Você está na página 1de 9

Ludwig von Mises contra Jesus Cristo, o Evangelho e a Igreja

(Carta aberta a Tom Woods)


Caro Tom:
Quando nós escrevemos A Grande Fachada, em 2002, eu era um dos
defensores mais ardentes do seu trabalho. Na verdade, via você como um
importante elemento para o futuro do movimento “tradicionalista” nos Estados
Unidos. Eu não previa sua dissidência pública da doutrina social da Igreja, em
benefício da “Escola austríaca” de Economia – radicalmente laissez faire –,
cujas pretensões vão muito além da economia até uma abrangente “filosofia da
liberdade” que não pode ser ajustada ao ensinamento do Magistério a respeito
dos deveres dos homens e das sociedades com respeito a Cristo e Sua Igreja, ou
até mesmo aos deveres dos homens uns com os outros no nível da justiça
natural. Também não previa que se tornaria um “professor residente” do
Instituto Ludwig Von Mises, um grupo libertário radical dedicado ao
pensamento de von Mises e seu discípulo “anarco-capitalista”, Murray
Rothbard, ambos liberais agnósticos que rejeitaram completamente o papel da
Igreja e do Evangelho na constituição da ordem social.
Sua dissidência da doutrina social produziu, da parte de respeitáveis
comentadores católicos, uma multidão de artigos contra você, como os que
podem ser encontrados aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui, sendo o último uma
série recém publicada em cinco partes na revista Chronicles sob o título “É
Tomas Woods um dissidente?”. Até o momento, pelas minhas contas, não
menos de doze estudiosos católicos denunciaram sua dissidência do
ensinamento do Magistério com relação a princípios básicos tais como salário
justo, primazia moral do trabalho sobre o capital, pecado da usura e da extorsão
pelos preços, imoralidade do dito “direito absoluto” à propriedade privada e a
necessidade de um governo guiado pela lei divina e natural, para o governo dos
homens decaídos. (Recentemente você até começou a promover a fantasia
“anarco-capitalista” da abolição de todos os governos e da criação de uma
“sociedade sem estado.”)
O ponto central de A Grande Fachada era que os católicos “tradicionalistas”
não dissentem da doutrina Católica enquanto tal, mas antes apenas exercitam
seu direito a prescindir de certas novidades litúrgicas e pastorais desconhecidas
na Igreja antes da década de 1960 e nunca impostas aos fiéis como obrigações
comprometedoras da nossa religião. Por exemplo, a proclamação histórica do
papa Bento XVI de que a Missa tradicional em latim “nunca foi ab-rogada” e de
que “em princípio foi sempre permitida” demonstrou a verdade da reivindicação
básica do livro. Mas lá estava você, Tom, nos meses seguintes à publicação de
nosso livro, declarando sua dissensão do ensinamento a respeito da fé e da
moral claramente enunciado como obrigatório por numerosos papas que
ensinaram sobre a justiça no mercado e a reta ordenação do Estado.
E visto que foi o livro mesmo do qual fomos co-autores, juntamente com o
seu mandato no The Remnant e no periódico The Latin Mass, que lhe deram
proeminência como um tradicionalista em primeiro lugar, você dificilmente
poderia esperar que seus ex-colegas permanecessem em silêncio à medida que
você continuava sua torrente de pronunciamentos contra o ensinamento papal,
incluindo o comentário descarado de que a “tentativa dos papas de elevar
princípios como os de ‘salário justo’ ao nível de doutrina obrigatória é algo
completamente diferente, e na verdade está carregada de erros” – não uma
afirmação esporádica, mas algo que você repetiu mais tarde em publicação, no
seu muito criticado A Igreja e o Mercado (p. 79). Você não reconhece a
completa audácia que há em um recém-convertido pretender dar conferências a
católicos de berço a respeito dos “erros” dos ensinamentos da Igreja afirmados
por papa após papa durante séculos?
Ora, uma coisa, Tom, é você expressar sua opinião – sua errante opinião –
de que ao se pronunciarem em matéria de economia e justiça social os papas
excederam o que você considera serem os limites de sua competência, ainda que
os próprios papas, respondendo a dissidentes como você, tenham insistido em
seu direito e dever de se pronunciar precisamente a respeito desses assuntos.
Mas é algo completamente diferente alegar, como você o faz, que você está
exercitando legítima liberdade na Igreja – não, você não está – e, muito pior,
engajar-se numa campanha para persuadir católicos de que aquilo que seu
instituto prega – uma forma de liberalismo social e econômico condenada por
uma extensa linhagem de papas (cf. a encíclica Ubi Arcano Dei, de Pio XI, n.61)
– é “perfeitamente compatível” com o Catolicismo Romano tradicional. Essa
propaganda encontrou até mesmo o caminho na direção de um promissor – sob
outros aspectos – novo periódico, “O Tradicionalista”, cujo número inaugural
incluiu um anúncio de página inteira em homenagem a von Mises, cuja
dogmática visão de mundo anti-cristã está evidente nas citações mostradas
abaixo.
Num artigo que mencionava as circunstâncias de nossa discussão por causa
de sua dissensão da doutrina social e de sua cooperação pós-Grande
Fachada com o Southern Poverty Law Center e sua caça às bruxas aos católicos
tradicionalistas (incluindo eu mesmo), eu aludi a algumas das opiniões
ultrajantes de Rothbard, que defende não apenas o aborto legalizado, a
prostituição, o uso de drogas, o suborno e a extorsão, mas também o direito
legal de matar de fome crianças não desejadas, em favor do qual ele argumentou
num livro que seu Instituto vende para o mundo como um “clássico da
liberdade”. E você, Tom, escreveu em louvor ao mesmo livro sem mencionar
suas afirmações morais depravadas, declarando apenas que “Rothbard descreve
as implicações filosóficas da idéia de propriedade de si mesmo” – uma idéia que
está em conflito com o próprio fato de ser o homem uma criatura de Deus. Você
também nunca mencionou o repetido elogio de Rothbard ao que o conjunto do
trabalho dele aclama como sendo “a subversão da Antiga Ordem… por meio de
uma ação libertária em massa que estourou em grandes revoluções do Ocidente
tais como a Americana e a Francesa, realizando as glórias da Revolução
Industrial e os avanços da liberdade…”
Por essa razão, Tom, eu nunca vi você criticar o ataque de Rothbard ao
“integrismo” católico – sim, ele usou exatamente aquela palavra, aquele perfeito
insulto aos católicos romanos tradicionais em decorrência do qual você e eu
escrevemos A Grande Fachada para atacar. Lembra-se? Naquele artigo em
particular, Rothbard imperiosamente depreciou “o ódio da Igreja ao liberalismo
em geral, do qual ela deriva seu ataque ao liberalismo econômico…” No mesmo
artigo, seu mentor descreveu o marco que foi a encíclica
social Quadragesimo anno, de Pio XI, como virulentamente anti-capitalista e,
para dizer a verdade, pró-fascista. “Essa tendência fascista é revelada pelos
rumos do catolicismo europeu no período entre guerras…” Seu mentor chamou
o papa Pio XI de fascista, Tom. Mas então, você também amontoou críticas
à Quadragesimo – baseando-se em seu estudo informal de economia, um
campo no qual você não possui nenhum título ou outra credencial reconhecida.
(Na verdade, antes de você ter-se incorporado ao Instituto você ensinou história
numa faculdade pública.)
Aqui eu desejo chamar a atenção dos católicos para as concepções
igualmente Cristofóbicas e anti-católicas de von Mises, recentemente expostas
num debate online em angelqueen.org, num tópico chamado “Desmascarando a
Escola Austríaca”. Essas idéias aparecem no livro Socialismo, de von Mises, o
qual seu Instituto vende como uma “obra-prima” que apresenta “uma crítica de
todo o aparato intelectual que acompanha o pensamento socialista,
incluindo as doutrinas religiosas implícitas por trás do pensamento socialista
ocidental…”
Nas treze citações abaixo, do capítulo 29 de Socialismo, von Mises ataca
Cristo, os Evangelhos e a Igreja como sendo inimigos da liberdade e da
sociedade e instigadores do socialismo e da escravidão, chama o Cristianismo de
“religião do ódio”, e declara que a Igreja tem de se reformar cingindo-se ao
liberalismo e ao capitalismo. Todas as citações aparecem online aqui, que é onde
o católico que deu origem ao tópico em angelqueen.org (alguém com o
pseudônimo de GordonG) as encontrou.
Tom, uma vez que você rejeitou todos os pedidos privados relativos à sua
campanha para fazer avançar o libertarianismo radical dentro da Igreja e
particularmente entre os tradicionalistas, nós que uma vez promovemos seu
trabalho nos sentimos obrigados a protestar publicamente contra o que você
está fazendo e a exigir que você se retifique pela confusão que está causando.
Porque você tem um dever perante Deus – como um membro da Igreja
confirmado (se bem que um membro um tanto novo) – de denunciar e repudiar
categoricamente as seguintes citações do livro de von Mises, e de romper seus
laços com o Instituto que promove sua (e de Rothbard) ideologia da “liberdade”
anti-católica, Cristofóbica e, de fato, imoral.
Ademais, é tempo de parar de fingir, como você tem feito por anos, que a
controvérsia que suas próprias palavras e ações têm provocado entre os fiéis
seja um debate sobre “economia” ou coisas particulares tais como a sabedoria
das leis do salário mínimo. Você se associou a uma organização cujas visões a
respeito do homem, da sociedade e da liberdade humana são inimigas da lei do
Evangelho. Você deve escolher entre o Magistério e o Instituto Ludwig von
Mises, e nenhuma quantidade de sofismas pode esconder a realidade daquela
escolha.
Como seu ex-colaborador e colega, e como alguém que admira seus talentos
e sabe o que eles poderiam trazer para uma defesa da doutrina social da Igreja
em lugar de seus aparentes ataques incessantes contra ela, eu espero que você
tome esta carta não como uma provocação, mas como um convite a reconsiderar
o caminho que você escolheu, a dar a volta e a se reunir aos seus irmãos na fé.
Atenciosamente,
Christopher A. Ferrara
* * *
LUDWIG VON MISES
CONTRA CRISTO, O EVANGELHO E A IGREJA
Do capítulo 29
de Socialismo (http://mises.org/books/socialism/part4_ch29.aspx )
1. A pregação de Jesus de um Reino vindouro destrói todos os
laços sociais:
A expectativa da reorganização por parte do próprio Deus quando chegou o
tempo, e a transferência exclusiva de toda ação e pensamento para o futuro
reino de Deus tornou o ensinamento de Jesus Cristo completamente negativo.
Ele rejeita tudo quanto existe, sem oferecer nada para repô-lo. Ele chega a
dissolver todos os laços sociais existentes…
2. Jesus é como os bolcheviques:
… Seu zelo pela destruição dos laços sociais não conhece limites. A força
motriz por trás da pureza e do poder de tal completa negação é uma inspiração
extática e uma esperança entusiástica de um novo mundo. Daí seu ataque
apaixonado a tudo quanto existe. Tudo pode ser destruído porque Deus, em Sua
onipotência, vai reconstruir a futura ordem. É desnecessário examinar se
alguma coisa pode ser reaproveitada na passagem da velha para a nova ordem,
porque essa nova ordem erguer-se-á sem auxílio humano. Ela não demanda de
seus partidários, portanto, nenhum sistema ético, nenhuma conduta particular
em qualquer direção positiva. Fé, e apenas fé, esperança, expectativa – isso é
tudo o que é necessário. Ele [o homem] não precisa contribuir em nada para a
reconstrução do futuro, Deus Ele mesmo o sustentou. O mais claro paralelo
moderno à atitude do cristianismo primitivo de completa negação é o
bolchevismo. Os bolcheviques, igualmente, desejam destruir tudo quanto existe
porque eles o consideram algo desesperadamente mau. Mas eles têm em mente
planos – por mais indefinidos e contraditórios que eles possam ser – para uma
futura ordem social. Eles exigem não apenas que seus seguidores devem
destruir tudo quanto exista, mas também que eles adotem uma linha de conduta
definida, que conduz em direção ao Reino futuro com o qual eles sonharam. O
ensinamento de Jesus a esse respeito, por outro lado, é somente negação.
3. Jesus despreza os ricos, incitando o mundo à violência contra
eles e suas propriedades; e Seu ensinamento espalhou “semente
maligna”:
Naturalmente, uma coisa está clara e nenhuma interpretação habilidosa
pode ocultar isso. As palavras de Jesus estão cheias de rancor contra os ricos, e
os Apóstolos não são menos brandos a respeito disso. O Homem Rico é
condenado porque ele é rico, o Mendigo é louvado porque ele é pobre. A única
razão por que Jesus não declara guerra contra os ricos e não aconselha
vingança contra eles é que Deus disse: “A vingança é minha”.
No Reino de Deus os pobres serão ricos, mas os ricos estarão envoltos em
sofrimento. Revisores tardios tentaram abrandar as palavras de Cristo contra os
ricos, das quais a versão mais completa e vigorosa é encontrada no Evangelho
de Lucas, mas resta um bocado suficiente para apoiar aqueles que encorajam o
mundo a sentir ódio, a se vingar a assassinar e a queimar os ricos. Até a época
do Socialismo moderno nenhum movimento contra a propriedade privada que
se originou no mundo cristão falhou em buscar autoridade em Cristo, nos
Apóstolos, e nos Padres Cristãos, para não mencionar aqueles que, como
Tolstoi, fizeram do ressentimento evangélico contra os ricos o próprio coração e
alma de seu ensinamento.
Este é um caso no qual as palavras do Redentor espalharam semente
maligna. Mais dano tem sido causado e mais sangue tem sido derramado por
conta delas do que pela perseguição aos heréticos e queima das bruxas. Elas
sempre tornaram a Igreja indefesa contra todos os movimentos que almejam
destruir a sociedade humana…
4. A Igreja, e não o liberalismo Iluminista, abriu caminho para o
Socialismo:
…Seria estúpido sustentar que o Iluminismo, ao arruinar gradativamente o
sentimento religioso das massas, abriu caminho para o Socialismo. Ao
contrário, foi a resistência que a Igreja ofereceu à disseminação das ideais
liberais que preparou o solo para o rancor destrutivo do pensamento
socialista moderno. A Igreja não apenas não fez nada para extinguir o fogo, mas
ela até mesmo tocou fogo na brasa…
5. A doutrina cristã destrói a sociedade, proíbe a preocupação
com o sustento e o trabalho, prega o ódio à família e até mesmo
endossa a castração:
… É por isso que a doutrina cristã, uma vez separada do contexto no qual
Cristo a pregou – expectativa do iminente Reino de Deus –, pode ser
extremamente destrutiva. Nunca e em lugar algum um sistema de ética social
que abraça a cooperação social poderá ser construído a partir de uma doutrina
que proíbe qualquer preocupação com o sustento e o trabalho, enquanto
expressa um feroz ressentimento em relação aos ricos, prega o ódio à família e
defende a castração voluntária.
6 O Evangelho não desempenhou nenhum papel na construção da
civilização ocidental:.
As façanhas culturais da Igreja durante seus séculos de desenvolvimento são
[fruto] do trabalho da Igreja, e não do cristianismo. É uma questão aberta
quanto desse trabalho se deve à civilização herdada do estado romano e quanto
se deve ao conceito de amor cristão, completamente transformado sob a
influência dos estóicos e de outros filósofos antigos. A ética social de Jesus não
tem papel algum neste desenvolvimento cultural. A realização da Igreja, neste
caso, foi torná-las inofensivas, mas sempre por um período limitado de tempo…
7. Porque ela se opõe ao liberalismo, a Igreja é uma inimiga da
sociedade:
O destino da civilização está em jogo. Porque não é como se a resistência da
Igreja às idéias liberais fosse inofensiva. A Igreja é um poder tão poderoso que
sua aversão às forças que trazem a sociedade à existência seria suficiente para
quebrar em pedaços toda a nossa cultura. Nas últimas décadas nós
testemunhamos com horror sua terrível transformação em um inimigo da
sociedade. Pois a Igreja, tanto a Católica quanto a Protestante, não é o menor
dos fatores responsáveis pela prevalência de ideais destrutivos no mundo
hoje…
8. O liberalismo é superior ao cristianismo e tem restaurado a
humanidade por meio da destruição da Igreja, motivo pelo qual a
Igreja o odeia:
Historicamente é fácil entender a aversão que a Igreja tem mostrado pela
liberdade econômica e pelo liberalismo político sob qualquer forma. O
liberalismo é a flor daquele iluminismo racional que desferiu o sopro da morte
no regime da antiga Igreja e do qual brotou a crítica histórica moderna. Foi o
liberalismo que solapou o poder das classes que por séculos estiveram
intimamente ligadas à Igreja. Ele transformou o mundo mais que o
cristianismo sempre o fez. Ele devolveu a humanidade ao mundo e à vida. Ele
despertou as forças que sacudiram as fundações do tradicionalismo inerte sobre
o qual Igreja cria estar repousada. A nova perspectiva provocou na Igreja um
enorme mal-estar, e ela ainda não se ajustou até mesmo às camadas mais
exteriores da época moderna.
9. O cristianismo se tornou uma religião do ódio, buscando
destruir o “admirável novo mundo” do liberalismo:
De fato, os padres em países católicos borrifam água benta sobre estradas de
ferro recentemente construídas e em dínamos de novas usinas, mas o cristão
confesso ainda estremece intimamente diante dos trabalhos de uma civilização
que sua fé não consegue compreender. A Igreja ressentiu-se fortemente da
modernidade e do espírito moderno. Que surpresa, então, que ela tenha se
aliado àqueles cujo ressentimento levou-os a desejar a dissolução deste
admirável novo mundo, e que tenha explorado seu arsenal bem estocado como
meio para denunciar o esforço terreno pelo trabalho e pela riqueza. A religião
que chama a si mesma religião do amor tornou-se uma religião do ódio, em
um mundo que parecia estar preparado para a felicidade. Quaisquer
pretendentes a destruidores da ordem social moderna poderiam fiar-se no
cristianismo como um líder.
10. Porque eles seguem o Evangelho e porque não foram
“vacinados” com a filosofia liberal, sacerdotes e monges são
inimigos da sociedade:
Sacerdotes e monges que praticaram a verdadeira caridade cristã, que
ministraram e ensinaram em hospitais e em prisões e que sabiam tudo o que
havia para saber a respeito da humanidade sofredora e pecadora – esses foram
os primeiros a serem enganados pelo novo evangelho da destruição social.
Apenas uma firme compreensão da filosofia liberal poderia tê-los vacinado
contra o infeccioso ressentimento que se assolou entre os seus protegidos e que
foi justificado pelos Evangelhos. Por assim dizer, eles se tornaram perigosos
inimigos da sociedade. Do trabalho de caridade brotou o ódio à sociedade.
11. A Igreja e o papado buscam escravizar os homens destituindo-
os da razão e da liberdade espiritual do capitalismo:
A Igreja sabe que ela não pode vencer, a menos que possa vedar a fonte da
qual seu oponente continua extraindo inspiração. Desde que o racionalismo e a
liberdade espiritual do indivíduo sejam mantidos na vida econômica, a Igreja
jamais terá êxito em agrilhoar o pensamento e em tomar conta do intelecto na
direção desejada. Para fazer isso, primeiro ela teria de obter a supremacia sobre
toda atividade humana. Por conseguinte, ela não pode se contentar com o viver
como uma Igreja livre em um estado livre [o próprio slogan de Cavour, o grande
inimigo maçônico da Igreja e do beato Pio IX – CAF]; ela deve procurar
dominar aquele estado. Ambos o papado de Roma e as igrejas protestantes
nacionais lutam pela soberania, já que ela as permitiria ordenar todas as coisas
temporais de acordo com seus ideais. A Igreja não pode tolerar outro poder
espiritual. Todo poder espiritual independente é uma ameaça a ela, uma ameaça
que aumenta em força à medida que a racionalização da vida progride.
12. O cristianismo necessita do socialismo a fim de manter a
teocracia contra a ameaça da “produção independente”:
Ora, a produção independente não tolera qualquer autoridade espiritual
suprema. Em nosso tempo, o poder sobre a mente só pode ser obtido por meio
do controle da produção. Todas as Igrejas já estão indistintamente atentas a
isso há tempos, mas para elas isso se tornou claro pela primeira vez quando a
idéia socialista, surgindo de uma fonte independente, fez-se sentir como uma
força poderosa e rapidamente crescente. Então, tornou-se claro para as Igrejas
que a teocracia só é possível numa comunidade socialista.
13. A Igreja deve se transformar cingindo-se antes ao capitalismo
do que ao ensinamento papal tal como o de Pio XI:
Se a Igreja de Roma quiser encontrar uma solução para a crise para qual o
nacionalismo a levou, então ela deve ser inteiramente transformada. Pode ser
que essa transformação e essa reforma a levem à aceitação incondicional da
indispensabilidade da propriedade privada dos meios de produção. Até o
presente ela está longe disso, como testemunha a recente
encíclica Quadragesimo anno.

Você também pode gostar