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TÓPICOS DE ANÁLISE EM FERNANDO PESSOA - POESIA DO ORTÓNIMO

O fingimento artístico: O ortónimo escreve de acordo com o seguinte processo: sente


(sentimento, coração). pensa sobre o que sentiu (pensamento, razão, «fingimento» -
que não é mentira, mas intelectualização e transformação mental do que sentiu) e, só
no final, escreve. Portanto, o que está escrito não é o resultado de um sentimento
efetivamente sentido, mas de um já transformado pelo pensamento, pelo que poderá
nem ter existido realmente, sendo fruto apenas de uma criação intelectual.
A dor de pensar: o sofrimento que o poeta adulto sente por ter uso da razão e da
consciência. Uma consciência que obriga o poeta a uma racionalização constante, que
se sobrepõe a tudo e anula o domínio de quaisquer sentimentos ou da simples
inconsciência. Por isso mesmo, deseja, por vezes, não pensar e manter a inconsciência
de uma criança, de uma pessoa inculta, de um não-poeta, de um gato, entre outros,
chegando a atingir o paradoxo de desejar ser inconsciente tendo consciência disso.
Sonho realidade: este dois mundos são sempre apresentados ao leitor (porque
sentidos assim pelo poeta) contraste e oposição. O «sonho» é, regra geral, conotado
com ideal, liberdade, perfeição, plenitude. A realidade é o factual, o inevitável, o
quotidiano físico em que vive o poeta e que lhe causa frustração, sofrimento e
desequilíbrio
A nostalgia da infância: A infância é um período de vida recheado de momentos
felizes, plenos e maravilhosos. Porém, sendo trazida por um som, uma visão ou
sensação, a referida infância vem intensificar o contraste entre um passado longínquo
e um presente (idade adulta), tão próximo do poeta quanto fonte de problemas. Por
conseguinte, ao recordar esse passado infantil, o poeta evoca espaços, pessoas e
vivências que hoje, para sua tristeza e imensa saudade, são apenas memórias, não
factos.

• O facto de considerar a infância um tempo de felicidade pode também levá-lo a


evocar memórias de uma infância que realmente não viveu, que apenas
reconstruiu por meio da ação do pensamento e que serve de contraponto à
realidade, permitindo uma fuga «intelectual» no tempo.
LINGUAGEM E ESTRUTURA

• Antítese: «Sinto mais longe o passado. / Sinto a saudade mais perto»;


• Antítese, apóstrofe: «O que em mim sente 'stá pensando. [...]/ Ah, poder ser
tu, sendo eu! / Ter a tua alegre inconsciência, / E a consciência disso! O céu!»;
• Anáfora: «Nem realidade para além dos bastidores / Nem realidade real em
quem vê»;
• Metáfora: «Chegou onde hoje habito / A casa que hoje sou.»;
• Personificação: «Entrai por mim dentro! Tornai / Minha alma a vossa sombra
leve! / Depois. levando-me, passai!»; - hipálage: «No plaino abandonado»;
• Sinestesia: «A tua incerta voz ondeando!»;
• Anáfora, antítese: «Não sei se é sonho, se realidade, / Se uma mistura de sonho
e vida»;
• Enumeração e metáfora: «Antigamente falava / De fadas, elfos e gnomos:/Hoje
fala só da escrava/ Indecisão que nós somos.»;
• Enumeração, gradação, antítese: «A ciência, a ciência, a ciência... / Ah, como
tudo é nulo e vão! / A pobreza da inteligência / Ante a riqueza da emoção!»;
• Interrogação retórica: «E eu era feliz?»;
• Hipérbato, metáfora: «E assim nas calhas de roda / Gira, a entreter a razão, /
Esse comboio de corda / Que se chama coração.».
ALBERTO CAEIRO-POESIA HETERONIMOS
Pessoa tem consciência de que, dentro de si, existem outros «eus» que sentem e
pensam de maneira diferente. Mas não só sentem e pensam como também escrevem
de maneira diferente da do ortónimo.
Fingimento artístico:

• Poeta bucólico
• Aprecia solitude e o silencio dos ambientes rurais
• Aprecia a natureza e a profissão ligada a ela pastor, guardador de rebanhos
• Conhece a realidade por meio dos sentidos
Reflexão existencial:

• O primado das sensações


• Deambulação pela natureza, sente apenas o que lhe e dado pelos sentidos
• Ausência total de pensamento
• Ausência de filosofia
• Sensações vividas como se fossem as primeiras
CANTIGAS DE AMIGO: Sujeito poético amigo e amiga
Temas:
Variedade do sentimento amoroso:

• triste e saudosa do amado que se ausentou e expectante pelo seu regresso ou


pela vinda a um encontro combinado:
• apaixonada e feliz por ser correspondida ou por poder dançar para ser vista e
notada pelo pretendente numa romaria;
• desconfiada e triste, por temer uma traição ou o fim da relação;
• temerosa da mãe, que poderá descobrir que esta lhe mentiu sobre a sua
relação com o amado ou sobre um encontro que tiveram às escondidas.
Confidência amorosa:
• diálogos com a mãe, as irmãs, as amigas ou ainda a Natureza sobre os seus
sentimentos relativamente ao amado presente ou ausente; monólogos de
verbalização do sentimento amoroso, feliz ou frustrado.
• conselhos da mãe, mais experiente, relativamente ao desenrolar da relação
amorosa
Relação com a Natureza:

• a Natureza (campestre ou marítima / fauna e flora) está de acordo com o


estado de espírito da jovem, tornando-se até um prolongamento desse estado;
• como confidente, a Natureza surge frequentemente personificada. Ambientes
(espaços, protagonistas e circunstâncias)
Ambientes (espaços, protagonistas e circunstâncias):

• Situações de vida popular em ambiente rural (campo, monte, fonte, rio, mar),
lugares de romaria, a casa (ambiente doméstico).
• A donzela, as amigas, as irmãs, a mãe, o «amigo» (amado ou pretendente).
• As vivências quotidianas relacionadas com a experiência do amor -a iniciação
ao amor, o encontro amoroso. a ausência do amado.
Linguagem, estilo e estrutura Caracterização formal

• As estrofes (também designadas coblas) normalmente são breves;


• A presença de refrão; - o recurso ao paralelismo;
• A regularidades estrófica e métrica: - uso de rima.
• O tipo de composição mais característico na lírica galego-portuguesa é a
cantiga paralelística com refrão e leixa-pren
• O paralelismo corresponde aos seguintes processos: - a repetição dos dísticos,
alterando uma palavra; - repetição integral de versos (o 1.° verso da 3.° estrofe
retoma o 2.° verso da 1.° estrofe e assim sucessivamente), processo que se
intitula leixa-pren.
CANTIGAS DE AMOR: Sujeito poético trovador da corte e minha senhor.
Temas:

• Coita de amor: - sofrimento amoroso que pode levar o trovador à sensação de


estar a enlouquecer ou ao desejo de morrer, por motivos vários - a senhor não
corresponde ao seu sentimento, está ausente, causa-lhe mais desamor do que
amor.
• Elogio / Amor cortês: - a senhor é apresentada como uma deusa a quem o
trovador serve como seu vassalo.
Ambientes (espaços, protagonistas e circunstâncias):

• Espaços nobres, palacianos ou cortesãos.


• A senhor surge como uma mulher ideal, de beleza excecional, conhecedora de
todas as regras de comportamento social. É descrita com um tal grau de
perfeição que parece imaterial e idealizada. Frequentemente, esta é uma
mulher casada, o que a torna inacessível para o trovador.
• O poeta servidor canta a beleza e as qualidades da sua senhor, expressa-lhe o
seu amor a que ela é indiferente.
Linguagem e estilo:

• Composições com número variável de estrofes.


• Dominam as composições sem refrão (cantigas de mestria, de influência
provençal) ou as cantigas de refrão.
• Existe progressão de sentido.
• Linguagem mais próxima da provençal (sul de França): coita, pesar, dor, premar
(termos referentes ao sofrimento amoroso): prez (honra, reputação); senhor.
• Recursos expressivos, tais como a comparação e a personificação.
CANTIGAS DE ESCARNIO (pessoa criticada identificada) E MALDIZER (pessoa criticada
não e identificada): Sujeito poético: Trovador ou jogral (membro do povo que vai à
corte para divertir os cortesãos)
Temas:
Paródia do amor cortês: louvor à mulher amada (nobre, cortesã ou real), mas com
ironia e sarcasmo, exaltando as suas faltas. os seus defeitos e as suas características
físicas ou de personalidade, que o autor quer denunciar; - crítica ao tópico da coita de
amor, que se apresenta como um fingimento.
Crítica de costumes: toda a sociedade medieval é alvo de críticas: todos os que o
trovador entender criticar pela denúncia de escândalos e perversidades - mulheres e
homens do povo, nobres, religiosos, o rei e outros jograis.
Ambientes (espaços, protagonistas e circunstâncias): Espaços sociais diversos por
onde circulam as figuras criticadas pelo trovador ou pelo jogral.
Linguagem e estilo:

• Críticas por meio de sátiras e sarcasmos; recurso a calão; trocadilhos e seleção


de vocábulos que surtem efeitos cómicos.
• Recursos expressivos, nomeadamente a comparação, a ironia e a
personificação.
CRONICA D JOAO I
Testemunhamos a afirmação da consciência coletiva, ou seja, o papel do povo, como
herói coletivo, que age unido por um mesmo propósito, acudindo ao Mestre (quando
julga que o querem matar, insurgindo-se contra D. Leonor, acusando-a de traição) e
resistindo durante o cerco à cidade de Lisboa.

• Manifestação de sentimentos de pertença a um grupo - a nação -, assente no


reconhecimento da autonomia política
• Ação popular coesa na defesa da independência nacional face a Castela e no
apoio ao Mestre de Avis
• Valorização da «terra», da identidade nacional e da vontade popular em
detrimento da sucessão dinástica Demonstração de coragem, abnegação e
patriotismo durante a guerra civil com Castela e o cerco de Lisboa
Na mesma crónica, verificamos a presença de atores individuais e coletivos: os
primeiros são o Mestre de Avis e Álvaro Pais; os segundos correspondem à «arraia
miúda» (populares), que se juntam, como força unificada, para defender com as
próprias mãos a sua terra, fundando o sentimento nacional.
Capitulo 115
O cenário está instalado: el-Rei de Castela decide cercar a cidade de Lisboa, que estava
de antemão preparada; quando o Mestre sabe da intenção do rival castelhano. ordena
que:

• os homens recolham a maior quantidade de alimentos possível;


• os homens vão de «barcas e batéis» ao Ribatejo, de onde trazem mantimentos;
• os lavradores e as suas famílias entrem na cidade cercada com todos os seus
pertences, bem como todos os outros que se queiram juntar;
Descrição da cidade cercada (e fortificada):

• muros robustos com suas «quadrilhas» (partes do muro protetor): 77 torres


em redor, coberturas de madeira: «lanças e dardos», «bestas de torno»,
«viratões» (arcos e setas de grande alcance) e catapultas; pedras e bandeiras
de S. Jorge (um dos padroeiros da cidade de Lisboa); - torres guardadas por
«senhores e capitães», «fidalgos e cidadãos honrados», -besteiros e homens
d'armas»;
• quando o sino das torres toca, os guardas deixam-nas a outros vigias e
aprontam-se para combater os inimigos;
• os «mesteirais» (artesãos) saem de suas oficinas e correm com as armas que
têm à mão: os restantes populares juntam-se à defesa e acorrem em multidões
aos muros com trombetas e gritos de apoio, espadas e lanças, sem temer o
inimigo;
• os clérigos e os frades da Trindade (contrariando as Leis da Santa Igreja) lutam
com o que têm à mão; todas as portas da cidade estão protegidas e a dificultar
a entrada de inimigos: - muros novos e proteções são construídos com pedras
que as mulheres recolhem nos campos;
• todos - fidalgos e populares, mesteirais e demais - vivem em amigável
comunhão na defesa de um objetivo comum: defender a sua cidade e expulsar
os castelhanos.
Capitulo 11

• O pajem do palácio vai a cavalo gritar ao povo que estão a matar o «Mestre de
Avis nos Paços da Rainha».
• Os populares da cidade, ao ouvirem tal notícia, alvoroçam-se e começam a
servir-se das armas que têm à sua disposição para acudir o Mestre.
• Álvaro Pais já vem pronto para o combate com uma «coifa» (parte da armadura
que protegia a cabeça) e um cavalo
• Álvaro Pais traz outros fidalgos armados que incitam a multidão a ajudar o
Mestre, pois era filho de D. Pedro (com D. Inês de Castro).
• A multidão é tanta e tão ruidosa que circula pelas ruas principais e secundárias,
atalhos e por onde possa para chegar ao Paço, sempre com Álvaro Pais à
cabeça, dizendo que matam o Mestre sem ele ter culpa de nada.
• Circula pelo povo a ideia de que fora a própria regente, D. Leonor Teles (com a
orientação do fidalgo galego com quem vivia, o Conde Andeiro), que mandara
matar D. João.
• Populares chegam ao palácio e veem as portas fechadas: começam a gritar
pelo Mestre e a dizer que estão prontos a arrombar as portas ou a incendiar o
Paço: já alguns populares vêm com escadas para subir às janelas e outros
rodeiam ameaçadoramente o Paço.
• Armas de que se serve o povo: «feixes de lenha» e «carqueija» para incendiar
o muro.
• Vozes bradam repentinamente, de dentro do Paço, dizendo que o Mestre está
vivo e que D. João Fernandes (Conde Andeiro) está morto.
• A multidão pede para ver o Mestre e confirmar; o Mestre mostra-se à janela,
dizendo que está vivo e bem.
• Povo deseja também a morte da regente «aleivosa», mas Leonor Teles e os
seus aliados conseguem fugir do Paço.
• Mestre sai do palácio, acompanhado de Álvaro Pais e seus cavaleiros, e pede
aos populares que regressem a casa, pois já fizeram ali a sua parte.
Capitulo 148

• O cerco prolonga-se e começam a faltar os mantimentos - cresce nos sitiados a


sensação de «míngua», falta do alimento que lhes permite manter o corpo
robusto.
• As privações começam a atingir também nobres e religiosos.
• O trigo escasseia, os cercados começam a comer «pam de bagaço d'azeitona, e
dos queijos das malvas e raízes d'ervas» e tudo o que a Natureza dá,
comestível ou não; há ainda os que escavam a terra à procura de uns grãos de
trigo.
• A comida falta, dando origem a querelas e a inimizades entre os sitiados, ainda
que diligentes e corajosos sempre que repicam os sinos a anunciar ataques
castelhanos; ainda assim, alguns homens resignam-se e, cheios de fome e
sofrimento, tentam consolar-se com inúteis palavras e lamentos.
• Todos se ajoelham na terra e pedem a Deus misericórdia ou então a própria
morte.
• O Mestre e o seu Conselho condoem-se, mas nada podem fazer, pois também
eles passam privação.
• O povo queixa-se de dois tipos de inimigos: os castelhanos, que os cercavam de
fora, e a escassez de alimentos, que os matava aos poucos dentro das
muralhas.
• Reflexão final de Fernão Lopes: chama à atenção dos outros e futuros
portugueses que não participaram em tal sofrimento e flagelo para porem os
olhos na confiança, na devoção e no patriotismo (até à morte) destes cercados
obedientes e tão sofredores.
• O cerco acabará quando a peste começar a vitimar sitiados e sitiantes,
regressando os castelhanos a sua terra.

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