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CAPÍTULO 1

A CANNABIS NA ONU: POLÍTICAS DE


DROGAS OU POLÍTICAS DE SAÚDE?
Dayana Rosa Duarte Morais1
Martinho Braga Batista e Silva2

Introdução

O consumo de cannabis por crianças ocupou a cena pública durante a


década 2010-2020 no Brasil, momento no qual o debate sobre a maco-
nha medicinal era intenso nos Estados Unidos da América (EUA), em
ambos os casos demandando a nossa atenção sobre o fenômeno da
regulação das drogas, não só sua proibição. O documentário “Ilegal”
(2014), no qual se pode acompanhar o dia a dia de famílias de crianças
com doenças incapacitantes que só adquiriram algum alívio de seu
sofrimento através do uso de maconha medicinal, designado canabi-
diol, ou, ainda, pela sigla CBD, coloca no centro de nossos estudos o
papel de órgãos reguladores como a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA). Outro órgão regulador ocupou um lugar cen-
tral na ampla cobertura midiática da chamada “retirada” da maco-
nha da lista de substâncias psicoativas ditas “perigosas” em 2020, uma

1. Dayana Rosa Duarte Morais, mestre e doutora em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medi-
cina Social – UERJ, graduada em Administração Pública pela UFF.
2. Martinho Braga Batista e Silva, doutor em antropologia pelo Museu Nacional – UFRJ,
professor do Instituto de Medicina Social - UERJ e integrante do colegiado gestor do Comitê
de Antropologia e Saúde – ABA (2021-2022).

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reclassificação que reconhece seu potencial terapêutico: a Organiza-
ção Mundial de Saúde (OMS). É a Organização das Nações Unidas
(ONU) que protagonizará nossa análise antropológica do controle
internacional da maconha nas páginas seguintes, atenta aos desliza-
mentos entre proibição, regulamentação e legalização das drogas.
Drogas não podem ser vistas exclusivamente como substâncias
psicoativas, inclusive a maconha, já que também são mercadorias,
de maneira que elas não são apenas consumidas como também cul-
tivadas e comercializadas. Produção, distribuição e uso de drogas são
práticas sociais proibidas e penalizadas, mesmo o consumo das ditas
“lícitas” pode ser patologizado, como no caso do alcoolismo. Desta
maneira, o uso de drogas pode ser medicalizado e criminalizado, não
apenas regulado. O que acontece na maioria das vezes é que o uso
com finalidades terapêuticas de uma substância pode vir a ser auto-
rizado, como é o caso do ópio quando assume a forma de morfina,
enquanto o uso da mesma substância com finalidades recreativas será
provavelmente condenado moral e legalmente, quando assume a for-
ma de heroína, por exemplo. A prescrição médica de maconha foi au-
torizada internacionalmente, embora alguns canabinoides da planta
ainda figurem na lista de substâncias psicoativas proscritas.
A regulação institucional do prazer é o principal vetor desses pro-
cessos sociais e históricos de penalização e patologização do uso de
drogas, sendo que sua judicialização e particularmente politização,
inclusive por parte do movimento antiproibicionista, sustenta o di-
reito à saúde dos usuários. Nosso trabalho de campo não acentuará
os usos cerimoniais, espirituais e religiosos de substâncias psicoativas,
nem aqueles com a finalidade de aprimoramento, destacando os fins
científicos e médicos da cannabis.
Como nos revelam algumas etnografias recentes com cultivado-
res de cannabis (VERISSIMO, 2017; SIERRA, 2018), a planta pode
se tornar um objeto de decoração, combustível, corda, papel, ali-
mento e remédio, entre outros usos e significados possíveis. Como a

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antropologia das drogas já deixou claro desde o final do século pas-
sado (VARGAS, 1998), essas práticas corporais em torno das drogas
são proibidas e também prescritas, de modo que o proibicionismo
convive com a incitação ao uso de medicamentos, bebidas alcoóli-
cas e outras substâncias que também são mercadorias e inclusive
biotecnologias. A etnografia em um campo up, apresentada ao final
desse capítulo, relevará uma estratégia de legitimação adotada para
sedimentar alguns usos e significados da cannabis, como veremos a
seguir.

A cannabis no Sistema Internacional de Controle de Drogas


A Liga das Nações, que foi promovida pelo presidente dos EUA, Woo-
drow Wilson, foi o primeiro organismo internacional permanente e,
em 1920, começou a incidir no tema das drogas, criando o Comitê
Consultivo sobre o Ópio – considerado por Thoumi (2015) o precur-
sor da Comissão de Drogas Narcóticas (CND). Já o Comitê de Higie-
ne da Sociedade, considerado o precursor da OMS, era o responsável
pelo tema da saúde. Essa divisão se traduz numa origem do Sistema
Internacional de Controle de Drogas (SICD) descolada da Saúde, ou
não integralmente interessado na Medicina.

Embora as questões sociais e médicas nunca tenham desaparecido com-


pletamente, o sistema focou-se em cálculos econômicos, estatutos re-
gulatórios e medidas de execução. A perícia médica desempenhou um
papel importante na definição de quais drogas possuíam potencial
de dependência, mas essas determinações se concentraram em mani-
festações fisiológicas estreitas e evitaram as implicações sociais mais
amplas da dependência. O controle da oferta surgiu como a razão de
ser do regime (McALLISTER, 2000, p. 49-50. Tradução e grifos nossos).

McAllister (2000) argumenta que o SICD surgiu em um “regime


liberal de livre comércio internacional” que ostensivamente favore-
ceu governos ocidentais e empresas (geralmente multinacionais), mas

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também concedeu certas vantagens a produtores e até a atores não
estatais, como traficantes.
A Segunda Guerra Mundial acabou com a Liga das Nações, pois
era a prova de que seu objetivo de perseguir a paz mundial havia fra-
cassado. Mas houve esforços para manter os organismos do SICD
que foram financiados pelos EUA, e deslocados para cidades como
Nova York, Princeton e Washington para garantir sua continuidade
(THOUMI, 2015). Não tardou e o SICD e toda a política internacio-
nal se reorganizava durante o pós-guerra.
Em 1945 a ONU foi criada com o objetivo de impedir outro con-
flito como aquele e, menos de 14 meses depois de sua criação e mais
de um ano antes da Declaração Universal de Direitos Humanos, o
Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU foi criado – e,
consequentemente, a CND também. Essa reorganização do SICD no
pós-guerra esteve diretamente relacionada ao fato de que “um gru-
po de estadunidenses queria assegurar que os representantes dos go-
vernos nas agências de controle fossem dos setores policiais e penais,
no lugar daqueles que tiveram formação médica, sociológica ou em
saúde pública” (SINHA, 2001, p. 18. Tradução nossa). Por isso, houve
pressão para que a CND reportasse diretamente ao ECOSOC, e não
à OMS. E assim foi. Entretanto, ainda que o ECOSOC mantivesse o
controle sobre o SICD, o Protocolo de Paris de 1948 deliberou que o
Comitê de Especialistas em Drogas (ECDD)3, da OMS, ficasse respon-
sável por recomendar quais substâncias seriam controladas.
O ECDD orbita o SICD, mas não o compõe diretamente enquan-
to instituição. Ele consiste em um grupo independente de especialis-
tas na área de drogas e medicamentos. O Comitê é convocado pela
OMS cerca de uma vez por ano para analisar o impacto das subs-
tâncias psicoativas na saúde pública e fazer recomendações à comu-
nidade internacional, e geralmente apresenta suas recomendações

3. Do inglês Expert Committee on Drug Dependence.

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nas sessões anuais da CND - desempenhando, assim, um papel de
consultor do SICD.
Há diversas formas de classificar as drogas, mas, o atual modelo
de classificação das drogas, na ONU, se dá por listas anexas às Con-
venções de Drogas, que são os principais documentos reguladores
do SICD. Independente da categoria de classificação que escolhamos
para a cannabis, podemos afirmar que ela tem sido usada para fins
espirituais, medicinais e fins recreativos desde o início da humanida-
de. Ou seja, a cannabis existe antes do SICD. Os primeiros exemplos
de controle da substância datam do século XIX, em alguns Estados
mediterrâneos, no Brasil e na África do Sul, como instrumento de
repressão social de minorias.
Internacionalmente, o esforço para controlar as substâncias psi-
coativas foi inicialmente concentrado no ópio, em particular na Chi-
na, durante os primeiros anos do século XX. Para cannabis, vários
países optaram mais por regulamentar do que proibir, e as evidências
disponíveis sugeriam que, embora não inofensiva, a cannabis não era
tão perigosa.
Apesar da falta de acordo entre nas primeiras reuniões interna-
cionais sobre a necessidade de incluir a cannabis no SICD, não de-
morou muito pra isso acontecer. Enquanto muitos representantes de
países não tinham nenhum conhecimento da substância e estavam,
consequentemente, confusos, os esforços da Itália, com o apoio dos
Estados Unidos, garantiram a menção ao “Cânhamo Indiano” em um
adendo da Convenção Internacional do Ópio (1912). Após a Primeira
Guerra Mundial, os esforços para desenvolver ainda mais um sistema
internacional de controle de drogas sob os auspícios da Liga das Na-
ções viu a droga tornar-se objeto de maior atenção. E, assim, a can-
nabis ficou sob controle internacional na Convenção de Genebra de
1925 e, gradualmente, Estados signatários começaram a aprovar uma
legislação nacional mais orientada para a proibição (BEWLEY-TAY-
LOR; BLICKMAN; JELSMA, 2014).

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Durante os anos 30, impulsionado por preocupações crescentes
em torno do uso da cannabis dentro de suas próprias fronteiras, os
EUA deixaram de desempenhar um papel coadjuvante para liderar
uma campanha internacional contra a cannabis. Mas foi só no pós-
-guerra que obteve êxito na empreitada. Depois de 1945, o EUA ex-
plorou seu status de nova superpotência dentro da ONU para forçar,
dessa vez com sucesso, um controle mais rigoroso da cannabis em
nível internacional.
O controle da cannabis se desenvolveu no final do século XIX,
e no início do século XX, por meio de várias iniciativas nacionais e
internacionais de controle de drogas, frequentemente relacionadas
ao ópio e uma supervisão crescente de produtos farmacêuticos. As
primeiras medidas de controle foram frequentemente implemen-
tadas como meios de controle social de grupos que operavam nas
periferias da sociedade.
Para regular a cannabis e outras substâncias, o SICD atualmente
é composto por um conjunto de instâncias da ONU. Além da CND,
fazem parte do SICD, a Junta Internacional de Fiscalização de Entor-
pecentes (INCB); o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Cri-
mes (UNODC); o Comitê de ONGs sobre Drogas e destacamos um
evento, a Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU (UNGASS).

Quadro 1 Objetivos dos órgãos e instâncias do SICD

Comissão de Criada em 1946, a CND é uma comissão funcional do ECOSOC e


Drogas Narcó- órgão central das Nações Unidas para políticas relacionadas a
ticas (CND) drogas, e também monitora a implementação das três Convenções,
estando habilitada a atuar em todas as áreas relacionadas com
os seus objetivos. Se estrutura em dois segmentos distintos: um
segmento normativo para o desempenho de funções e baseadas
nas Convenções; e um segmento operacional para exercer o papel
de órgão dirigente do UNODC. A CND se reúne anualmente e adota
uma série de debates, decisões e resoluções, podendo ser convo-
cadas reuniões intersecionais para fornecer orientação política ao
UNODC. Atualmente, a Comissão trabalha no acompanhamento
da Declaração Ministerial de 2019. Atualmente é composta por 53
Estados-Membros.

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Junta Inter- Criada em 1968, é um órgão de fiscalização independente para a
nacional de implementação das Convenções, sugerindo cooperação técnica e
Fiscalização de apoio financeiro, além de avaliar precursores químicos utilizados na
Entorpecentes produção ilícita de drogas para determinar se devem ser postos no
(INCB) controle internacional, por exemplo. Anualmente produz relatórios
com análises da situação do controle de drogas e chama atenção
para brechas no SICD, para o cumprimento das Convenções e
recomenda melhorias nos níveis nacionais e internacionais. Os
relatórios são baseados em informação providenciada pelos
governos e organizações internacionais.

Escritório das Criado em 1991, é o órgão técnico da CND, responsável por oferecer
Nações Unidas assistência aos Estados-Membros nas áreas de saúde, justiça
sobre Drogas criminal e segurança pública, incluindo controle e prevenção do
e Crimes uso de drogas, enfrentamento ao crime organizado transnacional,
(UNODC) tráfico ilícito de drogas, de seres humanos e de armas, reforma
penitenciária, corrupção e lavagem de dinheiro, gestão e recupera-
ção de ativos, além da prevenção ao HIV entre usuários de drogas e
pessoas em privação de liberdade.

Sessão Realizada em 1990, 1998 e 2016 com a temática das drogas, as


Especial da UNGASS tratam de assuntos sociais relevantes. Convocada pelos
Assembleia próprios Estados-Membros da ONU, a UNGASS é um fórum em que
Geral (UN- se debate e se acordam metas de nível internacional às quais os
GASS) sobre próprios membros estarão submetidos. Além disso, a declaração
Drogas final do encontro estabelece orientações gerais que servirão de
guia para as próximas ações ao redor do mundo das agências da
ONU sobre a temática, guiam conferências e podem nortear a
formulação das políticas nacionais.

Comitês de O VNGOC, criado em 1983, e o NYNGOC, criado em 1984, são


ONGs sobre comitês globais que visam apoiar organizações da sociedade civil
Drogas de no envolvimento com o sistema das Nações Unidas em políticas e
Viena (VNGOC) práticas internacionais sobre drogas, facilitando o intercâmbio de
e de Nova York informações entre organizações da sociedade civil e agências da
(NYNGOC) ONU, Estados-Membros e outros órgãos relevantes da ONU.

Fonte: MORAIS, 2021.

A partir da Convenção Única de Entorpecentes (1961), a OMS


passou a integrar o SICD ocupando parte das vagas na CND. Dos
12 assentos disponíveis, três são reservadas para “membros que
possuam experiência médica, farmacológica ou farmacêutica, es-
colhidos de uma lista de pelo menos, cinco pessoas indicadas pela
Organização Mundial de Saúde” (ONU, 1960). O restante dos
membros é escolhido de uma lista de pessoas indicadas pelos Esta-
dos-Membros da ONU.

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Cannabis e heroína no mesmo nível de regulamentação no
SICD

As Partes,
Preocupadas com a saúde física e moral da humanidade,
Reconhecendo que o uso médico dos entorpecentes continua indispen-
sável para o alívio da dor e do sofrimento e que medidas adequadas de-
vem ser tomadas para garantir a disponibilidade de entorpecentes para
tais fins,
Reconhecendo que a toxicomania é um grave mal para o indivíduo e
constitui um perigo social e econômico para a humanidade,
Conscientes de seu dever de prevenir e combater esse mal.
Considerando que as medidas contra o uso indébito de entorpecentes,
para serem eficazes, exigem uma ação conjunta e universal.
Julgando que essa atuação universal exige uma cooperação internacio-
nal, orientada por princípios idênticos e objetivos comuns,
Reconhecendo a competência das Nações Unidas em matéria de con-
trole de entorpecentes e desejosas de que os órgãos internacionais a ele
afetos estejam enquadrados nessa Organização,
Desejando concluir uma convenção internacional que tenha aceitação
geral e venha substituir os tratados existentes sobre entorpecentes, li-
mitando-se nela o uso dessas substâncias a fins médicos e científicos
e estabelecendo uma cooperação e uma fiscalização internacionais, per-
manentes para a consecução de tais finalidades e objetivos,
Concordam [...] (Preâmbulo da Convenção Única de Entorpecentes.
ONU, 1961)

A tendência de proibir o uso recreativo de cannabis tornou-se par-


te integrante do desenvolvimento de uma nova Convenção Única
que substituiria os tratados de controle de drogas existentes. Com
a aprovação da normativa, a cannabis foi classificada como um dos
psicoativos mais perigosos, considerada tendo quase nenhum valor

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terapêutico. Apesar das preocupações sobre usos tradicionais em
muitos países asiáticos e africanos, a forma final da convenção refletiu
o domínio do Ocidente dentro do processo de negociação.
É importante esclarecer que no marco normativo da Convenção
Única foram inauguradas quatro listas anexas à Convenção, cujas
substâncias são classificadas de acordo com o grau de controle acor-
dado entre os Estados e por recomendação da OMS, encarregada por
transferir uma droga de uma lista para outra, ou, até mesmo, retirá-
-la das listas. Nelas, estão inclusas não apenas drogas como cannabis,
ópio e cocaína, mas também outras utilizadas em medicamentos, por
vezes, comuns em nosso cotidiano e também em demais preparos
medicinais: a Lista I compreende as substâncias de estrita proibição; a
Lista II ratifica substâncias já listadas na Convenção anterior, de 1961;
a Lista III inclui preparos; e a Lista IV compreende substâncias já ci-
tadas na Lista I, mas que são consideradas particularmente perigosas
e, em razão disso, os Estados podem querer aplicar a elas medidas
específicas de controle.
A Convenção Única também traz modificações sobre a fiscalização.
Neste caso, determina algumas incumbências da OMS no SICD, que se
estiver de posse de informação que, na sua opinião, torne conveniente
uma modificação em qualquer das Listas notificará o Secretário-Geral,
fornecendo-lhe todos os dados em apoio de sua notificação (ONU, 1961).
Da mesma forma, “se a OMS constatar que a substância se presta a simu-
lar abusos e pode produzir efeitos nocivos semelhantes aos entorpecentes
das Listas I e II ou ser transformada em entorpecente” (ONU, 1961), co-
municará isso à CND, podendo recomendar que se decida pela inclusão
da substância nas Listas I e II. O mesmo vale para o caso em que, se a
OMS achar que um preparado, dadas as substâncias que contém, não se
presta a uso indevido e não pode produzir efeitos nocivos, a CND tam-
bém pode acatar sua recomendação e incluir a substância na Lista III. E
por aí vai: a OMS sendo consultada, podendo não ser sempre ouvida,
sempre verificando a finalidade médica e científica para classificação.

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Na Convenção de 1961, a CND chegou ao veredicto de que a can-
nabis não tinha valor medicinal, apesar do tradicional remédio in-
diano, por exemplo. A Índia estava representada por um bloco anti-
canábico, então não houve objeções. Como resultado, a minuta da
Convenção Única incluiu uma seção especial intitulada “proibição
da cannabis”. Mas a oposição impediu sua adoção no Plenário: 73
países participaram da omissão da definição de folhas e sementes de
cannabis. Então, o tradicional uso de bhang na Índia pode continuar.
Perguntas sobre “medicina indígena”, “uso quase médico”, “usos tra-
dicionais” e outras definições precisas do que seriam plantas ou subs-
tâncias derivadas que devem ser colocadas sob o controle permanece-
ram sem solução (BEWLEY-TAYLOR; BLICKMAN; JELSMA, 2014).
Os usos da cannabis que eram amplamente aceitos pela sociedade
em muitos países asiáticos e africanos, foram, portanto, condenados a
serem abolidos, uma abordagem culturalmente tendenciosa que tam-
bém foi estendida à mastigação das folhas de coca. Em uma batalha
para assinaturas, foram necessárias 40 ratificações do tratado para a
Convenção entrar em vigor, em 1964. Junto à heroína, e a algumas
outras drogas selecionadas, a cannabis foi incluída na Lista I e na Lista
IV, assim como sua resina, extratos e tinturas.

Terminando o que a Convenção Única não fez: a inclusão do


princípio ativo da cannabis e a criminalização das pessoas que
usam drogas
Uma década após a Convenção Única, e exibindo confusão crescente
sobre os critérios das listas de controle dentro do sistema internacional
ainda em desenvolvimento, a ONU escolheu incluir o princípio ativo
da cannabis, o delta-9-THC ou dronabinol (a formulação farmacêutica
do THC), na Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971. Esse
tratado teve como objetivo colocar sob controle internacional substân-
cias que não foram incluídas na Convenção Única, muitas delas produ-
zidas pela indústria farmacêutica. O dronabidiol foi incluído na Lista I

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na Convenção de 1971, demarcando que o uso dessa substância deveria
ser proibido, exceto para finalidades médicas e científicas limitadas. Na
ocasião, o ECDD da OMS reafirmou fortemente as opiniões expressas
anteriormente, relatando que “a cannabis é uma droga de dependência,
produzindo problemas de saúde pública e sociais, e que seu controle
deve ser continuado” (OMS, 1970, p. 09).
A inclusão do THC na Lista I permitiu seu uso na área de pesquisa
médica, mas impôs obstáculos para o desenvolvimento para o uso
medicinal. Um lobby bem-sucedido da indústria farmacêutica, com
base em um corpo de evidências que aumenta lentamente a respei-
to da eficácia medicinal da cannabis e seus canabinoides, levou a um
pedido de 1982 do governo dos EUA para transferir o dronabinol da
Lista I para a Lista II. Vários anos depois, o ECDD da OMS conduziu
uma revisão crítica que resultou em uma recomendação positiva: a
adoção da CND, em 1991, da recomendação da OMS para reclassifi-
cação do dronabinol foi o primeiro passo no ainda processo contínuo
de reconhecimento formal, no nível da ONU, da utilidade médica do
principal composto ativo de cannabis (THOUMI, 2015).
Ironicamente, esses esforços na ONU com o objetivo de reduzir e,
em última análise, eliminar o “abuso” de cannabis, coincidiu com a
sua popularidade crescente e uso, cada vez mais difundido, uma ten-
dência que estava intimamente associada à contracultura emergen-
te de movimentos em muitos países ocidentais, incluindo os EUA,
durante a década de 1960 (ESCOHOTADO, 2008). A Convenção de
1971 é, para Escohotado (2008), a reação proibicionista em relação à
visão de mundo presente no movimento da contracultura, pois con-
firmou o dever/direito de interferência mínima do estado na esfera
íntima. Mesmo sendo a contracultura um ator que não se fez pre-
sente de modo formal, conseguiu de algum modo incidir no campo,
produzir efeitos e reações.
A Convenção Única nem tinha sido impressa quando o deba-
te sobre o status da cannabis foi reiniciado. Na Sessão da CND

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imediatamente após a sessão de 1961, comentários de profissionais
da imprensa holandesa de que o vício da cannabis não era pior do
que o do alcoolismo desencadeou um debate (THOUMI, 2015).
Diante da crescente popularidade e difusão do uso da cannabis, ela
se tornou o foco das atividades de repressão às drogas em muitos
países ocidentais na década de 60. A mudança nos padrões de uso
nesses países coincidiu com a aplicação da Convenção Única. Deten-
ções por delitos de drogas alcançaram níveis sem precedentes, in-
cluindo a posse para uso individual. Nos EUA, por exemplo, crimes
relacionados às drogas aumentaram 94,3% entre 1966 e 1967, ano
em que Convenção foi ratificada em Washington (BEWLEY-TAY-
LOR; BLICKMAN; JELSMA, 2014).
Embora este seja um extremo, um número predominante de jo-
vens estava recebendo condenações criminais, multas e, em alguns
casos, sentenças de prisão em vários países ocidentais. O manejo
de pessoas que usavam cannabis nos sistemas jurídicos nacionais
consequentemente desencadeou um debate doméstico significati-
vo: inúmeros inquéritos e comissões foram estabelecidas para exa-
minar o uso da substância e recomendar mudanças nas suas leis
sobre cannabis.
Dezessete anos depois, a Convenção de 1988, ou a Convenção
Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópi-
cas, representou o “ápice da repressão” (BOITEUX, 2006, p. 40), ou
o auge da cruzada moral da proibição (BECKER, 2008), uma vez que
aparentemente os governos concordavam com a atualização de con-
siderar o fenômeno das drogas ilícitas como um desafio coletivo e
global, assentado nos princípios da cooperação e corresponsabilida-
de dentro da resposta repressiva. O consumo, por si só, não é passivo
de punição, mas as atividades de preparação para o consumo pessoal
são tipificadas como crime. Assim, o documento implicou que o ma-
nejo do consumo deixasse de ser considerado assunto exclusivo da
política nacional, ficando a critério de cada Estado ( JELSMA, 2003).

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Recentes alterações na regulação da cannabis no SICD

A presença da cannabis, junto à coca e ao ópio, nas listas do SICD,


nunca foi submetida a uma revisão crítica da OMS até 2018 – ou seja,
por lá ficou intacta por 57 anos. Um dos poucos esforços que haviam
sido feitos, até então, data de 1993, quando a OMS iniciou um projeto
sobre fatores de risco derivados do uso de cannabis. Foi acordado que
um dos tópicos de pesquisa seria a realização de uma “Avaliação Com-
parativa das consequências físicas e psicológicas derivadas do uso de
álcool, cannabis, nicotina e opiáceos”. O relatório divulgado em agos-
to de 1995 concluiu: “Considerando os padrões de uso, a cannabis re-
presenta um problema de saúde pública muito menor do que o álcool
e o fumo nas sociedades ocidentais” (THOUMI, 2015).
Em nota à imprensa, a OMS defendeu sua decisão de suprimir a
conclusão dessa comparação do relatório final afirmando que não
houve “nenhuma tentativa de ocultar informações, e a decisão de não
incluir tal comparação no relatório final foi baseada em critérios cien-
tíficos que não tinham relação com pressões políticas” (OMS, 1998). A
versão final do relatório, publicado em 1997, incluía o seguinte comen-
tário sobre a polêmica comparação de cannabis com álcool e tabaco:

O grupo de especialistas, que preparou a revisão do conhecimento sobre


a cannabis em 1985, incluiu uma seção no rascunho do relatório que
buscava comparar as evidências sobre as consequências da cannabis para
a saúde com os riscos de uma série de drogas lícitas e ilícitas, como ál-
cool, tabaco e opiáceos. Porém, a confiabilidade e a importância para a
saúde pública de tais comparações são questionáveis. [….] O risco quan-
titativo do uso de cannabis é uma grande incógnita, uma vez que faltam
estudos epidemiológicos confiáveis ​​e, portanto, essas comparações
eles tendem a ser mais especulativos do que científicos (WHO / MSA
/ PSA / 97.4: 29. Tradução e grifos meus).

Já sobre as recomendações mais recentes, os resultados da análise


de 2019 foram publicados em janeiro de 2019, junto a uma lista de

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recomendações para a reclassificação da cannabis e substâncias a elas
relacionadas. A avaliação da OMS mostrou que a cannabis não repre-
sentava o mesmo nível de risco para a saúde que a maioria das outras
drogas que foram colocadas na Lista IV. No entanto, a OMS recomen-
dou manter a cannabis na Lista I da Convenção de 1961, com base
“nas altas taxas de problemas de saúde pública, decorrentes do uso de
cannabis e a extensão global de tais problemas”.
No fim das contas, dentre as recomendações da OMS, estava a re-
moção de cannabis da Lista IV, assim reconhecendo a utilidade medi-
cinal da planta.

Figura 1 Recomendações da OMS sobre cannabis para a CND de 2020.

Fonte: CSFD

Numa votação apertadíssima, a sessão da CND de 2020 aprovou


a recomendação 5.1, que tirava a cannabis da Lista IV. A contagem
final sobre a remoção de cannabis da Lista IV foi muito próxima, com
27 votos a favor e 25 contra, com 1 abstenção. A Federação Russa,
hoje principal representante proibicionista no mundo, mobilizou um
bloco de países por trás de uma posição comum, argumentando não
fazer quaisquer alterações na classificação da cannabis porque isso

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levaria a confusão e afrouxamento do estabelecido no quadro regu-
latório internacional. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos, antigo
principal proibicionista, votaram a favor da exclusão da cannabis da
Lista IV, mas uniu os países para afirmar um suposto consenso global
de que a cannabis deve permanecer sujeita ao escopo total dos con-
troles internacionais.
A reclassificação foi uma boa notícia para milhões de pessoas que
usam cannabis para fins terapêuticos e reflete a realidade do crescente
mercado de medicamentos à base de cannabis. Mas a cannabis per-
manece na Lista I, ficando sob os mesmos controles rígidos que a he-
roína e a cocaína.
A revisão também ressalta a profunda desconexão entre a tomada
de decisão em organismos internacionais e o ímpeto crescente para a
reforma das políticas de drogas em todo o mundo. Mais de 50 países
em todo o mundo adotaram programas de cannabis medicinal, en-
quanto Uruguai, Canadá, México, Luxemburgo, 15 estados dos EUA
e várias outras jurisdições mudaram ou estão mudando para regula-
mentar legalmente a cannabis para uso não medicinal. Ao resistir a
evidências e mudanças, o SICD corre o risco de se tornar, cada vez
mais, isolado e irrelevante.

Políticas de drogas ou políticas de saúde?


Mas fica uma pergunta: sabendo da centralidade, valorização e até
deturpação de um critério médico e científico para a regulamentação
internacional, por que os próprios Estados e a Sociedade Civil, inte-
ressados em alterar a regulamentação da cannabis e/ou outras subs-
tâncias, escolhem o SICD para investir suas propostas e não a OMS
ou outros fóruns multilaterais?
A proteção à saúde foi e ainda é a justificativa de criação e sus-
tentação do SICD, mesmo que tenha se optado por agentes policiais
e penais no lugar de agentes de formação médica, sociológica e da
saúde pública, como demonstrou Sinha (2001). Isso está diretamente

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ligado ao fato de que a razão de ser do SICD é controle da oferta
(MCALLISTER, 2000), ainda que evidentes impactos negativos na
saúde (CSETE; KAMARUZAMAN; KAZATCHKINE et al., 2016) não
tenham sido calculados pelos seus defensores. Contudo, a OMS é a
única agência da ONU citada nas Convenções, para desempenhar pa-
pel de apoio e sugestão, conforme vimos anteriormente.
De acordo com Morais (2021), uma das estratégias de legitima-
ção empregadas na CND é eleger a arena de luta. De acordo com
a autora, que entrevistou atores interessados no chamado problema
mundial das drogas, foi possível perceber algumas das nuances entre
se debater em Viena (sede da CND) e Genebra (sede da OMS), ou até
mesmo ir além e considerar outras agências como ONU Mulheres e
UNAIDS, ou fóruns como a própria OMS e Alto Comissariado de Di-
reitos Humanos. Perguntada sobre a diferença entre se discutir sobre
drogas em Viena e Genebra, uma das entrevistadas da Sociedade Civil
falou que a principal diferença está em que a OMS fala de Redução de
Danos claramente. Outra entrevistada identificou a CND como uma
arena de luta importante de ser disputada.

Você ter espaços validados como espaços de discussão de determinados


temas, não é de todo ruim, não é só um gueto, mas é mais uma garantia
de onde é que a gente está falando e a partir do que nós estamos falando.
É claro que isso sempre pode ser usado para o bem e para o mal. Então
você ter esse espaço da CND não quer dizer que não possa ser usado
outro espaço. Isso não impede que os outros países utilizem os outros
instrumentos, de outros lugares, e façam um balanço no momento de
incorporar essas diretrizes internacionais em sua legislação, em seus pro-
gramas e políticas, eles podem utilizar. Agora, alguns países vão dizer: o
espaço qual é? É esse? Muitas vezes, ao discutir em outro espaço, não ha-
verá a validação e a vinculação juridicamente necessária. Então tem uma
razão: a CND validar a discussão desse tema e os documentos que dali
saem. Não acho que não tem que ser discutido em outros espaços, mas
eu acredito que a melhor estratégia é ir forçando as discussões nesses
espaços. Porque o que acontece é que quem vai, por exemplo, no espaço

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da OMS? Quem é que vai de representação dos países? A Saúde. Quem
vai pra CND nas delegações? A Polícia Federal. Poucos lugares mandam
alguém da Saúde, raramente alguém da área dos Direitos Humanos vai
pra um espaço como esse pra discutir. Mas a melhor estratégia seria
invadir esses espaços. (...) É isso, você vai tencionando de todos os
lados pra que a discussão comece a acontecer (MORAIS, 2021, p. 235).

Considerações finais

As Convenções são “saturadas de ambiguidade textual”, tornando


sua interpretação mais arte do que ciência. Uma orientação detalha-
da para interpretação é fornecida para cada tratado em um comen-
tário oficial. Os anais das conferências em que as convenções foram
negociadas fornecem informações sobre as intenções dos redatores
e os argumentos usados ​​em debates para chegar a compromissos ou,
muitas vezes, a votação. Esse é um dos argumentos utilizados para
justificar a legalização no Uruguai e Canadá, por exemplo, países que
basearam sua narrativa de normativa também na proteção à saúde.
Assim, as interpretações têm a flexibilidade ou espaço de manobra
que levam a uma variedade de reformas de políticas para cannabis,
desviando-se de uma lei repressiva de tolerância zero às drogas.
A priorização dos setores policiais e penais no SICD é evidente, re-
correndo à saúde apenas para consulta e comprometendo-se com a re-
pressão. Embora o argumento, tanto para proibir, quanto para regular,
seja a proteção da saúde, o SICD está focado na repressão de substân-
cias – ainda que à exceção daquelas que tenham finalidade médica e
científica comprovada, mesmo que não se tenha definido o que é fina-
lidade médica e científica (THOUMI, 2015); e tenham se passado quase
60 anos, desde a criação da ONU, para a classificação da cannabis ser
revista e a mesma ter sua eficácia médica e científica reconhecida.
A classificação da cannabis, antes das recentes mudanças foi, na
verdade, uma rejeição de sua utilidade para fins terapêuticos e um
esforço para limitar seu uso exclusivamente à pesquisa médica, para

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a qual apenas pequenas quantidades seriam necessárias. Hoje, mui-
tos países rejeitaram esta posição que é cientificamente insustentá-
vel e estabeleceu regimes legais reconhecendo as propriedades me-
dicinais da cannabis e seus compostos. Ou seja, ainda que tenha se
passado mais de meio século de silêncio, ou sussurros, houve altera-
ções significantes no consenso de Viena no que se refere à cannabis,
sendo possível identificar a disputa (e conquista dos países posicio-
nados contra hegemonicamente) em torno da categoria de finalida-
de médica e científica.
Quanto ao risco, vários países já tinham a cannabis classificada em
uma categoria para substâncias menos prejudiciais, ou tinham diretri-
zes de jurisprudência para reduzir as sanções para crimes de cannabis
em relação a outras substâncias mais nocivas. Isso desafia a classifica-
ção do SICD. As Convenções, no entanto, permitem certos desvios
nacionais, desde que eles cumpram com os requisitos mínimos para o
controle aplicável à lista da ONU em que a substância é incluída.
Sobre outros tipos de usos, além do medicinal e científico, não
há, nas Convenções, diferenciação entre posse e cultivo para uso
pessoal. Na Espanha, uma jurisdição com descriminalização de prá-
ticas estabelecidas e um relevante registro de jurisprudência sobre
o assunto, permitiram uma interpretação jurídica gradualmente
mais flexível, permitindo o exercício coletivo de cultivo para uso
pessoal na forma de “Clubes sociais cannabis” (BEWLEY-TAYLOR;
BLICKMAN; JELSMA, 2014).
A Convenção Única não reconheceu o uso religioso de plantas psi-
coativas como a coca e cannabis. As tradições, portanto, foram con-
denadas como comportamentos criminosos que deveriam ser elimi-
nados dentro de 25 anos. No entanto, a persistência generalizada de
usos religiosos de cannabis em cerimônias e tradições hindus, sufis e
rastafari levaram a práticas tolerantes de aplicação da lei em uma série
de lugares, como os Estados Unidos, Paquistão, Oriente Médio, Norte
da África e Jamaica (BEWLEY-TAYLOR; BLICKMAN; JELSMA, 2014).

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Incrivelmente, a Convenção de 1971 mostrou mais consideração com
os usos cerimoniais, deixando plantas psicodélicas (principalmente
cactos e cogumelos) fora do regime de controle, classificando apenas
seus alcaloides isolados. Consequentemente, em comparação com a
cannabis, há significativamente mais leniência no direito internacional,
no que diz respeito à religião, uso de peiote ou ayahuasca.

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