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32 MENDES, R. M. DE S., CHAVES, B. ED.

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O termo angiospermia foi Segundo APG a tradicional divisão das angiospermas6 em dicotiledô-
empregado por Linnaeus neas (Dicotyledonae7) e monocotiledôneas (Monocotyledonae7) foi refutada,
(Hortus Uplandicus, 1732)
para uma de suas ordens
o trabalho confirma a monofilia das monocotiledôneas, entretanto, mostra
em que dividiu a classe XIV que as dicotiledôneas são parafiléticas, tornando-se importante o reconheci-
do seu sistema: Didynamia mento das eudicotiledôneas, fortemente sustentada em análises cladísticas
Angiospermia. e reconhecida pelos grãos de pólen tricolpados e derivados deste (RAPINI,
7
Os nomes Dicotyledonae 2012) e as angiospermas basais (GUIMARÃES et al., 2009) – Figura 6.
e Monocotyledonae foram
empregados pela primeira
vez por Jonh Ray (Historia
Plantarum, 1686).

Figura 6 – Filogenia das Angisopermas baseado em APG III. Clados destacados são
monofiléticos e bem sustentados.

Entretanto, a relação entre os grupos citados no cladograma (Figura 6) ain-


da permanecem incertos, é o caso de Chlorantales e Ceratophylales, estes em
algumas análises aparecem de forma basal em relação às magnoliídeas, mo-
nocotiledôneas e eudicotiledôneas (este três grupos sendo irmãos). É certo que
maiores progressos serão feitos por meio de análises combinando dados de mui-
tas fontes, morfológicas e moleculares (JUDD et al., 2009).

3. Angiospermas basais
Várias linhagens evolutivas de angiospermas surgiram antes da separação de
monocotiledôneas e eudicotiledôneas. Todos estes grupos eram vistos como
“dicotiledôneas”, porém a relação deste grupo só foi esclarecida recentemen-
te (RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2007).
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As flores das angiospermas basais diferem das eudicotiledôneas por 7


O nome ANITA provém das
apresentar angiospermia frequentemente por secreção (e não por fusão iniciais dos taxa contidos
pós-genital), carpelos não unidos (gineceu apocárpico), pétalas ausentes, no Grado (Amborellaceae,
numerosas peças florais, filotaxia floral frequentemente espiralada, ou va- Nymphaeaceae,
Illiciaceae, Trimeniaceae,
riações entre espiralado e verticilado (SANTOS; CHOW; FURLAN, 2008; Autrobaileyaceae). No início
GUIMARÃES et al., 2009). da sistemática filogenética
Pertencem a este grupo as espécies anteriormente alocadas no Grado o grupo foi considerado um
clado por diversos autores,
ANITA e as magnoliídeas, e são os que possuem o maior número de caracte- porém por não se tratar de
res pleisomórficos dentre as Angiospermas. Estes grupos basais são pobres um grupo monofilético, do
em número de espécies, e não existem evidências fósseis de que eles teriam ponto de vista cladítico o
sido mais diversos no passado (RAPINI, 2012). conceito de “Grado ANITA”
está sendo abandonado,
O Grado ANITA7 é um grupo parafilético (Figura 6) que possui como ca- o grupo possui as ordens
racterísticas em comum gametófito feminino 4-nucleados e endosperma di- Amborellales, Nymphaeales,
ploide, exceto Amborellaceae, que possui gametófito feminino 9-nucleado e Austrobaileyales, que
nas análises filogenéticas
endosperma triploide. As demais angiospermas possuem gametófito feminino encontram-se como grupos-
8-nucleado e endosperma triploide. irmãos sucessivos das
Neste Grado o perianto é composto por tépalas, o carpelo cresce como demais angiospermas.
um tubo, há pouca diferenciação entre antera e filete, grão de pólen nor-
malmente monossulcado e, em geral, faltam columelas bem desenvolvidas
(JUDD et al., 2009). Neste clado está incluído Amborellaceae (monotípica,
Amborella trichopoda Baill.), Nymphaeaceae (ninfeias) – Figura 7A, Illiciaceae
e Schisandraceae8 (GUIMARÃES et al., 2009).
8
Com o abandono do nome
Illiciales para se referir a
A maioria das angiospermas9 não-eudicotiledoneas e não monocotiledô- Illiciales+Schisandraceae
neas pertencem à Magnolianae (clado das Magnoliídeas). Neste grupo estão (Austrobaileyales) em
incluídas as ordens: Magnoliales (Magnoliaceae, Annonaceae), Laurales (Lau- APG II, ANITA já não
corresponde ao acrônimo
raceae), Canellales e Piperales (Piperaceae e Aristolochiaceae) – Figura 7B-F
dos taxa envolvidos.
(GUIMARÃES et al., 2009).
Este grupo possui hábito variado, folhas com venação geralmente peni- 9
A julgar pelas
nérvia, coriáceas e com estômatos paracíticos. As flores apresentam muitas pe- características florais das
ças periânticas dispostos de forma espiralada ou em número de três; estames Angiospermas basais,
acredita-se que as primeiras
frequentemente laminares, com filete pouco diferenciado da antera e conectivo
Angiospermas devem ter
geralmente bem desenvolvido (JUDD et al., 2009). sido polinizadas por insetos,
simetria radial, bissexuais,
hipóginas, com numerosas
peças florais arranjadas de
forma espiralada e livres.
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Figura 7 – Exemplos de Angiospermas basais. Nymphaeaceae – Victoria amazonica (Poepp.) J. E. Sowerby, Vitória
régia (A), Magnoliaceae – Magnolia sp. (B), Annonaceae – Annona squamosa L., fruta do conde (C), Lauraceae –
Persea americana Mill., abacate (D), Piperaceae – Piper sp. (E), Aristolochiaceae – Aristolochia gigantea Mart., papo
de peru (F).
Fonte: http://snipurl.com/2598hl7/; http://snipurl.com/2598hws; http://snipurl. com/2598ir7; http://snipurl.com/2598i6g; Edson-Chaves (2010), http://
www.photomazza.com/?Aristolochia-gigantea.

Saiba mais
Uma flor de 125 milhões de anos – conheça as espécies chinesas que
podem estar na origem das plantas angiospermas atuais
Alguém pode imaginar um mundo sem flores? [...] Um dos fósseis mais importantes relaciona-
dos a essa questão foi encontrado há alguns anos na província de Liaoning, China (Figura 8), e
recebeu o nome de Archaefructus liaoningensis. Posteriormente, exemplares mais completos
desta e de uma outra espécie (Archaefructus sinensis) – Figura 8, foram descobertos [...]. Os fós-
seis dessas duas plantas procediam das camadas da Formação Yixian, cuja idade é atualmente
estimada em torno de 125 milhões de anos. [...].
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Figura 8 – À esquerda, uma possível cena em Liaoning (China) há 125 milhões de


anos: uma planta Archaefructus atrai um inseto, que por sua vez atrai um pteros-
sauro insetívoro Dendrorhynchoides, A interação entre as primeiras angiospermas
e estes animais seria responsável pelo sucesso dessas plantas, que dominam as
paisagens dos dias de hoje (arte: Maurílio Oliveira / Museu Nacional). À direita, fóssil
de Archaefructus sinensis (Foto: Ge Sun et al., Science).

O fato de a Archaefructus possuir na mesma haste os órgãos reprodutivos femininos (car-


pelos, envolvendo as sementes) e masculinos (estames), feição típica das angiospermas, faz
com que os paleobotânicos (pesquisadores que estudam os vegetais fósseis) considerem es-
sas plantas como as angiospermas mais primitivas conhecidas até o momento, classificadas
em um grupo a parte, denominado de Archaefructaceae.
Tal interpretação não está livre de crítica e existem alguns pesquisadores que não estão
certos de que as Archaefructus seriam realmente angiospermas. No entanto, é importante
ter em mente que, ao longo da evolução, as feições morfológicas das angiospermas atuais
não deveriam ter surgido todas de uma vez. Aliás, é muito comum que se encontrem no re-
gistro fóssil organismos que apresentam estágios "intermediários" dessas características. [...].
Outro ponto interessante na pesquisa de Archaefructus indica [...] que angiospermas ainda
mais primitivas poderiam ter sido plantas aquáticas totalmente submersas.
Um outro aspecto importante sobre as primeiras angiospermas está ligado à sua repro-
dução. Atualmente essas plantas se reproduzem pela polinização [...]. Não está certo se as
Archaefructus se reproduziriam desta maneira, visto que a polinização também pode ser
feita com a ação do vento. Em todo caso, os sedimentos de Liaoning possuem inúmeros
restos de insetos e aves, que certamente poderiam ter agido como agentes polinizadores.
Além dos pterossauros (répteis voadores), alguns insetívoros que, ao atacar insetos, pode-
riam ter espalhado pólens que poderiam fecundar plantas vizinhas.
Possivelmente devemos à interação entre os animais da época com as plantas do tipo
Archaefructus a evolução das angiospermas, que dominam as paisagens atualmente. [...].
Fonte: KELLNER, A. Disponível em: http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/cacadores-de-fosseis/uma-flor-
de-125-milhoes-de-anos.

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