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Comunicações e Pôsteres
XVIII Congresso Internacional ABRALIC
10 a 14 de julho de 2023
ISSN: 2317-157X
Organizadoras
Iriane Soares dos Santos
Marianna Ilgenfritz Daudt
Rachel Esteves Lima
ABRALIC
Associação Brasileira de Literatura Comparada
2023 - Salvador (BA)
EXPEDIENTE
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No atual evento de 2023, o XVIII Congresso ABRALIC conta com mais de 2000
participantes, incluindo simposistas, comunicadores, apresentadores de posteres,
ouvintes e convidados, e os trabalhos a serem apresentados refletem o vasto
percurso da ABRALIC ao longo de sua existencia. As quase 1600 comunicaçoes
confirmadas terao lugar dentro dos 101 Simposios distribuídos por afinidade em 10
Éixos Tematicos, que buscam abarcar uma ampla gama de topicos que refletem a
diversidade e a complexidade da Literatura Comparada.
No Éixo 1, "Contatos Interculturais: Diasporas, Viagens, Migraçoes",
exploram-se as influencias das dinamicas de deslocamento humano na produçao
literaria e nas trocas culturais. Ja o Éixo 2, "Épistemologias Plurais, Saberes Comuns",
busca desafiar as noçoes tradicionais de literatura nacional, abrindo espaço para a
incorporaçao de diferentes formas de conhecimento. O Éixo 3, "Literatura
Comparada como Zona de Vizinhança", propoe a literatura como um espaço de
encontro e dialogo entre diferentes comunidades e regioes, transcendendo
fronteiras geograficas e linguísticas. No Éixo 4, "Interseccionalidade: Raça, Genero,
Sexualidade e Classe nos Éstudos Comparados", serao discutidas as interseçoes de
identidades e as formas de opressao e privilegio presentes nas obras literarias. O
Éixo 5, "Ésteticas do Bem-Viver: Ancestralidades, Cosmopercepçoes e
Coletividades", explora concepçoes de bem-estar e cosmovisoes ancestrais
presentes em diversas culturas. O Éixo 6, "Relaçoes Interartes, Redes Virtuais,
Metaversos", investiga as interfaces e dialogos entre a literatura e outras
manifestaçoes artísticas e tecnologicas. O Éixo 7, "Éstetica e Política, Literatura e
Resistencia", examina as interaçoes entre a estetica literaria e a esfera política,
destacando o papel da literatura na resistencia e na transformaçao social. No Éixo 8,
"Traduçao como Arte do (Des)encontro", a traduçao e apresentada como uma forma
de encontro com a alteridade e de acesso a diferentes experiencias de mundo. O Éixo
9, "Literatura e Éspaços Comuns de Aprendizagem", aborda o papel da literatura na
educaçao humanística em tempos desafiadores para as humanidades e as artes. Por
fim, o Éixo 10, "Reinvençoes do Mundo: Utopias e Distopias", explora as narrativas
utopicas e distopicas como reflexos das crises e como fontes de reflexao sobre o
futuro e a sociedade.
Neste caderno de resumos, voce encontrara uma síntese das pesquisas e
discussoes que serao apresentadas durante o congresso. Cada resumo representa
um convite para mergulhar nas multiplas vozes e perspectivas que compoem o
panorama da Literatura Comparada no Brasil e no mundo. Por meio do encontro de
ideias, da troca de conhecimentos e do dialogo interdisciplinar, buscamos fortalecer
nossa comunidade academica e contribuir para a construçao de um futuro mais
inclusivo e solidario.
A gestao do bienio 2022/23, sediada em Salvador e sob a responsabilidade
de pesquisadores docentes da UFBA e da UNÉB, expressa imensa gratidao a
comunidade academica pela intensa participaçao no congresso e pelo engajamento
demonstrado para garantir o sucesso deste evento realizado de modo inteiramente
presencial. Agradecemos a todos os participantes, pesquisadores e palestrantes que
tornaram este evento possível. Desejamos a todos uma experiencia enriquecedora e
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esperamos que este caderno de resumos seja uma ferramenta valiosa para a
exploraçao e o compartilhamento de descobertas e novas reflexoes.
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10/07/2023 (SEGUNDA-FEIRA)
10h00’ às 16h00’
CREDENCIAMENTO
Local: Instituto de Letras da UFBA
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
17h00’ às 19h00’
CERIMÔNIA DE ABERTURA
Local: Fiesta Convention Center
Av. Antônio Carlos Magalhães, 741 - Pituba
Conferência
Anielle Franco
Conceição Evaristo
O radical projeto estético, político e ético das mulheres negras para a invenção de um mundo
comum
19h00 às 21h00’
CONGRAÇAMENTO
11/07/2023 (TERÇA-FEIRA)
08h30’ às 10h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
10h00’ às 10h30’
INTERVALO
10h30’ às 12h30’
MESAS-REDONDAS
Local: Auditórios de Letras e dos Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
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Mediação: Marcelo Magalhães (UFCE)
12h30’ às 14h30’
ALMOÇO
14h30’ às 16h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
16h00’ às 16h30’
INTERVALO
17h00’ às 19h00’
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SESSÃO PLENÁRIA
Local: Auditório da Reitoria da UFBA
R. Dr. Augusto Viana – Canela
Conferência Plenária
Flora Süssekind
Analogia/Correspondência/Comparabilidade: algumas observações crítico-conceituais
19h00’ às 21h00’
REUNIÃO DO CONSELHO DA ABRALIC
Local: Instituto de Letras
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
12/07/2023 (QUARTA-FEIRA)
08h30’ às 10h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
10h00’ às 10h30’
INTERVALO
10h30’ às 12h30’
MESAS-REDONDAS
Local: Auditórios de Letras e dos Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
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Raul Antelo (UFSC)
Comparatismo aturdito
Wander Melo Miranda (UFMG)
E depois dos Estudos Culturais?
12h30’ às 14h30’
ALMOÇO
14h30’ às 16h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
15h00’ às 17h00’
CERIMÔNIA DE OUTORGA DO TÍTULO DE DR. HONORIS CAUSA À GRIOT VOVÓ CICI
Local: Auditório da Reitoria da UFBA
R. Dr. Augusto Viana – Canela
16h00’ às 16h30’
INTERVALO
17h00’ às 19h00’
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SESSÃO PLENÁRIA
Local: Auditório da Reitoria da UFBA
R. Dr. Augusto Viana – Canela
Conferência
Antonio Negri (Conferência gravada)
O manto de Arlequim: uma nova política do comum
13/07/2023 (QUINTA-FEIRA)
08h30’ às 10h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
10h00’ às 10h30’
INTERVALO
10h30’ às 12h30’
MESAS-REDONDAS
Local: Auditórios de Letras e dos Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
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Italo Moriconi (UERJ)
Desafios ao literário
Kelvin Falcão Klein (UNIRIO)
Ecos e aparições na crítica sem juízo de W. G. Sebald
12h30’ às 14h30’
ALMOÇO
14h30’ às 16h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
16h00’ às 17h00’
INTERVALO
17h00’ às 19h00’
APRESENTAÇÃO DE PÔSTERES
Local: PAF III – Pavilhão de Aulas Glauber Rocha
R. Barão de Jeremoabo, s/n – Ondina
17h00’ às 19h00’
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LANÇAMENTO DE LIVROS
Local: Biblioteca Universitária Reitor Macedo Costa
Rua Barão de Jeremoabo, S/N - Ondina
19h00’ às 21h00’
ASSEMBLEIA GERAL DA ABRALIC
Local: Auditório do Instituto de Letras
R. Dr. Augusto Viana – Canela
14/07/2023 (SEXTA-FEIRA)
08h30’ às 10h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
10h00’ às 10h30’
INTERVALO
10h30’ às 12h30’
MESAS-REDONDAS
Local: Auditórios de Letras e dos Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
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Mediação: Roniere Menezes (CEFET-MG)
12h30’ às 14h30’
ALMOÇO
14h30’ às 16h00’
SIMPÓSIOS TEMÁTICOS
Local: Instituto de Letras e Pavilhões de Aulas da Federação (PAFs)
R. Barão de Jeremoabo, 147 – Ondina
16h00’ às 16h30’
INTERVALO
17h00’ às 19h00’
SESSÃO PLENÁRIA
Local: Auditório da Reitoria da UFBA
R. Dr. Augusto Viana – Canela
Conferência
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Ailton Krenak
Escritas da Memória-Oralidade
Encerramento
Mediação: Rachel Esteves Lima (UFBA)
19h00’ às 21h00’
SHOW DE ENCERRAMENTO
Em frente ao CEPAIA – Centro de Estudos Afro-Índio-Americanos da UNEB
Rua do Passo, 4 – Santo Antônio Além do Carmo
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SIMPÓSIO “(DES)SEMELHANÇAS E ESTRANHAMENTOS: ENCONTROS, DESENCONTROS E
RELEITURAS COMPARATISTAS NAS LITERATURAS AFRICANAS E AFRO-DIASPÓRICAS”
Lílian Paula Serra e Deus (UNILAB), Luciana Brandão Leal (UFV) e Roberta Maria Ferreira Alves
(UFVJM)
BANZO: UMA PONTE ENTRE TRAJETÓRIAS PASSADAS E PRESENTES, E A RESISTÊNCIA NOS POEMAS
DE CONCEIÇÃO EVARISTO
Bruna Carla Dos Santos
Resumo: Este presente artigo objetiva analisar as estratégias poéticas utilizadas em poemas da
escritora Conceição Evaristo compõe o livro Poemas da recordação e outros movimentos,
destacando os percursos da memória individual e coletiva que neles se encenam. Procura-se discutir
como, nos poemas em questão, o presente mostra construído pela revivência da história do povo
negro brasileiro, herdeiro das tradições e experiência dos africanos escravizados, bem como essa
experiência é passada aos descendentes, criando laços entre o vivido e o recordado. Nos poemas da
escritora, o passado relembrado é motivação para um maior conhecimento de vidas subalternizadas
que, todavia, não deixaram de legar aos seus descendentes exemplos de luta e vivência afetiva em
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coletividade. Além disso, a memória retomada na escrita de Evaristo evoca traumas, recordações
que cavam os rastros e restos do processo de escravização no Brasil. E, ao suscitar o termo Banzo em
seus poemas Evaristo, nos traz à luz toda trajetória dos negros africanos vindos de África com suas
experiências, vivências e reminiscências. Dentre vários teóricos solicitados pelas análises, destacam-
se Andreas Huyssen, Paul Ricoeur, Maurice Halbwachs, Pierre Nora, Michel Pollak, cujas reflexões
reforçam o desejo de que as “escrevivências” da escritora possa ser compreendida em seus vários
traçados poéticos.
Referências: ALMEIDA, Dinoráh Lopes Rubim. Desafios da memória como fonte histórica:
esquecimentos, silêncios, mutações e realidades. Disponível em: <https://goo.gl/IlYXBs>. Acesso: 27
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<www.letras.ufmg.br/literafro>. Acesso em: 01 fev. 2016. (p. 1-10). _____________________.
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Poemas da recordação e outros movimentos. Belo Horizonte: Ed. Nandyala, 2011. 95 p.
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Resumo: O trabalho tem como objetivo refletir acerca do espaço ficcional, caracterizado no romance
de Mia Couto, Terra Sonâmbula, através de sua atmosfera onírica e mística. A narrativa supracitada
deixa marcada a questão dos espaços e como estes constroem as memórias, além das próprias
identidades dos narradores, contadas através de uma narrativa poética. Os lugares e não lugares,
sob a ótica de Certeau e Augé, os espaços de memória, as cartografias existenciais, tudo isto revela
a ânsia das personagens em encontrarem o próprio eu. A estrada, o mar, as casas trazem a
personalidade de quem os constroem, de quem os habita, tal como afirma o próprio Mia Couto. É
nessa narrativa envolta em brumas de sonho, em que a verdade não seria tão importante quanto a
verossimilhança, que as personagens, em estado de dormência, perfazem suas próprias escrituras,
sustentadas pelas lendas e estórias dos que cruzaram antes deles essas mesmas estradas, os mesmos
mares, cultivaram as mesmas terras, construíram e habitaram os espaços, que aparecem na narrativa
como lugares místicos. Os espaços são desenhados, idealizados e sonhados pelas personagens, de
forma a caracterizarem suas angústias, medos, desejos. Não são apenas o reflexo das paixões dos
sujeitos, mas também atuam e agem, tais quais agentes, dos quais a narrativa depende para se
desenrolar. Os espaços que abrigam as personagens são os mesmos que ss aprisionam em um
devaneio de incertezas, forjado pela esperança do encontro, seja ele com o próximo ou com as
verdades fragmentadas, dos que tentam sobreviver entre guerras.
Referências: AUGÉ, Marc. Não lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade.
Tradução Maria Lúcia Pereira. 9. ed. Campinas: Papirus, 2012. BARBIERI, Cláudia. Arquitetura
literária: sobre a composição do espaço narrativo. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney.
Poéticas do espaço literário. São Paulo: Editora Claraluz, 2009, p. 105-126. BORGES FILHO, Oziris.
Espaço, percepção e literatura. IN: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney. Poéticas do espaço
literário. São Paulo: Editora Claraluz, 2009, p. 167-189. CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano:
1. Artes de fazer. Tradução de Ephraim Ferreira Alves. 22. ed. Petrópolis: Vozes, 2014. COUTO, Mia.
Terra sonâmbula. São Paulo: Companhia de bolso, 2015. SILVA, Cristina Maria. Caligrafias da
existência: narrativas de Moçambique em Mia Couto. Scripta, Belo Horizonte, v. 23, n. 47, p. 87-101,
1º quadrimestre de 2019. TUAN, Yi Fu. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio
ambiente. Tradução de Lívia de Oliveira. Londrina: Eduel, 2012.
21
mar foi lágrima do preto” que durante séculos é a “força motriz” do mundo fomentando arduamente
“o desejo de libertação”.
Referências: BUESCU, H. C. Literatura-Mundo Comparada e os Mundos em Português. Revista
Brasileira de Literatura Comparada, n. 32, 2017. CÉSAIRE, A. Discurso sobre o colonialismo. São
Paulo: Veneta, 2020. CRAVEIRINHA, Xigubo. Maputo: Alcance Editores, 2008. FANON, F.Pele Negra,
máscaras brancas. São Paulo: Ubu,2020 MATA, I. Literatura-Mundo em Português: encruzilhadas em
África. Anuario de Literatura Comparada. Salamanca, n. 3, 2013, pp. 107-12. OLIVEIRA, L. “Boa
Esperança”. Intérprete: Emicida. In: Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa. Intérprete:
Emicida. São Paulo: Laboratório Fantasma, 2015. Faixa 10 (3 min). TRINDADE, S. Cantares ao meu
povo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.
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de um luto. O primeiro, publicado em 2012, compõe-se de três partes: a que dá início à obra é o
diário e testemunho da mãe da escritora, Lili Stern, sobrevivente do campo de extermínio nazista de
Auschwitz, onde esteve por cerca de um ano como prisioneira; a segunda parte é uma espécie de
catálogo de verbetes escritos por Noemi Jaffe; e a terceira parte, um pequeno relato de Leda Cartum,
filha de Noemi. São três textos escritos por três gerações de mulheres que têm como núcleo a
experiência terrível da Shoá, vivida por Lili e retomada como uma herança traumática por sua filha e
sua neta. Lili: novela de um luto, último livro da escritora, publicado em 2021, é uma elaboração pela
escrita da morte de sua mãe, um relato intenso sobre as feridas do luto e a descoberta da ausência.
Em ambos os livros, pretende-se abordar a comida e sua relação com a mãe no que diz respeito à
subsistência alimentar, à tradição judaica e à memória do sabor e do saber, tomando-as como
imprescindíveis para o trabalho de luto na literatura de Jaffe.
Referências: DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Trad. Cláudia de Moraes
Rego. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001. FREUD, Sigmund. Luto e melancolia. Trad. Marilene
Carone. São Paulo: Cosac Naify, 2011. GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São
Paulo: Editora 34, 2006 (páginas selecionadas). JAFFE, Noemi. Lili: novela de um luto. São Paulo:
Companhia das Letras, 2021. JAFFE, Noemi. O que os cegos estão sonhando?: com o Diário de Lili
Jaffe (1944- 1945) e texto final de Leda Cartum. São Paulo: Editora 34, 2012. QUEIROZ, Maria José
de. A comida e a cozinha ou Iniciação à arte de comer. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1988.
QUEIROZ, Maria José de. A literatura e o gozo impuro da comida. Rio de Janeiro: Topbooks, 1994.
RODEN, Claudia. The book of jewish food: an odyssey from Samarkand to New York. New York: Knopf
Publishing Group, 1996.
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Resumo: Em busca de reconstruir a história de sobrevivência de sua família, Art Spiegelman
entrevistou seu pai e vasculhou volumoso material guardado na casa paterna. Não podendo
recuperar os diários que sua mãe escreveu por décadas, ele encontra um acervo fotográfico que
compõe sua conhecida Graphic novel Maus, em reprodução fac-símile e redesenhadas no estilo das
demais personagens. O escritor Jorge Mautner, também conhecido por sua obra musical, escreveu
suas memórias de infância no livro O filho do Holocausto, no qual a Shoah permanece como um
espectro onipresente: entre os capítulos, fotos do acervo pessoal do autor, em diversos momentos
com seus pais, usando fantasia, suas irmãs, de amigos, um conjunto de imagens que ampliam o
alcance do texto, oferecendo uma contribuição para o serviço da memória e da narrativa. A imagem
fotográfica isola, preserva e apresenta um momento, um instante destacado do contínuo da vida,
segundo John Berger, e que, segundo Boris Kossoy, faz com que a fotografia seja um inventário de
informações acerca de um determinado momento passado. Em associação ao literário, com ênfase
no memorialístico, as fotografias, que são vestígios de algo que já aconteceu, contribuem aportando
outros elementos à narrativa, além da mera ilustração. Essa comunicação pretende demonstrar
como as fotografias criam suas próprias narrativas adicionalmente ao trabalho da memória e da
literatura autobiográfica em Art Spiegelman e Jorge Mautner.
Referências: BERGER, John. Para entender uma fotografia. Tradução de Paulo Geiger. São Paulo:
Companhia das Letras, 2017. KOSSOY, Boris. Fotografias e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.
MAUTNER, Jorge. O filho do holocausto: memórias (1941-1958). Rio de Janeiro: Agir, 2006.
SELIGMANN-SILVA, Márcio (org.). História, memória, literatura: o testemunho na Era das Catástrofes.
Campinas: Editora da Unicamp, 2003. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Narrar o trauma: a questão dos
testemunhos de catástrofes históricas. Revista de Psicologia Clínica, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 65-
82, 2008. SONTAG, Susan. Sobre fotografia. Tradução de Rubens Figueiredo. São Paulo: Companhia
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Macedo Soares. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. SPIEGELMAN, Art. Metamaus. Tradução de
Érico Assis. São Paulo: Quadrinhos na Cia, 2022.
24
Cotovia, 1993. HUYSSEN, Andreas. Seduzidos pela Memória: arquitetura, monumentos, mídia. Rio
de Janeiro: Aeroplano, 2001. KAMIEN, Roger. Music: An Appreciation. Nova Iorque: Mc-Graw Hill,
2003. LERNER, Silvia Rosa Nossek. A música como memória de um drama: o Holocausto. Rio de
Janeiro: Editora Garamond, 2017. LESSA, Renato. O Silêncio e sua Representação. Edição Laboratório
de Estudos Hum(e)anos – Online, Rio de Janeiro: set. 2008. LEVI, Primo. É isto um homem?. Rio de
Janeiro: Editora Rocco, 1988. ______. A trégua. São Paulo: Companhia Das Letras, 2010. MATOS,
Lucas. Escuta Crítica – poesia e a palavra em performance. Blog Revista-Disco Blliss Não Tem Bis. 22
abr. 2014. Disponível em <http://blissnaotembis.com/blog/2014/04/revista-disco-blliss-nao-tem-
bis-escuta-critica-poesia-e-a-palavra-em-performance.html> Acesso em 25 ago. 2021. NATTIEZ,
Jean-Jacques. Music and Discourse: Toward a Semiology of Music (Musicologie générale et
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escuta: mídias e territórios sonoros. Rio de Janeiro: 7Letras, 2008. OSTINATO. In: Wikipedia : a
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Hurbinek: Revista do Centro Primo Levi PUC-Rio, Bines, R. K. e Lessa, R. (orgs.), Rio de Janeiro, Ed.
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facilitate murder. The Conversation. Boston, 12 mar. 2021. Disponível em
https://theconversation.com/how-the-nazis-used-music-to-celebrate-and-facilitate-murder-
155704> Acesso em 27 ago. 2021. Obras audiovisuais: A TRÉGUA. Direção: Francesco Rosi. Produção:
3 Emme Cinematografica, Stéphan Films. Filme, 125 min. 1997. TREM DA VIDA. Direção: Radu
Mihaileanu. Produção: Noé Productions, Raphaël Films, 7ï A, Hungry Eye Lowland Pictures, Le Studio
Canal +, RTL-TVI. Filme, 103 min. 1998. A VIDA é bela. Direção: Roberto Benigni. Produção: Melampo
Cinematográfica, Cecchi Gori Group Tiger Cinematografica. Filme, 116 min. 1997.
25
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Fania. Os judeus e as palavras. (trad. George Schlesinger). São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
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plenos. A maior parte da literatura produzida em prosa alí tendia para a reeducação dos
correligionários que tinham retornado ao judaísmo; desse jeito um dos gêneros principais cultivados
foi a apologética Esta comunicação propôe uma leitura da peregrinação e o messianismo (Goldish,
2001; Taub, 2012, 2021) como eixos de leitura que terão um caráter de estratégia discursiva num
manuscrito inédito de João Pinto Delgado, autor judeu português de expressão espanhola. O texto
tem o título «Dialogos contra a Cristandade» e aquele representa um exemplo da apologética dos
cristãos novos. A análise examina a constituição daqueles eixos segundo as alegorias do «converso»
(convertido) como sujeito errante/migratório (Wilke, 1996) e a viagem como exílio e redenção da
sua situação num futuro reparador.
Referências: Den Boer, Harm (2006). “El cristiano imaginado o la réplica del converso” en Den Boer,
Harm y Díaz-Mas, Paloma (dir.). Fronteras e interculturalidad entre los sefardíes occidentales.
Amsterdam/New York: Rodopi, 13-20. Cohen, Shai (2013). “La literatura conversa, ambigüedades e
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17132013000200003 Fine, Ruth (2013). “La literatura de conversos después de 1492: autores y obras
en busca de un discurso crítico” en Fine, Ruth; Michèle Guillemont y Juan Diego Vila (coords.) Lo
converso. Orden, imaginario y realidad en la cultura española (siglos XVI y XVII). Madrid/Frankfurt:
Iberoamericana/Vervuert, 499-526. Goldish, Matt. (2001). “Patterns in Converso Messianism”, en
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Valladolid: Ámbito, 547-556. Taub, Emmanuel (2012). “Ley, justicia y tiempo por venir: Maimónides
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portugais dans l'imaginaire sépharade du XVII siècle", en Esther Benbassa (ed.), Mémoires Juives
d'Espagne et du Portugal. París: Publisud, 53-68.
27
os exemplares da revista e da correspondência de Murilo Miranda — encontra-se na Coleção Plínio
Doyle e no Acervo Murilo Miranda na Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). Para a fundamentação
teórica, recorrem-se, inicialmente, aos estudos de Claudia Valladão de Mattos (1994), Hanna Arendt
(2008), Laura Maria de Abreu Daniel Ribeiro (1989) e Muza Clara Chavez Velasques (2000). Pretende-
se, assim, a partir da trajetória de Lasar Segall e dos textos e obras analisados, recuperar as
representações diaspóricas e exílicas judaicas nas páginas da Revista Acadêmica.
Referências: ACERVO MURILO MIRANDA. Sigla: MMi. Procedência: doado por Yedda Braga Miranda.
Instrumento de pesquisa: não possui. Estágio de tratamento: não organizado. Dimensão: 2,18 m.
Arquivo-Museu de Literatura Brasileira (AMLB) da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). ARENDT,
Hannah. Homens em tempos sombrios. 1. ed. Trad. Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das
Letras, 2008. MATTOS, Claudia Valladão de. Lasar Segall e sua crítica no contexto da modernidade.
Psicol. USP, São Paulo , v. 5, n. 1-2, p. 101-113, 1994 . Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-
51771994000100008&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 15 jan. 2023. RIBEIRO, Laura Maria de Abreu
Daniel. Revista Acadêmica (1933-1948) e Arte Moderna Brasileira nas Décadas de 1930-1940.
Dissertação (Mestrado em História do Brasil) - Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1989. VELASQUES, Muza Clara Chavez. Homens de letras
no Rio de Janeiro nos anos 30 e 40. Tese (Doutora em História Social) — Instituto de Ciências
Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2000. Disponível em:
<https://www.historia.uff.br /stricto/td/6.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2022.
28
do Estado, coube, aos etíopes, a penosa tarefa de entender a mudança hierárquica pela qual a
própria família precisou passar, ao lado das demais diferenças socioeconômico-culturais. E, a todas
essas, sobrepôs-se a distinção da cor da pele. Nossa proposta é abordar como tais enfrentamentos
e adaptações à nova experiência se apresentam na linguagem ousada da coletânea de contos de
Dália Betolin-Sherman, Eich shehaolam nihiya lavan (Como o mundo se tornou branco, Tel Aviv,
Kineret, Zmora-Bitan, Dvir, 2013), uma das raras escritoras israelenses de origem etíope. É através
do olhar da personagem Ester-menina e, depois, adolescente, quando o crescimento é
acompanhado pela sensação opressiva de estranheza, que se pode seguir a complexidade da
experiência no novo país, que se soma à dificuldade da convivência com a mãe, merecedora do
respeito, conforme a tradição ancestral, mas difícil de ser respeitada pela sua fraqueza,
analfabetismo, desemprego e desencanto.
Referências: Dália Betolin-Sherman, Eich shehaolam nihiya lavan (Como o mundo se tornou branco),
Tel Aviv, Kineret, Zmora-Bitan, Dvir, 2013.
29
de entendimento e de estabelecimento de relações pessoais, ora como fonte de herança familiar
capaz de unir passado e presente na busca do restabelecimento de uma memória coletiva. É intenção
partir de Aventuras de uma língua errante, livro de Jacó Guinsburg sobre o ídiche, no qual o autor
apresenta a língua como fator histórico de permanência e difusão da cultura judaica pelos séculos,
para traçar, na obra de Kucinski, as referências que, em diálogo com a cultura geral brasileira, se
mostram como estratégia de afirmação da cultura e das tradições judaicas na sociedade
contemporânea.
Referências: GUINSBURG, Jacó. Aventuras de uma língua errante. São Paulo, Perspectiva, 1996.
KUCINSKI, Bernardo. A cicatriz e outras histórias: (quase) todos os contos de B. Kucinski. São Paulo:
Alameda, 2021. KUCINSKI, Bernardo. K. – Relato de uma busca. São Paulo: Cosac Naify, 2014.
KUCINSKI, Bernardo. Os visitantes. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. KUCINSKI, Meir.
Imigrantes, mascates e doutores. Organização e seleção de Rifka Berezin e Hadassa Cytrynowicz. São
Paulo: Ateliê Editorial, 2002.
30
que possam servir de paradigma a algo como uma “literatura colateral” ao/em nosso cânone
literário. Esses “textos”, que provêm do domínio da tradição (literatura oral ou oratura) incluem
cosmogonias, cantos, rezas, preceitos, e podem se constituir num corpus interessante para uma se
pensar e produzir uma “formação” da Literatura Brasileira mais inclusiva, sobretudo para escolas
indígenas, mas não apenas. Entre tais textos, destacam-se os cantos e rezas Mbyá e Kaiowá que
circunscrevem uma visão “vegetal” do cosmos (como o Ayvu Rapyta, da tradição Mbyá), ou que
apresentam a ideia de caminhada (oguatá, na tradição Kaiowá) em direção a um modo de viver (teko
aragyidje) perfeito, ou seja, mais coeso/igualitário socialmente, e mais respeitoso com outras
dimensões de existência (plantas, bichos, deuses, antepassados). Assim, pensar a “literatura” TG (a
que está inscrita no cânone e a que está em suas margens) implica em repensar questões como
identidade nacional, mono/multilinguismo, memória, e meio-ambiente, Antropoceno.
Referências: CLASTRES, Pierre. A fala sagrada: mitos e cantos sagrados dos índios Guarani. Tradução
Nícia Adan Bonatti. Campinas, SP: Papirus, 1990. BENITES, Eliel. A Busca do Teko Araguyje (jeito
sagrado de ser) nas retomadas territoriais Guarani e Kaiowá. Tese (Doutorado em Geografia). UFGD,
2021. DIAS, Gonçalves. O Brazil e a Oceania. Rio de Janeiro: Garnier, 1908. DOR, Rémy. Ecrire l'oral,
traduire l'écrit : quelques remarques centrées sur des matériaux özbek. In: Revue du monde
musulman et de la Méditerranée, n°75-76, 1995. Oral et écrit dans le monde turco-ottoman. pp. 29-
51 MÜLLER, Adalberto. Ayvu Rapyta: Cosmopoética Guarani Mbyá. Tradução, introdução e notas de
Adalberto Müller. Posfácio de Álvaro Faleiros (no prelo). MÜLLER, Adalberto. Imaginary Geography:
Dickinson Latina. In Cristanne Miller; Karen Sánchez-Eppler (orgs.). The Oxford Handbook Of Emily
Dickinson. 1ed.Oxford: Oxford University Press, 2022, v. 1, p. 497-517. MÜLLER, Adalberto.
Tupinambá: Canción de La Serpiente. In: Francisco Segovia; Adrián Muñoz; Juan Carlos Calvillo.
(Org.). Primer Amor: Antología Poética. 1ed.Mexico: El Colegio de Mexico, 2022, v. 1, p. 339-343.
TEIXEIRA, Ava Ñomoandyja Atanásio. Cantos dos animais primordiais. Org. e tradução Izaque João.
São Paulo: Hedra, 2021 (Col. Mundo Indígena). VALENTIM, Marco Antonio. Cosmologia e política no
Antropoceno. Ethic@, Floriano?polis, v. 19, n. 2, 300-317. Ago. 2020. VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo.
A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. Rio de Janeiro: Ubu, 2017.
31
Grandesertão.br: o romance de formação do Brasil. São Paulo: Duas Cidades, Ed. 34, 2004.
GANDARA, Lemuel. Catálogo Metamundus (livro eletrônico): crítica da pulsão visual. Curadoria:
Augusto Niemar. Brasília, DF: Ed. do autor, 2022. RODRIGUES, Augusto. Onde as ruas não têm nome.
Brasília: Thesaurus, 2010. ROSA, João Guimarães. “Meu tio o iauaretê”. ROSA, João Guimarães. Estas
estórias. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. SILVA JUNIOR, Augusto. Geopoesia da boa
morte: a flâneuse Cora Coralina pelas ruas da tanatografia. Leitura, UFAL, n. 68, p. 368–378, 2021.
32
tempo, a caderneta abre espaço para a discussão sobre aspectos da colonialidade dentro do recorte
literário aqui proposto e, nessa brecha, é possível observar tanto os desdobramentos crítico-
genéticos do texto, como o retratado do povoado Vai na metade do século 20 e, em última instância,
da própria condição do arquivo, onde ainda residem traços do poder.
Referências: ASSMANN, Aleida, Espaços da Recordação: Formas e Transformações da Memória
Cultural, 1. ed. Campinas: Unicamp, 2011. DERRIDA, Jacques, “Archive fever in South Africa”, in:
HAMILTON, Carolyn et al (Orgs.), Refiguring the Archive, 1. ed. Cape Town: New Africa Books, 2002.
HAMILTON, Carolyn et al (Orgs.), Refiguring the archive, 1. ed. Dordrecht: Kluwer Academic, 2002.
HAY, Louis, A literatura sai dos Archivos, in: SOUZA, Eneida Maria de; MIRANDA, Wander Mello
(Orgs.), Arquivos Literários, 1. ed. Sa?o Paulo: Ateliê Editorial, 2003. MBEMBE, Achille, The Power of
the Archive and its Limits, in: HAMILTON, Carolyn et al (Orgs.), Refiguring the Archive, 1. ed. Cape
Town: New Africa Books, 2002. TAYLOR, Diana, O arquivo e o repertório: performance e memória
cultural nas Américas, Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013. SOUZA, Eneida Maria. “Crítica genética
e crítica biográfica”. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 45, n. 4, p. 25-29, out./dez. 2010. WILLEMART,
Philippe, Crítica genética e história literária, Manuscrítica: Revista de Crítica Genética, n. 10, p. 165–
185, 2001.
“NÃO TEM MAIS FUTURO”: MODERNIDADE E CRISE DE SENTIDO EM DORA SEM VÉU, DE RONALDO
CORREIA DE BRITO
Haymone Leal Ferreira Neto
Resumo: Este trabalho investiga a crise de sentido do personagem Wires no romance Dora sem véu
(2018) de Ronaldo Correia de Brito. Wires é um costureiro do Agreste pernambucano. Encontra a
narradora Francisca na carroceria do caminhão que os conduz ao santuário de Juazeiro do Norte. Ele
33
vai agradecer por ter se recuperado de um acidente de motocicleta; ela, procurar pelo paradeiro da
avó Dora. Wires surpreende a socióloga Francisca ao afirmar trabalhar como costureiro. “Pensei que
fosse agricultor”, ela retruca. Mas o rapaz largou o trabalho no campo pelo ramo de confecções. Ela
então olha para as mãos dele e não encontra os calos comuns aos camponeses; em vez disso, Wires
lhe mostra “as palmas finas, as unhas limpas e bem aparadas”. Quanto a ser agricultor, Wires afirma:
“já fui, não tem mais futuro. Lá onde eu moro, os homens da minha idade largaram a terra e a luta
com o gado” (BRITO, 2018, pp. 41-42). Entendemos que o personagem pode ser interpretado
conforme o que Peter L. Berger e Thomas Luckmann (2004) definem como crise de sentido. No
passado, as sociedades tinham sistemas de valores únicos, obrigatórios para todos, conservados e
administrados por instituições sociais. Na modernidade, contudo, valores comuns e obrigatórios não
conseguem atingir todas as esferas da vida (BERGER; LUCKMANN, 2004, pp. 32-33). A coexistência
de diferentes ordens de valores resulta na existência de comunidades paralelas de sentido diferentes
entre si: o pluralismo (BERGER; LUCKMANN, 2004, p. 36). As causas do pluralismo moderno são o
crescimento populacional, as migrações, o aumento das cidades, a economia de mercado etc.
(BERGER; LUCKMANN, p. 49). Acreditamos que uma crise de sentido profunda na sociedade
nordestina é um tema central do romance e o personagem Wires, um exemplo evidente dela, ao
representar a transição do trabalho no campo para a indústria.
Referências: BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: Zahar,
2021. BERGER, Peter L; LUCKMANN, Thomas. Modernidade, pluralismo e crise de sentido: a
orientação do homem moderno. Petrópolis: Vozes, 2004. BRITO, Ronaldo Correia de. Dora sem véu.
São Paulo: Alfaguara, 2018. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 11. ed. Rio de
Janeiro: DP&A, 2006.
34
Fronteiras na História, v.11, Belo Horizonte, UFMG, 1992. ASHCROFT, Bill; GRIFFITH, Gareth; TIFFIN,
HELLEN: The empire writes back : theory and practice in post-colonial literatures. Londres, Nova
Iorque: Editora Routledge, 1989. ASSMANN, Aleida. Espaços da Recordação: formas e
transformações da memória cultural. Trad. Paulo Soeth. Campinas: Editora Unicamp 2011.
BENJAMIN, Walter. Passagens. Organização: Willi Bolle. Colaboração: Olgária Matos. Trad. Irene
Aron e Cleonice Paes Barreto Mourão. São Paulo/Belo Horizonte: Ed.UFMG/Imprensa Oficial do
Estado de São Paulo, 2006. BELLUZZO, Ana Maria de Moraes. Brasil dos viajantes, volumes III: a
Construção da Paisagem. Salvador: Fundação Odebrecht, 1994. BESSE, Jean-Marc: O Gosto do
Mundo: Exercícios de Paisagem.Trad. Annie Cambe. Rio de Janieor: Editora UERJ, 2014. CÁMARA,
Mario; KLINGER, Diana; PEDROSA, Celia; WOLFF, Jorge (Org.): Indicionário do Contemporâneo, Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2018. HAMILTON, Carolyn; HARRIS, Veme; TAYLOR, Jane; PICKOVER,
Michele; REICI, Graeme; SALEH, Razia: Refiguring the Archive. Dordrecht: Editora Springer
Netherlands, 2002. MONGIA, Padmin (Org.): Contemporary Postcolonial Theory: A Reader. Londres:
Editora Arnold, 1996. RICHARDS, Thomas. The Imperial Archive: Knowledge and the Fantasy of
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7.ed. - São Paulo: Editora Cortez, 2010. PROCTER, Alice. The Whole Picture: The colonial story of the
in our museum and why we need to talk about it. Londres: Editora Cassel, 2020. WERÁ, Kaká: A Terra
dos Mil Povos - História Indígena do Brasil Contada por um Índio. São Paulo - SP: Editora Arapoty:
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Humanitá. AM. Anais do II Encontro Nacional de Leituras. Humanitá: ENALE, 2011. CD-ROM. P. 4-13.
BOLLE, Willi. “Um painel com milhares de lâmpadas” metrópole e megacidade. In: BENJAMIN,
Walter. Passagens. Organização e edição brasileira Willi Bolle. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2018.
3 v. PRADO, Antonio Arnoni. Prefácio. In: VEIGA, José Jacinto. A hora dos ruminantes. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2001. SILVA JUNIOR, Augusto R. da. Cora Coralina inédita: encontro das águas da
geopoesia na rua do fogo da Literatura de Campo. Anais eletrônicos do XV Congresso Internacional
ABRALIC: Circulação, tramas & sentidos na Literatura. Uberlândia: ABRALIC, 2018. SILVA JUNIOR,
Augusto Rodrigues da; MARQUES, Geórgia da Cunha. Godoy Garcia e Niemar: um canto geral
centroestino. ECOS - Estudos Contemporâneos da Subjetividade. vol. 5, n. 2, 2015. SILVA JUNIOR, A.
R. da. Tanatografia e morte literária: decomposições biográficas e reconstruções dialógicas.
ComCiência. n. 163. Campinas, nov. 2014. VEIGA, José Jacinto. A hora dos ruminantes. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2001.
36
Assis, demonstra em um romance de costumes que relatava a busca por grandezas predestinadas da
elite brasileira, um gesto dissimulador de ginga que disfarça, nas camadas do texto, uma exímia prosa
dos subúrbios, que desponta da classe popular e do alto do morro, percorre todo o romance e por
consequência o Brasil. O Bruxo nos faz caminhar por um século XIX diferente, constrói uma paisagem
polifônica que representa diretamente a corporeidade, a vocalidade e a culturalidade de um povo
que confronta o discurso monológico.
Referências: ASSIS, Machado de. Esaú e Jacó. Porto Alegre, RS: L&PM, 2018. BAKHTIN, Mikhail.
Estética da criação verbal / Mikhail Mikhailovitch Bakhtin; prefácio à edição francesa Tzvetan
Todorov; introdução e tradução do russo Paulo Bezerra. - 6. ed. São Paulo: Editora WMF Martins
Fontes, 2011. BEZERRA, Paulo. Uma obra à prova do tempo. Prefácio. In: BAKHTIN, Mikhail.
Problemas da Poética de Dostoiévski (PPD). Trad. Paulo Bezerra. 5° ed. –Rio de janeiro: Florence
Universitária, 2010. MEDEIROS, Ana Clara.; SILVA JR, A. R. da. Poética da criação verbal: a crítica
polifônica nos estudos da linguagem literária. Anuário de Literatura. Florianópolis, v. 20, n. 1, 2015,
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Disponível em: <http://www.letras.ufmg.br/literafro/autoras/28-critica-de-autores-
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duarte#sdfootnote1sym> Acesso em: 10 jan 2023.
37
região terrestre’, sem o pinçar da minúcia”. O desejo de registrar minúcias, à maneira dos viajantes
movidos por indagações científicas, e o distanciamento desse mesmo impulso frente a um lugar
“onde puja um mundo, conforme o visível” é indício das encruzilhadas entre os lugares e as palavras,
perceptíveis em anotações como esta, pertencente ao arquivo de Guimarães Rosa, alocado no
Instituto de Estudos Brasileiros, da Universidade de São Paulo. Nesse sentido, seguindo os rastros
desse viajante, este trabalho se dedica a algumas reflexões sobre as potencialidades dos escritos de
viagens, em especial aqueles guardados nos arquivos, enquanto caminho para encontros
imprevistos, caminhos para a desconfiança em torno de saberes e conceitos cuja estabilidade se
desfaz na provocação constante às palavras levadas adiante por escritores como Guimarães Rosa. E,
para acompanhar esse viajante e tecer as reflexões propostas, serão acionadas não somente leituras
pertinentes à pesquisa em arquivos, a exemplo das produções de estudiosos como Eneida Maria de
Souza, Reinaldo Marques e Arlette Farge, como também a leitura dos registros de outro escritor
igualmente viajante: Mário Palmério. Pelas anotações registradas por Palmério em seus diários,
durante as viagens que fizera à Amazônia, espero dinamizar um encontro entre rotas, arquivos e
viajantes, encontro imaginado diante de um cenário irredutível a sínteses, conceitos ou minuciosas
descrições.
Referências: FARGE, Arlette. O sabor do arquivo. Tradução Fátima Murad. São Paulo: Edusp, 2017.
MARQUES, Reinaldo. Arquivos literários: teorias, histórias, desafios. Belo Horizonte: Editora UFMG,
2015. MARQUES, Reinaldo. Acervo de Escritores Mineiros: espaço de saberes nômades. In:
MEDEIROS, Elen de; RODRIGUES, Leandro Garcia (org.). Acervo de Escritores Mineiros: memórias e
histórias. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2019. p. 247-265. PALMÉRIO, Mário.
Apontamentos para o Diário de Bordo Fray Gaspar de Carvajal. De 8-2-81 a .... Memorial Mário
Palmério, Uniube. PALMÉRIO, Mário. Diário da 2ª viagem à Amazônia Brasileira. Memorial Mário
Palmério, Uniube. ROSA, João Guimarães. Amazônia. Fundo João Guimarães Rosa, IEB, série
Literatura, subsérie “Manuscritos”, referência JGR-M-20,61. SOUZA, Eneida Maria. Ficções impuras.
In: SOUZA, Eneida Maria; LYSARDO-DIAS, Dylia; BRAGANÇA, Gustavo Moura (org.). Sobrevivência e
devir da leitura. Belo Horizonte: Autêntica, 2014. p. 111-118.
38
Munique: dtv, 1965. Tradução de Irene Aron. São Paulo: Martins Fontes, 2009. Goethe, Johann
Wolfgang von. Wilhelm Meisters Wanderjahre. Frankfurt: Deutscher Klassiker Verlag, 1989.
39
que lhe permite a completa liberdade para atacar as instituições sociais, propiciando uma reflexão
acerca da cultura popular para constituição identidade brasileira, superando qualquer dogmatismo
literário ou limiar institucional que tentam apagar a força criativa do seio popular. Assim, ao apontar
a carnavalização literária, destacamos que Machado de Assis constrói um discurso onde o poder
oficial é destronado e os praticantes do entrudo são coroados.
Referências: ASSIS. Machado. Crônicas de Lélio. Organizado por MAGALHÃES JUNIOR. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1958. BAKHTIN, M., VOLOCHÍNOV, V. N. Marxismo e Filosofia da Linguagem:
problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 9. ed. São Paulo: HUCITEC,
1981, 2008, 2014, 2015, 2017) BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 5. ed. São Paulo: Martins
Fontes, 2017. CANDIDO, Antônio. A vida ao rés-do-chão. In: ANDRADE, Carlos Drummond: Para
gostar de ler. São Paulo: Ática, 1984. v. 5, Prefácio. DAMATTA. Roberto. Carnavais, malandro e heróis:
para uma sociologia do dilema brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. DUARTE, Eduardo de Assis.
Machado de Assis afrodescendente – escritos do caramujo [antologia]. Rio de Janeiro e Minas Gerais:
Editora Pallas / Editora Crisálida, 2009. PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda. O carnaval das letras:
literatura e folia no Rio de Janeiro do século XIX. São Paulo: Editora Unicamp, 2004. QUEIROZ. Maria
Isaura Pereira de. Carnaval brasileiro: o vivido e o mito. São Paulo: Editora Brasiliense, 1999. RAMOS,
Ana Flávia Cernic. “Balas de estalo” de Machado de Assis: humor e política no segundo reinado.
Revista de Letras. v. 48, n. 2 (2008). Disponível em:
https://periodicos.fclar.unesp.br/letras/article/view/1194/974. Acesso em: 07 set. 2018.
40
Juracy Ignez Assmann Saraiva
Resumo: “O Alienista”, novela de Machado de Assis, objeto desta comunicação, foi publicada
periodicamente na revista A Estação, de outubro de 1881 a março de 1882, e incluída na coletânea
denominada Papéis avulsos, de 1882. Por centrar-se no tema da loucura e pela proximidade das
datas de publicação, a narrativa relaciona-se com Memórias Póstumas de Brás Cubas (1880) e com
Quincas Borba (1886-1891), sublinhando a relevância da representação da ruptura do equilíbrio
mental para o pensamento crítico reflexivo de Machado de Assis. Em “O Alienista”, a obsessão do
protagonista por determinar os limites entre lucidez e insanidade conduz a progressão das ações,
cuja significação se complementa pela menção a obras e autores não só da literatura, mas também
da história universal. Essas remissões projetam o posicionamento crítico do escritor que, ao conjugar
épocas temporalmente distintas, reflete sobre o contexto sociocultural do Rio de Janeiro da segunda
metade do século XIX, dando à narrativa a configuração de uma sátira. Por meio dela, critica o
cientificismo, próprio do Positivismo, a prepotência da ciência e o abuso do poder praticado em seu
nome, o perigo da radicalização das ideias e da credulidade, questiona a definição de razão e de
normalidade. Valendo-se das ações despropositadas de Bacamarte, Machado de Assis busca induzir
o leitor a desconfiar de verdades absolutas, sejam elas difundidas pelo psiquiatra de Itaguaí ou pela
ciência de sua época. Além disso, sugere que a loucura é uma extensão da disputa pelo poder, a qual
está representada, na narrativa, pelo posicionamento do cientista, Simão Bacamarte; do religioso,
padre Lopes; dos políticos, os vereadores; e do povo, o barbeiro Porfírio. Consequentemente, com
“O Alienista”, Machado desnuda a falsidade de comportamentos, o engodo de ideias, vistas como
autênticas, e confere à natureza satírica da narrativa o poder de iluminar a realidade.
Referências: Não há citações no resumo.
41
Abril, 1978. STEIN, Ingrid. Figuras Femininas em Machado de Assis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
TELES, Ana Carolina Sá. Personagens Machadianas e suas Constelações em Ressurreição, Helena e
Dom Casmurro. Tese de Doutorado em Literatura Brasileira. Orientação de Prof. Dr. Hélio de Seixas
Guimarães. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo, São Paulo,
2018.
42
brasileira, atenção à novidade das formas que Machado empreende no quadro do Romantismo, e
uma revisão sobre o diálogo intertextual que tais poemas sugerem.
Referências: ASSIS, Machado de. Poesias Dispersas. In: ___. Obras completas. Rio de Janeiro: Aguilar,
1973. v.3.
43
Referências: ASSIS, Machado de. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2008. 4v. FARIA, João
Roberto (org.) Machado de Assis: do teatro. Textos críticos e escritos diversos. São Paulo:
Perspectiva, 2008. JOBIM, José Luís. Machado de Assis, membro do Conservatório Dramático
Brasileiro e leitor do teatro francês. In: JOBIM, José Luís (Org.). A biblioteca de Machado de Assis. Rio
de Janeiro: Academia Brasileira de Letras; Topbooks, 2001. RIBEIRO, Maria. Teatro quase completo.
Organização e introdução de Valéria Andrade. Florianópolis: Mulheres, 2008.
44
O JOVEM MACHADO DE ASSIS, O MESTRE PORTUGUÊS E O PRIMEIRO DIÁLOGO INTERTEXTUAL
Wilton Jose Marques
Resumo: Nos primórdios da vida literária, o jovem Machado de Assis foi sobretudo poeta. E nesse
momento, seus primeiros passos foram de certa forma tutelados pelo também jovem poeta
português Francisco Gonçalves Braga, a quem dedicou vários poemas. Em momento impreciso de
1854, os caminhos literários de Braga, dezoito anos, e de Machado, quinze, acabaram por se cruzar
nas ruas do Rio de Janeiro. Embora a circunstância do encontro, fortuito ou não, seja impossível de
se conhecer em detalhes, é muito provável que a aproximação se deveu ao interesse mútuo pela
literatura. De imediato alçado à condição de mestre, o português acompanharia de perto o aprendiz
brasileiro. Além propriamente de evidentes influxos literários, já reconhecidos pela crítica, foi
Gonçalves Braga quem, na verdade, ajudou o jovem Machado nos movimentos iniciais de inserção
no universo literário brasileiro, seja no Periódico dos Pobres, seja na Marmota Fluminense. Nesse
sentido, a presente comunicação apresentará uma breve leitura do poema “A saudade”, dedicado a
Braga e publicado na Marmota Fluminense, de Francisco de Paula Brito, no dia 5 de outubro de 1855.
Além de apresentar novidades formais no corpo do texto, como o uso do verso decassílabo branco,
o jovem poeta, pela primeira vez, fez uso do recurso intertextual, que, como se sabe, será uma das
constantes estéticas que marcará o estilo machadiano.
Referências: BRAGA, Francisco Gonçalves. Tentativas poéticas. Rio de Janeiro: Tipografia de Nicolau
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Programa de Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento) -
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“EU A AMO, É VERDADE, MAS EU A ODEIO TANTO QUANTO A AMO”: O AMOR MONOGÂMICO
COMO INSTRUMENTO DE MANUTENÇÃO DA COLONIALIDADE DE GÊNERO NA OBRA ENTRE
L’ARBRE ET L’ÉCORCE, DE FRANÇOISE LOE-MIE.
José Barreto Romariz dos Santos Junior
Resumo: O amor monogâmico durante muito tempo foi visto, nas sociedades coloniais, como a única
maneira de construir relações afetivas entre sujeitos sociais, pois, segundo Polderman (2004), na
Guiana Francesa, durante o período colonial, havia somente dois status para a mulher na sociedade:
casada e viúva. Assim, se apoiando na estrutura patriarcal e machista, esse amor também foi/é
utilizado como instrumento de implementação e manutenção da colonialidade de gênero que
subalterniza o corpo feminino e o aprisiona em matrizes de dominação que interseccionam a raça, a
classe, o gênero, os afetos e as sexualidades. Ainda hoje, nas sociedades
modernas/capitalistas/coloniais, há o controle sobre os afetos e a maneira como as mulheres devem
performar suas existências em sociedade. Françoise Loe-Mie, na sua obra Entre l'arbre et l'écorce,
permite o diálogo e a reflexão sobre como o amor monogâmico é utilizado pelas personagens
masculinas como garantia da submissão das personagens femininas que desejam viver suas
subjetividades e seus afetos pautados na compreensão de que se pode agir socialmente de forma
outra que não a imposta por sujeitos brancos, heterossexuais e eurocentrados. Na esteira de Vasallo
(2022), hooks (2019a, 2019b, 2022) Oy?wùmí (2021, 2022) e Lugones (2020), este trabalho tem como
objetivo, portanto, compreender como o amor monogâmico se constitui como instrumento de poder
e de violência de gênero na obra de Loe-Mie, além de buscar entender como as masculinidades se
constroem sob o argumento de exclusividade amorosa instituída em via única, onde somente a
mulher deve obediência ao homem e onde se penaliza, persegue e desencoraja qualquer sujeito que
apresenta comportamentos dissidentes da monogamia compulsória.
Referências: HOOKS, bell. A gente é da hora : homens negros e masculinidades. São Paulo : Elefante,
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identidades de gênero. São Paulo : Editora Ananse, 2022 POLDERMAN, Marie. La Guyane française
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Rouge Édition, 2004. VASALLO, Brigitte. O desafio poliamoroso. São Paulo: Elefante, 2022.
46
Resumo: A escritora haitiana e diaspórica Edwidge Danticat afirma que “seu país” é um de incertezas:
“Meu país, eu senti, tanto como imigrante como artista, era algo, que seria o décimo departamento.
O Haiti era subdividido em nove departamentos geográficos, sendo que o décimo seria a terra natal
flutuante, a ideológica, que uniria todos os haitianos morando fora do Haiti, na diáspora (2010, p.49).
Tendo essa perspectiva do (des)locamento, pretendo discutir posicionamentos de Danticat enquanto
mulher, escritora e ativista diaspórica. Para tal, analisarei “memoirs” e ensaios, como a obra Create
Dangerously: The Immigrant Artist at Work (2010). A migração da autora ocorre aos 12 anos, devido
a condições políticas do Haiti (p.51). Essa condição a faz levar uma bagagem consigo, de perdas e
horrores, que se traduz em suas obras. Segundo a autora, a mente possui formas de proteger-se
contra horrores do passado e uma delas seria o “esquecer”. Esquecer seria um medo constante na
vida de um escritor diaspórico, pois é preciso contar, repassar. Segundo ela, houve inúmeras mortes
no Haiti para que outros pudessem viver (p.65). Danticat conclui: “Nós, os contadores de histórias,
devemos ser mais gratos que os demais pelo fato de que o exílio foi a punição escolhida para Adão
e Eva [...] porque caso eles tivessem sido executados, não haveria uma história a ser contada ou
histórias para se passar adiante” (p. 6). No viés da reflexão sobre diáspora e escrita, proponho
analisar escritas de si de Edwidge Danticat, a fim de observar seu posicionamento enquanto mulher
e escritora diaspórica. Penso que escritas de si promovem um convite a debates importantes no que
diz respeito à literatura, categorizações (autobiografia, o próprio estatuto da ficção), tradução
cultural e transversalidades no contexto diaspórico, especialmente no momento contemporâneo,
tão marcado pelo movimento: de pessoas, ideias e também de conceitos.
Referências: DANTICAT, Edwidge, Breath, Eyes, Memory. New York: Vintage, 1994. DANTICAT,
Edwidge. Create Dangerously: The Immigrant Artis at Work. New York: Vintage Books, 2010.
DANTICAT, Edwidge (Ed.). The Butterfly's Way: Voices from the haitian Dyaspora. New York, Soho,
2001. BUTLER, Maia; DAVIS MC-ELLIGATT, Joanna; FEIFER, Megan (Eds.) Narrating History Home and
Dyaspora: Critical esssays on Edwidge Danticat. Jackson: UP Mississippi, 2022.
47
Natali Fabiana da Costa e Silva
Resumo: Esta comunicação pretende apresentar o sistema literário da Guiana Francesa a fim de
compreender o lugar da autoria feminina nessa produção. Segundo Ndagano (1996), a literatura
guianense surgiu no século XIX acenando, já naquele momento, para uma dimensão embrionária da
negritude em seus horizontes poéticos e ficcionais. No século XX, ela se desenvolve e engaja
escritores que, para além do diálogo com os pensamentos de Aimé Césaire (1913-2008), Léon-
Gontran Damas (1912-1978) e Lépold Sédar Senghor (1906-2001), demonstram preocupação em
consolidar uma literatura que se afirme como autônoma, distanciando-se daquela produzida em
Martinica e Guadalupe, no Caribe. É, contudo, somente em meados da década de 1990 que a
literatura guianense escrita por mulheres surge. Sua estreia se dá pela publicação do romance La
saison des abattis (1996), de Lyne-Marie Stanley. Seu romance abre caminho para um grupo de
escritoras que passam a publicar a partir dos anos 2000, como Christiane Taubira, Sylviane
Vayaboury, Mireille Jean-Gilles, Françoise James Ousénie Loe-Mie, Marie-George Thebia, entre
outras. A autoria feminina amplia o pensamento da negritude, estendendo sua atenção à exploração
dos corpos de mulheres negras. Nesse sentido, busca-se observar a dinâmica entre o esgotamento
(épuisement) desses corpos femininos e, ao mesmo tempo, o florescimento (épanouissement) de
um olhar crítico em direção à França metropolitana, colocando em xeque sua relação com os
Departamentos Ultramarinos e suas ex-colônias.
Referências: CÉSAIRE, Aimé. Cahier d’un retour au pays natal. In: SENGHOR, Léopold Sédar (Org.).
Anthologie de la nouvelle poésie nègre et malgache de langue française. Paris: PUF, 1939. CÉSAIRE,
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merveilleux. Archipélies (en ligne), n. 5, 2018. Disponível em: https://hal.univ-antilles.fr/hal-
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Publishers, 2006, p. 107-171.
50
normalmente lançadas depara-se com as mais diferentes narrativas onde o protagonismo transita
entre casais homoafetivos, pretos, interseccionais, indígenas, entre outros. Entretanto, alguns
estereótipos ainda são encontrados e mantidos nas histórias. A partir desse cosmo proponho uma
leitura decolonial de fanfics como “À Luz do Luar” escrita pelos usuários @Samy2807 e
@Naruhinaproject que une a lenda do boto-cor-de-rosa com o anime japonês Naruto do qual os
usuários afirmam ser fãs. Para isso apoiaremos-nos nas teóricas Vergès (2020) e Lugones (2014) e
em suas contribuições.
Referências: LUGONES, María. Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas. Florianópolis,
vol.22, n. 320, p.935-952, setembro/dezembro, 2014. "margem", in Dicionário Priberam da Língua
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instrumento de Disseminação e Divulgação das/nas Margens. A invasão da cultura nos estudos de
língua e literatura - Vol. 1, n. 1, jan./jun. 2011 (pg. 158 À 172) SPIRIT FANFICTIONS. À Luz do Luar.
Disponível em: <https://www.spiritfanfiction.com/historia/a-luz-do-luar-21766600> Acessado em:
01/11/2022 VERGÈS, Françoise. Um feminismo decolonial. Trad. Jamille Pinheiro e Raquel Camargo.
São Paulo: Ubu Editora, 2020.
51
mais violento, pois, somado ao machismo, havia também os preconceitos e estereótipos do
colonizador, que perpetuam os estigmas a respeito das comunidades indígenas. Por meio da leitura
de autoras indígenas, é possível compreender que as vozes-mulheres precisam ser ouvidas e lidas,
pois, as lutas indígenas são forjadas também por mãos femininas, as quais possuem papel
fundamental na defesa das florestas, territórios e vida dos povos originários. A partir de uma visão
decolonial do feminismo, que revela uma interpretação nova sobre as relações globais e locais,
proponho a leitura de algumas poesias de “Weiyamî mulheres que fazem o sol”, título da obra da
escritora indígena Sony Ferseck, que conta com ilustrações em bordado da artista indígena Georgina
Sarmento. Nesse livro, a autora homenageia a luta das mulheres indígenas ao colocá-las como
protagonistas em seus versos, uma vez que Weiyamî, segundo ela, invoca Wei, nome traduzido da
língua macuxi que significa “Sol”, uma entidade feminina na cultura indígena macuxi.
Referências: VERGÈS, Françoise. Um feminismo decolonial, Ubu, 2020. JULIO, Suelen Siqueira. O
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<http://www.encontro2016.rj.anpuh.org/resources/anais/42/1471228116_ARQUIVO_SuelenSiquei
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PATRIARCALISMO E COLONIALISMO: UM DESAFIO À SEGREGAÇÃO COMPREENSIVA E SUAS FORMAS
DE DOMINAÇÃO. Margens: Revista Interdisciplinar | e-ISSN:1982-5374 | V. 16 | N. 26 | Jun., 2022,
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outro. Trad. Beatriz Perrone Moisés. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2019.
53
plasmadas na obra de Macaggi, nos detendo especificamente nas relações atinentes à construção
do lugar do feminino dentro dos vários espaços amazônicos: do “útero” por vezes inóspito da
floresta, do qual as personagens indígenas femininas são frequentemente “abortadas”; passando
pelo silenciamento frequente das mulheres “brancas”, que “desaparecem” através da adesão
completa à identidade masculina em função da sobrevivência, ou que se matam pela impossibilidade
de existir plenamente em espaços masculinos e violentos; até as personagens que, violadas, cedem
seu protagonismo para as homens “menores“, mesmo nos romances que têm seus nomes como
título.
Referências: ASSAD, Tâmera Maciel. A problemática das “invasões” na cidade e Manaus:
perspectivas de legalização fundiária à luz do Estatuto da Cidade. Disponível em:
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Roraima – 1905-1997. Centro de Comunicação, Educação, Letras e Secretariado. Departamento de
Comunicação Social. Universidade Federal de Roraima. Boa Vista, 1998.
55
2001) de Alberto, inseridos em um terceiro espaço conceitual (WEIMER, 2008) e vivencial (SOJA,
2010), sob a ótica de uma teoria da ausência (GLISSANT, 2021). O escritor e jornalista pretende, desse
modo, conectar sua primeira raiz, o reduto de vida fundacional (BACHELARD, 1993) em seu
andamento excêntrico como intelectual errante (ACHUGAR, 2006), a partir de um texto capital de
retorno, movimento narrativo interior, assinalado, no presente estudo, como texto migrante, dentro
de uma literatura em movimento (ETTE, 2008, 2018). Sua grafia crítica, íntima, mutável, em trânsito
permanente até as origens, eclode até várias escritas de si, ao ser ligada com outras/mesmas vozes
referenciais, que sugerem uma travessia de água textual sob o peso do afeto (ASSMANN, 2011;
SPINOZA, 2021). Alberto viaja para a ilha e a cultura cubana nas obras Informe contra mi mismo
(1997) e Dos Cubalibres. Nadie quieres más a Cuba que yo (2004), ressignifica-se como escritor
múltiplo e biobibliográfico (HOISEL, 2019), na busca insistente de uma história e literatura próprias
e coletivas que o legitimem dentro de uma outra biografia possível e que, ao mesmo tempo, almejam
preencher tantas estantes vazias (ROJAS, 2006, 2009, 2013) da produção cultural cubana dos últimos
60 anos.
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58
deixou marcas expressas da mudança do status do fazer crítico latino-americano de seu tempo; por
outro lado, podemos perceber que o exílio de González Echevarría, mesmo que negativo, possibilitou
ao cubano a construção de um mundo novo e próprio (SAID, 2003) por meio de sua teoria. Ao longo
desse trabalho, também levamos em consideração as postulações de Ottmar Ette (2021) sobre as
escritas no exílio.
Referências: ETTE, Ottmar. A expulsão do Éden: migração e escrita depois do Paraíso. Trad. Luciane
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p. 46-60.
59
longa-metragem, Triste Trópico. Para além dessa singela semelhança salientada entre o título do
best seller francês, cuja edição princeps veio a público em Paris no ano de 1955, e o da película
brasileira – lançada no Rio de Janeiro em plena ditadura civil militar brasileira (1973) –, tais textos
encontram peculiar afinidade na imprecisão genérica dos termos com os quais seus autores os
designam: “bricolage” e “antidocumentário”. Tomando o relato do antropólogo francês como objeto
cultural compósito e complexo por excelência – cujas facetas invulgares o remetem para além do
domínio das ciências humanas, fazendo-o adentrar as imprecisas fronteiras do campo da arte –,
entendo ser justamente neste território que Triste Trópico, longa-metragem de Arthur Omar, busca
diálogo com a obra autodiegética de Lévi-Strauss. Destarte, baseando-me nas reflexões
desenvolvidas pelo antropólogo francês nas obras La Pensée sauvage (1962) e O olhar distanciado
(1983), assim como nas ideias apresentadas pelo cineasta brasileiro no ensaio “O antidocumentário,
provisoriamente” (1973), proponho-me a realizar breve exposição do presente estado de minha
pesquisa de doutorado no PPGCL do Instituto de Letras/UFRJ, apontando reflexos formais que
vinculam ambas criações, a partir da relação dialética instaurada pela possível releitura feita pelo
cineasta brasileiro do texto do antropólogo francês – interação estética expressiva de um possível
entendimento da problemática cultural contemporânea enquanto fenômeno de interação entre o
global e o local.
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Dreyfuse Claude Lévi-Strauss (1935-1938). São Paulo: Alameda, 2013.
60
A autora em questão não se define como migrante, nem como exilada e muito menos como
refugiada. Yoko Tawada nasceu em Tóquio, no Japão, e vive há mais de trinta anos na Alemanha,
primeiro em Hamburgo e hoje em Berlim. Mas é justamente a sua posição, de plena convivência
entre os dois países tão diferentes, em cujas línguas produza a sua obra, não aceitando uma fixação
da sua condição em um espaço, que pretendo apresentar nesta breve comunicação. Yoko Tawada é
um caso claro de escritora inserida no conceito de Literaturas do Mundo, por ser impossível defini-
la a um único sistema literário. Este é outro ponto que pretendemos discutir aqui a partir dos Estudos
Transareais do comparatista alemã Ottmar Ette, uma vez que os caminhos tornam-se mais relevantes
que as localidades, o deslocamento se sobressai à demarcação e a comunicação, por meio da
produção literária e em si mesma como ambiente, atravessa e conecta elementos diversos que
compõem os espaços no globo.
Referências: ETTE, Ottmar. ZwischenWeltenSchreiben: Literaturen ohne festen Wohnsitz. Berlim:
Kulturverlag Kadmos, 2005. ETTE, Ottmar. Transarea: a literary history of globalization. Tanslated by
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Claudia Gehrke, 2014. TAWADA, Yoko. Nur da wo du bist da ist nichts. Tübingen: Konkursbuch Verlag
Claudia Gehrke, 5. Auflage, 2015.
61
aqueles que observam os volumosos grupos humanos que se arriscam diariamente na fronteira do
México para os Estados Unidos, ou as precárias embarcações que aportam no litoral europeu, não
pode ser compreendida fora de uma perspectiva histórica que sinaliza para sua relatividade: os dados
migratórios do século XXI não superam escandalosamente as proporções numéricas do século XIX.
O que muda a partir da segunda metade do século XX são as origens dos sujeitos que migram. A tal
crise contemporânea é, portanto, menos migratória do que discriminatória: sua gravidade cresce na
medida em que migrantes deixam de partir da Europa e para sair do Sul Global. Nesse contexto, a
América Central apresenta números expressivos. Na década de 1980, os sangrentos conflitos
armados provocaram a migração massiva de guatemaltecos e salvadorenhos para o México e os
Estados Unidos. Após a assinatura dos acordos de paz nos anos 1990, com o avanço das políticas
neoliberais na região, as contradições próprias a esse modelo de desenvolvimento somado à política
de deportação dos Estados Unidos de jovens alfabetizados no crime organizado originaram o
fenômeno das maras, atualmente principal causa dos fluxos migratórios centro-americanos em
direção ao norte do continente e à Europa. É, pois, tendo em vista esse contexto mais amplo dos
movimentos migratórios da região centro-americana, bem como sua articulação com as experiências
históricas, que propomos a leitura de Buscamos refúgio: nuestra guerra son las maras de Patricia
Simón (2019). O livro recolhe depoimentos de mulheres e homens oriundos do triângulo norte
centro-americano que migraram para a Espanha nos últimos anos. Além do já mencionado trabalho
do sociólogo Carlos Sandoval, será também realizado o diálogo com Moyano (2021); Chacón (2019)
e Segato (2014).
Referências: CHACÓN, Albino. El rompimiento de los espejos identitários en Centroamérica. Lectures
du genre. Literatura y migración en América Latina. n12. jan. 2019. MOYANO, Eduardo. Peligro:
refugiados. Madrid: Ediciones de la Torre, 2021. SANDOVAL, Carlos. No más muros. San José:
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"NO ES PAÍS PARA NEGRAS". LA DRAMATURGIA DE SILVIA ALBERT SOPALE DESDE LA PERSPECTIVA
POSMIGRATORIA.
Kamil Seruga
Resumo: La presente comunicación se centra en dos obras dramáticas y performativas tituladas "No
es un país para negras" (2019) y "Blackface y otras vergüenzas" (2021), ambas concebidas por la
dramaturga, actriz y directora afroespañola, Silvia Albert Sopale. La dramaturgia de Sopale
desestabiliza la noción de cultura (y sociedad) occidental, dado que se inscribe en ella, pero introduce
en su seno, simultáneamente, elementos y fuentes no occidentales que desafían su homogeneidad.
Nacida en España, de padre nigeriano y madre ecuatoguineana, la autora ofrece la singular
perspectiva de una mujer negra para abordar los temas relativos al género, la invisibilización de las
personas de color, las manifestaciones de neorracismo o la exclusión social de personas migrantes,
entre otros. Y es este último elemento que me interesa desarrollar desde la perspectiva
posmigratoria (Yildiz 2014; Römhild 2017; Schramm et al. 2019; Stewart 2021). De las tres tendencias
que se ramifican del término “posmigración”, de especial interés es la que se ha empleado para
generar un enfoque específico en los sujetos posmigrantes, es decir, los descendientes de los
migrantes que, a pesar de no emigrar ellos mismos, a menudo son percibidos y etiquetados como
“migrantes” o “extranjeros”. En este contexto, la pregunta pertinente a sus obras sería: ¿qué significa
ser afroespañola a la que, aunque arraigada, criada y plenamente asimilada en el país de acogida, se
mira como si fuera “otra”? Este marco teórico me permite delinear dos aspectos en las obras de
Albert Sopale. Primero, la subjetividad (la condición y los procesos de ser una persona o un yo) y la
agencia (la capacidad socialmente determinada de actuar y marcar la diferencia) del sujeto
posmigrante. Segundo, la denuncia de los mecanismos y estrategias que se utilizan para ejercer
control sobre o excluir a aquellas personas que se consideran otras.
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BRASIL, UM PAÍS DO FUTURO, POR MARTE BRILL
Laura da Silva Monteiro Chagas
Resumo: Entre o contingente de intelectuais de língua alemã que desembarcaram no Brasil como
exilados do regime nazista se encontravam tanto o renomado escritor austríaco Stefan Zweig (1881-
1942) como a jornalista alemã Marte Brill (1894-1969). Em 1941, Zweig publica seu livro-homenagem
ao país, Brasilien, Ein Land der Zukunft, em alemão, inglês e português; Brill escreve, entre 1937 e
1941, seu romance-diário do exílio, Der Schmelztiegel, que só vem a ser publicado em 2002. O livro
de Zweig oferece um panorama histórico, econômico e cultural calcado em uma versão convencional
e até apologética da colonização e é claramente direcionado a um público europeu que, como o
próprio autor admite, não veria o Brasil com bons olhos. Brill, por sua vez, produz um romance de
caráter autobiográfico no qual narra não só a trajetória de seu exílio, como também parece procurar
oferecer ao leitor um pequeno caleidoscópio de experiências de pessoas exiladas em São Paulo,
cidade em que a autora por fim se fixa junto com sua filha. Enquanto o potencial que Zweig enxerga
no Brasil como “país do futuro” é nada mais do que uma perpetuação de uma história colonial, o
romance de Brill revela uma disposição a procurar entender seu novo contexto e encará-lo não só
como uma necessidade de reinventar a própria vida como de uma perspectiva a uma nova
organização política e social. Assim, esta comunicação parte de uma breve apresentação da ideia
sustentada por Zweig do Brasil como “país do futuro” para deter-se em como o entendimento de
Brill contrasta com o do autor austríaco e se aproxima mais de um vislumbre de uma possibilidade
efetivamente diferente de futuro, ainda que não deixe de ter suas contradições.
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Davide. Notas para um naufrágio. Editora Âyiné: Belo Horizonte, 2021. Tradução Wander Melo
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da Silveira. FARAH, Ubah Cristina Ali. Madre piccola. Frassinelli: Torino, 2007. HALL, Stuart. Da
diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. MACÉ, Marielle.
Siderar, considerar: migrantes, formas de vida. Rio de Janeiro: Bazar do tempo, 2018. Tradução de
Marcelo Jacques de Moraes. SCEGO, Igiaba. Adua. São Paulo: Editora Nós, 2018. Tradução Francesca
Cricelli. SCEGO, Igiaba. Minha casa é onde estou. São Paulo: Editora Nós, 2018. Tradução Francesca
Cricelli.
68
pontuar de que maneira os últimos romances publicados pelo autor — “The childhood of Jesus”
(2013), “The schooldays of Jesus” (2016) e “The death of Jesus” (2019), em que os protagonistas,
assim como todos os outros personagens, chegam de navio a um novo território onde a língua falada
é o espanhol, língua estrangeira para todas essas pessoas que, ao mesmo tempo, não guardam
memórias de suas vidas antes de chegarem a esse novo lugar, essa “outra vida” —, tematizam essas
identidades construídas a partir do não pertencimento, ou seja, em torno do negativo do que são.
Referências: COETZEE, J. M. A infância de Jesus. Trad. José Rubens Siqueira. 1ª ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 2013. COETZEE, J. M. A vida escolar de Jesus. Trad. José Rubens Siqueira. 1ª
ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. COETZEE, J. M. The death of Jesus. New York: Viking,
2020. COETZEE, J. M. In conversation: J.M. Coetzee with Soledad Costantini. Entrevista concedida a
Soledad Costantini. YouTube, 29 mai 2018, Azkuna Zentroa, Bilbao. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=4VNk52t-YPM&list=WL&index=6. Acesso em: 28 ago 2022.
ETTE, Ottmar. EscreverEntreMundos: Literaturas sem morada fixa (SaberSobreViver II). Trad. Rosani
Umbach, Dionei Mathias, Teruco Arimoto Spengler. Curitiba: Ed. UFPR, 2018.
69
Disponible en: https://es.scribd.com/read/556339958/El-arte-de-la-lectura-en-tiempos-de-
crisis#a_searchmenu_61489 - RANCIÉRE, Jaques. A partilha do sensível. Tradução de Monica Costa.
São Paulo: Editora 34, 2009. - RIBEIRO, Djamila. Lugar de Enunciación. Ediciones Ambulantes; 1er
edición (21 Septiembre 2020) Disponibel en: amazon.com/-/es/Djamila-Ribeiro/dp/8494787861 -
ZILBERMAN, Regina. El estatuto de la literatura infantil. Cuadernos Literarios 3(6):17-39. 2006.
Disponible en: https://www.ucss.edu.pe/images/fondo-editorial/revista-cuadernosliterarios-
06/estatuto-literatura-infantil-regina-zilbe.
70
como ocorre o entrelaçamento dessas memórias ouvidas, vividas ou imaginadas nas obras
elencadas, a fim de refletirmos este período histórico. Para tanto, utilizaremos de referências
teóricas de Ilan Pappé (2016), Edward Said (2012) e Avi Shlaim (2004).
Referências: ANTUNES, Luísa Marinho. A construção da memória cultural por meio da literatura:
alguns aspectos. In: LAMAS, Nadja de Carvalho e MORAES, Taiza Mara Rauen. (Pro) Posições
Culturais. Joinville: Univille, 2010. p. 189 – 211. NUSSEIBEH, Sari. Once upon a country. New York:
Farrar, Strauss, and Giroux, 2007. OZ, Amós. De amor e trevas. São Paulo: Companhia das Letras,
2005. PAPPÉ, Ilan. A limpeza étnica da Palestina. São Paulo: Ed. Sundermann, 2016. SAID, Edward. A
questão da palestina. São Paulo: Ed. Unesp, 2012. SHLAIM, Avi. A muralha de ferro: Israel e o mundo
árabe. Rio de janeiro: Fissus Editora, 2004.
71
Ebenhausen bei München: Langewiesche-Brandt, 1962. QUANDT, Christiane. Paula Ludwig, uma
poeta quase esquecida. Beau Bassin: Novas Edições Acadêmicas, 2018. RIBEIRO, Sidarta. O oráculo
da noite: a história e a ciência do sonho. 1.ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. RIBEIRO-DE-
SOUSA, Celeste H. M. Do cá e do lá: introdução à imagologia. São Paulo: Humanitas, 2004. RICCI,
Michelle. Between Depiction and Experience: The Exile Dreams of Paula Ludwig. In: Women in
German Yearbook 17. Feminist Studies in German Literature and Culture. Patricia Herminghouse;
Susanne Zantop (Orgs.). Lincoln; London: University of Nebraska Press, 2001. p. 181-197. Disponível
em: <https://www.jstor.org/stable/ 20688931>. Acessado em: 06 mar. 2019. SCHMAUS, Marion. Exil
und Geschlechterforschung. In: Handbuch der deutschsprachigen Exilliteratur. Von Heinrich Heine
bis Herta Müller. BANNASCH, Bettina; ROCHUS, Gerhild (Hrsg.). Berlin/Boston: De Gruyter, 2013.
p.121-147. SCHMID, Sigrid. Schriftstellerinnen im Exil - Zuständig fürs Überleben. In: Österreichische
Literatur im Exil. Salzburg: Universität Salzburg, 2002, p. 1-9. Disponível em:
<http://www.literaturepochen.at/exil/l5038.pdf>. Acessado em 10 fev. 2020. SOUZA, Mauricio
Rodrigues de. Experiência do Outro, Estranhamento de Si: Dimensões da Alteridade em Antropologia
e Psicanálise. Prefácio Luís Claudio Figueiredo. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 2015.
SOUZA, Neusa Santos. O estrangeiro: nossa condição. In: O estrangeiro. Caterina Koltai (org.). São
Paulo: Escuta; FAPESP, 1998. p. 155-163.
72
casos, acredito que existe um núcleo de discussão em efervescência sobre o pós-colonialismo no Sul
do Brasil, especialmente sobre as heranças culturais/raciais e a maneira como estas foram mediadas
por estruturas familiares. Meu objetivo é pôr essa discussão em evidência. Entendo que essa
discussão transparece em romances publicados recentemente, como Barba Ensopada de Sangue
(Daniel Galera, 2012), Parayzo, Paraguai (Marcelo Labes), O Avesso da Pele (Jeferson Tenório, 2020),
Demo Via Let’s Go! (Gustavo Matte, 2017), Habitante Irreal e Marrom e Amarelo (Paulo Scott, 2011
e 2019) e no poemário Sagu (Mariana Berta, 2018) em que os temas de herança, identidade e família
- sob diferentes abordagens - operam como forças motrizes. Entendo que estas vozes apresentam
diferentes elaborações sobre a História e as identidades, tanto no sul do Brasil como na relação
estabelecida entre o sul do Brasil e o Brasil e por isso nos permitem vislumbrar esse núcleo de
discussão em sua efervescência, realizado por uma nova geração de intelectuais e artistas. Acredito
que é possível delinear maneiras como as elaborações do gauchismo são enfrentadas e entendidas
como passado vivo (Galera), como se integram questões do racismo e da desigualdade de classes
(Tenório e Scott) às diferentes elaborações sobre as identidades eurocentradas no interior do Sul
(Labes, Matte e Berta).
Referências: BERTA, M. Sagú. Florianópolis: [s.n.] 2019. GALERA, D. Barba ensopada de sangue. São
Paulo: Companhia das Letras, 2012. LABES, M. Parayzo-Paraguay. 2019. MATTE, G. Demo via, Let's
go! São Paulo - SP: Kazuá, 2017. MATTE, G. Nuvem Colona. Caiaponte Edições, 2019. MATTE, G.
Menos tropical ainda! debates subtropicalistas. Editora Kazuá, 2021. RADIN, J. C.; VALENTINI, D. J.;
ZARTH, P. A. História da Fronteira Sul. Chapecó - SC: Ed. UFFS, 2016. RAMIL, V. A Estética do Frio.
Pelotas - RS: Satolep Livros, 2009. SCOTT, P. Habitante irreal. São Paulo: Companhia das letras, 2011.
SCOTT, P. Marrom e Amarelo. Rio de Janeiro - RJ: Alfaguara, 2019. TENÓRIO, J. O avesso da pele.
Companhia das Letras, 2020.
73
ARTE E ARTIFICIAL, LÍNGUA OFICIAL E O ERROS LINGUÍSTICOS, IDIOMAS E NACIONALIDADES. O
PROCEDIMENTO DE HIBRIDIZAÇÃO COMO ESTRANHAMENTO EM O ERÓI SEM NEM UM AGÁ, DE
ZÉ DO ROCK
Robert Schade
Resumo: Os fluxos de migração estão cada vez mais fortes no mundo inteiro, assim como na
Alemanha. Embora a influência de autores estrangeiros na literatura alemã tenha sido
suficientemente pesquisada, ainda existe pouca reflexão sobre formas estéticas inovadoras desses
autores. O escritor brasileiro ZÉ DO ROCK (1997), que já mora há décadas na Alemanha, publicou
quase toda sua obra em lingua alemã. O livro Fom winde verfeelt, publicado primeiramente em 1995
em um alemão transformado (ultra-doitsh), foi lançado no Brasil em 1997, com o título O erói sem
nem um agá. A obra trata de suas viagens ao redor do mundo. Neste livro humoroso, o autor
transforma o idioma, seja o alemão ou o português, conforme as necessidades estéticas. O formalista
russo Victor Chklóvski, em seu texto A arte como procedimento (1916), define arte como um
rompimento com a automatização da percepção e da linguagem cotidiana. Um dos objetivos do
estranhamento é uma mudança semântica para perceber a palavra como se fosse pela primeira vez,
uma nova percepção do material linguistico, o qual, durante a rotina diária e do uso pragmático,
perdeu sua força estética. O procedimento de colocar palavras ou coisas em um novo contexto
aumenta a dificuldade do processo de percepção: „O dicurso poético é um discurso elaborado”
(CHKLÓVSKI 2013), que quer dizer construído, modificado, artificial. Zé do Rock cria uma linguagem
híbrida e artificial, que nos faz repensar a conexão entre arte e artificial (a forma), língua oficial e
erros linguisticos, e entre idiomas e nacionalidades em um mundo globalizado. Precisamos entender
o conceito estético e linguístico como dinâmico que o autor adapta ao respectivo contexto estético
ou geográfico enquanto muda o lugar. Nesses in-between spaces entre culturas (BHABHA 1994),
línguas e conceitos semânticos não são vistos como petrificados, mas como entidades que se
deslocam permanentemente.
Referências: BHABHA, Homi: How newness enters the world: Postmodern space, postcolonial times
and the trials of cultural translation. In: Bhabha, Homi: The Location of Culture. London/New York:
Routledge 1994, p. 303-337. CHKLÓVSKI, Victor: A arte como procedimento. In: Todorov, Tzvetan
(ed.): Teoria da Literatura. Textos dos Formalistas Russos. São Paulo: Editora Unesp 2013, p. 83-108.
Traduzido por Roberto Leal Ferreira GINZBURG, Carlo: Olhos de madeira. Nove reflexões sobre a
distância. São Paulo: Companhia das Letras 2001. Traduzido por Eduardo Brandão. JAMES, William:
The Principles of Psychology. Volume One and Two. New York: Dover Publications 1950. ROCK, Zé
do: fom winde ferfeelt. Berlin: edition diá 1995. ROCK, Zé do: O erói sem nem um agá. Porto Alegre:
L&PM 1997. SCHADE, Robert: Schwankende Ansichten. Bielefeld: transcript 2017. TAWADA, Yoko:
ÜberSeeZungen. Retrato de uma língua e outras criações. Porto Alegre: Bestiário 2019. Traduzido
por Gerson Roberto Neumann e Marianna Ilgenfritz Daudt.
74
eurocêntricas e a história literária brasileira são ressignificadas para, a partir das palavras de Daniel
Munduruku em seu prefácio à obra, constituírem “o caminho de volta, da aceitação, do
desprendimento, da ancestralidade”. Nesse processo de conexão com o passado e reinserção dos
saberes tradicionais no presente, cada texto literário torna-se um verso do poema-vida do autor
indígena, um elo de ligação com suas origens e de fortalecimento da potência da coletividade que
habita o ser indígena, e cada história contada (CUNHA, 2019; MUNDURUKU, 2016). Em Eu sou macuxi
e outras histórias, Dorrico não apenas demarca o texto literário como performance de tradução
cultural das artes verbais ameríndias, como também ressignifica nossa história literária de forma
transnacional ao resgatar sua ancestralidade macuxi e reconhecer-se filha de Makunaima.
Referências: CUNHA, Rubelise. O elo com a cadeia da tradição: a literatura indígena e o resgate da
potência coletiva. DORRICO, Julie; DANNER, Fernando; DANNER, Leno Francisco (Orgs.) Literatura
indígena brasileira contemporânea: autoria, autonomia, ativismo [recurso eletrônico] / Julie Dorrico,
Fernando Danner, Leno Francisco Danner (Orgs.) -- Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2020. DORRICO, Julie.
Eu sou macuxi e outras histórias. Caos e Letras, 2019. KRENAK, Ailton. A Potência do Sujeito Coletivo
– Parte I [entrevista concedida a Jailson de Souza Silva]. Revista periferias – O paradigma da potência,
p. 1-21, v. 1, n.1, 2018. Disponível em http://revistaperiferias.org/materia/a-potencia-do-sujeito-
coletivo-parte-i/. Acesso em 29 de julho de 2019. MUNDURUKU, Daniel. Memórias de índio: uma
quase autobiografia. Porto Alegre: Edelbra, 2016.
75
nationalism-autocracy/> Access in: Sep 5, 2022. KANÉ, Kavita. Lanka's Princess. New Delhi: Rupa
Publications, 2016. MAHAPRASHASTA, Ajoy Ashirwad. Collective Amnesia, grudges and India’s ‘Lost’
Glory: Eight Years of PM Modi’s Politics. The Wire, May 2022. Available in:
<https://thewire.in/politics/eight-years-narendra-modi> Access in: Sep 7, 2022. MIGNOLO, Walter;
WALSH, Catherine. On Decoloniality: Concepts, Analytics, Praxis. Durham: Duke University Press,
2018. MUKHERJEE, Meenakshi. The anxiety of Indianness. IN: The Perishable Empire: Essays on
Indian writing in English. New York: Oxford, 2000. RAO, A S. Myth and History in Contemporary Indian
Novels in English. New Delhi: Atlantic Publishers and Distributors, 2000. ROY, Anuradha. Sleeping on
Jupiter. New Delhi: Hachette India, 2015. RUSHDIE, Salman. Imaginary Homelands: Essays and
Criticism 1981-1991. London: Vintage Books, 1991. STRAUGH, Ingo. Brill’s Encyclopedia of Hinduism.
Leiden: Brill’s encyclopedia, 2010. VARMA, Pavan. Becoming Indian: The Unfinished Revolution of
Culture and Identity. New Delhi: Penguin Books, 2010. VERMA, Nirmal; BHALLA, Alok (edit). India and
Europe: Selected Essays. Shimla: India Institute of Advanced Study, 2000. Kindle edition.
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el México postrevolucionario. México, D.F.: ENAH, 2011. _______. Extranjería y antisemitismo en el
México posrevolucionario. INTER DISCIPLINA, 2(4), 2015. _______. México, País Refugio: la
experiencia de los exilios en el siglo XX. México, D.F.: Plaza y Valdés, 2002.
77
78
SIMPÓSIO “COMPARAR PARA DESCOMPARAR PARA RE-COMPARAR – NEM UM REPOSITÓRIO DE
CONCEITOS E NEM UM ESVAZIAMENTO DO CÉREBRO: UMA RE-INVENÇÃO DO OUTRO”
Edgar Cézar Nolasco (UFMS), Fábio do Vale (INSTED) e Luiz Lopes (CEFET-MG)
79
"plurilinguajeo", com base nas proposições de Walter Mignolo. Os comentários e análises ao longo
desta apresentação serão feitos à luz do referencial teórico dos estudos culturais e comparados,
enfatizando os conceitos propostos por Frantz Fanon, Walter Mignolo, Edgar César Nolasco entre
outros.
Referências: CABRERA, Damián. Xirú. Assunción: Ediciones de la Ura, 2012. FANON, Frantz. Os
condenados da terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1961. MIGNOLO, Walter. Historias locales/
Diseños globales. Colonialidad, conocimientos subalternos y pensamiento fronterizo. Madrid:
Ediciones Akal, 2013.MIGNOLO, Walter. Desafios decoloniais hoje. In: Epistemologias do Sul, Foz do
Iguaçu, PR, 2017. NOLASCO, Edgar Cézar. Perto do coração selbaje da crítica fronteriza. São Carlos:
Pedro & João Editores, 2013. ROA BASTOS, Augusto (comp.). Las culturas condenadas. Servilibros,
Asunción, PY, 2011.
80
do mundo. A segunda expressão, “esvaziamento do cérebro”, de Anibal Quijano, e já de alguma
forma dialogando com a de Mignolo, reforça e pontua o poder que aquele repositório teve, por
conseguinte, de esvaziar as mentes fronteiriças dos povos que se encontravam na “periferia” do
mundo ocidental moderno. Considerando que a literatura comparada sempre se pautou pela
preocupação do dentro e do fora, do centro e da periferia etc, aqui buscamos a prática do re-
comparar como forma de driblar uma possível prática moderna da disciplina apontando uma saída
de ordem descolonial: comparar para descomparar para re-comparar. Enfim, a desobediência
epistêmica indisciplinada como uma saída não disciplinar para uma prárica de re-comparação da
literatura comparada.
Referências: GIULIANO, Facundo (comp.). ¿Podemos pensar los no europeos? Buenos aires:
ediciones Del Signo, 2018. MIGNOLO, Walter. Desobediencia epistémica. Buenos Aires: Ediciones Del
Signo, 2010. NOLASCO, Edgar Cézar (org.) Exterioridades dos saberes.: NECC 10 anos. Campinas, SP:
Pontes Editores, 2019. NOLASCO, Edgar Cézar (org.) A literatura comparada no Brasil hoje. Campinas,
SP: Pontes Editores, 2022.
81
QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do Poder, Eurocentrismo e América. In: LANDER, Edgardo. (Org.).
Colonialidade do Saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Buenos
Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005. SANTIAGO, Silviano. Fisiologia da
composição. Cepe editora, 2020. VALE, Fábio do; NOLASCO, Edgar Cézar. Políticas para uma
pedagogia descolonial: linguagens e práticas educacionais na América Latina contemporânea.
NEMITYRA: Revista Multilingüe de Lengua, Sociedad y Educación-Vol3-N2, p. 68, 2021. VALE, Fábio
do. (2021). Teorizações contemporâneas: descolonização como ponto de partida latino-americano.
Ñemit?rã, 3(2), 10–12. https://doi.org/10.47133/NEMITYRA2021200E2.
82
rígidas, todas elas fornecidas pela orientação binária. Demolidas as estruturas filosófico-metafísicas
(dicotômicas) das epistemologias ortodoxas, a sabedoria trágica do bobo clariceano surge como um
artefato que zomba de todo ideal monolítico. Clandestina e plural por vocação, sua escrita sinuosa é
um modo muito singular de reconhecer no disfarce (máscara, duplo) a potência de uma oralidade
que transborda os horizontes da compreensão normativa.
Referências: FOUCAULT, M. A grande estrangeira: a literatura. Trad. Fernando Scheibe. BH:
Autêntica, 2016. LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. RJ: Rocco, 1999.
83
e antecipou diagnósticos sócio-políticos, artísticos e estéticos. A receptividade de sua obra ultrapassa
os limites da cultura europeia, assim como a complexidade e a amplitude de sua produção que, cada
vez mais, têm despertado o interesse para a compreensão de questões do mundo contemporâneo.
Sendo tão atuais e inquietantes, como ideias de Benjamin podem ser dadas a ver pela arte? Déba
Tacana (1988 - ), artista visual, pesquisadora, educadora e ceramista, tem raízes cigana e indígena da
etnia Tacana. Nascida no estado de Rondônia, cresceu em território de dispersões e encontros, nas
fronteiras entre Brasil e Bolívia. Em seu processo, recolhendo o barro como gesto de seus próprios
deslocamentos, faz de seu percurso um mergulho em dimensões que abarcam questões de
ancestralidade, território, narrativas, paisagem e ficção. Nosso intuito é fomentar uma reflexão
acerca de experiências estéticas e visualidades a partir de uma fricção entre o fazer artístico (obra-
processo) e o pensamento teórico, através de uma abordagem fenomenológica. Tendo pontos de
partida – tempo-espaço – tão distintos, sugerimos uma constelação entre a obra de Déba e o legado
visionário de Benjamin, aproximando criação e conceitos. Oferecendo as noções benjaminianas
situadas como partes de uma epistemologia “implicada”, pretendemos compreender como
“indiretamente”, “não intencionalmente”, tais tensões se fazem presentes e latentes, dando
visibilidade à amplitude das leituras e das possibilidades artísticas da produção contemporânea.
Referências: BIBLIOGRAFIA: ALMEIDA, D. C. V. Lugar de terra: territórios poéticos, atravessaementos
politicos, espirituais e de memória. In: Congresso de artes, ensino e pesquisa, 2018, Petrolina.
Margens em desvio: Sistema Político e Poético da Arte no Semiárido Nordestino. Petrolina: UNIVASF,
2018. v. 1. p. 1-405. ALMEIDA, D. C. V. . Movência da luz nos alevantamentos do barro. In: Maria
Cristina da Rosa Fonseca da Silva, Ana Paula Maciel Soukef Mendes. (Org.). Semear a resistência.
23ed.Florianópolis: AAESC, 2021, v. 1, p. 57-80. ARANHA, Carmen Sylvia G. Exercícios do olhar:
conhecimento e visualidade. São Paulo: Editora UNESP; Rio de Janeiro: FUNARTE, 2008. BENJAMIN,
Walter, Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 6ª ed. São
Paulo: Brasiliense, 2012 (Obras escolhidas: vol. I). ________________, Charles Baudelaire: um lírico
no auge do capitalismo / Walter Benjamin: tradução José Martins Barbosa, Hemerson Alves Baptista:
1ed. – São Paulo: Brasiliense, 1994. – (Obras escolhidas: v. III). BOLLE, Willi. Fisiognomia da metrópole
moderna: representação da história em Walter Benjamin. 2 ed. São Paulo: Editora da Universidade
de São Paulo, 2000. GAGNEBIN, Jeanne Marie. Walter Benjamin: os cacos da história. Trad. Sonia
Salzstein, São Paulo: N1 Edições, 2018. GUERREIRO, Antonio. A difícil arte de passear. Revista
SEMEAR 6. Cátedra Padre António Vieira de Estudos Portugueses da PUC-Rio / RJ - palestras
pronunciadas no VIII Seminário, em novembro de 2000, publicadas em 2002. Disponível em:
http://www.letras.puc-rio.br/unidades&nucleos/catedra/revista/6Sem_19.html. Acesso em 07 jul.
2020. PALHARES, Taísa Helena P. Aura – A crise da arte em Benjamin, São Paulo: Ed. Barracuda, 2006.
________________________ Aura: experiência que procura se estabelecer ao abrigo de qualquer
crise. Cadernos de Filosofia Alemã: Crítica e Modernidade, [S. l.], n. 8, p. 07-39, 2002. DOI:
10.11606/issn.2318-9800.v0i8p07-39. Disponível em:
https://www.revistas.usp.br/filosofiaalema/article/view/69483. Acesso em: 29 nov. 2022. QUEIROZ,
E. V.; ALMEIDA, D. C. V. Entre vistas, mundos e rios:: arte e tecnologia digital na pussanga de Denilson
Baniwa. Palíndromo, Florianópolis, v. 13, n. 29, p. 250 - 267, 2021. DOI:
10.5965/2175234613292021250. Disponível em:
https://periodicos.udesc.br/index.php/palindromo/article/view/19247. Acesso em: 8 jan. 2023.
Eventos presenciais: Outros paradigmas para o pensamento sobre arte; Ficcionar junto : Déba Tacana
- Ciclo de entrevistas realizado pelo Ateliê 397 em parceria com o Centro de Pesquisa e Formação –
Sesc São Paulo. Novembro de 2022. XII CIEHA - Congresso Internacional de Estética e História da Arte
- Emergências Transversais: Territórios e Perspectivas para a Arte. Fora Dos Muros: A Busca Por
Novos Territórios – Mesa com Prof(a). Dr(a). Inaicyra Falcão, MSc Déba Tacana UDESC, mediada pela
Prof(a). Dr(a). Irene Machado. Outubro de 2022.
84
Resumo: Este trabalho tem como objetivo refletir acerca de como o projeto colonial instaurado em
1532 no Império Inca, e consequentemente na região que hoje está localizada a Bolívia, além de
escravizar, explorar e descartar os corpos indígenas, corroborou a hierarquização e classificação
desses corpos ao longo dos séculos. O preconceito e a classificação racial são uma ficção epistêmica
(MIGNOLO, 2018) que resultam nas diferenças epistêmicas e ontológicas coloniais singulares de cada
lócus. O ciclo vital/mortal da ferida colonial (ANZALDÚA, 2007) reflete nas epistemologias
eurocêntricas persistentes no país aqui exposto, até causar uma ferida constante, resultando no
preconceito étnico-racial. O presente trabalho está vinculado a tese de doutorado intitulada “O
corpo(geo)político boliviano: teorizações fronteiriças descoloniais”, em processo de
desenvolvimento, no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens (PPGEL), da
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), desde março de 2021. Dessa maneira, este
trabalho nos ajuda a pensar na outra face do projeto colonial, que resultou na ferida colonial da
Bolívia, ou seja, reflete também o processo de resistência e descolonialidade dos corpos indígenas
desde os tempos da colônia Para tal, nos valemos de teóricos como Walter Mignolo (2018;2005),
Fausto Reinaga (2010), Gloria Anzaldúa (2007), Silvia Rivera Cusicanqui (1993), dentre outros.
Referências: ANZALDÚA, Gloria. Bordelands/La frontera: the new mestiza. São Francisco: Aunt Lute
Books, 2007. MIGNOLO, Walter. Si, podemos. In: GIULIANO, Facundo (org.) ¿Podemos pensar los no-
europeos?. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Del Signo, 2018.
85
comparada no Brasil hoje. Campinas: Pontes Editores, 2022. __________, Edgar Cézar. “Crítica
biográfica fronteiriça (BRASIL\PARAGUAI\BOLÍVIA)”. In: CADERNOS DE ESTUDOS CULTURAIS:
Brasil\Paraguai\Bolívia. Campo Grande: Editora da UFMS, 2015, p. 47-63. __________, Edgar C. “Por
uma gramática pedagógica da fronteira-sul: exterioridades, p. 09-29. CADERNOS DE ESTUDOS
CULTURAIS: pedagogias descoloniais, v.1. n.21, 2019 __________, Edgar C. O Teorizador vira-lata.
Campinas: Pontes Editores, 2022. TOLOSTANOVA, Madina V. & MIGNOLO, Walter D. Learning to
unlearn: decolonial reflections from eurásia and the Américas. Columbus: The Ohio state university
press, 2012.
86
reflexão teórica e conceitual, da presença do livro A hora da estrela, posto ser ele o desencadeador
de toda nossa proposta.
Referências: GUILIANO, Facundo (org) ¿Podemos pensar los no-europeos?. Ciudad Autónoma de
Buenos Aires: Del Signo, 2018. LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro. ed. Record, 2020
MIGNOLO, Walter. Desobediencia epistémica: retórica de la modernidade, lógica de la colonialidad
y gramática de la descolonialidad. Buenos Aires: Ediciones del Signo, 2010 (Colección Razón política)
MIGNOLO, Walter. Habitar la frontera: sentir y pensar la descolonialidad (antología, 1999-2014).
Barcelona: CIDOB, 2015, p. 173-189. NOLASCO, Edgar César. Perto do coração selbaje da crítica
fronteriza. São Carlos. SP: Pedro & João Editores, 2013. 170 p.
87
Resumo: Aportados pela proposta maior do simpósio eleito, nosso ponto de partida para a escrita
deste trabalho se assenta na crítica biográfica fronteiriça como possibilidade epistemológica outra
de teorizar acerca das conversas como fazer teórico subsidiado pela descolonialidade. Tendo como
horizonte a máxima de “Comparar para descomparar para re-comparar”, nosso ensejo é denotar
como as crônicas de Clarice Lispector constroem uma epistemologia assentada no cotidiano. Dito
isso, queremos compreender os escritos de Clarice enquanto cronista como uma forma de
experiência fronteiriça que faz parte de uma língua, um corpo, uma cultura, a partir do solo brasileiro.
A crônica clariceana, assim como a conversa segue um movimento de trânsito. Podendo ser lida no
presente, e re-atualizada por meio do contexto social/politico/cultural que nos circunda. Posto isso,
queremos tomar essas crônicas como uma maneira de conceituar o que estamos chamando na
esteira do proposto pela descolonialidade de “conversas epistêmicas”. Por fim, buscaremos denotar
como as crônicas assumem o risco do brincar de pensar, do jogo, de modo que a teorização crítica
biográfica fronteiriça se instaura como uma práxis de pensar, práxis essa que pode ser evidenciada
a partir da conceituação de uma conversa epistemica, por meio de um re-comparar que parte das
crônicas e se instaura nas frestas da realidade presente 40 anos depois de sua escrita. A priori nos
valeremos dos postulados de: Facundo Giuliano (2018); Walter Mignolo (2003; 2015; 2017;
2005;2012), Nolasco (2013); Quijano (2019).
Referências: COUTINHO, Afrânio. “Ensaio e crônica”. In: –––. A literatura no Brasil. São Paulo:
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Trad. de Solange Ribeiro de Oliveira. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. NOLASCO, Edgar Cézar. O
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podemos fazer teori(a)zação da fronteira-sul?. In: CADERNOS DE ESTUDOS CULTURAIS: Ensaio
biográfico, v. 1, n. 23, 2020, p. 59-74. NOLASCO, Edgar Cézar. Clarice Lispector: Nas Entrelinhas da
Escritura. São Paulo: Annablume, 2001 NOLASCO, Edgar Cézar. A hora da(s) estrela(s) Clarice e
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afirmação das epistemologias do sul. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019. SANTIAGO, Silviano.
“A política em Clarice Lispector”.2014. Editora Rocco.
88
década de 1920, entrevejo que o des-modernismo aqui evocado, é, em linhas gerais, uma
conceituação descolonial que objetiva des-ler o movimento artístico, literário e político modernista
não através do discurso placentário europeu coadunado pelo vínculo terceiro-mundista com o
colonizador, tal qual as críticas brasileiras vêm endossando nos últimos anos através do que
denominaram de revisitação crítica. Pelo contrário, delineio meu fazer teórico a partir das leituras
intelectuais de Silviano Santiago, contudo, sem me enclausurar nelas, uma vez que tenho a
(auto)consciência crítica que penso e escre(vi)vo à luz de uma epistemologia outra diversal às
reflexões do meu mineiro situado epistemologicamente no entre-lugar entre a reverência e o
desprendimento.
Referências: ANDRADE, Gênese. Klaxon uma revista gritante. In: REVISTA. Klaxon: mensário de arte
moderna. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2014, p. 11-37. ANDRADE, Mário de.
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inúteis. In: BOAVENTURA, Maria Eugênia (org.). 22 por 22: a Semana de Arte Moderna vista pelos
seus contemporâneos. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008, p. 39-40. ANDRADE,
Mário de. As duas irmãs IV: neblinas, neblinas. In: BOAVENTURA, Maria Eugênia (org.). 22 por 22: a
Semana de Arte Moderna vista pelos seus contemporâneos. São Paulo: Editora da Universidade de
São Paulo, 2008, p. 57-58. BOAVENTURA, Maria Eugênia. Introdução: chuva de batatas. In:
BOAVENTURA, Maria Eugênia. 22 por 22: a Semana de Arte Moderna vista pelos seus
contemporâneos. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008, p. 13-28. CARDOSO, Marília
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89
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MENESES, Maria Paula; SANTOS, Boaventura de Sousa (org.). Epistemologias do Sul. São Paulo:
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Vanguarda européia e modernismo brasileiro: apresentação dos principais poemas, manifestos,
prefácios e conferências vanguardistas, de 1857 até hoje. Rio de Janeiro: Editora Record, 1983.
90
narrativas em que a autora intercede em defesa das consideradas existências inferiores. A autora
revisa as relações de poder interespecíficas, exaltando a falta de conduta ética com a qual os
humanos tratam os demais seres com os quais convive, na esperança de assegurar a existência digna
de cada um deles, pelo reconhecimento do valor que deve ser atribuído a suas vidas. Diante de tal
reconhecimento, a autora apela ao constrangimento moral e ético daqueles que não se
envergonham diante dos absurdos e crueldades cometidos contra os animais. Ortese acredita que,
ao ultrapassar o paradigma racional, o homem se reconheceria na face animal, deixando-se afetar
por essa experiência e abrindo-se para uma relação de irmandade, que aconteceria através da
sensibilidade de ambos. Em As pequenas pessoas, Ortese evidencia que o processo de reificação da
vida não-humana não reincide apenas nos animais, como também estende-se à natureza, de modo
geral. Tal condicionamento dessas formas de existência sustentam a dominação humana, que
encontra a justificativa conveniente para o aproveitamento abusivo dos recursos naturais e das
espécies animais e vegetais. Identificada a temática central do livro, a pesquisa se propõe a estudar
a conflituosa relação do homem com os animais e a natureza nos textos que integram a coletânea,
a fim de verificar a hipótese de haver consonâncias entre as concepções da autora e as vertentes da
ecocrítica e da biopolítica, abordagens presentes nos Estudos Animais (Animal Studies).
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer. O poder soberano e a vida nua I. Tradução de
Henrique Burigo. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. BALDI, Andrea. “Infelicità senza desideri: ‘Il
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Macerata: Quodlibet Studio, 2015. p. 67-91. . “Nota al testo”. In: ORTESE, Anna Maria. Le piccole
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Lourdes Impellizieri Luna Ferreira da; SILVA, Cláudia Heloísa Impellizieri Luna Ferreira da. “Os livros
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Rio de Janeiro: Oficina da leitura, 2015. SINGER, Peter. Ethics in the real world. Ethics in the Real
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WOHLLENBEN, Peter. La saggezza degli animali. Milão: Grazanti, 2019.
91
SIMPÓSIO “ENTRE O CÂNONE E O ESQUECIMENTO: PROCESSOS DE (NÃO) CANONIZAÇÃO DE
AUTORES E OBRAS”
Alan Victor Flor da Silva (UFPA), Valdiney Valente Lobato de Castro (UERJ) e Yurgel Pantoja Caldas
(UNIFAP)
92
Referências: ANDRIES, Lise; GANJA, Lúcia. Introdução: O Folhetinista e o colibri. Escritas do jornal e
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da imprensa: Brasil/França, Século XIX. Campinas: Mercado de Letras, 2015. p. 11-24. BROCA, Brito.
Letras francesas. Organização e prefácio de Francisco de Assis Barbosa. São Paulo: Conselho Estadual
de Cultura, 1969. BRUM, José Thomaz. Prefácio In: MAUPASSANT, Guy de. Contos fantásticos: O
Horla & outras histórias. Porto Alegre: L&PM, 2015. p. 07-12. KON, Noemi Moritz. Apresentação In:
MAUPASSANT, Guy de. 125 contos de Guy de Maupassant: escolhidos por Noemi Moritz Kon e
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1906. ROCQUE, Carlos. História de A Província do Pará. Belém: Mitograph, 1976. ROCQUE, Carlos.
Antônio Lemos e sua época: história política do Pará. Belém: Amazônia Edições culturais, 1973.
SARGES, Maria de Nazaré. Belém: riquezas produzindo a belle-époque (1870-1912). Belém: Paka
Tatu, 2002. Fontes Primárias: A Província do Pará (1890-1900).
93
chamava “palcos burgueses” e se apresentar em outros locais, como fábricas, praças e as chamadas
“casas do povo”: “fomos representar nas “casas do povo”. Sabe-se que foram construídas por
trabalhadores e camponeses com suas próprias mãos, com o aparecimento dos primeiros núcleos
socialistas na Itália.” (Fo in Valentini, 1977, p.8) O objetivo do deslocamento de local, era justamente
pela busca de um público diferente ao comumente encontrado nos teatros italianos. Quando o autor
é traduzido e inserido no Brasil, na década de 80, é representado nesses mesmos palcos que tentou
se distanciar, desta forma, essa comunicação pretende a partir da ideia paratextual de Gerard
Genette (2009), analisar a função do teatro político engajado de Dario Fo, e suas reverberações, no
público brasileiro e italiano, e identificar quem foi o seu público em ambos os países, para que se
possa construir uma ideia do modelo de teatro engajado que o autor teve a intenção de produzir.
Referências: COMPAGNON, Antoine. O demônio da teoria. Literatura e senso comum. 2 ed. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010. GENNETE, Gerard. Paratextos Editoriais. Trad. Álvaro Faleiros. São
Paulo: Ateliê Editorial, 2009 VALENTINI, Chiara. La storia di Dario Fo. Milão: Feltrinelli, 1977.
94
contemporâneos ao poeta, que reconheceram o valor estético de sua obra e registraram suas
impressões em ensaios e artigos e reuniram alguns de seus poemas. A obra de Melo Leite permanece
dispersa em números da Revista Nova Cruzada, na qual publicou poemas e foi um de seus Cavalheiros
de Honra. Apresentamos uma leitura crítica de alguns textos, bem como comentários de escritores,
que foram seus contemporâneos, sobre a obra desse que foi considerado um poeta genial, mas que
ao mesmo tempo era fadado ao fracasso por causa do seu pessimismo diante da vida que o
desencorajava. Além disso, construímos a edição crítica do poema Rosa Morena, de sua autoria,
considerado pelos seus críticos como o melhor de sua lírica.
Referências: BARBOSA, João Alexandre. O cânone na História da Literatura Brasileira. In:
https://seer.ufrgs.br/index.php/organon/article/download/29708/18366/115058 Cairo, L. R. V.
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http://periodicos.pucminas.br/index.php/scripta/article/view/10392 CAIRO, Vivaldo. Ponte da
memória. Salvador: Editora Mensageiro da Fé, 1966. CAMBRAIA, César Nardelli. Introdução à crítica
textual. São Paulo: Martins Fontes, 2005. CHARTIER, Roger. Os desafios da escrita. Trad. Fulvia M.L.
Moretto. São Paulo: Editora Unesp, 2002. CHIACCHIO, Carlos. Malogrados... In: Homens & obras.
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Studia Philologica. Curitiba: Appris, 2012. p. 53-67 FIGUEIREDO, Jackson de. Humilhados e luminosos.
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Salvador: Imprensa Moderna de Prudêncio de Carvalho, ano III, n. 2, p. 28-29, dez. 1903. ______.
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Salvador: Imprensa Moderna de Prudêncio de Carvalho, ano V, n. VIII – IX, p. 14, ago. 1906. PAULO
FILHO. M. Lembranças de Mello Leite. In: Literatura e Arte. Jornal A Tarde. Salvador: 23 out. de 1954.
95
dialogam com outras obras da literatura fantástica, o que nos permite concluir que esse autor tentou
se adaptar aos gostos do público e às convenções desse gênero literário em voga.
Referências: BRUNO, Sampaio. O conto fantástico. In: BRUNO, Sampaio. A geração nova: ensaios
críticos – os novelistas. Porto: Livraria Chardron, 1984. p. 93-105. CARNEIRO, Maria do Nascimento
Oliveira. O fantástico nos contos de Álvaro do Carvalhal. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua
Portuguesa – Ministério da Educação, 1992. CHAGAS, Manuel Pinheiro. A lenda da meia-noite. Porto:
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Disponível em: <http://hdl.handle.net/10400.3/2573>. Acesso em: 14 jun. 2021. GATO, Margarida
Vale de. Edgar Allan Poe em translação: entre textos e sistemas, visando as rescritas na lírica
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Universidade de Lisboa, 2007. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10451/566>. Acesso em: 6 ago.
2021.
96
interrogaram sobre o sentido dos seus percursos e das suas produções (PAOLILLO, 2022). Tendo isso
em vista, intenciona-se, a partir dessa iniciativa, explorar alguns desses aspectos, expondo resultados
de pesquisa tanto parciais quanto concluídos a respeito da relação desse autor com os processos de
constituição de seu lugar defronte à memória que tem sugerido. No que diz respeito ao corpus
selecionado, optou-se pelo atravessamento de produções que dialogam com a proposta de revisão
do itinerário do autor (BIGNOTTO, 2018; BROCA, 1968; FERREIRA, 2018; LOBATO, 2009; PATI, 1951a,
1951b; SCHMIDT, 1939) e também de excertos dos seus escritos autorais (FLOREAL, 1922; 1924a;
1924b; 1928; 2005).
Referências: BIGNOTTO, Cilza Carla. O caso Sylvio Floreal. In: Figuras de autor, figuras de editor: as
práticas editoriais de Monteiro Lobato. São Paulo: Editora Unesp, 2018. p. 423-438. BROCA, Brito.
Memórias. Ed. José Olympio, 1968. COUTO, Ribeiro. "O romance de Sylvio Floreal". In: Illustração
Brasileira, n. 98, 08.1928. FERREIRA, Rafael Rodrigo. O literato ambulante: antologia e estudo da obra
de Sylvio Floreal (1918 - 1928). 2018. 180 f. Dissertação (Mestrado em Literatura Brasileira).
Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2018. FLOREAL,
Sylvio. A coragem de amar. São Paulo: Emprêza Editôra “Nova Era”, 1924a. FLOREAL, Sylvio.
Attitudes. São Paulo: Casa Duprat, 1922. FLOREAL, Sylvio. O Brasil trágico: impressões, visões e
mysttérios de Mato-Grosso. São Paulo: Empresa Graphica Rossetti LTDA, 1928. FLOREAL, Sylvio. O
rei dos caça-dotes: novella. São Paulo: Editores José Napoli & comp, Assembléa 58, 1924b. FLOREAL,
Sylvio. Ronda da meia noite: vícios, misérias e esplendores da cidade de São Paulo. São Paulo:
Boitempo Editorial, 2002 [2005]. LOBATO, Monteiro. Atitudes. In: Críticas e outras notas. [versão
Kindle]. São Paulo: Editora Globo, 2009. PAOLILLO, Lucas. "Mostras, esconder: enigmas no
impressionismo vibrante de Sylvio Floreal". In: Revista Mosaico. V. 14, N. 22, 2022. Disponível em:
https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/mosaico/article/view/86296. Acesso em 15.01.2023.
p. 306-327. PATI, Francisco. "Mais uma de Verlaine". In: Correio Paulistano, ed. 29136, 04.04.1951
(1951a). PATI, Francisco. "Paradoxos literários". In: Correio Paulistano, ed. 29101, 21.02.1951
(1951b). SCHMIDT, Affonso. "Sylvio Floreal". In: A tribuna, ed. 261, 26.01.1939.
97
Referências: CARTER, Angela. 103 Contos de Fadas. Trad. Luciano Vieira Machado. São Paulo:
Companhia das Letras, 2007. COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas. São Paulo: Editora Ática, 1987.
DARNTON, ROBERT. Histórias que os camponeses contam: o significado de Mamãe Ganso.
DARNTON, Robert. In: O Grande massacre de gatos e outros episódios da história cultural francesa.
Trad. Sônia Coutinho. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014, p. 21 – 93. ENGELS, Friedrich. A origem da
família, da propriedade privada e do Estado. Trad. Nélio Schneider. São Paulo: Boitempo, 2019.
FEDERICI, Silvia. Calibã e a Bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva. Trad. Coletivo Sycorax.
São Paulo: Editora Elefante, 2017. FELSKI, Rita. Authors. In: FELSKI, Rita. Literature After Feminism.
Chicago: The University of Chicago Press, 2003, p. 57 – 93. TATAR, Maria. Contos de Fadas. Trad. Ma
Luíza Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. WILLIAMS, Raymond. Notas sobre a prosa inglesa: 1780-
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Um teto todo seu. Trad. Bia Nunes de Sousa. São Paulo: Tordesilhas, 2014. ZIPES, Jack. The Oxford
Companion to Fairy Tales. Cornwall: Oxford University Press, 2000.
98
Resumo: O almanaque é considerado por Chartier (2001) como um “gênero simultaneamente
editorial e literário” (CHAVES, 2021, p. 204) – visão aproximada à que Ernesto Rodrigues (1999) indica
para o almanaque, como uma síntese entre o livro, a revista e o jornal. Nessa perspectiva, o objetivo
deste trabalho é discutir os processos de (des)canonização dos almanaques no Brasil, com especial
destaque para o Almanaque de Lembranças Luso-Brasileiro. De modo geral, é possível perceber certa
perda gradual de relevância que atinge publicações periódicas como o Almanaque de Lembranças
Luso-Brasileiro. Publicado ininterruptamente entre os anos de 1851 e 1932, o referido almanaque
ganha destaque, nas suas primeiras décadas de circulação no Brasil, em razão, dentre outras coisas,
de apresentar aos seus leitores um acesso, em primeira mão, a autores e obras literárias. Mas, à
medida em que o livro como objeto cultural passa a circular de forma autônoma, os almanaques
deixam de ter a relevância das primeiras décadas de sua circulação. Esse fenômeno parece ocorrer
com o Almanaque de Lembranças Luso-Brasileiro, que deixa de ser publicado no início dos anos de
1930. A abordagem metodológica que pretendemos para este estudo passa pela pesquisa em fontes
primárias (almanaques) e pela rede de discussões teóricas gerada pelos estudos do objeto (pesquisa
bibliográfica).
Referências: CHARTIER, Roger. "Textos, impressões, leituras". In: HUNT, Lynn (org). A Nova História
Cultural, 3a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. CHAVES, Vania. "O Almanaque: dos periódicos
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de%20nossa%22&pagfis=4204. Acesso em: 18 out. 2022. FIGUEIREDO, Vera Lúcia Follain de. A ficção
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100
http://repositorio.ufpa.br/jspui/bitstream/2011/1723/1/Dissertacao_RaymundoMoraesPlanicie.pd
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101
IMPACTOS DA ANTOLOGIA MODERNOS POETAS DO AMAPÁ
Yurgel Pantoja Caldas
Resumo: A antologia Modernos Poetas do Amapá foi lançada no ano de 1960. Essa obra é um marco
na história literária local porque se configura como a primeira coletânea de escritos poéticos
organizada durante o período em que o Amapá era Território Federal (1943-1988). Em que pese a
escassez de trabalhos críticos acerca da antologia Modernos Poetas do Amapá, é possível medir o
impacto do lançamento dessa obra através da imprensa escrita nos jornais da época. Em nível local,
a notícia sobre a primeira antologia poética da literatura amapaense foi destaque na edição de 9 de
outubro de 1960 do Jornal Amapá (principal veículo impresso de propaganda governamental, que se
tornaria o Diário Oficial do Estado). Álvaro da Cunha, Ivo Torres, Alcy Araújo, Arthur Nery Marinho e
Aluízio da Cunha são os poetas que fazem parte da referida antologia e dariam o rumo da literatura
e das artes na Macapá “moderna” tão desejada na política de Janary Nunes, o primeiro governador
do então Território Federal do Amapá. Este estudo tem por objetivo analisar o impacto estético
provocado pelo lançamento da obra Modernos Poetas do Amapá tanto no estabelecimento de
critérios estéticos quanto na vida cultural da cidade de Macapá e no então Território Federal do
Amapá, por extensão. Para tanto, os estudos de Lobato (2013), Candido (1997) e Canto (2017)
servirão de base teórica para realizar o objetivo deste trabalho, já aqui apontado, a partir de uma
abordagem própria da pesquisa bibliográfica e de fontes primárias.
Referências: CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira: momentos decisivos. Belo
Horizonte/Rio de Janeiro: Editora Itatiaia, 1997 (2 vols.). CANTO, Fernando. Literatura das Pedras: a
Fortaleza de São José de Macapá como locus das identidades amapaenses. Macapá: Editora da
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estrutural e táticas de sobrevivência em Macapá. São Paulo: Programa de Pós-graduação em História
Social/Departamento de História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Sociais da Universidade
de São Paulo. Tese (Doutorado), 240f, 2013. Modernos Poetas do Amapá. Macapá: Editora Rumos,
1960.
102
pesquisas para formulação de fortuna crítica de dissertação de mestrado em andamento que, no
âmbito das Poéticas Orais no Brasil, investiga a produção de cantos de capoeira de autoria feminina
tendo, como hipótese, a constituição de identidade e memória instituídas pelas performances de
vozes negras na concepção e escuta de narrativas experimentando, em torno das vivências de si
(NOGUEIRA; SILVA-SEMIK, 2018), um reconhecimento coletivo, a legitimar tempos e lugares
protagonizados por vozes subalternizadas (SPIVAK, 2010).
Referências: ALVES, Alcione Correa. [Uma vez mais,] mulheres deixam traços nas águas? Revista
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2022. ALVES, Alcione Correa. Antologia Tinta: poesia de mulheres afrouruguaias como prefácio às
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Horizonte: Ed. UFMG, 2010.
103
especialmente nos poemas “Leopoldo Maria Panero es el gran poeta espanhol del Paraguai y los
demás son todos funcionários” (2020) e “Drummond reescrito ou destraduzido en la frontera
selvagem” (2020) as marcas desse tropicalismo antropofágico, o qual faz com que a poética de
Diegues mostre a voz apagada da fronteira e também se inscreva no âmbito da literatura ocidental.
Estas estão inscritas tanto na linguagem, quanto nas intertextualidades propostas. O objetivo da
pesquisa é, portanto, analisá-las, conforme os pressupostos e a crítica de Castro e Fernandez (2022),
Ballestrin (2013), Júnior (2022) e Bancescu (2012).
Referências: BANCESCU, María Eugenia. Fronteras de ninguna parte: el portunhol salvaje de Douglas
Diegues. Abehache. ano 2, n.2, 2012, p. 1-13, disponível em:
http://www.hispanistas.org.br/arquivos/revistas/sumario/revista2/143-155.pdf. acesso em:
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https://www.seminariolhm.com.br/site/simposios/01/3.pdf. acesso em: 28\12\2022. VELOSO,
Caetano. Verdade Tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
PAPEL DAS PEQUENAS EDITORAS NA EMERGÊNCIA DAS VOZES FEMININAS NA CENA POETRY SLAM
BRASILEIRA
Ary Pimentel
Resumo: Tradicionalmente, alguns grupos sociais estiveram quase totalmente excluídos do universo
da representação e só recentemente começaram a se expressar com voz própria e a frequentar de
modo significativo o mundo do livro. Na medida em que não acessavam as máquinas expressivas da
sociedade, os grupos alterizados ou subalternizados foram representados, não se representaram.
Essas formas da exclusão e do preconceito são percebidas, nos dias de hoje, nas relações intergrupais
e interpessoais na medida em que ainda persistem nas tramas da cultura os legados do racismo, do
machismo e da subalternização. Os que foram definidos como Outrxs são precisamente aquelxs que
representam a diferença colonial, afirma Ochy Curiel. Mulheres, negras, pobres e moradoras de
periferias urbanas não conheceram os privilégios de quem produz conhecimento reconhecido e
obras artísticas de circulação no universo da publicação. Mesmo em cenas que já nasceram
subversivas, como a Literatura Marginal das Periferias, o hip-hop e os circuitos do Poetry Slam,
manteve-se o predomínio masculino. O objetivo desse trabalho é pensar a ação editorial
independente e artesanal na cena Poetry Slam como um terreno fértil para o empoderamento
feminino e como espaço alternativo às instâncias de consagração e reconhecimento. É no contexto
de produção dos zines, das editoras cartoneras e dos selos independentes criados a partir dos saraus
de periferias que se manifesta o incômodo diante do apagamento da autoria e da figura feminina na
literatura. Editoras como Selo do Burro, Padê ou Ganesha Cartonera atuam como caixas de
ressonância para as novas vozes que se erguem no campo literário, fomentando a sua reconfiguração
através da emergência de vozes que rompem com o silenciamento das vozes-mulheres. Publicações
dessas editoras fazem a tradução de uma performance verbi-voco-corporal para o contexto da
palavra impressa, atuando sobre as mobilidades culturais e na afirmação do direito de expressão de
sujeitos subalternizados.
Referências: BERNARDINO-COSTA, Joaze, MALDONADO-TORRES, Nelson, GROSFOGUEL, Ramón,
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marginais-periféricas contemporâneas. Salvador: EdUNEB, 2022.
105
Resumo: Os povos originários do Brasil têm sua marca na própria construção identitária. O destaque
principal é a oralidade. No entanto, com o passar dos séculos, algumas etnias indígenas utilizam o
arco e a flecha com outro significado: o livro e a escrita são suas novas “armas”. O poder da voz e da
escrita ecoa para além das aldeias para criar outras narrativas possíveis. Com isso, a produção
literária indígena, em especial escrita por mulheres, está ganhando cada vez mais espaço no mercado
editorial brasileiro por meio de uma infinidade de publicações que variam desde livros infantis,
infantojuvenis até literatura adulta. Auritha Tabajara é considerada a primeira cordelista indígena do
Brasil. Ela faz (ou tenta fazer) com sua escrita o diálogo com os não indígenas. A oralidade, sendo
uma particularidade desses povos, também pode ser sentida e constatada nas páginas de livros que
estão sendo publicados? Veremos como essas características se encontram no papel. Já do ponto de
vista teórico, a pesquisa se ancora no debate promovido pela estudiosa María Lugones que, em seu
artigo "Colonialidad y género" (2008), relata que as mulheres, antes da colonialidade, eram vistas e
respeitadas em suas tribos indígenas. A escrita é uma forma de poder utilizada para acessar outros
mundos que são possíveis de viver, pois “enquanto houver poesia, existirá comunicação”, como
aponta Graça Graúna.
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Jerusa PiresFerreira, Maria Lúcia Diniz Pochat, Maria Inês de Almeida. Belo Horizonte:Editora UFMG,
2010.
107
camuflam as violências cotidianas do racismo, ou ainda um projeto negrocida nacional, assim como
solapam a memória da diáspora, nossos saberes ancestrais”. Souza vem produzindo uma poética
demarcando seu lugar de mulher negra que trilha o próprio caminho e constrói pegadas e alicerces
com os (en)cantos de sua ancestralidade e convoca seus pares, especialmente as mulheres negras, a
seguir na caminhada. Objetiva-se, neste texto, analisar o modo como a escrita feminina negra vem
sendo utilizada como projeto político a fim de desconstruir e descentrar o poder e o saber, através
da leitura dos poemas “refazendo histórias negras” e “sou mulher preta”, presentes no livro O
levante da Fênix (2021), da escritora baiana Jovina Souza, autora de uma poética rica em imagens da
cultura africana que carrega a força e a magia de toda uma ancestralidade.
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108
não se encontram (no Brasil) livros desta área que já o tenham abordado. Trata-se de uma
competição de poesia oral, um movimento artístico-literário que tem como foco a palavra falada e a
performance dos poetas-slameros, podendo ser considerada como literatura oral performada
(FINNEGAN, 2005), em que os protagonistas são o corpo e a voz desses participantes, que leem ou
recitam de memória poemas autorais e, portanto, reivindicam seu lugar de poetas e ressemantizam
a própria noção de poesia.
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literária em plena realização, sobre a obra do artista Bião de Canudos. Compositor e musicista da
cidade de Canudos, na Bahia, Edmilson Batista, popularmente conhecido como Bião de Canudos, é
um trovador sertanejo. Inicialmente, apresentamos um breve histórico de Canudos e do autor, logo
após exploramos o conceito entre lugar, apresentado por Silviano Santiago para pensar as cidades
de Canudos múltiplas, a oralidade presente na poesia cantada e a trajetória de alguns cancioneiros,
como Bião. Por fim, analisaremos a letra “Isso é coisas do sertão” (2005) de composição do
canudense, estabelecendo os nós entre a arte, teoria, suas conexões e distanciamentos do que
entendemos como literatura.
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LOS SLAMS DE POESIA DE BUENOS AIRES, OTRO PERFIL DE LA POESÍA ARGENTINA ACTUAL
Lucia Tennina
Resumo: Esta presentación consiste en un análisis de las diversas concepciones sobre la idea de
“poesía” que circulan por las competencias de poesía oral identificadas como “slams” realizadas en
CABA y en diferentes barrios del conurbano bonaerense. Desde el 2011 empezó a conformarse un
circuito y fortalecerse una escena literaria ligada a los slams en primer lugar en un espacio cultural
independiente en CABA y luego, poco a poco, en el conurbano. La postura de sus participantes frente
a la poesía se formó a espaldas del circuito hegemónico que se suele identificar como “poesía
argentina actual”. Para el análisis de esta ponencia tomaré en cuenta registros etnográficos,
testimonios de participantes y consideraré, asimismo, el lugar que ocupa el objeto libro en cuanto a
la composición de una idea de “poesía”, tomando en cuenta las publicaciones que se realizan dentro
del circuito de los slams. Paralelamente, me enfocaré también en las formulaciones que desde la
crítica literaria local se montan sobre la categoría poesía argentina actual o contemporánea, en
función de poner en discusión principalmente la metodología de trabajo de esta disciplina. El análisis
se basa en el material recogido durante el trabajo de campo que vengo llevando adelante desde
junio de 2022 en los Slams de Capital, Zona Norte, Zona Sur y Zona Oeste.
Referências: BARENBOIM, E. 2016. “Sobre la gilada oral”. Buenos Aires. Disponible en:
https://drive.google.com/file/d/0B55eN7zGKOwhdjFvZkhnOHRKNjQ/view BOGADO, F. 2017.
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poesía. Buenos Aires: Entropía SMITH, M. K.. 2009. Take the mic. The art of performance poetry,
slam and spoken word. Illinois: Sourcebooks MediaFusion.
120
a Universidade do Estado da Bahia (UNEB), todas localizadas em regiões estratégicas para o estudo
que busca, a priori, localizar os(as) mestres(as) narradores(as) que residem no interior do estado. A
intenção é tanto conduzir a pesquisa em suas localidades como trazê-los à academia em rodas de
histórias em que os estudantes interessados nas narrativas de tradição oral poderão tanto constituir
repertórios quanto trocar saberes com mestres da cultura popular, alimentando assim a produção
de conhecimento acadêmico a partir de perspectivas plurais e decoloniais (MUNANGA, 2004).
Pretende-se ainda que os pesquisadores desenvolvam ações sustentadas nessa constituição de
acervos e promovam práticas artísticas articuladas com a comunidade acadêmica e local.
Referências: ALCONFORADO, Doralice. Cascudo: O erudito no popular. Boitatá – Revista do GT de
Literatura Oral e Popular da ANPOLL. Salvador, 2008. JOVCHELOVICH S, Bauer MW. Entrevista
Narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual
prático. Petrópolis: Vozes; 2002, p. 90-113. MACEDO, R. S. Atos de Currículo e Autonomia
Pedagógica: o socioconstrutivismo curricular em perspectiva. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013. MATOS,
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1987.
123
ORALIDADE, ESCRITA E REBELDIA: PERSPECTIVAS DECOLONIAIS SOBRE GRAFFITI E PIXAÇÃO EM
JOÃO PESSOA
Thiago Da Silveira Cunha
Resumo: Os graffiti e as pixações inscrevem anseios populares, assinaturas, desenhos, itinerários e
memórias. Confluem com a decolonialidade, nem tanto por essas práticas proporcionarem uma
descolonização do corpo, do olhar e do uso dos espaços, nem por escutar vozes de personagens
periféricos e memórias subterrâneas. A pesquisa percebe a formação de uma “consciência
fronteiriça” (NOLASCO, NORONHA, 2019), advinda de uma diferença colonial que é reafirmada
através de diferentes agenciamentos que seguem uma “matriz colonial de poder” (QUIJANO, 2005).
As narrativas de grafiteiros e pixadores em João Pessoa/PB corroboram com os apontamentos de
Zumthor (1997, 2006), pois encontramos diversos gêneros narrativos em seus depoimentos orais:
basófias, pilhérias, aforismos ou contos elaborados a partir da releitura de obras literárias. Soma-se
à forma do texto oral o elemento da performance. Nesta, existem nuances de entonação,
gesticulação, postura corporal, forma de se apresentar e se vestir. A captação dos depoimentos da
pesquisa está sendo fílmica, o que fez com que aqueles que não queriam ser reconhecidos se
transformassem em personagens de blusas longas, óculos escuros ou mesmo panos com estampa
de caveira cobrindo o rosto. Ainda devemos citar os elementos contextuais como componentes da
poética oral, que podem ser planejados ou não, como a chuva torrencial que caía enquanto o
grafiteiro Gigabrow me narrava um dilúvio em uma de suas histórias. Em João Pessoa, o caso mais
explícito do eco decolonial advém das inscrições do pixador Subitus, denunciando questões atuais
de classe, questões indígenas - assim como seu conflito com o garimpo -, questões de terra locais
etc. Nossa hipótese é que a atividade semeada por Subitus através de sua revolta, está pautada na
busca de “sanação” ou cura das “feridas coloniais” (MIGNOLO, 2019), aos moldes do que aponta o
artista guatemalteco Benvenuto Chavajay, ou mesmo na violência revolucionária de Fanon (2022).
Referências: FANON, Frantz. Os Condenados da Terra. São Paulo: Cia das Letras, 2022. MIGNOLO,
Walter. Reconstitución epistémica/estética: la aesthesis decolonial una década después. In: Calle14:
revista de investigación en el campo del arte, vol. 14, núm. 25, pp. 14-32, 2019. NOLASCO, E. C. e
NORONHA, M. M. de O. Corpo epistêmico na/da fronteira da exterioridade. Cadernos de estudos
culturais, Campo Grande, MS, v. 2, p. 25-34, jul./dez. 2019. QUIJANO, Aníbal. A Colonialidade do
Saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO,
2005. ZUMTHOR, P. Introdução à Poesia Oral. São Paulo: Hucitec, 1997. ____________.
Performance, recepção e leitura. São Paulo: EDUC, 2000.
VOU NO CLARÃO DA LUA, VOLTO NO RAIAR DO SOL: VOZ E POÉTICA NAS CANÇÕES DE BOI DE
MESTRE GENI
Zilene Dos Reis Maciel
Resumo: Fruto do projeto interdisciplinar apresentado à Universidade do Estado do Pará, cujo cerne
era cataloga às memórias narrativas de Mestres da cultura local mojuense, o presente artigo
investigar o conto épico encontrado nas canções de Mestre Gení, cancioneiro de boi da cidade de
Moju no Estado do Pará. Artesão das palavras, Germano da Costa Santos ou Mestre Gení, como
carinhosamente é conhecido o poeta mojuense pelos moradores locais, tem 80 anos de idade.
Destes, pelo menos trinta anos está à frente do boi Caprichoso, manifestação cultural que seu Gení
mantém construindo canções que tratam do imaginário maravilhoso na lenda da ressurreição do boi
precioso. Desta maneira, o objetivo deste é analisar as memórias do mestre de cultura Gení, por
meio das canções de boi, cantadas pelo narrador da pesquisa. As canções de boi de Mestre Gení
apresentam traços do imaginário amazônico, sobretudo por tratar de lendas locais, como a lenda do
vaqueiro, os feitos do pajé e, ainda, os desejos miraculosos das mulheres grávidas da região. A
metodologia aplicada foi a da revisão bibliográfica atrelada a entrevista semiestruturada de cunho
qualitativa e, postulados, fundamentados em Minayo (2001); Durand (2012); Barthes (2011);
Loureiro (2015); Le Goff (1992), entre outros. Mestre Gení, cria e recria uma literatura encontrada
nas ruas, nas toadas de boi, uma literatura não canônica e daí está sujeita às margens. As músicas do
124
cancioneiro fazem parte daquilo que se conhece como literatura oral, manifestações culturais,
transmitidas oralmente. Deste modo, verificou-se que o narrador traz em germe, em suas canções
de boi, a forma narrativa caracterizada como conto épico, assim, as memórias do cancioneiro de boi
contém teor literário substancial, no entanto, por estar alocada em produções culturais ditas
folclóricas, tais construtos são postos às margens dos estudos literários.
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Pochat, Maria Inês de Almeida. São Paulo: Editora Hucitec, 1997.
125
QUAL É A DETERMINAÇÃO QUE SUBJAZ A IDENTIDADE?
Adriana Madeira Coutinho
Resumo: Neste texto sobre teoria e crítica feministas, colocando em diálogo “Um Teto Todo Seu” de
Virginia Wollf, considerando o livro um tratado sobre a condição da escrita de mulheres, e o ensaio
“Falando em Línguas: uma carta para as mulheres escritoras do terceiro mundo” de Gloria Anzaldúa,
pretendo retomar a questão de qual a determinação que subjaz a identidade: classe, gênero ou raça?
A discussão não é nova e aparentemente está longe do fim. É verdade que antes da crítica feminista
e ainda durante muito tempo a identidade ficou restrita ao conflito de classes, em Bakhtin e Jameson,
por exemplo, o modo como a linguagem de um texto, de uma narrativa se expressa já é, como a
encontramos, uma questão de perspectiva. O que significa que tal texto deve ser lido com noções de
identidade para ser compreendido. A escrita de mulheres para não ser identificada, de alguma forma,
com uma essencialidade aprisionadora, precisa discutir e entender, pelo menos teoricamente, a
ontologia transitoria apresentada por Judith Butler “desde os 16 anos tenho sido uma lésbica”. Não
ser e estar sendo tem a necessária ambivalência entre o que se pretende enquanto crítica feminista
e epistemologias plurais. A abordagem logocêntrica à teoria dos gêneros, particularmente a tarefa
de definir a linguagem feminina como algo diferente e separado da linguagem masculina, será
analisada nesta comunicação juntando textos do início e do fim do século XX.
Referências: ANZALDÚA, Gloria (1981). “Speaking in tongues:a letter to Third World women writers”.
In:MORAGA, Cherríe & ANZALDÚA, Gloria(orgs.). This bridge called my back: writingsby radical
women of color. New York:Kitchen Table, p. 165-74 BUTLER, Judith. "Imitation and Gender
Insubordination." In The Critical Tradition, pp. 1707-18 WOOLF, Virginia. Um Teto Todo Seu.
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elementos estruturais no processo de desenvolvimento urbano em “Memórias de um sargento de
milícias” e em “Madame Pommery”. Anais eletrônicos do XV encontro ABRALIC – 19-23 de setembro
de 2016, p. 3906-3916, 2017. CHAUVIN, Jean Pierre. Poética da malandragem: Memórias de um
gigolô, de Marcos Rey. Revista Brasileira de Literatura Comparada, n. 12, 2008, p. 253-269. DEALTRY,
Giovanna. No fio da navalha: malandragem na literatura e no samba. 1 ed. Rio de Janeiro: Casa da
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volubilidade da personagem e as raízes da herança escravista. Revista de Letras - Juçara, v. 4, n. 1, p.
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Marcos. Memórias de um gigolô. São Paulo: Círculo do Livro, 1986.
EL MUNDO DEL DESEO NO ES TODO LO LUMINOSO QUE SE CREE”: EXCLUSÃO E VIOLÊNCIA EM LAS
MALAS, DE CAMILA SOSA VILLADA
Andre Rezende Benatti
Resumo: esta pesquisa tem como objetivo uma análise dos aspectos excludentes e violentos em
torno das personagens travestis da narrativa Las Malas (2019), da escritora argentina Camila Sosa
Villada. O feminismo, em toda sua história, tanto como teoria, quanto como prática, desempenhou
um papel fundamental na luta pela conquista dos direitos das mulheres. É o feminismo, também, o
responsável por formar bases para que hoje, no século, XXI, possamos imaginar velhas e novas,
diversas e diferentes formas de ser mulher. A recente abertura e expansão dos estudos literários
vêm possibilitando abordagens mais amplas que englobam temas caros à crítica cultural, como é o
caso dos estudos de minorias e de como suas memórias e narrativas podem contribuir para o
entendimento de suas identidades. No contexto da contemporaneidade, estudos e análises literárias
podem se valer da interdisciplinaridade para buscar objetos de pesquisa tidos como marginalizados
ou excluídos dos centros hegemônicos – seja no âmbito das artes ou da própria sociedade. A
“inclusão dos excluídos não é nem a suspensão das diferenças numa universalidade que as
transcende nem o reconhecimento de sua coexistência pacífica. Ela é a inclusão violenta numa forma
de comunidade sensível daquilo mesmo que a faz explodir, a inclusão numa linguagem daquilo que
escapa a essa linguagem.” (RACIÈRE, 2021, p.139). Tendo em vista o trecho acima, assim como a
discussão que permeia a obra As margens da ficção, de Jacques Racière, tentaremos nos ater aos
aspectos que fazem com que as travestis, representadas na obra de Camila Sosa Villada,
permanecem à margem da sociedade, sejam excluídas.
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malas. Tusquets: Buenos Aires, 2019.
127
Resumo: Passados mais de trinta anos da morte do escritor argentino Manuel Puig (1932-1990), sua
obra permanece instigante e relevante no cenário da literatura latino-americana. Dentre os seus oito
romances, a escolha de Sangue de amor correspondido (1982) se justifica por permitir a análise das
relações de um escritor argentino com a realidade brasileira e pelo registro das vozes periféricas. É
por meio de um relato, das lembranças de um pedreiro, que o romance é engendrado, revelando o
papel da memória como o local, tal como na escrita ficcional, onde se mesclam realidade e fantasia.
Esta comunicação abordará ainda o romance Cai a noite tropical (1988), cuja narrativa é quase toda
construída por meio dos diálogos de duas senhoras argentinas, Nídia e Luci, sobre a vida e os amores
de uma vizinha. Propõe-se a leitura da obra pelo viés da representação da vida cotidiana, que aparece
no modo como essas duas idosas experienciam a vida no Rio, no final dos anos 1980. O
reconhecimento da estranheza do mundo é realçado pelas dificuldades que elas sentem com o nosso
idioma e por apresentarem uma percepção da cidade, em que a imagem do cartão postal convive
com a violência, a desigualdade e a crise inflacionária. É a partir da análise dos "instantes banais' e
da rotina das duas idosas que Puig constrói um tocante relato sobre solidão, memória e invisibilidade
do corpo idoso. Em ambos os romances, seja na figura do pedreiro Josemar em Sangue ou nas duas
senhoras de Cai a noite, Puig põe em evidência personagens relegados à margem, contribuindo,
conforme afirma Jacques Rancière em As margens da ficção (2021), para o aparecimento de uma
democracia ficcional, na qual personagens das classes populares ganham uma nova representação
na literatura, reconhecendo-os como sujeitos capazes de experimentar e vivenciar os sentimentos
profundos e complexos.
Referências: RANCIÈRE, Jacques. O efeito de realidade e a política da ficção. Novos Estudos, São
Paulo, CEBRAP, n. 86, pp. 75-90, mar. 2010. ______. O fio perdido do romance. In: O fio perdido. São
Paulo: Martins Fontes, 2017. pp. 15- 37. RANCIÈRE, Jacques. As margens da ficção. Editora 34. São
Paulo, 2021. LEFÈBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo: Ática, 1991. BOSI,
Alfredo. Literatura e resistência. São Paulo: Cia. Das Letras, 2002. AUERBACH, Erich. Mimesis: a
representação da realidade na literatura ocidental. 7ª ed. rev. e amp. Trad. George Bernard Sperber
e equipe da Perspectiva. São Paulo: Perspectiva, 2021.
PELAS RUAS DE HAVANA: UMA MIRADA SOBRE CHAMACO, DE ABEL GONZÁLEZ MELO
Carin Cássia de Louro de Freitas
Resumo: Tendo como ponto de partida a obra "Chamaco" de Abel González Melo – dramaturgo e
diretor cubano que reside na Espanha atualmente –, este trabalho tem o intuito de traçar miradas
sobre a cena latino-americana e a pluralidade de expressões de dramaturgia emergentes na
contemporaneidade. Escrita em 2004, traduzida e encenada em diversos idiomas, "Chamaco" nos
coloca diante de personagens que vivenciam a marginalidade das ruas de Havana por meio de
diferentes pontos de vista. São figuras que, em meio às adversidades, à marginalização dos corpos,
as esperanças e os apagamentos sociais, podem ser levadas a circunstâncias extremas, nas quais a
violência surge como uma espécie de reconfiguração das narrativas. A obra de Abel González Melo
apresenta perspectivas da vida cubana de modo a expor, mas também questionar, aspectos que
envolvem gênero, juventude, a diária busca pela sobrevivência e as tensões estabelecidas na rua e
dentro dos núcleos familiares. Nesse sentido, a dramaturgia assume, de uma certa maneira, um
caráter político, ao colocar em pauta as existências e vozes desses personagens. Para além da análise
da tessitura dramatúrgica e das temáticas específicas suscitadas, propõe-se observar a presença de
questões comuns entre os países da América Latina, suas poéticas e os seus desdobramentos
históricos, sociais e políticos.
Referências: ABREU, Eberto García. Estaciones teatrales. Havana: Tablas Editora, 2016. DORT, B. O
estado de espírito dramatúrgico. Depoimento concedido a O.O. Tradução de Fátima Saad. Paris, 22
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Revisão da trad. Mônica Stahel. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
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130
também “quebrar com a naturalização da mulher como “anjo do lar”, a mãe e esposa dedicada que
servia como lente de aumento para refletir a figura masculina”. (TELLES, 2015, 401-410).
Referências: BARROS; Ana Vitoria. “A voz da mulher no século XIX” In: jornaldapuc.vrc.puc-
rio.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=5484&sid=24. Acesso: 15.01.23. FÊNIX; Maria Heloisa
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In: Revista de História e Estudos Culturais Janeiro/ Fevereiro/ Março/ Abril de 2012 Vol. 9 Ano IX nº
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reflexões para um repensar historiográfico – Rio de Janeiro e Buenos Aires, 1852-1855” In: DOSSIÊ:
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Curitiba: Editora UFPR, 2015. ETTE, Otmar. EscreverEntreMundos. Trad. Rosani Umbach, Dionei
Mathias, Teruco Arimoto Spengler. Curitiba: Editora UFPR, 2018. GUINZBURG, Natalia. Léxico
familiar. Trad. Homero Freitas de Andrade. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. GUINZBURG,
Natalia. Pequenas virtudes. Trad. Maurício Santana Dias. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
GUINZBURG, Natalia. Não me pergunte jamais. Trad. Julia Scamparini. Belo Horizonte: Âyiné, 2022.
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Referências: ACHUGAR. Hugo. Planetas sem boca: escritos efêmeros sobre arte, cultura e literatura.
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ficção. São Paulo: Editora 34, 2021.
134
momento, essas pessoas não apareceram. Isso ocorrerá à medida que ele próprio for assumindo sua
transgeneridade, demarcando a representatividade de pessoas trans nesse espaço. No primeiro ano,
mulheres pretas – em sua maioria lésbicas – foram vencedoras das batalhas. A partir das reflexões
da pensadora estadunidense Judith Butler, em “Corpos em Aliança e a política das ruas”, sobre como
algumas manifestações da urbe colocam corpos em luta pelo próprio direito de “viver e persistir, até
mesmo a florescer”, este trabalho pretende investigar o percurso traçado pelo Slam das Minas RJ
para se tornar um espaço de criação inclusivo para poetas trans e não binárias. Entre as questões
que se levantam: qual a importância desse espaço para esses poetas e de que tratam os seus poemas.
Referências: BUTLER, Judith. Corpos em Aliança e a política das ruas: notas para uma teoria
performativa da Assembleia. Tradução: Fernanda Siqueira Miguens. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2019.
135
várias tentativas para escapar da ilha, consegue autorização para deixar o país, quando passa a viver
nos Estados Unidos. Algumas passagens desse período vivenciado por Abreu compõem os
fragmentos do conto “Lixo e purpurina”, publicado em Ovelhas negras, o último livro organizado em
vida pelo escritor. Em paralelo, todo o esforço de sobrevivência de Arenas está relatado em sua
autobiografia, Antes que anoiteça, que também foi organizada quando o escritor cubano já se sabia
doente e disposto a dar fim à própria vida. Propomos analisar as diferentes representações do exílio
que são elaboradas pelos dois escritores latino-americanos e de que maneira elas permitem pensar
a relação com a doença e, também, com a literatura.
Referências: ABREU, Caio Fernando. Pequenas epifanias. Rio de Janeiro: Agir: 2006. ______. Lixo e
purpurina. In:___. Ovelhas negras. Porto Alegre: L&PM, 2002, p. 97-126. ARENAS, Reinaldo. Antes
que anoiteça. Trad. Irène Cubric. Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.
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Mercado Aberto, 2003. PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. Tradução Angela M. S.
Côrrea. São Paulo: Contexto, 2007. PRIORE, Mary del. (Org.) História das mulheres no Brasil. Carla
Bassanezi (Coord. de textos). 7. ed. São Paulo: Contexto, 2004. PRIORE, Mary del. A mulher na
história do Brasil. 4. ed. São Paulo: Contexto, 1994. (Coleção repensando a história.) SANTOS, Rita de
Cássia Silva Dionísio. Alexina de Magalhães Pinto. In: DUARTE, Constância Lima. Memorial do
memoricídio. Belo Horizonte: Editora Luas, 2022. p. 123-131. SOUZA, Eneida Maria de. “Crítica
genética e crítica biográfica”. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 45, n. 4, p. 25-29, out./dez. 2010.
Disponível em: <https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/fale/article/view/8549/6063>
Acesso em: 15 jun. 2022. SUPLEMENTO LITERÁRIO DE MINAS GERAIS. Literatura infantojuvenil.
Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais. Out. 2007. Disponível em:
<http://bibliotecapublica.mg.gov.br/pt-br/suplemento-litelario/edicoes-suplemento-
literarios/2007-1/65--65/file> Acesso em: 15 jun. 2022. TELLES, Norma. Escritoras, escritas,
escrituras. In: PRIORE, Mary del. (Org.) História das mulheres no Brasil. Carla Bassanezi (Coord. de
textos). 7. ed. São Paulo: Contexto, 2004.
O RESGATE DE UMA VIDA EXCLUÍDA NA OBRA “VOLTAR PARA CASA DE TONI MORRISON”
Samara Leal Barroso
Resumo: O objetivo deste artigo é visibilizar a condição de existência de uma mulher negra, “Ycidra”,
personagem fragilizada, conforme é apresentada, segundo a perspectiva da narrativa, referendada
pela autora Toni Morrison em sua obra “Voltar para casa”, uma vez que esta personagem passa por
inúmeras situações dolorosas, constrangedoras, conflituosas e até humilhantes, impostas por figuras
opressoras que a qualquer custo a faziam lembrar ou tentar conscientizá-la de sua condição de
subalterna, incapaz e invisibilizada com o intuito de torná-la apenas mais uma vida excluída do seio
da sociedade, por não dispor de características físicas e atributos considerados como o padrão
desejável pela sociedade elitista. É notório que Ycidra a fim de alcançar autonomia enquanto ser
humano, toma posse de si mesma, reconhece que embora sua condição fosse de mulher negra,
deveria receber o reconhecimento de ser vista como uma mulher digna de respeito, uma vez que o
tom de pele, não deveria ser o prenúncio para outorgar se uma vida é ou não valiosa, se deve ou não
ser respeitada, se pode ou não ocupar determinados espaços, se será ou não digna de merecer ou
conquistar o afeto e apreço das pessoas. É bem verdade que Ycidra precisou passar por situações de
extrema tensão, dor, medo, sofrimento, dúvidas e diversas inquietações, para poder ter consciência
de sua condição de vida e lutar veementemente por sua liberdade, respeito, aceitação e sobretudo,
nutrir um amor próprio capaz de salvar a si mesma, sem esperar que os demais o fizessem, uma vez
que apenas ela deveria ter tal tomada de consciência, pois os demais não teriam esta obrigação de
salvá-la da condição hostil em que sobrevivia, pois cada ser é responsável por seus próprios caminhos
e escolhas, e só o próprio indivíduo poderá compreender que é dono e capaz de gerir sua própria
liberdade.
Referências: DAVIS, A. Mulheres, Raça e Classe. Tradução de Heci Regina Candiani. São Paulo:
Boitempo, 2016. RIBEIRO, Djamila. Quem tem medo do feminismo negro? 1ª ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 2018. DUBOIS, W.E.B. As almas da gente negra. Tradução, introdução e notas,
HeloísaToller Gomes. – Rio de Janeiro: Lacerda Ed. 1999. 323 p. ISBN 85-7384-051-X SPIVAK, Gayatri
Chakravorty. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2010. MORRISON, Toni.
Voltar para casa. Editora Companhia das Letras, 2016.
137
contemporaneidade em que confluem questões das ordens dos planos da ética e da estética: como
representar e introduzir as vozes populares, como dar conta das vidas e das ações das personagens
dos setores pertencentes a um mundo social que não é o próprio dos escritores, sem que essa
distância reafirme prejuízos e interpretações negativas sobre o Outro social? No contexto atual da
América Latina o estudo das escritas de crônicas como as de Leila Guerriero requer prestar atenção
as poéticas dos novos realismos e ao mesmo tempo considerar os procedimentos de autofiguração
do escritor cronista e a legitimidade da ficção no registro do real. Levamos em conta os estudos de
M. Bakhtin, C. Ginzburg e R. Schwarz e de W. Benjamin.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento. O contexto de
François Rabelais. (Trad. Yara Franteschi Vieira) São Paulo: Hucitec, 1987. ¨------------. Questões de
literatura e de estética. A teoria do romance. São Paulo: Hucitec, 1988 BENJAMIN,
Walter.“Experiência e pobreza” In: OBRAS ESCOLHIDAS. Vol. 1. Magia e técnica, arte e política.
Ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad. Segio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1987.
CÁMARA, Mario. Nuevos territorios: vida, literatura y subjetivación. Revista Iberoamericana.
Pittsburgh, Año 2017. Vol. LXXXX. P. 801-813. Schwarz, Roberto (Org.) Os pobres na literatura
brasileira.
138
destacando a grande motivação dos autores de repor tais ausências, representificando o que foi
deletado ao longo de décadas. Entre os autores que dão sustentação teórica ao trabalho encontram-
se Aleida Assmann, Fernando Catroga, Patrick Chamoiseau e Edouard Glissant. As bases teóricas dse
estruturam a partir do que poderíamos chamar de POética da Ausência, com ênfase para o destaque
de textos das literaturas interamericanas que se inspiram na recuperação de linguagens esquecidas
e de identidades suprimidas, incluindo-se comunidades escravas, indígenas e em situação de
vulnerabilidade. A proposta desse paper é q a de ilustrar através de 3 obras litera'rias atuais,
produzidas no contxtos das Américas os processos de opacificação e apagamento de tais
comunidades assim como a intenção dos autores de recuperar as marcas, os vestígios do que sobrou
desses sucessivos processos de apagamento. Através da representificação de tais personagens e suas
histórias, a literatura exerce a importante tarefa de dar visibilidade ao que ficara esquecido por anos
e até séculos.
Referências: ASSMANN, Aleida. Formas e transformações da memória cultural. Campinas: Unicamp,
2011. BERND, Zilá. Inventário de ausências. Porto Alegre: editora ZOUK, 2022. CATROGA, Fernando .
Os passos do homem como restolho do mundo. Coimbra: Almedina, 2009. CHAMOISEAU, Patrick. La
matière de l'absence: Paris: Seuil, 2016. GLISSANT, Edouard. Poétique de la relation. Paris: Galimard,
1990.
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Dossiê Esperança Garcia: símbolo de resistência na luta pelo direito. Teresina: EDUFPI, 2017.
WALKER, Alice. Em busca dos jardins das nossas mães: prosa mulherista. Trad. Stephanie Borges. Rio
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errâncias territoriais e textuais. Belo Horizonte: Departamento de Letras Românicas, Poslit,
FALE/UFMG, 2002. MERCÊS, Calila. Calila das Mercês Oliveira. Movimentos e (re)mapeamentos de
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autoras negras brasileiras (1859-2006): posse da história e colonialidade nacional confrontada. Tese
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eletrônico]: carta às que vivem e vibram apesar do Brasil / Jota Mombaça. - 1. ed. - Rio de Janeiro:
Cobogó, 2020. NASCIMENTO, Beatriz. Beatriz Nascimento, Quilombola e Intelectual: possibilidade
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2006. SANTIAGO, Silviano. Deslocamentos reais e paisagens imaginárias – o cosmopolita pobre. In:
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Cricelli. São Paulo: Editora Nós, 2018.
DOS PÉS ESCUROS QUE PRECISAM SER AMADOS: POR UMA CRÍTICA LITERÁRIA DOS PEQUENOS
GESTOS ORDINÁRIOS NA LITERATURA DE AUTORIA NEGRA
Fernanda Silva e Sousa
Resumo: No início de Quarto de Despejo (1960), Carolina Maria de Jesus escreve “Aniversario de
minha filha Vera Eunice. Eu pretendia comprar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos gêneros
alimentícios nos impede a realização dos nossos desejos”. Sem condições de comprar, ela lava e
remenda um sapato que encontra no lixo para presentear a filha. Em 2015, após a chacina de doze
jovens negros pela polícia militar no bairro do Cabula, em Salvador (BA), a poeta Lívia Natália, movida
por um “extremo sentimento pelos mortos” (Domeneck, 2016), escreveu o poema “Quadrilha”,
publicado em Correntezas e outros estudos marinhos (2017), que diz: “Maria não amava João, /
Apenas idolatrava seus pés escuros / Quando João morreu, / assassinado pela PM / Maria guardou
todos os seus sapatos”. Diante da violência racial, que parece interditar o reconhecimento das
dimensões ordinárias da vida da população negra, fabular criticamente é lançar um olhar demorado
e cuidadoso para acontecimentos e ações que, no campo da história, exigem uma imaginação radical,
mas que na literatura de autoria negra brasileira aparecem sem pedir licença: pequenos gestos
ordinários de delicadeza e beleza que, embora não desvinculados de uma estrutura violenta,
sustentam vidas que não se limitam à resistência. À luz disso, a partir de uma leitura do poema
“Quadrilha”, em diálogo com a abertura de Quarto de despejo, argumentaremos que dar sapatos
remendados para a filha em seu aniversário e guardar os sapatos de um homem morto pela polícia
são pequenos gestos que precisam tomar à frente no exercício da crítica literária contemporânea,
anunciando uma trama de afetos, anseios e possibilidades que, ao serem imaginados, abrem espaço
para o reconhecimento da vida negra como insondável e bela, sobretudo quando parece não haver
nada mais para ser dito ou encontrado além da violência.
Referências: BUTLER, Judith. Quadros de guerra: Quando a vida é passível de luto? 7ª ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2015. DOMENECK, Ricardo. "Lívia Natália". Revista modos de usar &
co, 16 fev. 2016. Disponível em: <http://revistamododeusar.blogspot.com/2016/02/livia-
natalia.html>. Acesso em 7 jan. 2023. HARTMAN, Saidiya. Vênus em dois atos. Revista ECO-Pós, Rio
de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 12–33, 2020. HARTMAN, Saidiya. Vidas rebeldes, belos experimentos:
histórias íntimas de meninas negras desordeiras, mulheres encrenqueiras e queers radicais. São
Paulo: Fósforo, 2022. JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. São
Paulo: Ática, 2004. NATÁLIA, Lívia. Correntezas e outros estudos marinhos. Salvador: Ogum’s Toques
Negros, 2015. QUASHIE, Kevin. Black Aliveness, or a Poetics of Being. Durham: Duke University Press,
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2021. QUASHIE, Kevin. The Sovereignty of Quiet: Beyond Resistance in Black Culture. New Brunswick,
N.J.; London: Rutgers University Press, 2012. SHARPE, Christina. In the Wake: On Blackness and
Being. Durham: Duke University Press, 2016. WISSENBACH, Cristina Cortez. Da escravidão à
liberdade: dimensões de uma privacidade possível. In: SEVCENKO, Nicolau. História da vida privada
no Brasil. v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
143
metodológicos que balizam o diálogo entre as narrativas partem de um marco teórico do
pensamento negro decolonial e da categoria de amefricanidade,. Entre outros autores, destacam-se
Conceição Evaristo (2016), Lélia Gonzalez (2018), Cida Bento (2022), Achille Mbembe (2018), Saidiya
Hartman (2021), Grada Kilomba (2018) e Rita Segato (2021). A argumentação afirma a construção de
um projeto literário ancorado na concepção de cura ancestral e da fabulação crítica em torno da
nação (HARTMAN, 2021), em que é preciso, no trabalho com e contra o passado, a criação de um
futuro com dignidade (MBEMBE, 2018). Eliana Alves Cruz, com poucos documentos disponíveis e
sensibilidade diante dessa falta, faz a ficcionalização do passado em um processo de transposição de
arquivos para a construção de subjetividades irrecuperáveis, mas reafirmando as suas existências.
Referências: BENTO, Cida. O pacto da branquitude. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.
EVARISTO, Conceição. A escrevivência e seus subtextos. In: DUARTE, Constância Lima; NUNES,
Isabella Rosado (Orgs.). Escrevivência: a escrita de nós: Reflexões sobre a obra de Conceição Evaristo.
Rio de Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020. p. 26-46. CRUZ, Eliana Alves. Água de barrela. Rio de
Janeiro: Malê, 2018. CRUZ, Eliana Alves. Solitária. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. GONZALEZ,
Lélia. A categoria político-cultural de amefricanidade. In:_____. Por um feminismo afro-latino-
americano: ensaios, intervenções e diálogos. Rio de Janeiro: Zahar, 2020. p. 127-138. HARTMAN,
Saidiya. Perder a mãe: uma jornada pela rota atlântica da escravidão. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,
2021. KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janiero:
Cobogó, 2019. MBEMBE, Achille. Crítica da razão negra. São Paulo: n-1 edições, 2018. SEGATO, Rita.
Crítica da colonialidade em oito ensaios: e uma antropologia por demanda. Rio de Janeiro: Bazar do
Tempo, 2021.
144
de construção de subjetividade desse indivíduo. Dentro da literatura contemporânea brasileira, a
personagem Kehinde, do romance Um defeito de cor de Ana Maria Gonçalves, representa as
contradições típicas desse sujeito diaspórico. Um sujeito deslocado que busca resgatar e construir
territórios simbólicos e materiais. Kehinde, com seus deslocamentos dentro do romance, constrói
múltiplos territórios, que são frutos de sua experiência enquanto ser em diáspora. Todos esses
deslocamentos evidenciam a pluralidade cultural sob a qual o Brasil se constituiu e como o signo
escravidão permeia todas as relações entre os diferentes estratos sociais. Os arranjos culturais
típicos da diáspora, as ressignificações, as estratégias de sobrevivências e as formas de reelaborar as
culturas de origem são as bases sob as quais os indivíduos em diáspora se colocam nesse novo
mundo. Existir nesse espaço de disputas, de interseções e de deslocamentos exige desse sujeito
deslocado estratégias diversas. Partindo desse viés analítico é possível fazer uma cartografia dos
lugares percorridos por Kehinde tendo como foco os conceitos de territorialidade e
multiterritorialidade de Rogério Haesbert, assim como a noção de ambivalência e de nação proposta
por Homi K. Bhabha, associada às reflexões teóricas de Luiz Antônio Simas e Luiz Rufino. Dessa forma,
pretende-se nessa comunicação traçar uma breve análise desses deslocamentos que permeiam a
narrativa dessa personagem diaspórica.
Referências: BHABHA, Homi K. O local da cultura. Trad. Myriam Ávila [et al]. Belo Horizonte: Editora
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146
(Hartman, 2020), ao mesmo passo que se apresentam, talvez como falha da narração, como
denuncia da morte mas também da vida na herança-oralitura que a personagem Ponciá, que dá
nome ao livro, recebe de seu avô que fora escravizado.
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palavras. Escrevivência: a escrita de nós - Reflexões sobre a obra de Conceição Evaristo, Rio de
Janeiro, Mina Comunicação e Arte, p. 114-133, 2020.
147
narrativas com figuras heroicas estão presentes na história da humanidade desde os tempos
primitivos. Desde o mundo do homem dito não civilizado ao contemporâneo, personagens heróis se
fazem presentes no contexto da sociedade. Investigar como se dá a trajetória e constituição do herói
(padrão ou não) presente em Lunga, por meio da obra cinematográfica Bacurau (2019) dos diretores
Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles é o objetivo geral deste trabalho além do objetivo
específico de compreender a existência de arquétipos enquanto fenômeno do inconsciente coletivo
com foco na figura do herói, dentre outros. O herói em evidencia é investigado à luz das referências
bibliográficas principais: O herói de mil faces de Joseph Campbell (1997) e O Poder do Mito (1991)
também do mesmo autor. Os arquétipos e o inconsciente coletivo (2014) e O Homem e seus
Símbolos (2016,) ambas as obras de Carl Gustav Jung a fim de alcançar a compreensão do
questionamento central da pesquisa. Em desenvolvimento, a pesquisa aponta, até o momento,
relação dialógica entre o homem e seus heróis concatenados aos valores éticos e morais, revelando
complexidades do inconsciente coletivo.
Referências: ALBUQUERQUE, Gregório Galvão. Lunga, O Herói da Insurgência em Bacurau. In:
Trabalho Necessário (UERJ), v. 19, n. 40, set. / dez. 2021. BACURAU. Direção: Kleber Mendonça Filho,
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148
mostrar nesse trabalho. Em nosso modo de ver, o movimento intertextual se dá, principalmente em
dois âmbitos: personagens e procedimento literário/fílmico. Pretendemos estabelecer as relações
entre os personagens Zizo e Dom Quixote, Pazinho e Sancho Pança, Eneida e Dulcineia. Zizo, assim
como Dom Quixote é possuído por uma loucura sublime ao querer transformar sua realidade
circundante. Ao seu lado está Pazinho, seu amigo e interlocutor, tal qual Sancho Pança em relação a
Dom Quixote. Finalmente, temos Eneida, que, assim como Dulcineia, é a mulher inacessível e
descendente das heroínas literárias. O procedimento literário/fílmico, ao qual nos referimos
anteriormente, é o que podemos chamar de “a história dentro da história”. Cervantes insere a
primeira parte do seu Dom Quixote na segunda, assim como Cláudio Assis introduz seu filme dentro
do próprio filme.
Referências: A FEBRE do rato. Direção: Cláudio Assis. Roteiro: Hilton Lacerda, 2012. Disponível na
Netflix. BARROS, José D’Assunção, Os Trovadores Medievais e o Amor Cortês, Reflexões
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149
Francisco Claudio Alves Marques
Resumo: A (des)construção verbal de “territórios” imaginários como fortalezas, castelos, sítios e
lagoas era um expediente poético bastante comum entre poetas de cordel, repentistas e cantadores
do Nordeste brasileiro, pelo menos entre o final do século XIX e início do XX, conforme se tem notícia.
Esses territórios poéticos, denominados “marcos”, vão sendo verbalmente demolidos à medida que
um cantador lança provocações ao seu rival de modo que, durante o debate, ambos procuram
demonstrar sua superioridade na arte de compor em verso. Aquele que consegue desconstruir com
maior eficácia o “marco” edificado verbalmente pelo outro, é considerado o vencedor da peleja,
sendo, por isso, aplaudido e eleito pelo público ouvinte como o poeta mais habilidoso no trato do
verso e da rima. Nesta comunicação pretendemos demonstrar que, além de se apresentar como uma
oportunidade para que os artistas nordestinos demonstrem suas habilidades na arte de narrar em
versos, o “marco” poético também se constitui como um território em que os rivais da voz exibem
sua capacidade de cantar “ciência” – conhecimento adquirido no acesso a compêndios escolares,
jornais e almanaques –, apontando para o fato de que tanto poetas de cordel como cantadores se
apropriam de textos da literatura erudita para alinhavar suas composições.
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Marco (1870-1930). São Paulo: alameda, 2020. LEWIN, L. Um conto de dois textos: oralidade, história
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superioridade étnica – tentam desmobilizar o adversário (negro) se utilizando de representações que
vão do insulto à depreciação física e moral, erguendo uma espécie de dique à sua ascensão social e
ao reconhecimento de suas habilidades poéticas. Por outro lado, cantadores negros que resistem se
utilizando das mesmas armas poéticas do adversário com a finalidade de reverter os efeitos nefastos
do poder e da violência simbólica exercida arbitrariamente na interlocução poética e, por extensão,
no âmbito da sociedade estabelecida no Nordeste brasileiro no período pós-Abolição.
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poético em O Desafio de Romano e Inácio em Patos (1874). In: MARQUES, A. C. (Org.). Conflitos,
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Horizonte: Editora UFMG, 2010.
153
e separações, de aproximações e de distanciamentos, de desvios e de encontros. Essas considerações
sugerem que reconheçamos, quando se trata da literatura em perspectiva comparada, que todo
texto literário supõe uma determinada compreensão do que está acumulado na cultura (literária ou
não), de modo que devemos enfrentar a literatura sempre como um processo de relações entre
obras e entre essas e o mundo. Com base nesses princípios básicos da Literatura Comparada é que
nos propusemos cotejar, as recolhas de textos poéticos do escritor cearense Juvenal Galeno,
reunidos na coletânea Lendas e Canções Populares, cuja primeira edição é datada de 1865, com os
textos poéticos de Patativa do Assaré, publicados na coletânea Inspiração Nordestina, em 1956, com
vistas ao estabelecimento de confluências e divergências na representação do sertão e do
“sertanejo” e de seu universo sociocultural. Mais que comparar a produção poética de Galeno e
Patativa, na perspectiva aventada, pretendemos destacar a importância e o papel desenvolvidos
pelos referidos poetas na cena cultural brasileira entre o final do século XIX e primeiras décadas do
XX.
Referências: ANDRADE FILHO, João Batista de. Juvenal Galeno e suas canções populares: reflexo do
propósito educacional romântico sob os auspícios do Espiritualismo Eclético (1836-1889). Tese de
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a obra de Conceição Evaristo. Rio de Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020.
156
peça de teatro cria e recria um determinado universo de referência, onde se inscrevem os
personagens, seus traços particularizadores e suas esferas de ação. A partir da década de 1960, o
processo da renovação da linguagem teatral (aliado às transformações de ordem econômica, política
e social) trouxe subsídios para a criação de novas e potenciais possibilidades de realização cênica no
Brasil. Acompanhando esse processo, o discurso teatral vem sendo alvo de estudos sistemáticos no
universo acadêmico, seja no plano da forma, seja no plano do conteúdo. Reflexões desde Aristóteles
até a ruptura com o teatro tradicional, sobretudo nos moldes da chamada “peça bem-feita”, são
pontuados em trabalhos científicos. Nesta comunicação, o destaque é a obra "O infeliz jovem rei",
primeira peça do dramaturgo gaúcho Valter Sobreiro Junior, datada de 1962. Dividida em dois atos
e seis cenas, o drama "O infeliz jovem rei" estreou em 1963 no 2º Festival de Teatro de Pelotas,
atingindo considerável sucesso, o que rendeu a Sobreiro Junior vários prêmios. Por meio da
materialidade do texto dramático, podemos pensar em suas implicações e desdobramentos para a
compreensão do autor e, por extensão, de sua produção cultural. Com efeito, "O infeliz jovem rei"
possibilita ao leitor/espectador refletir sobre a condição de “ser e estar no mundo” a partir das
inquietantes e instigantes batalhas (com um plus de existencialismo sartriano) que o jovem príncipe
(depois rei) trava consigo mesmo.
Referências: BALL, David. Para trás e para frente: um guia para leitura de peças teatrais. Trad. de
Leila Coury. São Paulo: Perspectiva, 2009. CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de
símbolos: mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores, números. Edição revisada e
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157
protestante Jean Taffin (1529-1602) no qual subverte os limites impostos ao seu sexo por sua própria
religião; (2) Aemilia Lanyer (1569-1645) escreveu uma coleção de poemas recontando a história da
Paixão de Cristo pela perspectiva feminina e fazendo uma defesa de Eva, questionando convicções
misóginas com a determinação de defender todo o sexo feminino. Meu objetivo é analisar tais textos,
explorando as diferentes estratégias de subversão por elas usadas, ajudando a divulgar, desta forma,
obras tão importantes para a História da Literatura.
Referências: LANYER, Aemilia. Salve Deus Rex Judaeorum. Londres: Vallentine Simmes, 1611.
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Doutor Fausto. Trad. de Herbert Caro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. MANZATTO, Antonio.
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162
Resumo: Evelyn Underhill, em Mysticism (1911), afirma que a procura por um caminho espiritual de
retorno a um estado de “verdade absoluta” caracteriza o misticismo. Da busca que Cecília Meireles
e Clarice Lispector fizeram por uma saída para o eu nasceram suas obras de teor místico, abordando
contornos do que esta denominou “a própria coisa” e aquela “Absoluto”. Além do estudo das
religiões afro-brasileiras, a poeta se aprofundou no hinduísmo, budismo e misticismo judaico,
colhendo elementos que ganharam forma em sua obra. Cecília foi uma das pioneiras no relato da
experiência de pico (Abraham Maslow, 1964) a partir do olhar da mulher, o ponto final dessa
investigação é a descoberta do silencioso indizível, fonte de toda a imaginação/criação. Por sua vez,
Clarice nutriu grande interesse pelo misticismo judaico e pela obra de Baruch Spinoza; livros como A
maçã no escuro (1961) e A paixão segundo G.H (1964) exploram o tema da experiência do limite e o
enfrentamento de um “cheio-vazio” se configura como centro da caminhada mística.
Paradoxalmente, apenas a linguagem literária dá conta de narrar os contornos do vazio e do indizível.
Sendo assim, ao considerar a inclinação investigativa dessas grandes personalidades de nossa
literatura, a presente comunicação objetiva mostrar os resultados de um estudo comparado entre o
livro Canções (1956), de Cecília Meireles, e A paixão segundo G.H (1964), de Clarice Lispector.
Observa-se o caminho percorrido pelo eu lírico do primeiro e pela narradora do segundo, verificando
como é representada a experiência mística nessas obras. Além disso, são ressaltados trechos dos
poemas e do romance a fim de observar relações intertextuais com textos religiosos. Chega-se à
conclusão de que, nos dois livros, a caminhada mística se dá pela jornada através do vazio e do
silêncio. Por fim, apresenta-se uma reflexão sobre o aporte teórico usado no estudo.
Referências: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. Poesia e Estilo de Cecília Meireles. Rio de Janeiro:José
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164
habitual em certo sentido uma “vida as avessas”, um “mundo invertido.” (BAKTHIN, 2010, p. 140)
Algo, ao nosso ver, explícito nas obras tomadas como objeto desse estudo. Ambas apresentam o que
Bakthin definiu por categorias da carnavalização: contato familiar entre os homens, Excentricidade,
Mesalliance e Profanação. Elementos trazidos por Machado de forma a inverter o discurso bíblico, a
partir da paródia, do riso, do grotesco, mostrando o bem e o mal numa vertente ético-existencial.
Toda análise que permeia essa discursão parte então de uma pesquisa bibliográfica, com ênfase na
busca por fontes primárias, ou seja, anais, teses, dissertações, livros, etc. Quanto a natureza,
podemos defini-la como qualitativa, uma vez que o resultado é expresso por meio de uma análise
crítica e literária, numa associação de conceitos e ideias. Pensar sob o viés da carnavalização é uma
forma de mostramos que os discursos oficiais, são apenas uns entre muitos outros.
Referências: ASSIS, Machado de. Contos essenciais. São Paulo: Martin Claret, 2019. ASSIS, Machado
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UFRGS/UNESP, 2000.
165
Resumo: Este trabalho propõe-se a investigar como as manifestações do sagrado, em suas
construções metafóricas e simbólicas, encontram eco na poesia contemporânea de Língua
Portuguesa, tendo por base a obra do poeta carioca Alexei Bueno. Pode parecer paradoxal pensar a
presença do sagrado, que remete ao eterno, na sociedade contemporânea, tão bem definida por
Bauman como “líquida”. Seria possível conceber a perenidade na fluidez? Ao analisar a atual lírica
brasileira percebe-se que sim, pois é fácil constatar em muitos poemas a busca por uma conexão
com algo que habita na esfera do etéreo, ou seja, trata-se de um corpus poético de natureza profana
que evoca temáticas relacionadas ao divino. Isso porque, na atualidade, alguns poetas fazem da
ausência (ou presença) de deus(es) uma matéria poética. Com efeito, o poema, assim como os
antigos mitos, por possibilitar a interrupção temporária da visão prosaica do mundo, realiza uma
fissura no tempo e no espaço que enseja o encontro do homem com uma realidade outra. É isso que
leitor experimenta ao folhear as páginas da lírica bueniana, onde as deidades antigas passeiam com
naturalidade em meio à paisagem urbana. Essa pesquisa de cunho bibliográfico tem por objetivo
compreender como um poeta contemporâneo articula novos sentidos à antiga relação entre a
literatura e os deuses. Ressalta-se que o texto de Alexei Bueno ao dialogar com as divindades,
especialmente as da cultura helênica, mais que utilizar tais figuras como vazios ornamentos
literários, vale-se delas como recurso para tecer suas reflexões sobre a realidade de seu tempo.
Referências: BUENO, Alexei. Poesia Reunida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003. BUENO, Alexei. A
árvore seca. Rio de Janeiro: G. Ermakoff Casa Editorial, 2006. BURKERT, Walter. Greek religion.
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noção do divino e sua relação com o racional. Tradução Walter O. Schlupp. Petrópolis: Vozes, 2007.
OTTO, Walter F. Teofania: o espírito da religião dos Gregos antigos. Tradução de Ordep Trindade
Serra. São Paulo: Odysseus Editora, 2006. PAZ, Octavio. O arco e a lira. Tradução Ari Roitman e
Paulina Wacht. São Paulo: Cosac Naify, 2012. SPINA, Segismundo. Na madrugada das formas
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gregos: estudos de psicologia histórica. Tradução Haiganuch Sarian. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1990.
VERNANT, Jean-Pierre. O universo, os deuses, os homens. Tradução Rosa Freire d’Aguiar. São Paulo:
Companhia das Letras, 2000.
166
em versos sua forma subjetiva de compreender o corpo doutrinário ao qual se associam. •
Espiritismo Literário – poemas escritos por não adeptos do Espiritismo, mas que trazem em si temas
que podem ser a ele associados. Cada uma dessas modalidades possui aspectos específicos que
precisam ser detalhados e repensados para que se possa estabelecer a identidade desta Poesia
Espírita bem como seu lugar no cânone e nos estudos literários.
Referências: • AIZPURUA, Jon. El Espiritismo y la creación poética. Caracas, Venezuela: CIMA, 1993.
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https://archive.org/details/lecontefantastiq0000cast/page/n7/mode/2up?view=theater • CUNHA,
Eneida Leal. “Literatura e identidade”. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ. Revista do
Centro de Estudos Portugueses Hélio Simões. Ilhéus, BA: Editus, nº 01, 1998, p. 175-189. Disponível
em https://www.academia.edu/49118997/Literatura_e_Identidade • FOUCAULT, Michel. “O que é
um autor?” In: Ditos e escritos III - Estética: Literatura e Pintura, Música e Cinema. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2006. pp. 264-298. • FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL. Poesia Sempre. Rio
de Janeiro: FBN, 8, jun. 1997. • KARDEC, Allan. “Estudo sobre a poesia medianímica” (Étude sur la
poésie médianimique). In: VAVASSEUR, L. Ecos poéticos d’além tumba (Échos Poétiques d’Outre
Tombe). Trad. de Nereu Mello. São Paulo: Lar da Família Universal, 2001. • ______. O livro dos
Espíritos (Le livre des Sprits). Trad. de Guillon Ribeiro. Rio de Janeiro: FEB. 2004. • ______. Revista
Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos – 1858 (Revue Spirite - Journal d'études psychologiques).
Trad. de Evandro Noleto de Bezerra e Inaldo Lacerda Lima (poemas). Rio de Janeiro: FEB, 2004. •
______. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos – 1859 (Revue Spirite - Journal d'études
psychologiques). Trad. de Evandro Noleto de Bezerra e Inaldo Lacerda Lima (poemas). Rio de Janeiro:
FEB, 2004. • ______. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos – 1860 (Revue Spirite - Journal
d'études psychologiques). Trad. de Evandro Noleto de Bezerra e Inaldo Lacerda Lima (poemas). Rio
de Janeiro: FEB, 2004. • LEAL, Julio Cezar. O Espiritismo – Meditações poéticas sobre o mundo
invisível acompanhadas de uma evocação. Penedo: Tipografia do Penedense, 1869. 16p. • LOBO,
Luiza. Guia de escritoras da literatura brasileira. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2006. • PINHEIRO, Tobias.
“Espiritismo e Poesia”. In: RAMOS, Clóvis (org.). Antologia de Poetas Espíritas. Rio de Janeiro: Irmão
Pongetti, 1959. Disponível em https://garimpo-poesia.blogspot.com/p/e-books.html • RAMOS,
Clóvis (org.). Antologia de Poetas Espíritas. Rio de Janeiro: Irmão Pongetti, 1959. Disponível em
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brasileira. Rio de Janeiro: Sabedoria, 1969. • ROCHA, Alexandre Caroli. O caso Humberto de Campos:
autoria literária e mediunidade. Tese de doutorado. Campinas, SP : [s.n.], 2008. • ROMERO, Silvio.
Machado de Assis – Estudo Comparativo de Literatura Brasileira. Rio de Janeiro: Laemmert C.
Editores, 1897. Disponível em http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/01615800 • SILVA,
Vitor Manuel de Aguiar e. Teoria da Literatura – Vol. I. 4ª ed. Coimbra: Livraria Almeida, 1982.
167
“sentido infernal ou diabólico”. Mesmo a feitura do livro de iluminuras, realizado através de uma
técnica inovadora de gravura em metal, referida por Blake como “método infernal” é reveladora da
pretensão inquisitiva de Blake, já que através de seus “agentes corrosivos que, no Inferno, são
saudáveis e medicinais”, o autor pretendia “[solver] superfícies visíveis e expondo o infinito antes
oculto” (BLAKE, 2020)
Referências: BLAKE, William. The William Blake Archive. Disponível em:
http://www.blakearchive.org/blake/. Acesso em 10 mai. 2019. BLAKE, William. Visões.São Paulo:
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Symmetry: A Study of William Blake. Princeton: Princeton University Press, 1947. FRYE, Northrop. O
Grande Código: a Bíblia e a Literatura. Campinas, Sétimo Selo, 2021. FRYE, Northrop. O Poder das
Palavras: Bíblia e a Literatura II. Campinas, Sétimo Selo, 2021. PALEY, Morton D. "A New Heaven Is
Begun": William Blake and Swedenborgianism. Blake: An Illustrated Quarterly, [S.l.], v. 13, n. 2, p. 64-
90, fall 1979. Disponível em: http://bq.blakearchive.org/13.2.paley. Acesso em: 18 ago. 2020. RAINE,
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168
NENHUM PARAÍSO RECONQUISTADO: A HERMENÊUTICA FENOMENOLÓGICA DE NORTHROP FRYE
José Luiz Coelho Rangel Junior
Resumo: Com a publicação de The Great Code, em 1981, o escritor e crítico canadense Herman
Northrop Frye (1912-1991), passou a ser referência incontornável para os estudos que relacionam
literatura e religiosidade. No entanto, os dois livros posteriores dedicados ao assunto, Words with
Power (1990) e The Double Vision (1991), foram considerados ainda mais importantes, tanto pelo
autor quanto por aqueles que se dedicam a analisar seu trabalho, em razão de serem obras mais
bem resolvidas sob o ponto de vista da relação literatura/religião. De fato, Frye abre Words with
Power confessando que The Great Code era uma obra “muito vulnerável”. Além disso, como o
próprio autor afirma, a obra de 1990 “coloca mais ênfase na teoria crítica e tenta reexaminar a Bíblia
num nível em que sua conexão com a tradição literária se torna mais abrangente” (FRYE, 1990, p.
xii). No entanto, fora dos círculos restritos de estudos da obra do autor, é ainda menos notório que
o final do percurso intelectual de Frye – que suscitou releituras de seu trabalho como crítico da
cultura e da religião –, na verdade, ata as pontas de sua carreira. Ou seja, desde The Great Code,
passando por Words with Power e The Double Vision, Frye retoma o trabalho iniciado com seu
primeiro livro, Fearful Symmetry, de 1947, que, então, apresentava uma inovadora leitura de William
Blake . Este trabalho, portanto, se propõe a analisar as relações entre início e fim da obra do crítico
canadense, partindo de dois conceitos centrais da crítica de Frye, o que autor chamou de “nudez
dissimulada” e “interpenetração”. Utilizam-se estes dois conceitos como fios condutores para se
chegar ao lugar dado pelo autor à literatura, no interior da sociedade, e as relações entre a linguagem
poética, religião e ideologia.
Referências: FRYE, Northrop. Fearful Symmetry, a study of William Blake. Princeton, NJ: Princeton
University Press, 1974. ________. O Códigos dos Códigos: a Bíblia e a Literatura. Lisboa: Edições 70,
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Penguin.
170
Virgem e outras tantas sobre a vida de Cristo. Com a ampliação do cancioneiro alfonsino,
especialmente na sua versão mais longa com quatrocentas composições (E), o número de cantares
sobre festas marianas aumenta para um total de doze, desaparecendo as cinco cantigas crísticas
(Schaffer 2000). As diferentes formas de organização das composições finais das Cantigas de Santa
Maria permitem especialmente encontrar ecos com a configuração do Rosário, forma de oração que
se cristaliza sobretudo a partir do século XIII (Torres Jiménez 2017). Esta apresentação avalia como
o acrescento, reordenamento e subtração de composições nos diferentes testemunhos revelam, a
seu modo, (re)configurações de mistérios do Rosário influindo na interpretação global de cada uma
das compilações.
Referências: Disalvo, Santiago (2012), "Los VII goyos de la Virgen en las Cantigas de Santa María y la
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poética de Adélia Prado. Trata da análise de três poemas do primeiro livro da autora, "Bagagem"
(1976), a saber: "Um salmo", "Canção de amor" e "Fé". Dispõe sobre a profícua presença em seus
versos dos elementos bíblicos e religiosos de matriz cristã. Tais elementos se apropriam de diversas
manifestações, por meio de referências a fatos bíblicos vetero e neotestamentários ou de discussões
filosóficas acerca da existência de Deus e de outros fundamentos da fé, significados pelas
proposições teológicas do campo religioso cristão e do pensamento poético-teológico. "Bagagem"
delineia as características básicas do trabalho da poetisa, cuja vertente que mais interessa a este
trabalho é a forte influência bíblica e a perspectiva existencial de uma vida de esperança, marcada
contraditoriamente também pelo reconhecimento de suas tristezas, dentre elas, a morte. As análises
e comentários críticos sobre o corpus recorrem a fontes variadas da fortuna crítica da autora, em
especial Angélica Soares (2005) e Silvana Pinheiro (2019; 2021), além de dialogar com o pensamento
de Teilhard de Chardin (2005) e as discussões sobre teologia e literatura delineadas por Alex Villas
Boas (2016), bem como com a proposta filosófico-existencial de Viktor Frankl (2003).
Referências: BOAS, Alex Villas. Teologia em diálogo com a literatura: origem e tarefa poética da
teologia. São Paulo: Paulus, 2016. CHARDIN, Pierre Teilhard de. Sobre a felicidade; sobre o amor.
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175
o sentimento de solidariedade em personagens que mesmo empobrecidas, excluídas e dilaceradas
pela dor, não se eximem de ajudar seus semelhantes. A narrativa de Evaristo explora a dimensão
interna da experiência negra a partir da representação de redes de apoio, que influenciam os
membros do grupo retratado, sejam os mais velhos, ou mais jovens, todos são atravessados pela
herança cultural que os une. O estudo é fundamentado nos pressupostos teóricos de Lugones (2020),
Munanga (2015), Quijano (2005), Ribeiro (2017), dentre outros autores que me ajudam a entender
que o caminho para a sobrevivência é trilhado a partir da escuta das vozes ancestrais, pois a garantia
do futuro se dá com o auxílio delas.
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177
ENGENHOSA, MAS CHEIA DE SI E DE ESQUECIMENTO: A ESCRITA NA CONTRA-ETNOGRAFIA DE
DAVI KOPENAWA A RESPEITO DOS BRANCOS
Janaina Tatim
Resumo: Pretendo analisar a escrita como um tema-chave nas interpretações especulativas que o
xamã yanomami Davi Kopenawa faz de sua alteridade, os chamados “brancos”, no livro A queda do
céu (2010[2015]). Tendo por referência a cosmologia Yanomami, especialmente o xamanismo,
Kopenawa elabora uma crítica de sua alteridade a partir da comparação entre a transmissão da
palavra/pensamento na tradição oral, pelo corpo, e a replicação da palavra/pensamento pelos
“desenhos de escrita”. Apesar da particularidade de sua perspectiva, encontramos a homonímia de
termos em seu discurso e em algumas das fontes da filosofia ocidental de orientação dicotômica
entre interno/alma/logos como verdadeiro e externo/corpo/escrita como falso. As homonímias
permitem o desdobramento de equivocidades na compreensão de Kopenawa acerca da escrita, em
que termos e noções que parecem as mesmas se organizam com valores outros. No discurso de
Kopenawa, se ausenta a dicotomização dos termos, e se presentificam outros fatores
epistemológicos que (se) defendem (n)os valores firmados pela oralidade e contestam a supremacia
da escrita, denunciando uma espécie de narcisismo crônico em sua alteridade, o qual atrofia a
capacidade de (re)conhecer o que seja diferente de si, de seu próprio pensamento. Em sua contra-
etnografia, é marcante a percepção de que os brancos são capazes apenas de enxergar o outro e de
ouvir/entender palavras outras se elas estiverem escritas, por isso Kopenawa enxergou nas peles de
papel um espaço estratégico a ser ocupado por suas palavras. Embora os desenhos de escrita nunca
darão conta de mostrar o que veem os xamãs, Kopenawa acredita que por meio deles suas palavras,
que são outras, em seu dizer, possam alterar o pensamento dos brancos. Analisando pontualmente
entrechos do livro, meu intuito é expandir as chances de recepção do pensamento crítico de Davi
Kopenawa entre aqueles por quem ele gostaria de ser ouvido.
Referências: DERRIDA, Jacques. A gramatologia. São Paulo, Perspectiva, 1973. KOPENAWA, Davi;
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179
agrária e a subjugação do corpo feminino. Mulher e terra são propriedades. A retórica da
colonialidade de que nos fala Mignolo (2010) mostra ter raízes tão profundas que faz a mulher
duvidar se há alternativas à submissão. Em um movimento cíclico, como a serpente que engole a
própria cauda, a colonialidade mantém uma estrutura de exploração e violências. Apesar disso, o
que vemos na narrativa é uma tentativa de romper esse ciclo. Belonísia e Bibiana carregam em seu
narrar saberes ancestrais que, paulatinamente, se articulam no enfrentamento à retórica da
colonialidade. As vozes das irmãs são ouvidas como um grito de libertação contra a narrativa
colonial/patriarcal que prende seus corpos e explora a terra. Santa Rita Pescadeira é testemunha das
histórias que remontam aos tempos da escravização. Passado e presente se encontram, revelando
um sistema monolítico – pedra que sufoca e impede o florescer. Neste trabalho, buscamos refletir
sobre como o narrar dessas três mulheres, paridas pela terra, mobilizam saberes que questionam
certezas de um mundo colonial/patriarcal/branco, voltando-se a um futuro em que suas vidas sejam
possíveis.
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181
têm procurado ressignificar a associação entre mulher e natureza repensando os dualismos
natureza/cultura e mulher/homem a partir de uma reflexão que inclui a natureza não humana, ou
mais-que-humana (HARAWAY, 2022). Nos textos de tradição oral de Abya Yala se destacam uma
série de mitos que narram sobre tensões de gênero e intromissões da natureza não-humana,
evidenciando uma política, ou poética, do corpo, em histórias que narram sobre antropofagia,
metamorfoses corporais, relações íntimas entre seres de espécies diferentes, perspectivismo
interespecífico e multinaturalismo ontológico (VIVEIROS DE CASTRO, 2015); elementos que integram
a cosmopercepção (OYEWÙMÍ, 2021) indígena e conferem literariedade às suas narrativas. Entre as
coletâneas de textos recolhidos da tradição oral se destaca Moqueca de maridos (MINDLIN, 1997),
por trazer uma série de mitos que falam sobre tensões de gênero e intromissão da natureza não-
humana, além de apresentar narradoras e tradutoras mulheres, aspecto muito relevante, já que a
grande maioria dos informantes e narradores que se registram são homens, o que nos leva a pensar
em versões parciais das histórias, que excluem o ponto de vista feminino. Assim, propomos ler
algumas narrativas apresentadas nessa coletânea considerando sua contribuição para os estudos do
ecofeminismo e para a constituição de um pensamento verdadeiramente ecológico, integrando as
epistemologias indígenas (KRENAK, 2020), (KOPENAWA, 2015) e o discurso de novos feminismos,
como o feminismo comunitário de Abya Yala (CARVAJAL, 2020) e (CABNAL, 2010, 2018).
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182
Resumo: Os estudos em literaturas indígenas têm crescido significativamente no Brasil. Escritoras e
escritores, integrantes de povos originários de diversas regiões do país, compõem essa cena
multifacetada. No entanto, ainda é necessário um trabalho mais atento da crítica literária para essa
diversidade regional nas análises, considerando as especificidades de cada lugar. As produções
indígenas elaboradas na Bahia, por exemplo, são pouco examinadas, o que demanda uma ampliação
dos estudos para investigar as dinâmicas que ocorrem nesse espaço. Diante disso, para contribuir
com essa urgente tarefa, o objetivo deste trabalho é analisar o livro Tecendo histórias do meu lugar
(2022), de Ane Kethleen Pataxó, ilustrado por Zig Pataxó, no intuito de destacar de que forma a
memória e o território dessa comunidade estão representados na obra. A jovem escritora transforma
a sua bisavó Luciana Zabelê em personagem, reunindo diversas formas textuais para valorizar a
história dessa anciã: letras de música, carta para a bisavó, fotografia, ilustração, trajetória biográfica
dessa mulher e a relevância dela para o povo Pataxó, por ter lutado em defesa do território e pelo
direito de uma educação escolar intercultural dentro da comunidade. Alguns referenciais teóricos
serão abordados no trabalho: Graça Graúna (2013), com a discussão sobre as singularidades dos
textos de autoria indígena; Adriana Pesca (2020), que propõe a noção de escritas-resistência,
pensada a partir da perspectiva de uma mulher Pataxó; Ely Souza (2020), com o debate sobre as
assimetrias regionais encontradas por pessoas indígenas para conseguirem divulgar sua produção;
Florencia Garramuño (2014), que discute práticas inespecíficas e o campo expansivo da literatura.
Assim, este trabalho mostra que a escrita de Ane Kethleen Pataxó reúne várias gerações,
textualidades, formas de comunicação (oral e escrita) para fortalecer a memória e o território de seu
povo, o que contribui para a resistência das comunidades indígenas na Bahia.
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183
intervalos irregulares ao longo dos dez anos seguintes: Margarida (1879); Vida atribulada (1880); O
senhor deputado (1882); O homem indispensável (1883) e O Bastardo (1889). Enquanto trabalhava
nas “Cenas”, dedicou-se à redação de uma sequência de artigos sobre o naturalismo, publicados na
“Revista Estudos Livres” em 1882, periódico dirigido por Teixeira Bastos e Teófilo Braga. Os artigos
foram ampliados e reunidos no volume Estética Naturalista, de 1884. Outros textos esboçam ainda
as suas reflexões críticas, como o prefácio da segunda edição de Margarida e os prólogos de O senhor
deputado e do volume de contos Esboços do Natural, de 1883, reeditado em 2006, pela INCM. O
último título, corpus escolhido para esta comunicação, possui cinco contos de dimensão mais
alargada. O objetivo da apresentação é discorrer sobre este escritor e crítico do naturalismo,
buscando relacionar seu discurso defensor da nova forma do romance com a sua produção ficcional,
evocando seus artigos, exemplificando situações a partir das “Cenas da Vida Contemporânea”, mas
com o olhar mais detido nos contos naturalistas.
Referências: PEREIRA, Conceição Meireles. O provedor Júlio Lourenço Pinto – anatomia de um
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Assim, veremos como a dinâmica sagrado x profano auxilia no desenvolvimento da trágica história
de Magdalena.
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186
Haroldo Ceravolo Sereza
Resumo: Tido com um autor preocupado em representar o Brasil em sua obra, sobretudo em "O
cortiço", muitas vezes lido como uma grande alegoria do país, Aluísio Azevedo buscou em países
estrangeiros o cenário para alguns de seus romances, sobretudo os não identificados diretamente
com a estética naturalista. Uma porção da trama de "Girândola de Amores" se passa Itália; "A
mortalha de Alzira" inicia a trama "no ano de 17**" em Paris, "a grande cidade libertina". Parte das
peripécias de "Filomeno Borges" também ocorrem na Europa. "O Japão", publicado apenas em 1984,
a partir de manuscritos do autor, se passa no Oriente, país em que Aluísio trabalhou como diplomata.
Que aprendemos sobre Aluísio lendo "O Japão"? Como o escritor lida com o espaço e com a cultura
japonesa em seu livro? Num artigo sobre a obra, o antropólogo Renato Ortiz (1997) aponta várias
inconsistências históricas sobre o Japão, mas vê no texto uma "percepção idílica do isolacionismo
nipônico, medida de pureza em relação à Europa" e um olhar que tende a ver o Oriente "como uma
bloco homogêneo, em contraste com o Ocidente, ao mesmo tempo que coloca em relevo a questão
nacional que justamente é a afirmação de uma especificidade".
Referências: AZEVEDO, Aluísio de. (1980) Japonesas e norte-americanas. In: DIMAS, Antonio. Aluísio
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Torto Arado. São Paulo: Todavia: 2019
188
pedagógica, colocam as suas obras como um aviso para a necessidade urgente de eliminar estas
“pústulas” antes de uma degradação completa. Dentre essas patologias e tuberculoses a serem
exterminadas, os autores identificam a homossexualidade, compreendida como “aberração” ou
“inversão”, em consonância com os ensaios médicos e pseudocientíficos sobre as práticas sexuais
dissidentes, que se multiplicavam desde a metade do século XIX. Nesta comunicação, justapondo
criticamente estes dois naturalistas portugueses e pensando nos pontos de contato e de
distanciamento de suas propostas literárias, pretendemos evidenciar os aspectos e nuances da
representação das dissidências sexuais nos romances que integram os respectivos ciclos,
especificamente nas relações homossexuais entre mulheres que estão presentes em O Livro de Alda
(1898), de Botelho e Saphicas (1902), de Gallis. Assim, com apoio nos estudos de Santana (2007) e
Baguley (1990) sobre as configurações do Naturalismo e suas vertentes, e em estudos recentes sobre
os autores, de Duarte (2017) e Curopos (2018), questionamos como a descrição das personagens
lésbicas e suas trajetórias reveladas nessas narrativas articulam os mecanismos naturalistas e a
licenciosidade, e o discurso social e médico do período, ao abordar as dinâmicas do “safismo” pela
ótica de “vícios secretos” e “degeneração”.
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Palavras-chave: Naturalismo; Decadentismo; Nestor Victor; androginia.
190
Resumo: O romance brasileiro de 1930 volta-se para a tradição realista-naturalista ao intentar a
representação do país por um caminho oblíquo: privilegia tanto o espaço, quanto os sujeitos
alocados à margem dos centros. Ao se considerar a vertente do chamado “romance social” ou
“neorrealista” de 1930, observam-se os pontos em comum com a tradição realista-naturalista, agora
despida de excessos e cientificismo, dado o enraizamento moderno: aproveitam-se a fatura tendente
à verossimilhança e a eleição dos sujeitos socialmente invisíveis. Entre estes – despossuídos,
sertanejos, retirantes, operários, pequenos funcionários públicos – evidencia-se a presença da
mulher. Uma série de personagens femininas traçam o percurso que vai da “casa”, em termos de
vida privada, marcada pela esfera familista, e a “rua”, no sentido da experiência afim à autonomia
do sujeito, relacionada à liberdade e ao trabalho. Esta proposta acompanha recorrências estético-
sociais nas trajetórias femininas de seis romances do período – a saber: Parque Industrial (1930), de
Patrícia Galvão; Os Corumbas (1933) e Rua do siriri (1937), de Amando Fontes; Caminho de pedras
(1935), de Rachel de Queiroz; A estrela sobre (1937), de Marques Rebelo e São Bernardo, de
Graciliano Ramos (1934). Tal panorama permite analisar a figuração da mulher na vida pública,
possibilidades e impasses, entre o patriarcalismo e as promessas de emancipação burguesa.
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contraditórias) dos pensadores do teatro e das artes setecentistas, essas três se destacam como
principais e mais frequentes deflagradoras do qualificativo de “mau gosto” referente ao teatro de
cordel representado e publicado na segunda metade do século XVIII em Portugal.
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UM BREVE ESTUDO DE CARTOGRAFIA TEATRAL E TEATRO COMPARADO.
Fabricio Goulart Moser
Resumo: Esta comunicação tem como objetivo apresentar um breve estudo de Cartografia Teatral e
Teatro Comparado tendo como base as peças encenadas por grupos universitários que existiram em
diferentes cidades do Mato Grosso Uno, hoje os Estados de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul,
durante as décadas de 1960 e 1970. O Teatro Universitário Campo-grandense (TUC), o Teatro
Universitário de Dourados (TUD), o Teatro Universitário Três-lagoense (TUT), entre outros, são
alguns dos grupos que surgiram e funcionaram no período na região, levando ao público do Oeste
do Brasil textos inéditos, clássicos e contemporâneos da dramaturgia brasileira, mundial e local,
como “Piquinique no Front” de Fernando Arrabal, “Esperando Godot” de Samuel Beckett, “Arena
conta Zumbi” de Gianfrancesco Guarnieri e Augusto Boal, “O Jumento e o Capataz” de Marcos
Antônio Rodrigues de Oliveira, e outros. Esta análise faz parte de um estudo de Doutorado realizado
desde 2020 no Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo (USP),
sob a orientação da professora Elizabeth Ribeiro Azevedo, tem como referência metodológica os
estudos de Teatro Comparado e Cartografia Teatral, fundamentados por Jorge Dubatti, e como
fontes primárias e secundárias antigos jornais, depoimentos de integrantes dos grupos e estudos de
referência, entre os quais as obras Memória da Artes em Mato Grosso do Sul: histórias de vida (1992)
e Vozes do Teatro (2010) e a dissertação Aspectos da História do Teatro no Oeste do Brasil: notas
para a história do teatro sul-mato-grossense (2011).
Referências: DUBATTI, Jorge. Introducion a los Estudios Teatrales. México: Editora Livros de Godot,
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memória cultural do Mato Grosso do Sul. FCMS: Campo Grande, 2010.
194
"LIBERDADE, LIBERDADE" SOB O VIÉS DO TESTEMUNHO
Maria Clara Gonçalves
Resumo: A presente comunicação apresenta uma leitura da peça-show “Liberdade, liberdade”
(1965), de Millôr Fernandes e Flávio Rangel sob o prisma do conceito de testemunho. Concebida de
forma fragmentária, a partir de textos de diversos autores que contemplam acontecimentos
históricos que ilustram o sentido geral de liberdade, a obra é realizada em um momento em que o
cerceamento da liberdade estava ameaçado, haja visto que o Golpe Militar havia ocorrido no ano
anterior. Apresentar as inquietações do momento presente a partir de reflexões do passado, tendo
como fio condutor o conceito que dá título à peça, faz com que os autores recriem outros mundos,
em um exercício memorialístico, como forma de compreender e testemunhar o acontecimento
histórico em que estão inseridos, a ditadura. o pesquisador Márcio Selligmann-Silva pontua que "Não
podemos pensar em literatura de testemunho sem ter em mente essa concepção anti-essencialista
do texto. Nesse gênero, a obra é vista tradicionalmente como a representação de uma “cena”. Mas
qual é a modalidade dessa representação? Certamente não podemos mais aceitar o seu modelo
positivista. O testemunho escrito ou falado, sobretudo quando se trata do testemunho de uma cena
violenta, de um acidente ou de uma guerra, nunca deve ser compreendido como uma descrição
“realista” do ocorrido" (1998, p. 10). Posto isso, compreender tal espetáculo sob o viés do
testemunho nos permite abranger as leituras de “Liberdade, liberdade”, analisando-a a partir de seu
momento de criação, mas também para além dele.
Referências: FERNANDES, Millôr; RANGEL, Flávio. Liberdade, liberdade. Porto Alegre: L&PM, 2006.
RICOEUR, Paul. Memória, história, esquecimento. Disponível em:
http://www.uc.pt/fluc/lif/publicacoes/textos_disponiveis_online/pdf/memoria_historia.
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Ramos, Alex Polari e André Du Rap). Matraga, Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras da
UERJ. Rio de Janeiro, UERJ, v. 19, n. 31, jul./dez. 2012, p. 284-303. SELIGMANN-SILVA, Márcio.
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Letras da UFSM. Santa Maria, RS, UFSM; CAL, n. 16, jan./jul. 1998, p. 9-37.
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brasileiro contemporâneo. São Paulo: Perspectiva: Editora da Universidade de São Paulo, 1992. 296
p.
196
referida tensão entre arcaico e moderno, representada, em parte, na década de 1970, pelo
tensionamento entre o local e o cosmopolita. Essa tensão teria sido resolvida na obra de Zanotta por
meio da devoração, por intermédio de um modo de subjetivação antropofágico, sendo a
Carnavalização da cena um dos recursos estéticos adotados para tanto. A hipótese, portanto, é de
que o espetáculo A Felicidade Não Esperneia - Patati Patatá demonstra esse procedimento, pelo uso
do realismo grotesco e da inversão da lógica em cena, assim como de materiais insólitos, como arame
farpado e mesmo lixo para composição cenográfica.
Referências: AZEVEDO, Ana Beatriz Sampaio Soares. Antropofagia - palimpsesto selvagem.
Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas. São Paulo, 2012. FAVARETTO, Celso Fernando. Tropicália alegoria alegria. São Paulo: Ateliê
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Antropofágica / Anthropophagic Subjectivity. In: HERKENHOFF, Paulo e PEDROSA, Adriano (Edit.).
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estudos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. ZANOTTA, Júlio. Teatro-lixo. Porto Alegre: Mercado
Aberto, 1996.
197
comunicar corporalmente. Considerando que o corpo condiz a um organismo criativo, sendo que no
espaço teatral, a expressão corporal juntamente a performance, são elementos essenciais para que
o objetivo de comunicar seja alcançado. Todavia, mesmo quando não havendo na cena a expressão
verbal proferida de forma correta, o elenco e o espectador visualizarão a interpretação cênica, que
realiza comunicação por meio da expressão corporal, pois o corpo é mediador da linguagem, da
percepção, o corpo e suas manifestações linguísticas se fazem presentes nos processos individuais e
sociais. Deste modo, serão contempladas as obras de Maria Fonseca Falkemback (2005), Marco
Antônio Alves (2001), Augusto Boal (2009), Márcia Cristina Cebulisk (2007), Lídia Fachin (1993), Flávio
Desgranges (2012), Patrice Pavis (2015), Lúcia Romano (2013, Richard Schechner (2003), entre outras
obras que contribuirão para análise no presente estudo.
Referências: ALVES, M. A. O teatro como um sistema de comunicação. Trans/Form/Ação, São Paulo,
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FERRACINI, R. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator. 2ª ed. Campinas, SP: Editora
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ago. 2022.
198
TEATRO INFANTIL OU TEATRO PARA CRIANÇAS? – UM BREVE HISTÓRICO DRAMATÚRGICO
Sergio Manoel Rodrigues
Resumo: Quando se refere ao teatro destinado ao público infantil, nota-se uma certa incompreensão
de muitos acerca dessa manifestação artística. A começar pelas designações – teatro infantil ou
teatro para crianças? – a que tal representação cênica atende, acarretando inúmeras discussões
entre teatrólogos, críticos teatrais e pesquisadores da área. Além disso, esse teatro é, muitas vezes,
visto como uma forma de expressão pouco relevante, principalmente se comparado às
representações para adultos, prestigiadas, entre vários fatores, por sua origem clássica. Quanto à
encenação, “[...] a realização teatral dirigida à infância tende a eximir seus responsáveis de maiores
cuidados ou inquietações de caráter estético” (PUPO, 1991, p. 39), o que demonstra o
descomprometimento de alguns profissionais das artes cênicas, ao optarem pela montagem de
peças dedicadas às jovens gerações, com o intuito, apenas, de obter público. Assim, na tentativa de
entender as problemáticas mencionadas, este trabalho tem como objetivo apresentar um breve
panorama histórico do teatro dedicado a crianças, uma vez que, ao se remeter aos primórdios e
evolução dessa forma teatral no Ocidente, percebe-se que as primeiras encenações para crianças e
jovens possuíam uma dramaturgia de cunho moral e pedagogizante, como, por exemplo, ocorria no
drama escolar alemão, em meados do século XVI, e nos autos jesuíticos, durante a colonização
brasileira (1530-1815). Portanto, essas representações teatrais, cuja função visava à transmissão de
ensinamentos e/ou valores cristãos para jovens gerações, nos contextos escolar e religioso, e, em
alguns casos, com uma dramaturgia desprovida de efeito literário, constituíram o cerne do que se
conhece como teatro para infância nos dias atuais.
Referências: ANCHIETA, José de. Teatro de José de Anchieta. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
BELINKY, Tatiana; GOUVEIA, Júlio. Teatro para crianças e adolescentes: a experiência do TESP. In:
ZILBERMAN, Regina. A produção cultural para a criança. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1990. p. 29-
41. BENEDETTI, Lúcia. Aspectos do teatro infantil. Rio de Janeiro: Serviço Nacional do Teatro, 1969.
BERTHOLD, Margot. História mundial do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2006. BUARQUE, Chico. Os
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teatro infantil ontem e hoje. Rio de Janeiro: Lamparina, 2012. PUPO, Maria Lúcia de Souza Barros.
No reino da desigualdade: teatro infantil em São Paulo nos anos setenta. São Paulo: Perspectiva,
1991.
199
(2007) afirmam ser a única Contracultura a usar o “C” devido sua importância cultural no século XX.
Obra portadora de uma marcante (in)tensa negatividade lírica e dissonantes, nos termos de Hugo
Friedrich (1978). Ela usava o corpo como espaço para tornar pública seus registros: “seus repentes
urbanos”. Trata-se de um resgate da memória local, cujos corpora foram recuperados pelos
depoimentos de outros poetas, artistas e amigos contemporâneos a ela. A pesquisa de seu poetar
teve a metodologia qualitativa através de depoimentos de seus contemporâneos e amostras cedidas
pela família e sua última companheira. Grande parte do acervo crítico desta pesquisa encontra-se
depositado na Universidade Federal de Alagoas e em livro publicado pela Editora da Universidade
Estadual de Alagoas. A importância deste registro encontra-se pautada pela transposição da
linguagem do espaço ocupado pela literatura popular para o citadino, pela ruptura com o cânone
local (mais escrevente) com um poetar in presentia, pelo uso do corpo com suas performances
atingindo a cosmovisão e as pautas resistentes das tradições locais.
Referências: FOUCAULT, Michel. Ética, Sexualidade, Política. Organização e seleção de textos de
Manoel Barros da Motta. Tradução de Elisa Monteiro e Inês Autran Dourado Barros. 2ª ed.. Rio de
Janeiro (RJ): Forência Universitária, 2006. FRIEDRICH, Hugo. Estrutura da lírica moderna: da metade
do século XIX a metade do século XX. Tradução de Marise M. Curione. São Paulo: Duas Cidades, 1978.
GOFFMAN, Ken & JOY, Dan. A contracultura atracultura através dos tempos: do mito de prometeu à
cultura digital. Tradução de Alexandre Martins. Rio de Janeiro (RJ): Ediouro, 2007.
200
Resumo: Este trabalho tem como objetivo abordar a poética de Manoel de Barros em relação a
construção do filme Planuras do cineasta Mauricio Copetti (2014), de como é concebido sob um
embasamento teórico, em comparação as poesias de Manuel de Barros (O Guardador de Águas) no
lidar do homem pantaneiro, no mar do Xaraés. Investigarei a pertinência dessa proposta a partir de
metodologias que explorem todos os elementos constitutivos dessa arte, não apenas para trabalhar
questões temáticas, mas analisar as possibilidades sociais e culturais oferecidas assim para propor
um percurso que discute a questão da influência como substrato teórico-simbólico na relação entre
os dois autores e na busca por compreender como Manoel de Barros, no curso de seu projeto
poético, influência, e ressignifica a proposta do filme poesia de Mauricio Copetti. Como base teórica
deste estudo, estão os referenciais da Literatura Comparada, que parte desde Antônio Candido
(1975), Carvalhal (1998), Nitrini (2000), Pageaux (2011), até passar pelas referências que discutem
as temáticas da influência, principalmente Bloom (2002,2003), além de autores que refletem sobre
a questão dos precursores, como em Borges (1956) e T. S. Eliot (1989). Além dos estudos referentes
à Antropofagia, considerando o escritor Oswald de Andrade (1928), Perrone-Moisés (1990) e Rocha
(2011). A metodologia é construída a partir de exercícios de leitura e interpretação de trechos
significativos do corpus selecionado: Livro O guardador de águas (2017) de Manoel de Barros, fontes
históricas da chegada da família Barros no Pantanal Sul-mato-grossense. Em minhas leituras procuro
destacar a narrativa poética, textual e imagética do filme em comparação com as imagens verbais
(memórias) de Manoel de Barros, utilizando também como referência as discussões teóricas sobre
cinema, língua e linguagem (AUMONT-JAQUES) a arte do cinema (DAVID BORDWELL- KRISTIN
THOMPSON) (MARCEL MARTIN).
Referências: ANDRADE, Oswald de. Manifesto da Poesia Pau-Brasil. In: ROCHA, João Cézar de Castro
(Org.); RUFFINELLI, Jorge (Org.). Antropofagia hoje? Oswald de Andrade em cena. São Paulo, 2011.
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Imago, 2003. ______. A angústia da influência. Trad. Marcos Santarrita. Rio de Janeiro: Imago, 2002.
BARROS, Manuel. Livro de Pré Coisas: roteiro para uma excursão poética no Pantanal. Rio de Janeiro.
Record. 1985. BARROS, Manoel. Concerto a céu aberto para solo de árvores. 5ª ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1998. _____ . Matéria de poesia. Rio de Janeiro/São Paulo, Editora Record:
2001. _____. Livro das Pré-coisas. 5ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2007. _____. O guardador de águas.
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Planeta do Brasil: 2003 BORGES, Jorge Luis. Kafka e seus precursores. In: ______. Outras Inquisições.
Trad. Davi Arrigucci Jr.. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. CARVALHAL, Tania Franco. Literatura
comparada. 3. ed. rev. ampl. São Paulo: Ática, 1998. DAVID BORDWELL- KRISTIN THOMPSON: A arte
do cinema uma introdução; Tradução: Roberta Gregoli . Campinas - SP. Editora da Unicamp, SP;
Editora da USP, SP. 2013 DELEUZE, Gilles. Cinema 1 A imagem -movimento. Editora Brasiliense S.A.,
1983 DUARTE, R. Cinema e educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. SILVA JR., A. R.; GANDARA, L.
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Panapaná Brasil, 2014.
“NÃO TOQUE NO MEU BLACK”: O CABELO COMO ELEMENTO DE RESISTÊNCIA NEGRA NAS ARTES
LITERÁRIAS E VISUAIS
Leyla Thays Brito da Silva
201
Resumo: A partir do estudo do conto “Pixaim”, presente na coletânea “O tapete voador” (2016) da
atriz, escritora e poeta carioca, Cristiane Sobral, da análise da performance audiovisual “Bombril” da
artista visual mineira, Priscila Rezende (2010) e de algumas obras da artista plástica e cabeleireira
sul-africana, Lebohang Motaung, pretendemos com este trabalho desenvolver uma análise
intersemiótica, utilizando o campo literário e visual, de forma que se faça compreender a
importância do cabelo para a construção da identidade negra, entendendo, por meio destas diversas
expressões artísticas, que o cabelo não se limita somente à estética, ao transcender o campo das
aparências e se tornar um elemento de ancestralidade e resistência a todo o peso do racismo e dos
padrões hegemônicos impostos pela branquitude que afetam diretamente a autoestima e a vida de
pessoas negras. Nesse sentido, o presente trabalho tece análises com base nos estudos da
pesquisadora e pedagoga mineira, Nilma Lino Gomes (2019) que expõe os significados sociais e
culturais que o cabelo afro carrega, ao abordar concepções da maneira em que o negro se vê e é
visto pelos outros. Alét disso, Também teremos como respaldo teórico a obra “Tornar-se negro”
(1990) da psiquiatra, psicanalista e escritora carioca, Neuza Santos Souza, que em suas pesquisas e
reflexões discorre sobre os efeitos do racismo na psiquê do(a) negro(a).
Referências: SOUZA, Neusa Santos. Tornar-se negro: ou as vicissitudes da identidade do negro
brasileiro em ascensão social. Rio de Janeiro: Graal, 1990. GOMES, Nilma Lino. Sem perder a raiz:
corpo e cabelo como símbolo da identidade negra. 2a ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. GOMES,
Nilma Lino. Corpo e cabelo como ícones de construção da beleza e da identidade negra nos salões
étnicos de Belo Horizonte. São Paulo:USP, 2002 (tese: doutorado). SOARES, Anita Maria Pequeno.
Cabelo importa : os significados do cabelo crespo/cacheado para mulheres negras que passaram pela
transição capilar. Pernambuco: UFPE, 2018 (dissertação: mestrado). SILVA, Franciane Conceição.
Feições do racismo no conto “Pixaim”, de Cristiane Sobral. Belo Horizonte: Aletria, 2018.
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Pallas, 2017. OLIVEIRA, Maria Betânia da Rocha de. Entre o amor à Pátria e as teias da violência - o
triste fim. Campinas, SP: Pontes Editores, 2022. SILVA, Marisa Corrêa. O percurso do Outro ao
Mesmo: sagrado e profano em Helder Macedo e em Saramago. São Paulo: Arte & Ciência, 2009.
SILVA, Marisa Corrêa. Maio de 68 e o Século XXI: O pensamento de Slavoj Žižek. Uniletras, Ponta
Grossa, v. 40, n. 1, p. 22-32, jan/jun. 2018. Disponível em:
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ŽIŽEK, Slavoj. Como ler Lacan. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. 129
ŽIŽEK, Slavoj. Em defesa das causas perdidas. Trad. Maria Beatriz de Medina. Prefácio de Alysson
Leandro Mascaro. São Paulo: Boitempo, 2011.
203
um “viver na língua”. Defendo que Graciela empreende uma caminhada com as imagens e constrói
uma estética de deslocamentos do olhar, ampliando territórios e transformando formas de ser com
a câmera irredutíveis a determinações. Tal dinâmica de reelaboração subjetiva é expressa no manejo
semiótico e sensorial das imagens-palavras ao longo das vídeo-cartas. Ao criar modos provisórios de
colocar o corpo em cena, a cineasta ativa jogos de espelhos que convidam espectadoras(es) a rever
as imagens e a questionar quem nestas encontra-se vendo ou sendo vista(o). Essa espécie de
contraolhar desenvolvida por Graciela executa uma potência desestabilizadora que, como explica
bell hooks em 'Ensinando a transgredir', é capaz de transformar o mundo das imagens, liberando-as
de simplificações. O caminhar com as imagens em 'Nhemongueta Kunhã Mbaraete' ativa um
processo de cura para corpos constantemente estigmatizados, processo que Graciela descreve como
“caminho luminoso”, fazendo do cinema um espaço-tempo de abertura para produção da diferença.
Referências: ALVARENGA, Clarisse. Filmar o contato. In: Da cena do contato ao inacabamento da
história. Salvador: Edufba, 2017, p. 21-59. Disponível em:
<https://www.academia.edu/35183125/Da_cena_do_contato_ao_inacabamento_da_hist%C3%B3r
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pinheiro/.
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de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985a. 413 p. LAJOLO, Marisa.
Romance epistolar: o voyeurismo e a sedução do leitor. Matraga, Rio de Janeiro, 2002. LUCINDA,
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sexualidade na poesia feminina afro-brasileira contemporânea. Revista Ártemis, v. 14, p. 22-36,
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205
206
SIMPÓSIO “ABOLIENDO EL TRATADO DE TORDESILLAS: PROPUESTAS PARA UN
LATINOAMERICANISMO EN EL SIGLO XXI”
André Cabral de Almeida Cardoso (UFF), Horst Rolf Nitschack (UCh), Natalia López
Rico (UDP)
207
Carola Saavedra, Tejer la oscuridad (2021), de Emiliano Monge e A morte e o meteoro (2019), de
Joca Reiners Terron mostram como a noção deslocamento continua a ser relevante para o
estabelecimento de uma identidade latino-americana transnacional. Nas três obras, é através dela
que se busca resgatar a memória de processos históricos cuja elaboração é percebida como condição
inescapável para se imaginar o futuro. A errância surge, portanto, como imagem das construções
simbólicas que inserem a América Latina na modernidade assim como de suas contradições, a
começar pela grande viagem através do Atlântico que marca a sua fundação, ponto originário de
enormes violências, mas também do lançar-se à aventura incerta do futuro. O deslocamento pelo
espaço torna-se também deslocamento pelo tempo, percorrendo territórios simbólicos sempre
precários, cuja realidade e sentido continuam a ser disputados.
Referências: DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022.
FIGUEIREDO, Vera Lúcia Follain de. Da profecia ao labirinto: imagens da história na ficção latino-
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Joca Reiners. A morte e o meteoro. São Paulo: Todavia, 2019.
208
O DETETIVE METAFÍSICO E AS CICATRIZES DA DITADURA EM O CANTOR DE TANGO, DE TOMÁS
ELOY MARTINEZ
Carla De Figueiredo Portilho
Resumo: Propõe-se revisitar o debate sobre a figura do detetive metafísico em O Cantor de Tango,
discutindo o romance a partir dos conceitos de detetive metafísico (HOLQUIST, 1971) e ontológico
(GOMEL, 1995), como uma narrativa que busca resgatar a memória, a cultura e a história recentes
da ditadura na Argentina em diálogo com o olhar de uma pesquisadora brasileira. O protagonista,
pesquisador da história do tango, viaja a Buenos Aires em busca de um cantor mítico, cujas
apresentações-surpresa em locais improváveis o levam a percorrer a cidade, buscando a lógica que
as norteia. O pesquisador, irmanado ao detetive metafísico / ontológico, ao investigar descobre
muito mais sobre si próprio e o seu mundo do que sobre o seu objeto de pesquisa inicial. Suas
caminhadas por Buenos Aires o levam a empreender um trabalho de construção da memória recente
da Argentina, com base nos locais e fatos históricos descobertos em seu percurso, marcando que o
ato de caminhar equivale, simbolicamente, a narrar. Perdendo-se no Parque Chas, o pesquisador /
detetive percebe que o bairro labiríntico equivale às narrativas concêntricas dos personagens que
desvendam o mistério da escolha dos locais das apresentações. Citando um dos personagens do
romance, que diz que a forma de um labirinto não está nas paredes, mas no espaço entre elas, vemos
que o mesmo ocorre com a narrativa e, consequentemente, com a construção da memória, uma vez
que o seu significado não está no que é dito, mas nas entrelinhas, no que o leitor deve, por sua
própria conta, apreender e interpretar.
Referências: GOMEL, E. Mystery, Apocalypse and Utopia: The Case of the Ontological Detective
Story. Science Fiction Studies, v. 22, n. 3, p. 343-56, 1995. HOLQUIST, Michael. “Whodunit and Other
Questions: Metaphysical Detective Stories in Post-War Fiction.” New Literary History, v.3, n.1,
Modernism and Postmodernism: Inquiries, Reflections, and Speculations (1971). p.135-156.
MARTINEZ, Tomás Eloy. El Cantor de Tango. Buenos Aires: Planeta, 2004.
O CORAÇÃO DA TERRA
Celia De Moraes Rego Pedrosa
Resumo: No coração da terra A imagem do coração tem longa história na tradição artística e
filosófica do Ocidente. Em seu uso moderno, na produção poética, foi geralmente compreendida , a
partir principalmente de uma primeira demanda do romantismo, como metáfora ou metonímia que
implicava na identificação da escrita a uma expressão emotiva de sensibilidades e afetos do poeta.
No entanto, a releitura dessa produção há algum tempo vem mostrando seu caráter diversificado e
complexo, evidenciando também em consequência a complexidade tanto das relações entre poesia,
lirismo e subjetivação quanto da compreensão destas como móvel de uma experiência política do
sensível ou experiência sensível do político - segundo a dupla formulação proposta por Jacques
Rancière . Jacques Derrida coloca em discussão tais relações a partir especificamente de uma
releitura da imagem do coração, revendo a compreensão da poesia como re-cordação e desta como
abertura contraditória da escrita subjetivante ao espaçotempo presente, figurada na provocativa
imagem do pequeno porco-espinho enrolado em si mesmo e simultaneamente exposto ao
desconhecido e imprevisto das estradas . Com base nesses pressupostos, minha comunicação se
propõe a investigar, em alguma poesia dita latino-americana, o acontecimento do coração enquanto
imagem associada à interioridade/exterioridade da experiência da/na terra e com o lugar nela
exercido pelo movimento dos rios, com os rios. Seguiremos essa trilha de modo a tentar aprofundar
a leitura que, a partir do texto de Derrida, é desenvolvida por Marcos Siscar, que discute a relação
entre o uso tradicional da palavra coração e uma força de mundialatinização , a que se pode
contrapor uma outra força, de alter-mundialização por vir . Palavras-chave: poesia-terra- coração-
alter-mundialização
Referências: Cf. o ensaio “Transportes da liberdade”,em RANCIÈRE, Jacques. Políticas da escrita. Rio
de Janeiro, Editora 34, 1995, trad. Raquel Ramalhete. DERRIDA, Jacques. “Che cosè la poesia”. Em
Points de Suspension. Paris, Galilée, 1992. SISCAR, Marcos. “O coração transtornado”. Em
NASCIMENTO, Evando (Org.). Jacques Derrida: pensar a desconstrução. São Paulo: Estação
209
Liberdade, 2005. BERNARDO, Fernanda: Derrida – em nome da justiça. Do cosmopolitismo à alter-
mundialização por vir, Palimage, Coimbra, 2021.
210
Flavia Rangel Pimenta Castelione
Resumo: As ditaduras latino-americanas muito têm em comum em sua gênese e em seu
desenvolvimento. Tendo em vista esse pressuposto, esta pesquisa tem por objetivo aproximar
mazelas vividas nos Anos de Chumbo em diferentes lugares da América Latina e busca compreender,
por meio da literatura, algumas das potenciais ligações entre contextos ditatoriais latino-americanos.
Partindo do poema Tecendo o canto, de Pedro Tierra (1979), que conclama os torturados das
ditaduras a compor “o vasto coro dos oprimidos”, propomos um breve passeio por textos literários
que conectam de forma dialógica e polifônica as manifestações de opressão vivenciadas por presos
políticos. Nesse sentido, também visamos a uma compreensão de possíveis razões pelas quais, de
acordo com Kehl (2010), o Brasil tenha sido a única nação que anistiou os responsáveis pelo golpe
sem ao menos uma cobrança formal de retratação pública pela barbárie empunhada – prisões
arbitrárias, torturas, mortes, “desaparecimentos” -, o que perpetua a carência de elaboração da
ferida exposta que é a ditadura militar no país, haja vista o contexto atual de atos golpistas em favor
de um regime de exceção. Esse contexto hodierno brasileiro (e também o latino-americano, de forma
mais abrangente) escancara, mais do que nunca, a importância do estatuto da memória.
Referências: BAKHTIN, Mikhail Mikhailovitch. Estética da criação verbal. São Paulo: Editora WMF
Martins Fontes, 2003. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do
Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. GALEANO, Eduardo. O livro dos abraços. Porto Alegre:
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resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010. p. 123-132. LEAL, Beatriz.
Mulheres que mordem. Rio de Janeiro: Motor; Imã Editorial, 2015. MARTINELLI FILHO, Nelson.
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contos de Bernardo Kucinski. São Carlos (SP): Pedro & João, 2021, p. 39-50. TIERRA, Pedro. Poemas
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211
Contemporáneo, 1968. PIGLIA, R. "A mis companeros Beatriz Sarlo y Carlos Altamirano". Los Libros,
n° 40, Buenos Aires, março-abril, 1975.
PENSAR AMÉRICA LATINA DESDE EL BRASIL: SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA, DARCY RIBEIRO,
SILVIANO SANTIAGO
Horst Rolf Nitschack
Resumo: Con estos tres autores nos encontramos no solamente con tres fases de pensar Brasil en el
contexto de América Latina, fases que pertenecen a etapas distintas de la historia brasileña y
latinoamericana, sino también con tres discursos con referencias a disciplinas epistemológicas
distintas: es decir, el transcurso de la sociología, pasando por la antropología a la crítica cultural.
Sérgio Buarque de Holanda parte en su ensayo Raízes do Brasil (1936) de las diferencias
colonizadoras entre España y Portugal con una referencia teórica a la sociología Weberiana. Darcy
Ribeiro constata desde sus investigaciones antropológicas una unidad fundamental de América
Latina como resultado de un “proceso civilizatorio” ( “A América Latina existe?” (1979)) pero
preguntará en O povo brasileiro (1995) “Que é o Brasil entre os povos contempraneos?”. En Silviano
Santiago nos interesan sus reflexiones sobre el lugar de la literatura y cultura tanto brasileña como
latinoamericana desde su ensayo “O Entre-Lugar do Discurso Latino-Americano” (1978) hasta
“Atração do Mundo – Políticas de Globalização e de Identidade na moderna Cultura Brasileira” (2004)
y As Raízes e o labirinto da América Latina (2006). La propuesta de la intervención consiste en una
lectura de las tres posiciones desde la teoría de los afectos, examinando en cada uno de los autores
y sus pensamientos las economías y las circulaciones de afectos que producen o tensiones o las
potencias y deseos para situar al Brasil en un mapa latinoamericano y hacerlo parte de un cuerpo
con el nombre América Latina.
Referências: Holanda, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil (1936) Ribeiro, Darcy. “A América Latina
existe?” (1979)) - - - O povo brasileiro (1995) Santiago, Silviano. “O Entre-Lugar do Discurso Latino-
Americano” (1978) - - - “Atração do Mundo – Políticas de Globalização e de Identidade na moderna
Cultura Brasileira” (2004) - - - As Raízes e o labirinto da América Latina (2006).
212
latinoamericana. Santiago: IES. Morandé, Pedro (2017) Cultura y modernización en América Latina.
Santiago: IES.
PROSA "ESCÉNICA", PROSA "EN OBRA": UN CONTRAPUNTO ENTRE SERGIO CHEJFEC Y NUNO
RAMOS
Jorge Andrés Manzi Cembrano
Resumo: Basándome en mi investigación postdoctoral sobre Nuno Ramos y Sergio Chejfec,
comenzaré mi comunicación presentando la noción de “prosa escénica” o prosa “en obra”,
entendida como una importante orientación de diferentes autores/as latinoamericanos/as (de Brasil
e Hispanoamérica) cuya escritura se ha caracterizado, en las últimas décadas, por “aspirar a la
condición del arte contemporáneo” (Reinaldo Laddaga). Entre tales autores/as, además de Chejfec y
Ramos, podríamos considerar a Diamela Eltit, Cesar Aira, Mario Bellatín, Joao Gilberto Noll (cf. Horne,
Laddaga, Süssekind). La orientación “escénica” de la obra tendría que ver con un énfasis especial en
dicciones, acciones y temporalidades dramáticas (p.ej. discurso directo, en presente, uso de deícticos
temporo-espaciales, así como sus tensiones con el discurso retrospectivo novelesco) y la
experimentación con espacios delimitados o reducidos que sirven como “escena” para exhibir
acciones, dicciones, índices y “fragmentos de mundo”. O bien, para exhibir reflexivamente
procedimientos artísticos como si estuviesen "en obra" en el aquí y ahora de la escena (cf. Tassinari).
Dentro de este marco conceptual común, como contribución al diálogo brasileño-hispanoamericano,
presentaré algunos contrapuntos entre la prosa “escénica” del brasileño Nuno Ramos y del argentino
Sergio Chejec, apuntando principalmente a las diferencias en la enunciación y la dicción, en donde
Ramos se caracteriza por la desmesura, la volubilidad, el paso abrupto hacia la oralidad y el discurso
directo, mientras que Chejfec busca formalizar una dramaticidad atenuada, distanciada, que evita el
discurso directo. El contrapunto entre formalizaciones diferentes de lo “escénico” permitirá abrir
una discusión sobre las singularidades de la experiencia histórica contemporánea y de su
formalización artística en Brasil e Hispanoamérica.
Referências: Chejfec, Sergio. El llamado de la especie. [1995]. Buenos Aires: Beatriz Viterbo, 1997. --
-. Boca de lobo. [2000]. Buenos Aires: Alfaguara, 2008. Horne, Luz. Literaturas reales.
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contrarios, massa. Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 2022. Tassinari, Alberto. O espaço
moderno. São Paulo: Cosac Naify, 2001.
213
na relação entre nação, narração e tradução, intercultural, interlinguística e histórica, e/ou, em
especial, observando as formas como a literatura, ao longo do tempo, se estrutura como um espaço
de questionamento da própria ideia de nação. Por fim, propõe-se pensar como esses autores nos
seus mais recentes textos, deslocam-se do território da fronteira em direção a uma atenção
particular ao contexto nacional, em especial, a propagação de políticas negacionistas e autoritárias
no continente.
Referências: ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas. São Paulo: companhia das letras, p.
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215
relações foram tragicamente representadas através do tropo do incesto. Assim, através de uma
breve apresentação de algumas destas narrativas, proponho-me discutir como a intersecção das
relações de raça, gênero e classe nestes textos pode oferecer um novo olhar sobre a formação dos
discursos raciais na América.
Referências: Cadena, Marisol de la. Indígenas mestizos: raza y cultura en el Cuzco. IEP, Inst. de
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online: https://laboratoriodesensibilidades.wordpress.com/2022/03/22/a-morte-como-quase-
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Folha de S. Paulo, 13/06/98, p. 7. “O mestre artista” (sobre Barthes), “Mais!”, Folha de S. Paulo,
17/11/02, ps. 4 a 7.
220
escritura, nossa leitura busca evidenciar alguns aspectos que nos permitem observar, em Sartre e
em Barthes, as tendências transitivas e intransitivas da escrita literária.
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Editora 34, 2021. SARTRE, Jean-Paul. Que é a literatura? 3. ed. Tradução de Carlos Felipe Moisés. São
Paulo: Ática, 2004.
221
Laura Taddei Brandini
Resumo: A presente comunicação tem por objeto as relações entre a escrita de Roland Barthes e o
tema da viagem. A obra barthesiana é tomada em sua totalidade, sem cairmos em distinções entre
postulações teóricas e prática literária, uma vez que, para Barthes, ambas coexistem sob a forma da
escritura. O tema da viagem será delimitado pelas leituras que Barthes dedicou a autores e obras do
que definiremos como Literatura de Viagem: repertoriaremos a presença da Literatura de Viagem na
obra de Barthes e selecionaremos como corpus de análise o romance de Pierre Loti, Aziyadé (1879),
e o ensaio barthesiano “Pierre Loti: ‘Aziyadé’” (1971). Com base nesse primeiro romance de Loti,
carregado por uma visão fortemente eurocentrada e marcado por preconceitos oriundos de um
ponto de vista do colonizador sobre povos colonizados, Barthes desenvolve a noção de incidente,
central para o seu pensamento sobre a escrita literária, bem como para a sua prática. Como, a partir
de um romance árido em termos de reflexão, com uma função bastante clara de exploração do
Oriente exótico, repleto de fórmulas de fácil assimilação, isento de questionamentos, Barthes extrai
material para uma reflexão que fundamentará uma escrita que vai em sentido oposto ao escolhido
por Loti, em O Império dos signos (1970), de Barthes, por exemplo? Esta comunicação se debruça,
portanto, sobre Barthes enquanto leitor de Literatura de Viagem e as implicações da leitura de
Aziyadé, de Loti, para sua reflexão sobre a escritura.
Referências: BARTHES, Roland. Œuvres Complètes. Edição de Éric Marty. Paris: Seuil, 2003, 5v.
_____. O Império dos signos. Tradução de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: WMF Martins Fontes,
2007. LOTI, Pierre. Aziyadé suivi de Fantôme d’Orient. Paris : Gallimard, 1991.
222
materialização da individualidade estrita, presente no conceito moderno de “autor”, fixada como
estritamente individual, burguesa e relacionada com o surgimento da propriedade privada, o que
levou Roland Barthes (1968) a declarar a morte desta entidade. À vista disso, objetivando recuperar
uma literatura realizada efetivamente (e afetivamente) com o outro, partilhada, em convivência,
recordamos obras-espaços que evidenciam o pertencimento e, simultaneamente, o distanciamento
entre seus autores. Especificamente, nos centraremos na obra Como se fosse a casa: uma
correspondência (2017), realizada em coautoria, em colaboração entre dois poetas, fruto da troca
de e-mails entre a poeta Ana Martins Marques e do poeta Eduardo Jorge, durante o período em que
o poeta aluga seu apartamento para a poeta. Em Como Viver Junto (2013), Roland Barthes assegura
que literatura é o “campo fantasmático” em que o estar junto, o compartilhar tempo-espaço, ao
tempo que criar e manter um ritmo próprio, a “idiorritimia” acontece. Objetivando compreender a
coabitação entre os autores na (e para a) obra poética mencionada, estendemos a noção de espaço,
compreendendo-o metaforicamente enquanto obra literária, língua portuguesa e a própria
coabitação da casa -espaço físico- comum entre os autores. Além deste alargamento conceitual,
consideramos alguns “rasgos” do viver junto idiorrítimico elencados por Barthes para pensar a obra
enquanto uma relação conciliadora (utópica?) entre o individual e o coletivo, ambos permeados pelo
afeto. Destacamos o processo de realização do Rhythmós, o Télos, a Anakhóresis (anacorese)
enquanto vontade de ruptura, a Xeniteía como recurso para pensar-se alheado ao espaço, no
estrangeiro e enquanto uma vontade ativa.
Referências: ALEIXO, Ricardo (2017). Orelha. In: JORGE, Eduardo; MARQUES, Ana Martins. Como se
fosse a casa: uma correspondência. Belo Horizonte: Relicário. AUGÉ, Marc (2008). Não-lugares:
introdução a uma antropologia da supermodernidade. 7. ed. São Paulo: Papirus. BACHELARD, Gaston
(1989). A dialética do exterior e do interior. In: BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo:
Martins Fontes. BARTHES, Roland. Como viver junto: simulações romanescas de alguns espaços
cotidianos: curso e seminários do Collège de France, 1976-1977. Trad. Leyla Perrone-Moisés. 2ª ed.
São Paulo: Editora Martins Fontes, 2013. BARTHES, Roland. O rumor da língua. Tradução de Mário
Laranjeira. Prefácio de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Brasiliense, 1988. FOUCAULT, Michel. O que
é um Autor? In: Estética: Literatura e Pintura, Música e Cinema. (Col. Ditos e Escritos III). Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2006. JORGE, Eduardo; MARQUES, Ana Martins (2017). Como se fosse
a casa: uma correspondência. Belo Horizonte: Relicário. NANCY, Jean-Luc. La communaute
désouvrée. Paris: Christian Bourgois Éditeur, 1999. STILLINGER, Jack. Multiple authorship and the
myth of solitary genius. New York and Oxford: Oxford University Press, 1991.
223
fantasmático de um “viver-junto” hoje, precisaria ser reconsiderada, partindo de uma outra
pergunta: é ainda possível pensar em um ritmo todo seu hoje?
Referências: BARTHES, Roland. Como viver junto. Trad. Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Martins
Fontes, 2003. KAUFMAN, Dora. O paradoxo da solidão na sociedade hiperconectada: robôs
inteligentes e as novas famílias. Disponível em:
<https://epocanegocios.globo.com/colunas/IAgora/noticia/2021/01/o-paradoxo-da-solidao-na-
sociedade-hiperconectada-robos-inteligentes-e-novas-familias.html>. Acesso em: 15 jan 2023.
SANTAELLA, L. “A Grande aceleração & O Campo Comunicacional”. Intexto, nº 34, dezembro de
2015, p. 46-59.
224
linguagem e o pensamento, retirando da fotografia qualquer qualidade projetiva, imaginária e, por
isso mesmo, potencialmente ficcional. No segundo momento desta comunicação, voltarei meu olhar
para Rancière. No último ensaio de "O espectador emancipado", o filósofo vai de encontro a Barthes,
mas também ao encontro dele, tensionando a reflexão de "A câmara clara". Rancière concentra sua
crítica na pretensa qualidade “medusante” da fotografia de paralisar a linguagem e o pensamento.
Todavia, precisamente para criticar Barthes, o filósofo avança o conceito de uma pensatividade da
imagem que reativa o par "punctum"/"studium". Nesse gesto, Rancière parece apontar para algo
que já estava anunciado na primeira parte do ensaio de Barthes: a fotografia não é a superfície única
de manifestação da qualidade sensível do motivo fotografado, mas o entrelaçamento de regimes
diversos de apresentação sensível: a caracterização social, a forma determinada pela intenção da
arte (o "studium") e a indeterminação estética, aquilo que é percebido sem conceito e que escapa a
qualquer finalidade (o "punctum"). Ora, a indeterminação estética, os diversos índices de suspensão
da imagem não são precisamente os elementos que permitem aproximá-la da ficção?
Referências: BARTHES, Roland. Le message photographique. Communications, v. 1, p. 127- 138,
1961. __________. Rhétorique de l’image. Communications, v. 4, p. 40-51, 1964. __________. L’effet
de réel. Communications, v. 11, p. 84-89, 1968. __________. Roland Barthes por Roland Barthes.
Tradução de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Cultrix, 1977. __________. A câmara clara. Tradução
de Júlio Castañon Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015. RANCIÈRE, Jacques. Notes on the
photographic image. Radical philosophy, v. 156, p. 8-15, jul/ago 2009. __________. O espectador
emancipado. Tradução de Ivone Benedetti. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012. __________. O
destino das imagens. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.
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CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: CANDIDO, Antonio. Vários Escritos. 5. ed. Rio de Janeiro:
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tensões e estratégias na narrativa contemporânea. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 42, n. 4, p. 18-31,
dez. 2007. DALCASTAGNÈ, Regina. Literatura brasileira contemporânea: um território contestado.
São Paulo: Horizonte; Rio de Janeiro: UERJ, 2012. EVARISTO, C. Ponciá Vicêncio. 3 ed. Rio de Janeiro:
Pallas, 2017. OLIVEIRA, Maria Betânia da Rocha de. Entre o amor à Pátria e as teias da violência - o
triste fim. Campinas, SP: Pontes Editores, 2022. SILVA, Marisa Corrêa. O percurso do Outro ao
Mesmo: sagrado e profano em Helder Macedo e em Saramago. São Paulo: Arte & Ciência, 2009.
SILVA, Marisa Corrêa. Maio de 68 e o Século XXI: O pensamento de Slavoj Žižek. Uniletras, Ponta
Grossa, v. 40, n. 1, p. 22-32, jan/jun. 2018. Disponível em:
http://www.revistas2.uepg.br/index.php/uniletras. Acesso em: 30 abril. 2022. ŽIŽEK, Slavoj. Eles não
sabem o que fazem: O sublime objeto da ideologia. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1992.
ŽIŽEK, Slavoj. Como ler Lacan. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. 129
ŽIŽEK, Slavoj. Em defesa das causas perdidas. Trad. Maria Beatriz de Medina. Prefácio de Alysson
Leandro Mascaro. São Paulo: Boitempo, 2011.
PSICANÁLISE E STIMMUNG
Alexandre Marzullo Knauer Faccin
Resumo: Uma comunicação sobre ausência, psicanálise e falta, a partir de um conteúdo
tradicionalmente literário: a noção de "Stimmung". Em seu seminário VII, Jacques Lacan comenta
sobre uma passagem do epistolário de Freud e Fliess, onde o primeiro escreve ao segundo acerca de
sua autoanálise (carta 73). Para Freud, "o mais desagradável", tal como comentado por Lacan, "são
'die Stimmungen' - no sentido mais geral que podemos dar a essa palavra que tem sua ressonância
em alemão, os estados de humor, os sentimentos - e que, por sua natureza, encobrem, escondem o
quê? - 'die Wirklichkeit', a realidade" (LACAN, 2008, p. 37). Decerto, a palavra "Stimmung", aí
apresentada lacanianamente (mas a partir de Freud) como uma espécie de sinalização do furo que
aponta para o real, no entanto, não se tornou parte do vocabulário psicanalítico ortodoxo; não
consta sequer do léxico freudiano. No entanto, o século XX a requisitou - seja pela filosofia
heideggeriana, seja por certos estudos de literatura comparada - em um sentido ontológico e
literário, quase fenomenológico, e por vezes vinculado ao que seria a própria essência do material
literário, seu valor de "presença" - tal como se depreende dos textos de Hans Ulrich Gumbrecht sobre
o tema. Pois é aqui que desejamos atacar: poderia o estudo literário deste conceito, reconsiderado
sob a luz psicanalítica a partir da pista de Lacan, reposicionar-nos frente a uma experiência do real
que, iluminando a dimensão capaz de mobilizar o sujeito, poderia sensibilizá-lo e desterritorializá-lo
na medida em que o sujeito mesmo conseguisse perceber o real por trás da tessitura poética das
"Stimmungen" experimentadas, real esse ali se evadindo, mas sempre sinalizando? Não seria tanto
uma questão de presença, portanto, mas de falta: diante da ideia de uma "Stimmung", uma
dimensão mórbida da falta se anunciaria, sorrateira, levitando significantes e experiências subjetivas.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. A potência do pensamento: ensaios e conferências. Belo Horizonte:
Autêntica editora, 2017. FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos: coleção obras completas,
volume 4. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera, ambiência,
Stimmung: sobre um potencial oculto na literatura. Rio de Janeiro: Contraponto/PUC editora, 2013.
LACAN, Jacques. Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. LACAN, Jacques. O seminário, livro VII: a ética
da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. MASSON, Jeffrey Moussaieff (org.). A correspondência
completa de Sigmund Freud para Wilhelm Fliess - 1887-1904. Rio de Janeiro: Imago, 1986.
226
portuguesa. Neste sentido participa, especialmente com este romance, de um movimento
contemporâneo na literatura portuguesa de abertura para temas e espaços outros, em consonância
com a mundialização cultural dos tempos coevos. O romance em questão se passa nas longínquas
terras da Islândia, país de origem da cantora Björk. Esta comunicação, de acordo com a proposta
anunciada no título do simpósio a que se destina, busca estabelecer diálogos de viés psicanalítico
entre a obra literária de Valter Hugo Mãe e a produção audiovisual da cantora Björk, especialmente
em relação à paisagem e sua atuação na construção do sujeito. Nos textos, literário e audiovisual
destes artistas, constata-se a paisagem enquanto dimensão marcada pelo sinestésico, e o espaço
social como espaço relacional em que se constroem as subjetividades. O que nos leva a pensar o
corpo humano como agente mediador, afetando e sendo afetado, servindo-se de toda sua
potencialidade cinestésica em relação com o espaço vivido. Além disso, no romance de Valter e em
alguns videoclipes de Björk, é muito importante a questão do duplo, bem como o par aparentemente
antagônico ingenuidade/violência, aspectos que marcam a relação entre as gêmeas Halla e Sigridur
e sua família. A partir desses pontos, almeja-se discutir a paisagem e o espaço social familiar em sua
capacidade de suscitar uma reflexão sobre o “eu” e o “outro”, considerando processos objetivos e
subjetivos de constituição da psique humana, com o auxílio do texto “Os complexos familiares na
formação do indivíduo”, de Jacques Lacan.
Referências: COSTA, André; PELIANO, Adriana; CHADES, Maurício. As aventuras subjetivas de Björk.
Brasilia, D.F. s/n, 2014. LACAN, Jacques. Os Complexos Familiares na formação do indivíduo: ensaio
de análise de uma função em psicologia. Tradução de Marco Antônio Coutinho Jorge e Potiguara
Mendes da Silveira Júnior. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2018 MÃE, Valter Hugo. A
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Ayanne Priscila A. O que é psicanálise literária. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2022. CALDAS, Heloisa.
Da voz à escrita: clínica psicanalítica e literatura. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2007. CHAVES, Ernani.
Prefácio: O paradigma estético de Freud. In: FREUD, Sigmund. Arte, literatura e os artistas. Belo
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Além do princípio do prazer e outros textos (1917-1920). Tradução Paulo César de Souza. São Paulo:
Companhia das letras, 2010. FREUD, Sigmund. O delírio e os sonhos na Gradiva (1906). In: Obras
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César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. FREUD, Sigmund. O infamiliar [Das
Unheimliche]–Edição comemorativa bilíngue (1919-2019): Seguido de O Homem da Areia de ETA
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Arte, literatura e os artistas. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. IANNINI, Gilson; TAVARES, Pedro
Hiodoro; Romão, Tito Lívio Cruz. Prefácio: Escrever a clínica: Freud entre a ciência e a literatura. In:
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Horizonte: Autêntica, 2021. LACAN, Jacques. Lituraterra. In: LACAN, Jacques Outros Escritos.
Tradução Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. LACAN, Jacques. Homenagem a
Marguerite Duras pelo arrebatamento de Lol V. Stein. In: LACAN, Jacques Outros Escritos. Tradução
Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. MILLER, Jacques-Alain. Un esfuerzo de poesía.
Paidós, 2016. PASSOS, Cleusa Rios Pinheiro. As armadilhas do saber: relações entre literatura e
psicanálise. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009. PASSOS, Cleusa Rios Pinheiro.
Confluências: crítica literária e psicanálise. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1995.
SOUSA, Edson luiz André. Posfácio: Faróis e enigmas – Arte e Psicanálise à luz de Sigmund Freud. In:
FREUD, Sigmund. Arte, literatura e os artistas. Belo Horizonte: Autêntica, 2020.
AMOR AO MAR: UMA REPRESENTAÇÃO SIMBÓLICO AFETIVA DA LIBERDADE FEMININA PELO VIÉS
DO MATERIALISMO LACANIANO EM “TUDO QUE JÁ NADEI”, DE LETÍCIA PINHEIRO DE NOVAES OU,
APENAS, LETRUX
Fernanda Garcia Cassiano
Resumo: A proposta de pesquisa objetiva demonstrar como a relação afetiva que ultrapassa os
limites interpessoais contribui para a leitura do desejo como pulsão de liberdade na representação
feminina da literatura de Letícia Pinheiro de Novaes, em “Tudo que já nadei” (2021). De nome
artístico Letrux, a também compositora, cantora e artista é reconhecida por sua grande
maleabilidade com as palavras, já tão rarefeitas no terreno das demonstrações afetivas.
Compreende-se que o afeto, provido da identificação por qualquer ser, se constrói individualmente,
mas corrobora a formação de um sujeito social que busca emancipação e deseja o pertencimento.
Neste sentido, o objetivo geral da pesquisa é analisar a representação dos sujeitos femininos, na
forma dos eu líricos presentes na seleção de contos e poemas da obra selecionada, com as
contribuições das teorias sobre o afeto, discorridas por Safatle (2016), Noguera (2020) e Hooks
(2021), por meio da esteira sociológica e psicanalítica de Žižek (2010; 2012; 2015), ao reler a hipótese
de Lacan sobre a manifestação do amor elementar que, no caso em estudo, se dá pela - e para a -
relação do eu lírico com o mar. Ao estender tais leituras aos estudos literários por meio da aplicação
materialista lacaniana, Silva (2009) afirma que o Simbólico é um estágio no qual o indivíduo estrutura
por códigos linguísticos socializadores, assim, a principal hipótese do estudo é a de que o afeto pode
228
ser uma instância simbólica que se relaciona, diretamente, com as estruturas sociais que compõe
uma ordem simbólica restritiva ou libertária, visto que é por meio dessa configuração que a mulher
constrói a sua rede de sustentação emocional e ideológica, a fim de que se compreenda que esse
amor é, também, manifestação da crença do próprio sujeito, bem como dos mecanismos de
ideologia e formação de sua identidade histórica.
Referências: HOOKS, Bell. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Elefante, 2021.
LETRUX. Tudo o que já nadei: Ressaca, quebra-mar e marolinha. São Paulo: Planeta, 2021. Noguera,
Renato. Por que amamos: o que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor. Rio de Janeiro:
HarperCollins, 2020. SAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do
indivíduo. Autêntica, 2016. SILVA, Marisa Corrêa. Materialismo Lacaniano. In: BONNICI, Thomas e
ZOLIN, Lúcia Osana (orgs.). Teoria Literária: abordagens históricas e tendências contemporâneas.
3ªed. rev. e ampl. Maringá: Eduem, 2009. p. 211-216. ŽIŽEK, Slavoj. A visão em paralaxe. Boitempo
editorial, 2015. ŽIŽEK, Slavoj. Como ler Lacan. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar,
2010. ŽIŽEK, Slavoj. O Amor Impiedoso (ou: sobre a crença). Trad. de Lucas Mello Carvalho Ribeiro.
Belo Horizonte: Autêntica, 2012.
229
produção de uma literatura irônica, que opta pela ambiguidade e sobreposição de oposto
contraditórios, Dyonélio Machado constrói a posição de um comunista que por um lado considerava
a Intentona Comunista de 1935 um gesto improvisado e imaturo, e por outro, evitava assumir a
posição panfletária que o faria alvo das instituições policiais e burguesas, baseadas no Direito e no
discurso idealista do humanismo. É assim que podemos tomar sua posição ideológica como
expressando uma contradição ao nível do real, revelando o antagonismo da luta de classes,
simbolicamente recoberto pelo marxismo humanista de Dyonélio Machado.
Referências: ALTHUSSER, Louis. Para ler O Capital. Volume 1. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.
ALTHUSSER, Louis. Freud e Lacan. Marx e Freud: introdução crítica-histórica. Rio de Janeiro: Edições
Graal, 1985. ALTHUSSER, Louis. Por Marx. Campinas: Editora da Unicamp, 2015. BARTHES, Roland.
Sobre Racine. Porto Alegre: L&PM, 1987b. BARTHES, Roland. Michelet. São Paulo: Cia das Letras,
1991. BARTHES, Roland. S/Z. Uma análise da novela Sarrasine de Honoré Balzac. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1992. BARTHES, Roland. Introdução à Análise Estrutural da Narrativa. Petrópolis: Vozes,
2008. BELLEMIN-NOËL, Jean. Psicanálise e literatura. São Paulo: Cultrix, 1983. JAMESON, Fredric.
Marxismo e forma. Teorias dialéticas da literatura do século XX. São Paulo: Hucitec, 1985. JAMESON,
Fredric. O inconsciente político. A narrativa como ato socialmente simbólico. São Paulo: Ática, 1992.
LACAN, Jacques. Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. LACLAU, Ernesto; MOUFFE, Chantal.
Hegemonia e estratégia socialista: por uma política democrática radical. São Paulo: Intermeios, 2015
MACHADO, Dyonélio. Desolação. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2005. MACHADO, Dyonélio.
Deuses econômicos. Porto Alegre: Editora Garatuja, 1976. MACHADO, Dyonélio. Ele vem do Fundão.
São Paulo: Ática, 1982. MACHADO, Dyonélio. Endiabrados. São Paulo; Ática, 1980. MACHADO,
Dyonélio. Fada. São Paulo: Moderna, 1982. MACHADO, Dyonélio. Nuanças. São Paulo: Moderna,
1981. MACHADO, Dyonélio. O cheiro de coisa viva. Rio de Janeiro: Graphia Editorial, 1995.
MACHADO, Dyonélio. O Louco do Cati. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2003. MACHADO,
Dyonélio. O pensamento político de Dyonélio Machado. Porto Alegre: Assembleia Legislativa do
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Brasil, 2004. MACHADO, Dyonélio. Passos perdidos. São Paulo: Editora Moderna, 1982. MACHADO,
Dyonélio. Prodígios. São Paulo: Moderna, 1980. MACHADO, Dyonélio. Proscritos. Brasília: Siglaviva,
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Terceira vigília. Manuscrito, 1966-1980. 163 folhas. Disponível no Acervo Literário Dyonélio
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MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2010.
230
diálogo qualquer vestígio de instância moral e representando a caducidade arquetípica do moralismo
entranhado na família tradicional brasileira, elementos que chocaram de maneira insólita a
sociedade carioca de sua época. Impõe-se, como pano de fundo dessa investigação, a psicanálise
como influente mediadora entre a tradição e a modernidade brasileiras.
Referências: ANDRADE, O. O manifesto antropófago. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda
europeia e modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas.
Rio de Janeiro: José Olympio, 2012. ANDRADE, O. O rei da vela. São Paulo, SP: Abril, 1976. FREUD, S.
Totem e tabu: algumas concordâncias entre a vida psíquica dos homens primitivos e a dos neuróticos.
Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo, SP: Penguin-Companhia das Letras, 2013. FREUD, S. O
Inconsciente. In:______. Escritos sobre a psicologia do inconsciente. Coordenação geral da tradução
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FREUD, S. Além do princípio do prazer. In:______ Escritos sobre a psicologia do inconsciente.
Coordenação geral da tradução de Luiz Alberto Hanns; tradutores Claudia Dornbusch... [et al.]. Rio
de Janeiro, RJ: Imago, 2006, v. 2 (Obras psicológicas de Sigmund Freud). FREUD, S. O Eu e o Id.
In:______. Escritos sobre a psicologia do inconsciente. Coordenação geral da tradução de Luiz
Alberto Hanns. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 2007, v.3 (Obras psicológicas de Sigmund Freud).
RODRIGUES, N. [1957] Perdoa-me por me traíres. In: Teatro completo de Nelson Rodrigues: tragédias
cariocas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017b v. 2. RODRIGUES, N. [1959] Boca de Ouro. In: Teatro
completo de Nelson Rodrigues: tragédias cariocas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017, v. 2.
RODRIGUES, N. [1962] Otto Lara Resende ou bonitinha, mas ordinária. In: Teatro completo de Nelson
Rodrigues: tragédias cariocas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017, v. 2. RODRIGUES, N. [1965] Toda
nudez será castigada. In: Teatro completo de Nelson Rodrigues: tragédias cariocas. Rio de Janeiro:
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O OLHAR EMOLDURADO POR UMA JANELA INDISCRETA – SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE CINEMA E
PSICANÁLISE EM JANELA INDISCRETA (1954), DE ALFRED HITCHCOCK
Neurivaldo Campos Pedroso Junior
231
Resumo: Cinema e Psicanálise são contemporâneos. O ano de 1895 marca não apenas o nascimento
da Psicanálise, pelas mãos de Freud e Breuer, mas, também, o nascimento do Cinema, orquestrado
pelos irmãos Lumière. De 1895 para cá, muito se avançou e muita tinta ainda corre no papel com o
propósito de se estabelecer uma reflexão teórico-crítica acerca das relações entre aqueles dois
campos do saber. Conceitos fundamentais (e fundadores) da Psicanálise passam a ser relacionados
às noções de teoria e crítica do cinema bem como a problemas práticos da produção de filmes. Nos
debates atuais, emergem duas grandes tendências: de um lado, as interpretações psicanalíticas de
narrativas fílmicas e, de outro, as relações homológicas entre as técnicas cinematográficas
(enquadre, fotografia, música e montagem) e o processo clínico representado pelo tratamento
psicanalítico. Nosso objetivo, nesta comunicação, é o de propor uma análise do filme Janela
indiscreta (1954), produzido por Alfred Hitchcock, com vistas a discutir a elaboração de uma teoria
do olhar, ao longo da narrativa cinematográfica, que pode ser articulada às teorias do olhar
promovidas por Jacques Lacan, em especial no Seminário 11 – Os Quatros Conceitos Fundamentais
de Psicanálise. Jacques Lacan propõe uma esquize entre o olho e olhar. Ou seja, é por meio do olho
que enquadramos o visível. Contudo, é o olhar – aquele objeto ausente do campo visual – que incita
a ver. Dentro dessa pauta, destacamos que não é nosso interesse, nesta comunicação, tentar
converter a obra cinematográfica em um sintoma da teoria psicanalítica, mas, salvaguardadas as
especificidades de seus recursos cinematográficos, discutir como Janela indiscreta pode funcionar
como mola propulsora para se abordar conceitos psicanalíticos.
Referências: DIDI-HUBERMAN, George. O que vemos, o que nos olha. Trad. Paulo Neves. São Paulo:
Editora 34, 1998. DUNKER, Christian Iago Lenz. “Fazer cinema, fazer psicanálise”. In: DUNKER,
Christian Iago Lenz & RODRIGUES, Ana Lucília (Orgs.). Cinema e psicanálise: a criação do desejo. São
Paulo: Rversos, 2015. LACAN, Jacques. O Seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais de
psicanálise. Trad. M.D. Magno. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. LACOSTE, Patrick. Psicanálise na tela:
Pabst, Abraham, Sachs, Freud e o filme Segredos de uma alma. Trad. Clóvis Marques. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Ed., 1992. RIVERA, Tania. Cinema, imagem e psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,
2008. ZIZEK, Slavoj (Ed.). Everything you wanted yto know about Lacan but were afraid to ask
Hitchcock. London: Verso, 2010.
FANTASMA SAI DE CENA: UM OLHAR FREUDIANO SOBRE A VELHICE A PARTIR DE PHILIP ROTH
paula farias akkari
Resumo: Philip Roth (1933-2018), considerado por Harold Bloom o responsável pelo segundo ápice
da literatura norte-americana (MARTÍ, 2018), empreendeu uma vasta obra literária condicionada a
sua biografia. O autor não só assistiu a transformações sociais, como também examinou as próprias,
fazendo da ficção uma vitrine da realidade contemporânea e dos territórios comuns do humano. O
presente trabalho pretende expor e analisar o que nela consta sobre (su)a fase derradeira, a velhice
– em uma decisão que pretende seguir na “quebra da conspiração de silêncio” (DE BEAUVOIR, 1970,
p. 06) circundante ao tema, aglutinador de resistências uma vez que “expõe o limite ao qual todos
nós somos submetidos” (MUCIDA, 2019, p. 16). À luz da psicanálise freudiana, um foco cairá sobre
Fantasma sai de cena (2007), o volume final do projeto de formação – repetitivo e cheio de nós,
como a neurose – de seu alter ego Nathan Zuckerman. Para com base em Freud comentar suas
experiências, essas serão agrupadas em quatro núcleos de sentido cujos denominadores comuns são
a perda e o luto: I) corpo, incontinente, dolorido e rejeitado; II) sexo, guardado pelos conflitantes
quereres de seguir desejante ou deixar de sê-lo; III) desencontro com a atualidade, com as gerações
mais novas, suas tecnologias e valores; e IV) morte, certamente próxima.
Referências: BEAUVOIR, Simone de. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1970. MARTÍ, Silas.
Philip Roth era o ápice da literatura americada desde faulkner, diz harold bloom. Folha de S. Paulo.
23 de maio de 2018. 11h04. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2018/05/era-
uma-forca-e-esteve-entre-nos-por-muito-tempo-diz-paul-auster-sobre-philip-roth.shtml. Acesso
em: 29 de dez. de 2022. MUCIDA, Ângela. O sujeito não envelhece: psicanálise e velhice. 2ª Edição.
Belo Horizonte: Autêntica, 2019. ROTH, Philip. Fantasma sai de cena. São Paulo: Companhia das
Letras, 2007.
232
MAS, “O QUE FAZER?”: ESCRITORES CRIATIVOS E A FANTASIA COMO PROPOSTA DE REINVENÇÃO
DA REALIDADE
Polyana Corrêa
Resumo: Na psicanálise, Freud nos indica que o processo de fantasiar, enquanto ação psíquica,
envolve sempre a correção de uma realidade insatisfatória. Além disso, o trabalho mental intrínseco
ao fantasiar compreende três instâncias temporais que costuram a trama do desejo de um sujeito:
uma impressão atual e propulsora — um objeto da realidade, uma pessoa, um contexto político
insatisfatório — que faz com que uma memória do passado seja reacessada e que o futuro possa ser
montado ficticiamente como horizonte de realização de um ideal. Em um nível individual, esse
processo abarca atividades simples e cotidianas como a brincadeira da criança, na qual ela cria uma
realidade diferente daquela experienciada e o devaneio do adulto, momento no qual o psiquismo
permite que a fantasia tome lugar de uma realidade controversa. Enquanto o indivíduo que devaneia
geralmente não compartilha suas fantasias íntimas com o âmbito social, o escritor, ao criar uma obra
literária, oferece ao mundo não só a representação psíquica de seus desejos íntimos, mas também a
possibilidade de transformação de uma realidade opressora. No entanto, ao contrário das formas
fantasiosas presentes nos devaneios e nas brincadeiras infantis, um livro pode mudar historicamente
os rumos de toda uma geração. A fim de conduzir esta análise evocaremos o romance de 1863
intitulado “O que fazer? ” do escritor Nikolai Tchernychévski e sua respectiva importância não só
para o contexto da Revolução Russa como também na mobilização política e prática dos leitores
dessa obra. Apesar de sua condição de prisioneiro, da proibição do exercício de sua escrita
jornalística e da censura vigente no regime czarista, o impacto do romance de Tchernychévski traduz
e transmite para o nível de ações possíveis na realidade as questões filosóficas, critico-literárias e
políticas circulantes no ambiente cultural para além da utopia.
Referências: Freud, S. (1908/1996). Escritores criativos e devaneio. In: J. Salomão (Trad.). Edição
Standard das Obras Completas de Sigmund Freud (Vol. 9, pp. 131–143). Rio de Janeiro: Imago.
Tchernychévski, N. G. (2015). O que fazer?. Curitiba: Editoria Prismas. Trad.: Angelo Segrillo.
233
Referências: A BÍBLIA. Mateus 4: A tentação de Jesus. Trad. João Ferreira de Almeida. 2. ed. São
Paulo: Geográfica, 2013. 368 p. ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano. Trad. Rogério Fernandes. São
Paulo: Martins Fontes, 1992. LACAN, Jacques (1958-1959). O Seminário, livro 6: O desejo e sua
interpretação. Porto Alegre: Zahar, 2016. LACAN, Jacques (1962-1963). O Seminário, livro 10: a
angústia. Porto Alegre: Zahar, 2005. REZENDE, Maria Valéria. Quarenta Dias. Rio de Janeiro:
Alfaguara, 2014. SILVA, Marisa Corrêa. Materialismo Lacaniano. In: BONNICI, Thomas; ZOLIN, Lúcia
Osana (org.). Teoria Literária: Abordagens históricas e tendências contemporâneas. 4. ed. Maringá:
Eduem, 2019. p. 205-210. SILVA, Marisa Corrêa. O percurso do Outro ao Mesmo: sagrado e profano
em Helder Macedo e em Saramago. São Paulo: Arte & Ciência, 2009. ŽIŽEK, Slavoj. Como ler Lacan.
Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. ŽIŽEK, Slavoj. O amor impiedoso (ou:
Sobre a crença). Trad. Lucas Mello Carvalho Ribeiro. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.
234
romance tomando por base a crítica psicanalítica. A obra é narrada por Lucina, personagem
protagonista, e apresenta a trajetória de uma escritora que tem sua vida marcada pela convivência
com uma enfermidade nos olhos, para a qual o tratamento é incerto. É possível associar o romance
a uma já tradicional escrita da cegueira, cujas raízes podem ser rememoradas desde a mitologia
grega, das quais podemos citar Édipo e Tirésias como figuras emblemáticas; mas que persiste
também em obras contemporâneas como Ensaio sobre a cegueira (1995), de José Saramago, ou
Informe sobre Ciegos – terceira parte de Sobre Héroes y Tumbas (1991), de Ernesto Sábato, dentre
outros. O escopo de nossa análise, entretanto, recai sobre a forma como são tecidas e se desdobram
as relações da protagonista com sua mãe e seu namorado, atravessadas pela condição da cegueira,
mas, sobretudo pela inscrição do desejo. Para tanto, recorremos aos conceitos de narcisismo
primário, desenvolvido por Freud em sua Introdução ao Narcisismo (1914), e de montagem perversa,
a partir das considerações de Contardo Calligaris em Perversão – um laço social?(1986).
Referências: CALLIGARIS, Contardo. Perversão - um laço social? Salvador: Cooperativa Cultural
J.Lacan, 1986. FOSCARINI, Silvia Regina Gomes (et. al). Trauma, perversão e laço conjugal. Reverso.
Belo Horizonte. Ano 26, n 51. p. 77-84. Ago, 2004. FREUD, Sigmund. Obras completas, volume 12:
introdução ao narcisismo; ensaios de metapsicologia e outros textos (1914-1916). Tradução e notas
Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. FREUD, Sigmund. Obras completas,
volume 6: três ensaios sobre a teoria da sexualidade, análise fragmentária de uma histeria ("O caso
Dora") e outros textos (I90I-1905); tradução Paulo César de Souza. 11 ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2016. MELMAN, Charles; LEBRUN, Jean Pierre. O homem sem gravidade: gozar a qualquer
preço. Companhia de Freud: 2003. MERUANE, Lina. Cercada. Santiago: Cuarto Próprio, 2000.
MERUANE, Lina. Fruta podrida. Chile: FCE, 2007. MERUANE, Lina. Las infantas. Buenos Aires: Eterna
Cadencia, 2010. MERUANE, Lina. Póstuma. Novela. Santiago: Planeta, 2000. MERUANE, Lina. Sangue
no olho. Tradução Josely Vianna Baptista. São Paulo: SESI-SP Editora, 2018. MERUANE, Lina. Sistema
nervoso. 1. ed. Tradução Sérgio Molina. São Paulo: Todavia, 2020. MOREIRA, Jacqueline de Oliveira.
Édipo em Freud: o movimento de uma teoria. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 9, n. 2, p. 219-227,
mai./ago. 2004. PALMA, Clemente. Los ojos de Lina, in: Narrativa completa. Pontificia Universidad
Católica del Perú Ediciones del Rectorado, Lima, 2006. QUEIROGA, Lula. Noite severina. In: aboiando
a vaca mecânica. [2001]. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=aE6ueyXnfhI. Acesso
em: 05 ago 2022. SÁBATO, Ernesto. Sobre héroes y tumbas. 5. ed. (definitiva). Barcelona, Editorial
Seix Barral, S. A.: 1991. SARAMAGO, José. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo: Cia. das Letras, 1995.
235
Destarte, o presente estudo, por meio de uma revisão literária, objetiva uma breve discussão sobre
o processo de legitimação e aceitação dos quadrinhos nos espaços formais de ensino e as
possibilidades de uso das HQs enquanto suporte pedagógico.
Referências: NETO, Elydio dos Santos; SILVA, Marta Regina. Introdução: Os gibis estão na escola, e
agora? In: ______. Histórias em quadrinhos e práticas educativas, volume II: os gibis estão na escola
e agora? São Paulo: Criativo, 2015, p. 10-13. NOGUEIRA, Natania A. S. Gibiteca: possibilidades de
criação e uso no trabalho pedagógico com crianças, jovens e adultos. IN: Histórias em quadrinhos e
práticas educativas, volume II: os gibis estão na escola e agora? Organizadores Elydio dos Santos
Neto, Marta Regina Paulo da Silva. São Paulo: Criativo, 2015. p. 89-101. VERGUEIRO, Waldomiro. Uso
das HQs no ensino. In: RAMA, A.; VERGUEIRO, W. (Org.). Como usar as histórias em quadrinhos na
sala de aula. São Paulo: Contexto, 2010. p. 7-29. ______. Panorama das histórias em quadrinhos no
Brasil. São Paulo: Criativo, 2017. ______. Pesquisa Acadêmica em Histórias em Quadrinhos. São
Paulo: Peirópolis, 2017.
236
Júlio Cezar Bastoni Da Silva
Resumo: A produção do poeta catarinense Cruz e Sousa parece ocupar um lugar relativamente vário
em nossa tradição crítica e historiográfica. Em sua recepção imediata, em 1893, Araripe Júnior, a
partir de um viés ligado às teorias raciológicas de seu tempo, parece ter determinado um espaço
para a recepção da poesia sousiana que ainda nos esforçamos por superar: a de um poeta
“maravilhado” (ARARIPE JR., 1963, p. 147) com as conquistas da civilização, pouco afeito ou mesmo
avesso às lides sociais da época. De outro lado, a publicação tardia de suas obras completas,
organizadas por Andrade Muricy a partir do material legado pelo poeta a seu amigo Nestor Vítor,
nos evidenciou a faceta abolicionista e mesmo antirracista do autor, senda continuada até estudos
recentes, como os de Alfredo Bosi (2002) e Cuti (2009). Entre um poeta, portanto, afastado das
questões materiais e políticas de seu tempo, e outro, profundamente vinculado à reflexão e crítica
às consequências do racismo brasileiro de origem colonial-escravista, há uma clivagem que, a nosso
ver, ainda não foi superada, pois aparentemente reside em ênfases diversas sobre manifestações
particulares da poesia do autor. Em outras palavras, a poesia sousiana se dividiria em duas vertentes
aparentemente não comunicáveis, entre a de um tribuno e a de um místico, um poeta
simultaneamente voltado às questões da imanência e às da transcendência. Esta comunicação
pretende, nesse sentido, refletir sobre esse “incômodo lugar” da poesia sousiana em nossa tradição
historiográfica, procurando avaliar alguns pontos nevrálgicos de sua recepção crítica e seus
processos de canonização, bem como buscar possibilidades de compreendê-la como resultado de
um projeto literário orgânico, o que pode contribuir para o delineamento de seu perfil particular na
poesia brasileira, a partir de sua experiência na periferia da modernidade ocidental.
Referências: ARARIPE JÚNIOR. Movimento literário do ano de 1893. In: ARARIPE JÚNIOR. Obra
crítica. Rio de Janeiro: MEC: Casa de Rui Barbosa, 1963. p. 105-194. v. 3. BOSI, Alfredo. Poesia versus
racismo. In: ______ Literatura e resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 163-185.
CUTI. A consciência do impacto nas obras de Cruz e Sousa e de Lima Barreto. Belo Horizonte:
Autêntica, 2009.
237
MOREIRA, Maria Eunice. História da literatura: algumas considerações teóricas. Revista Vidya.
Número 37. Janeiro/junho 2002.
https://www.periodicos.unifra.br/index.php/VIDYA/article/view/471/457. Acesso em 05/04/2022.
OLINTO, Heidrun, Kreiger. Histórias de literatura: conflitos e caminhos. Revista Légua & Meia,
número, 1, UEFS. 2002. Disponível em http://www2.uefs.br/ppgldc/revista1_35.html. RANCIÈRE,
Jacques. A partilha do sensível; estética e política. Trad. Mônica Costa Netto. São Paulo: Editora 34,
2009. YÚDICE, George. A conveniência da cultura; usos da cultura na era global. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2004.
238
(v.10, p.85, 2008) Com isso, a representação do contexto genocida no arraial do Belo Monte e seus
personagens traz a lume o despertar para uma leitura de recepção que dialoga com a e literatura nas
suas interfaces. Em O Silêncio do Sino foi detalhado momentos que marcaram o episódio e
representa o comportamento da comunidade atual na perspectiva da identidade, o sentimento de
pertença, a recepção, a memória subterrânea e coletiva. Conforme POLLAK (1989) esse
reconhecimento do caráter potencialmente problemático de uma memória coletiva já anuncia a
inversão de perspectiva que marca os trabalhos atuais sobre esse fenômeno. E completa: “Aplicada
à memória coletiva, essa abordagem irá se interessar, portanto, pelos processos e atores que
intervêm no trabalho de constituição e de formalização das memórias” POLLAK (v. 2, p. 3-15,1989).
Referências: CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de Canudos. Rio de Janeiro: Ediouro, s.d.,
363p. POLLAK, Michael. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, n. 3, 1989, p. 3-15. ROCHA, J.C.
(org.). Teoria da ficção: indagações à obra de Wolfgang Iser. Rio de Janeiro: Eduerj, 1999. SANTTANA,
Ivan. O Silêncio do Sino: Um Menino na Guerra de Canudos. São Paulo: Lura Editorial – 1ª Edição,
2019. SILVA, José Calasans Brandão da. Cartografia de Canudos. Salvador: Assembleia Legislativa,
2015, 330 p. ZILBERMAN, R. Estética da recepção e história da literatura. Ed. Ática. São Paulo. 1989.
239
na antologia. Vamos nos basear nos estudos recentes destas obras, principalmente no livro da
Professora Florentina Souza. Ela afirma: “A invisibilidade social do afro-brasileiro manifesta-se, ainda,
na incapacidade de enxergá-lo fora dos papéis sociais a ele destinados pela sociedade” ( SOUZA). Por
isso, os negros na literatura são minorias. Machado ganha sua visibilidade quando se disfarça de
branco. Para isto, contribuem os historiadores e o próprio gênio, entretanto este deixa pistas, em
seus escritos, de suas fraquezas, que o tornariam como os “outro”. Os Cadernos Negros dão uma
visibilidade a história de escritores e escritoras negros/as que, em caso contrário estariam
totalmente esquecidos, restando para eles o estereótipo da seguinte expressão, os negros bons não
são bêbados (MACAHDO DE ASSIS), os negros bêbados não são bons (LIMA BARRETO).
Referências: ASSIS, Machado. Dom Casmurro, Penguin-Companhia; 1ª edição 2016 BARRETO, Lima.
Clara dos Anjos, Penguin-Companhia; 1ª edição 2012 BARTHES, Roland. A Camara clara. 3e. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1984.lo DELEUZE Gilles, Différence et répétition, Paris, PUF, 1968. CAMUS,
Albert. L'Étranger, Profil-Litteraire.fr (29 fevereiro 2016) OLINTO, Antônio. Literatura Brasileira,
Editora Lisa, 1994 SANTOS, Nilo Rosa. Sindicato, Poder, e Al - teridade: o “Outro” nas relações
políticas – Salvador, CRAES, 2004 SOUZA, Florentina da Silva. Afro-descendência em Cadernos Negros
e Jornal do MNU. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
240
Resumo: Embora ainda pouco estudado, há um vasto itinerário de obras em prosa onde Carlos
Drummond de Andrade discute marcadamente: o ofício de escritor, a condição do intelectual, a
reflexão sobre o propósito da estética e da literatura, bem como a conjuntura política de momentos
históricos marcantes, como a “Revolução de 1930”, a Segunda Guerra Mundial e o “Estado Novo”.
Cabe considerar também que o debate acerca da cultura brasileira institui uma tradição entre os
escritores nacionais, manifestando um traço constante, que delineia o roteiro de um "itinerário
intelectual coletivo", principalmente em relação a um processo contínuo de representação da
identidade cultural nacional; e que alguns literatos modernistas produziram relatos privilegiados
sintetizando tanto as condições sociais de sua intelectualidade, como os dilemas implicados na
problemática da atuação nos projetos políticos de modernização do Estado Nacional no Brasil. Nessa
medida, ao refletir sobre sua participação social no decênio de 1930, o intelectual modernista, além
de contribuir para a constituição da história da literatura brasileira, evidencia em que medida a
renovação dos meios expressivos promovida por ele se insere tanto nos âmbitos do Governo
Provisório e do Estado Novo na “Era Vargas”, como no contexto geral de sua época. Na evidência de
que a problematização desses aspectos é um programa discursivo da prosa Drummondiana que se
consolida a partir de 1940, busca-se demonstrar como “Tempo, vida, poesia” reflete sobre a
compreensão de Carlos Drummond acerca da “Revolução de 1930” e do Estado Novo. Nesse sentido,
desenvolvendo um dos eixos temáticos que ainda poderiam ser abordados na tese “Tempo, vida,
poesia: perfil autobiográfico na prosa Drummondiana”, o presente trabalho aborda algumas
perspectivas de Drummond sobre a “Revolução de 1930” que contrastam com sua reflexão acerca
das formas de atuação do intelectual vivenciadas durante o governo varguista. (MOREIRA, 2019)
Referências: MOREIRA, Thadeu Togneri. “Tempo, vida, poesia: perfil autobiográfico na prosa
drummondiana”. Tese(doutorado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 2019.
241
contradição no discurso do historiador Gilfrancisco para reescrever a literatura sergipana. Teresa
(USP), p.217-226, 2018.
242
Mondadori, 2003: PASOLINI, Pier Paolo. Teatro. Milano: Mondadori, 2001; PASOLINI, Pier Paolo. Per
il cinema. 2 vol. Milano: Mondadori, 2001. PASOLINI, Pier Paolo. Saggi sulla letteratura e sull’arte. 2.
vol. Milano: Mondadori, 1999; PASOLINI, Pier Paolo. Saggi sulla politica e sulla società. Milano:
Mondadori, 1999; PASOLINI, Pier Paolo. Romanzi e racconti. 2 vol. Milano: Mondadori, 1998; 3b)
Pasolini e Dante PATTI, Emanuela. Pasolini after Dante. Oxford: Legenda, 2016; PESSOA, Davi. Dante:
espinha dorsal de Pasolini? In: Davi Pessoa Carneiro Barbosa; Maria Pace Chiaveri. (eds.). Catálogo:
Dante poeta de toda a vida. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2015, v. 1, p. 97-106;
ZIGAINA, Giuseppe. Hostia: trilogia della morte di Pasolini. Venezia: Marsilio, 1995. 4) Literatura do
Sul Global e a Cultura ABDALA JR., Benjamin; SCARPELLI, Marli Fantini (eds.) Portos flutuantes:
trânsitos ibero-afro-americanos. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004. CAMINATI, Luca. Pasolini
Southward Quest(ion). Estetica. studi e ricerche. 2/2017, 273-292; CASSANO, Franco. Southern
Thought and Other Essays on the Mediterranean. New York: Fordham, 2012; COUTINHO, Eduardo.
Regionalism vs. World Literature in João Guimarães Rosa. In: Brazilian Literature as World Literature.
New York and London: Bloomsbury, 2018, 221–242. MAJSTOROVICH, Gorica. Global South
Modernities: Modernist Literature and the Avant-Garde. London: Lexington Books, 2020; SANTOS,
Boaventura de Sousa. The End of the Cognitive Empire. The Coming of Age of the Epistemologies of
the South. Durham: Duke Universiy Press, 2018; TRENTO, Giovanna. Pasolini e l’Africa, l’Africa di
Pasolini: Panmeridionalismo e rappresentazioni dell’Africa postcoloniale. Milano: Mimesis, 2010.
WEST-PAVLOV, Russel (ed.). The Global South and Literature. Cambridge: Cambridge University
Press, 2018.
LITERATURA-MUNDO E A LUSOFONIA
Adriano Carlos Moura
Resumo: : Mundo e universo são palavras que guardam muitas semelhanças, principalmente quanto
à abrangência: abarcam conceitos objetivos como astros, planetas, topografias, espécies as mais
diversas. Não fosse a origem colonial e elitista, literatura universal seria um sintagma que poderia
abranger as diferentes manifestações literárias presentes no mundo, respeitando-se as
idiossincrasias de cada nação, povo, cultura, território, língua. A universalidade da obra seria
entendida pela sua capacidade de transpor os limites de sua origem e de se espraiar por outras
nações, povos, culturas, territórios, línguas que, com o passar dos anos, reteriam numa espécie de
biblioteca coletiva as que julgassem merecedoras de permanência devido a suas éticas, estéticas,
políticas, ideologias, poéticas, ou devido aos critérios que cada grupo julgasse pertinente para definir
seus universais. Desse modo, a literatura universal seria composta por um número variado de
cânones europeus, americanos, asiáticos, africanos, ocidentais, orientais, indígenas. A Europa, que
durante séculos tomou para si a tarefa de hierarquizar e “organizar” o mundo de maneira que
atendesse exclusivamente a seus interesses, não goza mais do título de único centro da cultura ou
economia, apesar de ser ainda o continente com maior número de escritores sempre que aparece
alguma lista de “Clássicos da Literatura Universal” ou “Cânones” e de ser também o espaço através
do qual os não europeus se lançam para o resto do mundo. Como caminho teórico para compreensão
da produção e circulação de obras literárias que extrapolam os limites territoriais, temáticos e
linguísticos da nação, esta comunicação se propõe refletir sobre o conceito de literatura-mundo e
até que ponto essa seria uma chave para o entendimento e análise das questões que envolvem os
objetos literários das literaturas do chamado Espaço Lusófono.
Referências: BITTENCOURT, Rita Lenira de Freitas. Literatura-mundo e poéticas do presente: modos
de ler. IPÓTESI: Revista de estudos literários, Juiz de Fora, MG, v. 22, n. 1, p. 23-29, jan./jun. 2018.
Disponível em: https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/196111. Acesso em: 06 dez. 2019
DAMROSCH, David. What is world literature. New Jersey: Translation, 2003. ECO, Humberto. Quase
243
a mesma coisa. São Paulo: Record, 2014. KANDJIMBO, Luís. Alumbu – O cânone endógeno no campo
literário angolano para uma hermenêutica cultural. Luanda: Mayamba Editora, 2019. KESTLER,
Izabela Maria Furtado. O conceito de literatura universal em Goethe. Revista Cult. Disponível em:
https://revistacult.uol.com.br/home/o-conceito-de-literatura-universalem-goethe/ . Acesso em: 17
abril 2020. LARANJEIRA, Pires. Universo das literaturas africanas: epistemologias variadas, rizomas
com raiz, glocalizações e levantados do chão. In: GARCÍA, Flavio; MATA, Inocência (Orgs.). Pós-
colonial e Pós-colonialismo: propriedades e apropriações de sentido. Rio de Janeiro: Dialogarts,
2016. p. 201-214.
244
fronteiras entre o eu e o outro até chegarmos na ambivalência morte e vida, presente no texto de
Bakhtin sobre Rabelais e demais ocorrências no âmbito literário.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de
François Rabelais. Tradução de Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Editora HUCITEC, Editora
Universidade de Brasília, 1987. BAUDELAIRE, Charles. Flores do mal. Tradução: Júlio Castañon.
Editora Penguin-Companhia; 1ª edição, 2019. CORBIN, Alain. Saberes e odores: o olfato e o
imaginário social dos séculos dezoito e dezenove. Tradução: Ligia Watanabe. Editora Companhia das
Letras, São Paulo: 1987. JAQUET, Chantal. Filosofia do Odor. Tradução: Maria Angela Mársico da
Fonseca Maia e Michael Jean Maurice Vincent. Rio de Janeiro: Grupo Editorial Nacional (GEN)
Forense Universitária, 2014. LOTMAN, Iúri. “O Conceito de fronteira”. Tradução de Ekaterina Vólkova
Américo. In: BORGES FILHO, Ozíris. O espaço literário: textos teóricos. Uberaba: Ribeirão Gráfica e
Editora, 2016, p. 243-258.
245
constante movimento era o caminho para evitar o mal. No romance, o corpo em movimento é
colocado em paralelo com o mundo. Dessa forma, o mundo aparece como um corpo coletivo,
grotesco (BAKHTIN, 1987) e nômade, o que também se reflete na estrutura fragmentária, porém
una, do romance.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de
François Rabelais. Tradução de Yara Fratoschi Vieira. São Paulo: Editora Hucitec, 1987. LOTMAN, Iúri.
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TOKARCZUK, Olga. Correntes. Tradução de Olga Baginska-Shinzato. São Paulo: Editora Todavia, 2021.
246
irracional e inconsequente, legitimando assim qualquer ação que retifique o curso da rebelião e
controle seus efeitos inesperados”, o pensamento crítico e historiográfico brasileiro buscaria
“retratar as culturas não ocidentais como partes de uma pré-moldada fábula das três raças
formadoras, imbuídas e coordenadas por um certo telos da nacionalidade” (MELO, 2020, p. 143),
retirando, assim, a radicalidade daqueles que resistiram à assimilação a um Estado-Nação chamado
Brasil. O que se busca defender no estudo que aqui se propõe é que Barroso, ao seu modo, também
constitui sua própria prosa de contrainsurgência: seja em seus escritos ficcionais, seja em suas obras
integralistas, os russos estão sempre atrelados ao desvario próprio de uma visão do Oriente
construída por intelectuais e políticos ocidentais, deslegitimando o processo revolucionário de 1917,
bem como tentativas de reproduzi-lo em terras brasileiras.
Referências: MELO, Alfredo Cesar. Crítica da razão nacional-ocidentalista: por uma nova abordagem
pós-colonial nos estudos brasileiros. Alea: Estudos Neolatinos, v. 22, p. 17-40, 2020. GUHA, Ranajit.
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2020.
248
contemporâneo Joyce). Com o passar dos anos, Beckett passa do que Célia Berrettini considera uma
linguagem exuberante (BERRETTINI, 2004, p. 61), similar à de Joyce, a um estilo mais próprio,
abandonando qualquer preocupação figurativa, mas sempre com atenção à centralidade do papel
criador, transformador da linguagem, como destaca Edward Said. Beckett, assim, teria partido em
busca do que Pascale Casanova considera não apenas uma obra internacional, mas antinacional
(CASANOVA, 1997, p. 140), abandonando também uma visão de nação mais homogeneizante dos
revivalistas, associada ao pedagógico de Homi Bhabha. Nesse sentido, o papel dos diferentes
estágios de autotradução da obra de Beckett identificados por Chiara Montini é crucial:
primeiramente, o monolinguismo poliglota, seguido do bilinguismo predominantemente anglófono,
um bilinguismo predominantemente francófono e, por fim, um bilinguismo misto (MONTINI, p. 2).
Contudo, algumas questões, dentre muitas, permanecem: qual o papel dessa obra numa República
Mundial das Letras, como cunhada por Casanova? Uma vez findado esse projeto estético, podemos
considerá-lo exitoso? Quais as leituras feitas pela crítica e historiografia contemporâneas e que
questões elas suscitam?
Referências: BECKETT, Samuel. Dante… Bruno. Vico… Joyce. In: ______. Disjecta: Miscellaneous
Writings and a Dramatic Fragment. Nova York: Grove Press, 1984. ______. Recent Irish Poetry. In:
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Edward W. Humanismo e crítica democrática. Trad. de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia
das Letras, 2007.
249
sobre a África, seus aspectos culturais e mitológicos estão fundamentadas em Prandi (2001). Na
poesia dessas poetas, o erotismo torna-se a temática que define o sujeito feminino, de modo que o
corpo negro é inscrito enquanto local de prazer pelo prazer e não como um prazer a serviço do outro.
Referências: BORGES, Luciana. Poéticas da cor/eróticas de resistência: o corpo na poesia erótica de
escritoras negras brasileiras. Revista Letra Magna, v. 16, n. 26, 2020. Disponível em:
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identidade do negro brasileiro em ascensão social. 2.ed Rio de Janeiro: Edições Graal. 1983.
252
foi uma das precursoras da Negritude em Paris no período entreguerras, criou o Salão Clamart, que
reunia intelectuais negros da África e de sua diáspora, e foi editora do jornal “La Revue du Monde
Noir” (1931-1932). Quando retornou à Martinica, como liderança feminista criou a “Rassemblement
féminin” e “La Femme dans la Cité” (1945-1951), jornal dessa associação. Já Maria Nascimento foi
uma das fundadoras do Teatro Experimental do Negro (TEN, 1944-1961) e do jornal “Quilombo”
(1948-1950), dessa instituição. Neste jornal foi diretora-gerente e titular da coluna “Fala a mulher”.
Pretende-se, assim, a partir dos textos produzidos por Paulette Nardal, em “La Femme dans la Cité”,
e Maria Nascimento, no “Quilombo”, analisar as estratégias utilizadas por essas intelectuais negras
para enfrentar as opressões econômicas, políticas e de gênero em seus territórios, e as suas
propostas para elevação de autoestima das mulheres negras, de acesso à educação e ao trabalho, e
de direito ao voto e de participação política em seus países. O embasamento teórico de nossa análise
contempla Lélia Gonzalez, T. D. Sharpley-Whitinhg, Patricia Hill Collins, Giovana Xavier, bell hooks,
Alice Walker, Hanétha Vété-Congolo e Clara Palmiste.
Referências: COLLINS, Patricia Hill. Pensamento feminista negro: conhecimento, consciência e a
política do empoderamento. Tradução de Jamile Pinheiro Dias. São Paulo: Boitempo, 2019.
GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro-latino americano: ensaios, intervenções e diálogos.
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para todo mundo: políticas arrebatadoras. 12 ed. Tradução de Bhuvi Livanio. Rio de Janeiro: Rosa
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Tradução de Bhuvi Livanio. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2020. HOOKS, Bell. Erguer a voz: pensar
como feminista, pensar como negra. Tradução de Cátia Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante,
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NARDAL, Paulette. Beyond Negritude: essas from Woman in the City. Translated and notes by T. D.
Sharpley-Whiting. New York: State University of New York, 2009. NASCIMENTO, Maria. O Congresso
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Nacional das Mulheres Negras. Coluna “Escreve a Mulher”. Quilombo: vida, problemas e aspirações
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Nascimento: uma intelectual negra do pós-abolição. Niterói: Eduff, 2020. Coleção Personagens do
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busca dos jardins de nossas mães. Tradução Stephanie Borges. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.
253
SIMPÓSIO “LITERATURAS EM ABISMO: A PERSPECTIVA INTERSEMIÓTICA EM DEBATE”
Fernando de Mendonça (UFS) , Mariângela Alonso (USP) e Maria do Carmo Siqueira Nino
(UFPE)
254
desenvolvidas especialmente em sua obra “Matéria e Memória” (1999). A simbiose entre o passado
e o presente instaurada na forma de Tarkovski fazer cinema, compõe uma particularidade de
receptividade semiótica, bem como a utilização dos poemas de seu pai contribuem para a criação de
uma atmosfera onírica que fazem referência à memória e estimulam no indivíduo uma posição
contemplativa diante do filme. Assim como livro de Tarkovski “Esculpir o Tempo” (2002) onde estão
presentes os poemas de Arseny será utilizado, também será norteadora a leitura de Lucien
Dallenbach (1975) para o desenvolvimento de reflexões sobre a da “mise en abyme”, bem como a
de Umberto Eco (1989) para refletir sobre a questão especular que o filme provoca desde o seu
título. Nessa relação intersemiótica entre cinema e literatura, tendo como foco a obra
cinematográfica em questão, tais referenciais teóricos serão como o chão que antecede e,
concomitantemente, presentifica o salto existente em uma experiência abismal.
Referências: O Espelho. Direção de Andrei Tarkovski. Rússia, 1974. Longa-metragem, colorido e
preto e branco. Produção: E. Vaisberg. URSS Mosfilm (quarto grupo artístico), 1 DVD. (130min);
BERGSON, Henri. Matéria e Memória. São Paulo: Martins Fontes, 1999. TARKOVSKI, Andrei. Esculpir
o Tempo. 2ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2002. ANKER, Valentina; DALLENBACH, Lucien. A
Reflexão Especular. Art Internacional vol. XIX/2, fevereiro, 1975. Trad. do original em francês: Maria
do Carmo Nino. ECO, Umberto. Sobre os Espelhos E Outros Ensaios. 3ª edição. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1989.
255
CNRS Éditions, 2019. _______. La litttérature au quotidien: poétiques journalistiques au XIXe siècle.
Paris: Éditions du Seuil, 2007.
256
capacidade de recriar atmosferas por meio da luz, das cores e de seus efeitos ópticos, a presença dos
vitrais medievais é incontornável para a História das Artes, inclusive, e ainda que não seja habitual
uma reflexão nesse sentido, dentro da vertiginosa perspectiva da estrutura em mise en abyme. Com
o intuito de ocupar lacunas nesse tipo de abordagem – considerando a pouca visitação que os
estudos de mise en abyme realizam a exemplos da arte vitral – trazemos aqui uma proposta de
leitura que parte do “Vitral da Crucificação” (Vitrail de La Crucifixion), produzido entre 1161 e 1173,
com a última restauração datada em 2004, na Cathédrale Saint-Pierre et Sain-Paul, em Poitiers (FR).
Considerada uma das obras-primas da arte vitral, a obra se divide em três partes narrativas: o
martírio, a morte e a ressurreição/ascensão de Cristo, também apresentando na margem inferior
uma representação en abyme de seus doadores, as cabeças coroadas de Leonor da Aquitânia e
Henrique II, da dinastia Plantageneta. Nosso objetivo é de concentrar a reflexão em torno da
especular base que se forma na inusitada assinatura do vitral, verificando a relação ontológica que
existe entre esse tipo de linguagem visual e a qualidade mosaica, na qual será de extrema
importância a teorização que Lucien Dällenbach (2001), um dos mais importantes pensadores da
mise en abyme fez sobre a arte dos mosaicos, assim como a prefiguração legada pelos vitrais
medievais para com a moderna consciência fractal (CONDÉ, 1993).
Referências: CONDÉ, Susan. FRACTALIS, La Complexité Fractale Dans L’Art. La Différence, 1993. (trad.
Maria do Carmo Nino) DÄLLENBACH, Lucien. Mosaicos - um objeto estético à rebotes, Ed. du Seuil,
2001. (trad. Maria do Carmo Nino).
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SC, n. 92, jul. 2013. Tradução: André Vallias. Edição: Alexandre Nodari e Flávia Cera. Disponível em:
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Horizonte: Editora UFMG, 2014. TROIANO, Sergio. Calvino editore: riflessioni sui paratesti calviniani.
Incontri – Rivista Europea di Studi Italiani, Netherlands, Anno 30, 2015, p. 34-45. Disponível em:
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calviniani/download. Acesso em: 02 jul. 2019.
259
container de madeira utilizado para transporte foi pensado como uma evocação de frases em
palimpsesto, lembranças de leituras, ideias, pensamentos. Pensamentos estes que ao povoar a
mente e emergindo a partir do encontro com autores diversos mediados por vários tipos de
linguagens, sejam elas visuais (cinema, pintura) ou literárias ao longo de minha trajetória, tecem suas
influências e deixam suas marcas em mim. Toda escrita consiste em corte e a proposta levará
portanto em conta a vertigem viabilizada pela fragmentação, pela colagem, pelo labiríntico “mosaico
de citações” (Julia Kristeva, Sèméiotiké: Recherches pour une sémanalyse)), de referências
intertextuais a partir do deslocamento efetivado pelos trechos escolhidos, analisados à luz de
autores como Gérard Genette (Seuils; Pallimpsestes: la littérature au second degré)s), Lucien
Dällenbach (Le récit spéculaire: essai sur la mise em abyme; Mosaïques, Un objet esthétique à
rebondissements,), Susan Condé (Fractalis - La complexité fractale dans l’art), (Victor I. Stoichita, A
Instauração do Quadro - Metapintura nos Inícios dos Tempos), entre outros.
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Permutation, Fold-ins” in Blistène, Bernard, Legrand, Véronique, (org.) Poesure et peintrie "d´un art
à l´autre", França, Musée de Marseille, exposition du 12 février - 23 mai, 1993. - Condé, S., Fractalis
- La complexité fractale dans l’arts, tr.S.Condé, F.Vilter, C.Penwarden, Paris, La Différence, 1993 -
Dällenbach, L., Mosaïques, Un objet esthétique à rebondissements, Paris, Seuil, 2001 , Le récit
spéculaire. Essai sur la mise en abîme, Paris, Seuil, 1977 - Genette, G., Seuils, Paris, Seuil, 1987, coll.
Poétique. , Palimpsestes: la littérature au second degré, Paris, Seuil, 1982, coll. essais - Kristeva, J.,
Sèméiotiké: Recherches pour une sémanalyse, Paris, Seuil, (1969) 1978, coll. points. - Stoichita, Victor
I., A Instauração do Quadro - Metapintura nos Inícios dos Tempos Modernos Trad.Rui Pires Cabral,
Edição, revisão e bibliografia João Francisco Figueira e Vítor Silva KKYM | Lisboa, 2019.
260
Resumo: Uma criança acorda no meio da noite. Alcança uma cadeira. De joelhos, abre as janelas de
um casarão. A curiosidade chama-lhe do sono, há muito que ver noite adentro. Lá fora, na imensa
escuridão rompida de reflexos míticos, ergue-se a lona. O menino não está só... Em 1970, Federico
Fellini lança o filme documentário I Clowns, com tradução no Brasil para Os Palhaços. A obra foi uma
encomenda de um canal de televisão italiano. Contou o cineasta para essa produção com seu
parceiro Nino Rota, que nos move com trilha sonora primorosa. A encomenda era simples: contar
sobre os palhaços do passado. Assim fez Fellini, com tristeza amorosa, morando no filme, trazendo
lembranças, criando uma vida passada de infância, alcance, palhaços. Neste estudo, invisto sobre a
obra, filme documentário de Fellini, por dentro de sua inquietação, que opera em mim como
encantamento. Expectadora. A escolha que por vezes teima encontro, abismo, prescinde-se de um
lugar que outro, onde espia o medo e ri. Teoria é olhar. Digo, então, olhar por dentro, teoria e criação.
Para tanto, valho-me do recurso conceitual de mise em abyme dos estudos de André Gide enquanto
potência teórica, crítica e criativa para se pensar literatura pela criação literária com/em múltiplas
linguagens, discursos e interdisciplinaridades. Tomo-me enquanto quem lê, cria e escreve em três
tempos: fresta, rumo e contingência. Picadeiro é ferida.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Profanações. Tradução e apresentação de Silvino José Assmann.
São Paulo: Boitempo, 2007. AGAMBEN, Giorgio. O fogo e o relato. Ensaios sobre criação, escrita, arte
e livros. Tradução de Andrea Santurbano e Patricia Peterle. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018.
AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Trad. Vinícius Nicastro Honesko.
Chapecó: Argos, 2009. ADORNO, Theodor. O ensaio como forma. In. Notas de literatura. Trad. Jorge
de Almeida. São Paulo:editora 34, 2003. p. 15-45. DIDI-HUBERMAN, George. A sobrevivência dos
Vaga-lumes. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. DALLENBACH, Lucien. Intertexto e autotexto. In:
Intertextualidades. Tradução de Clara Crabbé Rocha. Coimbra: Almedina, 1979. TIMM, Ricardo.
Crítica da Razão Idolátrica. Porto Alegre: Editora Zouk, 2020. TIMM, Ricardo. ÉTICA DO ESCREVER:
Kafka, Derrida e a Literatura como crítica da violência. Porto Alegre: Editora Zouk, 2018.
261
SIMPÓSIO “MUNDOS RIZOMÁTICOS, CIRCUNVIZINHAS TRANSCULTURAIS: A LITERATURA
COMPARADA COMO ZONA DE FRICÇÃO NAS AMÉRICAS, ÁFRICAS E AMAZÔNIAS”
Amilton José Freire de Queiroz (UFAC), Ezilda Maciel da Silva (UFPA) e Henrique Silvestre Soares
(UFAC)
262
que as literaturas produzidas por Isabel Allende e Conceição Evaristo tecem olhares críticos e
solidários, bem como apresentam traços de uma literatura de resistência, ao assumirem a escrita
como espaço de denúncia e insurgência, ao “evocar as realidades pessoais e sociais – não através da
retórica, mas com sangue, pus e suor” (ANZALDÚA, 2000). Por isso, uma conclusão provisória do
trabalho seria a de que os dois contos inscrevem zonas de contato que rompem discursos
hegemônicos, ao trilhar espaços de memória que abrem horizontes para traçar meios para o ensino
de humanidades e linguagens da/na literatura hispano-americana e brasileira hoje.
Referências: ABDALA JÚNIOR, Benjamin. Comunitarismo literário-cultural e globalização: os países
de língua portuguesa. Journal of Lusophone Studies, v.1, p. 246-261, 2016; ALLENDE, Isabel. Cuentos
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línguas: uma carta para as mulheres escritoras do Terceiro Mundo”. Trad. Édina de Marco. Revista
Estudos Feministas, v. 8, n. 1, 2000b; BERND, Zilá. Afrontando fronteiras da literatura comparada: da
transnacionalidade à transculturalidade. Revista Brasileira de Literatura Comparada, v. 1, 2013; CASA
NOVA, Vera. Fricções: traço, olho e letra. Belo Horizonte: UFMG, 2008; COUTINHO, Eduardo. O novo
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memória e o imaginário transfronteiriço. É desse contraponto poético que emerge a constelação
rizomática das savanas e florestas em conexão. Portanto, este trabalho investiga a prática da
intertextualidade, transculturalidade e supranacionalidade como possibilidade pedagógica para
traduzir os mapas das paisagens poéticas de Mia Couto e Amarino Sales.
Referências: CANDIDO, Antonio. O estudo analítico do poema. São Paulo: Humanitas
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Fonseca (2006). Os resultados da pesquisa apontam para a cartografia das vozes negritude hoje: a
da jornalista Conceição Lima, a da professora Conceição Evaristo e a da ativista Cibele Resende. Três
vozes que se (des)encontram na figuração de poéticas da distensão, escrituras do corpo e itinerários
transfronteiriços. Três vozes que testemunham as polifonias intertextuais, interculturais e
transculturais das literaturas de fricção produzidas desde o olhar, a memória e tradição
afrodescendente. Enfim, procuramos demonstrar como a literatura afrodescendente
contemporânea (des)costura e distende os contrapontos da negritude desde o universo poético da
autoria feminina negra hoje.
Referências: ABDALA JÚNIOR, Benjamin. Necessidade e solidariedade nos estudos de literatura
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A invisibilidade do tradutor: uma história da tradução. São Paulo: Ed. Unesp, 2021.
268
PERELÉCHIN, O "ANTI-SCHNAIDERMAN"
Bruno Barretto Gomide
Resumo: Valéri Pereléchin (1913-1992) é hoje considerado um dos principais poetas da emigração
russa. Embora tenha deixado um arquivo opulento, dividido atualmente entre a Holanda e a Rússia,
foi objeto de pouca pesquisa nos principais centros de eslavística do Norte Global. No Brasil, onde
viveu por quatro décadas, é quase desconhecido, um caso (aparentemente) extremo de
marginalização e de isolamento da diáspora russófona na cultura de chegada. Sua atividade poética
e tradutória abrange três línguas (russo, mandarim e português) e um trânsito migratório entre São
Petersburgo, Kharbin e o Rio de Janeiro. Nesta comunicação, Pereléchin será examinado por três
ângulos: sua relação agônica com o meio literário brasileiro; suas tentativas de inserção em uma rede
de tradutores e estudiosos exilados nos Estados Unidos (Iuri Ivask, Gleb Struve e Victor Terras, entre
outros); sua competição, silenciosa mas agressiva, com outros tradutores de poesia russa no Brasil
dos anos sessenta e setenta, sobretudo com Boris Schnaiderman (1917-2016), o principal divulgador
da cultura russófona no Brasil. "Poesia russa moderna" (1968), realizado por Boris Schnaiderman em
parceria com Haroldo e Augusto de Campos, foi o pomo da discórdia, entendido por Pereléchin (mas
não necessariamente por seus interlocutores epistolares) como um exemplo de “futurismo” alheio
às vertentes mais representativas da poesia russa. Esta comunicação faz parte de uma pesquisa mais
ampla, financiada pelo CNPq, sobre a biografia intelectual de Boris Schnaiderman.
Referências: BAKICH, Olga. Valerii Pereleshin: the life of a silkworm. Toronto, U. of Toronto Press,
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269
em sua análise, mas também a circulação de ideias, imagens e representações no interior da própria
esfera literária russa, nas obras de menor alcance de público ou reconhecimento da crítica.
Referências: DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Dois sonhos – O sonho do titio e Sonhos de Petersburgo em verso
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270
Resumo: Kazímir Malévitch (1878-1935), artista da vanguarda, teórico da arte, filósofo e pedagogo,
no conjunto de referências sobre sua obra é considerado russo por diversos autores. Essa percepção
comum sobre o pertencimento identitário nacional do artista se deve ao fato de que a maioria de
seus textos foi escrita em língua russa e ao estabelecimento de sua carreira artística
majoritariamente em cidades da Rússia (Kursk, Moscou e São Petersburgo, no período imperial;
cidades da República Soviética Russa, no período soviético). Vale lembrar, no entanto, que o próprio
artista se autodeclarava ucraniano, que o ucraniano e o polonês foram suas línguas maternas e que
viveu até os 18 anos em cidades e vilas ucranianas. Os poucos textos autobiográficos do artista que
chegaram até nós são dedicados, em sua maior parte, à descrição da gênese de seu interesse pela
pintura e pelo desenho na infância e na juventude, sob a marcante influência da cultura visual e da
vida campesina ucraniana. Os temas do campesinato ucraniano estão presentes em suas telas
durante todos os períodos de sua carreira artística, destacando-se, aqui, o ciclo com as figuras de
camponeses produzido no contexto do Holodomor. Outro ponto relevante para a discussão alvidrada
é a especificidade da linguagem escrita do artista, originária não somente do compartilhamento das
experimentações poéticas futuristas e transmentais, mas também da secundariedade do idioma
russo como meio de expressão, provavelmente tratando-se de uma língua apreendida por Malévitch
na transição para a vida adulta. Propõe-se, portanto, para além dos debates sobre o pertencimento
nacional e/ou étnico do artista, explorar aspectos de sua autobiografia e obra artística e teórica
indicando a importância das raízes ucranianas para a formação de características únicas de sua
linguagem pictórica e escrita.
Referências: BASNER, Elena Veniamínovna. A pintura do período tardio de K.S.Malévitch: o
fenômeno da reconstrução pelo artista de sua carreira artística. Dissertação para a obtenção de
titulação de candidato de ciências em história da arte. São Petersburgo, 1999. [??????, ?????
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271
da ciência para organizar a sociedade, solucionar seus problemas e suprir suas necessidades, e os
que, reagindo a isso, afirmavam a inexorabilidade, no espírito humano, de desejos irracionais, do
anseio por conflito e da necessidade da busca e do fazer intermináveis. Se Dostoiévski se identifica
muito mais com a segunda posição do que com a primeira, ele contudo recusa as conclusões
provenientes de ambas, concebendo-as como expressões (ou sintomas) do individualismo e do
desenraizamento característicos das modernas sociedades europeias, cujos valores agora
penetravam a Rússia na garupa de um capitalismo ainda incipiente, mas profundamente
desagregador do ponto de vista social e psicológico. Num país em que modernização é praticamente
sinônimo de ocidentalização, o anti-herói dostoievskiano, destituído de nome e de lugar, figura como
símbolo de uma consciência nacional que pensa a si mesma a partir de seus próprios processos de
desenraizamento.
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274
Francisco Foot Hardman
Resumo: Nikolai Gógol, sem dúvida alguma, está entre os maiores nomes da literatura russa
moderna, até mesmo como um de seus "fundadores". Lu Xun, da mesma forma, é considerado um
dos pioneiros da moderna literatura chinesa, e por muitos críticos tido como o maior escritor do
século XX naquele país. Aqui apenas sugerimos uma ponte que aproxima, a partir de uma leitura
pessoal e cruzada dos conhecidos contos homônimos dos dois escritores: "Diário de um louco", seja
na versão original de Gógol (1835), seja na versão chinesa inaugural da literatura de Lu Xun (1918).
Valemo-nos das traduções brasileiras disponíveis de ambos. No caso de Lu Xun, com um registro
bibliográfico importante: salvo engano, a raríssima edição localizada recentemente por nossa colega
Fan Xing, que data de 1957, é a primeira disponível em língua portuguesa e no Brasil. Nada há, aqui,
de fortuito ou coincidente. Lu Xun foi um reconhecido tradutor da literatura russa na China, sendo
responsável, entre outros, pela introdução de "Almas Mortas" no Império do Meio. Parece que, neste
caso ao menos, temos uma espécie de rota da seda invertida, e a modernidade plena e sem aspas
que os russos legaram à humanidade chegou, também, com a força das palavras e da poesia, até o
extremo Leste, por caminhos que ainda podem ser trilhados.
Referências: - GÓGOL, Nikolai. Almas Mortas: poema. Trad. Tatiana Belinky. São Paulo: Perspectiva,
2011. - GÓGOL, Nikolai. O Capote e outras histórias. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Ed. 34, 2010. -
GOMIDE, B. B. (Org.). Nova antologia do conto russo (1792-1998). São Paulo: Ed. 34, 2011. - LU, Shin.
Diário de um louco: contos chineses. Trad. Antonieta Dias de Moraes. São Paulo: Eds. Zumbi, 1957. -
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mostração do real. Como considerou J. L. Nancy, Levinas nasceu para a literatura antes de se tornar
filósofo, o que talvez explique a precedência, em sua filosofia, da sensação e da “intriga literária”
sobre a transparência do saber teórico. Judeu de origem lituana que teve como língua materna o
russo e o hebraico, Levinas trouxe para o centro do pensamento filosófico europeu a síncope do
romance russo e inaugurou uma escritura filosófica e literária que excedeu os horizontes de
compreensão da tradição filosófica ocidental. Os seguintes temas presentes nos Cadernos de
cativeiro e no seu romance inacabado serão aprofundados: i) a relação entre “profecia” e “método
fantástico”, este associado por Levinas ao ??????, de Púchkin, e ambos entendidos como imagens
de uma “fome de acontecimento” às avessas [?????????] e sem causalidade que submete o “real às
bordas de um precipício”; ii) o procedimento de desformalização do real inscrito na cena de Alençon,
no romance inacabado Eros e iii) a noção de nudez presente na anotação de Levinas “Dostoiévski e
a busca pela nudez”, nos Cadernos.
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papel subalterno na sociedade do século XIX. Sua abordagem se deu sobretudo no meio da
intelligentsia russa, e marcou a literatura feminina com um tom ideológico e didático, e personagens
típicas dentro de um ideal de “mulher instruída”, isto é, mulher racional, cujos ideais e características
seriam os mesmos dos homens. Tolstói, ainda que não se vincule a essa tendência, apresenta, em
sua obra, elementos importantes para discutir essa questão. Propõe-se, então, a exposição de alguns
dos procedimentos estéticos empregados pelo escritor para criar a protagonista Anna, de maneira a
evidenciar como, por meio desta personagem, Tolstói positiva a subjetividade e o desejo femininos,
construindo uma representação que permite com que se estabeleçam diálogos com a Questão
Feminina. Em suma, discute-se como a estética apresentada em um texto literário pode se relacionar
a uma causa como a expressa pela Questão Feminina.
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algunos de los tópicos presentes en los escritos pedagógicos que incluyó en el boletín Yasnaya
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y traducción de Selma ANCIRA, México, Fondo Nacional para la Cultura y las Artes, 2005. • TOLSTÓY,
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281
Memórias póstumas de Brás Cubas e o conto “Teoria do medalhão”. A partir de um prisma que, no
Brasil, floresce nos ensaios de Roberto Schwarz, dos quais vale citar As ideias fora do lugar, faz-se
pertinente estabelecer um diálogo entre as referidas produções ficcionais a fim de observar de que
modo a obra de Gógol, cujo trabalho se desenvolveu na primeira metade do século XIX, contribuiu
para a gestação de uma forma de prosa capaz de lidar com a realidade material encontrada na
periferia do capitalismo. Sob tal perspectiva, além de uma atenção aos narradores, que apesar de
possuírem traços em comum são de naturezas distintas, surge a oportunidade de discutir o medalhão
machadiano à luz da figura de Tchítchikov — e vice-versa. Na esteira de tais observações, caberá
recorrer ainda às formulações de Dolf Oehler sobre Baudelaire, Heine, Flaubert dentre outros para
compreender de que modo Gógol pode se inserir no filão de escritores que exerceram, de algum
modo, a chamada “estética antiburguesa”, visto o teor da interlocução promovida pelo narrador-
autor de Almas mortas em relação ao “leitor” evocado do início ao fim da narrativa.
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Nasliêdia. Tom 2. Statí i vystupliênia. Moscou: Eisenstein-Tsentr, 2008, p.140.
283
torna-se mais nuançada. Sociedades como a Argentina também tomaram a Rússia como referência,
mas a distância geográfica e sua própria situação periférica ajudaram a construir um imaginário um
tanto diferente do gigante eurasiano, não só para dar conta do que ali acontecia como também para
explicar vários dos problemas presentes aqui. A arte, em particular, foi um campo bastante rico e
frutífero onde visões e descrições da Rússia foram produzidas e depois disseminadas por toda a
sociedade, e ainda assim pouco estudadas. Este trabalho pretende explorar as diferentes produções
artísticas (literatura, música, artes plásticas) que tiveram a Rússia como objeto central, não só para
explicar a imagem que foi construída sobre aquele país, mas também para analisar problemas
relacionados com a situação particular dos países periféricos e a viabilidade do comunismo, entre
outros.
Palavras-chave: Rússia; União Soviética; Argentina; Artes; internacionalismo
284
Neide Jallageas
Resumo: Quando perguntado sobre qual teria sido sua escola de arte, Andrei Tarkóvski, sem
titubear, responde: Guerra e Paz. Além de se educar artisticamente com o notável conde Tolstoi, o
cineasta foi leitor obsessivo de Dostoiévski, cujas obras não chegou a filmar, mas para as quais tinha
planos e apresentara propostas que nunca foram aceitas. Nas últimas páginas de seu diário o diretor
declara que o próximo filme que realizaria seria sua grande paixão: Hamlet, que ele mesmo levara
aos palcos moscovitas, da Moldávia e da Armênia em 1977, pouco antes de partir para a Itália. No
entanto, já no seu primeiro longa-metragem, Infância de Ivan (1962), reivindicou para si o direito de
subverter o roteiro para torná-lo filme. Sabemos também das ácidas críticas que fez Stanislaw Lem,
autor de Solaris (1972), para quem Tarkóvski teria se desviado completamente do texto literário.
Mas, Stalker (1979) parece ter sido o exemplo mais radical de transformação da obra literária original
em um roteiro totalmente diverso, ainda que escrito pelos próprios autores do livro, os irmãos Boris
e Arcadi Strugatski. Diante desse quadro, proponho apresentar algumas considerações sobre
Tarkóvski como leitor voraz e Tarkóvski, um artista que que fez do cinema a sua linguagem.
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288
uma vez que se revelam à beira do abismo, eliminando o véu ilusório que cobre as coisas ou que se
interpõe sobre as personagens e sobre os narradores, ou seja, há inconclusibilidade. Em suma, a
poética dostoievskiana afasta-se dos dogmas e configura-se em um grito pungente da instabilidade
dos sentidos e da falibilidade da razão. Com o objetivo de sustentar esta posição, ou seja, de
narrativas autorreflexivas, os romances Crime e castigo, O idiota e Os irmãos Karamázov serão
usados como exemplos.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. Problemas da poética de Dostoiévski. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense
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homem ridículo. São Paulo: 34, 2011. ____________________. Escritos da casa morta. São Paulo:
34, 2020. ____________________. Memórias do subsolo. São Paulo: 34, 2009.
____________________. O crocodilo e Notas de inverno sobre impressões de verão. São Paulo: 34,
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literatura e cultura russa. São Paulo: Ateliê, 2008. p.53-63.
289
só. Rasgos na paisagem, lembranças e algo se faz presente, neste espaço de ausências. E a sua
“observação do cotidiano e a transfiguração poética” como cerne de sua arte e temperamento, como
diz Boris Schnaiderman, que desempenha um papel fundamental em nossa recepção de Tchékhov.
E levantar perguntas na paisagem em Tchékhov, o lugar de descentramento, a angústia, a perda que
se instaura, o que parte, irremediavelmente, ou que está a ponto de partir. E hoje, diálogo com
nossas perdas, nos tempos de agora, e com as esperanças, e a poeira e brilho. Quem ali não é visto?
O que não se escuta? Nas cidades, um silêncio, perto do asfalto. Às margens do lago,ou fronteiras,
ou esquinas invisíveis na cidade, no escuro do continente, diante do mar. Margens na cidade e no
lago. Um silêncio, muito próximo, um silêncio. Uma folha. Ouve, você?
Referências: ANGELIDES, S. A. P. Tchékhov: Cartas para uma Poética. São Paulo: EDUSP, 1995.
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o haxixe e outras drogas. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. p.7-132. DIDI-HUBERMAN, G. A dialética
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vemos, o que nos olha. São Paulo: Editora 34, 1998. p. 79-116. TCHÉKHOV, A. A Dama do Cachorrinho
e Outros Contos. Tradução, posfácio e notas de Boris Schnaiderman. São Paulo: Editora 34, 2006a.
TCHÉKHOV, A. O beijo e outras histórias. Tradução de Boris Schnaiderman. São Paulo: 34, 2006b.
TCHÉKHOV, A. Cartas a Suvórin: 1886-1891. Tradução de Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas
de Andrade. São Paulo: Edusp, 2002. TCHÉKHOV, A. A Gaivota. Tradução de Rubens Figueiredo. São
Paulo: Cosac Naify, 2004. TCHÉKHOV, A. A Ilha de Sacalina: Notas de viagem. Tradução e
apresentação de Rubens Figueiredo. São Paulo: Todavia, 2018. VÁSSINA, E. A.P. Tchékhov: Um
clássico contemporâneo da literatura russa. Revista Cult, São Paulo, v. 12, n. 132, fev. 2009, p. 62-65.
290
SIMPÓSIO “NARRATIVAS CONTEMPORÂNEAS: PAISAGENS IDENTITÁRIAS E PERTENCIMENTOS EM
LÍNGUA PORTUGUESA”
Charles Borges Casemiro (IFSP) e Mauro Dunder (UFRN)
291
O ESPAÇO DO CONTO COMO PAISAGEM IDENTITÁRIA: VIOLÊNCIA E PERTENCIMENTO
Ana Luiza Gerfi Bertozzi
Resumo: A escrita dos Contos de Fada envolve um contínuo processo de manipulação e criação
literária que colabora para a permanência de tais narrativas no imaginário popular e nas produções
literárias contemporâneas, como é o caso do conto “Branca de Neve”, de Lídia Jorge, que estabelece
uma inegável relação de atualização com “Branca de Neve”, conto publicado no compilado dos
Irmãos Grimm: Kinder- und Haus-Märchen, na Alemanha, entre os séculos XVIII e XIX. O trabalho
propõe a análise comparativa dos dois contos chamados “Branca de Neve”, com o objetivo de
entender como é construída a paisagem identitária em cada um deles, a partir do ponto de contato
estabelecido entre as narrativas: o pertencimento das protagonistas - Branca de Neve e Maria da
Graça - e a violência sofrida por elas. Para isso, os contos serão analisados como discursos estéticos
literários, ou seja, a partir de suas propriedades históricas, dialógicas, sociais e ideológicas (BAKHTIN,
1997, 1988), destacadamente, entendendo o conto como forma histórica (PONTIERI, 2012) e
analisando a figuração literária das três categorias de mundo no discurso narrativo: sujeito, tempo e
espaço (BENVENISTE, 1976). A hipótese que esse trabalho busca investigar é a de que o
pertencimento das protagonistas ao seu espaço e a violência sofrida por elas são ferramentas na
construção da paisagem identitária. Por meio de diversas ferramentas formais que exemplificam os
constantes processos de atualização, os autores e a autora buscam construir as paisagens identitárias
dos contos: uma que busca a identificação, outra que busca o questionamento destes espaços.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 2. ed. Trad. Maria Ermantina Galvão G.
Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997. BAKHTIN, Mikhail. Questões de literatura e de estética: a
teoria do romance. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo, Unesp/Hucitec, 1988. BENVENISTE, Émile.
Problemas de linguística geral. Trad. Maria da Gloria Novak e Luiza Neri. São Paulo: Editora Nacional,
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GRIMM, Jacob; GRIMM, Wilhelm. Contos Infantis e Domésticos. Tradução: Teresa Aica Bairos. Lisboa:
Temas e Debates, 2013. (Título original: Kinder-und Hausmärchen). FILHO, Ozíris Borges. Branca de
Neve às avessas (pero no mucho). In: BARBOSA, Sidney. FILHO, Ozíris Borges. MORAES, Jorge Luiz
Marques de. O Espaço Literário na obra de Lídia Jorge. Rio de Janeiro, RJ: Bonecker, 2018. FIORIN,
José Luiz. Uma teoria da enunciação: Benveniste e Greimas. Gragoatá, v. 22, n. 44. UFF, 2017. p. 970-
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da enunciação: as categorias de pessoa, espaço e tempo. 3 ed. – São Paulo: Editora Contexto, 2016.
JORGE, Lídia. Branca de Neve. In: JORGE, Lídia. Antologia de Contos. Org. Marlise Vaz Bridi. São Paulo:
Leya, 2014. PONTIERI, Regina. Formas históricas do conto. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Letras
e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2012. VOLOBUEF, K. Os Irmãos Grimm e as raízes
míticas dos contos de fadas. In: VOLOBUEF, K.; ALVAREZ, R. G. H.; WIMMER, N. (Orgs.). Dimensões
do fantástico, mítico e maravilhoso. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011, p. 47-61.
292
metrópole e a decisão de regressar à terra em que nasceu faz com que esses personagens
questionem uma identidade antes ainda não problematizada. Alguns autores convocados para a
leitura do deslocamento e do pertencimento das personagens analisadas são Stuart Hall, Grada
Kilomba, Elsa Peralta, Julia Kristeva, dentre outros.
Referências: ALMEIDA, Djaimilia Pereira de. Luanda, Lisboa, Paraíso. 1. ed. São Paulo: Companhia
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Revisão técnica: Gustavo Bernardo. São Paulo: Annablume, 2007. pp: 221-236. JACOB, Sheila. “De
Luanda a Lisboa/Paraíso: uma trajetória de desencontros e recomeços”. In: Mulemba. Rio de Janeiro:
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Tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro – 11. ed., 1. reimp. – Rio de Janeiro: DP&A,
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neta da independência e filha da diáspora”. In: Ípsilon. March 21 2019. Disponível em:
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mesticagem-neta-independencia-filha-diaspora-1865819. Visitado em 25 maio 2022. KILOMBA,
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Contemporânea de Autoria Negra em Portugal: Impasses e Tensões”. Via Atlântica, nº 36, 283-
304,São Paulo, 2019. VALENTIM, Jorge Vicente; SILVA, Gabriel. “Ler o século XXI: a novíssima ficção
portuguesa”. In: Revista do Centro de Estudos Portugueses. Belo Horizonte, v. 41 n. 65, p. 9-14, 2021.
Disponível em:
http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/cesp/article/view/18599/1125614307. Visitado
em 7 de janeiro de 2023.
UM DIÁLOGO COM A HISTÓRIA PELAS VIAS DA RASURA: UMA ANÁLISE DO ROMANCE A MÁQUINA
DE FAZER ESPANHÓIS, DE VALTER HUGO MÃE.
Deborah Cristina Trindade dos Reis Kashirajima
Resumo: Na medida em que a obra, A máquina de fazer espanhóis de Valter Hugo Mãe retrata de
maneira opressora um regime ditatorial. Busca-se compreender os processos discursivos de
construção, desconstrução e reconstrução identitária e de pertencimento, o discurso histórico e o
discurso ficcional, que trazem a subjetividade do personagem principal à tona, além dos discursos
293
que pretendem se passar por “verdade absoluta”, de cunho “oficial”, discurso “verdadeiro” ou como
“narrativa mestra”. É nesse sentido que investigamos o conceito de memória, à luz da pós-
modernidade, para compreender o personagem Silva em seus discursos, cuja história, em uma casa
de repouso, calcada em suas lembranças, passa a ser vista, por ele próprio, como uma construção e,
por isso, como não reconhecida nos acontecimentos passados, já que, para ele, não existiria um
discurso da “verdade”. É nessa linha de estudos e nesse diálogo com a pós-modernidade que
pretendemos compreender o conceito de memória e entender como o personagem Silva,
reavaliando sua história no asilo, à luz de novas possibilidades, tenta resgatar o passado, a fim de
revelar os mecanismos de manipulação de identidades e de pertencimentos a que foi submetido."
Referências: MÃE, Valter Hugo. a máquina de fazer espanhóis. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
HUTCHEON, Linda. Poética do pós modernismo. ______. O que é o contemporâneo? E outros
ensaios. Chapecó: Argos. 2009. AGOSTINHO. Confissões. São Paulo: Nova Cultural,1999. BENJAMIN,
Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo:
Brasiliense, 2012. CANDIDO, Antônio. A personagem de ficção. São Paulo: Perspectiva, 2007 HEGEL,
Georg W. Friedrich, Estética: textos seletos. São Paulo: Ícone. 2012. JAMENSON, Fredric. Marxismo
e forma. São Paulo: Hucitec.1985. KRISTEVA, Julia. Introdução à Seminálise. São Paulo: Debates. 1969
LUKÁCS, Georg. A teoria do romance. São Paulo: Editora 34. 2006. ______. História e narração em
Walter Benjamin. São Paulo: Perspectiva, 2013.
MULHERES QUE LEEM MULHERES: O FIO DE ARIADNE EM AS LUZES DE LEONOR, DE MARIA TERESA
HORTA
Elisangela Aneli Ramos de Freitas
Resumo: Em As Luzes de Leonor (2011), romance de Maria Teresa Horta cuja protagonista é a poetisa
portuguesa Marquesa de Alorna (1750-1839), refazemos, junto à protagonista, os seus passos no
período entre o Terremoto de Lisboa, em 1755, quando tinha apenas cinco anos, e sua saída para o
exílio, em 1803, com 53 anos, quando já se sentia as ameaças de uma possível invasão napoleônica
em solo português. Nesse intervalo de 48 anos, Maria Teresa Horta articula, com o seu labor de tecer,
a vida de Alcipe ao lado de outras figuras femininas, seja na revelação de suas leituras pessoais –
grande intelectual que foi –, seja no seu círculo social na corte Portuguesa ou entre as francesas nos
deslocamentos entre Lisboa e Viena, durante o período de serviço diplomático de seu marido, o
conde de Oyenhansen, (1780-1784), envolvendo-a – e envolvendo-nos – numa busca pela
ancestralidade feminina dentro da literatura. Este movimento revela-nos uma Leonor leitora e
autora, assim como a própria Maria Teresa Horta e, em última instância, suas leitoras, num
movimento cíclico de mulheres que leem mulheres. Dentre as autoras lidas pela Marquesa de Alorna
citamos, entre outras, Hipátia de Alexandria, Christine de Pizan, Sóror Juana Inés de la Cruz,
evidenciando o movimento espiralar de trazer à luz o conhecimento – as luzes – da produção
intelectual e literária de mulheres. Objetiva-se, nesta comunicação, evidenciar este movimento
dentro da obra, identificando relações estabelecidas nos limites do romance e fora dele. Como
aporte teórico, os textos "Sobre o Conceito da História", de Walter Benjamin, o volume 3 de "Tempo
e Narrativa", de Paul Ricouer, e "Em busca do jardim de nossas mães", de Alice Walker serão
requisitados nessa análise.
Referências: BENJAMIN, Walter. "Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre a literatura e história
da cultura". São Paulo: Brasiliense, 2012. (Obras Escolhidas v.1) HORTA, Maria Teresa. "As Luzes de
Leonor". Lisboa: Dom Quixote, 2011. RICOEUR, Paulo. "Tempo e narrativa". São Paulo: Martins
Fontes, 2010. (V. 3) WALKER, Alice. "Em busca dos jardins de nossas mães". Rio de Janeiro: Bazar do
Tempo, 2021.
294
underground rumo a espaços de maior prestígio social, propiciando, assim, a consolidação de um
público leitor e novos fluxos de produção e experimentação. Por outro lado, é também verdade que
o reconhecimento internacional foi fundamental à consolidação desse cenário. Exemplo:
importantes prêmios do campo, como o Eisner Awards e o Festival de Angoulême (França),
consagraram diferentes artistas brasileiros nos últimos anos. Um deles foi Marcello Quintanilha.
Produzindo desde 1988, o autor teve sua primeira graphic novel publicada em 1999. Desde então,
tem se destacado artística e comercialmente. Em 2005, mudou-se para Barcelona para aproximar-se
do já consolidado mercado europeu, conciliando, simultaneamente, uma produção voltada ao
público brasileiro. Foi nesse cenário que, em 2015, lançou Talco de vidro. Ambientado no ocaso da
ascensão econômica vivida no Brasil entre 2002 e 2016, TdV retrata a convivência de duas primas,
marcada pelo mal-estar da prima rica (dentista) decorrente do belo sorriso da prima pobre. Já seu
narrador, compreendendo a prima rica, hesita em dizer seus nada nobres sentimentos pelo nome,
numa espécie de ética compartilhada de ódio ao pobre. Nesse sentido, TdV realiza uma espécie de
estudo (artístico) de caso de um certo sentimento íntimo de país - entroncando-se, inclusive, numa
tradição de obras que “discutem” figuras do ressentimento na cultura brasileira (XAVIER). Por outro
lado, Quintanilha é bastante enfático na defesa de uma não-identidade nacional de sua obra. Assim,
a partir da discussão dos tensionamentos e diálogos estabelecidos entre um projeto artístico que se
quer desvinculado do Brasil enquanto horizonte identitário, o tensionamento das demandas
mercadológicas europeias, e a historicidade do livro, será debatido a relevância da noção de sistema
literário para compreensão da obra.
Referências: ARANTES, Paulo. Providências de um crítico literário. In: ARANTES, Paulo; ARANTES,
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literatura brasileira. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 2000. CASANOVA, Pascale. A República Mundial
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Bezerra de. Romance gráfico brasileiro: a construção de um gênero quadro a quadro. 2015. 236 f., il.
Dissertação (Mestrado em Comunicação)—Universidade de Brasília, Brasília, 2016. QUINTANILHA,
Marcello. Talco de Vidro. 1. ed. São Paulo: Veneta, 2015. SCHWARZ, Roberto. Martinha versus
Lucrécia. São Paulo: Cia. das Letras, 2012a. ______. Sequências brasileiras: ensaios. São Paulo,
Companhia das Letras, 2014. XAVIER, Ismail. “Figuras do ressentimento no cinema brasileiro dos
anos 90”. In Fernão Pessoa Ramos, Maria Dora Mourão, Afrânio catani & José Gatti. Estudos de
cinema Socine 2000. Poto Alegre, Editora Sulina/FAMECOS.
295
exercício de reflexão para estabelecer afinidades interculturais e novas narrativas em contraponto.
Ao se revisitar o cânone literário historicamente estabelecido, torna-se possível criar novas
narrativas ou narrativas alternativas, afirmar outros tipos de pensamentos e paradigmas, que
tornam-se e tornar-se-ão institucionalizados e legitimados.
Referências: ALPERS, Edward. Indian Ocean Studies: How did we get here and where are we going?
A historian’s perspective. Journal of Indian Ocean World Studies, vol. 5, n. 2, pp. 314-336, 2021. AI
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2019. BORGES, M. P. Chinesinha. Macau: Instituto Cultural de Macau, 1995. 51 p. ISBN 972350166X
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de Macau. Rio de Janeiro: Gryphus, 2008.138 p. ISBN 9788560610174 (broch.). HARDMAN, F. F.
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2022. KOTHARI, A.; SALLEH, A.; ESCOBAR, A.; DEMARIA, F.; ACOSTA, A. (Org.). Pluriverso: um
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litoral do oceano Índico Africano. ESTUDOS sobre o Oceano Índico: antologia de textos teóricos.
Organização de Ana Mafalda Leite, Elena Brugioni, Jessica Falconi. Lisboa: Edições Colibri: [s.n.],
2019. SHI, Shu-Mei; TSAI, Chien-hsin; BERNARDS, Brian (org.). Sinophone Studies: A Critical Reader
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O OCEANO ÍNDICO: ANTOLOGIA DE TEXTOS TEÓRICOS (EXCERTOS). Lisboa: CESA-ISEG. eBook:
http://hdl.handle.net/10400.5/19965. Acesso em 25 de julho de 2022.
296
a dicotomia, pretendo ler a ficção de António Lobo Antunes em diálogo com certas noções das teorias
pós-colonial e decolonial, assim como traduzidas por importantes nomes do pensamento
contemporâneo, como Boaventura de Sousa Santos, Édouard Glissant, Stuart Hall, Walter Mignolo,
Aníbal Quijano, Ramón Grosfoguel.
Referências: ANTUNES, António Lobo. Até que as pedras se tornem mais leves que a água. 1. ed.
Lisboa: Dom Quixote, 2017. ANTUNES, António Lobo. Comissão das lágrimas. 1. ed. Lisboa: Dom
Quixote, 2011. GLISSANT, Édouard. Poética da relação. Trad. Marcela Vieira, Eduardo Jorge de
Oliveira. 1 ed. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.
COSMOPOLITISMO POSSÍVEL PRESENTE EM A FEBRE DAS ALMAS SENSÍVEIS, DE ISABEL RIO NOVO
Renan Henrique Messias de Paulo
Resumo: Em O Romance Português Contemporâneo Miguel Real, escritor e ensaísta, defende a ideia
de que o romance contemporâneo português “tornou-se cosmopolita, eminentemente urbano,
dirigido a um leitor global, explorando temas de caráter universal, centrado em espaços geográficos
exteriores à realidade nacional” (REAL, 2012, p. 11). Nesse sentido, a prosa contemporânea
portuguesa tenta fugir dos traços que marcaram sua literatura na primeira metade do século XX,
com romances regionais, rurais e que buscavam esboçar a identidade do sujeito português. Dito isto,
este trabalho tem como objetivo encontrar no romance finalista do prêmio Leya A Febre das Almas
Sensíveis, lançado em 2018 por Isabel Rio Novo, traços do cosmopolitismo, uma vez que o romance
narra os desafios do tratamento da tuberculose num Portugal das primeiras décadas do século XX.
No romance, as personagens enfermas são tratadas em sanatórios em zonas de altitude. Tão logo, a
narrativa do romance de Isabel Rio Novo se passa na Serra do Caramulo, uma região pobre e
campestre. Sendo assim, este trabalho busca encontrar na narrativa elementos que enquadram o
romance como cosmopolita, uma vez que a premissa do livro não apresenta esse caráter universal.
Além disso, pretende-se analisar o tom melancólico presente na obra, sendo essa melancolia
promovida pela doença, pelo atraso e pelas relações amorosas que se configuram entre as
personagens principais.
Referências: GINZBURG, Jaime. Literatura, violência e melancolia. São Paulo: Autores Associados,
2013. NOVO, Isabel Rio. A Febre das Almas Sensíveis. Lisboa: D. Quixote, 2018. REAL, Miguel. O
Romance Português Contemporâneo 1950-2010. Lisboa: Editorial Caminho, 2012.
297
desdobramentos, surgem outros conceitos, também artísticos-experimentais, como o de rede e
vagar, pensado por Deligny (2015); de sensação, por José Gil (2020); além de atravessamentos do
pensamento deleuziano e agambeniano, que por suas respectivas forças teóricas, acabam por
contaminar essa escrita.
Referências: AGAMBEN, G. A imanência absoluta. In: ALLIEZ, E. (org.). Gilles Deleuze: uma vida
filosófica. São Paulo: 34 Letras, 2000. DELIGNY, Fernand. O aracniano e outros textos. Tradução Lara
de Malimpesa. São Paulo: 1 edições, 2015. GARRAMUÑO, Florencia. Frutos estranhos: sobre a
inespecificidade na estética contemporânea. Trad. Carlos Nougué. Rio de Janeiro: Rocco, 2014. GIL,
José. Fernando Pessoa, ou a metafísica das sensações. traduzido por Miguel Serras Pereira, Ana Luisa
Faria. n-1 edições, 2020. SANTOS, Roberto Corrêa dos . Clarice, ela.. 1. ed. São Paulo: Instituto
Moreira Sales, 2012. SANTOS, Roberto Corrêa dos. Cérebro-Ocidente/Cérebro Brasil:
arte/escrita/vida/pensamento/clínica/tratos contemporâneos. Rio de Janeiro: Circuito, 2015.
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Krieger Olinto e Karl Erik Scholhammer. São Paulo: Edições Loyola/PUC-Rio, 2003.
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literatura hispanoamericana I. Porto Alegre, Letra 1, 2022. MELLO, Ana Maria Lisboa de. ANDRADE,
Antonio. (Org.) Translinguismo e poéticas do contemporâneo. Rio de Janeiro: 7Letras, 2019.
299
performativa da assembleia proposta por Butler e a noção de “comunidades experimentais” de
Carlos Bosualdo e Reinaldo Laddaga.
Referências: BUTLER, Judith "Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uam teoria
performativa de assembleia". Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. BOSUALTO; Carlos;
LADDAGA, Reinaldo “Experimental Communities” In HINDERLITER, Beth [et. al] Communities of
sense: rethinking aesthetics and politics Durhan & London: Duke University Press, 2009. FRASER,
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In CALHOUN, Craig [ed.] Habermas and the public sphere. Cambridge, Massachusetts: MIT Press,
1996. SOMERS-Willet, Susan B , "The cultural politicis of slam poetry: race, identity, and the
performance of popular verse in America" Ann Arbor: University of Michigan Press, 2009. WARNER,
Michael Publics and counterpublics New York: Zone Books, 2005.
300
Resumo: Cristina Rivera Garza concebe a escritura como uma prática que responde às demandas do
presente, não de modo utilitário ou como mero reflexo dele, mas como mutação e resistência à
instrumentalização da linguagem na atualidade. Em Los muertos indóciles. Necroescritura y
desapropiación (2013), a escritora mexicana contribui para a discussão sobre a condição da literatura
latino-americana na atualidade, junto a Josefina Ludmer e Florencia Garramuño, com o que chama
de “necroescritura” e “desapropiación”, tendo em vista os processos de real que a atravessam e a
mudança no estatuto do literário que isso implica, constituindo uma postura crítica que foca no uso
das tecnologias digitais e em “comunalidades de escritura”, efetivadas dentro e fora da linguagem.
Esta comunicação, em sintonia com a reflexão sobre as práticas artísticas e críticas na América Latina
Contemporânea, se propõe a discutir sobre os aspectos problematizados por Rivera Garza, neste
texto, em comparação a questões levantadas por Ludmer e Garramuño, para pensar as “redes
literárias e políticas de afeto”, que articulam instâncias diversas relacionadas à produção literária e
consideram a construção de sentido como um processo de múltiplas direções, vinculando a
expressão singular a dinâmicas sociais e culturais, econômicas e políticas. A partir da compreensão
da literatura como campo expandido em redes, entende-se que o escritor estabelece conexões
afetivas múltiplas que compõem suas escolhas estéticas, evidenciando modos de relação e práticas
de compartilhamento pela linguagem como ação e afetamento no presente.
Referências: BRIZUELA, Natalia. A escrita assume a categoria de prática artística. Depois da
fotografia: Uma literatura fora de si. Trad Carlos Nougué. São Paulo: Rocco, 2014. CÂMARA, Mário;
KLINGER, Diana; PEDROSA, Célia; WOLFF, Jorge. Indicionário do contemporâneo. Belo Horizonte:
Editora da UFMG, 2018. ENNE, Ana Lúcia S. “Conceito de rede e as sociedades contemporâneas”.
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p. 264 - 273. FERNÁNDEZ BRAVO, Álvaro. Discusión bibliográfica: Nuevas contribuciones para una
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Programa Avançado de Cultura Contemporânea da UFRJ, ano IV, 2009. Disponível em
http://revistazcultural.pacc.ufrj.br/los-restos-de-lo-real-de-florencia-garramuno-2/. _____. Frutos
estranhos: sobre a inespecificidade na estética contemporânea. Trad. Carlos Nougué. Rio de Janeiro:
Rocco, 2014. KIFFER, Ana; GARRAMUÑO, Florencia. Expansões contemporâneas. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2014. LEYS, Ruth. “The Turn to Affect: A Critique”, Critical Inquiry, vol. 37, nº 3, The
University of Chicago Press, 2011, pp. 434-472. LUDMER, Josefina. Aquí América Latina. Una
especulación. Buenos Aires: Eterna Cadencia, 2010. _____. “De la crítica literaria al activismo
cultural”. Chuy, n. 4, dez. 2017. NOGUEROL, Francisca (org). Dossiê “Escrituras contemporáneas en
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Disponível em https://revistalanda.ufsc.br/vol-7-n1-
2018/?fbclid=IwAR2TiUgbV3jENhOXAIVSkFckAQjdP0kaLit6UPUWuc_1m-JEC-DOm1UY3UI. RIVERA
GARZA, Cristina. ¿Sueñan las máquinas con el lenguaje del nosotros? Una curadoría. Los muertos
indóciles. Necroescritura y desapropiación. México: Tusquets, 2013.
301
através de um palimpsesto de narrativas íntimas de sujeitos expropriados figuradas em suas
alpercatas e em sacos de estopa cobertos de textos com relatos de fuga. A partir da reflexão de
Rosalind Kraus sobre a inespecificidade dos meios, em “A Escultura em Campo Ampliado” e de
Florência Garramunho, sobre a inespecificiadade da arte, em Frutos estranhos: sobre a
inespecificidade da literatura contemporânea, como traços característicos da pós-modernidade,
pretendemos estabelecer um diálogo entre as obras de Fuks e Ferero, acerca dos temas da memória
e da fuga em contextos de violência política e social. Para tal, tomaremos ainda o estudo de Alexis
Nouss, pesquisador que reflete sobre a temática do exílio nas artes e na literatura, e de Tamara
Kamenzain, sobre a presença da intimidade na produção contemporânea .
Referências: CACCIARI, Massimo. “La paradoja del extranjero”. In: Archipiélago, n. 26-27, inverno de
1996. CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 2008.
DERRIDA, Jacques. Paixões. Trad. Lóris Z. Machado. Campinas, SP: Papirus, 1995. FUKS, Julián. A
resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. GARRAMUÑO, Florencia. Frutos estranhos:
sobre a inespecificidade da literatura contemporânea. Rio de Janeiro: Rocco, 2014. HAREL, Simon.
Braconnages identitaires: Un Québec palimpseste. Montréal: VLB Éditeur, 2006. KRAUSS, Rosalind.
A Escultura em Campo Ampliado. Trad. Elizabeth Carbone Baez. Revista Gávea, n. 1, PUCRJ, 1984, p.
87-93. LACOUE-LABARTHE, Philippe. La paradoja y la mimesis. In: La imitación de los modernos:
(Tipografias 2), 1ª. Ed., Buenos Aires: Ediciones La Cebra, 2010, p. 15 - 39. KAMENSZAIN, Tamara.
Una intimidad inofensiva – los que escriben con lo que hay. Buenos Aires: Eterna Cadencia editora,
2016. (E-book) LEVI, Primo. É isto um homem? Trad. Luifi Del Re. Rio de Janeiro: Rocco, 1988. NANCY,
Jean-Luc. La existencia exilada. In: Archipiélago, n. 26-27, inverno de 1996. NOUSS, Alexis. La
condition de l’exilé – pensar les migrations contemporaines. Paris: Editions de la Maison des Sciences
de l’Homme, 2015. NOUSS, Alexis. L’exil et la migration aujoud’hui: rupture ou continuité? Paris:
Fondation Caloute Gulbenkian – Délégation en France, 2019. SAID, Edward. Reflexões sobre o exílio
e outros ensaios. Trad. Pedro Maia. São Paulo: Cia das Letras, 2003. SPIVAK, Gayatri. Pode o
subalterno falar? . Trad. Sandra Almeida, Marcos Feitosa e André Feitosa. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 2010.
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estética contemporânea. Tradução de Paloma Vidal. Rio de Janeiro: Rocco Digital, 2014. JASINSKI,
Isabel. Redes singulares e escritas nômades. In: CORDIVIOLA et. all. (Orgs.). Temas para uma história
da literatura hispano-americana I. Porto Alegre: Letra 1, 2022. NANCY, Jean-Luc. El sentido del
mundo. Trad. Jorge Manuel Casas. Buenos Aires: La Marca, 2003. SOUZA, Eneida Maria. Narrativas
impuras [livro eletrônico]. Recife: Cepe, 2021. STIGGER, Veronica. Opisanie ?wiata. São Paulo: Cosac
Naify, 2013.
303
o diálogo transnacional. Curitiba: Editora UFPR, 2021. PIZARRO, Ana. (Org.). La literatura
latinoamericana como proceso. Buenos Aires: Centro Editor de America Latina, 1985. SANCHEZ, Lola.
Difracciones de género y traducción: hacia otra cartografía de saberes situados. Iberic@l, Revue
d’études ibériques et ibéro-américaines. 2018, n. 13, p. 37-50. SAPIRO, Gisele. La sociología de la
literatura. Trad. Laura Folica. Buenos Aires: 2016.
REDE DE RELAÇÃO
Maria Cândida Ferreira de Almeida
Resumo: A perspectiva de uma rede de Relação como uma teoria para a Literatura Comparada foi
retirada da leitura de diversos textos que buscam definir este campo de estudos literários, que, em
sua versão mais pós-moderna, aponta sempre para um entendimento de “relação” que, para
justificar uma abordagem das obras literárias, passa pela ideia que há uma conexão, uma
correspondência de algo – tipologia de personagens, ambientação da trama, período histórico –,
estabelecendo uma relação, conexão e correspondência implícita no ato de comparar. Em obra
crítica, Eliane Robert Moraes expõe o resultado de uma experiência filosófica para o campo literário,
pois ao fazer uma genealogia da figura de Salomé na literatura, acaba concluindo que “é difícil
determinar quem deve o quê a quem, na medida em que nos deparamos com uma densa rede de
relações entre diversos artistas e escritores” (29, grifo meu). A versão do problema exposto por
Octavio Paz é mais poética e explicita o sesgo americano na configuração de outro trato, distinto ao
que se poderia descrever-se como influência na criação literária e por sua vez atiçou os estudos
comparatistas: “desenraizada e cosmopolita, a literatura hispano-americana é regresso e busca de
uma tradição. Ao buscá-la, a inventa”. Esta comunicação busca revisar algumas destas referências
com o objetivo de explicitar a formação destas redes de relações e sua função no campo da Literatura
Comparada.
Referências: Paz, Octavio. Puertas al campo, México, Universidad Nacional Autónoma de México,
1961. pp. 1 1-19 Robert, Eliane de Moraes. Corpo Impossível. São Paulo: Fapesb/Iluminuras, 2002.
304
Horizonte: Editora UFMG, 2018. VIDAL, Paloma. Estar entre: ensayos de literaturas en trânsito. 1a ed
. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Grumo, 2019.
305
Referências: GOLDSMITH, Kenneth. Escritura no-creativa - Gestionando el lenguaje en la era digital.
Trad. Alan Page. Buenos Aires: Caja Negra, 2015 LATOUR, Bruno. Reagregando o social: Uma
introdução à teoria do Ator-Rede. Trad. Gilson César C. de Sousa. Salvador/Bauru: EdUfba/EdUSC,
2012.
306
praticadas nas décadas de 70 e 80 entre os povos da floresta, contribuindo para que os direitos
constitucionais fossem alcançados nas décadas seguintes.
Referências: Nhexyrõ: artes indígenas em rede. Ailton Krenak - Tecendo redes de Afeto. Jaider Esbell
entrevista Ailton Krenak. Produção: Galeria Jaider Esbell em parceria com a produtora Sem Início
Sem Fim (2021). Disponível em: . Acesso: 20 fev. 2022.
307
na sociedade portuguesa contemporânea. Para isso, as discussões se ancoram nas proposições
teóricas de Ana Paula Arnaut (2010), que pontua reflexões sobre aspectos do romance português
contemporâneo, o qual abarca narrativas de forma mais múltiplas e com uma abordagem inovadora
de temas recorrentes; Cristina Nehring (2012), a qual faz um percurso teórico sobre o amor Eros
através do tempo; Júlia Kristeva (1988), em que aborda, através de um eixo psicanalista, os
desdobramentos do amor no sujeito apaixonado; Roland Barthes (1981) que trata sobre termos que
permeiam e configuram os discursos amorosos; e demais teóricos que contribuam para as reflexões
deste trabalho.
Referências: ARNAUT, Ana Paula. Post-Modernismo: o futuro do passado no romance português
contemporâneo. Via Atlântica, n. 17, p. 129-140, 2010. BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso
amoroso. Tradução de Hortensia dos Santos – Rio de Janeiro: F. Alves, 1981. KRISTEVA, Julia. Histórias
de amor. tradução de Leda Tenório. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. NEHRING, Cristina. Em defesa
do amor: . Tradução: Fátima Santos. – Rio de Janeiro: BestSeller, 2012.
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In: Estética: literatura e pintura, música e cinema. Org: Manoel Barros da Motta e Trad: Inês Autran
Dourado Barbosa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009. (Ditos e escritos, III). p. 264-
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Lisboa: Editora Gradiva, 2008. PESSOA, Fernando. 136 pessoas de Pessoa. Org: Jerónimo Pizarro e
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Concepção e direção: Leonor Areal. Disponível em: http://arquivopessoa.net. Acesso em: 24 nov.
2022. PESSOA, Fernando. Novas Poesias Inéditas. Direção, recolha e notas de Maria do Rosário
Marques Sabino e Adelaide Maria Monteiro Sereno. 4ª ed. Lisboa: Ática, 1993.
309
investigação determina averiguar como ocorrem as representações dos outros-marginais por parte
de um autor que está fora do contexto da transgeneridade, da Síndrome de Down e dos menores
infratores, refletindo as temáticas de seus romances como sendo algumas das formas e obsessões
encontradas no Romance Português Contemporâneo.
Referências: ABBAGNANO, Nicola. 2003. Dicionário de filosofia. Trad. Alfredo Bosi e Ivone Castilho
Benedetti. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes. AGUIAR, Joselia. História na Mário: Corpos em risco, com
Afonso Reis Cabral e Amara Moira. YouTube, 02 de junho de 2021. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=o7HL6Kiobyc&list=PLBVjHbNfnHp73261jqCNa e8RDT7LO9U-
_&index=20&t=115s >. Acesso em: 11 de agosto de 2022. ARNAUT, Ana Paula. Post-Modernismo no
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Linda. Poética do Pós-modernismo: história, teoria e ficção. Tradução Ricardo Cruz. Rio de Janeiro:
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romance pós-revolucionário português: propostas de uma nova construção do sujeito nacional.
Universidade Nova de Lisboa, FCSH, 1990 TEOTÔNIO, Rafaella Cristina Alves. Valter Hugo Mãe: filho
de mil homens e mil mulheres / Rafaella Cristina Alves Teotônio. – Recife, 2018. 216 f. VALENTIM,
Jorge Vicente. Corpo no corpo: homoerotismo na narrativa portuguesa contemporânea. São Carlos:
EdUFSCAR, 2016. VALE DE ALMEIDA, Miguel. Senhores de si: uma interpretação antropológica da
masculinidade. Lisboa: Fim do Século, 1995.
310
elementos de diversas áreas artísticas, resultando em um livro original, de teor político e reflexo,
mas sem perder o humor e a ironia, típicos da autora.
Referências: PORTELA, Patrícia. Dias Úteis. Porto Alegre: Dublinense, 2019.
VIDAS PRECÁRIAS, VIDAS EM RISCO EM A ORDEM NATURAL DAS COISAS, DE ANTÓNIO LOBO
ANTUNES: PERSPECTIVAS ENTRE LITERATURA E CLÍNICA
Juliano Andre Kreutz
Resumo: Na contemporaneidade, descentramentos, fragmentações e deslocamentos sinalizam a
transformação radical das categorias de sujeito e de identidade, observa Stuart Hall. Este estudo
investiga metamorfoses da noção de sujeito na interface entre discursos clínicos e literários. Recorre-
se à análise das perspectivas narrativas nas figurações de vidas precárias, em risco, no romance A
ordem natural das coisas, de António Lobo Antunes. Entrecruzam-se três proposições que matizam
as discussões: a) compreende-se que o corpo como agenciamento, rede de humanos e não-
humanos, não se define pela forma, mas pelo limite variável de sua ação (inspiração em Deleuze,
Spinoza e Vinciguerra); b) consideram-se duas vias de apreensão do outro, a percepção e o afeto,
que envolvem, respectivamente, as existências formais, mediadas por códigos culturais, e as forças
inomináveis, sem referências simbólicas (termos de Rolnik); c) borram-se as fronteiras entre saúde,
doença, normal e patológico, ao considerar-se a construção histórica da normalização de corpos e
condutas (compartilhado o entendimento de Foucault); ao afirmar-se a positividade das
diferenciações e situarem-se as formas de vida desviantes como desdobramentos de modos de
existência virtuais (na acepção de Braidotti). Motivam-se, assim, a problematização da dicotomia e
dos limiares entre sujeito e objeto, em diferentes regimes de focalização nas narrativas ficcionais, e
a análise de como objetos, mobilizados nos cursos das ações, modificam as situações e as práticas
de subjetivação ficcionalizadas. No romance antuniano, observa-se que os sentidos não se originam
em centros de consciência antropomórficos; que a opacidade das coisas impede a totalização dos
significados; que as presenças vivas do mundo no corpo interpretante/focalizador traduzem-se em
elipses, metáforas, fusões de múltiplas temporalidades e outros recursos de indeterminação de
sentidos. Sugere-se que a focalização (Bal, Niederhoff) corresponde não só à seleção e à restrição de
informação narrativa (à percepção), mas inclui in-formes, afectos, às margens do visível e do dizível.
Referências: ANTUNES, A. L. A ordem natural das coisas. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. BAL, Mieke.
Narratologia: introdução à teoria da narrativa. Florianópolis: Editora da Ufsc, 2021. BRAIDOTTI, ROSI.
Teratologies. Deleuze and Feminist Theory. p.156–172, 2000. Edinburgh: Edinburgh University Press.
DELEUZE, G. Espinosa - filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002. DELEUZE, G. Cursos sobre Spinoza
(Vincennes, 1978-1981). 3º ed. Fortaleza: EdUECE, 2019. HALL, S. A identidade cultural na pós-
modernidade. 11º ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006. NIEDERHOFF, Burkhard: Focalization. [2013] In:
Hühn, Peter et al. (eds.): the living handbook of narratology. Hamburg: Hamburg University. URL =
http://www.lhn.uni- hamburg.de/article/focalization. ROLNIK, S. Antropofagia Zumbi. São Paulo: n-
1 edições, 2021. VINCIGUERRA, L. La semiótica de Spinoza. 1º ed. Buenos Aires: Cactus, 2020.
LOBO ANTUNES, LUISA DACOSTA E MARIA VALÉRIA REZENDE: A VELHICE COMO APRENDIZADO DE
AUTO E HETEROPERCEPÇÃO
Marcia Regina Schwertner
Resumo: A figuração do idoso como protagonista e sujeito de sua história já é realidade no universo
ficcional, ainda que não tão amplamente quanto seria o esperado em uma sociedade como a
contemporânea, marcada pela rapidez de seus processos de envelhecimento demográfico e de
decréscimo populacional. A literatura age, nesse contexto, como instrumento de percepção de si e
do outro, é ação reflexiva e identitária, viabilizando a compreensão de conceitos e trajetórias. Dessa
forma, possibilita perspectivas não dicotômicas entre a vitimização e a vilania, assume uma maior
diversidade interpretativa e objetiva sensibilização e enfrentamento. Os romances "Para aquela que
está sentada no escuro à minha espera", de Lobo Antunes, "O planeta desconhecido e romance da
que fui antes de mim", de Luísa Dacosta, e "Quarenta dias", de Maria Valéria Rezende, são
exemplares na abordagem do tema; conteúdo, estética e recursos técnicos de produção textual
311
aliam-se na elaboração de diferentes imaginários e estruturas narrativas, entrecruzando aspectos de
teor público e privado, quebrando invisibilidades e exigindo conscientização. São obras que
permitem observar singularidades físicas e subjetivas em contato com redes comunitárias mais
amplas, não raro de exclusão, constituindo-se como esboços de um corpo e de uma sociedade
igualmente fragilizados, imersos nas dificuldades de lidar com a vivência cotidiana da velhice. No
referente ao arcabouço teórico, a interdisciplinaridade inerente ao tema exigiu opções de pesquisa
heterogêneas, provocando o diálogo de autores de diferentes áreas do conhecimento, como Arnaut,
Bachelard, Beauvoir, Birman, Dalcastagné, Fonseca, Goldenberg, Guedes, Reis e Tutikian.
Referências: Arnaut, Ana Paula. "A escrita insatisfeita e inquieta(nte) de Antonio Lobo Antunes".
2011 Bachelard, Gaston. "A poética do espaço". 1996. Beauvoir, Simone. "A velhice". 1990. Birman,
Joel. "O sujeito na contemporaneidade". 2012. Dalcastagné, Regina. "A personagem do romance
brasileiro contemporâneo 1990-2004". 2005. Fonseca, António M. "Desenvolvimento humano e
envelhecimento", 2004. Goldenberg, Miriam. "A bela velhice". 2014. Guedes, Joana. "Viver em um
lar de idosos: identidade em risco ou identidade riscada". 2012. Reis, Carlos. "História crítica da
literatura portuguesa". 2005 Tutikian, Jane. "Velhas identidades novas". 2006 Tutikian, Jane. A
debilidade do humanismo (A narrativa portuguesa e o século XXI). 2017.
A TEIA DO BAIRRO TAVARIANO: CONEXÕES ENTRE OS AUTORES CITADOS EM "O SENHOR ELIOT E
AS CONFERÊNCIAS"
Maria Catarina Rabelo Bozio
Resumo: O processo autoral de Gonçalo M. Tavares em “O senhor Eliot e as conferências”, obra
integrante da coleção O Bairro, se utiliza de uma tendência notada pela pesquisadora Leyla Perrone-
Moisés em “Mutações da Literatura no século XXI”. Segundo ela, tem crescido desde os anos de 1980
o número de romances que possuem um “grande escritor” como personagem principal. Contudo,
“(...) nenhum desses escritores atuais pretende tomar seus antecessores como modelos de vida ou
de escrita.” (2016, p. 147) e isso acontece também nessa obra de Tavares. Na verdade, é como se o
autor português partisse de resquícios de algumas características da obra de T. S. Eliot, como
“transcrições paródicas, (...), citações de autores clássicos ou contemporâneos” (BERARDINELLI, p
18), e buscasse fazer conexões a partir do contexto eliotiano com a obra poética alguns outros
autores de forma a subverter e inovar nesses diálogos. Sendo assim, esta comunicação, inspirada por
um trecho do artigo “L'auteur au pluriel. Le Quartier de Tavares et l'enfance de la littérature”, de
Julia Peslier – que propõe estarem, os habitantes do Bairro, aproximados por afinidades – pretende
comentar as relações existentes entre os autores das citações escolhidas como alvo das análises
realizadas pelo protagonista Senhor Eliot em suas conferências. Para citar dois exemplos de conexões
com poetas cujos versos que são citados pelo Senhor Eliot e que serão expandidos em nossa
comunicação, temos Silvya Plath, autora publicada pela editora em que T. S. Eliot trabalhou, a Faber
& Faber, e Marin Sorescu que, de acordo com pesquisadores de sua obra, empresta a
intertextualidade típica do autor inglês. Tais conexões contribuem para a formação de uma teia que
é parte do Bairro tavariano e que, por meio deste trabalho, esperamos conectar ao que é
reconhecido por Perrone-Moisés enquanto tendência literária do século XXI.
Referências: BERARDINELLI, Alfonso. Da poesia à prosa. São Paulo: Cosac Naify, 2007. PERRONE-
MOISÉS, Leyla. Mutações da literatura no século XXI. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
PESLIER, Julia. L'auteur au pluriel. Le Quartier de Tavares et l'enfance de la littérature In: LOEHR, Joël
e POIRIER, Jacques (Org.). Retour à l’auteur. Reims: Presses Universitaires de Reims, 2015. TAVARES,
Gonçalo M. O senhor Eliot e as conferências. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2012.
312
em plena construção – é possível identificar traços comuns nas atuais produções literárias, os quais
nos permitem delinear, ainda que de forma provisória, a trajetória que vem sendo construída pela
Novíssima Literatura Portuguesa. Em outras palavras, ainda que haja uma significativa diversidade
de autores compondo o atual panorama literário português, com obras que apresentam
características bastante diversas, é possível identificar aspectos frequentes na ficção contemporânea
portuguesa, sendo um deles, sem dúvida, a recorrência, em sua composição, a estratégias
metaficcionais. É a presença da metaficção na literatura portuguesa produzida no século XXI, pois, o
que nos interessa discutir no presente estudo. Objetivamos apresentar como romances de Gonçalo
M. Tavares, Afonso Cruz e José Luís Peixoto recorrem, em sua composição, a diferentes estratégias
metaficcionais, assumindo o processo de poesis como matéria-prima para a composição literária, em
estrito diálogo com o contexto histórico-cultural em que estamos inseridos. Almeja-se, ainda, por
meio da seleção de autores que pertencem a um mesmo contexto geracional, identificar um fio
condutor que existe na novíssima produção literária portuguesa, bem como discutir de que maneira
um mesmo recurso composicional – no caso, a metaficção – pode ser utilizado a partir de modos e
propósitos distintos, contribuindo para a produção de efeitos de sentido diversos.
Referências: CRUZ, Afonso. Para onde vão os guarda-chuvas. Lisboa: Alfaguara, 2013. CRUZ, Afonso.
A boneca de Kokoschka. São Paulo: Dublinense, 2021. CRUZ, Afonso. Nem todas as baleias voam. São
Paulo: Dublinense, 2021. GOMES, Álvaro Cardoso. A voz itinerante: ensaio sobre o romance
português contemporâneo. São Paulo: Edusp, 1993. HUTCHEON, L. Narcissistic Narrative: the
metafictional paradox. New York: Methuen, 1984. HUTCHEON, Linda (1988), Poética do Pós-
Modernismo, Rio de Janeiro, Imago Editora. MAIA, M. F. Entre a tradição e a pós-modernidade: o
percurso metaficcional em Livro, de José Luís Peixoto. Dissertação (Mestrado em Literatura e Crítica
Literária) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: 2016. NAVAS, Diana. Narcisismo
discursivo e metaficção: António Lobo Antunes e a revolução do romance. São Paulo: Scorteci, 2009.
NAVAS, Diana. Figurações da escrita: a metaficção nos romances de António Lobo Antunes. São
Paulo: Scortecci, 2013. PEIXOTO, José Luís. Livro. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. PEIXOTO,
José Luís. Em teu ventre. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. PEIXOTO, José Luís. Autobiografia.
São Paulo: Companhia das Letras, 2021. REAL, Miguel. O romance português contemporâneo: 1950-
2010. Lisboa: Caminho, 2012. TAVARES, Gonçalo M. Jerusalém. São Paulo: Companhia das Letras,
2006. TAVARES, Gonçalo M. Um homem: Klaus Klump. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
TAVARES, Gonçalo M. Aprender a rezar na era da técnica.. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
TAVARES, Gonçalo M. A máquina de Joseph Walser. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
313
Burke, sem definição encerrada. Em vista disso e considerando o fato de que Montaigne é uma
referência primordial para Saramago, a proposta desta comunicação é expor de que modo aspectos
do trabalho escrito na França no século XVI está presente no conceito proposto por Saramago.
Referências: BARRENTO, J. O gênero intranquilo: anatomia do ensaio e do fragmento. Lisboa: Assírio
e Alvim, 2010 BURKE, P. Montaigne and the ideia of essay. In: MONTAIGNE y su Mundo. Madrid:
Fundación Juan March, 2008. MOISES, M. Dicionário de termos literários. São Paulo: Cultrix, 2002.
MONTAIGNE, M. Ensaios. São Paulo: Editora 34, 2016. MONTAIGNE, M. Oeuvres Complètes. Éditions
Gallimard, 1962. SARAMAGO, J. Cadernos de Lanzarote. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
Edição Kindle. SARAMAGO, J. Cadernos de Lanzarote II. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
314
Vítor Matos. Lisboa: Editora Gradiva, 2005. NOGUEIRA, Carlos. José Saramago: a literatura e o mal.
Lisboa: Editora Tinta da china, 2022. RICOEUR, Paul. A Simbólica do Mal. Prefácio de Maria Luísa
Portocarrero. Lisboa: Editora Edições 70, 2013. SARAMAGO, José. As intermitências da morte.
Companhia das Letras, 2005.
UMA LEITURA DA PERSONAGEM EVITA/EVA LOPO EM A COSTA DOS MURMÚRIOS, DE LÍDIA JORGE
Talia Cristiane Elias Brito
Resumo: Talia Cristiane Elias Brito (Universidade do Estado do Rio Grande do Norte) Maria Aparecida
da Costa (Orientadora) Nosso trabalho tem por finalidade analisar a personagem Evita/Eva Lopo, do
romance A costa dos murmúrios (2004), da escritora portuguesa Lídia Jorge. Percebemos que a
personagem Evita passa por um processo de transformação em sua postura durante a narrativa,
tendo em vista sua relação amorosa com o alferes Luís Alex. Podemos inferir que a mudança de nome
da protagonista está de acordo com o momento transgressor da figura feminina. Observamos que o
impasse existente entre as personagens se dá, sobretudo, pelas ideologias contextuais da cultura
portuguesa, o que vem contribuir para enxergarmos a relação do casal não como um relacionamento
amoroso, mas sim um contrato social, uma vez que se configura em um seio político truncado de
relações de poder. Desse modo, buscamos trazer para o estudo uma análise sobre a maneira que
Evita/Eva Lopo se posiciona diante do esposo Luís Alex; especificamente, entender como acontece a
construção do relacionamento amoroso entre as duas personagens. Para tanto, nos apoiaremos nas
teorias de Platão (2020), em O banquete, o qual aborda sobre o amor; Maria Aparecida da Costa
(2014), que discorre sobre o amor no romance contemporâneo português; e Cristina Nehring (2012),
teorizando sobre os aspectos que fazem parte do sentimento amoroso, bem como do
relacionamento amoroso entre outros que se fizerem relevantes para o estudo.
315
Referências: COSTA, Maria Aparecida da. A paz tensa da chama fugaz: a configuração do amor no
romance contemporâneo, Lygia Fagundes Telles e Lídia Jorge. Natal: EDUFRN, 2014. NEHRING,
Cristina. Em defesa do amor. Tradução de Fátima Santos. – Rio de Janeiro: BestSeller, 2012. PLATÃO.
O banquete / Platão; Tradução de Maria Stephania da Costa Flores. - Jandira, SP: Principis, 2020.
316
de maneira que o vagaroso mecanismo do mundo não restabeleça o equilíbrio moroso de sua
monotonia: uma máquina orgânica de revoluções – ou, como prefiro, um jogo.
Referências: ALVES, Ida (Org.). Coisas desencadeadas: estudos sobre a obra de Carlos de Oliveira. Rio
de Janeiro: Oficina Raquel, 2013. BARTHES, Roland. Aula. São Paulo: Cultrix, 2013. BARTHES, Roland.
O rumor da língua. Trad. Mario Laranjeira. 3a ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012.
CAILLOIS, Roger. Os jogos e os homens: a máscara e a vertigem. Trad. Maria Ferreira. Petrópolis:
Editora Vozes, 2017. COELHO, Eduardo Prado. A palavra sobre a palavra. Porto: Portucalense Editora,
1972. DERRIDA, Jacques. A escritura e a diferença. Trad. Maria Beatriz Marques Nizza da Silva. 2a ed.
São Paulo: Perspectiva, 1995. DIDI-HUBERMAN, Georges. Diante do tempo: história da arte e
anacronismo das imagens. Trad. Vera Casa Nova e Márcia Arbex. Belo Horizonte: Editora UFMG,
2015. GOMES, António Martins. O jogo da verdade: perspectivas e materializações do olhar em
Finisterra de Carlos de Oliveira. 1994. 142f. Dissertação (Mestrado em Estudos Anglo-Portugueses)
– Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Lisboa, 1994. HUIZINGA,
Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Trad. João Paulo Monteiro. 9. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2019. MARTELO, Rosa Maria. A construção do mundo na poesia de Carlos de Oliveira.
1996. 556 f. Tese (Doutorado em Letras) – Faculdade de Letras, Universidade do Porto, Porto, 1996.
OLIVEIRA, Carlos de. Obras de Carlos de Oliveira. Lisboa: Caminho, 1992. SEIXO, Maria Alzira. A
palavra do romance: ensaios de genologia e análise. Lisboa: Livros Horizonte, 1986. SERRA, Pedro.
Romance & Filologia. Almeida Garrett, Eça de Queirós, Carlos de Oliveira. São Paulo: Nankin, 2004.
SILVESTRE, Osvaldo Manuel. Slow Motion: Carlos de Oliveira e a Pós-Modernidade. Braga/Coimbra:
Angelus Novus, 1995.
317
Cambridge University Press, 2016. PAVIS, Patrice. A análise dos espetáculos: teatro, mímica, dança,
dança-teatro, cinema. São Paulo: Perspectiva, 2005. PINHO, Davi . Virginia Woolf costura à janela:
em busca de uma textualidade andrógina. In: Davi Pinho; Fernanda Medeiros. (Org.). Literaturas de
Língua Inglesa: leituras interdisciplinares, vol. 2. 1ed.Rio de Janeiro: Letra Capital, 2017, v. 2, p. 21-
34. WOOLF, Virginia. Um esboço do passado. Tradução de Ana Carolina Mesquita. São Paulo: Editora
Nós, 2020. WOOLF, Virginia. Os Diários de Virginia Woolf. Volume I (1915-1918). Tradução de Ana
Carolina Mesquita. São Paulo: Editora Nós, 2021. WOOLF, Virginia. Os Diários de Virginia Woolf.
Volume II (1919-1923). Tradução de Ana Carolina Mesquita. São Paulo: Editora Nós, 2022.
318
o humano e o não humano como a dicotomia central da modernidade colonial”, ler Woolf como
teórica do antropoceno significa também explorar as maneiras pelas quais ela desafia a colonialidade
do poder e do gênero. Para tal, é interessante criar novos trânsitos entre seu pensamento e as
cosmovisões de outros outsiders que, como diz Ailton Krenak, entendem o fim do mundo antes como
os últimos movimentos de um longo processo de colonização do que como o fim do antropoceno.
Sem apagar as posições radicalmente distintas de onde enunciam suas resistências a um projeto de
civilização centrado na ideia colonial (generificada e racializada) do “humano”, esta comunicação
transitará por entre os diferentes loci de produção de Virginia Woolf, de seus intérpretes da virada
neomaterialista, e de pensadores indígenas, como Ailton Krenak, para criar tensões produtivas em
torno do conceito de antropoceno. Em última instância, indagaremos até que ponto, de seu lugar
autodenominado de outsider no centro de um Império Britânico em declínio, Woolf interrompe o
fluxo coerente do mecanismo civilizacional que separa os humanos de seus ecossistemas e sustenta
práticas colonialistas de destruição.
Referências: Adkins, Peter. The Modernist Anthropocene: Nonhuman Life and Planetary Change in
James Joyce, Virginia Woolf and Djuna Barnes. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2022. Krenak,
Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. Lugones, María.
Toward a Decolonial Feminism”. Hypatia 25, no. 4 (Fall 2010): 742-759. Woolf, Virginia. A Room of
One’s Own and Three Guineas, edited by Morag Shiach. Oxford: Oxford University Press, 2000. [1929]
[1938]
.
FICÇÕES LEGÍTIMAS EM DISPUTA: UM ENCONTRO TEÓRICO-LITERÁRIO ENTRE VIRGINIA WOOLF E
TONI MORRISON
Gabriel Leibold Leite Pinto
Resumo: Nesta comunicação pretendo colocar em debate a noção de “ficção legítima que normatiza
determinadas relações familiares e patologiza outras” (RODRIGUES, 2020, p. 22), recuperada pela
filósofa Carla Rodrigues a partir dos textos de Jacques Derrida enquanto uma discussão sobre o
“fundamento místico da autoridade” (DERRIDA apud RODRIGUES, 2020, p. 22). Uma das linhas
argumentativas que pretendo, portanto, desenvolver nesta comunicação parte do entendimento de
que a normatização de certas relações familiares em detrimento de outras deve ser criticada
enquanto discurso fundamentado e legitimado por uma epistemologia imperialista a qual situa a
instituição familiar patriarcal heteronormativa como pedra fundacional da suposta "civilização" no
binário civilização x barbárie. Dito isso, argumentarei de que maneira a literatura é, em potencial,
campo de disputa da legitimidade dessas formas de ficção socialmente estabelecidas como status
quo. Partindo, assim, do entendimento da escritora estadunidense, Toni Morrison, de que a casa
patriarcal racializada que é limitada, segundo essas diretrizes supostamente legítimas, deveria ser
redesenhada enquanto uma “casa aberta” (MORRISON, 1998, p. 4) em aliança com a compreensão
da escritora inglesa, Virginia Woolf, de que as palavras de uma língua chegam até nós carregadas de
“ecos, memórias, associações” passíveis de recombinações frutíferas (WOOLF, 1937, p. 5) é possível
produzir um encontro entre ambas capaz de interrogar a homogeneidade das ficções legitimadas
enquanto norma.
Referências: RODRIGUES, Carla. Escritas - filosofia e gênero. Rio de Janeiro: Ape’Ku, 2020.
MORRISON, Toni. “Home”. IN: LUBIANO, Wahneema (org.). The House that Race Built. New York:
Vintage Books, 1998. WOOLF, Virginia. Craftsmanship – um passeio à volta das palavras (1937). Trad.
Cátia Sá. Acesso em: https://chaodafeira.com/wp-content/uploads/2015/05/cad34.pdf.
319
gradualmente passou a se valer de elementos oriundos da esfera pictórica em favor de seus escritos
ficcionais e jornalísticos. Destarte, encontramos, tanto em sua seara contística quanto ensaística,
uma ampla galeria de textos, os quais assumem matizes pictóricas, e que, portanto, permitem-nos
traçar paralelos com a pintura, tais como as produções “Azul e verde”; “Retratos”; “O sol e o peixe”;
“Anoitecer sobre Sussex: reflexões no interior de um automóvel” e “Kew Gardens”. Em face dessa
perspectiva, a presente comunicação visa a investigar como se dá a elaboração do que aqui
chamaremos de “tessitura pictórico-imagética de Virginia Woolf” no conto “Kew Gardens”,
publicado em 1919. Partindo do pressuposto de que a autora se voltava intimamente às artes visuais,
conforme sublinha a teórica Maggie Humm, na coletânea The Cambridge Companion to Virginia
Woolf (2010), objetivamos ilustrar como Woolf se vale de elementos oriundos do âmbito pictórico
com vistas a compor esse “conto cromático”, no qual alguns recursos, tais como cores, luzes,
perspectivas, texturas e volumes se combinam de forma a traçar um inventivo “jardim composto de
tintas” —, capaz de sensibilizar e de mobilizar quase toda a gama de sentidos do leitor-espectador
desse “conto-quadro” —, bem como adquirem dimensões primordiais para a narrativa a qual enseja
construir.
Referências: CORTÁZAR, Julio. Alguns aspectos do conto. In: _____. Valise de cronópio. Trad. João
Alexandre Barbosa e Davi Arrigucci Júnior. 2ª.ed. São Paulo: Perspectiva, 2008, p. 147-163. GALVÃO,
Walnice Nogueira. Cinco teses sobre o conto. In: _____. FILHO, Domício Proença. O livro do
seminário. São Paulo: LR Editores Ltda., 1982, p. 167-172. GILLESPIE, Diane F. Virginia Woolf, Vanessa
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Arts. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2010. HARVEY, Benjamin. Virginia Woolf, Art Galleries
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Edinburgh: Edinburgh University Press, 2010. HUMM, Maggie. Virginia Woolf and visual culture.
In_____. SELLERS, Susan. The Cambridge Companion to Virginia Woolf. 2ª ed. Cambridge: Cambridge
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entre a pintura e a escrita. In: _____. NOGUEIRA, Nícea; OLIVEIRA, Maria Aparecida de; PINHO, Davi.
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PIGLIA, Ricardo. Teses sobre o conto. In: _____. Formas breves. Trad. José Marcos Mariani de
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In: _____. WOOLF, Virginia. Freshwater: a comedy. [1923; 1935]. Flórida: Harcourt, 1976. SELLERS,
Susan (Ed.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. 2ª ed Cambridge: Cambridge University
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Tomaz Tadeu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017, p. 99-119. ______. Foreword to Catalogue of
Recent Paintings by Vanessa Bell. In: ______. The Essays of Virginia Woolf. 1933-1941. Vol. 6. Ed.
Stuart N. Clarke. New York: Vintage Digital, 2017. E-book. _____. A Writer’s Diary. In: _____. Virginia
Woolf: The Complete Collection, 2016. E-book. _____. Anoitecer sobre Sussex: reflexões no interior
de um automóvel. In: _____. O sol e o peixe: prosas poéticas. Trad. Tomaz Tadeu. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2015. E-book. ______. O sol e o peixe. In: ______. O sol e o peixe: prosas poéticas.
Trad. Tomaz Tadeu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015, p. 77-83. E-book. ______. O cinema. In:
______. O sol e o peixe: prosas poéticas. Trad. Tomaz Tadeu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.
E-book. ______. Foreword to Recent Paintings by Vanessa Bell. In: ______. The Essays of Virginia
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Andrew McNeillie. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1994. _____. Kew Gardens. In: _____. The
Complete Shorter Fiction of Virginia Woolf. Ed. Susan Dick. 2ª ed. San Diego: A Harvest
Book/Harcourt Brace & Company, 1989. _____. Introduction. In: _____. The Complete Shorter
Fiction of Virginia Woolf. Ed. Susan Dick. 2ª ed. San Diego: A Harvest Book/Harcourt Brace &
320
Company, 1989, p. 1– 6. _____. Portraits. In: _____. The Complete Shorter Fiction of Virginia Woolf.
Ed. Susan Dick. 2ª ed. San Diego: A Harvest Book/Harcourt Brace & Company, 1989. _____. The Mark
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Diego: A Harvest Book/Harcourt Brace & Company, 1989. ______. Pictures and Portraits. In: ______.
The Essays of Virginia Woolf. 1919-1924. Vol. 3. Ed. Andrew McNeillie. New York: Harcourt Brace
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______. The Diary of Virginia Woolf. 1925-1930. Vol 3. Ed. Anne Olivier Bell & Andrew McNeillie. New
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______. Craftsmanship. In: ______. The Death of the Moth and Other Essays. Ed. Leonard Woolf.
London: The Hogarth Press, 1942.
321
políticos, da revisão histórica de Virginia Woolf, à luz da crítica feminista de Guber e Gilbert (2020),
Cixous (1976), Moi (1991) e Woolf (2014).
Referências: CIXOUS, Hélène. The Laugh of the Medusa. Tradução de Keith Cohen e Paula Cohen.
Chicago Journals, Chicago, v. 1, no. 4, p. 875 – 893, 1976. GILBERT, Sandra M; GUBAR, Susan. The
Madwoman in the Attic. New York: Yale University Press, 2020. MOI, Toril. Sextual Textual Politics.
London: Routledge, 1991. OLIVEIRA, Maria Aparecida de. Representações do feminino na obra de
Virginia Woolf. Jundiaí: Paco Editorial, 2017. PINHO, Davi. Virginia Woolf costura à janela: em busca
de uma textualidade andrógina. In: PINHO, D. MEDEIROS, F. (org) Literaturas de Língua Inglesa:
leituras interdisciplinares. Vol. II. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2017. SILVER, Brenda R. "'Anon' and
'The Reader': Virginia Woolf's Last Essays." Twentieth Century Literature, vol. 25, no. 3/4, 1979, pp.
356–441. WOOLF, Virginia. Between the Acts. New York: Harcourt, 2008. ______. Entre os atos.
Tradução de Tomaz Tadeu. Belo Horizonte: Autêntica, 2022. ______. Ficção moderna. In:Mulheres e
ficção. Tradução de Leonardo Fróes. São Paulo: Penguin & Companhia das Letras, 2019. ______. Mr.
Bennett and Mrs. Brown. In. Selected Essays. New York: Oxford University Press, 2009. ______. On
Re-reading novels. In WOOLF, Virginia. The Moment and Other Essays. Musaicom Books, 2017.
______. The character in fiction. In. Selected Essays. New York: Oxford University Press, 2009.
______. Um teto todo seu. Tradução de Bia Nunes de Sousa. São Paulo: Tordesilhas, 2014.
322
são fundamentais pela proteção do meio ambiente, enquanto o governo fascista capitalista único
interesse é dizimar a população indígena para extrair petróleo, minerais e madeira para exportação.
Ao mesmo tempo que o governo fascista é culpado pela devastação da floresta, não se pode
esquecer que o mundo global capitalista é envolvido no maquinário da exploração dos recursos
naturais. Para entender esse contexto, essa comunicação tem como objetivo conectar o
ecofeminismo com Virginia Woolf e as escritoras indígenas e estará embasado nas ideias de Karen J.
Warren, Rebecca Pearse e Raewyn Connell, in Gender: A Global Perspective e Bonnie K. Scott.
Referências: Connell, R.; Pearse, R. (2015), Gênero: uma perspectiva global, translated by Marília
Moschkovich. São Paulo: nVersos, 2015. Scott, Bonnie. (2012), In the Hollow of the Wave. Virginia
Woolf and Modernist Uses of Nature. Charlottesville: University of Virginia Press. Warren, K. (2000),
Ecofeminist Philosophy. A Perspective on What it is and Why it Matters, Maryland: Rowman &
Littlefield. Woolf, V. [1929] [1938] (2000), A Room of One’s Own and Three Guineas, Oxford: Oxford
University Press. Woolf, V. [1933] (1978), ‘The Novels of Turgenev’, in V. Woolf, The Captain’s
Deathbed and Other Essays, London: Harcourt Brace Jovanovich, pp. 53-61. Woolf, V. [1940] (1975),
‘The Leaning Tower’, in V. Woolf, The Moment and Other Essays, London: Harcourt Brace Jovanovich,
pp. 128-154.
323
como Woolf e Cixous ultrapassam o conceito de “Pacto Autobiográfico” do teórico francês Phillippe
Lejeune, uma vez que constroem um “Eu” não autoral e impessoal em nome de múltiplas
subjetividades em suas narrativas. Entretanto, tal afirmação não significa dizer que as autoras não
representam experiências pessoais em suas obras de escrita de vida. Ao contrário, tenta-se
demonstrar, nesta fala, que as vivências materiais, corporificadas e femininas são fundamentais para
a construção do “Eu” coletivo de Woolf e Cixous. Além disso, argumenta-se aqui que o “Eu” não
autoral de ambas se opõe ao “Eu” autobiográfico masculino e tradicional, calcado no discurso
filosófico e científico da sociedade patriarcal ocidental, através de uma narrativa não linear que se
funda nas ambiguidades e nas memórias fugidias e subjetivas de sujeitos fragmentados que se
opõem às certezas de um discurso cartesiano. Dessa forma, recorre-se, nesta fala, a obras como “A
Sketch of the Past” (1976), “Three Guineas” (1938) e “The Sun and the Fish” (1928), de Woolf, e “Le
Livre de Promethea” (1983) e “Savoir” (1998), de Cixous, para demonstrar como ambas as autoras
foram capazes de criar um “Eu” que, na verdade, diz “Nós”.
Referências: CIXOUS, Hélène. The Book of Promethea. Lincoln: University of Nebraska Press, 1991,
[1983]. CIXOUS, Hélène. Savoir. In: Veils. Cixous, H. Derrida, J. Stanford: Stanford University Press,
2001, [1998]. LEJEUNE, Phillippe. O Pacto Autobiográfico. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008,
[1975]. WOOLF, Virginia. A Sketch of the Past. In: Moments of Being. New York: Mariners Books,
1976. WOOLF, Virginia. The Sun and the Fish. In: The Captain's Deathbed and Other Essays. Orlando:
Harcourt Brace Javanovich, 1978, [1928]. WOOLF, Virginia. Three Guineas. In: Woolf, V. A Room of
One’s Own and Three Guineas. London: Penguin Books, 2019, [1938], p. 116 – 365 .
324
SHAKESPEARE, COMO GRANITO E ARCO-ÍRIS, EM ORLANDO, DE VIRGINIA WOOLF
Nícea Helena de Almeida Nogueira
Resumo: Tanto nos ensaios críticos como nos romances, Shakespeare se faz presente na escrita de
Virginia Woolf constantemente. Há décadas, a crítica especializada em Woolf se debruça sobre as
menções ao bardo de forma a comprovar o quanto sua obra foi determinante na formação da
escritora em uma infindável ausência-presença. Não foi apenas para mostrar erudição ou apego à
literatura elisabetana que Woolf conversava com Shakespeare em seus textos, mas para estabelecer
um diálogo que permitisse atualizar e moldar o seu próprio projeto literário. Assombrada e
entusiasmada pelo gênio do poeta, Woolf o transporta para as páginas de seu romance Orlando
(1928) e promove um encontro acidental entre ele e seu protagonista ainda no século XVI. O objetivo
desta comunicação é analisar os efeitos dessa presença, enquanto dramaturgo ancorado na história
e, portanto, real (granito) e o personagem de ficção (arco-íris) – recorrendo à metáfora woolfiana –
em uma das mais famosas biografias ficcionais do Modernismo inglês e destacar a “possibilidade
radical de ‘ocupar’ Shakespeare”, conforme Davi Pinho (2021). As peças Macbeth, Othello e Como
você gosta também figuram em Orlando, assim como o personagem Nick Greene, baseado em um
contemporâneo de Shakespeare e que iria reaparecer, um ano depois, na escrita de Woolf no ensaio
Um teto todo seu (1929). Shakespeare está, em Orlando, envolto em mistério, como um fantasma
que não se vê e como um personagem do qual não se fala, é apenas pressentido.
Referências: DE GAY, Jane. Virginia Woolf’s novels and the literary past. Edinburgh: Edinburgh UP,
2006. DICKSON, Andrew. As you like it. In: ______. The Globe guide to Shakespeare. London: 2016.
p. 29-42. PINHO, Davi. O fantasma de “Shakespeare” em Virginia Woolf. In: MEDEIROS, Fernanda;
LEÃO, Liana de Camargo (orgs.). O que você precisa saber sobre Shakespeare antes que o mundo
acabe. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2021. p. 507-518. TRAUB, Valerie. Gênero e sexualidade em
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Cambridge: CUP, 2001. p. 129-146. WOOLF, Virginia. Orlando: a biography. Edited by Rachel Bowlby.
Oxford: Oxford University, 1992. (Oxford World’s Classics). Kindle. WOOLF, Virginia. Orlando: uma
biografia. Tradução Tomaz Tadeu. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2021. WOOLF, Virginia. Um teto
todo seu. Tradução Bia Nunes de Souza e Glauco Mattoso. São Paulo: Tordesilhas, 2014.
325
e direito à cidade a partir da luta dos movimentos de moradia. Cad. Metrop., São Paulo: v. 21, n. 46,
pp. 951-974, set/dez 2019. Pinheiro Silva, T., Garcia, D., Lopes-Flois, L., & Sousa, L. (2019). Palavra de
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Horizonte: Letramento, 2017. SPIVAK, G. Pode o Subalterno Falar?. Trad. Sandra Regina Goulart
Almeida, Marcos Pereira Feitosa, André Pereira Feitosa. Editora UFMG, Belo Horizonte,2010.
WOOLF, Virginia. A arte do romance. Tradução de Denise Bottmann. Porto Alegre, RS: L&PM, 2019.
WOOLF, Virginia. Profissões para mulheres e outros artigos feministas. Porto Alegre: L&PM, 2018.
WOOLF, Virginia. Um teto todo seu. Trad.: Bia Nunes de Sousa, Glauco Mattoso. 1. ed. São Paulo:
Tordesilhas, 2014.
326
2015). Além de esses debates terem ganhado contornos feministas com a presença das irmãs
Vanessa Bell e Virginia Woolf (Cf. GOLDMAN, 2004, p. 40), deve-se levar em conta também as
práticas dos Bloomsberries, suas controvérsias sexuais e artísticas, suas sátiras performáticas e
brincadeiras como portas de acesso ao avant-garde, tal qual definido por Jane Goldman:
interferências performáticas a fim de reenquadrar práticas sociais e políticas (GOLDMAN, 2004, p.
48). Desse modo, é objetivo desta comunicação refletir acerca das dinâmicas de produção intelectual
do Bloomsbury Group a partir das brincadeiras, performances, embustes e experimentos que
realizaram como formas de crítica ao Império e às verdades estanques do pensamento ocidental no
que tange a questões de classe, gênero e raça. Além da amadora performance de Freshwater: a
Comedy (WOOLF, 1935), que conjugou os mundos público e privado com piadas internas e riso solto
a fim de criticar os ditames da era vitoriana, serão trazidas à baila outras performances controversas,
tal como o hilário Dreadnought Hoax (Cf. FARFAN, 2004), uma significativa afronta ao Império. A
comicidade e o deboche dos amigos de Bloomsbury distorcem suas próprias imagens como
intelectuais e os colocam em um trânsito imaginativo que afirma a diferença e promove exercícios
de alteridade, posto que, se eles são vítimas de suas próprias brincadeiras, a ideia de uma produção
intelectual sofisticada é também colocada à prova. O riso solto de Bloomsbury questiona construções
sociais e políticas, estabelecendo um diálogo ambíguo entre seriedade, comicidade e transgressão
artísticas (Cf. SANTIAGO, 2022).
Referências: FARFAN, Penny. Women, Modernism, and Performance. Cambridge: Cambridge
University Press, 2004. GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke:
Palgrave MacMillan, 2004. PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf.
Curitiba: Appris, 2015. SANTIAGO, Victor. Freshwater: uma comédia de Virginia Woolf – uma farsa
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edição. Rio de Janeiro: Rocco, 2021.
328
329
SIMPÓSIO “ESCRITAS DO CORPO FEMININO NAS LITERATURAS DE LÍNGUA PORTUGUESA”
Claudia Fabiana de Oliveira Cardoso (FAETEC), Luana Antunes Costa (UNILAB) e Maria Teresa
Salgado Guimarães da Silva (UFRJ)
330
80. COELHO, Nelly Novaes; LAJOLO, Marisa; MEDINA, Cremilda de Araújo; JOZEF, Bella; LAURITO, Ilka
Brunhilde; PRADO, Adélia; LADEIRA, Julieta de Godoy. Feminino Singular. Rio Claro: GRD; Arquivo
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Irene Ramalho; AMARAL, Ana Luísa. Sobre a Escrita Feminina. oficina n.o90CoimbraCentro de
Estudos Sociais Coimbra, , 1997.
331
interpela as aporias do cânone e põe em xeque o papel da teoria e da crítica literárias; como método
que promove reparação histórica com práticas de transgressoras, como me inspira bell hooks, e
como narrativa(s) de voz/autoria do corpo negro feminino que se insubordina, em um contínuo
processo de subjetivação emancipatória, nas esferas privada e pública. Trata-se de construção
coletiva, aquilombamento em prol da saúde física/mental tão ameaçada pelas necropolíticas, como
formulado por Achile Mbembe e pelo racismo estrutural, como proposto por Silvio Almeida. Nesta
direção, busco operacionalizar as categorias a partir da análise de poemas/escrevivências de três
corpos negros femininos: de Lia Vieira, Miriam Alves e Esmeralda Ribeiro.
Referências: 1- ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. São Paulo: Polen, 2019. 2- BENTO, Cida;
CARONE, Iracy.( Orgs) Psicologia social do racismo. Rio de Janeiro: Vozes, 2014. 3- CARNEIRO, Sueli.
Dispositivo de racialidade: a construção do outro como não ser como fundamento do ser. Rio de
Janeiro Zahar, 2023. 4- CONNELL, Raewyn. A iminente revolução na teoria social. Disponível
https://www.scielo.br/j/rbcsoc/a/ZZZqDf3h5FwNbfCMQ66jPqF/?lang=pt&format=pdf 5- D’Adesky.
Uma breve história do racismo. Intolerâncias, genocídio e crimes contra a humanidade. Rio de
Janeiro: Cassará, 2022 6- EVARISTO, Conceição. Escrevivência e seus subtextos. In. DUARTE,
Constância; NUNES, Isabella Rosado(Orgs.) Escrevivência: a escrita de nós. Reflexões sobre a obra de
Conceição Evaristo. Rio de Janeiro>: Mina Comunicação e Arte, 2020. 7- FANON, Franz. Pele negra.
Máscaras brancas. Tradução: Renato da Silveira. Salvador: EDUFBA, 2008. 8- GONZALES, Lelia. Por
um feminismo afro-latinoamericano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020. 9- hooks bell, Ensinando a
transgredir. Educação como prática de liberdade. Tradução: Marcelo Brandão Cipolla. Rio de Janeiro:
Martins Fontes, 2017 10- KILOMBA, Grada. Memória da plantação: Episódios de racismo cotidiano.
Tradução: Jess Oliveira. Rio de Janeiro: Cobocó, 2019 11- MBEMBE, Achille. Necropolítica. Tradução
Renata Santini. São Paulo: M1 Edições, 2018. 12- NASCIMENTO, Beatriz; RATTS, Alex(Org.)Uma
história feita por mãos negras. Rio de Janeiro: Zahar, 2021 13- PRESTES, C. R. S.; VASCONCELLOS, E.
G. Mulheres negras: resistência e resiliência ante os efeitos psicossociais do racismo. Pambazuka
News, 2013. Disponível em:
http://www.ammapsique.org.br/baixe/Artigo%20Cl%C3%A9lia%20Prestes%20-
%20Mulheres%20negras_%20resist%C3%AAncia%20e%20resili%C3%AAncia%20ante%20os%20efei
tos%20psicossociais%20do%20racismo.pdf 14- RUFINO, Luiz. Exu e a Pedagogia das encruzilhadas.
Rio de Janeiro: UERJ, 2017. 15- SANTOS, Vanessa Caroline. Contreguns literários em giras de
autopublição: negras escrevivências. Revista espaço acadêmico número: 226 jan/fev. 2021. Ano XX
bimestral. Disponível em:
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/53888/751375151351 16-
MENDONÇA, Ricardo Fabrino, ABREU, Fabiana, SARMENTO, Rayza. Repertórios discursivos e as
disputas políticas contemporâneas. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/nec/a/m5gtKdtQvwqTnBLNgX8ZK9F/?format=pdf&lang=pt.
332
hegemônica. Para tais discussões, dialogaremos com teorias e ensaios produzidos, principalmente,
por mulheres e suas experiências vividas. Sendo assim, os textos de Audre Lorde, bell hooks e Priscilla
Bezerra nos auxiliarão a escutarmos as vozes femininas. Destacamos as contribuições teóricas
presentes na obra Pele negra, máscaras brancas, de Frantz Fanon e no livro Memórias da plantação,
de Grada Kilomba. Além disso, ao observarmos a qualidade da escuta presente nas obras literárias,
percebemos as possíveis leituras que podem ser feitas à luz dos livros "Pedagogia da autonomia" e
"Pedagogia do oprimido", de Paulo Freire.
Referências: ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia
das Letras, 2019. AKOTIRENE, Carla. Interseccionalidade. São Paulo: Pólen, 2019. ALENCASTRO, Luiz
Felipe de. Vida privada e ordem privada no Império. In:ALENCASTRO, Luiz Felipe de. História da vida
privada no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.p.12-447. BAKHTIN, Mikhail. Estética da
criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2003. BEAUVOIR, Simone de. O
segundo sexo: fatos e mitos. Tradução de Sérgio Milliet. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016.
v. 1. ___________________. O segundo sexo: a experiência vivida. Tradução de Sérgio Milliet. 3. ed.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016. v. 2. BEZERRA, Priscilla. O filho é da mãe?. Fortaleza: Substância,
2017. BOTOSO, Altamir; PIOLA, Raquel Porto Franco. O espaço ficcional em Niketche: uma história
de poligamia e A paixão segundo G. H. Bauru: Canal6, 2012. CASIMIRO, Isabel Maria. Paz na terra,
guerra em casa. Recife: Editora UFPE, 2014. CHIZIANE, Paulina. Eu, mulher... por uma nova visão de
mundo. 3. ed. Belo Horizonte: Nandyala, 2018. ________________. Niketche: uma história de
poligamia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. FANON, Frantz. Os condenados da Terra.
Tradução de José Laurênio de Melo. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1979.
_____________. Pele negra, máscaras brancas. Tradução de Renato da Silveira. Salvador: EDUFBA,
2008. FONSECA, Maria Nazareth Soares. Costurando uma colcha de memórias. In: EVARISTO,
Conceição. Becos da memória. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2006.
_______________________________. Literaturas africanas de Língua Portuguesa: mobilidades e
trânsitos diaspóricos. Belo Horizonte: Nandyala, 2015. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia:
saberes necessários à prática educativa. 58ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2019a. FREIRE,
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África. 2. ed. Brasília: UNESCO, 2010. p. 167-212. HOOKS, bell. Erguer a voz: pensar como feminista,
pensar como negra. Tradução de Cátia Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante, 2019a. HOOKS, bell.
O feminismo é para todo mundo: políticas arrebatadoras. Tradução de Ana Luiza Libânio. Rio de
Janeiro: Rosa dos Tempos, 2018. HOOKS, bell. Olhares negros: nos transformamos em sujeitas.
Tradução de Stephanie Borges. São Paulo: Elefante, 2019b. HOOKS, bell. Teoria feminista: da margem
ao centro. Tradução de Rainer Patriota. São Paulo: Perspectiva, 2019c. KILOMBA, Grada. Memórias
da plantação – Episódios de racismo cotidiano. Tradução de Jess Oliveira. 1ª ed. Rio de Janeiro:
Cobogó, 2019. LORDE, Audre. A transformação do silêncio em linguagem e em ação. In: Irmã
outsider. Tradução Stephanie Borges. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. NASCIMENTO, Cremilda
Mizael. Os sapatos de Té: a filha do reino das águas de Deolinda e Antônio. Org. Elisabete Nascimento
e Bruno Luiz da Silva Nascimento. Rio de Janeiro: Quartica, 2015. PADILHA, Laura Cavalcante. Entre
voz e letra: o lugar da ancestralidade na ficção angolana do século XX.2. ed. Niterói: EdUFFRio de
Janeiro: Pallas Editora, 2007.
333
pessoal da cantora e compositora, cantadeira e dançadeira de Carimbó, enfatizando, em suas
construções poéticas, fragmentos que expressam o espaço e a voz da mulher na produção artística
nacional, uma arte que nos possibilite a reivindicação, a aceitação e a valorização de sua poética de
autoria feminina amazônica. O diálogo teórico será com Borges (2022), Freitas (2020), Nogueira de
Souza (2012), Ratts (2019), Santos (2022), Sarmento-Pantoja (2012), Oliveira (2012) entre outros.
Abordaremos a memória de resistência nas artes a partir da trajetória de Dona Onete, corroborando
para as investigações que ressaltem a voz persistente da mulher frente ao cânone literário. Dentre
as questões que nortearão o presente diálogo, enfatizo: Qual a noção de corpo e de performance da
mulher cantadeira e dançadeira de Carimbó? Que memórias e histórias de resistência estão
presentes nas narrativas cabocla do Pará? Pretendemos com este trabalho refletir e discutir a noção
de corpo, de performance e o protagonismo feminino da poetisa cabocla da Amazônia paraense
frente ao cânone literário machista brasileiro, enfatizar a escrita performática na poesia de Dona
Onete.
Referências: Literaturas: diálogos e resistências/Carlos Henrique Lopes de Almeida e Augusto
Sarmento-Pantoja (organizadores). Belém: UFPA, 2016. Borges, Francisco Santos. Memórias de
Velhas sobre a Manifestação Cultural do Marabaixo na Amazônia amapaense. Dissertação de
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334
FEITAS DE GRITO, GOZO E RITO: A POÉTICA ERÓTICA DE LEILA MÍCCOLIS, MARIA TERESA HORTA E
PAULA TAVARES
Juliana Goldfarb de Oliveira
Resumo: O discurso erótico carrega em si um paradigma social, pois, ao mesmo tempo em que
desafia questões morais, ao evidenciar temas ligados à sexualidade, ele costuma reforçar as relações
assimétricas de gênero através do binômio homem/sujeito e mulher/objeto. Assim, como defende
Borges (2013), a autoria feminina no erotismo pode incidir enquanto voz transgressora, que rompe
com um sistema de representação falocêntrica e propõe novas possibilidades de compreensão dos
corpos e desejos femininos. Esse trabalho tem como intenção refletir sobre as estratégias de
resistência ao discurso erótico hegemônico encontradas na obra poética de três autoras
contemporâneas: a brasileira Leila Míccolis, a portuguesa Maria Teresa Horta e a angolana Paula
Tavares. Apesar de estarem inseridas em contextos distintos e utilizarem técnicas diferentes na
produção poética, elas se assemelham na possibilidade de transformar o corpus poético em corpo
político, escrevendo sobre o prazer e transgredindo a escrita erótica através da mirada feminina (e,
por vezes, feminista). Nas autoras que recebem enfoque aqui, além da reflexão sobre o corpo, desejo
e sexualidade, o erotismo foi utilizado como modo de tensionar os sistemas políticos de seus países.
São corpos que olham para si, mas falam para o mundo - especialmente para outras mulheres - que
não aceitam se submeter e ser silenciadas em nome de um projeto político com que não concordam
ou de uma cultura que não as representam.
Referências: BORGES, Luciana. O erotismo como ruptura na ficção brasileira de autoria feminina: um
estudo de Clarice Lispector, Hilda Hilst e Fernanda Young. Florianópolis: Ed. Mulheres, 2013.
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africano? Como todo cabo-verdiano eu digo: Eu sou cabo-verdiano (risos). Aí está a ambiguidade,
não é? Eu sou cabo-verdiano. E o interessante nisso é que se dizer cabo-verdiano é negar a África”.
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Frota Pessoa, em 1902, na cidade do Rio de Janeiro. Buscaremos discutir e entender os obstáculos
que enfrentou, bem como os motivos que levaram ao silenciamento de sua voz. Em muitas das crítica
e resenhas em torno da sua obra, podemos observar as constantes menções a cor da sua pele ou a
sua sensualidade. A escritora deixou a literatura aos trinta anos de idade.
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androginia de Lulu é posta em prova no âmbito sexual, visto que este corpo infantilizado aguça o
desejo de seus interlocutores, criando assim um clichê obsceno a ser desenvolvido pelo conto. A
narrativa conta ainda com uma fotografia, identificada aqui como um postal erótico encadernada
junto à publicação, criando um arcabouço imagético que dá suporte à história. O trânsito formado
entre texto escrito e texto imagético faz desta narrativa um objeto para a análise sobre a produção
de corpos de sexualidades estranhas no princípio do século XX, a partir da semiologia,
primordialmente Barthes (1990; 2003), e intermidialidade (RAJEWSKY, 2005; SAMOYAULT, 2008),
assim como os estudos de gênero (PRECIADO, 2014; BUTLER, 2010) e pornografia (ABREU, 1996;
BRANCO, 1984; 1985; FOUCAULT, 1987; 2001; GREEN, 2000; MORAES, 2013; SONTAG, 1987).
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342
Tianalva Silva se autobiografa e narra os corpos de mulheres oriundos da cidade de Cachoeira, Bahia?
O objetivo apresentado é abordar na literatura de Tianalva Silva como os seres femininos: putas,
velhas, donas de casa, jovens, trabalhadoras, lésbicas e candobecista considerados como pessoas
distópicas cachoeiranos, enredadas por histórias, experiências e modos de vidas das personagens
que se apresentam e resistem à imposição patriarcal cachoeirana. Para tal, as narrativas
autobiográficas e memorialista da autora podem ser compreendidas no eixo da pesquisa qualitativa
e bibliográfica com leituras que retratam a autoficionalidade aos estudos do feminismo de gênero e
que são focos a serem produzidos no processo de análise, por meio do recorte crítico em Bhabha
(2013), Bosi (2001); Cândido (2000); Chauí (1984-2012); Chimamanda (2015) (2015); Cunha (2001);
Dalcastagnè (2008); Fiuza, Grecco (2020); Hooks (2018); Hool (2005); Jobim (1992); Lerner (2013);
Richard (2002), Rosini (2014), Silva (2018-2019); Silva (2002). Com o resultado dessa pesquisa,
acredita-se por meio dos seguintes campos científicos: literário, sociológico e filosófico, os quais
servirão como ferramenta para o entendimento do processo de exclusão e silenciamento de corpos
femininos imposto pelo patriarcado, como também ser mais uma ferramenta para a ampliação dos
estudos sobre o feminismo por meio da ficcionalidade literária.
Referências: ABREU, Márcia. Cultura letrada: Literatura e leitura. São Paulo: Editora UNESP, 2006.
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343
O GRANDE ESPETÁCULO DA DISSIDÊNCIA: DISPUTAS IDENTITÁRIAS NA DRAMATURGIA BRASILEIRA
DA REABERTURA POLÍTICA
João Pedro Cerdeira Lelis Silva
Resumo: Apesar de, no final da década de 1960, já se observasse no Brasil o surgimento de boates,
bares, e outros espaços de sociabilidade e encontros afetivos e sexuais entre homossexuais, é no
final dos anos 1970 em que a dissidência sexual vai galgar um espaço político a partir de importantes
marcos do direito LGBTQIA+ no Brasil, como a fundação do periódico O Lampião da Esquina, que
circulou de 1978 a 1981, a formação do grupo SOMOS, em 1978 – que conforme sublinha Green
(2019, p. 307), foi o primeiro grupo brasileiro em defesa dos direitos dos homossexuais –, e a
realização do 1.º Congresso Brasileiro de Homossexuais, realizado em 1980 na USP. No que diz
respeito a cena cultural, uma série de texto literários a respeito da homossexualidade surgiram neste
período. Entre eles, chamamos a atenção para a escrita e a encenação de textos dramatúrgicos. Se
a dramaturgia ocupara, entre as manifestações culturais, um espaço privilegiado na arte de
resistência contra a ditadura militar, ela também viria a ser um espaço importante para a emergência
de narrativas que disputavam com os discursos hegemônicos acerca da dissidência de gênero e
sexualidade no período da reabertura. Nestes textos, dos quais podemos destacar, por exemplo, As
três moças do sabonete, de Herbert Daniel, e Lira dos vinte anos, de Paulo César Coutinho, para além
de uma representação dos chamados "anos de chumbo", onde a censura, a tortura e a resistência
figuram como elementos importantes, a narrativa aponta para o debate a respeito da construção da
homossexualidade e da masculinidade. Assim, o que objetivamos nesta apresentação é discutir a
respeito dessas construções em textos da dramaturgia brasileira do período a partir de seu contexto
de enunciação, a fim de explicitar e discorrer a respeito das disputas identitárias ali engendradas.
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345
presente comunicación es recorrer una serie de escenas literarias que hacen foco sobre estos
personajes. A través de la obra de autores como Oscar Hermes Villordo, José María Borghello, Jorge
Asís, Néstor Perlongher, Ioshua, Miguel Ángel Lens o Mariano Blatt, entre otros, se ha ido
configurando una tradición en la que el deseo por el “chongo” asume diferentes formas y
significaciones. Partiendo de las propuestas teóricas de Alan Sinfield en su monografía On Sexuality
and Power (2004), se pretende indagar en cómo las escenas analizadas muestran el
entrecruzamiento de diversos ejes -género, clase, raza- dando lugar a una muy heterogénea gama
de figuraciones. La construcción del “chongo” o “cabecita negra”, en este sentido, obedece a una
serie de factores que se mantienen o se transforman a lo largo del tiempo. Es nuestra finalidad
explorar las derivas de ese deseo en una serie de textos -narrativos y poéticos-especialmente
representativos de los siglos XX y XXI.
Referências: Acha, Omar. Crónica sentimental de la Argentina peronista. Sexo, inconsciente e
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347
Muitas dessas imagens foram utilizadas pela transsexual como "efeito de real" (CHARAUDEAU, 2004)
para suas lembranças e memórias contadas em suas duas principais obras autobiográficas,
"Liberdade ainda que profana" (1998) e "Nem tão bela, nem tão louca" (2007). As imagens, ao
mesmo tempo que reforçam e dão credibilidade às rememorações, podem ser lidas como uma
"narrativa de vida imagética" à parte do texto escrito (LIMA, 2022), isto porquê as imagens, dispostas
cronologicamente (o que não ocorre com os relatos memorialísticos que surgem nas duas obras),
conseguem criar outros sentidos nos leitores para além daqueles pretendidos na escritura de uma
história de vida vivida intensamente. Nosso intuito, então, será promover uma análise discursivo-
imagética (MENDES, 2013), dentro dos pressupostos da Semiolinguística (CHARAUDEAU, 1983), das
fotografias que retratam os vários carnavais em que Ruddy reinava absoluta. O que a análise nos
mostra é que as imagens selecionadas pela autora para ilustrar seu sucesso, não apenas como
cabeleireira ou atriz, mas, principalmente, como "mulher", como musa carnavalesca, apresentam
uma performance que pode ser vislumbrada como um reforço de sua "identidade e alma" feminina.
As imagens mostram, sobretudo, uma transição de gênero e sexo, de rapaz efeminado, no início da
carreira, à visão de uma "mulher completa", como ela mesma se autodefinia.
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350
objetivos da pesquisa visam analisar como o encantado influencia a vida dos moradores e quais
temas reverberam nas entrelinhas dessas histórias, dentre eles destacam-se a questão do negro e
da homossexualidade. A primeira depreende da constituição física do Ataíde: “pretão, feio,
catinguento e com genitália de tamanho exagerado”; para uma sociedade com valores machistas, o
falo gigantesco é associado a orgulho, porém, no Ataíde, seu símbolo de poder é o instrumento
mortal que o configura como o terrificante ser que persegue, surra, estupra e mata pessoas,
revelando uma interpretação que se dirige a sentidos maléficos ao afrodescendente evidenciando
uma concepção racista e negativizando-os. A segunda diz respeito ao estupro, como a atividade de
tirar caranguejo e de pescar são eminentemente masculinas, o ataque do Ataíde se direciona mais
aos homens, desencadeando, pois, uma dupla interpretação acerca da insinuação de relações
homoafetivas na comunidade, assim, esta compreensão, concomitantemente, oculta e revela esse
tipo de relação. Nos discursos implícitos nas narrativas, a criatura simboliza o silenciamento e a
condenação das práticas homoeróticas, constatadas na concepção negativa inerente ao mito
especialmente se tratando da violação do corpo masculino, em que tal prática é considerada
desvirtuada e pervertida fazendo com que o castigo (estupro) extrapole a natureza hedionda do
abuso demonstre pensamentos preconceituosos e intolerantes de sujeitos atados numa perspectiva
homofóbica.
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351
sacudir, abalar e aterrorizar, provocando rachaduras nas estruturas sócio-gênero-sexuais
estabelecidas. São lôkax dissidentes de gênero e sexualidade que são felizes em serem o que são.
São as bixas, as bixinhas, as viadas, as pocs, as afeminadas, as travestis, as pessoas transexuais, as
cachorras, as putonas, as purpurinadas, as maquiadas, as afetadas. As dissidentes sexuais são pura
fechação e lacração, querem e permanecem fechando e lacrando em tudo que fala e faz, em seus
gestos, corpos, vozes, gritos, roupas, acessórios, ações, desejos e lôkurax. São lôkax dissidentes que
expõem a alegria em serem o que são e por concretizarem seus desejos e prazeres.
Referências: COLLING, Leandro; ARRUDA, Murilo Souza; NONATO, Murillo Nascimento.
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“CHEGA DE ANDAR ATRÁS DO QUE ESTÁ ATRÁS DE TI”: A RESSIGNIFICAÇÃO DA “TERRA SEM MAL”
NA POESIA DE WALDO MOTTA
Rodrigo Brito de Oliveira
352
Resumo: Este trabalho pretende analisar o livro Terra sem Mal – um mistério deleitoso e bufante
(2015) de Waldo Motta, poeta brasileiro contemporâneo. Nessa obra, sob uma perspectiva religiosa,
homoerótica e escatológica (e uma poética marcada por elementos da poesia satírica) Waldo
ressignifica a crença da Yvy marã’ey ou “Terra sem Mal” – profecia guarani acerca da existência de
uma terra perfeita, indestrutível, um abrigo contra a deflagração do mundo – declarando que esta
terra prometida está localizada não à frente, mas atrás, nas estranhas do corpo, no cu propriamente
dito. A presente pesquisa busca discutir as implicações éticas por trás da experiência com a “Terra
sem Mal” waldiana. Desse modo, recorre-se ao levantamento bibliográfico correspondente à teoria
etnográfica, à poesia contemporânea, ao homoerotismo e à fortuna crítica de Waldo Motta. A
análise do livro Terra sem Mal – um mistério deleitoso e bufante (2015), do poeta em questão, se
encontra em andamento, mas o que se percebe, a princípio, é que seu projeto poético vai além de
um simples deboche, demonstrando-se sustentado por implicações éticas que ainda estão por serem
melhor esclarecidas. A ressignificação de Motta não propõe uma solução para evitar a destruição do
mundo – pois nela já estamos inseridos –, mas de encontrar no fim a própria salvação.
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353
personagens femininas negras, a partir do conceito de interseccionalidade. Este é um estudo de
revisão bibliográfica que tem como corpus literário a obra Insubmissas lágrimas de Mulheres
(Evaristo, 2011). O recorte teórico aborda aspectos narrativos, sobretudo quanto a autor e narrador.
Para estabelecer o diálogo com a teoria narrativa, o aporte teórico do feminismo negro,
especificamente quanto à interseccionalidade e suas implicações para uma leitura sobre como o
racismo e o patriarcalismo dentro do sistema literário reforçam estereótipos sobre os corpos
femininos negros. A análise dos aspectos acima relacionados verifica como a autora, em sua práxis
narrativa, enfrenta o sistema literário, a partir de personagens femininas negras, que subvertem os
padrões de opressão e silenciamento para falar sobre seus próprios corpos entrecruzados por
violências. Assim se estabelece a fala e o lugar para personagens femininas negras na literatura
contemporânea,, a partir do conceito de escrevivência.
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354
de sua escrita e em qual ela mais se destacou ao tempo em que viveu, principalmente a participação
no teatro e nos jornais sobre frivolidades.
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355
tema em textos de diferentes gêneros, incluindo a produção destinada ao público infantojuvenil.
Cabe ressaltar que, ao contrário da produção de Cecília Meireles, a obra vastíssima e diversificada
de Fernanda de Castro ainda é muito pouco conhecida e estudada, apesar de ter sido premiada e de
contar com o reconhecimento de poetas e críticos, como David Mourão-Ferreira, Eduardo Pitta e
Miguel Real.
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Stuart B. Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo: Cia. das Letras,
1988.
356
transgressão das Três Marias. O foco será sobretudo na poesia das portuguesas Maria Adelaide
Fernandes Prata (1822-1881), Maria da Cunha (1862-1917), Virgínia Victorino (1895-1967) e Judith
Teixeira (1888-1959), e da brasileira Eunice Caldas (1879-1967). São poesias marcadas pelo silêncio
e por imagens exóticas ou naturais.
Referências: BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Trad. Maria Helena Kühner. 12ed. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2014. FADERMAN, Lillian. Surpassing the love of men: romantic friendship
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Female masculinity – Twentieth anniversary edition with a new preface. Durham and London: Duke
University Press, [1998] 2018.
357
Antônio, o que permite questionar como Aparecida transita entre os apelos eróticos face ao mundo
conservador e patriarcal onde se insere. Em Buriti, de 1956, a partir da terceira edição publicado no
volume Noites do sertão, Guimarães Rosa cria três personagens femininas memoráveis: Maria da
Glória, Maria Behu e Lala, que, às voltas com o ambiente pautado pelo erotismo da fazenda Buriti
Bom, respondem de maneira diversa à sedução que emana do lugar. Desse modo, esta pesquisa
examina, nas obras elencadas, o modo de construção das protagonistas femininas, com vistas à
análise comparativa entre as obras e com relação às categorias de tempo e espaço. Os pressupostos
teóricos principais que norteiam este estudo sustentam-se em um tripé, que são, em primeiro lugar,
textos sobre Lucia Miguel Pereira como escritora, em Memorial do memoricídio, organizado por
Constância Lima Duarte e Uma história do romance de 30, de Luís Bueno; textos sobre a ficção
rosiana contidos em sua fortuna crítica, como os de Benedito Nunes e Eduardo Coutinho. Em
segundo lugar, estudos sobre a categoria de espaço, como Teorias do espaço literário de Luis Alberto
Brandão. Em terceiro lugar, estudos sobre a categoria de tempo, como a obra basilar O tempo na
narrativa de Benedito Nunes.
Referências: BUENO, Luís. Uma história do romance de 30. São Paulo: Editora da Universidade de
São Paulo; Campinas: Editora da Unicamp, 2006. BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário.
São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Fapemig, 2013. COUTINHO, Eduardo Frederico. Guimarães
Rosa e o processo de revitalização da linguagem. In: ______. (Org.) Guimarães Rosa. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira/INL, 1991. p. 170-178. DUARTE, Constância Lima. (Org.) Memorial do
memoricídio: escritoras esquecidas pela história: volume l. Belo Horizonte: Editora Luas, 2022.
NUNES, Benedito. O amor na obra de Guimarães Rosa. In: COUTINHO, E. F. (Org.) Guimarães Rosa.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira/INL, 1991. p. 144-169. NUNES, Benedito. O tempo na narrativa.
São Paulo: Ática, 1995. PEREIRA, Lucia Miguel. Ficção reunida. Curitiba: Editora da UFPR, 2006. ROSA,
João Guimarães. Buriti. In: ______. Noites do sertão. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1976. p. 80-251
358
https://www.editorarealize.com.br/editora/anais/ceduce/2015/TRABALHO_EV047_MD1_SA8_ID8
6_05052015113317.pdf.
359
e estética’. (MBEMBE, 2015, p.70). Ainda que visão de negritude de Aimé Césaire aponte para uma
estratégia de afirmação e reafirmação de si (CESAIRE, 2010, p. 18), na qual o povo negro se coloca
contrário à subalternidade racial, o afropolitanismo, conceito complementar à negritude, pode ser
aplicado à literatura de Almeida, pois permite durante a leitura, descortinar a busca de uma
identidade portuguesa por intermédio da relação da protagonista Mila, uma mulher negra de cabelo
crespo, nascida em Angola e que vive em Portugal, que não consegue desabrigar sua existência
angolana, o que permeia o nascimento de duas consciências nacionais que se complementam. Nesse
contexto, pretende-se discutir de que forma a literatura composta por Almeida performa uma
representação das heranças de África como componentes de uma agência de negritude em Portugal.
Para isso, é necessária uma análise não reducionista da experiência de negritude e de africanidade
na obra, que dialogue com a condição afropolitana proposta por Mbembe. Ademais, Paul Gilroy diz
que a África contemporânea é substituída pelo que ele chama de “significantes icônicos” de um
passado africano genérico e ideal” (GILROY, 2012, p.24). A representação do cabelo crespo em Esse
Cabelo pode então performar um significante que ajuda na formação de uma representação da
negritude portuguesa, já que não se limita somente ao crespo de Mila, a protagonista, mas também
a outros crespos herdeiros de África que se compõem como icônicos em Portugal.
Referências: ALMEIDA, Djaimilia Pereira de. Esse cabelo: a tragicomédia de um cabelo crespo que
cruza fronteiras. Lisboa: Leya Brasil, 2017. 131 p. CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre a Negritude. Belo
Horizonte: Nandyala, 2010. 120 p. GILROY, Paul. O Atlântico negro: modernidade e dupla
consciência. Tradução de Cid Knipel Moreira. 2. ed. São Paulo, SP; Rio de Janeiro, RJ: Editora 34:
Universidade Candido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiaticos, 2012. 427 p. MBEMBE, Achille.
Afropolitanismo. Áskesis - Revista Des Discentes do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da
Ufscar, [S.L.], v. 4, n. 2, p. 68, 18 dez. 2015. Askesis. http://dx.doi.org/10.46269/4215.74.
360
VISÕES CONTRA-HEGEMÔNICAS DA NAÇÃO EM CONTOS DE MARIA FIRMINA DOS REIS E JÚLIA
LOPES DE ALMEIDA
Laísa Marra
Resumo: O trabalho compara os contos "A escrava" (1887), de Maria Firmina dos Reis, e "Os porcos"
(1903), de Júlia Lopes de Almeida. Com apenas dezesseis anos de diferença entre eles, esses contos
dialogam com um momento de efervescência política e cultural no Brasil, marcados não só pela Lei
Áurea, em 1888, e pela Proclamação da República, em 1889, como também pela influência do
positivismo, das teorias raciais e do naturalismo enquanto correntes de pensamento importantes
para a imaginação do Brasil como nação alinhada à "marcha da civilização" ocidental. Atentando
especialmente para os desfechos dos enredos das narrativas examinadas, argumenta-se que em
Maria Firmina dos Reis vemos esse contexto acionado para a projeção de outro tipo de nação, a qual,
diferentemente da hegemônica, incluiria na ideia de progresso o sujeito negro descendente de
indígenas e africanos. Já Júlia Lopes de Almeida recupera o mito alencariano da origem brasileira
como resultado do amor entre um homem branco e uma mulher indígena, e faz dele uma releitura
fatalista e grotesca. Com essa análise, defende-se que houve, no período histórico em questão, uma
pluralidade de visões em torno da nação brasileira e seus destinos, e que o discurso dominante, torno
do embranquecimento nacional, foi acompanhado de contradiscursos que precisam ser
considerados.
Referências: ALMEIDA, Júlia Lopes. Os Porcos. In: ______. Ânsia Eterna. Rio de Janeiro: Vermelho
Marinho, 2019. ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a
difusão do nacionalismo. Tradução de Denise Bottman. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
MARRA, Laísa. A narrativa de Maria Firmina dos Reis: nação e colonialidade. 2020. 191 f. Tese
(doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Letras, Belo Horizonte, 2020.
MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus identidade
negra. 5 ed. rev. ampl. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 2019. REIS, Maria Firmina dos. A escrava. In:
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Mulheres reescrevendo a nação. Estudos Feministas, Florianópolis, ano 8, p. 84-97, 1o sem. 2000.
SCHMIDT, Rita Terezinha. The nation and its other. Conexão Letras, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 86-110,
2005. SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e a questão racial no
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notes from Black Europe. Londres: Penguin Books, 2019. SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão
de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez, 1999.
362
sobre os corpos negros e revestida de modernidade e humanismo. Além disso, obras como o álbum
“Pretobrás – Por que eu não pensei nisso Antes?”, de Itamar Assunção, e “Lundu”, de Tatiana
Nascimento, entre outras, desafiam os parâmetros da interseccionalidade, da interconexão entre
pessoas, problemas sociais e ideias para modular uma dinâmica ontológica em que gênero, raça e
classe apresentam uma distinção significativa para dialogar mais especificamente com a teoria social
e com as tradições acadêmicas que tratam das relações de poder.
Referências: Assunção, Itamar, Pretobrás - Por Que Que Eu Não Pensei Nisso Antes?, Atração
Fonográfica, 1998. _____ Ataulfo Alves por Itamar Assumpção - Pra Sempre Agora, Paradoxx, 1996.
_____ Bicho de Sete Cabeças - Vol III, Baratos Afins, 1993. _____ Bicho de Sete Cabeças - Vol II,
Baratos Afins, 1993. _____ Bicho de Sete Cabeças - Vol I, Baratos Afins, 1993. _____ Intercontinental!
Quem Diria! Era Só o Que Faltava!!!, Continental, 1988. _____ Sampa Midnight - Isso Não Vai Ficar
Assim, MPA, 1983. _____ Às Próprias Custas S.A., Isca Gravações Musicais Ltda., 1981. _____ Beleléu,
Leléu, Eu. Lira Paulistana, 1980. (com Isca de Polícia) Collins, Patricia Hill. Bem mais que ideias. São
Paulo: Boitempo Editorial, 2022 _____; Patricia Hill; Bilge, Sirma. Interseccionalidade. São Paulo:
Boitempo Editorial, 2022. Nascimento, Abdias. O genocídio do negro brasileiro: processo de um
racismo mascarado. São Paulo: Editora Perspectiva, 2016. Nascimento, Tatiana. Esboço, Brasília:
Padê editorial, 2016 _____ Lundu, Brasília: Padê Editorial, 3ª edição, 2016 _____ Mil994, Brasília:
Padê Editorial, 2018 _____ 07 notas sobre o apocalipse, ou, poemas para o fim do mundo, Garupa e
Kza1 edições, 2019 _____ Oriki de amor selvagem: todos os poemas de amor preto (ou quase),
Brasília: Padê Editorial, 2020 Wilderson III, Frank B. Afropessimismo. São Paulo: Todavia; 2020.
363
adaptadas, traduzidas ou escritas para jovens projetavam modelos de masculinidade hegemônica,
fundamentadas em noções de heroísmo e de adesão aos valores burgueses de individualidade,
família, nação e trabalho. Em uma breve análise da história da leitura no ocidente, pode ser
observada a importância de romances como os de Verne, Dumas e Twain para a educação dos jovens,
bem como a persistência destas obras nos modelos de juventude e masculinidade apresentados nas
obras brasileiras até meados do século XX – quiçá até hoje. Por outro lado, as primeiras obras
nacionais publicadas no Brasil no século XIX, de caráter ainda mais pedagógico, tinham os “meninos”
como público alvo e ensinavam, também a partir da literatura, valores morais como a dedicação à
família, ao trabalho e à pátria. Por conseguinte, considerando que a identidade nacional esteve
colada à masculinidade e ao heroísmo por um longo período de tempo sem que este trinômio fosse
detectado (LUGARINHO, 2013), encontramos a literatura juvenil um campo privilegiado para
compreender as intersecções entre nacionalidade e gênero a partir do estudo das relações entre a
identidade nacional e a masculinidade na literatura juvenil, tendo como corpora as obras traduzidas,
adaptadas e escritas no Brasil no final do século XIX e início do século XX.
Referências: ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2° edição. Rio de Janeiro: LTC,
1981. BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. COELHO,
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GREGORIN FILHO, José Nicolau. Literatura juvenil: adolescência, cultura e formação de leitores. São
Paulo: Editora Melhoramentos, 2011. GREGORIN FILHO, J. N. Adolescência e literatura: entre textos,
contextos e pretextos. FronteiraZ. Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em Literatura e
Crítica Literária, [S. l.], n. 17, p. 110–120, 2016. Disponível em:
https://revistas.pucsp.br/index.php/fronteiraz/article/view/29044. Acesso em: 20 jan. 2019.
LUGARINHO, M. C. Masculinidade e colonialismo: em direção ao “homem novo” (subsídios para os
estudos de gênero e para os estudos pós-coloniais no contexto de língua portuguesa). Abril – NEPA
/ UFF, v. 5, n. 10, p. 15-38, 30 abr. 2013. Acesso em: 15 dez. 2022. ZILBERMAN, R. Leituras para a
infância no século XIX brasileiro. FronteiraZ. Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em
Literatura e Crítica Literária, [S. l.], n. 17, p. 22–42, 2016. Disponível em:
https://revistas.pucsp.br/index.php/fronteiraz/article/view/29413. Acesso em: 6 jan. 2023.
364
resistência diante do racismo estrutural que tem raízes ainda muito fortes no nosso país. Para isso,
nosso arcabouço teórico contará com os pressupostos desenvolvidos por Antonio Candido (1996);
Octavio Paz (2012); Alfredo Bosi (1977); Heloísa Buarque de Hollanda (1994); Dora Barrancos (2022);
Bel Hooks (2009); Regina Dalcastagnè (2008); Patrícia Hill Colins (2017); Carla Akotirene (2020); Sílvio
Almeida (2021) entre outros.
Referências: AKOTIRENE, Carla. Interseccionalidade. São Paulo: Editora Jandaíra, 2020. ALMEIDA,
Sílvio. Racismo Estrutural. São Paulo: Editora Jandaíra, 2021. BARRANCOS, Dora. História dos
feminismos na América Latina. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2022. BOSI, Alfredo. O ser e o tempo
da poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 1977. CANDIDO, Antonio. O estudo analítico do poema.
São Paulo.: Humanitas-Publicações, 1996. COLLINS, Patrícia Hill. Se perdeu na tradução? Feminismo
negro, interseccionalidade e política emancipatória. Parágrafo: Revista Científica de Comunicação
Social da FIAM-FAAM, v. 5, n. 1, p. 6–17, 29 jun. 2017. DALCASTANGÉ, Regina. Entre silêncios e
estereótipos: relações raciais na literatura brasileira contemporânea. Estudos de literatura brasileira
contemporânea. Brasília, n. 31, p. 87-110, jan./jun. 2008. HOLLANDA, Heloísa Buarque. Tendências
e impasses: o feminismo como crítica da cultura. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. HOOKS, Bell. Teoria
feminista: da margem ao centro. São Paulo: Perspectiva, 2009.
365
pretende, por meio da leitura analítica do livro, baseada em uma episteme majoritariamente
feminina e negra – como textos de Lélia Gonzalez (2018; 2020), Beatriz Nascimento (2018; 2021),
Sueli Carneiro (2011; 2019), Conceição Evaristo (In DUARTE; NUNES, 2020), Patricia Hill Collins (2019)
e a mesma com Sirma Bilge (2021), Audre Lorde (2019; 2020) e bell hooks (2019; 2020) – , estudar
exatamente o trato que Geni Guimarães confere a esses temas na concepção de seus versos,
identificando neles a interseccionalidade e a autorrepresentação que a poeta denota a partir da sua
experiência individual, que não se fecha em si, mas abrange toda uma coletividade, também nessa
obra: uma tessitura de palavras, lirismo e subjetividade que se potencializa como resistência política
e cultural na literatura brasileira contemporânea.
Referências: CARNEIRO, Sueli. Racismo, sexismo e desigualdade no Brasil. São Paulo: Selo Negro,
2011. CARNEIRO, Sueli. Escritos de uma vida. Prefácio Conceição Evaristo, Apresentação Djamila
Ribeiro. São Paulo: Pólen Livros, 2019. COLLINS, Patricia Hill. Pensamento feminista negro:
conhecimento, consciência e a política do empoderamento. Tradução de Jamille Pinheiro Dias. 1. ed.
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as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa.... Diáspora Africana: Editora Filhos da África,
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regresso. Rio de Janeiro: Malê, 2020. hooks, bell. Teoria feminista: da margem ao centro. Tradução
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pensar como negra. Tradução de Cátia Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante, 2019. hooks, bell. E
eu não sou uma mulher?: mulheres negras e feminismo. Tradução de Bhuvi Libanio. 3. ed. Rio de
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Stephanie Borges. São Paulo: Elefante, 2020. LORDE, Audre. Irmã outsider. Tradução de Stephanie
Borges. 1. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019. LORDE, Audre. Sou sua irmã: escritos
reunidos. Organizado e apresentado por Djamila Ribeiro. Tradução de Stephanie Borges. São Paulo:
Ubu Editora, 2020. NASCIMENTO, Maria Beatriz. Beatriz Nascimento, Quilombola e Intelectual:
Possibilidade nos dias da destruição. Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2018. NASCIMENTO,
Beatriz. Uma história feita por mãos negras: Relações raciais, quilombos e movimentos. (org. Alex
Ratts). 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2021.
366
individual que (re)tece as vivências de um eu-feminino decolonial ao remontar um passado
diaspórico ancestral, a partir da percepção do presente sobre as agruras que ficaram do passado.
Referências: ASSMANN, Aleida. Sobre as metáforas da recordação. In: Espaços da recordação:
formas e transformações da memória cultural. Trad. Paulo Soeter. Campinas, SP. UNICAMP, 2011.
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A MINHA VOZ AINDA ECOA, RECOLHE E RESSOA: POESIA NEGRA E FEMININA EM CONCEIÇÃO
EVARISTO
Cleo Amorim Nascimento
Resumo: A literatura tem como característica própria dar voz a uma gama de sentimentos nos quais
os autores se pautam para deixar fluir as mais variadas histórias, sejam elas ficcionais ou biográficas.
Nesse sentido, cabe destacar entre os gêneros literários o poema, pois ele pode ao mesmo tempo
juntar o lírico ao real fazendo ecoar vozes que além de contar suas histórias recolhem dentro de si a
essência do não dito, para em um determinado momento fazer ressoar aos que ouvem a verdade
sobre o que lhes constrói. A história de cada um compõe-se de pequenos fragmentos que se unem
em um movimento atemporal revelando que só somos inteiros quando nos reconhecemos nos
pedaços uns dos outros. Nesse contexto, a presente comunicação busca discutir como se dá a
368
construção da voz feminina e negra dentro da poesia de Conceição Evaristo, escritora e poetisa
afrodescendente, um dos grandes nomes da literatura brasileira contemporânea, a partir da análise
dos poemas Eu-mulher e Vozes-mulheres, a fim de discutir o lugar de fala da mulher negra dentro
da literatura feminina, bem como discutir questões de identidade relacionadas a mulheres, negras e
poetas dentro da literatura afro-brasileira. Convém destacar que este trabalho terá como
embasamento teórico Davis (2016), Schmidt (2012), Ribeiro (2017), entre outros.
Referências: DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. tradução Heci Regina Candiani. - 1. ed. São Paulo
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370
negra em Moçambique. O texto, portanto, revela de maneira sensível a visão da autora com relação
ao seu papel social. Convém ressaltar que as vozes femininas nas narrativas literárias configuram um
fecundo espaço no que diz respeito ao protagonismo e ao empoderamento das mulheres diante dos
discursos hegemônicos presentes nos espaços sociais que reservam às mulheres papéis de
subalternidades. Afinal, a escrita de autoria feminina mostra-se como alternativa de expressão de
vozes que não se sujeitam às imposições sócio-culturais. No contexto literário moçambicano, a obra
de Paulina Chiziane é representativa porque revela o seu olhar sobre Moçambique. Suas narrativas
envolvem o contexto material e subjetivo das mulheres, com temas significativos como a infância,
ritos de iniciação, virgindade, amor, sexo, lobolo, trabalho, sonhos e expectativas da adolescência e
os dramas da vida adulta. A leitura da obra de Chiziane possibilita descortinar tanto a vida íntima
quanto a vida pública dessas mulheres e todas as dificuldades que a conjuntura social lhes reserva.
A proposta deste trabalho é perscrutar as afirmações presentes no ensaio, a fim de compor o
pensamento de Paulina Chiziane e identificar traços de posicionamentos reconhecíveis na sua
composição ficcional.
Referências: BONNICI, Thomas. O pós-colonialismo e a literatura. Estratégias de leitura. Maringá:
Eduem, 2012. CARVALHO, Bruno Sciberras de. Subalternidades e possibilidades de agência: uma
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“FALAR É EXISTIR ABSOLUTAMENTE PARA O OUTRO”: VOZES FEMININAS NEGRAS QUE ECOAM
Elen Karla Sousa da Silva
Resumo: Este artigo propõe uma reflexão das escritas de autoria feminina negra de Jarid Arraes e
Ryane Leão que constroem travessias de elaboração subjetiva e poética que intimam a área da Teoria
da Literatura a se reexaminar. A escrita subversiva e a insurgência dessas escritoras negras, também
se presentifica no campo literário, contribuindo para a construção de novas formas de
representações, além de questionar e rasurar os estereótipos estabelecidos sob as perspectivas
eurocêntrica e colonial. A inserção paulatina de escritoras negras nos âmbitos acadêmicos brasileiros
tem o propósito de contribuir para a entrada e a (re)configuração de algumas marcas teóricas dentro
das universidades. Entendemos, também, que tal processo não é imediato, uma vez que a travessia
da função de objeto para o de sujeito que produz conhecimento é gradativa. E, nesse contexto, a
temporalidade está, de modo direto, relacionada, também, ao conhecimento dos códigos, ao
apropriar-se de sua fala e assenhorear-se de seus espaços, já que o que se considera como referencial
são os clássicos eurocêntricos, sendo cartesiana e continuamente relidos, reinventados,
reinterpretados, no inútil esforço de se buscar uma universalidade em situações tão individuais. Isto
posto, considero algumas discussões teóricas significativas para a análise e compreensão do corpus,
tais como Carneiro (2005; 2018; 2019), Gonzalez (1982; 1983; 2019), Ribeiro (2017), Collins (2015;
2016; 2019;), hooks (2018; 2019), Lorde (1984; 2019); Kilomba (2018; 2019), entre outras. Pretende-
se, com esta reflexão pensar essas rasuras como formadoras de um discurso estético-político,
marcado por questões étnico-raciais que revelam o lugar de pertencimento dessas escritoras.
Referências: ARRAES, Jarid. Um buraco com meu nome. São Paulo: Ferina, 2018. CARNEIRO, Sueli;
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Goulart Almeida; Marcos Pereira Feitosa; André Pereira Feitosa. Belo Horizonte: editora UFMG,
2010.
373
branco, é civilizado, bonito e inteligente, enquanto ao homem negro resta-lhe ser classificado como
primitivo e preguiçoso. Constância Lima Duarte em Canção para ninar menino grande: o homem na
berlinda da escrevivência (2020) frisa a questão do projeto escrevivência, e indica a existência de
denúncia e questionamento sobre o patriarcado, no entanto, não se limitando a ele. Ao longo da
narrativa, o mito masculino se desfaz, e Fio Jasmim torna-se um representante das contradições do
universo masculino, assim distanciando-se da figura heróica. Nessa perspectiva, o percurso teórico
será embasado por Connell (1995), Fanon (2005), Gonzalez (1984) e Lorde (2009). Palavras-chave:
Conceição Evaristo; Interseccionalidade; Racismo; Patriarcado; Masculinidades negras.
Referências: CONNEL, R. W. (2017). Políticas da masculinidade. Educação &Amp; Realidade, 20(2).
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Borges. -- 1. ed. -- Belo Horizonte : Autêntica Editora, 2019.
374
Resumo: Este artigo discute a identidade da mulher negra na literatura de autoria feminina
representada no romance Garota, Mulher, Outras (2020), de Bernardine Evaristo, com o objetivo de
mostrar doze mulheres britânicas vivenciam uma mistura de origens culturais, orientações sexuais,
classe e raça nas lutas de vidas cruzadas a partir da visão da sociedade inglesa. Para tal reflexão a
luta por espaços da arte da palavra de escritores negros pela representação de sua identidade na
Literatura Inglesa. Além disso, a importância da Literatura Britânica para a literatura de autoria
feminina no Brasil. Através dos referenciais teóricos, a presente pesquisa mostra a luta e as
conquistas de escritores negros britânicos, a representação de mulheres negras na literatura de
autoria feminina negra brasileira num espaço de desconstrução de um sistema normativo de gênero.
Utilizo como metodologia a pesquisa bibliográfica que norteará os estudos pautados em artigos e
estudos bibliográficos de autores como Stuart Hall (2013), Candido (2004), Michel Focault (1997).
Conclui definindo que a Literatura Negra Britânica assim como a Literatura de autoria feminina negra
brasileira reflete um apagamento de histórias negligenciado ao longo de séculos por uma alienação
imposta pelas sociedades e que obras como a de Bernardine Evaristo contribuem para ecoar uma
escrita nas quais mulheres negras são retiradas do patamar de alteridade, confrontar suas lutas,
colocá-las no centro de uma narrativa, dispondo aos leitores trajetórias de vidas que durante séculos
estiveram à margem e foram silenciadas nos cânones literários.
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Bernadine. Garota, mulher, outras. Tradução Camila von Holdefer. 1º ed. São Paulo: Companhia das
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Letras e Artes. Programa de Pós-graduação em Letras. Universidade Estadual de Maringá, Maringá-
Pr.
“ENTÃO ELA ESTÁ ESTUDANDO PARA SER FEITICEIRA, PARA ATRAPALHAR A NOSSA VIDA”: O
LUGAR DA MULHER NEGRA NA CONSTRUÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DAS RELAÇÕES AFETIVAS EM
DIARIO DE BITITA, DE CAROLINA MARIA DE JESUS
Janaina Tomaz Capistrano
Resumo: Considerando fundamental a leitura de obras que se localizam na contramão da hegemonia
branca, masculina e eurocentrada, sobretudo no âmbito educacional, trazemos para o centro das
investigações do projeto de pesquisa “Vozes da periferia: Carolina e outras pretas descolonizando o
patriarcado” a obra Diário de Bitita (1986), relato autobiográfico escrito por Carolina Maria de Jesus.
Este trabalho se constitui como desdobramento dos estudos desenvolvidos nesse projeto de
pesquisa, implementado no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), Campus São Gonçalo
do Amarante. O objetivo deste estudo é reconhecer na e pela linguagem o lugar da mulher negra na
construção e consolidação de relações afetivas, as quais são relatadas na obra Diário de Bitita. Para
tanto, focalizamos a escrita de uma mulher pertencente a um grupo ainda mais subalternizado, em
375
que o corpo social é desacreditado de suas potencialidades apenas por ser mulher, negra e pobre,
mas que usa a leitura e a escrita como armas para enfrentar a ordem patriarcal branca. Buscamos
fundamentar o estudo na teoria bakhtiniana da linguagem, recorrendo aos conceitos de vozes sociais
e relações dialógicas; bem como na teoria feminista decolonial, pensada, dentre outras, por Lélia
Gonzalez (2020), Sueli Carneiro (2011), bell hooks (2019), Audre Lorde (2019), Patrícia Coollins (2019)
e Grada Kilomba (2019), cujo conceito de interseccionalidade vem sendo bastante salutar para a
compreensão de como várias estruturas de opressão se cruzam silenciando e marginalizando corpos
sociais afetados por elas, inclusive em suas relações afetivas. Assim, a partir de um olhar
afrocentrado, este trabalho segue na esteira de estudos que buscam produzir fissuras no campo
simbólico da literatura, desconstruindo estereótipos que subalternizaram a escrita potente e urgente
de mulheres negras, as quais vêm se reafirmando mulheres sujeitos de suas histórias e dos saberes
que delas decorrem.
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decoloniais. Rio de Janeiro: Bazar do tempo, 2020. p. 39-49. hooks, bell. Erguer a voz: pensar como
feminista, pensar como negra. 1. ed. Tradução de Cátia Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante,
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Resende et al. Belo Horizonte: UFMG, 2019. RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento.
Tradução de Alain François et al. Campinas/SP: Editora da UNICAMP, 2007.
377
tais fins, utilizaremos como corpus analítico os poemas “Se me quiseres conhecer”, da obra Sangue
Negro (2001), de Noémia de Sousa, poeta moçambicana, em contraste ao poema “Minha África”, da
obra Na pele (2020), da poeta mato-grossense Luciene Carvalho. Os poemas em questão tratam do
requisitar da fala, da autoafirmação e da autorrepresentação. Nesse horizonte, esses versos estão
inseridos num espaço afrodiaspórico, dado o movimento (inter)nacional estabelecido entre África-
Brasil. Dessa forma, as autoras parecem comprometer-se e afetar-se com a materialidade poética,
pois há uma subjetividade exprimida em cada estrofe, embrenhando escrita e vivência em suas
produções. Alhures, os textos supracitados conclamam uma arquitetura imagética de África para a
sua interioridade, contestando o discurso racista da supremacia branca, navegando, desse modo,
para além dos perímetros territoriais, geográficos, pois exteriorizam um olhar de aproximação e
distanciamento entre povos, culturas, memórias e simbologias. Posto isto, os escritos notabilizam
esse encontro entre Pacífico e Índico, mas, também, paradoxos e estigmas envoltos à imagem
mascarada do nome/termo “África”. A abordagem analítico-literária da pesquisa ocorre por meio de
uma metodologia bibliográfica, e, nesse ensejo, amparamos nossas discussões, primordialmente,
em: Junior (2007), Mbembe (2018), Adichie (2019), entre outros apoios teóricos.
Referências: ADORNO, Theodor W. Palestra sobre lírica e sociedade. In: ADORNO, Theodor W. Notas
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380
negra feminina que tanto pode valer-se de estratégias discursivas próprias à revelação de um eu
negro, quanto anunciar uma voz coletiva que assume as experiências femininas negras” (FONSECA,
2020, p. 65). De acordo com a própria Conceição Evaristo, a escrevivência “extrapola os campos de
uma escrita que gira em torno de um sujeito individualizado”; ela surge enquanto “uma prática
literária cuja autoria é negra, feminina e pobre” (EVARISTO, 2020, p. 38). Para ilustrar essa ideia, a
escritora remete-se a Oxum e a Iemanjá: assim, no abebé (leque em forma circular com espelho no
centro) de Oxum, seria recuperado um rosto, uma individualidade mutilada pela colonização e
demais opressões; quando a individualidade é finalmente reconquistada, surge o abebé de Iemanjá,
em que outros rostos e individualidades são percebidos e é revelada “a nossa potência coletiva, nos
conscientiza que somos capazes de escrever a nossa história de muitas vozes. E que a nossa imagem,
o nosso corpo, é potência para o acolhimento de nossos outros corpos”.(EVARISTO, 2020, p. 39).
Assim, a partir da noção de escrevivência, veremos como esse conceito dialoga com a obra da própria
Conceição Evaristo, da escritora Carolina Maria de Jesus e da poeta Lívia Natália.
Referências: EVARISTO, Conceição. Escrevivência: sentidos em construção. In: DUARTE, Constância
Lima; NUNES, Isabella Rosado. A Escrevivência e seus subtextos. Rio de Janeiro: Mina, 2020, p. 26-
47. FONSECA, Maria Nazareth Soares. Escrevivência: sentidos em construção. In: DUARTE,
Constância Lima; NUNES, Isabella Rosado. Escrevivência: a escrita de nós. Rio de Janeiro: Mina, 2020,
p. 58-73.
DOS RÉS DOS PORÕES, FAVELAS E BECOS AO CHÃO DA ESCRITA: MODOS DE DESCORTINAR
SILÊNCIOS, OMISSÕES E VIOLÊNCIAS EM CORPOS NEGROS FEMININOS
Marinei Almeida
Resumo: Úrsula (2018), reconhecida como marco importante da literatura afro-brasileira, escrita por
Maria Firmina dos Reis ainda no século XIX, traz vozes de pessoas negras advindas do tráfico negreiro
para o solo escravizante do Brasil; Quarto de despejo (2014), da escritora Carolina Maria de Jesus
cujo chão de uma favela serve como matéria prima para suas anotações cotidianas, aponta para
narrativas de corpos negros violentados pela fome e pelo descaso social; nas quase mil páginas de
Um defeito de cor (2011) escritas por Ana Maria Gonçalves assistimos, tal qual em uma tela de
cinema, a violenta travessia atlântica de pessoas negras subjugadas em um fétido porão às mil e uma
peripécias na tentativa de resistir ao destino escravo e desumanizador que os aguardavam em terras
de uma das colônias portuguesas; travessia também é a base da ficção de Conceição Evaristo em
Ponciá Vicêncio (2003), na qual constatamos um retrato bastante cruel do período pós-abolicionista
no Brasil. Essas escritas, como outras aqui não citadas, têm em comum mulheres negras que lutam
contra a violência, o preconceito e desigualdade social, trazem, sobretudo, marcas de mãos
femininas inquietas que sentem a necessidade de contar, a partir das vozes de mulheres, narrativas
que não só apontam, mas desmistificam silêncios, omissões, violências de um sistema de herança
colonial. Considerando tais apontamentos, o objetivo desta intervenção é trazer para discussão
questões relacionadas à produções femininas, cuja atenção fulcral se dá sobre a luta de mulheres
negras em uma sociedade machista, sexista e, portanto, desigual. Abordagens como: o tardio
aparecimento e/ou reconhecimento de escritas associadas à literatura afro-brasileira (e/ou
afrodescendente e/ou literatura negra); violências contra o corpo feminino, estarão na pauta de
reflexão, por meio de incursões em escritas produzidas por mulheres negras e sobre mulheres
negras, na literatura contemporânea produzida no Brasil.
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de Gênero. Feminismo e Subversão de identidade. Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 2017. COLLINS, Patrícia Hill. Se perdeu na tradução? Feminismo negro,
interseccionalidade e política emancipatória. Parágrafo: Revista Científica de Comunicação Social da
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silêncios e estereótipos: relações raciais na literatura brasileira contemporânea. Estudos de literatura
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e o mito do estuprado negro. Sõ Paulo: Boitempo Editorial,2018.
381
RACISMO ESTRUTURAL E RELAÇÕES DE PODER EM PONCIÁ VICÊNCIO E BECOS DA MEMÓRIA, DE
CONCEIÇÃO EVARISTO
Paulo Marchiori Corte e Jesuino Arvelino Pinto
Resumo: A proposta desta pesquisa é refletir acerca das representações do racismo estrutural e
questões identitárias da mulher preta, suas vozes subalternizadas e o desenvolvimento do poder
que, entre situação de exclusões, silenciamentos e negligências, se desenvolvem, nos romances
Ponciá Vicêncio (2003) e Becos da memória (2006), de Conceição Evaristo, que constituem o corpus
deste estudo. Ao discorrer nestas duas narrativas sobre o encontro das vivências, suas formas e
representações da busca e reencontro, mesmo atreladas ao racismo estrutural, pressupomos que a
autora possibilita que a mulher preta consiga produzir fala e fazer-se ouvir, a partir de suas ações de
poder com as suas e seus, neste ambiente de subalternidade, alicerçado sob o prisma desse racismo
estrutural. A pesquisa busca aporte teórico para abordar as representações do racismo estrutural na
literatura afro-brasileira nas teses postuladas por Fanon (1979, 2008), Almeida (2018), Gonzales
(2014), Ribeiro (2017 e 2019), bell hooks (2019), Grada Kilomba (2019) e Carneiro (2020); e sobre as
questões de poder e suas (inter)relações, bem como a condição humana, em Arendt (1999, 2005 e
2009) e Spivak (2010). Na narrativa contemporânea de Evaristo, percebe-se a afirmação da cultura
do povo marginal, subalternizado. A literatura como um espaço de possibilidades se apresenta como
fator de desconstrução, de transgressão, como é próprio da escrita evaristiana. Perceber a literatura
como possibilidade de modificação e reconfiguração da própria língua portuguesa como modo de
apropriação e se relacionar abertamente com ela sem grilhões que impeçam esse movimento.
Referências: ABDALA JUNIOR, B. História, literatura e política. Cotia: Ateliê Editorial, 2007. ALMEIDA,
Silvio. O que é racismo estrutural. Belo Horizonte: Letramento, 2018. ARENDT, Hannah. A condição
humana. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2020. ARENDT, Hannah. Eichmann em
Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. ARENDT,
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e resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. São
Paulo: Ouro Sobre Azul, 2006. CARNEIRO, Sueli. Escrito de uma vida. São Paulo: Jandaíra, 2020.
EVARISTO, Conceição. Becos da memória. 3. ed. Rio de Janeiro: Pallas, 2020 . EVARISTO, Conceição.
Ponciá Vicêncio. 3. ed. Belo Horizonte: Pallas, 2020. FANON, Frantz. Os condenados da terra.
Tradução de 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. FANON, Frantz. Pele negra máscaras
brancas. Tradução de Renato da Silveira. Salvador: EDUFBA, 2008. GONZALEZ, Lélia. Por um
feminismo afro-latino-americano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020 HALL, Stuart. A identidade cultural na
pós-modernidade. Rio de Janeiro: Lamparina, 2015. HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e
mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. hooks, bell. Olhares negros: raça e
representação. Tradução de Sthephanie Borges. São Paulo: Elefante, 2019. KILOMBA, Grada.
Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Tradução de Jess Oliveira. Rio de Janeiro,
2019. MUNANGA, Kabenguele. Negritude: usos e sentidos. 2. ed. São Paulo: Ática, 1988.
NASCIMENTO. Abdias. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo RIBEIRO, Djamila. O
lugar de fala. São Paulo: Sueli Carneiro; Jandaíra, 2021. RICOUER, Paul. A memória, a história e o
esquecimento. Campinas: Unicamp, 2007. SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar?
Trad. Sandra Regina Goulart Almeida; Marcos Pereira Feitosa; André Pereira Feitosa. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2010.
382
demonstrando como o romance marca um período em que a escrita literária, produzida por
mulheres negras na atualidade, possui um traço decolonial constituindo para além de produção
artística, ação política rumo a justiça social. A pesquisa fez uso das teorias de Foucault (2010) sobre
o valor do discurso, Barthes ( 1968 ) (2000) sobre as concepções de subjetividade evidenciadas na
escrita, teorias de hooks (1980), Collins (2019), Davis (2013), Ribeiro (2015), pois compreendem os
processos identitários de uma mulher negra, representado pela personagem numa sociedade de
classes; as teorias de Munanga (2018), Fanon (2020), Hall (2013), Bhabha (2013) que versam sobre
a compreensão de negritude e os processos das identidades fragmentadas na contemporaneidade
não só como uma voz solo mas um discurso que materializa os anseios coletivos de todo um grupo
de mulheres.
Referências: ALMEIDA, Djaimilia Pereira. Esse Cabelo: a tragicomédia de um cabelo crespo que cruza
a história de Portugal e Angola. Alfragide: 2015. BARTHES, Roland. O rumor da língua. Trad. Mário
Laranjeira. São Paulo: Editora Brasiliense, 1998. FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas.
Tradução de Renato da Silveira. Salvador-BA. EDUFBA, 2018. HALL, Stuart. A identidade cultural na
pós-modernidade. Trad. Tomáz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: Lamparina,
2019. HOOKS, Bell. Mulheres negras; moldando a teoria feminista.1980 KILOMBA, Grada. Memórias
da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.
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Editora PUC Minas, 2017. SILVA, Débora Jean Lopes. MULHERES NA LITERATURA: Escritas de autoria
feminina negra. Universidade Federal de Mato Grosso, Programa de Pós-Graduação Profissional em
Ensino de História, Cuiabá, 2021.
384
entre os textos escolhidos. Para isso, utilizar-se-á da metodologia dos estudos da Literatura
Comparada e da revisão bibliográfica à medida que se buscará em textos teóricos e críticos
fundamentos para sustentar as análises e interpretações inferidas. Alguns teóricos e textos serão
indispensáveis para a pesquisa, como os textos publicados na obra Literatura Comparada textos
fundamentais, de Eduardo F Coutinho e Tania Franco Carvalhal (2011); Racismo estrutural, de Silvio
Almeida (2019), Tradição e esquecimento, de Paul Zumthor (1997).
Referências: ALDRIDGE, A. Owen. Propósito e perspectiva de literatura comparada. In. Literatura
comparada: textos fundadores. Ed. 2. Trad. Sonia torres. Org. Eduardo F. Coutinho e Tania F.
Cavalhal. Rio de Janeiro: Rocco, 2011. (p. 272-276). ALMEIDA, Silvio. O racismo estrutural. São Paulo:
Sueli, Carneiro , Pólen, 2019. JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: o diário de uma favelada.
10º Ed. São Paulo: Ática, 1992. MARCOS, Plínio. Querô uma reportagem maldita. In: Pomba Roxa.Rio
de Janeiro: Funart, 2017. ZUMTHOR, Paul. Tradição e Esquecimento. Trad. Jerusa Pires Ferreira e
Suely Fenerich. São Paulo: Hucitec, 1997.
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nstra%20a,chega%20a%208%2C9%25>. Acesso em: 05 ago.2022.
386
tradicionais e da emancipação pessoal por meio da literatura, busco escrever um livro de poemas
que será organizado em duas partes. Em “O armário” os poemas serão organizados em capítulos
conforme a celebração da eucaristia em rito romano (missa) e que apresentarão as tensões de uma
mulher lésbica oprimida pela imposição religiosa, sendo assim, ela buscará na autonegação uma
tentativa de salvar sua alma do pecado. Na transição para a segunda parte do livro, ela enfrentará
os problemas de gênero e sexualidade colocados pelos dogmas da igreja, e, com isso, virá a saída do
armário. Porém, ao sair desse móvel enclausurador, a personagem se vê presa numa “estante”, o
que será a segunda parte do livro. Em “A estante” os poemas expressarão as vivências da
personagem na sociedade, sendo a estante o lugar do julgamento opressor. A justificativa deste
projeto está em Judith Butler quando diz, em Problemas de Gênero (2021), que ameaçar com
problemas é uma forma de evitar problemas, logo, é necessário descobrir “a melhor maneira de criá-
los, a melhor maneira de tê-los” (BUTLER, 2021, p.7). Dessa forma, penso que a melhor maneira de
criá-los é por meio da arte, da poesia, da literatura, para que se possa ter aqueles que valham a pena
enfrentar; a luta contra o preconceito, a violência e o silenciamento das mulheres invisibilizadas que
são frutos do patriarcado cisheteronormativo.
Referências: BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos e mitos. Rio de Janeiro: Editora Nova
Fronteira, 2016. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de Monges Beneditinos de Maredsous
(Bélgica). São Paulo: Editora Ave-Maria, 2014. BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e
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2021.CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. 3ª. ed. Petrópolis: Vozes; São Paulo: Paulinas, Loyola, Ave-
Maria, 1993 FEDERICI, Silvia. Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva. São Paulo:
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São Paulo: Editora Lápis Roxo, 2016. SANTOS, Claudiana Gois dos; INÁCIO, Emerson da Cruz. A Bruta
flor do querer: amor, performance e heteronormatividade na afetividade lésbica. Seminário
Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (anais eletrônicos).
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2018, 367 p.
388
busca de superação da realidade retratada, quanto à figuração do exotismo para a complacência do
público (PELEGRINI, 2005). O fato é que as crianças, sobretudo, negras, são negligenciadas por uma
política perversa que avança sobre a vida, aniquilando-a (MBEMBE, 2019). Se todas as vidas são
dignas de serem vividas e até sepultadas (BUTLER, 2022), como os contos escolhidos, lidos sob esta
ambivalência, permitem entrever tanto a denúncia de um mundo dominando por poderes que
violentam os corpos infantis, quanto pela estilização da miséria e da violência, a qual se pode
perceber por traços de linguagem, como os manifestos pela pontuação (ADORNO, 2003) dos dois
contos? Da leitura temático-estilística, tentaremos extrair reflexões sobre a realidade social, bem
como sobre a criação literária, que estiliza esta realidade.
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Duas Cidades Ltda, 2003. BOSI, Alfredo. “Situação e Forma do conto brasileiro contemporâneo”. In:
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Vozes, 2000.
391
de transição sexual e de gênero para tornar-se Sandra. Esta, por ser uma mulher trans, perde todos
os atributos (leia-se éticos, morais, afetivos, etc.) que o outrora Sergio possuía. Daí que este corpo,
o de Sandra, torna-se socialmente um monstro, uma sujeita monstruosa, por ousar subverter as
rígidas leis do sexo e do gênero numa sociedade (brasileira e norte-americana) altamente
transfóbico-patriarcal. Sandra, além de carregar em seu corpo a monstruosidade por empreender a
transição, é apagada como sujeita, sua vida é roubada, vilipendiada, a personagem deixa de existir
como tal e apenas Sergio tem direito à existência. Isto se dá porque quando Sandra é assassinada
nos Estados Unidos por uma garota que convivia com ela, sua identidade de mulher é apagada, a
família a sepulta como Sergio, instaurando assim, um segundo assassinato: a destruição da memória
da personagem. O gesto perpetrado contra a personagem trans confirma tão somente o que
Preciado atesta sobre a monstruosidade encarnada num determinado corpo e que, portanto, deve
ser eliminado/apagado.
Referências: ARAÚJO, Maria Clara. Pedagogias das travestilidades. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2022. VIDAL, Alexandre Porto. Sergio Y. vai à América. São Paulo: Companhia das Letras,
2014. PRECIADO, Paul B. Eu sou o montro que vos fala: relatória para uma academia de psicanalistas.
Rio de Janeiro: Zahar, 2022.
392
O PROCESSO DE TRANSIÇÃO DE GÊNERO AUTOFICCIONAL DE DOIS HOMENS TRANS: PAUL B.
PRECIADO E LINO ARRUDA
Frida Pascio Monteiro
Resumo: Este trabalho aborda as autoficções trans, as quais estão em voga nacional e
internacionalmente. Romances, novelas, contos, dramaturgias são as autoficções em seus gêneros
mais corriqueiros. Nosso trabalho será em relação aos gêneros crônica e história em quadrinhos.
Para isso, analisaremos a coletânea de crônicas de Paul B. Preciado intitulada 'Um apartamento em
Urano: Crônicas da travessia' (2020) e a história em quadrinho 'Monstrans: Experimentando
horrormônios' de Lino Arruda (2021). Ambos os autores são homens trans que narram
autoficcionalmente, cada um em sua abordagem e gênero literário, seus respectivos processos de
transição, ou ainda, processo transexualizador. Como nosso cabedal teórico, trabalharemos com a
produção acadêmica de ambos: Preciado (2022; 2018; 2015) e Arruda (2020), com sua pesquisa
acadêmica acerca das figuras (in)humanas monstrans na autorrepresentação trans*/travesti em
histórias em quadrinhos sudacas. Para compreendermos esses corpos transgênero, de transhomens,
corpos dissidentes, inconformes e subalternos valer-nos-emos de Butler (2022; 2017); Lanz (2017) e
Halberstam (2020), sendo Butler um dos principais nomes da Teoria Queer, Lanz uma psicanalista,
teórica de gênero e mulher transexual brasileira e Halberstam um teórico queer, acadêmico e
homem transexual estadunidense. Halberstam (2020) reflete sobre a Arte Queer do Fracasso e, para
a cisheteronormatividade, não há fracasso maior do que romper com as barreiras de gênero por
meio da transição e processo transexualizador, basilados na hormonização como um de seus
alicerces. Para a cisheteronorma, pessoas transgênero são fracassados de gênero. Também
analisaremos as teorias das autoficções de Faedrich (2022), a escrita autobiográfica trans no trabalho
de Chaves (2021) e as histórias em quadrinhos como gênero literário em Miranda; Pinheiro-Mariz
(2014), O norte das autoficções/autobiografias trans será o livro do transhomem brasileiro, já
falecido, João W. Nery, o romance 'Viagem Solitária' (2011). Analisarmos, refletirmos a partir dessas
autobiografias autoficcionadas de homens trans na literatura é terreno fértil e profícuo.
Referências: ARRUDA, Lino. Monstrans: Experimentando horrormônios. Campinas, SP: Ed. do Autor,
2021. ARRUDA, Lino Alves. Monstrans: figurações (in)humanas na autorrepresentação
travesti/trans* sudaca. (Tese de Doutorado em Literatura). Universidade Federal de Santa Catarina -
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2022. BUTLER, Judith. A vida psíquica do poder: teorias da sujeição. Belo Horizonte: Editora
Autêntica, 2017. CHAVES, Leocádia Aparecida. A escrita autobiográfica trans como estratégia de
resistência e organização: vaga-lumes na escuridão de nosso tempo. (Tese de Doutorado em
Literatura). Universidade de Brasília - UNB. Brasília: 2021, 155 p. FAEDRICH, Anna. Teorias da
autoficção. 1a. ed. Rio de Janeiro: EdUERJ. 2022. HALBERSTAM, Jack. A Arte Queer do Fracasso.
(Trad.). Bhuvi Libanio. Recife: Cepe, 2020. LANZ, Letícia. O corpo da roupa: a pessoa transgênera
entre a transgressão e a conformidade com as normas de gênero. Uma introdução aos estudos
transgêneros. 2a. ed. Curitiba: Movimento Trans-gente, 2017. MIRANDA, Déborah Alves; PINHEIRO-
MARIZ, Josilene. Nos limiares da literatura: histórias em quadrinhos, adaptações e outras artes.
Revista Letras Rara, ISSN: 2317-2347, vol. 3, n. 2, 2014, p. 172-185. NERY, João W. Viagem solitária:
Memórias de um transexual trinta anos depois. São Paulo: Leya, 2011. PRECIADO, Paul B. Eu sou o
monstro que vos fala: Relatório para uma academia de psicanalistas. (Trad.). Carla Rodrigues. 1ªa.
ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2022. PRECIADO, Paul B. Um apartamento em Urano: Crônicas da travessia.
(Trad.). Eliana Aguiar. 1a. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2020. PRECIADO, Paul B. Testo Junkie: Sexo,
drogas e biopolítica na era farmacopornográfica. (Trad.). Maria Paula Gurgel Ribeiro. São Paulo: n-1
edições, 2018. PRECIADO, Paul B. Transfeminismo. São Paulo: n-1 edições, 2015.
393
formação da identidade feminina contemporânea no Brasil e na Argentina. Enquanto Felinto,
brasileira, frequentemente trata de questões relacionadas à infância e à dureza da vida, Venturini,
argentina, estreou as publicações com As primas, aos 85 anos de idade, trazendo à superfície uma
perspectiva diferenciada acerca da vida: a da estranheza visível. É aí que ambas se aproximam: no
conto de Marilene Felinto, a personagem principal perscruta a memória, acessando a dor de se achar
feia tal como o pai a dizia, para desenhar em perspectiva a professora que era capaz de achar beleza
em qualquer pessoa; no romance de Aurora Venturini, a protagonista é uma jovem artista bem-
sucedida que, com o auxílio inicial do professor, consegue estabelecer uma carreira, mesmo com
deficiência na fala. O que não se pode falar ainda pode ser representado, afinal. As duas personagens,
tanto a do conto quanto a do romance, estão às voltas com o mesmo dilema: dar forma; representar,
por meio do desenho, ora realista, ora abstrato, pessoas e situações que as cercam. A realidade
dessas personagens, para dizer com Édouard Glissant, é deslocamento. Georges Didi-Huberman, em
O que vemos, o que nos olha, cita uma passagem de Joyce: “Fechemos os olhos para ver”, estratégia
encontrada também pelas personagens para enxergar imagens que finalmente poderão ser
representadas ao tocar os instrumentos que as servem: papel, lápis, tela, tinta, enfim, beleza.
Referências: DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. Prefácio de Stéphane Huchet;
tradução de Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 2010. FELINTO, Marilene. Mulher feita e outros
contos. São Paulo: Fósforo, 2022. GLISSANT, Édouard. Poética da relação. Tradução Marcela Vieira,
Eduardo Jorge de Oliveira; prefácio Ana Kiffer, Edimilson de Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Bazar
do Tempo, 2021. VENTURINI, Aurora. As primas. Tradução Mariana Sanchez; prefácio Mariana
Enriquez. São Paulo: Fósforo, 2022.
394
heterossexualidade, bem como o Feminino enquanto conceito heurístico – desatrelado de sexo e
gênero, como construção sócio-histórica discursiva –, à luz de estudos de gênero oriundos de
Epistemologias do Sul. Para tanto, a obra literária é utilizada como fonte de indagações
correlacionadas, prioritariamente, à colonialidade de gênero em suas imbricações com a classe social
e as comunidades de vida e discurso representadas por Edwin. A presente pesquisa, eminentemente
bibliográfica, tem como base teórica principal os escritos de Wilton Garcia (2000), Guacira Lopes
Louro (2004), Alberto Mira (2013), José Carlos Barcellos (2006) e Eve Kosofsky Sedgwick (2007). Na
obra literária, percebe-se, através dos relatos sobre família, trabalho, religião e demais âmbitos
sociais, proposta de reconfiguração de sua personagem central, alçando-a da condição de sujeito
oprimido a empoderado. Baute, que é homossexual, através de sua prática artística – ao escolher
narrar a vida de personagem homossexual e Drag Queen – ajuda, numa perspectiva decolonial, a
construir arcabouço cultural que se reverte em espaço de identificação e representatividade aos
“marginais” do regime heterossexual. Na intersecção das práticas e dos discursos, o estudo da
literatura desvela criticamente visões de mundo e relações de poder, reforçando nossa confiança de
que as artes, seja a literária ou outras, possuem papel de destaque no processo (trans)formativo dos
sujeitos.
Referências: BARCELLOS, José Carlos. Literatura e homoerotismo em questão. Rio de Janeiro:
Dialogarts, 2006. GARCIA, Wilton. A forma estranha. São Paulo: Pulsar, 2000. LOURO, Guacira Lopes.
Um corpo estranho: ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
MIRA, Alberto. Cinefilia gay y el cultivo del yo. Razón y palabra, Monterrey, n.85, p. 01-24, dez. 2013-
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de mar. De 2016. SEDGWICK, Eve Kosofsky. A epistemologia do armário. Cadernos Pagu, Campinas,
trad. Plínio Dentzien, n. 28, p. 19-54, jan-jun/2007.
395
2003. JABLONKA, Ivan. Homens justos: Do patriarcado às novas masculinidades. Tradução de Julia
da Rosa Simões. São Paulo: Todavia, 2021.
396
performatividade de gênero, no contexto familiar e em instituições educacionais, ou por sua
deficiência física e raça, em diversos âmbitos sociais. Isso também ocorre no contexto narrativo, na
construção em terceira pessoa, que demonstra o apagamento da voz de um sujeito visto socialmente
somente como um corpo abjeto, sendo apenas visível de forma objetificada e não como sujeito digno
de valor social.
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução
de Renato Aguiar. 17. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. DALCASTAGNÈ, Regina.
Literatura brasileira contemporânea: um território contestado. Vinhedo: Horizonte, 2012. PEREIRA,
Carlos Eduardo. Enquanto os dentes. São Paulo: Todavia, 2017. RESENDE, Beatriz. Contemporâneos:
expressões da literatura brasileira no século XXI. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2008. SILVA, Tomaz
Tadeu da (Org.); HALL, Stuart; WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: a perspectiva dos
estudos culturais. 15. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.
397
sido vivida [...] sem acesso a qualquer conhecimento de tradição, de continuidade e esteio social.”
(RICH, 2010, p.36). Isto é, pessoas lésbicas vivem um apagamento histórico e contínuo. Na literatura,
esse apagamento também se manifesta e somente começa a ser driblado a partir da publicação e
veiculação da autoria de mulheres e pessoas dissidentes. Dentre essas produções está Controle, de
Natalia Borges Polesso, publicado em 2019, pela Companhia das Letras. A obra é um romance de
formação, no qual acompanhamos o crescimento de Maria Fernanda, uma mulher solitária que se
viu excluída do mundo logo após sua primeira crise de epilepsia, no início da adolescência. Paralelo
à doença, ela começa a perceber que o amor que sentia pela sua melhor amiga, Joana, é também
permeado pelo desejo do corpo, um desejo que é parte dela, assim como a epilepsia. Polesso
tematiza em sua obra as impossibilidades como amarras, uma espécie de limbo entre estar viva ou
estar morta. Pauta como muitas vezes as dissidências relegam os sujeitos a uma condição de morto-
vivo, de alienação à possibilidade de viver plenamente. “Eu quero viver” a sentença que finaliza o
romance, dita pela protagonista, dá o tom da narrativa: viver plenamente é exercer a sexualidade
dissidente. Nessa perspectiva, a presente comunicação visa discutir a inscrição da lesbianidade no
romance Controle, entendendo-o como uma obra de ficção que inscreve sujeitas secularmente
apagadas e que aponta para existência lésbica.
Referências: AZEVEDO, Adriana. O corpo-atritável ou uma nova epistemologia do sexo. In:
HOLLANDA, Heloísa Buarque (Org.). Pensamento feminista hoje: sexualidades do sul global. Rio de
Janeiro: Bazar do tempo, 2020, p. 302-313. BONNET, Marie-Jo. Les relations amoureuses entre les
femmes: XVIe - XXe siècle. Paris: Odile Jacob, 1995 BUTLER, Judith. Corpos que Importam: os limites
discursivos do sexo. Tradução de Veronica Daminelli e Daniel Yago Françoli. São Paulo: N-1 Edições,
2020 FACCO, Lúcia. As Heroínas saem do Armário: literatura lésbica contemporânea. São Paulo:
Edições GLS, 2004. FIGUEIREDO, Eurídice. Por uma Crítica Feminista: leituras transversais de
escritoras brasileiras. Porto Alegre, RS: Zouk, 2020. POLESSO, Natalia. B. Controle. São Paulo:
Companhia das Letras, 2019. POLESSO. Natalia B. Geografias lésbicas: literatura e gênero. Criação e
Crítica, São Paulo: USP, v.1, n.20, p. 169-191, abr./2018. Disponível em: . Acesso em: 24 abr. 2021.
PONTES, Isadora Araújo. Narrativas de mulheres e da lesbianidade: discurso do "outro lugar". Criação
e Crítica, São Paulo: USP, v.1, n.20, p. 169-191, abr./2018. Disponível em: . Acesso em: 12 jan. 2021.
SEDGWICK, E. K. A epistemologia do armário. Cadernos Pagu, Campinas, SP, n. 28, p. 19– 54,
jul./2016. Disponível em: . Acesso em: 25 abr. 2021. RICH, Adrienne. Heterossexualidade
Compulsória e a existência lésbica. Bagoas - Estudos gays: gêneros e sexualidades. Tradução de
Carlos Guilherme Valle. Natal, UFRN, n.5, v.4,. p. 14-44, nov./2010. Disponível em:
https://periodicos.ufrn.br/bagoas/article/view/2309. Acesso em: 15 jan. 2021. RICH, Adrienne.
Notas para uma política de localização (1984). In: MACEDO, Ana Gabriela (Org.). Género, Indentidade
e desejo; antologia crítica do feminismo contemporâneo. Tradução de Maria José da Silva Gomes.
Lisboa: Cotovia, 2002. p. 15-35. WITTIG, Monique. O pensamento straight. Tradução de Ana Cecília
Acioly Lima. BRANDÃO, Izabel et al (Org.). Traduções da cultura – perspectivas críticas feministas
(1970- 2010). Maceió: EDUFAL; Florianópolis: Editora da UFSC, 2017. p. 262-274.
398
narrativa, a sanção pragmática está assentada numa lógica de dupla estigmatização social dos
meninos em situação de rua: a invisbilidade e a (ultra)visibilidade. Com isso, é possível observar um
processo de esvaziamento da condição humana na medida em que se considera o outro como sujeito
digno de abjeção. Essa retórica ancora-se nos mecanismos de mistificação que são responsáveis pela
negação das políticas de extermínio e de genocídio da população mais pobre, da atuação do Estado
Penal. Ocorre daí a consolidação de um sistema de identificação e um princípio de unidade com
aqueles que desvalorizam a diferença e um sistema de divergência e assimetria com os diferentes,
os ‘desajustados emocionante’. A triagem da triagem, na sintaxe extensiva, busca os valores de
absoluto do destinador sócio-histórico, como os da branquitude, do esteticismo, do cristianismo etc.
Em síntese, os resultados expostos evidenciam uma descontinuidade com o projeto de identidade
nacional fundamentado na eufórica celebração da mistura por ultrapassar a noção ‘democrática e
cordial’ da sociedade brasileira.
Referências: ABDALA JÚNIOR, Benjamin. O Romance Social Brasileiro. São Paulo: Editora Scipione,
1993. AMADO, Jorge. Capitães da Areia. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. BARROS, Diana Luz
Pessoa de. Intolerância, Preconceito e Exclusão. In: LARA, Glaucia M. P.; LIMBERTI, Rita de Cássia P.
(org.). Discurso e (des)igualdade social. Contexto: São Paulo, pp. 61-78, 2015. BARROS, Diana Luz
Pessoa de. Preconceito e intolerância em gramáticas do português. In: BARROS, Diana Luz Pessoa de;
FIORIN. José Luiz (Orgs.). A fabricação dos sentidos: estudos em homenagem a Izidoro Bliktein. São
Paulo: Paulistana/Humanitas, 2008. BLIKSTEIN, Izidoro. Semiótica e totalitarismo. São Paulo:
Contexto, 2020. BLIKSTEIN, Izidoro. O aniquilamento do corpo em Auschwitz: análise semiótica do
relato do Primo Levi. Ide, São Paulo, v. 39, n.62, p. 135-146, 2016. FIORIN, José Luiz. A Construção da
Identidade Nacional Brasileira. Bakhtiniana: Revista de Estudos do Discurso, São Paulo, v. 1, n. 1, p.
115-126, 2009. LAFETÁ, João Luiz. 1930: A crítica e o modernismo. São Paulo: Duas cidades/Editora
34, 2000.
399
2011. LLANSOL, Maria Gabriela. Um Falcão no Punho: Diário I. Belo Horizonte: Autêntica Editora,
2011.
400
e de violência. Partindo do pressuposto de que existem, “nos textos literários elementos comuns que
identificam sua natureza, sem que isso os uniformize” (CARVALHAL, 2003, p. 125), o objetivo é
proceder ao exame dessas obras, procurando investigar as relações de semelhanças e diferenças que
elas estabelecem, elegendo como categoria analítica nuclear a representação do silêncio. Ao
discutirmos os dois romances, indagamos: Qual a relação de sentido teria o silêncio veiculado nos
comportamentos ou gestos dos personagens que integram as narrativas de Raduan Nassar, Lavoura
arcaica, e de Itamar Vieira Júnior, Torto arado? Quais seriam as dimensões do silêncio nessas obras,
como ele se estabelece de modo comum à ficção dos autores e quais as suas singularidades? Para a
discussão, no campo da literatura comparada contemporânea, elegemos, dentre outros estudiosos
e estudiosas, Tânia Carvalhal (2003); Sandra Nitrini (2015), bem como a sistematização do
pensamento crítico e teórico de Julia Kristeva (2012) acerca da noção de intertextualidade; na
perspectiva do estudo crítico dos romances, à luz da problemática do silêncio que envolve as
narrativas, teremos como referências principais: o pensamento crítico de Lourival Holanda (1992);
Roland Barthes (2003) e Susan Sontag (2015).
Referências: BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. Trad. Paulo Bezerra; Yara
Frateschi Vieira. 12 ed. São Paulo: HUCITEC, 2006. BARTHES, Roland. O neutro: anotações de aulas e
seminários ministrados no Collège de France, 1977-1978. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e cultura. São Paulo:
Editora Brasiliense, 1987. CARVALHAL, Tânia. O próprio e o alheio: ensaios de literatura comparada.
Rio Grande do Sul: Unisinos, 2003. FREIRE, Camilla. O avesso da palavra: estudo das representações
do silêncio no romance Dois irmãos, de Milton Hatoum. Dissertação (Mestrado em Estudos da
Linguagem) – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, 2017. HOLANDA, Lourival. Sob o signo do silêncio. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 1992. HOLANDA, Lourival. O espelho convexo: literatura e imaginário social. In: SANTOS,
Derivaldo dos; HOLANDA, Lourival; CABRAL, Valdenides; DUARTE, Zuleide. (orgs.). Trama de um cego
Labirinto. Ensaios de literatura e sociedade. João Pessoa: Ideia, 2010. KRISTEVA, Julia. A palavra, o
diálogo e o romance. In: KRISTEVA, Julia. Introdução à Semanálise. 3 ed. São Paulo: Perspectiva, 2012.
LINARD, Sérgio. Vozes sem sonoridade: tramas do silêncio em Anacrusa, de Ricardo Daunt. 2020.
Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem) – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes,
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020. JÚNIOR, Itamar Vieira. Torto arado. São Paulo:
Todavia, 2019. NASSAR, Raduan. Obra completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. NITRINI,
Sandra. Literatura comparada: História, Teoria e Crítica. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2015. SONTAG, Susan. A vontade radical: estilos. Trad. João Roberto Martins Filho. São Paulo:
Companhia das Letras, 2015.
401
patroa e babá, baseado na fantasia da mulher negra como mãe ideal (KILOMBA, 2019). O trabalho
vai mostrar pontos de contato e de contraste entre as duas obras que indicam alguns aspectos da
transformação da presença da babá na literatura brasileira ao longo do século XX.
Referências: BARRETO, Lima. Contos completos de Lima Barreto. Org. e Int. Lilia Moritz Schwarcz.
São Paulo: Companhia das Letras, 2010. DALCASTAGNÈ, R. "A personagem do romance brasileiro
contemporâneo: 1990-2004". In: Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, [S. l.], n. 26, p. 13–
71, 2011. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/estudos/article/view/9077.
FIGUEIREDO, Eurídice. Por uma crítica feminista: leituras transversais de escritoras brasileiras. Porto
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intervenções e diálogos. Org. Flavia Rios e Márcia Lima. Rio de Janeiro: Zahar, 2020. KILOMBA, Grada.
Memórias da plantação: episódios do racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Editora Cobogó, 2019. PIZA,
Edith. "Da cor do pecado". In: Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 3, n. 1, p. 52, jan. 1995.
RONCADOR, Sônia. A doméstica imaginária: literatura, testemunhos e a invenção da empregada
doméstica no Brasil (1889-1999). Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008. SANTOS, Ynaê
Lopes dos. Racismo brasileiro: uma história da formação do país. São Paulo: Todavia, 2022.
SCHWARCZ, Lilia. Lima Barreto: Triste visionário. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. SEGATO,
Rita. Crítica da colonialidade em oito ensaios e uma antropologia por demanda. Rio de Janeiro: Bazar
do Tempo, 2021. SOUZA, Mariana Filgueiras de e FIGUEIREDO, Eurídice. "A representação da criada
nas tragédias cariocas de Nelson Rodrigues". In: Revista Textura. v. 23 n. 56, out./dez. 2021. TELLES,
Lorena Féres da Silva. "Amas de leite". In: Dicionário da escravidão e liberdade. Org. Lilia Moritz
Schwarcz e Flavio Gomes. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. VERGÈS, Françoise. Feminismo
decolonial. São Paulo: Ubu Editora, 2020.
402
Tradução: Marcelo Brandão Cipolla. 2a edição. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2017 [1994]
WILDERSON III, Frank B. Afropessimismo. Trad. Rogerio W. Galindo e Rosiane Correia de Freitas. São
Paulo: todavia, 2021.
403
A HETERONORMATIVIDADE E SUAS FORMAS DE VIOLÊNCIA NO ROMANCE “A PALAVRA QUE
RESTA”, DE STÊNIO GARDEL
Raul Leme Medeiros
Resumo: Esse trabalho tem como objetivo analisar as formas de violência decorrentes da
heteronormatividade no romance A palavra que resta, de Stênio Gardel (2021). Na história em
questão, Raimundo Gaudêncio de Freitas é um senhor analfabeto de 71 anos que aprende a ler e
escrever para compreender uma carta enviada décadas atrás por Cícero, seu primeiro e grande amor.
Durante a juventude, os personagens se envolvem secretamente por dois anos até serem
descobertos e brutalmente separados. Raimundo, então, torna-se vítima de agressões físicas e
verbais no âmbito familiar, o que gera em si vários conflitos internos e externos. Assim, por meio
desta análise, discutimos as relações de poder que produzem os mais diversos tipos de violência
contra a população LGBTQIA+. Nesse sentido, pontuamos a heteronormatividade enquanto instância
capaz de determinar quais padrões sociais e sexuais devem ser seguidos, classificando-os até mesmo
como “naturais”. Para além da norma, também são definidos os desvios numa lógica binarista pela
qual o poder se estabelece ao elencar o “correto” e o “incorreto”. Consequentemente, tudo aquilo
que se apresenta como desviante da hegemonia heterossexual torna-se passível de estigmatização
e condenação. Para nosso estudo, temos como base os trabalhos de Butler (2003), Foucault (1982,
1988), Louro (2000), e Salih (2015), Silva (2000) e Spargo (2017).
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad.
Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. FOUCAULT, Michel. História da
sexualidade, v. I: a vontade de saber. Trad. Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon
Albuquerque. 13. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988. FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder.
Organização e introdução de Roberto Machado. 3. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1982. GARDEL, Stênio.
A palavra que resta. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da
sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. 2. ed.
Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 4-24. SALIH, Sara. Judith Butler e a teoria queer. Trad. Guacira
Lopes Louro. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015. SILVA, Tomaz Tadeu da. A produção social da
identidade e da diferença. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Identidade e diferença. Petrópolis:
Vozes, 2000. p. 73-102. SPARGO, T. Foucault e a teoria queer: seguido de ágape e êxtase: orientações
pós-seculares. Trad. Heci Regina Candiani. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017.
404
armas que não esperaríamos que utilizasse com tamanha maestria —, impulsiona uma nova
articulação no mundo factual, reivindicando sua existência como sujeito na literatura e fora dela.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Meios sem fim: notas sobre a política. Tradução: Davi Pessoa. Belo
Horizonte: Autêntica, 2015. BAUMAN, Zygmunt. Vidas desperdiçadas. Tradução: Carlos Alberto
Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: CANDIDO,
Antonio. Vários escritos. 6. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2017, p. 171-193. MBEMBE, Achille.
Necropolítica. Arte & Ensaios, Rio de Janeiro, n. 32, p. 123-151, dez. 2016. Disponível em:
<https://revistas.ufrj.br/index.php/ae/article/view/8993/7169>. Acesso em: 10 jan. 2023. REZENDE,
Maria Valéria. O voo da guará vermelha. 2. ed. Rio de Janeiro: Objetiva 2014. SPIVAK, Gayatri
Chakravorty. Pode o subalterno falar? Tradução: Sandra Regina Goulart Almeida; Marcos Pereira
Feitosa; André Pereira Feitosa. Belo Horizonte: UFMG, 2010.
405
suicídio entre adolescentes e jovens negros 2012 a 2016, Brasília DF. Universidade de Brasília, 2018.
Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/obitos_suicidio_adolescentes_negros_2012_2016.pdf.
Acesso em: 10/03/2019. NUNES, Rosilda Maria Q. Cruz. Juventudes negras em uma escola de São
Sebastião do Passé/ba: as faces de um perigo, suicídio e as trilhas da reexistência 2021. Dissertação
(Mestrado em Programa de Pós Graduação em Crítica Cultural) - Universidade do Estado da Bahia.
SOUZA, A. L.S. Letramentos de reexistência: poesia, grafite, música, dança: hip hop. 1. ed. São Paulo:
Parábola Editorial, 2011. v. 1. P.176.
SEM TÍTULO
Sandro Aragão Rocha
Resumo: O romance Parque das irmãs magníficas (2021), de Camila Sosa Villada, conta a história de
uma protagonista que leva o mesmo nome da autora. Camila, uma travesti do interior de Córdova
(Argentina), vive uma vida dupla: de manhã estuda Comunicação e Teatro, se camuflando para
sobreviver, e a noite trabalha no Parque Sarmiento com prostituição, dando espaço para ser quem
realmente deseja. As vivências, que entrecortam lembranças da infância e momentos em que a
protagonista já é maior de idade, narradas ora de forma crua, ora com grande grau poético e
fantasioso, dão forma ao texto e aos personagens que fazem parte da trama: desde pequenas, para
as travestis, tudo no mundo pode ser dor e violência, mas tudo, nesse mesmo mundo, pode ser
também o oposto, alegria e prazer. Nesse sentido, essa dualidade entre dor/prazer,
realidade/fantasia, amor/ódio, nos permite mergulhar mais fundo naquilo que é sentido nesse
retalho de narrativas que formam o todo-memória de Camila, e nos faz sentir mais vividamente o
que essas personagens reais-ficcionais vivenciam. Dessa forma, meu trabalho foi construído em
diálogo com memórias que emergiram a partir das reflexões que fiz da obra em questão, tendo como
objetivo analisar o modo como a relação entre memória, corpo e afeto aparece no texto de Camila
Sosa Villada, tendo como base teórica Judith Butler (2016), Paul B. Preciado (2019), Michel Foucault
(1987), Byung-Chul Han (2017), Stuart Hall (2015), João Silvério Trevisan (2018), entre outros.
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. PRECIADO, Paul B. Multidões queer: ntas para uma política dos
“anormais”. In: HOLLANDA, Helosa Buarque de. Pensamento feminista: conceitos fundamentais. Rio
de Janeiro: Bazar do Tempo, 2019. __________. O que é contrassexualidade?. In: HOLLANDA, Helosa
Buarque de. Pensamento feminista: conceitos fundamentais. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2019.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis,
Vozes, 1987. 288p. HAN, Byung-Chul. A agonia do Eros; tradução de Enio Paulo Giachini. Petrópolis:
Editora Vozes, 2017 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz
Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: Lamparina, 2015. TREVISAN, João Silvério.
Devassos no paraíso: a homossexualidade no Brasil da colônia à atualidade. Rio de Janeiro: Objetiva,
2018.
406
precariedade, desenvolvida por Judith Butler (2018), as reflexões sobre violência contra o corpo
feminino, realizadas por Heleieth Saffioti (2001; 2011), e as considerações sobre a relevância social
da literatura, de Karl Schollhammer (2000; 2013). Os resultados apontam para a significativa
contribuição da literatura enquanto ferramenta de intervenção crítica dentro de uma sociedade
violenta, permitindo-nos ver distintas formas e consequências da violência que permeia o nosso
cotidiano e que são facilmente banalizadas e invisibilizadas.
Referências: BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria
performativa de assembleia. Tradução de Fernanda Siqueira Miguens. 1ª ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2018. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Discriminação e violência contra a
população LGBTQIA+: relatório da pesquisa. Conselho Nacional de Justiça; Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento. Brasília: CNJ, 2022. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/2022/08/relatorio-pesquisa-discriminacao-e-violencia-contra-lgbtqia.pdf> Acesso
em: 02 jan. 2023. FERNANDES, Rinaldo de. O conto brasileiro do século XXI. In: Revista Graphos, vol.
14, nº 1, 2012. Disponível em:
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407
(2007) reflete, ao pensar sobre as mulheres e suas formas de ligação com a memória e a comunidade,
o fato de que a representação de trajetórias de vidas até então mobilizadas dentro do cenário
cultural/social permitiam apenas o conhecimento de experiências e identidades hegemônicas, e que
a partir do momento em que as mulheres reescrevem essa cena, temos diferentes perspectivas e
modos de sentir. Desta maneira, os processos de construção/desconstrução identitárias vivenciados
pelas personagens, por exemplo, estão relacionados aos lugares que ocupam, da problemática de
gênero, da formação cultural e formal que tiveram ou da ausência dessa formação, bem como do
acesso aos bens culturais e sociais. Assim, pretende-se refletir, a partir das trajetórias das
personagens, como esse lugar de invisibilidade, além de demarcar os silêncios individuais e/ou
coletivos, do que é ou não vedado às pessoas, promove um espaço de ruptura, ao colocar em cena
outras formas de partilha (Rancière, 2009) e reivindicação da experiência.
Referências: BEZERRA, Kátia. Vozes em dissonância: mulheres, memória e nação. Florianópolis: Ed.
Mulheres, 2007. RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível: estética e política. São Paulo: Editora 34,
2009. SAAVEDRA, Carola. Com Armas Sonolentas. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.
408
Heleieth Saffioti; a tese de doutoramento “A lavoura sagrada de Raduan Nassar”, de autoria de Flávio
Adriano Nantes. A proposta de leitura se dá por uma reflexão sobre as relações de gênero, a violência
contra as mulheres e o patriarcado, sobretudo o eclesiástico. Raduan em “Lavoura arcaica”
empreende a escritura acerca de uma família regida pelo sistema patriarcal: um pai soberano e
autoritário que se apresenta como zeloso pela família, pela ordem e pelo trabalho. No decorrer da
história observa-se que o genitor ensejava de fato exercer o poder e dominância sobre sua família,
culminando com o assassinato/feminicídio de Ana. As relações desiguais de gênero são
demonstradas pelo silenciamento de Ana (e todas as personagens-mulheres) e a não
responsabilização dos três personagens masculinos (pai, André e Pedro) sobre a violência extrema e
letal perpetrada.O patriarcado eclesiástico que ocorre no interior das sociedades ao redor do mundo,
conferindo poderio aos homens em detrimento das mulheres e que conforme Nantes (2018) se vale
de elementos religiosos para suprimir o direito de alguns em viver dignamente, por não
compactuarem com uma ética e uma moral forjadas a partir da religião, o que pode ser observado
na obra de Raduan por meio do comportamento do patriarca da família que assume a posição de
Deus ao extirpar o “mal sedutor”, no caso a filha.
Referências: HOOKS, Bell. The Will to Change: men, masculinity, and love . New York: Atria Books,
2004. Capítulo 2, Entendendo o patriarcado, tradução: Carol Correia, 2020. NANTES, Flávio Adriano.
A lavoura sagrada de Raduan Nassar / Flávio Adriano Nantes Nunes. São José do Rio Preto, 2018.
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Virgínia. Um teto todo seu. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
413
comportamentos e representações, conforme Gil (2002). O aporte teórico segue na esteira de nomes
como Bento (2020), Bourdieu (2017), Butler (2018), Zanello (2018) e Spivak (2018), bem como outros
que se desdobrem sobre as questões das relações de gênero e seu cruzamento com o texto literário.
Podemos perceber que na obra supracitada de Angela Carter, o personagem masculino Evelyn passa
por uma transmutação, transformando-o na feminina Eva, porém tal procedimento inacabado, altera
seu corpo físico e não sua mente. A partir daí, Carter lança reflexão sobre como este novo sujeito
passa a ocupar o lugar do oprimido, antes autor do próprio processo de opressão. Tal artimanha,
proporciona ao leitor a possibilidade de entender como o sujeito feminino foi relegado a um espaço
diminutivo, por uma ordem colonial de gênero que perpassa desde o campo simbólico até o material.
Assim, a autora britânica dialoga sobre temas como misoginia, machismo e violência de gênero, ao
passo que propõe uma subversão para descontruir discursos normativos contra os sujeitos femininos
marginalizados.
Referências: BENTO, B. A reinvenção do corpo- Sexualidade e gênero na experiência transexual.
Salvador: Editora Devires, 2017. BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand,
2017. BUTLER, J. P. Problemas de gênero: femininos e subversão da identidade. 16. ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. CARTER, A. The Passion of New Eve. London: Gollancz, 1977. GIL,
A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. SPIVAK, G. C. Pode o
subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. ZANELLO, V. Saúde mental, gênero e
dispositivos. Curitiba: Appris, 2018.
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A balada do café triste e outras histórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010. McCULLERS, Carson. O
coração é um caçador solitário. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. WESTLING, Louise Hutchings.
Sacred Groves and Ravaged Gardens. Athens: University of Georgia Press, 1985.
415
de autoras como Badinter (2011), Branco (2004), Figueiredo (2020), Kristeva (1989), Marie-Helène
Brousse (2004), Soler (2019) e Xavier, (2007), abordando e debatendo conceitos-chave como corpo,
maternidade, violência, marca materna e devastação. Beirando a estética do choque, interessa-nos
na obra “A débil mental”, portanto, a construção destes corpos atravessados pela violência e pelo
pedágio psíquico inscrito na relação com a maternidade em uma sociedade patriarcal. A obra de
Harwicz nos leva a questionar a corpsificação na linguagem, em que a maternidade pode sustentar-
se como abismo devastador, seja pela perda seja pelo estilhaçamento do Outro.
Referências: BADINTER, Elisabeth. O conflito: a mulher e a mãe. Rio de Janeiro: Record, 2011.
BROUSSE, Marie-Helène. Uma dificuldade na análise das mulheres. In MILLER, Jacques-Alain.
Ornicar? – de Lacan a Lewis Carroll. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. HARCWICZ, Ariana. A débil mental.
1ª ed. São Paulo: editora Instante, 2020. SOLER, Colette. A marca materna. In TAPERMAN, Daniela.
Corpo. 1ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2022.
416
Resumo: A literatura de autoria feminina brasileira, silenciada historicamente, discute o corpo da
mulher velha e negra através das políticas corporais que desarticulam o viés universalizante e
totalizador, empreendido pelo cânone literário. A partir da análise do conto “No muro’, que integra
a obra Ânsia eterna (1903), da escritora Julia Lopes de Almeida, localizada no final do século XIX e
início do século XX, examinaremos a condição feminina atravessada pela velhice, gênero, classe e
raça. A narrativa aborda a relação da personagem Maria Tereza e Teodora, uma escrava da família.
Ao longo da história são relatados fatos através das reminiscências de Maria Tereza que parece
lembrar-se de tudo que vivenciou em sua infância, menos de Teodora. O esquecimento, como um
elemento presente em toda a narrativa, metaforiza o silenciamento e a invisibilidade da mulher
negra e velha, a despeito de todo o trabalho em educar os filhos dos senhores brancos. O processo
da escravidão fez perpetuar as relações, cujas mulheres negras serviam as amas brancas. As histórias
contadas pela “Mãe preta” acabavam criando uma espécie de romance familiar que assumiu um
papel fundamental na formação dos valores e crenças do povo, para Lélia Gonzalez (2018) o nosso
volksgeist, que de forma consciente ou não, passavam para o brasileiro branco a cultura africana,
como a africanização do português falado no Brasil, o pretuguês como dizem os africanos lusófonos,
e dessa forma a própria africanização da cultura brasileira. Esse trabalho tem como objetivo,
portanto, analisar como a literatura de autoria feminina no entre -séculos produziu reflexões acerca
do corpo feminino imbricado às questões de gênero, raça, classe e idade.
Referências: AKOTIRENE, C. O que é Insterseccionalidade? Belo Horizonte: Letramento: justificando,
2018. BEAUVOIR, Simone de. A velhice. 3. Ed. Trad. de Maria Helena Franco Monteiro. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1990. BUTLER, Judith. Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade.
Tradução Renato Aguiar, 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. CARNEIRO, Sueli. [et al.];
organização Heloisa Buarque de Hollanda. Pensamentos feministas: conceitos fundamentais. Rio de
Janeiro: Bazar do tempo, 2019. COUTINHO, Eduardo. Literatura comparada, literaturas nacionais e o
questionamento do cânone. In: Revista Brasileira de Literatura Comparada, n°03, 1996. DEBERT,
Guita Grin. Gênero e Envelhecimento: Estudos Feministas, Rio de Janeiro, 2013. GONZALEZ, Lélia. A
mulher negra na sociedade brasileira: uma abordagem políticoeconômica. In: Primavera para Rosas
Negras: Lélia González em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018.
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Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Tradução de Jess Oliveira. São Paulo:
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transformação do silêncio em linguagem e ação. In: Textos escolhidos de Audre Lorde. s/d., p. 16-20.
Disponível em: https://we.riseup.net/assets/171382/AUDRE%20LORDE%20COLETANEA-bklt.pdf
______, Audre. Poesia não é um luxo. Tradução de tatiana nascimento. 2012. Disponível em:
https://traduzidas.wordpress.com/2013/07/13/poesia-nao-e-um-luxo-de-audre-lorde/ nascimento,
tatiana. cuírlombismo literário: poesia negra lgbtqi desorbitando o paradigma da dor. São Paulo: N-
1 edições, 2019. QUEIROZ, Louise. Girassóis estendidos na chuva. Salvador: Boto-cor-de-rosa livros
arte e café / paraLeLo13S, 2019. SILVA, Cidinha da. Canções de amor e dengo. São Paulo: Edições Me
Parió Revolução, 2016.
418
Resumo: Esta comunicação tem como objetivo discutir a figuração da mulher violenta na literatura
inglesa de autoria feminina do século XIX. Diferente de suas irmãs mais racionais e moderadas, como
é o caso de "Jane Eyre" (Jane Eyre, Charlotte Brontë, 1847), esse tipo de representação feminina, ao
incorporar as outroridades que lhe são impostas (forasteira, perigosa, irracional), chamam a sua
monstruosidade para dançar a tarantela. A mulher violenta escapa do binômio muito conhecido dos
anos oitocentos do Anjo do Lar e de sua oposta, a mulher hiperssexualizada. Não responde, portanto,
a nenhuma tradição cultural masculina. Escritas por mulheres, são figuras que revolucionam o que é
ser mulher, mesmo que pelo lado socialmente condenável da violência. Ao romperem com
opressões, de gênero e de classe, tornam-se mais livres e dilatadas; dessexualizadas. Existem como
força erótica no mundo e são agentes de mudança no interior da narrativa. Como paradigmáticas
dessa figuração, apresentamos, compondo uma longa lista de mulheres violentas na cultura
ocidental, Victoria di Loredani ("Zofloya, or the Moor", Charlotte Dacre, 1806) e Lady Audley ("Lady
Audley’s Secret", Mary E. Braddon, 1862). Duas personagens femininas que nos convidam a
descolonizar a nossa memória do que é ser mulher e a refletir sobre elas como figuras de resistência
e de contestação a uma estrutura patriarcal que se infiltra nos cantos mais profundos de nossa
organização social, política, cultural e psíquica. É nossa intenção, portanto, perseguir as questões
que se apresentam: que urgência comunica a mulher violenta? Quais são as suas denúncias? Nesse
sentido, o século XIX é extremamente contemporâneo, uma vez que, com queixas ainda atuais, essas
mulheres lançam luz sobre o nosso presente, de modo que nos auxiliam a (re)descobrir um tipo de
representação feminina que escapa da domesticidade e da docilidade.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? In: AGAMBEN, Giorgio. O que é o
contemporâneo? e outros ensaios. Tradução: Vinícius Nicastro Honesko. Chapecó: Argos, 2009, p.
55-76. BRADDON, Mary E. Lady Audley’s Secret. Nova York: OUP, 2012 [1862]. BRAIDOTTI, Rosi. El
sujeto en el feminismo. In: BRAIDOTTI, Rosi. Feminismo, diferencia sexual y subjetividade nómade.
Barcelona: Gedisa, 2004, p. 9-32. DACRE, Charlotte. Zofloya, or the Moor. Nova York: OUP, 2008
[1806]. MONTEIRO, Maria C. Unsex-me, ou um gênero limitado demais para mim. Ipotesi, Juiz de
Fora, v. 24, n. 2, p. 152-164, jul./dez. 2020. PAREDES, Julieta; GUZMÁN, Adriana. El tejido de la
rebeldía: ¿Qué es el feminismo comunitario?. La Paz: Comunidad Mujeres Creando Comunidad,
2014. WOOLF, Virginia. Um teto todo seu. 2. ed. Tradução: Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2019 [1929].
EM BUSCA DA MÃE ÁFRICA: IDENTIDADE E MEMÓRIA PÓS-COLONIAL EM ESSA DAMA BATE BUÉ,
DE YARA NAKAHANDA MONTEIRO
Rafaella Teotônio
Resumo: Em Essa dama bate bué (2021), romance de estreia da escritora Yara Nakahanda Monteiro,
o símbolo da Mãe África é metaforizado na busca da narradora Vitória por sua mãe, Rosa Chitula, ex-
combatente na guerra pela independência de Angola, em uma Luanda pós-colonial. A narrativa
acompanha a trajetória de Vitória que procura, na ausência da sua mãe os restos de memórias
apagadas pelo Colonialismo Português e pelo processo traumático de descolonização. É a sua própria
identidade, nas raízes africanas deixadas em Angola, que Vitória busca, ao retratar um país e um
continente violentado pelo colonialismo. Esta comunicação, tem como objetivo, portanto, discutir
sobre como a metáfora da Mãe África, na narrativa de Essa dama bate bué, articula uma trama de
significados que sugerem a África enquanto um corpo feminino violado e apagado. A África que a
personagem da trama procura é um continente mutilado pelas guerras e pelo processo de
apagamento das identidades africanas pelo Colonialismo Português. Nesse sentido a narrativa de
Yara Nakahanda Monteiro propõe pensar sobre identidade, memória e o lugar da mulher nas guerras
pela independência na África de Língua Portuguesa. Tendo como aporte teórico Aleida Assmann
(2011), Margarida Calafate Ribeiro (2020), Grada Kilomba (2019), V.Y. Mudimbe (2013), dentre
outros, propõe-se também uma discussão acerca da autoria afrodescendente na Literatura
Portuguesa Contemporânea.
Referências: ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação: Formas e transformações da memória
cultural. Tradução: Paulo Soethe. - Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2011. HALL,.Stuart. Da
419
diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representação
da UNESCO no Brasil, 2003 KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo
cotidiano. Trad. Jess Oliveira. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. MONTEIRO, Yara. Essa Dama Bate Bué!
São Paulo: Todavia, 2021. MUDIMBE, V.Y. A invenção da África: Gnose, Filosofia e a Ordem do
Conhecimento. Portugal: Edições Pedago, 2013. RIBEIRO, Margarida Calafate. Uma história depois
dos regressos: a Europa e os fantasmas pós-coloniais. Confluenze, Bolonha, v. XII, n. 2, p. 74-95, 2020.
420
abordar como as desventuras da maternidade são, no contexto da obra literária, também resultantes
de uma estar entre culturas, lugares, práticas e representações atravessados pelo poder da
colonialidade (QUIJANO, 2005).
Referências: EMECHETA, Buchi. "Feminism with a Small 'f'!". In: Kirsten H. Petersen (ed.), Criticism
and Ideology: Second African Writer's Conference, Stockholm 1988, Uppsala: Scandinanvian Institute
of African Studies, 1988, pp. 173–181. EMECHETA, Buchi. The Joys of Motherhood. England; Wales:
Heinemann, 2008. FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.
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421
422
SIMPÓSIO “CULTURAS (OU ESTÉTICAS) SEMPRE VIVAS: RESIDUALIDADE NOS ESTUDOS
LITERÁRIOS”
Cássia Alves da Silva (IFCE), Cássia Maria Bezerra do Nascimento (UFAM) e Mary Nascimento da
Silva Leitão (UECE)
O AMOR CORTÊS COMO RESÍDUO DO AMOR ROMÂNTICO N’O ROMANCE DE TRISTÃO E ISOLDA
Aline Leitão Moreira e Elizabeth Dias Martins
Resumo: Resumo: O Romance de Tristão e Isolda, de Joseph Bédier, narra a história de Tristão, um
cavaleiro sobrinho de um rei, e Isolda, uma dama medieval que casou-se com o tio de Tristão. Eles
foram amantes, o que ocorreu porque tomaram juntos o filtro da paixão. São apenas esses quatro
elementos principais que servem de espinha dorsal para a narrativa dos amantes das Cornualhas:
um cavaleiro, uma dama, uma poção mágica e uma relação transgressora e proibida. Muitos outros
elementos somam-se à narrativa a fim de que se dê um desenho melhor estruturado à história por
meio de aventuras, outros personagens, e características variadas, de modo que se possa ter aí algo
capaz de atravessar o tempo de forma tão longeva e prolífera como ocorre com nossos personagens.
No entanto, o amor e a paixão são evocados durante toda a narrativa do romance escrito por Bédier.
Os personagens, que servem de matriz às histórias de amores impossíveis, nas quais os apaixonados
morrem de e por amor, têm esse sentimento como potência na sua narrativa. Observam-se duas
perspectivas: o amor denominado cortês e o amor romântico, ambos evocando uma paixão
incomensurável. Contudo, um funcionando como resíduo de outro e ganhando nova significação.
Além disso, percebem-se os pontos convergentes e divergentes entre eles a partir desses elementos
residuais. É sobre esse tipo de amor que estamos falando: o amor entre um homem e uma mulher,
representado por Tristão e Isolda. Um amor impossível porque socialmente é irrealizável e, por isso,
trágico, já que chega, em última instância, a culminar com a morte dos amantes, que não podendo
viver esse amor, acabam por fenecerem.
Referências: BARROS, Maria Nazareth Alvim de. Tristão e Isolda – O Mito da Paixão. São Paulo:
Mercuryo, 1996.BÉDIER, J. O Romance de Tristão e Isolda. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
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2003.
423
Considerando-os ruins, aconselha o jovem poeta a parar de escrever e se mudar para Pondichéry,
então uma cidade com grande potencial comercial na qual o frustrado poeta poderia enriquecer. O
poeta retorna endinheirado à França passados dez anos, mas ainda escrevendo poemas “ruins”.
Vendo nesse episódio um tema digno de representação, a poeta portuguesa Adília Lopes reelabora
a trama diderotiana em O poeta de Pondichéry [1986]. Nesta comunicação, discutirei o poema “V”
da coletânea de Adília e sua possível relação com o Hino a Apolo, supostamente de autoria homérica.
Para tanto, fundamentarei tal leitura com as noções de “gênio não original”, de Perloff (2013), e
“poeta sem qualidade”, de Freitas (2002).
Referências: FREITAS, Manuel de (org.). O tempo dos puetas. In: ______ (org.). Poetas sem
qualidades. Lisboa: Averno, 2002. HOMERO. Hino homérico a Apolo. Introdução, tradução,
comentários e notas de Luiz Alberto Machado Cabral; apresentação de Antonio Medina Rodrigues.
Ed. bilingue. Cotia: Ateliê; Campinas: Ed. Unicamp, 2004. LOPES, Adília. O poeta de Pondichéry.
Apresentação de Raquel Menezes. Belo Horizonte: Moinhos, 2019. PERLOFF, Marjorie. O gênio não
original: poesia por outros meios no novo século. Tradução de Adriano Scandolara. Belo Horizonte:
Ed. UFMG, 2013.
424
Resumo: Em Lavoura arcaica (1975), de Raduan Nassar (1935-), André, narrador-personagem do
romance, apresenta um discurso que, a priori, se opõe ao de seu pai, Iohána, que, por sua vez,
representa os princípios fundadores da cultura, entendida aqui como conceito oposto ao de
natureza, e, portanto, vinculados a tempos e espaços distantes ao do autor e da obra. Apesar do que
o título do livro sugere, tais preceitos não seriam exatamente “arcaicos” conforme a definição de
Raymond Williams (1977) para quem o termo denota um elemento do passado que se tornou
obsoleto. Assim, a proposta deste trabalho é interpretar o romance em questão à luz da teoria da
residualidade (PONTES, 1999) a fim de identificar o que nele há de antigo – no sentido de estar
vinculado à alguma tradição - e não arcaico, porém, residual - isto é, os aspectos que sofreram
transformações através dos processos de cristalização, hibridação cultural e endoculturação, para
adaptar-se ao novo contexto cultural e estético em que está inserido; contribuindo com a renovação
do debate crítico sobre a obra. Para tanto, além dos conceitos operacionais da teoria da
residualidade, recorre-se aos de tradição, influência, desleitura, intertextualidade, originalidade e
recepção, dentre outros termos consolidados pela Literatura Comparada.
Referências: BLOOM, Harold. A angústia da influência: uma teoria da poesia. Rio de Janeiro: Imago,
1991. BORGES, Jorge Luis. Kafka e seus precursores. In: BORGES, Jorge Luis. Obras completas de Jorge
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História concisa da literatura brasileira. 43. ed. São Paulo: Cultrix, 2006. p.26-49. CADERNOS DE
LITERATURA BRASILEIRA. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 1996. n. 2. CANDIDO, Antonio.
Literatura como sistema. In: CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira: momentos
decisivos. 6. ed. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Ltda, 2000. p.23-25. CANDIDO, Antonio. O direito à
literatura. In: CANDIDO, Antonio. Vários Escritos. 4. ed. São Paulo; Rio de Janeiro: Duas Cidades; Ouro
sobre Azul, 2004. p.169-191. CAMUS, Albert. O homem revoltado. 8.ed. Rio de Janeiro: Record, 2010.
CARVALHAL, Tânia Franco. Literatura comparada. São Paulo: Ática, 1986. CARVALHO, Luiz Fernando.
Sobre o filme Lavour’Arcaica. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002. DUBY, Georges. Reflexões sobre a
história das mentalidades e a arte. In: Novos Estudos-CEBRAP, v. 2, n. 33, jul. 1992. DUBY, Georges.
A história continua. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor/ Editora UFRJ, 1993. ELESBÃO, Juliane de
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(Mestrado em Letras) – Programa de Pós-graduação em Letras, Universidade Federal do Ceará,
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medieval. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2010. FREUD, Sigmund. Totem e
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Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013. FRYE, Northrop. Anatomia da crítica: quatro
ensaios. São Paulo: É Realizações, 2013. GENETTE, Gerárd. Palimpsestos: a literatura de segunda
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culturais. In: HALL, Stuart; Liv Sovik (Org.). Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representação da
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Dissertação. (Mestrado em Letras) – Programa de Pós-graduação em Letras, Universidade Federal
do Ceará, Fortaleza, 2002. MARTINS, Elizabeth Dias. O caráter afrobrasiluso, residual e medieval no
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palavras: o endemoninhamento do discurso em Lavoura Arcaica. 2011. 122f. Dissertação (Mestrado
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Campinas, Campinas, 2011. SEDLMAYER, Sabrina. Ao lado esquerdo do pai. Belo Horizonte: Ed.
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perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009. VOVELLE, Michel. Ideologias e mentalidades. 2. ed. São Paulo:
Editora Brasiliense, 1991. WILLIAMS, Raymond. Marxismo e literatura. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editores, 1979.
426
construção dessa personagem, baseamo-nos na carnavalização de Baktin (2010) e na Teoria da
Residualidade Literária e Cultural, proposta teórico-investigativa sistematizada por Roberto Pontes
e certificada junto à Universidade Federal do Ceará e ao Diretório de Pesquisa do CNPq. Esta pode
ser resumida no seguinte: na cultura e na literatura nada é original, tudo é residual; e faz uso dos
seguintes conceitos operativos: resíduo, cristalização, mentalidade, imaginário, endoculturação e
hibridação cultural.
Referências: AMADO, Jorge. Dona Flor e seus dois maridos. 52ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.
BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François
Rabelais. Trad. de Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec, 2010. HOUAISS, Antônio. Dicionário
eletrônico Houaiss de Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001. KAYSER, Wolfgang.
O grotesco: configuração na pintura e na literatura. Tradução de J. Guinsburg. São Paulo :
Perspectiva, 2003. MACHADO, Ana Maria. Romântico, sedutor e anarquista: como e por que ler Jorge
Amado hoje. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2014. MARTINS, Elizabeth Dias. O caráter
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05/06/2006. Fortaleza (mimeografado), 2006. _______________. Poesia insubmissa afrobrasilusa.
Rio de Janeiro-Fortaleza: Oficina do Autor/EUFC, 1999. SANT'ANNA, Affonso Romano de. De como e
por que Jorge Amado em 'A morte e a morte de Quincas Berro D'Agua' é um autor carnavalizador,
mesmo sem nunca ter se preocupado com isto. Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, n.74,
jul./set, I983. _____________________________. O canibalismo amoroso. São Paulo: Brasiliense,
1984. SILVA, Alba Valéria Tinoco Alves. A linguagem do humor e do desejo em Dona Flor e seus Dois
Maridos. Entrepalavras, Fortaleza - ano 5, v.5, n.esp., p. 76-87, ago/dez 2015. SOARES, Jessica Thais
Loiola. Resíduos do amor medieval em Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga. 151 p.
Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2015.
427
Perspectiva, 2013. TOLKIEN, J.R.R. Sobre Histórias de Fadas. Trad. Regina Barros de Carvalho. São
Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2010. TORRES, José William Craveiro. Além da Cruz e da Espada:
acerca dos resíduos clássicos n’A Demanda do Santo Graal. CAPES. Fortaleza, 2011.
428
político, fazendo de sua voz poética um canto insubmisso e, por isso mesmo, a teoria que contribui
com a presente discussão é a de Roberto Pontes, formalizada no livro "Poesia Insubmissa
Afrobrasilusa" (1999). Lançamos mão das próprias reflexões da autora em um de seus discursos, em
que, a nosso ver, ela constrói uma poética, e em seus próprios poemas em que isso aparece exercido.
Ao articularmos as ideias de Cecília Meireles sobre poesia a teoria de Roberto Pontes, bem como a
de outros ensaístas sintonizados com a literatura social, como Alfredo Bosi (1977) e Pedro Lyra
(1993), não temos a intenção de aprisionar teoricamente a poesia da autora, e sim ter a voz de ambos
nos acompanhando em nossa análise. Para uma melhor compreensão da poesia política de Cecília
Meireles, complementamos nossa abordagem com o método fortuna crítica, recorrendo
principalmente aos estudos de Andresen (1999), Bosi (2007), Moura (2016) e Pietrani (2019).
Verificar-se-á que a perspectiva civil, feminina e pacifista assumida em sua insubmissão poética foi o
meio que a poeta usou para se engajar na crise social em curso, e que seus poemas, podem ter
alcançado, através da força ideológica de expressão, a instância mais alta da poesia, conscientizando
moralmente na vida política e social seu público leitor.
Referências: ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner. A poesia de Cecília Meireles. Metamorfose. Rio
de Janeiro: Cátedra José de Sena – Faculdade de Letras da UFRJ, n° 1, p. 61 - 71, 1999. BOSI, Alfredo.
O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1977. ______. Em torno
da poesia de Cecília Meireles. In: GOUVÊA, Leila V. B. Ensaios sobre Cecília Meireles. São Paulo:
Humanitas; Fapesp, 2007. LYRA, Pedro. Literatura e ideologia: ensaios de sociologia da arte. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993. MEIRELES, Cecília. Como escrevi o Romanceiro da inconfidência. In:
MEIRELES, Cecília. Romanceiro da inconfidência: Edição comemorativa - 60 anos. Org. André Seffrin.
12. ed. São Paulo: Global, 2013. ______. Mar absoluto e outros poemas. In: MEIRELES, Cecília. Obra
poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1983. MOURA, Murilo Marcondes de. O mundo sitiado: a
poesia brasileira e a Segunda Guerra Mundial. São Paulo, Editora 34, 2016. PIETRANI, Anélia
Montechiari. A palavra ecopoética de Cecília Meireles. In: Interdisciplinar: Revista de estudo em
língua e literatura. São Cristóvão, UFS, v. 32, jul.-dez., p. 99-112, 2019. PONTES, Roberto. Poesia
insubmissa afrobrasilusa: estudo da obra de José Gomes Ferreira, Carlos Drummond de Andrade e
Agostinho Neto. Fortaleza: EUFC, Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1999.
429
conceitos fundamentais. Rio de Janeiro: Bazar do tempo, 2019. PONTES, Roberto. Poesia insubmissa
afrobrasilusa. Rio de Janeiro: Oficina do Autor; Fortaleza: Edições UFC, 1999.
430
O CANTO ANTIGO ECOANDO NAS ÁGUAS: O ROLAR DAS PEDRAS EM “RIO ARRIBA”.
Sônia Maria Ferreira De Matos e Ana Beatriz Rodrigues Gonçalves
Resumo: Esse texto é uma parte da minha pesquisa do doutorado, ainda em andamento, intitulada
“Vozes antigas ecoando nas escritas femininas: novas vozes das mulheres latino – americanas” Aqui,
especificamente, pretendemos lançar nosso olhar sobre o livro de poesias da poetisa colombiana,
Yadira Rosa Vidal Villadiego, “Rio Arriba” (2021). Pretendemos observar os resíduos culturais dos
indígenas, dos povos negros e dos ribeirinhos que dividem o tempo presente ou viveram por ali
deixando seus rastros, com os quais o eu lírico dialoga e se deixa habitar, individual e culturalmente.
São poemas autobiográficos repletos da “presença” dos ancestrais, da cultura de outros povos, do
cotidiano de sua região, Urabá. Árvores, aves, água, a paisagem como um todo, as pessoas e seres
primordiais se conectam, se entrelaçam, se inscrevem uns nos outros. A paisagem " percebida por
outros sentidos". Suas raízes, firmemente fincadas ali, se alimentam daquele território, das suas
estórias, de suas culturas sobrepostas e de todo o mundo visível e invisível que, pelos “caminhos”
naturais do rio, chegou até ali e também fincou raiz. Procuremos perceber as vozes femininas,
antigas, das avós, das mães e de outras mulheres que ecoam no presente, no seu tecido poético.
Objetos comuns do dia a dia que contam suas estórias, que apresentam outras mãos que moldaram
o barro, que acenderam o fogo, que esculpiram camadas, que plantaram árvores e jardins, que
garimparam no rio e trouxeram ao mundo outras vidas. Tudo se sobrepondo em camadas residuais
e ancestrais.
Referências: COLLOT, Michel. Poética e filosofia da paisagem. Tradução: Ida Alves...[et al.] . Rio de
Janeiro: Editora Oficina Raquel, 2013. VILLADIEGO, Yadira Rosa Vidal. Rio Arriba. 2ª ed. Colômbia.
2021.
431
DAS CONFLUÊNCIAS ENTRE A ELEGIA ERÓTICA ROMANA E A CANTIGA DE AMOR TROVADORESCA
Tallyson Tamberg Cavalcante Oliveira da Silva
Resumo: O presente trabalho, de perspectiva comparatista, tem como fundamento principal o
cotejo e análise de dois gêneros lírico-amorosos de escopos temporais distintos: trata-se da elegia
erótica latina, gênero poético produzido na Antiguidade romana (século I a.C.), e da cantiga amorosa
trovadoresca, gênero lírico produzido na Baixa Idade Média Ocidental (entre os séculos XII e XIV).
Assim, objetiva-se, no presente trabalho, apontar, analisar e avaliar as similaridades tópicas (tanto
temáticas quanto estilísticas) entre os referidos gêneros líricos, de modo a evidenciar as possíveis
influências e contribuições exercidas pela literatura da Antiguidade latina na configuração do lirismo-
amoroso medieval, notadamente a partir daquelas exercidas pela produção poética dos mais
expressivos poetas elegíacos da latinidade – Catulo, Propércio, Tibulo e Ovídio – na constituição do
lirismo trovadoresco galego-português. Com isso, quer-se mostrar, refletir e analisar a existência de
uma residualidade transformadora pela qual passou a elegia erótica latina na configuração do
lirismo-amoroso trovadoresco, bem como explicar as prováveis causas para a existência desse viés
residual no campo da lírica-amorosa entre a Antiguidade romana e a Baixa Idade Média Ocidental,
quadrantes temporais considerados sempre como antagônicos e díspares. Desse modo, torna-se
evidente que o viés histórico torna-se fulcral nas análises empreendidas, possibilitando ajuizadas
reflexões em torno dos laços culturais entre a Antiguidade greco-romana e a Idade Média Ocidental.
Referências: CARVALHO, Francisco Freire de. Lições Elementares de Poética Nacional. 4ª ed. Lisboa:
Rollandiana, 1867. CATULLE. Poésies. Paris: Les Belles Lettres, 1998. CORREIA, Natália. Cantares dos
Trovadores Galego-Portugueses. 3ª ed. Lisboa: Estampa, 1998. CURTIUS, Ernst Robert. Literatura
Europeia e Idade Média Latina. Tradução de Teodoro Cabral (com colaboração de Paulo Rónai). 3ª
ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2013. FEDELI, Paolo. “A Poesia de Amor”. In:
CAVALLO, Guglielmo et al. O Espaço Literário da Roma Antiga. Trad. Daniel P. Carrara; Fernanda M.
Moura. Belo Horizonte: Tessitura, 2010. FERREIRA, Maria Ema Tarracha. Poesia e Prosa Medievais.
2ª ed. Lisboa: Ulisseia, 1998. FROMM, Erich. A Arte de Amar. Trad. Eduardo Brandão. 2º ed. São
Paulo: Martins Fontes, 2015. GRIMAL, Pierre. O Amor em Roma. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
LAPA, Manuel Rodrigues. Lições de Literatura Portuguesa: Época Medieval. 8ª ed., revista e ampliada.
Coimbra: Editora Limitada, 1973. MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa. 22ª ed. São Paulo:
Cultrix, 1986. _________. Dicionário de Termos Literários. 12ª ed. São Paulo: Cultrix, 2013.
MONGELLI, Lênia Márcia. Fremosos Cantares: Antologia da Lírica Medieval Galego-Portuguesa. São
Paulo: Editora Martins Fontes, 2009. PROPÉRCIO. Elegias de Sexto Propércio. Organização e tradução
de Guilherme Gontijo Flores. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2014. RAVIZZA, P. João. Gramática
Latina. 9ª ed. Niterói-RJ: Escolas Profissionais Salesianas, 1940. TIBULO. Poemas (Cantos de amor).
Trad. Carlos Ascenso André. Lisboa: Cotovia, 2015. VEYNE, Paul. Elegia Erótica Romana: o amor, a
poesia e o Ocidente. Tradução de Mariana Echalar. 1ª ed. São Paulo: Editora Unesp, 2015.
432
não enxergamos nada". O conceito de cosmopolítica, tal como formulado por pensadores como
Isabelle Stengers e Bruno Latour, nos auxilia a descolonizar nossos corpos e saberes, a narrar e
celebrar as multiplicidades. A cosmopolítica refere-se ao trabalho político de construção de relações
entre mundos diferentes, tanto no interior de cada sociedade como entre grupos humanos distintos.
Parte da premissa de que fazer ciência é fazer mundos, é registrar a polifonia, sem medo da
dissonância. Contudo, a proposta de uma "dialética sem síntese", de mundos que não podem ser
definidos por modelos dicotômicos, mas sim por dimensões que conformam uma sinfonia
desarmônica e descompassada, sempre esteve presente no pensamento ameríndio. Em termos
gerais, ao interpretarem o funcionamento do cosmos, os indígenas não assumem a homogeneização
como o horizonte para a interação entre as diferenças, muito pelo contrário: tendem a rechaçar o
Uno, a enfatizar a constância da diferenciação e a afirmar as multiplicidades. Esta comunicação busca
analisar a produção intelectual do ativista indígena Ailton Krenak, problematizando sua experiência
de pertencer a um mundo diverso e plural, onde reinam as relações cosmopolíticas, mas que vem
sendo desafiado pelo empobrecimento e adoecimento das existências e relações afetivas.
Consideramos que o pensamento ameríndio pode nos fornecer alternativas de vida no Antropoceno,
pois, diferentemente da modernidade, que buscou silenciar os Outros que não se encaixavam em
padrões definidos de civilização e do saber, os indígenas veem os Outros como a solução, e não como
o problema.
Referências: CLASTRES, Pierre (2017). A sociedade contra o Estado. Pesquisas de Antropologia
política. São Paulo, Ubu Editora. KRENAK, Ailton (2020). A vida não é útil. São Paulo: Companhia das
Letras. _______________(2019). Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras.
_______________(2022). Futuro ancestral. São Paulo: Companhia das Letras. LATOUR, Bruno (2019).
Jamais fomos modernos. Ensaio de antropologia simétrica. São Paulo: Editora 34. MARTÍNEZ
RAMÍREZ, María Isabel; NEURATH, Johannes (coord.) (2021). Cosmopolítica y cosmohistoria: una
anti-síntesis. Ciudad de México: Sb. Editorial. VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (2018). Metafísicas
canibais: elementos para uma antropologia pós-estrutural. São Paulo: Ubu Editora, n-1 edições.
WAGNER, Roy (2017). A invenção da cultura. São Paulo: Editora Ubu.
POESIA DE SLAM: NA ENCRUZILHADA DO ENCONTRO DA BOCA QUE TUDO COME COM A FOME
COLETIVA DE GANHAR VOZ
Cajota Domingues de Jesus
Resumo: Distante de seu berço teatral estadunidense, no Brasil o slam tem chão de asfalto, terra
batida, escadão, praça e pista de skate, entre outros. Embora exista uma organização regional,
nacional e mundial aqui as competições são tão marginais quanto o próprio orixá da comunicação. É
na rua, nos domínios de Exú se encontram com os domínios dos gritos dos invisíveis. Aquele que é
popularmente conhecido nos terreiros como dono da boca que tudo come acolhe aqueles que
possuem “uma fome coletiva de ganhar voz” (KILOMBA, 2019). É comum, inclusive, ver poetas
saudando o chão antes de declamarem suas palavras de dor, revolta, amor e suor. Assim, os
ensinamentos dos terreiros também invadem a cena poética, fazendo-a território de possibilidades
de resgate e novas construções. Por meio da poesia encontram suporte criando linguagem para
expressar, vivenciar, performar e registrar essa demanda revolucionária que busca emergir segundo
Lorde, afinal como ela mesmo já disse “Poesia não é um luxo”(1977). Entende-se aqui a poesia
enquanto ação política ao mesmo tempo que é escrita afetiva, não apenas frequentemente falar de
amor, mas por afetar quem lê através da escrita sobre aquilo que afeta quem escreve. Sobre essa
afetação, pensemos no que Conceição Evaristo diz sobre o espelho, ou melhor o abebé evocado pela
escrita negra que faz com que nos reconheçamos enquanto povo ao passo que também
reconstruimos nossa identidade por meio do auto-amor. E nos giros do tempo espiralar, na
encruzilhadas se tece a identidade e a poesia preta periférica constrói antigas rotas de fuga que
retomam um novo futuro, para além de um sistema que exige resistência daqueles que insistem em
voar com asas feitas de palavras em mundo que tenta o tempo todos os silenciar.
433
Referências: EVARISTO, Conceição. A escrevivência e seus subtextos. In: DUARTE, Constância Lima
(org.), NUNES, Isabela Rosado. Escrevivência: a escrita de nós: reflexões sobre a obra de Conceição
Evaristo. Rio de Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020 KILOMBA, Grada. Memórias da plantação –
Episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. LORDE, Audre. Irmã Outsider. Belo
Horizonte: Autêntica Editora, 2019. MARTINS, Leda Maria. Afrografias da memória: O reinado do
Rosário no Jatobá. São Paulo: Perspectiva: Belo Horizonte: Mazza, 2021. ______________.
Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo tela. Rio de Janeiro: Cobogó, 2021.
434
Joan. A cidadã paradoxal. As feministas francesas e os direitos do homem. Florianópolis: Ed
Mulheres. 2002. ZOLIN, Lúcia. Osana. Crítica feminista. In: BONNICI, T.; ZOLIN, L. O. (orgs). Teoria
literária, abordagens históricas e tendências contemporâneas. 2.ed. Maringá: UEM, 2005.
435
poesia” (1989), da precursora Maria Helena Vargas da Silveira (1940-2009) e a coletânea “Sopapo
Poética: Pretessência” (2016) em que destaco a poesia de dez escritoras: Ana dos Santos; Delma
Gonçalves; Fátima Farias; Isabete Fagundes Almeida; Lilian Rocha; Maria do Carmo dos Santos; Nádia
Lis Severo; Pâmela Amaro; Renata Mathias de Moura; e Silvana Conti. O objetivo é perceber os temas
e formas dessas poesias.
Referências: EVARISTO, Conceição. Gênero e etnia: uma escre(vivência) de dupla face. In: MOREIRA,
Nadilza Martins de Barros; SCHNEIDER, Liane. (Orgs.) Mulheres no mundo: etnia, marginalidade e
diáspora. João Pessoa: Idéia Editora Ltda, 2005. p. 201-212. EVARISTO, Conceição. Da grafia-desenho
de minha mãe, um dos lugares de nascimento de minha escrita. In: ALEXANDRE, Marcos Antônio
(Org). Representações performáticas brasileiras: Teorias, práticas e suas interfaces. Belo Horizonte:
Mazza edições, 2007. p. 16-21. EVARISTO, Conceição. Mãe Beata de Iemanjá. In: DUARTE, Eduardo
de Assis. (org). Literatura e afrodescendência no Brasil: Antologia crítica. V.1. Belo Horizonte: Ed.
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P. 83-90. EVARISTO, Conceição. Poemas da recordação e outros movimentos. Rio de Janeiro: Malê,
2017. GONZALEZ, Lélia. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa... São
Paulo: UCPA, 2018. LORDE, Audre. As ferramentas do senhor nunca derrubarão a casa-grande. In:
LORDE, Audre. Irmã outsider. Trad. Stephanie Borges. Belo Horizonte: Autêntica, 2019. P. 137-141.
MARTINS, Leda Maria. Afrografias da memória: O reinado do Rosário no Jatobá. São Paulo:
Perspectiva; Belo Horizonte: Mazza edições, 1997. ROCHA, Lilian Rose Marques da et. al.
Pretessência. Porto Alegre: Libretos, 2016. PADILHA, Laura Cavalcante. Entre voz e letra: O lugar da
ancestralidade na ficção angolana do século XX. 2ª Ed. Niterói: Ed. UFF; Rio de Janeiro: Pallas, 2007.
PADILHA, Laura Cavalcante. Novos pactos, outras ficções: Ensaios sobre literaturas luso-afro-
brasileiras. Lisboa: Novo Imbondeiro, 2002. PIEDADE, Vilma. Dororidade. São Paulo: Nós, 2017.
SANTIAGO, Ana Rita. Vozes literárias de escritoras negras. Cruz das Almas: Ed.UFRB, 2012. SILVEIRA,
Maria Helena Vargas da Silveira. Meu nome pessoa: três momentos de poesia. Porto Alegre:
[s.n.],1989.
436
insiste no presente. Em Aline Motta, os tempos se desordenam e são dançados e cantados por vozes
de mulheres que se reconhecem umas nas outras.
Referências: AGUILAR, Gonzalo; CÁMARA, Mario. A máquina performática: a literatura no campo
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“CANTE PRA ABRIR CAMINHO, PRA COMEMORAR”: REFLEXÕES SOBRE RELAÇÕES ENTRE O
SAGRADO E PROFANO NA MUSICALIDADE AFRO BRASILEIRA.
Karolyny Alves Teixeira de Souza
Resumo: Para a cosmovisão africana, as atividades da vida cotidiana, a música e as artes são
permeadas por elementos rituais que nos remetem ao universo sagrado, e não como algo
profanador, a exemplo da cultura ocidental. Para esses povos, a musicalidade é uma manifestação
rítmica que pode ser entendida como passaporte para se chegar ao sagrado. Assim como ocorre no
candomblé e nas demais tradições afro-brasileiras, não existe Orixá sem dança e sem movimento ao
som do tambor. Para essas tradições, toda divindade tem aspectos ambivalentes. O bem e o mal
fazem parte de um mesmo ser. A ambivalência está em tudo. O sagrado não se desliga do profano,
entendendo esse profano como algo que é comum a experiência vivida em sociedade e não como
uma dimensão punitiva do pecado. Nesse sentido, a musicalidade e o ritmo estão sempre presentes
no modo de vida do negro, partindo do pressuposto da não distinção entre sagrado e profano, mas
do princípio da ambivalência, da cooperação, da solidariedade entre os dois mundos que estão
unidos para atribuir sentido a vida cotidiana no universo afro-brasileiro. Desse modo, essa
comunicação busca partilhar reflexões acerca da relação entre sagrado e profano no universo das
manifestações culturais afro-brasileira, em especial a brincadeira do maracatu nação na rua.
Trazendo, para isso, elementos que são caros a compreensão dessa manifestação cultural como
brincadeira fundamentada no candomblé, traçando um paralelo com a cultura pop afro-brasileira, a
partir da letra da música “Cante pra Chamar”, escrita e interpretada pela cantora Larissa Luz. Essas
reflexões foram desenvolvidas a partir de minha escrevivência que se fez possível a partir do meu
corpo brincante de pesquisadora, percussionista e iniciada no candomblé. Nesses termos, essa
comunicação não visa esgotar perspectivas, mas sim criar possibilidades para se pensar a cultura
afro-brasileira e suas reminiscências.
Referências: BÂ, AMADOU HAMPATÉ, A. Tradição Viva. In. História geral da África, I: Metodologia e
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ORÍKÌS EM DIÁSPORA: DIÁLOGOS ENTRE LEDA MARIA MARTINS (2021) E FÉLIX AYOH’OMIDIRE
(2020)
Lohana Kárita Teixeira
Resumo: Em “Performances do tempo espiralar – poéticas do corpo-tela”, a poeta, ensaísta,
dramaturga e professora Leda Maria Martins desenha um caminho epistemológico negro e africano
a respeito do tempo, das oralituras e das performances. Seu ponto de percepção é baseado,
especialmente, na cultura bantu, entretanto, perpassa também outras culturas africanas e
diaspóricas. O professor e diretor do Instituto de Estudos Culturais da Awolowo University, Ile Ife,
Nigéria, Félix Ayoh’OMIDIRE deslinda o amplo campo de ocorrência da cultura yorubá na cultura
baiana e apresenta uma primorosa recomposição das oralituras yorubás. Ambos se dedicam ao
pensamento acerca das palavras no continente africano e nas Américas. As epistemologias bantu e
yorubá são, como explica Makota Valdina Pinto (s.d.), muito mais próximas do que a colonialidade
do saber pôde compreender. Aqui, nos interessa primordialmente a leitura que Martins e OMIDIRE
fazem dos Oríkìs, como os definem e em quais teias de sentido os relacionam. Essa análise faz parte
da minha pesquisa de mestrado, em andamento, intitulada “Orìkís depois do atlântico: palavra que
guarda a memória”, que objetiva evidenciar o conhecimento histórico e cultural presente nas
comunidades de matriz africana como forma de combater a pilhagem epistêmica (FREITAS, 2016).
Assim, para a reflexão acerca da perspectiva dos dois autores a respeito, de maneira mais específica,
dos Orìkís, e de modo geral, das Oralituras, esta comunicação se baseará nos capítulos: “Poéticas da
oralitura” (MARTINS, 2001); “Oralitura em textos poéticos yorubanos I: Ìjàlá e Ìrèmòjé” (OMIDIRE,
2000); “Oralitura na poesia yorubana II: Oríkì” (OMIDIRE, 2000), que analisados com base nos
conceitos de memória e performance, de acordo com Florentina da Silva Souza (2007).
Referências: AYOH'OMIDIRE, Félix. Yorubaianidade: Oralitura e matriz epistêmica nagô na
construção de uma identidade afro-cultural nas Américas. Salvador: Editora Segundo Selo, 2020.
FREITAS, Henrique. O arco e a arkhé: ensaios sobre Literatura e Cultura. Salvador: Ogum's Toques
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brasileiras. In: ALEXANDRE, Marcos Antônio (Org.). Belo Horizonte: Mazza Edições, 2007.
441
Viveiros de Castro, no prefácio ao livro A queda do céu, de Davi Kopenawa e Bruce Albert, identifica
na obra uma “contra-antropologia” (2015, p. 24), por apresentar a voz de um indígena que narra sua
cultura para o não-indígena ao mesmo tempo em que analisa o funcionamento da sociedade
ocidental. De forma semelhante, nessas obras, podemos perceber como, por meio de alguns
personagens, os autores indígenas nos apresentam sua visão sobre o mundo não-indígena – um
mundo com o qual mantém estreito contato, ainda que venham de um outro universo cultural. De
onde falam, nesse lugar de fronteira entre as duas culturas, suas histórias nos revelam um olhar
crítico para essa sociedade. Ao mesmo tempo, parecem vislumbrar um lugar onde a existência do
diferente é reconhecida e o convívio é possível.
Referências: KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. 2015. A queda do céu: palavras de um xamã
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ENCONTRO DE ÁGUAS UTERINAS: UMA PROSA POÉTICA ENTRE CANÇÕES DE LUEDJI LUNA E
POEMAS DE CONCEIÇÃO EVARISTO
Mileide Santos Dias
Resumo: A subjetividade negra feminina nos é negada de nossas ancestres às nossas descendentes,
fato refletido nas canções e nos textos literários que pejoram e objetificam corpos-mulheres.
Todavia, é possível, também a partir desses fazeres artísticos – literatura-canção –, reverter esse
processo nadando em direção ao mar de subjetivação. O principal objetivo desse texto é dialogar
canções de Luedji Luna com poemas de Conceição Evaristo. Por meio de uma metodologia
bibliográfica com caráter qualitativo, escrevemos um convite a um mergulho nas águas da
subjetividade negra feminina e suas curvas formadas pela memória ancestral. Intuindo justificar a
interface canção-literatura, apresentamos análises de Solange de Oliveira (2002). Como
instrumentação teórica, usamos o conceito tempo espiralar da intelectual Leda Maria Martins (2002;
2021a; 2021b) que nos conduz a epistemes poéticas e políticas de saberes, fazeres, performances
negras. Recorremos também aos escritos de bell hooks (2019; 2020), bem como aos estudos
analíticos e de casos de Neusa Santos Souza (2021) no afã de ancorar o processo de Erguer a voz para
Tornar-se negra. Com o intuito de fundir subjetividade negra e música, Ensinamentos ancestrais
africanos da filósofa Sobonfu Somé (2007) são utilizados. Os passeios pelas encruzilhadas e suas
equinas epistêmicas ficam a cargo dos ensaios de Luiz Antonio Simas e Luiz Rufino (2018).
Desaguamos na seguinte constatação: a representatividade das mulheres pretas em suas produções
artísticas/intelectuais apresenta relevância na restituição da subjetividade negra feminina.
Referências: hooks, bell. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. Tradução de Cátia
Bocaiuva Marigolo. São Paulo: Elefante, 2019. MARTINS, Leda Maria. Afrografias da Memória: o
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442
LIMA, CAROLINA, CONCEIÇÃO E ALE TRAÇANDO UM CRUZO ENTRE UM BRASIL DOS ESQUECIDOS
E A CONSTRUÇÃO DE UMA BRASILIDADE NEGRA A PARTIR DA ANCESTRALIDADE.
Natália Regina Rocha Serpa
Resumo: Este trabalho pretende discutir como a escrita de Lima Barreto em seu livro Memórias do
escrivão Isaías Caminha (1909), Carolina Maria de Jesus em seu livro Quarto de despejo (1960),
Conceição Evaristo em seu livro Ponciá Vicêncio (2003) e Ale Santos em seu livro O último ancestral
(2021) representam um grito de resistência negra aos apagamentos sistemáticos sofridos pela
população negra desde o Brasil imperial, passando pela Republica velha, atravessando a Nova
república e chegando aos dias atuais. A Literatura desses quatro autores é forjada na memória, na
mobilização política e ideológica dos marginalizados que habitam um Brasil que não os reconhece
como filhos, uma escrita que busca reavivar o passado, trazer à tona e sem edições as memórias dos
antepassados às novas gerações. Este trabalho convoca a encruzilhada enquanto epistemologia para
analisar escritas negras que se intercruzam e vão através de um tempo espiralar abrindo novos
caminhos para as novas gerações de escritores. É na encruzilhada de Exú que Lima Barreto e Carolina
Maria de Jesus apresentam um Brasil dos que passam fome, uma fome que se assemelha a do orixá
da comunicação. Já Conceição Evaristo e Ale Santos colocam suas escritas na encruzilhada para nos
alertar sobre a importância da lembrança e os perigos do esquecimento.
Referências: BARRETO, Lima. Recordações do Escrivão Isaías Caminha. São Paulo: Ática, 1997
EVARISTO, Conceição. Ponciá Vicêncio. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2003. 132p. JESUS, Carolina
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poesia oral. Trad. Jerusa Pires Ferreira et al. São Paulo: Hucitec, 1997.
446
corporal performática com o tempo, em que os nossos gestos, falas, modos, tudo o que somos e “o
modo como somos” são cosmopercepções que nos constituem, o que nos ajuda a pensar na
linguagem performática de Stella e seus múltiplos cruzamentos com sua ancestralidade; Leda traz
contribuições cruciais acerca disso, uma delas é afirmar que a parcela majoritária dos povos africanos
se origina de regiões que não tinham a letra manuscrita ou impressa como forma de expressão dos
saberes (p.17), traço esse que há de se considerar que cruza o corpo de Stella e se manifesta em sua
expressão performática: o falatório; ainda que ela também escrevesse em fragmentos de papelão
até hoje não encontrados, o seu falatório possui potência de se reconfigurar além de épocas e além
de si mesma. A ancestralidade afro-brasileira que atravessa a performance da artista, reverbera os
movimentos da memória, da identidade enquanto mulher negra, periférica e vítima de um sistema
repressivo manicomial dois antes antes da ditadura militar até o fim de sua vida, além da
simultaneidade entre passado, presente e futuro. “Eu não tenho que enfrentar nada / Eu tenho que
enfrentar a violência / A brutalidade e a grosseria / E ir à luta pelo pão de cada dia” (p.122), um dos
versos de Stella que nos remete também à obra “Interseccionalidade” de Cátia Akotirene, que possui
um olhar epistemológico sobre o atravessamento hereditário colonial em ser obrigada a tudo
aguentar e suportar (2019, p.16), trazendo à tona especificidades que distinguem, inclusive, o
feminismo negro do branco.
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São Paulo: Editora Cultrix, 1995.
450
e Rosane Paulino, esta comunicação propõe analisar dois agrupamentos: o primeiro entre um
conjunto de bocas castigadas, interditadas e silenciadas, e o segundo entre um conjunto de imagens
de bocas devoradoras e glutonas. A proposta tem como cerne as pesquisas do historiador e filósofo
Georges Didi-Huberman sobre a natureza dos Tempos da história da arte e os diálogos que se
estabelecem entre as imagens. A historiografia acadêmica constituiu essas afinidades a partir da
noção de estilo, como conjunto de características formais e de conteúdo que identificam um
determinado período, movimento ou artista, e que evoluem e se modificam a partir de diversos
fenômenos sociais, históricos e econômicos. Em contraposição a essa sequência linear, construída
no contexto do pensamento historicista do século XIX, Didi-Huberman tem focado uma parte
importante da sua pesquisa no trabalho do historiador Aby Warburg no Atlas Mnemosyne e em seu
dispositivo metodológico de criação de afinidades e diálogos entre imagens que, para além da
geografia e das periodizações acadêmicas, são ao mesmo tempo gestuais, temáticas, formais,
emotivas e pulsionais. Propomos assim, montar painéis dessas imagens à maneira de Warburg, essas
imagens podem ser pinçadas em diversas obras de vários artistas em períodos distintos,
principalmente de Berna Reale e Rosana Paulino.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Ninfas. Tradução de Renato Ambrósio. São Paulo: Hedra, Coleção
Bienal, 2012. BARREIRO ON-LINE. Festa – Berna Reale chega ao Barreiro. Barreiro On-line, 12 ago.
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Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 222-232. (Obras Escolhidas, 1.) BUTLER, Judith.
Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de Assembleia. Tradução
de Fernando Siqueira Niguens. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. DIDI-HUBERMAN, Georges.
Atlas. Cómo llevar el mundo a cuestas? Madrid: Reina Sofía, 2010. DIDI-HUBERMAN, Georges. Ninfa
Fuida: Essai sur le drapé-desir. Paris: Éditions Gallimard, 2015a. DIDI-HUBERMAN, Georges. Ninfa
moderna: Tradução de António Preto. Lisboa: KKYM, 2016a. DIDI-HUBERMAN, Georges. Levantes.
Tradução de Edgard de Assis Carvalho, Eric R.R. Heneault, Jorge Bastos, Mariza Perassi Bosco, São
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Deleuze: uma vida filosófica. São Paulo: Ed. 34, 2000. HERKENHOFF, Paulo. Mulheres do presente, a
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WARBURG, Aby. Atlas Mnemosyne. Tradução de Joaquín Chamorro Mielke. Madri: Akal, 2010.
451
a imagem da ninfa errante (AGAMBEN, 2012) que sobrevive e foge das imagens que provocam
transtornos fobicos gerados pelo imaginário, assim como outros elementos de similaridade com
narrativa do mito, mas transposto como outra natureza narrativa pertinente ao contemporâneo.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Ninfas. Trad. Renato Ambrósio. São Paulo: Hedra, 2012. BENJAMIN,
Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Benjamin e a obra de arte: técnica,
imagem, percepção. Trad. Marijane Lisboa e Vera Ribeiro. Org. Tadeu Capistrano. Rio de Janeiro:
Contraponto, 2012. BROWNE, Anthony. O túnel. Trad. Clarice Duque Estrada. Rio de Janeiro:
Pequena Zahar, 2014. DIDI-HUBERMAN, Georges. O Olho da História, I. Trad. Cleonice Paes Barreto
Mourão. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2017. DIDI-HUBERMAN, Georges. O olho da história, II. Trad.
Márcia Arbex e Vera Casa Nova. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2018. LINDEN, Sophie Van der.
Páginas e espaços do livro. In: Para ler o livro ilustrado. Trad. Dorothée de Bruchard. São Paulo: Cosac
Naify, 2011. JUNIOR, Baitello, WULF, Cristoph. Emoção e Imaginação: os sentidos e as imagens em
movimento. São Paulo: estação das letras e cores, 2014 OVÍDIO. Metamorfoses. Lisboa: Livros
Cotovia e Paulo Farmhouse, 2014. WULF, Christoph. Homo Pictor: imaginação, ritual e aprendizado
mimético no mundo globalizado. Trad: Vinicius Spricigo. São Paulo: Hedra, 2013. WARBURG, Aby.
História de fantasmas para gente grande: escritos, esboços e conferências. Org Leopoldo Waizbort.
Trad. Lenin Bicudo Bárbara. 1ª ed. São Paulo: Companhia das letras, 2015.
452
migrações e modos de sobrevivência desses elementos na cultura de todos os tempos, mas
principalmente na literatura moderna e contemporânea. A Ninfa warburguiana atravessa a sua obra
poética, percebida pelo olhar atento e algo voyeurístico de uma poeta-flâneuse (ela própria
inscrevendo-se muitas vezes em movimento), sendo vislumbrada de formas tão diversas como uma
mulher que ajusta as correias das sandálias a meio do corredor de um aeroporto; a segunda mulher
de um escritor que esteve sempre à sua margem, na vida e no nome, como na sepultura a um canto
de jardim; a filha de Agamémnon que já migrara da Grécia épica à Albânia do romance de Ismail
Kadaré e daí chega ao poema de Tatiana para fazer “[...] entender que pode ser um erro gracioso / a
conclusão mais lógica de um passo”; e mesmo o leopardo e a abstração, que, trasladados de um
verso de Hilda Hilst, nomeiam e assinalam um livro publicado em 2020. Seguindo essas figuras,
buscaremos compreender a consciência aguda do tempo que encarnam, numa poesia que parece
especialmente preocupada com a sua passagem e os seus atravessamentos.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Ninfas. Trad. Renato Ambrosio. São Paulo: Hedra, 2012. BARBOSA,
Marlon Augusto. Os usos do sintoma. In: Lacuna. Revista de Psicanálise. n. 13. Agosto de 2022.
BENJAMIN, Walter. Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. (Obras escolhidas 3). Trad.
José Carlos Barbosa e Hemerson Alves Baptista. São Paulo: Brasiliense, 1994. BENJAMIN, Walter.
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Stigmata. Londres; Nova York: Routledge, 2005. CUERVAS-DEL BARRIO, Javier. Gradiva y la Ninfa:
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Georges. Ninfa moderna. Essai sur le drapé tombé. Paris: Gallimard, 2002. DIDI-HUBERMAN,
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Botelho e R.P. Cabral. Lisboa: KKYM, 2011. DIDI-HUBERMAN, Georges. Aperçues. Paris: Les Éditions
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FAIA, Tatiana. Leopardo e Abstracção. Lisboa: Fresca, 2020. FREUD, Sigmund. Delírios e sonhos na
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depois de perder. Uma poética da Ninfa. Campinas, SP: Ofícios terrestres, 2021. SACCO, Daniela.
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volume 1. Org e Trad. Cássio Fernandes. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2018.
453
Warbuguiano coletivo com uma proposta digital e contemporânea, no qual haverá a iconografia da
artista visual venezuelana Arca, como um elemento central de uma Ninfa contemporânea. Portanto,
o ensaio e prancha estarão pautados na presença, ou familiaridades, da Ninfa nos trabalhos da Arca
principalmente na iconografia que há no seu projeto “KiCk”, que é marcado pela presença da Ninfa
dentro do escopo visual: clipes, fotografias, ensaios para revistas e as letras das canções.
Assertivamente Arca estilhaça a noção de Ninfa, como também, uma noção de gênero e beleza
clássica, ao mesmo passo que traz o gestuario familiar da Ninfa, agregando, dessa maneira, um
padrão de gestos: uma decomposição futurista que há no ato de ressemantizar. Há na iconografia
de Arca uma estranheza contemporânea, tal como um quadro de Bosch esteve para o século XVI.
Por intermédio dessa prancha/ensaio, será estabelecida uma noção dos rastros mnemônicos da
Ninfa: um pathosformel. A sobrevivência de uma imagem fundamental para a cultura ocidental.
Referências: BATAILLE, Georges. As Lágrimas de Eros. 2ª Edição. Portugal: Sistema Solar, 2015
BATAILLE, Georges. O erotismo. 1ª Edição. São Paulo: Editora Autêntica,.2014 BARTHES, Roland.
Sade, Fourier, Loyola. 1ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2005. BENJAMIN, Walter. Magia e
Técnica, arte e Política: Ensaios sobre literatura e história da cultura. 2ª Edição. São Paulo: Editora
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Stanford University Press, 2004. CALAME, Claude. Eros na Grécia Antiga. São Paulo: Editora
Perspectiva, 2013 CALASSO, Roberto. Literatura e os Deuses. 1ª Edição. São Paulo: Companhia das
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Zahar, 2009 DIDI-HUBERMAN, G. A imagem sobrevivente: Histórias da arte e tempo dos fantasmas
segundo Aby Warburg: 1,ed. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, 2013 DIDI-HUBERMAN, G. (2012).
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Tragédia. São Paulo: Companhia de Bolso, 2007. WARBURG, Aby. Histórias de Fantasmas para gente
Grande. 1ª Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. WAIZBORT, Leopoldo. Apresentação. In:
WARBURG, Aby. Histórias de Fantasmas para gente Grande. 1ª Edição. São Paulo: Companhia das
Letras, 2015. WIND. Edgard. Sobre uma recente biografia de Warburg. In: WARBURG, Aby. A
Presença do Antigo – Escritos Inéditos. 1ª Edição. Campinas: Editora da Unicamp, 2018.
454
nomes de personagens de novelas hilstianas, entre eles: Hillé, Kadosh, Samsara, e temáticas
importantes de sua obra: morte, reencarnação, segunda morte. Pescados de um glossário, os nomes
de batismo ganham, nas respectivas obras, referência, densidade e repertório, instigando uma
leitura guiada por estes eixos. Para além do estudo de caso, este trabalho pretende testar maneiras
de se aproximar da biblioteca da escritora, pensando relações entre leitura e escrita, citação ou
deformação de fontes, diálogos intertextuais e, mais especificamente, para acompanhar a pesquisa
feita pela escritora de correntes do misticismo literário e filosófico.
Referências: BLAVATSKY, Helena. Glossário teosófico. São Paulo: Editora Ground, 1998. HILST, Hilda.
Da prosa. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. WILLER, Cláudio. Um obscuro encanto: Gnose,
gnosticismo, e a poesia moderna. São Paulo: Civilização brasileira, 2010.
455
anotações sobre o livro de Euclides da Cunha, parte delas concentradas nas observações que o autor
de Os sertões faz sobre as boiadas. A caderneta de campo de Rosa reforça e reafirma o interesse do
autor em coletar expressões de linguagem e trejeitos populares, incorporando-as à narrativa – restos
deixados pelo percurso por Cunha. “Vareda – vereda, caminho”: anota Euclides em sua caderneta.
Quais são os percursos possíveis para delimitar um contorno para o sertão? A proposta é analisar o
ponto de inserção entre as duas obras máximas e os usos que fazem da linguagem, lá onde o sertão
árido e de rios secos de Cunha encontra os fluxos caudalosos de água e de histórias de Rosa,
aproximando paisagem e linguagem, corpo e palavra, saber e sentido.
Referências: CUNHA, Euclides. Os sertões: campanha de Canudos. São Paulo: Ateliê Editorial,
Imprensa Oficial do Estado, Arquivo do Estado, 2001. ----------------------- Diário de uma expedição.
Org: Walnice Nogueira Galvão. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. -----------------------Caderneta
de campo. Org: Olímpio de Souza Andrade. São Paulo: Editora Cultrix Ltda, 1975. ROSA, Guimarães:
Grande sertão: Veredas. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
456
Extraído da experiência da infância, esse método é a miniaturização (Verkleinerung), que pode ser
encontrada na prática benjaminiana da citação, na ação de colecionar pequenos objetos
(brinquedos, globos de neve, miniaturas e livros infantis) e em um projeto que não chegou a ser
realizar, qual seja: o de escrever um comentário sobre a redução (Verkleinerung) como artifício da
fantasmagoria, a partir do conto de fadas A nova Melusina (Die neue Melusine), de Goethe. À luz de
tal método, a apresentação pretende, ainda, iluminar alguns aspectos da “imaginação
miniaturizante” (Bachelard, 2005) da artista argentina Liliana Porter, cujo universo plástico é
povoado por miniaturas e personagens de escala pequena, o que a insere numa constelação de
afinidades eletivas com o pensamento de Walter Benjamin em torno da miniaturização como
dispositivo de criação artística.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. O país dos brinquedos: reflexões sobre a história e sobre o jogo. In:
Infância e história. Destruição da experiência e origem da história. Trad. Henrique Burigo. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2005. BACHELARD, Gaston. A miniatura. In: A poética do espaço. Trad.
Antonio de Padua Danesi. Sao Paulo: Martins Fontes, 2005. BAUDELAIRE, Charles. Moralidade do
brinquedo. In: Poesia e prosa. Org. Ivo Barroso. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 1995. BENJAMIN,
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Torres Filho e José Carlos Martins Barbosa. São Paulo: Brasiliense, 1987. -----. Berliner Chronik. In:
Gesammelte Schriften, Band VI. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlang, 1989a. -----. Diário de
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era de sua reprodutibilidade técnica. Organização de Márcio SeligmannSilva. Trad. Gabriel Valadão
da Silva. Porto Alegre: L&PM, 2017. -----. Passagens. Org. da edição brasileira Willi Bolle. Trad. Irene
Aron e Cleonice Paes Barreto Mourão. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2018. 3 v. CAMÊLO, Francisco.
Miniatura, miniaturização. Dispositivos de pensamento e de criação artística, a partir de Walter
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o tempo se lança como um Bretzel... In: Diante do tempo. História da arte e anacronismo das
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recommencer. Ce qui nous soulève, 2. Paris: Minuit, 2021. GAGNEBIN, Jeanne Marie. De uma estética
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Ricardo Timm et al. (Org.). Walter Benjamin: barbárie e memória ética. Porto Alegre: Zouk, 2020.
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457
que passou a vida na França, Agnès Varda. Por um lado, ao “investigar” a vida dos/as catadores/as
rurais, Varda mostra – e o mostrar é brechtiano – uma prática rural praticamente extinta para discutir
a proximidade daquele que tem uma câmera na mão com esses catadores/as e, sobretudo, pensar
de quem é a imagem assim como de quem é a sobra nos campos. A experiência fílmica da montagem
se transforma em políticas de usos, reaproveitamentos e reorganizações do material filmado. Por
outro lado, discute-se a partir da noção do colecionador em Walter Benjamin – manifesto em
Passagens e em uma leitura instigante de Pierre Missac de Benjamin como figura próxima do catador
– que seu pensamento pode ser lido como o pensamento de um catador/a urbano, que Varda mostra
em seu documentário, recolhendo uma série gigantesca de pedacinhos de texto como refugo da
história – um tipo de material que o catador/a tem contato. Compreensão essa que tem a ver com
experiência da pobreza e, ao mesmo tempo, com as experiências em geral. Assim, se a montagem
como crítica permite que um exercício estético se aproxime do gesto da pobreza, a crítica como
montagem permite uma prática do pensamento que transforme as noções de refugo em
pensamento. Ambas, em tensão, podem ler obras modernas e contemporâneas naquilo que se cata,
apontando tempos sombrios, como, por exemplo, a volta da fome no cenário geopolítico brasileiro
e a importância de uma releitura da ecopolítica de Josué de Castro.
Referências: BENJAMIN, Walter. Experiência e pobreza. IN: Magia e técnica: arte e política. São
Paulo,: Editora Brasilense, 2012. _______. Passagens. Editora UFMG: Belo Horizonte, Imprensa
Oficial, São Paulo, 2007. CASTRO, Josué. Geografia da fome. Todavia: São Paulo, 2022. MISSAC,
Pierre. Passagem. São Paulo: Editora Iluminuras, 2020.
458
HÉLIO OITICICA - DELIRAR O ARQUIVO, ARQUIVAR O DELÍRIO
Frederico Oliveira Coelho
Resumo: É notória a relação do artista plástico carioca Hélio Oiticica (1937-1980) com a produção de
um sólido arquivo ao longo de sua trajetória. A comunicação irá desenvolver a tensão entre uma
prática arquivística que visa ordenar, definir, classificar e garantir posteridade e uma prática artística
que enfatiza o componente experimental como motor criativo de vivência. Arquivo e
experimentação, portanto, são dois vértices que compõe a vida de um criador cuja reflexão crítica
com o tempo, o documento e a linguagem sempre foi central em sua vida. Desde sua formação,
Oiticica trabalhou com seu pai, o entomólogo e fotógrafo de vanguarda Hélio Oiticica, como
organizador de seus arquivos e fichas no Museu Nacional ainda na década de 1960. Ali, teve a
experiência de fazer do registro um local singular de criação. Com o desenvolvimento de sua carreira
artística, uma série de trabalhos tiveram na prática do registro, da escrita e da produção de séries
um diálogo permanente com a construção de seu arquivo pessoal e profissional. Ao mesmo tempo,
a vida de Oiticica foi marcada pela transgressão e pela expansão do corpo e da consciência, criando
uma persona em permanente fluxo e delírio inventivo, que de alguma forma constrasta com o
arquivista minucioso e organizado. O que busco com essa proposta é aprofundar, em um novo
momento teórico sobre o tema, minha pesquisa de vinte anos sobre a obra e o arquivo (o arquivo-
obra? a obra-arquivo?) de Oiticica. Provocando a perspectiva de Diana Taylor, especulo que Oiticica
fez um uso performativo do arquivo e das práticas de registro, visando tanto o momento
contemporâneo do artista quanto a posteridade das artes e de sua história.
Referências: CAMPOS, Haroldo. A Arte no Horizonte do Provável. São Paulo: Perspectiva, 1975.
CARVAJAL, Fernanda, DÁVILA, Mela, TAPIA, Mabel (orgs.). Archivos del comu?n II: el archivo
ano?mico. Madrid: Museu de Arte Reína Sofia, 2017. COELHO, Frederico. Livro ou Livro-me - OS
escritos Babilônicos de Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2010. FILHO, César Oiticica; COELHO,
Frederico. Conglomerados/Newyorkaises. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2011. SMALL, Irene.
Hélio Oiticica - Folding the Frame. Chicago: University of Chicago Press, 2016. FOUCAULT, Michel.
Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1980.
O ANJO BOXEADOR E SUAS MENSAGENS: ALGUMAS NOTAS SOBRE A POLÍTICA DAS CITAÇÕES NO
MONODRAMA DE CARLITO AZEVEDO
Gabriel Mattos Gonzalez
Resumo: Este trabalho visa apresentar algumas reflexões acerca do Monodrama (2009) de Carlito
Azevedo. Tais reflexões se preocupam em ler esse livro à luz de uma figura que aparece de forma
insistente ao longo de todos seus poemas, o anjo boxeador. Pretendo, aqui, não tanto propor novas
chaves interpretativas, mas desdobrar possibilidades que nos abram aos procedimentos recorrentes
nesse livro, como o caso das citações. Estas, como tentarei mostrar, podem ser lidas à luz da figura
do anjo boxeador. Como lembra Jacques Rancière, em seu O espectador emancipado, uma figura
sempre propõe um sistema de relações entre semelhança e dessemelhança. É ao substituir uma
expressão por outra que ela nos faz experimentar a textura sensível de um acontecimento. Essa
substituição, gostaria de notar, carrega a dimensão política da figura. Proponho, então, que o anjo
boxeador possa ser lido como um mensageiro de muitas vozes, as quais compõem o que chamo de
terceiro estado. Esse conceito deve ser entendido em sua dupla acepção, aquela própria à ciência
política, como representação do povo que sustenta o estado; mas também como aquela tomada
pela teoria quântica, representante de um operador de indeterminação, ou melhor, do próprio
espaço de relação entre as coisas, enquanto um terceiro desestabilizador. Essa noção, me parece,
abre a obra às muitas vozes ali presentes, aos seus ecos e suas ressonâncias. Desse modo, pode-se
perguntar, quais seriam, as políticas dessa figura, quais relações com sensível elas propõem, como
elas redistribuem os elementos da representação no livro. Sem que haja a pretensão de dar respostas
definitivas às essas perguntas, tomo-as como deriva. Pois, é, ao se desdobrar as mensagens do anjo,
em um jogo de dupla distância, que se olha de relance suas infinitas possibilidades.
Referências: MERLEAU-PONTY, Maurice. O olho e o espírito: seguido de A linguagem indireta e as
vezes do silêncio e A dúvida de Cézanne. São Paulo: Cosac & Naify, 2004 PERLOFF, Marjorie. O Gênio
459
não original: poesia por outros meios no novo século. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013.
RANCIERE, Jacques. O espectador emancipado. 1.ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012
AZEVEDO, C. Monodrama. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009. AZEVEDO, C. Livro das postagens. Rio de
Janeiro: 7Letras, 2016.
460
tecendo esta que pode ser considerada uma “narrativa performática” (RAVETTI, 2002), a partir da
qual não podemos ter certeza se estamos lidando com a realidade ou a ficção.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo e outros ensaios. Chapecó: Argos, 2009.
DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001.
DERRIDA, Jacques. Rastro e Arquivo, Imagem e Arte. In: Pensar em não ver: escritos sobre as artes
do visível (1979-2004). Org. Ginette Michaud, Joana Masó, Javier Bassas. Florianópolis: Ed. da UFSC,
2012. DIDI-HUBERMAN, Georges. Imagens apesar de tudo. São Paulo: Editora 34, 2020. DIDI-
HUBERMAN, Georges. Sobrevivência dos vagalumes. Tradução Vera Casa Nova e Márcia Arbex. Belo
Horizonte: Ed. UFMG, 2011. FARGE, Arlete. O Sabor do Arquivo. São Paulo: Edusp, 2009. MARQUES,
Reinaldo. Arquivos literários: teorias, histórias, desafios. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2015. MARQUES,
Reinaldo. Ficções do arquivo: o literário e o contemporâneo. In: COELHO, Haydée Ribeiro e VIEIRA,
Elisa Amorim (Org.). Modos de arquivo: literatura, crítica, cultura. 1. ed. Rio de Janeiro: Batel, 2018,
p. 465-483. PORTELA, Patrícia. A Coleção Privada de Acácio Nobre. Porto Alegre: Dublinense, 2017.
RAVETTI, Graciela. Narrativas Performáticas. In: ARBEX, Márcia., RAVETTI, Graciela (Org.).
Performance, exílio, fronteiras: errâncias territoriais e textuais. Belo Horizonte: Departamento de
Letras Românicas, Faculdade de Letras/ UFMG, 2002, p. 47-68. TAYLOR, Diana. O arquivo e o
repertório. Performance e memória cultural nas Américas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013.
461
epistolografia de Mario de Andrade. Sao Paulo: Edusp; Fapesp, 2007. PERES, José Roberto Pereira. O
Instituto de Artes da Universidade do Distrito Federal: uma experiência modernista de formação de
professores. Tese de Doutorado. Orientadora: Profa. Dra. Patrícia Coelho da Costa. PUC-Rio, 2020.
SAID, Edward. Representações do intelectual. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2005.
SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena; COSTA, Vanda. Tempos de Capanema. Rio de Janeiro: Paz
e Terra; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1984.
462
sua relação com as obras artístico-literárias, partiremos de importantes interpretadores da obra do
artista carioca, tais como Frederico Coelho (2014; 2017), Silviano Santiago (2017) e Miguel de Ávila
Duarte (2021); de escritos e arquivos do próprio Oiticica (através de arquivos do Projeto HO); e da
noção de “obra sempre em obras”, apresentada por Georges Didi-Huberman em sua obra “Sobre o
fio” (2019).
Referências: BACHMANN, Pauline Medea. A poesia como subtexto: a inscrição corporal da poética
secreta de Hélio Oiticica. In: Revista Remate de Males, Campinas-SP, v.39, n.1, pp. 171-190, jan./jun.
2019. COELHO, Frederico. 1970: pause / play. In: Revista Ars. São Paulo, v. 15, n. 30, 2017, p. 133-
147. COELHO, Frederico. Hélio Oiticica e o desejo de livro. In: O percevejo online. Rio de Janeiro, Vol.
06, Número 02, Julho-Dezembro de 2014, p. 113-127. DIDI-HUBERMAN. Sobre o fio. Desterro, Santa
Catarina: Cultura e Barbárie, 2019. DUARTE, Miguel de Ávila. Texto como container: escrita e
arquivamento no Conglomerado Newyorkaises de Hélio Oiticica. In: Revista Revell, Campo Grande,
v. 2, n. 29, agosto de 2021, p. 364-389. FOUCAULT, Michel. De espaços outros. In: Revista de Estudos
Avançados da Universidade de São Paulo, v. 27, 2013, p. 113-122. JAREMTCHUK, Dária. “Tudo o que
fiz antes, considero um prólogo”. In: Revista Ars. São Paulo, v. 15, n. 30, 2017, p. 7-15. KIFFER, Anna.
O rascunho é a obra: o caso dos cadernos. In: Revista de estudos de literatura brasileira
contemporânea, Brasília, nº 55, set./dez., 2018, p. 95-118. KIFFER, Anna. Involuções sobre escrita,
corpos e cadernos. In: Seminário Internacional Hélio Oiticica para além dos mitos. Rio de Janeiro, r&l
produtores associados, 2016, p. 179-194. OITICICA, Hélio; PAPE, Lygia. Fala, Hélio. In: Revista Ars. São
Paulo, v. 15, n. 30, 2017, p. 17-25. RANCIÈRE, Jacques. O espaço das palavras: de Mallarmé a
Broodthaers. Belo Horizonte, MG: Relicário, 2020. SANTIAGO, Silviano. Hélio Oiticica em Manhattan.
In: Revista Ars. São Paulo, v. 15, n. 30, 2017, p. 207-216.
463
Gallimard, 1994a. ______. Carnets II. Paris: Éditions Gallimard, 1994b. NOVALIS. Fragmentos de
Novalis. Seleção, tradução e desenhos de Rui Chafes. Lisboa: Assírio & Alvim, 2000. ______. Pólen:
fragmentos, diálogos, monólogo. Tradução, apresentação e notas de Rubens Rodrigues Torres Filho.
São Paulo: Iluminuras, 2009.
464
comparada com os estudos culturais e os ecos etnográficos, o desenvolvimento de uma reflexão
acerca do caráter plural e polifônico dos enredos carnavalescos apresentados pelas escolas de
samba, associações de matrizes negro-populares que reúnem, em sua práxis cotidiana, inúmeros
saberes importantes para o pensar do Brasil contemporâneo. Defende-se a ideia de que os enredos
selecionados podem ser lidos e interpretados enquanto pedaços de um grande arquivo público
anualmente aberto, vivido e compartilhado em meio aos ritos e às narrativas estruturantes das
agremiações sambistas - reconstrução de sentidos e produção de novas epistemes.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Estâncias – a palavra e o fantasma na cultura ocidental. Tradução
de Selvino José Assmann. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2007. BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito
de história. In: BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. Magia e técnica, arte e política. São Paulo:
Editora Brasiliense, 1996. BOSI, Alfredo. Dialética da Colonização. São Paulo: Companhia das Letras,
1998. CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. Carnaval carioca: dos bastidores ao desfile. Rio
de Janeiro: Editora UFRJ / MinC / Funarte, 1994. DIDI-HUBERMAN, Georges. Atlas do impossível –
Warburg, Borges, Deleuze, Foucault. In: ARTIÈRES, Philippe; BERT, Jean-François; GROS, Frédéric;
REVEL, Judith (dir.). Michel Foucault. Rio de Janeiro: Forense, 2014. FUX, Jacques; SANTOS, Darlan.
Estamira e Lixo Extraordinário. A arte na terra desolada. Revista Ipotesi – Universidade Federal de
Juiz de Fora, 2011. Disponível em: http://www.ufjf.br/revistaipotesi/files/2011/05/14-Estamira-e-
Lixo-Extraordin%C3%A1rio-Ipotesi-1521.pdf LEOPOLDI, José Sávio. Escola de Samba, ritual e
sociedade. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2010. SANTOS, Nilton. A arte do efêmero – Carnavalescos e
mediação cultural no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora Apicuri, 2009. VENTURA, Leonardo de
Souza Lima. Estamira em três miradas. Dissertação de Mestrado em Psicologia – Universidade de
Brasília (UNB). Disponível em:
https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/3955/1/2008_LeonardoSouzaLimaVentura.pdf.
ESCREVER COM LEITE, LER COM O CORPO: POLÍTICAS DA MEMÓRIA E POESIA CONTEMPORÂNEA.
Luciana María Di Leone
Resumo: Em julho de 2020, a justiça da Argentina conseguiu a localização exata na rua Bacacay de
um Centro Clandestino de detenção que tinha funcionado durante a última ditadura. Para encontra-
lo foi imprescindível cruzar documentos e alguns testemunhos de sobreviventes. Emma Le Bozec,
professora e poeta, tinha estado sequestrada ali durante alguns dias em 1977 e, no começo da
redemocratização, tinha fornecido uma espécie de planta baixa do prédio onde estivera cativa. Na
época, ela estava amamentando e tinha conseguido que os guardas autorizaram que ela – chamada
de “vaquinha” - fosse se “ordenhar” na cozinha. A necessidade do seu corpo, á feminização e à
animalização (Kiffer, 2021), paradoxalmente, deixaram traços que, catados na leitura, permitiram
acionar políticas de memória, verdade, justiça. Essa mesma dinâmica de ressignificação dos discursos
e imagens que subalternizam sujeites, através de feminizações e animalização dos seus corpos pode
ser vista na poesia contemporânea, como em Mugido, de Marília Floor Kosby ou Mara Pastor. Tanto
para o mapa de Emma Le Bozec quanto para o trabalho destas poetas um dos elementos centrais
que solicita ser lido é o leite, o leite materno, mas também outros leites animais, funcionam como
um dispositivo significativo que atravessa tanto o paradigma corporal e subjetivo quando o
paradigma político social. Esta comunicação pretende levantar as políticas do leite que se desenham
a partir dessas cenas de escrita: um mapa do cativeiro, e alguns poemas contemporâneos.
Referências: “Una sobreviviente del centro clandestino de Bacacay 3570 y su recuerdo de esos días
de terror. Relato de Emma Le Bozec”, https://www.pagina12.com.ar/276183-una-sobreviviente-del-
centro-clandestino-de-bacacay-3570-y-s KIFFER, Ana Paula Veiga. “O corpo vivo da história: tortura
e feminização dos corpos a partir da ditadura civil-militar brasileira”, Terceira Margem, vol.26.n. 48,
2022. KOSBY, Marília Floor. Mugido. Rio de Janeiro: Garupa, 2018. LE BOZEC, Emma. El dulce encanto
de las bravas. Invisibles, clandestinas, subversivas. Buenos Aires, Editores Asociados, 2015. PASTOR,
Mara. Las horas extra. Puerto Rico: La impresora, 2022.
465
Resumo: De produções multifacetadas, dispersas e pouco conhecidas do grande público, Samuel
Rawet (1929-1984) apresenta uma profusão de textos no campo da dramaturgia e da cena teatral. A
comunicação recolhe e analisa parte dessa obra inacabada, especificamente em nove textos
publicados na extinta Revista Branca, iniciativa carioca fundada por Saldanha Coelho (1926-2006), e
datada de 1950 a 1954. Em sua quase totalidade, tratam-se de ensaios inéditos em livro
salvaguardados em arquivos públicos e privados, virtuais e físicos. O conjunto aponta a importância
da revista, de modo geral, em mais de dez anos de atividade; e a presença contundente do teatro na
produção intelectual lacunar, porém sólida, de Rawet, de modo específico. Diante de uma postura
pública de negação da imagem do pensador, tais textos dispersos e o acervo do escritor, disposto no
Arquivo-Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa (AMLB/FCRB), escancara
que parte da recepção crítica aceitou o blefe de um Rawet que reafirmava em público, por exemplo,
ter rasgado todas as suas peças teatrais, dado desmentido pelos catorze manuscritos (completos e
incompletos) do seu espólio. Ainda que esta apresentação foque na produção inicial da crítica teatral
do escritor, vale lembrar que os temas teatrais, também renegados por ele, os acompanharam até o
final de sua vida, como mostram a sua correspondência com editores de teatro e diversas notas
fiscais da compra de peças publicadas em livro. Como linhas de força para a pesquisa futura desse
aspecto da produção de Samuel Rawet, o trabalho conclui que a lavra inicial rawetiana atesta a
consolidação do teatro moderno brasileiro, realiza a crônica de produções nacionais e internacionais,
acompanha lançamentos editoriais, estabelece debates em torno do teatro enquanto profissão e
fórmula a atuação de um artista e crítico-criador.
Referências: BINES, Rosana Kohl. A prosa desbocada do ilustre escritor estrangeiro. In: GRIN, Monica;
VIEIRA, Nelson. (Orgs.). Experiência Cultural Judaica no Brasil: Recepção, inclusão e ambivalência. Rio
de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 197-211. ______. Modos de desconexão: a crítica brasileira e a obra
de Samuel Rawet. In: KIRSCHBAUM, Saul. (Org.). Dez ensaios sobre Samuel Rawet. Brasília: LGE
Editora, 2007, p. 55-71. BINES, Rosana Kohl; TONUS, José Leonardo. Bibliografia. In: Samuel Rawet:
Ensaios reunidos. Organização: Rosana Kohl Bines e José Leonardo Tonus. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2008, p. 285-289. GONÇALVES, Luciano de Jesus. Que os Mortos Enterrem os seus Mortos:
A narrativa ficcional de Samuel Rawet. 2012. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade
Federal do Mato Grosso do Sul. ______. A estética do gozo e o gozo estético em “Trio”, conto de
Samuel Rawet. REVELL - REVISTA DE ESTUDOS LITERÁRIOS DA UEMS, 3(17), 263 – 283, 2017.
Disponível em: <http://periodicosonline.uems.br/index.php/REV/article/view/1949>. Acesso em 06
fev. 2018. ______. Samuel Rawet, crítico teatral e colaborador da Revista Branca. Anais do IV
Seminário do Programa de Pós-Graduação em Literatura Brasileira, FFLCH-USP, São Paulo, março de
2018, p. 136-143. Disponível em:
<https://literaturabrasileira.fflch.usp.br/sites/literaturabrasileira.fflch.usp.br/files/Semin%C3%A1ri
o%20do%20Programa%20de%20P%C3%B3s-
Gradua%C3%A7%C3%A3o%20em%20Literatura%20Brasileira/Edi%C3%A7%C3%A3o%20completa%
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Samuel Rawet para a Revista Branca. WEB REVISTA LINGUAGEM, EDUCAÇÃO E MEMÓRIA, [S. l.], v.
15, n. 15, p. 45–61, 2019. Disponível em:
https://periodicosonline.uems.br/index.php/WRLEM/article/view/3014. Acesso em: 7 jan. 2023.
KIRSCHBAUM, Saul. Samuel Rawet: Profeta da Alteridade. 2000. 106 f. Dissertação. (Mestrado em
Língua Hebraica, Literatura e Cultura Judaica) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000. ______.
Viagens de um caminhante solitário: Ética e estética na obra de Samuel Rawet. São Paulo:
Humanitas/FAPESP, 2011. RAWET, Samuel. Josias, o triste. Revista Branca, Rio de Janeiro, maio e
agos., n.12, p. 75-77. 1950a. [2? aniversário, ano II]. _______. A camisola do anjo. Revista Branca, Rio
de Janeiro, nov. e dez., n. 14, p. 35, 1950b [ano III]. _______. Anton Tchékhov. Revista Branca, Rio de
Janeiro, n. 15, p. 27, 1951a. [Ano III]. ______. A volta. Revista Branca, Rio de Janeiro, n. 16, p. 34-38,
1951b. [Edição do aniversário de 3 anos, peça em 1 ato]. ______. O teatro de Nelson Rodrigues.
Revista Branca, Rio de Janeiro, n. 17, p. [2], 1951c [Ano IV]. ______. O teatro de Nelson Rodrigues II.
Revista Branca, Rio de Janeiro, n. 18, p. 3, 1951d. [Ano IV]. ______. Posição da crítica teatral. Revista
Branca, Rio de Janeiro, n. 21, p. 2, 1952 a. ______. Teatro no Modernismo – Oswald de Andrade.
466
Revista Branca, Rio de Janeiro, n. [?], p., 1952b. [Número especial dedicado ao 30 aniversário do
Modernismo – Vol. II]. ______. A propósito de uma entrevista. Revista Branca, Rio de Janeiro, n. [?],
out. p.2, 5 e 11, 1952c. _______. Entrevista com Adolfo Celi. Revista Branca, Rio de Janeiro, n. [?],
dez. p. 5 e 11, 1952d. _______. Café da manhã – A última crônica. Revista Branca, Rio de Janeiro, n.
[?], abr., p., 1953 [Número em homenagem ao escritor Jones Rocha]. ______. Teatro no Modernismo
– Oswald de Andrade. In: COELHO, Saldanha. (Org.). Modernismo: estudos críticos. Rio de janeiro:
Revista Branca, 1954, p. 101-111. SEFFRIN, André. Bibliografia básica sobre Samuel Rawet em livro.
In: RAWET, Samuel. Contos e novelas reunidos. Organização: André Seffrin. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2004, p. 483-486. ______. Fiel à literatura: entrevista com André Seffrin, organizador de
Contos e novelas reunidos, de Samuel Rawet.? Opiniães, São Paulo, n. 11, p. 139-143, dez. 2017.
Depoimento a Luciano de Jesus Gonçalves. Disponível em:
<https://www.revistas.usp.br/opiniaes/article/view/142091>. Acesso em: 25 fev. 2018.
467
resistência e a censura. Enquanto isso, na obra de Cixous, por ser escrita na língua dos sonhos,
observamos o luto ser feito justamente nos sonhos. Assim, a presente proposta tenta pensar as
conexões dos dois autores, em uma teia perpétua de fragmentos no texto tecido na escrita.
Referências: • BARTHES, Roland. “Diário de luto”. São Paulo : Editora WMF Martins Fontes, 2011. •
_______. "O óbvio e o obtuso". Lisboa : Edições 70, 2018. • _______. “O prazer do texto”. São Paulo
: Perspectiva, 2015. • CIXOUS, Hélène. “Ève s’évade: La ruine et la vie,” Paris : Galilée, 2009. • Freud,
Sigmund. Lembranças encobridoras. In: "Obras Psicológicas de Sigmund Freud". Rio de Janeiro:
Imago, 1996. • _________. Luto e Melancolia. in “Obras Completas”, Rio de Janeiro: Imago, 1996.
468
unidos pela cor na montagem ensaística. Alinho-me a Benjamin, para quem a contemplação não
teme, nas interrupções, perder sua energia, “assim como o mosaico, na fragmentação caprichosa de
suas partículas, não perde a majestade”. No diário de criação de canções sobre cores, fomento uma
discussão cruzada que reflete sobre o cromatismo no fazer artístico, descolada de qualquer premissa
de “qualidade” da obra de uma novata na área musical, como sou. O diário resgata um arquivo
pessoal (listas, notas em cadernos, notas mentais, referências literárias, gravações) do qual partiu
meu processo de composição, incluindo influxos, impasses e alterações que este suscitou.
Considerando o caráter ubíquo, atemporal e sensorial da cor, busco amalgamar suas múltiplas
dimensões, como “um errante navegante”, e não discuti-la de forma verticalizada ou ligada a um só
tempo, espaço ou campo do saber. Desejo, ainda, ponderar por que a cor pode adquirir espessura
quando vista-lida-ouvida por essa perspectiva que desvia da ideia de totalidade.
Referências: BENJAMIN, Walter. Origem do drama barroco alemão. Trad. Sergio Paulo Rouanet. São
Paulo: Brasiliense, [1928], 1984. GAGE, John. A cor na arte. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2016.
GOETHE, Johann Wolfgang Von. Doutrina das cores. Trad. Marco Giannotti. São Paulo: Nova
Alexandria, [1810], 1993. KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte. Trad. Álvaro Cabral e Antonio
de Pádua Danesi. São Paulo: Martins Fontes, [1954], 1990. LICHTENSTEIN, Jacqueline. A cor
eloquente. Trad. M. Elizabeth de Mello e M. Helena Rouanet. São Paulo: Siciliano, 1994. MACIEL,
Maria Esther. As ironias da ordem – Coleções, inventários e enciclopédias ficcionais. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2010. NELSON, Maggie. Bluets. Seattle (EUA): Wave Books, 2009. PASTOUREAU,
Michel. Bleu – Histoire d’une couleur. Paris: Éditions du Seuil, 2006. PIRES, Paulo Roberto (org.). Doze
ensaios sobre o ensaio – antologia Serrote. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2018. SONTAG, Susan.
Contra a interpretação. Trad. Ana Maria Capovilla. Porto Alegre: L&PM, 1987. WISNIK, José Miguel.
Sem receita – ensaios e canções. São Paulo: PubliFolha, 2004.
469
SOARES, Leonardo Francisco. Rotas abissais: mimese e representação em A força do destino, de
Nélida Piñon, e E la nave va, de Federico Fellini. 2000. 141f. Dissertação (Mestrado em Letras-Estudos
Literários) Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. SOARES,
Leonardo Francisco. Leituras da Outra Europa: Guerras e Memórias na Literatura e no Cinema da
Europa Centro-Oriental. Belo Horizonte: UFMG, 2012. ULYSSE. Direção: Agnès Varda., 1982.
Disponível em: https://mubi.com/pt/films/ulysse. Acesso em: 15 jan. 2023. VARDA, Agnès. Varda par
Agnès. Paris: Cahiers du cinéma, 1994. YAKHNI, Sarah. Cinensaios de Agnès Varda: o documentário
como escrita para além de si. São Paulo: Hucitec, Fapesp, 2014.
470
pessoas. Além disso, algumas das receitas publicadas receberam alterações nos ingredientes ou no
modo de fazer, de modo que as receitas culinárias se configuram como espaços abertos e contínuos,
onde o gesto da escrita e o gesto de cozinhar se mesclam em sabores e saberes culinários. Por outro
lado, os livros de receitas nos sebos costumam estar no fundo, no fim, quase escondidos, sintomático
gesto do lugar a que esses saberes são atribuídos. Em um movimento de catar e ler livros de receitas
escritos por mulheres, encontro anotações, grafias e alterações nas receitas publicadas. Onde a
criatividade se (re)escreve na maioria dos títulos: arte culinária.
Referências: BARTHES, Roland. Escrever a leitura. In:______. O rumor da língua. São Paulo: Editora
WMF Martins Fontes, 2012, p. 26-29. MICHAELSEN, Mariana Vogt. (N)o verso das receitas, uma
página em branco: a escritura, a litura e a leitura de livros de receitas. Dissertação (mestrado em
Literatura) – Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2022.
471
bricolagem de teorias e conceitos), o plágio e o autoplágio declarados (a apropriação de escritos de
terceiros e a reciclagem dos próprios), o fraseado neobarroco/neobarroso (a sintaxe ziguezagueante,
avessa à conclusão, na qual se revezam termos cultos e dizeres plebeus). Dessas folhas periódicas
dispersas surgiram muitos dos títulos publicados a partir de 2001, textos que desestimam a
“voluntad de obra” e afirmam seu caráter circunstancial, transitório, aberto (“¿por qué publicar la
saliva? Pues porque no habrá obra” (2002), afirma Moreno. E acrescenta: “ya avisaré cuando escriba
un libro”). Embora o traço subjetivo estivesse presente desde sempre, é a partir de Vida de vivos
(2005), como assinala Sabo (2018), que o material previamente publicado passa a ser manipulado e
reescrito em textos que gravitam acentuadamente em torno de rememorações pessoais. Três títulos
dos últimos anos se destacam nesse conjunto: Black out (2016), recorrentemente comparado aos
Diários de Emílio Renzi (Piglia, 2015); Oración, carta a Vicky y otras elegías políticas (2018), releitura
das cartas redigidas por Rodolfo Walsh e de seu método de escrita; Contramarcha (2020), volume
que integra a coleção Lectores, de Ampersand, destinada a refletir sobre as leituras, as bibliotecas e
os arquivos de diversos autores, segundo a coordenadora da série. Em que medida esses três títulos
esquivam-se da armadilha da totalidade e da obra (da obra como totalidade) e perseveram numa
estética do processo e da abertura ao por vir? Através de quais procedimentos ensaiam operações
que anarquivam o arquivo da literatura argentina propondo outras chaves de sentido, outras
genealogias e comunidades possíveis? A comunicação buscará explorar algumas dessas questões e
as tensões insolúveis que habitam esses textos.
Referências: Altinier, Rocío. Reimaginar la literatura argentina desde el alcohol. Revista
Heterotopías, V, N° 6, 2020. Diz, Tania. Escribir para olvidar. A propósito de Black out. In: Darrigrandi,
Claudia; Mahieux, Viviane; Méndez, Mariela (orgs). El affair Moreno. Buenos Aires: Mansalva, 2020.
Gárate, Miriam V. Cenas do rádio em Los Diarios de Emilio Renzi e em Black out. Caracol, N 17, 2019.
____ Entre bot(el)la y bot(ella). Acercamientos ebrios a Black out. Comunicação XIII Congresso da
ABH, SP, 2022 (inédito) Louis, Annick. De la oración a la letanía Sobre Oración. Carta a Vicki y otras
elegías políticas, de María Moreno. Revista Luthor, N. 37, 2018. Pauls, Alan. El factor panceta. En:
Darrigrandi, Claudia; Mahieux, Viviane; Méndez, Mariela (orgs). El affair Moreno. Buenos Aires:
Mansalva, 2020. Romero, Walter. María Moreno. La máquina lectora. Em: Darrigrandi, Claudia;
Mahieux, Viviane; Méndez, Mariela (orgs). El affair Moreno. Buenos Aires: Mansalva, 2020, p. 233-
238. Sabo, María José. “Porque no habrá obra”. El archivo en la escritura de María Moreno. Orbis
Tertius, vol 20, N 22, 2015. ____ Formas de la amistad en la escritura de María Moreno. Revista
Contexto, Vitória, N 33, 2018. Viu, Julieta. Escenas de una bohemia setentista en la noche porteña:
memorias de María Moreno. Saga, Revista de Letras, N 11, 2019.
472
da colagem permite que o arquivo seja o operador pelo qual se aposta na força do anacronismo de
imagens e documentos a visitar, montar e produzir. Como se a colagem, e essa aposta crítica inclui
o trabalho de Neves, mas não se restringe a ele, fosse um procedimento de investigação duplamente
oportuno no Brasil contemporâneo: ao mesmo tempo em que é capaz de sobrepor tempos
históricos, ela aproxima corpos e realidades muitas vezes incompossíveis, desnaturalizando lugares
comuns em torno das ideias de presença e identidade.
Referências: BENJAMIN, Walter. “Sobre o conceito de história”. In: BENJAMIN, Walter. Magia e
técnica. Arte e política, obras escolhidas I. Trad. Sergio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 2010
(1985). ____________. Passagens. Org. BOLLE, Willi. Trad. Irene Aron, Cleonice Paes Barreto
Mourão. Belo Horizonte/São Paulo: Editora UFMG/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2007.
DIDI-HUBERMAN, Georges. A imagem sobrevivente. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro:
Mar/Contraponto, 2013. DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. Trad. Paulo
Neves. São Paulo: Editora 34, 2010. MARTINS, Leda Maria. Afrografias da memória – o Reinado do
Rosário do Jatobá. São Paulo: Perspectiva, 2021. ___________. “Performances do tempo espiralar”.
In: Performances, exílios, fronteiras (org. RAVETTI, Gabriela; ARBEX, Márcia). Belo Horizonte:
Faculdade de Letras/UFMG, 2002. NEVES, Eustáquio. Fotoportátil 5. São Paulo: Cosac & Naify, 2005.
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a linguagem da ruptura. São Paulo: Edusp, 1993.
473
enunciação da lírica moderna. Assim, parte do impacto que os escritos de Jean-Jacques Rousseau
teriam no pensamento dos primeiros românticos, por exemplo, se concretizaria pela influência de
suas ideias acerca da educação, dos direitos do homem, da liberdade, do papel da natureza como
extrapolamento dos limites de sistemas de racionalidade civilizatórios, tanto quanto pela adoção em
seus escritos de um modo pessoal de expressão,?na clave discursiva da intimidade e do uso da
primeira pessoa. Partindo deste recorte teórico, o presente trabalho pretende abordar a obra
poética do escritor português Manuel António Pina, à luz do problema da citação em sua escrita,
pensada aqui também com Antoine Compagnon, tomado sobretudo como gesto de intimidade e
infância, tanto quanto do sentido de assinatura que nela se opera, infância tomada, portanto, não
apenas como dispositivo discursivo de uma prática de escrita, mas como um modo reiteradamente
afeito ao borramento de sentidos hierarquizantes de autoria. Para isso, tomaremos como fio
condutor fragmentos do acervo digital de Pina, recentemente acolhido pela Casa dos Livros – Centro
de Estudos da Cultura em Portugal da Universidade do Porto.
Referências: Basílio, Rita (2017). Manuel António Pina – Uma pedagogia do literário. Porto: Assírio &
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realidade. Trad. Breno Longhi. São Paulo: Ubu Editora.
METAMORFOSES DO ESCRITOR
Pedro Alegre
Resumo: Em 1911, Kafka faz uma famosa anotação em seu diário: “Ao pretender me levantar da
cama hoje, simplesmente desmoronei. A razão para tanto é simples: estou trabalhando demais”.
Observações como essa se repetem frequentemente, dando forma ao que ele chama de “vida dupla
terrível, da qual é provável que só a loucura ofereça saída”. No entanto, a imagem canônica do
mundo do trabalho foi apresentada por Kafka depois, em 1914, na Metamorfose, quando Gregor
Samsa certa manhã se vê transformado num inseto e sente um pavor enorme, não de sua nova
condição, mas de chegar atrasado no serviço. Existem muitos exemplos desse tipo de vida paralela.
Robert Walser foi mordomo num castelo, além de secretário e copista; James Baldwin, engraxate
nas ruas de New York; Carolina Maria de Jesus, escritora e catadora de papel; Geovani Martins, que
antes de publicar o Sol na cabeça tinha longa carreira como homem-placa, garçom, atendente. É
comum que a literatura seja lida a partir de certo afastamento do mundo material, do pagamento
de contas e das horas calculadas de serviço. O que acontece com aqueles escritores, entretanto, que
têm nessa vida paralela a encenação da escrita? Quando uma obra (work/oeuvre) é vizinha de outro
mundo, o do trabalhador braçal (worker/ouvrier), ela pode ser o arquivo de modos heterogêneos de
vida (classe/raça/ gênero/língua)? É nessa direção que pretendo apresentar uma pesquisa sobre dois
mundos comuns – daquele que precisa trabalhar e que, nos intervalos do expediente, pensa e
escreve. Ou seja, do que torna inoperante (Nancy) e inacabada a obra da escrita e a do trabalho, no
espaço compartilhado entre si. Partindo de cenas de escritores que tematizam o assunto, de Jeferson
Tenório a Annie Ernaux, gostaria de pensar a escrita dentro do arquivo de metamorfoses que torna
um escritor, escritor, no mundo do trabalho.
Referências: Ernaux, Annie. O lugar. Trad. Marilia Garcia. São Paulo: Fósforo, 2021. Ernaux, Annie. A
vergonha. Trad. Marilia Garcia. São Paulo: Fósforo, 2022. Kafka, Franz. Diários. Trad. Sergio Tellaroli.
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477
reflexão sobre a sua complexa experiência da escrita crítica. O conjunto de notas, recortes de jornais,
colagens e textos que formam este registro mantido regularmente enquanto trabalhava no livro
Guerra Sem Testemunhas (1969), desvelam suas leituras, movimentos de pesquisa, rotinas, anseios,
inspirações, impasses, e principalmente, o esforço para dar visibilidade às trilhas percorridas em um
lugar configurado como campo de batalha para o autor: o espaço da literatura. Os modos de
agenciamento do seu processo de criação neste campo envolvem um olhar minucioso, consciência
existencial, e um rigoroso compromisso com a artesania da palavra. Desta forma, para conceber o
testemunho e estabelecer seu escopo crítico, o autor procede por meio de artifícios que operam a
reordenação das estruturas que compõem o pensamento abstrato. Este deslocamento, realizado
pela imaginação crítica, resulta em um intenso procedimento inventivo manifestado no próprio ato
da escrita, pois condensa o gesto seminal de um autor que decide arquivar para tornar público o seu
processo.
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Literária. São Paulo: Edusp, 1993. Bastidores da Criação Literária. São Paulo: Iluminuras, 1999.
478
experimentações artísticas que integram linguagem verbal, linguagem visual e projeto gráfico,
possibilitando às palavras ganharem corpo e às imagens, movimento, ações que contribuem para
transformar o livro em um novo objeto estético, marcado pelo hibridismo de linguagens. Realizar um
trabalho com a literatura infantil/juvenil em nossos dias, requer reconhecer o livro como unidade de
significação, cujos elementos em sua composição, contribuem reforçando e enriquecendo os
sentidos da obra: formato, tamanho do livro, capa, cores, tipo de papel, recortes, dobras, tipografia,
fontes, texturas, técnicas de ilustração, seleção vocabular, posicionamento do narrador no texto,
distribuição do texto verbal nas páginas... Elementos justificados por intenções textuais que agregam
valor estético e ampliam possibilidades perceptivas. Trabalho de seleção e exploração dos recursos
expressivos de linguagem que denuncia a presença de voz autoral e ilumina caminhos de leitura,
estabelecendo relações de sentido entre obra e público leitor. Este estudo pretende destacar a
importância da tríade intersemiótica: texto, imagem, design, em obras de autores contemporâneos,
(Odilon Moraes, Renato Moriconi, Alexandre Rampazo, entre outros) revelando como o uso criativo
dos recursos expressivos da linguagem contribui para o enriquecimento e unidade das obras,
fazendo da literatura infantil/juvenil, hoje, o lugar das grandes experiências e inovações artísticas. O
estudo encontra embasamento em pesquisas de Zigmunt Bauman, acerca da contemporaneidade,
as questões sobre o hibridismo cultural estão ancoradas em pesquisas de Lucia Santaella e os
fundamentos sobre a literatura infantil/juvenil em Nelly Novaes Coelho, Teresa Colomer, Maria Zilda
da Cunha e Eliane Debus.
Referências: BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro:
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linguagens e cultura na segunda era da internet. São Paulo: Paulus, 2021. (Livro eletrônico).
POR UMA POÉTICA EXPANDIDA: OS INSTAPOEMAS FEMINISTAS DE RUPI KAUR E RYANE LEÃO E
SEUS DESDOBRAMENTOS
Fernanda Barroso e Silva
Resumo: A produção literária atual, com processos criativos que expandem o modelo mais
convencional de expressão e de circulação do literário – o livro impresso –, conta com uma
diversidade de formas através das quais é desenvolvida. Nesse cenário, os intensos avanços
tecnológicos se destacam nesse processo em que novos suportes e interfaces são utilizados e
colaboram para uma reconfiguração de como a Literatura se manifesta, a contemplar os
Instapoemas de Rupi Kaur e Ryane Leão. Nos meandros dessa intensa relação entre Literatura e
Tecnologia, são vislumbrados atravessamentos que deslocam a experiência da Literatura para outros
ambientes, orientando as relações e as experiências do leitor, do autor e da obra. Por conseguinte,
essas novas paisagens, considerando as inúmeras potencialidades criadas e recriadas pelas mídias
sociais, promovem um encontro entre elementos assimétricos e ampliam as possibilidades de
significação. Nesse contexto, as produções das poetas indo-canadense Rupi Kaur e da brasileira
Ryane Leão, nomes expressivos da produção feminista contemporânea, são marcadas por uma
textualidade mosaica em interfaces intimistas, com textos que circulam e recebem interferências de
seus seguidores-leitores, ressoando discursos emancipatórios em relação às mulheres. Assim,
observa-se que pensar essas múltiplas articulações entre artes e suas linguagens traz à tona
479
processos sociais e culturais que delas fazem parte, fazendo também emergir o próprio contexto de
luta das poetas mencionadas. Interessa-nos, então, investigar como e em que extensão essas
experimentações da Literatura alcançam, de modo distinto do tradicional, a própria causa feminista
das poetas ao promover uma nova relação com o leitor, agora agente atuante nesse rico jogo da
produção poética de Kaur e Leão. Para tal, são considerados apontamentos de Penke (2019), Castells
(2013), Gattass (2011), Hayles (2009), Pojoga (2019) e Zilberman (2018) ao olhar para esses
atravessamentos e suas crescentes redes de conexão.
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internet. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. GATTASS, Luciana Barroso.
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NÃO QUERO MAIS SER EU: REJEITANDO LEITURAS AUTOBIOGRÁFICAS DAS ESCRITAS
CONFESSIONAIS DE CLARAH AVERBUCK E MEGAN BOYLE
Júlia Irion Martins
Resumo: Este trabalho compara a manipulação de paratextos em torno do livro Máquina de Pinball
(2002), da autora brasileira Clarah Averbuck, com a do livro Liveblog (2018), da autora estadunidense
Megan Boyle, que esteve muito envolvida no movimento “alt-lit” americano (que se estendeu
aproximadamente de 2007 a 2015). Ao reunir essas duas autoras de blogs feministas que viraram
livros, examino as suposições autobiográficas e autoficcionais incorporadas à literatura baseada na
Internet escrita por mulheres. Apesar de ambas basearem seus trabalhos em seus blogs pessoais,
Averbuck e Boyle adotam tratamentos diferentes para a questão da verdade versus a ficcionalização.
No entanto, por meio de suas respectivas manipulações de paratextos, ambas as autoras complicam
e rejeitam leituras simplesmente autobiográficas de suas obras. Ao colocar o desenvolvimento e a
materialidade da Web 2.0 em diálogo com as teorias do “auto”, meu trabalho lança as seguintes
perguntas: A materialidade da internet (em particular, a Web 2.0 e os mecanismos para verificar a
identidade do usuário) encoraja os leitores contemporâneos a confundir a narração em primeira
pessoa com uma escrita autobiográfica? O que está em jogo para a autoria e a autonomia das
mulheres quando se supõe que seus escritos online sempre tenham algum grau de “auto” ou de
verdade?
Referências: Averbuck, Clarah. Máquina de Pinball. Conrad Livros, 2002. Azevedo, Luciene. “Blogs: A
Escrita de Si na Rede dos Textos.” Matraga, Volume 14, Number 21, 2007. 44-55. Boyle, Megan.
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AS DOBRAS QUE RECONTAM AS MIL E UMA NOITES: ENGENHO E ARTE NA ADAPTAÇÃO EM POP-
UP DE ALADIM E A LÂMPADA MÁGICA (2011)
Lucas Silvério Martins
Resumo: Muitos são os meios de apresentação do texto literário que, plural e multifacetado, pode
assumir diferentes formas de apresentar o conteúdo que a constitui, numa relação intrinsecamente
estabelecida (CANDIDO, 2004). Destarte, podendo o texto ficcional ser observado por diferentes
prismas, atentamos, nesta investigação científica, a um tipo de apresentação do objeto livro que,
tamanha a sua materialidade, delega a si mesmo o signo de livro objeto, subdividindo, dentre
diversas outras, na categoria de livros pop-up. Assim, compõe objetivo para este trabalho investigar
as formas e o engenho da obra Aladim e a lâmpada mágica (2011), em adaptação sob
responsabilidade da editora Ciranda Cultural, com autoria de Paul Hess, e direção-geral de Clécia
Aragão Buchweitz. Desta feita, utilizando de análises descritivo qualitativas de caráter interpretativo,
objetiva-se de modo mais específico compreender a relação das formas e forças que exercem
486
materialidade na obra, quer seja no campo textual, imagético ou cinético, de modo a inquirir como
tais potências se engendram e formam este tal objeto, que é recebido pelo leitor. Para nortear o
processo investigativo, serão utilizadas a contribuição teórico-crítica de Antônio Candido (2004),
Peter Hunt (2010) e Nelly Novaes Coelho (2012), para tratar dos temas relativos ao campo literário
e suas epistemologias; Rui de Oliveira (2008) e Sophie Van der Linden (2011), para dissertar sobre as
singularidades dos recursos imagéticos; e Edith Derdyk (2013), Duncan Birmingham (2019) e Eliane
Debus, Maria Laura Spengler e Fernanda Gonçalves (2020), para tratar dos temas relativos às
materialidades do livro objeto e das obras pop-up. Será possível observar, assim, a correlação entre
a construção única de técnicas (literárias, imagéticas e cinéticas) que orquestram a potencialização
da fruição estético-literária.
Referências: BIRMINGHAM, Duncan. Pop-up: design and paper machanics. Reino Unido: GMC
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488
Derdik (2013) e Fernandes (2017), dentre outros, para discutirmos as materialidades das obras, bem
como Zumthor (2018) para que o leitor atue pelos palcos da interação com o texto.
Referências: DERDIK, Edith (org.). Entre ser um e ser mil: o objeto livro e suas poéticas. São Paulo:
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492
partir da surpreendente e inesplicável paralisação da grande cidade de São Paulo, que é observada
e vivenciada por três personagens que, à princípio, parecem ser os únicos sobreviventes. Dessa
forma, procuraremos elencar alguns pontos que podem ser investigados no romance, buscando
provocar o olhar do público leitor para a obra que é polissêmia e que, por isso, pode ter sua iminência
renovada permanentemente. Considerando que a literatura tem sido um fenômeno de
expressividade ao longo dos tempos, analisaremos, sobretudo, o hibridismo constante entre ficção
e realidade estabelecido através do entrecruzamento das subjetividades, dos afetos e das emoções
e que fazem da ficção de Paiva uma obra peculiar, fruto da exploração da vulnerabilidade de
consequências radicais. Para tanto, buscaremos embasamento teórico-crítico em estudiosos como
Bakhtin (1990), Jacoby (2007), Schollhammer (2009), Krysinski (2012),Garramuño (2014), Pellegrini
(2018), Hoisel (2019), Lyotard (2021), dentre outros.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. Questões de Literatura e Estética: a teoria do romance. Equipe de
tradução: Aurora Fornoni Bernardini; José Pereira Jr.; Augusto Góis Jr.; Helena Spryndis Nazário;
Homero Freitas de Andrade. São Paulo: Editora Hucitec, 1990. GARRAMUÑO, Florencia. Frutos
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época antiutópica. Trad: Carolina de Melo Bomfim Araújo. Rio de Janeiro: editora Civilização
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494
O CARÁTER INTERARTÍSTICO NO ROMANCE “O ARROZ DE PALMA”, DE FRANCISCO AZEVEDO
MARLI LOBO SILVA – UNB
Marli Lobo Silva
Resumo: O caráter interartístico no romance “O arroz de Palma”, de Francisco Azevedo Marli Lobo
Silva – UNB O presente estudo tem como objetivo apresentar discussões acerca das referências
alusivas a outras formas artísticas figuradas no romance “O arroz de Palma” (2019), do escritor
carioca Francisco Azevedo. A partir dessa perspectiva busca-se aproximar o campo literário ao campo
artístico no sentido de pensar o diálogo crítico com a modernidade na obra de Azevedo. Esta é uma
obra profícua que exemplifica seu caráter interartístico, pois se constrói a partir do processo de
hibridação, assim, é relevante para se estudar o diálogo intertextual que Azevedo desenvolve no
fazer criativo de sua narrativa. Este estudo também pretende esclarecer como o diálogo intertextual
e metalinguístico se entrecruza na obra. Nesse tocante, pensar a relação desses diálogos é
experienciar como as referências com outras linguagens se desdobram em saberes a outras formas
artísticas e como essas referências dialogam com os elementos internos da obra. Assim, para dá
sustentação teórica aos conceitos abordados neste estudo concentrar-nos-emos às discussões de
Haroldo de Campos, “Metalinguagem e outras metas” (1992), Samira Chalhub, “A meta-linguagem”
(1997), e Walter Benjamin, “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” (1987), este por
creditar à literatura num entrecruzamento com a busca de uma nova “objetividade” narrativa;
aqueles por teorizar o fenômeno da metalinguagem e como esta se desdobra no processo criativo
do autor. Palavras-Chave: Literatura; intertextualidade; metalinguagem; caráter interartístico
Referências: Haroldo de Campos, “Metalinguagem e outras metas” (1992), Samira Chalhub, “A meta-
linguagem” (1997), e Walter Benjamin, “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”
(1987).
495
SIMPÓSIO “IMAGENS E LITERATURA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO”
Jaime Ginzburg (USP), Juliana Santini (UNESP) e Paulo Eduardo Benites de Moraes (UNIR)
A FÚRIA DOS CORPOS: DESEJO E MUTILAÇÃO NA OBRA DE JOÃO GILBERTO NOLL E JOSÉ LEONILSON
Gabriela Fernandes De Carvalho
Resumo: Pretende-se, a partir da leitura de obras selecionadas do escritor brasileiro João Gilberto
Noll e do artista visual José Leonilson, analisar a presença do corpo vivo, pulsante, que deseja, em
oposição ao corpo fragmentado, mutilado, ferido, em decomposição, na construção de sujeitos e
escritos que transitam entre o recolhimento, o testemunho das narrativas pessoais, a ficcionalização
e busca de novos “eus”. Busca-se compreender o processo de elaboração do luto e a (re)montagem
da história do período pós-ditatorial brasileiro, especialmente nos anos iniciais da abertura, a partir
dos conceitos de alegoria e ruína trazidos por Walter Benjamin na tese "Origem do drama trágico
alemão". Para Benjamin, a alegoria moderna nos coloca constantemente num processo de choque,
da violência, da ruptura. A imagem alegórica é construída através de fragmentos, do inacabado, do
rompimento com a tradição. E assim como no terreno das ideias a alegoria é o imperfeito, o
destruído, no reino das coisas (ou das imagens) teremos a ruína. As imagens criadas pelos dois
artistas, nas suas respectivas linguagens, apostam nas estética do fragmentário, do imperfeito, do
partido, do inacabado, das ruínas. O vazio na obra do Leonilson e o silêncio na escrita do Noll tomam
um espaço fundamental na investigação, por apontarem para uma estética que se tece a partir dos
estilhaços. Tais análises serão feitas a partir dos conceitos discutidos por Didi- Huberman (2017a;
2018a; 2018b) e Benjamin (2016a; 2016b; 2007). Dessa forma, investigaremos as alegorias e ruínas
presentes nos dois artistas, como uma elaboração da ditadura, da perda e do luto.
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América Latina. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. BENJAMIN, Walter. O anjo da história. Edição
e tradução João Barrento. 2.ed; Belo Horizonte: Autêntica, 2016. ------. Origem do drama trágico
alemão. Edição e tradução João Barrento. 2.ed; Belo Horizonte: Autêntica, 2016. ------ . Passagens.
Willi Bole e Olgária Matos (orgs.), Belo Horizonte/São Paulo: Editora da UFMG/ Imprensa Oficial,
2007, p.535. Tradução de Irene Aron. BORGES, Anderson. Alegoria redimida em Walter Benjamin.
(Dissertação, UFMG, 2012). DIDI-HUBERMAN, Georges. Atlas, ou, o Gaio Saber Inquieto: o olho da
história III. Tradução Vera Casa Nova/ Márcia Arbex. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2018a. ------.
Diante do tempo: História da arte e anacronismo das imagens. Tradução Vera Casa Nova/ Márcia
Arbex Belo Horizonte: Editora UFMG, 2017a -----. Quando as imagens tomam posição: o olho da
história I. Tradução Vera Casa Nova/ Márcia Arbex Belo Horizonte: Editora UFMG, 2017b ------.
Remontagens do tempo sofrido: o olho da história II. Tradução Vera Casa Nova/ Márcia Arbex Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2018b. ------. Sobrevivência dos vaga-lumes. Tradução Vera Casa Nova/
Márcia Arbex Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. LAGNADO, LISETTE. São tantas as verdades. São
Paulo: Projeto Leonilson: Sesi, 1995. NOLL, João Gilberto. A máquina de ser. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2006. _____. Berkeley em Bellagio. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. _____. Canoas e
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Atlântico. São Paulo: Francis, 2004. _____. Lorde. São Paulo: Francis, 2004. _____. Mínimos,
múltiplos, comuns. São Paulo: Francis, 2003. _____. O cego e a dançarina. Rio de Janeiro: Record,
2008. _____. O quieto animal da esquina. São Paulo: Francis, 2003. _____. Romances e contos
reunidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
496
quadro, por meio do recurso ecfrásico, leitor e protagonista são conduzidos do imaginário à realidade
ou à possibilidade do real nos eventos sucedidos entre as personagens. Na obra serão observados as
referências intermidiáticas e os efeitos que o pictural produz no texto literário, além de explorar os
limites da imagem que vão além da representação no romance de Sérgio Sant’Anna. Ademais, o
narrador-personagem também será objeto de análise, pois ele que conduz, por meio do seu olhar, o
leitor à pintura de Inês. Desse modo, à vista do exposto, propõe-se a discutir a presença do visual no
romance, a relação entre o lisível e o visível, e a descrição pictural com base nos estudos de Liliane
Louvel (2012), bem como pensar a imagem (a pintura de Inês) e seu espectador (Antônio Martins) a
partir da relação dialética entre o que vemos e o que nos olha, pressupostos estabelecidos por Didi-
Huberman (1998).
Referências: DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. Trad. Paulo Neves. São Paulo:
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da UFMG, 2006. SANT'ANNA, Sérgio. Um crime delicado. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
497
e imagem articulam-se aos não-ditos da História, ora pelos impactos subjetivos do desaparecimento
político, ora pela impossibilidade de narrar a violência. Diante desse quadro, este trabalho propõe
uma análise intersemiótica de "Noite dentro da noite – uma autobiografia" (2017), de Joca Reiners
Terron, problematizando como as fotografias que abrem os capítulos do romance atuam na
estruturação de uma narrativa descentrada e fragmentária. A perspectiva de uma literatura
expandida (LUDMER, 2007; 2009) norteará a reflexão sobre um objeto posto na fronteira entre o
literário, o histórico e o autobiográfico, conduzindo à hipótese de que a inespecificidade
(GARRAMUÑO, 2014) liga-se aos borrões da História. Assim, a impossibilidade de fala do personagem
e as fotografias que mesclam realidade e grotesco colocam a Ditadura Militar, no romance, sob o
signo do que não pode ser dito – seja porque foi apagado, seja porque sua lembrança é insuportável.
* A expressão que abre o título pertence a Márcio Seligmann-Silva (2014, p.14).
Referências: GARRAMUÑO, Florencia. Frutos estranhos: sobre a inespecificidade na estética
contemporânea. Trad. Carlos Nougué. Rio de Janeiro: Rocco, 2014. LUDMER, Josefina. Literaturas
pós-autônomas. Ciberletras. n. 17, p. 1-6, jul. 2007. LUDMER, Josefina. Literaturas pós-autônomas
2.0. Revista Z-Cultural. n. 1, n.p., jul. 2009. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Imagens precárias: inscrições
tênues de violência ditatorial no Brasil. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea. n.43, p.13-
34, jan./jun.2014.
498
em geral, e discute como essa escrita é elaborada na série de Baniwa, entre outras experiências
artísticas que se interessam especialmente pela história do Brasil. Referindo-me a trabalhos em que
Denilson Baniwa e Jaider Esbell retomam a imagem múltipla de Makunaimî/Macunaíma, procuro
situá-los no que denomino paradigma anarquívico, que se configura em diferentes abordagens
críticas do arquivo colonial-moderno, as quais buscam perturbar sua ordem, questionar seus
sentidos sedimentados e desintegrar suas formas, para tornar possível o reconhecimento, a
imaginação e a fabulação de histórias silenciadas, rasuradas ou excluídas da possibilidade de
arquivamento. Diferenciando-o do que Carlo Ginzburg denomina paradigma indiciário, entendido
como “uma constelação de disciplinas centrada na decifração de signos de vários tipos, dos sintomas
às escritas”, argumento que no paradigma anarquívico está em jogo uma nebulosa de saberes
indisciplinares, que se constituem no e com o risco de interrogar rastros que restam como cinzas –
no que Édouard Glissant denomina “visão profética do passado” ou Saidiya Hartman chama de
“fabulação crítica”. Por meio de uma anarqueologia do sensível, considero alguns dos modos como
as experiências de reantropofagia ou antropofagia reversa, que estão em jogo em mobilizações
anarquívicas de Makunaimî/Macunaíma, retomam a herança do modernismo em parte de seus
gestos e processos poéticos, ao mesmo tempo em que são atravessadas por – e se abrem para –
potências cosmopoéticas que perturbam aquela herança e insinuam outros sentidos de mundo
comum.
Referências: ANDRADE, M. DE. Macunaíma: o herói sem nenhum caráter. São Paulo, SP: Ubu Editora,
2017. BANIWA, D.; OLIVEIRA, E. J. DE. Denilson Baniwa: Desmontagens da paisagem colonial. Língua-
lugar : Literatura, História, Estudos Culturais, n. 5, p. 176–191, 11 nov. 2022. DERRIDA, J. Cinders.
Tradução: Ned Lukacher. Lincoln & London: University of Nebraska Press, 1992. DERRIDA, J. La
difunta ceniza = Feu la cendre. Tradução: Daniel Alvaro; Tradução: Cristina De Peretti. Buenos Aires:
Ediciones La Cebra, 2009. DORRICO, J. A fortuna crítica (da exclusão): Makunaimî na literatura
indígena contemporânea. Revista do Centro de Pesquisa e Formação, v. 14, p. 112–131, jul. 2022.
ESBELL, J. Makunaima, o meu avô em mim! ILUMINURAS, v. 19, n. 46, 22 dez. 2018. FRADE, I.;
GUIMARÃES, A. Arte indígena cosmopolítica: na antropofagia reversa de Jaider Esbell. Revista Farol,
v. 17, n. 25, 2021. GINZBURG, C. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. Em: Mitos, emblemas,
sinais: morfologia e história. Tradução: Federico Carotti. São Paulo: Companhia Das Letras, 1991. p.
143–179. GLISSANT, É. Introdução a uma poética da diversidade. Tradução: Enilce do Carmo
Albergaria Rocha. Juiz de Fora: UFJF, 2005. HARTMAN, S. Vênus em dois atos. Revista ECO-Pós, v. 23,
n. 3 (tradução: Fernanda Sousa e Marcelo R. S. Ribeiro), dez. 2020, p. 12–33. MARQUES, L. M.;
PIMENTEL, L. G. Um comentário sobre “Nada que é dourado permanece, hilo, amáka, terra preta de
índio”, de Denilson Baniwa. Ephemera - Revista do Programa em Pós Graduação da Universidade
Federal de Ouro Preto, v. 4, n. 8, p. 120–131, 31 out. 2021. MEDEIROS, A. C. M. DE; FILHO, J. V. DA
S.; GOMES, L. A. P. Makunaimã no palco da literatura indígena contemporânea: autoria coletiva e
resistência política 90 anos depois de Macunaíma. ITINERÁRIOS – Revista de Literatura, n. 52, 28 out.
2021. MIBIELLI, R.; CAMPOS, S. P. P.; JOBIM, J. L. Jaider esbell, Makunaima/Macunaíma e a
arte/literatura indígena. Revista Brasileira de Literatura Comparada, v. 21, n. 38, p. 33–40, 17 dez.
2019. STERZI, E. Saudades do mundo: notícias da antropofagia. São Paulo: Todavia, 2022.
TAUREPANG et al. Makunaímã: o mito através do tempo. São Paulo: Editora Elefante, 2019.
499
em pensar a produção de obras contemporâneas marcadas fortemente pela apropriação e inclusão
de documentos, fotografias, manipulações tipográficas, o que tem sido chamado por elas como
“inespecífico” e “literatura fora de si”, respectivamente, contribuirá para analisarmos o processo de
construção da arquitetura narrativa do romance em questão. Em síntese, espera-se mostrar como,
a partir do jogo entre palavra e imagem, o romance opera entre dois regimes representacionais
distintos: o caráter simbólico da narrativa e o elemento sintomático das fotografias.
Referências: BRIZUELA, Natalia. Depois da fotografia: uma literatura fora de si. Rio de Janeiro: Rocco,
2014 DIDI-HUBERMAN, Georges. Imagens apesar de tudo. Trad. Vanessa Brito e João Pedro Cachopo.
São Paulo: Editora 34, 2020. DIDI-HUBERMAN, Georges. Remontagens do tempo sofrido: O olho da
história II. Trad. Márcia Arbex e Vera Casa Nova. Belo Horizonte: UFMG, 2018. GARRAMUÑO,
Florencia. Frutos estranhos: sobre a inespecificidade na estética contemporânea. Rio de Janeiro:
Rocco, 2014. HERINGER, Victor. O amor dos homens avulsos. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
500
A ALMA DA SAMBISTA: RESISTÊNCIA E ANCESTRALIDADE NAS CANÇÕES DE DONA IVONE LARA
Ana Laura Furtado Pacheco
Resumo: Este trabalho analisa canções de autoria de Dona Ivone Lara, “A Primeira-Dama do Samba”
(NOBILE, 2015). Reconhece-se que o cancioneiro brasileiro é, majoritariamente, masculino e
reprodutor da dicotomia homem x mulher, presente nas estruturas da sociedade constituída sobre
bases morais e conservadoras, cujas perspectivas segregacionistas opõem masculino x feminino,
casa x rua, liberdade x recato, além de estabelecerem papéis e regularem o indivíduo (BUTLER, 2017).
Enquanto o homem tem acesso à rua, ao trabalho e à liberdade, para a mulher, geralmente, é
delegado o recato, a casa, a dependência do homem – o provedor da família (BOURDIEU, 2010).
Porém, a mulher negra sempre foi sujeito do trabalho. Na época da escravidão, foi extraída de seu
lugar de origem, trabalhou de forma equivalente ao homem e sofreu violências corporal e sexual
(DAVIS, 2016). Segundo Werneck (2009), ser mulher negra é o resultado de heterogeneidades que
se articulam para enfrentar as condições adversas impostas pela dominação ocidental sexista e
racista. Gonzalez (1988) ressalta que a história da mulher negra é de resistências e lutas. Antes de se
tornar sambista, Ivone foi funcionária pública da área da saúde e arrimo de família. Ainda criança,
foi iniciada no jongo e Candomblé e destacou-se no Canto Orfeônico (BURNS, 2009). A pluralidade
de identificações dos sujeitos de Dona Ivone Lara: mulher negra, de origem humilde, trabalhadora,
sambista pioneira é o que levou à sua escolha como objeto de estudo. Enfim, essa pesquisa
apresenta, através da análise das canções “Alguém me avisou”, “Andei para Curimá” e “Ela é rainha”
a imagem que a compositora faz de si e apresenta em seus sambas, além de revelar como ela enxerga
o gênero musical que integra e suas estratégias para adentrar e desbravar um universo
predominantemente masculino, de forma a abrir caminho para as futuras gerações de sambistas.
Referências: ANDRADE, Mário de. Macunaíma, o herói sem nenhum caráter. São Paulo: Penguin
Classics Companhia das Letras, 2016. BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2010. BURNS, Mila. Nasci para sonhar e cantar - Dona Ivone Lara: a mulher no samba.
Rio de Janeiro: Editora Recorde, 2009. BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão
da identidade. 15. ed. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017. DAVIS, Angela.
Mulheres, raça e classe. Tradução Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo, 2016. FENERICK, José
Adriano. Nem do morro nem da cidade: as transformações do samba e a indústria cultural (1920-
1945). São Paulo: Annablume, Fapesp, 2005. GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo
afrolatinoamericano. Revista Isis Internacional, Santiago, v.9 p.133-141, 1988. HAN, Byung-Chul.
Sociedade do cansaço. Tradução de Enio Paulo Giachini. Petrópolis: Vozes, 2017. hooks, bell. Olhares
negros: raça e representação. Tradução de Stephanie Borges. São Paulo: Elefante, 2019. NETO, Lira.
Uma história do samba: volume I (As origens). São Paulo: Companhia das Letras, 2017. NOBILE, Lucas.
Dona Ivone Lara: A Primeira-Dama do Samba. Rio de Janeiro: Sonora Editora, 2015. PASTORAS da
Portela/ Batuque na cozinha. Direção: Anna Azevedo. Produção: Hi Brazil Filmes e Anna Azevedo.
Roteiro: Alexandre Medeiros e Anna Azevedo. 2004 (18 min. 18 seg.). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=2HJCRsBqgNU. Acesso em: 30 mai. 2019. PINHEIRO, Lisandra
Barbosa Macedo. Do canto popular ao “ponto cantado”: canção popular e musicalidade afro-
religiosa. Mouseion, Canoas, n. 30, p. 85-104, 2018. RIBEIRO, Djamila. Quem tem medo do feminismo
negro? São Paulo: Companhia das Letras, 2018. SANDRONI, Carlos. Feitiço Decente – Transformações
do samba no Rio de Janeiro (1917 – 1933). 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2012. SANTANNA, Marilda,
organização. As bambas do samba: mulher e poder na roda. Salvador: EDUFBA, 2016. SODRÉ, Muniz.
Samba, o dono do corpo. 2. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 1998. TATIT, Luiz. Estimar Canções:
Estimativas Íntimas na Formação do Sentido. Cotia: Ateliê Editorial, 2016. WERNECK, Jurema. Nossos
passos vêm de longe! Movimentos de mulheres negras e estratégias políticas contra o sexismo e o
racismo. In: VERSCHUUR, Christine (Dir.). Vents d'Est, vents d'Ouest: Mouvements de femmes et
féminismes anticoloniaux. Genéve: Graduate Institute Publications, 2009. WISNIK, José Miguel.
Machado Maxixe: o caso Pestana. Teresa revista de Literatura Brasileira, São Paulo, v. 15, n. 4, p. 13-
79, 2004. ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. Tradução: Jerusa Pires Ferreira e Suely
Fenerich. São Paulo: Ubu Editora, 2018.
501
EXPRESSÕES QUEER NA CANÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: UMA LEITURA DE “ZERO”, DE
LINIKER
Ana Luiza Martins e Rafael Eisinger Guimarães
Resumo: O presente trabalho propõe uma associação entre canção brasileira e estudos queer e
consiste num recorte da tese de doutorado intitulada Elementos queer na canção brasileira
contemporânea. A canção popular é entendida como um conjunto de expressões artísticas que, para
além do entretenimento, desenvolveu-se como uma das mais importantes representações da
brasilidade e, portanto, imbrica-se nos processos culturais e sociais contemporâneos. Nesse
contexto, os estudos da canção consolidaram-se como um campo teórico interdisciplinar consistente
no Brasil, especialmente em função das reflexões de estudiosos como Charles Perrone (1988) , José
Miguel Wisnik (2004), Luiz Tatit (1986; 2002), Elizabeth Travassos (2000) e Santuza Cambraia Naves
, (2004; 2010) cujos trabalhos sustentam a análise aqui proposta. Ao ter engendrado um espaço
simbólico de questionamento e subversão, a canção popular tornou-se terreno fértil também para
manifestações que se contrapõem aos padrões de gênero forjados na sociedade patriarcal
heteronormativa. Transcorridas modificações intensas no que tange aos meios tecnológicos de
criação, registro e transmissão de mídias artísticas, despontaram no país novos cancionistas, com
posturas igualmente transgressoras, que podem ser caracterizadas como expressões queer. O termo
denota o que é estranho, desviante do padrão, e abarca uma tendência política e teórica que busca
questionar os parâmetros e matrizes determinantes do gênero e da identidade. Essa perspectiva é
difundida por teóricas e teóricos como Teresa de Lauretis (1994), Judith Butler (2018), Paul Preciado
(2011; 2018), Guacira Lopes Louro (2018) e Larissa Pelúcio (2009), que embasam esse estudo. A partir
dessas considerações, propomos a leitura da canção “Zero ”, da cancionista Liniker, lançada no EP
Cru (2015), em sua modalidade audiovisual, publicada no mesmo ano em seu canal do YouTube,
cujos elementos estéticos realizam uma perspectiva queer. A leitura considera a canção como
expressão artística híbrida, constituída por elementos verbais, sonoros e visuais que engendram os
significados da obra.
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. LAURETIS, Teresa De. A tecnologia do gênero. Tradução de
Suzana Funck. In: HOLLANDA, Heloisa (Org.). Tendências e impasses: o feminismo como crítica da
cultura. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. p. 206-242. LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho: ensaios
sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. NAVES, Santuza Cambraia.
Canção popular no Brasil: a canção crítica. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2010. NAVES, Santuza
Cambraia. Da Bossa Nova à Tropicália. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. PELÚCIO, L. Traduções e
torções ou o que se quer dizer quando dizemos queer no Brasil?. Revista Periódicus, [S. l.], v. 1, n. 1,
p. 68–91, 2014. DOI: 10.9771/peri.v1i1.10150. Disponível em:
https://periodicos.ufba.br/index.php/revistaperiodicus/article/view/10150. Acesso em: 11 jan.
2023. PERRONE, Charles A. Letras e letras da música popular brasileira. Tradução de José Luiz Paulo
Machado. Rio de Janeiro: Elo, 1988. PRECIADO, Beatriz. Multidões queer: notas para uma política
dos "anormais". Revista Estudos Feministas [online]. 2011, v. 19, n. 1 [Acessado 11 Janeiro 2023], pp.
11-20. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0104-026X2011000100002>. Epub 18 Maio 2011.
ISSN 1806-9584. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2011000100002. TATIT, Luiz. A canção:
eficácia e encanto. 2. ed. São Paulo: Atual, 1986. _________. O cancionista: composição de canções
no Brasil. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2002. TRAVASSOS, Elisabeth. Modernismo e música brasileira. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. TRAVASSOS, Elizabeth; MEDEIROS, Fernanda Teixeira de (Orgs.).
Palavra Cantada: ensaios sobre poesia, música e voz, Rio de Janeiro, p. 307-315, 2008. WISNIK, José
Miguel. A gaia ciência. In: WISNIK, José Miguel. Sem receita: ensaios e canções. São Paulo: Publifolha,
2004.
“TOMA ESTA CANÇÃO COMO UM BEIJO”: CAETANO VELOSO CANTA PARA ANA CRISTINA CESAR
André Luis Valadares de Aquino
Resumo: No ensaio Pensamentos sublimes sobre o ato de traduzir, de Ana Cristina Cesar, é Caetano
Veloso quem está em cena, no Cinema Transcendental, no disco, também lançado em 1980, e na
502
tela, em que a poeta o vê, “Caetano no cinema cantando uma elegia de John Donne. / Eu de frente
para a tela, no escuro não faz sol. / [...].” (CESAR, 2016, p. 266). Trata-se de um ensaio de intenso
trabalho de citação e de colagem sonora, como um ensaio-toca-disco que executa as canções do
“cinema” de Caetano na tela da página. No ensaio, Ana Cristina Cesar valoriza a figura de Caetano
como “cantor”. A figura complexa do “cantor”, no caso de Caetano, que Ana Cristina Cesar mobiliza,
tem o sentido forte da ideia do intérprete, por isso do tradutor e do poeta. Nesse ensaio, interessa
menos à Ana Cristina Cesar o poema de John Donne, a tradução de Augusto de Campos e a melodia
de Péricles Cavalcanti, do que a interpretação de Caetano, porque esta concretiza justamente uma
poética do endereçamento, uma paixão, a tradução como tarefa do corpo. O ensaio de Ana Cristina
Cesar é uma encenação da resposta ao disco de Caetano, um ato de interlocução e uma transa, a
partir de diferentes aspectos da obra do artista baiano. Esta comunicação discute o ensaio de Ana
Cristina Cesar em que Caetano é um caso exemplar da questão do poema. A questão do poema é a
questão da recepção do poema, a quem se dirige o poema, ou seja, a questão do endereçamento
poético. Podemos dizer que Caetano é para Ana Cristina Cesar “um compositor de destinos”, um
intérprete, em sentido amplo –, para quem a poesia, isto é, a “biografia”, põe em questão “a que [ou
a quem] será que se destina?”.
Referências: CAMPOS, Augusto de. Balanço da bossa e outras bossas. São Paulo: Perspectiva, 2015.
(Coleção Debates, 3). ---. Verso, Reverso, Controverso. São Paulo: Perspectiva, 1979. CESAR, Ana
Cristina. Correspondência Incompleta. Rio de Janeiro: Aeroplano, Instituto Moreira Sales, 1999. ---.
Crítica e Tradução. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. ---. Poética. São Paulo: Companhia das
Letras, 2013. DERRIDA, Jacques. Che cos’èla poesia? Inimigo Rumor, n. 10. Trad. Marcos Siscar &
Tatiana Rios, 2001. DUARTE, Pedro (Org.). Caetano Veloso 80 anos: ensaios. Rio de Janeiro: Bazar do
Tempo, 2022. FALEIROS, Álvaro; ZULAR, Roberto; BOSI, Viviana (Org.). Sereia de papel: visões de Ana
Cristina Cesar. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2015. FERRAZ, Eucanaã. Nota. In: Letras. Org. Eucanaã Ferraz.
São Paulo: Companhia das Letras, 2022. MALUFE, Annita Costa. Estratégias para uma escrita do
segredo. In: Sereia de papel: visões de Ana Cristina Cesar. Org. Álvaro Faleiros, Roberto Zular, Viviana
Bosi. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2015. RIAUDEL, Michel. Les “sublimes” traductions d’Ana Cristina Cesar.
In: Revista da Anpoll, 1 (16). Disponível em: https://doi.org/10.18309/anp.v1i16.558. 2004. ROCHA,
Glauber. Revolução do cinema novo. São Paulo: Cosac Naify, 2004. SISCAR, Marcos. Ana C. aos pés
da letra. In: De volta ao fim: o ‘fim das vanguardas’ como questão da poesia contemporânea. Rio de
Janeiro: 7Letras, 2016. VELOSO, Caetano. Alegria Alegria: Uma Caetanave organizada por Waly
Salomão. Rio de Janeiro: Pedra Q Ronca e Produções Artísticas, 1977. ---. Cinema Transcendental.
Polygram, 1979. LP. ---. Letras. Org. Eucanaã Ferraz. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. ---. Livro.
Polygram, 1997. LP. ---. Verdade Tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. WISNIK, José
Miguel. Oração ao tempo. In: Caetano Veloso 80 anos: ensaios. Org. Pedro Duarte. Rio de Janeiro:
Bazar do Tempo, 2022.
503
pensar a representação dos favelados na arte, aproximando o “Favelário” de Drummond do Funk de
Favela do Baile da Selva, para pensar como ambos, lado a lado, podem tecer uma memória dessa
cidade, atravessada por uma política que extermina os subalternizados, apaga suas memórias e
destrói seus espaços. Além de pensar nas mudanças e na forma como a Necropolítica se reconfigura,
pretendo observar como essa representação passa de um paradigma individual e distante –
Drummond – para um paradigma coletivo, visto que as produções que compõe uma espécie de
“cancioneiro” do Baile da Selva são de vários Dj’s e vários Mc’s.
Referências: ANDRADE, Carlos Drummond. Corpo. São Paulo: Companhia das Letras, 2015
CARVALHO, Bruno. Cidade Porosa: dois séculos de história cultural do Rio de Janeiro. Tradução de
Daniel Estill. Rio de Janeiro: Objetiva, 2019. GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida
cotidiana. Tradução de Maria Célia Santos Raposo. Petrópolis: editora vozes, 2001. MBEMBE, Achille.
Crítica da Razão Negra. Traduzido por Sebastião Nascimento. São Paulo: n-1 edições, 2018. ______.
Necropolítica: Biopoder, soberania, estado de exceção, política de morte. Traduzido por Renata
Santini. São Paulo : n-1 edições, 2018. PONCIONI, Cláudia. Drummond, o “Favelário” e o Patrimônio.
Navegações v. 2, n. 1, p. 17-23, jan./jun. 2009 SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o Subalterno Falar?
Tradução de Sandra Regina Goulart Almeida, Marcos Pereira Feitosa, André Pereira Feitosa. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010. WISNIK, José Miguel. Sem Receita. São Paulo: Publifolha, 2004.
______. O som e o sentido: uma outra história das músicas. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
504
“VOCÊ SE SENTIA UM TOLO COMPLETO SEM SABER A LETRA”: A MÚSICA E O SENTIMENTO DE
COMUNIDADE EM A SCOTS QUAIR, DE LEWIS GRASSIC GIBBON
Carolina de Pinho Santoro Lopes
Resumo: A música pode contribuir para a formação da identidade e da sensação de pertencimento
a determinado grupo. As diversas referências a canções em A Scots Quair, de Lewis Grassic Gibbon
(1901-1935), representam esse processo de construção identitária por meio de performances
musicais. A obra em análise é uma trilogia composta pelos romances Sunset Song (1932), Cloud Howe
(1933) e Grey Granite (1934). A narrativa se passa nas primeiras décadas do século XX, entre 1911 e
os anos 1930, no nordeste da Escócia, região natal do escritor. Cada volume de A Scots Quair tem
como cenário um local ficcional, respectivamente: o vilarejo de Kinraddie, a pequena cidade de
Segget e a metrópole de Duncairn. Com isso, a trilogia acompanha a transição de um ambiente rural
para uma área urbana e industrializada. Essa modificação espacial está ligada a uma transformação
nos modelos de comunidade e na relação dos personagens com a tradição musical. Enquanto a
tradição musical escocesa é parte importante das celebrações comunitárias em Sunset Song, essas
canções têm um papel de menos destaque no último romance. Em Grey Granite, no entanto, é
possível perceber a formação de um novo repertório compartilhado, com um aspecto mais
internacional, constituído por canções políticas de esquerda. As referências a essas músicas também
sinalizam o progressivo envolvimento do jovem Ewan, um dos personagens centrais, com a política.
Referências: GIBBON, Lewis Grassic. A Scots Quair. Edinburgh: Polygon, 2006.
505
Enio Bernardes De Andrade
Resumo: Esta comunicação tem como objeto a canção “Você-você”, lançada por Caetano Veloso em
seu álbum mais recente, Meu Coco (2021), com participação da cantora portuguesa Carminho. A
partir da análise da obra, propõe-se uma discussão sobre a autoafirmação da língua portuguesa
falada no Brasil por meio da poética vocalizada das canções gravadas. Tal reflexão envolverá o mote
para a composição da faixa, criada diante do fato de a cantora Carminho retirar a expressão “você”
das letras de canções brasileiras por ela cantadas; a análise da construção poética em versos fixos e
sua relação com as poesias escrita e cantada, brasileira e portuguesa; os procedimentos musicais e
entoativos da composição, bem como a performance vocal dos intérpretes; e os intertextos e
citações nominais, evocando encontros e distanciamentos entre Brasil e Portugal. A incorporação,
na letra, do verso “o orvalho vem caindo”, de Noel Rosa, será discutida como procedimento
metonímico representativo da lírica cancional edificada no Brasil a partir da década de 1930, a qual
é reverenciada como marca da força poética da canção no Brasil ao ser entoada na performance
vocal de Caminho, sucedida do verso: “não podes negar que é lindo”. Assim, a perspectiva de
percurso da língua é invertida: o afastamento (que pressupõe um encontro anterior, no qual a língua
portuguesa chegou ao Brasil) é convertido em encontro de vozes, sob a força da cultura brasileira,
cuja marca é a lírica cancional sintetizada no verso de Noel. Como referencial teórico, serão utilizadas
reflexões do próprio Veloso em Verdade Tropical (1997), estudos sobre a canção e Caetano Veloso
em autores como Luiz Tatit (1996, 2008) e José Miguel Wisnik (2004); e sobre a voz, em Adriana
Cavarero (2011) e Paul Zumthor (2010).
Referências: CAVARERO, Adriana. Vozes plurais: filosofia da expressão vocal. Tradução de Flavio
Terrigno Barbeitas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. TATIT, Luiz. O século da canção. 2. ed. São
Paulo: Ateliê Editorial, 2008. ______. O cancionista: composição de canções no Brasil. São Paulo:
Edusp, 1996. VELOSO, Caetano. Verdade tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. WISNIK,
José Miguel. Sem receita: ensaios e canções. São Paulo: Publifolha, 2004. ZUMTHOR, Paul.
Introdução à poesia oral. Trad. Jerusa Pires Ferreira, Maria Lúcia Diniz Pochat, Maria Inês de Almeida.
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.
A QUEDA DA CASA DE USHER: A PAISAGEM SONORA GÓTICA NO CONTO DE EDGAR ALLAN POE
Gérson Luís Werlang
Resumo: O surgimento do romance gótico em meados do século XVIII provocou uma pequena
revolução literária, não reconhecida imediatamente pela crítica, mas que traria inumeráveis frutos
nos dois séculos e meio seguintes. A publicação do seminal O Castelo de Otranto, de Horace Walpole,
provocaria e desequilibraria a balança literária do período, mexendo com a imaginação do público e
de escritores que seguiriam a tradição do gênero. A maquinaria gótica incluía, a princípio, castelos
medievais, torres fantasmagóricas, fantasmas reais ou imaginados, e toda uma figuração que seria
seguida e transformada posteriormente. Suas bases foram lançadas por Walpole em 1764,
paulatinamente ampliadas nas últimas décadas do século XVIII por autores como Clara Reeve (1729-
1807), autora de duas obras determinantes, The Old English Baron, publicada em 1777, e Tales of
Other Times, em 1783, seguida de perto por Vathek, de William Beckford, em 1786. Note-se a
proeminência de escritoras depois do primeiro esforço de Walpole e da contribuição quase isolada
de Beckford. Com a aderência feminina à narrativa gótica, diversas escritoras se apropriariam do
gênero e fariam suas contribuições, notadamente Ann Radcliffe, Mary Shelley e mesmo Jane Austen,
com sua paródia gótica, A abadia de Northanger. Esses primeiros desenvolvimentos do gênero
seriam posteriormente ampliados e modificados no decorrer do século XIX. Este trabalho propõe-se
a fazer uma análise de num conto fundamental para o desenvolvimento da narrativa gótica, A Queda
da Casa de Usher, de Edgar Allan Poe (1809-1849), tendo em vista um aspecto muitas vezes
negligenciado: o som, partindo-se do conceito de paisagem sonora como concebido pelo músico e
compositor canadense R. Murray Schafer (1933-2021). Assim como o aspecto visual incluía
elementos peculiares, também os aspectos sonoros possuíam características bem definidas,
posteriormente imitadas, modificadas e ampliadas de acordo com a gênese de cada obra.
506
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PELÉ E CAETANO: O COMUM DESSA GENTE QUE NÃO TRAI A FORÇA QUE MORA NO CORAÇÃO
Leonardo Davino de Oliveira
Resumo: Ora "gente, espelho de estrelas, reflexo do esplendor", ora "no coração da mata, gente
quer prosseguir / quer durar, quer crescer, gente quer luzir" canta Caetano Veloso em "Gente"
(1977). Ligada à partilha cotidiana da existência, gente é comum, povo não. O comum é aquilo que
508
une o próprio ao oposto. Daí porque o termo "gente" interessa mais ao cancioneiro de Caetano
Veloso do que "povo", termo corrompido na história das práticas políticas de nossa nação, outro
conceito supostamente aglutinador, mas que tende a ser usado para excluir, apagar, silenciar o
oposto. A obra de Caetano Veloso tem instaurado no centro do debate público aquilo que durante
um bom tempo esteve às margens: a gente brasileira. "Não, meu nego, não traia nunca essa força,
não / essa força que mora em seu coração", canta na mesma canção. Esse trabalho pretende passar
em revista esses termos e conceitos, tomando como mote a figura do jogador de futebol Pelé (1940-
2022). Pelé é cantado por Caetano em pelo menos três canções: "Two naira fifty kobo", de 1977,
("No meu coração da mata gritou Pelé, Pelé / faz força com o pé na África"); "Love, love love", de
1978, ("A visão que comove / Pelé disse love, love, love"); e "Os meninos dançam", de 1979, ("A
história do samba, a luta de classes, os melhores passes de Pelé / tudo é filtrado ali"). As três do final
da década de 1970. Nas três, o jeito de corpo que representa nossa gente e lançou mundos no
mundo, o absurdo - por que radicalmente novo e nosso, brasileiro, e à margem da imagem
institucionalizada pela ditadura militar da época - modo de ser, de estar, de existir, um modo
engendrado e defendido pela canção brasileira, notadamente a tropicalista, a partir da segunda
metade do século XX.
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ENTRE A LITERATURA DE KENNETH GRAHAME E OS ÁLBUNS MUSICAIS DE PINK FLOYD: A TEORIA
DA ADAPTAÇÃO DE LINDA HUTCHEON
Marilei Golfe Milan
Resumo: Este estudo objetiva a interface entre Literatura e Música. Baseado na obra “O vento nos
Salgueiros”, do autor inglês Kenneth Grahame, a banda de rock Pink Floyd produziu o álbum “The
Piper At The Gates Of Down” e o reflexo desse, principalmente na composição da banda, produziu
outros dois álbuns “The Dark Side Of The Moon” e “Wish You Were Here”. Para isso a Teoria da
Adaptação de Linda Hutcheon (2013) oferece o amparo teórico. “O vento nos salgueiros” é um dos
cativantes clássicos infantis, uma parábola elegante e charmosa da literatura inglesa, sobre a luta de
classes, amizade, cooperação e lealdade. A adaptação pressupõe a existência de um texto prévio,
mas esses textos não competem entre si, entre eles há uma relação, cada qual obedece sua
linguagem, seu formato, seus distintos recursos. A adaptação se constrói de forma nem inferior nem
superior ao original, mas se abre em possibilidades de outros textos e contextos, nesse estudo, de
literatura para música. O pensamento de Linda Hutcheon (2013) expressa que adaptar e fidelidade
não tem sentido sinônimo. Além disso a autora diz que a fidelidade não deve ser parâmetro de
julgamento ou da análise das adaptações do abras, refuta, ainda, a ideia de mera reprodução do
texto original, embora defenda que adaptar significa, com ajustes, alterações e possibilidades de
diversas produções. Os resultados elucidam que a adaptação da obra para a escrita de letras de
músicas suscitam a interface de transformação da linguagem literária, proporcionado e consolidando
reflexões, assim alcançando diversos públicos, entre esses, os leitores, os ouvintes de músicas de
rock e os fãs da banda Pink Floyd.
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Companhia das Letras, 1993.
516
os românticos e entre os contemporâneos) merecem a mesma resposta: “Bach, sempre Bach”. Na
presente comunicação analisamos os argumentos centrais da palestra manniana e trechos do
romance, no intuito de mostrar que os aspectos da narrativa relacionados com a música remetem-
nos à teoria da formatividade de Luigi Pareyson (1966). Também somos remetidos ao mesmo filósofo
quando pomos em relação a forma das suítes de Bach com a forma rapsódica de Macunaíma. Em
ambas narrativas, a de Mann e a de Mário, podemos perceber o processo de construção estética que
torna uma “forma formada” em “forma formante”. No caso do romance, podemos perceber que, a
partir do quinto capítulo da narrativa, o narrador vale-se da metalinguagem para introduzir uma
mudança na estrutura material da narrativa, mais especificamente na correlação contrastiva entre a
extensão dos capítulos e a duração dos eventos relatados. No caso da rapsódia, por outro lado, pode-
se notar que o nono capítulo “Cartas pras Icamiabas” corresponde, por seu andamento paródico, sua
centralidade discursiva e material, à “sarabanda” da suíte, o que nos permite reler a obra segundo
os movimentos rítmicos anteriores e posteriores: o capítulo das cartas constitui uma suspensão do
tempo da ação, que, contraditoriamente, funde dois estilos, o parodiado, classicizante, e o da base
narrativa, supostamente inculto.
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519
Resumo: Este trabalho propõe-se a refletir a respeito de alguns importantes diálogos estabelecidos
entre Carlos Drummond de Andrade e a cultura popular, tomando como ponto central poemas e
crônicas que tratam de modo peculiar da música popular, como o samba, o congado, o batuque, o
carnaval. Elementos relativos à oralidade, a cantos, ritmos e performances ligadas a pessoas comuns
invadem a escrita do autor que as transfigura a seu modo. Nota-se, a busca de um encontro, um
diálogo, uma amizade – como pensa Jacques Derrida – com o outro e, ao mesmo tempo, percebe-se
uma clara consciência - do poeta - a respeito da distância existente entre classes, posições sociais,
raças, espaços, experiências. Em Drummond, sempre há um mundo partido. Entre os textos a serem
tratados, aparecem “Morro da babilônia”, “Tambor no escuro”, “Favelário nacional”, “Fala de Chico
Rei”, “Rosário dos homens pretos’”, “Canção de Itabira”, “As arcas e os baús”, crônica sobre Cartola,
texto sobre Aleijadinho, sobre Heitor dos Prazeres, etc. Aparecerão, no trabalho, alguns temas
ligados à escravidão presentes em Boitempo, mas a ênfase será na arte e sabedoria dos escravizados.
A análise almeja focar a potência inventiva da cultura afro-brasileira e a forma como o poeta de
Itabira ilumina aspectos fortes da própria história colonial e moderna brasileira por meio de seus
textos. Com este trabalho, que busca aprofundar investigações que vimos desenvolvendo nos
últimos anos, almejamos deixar mais evidentes laços existentes entre o projeto intelectual
modernista, com sua linguagem inovadora e a expressividade e a sabedoria popular. Talvez
possamos ver aí alguns ecos de conversas entre Mário de Andrade e Carlos Drummond. Os textos
drummondianos contribuem para evidenciar as dissonâncias econômico-sociais do país, marcar
contatos entre a escrita e a oralidade e trazer à tona relações entre o aspecto local e o cosmopolita
da cultura brasileira.
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literatura através do cinema: Realismo, magia e a arte da adaptação. Minas Gerais: UFMG, 2008.
521
cuidadosamente para construir não só a imagem como a sensação desse amor perene, cuja
separação dos corpos não é capaz de esmaecer. Busca-se, portanto, analisar a linguagem literária e
cinematográfica da diretora-escritora cuja narrativa do desejo dos personagens é construída através
da tessitura da memória e da rememoração de um passado em comum. Desse modo, pretende-se
refletir sobre a peculiar produção de Duras, que viaja pelos tempos da memória enquanto encanta
o espectador com todas as suas linguagens. .
Referências: AGATHA ou as leituras ilimitadas. Direção: Marguerite Duras. França. 1981 DURAS,
Marguerite. AGATHA. Paris: Les Editions De Minut, 1981 GASSET, José Ortega y. ESTUDOS SOBRE O
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O CARTEIRO BATE DUAS VEZES: AS ADAPTAÇÕES PARA O CINEMA DA OBRA “O DESTINO BATE À
SUA PORTA”, DE JAMES M. CAIN
Carlos Eduardo Japiassú De Queiroz
Resumo: Com a tentativa de relacionar as linguagens literária e cinematográfica, e a forma que se
relacionam no interior do gênero noir, este trabalho traça uma análise comparativa entre o romance
O destino bate à porta, de James M. Cain, e três das suas adaptações cinematográficas mais
conhecidas, sendo elas a italiana de 1943, intitulada Ossessione/Obsessão e dirigida por Luchino
522
Visconti, e as duas norte-americanas homônimas, lançadas em 1946 e 1981, dirigidas
respectivamente por Tay Garnett e Bob Rafelson. O romance é narrado em primeira pessoa e segue
um andarilho que chega a um estabelecimento de beira de estrada e se apaixona pela jovem esposa
do proprietário do local. Imersos em uma paixão visceral começam a tramar o assassinato do homem
e, após o objetivo atingido não encontram o fim esperado, em meio as desconfianças, segredos e o
peso da consciência, o que encontram é a redenção, possível apenas com a morte. Através da
comparação entre as obras foi possível perceber que o livro e suas adaptações se aproximam no que
se refere a ideia central do enredo, mas se distanciam no que se refere a linguagem, visto que a
forma de contar e de se relacionar com o espectador no cinema e na literatura ocorre de formas
distintas, cada linguagem faz uso de formas de expressão particulares, a palavra escrita, na literatura
e a linguagem audiovisual, no cinema; e ao contexto social, histórico e cultural no qual foram
produzidas, pois o mesmo enredo foi adequado de forma a revelar aspectos inerentes aos seus
contextos de criação, precisando se adaptar a parâmetros e modelos distintos.
Referências: BASSNET, Susan. Estudos da tradução: fundamentos de uma disciplina. Lisboa:
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Estudos Literários) - Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2014.
523
possíveis" questionando "a partilha policial do sensível e propondo uma redefinição das visibilidades
e legibilidades" (MARQUES, 2021); pensamos nos encontros interartes como uma cena,
acontecimento que redefine as fronteiras conceituais de definição de uma arte pela outra.
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CORTÁZAR
George Antônio Nogueira da Silva
Resumo: Este trabalho visa analisar o conto As babas do diabo (1959), de Julio Cortázar, pelo olhar
da influência imagética sobre a produção literária. Sendo um conto, em certo sentido, imbuído de
metalinguagem, usa-se, como proposta de análise, tanto textos específicos das artes visuais e da
Literatura, como também a reflexão que a obra de arte realiza sobre si mesma, fazendo um
movimento, ao mesmo tempo, teórico e artístico em sua expressão. O conto revela a influência da
imagem (midiaticamente representada na Fotografia e no Cinema) no modus operandi literário do
contexto de produção artístico em sua publicação – meados do século XX –, salientando a
proximidade entre as artes visuais e as letras (pós) modernas, que parecem tecer um movimento
contrário da influência da Literatura na sociedade: mais aberta a se deixar persuadir pelas artes
circunvizinhas, incorpora não somente no conteúdo, mas também no método, o domínio imagético.
Desta forma, a metalinguagem demonstra uma eficiente evidenciação de uma teoria estética capaz
de elucidar as propensões artístico-culturais. As manifestações da imbricação entre as artes, as
524
técnicas e nuances que geram os intercódigos fundamentais da produção estética são alguns pontos
discutidos no trabalho, que exibem a tendência contemporânea da inextricabilidade entre palavra e
imagem.
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Vagamundo (2018). A partir da revisão bibliográfica e cotejo com o filme, foi possível concluir que o
documentário dialoga, dentro das especificidades do gênero e da própria linguagem
cinematográfica, com o aspecto metaficcional da obra de Eduardo Galeano, ao evidenciar seu
procedimento construtivo, estabelecendo um diálogo interpoético entre o fazer literário de Galeano
e a montagem do filme, que se conceituam e definem a partir desse paradigma (meta)ficcional.
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de pensamento e criação, evidenciando, em seu expediente teórico-crítico-reflexivo, a preocupação
com a “mobilidade artificial crescente [...] dos veículos audiovisuais” e do “processo de automação
da percepção e de industrialização da visão provocada pelas novas tecnologias” (PARENTE, 1993, p.
18). O cinema atua, então, como dispositivo para pensar a própria poesia e o mundo, estabelecendo,
entre as duas artes, uma relação de outridade (PAZ, 1996), que se observa pelo compartilhamento
de ideias e pressupostos estéticos, de modo que o cinema figura, a um só tempo, como metáfora de
mundo – e da própria poesia – e também como método de criação: vê o mundo como quem vê um
filme, escreve o poema como quem faz um filme. Assim, a poeta transita pelo mundo e realiza sua
obra por meio de uma espécie de consciência cinematográfica que agencia esse duplo aspecto do
cinema para seus processos de criação e reflexão. Tem-se então uma poesia que coloca, na cena do
poema, o cinema, por meios muito diversos: pelo uso da écfrase; na menção à procedimentos
cinematográficos; na citação direta à diretores, filmes e pensadores do cinema. O que revela, por
fim, uma obra consonante aos hibridismos de uma arte inespecífica (GARRAMUÑO, 2014).
Referências: Referências bibliográficas FRIAS, Joana Matos. O corpo em câmera lenta caindo (depois
do filme fez um poema). In: A Escrita do Cinema?: Ensaios. [s.l.] : Documenta, 2015. p. 125–141.
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534
INFLUENCIADORES DA LEITURA NA INTERNET: CURADORIA E CONSTRUÇÃO DE “NOVOS”
MERCADOS LIVREIROS
Abinalio Ubiratan da Cruz Subrinho e Elizabeth Gonzaga de Lima
Resumo: Neste estudo, objetiva-se discutir e problematizar a atuação dos(as) digitais influencers do
produto livro e da leitura e os impactos decorrentes das ações desses(as) sujeitos(as) no universo
livreiro, sobretudo no que tange ao mercado e ao consumo de livros. Há anos as peças publicitárias
e o marketing orbitam entorno do livro, desde que esse produto, entre outras, graças a
reprodutibilidade técnica e a incipiente consolidação de públicos leitores, se tornou um bem de
consumo. A influência à aquisição de livros, nesta ou naquela mídia, mesmo que direcionada para
um público restrito, permeou (permeia) a cultura letrada: propagandas, comerciais, ações públicas
e privadas, sobretudo na Televisão e em mídias impressas, motivaram (motivam) o consumo desta
ou daquela obra, deste(a) ou daquele(a) autor(a). Logo, o que se observa de novo não é a publicidade
do livro, antes os novos atores, redes(mídias) nas quais esse chamariz ao livro e leitura vêm
ocorrendo. No presente artigo, debatemos um desses influenciadores, os BokTokers, sujeitos que,
dentro da plataforma TikTok, por intermédio das vídeos-resenhas, utilizam o seu capital, a influência,
para direcionar e transferir seguidores-usuários-consumidores para determinada obra e/ou
escritor(a), dinâmica que tem influído, diretivamente, no mercado do livro. Desse modo, para
consolidação desse estudo adotou-se métodos mistos, oriundos da pesquisa bibliográfica e
netnográfica, recorrendo a observação nas redes/perfis dos Influencers, e revisão bibliográfica
enquanto instrumento de construção de dados. O trabalho está ancorado nos estudos de mídia,
principalmente na vertente da sociologia da mídia, com os estudos de Barbero (1997), Thompson
(2013; 2019), Bersoza (2017) entre outros, também nos estudos de literatura me campo expandido
e literatura digital. Ao finalizar o estudo pode-se perceber que as ações dos digitais influencers
interviram no mercado tradicional do livro, sobretudo em sua divulgação, nas quais esses atores têm
se convertido, cada vez mais, em curadores de leituras.
Referências: AGUILAR, Y. Booktubers, el nuevo negocio de las editoriales. El Universal. set, 2014.
Disponível em: http://archivo.eluniversal.com.mx/cultura/2014/impreso/booktubers--75141.html .
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SHERLOCK HOLMES, O DETETIVE MULTIMÍDIA: DOS LIVROS AOS QUADRINHOS AOS FILMES E AOS
SERIADOS.
Alessandra Matias Querido
Resumo: Adaptações dos textos literários são constantes e, a medida em que temos mais meios para
adaptá-los, o estudo da literatura necessita abarcar outras mídias, pois cada vez mais entremeadas,
elas compõem “o sistema nervoso da humanidade”, como já afirmava Youngblood há 50 anos. O
autor nos alertava sobre a expansão sem retorno do cinema ou da Arte em geral e hoje é difícil
calcular o crescimento exponencial desta rede de mídias. Textos literários são adaptados para filmes,
séries, musicais, quadrinhos, jogos, pinturas, parques temáticos etc. A obra de Arthur Conan Doyle,
Sherlock Holmes, é um exemplo riquíssimo de como essas relações expandem a arte literária.
Adaptado para cinema, tv, seriados, musicais, jogos eletrônicos, peças de teatro e quadrinhos, desde
535
o lançamento da obra, em 1887, é tarefa quase impossível contabilizar o número de adaptações.
Neste simpósio, propomos a análise da adaptação da obra para o seriado da BBC, exibido entre 2010
e 2017, e estrelado pelos atores Benedict Cumberbatch e Martin Freeman. A adaptação foi sucesso
de público e crítica e atualizou o mítico detetive, trazendo-o para a nossa realidade intermídia, na
qual suas anotações e o diário de Watson, por exemplo, se tornam blogs na internet. Não bastasse a
atualização do contexto da narrativa, o seriado foi adaptado em seguida para quadrinhos em formato
mangá. Importante ressaltarmos que esta última adaptação foi feita a partir do seriado e não da obra
literária diretamente, o que nos faz perceber uma profunda conexão entre os recursos
cinematográficos e os quadrinhos, bem como as especificidades de cada mídia. Analisaremos o
episódio “O grande jogo” e a respectiva adaptação para mangá. Nosso objetivo é propor uma
discussão sobre este trânsito entre palavra/imagem em movimento/imagem estática e como ela nos
faz perceber a obra literária além dela mesma por meio de outras artes.
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o sumário da obra e organizar os contos conforme cada um dos movimentos da sinfonia. Ler os
contos considerando o ritmo previsto nesses movimentos adiciona outras camadas interpretativas à
experiência de leitura, cuja cadência e velocidade são constatadas pelo ritmo, pela extensão e pelo
impacto de cada um dos textos que integram a obra e que estão agrupados em quatro movimentos.
Numa proposta paródica e irônica, Stigger se apropria da “Ode à Alegria”, de Beethoven, para
representar o fim do mundo, como preconiza o último conto da coletânea, “O fim”, apropriando-se
da música para transgredi-la ao incluir nela, por meio de seus textos, notas de sombrio, ermo e turvo.
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https://www.premiopipa.com/pag/jaider-esbell/ . Acesso em: 21 de junho, 2022. PITTA, Danielle
Perin Rocha. Iniciação à teoria do imaginário de Gilbert Durand. 2.a Ed. Curitiba: CRV, 2017. ESBELL,
Jaider. Vamos ouvir as avós. Disponível em: http://www.jaideresbell.com.br/site/2020/04/11/abril-
indigena-2020-vamos-ouvir-as-avos/ . Acesso em: 12 de julho, 2022. WUNENBURGER, Jean-Jacques.
O imaginário. Tradução Maria Stela Gonçalves. Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2007.
540
literatura não deixou de ser afetada negativamente com a pandemia, mesmo que o isolamento possa
ter favorecido o consumo de livros, o hábito cultural de ler ficou longe dos percentuais de preferência
de outros hábitos entre os brasileiros durante a pandemia. A performance literária, ou o modo como
os corpos atuam na literatura, coloca-se como um ponto nevrálgico para a compreensão da projeção
social literária, de produção de sentido e identidades por meio do trânsito de textualidades, bem
como da inserção do ouvinte-leitor numa rede de afetos pelas circunstâncias de recepção da obra.
Autores “encenam” suas falas, pessoas se juntam para discutir suas leituras, a voz declama trechos
de livros, a poesia rende-se ao canto e a palavra ao enlevo do gesto. O impacto da pandemia da
Covid-19 nas atividades literárias deu-se, principalmente, pelo efeito suspensivo da performance
presencial e por ter sequestrado a conexão orgânica entre o autor e seu público. Como ficou
demonstrado pelos vários depoimentos de autores que aceitaram contribuir, respondendo ao
questionário do projeto: muitos escritores sofreram com a paralisação da vida cultural literária ou
passaram pelo processo de bloqueio criativo, em decorrência do isolamento.
Referências: EVEN-ZOHAR, Itamar. Polissystem Studies. In: Poetics Today. International Journal for
Theory and Analysis of Literature and Communication. vol.11, n.1, 1990. p.1-268. FERNANDES,
Frederico Garcia. Festivais literários, sistemas culturais e marketing territorial: um estudo de caso
italiano. Nonada: Letras em Revista, Porto Alegre, v. 2, n. 23, p. 20-33, 2014. Disponível em:
https://www.redalyc.org/pdf/5124/512451669006.pdf. MONTAGNANI, Maria Lillà; MORGANTI,
Ilaria; MUTI, Maria Chiara. The Phenomenon of Art Festivals: An empirical and legal analysis. In:
Quaderni ASK (Università Commerciale Luigi Bocconi). 2011. Disponível em:
https://www.ask.unibocconi.it/wps/allegatiCTP/2011-5%20Art%20Festivals.pdf. RODRIGUES,
Henrique. O livro na estrada: leitura, leitores e vida literária. Vitória: Cousa, 2022. SAFATLE, Vladimir.
O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. 2. ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2016. 360 p. WEBER, Millicent. Literary festivals and contemporary book culture. Springer,
2018. ZUMTHOR, Paul. Escritura e Nomadismo. Trad. Jerusa Pires Ferreira e Sonia Queiroz. Cotia:
Ateliê Editorial, 2005.
541
HUTCHEON, Linda. Uma teoria da adaptação. 1. ed. Florianópolis: Ed. UFSC, 2011. CANDIDO,
Antonio. Literatura e Sociedade. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1965.
542
Resumo: O presente estudo desenvolve uma análise intersemiótica e intermidiática da composição
buarquiana “Olhos nos olhos” (1976) a partir da recriação literária “Olhos nus: olhos”, do escritor
moçambicano Mia Couto no livro “Essa história está diferente: “Dez contos para canções de Chico
Buarque” (2010), sob organização de Ronaldo Bressane. O objetivo desta análise é traçar o caminho
da transmutação do olhar das personagens centrais, João Rosa e Clarice, em decorrência de seu
desenlace afetivo-amoroso, bem como estabelecer um paralelo entre a canção, texto de partida, e
a narrativa literária, texto de chegada, evidenciando os mecanismos utilizados pelo autor
moçambicano na elaboração da recriação literária. Nossa pesquisa de caráter exploratório-descritivo
debruçou-se sobre os postulados do semioticista russo Roman Jakobson em “Aspectos linguísticos
da Tradução” (1969), na conceituação acerca da tradução intersemiótica de Marcel Álvaro de
Amorim em “Da tradução intersemiótica à teoria da adaptação intercultural: estado de arte e
perspectivas futuras” (2013), e no percurso da transposição da obra musical para a mídia literária,
com base nos estudos de Leila Darin em “As múltiplas faces de um roteiro: o piano” (2015), Leyla
Perrone-Moysés em “Literatura Comparada: Intertexto e Antropofagia (1990), e Robert Stam em “A
literatura através do cinema: Realismo, Magia e a Arte da Adaptação” (2008), e “Teoria e prática da
adaptação: da fidelidade à intertextualidade” (2006).
Referências: AMORIM, Marcel Álvaro de. Da tradução intersemiótica à teoria da adaptação
intercultural: estado de arte e perspectivas futuras. Itinerários. Araraquara: UNESP, n. 36, jan/jun.
2013 BRESSANE, Ronaldo (org). Olhos nus: olhos. Essa história está diferente: Dez contos para
canções de Chico Buarque. São Paulo: Companhia das letras, 2010. DARIN, Leila. As múltiplas faces
de um roteiro: O piano. Tradução em Revista, 19, 2015. FARIA, ngela Beatriz de Carvalho. “A paixão
é um fio de chuva em vidro de janela: ‘Olhos nus: olhos’, de Mia Couto e ‘Olhos nos olhos’, de Chico
Buarque”. Mulemba, nº 3, UFRJ. Rio de Janeiro: 2010. Disponível em:
http://setorlitafrica.letras.ufrj.br/mulemba/artigo.php?art=artigo_3_4.php. Acesso em 22 de maio
de 2016. HOLLANDA, Chico Buarque. Meu caro amigo. 1976© Marola Edições Musicais. JAKOBSON,
Roman. Aspectos linguísticos da tradução. In: Linguística e Comunicação. Tradução de Izidoro
Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1969. PERRONE-MOYSÉS, Leyla. Literatura comparada.
Intertexto e Antropofagia. Flores da escrivaninha. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. STAM,
Robert. A literatura através do cinema: Realismo, Magia e a Arte da Adaptação. Tradução de Marie-
Anne Kremer. UFMG, 2008. STAM, Robert. Teoria e prática da adaptação: da fidelidade à
intertextualidade. Ilha do Desterro. Florianópolis, nº 51, p. 019-053, jul/dez. 2006.
543
inespecificidade tecidas por Garramuño (2014) e sobre a escultura em campo ampliado de Rosalind
Krauss (1984).
Referências: CAMPBELL, Brígida. Arte para uma cidade sensível. São Paulo: Invisíveis, 2015.
GARRAMUÑO, Florencia. Frutos estranhos. Sobre a inespecificidade na estética contemporânea. Rio
de Janeiro: Rocco, 2014. KIFFER, Ana; GARRAMUÑO, Florencia. Expansões contemporâneas.
Literatura e outras formas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014. KRAUSS, Rosalind. A escultura no
campo ampliado. Revista Gávea, Rio de Janeiro, v. 1, p.87-93, 1984. PIQUEIRA, Gustavo. Valfrido?.
São Paulo: Lote 42, 2016. VALFRIDO?. Homepage.
http://lote42.com.br/valfrido/index.html#objetos.
UM OLHAR COMPARADO EM CLARA, DE A CASA DOS ESPÍRITOS: UMA ANÁLISE ENTRE O LIVRO DE
ISABEL ALLENDE E O FILME HOMÔNIMO DE BILLE AUGUST
Laís Gerotto de Freitas Valentim
Resumo: Este trabalho tem por objetivo analisar a personagem Clara pelo viés de uma análise
comparativa entre o livro A casa dos espíritos (2017), de Isabel Allende, e o filme homônimo (1993)
produzido por Bille August. O insólito ficcional e o papel da mulher na sociedade são abordados ao
longo da produção literária e também da cinematográfica, pois estão presentes na protagonista
Clara, figura central da narrativa, e que são explorados também nessa pesquisa de caráter
exploratório-descritivo. Para tal estudo, além da obra de Isabel Allende e a produção de cinema
baseada nela, utilizamos como referências o capítulo 3 “Aspectos linguísticos da tradução” da obra
Linguística e comunicação (1969), de Roman Jakobson; Conceitos e práticas de Literatura Comparada
(2021), de Cristine Fickelscherer de Mattos e Helena Bonito Couto Pereira, bem como os artigos
“Tradução intersemiótica: do texto para a tela” (1998), de Thaís Flores Nogueira Diniz, e “Olhos
desnudos: Uma tradução intersemiótica da composição buarquiana Olhos nos Olhos” (2015), de
Janaína Santos Silva Soggia, além do artigo “Clara, a clarividente: o insólito ficcional na personagem”
(2021), de Laís Gerotto de Freitas Valentim. Teorias como a o realismo maravilhoso utilizada por
Irlemar Chiampi (1980) em O Realismo Maravilhoso: Forma e Ideologia no Romance
Hispanoamericano, assim como o capítulo de Teodosio Fernandez no compilado de David Roas em
Teorías de lo fantástico (2001) e “Lo Real Maravilloso americano: una propuesta de integración”
(1996), de Alicia Llarena auxiliaram na questão do entendimento do insólito ficcional da personagem.
Referências: ALLENDE, Isabel. A casa dos espíritos. Tradução de Carlos Martins Pereira. São Paulo:
Folha de S. Paulo, 2017. Coleção Folha Mulheres na Literatura. 464 p. CHIAMPI, Irlemar. O Realismo
Maravilhoso: Forma e Ideologia no Romance Hispanoamericano. São Paulo: Perspectiva, 1980
(Debates 160). DINIZ, Thaís Flores Nogueira. Tradução Intersemiótica: do texto para a tela. Cadernos
de Tradução, v. 1 n. 3 (1998): Edição regular. p. 313-338. Disponível em:
https://periodicos.ufsc.br/index.php/traducao/article/view/5390. Acesso em 21 dez. 2022.
FERNANDÉZ, Teodosio. O realismo maravilloso. In: ROAS, David. (Comp.). Teorías de lo fantástico.
Madrid: Arco Libros, 2001. p. 283-297. JAKOBSON, Roman. Aspectos linguísticos da tradução. In:
Linguística e Comunicação. Tradução de Izidoro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1969.
LLARENA GONZÁLEZ, Alicia. Lo Real Maravilloso americano: una propuesta de integración. Revista
Espejo de Paciencia, Las Palmas de Gran Canaria, vol. 1, p. 20-30, 1996. Disponível em:
http://www.aliciallarena.com/downloads/lorealmaravillosoamericano.unapropuestadeinteg.pdf.
Acesso em: 17 nov. 2020. MATTOS, Cristine Fickelscherer de. PEREIRA, Helena Bonito Couto.
Conceitos e práticas de literatura comparada. São Paulo: Editora Mackenzie, 2021. 180 p. Coleção
Conexão inicial. SOGGIA, Janaína Santos Silva. Revista Leitura V.2 nº 56, p. 88-102. jul/dez 2015–
Número regular. Disponível em:
https://www.seer.ufal.br/index.php/revistaleitura/article/view/2427/2034. Acesso em 21 dez.
2022. VALENTIM, Laís Gerotto de Freitas. Clara, a clarividente: o insólito ficcional na personagem.
Cadernos de Pós?Graduação em Letras, v. 21, n. 1, p. 85-97, jan./abr. 2021. Disponível em: doi:
10.5935/cadernosletras.v21n1p85-97. Acesso em 21 dez. 2022.
544
Leila Melo Coroa
Resumo: Em 1985, o desenhista argentino Antonio Lizárraga publica “Anatomia do gol”, livro de
artista editado por Massao Ohno e Marcelo Tápia. O livro de Lizárraga apresenta desenhos de
esquemas táticos do futebol, é prefaciado por um poema de Haroldo de Campos, cujo título é
homônimo ao de Lizárraga. O poema de Haroldo reaparece no mesmo ano em “A educação dos cinco
sentidos”, editado pela editora Brasiliense. No livro de Haroldo, o poema compõe uma série
intitulada “6 Metapinturas e 1Meta-retrato”, dedicada a diálogos com as artes plásticas. “Poema” e
“pintura” são as questões de “Anatomia do gol” de Haroldo de Campos, por isso são pensados a
partir da ideia de jogo: “jogar um/ jogo/ é como/ jogar o jogo/ da pintura ou/ do poema”. O sentido
de jogo aqui é de relação, de ir além, de atravessar campos, isto é, a mediação do vocábulo “como”
liga as diferentes materialidades e as diferentes práticas lúdicas. O campo literário funciona pela
sobreposição de muitos campos, é uma especificidade da literatura ocupar muitos campos, é um
campo aberto, como um campo de futebol popular. A poesia é um jogo da linguagem, o que importa
é o jogo, como o jogo se articula nos seus sentidos possíveis; e como a poesia faz pensar o próprio
jogo (o jogo da cultura, da sociedade, da política, da estética). O jogo coloca em ênfase o processo.
Esta comunicação analisa, portanto, a relação entre o poema de Haroldo e o desenho de Lizárraga
como uma forma de jogo, ou seja, como processo e interarte, em que o futebol é a figura que
expande os campos. O futebol é justamente o corpo híbrido da prosa e da poesia, da pintura e do
poema, da linguagem e da visualidade.
Referências: CAMPOS, Haroldo de. A educação dos cinco sentidos. São Paulo: Editora Brasiliense,
1985. FABRIS, Annateresa. Antonio Lizárraga: uma poética da radicalidade. Belo Horizonte: Editora
C/ Arte, 2000. HUIZINGA, Johan. Homo ludens: O jogo como elemento da cultura. Trad. João Paulo
Monteiro. Revisão e adaptação Newton Cunha. São Paulo: Editora Perspectiva, 2019. LIZÁRRAGA,
Antonio. Anatomia do gol. São Paulo: Editora Massao Ohno/ Timbra, 1985. MAMMÌ, Lorenzo. O que
resta: arte e crítica de arte. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2012. PIGNATARI, Décio.
Contracomunicação. Cotia/SP: Ateliê Editorial, 2004. WISNIK, José Miguel. Veneno Remédio: o
futebol e o Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
545
COHEN, Thiago et al. Pequena Coleção de Insignificâncias. Salvador: Associação Conexões Criativas,
2019 GARRAMUÑO, Florencia. Frutos estranhos: sobre a inespecificidade na estética
contemporânea. Rio de Janeiro: Rocco, 2014. HANSEN, João Adolfo. O que é um livro?. Cotia, SP:
Ateliê Editorial; São Paulo: Edições SESC São Paulo, 2019. (Coleção Bibliofilia, v. 1) KIFFER, Ana;
GARRAMUÑO, Florencia (org.). Expansões contemporâneas: literatura e outras formas. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2014. MACHADO, Neto et al. Astroneto: dança no espaço. Salvador:
Associação Conexões Criativas, 2017. MONTEIRO, Fábio Osório et al. Livro de fogo: chama histórias.
Salvador: Associação Conexões Criativas, 2021. PAIVA, Ana Paula Mathias de. A aventura do livro
experimental. Belo Horizonte: Autêntica; São Paulo: Edusp, 2010.
546
POÉTICAS DO CONTEMPORÂNEO: REVISITANDO CONCEITOS E BORRANDO AS BORDAS
Milena Guimarães Andrade Tanure
Resumo: Em “Literatura fora de si”, Garramuño (2014) coloca em cena o modo pelo qual a literatura
contemporânea encontra-se em ebulição e constante instabilidade. Em seus dizeres, essa produção
atual “atenta até contra a própria noção de campo como espaço estático e fechado”. Pensando esse
transbordamento, “campo expandido” e tensionamento de margens, Garramuño (2014) nos leva a
pensar em novas formas e traços de uma produção mais contemporânea que revela novas fissuras
e, até mesmo, uma reflexão sobre uma mutação daquilo que define o literário na literatura
contemporânea. Ela propõe, a partir disso, que para uma produção literária com essas formas “uma
leitura estritamente ‘disciplinada’ ou disciplinar pouco parece poder captar” (GARRAMUÑO, 2014,
p. 36). Por tal razão, essa escrita literária repotencializa as teorias e definições e, se não invalida,
deixa de lado certas definições que, sendo muitos formalistas, não dão conta do literário e do
estético que se tem hoje. Assim, o que se revela é que essa produção coloca em uma cena uma
ruptura da noção de campo como espaço estático e fechado. Para tanto, partiremos, nessa reflexão,
da obra O LIVRO de água e a produção estética, da Karina Rabinovitz, para pensar textos/instalações
que não respondem às categorias tradicionais de análise. Tanto O LIVRO de água como as demais
produções que constroem essa pesquisa desestruturam a ideia tradicional de representação e
partem para a simulação. São obras e artistas que propõem tensionamentos sobre categorias como
produção estética e política, ocupação do campo literário e ocupação do espaço urbano. Assim, a
partir das produções, pensamos o deslizamento de formas inespecíficas e o modo como elas
questionam, por exemplo, a noção de autoria, conceitos próprios da teoria literária e a própria
instituição chamada literatura.
Referências: AZEVEDO, Luciene; MOLINA, Cristian et. al. Autoria na cultura do presente:
apresentação. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 55, set/dez, 2018.
AZEVEDO, L. Reimaginar a vida, reimaginar a forma . Remate de Males, Campinas, SP, v. 39, n. 2, p.
726–740, 2019. DOI: 10.20396/remate.v39i2.8655722. Disponível em:
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/remate/article/view/8655722. Acesso em: 19 set.
2021. DALCASTAGNÈ, Regina. Literatura brasileira contemporânea: um território conquistado.
Vinhedo: Horizonte, 2012, p. 17-48. FONSECA, M. A. . Entre palavras e imagens: o espaço híbrido na
poética de Karina Rabinovitz.. 2011. In: VIEIRA, Nancy Rita Ferreira (Org.); BRITTO, Milena (Org.) .
Mulheres em cena: literatura e imagem. 1a. ed. Salvador: Edufba, 2017. GARRAMUÑO, Florencia.
Frutos estranhos. Sobre a inespecificidade na estética contemporânea. São Paulo: Rocco, 2014.
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Cadernos de Subjetividade, São Paulo, v. 2, n.1, p. 241-251, 1993. SUSSEKIND, Flora. Objetos verbais
não identificados. O Globo, Prosa e Verso,2013. Disponível em:
<https://blogs.oglobo.globo.com/prosa/post/objetos-verbais-nao-identificados-um-ensaio-de-
flora-sussekind-510390.html>. Acesso em: 08 jun 2021.
548
fragilidades que permeiam o processo de formação da literatura digital brasileira. A metodologia a
ser mobilizada durante o doutorado está fundamentada na perspectiva descritiva proposta por
(CANCLINI, 2016) e empreendida por (DIAS, 2018), acrescida da definição de instrumentos analíticos
e parâmetros interpretativos para a literatura digital brasileira. Para esta comunicação, como
proposta inicial, apresentaremos um panorama das características que acompanham a produção de
literatura digital no Brasil, elencando e sistematizando os atributos já mapeados e que permitem o
reconhecimento dessa literatura. Por meio de tal proposta esperamos apresentar como resultado o
estabelecimento de ferramentas conceituais (GAINZA,2018) que, abarcando crítica e metodologia,
permitirão a realização de leitura e análises de objetos da literatura digital brasileiras em uma
perspectiva condizente com a realidade latino-americana.
Referências: AMÂNCIO, Nair Renata. Revista Texto Digital: um espaço para a literatura digital
brasileira. 2021. Dissertação (Mestrado em Estudos de Literatura) – Universidade Federal de São
Carlos, São Carlos, 2021. CANCLINI, N. G. A sociedade sem relato: antropologia e estética da
iminência. São Paulo: EDUSP, 2012. ______. O mundo inteiro como lugar estranho. São Paulo:
EDUSP, 2016 DIAS, Arthur Souza. Lourenço Mutarelli, a imagem e a palavra: concepções
pósautônomas sobre quadrinhos e literatura. (Dissertação). Mestrado em Estudos de
Literatura/UFSCar, 2018. GAINZA C., Carolina Campos literarios emergentes: literatura digital en
América Latina. Estudios Avanzados. 2014, (22), 29-43. ISSN: 0718-5022. ______. Literatura chilena
en digital: mapas, estéticas y conceptualizaciones. Rev. chil. lit., Santiago, n. 94, p. 233-256, dic. 2016.
_______. Narrativas y poéticas digitales en América latina. Producción literaria en el capitalismo
informacional. Santiago de Chile: Ed. Cuarto Propio. 2018.
549
______. Aqui América Latina: uma especulação. Tradução de Rômulo Monte Alto. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2013. SANT’ANNA, Sérgio. A senhorita Simpson. São Paulo: Companhia das Letras,
1989. ______. O monstro. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
550
Lurie; posfácio de Marise Hansen. São Paulo: Penguin, 2013. NASCIMENTO, Evando. O pensamento
vegetal: a literatura e as plantas. 1ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021. O JARDIM. Direção:
Derek Jarman. Basilisk Communications, 1990. (Tradução de THE garden).
551
de Vitalino: brincando com os bonecos de barro do Mestre Vitalino (ORTHOF, 1994) na formação do
jovem leitor. Objetiva-se, também, verificar a busca desse leitor pelo resgate da coerência que os
vazios interroperam no texto assegurando sua comunicabilidade. Esse processo, decorrente de sua
atividade imaginativa, permite que sua produtividade entre em jogo, conferindo-lhe, pela interação,
prazer na leitura. Iser (1999) considera que a exploração dos vazios pelo texto literário intenciona
motivar o leitor a descobrir suas próprias projeções. Justamente, nesse leitor implícito, projeta-se
um leitor empírico: a criança. Desse modo, busca-se, na análise, compreender como se efetiva em
seu poema narrativo a oralidade, o ludismo e o diálogo com as artes plásticas. Assim, na análise da
obra de ORTHOF (1994), busca-se detectar como se efetiva a sua estrutura de comunicação e se esta
desperta o senso crítico no leitor, emancipando-o de seus pré-conceitos sobre o gênero poema, os
usos da língua e presença da ilustração em uma obra. Além disso, pretende-se observar suas
ilustrações, visando a detectar se possuem pregnância estética (OLIVEIRA, 2008), para ampliar o
imaginário do leitor infantil, constituir sua memória afetiva e desautomatizar seu olhar em relação à
imagem.
Referências: ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. Tradução de J.
Kretschmer. São Paulo: Editora 34, 1996. v. 1 ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito
estético. Tradução de J. Kretschmer. São Paulo: Editora 34, 1999. v. 2 JAUSS, Hans Robert. A história
da literatura como provocação à teoria literária. Tradução de S. Tellaroli. São Paulo: Ática, 1994.
OLIVEIRA, Ieda de (org.). O que é qualidade em ilustração no livro infantil e juvenil: com a palavra o
ilustrador. São Paulo: DCL, 2008, p. 13-47. ORTHOF, Sylvia. A onça de Vitalino: brincando com os
bonecos de barro do Mestre Vitalino. Rio de Janeiro: Salamandra, 1994.
552
Resumo: Araceli Simão Gimenes Russo Eliane Aparecida Galvão Ribeiro Ferreira Resumo: Ao refletir
sobre a literatura, Candido (1995) afirma que todos têm direito à sua leitura porque nos permite
vivenciar as mais diversas sensações, tornando-nos seres críticos e conscientes. Diante dessa
afirmação, este texto objetiva refletir sobre as potencialidades da literatura infantil na formação do
jovem leitor. Mais propriamente, da literatura infantil de temática africana no desenvolvimento das
relações étnico-raciais em contexto escolar. Para tanto, a partir do aporte teórico da Estética da
Recepção (JAUSS, 1994; ISER, 1994, 1999), almeja-se analisar o livro ilustrado Obax, de André Neves
(2010), cuja narrativa explora o protagonismo da criança negra. Nessa análise, pretende detectar, se
esta obra estabelece comunicabilidade com o leitor e, pela afluência de lacunas, rompe com seus
conceitos prévios sobre relações humanas em sociedade, ampliando seu horizonte de expectativa,
pela possibilidade de convívio com a diversidade. A obra faz parte de acervos de leitura resultantes
de políticas públicas e está disponível em Salas de Leitura e bibliotecas das escolas públicas do país.
Sua temática africana com abordagem identitária atende aos princípios da Lei n.11.645, de março de
2003, que estabeleceu as diretrizes e bases da educação nacional, incluindo no currículo oficial da
rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e indígena”.
Constrói-se a hipótese de que a leitura dessa obra de Neves (2010) possui potencialidades para
romper com os conceitos prévios dos leitores associados à negação ou ao ocultamento das
contribuições do continente africano e da diáspora ao patrimônio cultural da humanidade. Além
disso, sua leitura, pelo valor estético de sua narrativa e de suas ilustrações, e temática identitária,
pode cativar o jovem leitor, ampliar seu imaginário, romper com seus conceitos prévios sobre
ilustração enquanto apenas acessório de uma história. Palavras-chave: Literatura infantil de temática
africana; Obax, Método Recepcional
Referências: BORDINI, Maria da Glória; AGUIAR, Vera Teixeira de. Literatura: a formação do leitor:
alternativas metodológicas. 2. ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993. BRASIL. Lei n.º 10.639, de 09
de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e
bases da educação. Brasília e inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da
temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. Diário Oficial da União,
Brasília, 10 jan. 2003. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm.
Acesso em: 29 jan. 2022. BRASIL. Lei n.º 11.645, de 10 de março de 2008. Altera a Lei no 9.394, de
20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a
obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro Brasileira e Indígena”. Diário Oficial da União,
Brasília, 11 mar. 2008. CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: VÁRIOS ESCRITOS. 3. ed. rev. e
ampl. São Paulo: Duas Cidades, 1995, p.235-263. NEVES, André, Obax. São Paulo:Brinque-Book,
2010.
APROXIMAÇÕES ENTRE A REGÊNCIA INGLESA DO SÉCULO XVIII E O JOVEM LEITOR DO SÉCULO XXI:
A MATERIALIDADE DE UMA COLEÇÃO DE RECONTOS DE JANE AUSTEN
Débora Cristina Marini
Resumo: Tomando por base as considerações do professor Peter Hunt (2010), a literatura infantil é
escrita e produzida para um público que ainda está desenvolvendo, entre diferentes capacidades,
suas habilidades de leitura – desse modo, a indústria do livro, com seus autores, ilustradores e
editores. deve levar em conta as circunstâncias desse leitor. Ainda, entre os diferentes tipos de obras
literárias infantis, o reconto de clássicos da literatura é bastante utilizado. Neste nicho se encontra a
coleção aqui analisada, Awesomely Austen (2019-2020), produzida e publicada pela editora Hachette
UK. Trata-se de uma série de recontos dos seis romances da escritora inglesa Jane Austen, adaptados
para leitores entre 8 e 12 anos. A partir do exame dos livros que formam esta coleção, busco
identificar os objetivos e as estratégias da editora. A análise se concentra as escolhas linguísticas da
reescrita dos romances – essenciais para a aproximação entre o leitor dessa nova faixa etária e os
textos –, bem como nas características físicas dos livros, que são impressos em papel reciclado, com
capa dura colorida e texturizada, ilustrações em aguada, parâmetros que, em certa medida,
553
contribuem para a construção dos sentidos do texto (COELHO, 2000). Em vista disso, o objetivo deste
trabalho é identificar o possível público-alvo da coleção Awesomely Austen a partir da análise da
materialidade dos livros e das ilustrações que os compõem. Para tanto, as considerações de Vera
Maria Tietzmann Silva (2012, 2020) e Leonardo Poglia Vidal (2019) são elencadas para o trato com
as imagens e com os aspectos de produção do livro infantil. A partir do observado na coleção,
identifico em que medida esse novo conjunto reflete as semelhanças e divergências entre os
parâmetros dos séculos XVIII e XXI. A partir das escolhas empreendidas pela editora Hachette UK,
analiso como esse novo público leitor é imaginado.
Referências: BIRCHALL, Katy. Jane Austen’s Emma. London: Hodder Children’s Books, 2019. BUTLER,
Steven. Jane Austen’s Northanger Abbey. London: Hodder Children’s Books, 2020. COELHO, Nelly
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Jane Austen’s Persuasion. London: Hodder Children’s Books, 2019. HUNT, Peter. Crítica, Teoria e
Literatura Infantil. Tradução de Cid Knipel. 2 ed. São Paulo: Cosac Naify, 2010. MALIK, Ayisha. Jane
Austen’s Mansfield Park. London: Hodder Children’s Books, 2020. NADIN, Joanna. Jane Austen’s
Sense and Sensibility. London: Hodder Children’s Books, 2020. SILVA, Vera Maria Tietzmann. Ler
Imagens, Um Aprendizado: A Ilustração de Livros Infantis. Goiânia: Cânone Editorial, 2020. SILVA,
Vera Maria Tietzmann. Sobre Contos e Recontos (Nos 200 Anos de Kinder-und Hausmärchen, dos
Irmãos Grimm, 1812-2012). In: AGUIAR, Vera Teixeira de; MARTHA, Alice Áurea Penteado (Orgs).
Conto e Reconto: Das Fontes à Invenção. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2012, p. 13-33. VIDAL,
Leonardo Poglia. The Root of All Evil: Tradition and Morphology in Alan Moore’s Swamp Thing. Tese
(Doutorado em Letras) – Instituto de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre,
372 p., 2019. WOODFINE, Katherine. Jane Austen’s Pride and Prejudice. London: Hodder Children’s
Books, 2019.
554
Resumo: A reflexão sobre o efeito estético que um texto literário pode deflagrar em sua própria
estrutura e/ou na sua recepção pelo leitor empírico, ganha espaço privilegiado nos estudos da Teoria
da Literatura, mais propriamente com a Estética da Recepção e do Efeito (JAUSS, 1994; ISER, 1996,
1999). Com seu surgimento, firmaram-se as bases dos estudos voltados à formação do leitor. A partir
de suas contribuições teóricas, pôde-se considerar a comunicabilidade que se instaura na estrutura
textual de uma obra, pela sua afluência de vazios, potências de negação, pontos de indeterminação,
assim como nas configurações de seu leitor implícito. Isto posto, almeja-se neste texto, a partir desse
aporte teórico (JAUSS, 1994; ISER, 1996, 1999), analisar o livro ilustrado O pássaro na gaiola (2015),
com texto de Vicent van Gogh (1853-1890) e ilustrações de Javier Zabala. Essa obra é composta em
seu plano verbal por um fragmento de uma das cartas que o pintor enviou ao seu irmão caçula Théo
em 1880, no qual trata de seus sentimentos, pelo recurso a uma parábola sobre um pássaro
enjaulado que anseia por liberdade. Em seu plano imagético, o livro pauta-se no emprego de
inovações no projeto gráfico-editorial e de recursos pictóricos, os quais produzem homologias entre
poéticas. Esses aspectos, associados não apenas à literatura infantil, mas à produção artística pós-
moderna de um modo geral, são explorados com a finalidade de ampliar as potencialidades do livro
ilustrado na formação do leitor crítico. Constrói-se a hipótese de que essa obra, pela narrativa
alegórica de cunho biográfico e, em especial, pela dialogia com o universo das artes plásticas, faculta
ao leitor, conforme Umberto Eco (2003), perceber a citação intertextual e sentir-se participante do
relato.
Referências: ECO, Umberto. Sobre literatura. Rio de Janeiro: Record, 2003. GOGH, Vicent van. O
pássaro na gaiola. Ilustr. Javier Zabala. Trad. Mauro Gaspar. Rio de Janeiro: Pequena Zahar, 2015.
ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. Trad. Johannes Kretschmer. São
Paulo: Ed. 34, 1999. vol.2. ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. Trad.
Johannes Kretschmer. São Paulo: Ed. 34, 1996. vol.1. JAUSS, Hans Robert. A história da literatura
como provocação à teoria literária. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Ática, 1994.
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de adaptação das personagens da Odisseia para jovens leitores. Goiânia: Espaço Acadêmico, 2020.
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Rio de Janeiro: Galera Record, 2013. ______. Assassin’s Creed. Revelações. Tradução de Domingos
Demasi. Rio de Janeiro: Galera Record, 2013. ______. Assassin’s Creed. Renascença. Tradução de Ana
Carolina Mesquita. Rio de Janeiro: Galera Record, 2016. CARVALHO, Diógenes Buenos Aires de.
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Videogame, a evolução da arte. São Paulo: Lote 42, 2020.
556
o trabalho dos dois ilustradores que este texto verbal já teve. Em Os invisíveis (Casa da Palavra, 2013),
Renato Moriconi apresenta a narrativa visual através do contraste entre branco, preto, cinza e laranja
neon. Seu traço é marcado, vemos apenas as silhuetas dos personagens. Já em Os invisíveis
(Companhia das Letras, 2021), Odilon Moraes propõe um pensamento bem diferente. As ilustrações
são compostas apenas por traços. O preto e o branco destacam as personagens que não vemos. Elas
têm corpo, mas não conseguimos identificá-las. O principal objetivo desta comunicação é observar
de que modo a leitura do livro-álbum se transforma por meio das imagens propostas nestes dois
caminhos. Almejamos identificar as estratégias visuais propostas pelos ilustradores, analisando de
que maneira as palavras se relacionam com as ilustrações, estabelecendo com elas uma relação de
concordância ou discordância. A metodologia empregada será de cunho bibliográfico, focando, em
especial, nas questões visuais das obras. O aparato teórico centra-se no trabalho teórico do próprio
Odilon Moraes no que refere ao livro-álbum; nas reflexões de Donis A. Dondis, no tocante à sintaxe
visual; e às considerações de Raquel Matsushita sobre design.
Referências: DONDIS, A. D. A sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 2015.
MATSUSHITA, Raquel. Fundamentos gráficos para um design consciente. São Paulo: Musa, 2011.
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o objetivo livro e suas poéticas. São Paulo: Senac, 2013. Pág. 159-165. MORAES, Odilon. Carta ao
senhor Merlot: o sofrimento da imagem. In: Linguagens verbovisuais e do design em urdiduras
poéticas [recurso eletrônico] / Org.: André Ming Garcia, Maria Zilda da Cunha. São Paulo: FFLCH/
USP, 2022.
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Paulo: Ática, 2000. BOSI, Ecléa. Cultura de Massa e Cultura Popular. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1973.
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Tradução de Vera da Costa e Silva. São Paulo: José Olympio, 2008. CIRILLO, José; GRANDO, Angela.
Processo de criação e interações: crítica genética em debate, nas artes performáticas e visuais. Belo
Horizonte: C/Arte, 2008. CIRLOT, Juan-Eduardo. Dicionário de Símbolos. Tradução de Rubens
Eduardo Ferreira Frias. São Paulo: Centauro, 2005. COELHO, Nelly Novaes. A literatura infantil. 3ª
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559
realizar este estudo, buscamos auxílio nas pesquisas de Aby Warburg, Jack Zipes, Linda Hutcheon e
Maria Tatar.
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fadas. Cascais: Fundação D. Luís I – Casa das Histórias Paula Rego, 2018. ARRUDA, Luísa. A
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de François Rabelais. 4? ed. São Paulo: Hucitec; Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999.
BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES (Snow White and the Seven Dwarfs). Direção: David Hand,
William Cottrel, Wilfred Jackson, Larry Morey, Perce Pearce e Ben Sharpsteen. Produção: Walt
Disney. Estados Unidos: Walt Disney Productions, 1937. 83 min, cor. CARVALHAL, Tania Franco.
Literatura comparada. 4ª. ed. São Paulo: Editora Ática, 2001. MACKENZIE, Susie. “Don’t flinch, don’t
hide”, The Guardian, Londres, 30 de novembro, 2002. Disponível em:
https://www.theguardian.com/artanddesign/2002/nov/30/art.artsfeatures. Acesso em 22 abr.
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História, Teoria e Crítica. 2ª ed, São Paulo: Edusp, 2000. TATAR, Maria. Contos de fadas – Edição
comentada e ilustrada. Edição, introdução e notas: Maria Tatar. Trad. Maria Luzia X. de A. Borges. 2?
ed. com. e il. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. WARBURG, Aby. Histórias de fantasma para gente grande.
Editora Companhia das Letras, 2015. WILLING, Nick. Paula Rego, Secrets & Stories. Documentário,
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VENTURA, Adão. Jequitinhonha: poemas. 2. ed. rev. ampl. Belo Horizonte: Mulheres Emergentes
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Relumé Dumará, 2004.
561
tanto, a escolha de Adriana Falcão faz-se pertinente, uma vez que se trata de uma escritora brasileira
contemporânea, cuja obra é marcada pela multiplicidade de tendências e ganhou destaque no início
deste século, especialmente, pela prosa inovadora das histórias que inventa. Com experiência em
diferentes áreas de criação, como literatura, teatro, cinema e televisão, sua produção aborda com
profundidade e perícia o humor e as questões a ele relacionadas. Dessa forma, a partir dos
pressupostos da Estética da Recepção e do Efeito (JAUSS, 1994; ISER, 1996 e 1999), tal trabalho
possui o objetivo de apresentar uma análise da obra P.S Beijei (2004), de Falcão. Essa obra foi eleita,
pois aborda uma temática bastante cara a essa faixa etária, o primeiro beijo e a descoberta das
emoções. Sua narrativa híbrida, desenvolvida a partir de uma troca de e-mails entre duas amigas,
configura-se atraente aos jovens, sua linguagem fluida e dinâmica cativa esse público e sua qualidade
literária amplia seus horizontes de expectativa (JAUSS, 1994; ISER, 1996, 1999). Constrói-se a
hipótese de que sua narrativa apresenta potencialidades que podem cativar o jovem à leitura,
promovendo, assim, sua reflexão crítica, a humanização e emancipação intelectual, atuando como
ferramenta de empoderamento social.
Referências: AGUIAR, Vera Teixeira de; BORDINI, Maria da Glória. Literatura: a formação do leitor –
alternativas metodológicas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993. AZEVEDO, Izabel Cristina de Catro.
Hybrid Novel: articulação entre palavra e imagem no romance de Luna Clara & Apolo Onze, de
Adriana Falcão. Dissertação (Dissertação em Literatura e Crítica Literária, Departamento de Letras)
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2016. BRASIL, Secretaria de Ensino
Fundamental. (1998a) “Parâmetros Curriculares Nacionais, 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental:
Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais” / Secretaria da Educação Fundamental – Brasília
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Rieche. Rio de Janeiro: BestSeller, 2012.
564
personagens a concepções e ideologias ainda pertinentes como material de debate para com as
novas gerações.
Referências: ALMEIDA, Simão Farias. Monteiro Lobato e a problemática da nação: um projeto
dialógico e negociado. João Pessoa: Ideia, 2011. LOBATO, Monteiro. A chave do tamanho. 2. ed.
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QUENTIN BLAKE E ROALD DAHL: INTERLOCUÇÃO ENTRE TEXTOS VERBAL E VISUAL EM REVOLTING
RHYMES
Valquiria Pereira Alcantara
Resumo: Quentin Blake é um ilustrador reconhecido que trabalhou em parceria com Roald Dahl por
vários anos. Seus traços ágeis e cômicos dialogam com o texto preciso, bem-humorado e também
ágil de Dahl compondo um conjunto rico em camadas percebidas por diferentes leitores. O objetivo
desse trabalho é analisar como o texto visual de Quentin Blake estabelece interlocução com o texto
verbal de Revolting Rhymes, de Roald Dahl, em língua inglesa e a respectiva tradução de Luciano
Vieira Machado. Também é relevante observar como o texto dahliano dialoga hipertextualmente
com os textos considerados canônicos na literatura infantil. Para o desenvolvimento desse trabalho
levamos em conta os estudos de Sophie Van der Linden (2011) a respeito do livro ilustrado
observando as relações estabelecidas entre o texto visual e ambos os textos verbais – em inglês e
português. Ademais, na medida em que Revolting Rhymes constitui uma atualização bem-humorada
de contos de fada, apontamos relações hipertextuais, segundo o ponto de vista de Genette (1997),
sempre que pertinente. Como resultado da análise esperamos obter uma melhor compreensão da
contribuição oferecida pelos textos verbal e visual para a construção dos sentidos em Revolting
Rhymes bem como de possíveis relações hipertextuais com os textos canônicos. Considerando que
os contos de fada são frequentemente atualizados em releituras e traduções, a análise que
propomos pode contribuir para a compreensão de como se articulam diferentes sentidos em uma
obra voltada para o público infantil em interlocução com textos tradicionais. Dessa forma esperamos
que nosso trabalho possa dialogar simultaneamente com as áreas de Literatura Infantil e Estudos da
Tradução.
Referências: ALCANTARA, V. P. Roald Dahl: estudo comparativo de “Chapeuzinho Vermelho e o lobo”
em língua inglesa e as traduções para o português. Dissertação (Mestrado em Letras), Universidade
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traduzida- revendo a ferramenta de análise.” In: NITRINI, Sandra (org.) Revista Literatura e
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Bruchard. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
565
Ana Clara De Carvalho Brito
Resumo: Uma das figuras místicas de maior versatilidade, o vampiro, na literatura, é herança das
histórias folclóricas narradas oralmente. Ao longo dos séculos, a imagem do sugador de sangue vem
sofrendo diversas transformações e ganhando novos contornos e características específicas de seu
tempo, o que envolve e seduz leitoras e leitores, especialmente devido à exposição de elementos
sobrenaturais muito associados ao horror, à fantasia e ao insólito. É notável, portanto, que algumas
tendências são adotadas por autores nas narrativas vampirescas, como a caracterização do
predador, a criatura que gera fascínio pelo mistério que sua imagem apresenta, como homem, e a
construção da imagem feminina como donzela, virgem, frágil e pueril - ainda que a primeira vampira
da história, Carmilla, de Sheridan Le Fanu, seja a representação da Femme Fatale. Por isso, propõe-
se uma discussão sobre o horror e a representação do feminino na literatura que se apropriou do
mito do vampiro. Os elementos fantásticos associados à imagem do sugador de sangue serão
analisados, com o intuito de problematizar a imagem feminina criada nessas histórias e propor uma
reflexão sobre o que tanto atrai os leitores nessas narrativas. Obras pioneiras - indicadas nas
referências - terão foco específico, uma vez que oferecem material para discussão e debate, não só
por apresentarem um panorama geral sobre as mudanças da representação do vampiro na
literatura, mas também por sua recepção significativa em meio ao público leitor. Desse modo, será
possível entender o impacto do horror, do insólito e da fantasia no mito do vampiro, e mapear as
características sobrenaturais que geram conflitos morais - como a dieta baseada em sangue (que
pode ser humano ou não) - para investigar a importância do sugador de sangue como figura mística
e fantástica, que, apesar de não fazer parte da realidade factual, está muito presente na literatura.
Referências: ARGEL, Marta; NETO, Humberto Moura. O Vampiro antes de Drácula. São Paulo: Aleph,
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TODOROV, Tzvetan. As estruturas narrativas. 5ª ed. - São Paulo: Perspectiva, 2011.
O INCOMUM NA FICÇÃO DE MURILO RUBIÃO: A RELAÇÃO DO FANTÁSTICO E DO MEDO NO CONTO
“O BLOQUEIO”
Antônia Marly M da Silva
Resumo: A narrativa de Murilo Rubião é notadamente reconhecida pela técnica e engenhosidade
com que o escritor investiu em marcas próprias do fantástico. O estatuto da incerteza que alicerça o
relato fantástico, tal como concebe Bessière (2012), constitui ponto fulcral na composição de sua
produção ficcional. No confronto entre o comum e o incomum, entre o estranho e o familiar impõe-
se a indeterminação dos fatos narrados. No conto “O bloqueio”, integrante da obra O convidado
(1974), é sob o signo da ambiguidade que o insólito e o inverossímil se alojam. Trata-se da história
de Gérion, um novo morador em um apartamento recém-construído, lugar destacado pela
anormalidade de intensos barulhos durante a madrugada. Na narrativa, no trânsito entre o sonho e
a vigília, entre a luz e a escuridão, o desesperado protagonista se depara com a desconstrução
gradual do prédio em que mora. Entre o susto e o temor, o protagonista acompanha a máquina na
“impiedosa tarefa” da desconstrução do edifício. O sentimento de medo diante do desconhecido
potencializa o efeito do fantástico. Na ação do personagem, o temor emerge do estranhamento
provocado pelo cenário aterrorizante provocado pela máquina, elemento que desestabiliza e
ameaça a ordem natural das coisas. A realidade coaduna com o posicionamento de Roas (2014, p.
138) sobre a relação do fantástico com o medo. Na visão do autor, “o fenômeno fantástico supõe
uma alteração do mundo familiar do leitor” e, como consequência disso, “não cabe outra reação
senão o medo”. Sob tal perspectiva, faremos uma análise do referido conto, à luz dos postulados de
566
Roas (2014, 2011), Bessière (2012), Ceserani (2006) e Campra (2001) sobre o fantástico, bem como
a visão de Tuan (2005), Delumeau (2009), Lovecraft (2006) e França (2017, 2020) sobre o medo, entre
outros.
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570
coletânea Afrohorror - medos ancestrais. Ambas as obras, fílmica e literária, trazem o horror como
pano de fundo para abordar o racismo presente na sociedade contemporânea, tanto no contexto
estadunidense quanto no brasileiro. A partir de uma análise pormenorizada, é possível perceber o
medo constante que as personagens negras sentem ao serem vistas como “o outro” em uma
sociedade moldada pela supremacia branca. Chris e Ana, os protagonistas, saem da segurança de
suas casas para enfrentar um mundo repleto de comportamentos discriminatórios, lidando com o
racismo estrutural e com pessoas decididas a explorar seus corpos de forma cruel e violenta. Para
este estudo, buscar-se-á apoio em teorias que versam sobre o tema do horror como crítica social
(CARROLL, 1999; FRANÇA, 2008; MARKENDORF; RIPOLL, 2017), além de teóricos que se debruçam
sobre o insólito ficcional (ALAZRAKI, 2001; ROAS, 2014). Em suma, as obras selecionadas para análise
são permeadas pelo horror e pela violência que é manifestada por monstros reais, como o racismo
e a supremacia branca, transpassando os limites entre ficção e realidade.
Referências: ALAZRAKI, Jaime. ¿Qué es lo Neofantástico? In: ROAS, David (Org.) Teorías de lo
fantástico. Madrid: Arco/Libros, 2001. p. 265-282. CARROLL, Noël. A filosofia do horror ou Paradoxo
do coração. Campinas: Papirus, 1999. FRANÇA, Júlio. O horror na ficção literária: Reflexão sobre o
“horrível” como uma categoria estética. XI Congresso Internacional da ABRALIC - Tessituras,
Interações, Convergências, 13-17 de Julho de 2008. MARKENDORF, Marcio; RIPOLL, Leonardo (org.).
Expressões do horror: escritos sobre cinema de horror contemporâneo. Florianópolis: Biblioteca
Universitária, 2017. ROAS, David. A ameaça do fantástico: aproximações teóricas. Trad. Julián Fuks.
São Paulo: Unesp, 2014.
571
Letícia Veiga Castello Branco
Resumo: Com a emergência das tecnologias digitais, surge também um novo público leitor. Nesse
contexto, os mangás conseguem se popularizar e expandir as fronteiras de seu surgimento até atingir
a cultura ocidental. Essa mídia consiste em histórias em quadrinhos japonesas que abarcam temas
diversos de acordo com o público a qual é destinado. A obra em mangá Naruto (1999), de Masashi
Kishimoto, é destinada a jovens e adultos e traz em seu enredo uma mescla da mitologia japonesa
com questões de exclusão social que envolvem o cotidiano de suas personagens. O seu enredo foca
na personagem, Naruto, e em seu desejo de superação quanto a sua posição de excluído, em que
ele visa tornar-se um ninja relevante dentro de sua vila e criar laços importantes com seus amigos.
Para isso, ele passa por situações complicadas ao longo da obra que trazem vilões com diferentes
objetivos. O fantástico está atrelado à conexão entre o leitor e as personagens, e é a sua percepção
ambígua dos fatos que possibilita que ocorra a identificação com esses elementos (TODOROV, 2004).
No mangá discutido, a mitologia japonesa exerce esse papel, ao guiar o leitor em uma narrativa em
que o bem e o mal são ambíguos; para isso, a narrativa é centrada na trajetória de Naruto, mesmo
assim os vilões ganham destaque e popularidade, a ponto de suas narrativas de vida serem
exploradas. O estudo tem como foco analisar os personagens Pain e Itachi. Já que esses personagens
são vilões que visam a destruição em massa e o controle populacional. Porém, eles são importantes
devido às dimensões psicológicas abordadas como abandono familiar e disputas de poder, temas
chaves da vida deles. Desse modo, propõe-se discutir brevemente a identificação que o leitor possui
com as imagens vilanescas de Naruto ao gerar empatia em relações com suas vivências.
Referências: EISNER, Will. Narrativas gráficas. São Paulo: Devir, 2005. KISHIMOTO, Masashi. Naruto
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contemporânea com a qual o leitor/espectador se identifica, aproximando-se, muitas vezes, do
modo fantástico. Para tanto, propõe-se para esta comunicação a análise das narrativas curtas de
Ramos, presentes na coletânea “O pão do corvo” (2001, relançada em 2017), sobretudo de “Ele
canta”, em que nos deparamos com elementos estranhos, indefinidos e inexplicáveis que se
aproximam conceitualmente do insólito, da aparição de algo “que não pode aparecer, mas aparece”
(CAILLOIS, 1980), em suma, do fantástico. Não só, propõe-se aqui, similarmente, analisar as relações
entre a escrita de Ramos e suas manifestações artísticas que tendem a evidenciar experiências
multidirecionais que corroboram para a ideia de estranheza e arbitrariedade do mundo
contemporâneo (ROAS, 2014).
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jan. 2022.
579
catar objetos nas ruas; cuidar dos três filhos; evitar conflitos com os vizinhos; tentar driblar a fome e
o cansaço; viver na favela do Canindé na década de 50; por fim, escrever reunindo todos esses
pedaços do cotidiano. Essas peças que montam a narrativa não compõem uma obra em completude,
pois o que se lê é um diário de despejo, atravessado pela visão amarelada desencadeada pela fome,
pela miséria. É pela ruína e pelos restos que a escritora reúne seu material para escrever. Os
elementos e as cenas catadas diariamente por Carolina evocam a materialidade presente no seu
fazer enquanto escritora-catadora. Nesse percurso, ela expõe os seus processos de escrita, como se
lê: “Enquanto as panelas fervia eu escrevi um pouco”; “Deixei o leito às 4h para escrever”; “Vou parar
de escrever. Vou torcer as roupas que ensaboei ontem”. A narradora fura a lógica do tempo do
trabalho fazendo sua escrita virar ato apesar de. Ela afirma: “Mesmo elas aborrecendo-me, eu
escrevo”. Pela linguagem, a narradora faz com que a escrita siga erguendo, em palavras, uma obra
por vir. Lembremos do trecho: “É que estou escrevendo um livro, para vendê-lo. Viso com esse
dinheiro comprar um terreno para eu sair da favela”. Inscrito na lógica da possibilidade e do
processo, Quarto de despejo constrói-se por múltiplas vias, olhares, materiais. Por fim, para este
trabalho, lê-se a obra de Raffaella Fernandez sobre o projeto poético da autora e persegue-se a
noção de literatura proposta por Maurice Blanchot em A escrita do desastre, em que o inacabamento
e o processo se inscrevem como modos potentes de ler obras literárias.
Referências: BLANCHOT, Maurice. L’écriture du desastre. Paris: Gallimard, 1980. FERNANDEZ,
Raffaella. A poética de resíduos de Carolina Maria de Jesus. São Paulo: Aetia editorial, 2019. JESUS,
Carolina Maria de. Quarto de despejo (diário de uma favelada). São Paulo: Editora Francisco Alves,
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São Paulo: Cosac Naify, 2007. Documento de media – Imagem em movimento: DVD AUTO da
Catingueira. Compositor: Elomar Figueira Mello. Direção: João das Neves. Produção: Rossane
Comunicação e Cultura. Direção musical/transcrição: João Omar de Carvalho Mello. Direção DVD:
Mario de Aratanha e Marcos Malafaia. Direção, design, cenografia e manipulação de bonecos:
Marcos Malafaia. Figurinos: Rodrigo Cohen. Intérpretes: Luciana Monteiro de Castro, Marcelo
Bernardes, Ocelo Mendonça, Saulo Laranjeira e Xangai. Textos do encarte: Ernani Maurílio.
Manipuladores dos bonecos: Camila Polatscheck, Fabíola Rosa, Márcio Miranda, Paulo Emílio Luz –
Grupo Giramundo de teatro de bonecos. Vitória da Conquista-BA-Brasil: Associação Cultural
Fundação Casa dos Carneiros e Ministério da Cultura e Eletrobrás, 2011. 1 DVD (93 min). Gravação
da encenação ao vivo no Palácio das Artes, Belo Horizonte, abril 2011.
581
de serem obras comentadas ou analisadas individualmente, mas de serem observadas em
justaposição, como um mosaico ou como os traços sobre o papel que delineiam os contornos do
mapa desejado.
Referências: AMADO, Jorge. Capitães da areia. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. BARBA,
Andrés. República luminosa. Tradução de Antônio Xerxenesky. São Paulo: Todavia, 2018. BARRIE, J.
M. Peter e Wendy. Tradução de Sergio Flaksman. São Paulo: Cosac Naify, 2012. CAVERNA do Dragão.
Produção de TOEI Animation. [S.I.]. Alpha Midia; Cultline Video, 1984-86. 7 discos (590 min), DVD,
son., color. GOLDING, William. O senhor das moscas. Tradução de Geraldo Galvão Ferraz. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2006. MEINER, Carsten. Modernizando a topologia literária: convenção,
contingência e história. Tradução de Caetano W. Galindo. Versalete, Curitiba, v. 6, n. 11, p. 181-212,
2018. NELSON, O. T. The girl who owned a city. Mineápolis, Carolrhoda Books, 1995. SCHWOB,
Marcel. A cruzada das crianças. Tradução de Milton Hatoum. São Paulo: Editora 34, 2020. THE WALL.
Direção: Alan Parker. Produção: Alan Marshall. Roteiro: Roger Waters. Intérpretes: Bob Geldof e
outros. [S.I.] MGM; Tin Blue Productions; Goldcrest Films International, 1982. 1 arquivo digital (95
min.), son., col.
582
REPRESENTAÇÕES DO RISO NO FILME E NA NOVELA MORTE E MORTE DE QUINCAS BERRO D'ÁGUA
Elizabete Barros De Sousa Lima
Resumo: Mais uma vez, Jorge Amado deixa florir seu apreço às classes populares de Salvador. A
novela A morte e a morte de Quincas Berro D’Água detalha a cidade com seus pontos turísticos, em
meio à descrição das aventuras de seu personagem principal: Joaquim Soares da Silva. Com
personagens tipificados, ou seja, a contracena entre pessoas que se consideram da elite e aqueles
que deixam clara sua essência suburbana, o autor, por meio do riso, traça críticas às aparências
sociais, que se sobrepõem à essência do homem, separando-os em espaços não dialógicos. Dessa
forma, o trabalho objetiva discutir as formas que a representação fílmica conseguiu traduzir as
nuances do pensamento do escritor baiano, atentando-se para o riso como mediador das relações
entre os homens. Com base nisso, trabalhar-se-à por meio, em especial, da teoria de Mikhail Bakhtin,
nos livros "Problemas da poética de Dostoiévski" e "A cultura popular na Idade Média e no
Renascimento". Nessas obras, o escritor russo discorre sobre a força no riso para igualar os sujeitos
sociais, pois questiona a estabilidade da cultura superior, diminuindo sua supremacia e aproximando
das classes menos favorecidas. Esse pensamento dialoga com a obra de Jorge Amado, bem como sua
tradução fílmica pelo diretor Sergio Machado, que se apropriaram das linguagens risíveis para
dessacralizar as vozes oficiais.
Referências: AMADO, Jorge. A morte e a morte de Quincas Berro Dágua. 90.ed. Rio de Janeiro:
Record, 2004. BAKHTIN, Mikhail. Problemas da poética de Dostoiévski. Rio de Janeiro:
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contexto de François Rabelais. São Paulo-Brasília: Hucitec/Edunb, 1993. BUENO, Luís. Uma história
do romance 30. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Campinas: Editora da Unicamp,
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poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000. HERTZ, Robert. A
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Entrevistas / Clarice Lispector. Org: Claire Williams. Rio de Janeiro: Rocco, 207. LISPECTOR, Clarice:
Para não esquecer. Rio de Janeiro: Rocco, 2020. NANCY, Jean-luc. Corpus. Tradução: Rchard A. Rand.
New York: Frodham University Press, 2008.
"A VIDA COMEÇA NO PONTO FINAL": OS ROMANCES INACABADOS DE MARCEL PROUST E JAMES
JOYCE
Hêmille Raquel Santos Perdigão
Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar o inacabamento dos romances “Ulysses”, de James
Joyce, e “Em Busca do Tempo Perdido”, de Marcel Proust. Em "Ulysses", o protagonista Stephen
Dedalus é um aspirante a romancista que desaparece em certo ponto do enredo, sem a confirmação
se terá sucesso em sua carreira literária. O casal de protagonistas, Leopold e Molly Bloom, por sua
vez, está em uma crise matrimonial cujos rumos permanecem desconhecidos. O desfecho do
romance é um “Sim” sem ponto final, que surge como parte de uma lembrança do passado de Molly,
ou seja, ao invés de uma resolução dos conflitos, o fim do enredo conta com memórias e incertezas.
Algo semelhante encontramos em “Em Busca do Tempo Perdido”, de Marcel Proust. O protagonista
Marcel também é aspirante a artista, e, embora ele não desapareça no enredo como Dedalus,
também não há clareza quanto ao seu sucesso literário. Nas páginas finais, Marcel declara que, para
escrever sua obra, objetivava “captar o que algumas vezes, no curso da existência, eu sentira [....] e
me fizeram julgar a vida digna de ser vivida”. Mas, por fim, exclama: “Como seria feliz quem pudesse
escrever tal livro [...]! Para dar dele uma ideia, seria mister buscar comparações nas artes mais
diversas e mais altas”. Assim, aproximando-se do “Sim” de “Ulysses”, Marcel não nos dá um ponto
final, mas busca momentos do seu passado, e, ao invés de nos esclarecer se escreveu sua obra,
sugere que, para escrevê-la, é necessário buscar arquivos do passado. Dessa forma, as obras de Joyce
e Proust se apresentam como inacabadas em função de narrarem processos, a saber, o processo de
escrita de aspirantes a romancistas, com a busca por obras de arte que os antecedem, e o processo
de busca dos protagonistas por momentos vividos no passado.
584
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Theodore W. Notas de Literatura I. Tradução de Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, 2003.
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Lúcia Miguel Pereira. Porto Alegre: Editora Globo, 1970b RANCIÈRE, Jacques. O Fio Perdido: Ensaios
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585
ATANDO AS DUAS PONTAS DA VIDA: DA CASA DE MATACAVALOS À CASA DO ENGENHO NOVO
Leticia Lyra Acioly
Resumo: Machado de Assis, no conjunto de sua obra, apresenta o Rio de Janeiro do Segundo Reinado
através de seus personagens e dos lugares por onde transitam. O caso não é diferente em Dom
Casmurro, obra da maturidade de Machado, publicada em 1899, na qual percorremos ao lado de
Bento Santiago os caminhos feitos por este ao longo de sua vida – os locais por onde passou e as
reflexões construídas da juventude à maturidade. É com a perspectiva de “atar as duas pontas da
vida” que Bento reconstrói a casa de sua infância para viver a velhice, e não por acaso essa casa é
descrita no início da obra – durante o segundo capítulo – e algumas de suas características são
retomadas no decorrer da narração até quase o seu fim, onde somos levados a refletir o porquê da
existência de alguns detalhes arquitetônicos serem tantas vezes mencionados. Compreender o
significado dessas escolhas espaciais é tarefa árdua que não se esgota em um primeiro momento.
No entanto, através desta tarefa poderemos dar início à compreensão da grandeza de Machado de
Assis e da complexidade de sua obra – que, com o passar do tempo, continua crescendo em
possibilidades interpretativas e desvelando a generidade humana. Este trabalho possui como
objetivo demonstrar algumas das relações entre a literatura e a arquitetura, enquanto expressões
artísticas que figuram a realidade e apresentam a imagem do Rio de Janeiro e sua sociedade durante
o século XIX.
Referências: ASSIS, M. Dom Casmurro. São Paulo: Círculo do Livro, 1969. GLEDSON, J. Machado de
Assis: impostura e realismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. LUKÁCS, G. Narrar ou
descrever?. In: Marxismo e teoria da literatura. São Paulo: Expressão Popular, 2010. __________. O
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Trad. Júlio Castañon Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. BARRY, Sandra: "Nova Scotia
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Trad. Paulo Henriques Britto. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. BROWN, Bill. Other Things.
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MOTTA, Manoel Barros (Org.). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. LÉVI-STRAUSS, Claude.
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Press, 1994. PRZYBYCIEN, Regina. Feijão preto e diamantes, o Brasil na obra de Elizabeth Bishop. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2015.
A VIOLÊNCIA INVISÍVEL (DE PESSOAS QUEER): A ESCRITA QUE RETRATA, NOMEIA E ESCANCARA AS
CHAGAS EM "A CASA DOS SONHOS" E "O FIM DE EDDY"
Mohara Magalhães Bhering Villaça
Resumo: Atravessada pela coragem de dizer-se e usar a memória como ferramenta para
compreender e nomear violências de pessoas LGBTQIAP+, proponho uma leitura comparada de um
livro de memórias e um romance autobiográfico. "A casa dos sonhos" (Carmen Maria Machado,
2019), que foi o primeiro livro publicado com esse tipo de narrativa, sobre a própria experiência de
violência entre parceria íntima de duas mulheres e "O fim de Eddy" (Édouard Louis, 2014) que
elabora as violências vividas por ele em sua infância e adolescência como um jovem homossexual
entre as décadas de 1990 e o começo dos anos 2000 no interior da França. Ambos elaboram sobre a
necessidade de escrever a violência para que ela seja nomeada e transposta, e seu ciclo finalmente
rompido. A violência entre mulheres em relacionamentos sáficos ainda é um tema pouco elaborado
e discutido, a violência com raízes homofóbicas praticada pela própria família em uma esfera
cotidiana é mais discutida, mas ainda assim insipiente. As vozes que argumentam essas narrativas
geralmente são externas e muitas vezes, quando midiatizadas, póstumas. Veena Das contorna as
linhas da violência e como sua estrutura se banaliza em um cotidiano sem alarde com horror, assim
como Ivete Carmagos e Terezinha Taborda costuram esse horror indizível em palavras escritas, da
mesma forma que Margareth Rago também o faz com relatos de violência de mulheres durante a
ditadura militar no Brasil. Uma literatura que se equilibra entre a denúncia, a nomeação e a
autoetnografia, que não só relata a experiência vivida, mas seu impactos e os contornos sociais
envolvidos.
Referências: DAS, Veena. Vida e palavras: a violência e sua descida ao ordinário. Editora Unifesp,
2020. RAGO, Luzia Margareth. A Coragem Feminina da Verdade: mulheres na ditadura militar no
Brasil. Caderno Espaço Feminino - Uberlândia-MG, 2015. WALTY, Ivete Lara Camargos e MOREIRA,
Terezinha Taborda (org.). Violência e escrita literária. Belo Horizonte: Editora PUC Minas, 2020.
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Rayi Kena Ferraz da Cunha de Souza Teixeira
Resumo: O objeto principal desta apresentação será o texto “Nove bocas da nova musa” da poeta
Ana Cristina César que saiu como artigo de jornal para o periódico Opinião em 25 de junho de 1976.
Trata-se de um artigo de opinião curto sem pretensões teórico-críticas abrangentes, uma análise
pontual sobre o lançamento do nº 42/43 da revista acadêmica Tempo Brasileiro que propunha
apresentar a “Poesia Brasileira Hoje” (título da edição) a partir de uma pequena seleção de poemas
e de textos críticos sobre a poesia da época. Ao fazer a crítica da revista, Ana Cristina diz que: “fica
claro que não há uma reflexão por parte da revista sobre esta nova poesia, ou seja, uma proposta
editorial que a oriente: o critério para publicação dos poemas foi simplesmente o seu ineditismo”
(CÉSAR, 1993:46. Grifos da autora). A ausência de proposta editorial da revista referenciada por Ana
Cristina parece apontar igualmente a dificuldade de se estabelecer critérios sobre os quais discutir a
poesia contemporânea. Tal omissão é trazida logo de começo no texto de Ana C. como parte de um
problema (um equívoco) crítico: a abstenção não esclarece nada. Ao analisar a posição crítica-
literária da poeta em seu artigo de opinião buscaremos nessa apresentação a investigação e
visualização de um campo crítico brasileiro específico sobre “as poesias contemporâneas” e como se
dá o caso da crítica-poeta Ana Cristina César.
Referências: ANDRADE, Mário de. “O artista e o artesão” In: _____. O baile das quatro artes. São
Paulo: Martins Editora, 1975. ASSIS, Machado de. Obra Completa. vol. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
1994. Domínio Público. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000215.pdf. Acessado a 2 de setembro de
2022. BOSI, Viviana. “Ana Cristina César: ‘não, a poesia não pode esperar’”. In: Vera Bastazin. (Org.).
Travessias poéticas: poesia contemporânea. São Paulo: Educ, 2011, p. 468-495. CÉSAR, Ana Cristina.
“Nove bocas da nova musa” In: ____. Escritos do Rio. Rio de Janeiro: UFRJ Editora & Brasiliense
Editora, 1993. MELO NETO, João Cabral. Poesia e Composição – A Inspiração e o Trabalho de Arte.
Lisboa: Fenda Edições, 1982.
588
589
SIMPÓSIO “ÉTICAS-ESTÉTICAS DECOLONIAIS: ESTRATÉGIAS LITERÁRIAS DE RESISTÊNCIA
CULTURAL”
Elio Ferreira De Souza (UESPI), Roland Gerhard Mike Walter (UFPE) e Tania Maria de Araújo
Lima (UFRN)
A PALAVRA QUE RESTA EM DIAS QUENTES: RESISTÊNCIAS NOS SERTÕES DE STÊNIO GARDEL E
JARID ARRAES
Ana Claudia Félix Gualberto
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Resumo: Nas primeiras décadas do século XXI, houve um considerável interesse do mercado editorial
brasileiro e, consequentemente, da literatura contemporânea pelos diversos “sertões brasis” e suas
especificidades. Autoras e autores que abordam a temática dos sertões ou que escrevem nesses
espaços geo-políticos-culturais, a exemplo de Jarid Arraes, Stênio Gardel, Socorro Acioli, Itamar
Vieira Júnior, dentre outras/os, começam a ocupar lugar de destaque nas prateleiras das grandes
livrarias e nas lojas do comércio virtual. Assim, neste trabalho, proponho analisar a
(auto)representação dos/as sujeitos/as sertanejos/as, estigmatizados(as), silenciados/as e
invisibilizados/as no romance A palavra que resta de Stênio Gardel e no livro de contos Redemoinho
em dias quentes (2019) da escritora cearense, Jarid Arraes. Stênio Gardel nasceu em Limoeiro do
Norte, Ceará, e após participar de coletâneas de contos, lança seu primeiro romance A palavra que
resta, em 2021. Jarid Arraes (1991-) é natural de Juazeiro do Norte, Ceará, e já possui uma obra
literária significativa e diversificada, transitando no cordel, com Heroínas brasileiras negras em 15
cordéis (2020), na poesia, com o Um buraco com meu nome (2021), e na prosa, com o livro de contos
Redemoinho em dia quente (2019), com os romances As lendas de Dandara (2022) e Corpos desfeitos
(2022). As narrativas estão ambientadas no interior do Ceará, nas cidades de Juazeiro do Norte,
Crato, Barbalha e Limoeiro do Norte. Esta análise, portanto, baseia-se nas críticas feministas
decoloniais, a fim de “desconfigurar” o imaginário que se constrói sobre um sertão nordestino
brasileiro.
Palavras-chave: Jarid Arraes; Stênio Gardel; Sertanidades; Decolonialidade; Resistências.
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se faz o objetivo geral da presente proposta. Busca-se, de modo específico, inscrever um possível
diálogo entre as produções de Patrik Chamoiseau (Martinica) e Paulina Chiziane (Moçambique),
pretendendo-se discutir como pressupostos críticos do escritor martinicano dissolvidos em “Écrire
em pays dominé” (ANO) poderiam ser lidos na escrita de “Nicketche: uma história de poligamia”
(ANO), da autora moçambicana, de modo a vivificarem suas escolhas estéticas na tessitura do
romance em termos de seleções e combinações (ISER, 2002) de possibilidades de narrar, de utilizar
vocábulos, de dialogismo com vozes não canônicas, bem como pertencentes à tradição literária
ocidental. Defende-se, em foco, que as poéticas do “velho guerreiro”, da “pedra mundo”, pensadas
por Chamoiseau na sua escrita como nativo do “país dominado”Martinica, seriam modalidades
estético-políticas que poderiam ser associadas à obra da escritora, a qual, especificamente, dialoga
com a geografia da África lusófona e com um projeto ficcional que se compromete, eticamente, em
protagonizar representações de gênero, a figura feminina negra, interseccionada pelo patriarcado
da sociedade local. Nessa perspectiva, Chiziane “traduziria” (BARBOSA, 2005) o pensamento de
Chamoiseau em sua ficção. Como referencial teórico-crítico, entre outros nomes, estão: Inocência
Mata (2013), Maria Lugones (2008); Rita Chaves (2006); Roland Walter (2009); Stuart Hall (2003).
Palavras-chave: Paulina Chiziane; Patrick Chamoiseau; Estudos Pós-coloniais; Gênero; Tradução.
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era colonial. A partir da criação do Teatro Experimental do Negro – TEN se descortina para o corpo
negro perspectivas de estar no palco se expressando em movimento na arte e pela arte. Com isso,
se desconstrói o desprezível costume de tingir de preto rosto de ator branco para atuar como negro,
como também minimiza a condição de o negro ser visto em palco somente como serviçal. Nessa
perspectiva, Júlio Romão cria um teatro no bairro do Méier, no Rio de Janeiro, e convoca pessoas
negras para encenar as suas peças, a saber: A mensagem do Salmo (2018) e José, o vidente (2018),
isso para remover o negro da marginalidade e transformá-lo em ator. As peças expressam aspectos
sócio-político-sociais que transcendem a literatura e promovem reflexões e questionamentos acerca
da escravidão e da realidade social da qual o autor faz parte por ser negro e por pertencer a uma
posição social desfavorável. Nesse sentido, nos propomos a analisar as duas peças mencionadas pela
ótica da Escrevivência.
Palavras-chave: Escrevivência; Teatro negro; Júlio Romão.
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mesmo tempo, dele toma distâncias” (AGAMBEN, 2009, p. 59), proponho possíveis leituras sobre o
“narrar o inenarrável” (SELIGMANN SILVA, 2008, p. 67), e os efeitos da violência no corpo e
resistência do feminino.
Palavras-chave: autoritarismo; feminismo; violência; Claudia Lage; Lygia Fagundes Telles.
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Resumo: Considerando que a literatura de autoria indígena, desde o seu surgimento, esteve
relacionada a um ativismo político-cultural, e que a poesia foi historicamente utilizada como
instrumento de crítica social, os escritos de poetas nativos tornam-se pertinentes como recursos de
resistência e engajamento à medida que se avançam nos debates pelos direitos aos povos
originários. Com isso, propõe-se analisar a obra Ay Kakyri Tama: Eu moro na cidade, da autora Marcia
Kambeba, identificar as facetas da poética de resistência na literatura indígena e provocar reflexões
sobre as questões identitárias da luta dos povos originários brasileiros presentes no texto. Parte-se
inicialmente da conceitualização da formação da literatura indígena quanto uma escrita de voz
política e engajada, identificando as especificidades estéticas e teóricas Nas produções de autores
ameríndios. Em sequência são apresentados e discutidos os poemas selecionados, com intuito de
identificar as particularidades da obra dentro da temática proposta. Para fundamentação teórica são
utilizados os estudos de Graúna (2013), Munduruku (2012), Kambeba (2020) e Danner; Dorrico e
Danner (2019; 2020). Em desenvolvimento, a pesquisa aponta a relevância da autoria indígena na
ruptura de preconceitos e estereótipos, bem como no fomento e organização da luta por direitos,
sendo também utilizada como instrumento cultural de crítica social e ativismo político.
Palavras-chave: Literatura indígena; Poesia de resistência; Marcia Kambeba
595
realçar outras possibilidades de interação, compreensão e ação no mundo, partindo de saberes
vivenciados por populações historicamente relegadas às margens em que suas produções são
desvalorizadas porque são subjetivadas como um tipo de conhecimento inferior abrange percepções
para espacialidades e temporalidades diversificadas, propondo reimaginar imaginários e talvez
possibilite questionar a métrica e o espaço que é reservado para a arte produzida na Amazônia
acreana. As reflexões apresentadas nessa comunicação estão alinhadas com as discussões propostas
por ZUMTHOR (2007) e BENJAMIN (1987).
Palavras-chave: Oralidade; Teatro; Amazônia acreana
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POÉTICA E REALIDADE
Katia Fernandes de Lima
Resumo: A poesia da moçambicana Noémia de Sousa mescla lirismo com as experiências brutais do
mundo colonizado ao embalar o movimento de independência dos países africanos. Escrita entre
1948 e 1951, sua proposta estética engajada não apenas serve de instrumento de conscientização
para o autóctone acerca da política imposta pelo dominador português, mas também ajuda o leitor
a refletir sobre mecanismos que propiciaram a vulnerabilidade do corpo negro à violência, inclusive
nos dias atuais. Nota-se que a racialização, estrutura de poder instituída por intermédio do
capitalismo, biparte o planeta entre europeus e não europeus, conforme destaca Quijano (2009).
Dinâmica de dominação que é contestada artisticamente pela voz de Sousa enquanto temática
central do único livro publicado pela Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO) em 2001,
pois, diante do contexto socio-cultural desfavorável às ações anticolonialistas da época, a obra da
poetisa circula de maneira dispersa em periódicos do movimento de luta pela libertação de
Moçambique até a plena independência política do país (1975). Na coletânea intitulada Sangue
Negro (2001), mediante a perspectiva crítica da autora, percebe-se que as referências culturais do
colonizador são revistas, assim como o modelo tradicional de versejar. Essa prática de ressignificação
de valores faz emergir novos estilos de expressão que sinalizam elementos de rupturas ao paradigma
hegemônico, segundo argumenta Noa (2001) a respeito dos registros da língua ronga nos poemas
ou sobre vibração do sujeito lírico enquanto porta-voz dos oprimidos. Em tal projeto lírico, a presente
comunicação focaliza o enlace de texto e contexto na leitura de "Um dia" a fim de destacar as
estratégias estética e política de Sousa, entre as quais, o hibridismo linguístico, a referência à
oralidade, o uso do possessivo "nosso" que estabelece ligação entre possuído-possuidor.
Palavras-chave: Poesia africana; Ruptura, Noémia de Sousa.
597
Starobinski e László F. Földényi procuro fazer um compilado teórico-histórico crítico sobre a
melancolia. Com ocorrências principalmente na Europa, tinha entre suas vítimas poetas, homens da
ciência e da religião. Com a colonização chega na América Latina e logo se impregna das
características que o conquistador observa nos nativos conquistados. Assim, ao indígena,
especificamente nos Andes peruanos onde concentro minha pesquisa, foram impostos aspectos
emotivos como a raiva, o alcoolismo e, em acréscimo, a melancolia. Perdurando por todo o processo
de colonização e das jovens repúblicas independentes para chegar ao presente, interceptado nas
margens da psicologia. Assim, no trabalho a seguir busco gerar um debate relacionado ao estereótipo
do nativo melancólico, tomando como referência textos literários, fotografias e letras de música
desde meados do século XIX até o presente, para tentar entender como os estereótipos persistem e
como conseguiram foram institucionalizados ao longo do tempo.
Palavras-chave: Melancolia; Andes; Peru.
OUTROS BRASIS: O MUNDO QUE NÃO ME CONTARAM EM EU SOU MACUXI E OUTRAS HISTÓRIAS
DE JULIE DORRICO
Maria Luana Caminha Valois
Resumo: É dado que o território hoje designado Brasil já estava habitado antes da invasão europeia,
e que os povos originários já possuíam seus ritos, danças, estéticas, costumes e organização política.
Esta afirmação foi, por muitos anos, negligenciada, e é desse abandono que surge nossa investigação.
Pensando em termos literários, e entendendo que a sociedade dominante escuta pela letra, desde
1988 - com a promulgação da constituição federal -, os nativos se esforçam para publicar suas
histórias em contraponto aos estereótipos canônicos (selvagens, preguiçosos, infantis). A vista disso,
nos dedicaremos à obra Eu sou macuxi e outras histórias de Julie Dorrico. Com a finalidade de
entender, desde a perspectiva do nativo, aspectos da sua cultura. Assim, nosso esforço incide em
conhecer o povo, seus ritos e costumes assinalados ao longo dos escritos da autora Macuxi já
mencionados. Também, buscamos refletir à luz de teóricos como ESCALANTE (2015), WALSH (2009),
MIGNOLO (2008), GLISSANT (1981), QUIJANO (1992), como este povo se percebe no conceito de
nação brasileira. Deste modo, afirmamos que esta pesquisa corrobora na direção do amplo
entendimento da produção literária inigena contemporânea, bem como, coopera com a
disseminação de vozes marginalizadas. Para mais, favorece para diminuir o abismo entre o estado
brasileiro e os povos indígenas.
Palavras-chave: Literatura Indigena, macuxi, Julie Dorrico.
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homem pelo homem, evidenciando o local da exclusão do negro e objetivando o rompimento de
narrativas exploratórias.
Palavras-chave: Escrevivência; Decolonialidade; Poesia negra; Carolina Maria de Jesus.
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Resumo: Este trabalho objetiva refletir as possibilidades de resistência, a partir das trajetórias de
vida das artesãs da Casa das Bordadeiras, no território do Seridó, sertão potiguar, para uma noção
de desenvolvimento antissistêmica, anticapitalista, decolonial. Percorremos o protagonismo das
mulheres no território, que vem atuando numa geografia da resistência e da memória (MORAIS,
2021), na manutenção da tradição, da cultura e identidade regional, da perpetuação de saberes
ancestrais, da reinvenção estética, e numa perspectiva de economia colaborativa e solidária. A partir
do resgate do imaginal, das razões do coração, do terreno fértil da infância, da arte de fiar,
buscaremos perceber a existência de uma poética das bordadeiras, onde essas imagens poéticas e
criativas vindas do inconsciente, noturno, tornam-se a "origem da consciência", da razão, da ciência,
diurnas, e são como "germe" de novos mundos imaginados e novas interpretações (BACHELARD,
1988, p. 1). O território do Seridó vem sendo marcado por uma série de transformações no modelo
de produção, marcado por um modelo produtivo globalizado e industrializado. O Programa de
Interiorização da Indústria Têxtil - Pró-Sertão, surge como uma das políticas de Estado visando a
inclusão dos territórios e das mulheres, nas chamadas facções de costura, considerando um contexto
de masculinização das atividades do campo, numa perspectiva de terceirização, onde vem se
percebendo a violação de direitos trabalhistas, a exemplo da informalidade e jornadas de trabalho
exaustivas, o que vem demonstrando desafios na inserção produtiva das mulheres e acentuando
desigualdades de gênero. O modelo de desenvolvimento adotado pelo Estado vem se apresentando
a partir de uma noção de território importada da Europa em que se priorizam as propriedades
jurídico-políticas do território, os trâmites burocráticos, o capitalismo, e vem ameaçando a vida
humana e não humana (HAESBAERT, 2021) e que, portanto, precisa ser reinventado, reencantado.
Palavras-chave: Bordadeiras; Identidade; Regional; Decolonialidade.
600
Resumo: Este trabalho parte da hipótese que um dos mais graves efeitos da colonização na
neocolonialidade do presente é a brutalização e o deslocamento de pessoas e a destruição de
lugares. Desde a máquina da plantação e das minas até a máquina da favela os diversos tipos de
violência deslocaram a relação entre o sujeito, o lugar e o mundo no sentido de ela não nascer
organicamente das experiências, tradições e crenças culturais porque a ligação entre palavra/
linguagem, memória, identidade e cosmovisão foi rompida e recriada num processo de
transculturação. Nesta transculturação, a palavra ferida e a palavra imposta iniciaram uma dança
esquizofrênica que se tem alimentado de ritmos sincópicos desde o passado ao presente, com passos
fortes e fracos de dominação e resistência, ligando o colonial, o neocolonial, o pós-colonial e o
decolonial em distonia. Com base nesta hipótese surge a questão da literatura e teoria neste cenário
(pós-/neo/de)colonial. Como examinar as relações entre terra/lugar/espaço, saber/poder, (alter)
ideologia, discurso, (contra) memória e identidade/identificação/posição de sujeito na interface
entre o colonialismo do passado e as colonialidades contemporâneas? Em diálogo com Fredric
Jameson, Pierre Bourdieu e Edward Said apresento a minha abordagem teórica dos três
inconscientes – o “inconsciente político” (Jameson), o “inconsciente cultural” (Bourdieu) e o
“inconsciente ecológico” (Walter) – em ligação com o conceito da “memória inter/transbiótica”
(Walter). Dentro da área da literatura comparada esta abordagem suplementa o que Édouard
Glissant chama a “estética da terra” com o objetivo de revelar e problematizar quais as práticas
textuais de descolonização/ resistência ao contínuo roubo e à contínua destruição da terra.
Palavras-chave: identidade, memória, terra, abordagem teórica, descolonização.
IDEIAS PARA ADIAR O FIM DO MUNDO COM POESISTÊNCIA: CHICO CÉSAR & AILTON KRENAK
Tania Maria de Araújo Lima
Resumo: Esta pesquisa pretende analisar a canção “Reis do Agronegócio”, de Chico César, em um
diálogo culturalista com o livro Ideias para adiar o fim do mundo, de Ailton Krenak. O que ganharia a
área de literatura afro-ameríndia ao se estudar um assunto de tal relevância na atualidade? Que
interesse teria um estudo sobre a natureza de um poeta Griots no desenvolvimento dos estudos
literários da contemporaneidade? Em um diálogo precioso com a cultura indígena e afro-brasileira,
inicialmente, pretende-se acionar relatos e imagens referentes à preservação da natureza.
Acreditamos que o vocábulo natureza em Chico César e Krenak encontra-se nas fronteiras dos
interstícios do verbo resistência po(ética), principalmente, quando denunciam que as atrocidades
cometidas pelo capital financeiro ao ecossistema brasileiro se enquadram dentro de um processo de
dizimação dos mais perversos. Assim, ao observarmos as dobras deixadas pelo lixo da exploração
capitalista, amplia-se o solo movediço da barbárie que envolve não apenas o planeta Terra, mas o
cosmo inteiro. Estudar a natureza em sintonia com a poesia de Chico César e o pensar antropológico
de Ailton Krenak traduz uma cosmovisão de irmandade no sentido da preservação, mas também do
que há de mais sagrado na própria humanidade: a ecologia humana. Em sintonia com tudo isso,
acredita-se que ao falar de natureza em Chico César e Ailton Krenak, talvez estejamos mais próximos
das ancestralidades guardiães da floresta, dos documentos geo-históricos jamais descritos em
correspondência com um tipo de comunhão guardada secularmente pelos povos originários e
africanos. Falar de natureza com poesistência, a partir das leituras filosóficas de Ailton Krenak, é
requisitar a voz mineral com a sonoridade eco ambiental há muito esquecida de nossa crítica
literária.
Palavras-chave: Poesia Griots. Natureza. Cultura afro-ameríndia.
601
retorno à terra-mãe através do resgate às tradições e ancestralidades das personagens. A
fundamentação teórica utiliza a tese do pensamento espiral de Fábio Penna (2020) como forma de
trazer à tona as memórias das Sabelas, que revelam a maneira como as tradições dos povos
diaspóricos estão imbricadas nas manifestações identitárias cartografadas no texto evaristiano, além
de demonstrar como tais formações e ações se dão entre gerações distintas, centradas nas figuras
das deusas-mães. Junto a isso, a poética da relação de Glissant (2021) introduz à análise a perspectiva
abissal presente na novela, no sentido de que há uma extensão - para os descendentes desses grupos
- de uma história interrompida, repleta de “palavras mudas”, como verificamos na tessitura da obra.
Para a construção das performances das personagens e do encruzilhamento destas com os
arquétipos dos orixás, serão revistas as poéticas do corpo-tela (MARTINS, 2021) propostas por Leda
Maria Martins, que mesclam memória e identidade para compreender a função do tempo na
manutenção da ancestralidade.
Palavras-chave: Conceição Evaristo; Sabela; Ancestralidade; Orixás; Arquétipos.
602
do espírito alheio, tal como o inseto de sua presa”. Em “No” de 1980, Idea após uma obsessiva
elaboração editorial, seleciona poemas curtos como : “Ni con delicadeza/ ni con cuidado. Acaso/
tiene delicadeza/ vivir/ romperse el alma” (p.2). Com a publicação do Livro das Comunidades (1977),
Llansol inaugura sua trilogia Geografia de Rebeldes. Neste primeiro livro, emergem da escrita figuras
dissonantes em tempo e espaço ou em permanente migração ou travessia fazendo com que a
mutabilidade e a diferença sejam seu ponto de força. Llansol (Um Falcão no Punho, 1998, p.135), ao
referir-se ao corpo, afirmou: “a minha forma de rebeldia foi tão-só a recusa de o viver mutilado”
(1998). Por isso, nesta proposta, o encontro político (in)possível do convívio entre essas duas
mulheres constrói um pensamento estético sobre a singularidade de suas escritas-rebelde que
também pode se estender como alternativa de compreensão para tempos ainda mais
contemporâneos.
Palavras-chave: Llansol; Vilariño; Rebeldia; Mulheres.
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cenas de cada uma das mulheres: Sara, Else, Lise Penny e Clare. O momento qualquer, para Rancière
(2017, p. 154-5), “[...] fica nessa fronteira na qual as vidas que vão cair no nada se elevam a uma
totalidade de tempo e de injustiça, [o que] é talvez a política mais profunda da literatura.” Rancière
ecoa essa ideia do capítulo que Auerbach dedica a Virginia Woolf em Mímesis (2015). A
potencialidade política do momento eflui pelo apelo ao detalhe, no caso, a objetos desimportantes,
que ganham relevância na reflexão crítica da autora sobre a sociedade contemporânea,
metaforizada pelo espaço do hotel. Dessa relação deriva a pergunta: de que maneira detalhes
insignificantes podem funcionar como dispositivos do político (RANCIÈRE, 2012) em Hotel Mundo?
Esta leitura convoca como principal referência Jacques Rancière e também comentadores/as
brasileiros e estrangeiros/as como Marcolino (2018), Benfield (2017), Sparbo (2019), Szyma?ska-
Sabala (2002).
Palavras-chave: Literatura Contemporânea; Literatura em língua inglesa; Estética; Política.
604
que define o político como público (Odisseu) a contrapelo do privado (Penélope), apontando para
um olhar queer ainda não explorado, uma possibilidade de organização social baseada no cuidado
(care). Desta forma, Leonilson visava desestabilizar a normalização dos grandes discursos
normatizantes do espaço público (como a ideia da pós-ditadura), para tornar visível e colocar em
cheque as continuidades epistêmicas do autoritarismo brasileiro no raiar da nova democracia.
Palavras-chave: Literatura Contemporânea, Brasil anos 80, pós-ditadura, dissidência sexual, artes
plásticas
605
Beatriz Cerisara Gil
Resumo: Abordar o fato histórico na literatura apresenta desafios que não se limitam às tensões
ideológicas do jogo entre ficção e história ou entre o público e o privado - aspectos obviamente
visíveis em muitas narrativas e largamente explorados pela crítica do romance. Na França do século
XIX, muitos escritores mergulharam na complexidade de seu tempo pesquisando seus meandros sob
vários ângulos – moral, político, social, econômico. O romance, neste contexto, aparece como lugar
privilegiado de investigação social e de refundação do literário fazendo um rastreamento matizado
das experiências sociais e políticas, individuais e coletivas, da sociedade francesa do período. Se
temos, no memorialismo, um F.-R. de Chateaubriand que recria a prosa de língua francesa com a
problematização de sua posição pessoal dentro da conturbada realidade pós-revolução, temos, no
romance, H. de Balzac e G. Sand que tratam, cada qual a seu modo, daquilo que podemos considerar
como uma presentificação da história. Enfrentando a questão da história no romance – também
tematizada por um Stendhal irônico para quem o efeito da irrupção da política na ficção podia ser
comparado ao efeito de um tiro de pistola em meio a um concerto – os autores enunciam o
surgimento e as potencialidades da sociedade moderna. O presente trabalho pretende examinar a
construção de perspectivas narrativas que implicam análise e retrospecção histórica e que propõem
projetos e utopias dentro do contexto do romantismo na travessia do Antigo Regime para a
modernidade.
Palavras-chave: Romantismo; crítica social; romance.
606
alemães que se definiram como românticos. A analogia com autores de outras nacionalidades e do
mesmo período se tornou mais marcante a partir do estabelecimento dos estudos literários nas
universidades. Nesse sentido, o conceito de Romantismo Inglês cumpre, inicialmente, um propósito
didático. Com isso em mente, procurarei, nesta apresentação, investigar alguns esforços do período
em sistematizar a produção literária da época, tanto em sentido geral, a distinção entre romântico e
clássico, quanto local, a oposição entre lake school e cockney school; isto é, de um lado, um
romantismo ruralista; do outro, um romantismo metropolitano. Procurarei, também, analisar os
embates políticos e estéticos entre as duas escolas a partir de autores emblemáticos do período,
Samuel Coleridge e Charles Lamb.
Palavras-chave: Romantismo Inglês; Escolas Românticas; Samuel Coleridge; Charles Lamb
607
UM ANTIRROMANCE IRLANDÊS À LUZ DO ATO DE UNIÃO DE 1800: UM ESTUDO SOBRE CASTLE
RACKRENT, DE MARIA EDGEWORTH
Michelle Andressa Alvarenga de Souza
Resumo: A comunicação proposta se debruça sobre o romance Castle Rackrent, escrito por Maria
Edgeworth e publicado em 1800. Com atenção especial ao contexto histórico do Ato de União e ao
contexto literário irlandês com o surgimento do subgênero híbrido National Tale, o trabalho se
debruça sobre o forte apelo didático desse romance político irlandês no centro do Império Britânico.
Será demonstrado como esse texto, com seus aparatos textual e paratextual, coloca a problemática
da união de uma nação formada por componentes que se diversificam no campo étnico, cultural,
linguístico e religioso. O estudo reflete acerca do desafio da formação de uma dimensão conciliatória
no romance, que não traz o casamento como superação do conflito narrativo. Mostra-se, ainda,
como os desafios sociais impostos pela conturbada realidade da periferia celta impedem a
composição de um romance realista e resultam em uma espécie de antirromance, que evidencia as
contradições e ambivalências da realidade irlandesa em um momento crítico da história. Conclui-se
demonstrando como o romance estudado apresenta uma solução ideológica que pode ser percebida
em duas frentes: a de uma reforma feita pela elite da ascendência anglo-irlandesa, capaz de manter
o status quo preservando as tradições do país; e uma atitude assimilativa por parte da Grã-Bretanha
na ocasião da União com a Irlanda, que incorpore a alteridade ao invés de rejeitá-la.
Palavras-chave: Romance Político Irlandês; National Tale; Irlanda; Grã-Bretanha; Ato de União.
608
peremptoriamente desautorizava seu uso na Inglaterra, porque seriam termos correntes “apenas na
Escócia”. No entanto, a presente comunicação se confronta com os impasses composicionais do
primeiro romancista escocês, o médico Tobias Smollett, em sua busca por outorgar forma narrativa
à tumultuosa experiência de seu país, marcada por miséria, perda de autonomia e conflagração
generalizada. Em específico, analisaremos como seu romance inaugural, "The Adventures of
Roderick Random " (1748), explicitamente se apresenta como uma subversão das convenções do
romance inglês, cristalizadas nas obras de Samuel Richardson e Henry Fielding. Por exemplo: ao
contrário de "Pamela; or, Virtue Rewarded" e "The History of the Adventures of Joseph Andrews and
of his Friend Mr. Abraham Adams", em que constância e honestidade são recompensadas por um
enredo de ascensão social, "The Adventures of Roderick Random" figura uma trama em que a
agência do protagonista é anulada de maneira recorrente por pobreza, violência e conflitos étnicos.
Ao final, discutiremos se, nesse processo de subversão, podemos vislumbrar algumas invariantes da
novelística da Escócia setecentista.
Palavras-chave: Narrativa; Tobias Smollett; romance; Escócia
609
Mackandal e Dutty Boukman, que em Saint Domingue (atual Haiti), na segunda metade do século
XVIII, sonharam com o fim da escravidão e desafiaram as fronteiras entre animais, plantas e homens
em prol das lutas de libertação. Com Walter Benjamin (1987) e Alejo Carpentier (1985), identificamos
nas práticas e palavras proféticas desses dois homens, reminiscências que seguem interpelando o
tempo progressivo e linear que, em nome da modernidade e do progresso, continua pisoteando os
vencidos. Estes, por seu turno, exigem do tempo presente, através do canto, que é palavra e ação de
corpos em movimento, a justiça que até então lhes foi negada. As conclusões apontam que, na
dinâmica de uma profecia ainda não cumprida, o vodu, como prática de liberdade e interpelação
contínua, exige justiça à fratura dos tempos que constrói o futuro alimentando-se do sangue de suas
vítimas. Irresignavelmente humanos, conforme James (2000), os corpos negros em deslocamento
geográfico e identitário continuam ecoando o canto desses homens/animais/plantas, afirmando que
é preciso concretizar a profecia de descolonizar a natureza, os homens e o tempo, produzindo o
mundo comum.
Palavras-chave: Vodu; Liberdade; Profecia; Tempo; Espaço;
610
O terceiro conceito relevante de Glissant abordado nesta apresentação é o “Todo-o-Mundo”, que
pode ser usado nos estudos das Literaturas Indígenas. Ele destaca a importância da diversidade
cultural e da multiplicidade de perspectivas. Esse conceito pode ser de grande utilidade para esses
estudos na medida em que as Literaturas Indígenas brasileiras apresentam uma riqueza de visões e
de modos de expressão que não podem ser reduzidos a uma única lógica ou a uma única forma de
compreensão. Em resumo, a utilização dos conceitos propostos por Édouard Glissant pode ser de
fundamental importância para as pesquisas de Literaturas Indígenas. Essas obras literárias são uma
expressão da diversidade cultural, da mistura de elementos culturais e da multiplicidade de
perspectivas, que reflete as relações, lutas e resistências desses povos.
Palavras-chave: Literaturas Indígenas; Édouard Glissant; Diversidade Cultural.
MEMÓRIAS E LEITURAS DE DERCY TELES SOBRE A LUTA PELA TERRA EM XAPURI – ALTO ACRE
Estefany France Cunha da Silva
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo analisar a trajetória política e pessoal de Dercy
Teles a partir de narrativas orais e escritas relacionadas às questões identitárias ligadas ao
movimento de luta pela terra na Amazônia Acreana entre 1970-1990. Assim como, acompanhar e
problematizar a trajetória sindical e pessoal de desta sujeita, enquanto sujeita errante e promover
reflexões críticas sobre diferentes narrativas históricas e literárias com foco na produção de
identidades no interior das organizações e movimentos de trabalhadores rurais de Xapuri, na
Amazônia Acreana. Enquanto primeira mulher a presidir um sindicato no Acre, as construções criadas
durante seu percurso pessoal é importante para enxergar por um prisma tal as movimentações
sindicais e políticas vividas no Acre. A coleta e transcrição de fontes orais oriundas de arquivos
públicos online e privados compõem as principais fontes desta pesquisa. A discussão levantada na
análise perpassa entre os pontos das construções e desconstruções identitárias como líder,
sindicalista, mulher e mãe desde os anos 1970 até os dias atuais. Dado como uma fonte viva, as
narrativas de Teles são analisadas a partir de alguns dos sentidos gerados em meio a conversa com
as categorias de análise utilizadas, sendo essas a Errância, partindo de Édouard Glissant (2005) e
Paola Jacques (2012), a Memória abordadas partindo de Alessandro Portelli (2016) e Georges Didi-
Huberman (2015) e questões relacionadas a Gênero debatidas com Michelle Perrot (1988;1989).
611
Palavras-chave: Dercy Teles; movimento sindical no Acre; narrativas orais.
612
(Albuquerque Júnior, 2009), que colocam em cena poderosas imagens e dão a ver a “realidade” de
certa cidade do Sudoeste amazônico.
Palavras-chave: Cidade Amazônica; Narrativas Literárias; Amazonialismo.
613
CARTOGRAFIA DE VIVÊNCIAS E CONFLITOS DOS POVOS DA FLORESTA DO ACRE COM OS
“PAULISTAS”: UM ESTUDO NO ROMANCE "O EMPATE", DE FLORENTINA ESTEVES
Manoel Messias Feitosa Soares
Resumo: Nesta comunicação apresentamos resultados de uma análise literária da obra “O Empate”,
de autoria da escritora acreana Florentina Esteves, destacando-se os elementos cartográficos onde
a obra foi ambientada e suas inter-relações, destacando elementos dos discursos históricos
utilizados pela autora na tessitura de sua obra ficcional. Destacam-se, também, elementos que
possibilitam perceber a representação das relações de trabalho e das trocas culturais entre os grupos
sociais que constituíram a formação cultural da sociedade acreana. assim como os conflitos ocorridos
entre os trabalhadores da floresta e os novos empreendedores, os chamados paulistas, que estavam
implantando uma nova atividade econômica, a pecuária bovina nos espaços onde funcionavam os
antigos seringais. A pesquisa em tela, está em processo de desenvolvimento. Ela está sendo
fundamentada em pressupostos da Teoria Literária e dos Estudos sobre a Literatura de expressão
amazônica, destacando-se os estudos de: Reis (2013), Reuter (2002 e 2004), Santini (2018), Nunes
(1988 e 2013), Baccega (2007), Halbwachs (2003), Hall (2016), Pizarro (2012), Nenevé e Sampaio
(2015), Silva (2015), Loureiro (2014), Souza (2014), Borges Filhos (2007), Reis (1953) e outros. A
pesquisa, do tipo bibliográfica, com abordagem qualitativa, será desenvolvida a partir do método
analítico. Os resultados preliminares da pesquisa evidenciam que a narrativa literária de Florentina
Esteves contribui, significativamente, para percebermos a mobilidade dos sujeitos que migram em
busca de novas oportunidades, em conflito com os que já se encontravam assentados nos espaços
de vivências e trabalho, características presente na constituição da literatura produzida na Amazônia.
Além disso, mostra a importância dos seringais na formação cultural e econômica da sociedade
acreana e os conflitos vivenciados pelos seringueiros durante os empates.
Palavras-chave: Espaços de Vivências; Trabalho nos seringais acreanos; A contribuição das mulheres;
História dos deslocamentos; Locais dos Empates.
614
letras, criam em 1921 a “Associação dos Novos”. Dela participam Abguar Bastos, Ernani Vieira,
Jacques Flores, Paulo de Oliveira e De Campos Ribeiro. Em 15 de setembro de 1923, tais jovens
divulgam a revista “Belém Nova”, dirigida por Bruno de Menezes. Todos esses literatos, com
conhecimento do ideário da “Semana de Arte Moderna” em São Paulo, vão colaborar para a
mencionada publicação, na qual dão a lume, sob a autoria do amazonense Francisco Galvão, “O
manifesto da beleza”. Aliás, depois da revista “Klaxon” (1922), a “Belém Nova”, disseminadora do
pensamento vanguardista, é a primeira a difundir manifestos numa província brasileira. Entre “os
novos”, alguns colaboradores da publicação paraense, a exemplo de Bruno de Menezes, Francisco
Galvão, Abguar Bastos e Eneida de Moraes, deixam obras impressas, após terem aderido aos
pressupostos modernistas, veiculados nos manifestos estampados no periódico de Belém. Por sua
vez, a partir da década de 1960, o crítico Benedito Nunes passa a divulgar autores coestaduanos em
diários locais e de outros espaços nacionais. Semelhante fato revela sempre haver no Pará uma
preocupação dos docentes e dos artistas da palavra em produzir, mesmo em situações adversas, com
vistas a valorizar a cultura de uma região vilipendiada por insensíveis governos. Assim, com a
presente comunicação, objetivamos discutir uma obra de resistência cultural, a saber, “Batuque”
(1931), de Bruno de Menezes, bem como o juízo sobre ela elaborado por Nunes, um dos teóricos
que nos embasam aqui, ao lado de Alfredo Bosi.
Palavras-chave: Bruno de Menezes; “Batuque”; Benedito Nunes; Poesia e Crítica na Amazônia
brasileira; Resistência cultural.
615
propomos uma crítica a perspectiva evolutiva/moderna que tem orientado formas de narração e
produção da referida cidade. O referencial teórico/crítico e metodológico foi alicerçado a partir da
pesquisa bibliográfica e fotográfica em diálogo com os seguintes pesquisadores(as): Márcio Rodrigo
Coêlho de Carvalho (2020), Francisco Bento da Silva (2020), Juliana Schiel (2004) e Marilena Chauí
(2001) por discutirem em alguma medida o apagamento/subjetivação dos povos indígenas em
diferentes espaços/tempo, além de problematizarem a ideia de progresso, nacionalidade e
modernidade. Diante disso, foi possível inferir que esses rastros/resíduos são caminhos ancestrais
antigos, que resistem e sobrevivem ao processo de “modernização” da cidade de Rio Branco, Acre.
A “modernidade”, como prática e discurso, sangrou as terras, línguas e linguagens indígenas. Mas,
ao mesmo tempo, possibilitou muitas táticas e estratégias de sobrevivência(s) dessas populações em
meio aos projetos políticos e planos de governos para esta cidade.
Palavras-chave: Indígenas; Modernidade/Linearidade; Representações; (Re)existências.
616
culturas míticas e ancestrais dos povos do Alto Rio Negro, no estado do Amazonas. Palavras-chave:
1- Literatura e oralidade; 2- Teatro de Resistência; 3- Mito indígena.
Palavras-chave: Palavras-chave: 1- Literatura e oralidade; 2- Teatro de Resistência; 3- Mito indígena.
617
Como resultados, pôde-se constatar que os acontecimentos relatados na obra Caçando Carneiros
podem ser considerados como erótico e sexual, uma vez que atende os requisitos necessários
conforme destaca Paz, pois causa o efeito erótico e sexual em relação ao pensamento e o ato na
prática.
Palavras-chave: Amor, Erotismo; Sexualidade; jovem das orelhas escondidas.
618
possíveis determinações no processo de representação do objeto em estudo. Além disso, abordar o
tema da ditadura civil militar, procurando situá-la no contexto brasileiro, perpassando pela Guerrilha
do Araguaia e findando com dois históricos sequestros dos embaixadores norte-americano Charles
Elbrick e do alemão von Holleben, início e fim da recuperação da memória/passado da personagem
conhecida, na trama, como ‘você’ (TERRON, 2017, p. 12). A violência como temática não é algo
recente, pois diversas práticas violentas são conhecidas desde a antiguidade, sempre esteve
presente na vida cultural humana. Observada sob a perspectiva de formas e intensidades, ela destaca
as diversas relações de poder, dominação e subordinação existentes na condição humana e em suas
práticas sociais. A partir do século XIX discussões sobre essas práticas se tornaram frequentes, não
podendo deixar de visibilizar os primeiros decênios do século XX, devido aos grandes eventos
traumáticos que o perpassaram como referências de desumanização, tais como as duas Grandes
Guerras e os regimes ditatoriais. A fim de chegarmos a esse propósito, usaremos como bases Antonio
Candido, Censura-violência (2004), Regina Dalcastagnè, O espaço da dor: o regime de 64 no romance
brasileiro (1996), Jaime Ginzburg, Escritas da tortura (2010), Hannah Arendt, Origens do totalitarismo
(2012), Eurídice Figueiredo, A literatura como arquivo da ditadura brasileira (2017), Pedro Corrêa
Cabral, Xambioá: Guerrilha no Araguaia (1993), Romualdo Pessoa Campos Filho, Guerrilha do
Araguaia (1997), entre outras fontes.
Palavras-chave: Violência; Joca Reiners Terron; Noite dentro da noite.
A SOMBRA DE MATINTA PERERA: RELAÇÃO ENTRE MITO E CONTO DE FADAS NA OBRA "O DIA EM
QUE ENTERREI MIGUEL ARCANJO E OUTROS CONTOS DE FADAS", DE JAN SANTOS
Sarah Micaia Benevides Figueira
Resumo: O mito é uma tradução da realidade feita pelo humano, enquanto o conto de fadas é uma
história possível dentro desta realidade significada. Contos de fadas tem a característica de
ressignificar narrativas, arquétipos e símbolos, como obras contemporâneas tem mostrado em suas
reinterpretações desses contos, seja na literatura, no cinema ou na arte. O objetivo desta pesquisa
é analisar o mito da Matinta Perera na obra "O dia em que enterrei Miguel Arcanjo e outros contos
de fadas" (2019), de Jan Santos. De natureza quali-quantitativa, por ser analisada tanto a escrita
quando a temática do mito, a pesquisa é exclusivamente bibliográfica. Utilizou-se como base teórica
principal Mircea Eliade (1972, 1992) para conceituação do mito, Coelho (2020) para análise das
características do conto de fadas, e Cascudo (2012) quanto ao mito da Matinta Perera. O trabalho se
deu principalmente por Jan Santos ser um nome que está crescendo no cenário literário
amazonense, e por ser necessária uma valorização do mito amazônico. Feito o embasamento teórico
quanto ao mito, conto de fadas e mito da Matinta Perera, iniciou-se a análise do conto “Como Joana
deixou de ser criança”. Concluiu-se que, através da transformação da personagem Joana em Matinta
Perera, Jan Santos traz essa natureza do mito vivo que é a Matinta no norte do Brasil para
ressignificar o conto de fadas brasileiro.
Palavras-chave: Jan Santos; literatura de expressão amazonense; mitologia brasileira.
619
pequeno – porém, profundo – ensaio intitulado Vanguarda: renovar ou permanecer, mostra-se como
um exemplo dessa habilidade singular de Antonio Candido. Nesse texto, o autor indica como algumas
tendências estéticas das chamadas vanguardas europeias e do Modernismo brasileiro acabaram por
se transformar em elementos de rotina na formação do paideuma – como diria Ezra Pound – da
literatura nacional do século XX. Técnicas literárias como a supressão dos nexos sintáticos e a busca
de uma ordem espaço-temporal não linear acabaram por se tornar componentes imprescindíveis
para a forma literária que se pretende atual. Assim sendo, criou-se a perspectiva de que literatura
brasileira só possui valor na medida em que demonstra feição vanguardista, o que nos coloca diante
de um paradoxo, pois se a vanguarda é sempre algo provisório, como erigir o aspecto vanguardista
como um valor determinante? Rotinizar elementos de vanguarda não seria um modo de esmaecer o
caráter vanguardista que tais artifícios possuem? Para analisar essas e outras questões, a presente
comunicação pretende avaliar em que medida essa asserção de Antonio Candido se faz válida para
a literatura brasileira do século XXI. Esse exercício será feito por meio da análise de obras de duas
obras contemporâneas: 100 Coisas, de Fernando Bonassi, e Nove Noites, de Bernardo Carvalho.
Trata-se de duas propostas de construção literárias que são, a princípio, distintas, e será observado
em que medida se enquadram no processo de rotinização da vanguarda que Antonio Candido
identificou ainda no século XX.
Palavras-chave: Antonio Candido; Vanguarda; Literatura brasileira.
620
modo bastante resumido, podemos dizer que Antônio Candido formula uma espécie de gradiente
das funções do intelectual e da literatura ao longo do tempo. O autor de Formação da literatura
brasileira sugere que os intelectuais desenvolveram uma espécie de consciência, via literatura, que
vai da expressão do otimismo social, como forma compensatória das deficiências gerais do país,
forjada sobretudo durante o século 19, até uma consciência problemática do subdesenvolvimento,
do atraso. Na esteira das formulações de Antônio Cândido, a ideia da nossa comunicação é analisar
e discutir como alguns escritores, das primeiras três décadas do século 20, pensavam e lidavam
intelectualmente com a sua matéria. Mais especificamente, interessa-nos analisar como aquilo que
décadas depois foi chamado de consciência do subdesenvolvimento, por Antônio Candido, emergiu
talvez pela primeira vez em escritores como Alcides Maya, Hugo de Carvalho Ramos Monteiro Lobato
e também, tempos depois, numa figura como Graciliano Ramos. É por meio dos ensaios, dos artigos
e das crônicas desses escritores que pretendemos examinar a visão variada, mas sempre
problemática, contraditória e conflituosa, apresentada por eles da vida social econômica cultural e
literária do país. O ponto de partida comum entre eles se centra no fato de que todos pensam,
compreendem e lidam com a sua matéria a partir do espaço rural.
Palavras-chave: Antonio Candido; Consciência do subdesenvolvimento; Mundo rural; Ensaísmo.
621
romance”; “A personagem do romance” e “O Romantismo no Brasil”, além de outros textos que
abordam a teoria e a crítica de Candido acerca do romance e da formação da literatura brasileira,
como “Questões de romance: notas sobre Antonio Candido e a crítica brasileira”, de Teruki Otsuka,
e “O método crítico de Antonio Candido: forma, lírica e sociedade”, de Betina Bischof, entre outros.
Palavras-chave: Romance; Antonio Candido; Modernidade; Formação da Literatura Brasileira.
622
literatura en el lugar que le endilgó la tradición crítica moderna latinoamericana, como bien social,
cultural y ética-estéticamente válido.
Palavras-chave: Cándido; Tradición; Sistema; Función total; Literatura latinoamericana.
CAROLINA MARIA DE JESUS E JOSÉ DE CARVALHO, DOIS CASOS DE UMA FLANERIE NO SÉCULO XXI.
Tiago Mine Vieira
Resumo: Sob o signo da modernidade e dos grandes centros urbanos, discutiremos Carolina Maria
de Jesus com Quarto de despejo: diário de uma favelada (1960) e José de Carvalho com Buquê: cenas
de rua (2009), como dois fenômenos inicialmente estranhos e atípicos dentro da tradição e dos
estudos da bohème e da flanerie. Entranhados em vias públicas, ruas, espaços de passagem, ambos
os autores apresentam uma literatura típica das cidades em conformidade com a natureza e a
estrutura dessas paisagens. Ubicados à atividade de caminhar pelas ruas, suas obras desenvolvem-
se dentro dessa dinâmica e revelam traços de uma flanerie do baixo equador, uma errância que
contribui para a compreensão dessas literaturas diante dos desafios de leitura e compreensão dos
tempos atuais. Discutiremos em Quarto de Despejo uma superação da visão estrita do gênero diário,
em que a autora registra suas experimentações estéticas e cria sua visão de mundo como uma
flaneuse que se confronta com um país que se encontra às voltas com a invenção de sua própria
modernidade, essa perspectiva pretende contribuir com as demandas e os esforços decoloniais. Em
Buquê, trazemos para a discussão o escritor marginal, que busca recriar uma flanerie e uma bohème
pessoal dentro das contradições que o cercam no ombro a ombro com a cidade, clivando sua
produção para fora do mercado que, pela abordagem direta, corpo a corpo, faz chegar às mãos dos
leitores aquilo que escreve. Para dar concretude a essa análise, nos valemos de uma leitura que
leituras de Walter Benjamin e Antonio Cândido a respeito dos temas de modernidade e sistema
literário, compreendendo a noção de desenvolvimento histórico proposto por esses pensadores,
como ferramenta atual para repensar algumas questões inerentes à produção da vida e da arte no
século XXI.
623
Palavras-chave: Flanerie; Modernidade; Marginalidade; Gênero.
624
se processa na lucidez de sua cegueira; leitor excessivo que decifra os signos e os organiza em sua
escrita.
Palavras-chave: Jorge Luís Borges; soberania; mística; escrita;
625
por meio do abjeto, através de uma narrativa próxima ao horror, Falero constrói em sua escrita uma
experiência laboral utópica, através da ideia de divisão, de troca e de compartilhamento. Sob a
abordagem comparativista, analisaremos como as perspectivas dos autores se aproximam e se
distanciam. Assim, com essas obras, podemos tocar em políticas narrativas distintas para pensar a
condição do trabalhador do Brasil no século XXI e montar um cenário da posição da literatura
brasileira em relação ao espaço laborativo caleidoscópico e em desmonte do nosso tempo.
Palavras-chave: Trabalho; Ana Paula Maia; José Falero.
A MORTE COMO EXCESSO EM "UM SOPRO DE VIDA E A HORA DA ESTRELA" DE CLARICE LISPECTOR.
Joabe Nunes Dos Santos
Resumo: Todo texto escrito está imbricado com aquele que o criou e esse trabalho deseja
demonstrar como a partilha do sensível entre quem escreve e quem lê está aflorada em uma
profusão de momentos que compõem as duas obras finais de Clarice Lispector. Um Sopro de Vida
(1978) e A Hora da Estrela (1977) nota-se um movimento imanente das temáticas acerca da morte x
vida por meio de metáforas e simbologias desses dois movimentos dos quais o ser humano ocidental
partilha uma visão comum: nascimento – vida e morte – fim. Essa dicotomia de fim e começo é
quebrada pela escrita dessas obras no momento que nas palavras da autora o movimento pode ser
invertido e o que antes era começo pode ser o fim e o contrário idem. Amparado na teoria de
Georges Bataille, em seus famoso O Erotismo (2004) seguido de A literatura e o mal (2015) e A parte
maldita (2013), será analisado tais temáticas que envolvem uma a outra de maneira limítrofe.
Segundo o autor: “a vida é a negação da morte” (BATAILLE, 2004, p. 85) sendo assim, estamos o
tempo todo enquanto vivos negando de maneira veemente a morte que nos espreita. Já Clarice faz
o contrário, ela está constantemente colocando a morte em excesso nesses dois livros. O que para
Bataille se configuraria como um ato erótico. Será utilizado Gotibli (1995), Rancière (2000), Homem
(2012), entre outros, que compreendem o processo do fazer literário e da vida da autora, como
também dialogam com as temáticas pertinentes a esse trabalho. Nessas duas obras as temáticas
ficam nítidas ao ponto da autora mimetizar Macabéa e Ângela Pralini serem elas mesma,
estabelecendo um pacto ficcional que acaba por transformar também as obras em metalinguagem.
Palavras-chave: Clarice Lispector; vida; morte; autoria
626
SUPERPOSIÇÃO DE ESCRITAS NA FICÇÃO DE NOEMI JAFFE
Lígia Guimarães Telles
Resumo: A ficção brasileira contemporânea, na sua diversidade de tendências e de formas literárias,
traz como uma de suas possibilidades de realização aquelas marcadas pela hibridez, pela perda de
limites, pela transgressão a modelos estabelecidos, entre os quais os gêneros literários. Como uma
dessas realizações encontra-se a vasta e variada produção ficcional da escritora Noemi Jaffe,
particularmente no que tange à eleição de uma escrita prévia como estratégia narrativa, à qual
superpõe sua voz e sua escrita. Nessa vertente destacam-se os textos O que os cegos estão
sonhando? com o Diário de Lili Jaffe (1944-1945), publicado em 2012, e O que ela sussurra (2020).
Ambos têm como ponto de partida uma narrativa primeira que se realiza como forma de resistência:
no primeiro caso, resistência à experiência vivida em campos de concentração nazistas por Lili Jaffe
(mãe da escritora) durante a Segunda Guerra Mundial e, no segundo caso, resistência empreendida
por Nadejda Mandelstam contra o apagamento literal da escrita do seu marido, o poeta Óssip
Mandelstam, no contexto da Rússia stalinista, mediante utilização do sussurro contínuo e persistente
de seus poemas por ela memorizados como forma de salvá-los do esquecimento. Ao retomar textos
de outras escritoras e romper fronteiras históricas, geográficas, culturais, biográficas e subjetivas,
Noemi Jaffe questiona os limites das possibilidades expressivas e suplementa veredas abertas por
sua mãe Lili no Diário e por Nadejda Mandelstam em seus dois livros de memórias (1970; 1974), num
gesto simultaneamente estético e político.
Palavras-chave: Escrita; Resistência; Noemi Jaffe
627
noção da escrita criativa como gesto de contestação e de revolta contra sistemas ideológicos, sejam
eles sociais, políticos ou estéticos. A seguinte questão conduziu a investigação empreendida neste
trabalho: O que pode a escrita segundo as proposições de Bataille? Para dar mais consistência ao
debate, destacamos e comentamos passagens d' A experiência interior, d'O culpado bem como de
outras obras do autor. As reflexões sobre literatura e comunicação, empreendidas por pensadores
como Maurice Blanchot, Jean-Luc Nancy e Roland Barthes, bem com as discussões feitas por
Friedrich Nietzsche, no livro Genealogia da Moral, a respeito das noções de bom e mau, nos ajudaram
a pensar o tema proposto.
Palavras-chave: George Bataille; A literatura e o Mal; Comunicação; Contestação
"O MAIS DESERTO" - EXCESSO E CONTENÇÃO NA POESIA DE JOÃO CABRAL DE MELO NETO
Lucas Bezerra Facó
Resumo: A poesia de João Cabral de Melo Neto é conhecida pelo seu chamado à lucidez e à
contenção da expressão. A oposição ao excesso, ao "derramamento lírico" e à efusão sentimental
são algumas das posturas estéticas que Cabral defendeu ao longo de sua vida. À primeira vista,
poucos poetas parecem tão distantes de um pensador como Bataille. No entanto, acredito que o
filósofo oferece instrumentos interessantes para uma crítica dos consensos em torno da poesia de
Cabral. O título desta comunicação é retirado do poema "Alguns toureiros", do livro "Paisagens com
figuras". Poema em que Cabral presta homenagem a Manolete, toureiro espanhol cujo estilo de
tourear preciso e ascético Cabral via como afim à sua poética. É desse poema a máxima cabralina de
fazer poesia "sem perfumar sua flor/ sem poetizar seu poema". Se a lição do poema parece
corroborar a imagem de Cabral como um racionalista por excelência, é verdade também que a poesia
- e, mais do que ela, a escrita - é pensada como um jogo de vida e morte com uma força indomável,
contra a qual só podemos triunfar por meio da astúcia. O que torna o gesto poético belo, nessa
perspectiva, é que a sua serenidade é conquistada contra um fundo de horror, mas como se fosse o
produto de soberana liberdade - como se não houvesse um touro. Gostaria de apresentar este e
alguns outros poemas de Cabral que tematizam o ato de escrever. Espalhados ao longo de toda a
sua obra, estes poemas são interessantes pois com frequência permitem uma leitura que
desestabiliza os valores poéticos que, em outros momentos, são afirmados ou sustentados de forma
aparentemente dogmática. Quando tematiza a própria escrita, Cabral se aproxima mais da
concepção de Bataille segundo a qual a poesia é sempre, em certo sentido, um contrário da poesia.
Palavras-chave: escrita; joão cabral de melo neto; georges bataille; poesia;
628
(2014) e Barros (2012), esse trabalho utiliza contribuições como as de Ribeiro e Semedo (2011), Dutra
(2012) e Oliveira (2018).
Palavras-chave: Diálogos multiartísticos; literaturas guineenses e resistência; Raul Mendes
Fernandes.
629
vários estudiosos, o tratamento que Guimarães Rosa confere à linguagem, expressão de sua
profunda consciência do caráter de ficcionalidade da literatura, promove um estranhamento, como
diriam os formalistas russos, que garante à sua prosa um lugar diferenciado na produção literária
brasileira. Nesse sentido, a partir de alguns contos de Guimarães Rosa, do conceito de metáfora
absoluta, plasmado por teóricos e críticos, tais como Hans Blumenberg, Luiz Costa Lima, Modesto
Carone, e da reflexão contemporânea sobre mímesis, pretendo demonstrar que a metáfora absoluta,
base da linguagem da ficção literária, propicia o engendro de uma linguagem alusiva capaz produzir
o acontecimento do “não-fato”, do “não-tempo”, conforme registra o narrador de “Substância”, já
que, ampliando as considerações de Georges Bataille em relação à poesia, a ficção literária, ao operar
um desapossamento das coisas, produz algo que não existia antes, mas que passa ocupar o lugar das
coisas.
Palavras-chave: Ficção literária; Mímesis; Metáfora absoluta
630
soberana; enquanto o segundo é o subterfúgio estético que encobre uma estase generalizada
almejada pelo controle das massas. Assim, o informe segundo Bataille está necessariamente
interligado a um certo entendimento estético, político e ficcional do corpo e de sua respectiva nudez.
Com esta apresentação, desejo mapear a conjugação possível entre o informe batailliano e o que o
autor entende pelo processo de desnudamento – representado nos corpos de seus personagens em
meio a cenas de excesso e no movimento que o próprio escritor reconhecia estar presente em sua
filosofia.
Palavras-chave: Forma; Informe; Corpo; Nudez; Literatura Francesa
631
tem constituído seu projeto estético tanto enquanto forma de memória da guerra, dos conflitos, dos
sonhos (falidos) do socialismo, das disputas internacionais operadas em território nacional, como
também da falência de utopias e enquanto performance de contestação de identidades nacionalistas
homogêneas e encapsuladas, que negam a diversidade, a diferença, em nome de uma pertença
limitada a um imaginário de nação e de comunidade.
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sol durante a noite). Göttingen, Germany: Steidl/Goethe-Institut, 2016.
632
aparelhos reprodutivos. Entre os princípios simbólicos da lógica da dominação, o mais eficiente é o
da propriedade distintiva corporal (BOURDIEU, 2010), o que explica a importância que o corpo ganha
a partir da colonização (OYEWUMI, 2021). Muito da constelação de imagens racistas até hoje
disponíveis se produziu no âmbito dos relatos escritos pelos colonos na consagração da empreitada
imperialista, nos quais observamos ora uma invisibilização dos corpos africanos, ora a sua
depreciação, por vezes realizada, justamente, pela exacerbação depreciativa dos traços distintivos
corporais. Levando em conta tais considerações, pretende-se analisar, no presente trabalho, as
representações dos corpos, sobretudo os corpos femininos, na escrita literária, refletindo sobre os
caminhos percorridos pela escrita de mulheres, em Noémia de Sousa e Paulina Chiziane - duas
autoras de grande representatividade no cânone moçambicano -, para a constituição de
representações do corpo. Realizar-se-á tal estudo a partir de alguns dos poemas de Noémia de Sousa
presentes no livro Sangue Negro e do romance Balada de Amor ao Vento, de Paulina Chiziane,
atentando-se para os possíveis diálogos entre suas obras e para algumas convergências que se
podem surpreender com outros autores moçambicanos e de outros países do continente africano.
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OF WHEAT, DE NG?G? WA THIONG’O
Iuri da Silva Gomes
Resumo: Esta comunicação tem como objetivo analisar a obra A Grain of Wheat, de Ng?g? wa
Thiong’o, publicada em 1967, na primeira década da independência do Quênia. Trata-se de um
romance no qual Thiong’o mapeia cuidadosamente, tocando nos momentos-chave da imaginação
nacional os movimentos de massa mais longínquos até os atuais que levaram o país aos festejos de
celebração da Uhuru, da liberdade, em 12 de dezembro de 1963 (GIKANDI, 2015), com foco na
revolta Mau Mau. Embora o levante tenha sido derrotado, para muitos quenianos esse evento é
visto como um passo significativo que culminou na independência do país, já que o grupo de
637
guerrilheiros empreendia campanhas de ataque a europeus e africanos colaboracionistas do regime
colonial. O pós-independência e os feitos da guerrilha são louvados e ao mesmo tempo questionados
no romance, à medida que o narrador revela o papel de cada personagem na construção da
independência. Quanto ao lugar dos Mau Mau nesse ambiente discursivo, Oliveira (2018) pontua
que o romance é um tributo aos guerrilheiros e uma denúncia contra o regime pós-colonial, que
nunca reconheceu os seus esforços. Assim, a presente discussão pautará: 1) o movimento
guerrilheiro Mau Mau no Quênia; 2) a representação da guerrilha na obra de Thiong’o, e o por que
desse “representar” assumir o lugar de um “tributo” – trata-se de uma sugestão de identidade para
o novo período?; 3) o caráter que assume o texto literário que incorpora a História e a faz
personagem de seus eventos; 4) por fim, a junção dos principais elementos dessa proposta e seu
encaminhamento, à luz do significado da frase em suaíli, e que representa o Movimento Mau Mau:
“Mzungu arudi Ulaya, mwafrika apate uhuru”, que significa “Que o estrangeiro regresse à Europa,
para que os africanos possam recuperar a independência”.
Referências: ARISTÓTELES. Poética. Tradução e notas de Anna Maria Valente. Lisboa: Fundação
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638
qual as escritoras compartilham suas experiências individuais do processo que desaguou no
genocídio; é, principalmente, um elemento constitutivo da humanidade de suas personagens, com
destaque para a figura materna, ligada à transmissão de saberes que também ficaram sob risco.
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639
LES SOLEILS DES INDÉPENDANCES COMO ESTRUTURA NARRATIVA DA (DES)ILUSÃO PÓS-
NACIONALISTA NA COSTA DO MARFIM
Providence Bampoky
Resumo: O despertar da consciência nacional, fundamento das literaturas de língua francesa no
continente africano, em plena época colonial, constituiu um momento crucial na história das
literaturas que virão a ser marcadas pelos países em que surgem e evoluem. Ao longo da história, as
mais diferentes correntes de pensamento conceituaram a literatura como um mecanismo portador
e refletor do mundo social em que ela surge. É nessa lógica que nasce o romance do marfinense
Ahmadou Kourouma, Les soleils des indépendances escrito entre 1963 e 1965 e inscrito na corrente
dos “romances de desencanto” (CHEVRIER, 1990, p. 115), por quebrar o silêncio sobre a
desconstrução que sofreu o ideal dos movimentos de libertação nacional depois das independências,
os infortúnios deixados pela colonização e as ditaduras que os sucederam (MAMDANI, 1998; STOLER,
2016), mas sobretudo por ser um pretexto para mostrar ao mundo a realidade do continente
africano no período pré e pós-colonial. Essa comunicação busca analisar a experiência da violência
política ligada à era do partido único na Côte des Ébènes (país fictício da Costa do Marfim) e ao seu
impacto sobre a sociedade tradicional marfinense que sucumbe sobre o peso dos valores trazidos
com a colonização e perpetrado pelo novo regime pós-independência.
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MESTRE KAPELA E BINELDE HYRCAN: UMA APROXIMAÇÃO ENTRE ARTES VISUAIS E MEMÓRIA EM
ANGOLA
Taiana de Araujo Machado
Resumo: Nkali é uma palavra em igbo que, em tradução livre, quer dizer “ser maior do que o outro”.
A autora nigeriana Chimamanda Adichie (2019) recupera essa palavra para nos lembrar das
dinâmicas de poder que atravessam as histórias: como as contamos, quem as conta, quando e
quantas são contadas. A manipulação de tais dinâmicas perpetuam estereótipos e estruturas de
poder que inferiorizam o outro. Quando falamos da história dos países africanos de língua oficial
portuguesa (os PALOP) é preciso atentar para como sua produção artística e literária tem
apresentado autores e autoras alertas e críticas da sua própria condição interna no contexto pós-
independência. No entanto, como professores, editores e pesquisadores brasileiros seguimos nos
debruçando sobre os registros heroicos das lutas de libertação, enfatizando autores fundacionais
que promovem projetos nacionais restritos a uma narrativa. Dessa forma, contraditoriamente
acabamos por reiterar uma história única sobre esses países e reincidimos no erro de um olhar
estereotipado para essas sociedades, tomamos narrativas atravessadas por dinâmicas de poder
como as únicas narrativas possíveis. A presente comunicação parte do conceito de memória coletiva
de Hobswachs (2006) para propor uma análise da produção de Paulo Kapela e Binelde Hyrcan, ambos
artistas plásticos angolanos que buscam reinventar histórias e propor um olhar crítico sobre sua
sociedade a partir de diferentes pontos de vista. Assim, traçamos um paralelo entre artes visuais e
memória para ilustrar como as novas gerações têm apresentado reinvenções de resistência e
contestação a partir de outras imaginações da história de Angola; lembrando a nós, pesquisadores,
sobre as vozes díspares que compõe o mosaico de formação dessas nações.
Referências: HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Trad. Beatriz Sidou. São Paulo: Centauro,
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em 09 de janeiro de 2023.
641
legislação penal brasileira, que surge no intuito de prevenir essas violências e punir aqueles que a
perpetram ou praticam. A escolha do estudo de dois romances contemporâneos de autoras distintas
foi feita pela possibilidade de ampliar e comparar modos de se narrar essas violações em diferentes
textos literários, pontuando alguns tipos de abusos que são reconhecidos como crime, e, passíveis
de punição. Em Mulheres Empilhadas (2019) é possível refletir, principalmente, sobre a questão do
feminicídio – ou o assassinato de mulheres. Ao longo da narrativa, a narradora denuncia diversos
casos de violência contra mulheres de várias etnias, idades e classes sociais, incorporando ao enredo
indicações de casos factuais e os autos de processos jurídicos no Brasil. Já no romance O peso do
pássaro morto (2017), a representação da dor tem foco no estupro sofrido pela narradora. Com a
análise realizada até aqui percebemos, sobretudo, a dificuldade das personagens em elaborar os
traumas sofridos – falar sobre eles ou denunciá-los – e a ineficácia do sistema penal ao lidar com
casos de violência contra a mulher.
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jun. 2022.
643
corpo social, o poder será compreendido em sua característica microfísica, plural, que permeia
capilarmente os corpos ao ponto de produzi-los, que não se encontra apenas em âmbitos
institucionais, que não se detém, não se troca, mas que se exerce, se dá na ação, (re)produzindo
relações de poder. Deste modo, não há relações de poder sem resistências, sendo exercidas ali
mesmo aonde o poder se apresenta, em outras palavras, a resistência é compatriota do poder. Ela
existe tanto mais quanto esteja ali onde está o poder, a partir do poder e configura sua característica
relacional. Tendo o dito e não dito enquanto elementos próprios do dispositivo, no caso de Los
Vigilantes (1994), a rede que se estabelece entre tais elementos apresenta peculiaridades
panópticas, sendo um mecanismo de poder que se exerce sobre os indivíduos a partir da vigilância
individual e contínua, em forma de controle de punição, recompensa e de correção, isto é, de
formação e transformação dos indivíduos em função de certas normas.
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PELOS FIOS DA MEMÓRIA - PODER, SEXUALIDADE E VIOLÊNCIA EM MANO, A NOITE ESTÁ VELHA
DE WILSON BUENO
Eliza da Silva Martins Peron
Resumo: Resumo: A noção de gênero é um constructo social. A sociedade é instituída sob a lógica
do patriarcado e, sua estruturação, para além da família, pode ocorrer também no âmbito estatal.
Com o artigo pretendemos demonstrar as diferentes facetas do autoritarismo derivado desse poder
patriarcal e impostos de formas sub-reptícias e instituídas sob o pretexto de preservar a sociedade
monogâmica e o refreamento do “diferente” como algo a ser contido. O resultado são as memórias
traumáticas em que os desejos são mediados pelos estratos sociais. Observe-se que o refreamento
não se concentra somente na figura do pai ou da família enquanto patriarcado, mas também nas
relações cotidianas estabelecidas pela sociedade e, principalmente por outras figuras imanentes a
tais impedimentos personificado na figura do Estado. Para analisarmos utilizaremos o romance
póstumo de Wilson Bueno, autor paranaense - Mano, a noite está velha (2011) obra que possibilita
tanto a verificação de autoritarismos praticados no espaço das ruas em relação à figura dos
homossexuais e travestis quanto por desvelar outra forma de dominação, a que se perpetra pela
figura do pai. Para narrar, o autor vale-se da memória, recurso propício à reflexão sobre a
sexualidade, o autoritarismo, a violência e a morte. Como suporte teórico utilizaremos Focault,
Achile Mbembe, Giorgio Agamben, Pierre Bourdieu e outros que vierem a contemplar a temática.
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645
parte da protagonista. Num terceiro momento, quando somos atravessados pela temática da
resistência dos grupos historicamente oprimidos, como no desejo esperançoso de construção de
uma história a contrapelo, como propõe Walter Benjamin a partir da constatação de que não existiria
documento histórico de cultura que não fosse também documento de barbárie (2005, p.70). Daí que
nossa tarefa, como professoras, historiadoras feministas da literatura, seria então a de revolver
escombros, garimpar entulhos, buscar pelo legado que desapareceu, lembrando que o que está
morto na história pode ressuscitar (Schmidt e Ramos 2005, p.220).
Referências: KEHL, Maria Rita. O mal-estar persiste. Disponível em:
https://quatrocincoum.folha.uol.com.br/br/artigos/cinema/o-mal-estar-persiste. Acesso em 20 de
novembro de 2022. LOWY, Michael. Walter Benjamin: aviso de incêndio. Uma leitura das teses
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Marie Gagnebin e Marcos Lutz Müller. São Paulo: Boitempo, 2005. MENDONÇA FILHO, Kleber.
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Vitrine Filmes. 1 DVD, 141 min., widescreen, co- lor. son, 2016. SCHMIDT, Simone Pereira; RAMOS,
Tânia Regina. Resenha Escritoras brasileiras do século XIX: antologia. In: Graphos - Revista da Pós-
Graduação em Letras - UFPB João Pessoa, Vol 7., N. 2/1, 2005 – p. 219-222. WITTGENSTEIN, Ludwig.
Investigações filosóficas. Trad. José Carlos Bruni. Coleção Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural,
1979.
646
AS MARCAS DA VIOLÊNCIA COMO CONSTITUINTES DO SUJEITO EM O PESO DO PÁSSARO MORTO,
DE ALINE BEI, E YOUNG MUNGO, DE DOUGLAS STUART
Jorge Alves Pinto
Resumo: Ao atingir os corpos de diferentes modos, a violência deixa marcas capazes de transformar
os sujeitos, tornando-se ela mesma uma experiência constituinte de suas subjetividades. Partindo
do pressuposto de que enxergar as histórias pelo viés das sensibilidades nos permite levar em maior
consideração as emoções e as subjetividades (PESAVENTO, 2004), o presente trabalho estabelece
um estudo comparativo entre duas obras, uma brasileira, a saber O Peso do Pássaro Morto, de Aline
Bei (2017), e uma escocesa, Young Mungo, de Douglas Stuart (2022). Em ambos os textos,
encontramos protagonistas que passam por um episódio de estupro; no de Aline Bei, uma jovem e,
no de Douglas Stuart, um jovem gay. As duas personagens fazem parte de grupos que são
historicamente alvos de formas distintas de violência. Diante disso, nosso objetivo é investigar quais
as motivações para os atos de violência cometidos e como as vítimas são afetadas por eles. Para
tanto, nosso aporte teórico consiste em Gomes (2013; 2014), Figueiredo (2019) e Dutra (2019) para
discorrermos acerca da violência contra a mulher e o femicídio na literatura brasileira
contemporânea; em Brownmiller (1975) e Bourke (2009) para discutirmos a questão do estupro e
suas consequências; em Bourdieu (2022) e Connel e Messerschmitt (2013) para argumentarmos as
relações entre masculinidade hegemônica e violência. Por fim, compreendemos que as instâncias de
poder que circulam entre os indivíduos (FOUCAULT, 2022) colaboram para o processo de sujeição
(BUTLER, 2020), que é continuamente construído.
Referências: BEI, Aline. O Peso do Pássaro Morto. São Paulo: Editora Nós, Edith, 2017. BOURDIEU,
Pierre. A Dominação Masculina. Tradução Maria Helena Kühner. - 20ª ed. - Rio de Janeiro: Bertrand
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psíquica do poder: Teorias da sujeição. Tradução Rogério Bettoni - 1ª ed. - Belo Horizonte: Autêntica,
2020. CONNELL, Robert W. e MESSERSCHMIDT, James W.. Masculinidade hegemônica: repensando
o conceito. Revista Estudos Feministas [online]. 2013, v. 21, n. 1 [Acessado 6 Janeiro 2023], pp. 241-
282. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0104-026X2013000100014>. Epub 09 Maio 2013.
ISSN 1806-9584. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2013000100014. DUTRA, Paula Queiroz. Entre
a dor e o silêncio: a violência contra a mulher em romances contemporâneos. 2019. 178 f. Tese
(Doutorado em Literatura)—Universidade de Brasília, Brasília, 2019. FIGUEIREDO, Eurídice. Violência
e sexualidade em romances de autoria feminina. Revista Interdisciplinar, v. 32: Ano XIV - jul-dez de
2019. FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Introdução, organização e revisão técnica Roberto
Machado - 13ª ed - Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022. GOMES, Carlos Magno. Marcas da violência
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[online]. 2014, v. 22, n. 3. PESAVENTO, Sandra. Sensibilidades: escrita e leitura da alma. In:
Sensibilidades na história: memórias singulares e identidades sociais. Organizado por Sandra
Psavento e Frédéric Langue. Porto Alegre: Editora da UFRGS. STUART, Douglas. Young Mungo.
London: Picador, 2022.
647
feita pela narradora, como uma mulher-recolhida, uma barata, percebemos que a literatura, a
disputa das narrativas, tal qual proposto por Donna Haraway, a aproxima dos ciborgues, ao usarem
a linguagem/ literatura para sua emancipação e "cura". Para tratar dos aspectos dessa mulher
recolhida, em relação ao corpo e a identidade, dialogamos com Reich e com a visão somática, trazida
por João da Mata. Por fim, apontamos, ainda, uma discussão em torno da postura passiva da
psicanalista presente na obra.
Referências: FOUCAULT, Michel. Nascimento da biopolítica: Curso dado no Collège de France
(1978-1979). São Paulo: Martins Fontes, 2008. ____________. História da Sexualidade I: a vontade
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para todo mundo. São Paulo: Rosa dos Tempos, 2018. MATA, João da. Introdução à Somaterapia. Rio
de Janeiro: Ed. Circuito, 2020. NETTEL, Guadalupe. O corpo em que nasci. Trad. Ronaldo Bressane.
São Paulo: Rocco, 2013. RANCIÈRE, Jacques. Políticas da Escrita. São Paulo: Editora 34, 2017. REICH,
Wilhelm. Escute, Zé-Ninguém! São Paulo: Martins Fontes, 2007. ____________. A revolução sexual.
Rio de Janeiro: Zahar, 1980. ____________. A análise do Caráter. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
648
enquanto corpos de direito. Estudar o animal escrito, ou seja, o animal presente na literatura,
também significa estudar a nossa relação enquanto animais humanos com outros seres animais,
explorando as fronteiras entre humanidade e animalidade tensionadas na obra em questão. Segundo
Giorgi (2016), a partir da década de sessenta, o animal passa a aparecer cada vez mais como um
signo político nos textos literários latino-americanos, indicando uma tendência que perdura até hoje.
Júlia, mãe de Daniel e desaparecida durante a ditadura militar brasileira, luta contra a possibilidade
de ser reduzida a um mero corpo, embora isso continue acontecendo reiteradamente. Sua
associação ao mundo animal é uma das maneiras que seus algozes encontram de suspender ainda
mais seus direitos e tentar justificar suas sessões de tortura, principalmente nas passagens em que
a chamam de “porca”. Contudo, é por meio de seus próprios corpos que as personagens resistem. É
ao ressignificar seus corpos inseridos em um ambiente de desumanização e violência extrema que
as personagens são capazes de encontrar conforto umas nas outras. Esse contrapoder reafirma as
subjetividades que o regime ditatorial tenta o tempo todo negar. Trata-se de uma resistência
biopolítica.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer: O poder soberano e a vida nua I. Tradução de
Henrique Burigo. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002. ______. O aberto. O homem e o animal.
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animal que logo sou (A seguir). Tradução de Fábio Landa. São Paulo: Editora UNESP, 2002.
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interminável. Rio de Janeiro: Record, 2019. LESTEL, Dominique. A animalidade, o humano e as
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biopolítica. Florianópolis: Editora da UFSC, 2011. p. 23-54. MACIEL, MARIA E. Literatura e
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Florianópolis: Editora da UFSC, 2011. p. 117-148. PELBART, Peter P. Vida capital: ensaios de
biopolítica. São Paulo: Iluminuras, 2011.
649
pelas ex-combatentes, lidar com o machismo, sexismo, misoginia, preconceito e sobretudo com o
esquecimento da sociedade que não creditaram a elas as mesmas honras que concedeu aos homens
no pós-guerra. Assim, teceremos nossas reflexões embasadas nas considerações de Walter Benjamin
sobre a ideia de ganhar e perder uma guerra, bem como nas contribuições de Paul Ricoeur sobre
memória como construção do conhecimento histórico, além das ponderações de Chimamanda
Adichie sobre os perigos de uma única história e as de Simone Beauvoir sobre “ser mulher”.
Referências: ADICHIE, Chimamanda. O Perigo de uma Única História. ADICHIE, Chimamanda Ngozi.
Conferência TED: Os perigos de uma história única. 2011. Disponível em:
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Simone de. O Segundo Sexo. Vol. II. 3.ed. Trad. Sérgio Milliet. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016b
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Universitária, 2015. FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências
humanas. 9. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. RICOEUR, Paul. A memória, a história, o
esquecimento/ Tradução: Alain François [et al.]. – Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2007 SILVA,
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http://https://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/artemis/article/view/61154 ISSN: 1807-8214 V. 32
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do ECAD, 2021. Disponível em BalancoSocial2021.pdf (ecad.org.br) . Relatório Por elas que fazem a
música, 2022. Disponível em relatório-2022 (ubc.org.br) .
651
verificação de como esse ideário relacionado à guerra tem sido utilizado como metáfora para
estabelecer a presença da abordagem da epidemia emergente no início da década de 1980 nas obras
indicadas e como essa abordagem ainda se perpetua em produções mais recentes, promovendo o
corpo a campo de batalha da representação dessa “guerra”.
Referências: AROSA, Guido. O complexo melancólico. Rio de Janeiro: Garamond, 2019. BASTOS,
Francisco Inácio. Aids na terceira década. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006. BASTOS, Francisco
Inácio. “Da persistência das metáforas: estigma e discriminação & HIV/Aids”. In: Monteiro, Simone;
Villela, Wilza (Org.). Estigma e saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2013. SCHURMMAN, Heloisa.
Pequeno segredo: um amor maior que a vida. Rio de Janeiro: HarperCollins, 2016. SONTAG, Susan.
Aids e suas metáforas. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. VIEIRA, Isabel. Amarga herança de
Leo. São Paulo: FTD, 1999.
652
demandas a qualquer custo, sem limitar-se a preceitos éticos ou morais. Na defesa da reputação de
seus clientes, o detetive agride corpos alheios, os quais são, frequentemente, também mobilizados
para satisfação de desejos e caprichos. Fonseca aponta para a transgressão violenta enquanto regra
na atuação dos indivíduos da classe dominante, sempre em contato com a marginalidade
submetendo-a a sua vontade. Para a reflexão, é pertinente o pensamento sobre a narrativa policial
enquanto gênero, de autores como Ernest Mandel, Daniel Link e Sandra Lúcia Reimão. Esses autores
trazem a ideia de que a narrativa policial proporcionaria um modo de entendimento das relações
entre o crime, a justiça e o poder, de modo que um caso policial particular traria ideias sobre o
contexto social geral. Além disso, observações sobre o panorama político e literário da época de
Antonio Candido, Flora Sussekind e Roberto Schwarz são importantes
Referências: ARENDT, Hannah. Da violência; tradução de Maria Cláudia Drummond. Sabotagem,
2004. Disponível em:
http://pavio.net/download/textos/ARENDT,%20Hannah.%20Da%20Viol%C3%AAncia.pdf. Acesso
em: 19 de dez. de 2022. AVELAR, Idelber. A genealogia de uma derrota. In: Alegorias da derrota: a
ficção pós-ditatorial e o trabalho do luto na América Latina. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.
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Crítica e sociologia. In: Literatura e sociedade. 13ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre azul, p. 13-25, 2014.
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Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. FONSECA, Rubem. Feliz Ano Novo. 2ª ed. São Paulo: Companhia
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McCartney. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015. GINZBURG, Jaime. Literatura, violência e
melancolia. Campinas: Autores Associados, 2012. LINK, Daniel. O jogo dos cautos (sobre o policial).
In: Como se lê e outras intervenções críticas. Chapecó: Argos, p. 69-89, 2002. MANDEL, Ernest.
Delícias do crime: história social do romance policial. São Paulo: Busca Vida, 1988. NIETZSCHE,
Friedrich Wilhelm. Além do bem e do mal: prelúdio a uma filosofia do futuro; tradução de Paulo
César de Souza. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2005a. ______. Genealogia da moral;
tradução de Paulo César de Souza. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2005b. ______. A gaia
ciência; tradução de Paulo César de Souza. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. REIMÃO,
Sandra Lúcia. O que é o Romance Policial? 2ª ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1989. SANTIAGO,
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estudos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 61-92, 1978. SUSSEKIND, Flora. Tal Brasil, Qual Romance? Rio
de Janeiro: Edições Achiamé, 1984.
653
traumática como motor propulsor para representar a Ditadura Militar brasileira, contribuindo para
uma memória de caráter coletivo.
Referências: BENJAMIN, Walter. O anjo da história. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2016. BOSI,
Alfredo. Literatura e resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. CANDIDO, Antonio.
Literatura e sociedade. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2006. DALCASTAGNÈ, Regina. O espaço da
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(org.). O que resta da ditadura. São Paulo: Boitempo, 2010. SELIGMANN-SILVA, Márcio (org.).
História, memória, literatura: o testemunho na Era das Catástrofes. Campinas, SP: Editora da
Unicamp, 2003.
654
mais que uma breve menção à obra, inclusive com imprecisões acerca de aspectos como data de
confecção e extensão. Coube ao poeta e ensaísta José Paulo Paes oferecer ao público brasileiro uma
bela edição bilíngue da obra acompanhada de um estudo crítico que esquadrinha a "retórica do
orgasmo" que, segundo ele, consubstancia a obra. O pujante e mordaz estilo satírico da poética
aretiniana se coloca como um libelo imortal à emancipação da criação literária frente às coações da
agenda moral ou da sujeição ao interesse mecenato, em um raro momento histórico de ampliação
do arco de liberdade no âmbito da Renascença italiana. Nosso trabalho pretende resgatar a força
seminal destas "bagatelas licensiosas", conforme nomeadas por seu autor, em sua celebração
impudica e hedonista do princípio do prazer dedicada a todos os censores hipócritas que conservam
o "sujo costume de dizer aos olhos que não podem ver o que mais os deleita".
Referências: ALEXANDRIAN. História da literatura erótica. Tradução de Ana Maria Scherer e José
Laurênio de Mello. Rio de Janeiro: Rocco, 1993. ARETINO, Pietro. Sonetos luxuriosos. Tradução,
ensaio crítico, notícia biográfica e notas de José Paulo Paes. Rio de Janeiro: Record, 1981. PAES, José
Paulo. Notícia biográfica; Uma retórica do orgasmo. In: ARETINO. Op. cit.
ENTRE A SOMBRA E A LUZ, OU O QUE HÁ EM COMUM ENTRE EURÍDICE GUSMÃO E DILMA ROUSSEF
Anne Greice Soares La Regina
Resumo: A comunicação propõe uma análise da difícil dialética entre a invisibilidade histórica das
mulheres no Brasil e a conquista da presidência do país em 2010, fato que colocou a primeira
presidenta da república no centro dos holofotes. Privilegia-se, como ponto de partida, compreender
historicamente as narrativas que determinaram a invisibilidade pública da mulher na sociedade,
formatando-a como um fantasma social, uma presença-ausência constante e irresolvível, como na
história contada por Martha Batalha, um drama que não é particular, mas coletivo, pois percorre a
existência de todas as personagens da trama, mulheres que viveram na cidade do Rio de Janeiro
entre as décadas de 1940 e 1950, marcadas pela impossibilidade, pela negação de si mesmas e de
655
suas existências desejantes. A experiência do sofrimento político é o fio condutor e o elo entre as
vidas contadas pela autora para delinear a humilhação social que é parte do cotidiano de todas elas,
afetando-as psicologicamente, apesar de se originar de um fato político que decorre da desigualdade
política praticada, tolerada e fundamentada nas sociedades pelas mais diversas narrativas. Passados
cinquenta ou sessenta anos, observa-se uma mudança no que diz respeito à participação feminina
na sociedade, principalmente com a eleição de Dilma Roussef em 2010 e com a renovação do seu
mandato em 2014. Pretende-se investigar o que significou esta decisão do eleitorado e como outras
forças sociais agenciaram os mais diversos interesses para mobilizar narrativas que, girando em torno
do governo, em geral incidiam e alvejavam menos a chefe de Estado e mais a mulher ocupante de
um cargo público, sobre quem pousavam todas as luzes e atenções. Busca-se refletir em que medida
discursos arraigados e ainda remanescentes na sociedade contemporânea tensionam com as novas
visibilidades femininas.
Referências: BATALHA, Martha. A vida invisível de Eunice Gusmão. São Paulo: Companhia das Letras,
2016. DEMOCRACIA EM VERTIGEM. Direção: Petra Costa. Produção de Joanna Natasegara, Shane
Boris, Tiago Pavan. Brasil: 2019. Disponível na Netflix. GONÇALVES FILHO, José Moura. A
invisibilidade pública. COSTA, Fernando Braga: ______. Homens invisíveis. São Paulo: Editora Globo,
2004. p. 09-47. FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. 17 ed. Tradução de Laura F. A. Sampaio.
São Paulo: Loyola, 2008. SCOTT, Joan. A história das mulheres. BURKE, Peter (Org). A escrita da
história: novas perspectivas. Tradução de Magda Lopes. São Paulo: Editora UNESP, 2011.
656
Resumo: Como vaticinou Ana Cristina Cesar, em “Literatura e mulher: essa palavra de luxo”, a
discussão acerca da escrita de autoria de mulheres se encontra, ainda, longe de um remate, a
despeito dos questionamentos impelidos sobre a categoria “mulher”, a partir das fundamentações
de pensadoras como Audre Lorde e Judith Butler, que se desdobram há décadas. A quantidade de
simpósios, na presente Abralic, que privilegia o debate teórico mediante uma perspectiva de gênero
confirma tal afirmação. Nesse encadeamento, esta proposição parte do desejo de compreender
certo ímpeto violento encontrado em alguma poesia escrita por mulheres, materializado na
insistência de determinado gesto perfurador presente nessas obras, cujas temáticas tratam de
impasses que se apresentam à contemporaneidade, como a questão reprodutiva, a violência, a
desigualdade entre os estratos sociais no Brasil etc. Para além do enfrentamento do androcentrismo
branco, esse atributo belicoso será contraposto com um caráter propositivo que constitui, também,
esses projetos literários, considerando as ferramentas – punho, martelo, coice e bombas – e os
artifícios poéticos – humor causticante, manejo da brutalidade, recursos visuais etc. – utilizados pelas
autoras. Dentro desse contexto, este estudo observará como as poetas, em seus trabalhos, criam
aberturas para outros sentidos, no que diz respeito ao que se convencionou chamar de “mulher”,
“feminino” e “nacional”. Para tanto, esta comunicação lançará mão dos livros Um útero é do
tamanho de um punho, de Angélica Freitas; O martelo, de Adelaide Ivánova; O coice da égua, de
Valeska Torres; e Onde estão as bombas, de Tatiana Pequeno. Por fim, com o auxílio de reflexões
irrompidas por Heloisa Buarque de Hollanda, em As 29 poetas hoje, pretende-se trazer breves
apontamentos sobre a presença da referida poética na cena contemporânea, tendo em vista a
possibilidade de construção de um novo cânone, em se tratando da poesia de autoria de mulheres.
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução:
Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2020. CESAR, Ana Cristina. Crítica e tradução.
Prefácio: Alice Sant'Anna. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. FREITAS, Angélica. Um útero é do
tamanho de um punho. São Paulo: Cosac Naif, 2012. HOLLANDA, Heloisa Buarque de (Org.). As 29
poetas hoje. São Paulo: Companhia das letras, 2021. IVÁNOVA, Adelaide. O martelo. Rio de Janeiro:
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Editora, 2019. PEQUENO, Tatiana. Onde estão as bombas. Juiz de fora: Edições Macondo, 2019.
TORRES, Valeska. O coice da égua. Rio de Janeiro: Editora 7Letras, 2019.
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Victoria Colonna. 2.ed.Rio de Janeiro: Garnier, 1881. COLONNA, Victoria. As manhãs de uma avó:
leitura para a infância dedicada às mães de família. 2a ed. melhorada. Rio de Janeiro: B. L. Garnier,
1877. Disponível em: <gallica.bnf.fr> CHARTIER, Roger. A mão do autor e a mente do editor. São
Paulo: Ed. Unesp, 2014. COELHO, Nelly Novaes. Dicionário crítico da literatura infantil e juvenil
brasileira. São Paulo: EDUSP, 1995. COELHO, Nelly Novaes. Literatura infantil: teoria, análise,
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Infantil/Juvenil. 3 ed. São Paulo: Quiron, 1985. ELEUTÉRIO, Maria de Lourdes. Vidas de Romance. As
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(1973) é possível desvendar o lugar do corpo feminino e as representações de violência de gênero
que aparecem nos romances. A esse respeito, primeiramente nos interessa traçar quais foram esses
episódios e quais identidades foram desconstruídas a partir dessas representações. Com tal
dinâmica, busca-se através desta pesquisa entender as convergências e divergências presentes
nessas representações e como estes corpos femininos impulsionam o texto literário. Para tal,
buscarei teóricos/as dos estudos literários tais como: bell hooks (2018), María Lugones (2019),
Guacira Lopes Louro (1997), Constância Lima Duarte (2009), Carlos Magno Gomes (2010), Regina
Dalcastagnè (2001), Angela Davis (2016), Heleieth Saffioti (2015), dentre outros/as.
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complexidade sem estruturas essencialistas da herança literária. Pretende-se, assim, discutir a
subjetividade de Mitsuko a partir de suas lembranças pelo espaço, e como estas se relacionam na
revisão do cânone.
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Volto semana que vem se inscreve em uma longa e hoje reconhecida tradição de mulheres que
(re)emergem literariamente após os anos de chumbo, seja através das memórias das sobreviventes,
seja por meio das histórias contadas pelas descendentes de militantes (DI EUGENIO, 2020). As
autoras interseccionam, assim, tal como quem traça uma arqueologia do golpe de 2016, a herança
ditatorial e o novo avanço do protofascismo. Demonstro, por fim, como tais narrativas não se
resumem a registrar fatos históricos ou a descrever as agruras e violências enfrentadas pelos
movimentos sociais, mas se propõem, como obras esteticamente multifacetadas, a reconstruir, a
partir da ótica da subjetividade recalcada e traumatizada, os caminhos da memória-reflexão. Esse
processo tenta tirar sentido do fantasma golpista incrustado no imaginário cultural do Brasil-nação,
a fim de desvelar o inaudito histórico e, assim, quebrar sua corrente de padrões atávicos de opressão,
injustiça social e autoritarismo.
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poesia. Sua obra foi reunida no volume Emoção e memória – obra poética reunida 1949-1999,
porém, sua poesia ainda espera por apurados trabalhos de crítica literária.
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666
AS MULHERES E AS DITADURAS NA AMÉRICA DO SUL: TENSIONAMENTOS ENTRE FICÇÃO,
HISTÓRIA, FEMINISMO E RECONSTRUÇÃO DE MEMÓRIA EM ROMANCES DE AUTORAS
CONTEMPORÂNEAS
Natasha Centenaro
Resumo: Este trabalho analisa e discute as relações entre a literatura produzida por autoras e a
temática das ditaduras militares sul-americanas, especificamente, nos casos da brasileira e
argentina. Para isso, foram escolhidas duas narrativas em prosa publicadas no Brasil
contemporaneamente, Azul-corvo (2010), de Adriana Lisboa, e Mulheres que mordem (2015), de
Beatriz Leal. Nos livros, é possível perceber como a perspectiva das protagonistas, sendo uma
narradora autodiegética, em Azul-corvo (2010), além de outras personagens mulheres, relacionam-
se com questões como a memória, os traumas, a (im)possibilidade de superação dos acontecimentos
ainda recentes nas histórias desses países e as suas vivências enquanto mulheres. Por meio das
narrativas ficcionais, leitoras e leitores são conduzidas(os) a remontar um percurso histórico com
muitas feridas abertas e a se defrontar com movimentos como As Mães e as Avós da Praça de Maio,
em Buenos Aires, e com a Guerrilha do Araguaia, no Brasil. Questões como torturas aplicadas em
homens e mulheres, violências (físicas, sexuais, psicológicas) específicas contra mulheres, bem como
organizações clandestinas de resistências e a participação das mulheres, além das formas como esses
regimes ditatoriais civis-militares aconteceram e modificaram o cotidiano das sociedades são
abordadas durante a construção dessas personagens pensadas por escritoras. É pela literatura que
o horror do trauma e o peso da memória coletiva – vivenciados em corpos torturados, violentados,
desaparecidos, sequestrados, mortos – podem ser (re)atualizados, simbolizados e, em certa medida,
transcender à própria realidade e à (narrativa) memória dos fatos reais. Busca-se pensar as relações
entre a ficção e o real-documental, a história e a memória, a partir de relatos e depoimentos de
mulheres que vivenciaram e sobreviveram a esses acontecimentos, tensionando a história com a
literatura, a verdade do trauma com a simbolização da narrativa, a experiência individual com a
memória social.
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acádio-babilônica). Os corpos dessas entidades participam dessas narrativas e a violência masculina
perpetrada contra elas é digna de ser vista em com outros olhos (em seus próprios termos). A
mudança de perspectiva nos permite compreender nuances de como esse processo se deu: essas
personagens não ficam passivas diante dos acontecimentos, mas agenciam suas maternidades e
monstruosidades, promovendo o desenrolar da narrativa desses poemas e a geração de seus
respectivos mundos. Ao mesmo tempo, analisar a violência sofrida por seus corpos revela também
a violência historicamente sofrida pela natureza, uma vez que Gaia e Tiámat, nessas narrativas
cosmogônicas, são mundo, o espaço, a própria terra.
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ENTRE A SOMBRA E A LUZ, OU O QUE HÁ EM COMUM ENTRE EURÍDICE GUSMÃO E DILMA ROUSSEF
Anne Greice Soares La Regina
Resumo: A comunicação propõe uma análise da difícil dialética entre a invisibilidade histórica das
mulheres no Brasil e a conquista da presidência do país em 2010, fato que colocou a primeira
presidenta da república no centro dos holofotes. Privilegia-se, como ponto de partida, compreender
historicamente as narrativas que determinaram a invisibilidade pública da mulher na sociedade,
formatando-a como um fantasma social, uma presença-ausência constante e irresolvível, como na
história contada por Martha Batalha, um drama que não é particular, mas coletivo, pois percorre a
existência de todas as personagens da trama, mulheres que viveram na cidade do Rio de Janeiro
entre as décadas de 1940 e 1950, marcadas pela impossibilidade, pela negação de si mesmas e de
suas existências desejantes. A experiência do sofrimento político é o fio condutor e o elo entre as
vidas contadas pela autora para delinear a humilhação social que é parte do cotidiano de todas elas,
afetando-as psicologicamente, apesar de se originar de um fato político que decorre da desigualdade
política praticada, tolerada e fundamentada nas sociedades pelas mais diversas narrativas. Passados
cinquenta ou sessenta anos, observa-se uma mudança no que diz respeito à participação feminina
na sociedade, principalmente com a eleição de Dilma Roussef em 2010 e com a renovação do seu
670
mandato em 2014. Pretende-se investigar o que significou esta decisão do eleitorado e como outras
forças sociais agenciaram os mais diversos interesses para mobilizar narrativas que, girando em torno
do governo, em geral incidiam e alvejavam menos a chefe de Estado e mais a mulher ocupante de
um cargo público, sobre quem pousavam todas as luzes e atenções. Busca-se refletir em que medida
discursos arraigados e ainda remanescentes na sociedade contemporânea tensionam com as novas
visibilidades femininas.
Referências: BATALHA, Martha. A vida invisível de Eunice Gusmão. São Paulo: Companhia das Letras,
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história: novas perspectivas. Tradução de Magda Lopes. São Paulo: Editora UNESP, 2011.
671
confirma tal afirmação. Nesse encadeamento, esta proposição parte do desejo de compreender
certo ímpeto violento encontrado em alguma poesia escrita por mulheres, materializado na
insistência de determinado gesto perfurador presente nessas obras, cujas temáticas tratam de
impasses que se apresentam à contemporaneidade, como a questão reprodutiva, a violência, a
desigualdade entre os estratos sociais no Brasil etc. Para além do enfrentamento do androcentrismo
branco, esse atributo belicoso será contraposto com um caráter propositivo que constitui, também,
esses projetos literários, considerando as ferramentas – punho, martelo, coice e bombas – e os
artifícios poéticos – humor causticante, manejo da brutalidade, recursos visuais etc. – utilizados pelas
autoras. Dentro desse contexto, este estudo observará como as poetas, em seus trabalhos, criam
aberturas para outros sentidos, no que diz respeito ao que se convencionou chamar de “mulher”,
“feminino” e “nacional”. Para tanto, esta comunicação lançará mão dos livros Um útero é do
tamanho de um punho, de Angélica Freitas; O martelo, de Adelaide Ivánova; O coice da égua, de
Valeska Torres; e Onde estão as bombas, de Tatiana Pequeno. Por fim, com o auxílio de reflexões
irrompidas por Heloisa Buarque de Hollanda, em As 29 poetas hoje, pretende-se trazer breves
apontamentos sobre a presença da referida poética na cena contemporânea, tendo em vista a
possibilidade de construção de um novo cânone, em se tratando da poesia de autoria de mulheres.
Referências: BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução:
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INTELECTUAIS RUSSAS DO SÉCULO XIX: PARTICIPAÇÃO E LUTA
Denise Regina de Sales
Resumo: O objetivo desta comunicação é percorrer o universo das mulheres russas do século XIX,
sobretudo das intelectuais que conquistaram espaço no clássico mundo masculino, a fim de refletir
sobre a participação e resistência feminina na sociedade da época. O percurso será feito pela
apresentação e análise de textos de Elizavieta Nikolaievna Vodovozova (1844-1923), escritora e
pedagoga. Vodovozova vivenciou as primeiras mudanças progressistas no ensino para moças no
Império Russo, acompanhou as transformações sociais e políticas dos anos de 1860 e testemunhou
os acontecimentos dos primeiros anos pós-revolução. Seu livro de memórias – ? ???? ????? (No
alvorecer da vida) – é leitura fundamental para quem quer entender os movimentos e mudanças
sociais da virada do século XIX para o XX em seu país. Com perspicácia e visão histórica, Vodovozova
confere a suas experiências pessoais um significado social amplo, elucidador o fio que une o
movimento das mulheres à teia das transformações nacionais. Seus textos nos ajudam a pensar
várias questões de sua época – a formação das intelectuais, o comportamento e as possibilidades
das mulheres, as mudanças sociais provocadas pela abolição da servidão... Para tratarmos do texto
da autora russa no contexto brasileiro, utilizamos o conceito de polissistema literário, de Itamar
Even-Zohar, que reconhece o papel fundamental da tradução nas trocas literárias. A inspiração para
as reflexões apresentadas vem do trabalho pioneiro de Graziela Schneider a respeito da
emancipação feminina na Rússia soviética.
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resumem a registrar fatos históricos ou a descrever as agruras e violências enfrentadas pelos
movimentos sociais, mas se propõem, como obras esteticamente multifacetadas, a reconstruir, a
partir da ótica da subjetividade recalcada e traumatizada, os caminhos da memória-reflexão. Esse
processo tenta tirar sentido do fantasma golpista incrustado no imaginário cultural do Brasil-nação,
a fim de desvelar o inaudito histórico e, assim, quebrar sua corrente de padrões atávicos de opressão,
injustiça social e autoritarismo.
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681
Resumo: Este trabalho analisa e discute as relações entre a literatura produzida por autoras e a
temática das ditaduras militares sul-americanas, especificamente, nos casos da brasileira e
argentina. Para isso, foram escolhidas duas narrativas em prosa publicadas no Brasil
contemporaneamente, Azul-corvo (2010), de Adriana Lisboa, e Mulheres que mordem (2015), de
Beatriz Leal. Nos livros, é possível perceber como a perspectiva das protagonistas, sendo uma
narradora autodiegética, em Azul-corvo (2010), além de outras personagens mulheres, relacionam-
se com questões como a memória, os traumas, a (im)possibilidade de superação dos acontecimentos
ainda recentes nas histórias desses países e as suas vivências enquanto mulheres. Por meio das
narrativas ficcionais, leitoras e leitores são conduzidas(os) a remontar um percurso histórico com
muitas feridas abertas e a se defrontar com movimentos como As Mães e as Avós da Praça de Maio,
em Buenos Aires, e com a Guerrilha do Araguaia, no Brasil. Questões como torturas aplicadas em
homens e mulheres, violências (físicas, sexuais, psicológicas) específicas contra mulheres, bem como
organizações clandestinas de resistências e a participação das mulheres, além das formas como esses
regimes ditatoriais civis-militares aconteceram e modificaram o cotidiano das sociedades são
abordadas durante a construção dessas personagens pensadas por escritoras. É pela literatura que
o horror do trauma e o peso da memória coletiva – vivenciados em corpos torturados, violentados,
desaparecidos, sequestrados, mortos – podem ser (re)atualizados, simbolizados e, em certa medida,
transcender à própria realidade e à (narrativa) memória dos fatos reais. Busca-se pensar as relações
entre a ficção e o real-documental, a história e a memória, a partir de relatos e depoimentos de
mulheres que vivenciaram e sobreviveram a esses acontecimentos, tensionando a história com a
literatura, a verdade do trauma com a simbolização da narrativa, a experiência individual com a
memória social.
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monstruosidades, promovendo o desenrolar da narrativa desses poemas e a geração de seus
respectivos mundos. Ao mesmo tempo, analisar a violência sofrida por seus corpos revela também
a violência historicamente sofrida pela natureza, uma vez que Gaia e Tiámat, nessas narrativas
cosmogônicas, são mundo, o espaço, a própria terra.
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SIMPÓSIO “ESCRITAS E VIDAS CONTEMPORÂNEAS: INCURSÕES, AVALIAÇÕES E DESAFIOS AO
COMPARATIVISMO”
Adeítalo Manoel Pinho (UEFS) e Maria de Fátima Gonçalves Lima(PUC-Goiás)
685
representação a partir das descrições e publicização de uma obra autoral (Motocolombó) em uma
rede social (Instagram), produzida pelo autor deste estudo e que constitui o objeto de pesquisa de
sua tese de doutorado.
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Salvador: Núcleo Cultural Níger Okàn, 2004.
689
de autores e autoras em comunidades religiosas afro-brasileiras e também devido à adesão de
membros destas comunidades ao fazer literário profano. A esta literatura pautada na mitologia afro-
brasileira dá-se o nome de literatura de axé e seus responsáveis são autoras e autores de axé.
Consciente da existência do adjetivo axé para denominar textos literários, autoras e autores, têm-se
como objetivo deste estudo — além de apresentar os conceitos mencionados — através do método
comparativo comprovar a existência e o devir ativo de representações mitológicas afro-brasileiras
em obra literárias não cosmogônicas. Evidente, que para tal estudo serão necessárias diversas
leituras de mitos afro-brasileiros já catalogados, publicados e/ou povoando de forma oral
comunidades de axé a exemplo de terreiros de candomblés da Bahia. De posse de enredos, poesias
e/ou dramaturgias necessárias, serão comentadas, comprovadas discutidas as afro-brasilidades
guardadas nas entrelinhas das obras literárias escolhidas. Para o exercício proposto serão utilizadas
produções de autores como Jorge Amado, Zora Seljan, Ildásio Tavares, Carlos Vasconcelos Maia,
dentre outros. Ao final, o estudo comparativo irá demonstrar a importância da mitologia afro-
brasileira para construções de obras literárias, cujo autores e autoras são denominados e
denominadas como de axé.
Referências: AMADO, Jorge. Elogio de um chefe de seita. In: Anais do Congresso Afro-Brasileiro (2:
1937: Salvador, BA). Congresso Afro-Brasileiro (Bahia). Trabalhos apresentados ao 2° Congresso Afro-
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691
A MÍMESIS NA LITERATURA CONTEMPORÂNEA: UMA ANÁLISE DO POEMA DOMINGO DE SAMBA,
DOMINGO DE SANGUE
João Elias da Cruz Neto
Resumo: Muitos textos da literatura contemporânea fazem referência direta a acontecimentos da
sociedade que são bastante divulgados para a população pelos diversos meios de comunicação.
Neste trabalho, vamos analisar o poema Domingo de Samba, Domingo de Sangue, de autoria do
poeta Ricardo Vieira Lima, que tem como tema o assassinato de um músico no Rio de Janeiro, que
morreu após ser alvejado por, pelo menos, 80 tiros, disparados por militares do Exército Brasileiro,
e acabou tendo repercussão nacional e internacional. Para isso, inicialmente fazemos uma breve
introdução sobre o autor do poema; depois, discorremos sobre o estudo da mímese, que faz uma
relação entre a literatura e a realidade, por meio das obras de autores como Platão, Aristóteles,Costa
Lima e Compagnon. Em seguida, analisamos o impacto do assassinato na mídia e na sociedade,
mostrando como os meios de comunicação divulgaram o caso, e, ainda, descrevemos e analisamos
o poema, especificando todos os seus versos, levando em consideração a teoria dos autores
estudados. Por fim, relacionando com os estudos de Pellegrini e Candido, chegamos à conclusão de
que o poema se enquadra na escola literária do realismo por fazer uma representação objetiva do
momento presente da narrativa. No entanto, o poema não é uma simples narração do
acontecimento como se fosse uma notícia jornalística, pois o autor trabalha a linguagem se utilizando
de métricas características da poesia, além de diversos recursos estilísticos, transformando as
informações em arte.
Referências: Aristóteles. Poética – introdução, tradução e comentários de Eudoro de Souza. Porto
alegre: Globo, 1966. Atlas da Violência. IPEA. Disponível em:
<https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/filtros-series/1/homicidios>. Acesso em: 22 jul 2022.
CANDIDO, Antonio. Realidade e realismo. In: ______. Recortes. São Paulo: Companhia das Letras,
1993. CEIA, Carlos. Mímesis ou Mimese. IN: E-Dicionário de Termos Literários, 20 jun 2010.
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ser-confundido-com-bandidos-pelo-exercito-causa-revolta-na-internet/85264>. Acesso em: 20 jul
2022.
693
considerando a relação que se estabelece entre literatura e mercado. Isso porque, em um mundo
laboral em constante transformação, no romance de Cuenca aparece uma figuração do escritor
como um trabalhador que dispõe de suas experiências pessoais, seu corpo e afetos como materiais
que podem ser aproveitados para sua escrita e, portanto, capitalizados para o trabalho. Por outro
lado, o escritor também adota estratégias de legitimação e produção de valor no contexto do já
mencionado neoliberalismo que, além de destruir mecanismos de solidariedade e proteção social,
conforma novas subjetividades e relações sociais. Nesse cenário que promove a competição entre
indivíduos, aparece como demandada aos sujeitos a capacidade de autopromover-se, sendo mesmo
possível a figura do escritor-trabalhador como “empresário de si mesmo”. Considerando que se trata
de uma temática pouco e recentemente abordada pela produção crítica latino-americana, a análise
da obra de Cuenca ilumina novas zonas das literaturas contemporâneas da América Latina ao
considerar que o trabalho e o trabalho do escritor especificamente configuram diferentes modos de
narrar que cruzam dimensões documentais, com, por exemplo, a incorporação de expedientes
policiais referentes à morte do autor, e ficcionais.
Referências: Antunes, Ricardo. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviço na era digital.
São Paulo: Boitempo, 2018. Barthes, Roland. La preparación de la novela: notas de cursos y
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695
como algo essencial ao desenvolvimento humano e social. As análises são fundamentadas sobretudo
nos teóricos Antonio Candido, Georg Lukács e Raymond Williams.
Referências: Livros CANDIDO, Antonio. Vários Escritos, 6ª edição, Rio de Janeiro, editora Ouro sobre
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DO RATO. Direção: Cláudio Assis. Brasil: 2011. Netflix (115 min.) PATERSON. Direção: Jim Jarmusch.
EUA: 2016. Mubi (118 min.) O HOMEM QUE VIROU SUCO. Direção: João Batista de Andrade. Brasil:
1980 (94 min.)
696
propiciadas pela percepção, isto é, como a faculdade de libertar-nos das imagens primeiras, por meio
de uma acentuada e contínua alteração”. (BACHELARD, 2001, p.1). Para Durand o espírito do
imaginário é um “esforço do ser para erguer uma esperança viva diante e contra o mundo objetivo
da morte” (DURAND,1999, p.31). Essa esperança viva manifesta-se nos ecopoemas em que as
imagens e as palavras ecoam, suspiram, lamentam e agonizam a natureza emudecida. Neste sentido,
o meio ambiente, por meio das artes literária busca ser ouvido, visto e sentido em todas as suas
nuances.
Referências: BACHELARD, Gaston. A poética do devaneio. São Paulo: Martins Fontes, 1988. ______.
A Água e os Sonhos: Ensaio Sobre a Imaginação da Matéria. /Trad. De Antônio De P. Danesi. São
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das forças. /Trad. Mª Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes. 2001. DURAND, Gilbert. As
estruturas antropológicas do imaginário. Trad. Hélder Godinho. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
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Donizeti da Cruz (org.). Imaginário e performatividade.– Goiânia: Kelps, 2016. _____. Arte e Poesia
em Goiás. Goiânia. ed. Kelps. 2020. ______.Três líricas performativas. Goiânia: Ed. da UCG, 2007.
______. Leitura e Poesia I– Do Barroco ao Romantismo. Coleção Verso e Prosa, Kelps / Editora PUC-
GO, 2009. ______. Leitura e Poesia II – Leitura e Poesia II–Modernismo. Coleção Verso e Prosa, Kelps
/ Editora PUC-GO, 2012. _____.O discurso do rio em João Cabral. Lusoedições. Salmanca 2016.
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Ferreira, Suely Fenerich. São Paulo: EDUC, 2000.
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CALVINO, Italo. Seis propostas para o próximo milênio. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
SCHOLLHAMMER, Erik K. Ficção brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2009. VASCOUTO, Vanessa. Terra dentro. São Paulo: Reformatório, 2020.
698
Após isso, serão elencados os nomes, sua etimologia, seu significado e sua relação simbólica com
aspectos relevantes da obra em que estão inseridos. Em seguida, serão feitas considerações a
respeito da utilização de tais nomes por ambos os autores, com vistas a propor que a nomeação das
personagens não foram acidentais, mas sim intencionais.
Referências: BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 43 ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
BRITO, Adriano Naves de. Nomes próprios: semântica e ontologia. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 2003. CANDIDO, A. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 8.ed. Belo
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São Paulo: Editora Brasiliense, 1984. DANZIGER, Leila. Todos os nomes da melancolia. Rio de Janeiro:
Apicuri, 2012.
700
tratamos de uma poesia permeada pelo experienciar [erfahren] do inexeprienciável. Com esse
último termo, o mago-marxista nos alerta sobre aquilo que parte em sua origem [Ursprung] da
ordem impronunciável na experiência da poesia do aqui-e-agora: a fantasia, a loucura, o devaneio,
o inaudito, em suma, o transe. Tais elementos são fundamentais para compreender a arte de um
modo abrangente e estão presentes na poética de Pereira. Eles atravessam, então, os versos e
estrofes e deslocam o logos de sua forma mais maquínica, a saber, a razão instrumental, para a
linguagem. Dessa forma, acessaremos outras epistemologias que estejam de acordo com a
cosmovisão daqueles poemas negros. Com isso, esses poemas emergem e fluem em um devir da
linguagem, evocando/invocando uma experiência do inexperienciável.
Referências: BENJAMIN, Walter. Sobre o programa da filosofia por vir. Trad. Helano Ribeiro. 1. ed.
Rio de Janeiro: 7 Letras, 2019. PEREIRA, Edimilson de Almeida. Poesia +. (antologia 1985-2019). São
Paulo: Editora 34, 2019. PEREIRA, Edimilson de Almeida. Poemas para ler com palmas. Belo
Horizonte: Mazza Edições, 2017. PEREIRA, Edimilson de Almeida. Livro de falas. Belo Horizonte:
Mazza Edições, 2008.
701
avaliar o conteúdo de suas coleções. Também é alguém em constante impasse: o desejo por
completude e a certeza de sua impossibilidade. O colecionista se equilibra entre o vazio e a utopia,
mobiliza seu saber na ordenação de conjuntos que sem ele não existiriam, mas ciente de que sua
perspectiva é lacunar e circunscrita. Assim, propomos nesta comunicação cruzamentos entre o
colecionismo de Walter Benjamin – em especial a partir de "El coleccionismo" (2022), reunião de
ensaios recentemente publicada em Buenos Aires – e a montagem de poemas-objetos de Salomão.
Referências: BENJAMIN, Walter. El coleccionismo. Traducción de María G. Tellechea y Martina
Fernández Polcuch. Introducción de Beatriz Sarlo. Buenos Aires: Ediciones Godot, 2022. SALOMÃO,
Waly. Babilaques: alguns cristais clivados. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2007.
702
duas línguas – o alemão e o francês, mas também constrói uma imagem poética da poesia.
“Translíngue” designa pessoas que escrevem em uma ou mais línguas não maternas – é
frequentemente o caso, por exemplo, da produção literária contemporânea em português de
autores e autoras indígenas – , mas remete também à concepção da linguagem como uma
construção sempre inacabada, atravessada por contatos e passagens entre as línguas e as culturas,
isto é, “como construto social atravessado por contínuos contatos linguístico-culturais”, como
definem ANDRADE e LISBOA DE MELLO no prefacio do livro Translinguismo e poéticas do
contemporâneo. Entre tais práticas e experiências, podemos incluir a tradução, mas o campo
circunscrito pelo conceito de translíngue abarca também certas formas de escrita poética. Assim, a
partir das imagens de pensamento construídas pelo sonho de Benjamin, discutiremos práticas
translíngues na poesia brasileira de hoje, destacando em particular as poéticas da tradução.
Referências: BENJAMIN, Walter. "Carta à Gretel Adorno" (trad. Patricia Lavelle), revista Cult n° 283,
junho de 2022 “Sobre a linguagem em geral e sobre a linguagem humana”, “A Tarefa do tradutor”,
in: Escritos sobre mito e linguagem (org. Jeanne Marie Gagnebin, trad. Susana Kampff Lages e Ernani
Chaves). São Paulo: Livraria Duas Cidades/Editora 34, 2011. _. “Doutrina das semelhanças”, “Sobre a
faculdade mimética”, in: Linguagem, tradução, literatura (org. e tradução João Barrento). Belo
Horizonte: Autêntica, 2018. ALVES-BEZERRA, Wilson. Malangue Malanga. São Paulo: Iluminuras,
2021 AUGUSTONI, Prisca. O mundo mutilado. São Paulo: Editora Quelônio, 2021 BRITTO, P. H. O fim
do verão. Sao Paulo: Cia das Letras, 2022 CAPILÉ, André. Muimbu. Juiz de Fora: Macondo, 2017.
CRICELLI, Francesca. Repátria. São Paulo: Selo Demônio Negro, 2015. DORRICO, Julie (org.). Poesia
indígena hoje. Unicamp/Projeto p-o-e-s-i-a.org, 2020 JORGE, Eduardo. Teoria do hotel. São Paulo:
Selo Demônio Negro, 2019 LAVELLE, Patrícia. Bye bye Babel. Rio de Janeiro: 7Letras, 2022 (2a edição)
VIANNA BAPTISTA, Josely. Roça Barroca. São Paulo: Sesi-SP Editora, 2018 (2011) SISCAR, Marcos. Isto
não é um documentário. Rio de Janeiro: 7Letras, 2020
A “AGORIDADE” DA POESIA
Raquel Bernardes Campos
Resumo: Haroldo de Campos, em seu ensaio “Poesia da modernidade: da morte da arte à
constelação o poema pós-utópico”, nos mostrou como, num momento semelhante ao nosso, as
utopias foram enfraquecidas de sua potência revolucionária, cedendo lugar a implicações políticas
envolvendo disputas de poder, autoritarismo e censura. Longe, no entanto, de adotar uma postura
derrotista, Haroldo nos introduz à sutil beleza de um princípio-realidade: aquele no qual o presente
pode satisfazer às múltiplas demandas da atualidade, dando voz às diferenças, deslocando as
soluções existenciais de um possível futuro glorioso para a agoridade. O princípio-realidade é
baseado no conceito benjaminiano de Jetztzeit, com todas as suas possibilidades e recursos. O
presente trabalho procura analisar os legados das obras de Haroldo de Campos e Walter Benjamin
para a poesia brasileira do século XXI, pensando o seu contexto atual a partir de um princípio-
realidade pós-utópico, que substituiu o que Haroldo chamou de um princípio-esperança, calcado em
resoluções utópicas. A poesia é, segundo Décio Pignatari, uma “contradição antagônica”, em
oposição a uma espécie de “contradição não-antagônica” da prosa. Sendo assim, enquanto leitores
e críticos, a oportunidade de analisá-la a partir de um ponto de vista analógico (e não lógico) nos
permite compreender a multiplicidade de caminhos dessa “não-resolução”. Dito isso, ao
procurarmos analogias nas obras de dois autores distintos como Haroldo de Campos e Walter
Benjamin, podemos reforçar o que há em comum entre as suas especificidades escriturais e
podemos, sobretudo, compreender os seus espectros e rastros na poesia brasileira do século XXI.
Referências: BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1986. CAMPOS,
Haroldo de. Poesia da modernidade: da morte da arte à constelação o poema pós-utópico. In: _____.
O arco-íris branco: ensaios de literatura e cultura. Rio de Janeiro: Imago, 1997. PIGNATARI, Décio. O
que é comunicação poética. São Paulo: Ateliê Editorial, 2005.
UMA METÁFORA CRÍTICA ENTRE WALTER BENJAMIN E A POESIA BRASILEIRA: A EDUCAÇÃO PELO
INFERNO
703
Rodrigo Cavelagna
Resumo: Esta comunicação apresenta uma metáfora crítica da experiência poética, a educação pelo
inferno. Como se trata de resultado central de pesquisa de mestrado, pretende-se demonstrar um
percurso crítico, a partir de uma série de relações entre a recepção e a atualidade dos conceitos de
Walter Benjamin e de temas centrais da poesia brasileira. Uma “educação pelo inferno” corresponde
a uma constelação de analogias, em sua implicação mútua, enquanto método e abordagem
benjaminianos para apresentação da violência histórica, que envolvem a qualidade tátil, o
inconsciente ótico, as formas oníricas e as metáforas da cura. Ao mesmo tempo, surge como nome
de um mosaico, suscitado pela análise de um poeta, Roberto Piva. E se constrói sob determinado
“espaço de imagem”, em uma aproximação de Benjamin e Octavio Paz, que toma os termos em seu
ponto de indissociação: Poesia Política Violência. Apresenta-se, então, uma linha específica das
metáforas e analogias do inferno: entre as teses “Sobre o conceito de História” (BENJAMIN, 2012;
2020), a sobrevivência dos vagalumes (DIDI-HUBERMANN, 2011), e Roberto Piva, sua referência à
Dante e sua leitura de Antonin Artaud, o “Grã Cão” de Mário de Andrade, a Ditadura em Cacaso, a
metapoética da composição de Racionais MC’s e a obra de Marcelo Ariel (2008). Esse percurso,
portanto, envolve uma leitura da presença de Benjamin na poesia e na crítica contemporânea, mas
atentos a um aspecto singular à cada composição, uma forma de leitura: com outras analogias e
metáforas da escrita e da leitura poética, da reflexividade da obra de arte. Proponho discutir uma
abordagem da poesia e do fazer poético, como forma de escrita, análise e apresentação das imagens
da História.
Referências: ANDRADE, Mário de. Poesias Completas. Edição crítica de Diléa Zanotto Manfio. Belo
Horizonte: Editora Itatiaia, 2005. ARIEL, Marcelo. Tratado dos anjos afogados. São Paulo:
LetraSelvagem, 2008. BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política, Obras Escolhidas Vol.1. São
Paulo: Brasiliense, 2012. ______. Sobre o conceito de história. Organização e tradução de Adalberto
Müller e Márcio Seligmann-Silva. 1ªed. São Paulo: Alameda, 2020. BOLLE, Willi. “Um painel com
milhares de lâmpadas”: Metrópole e Megacidade. In: BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2018. BRETAS, Aléxia. Constelações em ruínas: luto, barbárie e memória ética. In:
Timm de Souza [et. al.]. Walter Benjamin: barbárie e memória ética. Porto Alegre: Zouk, 2020. BRITO,
Antônio Carlos Ferreira de. Poesia completa / Cacaso. São Paulo: Companhia das Letras, 2020. DIDI-
HUBERMAN, Georges. Quando as imagens tomam posição: o olho da história I. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2017. ______. Remontagens do tempo sofrido: o olho da história II. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2018. ______. Sobrevivência dos vaga-lumes. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011.
FERNANDES, Rafael Zacca. As flores da poesia na terra do saber: uma teoria do poema em Walter
Benjamin. Tese (Doutorado) – Departamento de Filosofia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, 2019. KANGUSSU, Imaculada. Sobre obras de arte e centelhas de esperança. In: Timm de
Souza [et. al.]. Walter Benjamin: barbárie e memória ética. Porto Alegre: Zouk, 2020. LAVELLE,
Patricia. Walter Benjamin metacrítico: uma poética do pensamento. 1. ed. Belo Horizonte: Relicário
edições, 2022. PIVA, Roberto. Paranoia. Fotografado e desenhado por Wesley Duke Lee. 2ª Edição.
São Paulo: Instituto Moreira Salles/Jacarandá, 2000. RACIONAIS MC’s. Sobrevivendo no Inferno. São
Paulo: Companhia das Letras, 2018.RACIONAIS MC’s. Sobrevivendo no Inferno. São Paulo:
Companhia das Letras, 2018. RIBEIRO, Gustavo Silveira. A canção dos escombros: Walter Benjamin e
a poesia brasileira contemporânea. Aletria: Revista de Estudos de Literatura, v. 29, n. 2, p. 119–136,
2019. ROCHA, João Cezar de Castro. A guerra dos relatos no Brasil contemporâneo. Ou: a 'dialética
da marginalidade'. Letras (Santa Maria), Santa Maria, v. 28-29, 2004. SOARES, Débora Racy. O
(desen)canto do pássaro: memória e testemunho em versos de Cacaso. Línguas&Letras, [S. l.], v. 11,
n. 21, 2010. STERZI, Eduardo. Terra devastada: persistências de uma imagem. Remate de Males, v.
34, n. 1, p. 95, 2014. ______. Cadáveres, vagalumes, fogos-fátuos. Celeuma, v. 1, n. 1, p. 3-14, 2013.
704
transversalmente ao comentário estético, encontramos no seu escopo um retrato político, ético,
histórico e social. Nesse sentido, na contramão do projeto filosófico kantiano de separação do
âmbito crítico entre o conhecimento, a moral e o espectro estético, as proposições constelares que
podemos encontrar no arcabouço benjaminiano busca reatar o liame intrínseco a tais dimensões. O
revival do postulado de Platão sobre os poetas e o livro da República, que podemos ler em O autor
como produtor, por exemplo, insere esse problema em um amplo movimento articulado por uma
vertente a qual o pensamento de Benjamin, de certo modo, também se assemelha. Como aparece
no texto, a questão sobre a “alta conta” reservada aos poetas no “interesse de comunidade”
(BENJAMIN, 1985, p. 120) revela-nos uma divisa importante no tratamento da arte e seu vínculo
social. Não somente, mas com o agravamento das tensões, a partir da política que vimos ser
empreendida nos anos passados de governo bolsonarista no Brasil, muitos dos artistas brasileiros
assumiram uma forte característica de engajamento que fizeram de suas apresentações, as mais
diversas, um lugar de contestação ideológica. Aliados ao desejo de Benjamin, em fazer jus aos
oprimidos da história sustentado pela trama entre a cultura, sempre alvo do cortejo vencedor, e a
direção revolucionária que resiste por força de uma trifurcação temporal (passado; tempo de agora
e devir), muitos resistiram. Dos exemplos a se destacar gostaria de analisar primeiro, algumas das
canções gravadas por Chico César, entoando poemas de Carlos Rennó, “Reis do agronegócio", ou, o
frevo “Pico”, que fazem uma leitura do cenário nacional diante do contexto apocalíptico.
Referências: ADORNO, Theodor. W., Primeiros escritos filosóficos, Tradução de Verlaine Freitas. São
Paulo: Editora Unesp, 2018. BENJAMIN, Walter. Diário parisiense e outros escritos: A nova literatura
francesa de Proust, Gide e Valery. Tradução de Carla Milani Damião e Pedro Hussak. Editora Hedra:
São Paulo, 2020. BENJAMIN, Walter. Linguagem, tradução, literatura: Filosofia, teoria e crítica,
Tradução de João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2018. BENJAMIN, Walter. Magia e
técnica, arte e política: Ensaios sobre literatura e história da cultura, Tradução de Sergio Paulo
Rouanet. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987. BENJAMIN, Walter. Œuvres Complètes II, Tradução de
Maurice de Gandillac; Rainer Rochlitz; Pierre Rusch. Paris: Gallimar, 2000. BENJAMIN, Walter. Rua de
mão única, Tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho, José Carlos Martins Barbosa. São Paulo:
Brasiliense, 2012. BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de História: Edição Crítica, organização e
tradução de Adalberto Müller e Márcio Seligmann-Silva, notas de Márcio Seligmann-Silva. São Paulo:
Alameda Editorial, 2020. BENJAMIN, Walter. Karl Kraus, Tradução de Helano Ribeiro. Rio de Janeiro:
7Letras, 2022. BENOÎT, Denis. Littérature e engagement: De Pascal à Sartre. Paris: Points, 2000.
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade: Estudos de Teoria e História Literária. Rio de Janeiro:
Ouro sobre Azul, 2011. CÉSAR, Chico. Reis do agronegócio. São Paulo: Urban Jungle: 2015. Álbum de
música (11:02min) CÉSAR, Chico. Pico. You Tube, 11 de Dezembro de 2020. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=i8cxicXwNrU JAMESON, Fredric. The Benjamin Files, Editora:
Verso, 2020. KRACAUER, Sigfried. O ornamento da massa. Tradução de Carlos Eduardo J. Machado e
Marlene Holzhausen. São Paulo: Cosac Naify, 2009. PALMIER, Jean Michel. Les chiffonnier, L´Ange et
le Petit Bossu. Esthétique et politique chez Walter Benjamin. Paris: Les Belles Lettres, 2006. PALMIER,
Jean Michel. Walter Benjamin. Un itinéraire théorique. Paris: Les Belles Lettres, 2010. TRAVERSO,
Enzo. La pensée dispersée; figures de l´exil juif. Paris: Lignes, 2004. TRAVERSO, Enzo. Melancolia de
Esquerda: Marxismo, História e Memória, Tradução de André Bezamat. Belo Horizonte: yiné, 2018.
FISCHER, Ernest. A necessidade da arte, Tradução de Leandro Konder, Rio de Janeiro. LTC, 9a Ed.,
2007. HUBERMAN, Didi. Quando as Imagens Tomam Posição: O olho da História, I, Tradução de
Cleonice Paes Barreto Mourão. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2017. SARTRE, Jean Paul. O que é a
Literatura? Tradução de Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Editora Ática, 2004. SELIGMANN-SILVA,
Márcio. Ler o livro do mundo: Walter Benjamin Romantismo e Crítica Poética. São Paulo: Iluminuras,
2020. WILLIAMS, Raymond. A produção social da escrita, Tradução de André Glaser. São Paulo:
Editora Unesp, 2014. WILLIAMS, Raymond. Cultura e materialismo, Tradução de André Glaser. São
Paulo: Editora da Unesp, 2011. WILLIAMS, Raymond. Política do modernismo: contra os novos
conformistas, Tradução de André Glaser. São Paulo: Editora Unesp, 2011.
705
SIMPÓSIO “ESTRATÉGIAS DO FEMININO: LITERATURA ESCRITA POR MULHERES E RESISTÊNCIA”
Laura Barbosa Campos (UERJ), Anna Faedrich (UFF) e Silvina Carrizo (UFJF)
706
Referências: Lembrar, escrever, esquecer, de Gagnebin Jeanne Marie (2006) Por uma crítica
feminista: leituras transversais de escritoras brasileiras , Figueiredo Eurídice (2020) Pensamentos
feministas hoje perspectivas decoloniais (2020) de, Hollanda Heloisa Buarque de . Abuso: A cultura
do estupro no Brasil (2020) de, Araújo Ana Paula
707
Apresentação Nádia Battella Gotlib. Florianópolis: Editora Mulheres; Santa Cruz Sul: Edunisc. V. II.
Muzart, Zahidé Lupinacci (org.). 2009. Escritoras brasileiras do século XIX. Prefácio Simone Pereira
Schmidt. Florianópolis: Editora Mulheres: CNPq. V. III. Oscar, João. 1994. Narcisa Amália. Vida e
poesia. Campos: Lar Cristão. Reis, Antônio Simões dos. 1949. Narcisa Amália. Rio de Janeiro:
Organizações Simões. Reis, Maria Firmina dos. 2019. Úrsula e outras obras. Prefácios de Ana Maria
Haddad Baptista e Danglei de Castro Pereira. 2. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara.
Souza, Auta de. 2009. Horto, outros poemas e ressonâncias: obras reunidas. Organização Alvamar
Medeiros, Ana Laudelina Ferreira Gomes e Angelita Araújo. Natal, RN: EDUFRN – Editora da UFRN.
Souza, Auta de. 2021. Dálias (1893-1897). Preâmbulo e notas Stella Maria Vaz Santos Valadares;
prólogo Anderson Tavares; apresentação, pesquisa e notas Ana Laudelina Ferreira Gomes. Brasília:
Senado Federal. (Coleção Escritoras do Brasil, v. 8)
708
políticas, de modo a evidenciar aspectos interseccionais e resistentes que desconstruam paradigmas
literários e culturais neutralizadores. Essas produções artísticas e literárias, produzidas
coletivamente pelas/das margens confrontam o cânone cisheteropatriarcal elitista e territorialista,
que invisibiliza e silencia vozes e corpos não contemplados pelo padrão, além de produzirem
epistemologias dissidentes, através da escrita e de outras criações artísticas que se encruzam e
permitem reconhecer e valorizar saberes anulados e assim afrontar paradigmas literários e culturais
neutralizadores. Tal confronto a esse conjunto de normas que deslegitima as experiências pessoais,
sobretudo de mulheres que produzem de modo independente e distante dos grandes centros,
também permite uma rasura das tradicionais narrativas e representações em torno do semiárido,
seus sujeitos e produções culturais, construindo epistemologias outras. Assim, essa pesquisa
também parte do mapeamento e reconhecimento desse processo de ajuntamento de vozes,
vivências e resistências das mulheres escritoras, produzindo de modo independente com outras
mulheres e dos cruzamentos de suas vivências, escritas e atuação política e social, em oposição aos
discursos hegemônicos, permitindo assim uma importante pluralidade temática e de estilos.
Referências: AKOTIRENE, Carla Interseccionalidade .São Paulo : Pólen, 2019. Hill Collins, Sirma Bilge
Interseccionalidade. Patricia. Trad. Rane Souza. - 1.ed. - São Paulo : Boitempo, 2020.
DERRIDA, Jacques. A lei do gênero. Revista Tempo, Espaço, Linguagem (Tel), [S.L.], v. 10, n. 2, p. 250-
281, jun. 2019. DERRIDA, Jacques. Essa estranha instituição chamada literatura: uma entrevista com
Jacques Derrida. Tradução de Marileide Dias Esqueda. Revisão técnica e introdução de Evando
Nascimento. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014. EVARISTO, Conceição. Esse lugar também é nosso.
[Entrevista concedida a] Ana Paula Acauan. Revista PUCRS, Porto Alegre, 2022. Disponível em
https://www.pucrs.br/revista/esse-lugar-tambem-e-nosso/. Acesso em: 24 mai. 2022. KILOMBA,
Grada. Memórias da Plantação: Episódios de Racismo cotidiano. Trad. Jess Oliveira. Rio de Janeiro:
Cobogó, 2019. HADDOCK-LOBO, Rafael. Abre-caminho: Assentamentos de metodologia cruzada
(Coleção X). Rio de Janeiro: Ape'Ku Editora, 2022. MADANÇA, RIBEIRO e SERTÃOSOL.(orgs.)
LiterÁridas. 1 ed. São Paulo- SP: Editora Brilho Coletivo, 2021. MADANÇA, RIBEIRO e SERTÃOSOL.
Úmidas. 1 ed. Belo Horizonte- MG, 2022. SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula.
(orgs.).Para além do pensamento abissal: Das linhas globais a uma ecologia de saberes para o Sul. In:
Epistemologias do Sul. São Paulo; Editora Cortez, 2010. SIMAS, Luiz Antonio, RUFINO, Luiz e
HADDOCK-LOBO, Rafael. Arruaças: uma filosofia popular brasileira. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,
2020. WITTIG, Monique. O pensamento hetero e outros ensaios. Trad. Maira Mendes Galvão. Belo
Horizonte: Autêntica, 2022. WITTIG, Monique. As Guerrilheiras. Trad. Jamile Pinheiro Dias, Raquel
Camargo. São Paulo: Ubu Editora, 2019.
709
Referências: BOSI, Alfredo. Literatura e resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. CATELLI, Nora. El
diario íntimo: una posición femenina. In: Revista de Occidente: El diario íntimo. Madrid: Fundación
José Ortegas e Gasset, n. 182 – 183, jul./ag. 1996. KUHNER, Maria Helena. A transgressão do
feminino. Rio de Janeiro: Editora PUC, 1989. LIMA, Luiz Costa Lima. Melancolia: literatura. São Paulo:
Editora Unesp, 2017. NAVARRO, Márcia Hoppe. Por uma voz autônoma: o papel da mulher na
história e na ficção latino-americana contemporânea. In: Rompendo o silêncio. Porto Alegre: Editora
UFRGS, 1995. PIÑA, Cristina. Límites, diálogos, confrontaciones: leer a Alejandra Pizarnik. Buenos
Aires: Corregidor, 2012. PIZARNIK, Alejandra. Diarios. Edição a cargo de Ana Becciu. Barcelona:
Lumen, 2016. STAROBINSKI, Jean. A tinta da melancolia. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
710
imprensa. O livro “El invencible verano de Liliana” (2021), de Cristina Rivera Garza, conta a história
do assassinato de Liliana Rivera Garza, sua irmã caçula, por um ex-namorado. Composta por
anotações e conversas com amigos da vítima, a narrativa-mosaico propõe “comemorar a presença”
de uma vida interrompida trinta anos antes. Nessa linha temporal, levantes feministas expuseram as
fragilidades de estados democráticos na proteção e na defesa de corpos feminizados e revelaram a
Cristina Rivera Garza as palavras que lhe faltavam para contar a principal história de sua vida: o
feminicídio de Liliana. Quais foram essas palavras? Gago (2020) defende que é necessário pensar a
misoginia como uma espécie de “cartografia política que conecte os fios que fazem com que as
violências se revelem como dinâmicas inter-relacionadas”. Nessas dinâmicas, as mulheres sairiam do
papel de vítima para inaugurarem uma palavra política. Diniz (2022) delibera que “desobedecer é
inventar a vida”. Ao comemorar a presença da irmã morta, a escritora também inventa a vida,
reivindica as palavras. Ao escrever as palavras da irmã e de tantas outras mulheres, promove sua
própria máquina de justiça. Como se narram as violências contra os corpos feminizados no seio de
uma sociedade misógina? Seria a literatura capaz de produzir uma linguagem que vá além de
catalogar as mulheres como vítimas?
Referências: ANZALDÚA, Gloria. A vulva é uma ferida aberta. A Bolha, Rio de Janeiro: 2021. GAGO,
Verónica. A potência feminista ou o desejo de transformar tudo. Elefante, São Paulo: 2020. GALINDO,
María. “Desobediencia, voy a sobrevivir por tu culpa”. In: Radio Deseo.103.3 (Bolívia). La Paz, 2020.
Disponível em: < https://youtu.be/VFXE1fudKKQ>. Acesso em 12 Jan. 2022. GARZA, Cristina Rivera.
El invencible verano de Liliana. Penguin Libros, Ciudad de México: 2021. GROS, Frédéric.
Desobedecer. Ubu Editora, São Paulo: 2018. GROSZ, Elizabeth. Corpos reconfigurados. In: Cadernos
Pagu. UNICAMP, Campinas: 2000. n. 14. LUDMER, Josefina. “Las tretas del débil”. La Sartén. Ediciones
El Huracán: Puerto Rico, 1985. LUDMER, Josefina. “Literaturas pós-autônomas”. Aqui América Latina:
uma especulação.. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013. HOLLANDA, Heloísa Buarque A. Explosão
feminista. Cia das Letras, São Paulo: 2019. PINEDA, Esther. Cultura femicida: el riesgo de ser mujer
en América Latina. 1ª ed. Buenos Aires: Prometeo Libros, 2019. RESENDE, B. “Estratégias literárias
da primeira pessoa”. In: MAGRI, I. & CHARBEL, F. & GUTIÉRREZ, R. (org.) Leituras do contemporâneo:
literatura e crítica no Brasil e na Argentina. Relicário, Rio de Janeiro: 2021. RUSSELL, D. & HARMES,
R. A. (Eds.), Femicide in Global Perspective. Thousand Oaks, California: Sage Publications, 2001.
SOLNIT, Rebecca. A mãe de todas as perguntas. Reflexões sobre os novos feminismos. Cia das Letras,
São Paulo: 2017. SOLNIT, Rebecca. De quem é esta história? Feminismos para os tempos atuais. Cia
das Letras, São Paulo: 2019.
711
feminina na literatura. 2ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. CERASI, Claire. Marguerite Duras
de Lahore à Auchwitz. Paris: Champion -Slatkine, 1993. DURAS, Marguerite; GAUTHIER, Xavière. Boas
falas: Conversas sem compromisso. Trad. Sieni Maria Campos. Rio de Janeiro: Editora Record, 1974.
DURAS, Marguerite; PORTE, Michelle. Les lieux de Marguerite Duras. Paris: Éditions de Minuit, 1977.
DURAS, Marguerite. Escrever. Trad. Rubens Figueiredo. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. FERREIRA, Júlia
Simone. L’intime et le secret dans l’écriture de Marguerite Duras. Beau Bassin, Éditions Universitaires
Européennes, 2018. LEBELLEY, Frédérique. Marguerite Duras, uma vida por escrito. Trad. Uélinton
de Oliveira e Vilma de Katinszky. São Paulo: Editora Página Aberta, 1994. MARINI. Marcelle.
Territoires du féminin avec Marguerite Duras. Paris: Les Éditions de Minuit, 1977 PINDON, Joëlle
Pagès. Marguerite Duras, l’écriture illimitée. Paris: Ellipses, 2012. VIRCONDELET, Alain. Marguerite
Duras: vérité et légendes. Paris: Éditions du Chêne. 1996.
712
A ESCRITA BIOGRÁFICA DE ANA ARRUDA CALLADO E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA A HISTÓRIA DAS
MULHERES, ESTUDOS DE GÊNERO E MEMÓRIA FEMININA: UMA ANÁLISE DE BERTA RIBEIRO: AOS
ÍNDIOS, COM AMOR
Jussimara Lopes de Jesus Simões
Resumo: Observamos a ampliação de abordagens no âmbito da crítica, da escrita e da pesquisa,
vários aspectos teórico-conceituais como possíveis vias de análise para biografias de autoria
feminina, cujo enfoque é reconstituir histórias de mulheres objetivando o reajustamento dos
discursos em circulação a partir, também, de uma perspectiva de gênero. Uma das minhas propostas
é apresentar uma abordagem que se constrói na projeção de análise dos mecanismos, dos propósitos
e dos conteúdos acionados em biografias de e sobre mulheres e no desvendamento de outros
possíveis entrelaçamentos subjacentes à relação biógrafa-biografadas. Neste sentido, a partir da
apresentação da produção biográfica de Ana Arruda Callado, jornalista, escritora e acadêmica, que
publicou sete biografias de mulheres brasileiras entre 1995 e 2016, analiso a importância da
presença feminina na produção biográfica no Brasil, no século XX enquanto autoria e tema. Neste
trabalho, analiso também como são potencializados os conceitos e temas substanciais como
memória, história, discurso e intersubjetividade na sua última publicação, de 2016, denominada
Berta Ribeiro: aos índios, com amor. Minha análise desse livro também se concentra na discussão
sobre relevância, as configurações e as diretrizes desse texto biográfico, amparando-me nos aspectos
teórico-metodológicos da crítica biográfica desenvolvidos por Leonor Arfuch, Eneida Maria de Souza,
Alexandre de Sá Avelar, Pierre Bourdieu e Francois Dosse e em estudos produzidos por Rachel Soihet,
Eleni Varikas, Margareth Rago e Michelle Perrot, que trazem associações entre biografia, estudos de
gênero e História das Mulheres
Referências: ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de
Janeiro: EdUERJ, 2010. BOURDIEU, Pierre. “A ilusão biográfica”. In: AMADO, Janaína e FERREIRA,
Marieta de Moraes. Usos e abusos da história oral. - 8ª edição – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006,
pp. 183-191. DOSSE, François. O Desafio Biográfico: escrever uma vida. Tradução Gilson César
Cardoso de Souza. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009. PERROT, Michelle. Práticas
da memória feminina. Revista Brasileira de História. São Paulo. Vol. 09, nº 18, ago-set, 1989. PRIORE,
Mary Del. Biografia: quando o indivíduo encontra a história. Topoi. Rio de Janeiro. 2009, vol.10, n.19,
pp.7-16. RAGO, Margareth. Entre a História e a Liberdade: Luce Fabri e o Anarquismo
Contemporâneo. São Paulo: Editora da UNESP, 2001 SOUZA, Eneida Maria de. Notas sobre a crítica
biográfica. In: Crítica Cult. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2002. p. 111-120. SOUZA, Eneida Maria
de. Janelas indiscretas: ensaios da crítica biográfica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. SOIHET,
Rachel. Mulheres e biografia. Significados para a História. Locus: Revista de História. MG: Juiz de
Fora. Vol 09, nº1. p. 33-48, 2003. VARIKAS, Eleni. O pessoal é político: desventuras de uma promessa
subversiva. In: Revista Tempo 3. Niterói. Relume-Dumará. Junho 1997, p.7
713
patriarchivo (Derrida 1997, Segarra 2014) y ocupar el lugar que no les pertenecía desde el punto de
vista de los poderes hegemónicos anteriores. Segundo, por el cuestionamiento y modificación tanto
de las representaciones espaciales tradicionales presentes en el imaginario social argentino (Livon-
Grosman 2004), como del impacto que esos tienen sobre el territorio actual. Así destacan la vigencia
de los "rasgos sostenidos" asociados con la región que lleva a la creación de los no-lugares (Augé
2000), el vaciamiento identitario y el aislamiento impuesto sobre el territorio mismo.
Referências: ANDERMANN, Jens (2000). Mapas de poder. Rosario, Beatriz Viterbo. ANDERSON,
Benedict (1992). Comunidades imaginadas. Reflexiones sobre el origen y la difusión del
nacionalismo. México, Fondo de Cultura Económica. AUGÉ, Marc (2000). Los no-lugares. Barcelona,
Editorial Gedisa. BLOOM, Harold (1995). El canon occidental. Barcelona, Anagrama. BUTLER, Judith
(2002). Los cuerpos que importan. Buenos Aires, Paidós. DE CERTEAU, Michel (2000). La invención
de lo cotidiano. Ciudad de México, Universidad Iberoamericana. DERRIDA, Jacques (1997) Mal de
archivo. Una impresión freudiana. Madrid, Trotta. FOUCAULT, Michel (1972). The Archaeology of
Knowledge. New York: Pantheon. GREGORY, Derek (1994) Geographical Imagination. Oxford,
Blackwell. HUTCHEON, Linda (1981). “Ironía, sátira y parodia. Una aproximación pragmática”.
Poétique, 46, pp: 1-16. JITRIK, Noé (1996). “Canónica, regulatoria y transgresiva”. Orbis tertius, 1(1),
p: 1-9. LEFEBVRE, Henri (2013). La producción del espacio. Madrid, Capitán Swiny. LIVON-GROSMAN,
Ernesto (2004). Geografías imaginarias. El relato de viajes y la construcción del espacio patagónico.
Rosario, Beatriz Viterbo. MASIELLO, Francine (1992). Between Civilization & Barbarism. Women,
Nation and Literary Culture in Modern Argentina. Lincoln & London, University of Nebraska Press.
MASSEY, Doreen (2007) Geometrías del poder y la conceptualización del espacio. Conferencia
dictada en la Universidad Central de Venezuela, Caracas. –––––––––––––– (1994). Space, Place and
Gender. Minneapolis, University of Minneapolis Press. MBEMBE, Achille (2002). “The Power of the
Archive and its Limits”. En: Carolyn Hamilton et al. Refiguring the archive. Dordrecht, Kluwer
Academic Publishers. SEGARRA, Marta (2014). “Community and the Politics of Memory”. Critical
Studies, 37, s: 177-189. SOJA, Edward (1985). “The Spatiality of Social Life: Towards a Transformative
Retheorisation”. En: D. Gregory et al. (eds.), Basingstroke, Social Relations and Spatial Structures.
SZURMUK, Mónica (2000). Women in Argentina: early travel narratives. Gainesville, University Press
of Florida.
"QUANTAS VIDAS ME COUBER, AMAR UMA MULHER": AFETO E RESISTÊNCIA NA POESIA LÉSBICA
BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
Laura Assis
Resumo: A partir de questões suscitadas por um verso de um poema de Ágnes Souza, "Amar uma
mulher", o presente trabalho tem como objetivo identificar estratégias utilizadas na representação
literária do afeto entre mulheres na poesia brasileira contemporânea, além de analisar
procedimentos por meio dos quais a caracterização e constituição deste afeto operam como
possíveis elementos de resistência em um sistema opressor heteropatriarcal. O foco da análise são
textos de poetas lésbicas brasileiras em atividade, como Angélica Freitas (em “Um útero é do
tamanho de um punho”, publicado em 2012, e “Canções de atormentar”, de 2020), Simone Brantes
(em “Quase todas as noites”, de 2016), Kátia Maciel (no livro “Ticket Zen”, de 2010), Maria Isabel
Iorio (em “Aos outros só atiro meu corpo”, de 2019), Mariana Paim (no livro “Lugar comum”, de
2021), Ágnes Souza (em “Pouso”, de 2020), entre outras autoras em cujos poemas é possível
observar essas estratégias, que passam pela figuração de vivências, descobertas, enfrentamentos,
conflitos e reafirmações de um posicionamento afetivo-político desviante de uma norma vigente,
empreendendo, por meio da literatura, a negação da exclusão e apagamento de experiências
distintas dos padrões heteronormativos. Como base teórica que auxiliará nessas análises, serão
trazidas questões relacionadas a temas como escrita feminina, literatura e resistência lésbica,
heterossexualidade compulsória e crítica feminista, a partir das reflexões de autoras como Hélène
Cixous, Adrienne Rich, Audre Lorde e Monique Wittig. As leituras das obras das poetas em questão
também serão relacionadas a textos de pesquisadoras brasileiras que já vêm analisando o assunto
aqui pesquisado, como Tatiana Pequeno e Monalisa Gomyde.
714
Referências: BRANTES, Simone. Quase todas as noites. Rio de Janeiro: 7Letras, 2016. BORGES, Kátia.
Ticket Zen. São Paulo: Escrituras, 2010. CIXOUS, Hélène. O riso da medusa. Rio de Janeiro: Bazar do
Tempo, 2022. FREITAS, Angélica. Um útero é do tamanho de um punho. São Paulo: Cosac Naify, 2012.
______. Canções de atormentar. São Paulo: Companhia das Letras, 2020. GOMYDE, Monalisa. Existe
uma Cultura Literária Lésbica? In: Caderno Espaço Feminino | Uberlândia, MG | v.34 | n.1 | jan./jun.
2021 | ISSN 1981-3082. https://seer.ufu.br/index.php/neguem/article/view/62698/32364 LORDE,
Audre. Irmã outsider: Ensaios e conferências. Tradução de Stephanie Borges. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2020. IORIO, Maria Isabel. Aos outros só atiro meu corpo. Bragança Paulista:
Editora Urutau, 2019. PAIM, Mariana. Lugar comum. Bragança Paulista: Editora Urutau, 2019.
PEQUENO, Tatiana. Poesia lésbica escrita por mulheres: dupla marca de subjetividade contra o
rochedo da inexistência. Revista CULT (24 nov. 2016). In:
https://revistacult.uol.com.br/home/indiciar-duplamente-o-silencio-mulher-lesbiandade-e-poesia/.
RICH, Adrienne. Heterossexualidade compulsória e existência lésbica & outros ensaios. Tradução de
Angélica Freitas. Rio de Janeiro: A Bolha, 2019. SHOWALTER, Elaine. A crítica feminista no território
selvagem. In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Tendências e impasses: o feminismo como crítica da
cultura. Rio de Janeiro: Rocco. p. 23–57 SOUZA, Ágnes. Pouso. Belo Horizonte: Editora Moinhos,
2020. WITTIG, Monique. O pensamento hétero e outros ensaios. Autêntica Editora, 2022.
MINHA IRMÃ E EU: MULHERES QUE ESCREVEM, MULHERES QUE PUBLICAM E AS EDITORAS
CARTONERAS
Lays Gabrielle da Silva Neves
Resumo: Essa oportunidade de comunicação é uma espécie de notícia que pretende olhar em
perspectiva tanto os sentidos iluminados até aqui, quanto as centelhas dos próximos passos desse
estudo, findado esse exercício. As mulheres sempre escreveram. O porquê da ausência desse reflexo
no mercado editorial passa por entender a dificuldade que existe da mulher se apropriar da palavra
“escritora”. De se “autorizar”. Definir o que são as editoras cartoneras, no entanto, parece não ser
um caminho muito eficaz, mesmo após duas décadas, desde que surgiu a primeira editora em solo
argentino. “Definir”, seguindo a etimologia da palavra, do latim definitivus, definire, é dar limite, dar
fim. Como fenômeno, manifestação, movimento, rede ou universo, ou mesmo acontecimento, as
editoras cartoneras surgem como elo imediato que conecta crise de projeto de sociedade e
715
reinvenção de mundos. De uma encruzilhada, nascem da e na contradição, sustentam paradoxos. A
ideia de estrutura é indissociável do seu contexto de aparição. Indivíduos que buscam sustento.
Subjetividades insustentáveis articuladas em torno do papelão. Indivíduos que buscam papelão, e
que encontram nas cartoneras uma tecnologia de representação. Para essas mulheres a poesia não
é um luxo, como disse Audre Lorde. Nem a poesia é luxo, nem o papelão é lixo, afirmam e confirmam
as mulheres editoras cartoneras. É pela Irmandade da palavra que a questão da gênese dos livros
cartoneros como gesto criativo carrega uma intenção. Talvez, pela primeira vez, estejamos
interessadas em analisar um campo da literatura do qual formamos parte, desde a essência mesma
da filosofia cartonera: caminhar na crítica e na prática de maneira colaborativa, em genuíno diálogo
com as demandas urgentes que conectam pessoas que se orientam para a acomodação de suas
vivências, ora pendulando para o individual, ora pendulando para o coletivo, mas sempre em
movimento.
Referências: ANZALDÚA, Gloria. A vulva é uma ferida aberta e outros ensaios. Trad. Tatiana
Nascimento. Rio de Janeiro: A Bolha Editora, 2021. CIXOUS, Hélène. O riso da medusa. Prefácio
Fréderic Regard; tradução Natália Guerellus, Raíssa França Bastos; posfácio Flavia Trocoli. - 1. ed. -
Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2022. DALCASTAGNÈ, Regina. O prego e o rinoceronte: resistências
na literatura brasileira. Porto Alegre: Zouk, 2021. FIGUEIREDO, Eurídice. Por uma crítica feminista:
leituras transversais de escritoras brasileiras. Porto Alegre: editora Zouk. 2020. FIGUEIREDO,
Eurídice. A nebulosa do (auto)biográfico: vidas vividas, vidas escritas. Porto Alegre: Zouk, 2022.
FRANCO, Anielle. Minha irmã e eu- Diário, memórias e conversas sobre Marielle. Rio de Janeiro:
Editora Planeta, 2022. GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro-latino-americano: ensaios,
intervenções e diálogos/ Organização Flavia Rios, Márcia Lima. -1ªed.- Rio de Janeiro: Zahar , 2020.
JOVELINO, Rosane Viana. Patuá. Ilustrações de Fábio Haendel. Cachoeira, BA: Cartonera das Iaiá,
2019. NASCIMENTO, Beatriz. O negro visto por ele mesmo. Ensaios, entrevistas e prosas. São Paulo:
UBU Editora, 2022. PRAZERES, Andressa dos; UILA, Barbara. (org.) GANZALA, Annie. (ilustração).
Irmandade da palavra: a voz da mulher no Recôncavo. Cachoeira, BA: Cartonera das Iaiá, 2019.
RIBEIRO, Ana Elisa, PEREIRA, Maria do Rosário A. e MOREIRA, Renata. (Orgs.) Prezada editora, -
mulheres no mercado editorial brasileiro. Belo Horizonte: Contafios, Moinhos, 2021. ROSA, Bárbara.
Carolinas, catadoras de sonhos: um diálogo entre Carolina Maria de Jesus e as catadoras de materiais
recicláveis de hoje.-Belo Horizonte: Quintal Edições, 2021. SANTOS, Sandra. Laboratórios de edição
no Brasil: entre formação e inserção. Rio de Janeiro: UERJ: SELB, 2022. SILVA, Cidinha da. Exuzilhar.
- 2. ed. - Rio de Janeiro: Pallas, 2022. SOUZA, Heleine Fernandes. A poesia negra-feminina de
Conceição Evaristo, Lívia Natália e Tatiana Nascimento. Rio de Janeiro: Malê, 2020. WOOLF, Virginia.
Um quarto só seu: & três ensaios sobre as grandes escritoras inglesas: Jane Austen, George Eliot,
Charlotte e Emily Brontë. Trad. Julia Romeu: prefácio Socorro Acioli. 1ª ed. -Rio de Janeiro: Bazar do
Tempo, 2020.
716
como o papel da ficção histórica na condução deste trabalho da memória. Sendo histórico, o cânone
é palco de disputas de poder ligadas à esfera simbólica da dominação social, por isso importa analisar
em bloco Volto semana que vem (2015), de Maria Pilla, e O corpo interminável (2019), de Claudia
Laje, obras representativas dessa enunciação, buscando identificar estratégias do feminino na busca
por recursos formais através dos quais figurar os traumas que lhe são próprios. Entende-se que assim
fazendo as autoras contribuam para a devidamente compor a memória de um período no qual a
presença das mulheres na resistência política é historicamente reconhecida, ainda que não o seja
através de seu próprio discurso: “o surgimento do feminismo brasileiro está inseparavelmente ligado
à experiência da ditadura (Pinto, 2003).
Referências: ATENCIO, R. J. (2014). Memory's Turn Reckoning with Dictatorship in Brazil. Wisconsin
The University of Wisconsin Press. CRUZ, Lua Gill da. DaPretéritos futuros : ditadura militar na
literatura do século XXI, Campinas, SP: [s.n.], 2021. FIGUEIREDO, Eurídice. A literatura como arquivo
da ditadura brasileira. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2017. GABEIRA, Fernando. O que é isso, companheiro?
Rio de Janeiro: Codecri, 1979. PINTO, Céli Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. São
Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003. SIRKIS, Alfredo. Os carbonários. São Paulo: Global,
1980. TAPAJÓS. Renato. Em câmera lenta. São Paulo: Alfa-ômega, 1979. VECCHI, Roberto, DI
EUGENIO, Alessia. A dupla cicatriz: a ditadura brasileira e a vocalização feminina da memória
traumática de Ana Maria Machado, estudos de literatura brasileira contemporânea, Brasília, n. 60,
e6009, 2020.
"DÁ-ME CONTA DO QUE VISTE E OUVISTE": UMA FLÂNEUSE NO BRASIL OITOCENTISTA NAS
CRÔNICAS SEMANAIS DE O JORNAL DAS SENHORAS
Luma Virgínia de Souza Medeiros, Maraysa Araújo Silva
Resumo: Na segunda metade do século XIX, no Rio de Janeiro, os jornais movimentavam a opinião
pública e faziam circular a literatura, sobretudo nos folhetins e nas crônicas. Em 1852, Juana Paula
Manso (1819-1875) inaugurou O Jornal das Senhoras, o primeiro periódico feminino e protofeminista
no Rio de Janeiro. Nele, reivindicou a emancipação moral da mulher, definida como o “justo gozo
dos seus direitos, que o brutal egoísmo do homem lhe rouba, e dos quais a deserda, porque tem em
si a força material” (Jornal das Senhoras, Rio de Janeiro, n. 1, jan. 1852, p. 5). Devido às inúmeras
“transgressões” políticas, literárias e jornalísticas, Manso e a sua obra foram banidas da memória
dos leitores (FLETCHER, 1994). Assim como a escritora argentina, outras mulheres oitocentistas
foram apagadas da memória oficial. Conforme aponta Duarte (2019), mulheres “escandalosas”,
como Nísia Floresta, foram vítimas de memoricídio, um violento processo que nega a memória das
mulheres na História. Todavia, apesar da tentativa de apagamento e da imposição de papéis restritos
ao espaço privado, as mulheres também transitaram pela cidade e escreveram sobre ela. Como
afirma Elkin (2022), a flâneuse, transeunte dos espaços públicos majoritariamente masculinos,
figurou pela cidade narrando histórias, escrevendo sobre os espaços e se relacionando com eles.
Neste trabalho, partindo da temática da flânerie na análise minuciosa de Benjamin (1989) na
literatura europeia, e da mulher flâneuse em Elkin (2022), nosso objetivo é analisar as estratégias
adotadas por Juana Manso para observar e escrever sobre a cidade em O Jornal das Senhoras na
seção das Crônicas da Semana. Usando o pseudônimo de Bellona, Manso simulou uma leitora
colaboradora do Jornal que revelava seus métodos para se inteirar e escrever sobre os
acontecimentos da cidade do Rio de Janeiro.
Referências: BENJAMIN, Walter. Paris do Segundo Império–O flâneur. Charles Baudelaire um lírico
no auge do capitalismo. SP: Brasiliense, 1989. DUARTE, Constância Lima. Nísia Floresta presente:
uma brasileira ilustre. Natal: Mariana Hardi, 2019. ELKIN, Lauren. Flâneuse: Mulheres que caminham
pela cidade em Paris, Nova York, Tóquio, Veneza e Londres. São Paulo: Fósforo Editora, 2022.
FLETCHER, Lea. Juana Manso: una voz en el desierto. In: FLETCHER, L. (comp.). Mujeres y cultura en
la Argentina del siglo XIX. Buenos Aires: Feminaria, 1994.
717
Resumo: O objetivo deste trabalho é apresentar uma leitura do romance Enervadas, de
Chrysanthème, situando-o no campo teórico dos estudos de gênero. A obra, publicada em 1922 e
narrada em 1ª pessoa, apresenta as peripécias de Lúcia, que já nas primeiras linhas da narrativa
recebe o diagnóstico médico de “enervada”, numa associação ao discurso da histeria em que muitas
mulheres foram enquadradas desde fins do século XIX. Também as demais personagens femininas
da obra compõem um panorama de figuras que questionam o status quo, isto é, os papéis
tradicionalmente atribuídos às mulheres naquela época. Trata-se de uma obra ousada, em que
desfilam mulheres pouco convencionais, sobretudo no que se refere à sexualidade e às normas
sociais, explícitas ou não, que enquadravam os gêneros dentro de determinadas expectativas
comportamentais. Segundo Gênese Andrade, na apresentação da obra “Modernismos, 1922-2022”,
pouco se refletiu sobre a literatura produzida por mulheres nas primeiras décadas do século XX,
ainda que elas estivessem muito presentes em revistas de variedades e em publicações das principais
editoras da época. Além disso, o Modernismo brasileiro ofuscou produções literárias que com ele
não coadunavam. Junte-se a isso o fato de que o interesse de boa parte das escritoras do período
residia em demandas “feministas”, a saber, sua literatura expressava aspectos ideológicos, relativos
à emancipação das mulheres em diversos campos.
Referências: ALONSO, Mariangela; TONIOSSO, José Pedro. Chrysanthème: perspectivas histórico-
literárias na Belle Époque brasileira. Revista EPeQ/Fafibe, 1ª. Ed., vol.01. ANDRADE, Gênese (Org.).
Modernismos, 1922-2022. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. CHRYSANTHEME. Enervadas. São
Paulo: Carambaia, 2019. DUARTE, Constancia. Feminismo e literatura no Brasil. Estudos Avançados,
17 (49), 2003. GENS, Rosa. CECÍLIA VASCONCELOS E AS MODERNAS MULHERES: A FIGURAÇÃO DE
CHRYSANTHÉME. XV Abralic.
718
Resumo: A participação das mulheres na sociedade esteve por muito tempo condicionada à outorga
masculina; na literatura não foi diferente. Para Octavio Paz (2017), os autores não lidos são vítimas
da indiferença, que, em sua ótica, é a pior censura possível. Essa indiferença tem sua constituição,
entre outras causas, na violência, uma violência que faz com que alguns grupos sejam silenciados e
suas ideias não sejam expostas, a não ser que atendam aos interesses dominantes. No campo
literário, não se permite, por exemplo, que uma obra seja publicada, que chegue até o leitor por
outros meios ou que suas ideias sejam desprezadas e destruídas. A partir da metáfora do quarto a
ser mobiliado, de Virginia Woolf (2016), esta comunicação tem como objetivo trazer à discussão o
que foi silenciado no que tange à literatura de autoria feminina produzida em Mato Grosso do Sul,
tendo por corpora textos produzidos por quatro autoras que escrevem desse lugar geográfico. Dois
aspectos serão analisados, a saber: a violência e a memória que confluem nas obras de Raquel
Naveira, Aglay Trindade,Tania Souza e Gleycielli Nonato, cujos textos selecionados nos apresentam
uma visão da historiografia constituinte do estado de Mato Grosso do Sul, a partir de uma ótica
ficcional em que “o passado só se deixar fixar, como imagem que relampeja irreversivelmente, no
momento em que é reconhecido” (BENJAMIN, 1985, 224), cabendo à ficção gerar/criar documentos
que fundarão a memória social local.
Referências: ARENDT, Hannah. Sobre a Violência. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994. BENJAMIN,
W. As Teses sobre o Conceito de História. In: Obras Escolhidas, Vol. 1, p. 222-232. São Paulo,
Brasiliense, 1985. NANTES, Aglay Trindade. Morro Azul: estórias pantaneiras. Campo Grande: IHGMS,
2010 NAVEIRA, Raquel. Guerra entre irmãos: poemas inspirados na Guerra do Paraguai. 2. ed. Campo
Grande, MS: Gráfica Ruy Barbosa, 1997. NONATO, Gleycielli. Morro do Criminoso. In: NONATO,
Gleycielli .Vila Pequena: Causos, contos e Lorotas. Campo Grande, MS/FCMS: Life editora, 2017.
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. In: Projeto história. São Paulo:
PUC, n. 10, p. 7-28, dezembro de 1993. PONTES, José Couto Vieira. História da Literatura Sul-Mato-
Grossense. São Paulo: Editora do Escritor Ltda., 1981. RICOEUR, Paul. A Memória, a história, o
esquecimento. Campinas: Unicamp, 2007. ROSA, Maria da Glória de Sá; NOGUEIRA, Albana Xavier. A
literatura sul-mato-grossense na ótica de seus construtores. Campo Grande, MS: Fundação de
Cultura de Mato Grosso do sul, 2011. SOUZA, Tânia. E eles vieram com o amanhecer. In. SOUZA,
Tânia. Coisas de Cá [online], 2020. Disponível em:
<https://taniasouzams.blogspot.com/2013/02/era-uma-vez.html>. Acesso em: 13 de dezembro de
2020.
719
é perpassado por orientações que extrapolam a dimensão estética do texto literário (MUZART,
1999).
Referências: CHARTIER, Roger. A História Cultural entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL,
1988. MEYER, Marlyse. Folhetim: uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. MORAIS
FILHO, José Nascimento. Maria Firmina dos Reis: fragmentos de uma vida. São Luís: SIOGE, 1975.
MUZART, Zahidé L. (org.). Escritoras brasileiras do século XIX: antologia. Florianópolis: Editora
Mulheres; Santa Cruz do Sul; EDUNISC, 1999. REIS, Maria Firmina dos. Úrsula; A Escrava. Belo
Horizonte; Florianópolis: PUC Minas; Ed. Mulheres, 2004.
720
interpelam o estar-entre-línguas, a visibilidade, as formas da literariedade de línguas minorizadas e
os sentidos da tradução, tudo isso juntamente ao entendimento do livro supracitado enquanto obra
coletiva de toda a América Latina. Em outro sentido, busco ao longo do estudo sugerido
compreender também os debates que compõem o complexo e rico campo literário brasileiro, e,
dessa forma, considerar o lugar que ocupa, neste caso então, a Editora Pachamama e, em particular,
a obra "Taynôh" (2019), de Aline Rochedo Pachamama.
Referências: AMATI-MEHLER, Jacqueline. A Babel do inconsciente: Língua materna e línguas
estrangeiras na dimensão psicanalítica. Rio de Janeiro: Imago, 2005. BARZOTTO, Leone Astride;
CARRIZO, Silvina (Orgs.). Filiações e afiliações interamericanas: legados familiares, étnicos e
nacionais. Porto Alegre: Letra 1, 2021. BOURDIEU, Pierre. As regras da arte: gênese e estrutura do
campo literário. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. CASANOVA, Pascale. A república mundial
das letras. São Paulo: Estação Liberdade, 2002. MONTALDO, Graciela. A propriedade da cultura:
ensaios críticos sobre literatura e indústria cultural na América Latina. Chapecó: Argos, 2004.
PACHAMAMA, Aline Rochedo. Taynôh: o menino que tinha cem anos. 3. ed. Rio de Janeiro:
Pachamama, 2019.
721
Janeiro: Imago, 1991. LUKÁCS, Gyorgy. A teoria do romance: um ensaio histórico-filosófico sobre as
formas da grande épica. Tradução José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Editora 34 Ltda., 2000.
MARINS, Francisco. A Aldeia Sagrada. 35. ed. São Paulo: Ática, 2015. MARTINS, Gilberto. Cidadela de
Deus – a saga de Canudos. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2003. MENTON, Seymour. La nueva novela
histórica da la América Latina 1979-1992. México: Fondo de Cultura Económica, 1993. RODRÍGUEZ,
A. Márquez. Historia y ficción en la novela venezoelana. 2 ed. Caracas: Talleres de Anauco Ediciones,
C. A., 1996. ZUCKI, Renata. Letramento literário: Práticas de leitura do texto literário nos anos iniciais
do ensino fundamental. Dissertação de Mestrado (Profletras). Unioeste. Cascavel, 2015.
ESTUDO TROPOLÓGICO COM FOCO NO TEXTO LITERÁRIO DO ESCRITOR GOIANO BERNARDO ÉLIS
Bruna Carla Martins Ramos
Resumo: O presente estudo objetiva indagar, através das personagens de dois contos bernardianos,
questões que (de)formam a sociedade, no caso aqui a goiana, visto que, no que se refere à formação
do processo histórico-social, são perceptíveis a situação de estereotipação da figura feminina e a
relação de poder presentes nos discursos sociais. Da mesma maneira, apresentar, também, a
722
coisificação do ser através da metaforização da língua e recursos estilísticos que compõem a
narrativa literária – tropos literários (WHITE, 2014; RICOEUR, 2000), o que por sua vez acabam por
reproduzir o cotidiano. O corpus de investigação se limita aos contos Caminhão de arroz, publicado
no livro “Caminhos dos gerais” em 1975, e Ontem, como hoje, como amanhã, como depois da obra
“Caminhos e Descaminhos” publicada em 1965. Do ponto de vista científico para a pesquisa, a
fundamentação teórica referente ao estudo terá como sustentação autores como Hayden White
(2014), Homi Bhabha (2005), Pedro Fonseca (2011) e Paul Ricoeur (2000) entre outros. Com relação
à metodologia, essa pesquisa se caracteriza como bibliográfica, uma vez que os dois contos serão
confrontados com fontes teóricas, a fim de que, por meio desse embate, se entenda a carga
ideológica impregnada nos tropos discursivos. Os resultados esperados, a partir da realização deste
estudo, possibilita entender o papel dos tropos (figuras de linguagem) no texto literário, quanto à
relação de opressão a que as classes subalternas estão submetidas, como também discutir o
processo histórico goiano para entender a influência do colonizador na criação de estereótipos
sociais da população do interior goiano. No caso dos contos discutidos: a mulher sertaneja e negra e
a mulher indígena. Entende-se também como forma de contribuição epistemológica às pesquisas
que exploram a obra do escritor goiano.
Referências: BHABHA, H. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2005. BOSI, A. História concisa
da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2017. BRANDÃO, R. de O. As figuras de linguagem. São
Paulo: Ática, 1989. COUTINHO, A. Notas de teoria literária. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1976.
COUTINHO, A. A literatura no Brasil: era modernista. V 5, 5. ed. São Paulo: Global, 1999. COUTINHO,
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2021). Essa escritora maranhense elaborou uma obra literária na qual podemos entrever, desde uma
perspectiva atual, traços de decolonialidade do pensamento já no século XIX. Para a presente
comunicação buscamos realizar considerações gerais sobre o conto A escrava (1887) e sua possível
leitura desde um olhar decolonial.
Referências: CASTRO-GÓMEZ, S.; GROSFOGUEL R. El giro decolonial: reflexiones para una diversidad
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pluralidade significativa de sentidos. Tal performance oportuniza a ressignificação da memória do
passado histórico de um país. O romance Torto Arado (2019), de Itamar Vieira Junior configura como
uma leitura profícua dessa relação. Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo analisar a relação
literatura e história presente no romance, intencionando compreender a forma como ocorre a
reinterpretação do passado do Brasil e os efeitos de sentidos configurados na ressignificação da
memória nacional. A articulação entretecida entre ficção e história possibilita a descentralização de
vozes e espaços, conforme salienta Hutcheon, “[...] se existe um mundo, então existem todos os
mundos possíveis: a pluralidade histórica substitui a essência atemporal eterna” (1991, p.84). Assim,
o romance é uma janela à reflexão de nosso passado histórico, cultural, social e político, tematizando
aspectos estruturais da sociedade, como, gênero, raça, classe e religião. Este trabalho tem como
referencial teórico os estudos sobre a metaficção historiográfica de Linda Hutcheon (1991), os estudo
sobre memória, raça, gênero e pós-colonialismo de Krada Kilomba (2019), e os estudos sobre o
pensamento decolonial de Walter Mignolo (2003).
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729
REPRESENTAÇÃO E SUBALTERNIDADE EM "BIOGRAFÍA DE UN CIMARRÓN" E EM "BIOGRAFIA DO
LÍNGUA": UM ESTUDO COMPARADO.
Higor David Rosa Afonso Pinto
Resumo: "Biografía de un Cimarrón" (Miguel Barnet) e "Biografia do Língua" (Mário Lúcio) são,
ambos, baseados na vida de um mesmo homem, Esteban Montejo. Talvez o único vivente registrado
que passou pela escravidão, pela guerra de independência, pelo colonialismo, pelo imperialismo,
pelo capitalismo e pelo comunismo, Esteban é uma figura que chama a atenção. Entretanto, há
importante problema: por ser analfabeto, não pode escrever a própria história. Por isso, perde,
guardadas as devidas proporções, o direito a representar-se, passando a ser representado. Por um
lado, é escrito pelo olhar antropológico, historiográfico e, em alguma medida, literário de Miguel
Barnet; por outro, é transformado por inteiro numa persona da ficção por Mário Lúcio. Surgem,
assim, imagens muito distintas, que se ligam diretamente ao lugar, às experiências e às necessidades
comunicativas de quem escreve. Isso porque, quando construída por outro, a representação de
Esteban não parte da própria experiência, mas do modo como Barnet e Lúcio recebem-na e decidem
apresentá-la. É uma mediação difícil, que estabelece encontros, agenciamentos, fragmentações e
reconfigurações. A figura que se lê, no fim, não é Esteban Montejo, mas uma conformação dele;
atravessada pelo discurso, mediada por necessidades, por visões de mundo e por valores
diretamente ligados ao lugar de cada autor. Surge, assim, terreno importante para fomentar o
debate acerca do modo como diferentes interpretações da personagem histórica serão reivindicados
por cada projeto. Afinal, o que está em jogo nestas diferentes representações? Que pistas podem
oferecer para pensarmos os processos contra-hegemônicos? A partir dessas perguntas, espera-se
propor um caminho que nos permita mergulhar nas implicações relacionadas ao diálogo entre
testemunho, ficção e história, de modo a contemplar os discursos (HALL, 2016), os lugares de fala
(RIBEIRO, 2017), e os possíveis agenciamentos (DELEUZE E GUATTARI, 1996) que influenciam cada
leitura e contribuem para cada modelo de construção de realidade.
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Resumo: Ao longo do tempo a literatura na América latina, inicialmente, com a colonização, revela
conflitos de imaginários entre os povos, espaço e tempo. Nesse sentido, este trabalho pretende
pensar o protagonista Diego de Zama, da novela Zama de Antonio Di Benedetto (1956), como se
constrói nessa perspectiva de ficção de anti-fundação da América Latina. Para tanto, Sommer (2004)
será interessante para a discussão sob a perspectiva das novelas de ficção fundacionais da América
Latina e as condições delineadas como um padrão de ser, fazer e pensar o mundo que tais novelas
repetem ao contribuir para construção do pensamento latino-americano homogêneo. Ao
percebermos que as novelas de ficção fundacionais romantizam e reverberam características
comuns a construção de um imaginário sociocultural, constatamos, por outro lado, que em Zama há
uma desconexão com realidades romantizadas. Nessa perspectiva, entrelaçada a conflitos, que
contradizem imaginários romantizados das novelas de ficção fundacionais da América Latina, o
argentino Di Benedetto (1956), elabora uma visão do período colonial em Zama (1956), como um
mundo de incertezas. A romantização da vida será problematizada a partir da reflexão de ANDERSON
(1983) a partir da questão da comunidade imaginada que o protagonista Diego de Zama também
está atrelado, porém com uma consciência diferente. As provocações de PIZARRO (1987) sobre a
literatura na América Latina será considerada para pensar o contexto da literatura latino-americana,
uma vez que sempre esteve relacionada a camadas privilegiadas em sua difusão de realidades. Essa
difusão de realidade em Zama remeterá ao estilo neobarroco visto em CALABRESE (2012). Em suma,
há indícios de que Zama (1956) apresenta-se como uma narrativa importante para pensar a
identidade do ser latino americano, sendo assim, provocar reflexão sobre a novela de anti-ficção
parece ampliar um horizonte de possibilidades para pensar o passado, entender o presente e
vislumbrar o futuro da América Latina.
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736
população negra no Brasil estão presentes ainda hoje. A partir do universo diegético apresentado
em Torto Arado, que possibilita a vozes historicamente silenciadas no Brasil se fazerem ouvir e ecoar
para além dos limites narrativos, a pesquisa bibliográfica percorre a ideia de que a descolonização
vivida no século XIX foi incompleta e limitada a aspectos jurídico-políticos, sendo necessária uma
segunda descolonização. A ideia é colocada em diálogo com as noções de sujeito soberano e sujeito
subalterno, abrindo o leque da análise para o campo do discurso mediante a análise dos sentidos
despertados pelo silêncio para a constituição de sujeitos, mobilização de memórias e formação de
sentidos. Os limites e acessos possibilitados pelo silêncio na materialidade do texto são justamente
o ponto de chegada desta análise, que resulta em considerações sobre o efeito-leitor e as
possibilidades de compreensão da obra a partir da importância das personagens femininas em sua
resistência perante a opressão.
Referências: BALLESTRIN, Luciana. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência
Política, nº11. Brasília, maio - agosto de 2013, pp. 89-117. BRASIL. Ministério do Planejamento,
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2021. Disponível em: https://forumseguranca.org Instituto DataFolha.br/wp-
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IDEIAS, Livraria Circulares - Livros e. Festival Tortoaraders: encontro com tradutores de torto arado.
2022. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ZhK3kENRUVc&t=376s. Acesso em:
23 maio 2022. ORLANDI, E.P. Análise de Discurso: princípios & procedimentos. Campinas:
Pontes. 2005. ____________. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. Campinas: Editora
Unicamp. 2007. SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Redefor. Zoppi Fontana, M.
Disciplina: Autoria, Efeito?Leitor e Gêneros de Discurso. Módulo 2 do Curso de Especialização em
Língua Portuguesa. São Paulo: 2010. SPIVAK, G.C. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora
UFMG, 2010. VIEIRA JUNIOR, I. Torto Arado. São Paulo: Todavia, 2021.
FICÇÃO PARA RESSIGNIFICAR A HISTÓRIA, LITERATURA QUE SE FAZ PELA MEMÓRIA: UMA LEITURA
DE "LA CABEZA DE MARIANO ROSAS" (2018), DE HÉCTOR SCHMUCLER
Phelipe de Lima Cerdeira
Resumo: Ao considerar as fricções e os choques causados pelo intricamento entre os discursos
histórico e ficcional na Argentina, passa a ser verossímil entender como um país cerceou diferentes
espaços de enunciação em prol de um porto-cidade. Partindo desse pressuposto e viabilizando uma
maneira para pensar as produções de ficção histórica, chega-se à criação do tropo literário Argentum
Córdoba (CERDEIRA, 2019), uma epistemologia de leitura criada para responder os estudos da ficção
histórica no País do Prata mediante à observação de diferentes escritores que enunciam a partir do
campo intelectual cordobês (BOURDIEU, 2002). Partindo de tais balizas, esta comunicação tem como
objetivo oferecer uma leitura possível para o romance La cabeza de Mariano Rosas (2018), do
escritor e cineasta Sergio Schmucler. Como fundamentação teórica, destaca-se a incursão não
apenas no que diz respeito à lógica de hipertrofia crítica argentina desenvolvida desde a geração de
1837, valorizando discussões sobre o rumo da ficção histórica (WEINHARDT, 2010; 2011) (ESTEVES,
2008) (FLECK, 2017, 2018) (AÍNSA, 1991) e o consequente impacto causado por um (re)alinhamento
do que pode ser entendido como histórico (BURKE, 1993), tomando como eixo de argumento a
memória individual e as memórias coletivas (HALBWACHS, 1990) enquanto arquitetura narrativa
possível de construção do coletivo.
Referências: AÍNSA, Fernando. La nueva novela histórica latinoamericana. Plural. 240 (82-85), 1991.
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(Doutorado em Estudos Literários). Programa de Pós-graduação em Letras, Universidade Federal do
Paraná, Curitiba, 2019. 569 p. CHAS, Susana Rosalía. Los que pintan la aldea II. Panorama general de
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literatura que parece história ou antropologia, e vice-versa. In: CHIAPPINI, Lígia; AGUIAR, Flávio Wolf
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biblioteca ilimitada ou uma babel ordenada: ficção-crítica contemporânea. Cadernos de Estudos
Culturais, Campo Grande, v. 1, p. 91-116, jan./jun. 2010.
738
resultados deste estudo apontam para a necessidade de se incentivar leitura de textos literários que
buscam ressignificar o passado narrado pela historiografia por meio da desconstrução da falácia da
igualdade étnica e social apregoada em nosso país. Nesse sentido, a obra de Sandroni (2011) apontar
às potencialidades da descolonização na formação leitora já no âmbito da Educação Básica.
Referências: CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: Vários escritos. 3.ed. São Paulo: Duas
Cidades, 1995. FLECK, Gilmei Francisco. O romance histórico contemporâneo de mediação: entre a
tradição e o desconstrucionismo – releituras críticas da história pela ficção. Curitiba: CRV, 2017.
KRISTEVA, Julia. Introdução à semanálise. Tradução de Lúcia Helena França Ferraz. 2.ed. São Paulo:
Perspectiva, 2005. SANDRONI, Luciana. Um Quilombo no Leblon. [ilustrações de Carla Irustra]. Rio
de Janeiro: Pallas, 2011. SANTAELLA, Lucia. O que é semiótica. Coleção Primeiro Passos, São Paulo:
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2012. SILVA, Eduardo. As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: uma investigação de
história cultural. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. SILVA, Rosangela de Jesus. O Brasil de
Angelo Agostini: política e sociedade nas imagens de um artista (1864-1910), 518f. Tese (Doutorado
em História). Universidade Estadual de Campinas, Campinas: São Paulo, 2010. PEIRCE, Charles
Sandres. Semiótica. Tradução de José Teixeira Coelho Neto. - São Paulo: Perspectiva, 2005.
739
de navios negreiros. O episódio, considerado o primeiro grande passo em direção à abolição da
escravidão no Brasil, é revisitado em O herói provisório sob uma ótica decolonial, contestadora da
historiografia tradicional. A partir de uma intrincada trama narrativa, em que diferentes relatos são
entrelaçados, acessamos perspectivas humanizadas, trajetórias de escravos, relatos de mulheres, em
geral, o olhar daqueles que não possuem espaço nos registros oficializados – como propõe Sharpe
(1992), a história dos vencidos. A narrativa, classificada como um novo romance histórico latino-
americano (AÍNSA, 1991; MENTON, 1993), apresenta densa construção metaficcional e uma
complexa teia de intertextualidades – também denominado, assim, como novo romance histórico
metaficcional (FLECK, 2017) –, com revisão crítica e perspectiva desconstrucionista do discurso
hegemônico. O conjunto dessas características articulam vias ao pensamento decolonial (MIGNOLO,
2003), tomado como a busca por pensar a partir de um lugar “outro”, de uma exterioridade colonial
eurocêntrica. Dessa maneira, promove e instiga um posicionamento crítico contínuo, capaz de
resistir, intervir e influir para o movimento de reconhecer, desvelar e questionar a colonialidade do
ser, do saber e do poder. Com base nessas considerações, analisamos criticamente O herói provisório
(2017) com o objetivo de evidenciar como suas estratégias narrativas e atitude impugnadora
convergem para a construção de um texto plural e questionador, capaz de ressignificar a
historiografia tradicional paranaense e atuar ativamente no processo de decolonização epistêmica.
Referências: AÍNSA, Fernando. La nueva novela histórica latinoamericana. Plural, México, n. 240, p.
82-85, 1991. FLECK, Gilmei Francisco. O romance histórico contemporâneo de mediação: entre a
tradição e o desconstrucionismo – releituras críticas da história pela ficção. Curitiba: CRV, 2017.
FROTA, Etel. O herói provisório. Curitiba: Travessa dos editores, 2017. MENTON, Seymour. La nueva
novela histórica de la América Latina: 1979-1992. México: Fondo de Cultura Económica, 1993.
MIGNOLO, Walter. [2003] Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e
pensamento limiar. Tradução de. Solange de Ribeiro de Oliveira. Belo Horizonte: Editora UFMG,
2020. SHARPE, Jim. A história vista de baixo. In: BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas
perspectivas. Trad. de Magda Lopes. São Paulo: Editora Unesp, 1992. p. 39-62.
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2017. HALL, Stuart. Da diáspora: Identidades e Mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG,
2003. LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas, São Paulo: Editora da UNICAMP, 1990.
(Coleção Repertórios). VEYNE, Paul. Como se escreve a história e Foucault revoluciona a história.
Brasília: Universidade de Brasília, 1998.
741
da República (1973) e o de Michel Foucault, em Vigiar e Punir (1987) e O que são as luzes (2011), que
explanam sobre processos políticos de violência e repressão, bem como do professor e crítico
literário Daniel Pires (2005, 2018, 2019), que contribui com o olhar biobibliográfico sobre Bocage.
Referências: BOCAGE, Manuel Maria Barbosa du. Obras completas de Bocage: sonetos, sátiras, odes,
epístolas, idílios, apólogos, cantatas e elegias. Tomo I. Organização, fixação de texto e notas: Daniel
Pires. Setúbal: Imprensa Nacional, 2018. FOUCAULT, Michel. O que são as Luzes. In.: Arte,
epistemologia, filosofia e história da medicina. Manuel Barros da Motta (Org.); Vera Lúcia Avellar
Ribeiro (Trad.). Rio de janeiro: Forense Universitária, 2011. pp. 259-270. FOUCAULT, Michel. Vigiar e
punir: nascimento da prisão. Raquel Ramalhete (Trad.). Petrópolis, Vozes, 1987. 288p. HORÁCIO.
Arte Poética. In.: A Poética Clássica: Aristóteles, Horácio, Longino. Introdução: Roberto de Oliveira
Brandão. Tradução: Jaime Bruna. São Paulo, Cultrix, 2014. ISER, A. Wolfgang. O Fictício e o
Imaginário: perspectivas de uma antropologia literária. Johannes Kretschmer (Trad.). Rio de Janeiro,
EdUERJ, 1996. KANT, Immanuel. Resposta à Pergunta: ‘Que é esclarecimento’?. In: Textos Seletos.
Arcângelo R. Buzzi e Leonardo Boff (Coord.), 2ª Ed. Bilíngue. Petrópolis: Vozes, 1985. 100 – 116 p.
PIRES, Daniel. Apresentação. In.: BOCAGE, Manuel Maria Barbosa do. Obra completa: cantatas,
canções, idílios, epístolas, odes e cantos. Volume II. Lisboa, Edições Caixotim, 2005. PIRES, Daniel. A
poesia clandestina de Bocage. In.: BOCAGE, Manuel Maria Barbosa do. Obras completas de Bocage:
sonetos, sátiras, odes, epístolas, idílios, apólogos, cantatas e elegias. Tomo I. Daniel Pires
(Organização, fixação de texto e notas.). Setúbal: Imprensa Nacional, 2018. PIRES, Daniel. Entrevista
– «Bocage constitui um facho da liberdade, que permanece aceso». Revista Imprensa Nacional.
Lisboa: Imprensa Nacional, 2019. PIRES, José Cardoso. Técnica do Golpe de Censura. In: E agora,
José?. Lisboa: Moraes Edições, 1977.
742
Resumo: O dialogismo interdisciplinar e literário aqui acionado dá enfoque ao problema da violência,
pensando-o como fato tão constitutivo quanto reprodutor e dinamizador para identidades africanas
e brasileiras forjadas nos domínios da história colonial e dos desdobramentos culturais de longa
duração que têm sido designados como “colonialidade”. É no intuito de buscar ferramentas teóricas
que permitam estabelecer interfaces renovadas entre esses campos epocais, geográficos e
identitários que recorrerei ao conceito de necropolítica. Transpassado por significações polêmicas,
cabe destacar a utilidade do conceito elaborado pelo pensador camaronês Achille Mbembe para o
exame de circuitos de violência extrema e ininterrupta, de de morticínio coletivo em moto contínuo,
processos que visam menos a extinção de seus alvos do que a reposição interminável da destruição
de um outro tão estigmatizado socialmente quanto incorporado aos pilares da ordem. Por sua vez,
a conversão do assassínio em matriz cultural de uma sociedade também afeta às forças de
questionamento e mudança dessa ordem, legitimando meios exorbitantes de autodefesa,
mobilização política e construção identitária. Estabelecer correlações entre “mundos de morte”, tais
como aqueles erigidos por instituições coloniais e racistas, constitui um princípio comparatista para
o recorte que examinarei, articulando representações ficcionais do necropoder repartidas entre os
cenários da guerra anticolonial em Angola inscritos no romance 'As lágrimas e o vento', de Manuel
Lima; e as cenas do racismo estrutural brutalmente exercido pelos aparelhos policiais e jurídicos no
Brasil, expressões plenas do “fazer morrer” sistemático, centradas no jovem protagonista do
romance 'O livro preto de Ariel', de Hamilton Santos. Interessa-me especificamente refletir sobre as
formas de ruptura e recriação de vínculos comunitários agenciadas nos contextos da descolonização
militarizada em Angola, visando um espelhamento crítico em relação à vigência do estado de exceção
que se observa entre as comunidades negras brasileiras.
Referências: LIMA, Manuel dos Santos. As lágrimas e o vento. Angola: Edições Chá de Caxinde, 2004
(1975). MBEMBE, Achille. Crítica da razão negra. Tradução de Marta Lança. Antígona: Portugal, 2014.
MBEMBE, Achille. Necropolítica. Biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte.
Tradução de Renata Santini. In: Arte & Ensaios. Revista do Programa de Pós-Graduação em Artes
Visuais. n. 32. Rio de Janeiro: Escola de Belas Artes; UFRJ, dezembro 2016. SANTOS, Hamilton Borges
dos. O livro preto de Ariel. 2.ed. Salvador: Editora Reaja, 2021. SODRÉ, Muniz. A sociedade incivil:
mídia, iliberalismo e finanças. Petrópolis: Editora Vozes, 2021.
743
NO ITINERÁRIO DE FRANCISCO GALVÃO E RÓMULLO GALLEGOS: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIAL
DA AMAZÔNIA NAS OBRAS “TERRA DE NINGUÉM” E “CANAIMA”.
Luan do Lago Duarte
Resumo: Quando pensamos em literatura amazônica, nos questionamos, muitas vezes, de qual
literatura da Amazônia estamos falando, temos, até então, diversas visões sobre nossos teóricos,
críticos e até autores. Podemos dizer então, que se existe culturas e literaturas que abrange toda a
Amazônia, passando por questões ancestrais, da relação entre local e universal, nacional e
internacional, e o que seria esse diálogo amplo e que instiga tanto uma, quanto outra literatura.
Logo, pensar na construção da cultura amazônica, seria pensar num conceito, numa noção, num
significado coletivo, social, histórico sobre a própria Amazônia. Logo, pensar Amazônia, é pensar no
seu processo de formação, da sua identidade, a partir também das narrativas orais, das construções
de pesquisadores, de diversas pessoas que estiveram e que fizeram parte da história da Amazônia
como 3 um todo. Então relacionar essas interpretações da Amazônia, é pensar no regime das águas,
pensar em autores da literatura, autores contemporâneos como Antônio Juraci Siqueira e
pesquisadores da atualidade como João de Jesus Paes Loureiro, mas também pensar nos seus
viajantes, os estudiosos que estiveram na Amazônia. A colonização. A dizimação de povos indígenas
e longas ditaduras são algumas das marcas em comum dos países que constituem a América Latina,
especificamente, os que englobam a Amazônia. Houve um período em que muitos autores latinos
resistiram a regimes totalitários como Ruan Rulfo, Teresa de La Parra, Rómullo Gallegos, Arturo
Pietri, Francisco Galvão, Graciliano Ramos, entre tantos outros. Tanto no diagnóstico da violência e
da experiência social sob o autoritarismo quanto no exame das contradições e impasses dos
intelectuais de diferentes vertentes políticas que se opunham ao regime de ditadura político-militar
de seus países, logo, faz relação ao tema “Aspectos comparativos na literatura histórico-social-
amazônica em Terra de Ninguém (1934) e Macunaima (1935) ”.
Referências: BRUNEL, PICHOIS e ROUSSEAU. Que é Literatura Comparada. Tradução Célia Berrettini.
São Paulo:Perspectiva, 1995. CARVALHAL, Tania Franco. Literatura Comparada. 4. ed. rev. e
ampliada, São 10 Paulo: Ática. 2006. . Intertextualidade: a migração de um conceito. Via Atlântica,
São Paulo, n. 9, p. 125- 136, 2006. _________________. O Próprio e o alheio: Ensaios de Literatura
Comparada. Porto Alegre: Unisinos, 2003. CLAUDON, Francis; HADDAD-WOTLIG, Karen. Elementos
de Literatura Comparada: Teorias e métodos da Abordagem Comparatista. Tradução de Luís Serrão.
Portugal: Editorial Inquérito, 1992. HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução de Beatriz
Sidou. 2ª ed. São Paulo: Centauro, 2013. KRISTEVA, Julia. Focos da Literatura Comparada. Rio de
Janeiro: Rocco, 1966. MACHADO, Álvaro Manuel; PAGEAUX, Daniel-Henri. Da Literatura Comparada
à Teoria da Literatura. Lisboa: Edições 70. 1988. SAMOYAULT, Tiphaine. A intertextualidade.
Tradução de Sandra Nitrini. São Paulo: Aderaldo & Rothschild, 2008. SILVA, Giuslane Francisca da.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução de Beatriz Sidou. 2ª ed. São Paulo: Centauro,
2013. Escritores Venezuelanos: https://personajeshistoricos.com/c-escritores/romulogallegos/
Acesso em 10 de setembro, às 10h45 Tudo sobre Rómulo Gallego:
https://bibliotecasalvadora.com/canaima-romulogallegos- resumen-completo-analisis-y-resena/
Acesso em 20 de setembro, às 12h20 Literatura latina:
https://escola.britannica.com.br/artigo/literatura-da-Am%C3%A9ricaLatina/603335 Acesso em 01
de outubro, às 13h O romance social de Francisco Galvão: expressões de uma representação da
cultura na Amazônia | Revista Elaborar (ufam.edu.br) Acesso em 03 de fevereiro, às 09h46.
744
Os meninos capitães da areia também foram afetados pela doença, experimentando a morte como
Almiro e Dora, mas a cura de Boa Vida que reaparece como um ressuscitado. Tal como na vida real,
a doença não é identificada de imediato, por isso se configura num movimento crescente do
vocabulário e vai passando por termos técnico-científicos, pelos populares até se caracterizar como
um simples Alastrim. É um cenário que se aproxima da pandemia atual da Covid 19, o qual não só
demonstra a atemporalidade do texto literário como atesta a permanência das desigualdades de
condições para enfrentando e combate à doença na cidade de Salvador, que pode ser mãe para
quem tem acesso à vacina, os brancos e madrasta para os negros. Para além de um sincretismo
superficial, os aspectos religiosos geram novos significantes, frutos de processos semânticos
potentes para compreensão da narrativa e do contexto ideológico marcado pela necropolitica.
Referências: SALAH, Jacques. A Bahia de Jorge Amado. SOUSA, Lúcia Soares. Introdução às Teorias
Semioticas. MIRANDA , Maysa. Os Capitães do Asfalto.
745
dignidade humana. Trata-se, portanto, de um trabalho de natureza comparativa cujo procedimento
principal consiste em “se alcançar aspectos jurídicos na produção literária de ficção” (GODOY, 2008),
configurando aquilo que os estudiosos dessa intersecção têm chamado de Direito na literatura.
Nesse modo de articulação, examinam-se aspectos singulares da problemática e da experiência
jurídica retratados pela literatura – como a justiça, a vingança, o funcionamento dos tribunais, à
ordem instituída, etc. -; entendida como obra literária. Analisa-se o direito a partir da literatura, com
base na premissa de que certos temas jurídicos encontram-se melhor formulados e elucidados em
obras literárias, uma vez que a literatura constitui uma espécie de repositório privilegiado por meio
do qual se inferem informações e subsídios capazes de contribuir diretamente na compreensão das
relações humanas que compõem o meio social (TRINDADE, GUBERT, 2008). Sob esse viés,
analisaremos a novela de O largo da Palma, tomando-a como locus de representação de situações
em que os direitos humanos são restringidos e/ou negados.
Referências: ADONIAS FILHO. O largo da Palma: Novelas. 7. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.
CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: Vários escritos. 5. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul,
2011, p. 171-93. DALCASTAGNÈ, Regina; DUTRA, Paula Queiroz; FREDERICO, Graziele. Literatura e
direitos humanos. Porto Alegre: Zouk, 2018. GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito &
Literatura: ensaio de síntese teórica. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. PIOVESAN,
Flávia. Temas de Direitos Humanos. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015. SARLET, Ingo Wolfgang.
Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9. ed. Porto
Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011. TRINDADE, André Karam; GUBERT, Roberta Magalhães.
Direito e Literatura: aproximações e perspectivas para se repensar o direito. In: TRINDADE, André
Karan; GUBERT, Roberta Magalhães; NETO, Alfredo Copetti (Orgs.). Direito & Literatura: reflexões
teóricas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008, p. 11-66.
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Cambridge University Press, 1995. WELLEK, R. & WARREN. A Função da Literatura. In Teoria da
Literatura. Trad. José Palla e Carmo. Lisboa: Publicações Europa-América, 1971.
747
mais real ou autêntica do que outra; não há, portanto, uma hierarquia dos modos de ser. Cada
maneira de ser é singular e incomparável. Assim, as existências mínimas comparecem em Pucheu
para pôr em vista o direito de existir, o que provoca tanto uma discussão de ordem estética quanto
político-ética.
Referências: CÂNDIDO, Antonio. O direito à literatura. In:_____. Vários Escritos. 5 ed. Rio de Janeiro:
Ouro sobre Azul/ São Paulo: Duas Cidades, 2011. p.170-193. LAPOUJADE, David. As existências
mínimas. São Paulo: n-1 edições, 2017. PELBART, Peter Pál. A vertigem por um fio: políticas da
subjetividade contemporânea. 1 ed. São Paulo: Iluminuras, 2018. PUCHEU, Alberto. Vidas rasteiras.
São Paulo: Editora Bregantini, 2020.
DIÁLOGOS POSSÍVEIS ENTRE ALBERT CAMUS E CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE: POR UMA
LEITURA DO PROCESSO CRIATIVO DE DRUMMOND SOB O SIGNO DA REVOLTA CAMUSIANA
Ana Carolina Botelho dos Santos
Resumo: A comunicação visa apresentar a pesquisa de Doutorado que venho desenvolvendo desde
o primeiro semestre de 2021 no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Literatura da
Universidade Federal Fluminense, em Niterói, Rio de Janeiro, sob orientação da Prof.ª Dra. Flávia
Vieira da Silva do Amparo. O objetivo central da minha pesquisa é buscar aproximações entre a
filosofia do franco-argelino Albert Camus e a poesia de Carlos Drummond de Andrade, investindo em
uma leitura de A rosa do povo, de 1945, e Claro enigma, de 1951, importantes obras do poeta
itabirano, à luz da perspectiva camusiana de revolta. Para compreendermos de que modo é possível
enxergamos o signo da revolta no processo criativo de Drummond, tendo em vista, sobretudo, as
obras escolhidas para compor o corpus da pesquisa, buscamos, entre outros referenciais teóricos,
suporte no ensaio filosófico O homem revoltado, publicado por Camus em 1951, estudo em que o
filósofo tece importantes considerações acerca dos tipos de revolta que marcaram a construção da
sociedade moderna e seus impactos também na literatura ocidental. No final da apresentação das
suas Confissões de Minas, Drummond chama a atenção para a necessidade de uma clara e sensata
representação da consciência do tempo na tessitura dos textos literários e convoca os escritores a
valerem-se da literatura como modo de dar sentido à experiência histórica (ANDRADE, 2011, p. 11).
Nessa perspectiva, a presente pesquisa e, por extensão, a comunicação desejam discutir como a lírica
drummondiana pôde servir de instrumento de revolta e de demonstração de consciência do tempo
àquele que só podia contar com o verbo poético para dar vazão ao seu instinto de solidariedade,
sentimento que está na essência do homem revoltado.
Referências: ANDRADE, Carlos Drummond de. Confissões de Minas. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
______. A rosa do povo. 1. ed. São Paulo: Cia das Letras, 2012a. ______. Claro enigma. 1. ed. São
Paulo: Cia das Letras, 2012b. CAMUS, Albert. O homem revoltado. Trad. Valerie Rumjanek. 14. ed.
Rio de Janeiro: Record, 2020.
748
pelo autor como “Fábula em um ato”, o que o levou a, propositalmente, não definir de modo
explícito nem local e tampouco o espaço dos acontecimentos. Os leitores e o público sabem apenas
que a ação acontece numa aldeia remota. Nas palavras do crítico Décio de Almeida Prado: “O
tratamento poético visa reduzir os fatos e as personagens à sua essência, tornar transparentes a
morfologia e a fisiologia do autoritarismo – como ele é e age.” (PRADO, 1993, p. 118). Nesse sentido,
o presente trabalho empreende uma análise da peça a fim de compreender de que maneira ela se
consolidou como um canto contra a sordidez totalitária nos idos dos “anos de chumbo”, além de
avaliar como a composição de Guarnieri chega aos dias de hoje e o que essa obra tem a comunicar
aos leitores e aos expectadores do presente.
Referências: GUARNIERI, Gianfrancesco. O melhor teatro - Gianfrancesco Guarinieri. 2ª ed., São
Paulo: Editora Global, 2001. Seleção: Décio de Almeida Prado. PONTO de Partida. In: ENCICLOPÉDIA
Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2023. Disponível em:
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/evento398467/ponto-de-partida. Acesso em: 15 de janeiro
de 2023. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7 PRADO, Décio de Almeida. Peças,
pessoas, personagens: o teatro brasileiro de Procópio Ferreira a Cacilda Becker. São Paulo: Cia das
Letras, 1993.
749
Ismail. O olhar e a cena – Melodrama, Hollywood. Cinema Novo, Nelson Rodrigues. São Paulo: Cosac
& Naify, 2003. 1 v.1 - n.1 – 2012. TODOS OS SONHOS DO MUNDO
https://www.youtube.com/watch?v=UPTqmF7nqmw
750
Walter Mignolo. Pela visão de João Antônio e pela linguagem por ele adotada – “cujo estilo nos
remete ao grito que vem de dentro, do âmago da raiz humana ferida nas periferias da brasilidade”,
(AGUIAR, 1997, p. 204), mesclando erudição com vocabulário das ruas, o autor revela ao leitor o
“paradigma decolonial” que, segundo MIGNOLO, (2017, p.57), “lucha por fomentar la divulgación de
otra interpretación que pone sobre el tapete una visión silenciada de los acontecimientos y también
muestra los límites de una ideología imperial que se presenta como verdadera y única interpretación
de los hechos”.
Referências: AGUIAR, F. A palavra no purgatório. São Paulo: Boitempo, 1997. ANTÔNIO, J.
Malagueta, Perus e Bacanaço. 3a edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1975. ANTÔNIO, J.
Malhação de Judas Carioca. Civilização brasileira, p. 41-54, 1975. BAKHTIN, M. O autor e o herói.
Estética da Criação Verbal. Trad. Maria Ermantina Galvão G. Pereira. Revisão. Marina Appenzeller.
São Paulo: Martins Fontes. 1983. MIGNOLO, W. D.; OLIVEIRA, M. Colonialidade: O lado mais escuro
da Modernidade. In: Revista Brasileira de Ciências Soc.iais. N.34, 2017. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rbcsoc/a/nKwQNPrx5Zr3yrMjh7tCZVk/?format=pdf&lang=pt. Acesso em:
20 ago.2022 QUIJANO, A. Colonialidad del poder y clasificación social. In: CASTRO-GOMÉZ, S.;
GROSFOGUEL, R. El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del
capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre Editores; Universidad Central, Instituto de Estudios
Sociales Contemporáneos y PontifiCia Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007. p. 93-126.
Disponível em: http://www.ceapedi.com.ar/imagenes/biblioteca/libreria/147.pdf. Acesso em: 25
mar. 2022.
751
são cada vez mais pertinentes. Isso se dá porque muitos de seus textos apresentam tais questões
como temática. Nesse sentido, uma de suas personagens mais representativas é Alvarenga, o qual
aparece em diversos textos carrerianos. Trata-se de um idoso, trabalhador informal, amante e
protetor de uma prostituta. O presente trabalho objetiva analisar o conto “Discurso aos cães”,
presente na obra As sombrias ruínas da alma, a partir da perspectiva da violência estrutural. A análise
se dá pelo estudo de cenas e discursos em que é possível perceber um desnudamento e visibilização
da injustiça social, um dos aspectos que caracterizam a violência estrutural. Segundo Galtung (2018),
esse tipo de violência caracteriza-se por impossibilitar que um indivíduo seja responsabilizado por
suas consequências, assim como pelo fato de um de seus resultados ser a desigualdade de acesso a
bens essenciais à vida para muitos indivíduos, enquanto uns poucos os têm em abundância.
Tomamos como referência para a análise, dentre outros, pensadores como Žižek (2014), Odália
(2017), Lins (1990), Ginzburg (2012) e Galtung (1990, 2018), no que se refere à temática da violência.
Quanto à categoria literária personagem, baseamo-nos em Candido (2007) e Brait (1985). A obra
destaca-se por criticar a desigualdade social, ao apresentar como protagonista uma personagem
que, em meio ao descaso, silenciamento e invisibilização impostos pela sociedade, vestida de Papai
Noel, dialoga com um cachorro e, nesse diálogo, expõe sua indignação com sua situação miserável e
o esvaziamento do sentido religioso presente nas festividades natalinas, as quais, apesar de
objetivarem comemorar o nascimento de Cristo, são, na verdade, dedicadas ao consumismo.
Referências: BEAUVOIR, Simone. A velhice. Tradução por Maria Helena Franco Martins. 3. ed. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2018. E-book Kindle. BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a
obra de Nikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da
cultura. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. 8. ed. revista. São Paulo: Brasiliense, 2012 (Obras
escolhidas v.1). p. 213-240. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002. BRAIT, Beth. A personagem.
São Paulo: Ática, 1985. CANDIDO, Antonio. Censura?violência. In: CANDIDO, Antonio. Recortes. São
Paulo: Companhia das Letras, 1993. CANDIDO, Antonio. Dialética da malandragem. Revista do
Instituto estudos brasileiros, n° 8, p. 67-89. São Paulo: USP, 1970. CANDIDO, Antonio; ROSENFELD,
Anatol; PRADO, Décio de Almeida Prado; GOMES, Paulo Emílio Salles. A personagem de ficção. 11.
ed. São Paulo: Perspectiva, 2007. CARRERO, Raimundo. As sombrias ruínas da alma. São Paulo:
Iluminuras, 1999. CARRERO, Raimundo. Condenados à vida: 70 anos de Raimundo Carrero. Recife:
Museu do Estado de Pernambuco, 2018. Catálogo de exposição, 13 nov.-16 dez. 2018, Cepe.
FRIEDMAN, Norman. O ponto de vista na ficção: o desenvolvimento de um conceito crítico. Revista
USP. São Paulo, n, 53, p. 166-182, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.2316-
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Peace Research, v. 27, n. 3. (Aug., 1990), p. 291-305. Disponível em:
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Tradução de Miguel Serras Pereira. São Paulo: Boitempo, 2014. LINS, Ronaldo Lima. Violência e
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pulsação narrativa: um movimento vigoroso e didático de criação literária. 2017. 237 f. Tese
(Doutorado em Teoria da Literatura) ? Centro de Artes e Comunicação, Universidade Federal de
Pernambuco, Recife, 2017. ODALIA, Nilo. O que é violência. Brasiliense, 2017. E-book Kindle.
PEREIRA, Carlos Alberto M... [et al.]. Linguagens da violência. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. PEREIRA,
Marcelo. Raimundo Carrero: a fragmentação do humano. Recife: Caleidoscópio, 2009. PERRONE-
MOISÉS, Leyla. Mutações da literatura no século XXI. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
SIQUEIRA, Sabrina. Aspectos de violência em contos gauchescos e dublinenses. Revista Eletrônica
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Disponível em: http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/LA/index. Acesso em: 20 jul.
2020. ŽIŽEK, Slavoj. Violência: seis reflexões laterais. Tradução de Miguel Serras Pereira. São Paulo:
Boitempo, 2014.
753
OS ESPAÇOS QUE HABITAMOS: A REPRESENTAÇÃO DE CIDADES NOS FOLHETOS DE ANTÔNIO
FRANCISCO
Felipe Gonçalves Figueira
Resumo: Uma característica recorrente na literatura de Antônio Francisco Teixeira de Melo é a
representação poética de espaços. Ora são fruto do empenho criativo do poeta em oposição àqueles
da vida cotidiana, como no folheto “Meu sonho” (FRANCISCO, 2011b, p. 13-24) e em “As seis moedas
de ouro” (idem, p. 51-64); ora são as cores e os cantos de seu sertão natal que são trazidos para seus
versos a partir de sua perspectiva crítica, como em “Um bairro chamado Lagoa do Mato”
(FRANCISCO, 2011a, p. 53 – 60). Em minha leitura, percebo a constituição desses espaços
representados como um exercício literário de reflexão filosófica sobre fundamentos éticos e
estéticos da própria sociedade no início de século XXI. Para o presente estudo, debruço-me sobre as
representações das cidades, que, em sua composição, o autor reimagina como exercício crítico.
Servem de corpus para o estudo os poemas encontrados nas antologias Por motivos de versos
(FRANCISCO, 2011a), Sete contos de Maria (FRANCISCO, 2011b), Dez cordéis num cordel só
(FRANCISCO, 2011c) e Quatro léguas e meia de cordel (FRANCISCO, 2019). Para o desenvolvimento
das reflexões sobre as dimensões teóricas da representação do espaço e do tempo na literatura, são
relevantes as proposições fundadas na análise do discurso de Mikhail Bakhtin (2006, 2018).
Referências: BAKHTIN, Mikhail. “O tempo e o espaço nas obras de Goethe”. In. _____ . Estética da
criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2006. (Coleção biblioteca universal)
_____ . Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo:
Ed. 34, 2018. FRANCISCO, Antônio. Por motivos de versos. Fortaleza: IMEPH, 2011a. ______ . Sete
contos de Maria. Fortaleza: IMEPH, 2011b. ______ . Dez cordéis num cordel só. Fortaleza: IMEPH,
2011c. ______ . Quatro léguas e meia de cordel. Fortaleza: IMEPH, 2019.
754
André; Medeiros, Elen de.. (Org.). Literatura e Teatro: encenações da existência. 1ed.Niterói: Eduff,
2018, v. , p. 127-153.
755
do erótico feminino e Lispector. Hesse escreve em seu diário sobre diferentes esculturas: “a bolsa é
uma bolsa semi-esfera - uma semi-esfera tubo um tubo arte é o que é tensão e liberdade oposição e
contradição objetos abstratos não símbolos para outra coisa pessoal distante, mas íntimo” (347).
Elas jogam com limites rígidos e desafiam movimentos literários ou artísticos específicos, abrindo
possibilidades para abstrações eróticas (conceito desenvolvido pela crítica de arte Lucy Lippard em
seu livro sobre Eva Hesse). A própria marca de minimalismo de Hesse, misturando desprendimento
com toque físico, natureza com sensualidade, anda em paralelo com a escrita de Lispector e seu
processo, permitindo-nos um olhar crítico sobre as maneiras pelas quais mulheres no exílio
encontram formas inovadoras de desenvolver sua arte quebrando estruturas patriarcais por dentro
delas.
Referências: Beard, Mary. The Invention of Jane Harrison. Cambridge, Mass: Harvard University
Press, 2000. Web. Cixous, Hélène, Clarice Lispector, and Verena Andermatt Conley. Reading with
Clarice Lispector. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1990. Web. Comissário, Ana,Paula
Pereira, and Rosanne Araújo Bezerra de. "Quem É Mulher De Verdade? – Corpo Feminino E
Sexualidade Em A Via Crucis do Corpo, De Clarice Lispector." Revista criação & crítica.29 (2021): 39-
54. Web. Ferguson, Roderick A. "Of Sensual Matters: On Audre Lorde's "Poetry is Not a Luxury" and
"Uses of the Erotic"." Women's studies quarterly 40.3 (2012): 295-300. Web. Harrison, Jane Ellen.
Prolegomena to the Study of Greek Religion. Cambridge University Press, 2010. Web. Lange-Berndt,
Petra. Materiality. London: Whitechapel Gallery, 2015. Web. Lippard, Lucy R. Eva Hesse. New York:
New York University Press, 1976. Web. Lispector, Clarice. A Via Crucis do Corpo. 2nd ed. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1984. Web. Lorde, Audre. Uses of the Erotic the Erotic as Power. Brooklyn,
N.Y: Out & Out Books, 1978. Web. Stoops, Susan L., Lynda Benglis, and Whitney Chadwick. More than
Minimal : Feminism and Abstraction in the '70's : Lynda Benglis ... [Et Al.]. Waltham. Mass: Rose Art
Museum, Brandeis University, 1996. Web. Whitworth, Michael H. "Virginia Woolf's Orlando,
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Raduan. Lavoura arcaica. São Paulo: Companhia das Letras, 2014. NIETZSCHE, Friedrich. A gaia
ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. NIETZSCHE, Friedrich. Ecce homo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2005. NIETZSCHE, Friedrich. Crepúsculo dos ídolos. São Paulo: Companhia das
Letras, 2006. NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
NIETZSCHE, Friedrich. O nascimento da Tragédia. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. NIETZSCHE,
Friedrich. Genealogia da moral. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. NUNES, Benedito. Poesia e
filosofia: uma transa. A palo seco – escritos de filosofia e literatura, n. 3, 2011, p. 8-17. Disponível
em: https://seer.ufs.br/index.php/apaloseco/article/view/5095. Acesso em: 16/11/2022.
NUSSBAUM, Martha. Fictions of the soul. In: NUSSBAUM, Martha. Loves Knowledge – essays on
philosophy and literature. New York: Oxford University Press, 1990.
757
construção de uma sociedade igualitária. Aleksandr Bogdánov costuma ser ignorado como escritor
de literatura por se filiar à política de produção de obras que propagassem o comunismo, entretanto,
é preciso analisar a obra em si, em seu mundo próprio, como afirmou György Lukács, para avaliar
qualquer qualidade literária. Compreendeu-se que A estrela vermelha permite um olhar sobre a
sensibilidade de um tempo histórico. A obra é expressão literária de uma utopia. Por tentar figurar
uma sociedade inteira, Bogdánov precisou abordar uma multiplicidade de temas, no entanto, este
trabalho centra-se apenas na práxis educativa.
Referências: BOGDÁNOV, Aleksandr. A estrela vermelha. São Paulo: Boitempo, 2020. LUKÁCS,
Georg. Estetica 1: La peculiaridad de lo estetico. Barcelona: Ediciones Grijaldo, 1982. LUKÁCS,
György. Introdução aos escritos estéticos de Marx e Engels. In: MARX, Karl; ENGELS, Friedrich.
Cultura, arte e literatura: textos escolhidos. São Paulo: Expressão Popular, 2010. LUKÁCS, György.
Pósfacio. In: GOETHE, Johann Wolfgang von. Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister. 2 ed. São
Paulo: editora 34, 2009. p. 581-605. LUKÁCS, György. Problemas del realismo. México D.F: Fondo de
Cultura Economica, 1966.
OBSESSÃO E ESCRITA: MULA DE DEUS, EM “ESTAR SENDO. TER SIDO”, DE HILDA HILST
Malane Apolonio da Silva
Resumo: Resumo: Publicado por Hilda Hilst, “Estar sendo. Ter sido” (2000) apresenta um encontro
entre personagens das outras obras de sua autoria. Com a presença de Vittorio, personagem, escritor
e protagonista do livro. O texto se inicia em meio a um diálogo entre os personagens Júnior (filho de
Vittorio), Matias (irmão de Vittorio) o próprio Vittorio, em uma perspectiva narrativa que se
experimenta em meio ao uso dos vários gêneros de escrita acionado desde as primeiras linhas desse
livro. Desse modo, a estrutura de produção de Hilst, permite ao leitor percorrer desde linguagem
teatral, cartas, estrutura poética ao texto prosa. No entanto, a relação entre personagens publicados
em outras obras, ou ainda a mescla de gêneros em meio ao texto, propõem a esse estudo, centrar-
se nas estratégias que Vittorio produz, enquanto escritor, para analisar sua obsessão por escrita
como estratégia de vida, especificamente no poema que finaliza seu texto "Estar sendo. Ter sido"
intitulado “Mula de Deus”. Para este estudo, refletiremos a estratégia de um personagem escritor
como via de mão dupla com as outras obras publicadas por Hilst, e ainda a soberana necessidade de
escrita de Vittorio. Para tanto, o referencial estará atrelado as discussões de Georges Bataille (2013)
para elencarmos a noção de dispêndio, Octavio Paz (2014) em suas reflexões sobre o viés poético.
Referências: HILST, Hilda. Estar Sendo. Ter Sido. 2. ed. São Paulo: Globo, 2000. HILST, Hilda . A
obscena senhora D. 2. ed. São Paulo: Globo, 2000. BATAILLE, Georges. A parte maldita – precedida
de A noção de dispêndio. Trad. Fernando Scheibe. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. DINIZ, Cristiano
(org.). Fico besta quando me entendem. São Paulo: Editora, 2013. PAZ, Octavio. O arco e a lira. São
Paulo: Cosac Naify, 2014. VÁRIOS AUTORES. Cadernos de literatura brasileira: Hilda Hilst. São Paulo,
Instituto Moreira Salles, 1999.
758
decisão racional e passa a se colocar como uma maneira de se deixar desorganizar pela realidade
com a qual o outro nos confronta.
Referências: COCCIA, Emanuele. A vida das plantas – uma metafísica da mistura. Trad. Fernando
Scheibe. Desterro: Cultura e Barbárie, 2018. DAVID-MÉNARD, Monique. A vontade das coisas: o
animismo e os objetos. Trad. Raquel Camargo. São Paulo: Ubu, 2022. DERRIDA, Jacques. “É preciso
comer bem’ ou o cálculo do sujeito’’. Trad. Denise Dardeau e Carla Rodrigues. In: Revista
Latinoamericana do Colégio Internacional de Filosofia, Valparaíso, n. 3, p. 149-185, jan/2018.
ESPOSITO, Roberto. As pessoas e as coisas. Trad. Andrea Santurbano e Patricia Peterle. São Paulo:
Rafael Zamperetti Cometi Editor, 2016. LISPECTOR, Clarice. Água viva. Rio de Janeiro: Rocco, 1998-a.
LISPECTOR, Clarice. A maçã no escuro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. LISPECTOR, Clarice. A paixão
segundo G.H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998-b.
759
narrativa curta (PIGLIA, 2004), e a utilização da categoria teórica do tempo (GENETTE, 1995) na
dinâmica da ruptura das relações habituais com a finitude humana. Resulta do processo investigativo
as considerações de ampliação artística dos frames compositivos, a predisposição reflexiva do texto
literário e a dilatação dos pendores existenciais da performance protagonística.
Referências: ANGHEL, Golgona. Recensão crítica de Olhares de Orfeu, de António Vieira. In: Revista
Colóquio/ Letras. Lisboa, n. 185, jan. 2014, p. 232-235. BRUNEL, P.; PICHOIS, C; ROUSSEAU. A. M.,
(org.). Que é literatura comparada?. Tradução: Célia Berrettini. São Paulo: Perspectiva, 1995.
GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa. Tradução: Fernando Cabral Martins. Lisboa: Vega, 1995.
KAFKA , Franz. Narrativas do espólio. Tradução: Modesto Carone. São Paulo : Companhia das Letras,
2002. MACHADO, Álvaro Manuel; PAGEAUX, Daniel-Henri. Da literatura comparada à teoria da
literatura. Lisboa: Edições 70, 1989. NAUPERT, Cristina (org.). Tematología y comparatismo literario.
Madrid: Arco/Libros, 2003. PIGLIA, Ricardo. Formas breves. Tradução: José Marcos Mariani de
Macedo. São Paulo: Companhia das letras, 2004. TOMACHEVSKI, Boris. “Temática”. In: TODOROV,
Tzvetan (org.). Teoría de la literatura de los formalistas rusos. Tradução: Ana María Nethol. México:
Siglo XXI, 1987. TROUSSON, Raymond. Los estudios de temas: cuestiones de método. In: NAUPERT,
C. (org.). Tematología y comparatismo literario. Madrid: Arco/Libros, 2003 VIEIRA, António. Olhares
de Orfeu: contos órficos. Lisboa. Editora: & etc, 2013.
760
Resumo: Pesquisa em curso, esta comunicação considera o princípio da dissonância como
transgressão de fronteiras para a análise interpretativa de alguns dos poemas da antologia Poétnica
(2014), de Nei Lopes, e seus desdobramentos. Um dos objetivos é levantar hipóteses para a pequena
quantidade de críticas acerca dessa voz poética e contribuir com a diversificação dos estudos
literários. O atual estudo da poesia brasileira de autoria negra se faz com o intuito de ultrapassar o
lugar periférico, o que se realiza também na maior circulação e recepção da produção literária. Mas
nem nesse espaço Nei Lopes poeta figura e desfila sua lírica, sendo sua voz poética dissonante em
variados nichos da contemporaneidade. Nei Lopes é pesquisador da diáspora africana no Brasil,
intelectual negro, intérprete de sua época e compositor de letras de samba. Sua antologia aborda
temas contemporâneos e ancestrais, lançando perguntas a um possível leitor/interlocutor.
Atravessando o movimento negro da década de 70, encerrando o século XX e inaugurando os
primeiros anos do século XXI, seus poemas contextualizam, dialogam, criticam e se inspiram em
poetas e compositores outros, buscando em referências diversas os motivos e as formas de traduzir
suas temáticas em experiência poética. Disso decorre uma rede de intertextualidades entre o
clássico, o moderno e o pós-moderno a relacionar-se com o circuito literário, com a intelectualidade
afrodescendente e com o panorama artístico, cultural, social e político, apontando para
concordâncias, divergências, cruzamentos e multiplicidades da poesia brasileira. O estudo dessa obra
de Nei Lopes visa compreender em que medida ela se revelaria como “poética da complexidade”, na
qual a confluência da polifonia e da diversidade suscitariam reflexões no campo crítica literária, ao
levar em consideração acontecimentos do passado com reflexos na produção literária atual.
Referências: CANDIDO, Antonio. O estudo analítico do poema. 5. Ed. São Paulo: Associação Editorial
Humanitas, 2006. DUARTE, Eduardo de Assis. (coord.) Literatura afro-brasileira: 100 autores do
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poesia & alguma ficção. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2003.
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Referências: ALAIM, Pedro. Processologia: multiplicidade, descentramento e organização em
Finnegans Wake, Grande Sertão: Veredas e Galáxias. 2018. 225f. Tese (Doutorado em Literatura e
Cultura) – Instituto de Letras / Programa de Pós-Graduação em Literatura e Cultura, Universidade
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EDUFBA, 2022. ALVES, Hélio J. S. Camões, Corte-Real e o sistema da epopeia quinhentista.
Universidade de Coimbra: Coimbra, 2001. ARISTÓTELES. Poética. Trad. Edson Bini. São Paulo:
EDIPRO, 2011. ARISTÓTELES. Retórica. Trad. Edson Bini. São Paulo: EDIPRO, 2011. BAKHTIN, Mikhail.
Questões de literatura e estética: a teoria do romance. Trad. Aurora Bernardini e outros. São Paulo:
Hucitec / Ed. Unesp, 1988. BAKHTIN, Mikhail. Problemas da poética de Dostoiévski. Tradução direta
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Felipe Moisés, Ana Maria L. Ioriatti. São Paulo: Companhia das Leras, 2007. CAMÕES, Luís Vaz de. Os
lusíadas. Coimbra. Almedina; Colégio das Artes da Universidade de Coimbra, 2016. CAMÕES, Luís Vaz
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Livre, 2020. COMPAGNON, Antoine. Os cinco paradoxos da modernidade. Trad. Cleonice P. Mourão,
Consuelo F. Santiago e Euníce D. Galéry. 2.ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. DELEUZE, Gilles.
Crítica e clínica. Trad. Peter Pál Pelbart. 2. ed. São Paulo: Ed. 34, 2011. DELEUZE, Gilles. Lógica do
sentido. Trad. Luiz Roberto Salinas Fortes. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2012. DERRIDA, Jacques.
Gramatologia. Trad. Mirian Chnaiderman; Renato Ribeiro. São Paulo: Perspectiva, 2008. FOUCAULT,
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9. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. (Coleção Tópicos) HOMERO. Odisseia. Trad. Carlos Alberto
Nunes. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001. HOMERO. Ilíada. Tradução e prefácio de Frederico Lourenço;
introdução e apêndices de Peter jones; introdução à edição de 1950 de E. V. Rieu. São Paulo: Penguin
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Geraldo Vieira. 5 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. LOURENÇO, Eduardo. Mitologia da
saudade: seguido de Portugal como destino. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. MEGIANI, Ana
Paula Torres. O Jovem Rei Encantado: Expectativa do Messianismo Régio em Portugal, Séculos XIII a
XVI. São Paulo: Hucitec, 2003. OLIVEIRA MARTINS, Joaquim Pedro. Camões, Os Lusíadas e a
Renascença em Portugal. London: Forgotten Books, 2018. (Reconstrução digitalizada de: OLIVEIRA
MARTINS, Joaquim Pedro. Camões, Os Lusíadas e a Renascença em Portugal. Porto: Livraria
Internacional de Ernesto Chardron, 1891.) RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa. Conteúdo: 3. O tempo
narrado. Trad. Cláudia Berliner; Rev. trad. Márcia Valéria Martinez de Aguiar. São Paulo: Editora WMF
Martins Fontes, 2010. VIRGÍLIO. Eneida. Trad. Nicolau Firmino. São Paulo: Livraria Lusitana, 1941.
VIRGÍLIO. Eneida. Edição bilíngue. Tradução de Carlos Alberto Nunes; organização, apresentação e
notas de João Angelo Oliva Neto. 3.ed. São Paulo: Editora 34, 2021.
762
Pretende-se ainda fazer uma comparação entre as duas Lucrezias: a figura proposta por Maquiavel
em Mandragola, e a de Tito Lívio, ao mesmo tempo próximas e antagônicas. Não nos restringindo,
contudo, a elas, serão analisadas outras figuras femininas de importância fundamental no
entendimento do panorama retratado por Maquiavel em suas comédias, que sempre as tiveram em
destacado lugar, afinal, para o autor, até a própria sorte é uma figura feminina, como frisado em O
Principe.
Referências: ASOR ROSA, A. Storia europea della letteratura italiana. Torino. Einaudi, 2009 BARATTO,
M. La commedia del Cinquecento. Vicenza. Neri Pozza, 1977 BARBARISI, G.& CABRINI,A. Il teatro di
Machiavelli. Milano. Cisalpino Ist. Ed. Universitario, 2005 BARTHES, Roland. Sul teatro, a cura di
Marco Consolini, Roma, Meltemi, 2002 BERGSON Henri. O riso – ensaio sobre a significação do
cômico, Rio de Janeiro, Zahar, 1940 BIGNOTTO, N. Política e vida privada na Mandragola em
Maquiavel. Cadernos de ética e filosofia política, São Paulo, n. 24, p. 7-21, USP, 2014 CHIESA, Renato.
MACHIAVELLI E LA MUSICA. Rivista Italiana di Musicologia, Milão, v. 4, p. 3-31, 1969. HUBERT, Marie-
Claude . As Grandes Teorias do Teatro , São Paulo, Martins Fontes, 2013 LARIVAILLE, Paul. A Itália no
tempo de Maquiavel. São Paulo, Companhia das Letras, 1988 MACHIAVELLI, N. La Mandragola. (P.
Stoppelli, A cura di). Milano. Mondadori, 2006 STOPPELLI, Pasquale (ed.). In: MACHIAVELLI, Niccolò.
Teatro: Andria-Mandragola-Clizia. Roma: Salerno Editrice, 2017.
NÃO TE CHAMO PARA TE CONHECER, QUERO ABRIR OS BRAÇOS E SENTIR-TE: SOPHIA DE MELLO
BREYNER ANDRESEN, POETA DA PRESENÇA.
Rodrigo Corrêa da Foonseca
763
Resumo: Este trabalho tem por objetivo investigar as configurações do olhar na poesia da poeta
portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen. Em sua obra poética, o olhar apresenta-se como
elemento central de uma espécie de relação com o mundo pelo sensível que caminha na contramão
de um entendimento exacerbadamente racional do olhar presente em nossa cultura ocidental de
hábitos intensamente cartesianos. A partir desse olhar sensível - ou seja, um olhar que não está
desgarrado do corpo, mas que dele parte -, estabelece-se uma ligação com o mundo pela presença.
Retomo, para isso, o pensamento de Hans Ulrich Gumbrecht acerca da produção de Presença que,
desafiando “ uma tradição largamente institucionalizada, segundo a qual a interpretação - ou seja, a
identificação e/ou atribuição de sentido - é a prática nuclear, na verdade a única, das humanidades.”
(GUMBRECHT, 2010, p. 22), promove a ideia de que, para além da construção de sentidos, em toda
interação entre dois corpos, há, também, produção de presença. Em outras palavras, se pensamos a
poesia, por exemplo, quando diante de um poema, mais do que atribuir sentidos, somos
corporalmente afetados pela matéria do poema - sua matéria-significante, sua métrica. Trata-se,
aqui, não apenas de propor uma análise dissonante que busca uma retomada do corpo e do sensível
na análise de poesia, mas de uma demonstração de que há, na própria poesia de Sophia, a presença
de uma voz dissonante que almeja uma relação com o mundo que não é racional, mas dos sentidos
do corpo. Tomo, para isto, por jornada, diversos poemas de Sophia de Mello, mas debruço-me
especialmente sobre um deles - Mar Sonoro - como forma de tentar evidenciar um caminho analítico
não hermenêutico, mas sensível, por meio dos conceitos de Matéria-emoção (COLLOT, 2018) e
Imaginação como Presença (GUMBRECHT, 2016).
Referências: ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner. Coral e outros poemas. Seleção e apresentação
Eucanaã Ferraz. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner.
Poemas Escolhidos. Seleção e organização Vilma Arêas. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
COLLOT, MICHEL. A Matéria-emoção. Rio de Janeiro: Oficina Raquel, 2018. DIDI-HUBERMAN,
Georges. Diante da imagem. São Paulo: Editora 34, 2013. GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera,
ambiência, Stimmung: sobre um potencial oculto da literatura. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014.
GUMBRECHT, Hans Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de
Janeiro: Contraponto, 2009. GUMBRECHT, Hans Ulrich. Serenidade, presença e poesia; Seleção e
tradução Mariana Lage. Belo horizonte: Relicário edições, 2016.
764
Editora 34, 2013. BURKE, Peter. A escrita da História: novas perspectivas. Peter Burke (org.); tradução
de Magda Lopes – São Paulo: UNESP. 1992. CANDIDO, Antonio. A personagem do romance. In:
CANDIDO, Antonio, ROSENFELD, Anatol et al. A personagem de ficção. 2. ed. São Paulo: Perspectiva,
1987. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu da Silva e
Guacira Lopes Louro. 12. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1997. HATOUM, Milton. A noite da espera. São
Paulo: Companhia das Letras, 2017. HATOUM, Milton. Pontos de fuga. São Paulo: Companhia das
Letras, 2019. LE GOFF, Jacques. História e memória. Tradução de Irene Ferreira; Bernardo Leitão et
al. 5. ed. Campinas/SP: Editora da UNICAMP, 2003. RICOEUR, Paul. A memória, a história, o
esquecimento. Tradução de Alain François et al. Campinas/SP: Editora da UNICAMP, 2007. SAID.
Edward W. Reflexões sobre o exílio e outros ensaios. Tradução de Pedro Maia Soares. São Paulo:
Companhia das Letras, 2003.
765
“QUANDO A MORTE SE APROXIMA”: ESTADO DE EXCEÇÃO, TESTEMUNHO E PRÁTICAS DE
BIOPOLÍTICA EM POEMAS DE PAULO FONTELES
Abilio Pachêco de Souza
Resumo: Resumo: O início de 2023, numa escalada de pensamento de extrema direita no Brasil,
intensificou ainda mais a necessidade da pauta da memória política e aguçou ainda mais a urgência
das pesquisas e estudos sobre o estado de exceção no Brasil. A resposta política foi imediata e a
repercussão internacional, com significativos apoios à Democracia no Brasil também. O apoio
internacional sempre foi importante, inclusive para a memória política, mesmo em momentos em
que fascistas não estavam nas ruas pedindo golpe de estado. Em agosto de 2007, a editora alemã
Matthes & Seitz Berlin, publicou os poemas de Paulo Fonteles. O livro saiu em uma edição bilíngue,
com o título em língua alemã “Wenn der Tod sich nähert, nur ein Atemzug” (“Quando a morte se
aproxima, resta um fôlego” – tradução livre). Os exemplares chegaram ao Brasil, no ano seguinte,
quando, só então, houve lançamento no Brasil. Paulo Cesar Fonteles de Lima era estudante de
Direito, quando foi preso no início dos anos 1970. Ele e sua esposa Hecilda Mary Veiga Fonteles de
Lima (grávida), que também foi presa, atuavam na reorganização da UNE (então na ilegalidade). O
livro que Paulo Fontelles escreveu é um conjunto de poemas em que são re-apresentados os fatos
vividos no cárcere, sobretudo a violência, a tortura física e a tortura psicológica causada pela
violência infringida a sua esposa grávida de oito meses. Nesta comunicação, pretendemos analisar o
testemunho (SELIGMANN-SILVA) do estado de exceção destacando poemas nos quais são possíveis
perceber, por parte do estado, práticas de biopolítica (Edgardo Castro) sobre as vidas desprovidas
de proteção (“vida nua”, de que fala Agamben).
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer: o poder soberano e a vida nua. Trad. Henrique Burigo,
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002. CASTRO, Edgardo. Vocabulário de Foucault: um percurso pelos
seus temas, conceitos e autores. Tradução Ingrid Müller Xavier. Belo Horizonte: Autêntica Editora,
2009. FONTELES, Paulo. Wenn der Tod sich nähert, nur ein Atemzug” (“Quando a morte se aproxima,
resta um fôlego”, tradução livre). Berlin, Matthes & Seitz, 2007. SELIGMANN-SILVA, Márcio. História,
memória e literatura. Campinas: Unicamp, 2003. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Literatura e trauma:
um novo paradigma. In: SELIGMANN-SILVA, Márcio. O local da diferença. Ensaios sobre memória,
arte, literatura e tradução. São Paulo: Editora 34, 2005a. 63-80. SELIGMANN-SILVA, Márcio. O local
do testemunho. Tempo e argumento. Florianópolis: UDESC, v.2, n.1, pp.3-20, junho de 2010.
766
importância da comunidade para os escravizados e amplifica a potência da mulher negra diante da
desumanização imposta pela escravidão.
Referências: BLASSINGAME, John. Slave Testimony: Two Centuries of Letters, Speeches, Interviews,
and Autobiographies. LSU Press, 1977. CARRASCOZA, Denise (org). Traduzindo no Atlântico Negro:
Cartas náuticas afrodiaspóricas para travessias literárias. Salvador: Ogum’s Toques Negros, 2017.
DAVIS, Angela. Women, race and class. New York: Random House, 1981. HALBWACHS, Maurice. A
memória coletiva. Trad. Laurent Léon Schaffer, São Paulo: Vértice, 1990. HUSSEY, Michael; EDER,
Elizabeth. It is My Desire to be Free: Annie Davis's Letter to Abraham Lincoln and Winslow Homer's
Painting A Visit from the Old Mistress. Social Education 74(3), 2010, pp 126–130. KRUEGER, Robert.
Brazilian Slaves Represented in their Own Words. In: Slavery & Abolition, 23:2 (2002), p. 169-186.
MOTT, Luiz. Piauí Colonial: população, economia e sociedade. Teresina: FUNDAC - Coleção Grandes
Textos, 2010. SELIGMANN-SILVA, Márcio. História, memória, literatura: o testemunho na era das
catástrofes. Campinas: Editora Unicamp. TRANSATLANTIC SLAVE TRADE DATABASE. Slave Voyages.
Disponível em: <https://www.slavevoyages.org/>. Acesso em 5 jan. 2023.
ANTÍGONA QUEER: UMA LEITURA DE PAI, PAI (2017), DE JOÃO SILVÉRIO TREVISAN
Arthur Antunes Araujo
Resumo: No "romance autobiográfico" (de acordo com a ficha catalográfica) Pai, pai (2017), João
Silvério Trevisan - importante militante pelos direitos civis da população LBTQIA+, um dos
fundadores do jornal Lampião da Esquina (1978-1981) de enfrentamento à censura durante a
ditadura civil-militar brasileira (1964-1985), autor de diversas obras ficcionais e ensaísticas - constrói
o relato memorialístico de sua história de vida, da infância marcada pela violência homofóbica
perpetrada pelo pai e familiares, pela perseguição política no período ditatorial brasileiro e por parte
dos movimentos de esquerda por ser um sujeito homossexual, e pela tentativa de apagamento
767
homofóbico por parte da crítica literária nacional até seu momento atual na velhice, ao mesmo
tempo em que constrói a biografia de seu falecido pai, José, com quem teve uma conturbada relação,
porque “e? com o peso incalcula?vel da sua ause?ncia que a figura paterna tem marcado minha vida
e minha literatura” (TREVISAN, 2017, p. 9). Neste trabalho, argumentamos que Trevisan, assim como
Antígona na tragédia grega busca dar um sepultamento para seu pai Édipo, para realizar o trabalho
de luto, que é também um trabalho de memória, assim como Antígona, Trevisan em seu citado
romance faz seu próprio trabalho de Antígona, seu próprio trabalho de luto e de memória ainda em
vida, seu testemunho e testamento contra o esquecimento e o apagamento que as histórias das
vidas dos sujeitos dissidentes são condenados numa sociedade (mundial e nacional) opressiva contra
as minorias políticas. O romance de Trevisan, portanto, “queeriza” a tradição de Antígona de salvar
a memória dos mortos e inscreve a história das vidas queer na tradição da memória de Antígona;
produz um testemunho da violência homofóbica e da insurgência contra essa violência, um arquivo
da violência e da insurreição contra a violência.
Referências: TREVISAN, João Silvério. Pai, Pai. - 1a ed. - Rio de Janeiro: Alfaguara, 2017.
768
Penguin Random House Grupo Editorial, 2019. RICOEUR, Paul. O si-mesmo como outro. São Paulo:
WMF Martins Fontes, 2014. SELIGMANN-SILVA, Márcio. A virada testemunhal e decolonial do saber
histórico. 1ª ed., Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2022. SELIGMANN-SILVA, Márcio. História,
memória, literatura: o testemunho na Era das Catástrofes. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2003.
SELIGMANN-SILVA, Márcio. O local do testemunho. Tempo e argumento, Florianópolis, v. 2, n. 1, p.
3-20, jan. / jun. 2010.
O AMOR NO CÁRCERE: UMA ANÁLISE DO POEMA “VIDA, AMOR E LUTA”, DE GILNEY VIANA
Cleidson Frisso Braz
Resumo: Discute-se nesta comunicação a poesia de amor no cárcere político. Pretende-
compreender porque muitos poetas, mesmo estando presos, encarcerados por um regime de
opressão, se dedicaram a escrever poemas de amor, como ocorreu durante a ditadura militar no
Brasil. Para isso, o debate recorre à psicanálise (FREUD, 1915; LACAN, 1945), de forma a lançar luz
sobre uma proposição ainda embrionária de que o amor estaria associado a um mecanismo do
inconsciente que busca recuperar um objeto perdido (das ding). Para tentar entender como o amor
persistiu mesmo em uma situação tão análoga à sua existência, considera-se que ele seja o destino
de uma pulsão incontrolável, ou mesmo uma forma de resistência, mas, principalmente, gozo. Desta
maneira, faz-se uma análise do poema “Vida, amor e luta”, de Gilney Viana, preso pelo regime
durante a década de 1970, de forma que os ecos produzidos por esta análise apontem certa
regularidade para a compreensão dos poemas de amor no cárcere. Ao fim e ao cabo, percebe-se que
o amor está associado à nostalgia de um objeto perdido, primordial, o qual o sujeito busca encontrar
no decorrer de sua história através de uma cena que, na verdade, é fantasiada. Conclui-se que a
linguagem, nesta dimensão, se destaca como uma possibilidade de realização e satisfação de um
desejo claudicante, a que comumente chamamos de amor.
Referências: FREUD, Sigmund. (1915a). Observações sobre o amor transferencial (novas
recomendações sobre a técnica da psicanálise III). Rio de Janeiro: Imago, 1996. _______________.
(1915b). As pulsões e seus destinos. Rio de Janeiro: Imago, 1996. _______________. (1914a). Sobre
o narcisismo: uma introdução. Rio de Janeiro: Imago, 1996 LACAN, Jacques. Do olhar como objeto a
minucioso. O Seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (1964). 2. ed. Trad.
M. D. Magno. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 69-118. ______________. (1998). De uma questão
preliminar a todo tratamento possível da psicose. In J. Lacan, Escritos (pp. 537-590). Rio de Janeiro:
Jorge Zahar (Trabalho original publicado em 1958). ______________. O inconsciente e a repetição.
O Seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (1964). 2. ed. Trad. M. D.
Magno. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 23-68. VIANA, Gilney. Poemas (quebrados) do cárcere. Rio de
Janeiro: Garamond, 2011.
769
romance de Ginzburg, a história é baseada na vida da família da autora, narrada em primeira pessoa
por uma narradora que também se chama Natalia, explorando cenários que abrangem o início do
fascismo, a guerra e o pós-guerra. Em As pequenas virtudes (1962), a autora escreveu ensaios
autobiográficos sobre a Segunda Guerra Mundial, a escrita, a amizade, entre outros temas, que
foram publicados entre 1944 e 1962. Essa é uma obra importante para compreender a construção
ficcional da autora, seus personagens e o trabalho relevante de suas recordações.
Referências: ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação. Org. da Tradução: Paulo Soethe. Campinas:
Editora da Unicamp, 2011. GINZBURG, Natalia. Léxico familiar. Trad. Homero Freitas de Andrade. São
Paulo: Companhia das Letras, 2018. GINZBURG, Natalia. As pequenas virtudes. Trad. Maurício
Santana Dias. São Paulo: Companhia das Letras, 2020. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Narrar o trauma:
a questão dos testemunhos de catástrofes históricas. Rio de Janeiro: PSIC. CLIN., vol. 20, n.1, p. 65 –
82, 2008.
770
Tocar o terror. São Paulo: Editora Bregantini, 2022. ROMÃO, Luiza. Também guardamos pedras aqui.
São Paulo: Editora Nós, 2021.
771
de judeus no Holocausto. Rio de Janeiro: Imprimatur, 2015. LEVI, Primo. Os afogados e os
sobreviventes. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. 3. ed. São Paulo/Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2004.
SELIGMANN-SILVA, Márcio. Apresentação da questão: a literatura do trauma. In: SELIGMANN-SILVA,
Márcio (Org.). História, memória, literatura: o testemunho na era das catástrofes. Campinas, SP:
Editora da Unicamp, 2003a. p. 45-58. SELIGMANN-SILVA, Márcio. A memória da história: levante do
gueto de Varsóvia e o testemunho de Zvi Kolitz. In: SLAVUTZKY, Abrão et al (Coord.). O dever da
memória: o levante do gueto de Varsóvia. Porto Alegre: AGE/Federação Israelita do Rio Grande do
Sul, 2003d. p. 111-132. TODOROV, Tzvetan. Diante do extremo. Tradução de Nícia Adan Bonatti. São
Paulo: Editora Unesp, 2017.
ENTRE BITUCAS E PALAVRAS: RELATO DE UMA SOBREVIVENTE EM DEPOIS DE TUDO TEM UMA
VÍRGULA, DE ELIZABETH CARDOSO
Fabíola Simão Padilha Trefzger
Resumo: Depois de tudo tem uma vírgula (2021), de Elizabeth Cardoso, é centrado na protagonista
Rita, ex-militante de esquerda, sobrevivente dos porões da ditadura militar brasileira. Detendo as
rédeas da enunciação, a personagem, que possui o hábito de catar bitucas, recupera seu passado de
horror, ao mesmo tempo em que denuncia a tentativa de extorsão e de distorção de sua própria
história por seu irmão, Diego, autor de uma espécie de “autobiografia familiar”. Chancelada pela
“confiabilidade presumida” (RICOEUR, 2007, p. 172) atribuída ao superstes, a atitude de resistência
à cooptação de seu relato testemunhal encontra paralelo no ato da narradora de colecionar palavras,
gesto que, sob um viés político e alegórico, visa a salvar da dispersão e a ressignificar o que na história
oficial foi descartado, não tendo sido, portanto, sequer registrado. Pretende-se realizar uma leitura
do romance de Cardoso, verificando o modo como a autora aproxima o “dever de memória”
(Ricoeur) da tarefa do colecionador, aproximação cuja dimensão política constitui o vértice dessa
convergência. Como postula Walter Benjamin, em suas Passagens: “[...] o ato mais diminuto de
reflexão política faz, de certa maneira, época no comércio antiquário” (2007, p. 245). Para a
fundamentação da discussão proposta, serão convocados os citados pensadores (Paul Ricoeur e
Walter Benjamin), além de outros cujas contribuições forem oportunas.
Referências: BENJAMIN, Walter. Passagens. Trad. Irene Aron e Cleonice Paes Barreto Mourão. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2007. CARDOSO, Elizabeth. São Paulo: Editora Patuá, 2021. RICOEUR, Paul.
A memória, a história, o esquecimento. Trad. Alain François et al. Campinas (SP): Editora da Unicamp,
2007.
772
tanto, serão basilares as contribuições de Márcio Seligmann-Silva, Jaime Ginzburg, Wilberth
Salgueiro etc.
Referências: ABDULALI, Sohaila. Do que estamos falando quando falamos de estu-pro. Tradução de
Luis Reyes Gil. São Paulo: Vestígio, 2019. DESPENTES, Virg inie. Teoria King Kong. Tradução de Márcia
Bechara. São Paulo: n-1 Edições, 2016. FIGUEIREDO, Eurídice. Por uma crítica feminista: leituras
transversais de escritoras brasileiras. Porto Alegre: Zouk, 2020. FREUD, Sigmund. Luto e melancolia.
Tradução de Marilene Carone. Apresentação e notas da tradutora. Apresentação de Maria Rita Kehl.
Posfácio de Urania Tourinho Peres. São Paulo: Cosac Naify, 2011. GAGNEBIN, Jeanne-Marie. Lembrar
escrever esquecer. São Paulo: Ed.34, 2006, p. 57). KEHL, Maria Rita. Ressentimento. São Paulo:
Boitempo, 2020. LEVY, Tatiana Salem. Parte II. Pós-escrito. In: ______. Tese de doutorado. Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2008. ______. A chave de casa. Rio de Janeiro: Record, 2009.
______. Vista chinesa. São Paulo: Todavia, 2021 SALGUEIRO, Wilberth (Org.). O testemunho na
literatura. Vitória: Edufes, 2011. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Testemunho e a política da memória: o
tempo depois das catástrofes. Projeto História, São Paulo, (30), p. 71-98, jun. 2005. SELIGMANN-
SILVA, Márcio (Org.). História, Memória, Literatura - O testemunho na era das catástrofes. Campinas,
SP: Editora da UNICAMP, 2013.
773
pode ser conhecida do grande público em virtude de ter sido descoberta anos mais tarde.
Apresentando características do ambiente literário de sua época, o romance em si aborda uma
perspectiva que o difere dos romances do período de sua publicação: a possibilidade dos
personagens negros e escravizados falarem a partir da sua perspectiva em torno da escravidão como
um sistema de opressão injustificável. A narrativa, portanto, apresenta um teor de testemunho no
discurso empregado pela personagem Preta Susana, agente que verbaliza as consequências desse
sistema como evento traumático para a população negra. Intérprete da violência causada pela
escravidão, a personagem traduz o processo opressor a que fora imposta como um ato impossível
de ser explicado. Desta forma, o presente artigo tem como objetivo elucidar a representação da
escravidão no romance de Maria Firmina dos Reis tendo como ponto de partida as influências
teóricas de Márcio Seligmann-Silva (2003) sobre o Testemunho, assim como também se ampara nos
estudos críticos sobre a obra da escritora maranhense com o intuito de analisar o debate sobre a
escravidão e como este tema se encontra presente no romance.
Referências: REIS, M. F. dos. Úrsula: um romance original brasileiro/ por uma maranhense. Rio de
Janeiro: Presença Edições; Brasília: INL, 1988. SELIGMANN-SILVA, Márcio. História, memória e
literatura. Campinas: Unicamp, 2003 Sousa, Larissa Da Silva. As mulheres do século XIX pelas
narrativas de Maria Firmina dos Reis. Quixadá. Dissertação de Mestrado. 2021
774
João Guimarães Rosa: o contista de Sagarana. Brasil/Brazil. Porto Alegre: Mercado Aberto, n. 15, ano
9, 1997. SARTRE, Jean-Paul. O que é literatura? Tradução de Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Ática,
1989. VIEIRA JUNIOR, Itamar. Torto arado. São Paulo: Todavia, 2019. TENÓRIO, Jéferson. O avesso
da pele. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
775
lugar no pós-ditadura latinoamericano. Menos visível é a figura dos perpetradores dos crimes das
ditaduras, seja em primeira pessoa, seja nas vozes da segunda geração. Dentre essas obras,
entretanto, há um conjunto de ficções que articulam a experiência, particularmente complexa, dos
próprios repressores, responsáveis por crimes contra a humanidade durante os anos das ditaduras.
Voltado para as formas com que a literatura latinoamericana contemporânea tem elaborado formas
narrativas a partir dessa perspectiva, este trabalho se detém sobre os romances chilenos “Múltipla
escolha”, de Alejandro Zambra, “La dimensión desconocida” e “Space Invaders”, de Nona Fernández.
Trata-se de três obras que articulam ficcionalmente casos e nomes reais da ditadura de Pinochet –
General Manuel Contreras, Cabo Andrés Valenzuela e o Caso Degolados, respectivamente –, a partir
de arquivos e testemunhos que, sob os “poderes performativos da ficção”, reconstroem a silenciosa
vivência dos perpetradores e suas famílias no Chile ditatorial e pós-ditatorial. Daí o interesse deste
trabalho em refletir, nessas obras, sobre as relações entre ficção e arquivo, as formas de construção
narrativa de vozes e personagens, e os aspectos ficcionais e factuais dos registros testemunhais. Com
isso, pretende-se desenhar um panorama a partir do qual possamos colocar em discussão as formas
de figuração dos perpetradores e de seus filhos, alargando com isso a leitura que fazemos da
literatura pós-ditatorial na contemporaneidade latinoamericana.
Referências: BASILE, Teresa. “Padres perpetradores: perspectivas desde los hijos e hijas de
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Planeta, 2017.
776
construção narrativa dos romances estabelece um paralelo com os conceitos de testemunha,
muçulmano e resto tal qual discutidos por Giorgio Agamben, em O que resta de Auschwitz. Dessa
forma, o presente trabalho tem por objetivo apresentar de que forma esses conceitos são
mobilizados no romances e quais suas implicações no sentido geral da obra. Para tanto, foi utilizada
como metodologia de análise a proposta de Wayne C. Booth em A Retórica da Ficção, em que se
prioriza o texto literário a partir do método de close reading. Os resultados obtidos fazem parte da
tese de doutoramento Um estudo da retórica adichieana.
Referências: ADICHIE, C. N. Americanah. London: HarperCollins Publishers, 2017. ADICHIE, C. N.
Americanah. Trad. Julia Romeu. São Paulo: Companhia das Letras, 2014. ADICHIE, C. N. Hibisco roxo.
Trad. Julia Romeu. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. ADICHIE, C. N. Purple hibiscus. London:
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777
sociais. Pretendemos, assim, compartilhar a análise de alguns poemas emblemáticos dessa “guinada
participante”, sem perder de vista seus desafios, limites e contradições.
778
Referências: ASSMANN, Aleida. Geschichte im Gedächtnis: Von der individuellen Erfahrung zur
öffentlichen Inszenierung. München: Beck, 2007.
779
amadurecimento é pautado por um episódio sombrio da história do país, que é trazido à tona em
uma narrativa voltada ao público jovem. Nesse sentido, é possível observar que o papel da memória
torna-se essencial para conscientizar as novas gerações acerca de fatos históricos que não podem
cair ao esquecimento, uma vez que o ato de rememorar não se restringe a não esquecer o passado,
mas também deve contemplar o agir sobre o presente, como atesta Gagnebin (2009). Desse modo,
a narrativa de Silveira culmina em uma possiblidade de ressignificação de tais eventos históricos e
de instrução formativa para jovens leitores, que assim como André, passam por um processo de
emancipação e compreendem o poder da resistência.
Referências: GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar Esquecer Escrever. 2° ed. São Paulo: Editora 34,
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Paulo: Editora da Unicamp, 2007. SELIGMANN-SILVA, Márcio. História, memória, literatura: o
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780
TORNADO, DE TERESA NORONHA: ENTRE MEMÓRIA E HISTÓRIA
Ricardo Luiz Pedrosa Alves
Resumo: Tornado (2021), narrativa da moçambicana Teresa Noronha, explora a intersecção de
memória e história a partir de um duplo luto: o irmão suicidado e o fim da condição colonial no país
africano. O romance, premiado em Portugal e finalista do Oceanos em 2022, é narrado em primeira
pessoa e se desenvolve a partir de (im)possíveis explicações para a morte do irmão e para a mudança
política em Moçambique. Não há respostas definitivas, na medida em que o testemunho evita a
hipertrofia histórica tão comum às obras pós-coloniais em nome da hesitação e da oralização do
depoimento, dirigido a um interlocutor impossível, pois suicidado. Os absurdos, o do suicídio e o da
violenta transição para a condição nacional em Moçambique, entrelaçam história íntima e familiar e
história pública. Além disso, o romance ultrapassa o escopo nacional, pois a memória é vivida num
caleidoscópio de múltiplas geografias (a africana e a europeia) e identidades (a portuguesa, a
moçambicana, a goesa), tratando também da relação entre a subjetividade e a sexualidade
femininas. Considerando que o romance se assenta sobre uma narrativa não-linear, permeada por
fragmentos, elipses e retomadas, a comunicação abordará tais vazios e hesitações de modo a
ressaltar a complexidade do testemunho presente em Tornado. Essa complexidade tem implicações
na própria percepção histórica, pois desessencializa as posições da situação colonial e as identidades
pessoais e coletivas nela envolvidas.
Referências: CAN, Nazir Ahmed. O campo literário moçambicano. Tradução do espaço e formas do
insílio. São Paulo: Kapulana, 2020. NORONHA, Teresa. Tornado. Porto: Editora Exclamação, 2021.
RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Editora da UNICAMP, 2007.
SELIGMANN-SILVA, Márcio. História, Memória, Literatura. O testemunho na era das catástrofes.
Campinas: Editora da UNICAMP, 2003.
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construção e a ficção. O local da diferença: ensaios sobre memória, arte, literatura e tradução. São
Paulo: Ed. 34, 2005, p. 105-118. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Grande Sertão: Veredas como gesto
testemunhal e confessional. Alea: Estudos Neolatinos [online]. 2009, v. 11, n. 1 [Acessado 8 Janeiro
2023], pp. 130-147. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S1517-106X2009000100011>. Epub 13
Out 2009. ISSN 1807-0299. https://doi.org/10.1590/S1517-106X2009000100011.
782
narrador adquire a instância de transmissão de experiência aos ouvintes. Em paralelo, discutiremos
alguns aspectos presentes em “Tres propuestas para el próximo milenio (y cinco dificultades)”, cuja
análise da literatura argentina dos anos70 registra a indissociabilidade entre literatura e experiência.
783
que é constituído por memórias dissentâneas capazes de assegurar novos/velhos significados para o
conflito e seus desdobramentos na cena contemporânea.
Referências: CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de Canudos. Edição crítica organizada por
Walnice Nogueira Galvão. São Paulo: Ubu, 2016. FONSECA, Aleilton. O pêndulo de Euclides. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. FONTES, Oleone Coelho. Canudos: a quinta expedição. 2. ed. Salvador:
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UFC, 2006. LOURES, Guilhon. Antônio Conselheiro. Brasília: LGE, 2004.
784
terem vagina? E ainda mais mulheres morrem por não terem vagina?” Por que tantas perguntas?
Tais perguntas talvez venham do histórico “peso do silenciamento” (Mel Duarte) imposto às
mulheres. Na ausência de políticas que respondam totalmente ou em parte aos problemas listados
no “Poema dos porquês”, resta aos poetas se postarem como porta-vozes de tanta injustiça. Estendo
a reflexão de Márcio Seligmann-Silva dirigida aos perseguidos na ditadura brasileira aos perseguidos
em nosso dia a dia: “Trata-se de uma luta que ainda não conquistou a sociedade e que está muito
dependente de iniciativas das vítimas” (A virada testemunhal e decolonial do saber histórico.
Campinas: Ed. Unicamp, 2022, p. 198). Nesse poema, mulheres, mendigos, crianças, transexuais são
vítimas de machismo, racismo, exploração, abandono, assédio, preconceito, misoginia, golpe,
violência, estupro, assassinato. Laura Conceição assume sem temor o teor testemunhal da poesia.
Suas performances em Tempos efêmeros (2018) dão mostra não só de sua vitalidade e inteligência,
de sua crítica engajada e bem elaborada, mas também de suas companheiras, na luta pela voz, pela
autonomia, pela diferença. A comunicação se propõe a analisar esse poema à luz do testemunho,
considerando ainda os ensaios “Quando cantam os pensamentos (a pergunta como canto)”, em
Anseios crípticos (1986), de Paulo Leminski, e “Valores modernos”, em Altas literaturas (1996), de
Leyla Perrone-Moisés.
Referências: CONCEIÇÃO, Laura. Poema dos porquês. In: DUARTE, Mel (org.). São Paulo: Planeta do
Brasil, 2019, p. 87-88. LEMINSKI, Paulo. Quando cantam os pensamentos (a pergunta como canto).
Anseios crípticos. Curitiba: Edições Criar, 1986, p. 81-84. PERRONE-MOISÉS, Leyla. Valores modernos.
Altas literaturas. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 143-173. SELIGMANN-SILVA, Márcio. A
virada testemunhal e decolonial do saber histórico. Campinas: Ed. Unicamp, 2022, p. 198.
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789
especular como tem sido operado no campo da literatura brasileira a noção de resistência, a que
textos ela tem se dirigido, a qual efeito discursivo ela tem servido como referência, mas sobretudo,
se e qual abalo ela tem causado no cerne do campo literário, como também, buscaremos
compreender se a crítica tradicional da literatura brasileira, e os autores e intelectuais negros
acionam a noção de resistência da mesma forma.
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recepção, leitura. 2 ed. Tradução: Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo: Cosac Naify, 2007.
791
motivo a autora ocupa esse espaço na literatura brasileira. Para tanto, a elaboração do trabalho se
constituiu a partir da leitura de Arnaldo Saraiva (1995) para compreender o conceito de literatura
marginal; Ítalo Calvino (1993) ao refletir sobre a definição de clássicos; Nícolas Pereira Rosa et al.
(2019) para discutir a literatura marginal e Zahidé Lupinacci Muzart (1995) com a questão do cânone
e dos marginalizados. Assim, após as reflexões desenvolvidas a partir do texto literário e aportes
teóricos, foi possível compreender como se constitui a literatura marginal e constatar também que
existe uma segregação na constituição do cânone, bem como na concepção de clássicos. Além disso,
o estudo desenvolvido ressaltou a escrita de resistência de Conceição Evaristo, evidenciando por
intermédio da sua obra Becos da Memória a resistência do povo negro e favelado, que
cotidianamente são colocados à margem.
Referências: CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: CANDIDO, Antonio. Vários escritos. São
Paulo: Duas Cidades, 1995. CALVINO, Italo. Por que ler os clássicos. São Paulo: Companhia das Letras,
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das letras do Hip Hop. IN: Hip hop e a filosofia. DARBY, Derrick. SHELBY, Tommie. tradução de Martha
Malvezzi Leal. São Paulo: Madras, 2006, p. 125-137.
793
frente aos moradores das comunidades e aos negros de forma geral, mas a literatura marginal tem
função de transformar essa visão, ou ao menos evidenciá-la como uma forma de denúncia.
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e modernistas no campo artístico brasileiro. Pensares em Revista, Rio de Janeiro, n. 1, p. 117-134,
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794
negra nacional de tatiana nascimento, de Kika Sena, de Beatriz Aqualtune, bem como a minha
própria produção poética, para evidenciar que escrevivências literárias negras não cis-heterossexuais
têm revelado sua tendência cuírlomobista de superação daquela temática para compor uma
literatura de autoria negra gênero-sexual dissidente.
Referências: BERND, Zilá. O que é negritude? São Paulo: Brasiliense, 1988. CLARKE, Cheryl. the days
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Faculdade de Letras da Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2018. Disponível em:
<https://repositorio.ufjf.br/jspui/bitstream/ufjf/6717/1/miriancristinadossantos.pdf>. Acesso em:
15 jan. 2022. nascimento, tatiana. cuíerlombismo literário: poesia negra lgbtqi desorbitando o
paradigma da dor. São Paulo: N-1 Edições, 2019.
795
livro conta a história de Sethe, uma negra ex-escrava cuja intenção de proteger os filhos e livrá-los
da escravidão fez com que ela tirasse a vida de sua bebê. Este trabalho tem como objetivo discutir a
importância da literatura negra de autoria feminina para a visibilidade de narrativas ficcionais que
destaquem o protagonismo feminino negro sob uma ótica que vise à desconstrução do olhar pautado
no exotismo, na erotização ou subalternidade de mulheres negras. Para isso, o percurso
metodológico escolhido foi a pesquisa bibliográfica e análise da obra Amada (1987) sob uma
abordagem decolonial que nos possibilitasse a compreensão de como a literatura de autoria negra-
feminina vem colaborando para a construção de um olhar que contemple a perspectiva do oprimido,
pela apresentação de personagens negras protagonistas de suas histórias, capazes de modificar o
rumo de suas vidas e de todo um coletivo negro. Sobre isso, Bell Hooks (1989) diz que sujeitos são
aqueles que têm o direito de definir suas próprias realidades, estabelecer suas próprias identidades
e nomear suas próprias histórias. Deve-se destacar que o contexto social atravessado pelo racismo
estrutural e institucional propiciou que, durante muito tempo, o cânone literário fosse
majoritariamente composto por homens brancos oriundos de classes abastadas, o que possibilitou
o apagamento de nossas narrativas, dificultando que nossas vivências, ancestralidade e memória
fossem mantidas e valorizadas socialmente. Assim, como referencial teórico, serão utilizados os
estudos de Evaristo (2005; 2020) sobre a representação e auto-representação da mulher negra na
literatura e escrevivência; a pesquisa de Dalcastagné (2021) acerca dos estereótipos reproduzidos na
literatura e Kilomba (2020) sobre a narrativa como instrumento para legitimação de nossas
identidades.
Referências: BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte, Editora UFMG, 1998. DALCASTAGNÈ,
Regina. Ausências e estereótipos no romance brasileiro das últimas décadas: alterações e
continuidades. Letras de hoje. Porto Alegre, v.56, n.1, p.109-143, jan.abr.2021. EVARISTO, Conceição.
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representação da mulher negra da mulher negra na literatura brasileira. Revista Palmares: Cultura
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Plantação – episódios de racismo cotidiano. Tradução Jess Oliveira. 1.ed. Rio de Janeiro: Cobogó,
2019. MORRISON. Toni. Amada. Tradução Evelyn Kay Massaro. São Paulo: Companhia das
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Fonte da Autoestima – ensaios, discursos e reflexões. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
MORRISON, T. A origem dos outros: seis ensaios sobre racismo e literatura. São Paulo: Companhia
das Letras, 2019. NJERI, Aza; RIBEIRO, Katiúscia. Mulherismo Africana: práticas na diáspora brasileira.
Currículo sem Fronteiras, v. 19, n. 2, p. 595-608, maio/ago. 2019. OY?WÙMÍ, Oyèrónké. A invenção
das mulheres: construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero. Tradução
Wanderson Flor do Nascimento. 1 ed. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,2021. RICOUER, Paul. A
memória, a história, o esquecimento. Trad. Alain François et.al. Campinas: Unicamp, 2007:18.
796
mercadológico da situação (oportunidade de vendas) do que, efetivamente, ao tratamento
respeitoso das produções negras, em especial as literárias.” (2021). Posto isso, de 2018 a 2021,
contabilizei em torno de 78 livros publicados por poetas negras/os/es principalmente em editoras
independentes. Ao longo da pesquisa foi possível catalogar cerca de 48 casais editorais. O objetivo
desta comunicação, pois, é analisar onde e como são publicadas/os as/os poetas negras/os
contemporâneos? Como e quem lê as/os poetas/os negras/os contemporâneas/os? Tal qual Fabiane
Rodrigues (2017) nomeou “quilombos editoriais” as propostas editoriais, em sua maioria, feitas por
pessoas negras e destinadas a formação de um público leitor negro (Duarte, 2014), tento analisar a
“bibliodiversidade” (López Winne e Malumián, 2016) dos catálogos das editoras independentes
coletadas, a fim de estabelecer um agrupamento por objetivos editoriais, e entender quais poéticas
despontam entre essas vozes.
Referências: CARRANÇA, Flávio. Autores negros enfrentam dificuldades para publicar suas obras.
Revista Problemas Brasileiros, São Paulo, n. 360, nov./dez. 2003. Disponível em:
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https://rascunho.com.br/liberado/pisando-em-ovos/. Acesso em: 12 jan 2023.
797
nas autoras movimentos que denunciam a continuidade de elementos pertencentes a uma visão
colonial relacionados a uma imagem e, até mesmo, uma memória para a pessoa negra. E, além de
denunciar, suas escritas e visualidades figuram também como proposições à reescrita dessa imagem,
com potencial de ser socialmente construída como memória. Para esta análise, somam-se as
reflexões de Sueli Carneiro e bell hooks.
Referências: CARNEIRO, Sueli. Escritos de uma vida. Belo Horizonte: Letramento, 2018. EVARISTO,
Conceição. “Da grafia-desenho de minha mãe, um dos lugares de nascimento de minha escrita”. In.:
ALEXANDRE, Marcos Antônio (org.). Representações performáticas brasileiras: teorias, práticas e
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pensar como negra. São Paulo: Editora Elefante, 2019. JESUS, Carolina Maria de. Casa de Alvenaria,
vol. 2: Santana. 1 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. JESUS, Carolina Maria de. Quarto de
Despejo. 2 ed. São Paulo: Editora Ática, 1993. KILOMBA, Grada. Grada Kilomba: desobediências
poéticas. Curadoria Jochen Volz e Valéria Piccoli; ensaio Djamila Ribeiro. São Paulo: Pinacoteca de
São Paulo, 2019. KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Trad.
Jess Oliveira. 1 ed. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.
798
Brasileira de Pesquisadores Negros-ABPN , no ano de 2021. A proposta foi apresentar o problema de
pesquisa de doutorado em andamento no Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos
Contemporâneos e Demandas Populares da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Compartilhando as reflexões com os/as colegas, nasce a necessidade de refletirmos sobre a EJA e
seus sujeitos dentro de um coletivo de mulheres chamado Mulheres do Ler, apresentado por
algumas alunas. Guardada as especificidades de uma educação de jovens e adultos fora do ambiente
escolar, fomos desafiadas com a seguinte problemática: como as mulheres, agora autoras
publicadas, se percebem nesse movimento de serem apresentadas como escritoras da/na Educação
de Jovens e Adultos? Dessa maneira, lançamo-nos ao seguinte objetivo da pesquisa: compreender o
processo de autoafirmação a partir da escrita e as reverberações desse processo na comunidade
onde essas alunas e professoras estão inseridas. Do ponto de vista teórico, debruçamo-nos sobre o
materialismo histórico e sobre autoras/es como Conceição Evaristo (2009), bell hooks (2017) e Paulo
Freire (1996), apoiam a construção desse estudo e a discussão da leitura e da escrita numa
perspectiva contra hegemônica. A escrevivência, como afirma Conceição Evaristo (2010), é mais que
escrever sobre si. É a escrita de nós. É um chamamento para que todas tenham as suas escritas-vida
marcadas na sociedade e com elas possam reescrever suas histórias rompendo o processo de
alienação do ser. Sendo assim, passamos a organizar encontros periódicos, em parceria com o clube
de leitura Ubuntu/IF Matão, a fim de lermos autoras negras e pensarmos juntas a produção de textos
das mulheres do ler.
Referências: ADICHE, C. N. O perigo de uma história única. 1ª edição - São Paulo: Companhia das
Letras, 2010. DUARTE, L.C; Côrtes, C e Pereira, A.R.M (orgs). Escrevivências: identidade, gênero e
violência na obra de Conceição Evaristo. 2º edição. Belo Horizonte: Idea, 2018 JESUS, C. M. de.
Quarto de Despejo: diário de uma favelada. 10ª edição. São Paulo: Ática, 2018. EVARISTO, C.
Literatura negra: uma poética de nossa afro-brasilidade. Belo Horizonte: SCRIPTA 13, 2º sem. 2009.
p.17-31. EVARISTO, C. Poemas da recordação e outros movimentos. Rio de Janeiro: Malê, 2017.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1997. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996 HOOKS, B. Ensinando a
transgredir: a educação como prática da liberdade. 2ª edição. São Paulo: editora WMF, Martins
Fontes, 2018. HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. 1ª edição. São Paulo: Elefante,
2021. KOSIK, K. Dialética do concreto. 2ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976. LUCINDA, E. Vozes
guardadas. 1ª edição. Rio de Janeiro: Record, 2019. SALES, S. R. & PAIVA, J. As muitas invenções da
EJA. Arquivos Analíticos de Políticas Educativas, v. 22, n. 58, 2014. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.14507/epaa.v22n58. Dossiê Educação de Jovens e Adultos. Editoras
convidadas: Sandra Regina Sales & Jane Paiva.
"NÃO SOU EU QUE VIVO NO PASSADO, É O PASSADO QUE VIVE EM MIM": O TEMPO E O RACISMO
NAS ESCRITAS DE LIMA BARRETO E NA MÚSICA DE EMICIDA
Ana Paola Laeber
Resumo: O presente trabalho tem por premissa apresentar parcialmente a pesquisa de tese
orientada pela Professora Doutora Viviana Mónica Vermes do Programa de Pós-graduação em Letras
(PPGL) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). A proposta deste estudo é versar em como
as escritas de Lima Barreto (1881-1922) e o rapper Emicida (1985- ) podem ser consideradas como
narrativas do desassossego. Sendo assim, essas vozes inquietantes ecoam resistência, ou como bem
diria Conceição Evaristo (2017), em um tempo bem distante, são vozes de uma bisavó que ecoam
799
"lamentos de uma infância perdida nos porões dos navios" e, ainda no tempo presente, igualmente
das mães que ecoam "baixinho revolta no fundo das cozinhas alheias" (Evaristo, 2017, p. 24). As
aproximações dessas vozes acerca da falta de cidadania ocasionada pelo racismo são percebidas nas
produções do autor carioca em "Diário Íntimo", publicada postumamente em 1953 e no rap "Boa
Esperança" do álbum "Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa ..." (2015). Pretende-se,
ainda, na construção desta tese, bem como na apresentação deste trabalho, traçar uma abordagem
teórica acerca dos espaços sociais e geográficos, em razão de configurar, de forma pertinente, as
relações em que os escritores aqui retratados balizaram seus modos de pensar e agir, posto que, os
seus lugares de fala foram e ainda são vozes que lutam em romper esses espaços de segregação.
Sem perder de vista que Lima Barreto e Emicida estão separados em tempos e espaços discursivos
distintos, pretende-se analisar, com em um processo espiral e dialógico, as possíveis
(re)apresentações e (re-des)construções identitárias entre os objetos deste estudo. Aspectos da
escrita desses escritores que utilizam uma literatura periférica e de resistência, o diário (linguagem
coloquial) e o rap (socioleto), serão abordados como construtores dessas representações de
identidade social.
Referências: Almeida, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte (MG): Letramento,
2018. Barreto, Lima. Diário Íntimo - Memórias. São Paulo: Brasiliense, 1956. Emicida. São Paulo: Lab
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UMA RESIDÊNCIA ARTÍSTICA DENTRO DE SI: REFLEXÕES SOBRE A ESCRITA POÉTICA, AUTO
TRADUÇÃO E A DANÇA
Feibriss Henrique Meneghelli Cassilhas
Resumo: Proponho nesta comunicação analisar e contextualizar a minha experiência de escrita
poética a partir da criação e realização de atividades com o coletivo Sarau Vozes Negras (SVN). Somos
um coletivo (CAMOZZATO, 2022) que propõe ações poético-pedagógicas em formatos de oficina,
saraus e performances em pró da consciência racial de forma interseccional (AKOTIRENE, 2018),
sobretudo com relação à comunidade negra LGBTQIAPN+. Venho contar como foram alguns dos
caminhos, encontros, estudos e reflexões sobre o meu processo de escrita enquanto apresento
textos de minha autoria já publicados (OLIVEIRA et al., 2021) ou performados em eventos online e
presenciais. O SVN foi um lugar de acolhida e possibilidade de existência durante dois processos que
marcam e preenchem essa escrita: o momento em que começo a me apresentar como artista e a
minha transição de gênero. Entrelaço na análise desses escritos como meu fazer artístico remodelou
a minha trajetória acadêmica como pesquisadora, tradutora de histórias contadas (CASSILHAS, 2019)
e professora que performa e se auto traduz para o inglês. Ao escrever vou deixando registros do meu
processo de transição de gênero em minha poética, repenso a minha trajetória, entendendo a função
de algumas pessoas e leituras (KINTÊ e CUTI, 2015; KINTÊ e SILVA, 2018; MARTINS, 2022 e 2016) que
me fizeram companhia e me impulsionaram a extrair no papel minha poesia interior impulsionada
pelas aulas de dança com a arte-educadora Fernanda Cassilhas.
Referências: AKOTIRENE, Carla. O que é interseccionalidade? Belo Horizonte, MG. Letramento:
Justificado, 2018. BARBOSA, Marcio. RIBEIRO, Esmeralda. Cadernos Negrs, volume 39: poemas afro-
brasileiros. São Paulo: Quilombhoje, 2020. (Cadernos Negros) BARBOSA, Marcio. RIBEIRO,
Esmeralda. Cadernos Negros: poemas afro-brasileiros. São Paulo: Quilombhoje, 2020. (Cadernos
Negros; v. 43) CAMOZZATO, Nathalia Müller. Vozes gênero-dissonantes: uma cartografia pós-
humanista. 2022. Tese (Doutorado) - Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2022. CASSILHAS, Feibriss Henrique Meneghelli. Tradução
de histórias do Sul da Nigéria: por uma corsciência da tradução-contação na voz de uma bixa preta
transviada no Brasil. 2019. Tese (Doutorado) - Programa de pós-graduação em Estudos da Tradução,
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2019. GOMES DE OLIVEIRA, Megg Rayara.
Nem ao centro, nem à margem! Corpos que escapam às normas de raça e de gênero. Salvador, BA.
Editora Devires, 2020. KINTÊ, Akins. CUTI. Pretumel de chama e gozo - Antologia da poesia negro-
brasileira erótica. São Paulo: Ciclo Contínuo, 2015. KINTÊ,Akins. SILVA, Nina. Incorporos - Nuances
de libido. São Paulo, 2018. OLIVEIRA, Apolo V… [et al.]. Transvivências Negras entre afetos e
aquilombamentos: contando histórias afro-diaspóricas. Salvador, BA. Devires, 2021.
802
na intersecção de gênero, raça e classe social. Essas me atravessam nas relações de tempo e espaço,
partindo do ato da leitura de dizer, performatizar, (re)fazer e traduzir poesias de pessoas escritoras
negras, reconhecendo a poesia como uma potência do dizer, do devir e da pulsação ao desenvolver
textos de resistência, de insistência, de ressignificação e de deslocamento na busca de
comprometimento as pessoas negras e LGBTQIAPN+ na contextualização Sul-Sul, o verbo e verso
próprios, despedaçando a palavra colonizadora, visibilizando a encruzilhada, a corporiedade e o
olhar anticolonial. A partir da ideia de que os caminhos não se concluem, nem se terminam, a
encruzilhada e os entrecruzamentos são lugares da pluralidade, dos encontros e dos borramentos
das fronteiras de gênero, conforme Nascimento (2021), Oliveira (2020) e Souza et.al (2022). As
poesias das encruzilhadas construídas e ditas coletivamente pelos grupos apresentam a criatividade
do (sobre)viver e a arte poética por meio de uma instigação epistêmico-metodológica interseccional,
a partir dos nossos lugares e modos de ação como pessoas dissidentes (bichas pretas e travestis).
Como resultado disso, a proposta é compreender a experiência poética de criar, ler e traduzir
enquanto uma forma prática da vida cotidiana e da intervenção direta nos espaços sociais,
mostrando os pontos de vista que as identidades se constrói, se deslocam e descolonizam no
momento de analisar e apresentar de alguma forma os discursos como poetas, artistas, tradutoras e
professoras sobre o que vivemos no ato de (re)criar, de performatizar, de traduzir textos que tenham
uma representação interseccional e como a recepção do público de diferentes espaços (instituições
de ensino, shows, etc.) nos leva a refletir em uma prática factual descolonizadora e epistemológica.
Referências: NASCIMENTO, Letícia Carolina Pereira do. Transfeminismo São Paulo: Jandaíra, 2021.
OLIVEIRA, Megg Rayara Gomes de. Nem ao centro, nem à margem: corpos que escapam às normas
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Fondo Editorial de la Asamblea Nacional de Rectores, 2012, pp. 7-19.
804
bibliográfica, com caráter qualitativo e os debates teóricos são norteados, principalmente por
Conceição Evaristo (2020), com o conceito de escrevivência; Diana Klinger (2008); Gislene Alves da
Silva; Jailma dos Santos Pedreira Moreira (2020); com estudos sobre autoficção e Leda Martins
(2003); Diana Taylor (2013) com trabalhos sobre literatura e performance, dentre outros e outras
que dialogam com as temáticas estudadas. Constata-se que as escrevivências reforçam e afirmam a
presença de múltiplos corpos de mulheres negras que se conectam, se atravessam e são
atravessados por vários aspectos sociais e históricos, que garantem ao texto de Evaristo o recurso
artístico capaz de pintar a vida por meio da palavra escrita e traduzir o intraduzível.
Referências: EVARISTO, Conceição. Escrevivência: a escrita de nós - Reflexões sobre a obra de
Conceição Evaristo / organização DUARTE, Constância Lima; NUNES, ROSADO, Isabella; ilustrações
Goya Lopes. Rio de Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020. EVARISTO, Conceição. A Escrevivência
e seus subtextos. In: A escrita de nós: reflexões sobre a obra de Conceição Evaristo / organização
organização DUARTE, Constância Lima; NUNES, ROSADO, Isabella; ilustrações Goya Lopes. Rio de
Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020. KLINGER, Diana. Escrita de si como performance: Revista
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Dominique. Discurso literário. 2 ed. 2 reimp. São Paulo: Contexto, 2016.
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autorreferencialidades e de performance do corpo, bem como da memória como um fenômeno
construído, de Maurice Halbwachs (1950), no discurso narrativo do romance.
Referências: CAPUCHO, L. Rato. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2007. CAPUCHO, L. Cinema Orly. Rio
de Janeiro: Interlúdio Editora, 1999. CAPUCHO, L. Mamãe me adora. Rio de Janeiro: Edições da
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coletiva. 2. ed. São Paulo, Vértice/Revista dos Tribunais, 1950. KLINGER, D. Escrita de si como
performance. Revista Brasileira de Literatura Comparada, n.12, p. 11-30, 2008.
808
O QUE FICA DEPOIS DO CESSAR-FOGO: UMA ANÁLISE SOBRE AS MARCAS DA GUERRA NOS
PROTAGONISTAS DE “MATADOURO-CINCO” E “NADA DE NOVO NO FRONT”
Diane Nascimento de Oliveira e Thiago Martins Caldas Prado
Resumo: Publicado em 1969, Matadouro-cinco tem como temática central um dos períodos mais
tenso da vida de seu autor, Kurt Vonnegut (2019): sua participação na Segunda Guerra Mundial.
Assim como Vonnegut, o protagonista de seu romance, Billy Pilgrim, serviu na guerra ao lado dos
Aliados, também foi capturado pelos alemães e conduzido como prisioneiro de guerra para Dresden,
onde sobreviveu por pouco a bombardeios britânicos e estadunidenses que destruíram a cidade
alemã. Já o romance de Erich Maria Remarque (2022), Nada de novo no front, publicado em 1929,
conta a história de Paul Baumer, jovem alemão de família humilde que, assim como muitos a época,
deixa tudo e vai para a guerra, mas descobre que, independentemente de qual lado da trincheira
esteja, a guerra só tem horror. Dessa forma, o objetivo deste artigo é compreender em que medida
a teoria do narrador de Benjamin (1987) suporta ou não essas duas narrativas, pois, conforme o
ensaísta, após viver o terror da guerra, o soldado retorna com um declínio na faculdade de
compartilhar experiências. Outros autores que fundamentarão este trabalho são: Thiago Martins
Caldas Prado (2011), que explana sobre os encaixes pós-modernos de focos narrativos, Allen (c2017),
que traça uma breve biografia de Vonnegut. Conclui-se que Bill Pelegriny e Paul lidaram com o
retorno da guerra de formas diferentes: o primeiro, tentou sobreviver, criou uma espécie de mundo
próprio (que incluía viagens no tempo e encontros com Ets.), o segundo, é emudecido pelos traumas
guerra – para ele, a morte é quase uma libertação.
Referências: ALLEN, William Rodney. A brief biography of Kurt Vonnegut. Kurt Vonnegut Musuem
and Library. Indianapolis, c2017. Disponível em: <https://www.vonnegutlibrary.org/kurt-
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obra de Nikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e política - ensaios sobre literatura e história da
cultura. 3. ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987. (Obras escolhidas 1). p. 197-221. CHIAPPINI, Ligia;
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do PPG em História Social da USP, defendida em 2010. PRADO, Thiago Martins. A constituição do
personagem-narrador pós-moderno. Analecta. Guarapuava, v. 12, n. 2, p. 67-87, jul/dez 2011.
REMARQUE, Erich Maria. Nada de novo no front. Porto Alegre: L&PM, 2022. VONNEGUT, Kurt.
Matadouro-cinco: ou a cruzada das crianças. uma dança compulsória com a morte. Rio de Janeiro:
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de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, São Paulo, n. 10, pp. 7-28, dez.1993.
813
uma vez que as memórias de sua família se confundem com a história da própria instituição familiar
brasileira. Mas, se por um lado, o vasto acervo de objetos, cartas, e registros presentes no Baú de
Ossos permite a Nava conservar, e em alguma medida – recriar a história de seus antepassados; sua
obra também revela a negação do direito à memória familiar alheia. Essa mnemônica destrutiva é
explícita, por exemplo, nos atos da avó materna, que vivia “como se não tivesse havido princesa
Isabel nem Treze de Maio” (Nava, 2012, p. 289), preservando instrumentos de tortura, queimando
registros de ex-escravizados e revogando o nome de batismo das crianças negras assimiladas à
periferia de seu núcleo doméstico. Portanto, a costura do enredamento familiar implica, no caso do
Baú de Ossos, a descostura de uma outra trama, a dos escravizados e seus descendentes
subordinados à ordem familiar do autor − na qual não apenas sofrem toda sorte de violência física e
simbólica, mas onde também lhes é subtraído o direito à uma história própria, ao sobrenome – e,
sobretudo, à memória.
Referências: Bourdieu, P. (1996). Razões práticas: Sobre a teoria da ação. Papirus Editora. Nava, P.
(2012). Baú de ossos. Companhia das Letras.
814
Una Especulacio?n. Eterna Cadencia Editora, 2020. Macpherson, Crawford Brough, and Cunningham,
Frank. The Political Theory of Possessive Individualism: Hobbes to Locke. United Kingdom, Oxford
University Press, 2011.
815
ambiente pós-colonial moçambicano. Buscando investigar o diálogo destas narrativas com os
impactos ambientais no oceano Índico e em suas sociedades costeiras, e com especial atenção às
formas através das quais as dinâmicas de desenvolvimento combinado e desigual do sistema
capitalista contribuem para essa situação, argumentamos que a literatura de Borges Coelho fornece
singulares e inovadores imaginários com os quais entender e imaginar as relações entre humanos e
não-humanos. Instigando reflexões críticas que desafiam as formas dicotômicas através das quais
usualmente pensamos tais domínios, os imaginários de Borges Coelho constroem conexões
complexas entre a literatura e a contemporaneidade moçambicana, apontando para a
indissociabilidade entre história, sociedade e natureza.
Referências: MUKHERJEE, Pablo. Postcolonial environments: Nature, Culture and the Contemporary
Indian Novel in English. London: Palgrave Macmillan, 2010. BORGES COELHO, J. P. Índicos Indícios:
Setentrião. Lisboa: Caminho, 2005a. ____. Índicos Indícios: Meridião. Lisboa: Caminho, 2005b. ____.
Ponta Gea. Lisboa: Leya, 2017.
SUÍTE TÓQUIO: UMA NARRATIVA SOBRE TENSÕES E VIOLÊNCIAS ENTRE MULHERES ATRAVÉS DO
TRABALHO
Liane Schneider
Resumo: Ao longo do romance Suíte Tóquio (2020), de Giovana Madalosso, diferentes espaços de
trabalho são justapostos através da construção de duas personagens que dão visibilidade a
experiências diversas ao longo da narrativa. Relações de trabalho vivenciadas entre mulheres no
plano público/privado embasam os elos estabelecidos entre essas personagens e os lugares
físicos/geográficos e afetivos que ocupam: uma mãe, profissional de relativo sucesso; a babá, que
atua de forma competente na esfera do lar, ambas assumindo alternadamente a voz narrativa no
816
romance e pintando as relações de trabalho a partir de suas perspectivas e contextos. A fim de
discutir como as relações de trabalho são retratadas por Giovana Madalosso, trazemos conceitos e
críticas feministas de Silvia Federici () quanto ao mundo capitalista e as relações de trabalho
estabelecidas dentro dele, bem como um olhar sobre a história das mulheres, da organização das
famílias e da maternidade, através de autoras como Joan Scott e outros/as. Demonstramos como
esses elos e atritos entre mulheres sustentam ou desfiam o modelo social capitalista sempre ainda
colonizador através das partes envolvidas – patroa, chefe, empregada doméstica, babá. Obviamente
outras marcas, para além do gênero, influenciam o grau de liberdade que as trabalhadoras
conseguem garantir - entre essas a classe social, o pertencimento étnico-racial, a formação escolar,
entre outras. Esse emaranhado de lugares ocupados e desafiados serão o foco da análise que
propomos.
Referências: FEDERECI, Sílvia. O Patriarcado do Salário. São Paulo: boi tempo, 2021. MIGUEL, Luis
Felipe & Biroli, Flávia. Feminismo e politica. São Paulo: Boi tempo, 2014. VERGES, Francoise. Uma
teoria feminista da violência. SCOTT, Joan. o engima da igualdade. Florianópolis, 2005, Revista
Estudos feministas, V13 n1, p.11 - 30.
817
Mayara Ranieri Paschoal
Resumo: A presente pesquisa propõe-se a analisar os poemas Nossa voz, Súplica, Porquê, Canção
Fraterna, Lição, O homem morreu na terra de algodão e Sangue Negro, reunidos no livro “Sangue
Negro” (2016) de Noémia de Sousa. A escolha desses poemas como corpus deve-se ao fato de terem
um elo temático comum: a opressão do sistema colonialista português em Moçambique, o
sofrimento decorrente das populações locais a partir do estabelecimento da superexploração do
trabalho e a ascensão (de um projeto ainda) da luta de libertação em Moçambique também na seara
da produção literária local. A partir da delimitação dos poemas, interessa-nos investigar em que
medida a produção poética de Noémia revela-se substancialmente imbricada com sua militância
política ao contestar e confrontar o sistema colonialista português. Para a realização desse estudo,
utilizamos como viés teórico-metodológico a perspectiva do materialismo histórico e dialético,
buscando refletir acerca da materialidade histórica e social da vida dos moçambicanos no contexto
em questão e que é, também, o da própria poetisa. Para a fundamentação dessa reflexão, teremos
como aporte teórico inicial autores como Frantz Fanon, Eric Williams, Walter A. Rodney, Antonio
Candido, Alfredo Bosi, Theodor Adorno e Terry Eagleton pretendendo estabelecer as possíveis
imbricações entre literatura, história e sociedade.
Referências: ADORNO, Theodor. Palestra sobre lírica e sociedade. Notas de literatura I. Trad. Jorge
de Almeida. São Paulo: 34, 2003, pp. 65-89. BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política.
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Dutra. São Paulo: Martins Fontes, 2006. FANON, Frantz. Os condenados da terra. Tradução de José
Laurênio de Melo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1968. _____. Em defesa da revolução
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Valdemir. De Escravo a Cozinheiro: Colonialismo e Racismo Em Moçambique. Salvador: EDUFBA,
2012.
818
resistência, em suas múltiplas intersecções, engendradas pelas obras que serão analisadas. Para
logramos em nossos objetivos, o pensamento de autores e autoras como Lélia González, Achille
Mbembe, Suely Rolnik, Frantz Fanon, Albert Memmi, Édouard Glissant, Patricia Hill Collins, entre
outros, será considerado. Por fim, salientamos que a nossa apresentação se embasará no conceito
de "poéticas do desabrigo" que investigamos atualmente, e que, a nosso ver, modula grande parte
da produção cultural e estética afrodiaspórica e que consiste, sobretudo, na condição dada a priori
de um desabrigo físico e ontológico do sujeito em diáspora.
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(1995), p. 505-518.
820
tratamento dado pelo filósofo aos representantes pulsionais que são o afeto (Affekt) e a ideia
(Vorstellung), em sua análise associados à “inércia” (LOURENÇO, 2016, p. 94), ao “instinto de
conservação social” (LOURENÇO, 2016, p. 94), às formas de repetição do conformismo ideológico,
político e social, desde “a versão mais paradoxal da melancolia” à “figura mais humilde e nua do
tédio” (LOURENÇO, 1999, p. 97).
Referências: FREUD, Sigmund. Além do princípio do prazer. Trad. e notas Maria Rita Salzano Moraes.
Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2020. FREUD, Sigmund. Ansiedade e vida pulsional. Novas
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Belo Horizonte: Autêntica, 2013. LACAN, Jacques. Seminário 5: as formações do inconsciente (1957-
1958). Tradução Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1999. LOURENÇO, Eduardo. Portugal como
destino seguido de Mitologia da Saudade. Lisboa: Gradiva, 1999. LOURENÇO, Eduardo. O labirinto da
saudade. Rio de Janeiro: Tinta-da-china Brasil, 2016.
821
as diferenças, abre um corte no tecido da colonização, uma vez que não aposta no congraçamento
entre os povos, muito menos na promessa de transcendência ou soteriologia mítica. O mito em
Penna é traduzido como morto desde o início, posição diametralmente oposta a estudiosos como
Joaquim Nabuco, Gilberto Freyre, Paulo Prado e Sérgio Buarque de Holanda, como se o ficcionista
fluminense escrevesse para denunciar a falácia do projeto nacional representado nos afamados
intérpretes. Tomado esse pressuposto, concordamos com a crítica de Lourenço sobre as repetições
de apologia e ressentimento ideológicos que atravancaram a reflexão de parte da historiografia
brasileira – e portuguesa – acerca do mito do colonialismo.
Referências: FINAZZI-AGRÒ, Ettore. Entretempos: mapeando a história da cultura brasileira. São
Paulo: Editora Unesp, 2013. FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira
sob o regime da economia patriarcal. 48. ed. São Paulo: Global, 2003. HOLANDA, Sérgio Buarque. O
homem cordial. São Paulo: Penguin Companhia das Letras, 2012. LOURENÇO, Eduardo. Do
colonialismo como nosso impensado. Lisboa: Gradiva, 2014. NABUCO, Joaquim. O abolicionismo. In:
SANTIAGO, Silviano (Org.). Intérpretes do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2000. v. 1. p. 19-167.
NIETZSCHE, Friedrich. Segunda consideração intempestiva: da utilidade e desvantagem da história
para a vida. Trad. Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003. PENNA, Cornélio.
A menina morta. Rio de Janeiro: Artium, 1997. PENNA, Cornélio. Dois romances de Nico Horta. Rio
de Janeiro: Artium, 2000. PENNA, Cornélio. Fronteira. Rio de Janeiro: Tecnoprint; Ouro, 1967. PENNA,
Cornélio. Repouso. Rio de Janeiro: Artium, 1998. PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a
tristeza brasileira. In: SANTIAGO, Silviano (Org.). Intérpretes do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
2000. v. 2. p. 25-104.
EM BUSCA DA SAUDADE
Mirella Márcia Longo Vieira Lima
Resumo: Em 2022, elegemos, como objeto de estudo, os diários de Drummond. Livro póstumo
contendo relatos de perdas - a maioria ocorrida nos anos 40 e 50 - "Uma forma de saudade: Páginas
de diário" integra esse corpus. O escritor apresenta textos datados, registrando doenças e mortes de
familiares e amigos. Para comentar os registros, optamos por uma leitura comparativa com "Claro
Enigma "(1951), conferindo destaque à parte intitulada "Os lábios cerrados". A leitura teve, como
alicerces, as qualificações que, principalmente nos ensaios "Melancolia e saudade" e "Da saudade
822
como melancolia feliz", Eduardo Lourenço elaborou para uma gama de emoções consteladas em
torno do sentimento de perda: náusea, angústia, melancolia, tédio, tristeza, nostalgia e saudade.
Considerando matizes diversos que as épocas emprestam à saudade, Eduardo Lourenço chega à
coloração que lhe foi conferida pela sensibilidade moderna: “angústia do ser que se vê como filho e
prisioneiro do tempo”. Tratando a escrita saudosa como limiar da “felicidade magoada” , Lourenço
indaga: “Quem melhor do que os poetas poderia, como Orfeu, descer ao labirinto do tempo
sepultado para aí surpreender a luz não extinta, simultaneamente espectral e ofuscante, da
felicidade passada?” Como se vê, fica grifado, na saudade, o jogo com o tempo. As reflexões de
Lourenço estarão no centro da comunicação. A partir delas, desenvolvemos a hipótese de que,
escrevendo com maior adesão aos momentos de perda, o autor do diário experimenta náusea e
angústia causadas pela visão de corpos doentes ou mortos. Desse “excesso de mundo” capaz de
travar o jogo com o tempo, o poeta desloca-se para buscar a saudade, “melancolia feliz”, nó que,
entrelaçando emoções, deixa-se atravessar pelo prazer vindo com a arte de “arder no tempo sem
nele se consumir”. Ansiada no diário, a saudade assoma, na poesia dos anos 50 e 60, com maior
nitidez.
Referências: ANDRADE, Carlos Drummond de. Uma forma de saudade: páginas de diário. (Org. de
Pedro Augusto Graña Drummond). São Paulo: Companhia das Letras, 2017. CAMILO, V. Drummond:
Da rosa do povo à rosa das trevas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. FREUD. Luto e melancolia. São
Paulo: Cosac&Naify, 2011. LEJEUNE, P. et BOGAERT, C. Le journal intime: Histoire et anthologie. Paris:
Textuel, 2006. LOURENÇO, Eduardo. Mitologia da saudade seguido de Portugal como destino. São
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do destino português. Lisboa: Gradiva, 2007. LOURENÇO, Eduardo. Tempo e Poesia. Lisboa: Relógio
D`água: 1987. VIEIRA LIMA, Mirella. Confidência mineira: o amor na poesia de Carlos Drummond de
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823
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Cultural do Governo da RAEM WONG Bik Wan. 2011. ???? Mori jiudian [Doomsday hotel]. Hong
Kong: Cosmos Book.
824
UMA IMPENSÁVEL RELAÇÃO: BRASIL, PORTUGAL E QUESTÃO DO "COLONIAL"
Vincenzo Russo
Resumo: Que a psicanálise histórica, tal como foi utilizada por Eduardo Lourenço, nas últimas seis
décadas tenha contribuido para a desmontagem e a desconstrução da mitologia cultural portuguesa
que se queria e se auto-reconhecia como discurso secular é, hoje em dia, um tópico crítico quase
consensual. Menos evidente (até para os especialistas do pensamento de Eduardo Lourenço)
aparece a contribuição oferecida pela psicanálise histórica para o mapeamento das relações
complexas e complexadas entre Brasil e Portugal lidas através das suas autonomas e inextricáveis
mitologias culturais tal como a pervasiva mitologia luso-brasilianista. A psicanálise histórica aplicada
ao caso Brasil irá contribuir também para a interpretação, por assim dizer “de fora”, das imagens e
das retóricas que a mitologia brasileira criou e reconfigurou ao longo da sua existência como História.
Aqui não se trata de realizar um recenseamento (entre os muitos percursos possíveis) das leituras
brasileiras de Eduardo Lourenço que, aliás, foi um gesto crítico já praticado, pelo menos em parte,
por críticos como João Tiago Lima (2013) e a Maria de Lourdes Soares (2015; 2018) à quem se deve
a edição de dois volumes fundamentais para entender o pensamento brasileiro de Eduardo
Lourenço: Do Brasil Fascínio e Miragem e o Tempo Brasileiro: Fascínio e Miragem quarto volume das
Obras Completas de Eduardo Lourenço. A nossa ideia é verificar de que forma a desconstrução da
mitologia brasileira contribui também para repensar o processo histórico do colonialismo português
e das suas implicações concetuais (colonização, retóricas luso-tropicalistas, anticolonialismo,
antiportuguesismo dos intelectuais brasileiros, etc).
Referências: Tommaso Auriemma, Estetica dell’evento. Saggio su Alain Badiou, Mimesis, Milano-
Udine, 2012 Eduardo lourenço, Do Brasil. Fascínio e Miragem, organização e prefácio de Maria de
Lourdes Soares, Gradiva, Lisboa, 2015. João Tiago Lima, «Existência e ficção ou o Brasil como
“personagem”» in Falar sempre de outra coisa. Ensaios sobre Eduardo Lourenço, Âncora Editora,
Guarda, 2013, pp. 111-118. Eduardo Lourenço, Do Colonialismo como nosso impensado, organização
e prefácio de Margarida Calafate Ribeiro e Roberto Vecchi, Gradiva, Lisboa, 2014. Eduardo Lourenço,
Tempo Brasileiro: Fascínio e Miragem. Obras completas IV, coordenação, introdução e notícias
biobliográficas de Maria de Lourdes Sosares, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2018. Maria de
Lourdes Soares, «O lugar e o espaço-tempo do Brasil» in Eduardo Lourenço, Do Brasil. Fascínio e
Miragem, Gradiva, Lisboa, 2015, pp. 9-35. Maria de Lourdes Soares, «A decisiva experiência de um
ano» in Eduardo Lourenço, Tempo Brasileiro: Fascínio e Miragem. Obras completas IV, Lisboa,
Fundação Calouste Gulbenkian, 2018, pp. 19-68. Margarida Calafate Ribeiro e Roberto Vecchi, «A
paixão pelo impensado» in Eduardo Lourenço, Do Colonialismo como nosso impensado, organização
e prefácio de Margarida Calafate Ribeiro e Roberto Vecchi, Lisboa, Gradiva, 2014, pp.13-17.
LER O BRASIL A PARTIR DA LITERATURA MALIENSE: AMADOU HAMPÂTÉ BÂ VINTE ANOS DEPOIS
DA APROVAÇÃO DA LEI 10.639/2003
Eumara Maciel dos Santos
Resumo: Esta escrita é uma resposta a uma questão que sempre foi colocada acerca do meu trabalho
de quase duas décadas sobre a obra de Amadou Hampâté Bâ: qual a relevância do estudo da
literatura maliense de expressão oficial de língua francesa para o campo da literatura negro-
brasileira? Fazia um esforço de grande fôlego e respondia com justificativas históricas, culturais,
sociológicas e literárias desde a diáspora negro-africana nas Américas, transportando corpos e
epistemologias, passando pela contextualização da Revolta dos Malês, em Salvador, na Bahia, a
cidade com maior população negra no Brasil, até os versos ou crônicas escritos em árabe nas bolsas
825
de mandingas, mas o que soava era uma desconfiança da legitimidade da pesquisa, um pedido de
explicação constante para a existência do estudo. Ao longo do tempo, fui compreendendo que essa
série de perguntas era um mecanismo racista de tentativa de desarticulação dos estudos africanos,
dos estudos da literatura negro-africana e da literatura negro-brasileira, um atentado à educação
para as relações raciais, ferindo também os princípios da Lei 10.639/03. Tal dispositivo legal, que
estabeleceu a obrigatoriedade do ensino de conteúdos de História da África e dos negros no Brasil
em currículo escolar brasileiro, pôs-me em contato com a literatura de tradição oral de Hampâté Bâ
pelo seu único livro traduzido para o português: Amkoullel, o menino fula. Dessa leitura, pude
entender nossos saberes e fazeres ancestrais como os valores civilizacionais negro-africanos e negro-
brasileiros da oralidade, do sentido comunitário, da circularidade, da corporeidade, da
ancestralidade como elementos constituintes da formação da História do Brasil e legados dos povos
africanos, portanto, ler Hampâté Bâ é também ter a oportunidade de ler o Brasil que foi, que é e que
poderá ser.
Palavras-chave: Amadou Hampâté Bâ. Literatura negro-africana. Literatura negro-brasileira. Lei
10.639/2003.
826
escola de missionários católicos. Já a terceira geração é da filha de Anikwenwa, Grace, que desiste
de estudar química para se tornar uma historiadora determinada a recuperar tradições familiares.
Este trabalho tem como objetivo analisar como os conflitos e os traumas transgeracionais
particulares da família de Nwamgba, em The Headstrong Historian, podem ser uma forma de
reapropriação histórica e cultural da Nigéria, país que foi colônia britânica até 1960. No conto de
Chimamanda, Obierka, marido de Nwamgba, é, inclusive, a mesma personagem do romance Things
Fall Apart, de Chinua Achebe, considerado o fundador da literatura nigeriana moderna. Isso já denota
a importância da intertextualidade e da reescrita na obra. Como fundamentação teórica, utilizo
estudos pós-coloniais (ASHCROFT; GRIFFITHS; TIFFIN, 2013;), a ideia de ressignificação ao escrever
sobre a África, do autor queniano Binyavanga Wainaina, e de estudos sobre a literatura africana e a
narrativa de Chimamanda (BRAGA, 2010; DOHERTY, 2014; LEITE et al., 2022; SOUZA, 2021; MIKAILU
& WATTENBERG, 2015).
Referências: ADICHIE, Chimamanda. The Thing Around Your Neck. New York: Knopf, 2009.
ASHCROFT, B.; GRIFFITHS, G.; TIFFIN, H. Post-Colonial Studies: The Key Concepts. London: Routledge,
2013. BRAGA, Cláudio. Trocando o próprio nome: identidade cultural e memória em “The
Headstrong Historian”, de Chimamanda Ngozi Adichie. Cadernos ESPUC, v. 1, n. 19, 2020, p. 42-50.
DOHERTY, Brian. Writing Back with a Difference: Chimamanda Ngozi Adichie’s ‘The Headstrong
Historian’. In: OKUYADE, Ogaga. Tradition and Change in Contemporary West and East African
Fiction, 2014, p. 187-202. LEITE et al (orgs.). O romance africano: tensões, conexões, tradições.
Goiânia: Cegraf UFG, 2022. MIKAILU, AVID; WATTENBERG, Brendan. My Name Will Not Be Lost:
Cosmopolitan Temporality and Reclaimed History in Chimamanda Ngozi Adichie's" The Headstrong
Historian". African Studies Quarterly, v. 15, n. 4, 2015. SOUZA, Lucas Sampaio Costa. Reescrita do
passado e conhecimento histórico na ficção contemporânea'A historiadora obstinada', de
Chimamanda Ngozi Adichie. Mosaico, v. 13, n. 20, 2021, p. 408-425. WAINAINA, Binyavanga. ‘How
to Write About Africa’. Granta. Disponível em: <https://granta.com/how-to-write-about-africa/>
Acesso em: 07 jan. 2023.
827
Referências: CHESTERMAN, A. Memes da tradução: o disseminar de ideias na teoria da tradução.
Traduzido por Monique Pfau, Fernanda Costa, Marília Portela, Marília Santana, Nathalia Amaya
Borges, Simone Salles. Salvador: EDUFBA, 2022. LEITE, Ana Mafalda; BERGAMO, Edvaldo A.;
BRUGIONI, Elena; CANEDO, Rogério (Orgs.). O romance africano: tensões, conexões, tradições.
Goiânia: Cegraf UFG, 2022. SPIVAK, Gayatri C. Death of a Discipline. New York: Columbia University
Press, 2003. TETTAMANZY, A. L. L.; SANTOS, C. M. dos (Orgs.). Lugares de fala, lugares de escuta nas
literaturas africanas, ameríndias e brasileira. Porto Alegre: Editora Zouk, 2018. VENUTI, L. A
invisibilidade do tradutor. Traduzido por Valéria Biondo, Laureano Pellegrin, Lucinéia Marcelino
Villela, Marileide Dias Esqueda. São Paulo: Editora UNESP, 2021. WALSH, C. Interculturalidade crítica
e pedagogia decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação
intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7Letras,
2009. WATSON, J. The Other Me. Cape Town: Karavan Press, 2022.
828
y la materialidad para tramitar los llakis o recuerdos penosos (Theidon, 2009) y los duelos del pasado
reciente (Jelin, 2002; Pino, 2017). Así, complejiza los procesos de mediación entre oralidad y
escritura, a los que estamos habituados en el abordaje de los testimonios canónicos, al incorporar la
imagen. En Yuyanapaq, la imagen aprovecha ese resquicio que queda en la traducción, por medio de
la cual la comisión recolecta, edita y transcribe los relatos de las víctimas. Las fotografías hablan del
dolor en aquello que se escapa de lo lingüístico; configuran de esta forma una retórica de la imagen
y, junto con ella, una retórica del dolor para capturar el discurso “chillón” (Agnoli Quispe, 2016),
testimoniar los vejámenes sufridos y tramitar las memorias recientes. Decimos “memorias” en plural
porque, en este caso, la fotografía forma parte tanto del archivo como del repertorio (Taylor, 2015),
es documento y es muestra, conforma memoria letrada y corpórea, lo que me permite proponer la
noción de testimonio performático, heterogéneo y migrante (Cornejo Polar, 1980 y 1996;
Campuzano, 2020 y 2021). El testimonio visual como un retablo, entre los cajones que lo componen,
dibuja un llaqta maqta o canto para reponerse y seguir viviendo luego del dolor.
Referências: CAMPUZANO, BETINA. (2020). Testimonios y retablos: cajas migrantes, urgencia
narrativa y espacio andino. Una lectura de Chungui. Violencia y trazos de memoria de Edilberto
Jiménez. Zama n°12 (12): 71-88. CAMPUZANO, BETINA. (2021). Cuando el monte escucha: una
historia gráfica sobre las heridas en la comunidad wichí. Sobre Hätäy (2021), de Luis Colque, Lourdes
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Latinoamericanos Vol. 8, n°10, Buenos Aires: 79-103. COMISIÓN DE LA VERDAD Y LA
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comunidades e identidades. Madrid: Siglo XXI. PINO, PONCIANO. (2017). En el nombre del gobierno.
El Perú y Uchuraccay: un siglo de política campesina. Lima: La Siniestra Ensayos, Universidad Nacional
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de Chile: Ediciones Universidad Alberto Hurtado. THEIDON, KIMBERLY, (2009) [2004]. Entre prójimos.
El conflicto armado interno y la política de la reconciliación en el Perú. Lima: Instituto de Estudios
Peruanos.
829
de las Tijeras ayacuchana se ha trasladado hasta Lima, acompañando aquellos que la practican, al
mismo tiempo en que presentaré mi experiencia de formación como Warmi Danzaq y los retos
enfrentados con el fin de alcanzar un cuerpo transformador en danza.
Referências: ARGUEDAS, José María. “La agoñia de Rasu-Ñiti”. In: José María Arguedas Obras
Completas. Tomo II. Lima: Editorial Horizonte, 1964. CAYO, Amiel. Willka Nina. El hijo del Wamani.
Lima: Editorial San Marcos, 2015. CORNEJO POLAR, Antonio. Una heterogeneidad no dialética: sujeto
y discurso migrantes en el Perú Moderno. IN: Revista Iberoamericana. Vol. LXII, n° 176-177. Julio-
diciembre, 1996, p. 837-844. MILLONES, Luis. “Un movimiento nativista del siglo XVI – El Taki Onqoy”.
In: OSSIO, Juan. Ideología Mesiánica del Mundo Andino. Lima: Colección Biblioteca de Antropología,
1973. p. 85-94. MILLONES, Luis. “Nuevos Aspectos del Taki Onqoy. In: OSSIO, Juan. Ideología
Mesiánica del Mundo Andino. Lima: Colección Biblioteca de Antropología, 1973. P. 95-101.
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Salvador de Jujuy. FHYCS-UNJU. Edición electrónica:
http://www.fhycs.unju.edu.ar/documents/publicaciones/revistas/jornales4/REVISTA-
JORNALER@S-4.pdf Noriega, J. (2012) Caminan los Apus. Escritura andina en migración, Lima:
Pakarina ediciones. Rivera Cusicanqui, Silvia (2015) Sociología de la imagen. Miradas ch’ixi desde la
historia andina. Buenos Aires: Tinta Limón. Rubinelli, M. L. (2011). Los relatos populares andinos:
expresión de conflictos. Río Cuarto. Ediciones del ICALA. Rubinelli, María Luisa (2016) Entre
condenados, ucumares y gualichados. Relatos andinos tradicionales. Jujuy, Argentina: EDIUNJU.
Scott, J. C. (2004). Los dominados y el arte de la resistencia. Discursos ocultos. México: Ediciones Era.
O REAL COMO SEMBLANTE: UMA LEITURA COMPARATIVA ENTRE EN OCTUBRE NO HAY MILAGROS
E O BALCÃO
Lara Mucci Poenaru
Resumo: O romance En Octubre no hay milagros (1965) de Oswaldo Reynoso apresenta a procissão
religiosa peruana como uma performance. Como simulacro, seu caráter divino é colocado em mesmo
plano que as ações profanas e se aproxima da obra dramática de Jean Genet, O Balcão (1968).
Dessarte, propõe-se pensar como a paixão pelo real (BADIOU, 2017) se entrelaça no romance e na
peça sob o viés do escândalo, da “operação teatral”, na qual a representação dos conflitos sociais é
levantada através de montagens, e do distanciamento brechtiano, ao provocar estranheza diante de
situações e ações apresentadas como normais. Sob este prisma, observa-se um movimento dialético
na carnavalização experienciada em ambas as produções; a liberdade é alcançada ao retirar as
máscaras sociais que a tradição impõe para que não se atente contra a lei, ao mesmo tempo em que
se alcança o gozo com o fetiche de se fantasiar de outrem. Desvelar-se dos disfarces forjados e
travestir-se são faces da mesma moeda. Essa dicotomia complexifica a própria noção de real. A
realidade, portanto, não pode ser compreendida como aquilo que sobra quando se caem as
máscaras da representação, uma vez que elas próprias são semblantes e são também parte do real,
e nisso reside o caráter ambivalente da experiência humana. Pode-se afirmar que as obras
conseguem captar imediatamente o fenômeno da fetichização com a imagem do real violento, que
irá se consolidar nas décadas seguintes. Conclui-se que, na radicalização de seus realismos, são bem
sucedidas ao abordar a temática da violência urbana com procedimentos formais que forjam a
representação audiovisual na prosa, de forma a alcançar o efeito da espetacularização da violência
de uma maneira particular e inaugural. O choque sentido pelos seus leitores imediatos é o mesmo
que será aplacado com a multiplicação exponencial das imagens violentas pela grande mídia.
Referências: BADIOU, Alain. Em busca do real perdido. Belo Horizonte: Autêntica, 2017. FOSTER, Hal.
O retorno do real. São Paulo: Ubu Editora, 2017. GENET, Jean. O Balcão. São Paulo: Abril Cultural,
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sobre o 11 de setembro e datas relacionadas. São Paulo: Boitempo Editorial, 2020.
831
SILENCIAMENTO, VESTÍGIO E MEMÓRIA DOS CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO NO BRASIL
Anairan Jeronimo da Silva
Resumo: O passado de fome e de morte que acometeu o Nordeste em períodos severos de seca,
como o ocorrido no ano 1932, marcaram a história do Brasil como nuvem turva que ainda não se
dissipou. A era Vargas empreendeu um esforço orquestrado e sistemático de contenção e
higienização dessas vítimas, confinadas nos chamados “currais humanos”; os oito Campos de
Concentração que o estado brasileiro implementou no Ceará em 1932, locais para onde os retirantes
famintos eram destinados. Porém, há elementos desse passado ainda escondidos entre montanhas
de terra seca e gritos abafados, sobre os quais incidiram esforços estatais de silenciamento e
apagamento. Fotografias, notícias de jornais, documentos, registros; tudo foi sendo entocado e
amordaçado, tal como as vítimas fatais desses Campos. Este trabalho, parte de um estudo de tese
em andamento, visa discutir sobre os caminhos encontrados pela arte, como forma de testemunhar
e resistir ao apagamento da memória dos campos de concentração, fazendo ecoar no cinema, a voz
dos que foram mortos pelo regime autoritário de Vargas e os vestígios de um trauma histórico. Para
tanto, analisamos o atravessamento entre ficção e realidade, narrados por Sabina Colares e David
Aguiar, em seu drama-documentário Currais (2019). Falaremos sobre a fotografia, as metáforas, as
personagens e as imagens do repertório estético, político e mnemônico da obra fílmica em questão;
uma narrativa forjada entre performances, atuações, relatos de sobreviventes e outras testemunhas
dos Campos. O suporte teórico para este recorte é baseado autores como Sarmento-Pantoja (2018),
Ranciére (2009; 2012) e Sarlo (2007).
Referências: CURRAIS. Dir. Sabina Colares; David Aguiar. Além mar filmes. 90min RANCIÉRE, J. O
inconsciente estético. São Paulo: Ed. 34, 2009. RANCIÉRE, J. O destino das imagens. Trad. Mônica
Costa Netto. Org. Tadeu Capistrano. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012. SARLO, B. Tempo passado:
cultura da memória e guinada subjetiva. Trad. Rosa Freire Aguiar. São Paulo: COmpanhia das LEtras;
Belo Horizonte: UFMA, 2007. SARMENTO-PANTOJA, A. Quando resistir não basta... In: Revista
Moara. 44ª Ed. 2015.
“EL EXILIO ES UN RÍO CIEGO”: DOR E MEMÓRIA EM ESTADO DE EXILIO, DE CRISTINA PERI ROSSI
Anita Rivera Guerra
Resumo: Há exatos 50 anos, em 1973, a uruguaia Cristina Peri Rossi escreveu os poemas que
compõem o livro Estado de exilio, publicado apenas em 2003. O poemário, nascido da dor e da
angústia do exílio ao qual foi forçada se submeter às vésperas do início da ditadura militar no
Uruguai, funciona como uma espécie de colagem/montagem da experiência do exílio, navegando
entre cidades, memórias e o tempo presente de forma a criar um continuum entre corporalidade e
subjetividade através do qual se navega, como em um “rio cego”. A dor é ao mesmo tempo aguda –
“Tengo un dolor aqui, / del lado de la patria” (ROSSI, 2005) – e latente, como no poema em que a
voz poética narra a viagem do exílio como um sonho e se pergunta, ao final, se “existió alguna vez
una ciudad llamada Montevideo” (ROSSI, 2005). A partir dessas navegações entre dor e memória,
realidade e apagamento, e permanência e trânsito, proponho realizar uma leitura de Estado de exilio
que explicite o caráter espiralar da experiência do exílio – e da experiência da escrita – não apenas
na obra dessa autora ainda pouco estudada no Brasil e no mundo, mas também em outras literaturas
latino-americanas que trabalhem o deslocamento político forçado durante as décadas de 1960 e
1970.
Referências: ROSSI, Cristina Peri. Poesia completa. Barcelona: Lumen, 2005.
832
1976 - durante o período ditatorial brasileiro - a narrativa, que fundamentalmente se ocupa do ato
de ler, caracterizando-se como uma obra metaficcional, aborda inúmeros temas relevantes aos
estudos literários, destacando-se aqui, dentre eles, a denúncia de arbitrariedades e injustiças que
compõem uma política de opressão. A loucura de Maria de França põe a descoberto a loucura
institucionalizada pelos órgãos do Governo, cujas ações carecem de um grau mínimo de
razoabilidade. Em termos teóricos, relaciono esses traços de negligência governamental com as
reflexões de Hannah Arendt, quando expõe aspectos do obscurecimento da política, em obras, tais
como: Origens do Totalitarismo (2000) e A Condição Humana (2018), e com o conceito de vida nua,
desenvolvido por Giorgio Agamben, na obra Homo Sacer: O Poder Soberano e a Vida Nua I (2010).
Demarco ainda, a interrelação entre política e estética a partir do elemento comum de
pertencimento a dimensão pública que Jacques Rancière elabora em sua teoria sobre a partilha do
sensível, concepção basilar de toda sua obra, a qual nomina inclusive um de seus livros, com título
homônimo a essa expressão (2005).
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer: o poder soberano e a vida nua I. Tradução de Henrique
Brigo. 2. ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução
de Roberto Raposo, revisão técnica e apresentação Adriano Correia. 13. ed. rev. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2018. ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. Tradução de Roberto
Raposo. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. LINS, Osman. A rainha dos cárceres da Grécia. São
Paulo: Companhia das Letras, 2005. RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível: estética e política.
Tradução de Mônica Costa Netto. São Paulo: Editora 34, 2005.
833
Resumo: O Brasil, desde seu perverso batismo cristão, é um território marcado e remarcado por
ferros em brasas. Brasas que imprimiram nesse corpo-nação um sinal de ignomínia estigma ou labéu,
do qual ainda não foi capaz de se desprender, ou desvencilhar-se. Visto que é um corpo-nação
marcado pela falta, que continua a sangrar, pois ainda se esquiva da pergunta que lateja em suas
histórias: Pode haver perdão sem que se possa acusar alguém, presumi-lo como seu autor verdadeiro
ou declará-lo culpado? É deste questionamento que surge esta tessitura crítica, que discute porque
no contexto brasileiro "O perdão [é] difícil”, a partir de narrativas que ecoam as memórias soterradas
por um pensamento colonial que continua a reverberar neste solo. Guiados por esse objetivo,
problematiza-se de que maneira as narrativas de Gótico Nordestino (2022), de Cristhiano Aguiar,
assumem um posicionamento decolonial ao reivindicarem a profundidade da fala de memórias
historicamente apagadas como condição sine qua non para que o perdão seja alcançado. Uma vez
que esta obra mergulha nos elementos góticos e folclóricos para criar histórias que vão desde os
tempos do cangaço, passando pela ditadura militar e chegando até ecos sombrios de um futuro
assentado em um mesmo silenciamento. Nesse sentido, o percurso investigativo que se pretende
lançar é orientado por um fazer crítico que não busca ser apenas um discurso sobre um passado
ditatorial, ou sombrio, tratando-o como algo finito, mas abordá-lo por meio de uma reflexão na qual
memória, corpo e linguagem se atravessam no tempo presente. Para tanto, parte de uma reflexão
permeada por categorias de pensamento, como memória e rastro, de Paul Ricoeur, assinatura, de
Jacques Derrida, contemporâneo, de Giorgio Agamben, paisagem, de Michel Collot, arte
transmoderna, de Enrique Dussel, e partilha do sensível, de Jacques Rancière.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Tradução Vinícius
Nicastro Honesko. Chapecó: Argos, 2009. 91 páginas. ISBN 978-85- 7897-005-5. AGAMBEN, Giorgio.
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crítico y matriz (de)colonial. Reflexiones latinoamericanas. Quito: Ediciones Abya-yala, 2005. p. 13-
35.
835
outros e outras protagonistas. Ou seja, testemunho menor, aqui, é pensando com as autoras, como
uma narrativa marginal, duplamente desviante, e situa-se como enunciação coletiva, uma escrita
moldada a um espaço-tempo. Convém ressaltarmos que as narrativas acima são produzidas por
mulheres sobreviventes, que estiveram e ainda estão em situação de exílio, que
(des)territorializaram seus testemunhos em contextos singulares, tanto geográfico quando gráfico,
ou seja, apresentam uma escrita exilada tanto física quanto em sua expressão, demonstrando a
singularidade e a multiplicidade de perspectivas de narrativas exiladas.
Referências: DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Kafka: por uma literatura menor. Tradução de Cíntia
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Bohemia, 2006. STREJILEVICH, Nora. Una sola muerte numerosa. Córdoba, AR: Alción Editora, 2006.
836
Resumo: Há 50 anos, no Brasil, em 1973, o escritor pernambucano Osman Lins publicou o romance
Avalovara, pela editora Melhoramentos. O enredo principal da obra se dá a partir da vida de Abel, o
protagonista, e três mulheres com quem ele se envolve romanticamente. A narrativa extrapola o que
podemos chamar de compreensão simples e desafia o leitor a atravessar o texto, enredar-se na
poética, deixando de lado a leitura comum e empreender o desvendamento tanto da própria
narrativa – cronologicamente e psicologicamente, quanto da arquitetura textual. Tal ideia se
confirma com Antonio Candido na apresentação que escreveu para Avalovara, quando diz: “O que
desde logo prende em Avalovara é a poderosa coexistência da deliberação e da fantasia, do calculado
e do imprevisto, tanto no plano quanto na execução de cada parte” (1973, p. 9). O engenho de
Osman Lins de fato coaduna tais elementos e exerce legítimo entendimento de que o feito – escrita
e lançamento – congregam sua atitude corajosa diante das trincheiras ideológicas de várias ordens
posicionamento político, crítica literária, em plena ditadura civil militar brasileira (1964-1981). Nesta
comunicação, pretendo retomar três instâncias de análise, imbuída da responsabilidade de
apresentar Avalovara como uma obra que merece conhecimento e reconhecimento no panorama
literário latino-americano, a saber: a crítica osmaniana; a ensaística do autor sobre a crítica literária
e registros de seu bravo posicionamento público mesmo com a consciência do opressor à espreita,
em entrevistas publicadas.
Referências: CANDIDO, Antonio. “A espiral e o quadrado”. In LINS, Osman. Avalovara, São Paulo:
Melhoramentos, 1973. LINS, Osman. Avalovara. 2 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1973. LINS,
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e o filho do padeiro: memórias imaginadas. São Paulo: Cosac Naify, 2014. BOSI, Alfredo. Narrativa e
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Teatro e política, Arena Oficina e Opinião. São Paulo: Annablume, 2016.
838
ótica de filhos de exilados das ditaduras latino-americanas, “herdeiros do exílio” que inauguram uma
nova perspectiva sobre a representação dos anos sob o regime autoritário. Partindo da leitura de
Mar azul, de Paloma Vidal e A resistência, de Julián Fuks, este trabalho busca analisar os mecanismos
estéticos desenvolvidos pelos autores na construção de representações sobre a temática, apontando
aproximações e diferenças entre eles. Para isso, considero a tensão entre o real e o ficcional
engendrada pelos textos, construída tanto pela trajetória pessoal de cada um, ambos filhos de pais
argentinos exilados no Brasil, quanto pelos mecanismos de criação de uma linguagem própria, cuja
escrita, embora imersa em um contexto histórico-político específico, não prescinde da centralidade
do texto como espaço criativo. Somando a suas trajetórias de ficcionistas o ofício de críticos
literários, Vidal e Fuks desenvolvem narrativas que funcionam como exercícios ficcionais, pautadas
em leituras de um legado e na reflexão sobre o fazer literário. A partir desse desdobramento de
ficcionistas a pesquisadores, analiso questões como exílio, deslocamento, memória e identidade,
presentes em seus romances e críticas acadêmicas e que colaboram para a construção de um projeto
político e literário no contexto da literatura brasileira contemporânea.
Referências: DALCASTAGNÈ, Regina. O espaço da dor: o regime de 64 no romance brasileiro. Brasília:
Editora UNB, 1996. FUKS, Julián. A resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. FUKS, Julián.
Romance: História de uma ideia. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. FUKS, Julián. “A era da pós-
ficção: notas sobre a insuficiência da fabulação no romance contemporâneo” in SAFATLE, Vladimir
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escrever esquecer. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2009. KRISTEVA, Julia. Estrangeiros para nós mesmos.
Tradução de Maria Carlota Carvalho Gomes. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. LUKÁCS, Georg. A teoria do
romance: um ensaio histórico-filosófico sobre as formas da grande épica. Trad. José Marcos Mariani
de Macedo. São Paulo: Duas Cidades; Editora 34, 2012. SARLO, Beatriz. Tempo passado: cultura da
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sentido, narrar o vivido é testemunhar do próprio ponto de vista sobre um evento histórico, como
faz Wanda; seria então ir contra um discurso de unicidade nacional, por ser um modo de contestar
o discurso oficial, porque este último promove o esquecimento e o apagamento de memórias que
narram o evento do ponto de vista de quem viveu ou viu a história passar diante dos próprios olhos.
Abordaremos aqui a literatura do testemunho por se tratar da narração de memórias traumáticas
(Sarmento-Pantoja, Seligman-Silva); Conceitos de memória individual e coletiva (Halbwach); a
compreensão do medo como paixão, dimensão do discurso e como componente do percurso
gerativo de sentido pela teoria da Semiótica francesa (Greimas; Fontanille; Barros; Bertrand).
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contexto, a poesia de Arminé Arjona ecoa como um grito de clamor por justiça e pelo fim da violência
contra a mulher. Sua lírica pode ser considerada uma performance feminista que estimula a comoção
e o respeito às vítimas, ao questionar as narrativas oficiais dos casos inconclusos e da falta de punição
para os culpados.
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847
OS SERTÕES NOSSO DE CADA LEITOR(A): DESMONTAGEM LITERÁRIA COMO RESISTÊNCIA
CRIATIVA
Elisabeth Silva de Almeida Amorim
Resumo: Na sociedade atual constantemente conectada, a promoção da leitura literária na educação
básica é questão da sobrevivência do sujeito de criação, meio às tecnologias digitais com leituras
dinâmicas e imagéticas através de textos curtos, frutos das desmontagens do literário. Espalhar
literatura em espaços não formais como canal no you tube faz com que a indicação do romance Os
sertões, de Euclides da Cunha (1902), fragmentado nos manuais didáticos de Língua Portuguesa,
Ensino Médio, não pereça, afinal a literatura precisa existir dentro e fora do manual didático para
resistir as tentativas de apagamentos. O romance em questão mostra vidas sertanejas ceifadas numa
guerra insana ocorrida em Canudos, na Bahia, no final do século XIX, tema oportuno para conhecer
a nossa história pelo viés literário. O objetivo é investigar como Os sertões é desmontado nos
manuais didáticos como uma ação política e criativa do sujeito. A proposta instiga-nos ir além da
formação do leitor ou da leitora, mas registrar a transformação de um sujeito criativo que utiliza
linhas de fugas por intermédio do desconstrutivismo (DERRIDA, 2014) e da abordagem
intersemiótica( BARTHES, 2012) para proporcionar diálogos entre literatura e outros signos. Os
sertões nosso de cada leitor(a) se ajusta e desajusta nas mãos criativas do sujeito de criação, assim,
Os sertões narrados por Euclides da Cunha ganhou olhares de Aleilton Fonseca, Antônio Torres e
Antônio Olavo em defesa dos subalternizados, em consonância com olhares transgressores nas mãos
poéticas de Jailma dos Santos Pedreira Moreira, Lícia Soares de Souza, Iraci Simões da Rocha e Léa
Costa Santana Dias, afinal a cada leitura com a marca sertaneja move uma série de desleituras.
Referências: AMORIM, Elisabeth S.A. Desmontagem literária na educação básica: modos de criar,
modos de combater e anular dispositivos de poder. Novas Edições Acadêmicas – Omni Scriptum
GmbH & Co.KG: Saarbrucken/Niemcy – Alemanha, 2016. BARTHES, Roland. Aula: aula inaugural da
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Resumo: A poética do chão e os sujeitos subalternos em Manoel de Barros e Ondjaki Profa. Érika dos
Santos Ferreira Gomes SEED-RR Profa. Dra. Rosidelma Pereira Fraga (PPGLUFRR)
(erikaferreira31@yahoo.com). O presente ensaio explora a poesia de Manoel de Barros em diálogo
com a poética de Ondjaki. Busca-se mostrar possíveis diálogos entre os procedimentos de linguagem
adotados pelo escritor angolano e pelo poeta brasileiro. Objetiva-se desvelar o entranhado
metalinguístico; a reflexão sobre o sujeito subalterno e a fixação pelo telúrico. A proposta volta-se
para a linguagem utilizada nas obras no tocante à análise da imagem poética, da intertextualidade e
também das nuances da memória dentro dos textos. A metodologia consistirá na pesquisa
bibliográfica de material teórico/crítico, leitura das narrativas pré-selecionadas e do suporte teórico.
É importante ressaltar, que nesta pesquisa utilizaremos como base teórica Aleida Asmann (2011),
Ecléa Bosi (1979), Spivak(2010), bem como, ensaios críticos sobre a temática; proposições filosóficas
e/ou psicológicas sobre memória e linguagem. Diante disso, busca-se responder à seguinte questão:
1- como o telúrico e os sujeitos subalternos são retratados nas obras?. Para comparar as figuras
minoritárias bem como a linguagem utilizada nas obras e responder a pergunta, realizou-se um
recorte de poemas dos livros Gramática expositiva do chão (1989), Livro de pré-coisas e Livro sobre
nada de Manoel de Barros (2010) e das obras Há prendisajens com o xão e Os transparentes de
Ondjaki (2002; 2012).
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criativos, livres e solidários, capazes de repensarem, a todo tempo, a invenção de si e de um mundo,
de fato, mais humano, mais justo/equitativo e autossustentável. Portanto, esperamos, com tal
comunicação, compartilhar reflexões e convocar a todos para este debate, de modo que possamos
perceber o que está por trás dessa educação militarizada e do seu processo de disciplinarização, o
que se perde e o que se reforça com isso.
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Monte Alto. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
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dizeres de bell hooks (2017), María Lugones (2020), Heleieth Safiotti (2013) para discutirmos sobre
gênero; Maurice Halbwchs (1990) para discutirmos sobre a “Memória”; Reinaldo Marques (2016)
para tratarmos sobre o Arquivo, e outros autores como Gayatri Chakravorty Spivak (2010) que
circundam teoricamente nossa abordagem; Félix Guatarri e Suely Rolnik (1996) para discutirmos a
subjetividade encarcerada em uma Micropolítica.
Referências: GUATARRI, Félix; ROLNIK, Suely. Subjetividade e história. In: GUATARRI, Félix; ROLNIK,
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definição. Rio de Janeiro: UFRJ, Instituto de Psicologia.
855
enlace entre a composição narrativa e a memória que está nas mãos do artista, que cumprirá, ou
não, um acorde entre texto e leitor. Nesse enlace, habita o rememorar, sempre pronto a se repetir
num contínuo de movência em poesia, memória, esquecimento, como processo de recriação. Neste
ensejo trazemos à baila a romancista Lindanor Celina (1927-2003), uma das representantes da
literatura feminina da Amazônia, autora de 7 Romances, 4 livros de Crônicas, 2 peças de teatro,
Símbolo, livro de poemas e suas crônicas publicadas na sua coluna Minarete, no jornal Folha do Norte
no período de 1954-1973, crônicas essas, que nos provocam a debruçar em estudos sobre a escritura
de Lindanor Celina. Nesse percurso, a possibilidade de olhar o texto como um corpo híbrido trazido
por Silviano Santigo (2008), em que ele se propõe a falar sobre sua escritura e relação com
“experiência, memória, sinceridade e da verdade poética”. Nos provoca refletir como a escritura
desta mulher estaria em um momento na história, experiência e memória como força criadora que
sugere o texto autoficcional, ou seja, de uma memória que atravessa a ficção e irriga a criação,
revisitada pelas crônicas da autora em busca de uma análise literária comparativa com seus
romances, um texto híbrido que traz o estatuto do vivido, na recriação ficcional na artesania
narrativa.
Referências: BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história
da cultura. Tradução: Sérgio Paulo Rouanet; 7ª edição – São Paulo, Brasiliense, 1994. BENJAMIN,
Walter. Rua de Mão única – Obras escolhidas, vol. II. Tradução: Rubens Rodrigues Torres e Filho; José
Carlos Martins Barbosa. Editora Brasiliense, 1987. CELINA, Lindanor. Pranto por Dalcídio - memórias.
Belém, SEDECT, Falângola, 1983. FERREIRA, Jerusa. Armadilhas da Memória e outros ensaios. Ateliê
Editorial, São Paulo, 2003. SANTIAGO, Silviano. Meditação sobre o ofício de criar. Aletria, v.18,
jul.dez, 2008.
856
as mulheres indígenas, até bem recentemente, foram contadas quase que exclusivamente por
homens não-indígenas. Para tanto, tem-se como referencial teórico-epistemológico a vertente
crítica feminista decolonial, principalmente as reflexões arroladas por pensadores/as como
Chimamanda Nigozi Adichie (2019), Heloisa Buarque de Hollanda (2018), Gloria Anzaldúa (2000),
Graça Graúna (2013) e Maria Lugones (2020). Sob esse olhar teórico, delineia-se uma pesquisa de
cunho bibliográfico e qualitativo (LAKATOS; MARCONI, 2003), materializada em um estudo analítico
e sistemático do referido livro de Potiguara, em que se examina, a partir das narrativas contidas na
obra, o que as experiências da mulher indígena têm compartilhado em forma de literatura escrita.
Afinal, como produtos da linguagem, as narrativas são também construções que produzem efeitos
concretos sobre a vida social. Dessa forma, compreende-se que tal produção literária configura-se
como uma forma de (re)existência aos regimes de poder/verdade (FOUCAULT, 2003) hegemônicos,
posto que a autora, mediante suas (auto)representações, desconstrói pressupostos eurocêntricos
que, por muito tempo, regularizaram um único ponto de vista a respeito das narrativas relacionados
às experiências da mulher indígena.
Referências: ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. Tradução Julia Romeu -
1° ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. ANZALDÚA, Gloria. Queer(izar) a escrita – Loca,
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Boaventura de. Epistemologias do Sul. GRÁFICA DE COIMBRA, Coimbra: 2009. SOUSA. Boaventura
de. Epistemologias do Sul. GRÁFICA DE COIMBRA, Coimbra: 2009.
858
sentido realizados por meio da metáfora intertextual ensinada pelo crítico João Alexandre Barbosa
(2005). Sob esse prisma, ampara-se Julia Kristeva (1979) e Sandra Nitrini (1997) que ajudam a pensar
no método de literatura comparada e as tessituras intertextuais de um autor por outro. Pensa-se em
uma literatura de contato transnacional como lemos especialmente no que diz Zila Bernd (2013) em
Afrontando fronteiras da literatura comparada. Tomando como base tal enfoque de literatura
comparada, busca-se responder à seguinte questão: como a intertextualidade temática é processada
nas obras? Para comparar essas figuras minoritárias e responder a tal pergunta, realizou-se um
recorte de poemas das obras Livro de pré-coisas e Livro sobre nada de Manoel de Barros (2010) e o
conto “O mendigo Sexta-Feira jogando no Mundial”, da obra O fio das missangas e O embondeiro
que sonhava pássaros de Mia Couto (2003).
Referências: BARBOSA, João Alexandre. A metáfora crítica. São Paulo: Duas Cidades, 2005. BOSI,
Alfredo. O ser e o tempo na poesia. 11. ed. São Paulo: Cultrix, 1983. BARROS, Manoel de. Livro de
pré-coisas: roteiro para uma excursão poética no Pantanal. Rio de Janeiro: Record, 1985. _______.
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KRISTEVA, Julia. Introdução à semanálise. Trad. Lúcia Helena F. Ferraz. São Paulo: Perspectiva, 1979.
NITRINI, Sandra. Literatura comparada: história, teoria e crítica. São Paulo: Edusp, 1997. PERRONE-
MOISÉS, Leila. Flores da escrivaninha: ensaios. São Paulo: Cia das Letras, 1990. SPIVAK, Gayatri
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falar?. Tradução de Sandra Regina Goulart Almeida, Marcos Pereira Feitosa, André Pereira Feitosa.
Belo Horizonte. Editora UFMG, 2010. 133
861
A MULHER DE ALEDUMA (1981): RESISTÊNCIA E REEXISTÊNCIA
Daniela dos Santos Damasceno
Resumo: A literatura, no caso em sua especificidade de autoria negra, pode propiciar a (re)
apropriação de um território cultural, sendo possível reverter valores, criar personagens dando-lhe
características, espaço/tempo a partir de uma ótica particular. Assim, o texto literário, enquanto
construção de sentido pode nos possibilitar repensar representações sociais, redimensionar nosso
olhar sobre o espaço social e questionar imagens, na medida em que atualizam signos-lembranças
que inserem o corpo negro numa cultura específica, desmitificando, por exemplo, estereótipos e
mitos sobre o negro e seu espaço, reproduzidos por sua vez nas diversas mídias e também na
literatura. Uma dessas vozes é a voz de Aline França, escritora negra baiana. Os seus textos ficcionais
residem em um protagonismo feminino (frequente), negro e baiano Nessa pesquisa, propomos
analisar o romance A mulher de Aleduma (1981), mais especificamente investigar os modos de
reelaboração da presença do negro e da mulher negra. A partir desse contexto, buscamos respostas
para as seguintes questões: Como os negros são apresentados e representados no romance? De que
forma os seus escritos podem avultar reflexões acerca das tradições e culturas negras? Com relação
ao percurso metodológico, realizamos na primeira etapa pesquisa bibliográfica, mas a proposta de
pesquisa se concentrou na análise do romance A mulher de Aleduma (1981). Portanto, a obra citada,
em si, constitui o cenário da pesquisa, pois é por esse suporte que o pesquisador tem acesso às
possibilidades de interlocução e interpretação. Ademais, Aline França enquanto escritora negra
baiana, e os personagens negros da narrativa, e os diferentes espaços e imagens presentes na obra
constituem-se como os principais sujeitos da pesquisa.
Referências: FRANÇA, Aline. A mulher de Aleduma. Salvador: Clarindo Silva e Cia. Ltda., Tipografia
São Judas Tadeu, 1981, 1 ed; Salvador: Ianamá, 1985, 2 ed. (ambas esgotadas). HOOKS, Bell.
Intelectuais negras. Estudos feministas, Florianópolis, v. 3, n.2, p. 464-478, ago./dez. 1995.
SANTIAGO, Ana Rita. Vozes literárias de escritoras negras. Cruz das Almas-Ba, editora UFRB, 2012.
862
Joranaide Alves Ramos, Sávio Roberto Fonseca de Freitas
Resumo: A literatura moçambicana é um lugar de resistência contra a máquina colonial e as práticas
neocolonias porque, ligada aos seus contextos histórico, político e social, inscreve sua luta
anticolonial, contribuindo para a defesa da cultura nacional, representando a sua história por sua
própria ótica, reavendo seus bens simbólicos tomados pelo colonizador. Nesse ambiente, idealiza-se
e mantém-se o projeto de moçambicanidade, uma atitude histórica, política e cultural de resistência
aos colonialismos que atravessam Moçambique. Destaca-se, nesse contexto, a poesia feita por
Noémia de Sousa e por Deusa D’África que, quando falam em nome de sua comunidade, parecem
convocá-la para retomar sua terra, seus corpos e sua voz, aqui entendidos como territórios de r-
existências, colaborando política e poeticamente com o projeto de moçambicanidade. Refletindo
sobre isso, o objetivo desta comunicação é analisar como terra, corpo e voz são territórios de r-
existências para povos subalternizados, como o africano, a partir da leitura de Sangue Negro, de
Noémia de Sousa, e de A voz das minhas entranhas, de Deusa D’África, bem como a colaboração
destas obras para com o projeto de moçambicanidade. Para tanto, realizamos um estudo
exploratório, bibliográfico e qualitativo, baseado em Haesbaert (2021), Secco (2016), Kilomba (2019),
Ribeiro (2017), Noa (2016), Mendonça (2016), entre outros. A partir da análise das categorias
elencadas, percebe-se que a poesia de Noémia de Sousa e a poesia de Deusa D’África são
instrumentos importantes para potencialização do referido projeto. Essas poetas, através de um tom
coletivo e vigoroso, convocam seu povo para lutar por liberdade, criando imagens poéticas que
revelam memórias e ancestralidades africanas.
Referências: BALLESTRIN, Luciana. América Latina e o giro decolonial. In: Revista Brasileira de Ciência
Política. n.11. Brasília, 2013, p. 89-117. CHIZIANE, Paulina. O canto do futuro. In: A voz das minhas
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Noémia de Sousa: Poesia combate em Moçambique. In: Cadernos Imbondeiro. João Pessoa. v.1, n.1,
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863
SOBRE UMA ÁGUIA CHAMADA MUTOLA
Sávio Roberto Fonseca de Freitas
Resumo: É nos contando mais esta estória que Paulina Chiziane nos presenteia com o conto Mutola,
o qual faz parte da coletânea de contos intitulada As Andorinhas (2013). Trazer esta mulher
transgressora para a ficção é um exercício que comprova mais uma vez o modo como Chiziane
exercita e contribui para o projeto de moçambicanidade no sentido de mostrar ao mundo que uma
nação só se territorializa identitariamente quando reconhece os grandes feitos de seu povo. Assim
como Mutola, Paulina Chiziane se supera quando faz a palavra literária transgredir na medida em
vence as páginas em branco, preenchendo-as com as estórias que migram da sua mente e tomam
forma literária. O objetivo deste estudo é analisar o conto Mutola, da escritora moçambicana Paulina
Chiziane. A ficção curta de autoria feminina moçambicana explora várias subjetividades poéticas,
uma delas é a figuração simbólica e alegórica de animais que se antropomorfizam em personagens
para melhor representar as tensões da realidade das mulheres. No conto em tela, a águia surge como
uma metáfora para resistência feminina contra o machismo patriarcal moçambicano. As análises
empreendidas foram conduzidas pela orientação crítica de (CHIZIANE: 2013, p. 12), (BOURDIEU:
2002,p.10), (ECKMAN, 2011, p.31), (ZANELLO, 2018, p.177) entre outras convocadas pelas análises
empreendidas.
Referências: BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Tradução Maria Helena Kuhner. 2ª Ed. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002 CHIZIANE, Paulina. Eu, mulher... Por uma nova visão do mundo.
Belo Horizonte: Nandyala, 2013. _________________. As andorinhas. Belo Horizonte: Nandyala,
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Angola e Moçambique. Rio de Janeiro: Quartet, 2007. ZANELLO, Valeska. Saúde mental, gênero e
dispositivos: cultura e processos de subjetivação. Curitiba: Appris, 2018.
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Literaturas africanas de expressão portuguesa. Lisboa: Biblioteca Breve; Instituto de Cultura e Língua
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moderno na literatura do século XX. São Paulo: Perspectiva, 2007. MOISÉS, Carlos Felipe. Tradição &
Ruptura: O pacto da transgressão na literatura moderna. Vila Velha, ES: Editora Opção, 2012.
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Lisboa: Caminho, 2007.
865
direita na vida social e política. No último decênio, o país vem passando por processos sociopolíticos
turbulentos, desde as jornadas de junho de 2013, o golpe jurídico-parlamentar de 2016 e a eleição
de Jair Bolsonaro, em 2018, o questionamento à democracia tem feito parte da vida pública e
privada, ou seja, passamos por um processo de desdemocratização. Segundo Pinheiro-Machado e
Freixo (2019), o bolsonarismo é caracterizado por uma visão de mundo ultraconservadora, que
assume um discurso nacionalista e crítico a tudo que pode ser identificado com o progressismo e a
esquerda, não se fixando apenas na figura de Jair Bolsonaro. Os romances analisados mostram
personagens secundários que nomeadamente, no caso de Diorama, ou implicitamente, no caso de
Solitária, assumem para si a retórica do bolsonarismo, cujas raízes são remetidas pelas duas autoras
aos tempos da ditadura militar. Além disso, a representação do tecido social esgarçado por discursos
autoritários e os usos de símbolos nacionais são destacados como sinais de como tal fenômeno se
entranhou na vida das pessoas que o defendem. Pretende-se, portanto, percorrer os caminhos dos
textos contemporâneos que oferecem uma visão literária do que vem acontecendo nos últimos anos
na nossa sociedade.
Referências: BENSIMON, Carol. Diorama. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. CRUZ, Eliana Alves.
Solitária. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. PINHEIRO-MACHADO, Rosana; FREIXO, Adriano de
(orgs.). Brasil em transe: bolsonarismo, nova direita e desdemocratização. Rio de Janeiro: Oficina
Raquel, 2019. SÜSSEKIND, Flora. Coros, contrários, massa. Recife: Cepe, 2022.
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Coletiva e Memória Individual. In: HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução de Laurent
Léon Schaffter. São Paulo: Revista dos Tribunais Ltda., 1990. p. 25-52. NIGRI, André. Esperanças no
futuro que teima em não vir. Quatro cinco um, São Paulo, 30 dez. 2022. RUFFATO, Luiz. Inferno
Provisório. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. RUFFATO, Luiz. O antigo futuro. São Paulo:
Companhia das Letras, 2022. RUFFATO, Luiz. Um deserto de estranhas veredas. Curitiba: Maralto,
2022. RUFFATO, Luiz. Em novo romance, Luiz Ruffato mostra como o Brasil 'avança para trás'.
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brasileiros no exterior, a emigração e o retorno. In: PRADO, Erlan José Peixoto do; COELHO, Renata
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867
Resumo: A historiadora Beatriz Nascimento (NASCIMENTO, 2018; RATTS, 2006) compreende o corpo
negro como um corpo-documento político e circunstrito pela memória, ao mesmo tempo em que
reivindica poder, questionando o status quo, o imaginário pré-estabelecido pela agenda colonial e
propondo suas próprias agendas (ASANTE, 2009). A partir desta categoria e considerando o Estado
da Maafa (NJERI, 2022, ANI, 1994), isto é, a experiência de desumanização radical que assola pessoas
negras em África e nas diásporas, pretende-se apontar na premiada obra Solitária de Eliana Alves
Cruz (2022) as interseções entre a memória, a história e a experiência da Maafa na construção das
protagonista-narradoras Eunice e Mabel. Importante frisar que a Maafa está para os corpos negros
africanos e afro-diáspóricos, cada um com seus atravessamentos singulares de territórios e culturas,
mas todos pautados pela necropolítica (MBEMBE, 2019) e pelo genocídio e suas facetas que vão da
morte física ao epitemicídio (SANTOS, 2009; CARNEIRO, 2005). Desta forma, interessa verificar como
esses dois corpos femininos negros de diferentes gerações documentam suas trajetória em Estado
de Maafa no Brasil e como a literatura, utilizando os Poderes Político-Poéticos da Arte (NJERI, 2020),
atua como ferramenta e anti-maafa, revelando estratégias contemporâneas de resistência,
permanência e continuidade da população afro-brasileira.
Referências: ANI, Marimba. Yurugu: An African-Centered Critique of European Cultural Thought and
Behavior. Trenton: África World Press, 1994. Disponível em:
https://estahorareall.wordpress.com/2015/08/07/dr-marimba-ani-yurugu-uma-critica-africano-
centrada-do-pensamento-e-comportamento-cultural-europeu/ ASANTE, Molefi. “Afrocentricidade:
notas sobre uma posição disciplinar”.In: NASCIMENTO, Elisa L.(Org.). Afrocentricidade - uma
abordagem epistemológica inovadora. São Paulo: Selo Negro, 2009. p. 93-110. CARNEIRO, Sueli. A
Construção do Outro como Não Ser como fundamento do Ser Sueli Carneiro. 2005. Disponível em:
https://www.passeidireto.com/arquivo/43133331/a-construcao-do-outro-como-nao-ser-como-
fundamento-do-ser-sueli-carneiro CRUZ, Eliana Alves. Solitária. São Paulo: Companhia das Letras,
2022. MBEMBE, Achille. Necropolítica. Biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte.
Trad. Renata Santini. São Paulo: n-1 edições, 2019. NASCIMENTO, Beatriz. Quilombola e intelectual.
Diáspora africana: Editora Filhos da África, 2018. NJERI, Aza. Reflexões artístico-filosóficas sobre a
humanidade negra. In.: Ítaca. Especial Filosofia Africana. n.º 36. Rio de Janeiro, UFRJ, 2020a. p. 164-
226. https://revistas.ufrj.br/index.php/Itaca/article/view/31895 RATTS, Alex. Eu sou atlântica: sobre
a trajetória de vida de Beatriz Nascimento. São Paulo: Imprensa oficial do Estado de São Paulo;
Instituto Kwanzaa, 2006. SANTOS, Boaventura S.; MENEZES, Maria Paula (Org.). Epistemologias do
Sul. Edições Almedina, 2009.
O USO POLÍTICO DA MEMÓRIA NO FILME JOSÉ CARLOS SCHWARZ, A VOZ DO POVO : RELAÇÕES
ENTRE CINEMA, LITERATURA E HISTÓRIA
Carmen Lucia Tindó Ribeiro Secco
Resumo: Pretendemos abordar o uso político da memória presente no documentário José Carlos
Schwarz, a Voz do Povo, produzido, em 2006, pelo realizador Adulai Jamanca, representante da nova
geração do cinema na Guiné-Bissau. Analisaremos a poética de José Carlos Schwarz apresentada no
filme em interlocução com outras artes: cinema, literatura, música, fotografia. Focalizaremos
relações entre memória, afeto e história. Letras de música, poemas, fotografias, canções, pequenos
vídeos, testemunhos, entrevistas, depoimentos compõem o documentário. O filme de Jamanca,
trazendo ficcionalmente esse material, ousa, assim, desadormecer memórias da história da Guiné-
Bissau e da vida do poeta-cantor José Carlos Schwarz, cujos poemas e letras de canções se
entrelaçam ao movimento da câmera que vai seguindo um jogo de percepções despertadas por
afetividades, pela captura de cenas antigas: da infância, do namoro, da juventude, da luta. O
documentário opera com memórias factuais, porém, também, com memórias pessoais e coletivas:
a casa, os amigos, a esposa, os filhos, a guerrilha, a utopia da nação guineense. Serão analisados, ao
fim e ao cabo, o olhar questionador do filme-documentário de Adulai Jamanca, a revisitação das
figuras de Amílcar Cabral e José Carlos Schwarz, a linguagem cinematográfica de Adulai Jamanca e o
papel de seu documentário no processo de narrar a nação guineense por um viés crítico, político,
pós-colonial.
868
Referências: COLLOT, Michel. Do horizonte das paisagens ao horizonte dos poetas. Tradução de Eva
Nunes Chatel. In ALVES, Ida Ferreira e FEITOSA, Márcia Manir Miguel (Orgs.). Literatura e paisagem:
perspectivas e diálogos. Niterói: EDUFF, 2010, pp. 191-218. MEDEIROS, Paulo. Spectral
potcoloniality: lusophone postcolonial film and the imaginary of the nation. In PONSANEZI, Sandra;
WALLER, Marguerrite (Orgs.). Postcolonial cinema studie. London; New York: Routledge, 2012. p.
129-142. NORA, Pierre. Les lieux de mémoire. Paris: Gallimard, 1984. RANCIÈRE, Jacques. "O
Dissenso". In: NOVAES, Adauto (Org.). A crise da razão. São Paulo; Rio de Janeiro: Companhia das
Letras; Fundação Nacional de Arte, 1996. SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. Trad. Hildergard
Fielst. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. SELIGMANN-SILVA, Márcio (org.). História, memória,
literatura: o testemunho na era das catástrofes. Campinas: Editora da UNICAMP, 2003. SOURIAU,
Étienne. A correspondência das artes: elementos de estética comparada. Trads. M. Cecília Queiroz
de Moraes Pinto e M. Helena Ribeiro da Cunha. São Paulo: Cultrix, 1983. XAVIER, Ismail. O discurso
cinematográfico. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
869
inclusive os arquivos do MPLA, termina por resgatar a memória da mãe, por meio do contato com a
personagem mamã Ju, com a qual combateu e, por via oblíqua e inconsciente, depara-se também
com as memórias angolanas. Então, do particular, individual, surge o público, o coletivo, por serem
desvelados os desdobramentos dos conflitos e contradições das fases seguintes a importantes
eventos históricos. Nesse contexto, vê-se ainda a violação dos corpos femininos como forma de
subjugação e demonstração do poder masculino durante os embates armados; a violência em suas
diversas formas: institucional, atmosférica, física, psicológica, cultural e simbólica; e, sobretudo, as
consequências do colonialismo português.
Referências: António Souza Ribeiro, Roberto Vecchi e Maurice Halbwachs.
870
literatura, assim, é via alternativa para o não esquecimento e o não silenciamento; ela posiciona o
artista como testemunha de seu tempo; funcionando ainda como produto humano, demarcado
historicamente, fonte de investigações contranegacionistas. Nesse sentido, esta comunicação
propõe a exposição e análise dos procedimentos estéticos realizados na obra Os que bebem como
cães para efeitos de representação do contexto político ditatorial no Brasil, especificamente a
condição desumanizadora a que foram submetidas as pessoas presas políticas. O trabalho é alinhado
aos estudos sobre memória, esquecimento, história e política, em diálogo com o que dizem sobre
esses temas Paul Ricoeur, Walter Benjamin, Hannah Arendt, Sigmund Freud, dentre outros.
Referências: ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. Tradução de Mauro W. Barbosa. São
Paulo: Perspectiva, 2019. BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de História. In: BENJAMIN, Walter.
Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Tradução de Sergio
Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 222-232. FREUD, Sigmund. Além do princípio do
prazer. In: FREUD, Sigmund. Obras completas: História de uma neurose infantil (“O homem dos
lobos”), Além do princípio do prazer e outros textos (1917-1920). Tradução de Paulo César de Souza.
São Paulo: Companhia das Letras, 2010a. v. 14, p. 161-239. FREUD, Sigmund. Obras completas, a
interpretação dos sonhos. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras,
2019. v. 4. RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Tradução de Alain Fraçois et al.
Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2007. SELIGMANN-SILVA, Márcio (org.). História, memória,
literatura. Campinas: Editora da Unicamp, 2003b. p. 371-385.
"QUANDO A PÁTRIA QUE TEMOS NÃO A TEMOS": UMA ANÁLISE DA TERCEIRA PARTE DO LIVRO
SEXTO, DE SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
Everson Nicolau de Almeida
Resumo: Em sua obra poética, a escritora portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-
2004) buscou estabelecer sua arte a partir da relação entre poesia e realidade, a qual, segundo a
autora, se constitui como objetivo da arte poética. Em sua obra intitulada de Livro Sexto, cuja
primeira edição foi publicada em 1962, Andresen apresenta uma poética em que o diálogo entre o
clássico e o contemporâneo se constitui a partir de alternâncias entre discursos e ideologias. Tal
recurso se evidencia na terceira parte do Livro sexto, que recebe o título de As grades, com forte tom
crítico ao regime salazarista. Esta proposta de comunicação busca analisar o recorte supracitado, a
partir da ideia de uso político da memória, pelo qual será possível estabelecer um paralelo entre os
regimes salazarista e bolsonarista, principalmente ao que tange a recorrência da ideologia fascista
reverberada na tríade “Deus, Pátria, Família”. Nesse sentido, será evidenciado o papel social e
atemporal da poesia, uma vez que as imagens propostas nos poemas constituem formas de
enfrentamento do passado que se atualiza no presente por meio da manutenção dos regimes de
poder conservadores. Além disso, a ideia de identidade nacional construída pelos discursos políticos
de vertente fascista e reformulada pela literatura, encontra na poética andreseniana uma
possibilidade de (des) construção de sentidos e de estabelecimento de novas bases para a invenção
de um mundo comum, tendo como princípio o estabelecimento de um novo olhar para a história e
para a realidade vista através das lentes da literatura.
Referências: ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner. Obra poética. Porto: Assírio & Alvim, 2015.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução: Beatriz Sidou. São Paulo: Centauro Editora,
2006. MALHEIRO, Helena. O Enigma de Sophia: da sombra à claridade. Alfragide: Oficina do Livro,
2008.
871
de catástrofes, pretendemos levantar quais os seguintes desdobramentos destas reflexões em um
contexto em que as testemunhas oculares não necessariamente desejam falar, mas são intimidadas
a fazê-lo. Dessa maneira, a comunicação com a qual se relaciona este resumo pretende analisar o
uso do testemunho nos romances A esmorga, de Eduardo Blanco Amor, e Balada da praia dos cães,
de José Cardoso Pires. Mais especificamente, a análise terá como foco as personagens de Cibrán, de
A esmorga, e Mena, em Balada, e seu lugar nas narrativas de testemunho do interrogatório policial.
Obrigados a narrar o que presenciaram, sem necessariamente terem seu relato levado em
consideração nas investigações, Cibrán e Mena, em um primeiro momento, denunciam um Estado
para o qual interessa apenas o testemunho que reforça a narrativa que deseja construir. Entretanto,
se sua voz morrerá em autos policiais descartados ou abandonados, é na ficção que encontram uma
possibilidade de reconhecimento, através do trabalho de escrita da obra ficcional, mas também pelo
próprio gesto de leitura da narrativa por parte do público.
Referências: SELLIGMAN-SILVA, Márcio. A história como trauma. In: NESTROVSKI.Arthur;
SELIGMANN-SILVA, Márcio.(Org.). Catástrofe e representação: ensaios. São Paulo: Escuta, 2000.
PIRES, José Cardoso. Balada da praia dos cães. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983. BLANCO
AMOR, Eduardo. A Esmorga. 14ª Ed. Vigo: Galaxia,1995.
872
Capítulos de 7-10. In: Póetica do Pós-modernismo: história, teoria, ficcção. Trad. Ricardo Cruz. Rio de
Janeiro, RJ: Imagem Ed., 1991. KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. Cotia: Ateliê
Editorial, 2002. LAMAS, Maria. As mulheres do meu país. Lisboa: Actuális. 1948. LOURENÇO,
Eduardo. O Labirinto da saudade: psicanálise mítica do destino português. Rio de Janeiro: Tinta da
China, 2009. MARTINS, Moisés de Lemos. O Olho de Deus no Discurso Salazarista. Porto: Edições
Afrontamento, 2016. MOTA-RIBEIRO, Silvana; PINTO-COELHO, Zara. Imagens de Mulheres na
Impressa Portuguesa. Livro de Actas – 4º SOPCOM, 2005. RENAN, Ernest. Que é uma nação?.
Tradução de Samuel Titan Jr. Revista Plural; Sociologia USP, S. Paulo, 4: 154-175. 1997. SELIGAMANN-
SILVA, Márcio. Do delicioso horror sublime ao abjeto e à escritura do corpo. In: O Local da diferença:
ensaios sobre memória, arte, literatura e tradução. Rio de Janeiro: Editora 34. 2005. p. 31 à 44.
SONTAG, Susan. Sobre fotografia. Trad.: Rubens Figueiredo. São Paulo, SP: Companhia das Letras,
2004. TAVARES, Manuela. Feminismos em Portugal: 1947-2007. Tese de Doutoramento -
Universidade Aberta, Lisboa, 2008. TELLES, Lygia Fagundes. As meninas. Rio de Janeiro, RJ: Editora
Nova Fronteira, 1984. VIEIRA, Alice. Maria Lamas: Uma escritora para a infância. In: Maria Lamas,
1893-1983: Catálogo. Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 1993.
ESCREVER PARA REGRESSAR: UMA ANÁLISE DE "OS GESTOS", DE DJAIMILIA PEREIRA DE ALMEIDA
Isabela Lapa Silva
Resumo: A comunicação procura analisar o livro “Os gestos: notas no regresso a casa” (2021), de
Djaimilia Pereira de Almeida. Essa obra apresenta uma composição de textos variados, os quais se
relacionam com os jogos de edição da memória e como ela atravessa os indivíduos. O aspecto
fantasmagórico é destrinchado em temas e motivos que retornam, entrelaçando referências
literária, fílmicas, experiências e notas pessoais a respeito dos processos de criação. Os textos em
conjunto são, como diz o subtítulo, como rotas de voltar para casa, sendo essa uma busca que não
tem percurso claro, nem ponto de chegada definido, mas que está aberta a descobertas e
ressignificações. É sobretudo uma obra de investigações, em que a autora se desdobra entre si e o
que o cria. O próprio título sugere a captura de movimentos, que vem em formas de memórias,
reflexões, notas avulsas, pequenas ficções, e resgatam a artesania da criatividade que permeia a
escrita, desde as mãos que materializam o texto na folha em branco. A comunicação busca, desse
modo, traçar linhas de investigação, tal qual a obra, buscando compreender como a memória é
utilizada como matéria-prima para criar e para inquirir a si mesmo sobre os processos criativos. Para
tanto, as discussões vão partir das relações entre a memória e a literatura, apoiando-se nos trabalhos
de Toni Morrison (2019), Emily Keightley e Michael Pickering (2012), Maurice Halbwachs (1990),
entre outros.
Referências: ALVES, Mota Fernanda; SOARES, Luísa Afonso; RODRIGUES, Cristiana Vasconcelos
(Orgs.). Estudos de memória: teoria e análise cultural. Ribeirão: Edição Húmus, 2016. ALMEIDA,
Djaimilia Pereira de. Os gestos: notas no regresso a casa. Lisboa: Relógio D'àgua, 2021. HALBWACHS,
Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990. MORRISON, Toni. A
fonte da autoestima: ensaios, discursos e reflexões. Tradução de Odorico Leal. São Paulo: Companhia
das Letras, 2019. E-book. KEIGHTLEY, Emily; PICKERING, Michael. The menemonic imagination:
remembering as creative practice. Basingdtoke: Palgrave Macmillan, 2012. KIFFER, Ana;
GARRAMUÑO, Florencia (Orgs.) Expansões contemporâneas: literatura e outras formas. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2014.
873
moçambicana e sua presença na literatura se constrói a partir da retomada de elementos ligados a
tradição e a oralidade, mas também a partir da utilização de formas já canônicas ligadas às
metrópoles colonizadoras. Construindo, a partir disso, uma literatura que está aberta às dinâmicas
do mundo e ainda assim realiza em si as multifacetadas contemporaneidades que tecem o seu
espaço de desenvolvimento. Além disso, tenciona-se uma análise direcionada para as personagens
femininas, buscando entender como, a partir do olhar para esses indivíduos subalternos, a autora
constrói sua representação do espaço moçambicano pós independência, trazendo à tona a narrativa
tanto daqueles que silenciaram quanto daqueles que foram silenciados. Por fim, também será
analisada a forma como a violência se coloca como um fio condutor da narrativa, sendo
representada, em larga escala, como um fator formador dessa sociedade. Como arcabouço teórico
tem-se textos relacionados contemporaneidade moçambicana, como os presentes no livro Perto do
fragmento, a totalidade: olhares sobre a literatura e o mundo de Francisco Noa. Para a abordagem
da representação do subalterno e questões feministas serão utilizados textos como Pode o
Subalterno falar? de Gayatri Spivak e produções de autoras feministas moçambicanas. Por fim, para
abordagem da violência serão utilizadas obras de autores como Michel Foucault e Achille Mbembe.
Assim, pretende-se entender como Lília Momplé responde a desafiadora tarefa de recriar, através
do olhar ficcional, múltiplas composições do indivíduo feminino e da sociedade moçambicana como
um todo.
Referências: NOA, Francisco. Perto do fragmento, a totalidade: olhares sobre a literatura e o mundo.
São Paulo: Editora Kapulana, 2015. SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? 1. ed. Trad.
Sandra Regina Goulart Almeida; Marcos Pereira Feitosa; André Pereira. Belo Horizonte: Editora da
UFMG, 2010.
874
A VOLATILIDADE ESPAÇO-TEMPORAL DOS ESTRATOS COLONIAIS EM LEITURAS DE CONCEIÇÃO
EVARISTO, DJAIMILIA PEREIRA DE ALMEIDA E AIDA GOMES
Marcelo Brandão Mattos
Resumo: Os estudos culturais e as teorias pós-coloniais são ancoradouros para análises de obras
ficcionais de autores representativos de nações que lutaram por independência e soberania, contra
o poder colonial, cujos produtos culturais subsistem em espaços de fronteira entre a tradição local e
a modernidade europeia, conforme os define o teórico indiano Homi Bhabha. Os estratagemas
coloniais, no entanto, não se limitam no tempo e no espaço. No que tange à extrapolação temporal,
há célebres contribuições de teóricos contemporâneos, como Walter Mignolo e Aníbal Quijano, que
apontam a sobrevivência de uma “colonialidade” que preserva os estatutos coloniais para além do
momento de domínio político do colonialismo. Há, contudo, a possibilidade de se pensar
transposições dos estratos coloniais para outros espaços, admitindo-se uma dissipação do poder
colonial que desafia os limites geográficos entre as nações – o que designamos, numa proposição
teórica, por “colonialismo volátil”. Nesse sentido, dualidades do mundo colonial descritas por Fanon
– como privilegiados e subalternizados, opressores e oprimidos, intolerantes e discriminados,
censores e silenciados, hegemônicos e periféricos – passam a ser parâmetros flutuantes que pautam
relações de pessoas de diferentes comunidades diaspóricas, unidas pelo pacto da experiência pós-
colonial. Por meio desse caminho teórico, propomos análises das obras: “Becos da Memória”, da
brasileira Conceição Evaristo; “As telefones” de Djaimilia Pereira de Almeida, nascida em Angola e
crescida em Portugal, autorreferida como escritora portuguesa; e “Os pretos de Pousaflores”, da
autora angolana Aida Gomes.
Referências: BARTHES, Roland. “A morte do autor”. In: ______. O rumor da língua. Lisboa: Edições
Setenta, 1987. pp. 49-53. BHABHA, Homi. O local da cultura. Traduzido por Myriam Ávila et al., Belo
Horizonte: Editora UFMG, 1998. CABRAL, Amilcar. A arma da teoria. Rio de Janeiro: Ed. Codecri, 1980.
EVARISTO, Conceição. Becos da Memória. 3. ed. Rio de Janeiro: Ed. Pallas, 2017. FANON, Frantz. Os
Condenados da Terra. Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 1968. FIGUEIREDO, Eurídice.
“Autoficção feminina: a mulher nua diante do espelho”. In: Revista Criação & Crítica. USP, São Paulo,
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<https://www.fflch.usp.br/dlm/criacaoecritica/dmdocuments/08CC_N4_EFigueiredo.pdf>.
Acessado em: 02/nov./2022. FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala: Formação da Família
Brasileira sob o Regime da Economia Patriarcal. Rio de Janeiro: Maia & Schmidt, 1933. FREIRE, Paulo.
Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1987. “GÊNERO DA AUTOFICÇÃO
VIRA TENDÊNCIA NA LITERATURA CONTEMPORÂNEA”. Correio Brasiliense, Brasília, 13 jan. 2014,
07:00. Disponível em:<https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e-
arte/2014/01/13/interna_diversao_arte,407518/genero-da-autoficcao-vira-tendencia-na-
literatura-contemporanea.shtml>. Acesso em: 05 nov. 2022. GUZZO, Morgani. “Conceição Evaristo:
a escrevivência das mulheres negras reconstrói a história brasileira”. Portal Geledés, 29 jul. 2021.
Disponível em: <https://www.geledes.org.br/conceicao-evaristo-a-escrevivencia-das-mulheres-
negras-reconstroi-a-historia-brasileira >. Acesso em: 05 nov. 2022. HALBWACHS, Maurice. A
memória coletiva. Trad. Beatriz Sidou. 2ª ed. São Paulo: Centauro, 2013. HALL, Stuart. Da diáspora –
identidades e mediações. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002. MATA, Inocência. A mediação
literária da realidade colonial: representações da realidade nas literaturas africanas em português.
Revista SCRIPTA. Belo Horizonte, v. 20, p. 81-93, 2° sem. 2016. MBEMBE, Achille. Necropolítica:
biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. Trad. Renata Santini. São Paulo: N-1
edições, 2018. MIGNOLO, Walter. “Desobediência epistêmica: A opção descolonial e o significado de
identidade em política”. Traduzido por Ângela Lopes Norte. Cadernos de Letras da uff, n. 34, 2008,
pp. 287-324. QUIJANO, Anibal. “Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina” In:
Landger, Edgardo (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas
latino-americanas. Trad. Júlio César Casarin Barroso Silva. Buenos Aires: CLACSO/UNESCO, 2005.
pp.227-278. SAID, Edward W. Orientalismo. O Oriente como invenção do Ocidente. Trad. Rosaura
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latino-americano”. In: Uma literatura nos trópicos: ensaios sobre dependência cultural. São Paulo:
875
Perspectiva, 1978. SANTOS, Milton. Pensando o espaço do homem. São Paulo: Hucitec, 1982.
______. O Espaço Divido – os dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos. 2 ed.
São Paulo: Edusp, 2004. SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? 1. ed. Trad. Sandra
Regina Goulart Almeida; Marcos Pereira Feitosa; André Pereira. Belo Horizonte: Editora da UFMG,
2010. TRIGO, Salvato. 2014. “A Emergência das Literaturas Africanas de expressão Portuguesa e a
Literatura Brasileira” In: ______. Ensaios de literatura comparada afro-luso-brasileira. Lisboa, Vega,
s.d., pp. 35-52.
876
modo, chama-nos atenção, porém, quando essa história é não apenas ignorada, mas também
contada por uma perspectiva hierarquizada e excludente, que, por certo, apaga vivências e induz as
narrativas a caminhos outros que não o das multiplicidades. Nesse sentido, esta comunicação se
propõe discutir a produção da cearense Jarid Arraes que, num enfrentamento aos racismos e
machismos estruturais e institucionais, recupera, em prosa e verso, retalhos de histórias de um grupo
social, construindo um mosaico literário no qual se erguem vozes de mulheres negras, de ontem, de
hoje e de amanhã. Em sua poética de “olhar oposicional”, num diálogo com as propostas de bell
hooks, reforça a necessidade de novos olhares sobre o passado, bem como de novos
direcionamentos de lutas coletivas para o futuro, não apenas como uma forma de rever situações
ou eventos. É a consciência, então – e a representação dessa consciência –, o melhor caminho para
que vários caminhos sejam trilhados rumo à busca por direitos e espaços de escuta.
Referências: HOOKS, bell. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. Trad. Cátia
Bocaiúva Maringolo. São Paulo: Elefante, 2019. HOOKS, bell. O olhar opositivo: a espectadora negra.
Fora de quadro. Trad. Carol Almeida. Disponível em https://foradequadro.com/2017/05/26/o-olhar-
opositivo-a-espectadora-negra-por-bell-hooks/, acesso em 01 de out. de 2021. PAZ, Octavio. A
consagração do instante. In:--- O arco e a lira. Trad. Olga Savary. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
p. 225-266.
877
1990. HALL, Stuart. Cultura e representação. Org. e revisão técnica Arthur Ituassu; tradução de Daniel
Miranda e William Oliveira. Rio de Janeiro: Ed. PUCRio; Apicuri, 2016. HUTCHEON, Linda. Poética do
pós-modernismo. Tradução de Ricardo Cruz. Rio de Janeiro: Imago, 1991. HUTCHEON, Linda. Uma
teoria da adaptação. Tradução de André Cechinel. 2 ed. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2013. LE GOFF, J.
História e memória. Tradução de Bernardo Leitão... [et al.]. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1990.
MARCELINO, Valentina. Colonialismo. Comandos africanos nas Forças Armadas Portuguesas.
Histórias de abandono e traição. Diário de Notícias, Lisboa, 29 de setembro de 2021. Política.
Disponível em: < https://www.dn.pt/sociedade/comandos-africanos-nas-forcas-armadas-
portuguesas-historias-de-abandono-e-traicao-14170942.html>. MBEMBE, Achille. Necropolítica:
biopoder, soberania, estado de exceção, política de morte. Tradução de Renata Santini. São Paulo:
N-1, 2018. MBEMBE, Achille. Políticas de inimizade. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo:
N-1, 2020. NESTROVSKI, Arthur; SELIGMANN-SILVA, Márcio (Orgs.). Catástrofe e representação:
ensaios. Tradução de Cláudia Valladão de Mattos. São Paulo: Escuta, 2000. RIBEIRO, António de
Sousa (Org.). Representações da violência. Coimbra: Almedina, 2013. RODRIGUES, Fátima da Cruz.
Antigos combatentes africanos das Forças Armadas Portuguesas: a guerra colonial como território
de (re)conciliação. 2012, 349 p. Tese (Doutorado em Sociologia). Universidade de Coimbra, Coimbra.
RODRIGUES, Sofia da Palma. “Por ti Portugal, eu juro!”: memórias e testemunhos dos comandos
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Geba. Vila Nova de Famalicão: Editorial Novembro, 2020.
878
MEMÓRIAS ENTRELAÇADAS EM BIOGRAFIA DO LÍNGUA, DE MARIO LUCIO
Renato dos Santos Pinto
Resumo: O romance BIOGRAFIA DO LÍNGUA, do cabo-verdiano Mario Lucio, toma como ponto de
partida a biografia do ex-escravo cubano Estebam Montejo e, como mote, o clássico AS MIL E UMA
NOITES. Afinal, tal como Sherazade, seu narrador, condenado à morte, se vale de uma longa história
para se salvar. O narrador rompe com o tempo histórico e cronológico ocidentais, medidos por
calendário e relógio, e propõe um pacto temporal com sua própria história ficcional. Logo de início,
arrasta por diversas páginas a biografia de uma criança de apenas sete meses e, já no final, descreve
o período que vai do início do capitalismo até os dias atuais em apenas algumas linhas. Além do
tempo, a espacialidade também ocupa lugar central em sua narrativa, principalmente em relação à
nação de Falésia, criada durante a própria narrativa. A história é contada em dois planos: o presente
do narrador e o da vida de sua personagem, o Língua. O objetivo desta comunicação é explorar a
temporalidade e espacialidade na narrativa, estabelecendo diálogos com clássicos, como AS CIDADES
INVISÍVEIS, de Calvino, e FAUSTO, de Goethe, entre outros. Também pretendemos realizar uma
comparação entre a Falésia, gestada na própria narrativa, e Cabo Verde, país de origem de seu autor.
Referências: SOUSA, Mario Lucio. Biografia do língua. Rio: Livros de criação: Imã editorial, 2019.
LARANJEIRA, Pires. Literaturas africanas de expressão portuguesa. Lisboa: Universidade Aberta,
1995. CALVINO, Ítalo. As cidades invisíveis. São Paulo: Cia das Letras, 1990. GOETHE, Johann
Wolfgang Von. Fausto. São Paulo. Martins Claret, 2016.
879
Emmanuel (org.). Pensar a imagem. Tradução: Carla Rodrigues (coord.). Belo Horizonte: Autêntica
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Fernando. Salazar e o Poder: a arte de saber durar. Lisboa: Tinta da China, 2012. SELIGMANN-SILVA,
Márcio. O local da diferença: ensaios sobre memória, arte, literatura e tradução. São Paulo: Editora
34, 2005.
880
angolana Aida Gomes e Garota, mulher, outras (2019), da britânica de origem nigeriana Bernardine
Evaristo, além do livro de contos No seu pescoço (2009), da renomada autora nigeriana, radicada
nos EUA, Chimamanda Ngozi Adichie. Através dessas leituras cruzadas, pretendo discutir como
percursos diversos de trânsito de pessoas dos países africanos em direção às antigas metrópoles
coloniais, ou às sedes do poder geopolítico contemporâneo, acabam por revelar aos leitores sujeitos
com motivações e expectativas que, embora diversas, encenam alguns aspectos cruciais da
experiência migratória, especialmente aquelas ligadas às questões de classe, raça e gênero. Nesse
sentido, algumas temáticas como as da violência, do racismo, da exclusão e da reificação do corpo
feminino, serão objeto de debate.
Referências: MORRISON, Toni. A origem dos outros. Seis ensaios sobre racismo e literatura. Trad.
Fernanda Abreu. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. SAID, Edward W. Cultura e imperialismo.
Trad. Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. VERGÈS, Françoise. Um feminismo
decolonial. Trad. Jamille Pinheiro Dias e Raquel Camargo. São Paulo: Ubu, 2020.
DAS APROXIMAÇÕES, UMA LEITURA DE "O MANUAL DOS INQUISIDORES" E "QUE CAVALOS SÃO
AQUELES QUE FAZEM SOMBRA NO MAR?", DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
Thaíla Moura Cabral
Resumo: A comunicação a ser apresentada propõe-se a tecer aproximações entre os romances O
manual dos inquisidores (1996) e Que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar? (2009), do
consagrado escritor português contemporâneo António Lobo Antunes. Nas obras referidas, há
personagens assombradas pelas imagens traumáticas que sobrevivem em sua memória; governantas
desamparadas que amparam e sustentam as famílias em ruínas; embates entre patroas e
empregadas; a ausência ou omissão da figura paterna; filhos problemáticos, despedaçados e
solitários. Pretende-se analisar, principalmente, além da temática da rasura dos afetos,
determinadas imagens obsessivas relacionadas ao medo (oriundo da infância) e à morte (tendo em
vista a presença de personagens que dão ares de estar mortas e vivas concomitantemente). Além
disso, será ressaltada a singularidade da escrita do autor - um escritor consciente dos processos
narrativos de construção dos textos por meio de evidências não explícitas e explícitas. Se, no primeiro
romance, temos um autor escamoteado que colhia/inquiria os depoimentos dos personagens, no
segundo, encontramos o que Diana Navas (2016) chama de “autor de autores”, ou seja, a presença
de um António Lobo Antunes personagem em constante diálogo e discussão com outras figuras do
enredo sobre o ofício da escrita, capaz de evidenciar uma espécie de projeção biográfica na ficção.
Com isso, tentar-se-á averiguar o desdobramento do discurso crítico do autor perante a construção
literária dos livros pertencentes, respectivamente, ao ciclo do poder (O manual dos inquisidores) e
ao ciclo do silêncio (Que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar?), o que pode levar à possível
conclusão de que o exercício do poder - autoritário e violento - culmina em silêncios ainda mais
aterrorizantes. Para tanto, serão utilizados como suporte teórico os apontamentos de Didi-
Huberman (2013), Rancière (2021), Safatle (2021), Faria (2021), Warrot (2013), Navas (2016),
Perrone-Moisés (2016), entre outros.
Referências: ANTUNES, António Lobo. O manual dos inquisidores. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
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Janeiro: Contraponto, 2013, p. 243-450. FARIA, Ângela Beatriz de Carvalho. A Lisboa disfórica de
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Cândido Mendes, Rio de Janeiro – 26 a 29 de outubro de 2000. Disponível em
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883
884
SIMPÓSIO “CONEXÕES E DESENCONTROS: ARQUIVOS DA TRADUÇÃO LITERÁRIA”
Coordenadores: Cláudia Tavares Alves (UFJF), Elena Santi (UFJF) e Patricia Peterle (UFSC)
885
'brasileiro' é a língua criada por Villa. Uma combinação de elementos constitui seu estilo nesse
poema: as nasais (então, designação, requisições, fundos jogos nasais), o abafamento do final da
frase, a incerteza na pronúncia das vogais e também a riqueza de citações livres de elementos
diversos da rica cultura brasileira. Seria essa língua uma nova língua? Uma língua não mais
portuguesa, nem brasileira? Como assinala Izabela Leal, Herberto Helder, poeta português leitor e
tradutor de Villa, sublinha o paradoxo do “portuliano” de Villa, publicando outro poema em estilo
análogo ao do poeta, como sendo sua própria tradução do italiano para o português, que,
paradoxalmente, deixa o texto original intocado. Tal paradoxo tradutório evidenciaria não apenas a
“gramática poética” de Villa mas também as aporias de toda e qualquer teoria da tradução poética.
Referências: CAMPOS, H. de. Do texto macarrônico ao permutacional. In: A operação do texto. São
Paulo: Perspectiva, 1976. LEAL, Izabela. Helberto Helder e o tradutor libertino. Itinerários,
Araraquara, n. 28, p.89-97, jan./jun. 2009. TAGLIAFERRI, Aldo. Il Clandestino. Sesto San Giovanni:
Mim, 2016.
886
preventing it from being an untroubled communication and opening the translated text to
interpretive possibilities that vary with cultural constituencies in the receiving situation" (2009).
Nesse sentido, esta comunicação visa se debruçar sobre a tradução literária pela perspectiva da
intertextualidade, dedicando-se em especial a exemplos que figurem explicitamente na produção
poética italiana contemporânea. Pretende-se refletir sobre o quanto o reconhecimento de
intertextos afeta ou não o processo tradutório e quais são os desdobramentos desse
reconhecimento na recepção de textos traduzidos. A fim de elucidar tais questões teóricas a partir
da prática tradutória, serão analisadas traduções para português de dois poemas italianos que
remetem ao soneto de Dante Alighieri, "Guido, vorrei che tu e Lapo ed io". São eles: "Guido, io vorrei
che tu e Lapo e io", da poeta contemporânea Giulia Martini, e "Mario Mieli in ciclostile: per un
apprendistato frocio", do crítico e poeta Jessy Simonini. O objetivo principal será observar como a
intertextualidade complexifica, em ambos os casos, o processo tradutório, revelando assim
especificidades da tradução poética que perpassam as diversas camadas envolvidas neste exercício
que é, antes de tudo, um gesto de leitura, interpretação e reescrita. A tradução, portanto, será
entendida como um espaço de atritos que estimulam justamente o desencontro, o embate, o
desconforto entre línguas e culturas, o que pode gerar, por consequência, uma possibilidade de
encontro, acolhimento e recriação.
Referências: ALIGHIERI, Dante. Tutte le opere. Londres: Universidade de Oxford, 1894. KRISTEVA,
Julia. Introdução à semanálise. Trad. Lúcia Helena França Ferraz. São Paulo: Perspectiva, 1974.
MARTINI, Giulia. Coppie minime. Latiano: Interno Poesia Editore, 2018. SIMONINI, Jessy. Campi di
battaglia: poesie. Roma: Sensibili alle foglie, 2021. VENUTI, Lawrence. Translation, Intertextuality,
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NERGAARD, Siri. Teorie contemporanee della traduzione. Milano: Bompiani, 2002. RABONI,
Giovanni. L'opera poetica. Milano: Mondadori, 2006.
888
Referências: CROVI, Raffaele. Il lungo viaggio di Vittorini. Una biografia critica. Venezia: Marsilio,
1998. DAROS, Romeu. Antologia vittoriniana: a tradução como resistência ao fascismo italiano.
Revista Escrita, Rio de Janeiro, n. 17, p. 1-15, 2013. ESPOSITO, Edoardo (org.). Il dèmone
dell’anticipazione. Cultura, letteratura, editoria in Elio Vittorini. Milano: il Saggiatore / Mondadori,
2009. GIORDANO, Caterina Francesca. Elio Vittorini: letteratura, critica e società. Tese de doutorado.
Dipartimento de studi umanistici da Università degli Studi “Roma Tre”. Roma, s/d. GUERINI, Andréia;
MOYSÉS, Tânia Maria. Retratos de escritores nas cartas de Italo Calvino: Vittorini, Pavese, Morante.
Anu. Lit., Florianópolis, v. 20, n. esp. 1, p. 32-50, 2015. VITTORINI, Elio. Erica e seus irmãos. Tradução
e apresentação de Liliana Laganá. Ilustrações de Paulo Pasta. São Paulo: Berlendis & Vertecchia
Editores, 2001. VITTORINI, Elio. Conversa na Sicília. Tradução de Valêncio Xavier e Maria Helena
Arrigucci. São Paulo: Cosac Naify, 2002. VITTORINI, Elio. Homens e não. Tradução de Maria Helena
Arrigucci. São Paulo: Cosac Naify, 2007. VITTORINI, Elio. Sardenha como uma infância. Tradução de
Maurício Santana Dias. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
889
RECEPÇÃO E TRADUÇÃO: UMA CARTOGRAFIA DE ELSA MORANTE
Helena Bressan Carminati
Resumo: É num aproximar-se do outro que o processo de tradução se dá, pois enquanto um meio-
do-caminho, seu espaço é de contato e passagem entre uma cultura e outra. O que obras traduzidas
nos dizem? Há um gosto da cultura que recebe um livro estrangeiro? O que me parece evidente, de
antemão, é a importância do fazer tradutório enquanto movimentador e articulador de diferentes
línguas e pensamentos. Nesse sentido, estudar a literatura italiana traduzida no Brasil é dar-se conta
de espaços de não-contato, de passagens que se fazem entrecortadas. Me refiro a escritora romana
Elsa Morante, que nascida em 1912, passa a escrever, já adulta, contos e fábulas que, em um
primeiro momento, são publicados sob os pseudônimos masculinos Antonio Carrera e Renzo Diodati,
pois facilitavam sua aceitação. Investigar sua produção literária é deparar-se com um corpus que
chega até o Brasil com um recorte específico e reduzido de publicações. Atualmente, apenas três de
suas obras são traduzidas, dentre elas estão: A História, publicada a primeira vez em 1978, A ilha de
Arturo lançada mais de 20 anos depois, em 2003 e por fim, a mais recente coletânea de ensaios,
publicada em 2017, Pró ou contra a bomba atômica. Seus outros livros, Il gioco secreto, Aracoeli,
Menzogna e sortilegio, Alibi, Lo sciale andaluso, Il mondo salvato dai ragazzini parecem ter sido
esquecidos pelo mercado editorial brasileiro. A partir do desarquivamento dessas obras o desejo é
que esta comunicação seja um espaço para reflexão da obra moranteana no Brasil, ao questionar de
que forma se dá sua circulação. Qual Elsa Morante encontramos do lado de cá do Atlântico?
Caminhando, assim, a partir do levantamento das traduções existentes e uma pesquisa em acervos
de jornais e revistas, proponho criar uma espécie de cartografia da autora, observando seus
movimentos e traduções em terras brasileiras.
Referências: MORANTE, Elsa. A História. Tradução de Wilma Freitas Ronald de Carvalho. São Paulo:
Círculo do Livro, 1981. ___________________. Menzogna e sortilegio. Torino: Giulio Einaudi editore,
1948. ___________________. Pro o contro la bomba e altri scritti, a cura di Cesare Garboli. Milano:
Adelphi, 1987 SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Tradução como cultura. Ilha do Desterro: A Journal of
English Language, Literatures in English and Cultural Studies, n. 48, p. 41-64, 2005.
POESIA E TRADUÇÃO COMO VIAS DE ENCONTRO: A ESCUTA DO OUTRO QUE SE FAZ RESSOAR
Júlia Bellei Xavier
Resumo: Partindo da definição de “língua morta” proposta pelo crítico Gianfranco Contini e
retomada por Giorgio Agamben no cerne de uma perspectiva que vislumbra ecos de uma outra
língua (o latim), para além do italiano, na língua poética de Giovanni Pascoli, esta comunicação visa
sugerir reflexões acerca das possíveis tangências entre poesia e tradução na obra do romagnolo.
Ademais, considerando as trilhas sonoras pré-verbais que o autor traduz em seus poemas, as
reflexões tencionadas serão conduzidas à escritura de Mariangela Gualtieri, que, ao recobrar o
conceito pascoliano de "voci di tenebra azzurra", evidencia, em suas produções, novas possibilidades
para que a poesia configure espaços porosos e disponíveis à reverberação dessas vozes de escuridão
azul. Sob esse ângulo, pretende-se enfatizar as confluências do tradutor e do poeta, o qual, como
sugere Cicero — retomando Hugh Kenner — traduz para introduzir na língua alguma nova
possibilidade (CICERO, 2012). Nessa ótica, importa salientar ainda que a tradução é contemplada
mais de um ponto de vista abstrato do que concreto, adquirindo relevo a sua potencialidade de “dar
voz ao outro, [...] ao que está em outra margem da cultura, ou aquele que já não está mais aqui”
(BELLEI, 2020). Dessa maneira, fragmentos de composições dos escritores referidos serão analisados
— com base, sobretudo, nas proposições filosóficas de Agamben — para trazer à baila a inquietação
que, análoga à do gesto tradutório, atravessa a poesia para acolher o estrangeiro e a pluralidade de
línguas e vozes que esse acomoda. Assim, vale acentuar que, nesse encaminhamento, a tradução
representa um fio condutor da pesquisa a ser apresentada na medida em que é entendida não só
como trânsitos e contatos linguísticos, mas também como uma forma de acolher a voz do outro, uma
alternativa para enriquecer a própria voz poética e para alargar os itinerários da poesia.
890
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Pascoli e il pensiero della voce (saggio introduttivo a Giovanni
Pascoli). In: PASCOLI, Giovanni. Il fanciullino. Milano: Feltrinelli, 1982. p. 7-21. BELLEI, Júlia. Épocas,
cosmogonias, perfeições precárias: os deslizamentos da obra de Fabio Pusterla em Argéman:
antologia poética, v. 2, n. 11, nov. 2021. Disponível em:
https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/230108. Acesso em: 12/01/2023. CICERO, Antonio.
Poesia e filosofia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012. CONTINI, Gianfranco. Il linguaggio del
Pascoli. In: CONTINI, Gianfranco. Varianti e altra linguistica. Torino: Einaudi, 1970. p. 219-245.
GUALTIERI, Mariangela. Voci di tenebra azzurra. Direção: Cesare Ronconi. Cesena: Teatro Valdoca,
2014. PASCOLI, Giovanni. Canti di Castelvecchio. Ariccia: Legatoria del Sud, 2006.
891
animais não humanos permanecem nossas eternas vítimas e presas, mas também nossos “iguais”
(termo de Saba) no sofrimento, e, em suma, nosso Outro - no fundo irremediavelmente inacessível
- que precisa ser interrogado. Da literatura italiana chega ao Brasil, em traduções, um certo
repertório fragmentado, feito de bestiários e outros textos dedicados ou centrados em animais não
humanos – formando outros arquivos, que propomos aqui reler, cruzando alguns textos, compondo
e recompondo, focalizando ideias e imagens que nos ajudem a repensar nossas relações com os
animais e com nós mesmos, com nossa própria natureza, mentes e corpos divididos entre
humanidade e animalidade.
Referências: Wataghin, Lucia. “Kaputt ou do malapartismo”. Prefácio a MALAPARTE, Curzio. Kaputt.
Trad. Federico Carotti. São Paulo: Companhia das Letras, 2021 Wataghin, Lucia. “O homem e os
animais: poemas de Saba”, In SABA, Umberto. O homem e os animais. Poemas de Umberto Saba.
Org. Patricia Peterle e Lucia Wataghin. Florianópolis: editora ufsc, 2014 Peterle, Patricia. “Poéticas
do comum: a cidade, a criança e o animal em Saba. In SABA, Umberto. O homem e os animais.
Poemas de Umberto Saba. Org. Patricia Peterle e Lucia Wataghin. Florianópolis: Editora UFSC, 2014
Tozzi, Federigo. Bestie. Milano: Garzanti, 2019 Menicanti, Daria. Il Cacodèmone e il Grillo El
Cacodemon y el grillo O Cacodemônio e o Grilo, org. Cattoni, Colella, Minazzi, Peterle, Wataghin;
trad. p/ o português Peterle e Wataghin, trad. p/ o espanhol Silvia Cattoni. Valore Italiano Editore
2022 Maciel, Maria Esther (org.) Pensar/escrever o animal. Ensaios de zoopoética e biopolítica.
Florianópolis: Editora UFSC, 2011
892
MITOS E LENDAS DO MONTE RORAIMA NA TRADUÇÃO DE KOCH-GRUNBERG
Riane de Deus Lima
Resumo: John Milton em Tradução, Teoria e Prática (1998) faz citação de autores alemães acerca da
tradução: Wilhem von Humboldt “considera a tradução como uma maneira de proporcionar ao
indivíduo experiências com as quais ele nunca teria tido contato. Tanto o indivíduo como a nação
passam por algo mais nobre e mais complexo”; Johann Gottfried Herder o tradutor é a “estrela da
manhã de uma nova era na literatura” e Goethe considera que “o tradutor é o profeta, o mensageiro,
o escolhido”. Apresento na pesquisa que o etnógrafo também alemão Theodor Koch-Grünberg em
sua viagem do Monte Roraima até o rio Orinoco, na Venezuela, ao coligir e traduzir textos, preservou
a arte poética indígena com sua “tradução interlinear”. Publicados em Mythen und Legenden der
Taulipáng und Arekuná-indianer (1924), traduzido em Mitos e lendas dos índios Taulipáng e Arekuná
(1953). E destaco a ausência das seções “FONETICA, PROLOGO, TEXTOS”, na edição brasileira do
livro, nas quais oito sequências narrativas, em língua Taurepáng, atribuídas aos indígenas
Mayuluaípu e Akuli, são omitidas. Segundo Lúcia Sá “as histórias que Mayuluaípu e Akuli contaram a
Koch-Grunberg serviram de base para Macunaíma, de Mário de Andrade, marco decisivo da história
da narrativa moderna brasileira”. Devemos considerar que os textos de fatura indígenas são
contribuição valiosa para o corpus da literatura brasileira, mas são depreciados e relegados a
material etnográfico. Pretendo tecer considerações acerca de novas formas de relações
interculturais, valorização das civilizações tradicionais, culturas das margens, pluralidade das
intersecções e as pretensas homogeneidades nacionais pós-coloniais e com isso, reafirmar uma
literatura indígena brasileira.
Referências: BURKE, Peter; HSIA, R. Po-chia. A tradução cultural nos primórdios da Europa Moderna/
Peter Burke e R. Po-chia Hsia (orgs.); tradução Roger Maioli dos Santos – São Paulo: Editora UNESP,
2009. CARVALHO, Fábio Almeida de. Makunaima=Macunaíma: contribuições para o estudo de um
herói transcultural. 1. ed.-Rio de Janeiro: E-papers, 2015. ______ Theodor Koch-Grünberg e a cultura
brasileira. Revista Gragoatá, Niterói, n. 41. P. 665-685, 2. sem. 2016. FRANK, Erwin H. Viajar é preciso:
Theodor Koch-Grünberg e a Völkerkunde alemã do século XIX. Rev. Antropol., São Paulo, v. 48, n. 2,
Dec. 2005. KOCH-GRÜNBERG, Theodor. Del Roraima al Orinoco: mitos y leyendas de los índios
Taulipang y Arekuná. Trad. Federica de Ritter. Caracas: Ernesto Armitano, 1989. ______ Del Roraima
al Orinoco: mitos y leyendas de los índios Taulipang y Arekuná. Trad. Federica de Ritter.Caracas,
Venezuela, 1981. ______ Mitos e lendas dos índios Taulipáng e Arekuná, Tradução de Henrique
Roenick, Revisão de M. Cavalcanti Proença , - Prefácio de Herbert Baldus, Revista do Museu Paulista,
São Paulo, v. VII, 1953, disponível em Biblioteca Digital Curt Nimuendajú - Coleção Nicolai,
www.etnolinguistica.org GOETHE, Johann Wolfgang Von. Divã ocidento-oriental / West-ostlicher
divan/ Johan Wolfgang Von Goethe; tradução e posfácio Daniel Martineschen. – 1.ed. – São Paulo:
Estação da Liberdade,2020. MILTON, John,1956- Tradução: teoria e prática / John Milton. – 2 –ed –
São Paulo: Martins Fontes,1998. – (Coleção leitura e crítica). SÁ, Lúcia. Literaturas da Floresta: textos
amazônicos e cultura latino-americana/Lucia Sá – Rio de Janeiro: EdUERJ, 2012.
893
em primeiro lugar, a inspiração do texto da Divina Comédia traduzido pelo Barão da Villa da Barra,
no século XIX, acrescentando-lhe notas mais específicas para o leitor brasileiro e dando mais acesso
ao texto italiano clássico, escrito no século XIV, por Dante Alighieri. A relevância da escolha do texto
está no fato de a Divina Comédia ser uma obra literária que, em sua universalidade, retrata a viagem
ao além em sua plenitude e em detalhes que, até os dias de hoje, habitam o imaginário ocidental.
Em segundo lugar, o projeto representa um trabalho de pesquisa em torno da literatura sacra e
profana, de tradução e de adaptação de textos críticos italianos e estrangeiros, e de contribuição
para a difusão do conhecimento e da leitura da obra de Dante no Brasil.
Referências: ARISTÓTELES. São Paulo: Nova Cultural, 1987. (Os Pensadores, v. 2). ARRIGONI, Maria
Teresa. O abismo, o monte, a luz: os símiles na leitura/tradução da Divina Comédia. 2001. 241 f. Tese
(Doutorado em Lingüística Aplicada) – Universidade Estadual de Campinas. 2001. ARRIGONI, Maria
Teresa. Tra l’occidente e l’oriente. ABPI em revista, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 85-95, 2009. ARRIGONI,
Maria Teresa. A Divina Comédia sob o enfoque da exclusão feminina. In: CONGRESSO LATINO-
AMERICANO DE GÊNERO E RELIGIÃO, 2., 2006, São Leopoldo. Anais eletrônicos... São Leopoldo: [s.
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de George Sperber. São Paulo: Perspectiva, 197l. BIANCHI, Enzo. La differenza cristiana. Torino: Giulio
Einaudi, 2006. BIZZARRI, Edoardo (Org.). O meu Dante. Instituto Cultural Ítalo-brasileiro, São Paulo,
1965. Caderno n. 5 Contribuições e depoimentos: Henriqueta Lisboa, Otto Maria Carpeaux, Miguel
Reale, Homero Silveira, Candido, Mota Filho, Ivan Lins, Haroldo de Campos, Dante Milano, Alceu
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897
tradutório presente em sua primeira tradução, de 1940. Em Para o lado de Swann, há uma
importante descrição, minunciosamente detalhada, do farfalhar do vestido de musselina azul da
mãe, que antecipa a ansiedade e o desejo do narrador-criança pelo beijo materno de boa-noite.
Contudo, em 1940, o tradutor mudou a cor do vestido para musselina branca, diferindo do original
francês, induzindo, assim, a uma relação plausível entre o vestido materno e um vestido de noiva.
Ou seja, uma interpretação equivocada, reativada pela recente tradução, que coloca em crise os
estudos proustianos que associam a cor branca do vestido à relação de nubentes entre mãe e filho.
A partir deste equívoco, assim como de certas escolhas do tradutor, este trabalho se propõe a
analisar como essa terceira tradução de Para o lado de Swann tanto pode construir novas quanto
fazer ruir antigas catedrais interpretativas.
Referências: BENJAMIN, Walter. A tarefa do tradutor. In: BENJAMIN, Walter. Escritos sobre mito e
linguagem. Tradução de Susana Kampff Lages e Ernani Chaves. São Paulo: Duas Cidades, Editora 34,
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vol. 144, p. 3-5, 2002.
899
problemas interligados entre si e ao momento da escritura daquela que viria a ser sua obra mais
difundida. Cunha realiza um mapeamento de temas que se tornariam centrais nas produções
intelectuais e artísticas, tais como os negros, os pobres, a condição de dependência econômica e
subdesenvolvimento, a religiosidade popular, as insurreições populares, entre outros. Dessa
maneira, ele promove a conscientização dos intelectuais sobre a própria consciência popular que
amadurecia. Euclides e seu olhar diferenciado para esse todo natural-cultural onipresente que é o
sertão apresentam-se como um desafio teórico-metodológico acerca de sua tradução para outra
língua. Como uma experiência e um processo que se abre na reflexão, a tradução de Os Sertões para
a língua inglesa exige do próprio tradutor, a priori, que a tradução seja encarada como crítica, ou,
uma maneira mais atenta de ler. Como os tradutores compreendem o sertão sob a ótica de Euclides
da Cunha? Nesse trabalho, vamos discutir acerca das perspectivas éticas e sócio-históricas de duas
traduções para a língua inglesa da obra desse cânone da literatura brasileira: Rebellion in the
Backlands, de Samuel Putnam (1944) e Backlands: The Canudos Campaign, de Elizabeth Lowe (2010).
Essas pontes auxiliam a difusão literária brasileira e estudos acerca da tradução de obras nacionais
pois projetam a literatura brasileira e seu autor na arena da literatura mundial. Por esse motivo,
procuraremos também refletir, nesse contexto específico, sobre o papel ativo do tradutor na
recontextualização do texto traduzido e na formação de cânones literários.
Referências: ABREU, Regina. Arqueologia de um livro-monumento: Os Sertões sob o ponto de vista
da memória social. In: O Clarim e a oração: cem anos de Os Sertões/ Organizador Rinaldo de
Fernandes: ilustrações T. Gaudenzi – São Paulo: Geração Editorial, 2002. BERMAN, Antoine. A
tradução e a letra ou o albergue do longínquo. Rio de Janeiro, RJ, 7Letras, 2007. CAMPOS, Haroldo
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USP, n. 45, p. 85-105, 30 maio 2000.
900
AUTOTRADUÇÃO LITERÁRIA: HIBRIDISMO CULTURAL, RECRIAÇÃO E A MANUTENÇÃO DE
ASPECTOS CULTURAIS NOS TEXTOS AUTOTRADUZIDOS
Maria Alice Gonçalves Antunes
Resumo: Resumo: Esta comunicação tem por base minha pesquisa sobre a autotradução literária e
os estudos de caso que venho desenvolvendo ao longo dos últimos 15 anos. Nesse período, pude
explorar e-mails (2003-2007), crônicas (Ribeiro, 1990), language memoirs (Hinojosa-Smith; 2002;
Dorfman, 2002; Santiago, 2003), entrevistas e textos autobiográficos (Antunes, 2017). Nelas,
autotradutores literários abordam sua relação com a autotradução literária, entre outros temas. Ao
abordá-la, apontam questões teórico-metodológicas em comum com a tradução literária stricto
sensu. A partir da análise das crônicas, language memoirs e entrevistas, pude verificar que a escritora
porto-riquenha Esmeralda Santiago (2003) indica a impossibilidade de comunicar vivências da
infância em Porto Rico no texto autotraduzido para o inglês e tenta minimizá-la incluindo um
glossário que espera auxiliar o leitor estadunidense na construção do significado. O estadunidense
Rolando Hinojosa-Smith (2003) cita o falar rural da classe migrante trabalhadora e acrescenta que
seria uma fraude fazer tais personagens falarem como um “profissional”. O brasileiro João Ubaldo
Ribeiro alude ao “ar traduzido” e afirma que “sempre quis dar um ar traduzido ao verter seu trabalho
para o inglês” (Antunes, arquivo pessoal, 2003-2007). O português/mirandês Amadeu Ferreira
(2002), tal como outros autotradutores, acredita que “a autotradução não é tradução” (Regattin,
2020). Para Ferreira (2002), autotraduzir é recriar. Embora os autotradutores acima mencionados
não aludam a questões teórico-metodológicas, pude perceber a referência subliminar a noções tais
como o hibridismo cultural, a recriação, a manutenção de aspectos culturais domésticos no texto
(auto)traduzido. A análise minuciosa dos textos autotraduzidos por João Ubaldo Ribeiro, Ariel
Dorfman e Amadeu Ferreira revelam, na prática da autotradução, o hibridismo cultural, a recriação
e a manutenção de aspectos culturais, embora nem sempre os comportamentos desses escritores
se repitam. Ou seja, a autotradução não é uma atividade que se dê de forma homogênea.
Referências: ANTUNES, Maria Alice G. Arquivo pessoal. Entrevista por e-mail. 2003-2007. ANTUNES,
Maria Alice G. Autobiographie, Self-translations and the Lives In-Between: the Cases of Gustavo
Perez Firmat andAriel Dorfman. Ticontre, v. VII, 2017, p. 85-107. DORFMAN, Ariel. "Resisting
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AMADEU. Amadeu Ferreira Entrevista TVI. PARTE I. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=H_WRzElctVc&t=62s HINOJOSA-SMITH, Rolando. "Language
and change". In BALDERSTON, Daniel & SCHWARTZ, Marcy E. (orgs.) Voice-overs. Translation and
Latin American Literature. NY: State University of New York Press, 2002, p. 49-51. REGATTIN, Fabio
(Org.). Autotraduzione Pratiche, teorie, storie Autotraduction Pratiques, théories, histoires (2020).
Città di Castello: Emil. RIBEIRO, João Ubaldo. Suffering in Translation. P.T.G. Newsletter, Portuguese
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Translingual writers reflect on their craft. Lincoln: University of Nebraska Press, 2003, p. 131-134.
901
roto y La novia fiel, sirviéndonos de teóricas/os como Benjamin (2008), Berman (2007), Britto (2012),
Campos (2011), Castro (2009) y Mayoral (2006). El reto del proceso de traducción de los cuentos
seleccionados no ha sido baladí: no solo en las cuestiones lingüísticas (lexicales, sintácticas, etc.), sino
en las estilísticas, ya que ambos –como gran parte de la obra de Pardo Bazán–, cuentan con una
fuerte carga lírica que hemos pretendido priorizar a la hora de traducir. La lectura de una obra
centenaria suele causarle cierto extrañamiento al lector y eso no sería diferente en el caso de un
texto traducido. Por consiguiente, cabe a nosotras, traductoras, decidir si mantenemos ese
distanciamiento o actualizamos la obra, manteniendo un lenguaje y estilo más propios del siglo XXI.
En nuestro caso, hemos optado por mantener cierto distanciamiento para valorar la importancia de
estilística y temática de estas obras decimonónicas. Para ello, hemos hecho uso de un lenguaje y una
estructura morfosintáctica menos actual, al optar por algo más cercano –en la medida de lo posible–
, al que podría utilizarse en la época.
Referências: BENJAMIN, Walter. A tarefa do tradutor, de Walter Benjamin: quatro traduções para o
português. Belo Horizonte: Fale/UFMG, 2008. BERMAN, Antoine. A tradução e a letra ou o albergue
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Civilização Brasileira, 2012. CAMPOS, Haroldo de. Da transcriação. Poética e semiótica da operação
tradutora. Belo Horizonte: FALE/UFMG (2011). CASANOVA, Pascale. A república mundial das letras.
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minucia-esculpida-em-cada-sentenca-de-graciliano-ramos.shtml. Acesso em: 02 jul. 2022.
903
SIMPÓSIO “LER O POEMA EM TRADUÇÃO: DA REDUÇÃO INSTRUMENTAL À SINGULARIDADE DO
POEMA TRADUZIDO COMO DISPOSITIVO CRÍTICO E FORMA DE VIDA”
Coordenadores: Mauricio Mendonça Cardozo (UFPR), Pablo Simpson (UNESP) e Marcos Antonio
Siscar (UNICAMP)
904
torna perceptível a importância da reescrita de um texto não apenas pelo aspecto tradutório, mas
pelo respeito à autoridade presente nele. Uma maneira de alcançar o propósito feminista existente
sob esses versos é o uso das práticas feministas da tradução, as quais visam a valorizar a
individualidade da autora mulher e suas implicações. Assim, com o intuito de refletir sobre a reescrita
de um texto sob uma perspectiva de cuidado e sensibilidade, que busca manter sua singularidade,
bem como seu propósito, será realizada uma tradução feminista do poema “La loba”. A realização
desta tradução sob a ótica das teorias dos estudos da tradução feminista, de Luise von Flotow, Sherry
Simon, entre outras, e de suas ferramentas corrobora com a necessidade de um olhar para além da
tradução instrumental, onde há, neste caso, uma preocupação com o poema e a voz da poeta. Com
isso, proponho uma análise sobre as traduções, as escolhas tradutórias e suas inferências,
demonstrando que a tradução de um poema está além da reescrita de um texto original em outra
língua, principalmente quando da intenção de preservação de uma fala que possibilita a ampliação
de discussões implícitas no texto original.
Referências: Luise von Flotow (1997) Sherry Simon (1996) Olga Castro (2017) Delfina Muschietti
(2010).
905
com J. D. e tentará agarrar o que sua voz lhe diz. Se a história tardia do sommier implicou uma
releitura de questões benjaminianas, o sonho com Derrida a deslocará para cenas da desconstrução,
inclusive para uma cena da perda do manuscrito de Fichus, 2002, que Derrida lhe teria confiado e
ela teria perdido. Sabe-se que, neste discurso de Frankfurt, Derrida, como se em sonho, evoca não
somente as relações entre a teoria crítica e a desconstrução, mas também um sonho de Benjamin
que entrelaça fichus (o xale e o perdido) e a poesia. Ainda sob o efeito do sonho, a narradora nomeia
o modo através do qual ela e Derrida se entrelêem, isto é: por secrécitation, condensação de
secretar, segredo e citação; remetendo o leitor, também, a Un ver à soie, 1998, texto em que Derrida
lê Savoir de Cixous. Dito isso, pensaria secrécitation como forma de dar sobrevida a outros textos,
reinvenção do ato de leitura a partir da singularidade de cada texto. Em Hyperrêve, inscrevendo a
língua da noite a se traduzir, num tempo em que vida e morte não mais se opõem, essa coisa sem
defesa, órfã, a escrita, recebe o événement na língua. Ou, em mais de uma: idioma Cixous.
Referências: CIXOUS, Hélène & DERRIDA, Jacques. Voiles. Paris: Galilée, 1998. CIXOUS, Hélène.
Hyperrêve. Paris: Galilée, 2006. DERRIDA, Jacques. Fichus: discours de Francfort. Paris: Galilée, 2002.
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(org.). História da língua portuguesa. Cotia, São Paulo: Ateliê Editorial, 2008.
907
compostas com o uso deliberado de “palavras erradas”, retiradas respectivamente de um poema de
John Donne; de um arquivo do FBI (o de Bertold Brecht); de uma página específica de Fim de partida
de Beckett; de uma conversa de Franz Kafka com Gustav Jarnouch; das placas do metrô de Londres;
e de um manual de micro-ondas. O exercício em questão fecha o ensaio “Variations on the right to
remain silent” (2016a, s.p.), que, todo dedicado ao tema da tradução, pensa-a sob o signo da
“catástrofe”. Defenderei em particular a fertilidade de aproximar essa concepção de tradução como
catástrofe da concepção derridiana da leitura (e da criação) como contra-assinatura (e.g. Derrida
1988, 2014).
Referências: CARSON, Anne. Cassandra Float Can. In: ______. Float. New York: Alfred A. Knopf,
Publisher, 2016. ______. Variations on the right to remain silent. In: ______. Float. New York: Alfred
A. Knopf, Publisher, 2016a. DERRIDA, Jacques. Signéponge. Paris: Éditions de Seuil, 1988. ______.
Essa estranha instituic?a?o chamada literatura: uma entrevista com Jacques Derrida. Traduc?a?o de
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014. ÍBICO. Fragmento 286. In: WILKINSON, Claire Louise. The Lyric
of Ibycus Introduction, Text and Commentary. Berlin/Boston: De Gruyter, 2013, p. 287.
908
do conjunto é em francês e não em português - "hommages excessives" -, o que já sugere alguma
coisa acerca da forma de vida literária do autor de Pena Capital, cuja vocação transnacional foi
também marcada por pontos biográficos muito dignos de nota, como as longas estadias em França
e em Inglaterra, em tempos ditatoriais e censórios. A transferência que aqui se propõe do adjectivo
"excessivas" para atributo de alguns exercícios tradutórios levados a cabo por Cesariny visa assinalar
a singularidade dos resultados desses exercícios, bem como o modo como a obra de Cesariny através
deles recompõe a sua própria expressão artística. Tendo sobretudo em conta este último princípio,
será dado especial destaque aos casos de Rimbaud e de William Morris: o primeiro, objecto de uma
extensa e intensa dedicação ao longo de anos, suscitada por uma muito especial afinidade electiva
cujos traços essenciais importa reconstituir com precisão; o segundo, metonímia expressiva de um
"coup de foudre" tardio pela irmandade pré-rafaelita, cujos contornos e consistência requerem ainda
definição.
Referências: Clare Cavanagh, “The art of losing: Polish poetry and translation”, Partisan Review, vol.
70, 2, Primavera 2003. Leo Strauss, “Persecution and the art of writing”, Persecution and the Art of
Writing, Chicago/ Londres, The University of Chicago Press, 1980. Lydia Davis, “John Ashbery’s
translation of Rimbaud’s Illuminations”, Essays One, Nova Iorque, Picador, 2020. Mário Cesariny, As
Mãos na Água A Cabeça no Mar, Porto, Assírio & Alvim, 2015. Mário Cesariny, Poemas Dramáticos e
Pictopoemas, ed. e pref. Perfecto E. Cuadrado, Porto, Assírio & Alvim, 2020a. Mário Cesariny, Poesia,
ed. e pref. Perfecto E. Cuadrado, Porto, Assírio & Alvim, 2017. Mário Cesariny, Textos de Afirmação
e de Combate do Movimento Surrealista Mundial, Lisboa, Documenta/ Fundação Cupertino de
Miranda, 2021. Os Pré-Rafaelitas: Antologia Poética, pref. e trad. Helena Barbas, Lisboa, Assírio &
Alvim, 2005. Rimbaud, Illuminations, trad. e pref. John Ashbery, Nova Iorque, W. W. Norton &
Company, 2012. Rimbaud, Iluminações/ Uma Cerveja no Inferno, trad. Mário Cesariny, Lisboa, Assírio
& Alvim, 1995.
909
Cidades, 1975 [1965]. CAMPOS, Haroldo de. Ensaio de meta-metalinguagem - O estudo de V. V.
Ivanov sobre o poema Khlébnikov. Revista USP, [S. l.], n. 2, p. 55-70, 1989. DOI: 10.11606/issn.2316-
9036.v0i2p55-70. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/25460.Acesso
em: 15 mar. 2021. CAMPOS, Haroldo de. O texto como produção (Maiakóvski). In: A ReOPERAÇÃO
DO TEXTO.2.ed. São Paulo: Perspectiva, 2013, p. 47-95. CAMPOS, Haroldo de. Transcriação.
Organização: Marcelo TÁPIA, Thelma Médici NÓBREGA.São Paulo: Perspectiva, 2013.
SCHNAIDERMAN, Boris. Haroldo de Campos e a transcriação da poesia russa moderna.
In:Fragmentos: Revista de Língua e Literatura Estrangeiras, Florianopolis, v. 25, 2003.
DOI:https://doi.org/10.5007/fragmentos.v25i0.7678. Disponível
em:https://antigo.periodicos.ufsc.br/index.php/fragmentos/article/view/7678. Acesso em: 19 abr.
2021 SISCAR, Marcos. De volta ao fim: o “fim das vanguardas” como questão da poesia
contemporânea. 1.ed. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2016.
DESTRUIR, TRADUZIR
Larissa Drigo Agostinho
Resumo: Essa comunicação faz parte de um projeto de pesquisa que visa pensar um novo ethos
poético, moderno e igualmente contemporâneo, a partir de dois poetas, Baudelaire e Hölderlin.
Trata-se de comparar dois momentos distintos na criação de dois poetas igualmente bastante
distintos. Nessa ocasião pretendemos explorar, a partir da atuação, tão controversa e comentada,
de Hölderlin como tradutor, de que forma sua prática de tradução forneceria um modus operandi,
ou uma espécie de método ou procedimento, para a criação poética e quem sabe, talvez possamos
dizer, de forma a tradução funciona como uma forma de vida. Desde muito cedo, 1798, Hölderlin se
preocupava sobretudo com a vivacidade (lebendigkeit) na poesia. Em uma carta ao seu amigo
Neuffer ele afirma que a vivacidade na poesia é o que mais o preocupava. Ele acreditava que deveria
extrair do que nele tinha o efeito mais destrutivo, um material, o material indispensável não de sua
poesia, mas de sua vida, e sem o qual o que tinha de mais profundamente seu não poderia estar
presente. Fazer presente o que há de mais seu, sombras da luz, como se aquilo que provoca a
destruição, o ímpeto destrutivo, digamos assim, fosse o tom subordinado de sua alma, entre os quais
ela brota e jorra e brilha da forma mais vivaz. É no manejo do ímpeto destrutivo, força que vem de
fora, que está o caminho para a vivacidade da poesia. De que forma esse processo se articula na
poesia de Baudelaire, no sentido maior da palavra, dos versos à prosa passando pelos diários e pelo
dandismo? Como Baudelaire fez do ímpeto de destruição uma forca motriz de sua poesia?
Referências: Baudelaire. Oeuvres complètes. Paris: Gallimard, 1975. Constantine, David. Hölderlin.
Clarendon Press, 1988. Carson, Anne. “Variations on the right to remain silent”. In: A Public Space,
Brooklyn, New York. Issue 7 / 2008. Fioretos, Aris. The Solid Letter: Readings of Friedrich Hölderlin.
Stanford University Press, 2000. Hölderlin, Friedrich. Hyperion and Selected Poems, edited by Eric L.
Santner. Continuum, 1990.
“A LOJA DE BOMBOM BARATO ALÉM DO EL” OU SOBRE COMO LEMINSKI CANTOU FERLINGHETTI
Lívia Mendes Pereira, Brunno Vinicius Gonçalves Vieira
Resumo: Os autores que Paulo Leminski traduziu, ou melhor, escolheu para fazer parte de seu
“paideuma particular” são em geral revolucionários em suas épocas e serviram como referências
para o futuro. O poeta curitibano não se limitou a uma acomodação passiva nas vertentes
literárias/tradutórias em que participou, ao contrário, a prática tradutória foi decisiva na construção
de sua poiesis singular, seja traduzindo, proseando ou poetando. Assim, Leminski perseguiu o
conceito de “trans-criação em tradução”, nos seus termos: ao reconhecer a “impossibilidade da
tradução enraizada na palavra” e ao considerar o ato de traduzir operando a partir de uma difícil
transformação, relacionada até mesmo a um “ato de violência” (LEMINSKI, 2012 [1986], p. 237), mas
que deve ser digerido de forma que ultrapasse a fronteira do impossível e passe a ser algo crítico e
criativo. Nesse sentido, o poeta fez com que seu trabalho tradutório alcançasse o status de “criação”,
ao produzir novos originais afinados, sobretudo, com sua poética, em alguns casos, como neste que
abordaremos, retificando a própria intentio operis autoral. Trataremos, pois, nesta comunicação a
910
expressividade que Leminski imprimiu nas traduções de poemas do poeta beat norte-americano
Lawrence Ferlinghetti, identificando seus momentos de “re-criação” de uma poesia, que, segundo
Leminski, está mais conectada ao poema falado, como uma espécie de recital. Acontece que essa
interpretação vai contra o próprio alvitre de Ferlinghetti, para o qual “poesia moderna é prosa” e,
conforme o próprio tradutor observa, seria um equívoco do autor, que teria “uma poesia muito
menos prosa do que ele imaginava” (LEMINSKI, 1984, p. 262). Pretendemos, juntos com Leminski,
tratar desses paradoxos, e de outros, diante do poema “A Loja de Bombom Barato [ou seria “dos
caramelos”] Além do El”, em busca de aprofundar a reflexão sobre essa singular forma de vida
antagônica do novo poema traduzido.
Referências: BENJAMIN, Walter. A tarefa do tradutor. Trad. Susana Kampff Lages. In: HEIDERMANN
(org.). Clássicos da teoria da tradução: Alemão-Português. 2.a ed., revisada e ampliada. Florianópolis:
UFSC, Núcleo de Tradução, 2010. Volume I. p. 201-231. CAMPOS, Haroldo de. Da tradução como
criação e como crítica. In: CAMPOS, Haroldo de. Metalinguagem e outras metas. São Paulo:
Perspectiva, 2010 [1963]. p. 31- 48. CARDOZO, Mauricio Mendonça. História da Tradução: a questão
do objeto, o objeto em questão. In: Gilles Abes; Juliana Bergmann; Andréa Cesco (Org.). História da
Tradução: potências de um diálogo. 1.ed. Florianópolis: Rafael Copetti Editor, 2021. v. 1, p. 9-34.
CARDOZO, Mauricio Mendonça. Ler Pelo Não: A Tradução Nos Vãos do Dito. In: SANDMAN. Marcelo;
MÜLLER. Aldaberto. et al. A pau e pedra a fogo e pique: dez estudos sobre a obra de Paulo Leminski.
Curitiba: Imprensa Oficial, 2010. FERLINGHETTI, Lawrence. Vida sem fim: As minhas melhoras
poesias. Trad. Nelson Ascher, Paulo Leminski, Marcos Ribeiro e Paulo Henriques Brito. São Paulo:
Brasiliense, 1984. LEMINSKI, Paulo. FERLINGUETE-SE. In: FERLINGHETTI, Lawrence. Vida sem fim: As
minhas melhoras poesias. Trad. Nelson Ascher, Paulo Leminski, Marcos Ribeiro e Paulo Henriques
Brito. São Paulo: Brasiliense, 1984. [Posfácio, p. 261-265]. LEMINSKI, Paulo. TRANS/PARALELAS. In:
LEMINSKI, Paulo. Ensaios e Anseios Crípticos. Campinas: Editora Unicamp, 2012 [1986]. p. 284-286.
LEMINSKI, Paulo. TAIYO TO TETSU: Entre o gesto e o texto. In: LEMINSKI, Paulo. Ensaios e Anseios
Crípticos. Campinas: Editora Unicamp, 2012 [1986]. p. 226-240. PEREIRA, Lívia Mendes. Paulo
Leminski cancionista e o poema-canção Verdura. ORGANON, v. 35, p. 1, 2019. POUND, Ezra. ABC da
literatura. Trad. José Paulo Paes, Augusto de Campos. São Paulo: Cultrix, 2013 [1970].
911
SISCAR, Marcos; MORAES, Marcelo Jacques; CARDOZO, Maurício Mendonça. Vida poesia tradução.
Rio de Janeiro: 7Letras, 2021.
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Salvador: Universidade Federal da Bahia, 1996, pp. 36-39. COHN, Robert Greer. L'Oeuvre de
Mallarmé: Un Coup de Dés. Paris: Librairie des Lettres, 1951. DAVIES, Gardner. Vers une explication
rationnelle du Coup de Dés: essai d’exégèse mallarméenne. Paris: José Corti, 1953. FALEIROS, Álvaro.
Um lance de dados: contrapontos à sinfonia haroldiana. Revista de Letras, São Paulo, v.47, n.1, p.11-
30, jan./jun. 2007. FALEIROS, Álvaro. Haroldo de Campos e a dobra de Mallarmé. Tessituras,
interações, convergências – XI Congresso Internacional da Abralic, USP, São Paulo, jul. 2008.
MALLARMÉ, Stéphane. Um Lance de Dados. Introdução, organização e tradução de Álvaro Faleiros.
Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2017. ROGER, Thierry. L'Archive du Coup de dés: Étude critique de la
réception d’Un coup de dés jamais n’abolira le hasard de Stéphane Mallarmé (1897-2007). Paris:
Classiques Garnier, 2010.
O RITO, O LUTO E A VIDA: NOTAS SOBRE TRADUÇÃO COM UMA VOLTA POR MALLARMÉ.
Pablo Simpson
Resumo: "No ritual do luto a comunidade é o sujeito autêntico do luto”. A frase anterior provém do
livro "O desaparecimento dos rituais" (2021: 25) de Byung-Chul Han. Gostaria de considerar o que se
propõe aí como uma ritualização do luto no contexto de um debate sobre tradução,
compreendendo-a como o espaço de certa permanência no tempo (a sobrevida) e como afirmação
do próprio tempo (a vida), a partir de três perspectivas. A primeira delas, de uma "agonística que
dramatiza a tarefa do tradutor", como assinalou Paul Ricoeur (2004: 19) ao confrontar tradução e
luto, na esteira da reflexão de Freud em "Luto e melancolia", e no caminho de um certo horizonte
da sabedoria. A segunda delas, do lugar desse luto como fundador de uma "comunidade de
tradutores", para servir-nos de uma formulação de Yves Bonnefoy com a qual pretendeu aproximar
poetas e tradutores do que caracterizaria como um "pensamento da vida", uma evidência do mundo
revelada pela poesia. O objetivo é considerar a afirmação de Byung-Chul Han, ainda, tendo como
terceira perspectiva o projeto de tradução de um conjunto de sonetos de Stéphane Mallarmé, poeta
913
central para uma certa ritualidade da própria poesia moderna, tomada por dimensões do vazio, da
ausência, e pelo gesto elegíaco de seus sonetos-túmulos.
Referências: Bonnefoy, Yves. La Communauté des traducteurs, Presses Universitaires de Strasbourg,
2000. Cardozo, Maurício Mendonça. “TranscriAção, dom de vida”, in Elyra, 9, 06/2017, p.41-57. Han,
Byung-Chul. O desaparecimento dos rituais. Petrópolis: Editora Vozes, 2021. Ricoeur, Paul. Sur la
traduction. Paris: Bayard, 2004.
O JOGO EQUÍVOCO DAS IDENTIDADES: NACÃO, ETNIA E LÍNGUA NA OBRA DE ARLINDO BARBEITOS
Anita Martins Rodrigues de Moraes
Resumo: Nesta comunicação, abordarei o complexo nacionalismo que perpassa a obra do poeta e
historiador angolano Arlindo Barbeitos (1940-2021), investigando a relação que sua poesia trava com
as chamadas formas tradicionais, ou seja, com o repertório cultural de povos que habitam o território
angolano. Pretendo sugerir que o nacionalismo que atravessa sua obra, desde 'Angola Angolê,
Angolema' (1976) e 'Nzoji (Sonho)' (1979), é marcado por questionamentos que se agudizam em seus
últimos livros de poemas, 'Fiapos de sonho' (1992) e 'Na leveza do luar crescente' (1998), bem como
em sua tese de doutorado em antropologia e história colonial, publicada com o título 'Angola-
Portugal: Representações de si e de outrem ou o jogo equívoco das identidades' (2011). Darei
914
destaque para as categorias de “nação”, “etnia” e “língua”, problematizadas por Barbeitos. Em sua
avaliação, onde havia troca e comunicação, que a “proximidade de todas as línguas bantu angolanas”
tornava “relativamente fácil”, a etnologia colonial produziu “unidades tribais”, ou seja, “entidades
diferenciadas e autônomas”, forjando classificações que se perpetuaram e que, inclusive, se viram
incorporadas aos discursos nacionalistas angolanos. Para Barbeitos, não se trata de desejar o bom
equilíbrio entre identidades étnicas e unidade nacional, mas sim de recuar e considerar que a “visão
antropológica” subjacente a programas nacionalistas é historicamente situada, isto é, localizada
numa determinada episteme. Nesse sentido, a onipresença das categorias de “nação”, “etnia” e
“língua” na construção de identidades evidenciaria, para o autor, a força de um imperialismo
epistemológico ainda vigente.
Referências: AIRES, Tiago Manuel Martins. Arlindo Barbeitos: Poética da Concisão. Dissertação em
Literatura Românica, área de Estudos Brasileiros e Africanos. Universidade de Lisboa, 2009.
AMSELLE, Jean-Loup; M’BOKOLO, Elikia (Orgs.). No centro da etnia: etnias, tribalismo e Estado na
África. Tradução de Maria Ferreira. Petrópolis: Editora Vozes, 2017. ARÊAS, Vilma. Água na água.
Revista de Estudos Portugueses e Africanos. Campinas, vol. I, n. 19, pp. 57-66, Jan/jun 1992.
BARBEITOS, Arlindo. Angola, Angolê, Angolema. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1976. ______.
Nzoji (Sonho). Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1979. ______. O rio. Estórias de regresso. Luanda:
União dos Escritores Angolanos (Coleção Contemporâneos); Porto: Edições ASA, 1988. ______.
Fiapos de sonho. Luanda: União dos Escritores Angolanos (Coleção Contemporâneos), 1992. ______.
Na leveza do luar crescente. Lisboa: Caminho, 1998. ______. Angola-Portugal: Representações de si
e de outrem ou o jogo equívoco das identidades. Luanda: Kilombelombe, 2011. GONÇALVES, Zetho
Cunha. Rio sem margem: poesia da tradição oral. Vila Nova de Cerveira (Portugal): NÓSSOMOS, 2011.
______. Rio sem margem: poesia da tradição oral (Livro II). Vila Nova de Cerveira (Portugal):
NÓSSOMOS, 2013. LABAN, Michel. Encontro com Arlindo Barbeitos. In Angola: Encontro com
Escritores (Vol . II). Porto: Fundação Eng. António de Almeida, 1991. LEITE, Ana Mafalda Leite.
Tempos, vozes e sonho: a poesia de Arlindo Barbeitos. In: LEITE, Ana Mafalda Leite. Oralidades e
escritas pós-coloniais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2012, p. 107-115. MARGARIDO, Alfredo. Prefácio a
Poetas Angolanos – Antologia da Casa dos Estudantes do Império (1962). In FREUDENTHAL, A.;
MAGALHÃES, R.; PEDRO, H; VEIGA PEREIRA, C. (Orgs.). Antologias de Poesia da Casa dos Estudantes
do Império (1951-1963) – Angola, São Tomé e Príncipe (Vol. I.). Lisboa: Edição ACEI, 1994. ______. A
Lusofonia e os lusófonos: novos mitos portugueses. Lisboa: Edições universitárias lusófonas, 2000.
MORAES, Anita Martins Rodrigues de. O Voo Esquivo: Arlindo Barbeitos e a Questão da Identidade.
União dos Escritores Angolanos (UEA), 2008. Disponível em https://www.ueangola.com/criticas-e-
ensaios/item/328-o-v%C3%B4o-esquivo-arlindo-barbeitos-e-a-quest%C3%A3o-da-identidade.
Acesso em: 05/09/2021. OLIVEIRA, Mário António Fernandes. Introdução a Poetas Angolanos –
Antologia da Casa dos Estudantes do Império (1959). In FREUDENTHAL, A.; MAGALHÃES, R.; PEDRO,
H; VEIGA PEREIRA, C. (Orgs.). Antologias de Poesia da Casa dos Estudantes do Império (1951-1963) –
Angola, São Tomé e Príncipe (Vol. I.). Lisboa: Edição ACEI, 1994.
915
não aos portugueses, que “dominam indubitavelmente o conteúdo dos 20 capítulos” (LINO, 2020),
mas aos membros de suas ex-colônias – aqueles cuja “língua materna” se configura como “língua do
outro”, para citarmos Derrida em O monolinguismo do outro (2001). O procedimento paródico
permite aproximar O kit de Lino do Manual de Domeneck, uma vez que esse se apresenta como
paródia dos livros de autoajuda. Aqui, está em jogo não o ressentimento de quem perdeu seu poder
político e simbólico, mas o rancor de quem foi abandonado e substituído na esfera amorosa. Alguém
a quem pouco ajuda escrever poemas de insulto, posto que o destinatário dos impropérios “jamais
dignou-se / a aprender” o português, esta “língua / conhecida como a Última Flor / da Irrelevância”
(DOMENECK, 2022, p. 53-54). Uma vez que ambos os escritores escrevem em língua portuguesa
vivendo em países estrangeiros (Lino, nos Estados Unidos; Domeneck, na Alemanha), trata-se de
observar a visada de uma perspectiva lusófona na arena global das relações interculturais.
Referências: DERRIDA, Jacques. O monolinguismo do outro. Trad. de Fernanda Bernardo. Porto:
Campos das Letras, 2001. DOMENECK, Ricardo. Cigarros na cama precedido por Manual para
melodrama. Rio de Janeiro: 7Letras, 2022. HUCHETON, Lina. Uma teoria da paródia. Trad. de Teresa
Louro Pérez. Rio de Janeiro: Edições, 70, 1989. JAKOBSON, Roman. Linguística e comunicação. Trad.
de Izidoro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1969. LINO, Patrícia. O Kit de sobrevivência
do descobridor português no mundo anticolonial. Juiz de Fora: Macondo, 2020. SHOHAT, Ella; STAM,
Robert. Crítica da imagem eurocêntrica: multiculturalismo e representação. Trad. de Marcos Soares.
São Paulo: Cosac Naify, 2006. XAVIER, Ismail. O olhar e a cena: melodrama, Hollywood, Cinema Novo,
Nelson Rodrigues. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
916
Haroldo. Transcriação. Organização Marcelo Tápia e Thelma Médici Nóbrega. São Paulo: Perspectiva,
2013. CHAUI, Marilena. Sobre a violência. Belo Horizonte: Autêntica, 2017. DERRIDA, Jacques. Le
monolinguisme de l’autre. Paris: Galilée, 2016. DERRIDA, Jacques. Da hospitalidade. São Paulo:
Editora Escuta, 2003. DERRIDA, Jacques. “Fidelidade a mais de um. Merecer herdar onde a
genealogia falta”. In.: OTTONI, Paulo. Tradução Manifesta. Double bind e acontecimento. Campinas
e São Paulo: Unicamp e Edusp, 2005. HECKER FILHO, Paulo. Saudades de Voltaire. Porto Alegre:
Sulina, 1998. MATOS, Olgária “Derrida e a língua do outro”. Revista Cult 195, São Paulo, outubro de
2014. MATOS, Olgária “Masculino e feminino. Walter Benjamin e a anti-physis”. Artefilosofia, V. 15,
n 29, Ouro Preto, 2020. PAZ, Gaspar. Interpretações de linguagens artísticas em Gerd Bornheim.
Vitória: Edufes, 2020.
APARIÇÕES DO ALÉM-MAR
Lúcia Ricotta Vilela Pinto
Resumo: A proposta busca retomar uma abordagem das estratégias de demarcação de fronteiras e
de suas exclusões, no âmbito da teoria da literatura presente em "Nacional por subtração" (1986) e
"Ideias fora do lugar" (1987), por Roberto Schwarz. O objetivo é avaliar como o estado presente de
determinadas experiências poéticas e artísticas recolocam no campo de uma visão do passado
espaços da língua de outros corpos (supostamente esquecidos) da lusofonia. No poema "Cemitério
marinho" de Poesia+ (antologia 1985-2019), de Edmilson de Almeida Pereira, no livro A água é uma
máquina do tempo (2022) e nas vídeo-instalações de Aline Motta percebemos uma preocupação
comum voltada a revolver a fixidez dos contornos da nação pelo desembarque nas águas navegáveis
de sua memória afro-brasileira. O que o discurso crítico de Roberto Schwarz fez foi articular
interpretação social e estética à escravidão, levando em consideração, como parte do processo
epistemológico e político da literatura, um lugar nacional que traduzisse o pensamento brasileiro. Os
trabalhos acima mencionados trocaram o curso desse pensamento. Ruas infernais da escravidão,
mar de histórias, navios negreiros e um mapa estrutural da experiência de pessoas negras em nossa
sociedade, existem agora nos entalhes, ossos e negativos transatlânticos, "apesar do abismo onde/
a forma informe ( a/ linguagem/) nos experimenta". E eis então desdobramentos tradutórios de
interculturalidade nesses exemplares de poesia-cemitério, que trai e traduz "outros-além-outros" na
lusofonia. Espera-se considerar ainda os tensionamentos da linguagem e outros meios poéticos, em
cada um dos poetas em questão, à luz da aparição de Exu e "Maxado" de Assis e seus deslocamentos
críticos e criativos. E à luz assim da reverberação de uma história de vínculo com os mortos.
Referências: DERRIDA, Jacques. Espectros de Marx: o estado da dívida, o trabalho do luto e a nova
internacional. Tradução Anamaria Skimmer. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994 HARTMAN.
Saidiya. Perder a mãe: uma jornada pela rota atlântica da escravidão. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,
2021. MOTTA, Aline. A água é uma máquina do tempo. São Paulo: Círculo de Poemas, 2022. PEREIRA,
Edmilson de Almeida Pereira. Poesia + (antologia 1985-2019). Prefácio de Roberto Zular. São Paulo:
Editora 34, 2019. . Entre Orfe(x)u e Exunouveuau. Rio de Janeiro:Azougue, 2017. SCHWARZ, Roberto.
Que horas são? São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
917
lastimoso por aquilo que destruiu. O lugar de enunciação, mesmo quando complexo e ambivalente,
se constitui a partir dessas exclusões e é incapaz de dar forma às perspectivas das duas mulheres.
“Literatura brasileira” é o nome que se dá a esse quadro, e a pergunta relevante para qualquer ética
da leitura é como entendemos o sentido do desfecho festivo – do conto e da formação da literatura
brasileira, isto é, como avaliamos os custos e sacrifícios necessários para o surgimento da literatura
nacional. No conto, o custo é o confinamento das duas mulheres, com seu canto, classificado como
loucura, passando a servir como matéria prima.
Referências: BAPTISTA, Abel Barros. O livro agreste: ensaio de curso de literatura brasileira.
Campinas: Ed. da Unicamp, 2005. BHABHA, Homi K. O local da cultura. Trad. de Myriam Ávila; Eliana
L. L. Reis; Gláucia R. Gonçalves.Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998. DERRIDA, Jacques. O monolinguismo
do outro. Trad. de Fernanda Bernardo. Belo Horizonte: Chão da Feira, 2016. RANCIÈRE, Jacques. João
Guimarães Rosa: a ficção à beira do nada. Trad. de Inês Oseki-Dépré. Relicário, 2021. ROSA, João
Guimarães. “Soroco, sua mãe, sua filha”. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
918
superiores”. Três décadas mais tarde, João Adolfo Hansen (2016), assumindo uma “perspectiva
internacionalista” que descarta a um só tempo o problema das “ideias fora do lugar” bem como a
resposta nacionalista ao mesmo, irá defender, com base em Abel Barros Baptista, a “ideia da
literatura como hospitalidade incondicional e tradução”. Nesse movimento, Hansen endossa
inadvertidamente a concepção universalista de Weltliteratur postulada no século XIX por Goethe –
a qual “se referia ao que é genericamente humano e comum a todos os homens” –, ignorando as
profundas desigualdades reconhecidas por Franco Moretti (2001) no “sistema-mundo literário”. O
problema reside na falsa equivalência sugerida por Hansen entre “hospitalidade condicional” e
“tradução”: voltando às proposições de Baptista (2005; 2014), mostraremos que a tradução se
impõe, na verdade, justamente porque a hospitalidade incondicional no que se refere à literatura
não passa de uma “utopia”, e que a heterogeneidade linguística que reclama a tradução como
performance constitutiva do idioma é justamente o que permite que se recoloque em nova chave o
problema do nacional(ismo) no campo estético-literário: nacional por tradução.
Referências: BAPTISTA, Abel Barros. O livro agreste: ensaio de curso de literatura brasileira.
Campinas: Ed. da Unicamp, 2005. BAPTISTA, Abel Barros. Três emendas: ensaios machadianos de
propósito cosmopolita. Campinas: Ed. da Unicamp, 2014. HANSEN, João Adolfo. Lugar do cânone e
da crítica nos estudos literários da universidade hoje. In: LOPES, Dayana M. et al. (Org.) VI Seminário
dos alunos da Pós-Graduação da UERJ. Rio de Janeiro: Letras e Versos, 2016. p. 7-38. MORETTI,
Franco. Conjecturas sobre a literatura mundial. In: SADER, Emir (Org.). Contracorrente: o melhor da
New Left Review em 2000. Rio de Janeiro: Record, 2001. p. 45-64. SCHWARZ, Roberto. Nacional por
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menino prodigioso que nasce da união entre um indígena e uma anta. Desta forma, nas literaturas
produzidas pelos povos indígenas, em especial por Clemente Flores, a língua portuguesa reflete e
refrata aquilo que podemos chamar de cosmovisão indígena, nas qualidades de pessoa. Nela a
pessoa humana não é apenas uma nem está sozinha. Ela é uma potencialidade que em especial, se
manifesta nos diálogos entre as diversas qualidades de gentes dos cosmos e se materializa através
da arte, em particular da verbal, da literatura.
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TRADUÇÃO À ELEGIA AO POETA FEDERICO GARCÍA LORCA, COMPOSTA POR MIGUEL HERNÁNDEZ
DURANTE A GUERRA CIVIL ESPANHOLA
Andrea Cristiane Kahmann
Resumo: Miguel Hernández Gilabert (Espanha, Orihuela, 1910 – Alicante, 1942) foi um poeta e
dramaturgo autodidata de origem humilde. Sua estreia na poesia flertava com formas clássicas e
temas católicos, mas por meio de colegas de letras, sobretudo Pablo Neruda e Vicente Aleixandre,
que o acolheram, acabou sendo introduzido a novas formas e ideias. É considerado, juntamente com
Federico García Lorca, uma das mais emblemáticas vítimas do fascismo que assolou a Espanha a
partir da Guerra Civil de 1936. Diferentemente de Lorca, morto quando a guerra nem bem eclodira,
Hernández viveu-a toda para morrer depois. Alistou-se à Resistência, ainda sob a comoção do
“desaparecimento” do colega andaluz. Para além da luta como brigadista republicano, ajudou a
organizar um jornal da resistência e compôs obras para levantar o moral de combatentes. O
poemário “Viento del pueblo” é deste período, e inicia com uma elegia a Federico García Lorca. Este
é o poema para o qual, neste trabalho, proponho por primeira vez uma tradução, como a clamar
pelo não esquecimento de duas mortes tão brutais. Quando as forças golpistas de Franco se
instalaram na Espanha por um banho de sangue, Hernández foi condenado à morte, convertida em
prisão perpétua por pressão estrangeira, tais como a do diplomata Pablo Neruda. Mas fome, frio,
maus tratos e doenças que poderiam ter sido tratadas condenaram Miguel Hernández à morte física
que não lhe deram as armas. Os fascistas tentaram impingir-lhe, ainda, a morte simbólica, o
desaparecimento de sua obra do cânone literário, o silenciamento sobre seu nome, mas não
conseguiram. Este é um trabalho sobre uma poesia em tradução, mas também sobre a força
transformadora da poesia - e de poetas que se relacionam, aprendem e ensinam, revoltam-se e
lutam. É, por fim, uma proposta de tradução contra o silenciamento, contra o esquecimento, uma
tradução antifascista.
Referências: HERNÁNDEZ GILABERT, Miguel. Elegía primera (A Federico García Lorca, poeta).
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924
especial, dos estudos de tradução de poesia. Por fim, baseados em conceitos de visualidade do texto
de Flusser (2017) e de literatura e performance de Zumthor (2014), buscamos realizar uma proposta
de definição polissêmica para esse conceito.
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Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo: Cosac Naify, 2014.
925
de ser contemporâneo de heróis míticos cujas falas e ações contempla e comenta do ponto de vista
das instituições e valores da democracia ateniense. Na comédia, essa sobreposição temporal é
substituída por sobreposição de registros; a linguagem solene da tragédia, própria à interlocução do
coro com heróis míticos e destes com os Deuses, se funde ao registro dos perrengues políticos e
particulares de cidadãos comuns, e o registro sublime da vida heroica se funde com o registro da
vida cotidiana de cidadãos toscos, banais e chulos. Como traduzir em português hoje essas tensões
e ambiguidades entre os dois registros linguísticos fundidos na apropriação da linguagem trágica pela
comédia e assim constitutivos da comédia como poesia? Tomando por paradigma a tradução que se
propõe traduzir a forma inteligível da tragédia, é preciso para a tradução da comédia manter o
escopo de transpor a forma inteligível própria da comédia como poesia e, desta forma, as tensões e
ambiguidades entre a democracia em política interna e a tirania em política externa bem como entre
a linguagem sublime da vida heroica e a linguagem tosca dos perrengues da vida cotidiana. Para
exemplificar se e como se atenderiam às demandas e exigências desta tradução da forma inteligível
própria da comédia como poesia, recorreremos a excertos de As Vespas de Aristófanes.
Referências: ARISTÓFANES. As Vespas; As Aves; As Rãs. Tradução do grego, introdução e notas de
Mário da Gama Kury. 3ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. ARISTOPHANES. Wasps. Commentary by
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O RITMO DO VERSO NA TRADUÇÃO DOS POEMAS DE JAMES JOYCE
Vitor Alevato do Amaral
Resumo: James Joyce (1882-1941) publicou seu primeiro livro em 1907, uma sequência de poemas
de marcado gosto simbolista e musicalidade elizabetana chamada Chamber Music (Música de
câmara ou Récita privada). Seu segundo livro de poemas, Pomes Penyeach (Poemas porversos, entre
outras traduções existentes), só apareceu em 1927. Além deles, três poemas de ocasião foram
publicados: “The Holy Office” (1904; “O Santo Ofício”), “Gas from a Burner” (1904; “Gás de um bico”)
e “Ecce Puer” (1932). Joyce também escreveu, mas não publicou, mais de uma centena de poemas,
incluindo algumas traduções. No Brasil, os poemas não coligidos de Joyce foram reunidos no livro
Outra poesia (2022). Portanto, apesar de nomeadamente prosador, o escritor irlandês também
escreveu poemas e fez algumas reflexões sobre a arte do verso (Joyce, 1963 e 2008). Nas suas
reflexões sobre literatura, Joyce tratou reiteradamente do ritmo, que constitui, para ele, um aspecto
fundamental do texto. Em seu ensaio de 1904, “A Portrait of the Artist” (“Um retrato do artista”),
precursor do romance A Portrait of the Artist as a Young Man (1916; Um retrato do artista quando
jovem) ele já enfatizava a necessidade de “liberar dos pedaços personalizados de matéria aquilo que
é seu ritmo individualizante, a primeira ou formal relação entre suas partes” (Joyce, 1991: 211). O
objetivo desta comunicação é tratar do aspecto rítmico da poesia de Joyce na tradução,
principalmente para a língua portuguesa, à luz das ideias do autor.
Referências: Joyce, James. Stephen Hero. Organizado por Theodore Spencer, A New Directions Book,
1963. ---. Occasional, Critical, and Political Writing. Organizado por Kevin Barry, Oxford, 2008. ---. “A
Portrait of the Artist”. Poems and Shorter Writings, organizado por Richard Ellmann et al., Faber and
Faber, 1991, pp. 2011-218.
JE TRADUIS TOUJOURS DANS UNE AUTRE LANGUE. JE NE SUIS L'HÔTE D'AUCUNE. L´ÉTHIQUE DU
TRADUIRE, LE THÈME ET LE MIGRANT.
Alice Maria de Araújo Ferreira
Resumo: En traduction, le rapport aux langues est un point d´inflexion et/ou de réflexion. Il légitime
la traduction évidemment, mais établit aussi une direction _un sens_ dans la relation : thème ou
version. Cette direction va dépendre des rapports que le sujet traducteur entretient avec les langues
qu´il pratique. Les catégories de langue maternelle, langue nationale, et langue seconde ou étrangère
réitèrent souvent le discours sur le rapport à la nation et donc aussi à l´étranger. L´objectif de la
communication est d´interroger le discours éthique en traduction qui s´articule autour du rapport
national/étranger à partir de celui qui accueil et le mettre aujourd´hui à l´épreuve de l´é/i-migré et
du thème, de celui qui se traduit dans/avec l´autre. Le sujet é/i-migré ne sépare pas facilement ce
que la distance a éloigné ; un sentiment paradoxal, la saudade quiçá, qui rend présent ce qui est
absent et absent ce qui est présent. Il relie ce que la catégorie moderne d'État-nation a distingué, en
tant que nationaux étrangers, des sujets contemporains qui mobilisent et/ou convoquent un
discours post-états-nations. Notre discussion propose deux moments : un récit personnel de
migration et traduction pour interroger les rapports affectifs que le sujet e/i-migré entretient avec
les langues qui lui servent à vivre. Un essai critique qui interroge le bien-fondé du sens unique,
traduire l´étranger, pour le mettre à l´épreuve du thème dans son double rapport : comment traduire
dans un double rapport éthique à l'altérité et à l'original qui, cette fois, ne sont pas du même côté ?
Et plus largement avec Meschonnic (2007), comment (car c'est toujours une manière) être éthique
avec soi-même et avec l'autre tel que les deux se constituent comme sujet par/dans la relation ?
Referências: BERMAN, Antoine. L’Épreuve de l´étranger : culture et traduction dans l’Allemagne
romantique. Paris : Gallimard, 1984. FERREIRA, Alice Maria Araújo. “Traduzir-se po-eticamente”.
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Eduardo “Filiação Intensiva e Aliança Demoníaca”, NOVOS ESTUDOS 77; MARÇO 2007 pp. 91-126
929
gênero da literatura de viagem ou a outros gêneros, e sua importância residiria apenas em ser um
registro documental de uma época. De uma forma mais explícita que a literatura de viagem, a
tradução literária é raramente contemplada em uma história da literatura como elemento
constitutivo do sistema literário brasileiro, apesar de historicamente ocupar um enorme espaço no
nosso mercado editorial. Assim como a literatura de viagem, a tradução literária ocupa o mesmo
espaço intermediário: trata-se de uma obra de autoria estrangeira, apesar de ter sido reescrita em
nossa língua e passado a fazer parte de nosso sistema literário. Em função de sua bidirecionalidade
discursiva - tanto a tradução quanto a literatura de viagem confrontam em um texto duas culturas e
línguas – essa produção desafia os critérios nacionalistas que fundamentam a formação do cânone
literário brasileiro. A partir da análise de algumas histórias literárias brasileiras mais conhecidas, por
meio de um levantamento que não é exaustivo, mas representativo, mostramos como essa produção
ora é tratada apenas como um documento de um período da história brasileira, ora como um assunto
estrangeiro, quando muito é estudada a partir de algum caso isolado, invariavelmente desconectada
da narrativa de desenvolvimento da literatura nacional brasileira.
Referências: BORM, Jan. Defining travel: on the travel book, travel writing and terminology. In:
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Comparada). WYLER, Lia. Línguas, poetas e bacharéis: uma crônica da tradução no Brasil. Rio de
Janeiro: Rocco, 2003.
A TRADUTORA E A ONÇA
Émilie Geneviève Audigier
Resumo: No século XVI, o frade André Thevet capturou e traduziu para o francês fragmentos
narrativos orais de uma cosmogonia tupinambá dos indígenas Tamoio, da Baía de Guanabara. Em
Meu destino é ser onça, Alberto Mussa juntou Le Brésil d’André Thevet Les Singularités de la France
Antarctique e La Cosmographie (1557), ente outros. Como tradutora do livro, juntei o texto em
português brasileiro modificado e passei de volta para o francês. Ou seja, não há um caso literário
que celebre mais a atividade do tradutor, ainda mais considerando a atual tradução de Alberto
Mussa em tupi antigo. O processo de escrita é plural, híbrido, composto, passa por diversas camadas
de textos, junta vários fragmentos de memória, leituras e experiências. A escrita possui esse
mecanismo inerente à criação — nada se cria, tudo se transforma. Toda escrita é jogo de composição,
pluralidade, apagamento, como demonstram os estudos sobre a genética literária e a
intertextualidade. A tradução funciona de maneira similar, como um palimpsesto. Precisa dessas
diferentes versões, sem necessariamente existir uma hierarquia, ou uma autoridade maior entre
elas. A restauração mitológica valoriza o motivo metafísico do ritual da antropofagia, visto com
horror pelos europeus, porém essencial na sociedade indígena. O livro oferece uma visão sobre o
canibalismo como única atitude cultural capaz de transformar o mal, inevitável e inerente à natureza,
em bem. Essa transformação se torna indispensável e faz parte de um sistema complexo de vingança,
no objetivo de manter a sociedade viva. O mito também faz eco à reflexão dos modernistas Oswald
de Andrade e Haroldo de Campos sobre a tradução, pois eles que concebem os atos de escrever e
traduzir como uma metáfora da devoração. “Meu jeito de amá-los é traduzi-los.”
Referências: ANCHIETA José de, Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões de Padre
Joseph de Anchieta (1554-1594). Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1933 CARDIM, Fernão,
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em português do Brasil, o texto será apresentado em tradução comentada sob o título "As cartas do
retornado".
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SEBALD, W.G. Unheimliche Heimat: Essays zur österreichischen Literatur. Frankfurt am Main: Fischer
Taschenbuch Verlag, 1995.
933
tradução etnográfica, isto é, a realidade social apreendida a partir do “ver”, transformada em
linguagem; do esforço de transformar o olhar do viajante em escrita, segundo nos explica Laplantine
(1996) e de sua relação com a tradução interlingual (JAKOBSON, 2011), pois a realidade vivenciada
pela viajante em uma língua estrangeira, no caso, a portuguesa, está sendo transmitida/traduzida ao
leitor por meio da narrativa de viagem. Somado ao exposto, acrescentaremos as categorias de
classificação e de tradução de culturemas ou Itens Culturalmente Marcados elaboradas por Franco
(1996) e Molina (2006; 2011), que tem nos auxiliado na percepção das técnicas de tradução utilizadas
pelas três viajantes.
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1951.
935
Resumo: O Livro de Kalila e Dimna, tradução indireta feita no século VIII d.C. do Pañcatantra indiano
( composto por volta do século I d.C.), sempre padeceu de algum tipo de "instabilidade filológica"
em árabe, instabilidade essa derivada de vários fatores, entre os quais pode-se mencionar o fato de
ser uma obra pioneira que praticamente fundou a ficção em árabe, de ter sido realizada por um
letrado cuja primeira língua não era o árabe, de haver tido uma ampla disseminação entre os leitores
e ouvintes dos mais diversos extratos sociais e de sua própria estrutura de "narrativas encaixadas",
que muita vez é um estímulo para a ampliação e a introdução de narrativas. Um dos exemplos disso
é a diferença do número de capítulos em diversos manuscritos dessa obra. "O casal de patos e o
maçarico" (na tradução espanhola do século XIII, "De las garças et del çarapico") ilustra bem essa
instabilidade, na medida em que, conquanto presente em várias traduções ocidentais feitas a partir
do árabe, consta em apenas três manuscritos nessa língua e não faz parte de nenhuma de suas
edições impressas. A contrário do que parte da crítica vem afirmando, desde o trabalho equivocado
do arabista Joseph Derenbourg no longínquo ano de 1887, nosso argumento segue a linha de que tal
capítulo pode ser considerado parte legítima de Kalila e Dimna e deveria encontrar seu lugar entre
os capítulos desse livro.
Referências: Cacho-Blecua, J. M., e Lacarra, M. J. (ed.). Calila e Dimna. Madrid, Castalia, 1984.
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Instituto de Estudios Islámicos y del Oriente Próximo, 2009. Garcia, Liliane Vargas. Políticas da
Tradução: História e Crítica Através do Prototexto Literário de Calila e Dimna (1251). Florianópolis,
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(2012; 2009). The Cultural Politics of Slam Poetry: Race, Identity, and the Performance of Popular
Verse in America. Ann Arbor: The University of Michigan Press.
937
alimentam os abutres. O autor contrasta a grandeza da natureza com a singeleza do modo de viver
dos habitantes. Sente medo dessa realidade desconhecida, diferente da sua vida de Londres. Se
apavora diante da escuridão tranquila e quente. Tudo ao seu redor constitui uma ameaça nessa terra
que lhe é estranha. Tudo parece aterrorizante , inclusive as notícias de doenças, como a febre que
se espalha.
Referências: Tomlinson, H. M. The Sea and the Jungle. Published, 1920, by E. P. Button & Company,
NY. NEW YORK E.P. DUTTON & COMPANY 681 FIFTH AVENUE
DAS ILHAS ITALIANAS PARA O BRASIL: GRAZIA DELEDDA E MARIA MESSINA EM PORTUGUÊS
Rafael Ferreira da Silva
Resumo: Localizadas no Mar Mediterrâneo, sem pontes para a península itálica, as ilhas Sicília e
Sardenha sempre foram terreno fértil para as artes, sobretudo a literatura. De fato, a Sicília não só
se lançou, na primeira metade do século XIII, como o berço da tradição literária em língua italiana,
como também goza do fato de ser a terra natal de grandes escritores contemporâneos. Por outro
lado, a Sardenha tem a tradição literária em língua italiana afirmada cinco séculos após, no século
XVIII, quando o italiano se torna a língua oficial. Um fato curioso que seus autores e autoras
compartilham é a constante exposição de seus territórios e tudo o que encerram. O objetivo desta
comunicação é discutir sobre a tradução destes marcadores culturais e identitários em textos de
duas autoras insulanas italianas: “Ragazze siciliane”, da siciliana Maria Messina (1887-1944) e “Fior
di Sardegna”, da sarda Grazia Deledda (1871-1936). Considerando que a tradução é um dos motores
essenciais para a constituição e a unificação do espaço literário mundial (Casanova, 2005), propomos
as primeiras perguntas de pesquisa: (1) Que elementos identitários-culturais as ilhas italianas
apresentam? e (2) São elementos semelhantes ou diferentes aos elementos identitários-culturais da
península itálica?; e com o intuito de aproximar essas duas realidades geográficas, através da
intercompreensão, da abertura de imaginações, culturas, para revelar as relações de identidade e
heterogeneidade, propomos a terceira e a quarta perguntas: (3) Como são/poderiam ser traduzidos
tais elementos numa perspectiva estrangeirizadora? e (4) E numa perspectiva domesticadora? Nossa
hipótese é de que o tradutor, migrante, que intermedeia a circulação das obras literárias e as
diferenças culturais, crie pontes (Paes (1990)) entre as diversas culturas através de seu ponto de
vista.
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940
França, se especializou na tradução da língua portuguesa, dando vida à obra do escritor português
Miguel Torga e dos brasileiros Harry Laus e Caio Fernando Abreu na língua francesa. Com essa
pesquisa, levanto questões pertinentes no que se refere ao trabalho de tradução cultural realizado
por Claire Cayron, onde a tradutora deixa de ser uma mera mensageira e passa a ser uma criadora
de informação, assumindo uma posição transcriadora. Para isso, faço uso Da Transcriação, de
Haroldo de Campos, e de Defesa e ilustração da abordagem hermenêutica em tradução (2021), de
Ioana Balacescu e Bernd Stefanik, para a análise de trechos específicos onde aspectos regionais,
provenientes da origem e da vivência de Caio F., podem ter-se apresentado como desafios
tradutórios para Claire Cayron.
Referências: ABREU, Caio Fernando. Les Dragons ne Connaisent Pas le Paradis. Tradução: Claire
Cayron e Alain Keruzoré. Bruxelles: Complexe, 1991. ABREU, Caio Fernando. Os Dragões Não
Conhecem o Paraíso. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. ABREU, Caio Fernando. Morangos
Mofados. Rio de Janeiro: Agir, 1982. BALACESCU, Ioana. & STEFANINK, Bernd. Defesa e ilustração da
abordagem hermenêutica em tradução. Tradução por Catarina Frescura Junges. Qorpus v.11 n.3
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https://qorpuspget.paginas.ufsc.br/files/2021/11/qorpus-v11n3-Catarina-Frescura-Junges.pdf
Acesso em: 26 de dezembro de 2022 CAMPOS, Haroldo de. Da Transcriação: Poética e Semiótica da
Operação Tradutora. Belo Horizonte: FALE/UFMG – Viva Voz, 2011 DIP, Paula. Para sempre teu, Caio
F.: cartas, conversas, memórias de Caio Fernando Abreu. – Rio de Janeiro: Record, 2009.
941
equivocação controlada. Tradução de Marcelo Giacomazzi Camargo e Rodrigo Amaro. ACENO -
Revista de Antropologia do Centro-Oeste, v. 5, p. 247-264, 2018. Disponível em:
https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/aceno/article/view/8341
942
estudos contemporâneos de Dirce Waltrick do Amarante (2022) e o contraponto de Sergio Medeiros
(2022) em busca da visibilidade tradutória.
Referências: CHAMBERLAIN, Lori. Gênero e a metafórica da tradução. Tradução de Norma Viscardi.
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Tradução. São Paulo: Edusc, 2002.
943
Resumo: A partir de traduções encontradas e disponíveis, para a língua inglesa, dos contos
populares, ou contos de fadas, de Hovhannes Tumanian (1869-1923), considerado um dos grandes
escritores da literatura armênia, discute-se, primeiramente, o conceito de invisibilidade do tradutor,
conforme Lawrence Venuti (2021). Sobretudo porque, nessas traduções que analisaremos (1971,
2007, 2018), observa-se um apagamento de quem são as pessoas que traduzem, abrangendo até
mesmo a língua de partida - supõe-se a possibilidade de essas traduções terem como língua de
partida o russo, língua para a qual estão traduzidos todos esses contos de Hovhannes Tumanian. Em
duas edições (1971, 2018), as semelhanças encontradas apontam para uma possível reedição da
tradução anterior, ou um cotejo, devido à profunda semelhança da ordem sintática e do léxico,
porém não constam tais informações na edição posterior. Para compreender esse apagamento,
consultam-se as ideias de David Bellos (2011), concernentes ao prestígio e ao desprestígio conferido
a determinadas línguas de partida, as de Gideon Toury (1985), acerca da tradução de línguas
minoritárias, de Itamar Even-Zohar (1970; 1979; 1990) e de José Lambert (1983), a respeito de
sistema e polissistema literários. Considera-se, ainda, o conceito de gêneros literários canônicos,
segundo a perspectiva, principalmente, de Harold Bloom (1995), Ítalo Calvino (20010) e Lígia
Chiappini (2005), uma vez que são contos de fadas, na visão de várias traduções – embora
discordemos dessa terminologia na nossa própria tradução desses textos, que denominamos contos
populares, seguindo a classificação que foi dada a esses contos em sua primeira edição (TUMANYAN,
1930) e em outra posterior (TUMANYAN, 1949). De uma ou de outra maneira, um gênero não tido,
historicamente, como “alta literatura”. Merece atenção a escassez de informações e de discussão de
como essas traduções são realizadas, visando compreender o tratamento insuficiente de que esses
textos são alvo.
Referências: BELLOS, David. Is that a fish in your ear?: translation and the meaning of everything.
Nova York: Faber and Faber (Farrar, Straus and Giroux), 2011. BLOOM, Harold. O cânone ocidental.
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944
ASPECTOS CULTURAIS DE FLAMENCA: A CULTURA MEDIEVAL NOS PARATEXTOS DAS TRADUÇÕES
DE ANTON M. ESPADALER
Iago Espindula de Carvalho, Kall Lyws Barroso Sales
Resumo: Este trabalho apresenta uma discussão introdutória acerca dos paratextos das traduções
de Flamenca, romance occitano do século XIII, por Anton Maria Espadaler Poch para o catalão (2015)
e para o espanhol (2019), buscando apresentar uma leitura crítica sobre a cultura a partir dos estudos
da tradução. Fundamentaremos esta investigação nos estudos da tradução de Antoine Berman
(1995; 2002; 2012) e na análise crítica das paratraduções (YUSTE FRÍAS, 2010; 2014; 2015) e dos
discursos de acompanhamento (TORRES, 2011). Assim, discutiremos aspectos sobre a forma como a
cultura medieval foi traduzida por Espadaler na edição para o catalão, lançada em 2015 pela editora
da Universidade de Barcelona, e a na edição para o espanhol, pelo mesmo tradutor, lançada em
2019, pela Roca Editorial, tomando como base para essa reflexão os paratextos das duas edições. No
que se refere à edição catalã, serão também consideradas as perspectivas do próprio tradutor no
trabalho “Cuatro pinceladas para Flamenca” (ESPADALER, 2018), texto publicado como estudo
posterior à publicação como complemento aos estudos empreendidos nela. Dessa forma,
buscaremos entender, principalmente com auxílio dos prólogos e das notas de fim das duas edições,
os caminhos tradutórios recorridos por Espadaler para apresentar aspectos da cultura da obra de
partida em suas traduções.
Referências: ANÔNIMO. Flamenca. Tradução prólogo e notas de Anton M. Espadaler, Barcelona,
Publicacions i Edicions de la Universitat de Barcelona, 2015. _________________. Flamenca.
Tradução prólogo e notas de Anton M. Espadaler, Barcelona, Roca Editorial, 2019. BERMAN, Antoine.
A tradução e a letra ou o albergue do longínquo. Tradução de Marie-Hélène Catherine Torres, Mauri
Furlan, Andreia Guerini. 2ª ed. Tubarão: Copiart; Florianópolis: PGET/UFSC, 2012. Disponível em:
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Gérard. Paratextos editoriais. Tradução de Álvaro Faleiros. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009. SALES,
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Santa Catarina, Florianópolis, 2014. Disponível em:
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informacion-detallada/174-au-seuil-de-la-traduction--la-paratraduction.html> Acesso em: 25 ago.
2022. _________________. Paratextualidade e Tradução: a paratradução da literatura infantil e
juvenil. In: Cadernos de Tradução. Florianópolis, nº 34, jul-dez, 2014. _________________.
Paratradução: a tradução das margens, à margem da tradução. DELTA: Documentação e Estudos em
Linguística Teórica e Aplicada, [S. l.], v. 31, n. 4, 2015. Disponível em:
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945
CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL DO TRADUTOR INDÍGENA: A TRADUÇÃO DO WÄTUNNÄ
YE'KWANA
Isabel Maria Fonseca
Resumo: A presente comunicação tem o objetivo de apresentar aspectos relativos à minha pesquisa
de doutorado em andamento sobre a Arte verbal do povo Yek’wana e os processos de
deslocamentos de construção de sentidos – criação, recriação, circulação e tradução. Os Ye’kwanas
habitam, com diversos outros povos indígenas, a grandiosa área cultural denominada de Circum
Roraima, localizada na tríplice fronteira Brasil-Guina-Venezuela. Para tanto, tomamos como
referência duas versões de Wätunnä, o fascinante conjunto narrativo de caráter histórico-mitológico
do povo Ye’kwana: a primeira foi publicada em 1970, em língua espanhola na Venezuela, por aquele
que é considerado o maior mitólogo do rio Orinoco, o francês Marc de Civrieux, que coletou as
narrativas mitológicas juntos aos Ye’kwana entre os anos de 1950 a 1970. A obra é intitulada
Watunna Mitologia Makiritare e é considerada um clássico da Literatura Indígena na Venezuela; A
segunda, intitulada Histórias e Saberes Ye’kwana, tem como autor o professor indígena Ye’kwana
Marcos Rodrigues e é a primeira versão do Wätunnä coletada, escrita e traduzida por um Ye’kwana.
A obra foi publicada em 2019, em Roraima, numa versão bilíngue - em língua Ye’kwana e em língua
Portuguesa. Sem a pretensão de aprofundamentos sobre os estudos da tradução, daremos ênfase
nesta interação ao papel do pesquisador e tradutor indígena Marcos Rodrigues e suas estratégias
tradutórias. Papel esse entendido como um acontecimento, uma ação, um ato de resistência e
emancipatório, como o de traduzir a própria língua e seus textos.
Referências: ALMEIDA, Maria Inês; QUEIROZ, Sônia. Na captura da voz: as edições da narrativa oral
no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica; FALE/UFMG, 2004. ANDRADE, Karenina Vieira. Wätunnä: a força
de uma profecia Ye’kuana. In: Tellus. Ano 9, n. 1, Campo Grande: UCDB, jul./dez. 2009, BENJAMIN,
Walter. Escrito sobre mito e Linguagem. GAGNEBRIN, Jeanne marie (Org). Traduzido por Susana
Kampff Lages, Ernani Chaves, São Paulo: Editora 34, S\D. BERMAN. Antoine. A prova do estrangeiro:
cultura e tradução na Alemanha romântica. Tradução de Maria Emília Pereira Chanut. Bauru, São
Paulo: Edusc, 2002. BROTHERSTON, Gordon & MEDEIROS, Sérgio. (Orgs.). Popol Vuh. São Paulo:
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GIMENES, Fernando Yekuana. Os cantos tradicionais ye'kwana. 2020. 138 f. Dissertação (Mestrado
em Letras) – Programa da Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal de Roraima, Boa Vista,
2019. RODRIGUES, Marcos. Histórias e Saberes Ye'kwana. In: CARVALHO (ORG). Leitura de textos
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VENUTI, Lawrence. Escândalos da tradução: por uma ética da diferença. Lawrence Venuti; traduzido
por Laureano Pelegrin, Lucinéia Marcelino Vilela, Marileide Dias Esquerda, Valéria Biondo; revisão
técnica Stella Tagnuin.- São Paulo: Editora Unesp, 2019. VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. O recado da
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ZUMTHOR, Paul. Introdução à poesia oral. Trad. Jerusa Pires Ferreira, Maria Lúcia Diniz Pochat e
Maria Inês de Almeida. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2010.
946
Resumo: Nesta comunicação apresento uma discussão sobre a tradução dos romances ditos beurs,
escritos por autores e autoras oriundos da imigração magrebina na França, com o recorte nas escritas
de Leïla Sebbar, Azouz Begag, Faïza Guène, cujas obras instigam a reflexão sobre exílio, xenofobia,
sexismo, aporofobia e o lugar do intrangeiro (SALES, 2022) na ficção francesa contemporânea. As
autoras e o autor escrevem de lugares distintos, mas constroem de forma aproximada uma narrativa
de “encruzilhada” (LARONDE, 1993), pois trazem uma poética da intersecção de universos múltiplos
no qual a identidade é este elemento de busca. Como autores com origem na imigração, suas escritas
possuem, predominantemente, como tema central as periferias da francosfera (VELDWACHTER,
2012), e para identificarmos a construção desta periferia na tradução, percorremos os romances
Parle mon fils, parle à ta mère (1984), de Leïla Sebbar, Le gone du Chaâba (1986), de Azouz Begag, e
Kiffe-Kiffe demain (2004), de Faïza Guéne. A partir do cotejo dos romances e de suas respectivas
traduções, evidenciaremos como tradutores e tradutoras articularam uma poética da tradução da
oralidade nestes romances e buscaremos evidenciar como o espaço do intrangeiro e do exílio são
construídos nas encruzilhadas dessas narrativas traduzidas em que se conectam ficção, história,
memória e tradição das comunidades magrebinas na França.
Referências: BEGAG, Azouz . Le gone du Chaâba. Paris: Seuil, 1986. GUÈNE, Faïza. Kiffe-Kiffe demain.
Paris: Le Libre de Poche, 2004. GUÈNE, Faïza. Amanhã, numa boa. Tradução de Luciana Persice
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(Katherine Mansfield). In: Complete works of Virginia Woolf [recurso digital]. United Kingdom: Delphi
Classics, 2014.
949
a serem respondidas: por que traduzir Oliveira Silveira para línguas não tão prestigiadas? Qual será
o público leitor de Oliveira Silveira? Entendemos que o autor, ao publicar em Porto Alegre por
edições organizadas por ele mesmo, se posicionou com relação ao mercado editorial brasileiro.
Nesse sentido, entende-se que traduzir para línguas com parco número de falantes, porém
expressivas por sua localização geográfica, é uma forma de respeitar os princípios do poeta. Também
serão propostas reflexões sobre cultura e identidade afro-gaúcha; aproximação da cultura gaúcha
com a africana; cultura afro-latino-americana; denúncia do racismo e do preconceito.
Referências: ALVES, Alcione Correa. [Uma vez mais,] mulheres deixam traços nas águas? Estação
literária, v. 23 (2019), Londrina, p. 173-188. Disponível em
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Roteiro dos tantãs. Porto Alegre: Edição do Autor. WALSH, C. (2013). Lo pedagógico y lo decolonial:
entretejiendo caminos. In: Catherine Walsh (Org.) Pedagogías decoloniales: Prácticas insurgentes de
resistir, (re)existir y (re)vivir. Ediciones Abya-Yala, p.23-68
950
Kateb Yacine (1929-1989), de origem árabo-berbere, tinha sido alfabetizado. "Nedjma", que significa
“estrela” em árabe, retrata a busca de quatro narradores pela personagem homônima, alegoria da
nação argelina no momento anterior à independência. O francês, questão problemática no Magreb
pelo fato de ser uma herança do sistema colonial, estabelecia uma relação hierárquica com as línguas
locais, como é o caso do árabe dialetal, variante do árabe clássico. No romance "Nedjma", as
influências de expressões locais se exprimem em francês por meio da voz e do ponto de vista do
nativo. Analisaremos trechos emblemáticos que, ao serem traduzidos, revelam a enorme
complexidade do contexto em que foi escrito "Nedjma". A partir disso, apontaremos algumas
reflexões desencadeadas pelas decisões de escolha tomadas pelos tradutores. Observaremos as
traduções apoiando-nos nas reflexões de Jacques Derrida, em "Torres de babel" e em "O
monolinguismo do outro". Com o auxílio desses ensaios, comentaremos trechos em que os vestígios
de um forte entroncamento cultural se fazem presentes, assim como os atritos derivados da
problemática da língua francesa na Argélia colonial.
Referências: Derrida, Jacques. "O monolinguismo do outro ou a prótese de origem." Trad. Fernanda
Bernardo. Porto: Campo das Letras, 2001. Derrida, Jacques. "Torres de babel." Trad. Junia Barreto.
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. Kateb, Yacine. "Nedjma." Paris: Éditions Seuil, 1996. (1a ed.
1956) Kateb, Yacine. "Nedjma." Trad. Teresa Menezes e António Gonçalves. Lisboa : Tricontinental
Editora, 1987. (Coleção Rosa dos ventos)
951
Intelectual argentino, professor, ensaísta, roteirista e crítico de teatro, foi convidado por Hermilo
Borba Filho a dar aulas na recém fundada Escola de Belas Artes do Recife. Nessa estadia, que duraria
quase dois anos, o escritor imprimiu suas percepções da cidade e do salão intelectual pernambucano
em cadernos, que eram suas anotações, uma espécie de diário. Nesse percurso, inserido em um
contexto histórico efervescente, minado por um campo político tenso, Tulio Carella foi confundido
com um traficante de armas e foi preso e torturado pelo exército brasileiro. Parte desse percurso
está nos versos destes poemas, que foram traduzidos para o português dentro da necessidade de
entender suas relações com outra obra do autor, Orgia, lançada três anos depois, e, diferentemente
de Roteiro Recifense, estruturada como romance. Esse processo de tradução se deu dentro da
necessidade do processo de elaboração da tese, e serviu para perceber que as duas obras eram feitas
da mesma matéria de memória (Ricoeur 2007; Gagnebin, 2006), calcadas em um homoerotismo que
se mostra claro em Orgia, mas latente e difuso em Roteiro Recifense. Esse trabalho tem por objetivo
mostrar o percurso dessa tradução e a interpelação possível entre a passagem do autor pela cidade,
o contexto histórico no qual essa passagem do autor está inserida e as relações de uma memória
individual e também coletiva, das quais essas duas obras coirmãs foram elaboradas.
Referências: BORBA FILHO, Hermilo. Deus no pasto. Um cavalheiro da segunda decadência. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1972. CARELLA, Tulio. Orgia. Diário primeiro. Rio de Janeiro: José Alvaro
Editor, 1968. CARELLA, Tulio. Orgia: os diários de Tulio Carella, Recife, 1960. São Paulo: Opera Prima,
2011. ______. Roteiro Recifense. Recife: Imprensa Universitária, 1965. CÂNDIDO, Antônio. O estudo
Analítico do poema. Humanitas Publicações-São Paulo: FFLCH/USP, 1996 DUSSE, Fernanda Cristina
Sant'ana. O diário rasurado de Judith Malina e as narrativas impossíveis da ditadura militar. Literatura
e Autoritarismo, Santa Maria, n. 16, mar. 2016. p. 63-75. GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever
esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006 RICOEUR, Paul. A Memória, a história, o esquecimento.
Campinas: Editora da Unicamp, 2007. REIS, Luís. Teatro Popular do Nordeste: o palco e o mundo de
Hermilo Borba Filho. Recife: CEPE, 2018. SUSSEKIND, Flora. Literatura e vida literária: polêmicas,
diários & retratos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985. PROFESSOR da U.R não desapareceu: foi
preso e está incomunicável. Diário de Pernambuco, Recife, p. 07, 26 de abril de 1961.
MARCAS DE VIOLÊNCIA E DAS RELAÇÕES DE PODER EM THE KILLER, TRADUÇÃO PARA A LÍNGUA
INGLESA DA OBRA O MATADOR, DE PATRÍCIA MELO
Paula Grinko Pezzini
Resumo: Questionar o cânone literário, no panorama brasileiro, hegemonicamente masculino;
evidenciar a operação tradutória não como produto final, mas enquanto movimento que pode
sugerir novos sentidos para um texto; entrelaçar, exatamente a partir da tradução literária, as
relações de poder que alicerçam uma obra quando geopoliticamente ambientada na América Latina;
e repensar o papel da tradução nessa dinâmica. Esses são os objetivos desta comunicação, à medida
que me proponho a analisar O matador (1995), obra da escritora brasileira Patrícia Melo; e sua
tradução para a língua inglesa, The killer (1998). Busco destacar a linguagem literária de Melo
enquanto propulsora de questionamentos pertinentes às posições socialmente construídas como
masculinas; e como essas relações de gênero, eivadas na dominação simbólica (BORDIEU, 2002),
foram traduzidas para a língua inglesa, com enfoque na trajetória do protagonista Máiquel e das
personagens Cledir e Érica. Nesse sentido, dialogo com Rita Segato (2003) e Lúcia Zolin (2007), visto
que ambas discutem os elementos estruturantes da violência masculina e localizam, em muito no
discurso colonial que divide homens e mulheres em polos opostos de poder, a fundamentação do
sistema patriarcal. A partir de Even-Zohar (1978) e Venuti (1995; 2002), pretendo observar se o
movimento tradutório entre O matador e The killer e a retextualização da obra em língua inglesa se
pautam na estrangeirização ou na domesticação de termos linguísticos, considerando que a narrativa
se respalda em um linguajar que remete a demonstrações de poder bastante locais. Portanto, com
base na construção das personagens femininas e em suas relações com o protagonista, intento
cotejar a Crítica Literária Feminista e os Estudos da Tradução para investigar a tradução em inglês de
uma das obras mais aclamadas de Patrícia Melo.
952
Referências: BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Tradução de Maria Helena Kühner. 2. ed.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. EVEN-ZOHAR, Itamar. Teoria dos Polissistemas. Tradução de
Luis Fernando Marozo, Carlos Rizzon e Yanna Karlla Cunha. 1978. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/translatio/article/viewFile/42899/27134. Acesso em: 03 jan. 2023. MELO,
Patrícia. O matador. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. MELO, Patrícia. The killer. Tradução de
Clifford E. Landers. Londres: Bloomsbury Publishing (UK), 1998. SEGATO, Rita Laura. Las estructuras
elementales de la violencia: ensayos sobre género entre la antropología, el psicoanálisis y los
derechos humanos. Bernal: Universidad Nacional de Quilmes, 2003. VENUTI, Lawrence. Escândalos
da tradução. Tradução de Laureano Pelegrin, Lucinéia Marcelino Villela, Marileide Dias Esqueda e
Valéria Biondo. Bauru: Editora da UFSC – Edusc, 2002. VENUTI, Lawrence. The translator’s invisibility:
a history of translation. London/New York: Routledge, 2008 [1995]. ZOLIN, Lúcia Osana. O matador,
de Patrícia Melo: gênero e representação. Revista Letras, Curitiba, n. 71, p. 53-63, jan./abr. 2007.
Disponível em: https://revistas.ufpr.br/letras/article/view/6234. Acesso em: 02 jan. 2023.
953
isso, a autora passou a ser conhecida mais por suas relações amorosas com figuras eminentes do
meio literário, tais como Antoine de Saint-Exupéry, André Malraux, Gaston Gallimard, entre outros,
que pelas obras que escreveu, aspecto que será problematizado nessa comunicação. Para tal análise,
serão utilizados como referencial teórico Bothorel (1993), Wagener (2008), Compagnon (2003),
Cunha (2002), Hollanda (1994), entre outros.
Referências: BOTHOREL, Jean. Louise ou la vie de Louise de Vilmorin. Paris: Grasset, 1993.
COMPAGNON, Antoine. O Demônio da Teoria: Literatura e senso comum. Trad. Cleonice P. Barreto
Mourão; Consuelo Fortes Santiago. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2003. CUNHA, Eneida Leal. Margens
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Belo Horizonte: Ed. UFMG, Abralic, 2002 JAUSS, H. R. A história da literatura como provocação à
teoria literária. Tradução Sérgio Tellaroli. São Paulo: Ática, 1994. HOLLANDA, Heloisa Buarque de.
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Vilmorin (1902-1969). Paris: Albin Michel, 2008.
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Caminhos para uma redefinição da prática feminista de tradução. Tradução: Emanuela Carla Siqueira
e Marcela Lanius. Revista X, v. 17, n. 1, p. 192-212, 4 de mar. 2022. NAGAE, Neide. Concepções
Japonesas do Romance do Eu. In: Estudos Japoneses, São Paulo, n. 17, p. 141-147, 1997. Disponível
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Neide. De Katai a Dazai: apontamentos para uma morfologia do romance do eu. 2006. Tese
(Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
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japonês. Tradução: Lavínia Porciúncula. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2007. REIMÓNDEZ,
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Revista, v. 2021, p. 312-349, 2021. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-
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Marileide Dias Esqueda, Valéria Biondo. São Paulo: Editora Unesp, 2019. VON FLOTOW, Luise.
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vol. 4, n° 2, 1991, p. 69-84.
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Juciane dos Santos Cavalheiro (UEA), Márcia Lopes Duarte (UNISINOS) e Sabrina Vier (UNISINOS)
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Early Jewish Literature. Germany – 2005. ZIMBARDO, Philip. The Lucifer Effect – Understanding How
Good People Turn Evil. Random House – 2007.
958
Carolina Muller
Resumo: Os projetos interdisciplinares centrados na leitura literária permitem que os sujeitos se
desenvolvam a partir do contato com diferentes gêneros literários, estando expostos a variadas
formas de ler e compreender os textos através da vivência de práticas colaborativas e mediadas que
propiciam a co-construção de sentidos. Tornam-se, pois, projetos que ampliam efetivamente as
competências leitoras dos alunos possibilitando a inserção social e a ampliação do pensamento. A
interdisciplinaridade pode ser vista sob a metáfora da rede, na qual diferentes cenários estão
interligados através de um processo mental dinâmico e ativo. A Literatura de Cordel é um gênero
popular de origem nordestina, cujas fundações advém dos romances portugueses em versos
surgidos da expressão oral que, com o passar do tempo, migraram também para a forma escrita.
Trata-se de uma literatura de cunho popular que carrega a expressividade, a cultura e a história de
um povo. Portanto, ao abordar esse tipo de literatura na escola, é necessário fazê-lo tomando como
base uma abordagem sócio-discursiva que permita a ampla reflexão acerca do texto e suas condições
de produção. Levando em conta os aspectos sócio-discursivos, o cordel pode ser visto como um
“espaço de vivências coletivas”. Diante dessa perspectiva, elaboramos o projeto “Cordel na caixa”
que foi desenvolvido com alunos de 5º ano de uma escola particular bilíngue da região Sul. Trata-se
de um projeto interdisciplinar, pois envolveu as disciplinas de Língua Portuguesa, Língua Inglesa, Arts
e Música. O projeto parte da leitura do livro Sonho de uma noite de Verão em Cordel inspirado no
clássico de William Shakespeare e escrito por Arievaldo Viana.
Referências: ALVES, Roberta Monteiro. Literatura de Cordel: por que e para que trabalhar em sala
de aula. In: Revista Fórum Identidades, Sergipe, ano 2, v. 4, p. 103-109, 2008. BAKHTIN, Mikhail.
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Leitura e interdisciplinaridade. Mercado das Letras, 1999. LINHARES, Thelma R. S. Reflexões.
Disponível em: http://www.camarabrasileira.com/cordel90.htm. Acesso em: 16 set. 2017. LUCK, H.
Pedagogia da interdisciplinaridade. Fundamentos teórico - metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2001.
MILLER, Naomi. Reimagining Shakespeare for children and young adults. Routledge, 2013.
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AINSOW, Mel. Tornar a educação inclusiva: Como essa tarefa deve ser conceituada? In: Tornar a
educação inclusiva, UNESCO, 2009, p. 11-25. DELEUZE, G. e GUATTARI, F. Mil platôs: capitalismo e
esquizofrenia, vol. 4. 1. ed. São Paulo: Ed. 34, 1997. GATTI, Bernadete A. Formação de professores
no Brasil: características e problemas. Educação & Sociedade, Campinas, v. 31, n. 113, p. 1355-1379,
out.-dez. 2010 Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br, Acesso em: 02.11.2020 PEREIRA,
Marcos Villela. Estética da professoralidade: um estudo crítico sobre a formação do professor. Santa
Maria: Ed. da UFSM, 2016. SOUZA, Ana Lúcia Silva. Letramentos de Reexistência: poesia, grafite,
música, dança: HIP-HOP. São Paulo: Parábola Editorial, 2011.
960
COLETIVOS POÉTICOS NO CONTEXTO ESCOLAR: POESIA PERIFÉRICA, PERFORMANCE E CIDADANIA
Gisele Gemmi Chiari
Resumo: Os coletivos poéticos são grupos que para além da produção e performance de poesia
trabalham em ações político-comunitárias fora dos meios institucionalizados criando redes e
promovendo formas de engajamento e de entrecruzamento entre arte e vida. A poesia dos slams,
por exemplo, caracteriza-se por ser altamente comunicativa devido à complexidade semiótica de
suas performances e temas abordados, como as desigualdades sociais, a violência, as subjetividades
e identidades das periferias das cidades. Durante as apresentações ou batalhas poéticas ocorrem
partilhas de afetos e experiências que fortalecem os vínculos sociais e o sentimento de
pertencimento desses grupos. Os encontros de poesia bem como as outras ações promovidas pelos
coletivos estimulam uma atitude ativa, sobretudo do público jovem, em relação a problemas sociais
como racismo, patriarcalismo e exclusão social. Dessa forma, pode-se pensar a poesia performática
marginal como ação ou acontecimento, e não como um objeto de consumo. Essa literatura traz a
linguagem e a cultura das periferias destoando das obras canônicas tradicionalmente estudadas na
escola que, muitas vezes, não são capazes de incentivar a leitura literária ou o pensamento crítico
nos estudantes. Este estudo propõe pensarmos como a força da poesia marginal performática pode
colaborar na formação de leitores e escritores atentos às questões político-sociais e suas
identidades. A escola deve ter consciência de que as novas mídias e tecnologias provocaram uma
mudança na sensibilidade e na receptividade das artes, bem como promoveram a veiculação da
informação e o estabelecimento de redes sociais. Nesse sentido, é preciso reavaliar o papel da
oralidade (ou da performance) na recepção literária, levando em consideração também que, no
Brasil, a prática alfabética proveio da herança colonial e é relativamente recente. Em suma, a partir
da experiência das ações dos coletivos de literatura marginal, propomos repensar a relação entre
literatura, oralidade, performance e cidadania nos contextos educacionais.
Referências: CANDIDO, Antonio. Direito à literatura. In: ______. Vários escritos. 5. ed., Rio de Janeiro:
Ouro sobre azul, 2011, p. 171-193. FERNANDES, Frederico Augusto Garcia. Experimentalismo, voz e
coletivos poéticos: um estudo da cena cultural londrinense na contemporaneidade. In: Literatura:
Teoría, Historia, Crítica, vol. 22, núm. 2, pp. 421-447, 2020. In:
https://www.redalyc.org/journal/5037/503764989015/html/ [acessado em 15/12/2022]
GONÇALVES, Fernando do Nascimento. Poéticas políticas, políticas poéticas: comunicação e
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Pós-Graduação em Comunicação | E-compós, Brasília, v.13, n.1, jan./abr. 2010. LEONÉ, Lucia di.
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Boldrini. São Paulo: Ed. 34, 2009. ZILBERMAN, Regina. Recepção e leitura no horizonte da literatura.
Alea. vol. 10, no. 1 , jan.-jun. 2008, p. 85-97. ZUMTHOR, Paul. A letra e a voz: a "literatura" medieval.
Trad. Amálio Pinheiro; Jerusa Pires Ferreira. São Paulo: Companhia das Letras. 1993.
961
interpretativo, pretendemos apontar elementos sobre como a narração do si-mesmo em terceira
pessoa faculta uma abertura ética para a instância narrativa. A apreensão da modelação narrativa
dessa torção ética – que torna o sujeito um outro, no interior mesmo de sua narrativa – será o
objetivo constante desta exposição. Buscamos, assim, mostrar como as instâncias narradoras nas
duas obras de Grass, ao atribuírem uma terceira pessoa ao si-mesmo de suas narrativas, tornam-se
alteridades que confundem, borram e revertem tanto a perspectiva narrativa quanto o
posicionamento ético da personagem do romance e do autor autobiografado.
Referências: GRASS, Günter. Nas Peles da Cebola. Trad. Marcelo Backes. Rio de Janeiro: Editora
Record, 2007. ________. O Tambor de lata. Tradução de Lúcio Alves e Rachel Valença. Rio de Janeiro:
Editora Nova Fronteira, 2017. RICOEUR, Paul. Temps et récit: La configuration dans le récit de fiction.
Tome 2. Paris: Éditions du Seuil, 1984. ________. Temps et récit: Le temps raconté. Tome 3. Paris:
Éditions du Seuil, 1985. ________. Soi-même comme un autre. Paris: Éditions du Seuil, 1990.
________. Parcours de la Reconnaissance. Trois études. Paris: Éditions Stock, 2004.
962
na categoria dos peritextos editoriais, com intuito de descrever: a) um levantamento de dados
editoriais das epígrafes do escritor, de obras publicadas no Brasil em primeira edição; b) as
contribuições teóricas de Gérard Genette (2009) para a leitura crítica literária na estética dos
paratextos editoriais; e c) como acontecem as operações sintáticas da presença de outros
enunciados no interior das epígrafes e por quais formas das relações dialógicas acontecem os
enunciados, partindo dos estudos dialógicos do Círculo de Bakhtin. A pesquisa pontuou e considerou
que as epígrafes dos romances são trechos retirados de poemas e romances de outros autores,
apresentados nas obras em língua portuguesa e estrangeira. As operações sintáticas ocorridas
funcionam em Discurso Citado e Direto, sendo partes de enunciados citados por Hatoum para
dialogar com leitores e outros elementos paratextuais da própria narrativa. Ao se apresentar na obra
literária e ganhar um novo contexto de produção, o discurso da epígrafe tem a finalidade de produzir
enunciados que levam o leitor a compreender a narrativa.
Referências: ALVES, Francisco Francimar de Sousa. Editoras. In: Os paratextos das antologias
brasileiras de contos de Edgar Allan Poe no século XXI. Tese (doutorado). Orientação: Luana Ferreira
de Freitas. Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão. Programa
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964
processos primários retornem e se submetam à elaboração consciente. Assim, o processo criativo
opera de modo inconsciente (no encontro espontâneo e sem reflexão entre os problemas vividos no
dia a dia do sujeito) e consciente (a partir da necessidade de realizar uma tarefa na qual ser criativo
é essencial). Já em uma linha filosófica, a criatividade está relacionada à capacidade do indivíduo de
conectar referentes para construir algo novo. A partir dessas considerações, nossa proposta é
apresentar o uso da escrita literária como articuladora entre a teoria psicanalítica e a apreensão de
seu conteúdo aplicado à criação do texto ficcional, utilizando o conto como formato. Para Lacan
(apud Kehl, 2001, p. 55), todos se tornam personagens do romance que é sua vida; porém, a
psicanálise se relaciona muito mais com o conto, pois “A contrac?a?o do tempo, que o conto
possibilita, produz efeito de estilo. A psicana?lise lhe possibilitara? perceber efeitos de estilo que
podera?o ser u?teis a voce?.” A teoria freudiana foi construída a partir da análise feita de seus
próprios sonhos, sendo posta em escrita, articulando fatos, suas impressões, literatura e
subjetividade. A psicanálise desde sua origem opera no campo da subjetividade; portanto, a criação
de um texto ficcional para articular a teoria e o sujeito representado por meio de personagens faz
com que o(a) aluno(a) ou o(a) profissional se utilize do processo criativo e articule o consciente e o
inconsciente, além de outros campos do saber humano para o ensino e a aprendizagem.
Referências: KEHL, Maria Rita. Minha vida daria um romance. In. Psicanálise, literatura e estéticas de
subjetivaçõo, organizado por Giovanna Baartucci. Rio de Janeiro: Imago, 2001. MORAIS, M. F.
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965
prático, uma imersão nas tênues tessituras da malha do texto, caminhando pelas estradas dos não
ditos, das ausências, dos eufemismos, enfim, que o leitor seja capaz de ver aquilo que, pela
linguagem literária, está para além das ações cotidianas. Como aporte teórico para justificar a
relevância da experiência do leitor em face da instância literária, adotou-se os pressupostos da
Estética da Recepção, a partir dos estudos de Hans Robert Jauss e Wolfgang Iser. Para os autores, o
texto fornece pistas ao leitor, sugere, dá margens para interpretações diversas, mediante o processo
de percepção. Partindo desse pressuposto e buscando responder ao questionamento: Qual
estratégia de ensino facilitaria a leitura literária em contexto escolar?, optou-se pelo uso do diário
de leitura, baseado nos estudos de Machado (1998) e Cosson (2021). Para os autores citados, o diário
é uma forma de interação verbal, onde o aluno registra/expõe suas impressões a respeito do texto
lido. Como exemplificação do uso do diário de leitura, elaborou-se, como efeito decorrente das
proposições levantadas acerca da importância da leitura literária, uma sequência didática tendo
como texto motivador o conto fantástico Demônios, do maranhense Aluísio Azevedo (1857-1913).
Referências: AGUIAR, Vera Teixeira de. O saldo da leitura. In: DALVI, Maria Amélia; REZENDE, Neide
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performativo na perspectiva da otobiografia: a escuta de vivências presentes em textos escritos, que
é uma das assinaturas da performatividade na literatura. São atos de criar, Deleuze (1987[1999]) que
estão nas vivências das pessoas, nas narrativas que saem do imaginário e ganham as folhas dos livros
impressos e/ou digitais. Esse processo é um ponto de partida para a professoralidade Pereira (2016).
É um aspecto de transformação que leva a pensar a professoralização atravessada pela criação de
escritas literárias; pela performatividade e pela subjetividade. Essas dimensões comungam em um
ponto de transformação: a formação docente, Kleiman (2001). Docentes que podem concluir o curso
de Letras também como escreventes de suas narrativas com traços autobiográficos. Por isso, a
importância de investigar práticas de escritas na formação docente.
Referências: BARTHES, Roland, Aula: pronunciada dia 7 de janeiro de 1977. São Paulo: Editora
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Essa estranha instituição chamada literatura: uma entrevista com Jacques Derrida. Trad. Marileide
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Trad. Marcelo Brandão Cipolla – 2ª. ed. - São Paulo: Editora WMF Martins Fontes. KLEIMAN, B.
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professor. Santa Maria: UFSM.
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ampliando o horizonte de expectativa de cada leitor, além de evidenciar a autoria feminina e uma
reflexão sobre a mulher e a sociedade presentes em cada conto.
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terceiro mundo.” In: Estudos Feministas, ano 8, 2000. ADICHIE, Chimamanda Ngozi. “Réplica”. In: No
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TERRITÓRIO DO VAZIO UMA LEITURA DO SONETO : "O CÉU, A TERRA, O VENTO SOSSEGADO ...."
DE LUÍZ DE CAMÕES
Petrônio Matias dos Santos
Resumo: O objetivo dessa comunicação é analisar o poema camoniano sob a luz da crítica sociológica
ou marxista ou dialética. Para tanto, concluimos que é impossível compreender o movimento
"intelectual" de uma civilização sem compreender também o seu movimento "material". Tal
premissa poderá parecer, a um analista de viés estruturalista, esquemática, pouco rigorosa. Porém,
por mais complexas que sejam as relações entre K. Marx denomina "Superestrutura" e
"Infraestrutura", não podemos simplesmente esquecê-las em favor de uma análise que privilegia a
parcialidade, perdendo de vista a globalidade.Este soneto de Luís de Camões é o exemplo concreto
e cabal disto. Se ele for visto pelo simples viés da análise pautada pela textualidade como imanência
absoluta, ele não passará de um brilhante e altamente elaborado jogo de palavras que fascina pelo
virtuosismo da linguagem e pela habilidade da construção de um texto equilibrado e perfeito num
"espaço poético" altamente condensado (a forma fixa petrarquista). Porém, se sobre ele lançarmos
um olhar que alcança para além de tal perspectiva, e busca no texto o que o texto em si não traz
marcado, mas que foi indispensável para a sua gestação, aí então o texto poético atinge uma
dimensão muito mais ampla, complexa e reveladora de determinados conflitos humanos pertinentes
a determinado momento cultural ou até mesmo pertinente a todo fluir histórico. Tal dimensão
inaudita, inefável, trans textual poderia ser expressa aproximativamente pela ideia (imperfeita)
hegeliana de geistesgeschichte ...
Referências: ____________. Literatura e Sociedade: estudos de teoria e história literária. 3 ed.
revista, SP. Editora Nacional, 1973, p.04. EAGLETON, Terry. Teoria da Literatura – Uma introdução.
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simbólico. Trad. Valter Lelis Siqueira. Maria Elisa Cevasco. São Paulo: Ática, 1992. SILVA, Marisa C.
“Crítica Sociológica” In: BONNICI, Thomas e ZOLIN, Lucia Osana. Teoria Literária – abordagens
históricas e tendências contemporâneas. EUEM, Maringá, 2009.
971
da ordem dos automatismos, em que se identifica no texto pontos previamente apontados por outro
leitor, excluindo-se, assim, uma apreensão subjetiva da leitura (em geral feita às pressas e para se
cumprir algum tipo de meta); ou, na contramão, b) possibilitam a “construção de si mesmo” (PETIT,
2013), levando o leitor a interpretações de si, dos que o rodeia e do mundo em que habita. Por
defender esse último paradigma, em que a leitura literária se nos apresenta, à luz de Bondía (2002),
como experiência, proponho, com esta comunicação, tanto refletir acerca de processos de
dessimbolização que, no entender de Birman (2020 [2012]), assolam as subjetividades
contemporâneas, como ponderar em que medida a Literatura pode tratar-se de via possível para
processos de simbolização e constituição subjetiva. Acredito que essa compreensão da leitura
literária como algo da ordem subjetiva e singular possa ressignificar as práticas de leitura em sala de
aula, bem como contribuir para o que Candido (2011 [1988]) compreende como sendo o princípio
humanizador da Literatura.
Referências: BIRMAN, Joel. O sujeito na contemporaneidade: espaço, dor e desalento na atualidade.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2020 [2012]. BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência
e o saber de experiência. Trad. João Wanderley Gerald. Revista Brasileira de Educação. n.19,
jan./abr., 2002, p. 20-28. CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: ______. Vários Escritos. 5 ed.
Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul/ São Paulo: Duas Cidades, 2011 [1988]. PETIT, Michèle. Leituras: do
espaço íntimo ao espaço público. Tradução Olga de Souza. São Paulo: Editora 34, 2013.
972
mesmo que se trate de acontecimentos nos quais só nós estivemos envolvidos, e com objetos que
só nós vimos. É porque, em realidade, nunca estamos sós” (Halbwachs, 1990, p.26). Nessa
perspectiva, a memória precisa de uma comunidade afetiva cuja estruturação se dá pelo convívio
social que cada sujeito estabelece com outras pessoas ou grupos sociais, assim, a memória de cada
indivíduo é firmada na memória das comunidades nas quais esses sujeitos estiveram imbricados.
Não se pode negar que a escola é um lugar de grandes memórias. Pensando nesse viés, o presente
texto propõe uma reflexão referente às narrativas da importância da literatura no desenvolvimento
de projetos de iniciação científica, bem como a representação que têm esses projetos como contexto
biográfico que atravessam as trajetórias de vida de estudantes egressos do centro territorial de
educação profissional do litoral norte e agreste baiano- cetep/lnab, situado no município de
Alagoinhas-Ba. Para escrita e análise das narrativas, buscamos dialogar com Candau (2012), Cruz
(2012), Delory-Momberger (2008), Pereira (2016), Halbwachs (1990), entre outros. Ao analisar os
fragmentos textuais selecionados para o texto, é notória a importância do desenvolvimento dos
projetos em suas vidas, visto que cada estudante se inscreve como autor e participante de memórias
coletivas; em suas narrativas, revelam suas histórias e identidades. “ A memória é, de fato, uma força
de identidade” (Candau, 2012, p.17).
Referências: CANDAU, Joel. Memória e Identidade. Ed. Contexto. São Paulo. 2012. CRUZ, Maria de
Fátima Berenice da. Leitura Literária na Escola: desafios e perspectivas de um leitor. Salvador:
EDUNEB, 2012. 228 p. DELORY-MOMBERGER, Christine. Biografia e educação: figuras do indivíduo -
projeto. Trad. de Maria da Conceição Passegi, João Gomes da Silva Neto e Luis Passegi. Natal, RN:
EDUFRN; São Paulo: Paulus, 2008. HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva. Editora Revista dos
Tribunais Ltda. São Paulo. 1990. PEREIRA, Aurea da S. As cartas como dispositivo biográfico: saberes
e aprendizagens de si. In: SOUZA, Elizeu Clementino; DEMARTINE, Zeila de B. F.; GONÇALVES,
Marlene( Orgs.). Gênero, diversidade e resistência: escritas de si e experiências de empoderamento.
1.ed. Curitiba, PR:CRV, 2016. p. 103-119.
POR QUE VOCÊS EXCLUEM QUEM CHAMAM DE “ESPECIAL”: PESSOA COM DEFICIÊNCIA E
LITERATURA.
Tiago Correia De Jesus
Resumo: Em 2015, o jovem escritor, ator, diretor e roteirista americano Ryan O’Connell, publicou a
autobiografia “I'm Special: And Other Lies We Tell Ourselves”, (Especial - E outras mentiras que a
gente conta sobre si mesmo), e que posteriormente, tornou-se uma série na provedora Netflix, cujo
nome foi sintetizado de “Special”. O termo “Especial” é utilizado há décadas em diversas sociedades
para classificar e distinguir as pessoas com deficiência, independente qual ela seja. No entanto, a
terminologia produz como seu principal efeito a diferenciação normativa entre os corpos, bem como
a sua exclusão no meio social. Assim, as camadas subjetivas das pessoas com deficiência são
aniquiladas por uma cultura estruturalizada para apagar o protagonismo desses corpos numa
sociedade capitalista-capacitista. Diante disso, a partir da obra de O’Connell, busco entender como
a sua literatura pode promover uma rasura e questionar as concepções excludentes criadas sobre as
pessoas com deficiência, bem como promover a partir de sua narrativa um efeito revés, uma vez que
o sujeito da enunciação é a voz subalternizada, silenciada e excluída. Para isso, a discussão pauta-se
nas reflexões teóricas do campo dos estudos sobre deficiência (DINIZ, 2007; FIGUEIRA, 2021),
capacitismo (DI MARCO, 2021; LORETO, 2021) e a escrita de si (FOUCAULT, 2014).
Referências: BUTLER, Judith. “Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do ‘sexo’”. In: LOURO,
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cuidado e capacitismo: uma análise antropológica de experiências, narrativas e observações sobre
violências contra mulheres com deficiência. Dissertação (mestrado) em Antropologia Social –
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, 2014. O'CONNELL, Ryan. E
974
REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DAS OFICINAS DE ESCRITA CRIATIVA ATRAVÉS DO ROMANCE “O
PRINCÍPIO DE VER HISTÓRIAS EM TODO LUGAR”
André Luís Souza Salviano
Resumo: A criação literária, que em algumas épocas era tida como uma vocação quase divina, e que
só poderia ser levada adiante por alguns poucos escolhidos, vem sendo desmistificada e
sistematizada com maior fôlego e material desde o século XIX. Em O princípio de ver histórias em
todo lugar, publicado em 2015, Leonardo Villa-Forte usa a ficção para discorrer sobre o papel da
prática das oficinas de escrita criativa e questões inerentes a ela tais como: o que pode ou não ser
considerado literatura e a importância do talento. A partir da leitura tem-se como provocação
algumas indagações: Qual a importância da escrita criativa? É possível ensinar a alguém escrever
ficção? As oficinas de escrita criativa não poderiam, através de suas práticas, em vez de escritores
formar melhores leitores? São algumas questões que a comunicação trará para o debate. Para
discuti-las conto com a contribuição de estudos feitos por Luiz Antonio de Assis Brasil, Paul Dawson,
Amílcar Bettega, Stephen Koch, Nelson de Oliveira e Raimundo Carrero. Serão discutidos também, a
partir dos teóricos citados, o papel da escrita criativa no âmbito das universidades e de como elas
podem contribuir para a melhora do ensino de literatura nos diversos níveis de aprendizagem,
incluindo o fundamental e o médio.
Referências: ASSIS BRASIL, Luiz Antonio de. (2016). A escrita criativa e a universidade. Letras de Hoje,
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976
Resumo: Em “2020: a escrita coletiva como nosso horizonte político”, texto publicado na revista
Pessoa, o poeta carioca Rafael Zacca se pergunta: “que podem os trabalhadores e as trabalhadoras
da escrita diante da máquina de guerra que se apoderou do Estado brasileiro nos últimos anos?
Certamente, mais do que dar forma poética e expressão à sua indignação singular” (ZACCA, 2020a).
Em outro texto, publicado no mesmo veículo também em 2020, o poeta lista “dez exigências para o
reconhecimento da escrita como trabalho”, entre elas a “regulamentação da remuneração do
trabalho em arte” e a “formalização de cursos de graduação e pós-graduação voltados para a
formação de escritores e escritoras nas universidades públicas (...)” (ZACCA, 2020b). Nesses textos,
Zacca tanto nos convoca a refletir sobre o papel das oficinas literárias no contemporâneo quanto
apresenta uma insistência em qualificar a escrita como trabalho que parece agir na contramão de
uma noção tradicional de trabalho poético. Nesta comunicação, discutiremos brevemente o papel
das oficinas sob duas lentes. A partir da leitura de poemas que dão notícias de uma preocupação
com o universo das ocupações laborais e da atuação de alguns poetas que são oficineiros,
procuraremos pensar de que formas as oficinas tensionam as diferenças entre o mundo do trabalho
e o da produção artística. Já a partir da leitura de poemas nos quais se possam reconhecer rastros
das experiências em oficina, investigaremos as possibilidades de requalificação da noção de trabalho
poético, tradicionalmente entendido como “a exploração dos poderes de uma linguagem desviada
do seu uso comunicacional” (RANCIÈRE, 2005, p. 38), e de que maneiras, através das oficinas,
requalificar essa noção significa aproximar a atividade literária da educação.
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politico?fbclid=IwAR2NK5iBQHQJUHmHSbUKcKdz4zGYDG7cYjXncCiUpb79VhgV959JbwXT1Pc.
Acesso em: 13 de setembro de 2022. ZACCA, Rafael. Dez exigências para o reconhecimento da escrita
como trabalho. Pessoa, 6 de outubro de 2020. Disponível em:
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como-trabalho. Acesso em: 13 de setembro de 2022. ZACCA, Rafael. Pega-pega. S./l.: s./e. 2022.
977
Resumo: Esta comunicação visa apresentar e comparar duas manobras teóricas, críticas e literárias
que se constroem contra a representação do cânone literário ocidental no âmbito da tradução
literária. Por um lado, a proposta atual de intervenção dos autores brasileiros Gontijo Flores e Capilé,
descritas em Tradução-Exu, ensaio de tempestades a caminho (2022) e, de certa forma, posta em
prática na tradução a quatro mãos de The Tempest de William Shakespeare e de Une tempête de
Aimé Césaire, fundidas e recriadas em Uma outra tempestade, tradução-exu (2022). Por outro, a
proposta das décadas de 1930-1940 do escritor argentino Jorge Luis Borges, explorada em ensaios
como “Las dos maneras de traducir” (1926), “Las versiones homéricas” (1932) e “Los traductores de
las mil y una noches”(1934) com práticas tradutórias variadas, entre as quais podem-se citar as
primeiras: “La última hoja del Ulises” de James Joyce e os textos que constituem a seção "Etcétera"
de Historia universal de la infamia (1935). Num segundo momento, esta comunicação buscará refletir
em torno do cânone literário, perguntando-se sobre as suas representações. A proposta de Borges,
embora coincida com os objetivos de Gontijo Flores e Capilé, ou seja, a de não apenas desierarquizar
o lugar do texto original e do escritor do texto original, como, mais do que isso, de a eles sobrepor a
figura do tradutor, situa-se na Argentina, entendida como a periferia do cânone, ao passo que os
autores brasileiros pretendem marcar seu ponto de partida para a tradução fora dos cânones
nacional e ocidental, sintetizando-a como uma “tradução-Exu”, inspirada pela presença da divindade
africana.
Referências: BORGES, Jorge Luis Obras completas I 1923-1949. Edição crítica comentada por Rolando
Costa Picazo e Irma Zangara. Buenos Aires: Emecé, 2009. CAPILÉ, André; GONTIJO FLORES,
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A Outra Tempestade, tradução-Exu, Belo Horizonte, Relicário, 2022. RUFINO, Luiz. Exu e a pedagogia
das encruzilhadas, tese de doutorado, Rio de Janeiro, UERJ, 2017.
978
CAMINHOS INTERROMPIDOS: REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO CRIATIVO NA ESCRITA DO
ROMANCE AS GLÓRIAS DE CATARINA
Rafael do Amaral Prudencio
Resumo: Ao refletir sobre a aventura, Giorgio Agamben (2018) mostra que o termo aventure refere-
se ao objeto de busca do cavaleiro e da busca de si mesmo. A partir da etimologia do verbo "trover",
que pode significar tanto "encontrar" como "compor poesia", e de um trecho do poeta "Ivain", de
Chrétien de Troyes, que apresenta um cavaleiro em busca do que não pode encontrar, Agamben faz
a correlação entre o cavaleiro e o poeta. O filósofo italiano também faz o correlato entre a aventura
do escritor e a aventura do protagonista da história, uma vez que o início da aventura de ambos
coincide com o início da narrativa. Dito isso, este trabalho trata de alguns aspectos da aventura na
escrita do romance As glórias de Catarina, parte integrante de minha tese de doutorado, que
apresenta a história de um homem que chega em uma cidade do interior chamada Promessas e
decide escrever a biografia do ex-jogador local Catarina. Desse modo, o que interessa aqui é pensar
nos problemas compartilhados entre escritor e protagonista para escrever a história de Catarina e
as soluções encontradas por ambos para avançarem nela. Além das reflexões de Giorgio Agamben,
esse trabalho se orienta pelas reflexões de Pier Paolo Pasolini (2005) sobre a relação entre escrever
e jogar futebol e nas reflexões de Walter Benjamin (2005) contra a concepção historicista
quantitativa do tempo histórico e a favor de sua concepção qualitativa e descontínua. Tais estudos
contribuíram para o encontro de um procedimento de escrita pautado pelo fragmento, pela
montagem e pela mistura de gêneros. Com isso, busca-se contribuir com uma discussão acerca do
processo criativo, ampliando as discussões sobre escrita criativa e expondo as complexidades do
gesto.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. A aventura. Tradução de Cláudio Oliveira. São Paulo: Autêntica,
2018. LOWY, Michel. Walter Benjamin: aviso de incêndio. Uma leitura das teses "Sobre o conceito
de história"; tradução de Wanda Nogueira Caldeira Brant, [tradução das teses], Jeanne Marie
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Belo Horizonte: Autentica, 2020. SALLE, Cecília Almeida. Gesto inacabado: processo de criação
artística. 5 ed. São Paulo: Intermeios, 2011.
980
enquanto um espaço de enunciaçao e produçao desse discurso .. Trazer a Análise do discurso e a
Análise crítica do discurso para esta investigaçao é, em alguma medida , pensar o discurso desses
jovens sertanejos na esteira da produçao capitalista, entendendo que esses mesmos discursos
também sao produzidos a partir de uma relaçao de poder e que estao, por si só, imbricados nessa
mesma relação de poder e que só a partir daí talvez seja possível uma produção de sentidos eficiente
dentro, ou fora, dessa relaçao de ensino/aprendizagem, sobretudo no que toca o ensino de língua
materna e de literatura brasileira, náo necessariamente nessa mesma ordem, na medida que se tem
aí um problema de representaçao quando esses mesmos jovens náo reconhecem o espaço em que
vivem como sertáo , nem a si mesmos como sertanejos, uma vez que esse reconhecimento fica
circunscrito a tela do cinema e da TV.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal, 4.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
RIBEIRO, Tiago; SOUZA, Rafael de; SAMPAIO, Carmen Sanches (Org.). Conversa como metodologia
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de rodapé, p.19). MALDONADO-TORRES, Nelson. Analítica da colonialidade e da decolonialidade:
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985
Por isso, o presente trabalho tem como objetivo analisar a representação imagética das personagens
negras retratadas nos livros infantis. As análises levam em conta o aumento significativo dessas
publicações após a implementação da lei 10.639/03 e a falta de uma crítica literária consolidada em
torno das obras, sobretudo no tocante às ilustrações. No entanto, também conta com experiências
vividas no espaço escolar e observações feitas a partir do contato das crianças com os livros.
Acreditamos que a Literatura Infantil publicada ou reeditada após a referida lei tem o dever de
contribuir com a formação cultural, social e ética das crianças pautando-se no antirracismo.
Compreendendo que as imagens chegam mais rapidamente às crianças, principalmente àquelas
ainda não alfabetizadas, o caminho trilhado nesta pesquisa concentra-se no texto visual e no impacto
causado pelas ilustrações, observando aspectos como o embranquecimento de personagens negras
através da presença predominante da cor marrom em detrimento na cor preta para representar
crianças negras, bem como figuras estereotipadas que reforçam imaginários e práticas racistas.
Contudo, também foi possível encontrar imagens positivas que visam promover a
representatividade, a valorização da população negra e desconstruir uma imagem negativa
cristalizada e difundida por uma literatura fundada no racismo estrutural.
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dezembro de 2021. SILVA, T.T. A produção social da identidade e da diferença. In. T.T. da Silva (Org.).
Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.
988
por Silva (2003), a partir do livro de Esmeraldina Ramos, escritora quilombola, numa turma de
graduação em Letras, como modelo para construção e aplicação de oficinas de leitura em turmas de
ensino fundamental II. O objetivo é promover a prática leitora e a mediação de leitura pelos
graduandos na disciplina de Prática de ensino, para aplicação nas escolas de educação básica.
Problematizou-se que os alunos não conhecem a escrita de autoras negras do estado e pouco leem
leituras literárias em sala de aula. Sendo assim, trata-se de um trabalho de pesquisa-ação, pois
permite ao professor aplicar e analisar o trabalho durante seu curso (GIL, 2017). Os procedimentos
de aplicação organizaram-se em leitura da obra, unidades de leitura, compartilhamentos e
construção de narrativas de leitura. Os resultados parciais colaboraram para mostrar que a leitura
pode ser acolhida pelos alunos no espaço-tempo da sala de aula, bem como promover um currículo
que discute conceitos, permitindo a reflexão de temas necessários à escola como racismo,
preconceito, resistência, além de solidificar a literatura da mulher afro-brasileira. O aporte teórico
foi norteado por Silva (2003), Leahy-Dios (2004), Candido (2017), Macedo (2021) e Amorim (2022).
Referências: AMORIM, Marcel Álvaro de [[et al]. Literatura na escola. São Paulo: Contexto, 2022.
CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 6ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre azul, 2017. GIL, Antonio Carlos.
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como metáfora social. São Paulo: Martins Fontes, 2004. MACEDO, Maria do Socorro Alencar Nunes
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Parábola, 2021. SILVA, Ezequiel Theodoro da. Unidades de leitura. Campinas-SP: Autores Associados,
2003.
989
ao PNLD 2015. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) – IEL/Unicamp. Campinas/Sp. 2019
SELIGMANN-SILVA, Márcio. 2001. “Literatura e Trauma: um novo paradigma”, in: Rivista di Studi
Portoghesi e Brasiliani III (2001), Pisa e Roma, pp. 103-118. (agora in: O local a diferença. Ensaios
sobre memória, arte, literatura e tradução, S.Paulo: Editora 34, 2005.
NOMES DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS, O QUE TÊM A NOS DIZER? INTERSECÇÕES ENTRE
LÉXICO, CULTURA E ENSINO EM UM PROJETO DE LETRAMENTO
Rodrigo Vieira do Nascimento
Resumo: Esta pesquisa é resultado da tese intitulada A TOPONÍMIA DAS COMUNIDADES
QUILOMBOLAS DO TOCANTINS: INTERSECÇÕES ENTRE LÉXICO, CULTURA E ENSINO NA PERSPECTIVA
DE UM PROJETO DE LETRAMENTO, que buscou conhecer e caracterizar a realidade toponímica
quilombola tocantinense, fomentando, por intermédio dos conceitos e procedimentos da pesquisa
toponímica, a intersecção entre léxico, cultura e ensino. O problema norteador desta discussão
envolve, com efeito, uma reflexão acerca das motivações onomasiológicas (linguísticas, físico-
geográficas, culturais, sociais, históricas etc.) dos nomes das comunidades quilombolas do Estado do
Tocantins. Dessa discussão, almeja-se apresentar um projeto de letramento, abordando os estudos
dos nomes das populações quilombolas, no propósito da ampliação do leque de informações de
conteúdos linguísticos, etimológicos, geo-históricos, socioculturais, antropológicos na prática
pedagógica do ensino de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental da Educação Básica. Os
procedimentos heurísticos desta pesquisa se fundamentarão nos princípios metodológicos da
pesquisa documental e bibliográfica, como paradigmas científicos que subjazem significações sobre
os povos quilombolas, a luz da abordagem qualitativa. Os resultados obtidos apontaram que o
topônimo atua como reflexo da vida e da história, permitindo um retorno ao passado. Os topônimos
analisados desvendaram a estreita relação do homem (sujeito quilombola) com o espaço físico-
natural (ambiente e paisagem), num sentido amplo, como elo afetivo do ser humano com o lugar, a
ponto de considerar suas impressões e percepções no ato denominativo. A pesquisa ainda revelou
que há uma grande incidência de topônimos compostos e uma tendência as taxonomias de natureza
física, comprovando que existe uma forte ligação do nome quilombola com o ambiente natural. E,
nesse contexto, observou-se que o trabalho com a Toponímia no contexto do ensino é uma proposta
educacional relevante e necessária, ao passo que o estudante é posto como protagonista no
processo de ensino e de aprendizagem.
Referências: ANDRADE, K. dos S. Atlas toponímico de origem indígena do estado do Tocantins:
ATITO. Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2010. ANTUNES, I. Território das palavras: estudo do léxico em
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“remanescentes”: notas para o diálogo entre indígenas e quilombolas. Mana, vol. 3, nº 2, 1997.
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Brasileiro de Terminologia Técnico-Científica. Brasília/DF, 1990. BIDERMAN, M. T. C. Teoria
linguística: linguística quantitativa e computacional. Rio de Janeiro: LTC, 1978. DICK, M. V. P. A. A
motivação toponímica. Princípios teóricos e modelos taxeonômicos. Tese de Doutoramento. FFLCH-
USP, 1980. FAZENDA, I. C. A. A Integração e interdisciplinaridade no ensino brasileiro: efetividade ou
ideologia. São Paulo: Loyola, 1993. ISQUERDO, A. N.; KRIEGER, Maria das Graças. (Orgs.) As ciências
do léxico: lexicologia, lexicografia e terminologia. Vol. II, Editora UFMS, Campo Grande, MS, 2004.
PARENTE, T. G. Fundamentos Históricos do Estado do Tocantins. Goiânia: Ed. da UFG, 1999. entre
outras.
990
educação, e, consequentemente da escola, é compreendida por muitos como uma possibilidade real
e promissora para o reconhecimento e valorização histórica da população negra. As ações
afirmativas forjadas desde a constituição de 1988, a implementação da Lei nº 10.639/2003,
atualizada depois pela Lei nº 11.645/2008, que tornou obrigatório o ensino da cultura e história
africana, foram fundamentais para consolidação de uma agenda político-pedagógica que
possibilitasse um ambiente favorável para fomentação de uma prática educacional antirracista. A
presente pesquisa, em desenvolvimento, tem como um de seus objetivos analisar a efetividade e o
alcance que a educação e leitura literária apresentam nas práticas escolares. Questionamentos
como: quais os modos em que a escola tem atuado, através do ensino de literatura, na promoção e
aplicabilidade de uma educação antirracista e de que forma o ensino de literatura, no Ensino Médio,
sob o viés do trabalho com o texto literário tem a contribuir para que a escola seja, de fato,
consolidada como espaço privilegiado no desenvolvimento e efetivação de uma educação para as
relações étnico-raciais contribuirão para a tessitura dos objetos da referida pesquisa. Configurar a
escola como espaço que reproduz o racismo e, ao mesmo tempo, faz parte dos processos e projetos
educacionais para o seu combate, será um dos aspectos a serem destrinchados pela pesquisa que
buscará direcionamentos quanto a compreender a educação literária como um instrumento
potencializador na construção de uma aprendizagem significativa com vistas à educação para as
relações étnico-raciais, comprometida em estabelecer e possibilitar mudança de comportamentos,
pensamentos e atitudes discriminatórias.
Referências: ALMEIDA, Maria José. Divulgação científica e texto literário: uma perspectiva cultural
em aulas de Física. Caderno Catarinense de Ensino de Física, v. 10, n. 1, p. 7-13, abril, 1993. ALMEIDA,
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silenciadas no currículo. In: SILVA, Tomaz Tadeu da. (Org.). Alienígenas na sala de aula: uma
introdução aos estudos culturais em educação. Trad. Tomaz Tadeu da Silva. Petrópolis: Vozes, 1995.
991
(CALDART, 2002), é constituída de sujeitos que, historicamente, tiveram suas identidades e modos
de vida desprezados e violentados pelo discurso colonialista, como se pode constatar em Hall (2003).
Logo, o ensino de literatura pelas vias da decolonialidade e da ficcionalização da vida, a escrevivência,
na Educação do Campo, será uma importante estratégia de reflexão crítica sobre estes processos, na
desconstrução de estereótipos negativos, possibilitando a elevação da autoestima e o fortalecimento
cultural e identitário dos(as) campesinos(as). Trata-se de um trabalho que é parte de uma pesquisa
de Doutorado, em andamento, a qual investiga o ensino de literatura na Educação do Campo em
diálogo com as identidades e modos de vida dos(as) campesinos(as). Espera-se contribuir no estudo
sobre a literatura e seu ensino na Educação Básica, em especial, na Educação do Campo.
Referências: CALDART, Roseli Salete. Por uma educação do campo: traços de uma identidade em
construção. In. KOLLING, Edgard Jorge; CERIOLI, Paulo Ricardo (Org.). Educação do Campo:
identidades e políticas públicas. Brasília: articulação nacional por uma educação do campo, 2002.
EVARISTO, Conceição. Olhos d'água/Conceição Evaristo. 2. ed. Rio de Janeiro: Pallas Míni, 2018.
__________ A escrevivência e seus subtextos. In. DUARTE, Constância Lima; NUNES, Isabella Rosado
(org.). Escrevivência: a escrita de nós: re?exões sobre a obra de Conceição Evaristo. 1. ed. Rio de
Janeiro : Mina Comunicação e Arte, 2020. MALDONADO-TORRES, Nelson. Analítica da colonialidade
e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In. Bernadino-Costa, (org.) Decolonialidade e
pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. ____________. Sobre la colonialidad
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El giro decolonial. Reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá:
Universidad Javeriana-Instituto Pensar, Universidad Central-IESCO, Siglo del Hombre Editores, 2007.
HALL, Stuart. Notas sobre a desconstrução do “popular”. In: Da Diáspora: Identidades e Mediações
Culturais. Liv Sovik (org); Trad. Adelaine La Guardia Resende. Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília:
Representação da Unesco no Brasil, 2003.
992
A PROMOÇÃO DA LITERATURA DE AUTORIA NEGRA NO CLUBE DE LEITURA UBUNTU: UMA
EXPERIÊNCIA DE EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA.
Valquíria Pereira Tenório e Djenane Sichieri Wagner Cunha
Resumo: O Clube de Leitura Ubuntu é um coletivo que desenvolve, durante o ano e como projeto de
extensão vinculado ao IFSP campus Matão, a promoção da literatura de autoria negra. Amparado
pela filosofia Ubuntu, se consolida como espaço de aprendizado baseado na partilha, no diálogo, no
respeito à fala e à escuta, trazendo a história e a cultura africana e afro-brasileira tão cruciais para
se pensar a sociedade brasileira e implementadas como componente curricular obrigatório pela lei
10.639/03. O projeto atua na criação e desenvolvimento do hábito da leitura, atendendo à lei
13.696/18, que instituiu a Política Nacional de Leitura e Escrita, tendo como diferencial a promoção
da leitura de autoria negra, corroborando para uma educação antirracista, pois atua para que a
literatura de autoria negra seja conhecida, vivenciada, rompendo estereótipos, evidenciando o
racismo que invisibiliza essa literatura. O Clube conta com bolsistas selecionados no início de cada
ano letivo, parcerias com outras instituições no Brasil e nos EUA e quatro frentes de trabalho: Roda
de Conversa; Encontro de Leitura Colaborativa; Sarau Ubuntu e Encontro Bilíngue. Realiza,
anualmente, a leitura de quatro livros escolhidos a partir de lista elaborada pelos participantes e
equipe de coordenação do projeto com a seguinte definição: um livro deve ser de autoria afro-
americana, um de autoria africana, os dois outros de autoria afro-brasileira, sendo que um deles
pode ser um livro de contos ou poesias. O projeto, divulgado no site institucional e em perfis de redes
sociais, é aberto a todas as pessoas que queiram participar. Atua como uma rica experiência de
educação antirracista e decolonial, na qual podemos ter pessoas com um grande acúmulo de
informações e conhecimentos nos temas tratados pelos livros lidos e outras iniciantes, mas que
entram nas atividades para o diálogo, a troca e o aprendizado de maneira coletiva.
Referências: GOMES, Nilma Lino. O movimento negro educador: saberes construídos nas lutas por
emancipação. Petrópolis, RJ:Vozes, 2017. BRASIL. LEI 10.639, de 9 de janeiro DE 2003. Altera a Lei no
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-
Brasileira", e dá outras providências. Brasília, 2003. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm BRASIL. Lei 13.696/2018 (LEI
ORDINÁRIA) 12/07/2018. Institui a Política Nacional de Leitura e Escrita. Brasília, 2018. Disponível
em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/Lei/L13696.htm.
993
material para análise no trabalho. À luz dessa realidade, apresentaremos aqui dois percursos de
orientandas que, mediando processos de leitura literária com turmas de Fundamental I, valeram-se
das Tecnologias de Informação e Comunicação como ferramenta para favorecer uma eventual
aproximação dos alunos/as com a literatura. As experiências evocadas possibilitam uma reflexão
sobre o alcance e os limites do uso das TICs em contextos desiguais.
Referências: EAGLETON, Terry. Como ler literatura. Porto Alegre: L&PM, 2017. SANTOS, Boaventura
de Souza. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Almedina, 2020.
994
Fundamental e, quando possível, no Ensino Médio nas escolas campo. Como é uma ação formativa
a proposta envolve 18 acadêmicos licenciandos em Letras da Universidade de Brasília
(bolsistas/residentes), 3 preceptores (professores da Educação Básica das escolas campo
envolvidas), além do professor orientador do projeto. O principal objetivo da proposta é contribuir
para formar futuros professores que fomentem a leitura literária em ambiente escolar, aspecto
central da proposta.
Referências: ABREU, M. (Org.). Leitura, história e história da leitura. Campinas: Mercado de Letras,
1999. BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: ________. Estética da criação verbal. São Paulo:
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2005. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. BNCC. Brasília/SEF, 2017. BRONCKART, J. P.
Atividades de linguagem, textos e discursos. São Paulo: EDUC, 1999. FARIA, M. A. Parâmetros
curriculares e literatura: as personagens de que os alunos realmente gostam. São Paulo: Contexto,
1999. KLEIMAN, A. B. Oficina de leitura: teoria e prática. 4.ed. Campinas: Pontes, 1996. KOCH, I. V. O
texto e a construção dos sentidos. São Paulo: Contexto, 1997. GUIMARÃES, E. A articulação do texto.
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mundo. São Paulo: Ática, 1993. _________. Literatura: leitores e leitura. São Paulo: Moderna, 2001.
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Perspectivas 3. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1982. ________ (org.). Leitura em Crise na Escola: as
alternativas do Professor. Novas Perspectivas 1. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1982.
995
sequência didática (DOLZ. SCHNEUWLY, 2004) para favorecer a interação e a participação dos alunos
em cada etapa de execução da proposta que contempla os eixos de leitura, análise linguística e
produção textual, normatizados pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Referências: BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018.
Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 20 jun. 2022. CALVINO, Í. Por
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(org.). Gramática, variação e ensino: diagnose & propostas pedagógicas/ Vários autores. Rio de
Janeiro: Letras, UFRJ, 2017.
996
por se traduzir como um problema, como algo diluído na sociedade do espetáculo e do culto às
imagens que oportunizam um acesso mais rápido e fácil à percepção de uma contemporaneidade
marcada pela pandemia do Covid-19. A dificuldade que os leitores estão encontrando para essa
interação mais demorada, mais paciente e menos imediatista dialoga com os excessos e a velocidade
que valorizam o que poderia ser definido como uma atenção dispersa, ou seja, um olhar panorâmico
sobre várias manifestações artísticas e literárias que acabam por empobrecer cada uma
individualmente e, por consequência, as próprias identidades culturais e políticas da maior parte da
sociedade. Com base nessas problematizações, colaborar para a formação de futuros professores de
literatura comprometidos, por sua vez, com a formação de leitores literários conscientes de sua
historicidade se apresenta como um desafio incontornável para discutir o valor da leitura desses
“inutensílios”. Assim, essa proposta de discussão se propõe a apresentar um relato das atividades
desenvolvidas nas disciplinas de Ensino da Literatura dos cursos de Letras da Universidade Federal
de Pelotas no ano de 2022, em um período de transição das atividades remotas, híbridas e
presenciais. Autores como Theodor Adorno, Walter Benjamin, George Steiner, Antonio Candido,
Marisa Lajolo, entre outros, apresentam o aporte teórico para os projetos e planos de aula com base
em textos literários voltados para o ensino de literatura na Educação Básica.
Referências: ADORNO, Theodor. Dialética negativa. Tradução: Marco Antonio Casanova. Rio de
Janeiro: Zahar, 2009. BENJAMIN. Walter. Reflexões sobre a criança, o brinquedo e a educação.
Tradução: Marcus Vinícius Mazzari. 2. ed. São Paulo: Duas Cidades; Ed. 34, 2011. CANDIDO, Antonio.
O direito à literatura. E outros ensaios. Coimbra: Angelus Novos, 2004. CASTELO, José. A literatura
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navegador. São Paulo: ed. da UNESP. 1998. FELMAN, Shoshana. Educação e crise ou as vicissitudes
do ensinar. In: Catástrofe e representação: ensaios / Arthur Nestrovski, Márcio Seligmann-Siiva
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aulas sobre linguagem, memória e história. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 2005. HONNETH, Axel.
Reificação. Um estudo de teoria do reconhecimento. Tradução: Rúrion Melo. São Paulo: Unesp,
2018. HUNT, Peter. Crítica, teoria e literatura infantil. Tradução: Cid Knipel. São Paulo: Cosac Naify,
2010. ISER, W. O jogo do texto. In: JAUSS, Hans Robert, et al. A literatura e o leitor: textos de estética
da recepção. Seleção, coordenação e tradução: Luiz Costa Lima. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2005. LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo: Ática, 1993.
OURIQUE, João Luis Pereira. (Org.). Literatura e formação do leitor: escola e sociedade, ensino e
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STEINER, George. Lições dos mestres. Tradução: Maria Alice Máximo. São Paulo: Record, 2018.
997
metodológicos, as Literaturas de Alta Fantasia podem estar presentes nas salas de aula. Contudo, é
forçoso reconhecer que são necessárias mais pesquisas, teóricas e de campo. Também é importante
salientar o desinteresse acadêmico pelo assunto, sendo necessário insistir no trabalho de divulgação
científica.
Referências: BAUDOU, J. La Fantasy. Paris: PUF, 2005. BURCAR, Lilijana. Fantazijska rnladinska
knji:levnost na prehodu v 21. Stoletje: primer britanskega prostora. Primerjalna knjizevnost. Letn. 30,
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Tudo que um geek deve saber. Novas Ideias. Edição do Kindle. MATANGRANO, Bruno Anselmi. O
mundo de Oz de Frank Baum: conto de fadas modernizado, utopia norte-americana ou alta fantasia
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https://periodicos.ufsc.br/index.php/desterro/article/view/76109/45279. _____ Ordem vermelha:
filhos da degradação, entre a alta fantasia e a distopia. Estudos de Literatura Contemporânea
Brasileira, Brasília,n. 56, e5620, 2019. Disponível em:
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Martins. Literatura em sala de aula: da teoria literária à prática escolar. PPGL/UFes. Anais do Evento
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Introdução à literatura fantástica. Tradução de Maria Clara C. Castello. São Paulo: Perspectiva, 2008
TOLKIEN, J. R. R. Sobre histórias de fadas. Tradução de Ronald Kyrmse. São Paulo: Conrad, 2006.
WOO, Benjamin. Getting a Life: The Social Worlds of Geek Culture McGill-Queen's University Press.
Edição do Kindle.
998
de literatura podem contribuir para a melhoria deste ensino frente aos novos processos de leituras
e de leitores advindos da modernidade. Adotaremos uma metodologia qualitativa que se baseará
em uma pesquisa bibliográfica a fim de entender, desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e
ideias, como os conceitos de: literatura, leitura, leitor, letramento e leitura literária. Além de
observações assistemáticas às aulas de literatura nos três anos do ensino médio da escola Centro
Educacional 619 de Samambaia Norte no Distrito Federal, com o fito de explicações mais profundas
e um entendimento mais amplo e prático da problemática. Ao longo das aulas assistidas serão
passados alguns questionários sobre os hábitos de leitura dos estudantes bem como a visão sobre
literatura que os mesmos possuem. Investigaremos também as estratégias de incentivo e de ensino
de literatura adotadas pela escola. O que se espera é que como resultado da pesquisa, ao seu
término, consigamos estruturar uma proposta metodológica baseada nos dados levantados no
estudo que nos possibilite uma intervenção produtiva à instituição. Desta forma daremos mais um
passo nesse caminho do ensino de literatura.
Referências: AGUIAR E SILVA, V. M. Teoria da Literatura. 8. ed. Coimbra: Livraria Almeida, 1988.
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999
portanto, contribuir com o debate sobre a nova concepção de ensino e aprendizagem da leitura
literária a partir da educação digital.
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alternativas. São Paulo: Global, 2009. p. 17-39.
1000
exatamente a uma recomposição da unidade, mas a uma nova recombinação; e que o recorte não
pressupõe o processo de colagem e pode se restringir ao ato de seleção e de exclusão para a
promoção de um isolamento do trecho. Esses procedimentos de seleção, extração, isolamento,
recombinação são também promovidos em sala de aula e na elaboração dos materiais didáticos que
apresentam o texto literário ao estudante. Assim, cabe-nos o questionamento referente a essa ação
didática: que escolhas de recortes têm sido realizadas em livros didáticos e cadernos de atividades?
Que processos de recontextualização são priorizados? Que representações do texto literário são
potencialmente construídas a partir de tais priorizações? A partir da análise de materiais didáticos
de ampla difusão, realizam-se aqui apontamentos em torno dessas questões, a fim de que, com isso,
instaure-se uma discussão sobre a presença do extrato de texto literário em sala de aula e as escolhas
didáticas que a circundam.
Referências: BELHADJIN, Anissa e PERRET, Laetitia. L’extrait et la fabrique de la littérature scolaire.
Bruxelles: Peter Lang, 2020. DAVIET-TAYLOR, Françoise e GOURMELENi, Laurent. Fragments:
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34, 2013.
1001
no interior do estado de Goiás, especificamente nas escolas que atendem crianças oriundas das
zonas rurais no município de Jussara. Verificar ainda, as possibilidades imbuídas nas práticas
literárias, para formação leitora e estética na infância. Na ideia de leitura baseada no sentido, a
criança é um leitor desde o princípio, o professor é um “facilitador” e um guia; o tratamento é
individualizado e a criança deve explorar, formular hipóteses, imaginar e verificar o sentido do texto.
Entre os resultados a alcançar inclui-se a compreensão de como a poesia, com as suas especificidades
de linguagem, pode potencializar o universo lúdico da criança e favorecer o refinamento da
sensibilidade e da percepção crítica e estética. A pesquisa será referendada por autores que se
dedicaram à investigação do desenvolvimento infantil, do ensino e outros que estudaram as
contribuições da poesia para percepção estética e crítica, como Huizinga (1980), Lajolo (1988),
Bordini (1991, 2010), Candido (2008), Vigotski (1998), Aguiar (2001), Zilberman (2003), Colomer
(2003), Todorov (2009).
Referências: AGUIAR, Vera Teixeira. Era uma vez... na escola: formando educadores para formar
leitores. Belo Horizonte: Formato Editorial, 2001. ANDRADE, Carlos Drummond de. Boitempo:
Menino Antigo 1ª ed. São Paulo: Companhia da Letras, 2017. BORDINI, Maria da Glória. Poesia e
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TODOROV, T. A literatura em perigo. Trad. Caio Meira. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.
1003
com a proposta da leitura de contos, utilizando o método linear já aplicado em outras pesquisas
sobre ensino e literatura. A pesquisa aconteceu no período de 4 meses, em 2022, no primeiro ano
de aula presencial, após a pandemia, nos tempos de aula de Língua portuguesa, em turmas do 2º e
do 3º ano do ensino médio. A ênfase aqui é verificar a resposta dos alunos quando convidados a
fazer a leitura literária por meio da contação da história, pois o método linear consiste na leitura do
texto pelo professor e na audição, no comentário e na produção dos alunos a partir desse ouvir o
texto, finalizando com o compartilhamento coletivo da produção textual individual por cada aluno
nos dois tempos de aula usados para a realização da atividade.
Referências: BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. São Paulo:Editora 34,2016. BARTHES,
Roland. Aula. Tradução de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Cultrix, 2004. BORDINI, Maria da Glória;
AGUIAR, Vera Teixeira. Literatura: a Formação do Leitor: Alternativas Metodológicas. Porto Alegre:
Mercado Aberto, 1988. LAJOLO, Marisa. Usos e Abusos da Literatura na Escola: Bilac e a Literatura
Escolar na República Velha. Rio de Janeiro: Globo, 1982. MANGUEL, A. Uma história da leitura.
Tradução Pedro Maia Soares. 1ª Ed. São Paulo: Companhia de Bolso, 2021. _____________ Os Livros
e os Dias. Tradução José Geraldo Couto. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. PEREIRA, Danglei
de Castro. Entre Harpócrates e Calíope: desafios em torno do ensino de literatura. Brasília
:Universidade de Brasília, Departamento de Teoria Literária e Literaturas, 2020. 99 p. : il.
1004
POLÍTICAS CURRICULARES E AGENTIVIDADE NO LOCAL DE TRABALHO: UMA ANÁLISE
ETNOGRÁFICA DO TRABALHO COTIDIANO COM EDUCAÇÃO LITERÁRIA NOS ANOS INICIAIS
Clecio Dos Santos Bunzen Junior
Resumo: O presente trabalho assume a importância de estudos sobre o currículo dos cotidianos
escolares como centrais para a compreensão da implementação das diversas políticas curriculares e
do processo de agentividade no local de trabalho. Em um contexto local forte de
neoconservadorismo político e de forte controle das várias políticas públicas e de linguagem
(RAJAGOPALAN, 2013), faz-se necessário observar com mais atenção as práticas cotidianas de sala
de aula, pois é lá que as professoras fabricam os currículos, inventam resistências e assumem
diferentes identidades. Partimos da concepção de que as professoras são as que mais conhecem as
necessidades locais e que formulam as políticas de facto (RICENTO, 2006; MCCARTY, 2011; BUNZEN,
2009; KLEIMAN, 2006; LESSARD; 2016). No âmbito das políticas públicas contemporâneas, alguns
municípios têm investido em construção de políticas públicas de letramento (STREET, 2014) próprias
para o trabalho com a educação literária nas escolas (PAIVA, 2012; MACEDO, 2021; AMORIM et al,
2022). A problemática central da investigação é justamente procurar compreender, por uma
pesquisa de cunho etnográfico, como duas professoras atuam no Programa de Leitura “Escola que
lê, faz a mudança acontecer” em uma escola pública no munícipio de Jaboatão dos Guararapes (PE).
Uma das características dessa política pública é a compra e distribuição de livros literários sem a
participação direta do professor em tais decisões. O programa é compreendido como parte de uma
política curricular que prescreve e regulamenta que tipo de obra literária precisa ser lida na escola
pelas crianças dos anos iniciais. Os resultados demonstram como nas ações de sala de aula as
professoras agem pela lógica do ator, ou seja, como os agentes nos níveis locais que participam da
elaboração, implementação e negociação nas redes municipais, nas escolas e nas salas de aula com
as políticas públicas que envolvem a educação literária.
Referências: AMORIM, Marcel; DOMINGUES, Diego; KLAYN, Débora; SILVA, Tiago. Literatura na
escola. São Paulo: Editora Contexto, 2022. BUNZEN, Clecio. Dinâmicas discursivas na aula de
português: os usos do livro didático e projetos didáticos autorais. Tese (Doutorado em Linguística
Aplicada), Universidade Estadual de Campinas, 2009. KLEIMAN, Angela. Processos identitários na
formação profissional – o professor como agente de letramento. In: Manuel Corrêa e François Boch
(Orgs.) Ensino de língua: representação e letramento. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2006, pp.
75-91. LESSARD, Claude. Políticas educativas: a aplicação na prática. Petrópolis: Vozes, 2016.
MACEDO, Maria do Socorro (Org.). A função da literatura na escola: resistência, mediação e formação
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In: Teresa MacCarty (Orgs.). Ethnography and language policy. New York: Routledge, pp. 1-28. PAIVA,
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Kanavillil. Políticas de ensino de línguas no Brasil: história e reflexões prospectivas. In: Luiz Paulo da
Moita Lopes (Org.) Linguística Aplicada na Modernindade Recente. São Paulo, Parábola, 2013.
RICENTO, T. Language Policy: Theory and Practice: An Introduction. In: Thomas Ricento (Org.) An
introduction to language policy: Theory and method. Oxford, Blackwell, 2006. STREET, Brian.
Relações entre políticas, teoria e pesquisa no campo do letramento. In: Letramentos Sociais. São
Paulo: Parábola, 2014, pp. 193-213.
1005
complexo que inclui, como seus principais pontos de articulação, a gama de determinantes já
descritos desde a proposta do primeiro simpósio em questão: os documentos orientadores do MEC,
os materiais didáticos oferecidos pelo PNLD, as bibliotecas escolares e seus programas oficiais de
constituição e alimentação do acervo, as avaliações de larga escala, os programas de formação
docente das licenciaturas à pós-graduação e ainda , por fim, as próprias condições concretas em que
têm atuado os professores das escolas públicas. Pretendemos, com essa análise, detectar as
principais dificuldades encontradas para o desenvolvimento de abordagens sistêmicas do ensino da
literatura mas também o seu potencial, inclusive no que diz respeito à efetiva experiência do que
isso pode significar em termos de uma reafirmação da desejável indissociabilidade entre teoria e
prática. Como base teórica, convocamos mais uma vez desde as primeiras observações de Antonio
Candido a respeito da constituição do nosso “sistema literário”, até as formulações teoricamente
mais detalhadas do seu funcionamento trazidas pela ciência da literatura empírica de extração
alemã.
Referências: CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: ___. Vários Escritos. 5 ed. Rio de Janeiro:
Ouro sobre Azul/ São Paulo: Duas Cidades, 2011. OLINTO, Heidrun Krieger. Letras na página, palavras
no mundo. Novos acentos sobre os estudos de literatura. Palavra. Rio de Janeiro: PUC-RJ, n.1, p. 7 -
40, 1993. OLINTO, Heidrun Krieger. Ciência da literatura empírica: uma alternativa. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1989.
1006
na história desse país os letramentos literários estiveram tão “on” entre os jovens (Petit, 2009;
Massol, 2018; Amorim et al, 2022), sejam nos saraus, nos slams, nas festas literárias, nas bienais de
livros, nos canais do YouTube etc., espaços esses em que o protagonismo juvenil se faz evidente,
deixando escapar a subjetividade leitora e escritora desses jovens – eis o que se pretende discutir
neste simpósio.
1007
Referências: CÂNDIDO, Antônio. “O direito à Literatura”. In: _______. Vários escritos. Rio de Janeiro:
Ouro sobre Azul, 2004. COLOMER, Teresa. “Andar entre livros: A leitura literária na escola”. In: Nos
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Sette-Câmara. Belo Horizonte: Âyiné, 2018.
DA SAÚDE À AMIZADE: "HÁ COISAS QUE NÃO SE PODE FAZER JUNTO SEM ACABAR GOSTANDO
UM DO OUTRO"
Jamilly Starling Santos de Jesus e Mônica de Menezes Santos
Resumo: Fruto da pesquisa de doutorado em andamento, intitulada "Expecto Patronum: notas sobre
docência, literatura e a pequena saúde”, o trabalho ao qual corresponde o presente resumo é
alicerçado na pergunta “pode o compartilhar de textos literários ser promotor da pequena saúde
deleuziana?” Aqui, a partir de experiências de leitura em salas de aula com crianças de duas turmas
do terceiro ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede municipal da cidade de Salvador,
costuradas pelo livro “Harry Potter e a Pedra Filosofal”, de JK Rowling, refletimos sobre a alegria
cultural que reside em dividir com os estudantes nossas paixões literárias, os escritores que
admiramos, as produções que nos afetaram a tal ponto que não podemos deixar de compartilhá-las
com aqueles cuja educação escolar está sob nossa responsabilidade e como esse compartilhamento
pode ser promotor da pequena saúde na escola. Para essas reflexões, além de recorrermos ao
conceito de Deleuze de “pequena saúde”, também caminharemos pelas obras de Spinoza e o seu
conceito de alegria, de Georges Snyders que, afinando-se ao conceito spinozano de alegria, elabora
o conceito de alegria cultural escolar, assim como também dialogaremos com Jorge Larrosa pelos
seus estudos que tratam da construção de amizades a partir do compartilhar de leituras.
Referências: ALMEIDA, Vanessa Sievers. Amor mundi e educação: reflexões sobre o pensamento de
Hannah Arendt [tese]. São Paulo: Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo; 2009. ARENDT,
Hannah. Entre o passado e o futuro. Barbosa. São Paulo: Perspectiva, 2013. LARROSA, Jorge.
Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017.
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ROWLING, J.K. Harry Potter e a Pedra Filosofal. Rio de Janeiro: Rocco, 2015a. SANTOS, Boaventura
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de Sousa. A cruel pedagogia do vírus. São Paulo: Boitempo, 2020. SPINOZA, Benedictus de. Ética.
Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009. SNYDERS, Georges. A alegria na escola. São Paulo: Editora
Manole Ltda., 1988 SNYDERS, Georges. Alunos felizes: reflexões sobre a alegria na escola a partir de
textos literários. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1993.
1010
Resumo: A comunicação proposta emerge de uma pesquisa de mestrado defendida em 2022, na
qual nos dedicamos a refletir sobre o espaço ocupado pela literatura na educação básica brasileira.
Nosso objetivo foi analisar o contato dos alunos de uma escola pública federal com a literatura, no
âmbito de um projeto de leitura intitulado Confraria Literária. A pesquisa, definida como um estudo
de caso, contemplou análise documental, entrevistas e aplicação de questionários, envolvendo a
professora idealizadora do projeto e os alunos participantes. Na apresentação aqui proposta, vamos
dar ênfase à análise do acervo memorialístico do projeto lançando luz sobre o material de divulgação
dos eventos do Confraria, as produções escritas e audiovisuais elaboradas nas atividades do projeto,
além dos registros fotográficos dos encontros. Nossa análise teve como aporte teórico autores como
Candido (2017) e suas reflexões sobre o acesso de todos os cidadãos à literatura. Além disso,
recorremos à Zilberman (2009; 2012), Rezende (2013) e Rouxel (2013) que problematizam o ensino
e a leitura da literatura na escola. Por fim, nos aproximamos de Dalvi (2021) no que se refere à
importância de trazer para a discussão questões sociais, econômicas e culturais, uma vez que estas
estão diretamente relacionados ao ensino de literatura no nosso país. Com a pesquisa, concluímos
que houve o contato efetivo dos participantes do Confraria com a leitura literária, que resultou, por
sua vez, na ampliação do repertório literário dos alunos da educação básica da instituição de ensino
proponente do projeto. Ganhou relevo na investigação, também, a atuação da professora
idealizadora do projeto, responsável direta pelo envolvimento dos estudantes/confrades com as
leituras propostas, o que nos levou a compreender a importância indiscutível do nosso papel como
mediadores de leitura no contexto escolar.
Referências: CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: Vários escritos. 6. ed., reimpr. Rio de
Janeiro: Ouro sobre Azul, 2017. DALVI, Maria Amélia. Educação, literatura e resistência. In: MACEDO,
Maria do Socorro Alencar Nunes (org.) A função da literatura na escola: resistência, mediação e
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brasileiro. In: ROUXEL, Annie; LANGLADE, Gérard; REZENDE, Neide Luzia de. (org.). Leitura subjetiva
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Neide Luzia de. (org.). Leitura subjetiva e ensino de literatura. São Paulo: Alameda, 2013.
ZILBERMAN, Regina. A leitura e o ensino da literatura. Curitiba: Intersaberes, 2012. ZILBERMAN,
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Graduação em Letras da Universidade de Passo Fundo - v. 5 - n. 1 - 9-20 - jan./jun. 2009.
1011
comunicação pretende discutir tais questões, de modo a colaborar, em alguma medida, para uma
“revisão crítica das metodologias de ensino da área”, como refere o presente Simpósio.
Referências: BAJOUR, C. Ouvir nas Entrelinhas: o valor da escuta nas práticas de leitura. Tradução de
Alexandre Morales. São Paulo: Editora Pulo do Gato, 2012. CHAMBERS, A. Tell Me: children, Reading,
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Literário. São Paulo: Contexto, 2014.
1012
da literatura em campo expandido, e as abordagens actantes ou performativas da leitura literária.
Convocados em suas particularidades, esses três eixos prenunciam um deslocamento da nossa
atenção da teoria (literária) tout court para o campo do ensino de literatura, isto porque, é
precisamente quando as teorias são provocadas respectivamente na e pela linguagem da experiência
(LARROSA), em confronto com inespecificidade e instabilidade do literário (KRAUSS; LUDMER,
GARRAMUÑO) e, no ato/acontecimento suscitado no processo de leitura (DURÃO; CECHINEL), que
os mais interessantes avanços encontram suas condições de aparecimento. De fato, o ensino de
literatura direciona contínuas provocações à teoria (literária) institucionalizada por se constituir em
um lugar de difícil sedimentação, aberto às intempéries performativas da leitura. Se a teoria
(literária) pretende hoje se desvencilhar dos discursos para iniciados, no que corre o risco de
irrelevância, é precisamente na reflexão sobre o ensino de literatura que surgirão as melhores
oportunidades. Esta é nossa proposta de reflexão para esse simpósio.
Referências: DURÃO, Fábio Akcelrud; CECHINEL, Andre. Ensinando literatura: a sala de aula como
acontecimento. São Paulo: Parábola, 2022. LARROSA, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência.
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VOLÓCHINOV, V. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017.
1014
de ler, discutir e escrever sobre nossos mitos literários antes só pertencentes à cultura formal e
convencional escolar ou acadêmica. Esta comunicação objetiva fazer uma reflexão sobre o processo
de formação de leitores e letramento literário por meio da prática de leitura e escrita de fanfictions.
A proposta é resultado da ação do projeto de extensão “Fanfiction Club: Círculo de leituras e escritas
de fãs”, iniciado e desenvolvido no ano de 2022, nos Cursos Técnicos do CEFETMG- Campus Curvelo
e IFTM – Campus Paracatu (MG). Para Henry Jenkins (2012), embora as práticas de leitura e escrita
de fãs sejam recorrentes nas séries de TV populares e filmes, não há razão para que docentes não as
ajustem ao cânone literário. Seguindo esta perspectiva, o projeto foi idealizado a partir da
possibilidade de trazer o universo da cultura participativa de fãs e suas ficções para as nossas pautas
educacionais. Proposta de ensino que assume o desafio de uma aprendizagem que preza pelas
competências e habilidades, sustentadas nas práticas de leitura e escrita informais do universo
online, além da expectativa de que podemos agregar nosso saber centrado na cultura oficial e cultora
da literatura clássica ao saber do espaço aberto, democrático e participativo dos fandons do
ciberespaço. Demonstração de que é possível ao docente se apropriar daquilo que existe fora da
escola, o saber informal que movimenta a cultura participativa dos fãs, e enredá-lo a sua pedagogia
institucional.
Referências: COSSON, Rildo. Círculos de leitura e letramento literário. São Paulo: Contexto, 2014
DOMINGOS, Ana Cláudia Munari. Hiperleitura e escrileitura [recurso eletrônico]: convergência
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Matrizes, ECA/USP, São Paulo. V. 6, N. 1-2 (2012). P. 11-24. Disponível em
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de fã” na internet. http://www.cencib.org/simposioabciber/PDFs/CC/Lucio%20Luiz.pdf. Acesso em
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e a experiência dos fãs leitores e escritores” In: Ciberlegenda – Revista do Programa de Pós-
graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense. 2013. Disponível em:
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fanfiction [recurso eletrônico]: novas leituras e escrituras em meio eletrônico. Passo Fundo: Ed.
Universidade de Passo Fundo, 2015. Disponível em: <www.upf.br/editora>. Acesso em: 23 out. 2016.
1015
(FCLAR), 1980 e Letras (IBILCE), 1979. Esses dados indicam que o debate sobre literatura e ensino no
ensino superior está presente na trajetória dos seus institutos e na movimentação do seu campo
(BOURDIEU, 1983) de pesquisa. Contudo, ainda no século XXI, desafios surgem diante do currículo
das licenciaturas em Letras e no estabelecimento do diálogo com a educação básica. A leitura
literária, como prática cultural (CHARTIER, 2001; CERTEAU, 2012) é crucial para a formação crítica
dos sujeitos perante as demandas sociais vigentes, como questões étnico-raciais, de gênero,
socioeconômicas e políticas; esta mobilização de capital intelectual (BOURDIEU, 2017) está atrelada
a uma sistematização e configuração do ensino. Finalmente, por meio da análise documental (ANDRÉ
e LÜDKE, 2015) curricular e de teses e dissertações, pretende-se discutir as perspectivas do ensino
de literatura da UNESP.
Referências: BOURDIEU, Pierre. Algumas propriedades dos campos. In: BOURDIEU, Pierre. Questões
de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983a. p. 89-94. CATANI, Afrânio Mendes et al. (comp.).
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uma operação de caça. Petrópolis: Vozes, 1994. LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli. A análise documental.
In: LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. 2. ed. São Paulo:
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Roger. Práticas de leitura. 2. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2001. p. 9-17.
1016
LETRAMENTO LITERÁRIO PARA ALUNOS DO NONO ANO: PROPOSTA DE ATIVIDADES DIALÓGICAS
COM A OBRA "TERRA SONÂMBULA", DE MIA COUTO
Renata Feitosa Silva
Resumo: O trabalho com o texto literário não é uma prática recorrente nos anos finais do Ensino
Fundamental visto que o foco a tal âmbito do estudo de língua portuguesa é dado somente nas séries
subsequentes. Assumindo a visão de literatura como um direito humano essencial - defendida por
Cândido (2004) - surge o tema de pesquisa desenvolvido – uma proposta de atividades dialógicas
voltadas à formação de leitores literários no nono ano do Ensino Fundamental, baseada nos estudos
de letramento literário de Rildo Cosson (2014) e Mirian Zappone (2021). O ponto de partida para a
dissertação é a leitura crítica da obra “Terra Sonâmbula”, do autor moçambicano Mia Couto, em
diálogo com outros textos de mesma temática. O objetivo deste trabalho é desenvolver atividades -
baseadas na sequência didática proposta por Dolz e Schneuwly (2004) e na estrutura do letramento
literário de Rildo Cosson (2014) - para incentivar o hábito de leitura literária em sala de aula bem
como para aproximar alunos e obra literária, uma vez que tal livro apresenta um relato de vida
próximo àquele vivido pela comunidade da unidade escolar. O processo de conclusão tem como
ponto de partida a leitura crítica das duas histórias paralelas e complementares: a sobrevivência de
Muidinga e Tuahir e os “Diários de Kindzu”, presentes no livro utilizado como base para o estudo e
culmina com a confecção dos “Diários de leitura 9A”, escritos pelos discentes a partir das vivências e
da inserção deles na leitura. O projeto foi finalizado com a tarde de autógrafos dos livros impressos
e a entrega deles aos responsáveis pelos discentes. Tais atividades e produções são o corpus para
análise de todo processo de letramento literário.
Referências: ABREU, Márcia. Cultura letrada: literatura e leitura / Márcia Abreu. – São Paulo: Editora
UNESP, 2006. BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. Trad. Maria Ermentina Galvão G.
Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997. BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum
Curricular. Brasília, 2018. _______. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Introdução. Ensino
Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. _______. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Língua
Portuguesa. Ensino Fundamental. Terceiro e quarto ciclos. Brasília: MEC/SEF, 1998. CANDIDO,
Antonio. O direito à literatura. In Vários escritos. 3. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995. COLOMER,
Teresa. Literatura não é luxo. É a base para construção de si mesmo São Paulo: Revista Nova Escola,
2015. Disponível em: < https:/novaescola.org.br/conteudo/8867/literatura-nao-e-luxo-e-a-base-
para-a-construcao-de-si-mesmo> Acesso em: 22 dez. 2022. COSSON, Rildo. Letramento literário:
teoria e prática. São Paulo: Editora Contexto, 2009. _______, Rildo. Literatura: modos de ler na
escola. Anais da XI Semana de Letras. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2011. _______, Rildo. Letramento
literário: teoria e prática. 2. ed., 4ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2014. COUTO, Mia. Mia
Couto revisitado. Digestivo Cultural. 14 de setembro de 2006. Disponível em:
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procedimento. In: SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. (Orgs.). Gêneros orais e escritos na escola. Trad.: Roxane
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importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez,
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(85 min.). PAULINO, Graça. Das leituras ao letramento literário – 1979-1999. Belo Horizonte:
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EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. União dos Dirigentes Municipais de Educação do Estado de
São Paulo.?Currículo Paulista. São Paulo: SEE- SP/UNDIME-SP, 2019. SOARES, Magda. B. Letramento:
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escola – entre a democratização e o cânone. Revista Literatura em Debate, v. 11, n. 21, p. 20-39,
jul./dez. 2017. Disponível em:
http://revistas.fw.uri.br/index.php/literaturaemdebate/article/view/2704. Acesso em: 10 de agosto
de 2020.
SALA DE AULA COMO UM LIVRO ABERTO A SER LIDO E ESCRITO PELA DIVERSIDADE DAS
EXPERIÊNCIAS LITERÁRIAS
Sandra Dias Loguercio
Resumo: Situações de crise, como a que vivemos no ensino das ciências humanas de maneira geral,
e no ensino de literatura em particular, resultam de múltiplos fatores. Há certamente o predomínio
da ideologia neoliberal e os efeitos socioeconômicos e culturais de uma política efetiva condicionada
por tal ideologia, que busca eliminar tudo que resulte em “conhecimento-emancipação” (SANTOS,
2011); mas há também aspectos internos, como aqueles que dizem respeito a momentos de ruptura
do conhecimento e das práticas de produção de conhecimento e de linguagens, como hoje vivemos
com a explosão das tecnologias de informação e comunicação. Nesse sentido, esse quadro de “crise”
não seria, antes, um sintoma de desencontros entre experiências de leitores/as e, sobretudo, entre
a expectativa docente e os anseios discentes? É possível levar a ler o que se quer que se leia? Como
se lê e como se leva a ler? Quais os sentidos dessa busca quanto à (trans)formação de leitores/as,
aquela que, segundo a BNCC (2017), deve formar para o “protagonismo e autoria na vida pessoal e
coletiva, de forma crítica, criativa, ética e solidária, defendendo pontos de vista que respeitem o
outro e promovam os Direitos Humanos” (p. 490)? A partir de um estudo de caso realizado junto a
estudantes de pós-graduação dos cursos de Letras e Pedagogia, inscritas em uma disciplina que
buscava refletir sobre as disposições do indivíduo (BOURDIEU, 2004a, 2004b; LAHIRE, 2004, 2005)
para ler literatura, passando por questões mais gerais sobre letramentos (SOARES 1995; STREET,
2014) e servindo-nos da produção da autobiografia de leitor/a como método de (auto)análise (PETIT,
2013), propomos discutir a experiência de leitores/as com a leitura literária e as repercussões dessas
narrativas, compartilhadas em boa medida, para o ensino de literatura e/ou aquele que se apoie em
leituras literárias.
1018
Referências: BOURDIEU, Pierre. Coisas Ditas. Ed. Brasiliense, São Paulo, 2004. BOURDIEU, Pierre.
Estrutura, habitus e prática. In: A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2004.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018. LAHIRE, Bernard
(coord.). Sociología de la lectura. Barcelona: Gedisa, 2004. LAHIRE, Bernard. Patrimônios Individuais
de Disposições. Para uma sociologia da escala individual. Revista Sociologia, Problemas e Práticas, nº
49, p. 11-42, Lisboa, Portugal, 2005 PETIT, Michèle. Trad. de Celina Olga de Souza. Leituras: do espaço
íntimo ao espaço público. Rio de Janeiro: Editora 34, 2013. SANTOS, Boaventura de Souza. A crítica
da razão indolente: contra o desperdício da experiência. v. 1, 8.ed., São Paulo: Cortez, 2011. SOARES,
Magda Becker. “Língua escrita, sociedade e cultura: relações, dimensões e perspectivas.” In: Revista
Brasileira de Educação, Caxambu, n. 0, p. 5-16, out. 1995. STREET, Brian. Trad. de Marcos Bagno.
Letramentos sociais. São Paulo: Parábola, 2014.
1019
como instrumento de análise e reflexão no ambiente de uma cultura determinada. As linguagens se
revelam em comum acordo com os espaços em que interagem, então dinamiza seus sentidos
seguindo suas modificações. “Semiosfera”, conceito que auxilia na descrição de uma determinada
cultura, com armazenamento e transferência de informações. Nesse sentido podemos considerar o
“texto literário” como “texto de cultura”. Se os signos modeliza a realidade, mapeamos, em um
primeiro momento, a sequenciação didática na vertente semiósferica, e, em seguida, a leitura de
textos literários, acompanhada da produção de diários de leitura (ROUXEL, 2012) escrito pelos
estudantes sobre o que entenderam a respeito do dialogismo entre texto literário e cultura. Os
resultados demonstraram em primeira instância, o desenvolvimento dos conceitos de etapas da
sequenciação didática como: Semioarticulação contextual; Articulação Semiósferica de leitura;
Articulação de Criação Literária Crítico-cultural; Consolidação da semioleitura crítica-cultural, esses
arranjos conceituais proporcionou uma prática pedagógica que instrumentou o leitor a ler a
literatura através da cultura, e, a ler a cultura através da literatura. Destarte, a influência mais
marcante do método foi a revelação de ensino crítico-cultural da literatura a partir da Semiótica da
Cultura, bem como os resultados de compreensão do texto literário como texto da cultura se
mostraram satisfatórios para a categoria do Ensino Médio.
Referências: ROUXEL, Annie. Práticas de leitura: quais rumos para favorecer a expressão do sujeito
leitor? In: Cadernos de Pesquisa, v.42, n.145, jan./abr. 2012a. p.272-283. DOI:
https://doi.org/10.1590/S0100-15742012000100015. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/cp/a/vbgD8LhYCcYxjFYf93P4Kwq/abstract/?lang=pt. Acesso em 13 jun.
2020. IURE. Lotman. La semiosfera- I: Semiótica de la cultura y del texto. (ORG) Desiderio Navarro.
Ediciones Cátedra, S. A., 1996. Juan Ignacio Luca de Tena, 15. 28027 Madrid.
1020
Resumo: Durante o período mais agudo e conturbado da pandemia, algo que há tempos estava
presente tanto no âmbito da teoria quanto no do projeto acadêmico e educacional tomou uma forma
muito própria e concreta, à revelia de ambos: uma experiência da leitura, uma busca pelo livro, pela
palavra, sobretudo a compartilhada, envolvendo concepções múltiplas de literatura. A dimensão da
escrita, não apenas como autoexpressão, mas como configuração de uma experiência de e no
mundo, pedia o olhar do outro, interrogava também a experiência alheia, almejava a leitura de
outrem. Um espaço novo parecia se constituir. Ao mesmo tempo, no âmbito estrito da educação
formal, ler tornou-se uma operação bem mais dificultosa, e não apenas quanto aos textos literários,
mas também no que se refere ao letramento mais básico. Uma codificação árida, pouco amigável,
refratária e nada acolhedora se evidenciou nos bancos escolares concretos ou virtuais. As câmeras
dos celulares, que já fotografavam as lousas dos professores antes ainda persistem e se somaram
aos “prints” das telas que registravam "powerpoints". Diante dos olhos de crianças e jovens, signos
não interpretáveis, nem pela escrita, mesmo que restrita ao gesto da cópia, nem pela leitura do
registrado nas telas. Esta comunicação parte de uma tripla visada para refletir sobre os paradoxos e
contradições da experiência leitora no período recente: 1) a do que encontra na leitura (a às vezes
na escrita) literária um lugar, não raro de conforto ou de elaboração do vivido; 2) a do que perde ou
não chega a construir o lugar da leitura para si; 3) a dos mediadores, sobretudo professores, que
oscilam entre a impotência, a surpresa e a perplexidade diante desse lugar em questão – antes ponto
de partida ou de chegada, hoje interrogação.
Referências: ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2010.
ANDRUETTO, María Teresa. Por uma literatura sem adjetivos. Trad. Carmem Cacciacarro. São Paulo:
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escreviam. In: BOLLE, Wilhelm (Org.). Walter Benjamin. Documentos de cultura, documentos de
barbárie. (Escritos escolhidos). São Paulo: Cultrix; EDUSP, 1986. MARTINS, Vima Lia de Rossi;
REZENDE, Neide Luzia (Org.). Dossiê 28: Literatura e Educação. In: Revista Via Atlântica. n. 28 (2015).
PETIT, Michèle. Leituras: do espaço íntimo ao espaço público. Trad. Celina Olga de Souza. São Paulo:
Editora 34, 2013. ZILBERMAN, Regina. A leitura e o ensino de literatura. Curitiba: Editora
Intersaberes, 2012.
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Multiletramentos na escola/Roxane Rojo, Eduardo Moura [orgs.].- São Paulo: Parábola Editorial,
2012.
1022
convicções quanto à necessidade de certos saberes, refletimos sobre o lugar da leitura literária para
além de sua constituição como saber escolarizado, e enquanto inteligência a ser emancipada. Nesse
viés, nosso olhar volta-se para os processos curatoriais como potenciais fatores de reprodução ou
dissidência na hierarquização de inteligências operada pela dinâmica escolar tradicional no que diz
respeito à leitura. Dialogamos neste breve estudo, numa perspectiva essencialmente bibliográfica,
com os postulados de Jacques Rancière (2012; 2020), Rita Felski (2020), Jorge Larrosa (2011), dentre
outros. Pensar o ser como pura suficiência de qualquer aprendizagem é acreditar em um (des)poder
cognoscente como fruto do deixar-se, entregar-se, permitir-se conduzir pelo sentimento e por
identificações não necessariamente explicáveis por teorias sentenciosas, inclusive, ou sobretudo, as
circunscritas ao campo das Humanidades. É, enfim, assistir (a)o transbordamento. E isso a curadoria
pode estar fazendo, hoje, melhor do que a tradição curricular.
Referências: ANDRADE, Patrícia Mourão de. Curadoria como poder e trabalho, e algumas notas
sobre a capitalização do amor. In: Chão da feira. Caderno de leituras n.144 /2022. Série intempestiva.
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Caminhos da curadoria. Trad. Alyne Azuma. Rio de Janeiro: Cobogó, 2014. RANCIÈRE, Jacques. O
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1024
relação aluno-texto no Ensino Remoto; promover a interação com a leitura por meio dos contos
infantojuvenis Vendedor de sustos, de João Anzanello Carrascoza (2014), e Detetive Siqueira em O
panfleto, de Dionísio Jacob (2010). Para isso, fez-se a seguinte pergunta: tendo em vista o isolamento
social, que mudanças ocorreram na atividade leitora dos estudantes do sexto e do sétimo ano de
uma escola particular de Campos dos Goytacazes-RJ? Para tal fim, a metodologia norteadora do
presente estudo pautou-se em pesquisa qualitativa-quantitativa, acrescida de estudos bibliográficos
e de pesquisa-ação. As análises mostraram o quanto é possível o professor promover encontros,
mesmo à distância, porque os alunos tomam a leitura como refúgio e forma de aumentar o prazer
por ela. Torna-se, portanto, essencial a contribuição e a mediação docente nesse processo uma vez
que a identidade e a prática leitoras dos estudantes encontram-se ainda em formação.
Referências: BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional da Educação. Parecer técnico nº
5/2020. Reorganização do Calendário Escolar e da possibilidade de cômputo de atividades não
presenciais para fins de cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da Pandemia da
COVID-19. Distrito Federal: Ministério da Educação, 28 abr. 2020a. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=145011-pcp005-
20&category_slug=marco-2020-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 25 ago. 2020. BRASIL. Portaria nº
343. Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a
situação de pandemia do Novo Coronavírus - COVID-19. Diário Oficial da União. Distrito Federal:
Ministério da Educação, 17 mar. 2020b. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-
/portaria-n-343-de-17-de-marco-de-2020-248564376. Acesso em: 25 ago. 2020. Acesso em: 25 ago.
2020. CARRASCOZA, João Anzanello. Vendedor de sustos. 1. ed. São Paulo: FTD, 2014. GUEDES, Paulo
Coimbra. A formação do professor de português: Que língua vamos ensinar? São Paulo: Parábola,
2006. INSTITUTO PRÓ-LIVRO. Retratos da Leitura no Brasil (2019). 5. ed. Instituto Pró-Livro, 2020.
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ZILBERMAN, Regina. A formação da leitura no Brasil. ed. rev. São Paulo: UNESP, 2019. MORAN, José
Manuel; MASSETO, Marcos Tarciso; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação
pedagógica. 10. ed. Campinas: Papirus, 2000. OLIVEIRA, Luciano Amaral. Coisas que todo professor
de português precisa saber: a teoria na prática. 1. ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.
ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO (OECD). PISA 2018:
insights and interpretations. OECD, 2018. Disponível em:
https://www.oecd.org/pisa/PISA%202018%20Insights%20and%20Interpretations%20FINAL%20PDF
.pdf. Acesso em: 7 nov. 2020. RIBEIRO, Ana Elisa. Textos multimodais: leitura e produção. 1. ed. São
Paulo: Parábola, 2020. SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Tradução de Cláudia Schilling. 6. ed. Porto
Alegre: Penso, 1998. SOUZA, Ismael. Estratégias de leitura para ler e compreender melhor. São Paulo:
Ideia Books, 2020. E-book ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola. 11. ed. São Paulo:
Global, 2003.
1025
atribuições da escola. A proposta deste trabalho é, portanto, através da pesquisa bibliográfica e da
constituição de um corpus local como amostra de uma realidade possível, refletir sobre os passos
iniciais de construção de um museu de leitores/leitoras/leituras: a partir da constituição de uma
fotobiografia, os modos de leitura ganharão suas próprias narrativas visuais, atreladas à reflexão
pautada na literatura como ética e na força dos afetos (KLINGER, 2014), habitáculo (PETIT, 2013) e
na ideia de quarentena-revelação que mostrou como o encontro com o outro – sujeito, livro ou
leituras – se alterou e nos alterou irrevogavelmente (HOMEM, 2020).
Referências: HOMEM, Maria. Lupa da alma: quarentena-revelação. São Paulo: Todavia, 2020.
KLINGER, Diana. Literatura e ética: da forma para a força. Rio de Janeiro: Rocco, 2014. PETIT, Michele.
Leituras: do espaço íntimo ao espaço público. Tradução Olga de Souza. São Paulo: Editora 34, 2013.
SANTIAGO, Silviano. “O entre-lugar do discurso latino-americano” (1971). Uma literatura nos
trópicos. Ensaios sobre dependência cultural. Rio de Janeiro: Rocco, 2000, pp. 9-26.
1026
insatisfação, reordenamos nossos sentidos e ampliamos nossas sensações por meio do texto
literário. Assim, propomos discutir as obras de José Saramago, Ensaio sobre a cegueira (1995) e de
Zygmunt Bauman e Leonidas Donskis, Cegueira moral: a perda da sensibilidade na modernidade
líquida (2014), retomando a abordagem de Perrone-Móises. Pois, a leitura dessas obras acentua, de
forma latente, nossas próprias experiências pandêmicas. Reordena nossas relações pessoais e
sociais, sem distanciamento. O resultado dessas leituras, embora muitas vezes brutal e angustiante,
é reflexo de quem desejamos ser ou deixar de ser. Se ao final desse processo, tal qual os personagens
de Ensaio sobre a cegueira, recobrarmos aquilo que perdemos (ou ganhamos...) ao longo do
caminho, teremos presenciado, principalmente de modo particular e individual, nossa própria
humanidade. Desse modo, o leitor passa, por meio da leitura das obras a serem estudadas, a
entender suas próprias experiências.
Referências: BAUMAN, Zygmunt; DONSKIS, Leonidas. Cegueira moral: a perda da sensibilidade na
modernidade líquida. Tradução Carlos Alberto Medeiros. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. CALVINO,
Italo. Um general na biblioteca. Tradução Rosa Freire d’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras,
2001. PERRONE-MOISES, Leyla. Flores da escrivaninha: ensaios. São Paulo: Companhia das Letras,
1990. RODRIGUES, Letícia. Conheça as 5 maiores pandemias da história. Disponível em:
https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Saude/noticia/2020/03/ conheca-5-maiores-pandemias-
da-historia.html. Acesso em: 12 ago. 2020. SARAMAGO, José. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.
1027
sociais, acrescentando um novo capítulo à história dos leitores e incentivando pesquisas que
forneçam panoramas atuais a respeito dos hábitos de leitura, do mercado editorial e possíveis
impactos no leitor contemporâneo no contexto do virtual. Chamados de produtores de conteúdo
literário, o número de leitores responsáveis por páginas voltadas à divulgação de conteúdo sobre
livros na internet em ferramentas como Instagram, Youtube e TikTok cresceu nos últimos anos. Esse
fenômeno tem como principal objetivo a troca e o acolhimento entre leitores visando o incentivo à
leitura. No livro Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva, Michèle Petit relaciona a importância
da leitura de livros com o processo de autonomia dos indivíduos, uma vez que o ato “(...) pode ajudar
os jovens a serem mais autônomos e não apenas objetos de discursos repressivos ou paternalistas.
E que ela pode representar uma espécie de atalho que leva de uma intimidade um tanto rebelde à
cidadania” (2009, p.19). Dessa maneira, a expansão do conhecimento de mundo dos indivíduos, por
meio do hábito de ler, pode servir de estímulo ao desenvolvimento do pensamento crítico e torna o
contexto que os incentivam em objeto de estudo. Somado a isso, em Notas para a definição de um
leitor ideal, Alberto Manguel afirma que os leitores se relacionam de forma tão particular com seus
livros que “Para todo leitor, sua biblioteca é uma espécie de autobiografia” (2021, p. 40), portanto,
consideramos importante analisar as ações desenvolvidas por produtores de conteúdo literário a fim
de levantar um panorama dessas manifestações e seus impactos no leitor contemporâneo.
Referências: MANGUEL, A. Notas para uma definição do leitor ideal. Tradução: Rubia G; Sergio M. 1.
ed. São Paulo: Edições Sesc SP, 2020. 174 p.PETIT, M. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva.
Tradução: Celina O. S. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2009. p. 7-58.
1028
pesquisadores que atuam em diferentes áreas. Em diálogo com a temática deste simpósio, há três
investigações realizadas com participantes de turmas de segundo e de terceiro ano do Ensino Médio
de uma escola pública federal de Porto Alegre, envolvendo recepção da leitura literária por parte de
estudantes, mediação de leitura em sala de aula e mediação de escrita ocorrida após a leitura do
livro O Avesso da Pele. A metodologia dessas investigações envolve observação participante, com
geração de dados registrados em diários de campo e questionários (ESTEBAN, 2012; GIL, 2008;
MINAYO, 2002); referente à mediação de escrita, envolve, ainda, textos de estudantes e bilhetes
orientadores de reescrita (PASIN, 2018). Os dados foram analisados majoritariamente de forma
qualitativa, ainda que alguns tenham recebido olhar quantitativo. Objetivou-se analisar estratégias
de: a) recepção da obra na perspectiva dos estudantes; b) mediação de leitura literária e participação
dos estudantes; c) mediação de escrita e espaço para as subjetividades de estudantes nas suas
produções. Dialogam com as pesquisas reflexões de Maria (2016), Zilberman (2008), Bajour (2012),
Candido (1995), Cosson (2006, 2015), Pennac (1998), Petit (2008), Rouxel (2013) acerca da leitura,
da mediação e da recepção literária na escola. Ainda, dialogam com a investigação sobre a escrita
das subjetividades, em especial, Bakhtin (2009, 2011), Bondía (2002), Guedes (2009) e Grigoletto
(2011). A análise preliminar aponta ganhos importantes com relação à recepção e à participação de
estudantes e às estratégias de mediação de leitura e escrita se comparados os dados ora gerados
com os dados gerados em ambiente virtual, durante a pandemia, em pesquisa anterior.
Referências: BAJOUR, C. Ouvir nas entrelinhas: o valor da escuta nas práticas de leitura. Tradução de
Alexandre Morales. São Paulo: Editora Pulo do Gato, 2012. BAKHTIN, M. Estética da criação verbal.
6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011. BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. 13. ed. São
Paulo: Hucitec, 2009. BONDÍA, J. L. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. In.: Revista
Brasileira de Educação, jan./mar. 2002. Disponível em: http://www.
scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf. Acesso em: 20/01/2020. CANDIDO, A. O direito à literatura. In:
_________. Vários escritos. 3.ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995. COSSON, R. Letramento literário:
teoria e prática. São Paulo: Contexto, 2006. COSSON, R. A prática de leitura literária na escola:
mediação ou ensino? Nuances: estudos sobre Educação. Presidente Prudente-SP, v. 26, n. 3, p. 161-
173, set./dez. 2015. ESTEBAN, M. P. Pesquisa qualitativa em educação. Porto Alegre; Artmed, 2010.
GIL, A. C.. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008. GRIGOLETTO, M.
Lições do modelo: a escrita que engessa e a que mobiliza. In: RIOLFI, Claudia; BARZOTTO, Valdir
Heitor. O inferno da escrita. Campinas: Mercado das Letras, 2011. GUEDES, P. C. Da redação à
produção textual: o ensino da escrita. São Paulo: Parábola, 2009. MARIA, de L. O clube do livro: ser
leitor, que diferença faz?. São Paulo: Global, 2016. MINAYO, M. C. (org). Pesquisa social: teoria,
método e criatividade. 21. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2002. PASIN, N. O. O bilhete orientador de
reescrita a serviço da interlocução no ensino de leitura e produção textual no contexto acadêmico
de Letras, 2018. 182 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Instituto de Letras, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018. PENNAC, D. Como um romance. Rio de Janeiro: Rocco,
1998. PETIT, M. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva/Michèle Petit; Tradução de Celina Olga
de Souza - São Paulo: Ed. 34, 2008. ROUXEL, A. Aspectos metodológicos do ensino da literatura.
Tradução de Neide Luzia de Rezende. In: DALVI, M. A.; REZENDE, N. L. de; JOVER - FALEIROS, R. (orgs).
Leitura de literatura na escola. São Paulo: Parábola, 2013. ZILBERMAN, R. Recepção e leitura no
horizonte da literatura. Alea [online]. 2008, vol.10, n.1, pp. 85-97. ISSN 1807-0299.
<http://dx.doi.org/10.1590/S1517-106X2008000100006>.
1029
XXI, houve um aumento bastante expressivo de pesquisas e relatos de práticas nesse campo de
estudo. A perspectiva da leitura literária, forjada no âmbito do ensino de literatura de língua
materna, tem contribuído de forma significativa para se pensar a inserção da literatura na aula de
língua estrangeira (LE) e a formação de leitores e leitoras também a partir da LE. Nesse contexto se
situa minha comunicação, que tem como objetivo apresentar um projeto de leitura literária de
contos de fadas e tradicionais realizado nas aulas de FLE em uma turma do 6º ano do Ensino
Fundamental do Colégio de Aplicação (CAp) da UFRGS. Após uma breve contextualização do ensino
de línguas estrangeiras no CAp-UFRGS, exporei alguns desafios para a inserção do texto literário nas
aulas de FLE e comentarei o referencial teórico deste trabalho, com foco na leitura literária como
vaivém dialético, concepção desenvolvida por Dufays et alii (2015). Em seguida, descreverei o projeto
com contos e sua realização em aula, com apresentação de algumas atividades. Concluirei com
alguns elementos de avaliação do projeto, bem como dos desafios e da importância de trabalhar
com a leitura literária na aula de FLE, sobretudo no contexto da Educação Básica.
Referências: DUFAYS, Jean-Louis; GEMENNE, Louis; LEDUR, Dominique. Pour une lecture littéraire :
Histoire, théories, pistes pour la classe. 3e édition. Louvain-la-Neuve : De Boeck Supérieur, coll.
Pratiques pédagogiques, 2015.
RODAS DE CONVERSAS LITERÁRIAS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA) COM A OBRA “OS
CEM MENORES CONTOS BRASILEIROS DO SÉCULO”
1030
Elisabeth Maria De Melo e Clecio Dos Santos Bunzen Junior
Resumo: O presente trabalho, oriundo de uma pesquisa-ação no âmbito do Mestrado Profissional
em Letras, tem como objetivo discutir os diálogos estabelecidos por uma turma de estudantes da
Educação de Jovens e Adultos da comunidade de Cajueiro Seco (Jaboatão, PE) em torno de
minicontos da obra “Os cem menores Contos Brasileiros do Século”, organizada por Marcelino Freire
e publicada pela Ateliê Editorial (2004). Do ponto de vista epistemológico, a investigação foi
desenvolvida em diálogo com três perspectivas que tratam sobre o Dialogismo Freireano (FREIRE,
1967), os Novos Estudos do Letramento (STREET, 2014; GEE, 1990) e a Educação Literária (BAJOUR,
2006; COLOMER, 2007; CANDIDO, 2011; DALVI, 2018; PETIT, 2009; YUNES, 1999; MACEDO, 2021).
Do enfoque metodológico, utilizamos a pesquisa-ação, baseando-se na perspectiva didática e
pedagógica dos processos interativos das rodas de conversa propostos por Bajour et al (2006).
Realizamos a intervenção (com gravações e fotografias) nas seguintes etapas: (i) seis rodas de
conversas literárias com minicontos; (ii) diálogos e reflexões com os minicontos; (iii) narrativas de
vida pelos alunos; (iv) a prática da escuta; (v) troca de experiências; (vi) análise dos elementos
coletados, (vii) avaliação. Neste trabalho, daremos enfoque à roda de conversa com o miniconto
“Primeiro grande amor”, de autoria de Reinaldo Damázio (2004). Como resultados da investigação,
notamos os(as) estudantes sendo donos(as) de suas próprias vozes, tendo a liberdade de ser e de ler
com a própria vida, fazendo relações intertextuais, entrelaçando narrativas, tecendo (singularmente
e coletivamente) os sentidos propostos pelos textos; desencadeando uma perspectiva crítica do
ambiente social, ressignificando sentidos e imaginando outras possibilidades para o texto literário.
Referências: BAJOUR, Cecilia; BOMBINI, Gustavo; CANTAGALLI, Alicia; CARRANZA, Marcela;
FERNÁNDEZ, Mirta Gloria. Experiencias de Capacitación: el Postítulo de Literatura Infantil y Juvenil.
Buenos Aires: Editora: Claudia López, 2006. FREIRE, Paulo. Educação Como Prática da Liberdade. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1967. MACEDO, Maria do Socorro Alencar Nunes; DEZOTTI, Magda;
PEDROSA, Janaina. Leitura literária na escola: compreendendo um evento pelas lentes da pesquisa
etnográfica. In: MACEDO, Maria do Socorro Alencar Nunes (Org). A pesquisa etnográfica em
alfabetização, leitura e escrita: a experiência do GPEALE. Curitiba, CRV, 2021. STREET, BRIAN V.
Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na
educação. São Paulo: Parábola Editorial, 2014. PETIT, Michèle. Os Jovens e a Leitura: uma nova
perspectiva. São Paulo: Editora 34, 2009, 2ª ed. YUNES, Eliana. Círculos de Leitura: teorizando a
prática. In: Leitura: teoria & prática. Revista semestral da Associação de Leitura do Brasil. Ano 18,
número 33. São Paulo:1999.
1031
no estado atual da produção de conhecimento, ela se apresenta como processo racional e articulado
das atividades escolares no contexto social. Os alunos atendidos pelo projeto de leitura que está em
andamento são adolescentes que tem a faixa etária entre 11 e 14 anos, oriundos do 6º e 7º anos do
Ensino Fundamental.
Referências: ABDALA JUNIOR, Benjamim (org.). Margens da Cultura: mestiçagem, hibridismo e
outras misturas. São Paulo: Boitempo, 2004 BOSI, Alfredo (1936). Literatura e resistência. São Paulo:
Companhia das Letras, 2002. BRASIL. Ministério da Educação, (1997). Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília, MEC/SEF. _________. Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, LDB. 9394/1996. BRASIL. _________. Lei 14.407 de 12 de julho de 2022. Dispõe
sobre alteração na LDB. Nº 9.394/1996 para estabelecer o compromisso da educação básica com a
formação do leitor e o estímulo à leitura. <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>
Acesso em 14 jul. 2022 _________. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular.
Brasília, 2018. CÂNDIDO, Antônio. Na sala de Aula: caderno de análise literária. 6ª ed. São Paulo:
Ática, 1998. CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador/ Roger Chartier; tradução
Reginaldo de Moraes – São Paulo: Editora UNESP, 1999. COLOMER, Teresa. Introdução à literatura
infantil e juvenil atual. Tradução Laura Sandroni. – São Paulo: Global, 2017. COMPAGNON, Antoine.
Literatura para quê? Tradução de Laura Taddei Brandini. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009. DALVI
Maria Amélia; REZENDE, Neide Luzia de; JOVER-FALEIROS, Rita (org.) Leitura de Literatura na Escola.
São Paulo, SP: Parábola, 2013. GOIÁS. Documento Curricular para Goiás - Ampliado (DCGO). Goiânia,
SEDUC/CONSED-GO/UNDIME-GO, 2019. FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso: aula inaugural no
Collège de France,pronunciada em 2 de dezembro de 1970. São Paulo: Loyola, 1996 JESUS, Carolina
Maria. Quarto de Despejo: diário de uma favelada – 1ª ed. – São Paulo: Ática, 2020. JOUVE, Vincent.
Por que estudar literatura? /Vincent Jouve; Marcos Bagno e Marcos Marcionilo, tradutores. – São
Paulo: Parábola, 2012. KI-ZERBO, Joseph (editor). História Geral da África. Vol I. 2 ed. rev. Brasília;
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viajante, a torre e a traça. São Paulo: Edições Sesc, 2017. _________________. Notas para uma
definição do leitor ideal. São Paulo: Edições Sesc, 2020. MUNDURUKU, Daniel. Contos Indígenas
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SCHOLLHAMMER, Karl Erik ( org.). Literatura e Cultura. Rio de Janeiro. Ed: PUC-Rio; São Paulo: Loyola,
2003. PERRONE-MOISÉS, Leyla. Altas Literaturas. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. PRATT,
Mary Louise. Os olhos do império: relatos de viagem e transculturação. Tradução Jézio Hernani
Bonfim Gutierre. Bauru, São Paulo: EDUSC, 1999. ROUXEL, Annie; LANGLADE, Gérard; REZENDE,
Neide Luzia de (Orgs.). Leitura Subjetiva e ensino de Literatura. Trad. de Amaury C. Moraes et al. São
Paulo: Alameda, 2013.
1032
imagens, o compromisso do leitor aumenta, já que necessita olhar com mais cuidado, refletir mais
profundamente e colaborar mais ativamente com o ilustrador (...)." Esta comunicação pretende
abordar aspectos da mediação do livro-imagem a partir da análise de mediações de leitura dos livros
Vazio, da ilustradora portuguesa Catarina Sobral, Editora 34; e do livro La Piscina, da ilustradora Sul-
coreana Ji Hieon Lee, Barbara Fiore Editora. O olhar que fundamenta a análise tem como ponto de
partida a formação do leitor literário, sua capacidade para se expressar e relacionar com o texto
escrito e visual, e do quanto o livro-imagem e sua mediação poderiam contribuir no sentido da
formação desse leitor.
Referências: ARIZPE, Evelyn. Imagens que convidam a pensar – o "livro álbum sem palavras" e a
resposta leitora. São Paulo: Revista Emília. (acessado em 27/02/2014) BAJOUR, Cecilia. La orfebrería
del silencio: la construcción de lo no dicho en los libros-álbum. 1? edição. Córdoba: Comunicarte,
2016. p. 85-100. BAJOUR, Cecilia. Ouvir nas entrelinhas: o valor da escuta nas práticas de leitura. 1?
edição. São Paulo: Pulo do Gato, 2012. NIKOLAJEVA, Maria; SCOTT, Carole. Livro Ilustrado: Palavras
e Imagens. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
1033
CAMINHOS PARA A MEDIAÇÃO DE LEITURA LITERÁRIA NA BIBLIOTECA: CONVERSAS LITERÁRIAS E
ATELIÊ DE ARTE
Mariana Cortez
Resumo: Esta comunicação pretende analisar propostas de mediação de leitura literária
desenvolvidas pela Biblioteca para Infância e Juventude Iguaçuense, em Foz do Iguaçu. As práticas
de leitura literária são realizadas em espaço não formal de educação, com o intuito de favorecer a
formação do leitor literário sentido comunitário. A principal atividade promovida pela BIJI são as
mediações literárias que buscam oferecer experiências sociais e afetivas, pautada, principalmente
pelas contribuições de Aidan Chambers (2007a; 2007b) adaptadas ao contexto de inserção em um
ambiente não formal de educação em bairro popular de uma cidade fronteiriça (Argentina, Brasil e
Paraguai). Especificamente, as práticas de mediação partem da seleção de livros infantis
plurissignificativos, da criação de ambientes de leitura e da escuta das respostas leitoras a fim de
conhecer a comunidade e promover o próprio diálogo entre os usuários do equipamento cultural.
Para tanto, problematiza-se experiências desenvolvidas a partir da leitura de livros ilustrados e por
meio delas, reflete-se sobre a forma de fazer da biblioteca, partindo de etapas concomitantes:
ambientação, isto é, a preparação do espaço com elementos que remetem à história a ser lida; em
seguida, faz-se a leitura em voz alta compartilhada com o grupo e, por fim, propõe-se a simbolização
que é uma conversa literária (CHAMBERS, 2008, 2007) integrada a fazeres artísticos, inspirados pela
abordagem dos ateliês Reggio Emilia (EDWARDS C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. 1999, 2015). Os
resultados das propostas oferecem elementos para pensar sobre a formação de leitores literários
em espaços não formais de educação, mas também contribui para o planejamento de práticas de
mediação de leitura nas escolas.
Referências: BAJOUR Cecília. Ouvir nas entrelinhas: O valor da escuta nas práticas de leitura. 1ª
edição. São Paulo: Pulo do Cato, 2012 CHAMBERS, A. El ambiente de la lectura. Trad. Ana Tamarit
Amieva. Mexico: Fondo de Cultura Económica, 2007a. CHAMBERS, A. Dime. Los niños, la lectura y la
conversación. Trad. Ana Tamarit Amieva. México: Fondo de Cultura Económica, 2007b. COLOMER,
Teresa. Andar entre livros: a leitura literária na escola. 1ª edição. São Paulo: Global, 2007. COLOMER,
Teresa. El papel de la mediacion en la formacion de lectores. Disponível em:
<file:///D:/Desktop/AREA%20DE%20TRABALHO/El_papel_de_la_mediacion_en_la_formacion.pdf>.
Acesso em: 02 abr. 2020. EDWARDS C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. Aspectos Gerais. In: EDWARDS C.;
GANDINI, L.; FORMAN, G. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação
da primeira infância. Tradução de Dayse Batista. Porto Alegre: Artmed: 1999 EDWARDS, C.; GANDINI,
L.; FORMAN, G. (org.). As cem linguagens da criança: a experiência de Reggio Emília em
transformação. Porto Alegre: Peso, 2015. v. 2. PETIT, Michele. El arte de la lectura en tiempos de
crisis. 1ª Edição. Barcelona-España. Oceano Travesia, 2009. PETIT, M. A arte de ler como resistir à
adversidade. Tradução de Arthur Bueno e Camila Boldrini. 1ª edição. São Paulo: Editora 34, 2009.
PETIT, Michele. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva. 2ª São Paulo: Editora.
1034
investigação um conjunto de textos caracterizados como materiais didáticos. No total, foram
analisadas 10 obras, sendo cinco livros didáticos de Língua Portuguesa e cinco materiais didáticos da
categoria de livros do novo ensino médio intitulados Projeto de Vida. Em função dos limites desta
comunicação, serão apresentados os dados referentes às obras caracterizadas como Projeto de Vida.
Para a análise do material, partiu-se do princípio de que a leitura de textos literários, na escola,
configura-se como uma prática demarcada por sua estrutura sócio histórica, ou seja, como uma
prática de letramento ou como um uso específico dos textos literários. Este uso particular se
caracteriza, por sua vez, por seu alinhamento aos modos cultos de leitura entre os quais se destaca
a leitura da crítica e da historiografia literária, conforme assinalam Hansen (2005), Aguiar (2000) e
outros autores que destacam a importância do conhecimento, por parte do leitor, das convenções
da escrita literária e de sua inserção sócio-histórica.
Referências: AGUIAR, F. As questões da crítica literária. In: MARTINS, M. H. et al. Outras leituras:
literatura, televisão, jornalismo de arte e cultura, linguagens interagentes. São Paulo : Itau Cultural,
2000. BRASIL. Ministério da Educação. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Secretaria
de Educação Fundamental. Edital n. 003/2019 – CGPLI. Edital de convocação para o processo de
inscrição e avaliação de obras didáticas, literárias e recursos digitais para o programa nacional do
livro e do material didático – PNLD 2021. Brasília, 07 de abril de 2021(a). BRASIL. Base Nacional
Comum Curricular. Histórico da BNCC, 2018. Disponível em:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/historico#:~:text=Acesse%20a%20Resolu%C3%A7%C3%A3
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participantes foram convidados a realizar a leitura da obra escolhida, posteriormente, foi promovido,
no espaço da biblioteca escolar, uma ação de mediação nominada de “Bate papo com a escritora”.
Após, foi realizada entrevista individual com os participantes, a respeito da experiência
proporcionada e os efeitos obtidos com a leitura. Utilizou-se a teoria da Estética da Recepção de
Jauss (1994) enfatizando o leitor e sua recepção, bem como o caráter humanizador da literatura
defendido por Cândido (2011). O método recepcional de Bordini e Aguiar (1988), foi utilizado para
compor os resultados deste trabalho, a partir da análise dos horizontes de expectativa e recepção
literária dos participantes da pesquisa. Como base teórica, sobre leitura e a importância da literatura,
dialogamos com teóricos como Todorov (2021), Jouvre (2002), Freire (1982) e Manguel (1997-2010).
Temas como biblioteca escolar, mediação literária, formação de leitores, literatura produzida em
Mato Grosso, utilizamos respectivamente, Milanesi (1993-2002), Bortolin (2018), Pettit (2008-2010),
Magalhães (2001), Mahon (2021), Walker (2020).
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Candido (2006), Compagnon (2010), Rouxel (2012). Além disso, para fundamentar a pesquisa de
campo e analisar os resultados, foi empregada a análise temática, para um estudo quantitativo e
qualitativo, conforme proposto por Laurence Bardin (1977). Como corolário, constatou-se que os
alunos-participantes ao serem postos em contato com texto e, por meio do trabalho de mediação
do professor, conseguiram fazer análises textuais de qualidade, interpretando e tecendo críticas ao
que era lido, bem como fazendo inferências, apontando intertextualidades e adentrando nas
camadas do texto.
Referências: BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. São
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QUARTO DE DESPEJO: UM CLÁSSICO PELA PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA
Arnon Tragino, Adriana Pin
Resumo: O relato de Quarto de Despejo configura um retrato: a vida de Carolina Maria de Jesus
como catadora de papel, nos anos finais da década de 1950, na favela do Canindé, em São Paulo. A
história e a geografia presentes no texto formam a narrativa cotidiana da autora que descreve e
questiona a miséria vivida; situação social irresoluta naquele momento para a classe, o gênero e a
raça de Carolina. Todo o registro, porém, escrito numa variedade linguística popular como reflexo
de pouca educação formal, foi feito longe do contexto letrado brasileiro, denominado como Segunda
Geração Modernista, tornando o diário uma obra famosa, mas marginal diante da produção
prestigiada na época. Após o momento de sucesso passageiro, o tempo deu ao livro um lugar de
clássico, mesmo que o aspecto da carência material, e não o seu valor intelectual, tenha sido a tônica
da recepção, como comenta Fernanda Miranda (2020) em “Dicção e devir em Carolina Maria de
Jesus”. Ao conseguir esse espaço, o diário assentou também na literatura brasileira a
contemporaneidade do descaso social, visto antes em autores como Lima Barreto ou Paulo Lins, por
exemplo. Assim, a preocupação dessa comunicação é entender a obra como clássica, considerando
a temática abordada, além da sua inserção relevante na produção literária do país e da linguagem
que utiliza. O viés teórico parte da noção de clássico pensada por Carolina Ferreira (2019), em
"Fundamentos histórico-filosóficos do conceito de clássico na Pedagogia Histórico-Crítica", e a
linguagem é analisada a partir das concepções de Marisa Lajolo em “A leitora no quarto dos fundos”.
Tal análise se justifica quando a presença da obra é requerida na educação básica, por exemplo, em
que alunos têm o contato com a produção dessa autora afro-brasileira e podem perceber nela a
pobreza, a fome e seu registro da realidade.
Referências: FERREIRA, C. G. Fundamentos histórico-filosóficos do conceito de clássico na Pedagogia
Histórico-Crítica. 162 f. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar) – Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Araraquara, 2019. JESUS, C. M. de. Quarto de despejo: diário de
uma favelada. São Paulo: Ática, 2020. LAJOLO, M. A leitura no quarto dos fundos. In: JESUS, C. M. de.
Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo: Ática, 2020. MIRANDA, F. Dicção e devir em
Carolina Maria de Jesus. In: JESUS, C. M. de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo:
Ática, 2020.
1040
sala de aula, promoveram a reflexão acerca do tema bem como estimularam a leitura crítica de
mundo e as práticas linguajeiras dos estudantes para a formação de leitores mais críticos dentro do
contexto que foi proposto.
Referências: MICOTTI, Maria Cecília de Oliveira. Como aprender com êxito por meio da pedagogia
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Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e
Tecnologia (IBICT) com o recorte temporal de 2018 até 2023. Elaborou-se um mapeamento das
pesquisas, adotando-se as abordagens qualitativa e quantitativa para tratamento dos dados. Como
resultados, das 44 pesquisas encontradas com o descritor “formação de leitores literários no ensino
fundamental I” apenas 11 se aproximam de nosso objeto de estudo e uma única tese versa sobre a
“mediação de leitura literária no ensino fundamental I”. De igual modo, o descritor “saberes do
professor para mediação da leitura literária” revelou somente uma pesquisa sendo esta em nível de
mestrado. Assim, evidenciada a carência de pesquisas no campo e, considerando o direito à literatura
(CANDIDO, 1972) e sua importância para a constituição do sujeito (PETIT, 2013; COLOMER, 2003;
ZILBERMAN, 1985), sinalizamos a iminência em refletir sobre os saberes (e fazeres) do professor para
que a mediação ocorrida promova experiências (BONDIA, 2013) carregadas de sentido com a
literatura e, consequentemente, a formação/manutenção de leitores literários desde a infância.
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bibliográfica, além de reunir estudos voltados a esse nível de ensino, identificou aqueles que
apontam aspectos relevantes à leitura de imagem e à mediação dessa modalidade de livro literário
nesta etapa da Educação Básica.
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Tamires Oliveira Pereira
Resumo: Trata-se da literatura infanto-juvenil como objeto de valorização da estética afro, mais
especificamente, o cabelo crespo. Sabendo-se que o letramento literário é uma alternativa viável de
associação das práticas sociais ao universo da literatura, possibilita aprofundar o trabalho de
valorização da estética afro nas escolas. Um dos traços físicos mais bem representados e trabalhados
nas obras infantis são os cabelos, enviesados pela multiplicidade dos penteados e pela força da
tradição do trançado passada de geração em geração. Observa-se que as personagens negras
ganharam protagonismo e se tornaram narradoras de suas próprias histórias, ressaltando os diversos
aspectos da tradição oral, valorização da beleza negra, mitologias e religiosidade. O objetivo desta
pesquisa é apreciar o protagonismo negro na literatura infantojuvenil por meio do letramento
literário. O embasamento teórico constitui-se de autoras e autores como Nilma Lino Gomes (2003);
Regina Zilberman (2012); Lilia M. Schwarcz (1993); Elisa L. Nascimento (2003), Ione Jovino (2006);
Heloísa Pires Lima (2005) e Antônio Sérgio Guimarães (1999). A metodologia é bibliográfica, seguida
de análise qualitativa de duas obras literárias infantis – Amor de cabelo de Mathew A. Cherry (2020)
e Betina de Nilma Lino Gomes (2009) que abordam a autoestima das personagens principais e a
presença da família como símbolo de ancestralidade a partir dos cabelos. Espera-se efetiva
contribuição do uso das literaturas selecionadas, com vistas à valorização da estética afro-brasileira
no ensino básico.
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1047
estudantes no percurso de sua formação leitora. Tendo como fundamentação teórica o
embasamento em grandes autores tais como: Colomer (2007), que discuti a importância da leitura
literária e a perspectiva do aluno-leitor; assim como Azevedo (2004) retrata as ilustrações nos livros
infantis; Coelho (2019) salientando sobre a formação do leitor; (Oliveira (2011) traz a discussão sobre
Literatura Infantil e Juvenil; Lajolo e Zilberman (2007) salienta sobre a Literatura brasileira infantil; e,
finalizando citamos a relevância para o aluno desenvolver os hábitos de leitura. Metodologicamente,
realizou-se uma pesquisa qualitativa a partir de uma revisão bibliográfica, pautado em leituras e
visão aprofundada das questões sobre a relação leitor-leitura literária- literatura-ilustrações. Como
resultados de pesquisa, constatou-se que variados fatores interferem no processo de formação do
leitor, dentre eles a dificuldade de assimilação das ilustrações com o texto escrito.
Referências: COLOMER, Teresa. Andar entre os livros: a leitura literária na escola. São Paulo: Global
Editora, 2007. COELHO, Eduardo Amorin. (Trans) Formação de hábitos de leitura: o leitor, a escola e
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1048
1049
SIMPÓSIO “AMAZÔNIA: UTOPIAS E DISTOPIAS”
Luís Heleno Montoril Del Castilo (UFPA) e Sheila Lopes Maués Autiello (UniMi)
1050
deste trabalho, visando compreender como se deu a interpretação e recepção de cada texto em sua
época a exemplo de: Mello e Souza (1979), Campos (1973), Proença (1955) Nunes (1999, 2002),
Holanda (1995), Lousada (1969), Bueno (2006) e Candido (1964, 1992, 2000).
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introdução Ítalo Moriconi. 1ª ed. São Paulo: Companhia das letras, 2019.
1052
Eliana Pires de Almeida
Resumo: Este artigo apresenta um fragmento da pesquisa em andamento que toma os filmes
adaptados para o cinema a partir de textos literários como ponto de investigação e reflexão como
produto cultural e representação social dos amazônidas, em especial, o estado do Pará. O cinema na
região, como no resto do Brasil e do mundo, significou um momento de atualização do estatuto da
arte e de uma nova forma de imperialismo cultural, como sugerido por Pierre Bourdieu. E o processo
de nascença do cinema e de uma sociedade do espetáculo na Amazônia também foi um momento
de muitas lutas sociais e ideológicas no processo de modernização na região. A pesquisa analisa as
relações culturais mediadas pelo cinema e por narrativas literárias na construção de uma identidade
amazônica, e como os meios narrativos e os processos audiovisuais reforçam os estereótipos ou
reinventam mundos, entre a utopia e distopia na/da Amazônia. Nesse sentido, a tese em
desenvolvimento tem como objetivo investigar e promover um diálogo no âmbito da Literatura
Comparada e dos Estudos Culturais para se cartografar e mapear uma memória identitária de uma
Amazônia plural, como testemunho de uma sociedade que serve de base narrativa a textos literários
e roteiros cinematográficos. Pretende-se mapear os textos literários adaptados para o cinema e
adaptações literárias para o cinema com ênfase em textos de autores amazônicos ou de temáticas
amazônicas. Pois, viajantes e cronistas difundiram uma visão colonialista sobre a região que deverá
ser reconsiderada ao longo da pesquisa. Ainda hoje, há a perpetuação dessa visão, porque “esses
elementos estão sempre presentes na invenção da Amazônia” (GONDIM, 1994, p.3). A respeito das
referências teóricas utilizadas nesta pesquisa, além de Neide Gondim nos interessam principalmente
três autores: Stuart Hall (2003), Homi Bhabha (1998) e Guy Debord (2003).
Referências: AGUIAR, Flávio. Literatura, Cinema e Televisão. In: PELLEGRINI, Tânia [et al.]. Literatura,
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fundamental para a história, mas ausente do enredo.
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81:numero-9-amazonies-bresiliennes&Itemid=55 >. Acesso em 20 de outubro de 2022.
1055
UM DRAMA EM GENTE: VIDA VIVIDA, VIDA FICCIONALIZADA NA AMAZÔNIA
Fernando Jorge dos Santos Farias
Resumo: A vida de Dalcídio Jurandir (1909-1979), o maior romancista da Amazônia, segundo a crítica
literária, foi marcada por uma série de inconstâncias capazes de mobilizá-lo a transfigurar e
reapresentar alguns episódios vividos, em seu conjunto romanesco. Nessa série ficcional, composta
por dez obras, transita como personagem principal o jovem Alfredo, figura nascida no interior da
Amazônia, que sonha em obter/reconquistar certo destaque social, muito semelhante ao seu
criador. Posto esse entendimento, tornou-se relevante erguer a seguinte questão: Quais
acontecimentos vividos por Dalcídio Jurandir, pelo menos aqueles encontrados em seus primeiros
anos de vida (até a altura dos anos de 1930), foram emblemáticos a ponto de ressurgirem em seus
romances? Com isso, objetivou-se localizar e discutir determinadas passagens pertencentes a sua
trajetória que substanciaram sua ilustração literária. Em termos teórico-metodológicos, investiu-se
no destaque de momentos registrados em seus documentos pessoais (cartas, registros avulsos, por
exemplo), acontecimentos biográficos colhidos por Eneida (1954;1962), Perez (1964), Nunes, Pereira
e Reolon (2006), além das compreensões de Miceli (2009) quando trata dos nascidos nas províncias
e seus condicionantes de possíveis, até a chegada à posição de intelectuais. Dentre as conclusões
obtidas, destaca-se que seus primeiros vinte anos de vida foram marcados por emblemáticas
desventuras, passíveis de encenação, de rearranjo para o plano romanesco, com a carga de “figura
errante”. Nessa trajetória – real e posteriormente ficcional - é possível pensar em uma vida disposta
em três atos, demarcados pelas angústias e desejos na infância, pelos infortúnios na capital do Pará
e no Rio de Janeiro, assim como, de forma derradeira, pela continuidade de seu drama pessoal
semelhante a tantos outros indivíduos distantes dos epicentros culturais que, dadas as
possibilidades, foram canalizados para a composição de uma intelectualidade de consagração
relativa.
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2006. PEREZ, Renard. Dalcídio Jurandir. In: Escritores Brasileiros Contemporâneos. 2ª ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1964.
1056
loucura enquanto tema explícito das narrativas e elemento de resistência, como o caráter
transgressor do processo literário, elaborado a partir de construções não convencionais. Esses dois
eixos formarão a base para a construção de um terceiro eixo, cujos tópicos se coadunam para a
defesa de que a obra literária é essencialmente o espaço do fora ou a loucura da linguagem.
Referências: BLANCHOT, Maurice. A parte do fogo. Tradução de Ana Maria Scherer. Rio de janeiro:
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CECIM, Vicente. Viagem a Andara, o livro invisível. São Paulo, Iluminuras, 1988. FOUCAULT, Michel.
A coragem da verdade: o governo de si e dos outros II: curso no Cóllege de France (1983-1984).
Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Editora WMJF Martins Fontes, 2011a. FOUCAULT, Michel.
A hermenêutica do sujeito: curso no Collège de France (1981-1982). 3 ed. São Paulo: Editora Martins
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Ramalhete. 42. Ed. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2014b.
1057
1979, que, embora do sexo masculino, reforça a representação do paradoxo vivenciado pelas
mulheres, no mundo amazônico dos seringais, comumente retratado.
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Internacional de Estudos Lingüísticos e Literários na Amazônia (I CIELLA). Belém: UFPA, 2007.
1058
percebemos a Semovência como processo de recriação da Região, como resistência de uma voz e
uma letra, reencantamento e reescrita constantes, que furtivamente escapam às delimitações de
uma única natureza. Esta pesquisa procura na poesia da Amazônia as ressonâncias das imagens
faladas que a Semovência pode trazer ao corpo que lê, ao corpo que se permite ouvir, e chegar à
origem do prazer de falar.
Referências: BACHELARD, Gaston. A poética do devaneio. Tradução Antonio de Pádua Danesi. São
Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2018.] BACHELARD, Gaston. A chama de uma vela. Tradução de
Glória de Carvalho Lis. Rio de janeiro: Bertrand Brasil, 2002. BACHELARD, Gaston. O ar e os sonhos:
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Fontes, 2001. BHABHA. Homi k. O local da cultura. Tradução de Myriam Ávila, Eliana Lourenço de
Lima Reis, Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte. Ed. UFMG, 1998. CASTILO. Luís Heleno Montoril
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outras visões de Andara. Belém: Secult, 2020. DELEUZE. Gille; GUATTARI, Félix. Mil Platôs:
capitalismo e esquizofrenia. Tradução de Ana Lúcia de Oliveira, Aurélio Guerra Neto e Celia Pinto
Costa. São Paulo: Ed. 34, 1995. v. 1. KOPENAWA, Davi, ALBERT, Bruce. A queda do céu: Palavras de
um xamã yanomami / Davi Kopenawa e Bruce Albert ; tradução Beatriz Perrone-Moisés; prefácio de
Eduardo Viveiros de Castro — 1a ed. — São Paulo : Companhia das Letras, 2015. LOUREIRO. João de
Jesus. Encantarias da palavra. Belém: ed.ufpa, 2017. MARTINS, Max. Poemas reunidos, 1952- 2001.
Belém: Editora da Universidade Federal do Pará/ EDUFPA, 2001. PAZ, Octavio. O arco e a lira.
Tradução: Ari Roitman e Paulina Wacht. São Paulo: Cosac Naify, 2012. ZUMTHOR, Paul. A letra e a
voz: a “literatura” medieval. Tradução Amália Pinheiro, Jerusa Pires Ferreira. São Paulo: Companhia
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Lúcia Diniz Pochat, Maria Inês Almeida. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. ZUMTHOR, Paul.
Performance, Recepção, leitura. Tradução de Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenrerich. São Paulo: Ubu
Editora, 2018.
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Serpente. Belém: Cejup, 2003. DELEUZE, G. & GUATTARI, F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia.
São Paulo: Editora 34, volume IV, 1997. 170 p GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético.
São Paulo: Editora 34, 1992. 203 p. HATOUM, Milton. Relato de um certo oriente São Paulo: Cia das
Letras, 1989. LA-ROQUE, Mayara. Trama das Águas. Belém: Monomito Editorial, 2021. PANTOJA,
Edilson. Albergue Noturno. Belem: Iap, 2005. RICOEUR, Ricoeur. Tempo e narrativa – Tomo 1.
Tradução de Constança Marcondes César. Campinas: Papirus editora, 1994.
1060
em que exercia a função de adido comercial da França não se restringiam à publicação de livros, pelo
contrário, também se materializavam em conferências proferidas em instituições que pudessem
porventura reunir pessoas ligadas à indústria e ao comércio e que se interessassem em estabelecer
negócios do outro lado do Atlântico. Não por acaso as informações sobre tais conferências são
publicadas sobretudo, mas não exclusivamente, em periódicos ligados ao comércio e à indústria. É
visível, por consequência, que havia um corpo a corpo no sentido de tornar púbicos os resultados de
suas prospecções nos países em que atuava e que os livros publicados pelo autor representavam
apenas uma parcela dessa divulgação que se inseria no interior de um projeto governamental do
qual Paul Walle fazia parte.
Referências: BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO,
Janaina; PORTELLI, Alessandro. Usos & abusos da história oral. 8. ed. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 2006.
p. 183-191. BROC, Numa. Dictionnaire Illustré des explorateurs et grands voyageurs français du
XIXème siècle. vol III, Amérique. Paris: Editions du CTHS, 1999. PRATT, Marie Louise. Os olhos do
Imperio: relatos de viagem e transculturação. Editora EDUSC, 1999. WALLE, Paul. No país do Ouro
negro: Para, Amazonas, Matto Grosso. Natal: EDUFRN, 2019.
1061
HETEROTOPIA, O ESPAÇO E A EXPERIÊNCIA COLONIAL
Ana Paula Veiga Kiffer
Resumo: Em texto já publicado “O Brasil é uma heterotopia” (SP, N-1, 2021) esbocei um certo
número de hipóteses, algumas das quais gostaria de desdobrar nesta proposta. A primeira delas
entende que a experiência colonial cria uma função e uma forma mais complexa do que aquela que
Foucault havia pensado para a noção de heterotopia (SP, N-1, 2013). Poderia dizer que, num certo
sentido, a própria noção de heterotopia moderna, para Foucault calcada já não mais nos antigos
tempos cíclicos, e sim na espacialidade do desvio, não existiria sem a conquista, a exploração e a
invenção dos espaços coloniais. Sob este prisma, e desde a singularidade da experiência colonial do
Brasil, haveria uma exigência contemporânea em rever tal noção. Isso porque entendo que o próprio
processo de revisão e reconstrução (poderíamos dizer reparação?) histórica da experiência colonial
deve deslocar os pontos onde o pensamento crítico e o vocabulário que ele cria nos encerra numa
visão, e logo numa prática de mundo subalterna, que desconsidera a existência de um grande
número de viventes. Certamente facilitando as políticas de descarte, e logo a consolidação do
brutalismo (Mbembe, 2020). A segunda hipótese é codependente da primeira. Se, de fato, as
heterotopias, ou os contra espaços dos desvios dependem da existência das colônias, pensar hoje e
desde aqui esses conceitos acaba por desarrumar a lógica e a temporalidade da relação entre utopia,
heterotopia e distopia. A partir do livro A queda do céu (Kopenawa & Albert, SP, Cia. Das Letras,
2015) e da noção de Relação, do poeta martinicano Edouard Glissant tentarei ao menos esboçar essa
questão.
Referências: Capello, Filipe. Critica dos afetos. BH: Autêntica, 2022. Foucault, Michel. O Corpo
utópico, As heterotopias. Trad.: Salma Muchail. SP: N-1, 2013. Glissant, Edouard. Poétique de la
Relation. Paris: Gallimard, 1990. Kiffer, Ana. "O Brasil é uma heterotopia". In: Pandemia Crítica, SP:
SESC Edições, N-1; pgs. 337-347. Kopenawa, Davi & Albert, Bruce. A Queda do Céu - palavras de um
xamã yanomami. Trad.: Beatriz Perrone-Moisés. SP: Cia das Letras, 2015. Mbembe, Achille.
Brutalisme. Paris: La Découverte, 2020.
1062
LITERATURAS DO FIM DO MUNDO: RESIGNAÇÃO E PÓS-PESSIMISMO CONTEMPORÂNEOS NA
LITERATURA DISTÓPICA BRASILEIRA E ARGENTINA.
Antonio Rediver Guizzo e Maíra Soalheiro Grade
Resumo: Lukács, em A teoria do romance (2000), observa que o elemento verdadeiramente social
da literatura é a forma. As características composicionais de uma época dialogam profundamente
com as estruturas históricas, culturais, econômicas e políticas da sociedade. Na contemporaneidade,
observamos o crescimento do número de produções literárias distópicas e pós-apocalípticas. Nesse
trabalho, em perspectiva semelhante a pesquisadores e críticos como Gregory Claeys (2017),
Fernando Reati (2006), Elsa Drucaroff (2006), Jill Lepore (2017), María Laura Pérez Gras (2022), Eirik
Vassenden (2022), investigamos, em obras literárias publicadas no Brasil e na Argentina a partir da
segunda década do milênio, como o modelo econômico neoliberal, as consequências da degradação
ambiental, as intermitentes crises financeiras, o recrudescimento democrático e a ascensão de
políticos de extrema direita ao poder são características de nossa contemporaneidade que
contribuem para um ascendente imaginário distópico figurado na literatura de nossa época. Além
disso, observamos que, diferentemente das distopias modernas clássicas (1984, Fahrenheit 451 e
Admirável Mundo Novo), a literatura distópica contemporânea assume, além da desconfiança de seu
tempo, sentimentos como desamparo e submissão frente aos possíveis futuros desoladores,
orientando-se por um pessimismo resignado e anti-utópico, que já não provoca nos personagens o
ânimo para a ação coletiva e raramente apresenta arcos narrativos revolucionários na composição,
características que Gonnermann (2019) relaciona ao conceito de pós-pessimismo. Sob essa
perspectiva de análise, as obras que compõe o corpus da pesquisa são Cadáver Exquisito (2018) de
Agustina Bazterrica e O deus das avencas (2021) de Daniel Galera.
Referências: BAZTERRICA, Agustina. Cadáver Exquisito. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Arte
Gráfico Editorial Argentino, 2018. CLAEYS, Gregory. Dystopia: A Natural History. A study of modern
despotism, its antecedents, and its literary diffractions. Oxford: Oxford University Press, 2017.
DRUCAROFF, Elsa. 2006. Narraciones de la intemperie. Sobre El año del desierto, de Pedro Mairal, y
otras obras argentinas recientes. Disponível em: <http://www.elinterpretador.net n° 27>. Acesso em
15 jun. 2022. GALERA, Daniel. O deus das avencas. São Paulo: Companhia das Letras, 2021.
GONNERMANN, Annika. The Concept of Post-Pessimism in 21st Century Dystopian Fiction. The
Comparatist, v. 43, Out. 2019, pp. 26-40. Disponível em: <https://muse.jhu.edu/article/739696>.
Acesso em: 22 jun. 2022. LEPORE, Jill. A Golden Age for Dystopian Fiction: What to make of our new
literature of radical pessimism. The New Yorker. New York, jun. 2017. Disponível em:
<https://www.newyorker.com/magazine/2017/06/05/a-golden-age-for-dystopian-fiction>. Acesso
em: 19 ago. 2022. PÉREZ GRAS, María Laura. Novelas anticipatorias del siglo XXI: una aproximación
a un género que crece en la Argentina en crisis. Revista de Literaturas Modernas, Vol. 47, no. 2, p.
87-108. Disponível em: https://bdigital.uncu.edu.ar/12393. Acesso em: 21 ago. 2022. REATI,
Fernando. Postales del porvenir. La literatura de anticipación en la Argentina neoliberal (1985-1999).
Biblos, 2006. VASSENDEN, Eirik. Hope in the Age of Dystopia: The Ghost in the Machine in Øyvind
Rimbereid's Solaris korrigert. Scandinavian Studies, University of Illinois Press v. 94, n. 2, p. 221-243,
2022. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/854618. Acesso em 17 mai 2022.
1063
nós, nós como cultura/as. Nesse fluxo integrador, temos a necessidade urgente de encontrar, a partir
de uma ética, formas de evitar e contornar aspectos seletivos e mortíferos, que estruturaram o
societário modo vivente de matriz ocidental, com sua alta carga de um solipcista condicionamento
individualizante. Para isso, buscaremos dialogar com algumas conceituações da psicanálise, e chaves
propostas por Donna Haraway - Antropoceno, capitaloceno, plantatioceno e Chthuluceno -,
juntamente com alguns aportes estabelecidos por Daniel Munduruku no conto “ A história de uma
vez”, cuja força da narrativa transmitida, nos chega e ensina a respeito das diferentes formas do
tempo.
Referências: FREUD, Sigmund. (2010) Além do princípio de prazer (1920). In: Freud (1917-1920) -
Obras completas volume 14: "O homem dos lobos" e outros textos. São Paulo: Companhia das Letras.
HARAWAY, Donna. Antropoceno, Capitaloceno, Plantationoceno, Chthuluceno:
fazendoparentes.o_capitaloceno_plantationoceno_chthuluceno_Fazendo_parentes.pdf. disponível
em
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4197142/mod_resource/content/0/HARAWAY_Antropoc
eno_capitaloceno_plantationoceno_chthuluceno_Fazendo_parentes.pdf acesso, 14/01/2023.
LACAN, Jacques. (1992). O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor. (Original publicado em 1969-1970). Munduruku, Daniel. A história de uma vez: Um olhar
sobre o contador de histórias indígenaAcessado em: https://pluriverso.online/wp-
content//uploads/2021/02/A-historia-de-uma-vez-Daniel-Munduruku.pdf acesso, 14/01/2023.
1064
Janeiro: Darkside Books, 2021. SANTOS, Vitor Cei. A voluptuosidade do nada: o niilismo na prosa de
Machado de Assis. Tese (Doutorado em Teoria da Literatura e Literatura Comparada) – Programa de
Pós-Graduação em Estudos Literários. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2015.
1065
Contracorrente, 2022. ROVIRA KALTWASSER, Cristóbal et al (ed.). "The Oxford Handbook of
Populism". Oxford: Oxford University Press, 2017.
1066
se relacionam com o presente histórico em que foram escritos? Os textos constituem distopias? Estas
são algumas das questões que este trabalho pretende responder, ainda que não definitivamente,
observando a projeção de aspectos daquele momento histórico nesses outros mundos, a
organização da sociedade, a condenação dos seres a uma realidade e a estaticidade da história.
Referências: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura I. São Paulo: Editora 34, 2003.
___________________. Teoria Estética. Edições 70, 2008. BECKETT, Samuel. The Complete Short
Prose. New York: Grove Press, 1995. ________________. The Collected Poems of Samuel Beckett.
New York: Grove Press, 2012. ________________. The Letters of Samuel Beckett: Volume I: 1929-
1940 Cambridge: Cambridge University Press, 2016. BERRIEL, Carlos E. O. Utopia, Distopia e História.
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britannique/dystopia-in-the-plays-of-samuel-beckett-purgatory-in-play>. Acesso em: 10/6/2019.
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Princeton University Press, 1970. LITTLE, James. Samuel Beckett in Confinement: Historicizing
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artístico. Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, Campinas, SP: 2021. VESCOVI, Gabriela Ghizzi. Tradução Comentada da Poesia Pós-Guerra
de Samuel Beckett. Dissertação (mestrado em Teoria e História Literária) – Universidade Estadual de
Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem, Campinas, SP: 2020.
1067
tradução de Wanda Nogueira Caldeira Brant, [tradução das teses] Jeanne Marie Gagnebin, Marcos
Luiz Müller. São Paulo: Boitempo, 2005.
1068
Resumo: Os estudos de paisagem nas literaturas de língua portuguesa, desenvolvidos com maior
visibilidade nos últimos anos, evidenciam que a tríade mundo, sujeito e palavra constitui uma
estrutura de sentidos. Os poetas portugueses contemporâneos, vozes em geral pouco conhecidas no
Brasil, têm apresentado na matéria-emoção poética uma leitura/escrita de mundo que delineia
geografias não limitadas a descrever espaços, mas a configurar o ambiente urbano circundante e a
emitir posicionamentos e questionamentos sobre a relação estabelecida entre o espaço físico/social
(território geográfico/simbólico) e o sujeito. As obras poéticas de Golgona Anghel, Manuel de Freitas
e Pedro Mexia, poetas contemporâneos nascidos ou radicados em Lisboa, apresentam paisagens da
cidade portuguesa e refletem, em discursos distópicos, as condições urbanas, expondo questões
próprias e similares ao mundo e ao tempo contemporâneo. O estudo em diálogo dessas vozes
portuguesas proporciona uma compreensão sobre o lirismo contemporâneo em Portugal,
predominantemente atento à vida urbana e às tensões econômicas, existenciais, políticas e sociais
que permeiam o mundo, a sociedade e a cultura contemporânea ocidental do século XXI. Utilizando
a perspectiva fenomenológica dos estudos de paisagem, no âmbito de uma geografia literária,
sobretudo orientada pela abordagem de Michel Collot, importante pensador da poesia moderna e
contemporânea, o trabalho visa examinar o contexto em que os poetas se inserem, os poemas
presentes em alguns de seus livros e as principais marcas de suas linguagens poéticas.
Referências: ANGHEL, Golgona. Vim porque me pagavam. Lisboa: Mariposa Azul, 2011. BAUMAN,
Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2022. ______. Globalização - as
consequências humanas. Rio de Janeiro: Zahar, 2021. BENJAMIN, Walter. Baudelaire e a
modernidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. CAUQUELIN, Anne. A invenção da paisagem. São
Paulo: Martins Fontes, 2011. COLLOT, Michel. Poética e filosofia da paisagem. Rio de Janeiro: Oficina
Raquel, 2013. ______. A matéria-emoção. Rio de Janeiro: Oficina Raquel, 2018. FREITAS, Manuel de.
Ubi Sunt. Juiz de Fora: Macondo, 2019. GOMES, Renato Cordeiro. Todas as cidades, a cidade.
Literatura e experiência urbana. Rio de Janeiro: Rocco, 2008. MAGALHÃES, Joaquim Manuel. Os dois
crepúsculos. Sobre poesia portuguesa actual e outras crónicas. Lisboa: A Regra do Jogo, 1981. MEXIA,
Pedro. Eliot e outras observações. Algés: Gótica, 2003. PALLASMAA, Juhani. Habitar. São Paulo:
Gustavo Gili, 2017. PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens urbanas. São Paulo: Editora Senac, 2004.
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a biography of George Orwell’s 1984. Londres: Picador, 2019. [ebook em inglês] NEWSINGER, John.
George Orwell: uma biografia política. Lisboa: Antígona, 2010. ORWELL, George; DAVISON, Peter
(org.). Diaries. Londres: W.W. Norton, 2012. [ebook em inglês] ORWELL, George; ORWELL, Sonia e
ANGUS, Ian. The Collected Essays, Journalism and Letters of George Orwell, Vol. 4: In front of your
nose 1945-1950. Londres: Secker and Warburg, 1968. ORWELL, George. 1984. Nova Iorque: Penguin
Signet Classics, 1977. [em inglês].
1070
LITERATURA E O DIREITO À CIDADE: ENTRE GUETOS E SUBMUNDOS DE SALVADOR
Liliane Vasconcelos
Resumo: A vida urbana está presente em boa parte das narrativas literárias produzidas a na
contemporaneidade. Esta predominância muitas vezes vem acompanhada do questionamento da
própria concepção de urbano arquitetada pelo mundo moderno. Neste contexto, um dos aspectos
mais significativos da produção literária que representa a capital baiana consiste na presença da
cidade como um elemento imprescindível para o andamento das narrativas. A cidade cresceu e se
tornou cenário de encontro, espetáculo, festa e principalmente arena de tensões onde as ações
cotidianas acontecem e dão formas aos nossos quadros de vida. É justamente diante dessa
predominância, que o conceito cunhado pelo filósofo Henri Lefebvre (2001, p.12), o direito à cidade,
nos ajuda a ler Salvador como uma obra que “contrasta com a orientação irreversível na direção do
dinheiro, na direção do comércio, na direção das trocas, na direção dos produtos. Com efeito, a obra
é valor de uso e o produto é valor de troca.” Mediante as tensões presentes nos usos dos espaços
públicos da cidade que o presente artigo busca ler Salvador representada pela literatura
contemporânea a partir das narrativas que representam os guetos e submundos de Salvador, A
rainha do cine Roma (2010) de Alejandro Reis, Clube dos niilistas (2020) de Tom Correia e Travesias
urbanas e outros contos ( 2020) de Rodrigo Lima. Através de uma perspectiva multidisciplinar
embasada em estudos urbanos e da literatura contemporânea constatou-se que o espaço urbano é
o lugar ideal para verificar a troca material e simbólica do habitante citadino, bem como as tensões
entre as desigualdades internas existentes na cidade, o que propicia aos intérpretes um
caleidoscópio de elementos que refletem a contemporaneidade, uma vez ressai a impropriedade de
uma visão totalizante da urbe.
Referências: AGAMBEN, G. O que é o contemporâneo? E outros ensaios. Chapecó, SC: Argos, 2009.
CARVALHO, Inaiá Moreira de. A casa grande a senzala: segregação, efeito território e desigualdades
em Salvador.2016. Disponível em: . Acesso em: 22 dez. 2022 CORREIA, Tom. Clube dos niilistas. São
Paulo: Ed. Urutau,2021 FAVERO, Celso A.; FREITAS, Carlos E.; TORRES, Paulo R. Distopias e utopias:
entre os escombros do nosso tempo. Salvador: EDUFBA, 2020 GARCÍA CANCLINI, Nestor.
Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Tradução Mauricio Santana Dias.
Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 2008. GOMES, Renato C. Da metrópole à cibercidade: cultura e
cosmopolitismo. In: MARGATO, Izabel (Org.); GOMES, Renato Cordeiro (Org.). Espécies de espaço:
territorialidades, literatura, mídia. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. p. 179-196 LEFÉBVRE, Henri,
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2001. LIMA, Rodrigo. Travessias urbanas e outros contos. Salvador: FB Publicações, 2020 PEIXOTO,
Nelson Brissac. Paisagens urbanas. 3. ed. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2004. PELLEGRINI,
Tânia. A ficção brasileira hoje: os caminhos da cidade. Revista da Critica Literária Latino Americana,
Medford, USA, ano 27, n. 53, p. 115-128, 2001 RESENDE, Beatriz. Contemporâneos: expressões da
literatura brasileira do século XXI. Rio de Janeiro: Casa da Palavra; Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional,
2008. REYES, Alejandro. A rainha do Cine Roma. São Paulo: Leya, 2010. VIVEIROS, Liana. Direito à
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<http://www.nomads.usp.br/virus/virus20/?sec=4&item=5&lang=pt>. Acesso em:
22. dez. 2022.
1071
eleições presidenciais, em que o candidato favorito é um líder de extrema-direita. Dentre os valores
propagados, estão o negacionismo ecológico, o moralismo e a perseguição de minorias. A intenção
é analisar os diversos modos pelos quais essas narrativas imaginam o futuro do país em relação com
a reprodução da espécie através das concepções de ancestralidade, parentesco e descendência
familiar. No plano macrossocial, apresentam governos negligentes com a preservação ecológica, o
que culmina no desastre ambiental e social. No plano micro, angústias e temores em torno da família
e enorme desamparo quanto ao futuro. A relação entre pais e filhos espelha um conflito social mais
abrangente, em que a ascendência se mostra problemática e a descendência, incerta. Em
consonância com esses aspectos, será analisada, em âmbito geral, a fusão do antropológico com o
cosmológico, i.e., o modo pelo qual o destino individual se funde ao destino de Gaia, a fim de
identificar elementos originais na narrativa distópica contemporânea em torno do
Antropoceno/Capitaloceno e do Holocausto ecológico. A hipótese de trabalho é de que a distopia
ocupa um lugar parecido com que foi o gótico do século XIX: materializa os medos e as inseguranças
sociopolíticas derivados de uma conjuntura estremecida pela atuação da extrema-direita e do
neoliberalismo.
Referências: GALERA, Daniel. O deus das avencas. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. POLESSO,
Natalia Borges. A extinção das abelhas. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. TERRON, Joca
Reiners. A morte e o meteoro. São Paulo: Todavia, 2019.
1072
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Argentina: Eterna Cadencia Martel, Fréderic. (2015) Cultura mainstream. Cómo nacen los fenómenos
de masas. México: Punto de Lectura Mignolo, Walter (comp.) (2008). Género y descolonialidad.
BuenosAires: Ediciones del signo Palaversich, Diana. (2012) “ Narcoliteratura (¿De qué más
podríamos hablar?)”, cultura.gob.mx Preciado, Beatriz. (2014). Testo yonqui: sexo, drogas y
biopolítica. Buenos Aires: Paidós Valencia, Sayak (2010). Capitalismo gore. España: Editorial Melusina
Valencia, Sayak y Katia Sepúlveda (2016). “Del fascinante fascismo a la fascinante violencia:
psico/bio/necro/política y mercado gore”. Barcelona: Mitologías.
1073
tradicionais, entre outras consequências trazidas por projetos pós-coloniais de desenvolvimento, um
modelo hegemônico que historicamente perpetua a monocultura agrícola no Brasil.
Demonstraremos, também, que a obra abordada revela em sua diegese o protagonismo de vozes
femininas, a atualização de traços literários regionalistas na literatura contemporânea e a força de
outros saberes e memórias ligadas à ancestralidade presente em comunidades que insistem em
sobreviver e perpetuar seu modo de vida e seus traços identitários. Na abordagem de nosso objeto
de estudo, utilizaremos de maneira destacada o conceito de distopia e utopia presentes em Carlos
Berrial e Carolina Dantas de Figueiredo, a questão da destruição das formas sociais autóctones pelo
processo hegemônico de desenvolvimento abordada pelos teóricos Franz Fannon e Stuart Hall e,
ainda, as discussões sobre a presença de traços regionalistas na literatura contemporânea de Karl
Erik Schollhammer e Zilda Cury.
Referências: BENJAMIN, Walter. Magia e Técnica, Arte e Política: ensaios sobre literatura e história
da cultura. São Paulo: Editora Brasiliense, 1996. BERRIEL, Carlos Eduardo Ornelas. Utopia, distopia e
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(2020, p. 11): “estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar
por alguns minutos, a gente morre”. Nesse sentido, ambas as obras oferecem uma ambientação
distópica e de crise, com luta pela sobrevivência em um cotidiano afetado por catástrofes ambientais
e ecocídio como consequência da exploração de recursos naturais, além de crise econômica, social
e individual. Desse modo, a análise será pelo viés da Ecocrítica, abordagem teórico-literária
abertamente política que relaciona a literatura e o meio ambiente em análises culturais e filosóficas.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? In: AGAMBEN, Giorgio. O que é o
contemporâneo? e outros ensaios. Tradução: Vinícius Nicastro Honesko. Chapecó: Editora Argos,
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MULHERES DO FIM DO MUNDO: UMA ANÁLISE DAS TRAJETÓRIAS DAS PERSONAGENS FEMININAS
EM CORPO SECOS, DE LUISA GEISLER, MARCELO FERRONI, NATÁLIA BORGES POLESSO E SAMIR
MACHADO DE MACHADO
Alice De Araujo Nascimento Pereira
Resumo: No estudo The Post-Apocalyptic novel in the Twenty-first Century (2016), Heather Hicks
afirma que, devido ao advento da modernidade no século XVIII, os romances pós-apocalípticos
passaram a apontar para o colapso da própria modernidade ao invés de contarem a história da
aniquilação da humanidade. Ao considerarmos que o patriarcado é um dos elementos constitutivos
fundamentais dessa modernidade, devemos observar quais, o que revelam e em que implicam as
perspectivas para as mulheres representadas nesses romances. Como ficam as vidas das mulheres
em um contexto de completo colapso social? Como suas relações interpessoais se modificam; que
resquícios do passado se mantêm; que perigos elas correm; que portas se abrem? Pretendemos
responder esses questionamentos lançando nosso olhar sobre as personagens do romance
apocalíptico brasileiro de temática zumbi, Corpos Secos (2020). Pensando a partir das questões de
gênero contemporâneas, como discutidas por Joan Scott e Cinzia Arruzza, e das lutas do movimento
feminista em nosso país, examinaremos como alguns dos papéis relegados ás mulheres – de esposas,
mães, donas de casa - são profundamente afetados e ressignificados na narrativa. Examinaremos
ainda como muitas das expectativas sobre elas são mantidas e até mesmo reforçadas nessas
circunstâncias. Embora haja reconfigurações positivas possíveis a partir da desagregação das
estruturas e alianças pela sobrevivência que elas conseguem formar, em diversos momentos, esse
mesmo desmantelamento coloca mulheres e crianças em posição vulnerável e sujeitas a formas de
violência mais severas. Por fim, buscaremos apontar como a resiliência das personagens parece ser
uma chave importante para uma possibilidade de recomeço.
Referências: ARRUZZA, Cinzia. Ligações perigosas: casamentos e divórcios entre marxismo e
feminismo. São Paulo: Usina editora. 2019 BACCOLINI, Raffaela. “The persistence of hope in
dystopian fiction”. In: PMLA, vol 119, no 03. Cambridge University Press. 2004, p. 518-521.
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categoria útil de análise histórica”. Educação & Realidade n. 20 vol. 2. Porto Alegre: editora da UFRGS.
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Crime and the imaginary disaster: Post-apocalyptic fiction and the crisis of social order. London:
Palgrave McMillan. 2015.
1077
LÓGICA COLONIALISTA E NECROPOLÍTICA: A MORTE E O METEORO DE JOCA TERRON
Angela Maria Dias
Resumo: Aimé Césaire, no seu manifesto-denúncia Discurso sobre o colonialismo (2020), caracteriza
a natureza perversa deste tipo de domínio, a partir da comparação com o nazismo e da cumplicidade
dos europeus, na medida em que, durante os séculos das conquistas, a aplicação dos mesmos
métodos só atingiu “apenas a povos não europeus. A equação do pensador martinicano “colonização
= coisificação” (CÉSAIRE, 2020,p.24) fica dramatizada em A morte e o meteoro, o sombrio romance
de Joca Terron (2019). Seu tom soturno, seu baixo-contínuo de fim, vai entoando uma espécie de
melancólico réquiem à dilapidação ecológica do mundo e à ausência de porvir da espécie humana.
O Antropoceno, como a nova era geológica da terra assoberbada e doente em decorrência da ação
humana sobre ela, capaz de corroê-la, como se ocorressem transformações geofísicas extremas,
manifesta inequivocamente a “intrusão de Gaia”, em seu “suscetível agenciamento de forças
indiferentes” (STENGERS, 2015, p.39) na história do mundo. E se a origem da crise pode ser reportada
à Revolução Industrial e às relações de produção capitalista, os humanos permanecem divididos por
interesses contrários e incompatíveis, no que tange às providências no sentido de um menor
dispêndio energético. Nesse sentido, como apontam muitos estudiosos do assunto, o homem, além
de mortal, torna-se mortífero ao ambiente propício à existência da própria espécie.
Referências: CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre o colonialismo. Trad. Claudio Willer. Ilustração. Marcelo
D’Salete. Cronologia. Rogério de Campos. São Paulo: Veneza, 2020. DANOWSKI, Deborah; VIVEIROS
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transcorrer do tempo em Schopenhauer: recorrência, lembrança, memória e história” In: Voluntas,
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política de morte. Trad. Renata Santini. São Paulo: n-1Edições, 2008. ROSA, Francis Mary Soares
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antropologia: São Paulo : Cosac Naify, 2014. ISBN 978-85-405-0386-1 (recurso eletrônico).
Consultado em fevereiro/2022.
1078
aponta que esse potencial transformador não tem apenas um aspecto negativo, e a experiência da
dor surge não só como um elemento das dinâmicas de controle, mas também como algo que leva o
sujeito a uma (re)descoberta de si mesmo e de seu poder de resistência. A dor enquanto força de
mudança vai aparecer principalmente em relação ao sofrimento que se observa na figura do outro.
A comunicação focará nesse aspecto, apontando como as narrativas parecem colocar a empatia
como uma forma de romper o torpor causado pelo sofrimento nas distopias, levando a um despertar
que levaria a revolução. Além disso, através da figura de suas protagonistas, as obras parecem propor
uma modelo de ética baseado na empatia que deveria guiar a ação revolucionária. O que se observa
é que a construção de uma nova sociedade nesses mundos estaria ligada diretamente à forma como
se escolhe lidar com a questão da dor.
Referências: BAUMAN, Zygmunt; DONSKIS, Leonidas. Cegueira moral: a perda da sensibilidade na
modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. COLLINS, Suzanne. Jogos Vorazes. Rio de Janeiro:
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Belo Horizonte: Chão da Feira, 2017.
1080
Gabriel Wirz Leite
Resumo: Desde a publicação em 1818 do livro “Frankenstein”, de Mary Shelley, a chamada literatura
de ficção científica passou por diversos desdobramentos tanto em termos de temática quanto de
forma. A máquina do tempo de H.G. Wells e as invenções de Jules Verne deram vez a cenários
terríveis marcados por totalitarismos aliados a inovações tecnológicas, como nos romances de
Aldous Huxley, George Orwell e, mais recentemente, Margaret Atwood. Como argumenta Adam
Stock (2019), o gênero de ficção conhecido como distopia tem, mais que outros, alcançado valor
cultural simbólico ao representar medos e ansiedades sobre o futuro. A ficção distópica se tornou,
portanto, um ponto de referência para discussões sobre política, cultura popular, relações
internacionais, segurança, discriminação racial, preocupações ambientais e muito mais. Em meio aos
efeitos nefastos do capitalismo causados pela humanidade nesta era conhecida como antropoceno,
narrativas distópicas têm sido uma constante de interesse. No Brasil, foram publicadas durante a
pandemia da Covid-19 algumas obras que atravessam pontos característicos das distopias, como é o
caso do romance “Corpos secos”, escrito por quatro pessoas: Luísa Geisler, Marcelo Ferroni, Natália
Borges Polesso e Samir Machado de Massado. Um cenário pós-apocalíptico digno dos zumbis nos
filmes do George Romero é retratado na obra, consequência dos produtos químicos utilizados pelo
agronegócio brasileiro em sua problemática monocultura de soja. Assim, este trabalho visa analisar
como o distópico é articulado nesta narrativa e que potência crítica ela pode ter, além de revisar um
pouco sobre as teorias da ficção científica.
Referências: AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer: o poder soberano e a vida nua. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 2007. ATWOOD, Margaret. In other worlds: SF and the human imagination. New York: Virago,
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1081
Eco-Dystopia: Science Fiction, the Anthropocene, and the Limits of Catastrophic Imagery (2022). Em
face desse contexto, indagamos: Como que o Antropoceno e a eco-distopia estão interligadas? Quais
foram os recursos narrativos utilizados pelas autoras para situar suas obras dentro da eco-distopia?
Quais as semelhanças e diferenças entre as duas obras? Como que as obras dialogam com o cenário
social latino-americano contemporâneo?
Referências: DANOWSKI, Déborah; CASTRO, Eduardo Viveiro. Há mundo por vir? Ensaio sobre os
medos e os fins. Florianópolis: Cultura e Barbárie Editora, 2022. HUGHES, Rowland; WHEELER, Pat.
Eco-dystopias: Nature and the Dystopian Imagination. In: New York: Critical Survey, vol. 25, n. 2, p. 1
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São Paulo: Companhia das Letras, 2021. SECCHES, Fabiane (org.). Depois o Fim: conversas sobre
literatura e Antropoceno. São Paulo: Editora Instante, 2022.
1082
Jade Martins Leite Soares
Resumo: Segundo Byung-Chul Han (2021), o vírus (referindo-se à pandemia SARS-CoV-2) é espelho
de nossa sociedade. Assim, hoje a sobrevivência é absolutizada, todas as nossas forças de vida são
usadas para prolongar a vida. E dentro dessa sociedade de sobrevivência perde-se completamente
o sentido de boa vida. A vida é reduzida a um processo biológico que deve ser otimizado. Ou, nas
palavras de Jonathan Crary (2016), “a vida comum se transformou em objeto da técnica”. No cuidado
exclusivo com a sobrevivência nos igualamos ao vírus, esse morto-vivo que apenas se multiplica, ou
seja, sobrevive sem viver. Então, segundo Han (2021), falta ao capitalismo a narrativa da boa vida.
Ele absolutiza a sobrevivência; é nutrido pela crença inconsciente de que mais capital significa menos
morte. O capital é acumulado contra a morte. E é por isso que no presente trabalho optamos por
utilizar a expressão capitaloceno para pensar os tempos em que vivemos, já que há uma
racionalidade sistêmica reforçando o lucro acima de todas as formas de vida. De acordo com Anna
Lowenhaupt Tsing (2015/2022) o nosso problema é que o progresso deixou de fazer sentido, há um
ritmo acelerado que acaba por atropelar a vida. Refletindo sobre a capacidade do capitaloceno de
transformar vida em sobrevivência e desmoronar mundos, ousaremos dançar em outros ritmos de
viver e criar, a partir da obra pioneira de ficção científica de Dinah Silveira de Queiroz, escritora
brasileira do início do século passado. Para tanto, utilizaremos o relançamento (2022) de dois livros
de contos da autora (Eles herdarão a Terra e Comba Malina) para ruminar sobre os outros mundos
possíveis sugeridos por Donna Haraway (2015). Ou ainda cogitar a existência de outros imaginários
que estejam além do mal-estar (1930/2020) do apagamento da extensa produção de Dinah Silveira
de Queiroz.
Referências: CRARY, Jonathan. 24/7: capitalismo tardio e os fins do sono. Tradutor: Joaquim Toledo
Júnior. São Paulo: Ubu, 2016. FREUD, Sigmund. Cultura, sociedade, religião: O mal-estar na cultura e
outros escritos. Tradutora: Maria Rita Salzano Moraes. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. HAN, Byung-
Chul. Sociedade Paliativa: a dor hoje. Tradutor: Lucas Machado. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2021.
SECCHES, Fabiane. (org.) Depois do fim: conversas sobre literatura e antropoceno. São Paulo: Editora
Instante, 2022. TSING, Anna. O cogumelo no fim do mundo: sobre a possibilidade de vida nas ruínas
do capitalismo. Tradutores: Jorgge Menna Barreto e Yudi Rafael. São Paulo: n-1 edições, 2022.
QUEIROZ, Dinah Silveira de. Dinah fantástica: contos de ficção científica reunidos. São Paulo: Editora
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DICK, Phillip K. Androides sonham com ovelhas eletrônicas? Tradução de Ronaldo Bressane. São
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Louise Farias da Silveira
Resumo: Os pesquisadores Bruno Anselmi Matangrano e Enéias Tavares, no estudo historiográfico
Fantástico brasileiro: o insólito literário do Romantismo ao Fantasismo, identificam como uma das
tendências da escritura do insólito ficcional no século XXI a “febre das distopias”. Segundo os
pesquisadores, os escritores nacionais fazem parte de um movimento da literatura especulativa que
se espalha pelo cenário internacional, o qual “responde à conjuntura política, em particular às fortes
ondas conservadoras pelas quais o mundo tem passado [...] e o crescimento constante de cadeiras
no senado e no congresso brasileiro pelas bancadas ruralista e evangélica – associadas a uma política
econômica elitista e a ultrajantes declarações racistas, xenófobas e homofóbicas.” (MATANGRANO
e TAVARES, 2018, p. 181-182). Com a ascensão da extrema direita no Brasil, personalizada em um
governo de tendências autoritárias e antiambientalistas, cujo negacionismo científico foi responsável
pela deplorável administração da saúde pública durante a pandemia de COVID-19, não surpreende
que mesmo ficcionistas mais afeitos à prosa realista se aventurem em novas perspectivas criativas,
voltando o olhar para um incógnito porvir. Nesse sentido, Daniel Galera especula, em seu recente O
deus das avencas (2021), por meio de três novelas, três tempos diferentes de uma sociedade que
flerta com a autodestruição e lida com as consequências de suas (más) escolhas políticas, ambientais
e tecnológicas. Neste trabalho, proponho uma análise da conjuntura distópica e ambiental que
avulta na referida obra de Galera. Como referencial teórico são utilizados, entre outros, os estudos
de Haraway (2015), Matangrano e Tavares (2018) e Torres (2021).
Referências: GALERA, Daniel. O deus das avencas: três novelas. São Paulo: Companhia das Letras,
2021. HARAWAY, Donna. Anthropocene, Capitalocene, Plantationocene, Chthulucene: Making kin.
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Disponível em: https://periodicos.uff.br/gragoata/article/view/47745. Acesso em: 06 jan. 2022.
1085
la actualidad trasciende lo epistémico como categoría de conocimiento para adentrarse en lo
ontológico evidenciando una necesaria transformación del aparato crítico que debe actualizarse para
dar cuenta de la cuestión de la literatura actual. La gran mayoría de los estudios ecocríticos coinciden
en la importancia que el espacio físico posee en la coexistencia con el ser humano. El Antropoceno
analizado bajo la mirada de los estudios de Bauman, Agamben, Ludmer y Heffes entre otros, intenta
ser el soporte teórico para una aproximación hermenéutica a la novela Mugre rosa (2021) de la
escritora uruguaya Fernanda Trías. Mugre rosa expone, en un vaivén temporal de vivencias y
recuerdos, la intimidad de una mujer que intenta sobrevivir a sus propias inseguridades y vínculos
inarmónicos en un mundo caótico, sombrío y amenazante. Es una novela de búsquedas, encuentros
y pérdidas que nunca logran romper el círculo cotidiano y obsesivo del deber ser femenino, la culpa
y la nostalgia de un tiempo que en todo momento es el refugio de una errática y obsesiva ideación,
en la voz protagónica de una joven mujer, en medio de una distopía apocalíptica que discurre entre
las borrosas líneas de una realidad pesadillesca.
Referências: Eixo 10
1086
CORPOS DISSIDENTES EM CAOS: COMO A FICÇÃO CLIMÁTICA CONTEMPORÂNEA PODE PROPOR
NOVOS FUTUROS ECOQUEER?
Mariana Mota Lopes
Resumo: A proposta de ecologia queer pode ser compreendida quando, fora do binarismo, desafia
a ideia de categorias fixas e opostas, como humano versus natureza, homem versus mulher e
heterossexual versus queer. Desse modo, tende a problematizar ordens de fluidez de gênero e
sexualidade tanto entre humanes quanto entre não-humanes. Nessa ótica, é possível discutir de que
formas a realidade nos circunscreve no mundo e as possibilidades de existência que a ficção pode
proporcionar. É a partir desta perspectiva que busco compreender os modos em que a teoria
ecoqueer, para além da ecocrítica, pode ser usada para a análise literária de textos contemporâneos,
e para o estabelecimento de “world-making” (Pratt 2021). A partir de teorias de gênero e sexualidade
que refletem sobre a relação de coexistência entre espécies, passando pela problematização do
termo antropoceno e proposição do gênero cli-fi para definir ficções distópicas sobre o caos
climático, proponho aqui a análise do livro Corpos Secos. Escrito a oito mãos, o romance situa a
narrativa em um Brasil posto em caos pós-apocalíptico. Assim, essa análise representa o início de
uma investigação sobre a aplicabilidade de um modelo ecoqueer para a compreensão da realidade
contemporânea, de modo a explanar sobre a possibilidade de existência de futuros co-constituídos
por humanes, não humanes e, no caso, mais-que-humanes.
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conversas sobre literatura e antropoceno. Editora Instante, 2022.
1087
uma maneira de viver e morrer bem nos nossos tempos é justamente unindo forças entre humanos
e não humanos para que possamos reconstruir refúgios e tornar possível uma recuperação e
recomposição que nos permita permanecer com o problema de viver em um mundo em ruínas.
Referências: GALERA. Daniel. O deus das avencas. São Paulo: Companhia das Letras, 2021.
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1091
Resumo: Em linhas gerais, o presente trabalho visa abordar a abrangência da metáfora da “divisão”
nas chamadas ficções do Antropoceno. Em termos mais específicos, seu objetivo é discutir como, em
retrospectiva, essa ficção contemporânea e sua dicção metafórica podem lançar uma nova luz sobre
as inovações modernistas e reorganizar a divisão estética/ética. Este trabalho é, portanto, uma
proposta para analisar como o conceito de “divisão”, ou “dividir”, uma ideia que ocupa prestígio na
modernidade, encontra expressão metafórica apropriada nas chamadas ficções do Antropoceno. O
ultrapassamento de fronteiras, ou limites, será tomado como ponto de partida para problematizar
as dicotomias que caracterizam a nossa constituição moderna. As ficções do Antropoceno, como
tentativas especulativas, traçam cenários possíveis, a partir da extrapolação da constituição
moderna. Ou seja, os “espaços murados” no romance "Oryx and Crake" de Atwood, os “condomínios
fechados” em "Parable of the Sower" de Butler ou a linha física presente no romance "Tropic of
Orange" de Yamashita, intensificam a dualidade da Modernidade. No entanto, uma vez que essas
divisões, limites são levados ao extremo pelas mudanças climáticas antropogênicas, ou pelas
consequências não intencionais da ação humana, os romances precisam lidar com diferentes escalas
de tempo-espaço, realidades visíveis-invisíveis que afetam suas causalidades e, portanto, suas
formas. Além disso, o Antropoceno, enquanto conceito revisionista, oferece um novo
enquadramento para um olhar sobre as produções literárias do passado, especialmente as
modernistas, através do questionamento do par estética/ética.
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O ANIMISMO REVISITADO
1092
Yasmin Franca Merelim Magalhães
Resumo: As categorias ontológicas deixadas como legado epistêmico ao século XXI já não suportam
as formas de existir e do estar-no-mundo contemporâneo que impelem filosofia a se reinterpelar e
se alimentar de esquemas conceituais que acompanham as virtualizações, sobretudo formuladas a
partir da ideia Antropoceno. Entretanto, a lírica contemporânea, como vanguarda de um modo de
se conjurar o shifter do eu/nós, coloca em xeque a hegemonia epistêmica e narrativa do nexo
causalista e recupera o paradoxo e a simultaneidade como substitutivos para a ordenação e
classificação do mundo em sistemas estanques, pautados na relação dominante e predatória da
fenomenologia do sujeito sobre (seu) objeto. Sob a inspiração de Levinas e Derrida, e evocando as
potencialidades emancipatórias dos saberes ancestrais, o que está em jogo nos poemas de Creeley,
Deguy e Ashbery, é um exercício de engenharia reversa sobre a grade conceitual que estrutura a
tradição do Ocidente, substituindo palavras-fetiche como autonomia e independência - termos-
chave da subjetividade burguesa - por uma ênfase sobre as complexas tramas de interdependência,
coopertencimento, dialogia entre os viventes e seu entorno, entendido não mais como um mero
pano de fundo para as ações do eu, mas antes como uma entidade subjetiva no seu próprio direito,
capaz, portanto, de interpelar o mundo em suas partes, e redesenhar os vínculos entre elas. Ao
elevar assim a figura da apóstrofe a dispositivo central, viabilizando a possibilidade de endereçar
como humano aquilo que supostamente não o é, o impacto gerado pelas supracitadas vozes poéticas
dispara a inusitada rede de reverberações sobre as discussões iniciadas por Haraway, Latour e
Viveiros de Castro, apontando para a urgência de uma repolitização radical do campo do sensível.
Indagar como tais questões se articulam na poesia contemporânea, entendida portanto como
câmara de eco dessas macro-tensões, é o que pretendo fazer nesta comunicação.
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1093
1094
REPRESENTAÇÕES DE GÊNERO E RAÇA EM PERSONAGENS FEMININAS DE TONI MORRISON E
MARYSE CONDÉ: SEXUALIDADES E AFETIVIDADES NEGRAS
Alana Maria do Nascimento
Resumo: O presente trabalho pretende realizar uma reflexão comparativa entre as personagens Sula
(2020), de Toni Morrison e Tituba (2022), de Maryse Condé, em relação às suas construções dentro
dos romances e suas respectivas vivências: de gênero, principalmente em relação à vivência da
sexualidade e estruturas de poder e raça, seja na subversão do papel destinado a uma mulher negra,
seja na resistência por meio do apreço à ancestralidade. Maryse Condé (re)inventa o julgamento das
bruxas de Salem e a diáspora africana pelo olhar de Tituba, uma bruxa negra escravizada e Toni
Morrison apresenta uma comunidade negra e periférica pós Segunda Guerra cercada de conflitos de
gênero, raça e classe pelo olhar de personagens femininas plurais, como Sula, com seus ideais de
liberdade. Para pensar nessas questões interessantes aos estudos de raça e gênero, em suas
representações dissidentes, o aporte teórico fica por conta de Judith Butler (2021) com a
necessidade de uma construção variável da identidade da mulher como um objetivo político para
uma política feminista que pense a identidade e representação de mulheres. Outra autora
indispensável para essas reflexões é Lélia Gonzalez (2020) e sua categoria de amefricanidade, que
procura pensar as proximidades e diferenças nas formas político-ideológicas de luta e resistência
contra o racismo e sobretudo, o racismo de gênero. As implicações políticas e culturais da categoria
de amefricanidade, abre novas perspectivas para o entendimento mais profundo da parte do mundo
onde ela se manifesta, seja na literatura negro-feminista dos Estados Unidos, seja na da região
Caribenha. As autoras, de certa forma, dentro de narrativas aparentemente completamente
diferentes, evocam questões interessantes para os estudos de raça, gênero e classe na literatura,
sobretudo dos estudos de representações da sexualidade e afetividade de mulheres negras como
chaves de resistência em romances de autoria negra.
Palavras-chave: gênero-raça; representação em personagens negras; autoria feminina negra
1095
Resumo: Alzilene Reis Chunnha – Universidade do Estado do Amazonas – CESTB/UEA – graduanda
Prof. Dr. Valter Luciano Gonçalves Villar – Universidade do Estado do Amazonas – CESTB/UEA –
Orientador A presente pesquisa tem como objetivo os estudos das representações do imigrante
árabe, elaboradas pelo escritor Milton Hatoum, quando da feitura do seu quarto romance, Órfãos
do Eldorado (2008). A esse romance, aliaremos, quando necessário, as reflexões de outros autores
sobre o fazer literário do escritor manauara, de descendência libanesa. Considerações essas,
espalhadas em diversas obras, de diversos críticos, estudiosos e pesquisadores. Nesse caminho,
nossos exames, ora se voltarão para as configurações literárias do homem amazônico, às voltas com
suas lidas na cidade de Manaus e com os contatos migratórios semíticos, ora se voltarão para as
ponderações críticas sobre a literatura amazonense. Para realização da nossa proposta de estudo,
nos utilizaremos do arcabouço teórico metodológico da Literatura Comparada, marcado pela ruptura
da tradição etnocêntrica, centrada nos conceitos de fonte e influência, à maneira formulada e
proposta por Silviano Santiago, Edward Said e Antonio Candido. No tocante aos materiais, nos
apoiaremos, sobretudo, nos três primeiros romances de Milton Hatoum – Relato de um certo Oriente
(1989), Dois irmãos (2000) e Cinzas do Norte (2005) e na leitura de alguns críticos literários, como
Davi Arrigucci Jr, Susana Scramim, Maria Zilda Ferreira Cury, Marcos Frederico Krüger Aleixo,
Benedito Nunes, entre outros, bem como nas produções dos programas de Pós-Graduação das
universidades brasileiras, que tratam da matéria, em suas respectivas propostas de pesquisas.
Palavras-chave: Literatura Amazonense; Árabe; Milton Hatoum.
1096
mundial. Assim, o presente trabalho expõe a discussão acerca do domínio da vida humana em
sociedade, na obra distópica O ceifador (2020), de Neal Shusterman. Dentro desse corpus, tem-se
como objetivo proceder a uma discussão em torno da dimensão limítrofe entre vida e morte, o qual
é designado ao Estado o poder de decidir quem morre e quem vive, a depender de como as políticas
públicas vigoram no meio social. O método utilizado para a investigação, toma por base,
principalmente, os textos teóricos dos filósofos Michel Foucault (1988) e Giorgio Agamben (2004),
onde focaremos na vertente dos estudos de filosofia política e das teorias sociais que se preocupam
com a vida enquanto objeto da política, tendo o aspecto da morte sob o “comando” do
ceifador/estado como representação de tais temáticas. Da mesma maneira, estudiosos como Hanna
Arendt (2012) e Gregory Claeys (2017) têm papeis fulcrais para a corroboração desse argumento.
Além disso, as formas de sentenciamento e a escolha das vítimas também serão analisadas com o
intuito de investigar os interesses e a “função” na sociedade.
Palavras-chave: distopia; morte; o ceifador.
1097
da obra que serve como corpus principal deste estudo, bem como, analisar as diversas questões
tratadas, como a transição de gênero, o auto reconhecimento, as questões na qual as trans/travestis
prostitutas são submetidas e a inclusão, destaque e importância da linguagem bajubá/pajubá para a
identidade trans e comunidade LGBTQIA+. Dessa forma, não é só feita a análise da representação de
personagens trans em narrativas ou poemas que as visibilizem, mas também a sua
representatividade como forma de (re)existir na literatura brasileira contemporânea. Para isso,
utilizaremos a teoria queer (Butler; Colling) e os estudos do espaço biográfico (Arfuch), como aporte
teóricos-metodológicos. Portanto, a importância deste artigo se dá diante a reflexão em respeito à
valorização, visibilidade e reconhecimento de uma literatura trans/travesti no Brasil.
Palavras-chave: Literatura Trans; Representatividade; Amara Moira.
1098
Palavras-chave: Teoria Literária; Localismo; UFSC
1099
Bruna Silva Ramos
Resumo: O presente trabalho tem como foco investigar como se desenvolveu a intertextualidade
entre o romance Crime e Castigo e a adaptação cinematográfica de mesmo nome, do animador e
diretor polonês, Piotr Dumala. Buscou-se compreender o processo de adaptação e o diálogo
estabelecido entre essas duas obras, identificar seus principais elementos focando nas semelhanças
existentes entre as duas narrativas, utilizando os conceitos oferecidos pela Literatura Comparada.
Também foi realizada uma extensa revisão bibliográfica, a fim de compreender o romance, bem
como as particularidades da adaptação e da linguagem cinematográfica. Dentre os resultados da
análise, foi possível identificar as estratégias utilizadas pelo diretor para adaptar um romance tão
complexo para uma animação de curta duração, bem como aspectos importantes dessas duas
narrativas.
Palavras-chave: Intertextualidade. Adaptação cinematográfica. Animação. Dostoiévski. Piotr
Dumala.
1100
aproximação com o espanhol língua adicional oral e escrita. Por meio da leitura em voz alta, primeiro
em português e depois em espanhol, procuramos criar e aumentar o repertório para a compreensão
das histórias narradas e na sequência propusemos retextualizações em diferentes gêneros textuais.
Nos 2o. anos, cada criança confeccionou um “caderninho para ler com as mãos” e, nos 4° anos,
produzimos coletivamente um “jornal mural”, a partir dos gêneros jornalísticos (notícia, cruzadinha,
classificados etc). Como conclusão, por meio das artes e percepções construídas na leitura foi
possível observar certa transformação na estrutura escolar, pois valorizamos a Imaginação e Criação
(Vigotski, 2009), além disso, verificamos que, espontaneamente, as crianças traduziam as palavras,
frases, expressões e os mediadores notaram que não era mais necessário ler em português e,
finalmente, pontuamos que durante as conversas literárias os estudantes alternavam as línguas
como situação linguística comum na região de fronteira.
Palavras-chave: Literatura infantil, Ensino de Espanhol, Formação de Leitores.
1101
análises literárias em diálogo com o corpus delimitado e à contribuição para a formação pedagógica,
conforme a lei 10.639/2003 e suas condições de aplicabilidade no ensino de literaturas amefricanas
em sala de aula. Ademais, considera-se o lugar amefricano como formador de conhecimento,
partindo da violência na formação histórica de lugar e na identificação de um pertencimento a esse
lugar, por parte da mulher amefricana no Uruguai. Esta comunicação conta com apoio da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado do Piauí - FAPEPI.
Palavras-chave: Antologia tinta; Poesia afro-uruguaia; Amefricanidade;
1102
protagonistas. Além de RICOEUR (1990, 2007, 2010, 2014), outros teóricos serão utilizados no
desenvolvimento da pesquisa, entre eles, BRANDÃO (2013), BRITO (2017), POLLAK (1992).
Palavras-chave: Ditarura, Memória, Identidade, Espaço
1103
tempo de exceção no campo político, mostrando as imagens poéticas encontradas na natureza. A
presente proposta é resultado de uma pesquisa de iniciação científica, tendo por objetivo analisar as
figuras de Orfeu e Eurydice presentes nos poemas "II - Eurydice" e "Soneto de Eurydice",
pertencentes à obra citada, os elementos mitológicos, as vozes de Orfeu e Eurydice como sujeitos
poéticos, utilizando as teorias ecocríticas como embasamento teórico. A construção proposta utiliza
uma metodologia de caráter bibliográfico e, dentre as obras estudadas, destaca-se "A Ecologia: grito
da terra, grito dos pobres", de Leonardo Boff (1995), "As três ecologias", de Félix Guattari (1989), "O
Salazarismo e o homem novo: ensaio sobre o Estado Novo e a questão do Totalitarismo", de
Fernando Rosas (2001) e "A presença da Mitologia Clássica e o pensamento filosófico no regresso à
Grécia de Sophia M. B. Andresen", de Miguel Vieira (2014) como algumas das obras que respaldam
a discussão proposta.
Palavras-chave: No tempo dividido; Sophia de Mello Breyner Andresen; Ecocritica.
1104
entrado no currículo via disciplinas de Literatura Brasileira e Literaturas Africanas, não via Teoria
Literária.
Palavras-chave: Teoria Literária; UFRJ; Redemocratização
1105
(2012); Cosson (2014); Freire (2001); Soares (1999); Todorov (2009 e 2017), entre outros
pesquisadores.
Palavras-chave: Literatura fantástica. Ensino de literatura. Leitura literária. Letramento literário.
Contos de assombração.
1106
cultural brasileira, a partir dos diálogos, lendas e crenças, pautadas no contexto em que a trama
acontece e nas características do personagem principal.
Palavras-chave: Nacionalidade; Literatura; Modernismo.
1107
anos de 1970. Naquele período, recebeu diversos prêmios, entre os quais se destaca o “Troféu
Mambembe de Melhor Autor”, em 1977 e 1979. Os textos dramáticos de Santos são,
fundamentalmente, direcionados para crianças. Suas produções compõem o livro “Teatro Infantil”,
peças teatrais escritas nos anos de 1970 e encontravam-se dispersas até que, em 2018, a Fundação
Nacional de Artes (FUNARTE), uma fundação do governo brasileiro ligada atualmente ao Ministério
da Cidadania, resolveu reuni-las e editá-las em um único volume; corroborando, assim, com o
trabalho de pesquisadores, apreciadores, professores e profissionais que se dedicam ao gênero
dramático infantojuvenil. Diante desses aspectos, emerge o objeto de estudo desta pesquisa. Das
onze peças que compõem a obra Teatro Infantil (2018), foi escolhida a obra “Senhor Rei, Senhora
Rainha”. A justificativa repousa no fato desta peça ser a primeira produção dramatúrgica de
Benjamim Santos. Além desse fato, com esta obra, o artista participou e venceu, em 1971, no Rio de
Janeiro, o Concurso Nacional de Dramaturgia Infantil, do Serviço Nacional de Teatro. Assim, ancorada
nas contribuições de Décio de Almeida Prado (2002) e de Renata Pallottini (1989), esta pesquisa tem
como objetivo analisar a configuração das personagens inscritas na obra dramática “Senhor Rei,
Senhora Rainha”, do escritor piauiense Benjamim Santos, a fim de compreender a densidade ôntico-
discursiva das personas no espaço diegético, além de observar, metodologicamente, como projeto
estético do dramaturgo pode ser vinculado como subsídio para formação do leitor literário.
Palavras-chave: teatro brasileiro contemporâneo, dramaturgia; , formação de leitor
1108
poesia de Virginia Brindis de Salas. Para tal, serão utilizado inicialmente os poemas "Semblanza" e
"Pregon numero uno" e, em seguida, poetas amefricanas uruguaias posteriores a ela. Ressalta-se,
como objetivo específico, sistematizar os resultados parciais de pesquisa com vistas a coordenar
ações de extensão na comunidade acadêmica, assim como na comunidade em geral, atrelando-as
ao Projeto de Extensão, bem como a refletir e debater sobre a Lei 10.639/2003 e suas condições de
aplicabilidade no ensino de literaturas amefricanas em sala de aula. No decorrer do tempo em que
a pesquisa será realizada, serão levados em consideração os aspectos existentes em seu corpus,
tendo como base os parâmetros de amefricanidade e afro-uruguaias, na perspectiva contemporânea
de produção uruguaia literária do gênero poesia.
Palavras-chave: amefricanidade; virginia brindis de salas: poesia; literatura uruguaia
contemporânea.
1109
feminina. Assim, essa pesquisa filia-se teoricamente a Análise do Discurso pois essa área trabalha
com um conceito muito específico da linguagem que é o discurso, pois a palavra discurso [...] tem
em si a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso assim, é palavra em
movimento, [...] com o estudo do discurso, observa-se o homem falando (ORLANDI, 2020, p. 13). A
Análise de discurso propicia o entendimento dos enunciados a partir das suas condições de
produção, permitindo ao pesquisador analisar a partir da exterioridade da produção do discurso,
uma nova materialidade discursiva.
Palavras-chave: arquivos; poesia; autoria feminina.
1110
Grosso do Sul), sob orientação do Prof. Dr. Edgar Cézar Nolasco. O grupo de rap Racionais Mc' s, na
década de 90, já era conhecido como o maior grupo de rap brasileiro. Nesse período, o Brasil foi
palco de diferentes eventos de violência organizada que denunciavam um processo estatal de
gerenciamento da miséria por meio da violência. Dessa forma, os intelectuais Racionais Mc 's se
consagram dentro de um contexto social que exclui, marginaliza e inviabiliza a sua existência física e
epistêmica. Logo, a pesquisa tem como objetivo estudar a partir da obra Sobrevivendo no Inferno
(1997) a criação do paradigma-outro que ela apresenta, dando ênfase a radicalicalidade opositiva
aos paradigmas hegemônicos além do compromisso fraternal que os intelectuais apresentam, re-
inventando a periferia brasileira e re-existindo enquanto sujeitos periféricos. Para tanto, a
fundamentação teórica partirá de uma teorização fronteiriça/ descolonial, tendo como aparato
teórico o pensamento de estudiosos como Walter Mignolo (2008), Frantz Fanon (2022) , Eneida
Maria de Souza (2002) e Edgar Cézar Nolasco (2010) e delimitando-se na transcrição da obra
Sobrevivendo no Inferno (2018) feita pelo professor Acauam Silvério de Oliveira.
Palavras-chave: racionais mc 's; paradigma-outro; re-invenção.
1111
marginalização na contemporaneidade: a questão racial e da saúde mental. Os sentimentos de não
pertencimento e de privação de existência no mundo estão presentes em seus registros poéticos,
que refletiam como a autora enxergava-se dentro de sua realidade hospitalar. Destarte, propomo-
nos a analisar a poesia “É Dito”, presente em “Reino Dos Bichos E Dos Animais É O Meu Nome”, a
fim de compreender como a literatura se faz um lugar de resistência para sujeitos apartados dos
centros socioeconômico e cultural na construção de um país. Para tanto, nos fundamentamos em
Hidalgo (2007), para tratar do conceito de literatura da urgência, definido por escritos literários
advindos de vivências extremas de opressão, como forma de autoafirmação do oprimido; em
Foucault (1972), a fim de afirmar o isolamento de sujeitos com doenças mentais como um
mecanismo de controle dos corpos, assim como de definição daqueles que têm ou não o direito à
cidadania; e em Weyler (2006), para tratar do projeto de higienização das cidades focado na
marginalização racial de indivíduos vistos como adoecidos na passagem do século XIX ao século XX.
Palavras-chave: Literatura da urgência; Exclusão; Resistência.
1112
De encontro à visão predominante no Ocidente, segundo a qual as plantas são entendidas ora como
seres inertes, ora como simples elementos de decoração, na obra de João Cabral, sob a lente
botânica, reconhecemos uma dimensão ativa aos viventes vegetais, reafirmando a capacidade da
escrita poética de proporcionar o caminho do humano em direção às suas alteridades.
Palavras-chave: João Cabral de Melo Neto; alteridade vegetal; plantas.
A REPRESENTAÇÃO DA MORTE NAS NARRATIVAS LITERÁRIAS "A NOIVA DE KEBERA" E "O FILHO
DE MUSSASSA", DE ALDINO MUIANGA
Jandira Francisco Domingos
Resumo: As sociedades africanas, estabelecidas e regidas com base nas suas cosmovisões culturais,
conceberam as concepções de morte, de tradições, de rituais e de crenças que envolvem este
processo da morte de maneira diferente, pois estes processos acarretam importantes significados
para os povos africanos. E é a partir desta perspectiva que os assuntos sobre ritos e crenças a volta
dos mortos e antepassados são pontos centrais de abordagem nos contos “A noiva de Kebera” e “O
filho de Mussassa”, do escritor moçambicano Aldino Muianga. Pois estes elementos são tidos, nestas
narrativas, como constituintes importantes na estabilidade de aldeias e na preservação cultural de
um determinado povo. Por este motivo, o trabalho tem como finalidade analisar a representação da
morte, para determinadas tradições moçambicanas e africanas, pesquisando sobre as crenças e os
procedimentos ritualísticos que antecedem a morte. Porque, após o processo da morte, estes mortos
são elevados às dimensões de entidades importantes para preservação cultural e para estabilidade
das aldeias Sangwa e Mpissane, mencionadas nos contos. Assim, este estudo foi baseado nas obras
de Diop (2012), Hall (2006), Secco (2012), Ribeiro (2010) e Leite (2020), que nos auxiliaram a observar
estes elementos a partir da cosmovisão cultural africana e moçambicana. Portanto, entender a
complexidade desses assuntos e desses elementos culturais significa entender parcelarmente a visão
cultural moçambicana e africana.
Palavras-chave: Morte; Rituais e crenças; Literatura Moçambicana.
1113
anedoticamente, porteiro de saunas gays em Paris. Contudo, na multidimensional biografia de
Herbert, há um elemento indispensável: sua relação com a literatura e a cultura. Na primeira-infância
era amante voraz dos livros; aos 14 anos, crítico de cinema amador; na atividade militante da
maioridade, um ávido loquaz de assuntos do gênero, que iam de Marilyn Monroe a Ingmar Bergman,
de Dostoiévski a Gabriel García Márquez. Mesmo seu emblemático “nome de guerra que pegou”,
Daniel, supõe-se vir em referência ao autor de Robinson Crusoé. E, não obstante, como sempre
reafirmou, era um prodigioso escritor. Tendo estes elementos em vista, o objetivo da presente
apresentação de pôster é investigar, tendo como corpus de análise o livro Passagem para o próximo
sonho (1982), a forma como obra de Herbert se relaciona e se intersecciona com a literatura, a
política, a história, a memória e a sexualidade. Metodologicamente, se vale de uma análise
pormenorizada do material herbertiano, aliado à contribuição teórica concernente ao período
ditatorial, a literatura de cunho testemunhal e a história do movimento homossexual no Brasil, que
se radica em autores como James Green, Renan Quinalha, Nico Poulantzas, Giorgio Agamben e Edson
Teles. Oriunda de um projeto de iniciação científica realizado na UFOP (Universidade Federal de Ouro
Preto), a apresentação se justifica na medida em que contribui no avanço das discussões, tanto
acadêmicas quanto políticas, relacionadas às bandeiras e lutas que Herbert jamais abandonou.
Palavras-chave: Herbert Daniel; Memória; Ditadura militar
1114
África ou à escravidão, fato que, por si só, é sintomático do apagamento histórico da presença negra
no projeto de fundação de uma cultura “genuinamente” brasileira. Nesse viés, a literatura marginal
surge nas periferias sob uma estratégia de resistência, assimilando e contestando toda uma tradição
literária brasileira, branca e elitista, corroborada pelo movimento modernista de 1922. A partir da
literatura, os autores da periferia, sujeitos vistos até então como destituídos de fala, apropriam-se
da escrita para dar lugar às violências cotidianas entranhadas e invisibilizadas no tecido social
brasileiro. Portanto, a partir das contribuições de Férrez, em “Terrorismo Literário” (2005); de Sérgio
Vaz, em “Manifesto da Antropofagia periférica” (2008); de Suely Rolnik, em “Antropofagia Zumbi”
(2021); de Rafael Cardoso, em “Modernidade em preto e branco” e de outros autores que põem em
xeque o discurso colonial sob uma ótica racial e étnica, a exemplo da Aníbal Quijano (2005) e Abdias
Nascimento (2016), o objetivo do presente trabalho é analisar a obra Os supridores (2020), do
escritor porto-alegrense José Falero, à luz dos princípios da absorção e da transformação, nos termos
da antropofagia periférica.
Palavras-chave: literatura marginal; antropofagia periférica; José Falero;
1115
representa situações em que um autossacrifício é necessário para que a personagem adquira
conhecimento ou evolua suas habilidades. Tal sacrifício envolve o acolhimento de diferentes
personagens que enfrentam violências e crises derivadas da condição diaspórica, notadamente
marcada pelo choque cultural e pela marginalização. São personagens que deixaram de pertencer à
Índia, pois dela se deslocaram, mas que não pertencem aos Estados Unidos. Assim, a trajetória de
individuação da protagonista dialoga com a busca de identidade da comunidade diaspórica indiana
representada na narrativa.
Palavras-chave: Literatura Indiana; Arquétipos; Exílio.
1116
estabelecidos na pesquisa serão amparados, principalmente, no pensamento de Elio Ferreira (2017;
2021) e de Lélia Gonzalez (2020).
Palavras-chave: negralização; memória afrodiaspórica; amefricanidade
1117
brasileira, trabalhando aqui, especificamente, a identidade negra feminina. Assim, o presente
resumo, visa analisar como se dá o processo de construção da identidade negra feminina no conto
“Força Flutuante”, presente no livro “Leite de Peito: contos” de Geni Guimarães (1988), observando
também o papel que Geni Guimarães desenvolve ao escrever sobre suas vivências, especificamente
neste conto. A pesquisa pretende analisar o conto relacionando-o também com os pressupostos
teóricos apresentados por Almeida (2019), Evaristo (2009) e Ribeiro (2017). Desta forma, o estudo
indicou que o processo de construção da identidade negra feminina no conto surge como uma
maneira de fortalecer a imagem da mulher negra, pois, no conto, pôde-se observar a formação da
personagem de Gini Guimarães, que passa a ocupar um lugar considerado de prestígio na sociedade,
transgredindo, chegando nesse lugar, que majoritariamente era ocupado por uma mulher branca e
de classe média, provando para aqueles que foram preconceituosos que ela era igual a eles e
também possuía competência para exercer a função de professora. Como consequência desse
estudo, fez-se possível observar que a escritora Geni Guimarães possui a sensibilidade de narrar,
escrever e descrever sensações íntimas vividas por ela e por outras mulheres negras que,
diariamente, passam pelas mesmas situações que ela passou, aproximando suas obras do conceito
criado por Evaristo (2009), o conceito de “escrevivência”, transformando as suas vivências em
escritas, atribuindo também à sua linguagem a presença marcante da oralidade.
Palavras-chave: Geni Guimarães; escritas femininas negras; literatura afro-brasileira.
1118
Licenciatura em Letras-Alemão, ao cursar disciplinas voltadas ao ensino de Língua e Literatura
estrangeira, depara-se imediatamente com sua formação básica de Língua e Literatura no período
escolar. Além disso, não raro o discente reencontra adversidades enfrentadas neste período que
influenciaram sua própria formação de leitor de literatura e que certamente influenciarão sua prática
futura como professor/a. Dessa forma – a fim de nos afastarmos de abordagens de ensino e
aprendizagem de Literatura que faz de textos literários meros instrumentos para o ensino de Língua,
por exemplo –, propõe-se aqui a investigação de contextos de ensino e aprendizagem de Literatura,
pautada pela busca de práticas de Letramento Literário no contexto de ALE que aproximem o leitor
do texto literário e proporcionem a troca de sentidos entre escritor, leitor e sociedade . A
metodologia abordada nesse trabalho é a de pesquisa de referencial bibliográfico em Língua Materna
(LM) e Língua Estrangeira (LE) acerca de Estudos Literários em diálogo com outras áreas de pesquisa.
Além disso, inclui-se a observação de rodas de leitura como um exemplo possível de práticas de
Letramento Literário, juntamente com a leitura e a análise da obra de Walcyr Monteiro e a
elaboração de uma proposta de Ensino e Aprendizagem de Literatura no contexto de ALE. No
presente momento, o trabalho está em fase de desenvolvimento.
Palavras-chave: Alemão como Língua Estrangeira; Walcyr Monteiro; Narrativas Indígenas.
O INAUDÍVEL RECADO DOS MORROS: APROXIMAÇÕES ENTRE AS IMAGENS DOS MONTES BIBLÍCOS
E "O RECADO DO MORRO", DE JOÃO GUIMARÃES ROSA
Lucas Branco de Araujo Motta
Resumo: O presente trabalho objetiva uma leitura entre a presença das figuras de montes no Antigo
Testamento e o conto “O recado do morro”, do Corpo de Baile (1956), buscando articular a relação
proposta pelo próprio autor entre o gênero literário e a configuração da personagem. A leitura de
textos religiosos pelo autor é um dos tópicos bem explorados na fortuna crítica do autor . O sertão
transcendental e metafísico e sua personagem transparecem formal e tematicamente em vários
aspectos: na construção narrativa de suas obras, em entrevistas e correspondências . Esta
aproximação entre o sertanejo e a personagem da parábola dá a dimensão para o dilema maior: a
contenda entre homem e destino. Assim, em tons de parábolas e apólogos, Guimarães Rosa
construiu os contos de Corpo de Baile, introjetando os dilemas das dimensões subjetivas das
personagens no gênero literário utilizado – o conto. Assim, em tons de parábolas e apólogos,
Guimarães Rosa construiu os contos de Corpo de Baile. A narrativa de Pedro Orósio e a formação de
uma canção-recado é o entrelaçamento do dilema entre homem e destino; a compreensão do
recado, oriundo do morro, alude à função dos morros e montes do Antigo Testamento – o encontro
entre Deus e homem. Deste modo, a narrativa levanta a incompreensão do homem com o divino,
que só pode ser superada com a compreensão de um recado que transpassa por diversos meios e
enunciadores. Reafirmando, assim, o desejo do autor pelas dimensões metafísicas que podem erigir
da criação literária. A aproximação da forma moderna do conto às formas aproveitadas pela Bíblia
implica na inflexão da relação entre subjetividade e forma literária
Palavras-chave: literatura; religiosidade; joão guimarães rosa; bíblia; gêneros literários;
1119
subsidiaram uma posição tão elogiosa em relação aos autores Naturalistas e outra tão depreciativa
em relação aos seus “antípodas” ligados à vertente poética do Simbolismo. Nossa investigação,
pretende, em diálogo com os contemporâneos de Eustáquio de Azevedo, tais como ZOLA (1982),
ROMERO (1882), CAMINHA (1893), CARVALHO (1894), VERÍSSIMO (1916), entre outros; discutir os
princípios estéticos e filosóficos que subjazem às leituras que Azevedo realizou das estéticas literárias
em questão.
Palavras-chave: Crítica e Historiografia; Literatura Amazônica; Naturalismo; Simbolismo
1120
DE RUÍNAS E SOBREVIVÊNCIAS: A POÉTICA DE UM MUNDO MUTILADO
Mainumi Miranda Cardoso Quadros
Resumo: O presente trabalho visa analisar a poética de Prisca Agustoni, em seu livro O Mundo
Mutilado, sob a perspectiva de ruínas e a visão que temos do estrangeiro, o prófugo, no século XXI.
Reconhecendo a urgência de uma voz poética - necessária, pela sensibilidade única que carrega - que
dê luz às questões das não-inéditas tensões derivadas dos movimentos migratórios, a autora relata
a onda migratória, entre 2013 e 2017, dos migrantes que fugiam pelo litoral norte-africano, na
tentativa de atracar no continente Europeu, em uma espera abissal de refúgio. Os mortos na
travessia, corpos mutilados, números empilhados. Os sobreviventes, infecção da globalização. É
neste contexto, sem dúvidas brutal, que a obra se configura. Assim, a partir de poemas selecionados
e partindo de uma leitura anacrônica da obra, pretende-se abordar a sensível poética da autora em
suas alegorias, em sua própria existência paradoxal, configurada na coexistência de ruínas e
sobrevivências. Como é, também, a realidade da gente que parte. Para isso, são enfocadas as
temáticas de hospitalidade e alteridade, embasadas nos questionamentos e discussões de Jacques
Derrida, e de vivência e relação peregrina entre as (anti)línguas. Busca-se relacionar, também, de
forma comparativa, os temas tratados por Agustoni com autores que viveram e escreveram em
contextos existenciais semelhantes: Marina Tsvetaeva e Walter Benjamin. Agustoni afirma, em um
de seus poemas, que “[...] é possível morrer / duas, três, quatro / dez, dezenove vezes / da mesma
morrida morte [...]” e o que pretende-se com este trabalho é embarcar na reflexão de que se se é
possível morrer dezenove vezes, também se é possível sobreviver ressurgindo vinte.
Palavras-chave: Prisca Agutoni, Poesia, Ruínas, Hospitalidade
1121
Resumo: A Literatura enquanto objeto de denúncia e resistência sempre se desenha como uma
atitude política. Em seus diálogos com a Historiografia nos permite ler momentos históricos por
caminhos diferentes dos traçados por um sistema dominante. Nossa reflexão tem como corpus a
Historiografia da República da espada (1889-1894) pela perspectiva delineada na História em
Quadrinhos (HQ) Triste República: A Primeira República comentada por Lima Barreto (2022), de Lilia
Schwarcz e Spacca. Nessa narrativa, nos deparamos com um homem preto, pobre e alcoólatra, o
escritor, Lima Barreto, que por meio de sua escrita trouxe à tona críticas às injustiças e aos
preconceitos que recaiam sobre si e sobre seus semelhantes. Na HQ, Lima Barreto é quem assume a
voz da história, segundo ele, uma escolha feita pelos escritores. Apoiado nesse tom, busca explorar
momentos nos quais são determinadas relações entre a ficção, a realidade (contada ou escrita) e sua
obra que se comportam como, em termos foucaultianos, uma “escrita de si”. Objetivamos, portanto,
através dos apontamentos históricos dos primeiros anos do desenvolvimento republicano brasileiro,
tracejar aproximações e distanciamentos em relação ao “entre-lugar” e a “zona de contato” da
Literatura, da História e da Antropologia. Para esse encontro, conversamos teoricamente com
Inocência Mata (2013), Mary Louise Pratt (1999), Helena Buescu (2017); literariamente com Gregório
de Matos (2010) e Lima Barreto (1922, 2004, 2017a, 2017b); historicamente com Lilia Schwarcz
(2013, 2015) e Heloisa Starling (2015), Jorge Ferreira e Lúcia Delgado (2018) e Hayden White (1991);
e em uma perspectiva filosófica com Platão (1997) e Michel Foucault (1983). Propomos assim,
ponderar, tendo em vista os encontros e desencontros, uma materialidade dessa outra visão para se
contar a “História Oficial”, tendo como norte a análise dos elementos verbais e não verbais que
compõem a HQ escolhida.
Palavras-chave: República da espada, HQ, Lima Barreto.
1122
Resumo: Este projeto tem como objetivo indicar uma relação existente entre as obras Os miseráveis
(1862), de Victor Hugo, e Vidas secas (1938), de Graciliano Ramos. Esses dois autores são também
conhecidos por uma escrita de cunho social, além de tantos outros aspectos presentes em suas
obras, que os posicionam como referências nas literaturas francesa e brasileira. Em Os miseráveis,
Hugo retrata a realidade da sociedade e da política francesa em 1815, trazendo como plano de fundo
uma França em constante movimento, atemorizada por repentinas revoluções e a destacada
degradação do ser humano. Em Vidas secas, Ramos, apresenta-nos a realidade de um nordeste
brasileiro assolado pela seca de água e de perspectivas. A trajetória das personagens, em ambas as
obras, revela a luta humana para ser mais humano e a busca por dignidade e igualdade. Mesmo que
de forma indireta, nos é mostrado o quão semelhante a problemas contemporâneos são aqueles
vividos pelas personagens das obras e também o quão indiferente a territórios eles são. Nessa
perspectiva, mostraremos os movimentos feitos por elas – as personagens - que buscam por
libertação das correntes de opressão, em uma odisseia onde situações extrínsecas à realidade do
homem geram reflexões e aprendizados. Contudo, cada uma das obras pertence a seu tempo e
espaço, quase cem anos as separam, dessa forma, durante as análises salvaguardamos o momento
histórico e o contexto em que foram concebidas, afim de evitar anacronismos. Ademais, entendemos
que quando tomamos a literatura como “um sistema vivo de obras, agindo umas sobre as outras e
sobre os leitores; e só vive na medida em que estes a vivem, decifrando-a, aceitando-a, deformando-
a.” (CANDIDO, 2000, p.68) podemos pensar nela como instrumento para criação de um mundo
comum e usar obras como a Os miseráveis e Vidas secas para ensinar e aprender sobre sociedade e
valores.
Palavras-chave: Graciliano Ramos; Victor Hugo; Literatura Comparada.
1123
teórica bahktiniana (BAHKTIN, 2015). Esses discursos são importantes para a construção narrativa
do texto indígena pois há uma utilização de dados reais da comunidade ao relatar diversas memórias
do povo, que são geralmente feitos por parentes mais velhos e passados para os descendentes de
forma oralizada. Quando Ytanajé Coelho Cardoso escreve Canumã, ele a faz em formato escrito e
transpassa sua experiência em que o eu-autor incorpora o sujeito narrativo. Apesar desse aspecto
autobiográfico presente, o autor não enfatiza somente em suas vivências e em seu ser, mas tem
como foco as vidas da sua comunidade, as relações deles com o mundo e suas perspectivas. Esse
tipo de narrativa mais plural é muito importante para os povos indígenas e representa também a
forma que os mesmos veem o outro. As histórias contadas no livro pelo narrador surgem dos
discursos de seus avós, figuras muito importantes na história e também nas comunidades indígenas.
Elas representam a sobrevivência das histórias, lendas e mitos indígenas e, mais importante, a
sobrevivência da comunidade munduruku. Com isso, é possível afirmar, de acordo com Márcia
Wayna Kambeba (2018), que a literatura para os povos originários tem um espaço gigantesco para a
constituição deles e a sua transcrição para uma literatura escrita representa a conservação desses
discursos e dessas memórias, transpassadas para os leitores de forma dialógica.
Palavras-chave: Literatura Indígena; Memória; Sujeito.
À BEIRA MAR: UMA ANÁLISE DA MEMÓRIA EM BARBA ENSOPADA DE SANGUE, DE DANIEL GALERA
Maria Regina Soares Azevedo de Andrade
Resumo: Este trabalho investiga o dispositivo narrativo da memória no romance brasileiro Barba
ensopada de sangue (2012), de Daniel Galera, premiado em 3º lugar no Prêmio Jabuti 2013 e
vencedor do Melhor Livro do Ano no Prêmio São Paulo de Literatura no mesmo ano. Para isso, a
análise ocorre por meio de uma observação dialética entre forma literária e processo social
(CANDIDO, 2006). A memória é investigada com auxílio das contribuições teóricas de Halbwachs
(2004), Gagnebin (2006), Ricoeur (2007) e Sarlo (2007), buscando categorizar e qualificar essa
1124
memória, ao mesmo tempo em que se intenta compreender o emprego desse recurso no âmbito
mais amplo da literatura brasileira contemporânea. Já o exercício crítico se apoia em estudos e
procedimentos de Conti (2012), Dalcastagnè (2018), Facchin (2015), Schollhammer (2012a, 2012b) e
Zandoná e Niederauer (2015), atentando-se para as especificidades estéticas e temáticas do
romance e relacionando-o com a sociedade em que se insere. Considerando as relações entre
literatura e sociedade, forma e conteúdo, atentamos para o modo como a memória opera na obra
(quem lembra, o que lembra e como o faz) e as possíveis implicações estéticas e sociais desse
recurso. Avalia-se que o emprego desse dispositivo no romance em questão se alinha com questões
próprias da sociedade brasileira, tais como a negação do passado e o esquecimento dissimulado, que
desfecham por estruturar nossa sociedade.
Palavras-chave: Memória; Sociedade; Literatura brasileira contemporânea; Barba ensopada de
sangue.
1125
pesquisa, o papel do pós-colonialismo para a continuidade desse sistema de subalternidade, pois o
mesmo está intrinsecamente ligado aos estereótipos e tabus contemporâneos, como as questões
que permeiam a sexualidade, incumbências ao gênero feminino, inferiorização da mulher e aos locais
de fala e atuação desta na sociedade brasileira. Como fundamento teórico, Spivak (2010), Hall (1996),
Fanon (1979), Da Matta (1980), Miranda (2003), principalmente, confluem para a compreensão de
conceitos essenciais a este trabalho e permitem uma relação mais concreta entre teoria-vivência.
Essa dominação patriarcal-religiosa sobre as mulheres perdurou por muitos séculos até que as
mudanças e reinvindicações fossem ouvidas e iniciadas, visando uma tentativa de reparação
histórica, todavia, ainda hoje encontram-se demasiados vestígios dessa trajetória de abuso.
Palavras-chave: Subalternidade; colonização; mulher.
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NESSE TRECHO, EVITAMOS BUZINAR: CONSIDERAÇÕES SOBRE LITERATURA E PSICANÁLISE
Mayara Esteves Costa
Resumo: Se os encontros com os outros e as trocas que deles advém compõem nossa experiência e,
por conseguinte, colaboram para com a produção dos sentidos que nos mantém em movimento; o
isolamento e a desassociação do coletivo, ao contrário, nos impulsionam para a anulação do sentido
e a ruptura com o desejo. Assim, nesse trabalho, parto da pandemia de COVID-19 para apontar dois
momentos de crise dos sentidos na produção acadêmica em ciências humanas. Isto é, revisito as
formas de condução das pesquisas antes dessa emergência sanitária; repenso desde a finalidade da
pesquisa e da crítica (em especial, a literária) até a esterilidade teórica com a qual se constroem
artigos. Ainda, aponto para a velocidade com a qual se teve de retomar as marchas no retorno ao
contato presencial. Por fim, encaro a literatura e a psicanálise a partir de uma postura reparadora,
na medida em que são duas instâncias de encontro, de movimentação de sentidos e de permissão
para o retorno ao desejo. Isto posto, foi possível pensar a Crítica a partir da Hermenêutica da
Desconfiança, a qual aponta para a busca interminável de sentidos ocultos no objeto de estudo; lê-
se paranoicamente (ou neuroticamente?) em vistas de esgotar o objeto, esgotar os sentidos do
texto. Rabaté aponta que essas leituras produzem somente resultados que estão de acordo com a
teoria inicial, na mesma medida em que Sedgwick questiona “o que saberíamos, então, que já não
sabíamos?”. Após a exploração desse mecanismo tautológico e suas materializações no texto
acadêmico, olha-se para a literatura e para a psicanálise a partir de seus traços reparadores (em
concordância com a proposta de Leitura Reparadora, elaborada por Eve Sedgwick), os quais
permitem a exploração do próprio eu e o encontro, não a produção, de sentidos outrora perdidos.
Palavras-chave: hermenêutica da desconfiança; leitura paranoica; leitura reparadora
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feminista, político e sócio-cultural, partindo da perspectiva do sujeito feminino, da sexualidade não-
normativa e do contexto presente durante a Segunda Guerra Mundial. Dessa forma, o nosso objetivo
é relacionar tais temas através dos pontos de vista teóricos e literários, sempre contrastando-os e
salientando-nos para os estudos da crítica feminista através dos textos lidos e das possíveis
comparações estabelecidas no meio sócio-cultural e político presentes na prática dentro da
sociedade contemporânea. Este estudo, visa, portanto, ao contrastar teoria e prática, nos fazer
refletir através do meio literário sobre como somos enquanto sociedade e como tais aspectos podem
ser relacionados à crítica feminista e ao meio político e sócio-cultural. Assim, este estudo diz respeito
não somente à crítica feminista e à literatura, mas também aos estudos sociais e antropólogicos da
sociedade em que vivemos e estamos adentrados.
Palavras-chave: crítica feminista; Virginia Woolf; Entre os Atos;
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RAQUEL LEAL DE CARVALHO
Resumo: Partindo da bem conhecida ênfase dos elementos regionais na literatura brasileira e da
evidente intersecção que há entre literatura e cinema, este trabalho analisa a influência literária em
produções cinematográficas contemporâneas de Frederico Machado: Lamparina da Aurora (2017),
Reviver (2018) e Boi de Lágrimas (2019), sob a estética do regionalismo, mediante o olhar da mimesis.
Para isso, apoiou-se no aporte teórico dos seguintes autores que discutem as categorias mimesis,
narrativa, regionalismo literário e cinema, respectivamente: Luiz Costa Lima (1980), Ricoeur (1994),
Debs (2010) e Bordwell; Thompson (2013). Como metodologia, adotou-se uma pesquisa de cunho
bibliográfico, que se insere no âmbito dos estudos comparativos interdisciplinares. Constatou-se que
a estética regionalista representada por obras da literatura brasileira, por meio do processo
mimético, também está contida em obras cinematográficas de Frederico Machado, seja pela
composição do espaço da narrativa, as memórias culturais ou, até mesmo, a autonomia da figura
feminina, aspecto de relevo para as novas configurações do regionalismo, conforme Braga (2017).
No filme Lamparina da Aurora (2017), as memórias culturais são representadas por meio da
religiosidade dos personagens, das opções gastronômicas e pelos costumes identitários. Nessa obra,
a personagem feminina se faz muito presente e a organização do espaço, como a mobiliária e as
áreas internas e externas a casa remetem às características regionais. Em Reviver (2018), a
organização espacial se faz evidente, pois a obra explora as paisagens da cidade de São Luís, capital
do Maranhão. Além disso, pode-se elucidar a autonomia da personagem feminina. A obra Boi de
Lágrimas (2019) evidencia a cultura do “Bumba Meu Boi” e a participação fervorosa da figura
feminina em manifestações políticas. Observou-se, portanto, que o regionalismo presente em obras
literárias brasileiras está nitidamente representado, também, no cinema contemporâneo.
Palavras-chave: regionalismo literário; cinema; mimesis.
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tenta revivê-la no presente apesar do mundo hodierno onde não há tempo para perder com o
passado. Neste mundo o homem precisa produzir e consumir progressivamente para ter uma vida
aprazível. Entretanto, quando chega a Velhice o ser humano adquire uma nova percepção – uma
cosmopercepção – isto é, ele passa a valorizar a lentidão do tempo, as simples coisas da vida e,
sobretudo, a natureza. Tomando como ponto de partida a percepção de mundo do idoso esta
pesquisa apresenta a análise dos contos “A presença” de Lygia Fagundes Telles e “As mimosas” de
Teolinda Gersão. O primeiro conto se passa em um hotel de idosos que logo tem a tranquilidade
rompida com a chegada de um jovem. A segunda obra revela um quarto de uma idosa carente de
companhia e presa a uma cama devido à fragilidade de sua saúde. Valendo-se da liberdade da
literatura em elucidar vários aspectos humanos, tanto subjetivos como sociais, é possível dialogar
com a Geografia Humanista Cultural, pois este campo de estudo investiga o ser-e-estar no mundo.
E, com base nos pressupostos dessa área, a pesquisa buscou entendimento em teóricos como Eric
Dardel (2015), Yi-Fu Tuan (2013), Simone de Beauvoir (2018), entre outros. Assim, verificou-se que
ambos os contos reafirmam que o bem-viver na velhice implica em relações topofílicas (lugares
afetivos) com o corpo, com as coletividades, com a Terra e que o acúmulo de bens, riquezas e glórias
são indispensáveis perante a ausência de amor e respeito entre as gerações.
Palavras-chave: literatura; velhice; geografia humanista cultural.
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obra influencia a construção narrativa proposta para o romance. Os pressupostos teóricos utilizados
neste estudo se apropriam das contribuições de Garramuño (2014), Schollhammer (2009; 2012;
2015), Modesto&Barbarena (2021) entre outros. Destarte, as análises desenvolvidas mostram além
da estética criativa do autor, rupturas e possibilidades ampliadas das noções convencionais quando
pensa-se o gênero romance, ao construir sua obra dividida em 11 capítulos, Herbert Daniel se
aperfeiçoa ao subdividir esses capítulos e inserir narrativas para além da autobiográfica, um não
pertencimento às especificidades atribuídas ao romance.
Palavras-chave: romance contemporâneo; Herbert Daniel; hibridismo.
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(entre Benjamin e Silviano), e assim conseguimos maiores aportes críticos e um olhar mais detalhado
para o fenômeno visado.
Palavras-chave: literatura, narrativa, teoria, história
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políticos, filosóficos e crítico-literários. Para o desenvolvimento desta análise, o trabalho utiliza
principalmente das noções de “tipo” - considerando, em geral, a ideia de que na representação
artística o “tipo” seria uma cristalização universal de um fato social e individual da realidade -, dando
enfoque para os efeitos do uso desse recurso no romance, e de “herói positivo”, empregada por
Rufus Mathewson para se referir à figura do protagonista idealizado na literatura russa, em especial
pelo grupo de intelectuais raznotchintsy do século XIX ao qual Tchernychevski pertencia. Além disso,
é também considerada para a análise a discussão político-filosófica e literária dos séculos XIX e XX
sobre o sentido de realismo e os elementos próprios ao pensamento tchernychevskiano, pautado no
materialismo, no utilitarismo e no socialismo utópico, associados a esta discussão. A partir disso, este
trabalho pretende refletir pelo prisma do personagem literário sobre a ponte entre ideologia e
literatura ao observar, por um lado, a estética resultante da aplicação literária do sentido de realismo
próprio ao sistema ideológico de Tchernychevski e, por outro, a forma como os próprios recursos e
desenvolvimentos estéticos contribuem para esse sistema. Assim, esta monografia busca dialogar e
colaborar com as considerações teóricas e críticas sobre o romance “O que fazer?" e o sistema
teórico realista de Tchernychevski.
Palavras-chave: literatura russófona; realismo; ideologia e literatura
CORPO (S) QUE FALA (M): PERFORMANCE E REPRESENTAÇÕES TRANS NOS TERREIROS DE
UMBANDA
Thaiane Peixoto Barbosa
Resumo: O corpo é um elemento importante nos estudos culturais e literários, mas por muito tempo
foi lido a partir de discursos hegemônicos e não inclusivos. Este trabalho, resultado de uma pesquisa
em andamento, apresenta um olhar voltado para a compreensão do corpo, das representações e
das performances das mulheres umbandistas transexuais – um grupo duplamente invisibilizado –
relacionando esse tema às discussões sobre gênero e sobre manifestações religiosas nos terreiros de
umbanda do município de Tabatinga/Amazonas. Partindo da problematização sobre o conceito de
corpo biológico até a ideia de corpo mítico e a sua importância nos espaços religiosos, em especial
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nas religiões de matriz africana, analisamos, a partir de uma observação não participante nos
terreiros de umbanda da cidade de Tabatinga, as representações e performances desses sujeitos e
buscamos entender como elas compreendem o espaço ocupado por seus corpos no terreiro dentro
e fora dos rituais sagrados, abordando o corpo como um elemento político, social, discursivo e
literário. A pesquisa tem base teórica em Paul Zumthor (2018), que aborda a questão da
performance; David Le Breton (2012), que apresenta uma visão sociológica para a noção de corpo;
Renata Marinho Paz e Tiago Alves Callou (2020), propõem uma abordagem religiosa da
corporeidade, e Butler (2020), que discute as estruturas e dimensões políticas dos corpos. Dessa
forma, esperamos fortalecer os estudos já produzidos sobre os movimentos LGBTQIA+, assim como
ampliar os estudos sobre o universo das religiões de matriz africana, aprofundando os
conhecimentos acerca da dimensão do corpo e das suas transições, expressões e representações.
Palavras-chave: Corpo, performance e representações; Mulheres trans; Religiões de matriz africana.
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mostrará os limites que uma mulher negra e sem dinheiro pode atingir e o quanto a estrutura ou a
falta dela afeta o indivíduo.
Palavras-chave: raven leilani; luster; tokenismo.
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O PROCESSO DE PERIFERIZAÇÃO SOBRE A POÉTICA GILKANIANA
Vitor Castro Brito
Resumo: O século XX, na literatura brasileira, exerceu função disruptiva acerca de vários papéis já
consagrados institucionalmente em cima das leis morais vigentes. Com essa mudança do paradigma
– tanto estético quanto performático – algumas escritas passaram a ser o centro da observação da
crítica e do público leitor geral. Gilka Machado, escritora carioca, toma seu auge logo no início da
efervescência artística. Com a publicação do livro “Meu Glorioso Pecado” (1928), a poeta publica um
de seus mais notáveis e completos poemas: "Lépida e Leve”, envolvendo a sinestesia simbolista com
a ruptura estética dos versos e contemplando o mais alto gozo feminino. Com esse panorama, este
trabalho propõe-se a discutir a periferia na poética gilkaniana, compreendendo um processo de
periferização que arrastou do centro para margem aquela que foi cotada – com apoio de grande
nomes da Literatura Brasileira, como Jorge Amado – a concorrer à primeira cadeira feminina da
Academia Brasileira de Letras. Para isso, objetiva-se, em segundo plano, compreender a subjetivação
do corpo feminino na poesia de Gilka Machado e estabelecer um paralelo entre a crítica e o contexto
da escritora. Fundamenta-se, assim, nos estudos contemporâneos de gênero com Butler (2003), a
fim de compreender como o papel da mulher é subvertido no momento de sua autoconsciência;
Candido (1965) e suas contribuições à percepção relacional entre as sociedades e suas/outras
literaturas; Deleuze e Guattari (2003) sobre a inferioridade de uma literatura dentro de uma língua,
observando processos de subjetivação através no corpo textual, que será complementada com as
observações de margens, centros e periferias, através da organização de artigos de Eble e
Dalcastagnè (2017). Para Gilka Machado, este trabalho buscará fonte na teorização de um
“simbolismo singular”, proposto por Nunes (2021).
Palavras-chave: Gilka Machado; Literatura periférica; Subjetivação
"A TEIA DE ARANHA É UMA CASA E UMA ARMADILHA": UMA ANÁLISE DO LIVRO "LÁ NÃO EXISTE
LÁ" DE TOMMY ORANGE
Wevelly Thaissa Ribeiro Perotes
Resumo: Este trabalho visa analisar como o escritor Nativo Norte-Americano Tommy Orange utilizou
o símbolo da teia de aranha para projetar uma metáfora na narrativa de seu livro “Lá não existe lá”
(2016). Ao explorar autores como Hertha D Wong (2009), Carol Patterson-Rudolph (1997) and
Katarzyna and Sergiusz Michalski (2010), e Carvalhal (2006), foi possível analisar a obra de Tommy
Orange a partir um de ponto de vista fundamentado em um aporte teórico. Em particular, esta
análise enfoca o uso da teia de aranha e suas qualidades simbológicas e culturais para com os povos
nativos americanos, e sua transformação em uma metáfora enraizada intrinsecamente dentro da
narrativa. Foram escolhidos três personagens para a discussão, estes apresentam suas respectivas
lutas internas dentro da narrativa do livro, que dialogam com a metáfora "lar e armadilha"
relacionando com a figura da aranha analisada. A partir desta perspectiva, esta análise, -
fundamentada no método de pesquisa bibliográfica- foi executada com o fim de se obter uma melhor
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compreensão e outras interpretações acerca do livro, foi possível notar em quais momentos da
narrativa o uso dessa metáfora foi colocada em ação afim de de expressar uma grande teia de aranha
que uniu todos os personagens da narrativa em uma armadilha, individualmente e coletivamente
Palavras-chave: teia de aranha; narrativa; metáfora
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