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A CONSTRUÇÃO DO CENCEITO DE EDUCAÇÃO EM ANTONIO

GRAMSCI

Resumo
O objetivo deste ensaio é refletir sobre o conceito de Daiane Grando
educação na perspectiva marxista de Antonio Gramsci Faculdade Guairacá
elencando alguns de seus conceitos e as possíveis prof.daianegrando@hotmail.com
contribuições destes para a área educacional. Em síntese, a
forma de compreender e pensar a educação no Brasil
recebe influência de várias correntes teóricas e podemos
constatar que Antonio Gramsci trás contribuições para a
construção de um conceito de educação voltado para um
viés crítico. Apoiados na literatura, concluímos que a as
teorizações gramscianas abrem amplas possibilidades para
uma educação voltada para superação da dominação e
disseminação de saberes que levem a formação humana a
partir de um processo dialético do real no âmbito de toda
sociedade civil.

Palavras‐chave: Antonio Gramsci. Educação. Conhecimento.

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A CONSTRUÇÃO DO CENCEITO DE EDUCAÇÃO EM ANTONIO GRAMSCI
Daiane Grando

PRESSUPOSTOS INICIAIS
A análise das concepções de educação e sociedade através dos tempos é crucial
para que possamos identificar os teóricos que contribuíram nas discussões sobre o ensino
e aprendizagem. O foco desta análise está voltado para a corrente teórica atrelada as
produções de Antonio Gramsci. Elencamos conceitos e refletimos sobre a forma como o
autor pensa a educação, o conhecimento e a sociedade.

O intuito é desvelar as contribuições da teoria Gramsciana e a gênese de seu


pensamento, pois sabemos que este influenciou e norteia diferentes formas de pensar a
educação mesmo na contemporaneidade. Para tanto, é necessário destacar as reflexões
pedagógicas de Gramsci e alguns dos conceitos discutidos pelo autor como: filosofia da
práxis, hegemonia, bloco histórico e intelectual orgânico, entre outros conceitos que se
fazem passiveis de análise e revelam seu posicionamento historicista que visou uma luta
constante pela formação cultural humana.

Gramsci inicia sua história de jovem revolucionário após ganhar uma bolsa de
estudos na universidade de Turim, não tendo condições de se manter na universidade
passa a escrever artigos para jornais. O momento pelo qual perpassa a cidade italiana é
de revolta, de luta entre os donos das fabricas e a classe operária. É nesse contexto que
ele sente a necessidade de estar à frente do movimento dos trabalhadores e auxiliar em
um processo revolucionário de esquerda (GUILHERME, 2009).

Gramsci defende assim seu ponto de vista e aliando‐se ao movimento trabalhador


estabelece vínculos políticos e existências com essa classe. Seu posicionamento em
relação ao socialismo fica explicito quando este se coloca a frente de um jornal com
sessões voltadas para esses ideais. Isso se explicita ainda com mais efervescência quando
também assume a liderança de um partido de cunho comunista (GRAMSCI, 1995).

Não obtendo sucesso em sua luta e com a ascensão da classe burguesa no poder é
acusado de incitar a guerra civil e é condenado a vinte anos de prisão. Nesse período em
que está em cárcere utiliza de seu pensamento militante para escrever sobre o contexto
em que estava inserido.

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Os cadernos do cárcere, assim chamados e publicados após sua morte expressam


seu pensamento revolucionário marcado por influências da tradição Marxista e sua
oposição à sociedade nos moldes capitalistas. Em condições desumanas e de isolamento
o autor não deixa seu espírito intelectual adormecer e mesmo sem recursos para produzir
consegue deixar o legado de seus cadernos e suas cartas.

Assim como Marx e seguindo seus pressupostos faz análises da sociedade e a


influência que esta exerce na formação do sujeito. Além da questão do trabalho e
relações de produção vistas em Marx, Gramsci busca nesses conceitos evidenciar que as
relações ideológicas e culturais influenciadas pelo poder estatal e consideradas por ele
determinantes para a vida em sociedade.

Coutinho (2011) salienta ainda que não fosse possível fazer os apontamentos
teóricos de Antonio Gramsci sem essa fundamentação no marxismo e que sua concepção
de marxismo como filosofia da práxis parte de um modo novo de relacionar economia e
política, infraestrutura e estrutura e de evidenciar como se da à ação humana frente a
estas determinações.

No artigo “Nosso Marx” publicado em 1918, Gramsci já expressava sua admiração


pela forma com que Marx compreendia a atividade cientifica. Salienta que muitas das
ideias que antecedem seu pensamento estão pautadas na compreensão de que o homem
é considerado espírito e pura consciência, vendo o indivíduo de forma isolada, muitas
vezes os conhecimentos valorizados eram arbitrários, fictícios (COUTINHO, 2011).

Partindo dos pressupostos de Marx a história passa a ser valorizada como domínio
das ideias, do espírito e consequentemente do conhecimento. A atividade científica passa
a ser algo sistemático e consciente vinculada ao indivíduo de forma isolada ou associada,
tem sua origem no concreto deixando de ser abstrações apenas religiosas e sociológicas
arbitrárias (COUTINHO, 2011).

Percebemos a forma como Marx compreende a realidade e o conhecimento como


parte desse todo. Gramsci partindo da análise dessas compreensões vai traçando os
caminhos para sua teoria, reconhecendo o valor do conhecimento historicamente
elaborado.

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Em Gramsci assim como em Marx o conhecimento é vinculado a um corpo que


pensa e que está estritamente conectado com as relações sócias. O autor se identifica
com esta materialização e conceitua que existe uma concepção de mundo que é
resultado do processo de vida real (PAZ; BEZERRA, 2007).

Tudo isso constitui a formação de uma epistemologia voltada para a compreensão


do real e como em Marx está atrelada a conhecimentos antropológicos, filosóficos e
sociológicos expressos no campo das ciências sociais. Em Gramsci é possível desvelar na
essência de seu pensamento a capacidade de mobilizar um quadro epistêmico capaz de
reconstruir os processos históricos que se preocupam com o particular e o universal
(SILVA, 2011).

A teoria do conhecimento expressa na esfera particular nada mais é do que um


conhecimento que de acordo com o contexto histórico, a cultura, a política, a classe
social pode se modificar e ser apropriado de diferentes formas e de acordo com as
necessidades humanas da realidade concreta. Já o que é universal deve ser transmitido
de geração para geração, é crucial e reconhecido como conhecimento científico ao qual
todo homem tem direito a acesso e compreensão e por meio deste estará
instrumentalizado para modificar a realidade em que vive.

Gramsci não vê o conhecimento como algo desvinculado do real, como algo


estanque e coloca que:

Se as verdades científicas fossem definitivas, a ciência teria deixado de


existir como tal, como investigação, como novas experiências, reduzindo‐
se a atividade científica a repetição do que já foi descoberto. O que não é
verdade, para felicidade da ciência (GRAMSCI, 1987, p. 70).

Para que o conhecimento seja verdadeiro é necessária uma revisão continua da


atividade cientifica. Como observamos na colocação do autor as verdades não são
definitivas e devem ser ressignificadas em suas múltiplas dimensões em todo processo de
ensino e aprendizagem.

Ao analisar de forma sucinta aspectos epistemológicos da teoria gramsciana é


possível compreender que em seus estudos existe uma indissociável relação entre

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conhecimento histórico, práxis, política, luta cultural e processos de formação humana.


Podemos evidenciar tais aspectos ao aprofundarmos nossas reflexões na compreensão e
análise de alguns de seus conceitos, evidenciando também a relação deste com a
educação e com o compromisso de formação humana apregoado pelo autor.

TRANSFORMAÇÃO E COMPREENSÃO DA REALIDADE EM GRAMSCI


Gramsci faz uma análise do estado e da sociedade civil como pertencente a esta
estrutura. Destaca que o estado deve zelar por equilíbrio, pela não dominação, assim, o
intuito é disseminar o espírito revolucionário para que a divisão de classes não se de por
meio da dominação de uma classe considerada fundamental sob uma classe subordinada.

Partindo disso, podemos dizer que Gramsci é contra o predomínio de normas e


valores ideológicos da classe burguesa sobre a classe proletária. É deste princípio que
nasce o conceito de hegemonia o qual:

[...] têm por objetivo compreender os fundamentos e as estratégias que


a classe dominante se utiliza para obter o consentimento ativo das
massas através de sua “auto‐organização” na sociedade civil (Carnoy,
1988, p. 95, apud NÉSPOLI, 2012, p. 68).

É desta hegemonia concebida por Gramsci que podemos destacar as influências


dos dominantes sob os dominados, desde os aspectos políticos bem como culturais e
históricos que influenciam diretamente na formação humana. Deste modo, estabelecem‐
se estratégias para disseminar concepções sociais voltadas para os interesses do capital.

Gramsci vai contra essa aceitação passiva de ideias e concepções, contra um poder
coercitivo de impor formas de ser e pensar socialmente. A sociedade civil deve ser um
extenso e complexo espaço público composto por identidades coletivas, com iniciativa
própria, composta por sujeitos capazes de construir sua própria cultura e valores e que
possam ter autonomia em relação ao poder estatal (SEMERARO, 1999).

Com a finalidade de superar a hegemonia dominante e atingir uma transformação


social a partir de identidades coletivas podemos destacar o papel do bloco histórico. Esta
hegemonia se da no interior do bloco histórico, conceituado por Gramsci, como uma

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aliança de grupos voltados à construção de um projeto histórico e classista tendo como


ponto de partida uma vontade coletiva (BARBOSA, S/A).

Essa consciência de classe esta atrelada ao que Gramsci chama de Filosofia da


práxis, união teoria‐prática que leva o sujeito a compreender e intervir no mundo que
vive. Assim, a filosofia da práxis é “uma concepção na qual os homens são sujeitos reais
da história e não instrumentos passivos de determinações materiais ou espirituais”
(SEMERARO, 1999, p. 73).

A importância dada por ele à liberdade e a vontade, mostra que isso só será
possível a partir de uma reforma intelectual e moral, sendo a escola e a cultura as
principais formadoras da consciência coletiva. Consciência esta que leva a participação
social ativa das classes menos privilegiadas construindo fundamentos éticos e políticos de
consenso, assim os homens se tornam sujeitos reais de sua história (SEMERARO, 1999).

Essa visão progressista em relação ao sujeito e a sociedade esta atrelada a cultura


como também a educação e a forma que está relação se da no seio social, para que assim
ocorra à práxis, ou seja, os sujeitos a partir de suas experiências podem vir a ser e
pertencer a esse meio social.

É crucial então compreendermos pontualmente as contribuições que Gramsci


proporciona a educação, pois, partindo dos conceitos sucintamente elencados é possível
destacar o papel das instituições sociais e principalmente da escola como ferramenta
para produção de cultura partindo de um viés critico.

APONTAMENTOS SOBRE A FUNÇÃO DA EDUCAÇÃO EM GRAMSCI


A essência de sua teoria esta pautada no marxismo originário. Podemos dizer que
isto se deu em conformidade com as idéias de Marx, mas não da mesma forma, pois a
sociedade está em constante transformação e Gramsci se depara com outro contexto
histórico, outra estrutura social. Tendo em vista estas transformações ele consegue
inovar de forma significativa as concepções marxistas (MARTINS, 2008).

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Diante da conjuntura social da época dentre as várias análises de Gramsci


podemos destacar sua visão e compreensão sobre o valor pedagógico do conhecimento.
Pensar a função da Educação e da escola em Gramsci é desvelar a importância do
conhecimento científico em sua esfera cultural, política e histórica, o qual pode levar a
emancipação humana.

A classe subalterna, assim denominada por Gramsci tem no conhecimento a ponte


para por meio da práxis, de suas ações teóricas e praticas cotidianas, ampliar suas
concepções de mundo. Por meio da cultura o homem sai da sua condição de “marginal”,
excluído e se faz pertencente ao contexto em que vive.

Para Gramsci, a humanidade é o reflexo do conhecimento historicamente


elaborado presente nas relações humanas. Para o autor, “a mente que desenvolve o
conhecimento está indissoluvelmente vinculada a um corpo situado e conectado às
relações sociais” (BEZERRA; PAZ, 2007, p. 14).

Diante disso, o princípio educativo deve constantemente fazer as relações com as


diversas facetas do conhecimento, aproximando o homem de seu mundo empírico.

O estado, o partido e o ser em sua essência individual cumprem funções de


hegemonia cultural. Partindo dessas interfaces Gramsci analisa as ações educativas na
escola tendo em vista que a partir de uma compreensão do pedagógico é possível ter
uma compreensão mais geral do pensamento político (MANACORDA, 1990).

Já em seus primeiros cadernos, Gramsci elucida a relevância das instituições que


incitam atividade cultural, contribuindo para a formação do ser social e entre estas
destaca o papel da escola. Historicamente o processo educativo é influenciado por
interesses sociais, políticos, ideológicos, portanto as transformações ocorridas na
sociedade no decorrer do tempo fazem com que a função da educação também se
modifique de acordo com o contexto.

Em um primeiro momento, o caráter intelectual de algumas atividades era


desconsiderando e isso influência diretamente na forma que se pensa à educação em
determinada época. O distanciamento entre teoria e prática, ciência e trabalho, esse

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processo de diferenciação provocou uma crise do princípio cultural e educativo


(MANACORDA, 1990).

Manacorda (1990) salienta ainda que partindo desta perspectiva, a classe


subalterna a qual trabalha com atividades consideradas sem um cunho intelectual e com
fins produtivos, práticos, acaba não tendo acesso ao conhecimento cientifico e cultural
ficando este restrito à classe dominante.

Gramsci é contra essa escola voltada aos interesses burgueses que trata o
conhecimento de forma técnica e enciclopédica, que instrumentaliza o trabalhador para
exercer determinadas funções nas quais não se vê como parte do processo.

Com o intuito de transformar essa educação o autor faz uma crítica à educação
tradicional. No caderno 12 ele aborda como a escola tradicional vem tratando o
conhecimento científico de forma abstrata e enfatiza ainda a importância do papel dessa
instituição para o desenvolvimento social como um todo:

A escola é instrumento para elaborar os intelectuais de diversos níveis. A


complexidade da função intelectual nos vários estados pode ser
objetivamente medida pela quantidade de escolas especializadas e pela
sua hierarquização: quanto mais extensa for a “área” escolar e quanto
mais numerosos forem os “graus” “verticais” da escola, tão mais
complexo será o mundo cultural, a civilização, de um determinado estado
(GRAMSCI, p. 19, 2000).

Diante destes pressupostos é possível evidenciar as potencialidades da escola


diante da sociedade. O estado conceituado como sociedade política e sociedade civil em
Gramsci é capaz por meio da educação de desenvolver seu mundo cultural e
consequentemente usar isso como ferramenta de poder.

Para além da análise de uma instituição em específico Gramsci enfatiza que é na


estrutura e na superestrutura que se da dá esse desenvolvimento. Os planos
superestruturais desenvolvidos na sociedade civil são organismos de origem privada que
tem relação com os meios de produção capitalista e se consolidam nas relações pessoais,
já a superestrutura, caracterizada como a sociedade política ou estado, tem a função de
consolidar a hegemonia exercendo um domínio direto sobre toda sociedade (GRAMSCI,
2000).

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Esse domínio direto pode ser capaz de levar a hegemonia, a uma disseminação de
formas de ser e pensar como já foi discutido anteriormente, podendo a escola ser uma
ferramenta para esses fins. Por isso a importância em refletirmos sobre os objetivos
dessa instituição social e a função que esta desempenha na formação do indivíduo.

A escola deve trabalhar com a cientificidade, instrumentalizando as massas. Nesse


sentido, a ciência esta presente em todos os momentos da vida humana e se consolida
nas relações sócias e no seio das estruturas como evidenciamos. Educamos a partir da
realidade viva, cultura e ciência são conceitos indissociáveis dessa realidade.

Em suas obras encontramos análises voltadas para diferentes pressupostos de


educação e de escola como: escola ativa, escola técnica, escola tradicional, escola
humanista, escola mecânica e jesuítica, escolas profissionalizantes, escola única, escolas
especializadas, escola clássica e escola elementar e média.

Não analisaremos cada denominação elencada anteriormente, mas evidenciamos


o olhar revolucionário de Gramsci para essas diferentes formas de pensar a educação. A
partir das análises Gramsciana das diferentes escolas e métodos de ensino é possível
destacar a escola unitária a qual expressa à vertente do seu pensamento em relação a
uma educação que pode levar a superação do status quo.

EDUCAÇÃO E ESCOLA
Partindo da necessidade da formação de uma consciência coletiva e da
importância da escola na formação dos intelectuais, Gramsci propõe algumas formas de
pensar a educação com o intuito de superar visões de senso comum e religião que
transformem os modos de pensar.

Falar em senso comum remete a ideia de que este é um mero significado ingênuo
da realidade, de uma compreensão aceita socialmente nos grupos sociais. Este sendo
comum em suas dimensões éticas e políticas não possui nada de ingênuo podendo
influenciar em determinadas visões de mundo e construir consensos que disseminam um
conformismo ativo das classes subalternas (MARTINS, 2008).

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É preciso superar essas formas limitadas de compreensão da realidade e isso se da


por meio do acesso ao conhecimento. É a partir dele que transformamos nossas ações. A
dialética entre conhecimento e ação abre possibilidades de ordem intelectual e moral,
que entram em confronto com a realidade e resultam em novas formas de pensar o
concreto visando à assimilação de novos elementos de interpretação (BEZERRA; PAZ,
2007).

Diante desse ponto de vista Gramsci propõe uma educação que supere as
desigualdades de classe e leve a apropriação do conhecimento historicamente
construído. Um processo pedagógico que zele pela formação de uma consciência
coletiva.

Suas primeiras proposições sobre a escola partem das reflexões sobre a


necessidade de uma intelectualização das atividades de cunho prático e uma praticização
das de cunho teórico (MANACORDA, 1990). Faz uma crítica a metodologias de ensino que
não contemplem objetivos que possam levar a essas relações.

Podemos analisar essas ações teóricas e práticas exemplificando a partir da visão


de Gramsci sobre o trabalho como principio educativo. É a partir do trabalho que o
homem se produz enquanto homem e de acordo com esse princípio o homem ao
produzir trabalho produz cultura e ciência. Diante disso, este pode ser tomado como
princípio fundamental no âmbito escolar orientando todo processo educativo
(RODRIGUES; HORA, 2012).

É possível assim destacar um exemplo da articulação do principio educativo com a


realidade social por meio do trabalho. A busca constante por uma educação para e pela
práxis faz com que Gramsci discuta sobre a educação escolar e analise como esta se
consolidou no contexto histórico em que viveu.

O trabalho é para Gramsci a ação concreta e deve estar atrelada a cientificidade.


Partindo dessa preposição:

Realiza sua opção por uma escola única de cultura geral humanística “no
sentido amplo e não somente no sentido tradicional”, isto é, definida a
solução racional da crise do princípio educativo, Gramsci dispõe‐se a

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estudar os modos concretos segundo os quais essa escola poderá


configurar‐se (MANACORDA, p. 158, 1990).

Conceituando ainda podemos definir de forma sucinta que a escola é “Unitária,


única, no sentido de união entre ciência e trabalho, cultura e trabalho, técnica e trabalho”
(RODRIGUES; HORA, 2012, p. 7). Sendo assim, a atividade mesmo que desenvolvida por
uma ação puramente “manual” esta articulada ao intelectual.

Nessa perspectiva a escola unitária atingiria as massas, fazendo com que o sendo
comum, seus costumes, idéias e crenças não sejam desconsiderados, mas se articulem ao
conhecimento cientifico. Partindo dessa visão é possível formar intelectuais no seio da
classe trabalhadora, os quais pudessem lutar por melhores condições de vida por meio de
uma emancipação de compreensões do concreto e do intelectual.

Surge assim a gênese da discussão do papel dos intelectuais na organização da


cultura, clamados por Gramsci de Intelectuais orgânicos. São categorizados nesses
termos, pois se originam de grupos sociais diferenciados, ou seja, cada grupo possui seus
intelectuais, estes pertencem à mesma classe (GRAMSCI, 2000).

O autor considera que as universidades e a escola da época em seus moldes não


conseguiam cumprir com a tarefa de formar lideres, defensores políticos atingindo as
massas. Coloca que essas instituições não estavam permeadas pelos ideais dos partidos e
não eram capazes de formar bons dirigentes já que assumiam uma posição apolítica
permeada por um discurso vazio (MANACORDA, 1990).

Percebemos assim a importância atribuída por Gramsci em articular a vida política


aos sistemas de ensino salientando que esta essência faz parte do real, do concreto esta
estritamente ligada a uma formação que leve o indivíduo a compreender seu papel, que
proporcione uma formação social.

Há então uma recusa de uma escola de caráter “desinteressado” que não objetive
tais análises. Por meio da visão de Gramsci a educação pode ser utilizada para diferentes
finalidades, pois, não tem um caráter desinteressado mais sim um duplo sentido ético‐
político. Este sentido é utilizado socialmente para manter consensos atribuídos pela
classe dominante em uma disputa constante por poder, ou vista por outro viés, pode ser

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o instrumento para romper com essa hegemonia e construir uma nova sociedade
(MARTINS 2008).

É necessário romper com concepções de mundo que vinculam os seres humanos


entre si e a natureza e que são é questionadas. É necessário romper com as verdades
existentes e apropriadas socialmente, principalmente na sociedade capitalista. Nesta, a
cultura é organizada e centralizada pelas unidades de produção e influência na
personalidade e potencialidades culturais do ser humano (BEZERRA, PAZ, 2007).

Essas concepções não podem se esmiuçar como algo objetivo. A sociedade não é
fundada na objetividade, mas sim em uma trama de relações sociais complexas e
subjetivas. Pensar a sociedade objetivamente é ver o mundo de forma acrítica, mecânica,
a‐histórica e anti‐humanista sendo isso prejudicial ao processo de transformação
(MARTINS, 2004).

Podemos tomar as palavras de Gramsci como pressuposto de um convite a


assumir um posicionamento crítico sobre o real. Precisamos ser capazes de assumirmos a
condição de sujeitos históricos imersos em um contexto em que a realidade é subjetiva e
influenciada por fatores que são determinantes e que devemos estar instrumentalizados
para interpretá‐los.

ALGUNS APONTAMENTOS
Partindo das discussões elencadas evidenciamos a importância dada por Gramsci
em desenvolver as potencialidades culturais do ser humano sem distinção de classe.
Refletindo sobre o atual momento histórico percebemos que a sociedade continua sendo
constantemente vinculada a interesses de classe e protagonizada pela influência de
políticas neoliberais, assim muitos princípios discutidos por em Gramsci parecem fazer
referencia a atualidade. O desafio de mudança estabelecido por ele está historicamente
posto e em constantemente discussão, contribuindo nas produções dos intelectuais
contemporâneos.

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Em Gramsci é possível encontrar diferentes maneiras de visualizar a escola e seu


papel frente aos grupos sociais. O processo de mobilização das massas pode ocorrer por
meio da educação escolar que valorize o homem como ser social.

A forma de conceber o conhecimento partindo do concreto revela sua luta por


uma práxis revolucionária e recupera pressupostos da tradição marxista desvelando
todos os entraves e possibilidades associados ao ato de conhecer. Para Gramsci o
conhecimento é mutável e obrigatoriamente disseminado na busca constante pela
mudança do ser social.

Sabemos que mesmo após as contribuições de diversos pensadores que


objetivaram transformar os moldes de uma educação tradicional e acrítica, o sistema do
capital ainda fornece ações determinantes em todas as esferas sociais. Pensar uma
educação para alem do capital é criar estratégias principalmente em relação aos
princípios educacionais, que levem ao rompimento com ideologias e verdades
estabelecidas e massificadas como pensamento hegemônico.

Essa aproximação com o pensamento de Gramsci nos leva a conhecer o valor de


seus conceitos e apontamentos para que se efetive uma educação para a emancipação.
Não há como negar seu extraordinário espírito revolucionário o qual mesmo quando
proibido de manifestar suas opiniões e em cárcere consegue continuar sua produção e
posteriormente tem suas concepções difundidas por todo o mundo.

REFERÊNCIAS
BARBOSA, W. Marxismo: História, política e método. Monografia apresentada no
Instituto Federal de Educação, ciência e tecnologia, S/A.

BEZERRA, C.; PAZ, S. R. Emancipação e apropriação social do conhecimento em Gramsci:


uma reflexão a partir do corpus categorial da filosofia da história. Trabalho & Educação‐
ISSN 1516‐9537/Submissões, Soumissions d'articles, Paper submissions‐2013/2014, v. 16, n.
2, p. 13‐26, 2012.

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COUTINHO, C. N. O leitor de Gramsci: Escritos escolhidos. Rio de Janeiro. Civilização


Brasileira, 2011.

GRAMSCI, A. Caderno 12. Apontamentos e notas esparsas para um grupo de ensaios


sobre a história dos intelectuais. O princípio educativo. In: Cadernos do Cárcere. Trad.
Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro, 2000.

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GUILHERME, C. A. S. A. O Gramsci político e revolucionário. Revista Urutágua 19 (2009):


117‐126.

MANACORDA, M. A. O Principio educativo em Gramsci. Porto Alegre: Artes Médicas,


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MARTINS, M. F. Marx, Gamsci e o conhecimento: ruptura ou continuidade? Campinas,


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RODRIGUES, J.; HORA, L. C. A. da. A educação em Gramsci e sua influência na Pedagogia


Histórico‐Crítica: a temática da escola e a crítica ao espontaneísmo. CEMARX (Colóquio
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SEMERARO, G. Da sociedade de massa à sociedade civil: A concepção da subjetividade em


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SILVA, M. L. Antonio Gramsci e as Ciências Sociais: A Unidade de contrários como


Fundamento de uma nova epistemologia. In: 35º ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO
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18: Marxismo E Ciências Sociais. Universidade Estaudal Paulista, Faculdade De Filosofia e
Ciências ANPOCS Campus de Marília, 2011.

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