Você está na página 1de 46

Teoria dos direitos humanos

Prof. Adriano Moura, Profa. Ana Paula Sales

Descrição

A teorização e a caracterização dos direitos humanos no tempo e no


espaço e suas consequências na sociedade globalizada e na realidade
contemporânea dos Estados.

Propósito

Compreender as origens da proteção normativa dos direitos humanos é


essencial para a atuação profissional em relações sociais, econômicas
e jurídicas, reconhecendo as possibilidades e limitações culturais e
normativas em sua aplicação prática.

Objetivos

Módulo 1

Teorias e classificações dos


direitos humanos
Reconhecer as teorias e classificações dos direitos humanos.
Módulo 2

Características dos direitos


humanos
Distinguir as características dos direitos humanos de forma
contextualizada.

meeting_room
Introdução
A presença dos direitos humanos nos mais diversos espaços
sociais da contemporaneidade não é uma novidade e muito
menos uma estratégia limitada aos juristas e seu campo
acadêmico profissional.

Discursar, justificar, requerer ou tomar decisões importantes na


gestão pública e nas relações sociais de natureza privada de
maneira embasada tem sido uma prática recorrente desde a
segunda metade do século XX, ecoando importantes
documentos internacionais de prescrição dos direitos humanos,
sem prejuízo de antecedentes mais restritos. Seja no campo
político, executivo, legislativo ou até mesmo do espaço da
Justiça, os direitos humanos têm lugar retórico de destaque nos
debates e falas organizadas.

Mas qual razão leva os direitos humanos a terem um alcance tão


amplo na sociedade contemporânea, ao mesmo tempo em que
geram debates muitas vezes tão polarizados que trazem a
impressão de termos vitoriosos e derrotados pautados no
mesmo conteúdo?

Veremos que inconsistências terminológicas (interpretações


genéricas ou erradas dos termos dos direitos humanos), falta de
comunicação com a sociedade como um todo e uma seletividade
(falsa noção de que direitos humanos são apenas para alguns)
em sua aplicação prática por parte do poder público são alguns
dos fatores responsáveis por isso.
Vamos, juntos, tratar das terminologias, teorias, dos modos de
classificação e das características que levam os direitos
humanos a serem tão presentes em nossas relações do
cotidiano, ainda que não tenhamos tal percepção.

Assista ao vídeo!

Material para download


Clique no botão abaixo para fazer o download do
conteúdo completo em formato PDF.

Download material

1 - Teorias e classificações dos direitos


humanos
Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer as teorias e
classificações dos direitos humanos.
Expressões jurídicas e seu
contexto na realidade social
Uma das grandes preocupações dos estudiosos da aplicação do direito
é justamente a terminologia (estudo dos termos, das palavras e seu
sentido) utilizada ao longo do tempo nos mais diversos documentos
jurídicos, tais como leis, códigos, decretos, constituições, entre outros.
Uma não rara incompatibilidade entre discursos políticos e jurídicos,
espécies normativas e o direito que acaba sendo aplicado nem sempre
é percebida pela sociedade civil e pelos atores da operação do direito.

Comentário
O senso comum crê que os termos do direito são incompreensíveis e
entendidos quase como um código secreto. Ambos os lados precisam
se esforçar, pois têm muito a contribuir entre si.

Não estamos falando necessariamente da falta de conhecimento


técnico das pessoas não letradas nas ciências jurídicas, mas sim de
muitas inconsistências terminológicas criadas e/ou perpetuadas por
fontes de reprodução de conteúdo “não muito científicas”, por assim
dizer (sem metodologia aplicada às teorias e práticas da área do direito
e suas relações com o restante do mundo).

Sim, o mundo jurídico tem seu próprio vocabulário escrito e falado,


criado nem sempre à imagem e semelhança da melhor técnica.

Pior do que não conhecer o vocabulário técnico, algo


normal em qualquer área, é não conhecê-lo e, por ouvir
dizer, passar a acreditar que ele significa algo que não
tem sentido.

Não conhecer o vocabulário técnico também se agrava, em tese, com a


realidade espacial do momento mais globalizado do mundo, com
possibilidades de trocas intensas, principalmente nas comunicações,
que incentiva ideias de maior amplitude de aplicação de normas
jurídicas; ou com traduções menos científicas ainda, potencialmente
universais, que acabam sofrendo resistência quando aplicadas em
determinado território, povo e em realidades cultural e economicamente
distintas.

E ainda mais se o desafio for tratar de direitos humanos, que são


entendidos como aplicáveis a todos os seres humanos. Vamos adentrar
agora esse campo para conhecermos as divergências terminológicas,
teorias e classificações dos direitos humanos que impactam as
relações cotidianas, seja qual for a sua área de atuação profissional ou
interesse pessoal.

Em outras palavras, foi criado um conceito chamado pós-verdade, que


pensa nossa sociedade.

Segundo esse conceito, passamos a crer menos no exercício racional.


Tendo em vista a fácil legitimidade de qualquer troca de pensamento
nas redes de comunicação, passa a ser desnecessária a reflexão
científica.

Assim, se você acredita em algo e busca aquilo que reforça o seu olhar
– independentemente do grau de absurdo –, isso é suficiente para que a
crença se torne verdade. Veja um exemplo!

close
Verdade e Pós-verdade e
exercício racional reforço da crença

Direitos humanos ou
direitos fundamentais: qual
o começo e qual o nosso
referencial?
Os direitos humanos normalmente aparecem no mundo ao largo da
história em momentos sequenciais de grandes tragédias humanas e ou
humanitárias. O ser humano, sim, ele mesmo que é tão protegido e
regulado pelo direito protagoniza, não raro, atos e fatos sociais que
mancham a linha cronológica de sua própria existência. Seja por valores
e interesses materiais normalmente ligados ao direito de propriedade ou
exploração comercial, incluindo dominação de povos e territórios,
conceitos e ideologias de cunho filosófico ou religioso e até mesmo
biológicos, a história relata um número exaustivo de ações de humanos
contra humanos.
Não são casos de disputas ou rixas individuais por culpa ou dolo dos
protagonistas da cena em si, mas, sim, batalhas orquestradas e
executadas com propósitos coletivos, normalmente associados a
liderança de um povo, estado ou coletivo menor que intenta impor suas
ideias a força para os demais; ou castiga, quando percebe que não
conseguiu seu objetivo primário.

Aqui estão algumas atrocidades lidadas na sociedade com naturalidade.


Acompanhe!

Largo
As transformações da história impactam o direito. Elas não ocorrem de
forma direta, mas como o direito é social, por consequência atingem em
maior ou menor grau as concepções jurídicas. Por isso, se diz “ao largo”.

Tirania do rei Leopoldo II da Bélgica, na


África

Bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki


Holocausto judaico

Massacre de Armênios

Para evitar lágrimas, queremos apenas que você perceba que fala-se em
direitos humanos quando os sujeitos percebem o que suas ideias e
verdades são capazes de fazer com o outro. Negar ou justificar qualquer
tipo de massacre faz com que você esteja reproduzindo exatamente as
ideias que nos levaram a tais massacres. Pense nisso! Vamos continuar.

Comentário
Podemos conceber algumas ideias do Jusnaturalismo mais clássico
que assimilava direitos ou ideias de princípios da natureza e do cosmos
como sendo parte integrante também do ser humano. Com divergências
e segmentações diversas, os antigos filósofos foram pioneiros em
agregar essas ideias de direitos e características. Cícero foi um desses
filósofos, um dos grandes nomes de Roma. Segundo ele, o homem deve
seguir a natureza, e então perceber como funciona a característica
individual de cada grupo. A ideia de mudança social, por exemplo, é algo
visto com estranheza. Quem nasce para ser filósofo será filósofo, e ir
contra sua natureza por qualquer interesse fará com que seu percurso
seja antinatural. O mesmo vale para a justiça.

Estamos aqui falando de um período que se estende de quatro a cinco


séculos antes de Cristo e que encontra um importante marco temporal
de nossa contagem histórica com a chegada do conceito de dignidade
de cada uma das pessoas, baseando-se no judaísmo e na filosofia
cristã, sem prejuízo do que a força religiosa da Igreja Católica iria
proporcionar na Idade Média nos séculos seguintes.

Igreja Católica
A religião judaico-cristã, filosoficamente falando, tende a propor
instrumentos de proteção da pessoa humana. Sim, o texto possui exceções
e interpretações que foram utilizadas de outra forma ao longo do tempo.
Se olharmos para o período do
século X até a chegada ao entorno
contemporâneo, perceberemos
claramente a produção de
legislações que procuraram proteger
melhor os direitos inicialmente
individuais (e depois coletivos) dos
seres humanos.

(MELLO, 2021)

Fato é que, partindo do Jusnaturalismo, na poeira dos séculos, a fé, a


filosofia cristã e o direito travariam intensos debates e batalhas para
atuar em direitos naturais, dignidade pessoal, liberdades individuais,
propriedades e no contato e atuação com a população indígena e com
os negros como pessoas escravizadas. Em outras palavras, ao longo do
tempo tivemos uma oscilação entre a defesa da dominação do outro,
justificada de formas diversas, e a obrigação moral de protegê-lo.

Já imaginou o conflito? Para não irmos muito além, podemos aqui


apontar duas atuações em especial veja!

Anchieta e Nóbrega na cabana de Pindobuçu, Benedito, Calixto, 1927.

Jesuítas e a atuação da Companhia de


Jesus

A ordem Jesuíta tinha a missão de catequizar e cuidar dos


índios, mas foi acusada de exploração, escravidão e
legitimação da escravidão.
Uma família brasileira do século XIX sendo servida por escravizados. O jantar.
Passatempos depois do jantar, Jean-Baptiste Debret, 1830.

Escravidão da população negra e a Lei do


Ventre Livre

O ordenamento jurídico no texto da lei fala em proteção da


pessoa humana, mas continua permitindo a escravização da
população negra como um todo.

Após a Segunda Guerra Mundial, foi criada a Declaração Universal dos


direitos humanos em 1948, um marco universal do tema que ilumina,
desde então, as reformas legislativas e a busca de um norte referencial
para o comportamento humano social, ainda que com diferenciados
níveis de aceitabilidade e aplicabilidade prática.

Eleanor Roosevelt segurando pôster da Declaração Universal dos direitos humanos,1949.

Caso queira, leia a declaração na íntegra e a use para acompanhar o


material daqui em diante.

Conheça alguns dos documentos mais importantes para a evolução


desse pensamento.

1888
Declarações de León

1215
Magna Carta Inglesa

1628
Petição de Direitos
1649
Habeas Corpus Act

1659
Toleration Act

1689
Bill of Rights

1776
Declaração de Independência
dos Estados Unidos da América

1787
Constituição dos Estados Unidos
da América

1789
Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão

1791
Declaração de Direitos
1864
Convenção de Genebra

1888
Lei Áurea do Brasil

1919
Convenção da Liga das Nações

1948
Declaração Universal dos
direitos humanos

1963
Carta Encíclica do Papa João
XXIII

Essa é só uma amostra da variedade geográfica e temporal das


declarações que podem ser encontradas ao longo da história
defendendo interesses que passam ao longo dos séculos e são
encorpados ou associados a uma ideia maior dos direitos humanos.

Muitos dos documentos mencionados, bem como diversos


acontecimentos contemporâneos a eles, ocorreram, principalmente,
como resposta a tragédias ou grandes violações históricas dos direitos
das pessoas. Não podemos esquecer que nem sempre “todos eram
iguais perante a lei”, mesmo nos territórios atuais de importantes países
e lideranças mundiais.

Reside aí, talvez, a primeira e maior violação contra o ser humano, que
afeta a própria ideia de um standard (padrão ou modelo) mínimo
refletido em alguns países como o Brasil, no Princípio Fundamental da
Dignidade da Pessoa Humana (CRFB 88, art. 1º, III).
Não podemos esquecer que antigamente os costumes e tradições
influenciavam o comportamento humano e os limites da atuação dos
poderes, em maior medida do que o direito formal dos chamados
Estados, uma realidade que nem sempre foi a mesma que vemos hoje
em dia.

Aliás, o tema dos costumes e tradições é muito bem-tratado na obra A


Invenção das Tradições (HOBSBAWN, 2012), quando o autor busca
explicar o conceito de tradição inventada e sua diferenciação dos
costumes, sendo mais um indicativo da dificuldade de termos, na
prática, um rol hermético ou mais unificado de direitos humanos
universais.

CRFB 88, art. 1º, III


Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos estados e municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I. a soberania;
II. a cidadania;
III. a dignidade da pessoa humana;
IV. os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V. o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

close
Costumes Tradição
inventada

Nosso hábito de voltar muito no tempo para explicar uma sociedade é


uma invenção. Os processos que se aportam no passado são de
interesse de um grupo em afirmar que nós pertencemos a ele. Por isso,
no Brasil vivemos com a ideia de ter um passado tão europeu.

Nesse sentido, para além dos exemplos e documentos históricos


citados e apresentados acima, os direitos humanos no século XX,
principalmente desde o Pós-Guerra de 1945 até a chegada aos nosso
dias, estão consolidados como direitos que visam assegurar, no plano
internacional e nos respectivos sistemas jurídicos nacionais, as
condições mínimas para a sobrevivência das pessoas.

Como exemplos, podemos citar o direito ao nascimento com vida e


criação até a idade adulta, à integridade física e moral, além de temas
como ir e vir, saúde, educação, trabalho, direitos políticos, acesso à
justiça e outros temas relevantes para uma vida digna.

Abrangem também as medidas de prevenção e reparação das violações


ocorridas. Vida digna não tem relação com “finanças”, mas, sim, com
acesso e com impedir que as pessoas não tenham condições de
dignidade humana.

A memória da guerra e da violência do seu entorno é mais importante e


trabalha problemas mais próximos do que uma tradição histórica, que
serve, de fato, para legitimar e naturalizar violências.

Publicação das Consolidação das Leis do Trabalho no Diário Oficial, 1943.

A própria evolução da legislação e justiça do trabalho no Brasil é um


exemplo claro de como um documento jurídico interno protege direitos
humanos.

O maior expoente foi, sem dúvida, a Consolidação das Leis do Trabalho


(CLT) pelo Decreto nº 5452 de 1º de maio de 1943.

Ela reuniu esforços criando uma legislação trabalhista antes espalhada


em legislações diversas, e as demais legislações trabalhistas são
referenciadas e aparecem na mesma CLT.

A CLT está disponível no site da Casa Civil do Governo Federal.

Você percebeu que alcançamos o nosso conceito contemporâneo de


direitos humanos?

Os direitos humanos na contemporaneidade são direitos que visam


assegurar os direitos humanos no plano internacional e nos respectivos
sistemas jurídicos nacionais. Abrangem também as medidas de
prevenção e reparação das violações ocorridas.

Terminologia dos direitos


fundamentais
Quando discutimos a terminologia dos direitos fundamentais, a
sensação é de que estamos tratando de coisas muito parecidas até
aqui, não é? Então por que falarmos ora direitos humanos, ora direitos
fundamentais?

E mais: o que os profissionais atualmente precisam conhecer sobre


cada um deles em suas respectivas áreas de atuação? Pois todos nós
somos afetados em nossas atividades pelas proteções jurídicas e
sanções possíveis de violações dos tais direitos humanos e dos direitos
fundamentais.

Recibo de venda da escrava nagô Francisca a Maria Antônia Teixeira, 1848.

Vejamos agora que nem sempre basta um documento jurídico ter uma
expressão técnica para garantir ações e resultados esperados.

A Constituição Imperial do Brasil, de 1824 ( encontrada na íntegra no


site da Casa Civil), continha no seu Título 8º, ao final do texto
constitucional, uma série de artigos destinados aos direitos
fundamentais entendidos como essenciais à época, incluindo o direito à
propriedade, utilizado também para o tráfico e escravização de pessoas
de origem africana, principalmente nas atividades econômicas de então,
como bem sabemos.

Não será difícil você perceber o ponto de conexão entre as duas


expressões. Partindo, inclusive de um conceito mais jurídico, é possível
ver no detalhe como a conexão ocorre.

Os direitos fundamentais são


conceituados como direitos
subjetivos, assentes no direito
objetivo, positivados no texto
constitucional, ou não, com
aplicação nas relações das pessoas
com o Estado ou na sociedade.

(MORAES, 2000)

Repare que, quando conceituamos os direitos fundamentais na


contemporaneidade, destacamos que os países os regulam nos
sistemas jurídicos nacionais, isto é, em suas Constituições, Códigos e
Leis diversas. E quando o fazem, buscam diferenciar ainda mais os
direitos humanos (ou parte deles) como direitos que estariam acima de
outros direitos nacionalmente protegidos. É uma maneira de dar maior
destaque e normalmente aferir medidas de proteção e sanção
diferenciadas. É o caso do Brasil, inclusive, que traz na Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB 88), em seus arts. 5º a 17,
o Título chamado Dos Direitos e Garantias Fundamentais.

Sanção
A parte da punição que cada ato deve conter. Como neste caso, são
marcantes e diferentes das demais bases da legislação.

Ulysses Guimarães segurando uma cópia da Constituição de 1988.

Ora, já começamos a entender um pouco melhor a terminologia de


direitos humanos e direitos fundamentais, uma vez que
compreendemos que alguns países elevam em suas constituições tais
direitos (e outros de seu interesse) à categoria de direitos fundamentais.
Pense na palavra fundamental: ela transforma a concepção de direitos
humanos, uma proposição histórica, em direitos fundamentais (que não
podem ser abdicados).

Vamos então ratificar nossas conceituações sobre o tema, para facilitar


ainda mais a nossa compreensão, entenda!

Direitos humanos expand_more

Visam assegurar, no plano internacional e nos respectivos


sistemas jurídicos nacionais, as condições mínimas para a
sobrevivência das pessoas, tais como o direito ao nascimento
com vida e criação até a idade adulta, à integridade física e
moral, além de temas como ir e vir, saúde, educação, trabalho,
direitos políticos, acesso à justiça e outros temas relevantes para
uma vida digna. Abrangem também as medidas de prevenção e
reparação das violações ocorridas.

Direitos fundamentais expand_more

Estão assegurados na ordem jurídica interna de cada país e


integram o rol de temas entendidos como superiores em
categoria aos demais direitos que regula. Se tal país é signatário
de documentos jurídicos internacionais que declaram direitos
humanos, terá, em seu rol de direitos fundamentais, os mesmos
direitos, além, eventualmente, de outros mais explicitados e que
reflitam realidades nacionais, nem sempre dimensionadas no
macro. Os direitos fundamentais podem refletir realidades de
bens e interesses materiais e imateriais.

Com tais conceituações, é possível chegarmos à conclusão de que


países como o Brasil, por exemplo, têm uma dupla proteção jurídica no
tocante aos direitos humanos e que tais expressões não são
excludentes, mas sim fortalecedoras de que os sistemas jurídicos
internacional e nacional estão afinados, cada qual ao seu modo.
Competências, decisões e força coerciva: esses países irão tomar todas
as providências para proteger os direitos de uma vida digna para as
pessoas.

E mais: na esfera internacional, os atores jurídicos são os países e


estados membros (no caso dos blocos) e há, portanto, um predomínio
da linguagem de direitos humanos mais ampla, com expressões macro
indefinidas no detalhamento de como deveriam ser integralmente
respeitados os direitos nos espaços políticos e jurídicos dos países.

Países
As forças internacionais impõem os direitos humanos? Não. no entanto,
podem restringir a participação nas relações internacionais. Um exemplo é
o pleito dos turcos e da Sérvia à União Europeia, que foi durante muito
tempo negado por entender que os países não observavam a questão dos
direitos humanos.

É justamente aí que temos um grande problema de execução, pois há


situações em que os países não conseguem pôr em prática os direitos
humanos consagrados internacionalmente, considerando fatores locais,
inclusive de natureza cultural, ligados a tradições e costumes diversos.

Casos históricos do Apartheid na África do Sul e a mutilação de partes


do órgão sexual feminino da Nigéria são alguns exemplos de tradição de
culturas que são consideradas, por princípios, contra os direitos
humanos.

Entrada do Museu do Apartheid em Joanesburgo.

Já na esfera dos sistemas jurídicos internos dos países, o acesso


primário à justiça é das pessoas naturais e jurídicas, normalmente
visando esgotar o tema com as normas jurídicas mais próximas, entre
particulares e particulares ou mesmo contra o poder público. Nesse
espaço, para os países que fazem a diferenciação de direitos
fundamentais, busca-se primeiro a proteção a essas normas, evoluindo-
se, conforme o caso, instâncias e violações ao espaço de tutela e
atuação de organismos internacionais.

Público
A forma de acesso à lei e sua aplicação são internas e seguem as normas
de cada país.

Exemplo
É o caso da Comissão Interamericana de direitos humanos, criada para
observar casos de violação. Os procedimentos começam com uma
denúncia e podem culminar com sanções econômicas aos países
signatários (OEA, 2021).

No caso do Brasil, há um ingrediente a mais logo como princípio


fundamental de nossa CRFB 88, que é a dignidade da pessoa humana.
Essa é mais uma demonstração do Brasil como país.

Na Assembleia Constituinte de 1987, o país valorizou a vida humana,


assim entendida como o direito ao nascimento, à alimentação, à
moradia, ao meio ambiente saudável, à criação dos pais em uma família,
ao acesso à educação, ao trabalho, à segurança pública; e o direito de ir
e vir, de competir e crescer em igualdade de condições pela propriedade
privada, entre outros.

Tudo isso deve ser assegurado às pessoas durante todo o seu tempo de
vida. Aliás, no caso dos bebês, até antes, pois nosso Código Civil põe a
salvo os direitos do nascituro.

Assembleia Constituinte de 1987


A Constituição gerada por essa assembleia em 1988 foi chamada, por
essas características, de Constituição Cidadã, e tinha como prioridade
romper com o passado ditatorial.

Nascituro
Passa a ser considerado protegido e com direitos mesmo durante a
gestação.

É possível afirmar que, em termos de documentos


jurídicos, o Brasil é um país extremamente protetivo
dos direitos humanos, do Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana e, claro, dos direitos fundamentais,
não só na CRFB 88, mas também em sua legislação
infraconstitucional.

É também comum que os entes federativos do Brasil, isto é, a União, o


Distrito Federal, os estados, territórios e municípios tenham em suas
estruturas órgãos de tutela dos direitos humanos, como ministérios ou
secretarias. Veja alguns exemplos!
Município
Ministério Secretaria Municipal de Assistência Social e direitos
humanos.

União
Ministério da Mulher, da Família e dos direitos humanos.

Estado
Secretaria de Justiça, direitos humanos e Desenvolvimento Social.

A imagem a seguir reflete certa confusão conceitual não só entre


direitos humanos e direitos fundamentais, mas com o sistema jurídico
como um todo, pois, se o direito está pautado para as relações das
pessoas entre si e com o Estado, todas as áreas deveriam entender que
os aspectos inerentes aos direitos humanos necessitariam estar
presentes.

Exemplo de relação entre os elementos.

A existência de órgãos e estruturas públicas quase que exclusivamente


dedicadas a proteger e tutelar essa categoria de direitos demonstra o
quão longe estamos do equilíbrio e da naturalização de sua aplicação
nas relações da vida.

Agora que conseguimos decifrar essas questões terminológicas e seus


significados, vamos voltar aos direitos humanos, sua classificação e
teorias, de modo a compreendermos como, de fato, podemos atuar
preventiva e reativamente para a proteção de tais direitos. Isso sem
esquecer da percepção do que devemos ou não praticar como
profissionais de mercado, pois já vimos que, quando lidamos com
pessoas, também lidamos com um ou mais de seus direitos humanos.

Naturalização
Fenômeno em que ocorre a compreensão coletiva de que algo é necessário
e socialmente natural.

Considerações sobre a
teorização e classificação
dos direitos humanos
Após tratarmos da terminologia e dos espaços dos direitos humanos e
fundamentais, vamos trabalhar com a teorização e classificação dos
direitos humanos, pois, dependendo do referencial de partida, a
abrangência e aplicação prática deles pode variar muito. É preciso
entender que base teórica e critério de classificação vamos seguir para
o escopo de nossos objetivos.

Partindo de um método mais tradicional, é possível buscar uma linha de


raciocínio cronológico, tendo como referência maior a própria teorização
e conceituação do direito, partindo da ideia do Jusnaturalismo, que
contempla ideias e bens jurídicos em tese sempre presentes na
proteção a ser consagrada ao ser humano em sociedade.

Tratam-se de princípios atrelados à existência do próprio homem, não


necessariamente dependentes da ideia posterior de humanidade,
convívio coletivo e pactos sociais diversos.

Teorização e classificação dos direitos humanos


Dentro de um campo científico, é necessário compreender seus conceitos
(disputas sobre seu olhar, conhecido como teorização) e classificações
(pensar como são utilizados e as características que permitem seu
reconhecimento).

Comentário
Historicamente, nas sociedades patriarcais como a nossa, adotamos
“homem” para designar humanidade ou o total das pessoas. Teremos
que reproduzir alguns desses usos, mas se aproximando da
contemporaneidade eles ganham formas mais igualitárias de
tratamento.

Sem prejuízo dos diversos momentos e correntes do Jusnaturalismo,


obviamente ele tem uma sustentação muito favorável à defesa de
direitos humanos, considerando sua própria ideia formadora como algo
inerente à existência do homem. Se existe o homem, sua vida em
existência (principalmente coletiva) depende de standards mínimos para
a sua manutenção, ao menos em teorização primária.

Seguindo, em dualidade à ordem jurídica do direito natural, encontramos


já bem-sedimentada e aceita na doutrina a ordem jurídica do direito
positivo, que, apesar de ser apresentada como uma sucessora mais
segura – menos suscetível a vontades e divindades potencialmente
variadas para a essencialidade de proteção do ser humano originado do
divino –, fica à mercê do caráter temporal de sua criação normativa e
vigência.
O apontamento inicial serve para inserirmos os direitos humanos como
conteúdo capaz de estar em espaços e fontes do direito natural e do
direito positivo, bastando, para isso, que os alicerces de cada
movimento de teorização do direito os reconheçam como tal.

Pela ótica do pensamento jusnaturalista e ético, a matriz orientadora da


fundamentação dos direitos humanos prevalecentes tem um caráter
mais Jusnaturalista ou de Positivismo Jurídico, vamos comparar!

Dualidade
Apresenta-se nas normas positivas (o que as pessoas fazem e está dando
certo) em vigor, que devem ser consideradas boas, válidas e legítimas
(justas). Essa dualidade faz com que a doutrina do direito natural provoque
um tensionamento constante na relação entre direito e justiça.

Jusnaturalista Positivismo
Jurídico
Matriz orientadora da
fundamentação dos Ideias fundamentadas
direitos humanos em uma perspectiva
prevalecentes. Tem um mais subjetiva, embora
caráter mais objetivista, sejam formalmente
pautado nas ideias garantidas pelo
essenciais e universais, sistema, estão
imutáveis ao tempo, close ancoradas nas
espaço e respectiva realidades temporais,
história. Essa espaciais e culturais,
fundamentação tem sem necessariamente
maior relevância na refletir algum padrão
base mais por sua relacionado à suposta
razão de ser do que por essência divina da
seus efeitos. criação humana ou algo
semelhante.

Sendo assim, se em tal tempo e lugar a proteção jurídica ao corpo


humano (material e imaterial) for algo extremamente valorizado, ela
poderá, sim, figurar como parte integrante do rol dos direitos humanos
da referida época e legislação. Tal proteção poderia, em um século
seguinte, por exemplo, ser completamente rechaçada pelo ordenamento
jurídico de um país, bloco ou mesmo por grandes organizações
internacionais. Pensemos no caso de uma família que se dissolve, veja!

Caso 1 expand_more
Um filho homem pode ter direito às posses do pai, e o
compromisso de passar a manter toda a família poderia ser um
direito.

Caso 2 expand_more

Em uma sociedade como a nossa, em que o direito das mulheres


é visto de outra forma e a liberdade ganha um caráter de
escolhas, o direito na relação seria aplicado em outro sentido.

Dentro de tal realidade, a matriz de natureza mais subjetivista lista a


dificuldade de sustentar a existência universal dos direitos humanos,
considerando as próprias limitações globais entre povos e países. Parte
do conteúdo de direitos humanos que estamos estudando aqui é
considerado ato atentatório à dignidade da própria vida em alguns
países do Oriente cuja formação e existência político-religiosa tem base
no Islã, por exemplo.

Malala Yousafzai, ativista paquistanesa ganhadora do Nobel da Paz em 2014.

Não confunda! No caso Malala, a negação do direito aos estudos era


contestável, inclusive internamente. Ela pleiteia esse direito e recebe
uma violência marcante como forma de manter uma tradição que não
dialoga com os direitos locais. Os costumes poderiam aceitar a
negação de seu direito de estudar, mas um conjunto vinculado à
proteção e tutela dos direitos humanos apontaria que seria necessária
uma revisão da primeira, e uma completa inaceitação da violência
sofrida por ela em consequência de pleitear tal direito.

Tal realidade sustenta a tese de que a matriz orientadora dos direitos


humanos tem natureza mais subjetivista, sendo que a maior prova disso
é o que se coloca em parâmetros e compromissos em documentos
internacionais (declarações, cartas, tratados ou convenções), e o
mesmo vale para os sistemas jurídicos internos dos países, como vimos
há pouco.

E que fique claro que não temos aqui o propósito de convencer sobre
qual alinhamento matricial é o certo ou errado.

A ideia é apresentar as bases e, de certo modo, fazer você perceber que,


no modelo dos direitos humanos da atualidade, matrizes mais
subjetivas acabam por prevalecer nas democracias ocidentais, ainda
que tenhamos um número cada vez maior de direitos assegurados.
Tais matrizes vêm sustentando cada vez mais direitos humanos na
sociedade contemporânea e, certamente, também dentro do direito
positivo, que se pratica principalmente desde a consagração do
movimento constitucionalista do século XX e os importantes
apontamentos feitos no período após a Segunda Guerra Mundial.

Classificação dos direitos


humanos: critérios
diferenciados e Teoria do
Status
A classificação de um instituto em qualquer área da ciência pressupõe a
eleição de um ou mais critérios que possam isolar quantitativa e
qualitativamente partes ou o todo de um elemento já conceituado.
Estamos falando sobre os direitos humanos que já tratamos nos itens
anteriores. Sabemos já importantes questões terminológicas a seu
respeito, juntamente com os chamados direito fundamentais, e
conhecemos as matrizes orientadoras de sua origem e sustentação ao
longo dos séculos até os dias atuais. Agora, aprenderemos a classificá-
los e dividi-los para, na sequência, melhor entendê-los.

Antes de iniciarmos, vamos deixar claro que já contamos com alguns


modelos e critérios tradicionais de classificação. Podemos classificar
os direitos humanos a partir de 3 importantes critérios e planos de
identificação.

filter_1
Plano segundo a Teoria do Status
(Georg Jellinek)
filter_2
Plano de gerações ou momentos
filter_3
Plano internacional e nacional
A seguir, iremos apresentar cada plano de maneira aprofundada, vamos
lá!
I - Plano segundo a Teoria do Status (Georg
Jellinek)

Os direitos humanos estariam vinculados e poderiam ser classificados


de acordo com a interatividade e proteção jurídica dos indivíduos com o
Estado (Poder Público). As 4 possibilidades jurídicas de se invocar
direitos fundamentais seriam os status apresentados a seguir, entenda!

Passivo expand_more

Tendo o indivíduo como um sujeito em estado de submissão ao


Poder Público e que tem uma série de comportamentos exigidos.

Ativo-negativo expand_more

Tendo o indivíduo o direito de resistir em face do Poder Público,


pois existem garantias do não agir estatal. É um critério negativo
para o Estado que não pode agir, sob pena de ferir os direitos do
indivíduo.

Positivo-pretensão expand_more

Tendo o indivíduo um papel de demandar do Estado uma série de


medidas em prol do respeito aos seus direitos. Refere-se à
liberdade de agir, muito associada à ideia de pretensão.

Ativo-acessibilidade expand_more

Tendo o indivíduo uma série de possibilidades de integrar a


estrutura do Estado, do Poder. Na maioria das vezes, ocorre por
atendimento a contratações públicas diversas, ou mesmo pleitos
de candidaturas e processos de licitação vinculantes.

II – Plano de gerações ou momentos


Os direitos humanos são classificados de acordo com a linha temporal e
o tipo de direitos protegidos em cada momento de surgimento
normativo. Por tal critério de classificação, surgido no final dos anos
1970 e defendido por Karel Vasakos, os direitos são divididos em 3
gerações que veremos melhor a seguir.

Karel Vasakos
Importante jurista tcheco-francês, com contribuições excepcionais a
respeito dos direitos humanos, especialmente no tocante aos modos de
classificação e categorização deles no tempo e no espaço.

Primeira Geração (Liberdades dos indivíduos)


Aqueles ligados ao exercício de liberdades para cada indivíduo e
limitações ao agir do poder público estatal. São os tradicionais direitos
civis e políticos, como liberdade, isonomia e acesso à propriedade.

O Brasil sempre valorizou muito o direito de propriedade no âmbito de


nosso ordenamento jurídico. Durante o século XIX, a regulação do
direito e acesso à propriedade imobiliária, a aprovação das chamadas
leis abolicionistas e, em especial, a Lei do Ventre Livre (Lei nº 2040, de
1871) revelaram a preponderância da propriedade versus a dignidade da
pessoa humana, ao até permitir que os filhos nascidos de pessoas
escravizadas à época fossem libertos em dado momento da vida, mas
com uma espécie de indenização ao “Sr. Proprietário”.

Tal conceito e ideia viriam a ser equilibrados e elevados a conteúdo de


Princípio Fundamental da CRFB 88, mais de 100 anos depois. (art. 1º, III
da CRFB 88).

Segunda Geração (Igualdade social)


Aqueles direcionados a possibilitar, de fato e de direito, um sentimento
de igualdade de condições de competição. São os direitos ditos sociais,
como educação, trabalho, assistência, saúde e moradia, entre outros.

O direito fundamental de acesso a um trabalho seguro e saudável é


ainda uma importante pauta internacional e nos sistemas internos dos
países. A Organização Internacional do Trabalho (OIT), por exemplo,
desenvolve desde 1919 uma atividade crescente na tutela dos
interesses das pessoas em atividade laboral – ou seja, de todos nós!

Saiba mais
A OIT está disponível nas redes. Ela atua na lógica da proteção, mais
uma vez marcada pelo tempo com a mudança nas formas de trabalho e
a necessidade de regulação da superioridade do empregador diante do
quadro desfavorável do trabalhador.

Terceira Geração (Fraternidade)


Aqueles destinados ao maior equilíbrio de vida social, tal como a paz
pelo bem-estar social, meio ambiente saudável, solidariedade,
diversidade, respeito às características étnicas, entre outros.

Certamente você já ouviu falar das preocupações mundiais a respeito


do meio ambiente em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil.
Seja pelas violações mais ordinárias, como falta de saneamento básico
e destinação correta do lixo urbano, rural, residencial ou da produção
econômica, o direito ao meio ambiente é um direito constitucionalmente
protegido e de todos.

Todos têm direito ao meio ambiente


ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se
ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras
gerações.

(Art. 225 da CRFB 88)

Ele é tido como coletivo, numa linguagem mais universal, e “difuso”, no


Brasil. Segundo as nossas leis, o direito ao meio ambiente pode e deve
ser tutelado por qualquer um do povo e, em especial, pela figura do
Ministério Público por todos os entes federativos em competência
concorrente. Sendo assim, há campo de fiscalização e legislação para
todos.

Dessa forma, atualmente podemos afirmar que proteger nossa fauna e


flora de um modo geral são atitudes que tutelam os direitos
fundamentais e despertam discussões ferrenhas no campo social,
econômico, político e até jurídico, na esfera nacional e internacional. Em
compensação, há poucas décadas o ideal de progresso defendia
ocupação, distribuição de terras e abertura de estradas como forma de
proteção e de levar o melhor do mundo a todos.

III – Plano internacional e nacional

Os direitos humanos podem estar mais ou menos protegidos no plano


internacional e no plano dos direitos nacionais dos países. Trata-se de
um critério que busca identificar, reconhecer e separar, quando for o
caso, tutelas diferenciadas de diversos níveis de direitos humanos, no
sistema de proteção internacional e nacional desses direitos.

Atenção!
Os critérios ou planos de classificação não são necessariamente
excludentes entre si, e visam apenas a uma abordagem temática
diferenciada, de acordo com maior ou menor interesse, por um ou outro
critério e seus resultados em determinado momento de uma região, país
ou bloco de países.

Países
As nações ou países não são os únicos atores envolvidos. Setores públicos,
privados e terceiro setor devem ser pensados nesse conjunto, sendo
“países” uma maneira de se referir a todos.

Mais do que decorar teorias e critérios de classificação dos direitos


humanos, é importante saber reconhecê-los nas atividades profissionais
do cotidiano e em todas as áreas do conhecimento. No plano
internacional, tratados e convenções de direitos humanos têm exigido
compromisso do Poder Público e de empresas privadas no
cumprimento de metas e políticas públicas de medidas sanatórias das
desigualdades sociais oriundas da falta de acesso a um ou outro direito,
considerando-o como inerente e necessário à condição humana.

video_library
Direitos humanos X Direitos
fundamentais no Brasil
Neste vídeo, apresentaremos as diferenças e características entre
direitos humanos e direitos fundamentais no Brasil.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Considerando a necessidade de medidas públicas de


enfrentamento da crise mundial de saúde desencadeada pela
pandemia da covid-19, o Brasil, assim como outros países, adotou
medidas restritivas de direitos, entre elas, as previstas no art. 3º da
Lei 13.979/2020, que prevê, entre outros pontos, que autoridades
públicas no âmbito de suas competências podem determinar
medidas de isolamento e quarentena com restrição do direito de ir e
vir, vacinação, uso obrigatório de máscaras de proteção individual,
entre outros.

Partindo da ideia conceitual dos direitos humanos, bem como da


questão terminológica envolvendo os chamados direitos
fundamentais, marque a opção correta:

Direitos fundamentais não são direitos humanos e


A podem ser limitados pela Lei 13.979/2020, mesmo
em caso de pandemia de covid-19.

Direitos humanos não são direitos fundamentais e


podem ser limitados, desde que no âmbito
B
internacional, mas nunca pelas leis internas de um
país, mesmo em caso de pandemia de covid-19.

Direitos humanos e direitos fundamentais são


expressões totalmente equivalentes e são assim
C utilizadas por questões de linguística típicas de
traduções de importantes documentos jurídicos do
inglês para o português.
Direitos humanos e direitos fundamentais permitem
restrições normativas e pontuais que visam proteger
D as condições de dignidade da pessoa humana,
sobretudo em meio a uma situação pandêmica,
como ocorre no caso do Brasil.

Direitos humanos são um dispositivo jurídico para


conter os excessos do Estado e são baseados na
E
ideia de direitos fundamentais (que o Estado deve
prover minimamente a todos os seus cidadãos).

Parabéns! A alternativa D está correta.

Os direitos humanos no plano internacional e sua incorporação no


sistema jurídico brasileiro não são violados por restrições
normativas feitas em prol da saúde, da vida e da coletividade. Ao
contrário, o eventual e fundamentado sacrifício de direitos
individuais pode salvar milhares de vidas e milhões de reais de
gastos públicos. No caso do Brasil, os direitos fundamentais
ratificam e incorporam as ideias dos direitos humanos pactuados
no cenário internacional (art. 1º, inciso III e art. 5º, parágrafos 1º e
2º da CRFB 88).

Questão 2

“O conceito de ‘civilização’ refere-se a uma grande variedade de


fatos: ao nível da tecnologia, ao tipo de maneiras ao
desenvolvimento dos conhecimentos científicos, a ideias religiosas
e aos costumes. Pode se referir aos tipos de habitação ou à
maneira como homens e mulheres vivem juntos, à forma de
punição determinada pelo sistema judiciário ou ao modo como são
preparados os alimentos. Rigorosamente falando, nada há que não
possa ser feito de forma ‘civilizada’ ou ‘incivilizada’. Daí, é difícil
sumariar em algumas palavras tudo o que se pode descrever como
civilização”. (ELIAS, 1994).

O texto acima trata sobre o conceito de civilização que é abordado


pelo autor em sua obra, demonstrando claramente que tal conceito
é variável no tempo e no espaço. A respeito do trecho, assim como
da classificação e teorização dos direitos humanos, é correto
afirmar que
A apesar de haver um decurso temporal considerável
desde a Antiguidade Clássica, os direitos humanos
não sofreram grandes alterações em sua
classificação.

o processo civilizatório da sociedade não afeta a


classificação e teorização dos direitos humanos,
B
pois desde sempre eles foram considerados direito
natural, embora nem sempre fossem respeitados.

o processo civilizatório da sociedade e seus


costumes no tempo e no espaço afetam
diretamente a classificação e teorização dos
C direitos humanos, e ainda trazem dificuldades
acerca da ideia de direitos humanos realmente
universais, assim entendidos, reconhecidos e
aplicados em todos os países do mundo.

o processo de concentração de capital nas


D
indústrias bélicas busca a manutenção da paz.

a civilidade ocidental histórica remete ao Império


Romano e depois passa por processos contínuos de
E superação e evolução, até alcançar o capitalismo,
em que o homem obtém equilíbrio e maturidade,
entendendo que existem direitos universais.

Parabéns! A alternativa C está correta.

A primeira fase do capitalismo financeiro se deu por meio da


independência dos setores empresariais dos interesses dos
Estados Nacionais. Com o comércio internacional se tornando uma
peça fundamental na balança de poder, cada vez mais os grandes
investidores (haute finance) tiveram poder sobre as decisões dos
Estados.
2 - Características dos direitos humanos
Ao final deste módulo, você será capaz de distinguir as características
dos direitos humanos de forma contextualizada.

Reflexões sobre os direitos


humanos
Os direitos humanos ocupam um lugar de destaque no cenário
internacional e nos sistemas jurídicos de países e blocos de países ao
redor do mundo, com especial destaque para os que se enquadram
como Estados Democráticos de Direito, que adotam regimes políticos
baseados na democracia (representação direta do povo), ainda que de
maneiras diferentes, na escolha dos membros dos poderes, em especial
legislativo e lideranças dos poderes executivos.

Mas como reconhecer as características gerais dos direitos humanos?

Como atentar para as especificidades de sua aplicação na diversificada


realidade de cada país do mundo global?

Regimes ditatoriais, regimes de exceção e outras formas de aristocracia


adotam em via de regra o corpo legislativo de interesse do grupo, não da
população. Logo, para eles, direitos humanos são desnecessários ou
não existem.

Soldados chilenos queimando livros durante a ditadura militar chilena de Pinochet, 1973.

Podemos considerar uma única idealização, uma única visão


dimensional teórica e prática dos direitos humanos? Vamos lá descobrir
as respostas a estes questionamentos.
video_library
O que faz um direito ser um
direito humano?
Confira neste vídeo algumas reflexões sobre a completa definição e
amplitude dos direitos humanos.

Caracterização dos direitos


humanos
Apesar de contarmos com importantes documentos históricos no
âmbito internacional com indicativos importantes a respeito do
conteúdo jurídico dos direitos humanos, sabemos que, na prática, a
doutrina e os tribunais vêm aplicando muito mais peso às
características do que a nominata de direitos propriamente dita. Tal
situação ocorre também pelo fato de cada vez mais direitos humanos
estarem espalhados em legislações infraconstitucionais dos variados
ramos do direito.

Nominata
Nominata, ou seja, nomes atribuídos. Quer dizer que a literatura
internacional e a maturidade dos direitos humanos impactam mais na sua
aplicação do que aquilo que é referenciado na lei como direito humano.

Infraconstitucionais
Embora os direitos humanos estejam previstos como fundamentais, a sua
aplicação e leitura estão dipostas em leis dispersas abaixo da Constituição,
como Estatuto do Idoso, ECA, entre outras.

Congresso Nacional do Brasil, Brasília.


Se o corpo legislativo não é um código específico encontrado em um
vade mecum (um manual específico de leis), como podemos fazer para
reconhecê-lo difuso nas leis de um país, ou mais especificamente nas
leis brasileiras?

Vamos conhecer algumas características do corpo legislativo e, em


seguida, acompanhar comentários, conexões e exemplificações de
interesse.

Universalidade

O alcance dos direitos humanos não é excludente de qualquer ser


humano por qualquer razão ligada à pessoa humana. Outros fatores
locais e normativos podem fazê-los não chegar até o indivíduo, mas
sendo possível chegar, toda pessoa humana é agraciada.

É talvez uma característica mais desejada do que efetivamente


alcançada, considerando a diversidade cultural dos países no mundo.
Para além da tradicional divisão entre Oriente e Ocidente, dentro dos
próprios continentes do chamado mundo ocidental são encontradas
inclusões e exclusões.

Temas como alimentação, caça aos animais, trabalhos forçados em


sistemas prisionais, pena de morte, legislação do trabalho, seguridade
social e educação são tratados de forma bem diferenciada. Veja alguns
exemplos!

O direito e a prática da caça no Brasil e nos Estados Unidos da América

A diferença entre a cultura de vida nos centros urbanos e no meio rural

Observe quanta variação podemos ter. Entendeu a dificuldade da


universalidade? Soma-se a isso o maior número de relações sociais
virtuais e presenciais entre pessoas e culturas diferentes em razão das
atuais tecnologias de comunicação, bem como por consequência das
facilidades para se viajar.

Essencialidade

Corolário da característica anterior, a essencialidade confirma a


universalidade e vice-versa. Só é universal pois é essencial à existência
e sobrevivência de todo ser humano.
Seguindo o comentário e a característica anteriores, resta saber o
conteúdo essencial em cada país e sua interpretação jurídica interna de
validar ou não o referido conteúdo. Para tal exemplo, podemos apontar a
maior ou menor tolerância que os governos têm na execução de
políticas públicas em torno da população carcerária e suas famílias.

O Massacre do Carandiru, 1992

Certamente você já ouviu a expressão direitos humanos relacionada a


temas de tratamento das pessoas apenadas preventivamente ou em
caráter reativo (e possivelmente também já ouviu muitas críticas a esse
respeito), mas o fato é que a essencialidade é discutível, por mais difícil
que possa parecer para cada um de nós, a respeito da visão dos
gestores públicos nacionais e internacionais.

É também um tema de conflitos constantes entre autoridades de um


país e organizações internacionais que realizam estudos e outras
atividades relacionadas aos direitos humanos e direitos fundamentais
das populações carcerárias. Vamos conhecer o debate sobre o direito
ao uso de armas, ouça!

Imprescritibilidade

A regra geral da segurança formal do direito no tempo não atinge os


direitos humanos. O bem jurídico tutelado supera o decurso temporal
formal. Obviamente, deve ser o titular do direito violado ou ameaçado
diligente em sua ação do Poder Judiciário, mas não há que se falar em
prescrição.

É uma característica de maior segurança jurídica, que pretende evitar


que casos de violações de direitos fundamentais fiquem impunes.
Como exemplo, temos as notícias sobre abusos da integridade física e
moral de pessoas, rotulados de assédios, ou abusos majoritariamente
com apelo sexual.

A área do entretenimento e o campo das instituições religiosas vivem


dramas constantes com situações do gênero. A Lei Maria da Penha
seria um direito humano? Segundo o texto da lei, sim, mas segundo a
decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre ela, não.

Ouça e saiba mais sobre a Lei Maria da Penha.


Inalienabilidade

Ao contrário de outros direitos disponíveis, no caso dos direitos


humanos a inalienabilidade visa blindar direitos oriundos da própria
condição do ser humano, evitando assim que abusos ou negócios
provenientes da exploração de mercado e suas leis próprias afetem em
especial os direitos das pessoas menos favorecidas socialmente.

Antes Depois
Foto do Rana Plaza, um O prédio continuou
prédio de oito pisos que ocupado, até que em
abrigava fábricas de 2013 ocorreu o colapso,
vestuário prestadoras arrow_forward deixando cerca de mil
de serviço para grandes trabalhadores mortos. A
marcas e um centro tragédia inflamou
comercial em Savar, debates sobre direitos
Bangladesh, em 2012. O humanos e a
imóvel apresentava importância de uma
rachaduras e corria cadeia de produção
risco de desabamento. mais sustentável para a
moda.

A pressão do capital e de outros possíveis direitos e interesses são


históricos na vida humana, em especial nos espaços de maior
liberalismo, fruto da contemporaneidade. Ocorre que, com o aumento
formal de direitos fundamentais, foi necessário taxar de inalienável o rol
de direitos que cada país traz como integrante de sua categoria
diferenciada.

Casos tradicionais colocados à prova diariamente, como os reiterados


usos de pessoas com crescimento físico diferenciado, modelos de pele
negra e comércio de órgãos são apenas alguns exemplos da
necessidade de proteger a mercantilização de direitos fundamentais,
esbarrando sempre nos limites morais das respectivas sociedades.

Vamos pensar agora sobre as crenças e os efeitos da intolerência


religiosa, acompanhe!

Irrenunciabilidade

Não se pode renunciar elemento ou parte integrante de seu todo, sob


pena de esvaziamento do todo. É uma incoerência lógica e jurídica. Visa,
em última análise, a evitar uma forma diversa da inalienabilidade
negativa. Agora é a vez de pensarmos o direito ao trabalho sob a
perspectiva dos direitos humanos. Vamos ouvir!

Trata-se de característica também presente em grande parte dos


sistemas jurídicos dos Estados Democráticos de Direito no mundo
ocidental. Visa evitar uma forma diferenciada de mercantilização às
avessas e, na maioria das vezes, com base no próprio ordenamento
legal. Está normalmente associada ao direito material e ao acesso à
justiça pelas pessoas naturais.

Inviolabilidade

Os ordenamentos jurídicos dos países não podem violar os direitos


humanos, mitigando seus valores de forma indireta em normas que
possam burlar as proteções legais. Tais direitos são invioláveis.

Uma meta a ser atingida: essa é maneira mais honesta e transparente


de comentar e exemplificar a característica acima, pois, infelizmente, os
direitos fundamentais são diariamente violados pelas pessoas e pelo
poder público. Um dos exemplos mais marcantes na atualidade é o
direito fundamental à saúde.

Refugiados esperam assistência de voluntários em um campo de refugiados na fronteira entre


Grécia e Macedônia, 2016.

Não é preciso se esforçar muito para constatar uma violação direta ou


indireta. O fato é que, apesar de haver trocas de responsabilidade entre
os juridicamente responsáveis, percebemos violações constantes há
algum tempo. Isso necessita ser revisto, sob risco de termos um
sistema eternamente tolerante às violações legais e constitucionais do
tema.

Refletir a hipótese da venda de órgãos sob a perspectiva dos direitos


humanos também é importante, vamos ouvir!

Historicidade

São construções históricas, derivadas de marcos importantes e


normalmente associados a eventos com grandes perdas humanas e
violações de outros direitos correlatos. A característica geral da
historicidade ratifica a percepção a respeito das origens e possível
caracterização de novos direitos na linha do tempo e do espaço.

A historicidade é um elemento que dificulta a implementação da


universalidade dos direitos fundamentais, pois costumes, tradições e
outros movimentos fazem parte da vida e não de regras imutáveis. Além
disso, não são fruto de uma evolução linear melhor ou pior, mas sim
resultados da realidade social.

Mulher com a bandeira palestina em frente aos soldados das Forças de Defesa de Israel durante
manifestações, 2010.

A historicidade vai, portanto, variar bastante nos continentes e


realidades de cada país, além de gerar conflitos jurídicos
supranacionais, principalmente no mundo atual. É preciso ficarmos
atentos para não sermos complacentes e intolerantes com as
diferenças, ainda que, na esfera internacional, elas estejam sob o mantra
dos direitos fundamentais e humanos.

Mas está no meu livro, na minha liberdade de culto, este povo sempre
teve direito a esta terra: ouça um debate sobre Israel e Palestina.
Interdependência

Os direitos fundamentais estão interligados, conectados entre si nos


importantes documentos jurídicos internacionais e na legislação interna
de cada país.

A interdependência dos direitos fundamentais é uma importante


característica (mais prática do que teórica) e, por isso, falaremos dela. É
pela via da interdependência que validamos nossos sistemas jurídicos,
principalmente em países como o Brasil, com diferentes espaços de
competência legislativa, judiciária e executiva. Tal característica é
essencial para uma pretensa harmonização em busca de maiores níveis
de eficiência da tutela dos direitos fundamentais.

Um assunto relacionado ao direito fundamental é o acesso à justiça dos


consumidores, categoria da qual dificilmente escapamos e que cada vez
mais se envolve em situações jurídicas de prestação de serviços,
compra e venda, restrição de crédito e outras violações, inclusive de
seus dados. Os consumidores têm atualmente, à sua disposição,
espaços diferenciados de consensualidade no âmbito federal, estadual
e municipal. Vejamos o exemplo das opções de um consumidor
residente no Rio de Janeiro.

Âmbito federal
Âmbito estadual
Âmbito municipal
Agora que você distinguiu as características gerais e específicas dos
direitos humanos, está apto a seguir para a contextualização de tais
direitos na visão dimensional, na teoria e na prática. Vamos lá!

Visão dimensional dos


direitos humanos
O estudo dos direitos humanos, sua terminologia, teorias,
características e classificação ao longo dos séculos é base para a
compreensão de como tais direitos são operados dos sistemas jurídicos
atuais dos países e também nas possibilidades e limitações no campo
de um direito supranacional que possa ser aplicado em relações
jurídicas estatais e situações complexas envolvendo pessoas naturais,
grandes corporações de atuação transnacional e outros fatos que
podem afetar a vida das pessoas em partes diferentes do globo.

Dentro da lógica desenvolvida e sedimentada, nos documentos


históricos que tratam dos direitos humanos e, no caso do Brasil e de
alguns países europeus, na tradição dos direitos fundamentais, tais
direitos fundamentais são entendidos como aqueles assegurados na
ordem jurídica interna de cada um dos países.

Ativistas em favor do voto feminino no Reino Unido, direito ainda tratado de acordo com regras
nacionais em muitos países, 1908.

Eles integram o rol de temas que um país entende como mais


importante em categoria aos demais direitos que regula.

Se tal país é signatário de documentos jurídicos internacionais que


declaram direitos humanos, é comum ter, em seu rol de direitos
fundamentais, os mesmos direitos, além de, eventualmente, outros
direitos mais explicitados e que refletem realidades nacionais, nem
sempre dimensionadas no macro.

É possível reconhecer uma divisão ou classificação em gerações, etapas


ou, como tem sido feito ultimamente, em dimensões diferenciadas no
tempo e conteúdo.

Assim, ao falarmos de como os direitos humanos são atualmente


enquadrados pelos Estados de Direito (para além dos importantes
referenciais históricos, já reconhecidos baluartes de iluminação global),
é no campo dos direitos fundamentais que reconhecemos os efeitos da
divisão geracional que pode refletir direitos materiais e instrumentais de
acesso à justiça e outros atos de cidadania das pessoas em caráter
individual ou coletivo.

Portanto, os direitos humanos são valorizados e enquadrados em


dimensões ou gerações, seguindo um encadeamento básico que vamos
recapitular agora.

Direitos de 1ª Geração - Liberdade dos indivíduos expand_more

São aqueles ligados ao exercício de liberdades para cada


indivíduo e a limitações do agir do poder público estatal. São os
tradicionais direitos civis e políticos: liberdade, isonomia e
acesso à propriedade.

Direitos de 2ª Geração - Igualdade social expand_more

São aqueles direcionados a possibilitar, de fato e de direito, um


sentimento de igualdade de condições de competição. São os
direitos ditos sociais, como educação, trabalho, assistência,
saúde, moradia, entre outros.

Direitos de 3ª Geração - Fraternidade expand_more

São aqueles destinados ao maior equilíbrio de vida social, tais


como paz, bem-estar social, meio ambiente saudável,
solidariedade, diversidade, respeito às características étnicas,
entre outros.

Direitos de 4ª Geração - Novos direitos expand_more

Essa geração, que não é consensual, ligada aos direitos de


acesso à informação e comunicação digital em rede, ao regime
mais democrático possível, e novos direitos da bioética.

Seja como for, segundo Domenico de Masi, em sua ideia de paradigma,


vivemos atualmente as transformações mais intensas e rápidas desde o
Renascimento, Iluminismo, Revolução Industrial e outros importantes
movimentos, em um período que traduz os efeitos da ação e reação da
sociedade civil, do mercado e dos poderes estatais em uma espiral
intensa e com giros dentro de uma mesma geração.

Não são mudanças simplesmente de uma sociedade líquida. Para além


da liquidez, há a superação de teses, antíteses, tradições, costumes e
outras variáveis de mudança de comportamento. Reflita alguns
questionamentos!
help Que Estado atenderá aos desejos e às
necessidades da geração presente, que vive
consideravelmente mais que as duas anteriores?

help Que educação será adequada?

help A educação será adequada apenas para a visão de


mercado ou sob outras premissas sociais mais
amplas?

Não são questões enceradas, mas servem como fundamentação para


defesa de revisitação dos direitos humanos e respectivos direitos
fundamentais de maneira mais intensa. Este ponto evidencia uma das
razões não para haver unanimidade na ideia de dimensões sequenciais
e sem fim, mas sim uma revisitação e criação de novos direitos para
novas realidades a serem incorporados ao conjunto da obra.

Ocorre que essa visão geracional está muito ligada à noção


predominante de período/tempo e a um movimento mais positivista do
direito, tendente a regulações mais específicas, o que acaba gerando um
“fatiamento” legislativo dos direitos humanos e criando barreiras
práticas para sua aplicação.

Refugiados venezuelanos buscando acesso a outros países da América Latina, fugindo da crise
de segurança e liberdade em seu país de origem, 2018.

Quando trabalhamos com a ideia dimensional, estamos pensando em


direitos humanos ou fundamentais que podem ser analisados sem
separação ou hierarquia nas seguintes dimensões, veja!

Se paração das dimensões em relação aos direitos humanos.

Não há, como na didática anterior geracional, a ideia de tanta


fragmentação integrar uma única realidade dinâmica. Veja, por exemplo,
o Direito Fundamental de Acesso à Justiça, previsto no art. 5º, inciso
XXXV da CRFB 88, que traz sob o prisma da igualdade a mensagem de
que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito”. Entenda melhor cada uma das 3 dimensões. Vamos
lá!

Individual/Liberal

Na medida que tal acesso pode ser realizado por qualquer um


do povo, pessoa jurídica de direito privado ou público, interna
ou estrangeira.

Social

Pode ter provocação e resposta de natureza coletiva, atingindo


direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Fraterna

Mundialmente, a Justiça pode se dar cada vez mais por


métodos adequados e consensuais de solução ou gestão de
conflitos, como mediação, conciliação e justiça restaurativa,
por exemplo. É o que chamam de Cultura da Paz, Bem-Estar
Social, entre outros.

Um importante direito que está ligado a várias dimensões não é limitado


ou hermético a um conceito, bem jurídico ou instituto específico; não
está isolado em período “A” ou “B” e pode ser referenciado pelos
documentos históricos mais antigos do século XIII, da Independência
dos Estados Unidos e certamente da Revolução Francesa no século
XVIII; e até mesmo estudos e referenciais teóricos mais modernos,
como os trabalhos de Cappelletti e Garth do Projeto Florença e seu
extrato mais conhecido, a obra Acesso à Justiça (1998).

Atualmente, não se trabalha mais na prática com a


clássica divisão Geracional e Temporal. Estamos todos
em uma ambiência única, na mesma espiral. O que
importa é garantir o não retrocesso, assegurando que
as pessoas possam exercer seus direitos e que os
Estados atuem como defensores tanto de forma
preventiva quanto reativa.
A interdependência está associada apenas aos
D direitos que não são relacionados aos direitos
humanos.

Os direitos humanos devem ser pensados no


contexto social de cada região, não podendo se
E sobrepor à cultura local. Quando signatários
plenamente, aí sim podem ser cobrados pelos
tribunais internacionais para seguirem o princípio.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Imprescritibilidade: nem todos os direitos fundamentais são


imprescritíveis, mas a regra geral da segurança formal do direito no
tempo não atinge os direitos humanos. O bem jurídico tutelado
supera o decurso temporal formal. Obviamente, deve ser o titular do
direito violado ou ameaçado diligente em sua ação do Poder
Judiciário, mas não há que se falar em prescrição.

Questão 2

De acordo com o sociólogo Domenico de Masi, vivemos um novo


“paradigma”, girando em torno de uma sociedade desorientada no
tempo e no espaço, diante da velocidade de incrementos
tecnológicos iniciados por uma revolução pós-industrial, com
ênfase nos costumes e práticas sociais desde o final do século
passado até os nossos dias.

Segundo o estudioso, estaríamos avaliando e regulando novos


tempos e ares com velhos direitos e paradigmas, sendo assim
impossível normatizar, com precisão e segurança, codificações,
constituições e outras formas de controle social.

Considerando as características estudadas dos direitos humanos,


marque a opção correta.

A percepção de Domenico de Masi não se coaduna


A com nenhuma das características dos direitos
humanos.

A percepção de Domenico de Masi se coaduna à


característica da imprescritibilidade dos direitos
B
humanos, pois ratifica a valorização de velhos
direitos no tempo.

O processo civilizatório da sociedade e seus


costumes no tempo e no espaço estão passando
por uma intensa onda de desorientação em que
C
vários direitos humanos estão sendo
redimensionados, reforçando a característica da
historicidade.

O processo de concentração de capital nas


D
indústrias bélicas busca a manutenção da paz.

A leitura do autor foca na inviolabilidade dos direitos


E humanos, sendo esse um valor universal e, por isso,
indiscutível para todos os homens.

Parabéns! A alternativa C está correta.

A sociedade desorientada de Domenico de Masi está passando por


um redimensionamento de direitos, do papel do Estado e das
pessoas. O norteador desse processo deve ser a historicidade,
compreendendo que os elementos citados são construções
históricas ligadas a marcos importantes e/ou eventos com grandes
perdas humanas e violações de outros direitos.

Considerações finais
Neste conteúdo, conhecemos as divergências terminológicas, teorias e
classificações que impactam as relações sociais e a compreensão da
realidade dos direitos humanos na atualidade. A base teórica é
importante, considerando que os sistemas jurídicos dos países não
necessariamente utilizam a linguagem universal dos documentos e
compromissos internacionais, gerando assim uma lacuna na
racionalidade lógica para o direito e áreas afins.

Também distinguimos as características gerais e específicas dos


direitos humanos, contextualizadas com a visão dimensional e suas
práticas clássica e moderna, de modo a gerar percepções e reflexões
múltiplas nas várias áreas profissionais. O conhecimento das
características e classificações, a interlocução com o sistema
constitucional dos direitos fundamentais no Brasil e a sociedade em
construção e reconstrução diante dos câmbios sociais são apenas
alguns dos ingredientes necessários à prática cotidiana dos direitos
humanos, que devem estar cada vez mais inseridos no conteúdo
normativo das normas jurídicas e comportamento das pessoas.

Em outras palavras, os direitos humanos devem estar pulverizados,


contidos nos mais diversos sistemas jurídicos, e ser tratados em caráter
principiológico, intrínseco a qualquer norma, devendo vir antes do
direito, inclusive, quando possível, mas não deixando de estar nele, sob
qualquer pretexto.

headset
Podcast
Ouça e revisite alguns pontos importantes do debate sobre direitos
humanos.

Explore +
Procure o vídeo Domenico de Masi “Paradigma”, disponível no YouTube.

Assista à entrevista do sociólogo Zygmunt Bauman concedida à Revista


Cult, disponível no Youtube.

Leia a Declaração Universal dos direitos humanos, disponível no site da


ONU.

Pesquise o site da Comissão Interamericana de direitos humanos e


obtenha informações sobre como atuar na defesa de tais direitos em
âmbito internacional.
Leia as Sentenças da Corte Interamericana de direitos
humanos relacionadas ao Brasil, disponíveis no site do Governo Federal.

Leia o artigo Vaticano sabia que ex-cardeal dos EUA era acusado de
assédio sexual, na página da Gazetaweb.

Leia o artigo Harvey Weinstein pega 23 anos de prisão em caso mais


emblemático do MeToo, disponível no site do jornal Folha de S.Paulo.

Leia o artigo direitos humanos: as Particularidades Africanas, de


Marcolino José Carlos Moco, da Universidade de Angola, disponível na
página da Associação Nacional de direitos humanos, Pesquisa e Pós-
Graduação.

No site do Supremo Tribunal Federal, leia a Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988 sob a ótica da instituição.

Conheça o site ShareAmerica e leia o artigo Estas vozes identificaram


nossos direitos humanos universais.

Referências
BBC BRASIL. Os sul-coreanos obrigados a trabalhar como escravos em
minas de carvão da Coreia do Norte. Consultado na internet em: 10 mai.
2021.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Centro


Gráfico, 1988.

CAPPELLETTI, M.; GARTH, B. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio


Antônio Fabris, 1998.

ELIAS, N. O processo civilizatório Volume 1: Uma História dos


Costumes. Rio de Janeiro: Jorge Zarah, 1994.

GÓMEZ, F. J. G. La Mediación como Vía al Bienestar y la Felicidade.


Cidade do México: Tirant lo Blanch, 2020.

HOBSBAWN, E.; RANGER, T. J. A Invenção das Tradições. São Paulo: Paz


e Terra, 2012.

MASI, D. Paradigma. Consultado na internet em: 10 mai. 2021.

MELLO, C. M. Da Construção Histórica aos Dias Atuais. Rio de Janeiro:


Processo, 2021.

MORAES, G. P. direitos fundamentais: Conflitos e Soluções. São Paulo:


Frater et Labor, 2000.
Organização dos Estados Americanos (OEA). Comissão Interamericana
de direitos humanos. Consultado na internet em: maio 2021.

SÁENZ, K. La Bonda, la Compasión y el Desapego en la Solución de


Conflitos. Cidade do México: Tirant Lo Blach, 2020.

TAYLOR, A. et al. “Ela vai no meu barco”: casamento na infância e


adolescência no Brasil – resultados de pesquisa de método misto. Rio
de Janeiro: Instituto Promundo, 2015. Consultado na internet em: 10
ago. 2023.

TOLEDO, C. Casamento infantil, um drama que persiste na América


Latina. Portal G1, 2023. Consultado na internet em: 10 ago. 2023.

UNICEF. O que são direitos humanos? Portal UNICEF, 2015. Consultado


na internet em: 10 ago. 2023.

Material para download


Clique no botão abaixo para fazer o download do
conteúdo completo em formato PDF.

Download material

O que você achou do conteúdo?

Relatar problema

Você também pode gostar