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SINOPSE

Tornei-me rainha dos abandonados, líder de ladrões e


esposa de um homem que instila medo em todos que cruzam
seu caminho. Ele era o marido que eu não queria. Agora, não
consigo entender a vida sem meu rei.

Eu deveria estar pronta para qualquer coisa. Como a


lagarta que se alimenta de veneno durante a metamorfose, fui
criada no mundo perigoso dos crimes de cartel. Mas nada
poderia ter me preparado para Cristiano de La Rosa, o veneno
de seu irmão ou o cartel Calavera.

Ainda é uma história sobre um amor forte o suficiente


para derrubar famílias, unir inimigos e dividir irmãos.
Resiliente o suficiente para derrubar aqueles que tentariam
destruí-lo. e altruísta o suficiente para fazer o sacrifício final.

Mas fui avisada, e você também. O dia da morte sempre


chega.

Desta vez, encontrará o que antes era uma


lagarta agora uma borboleta – e o inferno não
tem fúria como o da Monarca Branca.

Violent Triumphs é a conclusão “emocional,


fumegante, e perigosa” da série White Monarch da
USA Today bestselling.
1

Natalia

EU suspeito que você pode até gostar do sentimento de


rendição.

As palavras distantes de Cristiano ecoaram na escuridão


que caía sobre minha mente. Ele não quis me submeter à
morte, mas as mãos em volta do meu pescoço exigiram isso.

A parte de trás do meu crânio latejava onde havia sido


batida contra o chão de ladrilhos. Um momento, eu estava
tentando dizer a Cristiano algo importante por telefone. O
próximo, arrastada pelo nosso quarto e presa nas minhas
costas por um peso imóvel.

Agora, pontadas de luz branca perfuravam o preto.


Estrelas no céu noturno, prometendo paz. Não seria difícil
caminhar na direção delas. A escuridão sempre foi uma
presença feroz dentro de mim. Desconhecida. Sempre
convidativa.

A rendição seria simples. Meu corpo e meu treinamento


haviam falhado comigo – eu nem sequer revidei. Ou talvez
nada até aquele momento tivesse sido real. Talvez tudo isso
tivesse sido um sonho, e eu estava sendo arrancada do sono.
Quando minha traqueia se fechou sob o aperto, meus
gritos cederam. O alarme estridente da casa desapareceu em
um zumbido pacífico. Meu medo diminuiu um oceano de
tranquilidade subindo em seu lugar.

Céu.

Mamá me esperava de braços abertos.

Vá para ela. Esteja com ela novamente.

Eu não estava acordando. Eu estava morrendo.


Cristiano era a última pessoa que eu esperava ver nos
portões do Céu, mas lá estava ele, esperando de terno e
gravata. Graças a Deus. Onde quer que eu tivesse indo,
Cristiano estava lá e ele não deixaria nada me machucar.

Ele e minha mãe seriam a luz, a serenidade, o prêmio


por ceder à morte.

Tudo o que eu tinha que fazer agora era sucumbir. Vá


para ele.

Cristiano.

— Cristiano está morto. — Uma voz masculina e áspera


tomou conta de mim do jeito que mãos fortes travavam em
volta da minha garganta. — Você não tem porque lutar, —
disse ele. — Vá dormir.

A palavra raspou através dos resíduos da minha


consciência. Morto.
Era por isso que Cristiano me esperava nos portões para
a eternidade.

Mas ele não poderia morrer. Ele era intocável.

O que seria do mundo sem Cristiano de La Rosa? A dor


me inundou, mas com a mesma rapidez diminuiu. E em seu
lugar, a fúria aumentou. Alguém matou Cristiano.

A voz acima de mim pensou que eu não tinha nada pelo


que lutar, mas isso só me deu uma razão.

Ninguém – ninguém – iria fugir do assassinato de meu


marido.

Lute Natalia. Render-se não é uma opção.

A realidade cintilou. Artérias carótidas. Sem oxigênio.


Eu me forcei a sair da escuridão invasora. Arranhei os dedos
em volta do meu pescoço. Eu arqueei minhas costas até que
eu estava olhando de cabeça para baixo no espelho do quarto
encostado em uma parede. Na minha primeira noite aqui,
ficamos na frente dele – Cristiano passando os braços em
volta de mim por trás, exigindo a minha submissão. Eu não
tinha desistido antes. E com o tempo, eu fiquei mais forte.
Mentalmente, emocionalmente – e fisicamente. Sob a
orientação de Cristiano.

Eu queria aqueles momentos com ele de volta. Para ele


sobreviver, para que eu pudesse olhá-lo nos olhos e dizer que
resisti e venci.

Porque ele me ensinou como. Ele me ensinou a ter força.


Com um clique, lutei para virar a cabeça e ver de onde
vinha, mas minha visão ficou turva. O luar brilhava em um
metal. Uma faca? Foda-se. Comecei a me debater com ele.

— Shh, — ele disse. — Isso não vai doer.

Eu não tinha defendido contra uma faca. Nenhuma


arma. Nada em mim, exceto pijamas de cetim frágil e muita
pele exposta. Mas minha respiração. estava voltando.

Mude sua mentalidade, Cristiano havia me dito. Você


está no controle. Você pode derrubar um agressor. Você pode
lutar por sua vida e fugir.

Era tudo o que eu tinha que fazer. Fugir. Correr. Eu não


estava no nível que precisava para vencer, mas tinha a
vontade de sobreviver do meu lado – e o fato dele ter retirado
uma mão do meu pescoço para pegar a lâmina. Eu só
precisava incapacitá-lo por tempo suficiente para fugir dele e
chegar ao quarto do pânico.

Minha primeira aula de autodefesa no gramado me


ensinou mais do que combate corpo a corpo. Havia a arte da
diversão. A magia da distração.

Você já esteve na Disneylândia? Eu perguntei a


Cristiano quando a barra de seu antebraço travou em volta
do meu pescoço por trás.

O som do riso de resposta de Cristiano me emocionou.

Palavras rasparam da minha garganta. — Cristiano...


Não está... morto.
O rosto do agressor inclinou-se para o meu, dando-me
meu primeiro vislumbre em close dele no escuro. Nariz torto,
mau hálito, olhos redondos. — O que?

— Ele não está morto. Eu posso... — Eu deixei minha


voz vacilar, — levá-lo até ele.

Ele se inclinou para mais perto. — ¿Qué?

Eu bati minha testa em sua boca, e sangue jorou de


seus lábios. — ¡Cabrona! — Ele amaldiçoou.

A palma da minha mão bateu na traqueia dele. Plástico


caiu no chão. Eu só tinha força suficiente para chocá-lo, mas
era tudo que eu precisava. Ele afrouxou a outra mão em volta
do meu pescoço e eu o dei um soco no mesmo local, desta vez
com mais força.

Alarme cruzou seu rosto com seu grito gutural. O fato


de ele poder gritar significava que eu não tinha esmagado sua
traqueia. Eu apertei minha mão esquerda e fiz bom uso do
diamante extravagante que Cristiano tinha me dado. Enfiei
meu anel de casamento na garganta do homem várias vezes,
até que ele me soltou completamente para agarrar seu
próprio pescoço. O sangue escorreu para mim quando ele
chiou tão forte que meu próprio peito ficou apertado.

Com o pé descalço, chutei-o na virilha, me arrastei por


baixo dele e pulei. Eu tinha dado apenas dois passos quando
a mão dele agarrou meu tornozelo, e eu caí para frente.
Minha cabeça quebrou o espelho. Ele oscilou, e eu rolei uma
fração de segundo antes de cair no chão.
A briga curta tinha me acabado, mas ele ainda não
havia caído. O movimento do canto do meu olho me
estimulou a voltar. Peguei o maior pedaço de vidro quebrado
ao meu alcance e me levantei. No momento em que eu estava
de pé, o homem me agarrou por trás. Ele prendeu meus
cotovelos ao meu lado com um braço, agarrando o copo com
a outra mão. Eu a segurei até o sangue escorrer pelos meus
dedos, mas ele arrancou de mim e colocou na minha
garganta.

— Ninguém… me disse... que você revidaria, — ele


ofegou, lutando para falar. Se a boca dele não estivesse no
meu ouvido, eu não o teria ouvido por causa do alarme
estridente. — Seu marido te ensinou isso?

— Foda-se

— É uma ótima surpresa. Muito emocionante. Mas eu


vou cortar sua garganta se eu realmente precisar. — Sua
frente colou contra as minhas costas, ele levantou meu
queixo com o caco do espelho enquanto seu tom passava de
divertido para mau pressentimento. — Seu marido roubou de
nós. Esse é o preço. Para cada mulher que Cristiano levou,
mataremos duas dentro dessas paredes.

Eu já estive nessa posição antes, à mercê de um homem


ameaçador e seus caprichos. E eu estava com tanto medo.

Mas Cristiano havia me ensinado uma lição valiosa


naquele dia que ele simulou me atacar no gramado.
Eu não deveria ser subestimada. Eu sobrevivi ao meu
tempo na Terra dos Condenados, fazendo o meu melhor para
me proteger de todos os ângulos – mental, fisicamente,
emocionalmente. Cristiano me empurrou o mais longe que
pôde sem me machucar. Mas agora, eu tinha que estar
disposta a me machucar.

Eu puxei o pulso do meu atacante com todo o meu peso


corporal. O caco cortou o comprimento da minha garganta
enquanto eu girava até o braço do homem ser torcido em um
ângulo não natural. Puxei-o o mais para trás que pude e dei
um tapinha no nariz dele. Ele tropeçou para trás através dos
arcos para a varanda quando o sangue jorrou de seu rosto.

Correr? Ou ficar e lutar? Eu tinha que decidir

— Maldita perra1. — Ele me atacou com o fragmento de


vidro. — Sua puta de merda.

Tarde demais. Eu quebrei a primeira regra que Cristiano


me ensinou.

Não hesite.

Cobri meu rosto e me abaixei um segundo antes de um


tiro explodir através do quarto. Abaixei meus braços quando
seu corpo estremeceu e cambaleou na varanda. Ele tossiu,
estendendo a mão para mim, sangue borbulhando de sua
boca.

Eu não hesitaria duas vezes.

1 Maldita cadela
Eu corri para ele e o empurrei o mais forte que pude. Ele
virou para trás por cima do muro e caiu no penhasco
rochoso. Seus gritos guturais ecoaram pela encosta da
montanha até que ele atingiu um penhasco com um baque e
aterrissou na faixa da costa abaixo.

O silêncio desceu. Até os alarmes se tornaram ruído


branco. Eu matei um homem. Eu não tinha pensado nisso.
Apenas impelo ele... empurrei ele... assassinei ele.

Apertei meu pescoço. Algo quente e pegajoso encheu


minha palma. Afastei minha mão – sangue. Ele teria me
matado sem pensar duas vezes. Eu não lhe devia nada, mas
espiei pela borda de qualquer maneira. Havia luar suficiente
para distinguir sua figura sombreada, braços e pernas
espalhados como uma imagem de ação quebrada. Uma
sombra escura se infiltrou na areia. — Oh meu Deus...

— Ele está morto. — Eu me virei para encontrar o corpo


pequeno de Jaz na porta, sua arma apontada para mim. Ela
levantou a voz sobre as sirenes e acrescentou: — É um longo
caminho.

Uma batida passou quando nos encaramos. — Obrigada


— eu disse.

Ela abaixou a pistola. — Eles cortaram a eletricidade e


destruíram os geradores, — disse ela. — Temos que subir as
escadas para o quarto do pânico

— Eles?
— Há mais homens na casa

Olhei de novo por cima do muro. Maré alta. O oceano


espumoso lambia o corpo distorcido na praia. — Ele disse
que eles estão aqui para nós, — eu disse a ela. — As
mulheres. Como vingança

— Você está comigo? — Jaz perguntou.

Uma brisa passou pelo meu corpo seminu. — Eu


deveria...

— Não há tempo, — disse ela, virando-se. — Vamos

Ela correu pelo quarto, e eu a segui enquanto corríamos


para o segundo andar. — Espere! — Eu disse na entrada da
escada e me virei.

— O que você está fazendo?

— Temos que pegar Pilar. — Mantendo minhas costas


na parede, caminhei pelo corredor escuro até o quarto dela,
onde assobiei seu nome.

Depois de um segundo, Pilar deslizou para debaixo da


cama, o rosto manchado de lágrimas. — Natália. Ay, Dios mío

— Venha, — eu disse agachada para ajudá-la. —


Depressa. Você está machucada?

— N-não. — Ela tremeu quando se levantou. Jaz


guardou a porta, enfiando a cabeça no corredor antes de nos
chamar.
Pilar ofegou. — Você está coberta de sangue.

— Estou bem.

— Quem está fazendo isso? — Ela perguntou. — O que


eles querem?

— Vamos lá, — Jaz sussurrou.

Peguei a mão de Pilar e deixei Jaz nos levar através da


escuridão, confiando em seu conhecimento íntimo da casa.
Quando chegamos ao térreo, ela conduziu Pilar e eu à sua
frente. — Corram. Eu vou cuidar de nossas costas.

Atravessamos a sala principal e diminuímos a


velocidade quando nos aproximamos da cozinha, o caminho
mais rápido para a adega e o quarto do pânico. Jaz levantou
a arma e entrou primeiro, seus olhos se estreitaram
bruscamente enquanto ela examinava a sala.

— Está livre, — disse ela, acenando para uma porta que


dava para a garagem. — Por lá. Você conhece o caminho?

— Sí, — eu respondi. — E você?

— Bem atrás de você.

Agarrei o braço de Pilar e corri para frente. Meus pés


descalços bateram no ladrilho e estávamos ao alcance da
maçaneta quando Pilar tropeçou e me puxou para baixo com
ela. Minha cabeça acabou de errar o canto de uma mesa, mas
minha bochecha bateu no chão. A dor passou pelo meu rosto,
mas eu esqueci rapidamente quando Pilar gritou.
Olhei para trás e bati a mão na boca. Caímos sobre
Rocío, uma mulher que havia trabalhado ao lado de Fisker na
cozinha. O sangue espirrou no chão e nos armários,
escurecendo o chão ao seu redor.

— Shh. — Jaz puxou Pilar para seus pés e, quando ela


não se aquietou, a silenciou com um tapa no rosto. Jaz se
agachou. Segurou os dedos no pescoço de Rocío. — Ela está
morta.

Minha garganta se fechou. — Ela- ela estava indo para o


quarto do pânico também.

— Talvez. — Jaz fez o sinal da cruz pegou uma arma ao


lado do corpo de Rocío e acenou com a cabeça em direção à
geladeira. — Mas ela caiu brigando.

Eu segui seu olhar para o que parecia ser o corpo de um


homem caído em um canto. — Esse é um deles?

— Ele não é um de nós. Outros cartéis não percebem


que sempre revidamos. Todos nós. Nós vencemos ou
morremos tentando. — Jaz entregou a arma a Pilar. — Mas
todos nesta casa lutam.

— Eu não sei o que fazer com isso, — disse Pilar,


segurando a Glock como se fosse uma bomba-relógio.

— Se alguém vier até você, aperte o gatilho, — disse Jaz,


fechando a mão de Pilar em torno dele. — Você precisa cuidar
das costas de Natalia. Provavelmente é ela que eles querem. E
ela vai levar vocês para o quarto do pânico.
— E você? — Perguntei.

Os olhos de Jaz caíram para Rocío. — Eu te disse, — ela


falou, engolindo. — Eu luto.

— Não, Jaz. — Puxei seu braço para fazê-la me encarar.


— Você não entende. Aqueles homens estão aqui para nós.
Eles estão procurando por qualquer mulher, e vão matar
você.

— Tenho um trabalho a fazer. Assim como Rocío.

Eu ainda não sabia exatamente como Jaz tinha acabado


na Terra dos Condenados, mas eu poderia juntar um pouco
disso. Na minha primeira manhã aqui, ela revelou que havia
usado o sexo para sobreviver em algum momento de seu
passado. Cristiano havia dito mais cedo hoje à noite que Jaz
não sabia muita bondade. Considerando que a Terra dos
Condenados foi parcialmente construída como um porto
seguro e centro de reabilitação para vítimas do comércio de
prazer, trabalho forçado e muito mais, Jaz provavelmente se
encaixava em uma dessas categorias. — Talvez eles não
matem você, — eu disse. — E se eles te levarem?

Ela congelou, o medo claramente trabalhando através


dela. — Eu... eu não posso me esconder lá enquanto...
enquanto os outros nos defendem.

— Você não está se escondendo. Você está nos


protegendo. — Eu queria gritar para chegar até ela, mas lutei
para falar como estava, minha garganta doendo. Agarrei seus
braços e a sacudi até o alarme cruzar seu rosto. — Nós
precisamos de você. Se você não vem conosco, eu vou ficar
aqui com você.

— Não, por favor, — Pilar implorou com um soluço, os


olhos arregalados fixos em Rocío. — Você não pode me deixar
sozinha.

Jaz balançou a cabeça. — Se você morrer, e Cristiano


sobreviver, ele mesmo me matará.

— Então, onde você acha que ele iria querer o seu


lutador mais persistente?

— Com você. — A mandíbula de Jaz se firmou. — Tudo


bem, vamos lá.

Todas nós caímos pela porta, entramos na garagem e


descemos as escadas até o porão. Na porta do quarto do
pânico, eu estava tremendo demais para colocar meu polegar
no scanner de impressões digitais, então Jaz assumiu. Em
segundos, acendeu o verde e a trava se abriu.

Deixei Pilar e Jaz entrar primeiro. Após a quase


completa escuridão da casa, as luzes do teto do quarto
queimaram meus olhos e transformaram todos em um tom
opaco de cinza. Fechei a porta e a batida ecoou no completo
silêncio. Até Pilar parou de chorar. Trancada no cofre,
pressionei minha testa contra a porta fria de aço.

Cristiano.
Mesmo à distância, ele me salvou. Se não fosse pelas
minhas aulas de autodefesa, eu não estaria aqui. Mas onde
ele estava?

Preciso que você se salve e volte para casa, ele me disse


uma vez.

Eu estava em casa. Eu me salvei.

Ele tinha se salvado?

Minha respiração gaguejou.

— Cristiano está morto. Você não tem porque lutar. Vá


dormir.

As palavras com as quais eu tinha sido pressionada me


provocando. Sem ar. Quase não tenho esperança de me
salvar. Minha garganta se contraiu quando mãos fantasmas a
envolveram.

Fiz dois punhos, lutando contra os soluços que subiram


rápidos e esmagadores, no meu peito. Cristiano não tinha
soado bem no telefone mais cedo. Ele chamou meu nome
como se estivesse em câmera lenta, à distância. E havia um
homem ao fundo. O que ele disse?

Minhas têmporas latejavam quando o fundo da minha


garganta doía por conter as lágrimas. Estávamos
conversando... meu coração acelerou com um tipo de
excitação desconhecida e assustadora.

Volte.
Essa era a coisa importante que eu estava tentando
encontrar uma maneira de dizer a ele sem trair a pessoa que
eu era quando cheguei aqui.

Se eu soubesse que esses eram seus momentos finais,


eu teria dito isso.

Venha para casa.

Eu me virei e encostei-me na porta. Uma das paredes à


minha frente foi aberta para revelar prateleiras, como o
interior de um grande armário. Jaz passou um cobertor e
água para Pilar, enquanto segurava a arma na outra mão.
Em um canto, um monitor de TV tremeluzia com imagens de
segurança da casa. Não que houvesse muito o que ver
quando estava mortalmente quieto e silencioso.

Abri a boca para contar a Jaz o que tinha acontecido.


Talvez eu pudesse conectar o ataque ao andar de cima com o
que ouvi no telefone com Cristiano. Mas as palavras de antes
de Jaz voltaram para mim.

Se ele não voltar, você não conseguirá sair.

Ela me avisou que ninguém na Terra dos Condenados


perdoaria Cristiano arriscando sua vida em meu nome. Se
Cristiano estava em perigo, eu estava em perigo. Jaz deixou
claro horas atrás.

Seria minha culpa se ele não chegasse em casa.

O custo de sua vida seria meu.


De repente, Pilar estava na minha frente, tentando me
afastar da porta. — Você não parece bem.

— Ela bateu a cabeça, — disse Jaz, mudando os olhos


castanhos em forma de amêndoa para mim. — Você sente.
¿Cómo se dice? Como se diz em inglês? Doente do estômago?

— Náusea. — Pilar torceu o cabelo escuro em cima da


cabeça, prendeu-o com um nó e pegou meu cotovelo. — Você
deveria se deitar.

— Ela deveria fazer qualquer coisa, exceto se deitar, —


disse Jaz.

— Onde estão todos os outros? — Perguntei a Jaz. Pilar


puxou meu braço, mas fiquei parada. As batidas na minha
cabeça poderiam esperar. — Onde está Alejandro?

Jaz balançou a cabeça. — Lutando ou morto.

— Você viu ele?

— Não, mas eu sei. Algum cartel acha que pode entrar e


nos matar, mas ninguém que entra sairá vivo. Nós podemos
nos defender, e nós iremos. Eles não sabem que todas as
pessoas nesta casa lutam até a morte pelo que construímos.

Terra dos Condenados não era a cidade de Cristiano.


Pertencia a todos eles. E, aparentemente, eu não era a única
que Cristiano havia preparado para se defender – e defender
este lugar – no caso de sua ausência.
Pilar voltou ao armário, procurando nas prateleiras.
Quando a porta apitou atrás de mim, me mudei e Alejandro
conduziu duas mulheres da equipe que correram para os
braços abertos de Jaz.

Agarrei o cotovelo de Alejandro. — Você já ouviu falar de


Cristiano?

— Eu estive procurando por você. — Seus olhos


percorreram meu rosto enquanto Jaz e as mulheres
conversavam uma sobre a outra em espanhol. — O que
aconteceu?

— Você já ouviu falar dele? — Eu repeti alto, e o bunker


ficou em silêncio.

Cristiano está morto.

Esse é o preço.

Alejandro olhou para o chão. — Eu tenho que voltar lá


em cima. Fique aqui até eu te buscar.

— Max? — Jaz perguntou do outro lado da sala. —


Daniel?

Ouvindo os nomes dos dois homens que tinham ido com


Cristiano em sua missão, Alejandro virou o rosto. Graxa
manchou sua bochecha. — Nada.

Meu coração perdeu uma batida quando o pânico


aumentou em mim. — Nada? — Eu perguntei.

— Ninguém está atendendo minhas ligações.


— Talvez eles não consigam, — disse Pilar. — Eles
poderiam ter desligado o telefone ou adormecido.

— Eles foram atacados também. — Alejandro suspirou


claramente dividido sobre falar ou não, e talvez até o quanto
ele deveria dizer. — E em situações de emergência como essa
– perigo em campo, intruso ou ataque dentro das paredes –
sempre fazemos check-in em dez minutos. Não importa o
quê, — disse Alejandro. — É uma regra.

O ar ao meu redor se contraiu. Minha visão se estreitou


em uma mancha de sangue na camisa verde de manga
comprida de Alejandro. Eu ainda podia ouvir a voz profunda
e viva de Cristiano pelo telefone. Sua risada suada. Seu
comando controlado e enervante para eu descer ao porão
quando as sirenes soaram. Não houve alarme do seu lado.
Apenas meu nome. E a voz em segundo plano.

— Um presente de Belmonte-Ruiz, cabrón. Você fudeu


com a gente pela última vez.

— Belmonte-Ruiz, — eu sussurrei. O mais difundido


círculo de tráfico de seres humanos do México. Eles queriam
Cristiano morto, e por boas razões. Ele roubou deles. Evitou
suas tentativas de detê-lo. Orgulhava-se de machucá-los e do
fato de ele ainda estar de pé.

Era apenas uma questão de tempo até que o alcançasse.


E, no entanto, mesmo sabendo que isso colocava sua casa,
seu povo, sua esposa e ele mesmo em perigo – ele persistiu.
Ele não seria impedido de ajudar aqueles que não podiam se
ajudar.

Eu queria ficar brava com ele por isso, mas isso só


mostrava o tipo de homem que ele era. Um homem que eu
duvidei e critiquei todas as chances que eu tinha tido. Algum
bem neste jardim do mal. E eu não tive a chance de contar a
ele antes deles.

Eu sufoquei um soluço. — Eles tentaram matá-lo.

— Eles podem ter conseguido, — disse Alejandro.

Uma onda de náusea me atingiu. Toquei o corte


ensanguentado na garganta. De repente, tudo palpitou. Meu
pescoço. Minha mão. Minha testa onde eu a bati contra o
vidro, minha bochecha bateu no chão.

— Verifique a cabeça dela, — disse Alejandro a Jaz. —


Ela parece muito pálida.

— Eu estou bem. — Eu tinha que estar. Eu precisava de


respostas, não mais problemas. Peguei a camisa amarrotada
de Alejandro. — Você precisa encontrar o Cristiano. O
telefone dele pode estar quebrado, — falei. — Eles poderiam
ter perdido o sinal. Ou foi forçado a deixar as coisas para
trás. Ele não pode estar... ele precisa de nós.

— Eu enviei uma equipe para encontrá-los, — disse


Alejandro, uma tentativa fracassada de parecer
tranquilizador. — Segundo o GPS, Cristiano e Daniel não se
mexeram. Eu acho que é bom. Mas Max. o telefone dele está
off-line.

Eu fiz uma careta. — Por que?

— Inferno se eu sei, mas ele responderia se pudesse.

— O que acontece se você não tiver notícias deles dentro


de dez minutos após uma emergência? — Pilar perguntou.

— Isso nunca aconteceu, — respondeu Jaz.

— Nunca? — Eu olhei para Alejandro para confirmação.


— Em todos os anos que você conhece Cristiano, nunca
houve uma vez uma falha de comunicação, um acidente, a...

— Nunca. — Ele olhou o relógio. — Sempre


encontramos uma maneira de fazer contato, mesmo que
tenhamos que encontrar um telefone de alguma forma. Já faz
mais de meia hora. — Alejo fungou e agarrou a maçaneta da
porta. — Eu tenho que pegar...

— Isso não significa nada, — disse Pilar, sua voz


subindo quando ela olhou para Alejandro. — Telefones
falham o tempo todo. E você precisa trabalhar do seu lado da
cama

— Só estou tentando preparar Natalia. — Apesar do tom


brusco, a preocupação gravou as linhas ao redor dos olhos de
Alejo. — Mesmo deixando de lado a regra dos dez minutos, se
Cristiano estivesse vivo, ele nunca deixaria passar tanto
tempo sem verificar Natalia.
Oh Deus. Meus membros enfraqueceram e agarrei o
braço de Pilar. Alejo estava certo. O silêncio de Cristiano
falou mais alto do que qualquer coisa. Ele e eu tínhamos uma
história turbulenta, um casamento que mais se parecia com
um campo de batalha e estávamos brigando há semanas –
mas meu instinto sabia. Ele teria feito qualquer coisa ao seu
alcance para garantir que eu estivesse segura.

E mesmo que eu tenha desejado a minha vida de volta


mais vezes do que eu poderia contar, eu também queria
segurança para ele. Eu o queria de volta.

O mundo começou a flutuar. Deslizei por uma parede e


abaixei a cabeça entre os joelhos.

Se eu tivesse dúvidas, elas desapareceram diante dos


meus olhos.

Algo que ele disse na festa de gala voltou para mim.

Era o último desejo do Cristiano ouvir-me gritar.

E os céus lhe haviam concedido isso.


2

Natalia

Meu mundo tremeu, e eu me assustei. Jaz se curvou


sobre mim, iluminada pelas luzes brancas que pareciam tão
brilhantes quanto o sol. — Em que mês estamos? — Jaz
perguntou.

— O quê? — Eu me sentei lentamente. Não me lembrava


de estar deitada no chão ou me enrolar com um cobertor.

— Você sabe sua idade?

— Eu... vinte. Por que...

— Bom o suficiente. — Jaz ficou de pé abruptamente e


voltou para o lado dela do quarto. Ela se sentou em um
canto, puxou as pernas para o peito e segurou a arma na
parte superior dos joelhos.

Pressionei a palma da minha mão na minha cabeça


latejante para encontrá-la enfaixada. Minha mão também
tinha sido embrulhada em pedaços de vidro. — O que
aconteceu?

Ela manteve os olhos na porta. — Você desmaiou.


Minha visão dobrou. Cobertores e travesseiros foram
arrumados ao redor da sala. Mais mulheres apareceram.
Todo mundo dormiu, exceto Jaz.

— Quanto tempo eu estive fora? — A pergunta saiu


como um sussurro arranhado, minha garganta traumatizada
protestando.

— Eu não sei. Algumas horas? — Ela deu um suspiro.


— Alejandro diz que lá em cima está limpo, mas eles estão
lidando com os corpos.

— Corpos? Plural? Há notícias sobre... — Eu não


conseguia dizer o nome dele. Cristiano. Mesmo pensar fazia
meu coração afundar.

— Todas as mulheres que sobreviveram estão nesse


quarto. — Ela mudou. — Nada de Cristiano.

Eu lutei contra outra onda de náusea. Nada foi o pior


cenário possível. Todos os sinais apontavam para sua morte.
Eu tinha que acreditar que ele estava vivo, no entanto. Que
ele, como eu, tinha lutado o mais forte possível. Por toda a fé
que ele depositou em mim ao longo da minha vida, eu lhe
devia o mesmo.

— Ninguém se apresentou – não Max, Daniel ou


Cristiano. Eles estão mortos. — Seu nariz pequeno e pontudo
se contraiu. — O que você vai fazer sobre isso?

— O que?
— Eles mataram seu marido. Não é um homem
qualquer... o líder de uma poderosa organização criminosa.
Nosso salvador. Nosso protetor.

Eu levantei minha cabeça. Ela esperava que eu


assumisse Belmonte-Ruiz? Não. Ela esperava que eu me
encolhesse e caísse, ou fugisse. Talvez isso fosse sensato. Se
Cristiano de La Rosa não podia vencê-los, eu também não.
Então, novamente, acabei de derrotar um agressor que tinha
todas as vantagens contra mim.

Mas eu não conseguia pensar em algo tão assustador


agora. Esfreguei meus cotovelos, apenas com alguns pontos
doloridos. — Você cuidou de mim? — Perguntei a Jaz,
notando o kit de primeiros socorros aberto ao lado dela.

— Eu te acordei para ter certeza de que não tem uma


concussão, — respondeu ela. — Eu não acho que você tenha

— Como você sabe?

— Eu já fiz isso várias vezes para Cristiano e os caras.


Você provavelmente ficará bem. — Jaz puxou os joelhos com
mais força contra o peito. — O que é muito ruim. Isso teria
me poupado alguns problemas. Eu te disse o preço da vida de
Cristiano.

Minha vida.

Pilar sentou-se em sua cama improvisada no canto,


esfregando os olhos. — O que isso significa?
— Seu destino está ligado ao dele. — Jaz olhou para
Pilar. — O seu também

— Cristiano se colocou em perigo por mim, — disse a


Pilar. — Segundo Jaz, é minha culpa se ele morrer.

Pilar levou as mãos instáveis à boca. — E eles vão nos


matar?

Eu sempre tentei proteger Pilar, mas se Cristiano me


ensinou alguma coisa, era que nenhuma arma poderia
corresponder à verdade. Quanto mais ela soubesse, maior a
chance de sair daqui viva. — Eles vão tentar.

Eu segurei o olhar de Jaz. Ela não me assustou. Suas


ameaças só vieram da preocupação - eu sabia, porque ambas
tínhamos medo da mesma coisa.

Perder Cristiano.

E ela queria o que eu queria - sua sobrevivência.

A questão era por que eu me importava? Eu lutei com


Cristiano a todo o momento. Despojada, sem indignação para
me esconder atrás, apenas minha esperança básica,
inalterada e inexplicável permaneceu.

Que ele viveria.

Que ele voltaria para mim.

Que eu teria a chance de dizer a ele que eu não era a


mesma garota que chegou aqui. E que eu não o via como o
mesmo homem.
O tempo passou de maneira diferente no cofre. Eu não
tinha noção do quanto tempo passou quando Alejandro
finalmente reapareceu.

Eu pulei de pé, me apoiando na parede quando fiquei


tonta. — Bem? — Perguntei.

— Um helicóptero está entrando. Não é um dos nossos,


mas fizemos contato. — Alejandro olhou de Jaz e para as
mulheres acordando no chão para mim. — Cristiano está
nele.

Cobri minha boca e soltei um soluço inesperado. — Ele


está vivo?

— No sé2. — Incerto, Alejandro balançou a cabeça. —


Mas temos ótimos médicos à disposição para recebê-lo.

Eu colocaria os olhos nele. Tocaria ele. Diria a ele que


eu queria que ele ficasse. Que eu não queria mais sair. — Eu
deveria estar lá quando ele pousar, — eu disse, empurrando
uma dor de garganta.

Alejandro hesitou. — Com todo o respeito, você


provavelmente estaria no caminho. Nós temos isso sob
controle. Pode ser melhor se você ficar aqui embaixo.

— Pode ser melhor se eu não ficar, — eu respondi.

Alejandro arqueou uma sobrancelha. Até agora, eu não


tinha dado a ele – ou a ninguém – motivos para acreditar que

2 Eu não sei
gostaria que Cristiano voltasse vivo. Mas, apesar dos meus
melhores esforços, meus sentimentos por Cristiano estavam
se formando. Eu não queria admitir, mas agora não tinha
escolha. Eu não tinha mais nada para esconder. Minha alma
doía profundamente ao pensar em perdê-lo, em nunca mais
ouvir sua voz profunda e sólida de coisas não ditas.

— Você disse que Cristiano vai querer saber que estou


segura, — eu disse. — Talvez me receber lá, lhe dará
esperança.

Alejandro assentiu atrás dele. — Venha, então.

Fora do quadrado de metal, meu peito afrouxou. Eu


poderia respirar novamente. Eu estava agindo. Subimos
rapidamente para a garagem.

Alejandro sacou a arma quando entramos na casa por


uma porta dos fundos. — Fique do meu lado.

Embora algumas luzes voltassem a acender, minha pele


se arrepiou com a estranha quietude, como se a casa
estivesse deserta há meses. Alejandro ficou perto de mim, sua
postura firme.

— Eu pensei que você tinha dito que a costa estava


limpa, — eu sussurrei.

Ele não respondeu. Segundo Cristiano, cem por cento de


confiança em qualquer coisa era um desejo de morte.
Entramos em uma ala da casa que eu raramente tive a
chance de explorar a caminho de um elevador que só ouvi
falar de passagem.

Quando entramos, perguntei: — Para onde isso vai?

— Para o heliporto no telhado.

Saímos do elevador e pisamos em uma plataforma de


pouso aberta e bem iluminada. Não era nem o telhado – o
último andar da casa estava bem abaixo de nós. Era apenas a
noite negra e interminável no topo de uma montanha. Eu já
havia olhado para o mesmo céu e me deleitei com a variedade
de estrelas. Agora, elas estavam escondidas, afogadas pelos
holofotes.

Andamos em direção a um círculo de concreto elevado


delineado em tinta branca com um ‘H’ no centro. Uma equipe
de homens de jeans e camiseta esperava mãos nos bolsos,
sobrancelhas enrugadas.

— Quem são eles? — Perguntei.

— A equipe de trauma. Outros profissionais médicos


estão lá embaixo cuidando da equipe. — Alejo apontou para a
única mulher. — Ela lidera a equipe e já trabalhou com
Cristiano antes.

Mordi minha boca, olhando-a. Eu só conhecia hospitais


estéreis, jalecos brancos, estetoscópios, máquinas de alta
tecnologia. Mesmo quando Papá ou meu avô precisaram de
atendimento médico, os médicos pareciam profissionais. E
eles nunca teriam aceitado uma médica no comando, tão sem
sentido quanto isso era.

— Você tem certeza disso? — Perguntei. — Eu poderia


ligar para o meu pai. Ele saberá onde encontrar as pessoas
mais capazes do país

— A doutora Sosa é altamente capaz. Cristiano confia


nela. — Alejandro cruzou as mãos atrás das costas com uma
inspiração, procurando o céu. — Se ele estiver vivo quando
aterrissar estará em boas mãos.

Com um zumbido a distância, cada um de nós lançou


nossos olhares para trás. Um ponto piscante no horizonte
apareceu. Eu enrosquei meus dedos no meu esterno
enquanto ele se aproximava.

Eu só queria ver seu peito subir e descer, seus lábios e


mãos quentes e rosados de vida, seus longos cílios tremerem
quando ele abrisse os olhos escuros e cruéis que suavizariam
ao me ver.

Era pedir muito?

Por favor, eu rezei.

Eu segurei meu cabelo enquanto o helicóptero pairava


na nossa frente. Assim que pousaram, a equipe estava se
movendo, abrindo a porta, estendendo a mão, ajudando uma
mulher de pernas longas e bonitas em um vestido vermelho
curto e justo.
A visão inesperada de uma sereia com cabelos
cacheados e ruivos e lábios vermelhos deixou minha boca
aberta. Maquiagem recém-aplicada fazia parecer que ela veio
direto de um jantar.

— Quem é essa? — Perguntei.

Alejandro seguiu minha linha de visão. — Se eu tivesse


que adivinhar... poderia ser Natasha.

Natasha?

O nome disparou sinos de aviso. Cristiano havia


mencionado uma Natasha antes, mas ele a fez soar fugaz,
como um caso de uma noite só.

Uma maca apareceu, transferida rapidamente do


helicóptero para a calçada. Meu coração caiu aos meus pés
vendo o corpo sem vida amarrado a ele. Cristiano nunca
esteve tão quieto. Não me lembro de correr em direção a ele,
mas de repente ele estava ao alcance do braço. Mãos
enluvadas me contiveram. Homens gritaram para eu voltar. A
camisa rasgada de Cristiano revelou bandagens ensopadas de
sangue em torno de um torso outrora elegante, agora
machucado, mas sempre poderoso.

O corpo de Cristiano ricocheteou sem graça na maca


enquanto o tiravam do heliporto.

Sob uma máscara de oxigênio, sua palidez me assustou.


— Ele está vivo? — Eu me ouvi perguntar.
— Você tem que dar um passo atrás, señora, — disse
um dos homens.

Alejandro segurou as portas do elevador para eles.


Comecei a embarcar também, mas garras no cotovelo me
puxaram de volta. — Eles disseram para você sair.

Quando as portas se fecharam, virei-me para encarar a


voz aguda e feminina e as unhas de acrílico que me impediam
de ir com Cristiano. Se ela não estivesse usando salto alto o
suficiente para transformá-la em uma árvore em um vestido
obscenamente curto, teríamos ficado cara a cara.

— Quem é você? — Perguntei.

Ela soltou meu braço. — Eu sou a razão pela qual


Cristiano está vivo.

Ele está vivo. Ela tinha certeza? Como ela sabia? Isso
não importava. Era a única resposta que eu tinha conseguido
até agora, e eu aceitaria. Fiz o sinal da cruz e silenciosamente
agradeci Nossa Senhora de Guadalupe.

— Você, — a mulher disse sobre minha cabeça para


Alejandro. — Você é o chefe de segurança?

— No momento. — Ele apertou um botão para chamar


de volta o elevador. — Eu sou Alejandro

— Ah ,sim. Você falou com o meu piloto. — Ela estendeu


a mão. — Natasha Sokolov-Flores. Uma velha amiga de
Cristiano.
Eles apertaram as mãos e Alejandro inclinou a cabeça
na minha direção. — Esta é Natalia, esposa de Cristiano. Ela
é tanto a chefe da família quanto eu, enquanto Cristiano está
incapacitado.

Apreciei o voto de confiança, especialmente após as


opiniões anteriores de Jaz.

Natasha voltou seus olhos para mim. Ou aos meus


anéis, mais especificamente. — Isso é sábio? — Ela
perguntou. — Cristiano fez parecer que este era um
casamento de conveniência. Estou certa de que ele não
gostaria que seus negócios fossem gerenciados por uma
garota em que ele mal confia.

— E eu tenho certeza que ele não gostaria que você


falasse comigo dessa maneira, — eu disse.

Fiquei tão surpresa quando ela olhou para mim devido a


minha resposta. Mentalidade, Cristiano me lembraria.
Natasha tinha a errada sobre mim. Eu também. Cristiano
esperava que eu entrasse em uma situação como essa.

— Senhora de La Rosa tem muitos conselheiros, —


assegurou Alejandro.

Os olhos de Natasha voaram sobre mim e depois de


volta para ele. — Tenho certeza que você quer saber o que
aconteceu. Existe algum lugar onde possamos conversar?

Ela e Cristiano estiveram juntos? Esta noite? Ele não


havia mencionado isso no telefone – mas por que faria? De
qualquer forma, eu não podia deixar isso me incomodar
agora. A condição de Cristiano era muito mais importante. —
Podemos conversar aqui, — eu disse. — Agora.

O elevador apitou e embarcamos. — Talvez seja melhor


você nos deixar lidar com o lado comercial das coisas, —
Natasha me disse. — Não é bonito.

Eu seria a dona da torre de marfim e governaria a partir


dela. Cristiano havia me dito que uma vez que nossos votos
foram trocados. Se eu não acreditasse que poderia assumir
na ausência dele, ninguém o faria. — Eu preciso ser incluída
em qualquer discussão.

Ela olhou para Alejandro como se quisesse permissão.


— Cristiano confia nela, — disse ele. — Com todo o respeito,
você é a estranha aqui, Natasha.

O elevador parou na casa e as portas se abriram para o


último andar. — Me chame de Tasha. Cristiano faz, — ela
disse, saindo.

Tentei acompanhar Alejandro enquanto ele caminhava


pelo corredor até o meu quarto – até que ele parou
abruptamente na porta e se voltou para mim com uma
careta.

— O que é isso? — Perguntei.

— Você não pode deixar que ela ou alguém a intimide —


.Ele olhou para o chão. — Se Cristiano não sobreviver... você
está no comando. Tudo isso é seu. E não quero dizer
figurativamente, ele foi inflexível quanto ao seu casamento
ser legal.

Para me torturar, eu pensei. Agora, eu me perguntava se


as razões de Cristiano eram mais profundas do que isso. A
necessidade de se conectar comigo em algum nível, quando
eu não queria nada com ele. Uma tentativa de me proteger,
mesmo, se algo acontecer com ele.

— Você tem minha lealdade, Natalia, — disse Alejandro,


lendo minha mente. — Cristiano teria desejado isso.

Engoli em seco, olhando pela porta. O espelho quebrado


se foi. Presumi que o corpo na praia também tivesse
desaparecido. Alejandro e sua equipe foram rápidos.

Meu olhar mudou para Cristiano quando ele foi


transferido da maca para a cama. — Não devemos falar dele
como se ele tivesse partido. Ainda não.

A equipe de médicos trabalhou tão rapidamente que eu


mal conseguia manter os quatro em linha reta, muito menos
chegar a menos de um metro de sua cama. Em pouco tempo,
Cristiano havia sido conectado a um monitor cardíaco que
apareceu do nada, irrigado, estimulado e injetado. Manchas
brancas pontilhavam seu torso enquanto os IVs se
ramificavam em seu peito, braços e mãos.

Seu cabelo escuro e despenteado caiu sobre a testa


pegajosa, e eu resisti à vontade de empurrar os fios dos
olhos. — O que aconteceu? — Perguntei a qualquer um que
pudesse responder. — Ele foi baleado?

Tasha virou-se para mim com os braços finos cruzados.


— Apunhalado.

Assim, pude ver que o sangue de Cristiano havia


manchado seu vestido vermelho. Ela ajudou a salvar sua vida
enquanto eu fui acusada de colocá-lo em risco.

Se eu tivesse energia, eu a odiaria por ter informações


sobre o meu marido que eu queria. E para um queixo
pontudo que lhe dava um rosto marcadamente em forma de
coração, seus traços sensuais da Europa Oriental e um suave
sotaque indistinto que a fazia parecer exótica.

Alejandro nos chamou em direção à lareira e longe dos


médicos. — Conte-nos o que aconteceu, — disse ele a Tasha.

— Cristiano irritou as pessoas erradas com sua pequena


operação, — disse ela.

Ela sabia a verdade do que acontecia aqui na Terra dos


Condenados, então. Ela e Cristiano eram íntimos – mas quão
íntimos? O suficiente para discutir o meu casamento, mas
não o suficiente para ela saber que não era uma farsa
completa.
— A operação de Cristiano é tudo menos pequena, — eu
disse.

Ela levantou uma sobrancelha bem cuidada. — Você


está ciente disso?

— Os negócios do meu marido? Sim. — Do outro lado da


sala, médicos mascarados se reuniram perto da cabeça de
Cristiano. Girei meu diamante em volta do dedo e
acrescentei: — Já estamos cientes de que Belmonte-Ruiz está
por trás disso.

— Eles nos atingiram aqui também, — explicou


Alejandro. — Você disse que ele está vivo por sua causa?

— O atacante de Cristiano está morto, — disse ela. —


Não tive tempo de checar novamente, mas os homens do meu
pai confirmaram e agora estão cuidando do corpo

— Eu tenho homens a caminho para procurar Max e


Daniel. — Alejandro olhou para a tela do telefone. Eu tinha
perdido a conta de quantas vezes ele checou. — Você os viu?

— Somente no evento, — disse ela. — Um deles


guardava a porta enquanto Cristiano e eu conversávamos em
particular na varanda. — Ela lambeu o lábio inferior,
mantendo os olhos em Alejo. — Cristiano saiu antes de mim.
Quando saí, vi um manobrista em pé sobre ele com uma faca.
Cristiano havia sido esfaqueado várias vezes. O manobrista
estava prestes a acabar com ele

— E? — Perguntei. — Então o que?


Tasha demorou-se a desatarraxar sua bolsa fina de pele
de cobra. Ela pegou uma pequena arma que se encaixava na
palma da mão. — Elena. Nomeada após a minha falecida avó.
Nenhuma dama jamais me decepcionou.

— Você atirou nele? — Perguntei.

Ela jogou os cachos castanhos sobre o ombro. — Você


não faria, querida?

Minhas bochechas esquentaram. Cristiano nem me


deixou carregar uma arma. Onde estava a Monarca Branca
agora? Ainda está em seu escritório em La Madrina? Eu tive a
próxima melhor coisa. Minha aliança de prata, ouro e pérola,
inspirada nos elegantes 9mm, tinha agido como uma arma
horas atrás.

— Estávamos conversando quando aconteceu, — eu


disse. Eu ouvi o sorriso dele pelo telefone quando ele
percebeu que eu estava chamando com preocupação. Pedi
que ele abandonasse uma missão tão arriscada. Depois de
semanas de resistência da minha parte, quão horrível deve
ter sido para ele pensar que ele finalmente me deixou numa
situação perigosa – que o único perigo era o campo minado
habitual que nossas conversas apresentavam – apenas para
enfrentar... uma faca.

— Você viu o telefone dele, Tasha? Está off-line, — disse


Alejandro. — Ele estava segurando?
— Cristiano mal estava consciente, tinha a fala
arrastada, incapaz de fazer muito mais do que deitar no chão,
— disse ela.

— Fala arrastada? — Alejandro perguntou. — Se ele


estivesse drogado, isso explicaria porque ele não reagiu e
porque não nos alertou para problemas. — Alejandro
desbloqueou o telefone e começou a digitar. — Veja se seus
homens podem localizar e destruir a cela dele.

Eu tentei acompanhar sem me emocionar. No chão?


Drogado? Cristiano pairava sobre tudo, e não apenas
fisicamente. Ao pensar nele incapaz de se defender, um nó se
formou na minha garganta. — Como você o trouxe aqui? —
Eu pedi para mudar meu foco.

— Meus guarda-costas, — disse Tasha. — Eu não sabia


o que mais estava por vir, então o colocamos no meu carro.
Maksim não atendeu e eu não tinha o número de mais
ninguém, então liguei para meu pai. Ele enviou um
helicóptero para nós. Fizemos o possível para conter o
sangramento

— Ele poderia ter morrido no caminho, — eu disse. —


Ele deveria ter ido para um hospital.

Tasha bufou. — Não seja ingênua. Eles o costurariam e


o entregariam às autoridades

— Você acha que eu me importo, se ele sobreviver? —


Eu perguntei o calor subindo pelo meu pescoço. — Não
importa se ele for detido - Cristiano de La Rosa pode se livrar
de qualquer situação

— Supondo que ele sobreviva, — disse ela, tirando um


compacto de sua bolsa, — ele pode não ser capaz de tomar
muito mais.

Alejo fez uma pausa e levantou os olhos do telefone. —


O que você quer dizer?

— Se Belmonte-Ruiz estiver participando dos jogos de


Calavera, outros também estarão em breve. — Ela verificou o
batom no espelho de mão e passou o dedo em um canto da
boca. — Dizem que Cristiano parou de fornecer armas para
quem faz negócios com BR

— E qualquer organização fortemente envolvida com o


tráfico de seres humanos de qualquer tipo, — disse Alejandro
com um aceno de cabeça. — Não é um boato

Ela olhou de lado para ele e fechou seu compacto. — É


um número grande o suficiente para irritar algumas pessoas

— É, — Alejandro concordou. — Especialmente se a


verdade sobre a Terra dos Condenados for divulgada. Mas é o
que todos decidimos em equipe

Mordi meu lábio, lutando para acompanhar, mas ainda


o seguindo. A verdade sobre a Terra dos Condenados.

Boatos terríveis cercavam o cartel Calavera, uma


reputação que Cristiano e seus homens haviam cultivado
para se isolarem. Calavera era um dos principais traficantes
de armas em todo o mundo, e isso os tornava quase
intocáveis. Mas seria o suficiente para protegê-los se vazar
que a Terra dos Condenados realmente agia como um centro
de reabilitação para aqueles que os outros cartéis haviam
vendido como escravos?

Os líderes deste mundo subterrâneo em que cresci


poderiam justificar e apoiar quase tudo. Mas a interrupção do
modo como as coisas eram, o roubo que custou caro aos
rivais de Cristiano e a revelação do valor de décadas da
indústria.

Isso era negócio que ninguém por aqui apoiaria.

Mas não era nada que eu pudesse me preocupar agora.


A vida de Cristiano estava em risco.

E eu não queria pensar no que poderia acontecer com


tudo isso sem ele.
3

Natalia

As portas e as cortinas da varanda estavam fechadas,


mas através do tecido branco puro, o céu noturno iluminou-
se em azul Royal quando o amanhecer começou a aparecer.

A doutora Sosa se afastou da cama de Cristiano para


fazer anotações em uma prancheta. Foi a primeira vez que ela
se separou da equipe de trauma e não perdi minha
oportunidade de tentar obter respostas. — Doutora Sosa?
Sou Natalia, — falei ao me aproximar dela e acrescentei — de
La Rosa. Esposa do Cristiano. Ele está vivo?

Ela colocou a prancheta debaixo do braço. Quando ela


puxou as tiras da máscara cirúrgica por trás das orelhas,
pedaços de seu cabelo castanho claro caíram ao redor do
rosto. A julgar pelo coque casual e pelo inchaço ao redor dos
olhos, ela estava dormindo quando recebeu a ligação. — Sí.

O ar saiu do meu peito. Eu não esperava um simples —


sim— como resposta. Abri minha boca, mas não consegui
encontrar as palavras. — Ele... realmente?

— Cristiano foi esfaqueado três vezes, — disse ela. —


Duas lacerações profundas, mas limpas, em seu abdômen, e
uma que errou seu coração.
Eu cobri minha boca. Ouvindo sobre seu encontro com
a morte, de maneira tão franca, meu queixo tremeu.

Uma mão no meu ombro me alertou para Alejandro. —


'Errar' é uma coisa boa, Natalia, — ele disse.

— Cristiano tem muita sorte, — concordou a Dra. Sosa.


— Bem, ou isso, ou o atacante era extremamente habilidoso

— Eu... o que? — Eu perguntei. — Sinto muito, tem sido


uma longa noite. Soou como se você dissesse que ele era
habilidoso

— Eu ouvi o mesmo, — disse Alejandro. — O que isso


significa?

— Ele não atingiu nenhum órgão vital, — explicou ela,


apontando para o próprio abdômen. — Com três tentativas, é
quase como se ele estivesse tentando não matá-lo

— Isso não faz sentido, — disse Alejandro. — Mas


parece uma boa notícia?

Ela assentiu. — Ele perdeu sangue, mas é esperto - ou


tolo - porque deposita um pouco antes de cada grande viagem
fora da Terra dos Condenados. Também existem pessoas na
cidade que estão doando. — Ela revisou a prancheta e
suspirou. — Alguém menos teimoso provavelmente teria
entrado em choque hipovolêmico até agora, mas felizmente,
estamos preparados para fazer uma transfusão. Tenho que
observar as feridas um pouco, depois que tiver certeza de que
não há infecção, vamos costurá-lo.
— Então ele vai ficar bem? — Perguntei lentamente.

— Nunca é prudente dar garantias nesse tipo de


situação, mas as perspectivas são boas. Há alguns danos nos
tecidos e músculos, além das suturas, por isso vou precisar
que ele fique na cama por algumas semanas ou mais.

— Ele não vai gostar disso, — disse Alejandro. — Ele


esteve confinado na cama no passado – todos nós tivemos,
por um motivo ou outro, e eu o conheço. Ele é muito
impaciente. Você se lembra da última vez que ele foi baleado.

Eu fiz uma careta. — A última vez? Quantas vezes...?

— Ele voltou ao campo logo depois, — respondeu a Dra.


Sosa. — Apenas lembre-o de que, se ele piorar as coisas,
poderá resultar em cirurgia. Ou uma infecção. Mantenha as
feridas limpas, verifique se ele toma os antibióticos e
mantenha-o em pé o máximo que puder. Ele deve ficar bem
em breve.

Bem.

Eu queria isso?

Meu corpo respondeu por mim. Eu nem sabia como


lidar com o alívio que me inundava. Eu não tinha me
preparado para boas notícias. Meus membros fatigaram
quando a exaustão se instalou, mas eu me segurei. — Graças
a Deus, — eu disse. — Não agradeci a você, doutora

— Claro, mas meu trabalho ainda não está concluído.


— Longe disso, — Alejandro concordou, me olhando. —
Você daria uma olhada em Natalia?

— Eu me sinto bem, — eu disse à médica. — Cristiano


precisa mais de você

— Meus colegas podem lidar com ele no momento.


Venha. Sente-se, — ela disse, me guiando pelo cotovelo em
direção ao sofá em frente à lareira. — Vejo que você tem suas
próprias feridas de batalha. Dor de cabeça?

— Uma pequena, sim.

— Isso é de se esperar. Mas seu discurso parece


coerente, o que é bom. Vamos dar uma olhada. — Ela me
sentou, desembrulhou minhas ataduras e inspecionou os
cortes. — Eles parecem piores do que são, — observou ela. —
Feridas superficiais, embora o pescoço e este na sua
bochecha provavelmente deixem uma cicatriz

Eu olhei para Alejandro. — Pelo menos vou ter provas


de que me defendi quando Cristiano acordar.

Ele sorriu. — Ele precisará de boas notícias.

Depois que a doutora Sosa me costurou, eu me enrolei


no sofá, vendo-a fazer o mesmo com Cristiano.
Dedos vasculharam meu cabelo. Eu me deliciei com o
toque reconfortante. Cristiano. Ele estava aqui. Ele estava...

Ferido.

Eu abri meus olhos. Pilar empoleirou-se na beira do sofá


no quarto de Cristiano, onde eu adormeci em frente à lareira.

— Como você está? — Ela perguntou, me cobrindo com


um cobertor.

— Cristiano está acordado? — Perguntei, sentando-me.

— Ainda não.

Eu olhei para ele. O quarto esvaziou-se. Somente o sinal


sonoro constante do monitor de frequência cardíaca indicava
alguma vida.

Pilar olhou para a porta fechada do quarto e sussurrou:


— Nós poderíamos ir, você sabe.

Esfreguei os restos da minha dor de cabeça da têmpora


esquerda. — O que?

— Eu... sobre o que Jaz disse na sala de pânico. — Ela


moveu o rabo de cavalo solto por cima do ombro e enrolou as
pontas em volta da mão. — Eu sei que Cristiano deveria se
recuperar, mas tudo poderia acontecer. Você e eu poderíamos
estar em sérios problemas se ele não o fizer. Ou mesmo se ele
se recuperar. Nós poderíamos correr. Agora. Antes que ele
acorde.
Pilar estava prestando atenção? — Ninguém foge de
Cristiano, — eu disse. — Especialmente eu. Se isso fosse uma
opção, eu teria tentado semanas atrás

— É provavelmente a última coisa que você quer pensar


agora, mas essa pode ser nossa única chance. Ele está
inconsciente. Dois de seus melhores homens estão
desaparecidos. E os outros estão distraídos procurando por
eles. — Ela agarrou uma ponta do meu cobertor. — Podemos
ir ao seu pai e ao Barto. Barto vai nos ajudar, eu sei que ele
vai.

— Cristiano é tão forte quanto parece. — Eu balancei


minha cabeça, olhando-a nos olhos. — Quando ele acordar e
eu não estiver aqui, ele virá atrás de mim.

Com a manga da camisa, ela limpou o suor da têmpora.


— Você poderia... você poderia matá-lo. — Ela estremeceu e
saiu correndo. — Nós poderíamos encontrar uma maneira –
veneno, overdose, sufocando-o enquanto dorme – e escapar
antes que eles saibam que fomos nós.

Mordi o interior da minha bochecha. Eu entendi onde


Pilar estava indo. Nas últimas vinte e quatro horas, ela foi
sequestrada por Alejandro, transportada para um local que,
segundo boatos, explora mulher – dirigida por um homem
que ela temia desde a infância, quando testemunhou ele
espancar seu primo – e suportou um ataque que poderia
facilmente ter terminado com a sua vida.
Desde o retorno de Cristiano à cidade, o homem que ela
conhecia como El Polvo a perseguiu na pista de dança em La
Madrina, a fez assistir ao nosso casamento contra a minha
vontade e depois ordenou que ela fosse trazida para cá.

Mas ela ouviu de mim o pior dele. Pilar tinha sido uma
das pessoas para quem eu me virei depois da morte de minha
mãe.

Cristiano havia feito coisas imperdoáveis. O que


acontecia comigo, que eu não tinha vontade de correr? Por
que eu queria ser a primeira pessoa que ele visse quando
abrir os olhos? Que eu nem queria tentar esconder meus
sentimentos por ele de Pilar – ou de Cristiano, ou de mim
mesma? Não mais.

Não queria considerar o que dizia sobre mim – porque


havia cometido o erro de confiar cegamente em um homem
antes. Para Diego, eu teria feito qualquer coisa – por ele, eu
fiz. Isso era diferente? Eu não sabia

Mas a ideia de perder Cristiano havia me mostrado que


eu não estava pronta para me despedir. Apesar de tudo o que
passamos, ele e eu estávamos apenas começando a aprender
quem era a outra pessoa. A declaração do meu atacante, de
que meu marido estava morto, havia me incentivado a lutar
por minha própria vida – para que eu pudesse vingar a dele.
Eu jurei a Cristiano a minha lealdade, e se eu soubesse na
época ou não, eu quis dizer isso.
Cristiano fez coisas imperdoáveis, sim – mas ele também
fez coisas admiráveis. Ele se colocou em risco para me dar
um desfecho. Exceto pelas minhas perguntas sobre a morte
de minha mãe, ele sempre me dizia a verdade, não importa o
quão brutal. Ele me ensinou força de várias maneiras.

E embora ela não soubesse, ele ajudou Pilar a sair das


sombras também.

— Cristiano não trouxe você aqui para me fazer feliz. Ele


fez isso para protegê-la de Manu. — Peguei a mão dela e a
apertei. — Você sabia que seu primo foi quem molestou sua
meia-irmã?

Ela ofegou. — Nessa? Sim, eu sabia – mas isso não


deveria deixar minha família. Como você soube?

— Cristiano me disse. Foi por isso que ele o machucou


tanto anos atrás. Não apenas por roubar, mas para que ele
não pudesse... não pudesse ferir Nessa novamente.

Pilar abriu e fechou a boca algumas vezes. — Eu... Eu


não sabia. Você tem certeza?

— Ele me disse hoje à noite, mais cedo. — No início da


noite, quando as coisas tinham sido tão diferentes. Quando
eu estava tão perto de descobrir minha montanha russa de
um relacionamento com Cristiano. — Ele não é quem você
pensa que é. Há um coração muito grande lá dentro, embora
ele tente escondê-lo. Fique comigo. — Eu dei-lhe um sorriso
encorajador. — Passe um tempo com ele. Você vai ver
— Se você diz que é verdade, eu acredito em você. — Ela
mordeu a boca. — Mas... por favor, não diga a ele que sugeri
que tentássemos matá-lo.

Eu a puxei para um abraço. — Você vai descobrir com


Alejandro se há alguma informação nova?

— Claro. — Ela se levantou e arrumou o cabelo quando


saiu do quarto.

Levantei-me do sofá e dobrei o cobertor ao lado. Grata


pelo meu primeiro momento a sós com Cristiano, atravessei o
quarto, me abaixei ao lado da cama e encostei a palma da
mão na dele. Demos as mãos uma vez antes, quando
estávamos de carro, assistindo Sandra lutar por sua vida.

Algumas das últimas palavras que ele me disse ecoaram


em minha mente.

— Durma bem. Eu vou, sabendo que você é um dos


protegidos.

Eu não disse nada de volta. Ele dormia quase


pacificamente agora, mas havia vida em suas mãos – e
sangue sob as unhas.

Ansiedade apertou meu peito ao ver seus ferimentos.


Cristiano sempre pareceu invencível para mim. Mesmo
quando ele fugiu de nossa casa para escapar da ira de meu
pai, ele fez isso incólume.
A verdade é que, sem Cristiano andando nesta Terra, eu
não me sentiria tão segura. E eu não quis dizer apenas no
mundo dos cartéis.

Ele era um protetor – meu protetor.

Eu pensei que ele era o inimigo – mas talvez ele nunca


tivesse sido.

Sentimentos não estavam florescendo dentro de mim –


eles foram plantados há muito tempo, criando raízes sem o
meu conhecimento.

Eu não podia fingir que na minha hora mais sombria,


eu não tinha lutado mais para poder voltar para ele. Teria
sido o mesmo para ele? Era assim que ele ainda estava de
pé?

Porque ele deveria estar morto. Alejandro suspeitava que


ele havia sido drogado – eu tinha esquecido de perguntar à
médica sobre isso. Isso significaria que o ataque não foi
espontâneo. Belmonte-Ruiz teve Cristiano à sua mercê e nem
sequer causou danos sérios. Não faz sentido.

— Você não pode dormir aí, — ouvi atrás de mim.

Eu olhei por cima do ombro. Jaz estava parada na porta


com uma braçada de toalhas, uma tigela de plástico verde e
uma esponja. — Ele precisa ser limpo, — eu disse.

Ela entrou no quarto. — É por isso que estou aqui.


Meu marido está tomando banho de esponja de outra
mulher? Isso não iria acontecer. Eu me levantei da beira da
cama dele. Nossa cama. — Eu vou fazer isso.

Ela colocou os itens na mesa de cabeceira e desdobrou


uma toalha do topo da pilha. — Eu tenho cuidado do señor
de La Rosa há anos

— Isso foi antes, — eu disse.

— Antes de quê? — Ela perguntou, mas manteve os


olhos na tarefa à sua frente. Ela sabia a resposta.

— Antes de mim, — eu disse.

Alejandro estava certo mais cedo – foram os dias de


concessão a outros. Cristiano precisava que eu crescesse
agora e atuasse como sua esposa. Cuidar dele como uma, e
tomar decisões em seu melhor interesse.

— Você se importa com Cristiano, — observei.

Ela fez uma pausa e deixou a toalha cair ao seu lado. —


E você deixou claro que não

— As coisas mudam, — eu disse. — Pessoas mudam.

Jaz balançou a cabeça. — As pessoas não mudam. As


circunstâncias sim. Não confio em você sozinha com ele

— E eu também não confiava em você, — eu disse. —


Você escutou minha ligação com ele ontem à noite e depois
ameaçou minha vida, não pela primeira vez. Mas você
também ajudou a levar Pilar e eu para a segurança.
Ela deu de ombros e pegou a tigela e a esponja no
banheiro. — Fiz isso por Cristiano, — disse ela, com o som da
água corrente.

— Então, temos algo em comum, — eu disse. — Nossa


lealdade a ele.

Ela enfiou a cabeça na sala. — Você chama alimentar


pessoas de fora com lealdade à informação?

O telefone celular que Diego havia me dado. Jaz


provavelmente ajudou Cristiano a encontrá-lo. — Eu nunca
compartilhei informações fora desses muros, — prometi. —
Foi um erro aceitar o telefone. Eu paguei o preço. Cristiano
me perdoou.

Ela abriu a torneira e voltou para a cabeceira da cama


com uma tigela com água e sabão. — Ele é cego quando se
trata de você.

Suas palavras ecoaram a desconfiança que ela deixou


clara na noite anterior. Mas havia também a outra coisa que
ela havia dito. O que eu não lembrava até aquele momento.

— Mesmo que ele ainda não saiba, ele te ama.

Na noite passada, eu não sabia como me sentir sobre


isso, mas agora? Era possível que eu sentisse o mesmo por
ele e também não soubesse?

Fiquei quieta com o pensamento surpreendente. Então


empurrei-o para longe, considerando que Jaz inclinou a
cabeça como se ela pudesse ler minha mente.
— Ninguém pode negar que você foi boa com ele, — eu
disse. — Mas você precisa abrir espaço para mim, porque se é
uma ou outra você sabe quem Cristiano escolherá.

Jaz cruzou os braços. — Você tem certeza disso?

Eu não conseguia entender Cristiano tendo que escolher


entre nós duas, mas ele trabalhou duro para me trazer aqui –
e ainda mais para garantir que eu não pudesse simplesmente
me afastar. Afastei meus ombros quando assenti. — Eu tenho

— Jaz. — Alejandro se inclinou na porta. Quanto tempo


ele estava ouvindo, eu não tinha certeza. — Esse é o trabalho
de Natalia agora.

Jaz suspirou. — Espero que você prove que estou


errada, — ela me disse e se afastou.

Alejandro piscou, depois fechou a porta para me dar


privacidade.

Peguei a esponja.

E eu me preparei para cuidar do diabo. Para consertar o


monstro que destruiria todos os outros monstros. Para trazer
meu marido de volta à vida.
4

Cristiano

Eu abri meus olhos uma vez e vi meu anjo sombrio


acima de mim, sua silhueta marcada pela luz do sol
atravessando as portas em arco da varanda. Ela não estava
aqui agora. Talvez tivesse sido um sonho, mas ela era um que
eu esperava ter repetidamente. E, no entanto, eu quase morri
sem tê-la sequer uma vez.

Ansiava por seu toque gentil, as pontas enroladas de


seus cabelos negros da meia-noite roçavam minha pele
enquanto seus olhos ovais me acalmavam, mesmo quando
estavam cheios de desafio. — Natalia

— Bem-vindo de volta aos vivos. — Foi Alejandro que se


aproximou da cama, colidindo com a minha fantasia com um
sorriso no rosto. — Você é um pouco mais lento para se
recuperar na velhice. Eu tinha meu dinheiro com você
acordando esta manhã.

Realidade atingida com força brutal. Eu atirei em uma


posição sentada, a dor queimando no meu peito e abaixo do
meu lado. — Onde está Natalia? — As palavras rasparam da
minha garganta seca enquanto as máquinas em volta da
minha cama apitavam mais rápido, mais alto. — O que
aconteceu com ela?

— Não se mexa. — Alejandro colocou a mão no meu


ombro para tentar me aliviar de volta. — Sua esposa está
aqui, don Cristiano. Ela está dormindo. — Ele balançou a
cabeça para trás, onde os pés dela estavam sobre um braço
do sofá. — Ela não saiu do seu lado.

Até meu alívio foi exaustivo, atingindo como uma onda e


me forçando a voltar para a cama. — Ela está bem?

— Ela está bem, mas não dormiu muito nas últimas


trinta e seis horas. — Sua voz se aprofundou. — Eu posso
acordá-la, mas primeiro, devo interrogá-lo

— Deixe-a descansar, — eu disse apesar da minha


necessidade de olhar nos olhos dela e ouvi-la me dizer que
estava bem. — O que aconteceu?

— Belmonte-Ruiz. Eles reivindicaram a responsabilidade


pelo seu ataque e pelo daqui. Eles atacaram todas as
mulheres da casa.

Os gritos de gelar o sangue da minha esposa ecoaram


pelo nosso quarto. Um quarto onde, até recentemente, eu
nunca me senti nada além de seguro. A raiva passou pelo
meu peito como um caminhão Mack. — Natália. Alguém
colocou as mãos nela?

— Ela lutou de volta. Ela sobreviveu. Nem todo mundo


teve tanta sorte. Eu vou te informar mais tarde.
Fechei os olhos para me endurecer contra uma dor
muito pior do que algumas facadas. Algumas pessoas
pagaram o preço pelo que havia começado como uma
vingança pessoal. Ele cresceu muito mais ao longo dos anos,
e Calavera teve o apoio de todos na Terra dos Condenados –
mas eu os decepcionei. — Desculpe, — eu disse.

— Vamos providenciar um serviço para eles, — disse


Alejo. — Assim que você se recuperar, é claro.

Com a segurança de Natalia estabelecida e minhas


preocupações imediatas diminuídas, detalhes nebulosos do
ataque no hotel entraram em foco. Minhas feridas se
anunciaram apertadas e latejantes. A tensão na ponta do
meu nariz fez minha cabeça à beira de explodir.

Eu tinha experimentado coisas piores, mas essa dor em


particular me deixou tenso. Eu não tinha certeza de quantas
vezes o manobrista havia me apunhalado, mas mesmo uma
vez era demais. Eu não tinha sido capaz de parar. O ataque
parecia durar para sempre, me entregando lentamente à
porta da morte. O que mantinha Max e Daniel afastados?

— Por que não estou morto? — Perguntei.

— Porque seu agressor está

— Max pegou ele?

Alejandro hesitou. — Não

— Daniel? — Perguntei. — Acho que ouvi um tiro, mas


não entendi.
Alejandro olhou para o chão, demorando muito para
responder.

— O que? — Perguntei.

Ele levantou os olhos. Daniel está morto. Encontrado ao


lado do hotel. O corpo dele está em trânsito para que
possamos fazer um enterro adequado com os outros.

Foda-se. Minha garganta se contraiu. Já fazia algum


tempo desde que um membro da minha equipe imediata
levava um tiro por mim. As coisas haviam acontecido tão
rápido e, ao mesmo tempo, não. Este tinha sido um ataque
organizado. Meus momentos finais com Daniel passaram pela
minha cabeça – ele me provocando por ser excessivamente
protetor com Natalia. A insinuação de que eu era paranoico.
E, no entanto, ele sempre fez exatamente o que eu pedi, até
seus momentos finais. — E Maksim?

Alejandro inalou seu peito em expansão. Tentei me


preparar para as mesmas notícias, mas não havia preparação
para isso. Daniel tinha sido um homem bom e leal, mas Max
era mais do que um camarada. Ele era o melhor amigo que
eu já encontrei. Estávamos juntos desde o início e derrotamos
muitos que gostariam de nos ver mortos.

Finalmente, Alejandro exalou. — Eles o tem.

Levou um momento para que suas palavras se


registrassem. E quando o fizeram, o monitor de frequência
cardíaca ao meu lado acelerou. — O que? — Perguntei. — Do
que você está falando?
— Belmonte-Ruiz capturou Max. A boa notícia é que ele
ainda está vivo, o que significa que eles precisam dele. Eu já
vi provas de vida.

O sangue correu em meus ouvidos quando me sentei. —


Então por que diabos estamos sentados aqui? Temos que ir
atrás dele.

As sobrancelhas de Alejandro se franziram. — Nós


vamos. Mas primeiro, precisamos de um plano. E, para fazer
um, precisamos descobrir porque eles tentaram – ou não
tentaram, segundo Sosa – matar você e não Max. Se ele é
isca, então eles devem saber...

Apesar da forma como meu torso protestou, balancei


minhas pernas para o lado da cama, quase derrubando o
monitor. — Se você acha que eu vou sentar aqui enquanto
Max está com problemas, — puxei um IV do meu cotovelo
interior, — então você não sabe nada sobre mim, Alejandro...
eu faria o mesmo por você

— Ay. Tranquilo. Você precisa descansar...

— Não me diga para relaxar.

Alejandro me empurrou. Já sem fôlego, caí com força, e


a dor resultante foi suficiente para me lembrar de que eu
ainda poderia piorar as coisas. — Eu não pediria isso a você,
nem Max, — disse Alejo. — Você é inútil para nós morto, e é
isso que você será se for atrás dele com algo menos que cem
por cento
— Você me subestima, — eu disse, falhando em
controlar o volume da minha voz. Meu rosto queimava com o
pensamento de que Max tinha saído há mais de um dia, e
não tínhamos feito nada.

— Você é um perigo para si mesmo, mas também para


quem vai com você, — Alejandro me lembrou. — Nós o
pegaremos. Mas não hoje

— Nós não deixamos os homens para trás...

O ar no quarto mudou. Eu olhei além de Alejandro, e


minha raiva imediatamente se dissipou quando meu olhar
pousou em Natalia.

Cabelos longos e escuros, desarrumados, sem fôlego e


bochechas rosadas em um robe branco de cetim, ela me
encarou como se tivesse visto um fantasma. — Você está...
você está acordado

— Você está viva

Natalia se aproximou da cama. Ela também sentiu a


energia magnética pulsando entre nós? Ela me examinou da
cabeça aos pés. — E você está sangrando. — Ela olhou para
Alejo. — Por que ele está sangrando?

— Ele está tentando sair da cama, — disse Alejandro – o


maldito delator.

Um riacho escuro e vermelho escorria pelo meu


antebraço. Eu nem senti. Eu queria Natalia em meus braços
o mais rápido possível. — Deixe-nos, — eu disse a Alejandro.
— Estabilize todos dentro dessas paredes que podem lutar.
Vamos atrás de Max

— Com todo o respeito, senhor...

— Você é educado demais, Alejandro. A resposta é não,


— disse Natalia. Sua voz falhou, mas não com dúvida – suas
cordas vocais pareciam tensas. Sua postura se alongou
quando qualquer sinal de angústia a deixou. — Você não está
pisando fora deste quarto até que esteja totalmente curado.

Eu pisquei lentamente para ela. — Você está me dizendo


não?

— Ela acabou de fazer e está certa. — Alejandro


levantou o queixo, sem dúvida convencido de que ele tinha
reforço. — Nós não estamos prontos. Só estaríamos nos
deixando abertos para outro ataque aqui e colocando mais
homens em risco. Max sabe disso – Belmonte-Ruiz também.

De repente, a exaustão atingiu, junto com o desejo de


prometer a Natalia que nunca mais sairia do lado dela, desde
que ela me quisesse lá. — Convoque uma reunião, — eu
disse. Ainda tonto de qualquer medicamento administrado,
eu podia admitir que não estava no melhor estado de espírito
para tomar decisões. Mas eu estaria em breve. — Vamos
terminar essa discussão então.

Alejandro saiu do quarto, deixando-me com vergonha.


Meu parceiro estava com problemas por minha causa e eu
não estava fazendo nada. E, no entanto, Natalia estava aqui.
Ela estava em segurança.
— Venha aqui, — eu disse, e suavizei meu comando com
— mi amor

— Como você se sente? — Ela perguntou enquanto se


aproximava lentamente. — O que eu posso pegar para você?

O barulho na voz dela ressoou no meu peito. Eu não


pude ir até ela. Eu ainda estava conectado a mais de uma
máquina e, mesmo que não estivesse, meu corpo não se
movia tão rápido quanto eu precisava. Minha fraqueza estava
em exibição.

— Só você. — Tudo doeu quando eu a alcancei. — Por


favor. Venha

— Deite-se, e eu vou.

Disposto a ceder a qualquer coisa naquele momento por


seu toque, eu descansei contra o monte de travesseiros atrás
de mim. — Você está perdendo sua voz.

Ela me ignorou e abriu a gaveta da minha mesa de


cabeceira para tirar um pano. — Deixe-me ligar para a
enfermeira que a Dra. Sosa providenciou para nós...

Eu a parei. — Por favor, Natalia. Você é meu remédio.


Só você pode me curar.

Os lábios dela se curvaram quando seus olhos ficaram


nublados. Eu não sabia dizer se ela estava sorrindo, fazendo
uma careta ou tentando não chorar. Ela sentou na beira da
cama, chegando mais perto até o calor do seu corpo me
aquecer. O desprezo, ressentimento e raiva que às vezes
estragavam seu rosto quando ela olhava para mim
desapareceram. Então, eu não tinha imaginado a intimidade
do nosso último telefonema. A garota que apontou uma arma
na minha cara parecia aliviada por me ver vivo.

— Aqui. — Ela estendeu um copo de água da mesa de


cabeceira. — Beba isso.

Droga, Natalia. Ela estava apenas tentando cuidar de


mim, mas eu precisava de respostas mais do que fluidos ou
enfermeiras. Engoli a água o mais rápido que pude enquanto
ela desaparecia no banheiro.

Quando ela voltou, devolvi-lhe o copo e ela apertou o


pano agora umedecido no meu braço, onde havia tirado o IV.
A ferida era o equivalente a um arranhão, mas eu não
consegui impedi-la.

— Me desculpe, eu estava dormindo quando você


acordou, — disse ela, limpando a área.

Eu tinha visto vislumbres dela sobre mim, sua mão na


minha enquanto eu entrava e saía da consciência, seus olhos
normalmente cinza violeta.

Minhas feridas recém-costuradas protestaram quando


levantei meu braço para tocar sua bochecha, mas valeu a
pena quando ela virou o rosto na minha palma. — Eu sei que
você esteve aqui, — eu disse. — O que aconteceu? Conte-me
tudo
— Um dos manobristas te atacou. O que você se
lembra?

— Eu não quero. — Peguei o pano dela, descartando-o


no chão. Doeu pra caralho levantar meu braço, mas eu
peguei seu queixo e virei à cabeça para examinar os cortes
desagradáveis na testa e bochecha. Ela tinha seus próprios
pontos. Quando vi um corte longo e assustador correndo por
baixo do queixo, no pescoço, minha mão livre se fechou em
punho. — Quem fez isso em você? O que aconteceu aqui?

— Tasha atirou nele, a propósito. — Ela passou o


polegar sobre a marca vermelha no meu braço. — O membro
de Belmonte-Ruiz que atacou você. Ela entrou no helicóptero
e está aqui agora.

Tasha. Então é por isso que eu ainda estava vivo. — Ela


está aqui em casa? — Perguntei.

Natalia assentiu solenemente e acrescentou: — Ela... ela


salvou sua vida

— Essa é a menor das minhas preocupações. — Tasha


era uma boa amiga, e eu lhe devia, mas não queria pensar
nisso agora. — Você estava gritando ao telefone, Natalia

— Eu estava com medo, — ela murmurou. — Por você e


por mim.

Meus olhos vaguearam mais uma vez ao longo do corte.


Contusões escureceram seu pescoço esbelto. Eu insisti com o
queixo dela. — O que são essas marcas? Os cortes? Sua voz –
isso... alguém... você foi estrangulada?

— Eu lutei de volta, — disse ela, sorrindo suavemente.


— E eu ganhei. É isso que importa.

Orgulho inchou no meu peito. A minha garota. Ela se


saiu bem, mas uma vitória dificilmente era suficiente para me
aplacar. — Não me proteja, Natalia.

Enquanto eu tentava me sentar novamente, ela me


manteve no lugar com uma mão enfaixada no ombro.

— O que aconteceu lá?

— Por favor. Deite-se...

— Pare de me dizer para me deitar. Me dê todos os


detalhes, ou irei encontrar alguém que me conte.

Ela olhou para o monitor de frequência cardíaca. — Eu


não quero que você fique chateado.

Eu peguei seu pulso e trouxe a palma da minha mão


para o meu peito nu, para que ela pudesse sentir meu pulso.
— A dor física não é nada. Eu me senti pior, — eu disse. —
Mas a cada segundo que passa sem saber o que aconteceu
com você, a dor cresce. Minha raiva cresce e meu coração...

— Tudo bem, — disse ela, sua voz suave, apesar da


maneira como seus olhos dispararam sobre a tela quando
captou meu aumento da frequência cardíaca. Ela se
aproximou, mantendo a mão quente sobre o meu coração. —
Tudo bem. Eu vou te dizer. Belmonte-Ruiz tinha uma missão.
Por todas as mulheres que você tirou deles, eles queriam
retribuir o favor

— Eles miraram em você

— Todos nós. Nós revidamos, — ela disse rapidamente.


— Nem todo mundo sobreviveu, mas Jaz, eu, Pilar – estamos
todas seguras.

Isso não era bom o suficiente. Uma vida perdida, um


arranhão, até - era demais. Eu fecho meus olhos. — Eu jurei
que você estava segura aqui. Que eu estaria aqui para
protegê-la. Todos vocês. — Com a mandíbula cerrada desviei
o olhar. — Eu falhei com você.

Ela chegou ainda mais perto. — Você estava aqui,


Cristiano. Um homem entrou na sala enquanto eu estava ao
telefone com você. Ele colocou as mãos em volta do meu
pescoço e apertou até que eu vi estrelas.

Eu o rasgaria membro a membro. Eu choveria fúria em


sua família, seus irmãos, qualquer pessoa com quem ele se
importasse. Um filme nublado fechou minha visão enquanto
eu tremia com uma explosão iminente. Tudo que eu podia ver
era outro homem no meu quarto.

Ameaçando minha esposa.

Tocando nela.

Machucando-a.
Visões colidiram em minha mente como ondas contra
rochas afiadas. — Eu vou matar o filho da puta.

— Eu já fiz, — disse ela, seus olhos presos nos meus.

O que? Meu temperamento fervia quando as palavras


foram registradas. — Você...

Ela assentiu devagar, um sorriso orgulhoso se formando


em seu rosto. — Eu te disse. Eu lutei de volta e venci. Você
estava aqui. Você me ensinou. — A expressão dela ficou séria
novamente. — Eu entrei em pânico, no entanto. Eu não
estava com a mentalidade certa, não pude lutar com ele e
comecei a desistir. Eu fiz tudo errado no começo. Mas ele não
esperava que eu me defendesse, e esse foi seu erro. Acho que
nenhum deles esperavam isso de nós

— Ele subestimou você, — eu disse. — Mas você não se


subestimou

— Você nos deu. você me deu as ferramentas para me


defender, e eu me defendi

— Como?

— Jaz ajudou. — Ela enrolou o punho contra o meu


peito. — Vou lhe contar todos os detalhes mais tarde, e você
pode me dizer como fazer melhor da próxima vez.

Eu balancei minha cabeça, meio impressionado, meio


desejando ter visto com meus próprios olhos. — Você fez tudo
o que deveria. Você sobreviveu
— Regra número um - não morra. — Ela pegou meu
pulso, inclinou a cabeça para que eu não tivesse que alcançar
muito e levou meus dedos aos pontos. — Eles são um
distintivo de honra. Você me avisou que eu poderia me
machucar, então estava pronta para isso. Você tem cicatrizes.
Agora eu vou ter também. E elas vão me lembrar isso: às
vezes... as coisas podem parecer assustadoras e impossíveis.
Mas isso não significa que elas são.

Ela estava falando mais do que seu ataque? Tudo sobre


mim e minha vida a assustou quando ela chegou. Eu
esperava que isso fosse ela me dizendo que eu a havia
preparado bem, ensinado a se defender, e agora ela estava
pronta para se abrir para a possibilidade de coisas
assustadoras e impossíveis - como nós.

— As cicatrizes fazem parte de você, — eu disse, — e


elas representam a segunda chance que você se deu. —
Passei o polegar sobre sua bochecha machucada e cortada.
Havia uma pergunta gritante que eu não podia ignorar, e
estava preocupado que a resposta pudesse me desencadear
de uma maneira que eu não seria capaz de voltar, mas eu
tinha que saber.

— Natália. Ele tocou em você...? Ele fez... fez... — Eu


insisti. Ela era minha esposa. Nós compartilhamos uma
cama. Eu havia ameaçado o universo de que nenhum homem
deveria se aproximar dela. Se ele tentasse alguma coisa com
ela, isso mudaria tudo. Como me aproximei dela, a toquei e
até falei com ela. Isso iria partir meu coração em dois e me
enviaria para as profundezas do inferno que eu nem queria
reconhecer, mas eu tinha que cuidar dela antes que eu
pudesse me preocupar comigo mesmo. — Eu tenho que saber
se ele estuprou você, ou mesmo se ele tentou.

Ela se afastou, com um choque claro no rosto. Foi


brusco, mas era o único jeito de perguntar. Eu tinha que
saber isso imediatamente.

— Não. Não, não, não. — Ela apertou minha mão com a


dela. — Eles não estavam aqui para isso. Eles só nos queriam
mortas.

Minha frequência cardíaca se estabilizou quando a


resolução tomou conta de mim. — Vou encontrar uma
maneira de fazer isso direito. Seus irmãos e sua família
pagarão – e eu explodirei o cartel de Belmonte-Ruiz. O que fiz
antes, tentando impedir os negócios deles, não foi nada.
Agora eu vou buscá-los.

— Mas primeiro você vai descansar, — disse ela,


puxando o lençol para o meu peito. Ela pegou o IV caído,
deslizando o suporte de metal para mais perto da cabeceira.
— E você não machucará ninguém inocente em meu nome.
Console-se no fato de que nenhum homem que tenha entrado
nessas paredes com más intenções sobreviveu.

— Isso me dá pouco de conforto. Eles são apenas o rabo


da cobra. — Eu inalei, embora reconhecidamente, fiquei feliz
em ouvir isso. — Nem mesmo um conseguiu sair?
— Nem mesmo um. Fique quieto. — Ela levantou a
ponta de um curativo no meu torso, examinando a ferida. —
Alguns chegaram perto de escapar, mas seus homens
explodiram o helicóptero deles no céu. Você preparou sua
equipe – seu pessoal – bem. Eles são compostos em face do
perigo, como você. A maioria deles está vivo por causa disso.

Dificilmente era hora de elogios, mas eu podia ver que


ela estava tentando me confortar. O interesse dela pelos
meus sentimentos era novo – e muito bem-vindo. — Eles
entraram pelo telhado então, — eu disse.

— Alejandro acha que eles invadiram o sistema de


segurança pelo telefone celular que eu trouxe. Veja, quando
Diego me deu na casa do meu pai, ele queria que eu obtivesse
informações que pudesse passar para Belmonte-Ruiz. — Ela
respirou fundo. Suas bochechas coraram quando suas
teorias se espalharam. — Eles puderam acessar as câmeras
da casa para conseguir uma posição da propriedade. Eles
precisariam disso para derrubar o sistema por tempo
suficiente para violar as paredes via helicóptero, entrar pelo
telhado, substituir os geradores de reserva e a segurança...

— Eu entendi. — Eu não precisava ouvir mais.

Eles inundaram minha casa. Machucaram minha


equipe. Entraram no meu quarto. Ameaçaram a vida de
Natalia.

Eles colocaram algo na minha bebida. Encurralaram e


atiraram em Daniel.
Distante, ouvi Natalia chamar meu nome. — Eles vão
pagar por isso.

Ela forçou meu punho aberto, deslizando sua mão


delicada na minha machucada e áspera. — Cristiano, por
favor, acalme-se. Você não está em condições de ficar
chateado

— Eles sabem que eu não vou me sentar e não fazer


nada, — eu disse.

— É por isso que você precisa, — disse ela. — Ninguém


sabe o que está acontecendo ainda. Pode ser uma armadilha,
ou algum tipo de diversão, ou...

Não ouvi o resto. Apenas o toque dela trouxe minha


frequência cardíaca para um nível gerenciável.

Natalia suspirou como se carregasse o peso do mundo


nos ombros. — Você não quer saber como você está?

Eu podia dizer sem ouvir os médicos que meus


ferimentos eram relativamente leves. Eu tinha sido
costurado, e sem dúvida eles tentariam me manter na cama
por um período ridículo de tempo. Por experiência, sabia que
a dor poderia ser pior e, como já estava inquieto, ficaria de pé
em pouco tempo.

Não fazia sentido, no entanto. Eu deveria estar morto.


Ninguém nunca me colocou de joelhos e à mercê deles por
tempo suficiente para me furar – o que, três ou quatro vezes?
Eles me imobilizaram completamente. Eu poderia ter
assistido ele puxar uma arma e colocá-la na minha têmpora –
e não fazer nada sobre isso.

— Alguns dos médicos acham que você teve sorte, —


disse Natalia suavemente. — Mas eu sei que você faz sua
própria sorte. O manobrista não atingiu nenhum órgão vital e
errou o seu coração completamente.

Eu trouxe a mão dela para minha boca, observando seu


rosto, pedindo permissão silenciosa enquanto eu dava um
beijo em suas juntas, sua palma. — Isso é porque eu não sou
um homem normal, como já te disse. Meus órgãos são
impenetráveis

— E seu coração? — Ela perguntou. — É impenetrável


também?

— Não, mas não estava onde ele pensava que estaria, —


eu disse. — Porque estava aqui. Com você

— Cristiano, — disse ela respirando. Ela empurrou um


pouco do meu cabelo da minha testa, e levou tudo o que eu
tinha para não fechar os olhos e ceder à sensação dos dedos
dela na minha pele. Eu já a tinha perdido de vista por muito
tempo. Eu queria me satisfazer dela. — O médico não disse
que você bateu na cabeça. Você está se sentindo bem? — Ela
perguntou. — Essa experiência de quase morte fez você...
romântico?

— Apenas reforcei o que eu já sabia – o tempo é


precioso. Não vou mais desperdiçar isso me segurando
— Você, esperando? — Ela perguntou e se aventurou
um pequeno sorriso. — Desde quando?

Desejei que ela desmoronasse de uma vez por todas,


caísse em meus braços e buscasse segurança em mim, mas
ainda assim... ela se conteve. Algo havia mudado – eu podia
senti-la ceder, mas ela ainda não estava completamente lá.

Ela se aproximou o suficiente para que pudéssemos


falar em sussurros. — Você assustou todo mundo, — disse
ela.

— Você?

— Sim. Eu. Vai me dizer por que você foi para lá? — Ela
perguntou. — O que você estava procurando? O que era tão
importante que você arriscaria sua vida por isso?

— Você saberia a resposta se ao menos se deixasse ver.

Ela mordeu o lábio enquanto seus olhos vagavam pelo


meu corpo enfaixado, seus cabelos cor de corvo caindo ao
redor de seu rosto.

— Você, Natalia, — continuei. — Eu fui por você. Eu


estava procurando por você. Arriscaria minha vida por você.

Seu olhar disparou e ela agarrou minhas bochechas tão


de repente que eu me encolhi. Ela me forçou a olhá-la nos
olhos. — Não.

Eu fiz uma careta. — Não o quê?


— Chega de procurar um desfecho ou prova ou o que
quer que tenha levado você embora. Eu não preciso disso,
Cristiano de La Rosa. Você nunca vai procurar um desfecho
para mim novament.

— Mas não é só para você. É para mim também. —


Coloquei minhas mãos brutas e indignas sobre suas macias e
feridas, envolvendo-as. — Sempre haverá uma dúvida em sua
mente sobre o meu envolvimento na morte de Bianca, e eu
não vou viver assim.

Ela se afastou um pouco, a surpresa brilhando em seu


rosto. Suas sobrancelhas se uniram quando ela olhou de
lado, longe de mim. O que foi isso? A indecisão guerra dentro
dela? Qualquer coisa a ver com sua mãe, ela queria
respostas. Mas isso significava deixar-me continuar por esse
caminho.

— Você sabe alguma coisa? — Ela perguntou.

— Apenas suspeitas que estou tentando verificar.

Ela inalou profundamente pelo nariz. Se ela me pedisse


para voltar, eu o faria – assim que tivesse um plano para
recuperar Max e retaliar contra Belmonte-Ruiz.

— Não vá, — disse ela finalmente. — Quero que você


fique aqui. Fique em casa. Não procure respostas e não vá
atrás de Belmonte-Ruiz.

Eu devo tê-la ouvido mal. Ela colocaria meu bem-estar


acima de saber mais sobre o assassinato de Bianca? Acima
da vingança? Naquele momento, todas as minhas feridas
foram curadas. A lealdade e a confiança de minha esposa
eram o bálsamo, o anestésico, a cura para uma vida inteira
de rejeição e perda.

Foi, finalmente, a primeira indicação de que ela poderia


encontrar uma maneira de me amar.

Na outra noite, isso era tudo que eu queria ouvir dela –


fique.

Mas ela e eu sabíamos que não podia ser.

Eu sempre estive e sempre estaria nesta vida. Na linha


de fogo. Em risco. Não há garantia de amanhã. Eu não estava
deixando nada ir, e agora que Belmonte-Ruiz havia atentado
contra nós, eu teria que retaliar dez vezes. Natalia pode não
gostar, e sua preocupação era quase suficiente para me fazer
pensar duas vezes, mas eu não podia deixar Daniel e os
outros morrerem por nada. E não podia deixar Max para trás
- mesmo que, no fundo, soubesse qual seria o destino dele.

— Chega de conversa de negócios. — Corri minha mão


pelo antebraço e apertei o bíceps dela. Eu queria que ela se
aproximasse ainda mais, mas já havíamos feito muitos
progressos hoje à noite, e não queria perder a sorte. — Você
dormiu ao meu lado ontem à noite?

Lentamente, ela balançou a cabeça. — Você precisava


de espaço
— Você jurou que estaria na minha cama. — Meu tom
caiu. — É a regra, mi amor

— Circunstâncias atenuantes

— Se eu tivesse acordado e você não estivesse lá, teria


mandado todo mundo procurar por você

— Eles não precisariam procurar muito longe. Eles


teriam me encontrado no sofá. Ainda perto – caso você
precisasse de alguma coisa

— Eu preciso Natalia. Preciso de você como não precisei


de nada há muito tempo. Talvez nunca — Eu a puxei para
mais perto pelo braço até que nossos rostos estivessem a
centímetros de distância. — Eu não vou forçá-la a preencher
essa necessidade, mas você deve saber que isso está
profundamente dentro de mim.

Se uma coisa me impediu de cair nas garras da morte,


foi à promessa de sua doce boca pegando meu pau
novamente. Eu sonhava com isso, com a última noite que
passamos na mesma cama, com o jeito que ela ajoelhou-se de
bom grado e depois com o nosso beijo. Essas lembranças me
mantiveram vivo.

E o fato de eu lhe dever o mesmo.

Se eu pensasse que poderia retribuir com todo o vigor


que pretendia, eu a teria espalhado na minha frente agora.

Seria a primeira coisa que faria quando voltasse a


devorar sua vagina como o pedaço de doce que era.
Calor subiu pelo meu pescoço enquanto minha fome por
ela se agitava profundamente dentro de mim. Foda-se tentar
não assustá-la. Eu nunca deixei isso me parar antes. — Se
eu dissesse para você subir em cima de mim agora, o que
você diria?

Os lábios dela se abriram para respirar. —


Provavelmente te mataria. A médica disse que se você rasgar
suas suturas, ela terá que fazer uma cirurgia

— Ninguém conhece o remédio que eu preciso. Suba em


mim. Coloque-me dentro de você, isso vai me curar. E se não
o fizer, me dará algo para viver.

O rubor rosado de suas bochechas me agradou. Eu


estava ansioso para ver como ela iria recuar ou atacar
quando ela estava tão claramente tentando ser legal comigo.

Mas então ela olhou por cima do ombro. Inclinou-se


para mim. Escovou a boca ao longo da concha externa da
minha orelha. — OK.

Eu quase engasguei. — Ok? — Eu perguntei, sem me


preocupar em esconder a surpresa da minha voz.

Ela assentiu, passando as pontas dos dedos ao longo da


minha linha do cabelo, depois contra o meu couro cabeludo.

Meus olhos se fecharam em pura felicidade. Minha linda


rainha finalmente daria o que eu praticamente implorei. Pelo
que eu trocaria meu reino naquele momento.
Meu coração bateu forte, sua batida acelerada com o bip
da máquina.

Deus, não me deixe morrer de satisfação antes mesmo de


provar.

— Eu só preciso saber uma coisa, — Natalia sussurrou


em meu ouvido.

Abri meus olhos para olhar para os dela brilhantes. —


Qualquer coisa.

— Se eu subir no seu colo e finalmente te levar para


dentro de mim.

Eu salivava minha mão em seu braço se apertando


quando a necessidade passava por mim. — Sim?

— Você promete ficar quieto para não piorar suas


feridas?

A minha esperança foi esmagada como um veículo


achatado em uma panqueca por um compactador. Eu
poderia ter chorado se não tivesse vontade de rir. Minha
sedutora sabia exatamente como eu responderia. Deus não
foi misericordioso.

— Ficar parado? — Perguntei. — Prometi provar que sua


virgindade ainda estava intacta, destruindo-a completamente.
Como posso fazer isso se não me mexo?

— Ah. Que pena. — Ela umedeceu os lábios, piscando


preguiçosamente para mim. Ela também me queria assim?
Ou ela estava me provocando? — Você pode estar disposto a
arriscar sua vida por uma noite de sexo, mas eu não estou. —
Ela beijou minha bochecha – seu toque gentil quando meu
corpo respondeu com o puxão violento do desejo. — Não será
hoje à noite. Ou amanhã à noite. Mas irá acontecer. — Ela
disse. — Se cure, Cristiano, para que você possa cumprir
essa promessa.

Foda-se. Ela estava pronta então? Sua admissão foi o


mais doce consolo. Ela ia se entregar a mim. Eu pesava a
ideia de cumprir minha promessa agora e morrer no
processo, sem ter que esperar ainda mais, sabendo que isso
finalmente aconteceria e vivendo para apreciá-la.

Se eu pensasse que poderia arruiná-la hoje à noite sem


terminar em uma mesa de operações, eu poderia ter tentado.
Eu teria que estar contente sabendo que havia luz agora,
onde só havia escuridão antes.

Mas se isso significasse abrir os olhos de minha esposa


para o que poderíamos ser, não pude deixar de pensar que
deveria ter me matado mais cedo.
5

Natalia

Em nosso banheiro principal mal iluminado, Cristiano


estava diretamente sob uma lâmpada quente e macia que
brilhava sobre ele como se ele fosse uma estátua em um
museu. Da porta, eu o admirava no espelho. Ele escovou os
dentes usando apenas calças de moletom pretas baixas que
mostravam os músculos ondulando até um ‘V’ definido... e
além. Sua definição esculpida se estendia até o sul, eu me
perguntava se o tamanho dele poderia ser o resultado de
algum tipo especial de treino.

Cruzei meus braços sobre minha camisola para


esconder meus mamilos enquanto eles estavam em atenção.
— Você deveria estar na cama.

Ataduras e gazes brilhavam brancas contra seu


abdômen. Sua pele bronzeada e macia tinha sido estragada e
cicatrizada – e não apenas por esse ataque. — A doutora diz
que tenho me recuperado bem nos últimos dias, — disse ele.

Ele fez todos os esforços para esconder uma careta


enquanto se inclinava no quadril para cuspir na pia, mas eu
sabia.
— Sério? — Perguntei. — Porque eu falei com ela esta
manhã, e ela quer que você não fique de pé por pelo menos
mais uma semana.

Ele bufou. — Uma semana? Não, mami. Vou


enlouquecer se estiver de cama por mais alguns dias. E já
fazem alguns dias.

Não foi a primeira vez que passamos por isso. Eu tentei


entender o fato de que ele teve uma experiência traumática,
mas eu tive uma também. Cristiano queria voltar à ação. E
eu... eu nunca quero sofrer com o medo incapacitante de
pensar que o havia perdido novamente.

— Você não pode se recuperar em dias, — eu disse. —


Você...

— Eu já fiz isso antes. É muito mais perigoso para eu


estar parado, Natalia. Isso nos deixa vulneráveis. — Ele
passou a escova de dente sob a torneira. — A melhor maneira
de me curar é voltar ao trabalho.

— Eu proíbo, — eu disse. — Eu proíbo você de sair da


nossa cama.

Cristiano fez uma pausa e depois olhou para o teto. —


Sim, Dios Mío, esperei muito tempo para ouvir você dizer isso.
Fico feliz em ficar na cama por semanas, se você se juntar a
mim.
Ele certamente manteve sua mente suja e fome
insaciável de me levar para a cama. — Se você precisar fazer
uma cirurgia ficará fora do ar por muito mais tempo.

— Valeria a pena por uma noite com você.

Jaz entrou com pomada, frascos de comprimidos e os


itens para o banho de esponja. — Você deveria estar na
cama, senhor.

Eu não me incomodei em esconder meu sorriso com o


cuidado.

Ele piscou lentamente para os itens nas mãos de Jaz e


balançou a cabeça. — Eu já disse a vocês duas, sou
perfeitamente capaz de tomar banho.

— La doctora disse que você não deveria se banhar


ainda, — disse ela, colocando tudo no balcão. — Natalia
precisa limpar as feridas e trocar os curativos. Eu mostrei a
ela como. Vai demorar dois minutos, apenas fique aí.

— Jaz, em cinco segundos, eu vou pular no chuveiro, —


disse ele, tirando seu moletom. — Então, em três segundos,
eu estou puxando minhas calças.

— Você está muito instável. Você pode cair.

Jaz estava certa - ele poderia escorregar e bater com a


cabeça. Ele mal conseguia levantar os braços sem dor,
embora tentasse escondê-lo. Ele precisava de ajuda, mas
nunca admitiria. — Eu vou me juntar a você, — eu disse.
Seus olhos brilhavam quando encontraram os meus no
reflexo. — Juntar-se a mim? Você quer dizer... no chuveiro?
— A provocação em sua voz quase me fez rescindir minha
oferta.

— Eu te devo, — eu disse. No mês passado, eu fui à


única ferida no meu banheiro quando ele removeu o vidro dos
meus pés. — Por me ajudar após o incêndio no armazém.

Qualquer indício de brincadeira desapareceu de seu


rosto. — Eu sou a razão pela qual você se machucou em
primeiro lugar.

— Eu não esqueci. — Mas ele veio atrás de mim. Ele


escalou a lateral de um prédio prestes a explodir apenas para
me ajudar. Diego, por outro lado, havia me deixado cuidar de
mim mesma enquanto tentava – e falhava – recuperar as
drogas dos Maldonados.

Fui na direção de Cristiano, esperando que minhas


bochechas não ficassem vermelhas. Flertar com meu marido
algumas noites atrás tinha sido um vislumbre de diversão em
um momento escuro, e certamente poderíamos nos divertir.
— Você limpou e enfaixou minhas feridas, — eu disse. —
Deixe-me fazer o mesmo.

— Obrigado, Jaz, — disse Cristiano. — Você está


dispensada.

Com um movimento dos lábios, ela assentiu uma vez e


saiu do banheiro. Pelo menos desta vez, ela não discutiu. Ou
então ela viu o que eu também estava aceitando – as coisas
mudaram entre Cristiano e eu.

Eu não reconhecia esse comportamento em mim


mesma, mas já tinha visto isso antes. Do homem à minha
frente, parecendo satisfeito com minha exigência de cuidar
dele.

Eu estava apostando minha reivindicação.

Ele me disse muitas vezes antes – eu era dele.

E pela primeira vez, uma pequena voz na minha cabeça


respondeu de volta.

Ele era meu.

Cristiano assistiu no reflexo enquanto eu me


aproximava dele por trás. — Levante os braços um pouco, se
puder, — eu disse.

Ele os levantou lentamente para me dar acesso às


ataduras em torno de seu corpo.

— Dói? — Eu perguntei, enquanto me concentrava em


tirar a gaze.

— Você vai beijar para melhorar?


Implacável. Eu escondi meu sorriso. — Não.

— Então não, não dói.

Eu fiz uma careta para os cortes limpos e vermelhos,


não mais largos do que um palito, mas o suficiente para que
eles precisassem de suturas grossas e escuras para fechá-las.
Depois de tirar o curativo do peito, joguei tudo no lixo.
Atravessei o banheiro para ligar o chuveiro e, quando voltei,
ele estava lá, parado na minha frente. — Não posso tomar
banho com elas, — disse ele.

Meus olhos caíram em suas calças. — Você precisa de


ajuda?

— Sim. — Ele limpou a voz rouca. — Dói dobrar em


qualquer lugar.

Eu não tinha dúvida que deveria doer, mas desde que


ele raramente compartilhava quando ele estava com dor, eu
reconheci suas segundas intenções. Hoje à noite, porém, eu o
deixei agir assim.

Meus dedos roçaram sua pele enquanto eu trabalhava o


suor em sua bunda musculosa. Eu soltei um suspiro,
agradecida por ver que ele não estava se esforçando. A
doutora Sosa havia alertado Cristiano explicitamente sobre se
esforçar, mas se ele tivesse sexo em mente, eu não tinha
certeza de que ele tinha escutado os avisos dela.

Mas a visão dele exposto e precisando da minha ajuda


despertou meu desejo.
A designação de marido assumiu muitos significados
nas últimas semanas. Atormentador. Protetor. Professor. Eu
quase tremi sabendo como isso mudaria novamente em
breve. Amante. O pensamento de sexo com ele sempre me
excitou, mesmo quando isso me assustava e envergonhava.
Mas com o passar dos dias e Cristiano começou a se curar,
minha expectativa de finalmente me submeter a seus avanços
se tornou mais urgente.

Não poderia ser hoje à noite. Ele ainda estava longe de


estar curado.

Mas, por todas as vezes que ele gostava de me contorcer,


eu podia finalmente retribuir o favor.

Eu segurei seu olhar enquanto tirava minha camisola


sobre minha cabeça e a deixava cair com suas calças. Seus
olhos saltaram para os meus seios. Meus mamilos ainda
eram dois pontos de seixos, se mostrando para ele.

Eu entrei no chuveiro primeiro e estendi minha mão


para ajudá-lo.

Enquanto ele se movia sob a corrente de água, ensaboei


uma esponja e a toquei nas costas dele.

— Não há feridas aí atrás, — disse ele por cima do


ombro. — Você não precisa ser tão gentil.

Deslizei a esponja por toda a extensão, alcançando seus


ombros. Eu segui uma longa cicatriz da direita quando ela
cruzou sua espinha. Outras marcas nas laterais, braços e
costas contavam a história de uma vida violenta.

— Este não é o seu primeiro encontro com uma faca, —


imaginei e passei o polegar sobre uma pele levantada e
rosada sob uma omoplata. — Isso é de uma bala?

— Eu disse a você – eu fui derrubado antes.

Eu li um artigo no jornal anos atrás sobre o infame líder


anônimo do cartel Calavera. Alegou que ele tinha tomado
mais balas do que drogas em sua vida. Me mudei para a
frente de Cristiano, fascinada por cada pista do seu passado.
— O que aconteceu?

— Muitas coisas, — disse ele. — Vou te contar um dia


se você quiser, mas a longa cicatriz nas minhas costas é a
única com algum significado. Tudo começou com o cinto do
meu pai.

Eu congelei, levantando apenas meus olhos para os


dele. Eu queria ouvir isso me surpreendendo mais, mas não
era segredo que seu pai tinha sido abusivo. Diego tinha
falado sobre isso de vez em quando, mas ele minimizou. Isso
foi porque ele foi poupado principalmente? Seu irmão mais
velho suportou o peso disso para protegê-lo? Semanas atrás,
eu nunca chegaria a essa conclusão, mas estava começando
a conhecer Cristiano como esse tipo de homem. Aquele que
carregava o máximo que podia para proteger os outros.

— Eu odeio seu pai, — eu disse. — E sinto muito que ele


fez isso.
— Cheguei a um acordo e resolvi meus problemas com
ele, — afirmou Cristiano. Com esforço, ele levantou a mão e
encostou-se no azulejo. — Eu raramente ficava surpreso com
o quão longe ele iria. Diego, por outro lado, nunca vi a traição
dele.

Diego e Cristiano eram a única família imediata do


outro, então, é claro, eles estavam perto. Eu podia ver as
coisas mais claramente da perspectiva de Cristiano agora.
Diego havia se voltado contra o irmão, acusando Cristiano de
um crime brutal que poderia ter matado ele.

Eu olhei outra bala ferida acima de seu peitoral


esquerdo. — Você passou por tanta coisa que eu nem sei.

— Isso me fez quem eu sou, — disse ele. — O resto


dessas cicatrizes, mal vale a pena falar, Natalia, então não se
preocupe com elas. O mesmo acontecerá com minhas novas
feridas quando elas se curarem. Nós ficamos mais forte.
¿Entiendes?

— Eu entendo. — Eu passei a lavar as feridas,


garantindo que elas estivessem completamente limpas - e
tentando não me fixar no fato de que estávamos fisicamente
muito próximos e nus, e pela primeira vez, eu não estava com
medo, ansiosa ou nervosa.

Enquanto eu silenciosamente o ensaboava, seu pênis se


contraiu. Uma vez, isso teria me assustado. Agora, isso me
lembrou da nossa última noite juntos antes de tudo isso. No
andar de cima de sua boate, La Madrina, quando eu o
aconselhei a ir atrás do que ele procurava, sem saber dos
problemas que isso traria. E então, quando eu me ajoelhei
para confortá-lo.

Eu me virei quando um rubor subiu pelo meu peito e


troquei a esponja pelo seu xampu. Qualquer movimento era
um esforço para ele, mas não havia como ele conseguir
colocar os braços acima da cabeça. Eu precisaria de um
maldito banquinho para alcançar seu cabelo, no entanto.

Esguichei um pouco de xampu na palma da minha mão,


fui para o lado oposto do chuveiro e subi no banco para ficar
em cima dele. Quando ele apenas olhou para mim, eu disse:
— Entonces? Bem? — Eu levantei uma sobrancelha. — Venha
aqui.

Eu poderia jurar que ele riu enquanto caminhava em


minha direção. Eu afundei minhas mãos em seus cabelos.
Parecia haver ainda mais quando estava molhado –
abundantemente sedoso e como tinta nas minhas mãos.

Ele fechou os olhos e deixou cair à testa no meu


estômago enquanto eu ensaboava. Ele raspou o ponto
sensível entre os meus seios com sua barba e eu mordi meu
lábio para manter um gemido. Isso apenas o encorajaria, e
seu controle se mostraria escorregadio. Tínhamos que ser
bons, então eu tinha que ser a mais forte.

Ele deslizou as mãos pelo lado de fora das minhas coxas


e as descansou nos meus quadris, os dedos espalhando sobre
as minhas bochechas do bumbum. — Natalia, — ele
murmurou. — Te extraño3.

Eu sinto sua falta. Eu estava bem aqui, e mesmo assim,


entendi. Entre todos discutindo sobre ele nos últimos três
dias, Tasha e Alejandro monopolizando seu tempo, mais tudo
o que eu estava fazendo para manter a casa funcionando, não
estávamos realmente sozinhos desde que ele acordou. Os
remédios, que ele tomava, derrubavam ele à noite e eu
dormia no sofá para dar espaço a ele.

Meu coração batia no estômago. Talvez eu não estivesse


apenas preocupada com o controle de Cristiano. Despojado,
com suas mãos enormes em mim, e minha resistência a ele
não existia mais... desejo puxando em minhas profundezas
de uma maneira que não tinha desde antes dele sair. Eu lutei
com ele por tanto tempo. Eu não precisava mais. Eu não
queria.

Quando Cristiano acordou, me atingiu quando ficamos


cara a cara - até aquele momento, eu tinha pavor que ele não
sobrevivesse. Que eu o perderia. Que eu ficaria nessa
propriedade para me defender contra Diego, Belmonte-Ruiz e
até meu pai. O alívio que eu senti tinha sido palpável, mas
igualmente assustador de uma maneira diferente.

Isso não significava que ele ainda não era o homem que
me forçou a esse casamento. Quem ficou em pé sobre o corpo
morto da minha mãe e que me deixou, uma criança em luto,

3 Sinto sua falta.


em um túnel escuro por horas. Mas ele também protegeu
minha família e garantiu que todas as minhas necessidades
fossem atendidas desde a minha chegada aqui na Terra dos
Condenados.

Em nossa última ligação, eu queria pedir que ele


voltasse, mas não consegui encontrar as palavras.

E eu quase o perdi. O tempo era precioso, como ele


disse, e não deveria ser desperdiçado.

Em vez de tentar contar tudo isso, coloquei meus braços


em volta do pescoço e o abracei.

Ele pressionou os lábios na minha pele, trabalhando a


boca no meu peito antes de inclinar a cabeça. — Por favor, —
ele disse lentamente. — Por favor, não me negue mais.

Eu poderia me curvar e beijá-lo pela primeira vez desde


a noite em que ele deixou La Madrina. E desta vez, eu pude
admitir que estava disposta. Eu queria isso. Eu queria que
ele se curasse. Para ter o que ele precisava. Isso significava
que eu me importava. Mas eu também cuidei de Diego. Eu
tinha esquecido os sinais de alerta e tinha acreditado em
qualquer coisa que ele tinha dito ou feito. Depois do meu
julgamento horrível, eu poderia confiar em mim mesma?
Posso confiar em Cristiano?

A espuma escorria dos cabelos dele para o rosto, então


eu relutantemente tirei os braços do meu meio. — Você
precisa enxaguar.
— Você não sabe o que eu preciso Natalia.

Suspirei quando desci do banco e o conduzi sob a


corrente de água. Ele pegou meu rosto em suas mãos,
olhando nos meus olhos. Quando me aproximei, sua ereção
pressionou contra o meu estômago. Eu queria ceder. Para
acalmá-lo.

Talvez ele estivesse certo em acreditar que eu era a


única coisa que poderia curá-lo.

— Lembra da última vez que você me viu, antes de tudo


isso? — Perguntei.

— Eu fui esfaqueado, não atingido na cabeça. — Ele


roçou o polegar sobre o canto da minha boca. — Minha
memória está mais nítida do que nunca. Foi à noite em que te
peguei com o celular e te castiguei no clube. Você ainda está
brava comigo?

Eu balancei minha cabeça. — Essa não foi a última vez


que você me viu.

— Você está certa, — disse ele. — Você estava dormindo


enquanto eu arrumava uma mala.

— Eu não estou falando sobre isso. — Peguei-o na


minha mão. — Quero dizer, quando eu olhei para você de
joelhos.

— Cristo, Natalia. — Ele respirou fundo, seus dedos


cavando minhas bochechas e inspirando uma emoção que
terminou bem entre as minhas pernas. — Cuidado ao falar
assim.

Da última vez, estávamos no escuro. Agora eu pude ver


tudo. Ele era quase tão grosso quanto meu pulso, ainda mais
veemente que seu braço musculoso, e sua pele aveludada e
rosa se esticava enquanto ele crescia contra minha palma.

Seus olhos ficaram angustiados quando eu o acariciei, e


eu nunca tive tanta vontade de afugentar os demônios de
outra pessoa.

— Nós não podemos nos beijar – você sabe aonde isso


vai levar, — eu disse. — Mas isso vai ajudar? Você tem que
prometer ficar parado e não se esforçar.

— Eu nunca poderia ficar parado com as suas mãos em


mim. — A água escorria pelo nariz. Ele pegou meu pulso e eu
o soltei enquanto ele amarrava sua mão com a minha ao
nosso lado. — Não é disso que eu preciso, de qualquer
maneira.

— O que então?

Ele inclinou meu queixo para trás com a outra mão,


baixando o rosto para o meu. — Seus sentimentos mudaram
agora que você quase me perdeu?

— Sim. — Eu segurei seu olhar. — Mas você não pode


esperar que nosso relacionamento se transforme da noite
para o dia.
— Eu não espero. Mas se houver algo que você queira
dizer, diga agora.

Quando a determinação entrou em sua voz, um alarme


de aviso soou na minha cabeça. — Por que? — Eu perguntei
meus ombros tensos.

— Eu tenho que ir, Natalia. — Ele apertou os lábios. —


Não posso deixar Max ficar mais com Belmonte-Ruiz.

Droga. A frustração explodiu em mim e eu recuei para


cruzar os braços. Cristiano quase foi morto alguns dias atrás.
O que seria necessário para ele recuar? — Eu sei que você
não pode deixá-los fugir depois disso – é a natureza deste
mundo. Mas você não pode ir. Faça um plano e envie
Alejandro e seus homens atrás de Max.

— Fui eu quem colocou Max em perigo. — Linhas se


aprofundaram em sua testa com uma careta. — Não posso
enviar outras pessoas para fazer o meu trabalho. Eu terminei
de brincar com esses cabrónes e me entenda – eu vou
explodir os filhos da puta.

Ele não pode fazer isso. Agora não. Eu finalmente estava


me deixando ver Cristiano por tudo o que ele era, e ele iria se
colocar de volta na linha de fogo. Não foi tudo o que ele pediu
de mim nas últimas semanas – para me abrir à ideia de nós?
Para parar de brigar com ele? E agora que eu estava pronta,
ele voltaria para lá quando não estivesse na metade da
capacidade e seria morto? — Você não está pronto.
— Você precisa confiar em mim para saber do que sou e
não sou capaz.

— Você é um bobo.

Ele parou, piscando para mim.

Agora que eu tinha a atenção dele, não me contive. —


Você pensa que é um super-herói, mas não é. Você é mortal.
Você pode morrer.

— Eu nunca disse que não podia.

— Você está agindo assim. Fisicamente, você não está


nem perto de estar curado. Se você sair agora, voltará para
casa em um saco.

— Você realmente acredita nisso? — Ele se endireitou,


me pressionando. — Ou você está me provocando na
esperança de provar como meu corpo é capaz?

— Você também não está preparado mentalmente. Você


mal se deu a chance de se recuperar de um ataque à sua
vida. Você está agindo irracionalmente, por emoção...

— Você não me conhece, se acredita nisso.

— Você não se conhece. — Eu me levantei em toda a


minha altura, segurando seu olhar enquanto escurecia. —
Você é homem e pode cair, Cristiano. Você tem pessoas aqui,
dependendo de você.

— Você não acha que eu sei disso? — Ele apertou a


mandíbula e virou o rosto para mim. — É tudo que eu
sempre penso. Todas as vidas que estão em perigo quando
estou em perigo. É por isso que tenho que ir.

— É por isso que você não pode ir atrás de Max. No seu


estado, você é mais vulnerável do que o normal, e isso coloca
em risco as pessoas ao seu redor. Não seja idiota, Cristiano.

Ele entrou em mim. — Menina corajosa. Você acha que


pode me chamar de idiota?

— Você pode tentar me intimidar para ficar de boca


fechada, mas quando sua vida está em risco, eu não vou.

— Por que? — Ele perguntou.

— Você quase morreu.

— Eu já cheguei mais perto do que isso, antes.

Eu queria gritar com ele para colocar em sua cabeça


dura que ele poderia ser mais útil para Max aqui do que no
campo, mas isso não nos levaria a lugar algum. Respirei
fundo e tentei argumentar com ele. Ele se encolheu quando
eu coloquei minha mão sobre o ferimento no peito. —
Escúchame 4 , Cristiano. Me escute. Você não é fraco por
confiar em seus homens em um momento de necessidade.
Você não vê que isso o torna mais forte para saber quando
recuar e deixar que pessoas mais capazes ajudem?

4 Me escute.
Ele fez um punho. Dói-lhe que um inimigo tenha
conseguido o debilitar e o impediria de fazer tudo o que
pudesse por seu camarada.

A mão dele flexionou. — Cada um de seus toques me


conforta. Me cura. Mas, como você me acalma, o contrário
está sendo feito com o Max. Ele é um prisioneiro, não um
convidado.

Fechei os olhos contra a ideia, mas a imagem só ficou


mais clara no escuro. Se Max ainda estava vivo, não havia
dúvida de que ele estava sendo torturado. Eu tentei lutar
contra a visão dele amarrado em um quarto escuro,
ensanguentado e inchado. — Eu entendo, — eu disse. — Eu
também quero que Max volte para casa. Mas precisamos de
mais informações. Talvez eles o tenham levado como isca.

— Não é possível usar um homem morto como isca.

— Talvez você não devesse morrer.

Depois de uma batida, suas sobrancelhas se


contraíram. — O que?

— Eu tive muito tempo para pensar sobre tudo isso, —


eu disse. — 'Se você vai mirar, mate.' Você me ensinou isso.
Então, por que levar Max? Por que se dar ao trabalho de
atacar sua casa se eles planejaram matá-lo no hotel?

Reconhecimento aconteceu quando Cristiano pegou


minha linha de pensamento. — Qualquer mensagem seria
inútil se eu estivesse morto, — disse ele, sua expressão
diminuindo. — Eles queriam que eu vivesse. E você também.

— Eu? — Eu balancei minha cabeça. — Meu agressor


quase me sufocou até a morte. Ele quase cortou minha
garganta...

— Quase, — disse Cristiano. — Ele pode ter recebido


ordens para tirá-la viva. Ele tinha uma seringa com ele.

— O que? — Uma lembrança nebulosa retornou do


homem segurando o que eu pensava ser uma lâmina. — Um
tranquilizante?

— Você teria sido o primeiro alvo deles. Por que não


apenas atirar em você? — Ele engoliu em seco. — Meu pior
medo, quando eu pensei que estava morrendo, era que eles te
levassem, Natalia.

Abstive-me de estremecer. Essa nova informação mudou


completamente aquela noite. Havia mais risco do que minha
vida. Eu poderia estar na posição de Max agora, nas garras
de um cartel rival com um machado para me cortar.

Eu queria que o Max saísse. Desesperadamente. Mas à


vida de Cristiano significava mais para mim, por isso falei
com ele de uma maneira que sabia que chegaria até ele. —
Você vai me levar com você para recuperar Max?

Os cantos de sua boca caíram. — Por que eu deveria?

— Porque você deixaria a Terra dos Condenados


novamente desprotegida se você for. Você estaria me
deixando vulnerável. Se eles me quiserem, podem tentar
novamente.

O tormento estragou seus traços, mas não me deteve.


Eu precisava dele para entender o que ele poderia perder se
ele agisse de forma imprudente.

— Eles podem estar esperando você andar - não, correr -


para uma armadilha, — eu disse. — E se eles têm você, então
eles também me tem.

Ele levou minha mão ao peito. — Eu... Não posso deixá-


lo sentado lá e apodrecer, Natalia. E se não posso ajudá-lo,
falhei com ele.

Joguei meus braços em volta do pescoço dele, nossos


corpos nus e molhados corados. — Hay un tiempo señalado
para todo5, — eu sussurrei, citando a Bíblia. — Um tempo de
matar, e um tempo de curar.

— Você não tomou essas decisões sozinho. Max sabia no


que estava se metendo, — falei. — Ele pode lidar com isso.
Ele nunca esperaria que você salvasse a vida dele à custa de
todos os outros. Ele é forte.

Ele estremeceu. — O que eu faço?

Eu tinha um dos senhores do crime mais implacáveis e


agourentos nos braços, pedindo minha ajuda. Não foi a
primeira vez. Meu conselho para ele no quarto de cima de sua

5 Há um tempo para tudo.


boate estava errado. Se eu não tivesse dito para ele ir, talvez
ele tivesse ficado e nenhum de nós teria enfrentado a morte.

Então, novamente, não estaríamos aqui agora.

Ele voltou para mim. Não apenas fisicamente, mas


emocionalmente. Ele voltou para mim em busca de ajuda.

No possível evento de sua morte, eu sabia que teria que


acelerar. Por que isso deveria mudar desde que ele viveu?
Mais do que nunca, eu poderia ser a mulher que ele pensava
que eu era. A rainha que ele escolheu para ser sua esposa.

Eu alisei minha bochecha contra seu queixo, enquanto


todos os dois metros e meio dele estavam poderosos – e nus.
Encorajado pela justaposição de sua masculinidade e
vulnerabilidade, recuei e disse: — Você faz um plano. Você
monta uma equipe. Mas você não se apressa. Max é duro e
teimoso. Ele vai aguentar até que seus homens possam
chegar até ele.

Cristiano descansou a testa na minha. — Nós, — ele


disse. — Vamos fazer um plano. Vamos montar uma equipe.
Nós vamos tirá-lo de lá.

Eu estava com ele agora. Eu já o fazia há um tempo.


Com poucas palavras, Cristiano me disse que eu não estava
mais aqui contra a minha vontade. E eu aceitei isso.

Eu deixei Cristiano entrar. Entrei no papel que ele


estava me pressionando. Eu fiquei ao lado dele na torre de
marfim.
Nós éramos a realeza de Calavera.
6

Natalia

Notícias do último encontro de Cristiano com a morte se


espalhou pelas Terras dos Condenados e, na semana
seguinte, tornou-se um trabalho de tempo integral recebendo
desejos de boas-vindas nas formas de refeições caseiras e
produtos artesanais, como cerâmica, velas e tequila. Foi uma
celebração de sua boa sorte e não do que poderia ter sido, e
fiquei agradecida pela distração.

Mas quando cheguei da praça da cidade uma noite,


lembrei-me de que ainda tinha outros assuntos mais pessoais
para resolver. Tirei as luvas sujas de terra do plantio de
árvores e as deixei na entrada enquanto seguia as vozes para
a área de jantar.

As duas últimas vozes que eu queria ouvir – Tasha e


Cristiano.

Independentemente de onde na casa Tasha se


encontrava, ela estava se tornando uma presença mais
indesejável a cada dia, mas mais enlouquecedora era a
aversão de Cristiano a descansar.

Entrei e os encontrei conversando no final da longa


mesa, onde ninguém nunca se sentou. — Você tem asas
agora? — Eu perguntei, satisfeita com a minha voz e minhas
sandálias batendo no azulejo.

Cristiano parou no meio da frase para olhar para mim.


— ¿De qué estás hablando?6

Ele queria saber do que eu estava falando? Pfft. Dei um


sorriso cordial no rosto. — Eu sei que você não desceu as
escadas desde que a médica ordenou explicitamente que você
não o fizesse. E o elevador está fora de serviço enquanto
passa por atualizações de segurança. Então você voou? Ou
há um escorregador do andar de cima que eu não saiba?

— Estou na cama há duas malditas semanas, — disse


ele.

— Faz onze dias – não exagere.

— A Dra. Sosa estava lá em cima com a gente, — disse


Tasha, — e ela nos disse que estava tudo bem.

Nós? Eu olhei para Cristiano. Eu não deveria proíbi-lo


de ficar sozinho em nosso quarto com uma mulher que não
era Jaz ou a Dra. Sosa, mas aparentemente eu o fiz. E para
piorar as coisas, ele não apenas usou as escadas, como
também se vestiu – e parecia 'irritantemente' bonito com uma
camisa branca e calça social apertada. Foi a primeira vez que
ele ficou vestido, desde que ele foi entregue em casa para
mim ensanguentado e meio morto. Ele pensou que estava
indo a algum lugar?

6 Do que você está falando?


— Relaxe, Natalia, — acrescentou Tasha. — Cristiano
cura a um ritmo sobre-humano.

— Não, ele não cura. — Eu andei para ficar ao lado de


sua cadeira. — Porque ele não é sobre-humano. Ele é um
homem e foi esfaqueado três vezes.

— Eu ainda estou lutando para entender por que você


se importa. — Seus olhos estreitados permaneceram
treinados em mim. — Como você chamou seu casamento,
Cristiano? Uma aliança entre você e Costa? Nada mais.

Eu odiava a ideia de Tasha pensar que isso era tudo


para mostrar. Ela tinha sido íntima com Cristiano. Ela sabia
do que ele gostava e, considerando que eles estavam
passando um tempo juntos sem mim, como conseguir saber
suas intenções. Sem mencionar que ela era uma mulher
bonita que provavelmente conhecia como chegar a um
homem tão experiente quanto meu marido – onde eu ainda
era uma garota de várias maneiras, especialmente quando se
tratava de sexo.

Eu me virei para encarar Cristiano. — A médica esteve


aqui? O que ela disse?

Os olhos dele brilharam. — Que eu estou liberado para


quase tudo.

Um rubor subiu pelo meu peito. — Vou ter que ouvir


isso da boca dela.
— Você teria se estivesse ao lado dele, — disse Tasha
atrás de mim. — Onde você estava?

De repente, a jardinagem parecia inexpressiva, mas


passar muito tempo no ermo era muito mais do que isso.
Sem Max, Cristiano ou mesmo Alejandro para conversar, os
moradores tinham problemas para resolver, e eu ouvi alguns
deles enquanto ajudava na capela.

Eu me virei para Tasha. — Lidando com negócios.


Teresa estava me mostrando algumas coisas. — Eu levantei
minha mão esquerda antes de acrescentar: — Ela é a ourives
que fez nossas alianças.

Tasha verificou sua manicure. Como ainda estava


perfeitamente intacta após as últimas duas semanas estava
além de mim. — Ten cuidado, Cristiano. Você deve ter
cuidado, — ela disse. — Quando um mafioso cai, sempre há
abutres à espera.

Cristiano se afastou da mesa, levantou-se e colocou as


mãos nos meus ombros. — Você está sugerindo que eu caí?
— Ele perguntou.

Tasha molhou os lábios. — Você o fará se não assumir o


controle dessa situação. A notícia está se espalhando.

Ela indicou algo semelhante antes, quando chegou.


Antes que eu pudesse pedir que ela esclarecesse, Alejandro
abriu a porta da cozinha, segurando-a para que Jaz
passasse.
— Quantos lugares eu devo colocar para o jantar,
senhor? — Perguntou Jaz.

— Coloque para cinco, — eu respondi. — Pilar também


se juntará a nós. Você pode ir buscá-la, Alejandro?

— É claro, — ele disse, quase correndo na direção da


biblioteca onde Pilar passava a maior parte do tempo.

Enquanto Jaz distribuía talheres e guardanapos, e


enchia copos com vinho tinto, Cristiano foi para a cabeceira
da mesa, andando quase como se estivesse de volta ao
normal. Isso não significava que ele ainda não estava com
dor.

Liguei meu cotovelo ao dele e abaixei minha voz. —


Como você está se sentindo?

— Melhor do que nunca, — ele disse sem olhar para


mim.

— Tasha disse que a notícia está se espalhando. Isso


significa que pessoas além de Belmonte-Ruiz estão
começando a saber a verdade sobre as Terras dos
Condenados?

— Não estamos discutindo isso agora.

— Mas...

— Eu disse que não.

Tasha e Jaz se aquietaram, olhando para nós.


— Não é um assunto para o jantar. — Cristiano pegou
um dos candelabros elaborados do centro da mesa e o
empurrou em direção a Jaz. — Se livre disso. Ninguém pode
se ver com essas malditas cosas no caminho.

Minha boca se abriu quando ele falou algo tão estúpido


quanto castiçais. Mesmo que ele e eu tivéssemos discutido
desde o seu retorno, foi a primeira vez que ele foi agressivo
comigo. Eu nem tinha certeza do que era o assunto, mas
obviamente era doloroso.

A risada de Pilar apareceu antes dela junto com


Alejandro. Ele claramente disse algo para diverti-la, mas
quando seus olhos pousaram em Cristiano, seu
comportamento se encolheu.

Cristiano não tinha saído muito do nosso quarto desde


que ele estava confinado lá, o que significava... era a primeira
vez que Pilar o via – pelo menos enquanto estava consciente –
desde o nosso casamento. Ela torceu as mãos na frente dela,
seus nervos palpáveis, mesmo do outro lado da sala. —
Onde... onde eu devo sentar?

— Em qualquer lugar, menos no assento de Natalia, —


disse Cristiano, de pé atrás da cadeira na cabeceira.

Os olhos de Pilar dispararam. Como raramente


comíamos à mesa, ela não tinha como saber de quem era o
lugar de quem. — Aqui, — eu disse, estendendo a mão para
ela. Eu a conduzi para a cadeira ao lado da minha. —
Alejandro, você se senta em frente a ela.
Cristiano puxou minha cadeira, mas falou com Pilar. —
Presumo que você ficará conosco por um tempo.

Pilar olhou para Alejandro enquanto colocava um


guardanapo no colo. — Eu...

— O noivo não vai incomodar Pilar novamente, —


respondeu Alejandro por ela.

— Bom, — disse Cristiano, gesticulando para eu me


sentar.

Fiquei onde estava sentindo-me repentinamente fora do


circuito. — Do que você está falando?

— Noivo de quem? — Tasha entrou na conversa.

— Siéntate. — Cristiano mandou-me sentar, me


esperando enquanto gotas de suor haviam se formado no
lábio superior dele. Sabendo que ele não relaxaria até que eu
sentasse, eu obedeci. Ele me ajudou a me sentar e
perguntou: — Que tipo de comida você gosta, Pilar?

Eu dei a ela um sorriso encorajador.

— Tradicional, — disse ela.

— Tradicional o que? — Cristiano perguntou, sentando-


se na cabeceira. — Vietnamita tradicional? Você gosta de
Pho7? Indiano? Galinha ao curry?

7 Prato tradicional da culinária vietnamita. Trata-se de a sopa de arroz.


— Você sabe o que ela quer dizer, — eu disse a
Cristiano. Qual era o problema dele? Qualquer que fosse o
nervo que eu provoquei antes, obviamente ainda estava
fervendo. — A maioria das pessoas conta suas bênçãos após
uma experiência de quase morte – você acaba ficando ainda
mais mal-humorado.

Pilar mudou seu olhar horrorizado para mim. Em seu


mundo, as mulheres não saíam por aí chamando perigosos
chefões de mal-humorados.

Cristiano parou no meio da abertura do guardanapo no


colo e olhou para mim. — Você não me viu mal-humorado
ainda, mamacita.

— Ela tem razão, — disse Alejandro do outro lado da


mesa. — Talvez seja porque você parou com os analgésicos.

— Quando? — Eu exigi.

Cristiano recostou-se na cadeira, massageando a ponta


do nariz com um suspiro pesado. — Dias atrás.

— O que há de errado? — Perguntei. — É uma dor de


cabeça?

— Está se tornando uma, sim, — disse ele.

Pilar deu uma risadinha e depois respirou fundo quando


Cristiano olhou para ela, como se o riso pudesse causar
problemas. Ela ainda estava com medo dele. Eu não a culpo –
ele sequestrou nós duas - mas ele não a machucaria.
Cristiano não ia me machucar.

Isso me atingiu pela primeira vez – eu sabia o tempo


todo que ele não faria.

Cristiano nunca me machucaria.

Não naquela época, quando criança, quando ele me


assustou profundamente com a Monarca Branca debaixo do
meu queixo. Não quando ele me teve sozinha e me despiu no
meu banheiro na casa de Papá, ou quando eu estava à mercê
dele na igreja. Não quando eu estava diante dele como sua
nova noiva, reivindicada como sua propriedade.

Meu intestino havia me dito isso, mas quando a


realização completa passou por mim, olhei para ele. Talvez o
tempo todo Cristiano estivesse simplesmente me perseguindo
a qualquer custo. Isso não tornou o que ele fez bom, mas
também não o fez o monstro que eu pensava que ele era.

Enquanto eu estudava Cristiano, os olhos dele viajaram


dos ombros de Pilar, que estavam praticamente nos ouvidos
dela, para as mãos atadas firmemente à mesa. Ela usava um
vestido de mangas compridas, mas eu sabia que Cristiano
estava vendo os machucados desbotados embaixo dele.

Ele tirou a mão do rosto e deu um sorriso reconfortante.


Era claramente forçado, mas ele estava fazendo um esforço.
— Sinto muito por ter falhado com você agora. E sinto muito
pelo Manu.

Ela olhou para baixo. — Eu estou bem.


Cristiano havia passado as últimas semanas tentando
me convencer de que não era uma ameaça – agora ele teria
que começar tudo de novo com ela.

Mas então, ela levantou a cabeça com uma pitada de


um sorriso travesso. — Eu estou melhor que Manu, pelo
menos.

Cristiano soltou uma risada genuína. — Ontem correu


bem então?

— Ontem? — Perguntei. — E o que há de errado com


Manu? Se alguém não me disser o que aconteceu. —
Ameacei.

Tasha franziu os lábios vermelhos. — Quem diabos é


Manu?

— O ex de Pilar que ficou com ela pela última vez, —


explicou Cristiano, depois se virou para mim. — Prometi a
Pilar que ela não seria prisioneira aqui. Ontem Alejandro a
levou para casa.

Eu fiquei boquiaberta com minha amiga. Como eu senti


falta disso? Com meu tempo dividido entre cuidar de
Cristiano e cuidar dos negócios das Terras dos Condenados,
eu não tinha visto muito de Pilar ultimamente. Ela só tinha
planejado passar um fim de semana aqui, pelo amor de Deus,
e isso me escapou completamente de verificar com ela.

— Você foi para casa ontem? — Perguntei a ela.


— Sí, e ela escolheu voltar, — disse Cristiano, sem se
preocupar em esconder o sorriso. — Imagine isso.

Revirei os olhos. — Deixe-a falar por si mesma.

Ele respondeu com um arco de sobrancelha.

Pelo balanço rápido da cabeça de Pilar, ela não quis


falar, mas eu insisti. — Você quer ficar?

Ela assentiu devagar, os olhos passando de Alejandro


para Cristiano. — Desde que eu possa sair a qualquer hora
que eu quiser. Eu simplesmente não conseguia ver outra
saída do meu noivado com Manu. Eu tinha que contar aos
meus pais e pegar algumas coisas em casa, então Alejandro
foi comigo.

Peguei a mão dela sobre a mesa. — Me desculpe, eu não


estive aqui por você.

— Você tem muito com o que lidar, — disse ela. —


Estou me instalando agora – não se preocupe comigo.

Jaz e o chef entraram pela porta da cozinha para


entregar saladas adornadas com fatias de pêssego, queijo
feta, nozes e cranberries secas.

Tasha colocou uma pequena mordida na boca e gemeu.


— Divino. Onde você consegue pêssegos tão perfeitos?

Cristiano sorriu. — Bem aqui nas Terras dos


Condenados.
— Fisker não faz as melhores refeições? — Perguntei,
sorrindo para ele e depois para Pilar. Ela conhecia melhor a
comida, e eu esperava que um assunto confortável ajudasse a
aliviar a tensão em seus ombros. — Meu marido pode não ter
muita coisa a seu favor, mas sua comida é da terra e ele
emprega um chef de classe mundial.

Cristiano estreitou os olhos em mim. Eu levantei um


canto da minha boca o suficiente para transmitir que estava
brincando. Ele abriu a mão na mesa para mim. Foi à chance
perfeita de mostrar a Pilar que eu estava confortável perto
dele, para que ela pudesse estar também.

Quando coloquei minha mão na dele, ele a levou aos


lábios brevemente, depois a abaixou embaixo da mesa. —
Certamente seu marido tem mais alguma coisa a favor dele,
— disse ele.

O repentino poder masculino debaixo da palma da


minha mão enviou memórias do nosso chuveiro juntos
piscando na minha mente e um tremor de excitação pelo meu
corpo. Parte disso era a expectativa de saber que Cristiano
estava contando os dias até que ele estivesse curado o
suficiente para me receber.

— Perdoe-me por encarar minha esposa. Eu amo muito


quando ela me chama de marido sem zombar. — Cristiano
moveu nossas mãos para a minha coxa e se inclinou para
sussurrar no meu ouvido. — Você quer que eu fique na cama,
então eu vou me curar mais rápido. Mas lembre-se de que
quanto mais rápido eu me curar, mais cedo esse ponto
sensível entre suas pernas será meu para devastar.

Eu soltei uma respiração instável. O que antes havia


sido uma ameaça agora era uma promessa deliciosa. A
ternura não serviria. Não é a nossa primeira vez. E ele sabia
disso, aguardando até então, me provocando com suas
palavras.

Cristiano não esperou pela minha resposta. Quando


seus dedos deslizaram pela minha coxa, ele se virou para
Alejandro, que estava passando manteiga em uma fatia de
pão. — Como Manu reagiu?

Alejo pousou a faca. — Como você esperaria. — Ele deu


uma mordida, mastigando quando acrescentou: — Mas eu
lidei com isso.

— Ele tentou enfrentar Alejandro, mas, em vez disso,


levou um chute na bunda, — disse Pilar. — Foi divertido de
assistir.

Eu ri de seu sorriso incomum e perverso, feliz por ver


que ela estava relaxando. Afinal, quem melhor para derrubar
sua maior ameaça do que os homens mais ameaçadores que
ela conhecia? — Alejandro é um bom lutador, — eu disse.

— Ele é? — Cristiano perguntou enquanto deslizava a


mão pela minha coxa e apertava meu joelho no local exato
que fazia cócegas.
Eu ofeguei, agarrando seu pulso e tentando não rir. —
Mas Cristiano é melhor, — acrescentei rapidamente, e seu
poder sobre mim foi liberado.

— Ah, obrigado por dizer isso, mi amor. — Cristiano


piscou e voltou-se para Alejandro. — Suponho que você fez
mais do que derrubá-lo.

Alejo baixou a cabeça um pouco. — Não na frente da


senhorita.

— E seus pais? — Cristiano perguntou a Pilar.

Ela assentiu. — Eu disse exatamente o que Alejandro


queria que eu fizesse.

Meu foco vacilou com a mão de Cristiano ainda


descansando na minha perna. Minha mente começou a
registrar que, quando se tratava de sexo, Cristiano sempre
esperava algum tipo de sugestão para prosseguir. Com a
promessa de seus dedos tão perto, meu estômago deu um
salto.

— O quê? — Perguntei, parecendo tão atordoada quanto


me sentia. — O que Alejo disse para você dizer?

— Alejandro me deu instruções, — ofereceu Pilar.

— Elas vieram de Cristiano, — disse Alejo.

Tasha olhou para frente e para trás, como se estivesse


assistindo uma partida de tênis não muito emocionante. De
vez em quando, ela suspirava em seu prato.
— Eu disse a Manu e aos meus pais que não iria
terminar o casamento, — disse Pilar, — e que estava vindo
aqui para trabalhar. Para o Cristiano. Contra minha vontade.

Contra a vontade dela. A mentira era para o melhor.


Estar aqui comigo era melhor do que o futuro com Manu que
ela não conseguia evitar sozinha. E perpetuou os mitos que
cercavam Cristiano e a Terra dos Condenados. Eu entendi
porque Cristiano queria isso - mas como ele se sentiu com
tantas pessoas pensando que ele era o mesmo tipo de mal
que ele lutava?

Ele foi capaz de empregar lógica para remover sua


emoção da situação?

Ou cortou profundamente, e ele ficou bom em escondê-


lo?

— Confirmei que seu casamento era uma farsa, —


continuou Pilar, olhando de mim para Cristiano e voltando,
— e que Cristiano só havia feito isso para forjar a aliança com
Costa, mas que Natalia e eu não estávamos feridas.

Dois empregados entraram e colocaram bife e batatas


assadas na nossa frente.

— Obrigada, por me deixar ficar, — acrescentou Pilar, e


eu podia vê-la tentando ser gentil com um homem que temia
por tanto tempo. — Mas minha família nunca me deixa fazer
nada. Apenas trabalhar em sua loja e tentar encontrar um
marido. Eu gostaria de fazer a minha parte, talvez ajudar em
casa, ou...
— Podemos conseguir seu próprio lugar, se você quiser,
— disse Cristiano. — Ajudar você a começar um negócio – o
que quiser.

— O que você quer? — Perguntei a ela.

Ela recostou-se. — No sé. Eu... eu não tenho certeza.

Isso não me surpreendeu. Eu duvidava que nem seus


pais nem Manu tivessem perguntado. — Você pode começar
por aqui.

— Posso mudar meu nome? — Ela saiu correndo.

Nós quatro apenas olhamos para ela. Foi um pedido


pequeno e enorme.

Um jantar, e Pilar estava saindo de sua concha. Talvez


ela acreditasse no que eu estava tentando lhe contar sobre
Cristiano. Ou talvez tenha sido a presença de Alejandro que a
confortou. Eu tinha certeza de que eles estavam passando
algum tempo juntos – suspeitei que era outro motivo pelo
qual não a tinha visto muito.

— Bem... é claro, — respondeu Cristiano. — Inúmeras


pessoas dentro dessas paredes mudaram suas identidades.

— Esmeralda, — disse Alejandro, super concentrado em


cortar seu bife. — Ah, é um bom nome.

— Sim. — Eu peguei sua linha de pensamento. — Por


seus olhos esmeralda.

Pilar sorriu para si mesma. — Esmeralda. É bonito.


— Combina com você, — eu disse.

— Isso é muito emocionante, — disse Tasha, — pero, por


Dios, é chato. Não entendo por que nenhum de vocês está
discutindo o que realmente importa. — Os dentes dela
arranharam o garfo enquanto ela mordia, mastigava e engolia
em segundos. — Quase duas semanas se passaram e Max
ainda está desaparecido. Você não revidou, e isso faz você
parecer fraco.

— Não confunda estratégia com fraqueza, — eu disse.

— Você ficou sem tempo para a estratégia. É hora de


agir, — disse ela, olhando de mim para Cristiano. — Um
verdadeiro senhor do crime nunca deixaria isso acontecer.

— Tasha. — Cristiano avisou.

— Ninguém nem sabe onde está Max, — eu disse. — É


melhor atacar em silêncio, quando menos esperam, quando
tivermos certeza da localização dele.

— Isso pode levar meses. De fato, você talvez nunca


saiba sua localização exata. E todo dia que passa, as pessoas
falam. — Tasha esfregou os cantos da boca com um
guardanapo. — Você parece ainda mais fraco pelo fato de que
a verdade está saindo.

Cristiano olhou para o prato e não negou.

— Continue, — eu convidei.
— A reputação implacável de Calavera foi aprimorada
pelo mistério que os envolve. Mas com esses ataques e a
recusa de Cristiano em armar certos cartéis, está se tornando
uma fofoca popular que Calavera está trabalhando para o
lado errado.

— Porque ele não está traficando ninguém - ele está


ajudando os traficados, — eu disse.

— Certo, — disse Tasha. — Como você acha que isso o


faz parecer? Como um traidor. E não apenas para Belmonte-
Ruiz.

Eu já tinha ouvido duas vezes de Tasha agora. Até


Alejandro parecia pensar que era possível. Mas Cristiano
ainda tinha que trazer isso para mim. — Isso é verdade? —
Perguntei a ele.

Ele olhou para mim. — Dê-me um momento com minha


esposa.

Alejandro ficou em pé primeiro, pegando o prato. —


Vamos para a cozinha.

Pilar seguiu o exemplo, mas Tasha demorou-se a afastar


o jantar meio comido e a levantar-se da cadeira. — Ignorar o
problema não o fará desaparecer, — disse ela. — E isso
matará Max.

Segui Tasha com os olhos até que ela atravessou a sala


e desapareceu pelas escadas.

— Diga-me o que está acontecendo, — eu disse.


Cristiano recostou-se na cadeira e cruzou os braços.
Tive a sensação de que ele não havia dispensado os outros
para que pudéssemos conversar abertamente. — Não me
questione na frente dos outros.

— Eu não fiz.

— Eu não me deixei claro antes? — Ele perguntou. —


Eu disse que o tópico foi fechado durante o jantar.

Ah. Bem. Se ele não queria discutir negócios, eu não me


importava de mudar de assunto. E desde que ele insistia que
estava melhor, não havia razão para continuar deixando-o em
paz. Eu levantei meu queixo. — Então me diga isso. Por que
Tasha ainda está aqui? O que ela significa para você?
7

Natalia

Cristiano comeu seu último pedaço de bife do jeito que


comeu todos os outros - mastigando rápido e com força antes
de engolir com um gole de vinho. Ferido ou não, ele se
manteve fiel às suas alegações de que comia como se alguém
pudesse levar seu prato antes que ele terminasse. — Chin-
chin. — Ele levantou a taça de vinho. — Brindis, a mi bella
esposa.

— Brindar 'sua linda esposa' não vai deixar você de


responder à minha pergunta, — eu disse. — Por que Tasha
ainda está aqui? E o que significa que as pessoas estão
sabendo a verdade sobre o seu negócio?

— A família dela tem uma extensa rede aqui e na


Europa Oriental. — Chupando os dentes, ele largou a taça. —
Ela conhece bem esse mundo e é boa para obter informações,
por isso está me ajudando a encontrar coisas sobre
Belmonte-Ruiz. Mas peça que eu a mande embora, e eu irei.

— Mande-a embora.

Ele fez uma pausa e inclinou a cabeça, claramente


despreparado para essa resposta. — Por que?
Como ele poderia perguntar? Ele não viu o jeito que ela
olhou para ele? Pra mim? — Ela está pressionando você a
tomar decisões precipitadas.

— Ninguém me pressiona a fazer qualquer coisa, —


disse ele. — E eu não sou nada se não for minucioso.

— Lembre-se, você iria atacar depois que Max fosse pego


sem sequer considerar que poderia ser uma armadilha. — Eu
falei com você. Você pensa que está imune – que não pode
errar e pode sobreviver a qualquer coisa.

— Isso de novo. Eu entendo o seu ponto de vista – eu já


ouvi. Ouvi de Alejandro. — Seus talheres caíram no prato. —
Eu tomei uma decisão e você ficará por trás dela. Alejandro e
sua equipe partirão amanhã.

— Por que? Por que Tasha machucou seu ego?

Ele enrolou a mão em punho na mesa. — Como você me


pergunta? Discute comigo? Eu lhe disse que não queria
discutir nada disso na mesa de jantar, mas você e Tasha me
pressionam.

— Então vamos discutir como você disse a ela que nosso


casamento não significa nada – isso não é da conta dela.

— Você não discutiu nosso acordo com Pilar?

— Isso é diferente.

— Quão?
— Eu estava confiando em Pilar, não tentando dormir
com ela.

— Ah. — Ele agarrou os braços da cadeira e cruzou o


tornozelo sobre um joelho, parecendo divertido. — É por isso
que você acha que eu disse a Tasha que você não significa
nada para mim?

— Por que mais? Você estava fora da cidade. Teria sido


a desculpa perfeita. — Eu me mexi, desconcertada com a
ideia de Cristiano no evento político com outra mulher em
seu braço. Tasha, especialmente astuta e esperta, se torna
uma hóspede em nossa casa. — Um casamento arranjado e
celibatário significa que você não estaria tecnicamente
traindo.

— Você acha que Tasha se importa se eu trair minha


esposa? Se eu quisesse transar com ela, eu faria. Não tenho
todo o direito? Minha própria esposa nem dorme na minha
cama.

Meu rosto esquentou com sua franqueza. — Eu removi


qualquer tentação – para seu próprio bem.

— Mal ficamos sozinhos. E quando estamos você está


sempre se movendo. Constantemente há pessoas no meu
quarto, e à noite você vai para o sofá. — Uma sobrancelha se
ergueu. — Talvez se você me tratasse como seu marido em
vez de pária, ela entendesse a mensagem.

— Eu não trato você dessa maneira. — Eu fiz uma


careta. — Eu tenho sido uma boa esposa para você. Em um
ponto, não recuarei – sua recuperação é minha prioridade.
Não vou permitir que você arrisque sua saúde por Max, ou
então você pode transar. — A sugestão de um sorriso em seu
rosto só me estimulou. — Se isso me faz a vilã enquanto
Tasha trata você como um super-herói, tudo bem. Mas quero
você vivo e forte.

Ele passou uma mão pelo queixo, seus olhos, de


maneira irritante, fixos em mim. — Transar? — Ele riu. —
Você não precisa sentar no meu pau para me fazer sentir
desejado por aqui. Tudo o que peço é que você esteja na
minha mesa de jantar e na minha cama.

Inspirei pelo nariz. Não era minha intenção desprezá-lo,


apenas para tornar as coisas menos difíceis. De qualquer
forma, o calor de seu olhar poderia conjurar todas as
promessas que ele fez nas últimas semanas – para apagar
Diego. Para me mostrar o que era ter minha virgindade
tirada. Para me destruir. — Eu não. Não confio em mim para
dormir ao seu lado.

Ele passou a ponta da língua sobre a fileira inferior de


dentes e depois molhou o lábio inferior. Brilhava na luz
quente do lustre, cheio, sexy e tentador. — E porque não?

Isso foi além do sexo, mas eu também não havia lhe


dado muito em termos emocionais. Ambos os tópicos foram
assustadores. Suspirei. — Quando você me ligou do evento
político, eu estava prestes a pedir para você voltar para casa,
— eu disse. — Eu estava preocupada.
— Eu sei, — ele disse. — Se você tivesse perguntado, eu
teria vindo correndo. Eu estou aqui agora.

— Mas ela também está. Eu não teria sido tão ousada


por telefone se soubesse que você estava com uma mulher
com quem você tem intimidade. Então me responda: você
dormiu com ela naquela noite ou em algum momento do
nosso casamento?

— Você está com ciúmes. — Ele não se incomodou em


esconder o sorriso. — Meu Deus, é ainda mais espetacular
testemunhar do que eu jamais poderia ter esperado.

Ele estava gostando demais disso. Com um suspiro,


comecei a me levantar do meu lugar.

— Tasha é uma velha amiga que conheci no início da


segunda parte da minha vida – depois que deixei Costa, —
disse ele. — Ela vem de uma família muito poderosa, Rusa-
Méxicana.

— Eu também tenho velhos amigos, — eu disse,


sentando-me novamente. — Se essa é sua desculpa para
brincar, eu deveria receber o mesmo.

Ele riu. — Qualquer homem que tenta com você não


pode valorizar muito a própria cabeça.

Quando ele se levantou, eu olhei para ele. — Isso


significa que posso decapitar Natasha?

Ele congelou quando um canto da boca se contorceu. —


Durante o nosso curto casamento, você me acusou de dormir
com Sandra, Jaz e agora Tasha. Enquanto eu me sento aqui
celibatário e desesperado por me libertar – e não, não o tipo
de libertação que você já me deu. — Movi-me contra o
encosto da minha cadeira quando ele se adiantou até seus
pés encontrarem as pernas da minha cadeira. — Embora, eu
sonhe com o momento em que você engolirá meu pau
novamente.

Minhas bochechas ardiam. Bem, Cristiano certamente


estava de volta ao seu antigo eu. A imagem vulgar, mas
quente, que ele pintou me fez contorcer – e me lembrou o que
ele havia me dito sobre Tasha antes de tudo isso. — Ela fez
isso por você também.

— Mas não como você. Ninguém nunca fará isso por


mim como você. Eu não quero que meu pau seja sugado ou
manuseado ou qualquer coisa do tipo. — Ele arrastou minha
cadeira, comigo nela, e ficou em cima de mim. — Eu quero.
Foder. Minha esposa.

Eu estava finalmente pronta para isso. Ele não estava,


mas pelo olhar em seus olhos, eu não tinha certeza se
poderia falhar com ele por mais tempo. Se ele estivesse
disposto a se submeter a uma cirurgia para me receber, ele o
faria. Eu já tinha provado o poder de desvendá-lo antes, e era
tão doce agora. Ele só me queria. A qualquer custo.

— Mas... não posso, — disse Cristiano finalmente. —


Não como eu planejo. Não sei que tipo de sexo a Dra. Sosa
tem, mas ela provavelmente nunca me liberaria se tivesse
alguma ideia do que tenho reservado para você.
Oh Deus. Eu não sabia o que sentir – alívio?
Desapontamento? Eu o queria. Ter todo ele, sem reservas ou
ferimentos para desacelerá-lo, me assustou. Mas não haveria
outro jeito com ele.

Agarrando a borda, ele sentou-se na mesa. — Você quer


saber sobre as mulheres da minha vida? Vou lhe dizer, e
depois vamos deixar essa besteira sobre se eu manteria uma
amante quando tiver a perfeição na ponta dos dedos.
Entendido?

Mordi o interior da minha bochecha. Cristiano era um


deus, e ele me chamou de perfeição? Ele declarou sua
lealdade a mim quando eu lutei com unhas e dentes até
recentemente? Eu concordei mais por curiosidade do que
qualquer coisa. — Entendido.

— Jaz estava meio morta quando a encontramos. Tem


sido um caminho longo e árduo para reabilitá-la. Ainda vai
demorar um pouco até que ela deixe um homem tocá-la, e eu
sou uma das únicas pessoas no mundo em que ela confia.
Eduardo e Alejo também. Então, não, ela não é, e nunca foi,
uma amante. — Ele tamborilou com os dedos ao longo da
borda de madeira da mesa. — Ela pode ser mal-humorada,
mas quando se trata de aprender um combate técnico mais
corpo a corpo, ainda existem muitos gatilhos. Sandra, por
outro lado, aceitou muito bem. Ela quer revidar.

Eu enrolei minhas mãos no meu colo. Eu não deveria


ter trazido Jaz e Sandra para isso, mas, aparentemente, algo
sobre Cristiano com outra mulher mudou a química do meu
cérebro – e isso aconteceu mesmo no começo do nosso
casamento. — Desculpe, — eu disse.

— Sandra – eu já te disse que a tia dela a vendeu para a


prostituição – ela não dorme bem, então algumas noites,
ficamos acordados até tarde planejando como ela atacará
aqueles que a compraram anos atrás. Ela espera derrubar
todos eles por conta própria – e depois sua própria família
pela maneira como a traiu. — Ele inclinou a cabeça. — Foi
por isso que você a encontrou no meu escritório tão tarde em
La Madrina. Estávamos quebrando seus pontos fortes e
fracos na luta mais cedo naquela noite.

Tive o desejo irritante de me desculpar novamente. Foi


uma sensação estranha para mim, acreditar em cada palavra
que Cristiano disse. Mas instintivamente, eu sabia – ele não
mentiria sobre isso. O assunto era muito cru e a evidência de
seus esforços para ajudar estava ao meu redor.

Ele apenas demonstrou tanta honestidade inegável com


seu beijo e seu toque, quando cada um de nós foi privado de
qualquer coisa, exceto desejos primordiais. Eu nunca duvidei
de nossa química, mas tive sua palavra. Eu não sabia.

— Nada disso muda o fato de você ter tido intimidade


com Tasha, e agora ela está sob esse teto. — Eu nunca me
dignaria a dizer a Cristiano como viver antes, e mesmo agora,
eu vacilei. Era o meu lugar, mas levaria tempo para crescer
para esse papel. Tempo e prática. — Eu não me importo se
ela salvou sua vida, — eu disse. — É desrespeitoso ela ficar.
Seus olhos percorreram meu rosto. — Eu disse a ela que
nosso casamento era simplesmente um acordo entre duas
famílias pelas mesmas razões que disse ao senador Sanchez
que você é uma criança mimada que não se compara ao tipo
de mulher que eu posso ter.

Meu rosto aqueceu. — Então por que você não pegou


uma delas?

— Você sabe porquê. Porque eu queria você. — O


zumbido que veio em meus ouvidos nunca desapareceu. Com
as juntas de Cristiano embranquecendo contra a mesa e as
pálpebras abaixando, eu tive que evitar arquear em direção a
ele. — Porque mesmo que se casar com Natasha tivesse sido
uma mudança melhor nos negócios, — continuou ele, —
nunca me passou pela cabeça me casar com alguém até que
Diego a jogou aos meus pés. Eu sabia que você era a isca e
mordi o anzol de qualquer maneira.

Cristiano – viciado. Eu tinha feito algo que nenhuma


outra mulher no mundo tinha sido capaz de fazer e tinha
certeza de que muitas tentaram. — Por que eu? — Eu
sussurrei.

Ele abriu o botão da gola com uma mão. — Ninguém


mais foi capaz de me dar o que eu quero.

— Mais poder? — Meus olhos caíram para o pulso na


base de seu pescoço, as veias correndo ao longo das costas de
sua mão muscular. — Não, — eu disse, respondendo à minha
própria pergunta. — Não é isso que você está procurando.
Não faltam famílias poderosas com filhas elegíveis por aqui.

— Você não é uma criança mimada. Também não fiz


nosso acordo apenas por razões comerciais. Eu disse essas
coisas e mantenho você em pé de igualdade em público, para
sua proteção, Natalia.

Ele deslizou um pé para frente. Sua proximidade e


proteção me fizeram querer estar mais perto dele. Movi minha
sandália para roçar a borda interna de seu sapato. Com um
punho no colo, ele passou a sola no meu tornozelo. Eu não
pude evitar meu arrepio. Como um toque tão leve na minha
perna poderia provocar uma emoção dentro do meu peito?

— Eu não tenho muitos apegos. — Seu tom permaneceu


firme, mas suavizou nas bordas. — Meu cartel é um deles,
mas meu pessoal pode cuidar de si. Como você fez quando foi
forçada. É por isso que exagerei nas medidas de segurança.
Quando alguém suspeita das minhas fraquezas, tenta
explorá-las.

Eu não tinha esquecido as palavras de Jaz para mim –


que Cristiano me amava, mesmo que ele não soubesse. Ele
me amava? E ele sabia disso agora? Ele recebeu ordens para
cuidar da minha família e de mim no passado - talvez tudo
isso fosse porque ele nunca parou. — Eu sou uma de suas
fraquezas.

— Diego sabia disso antes de mim.


Meu coração pulou dolorosamente. Diego tinha me
usado, isso não era novidade. Mas Cristiano poderia
facilmente fazer o mesmo. Eu estava aqui por causa de
acordos que eles fizeram nas minhas costas – como eu
poderia confiar em Cristiano depois de tudo o que ele fez,
depois de anos odiando-o? Mas o maior problema era como
eu podia confiar em mim mesma. Eu toquei meu pescoço. —
A última coisa que quero é me importar com alguém de novo
– e fazer com que ele me traia.

— Então me ouça. — Ele se inclinou para frente. — Eu


tenho tentado lhe dizer isso há um tempo. Você é mais que
uma conquista para mim. Mais do que uma troca de poder.
Você é a filha de Bianca e Costa. — Agarrando os braços da
minha cadeira, ele a arrastou para frente até que nossos
rostos estivessem a centímetros de distância. — Você é a
garota que fui contratado para proteger e teria se não tivesse
sido enquadrado pelo assassinato de Bianca e forçado a fugir.
Você é minha esposa. — A respiração dele provocou meus
lábios, e eu resisti de fechar a curta distância entre nossas
bocas. — E se me ver no meu leito de morte não foi motivo
suficiente para convencê-la disso, terei que ser criativo.

Eu não precisava de mais convencimento. Mas suas


declarações e determinação eram boas demais para me
entregar. Eu encontrei os olhos dele. — Criativo como?

Ele passou as costas dos nós dos dedos ao longo do


comprimento da minha garganta. Com esse único toque,
minha boca ficou seca, mas fiquei muito molhada em outro
lugar – o ponto sensível que Cristiano ficou cada vez mais
impaciente para reivindicar.

— Acredito que lhe devo uma dívida, senhora de La Rosa


– e você está prestes a cobrar. — Ele pegou meu queixo em
um toque gentil que contradiz a dureza em seu olhar. — Você
jurou estar na minha mesa de jantar todas as noites. —
Levantando-se a toda a sua altura intimidante, ele olhou para
mim. — Agora eu quero você sobre ela.
8

Natalia

Era hora de cobrar uma dívida que Cristiano me devia.

Palavras que eu nunca esperava pensar... e


especialmente não neste contexto.

O jantar terminou antes de começar, e Cristiano ficou


em cima de mim, parecendo mais faminto a cada segundo. —
Eu preciso repetir? — Ele perguntou. — Eu disse, sente-se
em cima da mesa para que eu possa fazer da sua boceta
minha próxima refeição.

Borboletas explodiram no meu estômago. Eu mal


consegui conter meu suspiro com sua vulgaridade, mas eu
não conseguia controlar o jorro de calor entre minhas pernas.
— Mas suas feridas...

— Minha boca ainda funciona.

Eu levantei da minha cadeira. — A médica disse...

— Seu marido está com fome. — Com uma articulação


debaixo do meu queixo, ele levantou meu rosto. — Esperei
tempo suficiente para saber o seu sabor, e você esperou
pacientemente que eu pagasse a minha dívida. Você não
precisa me dizer que quer, apenas se não quiser. — Ele se
afastou e acenou com a cabeça para a mesa comprida e
robusta que acomodava pelo menos vinte pessoas. — Você
pode até que meu rosto esteja entre suas pernas para
contestar.

Desejo enrolado em mim. Ao mesmo tempo, mantê-lo à


distância teria sido o movimento certo, mas a melhor parte de
resistir a ele até agora foi ceder. — Não posso contestar uma
vez que você começou?

— Você pode, — ele me pegou pela cintura e me jogou


sobre a mesa, — mas você não vai.

— Talvez eu deva tomar banho primeiro.

— Vou te levar de qualquer jeito, inclusive suja.


Especialmente suja.

O que? Minha boca se abriu. — Isso não incomoda você?

Ele pegou meu tornozelo para desatar as tiras das


minhas sandálias de couro. — Não, — disse ele, removendo
cada sapato. — Outra hora, eu compensarei limpando você
com sabão de hortelã-pimenta. Apenas respirar em sua
vagina fará com que ela grite.

— Cristiano!

— Não finja que você está escandalizada. — Ele deslizou


minha bunda para a borda da mesa. — Agora, coloque os pés
para cima e fique nua para mim.
Eu olhei para ele por um momento. Eu não estava
fingindo. Eu realmente nunca tinha estado na presença de
alguém como ele. O máximo que Diego já exigiu de mim foi
um beijo. E o que eu tinha pensado naquela época? Que
Diego e eu libertaríamos nossa paixão quando chegasse a
hora?

Não foi assim que funcionou. O calor estava ardendo


entre Cristiano e eu desde o início, e cada vez que nos
batíamos como pederneiras, chegávamos perigosamente perto
de atear fogo em tudo ao nosso redor.

Deitei-me e levantei os calcanhares na mesa. Como se


ele não tivesse acabado de remover carinhosamente meus
sapatos, ele rasgou um buraco na virilha das minhas
leggings.

— O que...

— Eu vou comprar novas para você. — Ele manteve os


olhos no meu rosto enquanto deslizava um dedo sob o tecido
da minha calcinha, sua articulação roçando em mim.
Arrepios explodiram sobre a minha pele. Ele bateu a ponta no
meu clitóris, e eu ofeguei com a picada. — Isso é por discutir,
— disse ele, — mas não se preocupe, estou prestes a
melhorar.

Mordi meu lábio inferior, sem me preocupar em


esconder minha excitação. — E se alguém ver?

— Eles não vão, eu prometo a você. — Ele puxou uma


cadeira como se estivesse sentado para uma refeição, então
abriu minhas pernas e empurrou o rosto entre elas. Com a
calcinha entre os dentes, ele deixou que ela se encaixasse
contra mim novamente.

— Por mais que eu goste de fazer você se contorcer, —


disse ele, pegando uma faca de bife, — a roupa de baixo tem
que desaparecer.

Inspirei profundamente. — O que você está fazendo?

Com a ponta serrilhada, ele cortou a tira fina de tecido.


— Desembrulhando sua buceta doce como prometi, para que
eu possa lamber e chupar até encontrar o que quero – seu
doce núcleo.

Seus olhos negros penetraram nos meus, me chamando


para o lado escuro. Esta foi à submissão que ele prometeu
que eu apreciaria, se eu apenas ouvisse meu corpo e cedesse.
O calor se infiltrou em mim, me puxando para baixo.

Cristiano ficou sério. — Eu entendo porque sua guarda


ainda está alta, mas a partir de agora, ela abaixará. Quero
que você pense muito sobre as últimas semanas, Natalia.
Acordar ao meu lado e saber sem dúvida que falo sério
quando digo que quero você e somente você aqui como minha
esposa. Que prometi cuidar de você. Que estou tentando
proteger você e outras pessoas de coisas que ninguém jamais
deveria testemunhar e muito menos experimentar. E caso
nada disso seja uma razão suficientemente boa para você me
aceitar de uma vez por todas como seu marido, amanhã de
manhã você se lembrará de como eu comi sua boceta tão
bem, você não pode imaginar um futuro sem se sentar na
minha frente sempre que lhe apetecer.

Ele afundou a boca em mim como se eu fosse um bife


suculento, eliminando qualquer choque que eu pudesse ter
sentido por suas declarações. Tendo experimentado apenas a
língua suave de Diego, eu não estava pronta para o ataque de
Cristiano, a maneira como ele agarrou meus quadris e me
puxou para seu rosto com tanta força que me perguntei como
ele poderia respirar.

Nada poderia me preparar para o seu rosnado animal


vibrando através de mim.

Ou como ele enfiou a língua dentro de mim e destruiu a


última da minha força de vontade para resistir a ele.

Meus pés saltaram para seus ombros. Ele chupou meu


clitóris. Um gemido escapou da minha boca aberta. Prazer
tão severo que parecia doloroso, rasgou através de mim, mas
foi devido a mais do que uma combinação hábil de língua e
dentes. Foi à voracidade dele me devorar que fez minha
coluna arquear a ponto de estalar e meus gemidos ecoarem
pelo corredor.

Consumida, fechei minhas coxas em torno de suas


orelhas, mas ele as separou, mantendo-as abertas. — Não
feche as pernas novamente, — disse ele, lambendo os lábios.
— Eu preciso das minhas mãos.

Ele me espalhou mais. Com o inesperado dedo longo


dentro de mim, respirei fundo. Ele acrescentou outro,
facilitando tanto como se estivesse me testando. Ele os
retirou, enfiou-os na boca e deu sorriso voraz. — Quer
provar?

— Não, — eu quase engasguei horrorizada com a


sugestão.

— Mais pra mim.

Quanto mais rápido seus dedos entravam e saíam, mais


molhada eu ficava. Eu não sabia que poderia pingar dessa
maneira. Sua língua chupou e explorou meu clitóris como se
fosse seu novo brinquedo favorito, prestando atenção nele até
que meu interior se agitou e se contraiu em torno de seus
dedos.

— Eu entendo por que sua guarda ainda está alta, mas a


partir de agora, ela abaixará.

Com minha rendição, a felicidade irradiou do meu


núcleo para as pontas dos dedos das mãos e dos pés,
queimando qualquer coisa em seu caminho.

Ele removeu os dedos, segurou com força os meus


quadris e escondeu o rosto entre as minhas pernas. Sua
língua invadiu como se estivesse minerando ouro. Sua
voracidade trouxe meu clímax, estimulando-o
simultaneamente e aliviando o prazer cru e agonizante com
gemidos que vibravam ao longo das ondas do meu orgasmo.

No final, eu estava puxando seus cabelos enquanto


minhas coxas tremiam. Ele me beijou gentilmente, sua língua
macia na minha boceta trêmula enquanto ele me ajudava a
voltar para a Terra.

Ele desenrolou minhas mãos de seus cabelos e se


afastou, me levando. Um estrondo satisfeito em seu peito me
fez sentir como se eu o tivesse agradado.

Mesmo na minha névoa, eu me perguntava como ele


parecia tão contente quanto eu.

Eu estava quase com vergonha de olhá-lo nos olhos. Ele


se transformou de homem em animal, e eu?

Eu amei tanto, que gozei o mais humanamente possível.

Com uma boca como a dele, eu seria uma tola por não
me prender a ele.

Se havia alguma dúvida sobre se eu poderia aprender a


seguir o diabo.

Eu tive minha resposta.

No nosso quarto, desabotoei a camisa de Cristiano do


seu corpo enquanto ele observava da cama, nu da cintura
para cima. Ele enfiou o braço atrás da cabeça. — Se você der
um único passo em direção ao sofá, eu a trarei de volta para
esta cama – e você não gostaria de arriscar abrir minhas
feridas, não é?

Eu sorri. De repente, sua condição era uma


preocupação dele?

Mas a verdade era que eu não queria dormir separada -


já fazia um tempo. Eu escolhi o sofá na última semana e meia
para dar espaço a ele. Deixar seu corpo curar. Remover a
tentação.

E, se eu fosse honesta, essa parte ainda era nova para


mim de muitas maneiras – não apenas porque eu tive apenas
um amante, uma vez. Cristiano tinha razão em dizer que eu
estava de guarda, mas era mais uma questão de entrar em
território desconhecido do que resistência. Sobre passar a
vergonha de ter lutado tanto contra ele, para ceder
praticamente da noite para o dia.

— Eu não vi você tomar seus antibióticos, — eu disse,


segurando a camisa fechada sobre meu corpo nu.

Nós já tínhamos despido suas feridas e agora elas


respiravam. Eu me acostumei com a visão delas, mas minha
raiva ainda fervia sobre o que elas representavam. — Então,
dê para mim, enfermeira Natalia, — disse ele.

Fui ao armário trocar de camisola, descartando sua


camisa e minhas calças destruídas em uma pilha. No
banheiro, lavei minhas mãos por trinta segundos, como a
médica havia dito, molhei uma gaze e carreguei suas pílulas,
curativos frescos e pomada antibiótica de volta para a cama.
— Na primeira noite em que te trouxe aqui, — ele disse
enquanto eu subia na cama ao lado dele, — eu pensei que
você veria instantaneamente o quão bem nós nos encaixamos
uma vez que eu tivesse você em meus braços. Eu já sabia
desde o momento em que te vi na festa de fantasia que havia
uma atração entre nós. Eu assumi que você lutaria, resistiria,
mas que, uma vez que estivéssemos sozinhos, você não
precisaria mais temê-lo. Como minha esposa, você teria a
liberdade de ceder.

— Você não me conhecia tão bem quando me


reivindicou.

Ele balançou sua cabeça. — Eu não me considero um


homem ingênuo, mas quando se tratava de você, acho que
era.

Ele nunca pretendeu me forçar. Seu único erro foi


superestimar sua capacidade masculina e subestimar minha
vontade de odiá-lo. Fazia mais sentido que ele saísse da casa
de meu pai depois de curar minhas feridas do incêndio no
armazém. Eu deixei claro naquela manhã que acreditava que
ele ia me estuprar. Ou como ele me questionou sobre se
Diego tinha sido agressivo comigo junto à fonte na noite da
festa à fantasia.

Recostei-me nos calcanhares. Enfiando as pontas dos


dedos em torno de uma ferida, perguntei: — Dói?

— Muito menos do que há um momento atrás.


— Como foi? — Eu perguntei enquanto tocava
delicadamente a gaze molhada em seu torso. — Você estava
com medo?

Ele me observou. — Aterrorizado.

Meus olhos saltaram para os dele, surpresos com sua


admissão.

— Não por mim, — acrescentou. — Por você.

— Você se arrepende disso?

Ele fez uma pausa, digerindo a pergunta. — Não posso


Natalia. Eu nunca quero colocar você em perigo, mas muitas
vidas foram melhoradas por causa de tudo que antecedeu os
ataques.

Fiquei feliz em saber que ele faria tudo de novo. Se eu


não tivesse sobrevivido, pelo menos minha morte teria sido
em nome de algo bom. — Por quê? — Perguntei. — Por que
ajudar essas mulheres é tão importante para você?

— Eu preciso de um motivo?

Eu sorri tristemente enquanto afagava sua pele. —


Neste mundo, sim. Nada é gratuito. Ninguém age com boas
intenções.

Depois de alguns segundos silenciosos, ele estendeu a


mão e segurou minha bochecha em sua mão grande e
quente. — Você age, não é? — Seu polegar tocou o canto da
minha boca. — O que você acha que Bianca iria querer para
você?

Quantas vezes alguém trouxe minha mãe para mim?


Raramente, se é que alguma vez – como se o assunto de sua
morte estivesse fora dos limites, quando na verdade eu
gostava da chance de falar sobre ela. — Não sei o que ela
queria para mim, — falei, — mas não seria permanecer em
uma vida tão perigosa.

— Ela estava criando uma mulher forte que não


permitiria que o medo ou a vergonha a dominassem. Bianca
teria aprovado desde que você fosse honesta e inabalável em
suas escolhas. — Ele soltou a mão na minha coxa e apertou
gentilmente – não de brincadeira desta vez, nem mesmo
sexualmente. Apenas reconfortante. — Se você realmente
quer sair desta vida, vá, Natalia. Mas você estaria fugindo
porque querer isso assusta você, e acho que sua mãe teria
feito você questionar isso. Enfrente isso. Se você quer um
lugar ao meu lado, do jeito que ela estava ao lado de seu pai,
aceite-o. Possua-o. Não tenha vergonha do cartel correr em
seu sangue.

A vida no cartel era mutilação e assassinato e fornecia


ao mal os meios para tentar o bem. — É uma vergonha, — eu
disse desparafusando à tampa do frasco de comprimidos para
agitar seus antibióticos na palma da minha mão. — Pessoas
inocentes pagam o preço pelo que fazemos.

— Sua mãe era inocente? — Ele perguntou. — A minha


era? Não. Mas eles não pediram desculpas por isso.
Eu gostaria de poder acreditar na inocência de minha
mãe do jeito que eu era quando criança, mas não havia
espectador nesse negócio. Mas se minha mãe ajudou Papá a
tomar decisões, ou mesmo ficou sem protestar – isso a tornou
tão cruel quanto ele? Meu pai havia matado, e ela também.
Inclinei-me para trocar o frasco de comprimidos por um copo
de água em sua mesa de cabeceira. — As mulheres deste
mundo não devem ser subestimadas, — eu disse,
entregando-lhe seus remédios.

— Elas também são boas cuidadoras. — Ele jogou os


antibióticos para trás com um gole rápido e pousou o copo. —
Estou ansioso pelo dia em que você finalmente perceber
quem é Diego, e rezo para que toda a sua misericórdia tenha
sido esgotada até então.

— Eu já sei, Cristiano. Ele é um covarde e um


manipulador. — Algo que lembrava dor passou pelo rosto de
Cristiano, mas eu não o machuquei. Era alívio. Talvez porque
ele queria tanto confiar que eu finalmente cheguei a essa
conclusão depois de todos os seus esforços para me levar até
lá.

Desde o retorno de Cristiano, ele nunca vacilou em seu


ódio por seu irmão. — Diego me disse uma vez que vocês
nunca mais poderiam confiar um no outro, — eu disse. — E
ele estava certo.

— Ele culpa Costa e eu pela morte de nossa família. E


se Diego não consegue entender porque nosso pai teve que
morrer, então eu me preocupo com o que mais ele pode
justificar.

— Ele deve ter ajudado nos ataques de Belmonte-Ruiz,


— eu disse. Até muito recentemente, eu não pensava que
Diego fosse capaz de me colocar em perigo, mas não tinha
ideia do que estava lidando. Ele já havia admitido seu
envolvimento com Belmonte-Ruiz, mas se ele lhes fornecesse
informações, saberia que eu era um alvo, assim como
Cristiano.

— É... é minha culpa, — falei. — Eu trouxe o telefone


para dentro de casa.

— Verdade. — Cristiano esfregou a mandíbula. — Mas


se isso não tivesse funcionado, eles teriam encontrado outra
maneira. Confie em mim.

— Então também sou culpada pelo fato de que a


verdade sobre o seu negócio está vazando.

— Não, mi amor. Era apenas uma questão de tempo, —


ele disse calmamente. — É por isso que formei muitas
parcerias poderosas ao longo dos anos, acumulei o máximo
de dinheiro possível e isolei meu pessoal. E se eu tivesse
realmente preocupado, encerraria minha operação.

— Você não vai? — Tirei a tampa da pomada e passei


um pouco em cada uma de suas feridas. — Onde estão as
meninas que você resgatou na noite em que estive com você?
— Em um esconderijo a alguns quarteirões daqui. A
equipe treinada as ajuda a trabalhar nas etapas de
recuperação. Depois, as estabelecemos aqui ou em outro
lugar, se assim o desejarem.

Ele tinha uma resposta para tudo. — Então, o que


acontece agora, Cristiano?

— Eu não sei, mas não vamos parar. Isso te assusta?

Mordi meu lábio inferior. Diego e meu pai disseram em


momentos diferentes que eu estaria mais segura com
Cristiano. Até a Califórnia me deixaria exposta se alguém
realmente quisesse chegar até mim. Cristiano não estava
tentando esconder que eu estava em perigo, e eu gostei disso.
Além disso, não precisava me perguntar se arriscaria minha
segurança para que Cristiano pudesse ajudar mais mulheres,
homens e crianças. — Não, — eu disse. — Eu não estou
assustada.

— Eu pensei que apresentando o nosso casamento como


não mais do que um contrato, as pessoas seriam suscetíveis
de deixá-la em paz. Eles não fizeram.

— Talvez você deva tentar a abordagem oposta, — eu


disse.

Um canto da boca dele se levantou. — Não é uma má


ideia. Eu disse que a Terra dos Condenados também era
traiçoeira, e mesmo assim eles vieram nos buscar. Então
talvez agora eu deixe claro que você me pertence em todos os
sentidos da palavra. E não há dúvida de que os rumores
sobre o que eu faço com quem brinca com minhas coisas são
verdadeiros.

A maneira assustadora como sua voz caiu enviou um


raio de emoção através de mim. Cristiano havia me avisado
muitas vezes que ele era muito protetor, mas nunca o senti
mais verdadeiro do que naquele momento.

Abri um curativo novo e coloquei as mãos no meu colo,


estudando-o. — Você vai me dizer por que?

Ele não pediu esclarecimentos. Ele sabia o que eu quis


dizer. Ele escapou da pergunta uma vez hoje à noite, mas eu
não ia ficar quieta como quando cheguei. Sua hesitação
significava que havia razões porque ele fez o que fez, e eu a
queria saber. Eu queria saber mais. Conhecê-lo.

Ele coçou o nariz. — Eu sempre tive uma vantagem


física sobre a maioria dos outros, — disse ele. — Eu usei isso.
E espero que alguém que eu matei tenha merecido.

— Mas... — Eu brinquei com o canto do pacote de papel.


— Você lida com armas, Cristiano. Você arma os bandidos e
lhes dá uma vantagem sobre todos.

— Nunca serei o mocinho. Eu sou sensato. Nosso país,


nosso povo, confia na produção e no movimento do
contrabando. Leve isso embora, e nós cairemos. É assim que
as coisas são.

— Nesse caso, sexo é contrabando.


— Se cairmos porque eu perturbo o comércio sexual,
merecemos.

Fiquei igualmente aquecida e horrorizada pelo orgulho


que se espalhou por mim. Sua convicção me comoveu, pois
eu cuidava da evidência física do que resultou dele
advogando pelo bem. Igualmente assustador foi o quão
errada eu estive sobre ele.

— Mas se isso lhe der algum conforto, — ele disse, —


nunca armei Belmonte-Ruiz. E parei de vender para quem faz
negócios com eles.

— Tasha e Alejandro me disseram. Essa é outra razão


pela qual eles estão vindo atrás de você?

— Sí. — Ele estendeu a mão para o último curativo. — A


ver. Me dê isso.

— Eu ainda preciso envolver seu peito.

Ele gesticulou para eu entregar o pacote. Quando o fiz,


ele colocou de lado e pegou meu antebraço, me puxando para
a cama. Eu o deixei me guiar até a dobra do pescoço dele. —
Quando entramos na Terra dos Condenados pela primeira
vez, — disse ele, — o que você achou que veria?

Fechei os olhos como fiz naquele dia, me transportando


de volta para aquele momento. — O pior, — eu admiti. —
Prédios degradados, mendigos, prisioneiros, prostitutas. Eu
acho que meio que esperava uma guilhotina. Eu poderia jurar
que vi pessoas amontoadas no espaço de carga de uma
caminhão.

— Aqueles que escolheram deixar a Terra dos


Condenados e morar em outro lugar. — Ele passou a mão no
meu braço. — Eu não vou perguntar o que você achou de
mim.

— Eu pensei que você era um monstro.

Com uma respiração profunda, ele mudou debaixo de


mim. Seja por dor física ou qualquer outra coisa, eu não
tinha certeza. — Eu sou, Natalia. Não há dúvida.

Inclinei minha cabeça para ver o rosto dele melhor


quando sussurrei: — Você é mais assustador do que
qualquer monstro.

— Você lembra.

— Você me disse isso uma noite depois de um pesadelo,


quando minha mãe ainda estava viva. Você prometeu que
manteria os monstros afastados. Mas se você é o bom rapaz,
o que isso faz de todo mundo?

— Não são invenções da nossa imaginação, infelizmente.


Eles são ruins. Então eu tenho que ser pior. Fiz as pazes com
isso, mas isso não significa que também não suporto alguma
coisa.

Eu corri na cama, ficando ainda mais perto dele. Ele


falou de possuir meus desejos e necessidades. Eu queria
conhecê-lo melhor. Eu precisava saber porque – porque me
sentei ao lado dele agora, porquê ele se sentia obrigado a
ajudar, como chegou a esse lugar.

— Não há realmente nenhuma razão para você fazer


tudo isso? — Perguntei.

— Ninguém precisa de um motivo para ajudar essas


pessoas, — disse ele e fez uma pausa.

— Mas você tem um, — eu imaginei. Coloquei minha


mão na dele. Ele ficou tenso comigo, mas depois relaxou.
Oferecer-lhe conforto era novo para nós.

Ou talvez fosse eu quem precisasse.

Conhecer o funcionamento interno da mente, coração e


alma de Cristiano não era uma tarefa para os fracos de
coração. Imaginando o que eu acharia me assustou – mas
não o suficiente para recuar. Não fisicamente, e não em
qualquer novo território emocional em que estávamos
entrando.

— Diga-me o que aconteceu, — eu disse.


9

Natalia

Com cada inspiração, o enorme peito de Cristiano se


expandia sob minha bochecha, mas seu braço permaneceu
firme ao meu redor. O silêncio permeou em nosso quarto.
Presa na dobra do braço teria sido fácil mudar de assunto
para algo mais seguro. Por que agitar o barco com perguntas
sobre seu passado, agora que estamos em águas mais
suaves?

Mas ele sempre me incentivou a fazer perguntas, a olhar


mais de perto, a viver essa vida com os olhos bem abertos – e
ele não tinha me protegido dos lados feios dela. Então,
quanto mais ele ficava quieto, mais ansiosa eu ficava. Se
Cristiano lutou para se abrir sobre seu passado, eu suspeitei
que isso significasse que era profundamente doloroso para
ele. Eu poderia ser o conforto que ele precisava? Eu o fiz
sentir seguro?

Isso era possível quando eu apenas comecei a me


preocupar com sua segurança e conforto?

Talvez tenha sido sua hesitação. Para se abrir sobre o


que o assombrava, ele teria que dar um salto de fé.
Depois de um tempo, ele mudou. Coloquei minha mão
em seu peito e levantei meus olhos para ele. Ele acenou com
a cabeça em direção à porta do quarto. — Quando crescemos,
nossa casa tinha funcionários, como a sua. Como a minha
agora.

— Não é incomum.

— Meu pai me preparou a vida inteira para ajudar e,


eventualmente, assumir o controle de seus negócios. Diego
também, mas ele era muito mais jovem. Eu estava
significativamente mais envolvido. Meu pai tinha um
armazém perto da fronteira de Juárez e El Paso. Ele teve que
esconder isso do seu pai e das outras famílias por aqui. Lá,
meus pais treinaram e abrigaram mulas, prostitutas e
escravos. Eu visitei várias vezes antes da morte deles e vi o
funcionamento interno do comércio sexual.

— Quantos anos você tinha?

— Treze quando começou. — Ele fechou os dedos em


volta da minha mão em seu peito, veias saindo de seu
antebraço. — Eu o assisti silenciosamente construir esse
negócio. Sempre que eu tentava falar, ele me batia. Após um
surto de crescimento, tentei interferir fisicamente em um
acordo. No dia seguinte, foi a primeira vez que ele levou Diego
ao armazém. Ele tinha apenas oito anos.

A punição de Cristiano havia sido a introdução de Diego


ao lado mais sombrio daquela vida. O pai dele sabia como
isso afetaria Cristiano. Virei minha palma para apertar sua
mão. — Eu sinto muito.

Seus olhos escuros flutuaram até o teto. — Ele tentou


me fazer ver as pessoas como mercadorias. Não é diferente de
armas ou drogas a serem movidas através das fronteiras para
obter lucro. O mesmo com a minha mãe. Eles não viram
rostos, apenas cifrões. E controle. Talvez eu também teria se
não fosse... por Angelina.

Só de ouvir o nome de uma mulher, principalmente


porque Cristiano lutava para falar, me deixou nervosa. Ela
tinha que ser a razão. — Quem é Angelina?

Ele deslizou a mão pelas minhas costas, me puxando


para mais perto pelos meus ombros. — É estranho dizer o
nome dela em voz alta depois de tanto tempo. Ela era filha do
chefe da equipe da nossa casa. Eu não tinha tempo para
garotas, mas ela trabalhava muito em casa e era o tipo de
pessoa bonita que todos notavam. Eu tive uma queda
inofensiva - pelo menos foi inofensiva até meu pai perceber.

Sua mão ficou pegajosa na minha – ou talvez eu fosse a


única a suar. Não queria perguntar, com medo de já saber a
resposta, mas precisava. — O que aconteceu com ela?

— A última vez que lutei com meu pai, ele não me


derrotou e não envolveu Diego.

— Ele bateu nela? — Eu imaginei.


— Eu gostaria que ele tivesse. — O olhar assombrado
em seus olhos transformou o buraco no meu estômago em
uma rocha afundando de puro medo. — Quem dera ele
tivesse matado, porra.

A parte de trás do meu pescoço se arrepiou. Para ouvir


Cristiano, campeão de mulheres inocentes, admitir isso de
todas as coisas... dizia tudo. — Por que?

— Ele a vendeu a um ucraniano por algumas centenas


de dólares. Eu estava na sala. Meu pai me prendeu quando o
homem batia nela, a estuprava e depois a levou. E então meu
pai me deu o dinheiro.

Eu cobri minha boca com as duas mãos quando a bile


subiu na minha garganta. Ouvi dizer que seus pais tinham
ciúmes de meu pai, Diego, Cristiano e outros – era de
conhecimento comum, na verdade. Mas tinha sido
principalmente no contexto de seus negócios e planos para
derrubar minha família.

Isso, porém?

Era um nível totalmente novo de maldade. Apenas ouvir


as palavras horríveis trouxe lágrimas aos meus olhos. — Eu
não fazia ideia. Eu... — Meu queixo tremia. — Sinto muito,
Cristiano. Diego nunca disse nada.

— Ele era jovem. Eu costumava conversar sobre isso


com ele, então ele sabe, mas ele só testemunhou a ponta do
iceberg pessoalmente.
Cristiano beliscou os cantos internos dos olhos e
respirou através do que quer que estivesse passando por ele.

Eu trouxe a palma da mão ao meu coração. — Você não


precisa ser forte, — eu disse. — Você é forte para todos, o
tempo todo, mas não precisa ser assim comigo.

— Fui forçado a ser, — disse ele. — Nosso pai queria ter


certeza de que eu entendia que não havia espaço para anexos
neste mundo.

— O que você fez? — Perguntei.

— Eu sabia que meu pai não pararia nisso. Diego estava


ficando mais velho e começaria a ver mais. Eu queria protegê-
lo de nossos pais também. Eu não poderia viver em um
mundo onde sabia que isso estava acontecendo. Eu tinha que
nos tirar ou detê-los - e não havia como sair.

Apertei minha mandíbula para conter outra onda de


lágrimas que aqueceu a parte de trás dos meus olhos. Depois
de todo o conflito entre os irmãos, partiu meu coração ouvir
que Cristiano queria tanto proteger Diego que ele se colocou
em perigo. E que Diego não sabia, nem mesmo a extensão
dos negócios de seu pai.

— Como você sabe, — continuou Cristiano, — seu pai, o


meu e alguns dos outros cartéis da região formaram um
pacto contra o tráfico de pessoas. Então meus pais teriam
que retirá-los para expandir seus negócios.
— Foi por isso que você escolheu meu pai para pedir
ajuda.

— Naquele momento, eu tinha apenas quinze anos e não


tinha recursos. Usei o dinheiro do comprador de Angelina
para pegar uma arma e transportá-la para sua casa. Eu sabia
que Costa era justo e que seu avô era cruel – a combinação
certa para o que eu precisava. — Determinação entrou em
sua voz enquanto seus ombros recuavam. — Imaginei que,
assim que soubessem o que meus pais estavam fazendo, e
que planejavam derrubar os outros cartéis para se safar,
seriam a minha melhor chance de detê-los. E eu estava certo,
você sabe o resto.

Meu coração disparou. Se não houvesse mais na


história, não teria um final feliz. — Mas o que aconteceu com
Angelina?

Ele finalmente baixou os olhos cheios de angústia para


os meus e balançou a cabeça.

— Você não sabe? — Perguntei.

— Eu nunca a encontrei. Eu tentei. Comecei na Ucrânia


e na Rússia. Foi aí que conheci o avô de Tasha, cuja família
construiu uma forte rede no México e na Rússia ao longo de
muitas gerações. Mas, mesmo com a ajuda deles, faz oito
anos desde que ela foi levada. Era como procurar uma agulha
no palheiro. Mas isso me levou a outros homens e mulheres
que a sociedade deixou de lado e deixou para se defender. Da
Europa Oriental, passamos a ver mais do mundo. — Ele
respirou fundo e a resolução endureceu sua mandíbula. —
Tenho certeza de que Angelina está morta agora. Espero que
ela esteja. Algumas noites fico acordado pensando em tudo o
que ela suportou tudo por minha causa.

— Ah, não. Não, não, não. — Levantei-me em um


cotovelo e peguei seu queixo para forçá-lo a olhar para mim –
algo que eu aprendi com ele. — Não foi sua culpa, Cristiano.

— Eu fiz muito trabalho para superar meu passado com


meus pais. Eles não têm mais controle sobre mim. Mas
Angelina... eu me importei com ela, e isso arruinou sua vida.
— Ele pegou meu pulso, passando a palma da mão pela
barba antes de beijar o interior da minha mão. — Você pode
ver como isso me afetou. Porque eu mantenho você em
segredo do resto do mundo.

— Porque você... se importa comigo.

Ele franziu a testa. — Sempre me importei com você,


Natalia. Sempre. — Ele colocou um pouco do meu cabelo
atrás da orelha enquanto eu olhava para ele. — De uma
maneira distorcida, toda vez que eu te assustava, machucava
e empurrava, era para protegê-la.

Eu tinha um desejo avassalador de me inclinar e beijá-


lo. Beijar Cristiano – por vontade própria. Para afastar a
tristeza em seus olhos. Mas então, eles ficaram distantes.

— Mas não há garantia que eu possa, — disse ele. — É


por isso que você precisa aprender a lutar por si mesma. Não
pude proteger Angelina e falhei com sua mãe, não posso
falhar com você.

— Ambas as situações estavam fora de seu controle. —


Nos últimos onze anos, ele foi acusado dos crimes de seu pai.
Reconhecer isso significava admitir que eu estava errada
sobre tudo – incluindo o assassinato de minha mãe. — Você
realmente não a matou, não é? — Perguntei através de uma
risada na garganta.

— Não.

Abri minha boca para formar algum tipo de resposta,


mas o que eu poderia dizer? Eu não poderia devolver os anos
que ele havia perdido. A vida que ele conheceu. A família que
foi roubada dele. E eu tive um papel nisso.

— Você nunca teve provas suficientes – ou razão – para


acreditar no contrário, — disse ele, lendo minha mente.

Avançando, sabendo tudo o que eu sabia agora, eu


poderia ajudá-lo a se reconstruir. Eu me sentei, engolindo em
seco. — Nós vamos consertar você, — eu disse calmamente.
Cuidadosamente, passei o último curativo sobre o corte mais
próximo de seu coração. — Nós vamos consertar isso.

— Eu não preciso de conserto, Natalia. Com você do


meu lado, sou uma força a ser reconhecida.

Balancei minha cabeça e pressionei a fita, selando o


curativo. — Sente-se.
Ele empurrou o colchão e sentou-se. Peguei um rolo de
bandagem elástica e segui em frente até ficarmos cara a cara.
Ele esticou os braços quando alcancei os meus ao redor do
peito para enfaixá-lo.

Quando sua respiração aqueceu minha bochecha,


levantei meus olhos para seu lábio inferior cheio e depois
mais alto. Eu não tinha certeza do que esperava encontrar
em seus olhos – tristeza, arrependimento, dor. Mas ele
parecia perfeitamente satisfeito apenas em me ver trabalhar.

— Você ainda a procura? — Perguntei.

O pomo de Adão dele balançou. — Faz quase vinte anos,


Natalia. Talvez eu pudesse tê-la salvado naquela época se
tivesse os recursos que tenho agora. — Ele falou baixinho, a
centímetros do meu rosto. — Estou usando o que aprendi
naquela época para ajudar os outros. Mas não, eu não a
procuro mais.

Eu fechei os clipes na fita do curativo, prendendo-a


enquanto minha alma chorava. Essa porta nunca seria
fechada. Ele sempre se perguntaria o que tinha acontecido.
Seus pais sempre o segurariam de seus túmulos. — Você tem
medo de amar alguém de novo?

Sua expressão caiu como se eu fosse uma otária. Depois


de um momento, ele abaixou os braços, pegou meu bíceps
com firmeza, mas com cuidado, e me olhou nos olhos. — Eu
não a amava – era uma paixão de infância, mas isso não
diminui a devastação do que aconteceu com ela. — Ele fez
uma pausa como se escolhesse suas palavras com cuidado.
— Se fosse você, eu ainda estaria procurando.

Ele estava tentando me dizer alguma coisa? Seria


possível que nas últimas semanas de escuridão o amor
tivesse florescido?

— Não teria sido eu, — eu disse. — Seus pais teriam


matado minha família inteira... se você não os tivesse parado.

— Então eu fiz pelo menos uma coisa certa na minha


vida.

— E... e agora? — Eu perguntei através do nó que se


formava na minha garganta.

— Se alguém te levasse agora? É melhor eles me


matarem no processo, porque eu nunca pararia até encontrar
você. Não restaria nada nesta terra. E então, eu continuaria
na vida após a morte.

— Onde você procuraria primeiro? — Eu perguntei. —


Céu ou inferno?

— Céu, — ele disse imediatamente. — Se você ficar aqui


ao meu lado, isso mudará. Existe apenas o submundo para
pessoas como nós. Mas aqui embaixo, não queimamos. Nós
mandamos.

Fisicamente, não seria preciso quase nada para me


inclinar e beijá-lo, mas isso me custaria de outras maneiras.
Eu consentiria em minha queda. Descer com ele. Sangrar por
ele como ele prometeu que eu faria.
Ele pegou a parte de trás da minha cabeça e pressionou
os lábios na minha testa. — Eu não tenho medo de me
apaixonar, — disse ele contra a minha pele. — Se alguma
coisa, eu tenho medo de não me apaixonar. Seus pais
estabeleceram altos padrões para a aparência de uma
verdadeira parceria, mas não recuo de um desafio.

Todo enfaixado, mas ainda não curado, ele se recostou


no travesseiro e deixou as pálpebras se fecharem.

Não foi a primeira vez que Cristiano referenciou o


casamento dos meus pais e o amor deles um pelo outro. Era
tudo o que ele estava procurando. Tinha que ser. Isso
responderia a muitas das perguntas que o cercavam desde o
início.

Eu deixei meus olhos vagarem sobre meu marido forte,


ameaçador, mas dolorosamente vulnerável. Ele estava certo.
Comigo ao seu lado, seríamos uma força a ser reconhecida.

Nós?

Semanas atrás, poderia ter me surpreendido que eu


quisesse isso, mas eu não acho que isso realmente me
chocaria. Foi por isso que lutei com tudo isso com tanto
esforço.

Parecia inteiramente e assustadoramente natural ficar,


colocar minha coroa e descer mais fundo na escuridão com
Cristiano.
Mas isso não significava que eu tinha alguma ideia do
que encontraria quando tudo escurecesse.
10

Natalia

De costas no gramado da frente, lutei para respirar sob


o peso e a força considerável de Cristiano. Ele prendeu meus
pulsos sobre minha cabeça na grama e, com a velocidade que
um homem do seu tamanho não deveria possuir, manobrou
os quadris entre as minhas pernas, colocou as coxas embaixo
das minhas e as espalhou.

— Você está impotente contra mim, Senhora De La


Rosa, — disse ele com um sorriso convencido de maneira
irritante.

Eu empurrei meus quadris o mais forte que pude,


sabendo que não adiantaria.

— Terceira vez esta manhã – e estou ferida. As últimas


semanas de treinamento foram por nada?

Entre meus shorts e suas calças, apenas tecido fino nos


separava. — Lutei contra um agressor de verdade. É você
quem é forte demais para mim.

— O que eu te disse? Uma mentalidade limitada sempre


será sua maior responsabilidade. — Ele se inclinou até que
seu rosto pairou sobre o meu e seus olhos caíram na minha
boca. — Depois de me derrotar, você saberá que pode
enfrentar qualquer um.

Lambi meus lábios para ver se eu conseguia manter o


olhar dele lá. — Cristiano?

— Hmm?

A coisa sobre equipamento de treino leve projetado para


caber como uma segunda pele era que não deixava muito
para a imaginação. Cristiano tinha muita coisa acontecendo
no sul para esconder qualquer coisa. Mesmo quando ele não
estava duro, eu podia senti-lo entre minhas pernas, mas
agora algo se mexeu. — Eu acho que você é o único que tem
uma mentalidade errada.

— É? — Ele perguntou.

Eu mudei meus quadris, provocando-o com uma casa


quente para o monstro espesso e ondulado que se erguia
entre nós. Lembrando a ele que, com as aberturas largas do
meu short de corrida, ele poderia desabotoar puxar, mudar e
ficar dentro de mim em segundos.

Seu aperto afrouxou quando ele inalou. — Sim, — eu


disse.

Achatando meu pé contra sua coxa e usando o conselho


que ele repetia constantemente para mim, coloquei meu peso
atrás do ombro, empurrei sua perna e rolei por baixo dele.

— Oof. — Ele caiu de costas, segurando o abdômen.


Eu pulei para montá-lo, com cuidado para não me
sentar perto de seus ferimentos. — Desculpe, mas eu ganhei,
— eu disse, sorrindo para ele. — Eu machuquei você?

— Nada que alguns pontos novos não consertem.

Enquanto eu me inclinava para frente, meu rabo de


cavalo pendia sobre o meu ombro, as pontas roçando seu
peito. — Você deixou a guarda aberta.

— Eu peguei. — Ele segurou meu bíceps, me puxando


para baixo até que nossos corpos estavam colados – e eu
estava de volta sob seu controle. — Mas não, você não
venceu. A luta nunca acaba.

Seu coração batia forte nos meus seios – ou talvez fosse


eu. De qualquer maneira, nossa respiração se misturou e
nossos olhos procuraram o rosto um do outro. Nas semanas
desde que nos beijamos, a eletricidade entre nós não havia
diminuído. Pelo contrário – tornou-se ainda mais carregada.
Ao mesmo tempo, era exatamente o que eu estava
preocupada que acontecesse – que um beijo fosse poderoso o
suficiente para me fazer esquecer porque eu o odiava.

Mas eu já tinha esquecido. Ou talvez ele tivesse me dado


motivos suficientes para mudar minha mentalidade.

Não pela primeira vez desde que ele se abriu para mim
sobre seu passado, eu não queria apenas beijá-lo. Eu ansiava
por isso.
A necessidade em seus olhos estava ficando ainda mais
forte desde que ele começou a se curar completamente, e isso
traiu sua impotência. Eu poderia ter pedido qualquer coisa
naquele momento. Ou, eu poderia ser o única a iniciar,
deslizando o comprimento rígido de seu eixo, controlando
meu ritmo, seu orgasmo e o meu.

Eu estava dormindo ao lado dele como nas primeiras


semanas em que cheguei – só que agora, ele me puxava para
seu abraço a cada noite, boca no meu cabelo, meus quadris
aninhados nos dele, nossos corpos aprendendo a
compartilhar uma cama.

Ele acordou esta manhã pronto para treinar. E se ele


pudesse me derrubar no chão, então eu sabia o que estava
próximo. Fazia muito tempo. Ele estava esperando ainda
mais. Sua esposa relutante pediria e ele responderia dez
vezes. Com a dor ficando mais forte entre as pernas todos os
dias, talvez eu até implore. Ele me avisou que eu faria.

— Vejo que você está totalmente recuperado, senhor, —


Alejandro chamou alegremente de algum lugar próximo
demais.

Cheguei em uma posição sentada tão rapidamente que


quase caí de volta na grama.

Alejo caminhou em nossa direção, sem se preocupar em


esconder o sorriso.
Cristiano arrumou meu short e deu um tapinha nos
meus quadris para me fazer subir nele. — O que você está
fazendo de volta? Você deveria estar no sul.

Depois da refeição com Alejandro, Pilar e Tasha – que se


transformou em jantar quando Cristiano decidiu comer fora –
Alejandro reuniu uma equipe e levou-os a tentar recuperar
Max... contra o meu conselho. Eles carregaram Tasha em um
carro para devolvê-la para o lugar dela, e de acordo com
Cristiano, eles não tinham muito a relatar desde então.

Nesse caso, eu me preocupava que nenhuma notícia


fosse boa. Mas na leveza de Alejandro, parecia que eu estava
errada.

— Você localizou Max? — Eu perguntei enquanto me


levantava, limpando a grama das minhas pernas.

— Receio que não. Acredite, Cristiano será o primeiro, a


saber, quando o fizermos.

Quando Cristiano me colocou na frente dele, não


precisei perguntar porque – a razão pressionou minhas
costas. — Você tem esse olhar, — disse Cristiano.

— Qual? — Alejandro perguntou.

Como um gato que pegou o canário. Eu notei isso


também. — Você sabe alguma coisa, — eu disse.

— Eu sei duas coisas. Primeiro, a trilha de Max ficou


fria novamente, mas estamos extremamente perto de garantir
um informante dentro de Belmonte-Ruiz.
— Alguém está disposto a ajudar? — Perguntei.

— Disposto? Não. Mas ele concordou quando eu lhe


apresentei uma alternativa que não terminava bem para sua
família nos Estados Unidos. Agora, pressionamos até que ele
caia e esperamos a hora certa para atacar.

— Então por que você não está fechando o negócio? —


Cristiano perguntou.

— Eu não preciso estar lá para isso. — Ele ampliou sua


postura e cruzou os punhos debaixo dos braços. — Eu queria
entregar a próxima parte pessoalmente – fomos bem-
sucedidos em uma missão diferente. — Ele piscou e, em uma
reviravolta muito estranha, ele piou. Como uma coruja.

As mãos de Cristiano apertaram meus ombros. — ¿El


Búho?

— Sí, patrón. Quando levamos Tasha de volta à cidade,


obtivemos mais informações da família dela. Como esperamos
muito enquanto tentávamos rastrear Max, decidimos colocar
essa informação em bom uso.

— Foda-se, — disse Cristiano, mas não havia raiva por


trás de sua maldição. Se alguma coisa, ele parecia satisfeito.
— Você sabe onde estão os Valverdes, não é?

— Os Valverdes? — Perguntei o sobrenome um eco fraco


no fundo da minha mente. — Por que eu conheço esse
sobrenome?
Alejandro assentiu, e se ele parecia convencido antes,
agora parecia orgulhoso. — Eles estão mais perto do que você
pensa, chefe.

— Não estão no sul?

— Não mais.

Cristiano ficou rígido atrás de mim. — Não brinque


comigo, Alejandro.

Eu olhei para trás, me virando para olhar para


Cristiano. — Eles são o que você me deixou para encontrar?

— Sí, mi corazón, — disse ele, mas sua atenção


permaneceu em Alejandro. — Onde eles estão?

Alejandro inclinou o queixo para a frente. — Andar de


baixo.

Toquei o decote da minha blusa. Andar de baixo? O


único andar de baixo que eu tinha visto era a sala de pânico
e o espaço de armazenamento e, no extremo oposto da casa,
a sala de jantar subterrânea onde a festa aconteceu na
minha primeira noite. — Eles estão comendo? — Perguntei.

Cristiano riu e Alejandro se juntou antes de responder.


— Eles podem nem ter uma refeição sobrando.

O peito de Cristiano pressionou contra as minhas


costas. — Como você conseguiu isso?
— Você teve azar e isso o distraiu, — disse Alejandro. —
Achamos que você precisava de uma vitória depois das
últimas semanas.

Cristiano deslizou as mãos para descansar nas curvas


do meu pescoço, os dedos esticando sobre a minha clavícula.
— Quantos?

— Quatro. Depois que localizamos a cabeça, os outros


não ficaram muito atrás.

— Quatro? — Ele perguntou e soltou uma série de


maldições aterrorizadas. — Eu esperava uma, na melhor das
hipóteses.

— Uma pessoa? — Perguntei.

— Vamos retomar nossa lição mais tarde. — Cristiano


deu um beijo na parte de trás da minha cabeça e moveu a
boca no meu ouvido. — Não conte que eu vou esquecer a
posição em que você me colocou.

Todos os dias traziam mais perguntas, mas tive a sorte


de fazer isso com apenas uma resposta. Quem eram essas
pessoas que Cristiano aparentemente perseguiu até os
confins da Terra? E o que essa família tinha a ver com a
minha?

— Espere. — Virei-me para encará-lo, agarrando a


frente de sua camiseta antes que ele pudesse ir embora.

Ele arqueou uma sobrancelha para o meu punho em


sua camisa, depois levantou os olhos para mim. — Sim?
— Quem são os Valverdes? Porque você precisa deles?

— Vou lhe contar tudo, mas não agora. — Ele enxugou o


suor dos lábios e olhou por cima do ombro. — Primeiro,
preciso ver com o que estamos lidando.

Soltei sua camisa e o deixei ir embora. Embora eu


acreditasse que ele me contaria mais tarde, ainda era um não
que me transportou de volta aos meus primeiros dias na
Terra dos Condenados. Eu não queria voltar aos momentos
em que minha imaginação tinha sido deixada por conta
própria, girando fora de controle, conjurando teorias terríveis
– e, finalmente, falsas.

— Você disse que queria... que faríamos isso juntos, —


eu o chamei. — Como meus pais.

Cristiano parou onde estava depois voltou. — Nós vamos


fazer isso juntos.

A queda em sua voz registrou profundamente no meu


estômago, uma ameaça. — Então por que não posso ir com
você?

— Agora?

— Sim. Agora. Mostre-me o que está lá embaixo.

Ele voltou para mim, seus olhos vagando dos meus


tornozelos para os meus olhos. — Você não tem a primeira
pista do que está pedindo para fazer parte.

— Então me conte.
Ele massageou o peito. Fisker disse que Cristiano às
vezes tem azia. Gostava de bebidas, charutos e cigarros e
carne vermelha – o estresse constante não ajudava. Fiz uma
anotação mental para pedir algo leve para o jantar.

— Os Valverdes estavam por perto quando você era


criança, — disse Cristiano. — Rivais do seu pai.

— Alguns da velha guarda, então, — eu disse. Muitos


dos associados originais de meu pai foram assassinados ou
rebaixados, seus cartéis dissolvidos, derrubados ou
eliminados. Meu pai havia sobrevivido principalmente devido
à mudança de narcóticos para seu negócio mais seguro em
torno da logística de remessas.

— Algo assim. — Cristiano esfregou as têmporas. —


Pode ser perigoso lá em baixo. Vou avaliar a situação e subir
quando souber mais.

— Então, você escolhe o que eu vejo? Como isso é uma


parceria?

— Parceria? Mmm. — Ele umedeceu os lábios, dando-me


um olhar. — Eu tenho que dizer, eu gosto de ouvir você, meu
amor. Eu gosto muito disso.

Um calor agradável percorreu meu peito. Eu nem tinha


percebido o que estava fazendo. A palavra acabou saindo.
Mas era isso que estava se desenvolvendo entre nós.
Cristiano tinha me procurado para ser sua rainha, e todos os
dias isso se tornava mais verdade.
Por que a vida estava lá pra mim agora que eu tinha
visto tudo o que tinha aqui?

Agora que eu conhecia um homem como Cristiano?

A Califórnia não era mais casa. Tinha sido um lugar


para escapar dos meus medos e responsabilidades. E eu não
queria mais isso, o que era bom – porque nunca seria capaz
de voltar a isso.

Escolher essa vida não deixou espaço para hesitação.


Eu estava dentro ou fora, e Cristiano tinha que saber minha
decisão. — Ouvi o que você disse outra noite sobre mamãe
querer que eu vivesse honestamente, — falei. — Não quero
ser vítima do meu medo. Eu não quero ser uma espectadora
na minha vida. Eu escolho isso. O que quer que esteja aí, eu
posso lidar com isso.

— Eu sei que você pode, mas certas coisas, você não


pode voltar atrás.

Ele me avisou com palavras assustadoras, mas eu não


podia ignorar a única verdade que persistia desde que pisei
na igreja há mais de um mês. — Eu não posso voltar de
qualquer maneira, posso?

Alejandro assobiou para Cristiano.

Cristiano recuou. — Espere lá em cima. Eu volto logo.

Com ele, logo poderia significar minutos ou horas.


Ele se virou e andou a passos largos pela lateral da casa
onde a encosta da montanha tinha a vegetação mais densa.
Eu não tinha explorado muito nessa área. Eu não tinha
pensado que havia algo além de árvores cobertas de
vegetação. Agora eu me perguntava como poderia ter um —
andar de baixo.

Voltei para o nosso quarto, liguei o chuveiro e comecei a


remover meu top de corrida quando avistei a nova definição
em meus ombros e bíceps. Meu corpo estava mudando.
Fortalecimento. Assim como meu estado emocional e mental.

Deixei minha blusa e me inclinei sobre a pia para me


olhar no espelho. Na minha primeira noite aqui, eu me
encontrei no banheiro do térreo, olhando para o reflexo de
uma garota aterrorizada, zangada e exausta que pensava que
estava subindo as escadas para ser proverbialmente
arrancada por seu maior inimigo.

Quanto mudou desde então. Eu fui voluntariamente


ingênua. Com medo de aprender as verdades que eu supus
serem feias. O resultado de uma vida inteira sendo mimada
por Papá e Diego.

Eu trocaria a escuridão do mundo de Cristiano para


voltar a viver cegamente se eu pudesse?

Isso não importava. Não podia. Pelo menos era honesto


aqui.

Vapor ondulou sobre a porta do chuveiro. Meu rabo de


cavalo havia se soltado durante a briga e pendurado por cima
do ombro. Cicatrizes começaram a tomar forma, uma
pequena na minha bochecha e uma barra debaixo do meu
queixo. Minhas bochechas coraram do meu treino matinal e
da água quente corrente. Meus olhos tinham visto coisas que
não podia esquecer.

— Certas coisas, das quais você não pode voltar atrás.

Que coisas? Eu já tinha visto Cristiano cortar as


gargantas dos homens que tentaram sequestrar Sandra. Eu
tinha visto os rostos dos perdidos, mas não esquecidos,
gravados em um quadro branco, provavelmente não
esperando mais salvadores como Calavera. Eu lutei contra o
meu próprio agressor. Mas havia um lado mais horrível no
que Cristiano fez. El Polvo despejou areia na garganta de seus
piores inimigos. Eu tinha ouvido falar de uma morte lenta,
mas não havia testemunhado as complexidades e verdades
não ditas do que realmente significava.

Era isso o que estava acontecendo lá embaixo? Uma


morte lenta para os rivais do meu pai? Um inimigo tão velho
e obscuro que mal me lembrei do nome deles? Antes dos
ataques, Cristiano havia procurado uma chave para
desbloquear tudo o que queria. Eu estava aprendendo que
sua necessidade não atendida era eu. Nós. Nossa parceria.
Nosso casamento. Então, por que uma família da velha
guarda estava entre Cristiano e eu?

Meu pulso acelerou quando as peças do quebra-cabeça


formaram uma imagem maior. Ele disse que tinha a ver com
o desfecho. Jaz disse que era prova. E como em tudo aqui, a
vingança desempenhou um papel – Cristiano admitiu em
nossa última noite sozinhos antes de deixar a cidade.

Vingança em meu nome. Em nome do meu pai.


Encerramento para nós. Prova. Eu enrolei meus punhos
contra o balcão quando a resposta se formou em minha
mente.

Papá me disse, na manhã seguinte à festa à fantasia,


que o assassino de minha mãe foi contratado por um cartel
rival que não existia mais.

Mas talvez eles existissem. E talvez estivessem aqui.


11

Natalia

Eu esperei quase doze anos por respostas sobre a morte


de minha mãe e agora as pessoas responsáveis estavam aqui.
Perto. Em algum lugar debaixo dos meus pés.

Cristiano me pediu para esperar um pouco mais, mas


eu me contorci com o pensamento de mais peças de quebra-
cabeça esperando em algum lugar enigmático que Alejandro
chamou de — no andar de baixo.

Afastei-me do balcão do banheiro, desliguei o chuveiro e


fui para o meu armário. Depois de fechar um moletom com
capuz por cima da minha blusa, apertei meu rabo de cavalo e
fui para o térreo e para o lado da casa onde Cristiano havia
desaparecido.

O que eu estava fazendo? O que eu estava pedindo ao


abrir esta porta que estava trancada por tanto tempo? E se
eu não pudesse lidar com isso?

Cristiano havia dito que eu podia. Mas se o que eu


suspeitava fosse verdade, essa família era responsável por
mais do que a morte de minha mãe. Eles assumiriam a culpa
pelos onze anos que Cristiano estivera fugindo. Por sua
pobreza e luta, e a brecha irreparável entre ele e seu irmão.
Por suportar o ódio de seu mentor e futura esposa por tanto
tempo.

E por tudo isso, eles pagariam.

Cristiano havia exigido a morte torturante de muitos


inimigos, e talvez não houvesse um inimigo maior do que a
família Valverde.

Quanto mais eu andava da casa, mais arborizada ficava.


A sujeira começou a amolecer quando os galhos esmagaram
sob meus tênis. Copas de árvores frondosas bloqueavam o
céu. Asas bateram quando os pássaros assobiaram. Ah,
natureza.

Com o clique metálico de uma arma, eu congelei.

— Alto. — Pare.

Procurei a voz masculina, mas não vi nada – até que


Eduardo quase completamente camuflado saiu de entre
algumas árvores. — Natália?

Meus ombros se afrouxaram. — Dónde está


Cristiano? — Perguntei.

Se Eduardo sabia onde estava Cristiano, ele não


respondeu.

— Ache ele para mim, — eu disse com um suspiro. —


Agora, é urgente.
Eduardo removeu o rádio portátil preso ao colete à prova
de balas. — Jefe8, — ele disse. — Natalia está aqui.

Cristiano respondeu imediatamente. — Traga-a para


baixo.

Eduardo me levou alguns metros através das árvores.


Quando chegamos à encosta da montanha, ele puxou uma
pedra que não era pedra, mas uma cobertura de aço
disfarçando um teclado. Ele pressionou o polegar contra um
scanner de impressões digitais e parte da montanha à nossa
frente se abriu como a entrada de um cofre.

Dios santo. A porta era a montanha. Eu nunca teria


encontrado isso sozinha.

Eduardo foi o primeiro, desaparecendo por uma escada


escura.

Meus pés não se mexiam, no entanto. Desde a infância,


tentei não cair em espaços escuros. Com o cheiro do solo,
essa escada em particular me lembrou o túnel que Cristiano
havia me levado.

Ao contrário daquela vez, ele não ia me deixar lá em


baixo.

Eu me forcei a dar o primeiro passo, depois o próximo,


até ficar no pé de uma escada de pedra e diante de outra
porta segura. Eduardo inseriu suas credenciais e, uma vez
que abriu, ele entrou sem pensar duas vezes.

8 Patrão
Minha única companhia era o som da batida do meu
coração. Tive a sensação de que quando entrei, eu sairia um
pouco mudada. Mas eu aprendi mais durante a minha
metamorfose desde que cheguei, do que nos anos na
universidade, e me consolou ao ver que era o melhor - mesmo
quando nem sempre era assim.

Esse era o ventre de um mundo já horrível. Passei anos


fugindo disso, tentando fingir que não existia, e me
distanciando da minha infância. No entanto, eu estava
entrando nela com os olhos bem abertos agora.

Isso mostraria a Cristiano – e a mim – que eu estava


escolhendo esta vida. Escolhendo ele. Todo ele.

E eu merecia respostas. Eu merecia a chance de olhar


os assassinos de minha mãe.

— Não é tarde demais para se virar. — Cristiano se


materializou na escuridão, sombras transformando seus
olhos em órbitas.

Temor e uma pitada de medo se misturaram dentro de


mim quando entrei em uma sala de aço fria e mal iluminada.
Pequenas luzes verdes, amarelas e vermelhas brilhavam com
o zumbido das máquinas. Não aparelhos, percebi quando
meus olhos se ajustaram. Computadores e monitores.
Combinado com as caixas de vidro de livros e pastas que
revestiam as paredes, o espaço parecia um museu de alta
tecnologia.
E nada como um lugar para manter prisioneiros – mas
qual a profundidade dela?

Fui para a sala com temperatura controlada. Eduardo


havia desaparecido. — É aqui que você armazena as partes
dos corpos? — Perguntei.

— Hã?

Eu me virei para Cristiano. — Diz à lenda que você


guarda algo de todas as pessoas que você mata e o exibe.

— Ay. Senhor, dame paciencia. — Ele passou as mãos


pelo rosto enquanto pedia paciência a Deus e depois riu. —
Outro boato. Que tipo de cabrón maluco você acha que sou,
Natalia? Não sou santo, mas não guardo lembranças de todas
as mortes. Por outro lado, eu precisaria de um prédio maior.

Cristiano sorriu, divertido com seu humor doentio. Em


qualquer outro cenário, eu teria rido. O boato era ridículo a
ponto de ser cômico, e é claro que eu parei de acreditar na
maior parte do que ouvi sobre ele há um tempo. Mas naquele
momento, eu não conseguia superar meus nervos.

— Embora, suponho, de certa forma, esses sejam órgãos


proverbiais, — acrescentou Cristiano.

— Eu não sei o que isso significa.

— Eles são arquivos e registros de todas as operações.


Às vezes temos que agir rápido e com pouca informação, mas
tentamos ser o mais preparados e organizados possível. —
Ele olhou em volta. — Existe um túnel que se conecta a casa,
mas, caso contrário, essa área é isolada por motivos de
segurança, para que possamos trabalhar em paz. Nós não
queremos incomodar ninguém.

— Incomodar como?

Ele pigarreou, checou o telefone e o recolocou no bolso


dos calções. — Eu disse para você ficar lá em cima. Você
nunca ouviu essa expressão, a curiosidade matou o gato?

Ou, sua curiosidade é uma aflição, como meu pai havia


me dito várias vezes. Isso era mais profundo do que
bisbilhotar.

Eu tinha que dizer a Cristiano que sabia. Eu sabia o que


ele estava mantendo aqui embaixo. E que eu estava pronta
para receber minhas respostas, não importa como isso
mudaria minha vida. Foi por isso que eu corri para cá.

Agora que eu estava à beira, no entanto, o penhasco sob


meus pés desmoronava mais a cada passo. E como eu não
conseguia ver o fundo, tive que assumir que era uma queda
profunda. Na minha experiência, as respostas apenas
geraram mais perguntas. A retaliação apenas incitou mais
guerras, mais morte, mais vingança. E como Cristiano disse -
algumas coisas, eu não pude deixar de ver.

Engoli em seco pela garganta e fui até um grande painel


de controle abaixo de um banco de telas de computador.
Além dele, uma janela de vidro mostrava uma sala cheia de
servidores. — Este é o sistema de segurança?
— Um deles, mas é muito mais que isso. Informações
sobre sindicatos do crime organizado em todo o mundo,
desde narcóticos, artilharia, mercado negro, prostituição,
escravidão, lavagem de dinheiro, etc., — ele se afastou, sob a
penumbra. — Gerenciamos grandes e pequenos dados,
analisamos padrões e tendências, na esperança de unir
partes, como a maneira como as pessoas se movem, onde
começam e terminam, quais máfias estão se comunicando,
interações que parecem estranhas. Essa é apenas a ponta do
iceberg em termos do que está acontecendo lá fora.

Eu não conseguia esconder a reverência da minha voz.


— Eu não tinha ideia.

— É preciso muita força para alcançar cantos escuros.


Eu... não quero esconder essas coisas de você. — Ele puxou a
mandíbula, algo em conflito nele. Ele não queria me deixar de
fora. Mas ele provavelmente também lutou para me trazer. —
Mas alguns desses assuntos estão fechados. ¿Comprendes?

Sim, eu entendi. Eu reconheci a determinação nele


agora. E melancolia. Eu não discuti. Coisas que perturbam
alguém como ele deve estar no limite da humanidade. Eu
provavelmente estava melhor sem saber.

Meus olhos examinaram as pastas arquivadas e em


ordem alfabética. Alguns tinham nomes de pessoas, outros
listavam empresas, cartéis ou apenas iniciais e datas. — Por
que tudo isso não é digitalizado?
— Tudo é criptografado, mas, às vezes, nada é mais
seguro que o papel. Garanto-lhe, o governo tem seus próprios
hackers e muitas autoridades gostariam de acabar com o que
estamos fazendo.

Eu fiz uma careta. — Ajudar pessoas?

— Temos todos os tipos de empreendimentos ilegais,


Natalia. São com eles que financiamos nossos mais
benevolentes. O tráfico de armas tem sido muito bom para
mim, e preciso que essa renda continue. — Ele massageou a
nuca. — Nós temos um papel. Nós somos os bandidos; o
governo é o mocinho. Eles não gostam quando perturbamos o
equilíbrio. Não devemos fazer o trabalho deles por eles.

— Eles não querem que a imprensa descubra, — deduzi.


— Isso os tornaria motivo de chacota.

— A imprensa ou outros líderes mundiais. Pessoas ricas


também, que percorriam cidades inteiras para manter as
informações que selamos. Felizmente, não fazemos o que
fazemos pela imprensa ou por qualquer outra pessoa. Mas
tráfico de armas, lavagem de dinheiro, narcóticos, frete – eles
atuam como cobertura e mantêm nossas contas bancárias
cheias.

Eu o enfrentei novamente. Ele ficou parado, com as


mãos nos bolsos dos calções, me seguindo com os olhos.
Cristiano tinha paciência infinita. Eu não conseguia imaginar
meu pai ou Diego me guiando por tudo isso com tanta
sinceridade. Eles preferiram me proteger. Para me colocar em
uma caixa. Cristiano não. Para ele me dizer para não descer
aqui, deve ser ruim. Eu devia a ele a mesma confiança que
ele depositou em mim – eu tinha que incluí-lo na minha
decisão de saber se eu estava ou não pronta para enfrentar o
que estava por vir.

— Os Valverdes estão aqui?

Ele olhou para minhas mãos enquanto eu torcia meu


anel em volta do meu dedo. — Sí.

— Onde? — Perguntei. — O que mais tem aqui,


Cristiano?

Ele trabalhou a mandíbula de um lado para o outro


antes de responder: — Todo chefão precisa de uma
masmorra, Natalia. É do jeito que é. Você ficará feliz por isso,
depois de descobrir o que eles fizeram.

— Eu já sei.

Os olhos dele se fecharam. — O que você sabe?

— Eu descobri. Eles contrataram o assassino que matou


minha mãe, não foi?

Ele fechou os punhos nos bolsos e abriu os olhos,


disparando-os pela sala até que pousaram em uma mesa. Ele
foi até lá, pegou um rádio bidirecional e parou. Olhando para
o chão, ele suspirou, balançou a cabeça e disse no alto-
falante: — Faça-os gritar.
Meu estômago caiu com seu comando sinistro, mas
Cristiano não parou por aí. Ele desligou o rádio, foi até a
porta do armário e içou um balde azul com as duas mãos
para carregá-lo pelo quarto.

Eu estava prestes a repreendê-lo por levantar coisas que


poderiam ameaçar sua saúde quando ele largou o balde com
um baque aos meus pés.

Estava cheio de areia.

El Polvo. Toquei minha garganta quando ela se fechou


como se estivesse prestes a aprender em primeira mão seu
método de marca registrada de entregar a morte.

Uma cacofonia de gritos profundos e guturais soou em


algum lugar do edifício.

Eu girei meu pulso pulando enquanto tentava


determinar de onde vinha. — O que é isso?

— Essa é a parte deste mundo em que você está prestes


a entrar. Você tem certeza de que está pronta?

Os gritos pararam, mas não pararam o arrepio subindo


pela minha espinha. Eu sabia que isso iria acontecer. Eu tive
que ficar forte. — Você está tentando me assustar
novamente, como você fez naquela época, — eu disse. — Não
funcionou quando eu tinha nove anos. O que faz você pensar
que vai agora?

— Porque você sabe melhor.


Estudei o homem diante de mim. Às vezes, coisas
sombrias que me aterrorizavam se tornavam suportáveis
quando eu as iluminava – suportáveis e talvez até bem-
vindas. Não seria o caso aqui, mas as sombras não eram
escudos. Eles não impediriam que a verdade surgisse, então
por que não encará-la de frente, quando eu poderia controlá-
la? — Quero respostas, Cristiano. Eu não as mereço?

— Sim, e você as terá. Mas me diga a verdade – alguma


parte de você, por menor que seja ainda quer a vida que teve
na Califórnia? — Ele perguntou, assentindo atrás dele. — Ou
você quer o que está por trás da porta número dois? Você não
pode ter os dois.

— Eu não quero mais essa vida, — eu disse, e era a


verdade. O que não me perguntei em voz alta era se estava
pronta para isso. Mas eu aprendi em tenra idade, com o
homem que estava diante de mim – nunca hesite ou bata!
Você está morto.

Inclinei minha cabeça quando algo me ocorreu. — Você


está me dando uma escolha? — Perguntei. — Eu posso deixar
esse casamento?

Ele nunca levantou as ameaças de que minha família


perderia sua proteção se ele me perdesse. Tecnicamente, eu
ainda era sua prisioneira tanto quanto sua esposa. Ele era
corajoso o suficiente para me deixar escolher por mim
mesma?
Os olhos dele escureceram. — Se é isso que você quer
peça. Veja qual é a minha resposta.

Suspeitei que sua resposta fosse não. Mas Cristiano


costumava dizer que me conhecia melhor do que eu pensava,
e agora isso estava começando a se confirmar para mim. Se
eu pedisse minha liberdade, Cristiano diria que não. E ele
acreditaria nisso. Mas eu sabia melhor. Se eu realmente
quisesse me soltar, ele me libertaria.

— Eu prometo que você receberá suas respostas, —


disse ele. — Eu prometo que a vida de sua mãe será vingada.
Mas você não precisa assistir a essa parte.

Meu coração vacilou. Então era verdade. — Eles são os


responsáveis, — eu disse.

— Sim.

Eu esperava que a dor chegasse, mas, tendo adivinhado


por conta própria, o choque foi abafado. Em vez disso, meus
dedos tremeram quando a fúria queimou um caminho
através de mim. — Eu quero vê-los, — eu exigi.

— Você tem todo o direito de ficar com raiva, mas isso


pode atrapalhar seu julgamento.

Eu apontei para o meu peito. — É minha escolha fazer.


Não é sua. Você me ensinou isso.

Ele não podia discutir isso. Ele esfregou uma


sobrancelha, debatendo. — Se eu não posso convencê-la a
esperar, — ele disse, e fez uma pausa, — então você deve
saber mais antes de entrarmos lá.

Eu assenti com ele. — Estou ouvindo.

— Uma das primeiras missões em que iniciei foi localizar


o assassino que matou sua mãe. Quando seu pai me
perdoou, isso deveria ter sido suficiente, mas eu sabia que,
enquanto ainda tinha perguntas, não podia deixar por isso
mesmo. Ele estalou os nós dos dedos. — Embora ele possa
ter puxado o gatilho, qualquer assassino sairia da Virgem
Maria pela quantidade certa de dinheiro.

Eu vi coisas através dos olhos de Papá agora. Ele


chamou Cristiano de “cruel” e “implacável” em sua
perseguição ao assassino, e eu zombei. Mas ele estava certo.
— O assassino admitiu ter sido contratado por um cartel
rival – verdad? — Perguntei. — Foi o que meu pai me disse.

Cristiano assentiu. — Soubemos que o golpe havia sido


ordenado pelos Valverdes, mas era do conhecimento geral
que eles estavam fora do jogo há um tempo. Ao contrário de
outras federações que desmoronaram e corroeram com o
tempo, os Valverdes desapareceram praticamente da noite
para o dia.

— E foi isso que o alertou para que houvesse mais.

Ele clicou a língua. — Se houvesse um quebra-cabeça


lá, eu resolveria. Especialmente tendo você aqui como minha
esposa e sabendo que você ainda achava que eu tinha tido
participação no ataque dela.
Eu andei para frente. — Eu não acho que você a matou,
— eu disse, parando na frente dele. — Eu te disse isso, e para
parar de persegui-lo.

— Você não acha, não. Mas você também não sabe. E


isso está me comendo vivo.

— O que tem?

Ele franziu o cenho para mim. — Com o tempo, minha


esposa pode aprender a confiar em mim, e talvez até me amar
– mas sempre, um pequeno pedaço dela questionaria aquele
dia e o que ela viu. — Ele olhou para longe de mim, mas não
antes que a dor passasse por suas características
normalmente controladas. — Se eu não puder responder a
essa pergunta para você de uma vez por todas, se eu não
puder lhe dar um desfecho, e a segurança de me dar sua
confiança completa e implacável – então eu não mereço.

Oh. Meu coração se partiu por ele. Desde o dia em que


cheguei, até recentemente, eu tentava desesperadamente
descobrir os motivos de Cristiano para me trazer aqui. E ele
estava me mostrando eles o tempo todo. Começando na
igreja. Sua proposta, a cerimônia do laço, a papelada para
legalizar nossa união, o rosário de minha mãe, as flores e os
votos dele – nenhum, se tivesse sido uma zombaria. Ele fez o
caminho errado, mas isso não o tornou menos real.

Amor e devoção, que ele podia dar e ter retornado, era


tudo o que procurava. As únicas coisas que ele não podia
pegar comprar ou comandar. E ele não achou que realmente
conseguiria isso de mim até o capítulo da morte de minha
mãe ter sido encerrado. Até que ele o fechasse para mim.

Eu toquei nele, colocando minhas mãos em seu peito.


Eu queria pegá-lo em meus braços e aliviar essa dor,
finalmente me entregando a ele. Mais tarde. Agora, eu só
podia me desculpar. — Lo siento, Cristiano.

— Não se desculpe. — Ele circulou meus pulsos,


mantendo minhas mãos contra seus peitorais. — Você é
inteligente para não confiar em palavras minhas ou de
qualquer outra pessoa. — Sua voz caiu. — Você confia em
ações, então eu agi.

Meu couro cabeludo formigou. — Você os trouxe aqui.

— Confessar tudo. Para livrar sua mente de qualquer


dúvida sobre mim. Para garantir que, onde a morte de sua
mãe está envolvida, sou inocente.

— Eu sei que você é. Eu não duvido mais de você. —


Deslizei minhas mãos mais alto, saboreando o poder sob elas.
— Você nunca disse porque eles desapareceram.

— É isso que eu vou descobrir. — Ele desviou o olhar. —


Você os ouviu gritar, Natalia. Você sabe o que estou prestes a
fazer. Vou pegar as informações que quero e uma confissão
para você, mas pode levar dias até eu conseguir. Fique
satisfeita até então. Trarei você de volta quando os porcos
estiverem prontos para gritar.
Isso era justo. Eu ouviria da boca deles. Mas eu implorei
por respostas tantas vezes. A paciência foi forçada em mim.
Se subisse, voltaria a esperar. E depois de todos esses anos,
eu queria fazer alguma coisa.

— Eu também quero atuar, — eu disse.

Talvez eu me arrependa, mas minha mente já estava


decidida no momento em que percebi quem eram os
Valverdes.

Com um breve suspiro de resignação, ele assentiu uma


vez. — Espere aqui.

Ele me deixou sozinha no escuro com o eco assustador


dos gritos de homens crescidos. A ideia que eu tinha de que
poderia existir na superfície da minha escuridão interna
parecia tão absurda agora. Que eu poderia pisar nela,
caminhar nela, e nunca tropeçar e cair. Que eu podia ignorar
a maneira como cresci e os negócios de meu pai - e que
esperava que Diego fizesse o mesmo.

A Califórnia tinha sido uma bolha. Meu pai disse que


uma vida lá com Diego nunca teria acontecido.

Não seria suficiente para nenhum de nós.

Talvez mergulhar de cabeça na escuridão fosse


igualmente tolo. Mas não parecia haver nenhum meio termo,
e eu aprendi através de Cristiano que a ignorância só me
deixava vulnerável.
Entrei no armário de onde Cristiano pegou o balde de
areia. Nas prateleiras, havia correntes que eu já tinha usado
para rebocar caminhões, com ganchos enormes nas
extremidades. Corda trançada tão grossa quanto meu
antebraço. Uma serra elétrica.

Com um barulho, eu me virei. Cristiano estava em uma


porta na minha frente. — Ándale, — disse ele. — Vamos.

Eu fui com ele. Ele assentiu para eu passar primeiro. A


porta se fechou atrás de nós com um clique resoluto. Andar
pelo corredor era como pegar um túnel para o inferno.
Desapareceram as paredes de aço e o zumbido reconfortante
da justiça em ação, substituídos pelo ventre da montanha,
andaimes de madeira e grunhidos masculinos e abafados.

O ar ficou úmido. Mofado. Meus tênis mastigavam


sujeira no concreto quando vimos à direita, e depois outra,
até Cristiano abrir uma porta e gesticular para eu entrar.

Quando meus olhos se ajustaram, o sangue escorreu do


meu rosto.

Semanas atrás, a cena diante de mim seria suficiente


para me fazer correr, mas não antes de eu chamar Cristiano
de todos os nomes horríveis do dicionário. Agora eu entendia
melhor.

Havia mais de uma maneira de tornar o mundo um


lugar melhor. O bem nem sempre prevaleceu.

Às vezes, os monstros tinham que tomar as rédeas.


12

Natalia

Os homens sem camisa com suas bocas fechadas


olhavam de volta para mim. Ladeados por Alejandro e
Eduardo, eles estavam presos no teto baixo pelos pulsos
acorrentados, os dedos dos pés mal roçando o chão de terra.

Quatro homens, quando Cristiano esperava um, na


melhor das hipóteses.

Quatro vidas penduradas na balança.

Três tinham a idade de meu pai ou mais e o último


ainda mais novo que eu, possivelmente ainda adolescente.

Seus corpos pareciam na maior parte ilesos, mas as


contusões escureceram seus rostos. Confetes multicoloridos
debaixo deles eram evidências de que tinham sido
eletrocutados.

Para minha vergonha, fiquei chocada demais para me


mexer. Saber que essas coisas aconteciam, mesmo ouvindo-
as da sala ao lado, era totalmente diferente que testemunhá-
las.

Quando um filete de sangue deslizou do canto da boca


de um homem, o conteúdo do meu estômago revirou.
Mas eu prometi a mim mesma que poderia fazer isso.
Então, quando Cristiano disse: — Fíjate bien9, — olhe mais de
perto – eu olhei.

— Leia as tatuagens deles, — instruiu Cristiano.

— Que tatuagens? — Perguntei.

Apenas algumas decoravam os homens mais velhos,


mas eram simplesmente esboços desbotados que não
significavam nada para mim.

Cristiano me guiou para frente, ficando perto o


suficiente para que eu sentisse seu calor através do meu
casaco. Foi só quando eu estava de pé ao alcance do braço do
homem mais velho que eu vi. Tinta fraca, quase apagada,
rabiscando letras góticas no peito. Os outros dois homens
mais velhos tinham a mesma palavra. — Valverde, — eu li.

— Eles tentaram removê-los. Como covardes.

Dois dos quatro homens estremeceram, suas correntes e


gritos abafados ecoando ao nosso redor.

— Silencio. — Eduardo bateu em uma das costas com a


traseira do seu AR-15, e eles ficaram quietos. O mais novo e o
mais velho dos quatro permaneceram imóveis.

— Talvez eles devessem ter cortado o nome se não


quisessem ser encontrados, — disse Cristiano, caminhando
em direção aos homens, alongando suas costas e ficando em

9 Preste atenção
pé. — Eles vão confessar seus pecados. Farei o que for
preciso. Quero que você ouça da porra da boca deles.

E se eu dissesse a Cristiano que acreditava, até o


âmago, que ele era inocente – continuaria com o que
planejou?

Eu encontrei os olhos suplicantes do mais novo. Ele não


poderia ter sido nada mais do que uma criança quando isso
aconteceu.

— E se eles não fizeram isso? — Perguntei a Cristiano.

— Eu não os caçava para perguntar se eles fizeram. Eu


os trouxe aqui para descobrir o porquê.

Uma sensação de pavor me atravessou. Por mais de


onze anos, eu desejei respostas. Agora, elas seriam
concedidos pelo último homem na Terra que eu esperava.
Meu marido me mostrava mais todos os dias que ele fazia seu
próprio destino e que eu podia fazer o meu.

Cristiano andou, parando na frente de cada homem. —


Você sabe porque você está aqui. Você pediu um golpe na
Bianca Cruz. Esta é a filha dela. Minha esposa. — Ele
encontrou os olhos, e a ferocidade no olhar de Cristiano fez
até meu estômago revirar. Ele deu de ombros daquela
maneira ameaçadora que aperfeiçoou. — Quanto mais você
cooperar, mais rápido isso terminará – mas sou um homem
misericordioso, — disse ele em um tom que era tudo menos
compassivo. — Vou deixar um de vocês ir, o primeiro a
confessar.
Nenhum deles reagiu, não que eles realmente
pudessem, mas o silêncio deles ficou sob a minha pele. A vida
de todos com quem eu me importava tinha sido
irrevogavelmente mudada para pior por causa dos homens na
minha frente.

Talvez eles precisassem ser forçados a falar.

O pensamento me pegou desprevenida.

E trouxe a compreensão de Cristiano e Diego de uma


nova maneira. Eu fantasiei sobre justiça pelo assassinato de
minha mãe, mas não da maneira direta e brutal que estava
sendo oferecida atualmente. Eu pensei que uma bala na
cabeça do assassino fosse uma maneira de acertar a conta,
mas isso não era nada. Já tinha acabado antes que eu
soubesse que estava acontecendo, antes que eu tivesse um
momento para saborear o retorno.

Cristiano virou-se para mim. — É aqui que você sai do


caminho.

Era isso? Eu vim buscar mais, embora não pudesse


dizer exatamente o quê. Eu estava disposta a testemunhar
tortura? E se sim, que buracos me preencheria ver homens
crucificados por um crime de uma década?

Mesmo quando seus olhares queimaram em mim,


Cristiano e eu trancamos os olhos – até o mais velho dos
quatro balançar suas correntes. Cristiano virou-se para ele.
Seus olhos cinzentos se transformaram de opacos a
expressivos, enquanto ele tentava nos dizer algo por trás de
sua mordaça.

Alejandro e Eduardo trocaram um olhar. Cristiano


assentiu uma vez. — Deixe ele falar.

Eduardo arrancou a fita da boca. O homem esticou a


mandíbula, mas, de outra forma, pareceu desnorteado. —
Soy Vicente, — disse ele com voz rouca. — Eu sou...

— Vicente Valverde, — disse Cristiano. — O patriarca.

— Sí eu conhecia Costa. Posso lhe contar tudo o que


você quer saber, desde que eu mesmo fiz o maldito acordo.

À menção do nome do meu pai, dei um passo à frente.


— Qual acordo?

— Devo dizer, — disse Cristiano, pegando meu cotovelo


para me aproximar dele, — conhecendo sua reputação,
pensei que você seria o último a quebrar. Não o primeiro.

Vicente resmungou. — Eu não vou sair daqui vivo. Não


faz sentido tentar me salvar. — Ele se contorceu para impedir
o contato visual com os outros dois homens da idade dele, e
um acordo pareceu passar entre eles. — Vou lhe contar toda
a verdade com uma condição.

Eduardo riu com tanto exagero que exibiu um molar


ausente. — Ele está estabelecendo condições, chefe. Isso deve
ser bom.

Cristiano inclinou a cabeça para Vicente. — Continue.


— Mate-me rapidamente quando tiver o que deseja, mas
poupe meu neto e irmãos. Eles são os únicos membros
restantes da minha família.

Eduardo riu de novo e Alejandro se juntou.

— Por que eu concordaria com isso? — Cristiano


perguntou.

— Minha família desaconselhou minha estratégia. Eles


me avisaram que poderia falhar e sair pela culatra – mas eu
estava no comando e fiz a ligação. — Com um aceno breve,
Vicente acrescentou: — Meu neto era apenas um garoto
quando isso aconteceu. Ele tem apenas dezessete anos.

Dezessete? Minhas mãos suam, mas não as limpei na


bermuda para não parecer nervosa.

— Durante toda a vida ele foi forçado a se esconder e na


pobreza, — disse Vicente, — e ele tem potencial. Deixe-os
viver, e eles ficariam em dívida com você. Eles podem ser
grandes soldados.

— Foda-se, — disse Cristiano, as costas rígidas. —


Tienes huevos 10 – você tem coragem de pedir misericórdia?
Passei onze anos da minha vida me escondendo e comecei na
pobreza por sua causa.

O adolescente torceu em suas correntes. Eu não estava


acostumada a ver tanto medo nos olhos de alguém. A maioria
das pessoas neste mundo já estava integrada nesse tipo de

10 Tem coragem?
coisa, mas como eu, ele estava claramente em um novo
território.

— Meu neto é fascinado por este mundo, mas nunca foi


permitido fazer parte dele. — Vicente ficou mais animado
quando seu orgulho brilhou. — Em vez disso, ele colocou sua
energia em computadores. Ele não pode lutar, eu admito.
Mas ele pode encontrar coisas na Internet.

Cristiano não mataria um adolescente que não fez nada


errado. Eu não deixaria. Deixaria? Quando meus olhos se
moveram entre cada um deles, eu não pude deixar de ver a
justiça poética em tirar de Vicente como ele havia tirado de
mim.

Cristiano caminhou em direção ao adolescente de olhos


arregalados e olhou-o de cima a baixo. — Qual o nome dele?

— Gabriel.

— Conte-nos tudo, — disse Cristiano, voltando-se para


Vicente, — e minha esposa pode decidir o destino de Gabriel.

Se estivesse sozinha, teria engolido. Eu não era forte o


suficiente para isso ainda – puxar o gatilho quando havia
uma zona cinzenta, mesmo quando precisava ser feito. Era
isso que significava ficar ao lado de Cristiano? Vingar-se onde
era devido e tomar decisões que talvez eu nunca descubra
estar certas ou erradas?
Ele foi essas coisas, mas talvez ele também era sobre
saber quando dar um passo para trás. Havia força em se
afastar e também em perdão.

Para o garoto, talvez – mas não os outros.

— Solte-me, — disse Vicente.

— Mantenha os pulsos e os tornozelos amarrados. —


Cristiano pegou uma cadeira leve de plástico de um canto da
sala e a colocou no local onde Vicente estava parado.

O velho sentou, rolando o pescoço algumas vezes. —


Chegue mais perto, Natalia Cruz, — disse ele.

Minhas mãos formigavam. Ele disse meu nome como un


abuelo acenando para sua neta, como se ele sempre me
conhecesse. Cristiano voltou para o meu lado e colocou a
mão na parte superior das costas para me guiar em direção
ao velho.

Vicente olhou para cima, olhando entre nós dois. —


Quando seus pais caíram, Cristiano, não havia ninguém para
assumir o cartel. Vocês meninos eram muito jovens. Eu
queria os territórios de De La Rosa. Mas Costa teve o mesmo
pensamento. Então fomos à guerra por eles.

— Eu lembro, — disse Cristiano.

A presença de Cristiano, e sua palma grande e quente


nas minhas costas, me deu segurança para fazer perguntas.
— Quem ganhou?
— Não é tão simples, — disse Vicente. — Costa era mais
poderoso, e ele conseguiu, a princípio, ter jurisdição sobre
território suficiente para nos expulsar – mas com seus
próprios negócios expandindo mais rápido do que nunca, e
seu avô não estava mais por perto para ajudar, tornou-se
demais para ele lidar. Ele começou a perder o controle.
Ficamos mais famintos, lutamos mais e, em um ponto,
mantivemos a maioria. Então nós a perdemos. Para frente e
para trás, isso continuou. Uma guerra épica por território que
durou oito anos.

Meu queixo caiu. — Oito anos?

Eu olhei para Cristiano, que confirmou a história com


um aceno de cabeça. — Você era apenas um bebê quando
começou, — ele me disse.

— E tinha nove quando acabou, — eu disse


calmamente. Nove anos quando olhei para o chão com botas
sujas de sangue. Quando eu disse boa noite para minha mãe
pela última vez.

— Durante oito anos, vi meus homens morrerem, —


disse Vicente. — Primeiro, mulas, traficantes, depois
hermanos, primos, amigos, pais e filhos. Isso tinha que
terminar. Eu estava perdendo muitas pessoas. Meu sustento
sofreu.

Eu mudei de pé. — Como isso terminou?


Ele olhou para o chão, levantando e recolocando a
cadeira. — Seu pai não é santo, você sabe. Ele eliminou
linhagens inteiras.

Cristiano deslizou a mão até o meu ombro. — Responda


para ela.

Vicente levantou seus olhos cinzentos assombrados


para mim. — Foram negócios. Não foi pessoal. Até que
naturalmente, foi.

Calafrios se espalharam pelas minhas pernas nuas.


Coloquei minhas mãos nos bolsos do meu casaco. — O que
você quer dizer?

— Todo mundo sabia que Costa tinha uma fraqueza, e


apenas uma fraqueza. Com meu cartel diminuindo e prestes
a entrar em colapso, tive que fazer uma jogada ousada e
tomar tudo, ou morreríamos.

Eu sabia o que estava por vir. Apesar do desejo de


respostas por tanto tempo, parecer brutal, na verdade se
mostrou difícil. Eu queria me virar até Cristiano apertar meu
ombro de maneira tranquilizadora, mesmo quando a voz dele
ameaçava. — Continue, — ele ordenou.

— Nós matamos Bianca, — disse Vicente. —


Contratamos o assassino e fomos até o fim.

Sua confissão engrossou o ar já úmido na pequena e


suja câmara. Era isso. As peças finais no quebra-cabeça de
sua morte. Nada tão notável. Uma explicação pequena
demais para fazer justiça à sua vida vibrante. Uma história
que eu já ouvi muitas vezes – agarrar o poder que resultou
em vidas perdidas. Engoli em seco ao redor do nó que subia
na minha garganta. — Por que? — Perguntei, odiando como
minha voz falhou. — Por que ela teve que morrer?

— Para incapacitar seu pai, — Vicente disse


simplesmente. — Todo mundo sabia o quanto ele se
importava com ela, e que a morte dela o aleijaria. Então eu
formei meu plano em torno disso. — As correntes ao redor de
seus pulsos tilintaram quando ele apoiou os cotovelos nas
coxas. — Imediatamente após o golpe, esperávamos que
Costa fizesse uma de duas coisas. Primeira, que ele caísse em
uma dor tão profunda que mal notasse nossa invasão até que
estivesse completa. E então, já seria tarde demais.

— E a segunda? — Cristiano perguntou.

— Tirá-lo daqui. — Vicente lentamente levantou os olhos


para meu marido, inclinando a cabeça enquanto olhava para
Cristiano.

Quando ele não prosseguiu, Cristiano perguntou: —


Significado?

— O que você faria se alguém tirasse sua Natalia de


você? Até onde você iria? — Vicente perguntou, fazendo uma
pausa. — E quão fácil você se tornaria um alvo?

Cristiano ficou tenso atrás de mim, demorando um


momento para responder. — O assassinato de Bianca
colocaria Costa em uma queda livre. Ele perderia o controle,
— ele disse lentamente, trabalhando com isso. — Reaja por
paixão, não por lógica – ataque, torne-se vulnerável e se
mate.

Vicente assentiu. — Admito que violei uma regra tácita


entre cartéis naquela época – você não toca na família de um
colega. Mas eu estava desesperado. Fiz o que tinha que fazer
para salvar meu povo.

Apertei as mãos nos bolsos para tentar conter o tremor


que me atravessava. Eu entendi o raciocínio dele melhor do
que deveria. Ser uma responsabilidade para Cristiano e para
o meu pai quase me matou. — Olhe em volta, — eu disse. —
Você não os salvou.

— Não. Porque Costa não se expôs a retaliação como


esperávamos. Ele se escondeu em seu castelo para lamentar,
mas cercou-se de guardas e conselheiros, — Victor desviou os
olhos para mim, — mantendo sua filha pequena por perto.

A mão de Cristiano se moveu para a parte de trás do


meu pescoço, sob a minha linha do cabelo. Puxei minha gola.
Cristiano também estava suando, mas Vicente ainda mais. —
Isso não explica porque você saiu, — disse Cristiano.

— Os negócios de Costa continuaram normalmente, —


disse Vicente. — Ficou ainda mais forte, como vocês dois
sabem. E ficamos mais fracos. Perdemos qualquer
oportunidade de atacar, e lutar contra ele naquele momento
teria sido uma batalha perdida. Por isso, fazia sentido
arrumar o que restava da minha família e me mudar
— Mudança. — Cristiano bufou. — Você desapareceu,
praticamente da noite para o dia.

Ele assentiu. — Porque havia evidências me amarrando


ao assassinato de Bianca.

— Isso foi motivo suficiente para fugir? — Perguntei.

— Pense no seu marido, — ele me disse. — De como ele


reagiria no lugar de Costa. Se ele fez tudo isso para vingar
sua mãe, o que ele faria por você?

Eu não tive que considerar muito isso. Cristiano


perseguiu o assassino por uma década, para que ele pudesse
levá-lo aos pés de meu pai para desabafar.

— Eu vasculhei todas as pessoas que eu precisei,


arrancando as raízes apodrecidas do cartel responsável – até
que elas desaparecessem, — disse Cristiano e, baixinho,
acrescentou: — como farei com Belmonte-Ruiz.

Vicente assentiu. — Quando soube que as evidências


existiam, sabia que tínhamos que sair da cidade o mais
rápido possível. Se a verdade aparecesse, Costa iria me caçar,
e todos os membros da minha família, até sermos
erradicados. — Ele fez uma pausa para uma tosse seca no
ombro. — Foi à escolha certa. Especialmente desde que
soube, mais tarde, que Bianca foi estuprada naquele dia.
Sinto muito, Natalia. Isso nunca deveria acontecer.

Eu balancei, ou o chão debaixo de mim. Eu suspeitava


disso. Na verdade, no fundo, eu sabia disso. Com o tempo, eu
passei a entender seu vestido rasgado e os sinais de sua luta
pelo que era. Mas ninguém nunca me disse isso diretamente.

Cristiano me segurou pelo meu bíceps e disse contra o


meu ouvido. — Mantenha-se forte. Só por isso Vicente vai
morrer. Hoje, se ele tiver sorte. Ou com o tempo, se você
decidir.

Vicente olhou para os irmãos. — Já contei tudo o que


sei. Eu respondi suas perguntas. — Ele virou o rosto para a
frente. — Então você vai aceitar minha condição, Natalia?
Poupe minha família. Por favor. Gabriel é inocente. Meus
irmãos se opuseram ao assassinato.

Ainda me recuperando de tudo que acabei de saber,


minhas pernas ameaçavam ceder. Misericórdia? Ele não
estava em lugar para pedir. Eu não estava em lugar algum
para dar. Eu tinha conseguido o que tinha buscado. O que
Cristiano procurou para mim. Desfecho. Mas não parecia que
tinha terminado. Eu finalmente pude imaginar claramente o
que tinha acontecido nos momentos finais da minha mãe, e
isso me deixou doente. O medo que ela deve ter sentido –
passou por mim agora, deixando meu estômago fraco e
minha cabeça girando.

Um estranho no quarto que ela compartilhou com meu


pai.

— Vou levá-la para cima, — disse Cristiano, em algum


lugar distante. — Não vamos decidir nada agora.

— Claro, — respondeu Alejandro.


Encurralando-a. Violando ela.

Antes ou depois de invadir o cofre? E por quê?

Onde ele a encontrou? No banheiro dela, ao lado da


cama? Se ela estivesse no armário quando ele apareceu de
repente do túnel...?

Deixei Cristiano me guiar para a saída, incapaz de ver


através da minha névoa de perguntas crescentes.

Até...

— Espere. — Parei antes de chegarmos à porta,


plantando meus pés onde estavam. — Espere.

— Qué pasa, mi amor? — Cristiano perguntou. — O que


foi?

Eu me virei para encarar Vicente. Cristiano me soltou,


mas ficou perto. — Somente minha mãe, pai e eu sabíamos
da passagem secreta que o assassino usou para entrar no
quarto. Como você descobriu isso?

— Ah. Bem. Essa parte é simples. — O olhar de Vicente


viajou acima da minha cabeça e se fixou em Cristiano. —
Alguém ficou mais do que feliz em deixar a porta secreta
destrancada para nós. Para realizar o golpe, precisávamos de
uma pequena ajuda de dentro. E nós o encontramos – em um
irmão de La Rosa.

Não. Os arrepios começaram no meu couro cabeludo e


arderam sobre a minha pele. Cristiano, minha mente disse.
Ele tinha uma das maiores habilitações de segurança da
época. Por mais de onze anos, eu o culpei por esse crime. Eu
não tinha outra explicação. Seria fácil para mim colocá-lo no
papel de culpado. Virei minha cabeça por cima do ombro
para olhar para ele – meu marido.

Cristiano olhou para mim. Ele engoliu em seco, mas não


negou. Eu estava aprendendo a lê-lo melhor. Uma expressão
em branco que antes poderia parecer indiferença, agora era
paciência por quanto tempo levei para chegar aqui. Angústia
por não poder. Luta para não declarar sua inocência – e
acredite em mim que eu chegaria à verdade sozinha.

Meus pais confiaram nele. Ele tinha sido leal a eles. Ele
me trouxe tudo isso para vingar a morte de minha mãe. Eu
poderia compensar um pouco da minha falta de fé nele,
confiando que ele nunca teria cooperado com os Valverdes.

Mas se ele não tivesse, isso deixaria apenas uma


resposta. E não só transformou minha vida em mentira,
como também questionou tudo sobre mim, como pessoa.
Minhas escolhas, meus sentimentos, meu julgamento.

A dor da verdade permeava por mim, entorpecendo


minhas mãos, enrijecendo meu pescoço quando me virei
novamente para me dirigir a Vicente.

Eu mal me ouvi falar o nome que eu já venerava, mas


que continuava a cair ainda mais do seu longo pedestal
quebrado a cada dia. E agora, ao que parecia, finalmente
chegou ao fundo.— Diego.
13

Natalia

No ventre escuro e úmido da montanha, Vicente


Valverde confirmou a verdade. — Diego de La Rosa nos
deixou entrar no complexo do Cruz, — disse ele de uma
cadeira de plástico que balançava no chão irregular. — Mas
então, ele virou meu plano contra mim.

— Como? — A pergunta de Cristiano roncou através da


pequena sala.

— Um assassino só trabalha pelo melhor lance. Ele


vendeu a seu irmão a prova de que eu estava por trás do
assassinato, e Diego ameaçou me expor se eu não fosse
embora. — Ele respirou fundo enquanto sua expressão
escurecia, a primeira chama de raiva que eu já tinha visto
nele. — Eu deveria saber que se o bastardo trairia Costa, o
homem que o adotou quando menino, ele também se voltaria
contra mim.

— E nós, — disse Cristiano.

Vicente era apenas outro na longa fila daqueles que


Diego havia injustiçado.
Mas pelo menos com ele, eram negócios. Não para mim.
Isso foi profundamente pessoal.

— Um dos maiores erros que já cometi foi subestimar


Diego de La Rosa, — disse Vicente. — Espalhamos rumores
sobre nossas mortes e escondemos nossas identidades para
que ele nunca viesse nos procurar.

— Você era uma responsabilidade para ele, — disse


Cristiano. — Se alguém descobrisse que Diego havia ajudado.

— A vida de Diego terminaria. — Depois de outro ataque


de tosse, ele virou a cabeça e cuspiu na terra. — Com a morte
de Bianca, Diego se juntou a Costa, — disse ele e limpou o
canto da boca com o ombro nu. — Ele subiu na hierarquia do
cartel Cruz. Tornou-se um consultor de confiança. E abraçou
com tanta força a filha de Costa que ela faria qualquer coisa
por ele – incluindo se virar contra o pai se ele puxasse as
cordas certas.

Meu rosto aqueceu quando todos os olhares se voltaram


para mim. Eu felizmente me enrosquei nas garras de uma
cobra e nunca senti o aperto. Todos na sala também sabiam.

Incluindo Cristiano.

Eu fui uma tola.

Com minha mortificação, lágrimas aqueceram a parte de


trás dos meus olhos. Eu não conseguia mais ficar naquela
sala sem desmoronar. E nunca daria satisfação aos
Valverdes.
Eu já tinha ouvido o suficiente de qualquer maneira.

Virei-me e passei por Cristiano, correndo pelo corredor


subterrâneo que se parecia muito com um túnel, pelo
proverbial museu de partes do corpo, e subi as escadas.

Meus punhos tremiam. Não pensei em ir a algum lugar,


mas meus pés me carregaram em direção a casa.

Como é possível? Como?

Diego tinha segurado minha mão no funeral de minha


mãe e muitas vezes desde então. Ele escolheu meu vestido
para o serviço e trabalhou com o estado para arrumar a
papelada. Mais tarde, ele ajudou Papá com os detalhes da
organização do mausoléu elaborado que se tornaria o local de
descanso final da minha mãe.

Talvez minha cegueira ao seu verdadeiro caráter


pudesse ter sido desculpada na época, enquanto eu estava
sofrendo.

Mas pelos onze anos depois? Que desculpa eu tinha


para isso?

Peguei a maçaneta da porta para entrar na casa. Minha


mão tremia junto com o resto de mim, a ameaça de soluços
me imobilizando. Eu lutei para segurá-los. Eu não podia
desmoronar aqui, na frente da equipe, e onde alguém da
Terra dos Condenados poderia me encontrar. Eles e Cristiano
dependiam de mim para ser forte.

Eles eram tolos por depender de mim.


Se eu acreditava que isso fosse verdade sobre Diego,
tinha que admitir uma verdade muito mais assustadora.

Fui enganada e manipulada a tal ponto que nem sabia


quais partes de mim eram reais e o que havia sido moldado
por Diego.

Mãos me viraram pelos ombros e braços me cercaram,


me puxando para um peito forte e resistente. O grave
profundo e controlado da voz de Cristiano zumbiu no meu
ouvido. — Você está bem, — disse ele. — Eu estou com você.
Estou aqui.

Instantaneamente, meu corpo afrouxou, minhas


lágrimas cederam. Eu já havia sentido essa sensação de
segurança antes, respirando essa mesma mistura masculina
de suor e sujeira. Por mais improvável que tivesse sido, o
corpo sólido de Cristiano agiu como conforto no túnel. Eu
apertei seu pescoço, silenciosamente implorando para ele não
soltar, não me deixar para trás.

Mas essa não foi à única vez que eu fui acalmada dessa
maneira.

Dias depois, Diego me segurou nos braços dele, depois


enterramos Mamá.

O tempo todo, ele tinha sido responsável. Seu conforto


tinha sido uma mentira. Talvez Cristiano também estivesse
naquela época – talvez fosse agora.
Cristiano me guiou pelas escadas até o último andar. No
nosso quarto, ele me soltou para fechar a porta atrás de si. —
Natália...

— Todo Día de los Muertos, Diego acendeu uma vela por


ela, — eu disse. Olhei em volta da sala externa, sua lareira
silenciosa, cortinas de gaze branca, o espaço vazio onde o
espelho havia estado, um carrinho de bar onde Cristiano às
vezes preparava uma bebida à noite. Como eu tinha chegado
aqui? Fui transferida para este quarto como um peão. — Ele
trouxe sua sobremesa favorita para a casa, e flores para ela
como uma oferenda. — O afastamento da minha voz
combinava com minha postura flácida, meus punhos
enrolados. — Ele me ouviu falar sobre ela por horas. Ele me
segurou enquanto eu chorava.

— Ele manipulou você.

Deixando as lembranças, me virei para olhar para


Cristiano. — O que ele fez comigo semanas atrás, ele fez por
desespero. — Mesmo que eu achasse vil, pelo menos eu
poderia entender porquê ele mentiu para me levar para a
igreja – sua vida estava em risco. — Trocar-me por sua
própria segurança – é um ato de um homem desesperado. —
Virei meu corpo para Cristiano enquanto minha voz se
elevava. — Mas permitir que uma mulher que o tratou como
um filho seja estuprada e assassinada em seu próprio
quarto? — Eu gritei. — Isso não é desespero. É desprovido de
humanidade. Você sabia sobre isso?
Cristiano pegou minha raiva sem vacilar. — Eu tinha
suspeitas...

— E você não me contou?

— Elas não tinham sido confirmadas, — disse ele. —


Tudo o que eu tinha para continuar era o fato da porta ter
sido destrancada. E quando o peguei sozinho em La Madrina,
pude ver em primeira mão como ele estava bravo com Costa...

— Por...?

— Por matar nossos pais.

A resposta foi fácil, porque eu já havia superado esse


cenário um milhão de vezes na minha cabeça. Só que nunca
foi o gentil Diego que estava guardando rancor. Tinha sido
seu irmão ameaçador e cruel.

Meu corpo tremia tão violentamente que as lágrimas


quase caíram. Eu os mordi de volta. Vingança contra meu pai
por matar os de La Rosa. Eu estava certa o tempo todo – mas
nunca estive tão errada.

Meus membros enfraqueceram com a agitação do meu


estômago. Estendi a mão para me equilibrar em alguma
coisa, preocupada em vomitar.

— Venha, deixe-me abraçá-la, — disse Cristiano, dando


um passo à frente enquanto me alcançava.

Instintivamente, eu me afastei, meus olhos no chão


entre nós.
Uma vez eu o achei incapaz de sentir dor, mas não
precisava ver seu rosto para saber que o machuquei.

Ele deixou o braço cair ao lado do corpo, caminhou até o


carrinho e serviu-se de uma bebida.

Por que eu estava o excluindo? Cristiano não era o


culpado por isso. Ele também foi vítima das maquinações de
Diego. Eu me instiguei a ir até ele. Seu corpo, palavras e
ternura mantinham conforto.

Mas o mesmo aconteceu com Diego. Eu encontrei uma


casa nele mais vezes do que eu poderia contar, e cada vez eu
era mais tola. Diego foi à razão de minha mãe estar morta; o
que fazia cada toque dele, cada palavra, uma mentira.

Meu julgamento não era confiável.

Eu estava emocionalmente vulnerável quando Diego me


ajudou a pegar os pedaços da minha vida destruída após a
morte dela. Ele aconselhou meu pai na hora mais sombria e
me transformou na garota que ele queria que eu fosse. Quem
diria que Cristiano não fez o mesmo, cortando
propositalmente meu relacionamento com Diego para que ele
pudesse preencher o vazio que restava? Para que ele pudesse
me transformar em sua rainha, como costumava dizer?

Meu passado tinha sido uma mentira.

A fundação em que construí minha vida não passava de


fumaça e espelhos.

E estava desmoronando sob meus pés.


Minha mente repetiu uma das poucas conversas que
tive com Diego sobre seus pais. Talvez a única conversa
honesta que já tivemos.

— Você já pensou em se vingar pela morte deles?

Diego não respondeu imediatamente. Conforme os


segundos passavam, eu fiquei inquieta. Havia apenas uma
pessoa que ele se vingaria. Meu pai.

— Nos meus momentos mais sombrios, sim, — ele


admitiu.

Diego havia me interpretado.

De repente, Cristiano estava na minha frente, segurando


um copo com alguns goles de licor puro e âmbar. — Você está
em choque. Beba. Isso vai ajudar.

Eu peguei dele. Cheirei. Bebi, segurando na minha


boca. Conhaque. Engoli em seco e devolvi. Isso aliviaria a dor
por um tempo, mas eu não queria isso. Eu tinha que sentir
os erros que cometi.

— Eu sei que você está sofrendo. E nem se for a última


coisa que vou fazer... — Ele bebeu a bebida e agarrou o copo
enquanto dizia: — Diego pagará por isso.

— Ele disse que me amava. — As palavras caíram


suavemente sobre a minha língua de conhaque. — Eu o amei
de volta.
— Se isso é tudo o que é preciso, eu também vou te
amar. Mais do que ele jamais fez. Mais do que ele jamais
pôde.

Meu coração o alcançou. Era incompreensível o quanto


eu queria isso depois de odiar Cristiano por tanto tempo. E
que depois de todas as maneiras que eu o afastei, ele ainda
estava parado aqui. — Como? — Eu quase engasguei. Como
ele ainda não havia corrido para as colinas? — Você me
manipulou também. Você me forçou a esse casamento, me
trancou nesta casa e fez eu me apaixonar por você.

— Natalia. Minha querida. — Ele pegou meu queixo na


mão livre e puxou meu rosto para ele. — Eu me apaixonei por
você primeiro.

— Então por que você quase morreu por mim? —


Agarrei sua camiseta para empurrá-lo para longe, mas não
consegui fazê-lo. Eu já tinha perdido muito – mas com
Cristiano, por que parecia que eu tinha mais a perder do que
nunca? Puxei-o para mais perto enquanto meu queixo
tremia. — Eu o odeio. Me ajude a esquecer. Você prometeu
que me faria esquecer o nome dele.

A expressão de Cristiano endureceu quando ele apertou


a mandíbula e desviou o olhar. — E eu disse para você nunca
mais vir para mim, se ele for o motivo. Não vou te foder para
fazer você esquecer o nome dele.

— Então me foda, então eu saberei apenas o seu. Eu


estou disposta. E eu preciso disso, Cristiano.
Seu peito arfava com uma inspiração. O que ele estava
esperando? Ele teve sua permissão. Não que ele ou alguém
precisasse. Se eu pude ser enganada a dormir com o homem
que enganou minha família da pior maneira, e se minha mãe
poderia ser forçada por um estranho, então realmente – que
porra isso importava? O que havia de tão especial nisso?

Peguei o copo vazio, coloquei na mesa de cabeceira e


deslizei a mão entre nós para tocá-lo. Meu corpo se
emocionou quando ele se mexeu contra a palma da minha
mão. Nada poderia me acalmar agora, exceto isso. Exceto por
ser tão difícil, eu não conseguia pensar em mais nada. — Isso
é o que você queria, — eu sussurrei para ele. — É o que eu
quero.

— Eu não posso, — disse ele, sua voz estrangulada, mas


determinada. — Assim não. Você está com dor e está com
raiva.

— Mas eu estou disposta. — Eu agitei meus cílios para


ele. — Estou lhe dando esse presente...

— Eu não vou fazer isso.

Frustração passou por mim. — Então me deixe em paz!


— Eu gritei quando o empurrei. — Saia. ¡Vete ya11!

Eu me afastei, a fúria me devorando por dentro. Como


ele poderia me afastar quando eu precisava dele?

11 Vai embora já!


Ele se sentia diferente agora que percebeu o quanto eu
havia sido enganada?

Eu era uma traidora para minha mãe.

Mas e daí? Cristiano me levou onde ele me queria. Por


que não pegar o que muitas vezes proclamava pertencer a
ele?

Quando ele falou novamente, sua voz estava ainda mais


calma contra a minha raiva ecoando pelo quarto. — Você
disse que Diego a amava, mas você está errada, Natalia. O
amor é eu morreria por você, não você morreria por mim? —
Com sua pausa, suas belas e inquietantes palavras pairaram
no ar. — Diego tinha um certo carinho por você, sim, mas
não era suficiente. Ele tirou sua virgindade depois de
manipular você para oferecê-la, mas agora vou me afastar de
você para mostrar a diferença entre o amor dele e o meu.
Mostrar a você que o verdadeiro amor significa colocá-la em
primeiro lugar. Sempre.

Suas palavras me atingiram no meu âmago. Cristiano


faria o que Diego não poderia – desistiria do que queria, do
que lutou, do que o tornaria mais poderoso. Por mim.

— É disso que você precisa? — Eu ouvi a hesitação em


sua voz. Não foi fácil para ele não fazer nada quando toda a
sua vida foi sobre ação. — Espaço?

Vergonhosamente, fiquei de costas para ele. Eu não


conseguia olhar para o rosto bonito e dolorido e lembrar que
eu tinha escolhido o irmão errado naquela época – ou eu caía
tão profundamente em um buraco negro de arrependimento
que não tinha certeza de como sairia. — Sim.

— Eu estarei lá embaixo, se você precisar de mim.

Depois de um momento, a porta se fechou com um


clique suave.

Se você precisar de mim. Um silêncio ensurdecedor


permaneceu em seu rastro.

Dezenove anos atrás, Cristiano tinha procurado meu pai


em busca de ajuda. Isso terminou em uma bala na cabeça de
seus pais, com ele e Diego assistindo. O que aconteceu nos
oito anos desde então? Como isso os mudou? Quem eu teria
me tornado se Diego não estivesse lá?

Eu o deixei me acalmar, beijar e tocar, quando ele era o


vilão o tempo todo. E Cristiano tinha sido o herói, me
mostrando respeito, mesmo quando eu era um peão.

Eu confiei nele. Mas eu poderia confiar em mim mesma


com ele?

Eu o acusei dos crimes de seu irmão várias vezes. E


mesmo agora, ele tomou cada golpe que eu tinha para dar e
voltou para mais. Ele não revidou ou me deixou para cuidar
de mim mesma.

A pressão no meu peito diminuiu quando tudo que eu


sabia sobre Cristiano finalmente ficou claro. Desde tenra
idade, ele defendeu aqueles que não podiam se defender. Ele
traiu sua família – um pecado ainda maior em nosso mundo
do que trocar vidas humanas – e se uniu à nossa por um
senso de dever. E ele foi punido por isso. Acusado de um
crime que não cometeu, foi afastado e perseguido pelo
verdadeiro criminoso.

A verdade de Cristiano caiu em ouvidos surdos. E, no


entanto, ele confiou em mim para curá-lo.

Eu não podia acreditar em mim naquele momento, mas


Cristiano entendeu isso. Foi à razão pela qual ele se afastou.
E foi por isso que eu pude acreditar nele.

Eu me virei, corri pela porta e pelo corredor até


encontrar Cristiano descendo as escadas. — Espere, — eu
disse.

Ele voltou instantaneamente, a preocupação gravada


nas linhas de seu rosto. — O que foi?

Eu olhei para ele e vi outra pessoa. Eu o vi. Meu


protetor quando criança e meu protetor agora – contra
inimigos que se fizeram conhecidos e o tipo muito mais
perigoso. Aqueles que não fizeram.

Cristiano era meu aliado. Ele era a vítima.

E ele era meu marido.

— Eu... não preciso que você vá embora para provar seu


amor. Eu preciso...

Ele voltou a subir as escadas. Quando ele chegou ao


patamar, ele abriu a boca para falar, mas eu terminei de
falar. Agarrei suas bochechas, puxei seu rosto e o beijei com
tudo o que eu tinha. Ele me puxou contra seu corpo, um
braço forte em volta da minha cintura e me ancorou quando
ele pegou um punhado do meu cabelo na parte de trás da
minha cabeça. Como eu já o achei frio? Ele estava todo
quente agora, enquanto sua boca ansiosa, apimentada com
conhaque, me atraía, nossas línguas se açoitavam. Então ele
parou. Recuou. Retardou o beijo com beijinhos curtos em
seus lábios carnudos. Seu punho no meu cabelo relaxou,
massageando meu couro cabeludo e, em seguida, embalando
minha cabeça.

— Shh, — ele disse, passando a boca na minha


bochecha, que estava molhada de lágrimas silenciosas que eu
não tinha percebido que tinha derramado.

Eu me afastei para olhar em seus olhos. A dor neles, o


puro alívio, me machucou. Diego quebrou nossos corações e,
muitas vezes, Cristiano e eu nos machucamos. Foi o
suficiente. Minha voz vacilou quando minhas lágrimas caíram
mais rapidamente. — Eu... eu preciso de você.

— Eu não vou a lugar nenhum. Nem agora, nem nunca.

Em um momento, eu estava em seus braços quando ele


me carregou de volta para o quarto, me deitou na cama e
tirou meu tênis e meias.

Agarrei sua mão enquanto ele se levantava. — Não vá.


Ele se inclinou para a frente e afastou os cabelos da
minha bochecha. — Eu quis dizer o que disse. Não vou sair
do seu lado.

Ele passou por cima de mim, deslizou por baixo das


cobertas e me abraçou contra seu peito. Na última hora, a
única coisa que eu consegui controlar foram meus soluços.
Sabendo que Cristiano me tinha, eu os soltei, quebrando no
meu travesseiro enquanto ele sussurrava suavemente no meu
ouvido, seu aperto em volta de mim nunca diminuindo.

— Eu a decepcionei, — eu disse através dos meus gritos.


— Eu escolhi o inimigo.

— Shh, — ele disse, acariciando meu ouvido. —


Reconheça o fato de Bianca te amar mais do que qualquer
coisa no mundo. E que agora todos teremos o desfecho que
merecemos.

Desfecho. Era para isso que Cristiano havia arriscado


sua vida. Para me dar respostas, sabendo que elas me
machucariam, quando ninguém mais o faria.

O garoto que brincou com meu coração não era páreo


para o homem que, eu tinha certeza, me amava há um
tempo.

Lágrimas encharcaram meu travesseiro, mas nem todas


vieram da dor quando um pensamento se formou. Uma
traição completa e minuciosa me deu o maior presente que
eu nem sabia possível – a permissão para me apaixonar por
meu marido.
— Obrigada, — eu sussurrei.

Ele me apertou contra ele. Para qualquer outra pessoa,


ele era um chefe, um líder, um assassino. Para mim, ele era
apenas Cristiano. Até muito recentemente, eu não o deixei
ser assim.

Meus olhos inchados doíam. Eu os fechei, subitamente


exausta. Ele sabia melhor do que eu o que eu queria e o que
eu precisava. Finalmente, eles eram a mesma coisa. Durante
anos, eu tentei escapar da verdade, mas estava começando a
ver.

Esse era o meu destino.

Era ao lado de Cristiano.

Ele era o homem que eu queria, e agora eu sabia – ele


era o que eu precisava.
14

Natalia

Os destroços emocionais do dia anterior pareciam


físicos. Estava ao meu redor – e Cristiano e eu éramos uma
unidade no meio dela. Em algum momento da noite, eu tirei
minhas roupas e adormeci nua em seus braços. Seu corpo se
enrolou em torno do meu com tanta força que éramos
praticamente um. Suas pernas musculosas prenderam
minhas coxas, entrelaçadas com minhas panturrilhas. Seus
braços prenderam minhas costas em seu peito e nossos
dedos entrelaçados.

O amanhecer havia começado em um novo dia, e o


quarto ao meu redor não era o mesmo.

Os azuis eram mais ricos, os brancos mais brilhantes e


os dourados brilhavam como se tivessem acabado de ser
polidos. Uma brisa agitou as cortinas e esfriou minha pele
exposta quando o corpo de Cristiano aqueceu o resto de mim.

Cristiano não era o mesmo.

Ele sofreu por mim e por minha causa. Ele nunca seria
inocente, mas não era culpado do único crime que me
impediu de confiar nele. De cair nele.
Tudo mudou.

Haviam consequências a serem tratadas, concessões a


serem feitas e erros para corrigir – começando aqui em uma
cama que eu conhecia como minha.

Eu sabia o que havia pela frente. Eu sabia o que tinha


que fazer.

Eu não era a mesma.

Minhas decisões foram tomadas antes mesmo que eu


abrisse meus olhos.

Adormeci no casulo de Cristiano e acordei


transformada.

— Você acordou, — disse Cristiano.

Eu nunca pensei que o som e a sensação de sua voz


contra o meu ouvido pudessem trazer uma sensação tão
completa de calma e segurança. — Fique, — eu disse. — Eu
não podia dizer isso antes, no telefone, mas estou dizendo
agora. Não me abandone. E...

— E o que?

Engoli. — Eu sinto muito.

— Você não tem nada para se desculpar. Eu tenho.

Isso era verdade, mas eu nunca esperei ouvir um pedido


de desculpas de sua boca. Eu me mexi sob os lençóis, e ele
afrouxou seu aperto em mim para que eu pudesse me virar e
encará-lo. O quase preto de seus olhos não me enganava
mais. Eu vi profundidade onde uma vez tinha visto desolação.
Amor onde eu assumi que havia ódio. E uma força que
sempre esteve lá. — Por quê?

Seus braços me puxaram para tão perto que mal


tivemos que sussurrar. — Eu não deveria ter me gabado do
jeito que fiz depois de beijar você no dia do nosso casamento.
Deixei Diego me pegar.

De todas as coisas pelas quais ele tinha que se


desculpar, isso nunca passou pela minha cabeça. — Você
pagou o preço por isso, — lembrei a ele.

— Eu mereci o tapa. O beijo foi tão real quanto qualquer


outra coisa entre nós. Deveria ter sido o nosso momento, mas
eu o deixei roubá-lo. Eu me arrependi do meu erro
imediatamente. — Ele afastou uma mecha do meu cabelo da
minha bochecha. — E o vestido de noiva. Eu não sabia que
era da Bianca quando rasguei.

— Você consertou, — eu disse.

— Mas nunca será o mesmo. — De alguma forma, seu


olhar escureceu ainda mais. — É tudo pelo que sinto muito,
no entanto, não importa que tipo de monstro isso me faça.
Não posso me desculpar por qualquer coisa que me trouxe
até aqui. Eu tirei você do curso de uma vida que poderia ter
sido certa para você e te trouxe por um caminho traiçoeiro.
Minha estrada de terra com todos os seus buracos. — Ele
falou com a satisfação de uma criança que foi pega roubando
a sobremesa depois que ele encheu a barriga. — Não sinto
muito pelas coisas das quais devo me arrepender – a
tatuagem foi fodida, mas toda vez que a vejo, eu me orgulho
de ver que você é minha. Os homens de La Rosa são escória,
mas eu libertei você de um, só para acorrentá-la a outro.

— E você não está arrependido, — esclareci com alguma


diversão.

— Dizer isso seria mentira – eu faria tudo de novo.

— Eu me arrependo, — eu disse. — Bem, eu tenho


alguns arrependimentos, eu acho.

Ele beijou minha testa. — Jogue-os fora, — disse ele


contra a minha pele. — Eles não valem a pena expressar.

— Eu tenho que dizer um, então eu vou jogar fora. —


Cristiano exigiu uma coisa de Diego e eu antes do casamento,
e eu não tinha lhe dado isso. Tinha que ter sido importante
para ele. Eu pisquei para ele. — Gostaria que minha primeira
vez não tivesse sido com Diego. Eu pensei que queria. Eu
pensei que ele era digno.

— Não me importo que ele tenha tido você primeiro, —


disse Cristiano, me chocando em silêncio. — Não significa
nada. Ele não significa nada. — Ele passou a língua ao longo
da linha superior de dentes. — Será o que pensarei quando
finalmente enfiar uma bala nele, mas ainda assim, isso não
significa nada.
Eu não pude evitar um pequeno sorriso. — E se eu
chegar primeiro?

— Você tem que encontrá-lo primeiro.

— Você não sabe onde ele está?

Ele balançou sua cabeça. — Se ele estiver trabalhando


com Belmonte-Ruiz, poderá estar com Max. Espero que um
leve ao outro. — Seus olhos avaliadores encontraram os
meus. — Mas a nostalgia é uma coisa engraçada, Natalia. Se
Diego estivesse aqui agora, você não seria capaz de puxar o
gatilho. Tem muita história lá.

Colocando o lençol debaixo do braço, eu apalpei um


cotovelo. — Me dê mais crédito do que isso. Minhas viseiras
foram cruelmente arrancadas. Eu riria na cara dele se ele
tentasse sair do assunto.

— E você sabe que ele faria.

Toquei a bochecha de Cristiano, passando o dedo pela


mandíbula quadrada e angular. Eu nunca neguei sua beleza,
não importa o meu ressentimento por ele. Agora, eu estava
livre para me divertir. Não queria mais esperar. — E você
sabe o que eu diria para ele?

— Diga-me, mi amor.

— Que o irmão dele me fodeu melhor do que ele jamais


poderia esperar. E que estamos enviando-o para um túmulo.
— Então acho melhor eu te foder, para não fazer você
mentirosa. — Cristiano mordeu o lábio inferior, e a pequena
revelação de sua excitação fez meu estômago apertar. — Eu
esperei muito tempo por isso.

— Eu sei.

— Eu não quero dizer sexo. — Ele se inclinou para mim


até eu cair de costas, e seu rosto bonito e escuro olhou para
mim. Ele puxou o lençol para o meu estômago, e eu respirei
fundo enquanto o ar fresco acariciava meus mamilos.
Lambendo os lábios, ele passou um dedo entre os meus seios,
provocando o meu tremor. — Eu esperei você parar de agir
como uma princesa e começar a pensar como uma rainha.

— Nada menos pelo meu rei.

— Eu não era rei até você aparecer. Tu me coronaste12.


Você me coroou.

Parei a mão dele antes de mergulhar embaixo dos


lençóis. — Você não pode simplesmente invadir as muralhas
do castelo. Você precisa de uma estratégia.

Ele moveu a mão para inclinar meu queixo e roçar o


polegar sobre meu lábio inferior. — Qual deveria ser a nossa,
mi reina?

— Invada, saqueie e destrua até eu implorar pela


misericórdia do rei, — eu disse suavemente, deixando minha
respiração acariciar seu dedo. Eu empurrei seu peito. Ele

12 Você me coroou
rolou de costas e joguei um joelho sobre ele para sentar em
seus quadris. — Você me levou como prisioneira. Mas você
cometeu o erro de se apaixonar por mim. E quando você
menos esperar, reivindicarei meu trono.

— Nada agradaria mais um camponês como eu. — Ele


agarrou meus quadris e me puxou sobre sua virilha. Inalei
quando meu clitóris nu deslizou ao longo da ereção forçando
sua cueca. — Mas há mais em ser rainha do que sentar no
cetro do rei.

Meus seios balançavam e meus cabelos longos se


acumulavam em seu peito. — O que então?

— Você tem decisões a tomar. O destino de quatro


homens está em suas mãos.

Eu enrolei meus punhos em seu peito. O capricho de


nossa cama sonhadora e as primeiras horas da manhã deram
lugar a uma realidade brutal. Apenas um homem pagou o
preço pela morte de minha mãe. Os outros aguardam minha
sentença.

Que tipo de rainha eu seria? Justa e misericordiosa ou


astuta e cruel?

Cristiano pegou meu mamilo direito entre as pontas do


dedo indicador e do polegar. Respirei fundo quando ele
puxou, e o prazer viajou pelo meu estômago, terminando bem
entre as minhas pernas. — Mesmo em tempos de brincadeira,
você não pode esquecer que há inimigos a serem enfrentados.
Você está segura comigo, mas nunca deve abaixar
completamente a guarda.

Assim como no combate físico, a luta estava em


andamento.

— Vicente fez a ligação, — ele disse, — mas ele e sua


família são agora ninguém. Eles pagaram por seus erros.

Eu congelei, meus batimentos cardíacos reverberando


em todos os lugares, desde meus ouvidos até minha boceta.
— Você está dizendo que ele não tem culpa? — Perguntei
incrédula. — Que eu deveria perdoá-lo?

Ele colocou um pouco do meu cabelo atrás da orelha,


mas ele caiu para a frente novamente, nos escondendo do
resto do mundo – minha nova coisa favorita. — Simplesmente
demonstre que você pode governar de duas maneiras. Com a
verdade que você quer ou com os fatos. E o fato é que você
não terá muita satisfação matando três homens velhos e um
adolescente inocente.

— Então eu deveria deixá-los ir?

— Isso é com você. A maioria dos homens diria para


matar os quatro.

— O que você diria?

Suas pálpebras caíram quando ele deslizou a mão pela


minha espinha e aplicou pressão na minha parte superior
das costas. Inclinei-me até ficarmos cara a cara, meus seios
esmagaram seu peito nu, meu clitóris empurrando contra ele
em um novo ângulo. — Eu não sou a maioria dos homens.

— Não, você não é. Eu pensei que você era o pior deles,


mas você é justo.

— É justo que eu matasse um homem pelos pecados de


seu avô?

O neto. Se acreditássemos em Vicente, seu nieto,


Gabriel, era inteligente. E ele tinha toda a sua vida pela
frente. — Você faria? — Perguntei.

— Seríamos tolos por ignorar a história. Há muito risco


de deixar algum deles viver. A traição corrompe, olhe para
Diego.

— Olhe para você, — eu disse, enfiando meus dedos em


seus cabelos, colocando nossos lábios a centímetros de
distância. Eu queria vingança – não apenas para mim, mas
para meu marido, que havia sofrido – e seria tão fácil juntar
Gabriel com os outros. Virar meu rosto enquanto ele pagava
pelos pecados de sua família. Mas eu estaria ignorando a
história de Cristiano, que também era minha história. — Você
não cumpriu com o seu pai o dever familiar como os outros
teriam. Você escolheu o bem e o mal. Talvez Gabriel também.

— Verdade. Mas aqui estou eu, fazendo tudo ao meu


alcance para vingar a morte de Bianca. E eu faria o mesmo
por você. O neto pode não se sentir ressentido agora, mas
isso não significa que ele não vai. — Sua mão mergulhou
para cobrir minha bochecha direita. Um pouco mais abaixo e
à esquerda, e ele seria capaz de aliviar a dor pulsante que
crescia entre minhas pernas por mais tempo do que eu
queria admitir. — Ser líder vai muito além de usar uma coroa
e fazer exigências, — disse ele com um aperto. — Nenhuma
decisão é fácil. Farei esta para você, se você me pedir, mas
não se acostume.

Ele queria que eu ficasse sozinha e assumisse o controle


dessa vida. Se eu estava prestando atenção, era o que ele
estava pedindo de mim o tempo todo. Mas depois de anos
tentando abafar minha curiosidade e permanecer
voluntariamente no escuro, acabei com isso. Eu não deixaria
ele decidir por mim.

Eu mudei meu peso nele. — Eu sabia o que queria fazer


desde que acordei.

— Sim? — Ele inclinou a cabeça. — Conte-me.

— O neto pode viver. Se você achar melhor, ele pode


trabalhar aqui na Terra dos Condenados para você. — Eu
encontrei seus olhos. — O resto pode morrer.

Ele parou. — Natália.

Fiz um punho no cabelo dele e olhei nos olhos dele, para


que ele soubesse que eu quis dizer cada palavra. — Eu não
me importo como você faz isso, mas acabe com Vicente e
cada um de seus irmãos. Quero despejar suas cinzas na base
do túmulo de minha mãe para que suas almas sem valor
possam passar a eternidade beijando seus pés.
Eu assisti minha mãe morrer, e cada pessoa envolvida
pagaria.

Incluindo, se eu pudesse, o filho da puta que arruinou


minha vida.
15

Cristiano

Eu nunca tinha estado mais excitado em todos os meus


trinta e quatro anos. Eu merecia uma medalha por minha
abstinência desde a chegada de Natalia. Com o jeito que ela
estava afundando no meu pau, e com a ordem dela de
executar três homens em seu nome – eu estava em um
foguete em direção à lua. Ela estava pronta para mim. Eu
podia ver nos olhos dela quando seus cabelos caíram ao redor
do rosto, implorando para serem enrolados no meu punho.

Mesmo através da névoa, porém, sua dor ainda era viva


e forte. Isso foi bom. Ontem à noite, ela estava muito
profunda nisso, e levaria um tempo antes de desaparecer.
Mas agora que ela passou a noite sofrendo nos meus braços,
me deixando confortá-la, eu daria a ela alívio e libertação.

— Seria uma honra vingar você e Bianca, — eu disse.

Ela deslizou os quadris para frente e para trás, deixando


uma mancha molhada na virilha da minha cueca. — Existe
algo que você não faria por vingança?

— Você sabe que é mais complicado que isso. A


retribuição pode consumir tudo. — Lutei para organizar meus
pensamentos com sua fenda pulsante cada vez mais
gananciosa, mas essa conversa era importante. — Nunca
deixarei a vingança governar minha vida como meu pai e
Diego. Essa é a minha promessa para você. Para mim, minha
esposa, família e pessoas vêm primeiro.

Ela pairou seus lábios suculentos e deliciosos acima dos


meus. — Eu quero saber como é a sensação de vir primeiro,
— ela sussurrou.

Com um grunhido curto, deslizei a mão em seus


cabelos, puxando-a e segurando-a onde ela estava. — É um
caminho que você não pode voltar.

Eu precisava da permissão explícita dela, mas não


estava disposto a jogar sujo para obtê-la. Com a outra mão
em seu quadril, peguei um punhado de sua bunda e
empurrei minha pélvis, batendo meu eixo contra seu clitóris.

Os olhos dela reviraram. — Faça isso de novo.

Implorar. Exigir. Diga-me para te foder cru.

Tinha que ser sobre mim e ela e nada mais. Ela tinha
que querer isso mais do que queria resistir a mim ou
machucar Diego. Minha ereção estava ficando dolorosa, mas
eu precisava que ela pedisse, e que fosse agora.

Com uma batida na porta, nós dois congelamos. —


Senhor ? — Veio à voz de Jaz.

Fechei os olhos e suspirei. Deus, me dê um momento de


prazer ininterrupto nesta vida. Eu não merecia o prazer
requintado de foder minha esposa excitada pela primeira vez?
— Vete, — eu gritei, mandando Jaz embora.

— Es importante, — ela respondeu.

— Importante? — Natalia zombou. — Não. Ela tem um


sexto sentido para quando você e eu estamos chegando perto.
Ela quer ficar entre nós. Ignore.

Se isso era verdade ou não, Jazmín era intuitiva o


suficiente para saber quando era necessária e quando deveria
se tornar escassa. Peguei as bochechas de Natalia com as
duas mãos e apertei com força o suficiente para enviar a
mensagem de que esse culo 13 era meu quando voltasse –
depois a tirei da minha virilha e me levantei para me vestir.
— Pode ser sobre Max.

Enfiei minha mão nas calças e tentei acalmar minha


raiva enquanto atravessava o quarto. Eu a escondi com a
porta enquanto inclinava a cabeça para fora. — Qué quieres,
Jaz? Não é um bom momento.

— Alejandro quer você lá embaixo imediatamente.

— Puta madre, — amaldiçoei. — É sobre o que?

Ela encolheu os ombros. — Eu deveria apenas te


chamar.

— Natalia precisa de mim aqui. Ela não quer ficar


sozinha.

13 Bunda.
— Claro que não. Ela quer que você seja só para ela,
mesmo que os outros precisem de você.

Eu fiz uma careta para ela e avisei: — Jazmín.

— Sinto muito, mas é verdade, — disse ela, virando-se.


— Alejo está esperando por você.

Suspirei e fechei a porta antes de ir para o meu armário.


— Sinto muito, mi amor.

— O que foi? — Natalia perguntou.

Eu vesti uma camiseta, movendo-me rapidamente para


que eu pudesse acabar com isso. — Eu sou necessário lá
embaixo.

— Você é necessário aqui, — ela chamou da cama. —


Você sempre vai quando Jaz chama.

— Eu não vou. Isso é assunto da Terra dos Condenados.


— Ao sair do quarto, parei no meu caminho. A interrupção
cuidou da minha ereção, mas que, de repente, ameaçou
retornar. Natalia sentou-se de costas contra a cabeceira da
cama, o fino lençol branco debaixo dos braços, mal
escondendo as bagas rosadas implorando para serem
devoradas. Seus longos cabelos desgrenhados caíam em
torno de seus braços nus. Eu resisti a ela por tanto tempo, e
agora que eu a tinha, estava deixando-a nua e querendo em
nossa cama?
— Qué pendejo14, — murmurei sobre mim.

— O que aconteceu com 'este é um caminho do qual


você não pode voltar'? — Ela acusou. Com o aço em sua voz,
encontrei seu olhar. — Acho que inclui a cláusula 'a menos
que Jaz precise de mim'.

Ela estava chateada, e eu estava perto o suficiente para


dizer foda-se e voltar para a cama. Especialmente
considerando o lado possessivo de Natalia por si só era sexy o
suficiente para me fazer ir de novo. Mas se as notícias de
Alejandro tinham algo a ver com Max, eu tinha que ir. E eu
tinha que fazer isso agora, antes de mudar de ideia.

— Volto o mais rápido que puder. Te prometo. — Com a


minha promessa, me inclinei no quadril e a beijei com força e
rapidez, antes que ela – ou meu pau – pudesse protestar. —
Não se mexa um centímetro.

Desci as escadas para o centro de controle do porão


escuro e encontrei Alejandro esperando com os braços
cruzados sobre o peito.

14 Que idiota.
— É melhor que seja bom, — eu disse. — Você acabou
de me colocar na casinha do cachorro com Natalia. Ela
precisa de toda a minha atenção agora.

— Ela perdoará o cachorro se ele pegar um rato para


ela.

Eu arqueei uma sobrancelha para ele enquanto


seguíamos pelo corredor em direção aonde Vicente e sua
família permaneciam acorrentados e silenciados. Em vez
disso, ele me levou para uma sala diferente. Sentado sozinho
no meio estava Gabriel, neto de Vicente, com as mãos
amarradas na frente dele.

Alejandro arrancou a fita da boca do garoto e assentiu


uma vez. — Diga a ele o que você me disse.

Gabriel esticou o queixo, mas manteve os olhos baixos.


— Posso te ajudar.

Eu segui seu olhar para um par de óculos quebrados no


chão. — Olhe para mim, garoto, — eu disse.

Ele levantou os olhos temerosos, piscando rapidamente


e apertando os olhos. Talvez ele precisasse desses óculos. —
Eu posso ajudá-lo a encontrar Max, — disse ele.

Eu deixei meus olhos vagarem sobre o garoto magro. Eu


tinha certeza de que pesava mais que ele aos oito anos de
idade. — Como?
— Meu avô disse que eu posso encontrar coisas na
Internet – é como chamar Lionel Messi de bom jogador de
futebol.

— Lionel Messi, não é? Você é fã de esportes? —


Perguntei, ciente de quão sinistra minha risada soava quando
olhei para Alejandro. — Você me afastou da minha esposa
triste por isso?

— Codificação, vigilância, dark web, — o garoto falou


rapidamente, tropeçando em suas palavras, como se estivesse
implorando por sua vida. — Eu posso fazer tudo isso. Eu
construí meu primeiro computador a partir de peças
descartadas. A Internet é minha caixa de areia... e isso faz do
mundo meu playground.

— Minha equipe de inteligência é incomparável, — eu


disse. — Eles vêm de todo o mundo. Pequim, Rússia, São
Francisco...

— Com todo o respeito, senhor, se isso fosse verdade,


você não teria sofrido uma grande violação de segurança no
início deste mês, quando Belmonte-Ruiz atacou sua casa.

Alejandro parecia satisfeito – então, foi por isso que me


chamou aqui. Eu, por outro lado, não estava tão feliz. —
Como diabos você sabe disso? — Eu perguntei, dando um
passo à frente.

— Durante toda a minha vida ouvi falar da coragem e


glória de meu avô, tios-avós e do cartel que eles construíram.
Desde que fomos forçados a nos esconder, tive que ficar
invisível a vida toda. Agora, sou melhor em me esconder do
que ninguém e sei como obter informações. De você, de
Belmonte-Ruiz... mesmo de Diego. — Ele engoliu em seco. —
Quando soube que ele havia chantageado minha família para
desaparecer, me interessei por ele. Eu o acompanho há muito
tempo.

— Você sabe onde ele está? — Perguntei.

— Não, mas me dê uma chance. Eu posso encontrá-lo.

— Por que eu deveria acreditar em você?

— Seus homens aprenderam a invadir, mas eu nunca


conheci uma vida sem isso. Eu sou isso. Eu nunca fui à
escola. Eu só conheço computadores. Deixe-me treinar com
sua equipe, e eu me tornarei o melhor hacker do mundo, —
disse ele. — Me dê uma chance de me provar antes de me
matar. Deixe-me mostrar o que posso alcançar, sob sua
orientação.

Desde o momento em que ouvi Gabriel ser neto de


Vicente, soube que ele teria que morrer. Eu não cometeria o
mesmo erro que cometi com Diego. Mas pensei no que Natalia
havia dito. Eu era a outra metade dessa equação. Eu estava
ao lado de Diego e não senti ressentimento ou raiva por Costa
pelo que ele havia feito – apenas gratidão e lealdade.

— Por que eu confiaria em você? Eu vou matar o resto


da sua família, independentemente.
Sua inquietação parou. — Acho que entendo porque
você tem que fazer isso. Meu abuelo, eu amo ele, mas ele
viveu uma vida longa considerando suas chances.

Falado como um verdadeiro gênio da matemática. Lógica


e razão falaram com esse garoto. Um assassinato igualou
uma retribuição.

Mas então ele continuou: — E vi o rosto de Natalia lá.


Eu me sinto mal. Também perdi minha mãe em tudo isso.

Huh. Ou havia um coração naquela placa-mãe, ou ele


estava tentando manipular meu lado suave evidente por
Natalia. — O que você sabe sobre Belmonte-Ruiz? —
Perguntei.

— Não muito, mas eu aprendo rapidamente, — disse


Gabriel. — Eu sei mais sobre o que você faz aqui na Terra dos
Condenados.

— Não é mais um segredo. Temos nossos dedos em


muitas, uh, tortas, como eles dizem15. — Meu dedo deveria
estar na torta mais deliciosa naquele momento – eu apressei
mentalmente Gabriel.

— Armas, frete, lavagem de dinheiro – mas você também


trafica pessoas, — disse ele, e acrescentou, — exatamente na
direção errada, a maioria diria.

Os cabelos na parte de trás do meu pescoço se


arrepiaram. Havia rumores sobre a nossa operação, e isso

15 Quer dizer que eles estão envolvidos em muitas coisas


acabaria nos machucando, mas não havia como a verdade já
ter chegado aos cantos empobrecidos do México. — Como
você sabe disso?

— Eu te disse, sou invisível. Sua segurança é top de


linha, mas eu consegui. Você precisa de mim.

Esse tipo de habilidade era letal nas mãos erradas. Mas


nas corretas, era um trunfo. Como eu poderia saber quem era
esse garoto? Suas verdadeiras intenções? — E o que você
acha da nossa operação?

— Vocês são os mocinhos.

— Nós não somos, — eu disse, cruzando os braços


enquanto a luz fluorescente no teto zumbia. — Nós
machucamos muito mais do que ajudamos. Se coragem e
glória são o que você deseja, procure outro lugar. Fazemos o
que temos para sobreviver e promover nossa causa. Não traz
reconhecimento, apenas inimigos de todos os lados, e isso
está prestes a piorar.

— Então você precisará de boas informações, segurança


e proteção. Eu posso ajudar. Há mais e mais crianças como
eu aparecendo, — disse Gabriel. — Conhecemos a tecnologia
melhor do que nossos próprios rostos. Mas tenho algo que
muitos não sabem – conheci o pior deste país e estou
disposto a morrer antes de voltar a ele.

Isso completou sua terceira razão para oferecer ajuda.


Lógica, coração e motivação para uma vida melhor. Ah, e
frustrar a morte, é claro. Olhando para Alejandro, eu apertei
meus dedos. — Diego não é o que estamos tentando
encontrar agora.

— Max, — afirmou Gabriel. — Alejandro me disse.

Esfreguei a ponta do meu nariz. Minhas mãos estavam


atadas. Eu faria o que fosse necessário para ajudar Max. Eu
seria um tolo por recusar ajuda e um tolo por aceitá-la. —
Você tem até que minha paciência se esgote para nos ajudar
a encontrar tudo o que puder na localização atual de
Belmonte-Ruiz e Max, — eu disse.

— Sim, senhor. Obrigado, senhor.

Eu balancei a cabeça uma vez para Alejandro. —


Entregue-o para a equipe de TI. Os olhos não o deixam por
um segundo. Pegue um novo par de óculos para ele. E Alejo?

— Dime, — disse ele, me convidando para continuar.

— Não me perturbe de novo. Não ligo se o céu está


caindo.

Agora, eu iria foder minha esposa.

Isso era, se eu pudesse encontrá-la. Porque quando


voltei, ela não estava no quarto.

Ou na biblioteca. Ou à beira da piscina.

Depois de andar por toda a casa, me vi batendo na porta


de Pilar.
— Adelante16, — vieram duas vozes femininas, seguidas
de risadas e — ¡Embrujado17! Jinx!

Entrei no quarto e encontrei Natalia na ponta dos dedos


dos pés no armário de Pilar, tentando pegar uma bolsa na
prateleira superior – e usando jeans, meias e um suéter por
cima. Não nua como eu a deixei quando a pedi para ficar
parada.

Entrei, peguei a bolsa da prateleira e entreguei a ela. —


Indo para algum lugar?

Seus olhos ardentes encontraram os meus um momento


antes de ela se virar. — Não. Estamos reorganizando o
armário de Pilar.

Eu pisquei ao redor do espaço. Parecia que Pilar quase


não tocou em nada desde sua chegada. — Parece muito
organizado para mim.

— Bem, o método de Jaz não faz muito sentido para


nós, — explicou Natalia.

— Por que não? — Perguntei.

— Porque não, — ela retrucou.

Os olhos de Pilar ficaram em mim, esperando minha


reação – pela explosão. Em deferência à sua história com
homens violentos, respirei fundo para controlar meu
temperamento. — Eu preciso falar com você, Natalia.

16 Entre.
17 Enfeitiçado.
— Depois que terminarmos. — Natalia deu um passo
para trás, beliscando o queixo enquanto avaliava uma fileira
de sandálias. — Elas realmente devem ser organizados pela
altura do salto.

Ah. Não era sobre o armário de Pilar. Natalia estava me


punindo por deixá-la na cama. Como se tivesse sido fácil para
mim. Como se o pensamento de transar com ela nem sempre
fosse a primeira coisa que me vinha a mente.

Eu precisava limpar minha cabeça. Eu precisava do


espaço para pensar direito. Eu precisava foder tanto que não
havia mais nada em minha mente além de respostas. — Com
licença, Pilar, — falei, mantendo meus olhos em Natalia, —
mas minha esposa e eu estávamos no meio de algo que
precisa ser resolvido.

— Oh. — Natalia olhou por cima do ombro e piscou. —


Eu resolvi sozinha.

Se o sorriso dela era alguma indicação, eu devo ter


ficado tão pasmo quanto me senti. O pensamento dela
gozando sozinha na minha cama quando esse era o meu
trabalho.

Eu parei atrás dela, e pelo jeito que ela endureceu, ela


sabia que eu tinha acabado de brincar. — Marche sua bunda
lá para cima antes que eu faça isso por você.

— Ele espera que eu vá quando ele chama, — disse ela a


Pilar. — Do jeito que ele corre sempre que Jaz precisa dele.
Soltei uma risada curta, apesar de apenas me divertir
com a perspectiva de inventar maneiras de puni-la por esse
comentário. Peguei-a, joguei-a por cima do ombro e dei um
sorriso amigável a Pilar. — Vejo você quando terminarmos.
Não espere.

Para crédito de Pilar, pela primeira vez, ela não parecia


assustada. — Divirtam-se.
16

Natalia

Cristiano, o bruto, me deixou de pé no quarto,


aparentemente alheio aos meus olhares fumegantes. Eu
comecei a suar com toda essa roupa, mas isso fazia parte de
seu castigo por me deixar sozinha, nua e mais excitada do
que nunca. — Pendejo18, — eu disse.

— Você é muito corajosa em me chamar de idiota, —


disse ele. — Considerando que você estava tremendo de dor
de cabeça quando chegou aqui.

— Eu não estava. Eu fiquei aqui, nesse quarto, e


convidei você para me foder naquela primeira noite. Você foi
quem foi embora, — eu acusei.

Ele não merecia isso; minha gratidão por sua restrição


durante esse tempo não tinha limites. Cristiano poderia ter
pegado o que queria na nossa noite de núpcias. Quantos
homens em sua posição teriam pegado? Estremeci ao pensar.
Eu seria uma mulher diferente, se tivesse, casada com um
homem diferente.

18 Idiota
Mas já bastava. Eu precisava dele para terminar o que
havia começado e consumar esse maldito casamento.

— Eu não ia te estuprar do jeito que meu irmão fez. —


Cristiano me aproximou, pegando meu queixo em sua grande
mão e me forçando a olhá-lo nos olhos. — E isso é o que ele
fez, Natalia. Ele disse o que precisava para coagir você a sua
cama. Eu não faria o mesmo, e nunca o farei, então é melhor
você aprender a pedir o que você quer.

— Eu pedi. Eu disse para você não sair hoje de manhã,


mas você não hesitou nem um segundo antes de fugir
quando Jaz chamou. — Satisfação presunçosa se instalou em
mim quando ele se encolheu. Eu me ofereci a ele duas vezes
em vinte e quatro horas, e ele me recusou as duas vezes. A
implacável necessidade de ser aliviada por ele e somente ele
me empurrou para cutucá-lo até que ele reagisse. — Meu
marido vira as costas para a esposa quando outra mulher
precisa dele. Jaz, Tasha, Sandra... tem alguém que eu venha
antes?

— Como você ousa dizer que eu não a coloquei em


primeiro lugar! — Ele pegou a mão de volta, elevando-se
sobre mim. — Você queria algo desde que pisou dentro
dessas paredes?

Você.

Meu desejo por ele estava fervendo desde a nossa


primeira dança, eu simplesmente não queria admitir. Agora
que eu podia, isso me dominava, e eu odiava que pudesse ser
virada tão facilmente. Confiei em Cristiano com meu corpo,
mas não apagou a violação de Diego.

— Eu pensei que sabia o que você queria, mas talvez eu


estivesse errada, — eu disse, meus lábios apertados quando
eu baixei meus olhos para a virilha protuberante de seus
suores. — Ou talvez eu não estivesse. Deve haver outro
motivo para você manter as mãos em si.

— Cuidado com a boca, chiquita, — ele avisou.

Ser chamada como uma garotinha só me enfureceu


mais. Eu pisei debaixo do nariz dele. — Acho que ouvi Jaz
chamando. Talvez você deva correr para que eu possa voltar
para a minha amiga.

— A vida das pessoas está em risco. Você espera que eu


fique na cama quando eles precisarem de mim e deixá-los se
defender?

— Sim. — Eu estava sendo injusta, mas ele também.


Não era apenas meu coração que estava doendo desde ontem,
mas meu corpo também. Cristiano tinha prometido me foder
no esquecimento mais de uma vez, e ele ainda tinha que
seguir adiante. Ele esperava que eu implorasse por isso?

Ele deu um passo à frente até que estivéssemos frente a


frente, seus olhos escurecendo quando sua compostura
fissurou. Finalmente, sua raiva combinou com a minha. — A
melhor sinfonia do céu é apenas barulho em comparação com
seus pedidos para eu ficar na cama. Eu não poderia pedir
mais nada. Mas entenda - você não pode me comandar. Eu
não respondo a ninguém. Eu tenho um dever a cumprir.

— Você me pegou, você me colocou nesse papel, então,


sim, agora, você responde para mim. — Eu quase vibrava
com raiva. — E eu não vou ficar atrás de ninguém,
especialmente de Jaz. Ela está tentando ficar entre nós.

— Ninguém fica entre nós a menos que permitamos. E


desde quando você se importa? — O calor brilhou em seus
olhos quando ele inclinou a cabeça, me provocando. — Por
que minha esposa de repente se importa aonde eu vou e o
que faço? Qual poderia ser o motivo, hum?

— Porque... Porque...

Amor. Era por isso.

Porque eu tinha ficado sem motivos para não amá-lo.


Floresceu inesperadamente e brutalmente. O solo para isso
era rico, a base lançada antes que eu soubesse o que era
amar um homem. Minha mãe confiava nele, e eu também.
Cristiano vinha alimentando essa semente o tempo todo, e as
videiras haviam crescido demais em meu coração sem que eu
percebesse.

E ele sabia disso.

— Você não precisa brigar, mi amor, — disse ele


presunçosamente. — Se você precisar que eu te foda, basta
perguntar – e é sério.
Eu precisava tanto, doía com isso. Agarrei suas
bochechas e puxei sua boca para a minha. Por um momento,
ele pareceu atordoado demais para reagir, mas então ele
agarrou meu cabelo pela raiz e me apoiou contra uma parede.

— Você pensou que todas essas roupas poderiam me


deixar de fora, hein? — Ele disse.

— Quase funcionou.

— Você não tem ideia de como está errada. Diga, — ele


exigiu na minha boca, então puxou meu cardigã ao redor do
meu bíceps, me prendendo com ele. — Peça.

Minha respiração gaguejou junto com meu pulso. Eu


estava muito carente, muito dolorida, muito longe de tudo,
exceto a atração carnal entre nós. — Cristiano, por favor. Por
favor, faça?

— Fazer o que?

— Faça como você prometeu. Destrua o que é seu para


destruir. Tome minha virgindade como deveria ter sido feita.
Por favor, me foda. Por favor.

Suas mãos se fecharam, apertando minha blusa em


volta de mim. — Que maneira de perguntar, — disse ele, seu
peito estremecendo com a promessa. — Você fez valer a
espera. E eu vou responder sem restrições, mamacita. — Ele
arrancou meu suéter e enfiou a mão na frente da minha
calcinha. As pontas dos dedos deslizaram contra a minha
abertura, mas não entraram. — Você ficou molhada esse
tempo todo?

— Desde o início, — admiti com voz rouca.

Sua mão livre agarrou a cintura da minha calça jeans e


a puxou cada vez mais alto até que a costura da virilha se
apertou contra o meu clitóris. — Como é isso?

De boca aberta, ofeguei quando ele a massageou de um


lado para o outro. Oh. Deus.

Ele inclinou a cabeça, me avaliando com total


compostura enquanto seu peito roncava com um — Hmm.

— O quê? — Eu ofeguei.

— Estou decidindo o que fazer com você. Com base em


como você veio até mim, com suas garras, acho que o que
você precisa mais do que tudo agora é uma boa e dura foda.

A perspectiva de pedir isso para alguém como Cristiano


me emocionou e me assustou – assim como todo o resto
quando se tratava de meu marido. As últimas semanas foram
construindo isso, uma dança apaixonada, cada passo se
tornando mais fácil à medida que tínhamos nos dado
confiança. Eu confiava nele para me machucar das maneiras
que eu precisava, sem ir longe demais.

— Eu mereço ser punida por como te tratei. Como eu


falei com você, — respirei contra ele. — Faça eu me
arrepender.
Ele puxou minhas calças e as deixou em um monte
enquanto me levantava contra a parede. Minhas pernas o
envolveram instintivamente, como uma cobra com sua presa,
fora do meu controle, apertando-o mais perto.

— Eu vou punir você, Natalia Lourdes, e você vai pedir


mais, — disse ele, me segurando com uma mão e enfiando a
mão na calça com a outra para acariciar a si mesmo. — Mais
tarde, eu vou pedir para você colocar meu pau dentro de
você. Vou passar a língua ao longo e dentro de cada parte do
seu corpo que puder alcançar. Mas agora, eu vou enfiar
dentro de você, e você vai me deixar gostar da boa boneca que
você é. Compreende?

Se eu não estivesse presa à parede, eu poderia ter caído


com a necessidade. Em vez disso, empurrei seu peito,
movendo-o apenas centímetros. — Você não quer uma
boneca. Você quer a garota que apontou uma arma para
você. A que você está ensinando a revidar.

Ele prendeu meus pulsos e os segurou sobre minha


cabeça. Depois de trancá-los lá com uma mão, ele tirou o
moletom, alinhou a cabeça com a minha abertura e começou
a pressionar para dentro. — Então é uma pena que eu ainda
não te ensinei como sair dessa espera, não é? — Ele
perguntou e empurrou os quadris para frente.

Ele me encheu de uma só vez. — Foda-se, — eu chorei.


— Sim, foda-se, — disse ele, enraizando-se lá. — Foda-
se você e sua boceta muito apertada. Como é a sensação de
finalmente ser totalmente aberta?

Meu peito arfava. Ele saciou uma sede que era mais
profunda do que eu pensava ser possível. Finalmente, eu
estava cheia, pela primeira vez na minha vida, fisicamente -
mas também emocionalmente cheia de desejo e amor e tudo
mais que eu não conseguia entender. — Parece... — Nem as
melhores palavras podiam transmitir como a linguagem que
nossos corpos falavam. — Parece que deveríamos ter feito
isso semanas atrás.

— Não brinca. Tudo que eu queria é ver seu rosto


quando eu a reivindicasse. — Ele usou as duas mãos desta
vez para prender meus pulsos acima da cabeça antes de
recuar e me empalar novamente. — Como sua boceta se
rende para mim, então me chupa mais fundo.

— Ay, Dios m... — Eu chorei. — Oh. meu. D…

— Com quem você está falando, mi vida? — Ele pegou


minha boca para um beijo duro e úmido enquanto entrava e
saía, certificando-se de que eu sentia cada cume e veia de seu
membro. Prendendo meu lábio inferior entre os dentes, ele o
beliscou até eu gemer, depois o soltei. — Ninguém é tão
divino quanto você, — ele professou. — Você é a deusa no céu
que todos nós apelamos. Quem poderia combinar com você?

— Você.
Sua língua correu ao longo do meu lábio até o canto da
minha boca enquanto seus quadris aceleravam. — Isso dói?

Era uma pergunta simples com inúmeras respostas. A


dor sempre foi ruim? Poderia ser tão bom que doeu? Eu podia
desejar agonia física para encarnar meu desejo profundo por
ele? — Sim, — eu disse quando minha boceta se contraiu ao
redor dele e minhas pernas o puxaram ainda mais perto.

Ele se afastou até que eu tive que envolver meus


músculos da coxa para não escorregar pela parede. — Eu
poderia ser mais gentil, — disse ele. — Tratar você como uma
boneca de verdade. Como se você não pudesse lidar com isso.

— Eu aguento. Quero que doa e quero que melhore. —


Eu encontrei seu olhar, a evidente necessidade em seus
olhos. Para não me empurrar contra uma parede - ele poderia
ter feito isso a qualquer momento. Mas a necessidade de me
preencher de maneira que ninguém mais poderia. Para
finalmente me fazer querer. Libertei meus pulsos do aperto
dele, abracei seu pescoço e pressionei minha testa na dele. —
Eu sei que isso machuca você também.

Algo passou por seu rosto. Ele se inclinou e eu recuei,


mantendo-me fora de seu alcance. Com um rosnado que
reverberou no meu peito, ele capturou minha boca para um
beijo punitivo, do tipo que eu esperaria de um chefão mortal,
apaixonado e dominante.

Sem desconectar, ele me carregou pelo quarto e me


abaixou até que apenas minhas costas atingiram o colchão.
Segurando meus quadris, ele os trouxe para encontrar cada
um de seus impulsos fortes e rápidos. — Veja como sua
boceta me leva, Natalia – cada centímetro, — disse ele,
estendendo a mão para pressionar o polegar na minha boca.
Eu chupei automaticamente. — Eu prometo que, quando eu
terminar com você, você estará arruinada para mais alguém –
mas nunca terminarei com você. — Ele removeu o polegar e
se inclinou para frente para beliscar meu queixo e manter os
meus olhos nele. — E se isso te assusta, bom.

Eu arqueei minhas costas quando seus impulsos


implacáveis me atingiram cada vez mais fundo. O calor se
enrolou em meu coração, outro nó dolorido em mim que
Cristiano inspirou – um único que Cristiano poderia aliviar.
— Eu não estou com medo, — eu disse.

Ele deslizou a mão sob a barra da minha camiseta e a


espalhou pela minha barriga inferior, enquanto tremia. Seu
polegar mergulhou entre minhas dobras para o meu clitóris.
— Você tinha medo.

— Eu tinha.

— Mas agora, você aceita tudo o que tenho para dar.

— Quanto mais poderia haver? — Eu respirei enquanto


meus músculos tremiam em torno de seu pau.

— Eu posso me aprofundar muito mais, — prometeu. —


Mas eu preciso que você venha me buscar primeiro e solte
sua boceta. — Ele pegou minha cintura, seu aperto tão forte
que as pontas dos dedos quase se encontraram quando ele
me levantou. Me puxou para cada impulso. Me fodeu com
tanta força que suas bolas bateram nas minhas bochechas.
— Dê-me esse néctar apenas o suficiente para um deus; deixe
um homem indigno nas profundezas do céu.

Eu tremi com suas palavras. Era disso que eu sempre


precisei. Não ser mimada e pacificada com a poesia plana,
sem emoção e estúpida do caralho de Diego. Eu pegaria o cru
e profano de Cristiano sobre a prosa sem vida a qualquer dia.
Eu levaria seu sexo rápido e duro sobre o amor ardente de
Diego.

Fechei os olhos para que eu pudesse sentir todas as


sensações que passavam sobre mim, todas as nuances da
foda exigente de Cristiano.

— Olhos abertos, Natalia, — disse ele. — Eu sei que


você tem medo do escuro, mas na minha cama, você vai me
encarar.

Abri minhas pálpebras para o diabo bestial acima de


mim. O monstro debaixo da minha cama que se arrastou
para fora e me montou. Aquele que conheceu meus medos
mais profundos e os conquistou comigo.

Eu tremi com a força de um súbito orgasmo que quebra


as bases. Ele me segurou na segurança de seus olhos negros
quando eu encontrei o êxtase – não nas alturas do céu, mas
nas profundezas do seu inferno.
— Deus. Foda-se. — Ele parou e gemeu até o teto. —
Você está me segurando tão forte que pode ser o suficiente
para me manter fora de sua bunda por alguns dias.

Eu soltei um suspiro trêmulo quando o tremor do meu


orgasmo rolou através de mim. Agora, eu estava com medo.
Eu vim pelo diabo e aproveitei cada segundo disso – e agora
eu temia dar a ele da maneira que ele pedisse.

Ele puxou para fora de mim, seu pau duro, latejante,


quase roxo entre nós – e coberto de mim. Antes que eu
pudesse registrá-lo, ele se inclinou para frente e rasgou
minha blusa. — Vire, — ele exigiu, pedindo-me para o meu
estômago mais rápido, descartando a camisa arruinada.

Suas mãos se espalharam pela base da minha espinha e


deslizaram para o fecho do meu sutiã. Ele abriu, alisando as
palmas das mãos nas minhas costas. — Qué buena estas.

Eu não tinha certeza de me sentir sexy naquele


momento, curvada sobre a beira da cama, minha bunda no
ar, totalmente aberta para ele. O pensamento de levá-lo de
volta para lá inspirou mais nervos do que excitação.

Ele deslizou seu eixo liso entre as minhas nádegas e a


pele macia e venosa esfregou o botão cru dos nervos na
minha abertura.

— Você ficou quieta, — disse ele, e eu poderia jurar que


ouvi um sorriso em sua voz.
Ele estava gostando disso, do jeito que meu corpo ficou
tão tenso quanto às cordas de um violão afinado. Com as
cortinas abertas e o sol entrando, foder assim em plena luz
do dia parecia obsceno. — Não na minha bunda, — eu disse,
pressionando o lado do meu rosto no colchão. Minha voz
estremeceu quando eu disse: — Eu não posso.

— Não na sua bunda, — ele concordou. — Ainda não


está pronta. Eu quero brincar com isso primeiro. Conhecer
com meus dedos. Minha língua.

Eu segurei os lençóis, olhando de volta para ele


enquanto meu rosto ardia com o calor. — Você não faria isso.

— Oh, eu faria, mamacita. E eu irei. — Ele tirou a


camiseta por cima da cabeça, despindo-se na velocidade da
luz. — Mas entenda uma coisa. Quando chegarmos lá, nunca
te machucarei dessa maneira. Jamais, Natalia. Quando eu te
levar, será para nos enviar para a lua.

Fechei os olhos e, em vez de medo, a satisfação tomou


conta de mim. Eu passei tanto tempo lutando para desconfiar
de cada palavra da boca dele, especialmente quando se
tratava da dor que ele podia infligir. Eu escolhi acreditar nele
agora.

— Sua boceta, no entanto, — disse ele, abrindo meus


lábios com os polegares. Ele deslizou dentro de mim por trás,
seu comprimento completo e impressionante me empalando
lentamente, até que eu o levei à raiz. — Isso, eu usarei até
que eu tenha enchido você de porra suficiente para
compensar cada noite que eu perdi como seu marido.

A franqueza de suas palavras cortou minha névoa. —


Mas eu poderia engravidar!

— Me vale verga. Eu não ligo É tarde demais. Já está


vazando de mim. E sua doce e sedenta boceta engolirá tudo,
não é?

Eu nunca quis algo tanto uma coisa na minha vida. Eu


não conhecia outra resposta, exceto uma. — Sim, senhor.

— Noivinha obediente.

Ele colocou um pé no colchão, segurou meus quadris e


entrou em mim tão fundo que eu choraminguei. — É isso aí,
— disse ele, sua voz cheia de cascalho enquanto ele me
martelava. — Eu posso sentir o seu fim agora, e eu vou te
foder lá até que isso dê.

Meu rosto ficou vermelho. A plenitude absoluta e


completa da minha boceta, a sensação de ser mais ele do que
eu naquele momento, bateu em minhas necessidades mais
básicas. O prazer se intensificou enquanto ele se afastava até
que tudo que eu podia fazer era gritar. Eu nunca tinha me
ouvido fazer uma coisa dessas, mas estava muito longe para
ter vergonha de que meus gritos quase sacudissem as
paredes. — Sim! — As únicas palavras que eu pude formar
derramaram de mim. — Sim , papi. Por favor, por favor.
Eu queria a libertação dele tanto quanto a minha, e até
tentei encontrar seus impulsos penetrantes enquanto estava
preso.

O alívio veio rapidamente. Ele me jogou contra o colchão


várias vezes até que eu voltasse.

Meus músculos cansados tremiam quando relaxei no


colchão. Cristiano me levou até o fim, até que ele cumpriu
sua promessa e entrou em erupção no meu corpo murcho,
respirando vida de volta para mim.
17

Natalia

Cristiano estava sentado em frente a uma grande e


majestosa tapeçaria de veludo cor de vinho com fios dourados
pendurados em uma parede da sala principal. Na cabeceira
da mesa de jantar, o piso plano aberto o permitia ver através
da casa, pelo corredor e quase até a entrada. Eu não pude
deixar de pensar que ele havia projetado dessa maneira.

Restos de nosso pequeno banquete, preparados em


homenagem a uma visita de meu pai, estavam espalhados
pela mesa. Papá estava mais quieto do que o habitual desde
que voltamos de um passeio a cavalo pela Terra dos
Condenados. Nós o convidamos para ficar por alguns dias
para que pudéssemos apresentá-lo aos negócios dos quais ele
se tornaria parte da nossa... fusão.

E, de certa forma, tinha sido uma introdução para mim


também. Tínhamos atravessado a praça da cidade onde
Cristiano havia comprado minhas sandálias, dando um clique
na estrada com nossos cavalos. Do lado de fora, quem
pensaria que a Terra dos Condenados teria algo tão pitoresco
quanto uma Main Street? Havia também fazendas em pleno
funcionamento para manter os moradores alimentados – e
até uma destilaria para mantê-los de bom humor. A doutora
Sosa, que cuidou de Cristiano e eu depois do ataque de
Belmonte-Ruiz, dirigia uma clínica médica de tamanho
decente, onde ela via pacientes regularmente.

Fiquei impressionada com o quão bem eles operavam


como sociedade.

Eu não conseguia entender direito a reação do meu pai,


no entanto. Hoje, ele aprendeu a verdade sobre os negócios
de Cristiano – que Calavera estava envolvida no comércio de
pessoas, mas em vez de traficar pessoas, ele as estava
salvando.

Sentada à direita de Cristiano, dei a última mordida na


galinha que eu poderia enfiar no estômago e encostei contra o
encosto da cadeira, cobrindo minha barriga. — Estou tão
cheia.

— Foi uma excelente refeição, Pilar, — disse Papá do


outro lado da mesa. Ele sempre estava sentado à frente, mas
não havia confusão sobre quem pertencia à casa de
Cristiano.

Em nossa casa. Eu suspeitava que levaria um tempo


antes de realmente começar a parecer com a minha. Eu não
tinha escolhido nenhuma dessas coisas, ou, como Cristiano,
supervisionado sua construção desde o início. Eram as
pessoas que se sentiam mais em casa do que nas Terras dos
Condenados.

Era ele, Cristiano.


— Devo pegar a sobremesa? — Pilar perguntou e
esfregou a boca com um guardanapo. Quando ela se
levantou, Alejo e Barto também. O rosto dela ficou vermelho.
— Oh, não, não levante. Eu dou conta disso.

Os homens trocaram um olhar hostil. Sobre Pilar? Ela e


Alejandro haviam passado muito tempo juntos aqui em casa,
mas Barto a conhecia a maior parte de sua vida como minha
amiga. Ele estava mais quieto do que o habitual hoje à noite,
seus olhos vagando pela sala e pela empresa. Obviamente, ele
estava desconfortável como hóspede na Terra dos
Condenados, apesar do convite de Cristiano.

Quando Pilar saiu da sala, Jazmín entrou com uma


bandeja de copos altos e uma garrafa de licor que mais
parecia uma obra de arte. Uma sereia de estanho abraçou a
tequila, o rabo graciosamente enrolado em uma jarra coberta
com um esqueleto.

— É uma garrafa de tequila de dois mil dólares, —


comentou Papá, enquanto Jaz servia uma dose a cada um de
nós.

— É envelhecido três anos em barricas de carvalho


francês aqui em nossa região - apenas cem garrafas foram
produzidas, — disse Cristiano. — Sirena del Deseo.

— Sereia do Desejo, — eu traduzi. Nossos olhos se


encontraram. Cristiano e eu tínhamos escapado para a faixa
de praia abaixo da nossa varanda mais cedo. — Mi sirenita, —
ele me chamou – minha pequena sereia – enquanto
nadávamos e dançávamos no oceano, depois transamos sob o
sol quente do México.

Enquanto Jaz distribuía as bebidas, Cristiano levou as


costas da minha mão à boca para um beijo. — De acordo com
o decantador, o artista conta a história de amor de um
guerreiro mexicano que viajou até as profundezas do mar em
busca de sua amada sereia.

— Que romântico, — disse Pilar, atravessando a sala da


cozinha, as mãos cheias de um bolo. Atrás dela, um dos
funcionários da cozinha carregava uma pilha de pratos e
talheres. Ela colocou palitos de dente na mesa perto de
Cristiano.

— Ah, o famoso bolo tres leches de Pilar, — meu pai


comentou.

Ela corou, entregando-lhe o utensílio de servir. — Como


hóspede, você recebe a primeira fatia, señor Cruz.

— Eu não acho que a tequila é para ser romântica, — eu


disse, de volta à jarra. — O guerreiro no topo é um esqueleto.

— Ela é uma história de amor, mas uma trágica, —


disse Cristiano — como ele não sobreviveu à sua missão.

O calor da palma da sua mão contra a minha não fez


nada para conter o rastro de calafrios no meu braço, nem a
gravidade de sua carranca.

Quando todos nós tivemos tequila e bolo diante de nós,


perguntei: — Qual é a ocasião?
O humor de Cristiano aumentou com um sorriso. —
Preciso de uma para celebrar minha esposa e sua família?
Salud.

Cada um de nós levantou nossas tequilas com um —


¡Salud! — E tomou um gole.

— Embora, se meus cálculos estiverem corretos, —


Cristiano acrescentou, abaixando o copo, — hoje fazem seis
semanas desde que estávamos na igreja e fizemos nossos
votos.

Meus olhos ficaram presos aos dele. — Seis semanas e


uma vida.

— Dê um beijo no seu marido para comemorar, — ele


disse.

Apertei meus lábios, mas não por um beijo. Todo mundo


estava assistindo, e Cristiano sabia disso. — Quando
estivermos sozinhos.

— Não. Agora. — Ele se inclinou. — Venha. Un beso.

Atraída por ele como um ímã, inclinei-me para encontrá-


lo, equilibrando-me em sua coxa enquanto minha boca
encontrava os lábios dele, os lábios carnudos e quentes ao
mesmo tempo novos e familiares. Eu enrolei meu punho
contra sua perna. Eu o conhecia intimamente e ainda tinha
muito a descobrir. Mas eu me afastei rapidamente quando
lembrei que não estávamos sozinhos, baixando os olhos para
a mesa enquanto corava.
— O que aconteceu com seu pescoço? — A pergunta
abrupta de Barto e o tom endurecido fizeram meus olhos
pularem nos dele. — Isso parece o começo de uma cicatriz
hipertrófica.

Cobri a feia imperfeição quando Cristiano e eu trocamos


um olhar. Não queria mentir, mas ainda não tínhamos
abordado o assunto do ataque de Belmonte-Ruiz com meu
pai. A cicatriz não era claramente perceptível, mas começou a
ficar rosada e saliente. Originalmente, eu vesti uma gola alta
para o jantar, mas em uma noite tão quente de junho,
Cristiano disse que parecia suspeito – antes de me lembrar de
usar o símbolo da minha sobrevivência com orgulho.

— Não é nada, — eu disse com a minha primeira


mordida de bolo.

— Ela caiu no espelho, — ofereceu Pilar. — Quebrou.

Barto bufou, os nós dos dedos embranquecendo ao


redor do garfo enquanto olhava para Cristiano. — Ela caiu?
Você espera que alguém acredite nisso?

— Barto, — alertou meu pai, depois se virou para mim.


— Isso é verdade?

— Ela não pode ser honesta, — disse Barto. — Se ela


for, ela pode 'cair' novamente. Ou talvez seja Pilar desta vez.

Sua declaração foi suspensa quando um silêncio


sinistro desceu sobre a sala. Todos os olhos se voltaram para
Cristiano. Ele comeu um pedaço do bolo, mastigando
lentamente antes de engolir com um gole de tequila que deve
ter custado milhares de pesos. Olhando para Barto, ele se
recostou na cadeira. — Foda-se.

Alejandro agarrou o braço de Barto enquanto ele tentava


se levantar. — Tranquilo, — disse Alejo. — Relaxe, amigo.
Cristiano não colocou a mão em Natalia, e ele nunca o fará.

— Por que eu deveria acreditar? — Barto perguntou.

Cristiano chupou os dentes. — Natalia e eu precisamos


conversar com Costa em particular.

Alejandro e Pilar estavam com a louça, mas Barto ficou


onde estava. — Estou aqui para proteger e apoiar Costa, —
disse Barto. — Você pode dizer qualquer coisa na minha
frente.

— Isso foi uma ordem, — disse Alejandro, olhando para


ele.

Barto apertou o guardanapo e ergueu-se a toda a altura,


olho no olho com Alejandro. — Eu não recebo ordens dele.
Ou de você, pinche pendejo19.

— Por favor, pare, — disse Pilar, tocando o antebraço de


Barto e atraindo o olhar de Alejo. — Eu sei que você está
apenas sendo protetor, mas estamos todos do mesmo lado.
Cristiano tem sido bom para Natalia.

19 Maldito idiota.
— Obrigado, Esmeralda, — disse Alejandro, e Pilar
corou com seu novo nome.

As sobrancelhas de Barto se uniram. — Esmeralda...?

Cristiano se dirigiu ao meu pai. — Você pode informar


Barto sobre tudo mais tarde.

Papá assentiu uma vez. Com a dispensa, Barto jogou o


guardanapo no prato de bolo meio comido e saiu da sala com
Alejandro e Pilar atrás dele. A última coisa que ouvi foi à
provocação de Alejandro. — Tente acompanhar, Barto. Pilar
se chama Esmeralda agora.

Quando estávamos sozinhos, meu pai lambeu o garfo. —


Pilar realmente é uma boa padeira, como a mãe dela. — Ele
suspirou, colocando o utensílio no prato enquanto sua
expressão clareava. — É muito para absorver, Cristiano, tudo
o que você me mostrou aqui.

— É realmente notável, não é, papá? — Eu realmente


queria que ele gostasse daqui – ficasse tão impressionado
com Cristiano como eu e se sentir bem-vindo para visitar
sempre.

— Eu me sinto um pouco claustrofóbico, — disse ele.

— Além dos muros, você tem um deserto aberto em três


lados e todo o mar atrás de você, — apontou Cristiano.

— Como isso é bom? — Ele encolheu os ombros. — O


oceano prende você.
— Não, señor, — disse Cristiano. — Temos uma pequena
frota naval, de modo que a terra, o ar e o mar se abrem para
nós. Os navios estão guardados dentro da montanha, onde a
escavamos. — Ele piscou para mim. — Eu mencionei que
existem jet skis?

Eu suprimi um sorriso. Não, ele não tinha. Eu descobria


mais segredos da Terra dos Condenados todos os dias e tinha
acabado de saber sobre a encosta da montanha naquela
tarde – mas não havia menção a esportes aquáticos. Havia
algo que eles não tinham pensado?

— O que eu amo é que é autossustentável, — disse ao


meu pai. — A mulher que fez minhas alianças, Teresa,
também é eletricista, graças à educação que recebeu após
sua chegada. Outro casal produz a tequila mais suave da
agave azul cultivada aqui.

— Está buenísimo, — Cristiano concordou. — Tão bom,


mantemos isso à mão aqui.

— Todo mundo foi treinado em um ofício ou habilidade,


— eu disse.

— Isso é intencional. — Cristiano girou o copo na mesa.


— É um prazer vê-los bem alimentados, saudáveis e felizes,
mas se a Terra dos Condenados se dissolver amanhã, seu
povo sobreviverá. E se algo acontecer comigo, Max sabe...

Ele parou.
Não foi a primeira vez que Cristiano se referiu a Max
como se ele ainda estivesse por perto. E sem falta, eu veria o
momento em que Cristiano percebeu seu erro, a dor
brilhando em sua expressão. Como eu aprendi com a morte
de minha mãe, uma maneira de ajudar a aliviar o sofrimento
era com as memórias. Max não estava morto pelo que
sabíamos, mas eu tinha certeza que Cristiano acreditava que
ele nunca voltaria para casa. Eu não conseguia lembrar de
um caso em que um cartel capturou e depois libertou um
rival.

Cobri a mão de Cristiano com a minha. — Como você


conheceu Max?

— Como todo mundo, — disse ele, piscando seu olhar


sombrio para mim. — Cada um de nós procurava uma perna
para cima20. Fizemos nossa própria perna e depois ajudamos
a outra. Nos primeiros dias depois que eu saí do complexo –
ele disse, olhando para o meu pai –, eu jogava. Transforme
vinte pesos em quarenta, quarenta em cem.

Recostei-me no banco com a tequila, contente em saber


algo novo sobre o passado de Cristiano. — Eu não sabia
disso.

Com um aceno de cabeça, ele continuou: — Max


também estava jogando. Uma noite, eu perdi quase tudo. Ele
teve uma série de vitórias. Ele me deixou ficar com ele até
que eu estivesse de pé novamente, e quando as mesas

20 Vantagem sobre os outros


viraram, e ele precisava de mim, eu estava lá. Tem sido assim
desde então.

— Então, por que ele não estava... não é o Senhor da


Terra dos Condenados? — Perguntei.

Finalmente, recebi um sorriso de Cristiano, ainda que


torto. — Diplomacia não combina com ele. Ele prefere fazer o
que precisa ser feito.

— Sim, e você é diplomático? — Perguntei.

Com uma risada, ele levantou o copo. — Para Max. O


filho-da-puta mais feio que eu já vi, mas com um coração
lindo.

Nós três tocamos os copos novamente. — Sua


camaradagem, sua operação – é como nada que eu já vi na
minha vida, — disse meu pai. — Mas o mais impressionante
de tudo é que você conseguiu manter isso em segredo.

— O segredo está sendo divulgado, — disse Cristiano


francamente. Eu sabia que era tudo, menos fácil para ele
dizer, mas ele não gostava de adoçar coisas. Ele limpou a
garganta. — Houve... um ataque.

As sobrancelhas escuras e espessas de meu pai


abaixaram quando ele pousou o copo. — Aqui?

— Sí. E Natalia era um alvo.


— Qué? — A voz dele, que se tornou mais sonora com a
idade, era a única que eu ouvia mais profunda e rouca que a
de Cristiano. — Quando foi isso? Por que eu não sabia?

— Eu estou bem, — eu disse. — Cristiano foi quem se


machucou, mas não podíamos dizer nada porque ninguém
fora daqui sabia que ele estava ferido.

Papá se inclinou sobre a mesa, com as duas mãos na


superfície de madeira. — Quando foi isso?

— Há cerca de um mês, — disse Cristiano.

— Um mês! Você deveria ter me dito assim que entrei na


porta. — Ele deu um tapa na mesa. — Mais cedo.

— Sua pressão arterial, papá, — eu disse.

Ele recuou. — Eh? Que tal isso?

Eu não tinha ideia dos sinais vitais do meu pai, isso não
era algo que ele estava disposto a compartilhar comigo. Mas
parecia a coisa certa a dizer, e ele pareceu confuso o
suficiente para esquecer sua raiva por um momento.

Aparentemente, a arte da distração funcionava em mais


cenários do que em combate corpo a corpo.

— É onde você conseguiu a cicatriz? — Ele me


perguntou. — Você mentiu para Barto.

— Porque eu sabia como ele reagiria.


Ele acenou com a mão com desdém, recostou-se na
cadeira e nos encarou com um olhar. Não pude deixar de me
sentir como uma estudante no escritório do diretor. — O que
aconteceu?

Meu pai ouviu em silêncio e sem vacilar, enquanto lhe


contávamos os detalhes do ataque, até o final, incluindo
como Alejandro e sua equipe estavam em campo, mas haviam
chegado de mãos vazias até agora.

— Você está pedindo minha ajuda com um exército? —


Papá finalmente perguntou.

— Não, isso me leva a outras notícias, — disse


Cristiano. — Mencionei que conversei com Natasha Sokolov-
Flores no evento do senador Sanchez. Você sabe o quão
poderosa é a família dela. Juntamente com Alejandro, eles
foram capazes de encontrar Vicente Valverde.

Com a menção de seu antigo inimigo, o rosto de meu pai


mudou, sua única reação em minutos, além de pedir
esclarecimentos ou beber um gole de tequila. — Vicente
Valverde está morto. — Ele olhou para Cristiano e entrelaçou
os dedos na mesa. — Eu o caçaria e o mataria depois do que
o assassino nos contou, mas muitos confirmaram que ele
morreu de derrame.

— Um golpe de boa sorte para se safar tanto tempo,


talvez, — resmungou Cristiano. — Mas a sorte dele acabou.
Vicente está muito vivo e esperando para vê-lo.
Ele parou, suas rugas diminuindo quando uma
carranca lentamente tomou conta de seu rosto. — Do que
você está falando?

— Os Valverdes desapareceram com muita facilidade, —


explicou Cristiano. — Eu me perguntei o porquê, e
simplesmente trazer para você um assassino não foi
suficiente. — Ele estendeu o braço em minha direção na
mesa. — Eu queria que vocês dois pudessem enfrentar os
responsáveis pelo ataque de Bianca, e agora eu trouxe todos,
exceto um.

O olhar pesado de meu pai mudou de meu marido para


mim e de volta. — Vamos para algum lugar privado,
Cristiano. Traga aqueles charutos hondurenhos sobre os
quais você estava falando.

Cristiano mudou de posição. — Natalia já sabe tudo.

— Não devemos discutir coisas violentas e traumáticas


na frente de...

— Eu já enfrentei Valverde, — eu disse. Meu pai


precisava começar a entender que eu não era a princesa do
cartel de Cristiano. Como minha mãe, eu estava aprendendo
a ser uma parceira nisso. — Vi seu rosto machucado, ouvi
suas más desculpas e admissões – incluindo, pela primeira
vez, que minha mãe foi estuprada. Eu sabia que tinha
acontecido, mas ninguém nunca me contou. Eu tive que
pensar por anos, depois ouvi-lo de Vicente Valverde.
O rosto do meu pai empalideceu. — Por que eu te diria
isso? Saber os momentos finais de Bianca quase me matou
todos esses anos atrás. Eu escondi isso de você para protegê-
la.

Cristiano levantou a palma da mão sobre a mesa e


gesticulou para a minha. Eu peguei a mão dele. — Ela é mais
dura do que você acha, Don Costa, — disse ele. — Mantê-la
no escuro não fez nada além de prejudicá-la.

— Respeito você como marido dela, mas não posso dizer


que concordo. — Papá colocou os cotovelos na mesa e
beliscou a ponta do nariz. — Nenhuma criança deve ouvir
essas coisas sobre os pais.

— Você não protegeu Bianca dos horrores deste mundo,


— apontou Cristiano.

— E como eu disse, — papá retrucou, — veja o que


aconteceu com ela.

— Isso não aconteceu porque você a incluiu no seu


negócio, — eu disse suavemente. — E não foi porque você
não a protegeu. Você não poderia ter parado.

— Você não sabe disso.

Cristiano e eu trocamos um olhar, falando um com o


outro sem palavras. Não havia muito o que dizer, exceto pelas
notícias finais que duvidava que um de nós quisesse dar.
Meu pai deu um suspiro. — Diga-me que você me trouxe
essas informações sobre Valverde para que eu possa agir de
acordo. Agora. Esta noite.

— Você pode agir hoje à noite, — disse Cristiano


gravemente, balançando a cabeça lentamente. — Vou levá-lo
escada abaixo para eles quando estivermos por aqui.

— Eles? — Ele perguntou. — Quantos?

— Três mais um neto, Gabriel Valverde. Isso é tudo o


que resta da família. Mas decidimos poupar a vida de Gabriel.

— Jamás, — disse Papá, balançando a cabeça


vigorosamente. — Nunca. Não.

Minha boca apareceu. — Você nem ouviu quem ele é.

— O que há para saber? Ele é um Valverde. A linhagem


deles termina agora.

Eu me mexi no meu lugar. — Mas...

— A resposta é não. — Seu olhar escureceu em


Cristiano. — Se qualquer homem que tenha a ver com o
assassinato de Bianca...

— Ele não é um homem. — Engoli em seco. A presença


do meu pai e de Cristiano me deixou pequena, mas não podia
me silenciar. — Ele tem apenas dezessete anos. E ele era
criança quando tudo isso aconteceu.

Meu pai olhou para Cristiano: — Você não pode


permitir.
O olhar de Cristiano desviou-se para o prato de
migalhas diante dele, quando ele flexionou e curvou a mão
sobre a mesa. Eu quase podia ouvir as rodas de sua mente
em movimento. Eu deixei claro sobre Gabriel. O que havia
para pensar?

— É a decisão de Natalia, — disse Cristiano finalmente,


— e a rainha decidiu deixá-lo ficar com a cabeça. Eu a apoio
completamente.

— Natalia é muito misericordiosa, — ele franziu a testa


para mim. — Sinto muito, mi amor, mas esse é o domínio de
um homem. Se você quer ser rainha, dê um passo à frente
e...

— Estou sendo uma rainha. — Com o peso de uma


coroa proverbial, foi preciso um pouco mais de esforço para
me endireitar, mas eu fiz. — Nós não matamos os inocentes.
Nem todo conflito é resolvido com vingança e violência. Eu
aprendi isso com você. Você é misericordioso. Você é justo.
Você mostrou misericórdia para Cristiano quando ele era
menino, e veja quem ele é agora.

— É um erro, — ele avisou.

— Mas é meu para fazer.

— O garoto é um gênio em computadores, — Cristiano


interrompeu. — Ele só está conosco há uma semana, mas
Eduardo relata que é tão talentoso quanto afirmou. Ele
poderia ter muito a oferecer.
Eu esperava que isso fosse verdade. Não saberia se
tinha tomado a decisão certa, a menos que Gabriel nos
traísse. Eu estava fazendo um curso intensivo na realidade de
que minhas decisões não mais afetavam apenas a mim
mesma, mas a meu marido e a uma cidade inteira também.

A expressão de Cristiano azedou como se ele estivesse


prestes a sofrer uma extração dentária. — Chega disso. — Ele
olhou para mim. — Diga a ele.

Eu? A nuca do meu pescoço ficou úmida. E por um


momento entendi muito bem o que meu pai acabou de dizer.
Eu queria protegê-lo da traição de Diego, das notícias de que
ele não apenas confiava em um inimigo por tanto tempo, mas
o mantinha por perto.

Eu poderia pedir para Cristiano contar para ele por mim


ou pedir que ele levasse Papá ao porão para ouvir por si
mesmo, como eu. Mas o olhar de Cristiano me desafiou.
Mostrar força quando outros precisavam fazia parte do meu
papel.

Levantei-me e contornei a mesa para me sentar ao lado


de Papá. Quando estendi a mão, ele abriu a mão, pegou a
minha e levou a palma da mão aos lábios dele para um beijo.
— Qué, querida ? O que há de errado?

— Você me avisou sobre Diego.

Ele recuou. — Sim, e finalmente, ele está fora de cena.


Por que você está citando ele?
— Eu deveria ter escutado, mas mesmo se tivesse, seria
tarde demais. — Fiz uma pausa para pensar na melhor
maneira de dizer. Eu poderia suavizar o golpe com entrega
gentil – ou poderia fazer meu pai me ouvir falando sua língua.
— Ele nos fodeu.

Por hábito, eu esperava que ele comentasse minha


língua, mas ele só apertou minha mão com mais força e fez
uma careta. — Explique! Agora.

— Os Valverdes agiram desesperadamente para salvar


seu cartel. Mas eles tiveram ajuda. De Diego. E ele não era
um homem desesperado, mas um homem vingativo.

Os olhos do meu pai se arregalaram de uma maneira


que eu nunca tinha visto. Eu sempre podia contar sua raiva
pela maneira como seu olhar se estreitou, ofuscado por suas
sobrancelhas pesadas. Isso era algo mais. — Diego... ajudou?

— Foi ele quem deixou o assassino entrar em casa,


violou o sistema de segurança do complexo e deu a ele os
códigos para o cofre.

Meu pai havia aprendido a arte necessária para


esconder sua reação, mas isso não veio naturalmente para
ele. Atualmente em companhia segura, seu rosto ficou
vermelho cereja enquanto sua mão tremia segurando a
minha. — Eu não deveria acreditar tão facilmente. — Sua voz
baixa e profunda reverberou pela sala. — E isso diz tudo.
Bianca me avisou.
Apertei sua mão pegajosa. — Ele enganou todo mundo.
Exceto talvez ela.

— Por que? — Gotas de suor se formaram em seu lábio


superior. Ele balançou sua cabeça. — Eu já sei. A execução
dos pais dele. Bianca disse que ele estava ressentido com
isso. E eu, sempre me orgulho de ser um bom juiz de caráter.

— Você é, — eu disse. — Isso não muda isso.

— Ele também me enganou, — Cristiano ofereceu, seu


tom solene. — E eu era seu irmão.

Não senti falta da referência ao passado dele. Olhei para


Cristiano, ansiosa para ir até ele. Diego havia machucado
meu marido e meu pai tão profundamente que iluminou
brasas de raiva em mim. Eu queria ser justa, mas isso
significava que eu também não poderia ser cruel quando
chegasse a hora? Se eu tivesse Diego aqui nesta sala, tentaria
segurar Cristiano, sabendo o dano que ele poderia causar?
Ou eu deixaria a besta solta?

Parte de mim não se perguntava apenas sobre


Cristiano... mas também do que eu era capaz em nome de
vingança, especialmente para aqueles que amava.

— Diego é um mentiroso e covarde que cometeria


qualquer pecado para servir seus próprios interesses, — eu
disse. — Ele matou mi madre para vingar seus pais, sim –
mas ele também sabia que isso iria prejudicá-lo e dar a ele a
oportunidade de ficar ao seu lado enquanto você lamentava.
Eu deixei meu pai trabalhar a equação por conta própria
até que sua cabeça balançasse para cima e para baixo. —
Para ganhar minha confiança. Para me aconselhar. Infiltrar-
se no cartel Cruz – para que um dia ele próprio recebesse o
legado que acha que deve.

Cristiano enfiou um palito na boca e recostou-se. — Vou


deixar Valverde informar o resto, — disse ele. — Como Diego
os arruinou e exilou, e como ele planejou transformar o amor
de Natalia contra você, até que eu aparecesse.

— Qué cabrón, — disse Papá. — Eu nunca teria


permitido que aquele filho da puta fizesse isso.

Eu gostaria de poder concordar com ele e prometer ao


meu pai que ele sempre conheceria minha lealdade mais
profunda. Mas se Cristiano não tivesse retornado, eu ainda
estaria sob o feitiço de Diego. Depois de tudo que tinha caído,
eu teria permitido que ele acabasse com o Papá?

Eu olhei para minhas mãos. — Eu pensei que o amava,


e isso me cegou.

— Você o amava. — Cristiano ergueu os olhos para mim


enquanto lutava para acrescentar: — Tudo bem dizer. Foi real
para você.

Para mim. Isso piorou as coisas. Fingir que fui


enganada por sentimentos falsos seria mais fácil do que
admitir que abri minha alma a um inimigo.
— Você vê agora o homem que Diego é, — disse
Cristiano. — É isso que importa.

— Eu avisei que teria que matá-lo se ele partisse seu


coração, — disse meu pai.

Eu assenti. — Você avisou.

Um canto da boca de Cristiano se contraiu quando ele


reprimiu um sorriso.

— Isso me dá duas razões para colocar a cabeça em um


graveto e enviá-la pela Main Street em um carro alegórico, —
disse Papá, levantando-se da cadeira e erguendo-se sobre a
mesa. — Agora me diga onde encontrá-lo.

— Eu gostaria que pudéssemos, — eu disse.

— Nenhum lugar é seguro para ele agora. Barto! — Papá


chamou.

Barto entrou na sala de jantar imediatamente.

Quando Papá o interrogou, eu encontrei os olhos de


Cristiano. Seu olhar faminto me seguiu ao redor da mesa
quando fui até ele. Ele me puxou para seu colo antes de
deslizar meu bolo na frente dele. — Você não terminou sua
sobremesa.

Coloquei meus braços em volta do pescoço dele. —


Estou cheia. Eu não posso comer outra coisa. Se você
quiser...
Ele esfaqueou o garfo nele, pegando quase metade da
fatia e enfiou na boca.

Eu pisquei para ele. — Um jantar completo e sobremesa


não foram suficientes?

— Nunca recuse comida, — disse ele mastigando.

Eu não o via devorar nada com tanto fervor desde que


ele tinha comido minha panocha 21 nesta mesma mesa. O
homem era insaciável – e ele estava certo em tirar minha
virgindade. Qualquer coisa que eu experimentei até conhecer
o pau de Cristiano era esquecível.

Papá pigarreou e cada um de nós se virou para ele. —


Presumo que o casamento tenha sido consumado.

— Papá. — Minhas bochechas coraram quando meus


braços se apertaram ao redor do pescoço de Cristiano. — Isso
não é da sua conta.

— É da minha conta, — respondeu ele, com os olhos em


Cristiano. — Eu prometi que faria seu marido pagar se ele te
machucasse.

— Ela parece machucada? — Cristiano perguntou. —


Eu disse que ela seria amada, tratada bem e protegida aqui.
Estou fazendo o meu melhor em todas as frentes.

Fui bem tratada e protegida tanto quanto qualquer um


poderia ser em nossas circunstâncias. Mas eu fui amada?

21 Boceta
Calor acumulou em minha barriga enquanto eu estudava, de
perto, a barba escura e raivosa de Cristiano, a cavidade de
sua bochecha e as linhas finas em torno de seus olhos
devastadoramente astutos.

O amor era algo que ele podia expressar quando o


sentia, ou precisaria de tempo?

— As coisas obviamente mudaram entre vocês, — disse


meu pai. Eu me virei para encontrá-lo olhando para mim. —
Acho que saber a verdade fez a diferença na maneira como
você vê seu novo marido, mija. Sim?

— Sí, Papá, — eu concordei. — Certamente havia


maneiras melhores de me tornar sua esposa. — Cristiano
teve a decência de parecer arrependido – apesar de ter
deixado claro que tinha pouco a se arrepender. — Mas tenho
uma vida inteira para puni-lo por isso, — acrescentei.

A boca de Cristiano deslizou em um sorriso sinistro. —


Uma frase que terei prazer em cumprir.

— Espero netos em breve, — disse meu pai em um tom


de bom humor que fez Cristiano e eu levantarmos as
sobrancelhas um para o outro.

Virei minha cabeça para Papá. — Por que...?

— Eu preciso de um motivo?

Uma risada surpresa escapou dos meus lábios. Tentei


me levantar, mas os braços de Cristiano se apertaram em
volta da minha cintura.
— Com esta notícia sobre Diego, — meu pai disse, —
não posso deixar de pensar em família. Do que ele me custou.
De como Bianca amaria um neto, especialmente porque seria
de Cristiano, de quem ela cuidava.

Com a aprovação de minha mãe, mesmo de além-


túmulo, meu coração acelerou. Inclinei-me e esfreguei minha
bochecha contra a de Cristiano. — É um bom pensamento,
padre, — eu disse. — Um dia. Nós temos tempo.

Cristiano estava estranhamente silencioso sobre o


assunto. Ele tinha apenas uma coisa a dizer quando deu um
tapinha na parte externa do meu quadril. — Vá para a cama
– eu vou em breve. Seu pai e eu temos negócios lá embaixo.

Os negócios eram tudo que eu precisava ouvir.

A hora de comer, beber e se divertir já havia passado.


Agora era a hora de matar.
18

Cristiano

Talvez tenha sido todo o tempo que passei em fazendas


que me transformou em um animal hoje à noite. Talvez
tenham sido semanas de sono com Natalia e pensando em
nada além de todas as maneiras que eu queria fodê-la. Ou
anos me perguntando sobre sua vida – se ela floresceu ou
recorreu simplesmente à existência após a morte de Bianca, e
se ela ainda era cegamente devotada ao meu irmão ou se era
mais nostalgia do que qualquer coisa que os mantinha
juntos.

Isso não importava. Esta noite, eu abraçaria o animal.


Eu proverbialmente colocaria os assassinos de sua mãe aos
pés da minha esposa. Eu cortaria mais três gargantas em
nome de Bianca.

Em nossa cama, segurando os quadris de Natalia com


mais força do que eu quis dizer, eu bati nela por trás como
um cachorro montando sua cadela. Eu nunca fiquei tão
agradecido por ter um quarto à prova de som. Devia saber
que acabaria me casando com uma barulhenta.

Enrolei os longos cabelos escuros de Natalia em volta do


meu pulso e puxei a cabeça dela para trás. Eu gostava dela
desse ângulo, nas mãos e nos joelhos, mas sentia falta do
rosto dela. Especialmente quando foi ferrado de prazer.

— Mais rápido, mais forte, — ela chorou.

Ela estava falando sério? Eu nunca tinha fodido assim


na minha vida. Se eu fosse mais rápido, ela acabaria no
quarto ao lado. Se eu fosse mais forte, ela chuparia minhas
bolas.

Eu diminuí a velocidade, em vez disso, e depois de


algumas bombas deliberadas, curvei minha mão em torno de
sua bunda. — Por tanto tempo, você me tratou como seu
próprio monstro pessoal, — eu ameacei, agarrando um
punhado de sua bunda. — Agora, enquanto eu estou
preenchendo você, eu quero ouvir você dizer que você é
minha esposa.

— Ou o que?

Ela queria brincar. Eu também. Natalia já tinha


cutucado o animal antes, na nossa noite de núpcias, quando
eu a inclinei para o lado da minha cama e ameacei destruí-la.
Sua boceta deixou uma mancha molhada na ponta do meu
pau. Talvez uma semana depois, eu lhe dei um jantar de
frango quando enfiei El Gallo na garganta – e ela limpou o
prato. Ela possuía uma escuridão que se estendia para o
quarto. Sorte minha.

— Diga que você é minha esposa, ou eu vou bater em


sua bunda.
Ela mordeu o lábio inferior e deliberadamente não
respondeu.

Eu me forcei a me afastar dela, por mais doloroso que


fosse perder seu calor úmido.

Minha palma pousou com um tapa na curva externa de


uma bochecha, e ela ofegou. O choque no rosto dela foi
suficiente para fazer meu pau pular. Amassei a carne da
bunda dela, depois alinhei minha mão no mesmo local exato.

Ela caiu das mãos para os antebraços, pressionando a


cabeça no colchão.

— Volte para cima, — eu disse.

— E se eu quiser mais?

Lindo! Eu bati nela duas vezes com precisão e força


suficientes para fazê-la arder. Depois de um momento, minha
impressão da mão floresceu em sua pele. Talvez fosse isso
que eu deveria tatuar nela, porque nunca tinha visto nada
tão gostoso.

Ou eu tinha?

Alinhei minha cabeça latejante à sua fenda molhada e


empurrei dentro dela. Seu gemido de resposta foi quase tão
doce quanto sua boceta doce. Agora que meu pau a encheu, a
marca da minha mão parecia ainda melhor.

Peguei seus cotovelos e a puxei para cima. Nós dois


gememos no novo ângulo. Eu estava profundo ‘pra' caralho
agora. Eu mantive seus braços em um aperto firme, usando-
os como alavanca para entrar nela. — Você está presa agora,
hein? Essa bocetinha gananciosa me pertence. Diga.

Ela arqueou as costas, deixando a cabeça cair no meu


ombro. — É tão.

— E daí? — Enterrada até a raiz, cutuquei seu colo do


útero com algumas investidas curtas, e seus seios saltaram
em direção ao teto.

— É possível sentir isso no meu estômago?

Eu podia vê-la melhor agora. Eu queria a boca dela,


seus olhos requintados nos meus, e ver seus traços delicados
quebrarem com o orgasmo. — Você é a coisa mais perfeita
que eu já vi. — Eu capturei seu lóbulo da orelha entre os
dentes. — Mas se você não se chamar de minha esposa, eu
vou entrar em você e ficar lá até que não haja dúvida de que
você ficará grávida.

Ela estremeceu. Em tão pouco tempo, eu conheci esse


tremor específico como os primeiros tremores de seu clímax.
— Eu não quero seu bebê.

— Eu não me importo. — Eu circulei minhas mãos em


volta do pescoço, puxando-a de volta contra mim. — Olhe
para mim e diga.

Ela mal podia virar a cabeça nas minhas garras. Eu


nunca colocaria minhas mãos em volta da garganta de uma
mulher dessa maneira. Eu queria assustá-la. Eu queria o
medo e o orgasmo dela. Seus olhos violeta sempre
hipnotizantes encontraram os meus, e neles, eu encontrei
clareza. Determinação. Devoção. — Eu sou sua esposa, —
disse ela com firmeza. — Sou sua. E você é meu, marido.

Meus ouvidos tocaram com a minha erupção iminente.


Eu estava segurando-a com muita força, tentando penetrar
nela, tentando não machucar seu pescoço delicado enquanto
seu colo do útero batia. Eu só afrouxei meu aperto quando
ouvi a palavra parar. Eu me forcei a desacelerar o tempo
suficiente para entender o que ela estava dizendo.

— Não pare, — ela chorou. — Deus, Cristiano. Por favor,


não pare.

Eu a peguei para acalmá-la. Ela era uma barulhenta até


os momentos finais, mas seus orgasmos a silenciaram.
Quando ela ficou muda, ela estava perto. Ela abriu a boca e
ofegou por ar, deixou a cabeça cair no meu ombro e se
submeteu ao clímax.

No momento em que sua vagina me agarrou, eu era um


caso perdido. Soltei seu pescoço e a abracei enquanto ela me
ordenhava até que eu entrei em erupção.

Quando ela ficou frágil em meus braços, eu a coloquei


de bruços, me apoiei sobre ela e bombeei lentamente,
mantendo minha promessa. Eu joguei toda última gota nela
e, quando terminei, fiquei enterrado dentro dela, mantendo-a.

— Nós nunca conversamos sobre isso, — disse ela


calmamente.
— A que você está se referindo? — Perguntei, mesmo
sabendo.

— O que você acha? — Ela perguntou com aquele pouco


de atrevimento que eu amava. — Você sabe que eu não estou
no controle da natalidade.

Eu me afastei e sentei nas costas de suas coxas,


separando seus doces lábios rosados. — Você parece tão bem
‘pra’ caralho, cheia até a borda, — eu disse. — Você deve ver
como minha porra fica dentro de você.

— Você sabe o que acontece quando faz isso, não é?

Eu não pude evitar minha risada. — Eu ouvi.

Eu a afastei para deitar ao seu lado, tirando os cabelos


do rosto. — Na sua idade, você é extremamente fértil.

— Você é fértil na sua idade, velho? — Ela perguntou,


batendo os cílios em mim.

Eu recuei. — Trinta e quatro? Lamento dizer isso a você,


mas estou no meu melhor. Nós já poderíamos estar grávidos.

— Você diz isso tão facilmente, como se estivesse me


avisando que está saindo para conchas e café. — Ela tirou o
olhar de mim, sem olhar para nada na cama entre nós. —
Começamos a fazer isso, Cristiano. É uma boa ideia...

— Eu amo como você diz meu nome, — eu disse a ela,


de repente incapaz de pensar em outra coisa que não fosse
beijá-la. — Venha aqui.
— Eu não consigo me mover um centímetro. Depois de
andar a cavalo, além de treinar para combater predadores
durante o dia e ceder a um à noite de amor, estou tão
dolorida.

Eu trabalhei com ela todos os músculos na semana


passada. Eu a queria forte e satisfeita no final de cada dia. —
Vamos parar o treinamento, — eu disse, massageando seus
ombros com uma mão. — Se por alguma chance louca você
estiver grávida...

— Eu não quero parar, — disse ela, fechando os olhos


com um suspiro contente. — Eu gosto disso. Prefiro estar
preparada do que grávida.

Nós já deveríamos ter tido essa conversa. Eu apenas


parei para pensar sobre isso. Eu queria estar dentro dela o
tempo todo. Para ir o mais fundo que pudesse. Ver meu filho
crescer em sua barriga. — Você não quer um bebê?

Ela abriu os olhos para estudar meu rosto e fez uma


careta quando se levantou sobre um cotovelo. — Ainda não.
Tudo isso tem sido tão...

— E daí? — Perguntei baixinho quando ela não


continuou. — Você pode ser honesta.

— Tão rápido. Sou grata por isso, mas às vezes ainda


sinto vergonha. — Meu estômago se apertou antes que ela
acrescentou: — Vergonha de como estou feliz. Passei tanto
tempo vendo a vida do cartel como má. Você deveria ser o
diabo. Sinto como se estivesse vivendo a vida de outra
pessoa.

Alarmado, eu também me levantei. — O que isso


significa?

— Só que tudo virou tão rápido. E, ao mesmo tempo,


não. Eu sempre senti algo forte entre nós. No começo, eu
pensei que era apenas química sexual. E ódio. Um tipo
retorcido, onde eu também não conseguia parar de pensar
em você. — Seus olhos dispararam entre os meus antes que
ela rolasse de costas e olhasse para o teto. — Eu me pergunto
se eu estava traindo minha antiga eu, mas após a
manipulação de Diego eu nem sei quem eu sou. E daí se
nada disso é real?

Dói-me ouvi-la se perguntar. Era isso o que vinha


passando pela mente de Natalia desde aquele dia com os
Valverdes? Ela tinha acabado de garantir ao pai que Diego
havia enganado a todos nós, e isso não diminuiu o
julgamento de caráter de Costa.

— Eu livraria essa vergonha para você, se pudesse. —


Seus cabelos se espalharam sobre o travesseiro, e eu peguei
um punhado de fios de seda para passá-los pelos meus
dedos. — Mas você superará com o tempo. Sua traição ainda
é bruta. Enquanto isso, peço que, quando você não puder
confiar em si mesma, confie em mim para saber quem você é.
E você está exatamente onde deveria estar.

Ela virou a cabeça para mim. — Como você sabe?


— Quando voltei para casa, há onze anos, vi o que você
não viu. Que Diego estava enganando todo mundo. E que ele
tinha você em suas mãos. Eu me esforcei muito para tirá-lo,
não foi? Eu sabia. Confie em mim. O caminho não era claro
ou fácil, mas eu tinha fé que acabaríamos aqui.

— Aqui, — ela repetiu. Simplesmente. Sem inflexão ou


entusiasmo.

Natalia não me deu nenhuma indicação recentemente


de que queria estar em outro lugar. Mas se a verdade do
engano de Diego a fez duvidar de si mesma – talvez isso
mudasse algo para ela.

Engoli em seco, a apreensão afundando junto com uma


pergunta que eu precisava fazer. Eu tinha enfrentado muitos
medos na minha vida e sempre saía mais forte. Mas desde
que eu era adolescente, diante de Costa, eu tinha sido
confrontado com o medo de desistir voluntariamente de
alguém que amava.

— Antes de confrontar os Valverdes e saber a verdade,


você me disse que tinha terminado sua antiga vida. Isso
mudou?

Seu silêncio de resposta me fez suar. Quão tragicamente


irônico seria. Eu lutei muito trazer os Valverdes para ela,
para que ela pudesse finalmente liberar qualquer dúvida
sobre mim e se deixar apaixonar por mim completamente.
Mas ela já começou a cair. E se descobrir que ela não podia
confiar em seu julgamento a fizesse duvidar de nós? Duvidar
de mim?

— Eu quero estar aqui mais do que qualquer coisa,


mas... — Ela disse tão devagar que doeu.

Meu coração batia tão forte quanto durante o sexo. Eu


não tinha certeza, se confrontado com a decisão, que poderia
deixá-la ir. Agora que vislumbrou a vida que poderia ter
comigo, a coisa certa seria libertá-la e deixá-la decidir por si
mesma.

Mas então, a coisa certa teria sido não levá-la em


primeiro lugar.

— Mas você consegue entender por que é difícil admitir


isso? — Ela disse. — Que eu escolhi isso?

Ela escolheu isso. Era isso que eu precisava ouvir para


aliviar meus medos – por enquanto.

— É possível que, mesmo quando eu não confiei em


você, eu confiei, no fundo? — Ela continuou.

— Sim. Tinha sido meu trabalho vigiar sua família.

— O dia em que minha mãe morreu abalou nossa base,


mas talvez nunca tenha quebrado. — Ela colocou a mão na
minha bochecha, e eu me inclinei nela, esfregando minha
barba por fazer na palma da mão. — Adoro quando você faz
isso, — disse ela. — Isso me faz sentir como se eu tivesse
domado um animal.
— Você chamaria o que acabamos de fazer de domar?

Ela sorriu. E então, — eu confio em você.

Ah! Aí está. Porque eu nunca senti tanta satisfação,


deslizei minha mão sob seus cabelos e me inclinei para beijá-
la. E, no entanto, no fundo da minha mente, eu entendi que
estava tão aterrorizado quanto satisfeito – Natalia e seu amor
vieram com medos ainda maiores.

O medo de perdê-la só aumentaria à medida que nosso


relacionamento se aprofundasse.

— Você é tudo o que eu procurei, — eu disse contra seus


lábios. — Essa lealdade e devoção que você mostrou a Diego
quando tinha nove anos – eu ansiava. O amor entre seus pais
– você era uma família verdadeira. — Examinei seu rosto de
perto. Eu nem queria piscar. — Depois que Diego me ofereceu
tudo isso, eu o desejei com tanta força que estava disposto a
quebrar todas as minhas regras para tê-lo. Para ter você.

— É por isso que você foi tão insistente que viesse até
você de bom grado. Você queria que eu te escolhesse. E eu
escolho.

— Tudo o que fiz, fiz com o conhecimento de que poderia


lhe dar tudo o que você sempre desejou.

— E se eu desejo liberdade?

Eu parei. A única coisa que eu poderia dar a ela que


destruiria tudo. — Então peça. Veja qual é a minha resposta.
Eu não sabia minha resposta, mas minha reação
intestinal foi de: nunca. Se você ama alguém, liberte-o – foda-
se. Eu não era do tipo que esmagava algo que cobiçava antes
de deixar para lá – exceto talvez quando se tratava dela.

Felizmente, ela não perguntou.

— Meu pai me disse uma vez que queria que eu casasse


com um homem 'ótimo' – não um homem bom. — Ela inalou
audivelmente. — Agora, ele exige netos – ele deve pensar que
você é ótimo.

Eu sempre acreditei que Costa era um grande homem.


Ter o sentimento correspondido depois de crescer com uma
cobra como pai significava mais do que Natalia poderia saber.

— Eu quero uma família, — eu disse, — e vamos


atender às exigências de Costa – mas você está certa. Não é a
hora. Eu deveria ter mais cuidado, mas com você, e só você,
pareço perder o controle. — Corri minhas juntas pelos
arrepios em seu braço. — O tempo para uma criança nunca
estará certo quando tudo ao nosso redor for uma ameaça,
mas até que tenhamos lidado com Diego e Belmonte-Ruiz,
vamos esperar.

— Concordo. — Ela estendeu a mão e tocou uma das


feridas no meu abdômen com uma palma quente e suave. —
Você não escondeu nada esta noite. Você se sente bem?

Eu estava andando a cavalo, levantando caixas e


andando e levantando minha esposa em qualquer chance que
eu tivesse. — Estou bem.
— Você pensa que é invencível, mas não é, Cristiano. —
Ela virou de bruços. — Se eu vou ficar aqui com você, então
eu preciso que você fique por aqui.

— Eu não vou a lugar nenhum, — prometi enquanto


meus olhos saltavam para a curva perfeita de sua bunda sob
o lençol branco.

Ela fechou os olhos e moveu a bochecha contra o


travesseiro. Depois de alguns instantes, ela disse: —
Cristiano?

— Sí, mi amor?

— Você trouxe sua arma para a cama?

Ah, a que estava inclinada, carregada e cutucando seu


quadril. — Eu não controlo quando o galo canta.

— Eu quis dizer o que disse. — Ela deu um suspiro


doce. — Você me destruiu. Eu literalmente não posso me
mover.

— Você não precisa. De fato, seria melhor se você não o


fizesse.

— Por que? — Ela perguntou.

Deslizei o lençol até as coxas dela, depois passei uma


perna por uma dela e a abri. Salivando ao ver sua bunda lisa
e firme, eu disse: — Eu posso invadir você exatamente como
você está agora.
Ela riu baixinho. — Você é como um cachorro com um
osso.

— De fato. — Deslizei na cama para me aproximar dela,


passei a mão pelas costas dela e sussurrei em seu ouvido. —
Eu tenho que tirá-la do meu sistema. Essa necessidade
avassaladora de transar com você. Então vamos fazer amor,
prometo.

— Cristiano, meu sol, lua e estrelas, — disse ela, com os


olhos ainda fechados. — Nós já fizemos amor.

— Eu sei. Mas quero dizer de uma maneira que nos


muda cada um para nossos núcleos. Estou me segurando
para não te assustar.

Suas pálpebras se abriram. — Você já me assustou.


Você não vê como eu reagi à ideia de você se colocar em
perigo novamente? E se eu me permitir... e então eu te perco?

Inspirei e tentei não ler muito o que ela não tinha dito.
— E se eu te perder agora que finalmente tenho você? — Eu
disse. — Isso significa que eu não deveria nem tentar?

— Tentar o que?

— Amar você ou alguém. Ninguém na minha vida está


seguro. Ninguém jamais estará. — Eu tracei as linhas
bronzeadas fracas em suas nádegas desde a tarde na praia.
— Você acha que seu pai se arrepende de amar Bianca? Ele
não se arrepende.
Seu arrepio e a expressão de satisfação em seu rosto
quase dispararam a arma entre nós. Essa foi a minha deixa
para ir.

Lentamente, me afastei dela e me levantei.

Ela levantou a cabeça. — Aonde você vai?

— Vou tomar banho e me masturbar, ou não vou


conseguir dormir.

— E quanto a mim?

— Você está dolorida. E cansada – eu ouço na sua voz.


Descanse um pouco. Se eu desgastar você, talvez eu não
consiga aproveitar você de manhã. Vou acabar com você,
então.

Ela descansou a bochecha de volta no travesseiro


quando eu fui e liguei o chuveiro. Segundos a partir de agora,
em minhas fantasias, eu seria uma bola no fundo do 'cu' de
Natalia.

Mas quando eu pisei sob a corrente de água e peguei


meu pau na mão, não foi para onde minha mente foi. Em vez
disso, vi Natalia grávida do meu filho. Sem dúvida, eu era
uma merda doentia por ficar duro com isso, mas El Gallo
queria o que El Gallo queria. Deus a ajude quando ela
realmente estiver esperando meu filho! Eu já sabia que seria
uma confusão superprotetora.

Era tudo o que eu queria.


Apontei uma mão contra a parede de azulejos e estava
prestes a me acariciar no céu quando uma mão pequena e
hesitante me bateu nela. Eu olhei por cima do ombro. Natalia
colocou sua bochecha no meu bíceps e sorriu para mim. Meu
corpo a protegeu da água, mas sua palma molhada deslizou
ao longo do meu eixo.

— Eu pensei que você não poderia se mover, — eu disse.

Ela me acariciou gentilmente, quase como se estivesse


oferecendo conforto. — Você já me mudou para o meu
núcleo, Cristiano. E eu te amo.

Algo se soltou no meu peito. Eu não esperava... ainda


não. Mesmo que eu já soubesse que ela me amava, não havia
nada como ouvi-lo. Mesmo que eu tivesse mantido a fé de que
ela um dia iria, eu quase não conseguia concordar com a
minha sorte.

Calor correu através de mim. Calor e gratidão. Eu me


virei e peguei o rosto dela em minhas mãos, subitamente
sobrecarregado. — Você... Eu também te amo, minha Natalia.

Eu não conseguia expressar a magnitude disso com


palavras além disso, então eu disse a ela com meu beijo – e
ela respondeu, seus lábios macios aceitando cada beijo firme
que eu tinha que dar.
19

Natalia

Quando a água encharcou meu cabelo, Cristiano me


apoiou contra a parede do chuveiro e enfiou a mão embaixo
da minha coxa para levantar minha perna. Ele deslizou
dentro de mim e se enraizou ali, parando enquanto nos
beijamos, tornando-se parte de mim de maneiras
irrevogáveis. Seus dedos se curvaram nos meus cabelos. Com
os braços em volta do pescoço, puxei-o para mais perto.

Ele deslizou para dentro e para fora lentamente, me


atingindo em um novo local, que me enviou um profundo e
satisfeito ruído de prazer. Eu já estava inchada, sensível e
pulsando desde o meu último orgasmo, crua e dolorida.

Eu não sabia o significado de fazer amor até aquele


momento – eu não sabia o significado de amar. Eu fui tola em
pensar que sabia. Eu não queria amar Cristiano. Isso me
assustou, especialmente quando eu recentemente o temia.
Conhecê-lo dessa maneira, quando ele poderia ser tirado de
mim, era mais aterrorizante, no entanto.

Tudo o que ele queria realizar, tudo o que ele queria


proteger. Eu o admirava por isso, mas também o colocava em
perigo todos os dias.
E, no entanto, em um mundo de machismo e coragem,
as palavras de Cristiano antes foram as mais valentes que eu
já ouvi. Não apenas amando alguém que ele poderia
facilmente perder, mas querendo amor. Procurando isso.

Eu não era tão corajosa. Algo me disse que perdê-lo me


devastaria. E perder Cristiano era ainda mais provável do que
me apaixonar por um homem que eu odiava de todo o
coração.

Mas já era tarde demais agora.

Cristiano gemeu, movendo-se para mim, nossos corpos


escorregadios deslizando um contra o outro. Ele se afastou,
sua expressão dolorida quando seus olhos encontraram os
meus, e seus impulsos ficaram duros e firmes, em vez de
rápidos e febris como antes. A água bateu em nós, pingando
do nariz dele em mim.

Como eu poderia amá-lo tão ferozmente em tão pouco


tempo? E sentir que voltou sem condições?

Nossas bocas se encontraram, saboreando o sabor um


do outro. — Não entre dentro de mim, — eu disse.

— Eu preciso. Eu quero, Natalia.

— Mas eu quero provar você. — Eu empurrei seu peito,


e ele se retirou, seu pau em total atenção e balançando entre
nós. Fiquei de joelhos, peguei-o na boca e mostrei-lhe minha
fome, meu desejo de vê-lo desvendar. Com uma mão no meu
cabelo e um gemido nos lábios, ele derramou na minha boca
sem sequer um aviso.

Saímos do chuveiro e, depois de me lavar, coloquei


minhas alianças de volta quando ele tirou a navalha de uma
gaveta.

— Você vai fazer a barba? — Perguntei.

— Se não fizer, terá o dobro do comprimento pela


manhã. Você acordará ao lado de um animal selvagem.

— Imagine, — eu disse ironicamente, como se eu não


estivesse à mercê de um toda noite. Subi na ponta dos dedos
dos pés para um beijo rápido, depois passei um dedo sobre o
queixo. — Em algum momento, quando não estiver tão
cansada, vou raspar para você.

— Algum dia, — ele concordou. — Quando eu tiver cem


por cento de certeza de que posso deixá-la perto da minha
garganta com uma lâmina de barbear.

Eu ri. — Um homem sábio me disse uma vez que cem


por cento de confiança é um desejo de morte.

Quando me virei para sair, ele pegou meu antebraço,


puxando-me de volta à sua frente. Ele apertou os lábios,
hesitação nos olhos.

— Algo está errado? — Perguntei.

— Eu quero que você me faça uma promessa.


Uma brisa passou pela sala, ou talvez fosse apenas o
frio de seu tom grave que fez meu cabelo arrepiar. — O que?

— Se alguma coisa acontecer comigo, Natalia – e poderia


– me diga que você continuará vivendo uma vida plena. Se o
seu lugar for aqui, você assumirá as rédeas. Você será
implacável e gentil e prevalecerá sabendo que tem minha
bênção do além. E se você escolher outra vida, perseguirá
implacavelmente a felicidade.

— Eu não quero pensar sobre isso. — Chegou muito


perto de casa 22 . É claro que eu sabia que qualquer coisa
poderia acontecer a qualquer momento – aconteceu com a
minha mãe. A morte quase pegou Cristiano e eu. Eu estava
crua, física e emocionalmente, fodida e havia feito amor esta
noite. E eu concedi qualquer último pingo de resistência que
eu pudesse ter, para poder amar Cristiano.

Foi o maior risco que eu já corri por causa da


proximidade da morte sobre ele, e...

Você vai morrer por ele, seu amor.

As palavras da vidente estremeceram através de mim


pela primeira vez em um tempo. O que Cristiano estava
dizendo? Por que ele estava falando disso agora?

Porque o amor não era apenas uma ladeira


escorregadia, estava dirigindo sem freios e confiando que você

22 Ser muitofranco sobre algo


estaria seguro a cada colina, vale e curva acentuada. E
Cristiano não estava acostumado a ficar à mercê de nada.

— Você tem que pensar nisso, — ele insistiu. — Faz


parte de ser governante. Você precisa me prometer que faria e
seguiria em frente, se fosse necessário. — Ele pegou minha
mão nas suas, trazendo-a para sua boca com a barba por
fazer, raspando minha pele enquanto a beijava com
reverência. Ele colocou na testa, como se estivesse em
oração. — Por favor, Natalia. Me dê um pouco de paz na vida
após a morte. Diga-me que você continuaria e perseguiria a
felicidade, se eu fosse embora.

— Tudo bem, — eu disse, irritada por ele estar me


pressionando quando eu gostaria de viver apenas um dia sem
a ansiedade de perder tudo o que acabei de encontrar. — Mas
me dê o mesmo presente de paz. Se Belmonte-Ruiz tivesse
conseguido me matar, você teria continuado. Você vai
continuar.

A calma o permeava, e seus olhos frequentemente


negros estavam mais perto de marrom-chocolate derretido
naquele momento. — Eu não posso fazer essa promessa, —
disse ele, as palavras pesadas pousando a nossos pés.

Eu recuei. — Você acabou de me fazer dizer isso. Por


que você não pode?

— Porque eu vou te seguir.


Franzindo a testa, mudei e coloquei minha outra mão
sobre a dele – então fizemos um punho como um coração. —
Como assim você vai me seguir, Cristiano?

— Na morte.

Com uma sensação de afundamento, meus olhos caíram


ao nosso alcance. Eu mal conseguia entender o que ele
estava dizendo. Apertei sua mão, mais por necessidade de
segurar algo do que por oferecer conforto. — Não diga isso.
Você não faria.

Seu olhar castanho chocolate endureceu para um vazio


opaco e inacessível. — Ninguém escaparia machucando você.
Eu levantaria o inferno para vingar você, e se isso significasse
arriscar minha vida para alcançá-lo, não hesitaria.

— Cristiano...

— Eu não teria permissão para o céu, mas juro por tudo


que é sagrado. Eu sacudiria os portões até que me deixassem
tê-la.

Arrepios saltaram sobre a minha pele com um novo tipo


de pavor. Ele quis dizer isso – e não havia como mudar de
ideia. Minha morte significaria a de Cristiano.

Eu não poderia morrer por meu amor – ou o derrubaria


comigo.
Por volta do amanhecer, uma batida firme de madeira
veio à porta do nosso quarto. Cristiano deixou o calor da
nossa cama e, quando eu comecei a voltar a dormir, ele me
despertou.

— Venha, — disse ele, um fio de pânico em sua voz. —


Vista-se.

— O quê? — Abri os olhos e pisquei para dormir. — O


que há de errado?

— É Max.

Nós nos vestimos rapidamente, e eu amarrei meu cabelo


em um coque enquanto Cristiano e eu corríamos para o
térreo. Ele abriu a porta da frente para mim e saímos.

O amanhecer apareceu nas montanhas cor de


hematoma, as árvores verde-limão quando o sol nascente
atingiu suas folhas. A vista pacífica da imensa e adormecida
Terra dos Condenados foi interrompida por um motor
acelerado. Um dos veículos de segurança sempre afixado nos
portões da frente estava subindo a encosta da montanha.

Eu protegi meus olhos, apertando os olhos à frente. O


caminhão levantou uma nuvem de poeira enquanto
descíamos os degraus da frente. Quando paramos no final do
caminho, Alejandro, Eduardo e Barto apareceram ao nosso
lado.

— É mesmo. — Alejandro começou.

O carro parou e um dos porteiros uniformizados de


Cristiano saltou do lado do motorista antes de correr para a
porta lateral. — ¡Ayuda! — Ele pediu ajuda e então abriu a
porta. Quando o passageiro saiu cambaleando, os quatro
homens correram para a frente.

O sol apareceu, brilhando sobre o homem como se ele


tivesse caído dos céus. Arrastando um pé e com um rosto
inchado da cor das montanhas roxas em suas costas, ele
estava quase irreconhecível. Exceto pelo olho de vidro. —
Max, — eu sussurrei.

Ele caiu de joelhos e enrolou os dedos na grama.


Cristiano o alcançou primeiro e caiu ao lado de Max.

Olhei por cima do ombro. Meu pai estava na porta junto


com metade da equipe, com as mãos na boca. — Ligue para a
doutora Sosa.

Max se levantou do chão para se sentar sobre os


calcanhares. — Agua, — ele implorou.

Enquanto caminhava em frente, chamei de volta: — E


pegue água, agora!

— Você escapou? — Cristiano perguntou quando eu os


alcancei.
Com uma careta, Max balançou a cabeça. — Eles… me
deixaram sair, — ele murmurou.

Cristiano olhou para mim. — Mas por quê?

— Trégua, — disse Max com voz rouca.

Trégua? Eu fiquei imediatamente em dúvida. Isso não


fazia sentido. — Por que eles pediriam uma trégua? —
Perguntei.

O rosto de Max se contorceu quando ele engoliu e


formou os punhos contra o chão. — Deixe seus negócios em
paz.

— Por que eu faria? — Cristiano perguntou. Sua raiva


enviou um tremor pelo ar. — Porque eles devolveram um
homem que levaram? E torturam? Tenho ainda mais motivos
para destruí-los.

— Eles vão sair. — Disse Max. — Eles vão parar.

— Parar o que? — Perguntei.

— Tráfico.

Cristiano congelou. Ele não esperava essa resposta, nem


eu. Era o que ele queria – terminar o negócio deles. Mas
poderíamos confiar nessa informação? A preocupação
também se registrou no rosto de Cristiano.

Jaz entregou uma garrafa de água e recuou, cruzando


os braços finos sobre o estômago. Max bebeu de uma só vez,
jogou o plástico vazio para o lado e tentou se levantar.
Cristiano se levantou e o ajudou. Observar Max se
esforçar para ficar em seus próprios pés foi doloroso de
assistir, e Cristiano deve ter sentido o mesmo. — Não há
trégua, — disse ele. — BR pagará por isso, meu amigo. Eles
fizeram muito dano...

Max levantou a mão para detê-lo e limpou a boca na


manga antes de aceitar outra garrafa de água. Quando ele
abriu a blusa, ele conseguiu — Diego.

O nome enviou calafrios na minha espinha.


Instintivamente, peguei Cristiano quando ele abriu o braço e
me puxou para o lado dele. — Ele participou disso? —
Cristiano perguntou.

Max começou a assentir, depois tossiu e cuspiu, virou-


se e vomitou.

Cristiano olhou para Alejandro. — Encontre Diego e


execute-o. Agora. Jogue-o sobre um penhasco por tudo que
eu me importo. Não preciso mais assistir a vida se esvair
dele. — Cristiano baixou os olhos para os meus. — Você?

Eu balancei minha cabeça. — Eu só quero que ele se vá.

— Minha esposa exige a morte dele, — disse Cristiano.


— Então mate-o – e faça isso rápido.

Max, ofegante, encolheu-se quando se curvou, as mãos


nos joelhos. — Nós… não podemos matar Diego.

— Por que não? — Cristiano passou a língua pelos


dentes da frente. — Me dê um maldito motivo para eu não...
Com grande luta, Max levantou a cabeça. — Ele já está
morto.
20

Natalia

Max estava deitado em um quarto de hóspedes escuro,


recém-banhado e segurando uma garrafa de analgésicos. A
enfermeira que a doutora Sosa havia providenciado para nós
colocou uma toalha úmida sobre os olhos inchados, cuidando
das bochechas manchadas de cortes e contusões. Ele
agradeceu.

Segurando o rosário de minha mãe, caí em uma cadeira


e pressionei meu polegar no crucifixo.

Diego estava... morto.

O que eu deveria sentir sobre isso? Triunfo? Pena? Ele


poderia ter tido amor e oferecido perdão. Em vez disso, ele
escolheu o ódio e a vingança – e esse tinha sido o caminho
errado. A nostalgia afetou meu alívio por ele ter partido.
Houve bons tempos. Momentos genuínos de riso e carinho.
Montando na propriedade em nossos cavalos, correndo de
uma ponta a outra da cerca. No estúdio de arte de minha
mãe, transformando nossas impressões de mãos pintadas de
amarelo em galinhas, adicionando penas e bicos vermelhos à
impressão digital. E revezando-se com o telescópio,
apontando constelações um para o outro. Lembrei-me do seu
sorriso largo, olhos pacientes e sua preocupação com o meu
bem-estar sempre que falávamos no telefone – mas será que
isso era real se tudo tivesse sido construído com uma
mentira?

Não importava mais. Ele estava fora de nossas vidas, e


era assim que tinha que ser. Eu pensei que talvez eu quisesse
enfrentá-lo no final, até mesmo provocá-lo – mas eu não
precisava disso. Foi o suficiente saber que ele se foi.

Max removeu o pano e colocou suas pílulas na mesa de


cabeceira. A enfermeira o ajudou a sentar-se, depois arrumou
os travesseiros na cabeceira da cama.

— Como você se sente? — Perguntei.

— Dolorido, — respondeu ele, — mas grato por estar


vivo.

Com a voz rouca, a enfermeira encheu de água uma


jarra na mesa de cabeceira.

A preocupação gerou linhas ao redor dos olhos de


Cristiano quando ele a dispensou com um aceno de cabeça.
— O que aconteceu? — Ele perguntou quando estávamos
sozinhos.

Max olhou para mim e depois pegou uma unha


enegrecida. — Eu vou te contar tudo mais tarde. Por
enquanto, o importante é que Belmonte-Ruiz colocou Diego
no chão.

— Você tem certeza, Maksim?


Mesmo com as pálpebras inchadas de Max e os
inchaços roxos de Bizâncio 23 ao redor de seus lábios, eu
podia ver sua expressão se contrair. — Vi com meu único
olho bom. Diego se foi.

— Quero dizer que não estou surpreso, — disse


Cristiano, olhando de mim para Max. — Mas eu sabia, na
igreja, que quando eu libertasse meu irmão, ele não
sobreviveria enquanto eu estivesse na natureza. Eu o
subestimei, mas no final, eu estava certo.

— Como isso aconteceu? — Perguntei.

— Quando soube que Diego estava morto, eu disse que


não entregaria a mensagem a menos que eu tivesse certeza.
Eles me permitiram ver o corpo antes de descartá-lo. Diego
estava frio e sem vida em uma bolsa de corpo. Overdose
involuntária.

O cabelo na parte de trás do meu pescoço subiu, e eu fiz


o sinal da cruz. Mesmo quando meu estômago deu uma
cambalhota com o pensamento do corpo em decomposição do
meu melhor amigo de infância, eu gostei da confirmação de
sua morte.

Cristiano cobriu a boca com o punho. — Razão?

— Uma oferta para fazer as pazes com você e Costa, —


Max explicou, — mas há mais do que isso. Pelo que eu

23 A cor Bizâncio é um tom particularmente escuro de purpura.


descobri durante o meu tempo lá, Diego estava lhes custando
dinheiro, fazendo promessas que ele não podia cumprir.

— Como os Maldonados, — disse Cristiano. — A história


se repete. Diego nunca aprende. Que tipo de promessas?

O rosto de Max se contorceu quando ele se mexeu.


Levantei-me para ajudá-lo a arrumar o travesseiro. — Meu
palpite? — Max disse. — Com base no que eu peguei dos
guardas e de outros prisioneiros, Diego disse à BR que ele
poderia fazer você trabalhar para eles, não contra eles.

— Por que diabos eu trabalharia para eles? Nenhuma


quantia em dólar poderia me convencer, nada no planeta... —
Cristiano passou a mão pelo rosto enquanto balançava a
cabeça. Ele suspirou. — Natalia.

— O que? — Perguntei.

Max acenou para mim. — Ouvi falar da violação de


segurança aqui na mesma noite em que nos atacaram no
hotel. Eles poderiam estar tentando sequestrar você?

— Sí, — disse Cristiano entre dentes. — Eles levariam


minha esposa. Para retorno e estratégia.

— Estratégia? — Minha palma doía quando as contas do


rosário cavaram nela. Eu olhei entre os dois. — Para fazer o
que comigo?

Cristiano garantiu que o mundo pensasse que eu não


era nada para ele. Apenas poucas pessoas entenderam, desde
o início, que o oposto era verdadeiro. Diego foi o primeiro. Ele
colocou tudo isso em movimento.

Ele foi a Belmonte-Ruiz e disse a eles o que eu valia.

E como me pegar.

Minha nostalgia desapareceu quando me lembrei de


como Diego era conivente o tempo todo.

Minha garganta se fechou quando percebi que a


resposta para minha pergunta era óbvia, considerando o
negócio deles. — Eles teriam me vendido.

— Não, — disse Cristiano. Ele andou ao lado da cama de


Max, massageando sua mandíbula. — Isso teria começado
apenas uma guerra entre nós e não teria beneficiado Diego.
Ele está sempre pensando em como sair por cima. Se eu
estivesse no lugar dele, minha necessidade de controle
venceria o orgulho.

— Eu não entendo, — eu disse.

— Se eles conseguissem segurar Max fora do meu


alcance, eles poderiam fazer o mesmo com você. Eu seria
forçado a cooperar para mantê-la segura.

— Colaborar... como?

— Nossa infraestrutura, quando combinada com as


soluções de remessa da Costa, abrange não apenas as
Américas, mas também a Europa e partes da Ásia, —
explicou Max. — Trabalhar conosco pode aumentar seus
negócios da noite para o dia.

Cristiano assentiu e terminou o pensamento de Max. —


Mas depois de tudo o que eu acabei de fazer para impedi-los,
eles devem saber que eu nunca concordaria em fazer parceria
– não por qualquer quantia de dinheiro.

Meus dedos ficaram frios quando eu juntei as peças. —


Eles queriam que você traficasse pessoas.

Cristiano deixou cair o braço para o lado. — Diego sabe


que não há nada no mundo que possa me levar a fazer isso.

— Exceto pela única fraqueza que ele explorou antes, —


disse Max.

Eu. Eu era a fraqueza. A garotinha que ele foi acusado


de proteger. E então, quando ele voltou à cidade, eu me tornei
um outro tipo de fraqueza. Cristiano confessou mais de uma
vez que ele havia feito tudo isso por razões egoístas. Porque
ele queria amor. Meu amor Minha família. Ele me queria.

E ele estava disposto a deixar Diego viver para ter tudo


isso – dando a Diego toda a munição que ele precisava. Ele
planejou me usar como alavanca para transformar a vida de
Cristiano em um inferno. Forçar Cristiano a fazer a única
coisa que jurou nunca fazer. O que ele construiu uma vida
inteira prevenindo. E, no processo, Diego teria conseguido
mais controle, mais riqueza e virado a faca nas costas de seu
irmão - tudo ao mesmo tempo. E o que seria de mim?
Eu nunca descobriria e, por isso, agradeci a Deus por
manter o diabo em segurança. E agradeci ao meu diabo por
me proteger.

Quando peguei Cristiano olhando para mim, seu rosto


gravado de dor, atravessei a sala e peguei uma de suas mãos
enormes e poderosas nas minhas. O que teria feito Cristiano
decidir entre mim e a vida de muitos homens, mulheres e
crianças inocentes? Eu reconheci o olhar atormentado em
seus olhos pelo que era. Ele estava se espancando por não
saber o que ele teria escolhido.

Coloquei minha boca nas costas quentes e vigorosas de


sua mão e engoli para controlar a emoção na minha voz. —
Você nunca teria passado por isso, — eu assegurei a ele. —
Você é um bom homem. Você me deixaria ir para salvá-los, e
teria sido a escolha certa.

— Um homem bom demais? — Ele repetiu. — Você sabe


o que eu sou. Eu nunca poderia deixar você ir, e isso me faz o
tipo de monstro contra o qual tenho lutado.

Balancei minha cabeça e cerrei os dentes contra uma


onda de lágrimas. Era horrível demais para se pensar.
Cristiano teria feito a coisa certa. — Não importa. Você nunca
terá que fazer essa escolha.

Ele passou um braço em volta dos meus ombros e me


puxou para perto. Virei minha bochecha contra seu peito, e
ele cobriu o outro lado, me segurando lá. — Diego se safou
facilmente se ele tivesse prometido a eles que iria me libertar,
— disse ele, sua voz estridente contra o meu ouvido.

— Sim, — disse Max. — Mas se você não parar de foder


com Belmonte-Ruiz, eles sempre serão um inimigo.

— Quero acreditar na possibilidade deles pararem, —


disse Cristiano. — Mas por que eles? Todo o negócio deles é
um círculo de tráfico.

— Eles têm algo acontecendo do lado narcótico, — disse


Max. — Tudo o que sei é o que peguei aqui e ali, mas talvez o
informante de Alejo possa descobrir mais.

— Se não é tráfico, não importa, — disse Cristiano. —


Os deixe tomarem seus remédios. Eles podem até pegar em
armas e tentar roubar meus territórios por tudo que eu me
importo. Enquanto eles seguirem em frente.

Virei o rosto para a palma de Cristiano e o beijei,


agradecida por seu calor reconfortante, antes de puxar a mão
dele. Max tinha que estar exausto. Precisávamos deixá-lo
descansar. Mas primeiro eu tive que perguntar. — Você
aceitaria a trégua?

Depois do que ele passou, eu esperaria que ele dissesse


não. Ele tinha todo o motivo para querer revidar. Mas ele
apenas estreitou os olhos e disse: — Não é minha decisão,
mas se eu deixar de lado minha própria vingança pessoal...
eles fizeram duas ofertas de boa fé - tirando a vida de Diego e
poupando a minha. Se eles pararem porque nós paramos,
então nós todos conseguimos o que queremos.
Cristiano assentiu. — Você concorda, Natalia?

Parecia o fim. Diego não estava mais tentando nos


machucar. Belmonte-Ruiz nos queria de costas e, em troca,
haveria um pouco menos de sofrimento no mundo. Era isso
que Cristiano pretendia. Eu assenti. — Eu acho que se é
verdade... nós devemos aceitar.

Diego se foi, e o único arrependimento que senti foi que


ele não tinha sido capaz de superar seus próprios demônios
para fazer algo da sua vida. Mas se ele tivesse, talvez eu
nunca soubesse o amor enraizado dentro de mim por seu
irmão. Fiquei feliz, se tivesse que ser nós ou ele, que
Cristiano e eu ainda estávamos de pé.

Torci para envolver meus braços em volta do pescoço de


Cristiano. — Acabou, mi rey, — eu disse com um sorriso
genuíno. — Meu rei.

Ele procurou meu rosto com olhos escuros e céticos.


Cristiano passou onze anos esperando por esse momento, e
ele escapou mais de uma vez.

Agarrei seu pescoço, passei meus polegares pelas


cavidades sob as maçãs do rosto, que sempre o faziam
parecer tão sombrio, e o tranquilizei. — Acabou.

Meses de perigo e conflito terminaram. E, no entanto, eu


não tinha certeza de que era uma história que trocaria por
uma história mais fácil. Isso me preparou. Me educou. Me
fortificou. E isso me trouxe Cristiano.
Juntos, entraríamos no futuro mais fortes do que
nunca.
21

Natalia

Cinco meses depois

Cristiano e Papá me esperaram lá embaixo para que


pudéssemos sair para o desfile do Dia dos Mortos, mas eu
queria apenas mais alguns momentos na varanda do meu
antigo quarto. A música mariachi24 parecia mais fraca agora
do que na minha infância. Lembrei-me de dançar, pulando
pela casa enquanto eu cantarolava para mim mesma, minhas
sandálias de couro gastas clicando no azulejo.

Voltei para o meu quarto e verifiquei minha roupa mais


uma vez no espelho. Hoje, meu vestido colorido ombro a
ombro – uma explosão de laranja-calêndula, fúcsia e
vermelho-rosado contra o osso - foi uma homenagem a
Mamá, enquanto eu ficava ao lado de meu pai enquanto a
cidade o homenageia.

Braços fortes deslizaram pela minha cintura e eu


encontrei os olhos castanhos derretidos de Cristiano no
reflexo. — Ainda mais uma sinfonia do que o habitual neste

24Mariachi é um gênero musical popular do México e, simultaneamente, um termo de origem


incerta que se aplica aos grupos musicais que performam este gênero.
vestido e música para os meus ouvidos, — disse ele no meu
ouvido. — Você está linda. Você se parece com ela.

De terno e gravata, ele estava bonito como sempre.


Cobri seus antebraços com os meus, entrelaçando nossos
dedos. — Ela deveria estar aqui conosco

— Ela está. — Ele beijou a parte de trás da minha


cabeça. — Hoje, iremos ao desfile Día de los Muertos e
celebraremos sua vida.

— Com toda a cidade, — acrescentei.

— Eles a adoravam, como a você, — disse ele,


descansando as mãos na minha cintura, os dedos avançando
para dentro.

Inalei e tremi quando um calafrio percorreu minha


espinha.

— Frio? — Ele perguntou.

Não. Não foi isso. Ele sabia? Ele podia sentir o que
crescia sob as pontas dos dedos? Eu ajustei minha coroa de
rosas vermelhas no reflexo. — Com suas mãos em mim?
Jamás. Nunca.

Era verdade. Frio era uma coisa que Cristiano e eu


nunca sentiríamos. Com Cristiano, havia apenas calor.
Contentamento. Mesmo quando lutamos, o fogo ardia entre
nós.

Eu não queria que isso fosse de outra forma.


A vida estava mais animada do que nunca na Terra dos
Condenados, mas estava relativamente pacífica desde a nossa
trégua com Belmonte-Ruiz.

Eu tinha tudo o que eu poderia pedir – uma comunidade


que nos mantivesse alerta. Os negócios frutíferos do meu
marido e do meu pai. Minha família de boa saúde. Um futuro
cheio e promissor.

Um marido amoroso.

E a benção do filho dele na minha barriga.

Eu suspeitei que estava grávida na semana passada,


depois de ter uma náusea intensa três dias seguidos, mas
queria ter certeza antes de contar a Cristiano. Era quase
impossível fazer qualquer coisa na Terra dos Condenados
sem que ele descobrisse, então eu fugi para ver Paula na
clínica médica antes de sairmos para vir aqui.

Esta manhã, ela parou aqui em casa para colocar


silenciosamente um envelope nas minhas mãos para que
Cristiano pudesse ver por si mesmo.

Estávamos tendo um bebê.

Meu coração acelerou ao pensar no ultrassom que


estava na minha bolsa no andar de baixo. Cristiano ficaria
emocionado em saber as notícias, mas ainda assim, os nervos
afiaram minha emoção.

Especialmente no aniversário da morte de minha mãe.


Ser esposa de um dono de cartel, casada com um rei do
narcotráfico, e mãe aos 21 anos. Rainhas e reis do cartel
caíam o tempo todo, e onde isso deixava seus príncipes e
princesas? Cristiano e eu sabíamos muito bem - Eu sabia
que já tínhamos sido eles.

Era uma grande responsabilidade – nenhum de nós


assumiria levianamente. Veio com risco. Logo, o medo
floresceu em mim de uma nova maneira, sabendo o que eu fiz
desta vida e que apegos emocionais poderiam trazer.
Cristiano e eu perdemos os pais desde o início. Eu não queria
essa possibilidade para o meu filho, mas era a vida que
vivíamos.

E eu tinha o melhor homem do mundo para me apoiar.


Eu seria o mesmo apoio para ele.

Como ele fazia tudo o mais com paixão, fervor e coração


incomparáveis – o mesmo faria com a paternidade. Essa
criança conheceria o maior amor de ambos os pais.

— Pronta para ir ao desfile? — Ele perguntou.

Eu assenti. Primeiro, celebraríamos a vida de minha


mãe, juntamente com todos que esperavam visitas de seus
entes queridos neste dia dos mortos.

E então nos alegraríamos com o presente da vida


crescendo dentro de mim.
Passamos pelo desfile no último carro alegórico, o grand
finale – um esqueleto de smoking com um charuto preso em
um lado da boca. Cristiano e meu pai sopraram cada um por
conta própria, Montecristo, enquanto Papá reclamava da
obrigação de sua presença, enquanto ele acenava e sorria.
Secretamente, ele ficou satisfeito com a honra.

Caveiras de açúcar em branco e preto dançavam ao


nosso redor, enquanto damas vestidas como La Catrina
rodavam em vestidos coloridos e homens mascarados nos
carros alegóricos gesticulavam com as duas mãos para atrair
a multidão.

Uma mulher sorriu para Cristiano, balançando os


quadris enquanto o circulava. Ele piscou para mim.

Nós rastejamos pela estrada principal de lojas, carrinhos


de frutas e mercados anunciando cigarros e Coca-Cola.

— Vou mandar o garoto me buscar um mezcal, — disse


meu pai, enquanto a fina fumaça branca de cigarro com
cheiro de canela flutuava no vento.

— Gabe está trabalhando, — lembrei-o.

— Ele é inútil com um rifle. Barto deveria estar aqui em


cima.
Olhei para Gabriel Valverde, sua arma pronta, enquanto
ele montou no nível mais baixo do carro alegórico. Cristiano
não protestou quando me pediram para se juntar a meu pai
no desfile, mas estar em campo aberto a qualquer momento o
deixou ansioso.

— Estou tentando construir a confiança de Gabriel, e


Barto não tem falta disso, — eu disse, sorrindo para onde
Gabriel estava parado abaixo de nós, fora do alcance da voz.
— Ele melhorou muito. Você não consegue ver o quanto ele
parece mais forte?

— O garoto é um gênio. — Meu pai relutou em aceitar


um Valverde em sua vida e ainda não o chamaria de outra
coisa senão “criança” ou “garoto”, — mas pelo menos ele
reconheceu seu talento. — Ele deveria estar na frente de um
computador. Você precisa do cérebro dele dentro de casa, não
espalhado por todo o esqueleto de papel machê.

Ele tinha razão.

Tanto Barto quanto Cristiano haviam discutido o mesmo


argumento – e mesmo que tenha sido a única coisa em que
eles concordaram há algum tempo, eu colocava o pé no chão.
O desfile era à oportunidade perfeita para mostrar a Gabriel o
quanto eu acreditava nele. Com Barto em algum lugar
patrulhando a rua, todos os homens super protetores da
minha vida estavam num raio de quinze metros. Eu nunca
me senti mais segura.
Uma bebida com gás parecia muito boa, considerando
que meu estômago estava tão desconfortável. Toquei minha
mão brevemente. — Vou pegar o mezcal, — eu disse. — Uma
horchata gelada parece perfeita de qualquer maneira.

— Melhor que uma Coca Light quente? — Cristiano


perguntou. — Desde quando?

Minhas bochechas esquentaram. Meu corpo estava


experimentando coisas novas e incomuns. — Apenas um
desejo por algo diferente, — eu disse.

Oh. Ele arqueou uma sobrancelha. — Um desejo?

Eu levantei até as pontas dos pés e beijei sua bochecha


antes que ele pudesse seguir qualquer linha de pensamento
que estivesse se formando em sua mente. — Eu volto já.

— Você fica. — Ele me alcançou para largar o charuto.


— Eu irei.

— Fique aqui e aproveite o seu charuto, — eu disse e dei


a ele um olhar de repreensão. — Será o último que você terá
por um tempo.

Quando soube da indigestão de Cristiano, o fiz parar de


fumar, o limitava a tomar algumas bebidas por semana e
trabalhava com Fisker em receitas de refeições mais
saudáveis que não faziam Cristiano querer pular direto para
a sobremesa.

Mas era um dia especial.


Peguei minha bolsa de onde a tinha guardado, coloquei
por cima do ombro e comecei a me afastar quando uma mão
no meu cotovelo me puxou para trás. Eu me virei para
garantir que Cristiano ficaria bem, mas quando encontrei
seus olhos, havia apenas uma centelha de excitação neles.

Ele os levantou para o céu. — Veja.

Um pequeno caleidoscópio de borboletas-monarca


flutuou sobre nossas cabeças. — Papá, — eu chamei, e ele
caminhou até nós, seguindo nossos olhares.

A migração monarca passava durante o início de


novembro – como agora, nos dias de todas as almas, quando
o falecido vem visitar os vivos. Era por isso que se acreditava
que as monarcas mantinham os espíritos dos que partiram.
Isso acontecia todos os anos, mas nunca foi menos especial
acreditar que Mamá estava conosco. No dia do meu
casamento, achei a presença dela um aviso. Agora eu sabia
que tinha sido aprovação. Coloquei minha mão sobre meu
estômago. Hoje, ela voltou para abençoar a mim e ao meu
filho ainda não nascido.

— Te extraño mucho, Bianca. — Dizendo a ela que sentia


muita falta dela, meu pai sorriu, jogou cinzas do charuto nas
calêndulas vivas que nos cercavam e se afastou.

Cristiano tirou o Montecristo da boca, puxou meu rosto


para ele com uma mão e beijou meus lábios.

Eu andei até a parte traseira do carro alegórico,


acenando de volta para a multidão de desfiles. Com o ta-ra-ta-
ta de foguetes que parecia muito próximo de tiros, a multidão
soltou um suspiro coletivo. Desci as escadas do carro
alegórico e pulei para a rua.

Enquanto eu caminhava pela multidão em direção a um


vendedor de bebidas, um esqueleto dançando esbarrou em
mim com tanta força que tropecei nos meus sapatos de salto
alto. Em vez de tentar pegar minha bolsa quando ela caiu,
cobri meu estômago. Uma vez que eu endireitei meu pé,
percebi pela primeira vez que meu corpo mudaria – assim
como a maneira como eu o tratava. Eu teria que ter mais
cuidado onde quer que fosse. Inclinei-me e peguei o envelope
com o ultrassom primeiro, depois mordi o lábio para esconder
um sorriso enquanto o enfiava no bolso lateral.

Enquanto as pessoas caminhavam ao meu redor, eu


coloquei minhas coisas de volta na minha bolsa. Eu procurei
na rua pelo meu celular, depois verifiquei se ainda estava na
minha bolsa. Incapaz de encontrá-lo, levantei-me e me virei,
meu olhar pousando em um mariachi na multidão com um
par de olhos familiar.

Um olhar penetrante que me arrepiou a espinha e


depois desapareceu sob um sombreiro quando o homem
desapareceu de volta à multidão.

Diego.

Não – Diego está morto.

Respirei fundo para tentar acalmar meu coração


batendo. Não era possível. Minha condição atual estava
fazendo coisas com o meu cérebro, e minhas emoções
estavam exasperadas por voltar para casa no aniversário da
morte de Mamá. Esfreguei minhas têmporas e dei mais
alguns passos, agachando-me novamente para tentar
localizar meu telefone.

A música mariachi começou de algum lugar. Eu ouvia


isso o dia todo, mas agora que Diego estava em minha mente,
me levou de volta ao quarto dos meus pais naquela mesma
manhã, doze anos antes. Os ecos assombrosos da música
pela casa. O ventilador girando com uma brisa das janelas
abertas, projetando sombras sobre o corpo de Mamá no chão
de ladrilhos. Diego correndo, com a arma apontada, agindo
surpreso. O antebraço de Cristiano é uma barra em volta da
minha cintura quando sua mão apertou minha boca.

Um ataque de náusea me atingiu. Algo não parecia


certo. Eu me levantei e voltei para o carro alegórico quando
um homem com uma máscara de esqui se aproximou de
mim.

Foda-se. Eu desejei que minha respiração diminuísse


para que eu pudesse pensar. Não tínhamos inimigos no
momento, mas como Cristiano disse – a luta nunca acaba.
Eu não poderia ter muito cuidado. Eu me abaixei e me
escondi em um grupo de mulheres dançando enquanto
manobrava meu caminho de volta para o carro alegórico. Elas
giravam, suas saias se misturando em vermelhos, verdes e
roxos.

O rosto de Diego brilhou na multidão.


Mas... como?

Subi em um meio-fio e olhei furtivamente ao redor. A


altura do homem o diferenciava. Ele tirou o sombreiro e
sacudiu os cabelos castanhos dourados. Não poderia ser ele.
E, no entanto, os maneirismos de Diego estavam gravados no
meu cérebro. Enquanto eu vivesse, nunca esqueceria a
maneira como seus longos dedos rastreavam os fios de seu
cabelo. Ele apalpou o sombreiro do jeito que usava seu
chapéu de cowboy na festa à fantasia. Quando ele começou a
se virar em minha direção, notei uma gravata de laço de bolo
25- mas não esperei para ver se havia o brasão da família de
La Rosa.

Eu corri pela multidão, empurrando as pessoas para o


lado.

Um homem de tinta facial branca e esbranquiçada e


órbitas negras entrou no meu caminho, e eu parei. O
esqueleto que tinha esbarrado em mim antes. Eu me virei
para outro caminho, mas o homem vestido de preto se
aproximou de outra direção.

Eu tinha uma faca na minha bolsa. Cheguei e agarrei


quando uma voz disse em meu ouvido: — Se você fizer uma
cena, seu pai leva uma bala nas costas. Então começamos a
atirar na multidão, Natalia.

25Um laço de bolo é um tipo de gravata que consiste em um pedaço de cordão ou couro trançado
com pontas decorativas de metal (chamadas aiguillettes) e preso com um fecho decorative.
O ar sugou meus pulmões quando meu couro cabeludo
formigou. — Quem é você? — Perguntei. — Belmonte-Ruiz?

Ele não respondeu.

Minha palma suou ao redor do cabo da faca. Eu


precisava revidar – mas a partir desta manhã, a violência
física assumiu um novo significado para mim. Desde a minha
chegada a Terra dos Condenados, Cristiano tinha me
impressionado que eu nunca poderia ter medo de me
machucar. Eu não tinha. Mas agora que eu estava
carregando o filho dele?

Isso era diferente.

Eu tinha que proteger meu corpo a qualquer custo.

Ele pegou minha bolsa e a faca com ela enquanto


homens armados vestidos de preto com máscaras de esqui
apareciam ao meu redor, se aproximando. Com um som
estridente, os gritos começaram. Uma van branca veio em
nossa direção, enviando pessoas pulando para fora do
caminho.

Abri minha boca para gritar, e uma toalha úmida a


cobriu, me sufocando com um fedor doce e doentio. Prendi a
respiração, lutando para não inalar. Eu estava cercada.
Minha visão turva com pequenas explosões de luz. Nem
mesmo o aperto em mim poderia disfarçar a sensação dos
meus pulmões desmoronando. Nem os gritos das pessoas e a
música mariachi abafaram uma única palavra em meu ouvido
enquanto o mundo ao meu redor se desvanecia.
— Princesa.
22

Natalia

Minha cabeça pendia em algum lugar macio, mas atrás


dos meus olhos latejava. Deitada de lado, meu corpo
empurrava com o zumbido de um motor.

Meu bebê.

Meus olhos se abriram para um nada escuro como breu.


Fui cobrir meu estômago, mas meus cotovelos estavam
amarrados nas minhas costas e tinham sido longos o
suficiente para que eu não pudesse sentir minhas mãos.

— A Bela Adormecida se mexe. — A voz soou abafada e


diretamente acima de mim e sua familiaridade me tirou da
minha consciência aborrecida. Ombros doloridos. Queima de
garganta. Minha bochecha arranhou a estopa. Eu estou... no
colo?

— Nem chegamos à parte em que o príncipe te beija, —


acrescentou.

Diego.

Meu coração balançou no meu peito enquanto meu


corpo inteiro parou.
No dia de todas as almas, Diego ressuscitou dos mortos.
Minha cabeça latejava com dor e perguntas. Como ele ainda
estava vivo? Onde ele esteve nos últimos meses? O que ele
queria comigo?

Traços de terra e gasolina pungente se misturavam ao


cheiro familiar de Diego. Nunca entre na van. Era a regra
número um por aqui. Eu não tinha ideia de quanto tempo
estávamos dirigindo, mas uma vítima num veículo era como
se estivesse morta.

Por outro lado, parecia que a morte nem sempre era


permanente.

— Você estava... — Minhas cordas vocais protestaram


contra o que ele usou para me nocautear. — Você morreu.

— Ainda não. Não sem você. — O saco levantou, e


minha pele esfriou quando abri os olhos para dois esqueletos
armados à minha frente. Nós andamos na traseira de uma
van sem janelas, com um banco ao longo de cada painel
lateral. O esqueleto que ajudou a me encurralar colocou a
arma no joelho e apontou diretamente para mim.

Eu me movi, virando meu rosto para ver Diego olhando


para mim. Seus cabelos cor de cacau, com mechas douradas,
caíam em volta das maçãs do rosto régias. Uma camisa preta
com poeira na gola emprestava masculinidade que
compensava as características o suficiente para que ele
pudesse ser uma estrela de cinema. Eu vi a mesma paciência
e bondade em seus olhos verdes hipnotizantes como eu tinha
visto muitas vezes antes, mas agora eu só podia interpretar
isso como um ato para conseguir o que ele queria.

Eu também poderia agir.

Ele acariciou meu cabelo. — Eu prometi que voltaria


para você, não é? Arrisquei minha vida para afastá-la dele.

Ele.

Eles poderiam ter machucado ou levado Cristiano


também. Tudo aconteceu tão rápido. Minha garganta ficou
espessa de emoção. — Onde ele está?

— Você está livre dele agora, muñequita.

Muñequita - sua pequena boneca. A fúria apagou minha


confusão quando um milhão de refutações correu pela minha
cabeça. Eu nunca poderia estar, e nunca quis estar, livre de
Cristiano. Ele era meu marido, minha rocha e meu futuro.
Ele era dez vezes o homem que Diego jamais seria - e nunca
me tratou como uma boneca indefesa.

Mas eu tinha que pensar direito. Para ser inteligente,


como a rainha que Cristiano exigiu que eu fosse. Uma digna
de estar ao seu lado. Eu era responsável por mais do que
Cristiano e eu agora. Eu não poderia agir de forma
imprudente ou sem emoção. Estar furiosa com Diego não me
levaria a lugar algum, especialmente enquanto eu estava
amarrada e à sua mercê. Enquanto carregava um bebê, meu
corpo era minha prioridade.
Apesar de anos e anos do engano de Diego, não poderia
ter sido tudo uma performance. Tinha que haver uma parte
dele que se importava comigo. Cristiano chamou de carinho.
Diego passava dia após dia ao lado de meu pai, atendendo
minhas ligações e me ouvindo falar durante horas sobre a
escola, ou sobre como eu sentia falta dele ou de minha mãe.

Eu não poderia mais ser a garota que estava com ele,


mesmo que quisesse, mas poderia fazer o papel. Cristiano
tentou me avisar desde o início que era um jogo, e eu tinha
que jogar.

Eu estabilizei minha respiração. Uma coisa que


Cristiano havia transmitido: se eu falhasse em incapacitar
um sequestrador, como havia feito agora, devo agir de acordo,
mesmo que pareça antinatural, até que eu tenha um plano de
fuga.

— Tudo dói, — eu disse suavemente.

— Sinto muito, tivemos que emboscar você assim, —


disse Diego. — Eu não podia ter certeza de que você não iria
gritar ou revidar. Tenho certeza de que meu irmão
desesperado tentou convencê-la de que você quer estar na
Terra dos Condenados.

— Eu tive que tornar minha vida suportável. — A


mentira azedou na minha língua quando saiu, mas não era
difícil parecer convincente. Afinal, antes de amar Cristiano,
lutei contra qualquer coisa a ver com ele. — Mas isso não
significa que eu te perdoo por me trocar com ele.
— Eu não troquei você. Eu o deixei pensar que ele tinha
você por um tempo para que eu pudesse garantir nossa
sobrevivência – e funcionou, não foi? Nós dois ainda estamos
de pé.

Que ele deveria viver enquanto os céus levaram Mamá.

Inspirei pelo nariz para controlar minha vontade de


atacar Diego da maneira que eu fantasiava. Eu ainda não
sabia se Cristiano estava bem. Eu preciso jogar junto até
saber mais, por mais difícil que fosse.

— Estou realmente desconfortável, — eu disse


gentilmente. — Você vai me agradar me desamarrando?

Seus olhos percorreram meu rosto até meus seios,


estômago e coxas. — Você parece diferente, — disse ele. —
Mais magra. Mais forte. Como sei que você não vai tentar
revidar?

— Lutar com você ? Mesmo se soubesse como, eu não


faria nada tão estúpido. Você pode facilmente me dominar. —
Ele sempre me tratou como sua princesa frágil, então eu faria
o papel que uma vez veio facilmente para mim. Diego estava
certo, porém – eu era mais forte. E com tempo suficiente, eu
pude libertar minhas mãos de quase qualquer ligação.
Solomon e eu continuamos treinando quase diariamente, e
Cristiano gostou especialmente de Solomon para me fazer
passar por cenários potencialmente fatais. Foram alguns
meses rigorosos.
Pelo menos, até a semana passada, quando eu comecei
a fingir uma lesão no pulso até poder ver Paula na clínica
para um teste de gravidez.

— Não fiz nada na casa de Cristiano, a não ser andar de


cavalo e jogar futebol com a equipe para me manter ocupada.
E de qualquer maneira, — acrescentei, acenando com a
cabeça através do corredor da van aberta, — não posso
exatamente reagir com armas apontadas para mim.

Diego deu uma risadinha no homem com a 9mm no


joelho, e ele a colocou no coldre. — Eles são excessivamente
cautelosos, — explicou Diego. — Eles acham que isso é um
sequestro, não um resgate.

Diego, sem dúvida, escolheu suas palavras com


cuidado, esperando que elas influenciassem meu ponto de
vista. Isso não era um resgate – para ele ou para mim.

Diego me queria vivo por um motivo, o que significava


que ele precisava de mim.

Eu era uma alavanca contra Cristiano e meu pai – mas


com que objetivo? Obviamente, ele uniu forças com outro
grupo, provavelmente Belmonte-Ruiz. O que significava que,
depois de cinco meses, eles haviam quebrado a trégua. Se
alguma vez tivesse sido real.

Diego tirou um canivete do bolso da calça, abriu-o e


cortou as amarras dos cotovelos. Eu rolei meus ombros para
frente, esticando meus braços enquanto me sentava
lentamente.
Eu podia vê-lo em toda a sua glória agora. Alto,
musculoso, com a versão com cara de bebê do rosto
brutalmente bonito de Cristiano. Era o cabelo e os olhos
pretos de Cristiano, e as maçãs do rosto vazias e altas que o
tornavam demais para as telas. O mundo não poderia lidar
com isso, infelizmente para eles.

Tentei explorar essa atração por Diego novamente. —


Onde você esteve? — Perguntei. — Na igreja você disse que
voltaria para mim. Você não fez.

— É por isso que estou aqui agora. — Ele pegou minha


mão, levando-a a boca. — Pobre garota. Você sempre teve
alguém para resgatá-la. Eu, Barto, Costa, Cristiano. E, no
entanto, todos nós também a machucamos.

— O Diego que eu conhecia nunca me machucaria. —


Peguei minha mão, revirando os pulsos com exagero,
esperando me inclinar para a fragilidade que ele esperava de
mim.

— Não fui eu quem mudou. Meu irmão me mudou. —


Ele afastou o canivete. — Primeiro, Cristiano tirou meus pais
de mim. Então ele levou você e Costa. Ele fez o primeiro
movimento, estou apenas jogando o jogo.

Diego acreditava que ele havia sido enganado. Ele


continuaria com os negócios horríveis de seus pais sem
hesitar, apesar de todas as vidas que isso arruinaria.

Eu não podia fazer minha jogada agora, e ver que Diego


em carne e osso tinha me jogado – mas enquanto ele passou
praticamente a vida toda planejando, isso não significava que
ele não pudesse tropeçar. Ele me conhecia bem – mas eu
também o conhecia. Eu só precisava ser paciente. Pensar
estrategicamente. Para ficar alerta e saber o máximo possível
sobre o que ele estava planejando.

Max não teria mentido para Cristiano. Desde seu


retorno, ele foi tão leal como sempre. Na verdade, ele era mais
protetor conosco. Portanto, tinha que haver outra explicação
para o repentino retorno de Diego. — Max viu você em um
saco.

— Eu sei. Como eu disse, arrisquei minha vida por você


– quase morri naquele dia.

Naquele dia. Eu me lembrava bem – pelo menos, dos


momentos em que Max chegou tropeçando em casa e deu a
notícia. Diego colocou Max, Cristiano, meu pai, minha mãe e
eu em perigo muitas vezes. Lambi meus lábios, encontrando
minha boca seca. — Como você fez isso? — Perguntei. — E
por quê?

— Cristiano sempre seria uma ameaça para mim. Eu


precisava que ele acreditasse que eu estava morto.

A estrada ficou irregular e eu me apoiei no painel lateral


da van, subitamente tomada por náuseas. — Por quê? —
Perguntei.

— Então, Cristiano abaixou a guarda enquanto


Belmonte-Ruiz e eu formamos um plano para tirá-la de lá.
Então esse foi o trabalho de Belmonte-Ruiz. — E a
trégua deles com... — Parei antes que pudesse dizer nós. Eu
também precisava usar a linguagem em meu proveito e
separar meus interesses dos de Cristiano. — Com Cristiano e
seu cartel?

— Um truque para ganhar tempo enquanto colocamos


as coisas no lugar.

— Que coisas? — Perguntei.

Diego levantou as mangas de sua Henley 26 preta. Eu


disse muitas vezes o quão forte e sexy ele parecia na camisa
de mangas compridas e nervuradas. Ele tinha usado para me
lembrar disso, da mesma maneira que ele cuidadosamente
escolheu suas palavras?

— É complicado, — ele disse, — e não é nada que você


precise se preocupar. Apenas coopere e você ficará bem.

Não se preocupe. O mantra de Diego quando se tratava


de mim. Diego pediu minha confiança nele, o que significava
que ele acreditava que eu ainda era tola o suficiente para
acreditar. E por que não deveria? Ele não podia conhecer a
mulher que eu era agora. Como eu cresci. A profundidade do
amor que eu possuía por meu marido e o que eu faria para
chegar em casa até ele.

Ele estava seguro?

A estrada tinha suavizado, mas minha náusea voltou.

26 Marca de camisas masculinas


Eles o emboscaram também? Deus. Deixe-o estar
seguro.

Coloquei meu rosto entre os joelhos, pois tinha vontade


de vomitar.

— É enjoo? — Diego perguntou.

Meu coração despencou aos meus pés. O sangue


escorreu do meu rosto enquanto eu olhava para o chão
lamacento da van. Meu esmalte vermelho, muito feliz no
momento, queimou minhas íris. Não havia nenhum possível
modo como ele poderia saber que estava grávida. Eu nem
sabia até esta manhã, e meu estômago não era nada além de
abdominais depois dos treinos que Cristiano me fez passar.

Eu levantei minha cabeça. — O que?

— Vi o ultrassom na sua bolsa. — Ele franziu as


sobrancelhas. — Me desculpe princesa. Pensar nas mãos de
Cristiano em você... isso me mata. As coisas que você deve ter
sofrido com ele.

Enquanto ele falava, um filme vermelho cobriu meus


olhos. Se Diego soubesse que eu estava grávida, ele poderia –
usaria isso contra mim. Contra o Cristiano.

Bastardo do caralho.

Diego pensou que eu suportava os avanços sexuais de


Cristiano em vez de recebê-los. Ele assumiu que a gravidez
era contra a minha vontade quando foi à notícia mais feliz da
minha vida.
Não era a verdade que importava, mas o que Diego
acreditava.

De repente, entendi muito bem a posição em que


Cristiano estava desde o dia do casamento. Aqueles que
conheciam sua fraqueza poderiam explorá-la. Por isso, desde
o início, ele deixou o mundo pensar que nosso casamento era
apenas para mostrar.

Era por isso que eu não podia deixar Diego saber que
faria qualquer coisa possível para salvar meu bebê.

Resisti à vontade de puxar meus joelhos contra o peito e


me sentei. — Eu não pedi, — eu disse simplesmente. — O
bebê. O mundo não precisa de mais alguém como Cristiano.

Diego inclinou a cabeça para mim. — Você não quer


isso?

Um buraco se formou no meu estômago. Por Nossa


Senhora de Guadalupe, eu não gostaria que meu filho fosse
embora. Não podia. Mas, como Cristiano me ensinou, poderia
ser a melhor maneira de protegê-lo.

Olhei para o chão, balançando a cabeça. — Não.

— Não? — Ele solicitou. — Não o quê?

— Eu... eu não quero o bebê.

Diego se aquietou. Meu estômago revirou ainda mais


pela mentira que se estabeleceu entre nós. Eu me sinto
doente. Como eu poderia dizer isso?
Depois de alguns instantes, ele respondeu: — Você está
mentindo.

Meus olhos se fecharam. Ele estava me chamando de


mentirosa? — É a verdade, — eu disse, mas não parecia
convincente nem para meus próprios ouvidos.

Ele balançou a cabeça devagar. — Você esquece o


quanto eu posso ler você. Você quer o bebê. Devo assumir
que você também quer Cristiano, o que é um problema para
nós.

Segurei a ponta do assento.

Eu não queria cooperar ou cumprir. Ou magoar ou


matar o homem mais importante da minha vida. Fingir como
se Diego não tivesse me traído da pior maneira possível.

Mordi meu lábio inferior até ele doer. Eu tive que


segurar minha língua. Informação era poder, e eu precisava
retê-la tanto quanto precisava para obtê-la. Não pude revelar
que conhecia seus crimes, suas conspirações, a máscara que
ele se escondia atrás, o fato de que ele tinha... ele tinha...
destrancado o túnel e, como resultado, minha mãe foi...
porra. Foda-se ele. Foda-se ele.

— Eu posso ver que você está chateada, Tali. Diga-me o


que está passando pela sua mente – a verdade, no entanto.
Não há mais mentira.
— Sim, eu quero o bebê, — eu admiti. — Eu pensei que
você pensaria que eu fosse uma traidora se eu admitisse. Isso
não significa que eu me importo com Cristiano...

— Outra mentira.

Eu não podia fazer isso. Eu não podia sentar aqui e


fingir que ele não tinha feito isso, ou que eu trairia Cristiano.
Eu fui inocente e ingênua com Diego a vida toda, e onde isso
me levou? Aqui. Durante meses, lamentava que nunca tivesse
conseguido ouvir Diego confessar. Eu tinha uma segunda
chance de enfrentar o homem que era, aos meus olhos, o
verdadeiro assassino de minha mãe.

Eu levantei minha cabeça. As palavras saíram, deixando


um gosto metálico em seu rastro. — Eu sei o que você fez.

Sua expressão diminuiu. Após alguns momentos de


silêncio tenso, ele perguntou: — Do que você está falando?

— Exatamente o que você pensa, — eu disse.

Depois que revelei o que sabia, não havia como voltar


atrás. Permanentemente nos colocaria em lados opostos. Mas
eu tive que fazer isso. Para mim. Para ela.

— Eu ouvi isso diretamente de Vicente Valverde, — eu


disse, meu queixo formigando de nojo e desprezo. — Eu sei o
que você fez. Você os deixou entrar em casa e depois os
expulsou da cidade. Você é responsável pela morte de minha
mãe.
23

Natalia

A menção dos Valverdes – um nome que Diego


provavelmente nunca esperou ouvir da minha boca – ficou
completamente imóvel. Ele não piscou.

A mudança foi palpável e, por um momento, me


perguntei se havia acabado de selar meu destino. Eu não era
mais a donzela em perigo que ele queria que eu fosse.

Mas eu estava segurando isso há meses sem culpado


para acusar cara a cara. Agora, eu havia resgatado uma
pequena parte do que Diego havia roubado de mim, de minha
mãe, pai e Cristiano. Ele agora sabia que aos meus olhos,
nunca mais seria o herói.

E que nunca haveria um vilão maior para mim do que


ele.

— Por que você fez isso? — Perguntei. Eu sabia o


porquê, mas ele deveria ter que dizer isso.

Olhou pela van para os dois homens de Belmonte-Ruiz.


Suas expressões não mudaram. Eu duvidava que eles se
importassem com essa conversa.
— Costa me devia duas vidas por levar meus pais, —
disse ele. — Quando os Valverdes vieram até mim, vi minha
oportunidade. Eu peguei. Bianca pagou o preço pelo que
Costa fez, — disse Diego lentamente, como se escolhesse
cuidadosamente suas palavras. — Sinto muito por machucá-
la e até sinto que ela tenha morrido.

— Como você pode dizer isso quando você foi à causa da


minha mágoa e da morte dela?

A testa dele enrugou de preocupação quando ele olhou


para as mãos. — Eu me importava com Bianca, como eu me
importo com você. Me apaixonar por você aconteceu
lentamente e da noite para o dia. Isso me bateu forte. Eu
ainda te amo. — Ele estendeu a mão para me lembrar das
tatuagens entre os dedos – as rosas com o nome de sua
família em um e em seu dedo anelar, nossas iniciais. — Eu
sempre quis que fizéssemos isso juntos.

Cerrei os dentes. Dane-se.

Eu queria cuspir nele, dar uma cabeçada nele, chutá-lo


nas bolas. Mas eu não bati um cílio. — Fazer o que juntos?
Para que você me quer?

— Costa teria perdido o cartel Cruz se não fosse por


mim, Talia. Depois que seu avô faleceu, e antes que eu
assumisse um papel consultivo, Costa mal conseguia
controlar o que ele tinha – por isso os Valverdes tentaram
acertá-lo. — Ele suspirou, apoiando os cotovelos nos joelhos
enquanto esfregava o rosto. — Mas sob meu comando? Ele
floresceu. Era meu direito assumir um dia – fazia sentido que
você e eu o administrássemos.

— E o meu pai? — Perguntei.

— Quando você e eu estivéssemos casados, ele


entenderia que era hora de deixar o cargo.

— E se ele não entendesse?

— Ele entenderia. — Uma ameaça. — Se Cristiano não


tivesse entrado novamente na cena, seria o que teria
acontecido, — disse Diego. — Fizemos um pequeno desvio,
mas vamos acabar no mesmo lugar.

Como Cristiano havia dito, Diego teria assumido por


qualquer meio, e o caminho que ele teria escolhido estava
usando meu amor por ele contra Papá.

E se Diego ainda me visse nesse papel, mas soubesse


que não cooperaria – quais eram seus planos?

— Onde? — Eu perguntei através de uma andorinha. —


Onde vamos acabar?

— À frente dos cartéis de La Rosa e Cruz. — Diego ligou


as mãos entre os joelhos e olhou para mim. — E agora, você
também me ajudará a conseguir Calavera. Costa ainda me
deve uma segunda vida, mas eu aceitarei a próxima melhor
coisa – seu cartel. Sua filha. Esposa de Cristiano. Se você
conseguir superar tudo isso, podemos fazer isso em equipe
novamente...
— Você mentiu para mim. Você me manteve no escuro.
— A van empurrou quando pegamos mais uma estrada de
terra. — Isso não é uma equipe.

Diego manteve os olhos baixos enquanto flexionava as


mãos e massageia uma palma. — Os segredos em torno da
morte de Bianca sempre pesaram em mim. Sei que meu
envolvimento a machuca, mas você vai passar por isso. E
quando você conseguir teremos tudo o que sempre
desejamos. A fortuna, o negócio. — Ele olhou para mim. —
Com o tempo, uma vez que você me perdoe, talvez tenhamos
mais noites românticas como a nossa primeira.

Meu estômago revirou. Como ele se atreve a chamar


aquela noite de qualquer coisa, menos que uma violação. Isso
me deixou doente. Se Deus quiser, nunca mais pensaria
naquela noite e em como fui estúpida por me apaixonar por
suas palavras vazias. — Você roubou minha virgindade.

— Você me deu. — Ele estendeu a mão para tocar meu


rosto, mas eu recuei e ele largou o braço. — Você está certa
em ficar chateada. Eu simplesmente não aguentava vê-la se
casar com ele sem ter nenhum pedaço de você para mim.
Significou tudo para mim, Tali.

A bile subiu pela minha garganta e, desta vez, não teve


nada a ver com a estrada. Significa menos do que nada para
mim, eu queria dizer a ele. Cristiano me fode muito melhor.

Eu diria se fosse apenas responsável por mim mesma,


mas não correria o risco de provocá-lo.
Diego suspirou. — Devemos chegar em breve.

— Para onde você está me levando?

— Temos algumas coisas para descobrir.

Algumas coisas. Eu tinha uma ideia do que ele quis


dizer. — Cristiano não vai cooperar, — eu disse sem rodeios.

As sobrancelhas de Diego se levantaram. Ele não


respondeu a princípio, como se decidisse se eu realmente
sabia alguma coisa.

Eu poderia, se o plano dele fosse o que Cristiano, Max e


eu montamos meses atrás. Belmonte-Ruiz não tinha matado
nenhum de nós quando tiveram a chance – isso não foi
coincidência. Concluímos que Diego pretendia me usar como
alavanca para forçar Cristiano a ajudar Belmonte-Ruiz a
expandir seu círculo de tráfico de pessoas.

Mas isso nunca aconteceria.

Cristiano sabia dos meus desejos. Eu não permitiria que


ele colocasse em risco sua alma e a vida de outras pessoas.
Diego era ilusório o suficiente para pensar que ele poderia
fazer isso, mas eu descobri que os delírios de Diego eram
extremamente perigosos – e para Mamá, eles foram fatais.

— Meu irmão irritou muita gente. Eu não sou o único


que quer vê-lo morto, — disse Diego finalmente. — Se alguma
coisa, meu plano é a única coisa que o mantém vivo - pelo
menos enquanto eu precisar dele.
O veículo atingiu um solo macio e diminuiu a velocidade
até parar. Diego bateu no meu joelho, colocou sua jaqueta e
me passou o saco de estopa. — Coloque-o.

Ele me ajudou na van. O sol nunca atingiu meu rosto e


a temperatura caiu, mas o saco deixou entrar luz suficiente
para que eu pudesse dizer que ainda era dia. Subimos uma
pequena colina e lutei para respirar, como se algo estivesse
pesado no meu peito. Meu vestido roçou o chão quando a
terra densa bateu sob os espigões dos meus calcanhares.

Quando meus sapatos atingiram um solo mais firme e o


ar fresco ficou velho, Diego disse: — Você pode removê-lo.

Tirei o saco. Estávamos em um amplo armazém de


concreto e tijolos de um andar, cercado por paletes de
madeira e uma empilhadeira, estantes de aço com caixas de
plástico, latas de gás e caixas. Eu procurei por qualquer arma
em potencial. Gasolina e madeira para queimar o local.
Tesoura em uma estação de trabalho perto de uma correia
transportadora. Se ele não me amarrasse, eu poderia correr
para o extintor de incêndio contra uma parede. Incapacitá-lo
com isso exigiria pouca mobilidade e ainda menos
criatividade – mas e os outros homens?

Diego me levou a um escritório com janelas em um


canto do armazém. Ele me entregou as chaves e disse: —
Abra-o.

Ele não queria virar as costas para mim. Com a verdade


sobre minha mãe lá fora, eu tinha perdido pelo menos um
pouco da confiança que ele poderia ter mantido. Eu peguei a
chave única. Eu poderia enfiar nos olhos dele. Deslizou na
fechadura. Mas isso não é estratégico.

Ele definitivamente tinha uma arma com ele – ele seria


estúpido se não tivesse. Provavelmente estava em algum
lugar no peito dele.

Prendi a respiração quando abri a porta.

Diego pegou a chave e o saco de mim e gesticulou para


que eu passasse, depois para uma cadeira dobrável de metal
contra a parede traseira, sob uma luminária abobadada. —
Sente.

Ele caminhou até uma mesa de computadores em frente


ao banco. Acima, havia um banco de monitores – imagens de
segurança do interior e do perímetro do armazém.

— O que é isso? — Eu perguntei, tentando distraí-lo


enquanto observava o meu redor. Baldes vazios em um canto.
Uma pilha de tijolos em outro. Um armário de arquivos. Até a
lâmpada e a cadeira poderiam atuar como armas de defesa.
Qualquer coisa que não tenha sido trancada. Minha bolsa
não estava à vista.

— Nós apenas vamos deixar meu irmão saber que você


está segura.

— Por quê? — Eu perguntei enquanto caminhava para a


cadeira.

— Mãos atrás das costas.


Eu as segurei juntas na minha frente, esperando que ele
não pensasse em nada. Mais fácil de escapar dessa maneira.

Diego me olhou de cima a baixo. — Eu disse atrás de


você.

— Isso importa? — Eu disse, mas obedeci, me


preparando mentalmente para as restrições mais difíceis. No
entanto, ele me amarrou, eu poderia sair disso. Eu pratiquei
inúmeras vezes. Mas alguns cenários foram piores que
outros. Para algemas, eu poderia tentar encontrar um
suporte em cima da mesa na minha frente, mas eu precisaria
de um tempo sozinha. Todos os meus tênis em casa tinham
cadarços de Kevlar que podiam cortar gravatas ou cordas, e
alguns até tinham chaves de algemas universais amarradas
nos cadarços para esse fim – mas é claro, eu estava de salto
hoje.

Eu teria que encontrar outro jeito.

Quando ouvi o som de fita adesiva, meus nervos cheios


se acalmaram um pouco. De tudo o que ele poderia ter
escolhido, esse era o mais fácil de escapar. Eu posso até fazer
isso com ele na sala.

Fiz dois punhos para me dar mais espaço para mexer


enquanto ele tapava meus pulsos bons e apertados.

Mas não apertado o suficiente.

— Sinto muito se isso dói, — disse ele, seus olhos verdes


encontrando os meus quando ele franziu a testa. — É em
parte para mostrar, e em parte porque não tenho certeza se
posso confiar em você agora.

Um pedido de desculpas genuíno. Na sua voz, ouvi o


garoto que eu já amei. Tentei ver Diego como antes – como
um homem criativo, inteligente e equilibrado com o qual
sonhava passar o resto da vida. Ele disse que me amava, e eu
ainda acreditava que ele pensava que amava. Talvez o amor
egoísta fosse o máximo que ele era capaz, mas a abnegação
de Cristiano me ensinou o verdadeiro significado do amor.

Suas palavras voltaram para mim agora.

O amor é: — Eu morreria por você.

Não, — Você morreria por mim?

Um nó se formou na minha garganta. Não por mim, mas


pelo que Cristiano deve estar passando. Por eu desaparecer
bem debaixo do nariz dele, ele se culparia. Ele sofreria. Eu
tenho que sobreviver a isso, revidar e ir para casa com ele.

Se eu conseguisse aproveitar tempos melhores durante


uma situação como essa, Diego também poderia. — Como
você fez isso? — Eu perguntei quando ele rasgou a fita e a
bateu no lugar.

— Fazer o que? — Ele veio para ficar na minha frente,


examinando seu trabalho. Ele levantou a fita. — Eu não vou
me incomodar com sua boca, mas não grite. As únicas
pessoas que a ouviriam apreciariam e poderiam vir farejando.
Sou apenas um homem para defendê-la.
Abstive-me de estremecer. Mais uma vez, suas palavras
foram escolhidas intencionalmente para me irritar. Eu não
deixaria eles. — Como você me olhou nos olhos todos os
dias? — Perguntei. — Você nos assistiu enterrá-la.

Ele colocou o rolo de fita em cima da mesa e pegou o


pequeno envelope branco com meu ultrassom do bolso do
paletó.

— Está no passado, Tali. Não faz sentido revivê-lo.


Apenas saiba, desculpe, aconteceu do jeito que aconteceu. —
Diego suspirou, como se estivesse verdadeiramente
arrependido. — E para Cristiano ser acusado de violar uma
mulher que havia sido mãe dele? Um homem como ele, um
violador conhecido? Deve ter o despedaçado. Não consigo
imaginar.

Minha respiração ficou presa na garganta. Ele podia


imaginar, e isso o agradou. Talvez Diego tinha conhecimento
que seu irmão mais velho tinha tentado protegê-lo durante a
sua juventude de negócio de seus pais. No entanto, de
alguma forma, ele via isso como traição. — Como você pode
dizer isso de maneira tão descuidada? — Perguntei. — Ela foi
abusada porque você deixou o assassino entrar.

— Não havia como eu saber que isso aconteceria dessa


maneira. — Diego olhou para mim. — Bianca não merecia,
mas seu pai merecia. E ele merece o que está por vir ainda
mais.
Minha garganta secou. Diego poderia facilmente
arrancar o coração dos dois homens que mataram seus pais –
porque ele me tinha. — O que está acontecendo com ele? —
Eu perguntei tão baixinho, que eu não tinha certeza se ele
tinha ouvido.

Ele veio e se agachou na minha frente. O fato de ele ter


tido a coragem de me olhar nos olhos me disse que havia se
convencido de que era o herói dessa história.

— Meu problema é apenas com Cristiano e Costa, —


disse ele.

— Então é comigo também. Eles são mi familia.

— Eles não podem matar meus pais e destruir os


negócios da minha família, — disse Diego. — Eu vou atrás do
que por direito me pertence. Você não entende isso?

Eu tentei com tudo o que tinha. Se eu não pudesse


apenas entender, mas amar Cristiano, depois de anos
odiando ele, não teria sido difícil ver o ponto de vista do
garoto que eu adorava. Meu pai fez os dois testemunharem os
assassinatos de seus pais como um aviso – a lealdade seria
recompensada, a desavença custaria à vida deles.

Cristiano e meu pai decidiram o destino de Diego por


ele. Em vez de herdar o legado que sua família havia
construído, Diego seria para sempre uma carga, segundo em
comando, — apenas mais um trabalhador, — como ele se
referia amargamente. Ele perdeu sua família e seu império,
como Cristiano – mas pelo menos Cristiano tinha voz nisto.
Mas tudo isso foi apagado pela traição deliberada e
calculada que custou a vida de minha mãe. Diego fez essa
escolha quando ele poderia facilmente ter ido para o meu pai
e a salvado. Então não, eu não conseguia entender.

Minha mandíbula doía, molares moendo juntos. — Você


deveria saber, não importa o quanto eu te ame - eu nunca
ficaria ao seu lado e brincaria com a vida das pessoas.

— Você teria. Você vai, — ele disse resolutamente. Ele


levantou o pequeno envelope e o enfiou no decote do meu
vestido, sobre o peito esquerdo. Perto do meu coração. —
Lembre-se disso se você estiver tentando fazer algo estúpido.

Eu estava agradecida pela fita adesiva há um momento


atrás, mas de repente, era insuportável que eu não pudesse
atacá-lo ou cobrir meu estômago para proteger o que apenas
começou a crescer dentro de mim. — Cristiano não joga seus
jogos. Ele sabe que eu prefiro morrer a deixar isso acontecer.

— Não é sua escolha. — Ele olhou o relógio e caminhou


até uma das grandes janelas para olhar o armazém. — Costa,
Cristiano e eu te amamos, mas todos nós usamos você como
um peão.

Enquanto ele estava de costas para mim, olhei para as


telas de vigilância. Dois homens vigiavam o interior do
armazém, embora eu não pudesse dizer onde eles estavam
em relação a nós. Mais dois estavam na frente, enquanto um
guardava a entrada do parque. Cinco. Os números seis, sete e
oito seguravam rifles de assalto e percorriam o perímetro,
cercado por grandes árvores.

— Cristiano vai concordar, — disse Diego, ainda


olhando para longe. — Ele te ama, e ele de todas as pessoas
sabe que estar comigo é um destino muito melhor do que
diabos eu poderia arranjar para você.

Levou um momento para sua ameaça afundar. Ele


poderia me vender. Como seu pai fez com Angelina. Eu não
queria acreditar que ele era capaz disso, mas a verdade era
que eu não sabia o nível de depravação com que estava
lidando. E a pior parte foi que Diego sabia exatamente o que
uma ameaça como essa faria com Cristiano. Pode até ser o
suficiente para convencê-lo a cooperar.

Com uma série de bipes, Diego pegou o telefone do bolso


e apertou um botão para falar. — Bueno.

— Listos, — veio à voz de um homem através do alto-


falante.

Pronto.

Diego voltou ao computador sob os monitores e as


imagens de segurança cintilaram.

Meu interior torceu. Algo estava acontecendo. — O que


você está fazendo?

— Não se preocupe. Cristiano cooperará para mantê-la


segura. — Diego abriu um armário e removeu um tripé. Ele o
colocou atrás da mesa, em frente ao painel de controle. Em
seguida, ele pegou um smartphone com uma caixa volumosa
de uma gaveta da mesa e passou o polegar sobre a tela. —
Saber que tenho você o torturará. Você viu como ele tentou
me alimentar com os Maldonados. Não pude deixar isso para
lá, Natalia – você sabe disso. Cristiano deliberadamente
provoca seus inimigos, e ele não deve se surpreender quando
isso voltar para ele.

Eu não podia argumentar que Cristiano era um homem


bom, ou mesmo merecedor do que ele tinha. Ele, como Diego,
meu pai e eu, cometemos muitos pecados. Mas eu o amava
por quem ele era, falhas e tudo. Eu não poderia pedir um
parceiro melhor ou um pai melhor para o nosso futuro filho.

Quando alguém se tornava mãe? Eu não tinha certeza,


só que eu já me sentia extremamente protetora. Talvez tivesse
a ver com o que estava por vir mais do que qualquer coisa.
Desde que eu suspeitava da gravidez, comecei a imaginar
uma nova vida com Cristiano. Nossa mais recente aventura -
paternidade. Cristiano, áspero e mal-humorado, segurando
um filho recém-nascido nas suas mãos. Eu, passando as
lições que aprendi para uma filha e, assim, honrando a avó e
o pai, que me ensinaram força.

Eu tinha que fazer o que pudesse para proteger isso.

Sobrevivência, não importa o quê.

Luzes vermelhas piscavam nas telas da TV diretamente


na minha frente. Após uma série de sinais sonoros, as
imagens piscavam.
Diego cantarolou de satisfação, enroscou o smartphone
no tripé pelo estojo e deu um passo atrás antes de falar em
seu próprio telefone. — Estamos conectados. Coloque-os.

— O que é isso? — Perguntei com voz rouca, mas não


tinha certeza de que queria saber.

Ele apontou um pequeno controle remoto para o


smartphone e apertou um botão. — Estamos transmitindo.
Olhe para a câmera e diga olá ao seu marido.
24

Cristiano

Eu levei um momento para registrar o que eu estava


olhando.

Um escritório bem iluminado. Uma cadeira de metal no


centro. Minha esposa.

Sangue correu em meus ouvidos. Meu coração bateu


forte o suficiente para me deixar surdo e me desorientar.

Minha equipe e eu vasculhávamos o desfile abandonado.

Assim que as armas saíram, as pessoas limparam a área


rapidamente, exceto por alguns corpos no meio da estrada
que possivelmente tentaram detê-los. Quem eram eles? Quem
levou minha esposa? Tudo o que alguém poderia me dizer era
que homens de preto, alguns fantasiados, a colocaram em
uma van e desapareceram.

Bem desse jeito.

Costa e meus helicópteros foram enviados, mas não


conseguiram nada.

Eu tinha pisado em serpentinas de crepe caídas, glitter


e pratos e garfos de plástico procurando uma pista. Qualquer
coisa. Até recebermos a notícia de que seus sequestradores
queriam fazer contato, então corremos de volta para a Terra
dos Condenados.

Agora, Costa e eu estávamos no centro de controle do


porão, enquanto Gabriel ligava através de um feed de vídeo
ao vivo para nossos monitores de segurança.

Natalia.

Seu vestido, colorido contra um fundo cinza,


permaneceu intacto – gracias a Dios. Não havia ferimentos
que eu pudesse ver. Suas mãos pareciam estar amarradas
atrás das costas, mas ela não estava amordaçada.

— Natalia, mi amor, — eu disse, surpreso com o tom


calmo e frio da minha voz. Eu posso ter aprendido a manter a
compostura em uma situação ameaçadora, mas isso era algo
completamente diferente. Essa era toda a minha vida, porra.
— Você pode me ouvir? Onde você está?

Ela assentiu quase imperceptivelmente, mas seus olhos


se voltaram para o lado da câmera. Ela não estava sozinha.

Rezei para que ela tivesse sido resgatada por alguma


federação imprudentemente estúpida e que Belmonte-Ruiz
não tivesse quebrado sua trégua.

Mas por que as orações do diabo devem ser


respondidas?

— Irmão.
Calafrios se espalharam por mim com a voz muito
familiar. Uma que eu nunca confundiria. Uma que eu nunca
pensei que ouviria novamente.

Um rosto parecido com o meu preencheu a tela, mas


poderia muito bem pertencer a um estranho. Meu irmão.
Diego.

Que porra é essa. Ele estava vivo. Tudo no meu corpo


deixou de funcionar. Eu congelei, e foi uma coisa boa. Eu
nunca quis que Diego pensasse que ele tinha me pego de
surpresa.

Ele bloqueou Natalia enquanto olhava de mim para


Costa e de volta. — Bom. Vocês dois estão aí.

Minhas mãos se contorceram com o desejo de atravessar


a tela e envolvê-las em seu pescoço, apertando-as lentamente
para que ele experimentasse o esmagamento de cada osso
delicado, o colapso de sua traqueia...

— Você não sabe o que está fazendo, garoto, — disse


Costa ao meu lado, sua voz ecoando pela sala. Se ele ficou
chocado ao ver sua acusação anterior, ele não demonstrou.
— Deixe ela voltar. Ela não tem nada a ver com isso.

— Ela tem tudo a ver com isso. — Diego recuou até


Natalia voltar à vista. Ela focou os olhos acima da lente da
câmera.

Em mim?

— Natalia.
Ela fechou os olhos, engoliu em seco e os reabriu. Eu
não podia sentir falta do fogo neles enquanto meu próprio
olhar a perfurava.

Você entendeu, eu silenciosamente disse a ela. Seja


forte. Nós vamos tirar você disso.

— Será mais fácil para todos nós se Talia estiver viva, —


disse Diego, removendo uma arma do interior de sua jaqueta.
— Eu a amo e não quero machucá-la. Mas vamos esclarecer
uma coisa: eu colocarei uma bala no rosto bonito dela, se for
necessário, para não fazer nada que eu não o instrua
explicitamente.

A raiva queimou meu peito como azia dos dias


passados. Dias passados – desde que Natalia decidiu mudar
meu estilo de vida. Ela me queria saudável. Essa era a porra
da minha esposa, assumindo o comando de mim quando eu
nunca deixei ninguém me dizer como viver. Qualquer um
menos ela. O amor da minha maldita vida.

Minha garganta se fechou. Inspirei e expirei, querendo


afastar minha fúria.

Foco.

Diego a amava a sua maneira egoísta. Eu acreditei


quando ele disse. Mas ela era mais do que isso para ele. Ela
era minha fraqueza, e Diego sempre soube disso.

Eu tinha que confiar que Natalia poderia se livrar disso


depois de todos os exercícios que realizamos, dos movimentos
que ela aperfeiçoou e das inúmeras horas que passei punindo
ela e eu pelo fato de um homem ter chegado perto demais de
mim... tirando-a de mim meses atrás.

Um rolo de fita adesiva sobre a mesa me deu esperança


– ela seria capaz de se libertar se fosse isso que ele usou para
prender suas mãos.

E não perdi a maneira como Diego estupidamente virou


as costas para ela.

Ele confiava nela – isso era bom. Mas melhor ainda – ele
não parecia considerar a possibilidade de que ela pudesse
revidar. Ele nunca a viu como algo além de precioso.
Quebrável. Compatível.

Mas ela não era nenhuma dessas coisas, e se alguma


vez tivesse sido, teria sido um produto de seu ambiente.

Ela poderia enfrentá-lo.

Ela precisava.

Ela só precisava liberar as mãos, e eu precisava manter


os olhos dele em mim e fora dela.

Relutantemente, desviei meu olhar dela e o devolvi a


Diego, que estava me olhando com um sorriso. Ele sabia que
isso estava me matando. — O que você quer? — Perguntei a
Diego.

— Não faz muito tempo que eu te perguntei a mesma


coisa. — Diego colocou uma mão no bolso e inspecionou a
outra, passando o polegar ao longo de uma tatuagem na
parte interna do dedo anelar. — Você e eu ficamos um em
frente ao outro em seu escritório, enquanto você retirava
minhas opções até que restasse apenas uma – submeta-se
aos Maldonados e enfrente a morte.

Não estamos um pouco velhos para contar histórias,


Diego? Mordi minha língua. Eu conseguia pensar em mil
respostas que machucariam o ego de Diego enquanto eu
lentamente trabalhava sob sua pele. Eu já o havia sacudido
antes, como naquele dia em La Madrina. Mas Natalia poderia
pagar o preço por provocá-lo. Eu tive que sorrir e suportar.

— Você pensou que me tinha, — continuou Diego. —


Você deveria saber que nem minha morte terminaria isso.
Você não está curioso para saber como ainda estou vivo?

— Não, — eu disse. — Eu não dou a mínima para isso


ou para qualquer outra mentira que você tenha inventado
para justificar o jeito que você é. — Natalia empurrou
silenciosamente atrás dele. Ela estava trabalhando com as
mãos livres. Quando Diego começou a se virar, eu disse: —
Por que você está fazendo isso?

Havia muitas coisas que eu queria dizer a ele por seu


envolvimento na morte de Bianca, mas nada disso era mais
importante do que prender sua atenção. Mantendo-o fora de
Natalia. Mantendo-a segura. E encontrando-a.

Gabriel, Max e Alejo monitoraram tudo da sala ao lado,


procurando pistas na tela que pudessem indicar uma
localização geográfica. Diego não era estúpido o suficiente
para fazer uma ligação rastreável, mas essa conexão era tudo
o que tínhamos.

Diego cruzou os braços sobre o peito. — Eu nunca


conheci um homem mais disposto a trair a família – ou dar as
costas ao mundo em que ele foi criado. Todo mundo agora o
conhece como traidor. Você continua a trazer vergonha ao
nosso nome muito depois da morte de nossos pais.

Bom. Não consegui pensar em mais elogios.

— Para Cristiano, o sangue não faz família, — disse


Costa, fervendo ao meu lado. — Sua lealdade a mim passou
pelo teste do tempo e das circunstâncias. Ele é mi familia.

Coloquei minha mão no cotovelo de Costa para mostrar


minha gratidão, mas também para avisá-lo para controlar
sua reação. Era torturante não olhar para Natalia a cada
poucos segundos, mas se eu olhasse, Diego também poderia.

— Costa, — Diego disse, afastando sua atenção de mim,


— você teria desmoronado sem mim. Seu cartel é o que é por
minha causa. Você ficou inconsolável após a morte de Bianca,
mas eu te apoiei. Depois disso, você só acompanhou a
demanda e a nova ordem por causa da tecnologia e de novas
ideias que apresentei. — Diego ergueu o olhar sem piscar
para Costa. — Eu supervisionei o desenvolvimento do nosso
sistema de túneis avançado para os Estados Unidos eu
mesmo, — ele disse simplesmente. — Fiz a maioria das
conexões que precisávamos na fronteira. Conheço o seu
negócio melhor do que ninguém. — Ele enfiou as mãos nos
bolsos e balançou a cabeça. — E sem pensar duas vezes,
depois de vinte anos de lealdade, você me expulsou da casa
onde passei a maior parte da minha infância.

— Lealdade? — Costa explodiu. — Você matou minha


esposa. — Costa disparou em direção à câmera, segurando-a
com as duas mãos. — Sua traição nos custou tudo, e eu pago
muito – vou arrancar suas bolas por isso, — disse ele,
salpicando a lente. — Eu não vou deixar você levar minha
filha também.

Diego passou a língua pelos dentes superiores. Ele


finalmente conseguiu a reação pela qual tinha vindo.

— Você só pagou metade do preço para matar ambos os


meus pais, Don Costa, — Diego respondeu friamente. — Olho
por olho significa que você ainda me deve uma vida.

— Então pegue a minha, — disse Costa.

— Muito fácil. Estou disposto a negociar, no entanto.


Não matarei Natalia enquanto você fizer o que eu digo. — Ele
olhou para mim. — Gostaria de tê-la ao meu lado neste
próximo empreendimento.

Sobre meu corpo morto e apodrecido. Minhas mãos


latejavam por apertá-las, mas eu não conseguia soltar meus
punhos. Não podia deixar minha raiva abafar minha razão. A
vingança cegou Diego ao fato de que Natalia não era a garota
fraca que ela já foi. Eu não podia deixar isso me distrair
também.
Ela precisava de todo o meu foco.

Mantenha-a segura. Tire-a dali.

Olhei por cima do ombro quando Maksim entrou na


sala. Seu rosto abatido ficou branco como lençol quando ele
fez o sinal da cruz e pronunciou algo em russo. — Eu vi seu
cadáver, — disse ele a Diego.

— Você viu o que eu queria que você visse. — Diego


pigarreou. — Saia.

Max e eu encontramos os olhos brevemente. Ele sabia


alguma coisa? Ainda não, parece. Ele saiu.

— Como você soube sobre o túnel em minha casa? —


Costa perguntou quando Max se foi, seu tom de voz agora
calmo. — Ninguém sabia além de Bianca, Natalia e eu.

Diego olhou brevemente para o chão e recuou. — Com


muita paciência. Eu assisti. Eu esperei. Aprendi os códigos
de segurança, aprendi sobre seus segredos. Deixei a porta
aberta para o assassino quando soube que você estaria fora
da cidade.

— E o cofre? — Perguntei.

Diego sorriu. — Os objetos de valor e o dinheiro


totalizaram mais de um milhão de dólares. Em troca do
conteúdo, o assassino me forneceu uma arma, informações
sobre transferência de conta bancária e imagens de vídeo
ligando Vicente Valverde ao assassinato de Bianca.
— Que você pretendia expulsar da cidade, — eu disse.
— E Natalia deveria estar no desfile, mas e eu?

— Você encontrou Bianca e eu encontrei você, arma na


mão, — disse ele. — Não fazia parte do plano, mas funcionou
bem. Eu teria matado você, se pudesse. De qualquer
maneira, eu teria sido o herói. Fiquei tão chocado quanto
vocês dois quando entrei no quarto. Eu sabia o que deveria
acontecer, mas vê-la ainda era difícil.

Natalia parou. Os lábios dela se contraíram. Ela queria


falar. Para acabar. Para me proteger quando era ela quem
estava em perigo.

Fique calma. Eu tive que fazer isso com ela sem olhar
para ela.

Não podia ser fácil para ela ouvir tudo isso, mas ela
precisava manter a boca fechada e se concentrar na fuga.

— Vá direto ao ponto, traidor, — disse Costa em um


rosnado. — Por que estamos aqui?

O maxilar de Diego ficou tenso. Ele não gostava de ser


chamado de traidor, principalmente pelo homem que
assassinou nossos pais. Costa precisava parar de provocá-lo.
Se Diego descontasse sua raiva em Natalia, eu iria encontrar
uma maneira de chegar na sala, mesmo que isso significasse
escalar através da lente da câmera. Mas sua expressão
comprimida voltou rapidamente para neutro.
— Você trabalha para mim agora. Cumpra, e Natalia
estará segura. Ela está com raiva de mim agora – eu tenho
que culpar você por isso, irmão. — Diego revirou os ombros.
— Mas uma vez que seu feitiço se esgote, retornaremos ao
que éramos. Se você também se importa com ela, vai aceitar,
porque ela será feliz aqui. Ela será amada por mim. — Ele
mordeu o lábio inferior e acrescentou: — Toda noite, para
compensar todo o tempo que você roubou de nós.

Não.

Meu coração batia forte enquanto eu lutava contra a


imagem deles juntos.

Não reaja.

Isso não era sobre mim.

Limpei gotas de suor do lábio superior. Eu tenho que me


concentrar nela. Eu estava muito longe dela para ver. Se ela
suava também. Ou estremeceu. Se sua raiva a esquentou, ou
se o ódio gelado tomou conta. Ela precisava de mim. Meu
calor.

Minha respiração ficou mais irregular. Não pense nas


mãos de Diego nela.

Ela se sentiu forte? Ou ela lutou para separar a pessoa


na frente dela do garoto que ela conheceu?

— Vamos estar com ela antes que você a toque, — disse


Costa. — Eu prometo a você isso.
Se ele prometeu a Diego, eu ou Natalia, eu não tinha
certeza, mas ele estava fazendo ameaças que só poderiam nos
machucar. Eu olhei para ele. O pescoço amarrado e o rosto
vermelho-beterraba diziam tudo. Ele estava tentando
combater as mesmas imagens que eu.

— Tranquilo, — eu disse a ele baixinho para lembrá-lo


de ficar calmo, mas ele manteve os olhos focados na tela.

— Vale a pena perder Natalia? — Diego perguntou, suas


narinas dilatadas. — Porque se eu ouvir um sussurro de que
você está tentando encontrar nossa localização, eu vou tirar a
vida dela, e então você e eu estaremos em guerra total. Seus
exércitos juntos são fortes – mas o de Belmonte-Ruiz agora é
três vezes o tamanho que costumava ser e cresce a cada dia
que se espalha a notícia de como você está trabalhando do
lado errado.

Eu não duvidava disso agora. Eu não confiava


cegamente na trégua de Belmonte-Ruiz, mas quanto mais
tempo passava, menos preocupado eu ficava. Eles
mantiveram o fim da barganha, passando para outros
empreendimentos. Nosso informante havia sido morto, nós
não o substituímos. E tolamente. Eu queria acreditar que
todos nós poderíamos viver em paz. Porque Natalia e eu
estávamos prontos para começar uma família, mas não
faríamos durante uma guerra.

Eu não tinha percebido que ainda estávamos em uma.


Eu deveria ter prestado mais atenção.
— Então você quer a rede global de Cristiano e minha
infraestrutura de remessa, não é? — Disse Costa. —
Distribuir em uma escala maior e mais internacional. Isso
está certo?

— Todo mundo se beneficiará, até vocês dois – o que é


generoso da minha parte, considerando as regras deste
mandado mundial que eu mato por seus pecados contra a
minha família. — Enquanto Diego estava de costas, Natalia
continuava se contorcendo. Ela sairia. Ela se libertaria. E
então ela lutaria com tudo o que tinha. — Estamos
desenvolvendo um novo medicamento e queremos explodir no
mercado. Podemos lidar principalmente com a América do
Norte, mas precisamos de vocês dois para levar a Europa,
Ásia, Oriente Médio. Sua renda quadruplicará.

Eu assisti o rosto de Diego de perto enquanto Costa


resmungava. — Então por que nos chantagear? — Ele
perguntou. — Faça uma proposta e eu e meu parceiro iremos
discuti-la. Não vou negociar com você enquanto você
sequestrou minha filha.

— Porque a resposta de Cristiano será não. — Diego


caminhou para trás. — Ele precisa de motivação.

Meu peito trancou quando ele contornou a cadeira de


Natalia e colocou as mãos nos ombros dela. Tocou nela.
Massageado ela. Meu corpo tremia com uma explosão
iminente. Eu finalmente me deixei olhar para Natalia por
mais de alguns segundos. Eu tentei ver a força em seus
olhos. Ela estava tentando me acalmar quando precisava ser
o contrário.

Eu te amo, eu disse com o meu olhar. Eu estou indo para


você. Não importa o quê.

Inspirei pelo nariz. Eu precisava de uma cabeça calma -


e para manter os olhos em mim. Ele estava de pé atrás dela.
Se ele visse as restrições dela quebradas ou até soltas, isso só
poderia piorar as coisas.

— A distribuição de narcóticos é o que Belmonte-Ruiz


exige em troca de tudo o que você lhes custou, — explicou
Diego. — Mas depois tem o que eu quero.

O que Diego desejava desde o início?

Vingança. Legado. Poder.

E a qualquer custo.

Eu cruzei meus braços. — Nada vai trazer nossos pais


de volta à vida, Diego.

— Você está errado. Belmonte-Ruiz é o sindicato de


tráfico de seres humanos de maior sucesso no país. Com a
aprovação deles, sua ajuda e minhas orientações, o cartel de
La Rosa escalará esse negócio para um nível internacional -
como nosso pai gostaria.

Era como Max, Natalia e eu adivinhamos vários meses


atrás. Ele me pediu para brincar de Deus. Escravizar,
torturar e quebrar pessoas inocentes. Para abandonar o
código pelo qual vivi. Ele me pediu a única coisa que eu não
poderia dar a ele. Foi por isso que ele levou Natalia. — Eu
não vou fazer isso.

Diego apertou os ombros de Natalia. — Então Natalia


pagará o preço, — disse Diego, — e se você acha que isso
significa morte, é muito fácil.

Eu parei. — Você se importa muito com ela para vendê-


la.

— É por isso que, ao contrário de você, estou tentando


mantê-la segura, — disse ele. — Mas talvez nosso pai tenha
acertado quando vendeu Angelina.

Meu peito apertou com a menção do nome dela. Diego


era jovem demais para fazer parte disso e sabia apenas o que
eu disse a ele durante o tempo em que era jovem no rancho
de Costa. Eu fui vulnerável com ele. Revelei como eu ainda
pensava em Angelina e desejava ter os meios para encontrá-
la.

— Às vezes, se você quer aprender a ser cruel, precisa


começar arrancando seu próprio coração, — disse Diego
calmamente. — Prefiro não fazer isso desistindo de Natalia,
mas vou. Você entende. — Diego se dirigiu a mim e a Costa.
— Você me ensinou desde cedo os perigos de apegos
emocionais.

Minha lição tinha sido Angelina. Diego tinha


testemunhado não apenas a morte de um pai, mas também a
de uma mãe.
Isso mudou a nós dois de maneiras muito diferentes.

— Bianca suspeitava, — disse Costa. — Ela tinha uma


sensação de quem você era.

— Independentemente. — Diego balançou a cabeça. —


Você se esforçou ao máximo para me ver sofrer, e não se
engane, eu também quero isso para você. — Diego deslizou o
elástico do vestido fora do ombro de Natalia, esfregando os
bíceps nus quando uma pedra endureceu no meu estômago.
— Vamos expandir nossos negócios com ou sem você, mas
podemos fazê-lo exponencialmente mais rápido com a sua
ajuda. — Ele fez uma pausa. — Você nunca terá que ficar
cara a cara com as vidas que compra, vende e comercializa –
elas sempre serão desconhecidas, sem rosto. Mas Natalia? —
Ele olhou para o topo da cabeça dela e depois para cima. —
Amanhã ela poderá estar em um iate no Mediterrâneo, à
mercê de um sheik tão poderoso que ninguém, nem você,
poderá tocá-lo. É sua escolha em que inferno você quer viver.

Meu sangue ferveu. Essa foi à chance que eu tive


quando segui dois caminhos que nunca deveriam se cruzar –
enfurecendo pessoas perigosas, interrompendo seus
sistemas... e se apaixonar. Eu não trocaria o impacto que
causamos ou meu amor por Natalia por nada, mas foda-se
Diego por saber exatamente como me manipular.

Minha fúria havia se enrolado demais. Bati meus


punhos na mesa embaixo de mim e mandei tudo voar. — Eu
deveria ter matado você quando tive a chance.
— Não acho que alguém discorde desse ponto. — Diego
deu um tapinha no braço de Natalia, sorrindo para mim. —
Então, temos um acordo, parceiro?

Natalia balançou a cabeça, o queixo tremendo enquanto


murmurava: — Não.

Diego era apenas demente o suficiente para seguir com


sua ameaça contra Natalia. Eu não tive escolha. O que quer
que Natalia me pedisse para fazer ou não, eu não a colocaria
em perigo se pudesse evitar.

Diego colocou a mão no peito de Natalia e deslizou-a até


romper o decote, sobre o peito dela.

Não, filho da puta. Não...

Ele pegou um envelope branco.

— Se você precisar de outro motivo para cumprir, que


assim seja. — Ele rasgou o envelope e tirou uma fotografia
em preto e branco.

Eu apertei os olhos. O que...?

Quando a imagem diante de mim tomou forma, minha


garganta ficou seca. Não poderia ser.

— O que é isso? — Perguntou Costa, estreitando os


olhos.

Minha boca se moveu, mas meus ouvidos tocaram tão


alto que eu nunca me ouvi dizer isso. — Um ultrassom.
— O quê? — Costa rugiu e xingou Diego com — Vete a
La chingada27.

Enquanto eu não conseguia nem formar uma palavra.

Notícias que eu ansiava nos últimos meses, de repente


eu desejei ir embora. Eu deveria ter ficado feliz. Em vez disso,
orei à Virgem Maria para que não fosse verdade. Meus joelhos
dobraram como um medo que eu nunca conheci pesava sobre
meus ombros. Não poderia ser. Se eu me permitisse
acreditar, ficaria furioso ou desmoronaria, e nenhuma reação
ajudaria Natalia.

Elas eram mentiras.

Diego plantou a imagem para me irritar. Para me fazer


concordar com os termos dele. Isso não era verdade. Não
havia bebê.

Eu segurei a mesa e olhei dele para ela, a única que


importava aqui. Eu encontrei seus olhos angustiados. Como
se ela não pudesse suportar olhar para mim, ela abaixou a
cabeça e começou a soluçar.

Minha visão ficou turva. O chão debaixo dos meus pés


rolou. Era verdade.

Isso explicaria por que ela inventou uma lesão no pulso


na semana passada para interromper o treinamento. Por que
ela não reagiu quando Diego a levou do desfile. E uma
gravidez explicaria porque ela estava atualmente chorando

27 Vá para o inferno.
como nunca antes. Eu não queria nada mais do que pegá-la
em meus braços, mas, em vez disso, tinha que ficar aqui e
deixá-la.

Era a única mentalidade para a qual eu nunca pensei


em prepará-la.

Ela estava preocupada com sua condição, assim como


eu.

Eu pensei que tinha feito tudo o que podia para equipar


Natalia, mas essa era uma situação que nenhum de nós
jamais enfrentou. Eu falhei com ela. Eu queria me virar para
não cair logo ali, mas não podia deixar Natalia pensar que a
tinha deixado sozinha por um segundo.

Nós estávamos juntos nisso.

Levantei meus ombros como se estivesse me preparando


para uma luta de boxe. — Foda-se, — eu disse.

Diego respondeu como eu queria, saindo de trás da


cadeira de Natalia para nos olhar diretamente. — Isso é um
sim, então?

A cabeça de Natalia se levantou. — Não faça isso,


Cristiano, — disse ela, sufocando as lágrimas. — Essas
pessoas precisam de você. É tudo pelo qual você trabalhou.
Não faça o acordo.

O pensamento de trair aqueles que eu ajudei, e aqueles


que eu ainda posso ajudar, esfriou meu interior. Não seria
para sempre, não poderia ser. Eu encontraria uma saída.
Mas toda vida importava. Se eu não acreditasse nisso, nunca
teria assumido a missão ingrata e impossível de tentar
prejudicar o comércio de sexo e trabalho forçado.

Se eu fizesse isso, passaria de salvador a inimigo.

Eu não poderia arruinar inúmeras vidas para salvar


uma, poderia?

Para salvar duas.

O destino do meu filho ainda não nascido e da minha


esposa estava nas mãos de um homem que passou vinte anos
esperando para me ver sofrer.

Os olhos de Natalia imploraram para eu não fazer isso.


Mas ela não sabia que eu nunca poderia me afastar do amor
da minha vida? Do nosso bebê? Que eu faria o que fosse
necessário para mantê-la segura. Mesmo que isso significasse
quebrar todas as minhas regras e me tornar a pior versão de
mim mesmo.

Meu pai.

Eu assenti uma vez. — Você tem um acordo.


25

Natalia

Você tem um acordo.

As palavras de Cristiano ficaram na sala.

Meu coração se partiu sabendo o que lhe custou


concordar com o acordo. Ele colocaria em questão mais de
uma década de trabalho. Todos os dias, ele morria um pouco
por dentro ajudando um verdadeiro monstro – porque eu
estava em suas garras.

Exceto que não estava.

Enquanto Diego havia listado suas demandas para


Cristiano, eu me concentrei em sair das minhas restrições – e
consegui.

Eu libertei minhas mãos.

Agora, eu tinha que me libertar – e meu marido e bebê.

Minha garganta ficou completamente seca. Eu não


podia perder a coragem agora. Não havia tempo para fazer
estratégias e, no entanto, uma jogada falsa poderia me custar
tudo. Eu só tinha que agir antes que ele notasse alguma
coisa.
Ele recolocou a arma dentro da jaqueta. Eu tive que me
certificar de que, quando eu levantasse, ele não tivesse nem
um segundo para alcançá-la.

Meus olhos dispararam pela sala e pousaram nos


tijolos. Eles eram a coisa mais próxima de mim que poderia
causar sérios danos. Tinha que ser assim, e agora, enquanto
Diego se distraía com a logística do acordo.

— Uma semana? — Cristiano perguntou. — É


impossível.

— Você encontrará uma maneira, — disse Diego.

Meu coração batia forte quando eu silenciosamente tirei


meus saltos altos.

— Eu não negocio com traficantes, preciso... — A voz de


Cristiano vacilou quando eu levantei, mas seus olhos
continuaram treinados em Diego. — Eu preciso de tempo
para minhas conexões... para construir uma nova rede.

— Isso levaria muito tempo, — disse Diego.

Com os pés descalços, andei na ponta dos pés até o


canto da sala.

Diego virou a cabeça levemente e Cristiano pigarreou. —


Você quer que isso seja feito de maneira desleixada ou você
quer que seja feito certo?

Os olhos de Diego voltaram para a tela enquanto ele


parecia considerar a pergunta. Ele realmente pretendia
continuar com isso – construir um novo cartel a qualquer
custo.

E se era o verdadeiro motivo de Diego ou apenas a cereja


do bolo – ele acreditava que agora seria a única pessoa no
mundo com poder sobre Cristiano de La Rosa.

Mas ele não sabia que esse título me pertencia?

Só eu poderia domar a fera. Hoje, amanhã e para


sempre. Cristiano era meu.

Eu mal podia esperar mais.

Usei as duas mãos para pegar um tijolo no topo da


pilha. Eu testei o seu peso. Pesado. Sólido. Eu levantei meus
olhos para a parte de trás da cabeça de Diego. Pelo menos eu
não teria que olhá-lo na cara. Meu melhor amigo de infância.
Meu primeiro amor. Fechei os olhos brevemente, abri-os e
corri para frente.

Não hesite. Não...

Diego virou-se. Eu levantei o tijolo em seu rosto. Smack.


Sangue respingado. Seu corpo voou para o lado quando seu
grito gutural preencheu o pequeno espaço.

Meu estômago estava pesado quando eu congelei.

Diga que me ama, Talia.

Me diga que você ainda é minha garota.


— Ainda não acabou! — Os gritos de Cristiano me
sacudiram.

Diego ainda estava de pé, dobrou-se enquanto cuspia


um dente. Ele correu para mim. Tropecei para trás, tropecei
no cabo da lâmpada e perdi o equilíbrio. Mas eu não iria cair.

Diego veio até mim novamente, mas ele estava inclinado


para o lado, lutando para focar os olhos. Peguei a cadeira
dobrável de metal, levantei-a sobre a cabeça e abaixei-a o
mais forte que pude. Ele a agarrou antes que eu pudesse dar
o meu golpe, depois o usou como alavanca para me jogar
contra uma parede.

— Talia... — Ele tossiu, o sangue pingando em seus


olhos. Ele foi me agarrar, mas eu me afastei do caminho e me
encontrei de volta na pilha de tijolos.

Peguei outro e virei. Desta vez, apontei para o crânio


dele. O tijolo bateu contra ele. Ele cambaleou para trás, seus
olhos implorando para mim, depois caiu de joelhos. Eu o
chutei de costas, pulei em cima dele e levantei a lajota
novamente.

Ele estava pendurado por um fio.

Eu só tinha que fazer isso mais uma vez.

Não olhe para o rosto dele.

Ele gemeu. Meus olhos saltaram. Coberto de sangue, a


cabeça caiu para o lado, os olhos semiabertos. Eu tinha
esmagado uma das maçãs do rosto altas que o tornavam tão
bonito, uma que eu costumava tocar com reverência.

— Quando eu for, você estará do meu lado, ok? — Ele


disse. — Estou com você, vida ou morte.

— Vida ou morte.

Eu tinha muito mais pelo que viver agora e tudo pelo


que lutar. Era eu ou ele.

Eu levantei a lajota sobre minha cabeça com as duas


mãos e a bati. Seu crânio desabou. Seus olhos continuaram
abertos, mas distantes. Uma tomada e ele cedeu. Meu peito
agarrou. A respiração parou. Eu balancei, e minhas mãos
afrouxaram em torno da arma.

Não havia tempo para entrar em pânico. Não acabou – a


luta nunca acaba.

Eu entrei em ação, revirando suas pernas até ter seu


canivete dobrável. Enfiando-o entre os dentes, encontrei a
arma enfiada no bolso do paletó.

Eu me levantei segurando as duas armas. Ouvidos


tocando, eu me virei. O rosto bonito e pálido de Cristiano
encheu a tela.

Lar.

Eu tropecei em direção a ele. — Cristiano. — Minha voz


estrangulada soou longe.
— Eu sei, Baby. Eu sei, — ele disse, com a mandíbula
cerrada, os olhos astutos enquanto passavam pela sala,
depois se concentraram em mim. — Você fez bem. Mas você
ainda não terminou.

Eu segurei as armas no meu estômago enjoado. — O


bebê. É verdade.

Ele engoliu em seco. Seu pai o alertou jovem para nunca


formar vínculos emocionais – cortando o que ele teve com
Angelina. Esse era o preço do amor. Eu não podia deixá-lo se
arrepender.

Meu coração disparou, mas eu queria que ele


desacelerasse e eu me recompusesse. — Há pelo menos oito
homens do lado de fora armados, — eu disse.

Seus olhos rapidamente examinaram meu rosto antes


que ele virasse a cabeça por cima do ombro e chamasse
Gabriel. — Estou indo buscá-la, — prometeu Cristiano. —
Você sabe onde está?

Eu balancei minha cabeça. — Algum tipo de armazém


enorme.

— Saia dessa sala. Encontre um lugar para se esconder


até eu chegar lá.

— Há muitos deles.

— Escute, mi amor. — A calma na voz de Cristiano


acalmou meus nervos um pouco. — Vire-se e corte a garganta
de Diego para saber que ele está morto. Não use a arma, a
menos que seja absolutamente necessário. Procure no corpo
dele um telefone diferente, depois se esconda e me ligue para
que possamos tentar localizá-la. Se você encontrar alguém,
lute, Natalia.

Eu lutaria. Eu já lutei. Mas eu, com uma faca, uma


pistola e um bebê para proteger contra todos eles e seus
rifles?

Cristiano leu a hesitação nos meus olhos. —


Mentalidade, Natalia, — disse ele com firmeza. — Você é a
monarca branca. Você não vê isso? Você é a arma, a
sobrevivente, a assassina. Você consegue fazer isso.

Eu não tinha outra escolha. Tomei uma inspiração e


assenti com força. — Não vi nada quando entramos, mas a
pressão do ar aqui é baixa, — corri para fora. Olhei por cima
do ombro, enervada pelo silêncio do armazém. — É como
uma floresta. O chão é macio, muitas árvores grandes...

— Que tipo de árvores? — Gabe perguntou, entrando no


quadro atrás de Cristiano.

— Eu não sei. Pinheiro? Está seco, exceto que quase


parecia chover lá fora. Mas definitivamente não era.

Cristiano olhou para Gabriel. Ele assentiu lentamente,


seus olhos em mim, mas seus pensamentos em outro lugar.
— A migração da borboleta monarca, — disse ele finalmente.
— Deve ser. Suas colônias se agrupam em certos habitats de
inverno. O abeto de oyamel 28 cresce apenas em grandes
altitudes – posso olhar o alcance dos metros para obter uma
localização mais específica. Há tantas borboletas que suas
asas soam como uma chuva.

— Mensageiros de Deus, — eu sussurrei. Eles estavam


aqui.

— Sí. Você está protegida, — disse Cristiano e voltou-se


para Gabriel. — Você sabe onde ela está?

— Essas florestas são pequenas e podem ser


preservadas como reservas, mas o sistema de túneis de
Belmonte-Ruiz corre logo abaixo daquela área, com uma
entrada no porto de Acapulco, nas proximidades. — Ele
beliscou a ponte do nariz, falando consigo mesmo, como se
estivesse trabalhando nela. — Faria sentido que eles
conseguissem construir uma instalação operacional lá.

— Onde? — Perguntei.

— Sob a cobertura da cordilheira da Sierra Madre del


Sur. — Gabriel encontrou meus olhos e assentiu. — Eu sei
onde você está.

28 Árvore parecida com pinheiro.


Um momento, o rosto bonito, mas desenhado de
Cristiano, olhou para mim e, no outro, eu estava sozinha.
Cristiano estava a caminho. Os monitores da TV
escureceram, o escritório do armazém ficou num silêncio
ensurdecedor. O sangue de Diego cobriu minhas mãos
trêmulas. Ele perdeu, mas o que eu ganhei? Querer ele morto
não era o mesmo que cometer o ato. Ele era apenas a
segunda pessoa que eu já havia matado, e em um momento,
eu o amava mais do que ninguém.

Fiz o sinal da cruz, parte de mim esperando que Diego


encontrasse paz na vida após a morte, enquanto também o
condenava ao inferno.

Ele estava morto, e para ter certeza disso, eu cortaria


sua garganta. E então eu derrubaria uma tropa de homens
armados.

Fui até a mesa, peguei o mouse do computador e cliquei


no programa de CFTV. Uma janela minimizada se abriu com
uma visualização em grade da vigilância de diferentes
câmeras. Desta vez, não foi transmitido para os monitores
aéreos. Apertei os olhos e contei rapidamente os guardas. Os
dois no armazém eram a maior ameaça, mas eu só vi um
agora quando ele se inclinou contra uma estante de metal,
percorrendo seu telefone. Inclinei-me para frente, procurando
cada monitor. Onde estava o outro? E onde em relação ao
escritório eles estavam...
Minha testa bateu contra a tela do computador,
embaçando minha visão. Um punho na parte de trás do meu
cabelo me puxou para o chão.

Eu me virei. As pernas de Diego tremiam tanto que ele


caiu de joelhos, com o crânio esmagado e ensanguentado -
depois caiu no chão ao meu lado.

Minha cabeça latejava, meus olhos se cruzavam


enquanto eu engasgava. Não perca a consciência. Fique aqui.

Algo beliscou meu braço. Eu lutei para levantar minha


cabeça. Uma seringa. No meu ombro. Diego fez uma careta, o
polegar pressionando o êmbolo. Esvaziando em mim.

Sentindo que estava me movendo em câmera lenta,


estendi a mão. Lutamos com a seringa, mas eu pude vê-lo
perdendo a consciência. Com toda a minha força, eu
arranquei. — O que é isso?

Seus olhos se voltaram para o teto. — Escalera al Cielo.

Ele chiou de uma maneira tão dolorosa que eu senti no


meu próprio peito e garganta. A linha fina de cabelo suada,
ele começou a convulsionar.

O olhar dele ficou distante - como o de minha mãe em


seus momentos finais.

Meus lábios formigavam com tanta força que eu tive que


respirar. Uma sensação estranha, mas não desagradável de
formigamento percorreu minha mandíbula. Braços. Dedos.
Me incomodando.

— O que... o que está acontecendo? — Meus


movimentos ficaram letárgicos quando olhei para ele.

Olhei para o rosto pálido e pegajoso de Diego. Seu peito


afundou. Enquanto a vida se esvaía de seus olhos, ele disse:
— Você vem comigo.

E então ele se foi.

Escada para o céu. A memória voltou em pedaços. Diego


cantarolando Led Zeppelin. Sua referência casual à Coca
Light de que Juan Pablo Perez, químico de Nogales, estava
desenvolvendo uma nova droga. Baiacu, toxinas de peixe...
sedativo... um ritmo cardíaco mais lento.

Peguei a seringa com algum esforço e tentei focar minha


visão embaçada. Quase vazio?

Um bilhete de ida e volta para o céu. O mais ilusório e


eufórico.

Mas, com a dose errada, a escada desapareceu. O céu se


tornou o destino final.

Se ele me desse uma overdose, eu morreria aqui mesmo


neste andar.

Meu queixo tremeu. — O que é que você fez?

Ele não respondeu.


Eu precisava me virar. Me levantar. Rastejar se fosse
necessário. Mas meu corpo me traiu. Exultação e satisfação
se misturaram no meu estômago como uma onda, rolando
através de cada um dos meus membros, aquecendo meu
rosto de uma maneira que me fez querer sorrir.

Esconder, Cristiano havia me dito. Eu não conseguia


levantar um membro. Eu tentei deslizar de costas em direção
à mesa. Meus braços e pernas se tornaram macarrão, soltos e
caídos, cansados com o esforço.

Meus nervos vibraram. Um zumbido agradável tomou


conta.

Eu tinha que continuar. Fugir. Me esconder. Lutar.

Mas eu só podia afundar no chão, quando o céu me


puxou para cima, para cima, para cima e para longe.
26

Cristiano

O carro tomou o terreno acidentado da floresta o mais


rápido que pôde, mas cada minuto que passava parecia uma
hora, e nós também deveríamos estar nos movendo em
câmera lenta. Quando o crepúsculo começou a cair, subimos
um aterro de pedras. Apoiei-me no teto do Humvee para não
bater na minha cabeça.

Alejandro tinha um mapa espalhado sobre o console


central entre os bancos da frente enquanto Gabriel nos
dirigia pelo viva-voz. Alejo removeu a lanterna entre os dentes
e gritou por cima do arranhão das placas antiderrapantes da
picape contra as pedras. — Repita isso.

— Se a minha.. — a voz de Gabriel entra e sai, — está


correta, você... perto. — Os ataques de estática ao longo da
linha pioraram à medida que nos afastamos da civilização. O
garoto estava nos guiando ao longo da linha vermelha que ele
desenhou no mapa para indicar a rede de túneis de
Belmonte-Ruiz, mas parecia que estávamos prestes a perder
o contato. — Três quilômetros.

Três quilômetros? — O quê? — Eu exigi.

Sem resposta.
Max se endireitou. — Essas marcas de pneus estão na
lama?

Poderia ter sido isso, ou nada. — Está ficando escuro.

— Olhe para... — Gabriel disse. — Árvores

— Um local onde as árvores foram derrubadas. —


Apontei pela floresta em direção a um caminho lamacento,
grande o suficiente para um carro passar.

Max aumentou sua velocidade, correndo pela estrada


improvisada. Abaixei a janela e gesticulei à frente para
Eduardo e os homens no veículo atrás de nós.

Eu esmaguei meus dentes pela milésima vez desde que


deixamos a Terra dos Condenados. Natalia não ligou do
telefone de Diego como eu havia dito. Eu tinha que acreditar
que havia uma explicação. Bateria sem carga. Telefone
quebrado. Sem serviço. A qualquer momento, eu poderia tê-la
de volta em meus braços. Ela sobreviveria a isso. Eu sabia
disso no meu intestino.

Quando voltei no início do ano, assisti Diego ignorar e


manipular a melhor coisa de sua vida. E então, eu a tirei
dele. E a alimentei, observei-a crescer e mudar, de menina
para mulher, de minha prisioneira para minha esposa e,
agora, a mãe do meu filho. Diego subestimou Natalia pela
última vez, e hoje ela prevaleceu.

Ela terminaria isso. Eu a treinei bem. Eu não confiava


em mais ninguém que meus homens e, juntos, tínhamos
ensinado a ela como permanecer viva. Ela esperaria até
chegarmos lá. E então nós incendiaríamos o maldito lugar no
chão.

— Você tem que estar perto. — A voz de Gabriel veio


claramente. Alejo e eu trocamos um olhar. A estática se foi.
Estávamos perto de uma torre de celular. — Esta área é
super isolada, — disse Gabe, — e poderia servir como entrada
ou saída para uma passagem subterrânea.

Max olhou por cima do ombro. — Se você está nos


levando a uma armadilha, deve saber que não seria o
primeiro. Você também não será o último.

Não condenei o ceticismo de Max. De toda a merda


louca que passou pela minha cabeça nas últimas horas, me
perguntando se Gabe poderia estar armando para nós era um
pensamento leve. Gabe tinha feito tudo o que lhe pedia, no
entanto. Ele gostava de estar atrás do computador e de suas
lições com Solomon. Mas a paciência de Diego por vingança
era interminável, e ele enganou quase todo mundo, até a
mim, por mais tempo do que eu gostaria de admitir.

Gabriel estava por dentro o suficiente de nossos


sistemas para causar danos sérios, mas Natalia confiava
nele, e agora, ele era minha única esperança. Eu balancei a
cabeça para Max no caminho indicado para nós, em direção a
um destino que nenhum de nós tinha certeza de que existia -
nem mesmo Gabe, para ser sincero.
Do banco de trás, Alejandro passou por Max e eu, e
nossa artilharia e subiu em seguida. Maksim acelerou em
direção a uma estrutura de tijolos através das árvores. Ele
não parou até estarmos a alguns metros da porta. Eu esperei
por tiros. Tiros de aviso. Balas para apimentar os painéis
laterais ou quebrar o vidro externo do para-brisa.

Nada.

Silêncio.

Abri a porta, usando-a como um escudo enquanto


examinava a área.

— Talvez as marcas de pneus na lama estivessem indo,


não chegando, — disse Max quando nada aconteceu.

Ou talvez estivéssemos no lugar errado.

Foda-se. Eu tinha que entrar naquele armazém.

Alejandro abriu a porta. — Nós temos as suas costas, —


disse ele. — Vá.

Com um rifle de assalto amarrado no meu colete à prova


de balas, peguei meu .45 e corri a curta distância até a
entrada. Eu atirei na fechadura. Chutei a porta.

O espaço amplo e bem iluminado ficou mortalmente


parado. Totalmente silencioso.

Apenas eu. E as batidas do meu coração.


E se Natalia não estivesse aqui? E se ela nunca tivesse
estado?

Não. Ela estava aqui, escondida, como eu havia dito a


ela. Ela tinha que estar.

Passei por uma esteira rolante em direção a fileiras de


estantes de metal, olhando cada corredor enquanto eu
chamava o nome dela. Quando fiz um circuito parcial do
perímetro, comecei pelas pilhas. Chuto de lado caixas
aleatórias. Escondi o pânico na minha voz quando eu disse o
nome dela para que ela não ouvisse meu medo.

— Natalia.

Nada.

— Natalia.

Silêncio.

— Natalia! Droga!

Uma sala de segurança com janelas ficava à frente em


um canto, iluminada por telas de computador. Arma
apontada, eu andei em direção à porta aberta. Fui recebido
pelo zumbido suave do equipamento.

E um corpo morto.

Diego.

Mesmo com o rosto esmagado e sangue por toda parte,


reconheci meu irmão. Estávamos no lugar certo.
Mas onde estava Natalia?

Se escondendo? Ocupada?

Minha garganta começou a fechar e eu lutei por ar.

Eu me virei para retomar a busca no armazém quando


meus olhos se depararam com um par de pés descalços
saindo de trás da mesa.

As unhas dos pés da cor do esmalte que Natalia havia


acenado na frente do meu rosto há dois dias, implorando por
uma pedicure. Eu não tinha sido capaz de dizer não. Eu faria
qualquer coisa por esses dedos.

Eu dei um passo à frente.

Pelos quadris que balançavam contra mim quando


dançávamos. Isso mantinha meu olhar sempre que ela saía
do quarto. Isso daria meu filho.

Um zumbido começou nos meus ouvidos. Minhas botas


ficaram mais pesadas a cada passo. A pressão pesava no meu
peito. Nenhuma respiração entrou ou saiu do meu corpo
quando virei.

Artérias de cabelo preto sobre o chão de concreto


alcançavam seu rosto pálido em forma de coração. Olhos
fechados em repouso tranquilo. Lábios ligeiramente
separados – rosa e sorridentes naquela manhã, agora de um
azul gelado e alarmante.
Minha arma caiu no chão. Caí de joelhos e a sacudi
pelos ombros. — Natalia. Acorde, mi amor. — Eu apenas a
segurei em meus braços enquanto celebramos a vida de
Bianca. Ela estava quente. Brilhante e bonita. Crescendo com
a vida, agora eu sabia.

— Temos de ir. Levante-se! — Agarrei sua mão na


minha. Fria. Eu a segurei no meu peito em colapso e
pressionei meus outros dedos no pulso sob o maxilar dela.

Sem batimentos cardíacos.

Isso não era possível.

Não poderia estar certo. Eu estava em pânico demais


para encontrar sua artéria carótida.

Eu me forcei a expirar. Deslizou uma mão sob a cabeça


dela. Puxei seu corpo delicado para o meu colo, coloquei
minha orelha em seu peito. Ouvido.

Mas ela lutou. Ela ganhou. Eu já tinha visto com meus


próprios olhos.

Natalia não perderia essa batalha. Ela era muito forte,


muito boa, tinha muito a oferecer.

Eu esperei com minha bochecha contra seu peito. E


esperei. O corpo dela vibrou embaixo de mim. O coração dela
ou o meu? Minha própria batida com tanta força que eu não
conseguia ouvir mais nada. Apenas silêncio.

Silêncio mortal.
Eu não conseguia respirar. O ar se tornou água, espessa
e lenta, me afogando. — Acorde, Natalia.

Mas o corpo dela não mentia. O peito dela era uma


caverna. Mina escavada. Minhas costelas cederam quando
meu coração lutou, batendo forte e cheio de raiva. — Não, —
eu implorei. — Não, não, não.

Arranquei minhas armas e colete à prova de balas,


ajoelhei-me e puxei seu corpo contra mim. Havia um novo
corte em sua cabeça, mas mal tinha sangrado. Sem marcas
de estrangulamento. Sem outras feridas.

Engoli um soluço de raiva e puxei seu vestido, mas só


encontrei a pele macia e intocada em todos os lugares.
Nenhum tiro, ferimento – nada a matou. Por que ela não
estava respirando? Por que seu coração não batia?

Os músculos inúteis que eu construí para proteger,


defender e apoiar a sustentavam, mas não podiam fazer mais
nada. A esperança foi drenada do meu corpo.

Apertando minha mandíbula dolorida, eu a coloquei no


chão, coloquei as palmas das mãos entre os seios e empurrei
seu peito uma vez, duas, três vezes – repetidamente – e
depois parei para verificar a pulsação. Colocando o topo de
sua cabeça, inclinei o queixo para trás e coloquei minha boca
na dela, respirando nela, dando-lhe a vida, chamando-a de
volta da porta da morte.

Eu nunca deveria ter deixado ela sair do carro. Eu


baixei minha guarda. Eu virei às costas, pensando que Diego
estava morto. Que Belmonte-Ruiz seguiu em frente. Eu não a
havia treinado para lutar no caso dela engravidar – por que
não pensei nisso? Por que eu não tinha chegado aqui mais
rápido? O que aconteceu entre a nossa ligação e agora?

— Vamos, Natalia. — Voltei a compressões torácicas. —


Você prometeu voltar para casa para mim...

Nada. Não resta alma nela. Não queria admitir, mas


sabia no momento em que a vi.

Ela se foi.

Meu filho não nascido se foi.

Minha vida... se foi.

Botas bateram no piso do armazém, aproximando-se até


parar atrás de mim.

— Cristiano, — disse Max, sua voz falhando quando


seus passos foram retomados. — Vamos. Nós não podemos
ficar.

Eu me recostei, olhando para ela. Não consegui me


mexer. Eu corri para este armazém certo de sair com Natalia
- não nos meus braços, mas ao meu lado.

— Cristiano.

Eu ignorei Max. Alguém tinha que pagar por isso. Agora.


Hoje. — Onde eles estão?
— Belmonte-Ruiz não está mais aqui. Eles devem ter
encontrado os corpos e saído. Mas eles podem voltar a
qualquer momento...

Eu cerrei os dentes. — Eu quero estar aqui quando eles


o fizerem.

— Então você vai sair em um saco. — Max tinha minha


camisa em dois punhos antes que eu percebesse, me
puxando para os meus pés. — Coloque seu colete de volta. —
Ele me sacudiu enquanto seus olhos ardiam com o quê?
Medo? Raiva? Luto? — Pegue sua esposa e leve-a para casa.
Dê a ela um enterro adequado. Você deve isso a ela e muito
mais. — Ele me afastou. — Você quer que eles carreguem o
cadáver dela daqui com o seu?

Não. Fechei os olhos, mas ainda a vi deitada no chão.

— Olhe para ela, Cristiano, — ordenou Max. — Olhe


para sua esposa.

Não pude. Eu não pude encarar isso.

— Você a abandonará aqui? — Ele perguntou.

Abandono? Nunca.

Ela precisava de mim - mesmo na morte. Eu tinha que


ficar junto. Invoquei forças profundas e me forcei a voltar
para Natalia.
A rigidez de seu corpo sem vida não era menos
chocante. Meu pulso desapareceu, meu sangue parou de
fluir.

— Como isso aconteceu? — Max disse. — Ela estava


viva quando...

— Eu não sei. — Isso não importava. Eu a encarei.


Todas as vidas que eu tirei e nunca vi alguém tão quieto. Tão
sem resposta. Talvez, desde Bianca, eu nunca tivesse me
importado o suficiente para olhar.

— Pegue-a, — disse ele.

Pela primeira vez, eu não tinha ideia do que fazer –


então ouvi Max.

Eu levantei o corpo dela para o meu peito enquanto me


levantei e saí do prédio, no escuro, para a floresta.

Parei na porta do veículo quando uma brisa se moveu


através das folhas das árvores.

Não são folhas. Nem brisa.

Borboletas.

No alto, milhares de monarcas cobriam os abetos,


batendo as asas. Natalia encontrava conforto sempre que
alguma estava por perto, pensando que era a alma que partiu
de sua mãe e voltou para checá-la.

Mas eu não.
Eu tinha fé em muito poucas coisas, e em menos ainda
agora.

— Foda-se. — Nos meus braços, Natalia era


simultaneamente peso morto e leve como um pardal. — Foda-
se por tirá-la de mim.

Botas soaram atrás de mim. Max e Alejandro


apareceram ao meu lado. — Oh, Deus. — Alejo disse. — Não.

— Entre, — disse Max. — Estamos em território inimigo.


Entre.

Levei Natalia para o banco de trás, segurando-a contra


mim.

Eu tinha feito tudo ao meu alcance para trazer Natalia


de volta a esta vida. Eu prometi a ela minha proteção. Eu
falhei com ela. Eu deveria tê-la deixado em paz. As palavras
de Costa sobre a morte de Bianca, há muitos meses, ecoaram
em meus ouvidos.

— Eu não desejaria minha dor ou culpa a ninguém.

Eu entendi agora. Trazer Natalia para este mundo não


apenas arriscou sua vida, mas a minha também. Talvez
Costa fosse forte o suficiente para viver sem Bianca, mas eu
não era sem Natalia. Se isso me faz um covarde, então eu era
uma pessoa sem coragem.

Quando nos afastamos do armazém, coloquei meu rosto


no de Natalia. Eu beijei as lágrimas secas em suas
bochechas, seus cílios molhados e lábios frios. Um suspiro
escapou dela e eu engoli. Até o chocalho da morte veio suave
e gentil de sua boca doce.

— Céu ou inferno, eu vou te encontrar, — eu sussurrei


para ela. — Farei Belmonte-Ruiz pagar, e será a última coisa
que farei antes de me juntar a você.

Uma sensação de calma tomou conta de mim, sabendo


que eu estaria com ela novamente em breve.
27

Cristiano

Eu fiquei na parte de trás da capela escura que


ancorava a praça da cidade da Terra dos Condenados. No
meio da noite, Max, Alejandro e Eduardo acenderam velas e
rezaram no altar onde o corpo de Natalia havia sido colocado.
Seu pai, Barto e Pilar já tinham visto com seus próprios
olhos. Amanhã seria o velório antes do enterro de Natalia,
mas eu não conseguia comemorar a vida como estava
acostumado em nossas vigílias. Eu diria adeus hoje à noite.

Max se levantou primeiro e colocou o telefone no ouvido


para atender uma ligação. Até a casa de Deus não estava
isenta das exigências do trabalho. Maksim olhou para o
corredor para mim, assentiu e veio na minha direção. —
Gracias, — ele disse, desligou e se dirigiu a mim. — Nós
precisamos conversar.

— Agora não, — eu disse, meus olhos ardendo enquanto


olhava para frente.

— Precisa ser agora. Vidas estão em jogo. Coloque sua


dor de lado.
Impossível. Eu nunca conheceria outro momento sem
dor e miséria. Ter amado e sido amado por Natalia era tudo
que eu já precisava, mesmo quando não sabia.

Eu não poderia trazê-la de volta.

— Você ainda tem outras vidas dependendo de você, —


disse Max.

Engoli em seco e virei meu foco para ele. — O que foi?

— Sempre soubemos que haveria um preço a pagar pelo


que fazemos, — disse Max.

Meu coração deu um pulo, forçando sua presença em


mim, mesmo depois de ter sido arrancado. Eu fiz uma careta.
— Eu paguei.

— A vida de sua esposa e filho pode ter satisfeito Diego,


mas a morte deles significa pouco para Belmonte-Ruiz. — Ele
fez uma pausa quando Alejandro e Eduardo se aproximaram
e disse: — Eles estão vindo.

Isso era de se esperar. Eu estava fraco agora. E eu


atrapalhei mais um de seus acordos. — A que distância? —
Eu perguntei.

— Eles devem estar aqui ao amanhecer.

— Amanhecer é agora, — eu disse.

— Não exatamente, — disse Max. — Mas logo.

— Quantos?
— Suficiente. Belmonte-Ruiz é apenas parte da equação.
Eles recrutaram várias outras organizações para se juntarem
a ele. Eles querem que o país inteiro saiba que você está
acabado.

Diego mais uma vez prometeu a alguém mais poderoso


do que ele coisas que ele não poderia entregar. E ele pagou o
preço final.

Mas eu não tinha.

A sede de sangue e vingança de Belmonte-Ruiz não seria


satisfeita enquanto eu estivesse vivo. Eu tinha roubado deles.
Matado seus homens. Custei-lhes negócios e dinheiro. Eu fiz
inimigos de vários cartéis, fazendo-os parecer tolos muitas
vezes. E eu me safei disso.

Até agora.

— Alguém me dê um cigarro.

— Você parou, — disse Alejandro.

— Por Natalia. Pelo meu futuro. Não tenho nada agora.


— Minhas mãos suavam. Ansiava por segurar Natalia. Seria a
última vez. Como é que eu não seria capaz de tocá-la quando
quisesse, ter o conforto em sua presença, seu amor? Virei as
costas para o corpo dela, brilhando à luz da vela enquanto
esperava por mim no final do corredor. — Deixe-me me matar
tão devagar ou tão rapidamente quanto achar melhor. Me dê
uma merda de cigarro.
Eduardo ofereceu um com um isqueiro. Ele sempre foi
um homem de vício. Acendi a coisa e dei uma tragada
reconfortante. — Vocês conhecem o plano de saída, — eu
disse a eles.

— Já está em movimento, — respondeu Max.

Eu assenti. Para eles começarem as evacuações sem me


consultar, isso significava que era realmente o fim. Nós
sempre estávamos preparados para morrer por isso. E pela
possibilidade de haver chegado um momento de deixar a
Terra dos Condenados para trás.

Eu exalei uma nuvem de fumaça. — A frota está pronta?

— Nós já soamos os alarmes. As pessoas estão


embarcando. Eles terão comida, água e dinheiro – o
suficiente para colocá-los de pé onde quer que cada pessoa se
acomode.

Ninguém falou por um momento. Era aqui que


terminava.

— Você os serviu bem, — disse Alejo. — E você os


equipou. Todos nesses muros sobreviverão fora deles por sua
causa. Muitos deles só estão vivos por sua causa.

Eu assenti uma vez. — O tempo não está do nosso lado


– vão.

— E você? — Max perguntou.


Eu olhei para o cigarro na minha mão. Deveria ter sido
um charuto apreciado em comemoração à boas notícias. Do
meu primeiro filho a caminho. Da boa vontade que Deus
colocou sobre minha esposa e eu.

Em vez disso, levantei-o em direção ao céu antes de


pisar em um banco. Minha vida foi tirada de mim. Não havia
mais nada para mim aqui. — Quando todos estiverem em
segurança, encontre-me aqui de volta, — eu disse a Max. E
traga Barto. Apenas vocês dois. Até lá, ficarei sozinho com
minha esposa.
28

Cristiano

Vestida com uma camisola branca, Natalia brilhava no


final do corredor na capela escura. Velas tremeluzentes
formavam sombras de seu corpo na parede atrás do altar. Fui
em direção a ela e subi os degraus até onde ela estava
deitada em uma cama de cobertores artesanais e lençóis e
travesseiros de seda creme. A luz da vela trouxe cor às
bochechas dela, criando uma ilusão dolorosa de calor e vida.

Eu olhei para ela. Mãos cruzadas sobre o estômago. Seu


cabelo escuro em volta do rosto pálido, organizado por Pilar
para cair em cachos sobre os ombros esbeltos.

Eu toquei sua bochecha. Impossivelmente macia e


suave. Manuseando o canto da boca, me inclinei para
pressionar meus lábios nos dela – e fiquei lá. Eu não
aguentava me afastar.

Umidade escorria dos meus olhos para as bochechas


dela. O que foi isso? A última vez que chorei, derramei uma
lágrima pela morte de Bianca e depois tive que correr pela
minha vida. Agora, lágrimas correram pelo meu rosto, caindo
nos lábios sem vida de Natalia.
Agarrei os lados do rosto dela, beijando sua testa, os
cantos da boca, lembrando como eles se contorceram desde o
início quando ela lutou contra seus sentimentos por mim.
Sentei-me na cama improvisada e toquei seu cabelo. A
tatuagem na parte de trás do ombro dela. Peguei suas mãos
de seus lados para trazê-las para minha boca, respirando
nelas por tempo suficiente para aquecê-las.

Minha mente brincou comigo. Eu estava ficando louco.


Talvez eu já tivesse ido embora. Não havia dúvida – eu não
poderia continuar sem ela, ou minha mente certamente iria.

— Eu te amo, Natalia Lourdes, — eu disse. —


Mariposita. Eu te amo.

Abaixei suas mãos e beijei seu estômago. Um cheiro


metálico muito familiar encheu minhas narinas. Puxei seu
vestido para encontrar sangue entre suas pernas.

Foda-se. Eu apertei o tecido.

Não era suficiente perdê-la? Eu tinha que testemunhar


o aborto da minha esposa morta?

Eu não desejava mais a vida de Natalia, mas a minha


própria morte. E eu não podia confiar em ninguém além de
mim para conceder esse desejo. Eu enterrei minha cabeça no
ventre de Natalia, agarrando seus lados quando um soluço
assolou meu corpo.

Não havia Deus. Não havia Virgem. Eles não tiraram


minha esposa de mim e me deixaram vislumbrar por um
momento a família que eu poderia ter. Eles não me
mostraram amor puro apenas para separá-lo de maneira tão
repentina e cruel – nenhum poder superior poderia ser tão
brutal, nem mesmo para punir um homem como eu.

Exausto e emocionalmente esgotado, entrei e saí da


consciência. Era aqui que terminaria, e eu não tinha forças
para combatê-lo.

Eu não tinha certeza de quanto tempo dormi quando o


clique da pesada porta da frente da capela me despertou. Max
e Barto estavam na entrada. Eu dei um beijo na bochecha de
Natalia e me levantei para encontrá-los na metade do
corredor.

Os olhos de Barto ficaram estreitos em mim. — Você me


chamou?

— Todo mundo está fora? — Perguntei a Max.

— Toda pessoa. Todo animal. Apenas nós


permanecemos – Alejandro, Eduardo, Pilar, Jaz e Costa estão
no navio esperando por nós. A doutora Sosa também queria
ficar, caso fosse necessária.

— Pilar deveria ter ido mais cedo.

— Ela recusou, — disse Barto. — Ela já perdeu sua


melhor amiga. Ela não tem mais ninguém e se sente mais
segura conosco.
Eu assenti. Eu não tinha certeza este era o momento em
que ela deve finalmente ficar firme, mas não havia nenhuma
outra opção agora. — Gabriel? — Perguntei.

— Não o vi, — disse Max. — Suponho que ele já foi.

— Quando tudo isso acabar, encontre-o, se puder.


Ajudem-no. Ele é um bom garoto. Ele será um bom homem.

Max assentiu.

— Isso é sobre o quê? Por que estou aqui? — Barto


benzeu-se. — Para ajudar com o corpo de Natalia?

Eu olhei para ele, meu ex-camarada, um homem de


palavra, e alguém que, apesar da nossa história, eu pude
confiar durante minha juventude e agora, quando eu mais
precisava dele. Depois, para Max, meu amigo, meu confidente
e o braço direito.

— Você e eu, estamos juntos há muito tempo, Max. —


Belisquei os cantos internos dos meus olhos cansados. — Eu
não preciso lhe dizer como o plano se desenrola.

— Eu nunca realmente acreditei que isso chegaria a


isso, — disse Max.

Eu assenti. — Mas chegou.

Fiquei em silêncio por um longo tempo. Havia apenas


uma opção, mas enfrentá-la significava aceitar o fato de que
Natalia realmente se foi.
Eu me virei para Barto. — Belmonte-Ruiz está aqui por
sangue. Eles não vão parar até conseguir. Até que alguém
pague – e eu pagarei. Eles continuarão a me caçar. Se eles
não me fizerem de exemplo, alguém o fará. Á não sou bom
para ninguém, só levo perigo aonde quer que eu vá.

Barto levantou o queixo. — Você está pedindo minha


ajuda para tirá-lo do país?

— Não. — Fiz uma pausa. — A Terra dos Condenados é


equipada para que, em caso de emergência, seja detonada.

O silêncio caiu sobre a sala. Max fechou os olhos


brevemente, mas endireitou as costas.

A expressão de Barto finalmente diminuiu. —


Inteligente. Melhor perecer do que ser capturado.

— Melhor ainda, se você pode derrubar o inimigo com


você, — eu disse.

Barto olhou entre nós quando minha intenção foi


registrada. — Qualquer pessoa dentro dos muros da Terra
dos Condenados vai com ele.

Eu assenti. — Belmonte-Ruiz me quer – eles terão que


entrar no ermo e me pegar. E todo o seu cartel, além de
qualquer outra facção que se juntou a eles, será exterminada.
A explosão nivelará completamente a cidade, a montanha -
tudo.
Minha morte iria parar com isso. Belmonte-Ruiz poderia
ser destruído, e Costa, Max, Alejandro e toda a população da
Terra dos Condenados estariam a salvo deles.

De uma só vez, pude terminar esta guerra e causar um


impacto considerável no tráfico de pessoas. Não seria para
sempre, mas todas as vidas tinham valor, e muitas seriam
poupadas durante o tempo necessário para reconstruir a
operação que desmoronaria com a queda de Belmonte-Ruiz.

Barto parecia quase impressionado. — Você desistiria de


tudo isso?

— Para salvar vidas, sim.

Barto mexeu os pés, balançando a cabeça


lentamente. — E Costa?

— Diga que ele foi forçado a esse acordo contra sua


vontade. Eu tive a filha dele. Ele é respeitado o suficiente
para que, uma vez dissolvida nossa parceria, ele seja deixado
em paz.

— Será o fim de BR e sua operação, — disse Barto. —


Mas não vai terminar nada. Um líder desce e outro toma o
seu lugar. Há outros que gostariam de vê-lo morto.

— E eles vão. Minha vida em troca de muitas outras. É


um sacrifício que eu sempre quis fazer. Só a minha morte vai
parar com isso.

Barto olhou para o teto, depois assentiu com um


suspiro. — Como funciona?
Max ampliou sua postura e cruzou os braços, no modo
de estratégia total. — Existem duas maneiras de detonar. Do
centro de controle no porão, ou remotamente, a meio
quilômetro.

— Se você pode apertar o botão da água, por que


ficaria? — Perguntou Barto.

Eu suspirei. Não porque estava hesitando - não tinha


motivos para duvidar da minha decisão. Mas porque uma vez
que eu dissesse isso, a vida que eu conheci realmente
terminaria. — Sem Natalia, nada está me mantendo aqui, —
eu disse. — Ela se foi. Eu vou morrer hoje. Você foi bom com
ela... — Limpei minha garganta para manter minha voz
calma. — Mesmo depois de tudo o que passamos, considero
você um amigo.

Eu ofereci minha mão. Barto olhou por um momento.


Talvez agora ele finalmente percebesse o quão profundo meu
amor por Natalia era, mas se ele sabia ou não, não era mais
importante.

— Se você estiver disposto a fazer isso para vingá-la, —


disse ele, — e para salvar o resto de nós, então o sentimento
é mútuo.

— Foi por isso que te pedi aqui. Apelo à sua lógica, não
à sua emoção, e Costa teria tentado me convencer disso.
Eu... — A próxima parte não foi fácil. Eu queria Natalia aqui
comigo para o fim. Não faria diferença na vida após a morte –
se houvesse uma, eu a encontraria. Egoisticamente, eu
queria segurá-la até meu último suspiro, mas eu tinha sido
ganancioso o suficiente quando se tratava dela. A coisa certa
a fazer era dar a ela um local de descanso final pacífico, não
incinerá-la com o resto de nós.

— Leve Natalia com você, — eu disse. — Costa não deve


voltar até que as coisas se acalmem, mas estou contando com
você para sair daqui e levá-la para casa. Enterrá-la onde ela
pertence – com a mãe.

Uma pitada de desespero suavizou suas feições. — Você


tem minha palavra.

Era isso então. Não havia mais nada para ficar e o


tempo acabou. Quanto mais tempo o navio final
permanecesse no porto, mais todos estariam em risco. Eles
contavam comigo para ser forte.

Uma dor profunda bateu no meu estômago, mas eu a


ignorei e me virei para caminhar de volta pelo corredor até
Natalia. Eu tive que fazer uma pausa no topo da escada para
forçar a respiração dentro e fora dos meus pulmões.

Não havia outro caminho, no entanto.

Apenas minha esposa seria tão bonita na morte. Eu


quase conseguia me convencer de que sua palidez havia
diminuído. Que suas bochechas estavam coradas. Quando
deslizei meus braços por baixo de seu corpo e a levantei,
senti calor, não morte – autopreservação, permitindo-me
olhá-la pela última vez como sempre a conheci.
Bonita, vivaz, tão teimosa na morte quanto na vida.

Borboleta no céu, monarca em meus braços enquanto


dançávamos na noite da festa à fantasia. Ela zumbiu contra o
meu corpo com medo, ansiedade e excitação, enquanto nossa
inteligência se debatia e nossos pés dançavam o tango.

Sereia na água, mostrando-me como as curvas de uma


mulher poderiam suavizar minhas bordas duras e afiadas.

Dona do meu coração frio e negro.

Eu pressionei um beijo final contra seus lábios.

— Mi amor. Mi vida.

Meu amor. Minha esposa.

Minha necessidade por ela era tão voluntariosa, tão


emocionante, que senti sua respiração suave acariciar meus
lábios. Eu bebi seu doce suspiro na minha boca. Minha
descida à loucura havia começado e seu momento era
perfeito. Forcei minha boca para longe dela e meus pés
descendo as escadas.

Foi à coisa mais difícil que eu já fiz. Mesmo iluminar


dinamite sob meus próprios pés seria mais fácil, eu sabia.

Entreguei o corpo de Natalia para Barto.

Alcançando o coldre ao meu lado, eu removi a Monarca


Branca que eu trouxe para ela, abri a mão dela e enrolei seus
dedos em volta do gatilho. Meus olhos cansados alucinaram
seu polegar contra a pérola. — Enterre-a com isso. Para
proteção.

Barto assentiu uma vez, uma promessa de ver meu


comando passar e a levou embora.

— Suerte. Seja próspero, seja bom, — falei para Max. —


Não volte ao México nunca mais.

— Espero que você mude de ideia, — disse ele enquanto


apertamos as mãos. — Se você fizer, eu estarei esperando por
você.

Eu não desistiria. Eu não estava deixando nenhuma


chance de Belmonte-Ruiz se afastar do que eles fizeram e do
que roubaram de mim.

Eu me consolava com o fato de que exterminá-los


salvaria até mesmo uma vida. Toda vida tinha valor.

Mas a vida de Natalia valia tudo. E no final, valeu a


pena.
29

Cristiano

Nos momentos antes do amanhecer, apaguei as velas da


capela, não que isso importasse se queimasse. Belmonte-Ruiz
estaria aqui a qualquer momento e, uma vez dentro dos
portões, eu desperdiçaria tudo isso.

A Terra dos Condenados era casa, mas sem seu povo,


era uma concha. Fui em direção a casa pelas ruas vazias. O
silêncio trouxe uma sensação de paz que eu só conseguia
reconhecer sabendo que minha dor terminaria em breve e
com propósito. Subi o caminho da montanha pela última vez,
do outro lado da entrada e subi os degraus da porta da
frente.

Ao som de dentro da casa, eu congelei no meio do


caminho.

Passos apressados batiam contra o ladrilho da entrada.

Todo mundo deveria ter ido embora.

Poderia ser apenas um dos meus homens, mas peguei


minha arma de qualquer maneira e apontei na porta da
frente quando ela se abriu.
Gabriel Valverde jogou as duas mãos para cima. — Ay.
Sou só eu.

Eu coloquei a arma no coldre. — O que diabos você


ainda está fazendo aqui? — Eu perguntei, limpando minhas
mãos empoeiradas nas minhas calças. — Eu ordenei que
todos saíssem da Terra dos Condenados. O último barco está
partindo, se ainda não tiver saído.

Não pude sair. Não até que eu soubesse tudo o que


poderia descobrir sobre isso – ele disse, abrindo a mão para
me mostrar.

— Uma seringa? — Perguntei com uma careta.

— Escada al cielo.

— Escada para o céu? Essa é uma música do Zeppelin.


Você ficou louco, — eu disse, quase rindo. — Nós dois. Você
vai morrer aqui se...

— Max pegou no armazém no corpo de Natalia, — ele


correu para dizer. — Ele disse que você não sabia como ela
morreu, então eu estive pesquisando a noite toda. — Como se
esse fato tivesse acabado de ocorrer, ele piscou com força,
tirou os óculos com a mão livre e esfregou os olhos vermelhos
com as costas do punho. — Isso é o porquê Belmonte-Ruiz
querer sua ajuda. — Ele substituiu seus óculos e apertou o
cano entre os dedos. — Levar este medicamento ao mercado
internacional...

— Não importa mais, Gabriel.


— Sim - apenas ouça. A droga mata apenas com a dose
errada, Cristiano. Caso contrário, apenas coloca o usuário em
transe. Foi assim que Diego fingiu sua morte... bem,
clinicamente, ele estava morto, mas…

— Você foi um soldado melhor do que eu lhe dei crédito.


— Subi os degraus da frente e o agarrei pelos ombros. —
Corre. Você ainda poderá pegar o barco daqui. Obtenha sua
parte do dinheiro e pronto. Comece uma nova vida.

Eu andei por ele em casa.

— Você vai ficar? — Gabe perguntou, pânico rosqueando


sua voz enquanto me seguia pelo vestíbulo.

— Mais alguns segundos e talvez você precise nadar até


o barco, se quiser pegá-lo.

— Onde está o corpo de Natalia?

— Se foi! — Eu bati por cima do ombro, meus nervos se


desgastando com a menção do nome dela. — Saia daqui
antes que eu...

— E se ela acordar e você não estiver lá? O que então?

Eu congelei em minhas trilhas, meu couro cabeludo


formigando. Eu me virei lentamente. — O quê? — Meus olhos
dispararam entre os dele. — Se quem acordar?

— O que eu estou tentando lhe dizer, — disse Gabe,


tropeçando em suas palavras. — Acho que Diego a injetou
com isso – uma tetrodotoxina que poderia colocá-la em um
transe cataléptico.

Eu fechei meus punhos. — Fale inglês.

— Diego usou a Escada para o Céu para fingir sua


morte. Muito disso poderia matá-la, mas a quantidade certa
só a colocaria em um estado que imita a morte. Pode levar
doze horas, talvez mais, até que a droga acabe.

Minha garganta secou como meus olhos. Não era


possível engolir. Piscar. Funcionar. Pensar. Demorei mais
para calcular quanto tempo havia passado, mas estávamos
definitivamente perto disso. — Você está dizendo que ela
ainda pode.

Ele era louco. Eu ouvi seu peito esperando por um


batimento cardíaco. Esperei por sua respiração. Eu também
não senti.

— Você realmente ficou louco, — eu disse. — Que jogo


você está jogando comigo? Não me importo se você entrar no
barco, mas se não sair da minha vista...

— Não é brincadeira. — Eu já tinha visto Gabriel


assustado antes, e ele não estava agora. Ele respirou fundo.
— Ela ainda pode estar viva, Cristiano.

Eu me virei e me afastei. — Você está errado.

— Eu poderia estar, — ele admitiu. — Mas e se eu não


estiver?
Isso me atingiu então. Ela se mexeu nos meus braços.

Não tinha sido uma ilusão.

Minha mente não estava brincando comigo.

A dor no meu intestino não tinha sido desesperadora,


mas um instinto que eu tinha ignorado. O calor que senti em
seus lábios... o último suspiro de sua respiração – eles não
tinham sido finais. Eles não foram evocados por minha mente
por desespero para devolvê-la à vida.

— Ela está... ela está viva, — eu sussurrei.

Alívio explodiu em mim, enviando pura alegria


inalterada correndo pelas minhas veias. Eu sabia a verdade
sem dúvida. — Ela está viva, — eu disse a Gabe.

A boca de Gabriel abriu um sorriso. — Você disse que o


barco ainda pode estar aqui. Vá. Apúrese. ¡Corra!

Rápido. Corra! Eu poderia pegá-la. Mergulharia no mar e


nadaria o tempo que fosse necessário.

Céu ou inferno, terra, ar ou mar, eu vou te encontrar, mi


amor, e eu vou.

O que?

O que eu faria? Trazer ela de volta aqui? Ir com ela?

O medo me encheu, plantando meus pés onde estavam.

Ela teve uma segunda chance.


Como eu.

Prometi protegê-la. Desde então, houve duas tentativas


sérias em sua vida. Ela quase foi tirada de mim mais vezes do
que isso. Eu não a mantive segura. Eu só a colocaria em mais
perigo. Eu arrisquei a vida dela muitas vezes, e esta foi a
minha oportunidade de fazer as coisas direito. Natalia
acordaria no mar e ouviria das pessoas que mais gostavam
dela. Que eu estava morto. Que eu tinha morrido vingando-a
e completando a missão que me propusera a fazer – salvar
vidas. Seria difícil, mas eventualmente ela retomaria a vida.

Eu não ia correr para o oceano e chamá-los de volta


quando Natalia já tinha zarpado em um futuro melhor.

Ela estaria segura com Barto, Max, Pilar, Alejandro – e


seu pai. Era uma nova vida com eles ou a morte comigo, e ela
me escolheria se eu deixasse. Ela ficaria aqui ao meu lado até
o fim.

Eu tinha um propósito aqui. Eu precisava ver além


disso. Assim que eu decidi ficar para trás, sabia que era a
escolha certa, e ainda era.

Céu, inferno, ou qualquer coisa no meio – eu a


encontraria novamente.

Até nos encontrarmos, onde quer que fosse, ela estaria


segura.

— O que você está fazendo? — Gabriel perguntou. —


Vamos.
— Sal de aquí, — eu disse, mandando-o embora. — Você
não conseguiu me encontrar a tempo de me dizer que ela
estava viva, entendeu? Diga a ela que morri com dignidade e
com amor por ela em meu coração.

— Cristiano...

Carreguei-o, peguei-o pela camisa e fiz por ele o que


uma vez tentei fazer por Natalia. Eu assustei a merda dele
para o seu próprio bem. — Dê o fora daqui. Agora. Você não
pode ficar aqui. — Minha voz ameaçou quebrar quando eu o
empurrei. — Você ainda deve sua vida a Natalia. Fique com
ela. Cuide dela. Estou confiando em você para fazer isso por
mim. É meu... — Cerrei os dentes. — É o meu desejo de
morte.

Gabriel parecia como se tivesse visto um fantasma. Ele


se afastou de mim e olhou para o chão enquanto dizia. —
Sim, senhor. Prometi que seria um bom soldado para você e
para ela. Eu irei, na vida ou na morte. Obrigado por...

— Não há tempo. Vá.

Ele assentiu uma vez, depois correu para longe.

Eu não conseguia me mover, mal conseguia respirar


enquanto registrava. Natalia estava viva. Eu não podia
acreditar, porra. Não mudou nada e mudou tudo.

Era uma ocasião para comemorar.

Fiz uma bebida para mim mesmo, alguns dedos do meu


melhor e mais caro mezcal – depois enchi o copo até o topo.
Posso muito bem terminar a garrafa. Demorei a cortar e
acender um charuto hondurenho Gurkha Black Dragon que
eu estava guardando para uma ocasião especial. O
nascimento do meu filho ou filha. O casamento que eu tentei
convencer Natalia de que deveríamos repetir com o máximo
de extravagância possível. Nesse caso, eu celebraria sua vida
e a queda de Belmonte-Ruiz.

Meu amor, minha esposa, estava viva. Caminhei pela


casa vazia, pelo pátio onde Natalia e eu havíamos comido
escargot, passei pela mesa de jantar onde amei seu lugar
mais íntimo com a boca pela primeira vez e subi lentamente
as mesmas escadas onde ela me chamou de volta em suas
horas mais sombrias depois de saber a profundidade da
decepção de Diego. Onde qualquer amor que ela pudesse ter
deixado por ele finalmente se tornou meu.

Para o nosso quarto, onde ela matou um homem.

Onde eu a segurei em meus braços depois que ela


chegou aqui, onde tremeu contra mim.

Onde eu fiz amor pela primeira vez.

No chuveiro, onde havíamos confessado nosso amor


pela primeira vez.

O armário, onde eu a havia ameaçado por um bom


tempo com El Gallo.

Com minha bebida e charuto em uma mão, continuei no


armário e tirei o vestido de noiva de Natalia de seu cabide
extravagante e acolchoado. Ela havia entrado na igreja
naquele dia, com olhos curiosos e ansiosos e mechas negras
emoldurando suas feições delicadas e sua pele bronzeada e
macia. A coisa mais linda que eu já vi, e ela tinha sido minha.
Apertei o tecido fino do jeito que tinha feito naquele dia na
igreja. Ele rasgou com tanta facilidade e foi consertado o mais
próximo possível da perfeição.

Mas sempre seria marcado pela minha mão.

Eu estava fazendo a coisa certa.

Fui à varanda dar uma última olhada enquanto eles


partiam, mas não havia nada no horizonte, exceto a primeira
luz.

Sentei-me em uma das grandes cadeiras acolchoadas


que Natalia havia comprado para a varanda e tentei não
pensar nela, em algum lugar lá fora, sozinha.

Mas foi um feito impossível.

Ela não estava sozinha. Ela tinha o pai dela. Barto.


Alejo, Max, Gabe, Pilar – todos. Todo mundo menos eu.

Natalia estava mais forte do que no ano passado. Ela


prosperaria. Eu tinha dado isso a ela. E ela era ainda mais
bonita.

Como seria a vida dela sem mim? Havia uma chance...


Afastei meus pensamentos, beliscando o caro charuto
hondurenho que só comecei a desfrutar entre meus dedos até
quase o reduzir pela metade.

Eu não arriscaria a vida dela e permitiria que ela


morresse por mim, embora nunca houvesse dúvida de que eu
morreria por ela. Ela me prometeu que continuaria. Viver a
vida ao máximo. Perseguiria a felicidade.

O que mais eu poderia pedir? Eu estava sentado na


primeira fila de um dos maiores fenômenos de Deus – o
nascer do sol sobre o vasto oceano. E o conhecimento de que
eu tinha tomado a decisão certa, não importa o quanto dói.
Que minha Natalia estava segura.

Bebi meu mezcal e ouvi pés descalços batendo no


azulejo do corredor apenas um segundo antes de Natalia
entrar pela porta do quarto.
30

Cristiano

Seu olhar impiedoso, mas respirando, bochechas


rosadas de vida, fogo em chamas nos olhos violeta que eu
pensei que nunca iria reabrir – minha esposa morta estava
na minha frente com cabelos desgrenhados. Furiosa. — Foda-
se, Cristiano de La Rosa.

Larguei meu charuto no chão enquanto estava de pé.


Ela tinha que ser uma aparição. — Deus no céu, me diga que
estou vendo coisas, — eu disse, minha voz subindo quando
saí de trás da cadeira. — Diga-me que fiquei completamente
louco, e que estou vendo coisas, Natalia... — Eu fechei meus
punhos. — Diga-me que você não voltou aqui!

Ela correu para frente e me empurrou no peito. — Você


acha que pode me mandar embora enquanto fica aqui para
morrer?

Alejandro apareceu na porta e não parecia tão


assustador quanto deveria. Ele não tinha ideia do que eu
faria com ele por arriscar a vida dela.
Ela olhou de volta para Alejandro. — O que, vocês
pendejos 29 pensaram que poderiam tomar decisões sobre o
meu futuro? Fodam-se todos vocês, idiotas.

Voltei meu olhar para Alejo. — Você não poderia lidar


com ela? Ela estava morta há meia hora.

— Nós a ensinamos muito bem. Ela revidou quando


soube a verdade. — Ele limpou o lábio ensanguentado. — Ela
tem mais vontade de ficar do que eu tenho de fazê-la sair.

— Então a morte dela estará em seus ombros,


Alejandro, — eu retruquei, por mais injusto que fosse.

— Para voltar para você, ela teria atirado em mim. — Ele


assentiu com a mão. — Eu tenho certeza disso.

Ela segurava a monarca branca. Eu fiz uma careta. —


Você atirou em alguém, Natalia?

Ela limpou alguns cabelos que caíram em seu rosto. —


Ainda não.

Suspirei. — O barco já deveria estar longe agora.

— Ainda estamos atracados, — disse Alejo. — Eu tentei


ligar.

Tirei meu telefone do bolso. — No tengo señal.

Nada.

29 Idiotas
Nada, de fato. Eu não tinha serviço. Sem sinal. Sem wi-
fi.

— Belmonte-Ruiz deve ter transformado a área em uma


zona morta, — disse Alejandro.

Eles provavelmente bloquearam as torres de celular na


tentativa de derrubar nossos sistemas e impedir nossas
tentativas de fuga.

Eu teria feito o mesmo.

E se eu não tivesse escolhido ficar para trás, teria


funcionado. Eu não conseguia mais detonar nada
remotamente. Eu tinha duas opções restantes. Sair com eles
agora e deixar Belmonte-Ruiz viver... ou implodir a Terra dos
Condenados de dentro das paredes.

Não era uma escolha.

Tudo iria acabar – o que significava que Natalia não


poderia estar aqui. Eu tinha que levá-la de volta àquele navio.

— Se eles estão bloqueando o sinal, significa que estão


aqui, — disse Alejo. — Eles podem estar nos portões a
qualquer momento.

Eu olhei para ele. — Vete, — ordenei que ele saísse, e ele


fechou a porta atrás de si.

Coloquei minhas mãos na minha frente. Como um


homem que quase não implorou por nada, exceto apenas as
coisas que minha esposa poderia me dar, implorei a Natalia
para ver a gravidade da situação. — Sobre isso, você tem que
confiar em mim, mi amor, — eu disse.

— Não me dê essa besteira 'confie em mim, mi amor', —


ela atirou de volta entre dentes. — Seja homem e saia por
trás de suas desculpas. Encare-me.

Ela acendeu um fósforo sobre minha raiva e incendiou.


Ela tinha alguma ideia de quão difícil ela acabou de fazer isso
para mim? Eu a queria aqui ao meu lado – Deus, eu queria
isso mais do que qualquer coisa. Eu não tinha vontade de me
despedir. De modo nenhum. Mas que tipo de homem eu seria
se a colocasse de costas e a levasse comigo?

Eu vim do pátio e a peguei pelo bíceps. — Peço uma


coisa para você. — Enunciei cada palavra. — Faça o que você
prometeu.

— Não. — Ela deu de ombros e se afastou para cruzar


os braços. — Alejandro e Max não tiveram tempo de explicar.
Eles apenas disseram que você estava planejando derrubar
Belmonte-Ruiz e morrer no processo.

Belisquei os cantos internos dos meus olhos. — É


verdade. Sempre foi uma possibilidade. Eu esperava que
fosse uma alavanca que eu nunca precisaria puxar, mas eu
vou. Eu levantei meus olhos. — E você não pode estar aqui
para isso.

— Eu posso e vou. Eu vou ficar e lutar com você.


— Eu não estou lutando, Natalia, — eu disse. —
Nenhum de nós está. Todo mundo se foi, menos nós.
Estamos em menor número. Você está indo com Costa agora.

Sua boca pressionou em uma linha, como fazia quando


estava com tanta raiva que podia chorar – mas não se
permitiu. Suas mãos pequenas formaram dois punhos
formidáveis. — E você?

— Eu tenho que ficar e ver isso passar.

— E então o que?

Agora que estávamos cara a cara, eu não conseguia


mentir para ela. Mas eu também não podia contar a verdade.
Ela não iria, e eu tinha que tirá-la, qualquer que fosse o
custo. — Não é seu trabalho se preocupar comigo. Eu tenho
coisas sob controle...

— Você não me ouviu antes? Vou repetir, foda-se,


Cristiano. — Ela avançou e empurrou meu peito até que eu
estava encostado em uma parede. Lágrimas encheram seus
olhos. — Como você pode fazer isso comigo? Acordei sozinha
– sem marido, sem b-bebê. — A voz dela falhou, quase
destruindo minha determinação. — Sozinha. Meu próprio pai
pensou que eu tinha ressuscitado dos mortos e quase
desmaiou quando me viu.

— Você não está sozinha, — eu disse calmamente. —


Você tem pessoas lá embaixo que amam você. Que não
querem perder você.
— Sem você, estou sozinha, — disse ela calmamente. —
Eu preferia estar com você. Aqui.

As lágrimas nos olhos contavam uma história clara de


sua dor. Eu nunca quis machucá-la, mas gostaria de salvá-
la. Meu peito ameaçou ceder sob o peso da verdade – eu a
amava demais para deixá-la ficar.

Ela estaria sozinha, sim – mas estaria viva.

— Você não pode estar aqui para isso, — eu disse.

— Você me deixaria nesse mundo sozinha? Você me


forçou a estar aqui, fez eu me apaixonar por você, me fez
precisar de você como eu preciso de ar e água, — sua voz
falava, — e agora eu devo ir embora?

Ela foi me empurrar de novo, mas eu peguei seus


pulsos. Ela estava chorando muito para lutar comigo.

— Natalia.

— Eu já perdi meu bebê, — ela sussurrou, olhando para


baixo enquanto seu corpo tremia com mais soluços, desta vez
em silêncio. — Não foi o suficiente? Por que você continua me
pressionando a ser forte se não tenho nada para viver e
lutar?

Eu pensei que ela já tinha quebrado meu coração, mas


agora ele quebrou. — Shhh, — eu disse, juntando-a em meus
braços, segurando-a o mais forte que pude. Ela chorou de
uma maneira torturada quando ela desmoronou contra o
meu peito, e eu tive que inspirar no teto para parar de
derramar minhas próprias lágrimas. Para parar de quebrar e
ceder a ela.

— Eu não deveria ter revidado. — Suas lágrimas


encharcaram minha camisa. — Eu deveria ter esperado que
você viesse.

— O que você quer dizer?

— Se eu tivesse jogado o jogo dele... se eu continuasse


fingindo, pelo menos até você poder ir...

— Você teve que lutar, Natalia. Você precisava.

— Eu desejei que o bebê fosse embora, — disse ela. —


Tentei convencer Diego de que não o queria para que ele não
o visse como minha fraqueza – e perdi o bebê. O aborto foi
minha culpa.

Não. Não, meu amor. Ela se culpa por isso? Não é de


admirar que ela estivesse inconsolável. Peguei seus braços e
a sacudi gentilmente para despertá-la de sua dor. Ela olhou
para mim, com os olhos vermelho brilhando, transbordando
com lágrimas. — Me escuta, — eu disse. — Você fez
exatamente o que eu disse para você fazer. — Respirei fundo.
— E agora você tem que fazer o que eu digo apenas mais uma
vez.

— Não, — ela disse. — Por favor. Não.

— Natalia, — eu disse, mantendo o meu tom o mais que


pude. — Todo mundo está esperando por você.
— Então mande-os embora.

A adrenalina correu por minhas veias. Medo. Desespero.


Para mantê-la aqui comigo. Para levá-la e carregá-la
fisicamente escada abaixo. Ela estava tornando isso
impossível, e eu estava prestes a perder a paciência. Eu tinha
que ser cruel. — Você estaria disposta a morrer agora, neste
momento? Você está pronta para queimar viva? Porque esse é
o destino que você está me pedindo para lhe dar. — Eu olhei
para ela. — Você não é tão míope – você tem uma vida para
viver e não acaba hoje.

Eu esperava que ela continuasse falando comigo, mas,


em vez disso, a calma se apoderou dela. — Eu não vou a
lugar nenhum sem você, e não quero. Prefiro queimar ao seu
lado agora do que passar uma eternidade sozinha no céu,
então boa sorte tentando me convencer do contrário. Agora,
me diga como isso funciona.

Eu estava errado - não era calma. Era determinação.


Era o fim dos meus argumentos contra ela. Minha morte.
Dela. — Eu vou morrer hoje - é assim que funciona, — eu
disse.

— Então eu também vou, — respondeu ela sem hesitar.


— Pedi para você não poupar minha vida às custas de outras
pessoas, mas você o fez quando Diego pediu que você fizesse
o acordo. Você estava disposto a arruinar todas aquelas vidas
para me manter a salvo. — Sua voz suavizou. — É a minha
vez de tomar uma decisão difícil. Não faça minha escolha.
Não falhe comigo agora e me trate como Diego e meu pai. Eu
escolhi você porque não é como eles.

Isso não era justo. Depois de todas as maneiras que eu


a empurrei para ser sua própria mulher, ela sabia que sua
autonomia era um apelo que eu não podia negar.

Levar uma vida sem Natalia seria um verdadeiro inferno,


mas tirar a vida dela com a minha? Era isso que eu estaria
fazendo.

Toquei os cantos da boca dela quando olhou para mim


ansiosamente. Eu procurei seus olhos, segurei seu rosto e dei
o meu melhor. — Você sabe que meu amor por você abrange
o mundo. Supera tempo, espaço, vida humana. Eu escolhi
você sabendo que centenas sofreriam. Eu nunca poderia
tomar uma decisão que não a colocasse acima de tudo. Por
favor, Natalia. Eu te imploro. Vá.

— Sobre o meu cadáver. Você me ouviu? Alejandro terá


que arrastar meu cadáver daqui.

Eu olhei minha linda, muito zangada – muito viva –


esposa. Se eu a obrigasse a ir, eu estaria tomando decisões
por ela como os outros.

Sua determinação seria sua queda. Mas ela deixou claro


– essa era sua escolha.

Eu disse a ela a verdade, do começo ao fim.


31

Natalia

A brisa do mar esfriou minha pele úmida quando


Cristiano, Alejandro e eu corremos da casa para o navio.
Ainda ancorados, nossos entes queridos estavam em risco –
mas eu ainda tinha uma coisa a fazer.

Deixei Cristiano no convés com Max enquanto Alejandro


me escoltava para o navio pirata dos dias modernos.
Faltavam apenas bandeiras com caveiras e ossos cruzados -
mas a presença de Calavera estava por toda parte.

Encontramos meu pai parado na proa, olhando para um


oceano turquesa e sem horizonte. Sua estrutura alta e
imponente não era menos intimidadora contra o amanhecer.

Alejandro virou-se para mim. — Para que conste, acho


que você está fazendo a coisa certa. Você sempre foi corajosa.
E não se preocupe com Pilar, está bem?

Com gratidão e minha total confiança nele, peguei suas


mãos e as apertei. — Obrigada.

— Não precisa. — Ele beijou as costas dos nós dos meus


dedos. — Até nos encontrarmos novamente no céu, Natalia.
Quando ele nos deixou em paz, eu segui em frente. —
Papá, — eu disse.

Ele virou. — Mija. Gracias a Dios. Você voltou. Gabriel


disse que a morte foi falsa? O que diabos aconteceu?

O que aconteceu foi que eu havia acordado de um sono


profundo de sonhos selvagens tão fantásticos e realistas que
não tinha certeza de que não havia visitado o céu. Eu caí
flutuando em uma nuvem de algodão. As coisas estavam
confusas, meus dedos das mãos e pés formigando.

Como o zumbido eufórico em meus ouvidos


desapareceu, a irritação rasgou através de mim quando de
repente tive olhos que se abriram e uma boca que tragou ar
como se fosse meu último suspiro. E eu acordei com um
apito agudo, a ponta e o balanço do mar debaixo de mim,
cercada por gritos de homens. Com o estômago vazio. Sangue
no meu vestido. Um coração partido. E a monarca branca na
minha mão.

Se eu tivesse acordado momentos depois, teria perdido


Cristiano para sempre.

Engoli de volta o pensamento horrível e doloroso e


segurei as mãos de meu pai. — Não importa. Diego perdeu no
final.

— Você pode me contar tudo sobre a viagem. Não tenho


ideia de onde estamos indo, mas Barto está trabalhando
nisso com Max. — Ele deu um suspiro. — Y Cristiano? Ele
voltou a si?
Eu olhei para as nossas mãos. — Sim.

— Bom. — Papá moveu as mãos para a minha cintura, e


eu levantei meus olhos para encontrar seu olhar triste, as
linhas se aprofundando em torno de sua boca. — Sinto muito
por ter perdido meu neto. Não posso deixar de pensar que
sou parcialmente culpado.

Um nó se formou na minha garganta. Não foi culpa dele.


Não era de Cristiano. E não era minha. Tive alguns
momentos alegres como mãe e fiquei agradecida por isso.

Eu tentei o meu melhor para impedir que minha tristeza


aparecesse. E vislumbrei – mal – a dor que Cristiano deve ter
sofrido tentando me mandar embora para o meu próprio bem
agora. A dúvida que certamente o atormentava. A profunda
necessidade de me proteger, tomando a decisão por mim.

Como eu faria pelo meu pai agora. — Nenhum de nós


sabia a profundidade da decepção de Diego.

— Cristiano sabia. Eu deveria saber que ele não


machucaria Bianca, mas a total confiança de Diego e sua
convicção quando criança me convenceram disso.

— Mija. — Ela lutou para manter os olhos abertos, mas


eles ficaram vidrados quando seu olhar mudou sobre a minha
cabeça. — Por favor, Cristiano, — ela implorou, sua voz
estrangulada. — Por favor, não. — Ela estremeceu com o
esforço. — Minha filha.
— Eu estava errado. Agora eu sei que as palavras
moribundas dela foram um pedido a Cristiano para me
proteger – não ela implorando para que ele poupasse minha
vida, — falei. Eu tinha me agarrado à memória tantas vezes
enquanto crescia, e agora eu via pelo que era.

— Eu deveria ter confiado no meu instinto e levado


Cristiano para casa imediatamente, — disse ele.

— Está tudo bem, papá. Nós fizemos as coisas certas.

— Haverá outros netos, — disse ele. — Você não vai me


fazer esperar muito tempo para segurá-los, vai, mi corazón?

Como eu poderia mentir para o meu próprio pai, e sobre


algo assim? Seu coração partiria com a verdade.

Eu cerrei os dentes, quase incapaz de segurar minhas


lágrimas. Mas cometi – e cometi o mesmo crime contra ele
que ele teve contra mim por muitos anos. Aquele pelo qual eu
o persegui.

Eu menti para protegê-lo. — Sim, Papá. Você vai ter


seus netos em breve.

Com um sorriso satisfeito, ele olhou para mim. — Onde


está o Cristiano? Nós já deveríamos ter ido embora.

— Eu vou ver. — Fui beijar sua bochecha, mas joguei


meus braços em volta de seu pescoço. — Eu te amo.

— Te amo, mija.
Minha determinação quase quebrou lembrando de todas
as noites em que Papá rezou pela alma de minha mãe e
chorou até dormir. O pensamento de fazê-lo passar por isso
novamente era quase demais para lidar.

Reze por mim. Vou rezar por você.

Tudo o que eu tinha que fazer agora era ir embora. Dizer


adeus ao homem que me criou.

— Eu entendo porque você correu atrás dele agora, —


sussurrou Papá. — Sua mãe teria feito o mesmo.

A emoção me destruiu, ameaçando me derrubar. Eu me


afastei. O orgulho em seus olhos era claro. Isso significava
tudo para mim. Eu beijei sua bochecha e me forcei a sair
antes que ele suspeitasse das minhas lágrimas.

Eu queria me despedir de Pilar. Ver o sorriso de


Alejandro iluminar uma sala mais uma vez. Beijar a
bochecha de Barto e agradecer-lhe pelo serviço prestado à
minha família. Para garantir a Gabriel que ele tinha o mundo
na ponta dos dedos. Mas seria egoísta. Não havia mais
tempo. Eles precisavam sair.

Deixei meu pai na frente do navio e voltei para onde


Cristiano esperava no cais de carga. Ele não tinha expressão
quando seus olhos escuros me seguiram, mas eu pude ler
seu tormento. Talvez ele duvidasse de si mesmo, mas por
mais doloroso que fosse - era a decisão certa.
Ele me fez uma rainha quando outros me fizeram
permanecer uma princesa para sempre. Ter a opção de ir
viver, ficar ou morrer significava mais para mim do que ele
sabia. Eu ficaria ao lado do meu rei. Agora. Sempre.

Cristiano me ajudou a sair do navio. Enquanto se


preparava para partir, a preocupação apareceu, tensionando
meus ombros.

Com um braço forte em volta de mim, Cristiano me


puxou para mais perto e beijou o topo da minha cabeça. —
Eles estão preparados, — ele sussurrou. — Eles estarão
seguros, Natalia.

— E todo mundo? — Eu funguei, deslizando meus


braços em torno de seu meio para abraçá-lo de volta. —
Teresa e Felix? Jaz, Paula, a família Zamora...

— Eles estão indo para novas vidas. Eles ficarão bem. —


O contentamento na voz de Cristiano me confortou até que
ele soltou seu abraço e olhou para baixo. — Eu tenho que
dizer isso uma última vez, Natalia. Não é tão tarde. Eu posso
chamar de volta. Você ainda pode ir com eles.

Eu balancei minha cabeça com força. Eu estava


determinada, mas isso não significava que não estava com
medo.

Ele passou a mão pelos meus cabelos e pelas minhas


costas. — É isso. Todo mundo que você ama e se importa
está nesse navio.
Meu querido marido cabeça dura e olhos angustiados.
Estendi a mão para passar a palma da mão pela barba por
fazer. Era óbvio que ele não tinha se barbeado desde o desfile.
Seu arranhão era reconfortante de certa forma. Isso era real.
— Não há cenário possível em que eu saia do seu lado. Meu
lugar é aqui. Com você.

Com o meu marido foi onde eu fiquei. O silêncio caiu


sobre nós quando ficamos na praia pela última vez e
assistimos nossos amigos e familiares irem. Como dissemos
na nossa despedida final a todos com quem nos importamos
e a este mundo.
32

Cristiano

Com um vestido de renda preta, Natalia rodou em nosso


armário. O mesmo que eu a coloquei na igreja no dia do
nosso casamento. Ela levantou a saia e me mostrou seus
tênis com cadarços de Kevlar.

— No caso de você precisar correr na vida após a morte?


— Perguntei no espelho, onde consertei o manguito da minha
camisa.

Talvez eu estivesse vestido demais para a morte também


– mas não teríamos nada menos do que o melhor.

— Caso eu precise lutar, — disse ela, segurando la


Monarca Blanca.

— Essa é a minha garota. — Eu pisquei e inclinei minha


cabeça. — Un beso.

Ela me deu um beijo rápido.

Um zumbido soou acima de nossas cabeças, e Natalia


olhou para cima. — Helicópteros?

Enquanto eu assentia, um estrondo ecoou pelo vale da


Terra dos Condenados, estrondo como um trovão.
— Que som é esse? — Ela perguntou.

Voltei-me para o espelho, apertando o nó da minha


gravata preta. — Tanques batendo nos portões da frente, —
eu disse.

— Você sabe que as pessoas as chamam de las puertas


del infierno? — Ela disse.

Claro que sim. Os portões do inferno. — Para Belmonte-


Ruiz, será verdade.

Ela saiu do armário e foi para a varanda.

— Não é seguro lá fora, — eu chamei.

— Eu só quero uma última olhada.

Meu erro. Se eu queria que ela ficasse dentro de casa, eu


deveria ter dito a ela para fazer o oposto.

Saí com ela e verifiquei o céu para ter certeza de que


estávamos sozinhos. Quando decidi que era seguro o
suficiente por enquanto, me juntei a ela na mureta com vista
para a água.

No meu terno sob medida, Natalia em seu vestido de


noite de renda preta, nossas mãos trancadas entre nós,
captamos o oceano sem fim. Naquele momento, era calmo,
mas não durou.

— É melhor descermos, — disse ela finalmente. — Nosso


tempo acabou.
A calma em sua voz me surpreendeu levemente. Eu
esperava que isso fosse devido à sua fé em mim e às escolhas
que fizemos.

Eu me virei, a peguei em meus braços e a inclinei para


beijá-la com tudo o que eu tinha. Tínhamos tempo para isso,
pelo menos. Sempre haveria tempo para isso.

Levei minha esposa para as entranhas da montanha,


através do túnel que ligava a casa ao centro de controle,
zumbindo com os dados, comunicação e arquivos que
estávamos coletando há anos para proteger os outros. A
Inteligência de Belmonte-Ruiz gostaria de ter nas mãos para
o propósito oposto. As razões precisas pelas quais não a
tornamos à prova de explosão.

Atravessamos a sala, atravessando um labirinto de


corredores, passamos por dois sistemas de segurança
revestidos de ferro, onde apenas uma impressão digital – a
minha – funcionaria. Porque, sob qualquer outra
circunstância, eu teria queimado, mutilado ou esculpido
minha própria carne para impedir que a pessoa errada
entrasse neste espaço.
Uma vez lá dentro, fechei a porta, sentei-me no sistema
de computador e segui os mesmos passos que eu tinha um
milhão de vezes – todos, exceto o passo final, uma fase que
eu nunca havia entrado até agora.

Coloquei minhas credenciais, cliquei em todos os


sistemas, pressionei o polegar na digitalização final da
impressão digital e esperei o software de reconhecimento
facial identificar e aprovar meu rosto.

Temos a luz verde.

— E agora? — Natalia perguntou.

— Agora, esperamos.

Peguei o drone de segurança para monitorar o progresso


de Belmonte-Ruiz e de qualquer outra facção burra o
suficiente para se juntar a eles. Eu queria o maior número
desses filhos da puta que pudesse entrar nas paredes antes
de apertar o botão.

Natalia estava atrás de mim, com a mão no meu ombro,


enquanto as imagens enchiam a tela.

Eles atravessaram os portões. Eles inundaram a cidade,


fervilhando pelos becos, enchendo as artérias da Terra dos
Condenados como sangue.

— Eles se movem como um enxame de abelhas coxas, —


Natalia murmurou.
Eles dirigiram tanques através de casas, lojas e
mercados abandonados e atearam fogo a estruturas e
fazendas.

Assistir provou ser difícil. Não importava minha gratidão


pelo fato de que toda vida humana sob meus cuidados,
exceto a de Natalia, tivesse saído, um pedaço da história
morreria hoje.

Eu escolhi o presente em vez do passado e me levantei


da cadeira para encontrar meu verdadeiro lar nos olhos de
Natalia. Puxei-a em meus braços. Seu coração bateu contra o
peito. Ela estava assustada. Eu não poderia culpá-la. Eu
estava mais aterrorizado do que nunca. Se eu tivesse
calculado mal alguma coisa, se o botão não funcionasse, se
esses filhos da puta sobrevivessem – tudo isso poderia ser por
nada. Poderia ser fatal, irrevogavelmente errado.

Inclinei o queixo de Natalia e pressionei meus lábios nos


dela. — Tive sorte em ter você. Você foi tudo o que eu jamais
poderia ter esperado –- e muito mais.

Ela deslizou os braços em volta do meu pescoço,


sussurrando. — Eu estava apenas começando. Eu sinto
muito que...

Coloquei minha testa na dela. — O que?

— Sinto muito que você tenha que assistir tudo queimar


e que sua família tenha sido deslocada. — Uma carranca
puxou os cantos da boca de Natalia. Ela pensou neles
durante seu próprio fim iminente. Ela estava triste de saber
que não haveria como reconstruir esta comunidade
exatamente como tinha sido, ou, mais provavelmente, em
tudo. A maioria deles nunca mais se veria. — O que você fez
por essas pessoas nunca será esquecido, — disse ela, — não
importa que só restem cinzas.

— Nada disso significa nada sem eles. Sem você. —


Manuseei o canto da boca dela. — Prometi seguir você em
qualquer lugar, e eu teria, mariposa. Eu pensei que você
tinha ido. Para sempre. E eu estava bem atrás de você.

Ela apertou seus braços em volta do meu pescoço,


subindo na ponta dos dedos dos pés. — Agora vamos juntos.

À medida que a horda se aproximava e mais e mais


inimigos inundavam nossa casa, respirei fundo. — Como foi
morrer?

Ela inclinou a cabeça como se lembrasse, depois


balançou a cabeça. — Eu não gostei.

— Não se diz isso. — Eu sorri para ela. — Mas ouvi dizer


que a droga deveria ser pura felicidade.

— É muito melhor estar com você, — disse ela


densamente.

Ambos os nossos corações estavam batendo agora, mas


pelo menos era contra o peito do outro. Eu peguei sua
bochecha. — Você verá. Este não é um fim, mas o começo de
uma eternidade juntos. Ninguém mais. Só você e eu.
— Só você e eu, — disse ela, mas com menos esperança
em seu tom do que o meu. — Eu deveria ter lhe contado
sobre o bebê no momento em que suspeitei, mas queria ter
certeza. — Ela enfiou a mão no decote e puxou o ultrassom.
— Para mostrar isso e ver seus olhos se iluminarem.

Eu peguei quando meu maxilar formigou de emoção. —


Como você soube?

— Max pegou a seringa. — Sua voz vacilou. — Sinto


muito que você não tenha experimentado a felicidade da
paternidade, nem por um momento.

— Sinto muito por ter sido tirada de nós dois. —


Coloquei a imagem no bolso da jaqueta e alisei os cabelos, me
apaixonando mais por ela sentir profundamente a minha dor.
— Você resgatou seu filho. Diego matou nosso bebê e pagou o
preço.

— Nós carregaremos a perda conosco quando formos.

— E é hora de partir, — eu disse. — Você está pronta?

Ela mordeu o lábio inferior. — Eu estou assustada.

— Eu entendo você. Nós caímos juntos.

— Nós caímos juntos. — Ela assentiu, passando a mão


pela minha mandíbula, o polegar sobre a cavidade da minha
bochecha, alisando as sobrancelhas como se tivéssemos todo
o tempo do mundo. — Estou pronta.
Eu me concentrei nos lindos olhos violetas na minha
frente. Eu me apaixonei por eles na noite de gala quando ela
olhou para mim por trás de sua máscara. Eu lutei contra
isso. Eu tinha perdido.

Não havia dúvida de que eu venci.

Nada mais importava agora. Eu já sabia que não ficaria


aqui sem ela. Ela também não queria isso. Nós deixaríamos
essa vida juntos, e eu não poderia pedir mais do que isso.

Eu beijei minha Natalia mais uma vez. — Eu amo você,


minha esposa. Mi mariposita.

— Eu amo você, mi esposo. Cristiano, meu marido.

Tudo o que restava agora era apertar o botão e detonar.


Então foi o que eu fiz.

Um estrondo começou nas profundezas da Terra dos


Condenados, a batida furiosa do chão tremendo sob nossos
pés.

O submundo nos chamou de lar.


33

Costa Cruz

— Foi à explosão ouvida em todo o mundo – ou no


México, pelo menos. Há um ano, amanhã, uma misteriosa
cidade administrada por cartel conhecida como 'A Terra dos
Condenados' implodiu, matando seus próprios moradores,
além de algumas das organizações criminais mais difundidas
do México. Mas nenhum mais famoso ou perigoso do que dois
que se tornaram nomes conhecidos desde a explosão.

— Belmonte-Ruiz, conhecida por seu extenso círculo de


tráfico e pelo desenvolvimento de uma droga que, segundo os
boatos, leva seus usuários o mais 'perto do céu quanto
humanamente possível. A explosão incinerou nove décimos
do cartel, grande parte de duas outras facções e dois dos três
chefões do governo dos Estados Unidos na lista de Mais
Procurados do FBI.

— Não há mocinhos aqui, mas desde a sua destruição, a


lenda do cartel Calavera cresceu entre as pessoas. Uma vez
temido como um cartel internacional com um líder anônimo
conhecido por suas maneiras impiedosas, os narcocorridos30

30Um narcocorrido é um subgênero do gênero regional mexicano, do qual vários outros gêneros
evoluíram. Esse tipo de música é ouvida e produzida nos dois lados da fronteira México-EUA. Ele
usa uma base rítmica dançável, polca, valsa ou mazurka.
contam uma história diferente. É uma que a nossa emissora
não pode confirmar, mas essas baladas canonizam os líderes
do cartel Calavera por sua luta para conter o tráfico de
pessoas da maneira que o governo nunca pôde.

— Durante o Día de los Muertos, lembramos as vidas


inocentes perdidas naquele dia – se houver alguma. Mas o
que torna isso uma história trágica, e que fascinou o público,
é a história de amor entre Natalia Cruz, a deslumbrante filha
de Bianca King e o empresário Costa Cruz...

Desliguei a televisão e joguei o controle remoto na


minha mesa. Eu tinha ouvido o suficiente no ano passado.
Nunca ficou mais fácil. A maneira como glorificaram Natalia e
Cristiano - a mídia não sabia que tinha um pai enlutado? Eu
respeitei a paixão de Cristiano, e se ele quisesse se matar por
princípio, tudo bem. Mas levar minha filha com ele.

Eu ainda não tinha perdoado.

— A lenda diz que a explosão sacudiu a Terra até o


âmago, mudando a geografia do México para sempre, — ouvi
atrás de mim.

Virei-me para Barto quando ele estava na porta. — A


lenda exagera.

Mas não havia exagerado a beleza da minha filha. Nem a


determinação do meu genro de fazer as coisas do seu jeito.
Determinação que matou os dois.
Narcocorridos – baladas mexicanas – idolatravam
traficantes e cartéis, romantizando nossas vitórias e derrotas.
Eles contaram a história corretamente. Natalia e Cristiano
possuíam um grande amor, como o meu com Bianca. Ao
mesmo tempo, era tudo o que eu desejava para minha filha.

Coloquei os cotovelos na mesa e coloquei a cabeça nas


mãos. — Sem sentido.

— Mas nobre, — disse Barto, entrando na sala. — Eles


certamente fizeram a diferença no mundo, que você sabe que
eles queriam. Eles estão em paz agora, Costa.

Eu resmunguei meu acordo. No resto do ano, eu pude


entender o sacrifício que eles fizeram por um mundo melhor.
Mas no aniversário não apenas da morte deles, mas também
da Bianca, eu só queria lamentar.

Eu estava prestes a dizer a Barto para sair quando a


empregada bateu à porta do meu escritório.

— Correio, señor, — disse ela, pendurando uma pilha de


envelopes e catálogos para Barto antes de desaparecer
novamente.

Barto caminhou até a mesa, vasculhando tudo até parar


no item final - um volumoso envelope de papel pardo. — O
que é isso? — Ele perguntou.

Levantei minha cabeça e estiquei o pescoço para ver


melhor.
A letra parecia vagamente familiar. Nenhum endereço de
retorno, no entanto.

A única letra que eu conhecia pertencia àquelas que não


estavam mais comigo. Bianca e Natalia. Ambas se foram.

— Dê para mim, — eu disse.

— Pode ser perigoso, — disse Barto, virando o envelope.


— Deixe-me...

Levantei-me, contornei a mesa e peguei dele. Perigo


significava algo diferente nos dias de hoje. Isso não
significava nada. Eu não tinha nada a perder. Rasguei o
envelope e um rosário caiu.

Não é apenas um rosário. Um Sagrado Coração dourado


polido no centro e um crucifixo combinando. Rubis
vermelhos, pérolas leitosas em uma corrente de ouro. Eu
tinha encomendado a mim mesmo.

Eu saberia em qualquer lugar.

Tinha sido de Bianca.

— Mas que... porra? — Eu murmurei.

Barto estava ao meu lado imediatamente. — O que é


isso?

Bem-amado, com alguns arranhões no ouro e desgaste


nas pedras preciosas, isso não era uma réplica.
Eu empurrei as contas pelos meus dedos enquanto
minha garganta engrossava de emoção. — De onde veio? —
Eu olhei para Barto. — Quem enviou - e por que agora?

Os olhos de Barto se arregalaram quando algo passou


por seu rosto.

Alarme me fez endireitar. Qualquer reação era rara com


ele - especialmente uma surpresa. — Eu...

— O que? — Eu exigi.

Barto encontrou meus olhos e balançou a cabeça


lentamente. — Não sei, Don Costa. Sinto muito. — Seu olhar
voltou para a preciosa peça de joia agarrada na minha mão.
O tom de Barto se suavizou. — Talvez seja apenas um
simples sinal de Deus de que sua esposa está em paz, é isso.
— Barto benzeu-se. — Que ela e sua filha estão em boas
mãos.
EPÍLOGO

Natalia

Fomos avisados, e vocês também. No final, a morte pegou


o que queria – Cristiano e Natalia de La Rosa. Mas em seu
lugar, Joaquin e Jenny Delgado nasceram.

Meu agressor não tinha ideia de com quem estava


lidando.

Eu o preguei no peito com a sola do meu pé, e meu tênis


pousou diretamente entre os peitorais dele. Ele agarrou meu
tornozelo e torceu até que eu fui forçada a girar e encarar a
direção oposta. Oscilando em uma perna, qualquer outra
pessoa estaria perigosamente perto de cair de cara no chão.

Eu não. Levantei minha cabeça e encontrei um mar de


mulheres de olhos arregalados, a boca aberta. — Agarrar
uma perna como essa enquanto luta contra é comum e
perigoso, — eu disse. Meu cabelo na altura dos ombros caiu
para a frente, cortando meu rosto. — Então, neste cenário...

Foda-se.

Um brilho escuro me prendeu do fundo da sala. Os


braços de Cristiano cruzaram o peito largo, exibindo os
enormes bíceps que me abraçaram amorosamente esta
manhã.

Com o jeito que sua mandíbula firmou como uma


bomba-relógio prestes a explodir, ele parecia mais propenso a
me matar.

Ele deu um passo à frente na sala.

— Deixe ir, Dimitris, — eu assobiei para o homem


segurando meu tornozelo em um aperto firme.

— Hã?

O pobre rapaz não percebeu que sua vida estava em


risco. Cristiano deu outro passo.

— Solte minha perna, — eu disse baixinho, para não


assustar as mulheres sentadas no tapete à nossa frente. Eu
tinha certeza de que elas já estavam horrorizadas o suficiente
por me ver aqui em cima, mesmo que meu sobrenome falso
estivesse no banner na sala de registro. — Depressa.

Ele soltou e eu abaixei meu pé no chão graciosamente


para mostrar a Cristiano que meu corpo estava perfeitamente
sob meu controle. Eu me endireitei quando deslizei minha
sandália de volta e dei um passo para trás, gesticulando para
Dimitris continuar. — Desculpe por interromper sua lição, —
eu disse, recuando. — Continue.

Com um olhar engraçado, Dimitris voltou para a classe.


Dei a Cristiano meus melhores olhos de cachorrinho,
pois eles me serviram bem com ele no passado. Eu segurei
um dedo nos meus lábios para indicar que não devemos
interromper. A alternativa era que essas mulheres, que
convidamos aqui para aprender a se defender, me assistissem
ser atacada.

Quando encontrei Cristiano na porta, ele colocou a mão


na minha parte superior das costas e me guiou para fora da
pequena sala espelhada e para o escritório, onde fechou a
porta atrás de si.

— Natalia, — ele começou.

— Lourdes, meu amor, — eu o corrigi. Se eu não tivesse


sido capaz de ver sua raiva com meus próprios olhos, meu
nome, carregado de advertência, teria sido suficiente para me
dizer. — Ou Jenny, claro...

— Estamos sozinhos. — Suas sobrancelhas se


abaixaram. — Não mude de assunto.

Eu tentei parecer arrependida. — Desculpe, — eu disse.


— Eu estava apenas observando a aula antes do nosso
encontro e fico muito empolgada em demonstrar para as
meninas. E eu me sinto ótima...

— E se aquele pendejo lá fora tivesse puxado seu pé e


você tivesse perdido o equilíbrio?

Fui até Cristiano, peguei as mãos dele e as coloquei na


minha barriga de trinta e três semanas. — Tudo vai ficar
bem, papi. Estamos seguros aqui. Nada está acontecendo
com este bebê. — Eu sorri para ele. — Eu nunca tive tanta
certeza de nada.

Seus ombros se afrouxaram, ainda que um pouco. — Eu


me preocupo, mi amor.

Eu ri. — É como dizer que o papa reza. É muito óbvio.

— Eu não estou sendo irracional, — ele resmungou. —


Todo mundo naquela sala pensou que você era louca. Que
uma mulher grávida de oito meses ensinaria legítima defesa.
— Ele balançou a cabeça e proferiu um palavrão.

Sua preocupação não me incomodou, fez dele quem ele


era. Mas foi desnecessário. Apertei suas mãos sob as minhas.
— Você não consegue sentir o quão forte é a nossa bebita?

Como se fosse uma sugestão, ela chutou, mas seu


timing não era tão estranho. A bebê estava sempre se
movendo, sempre dizendo à mãe que ela estava pronta para
sair e dar alguns socos. Eu também queria isso,
considerando que meu útero havia se tornado um saco de
pancadas.

Cristiano grunhiu, alisando as mãos sob a minha blusa


e sobre a pele quente e apertada do meu estômago. — Mal
posso esperar para conhecê-la. — Seu comportamento
abrandou consideravelmente, como sempre acontecia quando
ele falava do futuro. — Você acha que ela virá cedo?
Eu assenti. — Ela é muito ansiosa e persistente. Como o
pai dela.

Ele se inclinou para colocar um beijo doce nos meus


lábios. — Não pense que você se safou. Desde o primeiro dia
desta gravidez, você foi estritamente proibida de ensinar
defesa pessoal.

— E eu definitivamente segui essa regra, — eu disse,


tentando não me contorcer com a mentira óbvia.

Como se Cristiano não soubesse. Seus lábios carnudos


pressionaram uma linha, exibindo seu ceticismo. — Eu não
estou tentando limitar você – você sabe disso. — Ele se
aproximou e passou as mãos pela parte de trás do meu
pescoço para juntar meu longo rabo de cavalo solto. — Eu
cheguei muito perto, muitas vezes, de te perder.

Eu lutei contra o desejo de fechar os olhos enquanto


seus dedos faziam cócegas sob a minha linha do cabelo. —
Mas este último ano foi tranquilo, — lembrei a ele. —
Ninguém sabe que estamos aqui, exceto Max. E ninguém está
perdendo ninguém.

Há um ano, Cristiano e eu tínhamos morrido.

Incinerados junto com a Terra dos Condenados.

Todo o México sabia disso. Durante meses, nos


escondemos em minúsculos apartamentos por toda a Europa,
nunca ficando em um lugar por muito tempo, mantendo
nossos rostos longe do público.
O bebê resultante não foi uma surpresa, considerando
que, sem muito mais o que fazer, tivemos relações sexuais
por dias a fio.

Oficialmente, éramos Joaquin e Jennifer Delgado agora.


Cristiano odiava me chamar por um nome falso, então às
vezes ele usava Lourdes em público. Mas sempre, em
particular, eu era sua Natalia.

Felizmente, embora tivéssemos sido grandes notícias em


nosso país, a história nunca chegou a sair realmente fora do
México.

E adorei nossa nova vida, nos deliciando todos os dias,


conhecendo o próprio núcleo de nós mesmos e um do outro.
Mas viver uma vida dentro de casa, sob o radar, nunca
duraria para nós – mesmo que isso significasse que
manteríamos um pequeno perigo vivo.

Abrir um negócio tinha sido arriscado. Nós possuímos e


fundamos uma escola de meninas que viaja para ensinar
autodefesa a toda e qualquer mulher – ou pessoas – que
desejarem participar. Uma vez concluído o curso,
buscávamos e trocávamos de local, para que nunca
ficássemos no mesmo local por muito tempo.

O pequeno risco nos convinha. Já tínhamos sobrevivido


às situações mais perigosas possíveis.

Um ano atrás, descemos para o ventre da besta, a


encosta da montanha estrondosa com sua iminente explosão.
Sempre havia uma boa chance de não sairmos a tempo,
então quando eu disse a Cristiano que estava pronta para
morrer ao seu lado, eu quis dizer isso.

Mas, felizmente, não havia acontecido dessa maneira.

Cristiano tinha toda a intenção de morrer no dia em que


pensou que tinha me perdido na escada do céu. Mas meu
reavivamento mudou seu plano de volta ao que ele e Max
haviam originalmente posto em prática há muitos anos em
caso de uma emergência como essa.

Depois que Cristiano apertou o botão e ouvimos o rugido


subterrâneo, passamos pelo sistema de túneis que dava para
a Terra dos Condenados, escavando a montanha e o oceano.
Nós tivemos que correr. Rápido. Eu nunca tinha me movido
tão rapidamente na minha vida, minha mão na de Cristiano
enquanto nos puxávamos.

Mas chegamos ao fim do túnel antes que a explosão


pudesse nos pegar, onde um submarino nos esperou com os
documentos para apoiar nossa nova vida e coordenadas já
programadas no GPS. Só Max sabia a verdade. Para todos os
outros, não éramos nada além de cinzas ao vento.

Agradeci a Nossa Senhora de Guadalupe todos os dias


que meu amor e eu tínhamos sobrevivido, e que agora,
finalmente formaríamos uma família. E agradeci a Cristiano
também, porque o diabo fez seu próprio destino e coroou sua
própria rainha.
Noite de encontro, a minha hora favorita da semana.

De mãos dadas, Cristiano e eu andamos pelas ruas de


paralelepípedos da pequena cidade da Grécia, onde
escolhemos nos contentar com os próximos momentos. Em
breve, aqui ou em nosso próximo lugar, teríamos que ficar
parados para ter o bebê.

O sol fez o seu caminho em direção ao horizonte,


lançando luz no final da tarde nas paredes de gesso branco
que dividiam os edifícios das cores vermelho, pistache e
melão. Fizemos nosso caminho preguiçoso pelo labirinto em
direção a músicas animadas no centro da cidade. Todo
sábado à noite, os moradores se reuniam para uma feira de
rua.

Cristiano comprou uma garrafa de malte único destilado


localmente e um pouco de baklava31, me dando uma mordida
antes que seu apetite animalesco o possuísse para comer um
pouco.

Paramos junto a uma parede para terminar nossos


doces. Um homem se cobriu da cabeça aos pés com tinta
spray dourada e ficou parado como uma estátua na frente de

31 Baclava é um tipo de pastel elaborado com uma pasta de nozes trituradas, envolvida em massa
filo e banhada em xarope ou mel.
uma tigela para obter gorjetas. Outro tocava uma melodia
assustadoramente bonita no violino. Uma adolescente
espreitou pelas cabines com um capuz de caveira.

Uma brisa fresca passou pela praça para uma perfeita


noite de novembro.

Os olhos de Cristiano percorriam a área ao nosso redor,


e eu sabia que ele estava pensando em seu povo na Terra dos
Condenados, dispersa pelo mundo agora. Eu tinha plena fé
de que todos haviam construído um lar em algum lugar e
estavam prosperando, como ele.

Eu esperava que isso fosse verdade para meus amigos,


Pilar e Alejandro, onde quer que estivessem.

Para meu pai, eu desejei paz, embora soubesse que ele


lutava com uma casa tão vazia. Eu não deveria ter enviado o
rosário. Cristiano não queria que eu fizesse, mas ele também
não tinha me parado. Eu não tinha certeza se Papá
entenderia, mas Cristiano havia dito que Barto
definitivamente entenderia.

Coloquei minha mão na de Cristiano e ele se virou para


sorrir para mim. — Mais roupas finas e artesanais aqui do
que vimos há algum tempo. Do que você precisa? — Ele
perguntou. — Suas calças não estão ficando muito
pequenas?

— Nunca pergunte a uma mulher que pode quebrar sua


rótula com um chute rápido se ela pode caber em suas
calças.
— Ay, pero você está grávida, mi corazón, — disse ele,
como se eu precisasse me lembrar.

— E você sabe do que as mulheres grávidas gostam? —


Perguntei.

— Sorvete, — ele respondeu.

Ele me conhecia tão bem. Ou isso, ou eu estava


ordenhando os desejos demais. De qualquer maneira, peguei
meu sorvete. Cristiano me comprou uma taça com uma
colher minúscula e percorremos a praça, parando para
comprar pequenas coisas que realmente não precisávamos,
principalmente para apoiar os moradores e aceitar o presente
ocasional para a nossa futura filha.

Enquanto estávamos em uma cabine admirando caixas


de joias de madeira, os cabelos na parte de trás do meu
pescoço subiram. O toque constante das unhas no vidro,
repetidamente, fazia uma batida simples que de alguma
forma se tornava arrepiante.

— Cristiano, — eu sussurrei.

Ele apertou minha mão. — Qué pasa?

Lentamente, virei à cabeça por cima do ombro e


encontrei os olhos escuros e astutos de uma mulher idosa
sentada do outro lado do caminho. Ela tamborilou as unhas
em uma bola de vidro centrada sobre o tecido de veludo roxo
amassado que cobria sua mesa.
Minha boca secou. Cocar de ouro cintilante. Uma
mistura de anéis em prata e ouro com pérolas e pedras
preciosas, nas mãos femininas.

Fazia mais de um ano e meio, mas eu não tinha


esquecido a mulher com os dedos esbeltos e enrugados, os
olhos assustadores e o perfume floral da gala anual de
fantasias do meu pai. E raramente passavam alguns dias que
eu não lembrava das palavras da vidente daquela noite.

— Você vai morrer por ele, seu amor.

Eu tinha morrido. Eu tinha sido declarada morta, meu


corpo tão desprovido de vida que matou meu primeiro filho.

Nada de bom poderia vir disso.

Recuei e bati no peito de Cristiano. Ele apertou meus


ombros. — O que é isso, Lourdes? — Ele perguntou. — Você
precisa...

Ele parou de falar. Eu me virei para ver o porquê. Seu


olhar também estava voltado para a velha olhando de volta
para nós.

— Quem quer saber o futuro? — Ela gritou na mesma


voz áspera. Sua gargalhada se transformou em uma tosse
seca.

— Ela me dá um mau pressentimento, — eu disse.

— E a mim, — ele concordou.

— Você conhece ela?


Ele assentiu. — Acredito que nos encontramos uma vez.

E ela contou a Cristiano o futuro dele?

Essa vidente havia dito que eu morreria pelo amor da


minha vida, e eu morri. Não apenas uma, mas duas. Eu voltei
a ganhar vida uma vez por Cristiano, e éramos fortes e
saudáveis agora. Eu não aguentava mais desespero.

Peguei a mão de Cristiano e comecei a puxá-lo para


longe.

Esta mulher só traz más notícias.

Cristiano

— Adorável jovem casal, — disse a velha, nos atrasando


enquanto seguíamos para uma fuga. — E com uma chiquita a
caminho.

Mulher inteligente. Ela sabia o sexo do meu filho. Em


qualquer outro momento, eu diria que é um palpite de sorte.
Agora? Eu não tinha certeza. Eu ainda não acreditava nesse
tipo de bruxaria. Mas a minha sorte tinha sido
estranhamente certa.

Foi premonição de que minha bebida havia sido drogada


no evento político? Ou algo mais?

Eu acalmei minha esposa com uma mão para cima e


para baixo em seus bíceps, trazendo-a para mais perto do
meu corpo. — O que ela te disse? — Eu sussurrei sobre a
cabeça de Natalia.

Suas costas ficaram rígidas. — Que eu morreria, —


disse ela e se afastou de mim para marchar em direção à
mesa da mulher.

Eu segui, ficando nas costas de Natalia enquanto ela


acusava: — O que você quer, vieja? Eu devo morrer pela
terceira vez? Eu e meu marido somos felizes. Muito dano foi
feito.

A mulher pressionou a mão na base do pescoço. — Eu


simplesmente entrego mensagens. Não sou tão diferente da
sua amada monarca.

Tudo bem, isso foi um pouco longe demais. A monarca


era privado entre Natalia e eu. Segurei o cotovelo de Natalia
para puxá-la de volta. — Vamos.

Mas ela não podia ser movida. — Era apenas uma


fantasia boba, — disse ela.

— E, no entanto, você está pensando em nomear sua


bebê em homenagem. — Seus olhos viajaram até os meus. —
Bem, eu não vou estragar tudo. Vou deixar você contar ao
seu marido o nome que você escolheu.

O rosto de Natalia drenou de sangue. Eu não tinha ideia


do que a mulher queria dizer, no entanto. Natalia tinha
escolhido um nome e não me disse?

— Fique longe de nós, — disse Natalia.

A mulher suspirou. — Eu não crio o destino de


ninguém. Eu te avisei, não foi? Você deveria ouvir da próxima
vez.

Da próxima vez.

Ela tinha nos avisado, que Natalia aparentemente


morreria, e eu cairia quando voltasse. Momentos depois que
eu a vi, eu literalmente caí de joelhos.

E agora ela estava aqui novamente.

Para nos dar um aviso.

— O que é? — Eu estreitei meus olhos em La bruja. — O


que você veio aqui para nos dizer?

Seus olhos brilhantes caíram no estômago de Natalia.


Coloquei meus braços em volta da minha esposa, estendendo
as mãos sobre a barriga dela, protegendo-a.

— É difícil ver o futuro de um homem morto. E você é,


não é? — Seu olhar saltou para Natalia enquanto ela sorria e
apertou os olhos. — No entanto...
Isso não significava nada. E, no entanto, eu me vi
inclinado, meu coração batendo contra as costas de Natalia.

— Eu não vejo nada.

Eu soltei um suspiro. Depois de uma vida inteira de


violência e morte ininterruptas em nome de vingança, amor e
sexo, eu murmurei: — Nada seria ótimo pra caralho. Por um
tempo.

— Por um tempo, — a feiticeira concordou, assentindo.


— Mas não para sempre. Também vejo luz e amor. Bem na
velhice. — Ela se levantou e se acomodou na cadeira, um
sorriso puxando um canto da boca. — E uma filha, —
acrescentou.

— Isso nós sabemos, — disse Natalia.

— Estou falando de uma depois dessa.

Huh. Duas filhas. Fiquei feliz por isso. Eu merecia, e


Natalia também. Nenhuma garota seria mais amada no
mundo.

A mulher recostou-se com um suspiro. — Então, eu já


estive errada antes. — Ela olhou para sua bola de cristal. —
Eu posso parecer um pouco mais, se você quiser? Eu posso
ver algo depois de tudo.

— Não, — Natalia e eu respondemos ao mesmo tempo.


— Bem. Também estarei aqui no próximo fim de
semana. — Ela pegou um maço de cigarros de algum lugar
debaixo da mesa. — Você tem um isqueiro?

— Eu parei, — eu disse.

— Certo.

Coloquei meu braço em volta de Natalia e a guiei para


longe enquanto ela lançava um último olhar por cima do
ombro para a mulher. — Sente-se melhor? — Perguntei.

— Eu? — As sobrancelhas de Natalia se levantaram. —


Eu poderia ter derrubado você com uma pena, você estava
tão interessado no que ela diria.

Eu ri. — Não. Não acredito em nada disso.

— Claro. — Ela revirou os olhos. — Então você não acha


que teremos uma segunda garota?

O pensamento colocou um sorriso no meu rosto desde o


apartamento do terceiro andar que alugamos por enquanto.

Como Natalia mudou, eu abri todas as janelas com vista


para um pequeno pátio. Um ar fresco entrou. Liguei o toca-
discos, sentei-me na beira da cama para tirar os sapatos e
recostei-me no colchão com um braço atrás da cabeça. Algo
que eu não tinha conseguido fazer muito na minha vida
anterior – sentar e ouvir música.

Pensei na Terra dos Condenados frequentemente – não


pude evitar. Tinha sido minha vida por doze anos. Mas entre
a minha infância com meus pais, meu serviço no complexo de
Costa e o cartel Calavera, eu vivi várias vidas. Esta, com
Natalia, seria apenas mais uma aventura, e não havia mais
ninguém que eu quisesse ao meu lado.

Por falar em demônio, ela saiu do banheiro com uma


camisola de seda preta com bordas rendadas vermelhas que
paravam logo abaixo do topo das coxas. Ela alisou as mãos
sobre a barriga, curvando as mãos por baixo e virando para o
lado para que eu pudesse ver o quão grande ela estava. Eu
gostava de vê-la crescer. Olhá-la o máximo possível e guardar
esses dias na memória. Quando a bebê chegasse, as coisas
ficariam um pouco mais caóticas. Viajar por aí não seria tão
fácil. Eu teria que continuar olhando por cima do ombro em
todos os lugares que íamos, com ainda mais em jogo.

Mas era um bom problema para se ter. Depois da vida


que levamos, eu estava confiante de que não havia nada que
minha esposa e eu não pudéssemos assumir.

Ela me serviu um uísque puro da garrafa que pegamos


durante a nossa viagem à praça e trouxe o copo e uma vela
acesa para a minha cabeceira. — É o Dia dos Mortos, e nós
não fizemos nada, — disse ela, sentada na beira da cama.

— Acho que devemos agradecer por um feriado sem


intercorrências pela primeira vez. — Eu pisquei. — Mas sim,
honramos aqueles que perdemos. Sua mãe. Nosso bebê.
Meus homens, seu pai também e nossos amigos.
Ela assentiu e olhou para a bolsa, onde mantinha o
ultrassom que recebeu nesta época no ano passado.

Peguei a mão dela, trouxe-a para a minha boca e dei um


beijo na parte de trás.

Com um sorriso, ela me passou minha bebida. — Como


é?

Eu tomei um gole. — Não é como o agave azul do


Zamora, — eu disse. — Mas muito legal.

Ela pegou o copo de mim, colocou-o na mesa de


cabeceira e subiu na cama com as mãos e os joelhos. A
mulher agia como se não estivesse grávida. Ágil como sempre
– sempre pronta para qualquer coisa, constantemente em
movimento, participando de combates corpo a corpo, apesar
da minha proibição explícita. Ela tinha apenas 22 anos, no
entanto. Aos trinta e seis, eu provavelmente tinha mais dores
sem carregar um humano do tamanho de um melão.

— Você perguntou antes se há algo que eu precise, —


disse ela.

— Diga-me, — eu respondi. — Você sabe que eu não


confio em ninguém para entregar meus desejos aos deuses.
Eu os faço acontecer eu mesmo. Eu vou lhe conceder
qualquer coisa.

Ela subiu em cima de mim. — Só você.

Montando minha cintura, ela abriu minha calça.


Colocou-me dentro dela. Balançou em mim.
Não era o trono que eu já imaginei para minha rainha
subterrânea, mas não podia reclamar.

Bienvenido al infierno. Bem-vindo ao inferno, meus


amigos.

Por acaso, parece e se parece muito com o céu.

— A vidente disse que você escolheu um nome. Ela


estava certa? — Eu perguntei.

Natalia se inclinou para frente, ainda girando em mim


enquanto seus cabelos escuros roçavam seus ombros, olhos
brilhantes quando encontraram os meus. — Mel, — ela disse.
— Abreviação de Oyamel.

— A floresta onde as monarcas fazem suas casas de


inverno, — eu disse. — A que você morreu. Eu amaldiçoei
aquelas borboletas, mi amor.

Ela sorriu, suas mãos se curvando contra o meu peito.


— Mas eu não morri, — disse ela. — Elas me protegeram.

Eu segurei sua mandíbula, tocando meu polegar no


canto da boca dela. — Todo dia eu penso comigo mesmo:
nunca te vi tão bonita. Como é possível? — Peguei seus
quadris. — Mel é muito legal. Oyamel Cruz de la Rosa.

— Mas para o resto do mundo, ela será Mel Cristina


Delgado.

Cristina?

— Para o Papá dela.


— Posso dar uma opinião? — Perguntei. — Deveríamos
colocar Bianca em algum lugar também. Talvez fingimos que
é seu apellido.

— E amaldiçoá-la com um nome longo e tradicional? —


Ela sorriu. — Sim, vamos. Oyamel Bianca Cristina Delgado.

— De La Rosa, — acrescentei. — Não haverá nomes para


a próxima garota.

— Angelina, — ela disse imediatamente.

Meu coração ameaçou se romper, transbordando de


amor. Natalia entendeu o que o nome significava para mim.
Seria Angelina.

O sorriso de Natalia deu lugar a um gemido quando ela


usou meu peito como alavanca para me empurrar, seus
quadris deslizando para frente e para trás mais rapidamente.

Depois que ela esteve nisso por um tempo, coloquei


minhas mãos em volta da nuca e a segurei no lugar. Eu
assumi com um ritmo lânguido e fácil. — Devagar comigo.
Relaxe.

Aparentemente, foi o que se fez na vida após a morte.


Ele fez uma boa refeição, bebeu uísque fino e fodeu sua
esposa grávida de oito meses. Ninguém tinha que morrer.
Ninguém dependia de nós para nada. Ninguém se importava
com o que fizemos. Porque ninguém sabia que ainda
estávamos vivos.

E ninguém jamais poderia.


Foi uma vida boa. Uma que eu estava mais que
agradecido por considerar que quase a perdi. Eu tinha tudo
que precisava em minha esposa e nossa filha – ou filhas,
como a velha senhora desejaria.

Então agora você sabe a verdade. É muita


responsabilidade. Não conte a ninguém.

Fim

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