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CUIDADOS PALIATIVOS

VETERINÁRIOS
PRIMEIRA EDIÇÃO - 2023

Ana Cláudia Mesquita Garcia


Jessica Chagas Affonso Gouveia
Marimar Mayworm Beck
E-book
gratuito
© 2023 Direito de reprodução do livro de acordo com a Lei nº
9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Qualquer parte desta
publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. Titulo:
Cuidados Paliativos Veterinários.

Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG


Endereço: Rua Gabriel Monteiro da Silva, 700
Centro – Alfenas – Minas Gerais – Brasil – CEP:
37.130-001

Reitor: Sandro Amadeu Cerveira


Vice-reitor: Alessandro Antônio Costa Pereira
Sistema de Bibliotecas da UNIFAL-MG / SIBI/UNIFAL-MG
Autoras: Ana Cláudia Mesquita Garcia, Jessica Chagas Affonso
Gouveia, Marimar Mayworm Beck
Revisores: Carolinne Torres S. Dias, Huber Aristóteles N. da Gama
Filho
Editoração: Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG)
Autoras
Ana Cláudia Mesquita Garcia
Doutora. Enfermeira paliativista. Docente na Escola de
Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG).

Jessica Chagas Affonso Gouveia


Psicóloga. Médica Veterinária. Pós-graduada em Acupuntura e
Terapia Assistida por Animais. CBA em Gestão de Negócios.

Marimar Mayworm Beck


Mestre. Médica veterinária. Fisioterapeuta. Pós-graduada em
Acupuntura.

Revisores
Carolinne Torres S. Dias
Centro de Reabilitação Veterinária Flor de Lótus. Médica
Veterinária graduada pela Universidade de São Paulo (FMVZ-USP).
Doutora pela Universidade de São Paulo (FM-USP). Pós-graduação
em Dor e Cuidados Paliativos Veterinários. Coordenadora da pós-
graduação de Cuidados Paliativos e Tratamento da Dor do
instituto PAV - Medicina Veterinária.

Huber Aristóteles N. da Gama Filho


Centro de Reabilitação Veterinária Flor de Lótus. Médico
Veterinário pela Universidade de São Paulo (USP). Especialista em
Acupuntura Veterinária.
Sumário

Apresentação .................................................................................04
1. O que são Cuidados Paliativos? .........................................05
2. O que são Cuidados Paliativos Veterinários? ................06
3. Como os Cuidados Paliativos surgiram na Medicina
Veterinária? .............................................................................07
4. Princípios dos Cuidados Paliativos Veterinários..........08
5. A partir de que momento na história clínica do paciente
os Cuidados Paliativos Veterinários se tornam uma
opção?........................................................................................10
6. O papel das terapias complementares na abordagem
dos Cuidados Paliativos Veterinários ..............................11
7. Eutanásia .................................................................................12
8. Quem pode realizar os Cuidados Paliativos
Veterinários? ..........................................................................14
9. O que o tutor pode fazer pelo seu animal em Cuidados
Paliativos? ................................................................................15
10. Luto nos Cuidados Paliativos Veterinários.....................16
Considerações finais ....................................................................18
Referências .....................................................................................20
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APRESENTAÇÃO

CUIDADOS PALIATIVOS
VETERINÁRIOS
“A compaixão pelos animais está intimamente ligada à bondade de
caráter, e pode ser seguramente afirmado que quem é cruel com os
animais não pode ser uma boa pessoa.”
ARTHUR SCHOPENHAUER

O e-book Cuidados Paliativos Medicina Veterinária, por meio de uma


Veterinários é uma iniciativa do Projeto linguagem simples, clara e objetiva.
de Extensão “PaliAÇÃO: ciência fácil em Com este material, temos o intuito de
audiovisual” da Universidade Federal de explicar aos tutores de animais a
Alfenas (UNIFAL-MG), em conjunto com importância desta abordagem de
as Médicas Veterinárias Jessica Chagas cuidados para que saibam o que são os
Affonso Gouveia e Marimar Mayworm Cuidados Paliativos Veterinários e como
Beck. Este e-book tem como objetivo esta forma de cuidar pode contribuir
disseminar, entre a população, para a qualidade de vida do animal nos
informações a respeito da temática dos casos de doenças graves e progressivas.
Cuidados Paliativos (CP) no contexto da
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1. O QUE SÃO CUIDADOS


PALIATIVOS?
De acordo com a Organização
A palavra “paliativo” deriva do
Mundial de Saúde (OMS), os CP são
latim pallium, que significa manto ou
uma abordagem de cuidados
proteção. O pallium era um manto
oferecidos por uma equipe
protetor usado por viajantes da
multiprofissional (profissionais de
antiguidade para se protegerem das
saúde de diversas áreas) que têm
condições climáticas durante as
como objetivo melhorar a qualidade
viagens. Considerando este
de vida e aliviar o sofrimento (físico,
contexto, os CP humanos têm a
psicológico, social e espiritual) de
finalidade de proteger as pessoas
pessoas que enfrentam doenças
com doenças graves e seus
graves, debilitantes ou ameaçadoras
cuidadores dos sintomas
da vida, bem como de seus familiares
angustiantes destas enfermidades
(OMS, 2020).
(Garcia et al., 2022).

Pallium - manto
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2. O QUE SÃO CUIDADOS


PALIATIVOS VETERINÁRIOS?
cuidados intensivos por longo prazo
Aplicando este conceito na
(Magalhães; Angelo, 2021).
Medicina Veterinária, podemos
Os CPV procuram proporcionar
entender os Cuidados Paliativos
aos pacientes qualidade de vida,
Veterinários (CPV) como uma
bem-estar, conforto e dignidade até
abordagem de cuidados que busca
o fim da vida. Para os tutores e/ou
melhorar a qualidade de vida dos
cuidadores, ajuda na orientação
pacientes (animais) que enfrentam
sobre sua saúde mental e no apoio no
doenças graves e potencialmente
período de luto. Nesse sentido, os
fatais. Os CPV têm como objetivo
CPV têm como objetivo proteger os
tratar a dor e amenizar os sintomas
pacientes e seus cuidadores do
que interferem na rotina do animal,
sofrimento advindo de doenças
sendo de grande importância em
graves e doenças incuráveis
casos de diagnóstico de doenças
(IAAHPC, 2009).
incuráveis e que necessitem de
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3. COMO OS CUIDADOS
PALIATIVOS VETERINÁRIOS
SURGIRAM NA MEDICINA
VETERINÁRIA?
e tem como uma de suas funções a
Os CPV são um campo emergente,
publicação das diretrizes que
sendo que os primeiros debates
orientam a prática dos CPV
sobre o assunto ocorreram por volta
(Magalhães; Angelo, 2021).
da década de 1980 nos Estados
A inserção dos CP na Medicina
Unidos (Cohen, 2014). A Associação
Veterinária foi facilitada pelo fato de
Internacional de Hospice e Cuidados
que, principalmente nos dias atuais,
Paliativos Animal (International
os animais de estimação têm sido
Association of Animal Hospice and
considerados como membros da
Palliative Care - IAAHPC) promove
família (famílias multiespécie). No
apoio físico, emocional e espiritual
Brasil, os CPV ainda são pouco
aos cuidadores de animais com
conhecidos, no entanto, há uma
doenças graves e atua na educação
tendência de crescimento desta área
de profissionais e no
ao se considerar o aumento do
desenvolvimento de pesquisas na
número de animais de estimação e o
área de CP para animais
desenvolvimento da Medicina
(https://iaahpc.org/) (Cohen, 2014).
Veterinária (Magalhães; Angelo,
A IAAHPC foi estabelecida em 2009
2021).
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4. PRINCÍPIOS DOS
CUIDADOS PALIATIVOS
VETERINÁRIOS

Embora a avaliação da dor nos


Assim como nos CP para humanos,
pacientes veterinários não seja fácil,
os CPV também são orientados por
existem maneiras de se fazer isso,
princípios que devem nortear a
como, por exemplo, pelo histórico da
prática do profissional médico
condição do paciente, pela
veterinário (IAAHPC, 2009). Abaixo
observação do comportamento,
estão apresentados os princípios que
dentre outras.
orientam a prática dos CPV, de
O manejo da dor é de suma
acordo com o proposto pela IAAHPC
importância para os CPV, pois
(2009):
quando a enfermidade já está
instalada, a progressão da dor é lenta
e mais difícil de ser identificada e é
1. Alívio da dor
nessa fase que os CP entram para
Doenças graves podem causar uma
oferecer bem-estar e qualidade de
mistura de sofrimento físico e
vida ao animal.
emocional que são experimentados
pelos animais enfermos, em especial
2. Padrão de comportamento dos
aqueles em fim de vida. Sendo assim,
pacientes veterinários
é de grande importância o
É indispensável o conhecimento do
entendimento técnico do médico
comportamento de cada animal que
veterinário no controle físico da dor
está sendo cuidado pela abordagem
de seus pacientes, assim como
dos CPV, pois deve haver uma
habilidades extras, muitas vezes não
coerência de tratamento de acordo
aprendidas na faculdade, que levam
com cada indivíduo. A análise
em consideração técnicas de
cuidadosa do animal em relação ao
comunicação, empatia e compaixão
estado fisiológico e sua comunicação
para o entendimento e melhoria da
não-verbal são importantes, pois
qualidade de vida do tutor e seu
cada paciente tem a sua
animal, visando a parte psíquica do
individualidade. É importante
componente multifatorial da dor.
lembrar que os CPV podem
O controle da dor física é uma
beneficiar todos os animais, como
preocupação primária, pois os
por exemplo, cães, gatos, aves,
animais não conseguem se expressar
equinos, répteis, dentre outros.
como os humanos.
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idade afetam de forma negativa a


Os animais podem mascarar sua
condição de vida do paciente.
dor a fim de se resguardar, por isso a
Preservar a saúde do paciente é uma
observação deve ser minuciosa e
tarefa de extrema importância no
cautelosa, pois frequentemente há
contexto dos CPV.
sinais sutis que refletem os seus
sentimentos e sua condição física. Os
4. Bem-estar emocional
animais possuem diversos
O bem-estar emocional do animal
mecanismos que os levam a mascarar
é essencial. Para tanto, os CPV
a sua real condição de dor, tanto
buscam a prevenção e o alívio de
física quanto psíquica. O
estados emocionais negativos por
treinamento de veterinários em
meio do controle da dor, redução das
identificação e diagnóstico da dor é
fontes de ansiedade, minimização do
imprescindível para uma boa prática
tédio e do isolamento. É necessário
de CP, além do apoio de uma equipe
promover a felicidade do animal por
multidisciplinar. O uso de escalas de
meio do enriquecimento ambiental,
dor e de técnicas de comunicação
da interação humano-animal, do
precisam fazer parte da rotina diária
afeto e de boa alimentação.
de profissionais paliativistas. Desta
forma, tornamos essa avaliação mais
5. Colaboração e consenso
objetiva e palpável, tanto para a
É importante que o processo de
equipe que acompanha o paciente
tomada de decisão a respeito do
quanto para os tutores.
tratamento do animal seja realizado
de forma compartilhada entre
3. Avaliação da qualidade de vida
médico veterinário e tutor,
A qualidade de vida do animal
considerando os valores e crenças
envolve os aspectos relacionados ao
deste tutor, e, principalmente,
bem-estar, como os aspectos físico,
levando-se em consideração o bem-
social e emocional. Normalmente a
estar do paciente, com o respaldo
doença, a deficiência ou as
técnico.
alterações orgânicas relacionadas à
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5. A PARTIR DE QUE
MOMENTO NA HISTÓRIA
CLÍNICA DO PACIENTE OS
CUIDADOS PALIATIVOS
VETERINÁRIOS SE TORNAM
UMA OPÇÃO?
Os CPV são indicados nos Quando o animal apresenta
seguintes casos: alguma doença grave para a qual
Animais idosos que apresentem não há cura e/ou que já esteja em
algum comprometimento físico estágio avançado.
que tenha impacto em sua
qualidade de vida (a idade não é É importante ressaltar que os CPV
um indicador por si só, o que se podem ser realizados em domicílio ou
leva em conta são as alterações em clínicas ou hospitais veterinários,
orgânicas, físicas ou psíquicas mas sobretudo dependem de uma
causadas pela idade e o equipe e não apenas de um só
sofrimento que isto causa para o profissional. Por exemplo, o clínico
animal); geral paliativista pode atender por
A partir de um diagnóstico de uma vida inteira um paciente dentro
doença crônica, grave e destes preceitos, no entanto ao
modificadora da qualidade de precisarmos de cuidados
vida (insuficiência de sistemas e hospitalares em alguma fase
órgãos - rim, fígado, por exemplo, específica da doença, tudo pode ser
osteoartrose, doenças perdido se essa equipe de
neurológicas – cinomose, intensivistas não estiver
síndrome da disfunção devidamente alinhada e treinada de
cognitiva/“demência”, acordo com o proposto pelos
endocrinopatias, dermatites princípios dos CPV.
crônicas, entre outras);
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6. O PAPEL DAS TERAPIAS


COMPLEMENTARES NA
ABORDAGEM DOS
CUIDADOS PALIATIVOS
VETERINÁRIOS
As terapias complementares aplicação de agulhas em pontos
podem ser entendidas como um específicos do corpo), a moxabustão
amplo grupo de práticas terapêuticas (técnica da medicina chinesa que
que não fazem parte da medicina aquece regiões ou pontos de
alopática. Tais práticas vêm acupuntura no corpo através da
ganhando espaço inclusive na queima da erva medicinal), a
Medicina Veterinária. Associadas ao ozonioterapia (utilização do gás
tratamento médico convencional, as ozônio misturado ao oxigênio para a
terapias complementares têm por produção de antioxidantes naturais),
finalidade minimizar os sinais e dentre outras, podem ser
sintomas causados por diversas combinadas com a medicina
doenças (Medeiros, 2020; OMS, convencional (tratamento
2013). Terapias complementares medicamentoso, cirurgias, etc.) para
como a acupuntura (técnica da melhorar a qualidade de vida do
medicina chinesa que consiste na animal.
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7. EUTANÁSIA

De acordo com um dos princípios de método tecnicamente aceitável e


dos CP humanos apresentados pela cientificamente comprovado,
OMS, esta abordagem de cuidados observando sempre os princípios
afirma a vida e considera a morte éticos” (CFMV, 2013).
como um processo natural que faz A eutanásia é um procedimento
parte do ciclo da vida. Assim, os CP eticamente aceitável, porém não
não pretendem apressar e nem adiar deve ser a primeira opção de escolha
a morte. A abordagem dos CP é para a resolução da situação, e sim
contrária ao prolongamento do ser uma possibilidade nos casos
processo de morte com sofrimento quando não há mais meios de
(distanásia). Vale ressaltar que, na proporcionar qualidade de vida ao
abordagem dos CPV, o animal não animal. No contexto dos CPV e
será “abandonado” para morrer sem segundo o CFMV (2013), a eutanásia
tratamento. O que acontece é que a deve ser indicada quando o bem-
partir do momento que se identifica estar do animal estiver
que a condição do animal é grave, comprometido de forma irreversível,
progressiva e irreversível, tutor e sendo um meio de eliminar a dor e/ou
médico veterinário, por meio de um o sofrimento dos animais, os quais
processo de tomada de decisão não podem ser controlados por meio
compartilhada, podem optar por de analgésicos, sedativos ou de
mudar o foco do tratamento: uma vez outros tratamentos; e quando o
que o tratamento curativo não surte tratamento representa custos
mais efeito na mudança da evolução incompatíveis com a atividade
natural da doença, pode-se optar por produtiva a que o animal se destina
uma abordagem de cuidados que vise ou com os recursos financeiros do
o conforto, o alívio do sofrimento e a tutor (CFMV, 2013).
qualidade de vida do animal. Quando a eutanásia for a indicação,
Idealmente, o desejável é que assim de acordo com critérios técnicos
que uma doença grave seja identificados pelo médico
diagnosticada, a abordagem paliativa veterinário, é de responsabilidade
seja utilizada em conjunto com as deste profissional “esclarecer ao
terapias curativas. proprietário ou responsável legal
No entanto, no Brasil a eutanásia pelo animal, quando houver, sobre o
de animais não-humanos é permitida ato da eutanásia” (CFMV, 2012), bem
em casos específicos. No contexto da como permitir que os tutores
Medicina Veterinária, a eutanásia acompanhem a realização do
pode ser entendida como: “a indução procedimento, se estes desejarem.
da cessação da vida animal, por meio
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A eutanásia pode ser realizada no Ou seja, é proibida a eutanásia de


ambiente doméstico ou em cães e gatos de rua por órgãos de
clínicas/hospitais veterinários. O zoonose, canis públicos e
tutor deverá assinar um termo estabelecimentos similares, exceto
jurídico legal autorizando a em casos de doenças graves ou
realização do procedimento, além de enfermidades infectocontagiosas
que o relato de todo o procedimento incuráveis que coloquem em risco a
deverá constar em um prontuário saúde humana e de outros animais.
devidamente documentado e datado. Para doenças zoonóticas incuráveis
Vale ressaltar que é obrigação do como, por exemplo, a leishmaniose
médico veterinário respeitar os (que atualmente possui tratamento
motivos religiosos/espirituais e por meio dos Cuidados Paliativos
morais dos tutores. com a finalidade de controle dos
No ano de 2021, entrou em vigor a sintomas causados pela doença), a
Lei Federal sob o nº 14.228/2021 eutanásia não pode ser a única e nem
(Brasil, 2021), que “dispõe sobre a primeira opção nestes
proibição da eliminação de cães e estabelecimentos.
gatos pelos órgãos de controle de É importante ressaltar que o tutor
zoonoses, canis públicos e e o médico veterinário devem
estabelecimentos oficiais conversar sobre o quadro clínico do
congêneres, salvo as disposições paciente para juntos decidirem qual a
específicas que permitam a melhor opção de tratamento, visando
eutanásia”. ao conforto, ao bem-estar e à
qualidade de vida do animal.
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8. QUEM PODE REALIZAR


OS CUIDADOS PALIATIVOS
VETERINÁRIOS?
Se colocar à disposição para
De acordo com a IAAHPC (2009), a
momentos críticos que possam
equipe que presta CPV deve contar
surgir;
com a presença de médicos
Orientar o cuidador com os
veterinários de diferentes
cuidados domiciliares; e
especialidades. Apesar de os CPV
Discutir e esclarecer todas as
estarem em grande expansão, ainda
opções de cuidados.
não há legislação ou orientações de
órgãos competentes a respeito do
Vale ressaltar que de acordo com
assunto no Brasil.
a Lei do exercício profissional da
O papel do médico veterinário
profissão de médico veterinário (Lei
consiste em:
Nº 5.517, de 23 de outubro de 1968),
Proporcionar qualidade de vida
como disposto no Capítulo II, Art. 5º,
ao animal;
é da competência privativa do
Respeitar os desejos do tutor;
médico veterinário o exercício da
Respeitar os limites emocionais e
prática clínica em todas as suas
financeiros dos tutores;
modalidades (Brasil,1968).
Esclarecer a situação real do
diagnóstico e prognóstico;
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9. O QUE O TUTOR PODE


FAZER PELO SEU ANIMAL
EM CUIDADOS PALIATIVOS?
Compartilhar individualidades do Realizar passeios curtos e
seu animal com o médico determinados pelo médico
veterinário; veterinário;
Organizar a medicação em Se o paciente for cadeirante,
horários determinados por meio realizar os exercícios na
de planilhas, dentro da posologia cadeirinha ou andadores para
determinada pela equipe de que o animal possa se sentir
médicos veterinários, melhor;
responsabilizando-se pela Passar tempo com o animal, como
correta administração de tais forma de carinho, atenção, zelo e
medicamentos e afins. compaixão por ele;
Realizar mudança de decúbito Auxiliar na hidratação,
para evitar lesões por pressão e alimentação, locomoção e outras
acúmulo de secreções (em atividades necessárias;
pacientes acamados); Filmar e anotar informações úteis
Realizar exercícios que possam para o médico veterinário
melhorar a respiração; acompanhar o desenvolvimento
Promover higiene física e oral; do quadro clínico, como: dor
Fazer exercícios físicos no animal física, falta ou ausência de
(sob orientação do médico apetite, dificuldade respiratória,
veterinário); perda de mobilidade,
incontinência, náuseas e vômitos.
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10. LUTO NOS CUIDADOS


PALIATIVOS VETERINÁRIOS
Os seres sencientes (aqueles Vale ainda ressaltar que o pesar
capazes de sentir sensações e não ocorre apenas após a morte do
sentimentos de forma consciente) animal. Existe o Luto Antecipatório,
possuem a capacidade de construir algo comum no contexto dos CP
fortes vínculos afetivos com outros humanos, que consiste na
seres, principalmente com aqueles apresentação de pensamentos sobre
que nos acompanham ou cuidam de como será a vida sem aquele ser
nós nos primeiros anos de vida. (Arantes, 2019), assim que se recebe
Somos programados biologicamente um diagnóstico ruim.
para exteriorizar ações que Na cultura ocidental, as pessoas,
despertam e mantêm a proximidade de forma geral, não são preparadas
do cuidador. Como ferramenta na para lidar com as perdas, e no caso
compreensão dos vínculos, o apego é dos animais de estimação isso se
uma característica presente nas torna um transtorno maior devido à
relações que apresentam vínculo sociedade ainda não reconhecer
afetivo (Vieira, 2019). como legítima a dor das pessoas que
Ao cuidar de um animal apreciado perdem um animal de estimação,
por uma família, pode-se sendo então considerado pelo que
testemunhar a presença de um Kenneth Doka denominou luto não
vínculo afetivo entre o tutor e o seu reconhecido (Casellato, 2015).
querido animal de estimação. A Muitas vezes, os próprios médicos
vivência do luto devido a morte de veterinários não sabem como acolher
um animal de estimação, um o tutor em seu sentimento de perda
processo doloroso causado pelo vivenciado pelo luto de um animal de
rompimento de um vínculo afetivo estimação. Esse fato e a questão de
entre tutor e animal, pode levar a não se possuir um sistema de apoio
respostas físicas, emocionais e propício para esse processo de luto
comportamentais (Vieira, 2019). Este faz aumentar a chance de ocorrer o
luto é legítimo e deve ser Transtorno de Luto Prolongado, que
reconhecido e respeitado, de modo pode ser entendido como uma
que experimentar a dor e poder desorganização emocional
expressá-la são parte de um prolongada, a qual impede a volta a
processo natural e saudável de uma rotina de vida normal.
vivência do luto (Lesnau; Santos,
2013; Vieira, 2019).
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Como afirmam Rodrigues e Labate considerando o crescente número de


(2012): “Negar a morte pode passar pessoas que adoecem em função de
uma ideia de força e controle. uma excessiva carga de sofrimento
Entretanto, uma perda seguida de sem possibilidade de elaboração, o
uma precária ou ‘má’ elaboração do que afeta também os profissionais de
luto – quando não se permite a saúde que lidam com o sofrimento
expressão da tristeza e da dor – traz alheio e que, frequentemente, não
graves consequências, como a maior têm espaço para cuidar de seu
possibilidade de adoecimento”. próprio sofrimento (Rodrigues;
Nesse contexto, o luto mal Labate, 2012).
processado tem se tornado um
problema de saúde pública,

Fonte: @petlosspsychologist
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os CPV têm beneficiado tanto os Os CPV ainda estão em
animais quanto os humanos (os desenvolvimento, também por
tutores e os próprios médicos isso,esta é uma abordagem de
veterinários), considerando seus cuidados ainda pouco conhecida,
objetivos de melhorar a qualidade de inclusive dentre os próprios
vida, gerar bem-estar e aliviar o profissionais veterinários. Assim,
sofrimento do indivíduo. Assim, esta esta publicação buscou apresentar
abordagem de cuidados tem trazido de forma breve a importância dos
avanços para o tratamento da dor, de Cuidados Paliativos, especificamente
enfermidades graves, para pacientes na Medicina Veterinária. Vale
com necessidades especiais e, até ressaltar que esta abordagem de
mesmo, para os animais idosos com cuidados visa aliviar o sofrimento
alguma disfunção ou doença crônica. não apenas dos animais, mas também
Para um cuidado adequado é de seus tutores, inclusive durante o
necessária uma equipe período de luto, e também da própria
multiprofissional, sendo de suma equipe médico-veterinária, por ter
importância um grupo profissional suas angústias e dores como
unido e coeso, para que o tratamento profissionais técnicos da área da
tenha êxito, atingindo os resultados saúde e dos cuidados, também
esperados. acalentadas.

Esperamos que muitos animais (humanos e não-humanos)


possam se beneficiar deste material!
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Fonte: @janegoodallcan

“Quando você passa a vida de uma forma


significativa com um cachorro, gato, coelho,
cavalo, porco, pássaro, sabe muito bem que
não somos os únicos seres no planeta com
personalidades, mentes e emoções, e amor”.
Jane Goodall - ativista pela conservação e proteção animal
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REFERÊNCIAS

Arantes ACQ. A morte é um dia que Conselho Federal de Medicina


vale a pena viver. Rio de Janeiro: Veterinária. Guia Brasileiro de Boas
Editora Sextante, 2019. Práticas em Eutanásia em Animais:
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