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10.º ano
Poesia Trovadoresca
Contextualização histórico-literária
A poesia trovadoresca situa-se na idade média. Os trovadores trouxeram consigo a afirmação do
sentimento amoroso. Cantaram o chamado amor cortês, que era um lirismo de devoção a uma dama,
quase sempre mulher casada. Era uma forma de servidão à sua senhora e, ao mesmo tempo, uma
libertação do amor platónico ou erótico, através do qual o trovador divinizava o objeto do seu amor.
Cantigas de amigo
Nas cantigas de amigo, o sujeito lírico é uma jovem donzela que exprime sentimentos amorosos
relativamente ao amigo ou namorado. Caracteriza-se pela simplicidade, mas exprime uma diversidade de
sentimentos e estados emocionais, normalmente relacionados a cenários do campo, do rio e do mar. Os
poemas estão associados à partida do amigo, à ausência deste e à saudade. A jovem apaixonada toma a
amiga ou a mãe como confidente. Por vezes, também se identifica com a naturesza, tornando-a sua
confidente. A relação com os elementos da natureza comprova a origem natural da cantiga e reaqlça a
autenticidade do sentimento expresso.
Temas:
Variedade do sentimento amoroso:
• saudosa e expectante pela ausência do amado;
• triste e saudosa pela partida do amado;
• feliz a dançar com as amigas em romarias, para seduzir os moços ou porque são
correspondidas;
• desconfiada e triste, por temer uma traição;
• temerosa da Mãe, por lhe mentir sobre a sua relação com o amado.
Confidência amorosa:
• diálogos com a Mãe, as irmãs, as amigas ou ainda a Natureza sobre os seus
sentimentos do momento relativamente ao amado presente ou ausente;
monólogos de verbalização do sentimento amoroso, feliz ou frustrado.
Quanto à forma:
Cantigas de mestria- sem refrão;
Cantigas de refrão- apresentam repetição de um ou mais versos no final de cada estrofe;
Cantigas paralelísticas- cantigas com refrão que apresenta a mesma ideia em versos alternados,
com pequenas variações verbais nos finais desses mesmos versos (leixa-prem).
Convém distinguir:
Paralelismo perfeito ou puro- a repetição tem encandeamento (2º verso de uma estrofe é o 1º da
estrofe alternada sequente);
Paralelismo imperfeito- a repetição está isolada.
Em suma:
Cantigas de amor
Nas cantigas de amor o tema central é o amor e o sujeito poético é um homem que expressa os seus
sentimentos por uma “senhor”, oriunda de um estatuto social superior. Nestas cantigas cultiva-se o amor
cortês em que a mulher amada é louvada, hiperbolicamente, com linguagem formal e respeito. O poeta
afirma que sofre por amor (a “senhor” não lhe corresponde, está ausente) e, por isso, tem coita de amor.
Temas:
Coita de amor: sofrimento amoroso (amor não correspondido), por motivos
vários - a «senhor» não lhe corresponde, está ausente;
Amor cortês: o objeto/alvo das cantigas de amor é sempre a mulher da nobreza ou da corte, cujo estatuto
social lhe confere um certo endeusamento; para a cantar, o trovador segue as regras da «mesura» ou do
cortejar da dama, com linguagem formal e respeito evidentes.
Linguagem e estilo:
Número variável de estrofes;
Número variável de rimas;
Por vezes têm refrão, mas nem sempre acontece;
Existe progressão de sentido;
Em suma:
Crítica de costumes:
• toda a sociedade medieval é alvo de críticas: mulheres e homens do povo; nobres, religiosos e religiosas;
o próprio rei, assim como todos aqueles que o trovador entender criticar sarcasticamente pela denúncia de
escândalos e perversidades.
Ambientes: ambientes sociais diversos, por onde circulam as personagens criticadas pelo trovador.
Linguagem e estilo: críticas por meio de sátiras e sarcasmos; recurso a calão; trocadilhos e seleção de
vocábulos que surtem efeitos cómicos.
Em suma:
Contextualização histórico-literária
A crise de 1383-1385 resultou numa nova dinastia, a dinastia de Avis. Ora, a Crónica de D. João I, ao relatar
de forma pormenorizada e intensa todos os eventos desta crise, bem como os que os antecederam e
sucederam, representa a legitimação dessa nova dinastia. Por outro lado, Fernão Lopes revela a afirmação
de uma consciência coletiva (povp) e diferentes atores, quer individuais, quer coletivos.
Esta crónica é considerada a crónica medieval mais importante, quer pelos acontecimentos que relata,
quer pela qualidade literária da sua prosa. Foi publicada pela primeira vez em Lisboa a 1644 e está dividida
em duas partes:
1ª ocupa-se no espaço e no tempo desde a morte de D. Fernando até à eleição de D. João I;
2ª relata o reinado deste monarca até à paz em Castela em 1411.
Todas estas figuras são apresentadas pelo cronista na sua densidade psicológica, nos dramas, nas angústias
e nos anseios e, por isso, ainda que muito diferentes (em termos de motivações, comportamentos e
atitudes), aproximam-se do lado humano. Mesmo quando o cronista foca a sua atenção nestes atores
individuais, fá-lo, porém, apenas no sentido de os integrar num todo, na sociedade à qual pertencem. Daí a
consciência coletiva ser tão marcante na sua obra.
Resumo do capítulo 11
O pajem do Mestre brada pelas ruas, a caminho da casa de Álvaro Pais, que matam o Mestre de
Avis nos paços da rainha, o que leva o povo a sair para a rua em grande agitação, pegando em
armas;
Álvaro Pais dirige-se com o pajem e outros aliados para os paços, apelando à população que corra
em auxílio do Mestre;
Chegada às portas do paço, que estavam fechadas, a multidão mostra-se ansiosa e agitada,
querendo entrar para confirmar que o Mestre está vivo;
Aconselhado pelos que estavam consigo, o Mestre aparece à janela para apaziguar a população
que, após a aparição, revela um “gram prazer”.
Sentindo-se seguro, o Mestre deixa os paços e cavalga até aos paços do Almitante onde estava o
irmão da rainha, D. João Afonso;
Pelo caminho, o Mestre interage com a população, que se mostra aliviada, alegre e disponível;
Próximo dos passos do Almirante, o Mestre é acolhido pelo conde, pelos funcionários da cidade e
outros fidalgos;
Já à mesa, vêm dizer ao Mestre que as gentes da cidade querem matar o bispo. O Mestre faz
tenções de o ir ajudar, mas é aconselhado a permanecer ali (a população mata o bispo).
Análise:
Este episódio enquadra-se na sequência de eventos que levaram ao cerco de Lisboa;
Aqui, o autor relata como se deu a aclamação do Mestre, após o assassinato do conde. As ações da
população demarcam os sentimentos que tinham em relação ao Mestre de Avis;
A população é a protagonista deste episódio- sensações auditivas (“e começamdo de fallaar huus
com os outros”) e visuais (“se moverom todos com maão armada, corremdo a pressa”);
Verifica-se uma concentração espacial (rua-paço-janela) que coincide com uma gradação e ritmo
crescentes das ações (apelo do pajem-apelo de Álvaro Pais-alvoroço da população-confusão,
nervosismo) que culminam no clímax (aparecimento do Mestre à janela);
Com o aparecimento do Mestre a população passa a ser de alívio e satisfação;
Demarcam-se sentimentos do povo que conferem uma tonalidade realista e expressiva ao episódio.
Nestas falas denigre-se a imagem de Leonor de Teles e apoia-se o Mestre de Avis.
Entre o povo (ator coletivo) aparecem-nos algumas personagens individuais (pajem do Mestre,
Álvaro Pais e Mestre de Avis)
No que diz respeito ao narrador, é notória a sua subjetividade (“era estranha cousa de veer”), a sua
simpatia pelo povo e a sua defesa do Mestre.
Resumo do capítulo 15
Quando souberam da vinda do rei de Castela, o Mestre e o povo começaram a recolher
mantimentos e muitos vão as lezírias buscar gado morto.
As populações movimentam-se: lavradores deslocam-se com as mulheres, filhos e tudo o que têm
para dentro da cidade; outros vão para Setúbal ou Palmela; outros ficam em Lisboa e há quem
fique nas vilas apoiantes de Castela;
Começa-se a preparar a defesa da cidade. O mestre deixa os fidalgos e cidadãos honrados
encarregues dos muros e torres, contando com besteiros e homens de armas. O próprio Mestre,
preocupado com a segurança da cidade, revista os muros e torres de noite;
Depois analisa-se a defesa a nível das portas da cidade: quantas eram e quem as vigiava;
Passa-se para a ribeira, zona onde foram construídas estacas para dificultar a passagem dos
castelhanos;
Ainda relativamente à defesa, refere-se a construção de um muro no à volta das muralhas na qual
até mulheres ajudaram; Nesta parte do episódio, o narrador estabelece uma comparação entre os
portugueses que tão bem defendem a sua cidade e os ilhos de Israel que fizeram o mesmo
(coragem e determinação da população);
No final do episódio, o cronista menciona a superioridade do rei de Castela com o objetivo de
realçar a postura da cidade de Lisboa que, perante um adversário tão feroz, está “guarnecida
comtra elle de gentes e darmas”.
Análise:
Neste capítulo somos convidados a presenciar: descrição da cidade de Lisboa quando o rei de
Castela a cercou; preparação da cidade pelo Mestre juntamente com a população; o esforço, a
valentia e adeterminação de gente de Lisboa;
O cronista relata o que foi feito relativamente aos mantimentos e, em seguida, à defesa da cidade;
A informação relativa à defesa da cidade é bastante detalhada: muros, torres, portas da cidade e
rio. Os pormenores descritivos abundam (referência ao nº de portas, nº de torres, nº de estacas...)
bem como os termos técnicos associados ao campo semântico de guerra (3º e 4º parágrafo);
À medida que descreve a proteção da cidade, aparecem os atores coletivos: lavradores, fidalgos,
homens de armas, mesteirões e mulheres;
É evidente a afirmação da consciência coletiva na medida em que se revela solidariedade,
entreajuda, patriotismo e orgulho entre as gentes da cidade. Uma consciência pela defesa da
cidade contra o inimigo;
O Mestre de Avis surge como ator individual com uma caracterização favorável, destacando-se a
sua diligência, determinação e apoio dado à população.
Resumo
Inês Pereira é uma jovem solteira que sofre a pressão constante do casamento, e reclama da sorte
por estar presa em casa, aos serviços domésticos, cansando-se deles. Imagina Inês casar-se com um
homem que ao mesmo tempo seja alegre, bem-humorado, galante e que goste de dançar e cantar,
o que já se percebe na primeira conversa que estabelece com sua mãe e Leonor Vaz. Essas duas
têm uma visão mais prática do matrimônio: o que importa é que o marido cumpra suas obrigações
financeiras, enquanto que Inês está apenas preocupada com o lado prazeroso, cortesão.
O primeiro candidato, apresentado por Leonor Vaz, é Pero Marques, camponês de posses, o que
satisfazia a idéia de marido na visão de sua mãe, mas era extremamente simplório, grosseirão,
desajeitado, factos que desagradam Inês. Por isso Pero Marques é descartado pela moça.
Aceita então a proposta de dois judeus casamenteiros divertidíssimos, Latão e Vidal, que somente
se interessam no dinheiro que o casamento arranjado pode lhes render, não dando importância ao
bem-estar da moça. Então lhe apresentam Brás da Mata, um escudeiro, que mostra-se exatamente
do jeito que Inês esperava, apesar das desconfianças de sua mãe. Eles se casam. No entanto,
consumado o casamento, Brás, seu marido, mostra ser tirano, proibindo-a de tudo, até de ir à
janela. Chegava a pregar as janelas para que Inês não olhasse para a rua. Proibia Inês de cantar
dentro de casa, pois queria uma mulher obediente e discreta. Encarcerada em sua própria casa,
Inês encontra sua desgraça. Mas a desventura dura pouco pois Brás torna-se cavaleiro e é chamado
para a guerra, onde morre nas mãos de um mouro quando fugia de forma covarde. Viúva e mais
experiente, fingindo tristeza pela morte do marido tirano, Inês aceita casar-se com Pero Marques,
seu antigo pretendente. Aproveitando-se da ingenuidade de Pero, o trai descaradamente quando
é procurada por um ermitão que tinha sido um antigo apaixonado seu. Marcam um encontro na
ermida e Inês exige que Pero, seu marido, a leve ao encontro do ermitão. Ele obedece colocando-a
montada em suas costas e levando Inês ao encontro do amante.
O texto vicentino não está dividido nem em atos nem em cenas, embora exista uma estrutura
tripartida (introdução, desenvolvimento e conclusão);
O género farsa e a especificidade da Farsa de Inês Pereira: seguindo os preceitos deste género,
esta farsa retrata a realização de trabalhos domésticos, nomeadamente a costura, da vida
quotidiana de uma jovem moça, em idade de casar, que é arrogante e pretende um marido culto e
nobre. Depois de defraudada nas suas expectativas para com o Escudeiro, seu primeiro marido, fica
viúva, voltando a casar, desta vez, com Pêro Marques. Deste quotidiano fazem igualmente parte a
mãe, a amiga alcoviteira Lianor (que lhe apresenta Pêro Marques) e os criados de casa;
As características do texto dramático, visíveis nesta farsa: não existem divisões cénicas explícitas,
embora seja possível detetar três momentos principais da ação: Inês solteira, Inês casada, Inês
viúva e novamente casada; existe um número variável de cenas, as quais mudam sempre que
entram ou saem personagens;
A peça revela um conflito entre forças opostas, entre mãe e filha: Inês que deseja casar com um
“homem discreto” que saiba “tanger viola” e a mãe que, experiente, deixa-lhe alguns conselhos
(“Não te apresses tu, Inês,/ maior é o ano que o mês”. Face aos conselhos, Inês replica: “Que
tendes de ver co isso?/ Todo o mal há de ser meu.”;
O discurso: inclui diálogo e monólogo (sobretudo, o de Inês), texto principal, que integra as falas
das personagens e várias didascálias (que dão informações sobre as personagens e os seus
movimentos, bem como sobre o espaço).
Inês: é a protagonista da farsa, pois a intriga desenvolve-se à volta do seu desejo de casar (para ter mais
liberdade) e das escolhas que faz neste sentido. De início, esta personagem feminina surge como alguém
muito descontente com a vida que tem: Inês sente-se “cativa” da vida doméstica que leva e gostaria de ter
a mesma vida que as outras jovens com uma vida mais folgada. Deste modo, representa um grupo social
com uma forma de estar, pensar e agir muito típica. Inês constrói uma imagem idealizada do seu marido de
sonho. A sua mãe e a alcoviteira Lianor Vaz tentam orientá-la mas InÊs mostra-se decidida e irredutível nas
suas opiniões. Inês acabará por aprender por sim e com os seus erros. Numa primeira fase,
enganada pelo Escudeiro Brás de Mata pela aparência, Inês opta pelo pretendente mais galante. Depressa
apercebe-se da má escolha que fizera e arrepende-se. Constata-se uma mudança de atitude da
protagonista que revela um plano futuro para se vingar do sucedido. Depois de ter sido enganada por Brás
da Mata, Inês escolhe a personagem que representa o “asno”, o lavrador Pêro Marques.
Mãe : uma mulher de pouca sorte, perspicaz, manifesta opiniões totalmente contraditórias das da filha
relativamente ao casamento e ao marido que esta devia escolher. Analisando as suas falas, repletas de
provérbios e as suas falas podemos dizer que a mãe é a voz do bom senso, da razão e também da
experiência. A mãe quer ajudar a sua filha tanto que elogia-a ao saber da proposta da Alcoviteira. Por
outro lado, dá conselhos a Inês sempre que um pretendente a vem visitar, o que mostra cuidado e
preocupação. Outras vezes coloca perguntas à filha com fim a deixá-la refletir e a ponderar melhor sobre o
seu futuro, fazendo referência à necessidade de um futuro seguro. Inês não quer casar com um homem da
sua classe social mas sim alguém da corte com um homem que toque viola e que saiba falar bem. A mãe
porém é mais realista e interessa-se pela condição económica do Lavrador. A partir do casamento com o
escudeiro, a mãe não volta a aparecer, como se a sua missão já estivesse terminada e que agora “todo o
mal” fosse responsabilidade da escolha que Inês fez.
Lianor Vaz: esta é uma personagem-tipo, uma alcoviteira, é uma mulher cujo oficio consistia em arranjar
casamentos apresentando pretendentes. Assim dá a conhecer Pêro Marques a Inês e à sua mãe
considerando-o “bom marido, rico, honrado conhecido”. Lianor Vaz partilha das mesmas opiniões da mãe
quanto à escolha que Inês devia fazer. Porém, tal como a Mãe, a alcoviteira não consegue convencer
inicialmente Inês a optar pelo lavrador e é só depois da morte do Escudeiro que Lianor Vaz aparece e
aconselha-a novamente chamando a atenção para as vantagens económicas de tal união. Esta personagem
denuncia o comportamento devasso do clero, através do encontro com o clérigo que a assedia, o que
constitui uma critica social.
Pêro Marques: Retrato fiel do camponês, do homem rústico e simples, Pêro Marques é uma personagem-
tipo e aparece como o primeiro pretendente, aquele que, apesar de todos os elogios da Alcoviteira, é
desprezado por Inês Pereira. Inês não hesita em caracterizá-lo de uma forma bastante negativa e
sarcástica, tecendo comentários insultuosos sobre ele (“parvo vilão”/”nunca vi tal coisa”/ “oh, Jesus!Que
João de bestas”). Esta caracterização direta (heterocaracterização) decorre das atitudes e comportamentos
que Pêro Marquês teve com Inês mesmo ainda antes de a conhecer (por exemplo, a carta que lhe escreveu
com uma linguagem demasiado básico). Quando é apresentando a Inês, esta personagem tem uma
situação cómica que se cria com Pêro Marques sem saber para que serve uma cadeira sentando-se ao
contrário nela ou quando procura em vão as pêras no seu chapéu. Pêro Marques autocaracteriza-se como
sendo um homem do bem, sério e decente. Para Inês estas qualidades não são de valorizar, antes pelo
contrário (ridiculariza-o sem perceber que ele se sente desconfortável por estar na mesma sala com
apenas ela). Por fim, a imagem do camponês inocente, ingénuo e desajeitado fica completa no ultimo
episódio da peça quando o vemos a transportar Inês,agora sua mulher, às costas, levando-as ao encontro
do Ermitão. Pêro Marques encara então o papel de marido ingénuo e obediente que é enganado pela
mulher.
Escudeiro Brás da Mata: Segundo pretendente de Inês Pereira que parece corresponder ao perfil
desenhado por ela para seu marido. Após os vários elogios dos judeus, o Escudeiro também ele é uma
personagem-tipo que parece ser um homem encantador, hábil com as palavras e com os instrumentos
musicais, mas na verdade é apenas um homem falso, arrogante, pelintra e prepotente.
Moço: Criado do Escudeiro, acompanha-o ao longo de toda a peça e é uma voz critica do amo. Leva uma
vida dura de pobreza e é maltratado pelo amo. É fiel mesmo assim ao seu amo fazendo tudo o que lhe
pede (como, por exemplo, o pedido do escudeiro para o moço vigiar Inês) e contra a sua vontade, cumpre
o pedido.
Judeus (Latão e Vidal): Desempenham um papel semelhante ao da Alcoviteira e têm por missão
apresentar a Inês o Escudeiro. São personagens cómicas e recorrem a uma linguagem caricatural como
quando apresentam o Escudeiro a Inês num retrato exagerado. Pertencem a uma comunidade judaica,
contribuindo para serem como personagens-tipo (na cerimónia de casamento executam rituais judaicos).
São gananciosos pois concretizam o casamento e exigem logo a quantia de dinheiro devida. Funcionam
como uma única personagem porque tanto ao nível do discurso como a nível do comportamento, ambos
completam-se.
Ermitão: é um ermitão que é diferente dos ermitas e monges que viviam isolados para se dedicarem
exclusivamente a Deus e que viviam da a fé e da a caridade das pessoas que os ajudavam e os
alimentavam. Para este “Deus é Cupido”. Seduz Inês Pereira e representa a vida da liberdade que a moça
pretendia levar, com a aprovação do próprio marido que não vê maldade em nada. Representa uma critica
ao clero, à sua imoralidade e à sua corrupção.
A representação do quotidiano
Uma das características da farsa, enquanto género, é representar flagrantes da vida quotidiana. Daí que
nesta obra seja possível identificar vários episódios que espelham hábitos, costumes, crenças e modos de
vida de pessoas daquela época, em especial aqueles que diziam respeito:
Dimensão satírica
A sociedade do século XVI surge satirizada. Aparece retratada através de personagens que representam
tipos (estratos) sociais: as moças que, cansadas da vida rotineira e vazia, ansiavam a libertação através do
matrimónio; a mãe que aconselha à filha um casamento com um homem de posses; os casamentos
arranjados quer por alcoviteiras quer por judeus; a ingenuidade e a simplicidade dos lavradores e dos
pastores; os judeus gananciosos e falsos; o clero imoral.
Vilão e lavrador (Pêro): personagem rústica, serve para fazer rir a gente da corte com a sua ignorância e
simplicidade;
Escudeiro: género de parasita, ocioso e vaidoso, que imita os padrões da nobreza – toca guitarra, verseja,
faz serenatas, finge-se bravo, mas é medroso e exploradr do Moço. Não trabalha e passa fome;
Ermitão: há uma desconformidade entre os atos e os ideais, pois, em lugar de praticar a austeridade, a
pobreza e a renúncia ao mudo, busca riqueza e os prazeres mundanos.
Cada uma destas personagens ilustra um determinado conjunto de defeitos e vícios que o dramaturgo
queria criticar (personagens-tipo são cruciais para a sátira social).
Gil Vicente recorre a artifícios, tais como a ironia e o cómico. Faz uso de três tipos de cómico: de caráter
(assenta na personalidade, no modo de ser da personagem, traduzindo-se muitas vezes, na incapacidade
de se adaptar a determinado ambiente social), visível, sobretudo nas personagens Pero Marques e
Escudeiro; de situação (baseia-se na intriga, no prórpio desenrolar dos episódios, que podem provocar
contrastes e desencontros), presente quando Pero Marques se apresenta a Inês e não sabe para que serve
uma cadeira; de linguagem (resulta na desadequação do que é dito ou do modo como +e dito
relatvamente ao contexto envolvente) , espelhado nas intervenções dos judeus (registo popular, repetitivo
e hesitante) casamenteiros ou de Pero Marques (linguagem provinciana, por vezes confusa).
Cómico de situação: baseia-se na intriga e no próprio desenrolar dos episódios. Como exemplo
disso tem-se, as atitudes desajeitadas de Pêro Marques ao longo da obra ou mesmo os judeus quando
querem forçar Inês a conhecer o pretendente que eles escolheram. A morte do Escudeiro também é
considerado cómico de situação pois foi morto pelo pastor mouro. Por fim, Pêro Marques leva Inês às
costas e esta canta uma cantiga sobre um “marido cuco”, isto é, traído. Toda esta cena é cómica pois este
não percebe e comporta-se como um “asno”.
Pêro Marques fala como lavrador que é, de forma simples, muito provinciana e por vezes, confusa,
visto que não é instruído.
Inês Pereira, a Mãe e Lianor Vaz falam como mulheres do povo recorrendo muito a ditados
populares e a provérbios.
Brás da Mata, como pretende enganar Inês, fala com ela de um modo galante sendo o seu discurso
rebuscado. Já com o moço, usa uma linguagem mais coloquial e agressiva, tal como faz com Inês
depois do casamento.
Os Judeus recorrem a uma linguagem de cariz popular e a dada altura, usam rituais judaicos.
Recursos expressivos:
Ironia: dá-se a entender o contrário do que se diz. Por exemplo, um elogio é uma crítica. (ex.: “Bem
sabedes vós, marido, quanto vos amo”. Inês profere estas palavras mas vai encontrar-se com o
Ermitão)
Comparação: relação de semelhança entre duas entidades/ realidades estabelecida por uma
expressão comparativa. ( “Estareis qui encerrada / nesta casa tão fechada / como freira d
´Ódivelas”. Brás da Mata compara a situação de Inês (fechada em casa) à clausura de uma freira, o
que acentua a violência da sua decisão).
Interrogação retórica: formulação de uma pergunta para a qual não se pretende uma resposta, mas
dar ênfase ao que se enuncia. (“E nasceu-te algum unheiro / ou cuidas que é dia santo?” Esta
pergunta tem tom irónico pois a Mãe só quer que Inês abandone o seu ócio).
Metáfora: relação de semelhança entre dois termos sem presença explícita de elemento
comparativo. (“porque a moça sisuda “ é uma perla pera amar” A mãe para ajudar a filha causa
uma boa impressão ao Escudeiro, aconselha-a a mostrar-se séria e reservada para ser digna de
louvor e apreciada, tal como uma pérola).
Metonímia: emprego de um termo que, por relação semântica ou proximidade, pode designar
outro. (“Renego deste lavrar” Neste contexto, o termo “lavrar” refere-se a costurar. Com esta
afirmação, Inês manifesta o seu desagrado não só relativamente a costurar como a todo o trabalho
doméstico).
Contextualização histórico-literária
A idade média foi considerada uma época de trevas, de ignorância e de atraso. Existia uma grande
vitalidade intelectual nesta época já que, durante este longo período se sucederam os “renascimentos” e
os esforços para recriar a sabedoria clássica. O renascimento pdoe definir-se como um movimento cultural
que marca a transição da idade média para a idade moderna e teve repercurssões políticas, sociais,
económicos e culturais. Em Portugal, o renascimento surgiu na segunda metade do século XVI e
apresentou a particularidade de estar ligado à espansão maritima.
- Sonetos: composições novas oriundas de Itália, fruto da valorização da cultura clássica que aí se
fez sentir já no século XIV; recorrem ao verso decassilábico, a chamada medida nova.
Chama-se escansão à contagem de sílabas métricas de um verso de acordo com as emissões de voz
individualmente bem distintas, assinalando-se todas sílabas até ao último acento tónico.
A técnica de versejar usando a redondilha menor (versos de 5 sílabas) ou redondilha maior (versos de 7
sílabos) deu-se o nome de medida velha, por oposição à medida nova ( 10 sílabas métricas – soneto,
canção).
A lírica tradicional: a lírica tradicional segue uma estrutura comum da poesia palaciana, um mote
desenvolvido em voltas.
- Mote: verso ou conjunto de versos que começam o poema e que servem para apresentar a ideia
que será desenvolvida nos versos seguintes;
- Voltas ( ou glosas) : versos que aparecem depois do mote agrupados em estrofes. Ao recuperar o
tema explicitado no mote, a volta pode repetir um ou mais vezes o mote, funcionando assim, como um
refrão.
A forma de encadear o mote e as voltas determinavam diferentes tipos de composições. Assim, entre as
várias composições camonianas em redondilha podemos encontrar:
-Cantigas: composições geralmente com um mote de 4 ou 5 versos e glosas ( uma ou mais estrofes) de -
oito, nove ou dez versos;
-Vilancetes: composições geralmente com um mote de 2 ou 3 versos e voltas (uma ou mais estrofes) de
sete versos;
-Esparsas: composições sem mote, de apenas uma estrofe, que podem apresentar oito, nove, dez ou mais
versos;
-Trovas ou endechas: composições sem mote, com um número variável de estrofes (normalmente de
quatro ou oito versos).
A representação da amada
Na lírica camoniana, existem dois tipos de mulher que variam de acordo com a medida utilizada na
composição poética em questão:
• Na medida velha, a mulher tem a mesma condição social que o sujeito poético, priveligiando-se, no
entanto, a de origem popular. Existe a possibilidade de relacionamento físico, sendo que, a figura feminina
é bela e encantadora, havendo a descrição da sua indumentária, objetos e sentimentos.
• Na medida nova, a mulher é de outra condição social, sendo, desta forma, uma mulher palaciana.
Destaca-se a mulher petrarquista (pele branca, olhos claros, cabelos louros, indumentária elegante;
superior em relação ao sujeito poético, seu submisso; relacionamento platónico, sem contacto físico),
havendo, desta forma, um amor platónico por parte do "eu" lírico.
Existem 2 tipos de mulher (a espiritual e a carnal)- a mulher sensual desperta o amor carnal
e fisico.
A mulher petrarquista é descrita como um ser ideal, que não deve ser desejado fisicamente
mas amado e idolatrado. (*petrarquista- inspiração na deusa Petrarca)
O poeta sente às vezes que a realização total do amor só é possível através do amor
espiritual e do amor fisico/carnal.
O sujeito poético está dividido entre o fascínio do amor platónico (espiritual)/petrarquista
vs. A atração por um amor carnal (entre a mulher que admira e a que deseja).A ausência da
mulher amada origina sofrimento, saudade e ânsia por um reencontro físico.
A experiência de uma vida amorosa fracassada poderá explicar a influência do amor de
concessão platónica.
O amor e os seus efeitos têm um poder transformador.
Exemplo: “Descalça vai para a fonte”: apresenta, num tom elogioso o retrato de uma mulher; “Um mover
d´olhos brando e piedoso”: descreve a mulher amada, concluindo que a sua beleza produz nele um efeito
alquímico e transforma o seu pensamento; “Aquela cativa”: exalta a beleza de Bárbora, uma mulher
exótica, exprimindo os sentimentos que a sua beleza gera nele; “Leda serenidade deleitosa”: descreve a
amada e as suas características foram as armas que o amor usou para o aprisionar.
Imagem de uma mulher angélica, um ser divido, de pele, olhos e cabelo claros, elementos
físicos reveladores das qualidades da alma, com um poder transformador da Natureza e do
Homem (influência petrarquista).
Representação de uma mulher maléfica, em contraste com a mulher anjo.
Novo conceito de beleza feminina distante do de Petrarca (pele, olhos e cabelos escuros),
capaz de provocar fascínio e tranquilidade no amador.
A imagem realista, inspirada na vida quotidiana, presente em algumas redondilhas.
A imagem petrarquista da mulher que representa a beleza, a castidade, a serenidade, a
harmonia, a unidade profunda entre a beleza externa e a beleza interna. Em geral, é um
modelo feminino de cabelos de “oiro”, pele clara, serena, impalpável, símbolo da perfeição.
Exemplo: “Tanto de meu estado acho incerto”: reflete sobre os efeitos contraditórios que a contemplação
da mulher amada provoca nele, demonstrando sofrimento amoroso; “Amor é fogo que arde sem se ver”:
tenta definir amor, apresentando expressões que revelam a sua natureza contraditória.
A representação da natureza
A Natureza aparece assiciada à poesia amorosa como expressão de estados de alma ou por contraste entre
o estado de espírito do sujeito poético; apresenta-se como objeto de contemplação, cenário para a
reflexão do eu poético; é geralmente uma paisagem diurna, natural, harmoniosa e agradável- descrição do
tipo locus amoenus -, um espaço propício ao amor.
Exemplo: “Se a Helena apartar”: retrato de uma figura feminina revelando o poder da sua beleza natural;
“A fermosura desta fresca serra”: descreve uma natureza alegre, harmoniosa, propícia à vivência do amor,
no entanto, esta causa-lhe sofrimento se a amada não estiver presente (natureza encarada como um
estado de alma).
Reflexão do poeta sobre o destino (que nunca lhe foi favorável), os erros que cometeu, o
amor fracassado, o desterro...
Afirma que nasceu para sofrer e que ele é o seu próprio tormento.
Considera-se com pouca sorte (“má fortuna”), e com azar no amor, refletindo sobre o seu
infortúnio e sobre o seu sofrimento.
O sujeito poético amaldiçoa o dia do seu nascimento, pois esse dia “deitou ao mundo a
vida/mais desventurada que se viu”.
Exemplo: “De que me serve fugir”: reflete sobre a sua vida, considerando que nasceu para sofrer; “Erros
meus, má fortuna, amor ardente”: recorda o seu passado, caracterizado pelos erros, pela má sorte e pelo
amor; “O dia em que eu nasci moura e pereça”: amaldiçoa o dia fatídico em que nasceu.
O tema do desconcerto
Este tema surge da consciência do poeta em relação ao mundo injusto, corrupto e maquiavélico qu o
rodeia e nunca lhe é favorável. Por isso mesmo, os poemas que versam sobre este tema revelam uma
agudeza mental que tem como consequência a angústia, a desolação/frustração e o sofrimento de
Camões.
Camões apresenta o destino e ele próprio como os responsáveis pelo seu infortúnio.
Nesta temática, já não é só o amor o sentimento que é explorado, mas também a revolta, o
remorso, o cansaço e o desespero perante a existência da morte.
Socialmente, o mundo é um desconcerto, provocando injustiças aos bons premiando os
maus.
As destruição do amor puro, a morte e a passagem do tempo, que só traz infortúnio, são
algumas realidades que chocam o poeta.
O desconcerto do mundo provoca espanto, revolta e inconformismo.
Reflexão sobre o desconcerto do mundo, ao nível social e moral, evidenciada em aspetos
como: a errada distribuição dos prémios e castigos (os maus são galardoados, os bons
severamente castigados); os contrastes entre a riqueza e a miséria; o crescente interesse
dos homens por valores materiais.
Exemplo: “Verdade, Amor, Razão, Merecimento”: reflete sobre o mundo que o rodeia e face a tal cenário a
única solução parece ser a fé cristã; “Os bons sempre vi passar”: apresenta a sua visão pessoal sobre o
mundo (injusto e arbitrário.
O tema da mudança
O tema da mudança aparece associado à temática do desconcerto e do destino. O poeta reflete sobre a
mudança na Natureza e a mudança no ser humano. A mudança é cíclica na Natureza (reversível) e é linear
(irreversível) no homem. A existência humana muda, mas é imprevisível e marcada pela adversidade, com
consequências negativas. O Poeta reflete ainda sobre a mudança da própria mudança, do que o soneto
“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades” é exemplo.
Exemplo: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”: reflete sobre a musnaça da natureza e o tempo
da natureza que se opõe à mudança do “Eu” e ao tempo humano, O tempo da natureza acarreta uma
conotação positiva e o do ser humano negativa.
Os Lusíadas é um poema épico, do género narrativo em verso, destinado a celebrar os feitos de heróis fora
do comum, mais precisamente o povo português, enquanto herói coletivo.
Visão global
Herói – o herói desta epopeia é o povo português representado na figura de comandante das naus,
Vasco da Gama. Há, portanto, um herói coletivo e outro individual.
Maravilhoso – o maravilhoso não só aparece com intervenções das divindades da mitologia (ex.:
vénus ou baco), como do Deus dos cristãos (reza de Vasco da Gama aquando da tempestade).
Forma – há um narrador que relata os acontecimentos; nesta obra podemos distinguir os vários
narradores:
O Poeta Relata a viagem de Vasco da Gama desde Moçambique até à Índia e regresso.
Conta ao rei de Melinde:
Vasco da Gama - História de Portugal;
-Viagem de Lisboa a Moçambique.
Relata, em Calecute, ao Catual alguns factos da História de Portugal e explicita
Paulo da Gama o significado das vinte e três figuras que estão representadas nas bandeiras
que levam.
Fernão Veloso Descreve o episódio dos Doze de Inglaterra.
Estrutura que:
- assenta em partes obrigatórias: Proposição, Invocação, Narração e a dedicatória é opcional. A obra é
dedicada D. Sebastião.
- determina uma narrção in media res que é o facto da narração começar com a viagem já a meio;
- exige “analepses completivas” ou seja, existir uma ação central (unidade de ação), o que não siggnifica
que não possa haver narrações de factos passados (analepses) ou até futuros (profecias).
O objetivo da epopeia é narrar e louvar os feitos grandiosos e, por isso, dignos de memória, de um povo,
para que não caiam no esquecimento e possam servir de exemplo e de inspiração para outros homens.
Estrutura externa:
O poema Os Lusíadas, escrito em versos decassilábicos, apresenta dez cantos; as estrofes organizam-se em
oitavas, com esquema rimático abababcc, sendo a rima cruzada nos seis primeiros versos e emparelhada
nos dois últimos.
Estrutura interna:
O poema está organizado em quatro partes: Proposição, Invocação, Dedicatória e Narração.
Na Proposição, o poeta enuncia um projeto narrativo audaz e vasto: glorificar os heróicos realizadores das
grandes navegações e descobertas e todos os que se tornaram imortais devido à grandeza dos seus atos,
na perspetiva do poeta.
Na Invocação, o poeta invoca as ninfas do Tejo, as Tágides para que o ajudem a cantar e contar os feitos
dos heróis humanos.
Na Dedicatória, Camões dedica o seu poema ao rei D. Sebastião (que reinava então em
Portugal), a quem tece vários elogios e incentiva-o a realizar feitos dignos de serem cantados.
A Narração, que constitui o desenvolvimento da obra e se inicia in media res, compreende diversos planos
narrativos, sendo que o acontecimento de relevo é a viagem de Vasco da Gama à Índia, núcleo central da
ação.
O Plano da Viagem constitui a ação central do poema. Compreende a narração da viagem da descoberta
do caminho marítimo para a Índia (Canto I, II, V, VI, VII, VIII, IX e X).
O Plano Mitológico é dado pela intervenção dos deuses na ação, simbolizando, por um lado, as diversas
autoridades superadas pelos heróis, por outro, o estatuto do herói português.
O Plano da História de Portugal é encaixado no plano da Viagem; são relatados episódios da História de
Portugal.
O Plano das considerações do Poeta revela-nos um autor atento ao seu tempo e com uma intenção
pedagógica e cívica. Assim, maioritariamente nos finais dos cantos, a narração é interrompida e o poeta
lança críticas, tece lamentos e desabafos ou incentiva os portugueses a seguirem o exemplo dos
verdadeiros heróis.
Imaginário épico
Mitificação do herói
O herói de Os Lusíadas é o povo português, simbolizado na figura de Vasco da Gama. Narrando os seus
feitos gloriosos e sublimes, mais meritórios do que todos os dos povos e nações anteriores, Camões eleva
os portugueses a um nível mítico, quase sobre-humano, ou seja, acima dos poderes terrenos. Assim, a
mitificação do herói resulta da interação do plano da intriga dos deuses, da mitologia, com o plano da
Viagem dos portugueses à Índia. Depois de superarem todas as dificuldades de ordem natural e humana
(Adamastor, Tempestade, oposição de deuses) e terem chegado à Índia, são conduzidos à Ilha dos Amores
onde se unem às ninfas, adquirindo um estatuto divino.
Reflexões do Poeta
Camões exprime as suas opiniões críticas sobre os factos que vai narrando. Assim, acompanhando a
viagem, as conquistas e as proezas gloriosas dos nossos navegadores, o poeta tece vários comentários
críticos No Canto I, observa-se a reflexão sobre a fragilidade humana, apesar dos valores humanistas que
norteiam a epopeia. No Canto V, o poeta incide na defesa da conciliação das armas e das letras, aspeto que
se relaciona com a importância que os humanistas atribuíam à formação integral do indivíduo, num
momento em que a aristocracia, empenhada nas trocas comerciais, descurava o apoio às artes e às letras.
No Canto VII, o poeta retoma a importância da conciliação das artes e das letras, numa perspetiva
autobiográfica, e manifesta cólera e indignação perante a ingratidão que ele cantava. No Canto VIII,
Camões reflete sobre o poder do dinheiro, o vil metal que leva mortes, traições, corrupção, tirania e
inimizades.
11º ano
Contextualização histórico-literária
Padre António Vieira viveu num perídodo conturbado da História de Portugal, um longo período de agonia
que se iniciou com o desaparecimento do rei D. Sebastião nos areais de Alcácer Quibir e que determinou a
perda da independência nacional, com a invasão do território português pelo exército espanhol em 1580,
cujo poder militar tomou a coroa da monarquia portuguesa.
A Europa vivia em tempos de crise generalizada e num clima de medo. No Brasil, viviam-se tempos de
exploração de Índios por parte dos colonos brancos.
Docere (educar/ensinar)- função pedagógica, muitas vezes conseguida através da citações bíblicas e
de autores da Igreja ou de obras clássicas;
Captar a atenção dos ouvintes e a sua disponibilidade para ouvir, fazê-los conscientes do que têm de bom,
para o preservar, e do que têm de mau, para o corrigir ou emendar
O sermão, enquanto discurso de caráter religioso, é uma das armas fundamentais da Contrarreforma.
• Exórdio – capítulo I – apresentação do tema que vai ser tratado no sermão, a partir do conceito
predicável: “vós sois o sal da terra” e das ideias a defender. Esta parte reveste-se de grande importância
dado que é o primeiro passo para captar a atenção dos ouvintes.
• Peroração – capítulo VI – conclusão do raciocínio com destaque para os argumentos mais importantes.
Capítulo I
O capítulo I (exórdio) inicia-se com o conceito predicável: “vós sois o sal da terra”. A partir deste conceito
(metáfora), e tendo como modelo Santo António, o Padre António Vieira vai desenvolver o seu sermão,
provando que a terra está corrupta, mas que o mal não está só do lado dos pregadores, pois os seres
humanos também têm culpa. A terra está corrupta porque o sal não salga ou a terra não se deixa salgar.
Ou a culpa está no sal (pregadores) ou na terra (ouvintes). Se a culpa está no sal, é porque os pregadores
não pregam a verdadeira doutrina, ou porque dizem uma coisa e fazem outra ou porque se pregam a si e
não a Cristo. Se a culpa está na terra, é porque os ouvintes não querem receber a doutrina, ou antes imtam
os pregadores e não o que eles dizem, ou porque servem os seus apetites e não os de Cristo.
Capítulo II
No capítulo II (exposição e confirmação) procede-se aos louvores aos peixes em geral. Começa pela
referência às propriedades do sal que deve conservar o são e preservar a corrupção. De seguida, a
indicação das virtudes dos peixes: as primeiras criaturas criadas por Deus; bons ouvintes; obedientes;
devotos. Estas virtudes dos peixes são, por contraste, a metáfora dos defeitos humanos.
Capítulo III
O capítulo III (exposição e confirmação) é consagrado aos louvores aos peixes, em particular. Em primeiro
lugar, o Santo Peixe de Tobias em que o seu fel sara a cegueira e o seu coração lança fora os demónios.
Deste modo, critica-se a heresia e a ausência de conversão por parte dos homens. Em seguida, a Rémora,
tem o poder da orientação e de acalmar. Critica-se a fraqueza humana e a ausência de força de vontade.
Posteriormente, o Torpedo que emite pequenas descargas elétricas que fazem tremer o braço do
pescador, impedindo a pesca. Critica-se, assim, a explorção do próximo, a corrupção e a ambição
desmedida. E, por fim, os peixes Quatro-Olhos que se defendem dos ataques vindos do céu e da terra.
Desta forma, critica-se a vaidade humana. No capítulo IV (exposição e confirmação), são feitas as
repreensões aos pexies, em geral. Os defeitos dos pexies são: comem-se uns aos outros, sendo que os
grandes comem os mais pequenos; revelam ignorância e cegueira. Neste capítulo, critica-se amaldade dos
homens na exploração que fazem uns dos outros.
1. O peixe Tobias :
-As suas entranhas curavam a cegueira dos homens tendo assim um poder curativo (seu pai, que era cego,
recuperaria a visão depois de, a conselho do Anjo Rafael, lhe ter sido aplicado um pouco do fel extraído
do peixe).
-O seu coração afugentava os demónios.
- Vestido de burel e atado com uma corda “este peixe parecia um retrato marítimo de Santo António”.
2. A rémora:
- peixe marinho cuja cabeça funciona como ventosa, o que lhe permite fixar-se a embarcações
(procurando conduzir ao bom caminho).
- pequena no seu tamanho mas com uma grande força, que conseguia imobilizar o leme das naus
(travando o mal).
3. O torpedo:
- peixe, parecido com a raia, capaz de produzir pequenas descargas elétricas que fazem tremer o braço do
pescador, obrigando-o a lagar a cana (assim o torpedo não é pescado).
4. O quatro-olhos:
- tem dois olhos “para se vingar das aves” e dois olhos “para se vingar dos peixes”.
- simboliza que devemos olhar ou só para cima (considerando que há Ceu) ou só para baixo (Inferno).
- este peixe simboliza o dever que os cristãos têm, isto é, olhando para o céu, mas lembrando sempre que
há inferno.
Outros peixes:
- Servem de alimento (as sardinhas são o sustento dos pobres e o salmão dos ricos);
-Ajudam à abstinência nas quaresmas;
-Com peixes, Cristo festejou a Páscoa;
- Ajudam a ir ao Céu;
- Multiplicam-se rapidamente (apenas aqueles que são consumidos pelos pobres).
Simbologia→também na terra os homens extorquem o que não lhes pertence, sem recearem as
consequências dos seus atos, ou seja, o castigo divino; as palavras de Santo António transformaram
vinte e dois homens desonestos que tomaram consciência dos pecados, se arrependeram e
confessaram, o que enaltefica a eficácia de Santo António; Tal como há homens que não sentem as
descargas elétricas do tropedo, também há homens que ouvem a verdade e continuam o seu caminho
errado; realça a importância que esses peixes poderiam desempenhar para fazer tremer o braço
daqueles que se desviam do caminho certo. Assim, a descarga simboliza as palavras de Deus.
Capítulo IV
No capítulo IV (exposição e confirmação), são feitas as repreensões aos pexies, em geral. Os defeitos dos
pexies são: comem-se uns aos outros, sendo que os grandes comem os mais pequenos; revelam ignorância
e cegueira. Neste capítulo, critica-se a maldade dos homens na exploração que fazem uns dos outros.
Não só se comem uns aos outros como os grandes comem os pequenos (critica à
prepotência dos grandes que “se alimentam” do sacrifício dos mais pequenos, tal como os peixes):
▪ Apelo de Vieira para que os peixes não se comam uns aos outros referindo-se ao Dilúvio e à arca
de Noé como exemplo de atitudes de bondade e generosidade a serem seguidas.
Capítulo V
No capítulo V (exposição e confirmação) procede-se às repreensões aos peixes, em particular. Inicia-se com
os Roncadores. Emboram tão pequenos, roncam muito, daí que representem a arrogância dos homens. Em
seguida, os Pegadores, sendo pequenos, pegam-se aos maiores, não os largando mais, razão por que
simbolizam o parasitismo, a vivência à custa dos outros. Os Voadores, apesar de serem peixes, também se
metem a ser aves. Por isso, simbolizam a pres
unção, a vaidade e a ambição. Por fim, na figura do Polvo, com a sua aparência de santo, identifica-se
como o maior traidor do mar.
Simboliza, pois a traição.
1. O roncador:
-embora pequenos e aparentemente vulneráveis, estes peixes emitem um som forte; esta autopromoção
revela a sua soberba e arrogância (“quem tem muita espada, tem pouca língua”);
-exemplo de Pedro, discípulo de Cristo: apesar de ter afirmado que defenderia até à morte o se Senhor,
bastou-lhe uma simples inventiva de uma mulher para negar que conhecia o seu Mestre; se tal aconteceu
com S. Pedro, muito menos razões terão os homens para exibirem a sua arrogância;
- outros exemplos bíblicos como David e Golias reiteram o facto dos arrogantes e os soberbos pensarem
que são Deus e acabarem diminuídos e humilhados.
-Santo António, símbolo de sabedoria, nunca se exibiu as suas capacidades, confinando-se à sua condição
de servo de Deus.
2. O pegador:
-parasita que vive às custas do seu hospedeiro;
-o parasitismo foi aprendido com os português, porque não há nenhum vice-rei ou governador que parta
para as conquistas sem ir rodeado de uma larga comitiva- critica ao aparelho colonial português;
-em termos humanos, os mais preguiçosos acabam como os pegadores, que, quando o tubarão, que lhes
serviu de hospedeiro, é pescado, morrem com ele, porque nele estão pegados.
-Deus também tem os seus “pegadores”, aqueles que espalham a palavra com David e Santo António, que
se pegou a Cristo e ambos foram bem sucedidos.
3. O voador:
-morfologicamente, possui uma barbatanas maiores que a generalidade dos peixes, dai que queira
imitar as aves; -esta ambição de se querer transformar naquilo que verdadeiramente não é só lhe traz
sofrimento porque está sujeito aos perigos do mar e do ar – no mar morre enganado pelo isco e no ar
morre cego pela ambição desmedida; -simboliza a ambição, a presunção e o capricho.
-Santo António sempre se demarcou da ambição, porque reconhecia que as asas que fazem subir
também fazem descer, o que pode precipitar a destruição. Santo António preferiu remeter-se à sua
humilde.
4. O polvo:
-o polvo é caracterizado através de comparações sugestivas:
> “com aquele seu capelo na cabeça parece um monge”- aparenta santidade.
> “com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela” – aparenta beleza.
> “com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão” –
aparenta serenidade.
- contudo, apesar da modesta aparência, o polvo é considerado o maior traidor do mar. Esta traição
consiste em enganar os outros peixes, caçando-os mais facilmente.
> “as cores, que no camaleão são gala, no polvo são malícia”;
> “as figuras que em Proteu são fábula, no polvo são verdade e artifício”; >o polvo veste-se
ou pinta-se “das mesmas cores a que está pegado”.
-simboliza traição, a dissimulação, a hipocrisia e a falsidade e é, assim, pior que Judas, o paradigma
do traidor no Evangelho, porque o apóstolo planeou a entrega de Cristo às escuras, mas executou a
traição às claras, enquanto o polvo, escurecendo a água com a sua tinta, rouba a luz à presa para a
apanhar.
- Santo António é considerado um exemplar de candura, da verdade e da sinceridade
O capítulo acaba com uma critica feroz aos portugueses. Vieira refere a degeneração dos valores nacionais,
uma vez que, no passado, as características exemplares de Santo António eram extensivas a todo o povo
português, não sendo, por isso, atributos dos santos.
Capítulo VI
O capítulo VI (Peroração) é a conclusão de todo “O Sermão de Santo António aos Peixes”, e Santo António
tem como objetivo a conversão dos homens à Fé de Deus. Santo António revela que tem inveja dos Peixes,
pois estes não ofendem Deus com a sua memória e cumprem o objetivo da sua criação, enquanto que os
Homens ofendem Deus com as suas palavras, com os
seus pensamentos e com a sua vontade, não atingindo o objetivo da sua criação.
Assim, Santo António reflete sobre os Peixes e os Homens e conclui que os Peixes são melhores que os
Homens, e que a única solução para o Homem é a conversão, porque só assim é que os Homens podem
dar glória a Deus.
O hino de louvor final -“louvai, peixes, a Deus”- e as razões para o louvor: Deus dê-los numerosos, belos e
diversos, porque lhes deu a água para nela viverem e se multiplicarem.
- A alegoria como recurso expressivo: representa uma realidade abstrata através de uma realidade
concreta, por meio de analogias, metáforas e imagens sucessivas, neste caso na sucessão alegórica relativa
às naus, o orador consegue concretizar os diversos vícios dos homens, simplificando a sua argumentação.
-A comparação como recurso expressivo: enquanto elogia os pregadores que espalham a doutrina divina e
que, portanto, ensinam, Vieira acusa os outros que não cumprem a sua função, sendo, por isso, votados ao
desprezo. Aludindo à função do sal, ou seja, salgar a terra com a mensagem bíblica, Vieira refere
que vai dar inicio aos louvores dos peixes, que devem ser atentamente ouvidos por estes, enquanto vivos,
enquanto podem ser apreciados.
-A metáfora como recurso expressivo: o orador utiliza a metáfora da arte de pescar para desenvolver a sua
crítica à exploração do homem pelo homem e, simultaneamente recorre a uma sucessão de imagens como
representação dos diversos tipos de poder abusivo – judicial, ancestral, religioso e real.
Conextualização histórico-literária
Em 1758, o rei D. Sebastião desapareceu na Batalha de Álcacer-Quibir. Não tendo deixado herdeiros,
houve uma longa disputa pela sucessão. Entre os pretendentes estava Filipe, rei de Espanha, que anexou
Portugal ao seu império em 1580. O domínio espanhol duraria sessenta anos (1580 a 1640). Criou-se nesse
período o mito popular do “Sebastianismo”, segundo o qual D. Sebastião retornaria para reerguer o
império português.
Entre os nobres desaparecidos nessa batalha, estava D. João de Portugal, marido de D. Madalena de
Vilhena.
Toda a ação se passa nos finais do séc. XVI, após o desaparecimento de D. Sebastião na Batalha de Alcácer-
Quibir. Com ele parte D. João de Portugal, personagem vital que desaparece também desencadeando
toda a ação dramática em Frei Luís de Sousa. Todos estes acontecimentos decorrem sob domínio Filipino,
21 anos depois da Batalha de Alcácer Quibir.
Após o desaparecimento de D. João de Portugal, D. Madalena manda-o procurar durante 7 anos mas
em vão. Casa então com D. Manuel de Sousa, nobre cavaleiro, de quem tem uma filha de 14 anos. D.
Madalena vive uma vida infeliz, cheia de angústia e de tranquilidade, no receio de que o seu primeiro
marido esteja vivo e acabe por voltar. Tal facto acarretaria para Madalena uma situação de bigamia e a
ilegitimidade de Maria, sua filha. Esta é tuberculosa e vive, em silêncio, o drama da sua mãe que será o
seu. Efetivamente D. João de Portugal acaba por regressar, acarretando o desenlace trágico de toda a ação.
A estrutura da obra
O espaço e tempo:
Ato I - Palácio de Manuel de Sousa Coutinho, em Almada (28 de julho de 1599):
Indícios trágicos:
• Coincidências temporais;
• Referências à sexta feira - todos os grandes acontecimentos que, por exemplo,
marcaram a vida de D.Madalena acorreram numa sexta-feira.
• Simbologia do número 7 – o sete indica uma mudança, que ocorre no final de
um ciclo, obrigando a um recomeço.
• Presságios\agouros e pressentimentos;
• Perda do retrato de Manuel de Sousa Coutinho – o retrato evidencia a sua
personalidade, a sua força, os seus princípios morais e religiosos, é prenúncio de
uma desgraça, funciona como o anúncio da tragédia que o vai aniquiliar.
Exposição
(cenas 1 e 2)
A peça inicia-se com D. Madalena refletindo sobre a paixão de D. Pedro e D. Inês de Castro narrada no
canto III de “Os Lusíadas”, sua obra predileta. As reflexões que se seguem transmitem o presságio da
desgraça que irá acontecer, presságio esse que percorre toda a obra através da atmosfera de supertição,
das apreensões e dos pressetimentos de D. Madalena. Esta associa o episódio referido da epopeia ao seu
amor com Manuel de Sousa Coutinho.
Telmo entra em cena e é evidente a relação de respeito e proximidade entre os interlocutores.
Telmo fora escudeiro de D. João de Portugal, primeiro marido de D. Madalena, desaparecido na
batalha de Álcácer-Quibir, daí apresentar reservas quanto a Manuel Coutinho (marido atual). Este
casal tem uma filha, Maria, que com 13 anos revela uma maturidade precoce e saúde débil.
D. Madalena procura por D. João durante 7 anos, acabando por casar com Manuel de Sousa
Coutinho. Porém, Telmo nunca aceitou esta 2ª união que dura há 14 anos, pois acredita no regresso
do seu amo.
(cenas 3 e 4)
Conflito
(cenas 5 a 8)
Desenlace
(cenas 9 a 12)
As cenas finais deste ato constituem o seu ponto culminante, já que Manuel incendeia o palácio, tendo-se
perdido o seu retrato, prenúncio da tragédia final. Para além disso, Maria fica fascinada com o ato de
coragem patriótica do pai, enquanto Madalena fica aterrorizada.
Exposição
(cena 1)
O ato inicia-se com um longo diálogo entre Telmo e Maria, que permite saber que:
Madalena se encontra, desde que entrou na casa de D. João de Portugal, num estado doentio de
angústia e ansiedade;
Telmo alterou a sua opinião relativamente a Manuel de Sousa Coutinho, considerando-o um
português às direitas;
A situação política provocada pelo incêndio ainda é delicada;
Maria tem um pressentimento quanto à identidade da figura representada no terceiro retrato ( os
dois primeiros são Camões e D. Sebastião), percebendo que Telmo lhe estava a mentir quando se
lhe referiu como “um da família destes senhores da casa de Vimioso”;
Madalena se refere à figura do retrato como “O outro, o outro”;
Maria e Telmo acreditam na crença sebastianista do regresso do rei;
A forma enigmática como a cena termina revela que Maria pressente a verdade ou parte dela
relativamente à história de D. João de Portugal.
(cenas 2 e 4)
Nestas cenas, Manuel revela a Maria a identidade do cavaleiro do retrato desaparecido na batalha de
Alcácer-Quibir, para além de dar a conhecer que os governadores já não o perseguem.
Manuel repreende carinhosamente Maria pela sua imaginação demasiado fértil, dizendo-lhe que ela tem
“uma grande propensão para achar maravilhas e mistérios nas coisas mais naturais e singelas”.
Para além disso, a cena 3 é relevante porque as palavras de Manuel pressagiam o destino funesto da filha,
a orevelarem que a existência de um (D. João) implicaria a inexistência do outro (Maria).
Conflito
(cenas 4-8)
O momento do conflito deste ato é marcado pelo reencontro de Madalena e Manuel, que lhe promete que
nos próximos quinze dias não sairá de casa, o que a tranquiliza bastante, mas tambémpela sua ida a Lisboa
(apesar da promessa que fizera), acompanhado de Maria e Telmo, para visitar a proma Soror Joana, que,
juntamente com o Marido, tinha abraçado a vida religiosa.
A angústia crescente de Madalena é delicada e a “viração” da tarde, no rio, pode fazer-lhe mal, mas
também porque é sexta-feira, dia fatídico.
Desenlace
(cenas 9-15)
O desenlace deste ato corresponde ao clímax da ação dramática, sendo de destacar:
as revelações de Madalena a Frei Jorge relativamente ao seu passado marcado pelo pecado de ter
amado Manuel ainda em vida de seu primeiro marido;
a referência, por parte de Madalena, ao caráter fatídico de sexta feira;
a chegada do Romeiro, que tráz a notícia que D. João está vivo, o que mergulha Madalena num
descontrolo emocional;
a resposta do Romeiro a Frei Jorge “Ninguém” apontando para o retrato de D. João de Portugal.
Exposição
(cena 1)
Longo diálogo entre Frei Jorge e D. Manuel, que permite perceber a angústia do segunto porque:
se culpabiliza pelo fim do casamento de D. Madalena e pela situação socioafetiva de Maria;
se mortifica elo estado de saúde de Maria;
se inteira do facto de apenas ele e seu irmão conhecerem a verdadeira identidade do Romeiro;
reitera a justeza da sua decisão de, conjuntamente com D.Madalena, tomarem o hábito.
Conflito
(cenas 2-9)
O desenrolar da ação drmática nestas cenas prende-se:
as informações sobre o estado débil de Maria;
o conflito interior de Telmo ao aperceber-se de que ama mais Maria que D. João de Portugal;
a tentativa de D. João de Portugal, ao saber que Madalena o procurou 7 anos, de desfazer o mal
que involuntariamente provocou;
o último encontro entre Madalena e Manuel, que faz ver à esposa que não lhes resta outra opção
digna a não ser a entrada no convento.
Desenlace
(cenas 10-12)
As cenas finais são constituídas por uma sucessão de momentos dolorosos, em que Madalena e Manuel
tomam o hábito no momento em que aparece em cena dizendo que, se os pais vão morrer, ela os
acompanhará.
Assim, Maria morre de vergonha nos braços da mãe, ao ouvir a voz do Romeiro, que, escondido, pede a
Telmo que reverta a situação.
• D. Manuel de Sousa Coutinho: Manuel de Sousa Coutinho pertencente à nobreza (cavaleiro de Malta).
Por um lado, é completamente racional e insensível aos pressentimentos de D.Madalena e de Maria, por
outro lado, é dominado pelo sentimento patriótico e liberal.
• Maria: Maria é uma menina (13 anos) muito inteligente e precoce para a sua idade, frágil (doente de
tuberculose), perspicaz, bondosa e ligada ao culto de D.Sebastião.
• Telmo Pais: Telmo Pais é um escudeiro, servidor de D. João de Portugal e de Manuel Sousa Coutinho. É
confidente de D.Madalena e protetor de Maria. Dividido entre a afeição antiga (D.João de Portugal) e a
afeição recente (Manuel de Sousa Coutinho).
• Frei Jorge: Irmão de Manuel tenta ser a voz do bom senso, da razão e do equilíbrio. As suas palavras
servem de conforto à família. Tal como Telmo, também ele funciona como o coro que faz apartes, que
comenta, que explica, que anuncia.
• D. João de Portugal (Romeiro): apesar de surgir no final do Ato II, D. João de Portugal é a personagem
que está sempre presente na obra, pela diversidade de vezes que é nomeado e lembrado. Ele é o
responsável pela alteração do rumo dos acontecimentos da ação trágica, pois é do seu reconhecimento
que resulta a impossibilidade da existência do segundo casamento de Madalena e a ilegitimidade de Maria
de Noronha. Revela-se íntegro, dado que, quando percebe que da sua vida e saúde dependem a desgraça e
a infelicidade desta família, pede ainda a Telmo que lhes diga que afinal este romeiro não é o verdadeiro D.
João de Portugal, o que acaba por não acontecer.
A dimensão trágica
De acordo com a classificação de Frei Luís de Sousa pelo próprio autor, a peça apresenta características
que a aproximam quer do drama romântico quer da tragédia clássica.
-Principais características trágicas da obra:
número reduzido de personagens;
personagens de elevado estatuto social e moral;
ação única e que converge para o desenlace trágico;
concentração temporal (progressão temporal, até culminar na madrugada da morte ou separação
da família);
concentração espacial (progressão espacial, terminando na Igreja de S. Paulo dos Domínicos);
vestígios do coro da tragédia clássica, nas personagens Telmo e frei Jorge;
presença de momentos e indícios trágicos.
Os indícios trágicos são sinais da fatalidade que se avizinha. Os indícios ou presságios podem surgir sob a
forma de acontecimentos, comportamentos, comentários, alusões ou informações que nem sempre são
entendidos pelas personagens como sinais trágicos. Ao longo da ação de Frei Luís de Sousa, há várias
situações e elementos que contribuem para a criação de um ambiente de medo e de suspeita e que
funcionam como uma espécie de preparação para o desenlace trágico.
A estrutura da obra
Introdução
-Apresentação da entrada de Simão Botelho na Cadeia da Relação do Porto, condenado ao degredo na
Índia.
-Referência sucinta à história triste de Simão, que se resume na frase «Amou, perdeu-se e morreu
amando».
-Reflexões do narrador sobre a história trágica de Simão.
Capitulo I
-Apresentação da família de Simão Botelho.
-Caracterização de Simão que aos 15 anos era rebelde e estudante em Coimbra.
Capitulo II e III
-Simão e Teresa (filha de Tadeu Albuquerque) veem-se pela primeira vez e apaixonam-se.
-As famílias de Simão e Teresa opõem-se ao amor dos jovens, devido ao ódio entre ambas.
-Tadeu de Albuquerque pretende casar Teresa com o seu sobrinho Baltasar.
Capitulo IV
-Teresa recusa o casamento e o pai decide encerrá-la num convento.
-Escrita de uma carta a Simão, na qual Teresa explica a sua situação.
-Simão regressa a Viseu e fica alojado em casa do ferrador João da Cruz.
Capitulo V-IX
-Breve encontro entre Teresa e Simão.
-Mariana, filha de João da Cruz, apaixona-se por Simão.
-Baltasar prepara uma emboscada a Simão e este é ferido. Simão consegue fugir com a ajuda de João da
Cruz que matam os dois criados de Baltasar.
-Tadeu decide encerrar Teresa num convento em Viseu. Simão fica em casa de João da Cruz que devia um
favor ao pai de Simão.
-Mariana cuida de Simão em casa de João da Cruz.
Capitulo X
-Simão vai ao encontro de Teresa, quando a jovem parte do convento de Viseu para o convento de
Monchique, no Porto.
-Simão mata Baltasar.
-Simão é preso.
Capitulo XI-XX
-Mariana continua ao lado de Simão, na prisão.
-É condenado à forca.
-Teresa chega ao convento de Monchique, no Porto, e toma conhecimento da condenação de Simão.
-Doença de Teresa que anseia pela morte, apesar de Simão, através de Mariana, a incentiva a não desistir.
-Decisão de Tadeu em trazer a filha de volta para Viseu quando sabe do estado frágil dela, e quando sabe
que
que Simão está também na cidade do Porto.
-Recusa de Teresa em fazer a vontade do pai.
-Assassínio de João de Cruz.
-Simão é condenado ao degredo por 10 anos e Mariana tem intenção em acompanhá-lo.
-Suplica de Teresa para que Simão não aceite o degredo e que cumpra o tempo na cadeia onde já esta.
-Partida de Simão para a Índia, na companhia de Mariana, no momento em que é informado da morte de
Teresa.
Conclusão
-Morte de Simão passados 10 dias e suicídio de Mariana, que se atira ao mar na companhia do corpo do
seu amado.
Teresa: Teresa representa um tipo vulgar na galeria feminina das heroínas românticas do tempo: amorosa
angelical, vítima indefesa num mundo que não lhe pertence, porque organizado para servir apenas o
egoísmo arbitrário dos homens, é um ente sensível, frágil, tendencionalmente incorpóreo votado pela
fatalidade para o deperecimento e a aniquilação. Mas essa sua personalidade ganha certa força na
alternância desta fraqueza com uma também sua própria vocação para morrer insubmissa. É que no fundo
nada consegue deter a determinação a que se entrega. “A desgraça não abala a minha firmeza, nem deve
intimidar os teus projetos.” – escreve ela a Simão.
Mariana: Mariana é a figura mais humana e mais complexa da obra. Mariana é vista como um símbolo de
gratidão desinteressada: é a enfermeira sempre vigilante do filho do desembargador Domingos Botelho
que salvara seu pai da forca. É um símbolo de generosidade discreta e delicada, pois dá ao hóspede bens
pessoais, cuidava do preso com abundância e limpeza, e a todos dizia que ali estava por ordem e à custa da
senhora D. Rita Preciosa. Mariana como um símbolo de amor humilde, puro: contenta-se com amar sem
ser amada, fazendo do amor um serviço gratuito, uma dádiva prestada sem quaisquer esperanças de
reciprocidade.
Baltasar Coutinho: Baltasar vive na dupla função para que o autor o criou: ser, por um lado, uma simples
peça dinâmica da intriga; por outro, surgir, pelos defeitos que encarna (covardia, perversão pelo interesse
do sentimento amoroso, cinismo, vaidade, desdém), como elemento contrastante de Simão, cujas
qualidades e simpatia avultam neste jogo de oposições intencionais.
Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho: Estas duas personagens não diferem fundamentalmente uma
da outra, como símbolos que são de pais despóticos, cuja autoridade se escuda por detrás de princípios
morais de tónica puramente formal, já que sempre traem este ou aquele interesse pessoa mesquinho,
manipuladores arbitrários que são de pessoas e instituições pela força do dinheiro, da pressão hierárquica
e das relações comprometidas. Tadeu é figura mais conseguida que a de Botelho – sobretudo quando, para
o fim da história, Camilo o descreve com os olhos encovados a reverem o suor e o sangue de uma raiva
que pedia debalde vingança.
João da Cruz: O ferrador ergue-se, ainda sobre o esqueleto do bom bandido, tão caro a ficção
ultrarromântica, que Camilo nele de certo modo e insinua e absolve na apóstrofe com que comenta a
morte do generoso protetor de seu tio paterno. Mas a carne que veste esqueleto é viva – e tão
naturalmente viva, que até a função dinâmica para que o narrador criou a figura se perde e apaga.
D. Rita: representa a convencionalidade do sentimento materno – age mais por obrigação familiar do que
por motivos afetivos; ajuda Simão porque esse é o seu papel e não porque o amor de mãe a leve a perdoar
e a compreender as atitudes do filho.
Ritinha: distingue-se das outras irmãs de Simão pela sua capacidade afetiva e representa, para Simão, o
único laço familiar genuíno, porque é conduzida por aquilo que sente e não pelas convenções que lhe são
impostas. A sua ligação a Simão leva-a a ser ela a relatora da sua história ao autor da obra, quando este era
criança.
Sugestão biográfica (Simão e narrador) e construção do herói romântico:
O narrador, Camilo Castelo Branco, afirma ser sobrinho do herói do seu Amor de Perdição, Simão Botelho,
cuja história de amor infeliz leu enquanto estava preso naCadeia da Relação, no Porto. Pelas informações
da vida e da morte do seu tio direito, Simão Botelho, Camilo propõe ao leitor contar esta história,
mostrando Simão como um herói verdadeiramente romântico que «Amou, perdeu-se e morreu amando».
Pelo conhecimento da biografia de Camilo e de Simão, cedo os leitores se apercebem da semelhança entre
estes dois heróis românticos - apaixonados fervorosamente (Simão - Teresa e Camilo - Ana Plácido),
perseguidores da sua felicidade amorosa contra as adversidades, sofredores das respetivas consequências,
mas continuamente ao serviço do verdadeiro Amor-Paixão.
O amor-paixão
Nesta obra, o autor associa a ideia do amor-paixão a ideia do Destino e da Morte, conferindo ao Amor uma
sacralidade que impõe o sofrimento e a expiação na Terra enquanto se aguarda a redenção espiritual.
O capítulo X é revelador desse pulsar amoroso intenso que, agrilhoado às normas sociais, torna Simão e
Teresa em duas almas penadas que só encontrarão paz para lá da Terra. Na missiva que Simão escreve a
Teresa, há uma carga dramática forte (“Considero-te perdida, Teresa”) que é reiterada por expressões
como “Parece que o frio da minha sepultura me está passando o sangue e os ossos”.
Contudo, o desejo de vingança de Simão sobrepõe-se ao desejo amoroso- o herói romântico é incapaz de
viver sabendo que o infame que ultrajou Teresa está vivo – “Poderia viver com a paixão infeliz; mas este
rancor sem vingança é um inferno. Não hei de dar barata a vida, não. Ficarás sem mim, Teresa; mas não
haverá aí um infame que te persiga depois da minha morte.”
É de notar, também, uma crença no amor após a morte, ou seja, capaz de transcender o físico para atingir
o espiritual e eterno.
Perspicaz, pois percebe a hipocrisia social, que potencia a mentira, o engano, a falsidade;
Determinada em seguir o coração, o que a leva a opor-se ao pai, pois prefere morrer do que casar
com o primo;
Com grande autodomínio, visto que não chora quando o pai a amaldiçoa;
Insubmissa e desafiadora da lei paterna,
Teresa é rebelde na forma como não segue o caminho que o pai quer, o que seria expectável na época e
está confiante na sua crença de casar por amor- sinal da mudança dos tempos e das convenções sociais da
época.
A partir da leitura do capítulo IV na sua totalidade, é possível referir alguns aspetos que tornam a obra
numa crónica da mudança social:
Apresenta-se uma sociedade em transformação, com ideais da revolução francesa, da qual Simão
Botelho é defensor;
Critica-se uma sociedade retrógrada e feita de desigualdades, a começar pela insignificância social
da mulher;
Denuncia-se uma sociedade repressora em diferentes quadrantes: social (discriminação de
géneros), jurídico (corrupção da justiça pelos poderosos, como quando Domingos Botelho interfere
junto de um corregedor para obter perdão para Manuel que desertou do exército), religioso (tirania
dos conventos) e familiar (casamentos por conveniência e autoridade paterna, que era
inquestionável);
Apontam-se as contradições entre o ser e o parecer, com a vida dissoluta que reinava nos
conventos;
Valoriza-se o papel do homem enquanto indivíduo que zela pela liberdade, dignidade e honra.
Concluindo, existe na obra um caráter revolucionário, com a insubordinação de Teresa, que não aceita
casar com quem seu pai lhe impõe. Desta forma, a Revolução Francesa é trazida para dentro da família.
Linguagem e estilo
O narrador:
Como já foi visto anteriormente, o título e o subtítulo sugerem duas dimensões – a ficcional e a
memorialista
– E desta forma destacam-se dois tipos de narrador, o narrador-autor e o narrador enquanto porta-voz da
ficção.
O narrador, ora é relator, ora observador critico. Intervém ao longo da obra através dos comentários,
parando o relato para tecer considerações pessoais.
Diálogos:
Nota-se a preocupação de Camilo em conseguir o efeito de verdade através dos diálogos que marcam os
momentos quer de tensão, quer de paixão, quer de sofrimento amoroso.
Os diálogos são também instrumentos únicos de descodificação das características especificas de
determinado grupo social, nomeadamente nobreza/burguesia (com registo cuidado) e do povo (com a
linguagem coloquial e familiar).
4. Os Maias, Eça de Queirós
Contextualização histórico-literária
Em Portugal, o Realismo e o Naturalismo aparecem ligados a nomes como Eça de Queirós, Antero
de Quental, Ramalho Ortigão, Jaime Batalha Reis, entre outros, e a expressões como Conferências
do Casino, Questão Coimbrã, Cenáculo e Geração de 70. A Geração de 70 foi a responsável pela
introdução de ideias novas no país, dando origem a polémicas e agitação que marcaram a
sociedade portuguesa do final do século XIX.
Os Maias
Nesta obra, Eça de Queirós aborda a história de uma família lisboeta em decadência, mas, sobretudo,
constrói uma crónica social, cultural e política que permite o conhecimento do espaço social da época em
que foi produzida. Faz análise da sociedade portuguesa, de forma cómico-trágica, sem perder de vista o
propósito ético da literatura.
Apesar das peripécias e da catástrofe no fim do enredo passional, uma certa intemporalidade resulta da
crónica de costumes, da análise social, que leva à observação, com mais pormenor, dos elementos que a
definem: figurantes e ambientes. Ou seja, há um conjunto de figurantes que, nos vários ambientes,
representam a mediocridade e a decadência da sociedade lisboeta oitocentista.
Os Maias constituem um verdadeiro fresco caricatural da sociedade portuguesa da época, conservando a
atualidade, apesar da mutabilidade dos contextos.
O autor desenvolve uma comédia de costumes da sociedade burguesa e lisboeta finissecular, como sugere
o subtítulo “Episódios da vida romântica”.
Visão global da obra e estruturação: título e subtítulo
Visão global
A ação do romance baseia-se na história de 3 gerações da família Maia (Afonso, Pedro e Carlos) e tem
como pano de fundo a sociedade lisboeta de grande parte do século XIX. Aliás, é possível reconhecer um
paralelismo entre os vários representantes da família Maia e os diferentes momentos da História de
Portugal desse mesmo século:
Estrutura
A estrutura de “Os Maias” é definida pelo autor ao sublinhar a importância do subtítulo- Episódios da vida
romântica. Assim, a obra apresenta dois níveis narrativos, como se pode verificar:
Estes dois níveis narrativos articulam-se de forma alternada, funcionando os ambientes como pano de
fundo para a atuação de algumas das personagens da intriga central que, pelo seu caráter e
comportamento, se destacam da mediocridade geral.
Esta segunda parte estende-se ao longo de catorze meses, cujos marcos temporais são os seguintes:
Outono de 1875 até aos fins de 1876- a morte de Afonso ocorre no inverno -“sol fino de inverno”-
Cap. XVII;
Princípios de 1877- “Semanas depois, nos primeiros dias do ano novo”- partida de Carlos e Ega para
a sua viagem de volta ao mundo.
Epílogo:
Os acontecimentos marcantes do desfecho do romance são:
Viagem de Carlos e Ega – 1877 – 1878 – “Mas, passado ano e meio, num lindo dia de março […]”
Carlos em Sevilha – “Nos fins de 1886, Carlos veio fazer o Natal perto de Sevilha […]”
Reencontro de Carlos e Ega- “E numa luminosa e macia manhã de janeiro de 1887, os dois amigos,
enfim juntos”
O epílogo retoma o ritmo rápido inicial: com efeito dez anos são contados em cerca de duas páginas. Esta
concentração temporal é conseguida através de:
Elipses – “E esse ano passou. […] Outros anos passaram”.
Resumos – “Gente nasceu, gente morreu. Searas amadureceram, arvoredos murcharam”
O famoso passeio final (momento simbólico e de reflexão protagonizado por Carlos e Ega) ocupa o resto do
capítulo XVIII, num total de, aproximadamente, 26 páginas, desacelerando o ritmo narrativo e
aproximando-se do ritmo da segunda parte.
Capítulo I
O romance inicia-se com a referência à instalação da família Maia (Afonso e Carlos) no Ramalhete, no
outono de 1875.
Este palacete, durante longos anos desabitado, estivera para se transformar na Nunciatura, em 1858,
quando o Monsenhor Bucarini o visitou. No entanto, a quantia oferecida por Vilaça (procurador da família
Maia) fez o representante do vaticano desistir da ideia. Os Maias viviam na Quinta de Santa Olávia, no
Douro e, ao decidirem voltar a Lisboa, encarregam Vilaça de restaurar o palacete, a contragosto do
procurador que alude a uma lenda de que a casa era fatal aos Maias. As obras são supervisionadas por
Carlos que parte numa viagem de um ano pela Europa. Afonso instala-se no Ramalhete, esperando o
regresso do neto.
Inicia-se a longa analepse que evoca o passado de Afonso da Maia
Contenda entre Afonso (liberal) e seu pai Caetano (absolutista) e consequente ida para Inglaterra;
Regresso a Portugal por ocasião da morte do pai, casamento com Maria Eduarda Runa e
nascimento de Pedro;
Regresso a Inglaterra por questões políticas e educação tradicional portuguesa ministrada a Pedro
pelo Padre Vasques, por vontade expressa da mãe;
Morte, em Lisboa, de Maria Eduarda – Pedro mergulha numa profunda depressão, iniciando uma
vida devassa e boémia;
Paixão de Pedro por Maria Monforte, mulher bela e elegante, filha dum negreiro;
Casamento às escondidas, sem aprovação de Afonso.
Capítulo II
O casal viaja por Itália, porém, Maria suspira por Paris, para onde se mudariam pouco tempo depois. Maria
fica grávida. Nessa altura, resolvem voltar para Lisboa, mas não sem antes escreverem a Afonso,
anunciando a sua partida e o nascimento do primeiro neto, na esperança de que ele os perdoasse e os
recebesse como família. Afonso tinha voltado para Santa Olávia.
Maria Eduarda, filha do casal, nasce, mas Pedro não avisa ao pai, por ainda estar magoado. A vida social do
casal era intensa em Arroios.
Quando nasce o segundo filho, Pedro coloca a hipótese de se reconciliar com o pai e ir a Santa Olávia
apresentar-lhe os netos. Contudo, numa caçada com os amigos, Pedro fere acidentalmente um italiano
que fazia parte do grupo, Tancredo. Este fica em casa do casal durante bastante tempo para se
restabelecer. Contudo, Maria e Tancredo apaixonam-se e fogem juntos, levando consigo Maria Eduarda.
Pedro procura apoio junto do pai, que o acolhe, assim como a Carlos, na casa de Benfica.
Pedro suicida-se e Afonso decide fechar a casa de Benfica, mudando-se com o neto para a Quinta de Santa
Olávia.
Capítulo III
A infância de Carlos é passada em Santa Olávia, recebendo uma educação liberal com um professor inglês,
Mr. Brown, que dá primazia ao exercício físico e às regras duras que Afonso impõe ao neto. É neste
ambiente de província que que os Maias convivem com os Silveiras: a Teresinha (primeira namorada de
Carlos), D. Eugénia (sua mãe); D. Ana (sua tia) e Eusebiozinho (irmão). Este era o oposto de Carlos, frágil,
tímido, medroso e estudioso. Neste capítulo evidenciam-se as diferenças entre a educação tradicional e a
educação inglesa. Vilaça dá notícias de Maria Monforte a Afonso e, segundo eles, a pequena morrera em
Londres. Vilaça morre e i seu filho substitui-o. Carlos entra em Medicina em Coimbra.
Capítulo IV
Carlos despertou para a sua vocação para Medicina quando ainda era criança. Para que os seus estudos
fossem mais tranquilos, Afonso ofereceu ao neto uma casa em Celas, onde Carlos leva uma vida boémia,
rodeado de amigos com ideias filosóficas avançadas e defensores de uma ideologia liberal. Deste grupo de
amigos destaca-se João da Ega, que estudava Direito. Terminado o curso, Carlos parte para a Europa um
ano. Ao fim desse tempo, Afonso espera-o no Ramalhete, onde se irão instalar – fim da grande analepse.
Carlos tenciona abrir um consultório em Lisboa, vontade que consegue satisfazer com a ajuda do avô. Ega
visita Carlos no consultório e anuncia-lhe a intenção de publicar o livro que andava a escrever- Memórias
de um átomo.
Capítulo V
Este capítulo inicia-se com um serão no Ramalhete, com a presença de vários amigos: D. Diogo, general
Sequeira, Cruges, Eusébio Silveira, Conde Steinbroken e Taveira, que fala dos Gouvarinhos, enquanto o
Marquês refere “essa coisa do Ega com a mulher do Cohen”.
A atividade no consultório de Carlos já começa a ter popularidade devido ao sucesso do caso de Marcelina
(mulher do padeiro que esteve às portas da morte). Carlos finalmente encontra Ega e é desvendado o
mistério do seu súbito desaparecimento: estava apaixonado por Raquel Cohen (que era casada). Durante
uma conversa entre Carlos e Ega, este propor-lhe conhecer os Gouvarinho e Carlos aceita. Após um
encontro com estes amigos de Ega, na Ópera de S. Carlos, Carlos pressente o interesse da Condessa.