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RESUMO
O presente artigo traça um panorama sobre o cinema em Teresina-PI, que tem enfrentado os
efeitos da mercantilização acelerada dos equipamentos culturais e dos instrumentos de lazer.
Para tanto, busca fazer uma análise da história do cinema na cidade e de sua relevância na
formação sociocultural e urbana da capital piauiense, bem como apurar o processo de
desvalorização do mesmo e o impacto negativo atual gerado pela ausência de cinemas de rua
na cidade, a obsolescência dos espaços públicos que circundam os cinemas que já fecharam e,
também, avaliar a repercussão da hipervalorização dos cinemas multiplex em shopping centers
locais.
INTRODUÇÃO
O cinema é uma das formas de lazer mais consumidas no mundo, especialmente
por sua capacidade de transmitir linguagens verbais e não verbais de forma que
entretenha o espectador, seja na comédia, drama ou ficção, através da comunicação de
emoções, sendo descrito como arte de produção de afetos por Amount e Marie (2001,
apud Garcia, 2011, p.2). À vista disso, é possível afirmar que o ser humano tende a ser
seduzido por filmes, por sua capacidade de desconectar temporariamente o espectador
da realidade ao prender sua atenção para a narrativa de uma história.
Figura 1 - Total de salas de cinema e distribuição por rede exibidora em 2020. Fonte: Agência
Nacional do Cinema – ANCINE (2020)
O mapa da Figura 1 ilustra que a distribuição das salas de cinema pelo país não é
uniforme em todas as regiões do Brasil, sendo menos concentrada nas regiões
Norte(13,62%), Centro-Oeste (8,53% das salas de cinema) e Nordeste (15,12%), e mais
concentrada nas regiões Sul e Sudeste (que abarcam juntas 62,73% das salas de cinema,
sendo mais da metade delas localizadas no Estado de São Paulo, com 1048 salas), isso
porque nessas regiões há mais Shoppings Centers, onde os cinemas normalmente estão
localizados. Conforme é possível observar na Figura 2, as regiões Norte, Nordeste e
Centro-Oeste possuem no total 203 Shopping Centers, enquanto as regiões Sul e
Sudeste possuem juntas o dobro: 417.
Os cinemas de rua
Os cinemas de rua são equipamentos culturais inseridos no contexto urbano. São
responsáveis por proporcionar uma conexão com o organismo social ao estabelecer
uma identidade territorial e transformar “a ida ao cinema” em um ato cultural e de
constituição de memória local. Isso se deve ao fato de que os cinemas de rua tendem a
ser espaços mais democráticos, por configurarem um espaço convidativo para um
público comum e, por isso, mais plural (IVAM; FARIAS, 2020).
Os cinemas de rua são facilitadores do exercício dos direitos culturais, visto que
além de não limitar seu público, também exibem filmes que transmitem uma linguagem
acessível para qualquer espectador e, por consequência, gera uma conexão com os
espectadores, sendo estes membros da vizinhança local, podendo ser estes nacionais
ou estrangeiros. Os filmes estrangeiros de caráter comercial nem sempre se conectam
com o público que reside ou frequenta os arredores, pois não abordam sua realidade.
Além disso, o preço do ingresso dos cinemas multiplex dificulta que uma grande parte
da população mantenha o hábito constante de ir ao cinema (IVAM, FARIAS, 2020).
Ainda assim, as sessões de cinemas de rua por vezes são utilizadas como
estratégias temporárias e eficazes de transformação local de espaços públicos, centros
históricos e de periferias, sendo organizadas pelas gestões municipais, organizações sem
fins lucrativos, associações de bairro ou pela própria população.
Entre as praças de Teresina, pode-se destacar a Praça Pedro II, núcleo de diversas
atividades culturais da cidade, como apresentações teatrais e musicais. Apesar deste
espaço público representar uma carga cultural relevante, esta praça desde o início é
marcada pela segregação social, sendo subdividida de acordo com as classes sociais.
Durante os eventos culturais ocorridos no local no início do século XX, a praça se dividia
em dois lados: a “praça de baixo”, frequentado por pessoas de baixa renda, e a “praça
Figura 5 – Vista Aérea da Praça Pedro II. Fonte: Google Imagens, 2022. Editado pela autora,
2022.
Figura 6 - Theatro 4 de Setembro (à esquerda) e Cine Rex (à direita), ambos localizados em frente à
praça Pedro II em Teresina-PI em 1942. Fonte: Biblioteca de imagens do IBGE, disponibilizado em 2022.
O estilo Art Déco foi bastante marcante nos cinemas de rua e teatros do século
XX no Brasil. Com as legislações urbanísticas vigentes na época, os prédios não poderiam
ser tão altos e os pavimentos superiores deveriam ter recuos, restando a alternativa de
escalonamento da volumetria para dar a impressão de grande altura nas fachadas
(CORREIA, 2008). Estes aspectos estão presentes na fachada do Cine Rex.
Figura 7 - À esquerda, Fachada do Cine Royal na década de 1960. A bilheteria(1) e a saída(2) eram
voltadas para a rua. À direita: estado atual do Cine Royal. Fonte:Ricardo Coutinho, 2014.
O cinema se torna cada vez menos acessível, visto que o preço dos ingressos tem
crescido exponencialmente no Brasil com o passar dos anos (Figura 3): de 2010 a 2019
o preço médio de um ingresso (PMI) aumentou cerca de 69%, chegando ao valor de R$
15,82 em 2019, enquanto o preço do ingresso em dólar diminuiu entre os anos de 2010
e 2019.
Figura 8 - Evolução do preço médio do ingresso (PMI) de 2010 a 2019. Fonte: Anuário Estatístico do
Cinema Brasileiro (2019).
Considerações Finais
Em vista disso, é possível concluir que o cinema, em especial o Cine Rex, teve
grande relevância na constituição dos aspectos culturais de Teresina. Entretanto, o ato
cultural de ir ao cinema na cidade passou a se direcionar apenas aos shoppings centers,
em razão da sensação simulada de segurança que esses locais transmitem e da cultura
do medo em torno do centro da cidade.
REFERÊNCIAS
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da imagem poética, uma necessidade. REVISTA EQUADOR, v. 5, n. 3, p. 458-478, 2016.
Disponível em: < https://revistas.ufpi.br/index.php/equador/article/view/5033/3037>.
Acesso em: 15 abr 2022
CORREIA, Telma de Barros. Art déco e indústria: Brasil, décadas de 1930 e 1940. Anais
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em:<https://www.scielo.br/j/anaismp/a/SsJfyGqyLKdZYJJn8Rg49Xx/?format=pdf&lang
=pt>. Acesso em: 10 mar 2022
DOS SANTOS, Raimundo Nonato Lima. Praticando espaços, entre acordes, letras e
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décadas de 1980 e 1990. 2016. Disponível em:
<https://repositório.ufpe.br/handle/123456789/24532>. Acesso em: 22 mar 2022
FAÇANHA, Antonio. A Evolução Urbana de Teresina. Carta CEPRO, Teresina, v.22, n.1,
p.59-69), jan./jun. 2003. Acesso em: 24 fev 2022
JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades, v. 21, n. 1, p. 13-25, 1961. Acesso em:
22 mar 2022
RAGO, Margareth. Inventar outros espaços, criar subjetividades libertárias. São Paulo:
Editora da Cidade, v. 100, p. 71, 2015.