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D I S C I P L I N A Psicologia da Educação

A Psicologia da adolescência

Autora

Vera Lúcia do Amaral

aula

05
Governo Federal Revisoras de Língua Portuguesa
Presidente da República Janaina Tomaz Capistrano
Luiz Inácio Lula da Silva Sandra Cristinne Xavier da Câmara
Ministro da Educação
Fernando Haddad Revisora Tipográfica
Secretário de Educação a Distância – SEED Nouraide Queiroz
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Ilustradora
Carolina Costa
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Editoração de Imagens
Reitor
José Ivonildo do Rêgo Adauto Harley
Carolina Costa
Vice-Reitora
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Secretária de Educação a Distância Bruno de Souza Melo
Vera Lúcia do Amaral Dimetrius de Carvalho Ferreira
Secretaria de Educação a Distância- SEDIS Ivana Lima
Johann Jean Evangelista de Melo
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Marta Maria Castanho Almeida Pernambuco Adaptação para Módulo Matemático
André Quintiliano Bezerra da Silva
Coordenador de Edição Kalinne Rayana Cavalcanti Pereira
Ary Sergio Braga Olinisky Thaísa Maria Simplício Lemos
Projeto Gráfico Imagens Utilizadas
Ivana Lima Banco de Imagens Sedis
Revisores de Estrutura e Linguagem (Secretaria de Educação a Distância) - UFRN
Eugenio Tavares Borges Fotografias - Adauto Harley
Jânio Gustavo Barbosa Stock.XCHG - www.sxc.hu
Thalyta Mabel Nobre Barbosa

Revisora das Normas da ABNT


Verônica Pinheiro da Silva
Divisão de Serviços Técnicos
Catalogação da publicação na Fonte. UFRN/Biblioteca Central “Zila Mamede”

Amaral, Vera Lúcia do.


   Psicologia da educação / Vera Lúcia do Amaral. - Natal, RN: EDUFRN, 2007.
208 p.: il.

   Conteúdo: A psicologia e sua importância para a educação – A inteligência – A vida afetiva: emoções e
sentimentos – Crescimento e desenvolvimento – A psicologia da adolescência – A formação da identidade:
alteridade e estigma – Como se aprende: o papel do cérebro – Como se aprende: a visão dos teóricos da
educação – Estratégias e estilos de aprendizagem: a aprendizagem no adulto – A dinâmica dos grupos e o processo
grupal – A família – A escola como espaço de socialização – Sexualidade – A questão das drogas – Os meios
de comunicação de massa.

1. Psicologia. 2. Psicologia educacional. 3. Didática. I. Título.

ISBN: 978-85-7273-370-0
CDU 159.9
RN/UF/BCZM               2007/49 CDD 150

Copyright © 2007 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da
UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Apresentação

D
ando continuidade à discussão sobre o desenvolvimento humano, nesta aula, vamos
observar o indivíduo no estágio em que geralmente o encontramos no Ensino Médio:
a adolescência. Vamos fazer um breve passeio pela história para ver como surge esse
conceito e vamos conhecer suas características físicas e comportamentais.

Objetivos
Conhecer o conceito de adolescência, diferenciando-o
1 de puberdade.

Conhecer as características psicológicas da adolescência.


2

Discutir a adolescência enquanto fenômeno universal.


3

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Adolescência, como surge?

N
a aula 4 (Crescimento e desenvolvimento), vimos que Piaget propõe como a última
das fases do desenvolvimento, o período das operações formais, que se inicia por
volta dos 12 anos de idade. Nesta fase, o pensamento atingiu a maturidade do seu
desenvolvimento, o indivíduo torna-se capaz de operar a partir de conceitos abstratos, sendo,
assim, capaz de abstrair e generalizar idéias. Concomitantemente a esse desenvolvimento
no plano mental, há também um crescimento orgânico acentuado, com modificações
fisiológicas, sobretudo dos órgãos da reprodução e dos caracteres sexuais secundários.

Pela idade, pelas características físicas e mentais, fica claro para nós que estamos nos
referindo a uma fase do desenvolvimento que costumamos chamar adolescência. Mas, será
que a adolescência é somente isso?

Atividade 1
Para você, o que é o adolescente? Cite a seguir 5 características que
1 você considera típicas do adolescente.

Você considera que essas características são comuns a todos os


2 adolescentes? Justifique.

1.
sua resposta

2.

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Discutindo um pouco da História

N
o início dos anos 60 do século XX, Phillippe Ariès, historiador francês, lança na
França o livro “A história social da infância e da família”, um marco no estudo
do conceito de infância e adolescência. Para ele, até o final do século XVIII não
havia uma concepção de infância como uma etapa distinta na evolução das pessoas;
uma criança era apenas um adulto em miniatura. Assim, elas participavam normalmente
de todas as atividades familiares, fosse o nascimento de uma criança, a morte de um
parente, fossem as atividades cotidianas.

A partir do início do século XIV, com todas as mudanças sociais trazidas pela Revolução
Industrial, começa também a ocorrer uma mudança nessa concepção. A instituição de leis
que reguladoras do trabalho e a responsabilização dos pais pela escolarização dos filhos
foram fatores importantes para a constituição de uma nova mentalidade sobre a família. As
crianças passaram a ser excluídas do mundo do trabalho e das responsabilidades e, com
isso, foram se separando do mundo dos adultos, surgindo o conceito de infância como um
período do desenvolvimento com características próprias.

A distinção entre crianças e adultos faz surgir a percepção de que há um período


intermediário, com características também particulares: a adolescência. Segundo Ariès, por
volta de 1890 há um enorme interesse por essa fase da vida, que se torna tema literário e
tema de preocupação dos educadores e políticos. De acordo com o autor, a adolescência
passa a ser caracterizada como um emaranhado de fatores de ordem individual, por estar
associada à maturidade biológica, e de ordem histórica e social, por estar relacionada às
condições específicas da cultura na qual o adolescente está inserido.

Assim, para Ariès, os conceitos de infância e de adolescência são invenções da sociedade


industrial. Mas, a partir daí, entendidos como fases da vida, esses temas passam a ser objeto
de estudos dos especialistas, provocando o aparecimento de políticas sociais e educacionais
e a consolidação da psicologia do desenvolvimento como área de conhecimento.

Os conceitos de adolescência
e puberdade

S
egundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a adolescência é um período da vida no
qual acontecem diversas mudanças físicas, psicológicas e comportamentais, que começa
aos 10 e vai até os 19 anos. No Brasil, para o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
ela começa aos 12 e vai até os 18 anos, provavelmente para coincidir com a maioridade penal
brasileira. Mas, que mudanças físicas, psicológicas e comportamentais seriam essas?

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A primeira mudança observada, geralmente, diz respeito às mudanças físicas. É o
período de um acelerado crescimento da estatura. O corpo do adolescente muda tão rápido
e tão radicalmente que não dá tempo para que ele se acostume com as modificações. O mais
comum é encontrarmos adolescentes com posturas “desengonçadas”, movimentos pouco
harmoniosos dos braços e pernas, resultando num caminhar “fora do ritmo”.

Figura 1 – Gráfico mostra o crescimento que ocorre na adolescência

Ao lado desse crescimento, uma série de outras modificações orgânicas começa a


acontecer, com características que variam entre meninas e meninos. Começam a aparecer
os chamados caracteres sexuais secundários: nas meninas, o surgimento das mamas; nos
meninos, o aumento dos testículos; em ambos, o desenvolvimento dos pelos pubianos. A
partir dessas modificações orgânicas, começa uma fase chamada puberdade. A puberdade,
então, não é o mesmo do que adolescência, mas ocorre dentro da adolescência, e marca,
organicamente, o início da preparação do sujeito para a procriação. A idade do início da
puberdade também varia em função do sexo: nos meninos, ocorre em torno dos 12 aos 14
anos; nas meninas, entre os 10 e os 13 anos.

Assim, a puberdade é marcada pelas características físicas descritas a seguir.

1. Nos meninos: modificação no timbre da voz; aumento da largura dos ombros;


aparecimento de pelos no rosto, axilas e região pubiana; crescimento do pênis e
testículos; e o surgimento da primeira ejaculação.

2. Nas meninas: desenvolvimento das glândulas mamárias; aumento dos quadris;


aparecimento de pelos na região pubiana; e o surgimento da primeira menstruação,
chamada menarca.

Essas características, apesar de serem universais e de acontecerem em todos os


seres humanos, podem sofrer variações, sendo aceleradas, retardadas e até interrompidas,

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dependendo de fatores ambientais, estresse, má nutrição, atividade física intensa. Por exemplo,
a desnutrição pode retardar a menarca em meninas e a prática de atividade física intensa, como
o trabalho infantil, pode acelerar esse processo. São conhecidos os estudos que mostram o
surgimento da menarca aos 9 anos de idade em meninas habitantes de regiões de clima quente
e, por outro lado, aos 15 anos em meninas que habitam regiões de clima frio.

Todas essas mudanças na anatomia e na fisiologia são, geralmente, acompanhadas


de mudanças comportamentais. A puberdade, como marca orgânica, é identificada pelo
mundo dos adultos como o momento em que o adolescente precisa começar a assumir
outro papel social, o que implica novas responsabilidades e posturas frente à vida. Como
essas mudanças ocorrem de uma forma muito rápida, o adolescente pode se sentir bastante
confuso, cheio de dúvidas e ansiedades com relação ao que a sociedade espera dele.

Essa pode ser, então, uma fase marcada por perdas: ele perde seu corpo infantil e
tem que passar a conviver com um “corpo novo” que ele ainda não sabe manejar muito
bem; perde dos pais a proteção e o amparo dispensados na infância; perde a identidade e o
papel dentro da família na qual mantinha uma relação de dependência natural. Essas perdas,
dependendo do suporte dado pela estrutura social e familiar, podem ser vivenciadas como
uma grande crise, que os autores costumam chamar de “crise da adolescência”.

As características
psicológicas da adolescência

M
auricio Knobel é um dos estudiosos dessa questão. Ele definiu uma síndrome normal Síndrome
da adolescência, como uma representação esquemática do fenômeno. A definição
Síndrome é um termo
de uma “normal anormalidade”, para ele, não significa que está identificando algo usado na Medicina para
patológico, mas serve somente para facilitar a compreensão desse período da vida. Vamos definir um conjunto de
sintomas que caracterizam
analisar agora as suas características psicológicas.
uma doença.
O contraditório na definição
de Knobel é ele usar o
termo para caracterizar algo
normal e não patológico.

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1. Busca de si mesmo e da identidade – Todas as modificações corporais e as expectativas
da sociedade com relação ao jovem levam-no a perceber que está vivenciando uma
situação nova, a qual muitas vezes é vivida com ansiedade pelo desconhecimento de
que rumo tomar. A experiência de ter um corpo em mutação leva a conflitos com a
auto-imagem, fazendo com que ora sinta orgulho ora sinta vergonha do próprio corpo.
Apesar de todas essas modificações, o adolescente precisa dar uma continuidade a sua
personalidade, ou seja, precisa saber quem ele é, em que está se transformando, para
assim reconstruir sua identidade. Os jovens passam horas e horas em frente ao espelho
e comparam-se uns aos outros, buscando um padrão de normalidade e aceitação.
Tais situações requerem momentos de isolamento e a assunção de identidades
transitórias, ocasionais ou circunstanciais, no sentido de entender a sua intimidade e,
assim, desenhar a sua própria identidade. Sobre a complexidade desse processo de
identificação estudaremos mais detidamente na próxima aula.

2. Tendência grupal – A busca da identidade no adolescente faz com que ele recorra,
como comportamento defensivo, à busca pela uniformidade, que pode lhe fornecer
segurança e auto-estima. A partir daí surge o espírito de grupo. No grupo, há
um processo massivo de identificação coletiva. Basta olhar para um grupo de
adolescentes: as vestimentas são semelhantes, o modo de falar (às vezes, criando
um “idioma” próprio), os lugares freqüentados, os interesses, tudo é absolutamente
semelhante. Neste momento, o jovem se identifica muito mais com seu grupo do que
com os familiares. No grupo, ele sente-se reforçado e apoiado em suas ansiedades.
Daí porque a vivência grupal é de fundamental importância. O grupo se constitui na
transição necessária entre o mundo familiar e o mundo adulto.

Figura 2 – a tendência grupal é próprio da adolescência

3. Necessidade de intelectualizar e fantasiar – A realidade impõe ao adolescente a


necessidade de renunciar ao corpo infantil e à proteção familiar. Isso pode ser vivido
como uma experiência de enorme desamparo e impotência, que o obriga a recorrer ao
pensamento para compensar essas perdas. O adolescente, então, tende a fugir para seu
mundo interior, como uma forma de buscar um reajuste emocional, e nessa tentativa de
encontro consigo mesmo começa a demonstrar preocupações de ordem ética, moral,
social. Neste momento, pode desenvolver grandes “teorias” sobre o mundo, nas quais
vai misturar justificativas concretas com idéias fantasiosas infantis.

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4. Crises religiosas – A conduta do jovem pode ir do total ateísmo até comportamentos
religiosos tão engajados que podem cursar do misticismo até o fanatismo. Entre
essas condutas, há uma grande variedade de posições religiosas e mudanças muito
freqüentes, tudo isso concordando com as mudanças e flutuações do seu próprio mundo
interno. A questão da religiosidade emerge como decorrência dos questionamentos
do adolescente sobre sua identidade, em uma tentativa de responder questões como
“quem sou”, “o que estou fazendo aqui”, “qual o meu papel na vida”.

5. Deslocamento temporal – A vivência temporal dos adolescentes pode ser observada em


situações que provavelmente já presenciamos: há um trabalho escolar para ser feito e
ele se envolve em outro tipo de atividade; a mãe insiste com a urgência do tempo e ele
responde que “dá tempo, o trabalho é pra... amanhã”. Outra situação seria uma festa
marcada para um mês depois, para a qual ele insiste em providenciar uma roupa “porque
está em cima da hora”. As urgências do adolescente são tão grandes quanto o “deixar para
depois”. Predomina uma visão sincrética do mundo, ou seja, uma visão indiferenciada dos
aspectos que constituem a realidade que se quer compreender, a percepção do todo sem,
porém, se compreender os seus aspectos constitutivos. O adolescente não possui ainda
as características adultas de delimitar e discriminar, o que só vai adquirindo lentamente
ao longo do seu desenvolvimento. À medida que vai elaborando suas perdas, começa a
surgir o conceito de tempo, que implica as noções de passado, presente e futuro.

6. Evolução sexual do auto-erotismo à heterossexualidade – Observa-se no adolescente


uma oscilação entre a atividade do tipo masturbatória e o começo dos exercícios
genitais, que se inicia se forma basicamente exploratória até evoluir para a verdadeira
genitalidade procriativa. Ao aceitar a sua genitalidade, o adolescente começa a busca
por um par. É a fase das grandes e “definitivas” paixões, que representa todos os
aspectos dos vínculos intensos e frágeis das relações interpessoais do adolescente.
A curiosidade sexual pode se manifestar pelo interesse por revistas pornográficas e
mesmo por experiências de ordem homossexual. O exibicionismo e o voyerismo se
manifestam nas vestimentas, nas maquiagens das meninas, nas atitudes durante jogos
e festas. Começam os contatos superficiais, depois profundos e mais íntimos, que
preenchem a sua vida sexual. Exibicionismo e
Voyerismo

7. Atitude social reivindicatória – Tais atitudes muitas vezes se configuram em respostas Exibicionismo e voyerismo
são manifestações da
às restrições impostas pela sociedade. Elas são a consolidação do que vem ocorrendo
sexualidade caracterizadas
no pensamento. As intelectualizações e fantasias conscientes que se reforçam nos por obtenção de prazer
grupos fazem com que essas atitudes se transformem em pensamento ativo, em uma sexual pela exibição dos
órgãos sexuais ou pela
verdadeira ação social, política, cultural. Muitas vezes, as perdas são vividas como
observação de outras
não sendo deles, mas da sociedade, dos seus pais, de sua família. O resultado é que pessoas, respectivamente.
descarregam toda sua revolta nessas figuras e podem vir a desenvolver atitudes São consideradas
patológicas quando essas
destrutivas, quando as perdas não são bem elaboradas. Essa particular característica
são as únicas maneiras de
do adolescente é aproveitada, em muitos casos, por certas seitas e grupos políticos ou se obter prazer sexual.
religiosos para arregimentar seguidores.

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8. Contradições sucessivas em todas as manifestações de conduta – A conduta do
adolescente está dominada pela ação, sendo esta a sua forma mais típica de expressão.
Mas, o adolescente não pode manter uma linha de conduta rígida, permanente, mesmo
que tente. Ele tem uma personalidade, no dizer de Spiegel, “esponjosa”, ou seja,
permeável, absorvente, que recebe e também projeta tudo enormemente. Isso faz com
que não possa ter uma conduta linear, o que só é observado em situações patológicas,
como no autismo e nas neuroses. Na verdade, é o mundo adulto que não suporta as
contradições dos adolescentes, não aceita suas identidades transitórias e exige deles
uma atitude adulta para a qual ainda não estão capacitados.

9. Separação progressiva dos pais – Esta é uma das perdas fundamentais que o adolescente
necessita assumir internamente e que pode gerar uma ansiedade muito intensa. Muitas
vezes, os pais não aceitam e negam o crescimento dos filhos, dificultando mais
ainda a resolução dessa ansiedade. Daí a importância da internalização por parte dos
adolescentes de boas imagens parentais, com papéis bem definidos, sem ambigüidades
ou encobrimentos. Algumas vezes, os pais transmitem uma imagem de personalidades
pouco consistentes, forçando o adolescente a buscar identificação com outras imagens
adultas, como ídolos do esporte ou do cinema, ou mesmo com figuras negativas que
prejudicam mais ainda sua formação. Um exemplo disso é a organização criminosa do
tráfico de drogas, que alicia jovens e até crianças para o mundo da criminalidade.

10. Constantes flutuações do humor – Além das modificações hormonais que já


influenciariam as modificações do humor, o sentimento básico de ansiedade e
depressão acompanha a adolescência, sobretudo devido às perdas que sofre. A
maneira como o adolescente as elaborar determinará a maior ou menor intensidade
dessas flutuações. A realidade nem sempre satisfaz suas aspirações, resultando em
sentimentos de frustração e solidão. Mas, da mesma maneira que se sente isolado do
mundo, um gesto simples pode fazer com que se sinta a mais feliz das criaturas.

Figura 3 – As flutuações de humor são outra característica desta fase

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A adolescência é um
acontecimento universal?

N
a atividade 1 perguntamos se você considerava as características que citou como
comuns a todos os adolescentes. O que estávamos querendo saber era a sua opinião
sobre a universalidade do “acontecer” adolescente. Agora que você leu sobre a
caracterização da adolescência feita por Mauricio Knobel, sua opinião continua a mesma?

Atividade 2
Reflita um pouco sobre os adolescentes que você conhece, observe-
1 os por alguns dias, converse com alguns deles. Em seguida, tente
listar quais das características descritas por Knobel você conseguiu
observar nesses adolescentes.

Se você puder, observe e converse com adolescentes de diferentes


2 classes sociais. Anote a seguir que características você pôde observar,
diferenciando pelas classes sociais.

1.
sua resposta

2.

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No início desta aula, quando discutimos o conceito de puberdade, dissemos que esse era
um fenômeno universal, apesar de ter sofrido variações. Ou seja, as modificações na estrutura
corporal, a explosão hormonal, o surgimento dos caracteres sexuais secundários podem variar
conforme a idade em que surgem, mas vão acontecer em todos os seres humanos, marcando
organicamente a transição entre a infância e a vida adulta. No entanto, quando se discute o
conceito de adolescência, sobretudo, se a entendemos como uma época caracterizada pelos
aspectos descritos anteriormente, as divergências entre os autores aparecem.

De uma maneira geral, a Psicologia tem, em suas teorias, naturalizado o fenômeno


psíquico, ou seja, apresenta-nos como se fizesse parte da natureza humana, como se
fosse algo de que somos dotados desde o nascimento. Observe como Knobel descreve a
adolescência, sem nenhuma preocupação em contextualizá-la no seu tempo histórico, na sua
cultura, nas relações com a sociedade. Seria possível imaginar um adolescente que desde a
sua infância já assume responsabilidades designadas para adultos – por exemplo, aqueles
que ajudam seus pais no roçado – passar por toda essa “crise” à qual nos referimos?

Ana Bock (1999) realizou um estudo interessante com psicólogos da cidade de São
Paulo, observando o significado que eles dão ao fenômeno psicológico de uma maneira
geral. Para ela, a visão desses psicólogos sobre o homem é a seguinte:

O homem, colocado na visão liberal, é pensado de forma descontextualizada,


cabendo a ele a responsabilidade por seu crescimento [...] Um homem que é dotado
de capacidades e possibilidades que lhe são inerentes, naturais. Um homem dotado
de uma natureza humana que lhe garante, se desenvolvida adequadamente, ricas e
variadas possibilidades. A sociedade é apenas o lócus de desenvolvimento do homem.
É vista como algo que contribui ou impede o desenvolvimento dos aspectos naturais
do homem. Cabe a cada um o esforço necessário para que a sociedade seja um espaço
de incentivo ao seu desenvolvimento. As condições estão dadas, cabe a cada um
aproveitá-las. (BOCK, 1999, p. 27).

Com relação à adolescência, Bock (2004) fez um outro estudo observando textos publicados
sobre esse tema, os quais visavam orientar pais e professores na “difícil” tarefa de educar os
jovens. O objetivo era analisar o conceito de adolescência subjacente a essas publicações. Ela
conclui que a adolescência, tal como apresentado nesses textos, não tem gênese social, ou seja,
nenhuma de suas características é constituída nas relações sociais e culturais.

Assim, ao se pensar a problemática da adolescência não se toma qualquer questão


social como referência. A falta de políticas para a juventude em nossa sociedade, a
desqualificação e inadequação das atividades escolares para a cultura jovem, o
sentimento de apropriação que os pais têm, em nossa sociedade, com relação aos
filhos, as contradições vividas, a distância entre o mundo adulto e o mundo jovem,
a impossibilidade de autonomia financeira dos jovens que ou não trabalham ou
sustentam a família, nenhuma destas questões é tomada como elemento importante
para compreender a forma como se apresenta a adolescência em nossa sociedade.
As relações familiares são as únicas que aparecem nos textos e são fator de influência
sobre a adolescência, mas não a constituem. (BOCK, 2004, p.38).

10 Aula 05 Psicologia da Educação


Temos defendido nesta disciplina a visão do homem enquanto um ser sócio-histórico,
ou seja, como aquele que pela sua atuação no mundo o transforma e é por ele transformado.
Nessa perspectiva, a adolescência é vista como uma construção social que tem repercussões na
subjetividade do sujeito, e não como um período natural do desenvolvimento. A compreensão
é que a adolescência é uma criação do homem. Os fatos sociais vão surgindo nas relações
sociais e com isso vão apresentando repercussões psicológicas. Assim, começa-se a dar
significados sociais a esses fatos. A adolescência é um desses fatos sociais que ganharam
significado social. Para compreendê-la, é preciso, então, que retomemos seu processo
social, para depois compreendê-la na forma como acontece para os jovens.

Concluímos com um trecho do trabalho de Bock (2004):

Não há nada de patológico; não há nada de natural. A adolescência é social e histórica.


Pode existir hoje e não existir mais amanhã, em uma nova formação social; pode existir
aqui e não existir ali; pode existir mais evidenciada em um determinado grupo social,
em uma mesma sociedade (aquele grupo que fica mais afastado do trabalho), e não
tão clara em outros grupos (os que se engajam no trabalho desde cedo e adquirem
autonomia financeira mais cedo). Não há uma adolescência como possibilidade de ser;
há uma adolescência como significado social, mas suas possibilidades de expressão
são muitas. (BOCK, 2004, p.42).

Atividade 3
Baseando-se na sua resposta à atividade 1, que tipo de comparação você pode
fazer entre o que você entendia por adolescência e o que você passou a entender
acerca desse período da vida, destacando os diversos aspectos envolvidos no
crescimento do ser humano, como o meio ambiente, a família e as questões
biológicas do indivíduo?
sua resposta

Aula 05 Psicologia da Educação 11


Resumo
Nesta aula, discutimos os conceitos de puberdade e adolescência, aprendendo
a diferenciá-los. Vimos também as características psicológicas da adolescência,
na visão de um dos seus teóricos. Finalizamos com a discussão sobre a
existência da adolescência como um fenômeno universal.

Auto-avaliação
Retome a atividade 2 e, à luz das concepções apresentadas por Ana Bock, faça
uma análise das observações dessa autora sobre a universalidade do conceito
de adolescência.

Referências
ARIÈS, P. História social da infância e da família. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.

BOCK, A. M. B. Aventuras do Barão de Munchhausen na psicologia. São Paulo: Cortez;


EDUC, 1999.

BOCK, Ana Mercês Bahia. A perspectiva sócio-histórica de Leontiev e a crítica à naturalização


da formação do ser humano: a adolescência em questão. Cad. CEDES, v. 24, n. 62, p. 26-43,
abr. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v24n62/20090.pdf>. Acesso em:
20 jul. 2007.

KNOBEL, M. El sindrome de la adolescencia normal. In: ABERASTURY, A.; KNOBEL, M. La


adolescencia normal. Buenos Aires: Paidos, 1977.

12 Aula 05 Psicologia da Educação

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