Você está na página 1de 14

AUL A

INI CI AL

CONHECIMENTOS PRÉVIOS

E APRESENTAÇÃO DO

MATERIAL DE PESQUISA
1 O que é

gramática?

Do grego “grammatiké”: a arte de escrever ou ler. Atualmente,

significa sistematização dos fatos da língua.

Seu enfoque pode ser variado, a depender do intuito do estudioso e

do enfoque dado por ele. Por exemplo:

○ A gramática histórica (ou diacrônica) estuda a história da língua,

debruçando-se sobre a origem e a evolução de determinado

sistema linguístico;

○ A gramática comparativa estuda as diferenças e semelhanças

entre as línguas, especialmente as derivadas do mesmo tronco;

○ A gramática descritiva (ou sincrônica) estuda o mecanismo pelo

qual uma língua se constrói em dado momento da história;

○ A gramática normativa é a própria gramática descritiva do

registro culto escrito, utilizada com intenção didática.

A base sobre a qual se constrói a gramática normativa é o uso culto

(daí falar-se em “norma culta”). Assim, estudiosos, pessoas conceituadas

e grandes escritores são os que norteiam a criação do padrão de uso da

língua. É em torno de suas obras que se constrói o ideal de bem falar e

escrever.

Nas palavras de Evanildo Bechara:

“Cabe à gramática normativa, que é uma das disciplinas com

finalidade pedagógica, elencar os fatos recomendados como modelares

da exemplaridade idiomática para serem utilizados em circunstâncias

especiais do convívio social. A gramática normativa recomenda como se

deve falar e escrever segundo o uso e a autoridade dos escritores corretos

e dos gramáticos e dicionaristas esclarecidos.”

3
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
A gramática normativa se divide formalmente em:

○ Fonética: estuda os fonemas ou sons que formam palavras, sua

correta pronúncia (ortoépia), correta grafia (ortografia) e correta

acentuação (prosódia);

○ Morfologia: estuda a estrutura, a formação, a classificação e a

flexão das palavras;

○ Sintaxe: estuda o emprego das classes gramaticais e suas funções,

bem como as relações de regência, concordância, colocação que

elas mantêm entre si na estruturação da oração e nas relações

entre orações.

Essa divisão é de caráter eminentemente didático e não corresponde

a distinções naturais da língua.

2 Por que

estudar gramática?

O estudo da gramática não costuma ser benquisto pela maioria das

pessoas. Parte disso se deve à não compreensão de sua finalidade: entendê-la

como uma soma de regrinhas arbitrárias é esvaziar-lhe completamente a

razão de ser.

Gramática é originalmente a “arte de inventar símbolos e combiná-los

para expressar pensamento” (Mirian Joseph). Ela prescreve como combinar

palavras de modo a formar corretamente as frases.

No Medievo, seu estudo era acompanhado do da retórica e da lógica,

cujos conceitos vale a pena apresentar:

○ Retórica: comunicação, por meio de símbolos, das ideias relativas

à realidade. Ela prescreve a melhor forma de combinar frases em

parágrafos e estes numa composição, que apresente unidade,

coerência e ênfase desejada, bem como clareza, vigor e beleza.

4
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
○ Lógica: arte de pensar; prescreve como combinar conceitos em

juízos e estes em silogismos e cadeias de raciocínio de modo a

obter a verdade.

Juntas, essas três artes – o Trivium – desenvolvem as faculdades

básicas do espírito e libertam a inteligência da ignorância, preparando o

indivíduo para o caminho da sabedoria.

Modernamente, o estudo do que se chama “gramática” envolve, em

grande parte, a retórica e mesmo a lógica. A análise dos fatos modelares

da língua inclui muito mais do que apenas a correta combinação de

símbolos para expressão do pensamento. Durante o estudo, fala-se sobre

as qualidades de um bom texto, o que envolve, por exemplo, coerência


e coesão, concisão, ênfase, figuras de linguagem etc. Esses tópicos, aliás,

são encontrados na maior parte das gramáticas normativas modernas, ou

seja, percebe-se que o estudo da chamada “gramática” passou e envolver

também o de vários elementos retóricos e mesmo lógicos.

Apesar disso, ressalta-se que o englobamento da retórica e da

lógica pela gramática não substitui o ensino individual de tais ramos do

conhecimento, cujo estudo aprofundado é de indiscutível valia.

De toda forma, independentemente da nomenclatura, não faria


sentido fatiar as artes do Trivium: um estudo que separe a técnica gramatical

de seu efetivo emprego é completamente vazio. É como ter em mãos uma


complexa e eficiente ferramenta, mas não saber como operá-la.

Como todo estudo normativo, a gramática exige memorização

de informações e regras, cujo objetivo é desenvolver uma comunicação

exemplar, dentro do que melhor existe no padrão culto da língua. Visa-se

ao ajuste da escrita àquilo que de melhor se produz na literatura culta.

Trata-se de ponte inegável com a boa literatura produzida em todas as

épocas, permitindo que o lapso de tempo entre as produções literárias não

nos afaste de nossos melhores autores e de nossa identidade cultural.

5
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Assim, essa arte passa longe de ser um amontoado de regrinhas

aleatórias; é um esteio da melhor comunicação, um padrão de excelência

quanto ao emprego da palavra.

“Quem escreve de maneira displicente confessa, com isso, antes

de tudo, que ele mesmo não atribui grande valor a seus pensamentos.

Pois apenas a partir da convicção da verdade e importância de nossos

pensamentos, surge o entusiasmo que é exigido para buscar sempre, com

incansável perseverança, a expressão mais clara, mais bela e mais vigorosa”,

escreveu Schopenhauer.

Dado que o pensamento humano se constrói por meio da linguagem

e que os homens se comunicam entre si também por meio dela, seu


polimento há de ser constante.

Cuidar da expressão é cuidar dos próprios pensamentos, garantindo

que eles sejam formulados e transmitidos da melhor forma possível.

Evidentemente, o aperfeiçoamento de tal faculdade enseja ascensão social,

mas tal efeito é secundário. Antes disso, disciplina a mente e traz polimento

ao espírito. Entregar-se ao estudo da gramática é, enfim, polir-se.

3 Quais são os

objetivos do Curso?

Desenvolver o estudo da gramática normativa da língua portuguesa,

compreendendo, por meio de análises textuais, seu verdadeiro fim.

6
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
4 Quais benefícios podemos auferir

a partir da conclusão do Curso?

Melhora do raciocínio, disciplina e permeabilidade da mente para o

estudo, melhora do entendimento do que se lê e da capacidade de escrever,

desenvolvimento da articulação entre as ideias, possibilidade de ascensão

profissional.

5 Para que servem

os dicionários e como usá-los?

De acordo com o Dicionário Michaelis, o vocábulo “dicionário” quer

dizer “coleção, parcial ou completa, das unidades lexicais de uma língua

(palavras, locuções, afixos etc.), em geral dispostas em ordem alfabética,

com ou sem significação equivalente, assim como sinônimos, antônimos,

classe gramatical, etimologia etc., na mesma ou em outra língua”.

São livros que se dispõem a fazer, portanto, um inventário abrangente

dos termos da língua, seus significados e empregos.

É claro que, dado o dinamismo da língua e a velocidade com que

ela se expande e modifica, há limitações naturais que lhes são impingidas.

É justamente o que reconhece Aurélio Buarque no prefácio de seu Novo

Aurélio (3ª impressão):

“Pretendeu-se fazer um dicionário médio, ou inframédio, etimológico,

com razoável contingente vocabular (bem mais de cem mil verbetes e

subverbetes), atualizado (dentro dos seus limites), atento não só à língua

dos escritores (muito especialmente os modernos, mas sem desprezo, que

seria pueril, dos clássicos), senão também à língua dos jornalistas e revistas,

do teatro, do rádio e televisão, ao falar do povo, aos linguajares diversos –

regionais, jocosos, depreciativos, profissionais, giriescos...”

7
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
O próprio dicionarista reconhece, portanto, tratar-se de um dicionário

“médio” ou “inframédio”, revelando a natural e esperada impossibilidade de

se registrarem todos os verbetes existentes na língua.

A fonte para a produção de um dicionário é abrangente, a fim de

captar as tendências da língua. Ainda no Prefácio, explica Aurélio:

“Entre os autores, dos mais desvairados gêneros, figuram com

certa frequência os cronistas, por se mostrarem, em maior ou menor

grau, bons espelhos da língua viva. São, aliás, vários deles, mestres da

prosa dos nossos dias. Nem foi esquecida outra classe de autores: a dos

letristas de sambas, marchas, canções. Eles – tal como, até certo ponto,

também os cronistas –, além de captarem a criação linguística popular,


não raro são, ainda por cima, criadores, inventores de palavras.

Injusto seria deixar de recorrer aos comentaristas políticos,

econômicos etc., aos repórteres, aos noticiaristas – desde os mais

qualificados colaboradores, de vária espécie, de jornais e revistas, até

aos mais modestos, aos focas anônimos, aos que fazem a cozinha da

profissão.”

6 O que são a

Academia Brasileira de Letras e o VOLP?

Academia Brasileira de Letras (ABL) é uma instituição cultural

privada, inaugurada em 20 de julho de 1897 e sediada no Rio de Janeiro,

cujo objetivo é o cultivo da língua e da literatura nacional.

Entre os primeiros integrantes, estavam Machado de Assis, Olavo

Bilac, Rui Barbosa e Joaquim Nabuco. O número de membros é sempre 40,

e a entrada de novos só ocorre com a morte de algum acadêmico.

Entre notáveis atividades da ABL, está a edição do VOLP – Vocabulário

Ortográfico da Língua Portuguesa –, espécie de dicionário que lista palavras

8
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem

como lhes fornece a grafia oficial. Seu objetivo, no entanto, difere do dos

dicionários comuns, uma vez que ele não explica o significado dos termos

registrados, mas apresenta sua grafia indicada, seu gênero, sua categoria

morfológica, eventualmente sua pronúncia correta etc. É o VOLP que

oficialmente registra a ortografia das palavras da língua portuguesa do

Brasil.

Abaixo, vê-se exemplo de pesquisa no VOLP. Em “inexorável” ( =

rigoroso, inflexível), esclarece-se que a pronúncia-padrão é de /z/. Em “xerox”,

apresentam-se a dupla possibilidade de grafia e a correta pronúncia do x

final: /cs/.

Pesquisa de “inexorável” no site do VOLP

9
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Pesquisa de “xerox” no site do VOLP

Observação importante:

Não raro, há divergências entre os próprios dicionários ou entre alguns


dicionários e o VOLP, o que não deve causar estranhamento ao usuário da

língua. Catalogar o léxico enquanto a língua ainda vive e se transforma não

poderia ser missão completamente uniforme. Cabe ao estudioso pesquisar

sempre, buscando o melhor e mais primoroso emprego das palavras.

10
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
7 O que é o

Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa?

“A existência de duas ortografias oficiais da língua portuguesa, a

lusitana e a brasileira, tem sido considerada como largamente prejudicial

para a unidade intercontinental do português e para seu prestígio no

Mundo.” (Anexo II)

Esse é precisamente o argumento de abertura da Nota Explicativa do

Acordo Ortográfico. Desde 1931, quando foi aprovado o primeiro acordo entre

Brasil e Portugal, houve inúmeras tentativas de unificar as grafias, todas

malsucedidas pelo desrespeito às peculiaridades de cada país no emprego

da língua. A unificação ortográfica absoluta, embora ideal, passava longe

de se concretizar, uma vez que vias administrativas jamais conseguiram

transpor artificialmente as diferenças inegáveis entre os países.

Feita tal constatação, o último Acordo Ortográfico (Decreto de 29

de setembro de 2008) adaptou seu escopo, surgindo com o intuito não de

unificar tudo o que já existia, mas de acautelar a grafia futura, especialmente

porque, além de Brasil e Portugal, entraram no debate os países africanos


oficialmente falantes de português: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau,

Moçambique e São Tomé e Príncipe. Justifica o documento do Acordo:

“Com a emergência de cinco novos países lusófonos, os fatores

de desagregação da unidade essencial da língua portuguesa far-se-ão

sentir com mais acuidade (...) Nesse sentido, importa, pois, consagrar

uma versão de unificação ortográfica que fixe e delimite as diferenças

atualmente existentes e previna contra a desagregação ortográfica da

língua portuguesa.”

Ressalta-se que, apesar de o decreto ser de 2008, o acordo em si é de

1990. O Timor-Leste tornou-se signatário em 2004.

11
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Estima-se terem sido unificados 98% do léxico, o que certamente já

representa um avanço.

Algumas divergências foram mantidas (de acentuação gráfica –

bebê e bebé, acadêmico e académico etc. são formas aceitas e registradas

oficialmente –; preservação de consoante muda – carácter e caráter, facto

e fato etc. são também formas registradas oficialmente), mas substancial

parte se unificou.

As principais alterações incidiram sobre a colocação do hífen, a

acentuação de alguns vocábulos, o emprego de maiúsculas e minúsculas e

o trema (o qual foi, em regra, abolido).

Fazem-se, com razão, algumas críticas à Reforma, como a

manutenção de hífen em “exceções consagradas pelo uso”, sem que haja

um critério objetivo para medir o que é “consagrado”. No entanto, trata-se de

um documento oficial, cujas alterações devem ser seguidas, especialmente

na produção de documentos oficiais e acadêmicos, dada a necessidade de

padronização.

8 Que

livros didáticos escolher?

O melhor livro de gramática normativa é aquele que, apresentando

a teoria correta, consegue ser mais bem entendido pelo leitor.

Algumas gramáticas (como as de Rocha Lima e Paschoal Cegalla)

expõem a matéria de forma extraordinariamente didática, sem preocupação

com divergências muitas vezes de cunho puramente acadêmico. Outros,

por sua vez, adentram nessas discussões e balizam o debate (Napoleão

Mendes, Evanildo Bechara, Amini Hauy e Celso Cunha – este último um

pouco menos).

12
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Há livros específicos para determinados fins:

○ A vírgula, de Celso Luft, por exemplo, fala apenas sobre o tema

do título;

○ Manual de Redação Jurídica, de José Maria da Costa, debruça-se

sobre as dificuldades linguísticas do profissional de Direito;

○ Dicionário de Questões Vernáculas, de Napoleão Mendes;

Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa, de Cegalla; e

Não Tropece na Língua, de Maria Tereza Piacentini, tratam das

dificuldades cotidianas no uso da língua;

○ “A Gramática”, de Fernando Pestana, traz a teoria gramatical com

apresentação das divergências entre os autores. Embora voltada

para concurso, é útil a todos;

○ Dicionário de Regência Verbal e Dicionário de Regência Nominal,

de Celso Luft, debruçam-se exclusivamente sobre o estudo da

regência de nomes e verbos;

○ Comunicação em Prosa Moderna, de Othon Garcia, aborda

técnicas de boa escrita.

Enfim, cada livro traz sua colaboração para o polimento do

conhecimento.

Para um estudo inicial, sugerem-se Gramática Normativa da Língua

Portuguesa, de Rocha Lima; Novíssima Gramática da Língua Portuguesa,

de Domingos Paschoal Cegalla; “A Gramática”, de Fernando Pestana, e

“Nova Gramática do Português Contemporâneo”, de Celso Cunha.

Não é necessário que o aluno adquira todos eles; basta escolher

aquele com cuja linguagem mais se identifique.

13
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
9 O que é a

Nomenclatura Gramatical Brasileira?

Até a metade do século XX, era caótica a teoria gramatical da

língua portuguesa. Tamanhas eram as subdivisões nas classificações dos

fatos linguísticos, que gramáticos se perdiam e se desencontravam, cada

um desenvolvendo suas próprias teorias, sem muita preocupação com a

unidade e a coesão gramatical.

Ciente de tal realidade, em 1957, o então Ministro da Educação e

Cultura, Clóvis Salgado, convocou professores do Colégio Pedro II para

elaboração do Anteprojeto de Simplificação da Nomenclatura Gramatical

Brasileira, cujo objetivo era padronizar a nomenclatura técnica empregada

nos estudos de gramática normativa.

Argumentou sensatamente o Ministro à época: “Um dos empecilhos

maiores, se não o maior, à eficiência do emprego da língua portuguesa reside

na complexidade e falta de padronização da nomenclatura gramatical em

uso nas escolas e na literatura didática”.

A portaria de nº 36 de 1959 recomentou expressamente que a

Nomenclatura Gramatical Brasileira fosse adotada no ensino programático


da língua portuguesa nos estabelecimentos de ensino.

Embora tenha sido importante passo rumo à unificação da

nomenclatura técnica, fato é que a multiplicidade de conceituação e análise

não cessou. A mera adoção da terminologia prescrita no documento não

impediu a proliferação de obras com análises distintas e frequentemente

inconciliáveis.

O objetivo deste Curso, no entanto, não é explicitar as divergências,

tampouco confundir o aluno com os pontos de maior impasse teórico, mas,

sim, apresentar as classificações pacíficas e as que, não sendo pacíficas,

sejam majoritárias e razoáveis.

14
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA

Você também pode gostar