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CHARGES1
Introdução
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A produção deste trabalho está vinculada a dois projetos de pesquisas desenvolvidos na Universidade
Estadual de Londrina. O primeiro deles, denominado Gêneros Discursivos e Argumentação e, o segundo,
PAD II – pesquisas em Análise de Discurso: diversidade e desigualdade social – a inclusão/exclusão do
sujeito na/pela história,coordenados, respectivamente, pelas professoras Esther Gomes de Oliveira e
Rosemeri Passos Baltazar Machado.
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Ana Carolina Bernardino, Mestranda bolsista (CAPES) do Programa de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Londrina – UEL – Londrina, Paraná, Brasil. E-mail:
a.carolina.bernardino@gmail.com.
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Talita Canônico e Silva, Doutoranda do Programa de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual
de Londrina – UEL – Londrina, Paraná, Brasil. Docente do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico no
Instituto Federal do Paraná – IFPR – Campus Londrina, Paraná, Brasil.E-mail:
talita.canonico@gmail.com.
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linguagem e os recursos argumentativos ao visarem à persuasão; à construção e
veiculação da ideologia; às vozes e aos silenciamentos que ecoam no discurso
produzido em condições de produção específicas, conforme certa formação discursiva.
As formações sociais e culturais estão sofrendo mudanças para se manterem na
sociedade atual. Um dos responsáveis pela manutenção do poder, por meio da
manipulação ideológica, são os meios de comunicação – a mídia, além das instituições
como escola, igreja e estado. A manipulação apresenta sua utilização entre os
indivíduos, em que um controla o outro sem seu consentimento. Nesse sentido, o
manipulador, a partir de sua própria ideologia, visa moldaros comportamentos e crenças
do manipulado,que não se vê como objeto de manipulação, pois acredita seguir aquele
caminho por vontade própria; no entanto, não é bem isso que acontece, já que
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meios de comunicação. Por fim, elaboramos algumas considerações a respeito do que
foi apresentado.
O campo do humor: a charge e seus sentidos
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As charges selecionadas para análise fazem analogia à manipulação midiática,
revelando o poder dos meios de comunicação ao influenciar sujeitos, por isso, a seguir,
faremos considerações a respeito de discurso, argumentação e manipulação.
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Consideramos as ideologiasum conjunto de visões que orientam o
comportamento social dos sujeitos, justificando/explicando a sociedade. A ideologia se
manifesta por meio do discurso e consiste na produção de ideias, nas condições sócio-
históricas em que elas são produzidas e disseminadas. E, segundo Baccega (2007, p.
34),
De acordo com Van Dijk (2017, p. 18), “o controle se aplica não só ao discurso
como prática social, mas também às mentes daqueles que estão sendo controlados, isto
é, aos seus conhecimentos”. Nesse sentido, a mídia usa de seu poder para manipular os
sujeitos, a partir das ideologias que acreditam.
Em seu livro Discurso e poder, Van Dijk (2017, p. 240) aponta que “manipular
pessoas envolve manipular suas mentes”, isso é possível de ser identificado graças a
estudos cognitivos, feitos em laboratórios, que mostram que a interpretação e a
compreensão dos discursos podem ser influenciadas pela forma como o contexto é
manipulado, ou seja, os discursos ficam armazenados em nossa memória de curto prazo.
Algumas estratégias são usadas para que isso ocorra, como por exemplo, o fato de as
manchetes dos noticiários serem escritas em destaque, fazendo com que os leitores
prestem atenção em determinada representação visual.
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Van Dijk (2017, p. 251) acrescenta:
Isso é evidente porque nossa mente trabalha de forma estratégica, de acordo com
a maneira como recebe determinado discurso.
Nas charges em análise, há um conjunto de imagens e palavras capazes de
persuadir o interlocutor a compreender a mídia como manipuladora. A persuasão ocorre
por meio da linguagem (recursos argumentativos), pelo apelo à emoção; Abreu (2006)
diferencia convencer de persuadir, destacando o convencimento como o gerenciamento
da informação e a persuasão como o despertar da emoção do outro, dessa forma, ao ser
convencido, o sujeito forma uma opinião e, ao ser persuadido, ele realiza a ação
conforme foi manipulado. Podemos chamar de argumentação a soma do ato de
convencer e de persuadir.
O campo do humor utiliza a ambiguidade como forma de ironia, quanto a isso
Fiorin (2017) destaca que “a maior parte dos termos da língua não é unívoca. Ao
contrário, as palavras possuem vários significados. É essa propriedade da linguagem
que permite os jogos de palavras”. O autor também esclarece sobre o silêncio,
afirmando ser um valioso recurso argumentativo, pois, apenas por meio de gestos ou
imagens é possível manifestar sentidos. A seguir, estudaremos as charges selecionadas a
fim de demonstrar como a argumentação e a ideologia do gênero direcionam os sentidos
a respeito da manipulação midiática.
Análise do Corpus
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consciência, visto que tais separações não foram produzidas pela
teoria nem pela consciência, mas pelas relações sociais de produção e
suas representações pensadas.
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Figura 4: Fonte: Tribuna da Internet (2018).
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O ‘controle da mente’ envolve muito mais do que apenas a
compreensão da escrita ou da fala; envolve também o conhecimento
pessoal e social, as experiências prévias, as opiniões pessoais e as
atitudes sociais, as ideologias e as normas ou valores, entre outros
fatores que desempenham um papel na mudança de mentalidade das
pessoas (VAN DIJK, 2017, p.20).
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Conforme o texto verbal “não penso, não existo, só assisto”, podemos interpretar
o sentido, demarcado pela gradação crescente dos termos, de que o sujeito não pensa,
pois recebe tudo pronto, e não existe pelo fato de não pensar, porque está limitado ao
ato de, somente, assistir – sentido de restrição demarcado pelo operador argumentativo
“só”. Essa gradação está estruturada em paralelo, recurso de intensificação denominado
paralelismo sintático, construído, neste caso, por advérbio (não/ só) seguido de verbo
(penso/ existo/ assisto).
Paralelismo sintático: advérbio + verbo
Não penso
Não existo
Só assisto
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A partir da interpretação do textoverbal e não verbal, verificamos que a
manipulação não ocorre, somente, da mídia para o interlocutor e, sim, há um exercício
de manipulação da ideologia dominante (política, economia) para os meios de
comunicação que, por sua vez, manipulam, pois“a ideologia dominante de um
determinado período costuma ser a ideologia dos que controlam os meios de reprodução
ideológica, especificamente, a classe dominante” (VAN DIJK, 2017, p. 47). Charaudeau
também ressalta (2015, p. 252): “as mídias manipulam de uma maneira que nem sempre
é proposital, ao se automanipularem, e, muitas vezes, são elas próprias vítimas de
manipulações de instâncias exteriores”.
Em análise ao texto verbal, constatamos o uso da linguagem por meio de
estratégias discursivas e argumentativas. Os verbos no imperativo (fale, finja)
evidenciam o posicionamento de autoridade do sujeito diretor, impedindo que o sujeito
âncora tenha qualquer outra atitude a não ser obedecê-lo, propondo um exercício de
neutralidade ilusória. A construção “fale sério, pausadamente e finja que sempre fomos
preocupados com isso!”, semanticamente, denota uma gradação crescente de sentidos,
em que “fingir” corresponde a um patamar mais significativo que “falar sério” e “de
forma pausada”, tanto que o verbo “fingir” está destacado em negrito – recurso gráfico
argumentativo. O advérbio “sempre” intensifica a carga semântica de “preocupados”,
revelando, na verdade, a falta de preocupação com o tema, pois a informação será
transmitida como importante, independentemente de ser considerada relevante ou não
pelos sujeitos que a transmitem.
Ao observar a data de veiculação da charge, mecanismo contextualizador,
relacionamoso tema “fakenews” ao ano político de 2018, enunciando a formação
discursiva e a condição de produção, pois, nesse período, as redes sociais foram
tomadas por compartilhamento de notícias falsas a respeito dos candidatos a cargos
políticos, gerando muitos problemas e, consequentemente, a divulgação dessa questão
pela mídia.
Com a análise das quatro imagens, focalizamos a função do gênero chargístico
em denunciar a manipulação midiática, deixando evidente o controle sobre os
indivíduos que as consomem. Para causar tais efeitos de sentido, os discursos apelam
para o conhecimento de mundo (fantoches são manipulados; o animal “burro” é
comandado por alguém; frase de autoria do filósofo René Descartes; e o acesso às redes
de entretenimento, onde notícias falsas são, geralmente, disseminadas). Em duas das
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análises, o texto verbal é combinado às imagens a fim de fortalecer a argumentação. Ao
compreender a ironia revelada pelas charges, é possível apreender o sentido da mídia
como detentora do poder.
Considerações
Com este trabalho foi possível constatar que o discurso midiático é responsável
por controlar a mente das pessoas para que consigam dominar suas ações. Nesse
sentido, para os indivíduos que estão no poder, é fundamental que consigam administrar
os discursos proferidos na sociedade, em específico, os discursos midiáticos, abordados
nesta pesquisa. Essa manipulação ocorre, justamente, porque as mentes podem ser
controladas/manipuladas, já que a informação funciona, segundo Charaudeau (2015)
como uma máquina humana, pois os níveis de produção e de recepção são níveis
humanos, dotados de intencionalidade e disseminadores de sentidos.
Referências
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ABREU, Antônio Suárez. A arte de argumentar: gerenciando razão e emoção. 9. ed.
Cotia: Ateliê Editorial, 2006.
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RUIZ, Mariana. Blog da Mariana Ruiz: alienação midiática. Disponível em:
<http://www.marianaruiz.com.br/2016/06/alienacao-midiatica/nao-penso-nao-existo-so-
assisto/>. Acesso em: 20 de jan. 2018.
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