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O absurdo das denúncias genéricas (ou, o Mágico de Oz e o


Estado-Leviatã, uma simbiose sinistra) – Por Jacinto Nelson de
Miranda Coutinho e Edward Rocha de Carvalho
Colunas e Artigos Hot Empório

Por Jacinto Nelson de Miranda Coutinho e Edward Rocha


de Carvalho - 07/05/2015

What are we to do if those chasing after devils decide to


chase after us? (Sir Thomas More)

1. Des(a)pontamento do problema

Tem sido difícil – muito difícil –, nos tempos atuais, sustentar a defesa do Poder Judiciário, embora ela seja
imprescindível, mormente porque prevalente o pensamento neoliberal e, portanto, uma base epistêmica
fundada na ação eficiente, a partir da qual o que se mais queira é ele fora do caminho dado ser, por excelência, o
garante da Constituição e, sobretudo, da cidadania.

Eficiência, como se sabe (ou deveria saber), é da ação, segundo o corifeu neoliberal, Friedrich August von Hayek;
nada de muito complicado quando em jogo estivesse a superação da tradicional causa-efeito[2]. Assim, quando a
ação fosse eficiente, o resultado seria, por conseqüência, também eficiente. Por isso, natural que a razão ficasse
fora[3]; na ante-sala; da mesma forma que o Direito positivo e, nele, a Constituição[4],ordem injusta por
definição porque não-espontânea como a lei que rege o mercado, essa sim uma – se fosse permitido dizer –
grudnorm. Fora – ainda que se queira dizer que não – deveria ficar, por conta de tal visão sobre o Direito, a
ética, inclusive em face de uma incompatibilidade visceral com a posição de Hegel[5]. Diante de tal quadro, é
sintomático que o Estado – e isto vale ao Poder Judiciário – seja um estorvo, em face de criar, executar e
garantir direitos; e o Direito (positivado ou não, por conta do reconhecimento inarredável dos princípios como
fonte) seja um empecilho a ser superado, desregulamentado ou, na pior das hipóteses (para tal pensamento),
flexibilizado. É assim que se consomem os direitos sociais e, não fossem cláusulas pétreas, já teriam ido –
inclusive formalmente – os direitos e garantias individuais, tudo a golpes de imbrogliretóricos, golpes de cena,
jogos de imagens, pela pura e cínica banalização do cotidiano.

Há muito se sabe disso[6] – ou deveria sabê-lo –, mas não é o que se passa. Em uma escala muito mais larga
que em vários outros segmentos da sociedade está, pela falta de conhecimento, o Poder Judiciário, logo ele
que se não deveria permitir tal desconhecer, justo para não colocar em risco seu mister – imprescindível – de
garante da Constituição. E só não foi mais acintosa a posição de alguns em certas passagens – enleados que
estavam pelo imaginário neoliberal, vendido como panaceia – porque faltava “estar na lei”[7], conforme a
velha praxe positivista-legalista. Não foi por outro principal motivo que os teóricos neoliberais, com medo da
reação dos juristas-legalistas, fizeram a Emenda Constitucional nº 19, de 04.06.98, inserindo a eficiênciano
caput do art. 37 da CR, de modo a afastar os impertinentes e cooptar os legalistas. Por sorte, como sói
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acontecer, nem tal regra “pegou” como deveria, por conta do precitado desconhecimento.

Ademais, o Poder Judiciário, pela força de alguns altamente esclarecidos, resiste, inclusive pela consciência de
não querer sofrer na carne os efeitos da manipulação do discurso democrático – como vem sofrendo –, não
fosse pelos inúmeros outros fundamentos, dentre os quais – dado o que interessa ao presente ensaio – aquele
(correto) de que a eficiência não superou – e não pode superar – a legalidade, ainda lá instalada (no art. 37
caput, CR) para nortear as ações estatais, se for o caso contra a própria eficiência. Afinal, persiste a máxima ética
de que os fins não justificam os meios, embora já se faça necessário glosar o furor com que se venha usando a
razoabilidade/proporcionalidade em favor da eficiência e contra a legalidade, não raro para justificar o
injustificável, máxime a sonegação dos direitos e garantias individuais.

Por sinal, quando o assunto diz com os Direitos Fundamentais, por suas expressões processuais penais, pouco há
para acrescer sobre o que já foi dito pelos melhores autores, em face da própria função do processo como
instrumento de salvaguarda do cidadão contra o abuso do poder: “È stato giustamente detto che il grado de civiltà
di un popolo si misura soprattuto dal modo con cui sono salvaguardati i diritti e le libertà dell’imputato nel processo
penale.”[8] Trata-se, portanto, de grau de civilidade e, assim, incompatível com a crença de que basta haver
previsão constitucional realizável para tudo estar acertado. Afinal, a superação da tensão entre faticidade e
validade, resolvida através do Direito[9], só tem razão de ser quando alguém com Poder faz valer, em ultima
ratio, as regras democráticas. Do contrário, beira-se o homo hominis lupus de Plauto (só que nele era numa
comédia).

Dentre as expressões processuais penais dos Direitos Fundamentais está o devido processo legal (art. 5º, LIV, CR),
fixado como garantia do cidadão. A ordem constitucional, por outro lado, dá vida à garantia começando por separar
as atribuições de acusar do poder de julgar. Isso, tão-só, não sustenta, como nunca sustentou, ter-se adotado o
sistema acusatório, justo porque – hoje ninguém duvida – a diferença entre ele e o sistema inquisitório, por
definição, está na gestão da prova;[10] e não na referida separação. Mantido, na matriz, oprincípio inquisitivo[11]
– de todo incompatível com a regra constitucional – segue o juiz, no processo penal,gestor da prova. A
precitada separação, todavia, já adotada há muito, foi um grande passo na democratização processual penal,
embora incipiente.

Ora, na estrutura do sistema inquisitório puro era o juiz que fixava o thema decidendum (estabelecendo o
conteúdo do processo) e o thema probandum (o que haveria de ser investigado), razão pela qual não se
estabelecia limites ao decisum: a garantia (retórica) era deslocada, como se sabe, para o tarifamento da prova, logo
superada – a garantia – quando foi necessário lançar mão da tortura, essa vergonha à inteligência humana. Não
se cogitava, portanto, do ne eat iudex ultra vel extra petita partium. Isto é algo que decorre da referida separação,
a qual vem importada do common law: a acusação como parte estabelece os confins do caso e tem a
auto-responsabilidade probatória; elementar, então, que não pudesse o juiz julgar nem além, nem fora do que
fora objeto do pedido. O fundamento histórico, como se sabe, é inglês, de 1166, quando Henrique II, por mais
um writ, criou um júri em Clarendon, para, inteligentemente, não perder nunca e o povo (no começo eram os
barões) juris dictio, tudo a partir de uma acusação (indictment) que é verdadeiramente a voice of the country,
embora sob controle rigoroso[12]. O importante, porém, é que o juiz – ao contrário do inquisidor europeu-
continental – ganha uma posição passiva. Não estranha, então, estar odue process of law diretamente ligado a
um “profundo significado de vida”[13], embora diretamente vinculado à forma.

No sistema inquisitório, como se sabe da história, o problema não está em quem faz o papel de inquisidor: basta
estar lá, naquele lugar, que o modus pensandi trata de fazer o resto, sob a batuta da analítica aristotélica. De
premissas falsas – forjadas pelo imaginário – chega-se, sem grande esforço, a conclusões falsas. É assim que
sempre se fabricou – e segue-se fabricando – delitos e delinqüentes, em nome da crença nas imagens, hoje
disseminadas (as imagens) como nunca a partir dos meios de comunicação. É justo aí que se constróem os
justiceiros, em nome de um deus qualquer, em geral eles mesmos, como lobos em pele de cordeiro. “Nelle cause
milanesi de peste manufacta , giugno-luglio 1630, vediamo come giudici nient’affatto disonesti, anzi inclini a
inconsueto garantismo, fabbrichino delitto e delinquenti: l’inquisito risponde docilmente; l’inquisitore gli scova in testa i
fantasmi che vi ha proiettato.”[14] Pode-se entendê-los – pela evidente ignorância: se não fosse seria caso
patológico – mas não os aceitar; eles, em definitivo, causam muito mal à democracia, mormente quando
ocupam um lugar que, no processo penal atual, tem sido de vida e de morte. Enfim, não há que ceder a esse

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tipo de gente porque os poucos que aí estão denigrem toda uma classe.

Tem-se, no Brasil, um arsenal capaz de conduzir o sistema processual penal à base acusatória, mas isso não
ocorrerá enquanto o Poder Judiciário não assumir a Constituição da República contra o CPP; enquanto se ficar
fazendo concessões imperdoáveis ao fundamento inquisitorial, contra a CR. O problema sério, assim, diz
respeito à epistemologia do sistema. Mas dela pouco se quer saber. Em troca, fala-se muito em reformas parciais
(o supra-sumo do engodo porque se trata de mera maquilagem) quando o que se precisa é umareforma total[15]
e séria – até porque já se foram mais de 41 anos desde o Anteprojeto Tornaghi e nada mudou
substancialmente – e do problema do tempo, epíteto de um sistema que vai pensado a partir de uma
racionalidade européia, embora para um país periférico: aqui, para não se fraudar a realidade, o processo tem
que durar o suficiente para as decisões serem, pelo menos, maduras; e não pagarem os jurisdicionados e os
magistrados. Sobre o tema, muito tem o Poder Judiciário a dizer, mas pouco diz. No primeiro caso, parece se
envergonhar quando o assunto é empunhar a bandeira da CR contra o CPP e, assim, permite que tudo siga
como sempre esteve, sem se caminhar para a reforma total necessária: bastaria começar a dizer “não” e logo se
encontrariam os meios para, quem sabe, uma lei delegada e, a partir dela, uma reforma de fundo. No segundo
caso, abandona, de uma certa forma, seus juízes – que trabalham muito, com as devidas e minguadas exceções
– para discutir um açodamento processual onde o que se não tem são bases materiais e pessoais. Assim,
dificulta – e muito – a defesa que dele se precisa fazer.

2. Situando o problema

A separação constitucional entre a atribuição de acusar e o poder de julgar não só deu o comado do processo
aos juizes naturais (outra garantia que se não quer respeitar, sempre sob o manto da manipulação das palavras)
como fez deles os controladores da higidez dos atos processuais. A denúncia, por elementar, é um deles.

Basta ver que tem sido comum – embora o termo não o recomendasse – o oferecimento de denúncias pelos
órgãos do Ministério Público contra gerentes e diretores de instituições financeiras e empresários que possuem
algum relevo dentro do ordenamento societário, baseando-se, para tanto, tão-só no cargo que detêm ou
simplesmente no fato de constarem no contrato social como sócios.

Talvez, para alguns, isso se deve aos novos rumos e às novas tecnologias utilizadas pelos pretensos criminosos.
Eles têm tudo; o Estado, nada. Daí – e (in)justamente por isso –, a adoção de novos “métodos” pelos órgãos
governamentais seria a única saída. Dentre eles, como preconizado pela Escola de Frankfurt – com
Hassemer[16] em sua maior expressão –, um direito de intervenção, pois os bens jurídicos atuais e protegidos
“no pertenecen al núcleo tradicional del Derecho penal.”[17]

Em síntese, diante de novas mágicas (riscos?), novas fórmulas.

Tudo isto, contudo, traz de volta a prática inquisitiva[18]; revive-se, com viço, um quadro mental paranoico – este,
até, nunca saiu de moda, verdadeiro prêt-à-porter que é –, como bem advertido por Franco Cordero[19]:
denuncia-se antes – baseando-se, quiçá, em preconceitos –, para se ir, então, à cata da prova, a fim de
consolidar o julgamento já realizado.

O tema, enfim, demanda uma análise, em primeiro lugar, em face da Constituição da República; e seguramente
antes das imaginárias (são inventadas) necessidades de preenchimento de eventuais vácuos punitivos.[20]

Não basta à ampla defesa e ao contraditório, em suma, a mera referência constitucional, como que fossem
poemas; belos de serem lidos, difíceis de serem colocados em prática. É necessário, antes de tudo, que sejam
levados a efeito, para que se não caia em um mar morto de dogmas que não servem a nada, ou, pior, servem
para justificar condenações sob o manto retórico de que foram efetivados quando, em verdade, não foi assim o
sucedido.

3. Erosão das garantias fundamentais: ex nihilo nihil fit

O problema aqui trazido parece simples; e é. A narrativa dos fatos na imputação, nos termos do art. 41, do

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CPP[21], deve ser feita de modo pormenorizado, com todas as circunstâncias, descritas de modo preciso, certo
e bem individualizado[22], o que, inafastavelmente, leva à lógica conclusão de que tudo isso – aqui, aplaudem
os positivistas – pode ser apreendido pela mera leitura do texto frio da lei, o qual não dá margem a dúvidas.

Então, a partir do momento em que se tem uma ordem de princípios – que, nunca é demais dizer, são
cogentes[23] – inscrita na Constituição da República e um artigo de lei que prescreve determinação inequívoca
sobre como efetivá-los, restaria pouco para duvidar de que a denúncia jamais poderia ser genérica,
especialmente no caso de diretores de empresas acusados de crimes contra a ordem tributária, econômica e
financeira.

Restaria. A prática, no sentido de ignorar a letra da lei e, pior, fazer de conta que a Constituição não passa de
uma garantia retórica[24] – ou, pior, descaradamente fácil de ser fraudada[25] –, é advertida nos EUA (e serve
para o Brasil), por Roberts e Stratton[26]: “Americans are losing the law that protects them from tiranny, and they
are losing the accountability of law, which ensures that government is the servant rather than the master of the
people. These erosions of liberty and constitutional order are not the work of organized invest groups or the result of
the influence of money on the political process. We Americans are losing the protection and accountability of law
because we have forgotten why these safeguards are important. We have emotionally and intellectually disconnected
from the long struggle to establish the people’s sovereignty over the law.”

Lá, por sinal, o acusado deve ser claramente cientificado do conteúdo da imputação para que a acusação seja
contestada – exceto se o acusado for do Taleban ou da Al Qaeda, é claro, e isso provam os detidos em
Guantanamo –, como determina a 6ª emenda à Constituição, no sentido de que o acusado “be informed of the
nature and cause of the accusation”[27]. “This requirement has application primarly to the indictment or information,
which must identify the offence charged and ‘sufficiently apprise the defendant of what he must be prepared to
meet’.”[28]

No Brasil, como já dito, o hábito de não individualizar corretamente a conduta é contumaz, embora o e. STJ já
tenha se manifestado por diversas vezes contra, valendo citar:

“A denúncia deve satisfazer duas condições: formal – descrição do fato com todas as suas circunstâncias;
material – evidência fática, no âmbito do juízo de probabilidade, de a imputação puder ser reconhecida, no
juízo de mérito. Tais exigências não fazem distinção quanto à natureza da infração penal. Envolve, portanto, os
crimes societários, de pluralidade subjetiva e de co-autoria. Exigência constitucional para efetivar os princípios
do contraditório e da defesa plena. Para ser incluído na denúncia, não basta ser sócio de pessoa jurídica, ou,
nela, exercer atividade de administração. Fundamental é evidenciar (juízo de probabilidade) haver praticado a
conduta (comissiva, ou omissiva), penalmente relevante.”[29]

“Em sendo fundamento do juízo da autoria dos delitos, que determinou a definição dos destinatários da
acusação, não, a prova da prática ou da participação da ou na ação criminosa, mas apenas a posição da recorrida
na pessoa jurídica, faz-se definitiva a ofensa ao estatuto da validade da denúncia (Código de Processo Penal,
artigo 41), consistente na ausência da obrigatória descrição da conduta de autor ou de partícipe dos
imputados.”[30]

Nada mais lógico; e elementar. A partir do momento em que o sistema processual penal brasileiro é orientado
por um Direito Penal de culpabilidade, onde o que está em julgamento não é o autor, mas, sim, o fato[31], a
exigência da individualização torna-se mais clara e incontestável. Não se deve esquecer, também, que há
estreita vinculação entre acusação e sentença[32], pois elas “sono correlate sul tema storico: la seconda può
contenere solo quanto figuri nella prima”[33]. “A acusação define e fixa, perante o tribunal, o objecto do processo.
Num processo de tipo inquisitório puro a acusação, mesmo quando existisse, condicionaria apenas o seda investigação
judicial, não o seu como nem o seu quanto.”[34] Surge, então, a pergunta: se do nada, nada surge, como poderia
haver sentença válida, baseada em denúncia genérica?

Afinal, ante a verdadeira busca de bodes expiatórios[35], que vem ocorrendo para a catarse nacional, surge à
luz a lembrança do julgamento de Ágata Colombini[36]: se o órgão do Ministério Público não sabe qual a
conduta do agente no suposto delito, nem mesmo como descrevê-la, como querer que o acusado saiba? Talvez,

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pense-se, havendo inversão do ônus da prova seria isso possível, o que, antes de ilógico, soa absurdo. Da forma
como está, fair trial[37] não há.

Certo é que, nos crimes contra a ordem tributária, econômica e financeira, há operações complexas, típicas
destes ramos de infrações, o que pode gerar um açodamento na investigação e a desconsideração de fatores
importantes na estrutura societária e financeira (por ex., constar do contrato, mas não praticar ato
administrativo nenhum; ou praticar atos de riscos inerentes às atividades financeiras). Que tudo isso é
complexo, ninguém duvida, mas a complexidade não pode gerar perplexidade, mormente porque nada é de
difícil compreensão.

Por outro lado, é certo que a dificuldade não pode servir de desculpas à indeterminação da acusação. Aliás, nas
maiores dificuldades é que a observância das regras se torna mais importante, sob pena de se perder o próprio
fundamento de um Estado de Direito!

Tanto não é difícil a precisão da acusação ser observada que já disse o e. STF que “a circunstância objetiva de
alguém meramente ostentar a condição de sócio de uma empresa não se revela suficiente para autorizar qualquer
presunção de culpa e, menos ainda, para justificar, como efeito derivado dessa particular qualificação formal, a
decretação de uma condenação penal”[38], bem como que “a autorização pretoriana de denúncia genérica para os
crimes de autoria coletiva não pode servir de escudo retórico para a não descrição mínima da participação de cada
agente na conduta delitiva. Uma coisa é a desnecessidade de pormenorizar. Outra, é a ausência absoluta de vínculo do
fato descrito com a pessoa do denunciado.”[39]

Para que se não diga que os exemplos são isolados, vêm no mesmo sentido, da Corte Suprema brasileira: RHC
57.667[40], RHC 60.652[41], RHC 62.893[42], HC 64.870[43], HC 71.788[44], HC 71.899[45], HC 74.319[46],
HC 73.590[47], HC 74.791[48], HC 79.399[49].

Ora, antes que se impute um crime, é necessário saber se há um crime a ser imputado e se alguém (e,
principalmente, quem) o cometeu; e isso parece lógico desde que Feuerbach[50] traçou as primeiras linhas
sobre a atribuição correta e proporcional de responsabilidades. Isso leva à certeza de que, quanto mais forem
os acusados, mais a atribuição deve ser precisa, para que seja possibilitado o controle da acusação que esteja
sendo feita e, especialmente, seja permitida a defesa preconizada pela CR.

Outro não é o ensinamento de Luigi Ferrajoli, quando afirma que “l’acusa contestata dev’essere formulata in
termini univoci e precisi, idonei a denotare esattamente il fato attribuito e a vincolare ad esso, contro
l’indeterminatezza dell’antico processo inquisitorio, l’oggetto del giudizio e della sentenza che lo conclude.”[51] É
necessária, então, a individualização acusatória[52] preconizada no art. 93, IX, da CR, para que haja um efetivo
gioco leale, nas palavras de Franco Cordero[53]. Na Itália, também, a questão é levada a sério: desde o Codice di
Procedura Penale Italiano de 1913, em seu art. 260, é determinado que o interrogante “contesta in forma chiara e
precisa all’imputato il fatto.”[54]

A validade da acusação e, via de consequência, a obediência ao contido no art. 41, do CPP, surge da imputação
clara e precisa, sem que se joguem os acusados no processo para que, então, provem sua inocência. No preceito
de tal artigo, como se sabe, o advérbio não deixa margem à dúvida, até porque é direito constitucional do
acusado saber, pela imputação precisa e clara, do que está sendo acusado.

Não dá para se dizer, todavia, que a aceitação dessas regras inquisitórias seja unanimidade, como já foi
demonstrado. Ainda magistrado, Alberto Silva Franco lembrava que “a imputação centra-se exatamente neste fato
histórico que deve ser localizado no tempo e no espaço e descrito com pormenores em relação às circunstâncias que
cercaram sua concretização. Entendimento diverso conduziria o juiz a uma situação de real perplexidade, pois se veria
na contingência de traduzir em termos específicos uma imputação feita dentro da mais total generalização e, ao
mesmo tempo, deixaria o acusado numa posição de absoluto desfavor, já que, desconhecendo o conteúdo fático da
acusação, não disporia de uma base sobre a qual pudesse organizar sua defesa.”[55]

Neste sentido, são diversos os precedentes do e. STJ de que “Em sendo fundamento do juízo da autoria dos
delitos, que determinou a definição dos destinatários da acusação, não, a prova da prática ou da participação da ou na

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ação criminosa, mas apenas a posição da recorrida na pessoa jurídica, faz-se definitiva a ofensa ao estatuto da
validade da denúncia (Código de Processo Penal, artigo 41), consistente na ausência da obrigatória descrição da
conduta de autor ou de partícipe dos imputados”[56] e, também, que “toda e qualquer presença de presunção de
responsabilidade, sobretudo, a de natureza absoluta, como sói acontecer em denúncias pelo fato exclusivo da posição
estatutária imputada na pessoa jurídica, readmite proscrita responsabilidade penal objetiva e é manifestamente
infringente do direito penal em vigor, informado pelo princípio do nullum crimen sine culpa, que requisita, como
pressuposto, já em nível da conduta e, pois, da tipicidade, a efetiva prática ou a participação da e na ação
criminosa.”[57]

Pragmaticamente, pensar de outra forma tornaria válido ao Ministério Público deter poderes infinitos – os
quais nem os bispos, com sua aparente “divindade”, pela detenção do “poder das chaves”, conseguiram controlar
–, denunciando genericamente (fornecendo à conduta um tipo penal qualquer), para depois buscar, de modo
desenfreado e quiçá quase paranoico[58], as provas para a condenação.

4. Apontamentos finais

O controle do Leviatã[59] acusatório – e aqui não se critica, como pode parecer a uma primeira vista, o MP,
mas, antes, o sistema –, pelo Judiciário, precisa ser feito, antes que seja tarde demais.

Assim, não seria demasia exigir de um ato tão singelo – mas que causa danos duradouros – que tivesse o
máximo de descrição, mormente quando se está a tratar de fatos pré-constituídos, baseados em números e
registros passados, como sói acontecer em delitos contra a ordem tributária, econômica e financeira. Não fosse
isso, há, na plenitude, formas de se investigar e definir os eventuais autores dos crimes, de modo a não se
produzir e reproduzir injustiças, das quais as notícias são inúmeras. É isso, pois, que o Poder Judiciário não deve
respaldar.

Aliás, não é muita exigência para um momento – a denúncia – que tem sua invalidade findada quando da
sentença condenatória, como tem proclamado a jurisprudência, repetindo velhos dogmas[60]. Por um lado, os
leading cases[61] dizem nada sobre o assunto, pois se fundamentam sobre temas absolutamente diversos dos
utilizados pela jurisprudência “atual” como pretensos paradigmas. Por outro, afirmar que a sentença sana o
vício da denúncia genérica, esclarecendo-a e a superando, significa dizer, em outras palavras, que de umhai kai
podem ser tirados Os Lusíadas.

Enfim, a denúncia deve, obrigatoriamente, sob pena de invalidação do ato e, se for o caso, trancado o processo
por ofensa ao art. 41, do CPP, descrever o fato criminoso com todas as suas circunstâncias, devendo o julgador
zelar para que as garantias sejam efetivadas, resguardando a supremacia da Constituição.[62]

A observância das regras, antes de tudo, visa salvaguardar todo o sistema; a democracia, em si, nada é sem
elas. Entretanto, para isso, é preciso lutar, dar passos adiante, mesmo que a utopia continue lá, andando, como
dizia o poeta. Porque, não for assim, pode-se ganhar a liberdade sem a conquistar, como se fosse um presente
do Estado-Leviatã, que a dá ou não, conforme as marés (que têm estado cada vez mais baixas e mais distantes
da praia); e um presente, afinal, pode ser tirado sem que com isso se cometam grandes injustiças, exceto pelo
choro da criança.

Por fim, cabe a advertência do Justice Clark, relator do caso Mapp v. Ohio[63]: “nothing can destroy a government
more quickly than its faliure to observe its own laws, or, worse, its disregard of the charter of its own existence.”[64]

Notas e Referências:

[2] HAYEK. Friedrich August von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de
justiça e economia. Trad. de Anna Maria Capovilla et alii. São Paulo: Visão, 1985, p. 3 e ss.

[3] HAYEK, F. A.. Direito…, p. 32: “A ilusão que leva os racionalistas construtivistas usualmente a uma
entronização da vontade consiste na crença de que a razão pode transcender o reino do abstrato, sendo capaz

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por si mesma de determinar que ações específicas são ou não desejáveis. (…) A ilusão de que a razão é por si só
capaz de nos revelar o que devemos fazer, e que, portanto, todo homem sensato deveria ser capaz de aderir ao
esforço pela consecução de fins comuns como membro de uma organização, dissipa-se rapidamente quando
tentamos pô-la em prática. (…) A razão é somente uma disciplina, uma apreensão das limitações das
possibilidades de ação eficaz, que muitas vezes nos dirá apenas o que não fazer.”

[4] HAYEK, F. A.. Direito…, p. 157-9: “Entre as normas que comumente chamamos ‘leis’, mas que são normas de
organização e não de conduta justa, estão em primeiro lugar todas aquelas relativas à distribuição e à limitação
dos poderes governamentais compreendidas no direito constitucional. São comumente consideradas a ‘mais
elevada’ espécie de lei, a que se confere uma dignidade especial ou a que se deve maior reverência do que a
qualquer outra. Mas, embora isso possa ser atribuído a razões históricas, seria mais apropriado considerar tais
normas uma superestrutura erigida para garantir que o direito seja mantido, e não a origem de todos os outros
direitos, como geralmente se pretende.(…) Mais que em qualquer outra área do direito público, encontra-se no
direito constitucional grande resistência à afirmação de que ele não possui os atributos das normas de conduta
justa. A maioria dos estudiosos da matéria parece julgar simplesmente abusivo e indigno de consideração o
argumento de que o direito constitucional não é direito no mesmo sentido em que assim chamamos o conjunto
das normas de conduta justa.”

[5] Ninguém desconhece que para Hegel a ética é filosofia do direito, entre outras coisas porque o Estado é a
expressão máxima daquilo que o autor chama de eticidade, ou seja, a substancialização da moralidade nas
instituições históricas que a garantem. HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. Trad.
de Orlando Vitorino. 2ª ed. Lisboa: Martins Fontes, 1976, § 258, p. 216.

[6] HINKELAMMERT, Franz J.. Crítica de la razón utópica. Bilbao: Desclée, 2002, p. 133 e ss. A edição original de
tal obra, porém, foi publicada em 1984 (Crítica de la razón utópica. São José: DEI) e recebeu edição brasileira:
Crítica da razão utópica. Trad. de Álvaro Cunha. São Paulo: Paulinas, 1988, p. 47 e ss). No âmbito de direito
brasileiro, v. COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Jurisdição, psicanálise e o mundo neoliberal. In Direito e
neoliberalismo: elementos para uma leitura interdisciplinar. Curitiba: Edibej, 1996, p. 39 e ss.

[7] A quimera da “lei que dá conta” diz respeito ao problema – de impossível solução – da segurança juridica.
Não é preciso saber muito sobre a “viragem lingüística” para se ter presente que a palavra não segura nada
(não permitindo “o” sentido mas tão-só “um” sentido entre tantos possíveis; tampouco “a” verdade – Toda! –,
sempre demais para um humano), justo porque desliza em giros produzidos pelas freudianas condensações e
deslocamentos (ou metáforas e metonímias, como queria Lacan), motivo bastante para ser levada mais a sério
no Direito, o que, de fato, não ocorre. Eis aí a fonte de boa parte do sofrimento de alguns juristas ao se
defrontarem com ceguinhos, nefelibatas e catedráulicos, como conceituou Lyra Filho, mormente em períodos
como o atual, onde se manipula discursivamente tudo o que for possível. Os lúcidos, sem embargo, sempre
souberam ler nas entrelinhas, de modo a não se iludirem. Bom exemplo são os europeus que viveram sob o
jugo de Hitler e têm muito a ensinar sobre o assunto: “Le leggi contano fino a un dato punto: anche perfette,
restano sulla carta quando nelle midolla pubbliche esplodano appetiti, deliri, fobìe; ma dove siano sbagliate,
disseminano effetti nefasti.” (CORDERO, Franco. Criminalia: nascita dei sistemi penali. Roma-Bari: Laterza,
1986, p. 97). Tradução livre: “As leis contam até um determinado ponto: ainda que perfeitas, restam sobre o
papel quando nos miolos que compõem o espaço público explodem apetites, delírios, fobias; mas onde são
equivocadas, disseminam efeitos nefastos.”

[8] PISAPIA. Gian Domenico. Compendio di procedura penale. 4ª ed. Padova: Cedam, 1985, p. 26. Tradução livre:
“Diz-se justamente que o grau de civilidade de um povo se mede sobretudo pelo modo com o qual são
salvaguardados os direitos e a liberdade do imputado no processo penal.”

[9] HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Trad. de Flávio Beno Siebeneichler.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p. 113: “Antes de retomar esta tensão externa entre as pretensões
normativas de ordens democrático-constitucionais e a facticidade de seu contexto social (Capítulo VII), eu
desejo reconstruir, nos próximos capítulos, a autocompreensão destas ordens jurídicas modernas. E tomo como
ponto de partida os direitos que os cidadãos têm que atribuir uns aos outros, caso queiram regular
legitimamente sua convivência com meios do direito positivo. Esta formulação deixa entrever que existe uma

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tensão entre facticidade e validade permeando o sistema dos direitos em sua totalidade, característica do
modo ambivalente da validade jurídica.”

[10] COUTINHO. J. N. M.. O papel do novo juiz no processo penal. In COUTINHO, J. N. M. (coord.). Crítica à teoria
geral do direito processual penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 14 e ss.

[11] Prevalente a noção kantiana de sistema, não há como se pensar em um princípio misto porque, em Kant,
responde ele pela idéia única, ou seja, aquela(e) que, como amálgama, presta-se a unir em conjunto os
elementos. Daí por que o sistema ou é inquisitório ou é acusatório e, portanto, fundados no princípio
inquisitivo ou no princípio dispositivo, respectivamente. Assim, tão-só discursivamente o sistema pode ser
misto. Portanto, quando aparece ele desta forma, do que se está falando é de um sistema inquisitório ao qual
se agregou elementos do sistema acusatório ou, por outro lado, fala-se de um sistema acusatório ao qual se
agregou elementos do sistema inquisitório. O ludíbrio decorre, ao que parece, de não se ter mais, no mundo,
sistemas puros. Para manejar a diferença é só comparar aquele dos EUA e o brasileiro. Por ela, vê-se logo
quanto inquisitorial segue sendo o sistema aqui adotado.

[12] CORDERO, F.. Guida alla procedura penale. Torino: Utet, 1986, p. 41.

[13] LOPEZ DE OÑATE, Flavio. La certezza del diritto. Milano: Giuffrè, 1968, p. 141.

[14] CORDERO, F.. Guida…, p. 51-2. Tradução livre: “Nas causas milanesas da peste manufaturada, junho-julho
de 1630, vemos como juizes por nada desonestos, antes inclinados a incomum garantismo, fabriquem delito e
delinqüentes: o inquirido responde docilmente; o inquisidor lhe retira da cabeça os fantasmas que para ele
projetou.”

[15] COUTINHO, J. N. M.. Efetividade do processo e golpe de cena: um problema às reformas processuais. In
WUNDERLICH, Alexandre (org). Escritos de direito e processo penal em homenagem ao prof. Paulo Cláudio
Tovo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp. 139-47.

[16] HASSEMER, Winfried. Critica al derecho penal de hoy. Bogota: Universidad Externado de Colombia, 1998.

[17] MARTÍNEZ-BUJÁN PÉREZ, Carlos. Derecho penal económico: parte general. Valencia: Tirant Lo Blanch,
1998, p. 62.

[18] CARVALHO, Salo de; WUNDERLICH, Alexandre. Criminalidade econômica e denúncia genérica: uma prática
inquisitiva. In BONATO, Gilson. Garantias constitucionais e processo penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p.
203.

[19] CORDERO, F.. Guida…, p. 51/2.

[20] Por todos, v. BATISTA, Nilo. Concurso de agentes: uma investigação sobre os problemas da autoria e da
participação no direito penal brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

[21] “Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a
qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e,
quando necessário, o rol das testemunhas.”

[22] CANELUTTI, Francesco. Lecciones sobre el processo penal. Trad. de Santiago Sentis Melendo. Buenos
Aires: EJEA, 1950, p. 193.

[23] “Os tribunais, porém, não estão apenas «ao serviço da defesa de direitos fundamentais»; eles próprios,
como órgãos do poder público, devem considerar-se vinculados pelos direitos fundamentais.” In CANOTILHO,
José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 200-, p. 444.

[24] CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen

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Juris, 2001, p. 188.

[25] CANOTILHO, J. J. G.. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das
normas constitucionais programáticas.2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2001, p. 262.

[26] ROBERTS, Paul Craig; STRATTON, Lawrence M. The tyranny of good intentions: how prosecutors and
bureaucrats are trampling the constitution in the name of justice. Roseville, California: Prima, 2000, prefácio.
Tradução livre: “Os Americanos estão perdendo a lei que os protege da tirania, e estão perdendo a
responsabilidade da lei, a qual assegura que o governo é o servo, ao invés de mestre do povo. Essas erosões da
liberdade e da ordem constitucional não são obras de grupos de investimentos organizados ou o resultado da
influência do dinheiro no processo político. Nós, Americanos, estamos perdendo a proteção e a
responsabilidade da lei porque esquecemos por que essas salvaguardas são importantes. Nós nos
desconectamos emocionalmente e intelectualmente da longa batalha para estabelecer a soberania do povo
sobre a lei.”

[27] Tradução livre: “seja informado da natureza e causa da acusação”. Na íntegra, sem tradução: In all criminal
prosecutions, the accused shall enjoy the right to a speedy and public trial, by an impartial jury of the State
and district wherein the crime shall have been committed, which district shall have been previously
ascertained by law, and to be informed of the nature and cause of the accusation; to be confronted with the
witnesses against him; to have compulsory process for obtaining witnesses in his favor, and to have the
Assistance of Counsel for his defence.

[28] ISRAEL, Jerold H.; LAFAVE, Wayne R. Criminal procedure: constitutional limitations. Saint Paul, Minnesota:
2001, p. 422. Tradução livre: “Este requerimento tem aplicação primária ao indiciamento ou esclarecimento,
que deve identificar o delito acusado e ‘avisar o acusado do que ele deve estar preparado para enfrentar’”.

[29] STJ, RESP 195.547/RJ, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJU de 21 jun. 1999, p. 209.

[30] STJ, RESP 302.543/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 22 set. 2003, p. 394.

[31] ROXIN, Claus. Derecho penal: parte general. Fundamentos. La estructura de la teoria del delito. Trad. de
Diego-Manuel Luzón Pena, Miguel Díaz y Garcia Conlledo, Javier de Vicente Remesal. 2. ed. Madrid: Civitas,
1997, p. 176 e ss.

[32] DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito processual penal. Coimbra: Coimbra Editora, 1974, p. 145: “Deve pois
firmar-se que o objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa
os poderes de cognição do tribunal (…) e a extensão do caso julgado.”

[33] CORDERO, F.. Procedura penale. 6. ed. Milano: Giuffrè, 2002, p. 955. Tradução livre: “são correlatas sobre o
tema histórico: a segunda pode conter só aquilo que conste na primeira”.

[34] DIAS, J. F.. Direito…, p. 144.

[35] FERNANDES, Paulo Silva. Globalização, “sociedade de risco” e o futuro do direito penal. Coimbra: Almedina,
2001, p. 53: “Como se sabe, a ameaça do legislador penal com sanções graves, embora saiba de antemão que
não vai ser capaz de, mesmo assim, proteger eficazmente o bem jurídico – uma vez que se criminaliza a
conduta, mas sabe que será muito difícil, ou mesmo impossível, punir os infractores –, cria a imagem de um
direito penal por um lado incapaz e, por outro, de pura intimidação, que acaba por punir, de quando em vez,
alguns infractores, que não passarão de bodes expiatórios.”

[36] CARRARA, Francesco. Reminescencias de cátedra y foro. Trad. de J. Guerrero. Bogotá: Temis, 1988, p. 263 e
ss.

[37] Inscrito, primariamente, na 6ª Emenda à Constituição Estadunidense, garante o direito a um processo


rápido, ao contraditório, à ampla defesa, à confrontação, ao silêncio, à assistência de Advogado, etc. “The sixth

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Amendment is the heartland of constitutional criminal procedure…”. In AMAR, Akhil Reed. The Constitution and
criminal procedure: first principles. New York: Yale University Press, 1997, p. 89. Tradução livre: “A sexta
Emenda é o núcleo do processo penal constitucional…”. A título de precisão, heartland, nos EUA, é entendido
como uma região geográfica onde valores tradicionais e suas influências predominam.

[38] STF, HC 73.590/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 13 dez. 1996, p. 50.162.

[39] STF, HC 80.549/SP, Rel. Min. Nelson Jobim, DJU de 24 ago. 2001, p. 44.

[40] Rel. Min Thompson Flores, DJU de 6 jun. 1980, p. 4.134.

[41] Rel. Min. Rafael Mayer, DJU de 27 mai. 1983, p. 7.533.

[42] Rel. Min. Sydney Sanches, DJU de 23 ago. 1985, p. 13.778.

[43] Rel. Min. Octávio Gallotti, DJU de 24 abr. 1987, p. 7.194.

[44] Rel. Min. Paulo Brossard, DJU de 4 nov. 1994, p. 29.830.

[45] Rel. Min. Maurício Corrêa, DJU de 2 jun. 1995, p. 16.230.

[46] Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 19 mai. 2000, p. 14.

[47] Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 13 dez. 1996, p. 50.162.

[48] Rel. Min. Ilmar Galvão, DJU de 9 mai. 1997, p. 18.130.

[49] Rel. Min. Nelson Jobim, DJU de 1º jun. 2001, p. 77.

[50] FEUERBACH, Paul Johann Anselm Ritter von. Tratado de derecho penal común vigente en Alemania. Trad.
de Eugenio Raul Zaffaroni e Irma Hagemeier. Buenos Aires: Hammurabi, 1989, p. 117.

[51] FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: teoria del garantismo penale. 7. ed. Roma: Laterza, 2002, p. 622.
Tradução livre: “a acusação cientificada deve ser formulada em termos unívocos e precisos, idôneos a denotar
exatamente o fato atribuído e a vincular a ele, contra a indeterminação do antigo processo inquisitório, o
conteúdo do processo e da sentença que o conclui.”

[52] CARVALHO, S.; WUNDERLICH, A.. Criminalidade…, p. 220.

[53] CORDERO, F.. Procedura…, p. 249.

[54] Tradução livre: “cientifica de forma clara e precisa o fato ao imputado. ”

[55] TACrimSP, Apelação Criminal 299.411-2, Rel. Alberto Silva Franco, j. em 17 nov. 1983, in RT 583/364.

[56] STJ, RESP 302.543/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 22 set. 2003, p. 394.

[57] STJ, RESP 238.670/RJ, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 24 mar. 2003, p. 291.

[58] CORDERO, F.. Guida…, p. 51/2.

[59] Aos que pretendem dizer que o Iluminismo se encerrou, não havendo mais que se falar em Estado-Leviatã,
pois se vive em uma Democracia (o Estado é bom, tal qual o Mágico de Oz, cuidando de todos e fazendo com
que tudo dê certo), com os checks and balances existentes, há de se responder com a Teoria Peter Pan do Bom
Governo: o governo seria maravilhoso se as pessoas acreditassem que ele detém poderes mágicos. Ora,

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Dorothy e seus amigos esquecem que, antes de tudo, o Mágico de Oz é uma pessoa e, por isso, tem todos os
problemas que daí decorrem. Partir da premissa da bondade do Estado dirigido por homens, portanto, é como
ensinar geografia a partir de uma terra plana! Por todos, ver os livros de BOVARD, James. Freedom in chains:
the rise of the state and the demise of the citizen. New York: Saint Martin, 2002; Lost rights: the destruction of
american liberty. New York: Palgrave Macmillan, 2000; Terrorism and tiranny: trampling freedom, justice and
peace to rid the world of evil. New York: Palgrave Macmillan, 2003.

[60] Vide a advertência de SUANNES, Adauto. Os fundamentos éticos do devido processo penal. São Paulo: RT,
1999, p. 204: “O reportar-se a entendimentos anteriores, alguns já bolorentos, porém, vai-se tornando regra,
menos em nome de algum descabido stare decisis e mais por força de um volume exagerado de serviço, ou
simplesmente, por força da lei do menor esforço.”

[61] STF, HC 51.451/SP, Rel. Min. Rodrigues Alckmin, DJU de 2 jan. 1974; STF, RHC 50.880/GB, Rel. Min.
Rodrigues Alckmin, DJU de 28 set. 1973. Basta ver que neste último habeas corpus a ementa contém a
seguinte afirmação, que se transformou na atual orientação, sabe-se lá como, por absoluta falta de
aplicabilidade: “Não é possível exigir, para a propositura de ação penal por crimes de propriedade industrial,
que a queixa descreva a atividade de cada querelado nas deliberações reservadas tomadas na sociedade: tal
exigência torna imune à persecução criminal esses delitos.”

[62] MORO, Sergio Fernando. Desenvolvimento e efetivação judicial das normas constitucionais. São Paulo:
Max Limonad, 2001, p. 84 e ss.

[63] Mapp v. Ohio (1961), 367 U.S. 643. A título ilustrativo, neste caso histórico e cercado de controvérsias,
Dolree Mapp foi condenada por possuir materiais pornográficos, encontrados após busca ilegal em sua casa
pela polícia, a qual estava à procura de um fugitivo. Ela apelou, alegando liberdade de expressão. Embora o
argumento tocasse à 1ª Emenda, a Suprema Corte invalidou o caso pela afronta à 4ª Emenda, pois se tratava de
uma busca ilegal.

[64] Tradução livre: “Nada pode destruir um governo mais rápido que a falha em observar suas próprias leis, ou,
pior, seu desrespeito à Carta de sua própria existência.”

Jacinto Nelson de Miranda Coutinho é Professor Titular de Direito Processual Penal na


Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. Especialista em Filosofia do
Direito (PUCPR), Mestre (UFPR); Doutor (Universidade de Roma “La Sapienza”).
Coordenador do Núcleo de Direito e Psicanálise do Programa de Pós-graduação em
Direito da UFPR. Chefe do Departamento de Direito Penal e Processual Penal da UFPR.
Advogado. Procurador do Estado do Paraná. Membro da Comissão de Juristas do
Senado Federal que elaborou o Anteprojeto de Reforma Global do CPP, hoje Projeto
156/2009-PLS.

Edward Rocha de Carvalho é advogado e mestre pela UFPR.

Imagem Ilustrativa do Post: The Wizard of Oz (1939) // Foto de: Insomnia Cured Here // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/tom-margie/3087835894/

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Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

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