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824-80
ARTE PÚBLICA PARA HABITAR O ESPAÇO PÚBLICO: UMA ANALISE DA VIDA URBANA
CONTEMPORÂNEA PELA LENTE DO TEATRO DE RUA E O DIREITO A CIDADE
Olivier Mongin entendeu a cidade como um participante ativo (ou seja, não contemplativo) no
espaço urbano, onde a relação circular entre o centro e a periferia domina, e por ser
multidimensional e não restrito por região, desenvolve "o processo da poesia, o espaço da paisagem
e o espaço da política" (2009, p. 39). Ele aperfeiçoou suas ideias, mostrando que a experiência
urbana é mais política do que nunca.
Com isto a rua é o espaço de encontro, de troca, de comunhão onde o espetáculo não é a
única preocupação, mas sim a relação que o mesmo terá com o espaço e com o público presente,
parte-se então do pressuposto que o teatro deve agir como acontecimento, recuperando o lúdico e
quebrando a forma de apropriação daquele lugar.
Rompe com o cinzento da ansiedade, valoriza a rua e a quem a utiliza, traz alegria, cor,
fantasia e imaginação, em vez de tensão, violência e pressa. A dimensão política torna-se muito
clara, com a abertura desses espaços para a poesia, o lúdico e a celebração, que a encenação
proporciona, ela acaba por sensibilizar os sentidos do cidadão comum habituado a tensão
cotidiana, apresenta a ele uma nova forma de ver e ouvir a própria cidade, que é vivida
coletivamente e partilhada entre todos que estiverem dispostos a isso, mesmo que seja por um
curto período de tempo (TRAVEIZ, 2013).
O teatro de rua traz em sua manifestação valores significativos que expressam o combate
à exclusão cultural e alienação valorizando a identidade do lugar, e em alguns casos sua história,
a liberdade, e a resistência que se volta a maior parte da população, na qual arte e política se
fundem motivando um pensar na sociedade, nas formas estabelecidas no cotidiano, além de ter
um papel fundamental na democratização da arte.
A partir das percepções sobre o teatro de rua e suas funções enquanto agente
sociopolítico procura-se iniciar um percurso entre teatro de rua, a história e a fenomenologia da
percepção que guiarão até a compreensão da cidade. Qual a importância de uma proposta
artística que se manifesta na rua? Quais as rupturas possíveis que ela pode proporcionar em meio
ao fluxo cotidiano? Como ela interfere no modo de ver a cidade? O teatro de rua exercita o pensar
sobre arte, não apenas como novas formas artísticas, mas também um convite a novas formas de
lutar nas trincheiras da cidade.
Dessa forma o teatro chega como potência, que desenha corpos em ação na cidade,
transformando a matéria, em luta. É um convite para ler a cidade de outra forma, para que o
nosso olhar seja direcionado as possibilidades que nos rodeiam, amedrontam, violentam, mas que
também nos beneficia com potência de vida. Habitada por plurais, em ideias de existência, de
pensamento, e uma busca incessante espacial e social.
O coletivo estopô balaio formado por nordestinos que atuam na grande São Paulo, mais
especificamente no bairro Jardim Romano, que sofre constantemente com enchentes, surge com
uma residência artística baseada na memória e narrativa com os moradores do bairro, resultando
em três espetáculos de Teatro. Um deles é denominado “A cidade dos rios Invisíveis” inspirado no
livro “cidade Invisíveis” de Ítalo Calvino e tem como objetivo um mergulho na história dos bairros
que margeiam a linha 12 da CPTM.
A história começa pelas enchentes que atingem a Zona Leste de SP, uma delas, em 2010,
que deixou parte do bairro do Romano embaixo d’água por três meses, fazendo com que a
população local se reinventasse. Através deste percurso o coletivo narra a história dos bairros e
de seus moradores, mostrando um novo olhar sobre o cotidiano de quem reside na região, além
de lançar olhos sobre as problemáticas existente nos bairros de forma poética e artística, onde o
público vivência a experiência através dos sentidos, uma nova forma de enxergar a cidade e suas
peculiaridades.
Dessa forma é possível ter acesso a informações sobre o que cada indivíduo pensa nos
fenômenos da vida cotidiana, e de certa forma compreendê-lo. Husserl chamava de
transcendência esta cadeia de ligações do “eu como pessoa, como coisa no mundo, e a vivência
desta pessoa, inseridos” (HUSSERL, 2000).
É necessário entender que o foco é refletir como o teatro de rua pode estimular o cidadão
a sentir e pensar onde vive, como principal ator do processo, sendo ele expectador, ou fazedor de
Teatro na cidade de Belo Jardim - PE. A cidade será invadida, ocupada, e vista como um modo de
viver, pensar e sentir. O modo de vida urbano de produz ideias, comportamentos, valores,
conhecimentos, formas de lazer e cultura (CARLOS, 2005); uma fonte de inspiração para atores e
encenadores que buscam novas formas de composição e novos espaços para abrigar suas
criações se moldando a forma do público em (re)conhecer as ruas da sua cidade de forma
instigante. E assim compreender como essa arte pode (re)afirmar e fazer pensar sobre o direito a
cidade.
OBJETIVO GERAL
Analisar a cidade através do teatro de rua como ferramenta para o direito a cidade a partir
do olhar dos atores (Produtores de teatro e Público), como elo desta interação.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
A cidade abriga a rua, as ruas são vias, veias, artérias da cidade. Estar na cidade quer
dizer ocupar os espaços, torna-los vivos, estimular as relações e as questões da vida urbana.
Antes lugar de encontro, de diferenças, hoje a rua passa a um lugar de passagem onde vidas não
se reconhecem ainda que se cruzem. O imediatismo existente na vida diária muitas vezes não
possibilita o olhar para o outro, o encontro, as inter-relações, e acumula apenas rastros.
LEFEBVRE afirma que, a essas necessidades, se somam outras, que não conseguem ser
satisfeitas pelo mercado. São elas a necessidade “de uma atividade criadora, de obra (e não
apenas de produtos e bens materiais consumíveis), necessidades de informação, de simbolismo,
de imaginário, de atividades lúdicas” (LEFEBVRE, 2008, p. 105). O mundo que nos é revelado por
nossos sentidos e pela experiência de vida, parece-nos à primeira vista o que melhor
conhecemos, já que não são necessários instrumentos nem cálculos para ter acesso a ele e,
aparentemente, basta-nos abrir os olhos e nos deixarmos viver para nele penetrar
(MERLEAUPONTY, 2004, p. 01).
A esfera pública diferente do que vivemos na esfera privada, na qual a vida é protegida
pela casa, pela discrição, denota dois fenômenos correlatados, mas não idênticos. Significa, em
primeiro lugar, que tudo o que vem a público pode ser visto e ouvido por todos Em segundo lugar,
o termo ‘público’ significa o próprio mundo, na medida em que é comum a todos nós e diferente do
lugar que nos cabe dentro dele. (ARENDT, 2000, p. 59-60)
Para BRITTO e JACQUES uma das reflexões críticas da vida urbana é o processo
denominado especularização imobiliária, o processo de privatização dos espações públicos e a
consequente gentrificação (enobrecimento de áreas com expulsão de população mais pobre) das
cidades contemporâneas. Nesses processos o ambiente urbano tende a se caracterizar como
cenografia e a experiência urbana cotidiana acaba se resumindo em circulação e utilização
disciplinadas por princípios segregatícios, despolitizadores e conservadores, que confere um
sentindo mercadológico, consumista e turístico ao seu modo de operação.
Tendo em vista todas as relações existentes entre o planejamento urbano, a rua e o teatro
o tema proposto não se propõe a ver o Teatro de rua como “salvador” dos conflitos urbanos da
cidade contemporânea, mas como uma ferramenta que pode estabelecer com a população,
através de sua ação, novas relações de enxergar a cidade e assim lançar olhares críticos sobre o
modo de se fazer o urbano e assim compreender que é necessário reivindicar o direito a um
planejamento de cidades democráticas e participativas.
METODOLOGIA
- Pesquisa de campo utilizando-se do método fenomenológico, uma vez que se trata de uma
escala de análise que requer uma perspectiva in situ a partir da observação direta dos atores,
visando explanar diferentes perspectivas;
Entrevistas com os atores sociais e artistas de Teatro de Rua – As entrevistas têm por
finalidade constatar e avaliar os valores e significados, bem como as relações conferidas
ao teatro de rua e a cidade;
Visitas de campo – As visitas de campo visam constatar como sucedem as relações entre os
atores que atuam no espaço, o teatro de rua e a cidade;
Análise de dados – última etapa dos procedimentos consiste da análise e reflexão de todas
as informações adquiridas nas etapas anteriores.
BIBLIOGRAFIA
ABRAHÃO, Sérgio Luís. Espaço público: do urbano ao político. São Paulo: Annablume, 2008.
BRECHT, Bertolt. Escritos sobre teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
BOAL, Augusto. Jogos para Atores e Não-Atores. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
FREITAS. Palco Giratório: Circuito Nacional. 1. ed. Rio de Janeiro: SESC. Departamento
Nacional, 2013. p. 1-117.
MOVIMENTO, Periferia em. “A cidade dos rios invisíveis”: Espetáculo teatral começa no
trem e termina no rio Tietê. 2016. Disponível em: http://periferiaemmovimento.com.br/cidade-
dos-rios- invisiveis-espetaculo-teatral-comeca-no-trem-e-termina-no-rio-tiete/. Acesso em: 14 set.
2016.
MONGIN, Olivier. A Condição Urbana – A cidade na era da globalização. São Paulo: Estação
Liberdade, 2009.