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DADOS DE ODINRIGHT

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Breve Biografia
Nos arredores da Cidade do México fica Coyoacán, um lugarejo cheio de
casinhas coloridas e praças arborizadas. Um dos 16 distritos da capital mexicana,
essa foi a região onde Leon Trotsky viveu até o fim dos seus dias. À época, sua
rotina parecia tão entediante quanto a dos coyoaquenses. Bem cedo, levantava
para cuidar dos cactos, dos coelhos e das galinhas. Terminadas as tarefas,
Trotsky se trancava no escritório para ler, escrever ou receber militantes ávidos
por discussões políticas. Sustentava a família – a segunda esposa, Natalia
Sedova, e o neto, Esteban Volkov – com os rendimentos dos livros e dos artigos
que escrevia para jornais.
Por trás da aparente tranquilidade, porém, Trotsky era um homem receoso.
Antes de se mudar para o México, o ex-revolucionário havia sido duramente
perseguido por Josef Stálin. Seus parentes também – a maioria foi morta a
mando do ex-colega. Desconfiado e, ao mesmo tempo, abalado emocionalmente,
Trotsky preferia viver recluso. “O fim evidentemente está próximo”, pressentiu,
numa espécie de testamento redigido em fevereiro de 1940. Ele morreria seis
meses depois, aos 60 anos.
∗∗∗
Leon Trotsky nasceu Lev Davidovich Bronstein, em 7 de outubro de 1879, na
cidade de Ianovka, Ucrânia. Seus pais eram agricultores e, embora descendentes
de judeus, pouco afeiçoados à religião. Evitavam o iídiche, o idioma das
comunidades judaicas da Europa Oriental, preferindo uma mistura de russo com
ucraniano. A família criava porcos e galinhas, mas vivia principalmente da
produção de trigo – plantio desenvolvido com o auxílio de alguns poucos
empregados. Fora isso, a infância de Liova (diminutivo de Lev) foi a de um
modesto camponês. Pelo menos até os 9 anos, quando, para estudar, foi viver
com os tios em Odessa, região mais povoada que Ianovka.
“Pouco a pouco, ensinaram-me que era preciso dizer bom-dia pela manhã,
lavar as mãos, limpar as unhas, não levar a comida à boca com a faca, não se
atrasar, agradecer”, Trotsky relembra em Minha Vida, um de seus livros. Aliás,
foi justamente em Odessa que ele conheceu a literatura, bem como a música e o
teatro – as particularidades da vida urbana.
Aos 17 anos, o rapaz de cabelo desgrenhado, olhos azuis e óculos redondos
foi transferido para outra escola, na cidade de Nikolaiev. Lá, interessou-se pelo
marxismo – ao frequentar grupos críticos ao czar. Aos 18, tornou-se líder de uma
das agremiações – o Sindicato dos Trabalhadores do Sul da Rússia, que reunia
serralheiros, marceneiros, eletricistas, costureiras e estudantes. Como era de se
esperar, a organização incomodou as autoridades. Em 1898, prestes a fazer 20
anos, Trotsky e outros membros do sindicato foram aprisionados. Nos meses
seguintes, ele passou por presídios em Kerson e Odessa até chegar a Moscou,
onde se casou com Alexandra Sokolovskaia – uma marxista dos tempos de
Nikolaiev. Condenado ao exílio na Sibéria, ele e a mulher viveram em Ust Kut,
uma aldeia apinhada de cabanas sujas e infestadas por mosquitos. No exílio,
além de se tornar pai de duas meninas, Trotsky aprofundou o conhecimento nas
obras de Friedrich Engels e Karl Marx. Em 1902, abandonou Alexandra e as
filhas e fugiu com uma identidade falsa. Foi aí que ele adotou o nome pelo qual
seria conhecido para sempre e que, segundo ele próprio, pertencia a um
carcereiro da prisão de Odessa.
Em 1903, refugiado em Londres (trabalhando para o Iskra, jornal dirigido por
Vladimir Lenin e cujo nome significa “fagulha”), casou-se com Natalia Sedova –
com quem teve outros dois filhos. Dois anos depois, retornou à Rússia. Popular
entre os militantes do Partido Operário Social-Democrata Russo (por ter sido um
dos líderes no passado), ele rapidamente assumiu o Soviete de Petrogrado. Seu
discurso era de que uma “revolução permanente” estava prestes a acontecer –
profecia que viria a se concretizar 12 anos depois.
Em dezembro de 1905, a polícia invadiu a sede do Soviete e prendeu todos os
líderes do partido, incluindo Trotsky. No fim do ano seguinte, novamente banido
para a Sibéria, ele fingiu-se doente durante a viagem e escapou. Abrigou-se
primeiro em Viena; depois, cruzou o Atlântico rumo a Nova York. Lá, retomou a
vida de jornalista e se uniu aos mencheviques, “minoritários” que faziam uma
leitura moderada do marxismo – batendo de frente contra os bolcheviques,
“maioria” sob a liderança de Lenin que acreditava que o governo deveria ser
diretamente controlado pelos trabalhadores. No entanto, com o passar dos anos,
Trotsky divergiu e se afastou dos mencheviques. Em 1917, aos 37 anos, ele
desertou e se aliou oficialmente aos bolcheviques.
∗∗∗
Ao tomar conhecimento da revolução contra o czar, em março de 1917, Leon
Trotsky retornou (de novo) para a Rússia. Quando chegou a Petrogrado, não
demorou para ser alçado à presidência do Soviete. Valendo-se do prestígio e da
influência que tinha nas massas, passou a conspirar contra o comando
provisório. Em outubro, quando o governo foi à bancarrota, Trotsky assumiu o
Comitê Militar Revolucionário.
Sua primeira ordem foi o recrutamento de camponeses e veteranos (ex-
czaristas) para o chamado Exército Vermelho, a fim de deter forças contrárias à
revolução. Pelos três anos seguintes, era o próprio Trotsky quem comandava os
soldados contra as forças estrangeiras e o Exército Branco (mencheviques, em
sua maioria). Suas viagens eram feitas a bordo de um célebre trem blindado
vermelho – um verdadeiro quartel-general sobre trilhos com secretaria, estação
telegráfica, centro de rádio, biblioteca e até garagem para automóveis. Entre
1918 e 1921, estima-se que a locomotiva tenha percorrido cerca de 105 mil
quilômetros, o suficiente para dar quase três voltas ao redor da Terra,
transportando tropas, armas e provisões.
Durante esses três anos de “comunismo de guerra”, Trotsky foi um líder
aclamado entre as massas. Muitos, inclusive, o consideravam o verdadeiro herói
da Revolução Bolchevique. Já outros, até mesmo do próprio partido, o
consideravam autoritário e impiedoso. Certa vez, em meados de 1919, um
professor reclamou que os habitantes de Moscou estavam morrendo de fome. Ao
que Trotsky respondeu: “Isso não é fome. Quando Tito tomou Jerusalém, as
mães judias comeram seus filhos. Quando eu fizer as mães comerem os filhos, aí
você pode me dizer: `Estamos morrendo de fome.” Já em seu livro Terrorismo e
Comunismo – o anti Kautsky, Trotsky justifica o uso de terror para colocar o
Partido Comunista à frente de tudo e de todos. “Quem deseja o fim não pode
condenar os meios.”
Em paralelo ao Comitê Militar, Trotsky assumiu o Politburo, o órgão
executivo encarregado de decisões imediatas. Posteriormente, tornou-se
comissário das Relações Exteriores. Sua obsessão era espalhar o movimento
comunista por todo o mundo, plano não endossado pelos homens fortes do
partido. Os embates ficaram mais contundentes, sobretudo após o advento da
União Soviética, em 1922.
Com a morte de Lênin, em 1924, as coisas pioraram. Visto como fonte de
desagregação e “eterno menchevique”, ele perdeu a liderança para Stálin. Em
seguida, foi destituído do comissariado e proibido de falar em público. Julgado
por traição, em 1927, Trotsky foi expulso do Partido Comunista e expatriado
pela terceira – e última – vez.
∗∗∗
Destruído pela máquina que ele próprio construíra, Trotsky foi perseguido por
Stálin, o algoz que vitimou quase toda a sua família – restando apenas a esposa,
Natalia, e o neto Esteban. Obrigados a se refugiar, os três passaram por países
como Turquia, França e Noruega. Sensibilizados, os pintores comunistas Diego
Rivera e Frida Kahlo apresentaram ao governo mexicano um pedido de asilo
para Trotsky e sua família. O clamor foi atendido em 1937. Foi aí que eles se
estabeleceram em Coyoacán: primeiro, na casa dos artistas; depois, em um
casarão a poucas quadras dali – Trotsky havia traído Natalia (e a confiança de
Rivera) com Frida.
Em maio de 1940, atiradores stalinistas invadiram sua casa. Por sorte, ele
sobreviveu. Três meses depois, em 20 de agosto, outro agente se infiltrou no
convívio com Trotsky – apresentando-se como simpatizante. Escondendo uma
pequena picareta por debaixo do casaco, o assassino surpreendeu Trotsky na
biblioteca, desferindo um golpe no crânio. Gravemente ferido, o líder
bolchevique chegou consciente ao hospital. Horas depois, sem sinal de melhora,
resignou-se: “Dessa vez, eles conseguiram”. Trotsky faleceu no dia seguinte.
∗∗∗
“O grito que ele deu eu jamais esquecerei.” As palavras são de Ramón
Mercader, assassino confesso de Trotsky, em depoimento à polícia. Sua
identidade foi mantida em segredo pelos 20 anos em que cumpriu pena
(máxima) no México. Ele jamais admitiu ligação com a URSS. Mesmo assim,
após ser solto, Mercader foi recebido pela Rússia e secretamente condecorado
como herói da União Soviética. Morreu em 1978, aos 65 anos, em Cuba.
A Revolução Alemanha e a Burocracia Stalinista

Introdução
Devido ao fato do seu atraso extremo, o capitalismo russo mostrou ser o elo
mais fraco da cadeia imperialista. O capitalismo alemão aparece na crise atual
como o elo mais fraco pela razão oposta: é o capitalismo mais avançado na
Europa que se encontra numa situação sem saída. Mais se afirma o caráter
dinâmico das forças produtivas na Alemanha, mais estas últimas sufocam no
sistema etático da Europa, parecido ao "sistema" de gaiolas de uma miserável
exposição provincial. Cada viragem da conjuntura coloca o capitalismo alemão
face às tarefas que ele se esforçou de resolver pelo meio da guerra. Por
intermédio do governo dos Hohenzollern, a burguesia alemã prestava-se a
"organizar a Europa". Com o governo de Bruning-Curtius ela tentou realizar… a
união alfandegária com a Áustria. Que terrível redução da tarefas, de
possibilidades, de perspectivas! Mas teve que renunciar a esta união. O sistema
europeu tem pés de barro. Se alguns milhões de austríacos se unem à Alemanha,
a grande hegemonia salvadora da França pode desmoronar-se.
A Europa e sobretudo a Alemanha não podem progredir na via do capitalismo.
Se a crise atual fosse ultrapassada temporariamente graças ao jogo automático
das forças do próprio capitalismo – nas costas dos operários – isso implicaria o
renascimento a breve prazo de todas as contradições sob uma forma ainda mais
concentrada.
O peso da Europa na economia mundial só pode diminuir. As etiquetas
americanas: plano Dawes, plano Young, moratória Hoover aderem solidamente à
frente da Europa. A Europa foi submetida à ração americana.
O apodrecimento do capitalismo implica o apodrecimento social e cultural. A
via da diferenciação sistemática das nações, do crescimento do proletariado ao
preço da diminuição das classes médias, é bloqueada. Uma paragem ulterior da
crise social só pode significar a pauperização da pequena burguesia e uma
degenerescência das camadas sempre maiores do proletariado em lumpen. Esse
perigo, que é o mais grave, apanha pela garganta a vanguarda alemã.
A burocracia social-democrata é a parte mais podre da Europa capitalista
apodrecida. Ela começou o seu percurso histórico sob a bandeira de Marx e
Engels. Ela fixou-se como objectivo o derrube da dominação da burguesia. A
potente subida do capitalismo aspirou-a e arrastou-a consigo. Em nome da
reforma, ela renunciou à revolução, primeiro nos fatos depois em palavras.
Kautsky, evidentemente, defendeu ainda durante muito tempo a fraseologia
revolucionária, adaptando-a às necessidades do reformismo. Bernstein pelo
contrário exigiu que se renunciasse à revolução: o capitalismo entra num período
de prosperidade pacífica, sem crise nem guerra. Predição exemplar. Pode parecer
que entre Kautsky e Bernstein, houve uma contradição irredutível. De fato, eles
se completavam um ao outro simetricamente, como a bota esquerda e a bota
direita do reformismo.
A guerra rebentou. A social-democracia apoiou a guerra em nome da
prosperidade futura. Em vez da prosperidade, foi o declínio. Hoje, já não se trata
mais de deduzir a necessidade da revolução da falência do capitalismo; nem de
reconciliar os operários com o capitalismo por intermédio de reformas. A nova
política da social-democracia consiste em salvar a sociedade burguesa
renunciando às reformas.
Mas a decadência da social-democracia não para aí. A crise atual do
capitalismo agonizante obrigou a social-democracia a renunciar aos frutos da
longa luta econômica e política e a trazer os operários alemãs ao nível de vida de
seus pais, de seus avôs e mesmo dos bisavôs. Não há quadro histórico mais
trágico e ao mesmo tempo mais repugnante que o apodrecimento pernicioso do
reformismo no meio dos estilhaços de todas as conquistas e de todas as suas
esperanças. O teatro está à procura do modernismo. Que ele encena muitas vezes
Os Tecelões de Hauptmann, a peça mais atual de todas as peças. Mas que o
diretor do teatro não esqueça reservar as primeiras filas para os chefes da social-
democrata.
Aliás, eles não querem saber dos espetáculos: eles chegaram ao extremo limite
da sua faculdade de adaptação. Há um limite abaixo do qual a classe operária da
Alemanha não pode aceitar descer por muito tempo. Todavia, o regime burguês
que luta pela sua existência não quer reconhecer esse limite. Os decretos de
excepção de Bruning são só o início para apalpar o terreno. O regime de Bruning
mantêm-se graças ao apoio cobarde e pérfida da burocracia social-democrata,
que apoia-se sobre a confiança misturada e enfadonha de uma parte do
proletariado. O sistema dos decretos burocráticos é instável, incerto e pouco
viável. O capital necessita de outra política mais decisiva. O apoio da social-
democracia que não pode esquecer os seus próprios operários, é não somente
insuficiente para que ele possa realizar os seus próprios objetivos, mas ele
começa já a estorvar. O período das meias medidas passou. Para tentar encontrar
uma saída, a burguesia deve se libertar definitivamente da pressão das
organizações operárias, ela deve varrê-las, quebrá-las, dispersá-las.
Aqui começa a missão histórica do fascismo. Ele promove as classes que se
encontram imediatamente acima do proletariado e temem ser precipitadas nas
suas fileiras; ele organiza-as, militariza-as graças aos meios do capital
financeiro, sob a cobertura do Estado oficial, manda-as esmagar as organizações
proletárias, das mais revolucionárias às mais moderadas.
O fascismo não é somente um sistema de repressão, de violência e de terror
policial. O fascismo é um sistema de Estado particular que é fundado sobre a
extirpação de todos os elementos da democracia proletária na sociedade
burguesa. A tarefa do fascismo não é de esmagar somente a vanguarda
comunista, mas também de manter toda a classe numa situação de atomização
forçada. Para isso, não basta exterminar fisicamente a camada mais
revolucionária dos operários. É preciso esmagar todas as organizações livres e
independentes, destruir todas as bases de apoio do proletariado e liquidar os
resultados de três quartos de séculos de trabalho da social-democracia e dos
sindicatos. Porque é sobre esse trabalho que em última análise se apoia o Partido
comunista.
A social-democracia preparou todas as condições para a vitória do fascismo.
Mas também por aí ela preparou as condições para a sua própria liquidação
política. É completamente justo atribuir à social-democracia a responsabilidade
da legislação de excepção de Bruning tal como a ameaça da barbárie fascista.
Mas é absurdo de identificar a social-democracia com o fascismo.
Pela sua política durante a Revolução de 1848 a burguesia liberal preparou o
triunfo da contra-revolução, que, seguidamente reduziu o liberalismo à
impotência. Marx e Engels fustigaram a burguesia liberal alemã, tão
violentamente como Lassalle e de maneira mais aprofundada que este último.
Mas quando os lassallianos meteram no "mesmo saco reacionário" a contra-
revolução feudal e a burguesia liberal, Marx e Engels indignaram-se justamente
deste ultra-esquerdismo a despeito do caráter globalmente progressista do seu
trabalho, infinitamente mais importante que o trabalho dos liberais.
A teoria do "social-fascismo" reproduz o erro fundamental dos lassallianos nas
bases históricas novas. Ao colar aos nacional-socialistas e aos sociais-
democratas a mesma etiqueta fascista, a burocracia stalinista é levada nas ações
tais como o apoio ao referendo de Hitler: isto não é melhor que as combinações
dos lassallianos com Bismarck.
Na sua luta contra a social-democracia, os comunistas alemãs devem apoiar-se
na etapa atual sobre duas posições distintas:
a. a responsabilidade política da social-democracia no que diz respeito a
potência do fascismo;
b. a incompatibilidade absoluta que existe entre o fascismo e as
organizações operárias sobre as quais se apoia a social-democracia.
As contradições do capitalismo alemão atingiram hoje uma tal tensão que uma
explosão é inevitável. A capacidade de adaptação da social-democracia atingiu o
limite que precede a auto-liquidação. Os erros da burocracia stalinista atingiram
os limites da catástrofe. Tais são os três termos da equação que caracteriza a
situação na Alemanha. Tudo se mantém sobre o fio da navalha.
Quando se segue a situação alemã através dos jornais que chegam com um
atraso de quase uma semana, quando um manuscrito precisa uma nova semana
para atravessar a distância que separa Constantinopla de Berlim, e quando é
preciso ainda semanas para que um caderno chegue até ao leitor, diz-se
involuntariamente: não será demasiado tarde? E responde-se cada vez: não, os
exércitos que participam a esse combate são demasiado gigantescos para que se
tenha a temer uma decisão simultânea e fulminante. As forças do proletariado
alemão não estão esgotadas. Elas nem mesmo estão em movimento. A lógica dos
fatos falará cada dia de modo mais imperativo. Isso justifica a tentativa do autor
de fazer ouvir a sua voz, mesmo com o atraso de várias semanas, isto é de todo
um período histórico.
A burocracia stalinista decidiu que ela realizaria mais tranquilamente o seu
trabalho, se ela fechasse o autor destas linhas em Prinkipo. Ela obteve do social-
democrata Hermann Muller que recusasse o visa a… um "menchevique": a
frente única foi nesta ocasião realizada sem hesitações. Hoje os stalinistas
declaram nos jornais soviéticos oficiais, que eu "defendo" o governo de Bruning
de acordo com a social-democracia que se bate para que me acordem o direito de
entrar na Alemanha. Em vez de se indignar desta baixaria, é melhor rir desta
estupidez. Mas não riamos por demasiado tempo, porque temos pouco tempo.
Não há dúvida nenhuma que a evolução da situação demonstra a justeza do
que nós afirmamos. Mas por qual via a História administrará esta prova: porque
a falência da fração stalinista ou pela vitória da política marxista? Toda a questão
está aí. Trata-se do destino do povo alemão, e não somente dele.
As questões que são examinadas neste caderno não datam de ontem. Há já
nove anos que a direção da Internacional Comunista ocupa-se em revisar os
valores e se esforça de desorganizar a vanguarda internacional do proletariado,
por convulsões tácticas, cuja soma é o que se chama a "linha geral". A oposição
de esquerda russa (os bolcheviques-leninistas) formou-se na base não somente
dos problemas russos, mas também dos problemas internacionais. E os
problemas do desenvolvimento revolucionário da Alemanha não eram a sua
última da sua preocupação. Os desacordos sérios nesse domínio apareceram
desde 1923. O autor destas páginas exprimiu-se várias vezes sobre questões
debatidas. Uma parte importante das suas obras críticas foi mesmo editada em
alemão. O presente caderno se situa na linha do trabalho teórico e político da
oposição de esquerda. Muito do que não é mencionado de passagem fez no
momento oportuno objecto de um estudo detalhado. Envio o leitor em particular
aos meus livros: "A revolução internacional e a Internacional Comunista", "A
revolução permanente", etc. Agora que os desacordos surgem a todos sob o
aspecto de um grande problema histórico, pode-se apreciar melhor e com mais
profundidade a sua origem. Para um revolucionário serio, para um marxista
autêntico, isso é absolutamente necessário. Os ecléticos vivem de pensamentos
episódicos, de improvisações que surgem sob a pressão dos acontecimentos. Os
quadros marxistas, capazes de dirigir a revolução proletária, educam-se por um
estudo aprofundado, permanente e seguido das tarefas e das divergências.
Prinkipo, 27 de Janeiro de 1932
Capitulo I: A Social-Democracia
A "frente de ferro" é o bloco que constituíram as organizações sociais-
democratas, poderosas pelos seus efetivos, com os grupos impotentes dos
"republicanos" burgueses, que perderam todo o apoio do povo e toda a
segurança. Se os cadáveres nada valem para a luta, eles são bastante bons para
impedir os vivos de lutarem. Os chefes sociais-democratas utilizam os seus
aliados burgueses para refrear as organizações operárias. A luta, a luta… só se
fala disso. Mas na condição que se possa finalmente passar-se sem combater. Os
fascistas decidir-se-ão verdadeiramente passar das palavras aos atos? Quanto aos
sociais-democratas, eles nunca se decidiram, e portanto eles não são piores que
os outros.
Em caso de perigo real, a social-democracia coloca suas esperanças não na
"frente de ferro" mas na polícia prussiana. Mau cálculo! O fato que os polícias
foram escolhidos por uma parte importante entre os operários sociais-democratas
não quer dizer tudo. Aqui ainda é a existência que determina a consciência. O
operário que se tornou polícia ao serviço do Estado capitalista, é um polícia
burguês e não um operário. No decurso dos últimos anos, esses polícias tiveram
que afrontar mais vezes os operários revolucionários que os estudantes
nacionais-fascistas. Uma tal escola não pode passar sem deixar marcas. E o
essencial é que todo o polícia sabe que os governos mudam mas que a polícia
fica.
Um artigo do número do Ano Novo do órgão de discussão da social-
democracia, Das freie Wort (que jornal miserável!) explica o sentido profundo da
política de "tolerância". Face à política e à Reichswehr, Hitler, parece, nunca
poderá chegar ao poder. Com efeito, a Reichswehr, segundo a constituição,
depende diretamente do presidente da República. Por consequência, o fascismo
não é perigoso tanto que estiver à cabeça do Estado um presidente fiel à
constituição. É preciso apoiar o governo Brüning até às eleições presidenciais,
para eleger, aliando-se com a burguesia parlamentar, um presidente
constitucional, e barrar assim por sete anos o caminho do poder a Hitler. Nós
reproduzimos muito exatamente o conteúdo do artigo.1 Um partido de massa,
que mobiliza milhões de pessoas (para o socialismo!) considera que a questão de
saber qual classe estará no poder na Alemanha de hoje, agitada completamente,
depende não da combatividade do proletariado alemão, não dos grupos de ataque
do fascismo, nem mesmo da composição da Reichsweher, mas do fato que o
puro espírito da constituição de Weimar (com a quantidade indispensável de
cânfora e naftalina) será ou não instalado no palácio presidencial. E que se
passará se, numa certa situação, o espírito de Weimar admite, de acordo com
Bettmann-Hollweg, que a "necessidade faz lei". E que se passará se o envelope
frágil do espírito de Weimar, apesar da cânfora e da naftalina, se rasga no
momento menos propício? E que se passará se… mas tais questões não têm fim.
Os políticos do reformismo, essa gente de negócios hábeis, esses velhos
habituados da intriga e do carreirismo, esses homens experientes nas negociatas
parlamentares e ministeriais, se mostram – não se pode encontrar expressão mais
tenra – perfeitos imbecis, desde que a marcha dos acontecimentos os projeta fora
da sua esfera habitual e os confronta com os fatos importantes.
Colocar sua esperança num presidente também é colocar a sua esperança no
"Estado". Face à próxima confrontação entre o proletariado e a pequena-
burguesia fascista – esse dois campos constituem a esmagadora maioria da nação
alemã – os marxistas de Vorwärts pedem ajuda ao vigilante noturno. "Estado
intervém!" (Staat, greif zu!). Isso significa:
"Brüning, não nos obrigues a defender-nos com as forças das
organizações operárias, porque isso mete em movimento todo o
proletariado, e então o movimento ultrapassará as cabeças calvas do
governo: na origem o movimento antifascista, terminar-se-á em
movimento comunista".
A isso Brüning, se ele não preferia calar-se, poderia responder:
"não poderei acabar com o fascismo com as forças de polícia, mesmo
se eu quisesse; mas eu não queria, mesmo se pudesse. Avançar com a
Reichswher contra os fascistas significaria cortar em dois a Reichswehr,
se isso não a mete em movimento na sua totalidade contra mim; e o que
é mais importante ainda: voltar o aparelho burocrático contra os
fascistas equivaleria a deixar as mãos livres aos operários, dar-lhes total
liberdade de ação: as consequências seriam as mesmas que as que
vocês, sociais-democratas vocês temem, e que eu, por esta razão, temo
duplamente".
As chamadas da social-democracia produzirão no aparelho de Estado, sobre
os juízes, sobre a Reichswehr, sobre a polícia, o efeito contrários do efeito
esperado. O funcionário mais "leal", o mais "neutro", o menos ligado aos
nacionais-socialistas tem o seguinte raciocínio:
"Os sociais-democratas têm milhões de pessoas atrás deles; eles têm
entre as mãos imensos meios: a imprensa, o parlamento, as
municipalidades; trata-se da sua própria pele, o apoio dos comunistas na
luta contra os fascistas lhes está assegurada; e portanto, esses senhores
todos-poderosos dirigem-se a mim, simples funcionário, para que eu
lhes salvo do ataque dum partido que conta vários milhões de membros,
e cujos dirigentes podem ser amanhã meus chefes: os assuntos desses
senhores os sociais-democratas deve ser bastante maus e sem qualquer
perspectiva… É tempo para mim, funcionário, em pensar na minha
própria pele."
O resultado é que o funcionário "leal", "neutro" que hesitava até ontem,
tomará obrigatoriamente mediadas de precaução, quer dizer se ligará com os
nacionais-socialistas para assegurar o seu futuro. É assim que os reformistas que
se sobrevivem a eles próprios trabalham para os fascistas do fato da sua linha
burocrática.
Parasita da burguesia, a social-democracia está condenada a um parasitismo
ideológico miserável. Logo ele retoma as ideias dos economistas burgueses, logo
ele se esforça de utilizar os trechos do marxismo. Tendo retomado no meu
caderno considerações contra a participação do Partido comunista no referendo
de Hitler, Hilferding concluiu:
"Na verdade, não há nada a acrescentar a estas linhas para explicar a
táctica da social-democracia em relação ao governo Brüning." E
Remmele e Thalheimer declararam: "Olhai, Hilferding apoia-se em
Trotsky".
E uma folha de couve fascista acrescentou: neste assunto pagam a Trotsky
com uma promessa de visa. Um jornalista stalinista entra em cena e telegrafa a
Moscovo a declaração do jornal fascista. A redação do Izvestia, onde se encontra
o infeliz Radek, imprime o telegrama. Esta cadeia merece ser notada antes de
passar a outra coisa.
Voltemos a questões mais sérias. Hitler pode pagar-se o luxo de uma luta
contra Brüning unicamente porque o regime burguês na sua totalidade apoia-se
nas costas da metade da classe operária, aquela dirigida por Hilferding e
companhia. Se a social-democracia não tivesse levado uma política de traição de
classe, Hitler, sem falar do fato que ele nunca teria adquirido a força que tem
hoje, ter-se-ia agarrado ao governo de Brüning com a social-democracia, isso
teria sido um fato duma importância política enorme. Suas consequências de
qualquer modo teriam ultrapassado os dirigentes sociais-democratas. Hilferding
tenta encontrar uma justificação à sua traição na nossa crítica onde nós exigimos
dos comunistas que eles considerem a traição de Hilferding como um fato.
Ainda que Hilferding nada tenha "a acrescentar" às palavras de Trotsky, ele
junta mesmo assim qualquer coisa: as relações de forças, diz ele, é tal que,
mesmo se ações comuns dos operários comunistas e sociais-democratas tivessem
lugar, seria impossível "mesmo intensificando a luta, derrubar o adversário e de
se apoderar do poder". O centro de gravidade da questão está nesta nota lançada
de passagem, sem prova em apoio. Segundo Hilferding, na Alemanha
contemporânea onde o proletariado constitui a maioria da população e a força
produtiva da sociedade, a luta comum da social-democracia e do Partido
comunista não poderia dar o poder ao proletariado! Mas então a que momento o
poder é susceptível de passar para as mãos do proletariado? Antes da guerra
havia a perspectiva do crescimento automático do capitalismo, o crescimento do
proletariado e o crescimento paralelo da social-democracia. A guerra acabou
com esse processo e doravante nenhuma força no mundo não é susceptível de a
restabelecer. O apodrecimento do capitalismo implica que a questão do poder
deve ser resolvida na base das forças produtivas atuais. Ao prolongar a agonia do
regime capitalista, a social-democracia conduz somente à decadência ulterior da
economia, à desintegração do proletariado, à gangrena social. Ela não tem outras
perspectivas; e amanhã será pior que hoje, e depois de amanhã, pior que amanhã.
Mas já os dirigentes da social-democracia não ousam mais olhar o futuro de
frente. Eles possuem todas as taras da classe dirigente condenadas a desaparecer:
a despreocupação, paralisia da vontade, tendência a se desviar dos
acontecimentos e esperar milagres. Se refletirmos, as pesquisas econômicas de
Tarnov preenchem a mesma função que as revelações consoladoras de qualquer
Rasputine…
Os sociais-democratas, aliados dos comunistas, não poderiam tomar o poder.
Aí está o pequeno burguês cultivado (gebildet), infinitamente cobarde e
orgulhoso, cheio da cabeça aos pés da desconfiança e do desprezo pelas massas.
A social-democracia e o Partido comunista têm os dois cerca de 40% dos votos,
sem ter em conta o fato que as traições da social-democracia e os erros do
Partido comunista rejeitam milhões de operários no campo da indiferença ou
mesmo no do nacional-socialismo. O fato desses dois partidos avançarem ações
comuns aumentaria consideravelmente a força política do proletariado, ao
mesmo tempo oferecendo novas perspectivas às massas. Mas partamos dos 40%.
Pode ser que Brüning ou Hitler tenham mais. Mas sós, esses três grupos: o
proletariado, o partido do centro ou os fascistas, podem dirigir a Alemanha. O
pequeno burguês cultivado está penetrado até aos ossos desta verdade: o
representante do capital só necessita de 20% dos votos para governar, porque a
burguesia possui os bancos, os trusts, os cartéis, os caminhos de ferro. É verdade
que o nosso pequeno-burguês cultivado se preparava, há doze anos, a
"socializar" tudo isso. Tudo pode acontecer! Programa de socialização – sim,
expropriação dos expropriadores – não, porque isso é já bolchevismo.
Analisamos acima a relação de forças fazendo um corte ao nível parlamentar.
Mas é um espelho deformado. A representação parlamentar de uma classe
oprimida é consideravelmente abaixo da sua força real, e inversamente, a
representação da burguesia, mesmo um dia antes da sua queda, será sempre a
mascarada da sua força imaginária. Só a luta revolucionária evidencia, varrendo
tudo o que pode esconder, a verdadeira relação de forças. Na luta direta e
imediata pelo poder, o proletariado desenvolve uma força infinitamente superior
à sua expressão no parlamento, com a condição, todavia, que uma sabotagem
interna, o austro-marxismo ou outras formas de traição, não o paralise.
Lembremos ainda uma vez a lição incomparável da história: quando os
bolcheviques apoderaram-se solidamente do poder, eles não dispunham na
Assembleia constituinte senão de um terço dos votos, o que com os socialistas-
revolucionários de esquerda fazia menos de 40%. E apesar da terrível destruição
econômica, a guerra, a traição da social-democracia europeia e sobretudo a
social-democracia alemã, apesar da reação de cansaço que tinha seguido a
guerra, apesar do desenvolvimento dum estado de espírito thermidoriano, o
primeiro Estado operário manteve-se quatorze anos. O que é preciso dizer da
Alemanha? Quando o operário social-democrata se insurgirá com o operário
comunista para tomar o poder, a tarefa será a 9/10 resolvida.
Portanto, declara Hilferding, se a social-democracia tivesse votado contra o
governo Brüning e tendo-o derrubado, isso teria como consequência a chegada
dos fascistas ao poder. Certamente, ao nível parlamentar o assunto apresenta-se
desta maneira; mas ao nível parlamentar não nos interessa aqui. A social-
democracia podia recusar o apoio à Brüning somente se ela se comprometesse na
via da luta revolucionária. Seja o apoio a Brüning, seja a luta pela ditadura do
proletariado. Não há terceira solução. O voto social-democrata contra Brüning
teria imediatamente modificado a relação de forças, não sobre o tabuleiro
parlamentar, cujos piões encontrar-se-iam de repente debaixo da mesa, mas na
arena da luta de classe revolucionária. Com uma tal viragem as forças da classe
operária não teriam sido multiplicadas por dois mas por dez, porque o fator
moral não ocupa o último lugar na luta de classes, sobretudo quando das grandes
viragens históricas. Uma corrente moral de alta tensão teria atravessado todas as
camadas do povo. O proletariado teria dito com segurança que ele era o único a
poder dar hoje outra orientação, superior, à vida desta grande nação. A
desagregação e a desmoralização do exército de Hitler teriam começado antes
mesmo dos combates decisivos. Certamente as confrontações não teriam podido
ser evitadas; mas a firme vontade de ganhar e uma ofensiva ousada teriam
tornado a vitória infinitamente mais fácil que não se imagina hoje o
revolucionário mais otimista.
Para isso só falta uma coisa: a viragem da social-democracia na via da
revolução. Após a experiência dos anos 1914-1932, seria uma ilusão ridícula
esperar uma viragem voluntária da parte dos dirigentes. No que respeita a
maioria dos operários sociais-democratas, é outro assunto: eles podem tomar
uma viragem e farão, é preciso somente ajudá-los. Mas será uma viragem não
somente contra o Estado burguês, mas também contra as esferas dirigentes do
seu próprio partido.
E aí, o nosso austro-marxista que "não tem nada a acrescentar" às nossas
palavras, tentará mais uma vez nos opor citações tiradas dos nosso próprios
trabalhos: não escrevemos, com efeito, que a política da burocracia stalinista se
apresentava como um seguimento de erros, não estigmatizamos a participação
do Partido comunista no referendo de Hitler?
Escrevemos e estigmatizamos. Mas lutamos contra a direção da Internacional
Comunista precisamente poque ela é incapaz de rebentar a social-democracia, de
lhe arrancar as massas à sua influência e de libertar a locomotiva da história do
seu travão enferrujado. Pelos seus impasses, seus erros, pelo seu ultimatismo
burocrático, a burocracia stalinista permite à social-democracia de se manter e de
recair cada vez sobre as suas patas.
O Partido comunista é um partido proletário, antiburguês, mesmo se ele é
dirigido de forma errada. A social-democracia, apesar da sua composição
operária, é um partido inteiramente burguês, dirigido nas condições "normais" de
modo muito hábil do ponto de vista dos objetivos da burguesia; mas esse partido
não vale nada nas condições de crise social. Os dirigentes sociais-democratas são
forçados, mesmo contra a sua vontade, de admitir o caráter burguês do seu
partido. A propósito da crise e do desemprego, Tarnov repete as frases usadas
sobre a "vergonha da civilização capitalista", da mesma maneira que um pastor
protestante fala do pecado da riqueza; Tarnov fala do socialismo como um padre
fala da recompensa no outro mundo; mas é completamente diferente que ele se
exprima sobre as questões concretas: "Se no 14 de Setembro esse espectro (do
desemprego) não fosse resolvido por detrás das urnas, este dia teria tido na
história da Alemanha uma fisionomia diferente" (em relação ao congresso de
Leipzig). A social-democracia perdeu eleitores e mandatos porque o capitalismo
revelou na crise a sua verdadeira cara. A crise não reforçou o partido do
"socialismo", mas pelo contrários ela enfraqueceu-o, da mesma maneira que ela
reduziu a circulação das mercadorias, o dinheiro nas caixas dos bancos, a
suficiência de Hoover e Ford, os rendimentos do príncipe de Mônaco, etc. As
apreciações mais otimistas da conjuntura, é preciso procurá-las agora não nos
jornais burgueses mas nos jornais sociais-democratas. Pode haver demonstração
mais indiscutível do caráter burguês desse partido? Se a doença do capitalismo
implica a doença da social-democracia, a morte próxima do capitalismo só pode
significar a morte próxima da social-democracia. Um partido que se apoia sobre
os operários mas que está ao serviço da burguesia não pode, num período de
exacerbação da luta de classe, não sentir o sopro do túmulo.
Capitulo II: Democracia e Fascismo
O 11º Plenário do Congresso executivo da Internacional Comunista admitiu a
necessidade de acabar com as vistas erradas que se fundam na "construção
liberal da contradição entre o fascismo e a democracia burguesa, entre as formas
parlamentares da ditadura burguesa e as suas formas abertamente fascistas… ".
O fundo desta filosofia stalinista é muito simples: partindo da negação marxista
de uma contradição absoluta, ela tira uma negação da contradição em geral,
mesmo relativa. É um erro típico do esquerdismo vulgar. Porque se não existe
nenhuma contradição entre a democracia e o fascismo, mesmo ao nível das
formas que toma a dominação da burguesia, esses dois regimes devem
simplesmente coincidir. Daí a conclusão: social-democracia = fascismo. Mas
porquê então chamam a social-democracia social-fascismo? Que significa a
propriamente dizer nesta ligação o termo "social", não recebemos até agora
qualquer explicação2.
Todavia, as decisões dos plenários do Comité executivo da Internacional
Comunista não modifica nada a natureza das coisas. Existe uma contradição
entre o fascismo e a democracia. Ela não é "absoluta" ou, para utilizar a
linguagem do marxismo, ela não exprime o domínio de duas classes irredutíveis.
Mas ela designa dois sistemas diferentes de dominação de uma só e mesma
classe. Esses dois sistemas: parlamentares democrático e fascista, apoia-se em
diferentes combinações das classes oprimidas e exploradas e entram
infalivelmente em conflito exacerbado um com o outro.
A social-democracia, hoje principal representante do regime parlamentar
burguês, apoia-se nos operários. O fascismo apoia-se na pequena burguesia. A
social-democracia não pode ter influência sem organização operária de massa. O
fascismo para instaurar o seu poder precisa destruir as organizações operárias. O
parlamento é a arena principal da social-democracia. O sistema fascista é
fundado sobre a destruição do parlamentarismo. Para a burguesia monopolista,
os regimes parlamentares e fascistas são os diferentes instrumentos da sua
dominação: ela recorre a um ou a outro segundo as condições históricas. Mas
para a social-democracia como para o fascismo, a escolha de um ou de outro
instrumento tem um significado independente, certamente, é para eles uma
questão de vida ou de morte política.
O regime fascista viu a sua vez chegar quando os meios "normais", militares e
policiais da ditadura burguesa, com a sua cobertura parlamentar, não bastam para
manter a sociedade em equilíbrio. Através dos agentes do fascismo, o capital
mete em ação as massas da pequena-burguesia enraivecida, as bandas de
lumpemproletariado desclassificados e desmoralizados, todos esses numerosos
seres humanos que o próprio capital financeiro mergulhou na raiva e no
desespero. A burguesia exige do fascismo um trabalho acabado: dado que ela
admitiu os métodos da guerra civil, ela quer ter a tranquilidade por muitos anos.
E os agentes do fascismo utilizando a pequena-burguesia como aríete destruído
todos os obstáculos sobre o seu caminho, levarão o trabalho até ao fim. A vitória
do fascismo faz de modo que o capital financeiro apanhe diretamente nas suas
tenazes de aço todos os órgãos e instituições de dominação, de direção e de
educação: o aparelho de Estado com o exército, as municipalidades, as
universidades, as escolas, a imprensa, as organizações sindicais, as cooperativas.
A fascisação do Estado não implica somente a "mussolinisação" das formas e
métodos de governo – nesse domínio as mudanças jogam no fim um papel
secundário – mas antes de tudo e sobretudo, o esmagamento das organizações
operárias: é preciso reduzir o proletariado a um estado de apatia completa e criar
uma rede de instituições penetrando profundamente as massas, para evitar toda
cristalização independente do proletariado. É precisamente nisso que reside a
essência do regime fascista.
O que acabou de ser dito não contradiz o fato que ele possa existir durante um
período determinado um regime de transição entre o sistema democrático e o
sistema fascista, combinando as características de um e de outro: tal é a lei geral
da substituição de um sistema por outro, mesmo se eles são irredutivelmente
hostis um ao outro. Há momentos onde a burguesia se apoia na social-
democracia e sobre o fascismo, isto é, que ela utiliza simultaneamente os seus
agentes conciliadores e os seus agentes terroristas. Tal foi, num certo sentido, o
governo de Kerensky durante os últimos meses da sua existência: ele apoiava-se
metade sobre os Sovietes e ao mesmo tempo conspirava com Kornilov. Tal é o
governo de Bruning dançando sobre a corda bamba entre dois campos
irredutíveis, com o pêndulo dos decretos de excepção nas mãos. Mas tal situação
do Estado e do governo só pode ter um caráter temporário. Ela é característica
do período de transição: a social-democracia está em vias de terminar a sua
missão, enquanto que nem o comunismo nem o fascismo ainda não estão prontos
a tomar o poder.
Os comunistas italianos que há muito tempo se vêm confrontados com o
problema do fascismo, protestaram mais que uma vez contra a utilização muito
propagada mas errada desse conceito. Na época do VIº Congresso da
Internacional Comunista, Ercoli desenvolvia ainda posições sobre a questão do
fascismo que são agora consideradas como "trotskystas". Definindo o fascismo
como o sistema mais consequente e o mais concretizado da reação, Ercoli
explicava:
"Esta afirmação não se funda nem sobre os atos terroristas e cruéis,
nem sobre o grande número de operários e de camponeses mortos, em
sobre a ferocidade dos diferentes tipos de tortura largamente
empregado, nem sobre a severidade das condenações; ela é motivada
pela destruição sistemática de todas as formas de organização autônoma
das massas".
Aqui Ercoli tem completamente razão: a essência e o papel do fascismo visam
liquidar totalmente todas as organizações operárias e a impedir qualquer
renascimento destas últimas. Na sociedade capitalista desenvolvida este
objectivo não pode ser alcançado unicamente por meios policiais. A única via
para aí chegar consiste em opor à pressão do proletariado – quando ela abranda –
a pressão das massas pequeno burguesas tomada pelo desespero. É precisamente
esse sistema particular da reacção capitalista que entrou na história sob o nome
de fascismo.
"O problema das relações existentes entre o fascismo e a social-
democracia – escrevia Ercoli – depende precisamente desse domínio
(quer dizer da oposição irredutível entre o fascismo e as organizações
operárias). Desse ponto de vista, o fascismo se distingue nitidamente de
todos os outros regimes reacionários que foram instaurados até ao
presente no mundo capitalista contemporâneo. Ele rejeita qualquer
compromisso com a social-democracia, ele persegue-a ferozmente; ele
tira-lhe toda possibilidade de existência legal; ele força-a exilar-se."
Eis o que declarava esse artigo, imprimido num órgão dirigente da
Internacional Comunista! A seguir Manuilsky soprou na orelha de Molotov a
ideia genial do "terceiro período". A França, a Alemanha, a Polônia foram
colocadas na "primeira fila da ofensiva revolucionária". A conquista do poder foi
proclamada tarefa imediata. Face à insurreição proletária todos os partidos, à
excepção do Partido comunista, eram contra-revolucionários, não era mais
necessário distinguir entre o fascismo e a social-democracia. A teoria do social
fascismo foi adotada. Os burocratas da Internacional Comunista mudaram de
opinião. Ercoli apressou-se a demonstrar que se a verdade lhe era cara, Molotov
lhe era ainda mais caro, e… escreveu um relatório defendendo a teoria do social-
fascismo. "A social-democracia italiana – declarou em Fevereiro 1930 – se
fascista com extrema facilidade." Infelizmente, é ainda com maior facilidade que
os funcionários do comunismo oficial se servilizam.
A nossa crítica da teoria e da prática do "terceiro período" foi, como se podia
esperar, declarada contra-revolucionária. A experiência cruel, que tão caro
custou à vanguarda proletária, tornou necessária uma viragem a esse nível
igualmente. O "terceiro período" assim como Molotov foram despedidos da
Internacional Comunista. Mas a teoria do social-fascismo continuou como único
fruto chegado à maturidade do terceiro período. Aqui não pode haver mudanças:
só Molotov se tinha ligado ao terceiro período; em contra-partida, Stálin
comprometeu-se pessoalmente com a teoria do social-fascismo.
Em enxergue dos seus estudos sobre o social-fascismo, o Rote Fahne colocou
estas palavras de Stálin:
"O fascismo é a organização de combate da burguesia que se sustenta
no apoio ativo da social-democracia. A social-democracia é
objetivamente a ala moderada do fascismo."
Como acontece geralmente a Stálin quando ele se esforça em generalizar, a
primeira frase contradiz a segunda. Que a burguesia se apoie sobre a social-
democracia e que o fascismo seja a organização de combate da burguesia, é
completamente indiscutível e foi dito há bastante tempo. Mas daí decorre
somente o fato que a social-democracia como o fascismo são instrumentos da
grande burguesia. Mas é impossível compreender porquê a social-democracia
mostra ser a "ala" do fascismo. Uma segunda definição do mesmo autor também
não é mais profunda: a social-democracia e o fascismo não são adversários mas
irmãos gémeos… Gémeos podem ser cruéis adversários; aliás, não é necessário
que aliados nasçam no mesmo dia da mesma mãe. A construção de Stálin não
somente a lógica formal falta, mas também a dialética. A força desta fórmula
reside no fato que ninguém a ousa criticar.
Entre a democracia e o fascismo não há diferença do ponto de vista do
"conteúdo de classe" nos ensina, seguindo Stálin, Werner Hirsch (Die
Internationale, Janeiro de 1932). A passagem da democracia ao fascismo pode
tomar o caráter de um "processo orgânico", isto é produzir-se "progressivamente
e a frio". Este raciocínio poderia surpreender se os epígonos não nos tivessem
aprendido a nos espantar.
Entre a democracia e o fascismo não há "diferença de classe". Isso significa,
evidentemente, que a democracia como o fascismo têm um caráter burguês. Nós
não esperamos Janeiro de 1932 para o adivinhar. Mas a classe dominante não
vive isolada. Ela encontra-se nas relações determinada com as outras classes. No
regime "democrático" da sociedade capitalista desenvolvida, a burguesia apoia-
se em primeiro lugar na classe operária domesticada pelos reformistas. É na
Inglaterra que esse sistema encontra a sua expressão mais concretizada, tanto sob
um governo trabalhista como sob um governo conservador. Em regime fascista,
numa primeira fase pelo menos, o capital apoia-se sobre a pequena burguesia
para destruir as organizações do proletariado. A Itália por exemplo! Existe
alguma diferença no "conteúdo de classe" desses dois regimes? Se se coloca a
questão somente a propósito da classe dominante, não há diferença. Mas se se
tomar a situação e as relações recíprocas entre todas as classes do ponto de vista
do proletariado, a diferença é muito grande.
No decurso de várias dezenas de anos os operários construíram no interior da
democracia burguesa, utilizando-a ao mesmo tempo lutando contra ela, seus
bastiões, suas bases, seus focos de democracia proletária: os sindicatos, os
partidos, os clubes de formação, as organizações desportiva, as cooperativas, etc.
O proletariado pode chegar ao poder não num quadro formal da democracia
burguesa mas pela via revolucionária: isto está demonstrado tanto pela teoria
como pela experiência. Mas é precisamente por esta via revolucionária que o
proletariado necessita de bases de apoio da democracia proletária no interior do
Estado burguês. Foi na criação de tais bases que se reduziu o trabalho da 2ª
Internacional na época onde ela preenchia ainda um papel histórico progressista.
O fascismo tem por função principal e única destruir todos os bastiões da
democracia proletária até aos seus fundamentos. Será que isso tem ou não um
"significado de classe" para o proletariado? Que os grandes teóricos se debrucem
sobre este problema. Tendo qualificado o regime de burguês – o que é
indiscutível – Hirsch, como seus mestres, esquece um detalhe: o lugar do
proletariado nesse regime. Eles substituem ao processo histórico uma abstração
sociológica árida. Mas a luta das classe é levada sobre o terreno da história e não
na estratosfera da sociologia. O ponto de partida da luta contra o fascismo não é
a abstração do Estado democrático mas as organizações vivas do proletariado,
onde é concentrada toda a sua experiencia e que preparam o futuro.
O fato que a passagem da democracia para o fascismo possa ter um caráter
"orgânico" ou "progressista" não significa evidentemente nada de diferente a não
ser que seja impossível de retirar ao proletariado sem perturbações nem combate
não somente as suas conquistas materiais – um certo nível de vida, uma
legislação social, direitos cívicos e políticos – mas também o instrumento
principal dessas conquistas, isto é suas organizações. Assim, essa passagem "a
frio" para o fascismo pressupõe a mais terrível capitulação política do
proletariado que e possa imaginar.
Os raciocínios teóricos de Werner Hirsch não são devidos ao acaso: ao mesmo
tempo que desenvolve as proclamações de Stálin, eles são ao mesmo tempo a
generalização de toda a agitação atual do Partido comunista. Seus esforços
principais visam demonstrar que entre o regime de Hitler e o de Bruning não há
diferença. Thälmann e Rammele veem aí atualmente a quinta-essência da
política bolchevique.
O assunto não está limitado à Alemanha. A ideia que a vitória dos fascistas
não traz nada de novo é propagada com zelo em todas as secções da
Internacional Comunista. No número de Janeiro da revista francesa Les Cahiers
du bolchevisme, lemos:
"Os trotskistas que agem na prática como Breitscheid aceitam a
célebre teoria social democrata do mal menor, segundo a qual Bruning
não é tão mau como Hitler, segundo a qual ele é menos desagradável de
morrer de fome sob Bruning do qu sob Hitler, e infinitamente preferível
ser fuzilado por Groener que por Frick."
Esta citação não é a mais estúpida, mesmo se, é preciso lhe conceder esta
justiça, ela é bastante estúpida. Todavia, ela exprime, infelizmente, a própria
essência da filosofia política dos dirigentes da Internacional Comunista.
O fato é que os stalinistas comparam dois regimes do ponto de vista da
democracia vulgar. De fato, se se aplicar ao regime de Bruning o critério
"democrático" formal, a conclusão que se tira é indiscutível: só resta os ossos e a
pele da orgulhosa constituição de Weimar. Mas para nós a questão não está no
entanto resolvida. É preciso considerar a questão do ponto de vista da
democracia proletária. É o único critério seguro quando se trata de saber onde e
quando o regimes fascista substitui a reação policial "normal" do capitalismo
podre.
Bruning é "melhor" que Hitler (seria mais simpático?), esta questão, é preciso
confessar, não nos preocupa de modo nenhum. Mas basta olhar o mapa das
organizações operárias para dizer: o fascismo ainda não venceu na Alemanha.
Obstáculos e forças gigantescas encontram-se ainda no caminho da vitória.
O regime atual de Bruning é um regime de ditadura burocrática, mais
exatamente: de ditadura da burguesia, realizada por meios policiais e militares. A
pequena burguesia fascista e as organizações proletárias equilibram-se por assim
dizer uma à outra. Se as organizações operárias estivessem reunidas em soviets,
se os comités de fábrica se batessem pelo controle da produção, poder-se-ia falar
de duplo poder. Do fato da dispersão do proletariado e da impotência táctica da
sua vanguarda, isso ainda não é possível. Mas mesmo o fato que exista
organizações operárias potentes capazes em certas condições opor uma resposta
fulminante ao fascismo, não permite a Hitler aceder ao poder e confere ao
aparelho burocrático uma certa "independência".
A ditadura de Bruning é uma caricatura do bonapartismo. Esta ditadura é
instável, pouco sólida e provisória. Ela não marca o início de um novo equilíbrio
social mas o anúncio do fim próximo do antigo equilíbrio. Ao se apoiar
diretamente sobre uma fraca minoria da burguesia, Bruning, tolerado pela social-
democracia contra a vontade dos operários, ameaçado pelo fascismo, é capaz de
lançar trovões sob a forma de decretos, mas não na realidade. Dissolver o
parlamento com o acordo deste último, promulgar alguns decretos contra os
operários, decidir uma trégua pelo Natal, aproveitar para regular alguns
pequenos assuntos, dispersar um centena de reuniões, fechar uma dezena de
jornais, trocar com Hitler cartas dignas de um merceeiro da província, - eis para
o que bastou Bruning. Para o que é mais elevado, ele tem os braços bastante
curtos.
Bruning é obrigado de tolerar a existência das organizações operárias, na
medida onde ainda não se decidiu entregar o poder a Hitler e onde ele não tem a
força independente necessária para os liquidar. Bruning é obrigado a tolerar os
fascistas e a protegê-los, na medida onde ele teme terrivelmente a vitória dos
operários. O regime de Bruning é um regime de transição, que não pode durar
muito tempo e que anuncia a catástrofe. O governo atual só se mantém porque os
principais campos ainda não mediram as suas forças. O verdadeiro combate
ainda não começou. Ele continua ainda diante de nós. É uma ditadura da
impotência burocrática que preenche a pausa antes do combate, antes da
confrontação aberta dos dois campos.
Os doutos que se vangloriam de não verem a diferença "entre Bruning e
Hitler", dizem de fato: pouco importa que as nossas organizações existam ainda
ou que elas seja já destruídas. Sob esta tagarelice pseudo-radical se esconde a
passividade a mais ignóbil: de qualquer maneira não podemos evitar a derrota!
Leiam atentamente a citação da revista dos stalinistas franceses: todo o problema
é saber se é melhor ter fome com Bruning ou com Hitler. Não colocamos a
questão de saber como e em quais condições é melhor morrer, mas como
combater e vencer. A nossa conclusão é a seguinte: é preciso começar o combate
geral, antes que a ditadura burocrática de Bruning seja substituída pelo regime
fascista, quer dizer antes que as organizações operárias sejam esmagadas. É
necessário preparar-se para o combate geral desenvolvendo, alargando e
metendo o acento nos combates particulares. Mas para isso, é preciso ter uma
perspectiva justa e, antes de tudo, não proclamar vencedor um inimigo que ainda
está longe da vitória.
Tocamos no centro do problema: ai está a chave estratégica da situação, a
posição de partida para a luta. Todo trabalhador consciente, mais ainda, todo o
comunista, deve ter em conta o vazio, a nulidade, a podridão das discussões da
burocracia stalinista onde se afirma que Bruning e Hitler é a mesma coisa. Vocês
misturam tudo! - respondemos-lhes. Vocês confundem vergonhosamente tudo
porque vocês têm medo das dificuldades, das tarefas importantes. Vocês
capitulam antes do combate, proclamam que já sofremos uma derrota. Vocês
mentem! A classe operária está dividida, enfraquecida pelos reformistas,
desorientada pelos abusos da sua própria vanguarda, mas ela ainda não está
vencida, suas forças ainda não estão esgotadas… Não, o proletariado da
Alemanha ainda é potente. Os cálculos mais otimistas se mostrarão
completamente ultrapassados no dia onde a energia revolucionária abre caminho
na arena da ação.
O regime de Bruning é um regime preparatório. Para o quê? Seja à vitória do
fascismo, seja à vitória do proletariado. Esse regime é preparatório porque os
dois campos se preparam para o combate decisivo. Meter um sinal de igual entre
Bruning e Hitler, é identificar a situação antes do combate à situação após a
derrota; isso quer dizer considerar antecipadamente a derrota como inevitável,
isso significa apelar à capitulação sem combate. A maioria esmagadora dos
operários, particularmente os comunistas, não quer nada disso. A burocracia
stalinista, naturalmente, também não quer. Que não se fique pelas boas intenções
que servirão a Hitler para abrir caminho para o seu inferno, mas compreender o
sentido objectivo da política, sua orientação, suas tendências. É preciso revelar
até ao fim o caráter passivo, cobarde, capitulador e declamatório da política de
Stálin – Manuilsky – Thälmann – Remmele. É preciso que os operários
revolucionários compreenda que é o Partido comunista que tem a chave da
situação; mas com esta chave a burocracia stalinista esforça-se por fechar as
portas que dão acesso à ação revolucionária.
Capitulo III: O Ultimatismo Burocrático
Quando os jornais do novo Partido Socialista Operário (SAP) escrevem contra
“os egoísmos de partido” da social-democracia e do Partido Comunista; quando
Seydewitz jura que para ele “o interesse de classe está acima do interesse de
partido”, - caem no sentimentalismo político ou, ainda pior, procuram, com
frases sentimentais, encobrir os interesses de seu próprio partido. Este é um meio
que não vale nada. Quando a reação exige que os interesses da “nação” sejam
colocados acima dos interesses de classe, nós, os marxistas, dizemos que, sob a
forma do interesse “geral”, a reação defende os interesses de classe dos
exploradores. Não se podem formular os interesses da nação de outro modo que
sob o ângulo da classe dominante ou da classe que pretende dominar. Não se
podem formular os interesses de classe de outro modo que sob a forma de
programa; não se pode defender o programa de outro modo que com a criação de
um partido.
A classe tomada em si não é senão matéria de exploração. O papel próprio do
proletariado começa no momento em que, de uma classe social em si, se torna
uma classe política para si. Isto só se pode produzir por intermédio do Partido. O
Partido é o órgão histórico com o auxílio do qual a classe operária adquire a sua
consciência. Dizer-se: “A classe está acima do Partido”, — é o mesmo que
afirmar-se: a classe em estado bruto está acima da classe em vias de adquirir a
sua consciência. Não só isto é falso, como é reacionário. Para justificar a
necessidade da frente única, não há nenhuma necessidade de recorrer-se a esta
teoria vulgar.
O desenvolvimento da classe, em sua consciência, isto é, a edificação de um
partido revolucionário que arraste atrás de si o proletariado, é um processo
complicado e contraditório. A classe não é homogênea. Suas diferentes partes
adquirem consciência por caminhos diferentes e em épocas diferentes. A
burguesia toma uma parte ativa neste processo. Cria os seus órgãos na classe
operária, utiliza os existentes, opondo certas camadas de operários a outras. No
seio do proletariado agem simultaneamente diferentes partidos. Eis porque ele
vive politicamente cindido durante a maior parte de seu caminho histórico. Daí
decorrer — com uma acuidade excepcional em certos períodos — o problema da
frente única.
O Partido Comunista – com uma política justa – exprime os interesses
históricos do proletariado. Sua tarefa consiste em conquistar a maioria do
proletariado: só assim a Revolução socialista é possível. O Partido Comunista só
pode desempenhar a sua missão guardando sua plena independência política e de
organização, sem reservas, em relação a todos os partidos e organizações dentro
da classe operária e fora dela. A transgressão desta regra fundamental da política
marxista é o mais grave crime contra os interesses do proletariado como classe.
A Revolução chinesa de 1925-1927 foi esmagada precisamente por ter a
Internacional Comunista, dirigida por Stálin e Bukharin, obrigado o Partido
Comunista chinês a entrar no Kuomintang, partido da burguesia chinesa, e a
submeter-se à disciplina deste último. A experiência da política stalinista para
com o Kuomintang entrará para sempre na história como exemplo de sabotagem
funesta da Revolução feita por seus dirigentes. A teoria stalinista dos “partidos
bi-partidos operários e camponeses” para o Oriente não é mais do que a
generalização e a canonização da experiência feita com o Kuomintang; a
aplicação desta teoria ao Japão, à Índia, à Indonésia, à Coreia, minou a
autoridade do comunismo e retardou o desenvolvimento revolucionário do
proletariado por uma série de anos. A mesma política pérfida foi efetivamente
conduzida, apesar de com menos cinismo, nos Estados Unidos, na Inglaterra e
em todos os países da Europa, até 1928.
A luta da Oposição de Esquerda pela independência completa e sem reservas
do Partido Comunista e de sua política, em todas as condições históricas e em
todos os graus de desenvolvimento de proletariado, provocou um aguçamento
extremo das relações entre a Oposição e a fração de Stálin durante o período de
seu bloco com a Chan-Kai-Chek e Wan-Tin-Wei, Purcell, Raditch, Lafollette,
etc. É inútil lembrar que Brandler e Talheimer, nesta luta, estiveram, assim como
Thaelmann e Remmele, do lado de Stálin, contra os bolcheviques-leninistas. Não
nos cabe, pois, tomar com Stálin e Thaelmann lições de independência da
política do Partido Comunista!
Mas o proletariado marcha para a aquisição de sua consciência, não pelos
graus da escola, mas pela luta de classes, que não sofre interrupções. Para a sua
luta, o proletariado necessita da unidade de suas fileiras. Isto vale tanto para os
conflitos econômicos parciais, nos limites de uma empresa, como para as lutas
políticas “nacionais”, tais como a defesa contra o fascismo. A tática da frente
única é, por conseguinte, não qualquer coisa de ocasional e artificial, não uma
manobra manhosa qualquer – não; ela decorre inteiramente das condições
objetivas do desenvolvimento do proletariado. As palavras do Manifesto
Comunista, afirmando que os comunistas não se opõem ao proletariado, que não
têm outros objetivos e outras tarefas senão os do proletariado, exprimem o
pensamento de que a luta do Partido pela maioria da classe não deve, em caso
nenhum, entrar em contradição com a necessidade que têm os operários da
unidade das suas fileiras de combate.
A Rote Fahne condena, com inteira razão, o palavrório sobre “os interesses de
classe acima dos interesses do Partido”. Na realidade, os interesses de classe,
bem compreendidos, e as tarefas do Partido, bem formuladas, coincidem.
Enquanto a coisa se limita a esta afirmação histórico-filosófica, a posição da
Rote Fahne é invulnerável. Mas as conclusões políticas que tira daí constituem
um embaralhamento direto do marxismo.
A identidade em princípio dos interesses do proletariado e das tarefas do
Partido Comunista não significa nem que o proletariado em seu conjunto tenha
desde já consciência dos seus interesses, nem que o Partido os formule, em todas
as circunstâncias, de um modo justo. A própria necessidade do Partido decorre,
precisamente, do fato de que o proletariado não nasce com a compreensão já
feita dos seus interesses históricos. A tarefa do Partido consiste, na experiência
da luta, em aprender a demonstrar ao proletariado o seu direito a dirigi-lo.
Entretanto, a burocracia stalinista considera que se pode, muito simplesmente,
exigir do proletariado a subordinação, baseada no passaporte do Partido, selado
com o carimbo da Internacional Comunista.
Toda frente única que não for posta antecipadamente sob a direção do Partido
Comunista, repete a Rote Fahne, é dirigida contra os interesses do proletariado.
Todo aquele que não reconhece a direção do Partido Comunista é, por isso
mesmo, um “contra-revolucionário”. O operário é obrigado a dar, de antemão, a
sua confiança ao Partido Comunista sob palavra de honra. Da identidade de
princípios da tarefa do Partido e da classe, o funcionário deduz o direito de
mandar na classe. A tarefa histórica que o Partido Comunista deve ainda
resolver: a unificação, sob a sua bandeira, da maioria esmagadora dos operários
– o burocrata transforma-a em ultimato, em revólver apontado contra a fronte da
classe operária. O pensamento dialético é substituído pelo pensamento
formalista, administrativo, burocrático.
A tarefa histórica que é preciso resolver já é considerada como resolvida. A
confiança que é preciso conquistar já é considerada como resolvida. A confiança
que é preciso conquistar já é considerada como conquistada. Isto é, como se vê,
muito simples. Mas nem por isso as coisas adiantam. Em política é preciso partir
do que existe e não do que é desejável ou do que o será. Levada até o fim, a
posição da burocracia stalinista é na realidade a negação do Partido: em que
consiste todo o seu trabalho histórico, se o proletariado deve reconhecer de
antemão a direção de Thaelmann e de Remmele?
Ao operário que quer entrar nas fileiras comunistas o Partido tem o direito de
dizer: Precisas reconhecer o nosso programa, os nossos estatutos e a direção dos
nossos organismos eleitos. Mas é insensato e criminoso impor-se esta mesma
condição a priori, ou mesmo uma parte desta, às massas operárias ou às
organizações operárias, quando se trata de ações comuns em nome de tarefas de
combate determinadas. Isto é o mesmo que minar o próprio fundamento do
Partido, que só pode preencher a sua função tendo relações recíprocas com a
classe. Em lugar de lançar-se um ultimato unilateral que irrita e humilha os
operários, é preciso propor um programa determinado de ações comuns: e o
caminho mais certo para conquistar-se a direção efetiva.
O ultimatismo é uma tentativa para violentar a classe operária quando não se
consegue persuadi-la: “Se vós, operários, não reconheceis a direção Thaelmann-
Remmele-Neumann, não vos permitiremos organizar a frente única.” O pior
inimigo não teria podido inventar uma situação menos cômoda do que a em que
os próprios chefes do Partido Comunista se colocam. É o caminho mais certo
para a ruína.
A direção do Partido Comunista alemão não faz senão acentuar mais
claramente o seu ultimatismo quando em seus apelos faz estas reservas
casuísticas: “Não vos pedimos que reconheçais antecipadamente as nossas
concepções comunistas”. Isto soa como uma desculpa para uma política que não
tem nenhuma desculpa. Quando o Partido declara que se recusa a entrar em
qualquer negociação com outras organizações, mas permite aos operários social-
democratas romper com a sua organização e, sem se chamarem comunistas,
colocar-se sob a direção do Partido Comunista, isto, precisamente, não passa do
mais puro ultimatismo. A reserva quanto às “concepções comunistas” é
completamente ridícula: o operário que está pronto desde já a romper com o seu
Partido para tomar parte na luta sob a direção comunista não hesitará em tomar o
nome de comunista. Os subterfúgios diplomáticos e o jogo de rótulos são
estranhos ao operário. Este vê, na política e na organização, o que estas encerram
de essencial. Continua na social-democracia enquanto não tiver confiança na
direção comunista. Pode-se dizer com certeza que a maioria dos operários social-
democratas fica no seu partido não porque tenha confiança na direção reformista,
mas unicamente porque ainda não tem confiança na direção comunista. Mas quer
lutar desde já contra o fascismo. Se lhe for indicada a etapa mais próxima da luta
comum, exigirá que a sua organização se coloque neste caminho. Se a
organização se obstinar em não aceitá-lo, poderá ir até a ruptura com aquela.
Em lugar de auxiliar os operários social-democratas a encontrar o seu
caminho, pela experiência, o Comitê Central do P.C. auxilia os chefes social-
democratas contra os operários. A sua aversão e o seu medo da luta, sua
incapacidade de combate, os Wels e os Hilferding os mascaram hoje com êxito,
apoiando-se na recusa do Partido Comunista em participar na luta comum. A
recusa obstinada, estúpida e insensata do Partido Comunista em aceitar a política
da frente única tornou-se, nas condições atuais, o mais importante recurso
político da social-democracia. E é por isto que a social-democracia, com o
parasitismo que lhe é próprio, se agarra tanto à nossa crítica à política ultimatista
de Stálin—Thaelmann.
Os dirigentes oficiais da Internacional Comunista peroram agora, com o ar
muito sério, sobre a elevação do nível teórico do Partido e sobre o estudo da
“história do bolchevismo”. Na realidade, o “nível” baixa cada vez mais, as lições
do bolchevismo são esquecidas, deformadas, espezinhadas. Entretanto, não é
difícil encontrar-se na história do Partido russo o precursor da política atual do
Comitê Central alemão: é o defunto Bogdanov, o criador do ultimatismo (ou
otzovismo). Ainda em 1905, considera impossível a participação dos
bolcheviques nos Sovietes de Petrogrado se os Sovietes não reconhecessem,
preliminarmente, a direção social-democrata. Sob a influência de Bogdanov, a
secretaria peterburguesa do Comitê Central bolchevique adotou em outubro de
1905 esta decisão: propor ao Soviete de Petrogrado o pedido de reconhecimento
da direção do Partido; em caso contrário, seria decidido abandonar-se o Soviete.
O jovem advogado Krassikov, membro do Comitê Central bolchevique nessa
época, lançou este ultimato à assembléia plena do Soviete. Os deputados
operários, inclusive os bolcheviques, se entreolharam com espanto e passaram à
ordem do dia. Ninguém deixou o Soviete. Pouco depois, Lenine chegou do
estrangeiro e passou um sabão tremendo nos ultimatistas: Não se pode, ensinava
ele, com auxílio de ultimatos, obrigar a massa a saltar por cima das fases
indispensáveis de seu próprio desenvolvimento político.
Bogdanov, entretanto, não renunciara à sua metodologia e criou, depois disso,
toda uma fração de “ultimatistas” ou de “otzovistas”: esta última designação lhes
foi dada porque eram inclinados a retirar3 os bolcheviques de todas as
organizações que se negavam a aceitar o ultimato enviado de cima: “Reconheça
primeiro a nossa direção”. Os ultimatistas procuravam aplicar a sua política não
só nos Sovietes, como também no domínio do parlamentarismo e do movimento
sindical e em geral em todas as organizações legais e semi-legais da classe
operária.
A luta de Lênin contra o ultimatismo foi uma luta pelas relações justas entre o
partido e a classe. Os ultimatistas no velho Partido bolchevique nunca se
elevaram a um papel de qualquer importância: do contrário, a vitória do
bolchevismo teria sido impossível. As relações atentas e sensíveis com a classe
constituíram a força do bolchevismo. Lênin continuou a luta contra o
ultimatismo mesmo quando estava no poder, particularmente e, sobretudo no
domínio dos sindicatos.
“Se tivéssemos imposto agora na Rússia, escrevia ele, após dois
meses e meio de vitórias incríveis sobre a burguesia da Rússia e da
Entente, como condição de admissão aos sindicatos, o “reconhecimento
da ditadura”, teríamos feito uma asneira, teríamos prejudicado a nossa
influência sobre as massas, teríamos auxiliado os mencheviques. Toda a
tarefa dos comunistas reside na capacidade de persuadir os retardatários,
na capacidade de trabalhar entre eles, e não de se separar deles pela
invenção de palavras de ordem puerilmente “esquerdistas”.
E isto é ainda mais obrigatório para os partidos comunistas do Ocidente, que
não representam senão a minoria da classe operária.
A situação, entretanto, mudou radicalmente na URSS durante o último
período. O Partido Comunista, armado do poder, já representa uma outra relação
entre a vanguarda e a classe: nesta relação existe um elemento de coação. A luta
de Lenine contra o burocratismo do Partido e dos Sovietes significava, no fundo,
uma luta não contra o mau funcionamento das secretarias, a inércia, a sujeira,
etc., mas contra a submissão da classe ao aparelho, contra a transformação da
burocracia numa nova camada “dirigente”. O conselho dado por Lenine antes da
sua morte, de criar-se uma Comissão de Controle operária independente do
Comitê Central e de retirar-se Stálin e sua fração do aparelho do Partido, foi
dirigido contra a degenerescência burocrática do Partido. Por uma série de
razões, sobre as quais não podemos nos deter aqui, o Partido deixou de lado esse
conselho. A degenerescência burocrática do Partido atingiu o auge nestes
últimos anos. O aparelho stalinista não sabe fazer outra coisa senão mandar. A
linguagem do comando é a linguagem do ultimatismo. Todo operário tem de
reconhecer antecipadamente que todas as decisões precedentes, atuais e futuras
do Comitê Central são infalíveis. As pretensões de infalibilidade aumentam à
medida que a política se vai tornando cada vez mais falsa.
Após ter concentrado em suas mãos o aparelho da Internacional Comunista, a
fração stalinista, muito naturalmente, trouxe os seus métodos para as secções
estrangeiras, isto é, para os partidos comunistas dos países capitalistas. A política
da direção alemã é o reflexo da direção de Moscou. Thaelmann vê como
comanda a burocracia stalinista, que declara contra-revolucionário todo aquele
que não reconhece a sua infalibilidade. Em que é Thaelmann pior que Stálin? Se
a classe operária não se coloca obedientemente ao seu comando, é porque a
classe operária é contra-revolucionária. Duplamente contra-revolucionários são
os que mostram a Thaelmann os perigos funestos do ultimatismo. Um dos livros
mais contra-revolucionários é a coletânea das Obras Completas de Lenine. Não é
à toa que Stálin as submete a uma censura tão severa, sobretudo nas edições em
língua estrangeira.
Funesto em qualquer circunstância, significando na URSS o desperdício do
capital moral do Partido, o ultimatismo é duplamente insolvível nos partidos do
Ocidente, que ainda apenas estão acumulando um capital moral. Na União
Soviética, a Revolução vitoriosa criou pelo menos as premissas materiais para o
ultimatismo burocrático sob a forma de aparelho de coerção. Nos países
capitalistas, inclusive a Alemanha, o ultimatismo se transforma numa caricatura
impotente e entrava a marcha do Partido Comunista para o poder. O ultimatismo
de Thaelmann—Remmele é antes de tudo ridículo. E o ridículo mata, sobretudo
quando se trata do partido da Revolução.
Transportai um instante este problema para a arena da Inglaterra, onde o
Partido Comunista (em consequência dos erros funestos da burocracia stalinista)
continua a não passar de uma parte ínfima do proletariado. Se se admite que toda
forma de frente única, exceto a forma comunista, é “contra-revolucionária”, o
proletariado britânico fará, por força, recuar a luta revolucionária até o momento
em que o Partido Comunista se puser à sua frente. Mas o Partido Comunista só
poderá colocar-se à frente da classe na base de sua própria experiência
revolucionária. Entretanto, a experiência só pode tomar um caráter
revolucionário por meio da atração de milhões de homens à luta. Ora, só se pode
arrastar à luta as massas não comunistas, e, sobretudo as massas organizadas, na
base da política de frente única. Caímos num círculo vicioso, do qual não há
saída no caminho do ultimatismo burocrático. Mas a dialética revolucionária
mostrou há muito tempo essa saída; demonstrou sua eficácia numa quantidade
inumerável de exemplos e nos domínios mais diversos: combinação da luta pelo
poder com a luta pelas reformas; independência completa do Partido com a
salvaguarda da unidade dos sindicatos; luta contra o regime burguês com a
utilização de suas instituições; crítica irredutível do parlamentarismo do alto da
tribuna parlamentar; luta implacável contra o reformismo com os acordos
políticos com os reformistas nas tarefas parciais.
Na Inglaterra, a inconsistência do ultimatismo salta aos olhos devido à
fraqueza extrema do Partido Comunista. Na Alemanha, os efeitos funestos do
ultimatismo são em parte mascarados pela força numérica considerável do
Partido e pelo seu crescimento. Mas o Partido alemão cresce graças à pressão
das circunstâncias e não graças à política da direção; não é o crescimento do
Partido que decide: o que decide é a relação política recíproca entre o Partido e a
classe. Nesta linha fundamental a situação não melhora porque o Partido põe
entre ele e a classe uma cerca de arame farpado de ultimatismo.
Capitulo IV: Os Ziguezagues dos Stalinistas na
Questão da Frente Única
A antiga social-democrata Torchors (Dusseldorf), que passou para o Partido
Comunista, diz num relatório oficial que pronunciou em nome do partido em
Francfort a meio de Janeiro:
"Os chefes sociais-democratas já estão suficientemente
desmascarados, e manobrar nesse sentido propondo-lhe a unidade na
cimeira é um desperdício de energia."
Citamos segundo o jornal comunista de Francfort que cobre de elogios esse
relatório. "Os chefes sociais-democratas já estão suficientemente
desmascarados". Suficientemente para a oradora, que passou da social-
democracia para o Partido comunista (o que , certamente, é honrado), mas
insuficiente para os milhões de operários que votam pela social-democracia e
toleram à sua cabeça a burocracia reformista dos sindicatos.
Todavia, é inútil referir-se a um relatório isolado. No último dos apelos do
Rote Fahne (28 de Janeiro) que me chegou, é de novo demonstrado que não é
admissível criar a frente única senão contra os chefes sociais-democratas e sem
eles. Porquê? Porque "ninguém dos que viveram e suportaram as ações desses
"chefes" durante estes últimos oito anos não acreditam neles". Mas então que
fazer, perguntamos nós com os que vieram para a política nestes últimos dezoito
meses? Desde o início da guerra novas gerações políticas cresceram; elas
próprias devem fazer a experiência da geração mais velha, nem que fosse a uma
escala extremamente reduzida.
"Trata-se justamente, ensinava Lênin aos ultra-esquerdas, em não
acreditar no que fez o seu tempo para nós, fez o seu tempo para a classe,
fez o seu tempo para as massas."
Mas a antiga geração social-democrata, que teve a experiência destes dezoito
anos, não rompeu com os seus chefes. Pelo contrário, é precisamente na social-
democracia que sobram muitos "velhos", ligados ao partido por fortes tradições.
É lamentável, evidentemente, que as massas levam tanto tempo a aprender. Mas
na grande medida a falta é dos "pedagogos" comunistas, que não souberam
desmascarar concretamente a natureza criminosa do reformismo. É preciso, pelo
menos, tirar proveito da nova situação, enquanto que a atenção da massas está
altamente concentrada sobre o perigo mortal para submeter os reformistas a uma
nova prova que será, talvez, desta vez decisiva.
Sem esconder nem moderar nada a nossa opinião sobre os chefes da social-
democracia, podemos e devemos dizer aos operários sociais-democratas:
"Como, por um lado, vocês estão de acordo em lutar connosco, e que,
por outro, vocês não querem romper com os vossos chefes, eis o que
nós propomos: obriguem eles a iniciar uma luta comum connosco por
tais e tais tarefas práticas, por tais e tais meios; no que nos diz respeito,
nós, comunistas, estamos prontos."
Que pode haver de mais simples, de mais claro, de mais convincente que isso?
É precisamente nesse sentido que escrevi – com deliberada intenção de
suscitar o temor sincero ou a indignação fingida dos imbecis e charlatans, —
que, na luta contra o fascismo, nós estávamos prontos a concluir acordos práticos
militantes com o diabo, sua avó, e mesmo com Noske e Zorgiebel.4
O partido oficial viola ele próprio a cada passo a sua posição imóvel. Nos seus
apelos a uma "frente única vermelha" (com ele mesmo), ele avança
invariavelmente a reivindicação de "liberdade ilimitada das manifestações, das
reuniões, das coligações e da imprensa proletárias". É uma palavra de ordem
absolutamente justa. Mas na medida onde o Partido comunista fala de jornais, de
reuniões, etc., proletários e não somente comunistas, ele avança a palavra de
ordem da frente única com a própria social-democracia, que edita jornais
operários, convoca assembleias, etc. O máximo da absurdidade é de avançar
palavras de ordem políticas, que contêm a ideia da frente única com a social-
democracia, e de recusar os acordos práticos para se bater por essas palavras de
ordem.
Münzenberg, que se disputa a linha geral e o sentido mercantil, escrevia em
Novembro no Der Rote Aufhau:
"É verdade que o nacional-socialismo é a ala a ais reacionária, a mais
chauvinista e a mais feroz do movimento fascismo alemão."
Se o partido de Hitler é a ala "a mais reacionária, a mais feroz", o governo de
Bruning é menos feroz e menos reacionária. Münzenberg chega com passos de
lobo à teoria do "mal menor" . Para salvar as aparências de ortodoxia,
Münzenberg distingue diferentes especies de fascismo: o ligeiro, o médio e o
forte, como se se tratasse de tabaco turco. Mas se todos os "círculos de esquerda"
(e quais são os seus nomes?) estão interessados na vitória sobre o fascismo, não
seria necessários apoderar-se imediatamente da proposição diplomática e
equívoca de Breitscheid, avançando do nosso lado um programa prático,
concreto e bem elaborado, de luta contra o fascismo, e exigindo uma reunião
comum das direções dos dois partidos, com a participação da direção dos
sindicatos livres? Ao mesmo tempo, seria preciso difundir energicamente esse
programa, a todos os níveis dos dois partidos e nas massas. As negociações
teriam que se desenrolar sob os olhos do todo o povo: a imprensa deveria dar um
relato cotidiano, sem exageros nem invenções absurdas. Os operários são
infinitamente mais receptivos a uma tal agitação concreta que bate justo, do que
aos ganidos contínuos sobre o tema do "social-fascismo". Se se tivesse posto o
problema desta maneira, a social-democracia não teria podido, mesmo um só
momento, esconder-se por detrás da decoração de cartão da "frente de fer".
Leiam A doença infantil do comunismo, o esquerdismo: é hoje o livro atual. É
precisamente a propósito de situações análogas àquela que temos hoje na
Alemanha que Lênin fala – citamos textualmente – da
"necessidade absoluta para a vanguarda do proletariado, para a sua
parte consciente, para o Partido comunista, de bordejar, fazer acordos,
compromissos com os diferentes grupos de proletários, os diversos
partidos operários e dos pequenos exploradores… Trata-se de saber
aplicar esta táctica de maneira a retirar e não de baixar nível de
consciência geral do proletariado, o seu espírito revolucionário, a sua
capacidade de lutar e de vencer."
Ora qual é a atitude do Partido comunista? Nesses jornais, ele repete
diariamente que para ele só é aceitável
"a frente única que será dirigida contra Bruning, Severing, Leipart,
Hitler e seus iguais".
Face ao levantamento proletário, não há dúvida que não terá qualquer
diferença entre Bruning, Severing, Leipart e Hitler. Os socialistas
revolucionários e os menchevique aliaram-se aos cadete e aos kornilovianos
contra o levantamento dos bolcheviques em Outubro: Kerensky conduziu sobre
Petrogrado o general cossaco cem-negros, Krasnov, os mencheviques apoiavam
Kornilov e Krasnov, os socialistas-revolucionários organizavam o levantamento
dos Junkers sob a direção de oficiais monárquicos. Mas isso não significa
absolutamente que Bruning, Severing, Leipart e Hitler pertencem sempre e em
todas as condições ao mesmo campo. Agora, seus interesses divergem. Para a
social-democracia, a questão é, neste momento, menos a defesa dos fundamentos
da sociedade capitalista contra a revolução proletária, do que a defesa burguesa
do meio-parlamento contra o fascismo. Seria uma muito grande besteira recusar
utilizar este antagonismo.
"Fazer a guerra para derrubar a burguesia internacional… escrevia
Lênin em A doença infantil, e renunciar à priori a bordejar, explorar as
oposições de interesses (mesmo se fossem momentâneas) que dividem
os nossos inimigos, a estabelecerem acordos e compromissos com os
aliados eventuais ( mesmo temporários, pouco seguros, instáveis,
condicionais), não são ridículos?
Citemos de novo textualmente: as palavras entre parênteses sublinhados por
nós são de Lênin.
E mais longe:
"Não se pode-se vencer um adversário mais potente senão pelo preço
de uma extrema tensão das forças e com a condição expressa de utilizar
com a maneira mais minuciosa, a mais atenta, a mais circunspecta, a
mais inteligente, a menor "racha" entre os inimigos."
Que fazem Thälmann e Remmele dirigidos por Manuilsky? A racha entre a
social-democracia e o fascismo – e que racha! - eles tentavam com todas as suas
forças repará-la com a ajuda da teoria do social-fascismo e da prática da
sabotagem da frente única.
Lênin exigia que se utilize cada
"possibilidade de assegurar um aliado numericamente forte, fosse um
aliado temporário, condicional, pouco sólido e pouco seguro. Quem não
compreendeu esta verdade não compreendeu nada do marxismo, nem
em geral do socialismo cientifico contemporâneo".
Olhai, profetas da nova escola stalinista: é dito aqui claramente e
precisamente, que vocês nada compreenderam do marxismo. Isso, é Lênin que
disse de vocês: respondam!
Mas sem vitória sobre a social-democracia, respondem os stalinistas, não pode
haver vitória sobre o fascismo. Isso é verdade? Num certo sentido é verdade.
Mas o teorema inverso é igualmente verdadeiro: a vitória sobre a social-
democracia italiana é impossível sem a vitória do fascismo italiano. O fascismo
tal como a social-democracia são instrumentos da burguesia. Enquanto que
dominar o capital, a social-democracia e o fascismo continuarão a existir em
diferentes combinações. Assim todos os problemas se reduzem a um só
dominador: o proletariado deve derrubar o regime burguês.
Mas é precisamente hoje, enquanto que esse regime treme na Alemanha, que o
fascismo corre ao seu socorro. Para derrotar esse defensor, é preciso, nos dizem,
previamente acabar com a social-democracia…
Um esquematismo assim parado nos coloca num círculo vicioso. Não se pode
sair disso a não ser no terreno da ação. O caráter da ação é determinado não pelo
jogo de categorias abstratas, mas pelas relações reais das forças históricas vivas.
Não, afirmam os funcionários, liquidemos "primeiro" a social-democracia. Por
qual meio? É muito simples: dando ordem às organizações do partido de recrutar
num tal prazo cem mil novos membros. Pura propaganda em vez de luta política,
um plano de burocrata no lugar de uma estratégia dialética. E se o
desenvolvimento real da luta de classe colocasse a partir de hoje à classe
operária a questão do fascismo, como uma questão de vida ou de morte? É
preciso então que a classe operária volte as costas ao problema, é preciso
adormecê-la, é preciso convencê-la que a luta contra o fascismo é uma tarefa
secundária, que esta tarefa possa esperar, que ela se resolva por ela própria, que
o fascismo domina já de fato, que Hitler não traga nada de novo, que não é
preciso ter medo de Hitler, que Hitler abra caminho à voz aos comunistas.
Talvez seja um exagero? Não, é a ideia diretora e verdadeira e evidente dos
chefes do Partido comunista. Eles não a levam sempre até ao fim. Quando são
confrontados às massas, eles fazem sempre marcha atrás sobre as suas últimas
conclusões, amalgamando diferentes posições, confundindo os operários e eles
próprios; mas cada vez que eles tentam sair disso, partem da vitória inevitável do
fascismo.
No 14 de Outubro do último ano, Remmele, um dos três chefes do Partido
comunista, declarou no Reichstag:
"Foi o próprio sr. Bruning que disse claramente: quando eles (os
fascistas) estarão no poder, a frente única do proletariado se realizará e
varrerá tudo" (barulhentos aplausos nas bancadas dos comunistas).
Que Bruning procure assustar a burguesia e a social-democracia por uma tal
perspectiva, é compreensível: ele defende o seu poder. Que Remmele console os
operários com tal perspectiva, é uma vergonha: ele prepara o poder de Hitler,
porque toda esta perspectiva é radicalmente falsa e testemunha uma
incompreensão total das psicologia das massas e da dialética da luta
revolucionária. Se o proletariado da Alemanha, que é hoje a testemunha direta de
todos os acontecimentos, deixa os fascistas aceder ao poder, quer dizer dá prova
de uma cegueira e de uma passividade absolutamente criminal, não há
decididamente nenhuma razão de contar com o fato que depois da chegada dos
fascistas ao poder, o mesmo proletariado sacudirá a sua passividade e "varrerá
tudo": em todos os casos não é o que se passou na Itália. Remmele raciocina
inteiramente no espírito dos fazedores de frases pequeno burgueses do 19º
século, que davam prova duma incapacidade total em mobilizar as massas, mas
que, em contrapartida, estavam fortemente convencidos que, quando Luís
Bonaparte tomou a cabeça da República, o povo se levantaria sem esperar para
defender e "varreria tudo". Todavia o povo, que tinha deixado o aventureiro Luís
Bonaparte aceder ao poder, mostrou-se evidentemente, incapaz de o varrer a
seguir. Foi preciso para isso novos acontecimentos importantes, tremores
históricos, incluindo a guerra.
A frente única do proletariado, para Remmele, não é realizável, vimos, senão
após a chegada de Hitler ao poder. Pode haver aí a confissão mais miserável da
sua própria carência? Dado que nós, Remmele e companhia, somos incapazes de
unir o proletariado, encarregamos Hitler dessa tarefa. Quando ele unir para nós o
proletariado, nós nos mostraremos com toda a nossa força. Depois veio a
declaração fanfarrona:
"Seremos os vencedores de amanhã, e a questão não se põe mais:
quem esmagará quem? Esta questão já está resolvida (aplausos nas
bancadas comunistas). Só há uma questão: a que momento
derrubaremos a burguesia?"
Só isso? Chama-se isso em russo, tocar o céu com o dedo. Nós amanhã
seremos os vencedores. Para isso, só nos falta hoje a frente única. Hitler nos dará
amanhã, quando ele chegar ao poder. Portanto o vencedor amanhã não será
Remmele, mas Hitler. Mas então, metam isso na cabeça: a hora da vitória dos
comunistas está longe de soar.
O próprio Remmele sente que o seu optimismo coxeia da perna esquerda, e
tenta consolidá-la.
"Esses senhores fascistas não nos assustam, eles gastar-se-ão mais
depressa que qualquer outro governo ("completamente verdade", nas
bancadas dos comunistas)".
A prova: os fascistas querem a inflação das notas de banco, e é a ruína para as
massas populares; em consequência, tudo se arranjará pelo melhor. É assim que
a inflação verbal de Remmele afasta os operários alemãs.
Temos aqui o discurso programático de um chefe oficial do partido, editado
num grande número de exemplares e que deve servir para a campanha de adesão
do Partido comunista: um formulário pronto para adesão ao partido foi
imprimido no fim do discurso. Esse discurso programático é inteiramente
construído sobre a capitulação diante do fascismo. "Não tememos" a chegada de
Hitler ao poder. Mas é de fato uma fórmula invertida de cobardia. "Nós" não nos
consideramos como capazes de impedir Hitler de chegar ao poder; pior: nós,
burocratas, estamos de tal forma podres, que não ousamos encarar seriamente a
luta contra Hitler. É por isso, "nós não temos medo". Do quê vocês não têm
medo: da luta contra Hitler? Não, eles não têm medo… da vitória de Hitler. Eles
não têm medo de se subtraírem ao combate. Eles não têm medo de reconhecer a
sua própria cobardia. Vergonha, três vezes vergonha! Num dos meus últimos
cadernos, escrevi que a burocracia stalinista se preparou a armadilhar Hitler…
sob a forma do poder de Estado. Os plumitivos comunistas, que vão de
Münzenberg a Ullstein e de Mosse a Münzenberg, declararam imediatamente:
"Trotsky calúnia o Partido comunista". Não é claro: por hostilidade pelo
comunismo, por ódio pelo proletariado alemão, por desejo ardente de salvar o
capitalismo alemão, Trotsky atribui à burocracia stalinista um plano de
capitulação. De fato, só resumi o discurso pragmático de Remmel e o artigo
teórico de Thälmann. Onde está a calúnia?
Thälmann e Remmele continuam nisso completamente fiéis ao evangelho
stalinista. Lembremos mais uma vez o que Stálin ensinou em Outono de 1923,
quando na Alemanha tudo se aguentava como hoje, sobre o fio da navalha:
"Os comunistas, escrevia Stálin a Zinoviev e Bukarine, devem se
esforçar (no momento atual) para se apoderarem do poder sem a social-
democracia, estarão maduros para isso,- eis, na minha opinião, o fundo
da questão… Se hoje na Alemanha o poder cai, digamos assim, e que os
comunistas o colhem, eles afundam-se com estrondo. Isso "no melhor"
dos casos. E no pior, eles serão quebrados em bocados e jogados fora…
Evidentemente, os fascistas vigiam, mas é mais vantajoso para nós que
os fascistas ataquem em primeiro: isso juntará toda a classe operária à
volta dos comunistas… Na minha opinião, é preciso refrear os Alemãs e
não encorajá-los."
No seu caderno sobre a Greve de massa, Langner escreve:
"A afirmação (de Brandler), segundo a qual a luta de Outubro (1923)
teria levado à "derrota decisiva", não é nada mais do que uma tentativa
de embelezar os erros oportunistas e a capitulação oportunista sem
combate".
É completamente verdade. Mas quem foi o instigador da "capitulação sem
combate"? Que "refreava" em vez de "encorajar"? Em 1931, Stálin desenvolveu
a sua fórmula de 1923: que os fascistas tomem o poder, eles nos abrirão o
caminho. Evidentemente, é muito mais perigoso atacar Brandler que Stálin: os
Langner bem o sabem… É verdade que os últimos meses – e os protestos
determinados da esquerda não têm nada a ver – uma certa mudança operou-se: o
Partido comunista não diz mais que Hitler deve tomar o poder para se esgotar
rapidamente; hoje, ele insiste mais no aspecto oposto da questão: que não se
retome a luta contra o fascismo à chegada de Hitler no poder; é preciso
desencadear a luta agora, insurgindo os operários contra os decretos de Bruning,
alargando e aprofundando a luta no terreno econômico e político. É justo. Tudo o
que dizem os representantes do Partido comunista nesse quadro é incontestável.
Sobre esse ponto não há desacordo entre nós. Mas resta ainda a questão
principal: como passar das palavras aos atos?
A maioria esmagadora dos membros do partido e uma parte importante do
aparelho – não duvidamos de forma alguma, querem sinceramente a luta. Mas é
preciso olhar a realidade de frente: esta luta não existe, não a vêm aproximar-se.
Os decretos de Bruning passaram impunemente. A trégua de Natal não foi
interrompida. A política das greves parciais improvisadas, considerando os
relatórios do próprio Partido comunista, não deu resultados sérios até agora. Os
operários constatam isso. Não se pode convencê-los com um só apelo. O partido
comunista rejeita sobre a social-democracia a responsabilidade da passividade
das massas. Historicamente, é incontestável. Mas não somos historiadores, mas
militantes políticos revolucionários. Não se trata de pesquisas históricas, mas de
meios permitindo sair do impasse. O SAP, que o início da sua existência
colocava de formal (particularmente nos artigos de Rosenfeld e de Seydewitz) a
questão da luta contra o fascismo e fazia coincidir o contra-ataque com a
chegada de Hitler ao poder, deu um passo em frente. A sua imprensa exige agora
que se organize rapidamente a resistência contra o fascismo, insurgindo os
operários contra a fome e a opressão policial. Nós reconhecemos de boa vontade
que a mudança na posição do SAP produziu-se sob a influência da crítica
comunista: uma das tarefas do comunismo consiste em fazer avançar o
centrismo em criticando o seu caráter híbrido. Mas isso é insuficiente: é preciso
utilizar politicamente os frutos dessa crítica propondo ao SAP a sua passagem
das palavras aos atos. É preciso submeter o SAP à prova prática, pública e clara:
não em interpretando citações isoladas – isso não bastaria - mas propondo um
acordo sobre os meios práticos precisos de resistência. Se o SAP revela a sua
carência, a autoridade do partido sairá reforçada, e o partido intermediários será
rapidamente liquidado. O que há a temer?
Não é verdade todavia que o SAP não se queira bater a sério. Há nele várias
tendências. Hoje, a medida onde o assunto se resume a uma propaganda abstrata
pela frente única, as contradições internas adormecem. Quando se passar à luta,
elas surgirão. Só o Partido comunista pode ganhar aí.
Mas resta a questão principal: a da social-democracia (SPD). Se ela rejeita as
proposições práticas que o SAP aceitou, isso criará uma nova situação. Os
centristas, que queriam manter-se a distância igual do Partido comunista e da
social-democracia, recriminar um contra o outro e se reforçar à conta dos dois
(tal é a filosofia de Urbahns), se encontrariam imediatamente suspensos sobre o
vazio, porque se tornaria evidente que é precisamente a social-democracia que
sabota a luta revolucionária. Não é uma vantagem séria? Os operários do SAP
voltariam de forma séria o olhar para o Partido comunista.
Mas a recusa de Wels e companhia em aceitar o programa de ação aceite pelo
SAP, não passaria impunemente mesmo pela social-democracia. O Vorwarts
perderia imediatamente a possibilidade de se queixar da passividade do Partido
comunista. A atração pela frente única cresceria logo entre os operários sociais-
democratas. E isso equivaleria a uma atração pelo Partido comunista. Não é
claro?
A cada uma dessas etapas e a cada uma dessas voltas, o partido comunista
descobriria novas possibilidades. Em vez da repetição monótona das mesmas
fórmulas acabadas, diante do mesmo auditório, ele ganharia a possibilidade de
mobilizar novas camadas, de as instruir sobre a base da experiência viva, de as
temperar e de reforçar a sua hegemonia na classe operária.
Não pode haver aí discussão sobre o fato que o Partido comunista renuncie ao
mesmo tempo à direção independente das greves, das manifestações, das
campanhas políticas. Ele mantêm a sua liberdade de ação. Ele não espera
ninguém.
Mas sobre a base das suas ações, ele manobra ativamente em direção das
outras organizações operárias, destrói as divisões entre os operários, faz surgir
abertamente as contradições do reformismo e do centrismo, faz avançar a
cristalização revolucionária no proletariado.
Capitulo V: Relembrança Histórica sobre a Questão
da Frente Única
As considerações sobre a luta política da frente única decorre das
necessidades nesse ponto fundamentais e imperativas da luta de classes contra
classes (no sentido marxista e não burocrático dessas palavras), que é impossível
ler sem corar de indignação e de vergonha, os objetivos da burocracia stalinista.
Pode-se explicar diariamente as ideias as mais simples aos operários ou aos
camponeses os mais atrasados e aos mais ignorantes, e ao fazer isso não sentir
qualquer lassidão; nesse caso, trata-se de meter em movimento camadas novas.
Mas que desgraça, quando é preciso demonstrar e explicar ideias elementares a
pessoas cujo cérebro foi laminado pela imprensa burocrática. Que fazer com os
"chefes", que não têm argumentos lógicos à sua disposição, mas que têm, em
contra-partida, ao alcance da mão um repertório de injúrias internacionais? As
posições fundamentais do marxismo são qualificadas com a ajuda de um só e
único termo: "contra-revolução"! Essa palavra é terrivelmente desvalorizada na
boca daqueles que até aqui, em qualquer caso, não demonstraram a sua
capacidade em fazer a revolução. E no que diz respeito às decisões dos quatro
primeiros congressos da Internacional Comunista? A burocracia stalinista
reconhece-as, sim ou não?
Os documentos estão bem vivos e conservaram todo o seu significado até
hoje. Disso extraio, - porque eles são bastante numerosos, - as teses que eu tinha
elaborado entre o 3º e o 4º Congressos para o Partido comunista francês. Elas
tinha sido adotadas pelo Burô político do Partido comunista russo e o Comité
executivo da Internacional Comunista, e publicadas nessa época em diferentes
línguas nos órgãos comunistas. Reproduzimos aqui textualmente a parte da teses
que é consagrada ao argumento e à defesa da política da frente única:
"… É evidente que a atividade do proletariado como classe não para
durante o período preparatório da revolução. Os conflitos com os
patrões, com a burguesia, com o poder de Estado, à iniciativa de um ou
de outro campo, se sucedem. Nesses conflitos, na medida onde eles
dizem respeito aos interesses vitais de toda a classe operária, ou da sua
maioria, ou de uma ou outra das suas partes, as massas operárias
ressentem necessidade de unidade de ação… O partido que se opõe
mecanicamente a esta necessidade… será inevitavelmente condenado
na consciência dos operários.
O problema da frente única nasce da necessidade de assegurar à
classe operária a possibilidade de uma frente única na luta contra o
capital, apesar da cisão inevitável na nossa época das organizações
políticas que se apoiam sobre a classe operária. Aquele que não
compreende esta tarefa considera o partido como uma associação
propagandista, e não como uma organização de ação de massas.
Se o Partido comunista não tivesse rompido radicalmente e
definitivamente com a social-democracia, ele jamais ter-se-ia tornado o
partido da revolução proletária. Se o Partido comunista não tivesse
procurado os meios organizativos afim de tornar possível a cada
instante ações comuns e coordenadas entre as massas operárias
comunistas e não comunistas (incluindo sociais democratas), ele teria
por aí mesmo manifestado a sua incapacidade em ganhar a maioria da
classe operária sobre a base da ação de massa.
Não basta separar os comunistas dos reformistas, nem de os ligar por
uma disciplina organizativa; é preciso que esta organização aprenda a
dirigir toda as ações colectivas do proletariado em todos os domínios da
sua luta real.
É a segunda letra do ABC do comunismo.
A frente única estende-se somente às massas operárias ou inclui
também os chefes oportunistas? O fato mesmo de colocar esta questão é
o fruto de um mal-entendido. Se nós podemos juntar simplesmente as
massas operárias à volta da nossa bandeira… sem passar pelas
organizações reformistas, partidos ou sindicatos, seria melhor
evidentemente. Mas então, a questão da própria frente única não se
colocaria sob a sua forma atual. Fora de todas as outras considerações,
temos interesse em atrair os reformistas fora dos seus covis e a colocá-
los ao nosso lado, face às massas combatentes. Ao aplicar esta táctica
justa, só podemos ganhar. O comunista que tem dúvidas ou apreensões
sobre este ponto é parecido com o nadador que adotou as teses sobre a
melhor maneira de nadar, mas que não ousa deitar-se à água.
Concluindo um acordo com outras organizações, nós nos impomos,
evidentemente, uma certa disciplina de ação.
Mas esta disciplina não pode ter um caráter absoluto. No caso onde
os reformistas travam a luta em detrimento evidente do movimento para
contrabalançar a situação e o estado de espírito da massas, nós
conservamos sempre, como organização independente, o direito de
levar a luta até ao fim e sem os nosso meio-aliados temporários. Não se
pode ver nesta política uma aproximação com os reformistas, que ao se
colocarem do ponto de vista do jornalista que pensa se afastar do
reformismo, quando, sem sair da sala de redação, ele critica-o sempre
nos mesmos termos, e que teme afronta-lo diante das massas operárias e
de dar a estas últimas a possibilidade de julgar os comunistas e os
reformistas nas condições de igualdade, as da luta de massa. Este medo
dito revolucionários da "aproximação" dissimula fundamentalmente
uma passividade política que se esforça de conservar uma ordem das
coisas, onde os comunistas e os reformistas têm suas esferas de
influência nitidamente delimitadas, os seus habituados às reuniões, à
sua imprensa, e onde tudo isso cria a ilusão de uma política séria.
Sobre a questão da frente única vemos se desenhar uma tendência
passiva e indecisa, mascarada por uma intransigência verbal. Primeiro,
o paradoxo seguinte salta à vista: os elementos direitistas do partido
com suas tendências centristas e pacifistas… aparecem como os
adversários os mais irredutíveis da frente única, se dissimulando por
detrás da bandeira da intransigência revolucionária.
Inversamente, os elementos que… nos momentos mais difíceis
estavam inteiramente em posições da IIIª Internacional, intervêm hoje
em favor da frente única. De fato, hoje são os partidários de uma táctica
passiva e temporizadora que intervêm sob a máscara de uma
intransigência pseudo-revolucionária". (Trotsky, Os cinco primeiros
anos da Internacional Comunista: pp. 345-378 da edição russa).
Não se diria que estas linhas foram escritas hoje contra Stálin, Manuilsky,
Thaelmann, Remmele, Neumann? De fato, elas foram escritas contra Frossard,
Cachin, Charles Rappoport, Daniel Renoult e outros oportunistas franceses que
se escondiam por detrás das fórmulas ultra-esquerdas. Seriam que as teses
citadas – esta questão colocamos-la abertamente à burocracia stalinista – eram já
"contra-revolucionárias", quando elas eram a expressão política do Burô político
russo, dirigido por Lênin, e que elas definiam a política da Internacional
Comunista? Que não tentem responder-nos que desde então as condições
mudaram: não se trata de questões conjunturais mas, como foi dito nos textos, do
abc do comunismo.
Há dez anos, a Internacional Comunista explicava assim o fundo da política
da frente única: o Partido comunista mostra nos fatos às massas e às suas
organizações, que ele está pronto a lutar com elas por objetivos mais modestos,
com a condição que elas vão no sentido do desenvolvimento histórico do
proletariado; o Partido comunista nessa luta tem em conta, a cada momento, do
estado de espírito real da classe; ele dirige-se não somente às massas, mas
também às organizações cuja direção é reconhecida pelas massas; diante das
massas, ele obriga as organizações reformistas a tomar publicamente posição
sobre as tarefas reais da luta de classes. A política da frente única acelera a
tomada de consciência revolucionária da classe, descobrindo nos fatos que não é
a vontade de cisão do Partido comunista, mas a sabotagem consciente dos chefes
sociais-democratas que sapa a luta comum. É evidente que essas ideias não
envelheceram.
Como explicar que a Internacional Comunista renunciou à política da frente
única? Pelas derrotas e fiascos que conheceu esta política no passado. Se as
derrotas, cujas causas residem não na política mas nos homens políticos,
tivessem sido no seu tempo evidenciadas, analisadas, estudadas, o Partido
comunista alemão teria sido perfeitamente armado face à situação atual, tanto de
um ponto de vista estratégico como tático. Mas a burocracia stalinista agiu como
o macaco atingido de miopia na fábula: tendo metido os óculos sobre o rabo e
tendo-os limpo sem resultado, ele decidiu que elas não serviam para nada e
quebra-os com uma pedra. Cada um age como ele entende, mas não é por causa
dos óculos.
Os erros na política da frente única eram de duas especies. Na maior parte das
vezes, os órgãos dirigentes do Partido comunista se dirigiam aos reformista lhes
propondo a luta comum sobre palavras de ordem radicais não decorrendo da
situação e não correspondendo ao nível da consciência das massas. Essas
proposições eram tiros em branco. As massas ficavam de fora, os dirigentes
reformistas interpretavam a proposição dos comunistas como uma intriga tendo
em vista destruir a social-democracia. Em todos os casos, tratava-se de uma
aplicação puramente formal da política da frente única, e que não ultrapassava o
estádio das declarações; de fato, na sua própria essência, ela não pode dar
resultados senão na base de uma apreciação realista da situação e do estado das
massas. A arma das "cartas abertas", demasiado frequentes e mal utilizadas,
encravou-se e foi preciso renunciar a elas.
Um outro tipo de deformação tomou um caráter muito mais fatal. Entre as
mãos da direção stalinista, a política da frente única se transformou numa busca
de alianças pelo preço do abandono da independência do Partido comunista. Ao
se apoiarem sobre Moscovo e se crendo todos-poderosos, os burocratas da
Internacional Comunista acreditaram a sério que eles poderiam comandar as
massas lhes impondo um itinerário, travar o movimento agrário e as greves na
China, comprar a aliança com Tchang Kaichek pelo preço do abandono da
política independente do Partido comunista, reeducar a burocracia dos
sindicatos, principais apoios do imperialismo britânico, por detrás da mesa do
banquete em Londres ou nas estações termais do Cáucaso, transformar os
burgueses croatas, como Raditch, em comunistas, etc., etc. Além disso, isso
começava com as melhores intenções do mundo: acelerar o desenvolvimento
fazendo no lugar das massas o que elas ainda não estavam maduras para o fazer.
Não é inútil relembrar que numa serie de países, em particular na Áustria, os
burocratas da Internacional Comunista esforçaram-se no último período em criar
a partir de cima, de maneira artificial, uma social-democracia de "esquerda" que
devia servir de ponte para o comunismo. Esta mascarada só conduziu a derrotas.
Os resultados de todas essas experiência e aventuras foram invariavelmente
catastróficas. O movimento revolucionário foi rejeitado durante anos.
Foi então que Manuilsky decidiu quebrar os óculos, e Kuusinen, par não mais
se enganar, proclama toda a gente fascista com a excepção dele próprio e dos
seus amigos. Hoje, o assunto é mais simples e mais claro, e doravante, não pode
aí haver mais erros. Que frente única pode haver com os "sociais-fascistas de
direita "? Assim tendo descrito por cima das nossas cabeças uma viragem de 180
graus, a burocracia stalinista viu-se forçada a declarar contra-revolucionárias as
resoluções dos quatro primeiros congressos da Internacional.
Capitulo VI: As Lições da Experiência Russa
Numa das nossas obras precedentes, referimos-nos à experiência bolchevista
na luta contra Kornilov: os dirigentes oficiais nos responderam por grunhidos de
desaprovação. Lembremos mais uma vez o fundo do assunto, para mostrar de
maneira mais precisa e mais detalhada como a escola stalinista tirou as lições do
passado.
Em Julho-Agosto de 1917, o chefe do governo, Kerensky, realizou
praticamente o programa do comandante em chefe Kornilov: ele restabeleceu na
frente os tribunais militares de campanha e a pena de morte para os soldados,
retirou aos Sovietes conciliadores toda influência sobre os assuntos do Estado,
reprimiu os camponeses, dobrou o preço do pão (no quadro do monopólio do
Estado sobre o comércio do trigo), preparou a evacuação de Petrogrado
revolucionária e juntou nos arredores da capital, de acordo com Kornilov, as
tropas contra-revolucionárias, prometeu aos aliados uma nova ofensiva na frente,
etc. Tal era a situação política geral. No 26 de Agosto, Kornilov rompeu com
Kerensky por causa das hesitações deste e lançou as suas tropas sobre
Petrogrado. O partido bolchevique estava numa situação semi-legal. Seus chefes,
a começar por Lênin, escondiam-se na clandestinidade ou estavam presos,
acusados de ligação com o estado-maior dos Hehenzollern. Os jornais
bolcheviques foram proibidos. As perseguições vinham do governo de Kerensky,
que era apoiado à sua esquerda pelos conciliadores socialistas-revolucionários e
mencheviques.
O que fizera o partido bolchevique? Ele não hesitou um minuto em concluir
um acordo prático com os seus carcereiros, Kerensky, Tseretelli, Dan, para lutar
contra Kornilov. Por todo o lado foram criados comités de defesa
revolucionários, onde os bolcheviques eram minoritários. O que não os impedia
de jogar um papel dirigente: quando dos acordos visando desenvolver a ação
revolucionária das massas, o partido revolucionário mais consequente e o mais
ousado ganha sempre. Os bolcheviques estavam nas primeiras filas, destruindo
as barreiras que os separavam dos operários mencheviques e sobretudo dos
soldados socialistas-revolucionários e mobilizou-os.
Talvez os bolcheviques tenham agido desta maneira unicamente porque
estavam desprevenidos? Não, os bolcheviques exigiram dezenas, centenas de
vezes no decurso dos meses precedentes, dos mencheviques uma luta comum
contra a contra-revolução que se mobilizava. Desde do 27 de Maio, enquanto
que Tseretelli reclamava medidas de repressão contra os marinheiros
bolcheviques, Trotsky declarou numa reunião do Soviete de Petrogrado:
"Se um general contra-revolucionários se esforça de passar o nó
górdio no pescoço da revolução, os cadetes ensaboarão a corda, mas os
marinheiros de Cronstadt virão combater e morrer connosco."
Isto confirmou-se inteiramente. Durante as jornadas onde Kornilov avançava,
Kerensky dirigiu-se aos marinheiros do cruzador Aurora, pedindo-lhes para
tomarem a responsabilidade de defender o Palácio de Inverno. Os marinheiros
eram todos bolcheviques. Eles odiavam Kerensky. Mas isso não os impedia de
proteger o Palácio de Inverno. Seus representantes foram à prisão "Kresty" para
encontrar Trotsky que aí estava preso, e lhe perguntaram: prende-se Kerensky?
Mas a questão era um pouco uma gracinha: os marinheiros compreendiam que
era preciso em primeiro lugar esmagar Kornilov e logo fazer contas com
Kerensky. Graças a uma direção política justa, os marinheiros do Aurora tinham
uma melhor compreensão que o comité central de Thälmann.
O Rot Fahn qualifica o nosso esclarecimento histórico "de errado". Por qual
razão? É uma questão inútil. Pode-se verdadeiramente esperar que dessa gente
objecções sensatas? Eles receberam ordem de Moscovo, sob ameaça de serem
despedidos, de ladrar quando ouvem o nome de Trotsky. Eles executam a ordem
como eles podem. Para eles, Trotsky
"fez uma comparação errada entre a luta actual de Bruning "contra"
Hitler e a luta dos bolcheviques quando do levantamento reacionários
de Kornilov no início de Setembro de 1917: confrontados
imediatamente a uma situação revolucionária aguda os bolcheviques
batiam-se contra os mencheviques para ganha a maioria nos Sovietes, e
armados na luta contra Kornilov, eles atacavam simultaneamente
Kerensky pelos flancos. Trotsky apresenta assim o apoio a Bruning e ao
governo prussiano como um mal menor".
É difícil refutar toda essa balbúrdia de palavras. Eu comparo, diga-se, a luta
dos bolcheviques contra Kornilov com a luta de Bruning contra Hitler. Não
sobrestimo as capacidades intelectuais da redação do Rote Fahne, mas essa gente
não podia não compreender o meu pensamento. A luta dos bolcheviques contra
Kornilov, eu a comparo com a do partido comunista alemão contra Hitler. No
quê que esta comparação está "errada"? Os bolcheviques, escreve Rote Fahne,
combatiam nessa época os mencheviques para ganhar a maioria nos Sovietes.
Mas o Partido comunista alemão, também ele, combate a social-democrata para
ganhar a maioria na classe operária. Na Rússia, estávamos na véspera de "uma
situação revolucionária aguda". Correto! Todavia, se os bolcheviques tinham
adotado em Agosto a posição de Thälmann, é uma situação contra-
revolucionária que poderia ser instaurada no lugar da situação revolucionária.
No decurso das últimas jornadas de Agosto, Kornilov foi esmagado, de fato
não pela força das armas, mas pela unidade das massas. No dia seguinte do 3 de
Setembro, Lênin propôs na imprensa aos mencheviques e aos socialista-
revolucionários, o seguinte compromisso:
"vocês têm a maioria nos Sovietes, lhes dizia ele, tomai o poder, nós
apoiamos-vos contra a burguesia. Garantam a liberdade total de
agitação e nós prometemos-vos uma luta pacífica pela maioria dos
Sovietes".
Eis o oportunista que era Lênin! Os mencheviques e os socialistas-
revolucionários rejeitaram o compromisso, quer dizer uma nova proposta de
frente única contra a burguesia. Essa recusa tornou-se entre as mãos dos
bolcheviques uma potente arma para a preparação do levantamento armado que,
sete semanas mais tarde, varreu os mencheviques e os socialistas-
revolucionários.
Até agora, no mundo, só houve uma revolução proletária vitoriosa. Em
nenhum caso, eu não considero que nós tenhamos cometido qualquer erro no
caminho da vitória; contudo, penso que a nossa experiência apresenta para o
Partido comunista alemão uma certa importância. Desenvolvo uma analogia
histórica entre duas situações muito próximas e aparentadas. Que respondem os
dirigentes do Partido comunista alemão? Injúrias.
Só o grupo ultra-esquerda do Roter Kampfer, armado com toda a sua ciência,
esforçou-se de criticar seriamente a nossa comparação. Ele considera que os
bolcheviques agiram em Agosto de maneira correta,
"porque Kornilov era o representante da contra-revolução czarista. O
que significa que a sua luta era a da reação feudal contra a revolução
burguesa. Nessas condições, um acordo tático dos operários com a
burguesia e o seu apêndice socialista-revolucionário e menchevique era
não somente necessário mas inevitável, porque os interesses das duas
classes coincidiam para afastar a contra-revolução feudal."
Mas como Hitler representa a contra-revolução burguesa e não feudal, a
social-democrata que apoia a burguesia não pode se comprometer contra Hitler.
É por esta razão que não existe a frente única na Alemanha e que a comparação
de Trotsky é errada. Tudo isso parece muito sólido. Mas de fato, não há uma só
palavra justa. A burguesia russa em Agosto de 1917 não se opôs de forma
alguma à reação feudal: todos os proprietários apoiavam o partido cadete, que se
opunha à expropriação dos proprietários de terras. Kornilov se proclamava
republicano, "filho de camponeses" e partidário de uma reforma agrária e da
Assembleia constituinte. Toda a burguesia apoiava Kornilov. O acordo dos
bolcheviques com os socialistas revolucionários e os mencheviques tinha-se
tornado possível unicamente porque os conciliadores tinham temporariamente
rompido com a burguesia: foi com medo de Kornilov que os tinha empurrado.
Os conciliadores tinham compreendido que a partir do momento onde Kornilov
vencesse, a burguesia deixaria de ter necessidade deles e permitiria a Kornilov
de os esmagar. Nesses limites, vê-se que há uma total analogia com as relações
que existem entre a social-democrata e o fascismo.
A diferença não começa de forma alguma onde os teóricos do Roter Kampfer
a veem. Na Rússia, as massas pequeno-burguesas, sobretudo camponesas,
tendiam não para a direita mas para a esquerda. Kornilov não se apoiava sobre a
pequena burguesia. É precisamente por esta razão que o seu movimento não era
fascista. Era uma contra-revolução burguesa – e de forma alguma feudal –
dirigida por um general conspirador. É nisso que residia a sua fraqueza. Kornilov
apoiava-se sobre a simpatia de toda a burguesia e sobre o apoio militar dos
oficiais, dos junkers, quer dizer da jovem geração desta mesma burguesia. Isso
mostrou-se insuficiente. Mas no caso de uma política errada dos bolcheviques, a
vitória de Kornilov não era de forma alguma excluída.
Vemos que os argumentos do Roter Kampfer contra a frente única na
Alemanha são baseados no fato que os seus teóricos não compreendem nem a
situação russa, nem a situação alemã.5
Sentido-se pouco seguro sobre o gelo escorregadio da história russa, o Rote
Fahne tenta abordar a questão de um outro lado. Para Trotsky, só os nacionais-
socialistas são fascistas.
"uma situação de excepção, a redução ditatorial do salário, proibição
de fazer greves… tudo isso não é fascismo par Trotsky. Mas tudo isso o
nosso partido deve suportar."
A irritabilidade impotente dessa gente é desarmante. Onde e quando propus
"apoiar" o governo Bruning? E o que quer dizer: "suportar"? Trata-se de um
apoio parlamentar ou extra-parlamentar do governo Bruning, é uma vergonha
para os comunistas de falarem disso. Mas num outro sentido mais largo,
histórico, vocês, senhores vociferadores, vocês são obrigados de "apoiar" o
governo Bruning, porque vós estais demasiados fracos para o derrubar.
Todos os argumentos que o Rote Fahne dirige contra mim a propósito dos
assuntos alemãs poderiam também se dirigir contra os bolcheviques em 1917.
Poder-se-ia dizer:
"Para os bolcheviques, a política de Kornilov começa com Kornilov.
Mas, de fato, Kerensky não é um kornilovista? A sua política não visa
esmagar a revolução? Não ameaça os camponeses com expedições
punitivas? Não organiza ele os lock-out? Lênin não está na
clandestinidade? E tudo isso, nós devemos apoiá-lo?"
Tanto que me lembro, nem um só bolchevique se arriscou a utilizar um tal
argumento. Mas se houvesse um, ter-lhe-iam respondido aproximadamente isto:
"Nós acusamos Kerensky de preparar e de facilitar a chegada de
Kornilov ao poder. Mas isso nos livrará da obrigação de responder à
ofensiva de Kornilov? Nós acusamos o porteiro de ter aberto metade
das portas ao ladrão. Mas será que isso implica que negligenciemos a
porta?"
Como o governo Bruning, graças à condescendência da social-democrata,
meteu o proletariado até aos joelhos na capitulação diante do fascismo, vocês
concluem daí: até aos joelhos, até à cintura ou totalmente, não é a mesma coisa?
Não, não é a mesma coisa. Aquele que se meteu no pântano até aos joelhos pode
ainda sair disso. Mas para aquele que se meteu até à cabeça, não tem mais
esperanças de sair de lá.
Lênin escrevia sobre os ultra-esquerdas:
"Eles falam bem de nós, bolcheviques. Às vezes temos vontade de
lhes dizer: se vocês nos elogiassem menos, vocês compreendiam melhor
a táctica dos bolcheviques e conheciam-a melhor!"
Capitulo VII: As Lições da Experiência Italiana
O fascismo italiano saiu diretamente do levantamento do proletariado italiano,
traído pelos reformistas. Desde do fim da guerra, o movimento revolucionário na
Itália foi se acentuando e, em Setembro de 1920, resultou na tomada das fábricas
e oficinas pelos operários. A ditadura do proletariado era uma realidade, era
preciso somente organizá-la e tirar daí todas as conclusões. A social-democrata
teve medo e recuou. Após ousados e heroicos esforços, o proletariado se
encontrou diante do vazio. O desmoronamento do movimento revolucionários
foi a condição prévia mais importante do crescimento do fascismo. Em
Setembro, a ofensiva revolucionária do proletariado parou, desde Novembro, se
produziu o primeiro ataque importante dos fascistas (a tomada de Bolonha).
Na verdade, o proletariado ainda era capaz após a catástrofe de Setembro de
combates ofensivos. Mas a social-democrata só tinha uma preocupação: retirar
os operários da batalha pelo preço de concessões continuas. Os sociais-
democratas esperavam que uma atitude de submissão da parte dos operários
levantava a "opinião pública" burguesa contra os fascistas. Além disso, os
reformistas contavam mesmo sobre a ajuda de Vítor Emanuel. Até ao último
momento, eles dissuadiram com todas as energias os operários de lutar contra os
bandos de Mussolini. Mas isso não serviu de nada. Seguindo a alta burguesia, a
coroa meteu-se do lado fascista. Convencidos no último momento que era
impossível parar o fascismo com docilidade, os sociais-democratas chamaram os
operários para a greve geral. Mas essa chamada foi um fiasco. Os reformistas há
muito tempo que tinham molhado a pólvora, temendo que ela não tomasse fogo.
Quando eles aproximaram o fósforo aceso com a mão a tremer, a pólvora não
tomou fogo.
Dois anos após o seu aparecimento, o fascismo estava no poder. Ele reforçou
suas posições graças ao fato que o primeiro período do seu domínio coincidiu
com uma conjuntura econômica favorável, que sucedia à depressão de 1921-
1922. Os fascistas utilizaram a força ofensiva da pequena burguesia para
esmagar o proletariado que recuava. Mas isso não se produziu imediatamente. Já
instalado no poder, Mussolini avançou no seu caminho com uma certa
prudência: ele ainda não tinha um modelo a seguir. Nos dois primeiros anos,
nem mesmo a constituição foi modificada. O governo fascista era uma
coligação. As bandas fascistas, durante esse tempo, utilizavam o cacete, a
navalha e o revólver. Foi progressivamente que foi criado o Estado fascista, o
que implicou o estrangulamento total de todas as organizações de massa
independentes.
Mussolini obteve esse resultado através da burocratização do partido fascista.
Após ter utilizado a força ofensiva da pequena burguesia, o fascismo a
estrangulou com as tenazes do Estado burguês. Ele não podia agir de outra
forma, porque o desencantamento das massas que ele tinha reunido, tornava-se
um perigo imediato para ele. O fascismo burocratizado se aproximou extra-
ordinariamente das outras formas de ditadura militar e policial. Ele já não tem a
base social de outrora. A principal reserva do fascismo, a pequena burguesia,
esgotou-se. Só a inércia histórica permite ao Estado fascista manter o
proletariado num estado de dispersão e de impotência. A relação de forças se
modifica automaticamente em favor do proletariado. Essa mudança deve
conduzir à revolução. A derrota do fascismo será um dos acontecimentos dos
mais catastróficos na história europeia. Mas os fatos provam que todos esses
processos pedem tempo. O estado fascista existe há dez anos. Quanto tempo ele
ainda se manterá? Sem arriscar em fixar prazos, pode-se dizer com segurança
que a vitória de Hitler na Alemanha significaria um novo prolongamento para
Mussolini.
O esmagamento de Hitler marcará para Mussolini o princípio do fim.
Na sua política em relação a Hitler, a social-democrata não inventou uma só
palavra: ela limitou-se a repetir pesadamente o que realizaram no seu tempo os
reformistas italianos. Estes últimos explicavam o fascismo como uma psicose do
pós-guerra; a social-democrata alemã vê aí uma psicose "de Versailles", ou ainda
uma psicose da crise. Nos dois casos, os reformistas fecham os olhos ao caráter
orgânico do fascismo, como movimento de massas, nascido do declínio do
imperialismo.
Temendo a mobilização revolucionária dos operários, os reformistas italianos
metiam todas as esperanças no "Estado". A sua palavra de ordem era: "Vitor
Emanuel, intervêm!" A social-democrata alemã não tem um recurso tão
democrático como um monarca fiel à constituição. Então, contentam-se com um
presidente. "Hindenburg, intervêm!"
Na luta contra Mussolini, quer dizer no recuo diante dele, Turati lança a
fórmula genial: "É preciso ter coragem de ser cobarde". Os reformistas alemãs
são menos frívolos nas suas palavras de ordem. Eles exigem "coragem para
suportar a impopularidade". (Mut zur Unpopularität). É a mesma coisa. Não se
teme a impopularidade, quando se se acomoda cobardemente com o inimigo.
As mesmas causas produzem os mesmos efeitos. Se o curso das coisas
dependessem somente da direção do partido social-democrata, a carreira de
Hitler estaria assegurada.
Contudo, é preciso reconhecer que, pelo seu lado, o Partido comunista alemão
não aprendeu grande coisa da experiência italiana.
O partido comunista italiano surgiu quase ao mesmo tempo que o fascismo.
Mas as mesmas condições de refluxo revolucionário, que levaram o fascismo ao
poder, travaram o desenvolvimento do Partido comunista. Ele não se deu conta
das dimensões do perigo fascista, embalava-se nas ilusão revolucionária, era
irredutivelmente hostil à política da frente única, em suma, sofreu de todas as
doenças infantis. Nada de espantoso nisso: ele tinha somente dois anos. Ele não
via no fascismo senão "a reação capitalista". O Partido comunista não discernia
os traços particulares do fascismo, que decorrem da mobilização da pequena
burguesia contra o proletariado. Segundo as informações dos meus amigos
italianos, excluindo só Gramsci, o partido comunista não acreditava na
possibilidade da tomada do poder pelos fascistas. Pois que revolução proletária
sofreu uma derrota, pois que o capitalismo resistiu, e que a contra-revolução
triunfou, que golpe de Estado contra-revolucionário poderá ter lugar? A
burguesia não pode se insurgir contra ela própria! Tal é a orientação política
fundamental do Partido comunista italiano. Todavia, é preciso não esquecer que
o fascismo italiano era um fenômeno novo, que se encontrava somente em fase
de formação: teria sido difícil mesmo para um partido mais experiente em
discernir os seus traços específicos.
A direção do Partido comunista alemão reproduziu hoje quase literalmente a
posição inicial do comunismo italiano: o fascismo é somente a reação capitalista;
as diferenças entre as diversas formas da reação capitalista não têm importância
do ponto de vista do proletariado. Esse radicalismo vulgar é tanto menos
desculpável que o partido alemão é muito mais velho que o partido italiano na
época correspondente; além disso, o marxismo enriqueceu-se hoje da
experiência trágica da Itália. Afirmar que o fascismo já está instalado ou negar
mesmo a possibilidade da sua acessão ao poder, equivale ao mesmo
politicamente. Ignorar a natureza especifica do fascismo só pode paralisar a
vontade de lutar contra ele. O erro principal atribui-se evidentemente à direção
da Internacional Comunista. Os comunistas italianos mais que os outros
deveriam levantar a voz para prevenir contra esses erros. Mas Stálin e Manuilsky
obrigaram-os a renegar as lições mais importantes da sua própria derrota. Vimos
com que pressa Ercoli se despachou a passar às posições do social-fascismo, isto
é para as posições de espera passiva da vitória fascista na Alemanha.
A social-democrata internacional consolou-se bastante tempo dizendo-se que
o bolchevismo não era concebível senão num país atrasado. Ela aplicou a mesma
afirmação ao fascismo. A social-democrata alemã deve agora compreender a
seus custos a falsidade desta consolação: os seus companheiros de jornada
pequeno burgueses passaram e continuam a passar para o campo do fascismo, os
operários abandonam para o Partido comunista. Só se desenvolvem na
Alemanha o fascismo e o bolchevismo. Ainda que na Rússia por um lado e a
Itália por outro sejam países infinitamente mais atrasados que a Alemanha, um e
outro têm contudo servido de arena ao desenvolvimento dos movimentos
políticos, característico do capitalismo imperialista. A Alemanha avançada deve
reproduzir os processos que, na Rússia e em Itália, já terminaram. O problema
fundamental do desenvolvimento alemão pode hoje ser formulado assim: seguir
a via russa ou a via italiana? Evidentemente, isso não significa que a estrutura
social altamente desenvolvida da Alemanha não tenha importância para o
destino futuro do bolchevismo e do fascismo. A Itália é, numa larga medida mais
que a Alemanha, um país pequeno burguês e camponês. Basta lembrar que na
Alemanha há 9,8 milhões pessoas trabalhando na agricultura e a economia
florestal, e 18,5 milhões na indústria e comércio, quer dizer duas vezes mais. Em
Itália, para 10,3 milhões de pessoas trabalhando na agricultura e na economia
florestal há 6,4 milhões de pessoas trabalhando na indústria e comércio. Esses
números brutos, globais, estão ainda longe de dar uma imagem do peso
específico elevado do proletariado na vida da nação alemã. Mesmo o número
gigantesco dos sem emprego é uma prova contrária da potência social do
proletariado alemão. O conjunto é de traduzir esta potência em termos de
política revolucionária.
A última grande derrota do proletariado alemão, que se pode meter sobre o
mesmo plano histórico que as jornadas de Setembro em Itália, vai a 1923.
durante os oito anos seguintes, muitas feridas cicatrizaram, uma nova geração se
levantou. O Partido comunista da Alemanha representa uma força infinitamente
maior que os comunistas italianos em 1922. O peso específico do proletariado; o
período bastante longo que decorreu desde da sua última derrota; a força
considerável do Partido comunista tais são as três vantagens que têm uma
enorme importância na apreciação geral da situação e das perspectivas. Mas para
utilizar essas vantagens, é preciso compreendê-las. O que não é o caso. A
posição de Thälmann em 1932 reproduziu a posição de Bordiga em 1922. É
nesse ponto que o perigo se torna particularmente grave. Mas aqui também, tem
uma vantagem complementar que não existia há dez anos. Nas fileiras dos
revolucionários alemãs encontra-se uma oposição marxista que se apoia sobre a
experiência da última década. Esta oposição é numericamente fraca, mas os
acontecimentos dão à sua voz uma força excepcional. Em certas condições, um
ligeiro empurrão pode desencadear uma avalanche. O Impulso crítico da
oposição de esquerda pode contribuir para uma mudança oportuna da política da
vanguarda proletária. É nisso que se resume hoje a nossa tarefa!
Capitulo VIII: Pela Frente Única: A Caminho dos
Sovietes, Órgãos Superiores da Frente Única
A veneração em palavras dos Sovietes é tão propagada nos círculos "de
esquerda" como a incompreensão da sua função histórica. Os Sovietes são
definidos na maior parte das vezes como órgãos de luta pelo poder, os órgãos da
insurreição e enfim os órgãos da ditadura. Essas definições são formalmente
corretas. Mas elas não se esgotam a função histórica dos Sovietes. E sobretudo,
elas não explicam porque são precisamente os Sovietes que são necessários na
luta pelo poder. A resposta a esta questão é a seguinte: tal como o sindicato é a
forma elementar da frente única na luta econômica, o Soviete é a forma mais
elevada da frente única, quando chega para o proletariado a época da luta pelo
poder.
O próprio Soviete não possuí qualquer força milagrosa. Ele é apenas o
representante de classe do proletariado com todos os seus lados forte e seus
lados fracos. Mas é precisamente isso, e somente isso, que faz que o Soviete
ofereça a possibilidade organizacional aos operários das diferentes tendências
políticas e que estão a níveis diferentes de desenvolvimento, de unirem seus
esforços na luta revolucionária pelo poder. Na situação atual pré-revolucionária,
os operários alemãs de vanguarda devem ter uma ideia muito clara da função
histórica dos Sovietes como órgãos da frente única.
Se, no decurso do período de preparação, o Partido comunista tivesse
conseguido eliminar completamente das fileiras do proletariado todos os outros
partidos, e a juntar sob a sua bandeira, tanto organizativa como politicamente a
esmagadora maioria dos operários, os Sovietes não seriam necessários.
Mas, como prova a experiência histórica, nada permite acreditar que o Partido
comunista, em qualquer país que seja – nos países de velha cultura capitalista
ainda menos que nos países atrasados -, conseguisse ocupar uma posição
totalmente hegemônica no seio da classe operária, sobretudo antes da revolução
proletária.
A Alemanha hoje nos mostra precisamente que a tarefa da luta direta e
imediata pelo poder se coloca ao proletariado muito antes que esteja
inteiramente reunida sob a bandeira do Partido comunista. A situação
revolucionária, ao nível político, se caracteriza precisamente pelo fato que todos
os grupos e todas as camadas do proletariado, ou pelo menos a sua esmagadora
maioria, aspiram unir seus esforços para mudar o regime existente. Contudo, isso
não significa que todos compreendam como proceder e ainda menos que estejam
prontos a romper com seus partidos e passar para as fileiras do Partido
comunista. A consciência política não amadurece de maneira linear e uniforme,
profundas diferenças internas subsistem mesmo na época revolucionárias quando
todos os processos se fazem por saltos. Mas paralelamente, a necessidade de
uma organização acima dos partidos, englobando toda a classe, se faz sentir. Dar
forma a essa necessidade, tal é a missão histórica dos Sovietes. Tal é o imenso
papel. Nas condições de uma situação revolucionária, eles são a mais alta
expressão organizativa da unidade do proletariado. Quem não compreendeu isso
não compreendeu nada sobre a questão dos Sovietes. Thälmann, Neumann,
Remmele podem pronunciar todos os discursos e escrever os artigos que
quiserem sobre a futura "Alemanha soviética". Pelo sua política atual eles
sabotam a criação dos Sovietes na Alemanha.
Estando muito longe dos acontecimentos, não sabendo diretamente o que
ressentem as massas, e não tendo a possibilidade de tomar o pulso da classe
operária diariamente, é muito difícil para mim prever as formas transitórias que
conduzirão à criação dos sovietes na Alemanha. Aliás, avancei a hipótese que os
sovietes poderiam ser a extensão dos comités de fábrica: em dizendo isso, apoio-
me essencialmente na experiência de 1923. Mas é claro que não é a única via.
Sob a pressão do desemprego e da miséria por um lado, sob o avanço fascista de
outro, a necessidade da unidade revolucionária pode tomar diretamente a forma
dos Sovietes, deixando de lado os comités de fábrica. Mas qualquer que seja a
via pela qual se chegue aos Sovietes, eles não serão outra coisa senão a
expressão organizativa dos pontos fracos e fortes do proletariado, das suas
diferenças internas e da sua aspiração geral a ultrapassá-las, numa palavra, os
órgãos da frente única de classe.
Na Alemanha, a social-democracia e o Partido comunista partilham a
influência sobre a maioria da classe operária. A direção social-democrata faz o
que pode para afastar dela os operários. A direção do Partido comunista opõe-se
com todas as forças ao afluxo dos operários. Isso tem por resultado o
aparecimento de um terceiro partido, que se acompanha de uma modificação
relativamente lenta da relação de forças em favor dos comunistas. Mesmo se o
Partido comunista levasse a cabo um política correta, a necessidade da unidade
revolucionária da classe cresceria entre os operários infinitamente mais rápido
que a preponderância do Partido comunista no interior da classe. A necessidade
da criação dos Sovietes manteria assim toda a sua amplitude.
A criação dos Sovietes pressupõe o acordo dos diferentes partidos e
organizações da classe operária, começando pelas fábricas; esse acordo deve
incluir tanto a necessidade dos Sovietes como o momento e o modo da sua
formação. Isso significa: os Sovietes são a forma concretizada da frente única na
época revolucionária e sua aparição deve ser precedida pela política da frente
única no período preparatório. É necessário lembrar ainda mais uma vez que no
decurso dos primeiros seis meses de 1917 na Rússia, eram os conciliadores,
socialistas-revolucionários e mencheviques, que detinham a maioria nos
Sovietes? O partido dos bolchevistas, sem renunciar um só momento à sua
independência revolucionária como partido, respeitou paralelamente, no quadro
da atividade dos Sovietes, a disciplina organizativa em relação à maioria. É claro
que na Alemanha, o Partido comunista ocupará a partir da aparição do primeiro
Soviete um lugar muito mais importante que o dos bolcheviques nos Sovietes em
Março de 1917. Não está excluído que os comunistas ganhem muito rapidamente
a maioria nos Sovietes. O que não retiraria de forma alguma a estes o seu
significado de instrumentos da frente única, porque, no início, a minoria dos
sociais-democratas, os sem partido, os operários católicos, etc. - se contará por
milhões, e o melhor meio para partir o pescoço, mesmo na situação mais
revolucionária, é de não ter em conta uma tal minoria. Mas tudo isso é a música
do futuro. Hoje, é o Partido comunista que é a minoria. É daí que é preciso partir.
O que foi dito não significa, evidentemente, que o caminho levando aos
Sovietes passe obrigatoriamente por um acordo prévio com Wels, Hilferding,
Breitscheid, etc. Em 1918, Hilferding questionava-se como incluir os Sovietes
na constituição de Weimar, sem prejudicar esta última; pode-se pensar que
atualmente o seu espírito está ocupado pelo seguinte problema: como incluir os
quartéis fascistas na constituição de Weimar sem prejudicar a social-democracia?
É preciso passar pela criação dos Sovietes no momento onde o estado geral do
proletariado o permite, mesmo se isso se faz contra a vontade das esferas
dirigentes da social-democracia. Para isso, é necessário destacar a base social-
democrata da cúpula: mas não se pode atingir esse objectivo, fazendo como se
ele já fosse realizado. Para destacar milhões de operários sociais-democratas de
seus chefes reacionários, é preciso justamente mostrar a esses trabalhadores que
estamos prontos a entrar nos Sovietes mesmo com esses "chefes".
Todavia, não se pode considerar como excluído à priori o fato que mesmo a
camada superior da social-democracia se verá obrigada afrontar a atmosfera
escaldante dos Sovietes, para tentar repetir a manobra de Ebert, Scheidemann,
Haasse e companhia em 1918-1919: tudo dependerá, então, menos da má
vontade desses senhores do que da força e das condições nas quais a história os
apanhará nas suas tenazes.
O aparecimento do primeiro Soviete local importante onde os operários
sociais-democratas e comunistas estariam presentes não como indivíduos mas
como organização, produziria um efeito considerável sobre o conjunto da classe
operária alemã. Não somente os operários sociais-democratas e sem partido, mas
também os operários liberais e católicos não poderiam resistir por muito tempo a
esta força centrípeta. Todas as partes do proletariado alemão, o mais inclinado e
o mais apto à organização, seriam atraídos pelos Sovietes como a limalha pelo
imã. O Partido comunista encontraria nos Sovietes um novo terreno de luta,
excepcionalmente favorável, para conquistar um papel dirigente na revolução
proletária. Pode-se considerar como certo que a maioria esmagadora dos
operários sociais-democratas e mesmo uma parte não negligente do aparelho
social-democrata seriam a partir de agora arrastada no quadro dos Sovietes, se a
direção do Partido comunista não zelasse tanto em ajudar os chefes sociais-
democratas a parar a pressão das massas.
Se o Partido comunista julga inaceitável todo acordo com os comités de
fábrica, as organizações sociais-democratas, os sindicatos, etc., sobre um
programa preciso das tarefas práticas, isso significa unicamente que ele julga
inaceitável criar Sovietes com a social-democracia. Como não pode haver
sovietes estritamente comunistas, porque eles não seriam úteis a ninguém, a
rejeito pelo Partido comunista dos acordos e das ações comuns com os outros
partido da classe operária, não significa nada de diferente que a rejeição do
Sovietes. O Rote Fahne responderá, com inverosimilhança, a este raciocínio com
um monte de injúrias e provará, como dois e dois são quatro, que eu sou agente
eleitoral de Bruning, aliado secreto de Wels, etc. Estou pronto a assumir a
responsabilidade de todos esses artigos, mas com uma só condição: que o Rote
Fahne, pelo seu lado, explique aos operários alemãs como, a qual momento e sob
qual forma os Soviets podem ser criados na Alemanha sem a política da frente
única em relação às outras organizações operárias.
Para esclarecer a questão dos Sovietes, como órgãos da frente única, as
reflexões feitas sobre o assunto por um dos jornais da província do Partido
comunista, o Klassenkampf (Halle Mersenburg), são muito instrutivas.
"Todas as organizações operárias – ironiza o jornal -, sob a sua forma
atual, com todos os seus erros e suas fraquezas, devem ser reunidas nas
grandes uniões antifascistas defensivas. Que quer dizer? Podemos
passar sem as grandes explicações teóricas; a história foi nesta questão
um grande professor da classe operária alemã: o esmagamento da
revolução de 1918-1919 foi o preço que pagou a classe operária alemã,
pela frente única de todas as organizações operárias, que era uma
magma sem forma."
Nós temos aqui um exemplo desigual de conversa superficial!
A frente única em 1918-1919 se realizou essencialmente a través dos Sovietes.
Os espartakistas deviam, sim ou não, entrar nos sovietes. Se se tomar esta
citação literalmente, eles deviam ficar de fora dos sovietes. Mas como os
spartakistas representavam um fraca minoria da classe operária e não podia
absolutamente substituir seus próprios sovietes aos da social-democracia, seu
isolamento em relação aos sovietes teria simplesmente significado seu
isolamento em relação à revolução. Se a frente única tinha este aspecto de
"magma sem forma", a falta não pertencia aos sovietes como órgãos da frente
única, mas ao estado político da própria classe operária, quer dizer a fraqueza da
União spartakista e à força extraordinária da social-democracia. De forma geral,
a frente única não poderia substituir um potente partido revolucionário. Ele pode
somente ajudá-lo a se reforçar. Isto é válido para os sovietes. O temor que a fraca
União spartakista deixasse passar uma situação excepcional, empurrou-a para
ações ultra-esquerda e a intervenções prematuras. Em contrapartida, se os
spartakistas tivessem ficado no exterior da frente única, quer dizer dos sovietes,
esses traços negativos ter-se-iam manifestado sem qualquer dúvida ainda mais
nitidamente.
Essa gente na verdade não tiram nada da experiência da revolução alemã de
1918-1919? Nem leram A doença infantil do comunismo? O regime stalinista
causou realmente estragos nos espíritos! Depois de ter burocratizado os Sovietes
na URSS, os epígonos os consideram como simples instrumento técnico nas
mãos do aparelho do partido. Esqueceram que os sovietes foram criados como
parlamentos operários, e que eles atraíam as massas porque ofereciam a
possibilidade de reunir lado a lado todas as fracções da classe operária,
independentemente das diferenças de partido; esqueceram que é precisamente
nisso que residia a gigantesca força educativa e revolucionária dos sovietes.
Tudo foi esquecido, confundido, desfigurado. Oh, epígonos três vezes malditos!
O problema das relações entre o partido e os sovietes tem uma importância
decisiva para uma política revolucionária. O curso atual do Partido comunista
visa de fato substituir o partido aos sovietes; por outro lado, Hugo Urbahns, que
não falha uma ocasião de aumentar a confusão, apronta-se a substituir os
sovietes pelo partido. Segundo o relatório dado pelo S.A.Z., Urbahns declarou
no decurso de uma reunião tida em Janeiro em Berlim, criticando as pretensões
do Partido comunista a dirigir a classe operária:
"A direção estará entre as mãos dos sovietes, eleitos pelas próprias
massas e não escolhidas segundo a vontade e o prazer de um só partido"
(aprovação massiva).
É compreensível que o ultimato do Partido comunista irrite os operários que
são levados a aplaudir todo o protesto contra a fanfarronice burocrática. Mas isso
não muda nada ao fato que a posição de Urbahns sobre esta questão também,
nada tenha em comum com o marxismo. É indiscutível que os "próprios"
operários elegerão os Sovietes. A questão é saber quem eles elegerão. Devemos
entrar nos sovietes com as outras organizações, quaisquer que sejam, com "todos
os seus erros e fraquezas". Mas pensar que os sovietes pode "por eles próprios"
dirigir a luta do proletariado pelo poder, equivale propagar um grosseiro
fetichismo do soviete. Tudo depende do partido que dirige os Sovietes. É porquê,
contrariamente a Urbahns, os bolcheviques-leninistas não recusam de forma
alguma ao Partido comunista o direito de dirigir os sovietes, pelo contrário, eles
declaram: é sobre a base da frente única, é através das organizações de massa,
que o Partido comunista pode conquistar uma posição dirigente nos futuros
sovietes, e conduzir o proletariado à conquista do poder.
Capitulo IX: O S.A.P (Partido Socialista Operário)6
Só os funcionários enraivecidos que acreditam que tudo lhes é permitido ou
papagaios estúpidos que repetem injúrias, sem compreender o sentido, podem
qualificar o SAP de partido "social-fascista" ou "contra-revolucionário". Mas
seria dar prova de ligeireza imperdoável e dum optimismo barato confiar à priori
numa organização que, ainda que tenha rompido com a social-democracia, se
encontra sempre a meio caminho entre o reformismo e o comunismo, com uma
direção mais próxima do reformismo que do comunismo. Sobre esse ponto
igualmente a oposição de esquerda não é de forma alguma responsável pela
política de Urbahns.
O SAP não tem programa. Não compreendemos por aí um documento formal:
um programa é sólido se o seu texto está ligado à experiência revolucionária do
partido, aos ensinamentos das lutas, que se tornaram a carne e o sangue dos seus
quadros. O SAP não é nada disso. A Revolução russa, suas diferentes etapas,
suas lutas de fracções; a crise alemã de 1923; a guerra civil na Bulgária; os
acontecimentos da Revolução chinesa; o combate do proletariado inglês (1926);
a crise revolucionária espanhola – todos esses acontecimentos que deveriam
estar na consciência do revolucionário como estacas no caminho político, não
são para os quadros do SAP senão lembranças jornalísticas confusas e não uma
experiência revolucionária profundamente assimilada. É indiscutível que um
partido operário deve ter uma política de frente única. Mas a política de frente
única apresenta perigos. Só um partido revolucionário, temperado na luta, pode
levar a cabo essa política com sucesso. De qualquer modo, politica de frente
única não pode constituir o programa de um partido revolucionário. Portanto, é a
isso que se resume hoje toda a atividade do SAP. A política da frente única é
assim levada para o interior do partido, quer dizer serve para apagar as
contradições entre as diferentes tendências. Tal é a função fundamental do
centrismo.
O dia-a-dia do SAP oscila entre esses dois polos. Apesar de Strobel ter-se
retirado, o jornal continua meio pacifista e não marxista. Artigos revolucionários
isolados não modificam nada a sua fisionomia, pelo contrários, eles só lhe dão
relevo. O jornal se entusiasma pela carta de Kuster a Bruning a propósito do
militarismo, carta aborrecida, de espírito profundamente pequeno-burguês. Ela
aplaude o "socialista" dinamarquês, antigo ministro do rei, pelo sua recusa em
tomar parte da delegação governamental em condições demasiado humilhantes.
O centrismo se contenta com pouco. Mas a revolução pede muito, a revolução
pede tudo.
O SAP condena a política do Partido comunista alemão: cisão dos sindicatos e
formação do RGO (oposição sindical vermelha). A política sindical do Partido
comunista alemão é, sem dúvida, profundamente errada: a direção de Lozovsky
custa caro à vanguarda proletária internacional. Mas a crítica do SAP não é
menos errada. O problema essencial não é que o Partido comunista "divide" as
fileiras do proletariado e "enfraquece" as uniões sociais-democratas. Não é um
critério revolucionário, porque com a direção atual, os sindicatos estão ao
serviço dos capitalistas e não dos operários. O crime do Partido comunista não é
que ele "enfraqueceu" a organização de Leipart, mas que ele se enfraqueceu a si
próprio. A participação dos comunistas nas uniões reacionárias é ditada não por
princípio abstrato de unidade, mas pela necessidade de lutar para limpar as
organizações dos agentes do capital. O SAP faz passar antes deste aspecto ativo,
revolucionário, ofensivo da política, o principio abstrato da unidade dos
sindicatos, dirigidos por agentes do capital.
O SAP acusa o Partido comunista de tendência ao golpismo. Tal acusação
funda-se igualmente em certos fatos e certos métodos; mas antes de ter o direito
de avançar esta acusação, o SAP deve formular exatamente e mostrar com fatos
qual é a sua posição sobre as questões fundamentais da revolução proletária. Os
mencheviques acusavam sempre os bolcheviques de blanquismo e de
aventureirismo, quer dizer de golpismo. Todavia, a estratégia leninista estava tão
afastada do golpismo como o céu da terra. Mas Lênin compreendia e sabia
explicar aos outros a importância da "arte do levantamento" na luta proletária.
Sobre esse ponto a crítica do SAP tem um caráter tanto mais duvidoso que ela se
apoia sobre Paul Levi, que se assusta com as doenças infantis do Partido
comunista e preferiu o marasmo senil da social-democracia. Durante as
conferências limitadas sobre os acontecimentos de Março de 1921 na Alemanha,
Lênin dizia de Levi: "Este homem perdeu a cabeça definitivamente". É verdade
que Lénine logo acrescentava com malícia: "Ele tinha pelo menos qualquer coisa
a perder, mas não se pode dizer o mesmo dos outros." Entre "os outros"
figuravam: Bela Kun, Thalheimer, etc. Não se pode negar que Paul Levi tivesse
uma cabeça sobre os ombros. Mas é pouco provável que este homem que perdeu
a cabeça e que, sob esta forma, saltou das fileiras do comunismo para as fileiras
do reformismo, seja um professor competente para um partido proletário. O fim
trágico de Levi – deu salto pela janela durante um acesso de loucura – simboliza
de qualquer modo a sua trajetória política. Para as massas, o centrismo não é
senão a transição de uma etapa para outra, mas por certos homens políticos, pode
se tornar uma segunda natureza. À cabeça do SAP se encontra um grupo de
sociais-democratas desesperados, funcionários, advogados, jornalistas, que
atingiram a idade onde a educação política deve ser considerada como
terminada. social-democrata desesperado na significa ainda revolucionário.
Georg Ledebour é um representante deste tipo, o seu melhor representante. Só
recentemente que tive ocasião de ler o relatório do seu processo em 1919. E mais
de uma vez no decurso da minha leitura, aplaudi mentalmente o velho
combatente, a sua sinceridade, o seu temperamento, a sua nobreza. Mas
Lebedour nem sempre franqueou os limites do centrismo. Onde se tratou de
ações de massa, formas superiores da luta das classes, da sua preparação, onde se
tratou para o partido de tomar a responsabilidade da direção dos combates de
massa Ledebour é somente o melhor representante do centrismo. É isso que o
separou de Liebknecht e de Rosa Luxemburgo. É isso que o separa hoje de nós.
Indignando-se do fato que Stálin acusa a ala radical da velha social-
democracia alemã de passividade em relação à luta das nações oprimidas,
Ledebour lembra que, precisamente na questão nacional, ele sempre deu prova
de grande iniciativa. É absolutamente indiscutível. Ledebour, pessoalmente,
ergueu-se com muita paixão contra as tendências chauvinistas na velha social-
democracia alemã, sem de forma alguma dissimular o sentimento nacional
alemão, muito desenvolvido nele. Ledebour sempre foi o melhor amigo dos
imigrantes revolucionários russos, polacos ou outros, e muitos entre eles
conservaram uma lembrança calorosa do velho revolucionário, que nas fileiras
da burocracia social-democrata chamavam com condescendente ironia tanto
"Ledebourov", como "Ledibursky".
Todavia, Stálin que não conhece nem os fatos, nem a literatura desta época,
tem razão nesta questão, na medida pelo menos onde ele retoma a apreciação de
Lênin. Tentando responder, Ledebour só confirma esta apreciação. Ele refere-se
ao fato que, nos seus artigos, ele exprimiu mais de uma vez a sua indignação
para com os partidos da IIª Internacional, que julgavam com uma perfeita
serenidade o trabalho de um dos seus membros, Ramsay MacDonald, que
resolvia o problema nacional da Índia com ajuda de bombardeamentos aéreos.
Esta indignação e este protesto traduzem a diferença indiscutível e honrada que
existe entre Ledebour e um qualquer Otto Bauer, sem falar dos Hilferding ou dos
Wels: para que esses senhores se possam lançar nos bombardeamentos
democráticos, não lhes falta Índias.
Contudo, a posição de Ledebour sobre esse ponto não sai dos limites do
centrismo. Ledebour reclama a luta contra a opressão colonial: ele votará no
parlamento contra os créditos coloniais; ele tomará a defesa corajosa das vítimas
do levantamento esmago pelos colonialistas. Mas Ledebour não tomará parte na
preparação do levantamento colonial. Ele considera que tal trabalho depende do
golpismo, do aventureirismo, do bolchevismo. Aí está o fundo do problema.
O que caracteriza o bolchevismo na questão nacional, é que ele trata as nações
oprimidas, mesmo as mais atrasadas, não somente como objetos, mas também
como sujeitos políticos. O bolchevismo não se limita a reconhecer-lhe "o direito"
à autodeterminação e a protestar no parlamento contra a violação desse direito.
O bolchevismo penetra nas nações oprimidas, dirige-as contra seus opressores,
liga suas lutas à do proletariado dos países capitalista, ensina aos oprimidos,
chineses, hindus ou árabes a arte do levantamento, e assume toda a
responsabilidade desse trabalho face aos seus carrascos civilizados. É aí somente
que começa o bolchevismo, isto é o marxismo revolucionário agissante. Tudo o
que resta abaixo deste limite é centrismo.
Os únicos critérios nacionais não permitem apreciar corretamente a política de
um partido proletário. Para um marxista, é um axioma. Quais são então as
simpatias e os laços internacionais do SAP? Os centristas noruegueses, suecos,
holandeses, organizações, grupos ou pessoas isoladas, a quem o seu caráter
passivo e provincial permite de se manter entre o reformismo e o comunismo,
tais são os amigos os mais próximos. Angelica Balabanova é o símbolo dos laços
internacionais do SAP: ela tenta ainda hoje ligar o novo partido aos cacos da
Internacional 2 ½.
Léon Blum, defensor das reparações, compadre socialista do banqueiro
Oustric, é tratado nas páginas do jornal de Seydewitz "camarada". O que é isso?
Delicadeza? Não, é falta de princípios, de caráter, de firmeza. "Você procura
sarilhos?, dirá qualquer douto sempre fechado no seu gabinete. Não, esses
detalhes exprimem o fundo político com muito mais verdade e autenticidade que
o reconhecimento abstrato dos Sovietes, não fundada sobre a experiência
revolucionária. Só se podem ridiculizar, tratando Blum de "fascista". Mas quem
não despreza nem odeia esta canalha política não é um revolucionário.
O SAP se destaca do "camarada" Otto Bauer no limite onde Max Adler o faz.
Para Rosenfeld e Seydewitz, Bauer não é um adversário ideológico, talvez
mesmo temporário, enquanto que para nós, é um inimigo irredutível, que
conduziu o proletariado da Áustria num pântano medonho.
Max Adler é um barômetro centrista bastante sensível. Não se pode negar a
utilidade de tal instrumento, mas é preciso se convencer que se ele regista a
mudança de tempo, ele é incapaz de influenciá-lo. Do fato da sua situação sem
saída do capitalismo, Max Adler está de novo pronto, não sem dor filosófica, em
reconhecer que a revolução é inevitável. Mas que confissão! Só reservas e
suspiros! A melhor solução teria sido que a IIª Internacional e a IIIª Internacional
se unissem. A solução mais vantajosa teria sido introduzir o socialismo pela via
democrática. Mas, infelizmente, esse meio é visivelmente irrealizável. É
evidente que nos países civilizados, e não somente nos países bárbaros, os
operários devem, infelizmente, três vezes infelizmente, fazer a revolução. Mas
mesmo este consentimento melancólico da Revolução é só literatura. A história
não conheceu e nem nunca conhecerá situação tal que Max Adler possa dizer: "A
hora soou!" Os homens como Adler são capazes de justificar a revolução no
passado, de a reconhecer como inevitável no futuro, mas eles são incapazes de a
chamar no presente. Não há nada a esperar de todo esse grupo de velhos sociais-
democratas de esquerda, que nem a guerra imperialista, nem a Revolução russa
não fizeram evoluir. Como instrumento barométrico, passa ainda. Como chefe
revolucionário, nunca!
No fim do mês de Dezembro, o SAP dirigiu a todas as organizações operárias
uma chamada para organizar em todo o país reuniões, onde os oradores de todas
as tendências teriam o mesmo tempo de palavra. É evidente que não se chegaria
a nada em se comprometendo nessa via. Com efeito, que sentido teria para o
Partido comunista e o Partido social-democrata partilhar igualmente a tribuna
com Brandler, Urbahns e outros representantes de organizações e grupos
demasiado insignificantes para pretender ocupar um lugar particular no
movimento? A frente única é a unidade das massas operárias comunistas e
sociais-democratas e não um mercado entre grupos políticos sem base de massa.
Dir-nos-ão: o bloco de Rosenfeld-Brandler-Urbahns não é um bloco de
propaganda para a frente única. Mas é precisamente nesse domínio da
propaganda que um tal bloco é inadmissível. A propaganda deve apoiar-se sobre
princípios claros, sobre um programa preciso. Caminhar separadamente, bater
conjuntamente. O bloco só é criado para ações práticas de massa. As transações
na cimeira sem base de princípio não levam a nada, salvo à confusão.
A ideia de apresentar às eleições presidenciais um candidato da frente única é
uma ideia fundamentalmente errada. O partido não tem o direito de renunciar a
mobilizar seus partidários e a contar suas forças nas eleições. Uma candidatura
do partido que se opõe a todas as outras candidaturas não pode em qualquer caso
constituir um obstáculo a um acordo com outras organizações para objetivos
imediatos da luta. Os comunistas, que sejam ou não no partido oficial, apoiarão
com todas as suas forças a candidatura de Thälmann. Não se trata de Thälmann
pessoalmente, mas da bandeira do comunismo. Nós o defenderemos contra os
outros partidos. Destruindo os preconceitos, inoculados aos comunistas da base
pela burocracia stalinista, a oposição de esquerda abre caminho para a sua
consciência.7
Qual foi a política dos bolcheviques no que respeita as organizações operárias
e os "partidos" que se tinham desenvolvidos à esquerda do reformismo ou do
centrismo a caminho do comunismo?
Em Petrogrado, em 1917, existia uma organização inter-distritos que
contavam quatro mil operários. A organização bolchevique juntava em
Petrogrado dezenas de milhares de operários. Contudo, o comité dos
bolcheviques de Petrogrado concordou sobre todas as questões com as inter-
distritais, mantinha-as ao corrente de seus planos e facilitou assim a fusão
completa das duas organizações.
Pode-se responder que as inter-distritos estavam politicamente próximas dos
bolcheviques. Mas não se tratava somente das inter-distritos. Quando os
mencheviques internacionalistas (o grupo de Martov) se opuseram aos sociais-
patriotas, os bolcheviques fizeram tudo para fazer ações comuns com os
martovistas; se na maioria dos casos foi um fiasco, a falta não era dos
bolchevistas. É preciso acrescentar que os mencheviques-internacionalistas
continuaram a ser formalmente membros do mesmo partido que Tseretelli e Dan.
A mesma táctica, mas a uma grande escala foi adotada em relação aos
socialistas-revolucionários de esquerda. Os bolcheviques levaram uma parte dos
socialistas revolucionários de esquerda até ao Comité militar revolucionário, isto
é o órgão da insurreição, mesmo se nessa época os socialistas-revolucionários de
esquerda fossem sempre membros do mesmo partido que Kerensky, contra o
qual a insurreição foi diretamente dirigida. Evidentemente, não era muito lógico
da parte dos socialistas revolucionários de esquerda, isso provava que tudo não
estava em ordem na cabeça deles. Mas se fosse preciso esperar que tudo
estivesse em ordem em todas as cabeças, nunca haveria revolução vitoriosa. Os
bolcheviques formaram a seguir com o partido dos socialistas revolucionários de
esquerda ("kornilovistas" de esquerda ou "fascistas" de esquerda segundo a
terminologia atual) um bloco governamental que se manteve alguns meses e só
acabou depois do levantamento dos socialistas revolucionários de esquerda.
Lênin resumiu assim a experiência dos bolcheviques no que diz respeito aos
centristas de esquerda:
"A tática justa dos comunistas deve consistir a utilizar estas
hesitações e a não as ignorar; sua utilização exige que se faça
concessões aos elementos que se viram para o proletariado, e isso
somente na medida e no momento onde eles se voltam paralelamente
para ele; paralelamente é preciso lutar contra os que se voltam para a
burguesia… Tomando uma decisão demasiado precipitada: "Nenhum
compromisso, nenhum subterfúgio", só pode prejudicar ao reforço do
proletariado revolucionário… "
A tática dos bolcheviques nesta questão nunca teve nada em comum com o
ultimato burocrático!
Também não há muito tempo que os próprios Thälmann e Remmele estavam
no partido independente. Se eles fizerem um esforço de memória, terão talvez a
oportunidade de se lembrar o seu estado político nos anos onde, tendo rompido
com a social-democracia, aderiram ao partido independente e deram-lhe um
impulso à esquerda. Que teriam feito se alguém lhes tivesse dito então, que eles
representavam somente "a ala esquerda da contra-revolução monárquica "? Eles
teriam concluído provavelmente que os seus acusadores estavam bêbados ou
loucos. E portanto, é precisamente assim que eles definem o SAP!
Lembremos as conclusões que tirou Lênin do aparecimento do partido
independente:
"Porquê na Alemanha o deslocamento dos operários da direita para a
esquerda, deslizamento absolutamente idêntico ao que conheceu a Rússia em
1917, conduziu não ao reforço imediato dos comunistas, mas primeiro ao do
partido intermediário dos «independentes»… É evidente que uma das causas
disso foi a táctica errada dos comunistas alemãs, que devem sem temor e
lealmente reconhecer este erro e aprender a corrigir… Este erro é uma das
numerosas manifestações da doença infantil, o esquerdismo, que agora se
declarou abertamente; ela será melhor tratada, mais rápido e com maior proveito
para o organismo".
Dir-se-ia que está escrito diretamente para a situação atual!
O Partido comunista alemão é hoje muito mais potente que a União
spartakista de então. Mas se agora uma segunda versão do partido independente,
em parte com a mesma direção, aparece, a falta do Partido comunista é mais
grave.
A aparição do SAP é um fenômeno contraditório. Mais valia, evidentemente,
que os operários aderissem diretamente ao Partido comunista. Mas para isso, o
Partido comunista deveria ter tido outra política e outra direção. É preciso julgar
o SAP não a partir de um Partido comunista ideal, mas do partido tal que ele
existe. Na medida onde o Partido comunista ficou em posição de ultimato
burocrático e se opunha às forças centrífugas no interior da social-democracia, a
aparição do SAP era inevitável e progressista.
Mas a existência de uma direção centrista limita consideravelmente esse
caráter progressista do SAP. Se uma tal direção se estabiliza, o SAP está perdido.
Aceitar o centrismo do SAP em nome do papel globalmente progressista desse
partido equivale a liquidar esse papel progressista.
Os elementos conciliadores que se encontram à cabeça do partido e que sabem
manobrar, se esforçam por todos os meios de mascar as contradições e de atrasar
a crise. Esses meios serão eficazes até ao primeiro empurrão sério dos
acontecimentos. A crise do partido arrisca-se a desenvolver-se no momento mais
forte da crise revolucionária e de paralisar os elementos proletários.
A tarefa dos comunistas é ajudar os operários do SAP a limpar
suficientemente o centrismo das suas fileiras e a se desembaraçar da sua direção
centrista. Para isso, é preciso nada deixar em silêncio, não tomar as boas
resoluções por ações e chamar as coisas pelo seu nome. Pelo seu nome e não por
um nome inteiramente inventado. Criticar e não caluniar. Procurar a
aproximação e não afastar brutalmente. Sobre a ala esquerda do partido
independente, Lênin escreveu:
"É absolutamente ridículo ter medo de um «compromisso» com esta
ala do partido. Pelo contrário, os comunistas devem procurar e
encontrar a forma adequada de compromisso com ela, um compromisso
que, por um lado, facilitará e apressará a fusão completa e indispensável
com esta ala, e que, por outro lado, não estorvará nada os comunistas na
sua luta ideológica e política contra a ala oportunista direitista dos
independentes."
Hoje, quase não há nada a acrescentar a esta diretiva tática.
Nós dizemos aos elementos de esquerda do SAP:
"Os revolucionários se temperam não somente nas greves e combates
de rua, mas também e antes de tudo na luta por uma política justa do seu
próprio partido. "Tomai as «vinte e uma condições», elaboradas no seu
tempo para aceitar novos partidos na Internacional Comunista. Tomai os
trabalhos da oposição de esquerda, onde as vinte e uma condições são
utilizadas para analisar a evolução da situação no decurso dos oito
últimos anos. À luz dessas "condições", lançai um ataque sistemático
contra os centrismo nas vossas próprias fileiras e levem-no até ao fim.
De outro jeito, não vos restará senão jogar o papel pouco glorioso de
caução de esquerda do centrismo".
E depois? Depois, é preciso voltar-se para o partido comunista alemão. Os
revolucionários não se situam de forma nenhuma a meio caminho entre a social-
democracia e o Partido comunista, como queriam Rosenfeld e Seydewitz. Não,
os chefes sociais-democratas são os agentes do inimigo de classe no
proletariado. Os chefes comunistas são revolucionários ou meio revolucionários
confusos, maus, sem talento, extraviados. Não é a mesma coisa. É preciso
destruir a social-democracia, mas é preciso corrigir o Partido comunista. Vocês
dizem que é impossível? Mas tentaram seriamente meter mãos à obra. Quando
os acontecimentos pressionam o Partido comunista, é preciso agora ajudar os
acontecimentos pela pressão da nossa crítica. Os operários comunistas nos darão
ouvidos se eles se se convencerem dos fatos que nós não queremos criar um
"terceiro partido", mas que nos esforçamos sinceramente de lhes ajudar a fazer
do Partido comunista existente o verdadeiro dirigente da classe operária.
— E se isso não resultar?
— Se isso não resultar, significa, seguramente, na situação histórica dada,
a vitória do fascismo.
Mas antes dos grandes combates, um revolucionário não pergunta o que se
passará em caso de derrota, ele pergunta como fazer para que isso tenha sucesso.
Isso é possível, isso é realizável, por consequência isso deve ser feito.
Capitulo X: O Centrismo em Geral e o Centrismo da
Burocracia Stalinista
Os erros da direção da Internacional Comunista e, por isso mesmo, do Partido
comunista alemão pertencem, para retomar a terminologia bem conhecida de
Lênin, à "serie de asneiras ultra-esquerdas". Mesmo as pessoas inteligentes
podem cometer asneiras, sobretudo na sua juventude. Mas, como aconselhava já
Heine, não se pode abusar. Quando as asneiras políticas dum certo tipo são
cometidas sistematicamente, durante um longo período, além disso sobre
questões muito importantes, elas deixam de ser simples asneiras e se tornam uma
orientação. De que orientação se trata? A que necessidades históricas ela
responde? Quais são as suas raízes sociais?
A base social da ultra-esquerda varia segundo os países e as épocas. O
anarquismo, o blanquismo e suas diferentes combinações, incluindo a mais
recente: o anarco-sindicalismo, são expressões completas do ultra-esquerdismo.
Essas correntes, que se tinham desenvolvido principalmente nos países latinos,
tinham por base social a antiga pequena burguesia da indústria clássica de Paris.
A sua persistência deu uma importância indelineável às diferentes variedades
francesas de ultra-esquerda e lhes permitiu até a um certo ponto exercer uma
influência ideológica sobre o movimento operários dos outros países. O
desenvolvimento da grande indústria em França, a guerra e a Revolução russa
quebraram a espinha dorsal do anarco-sindicalismo. Rejeitado para segundo
lugar, ele se transformou num oportunismo de má qualidade. Nesses dois
estádios do seu desenvolvimento, o sindicalismo francês é dirigido pelo mesmo
Jouhaux: os tempos mudam e nós também.
O anarco-sindicalismo espanhol não conseguiu conservar uma aparência
revolucionária senão numa situação de estagnação política. A revolução, em
colocando brutalmente os problemas, forçou os dirigentes anarco-sindicalistas a
abandonar o ultra-esquerdismo e a revelar a sua natureza oportunista. Pode-se
estar certo que a revolução espanhola expulsará os preconceitos sindicalistas do
seu último refúgio latino.
Elementos anarquistas e blanquistas estão presentes em todas as outras
correntes e grupos ultra-esquerda. Na periferia do grande movimento
revolucionário sempre se observou manifestações de golpismo e de
aventureirismo, cujos agentes são as camadas atrasadas, muitas vezes semi-
artesanais, de operários, sejam intelectuais, companheiros de estrada. Mas em
geral, esse tipo de ultra-esquerda não tem significado histórico independente e
apresenta muitas vezes um caráter episódico.
Nos países atrasados do ponto de vista histórico que devem realizar a sua
revolução burguesa, quando já existe um movimento operários mundial
desenvolvido, a intelectualidade de esquerda introduz muitas vezes no
movimento semi-espontâneo das massas, principalmente pequeno burguesas,
palavras de ordem e os métodos os mais extremistas. Tal é a natureza dos
partidos pequeno-burgueses como o dos "socialistas revolucionários" russos com
suas tendências ao golpismo, ao terror individual, etc. Pelo fato da existência de
partidos comunistas no Oriente, é pouco provável que grupos de aventureiros
independentes adquiram a importância dos socialistas revolucionários russo. Em
contra-partida, os elementos aventureiros podem existir nas fileiras dos jovens
partidos orientais. No que diz respeito aos socialistas revolucionários russo, eles
se transformaram sob a influência da evolução da sociedade burguesa, em
partido da pequena burguesia imperialista e adotaram uma posição contra-
revolucionária em relação à Revolução de Outubro.
É claro que a ultra-esquerda da Internacional Comunista atualmente não entra
em nenhuma das categorias descritas acima. O principal partido da Internacional
Comunista, o Partido comunista da União soviética, apoia-se manifestamente
sobre o proletariado industrial e se liga, bem ou mal, às tradições das
organizações proletárias. O fato que a política ultra-esquerda do comunismo
oficial domina uniformemente e simultaneamente nos diferentes países onde as
condições são diferentes, não testemunham que essa corrente não têm raízes
sociais comuns? Essa corrente ultra-esquerda que apresenta em todo o lado o
mesmo caráter "de princípio" aplica-se na China e na Grande-Bretanha. Onde é
então preciso procurar a origem desse novo ultra-esquerdismo?
Uma circunstância muito importante complica mas ao mesmo tempo esclarece
esse problema: o ultra-esquerdismo não é absolutamente um traço constante
fundamental da direção atual da Internacional Comunista. Esse mesmo aparelho,
para a maioria dos seus membros, levou até 1928 uma política abertamente
oportunista, juntando-se ao menchevismo em numerosos pontos muito
importantes. Nos anos 1924-1927, os acordos com os reformistas eram
considerados como obrigatórios; além disso, admitia-se que o partido renuncie à
sua independência, à sua liberdade de crítica e mesmo à sua base de classe
proletária.
Também, não se trata de uma corrente ultra-esquerda particular, mas do longo
zig-zag de uma corrente que, no passado, provou a sua capacidade a realizar
violentos zig-zags ultra-direitistas. Esses indícios deixam pensar que se trata do
centrismo.
Para falar de maneira formal e descritiva, todas as correntes do proletariado e
da sua periferia que se situam entre o reformismo e o marxismo e que
representam muitas vezes as diferentes etapas levando do reformismo ao
marxismo, e inversamente, revelam do centrismo. O marxismo, como o
reformismo, tem a sua base social estável. O marxismo exprime os interesses
históricos do proletariado. O reformismo corresponde à situação privilegiada da
burocracia e da aristocracia operárias no Estado capitalista. O centrismo que nós
conhecemos no passado não tinha nem podia ter base social própria. As
diferentes camadas do proletariado se aproximaram da orientação revolucionária
por caminhos e a ritmos diferentes. Nos períodos de expansão industrial
prolongados ou ainda nos períodos de refluxo político, após uma derrota,
diferentes camadas do proletariado deslizam politicamente da esquerda para a
direita e chocam com outras camadas que começam a evoluir para a esquerda.
Diferentes grupos, travados a certas etapas da sua evolução, encontram chefes
temporários, suscitam seus próprios programas e organizações. Compreende-se
assim qual diversidade de correntes a noção de "centrismo" cobre! Segundo a
sua origem, a sua composição social, a sua orientação, esses diferentes grupos
podem entrar em conflito agudo uns com os outros, sem parar igualmente de
serem variedades do centrismo.
Se o centrismo em geral joga habitualmente o papel de caução de esquerda do
reformismo, ele não é igualmente possível dar resposta definitiva à questão: a
qual dos dois campos principais, marxista ou reformista, pertence tal desvio
centrista? Aqui, mais que qualquer outro lugar, é preciso a cada vez analisar o
conteúdo concreto do processo e as tendências internas da sua evolução. Assim,
certos erros políticos de Rosa Luxemburgo pode ser caracterizados com uma
relativa justeza teórica, como centristas de esquerda. Pode-se mesmo ir mais
longe e afirmar que a maioria das divergências de Rosa Luxemburgo com Lênin
eram devidas a um desvio centrista mais ou menos importante. Só os burocratas
descarados e ignorantes da Internacional Comunista, podem classificar o
luxemburguismo, como corrente histórica, no centrismo. É inútil lembrar que os
"chefes" atuais da Internacional a começar por Stálin, não chegam ao tornozelo
da grande revolucionária tanto politicamente como teoricamente e moralmente.
Certos críticos que não refletiram bastante ao fundo da questão acusaram
diversas vezes nestes últimos tempos o autor destas linhas de abusar do termo
"centrismo", em reagrupando sob este termo correntes e grupos diversos do
movimento operário. Com efeito, a diversidade dos tipos de centrismo provêm,
dissemos, mesmo da essência do fenômeno e não de um emprego abusivo do
termo. Lembremos que os marxistas foram muitas vezes acusados de meter na
conta da pequena burguesia os fenômenos mais variados e os mais
contraditórios. Efetivamente, é preciso situar na categoria "pequeno-burguês"
fatos, ideias e tendências à primeira vista totalmente incompatíveis. O
movimento camponês e o movimento radical nas cidades pela Reforma tem um
caráter pequeno-burguês; tal como os Jacobinos franceses e os populistas russo,
os proudhonianos e os blanquistas, a social-democracia atual e o fascismo, os
anarco-sindicalistas franceses, o Exército de Salvação, o movimento de Gandhi
na Índia, etc. A filosofia e a arte oferecem um quadro ainda mais contrastado.
Isso significa que o marxismo brinca com as palavras? Não, isso significa
unicamente que a pequena burguesia se caracteriza pela extraordinária
heterogeneidade da sua natureza social. Ao nível das suas camadas inferiores,
ela confunde-se com o proletariado e cai no lumpemproletariado. Suas camadas
superiores tocam de muito perto a burguesia capitalista. Ela pode apoiar-se sobre
as antigas formas de produção mas igualmente conhecer um desenvolvimento
rápido na base da indústria mais moderna (as novas "camadas médias"). Nada de
espantoso que ela ideologicamente se ornamente com todas as cores do arco-iris.
O centrismo no seio do movimento operários joga num certo sentido o mesmo
papel que a ideologia pequeno burguesa sob todas as suas formas em relação à
sociedade burguesa no seu conjunto. O centrismo reflete os diferentes tipos de
evolução do proletariado, o seu crescimento político, a sua fraqueza
revolucionária, ligada à pressão que todas as outras classes da sociedade
exercem sobre ele. Nada de espantoso que a paleta do centrismo seja tão
colorida. Isso não implica que se renuncie à noção de centrismo; é preciso
somente em cada caso proceder à análise social e histórica concreta para
evidenciar a natureza real de tal variedade de centrismo.
A fração dirigente da Internacional Comunista não depende do centrismo "em
geral"; é uma formação histórica bem definida, com raízes sociais potentes
mesmo que sejam recentes. Trata-se antes de tudo da burocracia soviética. Nos
escritos dos teóricos stalinistas, esta camada social não existe. Só é questão de
"leninismo", da direção desencarnada, da tradição ideológica, do espírito do
bolchevismo, da inconsistente "linha geral"; mas nem uma palavra sobre o fato
que o funcionários bem vivo, em carne e osso, agita esta linha geral como um
bombeiro a sua mangueira; isso vocês não ouvem falar.
Portanto, esse funcionários é parecido com tudo salvo a um espírito
desencarnado. Bebe, come, multiplica-se e toma cuidado com o seu ventre
florescente. Dá ordens com voz de trovão, promove na escala burocrática gente
que lhe é devotada, mostra-se fiel aos seus chefes, proíbe que lhe critiquem e vê
nisso a essência da linha geral. Há vários milhões desses funcionários, vários
milhões!
Mais que operários no momento da Revolução de Outubro. A maioria desses
funcionários nunca participou na luta de classes com os riscos e os sacrifícios
que ela implica. Esses indivíduos na sua imensa maioria nasceram politicamente
como classe dirigente. E por detrás deles se profila o poder de Estado. Ele
assegura a sua existência, colocando-os bem acima das massas. Eles ignoram o
perigo do desemprego, se souberem manter-se de guarda. Os erros mais
grosseiros lhes são perdoados, se eles estão prontos a jogar, no momento
apropriado, o papel de bode expiatório, em inocentando seu superior imediato de
toda a responsabilidade. Esta camada dirigente de vários milhões de indivíduos
tem um peso social e uma influência política no país? Sim ou não?
Sabe-se há muito tempo que a burocracia e a aristocracia operárias estão na
base social do oportunismo. Na Rússia, esse fenômeno tomou formas novas.
Sobre a base da ditadura do proletariado – num país atrasado e cercado pelos
países capitalistas – criou-se pela primeira vez, a partir de camadas superiores de
trabalhadores, um potente aparelho burocrático que se ergueu acima das massas,
que o comanda, que goza de privilégios consideráveis; os seus membros estão
solidários entre eles e introduziu na política do Estado operário os seus interesses
próprios, seus métodos e os seus procedimentos.
Não somos anarquistas. Nós compreendemos a necessidade do Estado
operários e, por consequência, o caráter historicamente inevitável da burocracia
durante o período de transição. Estamos conscientes dos perigos que isso
implica, particularmente para um país atrasado e isolado. Idealizar a burocracia
soviética é o erro o mais imperdoável que seja para um marxista. Lênin emprega
toda a sua energia para que o partido, vanguarda independente da classe operária
se erga acima do aparelho de Estado, o controle, o vigie, o dirija e o filtre,
colocando os interesses históricos do proletariado – internacional e não somente
nacional – acima dos interesses da burocracia dirigente. Lênin considerava que o
controle da massa do partido sobre o aparelho era a primeira condição do
controle do Estado pelos partidos. Leiam atentamente os seus artigos, seus
discursos e as suas cartas do período soviético, particularmente dos dois últimos
anos da sua vida, e verão com qual angustia o seu pensamento surge cada vez
sobre esta questão escaldante.
Que se passou no período que segui a morte de Lênin? Toda a camada
dirigente do partido e do Estado que tinha participado na revolução e na guerra
civil foi varrida, afastada, esmagada. Funcionários impessoais tomaram o seu
lugar. Na mesma época, a luta contra o burocratismo que tinha um caráter tão
agudo do tempo de Lênin, quando a burocracia ainda estava no berço, parou
totalmente, enquanto que a burocracia se desenvolveu de maneira monstruosa.
Quem teria podido levar esta luta? O partido como vanguarda auto-gerida do
proletariado não existe mais. O aparelho do partido confundiu-se com o Estado.
O GPU é o instrumento principal da linha geral no interior do partido. A
burocracia não tolera nenhuma crítica vindo da base, ele proíbe mesmo aos seus
teóricos de falar nisso. O ódio furioso à oposição de esquerda deve-se em
primeiro lugar a que a oposição fale abertamente da burocracia, do seu papel
específico, dos seus interesses e revela publicamente que a linha geral é a carne e
o sangue da nova camada dirigente no poder, que não se identifica de forma
alguma com o proletariado.
A burocracia adquire a sua infalibilidade original do caráter operário do
Estado: a burocracia de um Estado operário não pode degenerar! O Estado e a
burocracia são tomados aqui não como processos históricos, mas como
categorias eternas: a Santa Igreja e seus servidores não pode se enganar! Se a
burocracia operária na sociedade capitalista se ergueu acima do proletariado em
luta e degenerou ao ponto de dar o partido de Noske, Scheidemann, Ebert e
Wels, porquê ela não pode degenerar erguendo-se acima do proletariado
vitorioso?
Pela sua posição dominante e incontrolada, a burocracia soviética adquire uma
mentalidade que, em muitos aspectos, está em total contradição com a de uma
revolução proletária. Para a burocracia, os seus cálculos e combinações em
política interior e internacional são mais importantes que as tarefas de educação
revolucionária das massas e que as exigências da revolução internacional.
Durante vários anos, a fracção stalinista mostrou que os interesses e a psicologia
do "camponês rico", do engenheiro, do administrador, do intelectual burguês
chinês, do funcionário dos sindicatos britânicos eram-lhe mais próximos e mais
acessíveis que a psicologia e as necessidades dos simples operários, dos
camponeses pobres, das massas populares chinesas insurretas, dos grevistas
ingleses, etc. Mas nesse caso, por qual razão a fracção stalinista não se
comprometeu até ao fim na via do oportunismo nacional? Porque ela é a
burocracia de um Estado operário. Se a social-democracia internacional defende
os fundamentos da dominação da burguesia, a burocracia soviética é forçada a
adaptar-se às bases sociais saídas da Revolução de Outubro, enquanto que ela
não proceder a uma mudança a nível do Estado. Daí, a dupla natureza da
psicologia e da política da burocracia stalinista. O centrismo, centrismo que se
apoia nos fundamentos do Estado operário, é a única expressão possível desta
dupla natureza.
Nos países capitalistas, os grupos centristas têm muitas vezes um caráter
temporário, transitório, porque eles refletem o deslize a direita ou à esquerda de
certas camadas operárias. Por outro lado, nas condições da República dos
Sovietes, milhões de burocratas constituem para o centrismo uma base muito
mais sólida e organizada. Ainda que sendo um meio favorável natural para as
tendências oportunistas e nacionais, ela é forçada de defender as bases da sua
dominação lutando contra o kulaque; ela deve também se preocupar com o seu
prestígio de "bolchevique" no governo operário mundial. Após uma tentativa
para se aproximar do Komintang e da burocracia de Amesterdão, pela qual ela
tem afinidades, a burocracia soviética entrou em conflito agudo permanente com
a social-democracia que reflete a hostilidade da burguesia mundial em relação ao
Estado soviético. Tais são as origens do atual zig-zag à esquerda.
O que faz a originalidade da situação, não é o fato que a burocracia soviética
seja particularmente imunizada contra o oportunismo e o nacionalismo, mas o
fato que, não podendo adotar de maneira definitiva uma posição nacional-
reformista, ela se vê forçada em realizar zig-zag entre o marxismo e o nacional-
reformismo. As oscilações do centralismo burocrático que estão em relação com
a sua potência, seus recursos e contradições agudas da sua situação, atingiram
uma amplitude sem igual: das aventuras ultra-esquerda na Bulgária e na Estônia
à aliança com Tchang Kaichek, Raditch e Purcell; da vergonhosa fraternização
com os quebra-greves ingleses à recusa categórica da política da frente única
com os sindicatos de massa. A burocracia stalinista exporta os seus métodos e os
seus ziguezagues para os outros países, na medida onde, pelo intermediário do
partido, não somente ela dirige a Internacional Comunista, mas além disso lhe dá
ordens. Thälmann era pelo Komintang, quando Stálin era pelo Komintang,
embaixador de Tchang-Kaichek, um chamado Chao Litzi, interveio em coro com
Thälmann, Semard e todos os Remmele contra o "trotskismo". O "camarada"
Chao Litzi declarou:
"Nós estamos convencidos que o Komintang sob a direção da
Internacional realizará a sua missão histórica" (Processos-verbais,
volume 1, p. 459)
Aí estão os fatos históricos.
Tomai o Rote Fahne do ano 1926, encontrarão aí um grande número de artigos
sobre o seguinte tema: exigindo a ruptura com o Conselho geral inglês dos
quebra-greves, Trotsky prova o seu… menchevismo. Hoje, o "menchevismo"
consiste em defender a frente única com as organizações de massa, quer dizer
em levar a política que os IIIº e IVº Congressos da Internacional Comunista
tinha formulado sob a direção de Lênin (contra todos os Thälmann, Thalheimer,
Bela Kun e outros Frossard).
Esses zig-zags assustadores teriam sido impossíveis, se em todas as ações da
Internacional Comunista uma camada burocrática, se auto-suficiente, isto é
independente do partido, não se tivesse formado. É aí que se encontra a raiz do
mal.
A força do partido revolucionário reside no espírito de iniciativa da vanguarda
que examina e seleciona os seus quadros; é a confiança que ela tem dos seus
dirigentes que os conduz progressivamente para a cimeira. Isso cria um laço
indestrutível entre os quadros e as massas, entre os dirigentes e os quadros e
assegura toda a direção. Nada de igual existe nos partidos comunistas atuais. Os
chefes são designados. Eles escolhem os subordinados. A base do partido é
obrigada a aceitar os chefes designados à volta dos quais se cria uma atmosfera
artificial de publicidade. Os quadros dependem da cúpula e não da base. Numa
larga medida, eles procuram as razões da sua influência e da sua existência no
exterior das massas. Eles tiram as suas palavras de ordem políticas do telegrama
e não da experiência da luta. Ao mesmo tempo, Stálin mantêm em reserva para
toda ocasião documentos acusadores. Cada um dos chefes sabe que a cada
instante, ele pode ser varrido como uma simples palha.
É assim que em toda a Internacional Comunista se cria uma camada
burocrática fechada, meio favorável para os bacilos do centrismo. O centrismo
de Thälmann, de Remmele e os seus compadres é muito estável e resistente do
ponto de vista organizacional porque ele apoia-se sobre a burocracia do Estado
soviético, mas ele distingue-se por uma extraordinária instabilidade do ponto de
vista político. Privado da confiança que só pode dar uma ligação orgânica com
as massas, o Comité central infalível é capaz dos zig-zags mais monstruosos.
Menos ele está preparado a uma luta ideológica séria, mais é e generoso em
injúrias, insinuações e calúnias. Stálin, "grosseiro" e "desleal", segundo a
definição de Lênin, é a personificação desta camada.
A característica dada acima do centrismo burocrático determina a atitude da
oposição de esquerda em relação à burocracia stalinista: apoio total e ilimitado
na medida onde a burocracia defende as fronteiras da República dos Sovietes e
os fundamentos da Revolução de Outubro; crítica aberta na medida onde a
burocracia pelos seus zig-zags administrativos torna mais difícil a defesa da
revolução e a construção do socialismo; oposição implacável na medida onde
pelo seu comando burocrático, ela desorganiza a luta do proletariado mundial.
Capitulo XI: A Contradição entre o Sucesso
Econômico da URSS e a Burocracia do Regime
É impossível elaborar as bases de uma política revolucionárias num "só país".
O problema da revolução alemã é atualmente indissoluvelmente ligado à questão
da direção política na URSS. É preciso compreender esse laço em todas as suas
consequências.
A ditadura do proletariado é a resposta à resistência das classes possuidoras.
Os limites às liberdades decorre do regime militar da revolução, isto é das
condições da guerra de classes. Desse ponto de vista, é claro que a consolidação
interior da República dos Sovietes, seu crescimento econômico, o
enfraquecimento da resistência da burguesia, e sobretudo o sucesso da
"liquidação" da última classe capitalista, os kulaques, deveria levar ao
desenvolvimento da democracias no partido, nos sindicatos e nos Sovietes.
Os stalinistas não se cansam de repetir que "já entramos no socialismo", que a
coletivização atual marca ela própria a liquidação dos kulaques como classe, e
que o próximo plano quinquenal deve levar esse processo até ao fim. Se é assim,
porquê esse processo conduziu ao esmagamento total do partido, dos sindicatos e
dos Sovietes pelo aparelho burocrático que, pelo seu lado, tomou o caráter do
bonapartismo publicitário ? Porquê no tempo da fome e da guerra civil o partido
vivia uma vida intensa, porquê não veio à ideia de ninguém perguntar se se podia
ou não criticar Lênin ou o comité central no seu conjunto, enquanto que, agora, a
menor divergência com Stálin ocasiona a exclusão do partido e de medidas
administrativas de repressão?
O perigo de guerra vindo dos Estado imperialistas não pode em qualquer caso
explicar e ainda menos justificar o desenvolvimento do despotismo burocrático.
Quando numa sociedade socialista nacional as classes são mais ou menos
liquidadas, isso marca o início do desaparecimento do Estado. Se uma sociedade
socialista pode opor uma resistência vitoriosa a um inimigo exterior, é enquanto
sociedade socialista e não como Estado da ditadura do proletariado e ainda
menos como Estado da ditadura da burocracia.
Mas não falamos do definhamento da ditadura: é ainda demasiado cedo
porque ainda não "entramos no socialismo". Falamos de outra coisa. Nós
perguntamos: o que explica a degenerescência burocrática da ditadura? Donde
vem esta contradição alarmante, monstruosa, temível, entre os sucessos da
edificação socialista e o regime de ditadura pessoal que se apoia sobre um
aparelho impessoal, que agarra pelas goelas a classe dirigente do país. Como
explicar que a política e a economia se desenvolvem em direções totalmente
opostas?
Os sucessos econômicos são muito importantes. A partir de agora a Revolução
de Outubro justificou-se plenamente de um ponto de vista econômico. Os
coeficientes elevados do crescimento econômico são a expressão irrefutável do
fato que os métodos socialistas apresentam uma vantagem imensa, e isso mesmo
para a realização das tarefas de produção que, a Oeste, foram resolvidas por
métodos capitalistas. As vantagens da economia socialista nos países atrasados
não serão tão grandiosas?
Todavia, a questão colocada pela Revolução de Outubro ainda não se realizou
nem mesmo em esboço.
A burocracia stalinista qualifica a economia de "socialista" partindo das suas
premissas e das suas tendências. Mas isso não basta. Os sucessos econômicos da
União soviética produzem-se sobre uma base econômica ainda pouco
desenvolvida. A indústria nacionalizada passa pelos estádios que as nações
capitalistas avançadas já alcançaram há muito tempo. A operária que faz bicha
tem o seu critério do socialismo, e esse critério do "consumidor", para retomar a
expressão desprezível do funcionário, é na realidade completamente decisivo.
No conflito entre o ponto de vista da operária e do burocrata, nós, oposição de
esquerda, estamos com a operária contra o burocrata que exagera as realizações,
escamota as contradições que se acumulam, e mete a faca na garganta da
operária para a impedir de criticar.
No ano passado, passou-se bruscamente do salário igual ao salário
diferenciado (à peça). É indiscutível que o princípio de igualdade no pagamento
do trabalho é irrealizável, quando o nível das forças produtivas e por
consequência da cultura geral é baixo. Isso implica igualmente que o problema
do socialismo não se resolve unicamente ao nível das formas sociais da
propriedade, mas pressupõe uma certa potência técnica da sociedade. Todavia, o
crescimento da potência técnica faz transbordar automaticamente as forças
produtivas fora das fronteiras nacionais.
Voltando ao salário à peça que tinha sido suprimido prematuramente, a
burocracia qualificou o salário igual de princípio "kulaque". É um absurdo
evidente que mostra em quais impasses de hipocrisia e de mentira os stalinistas
se afundam. De fato, era preciso dizer: "Avançamos muito depressa com
métodos igualitários de retribuição do trabalho; estamos ainda longe do
socialismo; somos ainda pobres e precisamos de voltar atrás, aos métodos semi-
capitalistas ou kulaque." Repetimos que não há aqui contradição com o objectivo
socialista. Só há uma contradição irredutível com as falsificações burocráticas da
realidade.
O regresso ao salário à peça foge o resultado da resistência oposta pelo sub-
desenvolvimento econômico. Tais recuos, ainda haverão outros, sobretudo na
agricultura onde se fez um grande salto administrativo em frente.
A industrialização e a coletivização são levados a cabo com os métodos de
comando unilateral, incontrolado e burocrático, que passa acima da cabeça das
massas trabalhadoras. Os sindicatos são privados de toda possibilidade de
influenciar a relação entre consumo e acumulação. A diferenciação no seio do
campesinato foi liquidada provisoriamente menos econômica que
administrativamente. As medidas sociais tomadas pela burocracia no que
respeita a liquidação das classes são terrivelmente adiantadas sobre o processo
fundamental que constitui o desenvolvimento das forças produtivas.
Isso conduz ao aumento dos preços de custo industriais, a baixa qualidade da
produção, ao aumento dos preços, à penúria de bens de consumo, e deixa
aparecer no horizonte a ameaça da ressurgimento do desemprego.
A extrema tensão da atmosfera política no país é o resultado das contradições
entre o crescimento da economia soviética e a política econômica da burocracia
que, tanto é monstruosamente em atraso nas necessidades da economia (1923-
1928), como se assusta do seu próprio atraso e se lança numa fuga em frente,
para recuperar por medidas puramente administrativas o que ela deixou passar
(1928-1932). Aí também, um zig-zag à esquerda sucede um zig-zag à direita.
Com esses dois zig-zags a burocracia encontra-se cada vez em contradição com
as realidades da economia e por consequência com o estado de espírito dos
trabalhadores. Ela não pode tolerar suas críticas, nem quando ela está em atraso,
nem quando ela vai em frente.
A burocracia não pode exercer a sua pressão sobre os operários e os
camponeses de outro jeito que em privando os trabalhadores da possibilidade de
participar à solução dos problemas do seu próprio trabalho e de todo o seu
futuro. É aí que se encontra o maior perigo. O medo constante da resistência das
massas provoca ao nível político um "curto-circuito" da ditadura pessoal e
burocrática.
Isso implica que seja preciso afrouxar os ritmos da industrialização e da
coletivização ? Por um certo período, é indiscutível. Mas este período pode ser
de curta duração. A participação dos operários na direção do país, da sua política
e da sua economia, um controle real sobre a burocracia, o crescimento do
sentimento de responsabilidade dos dirigentes em relação aos dirigidos, tudo isso
só pode ter uma influência benéfica sobre a produção, diminuirá as fricções
internas, reduzirá ao mínimo os custosos zig-zags econômicos, assegurará uma
repartição mais sã das forças e dos meios e, no fim de contas, aumentará o
coeficiente geral do crescimento. A democracia soviética é uma necessidade vital
sobretudo para a economia. Ao contrário, o burocratismo encerra trágicas
surpresas econômicas.
Se se examina globalmente a história do período dos epígonos no
desenvolvimento da URSS, não é difícil chegar à conclusão que a premissa
política fundamental da burocratização do regime foi o cansaço das massas a
seguir ao transtorno da revolução e da guerra civil. A fome e as epidemias
atingindo o país. As questões políticas passaram para o segundo lugar. Todos os
pensamentos fixaram-se sobre um pedaço de pão. Durante o comunismo de
guerra, todo a gente recebia a mesma ração de fome. A passagem à Nova
Economia Política levou os primeiros sucessos econômicos. A ração se tornou
abundante, mas toda a gente não tinha direito a isso. A instauração da economia
mercantil conduziu ao cálculo dos preços de custo, à racionalização elementar, à
partida de operários das fábricas em excesso. Os sucesso econômicos
acompanharam-se durante um longo período do crescimento do desemprego.
É preciso não esquecer um só instante que o reforço da potência do aparelho
se apoiava sobre o desemprego. Após anos de fome, o exército de reserva de
desempregados assustava todos os proletários nas máquinas. O afastamento fora
das empresas de operários independentes e críticos, as listas negras de opositores
tornaram-se um instrumento dos mais importantes e mais eficazes nas mãos da
burocracia stalinista. Sem esta circunstância, ela não teria conseguido abafar o
partido de Lênin.
Os sucessos econômicos ulteriores levaram progressivamente a liquidação do
exército de reserva de operários industriais (a sobre-população escondida nas
aldeia, mascarada pela coletivização, guarda ainda toda a sua acuidade). O
operários industriais não tem doravante mais medo de serem despedidos. A sua
experiência diária lhe ensina que a improvidência e o arbítrio da burocracia
complicaram consideravelmente a solução dos seus problemas. A imprensa
soviética denuncia certas oficinas e empresas onde não se deixa bastante lugar à
iniciativa dos operários, ao seu espírito inventivo, etc.: como se se pudesse
fechar a iniciativa do proletariado nas oficinas, como se as oficinas pudessem ser
oásis de democracia produtiva, enquanto que o proletariado é esmagado no
partido, os Sovietes e os sindicatos.
O estado geral do proletariado é hoje muito diferente do que era nos anos
1922-1923. O proletariado cresceu numericamente e culturalmente. Após ter
realizado um trabalho gigantesco, que está na origem da regeneração e do
crescimento da economia, os operários sentem renascer e crescer a sua
segurança. Esta segurança aumentada começa a se transformar em
descontentamento em relação ao regime burocrático.
O partido amordaçado, o desenvolvimento do regime pessoal e do arbitrário
pode dar a impressão de enfraquecimento do sistema soviético. Mas tal não é o
caso. O sistema soviético é consideravelmente reforçado. Paralelamente, a
contradição entre esse sistema e o grampo burocrático agravou-se claramente. O
aparelho stalinista vê com terror que o sucesso econômico não reforça mas pelo
contrário sapa a sua posição. Na luta para manter as suas posições, ele é já
obrigado a apertar o controle, proibir toda forma de "autocrítica" outra que não
sejam os louvores bizantinos dirigidos aos chefes.
Não é a primeira vez na história que o desenvolvimento econômico entra em
contradição com a situação política na qual ele se produz. Mas é preciso
compreender claramente quais condições precisamente geram o
descontentamento. A vaga opositora que avança, não é dirigida contra o Estado
socialista, as formas soviéticas ou o Partido comunista. O descontentamento é
dirigido contra o aparelho e a sua personalização, Stálin. O que explica que
recentemente se desencadeou uma campanha furiosa contra o dito "bando
trotskista".
O adversários risca de ser imperceptível, ele é por toda o lado e por parte
alguma. Surge nas oficinas, nas escolas, escapa-se nas revistas históricas e em
todos os manuais. Isso significa que os fatos e os documentos confundem a
burocracia, revelando as suas flutuações e erros. Não se pode lembrar o passado
tranquilamente e objetivamente, é preciso refazer o passado, é preciso tapar
todas as rachas pelas quais pode se infiltrar uma desconfiança quanto à
infalibilidade do aparelho e do seu chefe. Temos diante de nós os traços
característicos de uma camada dirigente que perdeu a cabeça. Iaroslavsky, ele
próprio, revelou-se pouco seguro ! Não são incidentes devidos ao acaso, simples
detalhes, conflitos de pessoas : o fundo do assunto é que os sucessos
econômicos, que, num primeiro tempo, reforçaram a burocracia, são, hoje, em
oposição com a burocracia, pelo fato que a dialética do seu desenvolvimento. É
por esta razão que na última conferência do partido, isto é no congresso do
aparelho stalinista, o trotskismo, três vezes batido e esmagado, foi declarado
"vanguarda da contra-revolução burguesa".
Esta resolução estúpida e ridícula do ponto de vista político levanta o véu
sobre certos planos muito "práticos" de Stálin no domínio do ajusto de contas
pessoais. Não foi por acaso que Lênin tinha prevenido o partido contra a
designação de Stálin como secretário-geral : "esse cozinheiro só pode nos
prepara pratos picantes… " E o cozinheiro ainda não esgotou a sua ciência
culinária.
Apesar do aperto dos parafusos teóricos e administrativos, a ditadura pessoal
de Stálin aproxima-se visivelmente do seu declínio. O aparelho está
completamente rachado. A racha nomeada Iaroslavsky é somente uma centenas
de rachas que hoje ainda não têm nome. O fato que a nova crise política
amadurece na base dos sucessos manifestos e incontestáveis da economia
soviética, do crescimento de efetivos do proletariado e dos primeiros sucessos da
agricultura coletivizada, é uma garantia suficiente para que a liquidação do
despotismo burocrático coincida não com um desmoronamento do sistema
soviético, como se poderia temer há ainda três ou quatro anos, mas pelo
contrário com a sua libertação, seu desenvolvimento.
Mas é precisamente no seu último período que a burocracia stalinista é capaz
de fazer mais mal. A questão do seu prestígio tornou-se para ela a questão
política central. Se se exclui do partido os historiadores apolíticos unicamente
porque eles não souberam explorar os êxitos de Stálin em 1917, o regime
plebiscitário pode admitir o reconhecimento dos erros cometidos em 1931-1932?
Pode renunciar à teoria do social-fascismo? Pode desdizer Stálin que resumiu o
fundo do problema alemão na seguinte formula: que os fascistas cheguem
primeiro ao poder, nossa vez seguirá?
As condições objectivas na Alemanha são elas próprias sobre esse ponto
imperativas se a direção do Partido comunista alemão dispõe da liberdade de
ação indispensável, ela seria já, sem qualquer dúvida, voltada para nós. Mas ela
não é livre. Enquanto que a oposição de esquerda avança ideias e palavras de
ordem do bolchevismo, verificadas pela vitória de 1917, a clique stalinista
ordena por telegrama o lançamento de uma campanha internacional contra o
"trotskismo". A campanha é levada não sobre a base dos problemas da revolução
alemã, que é uma questão de vida ou de morte para o proletariado mundial, mas
sobre a base de um artigo miserável e falsificador de Stálin sobre questões de
história do bolchevismo. É difícil imaginar uma desproporção maior entre as
tarefas do momento por um lado, seus magros recursos ideológicos da direção
oficial de outro. Tal é a situação humilhante, indigna e ao mesmo tempo
profundamente trágica da Internacional comunista.
O problema do regime stalinista e o problema da revolução alemão estão
ligados por um laço indestrutível. Os próximos acontecimentos o resolverão ou o
resolverão tanto no interesse da revolução russa como da revolução alemã.
Capitulo XII: Os Brandlerianos (KPDO) e a
Burocracia Stalinista8
Não há, e não pode haver contradições entre os interesses do Estado soviético
e os do proletariado internacional. Mas é radicalmente falso estender esta lei à
burocracia stalinista. O seu regime está cada vez mais em contradição tanto com
os interesses da União soviética como os da revolução mundial.
Por causa da burocracia soviética, Hugo Urbahns não vê as bases sociais do
Estado proletário. Urbahns elabora com Otto Bauer o conceito de Estado acima
das classes, mas diferente de Bauer, ele encontra o seu modelo não na Áustria
mas na atual República dos Sovietes.
Aliás, Talheimer afirma que a "orientação trotskista que dúvida do caráter
proletário (?) do Estado soviético e o caráter socialista da edificação econômica"
(10 de Janeiro) um caráter centrista. Ao afirmar isso, Talheimer mostra até onde
vai a identificação do Estado operário com a burocracia soviética, ele quer que
se olhe a União soviética com os óculos da fracção stalinista e não com os olhos
do proletariado internacional. Noutros termos, ele raciocina não como um
teórico da revolução proletária mas como o lacaio da fracção stalinista. Um
lacaio vexado, em desgraça, mas mesmo assim um lacaio que espera ser
perdoado. Por isso, mesmo na "oposição", ele não ousa nomear em voz alta a
burocracia: como Jeová ela não o perdoa: "Não pronuncies o meu nome em
vão."
Tais são os dois polos dos grupos comunistas: um não vê a floresta por causa
das árvores, enquanto que o outro, a floresta impede-o de distinguir as árvores.
Todavia, no fim de contas nada de surpreendente que Thalheimer e Urbahns se
descubram afinidades e façam bloco contra a apreciação marxista do Estado
soviético.
O "apoio" do exterior traz à experiência russa, "apoio" sumário e não
compromete nada, tornou-se nestes últimos anos uma mercadoria bastante
propagada e muito barata. Em todas as partes do mundo, há muitos jornalistas,
turistas, escritores mas também "socialistas" mais ou menos radicais,
humanitários e pacifistas, que manifestam em relação à URSS e a Stálin o
mesmo apoio incondicional que os brandlerianos. Bernard Shaw, que no seu
tempo criticou violentamente Lênin e o autor destas linhas, aprova plenamente a
política de Stálin. Maximo Gorki, que estava na oposição com o Partido
comunista do tempo de Lênin, está hoje inteiramente ao lado de Stálin.
Barbusse, que anda mão na mão com os sociais-democratas franceses, apoia
Stálin. O semanário americano The New Masses, publicação dos pequeno-
burgueses radicais de segunda ordem, toma a defesa de Stálin contra Rakovsky.
Na Alemanha, Ossietzky que citou com simpatia o meu artigo sobre o fascismo,
julgou necessário de notar que eu era injusto na minha crítica a Stálin. O velho
Ledebour disse: "No que respeita o problema principal na polémica que opões
Trotsky a Stálin – a socialização pode ser empreendida num país isolado e
levado a cabo -, coloco-me inteiramente ao lado de Stálin". Poder-se-ia
multiplicar os exemplos deste tipo. Todos os "amigos" da URSS abordam os
problemas do Estado soviético do exterior, como observadores, simpatizantes e
às vezes como turistas. Evidentemente, vale mais ser amigo do plano quinquenal
soviético que amigo da bolsa de nova-iorquina. Todavia, a simpatia passiva da
pequena-burguesia de esquerda está muito afastada do bolchevismo. A primeira
derrota importante de Moscovo bastará a dispersar a maioria do publico, como
poeira no vento.
Em quê a posição dos brandlerianos sobre o Estado soviético se distingue da
posição de todos esses "amigos"? Unicamente talvez por uma menor sinceridade.
Um tal apoio não aquece nem arrefece a República dos Sovietes. E quando
Thalheimer nos ensina, a nós oposição de esquerda, bolcheviques-leninistas
russos, que atitude é preciso ter para com a URSS, não deixa de inspirar um
sentimento de nojo.
Rakovsky dirigiu em pessoa a defesa das fronteiras da República do Sovietes;
ele participou nos primeiros passos da economia soviética, na elaboração da
política em relação ao campesinato; ele esteve na origem dos comités de
camponeses pobres na Ucrânia e dirigiu a aplicação da política da Nova
Economia Política às condições originais da Ucrânia; ele conheceu todos os
meandros desta política; ainda hoje ele segue-a dia a dia de Barnaul com uma
atenção apaixonada; ele previne contra os erros possíveis e sugere soluções
justas. Kote Tsintsatzé, esse velho combatente morto na deportação, Moralov,
Karl Grunstein, Kasparova, Sosnovky, Kossior, Aussem, os Eltsin, pai e filho,
Blumkine, fuzilado por Stálin. Dingelstedt, Chumskaia, Solntsev, Stopalov,
Poznansky, Sermux, Botov que Stálin fez morrer sob a tortura na prisão,
dezenas, centenas, milhares de outros dispersos nos prisões e na deportação,
todos são combatentes da Revolução de Outubro e da guerra civil, todos tinham
participado na edificação socialista, nenhuma dificuldade não os assustava e
todos estão prontos a retomar o seu posto de combate ao primeiro sinal. Pertence
a eles receber as lições de Thalheimer sobre a fidelidade ao Estado operário?
Tudo o que há de progressista na política de Stálin foi formulado pela
oposição de esquerda e foi combatido pela burocracia. Anos de prisão e de
deportação, tal é o preço que a oposição de esquerda pagou e paga ainda por ter
tomado a iniciativa do plano, dos ritmos elevados de crescimento, da luta contra
os kulaques e de uma coletivização maior. Qual foi o contributo à política
econômica da URSS de todos esses partidários incondicionais, desses
simpatizantes, incluindo os brandleristas? Nenhum! Por detrás do seu apoio
sumário e não crítico a tudo o que se faz na URSS, se esconde uma simpatia
morna e não um entusiasmo internacionalista: é que o assunto se passa para lá
das fronteiras da sua própria pátria. Brandler e Thalheimer pensam e dizem em
voz baixa: "O regime de Stálin, evidentemente, não nos convinha, a nós alemãs;
mas é bom para os russos!"
O reformista vê na situação internacional a soma das situações nacionais; o
marxista considera a política nacional em função da politica internacional. Nesta
questão fundamental, o grupo do KPDO (os blandleristas) ocupa uma posição
nacional-reformista, quer dizer que ele nega na prática, se não é em palavras, os
princípios e os critérios internacionalistas da politica nacional.
Roy, cujo programa político para a Índia e a China decorria inteiramente da
ideia stalinista dos partidos "operários e camponeses" para o Oriente, era
partidário e o colaborador mais próximo de Thalheimer. Durante muitos anos,
Roy fez a propaganda para a criação de um partido nacional-democrata na Índia.
Noutros termos, ele intervinha não como um revolucionário proletário mas como
um democrata nacional pequeno-burguês. O que não o impediu de forma alguma
de participar ativamente no estado-maior central dos brandleristas9.
Mas foi em relação à URSS que o oportunismo nacional dos brandleristas se
manifesta da maneira a mais grosseira. A burocracia stalinista, a acreditar neles,
agiu sem cometer o menor erro. Mas não se sabe porquê, a direção desta mesma
fracção stalinista é desastrosa na Alemanha. Porquê? É porque não se trata de
erros parciais de Stálin, devidos ao seu desconhecimento dos outros países, mas
de sucessão de erros, de toda a orientação. Thälmann e Remmele conhecem a
Alemanha como Stálin conhece a Rússia, como Cachin, Semard e Thorez
conhecem a França. Eles formam uma fracção internacional e elaboram a sua
política para os diferentes países. Ora, acontece que esta política, irrepreensível
na Rússia, ocasiona a ruína a revolução em todos os outros países.
A posição de Brandler torna-se particularmente inoportuna quando se
relaciona com o interior da URSS, onde o brandleriano é obrigado a apoiar
Stálin incondicionalmente. Radek que, no fundo, foi sempre mais próximo de
Brandler que da oposição de esquerda, capitula diante de Stálin. Brandler só
podia aprovar esse acto. Mas Radek após a sua capitulação foi logo obrigado por
Stálin a proclamar que Brandler e Thalheimer eram "sociais-fascistas". Os
suspiros platônicos do regime stalinista em Berlim nem tentaram escapar a essas
contradições humilhantes. Todavia, o seu objectivo prático é claro, mesmo sem
explicação ("Se tu me colocas à cabeça do partido na Alemanha, declara
Brandler a Stálin, comprometo-me a reconhecer a tua infalibilidade nos assuntos
russos, com a condição que tu me permitas levar a minha política nos assuntos
alemãs".) Pode-se sentir respeito por tais "revolucionários"?
A crítica que fazem os brandlerianos da política da burocracia stalinista na
Internacional comunista, é completamente unilateral e desonesta do ponto de
vista teórico. O único defeito desta politica é de ser "ultra-esquerda". Mas pode-
se acusar de ultra-esquerda o bloco de quatro anos entre Stálin e Tchang-
Kaichek? Era de ultra-esquerda a criação da Internacional camponesa? Pode-se
qualificar de golpista o bloco com o conselho geral dos fura-greves? E que dizer
da criação dos partidos operários e camponeses na Ásia e do partido operário e
lavrador nos Estados-Unidos?
Além disso, qual é a natureza social do ultra-esquerdismo stalinista? Um
estado de alma passageiro? Um estado doentio? Procura-se em vão uma resposta
a esta questão no teórico Thalheimer.
A oposição de esquerda desvendou o código deste enigma: trata-se de um zig-
zag ultra-esquerda do centrismo. Os brandleristas não podem aceitar esta
definição confirmada pelo desenvolvimento dos últimos nove anos, porque isso
significa a morte política deles. Eles seguiram a fracção stalinista em todos os
seus zig-zags à direita, mas opuseram-se aos zig-zags de esquerda; por aí, eles
provaram que eles eram a ala direita do centrismo. O fato que eles tenha
arrancado o tronco, como um ramo morto, está na ordem das coisas; quando das
viragens bruscas do centrismo, é inevitável que certos grupos e camadas se
afastem à direita e à esquerda. O que foi dito não implica que os brandleristas se
tenham enganado em tudo. Eles tiveram razão e ainda razão sobre numerosos
pontos contra Thälmann e Rammele. Não há nada de extraordinário nisso. Os
oportunistas podem ter uma oposição justa na luta contra o aventureirismo.
Inversamente, a corrente ultra-esquerda pode colher exatamente o momento da
passagem da luta para ganhar as massas para a luta pelo poder. Na sua crítica de
Brandler, os ultra-esquerda exprimiram no fim de 1923 bom número de ideias
justas, o que não os impediu de cometer grandes erros em 1942-1925. O fato que
na crítica deles os saltos do "terceiro período", os branleristas tenham retomado
uma serie de considerações antigas mas justas, não testemunha de forma alguma
a justeza de sua posições em geral. É preciso analisar a política de cada grupo a
través de vários períodos: nos combates defensivos, nos combates ofensivo, nos
períodos de ascenso e nos momentos de refluxo, nas condições de luta par
ganhar as massas e numa situação de luta direta pelo poder.
Não poderia haver direção marxista especializada nos problemas de defesa e
de ofensiva, de frente única ou de greve geral. A aplicação correta de todos esses
métodos só é possível quando se é capaz de apreciar sinteticamente a situação no
seu conjunto, quando se sabe analisar as forças em jogo, fixar as etapas e as
voltas e, a partir dessa análise, acertar um conjunto de ações que respondem à
situação presente e preparam a etapa seguinte.
Brandler e Thalheimer se consideram quase como especialistas exclusivos da
"luta pelas massas". Essa gente apoia com grande seriedade que os argumentos
da oposição de esquerda em favor da política da frente única são um plagiado da
sua própria posição. Não se pode recusar a ninguém o direito de ser ambicioso!
Imaginem que no mesmo momento onde você explica a Heinz Neumann um erro
de multiplicação, um valente professor de aritmética declara que você o copia,
porque desde anos ele explica os mistérios do cálculo, exatamente como você.
A pretensão dos brandleristas me deu, de qualquer modo, um minuto de
alegria na situação actual tão triste. A sabedoria estratégica desses senhores data
do IIIº Congresso da Internacional comunista. Aí eu defendi o ABC da luta em
direção das massas contra a ala "esquerda" de então. No meu livro, Nova etapa,
consagrado à popularização da política da frente única e editado pela
Internacional comunista em diferentes línguas, sublinho de muitas maneiras o
caráter elementar das ideias que aí são defendidas. "Tudo o que é dito, lemos,
por exemplo na página 70 da edição alemã, constitui uma verdade elementar do
ponto de vista de toda experiência revolucionária séria. Mas alguns elementos de
"esquerda" do congresso viram nessa táctica um avanço para a direita… " Entre
estes figuravam Thalheimer ao lado de Zinoviev, Bukarine, Radek, Maslov,
Thälmann.
A acusação de plagiado não é somente a única acusação. Não somente a
oposição de esquerda apoderou-se da propriedade intelectual de Thalheimer, ela
deu para além disso, parece, uma interpretação oportunista. Esta curiosa
afirmação merece que nos atardemos na medida onde ela dá a possibilidade de
melhor esclarecer a questão da política do fascismo.
Numa das minhas precedentes obras, exprimi a ideia que Hitler não podia
chegar ao poder pela via parlamentar: mesmo admitindo que ele possa obter 51%
dos votos. A agudização das contradições econômicas e o agravamento das
contradições políticas deveriam conduzir a uma explosão muito antes da chegada
desse momento. É por essa razão que os brandleristas me atribuem a ideia que os
nacionais-socialistas desaparecerão da cena sem que uma ação extra-parlamentar
de massa dos operários seja necessário. No quê isso vale mais que as invenções
do Rote Fahne.
Partindo da impossibilidade onde se encontram os nacionais-socialistas de
aceder "pacificamente" ao poder, concluo daí que eles tomam inevitavelmente
outras vias, seja um golpe de Estado direto ou uma etapa de coligação resultando
inevitavelmente num golpe de Estado. A auto-liquidação sem dor do fascismo
seria possível num só caso: se Hitler aplicasse em 1932 a mesma política que
Brandler em 1923 sem sobrestimar os estrategas nacionais-socialistas, creio
todavia que eles são mais sólidos e perspicazes que Brandler e companhia.
A segunda objecção de Thalheimer é ainda mais profunda: a questão de saber
se Hitler chegará ao poder pela via parlamentar ou por outra via não tem, diz ele,
qualquer importância, porque ela não modifica a "essência" do fascismo, que, de
qualquer maneira, não pode instaurar a sua dominação senão sobre os
fragmentos das organizações operárias. "Os operários podem tranquilamente
deixar aos redatores de Vorwarts o cuidado de analisar as diferenças que podem
existe entre a chegada de Hitler ao poder pela via parlamentar e a chegada por
outra via." (Arbeiterpolitik, 10 Janeiro). Se os operários da vanguarda seguem
Thalheimer, Hitler cortar-lhe-á as goelas seguramente. Para o nosso douto
professor, só importa "a essência" do fascismo, ele deixa os redatores de
Vorwarts apreciar a maneira como ela se realiza. Infelizmente, "a essência"
programista do fascismo não pode se manifestar plenamente senão depois da sua
chegada ao poder. Trata-se portanto de não o deixar chegar ao poder. Para isso, é
preciso compreender a estratégia do inimigo e explicar aos operários. Hitler faz
grandes esforços para fazer entra em aparência o seu movimento no quadro da
constituição. Só um pedante que se imagina ser um "materialista" pode acreditar
que tais procedimentos não têm influência sobre a consciência política das
massas. O constitucionalismo de Hitler visa não somente manter uma porta
aberta para um bloco com o centro, mas também enganar a social-democracia,
mais exatamente, para que os chefes da social-democracia enganem mais
facilmente as massas. Quando Hitler jura que acederá ao poder pela via
constitucional, eles proclamam logo que o perigo do fascismo não é de temer por
agora. De qualquer modo, teremos ocasião de medir a relação de forças nas
eleições de toda a espécie. Cobrindo-se com a perspectiva constitucional, que
adormece os seus adversários, Hitler quer manter a possibilidade de dar um
golpe no momento decisivo. Esta astúcia de guerra, apesar da sua simplicidade
aparente, encerra em si uma força enorme, porque ela apoia-se não somente na
psicologia dos partidos intermediários que desejam resolver a questão
politicamente e legalmente, mas também, o que é muito mais perigoso, sobre a
credulidade das massas populares.
É necessário acrescentar que a manobra de Hitler é uma faca de dois gumes:
ele engana os seus adversários mas também seus partidários. Ora, para a luta,
sobretudo para uma luta ofensiva, é necessário ter um espírito combativo. Não se
pode manter esse espírito senão convencendo as suas tropas do caráter inelutável
de uma luta aberta. Esse raciocínio implica igualmente que Hitler não pode
prolongar demasiados tempo o seu tenro idílio com a Constituição de Weimar,
sem desmoralizar as suas fileiras. Ele deve tirar a tempo o punhal do seu seio.
Não basta compreender a única "essência" do fascismo, é preciso saber
apreciá-lo como fenômeno político real, como inimigo consciente e pérfida.
Nosso mestre-escola é demasiado "sociólogo" para ser revolucionário. Não é
claro de fato, que os pensamentos profundos de Thalheimer entram como fatores
positivos nos cálculos de Hitler, porque é fazer serviço ao inimigo meter no
mesmo saco a difusão pelo Vorwarts ilusões constitucionais e a revelação da
astúcia que o inimigo ergue sobre as suas ilusões.
A importância de uma organização vem seja das massas que ela mobiliza, seja
do conteúdo das ideias que ela é capaz de fazer penetrar no movimento operário.
Não se encontra nada disso entre os brandleristas. Portanto, com qual desprezo
magnífico Brandler e Thalheimer falam do pântano centrista do SAP! De fato, se
compararmos essas duas organizações, o SAP e o KPDO, todas as vantagens
estão do lado do primeiro. O SAP não é um pântano, mas uma corrente viva. Ele
evolui da direita para esquerda, para o comunismo. O epíteto do pântano aplica-
se muito melhor à organização de Brandler-Thalheimer, que se caracteriza por
uma completa estagnação ideológica.
No interior do grupo do KPDO, existia há muito tempo uma oposição,
descontente essencialmente com os dirigentes que se esforçam em adaptar sua
política não tanto às condições objectivas mas ao estado de humor do estado-
maior stalinista de Moscou.
A oposição de Walcher-Frolich tolerou durante vários anos a política de
Branler-Thalheimer que, sobretudo no que respeita a URSS, tinha não somente
um caráter errado, mas também conscientemente hipócrita e politicamente
desonesto; é claro que ninguém não inscreverá isso no ativo do grupo dissidente.
Mas o fato é que o grupo Walcher-Frolich reconheceu finalmente a quanto inútil
uma organização cujos chefes procuram antes de tudo ganhar a simpatia de seus
superiores. A minoria julga indispensável a adoção de uma política independente
e ativa, dirigida não contra o sinistro Rammele, mas contra a orientação e o
regime da burocracia stalinista na URSS e na Internacional comunista. Se
interpretarmos corretamente a posição de Walcher-Frolich a partir de materiais
ainda extremamente insuficientes, esta última constitui, todavia, um progresso
sobre esse ponto. Após ter rompido com um grupo visivelmente moribundo, a
minoria é agora confrontada na tarefa de uma nova orientação, nacional e
sobretudo internacional.
A minoria dissidente, tanto que se possa julgar, considera como sua tarefa
principal no período vindouro, apoiar-se sobre a esquerda do SAP, ganhar esse
novo partido para o comunismo e de se servir para meter fim ao
conservadorismo burocrático do Partido comunista alemão. É possível
pronunciar-se sobre esse plano, formulado de modo tão vago e geral: as bases de
princípio continuam obscuras. É preciso uma plataforma! Pensamos não num
documento que se contentaria de reproduzir os lugares comuns do catecismo
comunista, mas num texto trazendo as respostas claras e concretas às questões
militantes da revolução proletária, questões que, durante estes últimos nove anos
rasgaram as fileiras comunistas e que conservam hoje ainda toda a sua
atualidade. De outro modo, isso equivaleria a se dissolver no SAP e a atrasar a
sua marcha para o comunismo.
A oposição de esquerda seguirá com atenção e sem tomar partido a evolução
da minoria. A cisão de uma organização moribunda deu, mais de uma vez no
decurso da história, um impulso ao desenvolvimento progressista à sua parte
viável. Seremos muito contentes ver que esta lei se confirma mais uma vez no
que concerne a sorte da minoria. Mas só o futuro nos dirá.
Capitulo XIII: A Estratégia das Greves
Na questão sindical, a direção comunista confundiu definitivamente o partido.
O curso geral do "terceiro período" visava criar sindicatos paralelos. Partia-se da
hipótese que o movimento de massas excedia as antigas organizações e que os
órgãos do RGO (Oposição Sindical Revolucionária) tornar-se-iam os comités de
iniciativa para a luta econômica. Para realizar esse plano, só faltava um pequeno
detalhe: o movimento de massa. Durante as inundações da primavera, a água
arrastou um grande número de cercas. Tentemos retirar as cercas, decidiu
Losovsky, talvez as águas da primavera comecem a correr.
Os sindicatos reformistas resistiram. O Partido comunista excluiu-se ele
próprio das fábricas. A seguir, decidiu levar à política sindical correções parciais.
O Partido comunista recusou chamar os operários não organizados a entrar nos
sindicatos reformistas. Mas ele pronunciou-se igualmente contra a saída dos
sindicatos. Criando organizações paralelas, ele tornou a dar vida à palavra de
ordem de luta no seio das organizações reformistas para ganhar aí influência. A
mecânica no conjunto é um modelo de auto-sabotagem.
O Rote Fahne queixa-se que muitos comunistas consideram como inútil
participar nos sindicatos reformistas. "Para que serve voltar a dar vida a esse
botequim? " declaram. Com efeito: com qual objectivo? Se se trata de lutar
seriamente para se apoderar dos antigos sindicatos, então é preciso chamar os
que não estão organizados a entrar aí: são as camadas novas que podem criar
uma base para uma ala esquerda. Mas nesse caso, não é preciso criar sindicatos
paralelos, isto é uma agência concorrente para recrutar os trabalhadores.
A direção na sua política em relação aos sindicatos reformistas atinge as
mesmas cimeiras de confusão como nas outras questões. O Rote Fahne do 28 de
Janeiro criticou os militantes comunistas do sindicato dos metalúrgicos de
Düsseldorf por ter avançado a palavra de ordem de "luta impiedosa contra a
participação dos dirigentes sindicais" ao apoio do governo Bruning. Essas
reivindicações oportunistas são inaceitáveis, porque elas pressupõem (!) que os
reformistas são susceptíveis de renunciar a aceitar Bruning e as suas leis de
excepção. Na verdade, tudo isso parece uma brincadeira de mau gosto! O Rote
Fahne considera que basta cobrir de injúrias os dirigentes, mas inaceitável de os
submeter à prova política das massas.
Ora, atualmente os sindicatos reformistas oferecem um campo de ação
extraordinariamente favorável. O partido social-democrata tem ainda a
possibilidade de enganar os operários com a sua propaganda política; por outro
lado, o impasse do capitalismo ergue-se diante dos sindicatos como uma muro de
prisão. Os 200 ou 300.000 operários organizados nos sindicatos vermelhos
independentes podem se tornar num precioso fermento no interior dos sindicatos
reformistas.
No fim de Janeiro, uma conferência comunista dos comités de empresa de
todo o país teve lugar em Berlim. O Rote Fahne, dá o relato seguinte: "os
comités de fábrica constroem a frente operários vermelho" (2 de Fevereiro).
Procurar-se-se ia em vão informações sobre a composição da conferência, sobre
o número de operários e de empresas representada. Com a diferença dos
bolcheviques que notavam cuidadosamente e publicamente toda modificação da
relação de forças no seio da classe operária, os stalinistas alemãs, imitam nisso
os da Rússia, jogam às escondidas. Ele não querem reconhecer que os comités
de fábrica comunistas não representam senão 4% do total contra 84% dos
sociais-democratas! O balanço político do "terceiro período" está contido nesse
relato. O fato de baptizar "frente única vermelha" o isolamento dos comunistas
nas empresas, fará avançar as coisas?
A crise prolongada do capitalismo marca no interior do proletariado a linha de
partilha a mais dolorosa e a mais perigosa: entre os que trabalham e os
desempregados. O fato que os reformistas sejam preponderantes nas empresas, e
os comunistas entre os desempregados, paralisa as duas partes do proletariado.
Os que têm trabalho podem esperar mais tempo. Os desempregado são mais
impacientes. Hoje, a sua impaciência tem um carácter revolucionários. Mas, se o
Partido comunista não consegue encontrar as formas e as palavras de ordem de
luta que, unindo os desempregados e os que trabalham, abrirão a perspectiva de
uma saída revolucionária, a impaciência dos desempregados se volta
infalivelmente contra o Partido comunista.
Em 1917, apesar da política correta do partido bolchevique e o rápido
desenvolvimento da revolução, as camadas mais desfavorecidas e as mais
impacientes do proletariado começavam mesmo em Petrogrado, desde
Setembro-Outubro, a afastar o olhar do bolchevismo e a se voltar para os
sindicalistas e os anarquistas. Se a Revolução de Outubro não tivesse rebentado
a tempo, a desagregação do proletariado teria tomado um carácter agudo e
levado ao apodrecimento da revolução. Na Alemanha, os anarquistas são inúteis:
os nacionais-socialistas podem ocupar seus lugares, combinando a demagogia
anarquista com seus objetivos abertamente reacionários.
Os operários não são de forma alguma imunizados uma vez por todas contra a
influência dos fascistas. O proletariado e a pequena burguesia se apresentam
como vasos de comunicação, sobretudo nas condições presentes, quando o
exército de reserva do proletariado não pode fornecer os pequenos comerciantes,
os vendedores a domicilio, etc., e a pequena burguesia enraivecida, os proletários
e o lumpemproletariado.
Os empregados, o pessoal técnico e administrativo, certas camadas de
funcionários constituíam no passado um dos apoios importantes da social
democracia. Hoje, esses elementos passaram ou passam aos nacionais-
socialistas. Eles podem mobilizar, se ainda não começaram a fazer, a aristocracia
operária. Segundo esta linha o nacional-socialismo penetra por cima no
proletariado.
Todavia, a sua penetração eventual por baixo, quer dizer pelos
desempregados, é muito mais perigosa. Nenhuma classe não pode viver muito
tempo sem perspectivas e esperanças. Os desempregados não são uma classe
mas eles constituem já uma camada social muito compacta e muito estável, que
procura em vão sair das condições de vida insuportáveis. Se é verdade, em geral,
que a única revolução proletária pode salvar a Alemanha do apodrecimento e da
desagregação, isso é verdade em primeiro lutar para milhões de desempregados.
Dado a fraqueza do Partido comunista nas empresas e os sindicatos, o seu
crescimento numérico não resolve nada. Numa nação abalada pela crise, minada
pelas suas contradições, um partido de extrema esquerda pode encontrar dezenas
de milhares de novos partidários, sobretudo se o aparelho do partido é, com um
objectivo de "competição", exclusivamente voltado para o recrutamento
individual. O que é decisivo, são as relações entre o partido e a classe. Um
operário comunista eleito para um comité de fábrica ou para a direção do seu
sindicato tem mais importância que um milhar de novos membros, recrutados
aqui e ali, entrando hoje no partido para o abandonar amanhã.
Mas este afluxo individual de novos membros não durará eternamente. Se ele
persiste em afastar a luta até ao momento onde ele terá definitivamente afastado
os reformistas, o Partido comunista compreenderá depressa que a partir de um
certo momento a social-democracia deixa de perder influência a proveito do
Partido comunista e que, por outro lado, os fascistas começam a desmoralizar os
desempregados, principal base do Partido comunista. Um partido político não
pode impunemente abster-se de mobilizar as suas forças para as tarefas que
decorrem da situação. O Partido comunista esforça-se por desencadear greves
sectoriais para abrir caminho a uma luta de massas. Os sucessos nesse domínio
são magros. Como sempre os stalinistas ocupam-se da autocrítica: "Nós não
sabemos ainda organizar… ", "não sabemos ainda treinar…", além disso "nós"
significa "vocês". A teoria de triste memória das jornadas de Março de 1921
reaparece; "electrizar" o proletariado por ações ofensivas minoritárias. Mas os
operários não necessitam de serem "electrizados". Ele querem que lhes deem
perspectivas claras e e que os ajudem a criar premissas de um movimento de
massa.
Na estratégia das greves, é claro que o Partido comunista apoia-se sobre
citações isoladas de Lênin nas interpretação que delas dão Lozovsky e
Manuilsky. Certamente que houve períodos onde os mencheviques, lutavam
contra a "grevemania" enquanto que os bolcheviques tomavam a cabeça de cada
nova greve, mobilizando o movimento de massas cada vez mais importantes.
Isso correspondia a um período de despertar de novas camadas da classe. Tal foi
a táctica dos bolcheviques em 1905, no período de desenvolvimento industrial
que precedeu a guerra, nos primeiros meses da revolução de Fevereiro.
Mas no período precedendo diretamente Outubro, a partir do conflito de Julho
1917, a táctica dos bolcheviques foi diferente: eles não favoreciam as greves,
eles travavam-na porque cada grande greve tinha tendência a se transformar em
confrontação decisiva, enquanto que as premissas políticas ainda não tinham
amadurecido.
O que não lhes impedia, no decurso desses meses, tomar a cabeça de todas as
greves que rebentavam apesar dos avisos, essencialmente nos setores mais
atrasados da indústria (têxteis, couros, etc.).
Se, em certas condições, os bolcheviques desencadeavam ousadamente greves
no interesse da revolução, nas outras condições, sempre no interesse da
revolução, eles refreavam os operários para não entrarem em greve. Nesse
domínio como nos outros, não há receita pronta. A táctica das greves para cada
período se integrava sempre numa estratégia global e o laço entre a parte e o
todo era claro para os trabalhadores de vanguarda.
Como é que é na Alemanha? Os operários que têm trabalho não opõem
resistência à redução dos salários, porque eles têm medo dos desempregados.
Não há nada de espantoso: quando existem vários milhões de desempregados, a
greve tradicional, organizada pelos sindicatos, é uma luta sem esperança. Ela é
duplamente condenada quando existe um antagonismo político entre os
desempregados e os que têm um emprego. O que não exclui as greves sectoriais,
particularmente nos setores mais atrasados da indústria. Em contra-partida, são
os operários dos setores mais importantes, que, numa tal situação, são os que são
levados a escutar a voz dos dirigentes reformistas. As tentativas do Partido
comunista para desencadear uma greve, sem que a situação no seio do
proletariado não seja modificada, se reduzem a pequenas operações de
partidários que, mesmo em caso de sucesso, não têm seguimento.
Segundo as narrativas dos operários comunistas (ver nem que seja Der Rote
Aufbau), muitos operários nas empresas declaram que as greves sectoriais não
têm atualmente qualquer sentido, que só a greve geral pode arrancar os operários
à miséria. "Greve geral" significa aqui "perspectivas de luta". Os operários são
tanto menos entusiasmados pela greves sectoriais que são diretamente
confrontados ao poder de Estado: o capital monopolista fala aos operários a
linguagem das leis de excepção de Bruning.10
Na aurora do movimento operário, os agitadores abstiveram-se muitas vezes
em desenvolver perspectivas revolucionárias e socialistas para não assustar os
operários que procuravam mobilizar para uma greve. Hoje a situação apresenta-
se de maneira totalmente oposta. As camadas dirigentes dos operários alemãs
não podem decidir participar numa luta econômica senão na perspectiva geral
que as lutas a vir são claras. Essas perspectivas, elas não as encontram junto da
direção comunista.
A propósito da táctica das jornadas de Março de 1921 na Alemanha
("electrizar" a minoria do proletariado em vez de ganhar a sua maioria), o autor
destas linhas declarou no IIIº Congresso: "Quando a esmagadora maioria da
classe operária na se encontra no movimento, não simpatiza com ele ou ainda
dúvida do seu sucesso, quando a minoria, por outro lado, corre em frente e
esforça-se mecanicamente em empurrar os operários para a greve, neste caso
esta minoria, impaciente pode, na pessoa do partido, entrar em conflito com a
classe operária e aí quebrar a cabeça."
Deve-se renunciar à greve como forma de luta? Não, não renunciar mas criar
as premissas políticas e organizativas indispensáveis. O restabelecimento da
unidade sindical é uma. A burocracia reformista não quer nada disso,
naturalmente. Até agora a cisão assegurou-lhe a melhor posição possível. Mas a
ameaça direta do fascismo modifica a situação nos sindicatos retira a vantagem à
burocracia. A aspiração à unidade cresceu. A clique de Leipart pode sempre
tentar, na situação atual, recusar em restabelecer a unidade: isso multiplicará por
dois ou por três a influência dos comunistas no interior dos sindicatos. Se a
unidade se realiza, tanto melhor, um largo campo de atividade abrir-se-á diante
dos comunistas. Não são as meias medidas que são precisas mas uma viragem
radical!
Sem uma grande campanha contra a carestia da vida, pela redução da semana
de trabalho, contra a diminuição dos salários, sem a participação dos
desempregados nessa luta, sem a aplicação da política da frente única, as
pequenas greves improvisadas nunca farão desenvolver o movimento numa luta
de conjunto.
Os sociais-democratas de esquerda falam da necessidade, "em caso da tomado
do poder pelos fascistas", de recorrer à greve geral. É muito possível que o
próprio Leipart mostre tais ameaça quando ele está entre quatro paredes. O Rote
Fahne fala sobre este assunto do luxemburguismo. É caluniar a grande
revolucionária. Se Rosa Luxemburgo sobrestimou a importância própria da
greve geral na questão do poder, ela compreendeu muito bem que não se chama
arbitrariamente à greve geral, que ela é preparada por todo o itinerário anterior
do movimento operário, pela política do partido e dos sindicatos. Na boca dos
sociais-democratas de esquerda, a greve geral é antes de tudo um mito
consolante que lhe permite evadir da triste realidade.
Durante muitos anos os sociais-democratas franceses prometeram recorrer à
greve geral em caso de guerra. O congresso de Basileia de 1912 prometia mesmo
recorrer ao levantamento revolucionários. Mas a ameaça de greve e
levantamento não foi nesses dois caso senão um trovão de opera. Não se trata de
forma alguma de oposição entre greve e levantamento. O social-democrata
bebeliano de antes da guerra era um reformista, armado do conceito abstrato de
revolução; o reformista do após-guerra, agitando a ameaça da greve geral, é já
uma verdadeira caricatura.
A atitude da direção comunista em relação à greve geral é, evidentemente,
muito mais séria. Mas a clareza lhe faz falta, mesmo nesta questão. Portanto a
clareza é necessária. A greve geral é um meio de luta muito importante mas não
é um remédio universal. Há situações onde a greve geral risca de enfraquecer
mais os operários que o seu inimigo. A greve deve ser um elemento importante
do cálculo estratégico, mas não uma panaceia na qual se afoga toda a estratégia.
De modo geral a greve geral é o instrumento de luta do mais fraco contra o
mais forte, ou, mais exatamente, daquele que, no início da luta, se sente mais
fraco contra aquele que considera como o mais forte: quando pessoalmente não
posso utilizar um instrumento importante, tento pelo menos de evitar que o
inimigo não se sirva; se não posso disparar com um canhão, retiro-lhe pelo
menos o percutor. Tal é a "ideia" da greve geral.
A greve geral sempre apareceu como um instrumento de luta contra um poder
de Estado estabelecido que dispõe dos caminhos de ferro, do telegrama, das
forças militares e policiais, etc. Paralisando o aparelho de Estado a greve geral,
seja "assusta" o poder, seja criando as premissas a uma solução revolucionária da
questão do poder.
A greve geral mostra ser um meio de luta particularmente eficaz, quando só o
entusiasmo revolucionário une as massas trabalhadoras, a ausência de
organização e de um estado-maior de combate não lhe permitindo nem de
apreciar antecipadamente a relação de forças nem de elaborar o plano de
operações. Pode-se pensar que a revolução antifascista em Itália, cujo início será
marcado por um certo número de conflitos localizados, passará inevitavelmente
pelo estádio da greve geral. Não é somente por esta via que a classe operária de
Itália, hoje atomizada, terá de novo consciência de formar uma só classe e medir
a força de resistência do inimigo que ela deve derrubar.
A greve geral seria uma forma apropriada de luta contra o fascismo na
Alemanha, somente se este último já estava no poder e mantinha firmemente o
aparelho de Estado. Mas a palavra de ordem de greve geral é uma fórmula uma
vazia se se tratasse de esmagar o fascismo na sua tentativa para se apoderar do
poder.
Quando da marcha de Kornilov sobre Petrogrado, nem os bolcheviques nem
os sovietes no seu conjunto não pensavam a desencadear uma greve geral. Nos
caminhos de ferro os operários lutavam pelo transporte de tropas revolucionárias
e reter os trens de Kornilov. As fábricas não paravam senão na medida onde os
operários deviam partir para a frente. As empresas que trabalhavam para a frente
revolucionária multiplicavam a atividade.
Estava fora de questão a greve geral durante a Revolução de Outubro. Na
véspera da revolução, as fábricas e os regimentos na sua imensa maioria já se
tinham associado à direção do Soviete bolchevique. Chamar as fábricas para a
greve geral nessas condições significava enfraquecer-se a si próprio e não
enfraquecer o adversário. Nos caminhos de ferro, os operários esforçavam-se por
ajudar o levantamento; os empregados, fingindo um ar de neutralidade,
ajudavam a contra-revolução. A greve geral dos caminhos de ferro não tinha
qualquer sentido: a questão foi resolvida quando os operários tomaram a
vantagem.
Se, na Alemanha, a luta rebenta a partir de conflitos localizados, devidos a
uma provocação fascista, é pouco provável que uma chamada à greve geral
responda às exigências da situação. A greve geral significa antes de tudo: cortar
uma cidade da outra, um bairro do outro, e mesmo uma fábrica de outra. Seria
mais difícil de encontrar e de juntar os desempregados. Nessas condições os
fascistas que não têm falta de estado-maior, podem ganhar uma certa
superioridade, graças à sua direção centralizada. Certamente, suas tropas estão
nesse ponto atomizadas que mesmo então, a tentativa dos fascistas pode ser
afastada. Mas é já um outro aspecto do problema.
A questão das comunicações ferroviárias deve ser abordada não do ponto de
vista do "prestígio" da greve geral que implica que todos façam greve, mas do
ponto de vista da sua utilidade no combate: para quem e contra quem as vias de
comunicação servirão durante a confrontação?
Por consequência, é preciso preparar-se não para a greve geral mas para
resistir aos fascistas. Isso implica: criar em todo o lado bases de resistência,
destacamentos de choque, reservas, estados-maiores locais e centros de direção,
uma ligação eficaz, planos muito simples de mobilização.
O que fazem as organizações locais num canto da província, em Bruchsal ou
em Klingental, onde os comunistas com o SAP e os sindicatos criaram uma
organização de defesa, apesar do boicote da parte da cimeira reformista, é um
exemplo para todo o país, em despeito das suas dimensões modestas. Ó chefes
potentes, ó estrategas sete vezes doutos, temos vontade de lhes gritar, tomai uma
lição junto dos operários de Bruchsal e de Klingental, imitem-os, alargai vossas
experiências, tomai uma lição junto dos operários de Bruchsal e de Klingental!
A classe operária alemã dispõe de potentes organizações políticas, económicas
e desportivas. É isso que faz a diferença entre o "regime de Bruning" e o "regime
de Hitler". Bruning não tem nenhum mérito: a fraqueza burocrática não é um
mérito. Mas é preciso ver as coisas de frente. O fato principal, capital,
fundamental é que a classe operária na Alemanha está ainda em plena posse das
suas organizações. Uma utilização incorreta da sua força é a única razão da sua
fraqueza. Basta estender a todos o país a experiências de Bruchsal e de
Klingental, e a Alemanha apresentará outra cara. Nessas condições, a classe
operária poderá recorrer a formas de luta contra os fascistas muito mais eficazes
e diretas que a greve geral. Se a evolução da situação tornasse necessária a
utilização da greve geral (uma tal situação poderia nascer de um certo tipo de
relações entre os fascistas e os órgão do Estado ), o sistema de comités de defesa
constituídos na base da frente única garantiria previamente o sucesso da greve de
massas.
A luta não pararia nessa etapa. De fato, o que é no fundo a organização de
Bruchsal e de Klingental? É preciso saber discernir o que é importante nos
acontecimentos aparentemente menores: esse comité local de defesa é de fato o
comité local dos deputadas operários; ele não se chama assim e ele não tem
consciência disso, porque trata-se de um pequeno lugar na província. Aqui
também, a quantidade determina a qualidade. Transponham esta experiência em
Berlim e terão o Soviete dos deputados operários de Berlim!
Capitulo XIV: O Controle Operários e a Cooperação
com a URSS
Quando falamos das palavras de ordem do período revolucionário, elas não se
devem compreender num sentido demasiado estreito. Só se podem criar Sovietes
num período revolucionário. Mas quando ele começa? Não se pode saber
olhando para o calendário. Só se pode sentir na ação. É preciso criar os Sovietes
no momento onde se podem criá-los.11
A palavra de ordem de controle operário sobre a produção se relaciona, em
grande medida ao mesmo período que a criação dos sovietes. Mas aí também
não se deve raciocinar de maneira mecânica. As condições particulares podem
levar as massas a controlar a produção muito antes que elas estejam prontas a
criar os Sovietes.
Brandler e a sua sombra esquerda, Urbahns, avançavam a palavra de ordem de
controle sobre a produção independentemente da situação política. O que teve
por único resultado lançar o descrédito sobre essa palavra de ordem. Hoje, seria
incorreto rejeitar essa palavra de ordem, numa situação de crise política que
sobe, unicamente porque não há ainda ofensiva de massa. Para a própria
ofensiva, é preciso palavras de ordem precisando as perspectivas do movimento.
Um período de propaganda deve inevitavelmente preceder a penetração da
palavra de ordem nas massas.
A campanha para o controle operário pode começar, segundo as
circunstâncias, não sob o ângulo da produção mas sob o do consumo. A baixa do
preço das mercadorias, prometida pelo governo Brüning quando ele diminuía os
salários, não se realizou. Esta questão não pode deixar de tocar as camadas mais
atrasadas do proletariado, que ainda estão muito afastadas da ideia da tomada do
poder. O controle operário sobre os custos da produção e os benefícios
comerciais é a única forma real de luta pela baixa de preços. Dado o
descontentamento geral, a criação de comissões operárias que, com a
participação das donas de casa, examinarão por quais razões o preço da
margarina aumenta, pode marcar o princípio efetivo do controle operários sobre
a produção. Evidentemente, trata-se aí de uma via de abordagem possível,
tomada a título de exemplo. Ainda não está em causa a gestão da produção: a
operária não chegará aí imediatamente, esta ideia lhe é ainda completamente
estrangeira. Mas é mais fácil de passar do controle sobre o consumo ao controle
sobre a produção, pois a gestão direta, paralelamente no decurso geral da
revolução.
Com a crise atual, o controle sobre a produção na Alemanha contemporânea
implica um controle não somente sobre as empresas em atividade, mas também
sobre as empresas que funcionam a metade e sobre aquelas que estão fechadas.
Para isso, é preciso associar ao controle os operários que trabalham nessas
empresas antes do seu despedimento. É preciso proceder da seguinte maneira:
remeter as empresas fechadas em funcionamento sob a direção de um comité de
fábrica, em se baseando sobre um plano econômico. O que levanta
imediatamente a questão da gestão etática da indústria, quer dizer da
expropriação dos capitalistas pelo Estado operário. Assim, o controle operário
não poderia ter uma situação prolongada, "normal", como as convenções
colectivas ou a segurança social. O controle operário é uma medida provisória,
nas condições de extrema tensão da luta de classes, considerada somente como
uma ponte para a nacionalização revolucionária da indústria.
Os brandleristas acusam a oposição de esquerda de lhes ter retomado a palavra
de ordem de controle operário sobre a produção após a terem ridiculizado
durante vários anos. A acusação é surpreendente! Foi o partido bolchevique que,
em 1917, foi o primeiro a defender em larga escala a palavra de ordem de
controle sobre a produção. Em Petrogrado, o Soviete dirigiu toda a campanha
sobre esse ponto como sobre os outros. Como testemunha e ator desses
acontecimentos, posso testemunhar que nós não sentimos de forma alguma a
necessidade de solicitar as diretivas de Brandler-Thalheimer, nem de recorrer aos
seus conselhos teóricos. A acusação de "plágio" é formulada com uma certa
imprudência.
Mas a infelicidade não está aí. A segunda parte da acusação é muito mais
grave: até ao presente os "trotskistas" protestavam contra a campanha sobre a
palavra de ordem de controle sobre a produção, agora eles defendem essa
palavra de ordem. Os brandleristas vêm aí a prova da nossa incoerência! De
facto, eles só revelam a sua total incompreensão da dialética revolucionária,
contida na palavra de ordem de controle operário, em a reduzindo a uma receita
técnica de "mobilização das massas". Eles condenam-se a eles mesmos, quando
argumentam que repetem já há vários anos essa palavra de ordem que só é válida
para o período revolucionário. O pica-pau que, durante anos, martelou a casca do
tronco do carvalho, considera também, no fundo da sua alma, que o lenhador que
abateu a árvore com o machado, o copiou-o de maneira criminosa.
Para nós, a palavra de ordem de controle está ligada ao período de duplo
poder na indústria, que corresponde à passagem do regime burguês ao regime
proletário. Não, responde Thalheimer, duplo poder significa "igualdade (!) com
os patrões"; os operários lutam pela direção total das empresas. Os brandleristas
não permitirão "castrar", - é formulado assim! - essa palavra de ordem
revolucionárias. Para eles, "controle sobre a produção significa a gestão da
produção pelos operários" (17 de Janeiro). Mas porquê chamar gestão, controle?
Numa linguagem compreensível para todos, compreende-se controle, a
vigilância e a verificação por um organismo do trabalho de um outro organismo.
O controle pode ser muito ativo, autoritário e geral. Mas é sempre um controle.
A própria ideia dessa palavra de ordem nasceu do regime transitório nas
empresas, quando o patrão e a sua administração já não podem dar um passo
sem a autorização dos operários; mas por outro lado, os operários ainda não
criaram as premissas políticas da nacionalizações, eles ainda não adquiriram as
técnicas de gestão, nem criaram os órgãos necessários. Não esqueçamos que se
trata não somente da direção das oficinas mas também do vazamento da
produção, da operações de crédito, do abastecimento da fábrica em matérias-
primas, em novos equipamentos.
É a força da pressão global do proletariado sobre a sociedade burguesa que
determina a relação das forças na empresa. O controle não é concebido senão no
caso de uma superioridade indiscutível das forças políticas do proletariado sobre
as do capital. É falso pensar que no decurso da revolução todos os problemas são
resolvidos pela violência: podemos-nos apoderar das fábricas com a ajuda da
Guarda vermelha; mas para as gerir as novas premissas jurídicas e
administrativas são necessárias; é preciso conhecimentos, hábitos, organismos
apropriados. Tudo isso torna necessário um período de aprendizagem. Durante
esse período o proletariado tem interesse em deixar a gestão entre as mão de uma
organização experiente ao mesmo tempo forçando-a a abrir todos os seus livros
de contas e instaurando um controle vigilante sobre todas as suas ligações e
ações.
O controle operário começa numa empresa. O comité de fábrica é o órgão de
controle. Os órgãos de controle nas fábricas devem entrar em ligação umas com
as outras, seguindo as ligações econômicas existentes entre as empresas. Nesse
estádio, ainda não há plano econômico global. A prática do controle operário
prepara os elementos desse plano.
Inversamente, a gestão operária da indústria a uma escala muito mais
importante parte de cima, mesmo no seu início porque ela é inseparável do poder
e dum plano econômico geral. Os órgãos de gestão não são mais os comités de
fábrica mas os Sovietes centralizado. O papel dos comités de fábrica continua
importante, mas no domínio da gestão da indústria, trata-se de um papel auxiliar
e não de um papel dirigente.
Na Rússia, a etapa do controle operário não dura, porque a intelectualidade
técnica, convencida, seguindo a burguesia, que a experiência dos bolcheviques
não duraria senão algumas semanas, tentando todas as formas de sabotagem e se
recusava qualquer acordo. A guerra civil que transforma os operários em
soldados, deu um golpe mortal à economia. Também a experiência da Rússia
traz relativamente poucas coisas sobre o controle operário como regime
particular da indústria. Mas um outro ponto de vista tem tanto mais valor: ela
prova que num país atrasado, um proletariado jovem e inexperiente, cercado
pelo inimigo, conseguiu resolver o problema da gestão da indústria, apesar dos
atos de sabotagem, não somente dos poderosos mas também do pessoal técnico e
administrativo. Do que a classe operária alemã não seria capaz!
O proletariado, dissemos, tem interesse que a passagem da produção
capitalista privada à produção capitalista de Estado e socialista se faça com
menos agitação econômica possíveis e evitando todo desperdício inútil do bem
nacional. Eis porquê o proletariado deve se mostrar pronto e criar um regime de
transição nas fábricas, as oficinas e os bancos, ao mesmo tempo que se
aproximam do poder e mesmo depois de se ter apoderado do poder por uma luta
ousada e decidida.
As relações na indústria no momento da revolução alemã serão diferentes dos
que conheceu a Rússia? Não é fácil responder a esta questão, sobretudo para um
observador exterior. O curso real da luta de classes pode não deixar lugar para o
controle operário como etapa particular. Se a luta se desenvolve num situação
muito tensa, marcada por uma pressão crescente dos operários por um lado, pela
multiplicação dos atos de sabotagem dos patrões e da administração por outro
lado, acordos, mesmo de curta duração, serão impossíveis. A classe operária
deverá então tomar posse simultaneamente do poder e da gestão completa das
empresas. A paralisia parcial da indústria e a presença de um exército
considerável de desempregados tornam este "atalho" bastante provável.
Em contrapartida, a existência de potentes organizações no seio da classe
operária, a educação dos operários num espírito não de improvisação mas de
ação sistemática, a lentidão com a qual as massas se radicalizam e se juntam ao
movimento revolucionário, são fator que fazem pender a balança a favor da
primeira hipótese. Seria portanto falso rejeitar previamente a palavra de ordem
de controle operário sobre a produção.
Em qualquer caso, a palavra de ordem de controle operário tem para a
Alemanha ainda mais do que para a Rússia um sentido diferente daquele da
gestão operária. Como muitas outras palavras de ordem transitórias, ela mantém
uma grande importância, independentemente da questão de saber em que medida
será realizada e se será de maneira geral.
Quando ela está em condições de criar as formas transitórias de controle
operários, a vanguarda do proletariado liga à sua causa as camadas mais
conservadoras do proletariado e neutraliza certos grupos da pequena-burguesia,
sobretudo os empregados técnicos, administrativos e bancários. Se os capitalistas
e toda a camada superior da administração manifestam uma hostilidade
irredutível e recorrem à sabotagem da economia, a responsabilidade das medidas
severas que daí decorrem, repousará, aos olhos do povo, não sobre os operários
mas sobre as classe inimigas. Tal é a significação política complementar da
palavra de ordem de controle operários, além do seu significado econômico e
administrativo indicado acima. De qualquer modo, o apogeu do cinismo político
é atingido por aqueles que avançaram a palavra de ordem de controle operários
num período não revolucionários, lhe conferindo assim um carácter puramente
reformista e que agora nos acusam de hesitações centristas porque nós nos
recusamos identificar controle operário e gestão operária.
Os operários que se erguem até aos problemas de gestão da indústria não
quererão nem poderão se inebriar com as palavras. Nas fábricas, eles têm o
hábito de lidar com material muito menos maleável que as frases, e eles
compreenderão o nosso pensamento melhor que os burocratas: o verdadeiro
espírito revolucionário, não consiste em utilizar a violência em todo o lado e a
cada momento, e ainda menos a se inebriar de palavras sobre a violência. Onde a
violência é necessária, é preciso utilizá-la ousadamente, de maneira decidida e
até ao fim. Mas é preciso conhecer os limites da violência, é preciso saber a que
momento se torna necessários combinar a violência e as manobras tácticas, os
golpes e os compromissos. Quando dos dias de aniversário de Lênin, a
burocracia repete frases aprendidas de cor sobre o "realismo revolucionários",
para poder troçar disso mais livremente o resto do ano.
Os teóricos prostituídos do reformismo esforçam-se em ver nos decretos de
excepção contra os operários, a aurora do socialismo. Do "socialismo militar"
dos Hohenzollern ao socialismo policial de Brüning! Os ideólogos de esquerda
da burguesia sonham com uma sociedade capitalista planificada. Mas o
capitalismo já demonstrou que no que respeita a planificação, ele é somente
capaz de esgotar as forças produtivas no interesse da guerra.
À parte essas questões, há ainda uma: de que maneira resolver o problema da
independência da Alemanha em relação ao mercado mundial, enquanto que o
montante actual das suas importações e das suas exportações é considerável?
Nós propomos começar pela esfera das relações germano-soviéticas, quer
dizer pela elaboração de um importante plano de cooperação entre as economias
alemã e soviética, em ligação com o segundo plano quinquenal e como
complemento a este. Dezenas e centenas de fábricas poderiam ser lançadas em
pleno rendimento. O desemprego na Alemanha poderia ser totalmente liquidado
– é pouco provável que isso necessite mais de dois ou três anos – sobre a base de
um plano econômico, englobando os dois países em todos os domínios.
Os dirigentes da indústria capitalista alemã não podem, evidentemente, acertar
um tal plano, porque ele implica a sua própria liquidação do ponto de vista
social. Mas o governo soviético, com a ajuda das organizações operárias, dos
sindicatos em primeiro lugar, e dos elementos progressistas entre os técnicos
alemãs, pode e deve elaborar um plano susceptível de abrir grandiosas
perspectivas. Como todos esses "problemas" de reparações e pfennigs
suplementares parecerão mesquinhos em comparação às possibilidades que
abrirão ao conjunção dos recursos em matérias-primas, em técnicas e em
organização das economias alemã e russa.
Os comunistas alemãs desenvolvem uma grande propaganda à volta do
sucesso que conheceu a edificação da URSS. É um trabalho indispensável. Mas,
sobre isso, eles embelezam a realidade de maneira enjoativa, o que é
completamente desnecessário. Mas o que é pior ainda, é que eles são incapazes
de ligar os sucessos e as dificuldades da economia soviética aos interesses
imediatos do proletariado alemão, ao desemprego, à baixa dos salários e ao
impasse econômico geral da economia alemã. Eles não querem nem sabem
colocar o problema da cooperação germano-soviética sobre uma base que seja ao
mesmo tempo rentável do ponto de vista econômico e profundamente
revolucionário.
No início da crise – há dois anos – colocamos esse problema na imprensa. Os
stalinistas proclamaram imediatamente que nós acreditamos na coexistência
pacífica do socialismo e do capitalismo, que nós queríamos salvar o capitalismo.
Eles não tinham previsto nem compreendido uma só coisa: um plano econômico
concreto de cooperação poderia tornar-se um potente fator da revolução
socialista, com a condição de fazer disso um sujeito de discussão nos sindicatos,
nos comícios, nas fábricas, entre os operários das empresas ainda em atividade,
mas também daquelas que estão fechada, com a condição de ligar essa palavra
de ordem ao controle operários sobre a produção, depois num segundo tempo ao
da conquista do poder. O estabelecimento de uma cooperação econômica
planificada, real, ao nível internacional pressupõe a existência do monopólio do
comércio exterior na Alemanha, a nacionalização dos meios de produção, a
ditadura do proletariado. Assim teria sido possível mobilizar milhões de
operários, desorganizados, sociais-democratas e católicos na luta pelo poder.
Os Tarnov procuram assustar os operários alemãs, explicando que a
desorganização da indústria que resultaria da revolução, ocasionaria uma
desorganização terrível, a fome, etc. É preciso não esquecer que esses mesmo
indivíduos apoiaram a guerra imperialista que não podia trazer ao proletariado
senão sofrimento, infelicidade e humilhações. Fazer recair sobre o proletariado
os sofrimentos da guerra agitando a bandeira dos Hohenzollern? Sim. Sacrificar-
se pela revolução sob a bandeira do socialismo? Não, nunca!
Quando nas discussões se afirma que "nossos operários alemãs" nunca
aceitarão "tais sacrifícios", não se lisonjeia mas calúnia-se também os operários.
Estes últimos são, infelizmente, demasiado pacientes. A revolução socialista não
exigirá do proletariado alemão uma centésima parte das vítimas que a guerra dos
Hohenzollern, Leipart e Wels consumiu.
De que caos partem os Tarnov? A metade do proletariado alemão já foi
lançado para a rua. Mesmo se a crise diminui daqui a um ou dois anos, ela
ressurgiria daqui a cinco anos, sob formas ainda mais terríveis, sem falar do
facto que as convulsões que acompanham a agonia do capitalismo só podem
conduzir a uma nova guerra. De qual caos les Hilferding têm medo? Se a
revolução tivesse por ponto de partida uma indústria capitalista em plena
expansão – o que de uma maneira geral é impossível – a substituição do antigo
sistema econômico poderia, efetivamente, durante os primeiros meses e mesmo
os primeiros anos provocar uma baixa momentânea da economia. Mas de facto o
socialismo na Alemanha atual deveria partir de uma economia cujas forças
produtivas só trabalham a metade. A regularização da economia disporia à
partida 50% de reservas, o que é largamente suficiente para compensar as
hesitações dos primeiros passos, atenuar os tremores agudos do novo sistema e a
preservar de uma queda momentânea da forças produtivas. Utilizemos sob
reserva a linguagem dos números: no caso de uma economia capitalista
funcionando a 100%, a revolução socialista deveria num primeiro tempo descer
a 75% e mesmo a 50%; em contrapartida, no caso de uma economia funcionando
a 50% da sua capacidade, a revolução poderia subir a 75% e mesmo a 100%,
para logo conhecer um desenvolvimento sem precedentes.
Capitulo XV: A Situação é Desesperada?
É uma tarefa difícil mobilizar de uma só vez a maioria da classe operária
alemã, para uma ofensiva. Depois das derrotas de 1919, 1921 e 1923, após as
aventuras do "terceiro período", os operários alemãs, que são já fortemente
agarrados pelas poderosas organizações conservadoras, viram se desenvolver
neles os centros de inibição. Mas esta sólida organização dos operários alemãs,
que, até agora, impediu toda a penetração do fascismo nas suas fileiras, abre as
maiores possibilidades para os combates defensivos.
É preciso ter presente no espírito o facto que a política da frente única é muito
mais eficaz na defesa que no ataque. As camadas conservadoras ou atrasadas do
proletariado são arrastadas mais facilmente numa luta para defender as regalias
obtidas do que conquistar novas posições.
Os decretos de excepção de Brüning e a ameaça vindo de Hitler são, nesse
sentido, um sinal de alarme "ideal" para a política da frente única. Não se trata
de defesa no sentido mais elementar e mais evidente do termo. É possível, nessas
condições, ganhar para a frente única a grande maioria da classe operária. Ainda
mais, os objetivos da luta não podem deixar de ter a simpatia entre as camadas
inferiores da pequena burguesia, incluindo os pequenos comerciantes dos bairros
e dos distritos operários.
Apesar de todas as dificuldades e dos perigos, a situação atual na Alemanha
apresenta vantagens enormes para o partido revolucionário; ela dita de modo
imperativo um plano estratégico claro: da defensiva à ofensiva. Sem renunciar
um só instante ao seu objectivo principal que continua a ser a conquista do
poder, o Partido comunista ocupa, para as ações imediatas, uma posição
defensiva. É tempo de dar a fórmula "Classe contra classe" o seu significado
real!
A resistência dos operários à ofensiva do capital e do Estado provocará
inevitavelmente uma ofensiva resoluta do fascismo. Mesmo tímidos que tenham
sido os primeiros passos da defesa, a reação do adversário reforçará rapidamente
as fileiras da frente única, alargará as suas tarefas, tornará necessária a aplicação
de métodos mais decididos, rejeitará fora da frente única as camadas reacionárias
da burocracia, reforçara a influência dos comunistas, ao mesmo tempo que
derrubará as barreiras entre os operários, e prepara, assim, a passagem da
defensiva à ofensiva.
Se nos combates defensivos o Partido comunista ganha a direção – e com uma
política justa isso não faz qualquer dúvida – ele não deverá em qualquer caso
pedir às direções reformistas e centristas o seu acordo para a passagem à
ofensiva. São as massas que decidem: a partir do momento onde elas se
destacam da direção reformista, um acordo com esta última perde todo
significado. Perpetuar a frente única traduziria uma incompreensão total da
dialética da luta revolucionária equivaleria a transformar a frente única de
trampolim em barreira.
As situações políticas as mais difíceis são, num certo sentido, as mais fáceis:
elas não admitem senão uma só solução. Quando se designa claramente uma
tarefa pelo seu nome, em princípio já se resolveu: da frente única para a
defensiva à conquista do poder sob a bandeira do comunismo.
Quais são as possibilidades de sucesso? A situação é difícil. O últimatismo
ultra-esquerda é um apoio do reformismo. O reformismo apoia ditadura
burocrática da burguesia. A ditadura burocrática de Brüning agrava a agonia
econômica do país e alimenta o fascismo.
A situação é muito difícil e muito perigosa, mas de forma alguma desesperada.
O aparelho stalinista, beneficiando duma autoridade usurpada e de recursos
materiais da Revolução de Outubro, é muito forte mas ele não é todo poderoso.
A dialética da luta de classes é mais forte. É preciso somente saber ajudá-la no
momento oportuno.
Hoje, muita gente "à esquerda" ostentam um grande optimismo quanto à sorte
da Alemanha. Em 1923, dizem, quando o fascismo era ainda muito fraco e que o
Partido comunista gozava duma grande influência nos sindicatos e nos comités
de fábrica, o proletariado não venceu; como se poderia esperar um vitória hoje,
enquanto que o partido enfraqueceu e que o fascismo é incomparavelmente mais
forte?
Este argumento, à primeira vista convincente, é de facto falacioso. Em 1923,
pararam diante do combate: diante do espectro do fascismo o partido recusa o
combate. Quando não há luta, não pode haver vitória. É precisamente a força do
fascismo e a sua pressão que excluem hoje toda a possibilidade de recusar o
combate. É preciso lutar. E se a classe operária alemã se compromete no
combate, ela pode vencer. Ela deve vencer.
Ontem ainda os grandes chefes declaravam: "Que os fascistas cheguem ao
poder, isso não nos faz medo, eles próprios se esgotarão rapidamente, etc." Esta
ideia predominou na cúpula do partido durante vários meses. Se ela se enraizou
definitivamente, isso teria significado que o Partido comunista procurava a
anestesiar o proletariado antes que Hitler não lhe corte a cabeça. Era aí que
estava o perigo principal. Hoje, ninguém defende esta ideia. Alcançamos uma
primeira vitória. A ideia que o fascismo deve ser esmagado ante da sua chegada
ao poder, penetrou as massas operárias. É uma vitória importante. Toda a
agitação futura deve partir daí.
As massas operárias estão abatidas. O desemprego e a necessidade os
derrotam. Mas a confusão da direção, o estrago que ela provocou, as viravoltas
ainda mais. Os operários compreendem que é impossível deixar Hitler chegar ao
poder. Mas como? Nenhuma solução há vista. Os dirigentes nada ajudam, pelo
contrário, eles são um obstáculo. Mas os operários querem lutar.
É um facto surpreendente que não se tenha apreciado, tanto que se possa
julgar de longe, pelo seu justo valor: os mineiros de Hirsch-Dunker declararam
que era preciso substituir o sistema capitalista pelo sistema socialista! Isso
significa que eles estão de acordo amanhã para criar os Sovietes, como forma de
organização de toda a classe. Talvez que a partir de hoje eles estejam de acordo:
basta perguntar-lhes! Esse sintoma por ele próprio é cem vezes mais importante
que todos os julgamentos impressionistas desses senhores, homens de letras e
bons faladores, que se queixam desdenhosamente das massas.
Observa-se efetivamente nas fileiras do Partido comunista uma certa
passividade, apesar dos berros do aparelho. E porquê? Os comunistas da base
vêm cada vez menos às reuniões de célula, onde lhes encharcam de palavras
ocas. As ideias que vêm de cima não podem ser aplicadas nem na fábrica nem na
rua. O operário tem consciência da contradição irredutível que há entre o que ele
necessita quando está diante das massas, e o que lhe trazem nas reuniões oficiais
do partido. A atmosfera artificial, criada pelo aparelho rabugento, fanfarão e que
não suporta as objecções, torna-se insuportável para os simples membros do
partido. Daí o vazio e a frieza da reuniões. Isso traduz não a recusa da luta mas
um desespero político e um protesto surdo contra a direção toda-poderosa mas
estúpida.
Esse desespero nas fileiras do proletariado encoraja os fascistas. Eles
continuam a ofensiva. O perigo cresce. Mas precisamente esta abordagem do
perigo fascista sensibilizará de maneira extraordinária os operários de vanguarda
e criará uma atmosfera favorável para avançar as proposições claras e simples
desembocando na ação.
Referindo-se ao exemplo de Braunschweig, Münzenberg escreveu em
Novembro do ano passado: "Hoje, não pode haver qualquer dúvida que essa
frente única surgirá um dia espontaneamente sob a pressão crescente do terror
fascista e dos ataques fascistas. " Münzenberg não nos explica porquê o Comité
central, do qual ele faz parte, não fez dos acontecimentos de Braunschweig o
ponto de partida de uma política ousada de frente única. Pouco importa:
Münzenberg, mesmo que ele reconheça aí a sua própria inconsistência, tem
razão no seu prognóstico.
A abordagem do perigo fascista só pode provocar a radicalização dos
operários sociais-democratas e mesmo da camada importante do aparelho
reformista. A ala revolucionária do SAP fará sem qualquer dúvida um passo em
frente. Nessas condições, um viragem do aparelho comunista é mais ou menos
inevitável, mesmo que pague o preço de quebras e cisões internas. É para um tal
desenvolvimento que é preciso se preparar.
Uma viragem dos stalinista é inevitável. Certos sintomas já dão as dimensões
da força da pressão exercida pela base: certos argumentos já não são retomados,
a fraseologia torna-se cada vez mais confusa, as palavras de ordem cada vez
mais ambíguas; ao mesmo tempo, se exclui do partido aqueles que tiveram a
imprudência de compreender as tarefas antes do Comité central. São sintomas
que não enganam, mas por agora só são sintomas.
Já várias vezes, no passado, a burocracia stalinista estragou centenas de
toneladas de papel numa polêmica contra o "trotskismo" contra-revolucionário,
para finalmente dar uma viragem de 180º e tentar realizar o programa da
oposição de esquerda, muitas vezes, na verdade, com um atraso fatal.
Na China, essa viragem foi tomada demasiado tarde e sob uma forma tal que
deu de facto o golpe de misericórdia à revolução ( o levantamento de Cantão).
Na Inglaterra, essa "viragem" foi da iniciativa do adversário, quer dizer do
conselho geral que rompeu com os stalinistas quando não precisou mais deles.
Na URSS a viragem de 1928 chegou a tempo para salvar a ditadura da catástrofe
iminente. Não é difícil explicar as diferenças entre esses três exemplos
importantes. Na China, o Partido comunista, jovem e inexperiente, seguia
cegamente a direção moscovita; de facto, a voz da oposição de esquerda não teve
tempo de chegar até à China. Foi o que se passou igualmente na Inglaterra. Na
URSS, a oposição de esquerda estava presente e levou uma campanha sem
descanso contra a política em relação aos kulaques.
Na China e Inglaterra, Stálin e companhia tomavam riscos à distância; na
URSS, o perigo planava sobre a sua própria cabeça.
A vantagem política da classe operária alemã baseia-se no facto que todos os
problemas foram colocadas abertamente e no momento desejado; a autoridade da
direção da Internacional comunista é consideravelmente afetada; a oposição
marxista age mesmo na Alemanha; a vanguarda do proletariado conta milhares
de elementos experientes e críticos, que são capazes de levantar a voz e que
começam já a fazê-la ouvir.
Na Alemanha, a oposição de esquerda é numericamente fraca. Mas a sua
influência pode revelar-se decisiva por ocasião de uma viragem brusca. Tal como
um agulheiro pode, apoiando oportunamente sobre uma alavanca, enviar um
trem fortemente carregado sobre outra via, a fraca oposição pode, apoiando
sobre uma alavanca ideológica com um gesto firme e seguro, obrigar o trem do
Partido comunista alemão e sobretudo o pesado comboio do proletariado alemão
a mudar de direção.
Os acontecimentos provam, cada dia, a justeza da nossa posição. Quando o
teto começa a arder acima da suas cabeças, os burocratas mais obtusos não se
preocupam mais do seu prestígio. E os conselheiros secretos saltam pela janela,
de cuecas. A pedagogia dos factos ajudará a nossa própria crítica.
O Partido comunista alemão conseguirá fazer essa viragem a tempo? Agora
não se pode falar disso senão de maneira condicional. Sem o frenesim do
"terceiro período", o proletariado alemão estaria já no poder. Se o Partido
comunista tivesse aceite o programa de ação, avançado pela oposição de
esquerda após as últimas eleições para o Reichstag, a vitória teria sido
assegurada. Hoje, não é possível falar de vitória segura. Mas pode-se qualificar
de oportuno a viragem que permitirá aos operários alemãs entrar na luta, antes
que o fascismo não se apodere do aparelho de Estado.
Para arrancar essa viragem, um esforço imenso é necessário. É preciso que os
elementos de vanguarda do comunismo, no interior e exterior do partido não
tenham medo de agir. É preciso lutar abertamente contra o últimatismo limitado
da burocracia, no interior do partido e diante das massas operárias.
"Mas é a ruptura da disciplina?" dirá um comunista hesitante. Seguramente, é
uma ruptura da disciplina stalinista. Nenhum revolucionário sério não rompe a
disciplina, mesmo formal, se para isso não tem razões imperiosas. Mas aquele
que, se cobrindo de disciplina, tolera uma política cujo carácter desastroso é
evidente, esse não é um revolucionário mas um fraco, um canalha. Seria um
crime da parte dos comunistas opositores comprometerem-se como Urbahns e
companhia na via da criação de novo Partido comunista, mesmo antes de ter
feito esforços sérios de mudar a orientação do antigo partido. Não é difícil criar
uma pequena organização independente. Mas criar um novo Partido comunista é
uma tarefa gigantesca. Os quadros necessários para uma tal tarefa existem? Se
sim, que é que eles fizeram para influenciar as dezenas de milhar de operários
que são membros do partido oficial? Se esses quadros se consideram capazes de
explicar aos operários a necessidade de um novo partido, então eles devem, antes
de tudo, meterem-se à prova, trabalhando na regeneração do partido existente.
Colocar hoje o problema de um terceiro partido significa opôr-se, na véspera
de uma grande decisão histórica, a milhões de operários comunistas, que, ainda
se descontentes da sua direção, continuam ligados ao seu partido por um
sentimento de auto-conservação. É preciso encontrar uma linguagem comum
com esses milhões de operários comunistas. É preciso apesar dos insultos, as
calúnias e as perseguições, chegar até à consciência desses operários, mostrar-
lhes que nós queremos a mesma coisa que eles; que não temos outros interesses
senão os do comunismo; que a via que nós indicamos é a única via justa.
É preciso desmascarar impiedosamente os que capituladores de ultra-
esquerda; é preciso exigir dos "dirigentes" uma resposta clara à questão: que
fazer agora?, e propor a sua própria resposta para todo o país, para cada região,
para cada cidade, para cada bairro, para cada fábrica.
No interior do partido, é preciso criar células de bolcheviques-leninistas. Eles
devem inscrever sobre a sua bandeira: mudança de orientação e reforma do
regime do partido. Aí onde eles asseguram uma base sólida, eles devem passar à
aplicação nos factos da política da frente única, mesmo a uma escala local pouco
importante. A burocracia do partido vai excluí-los? Certamente, mas o seu reino
nas condições atuais não durará muito tempo.
Uma discussão pública, sem interrupção das reuniões, sem citações trucadas,
sem calúnias venenosas, uma troca leal de opiniões são necessárias nas fileiras
dos comunistas e de todo o proletariado; é assim que na Rússia, durante todo o
ano de 1917, polemizamos com todos os partidos e no seio mesmo do nosso
partido. É preciso através desta larga discussão, preparar um congresso
extraordinário do partido com um único ponto na ordem do dia: "Que faremos?"
Os opositores de esquerda não são intermediários entre o Partido comunista e a
social-democracia. São soldados do comunismo, seus agitadores, seus
propagandistas, seus organizadores. É preciso se vira para o partido! É preciso
lhe explicar! É preciso o convencer!
Se o Partido comunista se vê forçado em aplicar a política da frente única, isso
permitirá afastar quase com certeza a ofensiva fascista. E uma vitória séria sobre
o fascismo abrirá a via à ditadura do proletariado.
Mas o facto de ter tomado a cabeça da revolução não bastará a resolver todas
as contradições que o Partido comunista tem nele. A missão da oposição de
esquerda não será de forma alguma terminada. Num sentido, ela apenas começa.
A vitória da revolução proletária na Alemanha deverá ter como primeira tarefa, a
liquidação da dependência burocrática em relação ao aparelho stalinista.
Amanhã, após a vitória do proletariado alemão e mesmo antes, na sua luta
pelo poder, a sujeição que paralisa a Internacional comunista saltará. A
indigência das ideias do centrismo burocrático, as limitações nacionais do seu
horizonte, o carácter anti-proletário do seu regime, tudo isso aparecerá à luz da
revolução alemã que será incomparavelmente mais viva que a da Revolução de
Outubro. As ideias de Marx e de Lênin triunfarão sem falta no seio do
proletariado alemão.
Conclusão
Um comerciante levava os bois para o matador. O carniceiro avança, de faca
na mão. "Cerremos fileiras e transparecemos o carrasco com os nossos cornos",
propôs um dos bois. "Mas porquê o carniceiro é pior que o comerciante que nos
conduziu até aqui com a forquilha", responderam-lhe os bois que tinham
recebido a sua educação política na escola de Manuilsky. "A seguir poderemos
fazer contas com o comerciante". "Não", responderam os bois ao seu
conselheiro. "Tu és a caução de esquerda dos nossos inimigos, e tu és um social-
carniceiro". E eles recusaram cerrar fileiras. (Tirado das fábulas de Esopo.)
"Colocar a anulação da paz de Versailles obrigatoriamente,
absolutamente e imediatamente no primeiro plano, antes da questão da
libertação do jugo do imperialismo dos outros países oprimidos pelo
imperialismo, é do nacionalismo pequeno-burguês (digno dos Kautsky,
Hilferding, Otto Bauer e companhia), e não da Internacional
revolucionária".
O que é preciso, é o abandono completo do comunismo nacional, a liquidação
pública e definitiva das palavras de ordem de "revolução popular". Não: "Abaixo
o tratado de Versailles!, mas "Vivam os Estados-Unidos Soviéticos da Europa."
O socialismo só é realizável sobre a base das mais recentes conquistas da
técnica moderna e sobre a base da divisão internacional do trabalho.
A edificação da URSS não é um processo nacional que pode bastar-se a si
próprio, ela faz parte integrante da revolução internacional.
A conquista do poder pelo proletariado alemão e europeu é uma tarefa
incomparavelmente mais real e mais imediata que a construção de uma
sociedade socialista fechada sobre si própria e autuária, no interior das fronteiras
da URSS.
Defesa incondicional da URSS, primeiro Estado operário, contra os inimigos
interiores e exteriores da ditadura do proletariado!
Mas a defesa da URSS não deve ser levada com os olhos vedados. controle do
proletariado internacional sobre burocracia soviética! Exposição completa do
nacional-reformismo e das tendências thermidorianas cuja teoria do socialismo
num só país é a generalização.
Do que precisa o Partido comunista? O regresso à escola estratégica dos
quatro primeiros congressos da Internacional comunista. Abandono do
ultimatismo em relação às organizações operárias de massa: a direção comunista
não poderá ser imposta, ela deve ser ganha.
O abandono da teoria do social-fascismo, que ajuda a social-democracia e o
fascismo.
Exploração consequente do antagonismo entre a social-democracia e o
fascismo:
a. por uma luta eficaz contra o fascismo;
b. para opor os operários sociais-democratas à sua direção reformista.
São os interesses vitais da democracia proletária, e não os princípios da
democracia formal, que devem servir de critério para apreciar as mudanças de
regimes políticos da dominação da burguesia.
Nenhum apoio nem direto nem indireto ao regime de Brüning!
Defesa ousada e dedicada das organizações do proletariado contra os fascistas.
"Classe contra classe!" Isso significa que todas as organizações do
proletariado devem ocupar o seu lugar na frente única contra a burguesia.
O programa prático da frente única deve ser definido por um acordo entre as
organizações diante das massas. Cada organização continua sob a sua bandeira e
conserva a sua direção. Na ação, cada organização respeita a disciplina da frente
única.
"Classe contra classe!" É preciso desenvolver uma campanha de agitação para
que as organizações sociais-democratas e os sindicatos reformistas rompam com
seus pérfidos aliados burgueses da "frente de ferro" e cerrem fileiras com as
organizações comunistas e toda as outras organizações do proletariado.
"Classe contra classe!" Propaganda e preparação organizativa dos sovietes
operários, como forma superior da frente única proletária.
Total independência política e organizativa do Partido comunista a cada
momento e em qualquer circunstância.
Nenhuma combinação de programas ou de bandeiras. Nenhuma transação sem
princípios. Total liberdade de crítica em relação aos aliados do momento.
A oposição de esquerda apoia, vai de si, a candidatura de Thaelmann ao posto
de presidente. Os bolcheviques-leninistas devem estar nos postos avançados na
mobilização dos operários, sob a bandeira da candidatura comunista oficial.
Os comunistas alemãs devem inspirar-se não do regime interno atual do
Partido comunista da URSS que reflete a dominação do aparelho sobre a base
duma revolução vitoriosa, mas do regime do partido que conduziu à revolução.
A liquidação da omnipotência do aparelho no Partido comunista alemã é uma
questão de vida ou de morte.
O regresso à democracia no partido é indispensável.
Os operários comunistas devem obter em primeiro lugar uma discussão séria e
honesta no partido sobre as questões de estratégia e táctica. A voz da oposição de
esquerda (dos bolcheviques-leninistas) deve ser escutada pelo partido. Depois de
uma discussão geral no partido, as decisões devem ser tomadas por um
congresso extraordinário, eleito livremente.
A política correta do Partido comunista em relação ao SAP é a seguinte:
crítica sem concessões (mas honesta, quer dizer correspondente aos factos) do
carácter bastardo da direção; atitude atenta, fraternal, em relação à ala esquerda;
estar pronto a fazer acordos práticos com o SAP e instaurar laços políticos mais
estreitos com a ala revolucionária.
Mudança total de orientação na política sindical: luta contra a direção
reformista na base da unidade dos sindicatos.
Levar sistematicamente a política da frente única nas empresas. Acordos com
os comités de fábrica reformistas, na base dum programa preciso de
reivindicações.
Luta pela baixa de preços. Luta contra a redução de salários. Colocar esta luta
no centro da campanha pelo controle operários sobre a produção.
Campanha pela cooperação com a URSS na base dum plano econômico único.
Elaboração pelos órgãos da URSS, com a participação das organizações
interessadas do proletariado alemão, dum plano tendo valor de exemplo.
Campanha pela passagem da Alemanha para o socialismo na base dum tal
plano.
Os que afirmam que a situação é desesperada, mentem. É preciso expulsar os
pessimistas e os cépticos das fileiras do proletariado como empestados. Os
recursos internos do proletariado alemão são inesgotáveis. Elas abrirão caminho.
A Viragem da Internacional Comunista e a Situação
na Alemanha

Capitulo I: As Origens da Última Viragem


Na nossa época, as viragens táticas, mesmo as mais importantes, são
absolutamente inevitáveis. Elas são o resultado de viragens abruptas na situação
objetiva (instabilidade das relações internacionais; flutuações bruscas e
irregulares da conjuntura; repercussões brutais das flutuações econômicas ao
nível político; movimentos impulsivos das massas que têm o sentimento de se
encontrar numa situação sem saída, etc.). O estudo atento das mudanças na
situação objetiva é hoje uma tarefa muito mais importante e ao mesmo tempo
infinitamente mais difícil que antes da guerra, na época do desenvolvimento
"orgânico" do capitalismo.
A direção do partido se encontra agora na situação de um motorista que
conduz o seu carro sobre um caminho montanhoso em zig-zag. Uma viragem
tomada a contra-tempo, uma velocidade excessiva, fazem correr aos viajantes e
ao carro perigos muito graves, que podem ser mortais.
A direção da Internacional Comunista nos deu, estes últimos anos, exemplos
de viragens muito bruscas. A última, nós observamos no decurso dos últimos
meses. Qual é a razão das viragens da Internacional Comunista depois da morte
de Lênin? Deve-se a mudanças da situação objetiva? Não. Pode-se afirmar com
toda a certeza que a partir de 1923, a Internacional Comunista não tomou a
tempo nenhuma viragem táctica fundada sobre uma análise correta das
mudanças que intervieram nas condições objetivas. Pelo contrário, cada viragem
é de facto o resultado de uma agudização insuportável da contradição entre a
linha da Internacional Comunista e a situação objetiva. E nós a constatamos hoje
ainda mais uma vez.
O IXº plenário do Comité executivo da Internacional Comunista, o VIº
Congresso e sobretudo o Xº plenário foram orientados para um desenvolvimento
brusco e linear da revolução ("o terceiro período" ), desenvolvimento que a
situação objetiva nessa época excluía totalmente, após as severas derrotas na
Inglaterra e em China, o enfraquecimento dos partidos comunistas no mundo
inteiro, e sobretudo nas condições de expansão comercial e industrial que
conheciam toda uma serie de países capitalistas. A viragem táctica da
Internacional Comunista a partir de Fevereiro de 1928 esteve assim em total
contradição com o curso real da história. Esta contradição deu lugar às
tendências aventureiras, ao isolamento prolongado dos partidos, ao seu
enfraquecimento organizacional, etc. A direção Internacional Comunista não
efetuou uma nova viragem senão em Fevereiro de 1930, quando esses
fenômenos tinham já um carácter nitidamente ameaçador; essa viragem estava
em recuo e à direita em relação à táctica do "terceiro período". Por ironia da
sorte, sem piedade pelos seguidismo, essa nova viragem táctica da Internacional
Comunista coincidiu no tempo com uma nova viragem na situação objetiva. A
crise internacional duma gravidade sem precedentes abre sem dúvida novas
perspectivas de radicalização das massas e de perturbações sociais. É
precisamente nessas condições que uma viragem à esquerda era possível e
necessária: era preciso impulsionar um ritmo rápido ao ascenso revolucionário.
Isso teria sido bastante correto e necessário se, durante esses três últimos anos, a
direção da Internacional Comunista tivesse aproveitado, como devia, o período
de relançamento econômico, acompanhado do refluxo do movimento
revolucionário, para reforçar as posições do partido nas organizações de massa, e
principalmente nos sindicatos. Nessas condições, o motorista teria podido e
deveria ter em 1930 passar da segunda à terceira ou, pelo menos, preparar-se a
fazê-lo no futuro próximo. De facto, assistiu-se ao processo inverso. Para não
cair no precipício, o motorista teve que reduzir para a terceira que ele tinha
passado demasiado cedo, para a segunda; se ele tivesse seguido uma linha
estratégica justa, ele teria sido obrigado a acelerar.
Tal é a contradição flagrante entre as necessidades tácticas e as perspectivas
estratégicas, na qual, consequência lógica dos erros da direção, se encontram
hoje os partidos comunistas de toda uma serie de países.
É na Alemanha que esta contradição se manifesta sob a forma mais nítida e a
mais perigosa. Com efeito, as últimas eleições aí revelaram uma relação de
forças completamente originais, que é o resultado não somente dos dois períodos
de estabilização na Alemanha desde da guerra, mas também dos três períodos de
erros da Internacional Comunista.
Capitulo II: A Vitória Parlamentar do Partido
Comunista à Luz das Tarefas Revolucionárias
Hoje a impressa oficial da Internacional Comunista apresenta os resultados
das eleições na Alemanha como uma vitória grandiosa do comunismo; esta
vitória meteria a palavra de ordem "a Alemanha dos Sovietes" na ordem do dia.
Os burocratas optimistas recusam meditar sobre o significado da relação de
forças que revelam as estatísticas eleitorais. Eles analisam o aumento de votos
comunistas independentemente das tarefas revolucionárias e dos obstáculos
nascidos da situação objetiva.
O partido comunista obteve cerca de 4.600.000 votos contra 3.300.000 em
1928. Esse aumento de votos de 1.300.000 votos é enorme se nos colocarmos do
ponto de vista da mecânica parlamentar "normal", tendo em conta o aumento
geral do número dos eleitores. Mas os ganhos do partido comunista parecem
pálidos face ao progresso fulgurante dos fascistas que passem de 800 000 votos a
6.4000.000. O facto que a social-democracia, apesar das percas importantes,
tenha guardado os seus principais quadros e recolhido mais votos operários que
o partido comunista, tem também uma grande importância na apreciação das
eleições.
Portanto, se procuramos quais são as condições interiores e internacionais
susceptíveis de cair com força a classe operária do lado do comunismo, não se
pode dar melhor exemplo que o da atual situação na Alemanha: a dificuldade do
plano Young, a crise econômica, a decadência dos dirigentes, a crise do
parlamentarismo, a maneira assustadora como a social-democracia no poder se
desmascara ela própria. O lugar do Partido comunista alemão na vida social do
país, apesar do ganho de 1.300.000 votos, continua frágil e desproporcional do
ponto de vista das condições históricas concretas.
A fraqueza das posições do comunismo está indissoluvelmente ligada à
política e ao funcionamento interno da Internacional Comunista; ela se revela de
maneira ainda mais evidente se compararmos o papel social atual do partido
comunista e suas tarefas concretas e urgentes nas condições históricas presentes.
É verdade que o próprio partido comunista não contava com um tal
crescimento. Mas isso prova que com os seus erros e derrotas repetidas, a
direção do partido comunista perdeu o hábito das perspectivas e dos objetivos
ambiciosos. Ontem, ela subestimava as suas próprias possibilidades, hoje ela
subestima novamente as dificuldades. Um perigo é assim multiplicados por
outro.
A primeira qualidade de um autêntico partido revolucionário é saber olhar a
realidade de frente.
Capitulo III: As Hesitações da Grande Burguesia
A cada desvio da estrada da história, a cada crise social, é preciso e sempre
reexaminar o problema das relações existentes entre as três classes da sociedade
atual: a grande burguesia tendo à cabeça o capital financeiro, a pequena
burguesia oscilante entre os dois principais campos, e, enfim, o proletariado.
A grande burguesia só constitui uma ínfima fracção da nação não pode
manter-se no poder sem o apoio da pequena burguesia da cidade e do campo,
quer dizer entre os últimos representantes das antigas camadas médias, e nas
masas que constituem hoje as novas camadas médias. Atualmente, esse apoio
reveste duas formas principais, politicamente antagônicas, mas historicamente
complementares: a social-democracia e o fascismo. Na pessoa da social-
democracia, a pequena burguesia, que está a reboque do capital financeiro,
arrasta atrás de si milhões de trabalhadores.
Dividida, a grande burguesia alemã hesita hoje. Os desacordos internos
centram-se sobre a escolha do tratamento a aplicar hoje à crise social. A terapia
social-democrata afasta uma parte da grande burguesia, porque os seus
resultados têm um carácter incerto e que ela arrisca-se a ocasionar enormes
despesas gerais (impostos, legislação social, salários). A intervenção cirúrgica
fascista aparece à outra parte demasiado arriscada e não justificada pela situação.
Noutros termos, a burguesia financeira no seu conjunto hesita quanto à
apreciação da situação, porque ela não encontra ainda razões suficientes para
proclamar o acontecimento do seu "terceiro período", onde a social-democracia
deve ceder imperativamente lugar ao fascismo; além disso, todos sabem que
quando chegar o momento de fazer contas, a social-democracia será compensada
pelos serviços dados pelo progrome geral. As hesitações da grande burguesia –
dado o enfraquecimento dos seus principais partidos – entre a social-democracia
e o fascismo são o sintoma mais evidente de uma situação pré-revolucionária.
Capitulo IV: A Pequena Burguesia e o Fascismo
Para que a crise social possa desembocar numa revolução proletária, é
indispensável, fora das outras condições, que as classes pequeno burguesas
caiam de forma decisiva do lado do proletariado. Isso permite ao proletariado
tomar a cabeça da nação, e de a dirigir.
As últimas eleições revelam um avanço inverso, e é aí que reside o seu valor
sintomático essencial. Sob os golpes da crise, a pequena burguesia caiu não do
lado da revolução proletária, mas do lado da reação imperialista a mais
extremista, arrastando camadas importantes do proletariado.
O crescimento gigantesco do nacional socialismo traduz dos factos essenciais:
uma crise social profunda, arrancando as massas pequeno burguesas ao seu
equilíbrio, e a ausência de um partido revolucionário que, a partir de agora
jogaria perante os olhos das massas um papel dirigente reconhecido. Se o partido
comunista é o partido da esperança revolucionária, o fascismo como movimento
de massas é o partido do desespero contra-revolucionário. Quando a esperança
revolucionária se apodera da massa inteira do proletariado, este último arrasta
sem falhar atrás de si, no caminho da revolução, camada importantes e sempre
maiores da pequena burguesia. Ora, nesse domínio, as eleições dão precisamente
uma imagem oposta: o desespero contra-revolucionário apoderou-se da massa
pequena burguesa com uma força tal que ela arrastou atrás de si camadas
importantes do proletariado.
Como explicar isso? No passado observamos (Itália, Alemanha) um brusco
reforço do fascismo, vitorioso ou pelo menos ameaçador, no seguimento de uma
crise revolucionária esgotada ou falhada, no seguimento de uma crise
revolucionária, no decurso da qual a vanguarda revolucionária tinha revelado a
sua incapacidade em tomar a cabeça da nação, para a mudar a sorte de todas as
classes, incluindo a pequena burguesia. É precisamente isso que fez a enorme
força do fascismo na Itália. Mas hoje na Alemanha não se trata da saída de uma
situação revolucionária mas da sua abordagem. Os funcionários dirigentes do
partido, optimistas por função, tiram daí a conclusão que o fascismo chegado
"demasiado tarde" é condenado a uma rápida e inevitável derrota (Die Rote
Fahne ). Essa gente não quer aprender nada. O fascismo chega "demasiado
tarde", se nos referirmos às crises revolucionárias passadas. Mas ele aparece
bastante cedo – na madrugada – para a nova crise revolucionária.
Que ele tenha tido a possibilidade de ocupar uma posição inicial tão forte na
véspera de uma crise revolucionária, e não no seu fim, não constitui o ponto
fraco do fascismo mas o ponto fraco do comunismo. A pequena burguesia, por
consequência, não necessita de novas desilusões quanto à capacidade do partido
comunista em melhorar a sua sorte; ela apoia-se na experiência do passado, ela
lembra-se das lições do ano 1923, dos saltos caprichosos do curso ultra esquerda
de Maslow-Thaelmann, a impotência oportunista do mesmo Thaelmann, a
conversa oca do "terceiro período", etc. Enfim, e é essencial, a sua desconfiança
pela revolução proletária se alimenta da desconfiança dos milhões de operários
sociais democratas que sentem em relação ao partido comunista. A pequena
burguesia, mesmo se os acontecimentos arrancaram-na completamente à
orientação conservadora, não pode se virar para o lado da revolução social a não
ser que esta última tenha a simpatia da maioria dos operários. Esta condição
muito importante falta precisamente na Alemanha, e não é por acaso.
A declaração programática do Partido comunista alemão antes das eleições foi
inteiramente e unicamente consagrada ao fascismo como inimigo principal.
Todavia, o fascismo saiu vencedor das eleições, tendo reunido não somente
milhões de elementos semi-proletários, mas também centenas de milhares de
operários da indústria. Isso mostra que, apesar da vitória parlamentar do partido
comunista, a revolução proletária sofreu globalmente nessas eleições uma grave
derrota, que não é evidentemente decisiva, mas que é preliminar, e que deve
servir de aviso e de cautela. Ela pode tornar-se decisiva, e tornar-se-á inevitável,
se o partido comunista não é capaz de apreciar a sua vitória parlamentar parcial
em ligação com esta derrota "preliminar" da revolução, e de tirar todas as
conclusões necessárias.
O fascismo tornou-se na Alemanha um perigo real; ele é a expressão do
impasse agudo do regime burguês, do papel conservador da social-democracia
face a esse regime, e da fraqueza acumulada do partido comunista, incapaz de
derrubar esse regime. Quem nega isso é um cego ou um fanfarão.
Em 1923, Bradler, apesar de todos os avisos, sobrestimou monstruosamente as
forças do fascismo. Desta falsa apreciação da relação de forças nasceu uma
política defensiva, feita de espera, de subterfúgio e de cobardia. Foi o que perdeu
a revolução. Tais acontecimentos deixam traços nas consciências de todas as
classes da nação. A sobre-estimação do fascismo pela direção comunista criou
uma das causas do reforço ulterior do fascismo. O erro inverso, quer dizer a sub-
estimação do fascismo pela direção atual do partido comunista, pode levar a
revolução a uma derrota ainda mais grave por longos anos.
A questão do ritmo de desenvolvimento que, evidentemente, não depende
unicamente de nós, confere a esse perigo uma atenção particular. Os aumentos
de febre registados pela curva das temperaturas politicas e reveladas nas
eleições, permitem pensar que o ritmo do desenvolvimento da crise nacional
pode ser muito rápida. Noutros termos, o curso dos acontecimento pode, num
futuro próximo, fazer resurgir na Alemanha, num novo momento histórico, a
velha contradição trágica entre a maturidade da situação revolucionária por um
lado, a fraqueza e a carência estratégica do partido revolucionário por outro lado.
É preciso dizer claramente, abertamente e, sobretudo, suficientemente cedo.
Capitulo V: O Partido Comunista e a Classe Operária
Seria um erro monstruoso consolar-se dizendo que o partido bolchevique que,
em Abril 1917, após a chegada de Lênin, começava a se preparar a conquistar o
poder, tinha menos de 80 000 membros e mobilizava, mesmo em Petrogrado,
apenas o terço dos operários e uma parte ainda mais fraca dos soldados. A
situação na Rússia era completamente diferente. Foi só em Março que os
partidos revolucionários tinham saído da clandestinidade, após três anos de
interrupção da vida política, mesmo abafada, que existia antes da guerra.
Durante a guerra a classe operária tinha-se renovado aproximadamente por 40%.
A esmagadora maioria do proletariado não conhecia os bolcheviques, nem
jamais tinha ouvido falar deles. O voto pelos mencheviques e os socialistas-
revolucionários, em Março e Junho, foi simplesmente a expressão dos seus
primeiros passos hesitantes após o seu despertar. Nesse voto, não havia sombra
de decepção em relação aos bolcheviques, ou de uma desconfiança acumulada,
que não pode ser senão o resultado dos erros do partido, verificados
concretamente pelas massas. Pelo contrário, cada dia da experiência
revolucionária de 1917 afastava as massas dos conciliadores e as empurrava para
o lado dos bolcheviques. Daí o crescimento tumultuoso, irresistível do partido e
sobretudo da sua influência.
Fundamentalmente, a situação na Alemanha difere nesse ponto e sobre muitos
outros. O aparecimento na cena política do Partido Comunista alemão não data
de ontem, nem de anteontem. Em 1923, a maioria da classe operária estava atrás
dele, abertamente ou não. Em 1924, num período de refluxo, ele recolhia
3.600.000 votos, quer dizer uma percentagem da classe operária superior à de
hoje. O que significa que os operários que ficaram com a social-democracia,
como os que votaram desta vez pelos nacional-socialistas, agiram assim não por
simples ignorância, não porque o despertar data de ontem, não porque eles ainda
não sabem o que é o partido comunista, mas porque eles não acreditam nele na
base da sua própria experiência destes últimos anos.
É preciso não esquecer que em Fevereiro de 1928 o IXº plenário do Comité
Executivo da Internacional Comunista deu o sinal de uma luta reforçada,
extraordinária e implacável, contra os "sociais-fascistas". A social-democracia
alemã, durante quase todo esse período, esteve no poder, e cada uma das suas
ações revelava às massas o seu papel criminoso e infame. Uma crise econômica
gigantesca coroa tudo. É difícil imaginar condições mais favoráveis ao
enfraquecimento da social-democracia. Portanto, esta última manteve no seu
conjunto as suas posições. Como explicar esse facto surpreendente? Pelo simples
facto que a direção do partido comunista ajudou pela sua política a social-
democracia, apoiando-a na sua esquerda.
Isso não significa de forma alguma que o voto de cinco a seis milhões de
operários e operárias na social-democracia exprima sua confiança completa. Não
se tome os operários sociais democratas por cegos. Eles não são tão ingênuos em
relação aos seus dirigentes, mas eles não vêm outra saída na situação atual. Nós
falamos evidentemente, dos simples operários, e não da aristocracia e da
burocracia operária. A política do partido comunista não lhes inspira confiança,
não porque o partido comunista é um partido revolucionário, mas porque eles
não acreditam que ele possa obter uma vitória revolucionária e não querem
arriscar a sua cabeça em vão. Ao votar, de coração apertado, pela social-
democracia, esses operário não lhe manifestam sua confiança; em contrapartida
eles exprimem a sua desconfiança em relação ao partido comunista.
É nisso que reside a enorme diferença entre a situação dos comunistas alemãs
e a dos bolcheviques russos em 1917.
Mas as dificuldades não se limitam a esse problema. Uma desconfiança surda
em relação à direção acumulou-se no interior do partido e sobretudo entre os
operários que o apoiam ou simplesmente votam por ele. O que aumenta o que se
chama a "desproporção" entre a influência do partido e os seus efetivos; na
Alemanha, uma tal desproporção existe se qualquer dúvida, ela é particularmente
nítida ao nível do trabalho nos sindicatos. A explicação oficial da desproporção é
a tal ponto errada que o partido não está em situação de "reforçar" ao nível
organizativo a sua influência. A massa aí é considerada como um material
puramente passivo, cuja adesão ou não-adesão ao partido depende unicamente
da capacidade do secretário a forçar a mão a cada operário. O burocrata não
compreende que os operários têm o seu próprio pensamento, a sua própria
experiência, a sua própria vontade e a sua própria política ativa ou passiva em
relação ao partido. Ao votar pelo partido, o operário vota pela sua bandeira, pela
Revolução de Outubro, pela sua revolução futura. Mas, ao recusar de aderir ao
partido comunista ou segui-lo na luta sindical, ele exprime a sua desconfiança
em relação à política diária do partido. Esta "desproporção" é no fim de contas
um dos canais por onde se exprime a desconfiança da massas em relação à
direção atual da Internacional Comunista. E esta desconfiança, criada e reforçada
pelos erros, derrotas, o simulação e os enganos cínicos das massas de 1923 a
1930, representa um dos principais obstáculos no caminho da vitória da
revolução proletária.
Sem confiança em si, o partido não ganhará a classe. Se ele não ganha o
proletariado, ele não arrancará as massas pequeno burguesas ao fascismo. Esses
dois factos estão indissoluvelmente ligados.
Capitulo VI: O Regresso ao "Segundo Período" ou em
Frente, mais uma Vez, a Caminho do "Terceiro
Período"?
Se se adota a terminologia oficial do centrismo, é necessário formular o
problema da maneira seguinte. A direção da Internacional impôs às secções a
táctica do "terceiro período", quer dizer, a táctica do levantamento
revolucionário imediato, numa época que se caracterizava essencialmente por
traços do "segundo período": estabilização da burguesia, refluxo e declínio da
revolução. A viragem que se operou em 1930 marcou a recusa da tática do
"terceiro período" e o regresso à táctica do "segundo período". Enquanto que
essa viragem fazia caminho no aparelho burocrático, sintomas muito importantes
testemunhavam claramente, pelo menos na Alemanha, a aproximação efetiva do
"terceiro período". Isso não prova a necessidade de uma nova viragem a caminho
da táctica do "terceiro período", que acabou de ser abandonada?
Nós recorremos a esses termos para tornar mais acessível o enunciado do
problema àqueles cuja consciência é estorvada pela metodologia e terminologia
da burocracia centrista. Mas em nenhum caso não fazemos nossa esta
terminologia que máscara a combinação do burocratismo stalinista com a
metafísica bukhariniana. Rejeitamos a concepção apocalíptica do "terceiro
período" como a última: o seu número até à vitória do proletariado é uma
questão de relações de forças e de mudanças na situação; todo isto não pode ser
verificado senão através da ação. Mas nós rejeitamos mesmo a essência do
esquematismo estratégico, com os seus períodos numerados. Não há táctica
abstrata, afinada antecipadamente, que seja para o "segundo" ou "terceiro"
período. Naturalmente não se pode chegar à vitória e à conquista do poder sem
levantamento armado. Mas como chegar ao levantamento?
Os métodos e o ritmo da mobilização de massas dependem não somente da
situação objetiva em geral, mas também e antes de tudo, do estado no qual se
encontra o proletariado no início da crise social no país, das relações entre o
partido e a classe, entre o proletariado e a pequena burguesia, etc. O estado do
proletariado no patamar do "terceiro período" depende por seu lado da táctica
aplicada pelo partido no período precedente.
A mudança de tática normal e natural, correspondente à viragem atual na
situação na Alemanha, teria sido uma aceleração do ritmo, uma progressão das
palavras de ordem e dos métodos de luta. Mas essa viragem táctica teria sido
normal e natural se o ritmo e as palavras de ordem da luta de ontem tivessem
correspondido às condições do período precedente. Mas isso estava fora de
questão. A contradição aguda entre a política ultra-esquerda e a estabilização da
situação é uma das causas da viragem táctica. É por isso, no momento onde a
nova viragem da situação objetiva, paralelamente ao reagrupamento geral
desfavorável das forças políticas, levou ao comunismo um aumento de votos, o
partido mostrou-se estrategicamente e taticamente mais desorientado,
embaraçado e derrotado como nunca esteve.
Para explicar a contradição na qual caiu o Partido Comunista alemão, como a
maioria das outras secções da Internacional Comunista, mas muito mais
profundamente que elas, tomemos a simples comparação. Para saltar uma
barreira, é preciso primeiro tomar balanço, correndo. Mais a barreira é alta, mais
importante é começar a correr a tempo, nem muito tarde nem demasiado cedo,
para atingir o obstáculo com a força necessária. Todavia, desde Fevereiro de
1928, e sobretudo desde Junho 1929, o Partido comunista alemão tem tomado
balanço. Nada de estranho pelo facto que o partido tenha começado a perder o
fôlego e a arrastar os pés. A Internacional Comunista deu enfim uma ordem:
"mais devagar!" Mal o partido, sem fôlego, encontrou num ritmo mais normal,
surgiu aparentemente diante dele uma barreira não imaginária, real, que riscava
exigir um salto revolucionário. A distância bastaria para tomar balanço? Seria
necessário renunciar à viragem e a substitui-la por uma contra-viragem? - tais
são as questões tácticas e estratégicas que se colocam ao partido alemão com
todo o seu acuidade.
Para que os quadros dirigentes do partido estejam em condições de encontrar
uma resposta correta a essas questões, eles devem ter possibilidade de apreciar o
caminho a seguir, em ligação com a análise da estratégia dos últimos anos e das
suas consequências, tais como elas surgiram nas eleições. Se, fazendo contrapeso
a isso, a burocracia conseguisse pelos seus gritos de vitória amordaçar a voz da
autocrítica política, o proletariado seria inevitavelmente arrastado numa
catástrofe mais medonha que a de 1923.
Capitulo VII: As Variantes Possíveis do
Desenvolvimento Ulterior
A situação revolucionária, que coloca ao proletariado o problema imediato da
conquista do poder, é composta de elementos objetivos e subjetivos, que estão
ligados entre eles e se condicionam mutuamente numa larga medida. Mas esta
interdependência é relativa. A lei do desenvolvimento desigual aplica-se também
inteiramente aos fatores da situação revolucionária. O desenvolvimento
insuficiente de um deles pode conduzir à seguinte alternativa: seja a situação
revolucionária não chega a explodir e se re-absorbe, seja, chegada à explosão,
ela se termina pela derrota da classe revolucionária. Qual é, a este sujeito, a
situação na Alemanha de hoje?
1. Nós estamos indubitavelmente em presença de uma crise nacional
profunda (economia, situação internacional ). A via normal do regime
parlamentar não oferece nenhuma saída.
2. A crise política da classe dominante e do seu sistema de governo é
absolutamente incontestável. Não é uma crise parlamentar mas a crise da
dominação da classe burguesa.
3. Todavia a classe revolucionária está ainda profundamente dividida por
contradições internas. O reforço do partido revolucionário ao detrimento do
partido reformista está no início e se produz, ainda pelo momento, a um
ritmo que está longe de corresponder à profundidade da crise.
4. Desde do início da crise, a pequena burguesia ocupou uma posição que
ameaça todo o sistema atual da dominação do capital, mas que é ao mesmo
tempo mortalmente hostil à revolução proletária.
Noutros termos, estamos em presença de condições objetivas fundamentais da
revolução proletária; uma dessas condições políticas existe (estado da classe
dirigente ); a outra condição política (estado do proletariado) apenas começa a
evoluir no sentido da revolução, mas, pelo facto da herança do passado, não
pode evoluir rapidamente; enfim, a terceira condição política (estado da pequena
burguesia ) tende não do lado da revolução proletária mas para o lado da contra-
revolução burguesa. Esta última condição evoluirá se mudanças radicais
intervêm mesmo no seio do proletariado, isto é, se a social-democracia é
liquidada politicamente. Estamos confrontados assim a uma situação
profundamente contraditória. Algumas das suas componentes metem na ordem
do dia a revolução proletária; mas outras excluem toda possibilidade de vitória
num período muito próximo, porque elas implicam uma profunda modificação
prévia da relação de forças políticas.
Certas variantes na evolução ulterior da situação atual na Alemanha essas
variantes dependem tanto das causas objetivas, cuja política dos inimigos de
classe, como da atitude do próprio partido comunista. Indicamos
esquematicamente quatro variantes possíveis do desenvolvimento.
1. O partido comunista assustado pela sua própria estratégia (o terceiro
período), avança às apalpadelas, com a maior das prudências, procurando
evitar toda ação arriscada; ele deixa escapar sem combate uma situação
revolucionária. Será, a repetição sob uma outra forma da política de
Brandler em 1921-1923. Os brandleristas e os meio brandleristas no interior
e exterior do partido empurram nesta direção, que reflete a pressão da
social-democracia.
2. Sob a influência do seu sucesso nas eleições, o partido efetua, pelo
contrário, uma viragem brutal à esquerda, lançando-se numa luta direta pelo
poder e, tornado-se o partido de uma minoria ativa, sofre uma derrota
catastrófica. O fascismo, agitação gritante e imbecil do aparelho, que não
sobe a consciência das massas, mas pelo contrários a obscurece, o desespero
e a impaciência de uma parte da classe operária, e sobretudo da juventude
no desemprego, tudo isso a empurra nesta direção.
3. É possível também que a direção, sem renunciar ao que quer que seja,
se esforce em encontrar empiricamente uma via intermédia entre as duas
primeiras variantes e realize assim uma série de erros; mas ela levará tanto
tempo a ultrapassar a desconfiança das massas proletárias e semi-proletárias
que, durante esse tempo, as condições objetivas terão tempo de evoluir num
sentido desfavorável para a revolução, cedendo lugar a um novo período de
estabilização. O partido alemão é empurrado antes de tudo nesta direção
eclética, que alia um seguidismo geral a um aventureirismo nos casos
particulares, pela direção stalinista de Moscovo que teme tomar uma posição
clara e se prepara antecipadamente um álibi, quer dizer a possibilidade de
rejeitar sobre os "executantes" a responsabilidade, à esquerda ou à direita
segundo os resultados. É uma política que conhecemos bem, que sacrifica os
interesses históricos internacionais do proletariado aos interesses de
"prestigio" da direção burocrática. Os pressupostos teóricos de uma tal
orientação foram já dados na Pravda do 16 de Setembro.
4. Terminemos pela variante a mais favorável ou mais exatamente a única
favorável: graças ao esforço dos seus melhores e mais conscientes
elementos, o partido alemão se dá conta de todas as contradições da situação
atual, de unir a maioria do proletariado e de conseguir que as massas semi-
proletárias e as camadas mais exploradas da pequena burguesia mudem de
campo. A vanguarda proletária como dirigente da nação dos trabalhadores e
oprimidos, acede à vitória. A tarefa dos bolcheviques-leninista (da Oposição
de esquerda) é ajudar o partido a orientar a sua política nesta via.
Seria completamente inútil procurar adivinhar qual destas variantes tem mais
possibilidades de se realizar num período próximo. É lutando e não entregar-se a
conjunturas que resolvemos tais questões.
Uma luta ideológica implacável contra a direção centrista da Internacional
Comunista é um elemento indispensável desse combate. Moscou já deu sinal de
uma política de prestígio burocrático, que obre os erros passados e prepara os
erros de amanhã, pelos seus gritos hipócritas sobre o novo triunfo da linha.
Em exagerando de maneira inverosimilhante a vitória do partido, ao
minimizar de maneira não menos inverossímil as dificuldades e interpretando
mesmo o sucesso dos fascistas como um fator positivo da revolução proletária, a
Pravda emite todavia uma pequena reserva. "Os sucessos do partido não lhe
dever dar voltas à cabeça." A política pérfida da direção stalinista é aqui ainda
fiel a ela própria. A análise da situação é feita no espírito da ultra-esquerda
acrítica. O que leva conscientemente o partido na via do aventureirismo. Ao
mesmo tempo, Stálin se prepara um álibi com a frase ritual sobre "a vertigem do
sucesso". É precisamente esta política de vistas curtas e sem escrúpulos que pode
perder a revolução alemã.
Capitulo VIII: Onde está a Saída?
Em cima, fizemos uma análise sem qualquer rodeio nem indulgência das
dificuldades e dos perigos que dependem inteiramente da esfera política
subjectiva; eles decorrem principalmente dos erros e dos crimes da direção dos
epígonos e, hoje, comprometem manifestamente a nova situação revolucionária
que, na nossa opinião, está em vias de se criar. Os funcionários ou ignoram a
nossa análise, ou renovam seus estoques de injúrias. Mas não se trata desses
funcionários incuráveis, mas da sorte do proletariado alemão. No partido,
incluindo o aparelho, há um bom número de gente que observa e reflete, e que o
carácter agudo da situação forçará a refletir amanhã com uma intensidade
redobrada. É a eles que nós destinamos a nossa análise e as nossas conclusões.
Toda a situação de crise contém fatores importantes de indeterminação. Os
estados de espírito, as opiniões e as forças, tanto as hostis como as aliadas, se
formam no próprio processo da crise. É impossível prevê-las antecipadamente de
maneira matemática. É preciso considerá-las na luta, pela luta, e fazer as
correções necessárias fundando-se sobre essas considerações tiradas da vida.
Pode-se considerar antecipadamente a força da resistência conservadora dos
operários sociais democratas? Não. À luz dos acontecimentos dos últimos anos
esta força aparece gigantesca. Mas no fundo do problema é que a política errada
do partido, que encontrou a sua expressão final na teoria absurda do social-
fascismo, é o que mais favoreceu a coesão da social-democracia. Para medir a
capacidade real da resistência da social-democracia, é preciso encontrar outro
instrumento de medida, quer dizer que os comunistas se deem como táctica
correta. Se esta condição é preenchida – e já é bastante – descobrir-se-á
relativamente a curto prazo, a que ponto a social-democracia é comida pelo
interior.
O que foi dito acima aplica-se igualmente ao fascismo, mas sob outra forma.
Desenvolveu-se nas condições diferentes, graças ao fermento da estratégia
zinovievo-stalinista. Qual é a sua força ofensiva? Qual é a sua estabilidade?
Atingiu o seu ponto culminante, como nos afirmam os optimistas profissionais,
ou inicia apenas os seus primeiros passos? É impossível prever mecanicamente.
Só se pode determinar através da ação. É precisamente em relação ao fascismo,
que é uma lâmina nas mãos do inimigo de classe, que uma política errada do
partido comunista pode, num curto prazo, conduzir a um resultado fatal. Aliás,
uma política justa pode – é verdade a muito mais largo prazo – minar as posições
do fascismo.
No momento das crises do regime, o partido revolucionário é muito mais forte
na luta de massas extra-parlamentar, que no quadro do parlamentarismo. Com
uma só condição, todavia: que ele compreenda corretamente a situação e que ele
seja capaz de ligar praticamente as necessidades reais das massas às tarefas da
conquista do poder. Atualmente, tudo conduz a isso.
Também seria um erro grave só ver na situação alemã atual dificuldades e
perigos. Não, a situação oferece igualmente enormes possibilidades com a
condição que ela seja analisada em profundidade e utilizada diretamente.
O que é preciso para isso?
1. Uma viragem forçada "à direita", enquanto que a situação evolui "à
esquerda", exige um exame atento, consciencioso e hábil da evolução
ulterior das outras componentes da situação. É preciso rejeitar
imediatamente a oposição abstrata entre métodos do segundo e terceiro
período. É necessário tomar a situação tal como ela é, com todas as suas
contradições e na dinâmica viva do seu desenvolvimento. É preciso adaptar-
se atentamente às mudanças reais desta situação, e agir sobre ela no sentido
do seu desenvolvimento efetivo e não por complacência pelos esquemas de
Molotov ou Kuusinen. Orientar-se na situação é a tarefa mais difícil, a mais
importante. Isso não se pode resolver por métodos burocráticos. As
estatísticas, muito importantes que sejam, são insuficientes para este
objetivo. É preciso estar diariamente à escuta do proletariado e dos
trabalhadores em geral. É preciso não somente avança palavras de ordem
vitais e mobilizadoras, mas também se preocupar da maneira como elas são
retomadas pelas massas. Só um partido que tem por toda a parte dezenas de
milhares de antenas, que recolhe seus testemunhos, que examina todos os
problemas e que elabora ativamente uma posição colectiva, pode atingir um
tal objetivo.
2. O funcionamento interno do partido está indissoluvelmente ligado a
esse problema. Pessoas indignadas por Moscovo independentemente da
confiança ou da desconfiança do partido em relação a eles, não podem levar
as massas ao assalto da sociedade capitalista. Mais o regime actual do
partido é artificial, mais profunda será a crise no dia e na hora da decisão.
De toda as "viragens", a mais urgente e a mais necessária concerne o regime
interno do partido. É uma questão de vida ou de morte.
3. A mudança de regime do partido é uma condição mas também uma
consequência da mudança de orientação. Um é indispensável sem o outro. O
partido deve sair desta atmosfera hipócrita, convencional, onde se passa sob
silêncio os ideais reais e onde se glorificam valores fictícios, numa palavra,
à atmosfera perniciosa do stalinismmo, que é o resultado não de uma
influência ideológica e política, mas de uma grosseira dependência material
do aparelho e dos métodos de comando que daí decorrem. Para arrancar o
partido à sua prisão burocrática, é indispensável verificar globalmente a
"linha geral" da direção alemã, desde 1923 e mesmo desde das jornadas de
Março de 1921. A oposição de esquerda deu, numa serie de documentos e de
trabalhos teóricos, a sua avaliação sobre todas as etapas da política oficial
funesta da Internacional Comunista. Esta crítica deve se tornar uma das
conquistas do partido. Ele não conseguirá iludi-la ou passá-la
despercebidamente. O partido não se elevará à altura das suas tarefas
grandiosas sem uma livre apreciação do seu presente à luz do seu passado.
4. Se o partido comunista, apesar das condições extraordinariamente
favoráveis, se revelou impotente em estremecer o edifício social-democrata
com a formula do "social-fascismo", em contra-partida o fascismo real
ameaça agora esse mesmo edifício não com as formulas puramente verbais
de um radicalismo fictício, mas com formulas químicas dos explosivos.
Verdadeira que seja a afirmação segundo a qual a social-democracia
preparou pela sua política o desenvolvimento do fascismo, continua a ser
verdade que o fascismo surge como uma ameaça mortal sobretudo para esta
mesma social-democracia, cujo esplendor está indissoluvelmente ligado às
formas e aos métodos do estado democrático, parlamentar e pacifista. Sem
dúvida que os dirigentes da social-democracia e uma fina camada da
aristocracia operária prefere em última instância uma vitória do fascismo do
que a ditadura revolucionária do proletariado. Mas precisamente, a
iminência dessa escolha está na origem das imensas dificuldades que
conhece a direção social-democrata face aos seus próprios operários. A
política da frente única dos operários contra o fascismo decorre de toda a
situação. Ela oferece ao partido comunista enormes possibilidades. Mas a
condição do sucesso reside no abandono da prática e da teoria do "social
fascismo" cuja nocividade torna-se perigosa nas condições atuais..A crise
social provocará inevitavelmente profundas rachas no edifício social-
democrata. A radicalização das massas tocará igualmente os operários
sociais democratas muito antes que eles deixem de ser sociais democratas. É
preciso inevitavelmente concluir com as diferentes organizações e fracções
sociais democratas acordos contra o fascismo, colocando aos dirigentes
condições precisas diante das massas. Só os oportunistas amedrontados,
aliados de Tchang-Kai-Chek e Wan-Jing-Wei, pode se ligar previamente
contra os acordos por uma obrigação formal. É preciso abandonar as
declarações ocas dos funcionários contra a frente única, para regressar à
política única tal que ela foi formulada por Lênin e sempre aplicada pelos
bolcheviques, e particularmente em 1917.
5. O problema do desemprego é um dos elementos mais importantes da
crise política atual. A luta contra o capitalismo e pela jornada de trabalho de
7 horas continua sempre na ordem do dia. Mas só a palavra de ordem de
cooperação larga e sistemática com a URSS pode levar esta luta à altura das
tarefas revolucionárias. Na sua declaração programática para as eleições, o
Comité central do partido alemão declara que depois da sua chegada ao
poder os comunistas acertam uma cooperação com a URSS. Isso não faz
dúvida. Mas não se oponha a perspectiva histórica às tarefas políticas
políticas da hora. É desde hoje que é preciso mobilizar os operários e, em
primeiro lugar, os desempregados, sob a palavra de grande cooperação
econômica com a República dos Sovietes. O Gosplan da URSS deve
elaborar com a participação dos comunistas e dos especialistas alemãs, um
plano de cooperação econômica que, partindo do desemprego se desenvolve
uma cooperation geral, englobando os principais ramos da economia. O
problema não é de prometer uma reorganização da economia após a tomada
do poder, mas chegar ao poder. O problema não é de prometer a cooperação
entre a Alemanha soviética mas de ganhar hoje as massas para esta
cooperação ligando-a estreitamente à crise e ao desemprego desenvolvendo
um plano gigantesco de reorganização social dos dois países.
6. A crise política na Alemanha mete em questão o regime que o tratado
de Versailles instaurou na Europa. O Comité central do Partido comunista
alemão diz que uma vez no poder, o proletariado alemão liquidará os
documentos de Versailles. E é tudo? A abolição do tratado de Versailles seria
assim a mais alta conquista da revolução proletária! Ele seria substituído por
quê? Esta maneira negativa de colocar o problema aproxima o partido dos
nacionais-socialistas. Estado-unidos soviéticos da Europa, eis a única
palavra de ordem correta trazendo a solução à fragmentação da Europa, que
ameaça não somente a Alemanha mas também toda Europa da decadência
econômica e cultural total.
A palavra de ordem de unificação proletária da Europa ao mesmo tempo uma
arma muito importante na luta contra o chauvinismo abjecto dos fascistas, contra
a sua cruzada contra a França. A política mais perigosa e a mais incorreta é
aquela que consiste a adaptar-se passivamente ao inimigo, a se fazer passar por
ele. Às palavras de ordem de desespero nacional e de loucura nacional, é preciso
opor as palavras de ordem que propõem uma solução internacional. Mas para
isso, é indispensável limpar o partido do veneno do nacional-socialismo cujo
elemento essencial é a teoria do socialismo num só país.
Para condensar tudo o que foi dito acima numa formula simples, coloquemos
a questão da maneira seguinte: a táctica do Partido comunista alemão deve, no
imediato período, ser colocada sob o sinal da ofensiva ou da defensiva? A isso
nós respondemos: defensiva.
Se a confrontação tivesse lugar hoje, consequência da ofensiva do partido
comunista, a vanguarda proletária fracassava-se contra o bloco constituído pelo
Estado e o fascismo, a maioria da classe operária se colocando numa
neutralidade temerosa e perplexa, a pequena burguesia, quanto a ela apoiando na
sua maioria diretamente o fascismo.
Uma posição defensiva implica uma política de aproximação com a maioria
da classe operária alemã e a frente única com os operários sociais democratas e
sem partido contra o perigo fascista.
Negar esse perigo, minimizá-lo, tratá-lo com ligeireza é o maior crime que se
possa cometer hoje contra a revolução proletária na Alemanha.
O que vai "defender" o partido comunista? A constituição de Weimar? Não,
nós deixamos esse cuidado a Brandler. O partido comunista deve apelar para a
defesa das posições materiais e intelectuais que a classe operária já conquistou
no Estado alemão. É a sorte dessas organizações políticas e sindicais, dos seus
jornais e das suas tipografias, dos seus clubs e das suas bibliotecas, que está em
jogo. O operário comunista deve dizer ao operário social-democrata: "A política
dos nossos partido é inconciliável; mas se os fascistas vêm esta noite destruir o
local da tua organização, virei ajudar-te, de armas na mão. Prometes que em caso
onde esse mesmo perigo ameace a minha organização virás em meu socorro?"
Tal é a quintessencia da política do período atual. Toda agitação deve ser levada
neste espírito.
Mais nós desenvolvemos esta agitação com perseverança, com seriedade, com
reflexão, sem gritaria ou fanfarronice com a qual os operários se cansaram, mais
as medidas organizacionais defensivas que nós proporemos em cada fábrica, em
cada bairro popular, serão pertinentes, menor será o perigo que o ataque dos
fascistas nos apanhem de surpresa, maior será a segurança que este ataque nos
unirá e não dividirá as fileiras operárias.
Com efeito, os fascistas, do facto do seu sucesso vertiginoso, do facto do
carácter pequeno burguês, impaciente e indisciplinado do seu exército, terão
tendência a passar ao ataque num período próximo. Procurar a concorrenciá-los
atualmente nesta via seria uma medida ao somente desesperada mas também
mortalmente perigosa. Mais os fascistas aparecerão aos olhos dos operários
sociais democratas e ao conjunto das massas trabalhadoras como o campo que
ataca, maiores serão as oportunidades não somente de esmagar a ofensiva dos
fascistas, mas também de passar à contra-ofensiva vitoriosa. A defesa deve ser
vigilante, ativa e corajosa. O estado-maior deverá considerar todo o campo de
batalha e ter conta de todas as mudanças para não deixar passar uma nova
reviravolta da situação quando se tratar de dar o sinal do assalto geral.
Há estrategas que se pronunciam sempre e não importa quais circunstâncias
pela defensiva. Os brandlerianos, por exemplo, são desses. Admirar-se de que
ainda hoje eles falarão da defensiva, seria completamente pueril. Os
brandlerianos são um dos porta-vozes da social-democracia. Nós devemos em
contra-partida nos aproximar dos operários sociais democrata no terreno da
defensiva para os mobilizar a seguir numa ofensiva decisiva. Os brandlerianos
são completamente incapazes disso. Quando a relação de forças se modificará de
maneira radical em favor da revolução proletária, os brandlerianos aparecerão
novamente como um peso morto e como um travão da revolução. É a razão pela
que uma política defensiva visando a aproximação com as massas sociais
democratas não deve em qualquer caso implicar um enfraquecimento das
contradições com o estado-maior brandleriano, por detrás do qual não há nem
haverá nunca as massas.
No quadro do reagrupamento de forças, caracterizado acima, e as tarefas da
vanguarda proletária, os métodos de repressão física aplicada pela burocracia
stalinista na Alemanha e noutros países contra os bolcheviques-leninistas,
tomam um significado particular. É um serviço direto dado à polícia social-
democrata e às tropas de choque do fascismo. Em contradição total com as
tradições do movimento revolucionário proletário, esses métodos respondem
perfeitamente à mentalidade dos burocratas pequeno burgueses, que têm o
salário garantido do alto e que temem perdê-lo com a irrupção da democracia no
interior do partido. As infâmias dos stalinistas devem ser alvo de um largo
trabalho de explicação, o mais concreto possível, visando desmascarar o papel
dos funcionários os mais indignos do aparelho do partido. A experiência da
URSS e de outros países prova que os que lutam com a maior frenesim contra a
oposição de esquerda, são os tristes fulanos que necessitam absolutamente de
dissimular à direção os seus erros e seus crimes : delapidação dos fundos
comuns, abusos de função, ou simplesmente incapacidade total. É
completamente claro que a denunciação dos atos brutais do aparelho stalinista
contra os bolcheviques-leninistas será tanto mais coroado de sucesso que nós
desenvolveremos mais largamente a nossa agitação geral sobre a base das tarefas
expostas acima.
Se examinamos o problema da viragem táctica da Internacional Comunista
unicamente à luz da situação alemã é porque a crise alemã coloca o Partido
comunista alemão mais uma vez no centro da atenção da vanguarda proletária
mundial, e porque à luz desta crise todos os problemas aparecem com um grande
destaque. Não seria difícil mostrar que o que é dito aqui se aplica, mais ou
menos, também aos outros países.
Em França, todas as formas tomadas pela luta de classes desde da guerra têm
um carácter infinitamente menos agudo e decisivo que na Alemanha. Mas as
tendências gerais do desenvolvimento são as mesmas, sem falar, evidentemente,
da dependência direta que liga a sorte da França à da Alemanha. As viragens da
Internacional Comunista têm em qualquer caso um carácter universal. O Partido
comunista francês, proclamado por Molotov desde 1928 primeiro candidato ao
poder, levou estes dois últimos anos uma política completamente suicidária. Ele
não conheceu em particular o desenvolvimento econômico. Uma viragem táctica
foi anunciada em França no momento onde a recuperação econômica cedia lugar
a uma crise. Assim as mesmas contradições, as mesmas dificuldades e as
mesmas tarefas, das quais falamos a propósito da Alemanha, estão também na
ordem do dia em França.
A viragem da Internacional Comunista, em ligação com a viragem da
situação, coloca a Oposição comunista de esquerda diante de tarefas novas e
extremamente importantes. Suas forças são reduzidas. Mas cada corrente se
desenvolve paralelamente às suas tarefas. Compreendê-las claramente, é possuir
um dos trunfos mais importantes da vitória.
Apêndice

O Perigo Fascista Paira Sobre a Alemanha


A imprensa oficial do Comintern interpreta agora os resultados das eleições da
Alemanha [Setembro de 1930] como uma prodigiosa vitória do comunismo, que
situaria na ordem do dia a palavra-de-ordem da "Alemanha soviética". Os
burocratas optimistas recusam refletir sobre o significado da relação de forças
revelada polas estatísticas eleitorais. Examinam o incremento de votos
comunistas independentemente das tarefas revolucionárias criadas pola situação
e os obstáculos estabelecidos. O partido comunista recebeu por volta de
4.600.000 votos, face aos 3.300.000 em 1928. Do ponto de vista dos
mecanismos "normais" do parlamentarismo, o ganho de 1.300.000 votos é
considerável, mesmo levando em conta o aumento no número total de votantes.
Mas o ganho do partido fica ensombrado completamente se comparado com o
progresso do fascismo, que passa de 800.000 a 6.400.000 votos. De num menor
importância para a avaliação das eleição é o facto de a social democracia, apesar
das perdas substanciais, reter os seus quadros principais e ainda receber um
maior número de votos operários [8.600.000] do que o Partido Comunista.
No entanto, se nos perguntarmos que combinação de circunstâncias internas e
externas poderiam fazer virar a classe operária do lado do comunismo com
maior velocidade, num acharíamos um exemplo de melhores circunstâncias para
um giro tal do que a atual situação na Alemanha: A soga do Young12, a crise
econômica, a decadência dos dirigentes, a crise do parlamentarismo, o incrível
auto-desmascaramento da social democracia no poder. Do ponto de vista destas
circunstâncias históricas concretas, a influência do Partido Comunista na vida
social do país, apesar do ganho de 1.300.000 votos, devém proporcionalmente
pequena.
A fraqueza da posição do comunismo, totalmente ligada à política e
funcionamento interno do Comintern, revela-se mais claramente se
compararmos o peso social atual do Partido Comunista com estas concretas e
inadiáveis tarefas que as atuais circunstâncias históricas colocaram na sua frente.
É certo que o Partido Comunista num contava com ganho semelhante de
votos. Mas isso prova que ante a desfeita dos seus erros e defeitos, a direção do
Partido Comunista deixou de ter grandes objetivos e perspectivas. Se ontem
subestimava as suas possibilidades, hoje ainda subestima mais as dificuldades.
Por esta via, um perigo vê-se multiplicado polo outro.
Para além do mais, a primeira qualidade de um autêntico partido
revolucionário é a de ser capaz de olhar a realidade cara a cara.
Para que a crise social poda ser conduzida para a revolução proletária, cumpre
que, ao lado de outras condições, se dê um decisivo movimento das classes
pequeno burguesas na direção do proletariado. Isto daria ao proletariado a
ocasião de pôr-se à frente da nação e liderá-la. As últimas eleições revelam – e
isto é o seu principal valor sintomático – uma tendência no sentido contrário.
Sob a desfeita da crise, a pequena burguesia tem-se decantado num polo
revolução proletária, mas pola mais radical reação imperialista, empurrando
nessa direção um considerável sector do próprio proletariado.
O crescimento gigantesco do nacional socialismo é expressão de dous fatores:
uma profunda crise social, que desestabiliza o equilíbrio das massas pequeno
burguesas, e a carência de um partido revolucionário que apareça ante as massas
populares como reconhecido dirigente revolucionário. Se o Partido Comunista é
o partido da esperança revolucionária, o fascismo é, como movimento de
massas, o partido da desesperança contra-revolucionária. Quando a esperança
revolucionária abraça as massas proletárias ao completo, isso empurra
inevitavelmente no caminho da revolução consideráveis e crescentes camadas
pequeno-burguesas. Precisamente nesse plano, as eleições oferecem a imagem
oposta: a desesperança contra-revolucionária abraça as massas pequeno
burguesas com tanta força que que empurra importantes sectores do
proletariado...
O fascismo na Alemanha tem-se convertido num perigo real, como uma aguda
expressão da posição de indefenso em que se acha o regime burguês, o papel
conservador da social democracia nesse regime, e a impotência acumulada polo
Partido Comunista para derrubá-lo. Quem negar isto, é cego ou um fanfarrão.
O perigo atinge particular gravidade ligado com a questão do ritmo de
desenvolvimento, que no depende apenas de nós. O estado febril detectado na
curva política com motivo das eleições mostra que o ritmo de desenvolvimento
da crise nacional pode decorrer com rapidez. Por outras palavras, o curso dos
acontecimentos num muito próximo futuro pode fazer ressurgir na Alemanha,
num novo plano histórico, a velha trágica contradição entre a madureza de uma
situação revolucionária, de uma parte, e a fraqueza e impotência estratégica do
partido revolucionário, de outra. Isto deve ser dito com clareza, abertamente e,
sobretudo, a tempo.
Pode ser calculada com antecedência a força da resistência conservadora dos
trabalhadores social-democratas? No tal. À luz dos acontecimentos do passado
ano, essa força semelha ser gigantesca. Mas na verdade o que mais ajudou à
coesão da social democracia foi a política errada do partido Comunista, que
achou a sua mais alta expressão na absurda teoria do social fascismo. Para
medirmos a resistência real da social democracia, cumpre um diferente
instrumento de medida, quer dizer, uma correta táctica comunista. E essa
condição – e no é condição pequena – o grau de unidade interna real da social
democracia pode revelar-se em pouco tempo.
Embora de modo diferente, o que foi dito anteriormente também tem a sua
aplicação no fascismo: Desenvolveu-se, de uma parte, a partir da instabilidade
das condições criadas pola estratégia Zinoviv-Stálin13. Qual é a sua força
ofensiva? Qual a sua estabilidade? Tem atingido o seu ponto álgido, como nos
asseguram os optimistas profissionais [Comintern e partidos comunistas
oficiais], Ou está apenas no primeiro degrau da escada? Isto não pode ser predito
mecanicamente. Pode determinar-se só através da ação. Precisamente em função
do fascismo, que vem sendo uma lâmina de barbear em mãos do inimigo de
classe, a errada política do Comintern pode produzir resultados fatais em pouco
tempo. De outra parte, uma correta política – não em tá breve período de tempo,
é certo – pode socavar as posições do fascismo.
Se o Partido Comunista, apesar das circunstâncias excepcionalmente
favoráveis, provou a sua impotência para abalar seriamente a estrutura da social
democracia com ajuda da sua fórmula do "social fascismo", o fascismo real, polo
contrário, ameaça agora essa estrutura, não já com fórmulas verbais de um falso
radicalismo, mas com as fórmulas químicas dos explosivos. Por mais que seja
certo que a social democracia preparou com a sua política o florescimento do
fascismo, não é menos certo que o fascismo supõe uma ameaça mortal
primeiramente para a própria social democracia, cuja força está
indissoluvelmente ligada com formas e métodos democrático-parlamentares e
pacifistas de governo...
A política de frente unida de trabalhadores contra o fascismo nasce desta
situação. Abre grandes possibilidades para o Partido Comunista. Uma condição
para o êxito, porém, é o rechaço da teoria e prática do "social fascismo", cujo
dano pode ser quantificado sob as presentes circunstâncias.
A crise social produzirá inevitavelmente uma profunda cissão no seio da
social democracia. A radicalização das massas afetará aos social-democratas.
Nós teremos que chegar a acordos, inevitavelmente, com diversas organizações e
facções social-democratas contra o fascismo, colocando condições precisas aos
seus líderes, à vista das massas... Devemos abandonar declarações vacuás sobre
a frente unida e voltar à política de frente única consoante com a formulação de
Lênin e a sua aplicação constante por parte dos bolcheviques em 1917.
A Vitória de Hitler Significaria a Guerra Contra a
URSS
Atualmente a política mundial apresenta dois pontos quentes, afastados um do
outro de maneira que não é habitual: um sobre a linha Mokden-Pequim, a outra
na linha Berlim-Munique. Cada um desses focos de infecção está em condições
de perturbar o curso "normal" dos acontecimentos por anos ou mesmo dezenas
de anos. Todavia, os diplomatas e os políticos oficiais continuam a se ocupar das
suas tarefas diárias, como se nada de particular se passava. Eles já se tinham
conduzido exatamente da mesma maneira em 1912, durante a guerra dos Balcãs,
que foi o preludio à guerra de 1914.
Chama-se justamente a isso a "política da avestruz", o que é muito injurioso
para esse animal inteligente. A bela resolução da Sociedade das Nações sobre a
questão da Manchúria é um documento exemplar, mesmo se se julga no quadro
da história da diplomacia europeia. Nenhuma avestruz que se respeita não teria
colocado a sua assinatura. Todavia, pode-se considerar como uma circunstância
atenuante a esta cegueira (em muitos casos, trata-se antes de mais da vontade de
não ver nada) face ao que se prepara no Extremo Oriente, o facto que os
acontecimentos aí se desenrolam a um ritmo relativamente lento. O Oriente,
ainda que acorde para a vida moderna, está ainda longe do ritmo "americano" ou
mesmo europeu.
A Alemanha, em contra-partida, não é um simples caso. A Europa balcanizada
em Versailles está num impasse: o nacional-socialismo é para a Alemanha a
expressão política concentrada. Em termos de psicologia social, essa corrente
pode ser descrita como uma histeria contagiosa, nascida do desespero das
camadas médias. Penso aqui nos pequenos comerciantes, artesãos e camponeses
arruinados, a uma parte do proletariado no desemprego, aos funcionários e aos
antigos oficiais da Grande Guerra que trazem sempre com eles as suas
decorações, mas que não ganham mais o salário, aos empregados de escritórios
que fechara, aos contabilistas dos bancos falidos, aos engenheiros sem emprego,
aos jornalistas sem salários e sem perspectivas, aos médicos cujos clientes
continuam doentes mas não sabem como lhes pagar.
Hitler recusou responder às questões sobre o seu programa de política interior,
como se tratasse de segredos militares. Ele não tem intenção, declara, de
entregar aos seus adversários políticos o segredo do seu tratamento milagre. Não
é muito patriótico mas é hábil. De facto, Hitler não tem nenhum segredo. Mas
não temos intenção de nos ocupar da sua política interior. No domínio da política
exterior, a sua posição parece, à primeira vista, um pouco mais clara. Nos seus
artigo e seus discursos, Hitler declara a guerra ao tratado de Versailles, onde ele
próprio é um produto. As injúrias agressivas contra a França são a sua
especialidade. Mas na verdade, se ele chegasse ao poder, Hitler tornar-se-ia um
dos principais apoios do tratado de Versailles e o cúmplice do imperialismo
francês.
Essas afirmações podem parecer paradoxais, mas eles decorrem sem
contradizer da lógica da situação europeia e internacional, tanto que se analise
corretamente, isto é se se parte das forças políticas fundamentais e não de
discurso vazios, de gestos e de outros faturas demagógicos. Hitler terá
necessidade de aliados.
Os fascistas alemãs declaram que o marxismo e o tratado de Versailles são os
seus dois inimigos. Por "marxismo", eles compreendem os dois partidos alemãs
– a social-democracia e os comunistas - e um Estado – a União soviética. Por
"Versailles" eles compreendem a França e a Polônia. Para compreender que
papel internacional jogaria a Alemanha nacional-socialista, é preciso estudar
esses momentos nas suas interações.
A experiência italiana esclareceu as relações entre o fascismo e o marxismo.
Até à marcha de opereta em Roma, o programa de Mussolini não era menos
radical e místico que o de Hitler. Na prática, ele se transforma rapidamente num
programa de luta contra as forças da oposição e as forças revolucionárias. A
imagem do seu modelo italiano, o nacional-socialismo não pode se apoderar do
poder senão depois de ter quebrado as organizações operárias. Certamente, não é
simples. Os nacionais-socialistas encontra a guerra civil entre eles e esse poder
que eles desejam tão ardentemente. Mesmo se Hitler obtivesse uma maioria
parlamentar por meios pacíficos – o que pode sem qualquer problema ser riscado
da lista das possibilidades – ele não escaparia por isso à necessidade de torcer o
pescoço ao Partido comunista, à social-democracia e aos sindicatos, pra poder
instaurar a dominação do fascismo. Trata-se aí duma intervenção cirúrgica
demorada e difícil. O próprio Hitler sabe muito bem. É por esta razão que ele
não encara de forma alguma ligar os seus planos políticos à sorte incerta do
parlamentarismo.
Quando Hitler afirma com todas as suas forças a sua vontade de agir na
legalidade, ele espera de facto o momento favorável para bater com rapidez e
precisão. Conseguirá? Não é uma tarefa fácil, mas isso seria dar prova de uma
ligeireza imperdoável considerar um sucesso de Hitler como excluído. Qualquer
que seja a via pela qual Hitler chega ao poder, pela grande porta ou por
arrombamento, a fascisação da Alemanha desencadearia um grave conflito
político interior. Isso paralisaria inevitavelmente as forças do país por um longo
período e Hitler ver-se-ia obrigado em procurar nos países vizinhos não uma
vingança, mas aliados e protetores. É desta ideia fundamental que deve partir a
análise.
Na sua luta contra o fascismo, os operários alemãs procurarão e encontrarão
naturalmente o apoio da União Soviética. Pode-se, nestas condições, imaginar
um só momento que o governo de Hitler se riscaria a um conflito armado com a
França ou a Polônia? Entre o proletariado de uma Alemanha fascista e a União
Soviética há Pilsudsky. A ajuda ou pelo menos a supressão do corredor polaco.
Esta questão – a questão das fronteiras alemãs no seu conjunto – aparecerá a
Hitler como desnudada de qualquer importância, desde que ele terá que lutar
duramente para conquistar e conservar o poder.
Pilsudsky poderia servir de ponte a Hitler para obter a amizade da França, se
não existisse já outras pontes, menos afastadas. Na imprensa francesa, mesmo se
pelo momento unicamente nos jornais de segunda ordem, vozes ergueram-se
para afirmar que era tempo de se voltar para Hitler. A imprensa oficial, o Temps
o primeiro, adota naturalmente uma atitude hostil em relação ao nacional-
socialismo, não porque os mestres do destino da França de hoje tomem a sério os
gestes belicosos de Hitler, mas porque eles temem a única pela qual Hitler pode
chegar ao poder: a via da guerra civil cujo resultado é imprevisível. A sua
política de golpe de Estado à direita não se arrisca em desencadear uma
revolução à esquerda? É o que inquieta as esferas dirigentes na França, de resto
com razão.
Uma coisa pelo menos está segura: se Hitler ultrapassasse todos os obstáculos
e chegasse ao poder, ele deveria começar, por ter as mãos livres no seu próprio
país, por um ato de lealdade ao tratado de Versailles. Ninguém no Quai d' Orsay
tem dúvidas. Ainda mais, sabe-se aí perfeitamente que a ditadura militar de
Hitler, uma vez instaurada de maneira duradoura na Alemanha, seria um fator
infinitamente mais estável para a preponderância francesa na Alemanha, que a
forma atual de governo na Alemanha, cuja fórmula matemática não compreende
senão as desconhecidas. A guerra será inevitável.
Seria completamente pueril imaginar que os círculos dirigentes em França
"seriam tímidos" em saber como os protetores de uma Alemanha fascista. A
França protege a Polônia, a Romênia e a Jugoslávia, três países dominados por
ditaduras militares. Não é um acaso. A preponderância atual da França na
Europa explica-se pelo facto que a França tornou-se a única herdeira da vitória
alcançada em comum com os Estados-Unidos e a Grande-Bretanha (não
menciono a Rússia, porque ela não tomou parte na vitória, ainda que seja ela que
tenha sofrido as maiores percas em homens ). A França recebeu das mãos da
mais forte coligação de potências mundiais que a história conheceu, uma herança
que ela não quer deixar escapar, mesmo se ela é demasiado pesada para os seus
ombros fracos. O território da França, pela sua população, suas forças
produtivas, seu rendimento nacional, tudo isso não é visivelmente em relação
com a manutenção da sua preponderância. A balcanização da Europa, a
agudização das contradições, a luta contra o desarmamento, o apoio às ditaduras
militares, tais são os métodos necessários para a manutenção da preponderância
francesa.
No sistema de preponderância francesa, a grande divisão do povo alemão
constitui um elo tão necessário que as fantásticas fronteiras da Polônia com o seu
celebro "corredor". Na linguagem do tratado de Versailles, a palavra "corredor"
designa o que alguns definiriam como a ablação de uma costela dum corpo vivo.
Se a França, ao apoiar o Japão na Manchúria, jura por todos os santos que ela
quer a paz, isso significa simplesmente que ela procura garantir o carácter
intangível da sua própria preponderância, a saber o direito a retalhar a Europa
em pedaços e levá-la ao caos. A história prova que os conquistadores insaciáveis
tem sempre tendência ao "pacifismo", porque eles temem a vingança dos
vencidos.
Um regime fascista que não poderia instalar-se senão ao meio de convulsões
sangrentas e pelo preço de um novo enfraquecimento da Alemanha, seria, em
contrapartida, um fator não apreciável da preponderância francesa. A Franca e o
seu sistema versalhense nada têm a temer dos nacionais-socialistas.
"Hitler no poder" significaria portanto a "paz"? Não, "Hitler no
poder"significaria um novo reforço da preponderância francesa. "Hitler no
poder" significaria a guerra, não contra a França, não contra a Polônia, mas
contra a União Soviética.
Nestes últimos anos, a imprensa moscovita tem, várias vezes, falado do perigo
duma invasão militar da União Soviética. O autor destas linhas fez várias vezes
objecções a essas profecias superficiais, não porque ele acreditaria que na
Europa ou no resto do mundo, a vontade de guerra contra a União soviética
faltasse. Ela não falta! Mas para uma empresa tão arriscada, havia grandes
divergências e reticências, não somente entre os diferentes países europeus, mas
ainda mais no seio de cada país. Nenhum político, provavelmente, não acredita
que se possa destruir a União soviética por meio de exércitos reunidos na
fronteira ou com simples operações de desembarque aéreo. O próprio Winston
Churchill não acredita nisso, apesar das suas ruidosas vocalizações políticas.
Uma tal tentativa teve lugar nos anos 1918-1920, quando Churchill, como ele se
vangloriza, mobilizava "catorze nações" contra a União soviética. O ministro das
Finanças britânico não conheceria mais a sua felicidade, se ele pudesse recuperar
as centenas de milhões de libras utilizadas outrora para a intervenção. Mas nada
serve lamentar-se sobre o leite derramado. Além disso, esse dinheiro foi o preço
de uma boa lição. Nessa época, nos primeiros anos da República dos Sovietes,
quando o Exército Vermelho marchava com sapatos de criança calçados – ela
não tinha geralmente nada para meter nos pés – os exércitos das "catorze nações"
não puderam vencer: compreende-se que a esperança de vitória seja bem fraca
no momento onde o Exército vermelho representa uma força poderosa, com um
passado rico de vitórias, com jovens oficiais mas experientes, com arsenais
suficientes e com os recursos inesgotáveis, saídos da Revolução!
Mesmo se elas fossem arrastadas para uma tal aventura, as forças conjuntas
dos povos vizinhos seriam demasiado fracas para uma intervenção na União
soviética. O Japão está demasiado longe para poder jogar um papel militar
independente contra a União soviética: aliás, o Mikado está suficientemente
ocupado com os sarilhos no seu próprio país. Para que uma intervenção seja
possível é preciso um grande país, altamente industrializado e além disso
continental, que queira e possa assumir o encargo principal de uma cruzada
contra a União soviética. Mais precisamente, necessita-se de um país que na
tenha nada a perder. Um olhar sobre o mapa político da Europa mostra que sá
uma Alemanha fascista poderia se encarregar dessa tarefa. Ainda mais, uma
Alemanha fascista não teria outra escolha. O fascismo, depois de ter acedido ao
poder pelo preço de inumeráveis vítimas, após ter falhado em todas as questões
de política interior, após ter capitulado diante da França e, em consequência,
diante dos Estados meio vassalos como a Polônia, não teria outra solução senão
procurar uma saída temerária à sua própria falência e com as contradições da
situação internacional. A guerra contra a União soviética seria, nessas condições,
uma necessidade absoluta.
A esta sombria previsão, poderia-se responder dando o exemplo da Itália, com
quem a União soviética chegou a um modus vivendi. Mas esta objecção é
superficial. A Itália está separada da União soviética por toda uma serie de
países. O fascismo italiano subiu com o fermento de uma crise puramente
italiana, do facto que as pretensões nacionais da Itália tinham sido, em grosso,
satisfeitas em Versalhes. Ele chega ao poder pouco tempo após a primeira grande
guerra mundial, a um momento onde não poderia estar em questão uma nova
guerra. Finalmente, a Itália continuou só e ninguém na Europa não sabia quanto
tempo duraria o regime fascista por um lado, o regime soviéticos por outro.
Sobre todos esses pontos, a posição da Alemanha de Hitler é perigosamente
diferente. Ela necessita dum sucesso político exterior. A União soviética seria
um vizinho insuportável. É preciso que nos lembremos quanto tempo Pilsudsky
hesitou antes de assinar um pacto de não-agressão com a Rússia. Hitler, lado a
lado com Pilsudsky, já respondeu à nossa questão. Por outro lado, a França sabe
bem que ela não está em estado de manter a Alemanha desarmada por muito
tempo. A política francesa consistirá portanto em orientar o fascismo alemão
para o Leste. Isso abriria uma válvula de segurança e ofereceria – quem sabe? -
uma oportunidade de chegar a uma nova solução do mais sagrado dos problemas
mundiais, o problema das reparações.
A Rússia deve estar pronta.
Se se toma por adquirida a afirmação dos profetas fascistas, segundo a qual
eles chegariam ao poder na primeira metade de 1932 – mesmo se estamos longe
de acreditar na palavra dessa gente – é possível esboçar antecipadamente uma
especie de calendário político. A fascisação da Alemanha tomará alguns anos: o
esmagamento da classe operária alemã, criação de uma milicia fascista e o
restabelecimento do exército. Cerca de 1933-1934 é que as condições prévias a
uma intervenção militar na União soviética seriam criadas.
Esse calendário parte naturalmente da hipótese que, durante esse tempo, o
governo da União soviética espere pacientemente. As minhas relações com o
governo atual são de tal natureza, que não tenho o direito de falar em seu nome,
nem indicar as suas intenções, que não posso julgar, como qualquer leitor da
imprensa ou homem político, que sobre a base de todas as notícias disponíveis.
Posso mais livremente explicar qual deveria ser, na minha opinião, a atitude do
governo soviético em caso de golpe de Estado fascista na Alemanha.
No seu lugar, desde que eu receba a notícia telegrafada deste acontecimento,
darei ordem para uma mobilização parcial. Quando nos encontramos frente a
frente a um inimigo mortal e que a guerra decorre necessariamente da lógica da
situação objetiva, seria dar prova de uma ligeireza imperdoável deixar a este
adversário o tempo de se instalar solidamente, de se reforçar, de concluir
alianças, de se assegurar da ajuda necessária, de acertar um plano geral de
agressão militar – não somente para o Oeste, mas igualmente para o Este – de
deixar crescer assim um perigo considerável.
As tropas de assalto de Hitler já fazem ouvir em toda a Alemanha um canto de
guerra contra os Sovietes, que é obra de um certo Dr. Hans Büchner. Não seria
razoável deixar os fascistas gritar esse canto de guerra. Se eles devem cantá-lo,
que seja, pelo menos, staccato.
Pouco importa saber quem, dos dois adversários, tomará a iniciativa: uma
guerra contra o Estado hitleriano e a União soviética seria inevitável, e isso a
breve prazo. As consequências desta guerra seriam incalculáveis. Quaisquer que
seja as ilusões que se alimente em Paris, uma coisa é certa: o tratado de
Versalhes partirá em fumo, nas chamas da guerra entre os bolcheviques e os
fascistas.
Tarefas e Perigos da Revolução na Índia
A Índia é o país colonial clássico e a Grã-Bretanha é a metrópole clássica.
Toda a perversidade das classes dominantes e todas as formas de opressão que o
capitalismo tem usado contra os povos atrasados do Oriente encontra sua síntese
mais completa e atroz na história da gigantesca colônia a que os imperialistas
britânicos prenderam como sanguessugas há um século e meio. A burguesia
inglesa se esforçou para cultivar todos os vestígios da barbárie e todas as
instituições medievais que servem a exploração do homem pelo homem.
Obrigou seus agentes feudais a adaptarem-se a exploração colonial capitalista e
fez deste vínculo, o seu corpo, a sua correia de transmissão para as massas.
Os imperialistas britânicos gabam-se de suas ferrovias, canais e empresas
industriais na Índia, que tiveram investimento de cerca de quatro bilhões de
dólares em ouro. Entre muita fanfarra, os exegetas do imperialismo compararam
a Índia contemporânea com a Índia antes da ocupação colonial. Mas quem pode
duvidar por um momento que uma nação privilegiada de 320 milhões de
habitantes, se desenvolveria de forma infinitamente mais rápida e mais próspera
se fosse sacudido o jugo da pilhagem sistemática e organizada? Basta mencionar
os quatro bilhões de dólares que representam o investimento britânico na Índia,
para imaginar o que a Grã-Bretanha retira deste país em cinco ou seis anos.
Apesar de não dar a Índia, mais doses de tecnologia e cultura para facilitar a
exploração das riquezas do país, o Shylock do Tâmisa não poderia evitar a
propagação, crescente, das ideias de independência econômica e nacional entre
as massas.
Como ocorre nas nações burguesas mais velhas, as numerosas nacionalidades
da Índia só podem ser fundidas em uma única nação através da revolução que as
unifique cada vez mais estreitamente. Mas, ao contrário dos países mais velhos,
esta revolução na Índia é uma revolução colonial dirigida contra a opressão
estrangeira. É, também, a revolução de uma nação historicamente atrasada em
que a servidão feudal, as divisões de casta e da escravidão ainda existem ao lado
dos antagonismos de classe da burguesia e do proletariado, que agravou-se muito
no último período.
O caráter colonial da revolução na Índia contra um dos opressores mais
poderosos mascara, para alguns, o alcance dos antagonismos sociais internos do
país, especialmente aos olhos daqueles que se aproveitam desta máscara. Na
verdade, a necessidade de livrar-se de um sistema de opressão colonial, cujas
raízes estão embutidos na velha exploração nativa, exigem das massas indianas
um tremendo esforço revolucionário, o que por si só outorga uma enorme
envergadura a luta de classes. O imperialismo britânico não abandonará
voluntariamente suas posições, como ele humildemente abana o rabo para os
Estados Unidos, se esforçará até a última gota de energia maldade para esmagar
a Índia insurgente.
Esta é, certamente, uma grande lição de história. A revolução indiana, mesmo
nesta fase que não escapou a liderança traiçoeira da burguesia nacional, é
esmagada pelo governo "socialista" de Mac Donald. As represálias sangrentas
por esses canalhas da Segunda Internacional, que se comprometem a instituir o
socialismo pacificamente em seus próprios países, são um sinal do que o
imperialismo britânico tem reservado para a Índia. As discussões da social-
democracia sobre a forma de conciliar os interesses da Inglaterra burguesa com
os da Índia democrática são o complemento necessário à repressão sangrenta de
Mac Donald, que sempre está disposto, entre massacre e massacre, a enviar
ainda uma outra comissão de reconciliação.
A burguesia britânica compreende perfeitamente bem que a perda da Índia não
só significaria o colapso estrondoso do seu poder mundial, que já está em
avançado estado de decomposição, mas também uma catástrofe social interna.
Trata-se de uma luta de vida ou morte. Todas as forças começam a agir. Isto
significa que a revolução deve mobilizar todos os seus recursos. Milhões de
pessoas têm-se colocado em movimento. Tal implantaram o poder espontâneo
que a burguesia nacional foi forçada a agir para controlar o movimento e cortar
seu fio revolucionário.
O movimento de resistência passiva de Gandhi é o nó tático que amarra a
ingenuidade e a abnegada cegueira das massas pequeno-burguesas dispersas às
traiçoeiras manobras da burguesia liberal. O fato de o Presidente da Assembleia
Legislativa da Índia, a instituição oficial de conluio com o imperialismo, ter
deixado seu posto para assumir o boicote aos produtos britânicos é
profundamente simbólica.
"Vamos provar — diz a burguesia nacional para os senhores do
Tâmisa — eles são indispensáveis, que não podem silenciar as massas
sem o nossa concurso, mas este concurso tem o seu preço."
Mac Donald responde aprisionando Gandhi. É possível que o lacaio exceda as
intenções do mestre, porque ele exibe um zelo que excede o seu dever de provar
que está acima de qualquer suspeita. É possível que os conservadores,
imperialistas sérios e experientes, não tenham ido tão longe nesta fase. Mas por
outro lado, os líderes nacionais da resistência passiva necessitam dessa repressão
para dar brilho às suas enfermas reputações. Mac Donald irá fornecer este
serviço. Enquanto massacra os trabalhadores e camponeses, prende Gandhi
depois de avisá-lo com suficiente antecipação, tal como fez o Governo
Provisório Russo com os Kornilovs Denikins.
Se a Índia é um componente do domínio interno da burguesia inglesa, a
dominação imperialista do capital britânico sobre a Índia não é menos
componente de ordem interna indiana. A questão não pode ser reduzida à mera
expulsão de dezenas de milhares de exploradores estrangeiros. Não se pode
separá-los dos opressores internos, e quanto mais se fortalece a pressão das
massas, menor será o desejo dos opressores nacionais de separar-se dos
estrangeiros. Como na Rússia a liquidação do czarismo e de suas dívidas ao
capital financeiro mundial só foi possível porque os camponeses tiveram de
abolir a monarquia para abolir o latifúndio, na Índia a luta contra a opressão
estrangeira deriva, para as massas inumeráveis de camponeses oprimidos e semi-
pauperizados, da necessidade de liquidar os latifundiários feudais, e seus agentes
e intermediários, os funcionários locais e os usurários predatórios.
O camponês indiano quer uma distribuição "equitativa" da terra. Essa é a base
da democracia. E é, ao mesmo tempo, a base social da revolução democrática em
seu conjunto.
Na primeira etapa de sua luta, os camponeses atrasados, inexperientes e
dispersos, que em todas as aldeias se opõem aos representantes individuais do
regime odiado, sempre recorrem a resistência passiva. Deixam de pagar o
arrendamento ou os impostos, escapam para a selva, desertam do serviço militar,
e assim por diante. As fórmulas tolstoianas de resistência passiva foram, em
certo sentido, a primeira etapa do despertar revolucionário das massas
camponesas russas. Gandhismo é o mesmo em relação às massas da Índia.
Quanto mais "sincero" se mostra Gandhi pessoalmente, mais útil é aos amos para
disciplinar as massas. O apoio prestado pela burguesia à resistência passiva ao
imperialismo é apenas pré-condição para sua resistência sangrenta diante das
massas revolucionárias.
A história registra mais de uma ocasião em que os camponeses passaram de
formas passivas de luta para as guerras mais amargas e sangrentas contra seus
inimigos imediatos: os proprietários, autoridades locais, os usurários predatórios.
Na Idade Média houve muitas guerras camponesas na Europa, também
abundaram represálias cruéis contra elas. Tanto a resistência passiva como a
insurreição sangrenta dos camponeses só podem se tornar uma revolução sob a
liderança de uma classe urbana, que logo assume a liderança da nação
revolucionária, depois da vitória, torna-se a depositária do poder revolucionário.
Nos tempos modernos, essa classe é unicamente o proletariado, também no
Oriente.
É verdade que o proletariado indiano é numericamente menor que o
proletariado russo, às vésperas de 1905 e 1917. Esta realidade de um
proletariado relativamente pouco numeroso foi o principal argumento de todos
os filisteus, todos os Martinovs, todos os mencheviques contra a perspectiva da
revolução permanente. A concepção de que o proletariado russo, empurrando a
burguesia para o lado, poderia ser colocado à frente da revolução agrária dos
camponeses e promoveria sobre esta onda a ascensão da ditadura revolucionária
parecia fantástica. Acreditavam-se realistas quando confiavam em que a
burguesia liberal, contando com as massas da cidade e do campo, realizaria a
revolução democrática. Mas descobriu-se que as estatísticas da população não
são um índice do papel econômico e político das diversas classes. A Revolução
de Outubro o demonstrou de uma vez por todas, e de maneira mais convincente.
Se hoje o proletariado indiano é numericamente menor do que o russo, isso
não significa que suas possibilidades revolucionárias são menores; a fraqueza
numérica do proletariado russo, em comparação com o norte-americano e o
britânico não foi um obstáculo para o estabelecimento da ditadura do
proletariado na Rússia. Pelo contrário, todas as peculiaridades sociais que
tornaram possível e inevitável a Revolução de Outubro existem na Índia e de
forma agravada. Neste país de camponeses pobres, a hegemonia da cidade não é
menor do que na Rússia czarista. A concentração do poder industrial, comercial
e bancário nas mãos da grande burguesia, especialmente nas mãos da burguesia
estrangeira, e o rápido crescimento do proletariado industrial, excluem a
possibilidade de que a pequena burguesia urbana, e até mesmo intelectuais,
desempenhem um papel independente. Isso transforma o mecanismo político da
revolução em uma luta entre o proletariado e a burguesia pela liderança das
massas camponesas. Falta uma "simples" condição: um partido bolchevique. E
que é, neste momento, o ponto crucial do problema. Vimos como Stálin e
Bukharin aplicaram na China a concepção menchevique da revolução
democrática. Armado com um aparato poderoso, foram capazes de aplicar as
fórmulas mencheviques na ação e, portanto, foram forçados a levá-las até as suas
últimas consequências. Para garantir o protagonismo da burguesia na revolução
burguesa (esta é a concepção fundamental do menchevismo russo), a burocracia
stalinista transformou o jovem Partido Comunista Chinês em uma seção
subordinada do partido burgues nacional. Segundo o acordo formal assinado por
Stálin e Chiang Kai-shek (através do atual Comissário do Povo da Educação,
Bubnov), os comunistas receberam apenas um terço dos lugares do Kuomintang.
Com isto o partido do proletariado entrou na revolução como cativo oficial da
burguesia, com a bênção do Comintern. O resultado é conhecido: a burocracia
stalinista destruiu a revolução chinesa. Foi um crime político sem precedentes na
história.
Junto com a ideia reacionária do socialismo num só país, em 1924, Stalin
levantou a palavra de ordem de "partidos biclasistas operários e camponeses”
para a Índia, bem como para todos os países do Oriente. Com esta palavra de
ordem procurou-se novamente impedir que o proletariado tivesse um partido e
uma política independentes. Desde então, o pobre Roy se tornou um apóstolo do
partido "popular" ou "democrático" supraclasista que engloba tudo. A história do
marxismo, os processos do século XIX, a experiência de três revoluções russas,
nada, nada disto teve seus efeitos sobre estes senhores. Todavia, ainda não
compreendi porque o "partido dos trabalhadores e camponeses" só é concebível
sob a forma de um Kuomintang, isto é, um partido burguês que arrasta os
operários e camponeses para traí-los e esmagá-los mais tarde. A história nunca
conheceu outro tipo de partido supraclasista, global. Depois de tudo, Roy – o
agente de Stálin na China, o profeta da luta contra o "trotskismo" e o executor do
"bloco de quatro classes" Martynovista — foi um bode expiatório para os crimes
da burocracia stalinista após inevitável derrota da revolução chinesa.
Na Índia, seis anos foram desperdiçados em experimentos desgastantes e
desmoralizantes para realizar a fórmula stalinista dos partidos biclasistas de
trabalhadores e camponeses. Os resultados são claros: partidos de “trabalhadores
e camponeses" provinciais débeis, que vacilam, avançam aos tropeços ou
simplesmente se desintegram ou desaparecem no preciso momento em que
supõe-se que deveriam atuar, no momento de ascensão revolucionário. Mas não
há um partido proletário. Deverá ser formados no calor dos acontecimentos. E
para isto é necessário remover a montanha de escombros criados pela direção
burocrática. Essa é a situação! Desde 1924 a direção do Comintern fez todo o
possível para que o proletariado indiano permanecesse impotente, para
enfraquecer a vontade da vanguarda proletária, para cortar as asas.
Enquanto Roy e outros discípulos de Stálin desperdiçavam anos valiosos no
desenvolvimento de um programa democrático para um partido supraclasista, a
burguesia nacional aproveitou essas circunstâncias ao máximo para assumir o
controle total dos sindicatos.
Na Índia está-se criando um Kuomintang, não como um partido político, mas
como um "partido" dentro dos sindicatos. Agora, no entanto, assustados com sua
própria obra, seus criadores a deixaram de lado, caluniando os "executores".
Desta vez, os centristas saltaram para a "esquerda", mas a situação não melhorou
com isso. A posição oficial da Internacional Comunista sobre os problemas da
revolução na Índia é uma confusão tão miserável que parece ser criado
especialmente para desorientar a vanguarda proletária e levá-la ao desespero. A
metade das vezes ocorre porque a direção tenta constantemente e
conscientemente esconder seus erros de ontem. A outra metade da confusão pode
ser atribuída à incapacidade do centrismo.
Aqui não nos referimos ao programa da Internacional Comunista, que atribui
um papel revolucionário à burguesia colonial e apoia plenamente as invenções
de Brandler e Roy, que continuam a usar o disfarce de Martynov e Stálin.
Tampouco nos referimos a inumeráveis edições do livro de Stálin, Problemas do
leninismo, em que continua, em todas as línguas do mundo, a exposição sobre os
partidos biclasistas de trabalhadores e camponeses. Não. Nós limitamo-nos ao
presente, como a questão é colocada hoje no Oriente, em consonância com os
erros de terceira da Internacional Comunista.
A palavra de ordem central dos stalinistas, tanto na Índia como na China,
continua a ser a ditadura democrática dos operários e camponeses. Ninguém
sabe, ninguém explica, porque ninguém entende, o que significa agora esta
palavra de ordem, no ano 1930, após a experiência dos últimos 15 anos. Qual é a
diferença entre ditadura democrática dos operários e camponeses da ditadura do
Kuomintang, que massacraram os trabalhadores e camponeses? Os Manuilskis e
Kuusinens responderão, talvez, que falavam da ditadura de três classes
(trabalhadores, camponeses e pequena burguesia urbana) e não quatro, como na
China, onde Stálin foi tão bem sucedido em atrair ao bloco o seu aliado Chiang
Kai-shek.
Se assim for, nós respondemos, tratem de explicar por que rejeitam a
burguesia nacional como um aliada na Índia, a mesma burguesia nacional pela
qual expulsaram e depois prenderam o Partido Comunista Chinês, e os
bolcheviques que a repudiaram. A china é um país semi-colonial. Na China não
existe uma casta poderosa de senhores feudais e seus agentes. Mas a Índia é um
país colonial clássico, com poderosos remanescentes do sistema de castas feudal.
Se Stálin e Martinov deduzem o papel revolucionário da burguesia chinesa da
presença da opressão estrangeira e dos restos feudais neste país, na Índia, cada
uma dessas razões atua com força dobrada. Isto significa que a burguesia
indiana, de acordo com uma interpretação estrita do programa da Internacional
Comunista, tem um direito infinitamente maior de exigir a sua integração no
bloco stalinista (de quatro classes) que a burguesia chinesa, com seu
inesquecível Chiang Kai-shek e seu "fiel" Wan Tin-wei. Mas visto que este não é
o caso, porque, apesar da opressão do imperialismo britânico e do legado da
Idade Média, a burguesia indiana só é capaz de desempenhar um papel contra-
revolucionário e não revolucionário vocês devem repudiar implacavelmente a
política traiçoeira aplicada na China e corrigir imediatamente o seu programa,
em que esta política deixou vestígios pusilânimes, mas sinistros!
Mas isso não esgota o problema. Se a Índia está construindo um bloco sem a
burguesia e contra a burguesia, quem vai dirigir? Os Kuusinens e Manuilskis
responderão talvez com a indignação arrogante de sempre: "Pois o proletariado,
é claro!" Bem, respondemos, perfeitamente. Mas se a revolução indiana é
desenvolvida com base em um bloco de trabalhadores, camponeses e da pequena
burguesia; se este bloco combaterá não só o imperialismo e o feudalismo, mas
também a burguesia nacional, estreitamente ligada a eles em todos os problemas
fundamentais; se a cabeça deste bloco é o proletariado; se este bloco somente
chega a vitória varrendo os seus inimigos por uma insurreição armada e, assim,
eleva o proletariado ao papel do verdadeiro líder da nação, neste caso surge a
pergunta: quem vai exercer o poder após a vitória, se não o proletariado? E neste
caso, qual é a diferença entre a ditadura democrática dos operários e camponeses
e a ditadura do proletariado, que lidera os camponeses? Em outras palavras, qual
é a diferença entre a hipotética ditadura de operários e camponeses e o regime
que estabeleceu a Revolução de Outubro?
Não há resposta para esta pergunta. Não pode havê-la. O curso do processo
histórico converteu a "ditadura democrática", em uma ficção oca, e também uma
armadilha traiçoeira para o proletariado. Bela palavra de ordem, que dá origem a
duas interpretações diametralmente opostas: uma, a ditadura do Kuomintang,
outra, a ditadura de outubro! Pois se excluem mutuamente. Na China os
stalinistas interpretam a ditadura democrática de duas maneiras, primeiro como
uma ditadura do Kuomintang de direita, depois, como uma ditadura de esquerda.
Como explicá-la na Índia? Eles permanecem em silêncio. Eles são forçados a
ficar em silêncio por medo de abrir os olhos dos seus adeptos para os seus
crimes. Esta conspiração de silêncio é de fato uma conspiração contra a
revolução indiana. E todo o clamor extremamente esquerdista ou ultra-esquerda
atual na melhor das coisas é um apêndice, porque as vitórias da revolução não
são atendidas com gritos e barulho, mas sim com clareza política.
Mas isso não é suficiente para desenrolar o novelo. Alguns tópicos são
enredados precisamente neste ponto. Ao mesmo tempo que conferem a
revolução um caráter democrático abstrato e permitem chegar à ditadura do
proletariado somente após estabelecida alguma espécie de "ditadura
democrática" mística ou supersticiosa, nossos estrategistas rejeitam a palavra de
ordem política central de todo o movimento democrático revolucionário,
precisamente a palavra de ordem de uma assembleia constituinte. Por quê? em
que base? É absolutamente incompreensível. Para o camponês, a revolução
democrática significa igualdade, especialmente partilha igual da terra. A
igualdade perante a lei depende desta igualdade prévia. A Assembleia
Constituinte onde formalmente os representantes de todo o povo ajustam suas
contas com o passado, mas onde a realidade das diversas classes ajustam suas
contas reciprocas, é a expressão generalizada, natural e inevitável das tarefas
democráticas da revolução, não apenas na consciência das massas camponesas
que despertam, mas também na consciência da própria classe trabalhadora. Nos
estendemos neste ponto com relação à China, e não vemos necessidade de
repetir aqui. Acrescentemos apenas que a multiplicidade provinciana da Índia, as
variadas formas governamentais e sua não menos variada interpenetração com as
relações feudais e de castas, conferem a palavra de ordem de uma assembleia
constituinte um conteúdo democrático revolucionário particularmente profundo.
Atualmente, o teórico da revolução indiana no Partido Comunista da União
Soviética é Safarov, que, graças a uma feliz capitulação, passou com sua
desastrosa música para o campo do centrismo. Em um artigo programático sobre
as forças e as tarefas da revolução na Índia, publicada no bolchevique, Safarov
gira cuidadosamente em torno da questão da Assembleia Constituinte como um
rato experiente em torno de um pedaço de queijo posto em uma armadilha. Este
sociólogo quer evitar a todo custo cair na armadilha do trotskismo. Resolve o
problema sem a maior preocupação, para se opor à Assembleia Constituinte da
seguinte perspectiva:
"O desenvolvimento de um novo ascenso revolucionário sobre a base
[!] da luta pela hegemonia proletária leva à conclusão [a quem? Como?
Por quê?] de que a ditadura do proletariado e do campesinato na Índia
só é possível sob a forma Soviética."
Parágrafo incrível! Martinov multiplicado por Safarov. A Martinov o
conhecemos. E quanto a Safarov, Lênin disse uma vez, não sem certa ternura,
que "Safarchik irá para a esquerda, Safarchik vai cair de cara." A perspectiva
apresentada por Safarov não invalida essa caracterização. Tem sido bem à
esquerda e deve ser reconhecido que não violou a segunda parte da previsão de
Lênin. Vejamos em primeiro lugar o problema de que o ascenso revolucionário
das massas é desenvolvido "com base" na luta dos comunistas pela hegemonia
proletária. Isso é colocar o processo de cabeça para baixo. Acreditamos que a
vanguarda proletaria inicia, ou se prepara para iniciar, ou deveria iniciar, a luta
pela hegemonia na base de um novo ascenso revolucionário. A perspectiva de
luta, de acordo com Safarov, é a ditadura do proletariado e do campesinato. Aqui
ele elimina a palavra "democrático" por causa do esquerdismo. Mas não se
afirma claramente de que tipo de ditadura biclasista se trata: Kuomintang ou
Outubro. Ele nos dá sua palavra de honra de que esta ditadura pode ser
alcançada "apenas na forma de sovietes". Parece muito nobre. Por que queremos
a palavra de ordem de uma assembleia constituinte? Safarov só está disposto a
aceitar a "forma" soviética.
A essência do epigonismo — sua essência desprezível e sinistra — reside em
abstrair dos processos reais do passado e suas lições tão somente a forma, que se
torna um fetiche. Isto é o que aconteceu com os sovietes. Sem dizer nada sobre o
caráter de classe da ditadura — a ditadura da burguesia sobre o proletariado tipo
Kuomintang? Ou ditadura do proletariado sobre a burguesia tipo em Outubro?
— Safarov entorpece alguém, principalmente a si mesmo, com a forma soviética
da ditadura. Como se os soviets não pudessem ser uma arma para enganar os
operários e camponeses! O que mais foram, se não, os soviets mencheviques e
social-revolucionários de 1917? Uma arma para reforçar o poder da burguesia e
preparar a sua ditadura. O que foram os sovietes social-democratas da Alemanha
e Áustria em 1918-1919? Organizações para salvar a burguesia e para enganar os
trabalhadores. Com o maior desenvolvimento da movimentação revolucionária
na Índia, com um ascenso maior das lutas de massas e o enfraquecimento do
Partido Comunista – e isso é inevitável, se impor-se o embroglio safaroviano —
, é possível que a burguesia nacional indiana crie soviets operários e camponeses
para dirigi-los, assim como agora dirige os sindicatos, para estrangular a
revolução como os social-democratas alemães fizeram quando ela se tornou
chefe dos soviets. A natureza traiçoeira da palavra de ordem da ditadura
democrática é que não fecha aos inimigos de uma vez por todas essa
possibilidade.
O Partido Comunista da Índia, cuja criação demorou seis anos - e que anos! -
Vê-se privado, em meio ao ascenso revolucionário, de uma das armas mais
importantes para mobilizar as massas, precisamente o slogan democrático da
assembleia constituinte. Em vez disso, este jovem partido, que ainda não deu os
seus primeiros passos, padece do slogan abstrato de sovietes como forma de uma
ditadura abstrata, isto é, uma ditadura que ninguém sabe que tipo é. A apoteose
da confusão! E tudo isso vem acompanhado, como sempre, pelo repugnante
retoque e embelezamento de uma situação bastante grave e nada agradável.
A imprensa oficial, e o mesmo Safarov em particular, apresentam a situação
como se o nacionalismo burgues indiano fosse um cadáver, como se o
comunismo tivesse vencido ou estivesse em processo de conquistar a aliança do
proletariado e este por sua vez já arrastara o campesinato. Com a maior
irresponsabilidade os líderes e sociólogos falam sobre seus desejos como uma
coisa já realizada. Para colocá-lo mais corretamente, em vez de afirmar a
realidade resultante da sua política errônea, afirmam como real o que poderia
haver sido, de ter aplicado uma política correta nos últimos seis anos. Mas
quando a incoerência da fantasia e da realidade vier à luz, a culpa recairá sobre
os comunistas indianos por executar mal esta incoerência geral que recebe o
nome de linha geral.
A vanguarda do proletariado indiano esta apenas no limiar da sua grande obra
e tem um longo caminho a percorrer. Uma série de derrotas será o preço a pagar
não só pelo atraso do proletariado e do campesinato, mas também pelos pecados
da direção. A tarefa principal, neste momento, é conseguir obter uma
compreensão marxista clara das forças motrizes da revolução e uma perspectiva
correta, uma política previdente para rejeitar fórmulas estereotipadas da
burocracia e que, para realizar as magnas tarefas revolucionárias, ajusta-se
cuidadosamente às etapas reais do despertar político e crescimento
revolucionário da classe operária.
O que é uma Situação Revolucionária?
Para analisar uma situação, de um ponto de vista revolucionário, é necessário
distinguir entre as condições econômicas e sociais de uma situação
revolucionária e a situação revolucionária propriamente dita as condições
econômicas e sociais de uma situação revolucionária se dão, em geral, quando as
forças produtivas de um país estão em decadência; quando diminui
sistematicamente o peso do país capitalista no mercado mundial e os recursos
das classes também se reduzem sistematicamente; quando o desemprego já não é
simplesmente a consequência de uma flutuação conjuntural, mas um mal social
permanente com tendência a se elevar. Estas são as características da situação da
Inglaterra; podemos dizer que ali se dão e se aprofundam diariamente as
condições econômicas e sociais de uma situação revolucionária. Porém, não
podemos esquecer que a situação revolucionária deve ser definida politicamente
– não apenas sociologicamente –, e aqui entra o fator subjetivo, o qual não
consiste somente no problema do partido do proletariado, mas que é uma
questão de consciência de todas as classes, obviamente, fundamentalmente do
proletariado e seu partido.
A situação revolucionária somente existe quando as condições econômicas e
sociais que permitem a revolução provocam mudanças bruscas na consciência da
sociedade e de suas diferentes classes. Quais mudanças?
Para nossa análise devemos considerar as três classes sociais: a capitalista, a
classe média e o proletariado. São muito diferentes as mudanças de mentalidade
necessárias em cada uma destas classes.
O proletariado britânico sabe muito bem, muito melhor que todos os teóricos,
que a situação econômica é muito grave. Porém, a situação revolucionária se
desenvolve apenas quando o proletariado começa a buscar uma saída, não sobre
os trilhos da velha sociedade mas pelo caminho da insurreição revolucionária
contra a ordem existente. Esta é a condição subjetiva mais importante de uma
situação revolucionária. A intensidade dos sentimentos revolucionários das
massas é um dos índices mais importantes da maturidade da situação
revolucionária.
Contudo, a etapa seguinte à situação revolucionária é a que permite ao
proletariado converter-se na força dominante da sociedade, e isto depende até
certo ponto (ainda que menos na Inglaterra que em outros países) das ideias e
sentimentos políticos da classe média, de sua desconfiança em todos os partidos
tradicionais (incluindo o Partido Trabalhista, que é reformista, ou seja,
conservador) e de que deposite suas esperanças numa mudança radical,
revolucionária, da sociedade (e não numa mudança contra-revolucionária, isto,
fascista).
As mudanças no estado de ânimo da classe média e do proletariado
correspondem e são paralelas às alterações no estado de ânimo da classe
dominante. Quando esta enxerga que é incapaz de salvar seu sistema, perde
confiança em si mesma, começa a se desintegrar, divide-se em frações e
camarilhas.
Não se pode saber de antemão, nem indicar com exatidão matemática, em que
momento desses processos, a situação revolucionária está madura. O partido
revolucionário apenas pode descobri-lo através da luta pelo crescimento de suas
forças e influência sobre as massas, sobre os camponeses e a pequena burguesia
das cidades etc.; e pelo debilitamento da resistência das classes dominantes.
Aplicando estes critérios à situação da Grã Bretanha, vimos que:
As condições econômicas e sociais existem e se tornam mais prementes e
agudas.
Todavia, estas condições econômicas não provocarão uma resposta
psicológica. Não faz falta uma mudança nas condições econômicas, já
intoleráveis, mas uma mudança na atitude das distintas classes diante desta
intolerável e catastrófica situação que vive a Inglaterra.
O desenvolvimento econômico da sociedade é um processo muito gradual,
que se mede em séculos e décadas. Porém, quando se alteram radicalmente as
condições econômicas, a resposta psicológica, já demorada, pode aparecer muito
rápido. E, assim, sucedendo rápida ou lentamente, essas mudanças
inevitavelmente devem alterar o estado de ânimo das classes. Somente então
temos uma situação revolucionária.
Em termos políticos, isto significa:
Que o proletariado deve perder sua confiança não apenas nos conservadores e
nos liberais mas também no Partido Trabalhista. Deve concentrar sua vontade e
sua coragem nos objetivos e métodos revolucionários.
Que a classe média deve perder sua confiança na grande burguesia, nos
senhores, e voltar seus olhos ao proletariado revolucionário.
Que as classes possuidoras, as camarilhas governantes, rechaçadas pelas
massas, perdem a confiança em si mesmas.
Essas atitudes se desenvolverão inevitavelmente, porém ainda não existem.
Podem desenvolver-se num breve lapso devido à gravidade da crise. Este
processo pode durar dois ou três anos, inclusive um ano. Porém, hoje é uma
perspectiva, não um fato. Temos que assentar nossa política nos fatos de hoje,
não nos de amanhã.
As condições políticas de uma situação revolucionária se desenvolvem
simultânea e mais ou menos paralelamente, todavia isso não significa que
amadureçam todas ao mesmo tempo: esse é o perigo que nos ameaça. Das
condições políticas atuais, a mais imatura é o partido revolucionário do
proletariado. Não está excluída a possibilidade de que a transformação
revolucionária do proletariado e da classe média, e a desintegração da classe
dominante, se desenvolvam mais rapidamente que a maturação do Partido
Comunista. Isso significa que poderia se dar uma verdadeira situação
revolucionária sem um partido revolucionário adequado. Em certa medida, se
repetirá o que ocorreu na Alemanha em 1923. Porém, é um erro absoluto
considerar que esta é hoje a situação da Inglaterra.
Dizemos que não está excluída a possibilidade de que o partido possa estar em
descompasso com os demais elementos da situação revolucionária, todavia não é
inevitável. Não podemos fazer um prognóstico exato, mas aqui não se trata de
um problema de prognósticos e sim de nossa atividade.
Nesta conjuntura, quanto tempo necessitará o proletariado britânico para
romper seus vínculos com os três partidos burgueses? É muito possível que, com
uma política correta, o Partido Comunista cresça proporcionalmente à bancarrota
e desintegração dos demais partidos. Nosso objetivo e nosso dever são
concretizar essa possibilidade.
Conclusões: isso é suficiente para explicar porque é totalmente errôneo
colocar que na Inglaterra o conflito político se dá entre a democracia e o
fascismo. A era fascista começa, seriamente, depois de uma vitória importante e
temporalmente decisiva da burguesia sobre a classe operária. Contudo, na
Inglaterra as grandes lutas ainda não ocorreram. Como já assinalamos, referindo-
nos a outro tema, o próximo capítulo político da Inglaterra, depois da queda do
governo nacional e do conservador que provavelmente o suceda – será
possivelmente liberal-trabalhista –, que num futuro próximo pode se tornar mais
perigoso que o espectro do fascismo. Condicionalmente, denominamos esta
etapa como kerenskismo britânico.
Todavia, há que acrescentar que não necessariamente em toda etapa e em
todos os países o kerenskismo será tão débil como foi o russo, que o era porque
o Partido Bolchevique era forte. Por exemplo, na Espanha o kerenskismo – a
coalizão de liberais e "socialistas" – não é, de maneira alguma, tão débil como o
foi na Rússia, e isso se deve à debilidade do Partido Comunista. O kerenskismo
combina a fraseologia reformista, "revolucionária", "democrática", "socialista" e
as reformas sociais democráticas de importância secundária com a repressão à
ala esquerda da classe operária.
É um método oposto ao do fascismo, porém serve aos mesmos fins. A derrota
do futuro lloydgeorgismo somente será possível se sabemos prever sua chegada,
se não nos deixamos hipnotizar pelo espectro do fascismo – que hoje é um
perigo muito mais distante que Lloyd George e sua ferramenta do futuro, o
Partido Trabalhista. Amanhã o perigo pode ser o partido reformista, o bloco de
liberais e socialistas; o perigo fascista, todavia, está muito distante. Nossa luta
para eliminar a etapa fascista e eliminar ou reduzir a etapa reformista é a luta por
ganhar a classe operária para o Partido Comunista.
Notas

1 - O artigo é modestamente assinado pelas iniciais E. H. . É preciso


reproduzi-las para os nossos descendentes. Gerações de operários de diferentes
países não trabalharam por nada. Os grandes pensadores e combatentes
revolucionários não passaram pela terra sem deixar traços. E.H. Existe, ele cuida
e indica ao proletariado alemão a via a seguir. As más línguas afirmam que E. H.
é aparentado a E. Heilmann, que se desonrou durante a guerra por um
chauvinismo particularmente crapuloso. É difícil acreditar: um espírito tão
brilhante!

2 - Entre os metafísicos (gente que pensa de maneira anti-dialética) a mesma


abstração preencheu duas, três ou ainda mais funções, muitas vezes totalmente
opostas. A "democracia" em geral e o "fascismo" em particular, como vimos, não
difere em nada um do outro. Mas isso não impede que deva existir ainda sobre a
terra "a ditadura dos operários e dos camponeses" (para a China, Índia,
Espanha). Ditadura do proletariado? Não. Ditadura capitalista? Não. Então qual?
Democrática! Revela-se que sobre a terra existe ainda uma democracia em
estado puro, acima das classes. E portanto o 11º plenário explicou que a
democracia não difere em nada do fascismo? Só um indivíduo muito ingênuo
pode esperar dos estalinistas uma resposta honesta e séria sobre esta questão de
princípio. Não haverá de facto senão algumas injurias suplementares, um ponto é
tudo. E portanto o prejuízo da revolução no Oriente está ligado a esta questão.

3 - Otzovistas: do verto russo otzyvat, que significa chamar, retirar.

4 - A revista francesa Les Cahiers du bolchevisme, a mais estúpida e a mais


ignorante de todas as produções da burocracia estalinista, apoderou-se
avidamente da alusão à avó do diabo, evidentemente sem se duvidar um só
instante que ela tem na literatura marxista uma muito grande história. A hora está
próxima, esperemos, onde os operários revolucionários expedirão a avó
mencionada sobre os seus professores ignorantes e de má fé, para que eles
aprendam.

5 - Todas as outras posições desse grupo são do mesmo nível e apresentam-se


como uma repetição dos erros mais grosseiros da burocracia estalinista,
acompanhada de caretas ainda mais ultra-esquerda. O fascismo triunfa já, Hitler
não é um perigo independente, os operários não querem se bater. Se é assim, e e
se sobra bastante tempo, é preciso que os teóricos do Roter Kampfer utilizem
esse interregno e leiam bons livros, em vez de escreverem maus artigos. Há
muito tempo, Marx explicava a Weitling que a ignorância não podia conduzir a
bons resultados.

6 - SAP: Sozialistisch Arbeiterpartei (Partido Socialista Operários).


Organização centrista, nascida de uma cisão da ala esquerda do Partido social-
democrata; em 1932, fusionou com a minoria do KPDO (Partido comunista
alemão da oposição); membro juntamente com outros grupos sociais-democratas
da esquerda da União internacional do trabalho; a seguir membro dirigente do
Burô de Londres para a unidade dos socialistas revolucionários; após a guerra, a
maioria dos seus membros voltaram para o partido social-democrata.

7 - Infelizmente, a revista Permanente Revolution publicou um artigo que, na


verdade, não emana da redação, pela defesa do candidato único operário. Não
pode haver dúvidas que os bolcheviques-leninistas alemãs rejeitarão tal posição.

8 - KPDO: Kommunistiche Partei Deutschlands-Opposition (Partido


comunista alemão da oposição). Organização formada pela oposição de direita
ao PCA, após a sua exclusão: dirigida por Brandler e Thalheimer; a partir de
1930, forma com outros grupos comunistas direitistas a União internacional da
oposição comunista; 1931: cisão, a minoria junta-se ao SAP.

9 - Hoje, Roy foi condenado a numerosos anos de prisão pelo governo


MacDonald. Os Jornais da Internacional comunista nem se sentem obrigados a
protestar: pode-se concluir uma aliança estreita com Tchang Kaichek, mas não se
deve, em nenhum caso, defender o brandleriano indiano Roy contra os carrascos
imperialistas.

10 - Certos ultra-esquerda (por exemplo o grupo italiano dos Bordighistas


consideram que a frente única só é aceitável para as lutas econômicas. Hoje
ainda mais que no passado é impossível separar as lutas econômicas das lutas
políticas. O exemplo da Alemanha onde as convenções tarifárias são suprimidas,
onde os salários são diminuídos por decretos governamentais deveria fazer
compreender esta verdade mesmo às crianças de tenra idade. Notemos de
passagem que na hora atual, os estalinista dão vida a numerosos antigos
preconceitos dos bordighistas. Nada de espantar a que o grupo ''Prometeo'', que
não aprende nada e não progrediu uma polegada, seja hoje, na hora dos zig-zags
ultra-esquerdas da Internacional comunista, muito mais próximo dos estalinistas
que de nós.

11 - Lembremos que na China os estalinistas opuseram-se à criação de


Sovietes durante o período do ascenso revolucionário; durante a vaga de refluxo
eles decidiram organizar o levantamento de Cantão, chamaram as massas para a
criação do Soviete no mesmo dia do levantamento!

12 - "A soga do Young": di respeito ao Plano Young. Após Owen D. Young,


poderoso homem de negócios norte-americano, que foi Agente-geral para a
reparação da Alemanha durante a década de 20. No verão de 1929, foi presidente
da conferência que adotou o seu plano, que substituiu o mal sucedido Plano
Dawes, para "facilitar" que a Alemanha pagasse as reparações acordadas no
Tratado de Versalhes.

13 - "Estratégia Zinoviev-Stálin": Gregory Y. Zinoviev (1883-1936),


presidente do Comintern desde a sua fundação em 1919 até a sua substituição
por Stálin em 1926. Após a morte de Lenine, Zinoviev e Kamenev figurão um
bloco com Stálin (a Troika) contra Trotsky, e dominamos o partido Soviético. No
período de dominação do Comintern por parte de Zinoviev-Staline, uma linha
oportunista conduziu-no a umha série de erros e oportunidades perdidas, a mais
notável das quais foi a revolução alemã de 1923. Após a ruptura com Stálin,
Zinoviev aderiu à trotskista Oposição de Esquerda. Mas em 1928, após a
expulsão do partido da Oposição Unida, Zinoviev capitulou ante Stálin.
Readmitido no partido, foi expulso de novo em 1932. Após a negação de toda
perspectiva crítica, foi readmitido mais uma vez, mas em 1934 foi expulso e
encarcerado. "Confessou" no começo dos grandes julgamentos de Moscou em
1936 e foi executado.
Table of Contents
Breve Biografia
A Revolução Alemanha e a Burocracia Stalinista
Introdução
Capitulo I: A Social-Democracia
Capitulo II: Democracia e Fascismo
Capitulo III: O Ultimatismo Burocrático
Capitulo IV: Os Ziguezagues dos Stalinistas na Questão da Frente
Única
Capitulo V: Relembrança Histórica sobre a Questão da Frente Única
Capitulo VI: As Lições da Experiência Russa
Capitulo VII: As Lições da Experiência Italiana
Capitulo VIII: Pela Frente Única: A Caminho dos Sovietes, Órgãos
Superiores da Frente Única
Capitulo IX: O S.A.P (Partido Socialista Operário)
Capitulo X: O Centrismo em Geral e o Centrismo da Burocracia
Stalinista
Capitulo XI: A Contradição entre o Sucesso Econômico da URSS e a
Burocracia do Regime
Capitulo XII: Os Brandlerianos (KPDO) e a Burocracia Stalinista
Capitulo XIII: A Estratégia das Greves
Capitulo XIV: O Controle Operários e a Cooperação com a URSS
Capitulo XV: A Situação é Desesperada?
Conclusão
A Viragem da Internacional Comunista e a Situação na Alemanha
Capitulo I: As Origens da Última Viragem
Capitulo II: A Vitória Parlamentar do Partido Comunista à Luz das
Tarefas Revolucionárias
Capitulo III: As Hesitações da Grande Burguesia
Capitulo IV: A Pequena Burguesia e o Fascismo
Capitulo V: O Partido Comunista e a Classe Operária
Capitulo VI: O Regresso ao "Segundo Período" ou em Frente, mais
uma Vez, a Caminho do "Terceiro Período"?
Capitulo VII: As Variantes Possíveis do Desenvolvimento Ulterior
Capitulo VIII: Onde está a Saída?
Apêndice
O Perigo Fascista Paira Sobre a Alemanha
A Vitória de Hitler Significaria a Guerra Contra a URSS
Tarefas e Perigos da Revolução na Índia
O que é uma Situação Revolucionária?
Notas

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