Você está na página 1de 45

O MENINO

DE CflLÇfl
CDRTfl

ILUSTRAÇÕES

~-;:;::::..-=.-:;::::..-:::::::.=::.::::; Rafael Sica

:\'<>,>:;
. ..
·q,.

f ~-
"'
' ,;.'·~· J
\'j.
• ..

~1'" ·~

.· '.,_:~.. fT[j
-· -
··~
-;::....-=--==--==--==--==~ Flavio de Souza

O MENI NO
DE CflLÇ fl
CURT fl

ILUSTRAÇÕES
Rafael Sica
~
~
f
~
t,,
~ ~ t ~ D
~
~ ~
"' :. . ;
.
\

--..
"'
~

.• o
o
~
() v__

e:
e
,;

,,- ,,,, ,
, ,;
,.
.,
.,
,
b /
,
,,
.,
? ,,, ,,
,
, ,,, , - . ' . ..
~

, ,
- ' .,, .
/

. .
q uand o eu era menor, ficava bast ante na casa dos meu s
avós, os pais do meu pai. Meu pai e minh a mãe
trab alha vam de noite, entã o minh a vó Nen a ou meu vô Joca
iam
s.
me busc ar na escola, e eu toma va banh o e jant ava na casa dele
Mui tas vezes meu s pais se atras avam , ou estav am muit o
cans ados, ou o trâns ito estav a horrível, ou as três coisas ao
s
mesm o tempo, e eu acab ava dorm indo lá, no quar to que ante
foi do meu pai e do meu tio.
Na casa dess es avós eu podi a faze r coisas que eu só podi a
ue
faze r lá. Min ha avó deix ava eu com er a sobr eme sa ante s porq
acre ditav a quan do eu dizia que depois ia com er a com ida.
No banh eiro tinh a banh eira e meu avô brin cava comigo de
bata lha- nava l e temp estad e de neve, e depois eu podi a ficar
mais dent ro da água até ficar enru gado . Lá eu podi a dese nhar
com tinta e pinc el todo dia. Eu podi a faze r tant a coisa!
Naq uela casa pare cia que o temp o pass ava mais deva gar.

5
1& vó N ena estava sempre indo ou chegando, entrando ou
a saindo. Cozinhando ou lavando ou passando. Bordando
ou lendo ou falando com uma amiga ao telefone em pé e
andando pela casa, catando coisas e pondo ou tirando do
lugar. Ela parecia um brinquedo daqueles que só para
quando a corda acaba, e a corda dela durava o dia inteiro.
Quando a novela começava, ela já estava entre o mundo
daqui e O mundo dos sonhos e ia sonâmbula pro quarto.
Falava boa-noite enquanto escovava os dentes, de olhos
fechados. O último beijo tinha cheiro de hortelã.

P or isso tudo eu passava mais tempo com o meu avô. Ele trabalhava
em casa, então podia fazer coisas que o meu pai não podia. Ele gostava
de tomar café da manhã na padaria da esquina. Tomar lanche na padaria.
E tomar um cafezinho a qualquer hora na padaria. Ele preferia comprar um
jornal diferente todo dia, porque gostava de variar. Ele achava que ler
sempre o mesmo jornal era como conversar sempre com a mesma pessoa.
O vô Joca me ensinou uma pilha de jogos de baralho. Eu ensinei ele a
jogar videogames . Eu instalei pra ele a n1aioria dos programas no
computador e todos os aplicativos no celular, porque o filho dele, o meu pai,
perdia a paciência depois de dois minutos. Não sei por quê, mas parece que
neto tem mais paciência com avô, e avô, com neto.
Ele já tinha lido pra mim mil e uma histórias. E contado outras. E até
inventou uma em que eu era o herói. Um dia eu vou fazer um desenho
animado e meu avô vai ser o herói.
. .l es~a hi_stória eu sou o herói porque descubro um segredo
l ~ misterioso que depois eu desvendo, participo de uma
caça ao tesouro e ainda faço um agro dar risada. Mas não é
conto de fada não, eu sou o herói, mas o agro não é um monstro
peludo, feroz e fedido. O ogro é o meu bisavô Alexandre.
Geralmente a gente nasce com oito bisavós, né? São dois
pais, quatro avós, quatro bisavôs e quatro bisavós, né? Então,
pra ficar claro de qual bisavô eu estou falando: o ogro desta
história é o pai do pai do meu pai.
Esse bisavô era um resbufaclão. Foi avó Nena que inventou
esse apelido, ela achou que o sogro dela resmungava, bufava e
reclamava demais. Tem gente que acha que reclamar e
resmungar é a mesma coisa. Mas eu não acho, porque tenho
uma tia que reclama muito todo dia de quase tudo e cada vez
que ela faz uma reclamação, o marido, meu tio, resmunga
coisas assim: "Por que essa mulher reclama tanto?", "O que eu
fiz pra merecer isso?", "Será que isso nunca vai acabar?".
Esse apelido começou maior: Resmumbufaclamão. Depois de
um tempo acabou virando Resbufaclão, que era um apelido
secreto, tá? E o único que ele teve. Ninguém nunca teve coragem
de chamar o bisavô Alexandre de Alex, Xandre, Alê. Nem os pais
dele pensaram em fazer isso, ele já era enfezado desde pequeno.
Me disseram que enfezado vem de fezes, que é como os
médicos chamam o cocô, porque quem vai pouco ao banheiro
fica ... enfezado, com bastante fezes dentro, e isso faz a pessoa
ficar irritada. Mas eu não sei se o intestino do meu bisavô
funciona bem ou não ...

..
• "' ~
'
" '
• \
~

~ .•
.. o '\
' ~

' '
'
'
'

oo o o
o
o;o
' o
' ' o
,
!/1;
A

' '
.. ' \ '
'
' '
\

. .
' ' '

'
A ma ior ia da s pe sso as ch am av a ess e me
Go nz ag a. El e es tav a se mp re de ca ra
faz ia o qu e se mp re faz ia do jei to qu e
u bisavô de se u
am arr ad a e só
sem pre faz ia no
ho rár io qu e sem pre faz ia no me sm o
lug ar e com as me sm as
pe sso as ou en tão ele com ele me sm o.
Se nã o po dia se r do
jei to dele, o se u Go nz ag a cru za va os
bra ço s, en du rec ia o
qu eix o e olh av a pr a um lug ar on de nã
o tin ha nin gu ém, isso
qu an do nã o dava as co sta s pro s ou tro
s ou se afa sta va .
Nã o, ele tin ha ou tro ap eli do sim , tam
bé m sec ret o, só
me u. Le mb ra? Eu já até ch am ei me u
bisavô de ogro. Depois
ele ga nh ou ou tro , ma s ess e eu vo u co
nta r ma is pro fim da
his tór ia, tá?
Me dis se ram que ele era as sim ma l-h
um ora do po rqu e
tin ha pre ssã o alt a e po r iss o tin ha do
r de ca be ça o tem po
tod o e nu nc a tom av a rem éd io, e po r iss
o o mu nd o tin ha qu e
ac eit ar que ele er a da qu ele jei to e pro
nto . Já me ex pli ca ram
o qu e é pre ssã o alt a, ma s eu nã o lem
bro se tem a ve r com a
pe sso a se r pre ssi on ad a a faz er coisa s
que ela nã o qu er ou se
a pesso a vê coisas qu e ela nã o go sta
e fica im pre ssi on ad a .. .
se be m qu e aí se ria im pre ssão alt a, ma
s é me lho r eu de ixa r
iss o pr a lá e co nti nu ar a his tór ia.

i
~
1
r,
bisavô Alex andre .se apos ento~ , a bisav ó Flori nda
O morr eu e aí ele foi ficando mais calad o do que já era
e mais sério e mais enfia do dentr o da casa dele. E O fusca
ficou parad o anos e anos na gara gem, até a filha mais velha
dele, a tia-avó Cele ste, come çar a usar.
Af ele come çou a esqu ecer quas e tudo ou tudo mesmo:
palav ras, nomes, ativi dade s. Ele esqu ecia como cham ava 0
cachorro. Esqu ecia de dar comida pro cacho rro. Esqu ecia de
fecha r a torne ira da pia. E sque cia de almo çar. Esqu ecia de
dorm ir.
Depois ele começou a esqu ecer o próp rio nome e um dia
ele saiu de casa pra co1n prar algu ma coisa que ele não sabia
mais o que era en1 uma loj a que ele não lemb r ava mais qual
era e quan do tento u volta r não tinha ideia de onde morava.
Entã o meu bisavô não podi a mais ficar sozin ho. Como
quan do a gente é bem pequ eno. Por que qual quer luga r do
n1undo pass a a ser u n1 luga r perig oso.

. ~)
.....
..

~
.. . ..
~
(

•• 1.,.

- , ..\ -~,
.,
' ' '' ' ' '
' ,
.' , \ '•

ô f'\ .'
·~
•:~,. >:.i.._•'
~ ' .•
t • ' '
'
' '' ~
~
1
m dia eu dor mi na cas a da vó Ne na e do vô Joc a e
U qua ndo aco rde i fui pro qua rto da bag unç a pra pegar
um dos brin que dos ant igo s do me u pai . Ele não par tici pa
muito des ta his tór ia, ma s eu pos so con tar que ele foi um
me nin o que não dei xav a tud o jog ado e não que bra va os
brinquedos dele. Est á tud o até hoje lá no qua rto da bagunça.
Eu que ria ser ass im. Um dia , que m sab e, eu vou ser mais
.
como o me u pai .
O nde eu estava? No quarto da bagunça, onde eu achei um cadernão
pesado com cheiro forte, com cara de álbum de fotos. Era!
Que álbum esquisito. Pra começar, na capa estava escrito
photograph ias. Que jeito louco de escrever! As fotos não tinham cor. Eu
pensei: "Será que desbotaram ?". Preso numa página tinha um envelope
cheio de tiras com fotos transparent es e bizarras, e tiras de fotos tão
pequenas que não dava pra ver nada direito. Eu pensei: "O que será que
são essas tiras?".
Minha avó tinha saído pra ir à missa, à ginástica chinesa, à feira e a
mais alguns lugares. Meu avô gosta de ficar lendo e escrevendo de noite, e
de manhã ele dorme. Não tinha ninguém pra responder às minhas
perguntas. Liguei pra minha mãe e pro meu pai, mas eles não atenderam.
Eu comecei a olhar as fotos do álbum e fui estranhando porque não
reconhecia aquelas pessoas. Aí eu virei uma página e fiquei parado de
boca aberta. Tentando entender o que estava vendo. Sem conseguir!
W I Ili
J

f I

, I

I
I

,,.
,I

-
que eu estava fazendo numa fotografia sem
cor, com uma r oupa esquisita, quase careca
'
com um chumaço de cabelo em cima da testa,
segurando um gato que eu nunca vi?
Na foto do lado, tinha eu de novo, com meu pai do
1neu lado, com os olhos azuis, mas ele estava de
bigode e o cabelo dele, que é loiro, estava preto. Aí eu
fiquei mais parado e com a boca mais aberta ainda.
Que choque, caramba!
O eu naquela foto era o vô Jaca, e o meu pai era o
bisavô Alexandre! Foi assim que eu descobri que era
muito parecido com meu avô e que meu pai era muito
parecido com o avô dele. As outras páginas do álbum
tinham várias f otogTafias do meu bisavô, de todos os
t ipos: bonitas, engraçadas, estranhas. Umas três
t rist es. E uma muito especial.
1
~ ão sei quanto tempo eu fiquei ali parado, só virando as páginas
l ~ e olhando foto por foto. Só sei que uma hora eu comecei a
sentir cheiro de almoço e meu avô voltou da rua com o jornal e um
picolé pra cada um.
Eu comecei a fazer uma pilha de perguntas que ele só acabou
de responder depois que a gente acabou de lavar, enxugar e guardar
a louça.
A primeira coisa que meu avô explicou é que quando ele era
criança, pelo menos onde ele morava, ninguém usava bermuda
porque esse tipo de roupa não existia. Menina usava saia, calça e
shorts, menino usava calção, calça ou calça curta.
Do mesmo jeito que as crianças aprendiam a escrever com lápis
até saber fazer isso muito bem, pra só depois usar uma caneta, os
meninos só usavam calça curta até certa idade, pra depois usar calça
comprida. Era por isso que ele chamava calça de calça comprida!
Era uma das coisas que separava os meninos crianças dos homens
adultos. Isso foi difícil de eu entender porque meu pai só usa bermuda.
Pra ele vestir uma calça precisa estar um frio de rachar.
As calças nunca tinham elástico na cintura. Pra elas não caírem,
as pessoas tinham que usar cinto ou o que os meninos geralmente
usavam com a calça curta: suspensório.
Aí o vô Joca deu risada, porque se lembrou de uma expressão que
falavam quando ele era jovem: "pegar de calça curta", que é a mesma
coisa que pegar alguém de surpresa, desprevenido. Ele riu porque
nunca tinha ligado a expressão com aquele tipo de roupa infantil.
--
So - -=

-------
.
' "
'
-
~-
'• .... ,,

, , ... ..... _,'I'


' _,.'
~

g ,''
•'
'

7o
1 -

O que 1nais n1eu ~vô explicou? Já tinham inventado a


fotografia colonda, mas era uma coisa caríssima e
)'
n1es1no depois que ficou um pouco menos cara, as pessoas quase
não usavan1 porque pra ter as fotos na mão a pessoa precisava
prin1eiro colocar ...
Eu me esqueci de contar uma coisa: não existia celular no
mundo, só às vezes em filme de disco voador. E, mesmo depois
que inventaram os celulares, não dava pra tirar fotos com eles,
na verdade só dava pr a ligar pra alguém ou pra receber ligação.
Bom, então, pra ter fotos, a pessoa primeiro tinha que ter a
máquina fotográfica e colocar dentro dela uma tira transparent e
como aquela que eu achei no envelope dentro do álbum, e que
chamavam de filme. Só que o filme vinha enrolado dentro de
uma embalagem de metal, porque não podia receber luz. Ai. a
pessoa tirava uma foto, ruc ruc ruc, virava uma manivela pro
filme correr, tirava outra foto, ruc ruc ruc, manivela, outra foto,
ruc ruc ruc ... e assim por diante.
Daí a pessoa tinha que enrolar o filme, lá dentro da máquina,
ruc ruc ruc ruc ruc, até voltar inteiro pra embalagem, que a
pessoa tirava da máquina e levava a uma loja onde faziam a
revelação, que fazia o filme virar uma tira com tudo no negativo,
o que era branco ficava preto e o que era preto ficava branco.
Aí só faltava fazer uma coisa chamada ampliação, aumentando
foto por foto e pondo cada uma num papel especial.
Se você achou essa explicação muito comprida e complicada,
é porque não ouviu a do meu avô, que teve muito, muito, muito
mais detalhes!
que mais? O vô Joca contou ~ue nun~a se deu bem
O com O pai. Quando ele er a criança, n ao era todo
pai que pegava os bebês no colo. Nem dava mamadeira.
Nem comida na boca. Nem banho. Trocar fr alda, então,
nem pensar. Na verdade, quase nenhum pai fazia nada
disso, que era "serviço
· d e muIher ".
o bisavô Alexandre era mais afastado ainda dos filhos
do que os outros pais. Meu avô nunca ficou no colo dele.
Nunca ouviu história. Nunca ganhou beijo ou abraço.
Eu perguntei uma coisa e o meu avô respondeu que 0
pai dele não era mau n em violento e que amava os filhos.
Ele só tinha aquele jeito não muito próxim o das outras
pessoas, pra não dizer bem afastado.
Foi por causa dessa resposta que eu comecei a achar
que tinha acontecido alguma coisa muito ruim entre ele
e o pai, pro vô Jaca desgostar e ter até um pou co de raiva
daquela pessoa que geralmente parecia um ogro, mas
amava o filho.
Como sempre acontecia quando a gent e tinha uma
conversa dessas, cheia de informação, ele e eu ficamos
quietos, só pensando.
D e repente meu avô ficou parado feito um bicho selvagem.
que escuta barulho perigoso, daquele jeito que parece que
eles não têm olhos nem boca nem nariz, só duas orelhas enormes.
Aí ele foi até a janela e espiou meio escondido atrás da
cortina. Bufou, bateu o pé, ficando parecido com o pai dele, e
reclamou e resmungou bem alto:
- Qual é, bicho? Que falta de desconfiômetro! Me inclua fora
dessa!
Meio segundo depois ele foi quase correndo pra cozinha, onde
tinha a porta que dava pro quintal, onde tinha a porta que dava
pra rua de trás. Quando eu ouvi a primeira porta bater e depois
a outra, sabia que o vô Joca não queria ver quem estava
chegando e só ia voltar bem depois.
E u adivin hei que a pessoa ou uma das pessoa s era
n1eu bisavô Alexan dre. Só o pai do pai do meu pai
podia deixar meu avô tão transto rnado pra fazer ele se
manda r sem nem dar tchau pra mim.
E era mesmo : minha tia-avó Celest e chegou sem tocar
a campa inha, puxan do meu bisavô pelo braço, já faland o,
sem nem pensar em pedir por favor:
- Seus avós não estão, certo? Então você vai ter que
ficar com o seu Gonza ga. Eu volto assim que puder. Até,
meu anjo, beijinh os.
No meio da frase ela colocou o pai sentad o no sofá,
assim como se ele fosse um boneco, e antes de acabar a
frase ela já tinha batido a porta. Superp ouco depois eu ouvi
o barulh o do carro que ela usava, que era do meu bisavô ,
um fusca de mais de cinque nta anos, subind o a rua.
ssa tia-avó era a filha mais próx~ma do bisavô
E ,,
A1 exandre . Era a pessoa
soque, ap esar de ser
.
boazinha
que mais tomava cont
e boa
_ filha,
. era
. meio
a dele
,
.
irrespon sa"vel, né? Porque essa. nao foi
. a primeira nelll a
última vez que ela deixou o pai velhinho com um menino
sem t er Um adulto na casa. Ela disse que ia voltar logo, '
mas mesmo assim, né? A gente acha que adulto não faz as
maluquices que a gente faz ou pensa em fazer, mas eles
fazem sim, pelo menos a 1guns, ne"?.

e orno sempre, eu não sabia como cumprimentar o seu Gonzaga.


Eu achava superesquisito dizer "Oi, bisavô Alexandre". "Tudo
bem, bisavô?" era menos ruim, mas tosco. "E aí, biso" era bizarro
porque não tinha nada a ver com ele, como eujá contei.
Então eu só fiz cara de "oi" e o que sempre fazia quando ficava
sozinho com ele: liguei a televisão e fiquei olhando, como se
estivesse assistindo. Me sentindo mal-educado. E triste. Porque
meu avô era super meu amigo, e o pai dele, um tipo de desconhecido.
Por que eu nunca conseguia conversar com ele? Que bisneto do
mal que eu era. Ou estúpido. Mas aí eu pensava o de sempre: "Ele
nunca conversou com você, ele é adulto e conhece você desde que
nasceu, ele é que deveria começar um papo". E me sentia um pouco
melhor. Ou menos mal.
oi aí que eu comecei a dar uma de detetive Vagner
F Vargas e fiz, no estilo do meu herói preferido, algumas
perguntas importantes escondidas no meio de uma pilha de
perguntas desimportantes :
_ o meu vô Joca queria muito ir em algum lugar que você
não levou? Parque de diversões? Estádio de futebol? Teatro?
_ Você não levou o vô Joca nesse lugar porque não podia ou
porque não quis?
- Não quis porque não teve vontade ou porque não queria
gastar dinheiro?
- Quis economizar porque precisava ou porque achava que
não era importante levar o filho em nenhum lugar?
E outras perguntas mais.
u de sc ob ri qu e me u bis av ô es tav a esquecido,
ma s só de
co isa s do pr es en te. Do pa ssa do ele se lem br av
a de tud o,
até do s de tal he s. E foi res po nd en do tud o qu e
eu pe rg un tav a.
Pr im eir o só co m um sim ou um nã o. Depois co
m poucas
pa lav ras . De po is co nta nd o um a h ist ór ia com
o res po sta pr a
ca da pe rg un ta.
Fo i tão div ert ido e leg al ter es sa co nv ers a en
orm e que,
qu an do eu vi, tin ha de sli ga do a tel evisão se m
pe rce be r e,
qu an do olh ei o r elógio , vi qu e já tin ha pa ssa do
qu as e um a ho ra.
Fo i as sim qu e eu fique i sab en do , alé m de um
a pil ha de
ou tras coisa s, de um a br iga en tre me u bisavô
e o filho. Foi
de po is de ss a dis cu ssã o qu e ele s pa ra ra m de se
fal ar e o vô Jo ca
passo u a se en co ntr ar com o pa i só qu an do nã
o po dia evitar.

Você também pode gostar