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CRISTHIANE DE SOUZA
É vedada, terminantemente, a cópia do material didático sob qualquer
forma, o seu fornecimento para fotocópia ou gravação, para alunos
ou terceiros, bem como o seu fornecimento para divulgação em
locais públicos, telessalas ou qualquer outra forma de divulgação
pública, sob pena de responsabilização civil e criminal.
SUMÁRIO
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
2. Os métodos de alfabetização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
2.1 Método sintético . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
2.1.1 Método da soletração ou método alfabético . . . . . . . . . . . . . . . . . .10
2.1.2 Método da silabação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
2.1.3 Método fônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11
2.2 Método analítico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.2.1 Método de palavração . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2.2 Método de sentenciação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15
2.2.3 Método global ou dos contos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.2.4 Método ideovisual de Decroly . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17
2.2.5 Método natural de Freinet . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17
2.2.6 Método Paulo Freire . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .18
2.3 Método analítico-sintético . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2.3.1 Método da Abelhinha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4. Concepções de alfabetização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
6. Letramento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
11 Hipótese de leitura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
15. Avaliação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96
INTRODUÇÃO
Neste conteúdo, traçaremos um panorama abordando a história dos métodos e das cartilhas no
processo inicial de alfabetização no Brasil. Iremos discutir as diferenças e as aproximações conceituais
entre alfabetização e letramento, trazendo os mais renomados teóricos que estudam esta temática.
Estudaremos como é possível alfabetizar em contextos de letramento, quais atividades são possíveis
de serem desenvolvidas e, principalmente, como organizar o trabalho em sala de aula com crianças
no processo de alfabetização inicial.
Além destas avaliações iniciais tratadas, iremos estudar outros procedimentos de escrita e leitura
que contribuem para avaliação e diagnóstico da escrita, especialmente para crianças que já escrevem
alfabeticamente, como a reescrita, revisão e edição de textos, incluindo o trabalho com a análise e
reflexão sobre a língua.
O grande desafio colocado por este conteúdo é aprender como se pode alfabetizar crianças para
que, de fato, venham a assumir a condição de cidadãos da cultura letrada. O objetivo é mostrar, com
situações de leitura e de produção de texto, que a alfabetização é mais ampla que a apropriação de
diferentes usos da linguagem escrita.
Bons estudos!
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1. ALFABETIZAÇÃO AO LONGO DA HISTÓRIA
Como alfabetizar? Qual é o método de ensino mais adequado para alfabetizar os alunos? Escolher
um método de ensino não é fácil porque exige do professor um conhecimento de como o aluno
aprende e de como se dá a relação entre o ensino e a aprendizagem no processo de alfabetização.
A partir de agora propomos a você conhecer como os métodos de ensino vêm se transformando
ao longo da história.
Acreditava-se que aprender a escrever era necessário apenas para quem quisesse se tornar escriba.
Para o restante da população, o interesse era centrado na leitura e, para isso, não era necessário
ir para a escola. A aprendizagem da leitura se dava através da transmissão de conhecimento, e a
escrita aconteceria como consequência.
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É desta época o surgimento do alfabeto, tal como o conhecemos hoje. O nome das letras (princípio
acrofônico) do alfabeto era a chave da decifração. Bastava memorizar o nome das letras para iniciar
a decifração da escrita, que acontecia da seguinte maneira: juntando o valor das letras, descobria-se
a escrita da palavra. As ilustrações e o contexto em que a palavra era utilizada sempre contribuíram
na facilitação do processo de codificação.
Saiba mais
Assista aos vídeos sobre a história da escrita e seu desenvolvimento no mundo, para compreender a
importância que têm em nossa sociedade saber ler e escrever.
Disponível em:
Parte I: http://youtu.be/r7yeiRtc1fA.
2. OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO
No Brasil, desde o início do século XIX, há uma grande preocupação de teóricos e educadores
em buscar explicações para um problema antigo e, ao mesmo tempo, atual – a dificuldade das
crianças em aprender a ler e escrever, especialmente na escola pública. Buscando enfrentar esse
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problema, diferentes métodos de alfabetização foram propostos no decorrer desse período histórico
até os dias atuais.
É importante destacar que uma nova proposta pedagógica para desenvolver a aprendizagem da
leitura e produção escrita não nasce do nada, de um dia para outro. Ela é sempre resultado de uma
tentativa de ruptura com o já estabelecido e, ao mesmo tempo, da procura de uma continuidade, de uma
ligação com o passado. Portanto, para entendermos as práticas pedagógicas atuais de alfabetização,
é necessário adotarmos uma perspectiva histórica e examinar a história das metodologias. Esse
percurso permite constatar os avanços realizados e, ao mesmo tempo, explicar as resistências a
novas possíveis evoluções. Podemos perceber, no interior dos avanços, aquilo que permaneceu
inerte e que, até hoje, coloca obstáculos a uma mudança efetiva do modelo de aprendizagem de
leitura e escrita.
Pode-se separar a história do ensino da alfabetização em três períodos principais, sendo que
cada período possui um método específico:
• O primeiro vai da Antiguidade até meados do século XVIII e é marcado pelo uso exclusivo do
chamado “método sintético”.
• O segundo, a partir do século XVIII, dá início a um processo de oposição teórica ao método
sintético pelos precursores do chamado “método analítico”.
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2.1 Método sintético
O método sintético parte das unidades menores da língua: da relação letra/som ou da sílaba. São
eles: método da soletração, método da silabação e método fônico. Historicamente, teve influência
muito maior na alfabetização praticada nas escolas brasileiras.
Pode-se dizer que a língua escrita é vista como um conhecimento externo ao educando. O processo
se inicia do mais simples para o complexo, estabelecidos racionalmente por um processo cumulativo
em que a criança aprende as letras, depois as sílabas, as palavras, frases e, finalmente, o texto
completo. Dessa forma, acredita-se que o processo não pode avançar caso todas as dificuldades da
fase anterior não estejam dominadas, ou seja: o educando precisaria saber o alfabeto, conhecendo
cada uma das letras, independentemente do seu valor fonético e da sua escrita.
Observe, na Figura 2, como deve ser a sequência para a aplicação do método sintético:
Figura 2 – Método sintético
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2.1.1 Método da soletração ou método alfabético
Na Figura 3 apresentamos um exemplo de atividade que pode ser realizada em sala de aula:
Figura 3 – Método da soletração
Acredita-se que o aprendiz, ao compreender que poucas letras juntas substituem sílabas das
palavras faladas, e que coisas escritas apenas com duas letras podem ser lidas, decorando as sílabas
e juntando-as, será possível ler palavras e, consequentemente, ler textos. Este método surge com a
pretensão de “ensinar a ler bem num menor espaço de tempo”. Observe as etapas:
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• Neste método já se introduzem as frases;
• a princípio são apresentadas as vogais, na sequência, os ditongos, em seguida as consoantes;
• as sílabas são apresentadas na ordem (ma, me, mi, mo, mu) e depois embaralhadas para
identificação posterior;
• seguem-se palavras formadas por três letras (amo, mia, mau) e, finalmente, onze vocábulos
contendo as sílabas estudadas.
Ordem do conteúdo:
a) Cinco letras que representam as vogais;
b) ditongos;
c) sílabas formadas com as letras v, p, b, f, d, t, j, m, l;
d) dificuldades ortográficas aparecem do meio para o fim da cartilha: dígrafos, sílabas
travadas (terminadas por consoantes) e as letras g, c, z, s, x;
e) leitura.
Neste método é ressaltada a dimensão sonora da língua, as palavras são formadas por sons,
denominados de fonemas. Acredita-se que o aprendiz, ao compreender que os fonemas existem como
unidades, possa treinar a pronúncia de cada um deles (exemplo: /S/ /a/ /v/ /i/ para a palavra-chave)
e depois decore as letras equivalentes, aprendendo mais e mais correspondências fonema-grafema,
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para que possa ler palavras e, um dia, textos. Parte-se de unidades menores da língua e a ênfase
recai na decodificação e na codificação. São as etapas:
Ensina-se a produzir oralmente os sons representados pelas letras e uni-los para formar palavras;
primeiro, combinam-se entre si as vogais. Ex.: ai, eu, ou, aia, ei. Depois as combinações com
uma consoante. Ex: fi, fu, fui;
parte-se de palavras curtas, formadas por apenas dois sons representados por duas letras, para
depois estudar palavras de três letras ou mais;
são propostas associações visuais e auditivas com a forma e os sons das letras, e pode-se
utilizar histórias;
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Saiba mais
O primeiro desafio é descobrir que as palavras são formadas por fonemas (sons menores do que a
sílaba) e que os fonemas, por sua vez, são representados por grafemas (letras).
Aprender a decodificar
O segundo é aprender as relações entre os fonemas e os grafemas para compreender o som das
palavras escritas.
O terceiro desafio é conhecer as regras que normatizam a escrita das palavras. A seguir, há exemplos
de atividades propícias ao trabalho com o método fônico.
Figura 5 – Método fônico
Fonte: http://tiainez.blogspot.com.br/2010/02/apostila-metodo-fonico.html
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unidades amplas como histórias ou frases para chegar em nível de letra e som, mas sem perder de
vista o texto original e seu significado.
A ênfase da discussão sobre métodos continuou incidindo no ensino inicial da leitura, já que o
ensino inicial da escrita era entendido como uma questão de caligrafia (vertical ou horizontal) e do
tipo de letra a ser usada (manuscrita ou de imprensa, maiúscula ou minúscula), o que demandava
especialmente treino, mediante exercícios de cópia e ditado.
No grupo dos métodos analíticos, temos três tipos principais: a palavração, a sentenciação e o
método global. Veremos cada um deles a seguir.
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No método de palavração, as palavras são reconhecidas pela imagem visual e sua configuração
gráfica. Para que o aprendiz memorize as palavras, utilizam-se como recurso cartões de fixação, com
palavras de um lado e figuras de outro. Exercícios motores de escrita de cada palavra também são
realizados. Há o incentivo também de estratégias de leitura, como o olhar direcionado para detalhes
da palavra, como letras, sílabas e sons.
O método de palavração foi criado por Arthur Joviano, em 1907, em Minas Gerais. Para ele, o
aluno deveria ser capaz de ligar a ideia da palavra à forma e, assim, a palavra se desenharia na
sua “retina”. O livro dele apresenta lições com listas de palavras para serem exploradas oralmente.
As palavras impressas em listas aparecem em colunas, em posições distintas para que o aprendiz
a reconheça em qualquer posição. Sugere-se também o trabalho de decomposição de algumas
palavras listadas.
2.2.2 Método de sentenciação Quadro 2 – Método de palavração
ABACATE FOCA
Neste método, o trabalho é realizado por meio da
APITO FOGO
memorização de sentenças completas ou frases, para, em
seguida, tratar isoladamente as palavras que as compõem e, BONÉ GÊNIO
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Figura 7 – Método de sentenciação
O método global foi publicado por Lúcia Casasanta em 1930 com o título de O livro de Lili
(MORTATTI, 2000), que traz a seguinte metodologia: fase da história, que deve ser memorizada e
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“lida” durante um certo tempo; fase da sentença, em que se identifica sentenças do mesmo texto,
que podem ser recortadas e remontadas na ordem em que estavam no texto; fase de porção de
sentido, em que se reconhece expressões em sentenças conhecidas; fase de palavração, em que
se identificam palavras nas sentenças a partir de decomposições e, por último, a fase da silabação,
relacionando sílabas de palavras concretas e conhecidas pelos aprendizes. Suas historietas retratam
a família, enfatizando a mão como cozinheira e zelosa por suas bonecas, com a patinha Teteia, com
a cachorrinha Suzete e seu amigo Joãozinho.
Veremos agora os tipos principais do método global ou Figura 8 – Método global
dos contos.
Este método parte da ideia de que a criança lê e escreve textos relacionados com suas experiências.
Observe outras considerações importantes:
• A criança se familiariza com a escrita por imersão, à medida que interage com textos, ouve
histórias, desenha e faz tentativas de escrita.
• A criança aprende a ler lendo e a escrever escrevendo.
• O material de trabalho são os textos lidos para os colegas, composições impressas pelas
próprias crianças e textos relacionados à experiência.
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• O ensino desenvolve-se em situações de uso da leitura e da escrita.
• Valoriza-se a inteligência, os gestos e a sensibilidade. O desenvolvimento ocorre por meio da
livre expressão, do trabalho manual, da experimentação.
• Estimula a reflexão, a criatividade, o trabalho, a cooperação e a solidariedade.
O processo de alfabetização no Método Paulo Freire parte da escolha das palavras geradoras, em
seguida da silabação, da formação de novas palavras e da conscientização do educando. Vejamos:
• As palavras geradoras: o primeiro passo é o levantamento do universo vocabular dos alunos.
Por meio de conversas informais, o educador observa os vocábulos mais usados pelos alunos
e a comunidade, e assim seleciona as palavras que servirão de base para as lições.
• A silabação: cada palavra geradora passa a ser estudada através da divisão silábica,
semelhantemente ao método tradicional. Cada sílaba se desdobra em sua respectiva família
silábica, com a mudança da vogal (BA-BE-BI-BO-BU).
• As palavras novas: o passo seguinte é a formação de palavras novas. Usando as famílias
silábicas agora conhecidas, o grupo forma palavras novas.
• A conscientização: um ponto fundamental do método é a discussão sobre os diversos temas
surgidos a partir das palavras geradoras. Para Paulo Freire, alfabetizar não pode se restringir
aos processos de codificação e decodificação. Dessa forma, o objetivo da alfabetização de
adultos é promover a conscientização acerca dos problemas cotidianos, a compreensão do
mundo e o conhecimento da realidade social.
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• 2ª fase: Escolha das palavras selecionadas, seguindo os critérios de riqueza fonética e
dificuldades fonéticas – numa sequência gradativa das mais simples para as mais complexas,
do comprometimento pragmático da palavra na realidade social, cultural, política do grupo e/
ou sua comunidade.
• 3ª fase: Criação de situações existenciais características do grupo. Trata-se de situações
inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com o intuito de abrir perspectivas para
a análise crítica consciente de problemas locais, regionais e nacionais.
• 4ª fase: Criação das fichas-roteiro que funcionam como roteiro para os debates, as quais
deverão servir como subsídios, sem no entanto seguir uma prescrição rígida.
• 5ª fase: Criação de fichas de palavras para a decomposição das famílias fonéticas correspondentes
às palavras geradoras.
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• A criança não tem oportunidade de produzir o seu próprio texto, partindo de suas experiências
e vivências sociais.
O aprendizado do código alfabético se dava por meio do ensino transmissivo das unidades da
língua seguindo uma progressão predeterminada que vai das unidades mais simples para as mais
complexas. Partia-se do pressuposto de que todos os alunos iniciavam o processo sem conhecimento
algum sobre a escrita, como um papel em branco, e que cabia aos professores o ensino das letras,
sílabas e palavras. Ao aluno, nessa concepção, restaria um papel passivo de “recebedor” de algo
pronto: a língua.
Assim, o trabalho com a linguagem nessa primeira etapa da alfabetização oferecia muitas atividades
para as crianças desenvolverem habilidades de coordenação motora e discriminação auditiva e visual,
para que o aluno fosse capaz de identificar o traçado das letras e das sílabas isoladas. Dessa forma,
o acesso aos textos limitava-se à prática de contar histórias pela professora, com o intuito de tornar
o texto escrito mais simples e, consequentemente, mais “fácil” de ser compreendido.
As autoras Almira Sampaio Brasil da Silva, Lúcia Marques Pinheiro e Risoleta Ferreira Cardoso
criaram o “Método misto de ensino da leitura e da escrita” que foi utilizado na Escola Guatemala, na
cidade do Rio de Janeiro, em 1965.
Para a aplicação do “método da Abelhinha” são usados recursos fônicos e visuais, tendo como
protagonista a História da Abelhinha, organizada em sete capítulos, estabelecendo relações entre
os personagens, os sons e as letras.
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• Há a associação de três elementos: personagem - forma da letra - som da letra (fonema).
A personagem Abelhinha, que dá nome ao método, tem uma grande importância no enredo da
história, pois, através das situações que são criadas pelas autoras a partir da perda de uma de suas
asinhas, os demais personagens são apresentados, criando um clima de magia e envolvimento
através da narração.
SAIBA MAIS
É um método global que parte da letra contextualizada. As letras são associadas ao universo
dos educandos.
• A base do método está na associação da letra (método de fonação), como personagem de
uma história: papai (p), mamãe (m), neném (n) e ratinho (r);
• A aprendizagem acontece por meio do jogo, propondo que a sala de aula seja um espaço
para a criatividade e a livre expressão das crianças, dispensando o esforço da memorização.
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Figura 11 – Introdução das vogais, através da recitação
Fonte: http://www.acasinhafeliz.com.br/CasinhaFeliz.htm
Saiba mais
Para saber mais sobre os métodos de alfabetização, assista ao vídeo “Pata Nada”.
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3. O SURGIMENTO DAS CARTILHAS
Cartilhas são livros didáticos infantis destinados ao período da alfabetização. Daí seu caráter
transitório, limitando-se seu uso à etapa em que, na concepção tradicional da alfabetização, a
criança necessita dominar o mecanismo considerado de base na aprendizagem da leitura e escrita.
Apresentam um universo de leitura bastante restrito, em função de seu objetivo: trata-se de um pré-
livro, destinado a um pré-leitor.
A cartilha restringe-se ao ensino de técnicas Figura 12 – Classes de alfabetização
de leitura, entendendo-se esse procedimento
como a decifração de um elemento gráfico em
um elemento sonoro. É assim que a criança
aprende a identificar as letras, em seguida
as sílabas e depois as palavras. Apesar da
diversidade de concepções sobre os diferentes
autores de cartilhas, cabe afirmar que todos eles
destacam a dependência do sistema de escrita
em relação ao sistema oral. Todas as cartilhas Fonte: UberImages/Istock
partem do pressuposto de que, para aprender
a ler, o aluno deve transformar o signo em signo oral para depois chegar à compreensão.
A Cartilha do ABC, também escrita por João de Barros, podia ser comprada até em alguns
supermercados ou certas lojas de estações de trem.
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Figura 13 – Cartilha João de Barros
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_de_Barros#/media/File:Grammatica_da_lingua_portuguesa.jpg
Outra cartilha muito conhecida, produzida por Antônio Feliciano de Castilho (1850), em Lisboa,
também foi utilizada no Brasil, chamada de O método Castilho para o ensino rápido e aprazível do ler
impresso, manuscrito e numeração do escrever. Essa obra incluía abecedário, silabário e textos de
leitura, sendo arcada por preocupações fonéticas. Apresentava textos narrativos para ensinar o uso
das letras, fazendo uma lição para cada uma delas e para os dígrafos. Veja na Figura 14 a imagem
de um exemplar:
Figura 14 – Método Castilho
Fonte: http://institutodecoimbra.blogspot.com.br/2010/01/alfabetizacao-e-polemica-
do-metodo-de.html (versão digitalizada em http://purl.pt/185).
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Em 1876, surgiu o segundo texto português de importância para o ensino da leitura no século
passado: a Cartilha maternal, do poeta João de Deus Ramos. Nela era utilizado um modo de escrever
letras com destaque dentro das palavras, desenhando-as com hachuras. Dessa forma, o aprendiz
se concentrava no que de novo era apresentado. O autor era contra os métodos já apresentados.
O seu trabalho marca a transição dos métodos existentes para os métodos analíticos, que foram
divulgados no Brasil durante a República.
Figura 15 – Cartilha João de Deus
Fonte: http://www.leilaodeartebrasileira.com.br/peca.asp?
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A título de apresentação, o autor expõe, antes da 1ª lição, alguns subsídios para uma melhor
utilização da cartilha como instrumento auxiliar do trabalho.
As lições tanto podem servir ao ensino pela silabação como pela palavração. Neste
caso, o aprendizado deve ser iniciado na 4ª lição. Recomenda-se a quem se encarregue
do ensino, professor ou leigo, que desde logo leve os alunos a escrever, no quadro
negro ou no caderno, mediante cópia de modelos que para isso prepare, e depois
sob ditado. A escrita deve ser feita em letra manuscrita, sem que as sílabas se
apresentem separadas, como aparecem nas primeiras lições do livro. Desde o início,
se o ensino estiver sendo feito pela silabação, ou, quando julgado conveniente, se
estiver sendo feito pela palavração aconselha-se que os alunos organizem uma
coleção de pequenos cartões ou pedacinhos de papel, em que eles próprios escrevam
as sílabas aprendidas. Com esse material, tão fácil de obter-se, terão as crianças
elementos de um jogo que lhes despertará grande interesse, e que servirá tanto aos
exercícios de verificação das palavras e sílabas aprendidas como aos de invenção
para a descoberta de novas palavras ou combinações destas em sentenças. O aluno
mais rapidamente compreenderá assim o mecanismo da leitura e logo chegará às
historietas apresentadas nas últimas páginas, umas originais, outras adaptadas.
(MORTATTI, 2000 apud LOURENÇO FILHO, 1953, p. 2).
Outras cartilhas que também merecem destaque pela influência que exerceram na alfabetização
são a Caminho suave, de Branca Alves de Lima, e a Cartilha Sodré (MORTATTI, 2000), que constam
também na lista das dez mais utilizadas em grupos escolares.
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Figura 17 - Cartilhas Caminho Suave e Cartilha Sodré
É possível concluir que as cartilhas, tanto as apresentadas aqui como as demais, apresentam
textos completamente artificiais, elaborados apenas com o intuito de gerar unidades das lições com
os elementos já dominados. Esses textos não lidam adequadamente com os elementos coesivos e,
às vezes, nem com a coerência discursiva, o que faz deles modelos inapropriados para os alunos. O
único objetivo das cartilhas é colocar em evidência a estrutura da língua escrita, tal como é concebida
pelos métodos de alfabetização. Por isso, as cartilhas tendem a apresentar uma escrita sem significado.
Figura 18 – Cartilha Caminho suave
Fonte: http://3.bp.blogspot.com/_mbLYbECcgPg/SK75VGsijSI/AAAAAAAADPw/TpVoIrAduD8/
s320/Cartilha+para+alfabetiza%C3%A7%C3%A3o+de+Ademir+Pfiffer+05.jpg
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A partir da década de 50, a escola tornou-se um bom laboratório para pesquisadores da área da
psicologia. Com a necessidade de ampliar o trabalho desenvolvido com os métodos e as cartilhas
de alfabetização, os psicólogos produziram livros de “exercícios de prontidão”, que se restringia
ao aluno: fazer curvinhas, completar figuras e localizar animais, objetos à direita e à esquerda. A
escrita continuou sendo entendida como uma questão de habilidade caligráfica e ortográfica, que
devia ser ensinada simultaneamente à habilidade de leitura. O aprendizado de ambas demandava
um “período preparatório”, que consistia em exercícios de discriminação e coordenação visomotora
e auditivomotora, posição de corpo e membros, dentre outros.
Mas é claro que não é com esses exercícios que se aprende a ler e a escrever. O professor
pode propor inúmeras atividades mais significativas que contribuam de fato para o processo de
alfabetização. Para aprender a ler é preciso conhecer as letras e os sons que representam, mas é
também fundamental buscar o sentido, isto é, compreender o que está escrito.
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4. CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO
No tópico Alfabetização ao longo da História, abordamos a história do ensino da leitura e da
escrita na fase inicial de escolarização de crianças no Brasil. Vimos também que as práticas sociais
de leitura e escrita se tornaram práticas escolarizadas, submetidas à organização, sistemática e
intencional, a partir de métodos de ensino.
De lá para cá, saber ler e escrever tornou-se uma grande preocupação social, cultural e política,
principalmente porque a maioria da população brasileira fracassava na escola e, também, porque
havia um índice de medida e testagem da eficiência da escola pública, laica e gratuita, o que foi
atribuindo diferentes sentidos ao ensino da leitura e escrita.
Com base na perspectiva interacionista, é possível pensar numa proximidade entre alfabetização
e letramento, porque o texto é a “concretude” da língua e a “materialização” do discurso. É possível
pensar tomando o texto como unidade de sentido, portanto, como objeto de ensino-aprendizagem e
ao mesmo tempo mediador desse processo. O interacionismo permite ampliarmos as possibilidades
de uso e funções sociais do ler e escrever, porque nos proporciona pensar na contribuição dessas
atividades especificamente humanas para o processo da constituição do sujeito, que são também
leitores e produtores de textos que buscam atribuir sentidos para a vida.
Por outro lado, é importante destacar que apenas a interação com textos que circulam socialmente
não garante que os alunos se apropriem da escrita alfabética, uma vez que, no geral, essa aprendizagem
não acontece de forma espontânea, mas exige um trabalho de reflexão sobre as características do
nosso sistema de escrita. Iremos abordar com mais profundidade este tema ao longo do material.
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Saiba mais
Para saber mais, assista ao vídeo: O que é ser alfabetizado e letrado? Parte 1 - Salto para o futuro.
Nos primeiros censos populacionais já se buscava conhecer o número de pessoas que sabiam
ou não ler e escrever. Os critérios para considerar um sujeito analfabeto ou alfabetizado foram sendo
modificados a partir de novas condições culturais, sociais e políticas do país e, em decorrência, nas
definições de alfabetização.
A partir da década de 1950, uma pessoa capaz de escrever apenas seu próprio nome era
considerada analfabeta. No censo de 2000,
[...] considerou-se como alfabetizada a pessoa capaz de ler e escrever um bilhete
simples, no idioma que conhecesse. Aquela que aprendeu a ler e escrever, mas
esqueceu, e a que apenas assinava o próprio nome foram consideradas analfabetas
(IBGE, 2000, s/p).
Os critérios definidos a partir do censo de 1950 no Brasil passaram a se basear nas definições
de alfabetização/analfabetismo da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco). Desde que essa organização foi fundada, essas definições vêm sendo elaboradas,
revisadas e recomendadas.
Os dados são obtidos por meio de pesquisas por amostragem de domicílio e também pelas
avaliações do sistema educativo e das competências dos estudantes – Programa Internacional
de Avaliação de Estudantes (Pisa) e, no Brasil, do Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional
(Inaf), a partir de 2000, Sistema Nacional de Avaliação da Educação (Saeb), do Exame Nacional de
Desempenho de Estudantes (Enade) para o Ensino Superior, e do Exame Nacional do Ensino Médio
(Enem), a partir da década de 1990.
O estudo mais recente a respeito do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), foi realizado entre
2012 e 2015 pelo Instituto Paulo Montenegro e os profissionais da Ação Educativa. Pode-se verificar a
melhoria nas condições de alfabetismo da população jovem e adulta brasileira e a progressiva ampliação
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da escolaridade de sua população. Essa pesquisa se deu por meio de entrevistas domiciliares e a
amostra é estratificada com alocação proporcional à população brasileira de cada região.
A seguir, apresentamos a escala de alfabetismo do Inaf, organizada em cinco grupos que retratam
distintas condições de alfabetismo: analfabeto, rudimentar, elementar, intermediário e proficiente.
Esse novo agrupamento permite compreender as habilidades e práticas que compõem esses grupos
a partir da revisão da escala de proficiência.
Quadro 3 – Escala de proficiência
Analfabeto Corresponde à condição dos que não conseguem realizar tarefas simples
que envolvem a leitura de palavras e frases, ainda que uma parcela destes
consiga ler números familiares (números de telefone, preços etc.).
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Grupos Escala especial para estudo alfabetismo
Nesse estudo, participaram 2.002 pessoas escolhidas de forma amostral, considerando a alocação
proporcional à população brasileira em cada região. Na amostra realizada para este estudo, as
mulheres representam 52%, e os homens, 48% de população pesquisada. Em termos educacionais,
44% declararam estar cursando ou ter cursado até o ensino fundamental, 40% o ensino médio e
apenas 17% o ensino superior.
A tabela a seguir apresenta a distribuição dos respondentes nos cinco grupos de alfabetismo.
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Tabela 1 – Distribuição da população pesquisada por grupo de alfabetismo
Grupo % Nº de respondentes
Analfabeto 4% 88
Proficiente 8% 161
Os resultados indicam que 27% das pessoas foram classificadas como analfabetas funcionais, sendo
apenas 4% correspondente ao grupo de pessoas consideradas analfabetas, já que não conseguem
realizar tarefas simples que envolvam leitura de palavras e frases. Apenas 8% dos respondentes
estão no último grupo de alfabetismo, revelando que mesmo as pessoas que têm o ensino superior
(17%) não conseguem alcançar o grupo mais alto da escala de alfabetismo.
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Tabela 2 – Distribuição da população pesquisada por grupos de alfabetismo e escolaridade (% nos grupos)
Nenhuma 97 5% 59% 8% 1% 0% 0%
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A pesquisa mais recente realizada pelo IBGE atesta que cerca de
[...] 66,3 milhões de pessoas de 25 anos ou mais de idade (ou 51% da população
adulta) concluíram apenas o ensino fundamental. Além disso, menos de 20 milhões
(ou 15,3% dessa população) haviam concluído o ensino superior (IBGE, 2018).
A taxa de analfabetismo no país foi de 7,2% em 2016 (11,8 milhões de analfabetos), sendo que,
para as pessoas de 60 anos ou mais de idade, a taxa de analfabetismo chegou a 20,4%. A região
Nordeste apresentou a maior taxa de analfabetismo (14,8%), quase quatro vezes maior do que as
taxas do Sudeste (3,8%) e do Sul (3,6%). Já na região Norte essa taxa foi de 8,5%, e, no Centro-
Oeste, de 5,7%. Outro dado significativo é que “[...] 51% da população de 25 anos ou mais possuem
apenas o ensino fundamental completo e 15,3% concluíram o ensino superior” (IBGE, 2018).
Apesar dos avanços obtidos, de acordo com levantamento divulgado pela Unesco, o Brasil
possui a oitava maior população de adultos analfabetos. São cerca de 14 milhões de pessoas. Este
fato compromete o futuro do Brasil e exige políticas públicas para melhorar os índices, tanto os
quantitativos como os qualitativos.
Figura 19 – Países com mais adultos analfabetos
Fonte: https://veja.abril.com.br/blog/impavido-colosso/brasil-e-o-8-pais-com-mais-adultos-analfabetos-do-mundo/
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Trata-se, portanto, de um problema que acompanha a história do país. A educação escolar se
tornou, assim, um meio privilegiado de aquisição de saber. Como vimos, é preciso saber utilizar a
leitura e a escrita de acordo com as exigências sociais – o que vem sendo designado “letramento”.
É preciso avançar muito mais no aprendizado da leitura e da escrita no Brasil.
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Figura 20 - Desempenho de leitura (Pisa/2015)
Fonte: https://exame.abril.com.br/brasil/brasil-esta-entre-os-8-piores-em-ciencias-em-ranking-de-educacao/
Acredita-se que, para reverter esse quadro, é necessário investir na formação dos professores,
nos materiais de apoio, nos materiais didáticos, nas plataformas digitais e, especialmente, nas políticas
públicas que considerem as especificidades de cada estado, município e escola, mas que tenha uma
base nacional curricular comum.
6. LETRAMENTO
Atualmente, letramento é a palavra mais utilizada na maioria dos textos acadêmicos sobre o
tema e se encontra também em alguns dicionários técnicos e de alfabetização. O termo foi utilizado
pela primeira vez por Mary Kato na apresentação de seu livro No mundo da escrita: uma perspectiva
psicolinguística (1986) e traz uma definição indireta de letramento relacionada com a função da
escola de formar “cidadãos funcionalmente letrados”, do ponto de vista tanto do crescimento cognitivo
individual quanto do atendimento a demandas de uma sociedade que prestigia a língua padrão ou
norma culta da língua.
Leda V. Tfouni, em seu livro Adultos não alfabetizados: o avesso do avesso (1988), evidencia as
relações entre escrita, alfabetização e letramento e o conceitua como um termo centrado nas práticas
sociais de leitura e escrita e nas mudanças por elas geradas em uma sociedade. Em Letramento
e Alfabetização (1995), Tfouni constata que falta, em nossa língua, uma palavra para designar o
processo de estar exposto aos usos sociais da escrita, sem, no entanto, saber ler nem escrever.
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Magda Soares também publicou alguns livros e muitos artigos discutindo o termo letramento,
especialmente em Letramento: um tema em três gêneros (2004). A autora é referência constante
nos estudos sobre este tema.
Como Magda Soares (2004) e outros estudiosos, considera-se perfeitamente possível e adequado
alfabetizar letrando, isto é, ensinar o sistema de escrita alfabética, permitindo que os aprendizes
vivam práticas de leitura e de produção de textos nas quais vão incorporando aqueles conhecimentos
sobre a língua escrita.
Saiba mais
Para saber mais, assista ao vídeo O que é letramento, que procura mostrar por meio de um poema de
Kate M. Chong o significado tão complexo desta palavra.
Partindo dessas definições, é possível dizer que o letramento está diretamente relacionado com
a língua escrita e seu lugar, suas funções e seus usos nas sociedades letradas. É a inserção na
cultura escrita que valoriza o ler e o escrever do modo mais efetivo – não apenas o acesso a ela,
mas também a participação efetiva na cultura escrita.
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Curiosidade
“Etimologicamente, a palavra inglesa literacy, vem do latim littera (letra), com o sufixo – cy, que
denota qualidade, condição, estado, fato de ser (como, por exemplo, em innocency, a qualidade
ou condição de ser inocente). No Webster’s Dictionary, literacy tem a acepção de ‘the condition
of being literate’, e literate é definido como ‘educated; especially able to read and write’, educado,
especialmente capaz de ler e escrever. Ou seja: literacy é o estado ou condição que assume
aquele que aprende a ler e a escrever. Implícita nesse conceito está a ideia de que a escrita traz
consequências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas, linguísticas, quer para o grupo
social em que seja introduzida, quer para o indivíduo que aprenda a usá-la. Em outras palavras: do
ponto de vista individual, aprender a ler e escrever – alfabetizar-se, deixar de ser analfabeto, tornar-
se alfabetizado, adquirir a ‘tecnologia’ do ler e escrever e envolver-se nas práticas sociais de leitura
e de escrita – tem consequências sobre o indivíduo, e altera seu estado ou condição em aspectos
sociais, psíquicos, culturais, políticos, cognitivos, linguísticos e até mesmo econômicos; do ponto de
vista social, a introdução da escrita em um grupo até então ágrafo tem sobre esse grupo efeitos de
natureza social, cultural, política, econômica, linguística. O ‘estado’ ou a ‘condição’ que o indivíduo
ou o grupo social passam a ter, sob o impacto dessas mudanças, é que é designado por literacy.”
(SOARES, 2004, p. 18, grifo nosso).
As práticas de letramento envolvem diferentes tipos de material escrito, eventos e práticas que
fazem parte naturalmente das experiências vividas pelas pessoas e grupos sociais em sociedades
letradas. Considera-se, então, a existência de diferentes níveis de letramento. Mesmo adultos e
crianças analfabetas podem ser considerados letrados em certo nível, porque podem utilizar no
discurso oral características apontadas como exclusivas do discurso escrito. Pode ocorrer também
que pessoas alfabetizadas tenham um baixo nível de letramento, podendo ser consideradas iletradas,
já que o letramento não é consequência natural da alfabetização. Nesse sentido, a leitura e a escrita
precisam ser ensinadas e aprendidas, e a escola continua sendo uma das agências privilegiadas
para o processo de aquisição da leitura e da escrita e para a promoção do letramento.
As práticas de leitura e produção de textos implicam uma situação social. Na vida cotidiana, um
mesmo sujeito realiza diferentes ações de leitura e escrita. Por exemplo, imaginemos uma pessoa
que, pela manhã, lê jornal, ouve o noticiário do rádio ou assiste ao jornal da TV; em seguida, faz uma
lista de compras e escreve um bilhete para alguém que vai chegar durante sua ausência; depois, vai
ao mercado, lê os folhetos de ofertas e localiza nos rótulos das embalagens a composição do produto
e a data de validade; ao voltar para casa, encontra uma carta na caixa de correio e a lê; prepara
uma comida lendo uma receita escrita; conversa com o(a) vizinho(a); lê e responde mensagens do
correio eletrônico; à noite, lê um romance para se descontrair etc. Todas essas ações são diferentes
formas de ler e produzir textos.
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linguagem escrita e com palavras antes mesmo de adquirirem o conhecimento da escrita convencional.
Isso significa que elas compartilham os usos e as funções da escrita com os adultos, mas precisam
entender como funciona o sistema de escrita alfabética.
Como desenvolver práticas de alfabetização nessa perspectiva? Seriam essas práticas efetivas?
O trabalho com a língua portuguesa deve se dar por meio de práticas sociais de leitura e escrita,
formando alunos que saibam produzir e interpretar textos de uso social, tanto orais como escritos,
e que estejam inseridos em várias situações comunicativas que permitem a plena participação no
mundo letrado. Para isso é imprescindível colocar o aluno em contato sistemático com o papel de
leitor e escritor, compartilhando a multiplicidade de propósitos que a leitura e a escrita possuem: ler
por prazer, para se divertir, para buscar alguma informação específica, para partilhar emoções com
os outros, para contar aos outros o que leu ou para recomendar; escrever para expressar as ideias,
para organizar os pensamentos, para aprender mais, para registrar e conservar como memória, para
informar, para expressar sentimentos, para se comunicar a distância ou para influenciar os outros.
É preciso que o aluno ocupe sistematicamente a posição de leitor e escritor. Criar um contexto de
letramento desde a educação infantil é necessário, pois representa uma abertura de possibilidades,
um exercício do direito de aprender na escola as práticas de leitura e escrita tal como acontecem na
vida. É desta forma que se pode favorecer a plena participação dos alunos no mundo da cultura escrita.
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Uma criança que já conhece várias funções da escrita, que já desenvolveu o gosto pela leitura de
histórias, que já se arrisca a ler e a escrever, por conviver com pessoas que usam a escrita, certamente,
ao entrar na escola, não terá dificuldade de compreender o funcionamento do código alfabético, seja
qual for o método utilizado. No entanto, para uma criança que não teve esta oportunidade, a entrada
no mundo da escrita pela alfabetização desvinculada do letramento, resulta, em geral, em fracasso
na aprendizagem.
A leitura em voz alta tem sido uma das estratégias mais eficientes para favorecer esse processo
e aproximar os alunos do mundo letrado, mesmo quando ainda não sabem ler. A leitura contribui para
ampliar a visão de mundo, estimular o desejo de outras leituras, exercitar a fantasia e a imaginação,
compreender o funcionamento comunicativo da escrita, compreender a relação fala/escrita, desenvolver
estratégias de leitura, ampliar a familiaridade com os textos, desenvolver a capacidade de aprender,
aprimorar o repertório textual e de conteúdos para a produção dos próprios textos, conhecer as
especificidades dos diferentes tipos de texto e favorecer a aprendizagem das convenções da escrita,
só para citar algumas possibilidades.
Para experimentar essas possibilidades, não é preciso ler por si mesmo. É possível ler através
do professor. Portanto, na rotina da sala de aula, seja qual for a idade dos alunos, é fundamental que
sejam garantidos momentos diários de leitura pelo professor e pelos alunos.
Figura 21 – Professor e alunos
Fonte: SirJ_Po/Istock
É importante afirmar que a simples exposição dos alunos à escrita de aula não é suficiente para
que eles se alfabetizem. Salas de aula cheias de escritas afixadas nas paredes não se constituem,
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por si só, em ambientes alfabetizadores nem contextos de letramento. Isso é algo que depende da
criação do maior número possível de situações de uso real da escrita na escola.
A aprendizagem da escrita está relacionada à reflexão que os alunos podem fazer sobre ela – suas
características, seu modo de funcionamento e suas regras de geração. Para que eles aprendam a ler
e escrever, é preciso, portanto, planejar situações didáticas específicas destinadas a essa finalidade,
não bastando inundá-los de letras escritas.
Para que o aprendiz reflita sobre o sistema de escrita alfabética, é necessário que ele se aproprie
de uma série de conhecimentos, tais como:
a) Escreve-se com letras, que não podem ser inventadas, que têm um repertório finito e que
são diferentes de números e outros símbolos.
b) As letras têm formatos fixos, e pequenas variações produzem mudanças em sua
identidade das mesmas (p, q, b, d), embora uma letra assuma formatos variados (P, p, P, p).
c) A ordem das letras é definidora da palavra e configuram-na. Uma letra pode se repetir no
interior de uma palavra e em diferentes palavras.
d) Nem todas as letras podem vir juntas de outras e nem todas podem ocupar certas
posições no interior das palavras.
e) As letras notam a pauta sonora, e não as características físicas ou funcionais dos
referentes que substituem.
f) Todas as sílabas do português contêm uma vogal.
g) As sílabas podem variar quanto às combinações entre consoantes, vogais e semivogais
(CV, CCV, CVSv, CSvV, V, CCVCC, ...), mas a estrutura predominante é a CV (consoante-
vogal).
h) As letras notam segmentos sonoros menores que as sílabas orais que pronunciamos.
i) As letras têm valores sonoros fixos, apesar de muitas terem mais de um valor sonoro
e certos sons poderem ser notados com mais de uma letra. (adaptado de LEAL;
ALBUQUERQUE; MORAIS, 2010).
Defendeu-se até aqui a necessidade de a criança vivenciar, desde cedo, atividades do nosso sistema
de escrita de forma reflexiva e lúdica, sendo inserida em atividades de leitura e escrita de diferentes
textos. É imprescindível o envolvimento dos estudantes em situações prazerosas, contextualizadas
e significativas que explorem a compreensão e a produção de textos de variados gêneros orais e
escritos. Porém, para que a criança seja capaz de ler e produzir textos com autonomia, é necessário
que se consolide as correspondências grafofônicas, ao mesmo tempo em que vivenciem atividades
de leitura e produção de textos.
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Conhecer as letras do alfabeto, saber que as palavras são segmentadas em sílabas, perceber
que existem relações entre o uso de unidades gráficas (letras) e unidades sonoras (fonemas) ou
mesmo saber comparar palavras quanto às semelhanças sonoras e gráficas são aprendizagens,
dentre outras, que podem ser consolidadas logo no início do ensino fundamental.
Para criar contextos significativos é importante ouvir o que os alunos têm a dizer e observar as
situações em que eles se mobilizam para realizar com entusiasmo as atividades. Além disso, podem ser
criadas estratégias específicas, como assembleias de turma em momentos de conversa espontânea,
por exemplo, roda de casos ou de tomadas de decisões coletivas sobre a organização do trabalho.
Outra estratégia é a discussão sobre programas vistos na TV, livros, brincadeiras, viagens, cultura e
hábitos das famílias e acontecimentos que mobilizam a cidade, o país e o mundo.
É necessário também favorecer o contato com os textos, com seu uso efetivo e com a análise de
seus aspectos formais, para que as relações entre a escrita e a leitura se façam presentes de maneira
significativa para os alunos. Situações como avisos aos alunos, comunicações entre as turmas,
pesquisas e seus registros e cartazes relacionados à vida escolar são ricas em potencial educativo.
Para entrar no mundo da escrita, é importante que as crianças interajam com uma grande
diversidade de textos, já que são capazes de produzir e reproduzir textos narrativos, descritivos, de
ficção, cartazes e textos de jornais.
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Outro aspecto fundamental que o professor precisa considerar em sala de aula é que o ensino
priorize o atendimento à heterogeneidade. Perrenoud (1995) aposta nas atividades promotoras de
interações que desafiem os educandos a construir novos conhecimentos. Essa alternativa, segundo o
autor, é alcançada por meio de uma prática que considere os percursos individuais de cada aprendiz,
sem confundir esse caminho com a elaboração de programas especiais, vinculados às necessidades
educativas de cada aluno, por um lado, ou a adesão de um ensino em que todos, sempre e ao mesmo
tempo, estejam expostos às mesmas atividades e conteúdos.
A resposta é: usando recursos didáticos disponíveis na escola para lidar com os alunos em vários
níveis de aprendizagem do sistema de escrita alfabética. Por exemplo, além do trabalho de reflexão
sobre palavras, desenvolvido no coletivo com a mediação da professora, é possível que as crianças
leiam silenciosamente, se souberem ler autonomamente, mas possivelmente ainda não compreendem
o texto. Quando isso acontece, é importante que a professora leia para o grupo. Depois da leitura
coletiva, podem ser feitas questões sobre o texto, oralmente ou por escrito. Para os aprendizes que
não leem convencionalmente, pode-se propor um trabalho com a localização de palavras do texto,
como circular palavras que eles já conhecem.
Leal (2004) reafirma que as situações didáticas de trabalho individual são também muito importantes
no processo de aprendizagem, pois as crianças podem pensar sobre conceitos e organizar o que já
sabem sobre determinado tema e tomar consciência de quais são as suas lacunas.
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É importante que elas aprendam a refletir e a sistematizar seus próprios saberes, que
aprendam a coordenar sozinhas suas ações e colocar à disposição o que já sabem
para resolver os problemas a serem superados. O fato de propor um trabalho individual
não implica que desconsideremos a importância da interação em sala de aula, nem
que o aluno não possa estabelecer trocas, ou fazer perguntas, ou até mesmo levantar
da cadeira para falar com o professor ou com um colega. Atividades de “ditado mudo”
são excelentes propostas para que os alunos mobilizem o que eles aprenderam para
notar as palavras no papel. Nesse momento, o professor pode passar nas carteiras,
olhando o que eles estão escrevendo e conversando com cada um, individualmente,
levando-os a usar pistas para realizar a tarefa, pode ser preciosa para que os alunos
ultrapassem obstáculos e sintam o interesse do professor. (LEAL, 2004, p. 48).
Outra atividade bastante interessante para trabalhar com os alunos em seus diferentes níveis
de aprendizagem é a utilização de jogos. Em todas as culturas existem jogos com palavras, e as
crianças gostam de brincar com as letras para formar as palavras que estão aprendendo a escrever.
Saiba mais
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7.2 Organização das atividades
Daremos algumas sugestões de atividades que poderão ser desenvolvidas durante todo o ano,
considerando as experiências e o diagnóstico da turma. Curto, Morillo e Teixido (2000) apresentam
sugestões gerais para a organização por atividades que o professor pode ter como parâmetros
durante a alfabetização, reproduzidas a seguir, além de outras que também são significativas para
o desenvolvimento da criança:
• Explicação de textos
• Leitura de textos pelo professor
• Reconstrução oral de contos e narrativas
• Ditado para o professor
• Memorização de textos (canções, poemas, refrões)
• Declamação e dramatização
• Tomar notas (para alunos que já dominam o sistema alfabético)
• Preparar debates
• Jogral para a turma com poemas
• Roda de leitura
- orientar como devem se apresentar (postura, timbre de voz, esperar a vez de falar, dar importância
para saber já de cor o que o texto fala, entonação, dentre outras);
- pedir que os alunos observem a forma como se apresentaram, se têm dificuldades em falar
em público ou não etc.
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• Montar as palavras em destaque de cada poema com letras móveis
• Retirar do texto palavras que começam com a mesma letra
• Listar palavras e identificar o início de cada uma delas
• Identificar oralmente as palavras que rimam no poema
• Identificar a semelhança sonora entre as palavras
• Confeccionar palavras com letras móveis, máquinas de escrever, computadores etc.
• Interpretação da própria escrita
• Interpretação de textos com imagens
• Leitura de textos memorizados
• Interpretação de textos a partir de (localizar, completar, escolher)
Figura 22 – Ler sem saber ler
• Cópia de textos
• Ditados – o aluno dita ao professor, um aluno dita a outro(s), o professor dita aos alunos
• Escrita de textos memorizados
• Reescrita de textos conhecidos (repetir, fazer alterações, escrever diferentes versões do texto)
• Completar textos incompletos, com lacunas etc.
• Escrever textos originais
• Atividades de edição, reprografia e impressão
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• Leitura de textos com lacunas, incompletos
• Reconstrução de textos fragmentados e desordenados
• Relacionar e classificar textos distintos
• Resumo e identificação da ideia principal
• Atividades de biblioteca e de gosto pela leitura
• Atividades de arquivo e classificação de textos
• Explorar poemas por meio de atividades impressas que tenham como foco circular palavras
e responder questões de compreensão de textos de forma individual
• Estimular a antecipação de sentidos sobre o livro apenas pela análise da capa e do seu título
• Explorar quem é o autor e perguntar se os alunos conhecem outros livros do mesmo
• Explorar as imagens da capa
• Explorar a relação entre várias informações apresentadas no texto
Figura 23 – A leitura em diferentes espaços
Além das atividades listadas, apresentamos outras propostas que podem ser aplicadas em sala
de aula.
a) Jogos e desafios
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Possíveis situações para o jogo de bingo
* Os alunos recebem apenas a cartela sem as letras e consultam o alfabeto da sala de aula para
escolher quais letras colocar; preenchendo a cartela à sua escolha. À medida que a professora
sorteia, os alunos vão marcando (isso exige conhecimento do alfabeto, habilidade de grafar as letras
e reconhecimento da letra ditada).
* A professora fornece a cartela preenchida com palavras conhecidas e dita as palavras que serão
marcadas na cartela. Isso exige identificação e reconhecimento global de palavras ditadas. Se a
professora apresenta a palavra ao ditar, exige-se a habilidade de comparação; se não a apresenta,
exige-se memorização. Se a professora ao apresentar apenas mostra a palavra sorteada, os alunos
exercitam a leitura quando têm de descobrir qual é a palavra.
* A professora preenche a cartela com letras e sorteia palavras para os alunos identificarem a letra
inicial. Nesse caso, se a professora dita e mostra a palavra, os alunos vão identificar a letra, mas,
se a professora não a mostra, os alunos têm de selecionar, na cadeia sonora, o primeiro fonema e
descobrir a letra correta que lhe corresponde na cartela.
Figura 24 – Legenda
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b) Trabalho com temas
O trabalho partindo da organização por temas favorece a leitura e o registro de textos relacionados
ao assunto escolhido. O tema pode ser eleito ou proposto, como brincadeiras, cinema ou esportes.
Cabe ressaltar que são as atividades de leitura e escrita em torno do tema que contribuem para
o processo de alfabetização. Se, por exemplo, o grupo estiver estudando o tema “brincadeiras de
nosso tempo e da época de nossos avós”, vai precisar registrar por escrito as listas de nomes de
brincadeiras, fazer esquemas comparativos entre as brincadeiras de outros tempos mas que ainda
permanecem e as mais desconhecidas, vai poder produzir um convite para os avós, criar legendas
para exposição de brinquedos, entre várias outras atividades.
Todas essas atividades vão exigir que o professor apresente exemplos de tipos de textos e
solicite às crianças que tentem escrever, com sua ajuda, uma carta de convite ou um cartaz. Exigem,
também, que ele proponha jogos e desafios para a escrita ou para o reconhecimento de nomes de
brincadeiras, além de indagar e informar os alunos sobre o alfabeto, sons iniciais e finais de palavras
que eles já conhecem ou pedaços de palavras que ajudam a escrever outras, sempre coordenando
o estudo de um tema com a necessidade de ensinar a ler e a escrever. Em todas as situações, é
preciso rever o planejamento geral do tema para pensar especificamente nas necessidades de escrita
e leitura que o trabalho exige.
c) Trabalho a partir da necessidade de ler ou escrever determinado tipo de texto
Para este trabalho, escolhe-se um texto, que pode ser um conto, uma receita uma lista ou um
cartaz que tenha uma situação sociocomunicativa.
A tarefa pode ser feita em duplas ou grupos muito reduzidos. Conforme a intenção de difusão do
cartaz, pode-se produzir vários exemplares na aula, ou então é possível que o grupo opte por um
cartaz vencedor que deverá ser reproduzido posteriormente. A atividade requer que se tenha visto,
previamente, vários modelos de cartazes.
Ainda no mesmo texto referido (CURTO; MORILLO; TEIXIDO, 2000, p. 43), há a proposta de uma
sequência de planejamento para a leitura de um cartaz. Isto demonstra que as atividades de leitura
e escrita, embora ligadas, exigem estratégias diferenciadas.
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Desenvolvimento da atividade:
• Conteúdos específicos;
• características dos cartazes;
• procedimentos e escrita dos cartazes;
• correção completa;
• articulação de mensagens verbais com imagens, recursos plásticos e tipográficos
etc.;
• edição com materiais adequados;
• reprodução, se for o caso.
Material:
A rotina da sala de aula precisa ser um ambiente rico em situações em que a leitura e a escrita
são necessárias e fazem sentido. Sugerimos algumas propostas que fazem parte do cotidiano da
escola e podem ser aproveitadas tanto para apropriação do sistema de representação de escrita
alfabética como para avançar no nível de letramento. São elas:
• Chamada
• Organização da agenda do dia e da semana (momentos de contar e de ler histórias, roda de
conversa, trabalho com o alfabeto)
• Utilização do calendário, com datas, dias da semana e horários para marcar tempo entre uma
atividade e outra
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• Agenda dos alunos, com pequenos lembretes sobre tarefas e materiais a serem utilizados,
assim como correspondências entre as famílias
• Listas de materiais a serem trazidos, de livros lidos e de personagens de histórias com suas
características
• Registro em caderno de palavras aprendidas
• Horários e dias de organização e frequência a bibliotecas ou de atividades extraclasse
• Pequenos relatórios de atividades realizadas
É importante destacar que existem inúmeras estratégias de organização que podem ser
desenvolvidas pelo professor. O fundamental é variar o tipo de estratégia para que gerar cansaço
nas crianças. Para isso, cabe a ele planejar a organização do trabalho durante o ano, registrando
e observando as melhores estratégias, preocupando-se sempre em garantir uma aprendizagem
significativa e contextualizada da leitura e da escrita.
Diante desse fato, cabe ao professor a escolha dos recursos a serem utilizados. O quadro a
seguir oferece alguns recursos didáticos essenciais ao ciclo de alfabetização.
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1. livros que aproximem as crianças do universo literário, ajudando-as a se constituírem como
leitoras, a terem prazer e interesse pelos textos, a desenvolverem estratégias de leitura e a ampliarem
seus universos culturais, tais como os livros literários de contos, poemas, fábulas, dentre outros;
2. livros que ampliem o contato com diferentes gêneros e espaços sociais, considerando as
diferentes finalidades de leitura, tais como os livros de reflexão sobre o mundo da ciência, as
biografias, os dicionários, os livros de receitas, dentre outros;
4. revistas e jornais variados que promovam a diversão e o acesso a informações, tais como os
jornais, com destaque aos suplementos infantis, as revistas infantis e os gibis;
6. materiais que estimulem a reflexão sobre palavras, com o propósito de ensinar o sistema alfabético
e as convenções ortográficas, tais como jogos de alfabetização, abecedários, pares de fichas de
palavras e figuras, envelopes com figuras e letras que compõem as palavras representadas pelas
figuras e coleções de atividades de reflexão sobre o funcionamento do sistema de escrita;
7. os materiais que circulam nas ruas, estabelecimentos comerciais e residências, com objetivos
informativos, publicitários, dentre outros, como os panfletos, cartazes educativos e embalagens;
8. os materiais cotidianos com os quais nos organizamos no tempo e no espaço, como calendários,
folhinhas, relógios, agendas, quadros de horários de todos os tipos, catálogos de endereços e
telefones, mapas, itinerários de transportes públicos etc;
9. os registros materiais a respeito da vida da criança e dos membros de seus grupos de convívio:
registro de nascimento/batismo ou casamento (dos pais e/ou dos parentes), boletim escolar, cartões
de saúde/vacinação, fotografias (isoladas e em álbuns), cartas ou e-mails, contas domésticas, carnês,
talões de cheque, cartões de crédito etc;
10. recursos disponíveis na sociedade que inserem as crianças em ambientes virtuais e que
promovem o contato com outras linguagens, tais como a televisão, o rádio, o computador, dentre
outros.
Muitos desses materiais podem ser construídos pelos próprios professores e outros podem estar
disponíveis na escola. É necessário que conheçamos tudo que é disponibilizado para que o processo
de alfabetização seja o mais significativo possível.
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8. PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA
Estudamos no tópico “Alfabetização ao longo da história” que a visão tradicional de alfabetização
pressupõe que o aluno aprende repetindo e memorizando. Ele decora a correspondência entre as
formas gráficas (letras) e os sons que elas substituem (fonemas) até ser capaz de “decodificar” ou
“codificar” palavras. Em seguida, “decodificar” e “codificar” frases e textos.
Curiosidade
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Emilia_Ferreiro.
Ana Teberosky, docente da Universidade de Barcelona, tem conduzido uma série de pesquisas,
buscando a organização de instrumentos de ensino.
Fonte: https://novaescola.org.br/conteudo/251/ana-teberosky-debater-e-opinar-estimulam-a-leitura-e-a-escrita
Uma dessas contribuições mais instigantes reúne conceitos de uma psicogênese da língua
escrita, vista como uma grande revolução conceitual nas referências teóricas em que se tratava a
alfabetização para um novo conceito: a interpretação do modo pelo qual a criança aprende a ler e
a escrever (MOURA, 2004).
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apresenta ao alfabetizando durante o processo de ensino e de aprendizagem. Estes aspectos são
tradados pela teoria da psicogênese da escrita.
Esta proposta pedagógica baseada na psicologia genética implica compreender que o processo
de construção do conhecimento só é possível a partir da interação entre o sujeito cognoscitivo e o
objeto que deseja conhecer. Para tanto, temos de apresentar a leitura e a escrita como um desafio
cognitivo, e não como uma aprendizagem mecânica de uma técnica. É preciso partir de problemas
significativos e desafiadores para as crianças para que possam progredir no conhecimento do escrito
pelo questionamento das hipóteses que construíram.
Aprender a ler e a escrever não é somente um processo cognitivo, mas também uma atividade
social e cultural que contribui para criar vínculos entre a cultura e o conhecimento. Assim, quando
a escola ensina a ler e a escrever, não possibilita apenas a aprendizagem dos conteúdos educativos
das diversas áreas do currículo. Ao realizar essas ações, as crianças também aprendem a usar a
linguagem em sua qualidade de ferramenta de comunicação entre as pessoas e as culturas.
Ensinar a ler e a escrever textos diversos em contextos distintos, com variedade de intenções
e com diferentes destinatários, atualmente, é uma maneira de evitar esse evidente desajuste entre
o que se faz na sala de aula e o que ocorre fora dos muros escolares. Assim, num contexto em que
a escrita e a leitura fazem parte das práticas cotidianas, a criança tem a oportunidade de observar
adultos utilizando a leitura de jornais, bula de remédios, instruções, guias para consulta e busca de
informações específicas ou gerais. A criança também observa o uso da escrita pelos adultos para
a confecção de listas, preencher de cheques e documentos ou realizar pequenas comunicações e
atos de leitura.
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Abordaremos aqui a psicogênese da língua escrita, apresentando como as crianças constroem
a mesma, de que conhecimentos elas partem e quais são suas hipóteses.
Saiba mais
Desde cedo, o nome exerce um papel muito forte na criança, unificando e representando a primeira
marca forte do indivíduo. Assista ao vídeo O nome próprio e os próprios nomes e saiba a importância
do nome próprio no processo de alfabetização.
De acordo com Ferreiro e Teberosky (1999 apud ANDRADE; FRANCO 2006, p. 72) justifica-se a
proposta pelo motivo de que “[...] a escrita espontânea, produzida antes do ensino sistemático, traz
os mais claros indicadores das explorações infantis para compreender a natureza do processo”. A
aprendizagem da leitura e da escrita é evolutiva.
Tradicionalmente, a escrita infantil foi olhada apenas nos seus aspectos figurativos, isto é, no
seu aspecto gráfico, que tem a ver com a qualidade do traço, com a distribuição das formas, com
a orientação da escrita ou com o traçado das letras (inversões ou rotações).
Parte-se do pressuposto de que é preciso estabelecer e fixar associações entre letras e sons.
O trabalho fica em torno dos elementos que compõem a prontidão ou a maturidade que habilita a
criança ao início dessa aprendizagem, percepção e motricidade. Para Ferreiro e Teberosky (1999),
de pouco adianta ensinar a criança a traçar letras, apurar o traçado, usar o papel, se não forem
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oferecidas a ela situações em que a escrita, como sistema de representação, não possa ser objeto
do pensamento infantil. As crianças têm uma notável capacidade de interpretar a escrita e a leitura
mesmo antes de estarem habilitadas a ler.
Para poder interpretar a própria escrita quando ainda não sabe ler e escrever convencionalmente,
é preciso que a criança reflita sobre as escolhas feitas e, dependendo da situação proposta, justifique
essas escolhas para si mesma e para os outros, com todas as explicações que forem necessárias:
por que sobram letras, por que elas parecem estar fora de ordem, por que parece estar escrito errado
conforme seu próprio critério etc.
O conteúdo que Ferreiro e Teberosky (1999) procuram demonstrar é aquele referente ao que
a criança quis representar e as estratégias utilizadas para fazer diferenciações e representações
– aspectos construtivos da escrita, que são divididos em cinco níveis sucessivos que serão
apresentados na sequência.
Nesse momento inicial, observamos que a criança começa o caminho da apropriação da escrita
imitando e tentando copiar grafismos ou marcas gráficas diferenciados do desenho. Com o tempo, as
produções com intenção de escrever adquirem algumas características formais da escrita, ou seja,
começam a aparecer traços gráficos controlados, linearidade organizando o que não é desenho e
começam a surgir tentativas de produzir marcas gráficas semelhantes às características das letras.
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A interpretação, portanto, só pode ser feita pelo próprio autor. Neste período as crianças têm
dificuldades de compreender a função da escrita, fato que leva algumas delas a responder à
proposta de escrita com um desenho, classificado por outras como escrita. O aprendiz que está
na fase ou etapa pré-silábica ainda não descobriu que a escrita registra no papel a pauta sonora,
isto é, a sequência de pedaços sonoros das palavras que falamos.
Num momento inicial, as crianças bem pequenas ainda não distinguem desenho e escrita,
de modo que, muitas vezes, ao pedirmos que escrevam uma palavra que denomina um objeto ou
animal, desenham a forma (do objeto ou animal) em foco. Em seguida, no percurso evolutivo, as
mesmas crianças, ao escreverem determinadas palavras do jeito que sabem, começarão a produzir
garatujas e rabiscos parecidos com letras.
Os nomes próprios também servem de modelo de escrita. Eles atuam sobre o repertório de traços
que podem trazer resultados positivos ou negativos: negativos, quando é sustentada a ideia de que
se aprende a escrever copiando; positivos, quando servem como modelos para produções futuras.
Como exemplo, segue a escrita de uma criança. Ao escrever elefante, a aluna opta por uma
escrita grande, comparando a escrita ao tamanho do animal. Já na escrita de passarinho usa menos
grafismos, indicando que a criança está atenta ao referente da linguagem, ao objeto que a palavra
nomeia.
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Figura 25 – Hipótese pré-silábica, nível 1
Esta primeira hipótese, de eixo qualitativo, tem a ver com a exigência de diferenças internas nos
traços contínuos de uma escrita. Por exemplo, uma escrita como AAAA é rejeitada pelas crianças,
que argumentam que não serve para ler, porque todas são iguais, mesmo depois de terem atribuído
o valor “A” às letras.
A hipótese de quantidade mínima, eixo quantitativo, refere-se à exigência de que deve haver um
número mínimo de letras para aceitar a possibilidade de que uma escrita diga algo. Normalmente, as
crianças rejeitam textos com uma ou duas letras, porque eles não diriam nada, enquanto aceitam ler
textos com três ou mais letras. Os três traços gráficos constituem a quantidade que marca o limite
mínimo para aceitar o que pode ser interpretado ou lido. Nesta fase, a escrita ainda não está regulada
por diferenças e semelhanças entre os significados sonoros das letras.
Com apenas seis letras, a aluna Bárbara explora ao máximo as combinações possíveis na
escrita das palavras propostas a ela. Aqui demonstra sua preocupação com a variedade interna e a
quantidade mínima. Veja:
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Figura 26 - Hipótese pré-silábica, nível 2
Outro exemplo é Larissa, 5 anos, que também se preocupa com a quantidade mínima e a variedade
interna. Usa exaustivamente o recurso de alternância de letras, explorando apenas as letras O, H e B.
Vale destacar que a escrita continua não analisável, e a interpretação ainda é feita pela própria
criança de forma global e não fragmentada.
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Figura 27 - Hipótese pré-silábica, nível 2
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ao ler o que escreveram, tendem a pronunciar a palavra dividindo-a em sílabas e buscando fazer
corresponder as letras ou marcas colocadas no papel aos segmentos silábicos orais que pronunciam.
As estratégias utilizadas pela criança, que tem suas escritas no nível silábico, obedecem ao critério
de relacionamento entre as unidades da escrita e da linguagem. Atribui a cada letra ou marca escrita
o registro de uma sílaba falada.
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escrito algo. É frequente a criança utilizar-se de letras não interpretadas no interior da palavra, cuja
função é apenas a de preencher a quantidade considerada mínima para a escrita.
Outra maneira momentânea de negociar o conflito é deixar letras sobrantes. Quando lê o próprio
nome, a criança sente dificuldade de ajustar a leitura. Sobram letras que a criança não sabe explicar,
pois sabe que são componentes da escrita convencional da qual já se apropriou.
Nas crianças escolarizadas que dispõem de informação sobre as letras, quase sempre as escritas
silábicas também têm valor sonoro convencional, isto é, a criança não escolhe qualquer unidade
gráfica para escrever, mas aquelas que correspondem ao valor sonoro das sílabas. Normalmente,
por muitos motivos, este valor da sílaba recai na vogal. Entretanto, nem sempre as escritas silábicas
têm valor sonoro convencional, porque este, por ser convencional, não pode ser deduzido e requer
informação sobre o nome e o valor das letras. Portanto, podem existir – e existem – muitas escritas
silábicas sem valor sonoro convencional, mas já reconhecemos que elas pertencem a este nível se
tivermos assistido ao desenvolvimento da produção e observado seu procedimento de construção.
Seguem alguns exemplos que demonstram o uso das letras em seus valores sonoros convencionais.
A criança recorre mais às vogais que às consoantes para registrar o valor fonético da sílaba oral.
Figura 29 – Valor fonético da sílaba oral
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Figura 30 - Hipótese silábica com valor sonoro
Ao longo desse nível, a importância de ambas as hipóteses cai na medida em que entram em
conflito com as tentativas de obter maior precisão na busca da correspondência sonora e o do valor
sonoro convencional, assim como os modelos escritos que estão à disposição das crianças, entre
eles, novamente, os modelos de seus nomes próprios.
Assim, vemos que, para muitas crianças silábicas, torna-se conflituoso ter que escrever:
• palavras dissílabas ou monossílabas (como pode ser palavra algo com uma única letra ou
com apenas duas letras? Como aceitar colocar “E” para “pé” ou “P A” para “pata”?).
• palavras cujas sílabas podem ser notadas por uma mesma letra (por exemplo, como explicar
que, ao final da tentativa de notar “arara”, a criança se depare com “A A A”?).
• palavras diferentes, usando as mesmas letras (como aceitar que, ao tentar escrever “vovó” e
“Totó”, se tenha, ao final, a mesma sequência “O O”?).
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Saiba mais
Assista ao vídeo Construção da escrita: primeiros passos, parte 3. O objetivo desse trecho do vídeo
é permitir uma primeira aproximação à psicogênese da língua escrita. A ideia é apoiar as ações do
alfabetizador na compreensão de uma parte do processo de alfabetização de um ser humano. Para
isso, deve-se elucidar aos alfabetizadores a lógica que compreende a construção da escrita durante o
período de aprendizado da leitura e da escrita de uma criança.
• Que “leiam” textos cujo conteúdo sabem de cor, recebendo a informação de que ali está escrito...
(o poema, a parlenda, a música, a adivinha etc.), para que possam ajustar o que sabem que
está escrito com o texto impresso.
• Que “leiam” textos em que possam utilizar estratégias de leitura que não se restrinjam à
decodificação – antecipação, inferência, seleção, verificação – e que coloquem em questão
o uso do valor sonoro convencional das letras.
• Que escrevam pequenos textos que lhes façam sentido e “leiam” suas escritas para a professora,
justificando suas escolhas.
• Que trabalhem com crianças que dão soluções diferentes para os desafios colocados pelas
atividades – por exemplo, com escritas silábicas com valor sonoro.
Na escrita do aluno Alexandre, vê-se claramente o que dissemos no parágrafo anterior, pois
escreve “elefante” utilizando a correspondência silábica e, em “jacaré”, “onça” e “macaco” já utiliza
correspondência alfabética em alguns momentos.
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Figura 31 - Hipótese silábico-alfabética
Sabemos que o aluno começa a escrever alfabeticamente algumas sílabas e, para escrita de
outras, permanece silábico. Às vezes, há razões lógicas por trás deste comportamento. Uma delas
é porque certas letras, pelo seu nome, podem ser consideradas como uma sílaba completa, por
exemplo, “z” em maionese, que Juliana escreve “MAIONZ”.
Figura 32 - Hipótese silábico-alfabética
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Essas escritas parcialmente alfabéticas não levam automaticamente a concluir que podem existir
sílabas de duas, três, quatro, cinco e que até possuem uma só letra. Os alunos costumam generalizar
nesse nível que todas as sílabas têm sempre duas letras. Provavelmente, isto acontece pela frequência
significativa desse tipo de sílaba na nossa escrita.
Em função também da frequência de sílabas com uma consoante e uma vogal, nesta ordem,
outra generalização indevida feita pelos alunos é de que todas as sílabas são assim. Dentro desse
raciocínio, os alunos costumam escrever “armário” como segue: RAMARIO.
Ao atingir essa fase final do processo de apropriação da escrita alfabética, as crianças resolvem
as questões “o que” e “como” da forma como o fazemos nós, adultos bem alfabetizados e usuários
do português: colocando, na maioria dos casos, uma letra para cada fonema que pronunciamos.
Assim como nós, as crianças o fazem, mesmo sem conseguir explicar o que descobriram. Mas,
diferentemente de nós, elas cometem muitos erros ortográficos.
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A criança recém-chegada a uma hipótese alfabética acredita que, ao colocar uma letra para cada
som, tal como pronúncia de palavras, tende a pensar que seus problemas de escrita estão resolvidos.
Esse engano não pode atingir também os professores. Não podemos confundir ‘ter alcançado uma
hipótese alfabética de escrita’ com estar alfabetizado. Para o aluno ser considerado alfabetizado,
ele precisa ter o domínio das convenções som-grafia, conhecendo as convenções ortográficas. O
conceito de alfabetizado, hoje, envolve a possibilidade de participar das práticas de letramento, a
partir da leitura, compreensão e produção de textos escritos.
Figura 33 - Hipótese alfabética
A escrita de Aline, como visto na Figura 33, nos faz entender que ela já compreendeu o sistema
de representação de escrita alfabética, porém há um amplo conteúdo para ser ainda dominado.
Portanto, a construção de escritas alfabéticas não significa que o processo de apropriação da escrita
tenha terminado.
Ora as crianças emendam palavras, ora dividem palavras em duas ou três partes. A presença
de erros ortográficos nesta produção indica a forma pela qual as crianças chegaram a descobrir as
funções da escrita, a representação que esta realiza e a sua organização, como em “DINOSAURO”
e “TATUSSINHO”.
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O que propor às crianças com escritas recém-alfabéticas?
• Que leiam muitos textos de conteúdo parcialmente conhecido, de forma a se sentirem seguras
para ler cada vez mais.
• Que escrevam textos e “leiam” suas escritas para a professora, justificando suas escolhas.
• Que realizem atividades que coloquem em questão a divisão do texto em palavras e a ortografia.
• Que trabalhem com crianças que dão soluções diferentes para os desafios colocados pelas
atividades – por exemplo, com escritas alfabéticas que já consideram a divisão do texto em
palavras e a ortografia.
Albuquerque (2012, p. 25) ressalta que “[...] os trabalhos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky
deram um novo sentido aos erros ou escritas não convencionais dos alunos, que passaram a ser
vistos como reveladores de suas hipóteses de escrita”. Diferentemente de uma prática tradicional
de alfabetização e avaliação, na perspectiva construtivista e interacionista de ensino, e também na
perspectiva inclusivista, avaliam-se as conquistas e as possibilidades dos estudantes ao longo do
ano escolar, e não apenas os impedimentos e as condutas finais e acabadas. O erro, que antes
precisava a todo custo ser evitado, já que era o principal sintoma de exclusão escolar, passa a ser
considerado como indicador da forma como os alunos pensam sobre determinado conhecimento.
A sondagem se relaciona à identificação dos conhecimentos que os estudantes já desenvolveram,
com o objetivo de fazê-los avançar em suas aprendizagens.
O professor deve realizar a primeira sondagem no início do período letivo e, depois, ao fim de
cada bimestre, manter um registro criterioso do processo de evolução das hipóteses de escrita das
crianças. Ao mesmo tempo, é fundamental uma observação cotidiana e atenta de percurso dos alunos.
O ditado deve ser iniciado por uma palavra polissílaba, seguida de uma trissílaba, de uma
dissílaba e, por último, de uma monossílaba, sempre de um mesmo campo semântico (agregados
por uma unidade de sentido). Após a lista, é preciso ditar uma frase que envolva pelo menos uma
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das palavras já ditadas para poder observar se o aluno volta a escrevê-la de forma semelhante, ou
seja, se a escrita da palavra permanece estável mesmo num contexto diferente.
Figura 34 - Sondagem
Deve-se evitar que as palavras tenham vogais repetidas em sílabas próximas, como “ABACAXI”,
por causar grande conflito para as crianças que estão entrando no ensino fundamental, cuja hipótese
de escrita talvez faça com que acreditam ser impossível escrever algo com duas ou mais letras iguais.
Por exemplo: um aluno com hipótese silábica com valor sonoro convencional, que utiliza vogais,
precisaria escrever “AAAI”. Os monossílabos ficam para o fim do ditado. Esse cuidado deve ser
tomado, pois no caso de as crianças escreverem segundo a hipótese do número mínimo de letras,
poderão se recusar a escrever se tiverem de começar por ele.
Terminado o ditado, é imprescindível pedir que a criança leia o que escreveu. Por meio da
interpretação dela sobre a própria escrita, durante a leitura, é que se pode observar se ela estabelece
ou não relações entre o que escreveu e o que lê em voz alta – ou seja, entre o falado e o escrito – ou
se lê aleatoriamente.
Se o aluno escreveu “BGEO” para o ditado da palavra “brigadeiro” e associou cada uma das
sílabas dessa palavra a uma delas, é necessário registrar abaixo a relação de cada letra com uma
sílaba. Pode-se usar a marcação com sinais que indiquem quais as associações que foram feitas
pela criança:
B G E O (brigadeiro)
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ıııı
Se a criança escrever com variadas letras (RCOIDRS), sem que o critério de escolha desses
caracteres tenha alguma relação com a palavra falada, será necessário anotar o sentido que ele
usou nessa leitura.
RCOIDRS
Esse tipo de marcação é importante, pois permite observar com mais clareza a hipótese que a
criança tem e, posteriormente, os avanços que ela obtém ao longo do ano.
Cabe salientar que o diagnóstico não é utilizado apenas para constatar conhecimentos e habilidades
dos alunos (seus avanços e suas dificuldades), mas, também e sobretudo, para fornecer informações
que subsidiem as práticas de alfabetização desenvolvidas em sala de aula. Não adianta apenas contatar
os avanços e as dificuldades das crianças e registrar essas informações em um relatório. É preciso
ir além, usando tais informações sobre a tomada de decisões em relação ao trabalho pedagógico a
ser desenvolvido em sala de aula e à necessidade, ou não, de realização de atividades extraclasse
junto a alguns aprendizes.
Atender à diversidade de conhecimento dos aprendizes em sala de aula pressupõe ajustar o ensino
às diferentes necessidades de aprendizagem da turma. Nesse sentido, a tarefa docente envolve a
proposição não apenas de atividades únicas e padronizadas, que são realizadas simultaneamente
por todos os alunos, mas, também, de atividades diferenciadas ou que podem ser respondidas de
modos distintos por alunos com diferentes níveis de conhecimento.
11 HIPÓTESE DE LEITURA
Muito antes de as crianças lerem convencionalmente, elas tentam interpretar os diversos textos
que encontram a seu redor (livros, embalagens comerciais, cartazes de rua, títulos, anúncios de
televisão, história em quadrinhos etc.).
Uma das primeiras ideias que as crianças elaboram em relação ao significado de uma sequência
de letras é a seguinte: as letras representam o nome dos objetos. O significado de um texto escrito
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é, portanto, inteiramente dependente do contexto. Se o contexto for um livro com figuras, imagina-se
que as letras digam o nome dos objetos ilustrados. No exemplo da Figura 35, para a criança, o que
está escrito abaixo da imagem de carro é a palavra “CARRO” e não a marca Hot Wheels. São as
ideias que as crianças têm a respeito do que está escrito e do que se pode ler.
Figura 35 - Hipótese de leitura
Fonte: http://unrealitymag.com/wp-content/uploads/2009/01/hot-wheels.JPG
As relações entre o contexto e o texto escrito passam pelas seguintes etapas, segundo Emília
Ferreiro (2001, p. 69):
1 – O significado de um determinado texto escrito depende inteiramente do contexto.
Se mudarmos o contexto, a interpretação do texto escrito mudará. Se o contexto não
puder ser interpretado, texto escrito também não terá interpretação alguma.
2 – Se for estabelecida uma relação inicial entre contexto e texto escrito, o texto
manterá a mesma interpretação a despeito de mudanças de contexto (durante um
determinado intervalo de tempo).
As ideias sobre o que está escrito e o que se pode ler evoluem de acordo com as oportunidades
de contato com a escrita. Uma atividade interessante é a apresentação de fichas contendo figuras e
cartões com algumas palavras escritas. A criança lê a figura e a associa ao nome escrito no cartão
(LEÃO). Mesmo trocando o cartão com outra palavra escrita, a criança continua acreditando que
aquela palavra se refere à ilustração: ela lê “LEÃO” na ficha que está escrito “MACACO”.
Figura 36 - Fichas de leitura
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Fonte: GlobaIP/Istock ID: 93215377
A ideia de que se escreve tudo o que se fala não é prévia à alfabetização. Pelo contrário, descobrir
que é necessário escrever tudo, sem omitir nada, requer bastante experiência com a língua escrita.
Emília Ferreiro e colaboradores (2001) realizaram experimentos com crianças de diferentes países,
línguas, idades e classes sociais buscando compreender a natureza e a evolução dessa distinção
entre “o que está escrito” e “o que se pode ler”, e observaram que, em torno dos quatro ou cinco
anos, crianças urbanas costumam pensar que apenas os substantivos precisam estar escritos para
que possa ler um enunciado.
Quando uma criança desenha, por exemplo, um menino jogando bola, o que aparece no desenho
é o menino e a bola. Tudo o mais é inferido por quem o interpreta quando olha para o desenho e
diz: o menino está jogando bola. Outro exemplo: se a figura representar um pato na água e o texto
mais próximo for “O pato nada”, as crianças, em geral, acham que pode estar escrito “pato” e “água”,
mas que podemos ler “o pato está nadando”, “o pato está na água”, ou qualquer outra afirmação
compatível com o contexto.
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Saiba mais
Assista ao vídeo “O que está escrito e o que se pode ler”, para perceber a evolução dessas hipóteses
por meio da sequenciação das entrevistas de sete crianças. Nelas vemos inicialmente Ricardo Patrick
considerar todos os fragmentos (palavras) do texto, mesmo os de poucas letras, e atribuir a cada um
deles, reiteradamente, um dos substantivos da frase:
1. Ricardo Patrick:
OS MENINOS GOSTAM DE BRINCAR DE CARRINHO
No entanto, parece que esta possibilidade de considerar todos os pedaços do texto escrito só irá
reaparecer no final desta série evolutiva:
2. Daiara:
A MENINA TEM UM MONTE DE BONECA
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3. Fernando:
A MÃE E O MENINO BRINCAM DE DIGIMON
Parte 1: http://youtu.be/8sNewdWQuWI
Parte 2: https://youtu.be/S9xgH5MeALE
Parte 3: https://youtu.be/GdgctE4FtAM
Parte 4: https://youtu.be/Wk0tO951kX4
Observando a forma pela qual as crianças atribuíram as partes do falado aos segmentos escritos,
poderíamos pensar que a evolução das respostas mostra uma dificuldade de percepção da separação
entre as palavras do texto. Elas não têm nenhuma dificuldade para perceber, mas têm enormes
problemas para interpretar.
Só Ricardo Patrick pensa que, apesar de “meninos” e “carrinhos” aparecerem, cada um, uma
única vez no enunciado (Os meninos gostam de brincar de carrinho), podem estar escritos várias
vezes e de diferentes formas. Nenhuma das outras aceitaria esta ideia. A necessidade de agrupar
segmentos gráficos – de juntar os pequenos aos grandes – para interpretá-los tem a ver com duas
questões de natureza estritamente conceitual: a hipótese de que nem tudo o que se lê precisa estar
escrito de forma independente e a hipótese de que existe uma quantidade mínima de letras exigida
para considerar algo adequadamente escrito.
As crianças precisam resolver conceitualmente essas contradições para poder considerar todas
as partes do texto gráfico. Pintar com lápis de cor os espaços entre as palavras para ajudá-los a
“perceber” não faria qualquer diferença. Na verdade, as dificuldades de interpretação vão sendo
resolvidas à medida que vão avançando em direção à ideia de que se escreve tudo o que se fala,
na ordem em que se fala.
Essas construções elaboradas pelas crianças dão inúmeras pistas ao leitor atento sobre por que
é importante oferecer-lhe a oportunidade de defrontar-se com textos nos quais ela sabe o que está
escrito. Colocá-la, frequentemente, neste tipo de situação é oferecer-lhe oportunidades para pensar
sobre a escrita, elaborar hipóteses, testá-las e reconstruí-las progressivamente, apoiando-a em seu
esforço para aprender a ler e escrever.
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Uma boa situação de aprendizagem é oferecer textos que os alunos conheçam de cor (parlendas,
poemas, canções e quadrinhas) e solicitar que acompanhem a leitura indicando com o dedo. Essa
costuma ser uma boa situação para que possam reorganizar suas ideias sobre o que está escrito
e o que se pode ler. Por exemplo, ao realizar uma atividade de leitura de uma quadrinha ou canção
que as crianças sabem de cor, é interessante que, enquanto elas vão dando conta de localizar as
palavras que acreditam estarem escritas, o professor vá propondo a localização de outras mais
“difíceis”. Observe a parlenda a seguir:
CORRE CUTIA
NA CASA DA TIA
CORRE CIPÓ
NA CASA DA VÓ
Além de pedir para localizar “tia” e perguntar com que letra começa ou termina, é possível propor
inúmeras questões para os alunos pensarem. Pode-se notar que há palavras repetidas (corre, casa).
Para quem ainda não compreendeu que tudo o que se lê precisa estar escrito, isso pode soar absurdo.
O trabalho com listas (de animais, brincadeiras preferidas e ajudantes da semana, por exemplo)
também é adequado na fase inicial de alfabetização.
Deve-se ter cuidado para não confundir as hipóteses de escrita (pré-silábica, silábica, alfabética)
com as hipóteses de leitura. Hipóteses de leitura são as soluções que o aluno produz quando solicitado
a interpretar um texto escrito por outra pessoa.
É importante destacar que o conhecimento das “hipóteses de leitura” não deve se transformar em
um recurso para categorizar os alunos, mas sim estar a serviço de um planejamento de atividades
que considere suas representações e atenda suas necessidades de aprendizagem.
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dos alfabetizandos considerando o que os alunos já aprenderam e do que precisam aprender sobre
questões “o que” e “como” a que temos nos referido.
Diante de muitas contribuições da teoria da psicogênese da língua escrita, foram surgindo alguns
problemas graves. Surgiu um discurso em muitas escolas de que as crianças espontaneamente
aprenderiam a ler, desde que pudessem participar de situações onde lessem e escrevessem textos.
Não seria preciso trabalhar com palavras e suas unidades menores (sílabas e letras), porque as
crianças descobririam sozinhas como a escrita funciona. Infelizmente, essa má apropriação da teoria
provocou o abandono do ensino sistemático das correspondências grafema-fonema, o descaso
com a caligrafia e o não ensino de ortografia. Concebemos que a aprendizagem é um processo de
construção do conhecimento que ocorre através de conflitos anteriores estabelecidos elo indivíduo,
tanto quando escreve sozinho como quando escreve em interação com os demais.
Para ingressar no que Ferreiro (1999) denominou de “período de fonetização da escrita”, que se
inicia no nível silábico e culmina no alfabético, a criança precisará, necessariamente, desenvolver
capacidades de reflexão fonológica, estabelecendo relações entre a escrita e a pauta sonora, por
meio, por exemplo, da segmentação de palavras orais em sílabas e da comparação de palavras
quanto ao tamanho e às suas semelhanças sonoras.
De acordo com o Programa Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) do
Ministério da Educação (2013, p. 9), uma criança pequena pode, por exemplo:
- observar que a palavra janela tem 3 pedaços” (sílabas), que a palavra casa tem 2
“pedaços” e que, portanto, a primeira palavra é maior;
- identificar, ao lhe mostrarmos 4 figuras (gato, bode, galho e mola), que as palavras
gato e galho são as que “começam parecido”, porque começam com/ga/;
- falar cavalo, quando lhe pedimos que diga uma palavra começada com o mesmo
pedaço que aparece no início da palavra casa;
- falar palavras como caminhão ou macarrão, quando lhe pedimos que diga uma
palavra que rime com feijão;
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- identificar, ao lhe mostrarmos 4 figuras (vestido, martelo, vampiro, coruja), que as
palavras vestido e vampiro são as que começam parecido, porque começam “com
o mesmo sonzinho”.
Com base nessa perspectiva, Leal (2004) propõe alguns tipos de atividades fundamentais para
que os alunos avancem sobre seus conhecimentos sobre as relações som-grafia de nossa língua:
• Atividades envolvendo a sistematização das correspondências som-grafia
• Atividades envolvendo consciência fonológica
• Atividades para desenvolver a fluênciade leitura
• Atividades envolvendo leitura e produção de texto
• Atividades para o ensino da norma ortográfica
Para o trabalho envolvendo consciência fonológica, sugerimos jogos que permitam aos alunos
compreenderem as relações entre as partes orais e escritas das palavras (bingo dos sons iniciais
e caça-rimas), atividades que trabalhem diferentes habilidades em diferentes níveis das palavras,
como identificar, adicionar, subtrair e produzir unidades similares de diferentes palavras (palavra
que comecem com a mesma sílaba) e atividades de exploração de textos que trabalham o extrato
sonoro da língua (cantigas de roda, parlendas, trava-línguas, textos poéticos), permitindo aos alunos
explorarem palavras que apresentam sons parecidos.
As atividades envolvendo a fluência em leitura podem ser feitas a partir de textos curtos ou não.
São exemplos a leitura livre ou em pequenos grupos com gêneros diversos, em que a professora
pode organizar um cantinho de leitura com variados textos; ler para os colegas em pequenos grupos;
fazer leitura coletiva para o grande grupo ou realizar pesquisas para o desenvolvimento dos projetos
didáticos realizados em sala de aula. Além disso, pode-se sugerir um recital de poemas ou uma
‘hora da notícia’ ou reportagem, sugerindo que os alunos fiquem responsáveis em trazer notícias
interessantes para ler para os colegas da sala.
Outro bom recurso didático para pensar sobre o sistema de escrita alfabética e desenvolver
atividades de leitura e produção de texto são os livros paradidáticos, que podem tratar das letras
do alfabeto e refletir sobre as correspondências som/grafia; refletir sobre as semelhanças sonoras
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das palavras a partir de textos que exploram rimas, aliterações e repetições de palavras; explorar
o vocabulário (formação de palavras e significados de palavras) ou tratar de recursos linguísticos
utilizados para a construção da textualidade (onomatopeias, repetição de frases e expressões ao
longo do texto e presença de textos cumulativos).
Vale ressaltar que, mesmo quando a criança compreende a escrita alfabética, ela ainda desconhece
a norma-ortográfica. Por essa razão, muitos erros são detectados na produção escrita dos aprendizes.
Saiba mais
Assista aos vídeos indicados para saber mais sobre a Apropriação do Sistema de Escrita Alfabética,
disponíveis em:
Parte I: https://www.youtube.com/watch?v=Ne0ImYjWuf8.
Pág. 79 de 98
Figura 37 - Diagnóstico de escrita
Também estudamos as hipóteses de leitura com o intuito de averiguar as primeiras ideias das
crianças sobre a língua escrita, ou seja, como elas interpretam os signos gráficos e que condições
devem reunir esses signos para ter significado, representar simbolicamente a linguagem, frequentemente
utilizando texto e imagem e pedindo para que a criança leia o texto. O objetivo é observar que tipo
de interpretação recebe o texto escrito a partir da informação que a imagem que o acompanha
fornece. Além dessas avaliações iniciais abordadas, iremos estudar outros procedimentos de escrita
e leitura que contribuem para avaliação e diagnóstico da escrita, especialmente para crianças que
já escrevem alfabeticamente.
É importante destacar que a avaliação deve ser um processo formativo, contínuo, que não
necessita de situações distintas das cotidianas. Portanto, o que abordaremos neste tema serão alguns
critérios para análise e avaliação dos avanços das crianças que devem ser utilizados em situações
de aprendizagem da leitura e escrita em sala de aula.
Além das atividades de leitura e escrita que destacaremos como processos de aprendizagem
e, ao mesmo tempo, avaliativos, é necessário analisar alguns procedimentos que podem se tornar
bons instrumentos, como avaliar se:
• a organização dos alunos favoreceu o desenvolvimento da atividade;
• a organização dos espaços (sala de aula, pátio, biblioteca, laboratório de informática) ajudou
ou não esse desenvolvimento;
• a organização do material antes de iniciar a atividade contribuiu ou não para o seu desenvolvimento;
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• o tempo reservado para a atividade foi suficiente;
• as questões colocadas pelos alunos durante a atividade e as respostas dadas favorecem ou
não o processo de aprendizagem.
São textos que as crianças conhecem de memória, como parlendas, adivinhas, canções, cantigas
populares, quadrinhas, trava-línguas, poemas e que podem ser utilizados como recursos avaliativos
tanto para crianças em hipóteses não alfabéticas como alfabéticas.
Figura 38 – Parlenda
Fonte: http://singrandohorizontes.files.wordpress.com/2011/01/parlenda_cachimbo.jpg
Em relação à escrita, pode-se propor às crianças que escrevam um texto de memória com
o intuito de perceber se escreveram todas as letras ou omitiram algumas e se segmentaram as
palavras. É importante, também, verificar a organização do texto no papel, o traçado e se o título
está diferenciado no texto.
Em relação à leitura, podemos propor às crianças que leiam um texto de memória com o objetivo
de identificar o conhecimento das letras e sua correspondência sonora, mesmo antes de saber ler
convencionalmente. Também é possível verificar a identificação de palavras ou de determinados
fragmentos e, especialmente, as estratégias que utiliza para essa identificação: vogais, consoantes,
memória visual da palavra e a distinção entre o título e o texto. O objetivo de usar um texto conhecido
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é verificar se a criança, no texto, utiliza estratégias de decifração (reconhece vogais, consoantes e
palavras).
Saiba mais
Assista a este vídeo sobre textos que se conhece de memória e saiba como eles podem ser utilizados
em sala de aula.
Pode-se propor às crianças que reescrevam um texto (conto ou fábula) ou um fragmento dele
previamente lido em voz alta pelo professor até que se torne conhecido. Convém assegurar que as
crianças compreendam a comanda da produção (qual o texto, ou parte dele, a ser reescrito).
A reescrita é uma atividade de produção textual com apoio. É a escrita de uma história cujo
enredo é conhecido e cuja referência é um texto escrito. Quando os alunos aprendem o enredo, junto
vem também a forma, a linguagem que se usa para escrever, diferente da que se usa para falar. A
reescrita é a produção de mais de uma versão, e não a reprodução autêntica. Não é condição para
uma atividade de reescrita – e nem desejável – que o aluno memorize o texto. Para reescrever não
é necessário decorar: o que queremos desenvolver não é a memória, mas a capacidade de produzir
um texto em linguagem escrita. O conto tradicional funciona como uma espécie de matriz para a
escrita de narrativas. Ao realizar um reconto, os alunos recuperam os acontecimentos da narrativa,
utilizando, frequentemente, elementos da linguagem que se usa para escrever. O mesmo acontece
com as reescritas, pois ao reescrever uma história, um conto, os alunos precisam coordenar uma
série de tarefas: eles precisam recuperar os acontecimentos, utilizar a linguagem que se escreve,
organizar junto com os colegas o que querem escrever, controlar o que já foi escrito e o que falta
escrever. Ao realizar essas tarefas, os alunos estarão aprendendo sobre o processo de composição
de um texto escrito.
A observação da reescrita pode se dar, conforme Curto, Morillo e Teixido (2000, p. 220), por meio:
• da preparação do que será escrito, a capacidade de organizar oralmente o texto;
• da ordem e lógica de exposição das ideias;
• da diferenciação entre as formas de linguagem oral e formas próprias do escrito;
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• do registro de formas específicas de texto narrativo: discurso direto ou indireto, nexos temporais,
formas de início ou final típicas do conto, passagens concretas que não podem ser alteradas
(canções, estribilhos, frases características etc.), a narração em terceira pessoa, a coerência
dos tempos verbais etc.;
• do respeito à escrita do título, diferenciando-o, tipograficamente e por sua situação, do texto.
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Figura 40 - Reescrita da fábula O rato da cidade e o rato do campo
Podemos considerar que essa criança está alfabetizada, apesar de apresentar problemas de
ortografia e pontuação na reescrita da fábula O rato do campo e o rato da cidade.
Agora vejamos uma carta para o Papai Noel escrita por uma criança que ainda não está alfabetizada,
mas que já descobriu que há uma relação entre o que se fala e o que se escreve.
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Figura 42 – Carta para Papai Noel
É importante perceber que as propostas de reescrita de conto, fábula ou a escrita de uma cartinha
para o Papai Noel estão contextualizadas: destinam-se a determinados interlocutores e apresentam
características específicas do gênero.
Cada produção exige de professores e alunos um trabalho que não começa nem termina na
escrita do texto propriamente dito. Há todo um processo que antecede essa produção (leituras,
observação das características do gênero e planejamento) e outro que continua depois da produção
(revisão, reescrita e produto final). É esse processo, depois da produção, que auxiliará a avaliação
e as possíveis intervenções para que o aluno avance no domínio da língua escrita.
Todos os alunos, alfabetizados ou não, são capazes de produzir textos. Mas o aperfeiçoamento
dos textos daqueles que já estão alfabetizados exige o desenvolvimento de atividades de revisão e
edição (passar o texto a limpo). Por meio delas, busca-se melhorar a organização geral dos textos,
a adequação às características do gênero, a utilização dos recursos discursivos e os aspectos
gramaticais (incluindo a ortografia).
É importante selecionar alguns aspectos de cada vez, e não trabalhar todos ao mesmo tempo.
Revisar o próprio texto, tendo em vista torná-lo mais compreensível ou mais próximo de determinado
gênero, é uma tarefa difícil para a criança, embora ela possa, desde muito cedo, apagar e refazer
suas escritas de acordo com os próprios critérios de certo ou errado.
A tarefa da escola é ensinar crianças e jovens a revisar os próprios textos. Embora seja uma
atividade trabalhosa, vale a pena fazer a reescrita coletiva do texto, pois, como os problemas se
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repetem, ao corrigir o texto de um aluno, a classe discute problemas que são dificuldades de todos.
A reescrita coletiva também vai mostrando aos alunos a necessidade de revisar o próprio texto. As
perguntas feitas pelo professor vão sendo incorporadas pelas crianças e, com o tempo, elas mesmas
terão condições de se fazerem perguntas quando estiverem escrevendo.
Um estudo realizado pela professora Maria Cecília Rafael de Góes (Unicamp/SP), com crianças de
2ª a 4ª série de uma escola pública de Campinas (SP), fornece-nos subsídios sobre a importância da
revisão de texto como ação que eleva a capacidade de reflexão em relação, não apenas à linguagem,
mas também à atividade mental em geral.
Diz a autora:
Há, naturalmente, componentes reflexivos no escrever desde seus estágios iniciais
[...]. A criança sabe o que está escrevendo e faz, com frequência, escolhas deliberadas,
mas sua capacidade de ajustar a organização dos enunciados ao leitor ainda é
emergente. (GOES, 1993, p. 114).
Segundo Góes, tal expansão do funcionamento da escrita tem sido, em geral, pouco explorada
no contexto escolar. No estudo realizado, a autora utilizou três procedimentos diferentes:
• Revisão individual do texto - Cada criança foi instruída a ler seu texto e indicar as correções
necessárias. Foi pedido a elas que examinassem o texto pensando que este deveria ser
compreendido por pessoas que não estariam próximas do escritor. A tarefa era identificar
problemas e fazer alterações em trechos do texto que poderiam impedir a compreensão do
leitor. Oito dos doze alunos efetuaram correções de ortografia e, mais raramente, de palavras
omitidas e pontuação (apenas, ponto final). Os outros quatro não fizeram qualquer correção.
• Revisão em duplas - Uma criança ficou no papel de escritora e a outra no de leitora. A
entrevistadora dava orientação para que buscassem melhorar o texto e sugeria à criança-
leitora que indicasse para a criança-escritora as mudanças necessárias para maior clareza do
texto. Como no procedimento anterior, as correções sugeridas foram de ortografia e omissão
de palavras. Mas apareceram dois elementos novos: a criança-leitora apontou problemas de
traçado da escrita, de concordância nominal e de terminação verbal. De qualquer forma, não
fizeram mudanças na constituição dos enunciados, a não ser ocasionalmente pela inclusão de
palavra omitida. Um aspecto interessante na interação das duplas é que as crianças-leitoras que
tinham um bom desempenho na escola assumiram o papel da professora, fazendo cobranças
ao colega em tons de repreensão e paternalismo, também dando explicações.
Góes chama a atenção para o fato de a atuação das crianças, nos dois procedimentos, refletir a
experiência que elas têm vivenciado em sala de aula na prática de avaliação e correção de textos,
ou seja, focalizando a ortografia, alguns aspectos gramaticais e o traçado da letra. É possível supor
que a forma pela qual tem sido concebido o lugar de leitor na escola, o olhar restrito do professor
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na leitura e correção dos textos, o escrever como exercício e a pouca importância dada ao que se
escreve têm levado a criança a lidar com a escrita apenas como sistema convencional de registro,
pouco se preocupando com a efetiva interlocução em que está envolvida.
• Revisão ou explicitação dirigida - Como nos dois procedimentos anteriores, as crianças não se
detiveram nos aspectos da organização dos enunciados. A pesquisadora adotou um terceiro
procedimento em que apontava previamente problemas a serem resolvidos e conduzia o
diálogo de modo a favorecer as propostas de solução.
• que apresentavam dúvidas sobre a identificação do referente (por exemplo: “Na escola há
muitos roubos. Eles são os alunos”);
• incompletos (ex.: “O homem à noite no cemitério”);
• obscuros: “Agora tenho onze anos antes de eu entrar faz cinco anos que eu não estudava aqui”.
Esse procedimento mostrou-se mais eficaz, ou seja, as crianças conseguiram operar sobre os
problemas de enunciado, com diferentes graus de êxito, quando apoiadas nas orientações dadas
pela entrevistadora. Segundo Góes, o papel assumido pela entrevistadora constituiu uma ajuda para
a busca de soluções, muitas das quais foram bastante adequadas.
O processo de edição do texto não precisa ser realizado em uma única aula. É até desejável que
seja feita por etapas, pois as crianças tendem a dispersar-se em atividades como essa. Quando os
alunos estiverem familiarizados com a revisão e a edição, esta pode ser feita por grupos, discutindo
os problemas no coletivo e, posteriormente, cada grupo pode encarregar-se de melhorar um parágrafo
ou determinado aspecto do texto. Nesse movimento, cada grupo pode apresentar suas sugestões e,
se o autor concordar, modifica-se o texto.
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14. ANÁLISE E REFLEXÃO SOBRE A LÍNGUA
14.1 Pontuação
Para que a criança aprenda a pontuar, é necessário um trabalho sistemático da escola partindo
sempre da leitura e da produção de textos, considerando duas questões: a criança precisa estar
alfabetizada e o professor precisa apresentar o papel da pontuação dentro do contexto em que está
registrado.
É interessante propor o ensino da pontuação com base na leitura – chamando a atenção dos
alunos tanto para as diversas partes do texto marcadas pela pontuação como para sua articulação
–, na produção de textos (planejamento, revisão e edição) e por meio de jogos. Pode-se pedir aos
alunos que observem os sinais de pontuação utilizados e sua importância para garantir sentido,
focando no uso da pontuação nos diálogos, por exemplo. Também pode-se discutir com as crianças
o uso da pontuação, considerando a intencionalidade do autor, discutindo a melhor forma de marcar
graficamente essa intenção e a inter-relação das partes que vão compor o texto.
Saiba mais
Assista ao vídeo O que é e para que serve a pontuação para ampliar seus conhecimentos sobre o uso
dos sinais de pontuação e como a escola tem ensinado esse conteúdo.
Analisando a reescrita do conto João e Maria de uma aluna que está no primeiro ano do ensino
fundamental e já se apropriou do sistema de representação de escrita alfabética, percebemos que ela
precisa de um trabalho sistematizado de análise e reflexão sobre a língua, pois seu texto apresenta
erros ortográficos, não faz uso da pontuação e tem dificuldades nos aspectos morfossintáticos (flexão
verbal, concordância verbal e nominal, uso de pronomes) e gramaticais dos textos.
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Figura 43 – Reescrita de João e Maria
É importante, como já dissemos, revisar um aspecto de cada vez para que a criança avance em
sua aprendizagem da língua escrita. Vimos aqui algumas propostas para o trabalho com a pontuação.
Nos próximos itens vamos estudar como trabalhar os outros aspectos textuais, recorrendo sempre
à produção do aluno e às suas especificidades.
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de normas práticas para contornar a dificuldade no futuro ou ajude-os a consultar
a gramática e/ou dicionário, conforme o caso.
- Solicite aos alunos que corrijam seus textos em duplas, em pequenos grupos ou
individualmente.
Dessa forma, o educandos compreenderão cada vez mais a estrutura e as normas da língua
portuguesa por meio da análise, reflexão e correção dos erros mais comuns.
É importante analisar os erros que estão nas produções. É muito comum encontrarmos nos textos
dos alunos o uso inadequado de algumas flexões verbais, como no exemplo a seguir:
Quadro 4 – Forma verbal
b) Sintaxe de colocação
É a parte da gramática que trata da correta colocação dos pronomes. Na apropriação da língua
escrita, é necessário que o estudante perceba a equivalência na substituição do nome pelo pronome.
Ex.: Era uma vez um menininho e uma menininha. O nome deles era João e Maria. Eles
moravam com a madrasta e o pai.
c) Concordância verbal
Ocorre quando o verbo se flexiona para concordar com o seu sujeito. É imprescindível que os
estudantes aprendam e façam adequadamente a concordância verbal.
Ex.: Então o João e a Maria comesou (começaram) a andar. Mesmo perdidos, eles caminhando
(caminharam) e encontraram uma casa feita de doces.
d) Concordância nominal
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e) Regência nominal e verbal
A regência verbal indica a relação que um verbo estabelece com o seu complemento através
do uso ou não de uma preposição. A regência nominal indica a relação que um nome estabelece
com o seu complemento através do uso de uma preposição.
Ex.: Então como eles estavam com fome ele correrão e começaram a comer então uma velinha
saio da casa de doce e falou aqui dentro tem muito mais então o João e a Maria entrarão e os dois
não sabião que aquela velinha era a bruxa então...
Neste trecho, há muitos aspectos a corrigir, a repetição do mesmo conectivo, concordância verbal
e alguns erros ortográficos.
14.4 Ortografia
O ensino da ortografia deve-se iniciar com os alunos já alfabetizados e não deve ser ensinado
por meio de cópias e ditados. De acordo com Morais (2005), o ensino de ortografia deve ajudar o
aprendiz a pensar sobre a grafia das palavras, a verbalizar por que escreveu de um jeito e não de
outro, a discutir hipóteses de escrita, a perceber regularidades e irregularidades na escrita, a descobrir
regras e a memorizar a grafia de palavras quando não há regras.
Segundo Morais (2005), o ensino da ortografia torna-se mais eficaz quando o professor compreende
as causas dos erros das crianças que, para isso, precisam distinguir regularidades e irregularidades do
sistema de escrita. No primeiro caso, é possível trabalhar na direção da descoberta e aprendizagem
de regras; no segundo, há a necessidade de memorização.
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sopa, suco; o uso de M antes de P e B; o uso do J seguido de A, O, U para grafar palavras como
jaula, jogo, caju; o uso de GU em palavras como guerra, guitarra.
• São exemplos de regularidades morfológico-gramaticais: adjetivos que indicam o lugar de
origem se escrevem com ESA no final (portuguesa, francesa); substantivos derivados se
escrevem com EZA (beleza, pobreza); todas as formas da terceira pessoa do plural no futuro
do indicativo se escrevem com ÃO, enquanto todas as outras formas de terceira pessoa do
plural em qualquer tempo verbal se escrevem com M no final (cantam, cantavam, bebam,
beberam); todos os infinitivos terminam com R.
• As correspondências irregulares não apresentam uma regra que ajude o aprendiz a selecionar
a letra ou o dígrafo que deverá ser usado. Exemplos: som de S (seda, cedo, auxílio, asseio,
piscina, cresça, amanheça, exceção); som de G (girafa, jiló); som de Z (tesoura, exame); som
de X (enxuta, cheio); emprego de H inicial; emprego de L e LH em palavras como Júlio e julho;
família e toalha.
De modo geral, existe consenso entre os pesquisadores dessa área que, para progredir na
aprendizagem da grafia correta das palavras, o aluno precisa conviver com os textos escritos. Assim, o
contato frequente com atividades de leitura impulsiona essa aprendizagem. Outro fator é a frequência
de uso de palavras em contextos significativos.
Considerando a escrita das crianças que já entendem a escrita alfabética, é perceptível que parte
dos alunos se inclinem a imaginar que uma letra isolada representa um único som, praticando assim
várias violações ortográficas. As crianças devem ser levadas pelo professor a refletir sobre a norma
ortográfica, mas para esse trabalho é necessário que os aprendizes já sejam capazes de produzir
e ler pequenos textos com alguma fluência, para que a ortografia venha a ser tomada como objeto
de ensino e aprendizagem mais sistemáticos.
Por fim, o conhecimento de normas ortográficas e princípios morfológicos, dos quais o aprendiz
vai se apropriando gradativamente, desde que haja um trabalho intencional e sistemático da escola,
consolida e aprofunda esse aprendizado. Desta forma, é imprescindível que o corpo docente defina
metas relacionadas ao processo de ensino-aprendizagem, considerando os erros apresentados pelos
alunos em suas produções de textos com o propósito de recomendar atividades que possibilitem o
crescimento das crianças. O importante é estabelecer atividades individuais ou coletivas.
Cabe ao professor avaliar as produções textuais e planilhar os erros de cada criança a fim de
identificar quais são os erros mais comuns da turma e trabalhar coletivamente, e os demais, realizar
um trabalho individual. Exemplo:
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Quadro 5 – Sondagem ortográfica
Ainda tomando como exemplo a produção da aluna Larissa, percebe-se que a prioridade seria o
trabalho com os aspectos morfológico-gramaticais. Especificamente os tempos verbais (presente e
passado) não terminam com ÃO, exceto os verbos conjugados na terceira pessoa do plural – estão
e são.
Também pode-se selecionar um dos trechos de um texto produzidos pelos alunos e compartilhar
com a turma, a fim de discutir, formular hipóteses sobre a forma que consideram correta, justificar
suas escolhas, problematizar as soluções e apresentar as regras ortográficas, de acordo com a
necessidade do grupo.
Saiba mais
Disponível em:
Parte 1: www.youtube.com/watch?v=GMc3XXtPIsg.
Parte 2: www.youtube.com/watch?v=F7Hcg8NTajQ.
15. AVALIAÇÃO
Como viemos apontando ao longo do trabalho, a avaliação é um instrumento que auxilia o aluno
a aprender e precisa ser parte integrante do trabalho realizado em sala de aula. É a partir dela que
podemos rever procedimentos, replanejar as propostas de trabalho e perceber os avanços e as
dificuldades no processo de ensino e aprendizagem.
Nessa perspectiva, avalia-se tanto os alunos, para mapear seus percursos de aprendizagem,
como as práticas pedagógicas, com o objetivo de analisar as estratégias de ensino adotadas de modo
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a relacioná-las às possibilidades dos educandos. Como abordado por Ferreira e Leal (2006, p. 34),
“[...] é papel de a escola ensinar, favorecendo, por meio de diferentes estratégias, oportunidades de
aprendizagem, e avaliar se tais estratégias estão sendo de fato adequadas”.
Quanto ao registro dessas avaliações, pode-se também propor diversificação quanto aos
instrumentos: cadernos de registros dos estudantes; portfólios com a coletânea de atividades/registros
realizados pelas crianças ao longo de um determinado período que permitem que tanto o professor
como os próprios alunos acompanhem as dificuldades e os avanços em uma determinada matéria
e as fichas de acompanhamento individual (de cada aluno) e coletivo (da classe).
Nessa perspectiva de avaliação, é importante pensarmos em: Por que e para quê avaliar? Para
quem? Onde? Quando? O quê? Como? Com quem? Quais os resultados das ações empreendidas? É
importante considerar que a avaliação visa gerar informações para que professores e alunos possam
refletir e criar estratégias de superação dos seus limites e ampliar suas possibilidades sobre cada eixo
da língua trabalhado. Ao conhecer as formas pelas quais as crianças aprendem, o professor poderá
planejar melhor a sua intervenção pedagógica, pois mapear a reação da criança à intervenção docente
é a razão de ser do processo avaliativo em sala de aula, considerando os percursos diferenciados.
A avaliação deve estar presente nas atividades do dia a dia da sala de aula e em momentos
previstos para sintetizar o desempenho dos alunos, da turma e do professor. Esse movimento permite
uma visão de conjunto do que cada um conseguiu desenvolver neste período e auxilia o professor a
planejar suas intervenções, propondo procedimentos que levem os alunos a atingir novos patamares
de conhecimento.
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CONCLUSÃO
Estamos finalizando o módulo que tratou dos estudos sobre a função social da leitura e da
escrita. Como você pode constatar, tais práticas sociais de leitura e escrita se tornaram práticas
escolarizadas, submetidas à organização a partir de métodos de ensino, tornando a alfabetização
sistemática e intencional.
De lá para cá, saber ler e escrever tornou-se uma grande preocupação social, cultural e política,
principalmente porque a maioria da população brasileira fracassava na escola e também pelos
diferentes sentidos ao ensino da leitura e escrita que foram sendo atribuídos ao longo do tempo.
Saber ler e escrever, saber utilizar a leitura e a escrita nas diferentes situações do cotidiano são
inquestionáveis, tanto para o exercício pleno da cidadania, no plano individual, quanto para a medida
de inclusão no nível sociocultural e spolítico.
Por este motivo é que, ao longo do módulo, fomos discutindo a necessidade de planejar o trabalho
pedagógico de alfabetização, articulando as atividades de uso da linguagem com as atividades de
reflexão sobre a escrita. Isso significa dizer que a alfabetização, tomada como aprendizagem inicial
da leitura e escrita, não pode se dar fora de contextos de letramento que potencializem o domínio
da linguagem.
Como viemos apontando ao longo do trabalho, a avaliação é um instrumento que auxilia o aluno
a aprender e precisa fazer parte integrante do trabalho realizado em sala de aula. É a partir dela
que podemos rever procedimentos, replanejar as propostas de trabalho e perceber os avanços e as
dificuldades no processo de ensino e aprendizagem.
Para isso, o professor tem o papel de avaliar as produções de textos realizadas, conversar com
os alunos sobre elas, orientá-los, comparar a evolução da escrita e da leitura individualmente. Este
trabalho só é possível por meio do registro. É imprescindível ao professor organizar produções num
portfólio para acompanhar os avanços de cada um, identificando seus pontos fortes e fracos. É
importante, ainda, registrar as condições em que a atividade foi feita.
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Vale ressaltar que o trabalho com a língua portuguesa deve-se dar por meio de práticas sociais
de leitura e escrita, formando alunos que saibam produzir e interpretar textos de uso social, tanto
orais como escritos, e que estejam inseridos em várias situações comunicativas que permitem a
plena participação no mundo letrado.
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Estudo especial sobre alfabetismo e mundo do trabalho. São Paulo: Ação Educativa, 2016. Disponível
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