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Abstract:
1
Amanda Martins do Amaral, estudante de Psicopedagogia na Universidade de Taubaté. Graduação em 2014 na Universidade
Norte do Paraná. Professora de 1º ano do Ensino Fundamental, em Colégio Basic.
2
Profa. Dra. Maria Aparecida Campos Diniz de Castro, professora na Universidade de Taubaté. Doutorado em Educação
(Psicologia da Educação) em 2000 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Amaral, Amanda – O professor e o processo de alfabetização: A relevância da ação psicopedagógica na
prática formativa
Keywords:
1. Introdução
A criança que ingressa no 1º ano do Ensino Fundamental passa por uma fase de diversas mudanças
relacionadas à escolarização e ao próprio desenvolvimento, onde muitas expectativas são criadas em
relação ao processo de alfabetização. A ansiedade frente aos novos desafios aumenta, podendo
sobrecarregar tanto as crianças, quanto professores e familiares envolvidos.
Diante dos desafios enfrentados nessa etapa, torna-se relevante discutir quais são os limites e
possibilidades enfrentados pelos professores alfabetizadores. Pesquisas apontam que a formação inicial do
docente é insuficiente para seu exercício em sala de aula, outros fatores que colaboram para as dificuldades
enfrentadas são: o contexto de trabalho, a formação homogênea que desconsidera a prática, a histórica
vulnerabilidade política do magistério, o baixo prestígio profissional, a fragmentação e o isolamento
forçado pela estrutura (IMBERNÓN, 2011).
Para que a escola seja um local de construção de conhecimentos e não de impedimentos, deve-se
investir no processo de formação docente que assuma “um papel que vá além do ensino que pretende uma
mera atualização científica, pedagógica e didática e se transforma na possibilidade de criar espaços de
participação, reflexão e formação para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder conviver com a
mudança e com a incerteza” (IMBERNÓN, 2011, p.19).
O autor destaca a aquisição de conhecimentos por parte do professor como um processo amplo e não
linear, por isso a importância de se investir em uma formação reflexiva que se adapte ao contexto
educativo, que possibilite ao docente experimentar os aspectos novos que viveu em sua formação. Quanto
mais interativas e reflexivas as práticas formativas, maior será a aquisição de conhecimentos por parte do
docente.
Para desenvolver uma nova visão do ensino, o professor pode encontrar professores mais
experientes, ler estudos de caso, assistir a vídeos de aulas, discutir com os pares, estudar
artigos acadêmicos etc. E mesmo que esteja bastante decepcionado com o status quo, ele
pode não querer colocar em prática essa nova visão, pode estar pouco motivado para a
mudança, ter pouco apoio em seu ambiente de trabalho ou de seus pares para se arriscar a
abandonar práticas tradicionais ou para fazer o esforço necessário para mudar, e assim por
diante (SHULMAN, 2016, p.126).
Quase sempre, é improvável que um trabalho colaborativo possa realizar-se entre professores ou
professores e especialistas e até mesmo com um grupo de alunos, sem que se estabeleça um certo tipo de
relação entre os membros do grupo, considerando que a qualidade da relação é crucial no âmbito desse
contexto de trabalho. Com os docentes iniciados na prática profissional a situação não é diferente.
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Os professores de séries iniciais enfrentam dois desafios que se relacionam entre si: a complexidade
dos processos de alfabetização e a precariedade da formação inicial e continuada dentro dos espaços
escolares. Visando compreender parte desta realidade, a presente pesquisa está organizada nos seguintes
eixos: o processo de aquisição da leitura e escrita na concepção psicogenética; atuação pedagógica: limites
e possibilidades; a atuação do psicopedagogo institucional.
O interesse por esta temática tem origem na própria experiência profissional da pesquisadora que,
enquanto professora de 1º ano do Ensino Fundamental desde 2015, deparou-se desde o início da carreira
com diversos desafios relacionados a formação e a falta de espaços para o diálogo e a reflexão sobre a
prática, que atrelados à pouca experiência desencadearam sentimentos como frustração e insegurança na
hora de alfabetizar.
No início da carreira, a principal dificuldade enfrentada estava em administrar o tempo de aulas de
acordo com a grade curricular da escola de forma que os alunos participassem do processo de
aprendizagem de forma ativa e, apesar dos conteúdos teóricos estudados, a postura adotada era pouco
reflexiva – na realidade o pensar sobre e o descontentamento com relação à prática aconteciam
frequentemente – gerando um sentimento de incapacidade em aliar de forma satisfatória teoria e prática.
Neste tempo de atuação, os alunos que pouco avançavam nos processos de leitura e escrita levaram
essa pesquisadora ao seguinte questionamento: seriam dificuldades na aprendizagem ou no ensino? É certa
a necessidade de aprimorar e personalizar a educação de acordo com os diferentes alunos, no entanto o
sentimento de solidão e desorientação se faz presente em diversos momentos da prática docente,
evidenciando a necessidade urgente de criação de espaços de discussão e trocas bem desenvolvidos dentro
do ambiente escolar que favoreçam a reflexão e formação de forma crítica e assertiva.
A partir das dificuldades enfrentadas na prática e da compreensão de que outros profissionais vivem
desafios semelhantes, sentiu-se instigada a investigar, buscando respostas às seguintes questões: Quais são
as limitações e possibilidades da atuação pedagógica do professor alfabetizador? Como o psicopedagogo
poderá contribuir para a formação docente?
Tendo em vista a necessidade de se estabelecer espaços de formação que aperfeiçoem a prática
docente, o presente artigo discute dados coletados junto à professores alfabetizadores em uma escola
particular do interior de São Paulo, com os objetivos de evidenciar os limites e possibilidades da atuação
pedagógica durante o processo de alfabetização, identificar as alternativas adotadas pelas professoras
diante das dificuldades comuns ao cotidiano pedagógico junto a turmas de alfabetização no ensino
fundamental, averiguar a importância do Psicopedagogo Institucional enquanto profissional que poderá
criar possibilidades de formação docente no espaço escolar, atuando de forma reflexiva, preventiva e
terapêutica frente às dificuldades encontradas e propor alternativas de parceria colaborativa entre o
psicopedagogo e os professores alfabetizadores.
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A concepção Psicogenética da Língua Escrita de Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999), concebe
o ato de ler e escrever para além da simples decodificação, pois “a invenção da escrita foi um processo
histórico de construção de um sistema de representação, não um processo de codificação(...) As
dificuldades que as crianças enfrentam são dificuldades conceituais semelhantes às da construção do
sistema e por isso, pode-se dizer que a criança reinventa esses sistemas” (FERREIRO, 2011, p.16).
Assim como as pesquisadoras defendem, ao discutir-se a alfabetização se faz necessário a clareza
nos seguintes aspectos: A leitura não é decifrada; a escrita não é a cópia de um modelo. Mais importante
do que se discutir qual método utilizar para que o aluno aprenda, é refletir sobre a concepção que se tem da
aprendizagem, do aluno e do professor neste processo.
Cabe destacar que Piaget (1991), partiu da concepção de desenvolvimento envolvendo um processo
contínuo de trocas entre o organismo e o meio ambiente; o desenvolvimento cognitivo ocorre por meio de
constantes desequilíbrios e equilibrações. As ações no período pré-operatório, mesmo internalizadas, não
são ainda reversíveis. A partir dos sete anos de idade (aproximadamente), há grandes mudanças na forma
como a criança lida com o mundo e o conhece, evidenciando a passagem para uma nova etapa de
desenvolvimento cognitivo: a fase operatória concreta, na qual o pensamento lógico, objetivo adquire
preponderância; deixa de ser menos egocêntrico e o real e o fantástico não mais se misturam em sua
percepção. A criança torna-se capaz de construir um conhecimento mais compatível com o mundo que a
rodeia.
Diante da ação pedagógica, se o aluno idealizado é aquele que recebe toda a informação de forma
passiva e não questiona o que lhe é trazido, as práticas e os métodos estarão de acordo com essa
perspectiva que considera a leitura inicial como puro mecanismo. A escrita é concebida como código de
transcrição e sua aprendizagem nada mais é que a aquisição de uma técnica, os erros servem para
identificar e classificar o quanto as crianças aprenderam do conteúdo ensinado, a aprendizagem acontece
de fora para dentro e o professor tem o papel central nesse processo.
Quando o aluno é identificado como um sujeito ativo, que constrói hipóteses e interage com o
objeto de conhecimento para transformá-lo, o foco estará em compreender quais são os processos de
aprendizagem que ele já domina, quais conhecimentos ele já possui ao iniciar a aprendizagem escolar e o
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nível de desenvolvimento deste sujeito, ou ainda, quais as formas de estimulação adequadas, que poderão
ajudá-lo a avançar nesse processo.
O professor tem o papel de mediador e os erros são considerados construtivos na medida em que se
compreendem as hipóteses que o aluno constrói. Ferreiro e Teberosky (1999), explicam que “para uma
psicologia associacionista, todos os erros se parecem. Para uma psicologia piagetiana, é chave o poder
distinguir entre os erros aqueles que constituem pré-requisitos necessários para a obtenção da resposta
correta” (p.33). Os erros cometidos merecem atenção, pois representam a interpretação que os sujeitos
realizam frente aos obstáculos em que se colocam e apontam quais as hipóteses colocadas em jogo para
solucionar o “problema”.
A compreensão de que a alfabetização se inicia bem antes do ingresso no 1º ano do Ensino
Fundamental se faz necessária, pois - de acordo com as pesquisadoras - aos 6 anos a criança já possui toda
uma série de concepções sobre a escrita que precisam ser levadas em consideração.
Antes mesmo da leitura convencional, a criança cria suas próprias hipóteses em relação aos textos:
uma quantidade mínima de caracteres para que algo possa ser lido (palavras com menos de 3 letras não
podem ser lidas) e a variedade de caracteres nas palavras (palavras com todas as letras iguais também não
servem para ler) são exemplos de questionamentos levantados pelas próprias crianças em processo de
aquisição da leitura e escrita.
Cabe destacar que Ferreiro e Teberosky (1999) definiram o processo evolutivo da escrita em cinco
níveis: 1. Hipótese pré-silábica; 2. Intermediário I; 3. Hipótese silábica; 4. Hipótese silábico-alfabética; 5.
Hipótese alfabética. Vian e Russo (2001, p.29) caracterizam os desafios nesse processo, argumentando que
em cada nível a criança elabora suposições a respeito dos processos de construção da escrita, baseando-se
na compreensão que possui desses processos, sendo assim a mudança de um nível para o outro só
acontecerá quando ela se deparar com questões em que seu nível atual não consiga explicar, assimilando os
conceitos de forma gradativa, porém nem sempre linear.
De acordo com a epistemologia genética, o sujeito aprende através das suas próprias ações sobre os
objetos do mundo, é através do processo de assimilação que o sujeito interpreta e transforma as
informações que recebe, ou seja, a ação é a origem de todo conhecimento, se fazendo mais importante que
a simples escolha de métodos, pois “os estímulos não atuam diretamente, mas são transformados pelos
sistemas de assimilação do sujeito: neste ato de transformação o sujeito interpreta o estímulo (o objeto, em
termos gerais) e é somente em consequência dessa interpretação que a conduta do sujeito se faz
compreensível” (FERREIRO, TEBEROSKY, 1999, p.30).
A escrita aqui é compreendida como um sistema de representação, sua aprendizagem como a
apropriação de um novo objeto de conhecimento e a criança como sujeito cognoscente, considerada o
ponto de partida de toda a aprendizagem. Os avanços nas hipóteses da escrita acontecem a partir dos
conflitos em que a criança se coloca, chamados de perturbação. Para dar conta de um objeto não
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assimilável, o sujeito é forçado a modificar seus esquemas assimiladores que se reestruturam para assimilar
o novo objeto.
Sabendo de todo conhecimento que o sujeito traz consigo antes mesmo de ler e escrever
convencionalmente e quais ele coloca em jogo para interpretar e assimilar o objeto de conhecimento é
fundamental compreender como a criança pensa e quais caminhos ela utiliza para “reinventar” a escrita, a
partir dessa reflexão as ações devem ser pensadas levando em consideração o sujeito que pensa e age,
construindo o próprio conhecimento.
É preciso reconhecer as deficiências científicas e a pobreza conceitual dos atuais programas de
formação (NÓVOA, 1992), o que provoca uma certa superficialidade na formação inicial, não garantindo
aos egressos dos cursos de Pedagogia uma bagagem sólida de conhecimentos, capaz de os ajudar a avaliar
com propriedade as reais condições de aprendizagem da criança, em início de alfabetização.
Naturalmente, surgem as tensões e conflitos entre os professores iniciantes, instaurando a
desconfiança e a insegurança diante da tão séria tarefa de alfabetizar, sobretudo com total controle de sala
de aula e da diversidade de situações que nela ocorrem no dia a dia escolar. No item a seguir, será
enfatizada a questão pedagógica, cujo olhar da pesquisadora incidirá sobre os reais limites e possibilidades
vividos no campo da prática e a intensificação das exigências em relação à atividade laboral durante a
tarefa alfabetizadora. Concordamos com Dominicé (1990) que... ninguém se contenta em receber o saber,
como se fosse trazido do exterior pelos que detêm os seus segredos formais. A noção de experiência
mobiliza uma pedagogia interativa e dialógica (p.149-150).
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Segundo o autor (2011), o tipo de formação inicial que os professores recebem não oferece preparo
suficiente para lidarem com os desafios presentes na prática da sala de aula e essa formação é muito
importante, pois é no início da carreira que as crenças, virtudes, vícios e rotinas são assumidos como
processos habituais da profissão. Portanto “é necessário estabelecer uma formação inicial que proporcione
um conhecimento válido e gere uma atitude interativa e dialética que conduza a valorizar a necessidade de
uma atualização permanente em função das mudanças que se produzem; a criar estratégias de intervenção,
cooperação, análise, reflexão; a construir um estilo rigoroso e investigativo” (IMBERNÓN, 2011, p.69).
Nóvoa (2019, p. 6) colabora com este raciocínio quando afirma que “não é possível aprender a
profissão docente sem a presença, o apoio e a colaboração de outros professores”. O autor explica que o
desenvolvimento profissional dos professores se organiza em três diferentes momentos: a formação inicial,
a indução profissional e a formação continuada. Em todas as etapas a colaboração e cooperação se fazem
fundamentais no processo de formação, como forma de garantir a ação-reflexão-ação desses profissionais.
Os autores estudados acordam que, no decorrer da história, as universidades negligenciaram seu
papel em relação à formação docente, e esta tarefa ficou à cargo das escolas normais (nível médio e não
superior), o que dificultou toda a trajetória formativa dos professores, além de estagnar as mudanças que
acontecem no campo da Educação, criando um abismo entre as práticas escolares e o conhecimento
produzido nas universidades.
Segundo Nóvoa (2019) ainda na formação inicial, é fundamental a criação de espaços nas
universidades que levem em consideração os conteúdos científicos específicos das disciplinas
(Matemática, Ciências, História...) e conhecimentos em Educação (Fundamentos da didática, psicologia,
currículo...). O autor defende a relevância desses conhecimentos, mas ressalta a importância de que as
práticas presentes nesses espaços ultrapassem as barreiras da fragmentação atual das licenciaturas, levando
em consideração o conhecimento profissional docente, destacando a importância...
Ressalta-se, a partir das ideias do autor, a necessidade de uma comunicação entre universidades e
escolas a fim de se romper com o abismo entre os conhecimentos produzidos em ambos os espaços, de
forma que um saber complemente o outro, tornando possível formar professores preparados para lidarem
com os desafios iniciais da carreira de forma consciente, estimulando a criação de uma rede de apoio
formada por professores mais experientes, por meio de experiências trocadas e reflexivas. Fazendo da
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escola um espaço dinâmico, aprendente e colaborativo, no qual se produz conhecimentos acerca dos seus
reais problemas, com a colaboração de todos.
Pode-se afirmar que os desafios formativos, apesar de serem um elemento importante, não são os
únicos e talvez não sejam o aspecto decisivo na formação permanente do professor. Para Imbermón
(2011), muitos obstáculos podem ser utilizados como álibis para a resistência por parte de alguns
professores, e os mesmos obstáculos também podem ser motivo de uma cultura profissional que culpe os
professores sem lutar para uma melhor formação e desenvolvimento profissional. Entre esses obstáculos, o
autor destaca:
A falta de um debate sobre a formação inicial dos professores dos diversos níveis
educativos. A falta de coordenação, acompanhamento e avaliação por parte das instituições
e serviços implicados nos programas de formação permanente. (...) Os horários
inadequados, sobrecarregando o trabalho docente. A falta de formadores ou assessores e,
entre muitos dos existentes, uma formação baseada em um tipo de transmissão de
normativo-aplicacionista ou em princípios gerencialistas (2011, p.111).
Esses são alguns dos obstáculos que provocam o abandono, por parte do professor, da formação
permanente, fazendo com que ele retorne às práticas mais familiares, rotineiras e seguras, ou seja, práticas
pouco ou nada inovadoras. Como consequência, tanto os profissionais da educação como as instituições
educativas passam a impressão de desorientação sobre o futuro da escola e o conjunto da profissão.
Concordamos com Nóvoa, quando nos alerta sobre a emergência em alterar a forma como os
professores iniciam sua carreira, que atualmente ainda é possível vê-los serem “deixados à sua própria
sorte nas escolas, com pouco ou nenhum apoio, lutando sozinhos pela sua sobrevivência” construindo
políticas públicas de indução profissional. Como uma das possibilidades o autor defende a implantação de
“programas de residência docente, desde que concebidos como um espaço de transição entre a formação
inicial e a profissão. Eles não devem servir para diminuir a formação inicial e, muito menos, para políticas
racionalizadoras de gestão que podem acentuar a precariedade e relações de trabalho mais frágeis ” (2019,
p. 9).
Tal situação, provoca novas indagações quanto à atuação pedagógica, tais quais: que tipo de
conhecimento e de saber-fazer possibilitam aos professores (em especial, os iniciantes) desempenharem o
seu trabalho de modo eficaz? Que tipo de formação seria mais adequada para preparar e ajudar os
professores a desenvolverem competências necessárias ao desempenho do trabalho pedagógico,
especialmente, como alfabetizadores de sucesso?
Caminhando para o enfrentamento e discussão dessas dificuldades, a partir da década de 1980,
houve uma tendência que convocou os pesquisadores a colaborem com os professores no momento de
encontrar respostas para os problemas da escola e da sala de aula. Dessa forma, incentiva-se o professor a
detectar e resolver problemas e ocorrências próprias do cotidiano escolar, orientado devidamente para tal e
ancorado pela base científica e teórica, o que poderá promovê-lo como pessoa e profissional. Uma das
formas de associar a prática à pesquisa se dará por meio da pesquisa-ação, processo pelo qual o professor
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iniciante poderá entender seu próprio processo de conhecimento, refletindo sobre a ação, adotando uma
postura investigativa junto à prática, testando hipóteses e reformulando seu pensamento e posturas diante
das questões do ensino, responsavelmente buscando respostas para incertezas quanto às melhores
alternativas para o alcance de resultados assertivos nas situações de ensino. Daí que,
Quando os professores trabalham juntos, cada um pode aprender com o outro. Isso os leva
a compartilhar evidências e informação e a buscar soluções. A partir daqui os problemas
importantes das escolas começam a ser enfrentados com a colaboração entre todos,
aumentando as expectativas que favorecem os estudantes e permitindo que os professores
reflitam sozinhos ou com os colegas sobre os problemas que os afetam (IMBERNÓN,
2011, p.82).
A complexidade dos problemas que hoje se colocam à escola (...) exige uma capacidade de
leitura atempada dos acontecimentos e sua interpretação como meio de encontrar a solução
estratégica mais adequada para elas. Esse processo, pela sua complexidade, exige
cooperação, olhares multidimensionais e uma atitude de investigação na ação e pela ação.
(...) Exige do professor a consciência de que a sua formação nunca está terminada e das
chefias e do governo, a assunção do princípio da formação continuada (ALARCÃO, 2001,
p. 24).
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4. Metodologia
A pesquisa aqui desenvolvida tem como propósito analisar os principais desafios e possibilidades
enfrentados pelos professores de turmas de alfabetização mediante a interpretação dos relatos feitos pelos
próprios docentes, optou-se por utilizar como procedimento metodológico a abordagem qualitativa, de
modo que seja possível compreender o objeto de estudo com maior profundidade, acessando os sentidos e
significados presentes na experiência docente dos participantes.
De acordo com Gatti e André (2014, p. 3), a abordagem qualitativa “busca a interpretação em lugar
de mensuração, a descoberta em lugar de constatação, e assume que fatos e valores estão intimamente
relacionados, tornando-se inaceitável uma postura neutra do pesquisador”. Esta observação torna-se
relevante, pois para a pesquisadora, estar inserida no contexto da escola, atuando como docente, foi uma
variável importante no processo, permitindo identificar aspectos relevantes que a auxiliariam na condução
do estudo.
Assim, buscou-se um percurso metodológico que permitisse examinar e compreender o ponto de
vista dos participantes envolvidos quanto as atividades realizadas com turmas de alfabetização, possíveis
dificuldades no início da carreira e contribuições trazidas pela atuação psicopedagógica. Para coleta de
dados foram utilizados: um questionário organizado com questões objetivas e questões explicativas; e a
entrevista individual dirigida a três professoras atuantes em turmas de primeiro e segundo ano do Ensino
Fundamental I, em uma escola particular situada no interior de São Paulo.
O questionário proposto na primeira etapa da investigação visava construir o perfil das professoras
entrevistadas, por meio da coleta de dados referentes à caracterização dessas profissionais, como idade,
tempo de atuação, formação inicial e possíveis necessidades formativas. O questionário foi enviado por
meio do Google Forms e antecede a segunda etapa que foi uma entrevista, realizada com os mesmos
sujeitos, em forma de encontro virtual individual. Cada entrevista teve duração média de 50 minutos,
contendo seis questões norteadoras cada, as entrevistas foram gravadas e seu conteúdo transcrito,
fornecendo rico material para a análise de dados.
Para fins do presente texto, foram selecionados alguns aspectos considerados relevantes, tendo em
vista os objetivos definidos: evidenciar os limites e possibilidades da atuação pedagógica durante o
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processo de alfabetização, identificar as alternativas adotadas pelas professoras diante das dificuldades
comuns ao cotidiano pedagógico junto a turmas de alfabetização no ensino fundamental, averiguar a
importância do Psicopedagogo Institucional enquanto profissional que poderá criar possibilidades de
formação docente no espaço escolar, atuando de forma reflexiva, preventiva e terapêutica frente às
dificuldades encontradas e propor alternativas de parceria colaborativa entre o psicopedagogo e os
professores alfabetizadores.
Para garantir o anonimato das participantes, os nomes utilizados são fictícios, sem nenhuma
correspondência com o nome e/ou sobrenome da professora.
5. Resultados e discussão
5.1 A trajetória e perfil profissional dos professores que atuam nas turmas de 1º e 2º ano
Nessa categoria, apresentamos os dados obtidos a partir da análise dos questionários e das
entrevistas. Sendo possível caracterizar o perfil das professoras de 1º e 2º ano do Ensino Fundamental
entrevistadas e verificar os limites e possibilidades da atuação pedagógica durante o processo de
alfabetização.
Quando fazia o nono na cidade de Mogi das Cruzes, o professor de Geografia, após
explicar sobre latitude e longitude, pediu para eu falar o que havia entendido, naquele
momento, enquanto eu falava sobre esse assunto para a classe toda, tive a certeza de que
queria ser
professora, amei aquela experiência. (Wanda)
Carol tem 30 anos, é professora há 6 e atua desde o início da carreira com turmas de alfabetização,
atualmente trabalha com uma turma de 1º ano e outra de pré-escola, sua escolha profissional se deu desde a
infância.
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Desde criança tinha o desejo por exercer essa profissão. Com o tempo esse desejo
somente se confirmou. Até pensei em cursar outras áreas, mas essa sempre foi a minha
vontade e acabou se concretizando. (Carol)
A escolha profissional é afetada pelo contexto histórico, cultural, social e econômico da sociedade,
além das influências pessoais e familiares. Entre os fatores que podem influenciar a escolha pela profissão
docente, podem ser destacados: a influência de pessoas que se tornam referência nessa escolha, a
admiração por algum professor durante a trajetória escolar e até mesmo a falta de outra oportunidade para
seguir em outras carreiras. Para Oliveira, o professor não inicia sua formação na academia, desde os
primeiros anos de escolarização os docentes possuem como modelos seus próprios professores “e que
revisitados através do trabalho da memória, acabam por referenciar perfis profissionais e pessoais que os
marcaram” (OLIVEIRA, 2007, p.11).
Cavaco (1991, p. 166) refere-se ao gosto pela profissão como sendo elemento importante nos
primeiros anos, gostar do que faz é fundamental para que o professor mantenha a resiliência, pois isso
impulsiona a busca por aprimoramento. Ao relatarem suas experiências todas entrevistadas disseram que
gostam muito de ser professoras. Os sentimentos expressados por elas revelam o compromisso com a
função de ensinar.
O que me estimula é sempre ver o resultado no final do ano, quando a gente inicia o ano a
gente recebe os alunos de uma maneira, principalmente as séries iniciais que a gente
consegue ver bastante isso, não que nas outras a gente não veja, mas nas séries iniciais o
reconhecimento, a visão é melhor do nosso trabalho, a gente pega crianças que não
sabem ler nada e no final do ano a gente vê a criança lendo e isso é uma satisfação muito
grande, isso é o que me estimula, é o resultado final. A gente passa o ano inteiro
agonizada, fica pensando “Será que eu vou conseguir? Será que eu vou dar conta do
recado? Será que esse eu vou poder ajudar?” E chega no final do ano e a gente entrega
um aluno, não vamos falar pronto, mas em condições de ir para série seguinte, essa é a
satisfação, por isso eu sempre gostei das séries iniciais. (Wanda)
As professoras revelam também aspectos importantes sobre os desafios impostos pela inserção
profissional. Sabe-se que o processo de inserção do professor na carreira docente é marcado por inúmeras
dificuldades, sentimentos como solidão, insegurança e ansiedade aparecem com frequência nos relatos.
Pode- se afirmar também que não se nasce professor, aprende-se a ser docente e por isso todas as relações
vividas no contexto de trabalho são essenciais para o desenvolvimento do professor, pois “aprende-se
através da prática profissional, na interação com os outros (os diversos outros: alunos, colegas,
especialistas, etc.) enfrentando e resolvendo problemas, apreciando criticamente o que se faz e como se
faz, reajustando as formas de ver e agir” (CAVACO, 1991, p. 167).
O relato a seguir evidencia o quanto os sentimentos e impressões são marcantes no início da
carreira docente, compondo parte da formação profissional:
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Nós que começamos bem novinhas, ainda mais em escola particular, sabemos que tem um
preconceito com professoras novas em que já falam “ah, mas não tem experiência”, eu
ouvi muito isso na minha primeira turminha. (...)O fato dessas pessoas falarem isso para
mim, fazia com que eu acreditasse no que elas estavam falando, como se eu realmente não
fosse ter capacidade para dar conta, capacidade de ter responsabilidade para assumir
uma sala, então eu levei isso muito para mim. Antes de chegar no primeiro dia de aula,
fiquei muito ansiosa, muito insegura(...)foi um desafio muito grande porque eu ficava
muito ansiosa, eu não dormia na semana antes de voltar, acordava cinco horas da manhã,
não descansava, ficava tão focada e ansiosa em querer começar logo. (Natasha)
O relato acima evidencia o quanto a forma como os professores iniciantes são acolhidos pela escola
é fundamental em sua inserção profissional, no entanto esta questão não parece ser levada em consideração
de forma intencional. Os professores são deixados à própria sorte, sobrevivendo sozinhos aos desafios
impostos pela inserção profissional, sem um processo de apoio para os enfrentamentos de dúvidas e
inseguranças tão comuns no início da profissão. A situação relatada pela professora Natasha sobre sua
experiência inicial destaca o impacto da falta de ações que visam essa inserção de forma mais tranquila. A
dificuldade nas relações interpessoais, a desconfiança por parte das famílias e dos outros profissionais da
escola aparecem em diferentes momentos, como no extrato:
A gente sabe que é uma responsabilidade muito grande, é como se a gente fosse uma
segunda mãe dentro da sala, a gente tem que ficar com os olhos atentos à todo momento e
qualquer coisinha a responsabilidade é nossa e pra a gente que tem pouca idade isso é
visto como falta de maturidade, falta de experiência, acha que não vai dar conta, como a
gente sempre escuta (...) Uma mãe falou pra mim no final do ano, na última reunião,
emocionada e chorando porque ela se sentiu um pouco culpada por ter me julgado lá no
início do ano, ela falou “eu imaginei que você não fosse dar conta, quando eu vi que você
era a professora do meu filho eu já sabia que você trabalhava aqui, que você era
estagiária e teve a oportunidade de assumir uma sala, mas eu não acreditei que você fosse
dar conta. (Natasha)
Prosseguindo sobre os desafios do início da carreira, o sentimento de medo se faz presente nos
relatos a seguir, ainda que essas professoras tenham manifestado uma inserção profissional mais tranquila
que a da professora Natasha.
O primeiro ano foi uma dor de barriga, muito nervosismo, medo de errar, na verdade uma
coisa é você estar com uma professora na sala, outra coisa é você estar sozinha, mas a
coordenadora estava ali para me ajudar. Ela não passava a mão na minha cabeça
quando eu errava não, “metia o chicote”, mas me dava o caminho e com isso fui
aprendendo. Aproveitei essa oportunidade, coisas que eu não sabia tive a humildade de
perguntar para ela, a humildade de reconhecer que eu não estava apta para conduzir uma
sala sozinha me ajudou muito, sempre que necessário pedia ajuda para a coordenadora e
para as outras professoras até o dia que consegui andar com as minhas próprias pernas.
(Wanda)
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Eu senti medo, mas muita realização, muita, muita, era assim... um sonho se realizando!
Então eu fiquei com bastante medo por ser a primeira sala, o primeiro dia de aula, os pais
entram, deu bastante medo, mas foi um medo bom porque eu queria muito que aquilo se
concretizasse. Então foi um medo, mas também um sentimento muito grande de
realização. (Carol)
No relato da professora Wanda, observa-se que ela teve apoio, alguém mais experiente que lhe
mostrasse o caminho mesmo que de uma forma mais autoritária, além da coordenadora o apoio veio de
outras professoras mais experientes, o que não aconteceu com a professora Natasha, como aparece no
extrato a seguir:
A gente sabe que na escola tem uma certa disputa entre os professores, a gente sabe disso.
Então quando entrei para assumir uma sala, eu via que muitas colegas de trabalho me
viam como uma concorrência e não como uma colega, e com a Rosa não tive isso, ela era
super tranquila. Mas com as outras professoras eu não sentia tanta segurança de pedir
uma ajuda, tirar uma dúvida porque eu via que não iria ajudar como deveria, por ter um
certo ciúmes. (...) Na questão da coordenação eu não tive muito apoio, não vou mentir,
vou falar a verdade, porque eu não tive sabe. Era meio assim: “Se vira! Você já tem sua
sala, se vira!” Mas quando acontecia alguma coisa, algum pai que às vezes questionava,
aí a pessoa vinha procurar saber o que aconteceu, mas não assim “olha, tá precisando de
ajuda? Tá tudo bem?” (Natasha)
As estratégias utilizadas pelas professoras para que seus alunos avancem na leitura e escrita são
centralizadas no uso do livro didático. Wanda e Natasha justificaram a falta da prática de leitura de histórias
em sala de aula pelo excesso de conteúdos trabalhados no 2º ano, outro agravante foi a pandemia de
COVID-19, que modificou toda a estrutura da sala de aula, no momento da entrevista os alunos estavam em
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revezamento e enquanto metade da turma assistia às aulas na sala de aula, a outra metade assistia a mesma
aula por um aplicativo de vídeo chamadas online, dificultando a flexibilidade das aulas e utilização de
diferentes espaços, uma vez que os professores precisaram lecionar para os que estavam presencialmente e
para aqueles que estavam online ao mesmo tempo, tendo que lidar com a insegurança e todos os desafios
que o novo cenário proporcionou.
Apesar de não terem ações voltadas para a prática de leitura de histórias dentro da sala de aula,
outras ações são tomadas pelas professoras como mostra o extrato a seguir:
Esse ano a gente também está com um projeto de leitura do 2º ano, deles lerem também
toda semana um livrinho, mas também tem a leitura dentro da sala de aula, com
participação nas atividades do livro, nos textos que o livro traz, o livro do 2º ano tem
bastante gêneros textuais, então convites: a gente monta convites, trabalha a leitura,
cartas... A gente trabalha a leitura mesmo mais baseada no conteúdo da aula. (Natasha)
O projeto citado pela professora tem o objetivo de que os alunos realizem em casa a leitura dos
livros indicados semanalmente, visando a aproximação e interesse da família em vivenciar experiências
literárias de forma prazerosa, o que colabora de forma significativa para despertar o gosto pela leitura nas
crianças. No entanto devemos considerar que algumas crianças podem não ter a oportunidade de vivenciar
tais momentos por diferentes motivos, seja pela rotina familiar mais tumultuada ou pelas prioridades dos
cuidadores, que podem optar por não realizar a leitura ou então fazê-la de forma negativa, o que não será
proveitoso.
Refletindo sobre as diferentes realidades vivenciadas pelos alunos, é necessário que a escola
incentive as famílias a participarem, mas sem perder de vista que muitas vezes o único lugar onde essas
práticas podem acontecer é dentro da própria sala de aula, por isso a importância de se ter cada vez mais
tempo e espaços dedicados à leitura e contação de histórias aos alunos de forma intencional no espaço
escolar.
Outra estratégia utilizada pelas professoras é a leitura dos gêneros textuais, de textos explicativos e
enunciados presentes no livro didático, utilizado como recurso central. A criatividade para tornar os
momentos de leitura interessantes é algo que chama a atenção no relato a seguir:
No início do ano eu faço uma apresentação para eles de motorista, o motorista serve para
guiar os nossos olhos, eu vou chamar esse indicador de motorista “Por que ele é o
motorista?” “Porque ele vai guiar os nossos olhos”. Eu faço muito a leitura
compartilhada, a leitura coletiva, cada um lê um trecho, cada um lê um pedaço, lógico
que depois que eles leem o enunciado eu releio porque se deixar só para eles às vezes o
entendimento e a compreensão não fica boa, eles não conseguem compreender e
interpretar o que é para ser feito. Mas a intenção é para que eles percam a vergonha, que
é uma barreira bem marcante no 1º e 2º ano, de errar, de falar errado. Para tirar essa
coisa de vergonha que eles têm. O hábito de estar lendo constantemente. (Wanda)
É possível perceber que a professora se sente satisfeita com a metodologia adotada no momento da
leitura, pois essa estratégia prende a atenção dos alunos fazendo com que avancem gradualmente, ou seja,
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a ludicidade no momento da leitura com um recurso simples (o dedo) faz toda a diferença no momento da
aprendizagem. Os objetivos iniciais também estão claros na fala da professora, os alunos precisam
primeiramente perder a vergonha de ler e aos poucos com o treino melhoram a fluência na leitura para
enfim melhorarem na compreensão do que é lido. Por isso é tão importante que as crianças tenham contato
com leituras feitas por parceiros mais experientes em que poderão renunciar à decodificação para se
dedicarem ao entendimento daquilo que é lido, exercitando a criatividade, a memória e a interpretação,
requisitos necessários para a aprendizagem significativa, ou seja, mesmo antes de ser capaz de ler
convencionalmente o aluno já é capaz de compreender e se relacionar com diferentes tipos de textos.
Sabendo disso é fundamental que as estratégias de alfabetização não se limitem à pura
decodificação na leitura e escrita, pois ambas possuem uma função social, é importante que se compreenda
o processo de aprendizagem como algo não linear, para melhorar a relação com os erros e desafios
enfrentados pelos alunos no processo de aquisição da língua escrita de forma reflexiva. O extrato a seguir
mostra o que a professora Carol pensa sobre o trabalho com a alfabetização:
A escola trabalha bastante com o silábico, a gente apresenta sempre as sílabas na ordem
do alfabeto, e é fácil porque as crianças assimilam bem, a gente vai trabalhando aos
pouquinhos cada sílaba, e vamos juntando as novas com as que já aprendeu e assim eles
vão lendo, e assim vamos trabalhando esse processo e gradativamente eles vão evoluindo.
(Carol)
A professora utiliza como base a metodologia em que as crianças aprendem uma família silábica
por semana seguindo a ordem do alfabeto e quando terminam o alfabeto escrevem palavras com sílabas
simples, logo estão prontas para as sílabas complexas, para depois escreverem frases e por último textos.
É inegável que parte da alfabetização seja a decodificação dos símbolos, mas ela não se dá somente
por essa perspectiva, por isso é importante instigar os alunos a pensarem sobre a escrita, brincarem com os
sons das letras e com as palavras, cantarem, rimarem, fazerem roda e tantas outras atividades que
influenciam direta e indiretamente na alfabetização.
Como Ferreiro e Teberosky apontam, “o método pode ajudar ou frear, facilitar ou dificultar; porém,
não pode criar aprendizagem. A obtenção do conhecimento é um resultado da própria atividade do sujeito
(...), isto significa que o ponto de partida de toda a aprendizagem é o próprio sujeito e não o conteúdo a ser
abordado” (FERREIRO, TEBEROSKY, 1999, p. 31 e 32).
Por este motivo é importante que se leve em consideração o sujeito que aprende e para definir a
didática ou metodologia mais adequada, o professor deve detectar o nível em que se encontra o aluno para
intervir coerentemente no processo de aprendizagem de cada um.
É fato que em turmas de alfabetização existem alunos de todos os níveis, tornando difícil
desenvolver um trabalho que possa ser compreendido e acompanhado por todas as crianças, mas apesar de
difícil não é impossível. As professoras demonstram compreender isso, e evidenciam precisar de ajuda
para organizarem a rotina de forma que consigam realizar as atividades que julgam importantes, como
mostra o relato a seguir:
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Eu não faço mais essa roda de leitura, quando trabalhei no 1º ano, no 1º momento eu
fazia essa roda de leitura com eles, no 2º ano como as atividades e a quantidade de
exercício da série é maior, às vezes não me sobra tempo para fazer a roda de leitura, a
programação do dia às vezes é bem puxada. Aqui (aponta para a cabeça) vem muitas
coisas para fazer, mas na prática, na hora, às vezes no momento quando vejo não
consegui fazer, então como não consigo fazer a roda de leitura eu faço isso para eles,
cada um lê um trecho dos textos em História, Geografia e Ciências, e em Português e
Matemática vai lendo os enunciados, os textos de Português. (Wanda)
A fala da professora mostra que ela pensa em estratégias diferentes, mas que precisa cumprir com
todos os conteúdos da série e isso faz com que o tempo para atividades diversificadas seja pouco, o
currículo da escola em questão é pautado no Livro Didático e por isso pouco flexível, fazendo com que
professores se sintam reféns dos conteúdos que precisam aplicar. A falta de formação, comunicação e
reflexão entre os pares da instituição escolar faz com que os professores se sintam sozinhos com as
angústias, muitas vezes estagnados por não conseguirem enxergar alternativas de planejamento.
No próximo relato observa-se uma dificuldade que deveria ser levada para discussão e estudo de
caso na atual realidade em que a escola se encontra devido a pandemia de COVID-19, mas a professora
continua expressando em sua fala sentimentos de solidão e incerteza:
Agora por estar híbrido não tem a oportunidade de sair com eles da sala, de levar eles na
biblioteca, deles se sentarem ali no pátio para fazer uma leitura porque é praticamente
impossível, já que metade da turma está no computador e a outra metade no presencial.
Por que você faz para um e não faz para outro? Ah, para sair da sala tem que levar o
celular, fica meio complicado, até todo mundo ler já acabou a aula. Mas assim, eu
poderia também estar fazendo mais? Poderia. É algo que posso pensar no segundo
semestre? Posso pensar. Mas no momento é o que está dando para fazer. (Natasha)
Através dos relatos das professoras foi possível observar que cada uma possui um perfil
profissional diferente da outra, com algumas dificuldades enfrentadas semelhantes e outras diferentes,
determinadas docentes refletem mais sobre o próprio trabalho enquanto outras tem uma visão mais
objetiva e todas essas características devem ser levadas em consideração nos momentos de práticas
formativas que acontecem dentro da instituição, para que os professores se sintam seguros e ouvidos,
reflitam e aprendam com a própria realidade escolar de forma que possam aprender e agir com criticidade
no contexto escolar.
Enxerga-se nesta lacuna formativa um vasto campo para a psicopedagogia institucional atuar, onde
o profissional trabalhará com as individualidades presentes no espaço, de forma que a instituição se
desenvolva enquanto espaço formador, proporcionando um clima colaborativo entre os profissionais da
educação, baseado no diálogo e não em um conjunto de papeis e funções a serem desempenhadas por
normas ou regras técnicas. No próximo item será discutida a atuação psicopedagógica dentro das
instituições escolares.
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No fundamental, quando falaram para mim que eu ia ficar no segundo ano, falei “tudo
bem, mas se eu precisar de ajuda, vocês vão me ajudar né, eu não tenho experiência,
vou ficar insegura”, e me responderam “não, pode ficar tranquila!” Mas não tive ajuda,
no primeiro obstáculo que eu tive ali, sofri as consequências, não fui ouvida, não fui
entendida, saí como a errada e isso mexeu muito comigo porque é como se eu estivesse
entregando um trabalho ruim, fiquei muito nervosa. (Natasha)
Sinceramente eu digo para você que não é 100%, eu gostaria que fosse 100%, não vou
falar para você que não tenho apoio, também estaria mentindo. Mas quando alguma
coisa dá errado, nunca posso falar “Foi fulano que me orientou, foi minha orientadora,
minha diretora que me orientou a fazer dessa maneira”, muitas vezes eu me via perdida
e com uma raiva danada querendo falar “foi fulano que me mandou fazer desse jeito”,
deu errado e eu paguei a conta sozinha. (Wanda)
Essa falta de apoio faz com que os professores se isolem cada vez mais tentando resolver as
situações sozinhos, pois ficam com medo de compartilhar os problemas enfrentados e serem vistos como
fracos ou maus profissionais. Esse isolamento repercute na precariedade da prática pedagógica que precisa
ser dialética para que possa se aprimorar.
Um ambiente dinâmico e alegre, ações pensadas para acolher e orientar professores e outros
profissionais, tempo dedicado à troca entre pares são essenciais para um clima favorável à aprendizagem.
“A assessoria tem sentido quando, a partir da igualdade e da colaboração, diagnostica obstáculos, fornece
ajuda e apoio ou participa com os professores, refletindo sobre sua prática” (IMBERNÓN, 2011, p. 98).
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No momento em que a professora Natasha se refere ao psicopedagogo como alguém que entende os
dois lados e faz uma crítica à postura da direção que “só quer resultados”, é perceptível a falta que faz um
profissional que enxergue o processo, pois a aprendizagem é muito mais que a entrega de resultados, ela se
dá principalmente pelos caminhos percorridos. Quando o professor é cobrado somente nesse aspecto,
consequentemente adota uma postura similar com os alunos e é preciso muita reflexão e estudo para não
deixar que isso aconteça, por isso a importância de um trabalho que envolva toda a comunidade escolar,
não somente a figura do professor.
Carol realiza um apontamento importante sobre as reais funções desempenhadas dentro do
ambiente escolar que vão de acordo com a professora Natasha, o psicopedagogo precisa estar junto com os
professores para que a mudança aconteça, em uma relação horizontal, de trocas e aprendizagens:
Desde que ele esteja lá para ajudar o professor, e não para fazer vista para os pais,
porque se ele está lá para fazer vista para os pais não vai adiantar nada, se é para dizer
que tá fazendo, que tá acompanhando, se ele está lá para ajudar o professor de verdade
vai ajudar, senão, não. (Carol)
Wanda enxerga a interdisciplinaridade do trabalho deste profissional, que vai além da equipe
escolar e consegue mediar as relações entre escola e família.
Vai ter mais um profissional para estar observando a dificuldade encontrada pela família,
pelo aluno, mais um profissional para estar contribuindo, para intervir no processo de
aprendizagem, eu acho que o trabalho desse profissional é muito importante, a criança
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prática formativa
consegue se desenvolver porque você vai ter mais um para te ajudar, na observação do
dia a dia, mais um que você vai poder trocar informações com ele. Quando esse
profissional vai até a escola, a professora tem um contato diário com ele, diário não,
constante. Sempre que necessário tem o contato com esse profissional, eles vão trocar
informações, e eles vão estar observando e procurando um caminho, uma solução para
que o aluno possa aprender, então sem dúvidas esse profissional é um recurso a mais que
ajuda muito no processo de aprendizagem. (Wanda)
6. Considerações Finais
Os dados coletados nesta pesquisa sugerem que a formação continuada, apesar de necessária, não é
um elemento levado em consideração intencionalmente na prática das professoras pesquisadas e não é
proporcionada pela instituição de ensino em questão. Por este motivo a maior parte da prática pedagógica
está pautada em um ensino com poucas inovações e reflexões no que diz respeito às teorias de
aprendizagem.
Por não conhecer profundamente como as crianças aprendem em cada faixa etária, o ensino parte
de fora para dentro, utilizando o livro didático como recurso central. Em diferentes momentos as
professoras mostram problemas enfrentados em relação à excesso de conteúdos e falta de tempo para
organizar a rotina com maior autonomia por estarem sempre seguindo um “manual de instruções”.
Para enfrentar as dificuldades todas recorreram – em algum momento da carreira – às professoras
mais experientes, não por ser uma ação pensada pela escola e sim por parecer ser uma das únicas opções
que elas possuíam. Esse momento de trocas também é considerado uma prática formativa importante
dentro do espaço escolar, no entanto não deve ser o único, uma vez que para as mudanças acontecerem o
embasamento teórico se faz fundamental e deve ser aliado à prática de forma reflexiva.
A própria experiência dentro da sala de aula faz com que os docentes amadureçam
profissionalmente e pode ser considerada formativa, as professoras demonstram ter muita força de vontade
e criatividade para inovar com seus alunos, superando os obstáculos vivenciados no dia a dia e mesmo sem
intenção assumem o papel de pesquisadoras.
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A principal carência encontrada está na falta de espaços para que essas profissionais possam
compartilhar suas experiências, refletir sobre os problemas encontrados, discutir soluções entre os pares e
com a gestão, que deve ser parceira da equipe. O sentimento de solidão, assim como para a pesquisadora,
esteve presente nos relatos das pesquisadas, apontando o quanto essa mudança na postura das instituições é
urgente.
A falta de planejamento e ações voltadas para as práticas formativas dentro do espaço escolar deve
ser trabalhada pelo psicopedagogo institucional que, enquanto profissional responsável pelos processos de
aprendizagem, pode trabalhar com toda a equipe visando a quebra de paradigmas educacionais rígidos e
arcaicos, promovendo a reflexão de todos os profissionais da instituição de forma que se consiga
desenvolver um trabalho reflexivo, preventivo e terapêutico frente as dificuldades encontradas.
Sabe-se que as mudanças no campo educacional são urgentes e acontecem morosamente, pois não
existe solução pronta para os problemas enfrentados atualmente. Por este motivo, apesar do macro ser
importante, é necessário que se olhe também para o micro, para cada indivíduo que faz parte do contexto
escolar, cada obstáculo enfrentado e habilidade manifestada formam a diversidade e identidade das
instituições, que assim como as pessoas são únicas.
Cabe ao psicopedagogo institucional investigar a realidade escolar, os pontos fracos e fortes da
equipe, as crenças enraizadas e a postura dos profissionais estando sempre atento ao que é dito,
contrapondo com aquilo que é realizado. Após a análise do contexto surgirá a necessidade de levar os
profissionais envolvidos à reflexão sobre a própria prática, e no caso dos professores sobre a prática
pedagógica.
O grande desafio está em formar e incentivar gestores, professores, equipe escolar e comunidade a
transformarem o currículo escolar e o próprio Projeto Político Pedagógico, visando uma educação que
realmente forme sujeitos críticos e autônomos, entregando a eles diferentes formas de se relacionar com a
aprendizagem.
Se o objetivo é formar sujeitos críticos e autônomos, deve-se criar uma cultura escolar que
incentive a autonomia, criatividade e criticidade dos seus profissionais, abrindo espaço e tempo para
diálogo e construção de novas práticas. A ponte entre as universidades e escolas deve se fortalecer, pois
uma oferece toda a teoria enquanto a outra possui rico campo de estudos, uma complementando à outra,
por este motivo é necessário que a escola esteja de portas abertas para receber e interpretar o novo,
construindo sua própria identidade.
Levando em consideração os dados coletados, percebe-se como tarefa importante do
psicopedagogo romper o isolamento entre os professores, abrindo espaço para que possam construir uma
prática mais colaborativa e assertiva, além de mostrar caminhos e oferecer materiais para estudo,
investigação e discussão, promover momentos de estudo de caso, escutar as soluções levantadas pela
equipe e gerir as relações que acontecem dentro do espaço escolar respeitando a individualidade de cada
um, objetivando o crescimento da escola como um todo.
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Compreende-se que quando todos se sentem parte do processo, capazes de construir, aprender e
colaborar uns com os outros o ambiente se torna mais agradável, os problemas são resolvidos com mais
facilidade e a carga não fica tão pesada quanto parece ser. Quando amadurecemos mudamos nossa postura
enquanto profissionais e consequentemente aprimoramos nossa forma de ensinar, e é justamente disso que
a educação precisa, aprimoramento e reflexão constantes para uma sociedade que não para de mudar.
Os fundamentos encontrados nesta pesquisa levam a pesquisadora a assumir uma constante postura
formativa e reflexiva, a fim de desenvolver uma prática pedagógica comprometida com a aprendizagem de
todos os alunos. Cabe destacar a importância de cada profissional presente no espaço escolar: professores,
gestores, coordenadores, psicopedagogos e pesquisadores, que juntos formam um conjunto de saberes que
merecem ser compartilhados e discutidos, de forma que garantam de forma consciente a busca pela
profissionalização docente. Dito isto, espera-se que essa não seja a finalização dos temas aqui abordados, e
sim parte do processo de pesquisa e reflexão.
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Amaral, Amanda – O professor e o processo de alfabetização: A relevância da ação psicopedagógica na
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Submetido: XX/XX/XXXX
Aceito: XX/XX/XXXX
Revista