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Universidade do Estado de Mato Grosso

Campus Universitário de Alto Araguaia – MT


IV Semestre de Letras
Disciplina: Teoria Literária II
Docente: Marcelo Lachat
Discente: Ana Paula Madalosso Lima

Biografia

Mikhail Mikhailovich Bakhtin nasceu em 1895, na cidade de Orel,


Rússia. Foi um filósofo, crítico, semiólogo, que trabalhou na teoria
literária, ética e filosofia da linguagem. Seus escritos tratam de uma
enorme variedade de assuntos - marxismo, semiótica, estruturalismo,
crítica religiosa, crítica literária, história, filosofia, sociologia,
antropologia e psicologia.

Boa parte de sua obra, iniciada no fim dos anos 1910, foi
perdida, e ele ficou praticamente esquecido após a Segunda Guerra
Mundial, sendo redescoberto pelos estudiosos russos na década de
1960. Ele era o líder de um grupo de intelectuais com interesses
variados, que se reuniam para discutir assuntos dos mais variados
temas (literatura, religião, política etc.) e organizavam palestras,
debates e concertos. Este grupo ficou conhecido como “Círculo de
Bakhtin”.

Sua primeira obra importante versava sobre filosofia moral,


que nunca foi publicada na íntegra, mas uma pequena seção foi
lançada em 1919, com o título Arte e Responsabilidade.

Em 1924, mudou-se para Leningrado, onde assumiu um cargo no


Instituto Histórico. Nesta época escreveu, Sobre a Questão da
Metodologia de Estética em Obras Escritas, obra que só foi publicada
50 anos mais tarde, pois desde aquela época foi vítima da repressão
política que o perseguia ao longo de boa parte de sua carreira – ele
chegou a ser exilado por seis anos no Cazaquistão durante o governo
de Stalin. Mas mesmo no exílio continuou sua obra, escrevendo vários
ensaios importantes, incluindo O discurso no romance.

Em 1961, sua saúde estava deteriorada (sofria de osteomielite e


teve uma perna amputada em 1938), o que o forçou a se aposentar Em
1969, Bakhtin se mudou de volta para Moscou, onde viveu até sua
morte, em 1975.

Bakhtin não deixou uma teoria ou uma metodologia


consolidada. Como já foi dito, sua obra permeia por várias esferas do
conhecimento humano, num desenvolvimento interdisciplinar. Esta
característica fica mais evidenciada (e prejudicada) pelo fato de que
grande parte de seus estudos foi perdida e também porque suas obras
não foram publicadas na sequência pela qual foi escrita. Junte-se a isto
os trabalhos escritos em coautoria, e algumas obras assinadas por seus
colegas que possivelmente sejam suas (talvez fugindo da perseguição
política).

Conceitos fundamentais associados à obra de Bakhtin incluem


o Dialogismo, a Polifonia e o Carnavalização.

Dialogismo

Na obra Imaginação Dialógica, Bakhtin faz o contraste entre o


“monologismo” e o “dialogismo”. Para ele, o trabalho literário
dialógico carrega um continuo diálogo com outros trabalhos literários
e outros autores todo enunciado; ele se constitui a partir de outro
enunciado e tem pelo menos duas vozes. É como se cada obra se
apropriasse de outras, sendo continuamente informada pelos trabalhos
anteriores. E este diálogo não se trata de simples influência, pois a
troca se dá em ambas as direções, ou seja, os trabalhos prévios
também se apropriam da obra mais recente.

Isto supõe que cada palavra tem uma carga pessoal, uma
história de uso de quem a utiliza, e antecipa uma resposta futura.

O termo “dialogismo” não se aplica apenas à literatura. Para


Bakhtin, toda linguagem é dialógica. Tudo o que qualquer pessoa
disser, sempre o será feito em resposta a algo que foi dito antes, e em
antecipação ao que será dito em resposta. “Nós não falamos no
vácuo”. Toda linguagem, e as idéias que ela contém e comunica, é
dinâmica, relacional e engajada num processo sem-fim de re-descrição
do mundo.

Ele também enfatizou algumas linguagens que maximizam


esta natureza dialógica das palavras, e outras que tentam limitar essa
polivocalidade, como a ordem militar, que não espera resposta, apenas
obediência.

Polifonia

Bakhtin apropriou o termo “polifonia” da música, onde é usado para


designar a composição musical em que vários sons ou melodias
sobrepõem-se uns aos outros em harmonia.

Analisando o trabalho de Dostoyevsky, notadamente Os


Irmãos Karamazov, ele desenvolveu este conceito, enxergando o
escritor com o primeiro a, em seus romances, descrever as situações
sob vários ângulos, refletindo a diferente maneira de pensar e agir dos
personagens, fugindo de uma “razão única”, e demonstrando que duas
ou mais pessoas podem divergir de opiniões por enxergar a realidade
de forma pessoal e única, e não necessariamente uma ou algumas
delas têm que estar erradas. São apenas visões de mundo diferentes e
ocasionalmente conflitantes. Este tipo de narrativa é uma das
principais características do Realismo moderno.

A polifonia inclui uma diversidade de pontos de vista, opiniões


e vozes. Os personagens falam uns com os outros e, por vezes, com o
leitor – que assim, também se torna um personagem. É um recurso
narrativo permeado pelo conceito de dialogismo.

Os personagens são o sujeito do discurso, e não meramente o


objeto do discurso do autor. Embora este verbalize o pensamento de
todos, ele se coloca apenas como um personagem a mais, ainda que de
essencial importância, por ser o organizador dos diálogos. Na voz de
Bakhtin, “não se trata da ausência, mas da mudança radical da posição
do autor", que se afasta ao máximo possível para ter uma visão ampla,
passando a ser um expectador que observa e narra os fatos de maneira
objetiva.

A diversidade das idéias e atos dos sujeitos/personagens se


polifonizam, formando um conjunto por meio do contexto e da
valência de cada uma das vozes.

Carnavalização

Bakhtin cunhou o termo “Carnavalização” ao transportar este


comportamento social para a literatura. Foi analisando a obra
Gargantua e Pantagruel, de Rabelais, que Bakhtin desenvolveu este
conceito, apresentado no seu livro A cultura popular na Idade Média e
no Renascimento: o contexto de François Rabelais.

Obviamente, a palavra deriva de carnaval. Mas não se trata da


festa midiática que atrai turistas ao Rio de Janeiro e Salvador, e sim no
ancestral festejo que inspirou este que conhecemos hoje. O original
nasceu no século XVI na Europa, onde as pessoas simples, alijadas
das benesses reservadas à elite, viviam duas vidas, uma subordinada
às regras, e outra, a carnavalesca, quando se uniam nas praças e
promoviam festejos livres de regras e cheios de profanações e
sacrilégios, satirizando, parodiando e subvertendo o sério, o formal, os
poderes constituídos, as convenções, os dogmas, enfim, todas as
regras e padrões da sociedade.

Pela ocupação do espaço público, o homem do povo transmuta


a sua maioria numérica para a maioria qualificada, naquele momento
sendo o dono da voz, retomada à força do poder imposto, ou mesmo
constituído, este mesmo poder que lhe havia surrupiado a voz com seu
discurso descarnavalizante.

Conclusão

Dialogismo, polifonia e carnavalização não se referem somente


à análise literária. Seus conceitos se aplicam à política, economia,
sociologia, psicologia e quaisquer outras manifestações culturais que
tentem se utilizar de discursos monológicos, monofônicos e
descarnavalizantes.

Governos autoritários, nacionalistas e populistas cultuam o


monologismo, o monofonismo e a descarnavalização, sequestrando a
palavra na tentativa de ser a única voz a dar comandos e criar uma
falsa realidade a ser vendida à plebe.

Provavelmente esta interpretação dos conceitos de Bakhtin é


que o fazia ser vítima do aparelho de repressão da ditadura stalinista, a
quem não interessava a palavra democrática.

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