Processo Seletivo de Professores GARRA 2022 - Carta de Motivação
Danilo M. Lobo G. Delgado - 201811004
Falar sobre Educação Popular, sobretudo no contexto brasileiro, é abordar o
potencial trazido pela prática do processo de ensino e aprendizagem na transformação da sociedade como um todo, a partir de diversas perspectivas. Primeiramente, é importante perceber que se trata da dicotomia entre duas formas predominantes de se pensar a educação, sendo uma hegemônica, defendida pelo "primeiro mundo" no cenário internacional e subserviente aos interesses do mercado global, ou seja, que trabalha pela formação da mão de obra que o capital carece, sem se preocupar diretamente com a autorrealização do aluno no meio profissional. Do outro lado, enxerga-se um modelo educativo que preza pela emancipação do estudante a partir do conhecimento, seja ele construído, direta ou indiretamente, no ambiente escolar ou simplesmente a partir da valorização, defendida por esse formato, de saberes populares desprestigiados pelo que Paulo Freire conceituou como sistema "bancário" de educação. Existe, em todo esse processo, uma contradição evidente: como conciliar o potencial emancipador da educação com as demandas de conteúdo do "ensino bancário"? Isso torna-se uma preocupação no momento em que, mesmo que o modelo educacional hegemônico não tenha grandes interesses na libertação crítica das camadas populares, são seus conceitos que moldam, majoritariamente, as provas e exames responsáveis pelas melhores possibilidades de ascensão social e educacional para os mais oprimidos, como o ENEM e inúmeros outros vestibulares públicos. Não cabe aqui entrar nos pormenores teóricos desse paradoxo, que colabora imensamente para o debate e a ascensão de ideias importantíssimas para a construção da educação que queremos para o Brasil, mas é fundamental apontar o papel exercido pelos cursinhos populares, como o Garra, na fomentação de práticas educativas que, simultaneamente, contribuem para a emancipação crítica e a ascensão social de seus estudantes, o que, por sua vez, cria um poderoso ciclo de fortalecimento do próprio movimento da Educação Popular por meio daqueles que tiveram suas próprias experiências dentro das salas de aula revestidas por esse modelo de ensinar e aprender. Ainda, é importante tratar do ponto culminante de toda a perspectiva referente à proposta emancipadora da educação: a transformação social, o aprimoramento da realidade humana ou, do modo mais poético, tomado emprestado de movimentos sociais, a consumação de "novos mundos possíveis". Nesse contexto, é impreterível ressaltar que vivemos uma crise imaginativa acerca da capacidade de idealizar e lutar por novos mundos. Tudo que concebemos como fundamental para nossas próprias utopias coletivas é, rapidamente, apropriado pelo Neoliberalismo e transformado em formas de consumo, enquanto as forças mais reacionárias da sociedade, local e globalmente, não medem esforços para atacar o que já foi construído em prol de melhores condições de vida para os que mais são atingidos por esse sistema econômico, inclusive no âmbito educacional. Então temos o mais fundamental e intrínseco papel da educação em nosso tempo: a possibilidade de trazer instrumentos transformadores para aqueles que poderão mudar o mundo. Em cada sala de aula encontram-se sujeitos, com seus próprios sonhos e perspectivas, que poderão contribuir na construção de uma realidade mais razoável, seja fomentando a Educação Popular, lutando pela sustentabilidade climática, combatendo as inequidades do capitalismo ou ajudando na vida de uma única pessoa. Isso pode acontecer com qualquer um, independentemente de suas experiências educacionais, mas uma proposta de ensino e aprendizagem que preze pela libertação do indivíduo torna tudo mais possível. Após uma breve crítica ao capitalismo, da qual tenho tido dificuldades de escapar, chega a hora em que me apresento. Sou Danilo, tenho 21 anos e sou graduando na Licenciatura em História da UFJF desde 2018. Passando por uma breve experiência de trabalho na área de Direito, ao longo da pandemia, percebi que mantenho mais vivo do que nunca o sonho de ser professor. Cresci ao lado de dois incríveis educadores da área de História, meus pais, e vi se construir em mim um desejo natural de seguir o mesmo caminho, por acreditar fielmente no papel transformador da educação não apenas para a sociedade como um todo, mas para a vida de cada indivíduo. Ao longo dos últimos dias, nos quais venho preparando minha inscrição neste processo seletivo, tenho pensado muito sobre o que me faz estar aqui, escrevendo esta carta, e minhas conclusões se dividem em dois caminhos: primeiro, cá estou por acreditar que a experiência de ser professor ou monitor do Garra, caso seja escolhido, será fundamental para o que espero atingir ao longo da graduação, profissional e pessoalmente, tendo a primeira experiência contínua na sala de aula em que não seja aluno e experimentando o contato com os estudantes, com quem espero aprender tanto quanto ensinar. Do outro lado, confio imensamente na proposta do projeto e espero poder contribuir da melhor forma para que os alunos alcancem seu objetivo de entrar na universidade, o que pode ser o primeiro passo para a consolidação de seus sonhos. Farei meus melhores esforços para que, no fim do ano, alguém venha me dizer "cara, acertei várias questões de História no ENEM", o que tenho imaginado como a maior felicidade que essa experiência pode me oferecer. Por fim, ressalto que acredito, também, no potencial imenso que o ensino de História pode ter na construção de um saber crítico que represente a possibilidade para os alunos na construção de um pensamento emancipador que seja de imenso valor para as questões aplicadas no ENEM. A oportunidade de fomentar um processo de Ensino e Aprendizagem que faça cada estudante se perceber como um sujeito histórico, capaz de transformar a realidade, sem se perder a rigidez com o conteúdo demandado é uma das características mais importantes dessa área de conhecimento no âmbito escolar. A História foi, ao longo dos milênios, construída por pessoas comuns e escrita em nome de nobres reis de mundos distantes, e é fundamental que cada estudante compreenda que ele mesmo é protagonista histórico do tempo em que vive, assim como os escravizados que construíram os alicerces iniciais da economia brasileira no período colonial e os trabalhadores que lutaram e alcançaram seus direitos durante o governo de Getúlio Vargas.
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