Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
CARREIRAS JURÍDICAS
INTENSIVO I
Módulo I
DIREITO CIVIL
Pablo Stolze
1
Fundamentalmente, temos três faria aderir a uma concepção próxima
teorias principais explicativas do da concepcionista.
nascituro: Finalmente, a teoria
i) teoria natalista – defendida concepcionista sustenta que o nascituro
direta ou indiretamente por Vicente é considerado pessoa desde a
Ráo, Silvio Rodrigues, Silvio Venosa; concepção, podendo titularizar direitos
ii) teoria da personalidade personalíssimos e até mesmo certos
condicional – Serpa Lopes; direitos materiais de conformidade com
iii) teoria concepcionista – a sua peculiar situação.
Silmara Chinelato, Flávio Tartuce.
A primeira teoria – natalista - O Código Civil adotou alguma
tradicional em nosso sistema, sustenta dessas teorias?
que a personalidade somente seria Clóvis Beviláqua, em seu livro
adquirida a partir do nascimento com “Comentários ao Código Civil dos
vida, de maneira que o nascituro não Estados Unidos do Brasil”, editora Rio,
seria considerado pessoa, gozando de 1975, pág. 178, após elogiar
mera expectativa de direitos. abertamente a teoria concepcionista
Ainda que se defenda a teoria conclui que o Código Civil adotou
natalista, a sua aplicação deve sempre natalista “por parecer mais prática”,
levar em conta o princípio da dignidade embora existam situações em que o
da pessoa humana, razão pela qual no nascituro se apresenta como pessoa.
direito comparado, era absurda a A opinião de Beviláqua ainda é
redação do anterior do art. 30 do Código atual. A primeira parte do art. 2º
da Espanha, que reconhecia a aparentemente adota a teoria natalista,
personalidade somente se o feto, uma mas a segunda parte do mesmo
vez nascido, tivesse forma humana e dispositivo e dispositivos outros no
sobrevivesse às primeiras vinte e quatro ordenamento indicam a influência
horas. concepcionista.
A segunda teoria – da Observação: em nosso sentir,
personalidade condicional – por sua mesmo após o julgamento da ADI 3510
vez, admite que o nascituro já seria (Lei de Biosegurança), a polêmica
titular de certos direitos personalíssimos quanto à natureza do nascituro e às suas
(como o direito à vida e à saúde), mas teorias continua.
somente consolidaria direitos de cunho A teoria concepcionista e a
material ou econômico, sob a condição jurisprudência brasileira.
de nascer com vida. Trata-se de uma Especialmente nos últimos anos, a
teoria muito presente na jurisprudência. teoria concepcionista vem ganhando
*MHD dá uma opinião próxima dessa força no Direito Brasileiro:
teoria da personalidade condicional, a) lei dos alimentos gravídicos
tratando de explicar que o nascituro (Lei n. 11804/2008);
possuiria uma personalidade formal, b) o reconhecimento do dano
para titular certos direitos moral ao nascituro (REsp 399028/SP,
personalíssimos, como o direito à vida, REsp 931556/RS);
mas os direitos de natureza econômica c) a possibilidade de indenização
adviriam apenas com o nascimento com pelo seguro DPVAT por conta da morte
vida. Stolze entende que essa teoria de do nascituro (REsp 1120676/SC e
MHD se aproxima da Linha da informativo STJ de 15-05-2011).
personalidade condicional. Já Tartuce Vale acrescentar ainda que o
entende que essa posição de MHD a REsp 1.415.727/SC, rel. Min. Luis
Felipe Salomão, salienta o crescimento
2
da importância e da influência da teoria 2º), ainda que para atuar necessite do
concepcionista no Brasil (recomenda-se auxílio de institutos protetivos como a
leitura). curatela e a tomada de decisão apoiada
A despeito do fortalecimento da (artigos 6º e 84 do EPD).
teoria concepcionista, não se pode dizer Para que se possa perceber a
ainda que ela soluciona todas as dimensão do Estatuto da Pessoa com
situações de fato apresentadas. No atual Deficiência, confira-se o seu art. 6º em
estágio do nosso Direito, p. ex., ainda que a capacidade da pessoa civil com
não se admite a transmissibilidade deficiência é expressamente reafirmada:
direta da herança de um nascituro para a
mãe. Terá, pois, de nascer com vida “”
para consolidar o Direito,
eventualmente transmitindo-o. O estatuto considera a curatela,
Capacidade Jurídica art. 85, medida extraordinária, que só
será aplicada quando rigorosamente
1. Distinção necessário. Além disso a curatela é
Vale lembrar inicialmente a limitada à prática de atos de natureza
distinção existente entre capacidade e negocial e patrimonial. Exemplo: venda
legitimidade. de imóvel.
A capacidade é conceito mais Outra novidade é a possibilidade
amplo, que nos conduz a uma aptidão de se nomear mais de um curador para a
geral, reconhecida em Lei para atuar na mesma pessoa: curatela
vida jurídica. compartilhada.
Tradicionalmente, subdivide-se Diversos direitos foram
em capacidade de direito e capacidade reconhecidos nos âmbitos da educação,
de fato. da família, da vida política, garantia de
Diferentemente, a legitimidade é mobilidade e acessibilidade, enfim, uma
específica, traduzindo uma pertinência verdadeira consolidação das conquistas
subjetiva (Calmon de Passos) para a obtidas pela convenção sobre os direitos
prática de certos e determinados atos, das pessoas com deficiência
vale dizer, uma pessoa pode ser capaz, (Convenção de New York).
mas não ter legitimidade para a prática Ora, com reconhecimento da
de certo ato (exemplo: dois irmãos capacidade legal da pessoa com
maiores e capazes não podem casar deficiência, os artigos 3º e 4º do CC
entre si). sofreram profunda modificação, uma
vez que, como dito, a deficiência não é
2. Advento do Estatuto da Pessoa com mais causa de incapacidade civil.
Deficiência
O Estatuto da pessoa com “Art. 3o São absolutamente
deficiência (Lei n. 13146 de 6-7-2015), incapazes de exercer pessoalmente os
atos da vida civil:
reconstruiu a teoria da capacidade civil. I - os menores de dezesseis anos;
Até então, os artigos 3º e 4º do CC II - os que, por enfermidade ou
Brasileiro, dispondo sobre incapacidade deficiência mental, não tiverem o
absoluta e relativa, inseriram a necessário discernimento para a prática
deficiência como causa de incapacidade desses atos;
III - os que, mesmo por causa
civil. transitória, não puderem exprimir sua
A partir do EPD, operou-se uma vontade.
verdadeira desconstrução ideológica: a Art. 3o São absolutamente incapazes
pessoa com deficiência passa a ser de exercer pessoalmente os atos da vida
considerada legalmente capaz (EPD, civil os menores de 16 (dezesseis)
3
anos. (Redação dada pela Lei nº 13.146, é regulada por lei especial: Estatuto do
de 2015) (Vigência) Índio – Lei n. 6001/73, art. 8º.
I - (Revogado); (Redação dada pela
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
*Deficiência não é causa de
II - (Revogado); (Redação dada pela incapacidade...a_ a brecha autofágica -
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) Jus Navigandi.pdf
III - (Revogado). (Redação dada
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
Art. 4o São incapazes,
relativamente a certos atos, ou à maneira
Material do Professor - Direito Civil -
de os exercer: Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (2).pdf
Art. 4o São incapazes, Material de Apoio _ Direito Civil_
relativamente a certos atos ou à maneira Pablo Stolze_ Aula 02.pdf
de os exercer: (Redação dada pela Lei nº
13.146, de 2015) (Vigência)
I - os maiores de dezesseis e
Comentários aos artigos 3º e 4º do CC
menores de dezoito anos; Conforme já vimos, os artigos 3º e
II - os ébrios habituais, os 4º do CC foram reconstruídos a partir
viciados em tóxicos, e os que, por do estatuto da pessoa com deficiência:
deficiência mental, tenham o
discernimento reduzido; “Art. 3º São absolutamente
III - os excepcionais, sem incapazes de exercer pessoalmente os
desenvolvimento mental completo; atos da vida civil:
II - os ébrios habituais e os viciados I - os menores de dezesseis anos;
em tóxico; (Redação dada pela Lei nº II - os que, por enfermidade ou
13.146, de 2015) (Vigência) deficiência mental, não tiverem o
III - aqueles que, por causa necessário discernimento para a prática
transitória ou permanente, não puderem desses atos;
exprimir sua vontade; (Redação dada III - os que, mesmo por causa
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) transitória, não puderem exprimir sua
IV - os pródigos. vontade.
Parágrafo único. A capacidade Art. 3º São absolutamente
dos índios será regulada por legislação incapazes de exercer pessoalmente os
especial. atos da vida civil os menores de 16
Parágrafo único. A capacidade (dezesseis) anos. (Redação dada pela Lei
dos indígenas será regulada por nº 13.146, de 2015) (Vigência)
legislação especial. (Redação dada pela I - (Revogado); (Redação dada
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)” pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
II - (Revogado); (Redação dada
A partir do EPD, a única hipótese pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
de incapacidade civil absoluta é a do III - (Revogado). (Redação dada
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
menor impúbere (abaixo dos 16 anos) e,
além disso, as hipóteses de incapacidade Art. 4º São incapazes,
relativa não contemplam mais a relativamente a certos atos, ou à maneira
deficiência. de os exercer:
O inciso III do art. 4º foi mal Art. 4º São incapazes,
posicionado, pois não se pode relativamente a certos atos ou à maneira
de os exercer: (Redação dada pela Lei nº
considerar relativamente incapaz uma 13.146, de 2015) (Vigência)
pessoa que se encontra em estado I - os maiores de dezesseis e
vegetativo (coma), já que em verdade é menores de dezoito anos;
absolutamente incapaz posto que não II - os ébrios habituais, os
pode exprimir vontade alguma. viciados em tóxicos, e os que, por
deficiência mental, tenham o
Por fim, o EPD modificou a discernimento reduzido;
expressão “índios” por “indígenas”, III - os excepcionais, sem
pois a primeira palavra é considerada desenvolvimento mental completo;
pejorativa. A capacidade dos indígenas
4
II - os ébrios habituais e os Patrimônio Mínimo”, segundo a qual as
viciados em tóxico; (Redação dada pela normas civis devem resguardar um
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
III - aqueles que, por causa
mínimo patrimonial para que cada
transitória ou permanente, não puderem pessoa tenha vida digna. Esse
exprimir sua vontade; (Redação dada pensamento justifica as normas de
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) proteção do pródigo e as normas do
IV - os pródigos. bem de família.
Parágrafo único. A capacidade
dos índios será regulada por legislação
Outro ponto digno de nota é no
especial. sentido de que a idade avançada, por si
Parágrafo único. A capacidade só, não é causa de incapacidade civil,
dos indígenas será regulada por segundo pensamento tradicional.
legislação especial. (Redação dada pela A partir do Estatuto da Pessoa
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)”
com Deficiência, a deficiência mental
ou intelectual, como vimos, não é mais
Todas as hipóteses de
causa de incapacidade civil.
incapacidade decorrentes de deficiência
Assim, por exemplo, se o pai de
desapareceram. Salientamos, nos termos
João, Sr. Joaquim, tem 93 anos, e é
do novo sistema normativo a
portador de uma deficiência mental,
impropriedade do inc. III do art. 4º, na
ainda assim, é considerado legalmente
medida em que, pessoas impedidas de
capaz, embora possa ser nomeado um
exprimir vontade, a exemplo de quem
curador para representá-lo quanto a atos
está em coma, não poderiam ser
negociais ou patrimoniais.
consideradas apenas relativamente
2. Benefício de restituição ou restitutio
incapazes.
in integrum.
Ainda tratando da incapacidade
A expressão restitutio in integrum
relativa, observamos que os pródigos
não apenas pode se referir ao benefício
continuam contemplados na norma.
de restituição, mas também, no âmbito
O que se entende por pródigo?
da responsabilidade civil, pode
Segundo Clóvis Beviláqua, pródigo é
significar restituição ou reparação
aquele que desordenadamente gasta o
integral do dano. O benefício de
seu patrimônio, podendo reduzir-se à
restituição é um instituto clássico de
miséria. Em geral, decorre de um
Parte Geral de Direito Civil. Lembra
transtorno de personalidade, uma
Clóvis Beviláqua, em sua obra “Theoria
compulsão. Nos termos do art. 1782,
Geral do Direito Civil”, que este
por conta da sua relativa incapacidade,
benefício era concedido aos menores
poderá ser nomeado um curador ao
incapazes, a fim de que pudessem
pródigo, que irá assisti-lo apenas em
invalidar um ato perfeitamente
atos de conteúdo patrimonial. Vale
praticado alegando simples prejuízo.
acrescentar ainda, que o pródigo tem
Segundo esse jurista, esse benefício
liberdade para casar, de maneira que o
violaria o direito adquirido prejudicando
seu curador apenas deverá se manifestar
a circulação de bens.
quanto ao regime de bens escolhido.
O CC/1916, em seu art. 8º,
O processo de
expressamente proibia o benefício de
constitucionalização do Direito Civil
restituição. O CC/2002 é silente. Mas o
resultou no reconhecimento de que a
melhor entendimento é no sentido de
pessoa, e não o patrimônio, está no
que a proibição persiste, à luz do
epicentro do sistema normativo
princípio da boa-fé objetiva.
brasileiro. Nessa perspectiva, à luz do
Obs.: cf. no material de apoio,
princípio da dignidade da pessoa
apostila 01, os comentários ao art. 119
humana, o professor Luiz Édson Fachin
do CC.
elaborou a tese “Estatuto Jurídico do
5
para a definição da capacidade civil aos
3. Efeitos da redução da maioridade 18 anos não altera o disposto no art. 16,
I, da Lei n. 8.213/91, que regula
O art. 5º do CC estabelece que a específica situação de dependência
maioridade é atingida aos 18 anos econômica para fins previdenciários e
completos. outras situações similares de proteção,
Segundo Washington de Barros previstas em legislação especial.”
Monteiro, a maioridade é alcançada no
primeiro instante do dia do aniversário. 4. Emancipação
O mesmo autor afirma que ignorada a É instituto presente em diversos
data de nascimento, deverá ser feito sistemas no mundo a exemplo do que se
exame médico para a verificação da lê no art. 133 do CC de Portugal. A
maioridade e, havendo dúvida, pender- emancipação opera a antecipação da
se à pela capacidade (“in dubio pro capacidade plena podendo, em termos
capacitate”). classificatórios, ser:
A redução da capacidade civil dos i) voluntária (CC, 5º, p. ú, I,
21 para os 18 anos, causou acentuada primeira parte) – a emancipação
polêmica especialmente no âmbito dos voluntária é a concedida por ato dos
alimentos. pais, ou um deles na falta do outro,
A Jurisprudência do STJ já se mediante instrumento público, em
consolidou (REsp 347010/SP; REsp caráter irrevogável e independentemente
442502/SP; HC 55606/SP; STJ, 358), de homologação judicial, se o menor
no sentido de que o alcance da tiver ao menos dezesseis anos
maioridade não implica cancelamento completos; o menor deve participar do
automático da pensão. ato emancipatório, não para autorizar os
A título de complementação de pais, mas para que, dele tomando
pesquisa, vale lembrar que, conforme ciência, surta efeitos em sua esfera
parâmetro geral da jurisprudência, a jurídica.
pensão alimentícia é paga até a A doutrina (ver “A
conclusão dos estudos. responsabilidade dos pais pelos filhos
Contudo, a obrigatoriedade de menores” de Silvio Venosa), bem como
pagar pensão, nos termos do REsp a própria jurisprudência (REsp
1312706/AL, não alcança os estudos de 122573/PR, AgRg no Ag 1239557/RJ),
pós-graduação. apontam no sentido de que em caso de
Finalmente, o mesmo Tribunal emancipação voluntária, os pais
tem defendido a tese dos alimentos continuam solidariamente responsáveis
transitórios (REsp 1.388.955/RS), pelos ilícitos cometidos pelos filhos
segundo a qual os alimentos entre ex menores emancipados até que
cônjuges ou ex companheiros em que o completem 18 anos de idade.
credor tenha saúde e aptidão para o ii) judicial (CC, 5º, p. ú, I,
trabalho são temporários. segunda parte – é aquela concedida pelo
A redução da maioridade civil juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver
interferiu no âmbito previdenciário? dezesseis anos completos; ou
Segundo forte entendimento iii) legal (CC, 5º, II a V) – as
doutrinário, as normas previdenciárias hipóteses previstas nos incisos II a V
são especiais, de maneira que um são de emancipação por força de lei:
eventual auxilio ou benefício deve ser a) Casamento – ainda que o
pago até o limite previdenciário menor emancipado venha a se divorciar
estabelecido. ou separar, a emancipação persiste, uma
vez tais atos dissolutórios têm efeitos ex
“I Jornada de Direito Civil - nunc. Todavia, seguindo a melhor
Enunciado 3. A redução do limite etário
6
doutrina (Tartuce, Simão, Zeno Veloso) cláusulas gerais. Sobre o tema, ver as
em caso de invalidação do casamento, obras de Judith Martins-Costa.
uma vez que os efeitos da sentença se Economia própria é um conceito aberto
projetam ex tunc, é razoável concluir, ou indeterminado que será preenchido
salvo caso de putatividade, que o ato pelo juiz de acordo com as
emancipatório perde efeitos. circunstâncias do caso concreto.
Veremos nas aulas de família, a Observação: o prof. Miguel Reale
excepcional hipótese de casamento Lembra (cf. parte final da apostila 01)
abaixo dos 16 anos (CC, 1520). que o CC/2002 é informado por três
b) exercício do emprego público princípios: o da operabilidade (aquele
efetivo – também, nos termos do inciso que orienta a codificação no sentido da
III, a emancipação pode decorrer do abertura de suas normas para melhor
exercício do emprego público efetivo. aplicação ao caso concreto); o da
Mas a expressão “emprego” deve ser socialidade (que projeta a função social
lido como “cargo” ou “função”. no CC); e o da eticidade (que projeta a
Segundo MHD, em seu “Curso de boa-fé no CC).
Direito Civil Brasileiro”, não haverá
emancipação em face de quem exerça “Art. 5º A menoridade cessa aos
mera função de confiança ou de quem dezoito anos completos, quando a pessoa
fica habilitada à prática de todos os atos
celebra contrato temporário com a da vida civil.
Administração Pública. Parágrafo único. Cessará, para os
c) colação de grau em curso de menores, a incapacidade:
ensino superior – a emancipação ainda I - pela concessão dos pais, ou de
deriva, nos termos do inciso IV, da um deles na falta do outro, mediante
instrumento público, independentemente
colação de Grau em curso de ensino de homologação judicial, ou por sentença
superior. Note-se que não é a aprovação do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver
em vestibular, mas a colação de grau dezesseis anos completos;
que emancipa. II - pelo casamento;
d) pelo estabelecimento civil ou III - pelo exercício de emprego
público efetivo;
comercial, ou pela existência de relação IV - pela colação de grau em
de emprego, desde que, em função curso de ensino superior;
deles, o menor com dezesseis anos V - pelo estabelecimento civil ou
completos tenha economia própria – comercial, ou pela existência de relação
finalmente, a emancipação poderá de emprego, desde que, em função deles,
o menor com dezesseis anos completos
decorrer do estabelecimento civil ou
tenha economia própria.”
estabelecimento comercial ou da relação
de emprego desde que o menor com Questões especiais envolvendo a
dezesseis anos completos tenha emancipação:
economia própria. 1) o menor emancipado que
Em nosso sentir, a perda do exerça atividade empresarial, na forma
emprego, ou o fim do estabelecimento da Lei de Falências, poderá falir.
civil ou comercial, não deve resultar no Eventual ilícito penal praticado deve ser
retorno à incapacidade, sob pena de tratado como ato infracional, na forma
insegurança jurídica. do ECA. Ver Paulo Henrique Sumariva
O que se entende por economia (“A lei de falências e inimputabilidade
própria? Como se sabe, o CC/2002 é um penal”). Vale lembrar que a
sistema aberto de normas, na emancipação não antecipa a capacidade
perspectiva do princípio da penal;
operabilidade (Miguel Reale) permeado 2) emancipação e alimentos – O
por inúmeros conceitos abertos e emancipado, assim como se dá com o
7
maior de 18 anos, pode não perder o testemunhas se não houver o
direito aos alimentos, de acordo com as profissional (art. 77 e seguintes).
circunstâncias do caso concreto (AC Morte presumida. O CC
7001.142.9321/TJRS); estabelece situações de morte
3) emancipação e união estável – presumida, nos casos de ausência (art.
segundo a letra da Lei, o casamento 6º, 2º parte) e 22 e seguintes, e nas
emancipa e não a união estável. Mas, a hipóteses do art. 7º do CC (sem
questão comporta discussão na doutrina decretação de ausência).
(ver Thiago Simões: “A emancipação “Art. 6º A existência da pessoa
decorrente da união estável: uma natural termina com a morte; presume-se
esta, quanto aos ausentes, nos casos em
possibilidade jurídica”); que a lei autoriza a abertura de sucessão
4) emancipação e Código de definitiva.
Transito – o emancipado não pode obter Art. 7º Pode ser declarada a morte
a carteira de habilitação, uma vez que o presumida, sem decretação de ausência:
inc. I do art. 140 do CTB exige que a I - se for extremamente provável a
morte de quem estava em perigo de vida;
pessoa seja penalmente imputável. II - se alguém, desaparecido em
5) emancipação e prisão civil - campanha ou feito prisioneiro, não for
embora não tenha capacidade penal encontrado até dois anos após o término
admite-se a prisão civil do menor da guerra.
emancipado por débito alimentar. Isso Parágrafo único. A declaração da
morte presumida, nesses casos, somente
porque não se trata de uma prisão poderá ser requerida depois de esgotadas
criminal, mais de um meio coercitivo de as buscas e averiguações, devendo a
cumprimento da obrigação. Nessa linha, sentença fixar a data provável do
Otávio de Oliveira Pinto sustenta a falecimento.”
possibilidade de prisão civil, temperada Quanto à ausência recomenda-se
por um regime diferenciado, a exemplo fundamentalmente a leitura dos artigos
da prisão domiciliar (“A prisão civil do 22 e seguintes do CC; cf. também texto
menor emancipado devedor de complementar especial na área do
alimentos” Ed. Virtual Books). aluno. Essencialmente a ausência é um
procedimento. Em concursos, o que cai
Material de Apoio _ Direito Civil_ em geralmente é o texto da Lei.
Pablo Stolze_ Aula 03.pdf Conceitualmente, a ausência
Material do Professor - Direito Civil - ocorre quando a pessoa desaparece do
Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (3).pdf seu domicílio, sem deixar notícia ou
Material do Professor - Direito Civil - representante.
Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (4).pdf No momento em que é aberta a
5. Extinção da pessoa física sucessão definitiva dos bens do ausente
Nos termos do art. 6º do CC, a ele é considerado morto por presunção.
morte marca o fim da pessoa física ou Vale lembrar ainda, que o
natural. CPC/2015 refere-se à ausência nos
O Conselho Federal de Medicina artigos 744 e 745, valendo também
por meio das resoluções 1826/2007 e anotar que a sentença de ausência não é
1480/1997, dispõe a respeito do marco registrada no livro de óbitos, mas em
final da existência humana, livro especial, no cartório do domicílio
estabelecendo que “a morte encefálica anterior do ausente (LRP, art. 94).
equivale à morte clínica”. Também pode haver morte
A Lei de Registros Públicos (Lei presumida, sem decretação de ausência,
n. 6015/73), dispõe que a morte deverá nos termos do art. 7º do CC.
ser atestada por médico ou, Nas hipóteses ai previstas,
excepcionalmente, por duas existem contundentes indícios ou provas
8
de que a morte aconteceu, embora o tratamento ou cuidado médico, na fase
corpo não haja sido encontrado. mais avançada da sua doença
Nas hipóteses do art. 7º, deve-se Em provas, só aplica-se a
instaurar um procedimento de comoriência se a questão der a ordem
justificação, a ser devidamente dos óbitos.
instruído, cuja sentença que declarar o *****
óbito deve ser registrada no próprio
livro de óbitos (livro “C”), cf. opinião PESSOA JURÍDICA
de Luis Ramon Alvares.
1. Introdução
6. Comoriência Orlando Gomes, em sua obra
O que é comoriência? “Introdução ao Direito Civil”, pondera
Inicialmente não devo confundir que a categoria da pessoa jurídica
comoriência com a premoriência, que (outrora denominada por Teixeira de
significa pré-morte. Freitas “ente de existência ideal”),
Comoriência significa morte decorreu da necessidade de se
simultânea. Nos termos do art. 8º do personificar grupos sociais para que
CC, não se podendo identificar a participassem melhor do comércio
sequência cronológica dos óbitos, jurídico. Em outras palavras, o conceito
aplica-se a presunção da comoriência, básico de pessoa jurídica decorreu do
no sentido de que os comorientes teriam fato associativo.
morrido ao mesmo tempo. Se isso Com efeito, respeitando a sua
ocorrer, abrem-se cadeias sucessórias origem sociológica, podemos definir
autônomas e distintas (um comoriente pessoa jurídica, a exemplo das
nada herda do outro). sociedades e das associações, como um
“Art. 8º Se dois ou mais grupo humano personificado, criado na
indivíduos falecerem na mesma ocasião, forma da lei, para realização de fins
não se podendo averiguar se algum dos
comorientes precedeu aos outros,
comuns.
presumir-se-ão simultaneamente Complementando esta noção, nos
mortos.” dias de hoje, diante da complexidade
Observação: Os comorientes não das relações sociais, surgem outras
precisam estar no mesmo local! A Lei pessoas jurídicas de estrutura peculiar
se refere apenas ao momento, pela das fundações e das EIRELI (empresas
expressão “ocasião”. Em geral, é no individuais de responsabilidade
mesmo lugar, mas não sempre. Dito de limitada).
outra forma, em geral, os comorientes
estão no mesmo lugar (v. g., mesmo 2. Teorias explicativas
avião). Mas podem não estar, uma vez Existem diversas teorias
que o art. 8º se refere à mesma ocasião. explicativas da natureza jurídica da
Observação 2: temas como pessoa jurídica: lógico-formal (Kelsen)
eutanásia, ortotanásia, aborto, e da teoria institucionalista (Hauriou).
testamento vital são vistos em outras Fundamentalmente, as correntes
grades do curso. doutrinárias que reputamos mais
Quanto ao testamento vital, a sua importantes são as seguintes: a) corrente
disciplina é feita pela Resolução n. negativista (BRINZ, BEKKER,
1995/2012 do CFM. É uma ato jurídico PLANIOL); e b) a corrente
expressão da dignidade da pessoa afirmativista.
humana, pelo qual o paciente emite uma A corrente negativista negava a
declaração de vontade antecipada no existência e a autonomia da pessoa
sentido de não querer determinado jurídica, reconhecendo-a como um
9
simples patrimônio coletivo, ou um Parágrafo único. Decai em três
mero grupo de pessoas. anos o direito de anular a constituição
das pessoas jurídicas de direito privado,
Prevaleceu, no entanto, a corrente por defeito do ato respectivo, contado o
afirmativista, que admitia a existência prazo da publicação de sua inscrição no
da pessoa jurídica. registro.”
Dentro da corrente afirmativista Obs.: caso não haja o registro,
há apenas três teorias fundamentais: estaremos diante de um ente
teoria da ficção (WINDSCHEID; despersonificado (art. 986),
SAVIGNY); teoria da realidade objetiva tradicionalmente tratado como
(Lacerda de Almeida, Clóvis sociedade irregular ou de fato
Beviláqua); teoria da realidade técnica (Waldemar Ferreira), tema do Direito
(FERRARA). Empresarial.
Para a teoria da ficção, a pessoa Em geral, o registro do ato
jurídica teria uma mera existência constitutivo é feito no CRPJ (cartório de
abstrata ou ideal, fruto da técnica pura registros de pessoas jurídicas) ou na
do direito, sem uma realidade objetiva Junta Comercial.
ou social. Excepcionalmente, nos termos da
A segunda teoria, por sua vez, segunda parte do art. 45 (cf. acima), a
reconhece a pessoa jurídica como um pessoa jurídica necessita de um
organismo social vivo, embora negue a autorização ou aprovação especial do
importância da técnica do Direito em Poder Executivo. Não é a regra. É o
sua formação. É uma teoria influenciada caso dos bancos ou das seguradoras,
pelo organicismo sociológico. Ela cai que necessitam de autorização da
no exagero oposto ao da teoria da SUSEP - superintendência de seguros
ficção, negando a importância da privados.
técnica do Direito. O que são os entes
Sem dúvida, a terceira teoria, da despersonificados? Trata-se, segundo a
realidade técnica, é a mais equilibrada. teoria geral do Direito Civil, nos termos
Em nosso sentir, é a teoria adotada pelo do art. 45 do Código, de entes que,
Direito Brasileiro. Segundo ela, a embora não sejam tecnicamente pessoas
pessoa jurídica teria existência e atuação jurídicas, têm capacidade processual
objetiva e social, embora a sua (art. 12, CPC/73; art. 75 CPC/2015). É
personalidade fosse conferida pela o caso do espólio, do condomínio, da
técnica do direito. herança jacente. Segundo MHD, seriam
Em que momento a pessoa grupos despersonalizados ou com
jurídica adquire personalidade? personificação anômala.
Diferentemente da pessoa física, o Quanto ao condomínio, é forte a
registro da pessoa jurídica é constitutivo doutrina no sentido de que se trata de
de sua personalidade, cf. art. 45 do CC. um ente despersonificado, embora tenha
Isso porque, segundo a expressa e CNPJ, por ficção tributária, o que é
literal dicção do art. 45 do CC, “começa reforçado pelo antigo PL 80/2011.
a existência legal” da pessoa jurídica a Questão de concurso: o que é
partir do registro do seu ato constitutivo corporação de mão morta? Tema
“Art. 45. Começa a existência estudado por “José Antônio Ávila”. O
legal das pessoas jurídicas de direito CC/1916 fazia referência a elas. Trata-
privado com a inscrição do ato
constitutivo no respectivo registro, se daquelas corporações que conservam
precedida, quando necessário, de perpetuamente os seus bens, isentos de
autorização ou aprovação do Poder encargos, e sem a obrigação de aliena-
Executivo, averbando-se no registro los, como as Igrejas e os Mosteiros,
todas as alterações por que passar o ato Santas Casas de Misericóridas etc.
constitutivo.
10
expulsão de um condômino? Já existe
3. Espécies básicas de pessoas jurídicas fundamento jurídico e jurisprudência
de direito privado nesse sentido.
O art. 44 do CC, em um rol não
exaustivo, dispõe sobre as pessoas
jurídicas de direito privado. Material de Apoio _ Direito
Aqui, trataremos das espécies Civil_ Pablo Stolze_ Aula 04.pdf
mais importantes, respeitados os limites O art. 57 do CC trata da expulsão
do Direito Empresarial: associações, do associado, e não do condômino. Em
fundações e sociedades. situações excepcionais, uma parcela da
Obs.: na apostila parte geral 02, doutrina (JDC, 508: “Verificando-se
ver o item 8, a respeito do art. 2031 do que a sanção pecuniária mostrou-se
CC. ineficaz, a garantia fundamental da
função social da propriedade (arts. 5º,
3.1. Associações XXIII, da CRFB e 1.228, § 1º, do CC) e
Conceito. As associações, a vedação ao abuso do direito (arts.
espécies de pessoas jurídicas de Direito 187 e 1.228, § 2º, do CC) justificam a
Privado, são formadas pela união de exclusão do condômino antissocial,
indivíduos para realização de fins não desde que a ulterior assembleia
econômicos (art. 53 do CC). prevista na parte final do parágrafo
Toda associação deve ter único do art. 1.337 do Código Civil
finalidade não econômica ou ideal. delibere a propositura de ação judicial
O ato constitutivo de uma com esse fim, asseguradas todas as
associação é seu estatuto (art. 54), que garantias inerentes ao devido processo
deve ser levado ao CRPJ. O órgão legal.”), como reflexo na jurisprudência
máximo de uma associação é sua (AC 957743-1 TJPR), à luz do princípio
assembleia geral, cujas atribuições estão da função social, admite a expulsão de
explicitadas no art. 59 do CC. um condômino, mediante ação judicial
Nos termos do art. 55, em uma que lhe imponha uma obrigação de não
associação, pode haver categorias fazer (não morar).
diferentes de associados, mas dentro de
cada categoria, não pode haver 3.2. Fundações
discriminação. Obs.: regra geral, à luz As fundações de direito privado
do art. 61, dissolvida uma associação, o resultam não da união de indivíduos,
seu patrimônio será atribuído a mas de um patrimônio que se
entidades de fins não econômicos personifica para realização de uma
designadas no estatuto, ou, omisso este, finalidade ideal (ponto em comum com
a instituição municipal estadual ou a associação), nos termos do art. 62 do
federal, de fins iguais ou semelhantes. CC.
Cf. art. 57 do CC, admite-se, “CAPÍTULO III
havendo justa causa, respeitado o DAS FUNDAÇÕES
Art. 62. Para criar uma fundação,
contraditório, a expulsão do associado. o seu instituidor fará, por escritura
“Art. 57. A exclusão do associado pública ou testamento, dotação especial
só é admissível havendo justa causa, de bens livres, especificando o fim a que
assim reconhecida em procedimento que se destina, e declarando, se quiser, a
assegure direito de defesa e de recurso, maneira de administrá-la.
nos termos previstos no estatuto. Parágrafo único. A fundação
(Redação dada pela Lei nº 11.127, de somente poderá constituir-se para fins
2005)” religiosos, morais, culturais ou de
Nessa linha de pensamento, é assistência.
juridicamente possível, também, a Parágrafo único. A fundação
somente poderá constituir-se para fins
11
de: (Redação dada pela Lei nº CPC/2015, segundo o qual o juiz
13.151, de 2015) decidirá quando houver dúvida quanto
I – assistência social;
(Incluído pela Lei nº 13.151, de 2015)
ao estatuto elaborado pelo MP;
II – cultura, defesa e conservação e) por fim, o registro do cartório
do patrimônio histórico e artístico; de registro de pessoas jurídicas
(Incluído pela Lei nº 13.151, de 2015) O art. 66 do CC, alterado pela Lei
III – educação; (Incluído pela n. 13151/2015, deixa claro a precípua
Lei nº 13.151, de 2015)
IV – saúde; (Incluído pela Lei
função fiscalizatória do MP em face das
nº 13.151, de 2015) fundações privadas.
V – segurança alimentar e “Art. 66. Velará pelas fundações o
nutricional; (Incluído pela Lei nº Ministério Público do Estado onde
13.151, de 2015) situadas.
VI – defesa, preservação e § 1º Se funcionarem no Distrito
conservação do meio ambiente e Federal, ou em Território, caberá o
promoção do desenvolvimento encargo ao Ministério Público Federal.
sustentável; (Incluído pela Lei nº (Vide ADIN nº 2.794-8)
13.151, de 2015) § 1º Se funcionarem no Distrito
VII – pesquisa científica, Federal ou em Território, caberá o
desenvolvimento de tecnologias encargo ao Ministério Público do Distrito
alternativas, modernização de sistemas Federal e Territórios. (Redação dada
de gestão, produção e divulgação de pela Lei nº 13.151, de 2015)
informações e conhecimentos técnicos e § 2º Se estenderem a atividade por
científicos; (Incluído pela Lei nº mais de um Estado, caberá o encargo, em
13.151, de 2015) cada um deles, ao respectivo Ministério
VIII – promoção da ética, da Público.”
cidadania, da democracia e dos direitos De acordo com esse dispositivo, a
humanos; (Incluído pela Lei nº função fiscalizatória primária das
13.151, de 2015) fundações privadas é do Ministério
IX – atividades religiosas; e
(Incluído pela Lei nº 13.151, de 2015)
Público estadual ou do MPDFT.
X – (VETADO). (Incluído Em situações especiais e
pela Lei nº 13.151, de 2015)” justificadas, o MPF poderá exercer
Requisitos para a constituição de atividade fiscalizatória, (cf. JDC, 147) a
uma fundação. exemplo de quando há suspeita desvios
a) afetação de bens livres do de recursos originados de convênio com
instituidor; a União.
b) instituição da fundação deve O art. do CC, 67, cuida dos
ser feita por escritura pública ou por requisitos para alteração do estatuto de
testamento; uma fundação. Para que se possa alterar
c) elaboração do estatuto da os estatuto da fundação.
fundação. O estatuto da fundação Nos termos do art. 68, vale
poderá ser elaborado diretamente por acrescentar, a minoria vencida, que
seu criador ou, nos termos do art. 65, discordou da alteração, terá o prazo
por um terceiro, em confiança. Caso decadencial de dez dias para impugnar a
este terceiro não elabore o estatuto, o alteração em juízo.
MP, subsidiariamente, poderá fazê-lo “Art. 67. Para que se possa alterar
o estatuto da fundação é mister que a
(ver “O MP e as Fundações Privadas”
reforma:
de Lincoln de Castro). I - seja deliberada por dois terços
d) aprovação do estatuto. Em dos competentes para gerir e representar
geral, a aprovação do estatuto é feito a fundação;
pelo MP. Caso o próprio MP elabore o II - não contrarie ou desvirtue o
estatuto, nos termos do art. 1.209 do fim desta;
III - seja aprovada pelo órgão do
CPC/1973, caberia ao juiz aprová-lo. Ministério Público, e, caso este a
Melhor é a redação do art. 764 do
12
denegue, poderá o juiz supri-la, a A profunda transformação
requerimento do interessado. experimentada pela teoria da empresa
III – seja aprovada pelo órgão do
Ministério Público no prazo máximo de
ao longo do século XX, dentre outros
45 (quarenta e cinco) dias, findo o qual efeitos, alterou a percepção jurídica do
ou no caso de o Ministério Público a fenômeno societário. E esta influência é
denegar, poderá o juiz supri-la, a percebida em nosso CC (art. 982).
requerimento do interessado. À luz da moderna teoria da
(Redação dada pela Lei nº 13.151, de
2015)
empresa, fonte de inspiração do art. 982
Art. 68. Quando a alteração não do CC, não mais civis ou mercantis, as
houver sido aprovada por votação sociedades hoje são: simples ou
unânime, os administradores da empresárias.
fundação, ao submeterem o estatuto ao Inicialmente, merece referência o
órgão do Ministério Público, requererão
que se dê ciência à minoria vencida para
art. 977 do CC, que trás uma regra
impugná-la, se quiser, em dez dias. peculiar. Nos termos deste dispositivo,
Finalmente, vale lembrar, que o os cônjuges não poderão contratar
art. 69 do CC trata do destino do sociedade, entre si ou com terceiros, se
patrimônio da fundação que acaba. forem casados em comunhão universal
Art. 69. Tornando-se ilícita, ou separação obrigatória de bens.
impossível ou inútil a finalidade a que Vale acrescentar ainda que, nos
visa a fundação, ou vencido o prazo de termos de forte corrente de pensamento
sua existência, o órgão do Ministério
no Brasil (ver parecer jurídico 125/2003
Público, ou qualquer interessado, lhe
promoverá a extinção, incorporando-se o do DNRC, hoje chamado DREI -
seu patrimônio, salvo disposição em Departamento de Registro Empresarial
contrário no ato constitutivo, ou no e Integração), as sociedades entre
estatuto, em outra fundação, designada cônjuges, constituídas antes do
pelo juiz, que se proponha a fim igual ou
CC/2002, não são atingidas pela regra
semelhante.”
do art. 977, à luz da garantia do ato
Delicada questão diz respeito à
jurídico perfeito.
cláusula de reversão dos bens da
Outro interessante aspecto
fundação extinta. Daniel Dias, na obra
introdutório, diz respeito ao p. ú. do art.
“Negócio Fundacional” (editara GEN),
982, segundo o qual por força de Lei,
em posição pioneira e singular, defende
a licitude da cláusula, ou seja, o considera-se empresária a sociedade por
ações, e simples as cooperativas..
instituidor poderá fazer os bens
A cooperativa, tema do Direito
voltarem para si ou para terceiro que ele
Empresarial, nos termos do referido p.
designar (cf. Ap 10529-0/2007 TJBA).
ú., é tratada com sociedade simples, o
que levou parte da doutrina (Julieta
3.3. Sociedades
Lunz; Paulo Rego) que o seu registro
Trata-se de um tema a ser
seria feito no CRPJ. Mas ainda é forte o
desenvolvido na grade de Direito
entendimento segundo o qual o registro
Empresarial, cabendo-nos apresentar
é feito na Junta Comercial (JDC, 69).
uma noção fundamental a respeito do
A diferença entre sociedade
assunto.
simples e empresária é um dos pontos
Diferentemente das associações e
mais profundos e complexos do Direito
fundações, a sociedade é pessoa jurídica
Empresarial, tendo em vista a polêmica
de Direito Privado constituída por meio
em torno do fenômeno da
de contrato social (art. 981), com o
empresarialidade. Em nosso sentir, o
objetivo de exercer atividade econômica
art. 982, concluímos que empresária é a
e partilhar lucro. Vale dizer, nos termos
sociedade que reúnem um elemento
do CC, sociedade tem finalidade
material – exercício de atividade
lucrativa.
13
tipicamente empresarial, aliada a um alterou o estatuto da OAB para admitir
elemento formal – registro na Junta que o advogado possa constituir uma
Comercial. Faltando qualquer um pessoa jurídica unipessoal para o
desses dois requisitos, a sociedade é exercício da advocacia.
simples. Finalmente, temos que a RFB,
Em verdade, a distinção prática aparentemente, mudou entendimento
nem sempre é fácil. Para facilitar a para reconhecer que mesmo a EIRELI
compreensão, acrescentamos que uma simples (v. g., aquela constituída por um
sociedade empresária, com registro na médico) deve ser tributada como pessoa
junta e sujeita a falência é marcada pela jurídica. Cf. Solução de Consulta n. 272
impessoalidade. Vale dizer, na da COSIT de 26-09-2014.
sociedade empresária, seus sócios *****
apenas articulam fatores de produção
(capital, trabalho, tecnologia, matéria Material de Apoio I - Direito Civil -
prima), sem que a figura de cada sócio Flavio Tartuce - Aula 05.pdf
seja pessoalmente indispensável ao Material de Apoio II - Direito Civil -
exercício da atividade (exemplos: Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
bancos, concessionárias). Material de Apoio III - Direito Civil -
Por outro lado, as sociedades Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
simples, registradas no CRPJ (em geral) Material de Apoio IV - Direito Civil -
e com regras próprias de dissolução, é Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
marcada pela pessoalidade, uma vez que Material de Apoio V - Direito Civil -
os próprios sócios pessoalmente Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
realizam a sua atividade a exemplo da
sociedade de médicos, de advogados, DIREITOS DA PERSONALIDADE
etc. (artigos 11 a 21 do Código Civil)
O grande fenômeno com que se
depara hoje o jurista é a transformação 1. Conceito
de uma sociedade simples em Os direitos da personalidade são
empresária. aqueles inerentes à pessoa humana e à
sua dignidade.
3.4. Noções básicas de EIRELI Teoria dos direitos inatos da
Trata-se de instituto típico do pessoa. São direitos originários, teoria
Direito Empresarial. defendida por Rubens Limongi França,
A Lei n. 12441/2011 alterou o Carlos Alberto Bittar e MHD (bem
CC, art. 980-A para consagrar a EIRELI como Tartuce).
(EMPRESA INDIVIDUAL de A pessoa jurídica possui direitos
responsabilidade limitada), pessoa da personalidade não por sua natureza,
jurídica unipessoal, distinta do sujeito mas por equiparação legal (cf. CC, 52).
que a criou, e com responsabilidade “Art. 52. Aplica-se às pessoas
limitada ao seu capital (que deve ser no jurídicas, no que couber, a proteção dos
direitos da personalidade.”
mínimo de 100 salários mínimos). Cf.
Como os danos morais são lesões
ADI 4637.
aos direitos da personalidade, a pessoa
A doutrina tem admitido (João
jurídica pode sofrer dano moral, cf. STJ,
Glicério; Alexandre Gialluca) a
227.
constituição da denominada EIRELI
O CC/2002 tutela os seguintes
simples para o exercício de atividade
direitos da personalidade:
não empresarial, a exemplo daquela
- direito à vida;
constituída por um médico.
- direito à integridade físico-
Recentemente, a Lei n. 13247/2016
psíquica;
14
- direito ao nome; “Art. 8º Ao aplicar o ordenamento
- direito à honra (subjetiva, ou jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e
às exigências do bem comum,
auto estima, e objetiva, ou reputação resguardando e promovendo a dignidade
social); da pessoa humana e observando a
- direito à vida privada, proporcionalidade, a razoabilidade, a
intimidade e segredo; e legalidade, a publicidade e a eficiência.”
- direito à imagem (imagem Segundo Kant (que inspirou a
retrato, ou fisionomia e imagem colocação da dignidade na CRFB e no
atributo, ou repercussão social). CC), a dignidade da pessoa humana é
*Esses direitos foram especialmente aquilo que a pessoa é, como ser
desenvolvidos pela doutrina italiana. racional, considerando-se um fim em si
Obviamente, pessoa jurídica não mesmo. A pessoa humana é sempre fim,
conta com defesa ao direito à vida, à nunca meio. Se a pessoa for meio,
integridade física e psíquica, à honra instrumentalizada, haverá lesão à
subjetiva, vida privada, intimidade, mas dignidade humana).
apenas ao nome, à honra objetiva, ao *Aulas de Michael Sandel, professor de
segredo, bem como à imagem retrato Harvard, no Youtube com legendas em
(como a marca) e imagem atributo. português.
Rubens Limongi França dizia que Viola a dignidade humana:
os direitos da personalidade são os - contrato de prostituição?
direitos de integridade, e utilizava uma - “pessoa-seta”?
classificação tripartida: - contrato de venda de órgãos?
i) direitos de integridade física – - barriga de aluguel (gestação de
direito ao corpo, vivo ou morto; substituição remunerada)?
ii) direitos de integridade moral – Para Kant, as quatro situações
nome, honra, imagem, intimidade etc. violam a dignidade da pessoa humana.
iii) direitos de integridade Existem direitos da personalidade
intelectual – as invenções, criações, que estão previstos na CRFB/88 como
direitos de autor etc. direitos fundamentais, v. g., o direito de
O rol dos direitos da associação.
personalidade do CC/2002 é taxativo Segundo o Professor português
(numerus clausus) ou exemplificativo José de Oliveira Ascensão, trata-se de
(numerus apertus)? Trata-se de rol uma questão de perspectiva, pela qual
exemplificativo, posto que existem os direitos de personalidade estão para o
outros direitos da personalidade. Cf. Direito Civil, assim como os direitos
JDC, 274: “Os direitos da fundamentais estão para o Direito
personalidade, regulados de maneira Constitucional, bem assim como os
não-exaustiva pelo Código Civil, são direitos humanos estão para o Direito
expressões da cláusula geral de tutela Internacional.
da pessoa humana, contida no art. 1º, Ademais, existem direitos da
inc. III, da Constituição (princípio da personalidade que sequer estão escritos,
dignidade da pessoa humana). Em caso a exemplo do direito à opção sexual (cf.
de colisão entre eles, como nenhum REsp 613374/MG, conhecido como
pode sobrelevar os demais, deve-se “Hélio Bicha”) e o direito ao
aplicar a técnica da ponderação.” esquecimento (JDC, 531: “A tutela da
*A técnica da ponderação foi dignidade da pessoa humana na
desenvolvida na Alemanha por Robert sociedade da informação inclui o
Alexy. direito ao esquecimento”).
Cf. ainda o art. 8º do CPC, que é * Quanto a este último, direito ao
um complemento ao art. 5º da LINDB: esquecimento, cf. REsp 1334097/RJ
15
(caso em que a Rede Globo foi - C é a conclusão, com enunciado
condenada por publicar no programa de preferência (e, como quer o
Linha Direta uma história que CPC/2015, fundamentada em critérios
contradizia absolvição no caso da objetivos.
Chacina da Candelária). Ex.: um paciente médico, chega a
**Caso da Xuxa, e seu filme “Amor, um Hospital baleado e de madrugada. O
estranho amor”, quando entrou com médico de plantão ordena a cirurgia de
ação contra a Bandeirantes, que estava emergência e o paciente afirma que, por
prestes a reapresentar o filme. Houve convicções religiosas, não quer se
um acordo e a empresa não mais exibiu submeter à intervenção (Testemunha de
o filme. Jeová), pois não aceita transfusão
CPC, 489: sanguínea. O médico e sua equipe,
“Seção II guiados pelo art. 15 do CC e pelo
Dos Elementos e dos Código de Ética Médica, sedam ao
Efeitos da Sentença
Art. 489. São elementos
paciente e realizam a cirurgia, salvando
essenciais da sentença: a sua vida. Anos após, o paciente
(...) ingressa com ação de indenização por
§ 2º No caso de colisão entre danos morais contra o médico, sua
normas, o juiz deve justificar o objeto e equipe e o hospital. Como juiz, decida.
os critérios gerais da ponderação P1 P2
efetuada, enunciando as razões que
Dignidade Vida Dignidad Direito à
autorizam a interferência na norma
humana e opção
afastada e as premissas fáticas que
humana religiosa
fundamentam a conclusão.
T1 T2 T3 T4
Foi adotada a técnica da Cirurgia Não Vida Ação de
ponderação de Humberto Ávila, de aceita salva indenizaçã
sobre normas de qualquer natureza, e emergênci transfusã o
não a de Robert Alexy – para este a o
último, a ponderação se aplica apenas sanguíne
a
aos direitos fundamentais.
Nesses casos de ação de
Para Robert Alexy, os direitos
indenização, o que se tem entendido que
fundamentais tem a forma de princípios
prevalece o direito à vida.
e seriam mandamentos de otimização.
Ex.2: Caso Daniela Cirelli, que
Os direitos fundamentais, como
estava na praia mantendo relações
princípios e mandamentos de
sexuais com o namorado e foi filmada.
otimização, podem ser aplicados a
Duas demandas: 1) tutela inibitória; 2)
qualquer relação jurídica, inclusive as
responsabilidade civil. A primeira foi
privadas e, nessa realidade, é comum a
julgada procedente, posto que o direito
existência de conflito entre eles.
à intimidade prevalece sobre o direito à
*Ler o artigo do professor em que
informação. Na ação de
debateu com Lenio Streck a validade da
responsabilidade civil, julgou-se
ponderação. Segundo Lenio, a
improcedente, posto que ela assumiu o
ponderação vem sendo utilizada como
risco quando se expôs, prevalecendo o
varinha de Harry Potter ou teoria da
direito à informação sobre à intimidade.
Katachanga real.
Perceba-se: mudou o pedido, mudou o
Fórmula da ponderação:
peso do princípio.
- P1 e P2 são os
Stefano Rodotari (italiano) –a
princípios/direitos fundamentais/normas
pessoa que se exibe profissionalmente
em colisão;
deve ter sua intimidade analisada de
- T1, T2, T3, ..., Tn são os fatores
forma diferente daquela pessoa comum
fáticos;
que, ao contrário, foge da evidência.
16
Os principais casos de ponderação Os direitos da personalidade, em
no STF e STJ envolvem direito à regra, são intrasmissíveis,
intimidade e á imagem (cRFB, 5º, V e irrenunciáveis e indisponíveis. A pesar
X) vs. direito à informação e a liberdade do CC, 11, ab initio se referir aos “casos
de imprensa (art. 5º, IV, IX e XIV da previstos em lei”, casos há em que tais
CRFB). A jurisprudência, características sedem sem previsão
principalmente do STF, tem dado maior legal.
peso à liberdade de imprensa (direito de Entretanto, existe uma parcela dos
informação que, na dúvida, é atribuído direitos da personalidade, relacionada a
maior peso). Exemplo do julgamento aspectos patrimoniais, que é
das biografias não autorizadas. transmissível, renunciável e disponível.
*Enquanto nos países europeus se dá Exemplos: uso da imagem com
maior peso à intimidade e à imagem, fins econômicos; direitos morais do
nos EUA o peso maior é do direito à autor e os respectivos direitos
informação. patrimoniais de autor (Lei n. 9610/98).
JDC, 279: “A proteção à imagem Enunciados das JDC:
deve ser ponderada com outros “I Jornada de Direito Civil -
interesses constitucionalmente Enunciado 4 O exercício dos direitos da
personalidade pode sofrer limitação
tutelados, especialmente em face do voluntária, desde que não seja
direito de amplo acesso à informação e permanente nem geral.”
da liberdade de imprensa. Em caso de Exemplo: contrato de uso vitalício
colisão, levar-se-á em conta a de imagem, no Brasil, é nulo por
notoriedade do retratado e dos fatos ilicitude do objeto. Cf. artigos 11 e 166,
abordados, bem como a veracidade II. Dizem também que é o caso do
destes e, ainda, as características de Ronaldo com Nike.
sua utilização (comercial, informativa, “III Jornada de Direito Civil -
biográfica), privilegiando-se medidas Enunciado 139. Os direitos da
que não restrinjam a divulgação de personalidade podem sofrer limitações,
ainda que não especificamente previstas
informações.” em lei, não podendo ser exercidos com
O último aspecto é denominado abuso de direito de seu titular,
função social da imagem por Tartuce. contrariamente à boa-fé objetiva e aos
*Imagem atual, finalidade da imagem, bons costumes.”
tempo de exposição dentre outros são CC, 187. O exemplo é o abuso na
temas tratados por Anderson Sheraiber. informação ou na veiculação da notícia.
Ver REsp 1195995/SP. Versou Cf. acima caso “Hélio Bicha”.
sobre o direito de não saber (intimidade)
vs. direito à saúde da pessoa e de ii) art. 12 – tutela da
terceiros. personalidade
“Art. 12. Pode-se exigir que [1]
cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da
2. Análise dos artigos do CC personalidade, e [2] reclamar perdas e
relacionados aos direitos da danos, sem prejuízo de outras sanções
personalidade previstas em lei.
i) art. 11 – características dos Parágrafo único. Em se tratando
direitos da personalidade de morto, terá legitimação para requerer
“CAPÍTULO II a medida prevista neste artigo o cônjuge
DOS DIREITOS DA sobrevivente, ou qualquer parente em
PERSONALIDADE linha reta, ou colateral até o quarto grau.”
Art. 11. Com exceção dos casos Em “1”, trata-se do princípio da
previstos em lei, os direitos da prevenção. Cabem medidas de tutela
personalidade são intransmissíveis e específica (ex.: multa diária ou
irrenunciáveis, não podendo o seu astreintes), cf. CPC, 497.
exercício sofrer limitação voluntária.”
17
“Seção IV sobrinhos, primos, tios-avós e sobrinhos-
Do Julgamento das Ações netos].”
Relativas às Prestações de Fazer, de Não “Art. 20.
Fazer e de Entregar Coisa (...)
Parágrafo único. Em se tratando
Art. 497. Na ação que tenha por de morto ou de ausente, são partes
objeto a prestação de fazer ou de não legítimas para requerer essa proteção o
fazer, o juiz, se procedente o pedido, cônjuge, os ascendentes ou os
concederá a tutela específica ou descendentes.”
determinará providências que assegurem Mudaram o art. 12 e esqueceram
a obtenção de tutela pelo resultado de modificar o art. 20. Atenção a esse
prático equivalente.
detalhe em provas, pois pode ser que
Parágrafo único. Para a seja certo incluir o companheiro (a
concessão da tutela específica destinada doutrina inclui companheiro nos dois,
a inibir a prática, a reiteração ou a cf. JDC, 275). No art. 20, p. ú., a
continuação de um ilícito, ou a sua doutrina inclui também os colaterais
remoção, é irrelevante a demonstração da
ocorrência de dano ou da existência de
(por todos (Silmara Chinellato).
culpa ou dolo.” Exemplos: livros biografia de
Em “2” estamos diante do Garrincha e Lampião (“O Mata Sete”).
princípio da reparação integral dos “V Jornada de Direito Civil -
Enunciado 398 - As medidas previstas no
danos, através de ação reparatória de art. 12, parágrafo único, do Código
danos materiais, morais, e estéticos. Cf. Civil podem ser invocadas por qualquer
STJ, 37 (“São cumuláveis as uma das pessoas ali mencionadas de
indenizações por dano material e dano forma concorrente e autônoma.”
moral oriundos do mesmo fato.”) e 387 “V Jornada de Direito Civil -
Enunciado 400 – Os parágrafos únicos
(“É lícita a cumulação das indenizações dos arts. 12 e 20 asseguram
de dano estético e dano moral.”): legitimidade, por direito próprio, aos
“III Jornada de Direito Civil - parentes, cônjuge ou companheiro para
Enunciado 140. A primeira parte do art. a tutela contra lesão perpetrada post
12 do Código Civil refere-se às técnicas mortem.”
de tutela específica, aplicáveis de ofício, Então, são dois lesados indiretos:
enunciadas no art. 461 do Código de
Processo Civil [497 do CPC/2015],
o dano indireto ou dano em ricochete,
devendo ser interpretada com resultado que atinge o morto e repercute no
extensivo.” familiar; e o dano direto, que atinge o
próprio familiar.
Material de Apoio - Direito Civil -
Flávio Tartuce - Aula 06.pdf
O art. 12, p. ú., adotando o iii) art. 13 - tutela da integridade
modelo português, reconhece direitos da físico-psíquica. Direito ao corpo vivo.
personalidade do morto (geral), e deve É defeso o ato de disposição do
ser confrontado com o art. 20, p. ú, que próprio corpo, quando importar
reconhece direito à imagem do morto diminuição permanente da integridade
(específico). Nos dois artigos há física, ou contrariar os bons costumes,
legitimidade dos lesados indiretos, que salvo por exigência médica.
são seus familiares (dano em ricohete) “Art. 13. Salvo por exigência
“Art. 12. médica, é defeso o ato de disposição do
(...) próprio corpo, quando importar
Parágrafo único. Em se tratando diminuição permanente da integridade
de morto, terá legitimação para requerer física, ou contrariar os bons costumes.
a medida prevista neste artigo o cônjuge Parágrafo único. O ato previsto
sobrevivente, ou qualquer parente em neste artigo será admitido para fins de
linha reta [ascentedentes e descentes], ou transplante, na forma estabelecida em lei
colateral até o quarto grau [irmãos, tios, especial.”
18
Obs.: transexualismo (patologia) falecidas para transplantes ou outra
vs. transexualidade (condição). Ainda é finalidade terapêutica, dependerá da
autorização do cônjuge ou parente, maior
tratado como transtorno. Com indicação de idade, obedecida a linha sucessória,
médica é possível a cirurgia de reta ou colateral, até o segundo grau
transgenitalização. Realizada a cirurgia, inclusive, firmada em documento
deve ocorrer a mudança do nome e do subscrito por duas testemunhas presentes
sexo no registro civil (cf. Inf. 411 STJ). à verificação da morte. (Redação dada
pela Lei nº 10.211, de 23.3.2001)
Há tendência de ser passar a ser Parágrafo único. (VETADO)
transexualidade. Este tema encontra-se (Incluído pela Lei nº 10.211, de
com repercussão geral reconhecida no 23.3.2001)”
STF. Qual vontade prevalece, do
“IV Jornada de Direito Civil - doador ou do familiar? Prevalece a
Enunciado 276 – O art. 13 do Código vontade do doador, posto que se trata de
Civil, ao permitir a disposição do próprio
corpo por exigência médica, autoriza as direito personalíssimo:
cirurgias de transgenitalização, em “IV Jornada de Direito Civil -
conformidade com os procedimentos Enunciado 277 – O art. 14 do Código
estabelecidos pelo Conselho Federal de Civil, ao afirmar a validade da
Medicina, e a conseqüente alteração do disposição gratuita do próprio corpo,
prenome e do sexo no Registro Civil.” com objetivo científico ou altruístico,
para depois da morte, determinou que a
Serve para todos os fins jurídicos, manifestação expressa do doador de
como penal (aplicação da Lei Maria da órgãos em vida prevalece sobre a
Penha), trabalhistas, previdenciários. vontade dos familiares, portanto, a
Se o casamento for celebrado e o aplicação do art. 4º da Lei n. 9.434/97
transexual (agora mulher) não revelar ficou restrita à hipótese de silêncio do
potencial doador.”
sua situação anterior, caberá anulação
Quando houver dissenso entre os
por erro? A resposta atual ainda é sim
parentes, a solução provável é a não
(Carlos Roberto Gonçalves; MHD).
doação.
v) direitos do paciente médico
iv) Direito ao corpo morto -
(Art. 15):
disposições post mortem de partes do “Art. 15. Ninguém pode ser
corpo. As disposições post mortem são constrangido a submeter-se, com risco de
possíveis a título gratuito, com os vida, a tratamento médico ou a
objetivos científicos ou de transplantes, intervenção cirúrgica.”
sendo o ato revogável a qualquer tempo. A expressão “risco de vida” é
É proibida a venda de órgãos. jurídica, pois significa risco de morte.
“Art. 14. É válida, com objetivo Cuidado como for cobrado em
científico, ou altruístico, a disposição concursos, pois as duas formas podem
gratuita do próprio corpo, no todo ou em ser consideradas corretas, mas se é
parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de cobrado o texto da lei, deve-se segui-lo
disposição pode ser livremente revogado à risca.
a qualquer tempo.” Esse dispositivo não pode excluir
A matéria também é tratada pela o direito à vida (bem maior), em regra.
Lei n. 9434/1997, pelo princípio do Estão em jogo dois princípios: da
consenso afirmativo: beneficência e da não maleficência (o
“CAPÍTULO II profissional da área da saúde deve fazer
DA DISPOSIÇÃO POST MORTEM DE o bem e não pode fazer o mal).
TECIDOS, ÓRGÃOS E PARTES DO
CORPO HUMANO PARA FINS O problema do “testamento”
DE TRANSPLANTE. biológico ou vital. Código de Ética
(...) Médica:
Art. 4º A retirada de tecidos, “Capítulo V
órgãos e partes do corpo de pessoas RELAÇÃO COM PACIENTES
19
E FAMILIARES 2) sobrenome, patronímico ou
É vedado ao médico: nome de família, que também pode ser
(...)
Art. 41. Abreviar a vida do
simples ou composto;
paciente, ainda que a pedido deste ou de 3) partículas (de, dos, da...);
seu representante legal. 4) agnome (expressão de
Parágrafo único. Nos casos de manutenção de nome anterior, como
doença incurável e terminal, deve o Júnior, Filho, Neto, Sobrinho,
médico oferecer todos os cuidados
paliativos disponíveis sem empreender
Segundo);
ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis Além desses elementos, o art. 19
ou obstinadas, levando sempre em do CC, bem como na L9610/98, há
consideração a vontade expressa do também proteção do pseudônimo, que é
paciente ou, na sua impossibilidade, a de o nome por trás do qual se esconde o
seu representante legal.”
autor de obra intelectual, cultural ou
Testamento biológico ou vital é
artística (inclui o nome artístico).
uma declaração feita pelo paciente ou
Exemplos: Ricardo Reis, Tiririca, Silvio
seus representantes quais os tratamentos
Santos, Xuxa.
médicos deseja ou não se submeter (ou
Segundo a Lei de Registros
seja, dirigida aos profissionais da área
Públicos (Lei n. 6015/73), o nome, em
de saúde). Representa o direito à morte
regra, é imutável, cf. art. 58. Exceções:
com dignidade.
alteração administrativa; modificação
Essa declaração é admitida
judicial (ação de retificação de registro
também pela Res. CFM 1.995/2012,
civil).
denominada com diretivas antecipadas
Hipóteses de alteração do nome:
de vontade dos pacientes.
a) nome que expõe a pessoa ao
Cf. www.testamentovital.com.br
“V Jornada de Direito Civil -
ridículo, inclusive em caso de
Enunciado 528 – É válida a declaração homonímias (nomes iguais). Exemplo:
de vontade expressa em documento Jacinto Aquino Rego, Sum Tim Am,
autêntico, também chamado "testamento Armando Pinto, Francisco de Assis
vital", em que a pessoa estabelece Pereira (Maníaco do Parque), Valdisnei
disposições sobre o tipo de tratamento
Miquei Donald, Jacinto Pinto Aquino
de saúde, ou não tratamento, que deseja
no caso de se encontrar sem condições Rego.
de manifestar a sua vontade.” b) tradução de nomes
Isso porque é possível a estrangeiros: John – João; Mary –
ortotanásia, que é o não emprego de Maria; Josehp – José; Bill – Guilherme;
técnicas de sobrevivência. Seu contrário c) erro crasso de grafia.
é a distanásia. De qualquer forma não se Exemplos: Frávio, Cráudio, Gredtoni
confunde com a eutanásia. (Gladston);
d) adequação de sexo;
vi) tutela do nome – artigos 16 a e) introdução de alcunhas,
19. O nome é o sinal que representa a cognomes ou apelidos. Ex.: Xuxa.
pessoa na sociedade. Todos os f) casamento, união estável,
elementos do nome estão protegidos: reconhecimento de filho e adoção.
“Art. 16. Toda pessoa tem direito g) proteção de testemunhas (Lei
ao nome, nele compreendidos o prenome 9807/99);
e o sobrenome.
h) inclusão de sobrenome de
(...)
Art. 19. O pseudônimo adotado padrasto ou madrasta por enteado ou
para atividades lícitas goza da proteção enteada havendo justo motivo e
que se dá ao nome.” concordância deste (Lei Clodovil – Lei
1) prenome, ou primeiro nome, n. 11924/2009);
que pode ser simples ou composto;
20
i) inclusão de nome de família Esse artigo tem muitos problemas.
remoto para obtenção de cidadania É necessário traduzi-lo: Em regra, a
estrangeira. Tema não pacífico na utilização da imagem alheia depende da
jurisprudência. autorização do seu titular, com duas
j) casos de abandono afetivo pelo exceções:
pai, retirando-se o seu sobrenome (REsp - administração da Justiça (v. g., a
1.304.718/SP) solução de crimes);
Obs.: lei n. 6015/73, art. 56: - ordem pública.
“Art. 56. O interessado, no Esse artigo, levado à risca,
primeiro ano após ter atingido a conduza à censura. Para que isso não
maioridade civil, poderá, pessoalmente
ou por procurador bastante, alterar o
ocorra, o dispositivo deve ser ponderado
nome, desde que não prejudique os com outros valores constitucionais
apelidos de família, averbando-se a como a liberdade de imprensa e o
alteração que será publicada pela direito à informação. Cf. CRFB, artigos
imprensa. (Renumerado do art. 57, pela 5ª, IV, IX e XIV.
Lei nº 6.216, de 1975).” “Art. 5º
Tem-se entendido que esse prazo (...)
de um ano não se aplica havendo IV - é livre a manifestação do
motivo plausível para modificação, pensamento, sendo vedado o anonimato;
como nos casos de lesão à dignidade (...)
IX - é livre a expressão da
humana, (segundo Tartuce a ação seria atividade intelectual, artística, científica
imprescritível) Cf. REsp 538187/RJ. e de comunicação, independentemente de
Prevenção e reparação integral censura ou licença;
na tutela do nome: artigos 17 e 18. (...)
“Art. 17. O nome da pessoa não XIV - é assegurado a todos o
pode ser empregado por outrem em acesso à informação e resguardado o
publicações ou representações que a sigilo da fonte, quando necessário ao
exponham ao desprezo público, ainda exercício profissional;”
quando não haja intenção difamatória Foi o que fez o STF no
[essa parte sublinhada é irrelevante no julgamento das biografias não
dispositivo]. autorizadas (ADIN 4815), concluindo
Art. 18. Sem autorização, não se
pode usar o nome alheio em propaganda
que não cabe a proibição a priori. A
[na verdade, publicidade. Propaganda é análise é a posteriori da eventual
termo técnico que se refere a responsabilidade civil.
proselitismo político] comercial.” “IV Jornada de Direito Civil -
Enunciado 279 – A proteção à imagem
vii) tutela da imagem – refere-se deve ser ponderada com outros
interesses constitucionalmente tutelados,
tanto à proteção da imagem retrato especialmente em face do direito de
(fisionomia, fotografia) quanto atributo amplo acesso à informação e da
(repercussão social). Essa divisão é liberdade de imprensa. Em caso de
atribuída a Adriano De Cupis. colisão, levar-se-á em conta a
“Art. 20. Salvo se autorizadas, ou notoriedade do retratado e dos fatos
se necessárias à administração da justiça abordados, bem como a veracidade
ou à manutenção da ordem pública, a destes e, ainda, as características de sua
divulgação de escritos, a transmissão da utilização (comercial, informativa,
palavra, ou a publicação, a exposição ou biográfica), privilegiando-se medidas
a utilização da imagem de uma pessoa que não restrinjam a divulgação de
poderão ser proibidas, a seu informações.”
requerimento e sem prejuízo da Atenção: STJ, 403: “Independe de
indenização que couber, se lhe atingirem prova do prejuízo a indenização pela
a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, publicação não autorizada de imagem
ou se se destinarem a fins comerciais.
(Vide ADIN 4815)”
de pessoa com fins econômicos ou
comerciais.” É irrelevante o atentado à
21
honra e à boa fama como consta ao final Em regra, o domicilio da pessoa
do art. 20, pois o uso indevido de natural é o local de sua residência, ou
imagem não autorizada gera dano moral seja, aquele onde ela se estabelece com
presumido (in re ipsa). É o que se ânimo definitivo de permanência.
chama na Itália de “lucro na Considera-se residência onde a
intervenção”. pessoa mantêm seus bens de uso
pessoal, particular, íntimo.
viii) tutela da intimidade, vida “TÍTULO III
privada e segredo (CC, 21) Do Domicílio
“Art. 21. A vida privada da Art. 70. O domicílio da pessoa
pessoa natural é inviolável [CRFB, 5º, natural é o lugar onde ela estabelece a
X], e o juiz, a requerimento do sua residência com ânimo definitivo.”
interessado, adotará as providências A Lei admite a pluralidade dos
necessárias para impedir ou fazer cessar domicílios residenciais:
ato contrário a esta norma. (Vide ADIN “Art. 71. Se, porém, a pessoa
4815)” natural tiver diversas residências, onde,
A vida privada da pessoa natural alternadamente, viva, considerar-se-á
em verdade não é inviolável. A domicílio seu qualquer delas.”
intimidade não é absoluta, devendo ser Existe também o domicílio laboral
ponderada com outros direitos e valores. ou profissional:
“Art. 72. É também domicílio da
Exemplos: raio-X em aeroportos, pessoa natural, quanto às relações
biografias, fiscalização de e-mails concernentes à profissão, o lugar onde
corporativos, fiscalização do local de esta é exercida.
trabalho. Anderson Shreiber. Parágrafo único. Se a pessoa
exercitar profissão em lugares diversos,
cada um deles constituirá domicílio para
Observação. Muitos autores as relações que lhe corresponderem.”
afirmam que os direitos da Perceba-se que também é
personalidade são imprescritíveis admissível a pluralidade de domicílios
(Rubens Limongi França, Francisco profissionais, cf. o p. ú. acima.
Amaral e MHD). Porém, prevalece na Essa é uma diferença do atual CC
doutrina e na jurisprudência a tese com o anterior, posto que no antigo
segundo a qual a ação de reparação de admitia-se apenas um domicílio que, de
danos por lesão à personalidade regra, era o residencial. Agora, temos
prescreve em três anos (CC, art. 206, § dois domicílios, o pessoal e o
3º V; Carlos Roberto Gonçalves, Pablo profissional, sendo essa nossa regra
Stolze e Rodolfo Pamplona; Tartuce atual.
também). Para a pessoa que não tenha
Entretanto, o STJ tem entendido residência fixa (habitual), o local de
que a ação de reparação de danos, no domicílio é o lugar onde for encontrada:
caso de tortura (ditadura) é “Art. 73. Ter-se-á por domicílio
imprescritível. AgRg no REsp da pessoa natural, que não tenha
1480428/RS. residência habitual, o lugar onde for
encontrada.”
Material de Apoio - Direito Civil - Exemplos: nômades (hippies,
Flavio Tartuce - Aula 01 On line.pdf ciganos, circenses). Caixeiro viajante
não é exemplo, tendo em vista que ele
DOMICÍLIO possui vários domicílios.
Classificação do domicílio da
1.Conceito pessoa natural:
a) domicílio voluntário – aquele
1.1. Domicílio da pessoa natural que decorre da autonomia privada, isto
22
é, da intenção manifesta de mudar ou de heterotópicas, pois são de cunho
se estabelecer em um local: material.
“Art. 74. Muda-se o domicílio, “Seção V
transferindo a residência, com a intenção Da Declaração de Incompetência
manifesta de o mudar. Art. 112. Argúi-se, por meio de
Parágrafo único. A prova da exceção, a incompetência relativa.
intenção resultará do que declarar a Parágrafo único. A nulidade da
pessoa às municipalidades dos lugares, cláusula de eleição de foro, em contrato
que deixa, e para onde vai, ou, se tais de adesão, pode ser declarada de ofício
declarações não fizer, da própria pelo juiz, que declinará de competência
mudança, com as circunstâncias que a para o juízo de domicílio do réu.
acompanharem.” (Incluído pela Lei nº 11.280, de 2006)”
b) domicílio legal ou necessário – No CPC/2015 ficou assim:
é aquele imposto pela norma jurídica, “Art. 63. As partes podem
nas hipóteses do art. 76 do Código modificar a competência em razão do
valor e do território, elegendo foro onde
Civil. O domicílio legal não será proposta ação oriunda de direitos e
necessariamente exclui o voluntário. obrigações. [conceito legal]
“Art. 76. Têm domicílio § 1º A eleição de foro só produz
necessário o incapaz, o servidor público, efeito quando constar de instrumento
o militar, o marítimo e o preso. escrito e aludir expressamente a
Parágrafo único. O domicílio do determinado negócio jurídico.
incapaz é o do seu representante ou § 2º O foro contratual obriga os
assistente; o do servidor público, o lugar herdeiros e sucessores das partes.
em que exercer permanentemente suas § 3º Antes da citação, a cláusula
funções; o do militar, onde servir, e, de eleição de foro, se abusiva, pode ser
sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a reputada ineficaz [atenção ao comentário
sede do comando a que se encontrar abaixo] de ofício pelo juiz, que
imediatamente subordinado; o do determinará a remessa dos autos ao juízo
marítimo, onde o navio estiver do foro de domicílio do réu.
matriculado; e o do preso, o lugar em § 4º Citado, incumbe ao réu
que cumprir a sentença.” alegar a abusividade da cláusula de
c) domicílio contratual – fixados eleição de foro na contestação, sob pena
em contratos escritos, para o exercício e de preclusão.”
cumprimento de direitos e obrigações a Ou seja, no § 3º parece ter havido
eles concernentes. Exemplos: local do um retrocesso porque apesar de não
pagamento, da prestação do serviço, da mencionar aplica-se a contratos de
entrega da mercadoria, da entrega do adesão. Inclusive, pelo CDC, será
imóvel, da entrega das chaves, da entra cláusula nula, mas pelo CPC será
da obra e assim sucessivamente. ineficaz.
“Art. 78. Nos contratos escritos,
poderão os contratantes especificar 1.2. Domicílio das pessoas jurídicas de
domicílio onde se exercitem e cumpram direito público e de direito privado
os direitos e obrigações deles “Art. 75. Quanto às pessoas
resultantes.” jurídicas, o domicílio é:
Atenção! Domicílio contratual I - da União, o Distrito
não se confunde com a cláusula de Federal;
eleição de foro. II - dos Estados e Territórios,
No CPC/73, art. 112, havia as respectivas capitais;
III - do Município, o lugar
previsão da nulidade da cláusula de onde funcione a administração
eleição de foro em contrato de adesão municipal [Prefeitura];
com possibilidade de conhecimento de IV - das demais pessoas
ofício. jurídicas, o lugar onde funcionarem as
*Apesar de se tratarem de normas respectivas diretorias e administrações,
ou onde elegerem domicílio especial
constantes do CPC, as regras abaixo são no seu estatuto ou atos constitutivos
23
[domicílio estatutário da pessoa da personalidade jurídica (“disregard of
jurídica]. the legal entity” ou “disregard
§ 1º Tendo a pessoa jurídica
diversos estabelecimentos em lugares
doctrine”, ou ainda “teoria da
diferentes, cada um deles será penetração”).
considerado domicílio para os atos nele Segundo Fábio Ulhoa Coelho,
praticados. [ou seja, há pluralidade de levanta-se o véu da pessoa jurídica.
domicílios também da pessoa jurídica] Também se fala em retirar o escudo da
§ 2º Se a administração, ou
diretoria, tiver a sede no estrangeiro,
pessoa jurídica.
haver-se-á por domicílio da pessoa Segundo MHD, não é mais teoria,
jurídica, no tocante às obrigações pois já está positivado na Lei. Mas nos
contraídas por cada uma das suas concursos ainda é cobrado como “teoria
agências, o lugar do estabelecimento, da desconsideração”.
sito no Brasil, a que ela corresponder.”
[empresa com sede no estrangeiro tem
Não se pode confundir
domicílio no local da filial situada no desconsideração com despersonificação
Brasil] ou despersonalização:
***** Desconsideração da Despersonificação ou
Personalidade (art. despersonalização
50) (art. 51)
A pessoa jurídica não A pessoa jurídica é
é extinta; há apenas extinta (dissolvida).
DESCONSIDERAÇÃO DA uma ampliação de Há apuração do ativo
PERSONALIDADE JURÍDICA responsabilidades. Há e passivo e fim da
quebra da autonomia pessoa jurídica.
da p. j.
“Art. 50. Em caso de abuso da
2. Desconsideração da personalidade personalidade jurídica, caracterizado
jurídica pelo desvio de finalidade, ou pela
A pessoa jurídica é uma realidade confusão patrimonial, pode o juiz
técnica e orgânica e, por isso, não se decidir, a requerimento da parte, ou do
Ministério Público quando lhe couber
confunde com seus membros (sócios e
intervir no processo, que os efeitos de
administradores). Ou seja, há uma certas e determinadas relações de
autonomia da pessoa jurídica frente aos obrigações sejam estendidos aos bens
seus componentes (CC/1916, art. 20; particulares dos administradores ou
CC/2002, art. 45). sócios da pessoa jurídica.
“Art. 45. Começa a existência Art. 51. Nos casos de
legal das pessoas jurídicas de direito dissolução da pessoa jurídica ou
privado com a inscrição do ato cassada a autorização para seu
constitutivo no respectivo registro, funcionamento, ela subsistirá para os
precedida, quando necessário, de fins de liquidação, até que esta se
autorização ou aprovação do Poder conclua.
Executivo [v. g., sociedade seguradora], § 1º Far-se-á, no registro onde a
averbando-se no registro todas as pessoa jurídica estiver inscrita, a
alterações por que passar o ato averbação de sua dissolução.
constitutivo. § 2º As disposições para a
Parágrafo único. Decai em três liquidação das sociedades aplicam-se,
anos o direito de anular a constituição no que couber, às demais pessoas
das pessoas jurídicas de direito privado, jurídicas de direito privado.
por defeito do ato respectivo, contado o § 3º Encerrada a liquidação,
prazo da publicação de sua inscrição no promover-se-á o cancelamento da
registro.” inscrição da pessoa jurídica.”
Porém, diante de abusos Duas são as modalidades de
praticados por sócios e administradores desconsideração da personalidade
da pessoa jurídica surgiu, no Direito jurídica:
Comparado, uma teoria que quebra essa a) direta ou regular – é a prevista
autonomia, a teoria da desconsideração no CC, 50 e CDC, 28, em que bens dos
24
sócios ou administradores respondem Observações:
por dívidas da p. j.; 1) JDC, 281 – “A aplicação da
b) indireta, inversa ou invertida – teoria da desconsideração, descrita no
já era tratada pela doutrina e art. 50 do Código Civil, prescinde da
jurisprudência e encampada pelo demonstração de insolvência da pessoa
CPC/2015: bens da pessoa jurídica jurídica.”
respondem por dívidas dos sócios ou 2) JDC, 284 – “As pessoas
administradores. Cf. Rolf Madaleno, jurídicas de direito privado sem fins
JDC, 283, e decisões do próprio STJ lucrativos ou de fins não-econômicos
(Inf. 440), bem como o CPC, 133, § 2º: estão abrangidas no conceito de abuso
“IV Jornada de Direito Civil - da personalidade jurídica.” Cabe
Enunciado 283. É cabível a desconsideração inclusive de EIRELI.
desconsideração da personalidade
jurídica denominada "inversa" para
Qualquer pessoa jurídica, inclusive S/A,
alcançar bens de sócio que se valeu da associações, fundações podem ter a
pessoa jurídica para ocultar ou desviar desconsideração da pessoa jurídica.
bens pessoais, com prejuízo a terceiros.” JDC, 469 – “A empresa individual
“Teorias” da desconsideração, de responsabilidade limitada (EIRELI)
aplicadas às duas modalidades acima: não é sociedade, mas novo ente jurídico
a) teoria maior – adotada pelo CC, personificado.”
art. 50. Decorre do abuso da 3) JDC, 285 – “A teoria da
personalidade jurídica, pelo desvio de desconsideração, prevista no art. 50 do
finalidade, ou confusão patrimonial, Código Civil, pode ser invocada pela
aliados a um prejuízo ao credor. pessoa jurídica, em seu favor.”. Assim,
Aplicando a teoria maior, JDC, a pessoa jurídica pode pleitear a
282: “O encerramento irregular das desconsideração em relação a outra p. j.,
atividades da pessoa jurídica, por si só, bem como a sua própria
não basta para caracterizar abuso da desconsideração para atingir um de seus
personalidade jurídica.”. Também sócios.
entendimento do STJ no repetitivo 4) Em regra, a desconsideração
AgRg no REsp 1306553/SC: ou seja, o ocorre em ação judicial, mediante
mero encerramento irregular das pedido do MP ou do interessado.
atividades não basta para a aplicação da Porém, como exceção, a lei
teoria maior. anticorrupção (Lei n. 12846/2013)
Cuidado: em execução fiscal o criou uma modalidade de
entendimento é justamente o desconsideração administrativa, sem
contrário. ação judicial (art. 14), cf. inclusive já
b) teoria menor – supostamente pode decidir o STF, Inf. 732:
foi adotada pelo art. 28, § 5º do CDC e “Art. 14. A personalidade
também na Lei n. 9605/98, art. 4º jurídica poderá ser desconsiderada
(danos ambientais). Basta o prejuízo ao sempre que utilizada com abuso do
direito para facilitar, encobrir ou
credor. dissimular a prática dos atos ilícitos
O julgado paradigma é o RESp previstos nesta Lei ou para provocar
279273/SP, do caso da explosão do confusão patrimonial, sendo estendidos
Shopping Center Osasco. todos os efeitos das sanções aplicadas à
Curiosidade quanto ao CDC, 28. pessoa jurídica aos seus administradores
e sócios com poderes de administração,
No caput trata da teoria maior, e no § 5º observados o contraditório e a ampla
a teoria menor. Quando pesquisamos o defesa.”
veto ao § 1º percebemos que o veto Interessante que adota a teoria
deveria ter também arrastado o § 5º. maior.
Como as leis são feitas no Brasil...
25
5) o CPC/2015 criou um novo Cf. art. 1062 a desconsideração é
incidente de desconsideração da cabível também nos JECív.
personalidade jurídica, com *****
contraditório, afastando, em tese, a
desconsideração de ofício (artigos 133 a
137).
“CAPÍTULO IV PRINCIPAIS MODALIDADES
DO INCIDENTE DE DE BENS
DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA
Art. 133. O incidente de
desconsideração da personalidade 3. Dos Bens. Objeto do direito
jurídica será instaurado a pedido da parte 3.1. Introdução. Bens vs. coisas
ou do Ministério Público, quando lhe Sempre houve divergência sobre o
couber intervir no processo.
§ 1º O pedido de desconsideração
significado de cada uma dessas
da personalidade jurídica observará os expressões, bens e coisas. Para CMSP,
pressupostos previstos em lei. bem é gênero e coisa espécie (bem tudo
§ 2º Aplica-se o disposto neste que me agrada; coisa bens corpóreos).
Capítulo à hipótese de desconsideração O CC não adotou a ideia de Caio
inversa da personalidade jurídica.
Art. 134. O incidente de
Mário da Silva Pereira. Na parte geral, o
desconsideração é cabível em todas as CC adotou coisa para gênero de tudo
fases do processo de conhecimento, no que não é humano (casa, carro,
cumprimento de sentença e na execução dinheiro, animais, etc.). Já a expressão
fundada em título executivo bem é espécie, a coisa com interesse
extrajudicial.
jurídico e ou econômico.
§ 1º A instauração do incidente
será imediatamente comunicada ao Patrimônio. É a soma de bens
distribuidor para as anotações devidas. corpóreos e incorpóreos da pessoa que
§ 2º Dispensa-se a instauração do tenham valor econômico. Exemplos:
incidente se a desconsideração da imóveis, veículos, dinheiro,
personalidade jurídica for requerida na
conhecimento, experiência, dotes
petição inicial, hipótese em que será
citado o sócio ou a pessoa jurídica. físicos.
§ 3º A instauração do incidente Tese do “estatuto jurídico do
suspenderá o processo, salvo na hipótese patrimônio mínimo.” Luiz Edson
do § 2º. Fachin. Deve-se assegurar à pessoa um
§ 4º O requerimento deve mínimo de direitos patrimoniais para
demonstrar o preenchimento dos
pressupostos legais específicos para que viva com dignidade (personalização
desconsideração da personalidade do patrimônio e do Direito Civil), com a
jurídica. valorização dos direitos existenciais. É
Art. 135. Instaurado o incidente, uma expressão do mínimo existencial
o sócio ou a pessoa jurídica será citado estudado em Direito Constitucional.
para manifestar-se e requerer as provas
cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias. Exemplos: 1) STJ, 364: é bem de
Art. 136. Concluída a instrução, família, portanto impenhorável, o
se necessária, o incidente será resolvido imóvel onde reside pessoa solteira,
por decisão interlocutória. tendo em vista que o fim social da Lei
Parágrafo único. Se a decisão for do Bem de Família (Lei n. 8009/90) é a
proferida pelo relator, cabe agravo
interno. proteção da pessoa e do direito à
Art. 137. Acolhido o pedido de moradia, e não do patrimônio; 2) CC,
desconsideração, a alienação ou a 548: nulidade da doação universal de
oneração de bens, havida em fraude de todos os bens sem a reserva do mínimo
execução, será ineficaz em relação ao para a sobrevivência do doador (“o
requerente.”
Direito não aceita o ato Franciscano”).
26
Deve reservar o usufruto, alimentos, direitos reais sobre imóveis (v. g.,
renda ou qualquer instituto que proteja hipoteca) e o direito à sucessão aberta
sua mantença. Cf. também a CRFB, 1º, “Art. 80. Consideram-se imóveis
III; 6º (moradia) e CPC, 8º. para os efeitos legais:
“Art. 8º Ao aplicar o ordenamento I - os direitos reais sobre imóveis
jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e e as ações que os asseguram;
às exigências do bem comum, II - o direito à sucessão aberta.
resguardando e promovendo a dignidade Além disso, há que se considerar:
da pessoa humana e observando a Art. 81. Não perdem o caráter de
proporcionalidade, a razoabilidade, a imóveis:
legalidade, a publicidade e a eficiência.” I - as edificações que, separadas
do solo, mas conservando a sua unidade,
forem removidas para outro local;
3.2. Classificação ou modalidades de [exemplo é a casa pré-fabricada, o chalé
bens no CC/2002 de madeira]
II - os materiais provisoriamente
3.2.1. Quanto à modalidade (CC, 79 a separados de um prédio, para nele se
84) reempregarem.” [exemplo da cobertura
de um galpão]
a) bens imóveis – são aqueles cujo
transporte ou remoção implica em
b) bens móveis – aqueles cujo
destruição ou deterioração.
“Art. 79. São bens imóveis o solo transporte ou remoção não implica em
e tudo quanto se lhe incorporar natural destruição ou deterioração.
ou artificialmente.” São três modalidades:
a.1) bens imóveis por natureza – a b.1) bens móveis por natureza – a
imobilidade decorre de sua essência, mobilidade decorre de sua essência.
como exemplos a árvore que nasceu Eles têm movimento por força alheia, a
sozinha; exemplo de um automóvel, ou por força
a.2) bens imóveis por acessão própria, como os animais (nesse caso,
física industrial – a imobilidade decorre os semoventes);
de uma atuação humana concreta e b.2) bens móveis por antecipação
efetiva. Exemplo: construções e – a mobilidade decorre de uma atuação
plantações. humana concreta e efetiva (exemplos:
a.3) bens imóveis por acessão plantação colhida; materiais
física intelectual – a imobilidade provenientes da demolição de um
decorre da vontade do proprietário prédio;
(móveis incorporados ao imóvel pela b.3) bens móveis por
vontade. Exemplos: equipamentos do determinação legal – CC, art. 83:
estúdio da Rede LFG; o trator em uma energias com valor econômico (solar,
propriedade rural. Essa categoria elétrica); direitos reais sobre móveis
persiste? Segundo o JDC, 11, não: “Não (penhor que recair sobre uma joia); e
persiste no novo sistema legislativo a direitos pessoais patrimoniais (direitos
categoria dos bens imóveis por acessão autorais da Lei n. 9610/98)
intelectual, não obstante a expressão “Seção II
"tudo quanto se lhe incorporar natural Dos Bens Móveis
Art. 82. São móveis os bens
ou artificialmente", constante da parte suscetíveis de movimento próprio, ou de
final do art. 79 do Código Civil.” Para a remoção por força alheia, sem alteração
maioria da doutrina persiste, da substância ou da destinação
confundindo-se com o conceito de econômico-social.
pertenças. Assim, há dúvida doutrinária Art. 83. Consideram-se móveis
para os efeitos legais:
séria. I - as energias que tenham valor
a.4) bens imóveis por econômico;
determinação legal – CC, art. 80:
27
II - os direitos reais sobre objetos constituindo partes integrantes, se
móveis e as ações correspondentes; destinam, de modo duradouro, ao uso,
III - os direitos pessoais de caráter
patrimonial e respectivas ações.
serviço ou ao embelezamento
Art. 84. Os materiais destinados a (aformoseamento) de outro. Geralmente
alguma construção, enquanto não forem são móveis incorporados ao imóvel pela
empregados, conservam sua qualidade de vontade do proprietário e, em regra, não
móveis; readquirem essa qualidade os seguem o principal (CC, 94), salvo se o
provenientes da demolição de algum
prédio.”
contrário resultar da lei, da
Atenção! Navios e aeronaves não manifestação de vontade ou das
móveis especiais, tendo em vista que circunstâncias do caso.
admitem hipoteca e têm registro Exemplos: MHD dá o exemplo de
especial (Capitania dos Portos e ANAC, um piano que foi incorporado a uma
respectivamente). casa ou a um conservatório. Na venda
Aliás, a hipoteca pode ser móvel da casa, as circunstâncias indicam que o
ou imóvel. Aquela que recai sobre uma piano não acompanha; já no
casa é imóvel; já aquela que recai sobre conservatório, acompanhará.
um navio é móvel. b.4) partes integrantes – são
acessórios que formam com o principal
3.2.2. Classificação quanto à um todo uno e indivisível. Nas partes
dependência ou bens reciprocamente integrantes, não possuem a autonomia
considerados (CC, 92 a 96) funcional das pertenças. Exemplos:
Os bens são considerados em lâmpada do lustre; lente da câmera.
relação com outros bens. Um bom exemplo: um carro que
a) bens principais – existem sobre já vem com um toca CD embutido é
si de forma concreta ou abstrata, parte integrante; aquele que é instalado
independentemente dos demais. no orifício próprio é pertença.
Exemplo: uma casa; b.5) benfeitorias – são acréscimos
b) bens acessórios – aqueles bens e melhoramentos realizados no
cuja existência supõe a do bem principal principal.
(CC, art. 92). Na verdade, a doutrina brasileira
Princípio da gravitação jurídica. não elucidou bem a diferença entre
O acessório segue o principal. Aplica-se benfeitorias e pertenças. Para Tartuce, a
a bens, obrigações e contratos. benfeitoria é feita por terceiro, enquanto
São bens acessórios: a pertença pelo proprietário, e o maior
b.1) frutos – saem do principal exemplo disso é a lei de locações que
sem diminuir sua quantidade. Segundo trata apenas das benfeitorias. Há quem
Beviláqua, são eles: diga que a benfeitora é mais profunda.
- frutos naturais: provêm das São três categorias de benfeitorias
essência das coisas. Exemplo: frutas dos (CC, 93):
vegetais; a) necessárias – revelam a
- frutos industriais: atividade conservação da coisa, como o telhado
humana. Exemplo: cimento da fábrica; de uma casa;
- frutos civis: são os rendimentos b) úteis – facilitam o uso, como o
dos bens: juros de um capital, aluguéis corrimão de uma escada;
de um imóvel, dividendos de ações etc.; c) voluptuárias – são aquelas de
b.2) produtos: saem do principal, mero deleite ou recreio, como a piscina
diminuindo a sua quantidade. Exemplo: numa casa.
“CAPÍTULO II
pepita de outro retirada de uma mina; Dos Bens Reciprocamente Considerados
b.3) pertenças: não era prevista no Art. 92. Principal é o bem que
CC/1916. São bens acessórios, que não existe sobre si, abstrata ou
28
concretamente; acessório, aquele cuja comodato, mútuo e fiança geram a
existência supõe a do principal. quebra da regra ora estudada.
Art. 93. São pertenças os bens “Seção III
que, não constituindo partes integrantes, Dos Bens Fungíveis e Consumíveis
se destinam, de modo duradouro, ao uso, Art. 85. São fungíveis os móveis
ao serviço ou ao aformoseamento de que podem substituir-se por outros da
outro. mesma espécie, qualidade e
Art. 94. Os negócios jurídicos que quantidade.
dizem respeito ao bem principal não
abrangem as pertenças, salvo se o
contrário resultar da lei, da manifestação 3.2.4. Quanto ao consumo ou
de vontade, ou das circunstâncias do consuntibilidade (CC, 86)
caso. Temos dois critérios totalmente
Art. 95. Apesar de ainda não distintos:
separados do bem principal, os frutos e
produtos podem ser objeto de negócio
- consumo fático – se o consumo
jurídico. do bem gera ou não destruição imediata;
Art. 96. As benfeitorias podem ser - consumo jurídico – se o bem é
voluptuárias, úteis ou necessárias. alienável ou inalienável.
§ 1º São voluptuárias as de mero Assim, podemos ter bens
deleite ou recreio, que não aumentam o
uso habitual do bem, ainda que o tornem
consumíveis e não consumíveis ao
mais agradável ou sejam de elevado mesmo tempo...
valor. “Art. 86. São consumíveis os
§ 2º São úteis as que aumentam bens móveis cujo uso importa
ou facilitam o uso do bem. destruição imediata da própria
§ 3º São necessárias as que têm substância, sendo também considerados
por fim conservar o bem ou evitar que se tais os destinados à alienação.”
deteriore. a) bens consumíveis – o uso gera
Art. 97. Não se consideram destruição imediata, bem como os
benfeitorias os melhoramentos ou alienáveis;
acréscimos sobrevindos ao bem sem a
b) bens inconsumíveis – o uso não
intervenção do proprietário, possuidor ou
detentor.” gera destruição imediata bem como os
inalienáveis.
3.2.3. Classificação quanto à Como os critérios são totalmente
fungibilidade distintos, um bem pode ser consumível
a) bens infungíveis – são e inconsumível ao mesmo tempo.
insubstituíveis, podendo ser móveis (um Um carro quitado, sem nenhuma
cavalo famoso; um automóvel (por restrição, é um bem consumível, do
conta do número de chassi) ou ponto de vista jurídico (pode ser
imóveis; vendido, doado), e inconsumível do
b) bens fungíveis – são os móveis ponto de vista fático (já que usado não
que podem ser substituídos por outros desaparece).
de mesma espécie, qualidade e Atenção! Em regra, o bem
quantidade. Exemplo: dinheiro. fungível equivale a um bem consumível
O contrato de empréstimo tem faticamente, e o bem infungível a um
duas categorias: tratando-se de bem bem inconsumível. Mas há exceções,
infungível, teremos o comodato, ou como no exemplo da última garrafa de
empréstimo de uso (o bem será usado e uma bebida famosa: é consumível
depois devolvido), como de uma casa faticamente juridicamente e, ao mesmo
ou de um carro; já o contrato de bem tempo, infungível.
fungível é o mútuo, ou empréstimo de
consumo (sendo devolvido outro de Material de Apoio - Direito Civil - João
mesmo gênero, espécie e quantidade). Aguirre - Aula 01.pdf
No futuro veremos como essa regra
29
Material do Professor - Direito Civil - i) bem de família voluntário ou
Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (5).pdf convencional – CC, 1711 e seguintes.
BEM DE FAMILIA
a) sujeitos:
A proteção do bem de família 1) cônjuges, decorrente de
legal consiste na tutela do direito à casamento heterossexual ou
moradia (CRFB, 6º), da dignidade homossexual.
humana e da solidariedade. 2) entidades familiares:
O CC/2002 rompeu o paradigma - união estável, hetero ou
patrimonialista e valorizou o ideal homossexual.
existencialista. Isso ensejou uma O CC/2002 tem uma deficiência
verdadeira revolução no Direito no tocante à união estável. Apesar de a
privado. regulamentar, em vários dispositivos
Além disso, na obra clássica do acaba dando tratamento discriminatório
atual Min. Edson Fachin, “O Estatuto pelo esquecimento (ex. do art. 12 sobre
Jurídico do Patrimônio Mínimo”, ele a proteção dos direitos da
aborda a tese da garantia de um mínimo personalidade).
existencial para se preservar a dignidade - família monoparental – formada
da pessoa humana. Esse é um escopo da por qualquer dos pais e seus
L8009/90, inspirada no homestead do descendentes;
Estado do Texas. - família anaparental – família
É nesse sentido, de garantia de um sem pais;
mínimo existencial, que o STJ editou a - família socioafetiva – família
súmula 364: “O conceito de eudemonista;
impenhorabilidade de bem de família - STJ, 364: solteiros, separados
abrange também o imóvel pertencente a judicialmente, divorciados, viúvos;
pessoas solteiras, separadas e viúvas”. - família unipessoal: uma só
Corrobora esse entendimento a pessoa, cf. doutrina de Rodrigo da
tese de que, aferida à saciedade que a Cunha Pereira, que existe apenas para a
família reside no imóvel sede da extensão da proteção.
empresa, impõe-se a exegese 3) Terceiro, que institui o bem de
humanizada à luz do fundamento da família através de testamento ou
República voltada à dignidade da doação, caso em que a constituição do
pessoa humana. Proteção do bem de bem de família submete-se à aceitação
família. Cf. STF, REsp 6261399/RS. de ambos os cônjuges ou da entidade
O STF tem uma interpretação familiar ou do separado de fato.
teleológica (finalidade) da Lei n. “SUBTÍTULO IV
8009/90, que é a tutela da dignidade Do Bem de Família
Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou
humana e a proteção ao direito de a entidade familiar, mediante escritura
moradia. pública ou testamento, destinar parte de
seu patrimônio para instituir “bem de
1) Conceito família”, desde que não ultrapasse um
Consiste no imóvel utilizado terço do patrimônio líquido existente
ao tempo da instituição, mantidas as
como residência da entidade familiar, regras sobre a impenhorabilidade do
impenhorável e que não pode ser objeto imóvel residencial estabelecida em lei
de execução por dívida civil, fiscal, especial.
comercial ou de qualquer natureza, Parágrafo único. O terceiro
salvo as exceções previstas em Lei. poderá igualmente instituir bem de
família por testamento ou doação,
dependendo a eficácia do ato da
1.1. Espécies aceitação expressa de ambos os
30
cônjuges beneficiados ou da entidade Art. 1713. (...)
familiar beneficiada.” § 1º Deverão os valores
mobiliários ser devidamente
b) Objeto individualizados no instrumento de
instituição do bem de família.
Será bem imóvel residencial § 2º Se se tratar de títulos
urbano ou rural, destinado ao domicílio nominativos, a sua instituição como bem
familiar. Essa proteção inclui todos os de família deverá constar dos respectivos
bens acessórios que o compõe, livros de registro.
inclusive as pertenças. Ou seja, é uma § 3º O instituidor poderá
determinar que a administração dos
exceção à exceção do princípio da valores mobiliários seja confiada a
gravitação jurídica. instituição financeira, bem como
“Art. 1.712. O bem de família disciplinar a forma de pagamento da
consistirá em prédio residencial urbano respectiva renda aos beneficiários, caso
ou rural, com suas pertenças e em que a responsabilidade dos
acessórios, destinando-se em ambos os administradores obedecerá às regras do
casos a domicílio familiar, e poderá contrato de depósito.
abranger valores mobiliários, cuja renda Art. 1.714. O bem de família,
será aplicada na conservação do imóvel e quer instituído pelos cônjuges ou por
no sustento da família.” terceiro, constitui-se pelo registro de seu
título no Registro de Imóveis.”
Relembrando a regra das
pertenças: “Art. 94. Os negócios d) efeitos
jurídicos que dizem respeito ao bem Com a instituição do bem de
principal não abrangem as pertenças, família voluntário o prédio se torna:
salvo se o contrário resultar da lei, da - inalienável e impenhorável;
manifestação de vontade, ou das - o bem de família voluntário não
circunstâncias do caso.” A instituição responderá elas dívidas posteriores à
do bem de família legal abrange as instituição, i. é, as dívidas anteriores
pertenças, de forma que, nesse caso, o alcança o bem, como também as dividas
acessório segue o principal, mesmo posteriores relacionadas a tributos
sendo uma pertença. decorrentes do imóvel e dívidas de
O bem de família voluntário pode condomínio posteriores à instituição do
abranger valores mobiliários (títulos, bem de família.
debêntures etc.) cuja renda será aplicada Se o bem de família, nos casos
na conservação do imóvel e no sustento acima, responde por alguma dívida, o
da família. saldo deve ser destinado em outro
“Art. 1.713. Os valores prédio, como bem de família, ou em
mobiliários, destinados aos fins previstos títulos da dívida pública, para sustento
no artigo antecedente, não poderão
exceder o valor do prédio instituído da família. Mas o juiz, por motivos
em bem de família, à época de sua relevantes, devidamente justificados,
instituição. pode determinar outra solução.
“Art. 1.715. O bem de família é
c) Forma isento de execução por dívidas
Depende de escritura pública (não posteriores à sua instituição, salvo as que
provierem de tributos relativos ao prédio,
se aplicando no caso o art. 108) ou ou de despesas de condomínio.
testamento, desde que o valor do bem Parágrafo único. No caso de
não ultrapasse 1/3 do patrimônio líquido execução pelas dívidas referidas neste
do instituidor ao tempo da instituição. artigo, o saldo existente será aplicado em
Ou seja, deve ser feito por escrito outro prédio, como bem de família, ou
em títulos da dívida pública, para
e registrado no cartório de registro de sustento familiar, salvo se motivos
imóveis (CRI) do local em que o imóvel relevantes aconselharem outra solução, a
está situado. critério do juiz.”
31
A inalienabilidade só pode ser companheiros e a maioridade dos filhos,
afastada é a regra geral, e só pode ser desde que não sujeitos a curatela.
afastada mediante consentimento dos
interessados (membros da entidade ii) bem de família legal
familiar), ouvido o MP, por decisão (L8009/90)
judicial apurada a procedência das Cf. art. 1º, caput:
razões dos requerentes. “Art. 1º O imóvel residencial
próprio do casal, ou da entidade familiar,
é impenhorável e não responderá por
e) extinção qualquer tipo de dívida civil, comercial,
Comprovada a impossibilidade de fiscal, previdenciária ou de outra
manutenção do bem de família natureza, contraída pelos cônjuges ou
convenciona o juiz poderá, a pelos pais ou filhos que sejam seus
requerimento dos interessados, extingui- proprietários e nele residam, salvo nas
hipóteses previstas nesta lei.”
lo ou autorizar a sub-rogação real,
Ou seja:
ouvido o instituidor e o MP.
1º) imóvel residencial próprio do
A instituição durará até que
casal ou da entidade familiar;
ambos cônjuges faleçam ou até que os
2º) é impenhorável;
filhos completem a maioridade (CC.
3º) não responderá por qualquer
1716). Apesar de o dispositivo se referir
dívida (contraída pelos cônjuges ou
apenas aos cônjuges, aplica-se também
pelos pais ou filhos que sejam seus
aos companheiros ou membros da
proprietários e nele residam), salvo as
entidade familiar.
“Art. 1.716. A isenção de que exceções previstas na própria Lei.
trata o artigo antecedente durará Trata-se de uma norma
enquanto viver um dos cônjuges, ou, na imperativa, de ordem pública. Ainda
falta destes, até que os filhos completem que o proprietário venha a dar o bem em
a maioridade.” garantia se torna uma garantia ineficaz.
CC, 1721. A dissolução da STJ, 305: “A Lei 8.009/90 aplica-
sociedade conjugal por separação, se à penhora realizada antes de sua
divórcio, morte, nulidade ou vigência”. É assim porque é uma norma
anulabilidade não extingue o bem de de ordem publica. Trata-se de uma
família. Mas aplica-se também à união retroatividade justificada ou
estável. motivada em prol das normas de
“Art. 1.721. A dissolução da
sociedade conjugal não extingue o bem ordem pública.
de família..” Observações:
Dicas: 1) AgRg no AREsp 140598/SP. Já
1) dissolvida a sociedade conjugal que é norma de ordem pública, pode ser
pela morte de um dos cônjuges o conhecida de ofício pelo juiz.
sobrevivente poderá pedir a extinção da 2) AgRg no REsp 292907. Antes
proteção se for único bem do casal. da arrematação do bem, a alegação de
Vale também para a união estável. Se impenhorabilidade é cabível por petição
ocorrer, não afasta a proteção da Lei n. simples, não cabendo a preclusão;
8009/90. 3) o que acontece se o devedor,
“Art. 1721. antes de constituir advogado, nomeou o
Parágrafo único. Dissolvida a bem de família à penhora e, depois, por
sociedade conjugal pela morte de um dos embargos do devedor arguiu a
cônjuges, o sobrevivente poderá pedir a
extinção do bem de família, se for o
impenhorabilidade do bem de família?
único bem do casal” É o que se chama de bem de família
2) extingue-se o bem de família ofertado. São duas correntes: para a
pela morte dos cônjuges ou primeira, os embargos devem ser
rejeitados, porque a) não se pode alegar
32
a própria torpeza; ou b) pela proibição equipamentos, inclusive os de uso
do comportamento contraditório (venire profissional; e móveis que guarnecem a
contra factum proprium). Essa tese tem casa.
como pressuposto ser o bem de família Ainda, segundo o art. 2º:
legal renunciável (Daniel Assumpção). “Art. 2º Excluem-se da
Para a segunda, a proteção do bem de impenhorabilidade os veículos de
transporte, obras de arte e adornos
família legal não é passível de renúncia suntuosos.
por se tratar de norma de ordem pública Parágrafo único. No caso de
(Flávio Tartuce). imóvel locado, a impenhorabilidade
No AgRg 888654/ES e no REsp aplica-se aos bens móveis quitados que
511023, o bem de família legal visa a guarneçam a residência e que sejam de
propriedade do locatário, observado o
tutela do direito existencial e por isso disposto neste artigo.”
não admite renúncia, desde que Também, o entendimento do STJ,
preservada a boa-fé. 449: “A vaga de garagem que possui
No REsp 1299580/RJ e no REsp matrícula própria no registro de
1364509/RS se decidiu que a arguição imóveis não constitui bem de família
de impenhorabilidade do bem de família para efeito de penhora”.
deve verificar os ditames da boa-fé
objetiva. 5) Exceções à impenhorabilidade
A preservação da dignidade do bem de família legal (L8009,, art.
humana e proteção do direito à moradia 3º):
permite uma interpretação extensiva da (I) as dívidas com o empregado
proteção ao bem de família legal. que trabalha no próprio imóvel foi
No REsp 950663/SC retiramos a revogado pela LC 150/2015. Atenção!
regra de que a proteção vale para o (II) pelo titular do crédito de
único imóvel do devedor que esteja em financiamento destinado à aquisição ou
usufruto para moradia de sua mãe, construção do próprio bem imóvel, no
pessoa idosa. limite dos créditos e acréscimos do
STJ, 486: “É impenhorável o contrato;
único imóvel residencial do devedor (III) pelo credor de pensão
que esteja locado a terceiros, desde que alimentícia. Deve observar o direito do
a renda obtida com a locação seja co-proprietário sobre o bem, ressalvadas
revertida para a subsistência ou a as hipóteses em que ambos responderão
moradia da sua família.”. pela dívida. Atenção: Cf. REsp
No EREsp 1216187/SC se decidiu 1826108/MS, os honorários de
que bem de família insuscetível de advogado estão excluídos da exceção do
penhora o único imóvel do devedor em art. 3º, III.
que resida seu familiar, ainda que o (IV) cobrança de impostos, taxas
proprietário não o habite. e contribuições sobre o imóvel familiar
Como consequência, o STJ não (ex.: IPTU). Trata-se de obrigação
estabelece limite de valor para a proter rem e vale para as dívidas
proteção do bem de família. REsp condominiais (cf. REsp 1324107/SP).
114719/SP, REsp 1087727/GO e REsp (V) a execução da hipoteca sobre
712259/SP o imóvel oferecido como garantia real
pelo casal ou pela entidade familiar.
4) Bem objeto da proteção. A O STJ tem entendido que a
impenhorabilidade compreende o exceção à impenhorabilidade só se
imóvel sobre o qual se assentam as aplica se a hipoteca for constituída no
construções, plantações, benfeitorias de interesse de ambos os cônjuges ou da
qualquer natureza; todos os família (prova a cargo do credor). Caso
33
contrário, prevalece a de imóvel urbano. Segundo o STF essa
impenhorabilidade. Cf. AgRg no Ag exceção é constitucional e pode gerar a
597243/GO (bem de família hipotecado penhora do bem de família (RE
para dívida da empresa. 352940/SP).
Impenhorabilidade) e REsp 1115265/ *****
RS (pequena propriedade rural que visa Material de Apoio - Direito Civil -
a subsistência, dada como garantia de Flavio Tartuce - Aula 02 (II).pdf
dívida. Impenhorabilidade). Material do Professor - Direito Civil -
(VI) imóvel adquirido com Pablo Stolze - ParteGeral - 02 (II).pdf
produto de crime ou para execução de TEORIA DO
sentença penal condenatória a FATO OU NEGÓCIO JURÍDICO
ressarcimento, indenização ou Artigos 104 a 185 do CC.
perdimento de bem. Cf. REsp
711889/PR, que exige prévia e expressa 1. Conceitos iniciais: fato, ato e negócio
sentença penal condenatória. jurídico
(VII) por obrigação decorrente da
fiança concedida em contrato de locação
Fato natural ou
fato jurídico
strictu sensu
-exemplo é o
decurso do tempo
Negócio jurídico
-ato jurídico com
composição de
Fato jurídico ou
interesses e
fato jurídico lato
finalidade
sensu ou em
lícito ou
sentido amplo
ato jurídico lato
- fato que
sensu
Fato interessa ao direito
Fato humano ou Ato jurídico
-é qualquer
fato jurígeno stricto sensu
ocorrência
-possui o elemento -ato jurídico
volitivo (vontade) decorrente de
efeitos legais
ilícito
-responsabilidade
civil;
Ato fato jurídico*
pode adquirir
qualquer uma das
formas deste
esquema
(metamorfo).
Fato não jurídico
34
jurídico lato sensu (Vicente Ráo, Exemplo: reconhecimento de
Orosimbo Nonato, Zeno Veloso, Pablo filho, ato jurídico em sentido estrito,
Stolze e Rodolfo Pamplona, e Tartuce) pode haver ação de anulação por erro,
– a antijuridicidade não faz com que o dolo, coação; o pagamento direto pode
ato seja considerado relevante e ser anulado por dolo etc.
aceitável para o Direito. e) ato-fato jurídico ou ato real
c) negócio jurídico – é um ato (Pontes de Miranda) – conceito não
jurídico em que há uma manifestação ou aceito por todos os autores. É um fato
composição de interesses com jurídico qualificado por uma vontade
finalidade específica (fato + Direito + não relevante juridicamente em um
vontade + licitude + interesse(s) + primeiro momento, mas que se revela
finalidade específica). relevante por seus efeitos.
A expressão negócio vem de neg Exemplos: 1) uma criança de 6
+ otium, i. é, negação do ócio, com a (seis) anos que compra lanche na
ideia de movimento. cantina da escola (cf. JDC, 138: “A
Segundo Antônio Junqueira de vontade dos absolutamente incapazes,
Azevedo, negócio jurídico é todo fato na hipótese do inc. I do art. 3º é
jurídico consistente em declaração de juridicamente relevante na
vontade, a que todo o ordenamento concretização de situações existenciais
jurídico atribui os efeitos designados a eles concernentes, desde que
como queridos, respeitados os demonstrem discernimento bastante
pressupostos de existência, validade e para tanto.”); 2) o achado de um
eficácia impostos pela norma jurídica tesouro sem querer; 3) relação
que nele incide. contratual de fato, em que Junqueira dá
O negócio jurídico é a principal o exemplo de um pouso de emergência
forma de expressão da autonomia feito por um avião privado em um
privada, da vontade individual, v. g., aeroporto privado
contrato, casamento e testamento. O ato-fato jurídico é um conceito
d) ato jurídico stricto sensu – é metamorfo, i. é, pode se transformar em
um ato jurídico em que os efeitos são qualquer outro (negócio jurídico, ato
meramente legais (Marcos Bernardes de jurídico etc.).
Mello). A fórmula: (fato + Direito +
vontade + licitude + efeitos legais). 2. Elementos constitutivos do negócio
Exemplos: pagamento direto de uma jurídico
obrigação; reconhecimento de filho; Escada ponteana (ou pontiana).
ocupação de um imóvel. Pontes de Miranda dividiu a
O ato jurídico stricto sensu constituição do negócio jurídico em três
representa o “mero preenchimento de planos: plano da existência, plano da
um espaço jurídico”, enquanto o validade e plano da eficácia.
negócio jurídico “cria o espaço”. Não há Plano da
criação de instituto próprio como no Eficácia
negócio jurídico.
Plano da
“TÍTULO II
Validade
Dos Atos Jurídicos Lícitos
Art. 185. Aos atos jurídicos
Plano da
lícitos, que não sejam negócios jurídicos
Existência
[ou seja, aos atos jurídicos em sentido
estrito], aplicam-se, no que couber, as
disposições do Título anterior [aplicam-
se as mesmas regras do negócio O esquema é perfeitamente
jurídico, especialmente a teoria das lógico, pois para que o negócio jurídico
nulidades].” seja válido, ele deve existir. Para que o
35
negócio gere efeitos, deve existir e ser Venosa, Pablo Stolze e Rodolfo
válido, “em regra”. Porém, é possível Pamplona).
que o negócio exista, seja inválido e
esteja gerando efeitos. Exemplo: um 2.2. Plano da validade
negócio anulável antes da propositura Surgem nesse plano os requisitos
da ação anulatória. Aliás, se a ação não de validade, pois os substantivos (parte,
for proposta no prazo decadencial objeto, vontade e forma) recebem
previsto em lei, o negócio convalida. adjetivos, na forma do art. 104 do CC
Pela convalidação o negócio inválido (partes capazes; vontade livre; objeto
passa a ser válido. lícito, possível, determinado ou
determinável; forma prescrita ou não
2.1. Plano da existência defesa em lei).
Se o negócio jurídico apresentar
Neste plano estão os elementos problema ou vício quanto a esses
mínimos do negócio jurídico que elementos, será inválido.
formam o seu suporte fático Classificação da invalidade:
(pressupostos de existência). i) quanto ao grau/gravidade:
Macete. São substantivos sem a) nulidade absoluta ou nulidade –
adjetivos: partes, vontade, objeto e gera negócio jurídico nulo (artigos 166
forma. Se o negócio jurídico não e 167), envolvendo ordem pública;
apresentar tais pressupostos, será b) nulidade relativa ou
inexistente (um nada para o direito). anulabilidade – gera negócio jurídico
Se o negocio jurídico não anulável (artigo 171), envolvendo
apresentar tais pressupostos será ordem privada;
inexistente, um “nada para o Direito”.
O CC/2002, assim como seu ii) quanto à extensão:
antecessor, não adotaram a teoria da a) invalidade total – o negócio é
inexistência, procurando resolver os nulo ou anulável;
problemas do negócio jurídico apenas b) invalidade parcial – parte do
no plano da validade (teoria das negócio é nulo ou anulável.
nulidades). Dizia Silvio Rodrigues que a “Art. 184. Respeitada a intenção
teoria da inexistência é inútil, das partes, a invalidade parcial de um
negócio jurídico não o prejudicará na
inconveniente e inapropriada (MHD, parte válida, se esta for separável [a
Rubens Limongi França, Flávio parte útil de um negócio não o prejudica
Tartuce). na parte útil – princípio da conservação
A teoria da inexistência foi do negócio jurídico]; a invalidade da
desenvolvida na Alemanha por obrigação principal implica a das
obrigações acessórias, mas a destas não
Zachariae em 1808 para resolver o induz a da obrigação principal.”
problema do casamento entre pessoas Exemplo: somente a cláusula de
do mesmo sexo (exemplo que juros de um contrato é nula (nulidade
desapareceu na realidade brasileira, absoluta parcial). Retira-se essa cláusula
porque segundo o STF é possível e aproveita-se o restante do contrato.
casamento entre pessoas do mesmo Nesse mesmo sentido, CDC, 51.
sexo). Requisitos de validade:
A maioria da doutrina brasileira é a) partes capazes – artigos 3º e 4º
adepta à teoria da inexistência, apesar do Código Civil, alterados pelo EPD.
de não adotada pela Lei (Pontes de Além de capazes, as partes devem
Miranda, Junqueira, Caio Mário da ser legitimadas. Legitimação é uma
Silva Pereira, Zeno Veloso, Silvio capacidade específica para o negócio
jurídico. Exemplos: artigos 1647 e 1649
36
do CC, que exigem a outorga uxória ou d) forma prescrita ou não defesa
marital (outorga conjugal) para em lei.
determinados negócios, sob pena de Não se confunde a forma (gênero,
anulabilidade para vender imóvel, fazer qualquer formalidade, a exemplo da
doação e prestar fiança. forma escrita) com a solenidade
(espécie, como o ato público, a exemplo
b) objeto lícito, possível, da escritura pública).
determinado ou determinável – é Cf. CC, 107, os negócios jurídicos
exigível sob pena de nulidade absoluta são informais e não solenes (princípio
do negócio (CC 166, II). da liberdade das formas).
“Art. 106. A impossibilidade Cf. CC, 108, a escritura pública é
inicial do objeto não invalida o negócio essencial para validade dos atos de
jurídico se for relativa, ou se cessar antes
de realizada a condição a que ele estiver
disposição de imóvel com valor
subordinado.” superior 30 (trinta) salários mínimos,
“A impossibilidade inicial do sob pena de nulidade absoluta.
objeto não invalida o negócio jurídico Cf. CC, 109, as partes podem
se for relativa” significa um objeto estipular que a escritura pública é
determinável, como na obrigação de dar essencial ao ato.
coias incerta. Exemplo: entrega de um
boi ou de um cavalo. Há uma 2.3. Plano da Eficácia
impossibilidade inicial de entregar o boi Aqui estão as consequências do
que, mais na frente é sanada. É chamada negócio jurídico: modificações ou
de impossibilidade sanável. extinção de direitos (MHD).
c) vontade livre – sem os vícios Temos:
do consentimento (erro, dolo, coação i) elementos acidentais –
moral, estado de perigo e lesão, cuja condição, termo e encargo (modo);
presença geram anulabilidade). ii) inadimplemento – resolução;
Aplicam-se aqui as regras de iii) juros, multa, perdas e danos;
interpretação da vontade: artigos 111 a iv) regime de bens de casamento;
114: v) registro imobiliários.
“Art. 111. O silêncio importa Esse plano da eficácia deve ser
anuência, quando as circunstâncias ou assistido em aula on line.
os usos o autorizarem, e não for
necessária a declaração de vontade
expressa. [a regra do Direito Civil é
Observação final. Negócio
“quem cala não consente”]. jurídico processual. Instrumento de
Art. 112. Nas declarações de gerenciamento processual. É um fato
vontade se atenderá mais à intenção jurídico voluntário em cujo suporte
nelas consubstanciada do que ao sentido fático esteja conferido ao respectivo
literal da linguagem. [prevalência da
boa-fé sujetiva/intencional sobre a
sujeito o poder de escolher a categoria
palavra escrita] jurídica ou de estabelecer dentro dos
Art. 113. Os negócios jurídicos limites fixado no próprio ordenamento
devem ser interpretados conforme a boa- jurídico, certas situações processuais
fé e os usos do lugar de sua celebração. (Pedro Henrique Nogueira). Cf. artigos
[interpretação conforme a boa-fé
190 e 191 do CPC.
objetiva e regras de tráfego]
Art. 114. Os negócios jurídicos Dica: enunciados ENFAM e
benéficos [=gratuitos] e a renúncia Forum nacional de processualistas civis.
interpretam-se estritamente Cf. no site do professor a aula n. 6 da
[=restritivamen-te].” [o grande exemplo EPD.
é a fiança, cf. art. 819]
37
Material de Apoio _ Direito Civil_ Pablo normal, em face das circunstâncias do
Stolze_ Aula 03 (II).pdf negócio.”
Material do Professor - Direito Civil - Vale lembrar ainda, com
Pablo Stolze - ParteGeral - 03 (II).pdf inspiração na doutrina de Roberto de
Rugiero, que o erro, quanto à sua
DEFEITOS DO classificação, poderá ser em face do
NEGÓCIO JURÍDICO objeto, do negócio, da pessoa ou do
próprio direito positivo (erro de direito).
“Art. 139. O erro é substancial
1. Erro quando:
I - interessa à natureza do
1.1. Conceito negócio, ao objeto principal da
A doutrina brasileira costuma declaração, ou a alguma das qualidades a
distinguir erro da ignorância. O erro ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à
seria uma falsa representação positiva
qualidade essencial da pessoa a quem se
da realidade , ao passo que a ignorância refira a declaração de vontade, desde que
traduziria um estado de espírito tenha influído nesta de modo relevante;
negativo (desconhecimento). Para o CC III - sendo de direito e não
essa distinção não tem qualquer implicando recusa à aplicação da lei, for
o motivo único ou principal do negócio
relevância prática.
jurídico.”
O erro, disciplinado a partir do
O erro sobre o objeto é aquele que
art. 138 do CC, causa de invalidade do
incide nas próprias características do
negócio jurídico, segundo a doutrina
objeto do negócio. Ex.: ao comprar um
tradicional, deverá ter dois requisitos:
elefante de marfim, paga como se fosse
a) deve ser essencial ou
de marfim, mas leva um de resina; foi
substancial (cf. Resp 1163118/RS); e
comprar um relógio de ouro, paga o
b) o erro deve ser escusável ou
preço respectivo, mas leva um folhado,
perdoável (REsp 744311/MT).
por engano.
Essencial ou substancial é o erro
O erro sobre o negócio, por sua
que contamina a essência do negócio
vez, é aquele que incide no
jurídico. Perdoável/escusável é o erro
enquadramento da própria declaração de
que qualquer pessoa de conhecimento
vontade manifestada. Exemplo: imagino
médio, de conhecimento médio, no
celebrar uma doação, quando em
lugar daquele que agiu com erro,
verdade celebrei um comodato.
também erraria.
Temos ainda o erro sobre pessoa,
Esta última característica do erro
aquele que incide nas características ou
vem sendo questionada. Provar que o
elementos de identificação do outro
erro é escusável é algo muito subjetivo.
declarante. Ex.: minha empresa de
A doutrina moderna, como (Augusto
marketing se interessou em contratar
Bufulin – “O Erro e os seus requisitos”
um modelo para um ensaio; o preposto
JDC, 12) entende que à luz do princípio
foi até o domicílio do modelo e
da confiança, que inspira o CC, o erro,
celebrou o contrato com o irmão gêmeo
para se configurar, dispensa o requisito
univitelino do mesmo. Observação: vale
da escusabilidade.
“CAPÍTULO IV
lembrar que o erro sobre a pessoa tem
Dos Defeitos do Negócio Jurídico especial aplicação no Direito de
Seção I Família, podendo resultar na anulação
Do Erro ou Ignorância de casamento (artigos 1556 e 1557).
Art. 138. São anuláveis os Erro de direito. Clóvis Beviláqua
negócios jurídicos, quando as
não era simpático à tese de erro de
declarações de vontade emanarem de
erro substancial que poderia ser direito, razão pela qual o CC/1916 não o
percebido por pessoa de diligência contemplava. A evolução da nossa
38
doutrina, todavia, desembocou na
aceitação da tese. Grandes autores como 2.1. Conceito
Eduardo Espíndola, Carvalho Santos, Segundo Clóvis Beviláqua, em
Caio Mário da Silva Pereira, defendiam sua Teoria Geral do Direito Civil, o
o erro de direito desde que não dolo é defeito do negócio que se
traduzisse intencional recusa à aplicação caracteriza pelo artifício astucioso para
da Lei. O erro de direito é aquele que enganar uma das partes, induzindo-a ao
incide no âmbito de atuação permissiva erro. Vale dizer, o dolo, causa de
da norma, ou seja, um erro sobre a invalidade do negócio jurídico
ilicitude do ato: o declarante, de boa-fé, (anulabilidade), caracteriza-se pela má-
ao interpretar a norma, imagina fé empregada para enganar ou ludibriar
permitido o que é proibido. uma das partes.
“Art. 139. O erro é substancial Nos termos do Código Civil, o
quando: dolo que resulta na invalidade é o
(...)
III - sendo de direito e não
principal (CC, 145), o qual não se
implicando recusa à aplicação da lei, confunde com o dolo acidental (art.
for o motivo único ou principal do 146), que resulta apenas em perdas e
negócio jurídico.” danos.
Outro importante aspecto diz “Seção II
respeito à denominada cognoscibilidade Do Dolo
do erro, ou seja, para se configurar, o Art. 145. São os negócios
jurídicos anuláveis por dolo, quando este
erro deve ser de conhecimento da outra for a sua causa. [dolo essencial]
parte? Há quem a exija, como José Art. 146. O dolo acidental só
Fernando Simão. Embora a matéria não obriga à satisfação das perdas e danos, e
seja pacífica na doutrina, entendemos é acidental quando, a seu despeito, o
que esta cognoscibilidade é dispensável, negócio seria realizado, embora por
outro modo. [dolo acidental]”
na medida em que se a outra parte
Observação. Tradicionalmente,
percebe o erro, ingressamos na seara do
por influencia do direito romano,
dolo.
costuma-se diferenciar o dolo enquanto
Questão especial de concurso. O
vício ou defeito (dolus malus) do
que é erro impróprio? Segundo a
denominado dolus bonus, socialmente
Professora Ana Magalhães (“O erro no
aceito, especialmente utilizado como
negócio jurídico” – Atlas), o erro
técnica de publicidade (puffing) tema de
impróprio ou erro obstáculo, derivado
especial interesse no Direito do
do pensamento de Savigny e que não
Consumidor. Por ela o produto tem suas
tem aplicação prática no Direito
características superestimadas (ex.: “o
Brasileiro, é aquele que incide apenas
melhor do mundo”; é muito usada
na vontade declarada do sujeito, ou seja,
também nas propagandas de creme
é o erro que se caracteriza quando
dental, de shampoo; as imagens nas
alguém emite mal a sua vontade. Em
lanchonetes em que o produto tem
nosso sentir, essa categoria de erro é
aparência muito mais atrativa que a
inútil e imprecisa. Ele se confunde com
entregue ao consumidor).
os outros erros, pois o declarante incide
A denominada mensagem
em erro na declaração da vontade,
subliminar caracteriza prática dolosa e
podendo ser invalidado.
abusiva? Segundo Henrique Pinheiro
Obs.: deve ser diferenciado o erro
(“Mensagem Subliminar na Teoria do
do vício redibitório, o que será estudado
Negócio Jurídico”), as mensagens
na teoria geral dos contratos.
subliminares são estímulos enviados de
forma dissimulada abaixo dos limites da
2. Dolo
39
percepção consciente, aptos a “Art. 150. Se ambas as partes
influenciar escolhas a atitudes. procederem com dolo, nenhuma pode
alegá-lo para anular o negócio, ou
A mensagem subliminar, de reclamar indenização.”
acordo com a principiologia do CDC, O que se entende por dolo de
tem sido encarada como uma prática terceiro? O art. 148 do CC trata do dolo
dolosa e abusiva, passível de de terceiro. Em tal situação, o negócio
responsabilização. jurídico somente será invalidado se o
ConJur - Juiz manda emissora retirar beneficiário do dolo dele sabia ou tinha
clipe institucional do ar.pdf como saber; em caso contrário, se não
ConJur - Promotora quer que empresas sabia nem tinha como saber, o negócio é
expliquem propaganda.pdf mantido, respondendo apenas o terceiro
O indivíduo, vítima de pelas perdas e danos. Ex.: “A” tem uma
propaganda subliminar por mensagem fazenda de gado, e recebe uma visita de
que lhe é enviada, induzido a consumir, “B”, e reclama da qualidade do rebanho,
segundo Pablo Stolze, vítima da que afirma não valer R$10.000,00. “B”
captação dolosa da vontade, o que é promete vender assim mesmo, mas por
uma hipótese de negócio jurídico R$50.000,00. “B”, enganando o
viciado pelo dolo (professor: “em nosso comprador “C” sobre a qualidade da
sentir, se a mensagem subliminar induz vacada, vende mesmo por esse valor
o declarante à prática de determinado maior. Se ficar demonstrado que “A”
negócio, operou-se uma captação dolosa sabia ou tinha como saber, “C” pode
da sua vontade, de maneira que invalidar o negócio; se não, poderá
podemos concluir que, em tese, o apenas exigir perdas e danos do terceiro
negócio jurídico celebrado, é viciado “B”.
pelo dolo”). “Art. 148. Pode também ser
Dolo negativo. Vale lembrar anulado o negócio jurídico por dolo de
ainda, o denominado dolo negativo, terceiro, se a parte a quem aproveite dele
previsto no art. 147 do CC, e que resulta tivesse ou devesse ter conhecimento; em
caso contrário, ainda que subsista o
da violação do dever de informar negócio jurídico, o terceiro responderá
derivado da cláusula geral de boa-fé por todas as perdas e danos da parte a
objetiva. Em outras palavras, é um dolo quem ludibriou.”
consistente numa malévola omissão
intencional, um silêncio reprovável. 3. Coação
“Art. 147. Nos negócios jurídicos Trata-se aqui da coação moral
bilaterais, o silêncio intencional de uma (=psicológica), tendo em vista que a
das partes a respeito de fato ou qualidade
que a outra parte haja ignorado, constitui coação física torna o negócio
omissão dolosa, provando-se que sem ela inexistente.
o negócio não se teria celebrado.”
O CC trata ainda do dolo de 3.1. Conceito
representante (art. 149) e do chamado A coação (moral ou psicológica),
dolo bilateral (art. 150). Este último, o causa de invalidade (anulabilidade) do
dolo bilateral, se configura quando as negócio jurídico, nos termos do art. 151,
duas partes, simultaneamente tentam consiste na ameaça ou violência
enganar uma à outra. psicológica dirigida contra uma das
“Art. 149. O dolo do partes (ou a pessoa que lhe seja
representante legal de uma das partes só próxima) ou aos seus bens. Francisco
obriga o representado a responder
civilmente até a importância do proveito Amaral escreve muito bem sobre esse
que teve; se, porém, o dolo for do tema.
representante convencional, o “Seção III
representado responderá solidariamente Da Coação
com ele por perdas e danos.”
40
Art. 151. A coação, para viciar a 4.1. Conceito
declaração da vontade, há de ser tal que O estado de perigo não foi
incuta ao paciente fundado temor de
dano iminente e considerável à sua
contemplado no CC/1916, mas sim no
pessoa, à sua família, ou aos seus bens. art. 156 do CC/2002, influenciado, sem
Parágrafo único. Se disser dúvida, pelo princípio da função social.
respeito a pessoa não pertencente à Trata-se de um defeito que se
família do paciente, o juiz, com base nas diferencia da lesão pelo seu caráter
circunstâncias, decidirá se houve
coação.”
emergencial.
Toda coação é apreciada em O estado de perigo se configura
concreto. A ameaça dirigida a um não quando uma pessoa, premida da
tem o mesmo efeito que aquela dirigida necessidade de salvar-se ou a pessoa
a outrem. Dito de outro forma, é próxima, de grave perigo de dano
importante anotar, nos termos do art. conhecido pela outra parte, celebra um
152, que toda coação é analisada em negócio assumindo uma obrigação
concreto. Na mesma linha, acrescenta o excessivamente onerosa. O estado de
art. 153, a coação não se confunde com perigo exige para sua caracterização,
o simples temor reverencial nem com a que a outra parte saiba o perigo de dano
ameaça do exercício normal de um (dolo de aproveitamento), resultando na
direito. invalidade do negócio.
“Seção IV
“Art. 152. No apreciar a coação,
Do Estado de Perigo
ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a
Art. 156. Configura-se o estado de
condição, a saúde, o temperamento do
perigo quando alguém, premido da
paciente e todas as demais circunstâncias
necessidade de salvar-se, ou a pessoa de
que possam influir na gravidade dela.
sua família, de grave dano conhecido
Art. 153. Não se considera coação
pela outra parte, assume obrigação
a ameaça do exercício normal de um
excessivamente onerosa.
direito, nem o simples temor
Parágrafo único. Tratando-se de
reverencial.”
pessoa não pertencente à família do
Assim como no dolo, a coação declarante, o juiz decidirá segundo as
também pode provir de terceiro (artigos circunstâncias.”
154 e 155). Na mesma linha, o negócio A jurisprudência brasileira tem
jurídico em que há coação de terceiro amadurecido para admitir o
somente será invalidado se o reconhecimento do estado de perigo
beneficiário soubesse ou tivesse como (ver REsp 918392/RN).
saber, com a peculiaridade de que Especial aplicação do estado de
responderá solidariamente com terceiro perigo, temos na absurda exigência do
pelas perdas e danos. cheque caução ou de outra garantia
“Art. 154. Vicia o negócio como condição para o atendimento
jurídico a coação exercida por terceiro,
se dela tivesse ou devesse ter
hospitalar de emergência.
conhecimento a parte a que aproveite, e Finalmente, vale acrescentar que a
esta responderá solidariamente com Lei n. 12653/2012 alterou o CP para, no
aquele por perdas e danos. artigo 135-A considerar crime a
Art. 155. Subsistirá o negócio exigência de cheque caução ou
jurídico, se a coação decorrer de terceiro,
sem que a parte a que aproveite dela
equivalente como condição para o
tivesse ou devesse ter conhecimento; mas atendimento hospitalar de emergência.
o autor da coação responderá por todas
as perdas e danos que houver causado ao
coacto.” Material de Apoio - Direito Civil - João
Aguirre - Aula 04 (II).pdf
4. Estado de perigo I) Lesão
1. Noção
41
Cf. art. 157, a lesão ocorre quando judicial do negócio por meio da redução
alguém, por premente necessidade ou do proveito do lesionador ou do
complemento do preço.”
inexperiência assume uma prestação
manifestamente desproporcional com
2. Elementos
relação à prestação oposta.
i) elemento objetivo – é a
Segundo MHD, visa-se proteger o
desproporção entre as prestações. A
contratante que está em desvantagem
desproporção acarreta prejuízo a uma
(inferioridade) devido à desproporção
das partes.
entre as duas prestações.
“Seção V ii) elemento subjetivo – segundo
Da Lesão Stolze/Pamplona, não mais se admite o
Art. 157. Ocorre a lesão quando “negócio da China”. É possível um bom
uma pessoa, sob premente necessidade, ganho, mas não pode representar lucro
ou por inexperiência, se obriga a abusivo, manifestamente
prestação manifestamente
desproporcional ao valor da prestação
desproporcionais.
oposta. Para Tartuce, a manifesta
§ 1º Aprecia-se a desproporção desproporção configura a excessiva
das prestações segundo os valores onerosidade para a parte prejudicada.
vigentes ao tempo em que foi celebrado Álvaro Villaça Azevedo alerta
o negócio jurídico.
§ 2º Não se decretará a anulação
para a diferença entre a lesão subjetiva,
do negócio, se for oferecido suplemento prevista no CC, 157, que deve ser
suficiente, ou se a parte favorecida analisada casuisticamente, pelo
concordar com a redução do proveito.” desequilíbrio entre as partes (sujeitos);
A revisão judicial ou extrajudicial da lesão objetiva, prevista no art. 480.
do negócio jurídico consagra os “Art. 480. Se no contrato as
princípios da: 1) função social do obrigações couberem a apenas uma das
contrato; e 2) princípio da conservação partes, poderá ela pleitear que a sua
prestação seja reduzida, ou alterado o
do negócio jurídico. modo de executá-la, a fim de evitar a
O CC, 157, § 2º dispõe que a onerosidade excessiva.”
invalidade negocial pode ser afastada Segundo Villaça, os elementos
em duas hipóteses: 1) se for oferecido subjetivos da lesão do art. 157 são “sob
suplemento suficiente; ou 2) se a parte premente necessidade” ou
favorecida concordar com a redução do “inexperiência”, conceitos abertos.
proveito. Percebe-se que é a própria Assim, a lesão do art. 157 tem uma
conservação do negócio jurídico. O fórmula: [(premente necessidade/
momento processual correto para inexperiência) + (desproporção) =
oferecer o suplemento é a defesa. lesão].
Enunciados do CJF: *Segundo MHD, os conceitos
“III Jornada de Direito Civil - indeterminados, que compõe a clausula
Enunciado 149. Em atenção ao princípio
da conservação dos contratos, a
aberta, geralmente possuem uma
verificação da lesão deverá conduzir, estrutura formada por um sujeito e um
sempre que possível, à revisão judicial adjetivo (ex: boa-fé; justa causa; extensa
do negócio jurídico e não à sua anulação, área/considerável número de pessoas
sendo dever do magistrado incitar os etc.)
contratantes a seguir as regras do art.
157, § 2º, do Código Civil de 2002.”
Premente necessidade. Esse
“IV Jornada de Direito Civil - conceito indeterminado que deve ser
Enunciado 291. Nas hipóteses de lesão preenchido pelo juiz no caso concreto.
previstas no art. 157 do Código Civil, Exemplo de Tartuce: a compra e venda
pode o lesionado optar por não pleitear a de um imóvel pode caracterizar uma
anulação do negócio jurídico, deduzindo,
premente necessidade? Sim, em razão
desde logo, pretensão com vista à revisão
do direito social à moradia do art. 6º da
42
CRFB (mínimo existencial, cf. Fachin, utilizado para encobertar outro.
na obra “Estatuto jurídico do patrimônio Exemplo: divórcio simulado, para
mínimo”). fraudar os credores.
Segundo Teresa Ancona Lopez, é Na simulação existe um negócio
preciso distinguir a lesão do estado de jurídico aparente que não corresponde à
perigo e do estado de necessidade: realidade. No exemplo acima, o casal
- estado de necessidade – obriga o está aparentemente divorciado, a partir
sujeito a causar a destruição ou a de uma sentença que homologou o
deterioração de coisa alheia ou um dano acordo judicial, mas continuam vivendo
à pessoa a fim de livrar-se de perigo como casados.
iminente (cf. art. 188, II do CC). Trata- A simulação caracteriza um
se de uma excludente de ilicitude; desacordo voluntário entre a vontade
- estado de perigo – o sujeito sabe declarada e a vontade interna, real.
da necessidade de se salvar ou de salvar Existe a possibilidade de uma
alguém de um perigo e assume uma simulação inocente, i. é, que não traz
prestação excessivamente onerosa prejuízo a ninguém. Mesmo assim,
imposta pela outra parte que sabia da como é de ordem pública, acarreta a
existência desse perigo (dolo de invalidade.
aproveitamento); “III Jornada de Direito Civil -
- Lesão – “estado de precisão” Enunciado 152. Toda simulação,
inclusive a inocente, é invalidante.”
econômica ou financeira. Segundo
Contra esse entendimento se opõe
CMSP, “não se trata da alternativa entre
abertamente Cristiano Chaves de Faria e
a fome e o negócio (perigo), mas de
Nelson Rosenvald, bem como Silvio
uma necessidade contratual”.
Venosa.
Inexperiência. Falta de intimidade
Somos mais acostumados com a
ou de familiaridade com o tipo de
alegação da simulação por parte de
negócio celebrado. Tb. outro conceito
terceiros, mas ela pode ser alegada pela
indeterminado. Segundo Moreira Alves,
própria parte na simulação, sem medo
que foi da comissão de juristas revisora
de caracterização de venire contra
do CC a inexperiência não se confunde
factum proprium. Como ela acarreta
com o erro, pois não se trata de
nulidade, entende-se que pode ser
desconhecimento ou falso
suscitada por qualquer pessoa.
conhecimento: o inexperiente conhece a “IV Jornada de Direito Civil -
desproporção, mas por fala de Enunciado 294. Sendo a simulação uma
experiência da vida, concorda com ela causa de nulidade do negócio jurídico,
sem se atentar para seus efeitos pode ser alegada por uma das partes
prejudiciais. contra a outra.”
“V Jornada de Direito Civil - Cf. STJ, REsp 1140380/DF, num
Enunciado 410. A inexperiência a que se contrato de compra e venda com
refere o art. 157 não deve quitação simulada com o intuito de
necessariamente significar imaturidade adquirir financiamento bancário. Nesse
ou desconhecimento em relação à prática
de negócios jurídicos em geral, podendo caso, o STJ decidiu que se trata de
ocorrer também quando o lesado, ainda simulação inocente que a própria
que estipule contratos costumeiramente, quitação possui uma presunção relativa ,
não tenha conhecimento específico sobre ou seja, trata-se de entendimento
o negócio em causa.” contrário à JDC, 294.
II. Simulação 2. Simulação absoluta e relativa
1. Noção i) simulação absoluta – um
“Fazer uma coisa passar por negócio jurídico é celebrado para ser
outra”, um negócio jurídico que é
43
aparente, mas na verdade, não deseja preencher todos os requisitos
negócio algum. substanciais e formais de validade; 2)
Dica: não existe alteração na não pode ofender a Lei; 3) não pode
situação anterior. Existe um negócio prejudicar terceiros.
jurídico aparente mas, na prática, nada Cf. art. 167, § 1º, haverá
mudou (nenhuma alteração no status simulação nos negócios jurídicos
quo ante). quando:
ii) simulação relativa – celebra-se I) aparentarem conferir ou
um negócio jurídico para que ele transferir direitos a pessoas diversas das
apresente essas características a que realmente se conferem ou
terceiros, mas se deseja um outro transmitem. Essa situação se chama
negócio. simulação subjetiva. O sujeito diverso
Dica: existe alteração na situação é chamado de interposta pessoa, laranja,
anterior, mas não da forma que está cítrico, “testa de ferro”;
aparente. II) contiverem 1) declaração, 2)
Na simulação relativa, existe um confissão, 3) condição ou 4) cláusula
negócio jurídico aparente mas, na não verdadeira;
prática pretende-se a produção de III) os instrumentos particulares
efeitos de um outro negócio. forem antedatados ou pós-datados.
Na simulação relativa existem II e III tratam da simulação
dois negócios: objetiva.
1º) negócio aparente – simulado, *****
que é nulo;
2º) negócio oculto – dissimulado,
que pode ser válido.
O exemplo clássico é uma doação Material de Apoio - Direito Civil -
simulada por uma compra e venda. Flavio Tartuce - Aula 01 On line
Veja o caso. O marido compra (II).pdf
para a amante um apartamento. Ele paga
R$1500000,00. Coloca o apartamento Aula em dois temas: 1) Plano da
no nome da amante. A mulher consegue eficácia do negócio jurídico; 2) Fraude
na Justiça modificar o registro do contra credores.
imóvel para o nome do casal, o que em
nada interferiu no negócio com o 1. Plano da eficácia do negócio
vendedor. jurídico
“III Jornada de Direito Civil - Pontes de Miranda, na obra
Enunciado 153. Na simulação relativa, o Tratado de Direito Privado,
negócio simulado (aparente) é nulo, mas
o dissimulado será válido se não ofender
influenciado pela doutrina alemã,
a lei nem causar prejuízos a terceiros.” dividiu o negócio jurídico em três
“IV Jornada de Direito Civil - planos:
Enunciado 293. Na simulação relativa, o 1) plano da existência;
aproveitamento do negócio jurídico 2) plano da validade;
dissimulado não decorre tão-somente do
afastamento do negócio jurídico
3) plano da eficácia.
simulado, mas do necessário É o esquema que dá origem à
preenchimento de todos os requisitos escada ponteana.
substanciais e formais de validade
daquele.” PLANO DA
EFICÁCIA
Assim, segundo a conjugação de (consequências
tais enunciados, para que o negócio PLANO DA do negócio).
jurídico dissimulado (oculto) produza VALIDADE Elementos
PLANO DA (CC, 104): acidentais do
efeitos na simulação normativa: 1) deve
44
EXISTÊNCIA -partes negócio I - as condições física ou
-partes; capazes; jurídico: CC, juridicamente impossíveis, quando
-vontade; - vontade livre; 121 a 137. suspensivas;
-objeto; e -objeto lícito,
II - as condições ilícitas, ou de
- forma. possível e
determinável;
fazer coisa ilícita;
- forma III - as condições
prevista ou incompreensíveis ou contraditórias.”
não defesa em Exemplos de condições perplexa e
lei. potestativa: dou-lhe um carro se você
Os elementos acidentais não são ganhar o campeonato de futebol mas
essenciais; estão relacionados à não jogando (perplexa); dou-lhe um
modificação e extinção de direitos carro se eu quiser (puramente
decorrentes do negócio jurídico. São potestativa).
três elementos: II) Quanto à possibilidade:
a) condição; - condições possíveis – são
b) termo; aquelas que podem ocorrer no plano
c) encargo ou modo. fático e jurídico (dou-lhe um carro se
for aos EUA);
a) Condição - condições impossíveis: aquelas
Elemento acidental do negócio que não podem ocorrer (v. g., dou-lhe
jurídico que associa a sua eficácia a um um carro se fores a Marte). Geram a
evento futuro e incerto. nulidade do negócio quando
Temos duas conjunções: suspensivas, cf. CC, 123, I. Então,
- “se”: condição suspensiva; cuidado! Deslocamos a discussão para o
- “enquanto”: condição plano da validade, percebeu?
resolutiva. Cuidado:
“Art. 124. Têm-se por
Classificação das condições: inexistentes as condições impossíveis,
I) quanto à licitude: quando resolutivas [ou seja, não escritas
- condições lícitas – são aquelas – ex.: dou-lhe uma renda enquanto não
que não contrariam a lei, a ordem fores a Marte], e as de não fazer coisa
pública ou os bons costumes (CC, 122); impossível.”
- condições ilícitas – aquelas que
contrariam os parâmetros acima, e III) Quanto à origem:
acarretam a nulidade do negócio - condições casuais (ou causais) –
jurídico. decorrem da natureza, v. g., “dou-lhe
“CAPÍTULO III um carro se chover amanhã”;
Da Condição, do Termo e do Encargo - condições potestativas -
Art. 121. Considera-se condição a decorrem da vontade. Temos duas
cláusula que, derivando exclusivamente modalidades: 1) puramente potestativas:
da vontade das partes, subordina o efeito
do negócio jurídico a evento futuro e
são ilícitas cf. visto acima (vontade de
incerto. um + vontade do mesmo). Exemplo:
Art. 122. São lícitas, em geral, dou-lhe um carro se eu quiser; 2)
todas as condições não contrárias à lei, à simplesmente potestativas: são lícitas
ordem pública ou aos bons costumes; (vontade de um + vontade do outro).
entre as condições defesas se incluem as
Exemplo: dou-lhe um carro se você
que privarem de todo efeito o negócio
jurídico [perplexas], ou o sujeitarem ao cantar no show amanhã;
puro arbítrio de uma das partes - condições mistas – decorrem da
[puramente potestativas]. natureza e da vontade, v. g., dou-lhe um
Art. 123. Invalidam [nulidade carro se você cantar no show amanhã e
absoluta] os negócios jurídicos que lhes
estiver chovendo.
são subordinados:
45
IV) Quanto aos efeitos Contudo, o termo inicial tem uma
- condições suspensivas – são especificidade, pois ele não impede a
aquelas que enquanto não verificadas, aquisição, mas apenas o exercício:
suspendem a aquisição e o exercício do “Art. 131. O termo inicial
direito (art. 125 do CC). Ou seja, não há suspende o exercício, mas não a
aquisição do direito.”
direito adquirido. Exemplo: dou-lhe um
Exemplo: o termo inicial da
carro se você for de São Paulo a
minha locação é amanhã. Eu já tenho
Aparecida (nesse caso não há direito
direito adquirido sobre o contrato.
adquirido sobre o carro);
Porém eu não posso exercer os meus
- condições resolutivas – enquanto
direitos.
não realizadas vigora o negócio
Quanto à origem o termo pode ser
jurídico, podendo exercer-se os direitos
legal ou convencional. Exemplo do
por este estabelecidos (CC, 127). Ou
primeiro: o termo inicial para a atuação
seja, há direito adquirido que pode
do inventariante é quando ele firma o
ser exercido (“enquanto”). Ocorrendo
compromisso como inventariante; do
a condição, o negócio é extinto, com o
segundo: termos iniciais e finais dos
fim dos direitos correspondentes (CC,
contratos.
128). Exemplo: dou-lhe uma renda
O termo pode ainda ser certo
enquanto você estudar Direito.
“Art. 128. Sobrevindo a condição determinado ou indeterminado. Certo
resolutiva, extingue-se, para todos os determinado: sei que ocorrerá e quando
efeitos, o direito a que ela se opõe; mas, ocorrerá (v. g., termo final de um
se aposta a um negócio de execução contrato). Certo e indeterminado: sei
continuada ou periódica, a sua que ocorrerá mas não sei quando
realização, salvo disposição em
contrário, não tem eficácia quanto aos
(exemplo: morte).
atos já praticados, desde que compatíveis
com a natureza da condição pendente e C) Encargo ou modo
conforme aos ditames de boa-fé.” É um ônus ou fardo introduzido
em ato de liberalidade (doação e
b) Termo testamento). É o famoso “presente de
É o elemento acidental do negócio grego”. As conjunções são “para que”
jurídico que associa a sua eficácia a um ou “com o fim de”.
evento futuro e certo (“quando”). O exemplo clássico de Beviláqua:
Exemplo: “dou-lhe um carro “dou-lhe um terreno para que construa
quando seu pai morrer”. em parte dele um asilo”. O donatário já
Quanto aos efeitos, o termo pode recebe o terreno; se não construir o asilo
ser: no prazo fixado pelo doador caberá
- inicial (começo ou dies a quo); revogação da doação.
ou Conforme art. 136, há direito
- final (término ou dies ad quem). adquirido:
Prazo é o lapso temporal entre o “Art. 136. O encargo não
dies a quo e o dies ad quem. suspende a aquisição nem o exercício do
Quanto ao termo inicial, aplicam- direito, salvo quando expressamente
imposto no negócio jurídico, pelo
se as regras da condição suspensiva; e disponente, como condição suspensiva.”
quanto ao termo final, da condição “Seção II
resolutiva, no que couber. Da Revogação da Doação
“Art. 135. Ao termo inicial e final Art. 555. A doação pode ser
aplicam-se, no que couber, as revogada por ingratidão do donatário, ou
disposições relativas à condição por inexecução do encargo.”
suspensiva e resolutiva.” Considera-se não escrito o
encargo ilícito ou impossível:
46
“Art. 137. Considera-se não Esses atos de alienação em fraude
escrito o encargo ilícito ou impossível são anuláveis (cf. CC, 171), havendo
[regra], salvo se constituir o motivo
determinante da liberalidade, caso em
um prazo decadencial de 4 (quatro),
que se invalida [nula] o negócio contados da realização do negócio, para
jurídico.” a propositura da ação anulatória (CC,
Exemplo: “dou-lhe uma casa para 178).
que você mate 100 (cem) pessoas” “Art. 790. São sujeitos à
execução os bens:
(...)
CONDIÇÃO TERMO ENCARGO
VI - cuja alienação ou gravação
SUSPENSIVA INICIAL MODO
com ônus real tenha sido anulada em
- se; - quando; - para que;
razão do reconhecimento, em ação
- suspende a - não - não
autônoma, de fraude contra credores;”
aquisição e o suspende suspende a
exercício do aquisição, aquisição Assim, há uma tese antiga no
direito; mas sim o nem o sentido de que, na fraude contra
exercício do exercício; credores, as alienações devem ser
direito; consideradas como ineficácia e não
- não há - há direito - há direito como anulabilidade (cf. Alexandre
direito adquirido; adquirido,
adquirido; bem como
Câmara e Carlos Roberto Gonçalves).
possibilidade Alguns julgados adotam essa premissa
de exercício. (cf. REsp 971884/PR). Isso para afastar
Na LINDB: a possibilidade do credor que promoveu
“Art. 6º A Lei em vigor terá efeito a ação “ganhar, mas não levar”. Como o
imediato e geral, respeitados o ato art. 790 do NCPC confirma a anulação,
jurídico perfeito, o direito adquirido e a
essa tese está enfraquecida, até porque
coisa julgada.
§ 1º Reputa-se ato jurídico existem julgados do STJ que adotam a
perfeito o já consumado segundo a lei anulação (REsp 710810/RS).
vigente ao tempo em que se efetuou. A ação anulatória na fraude contra
§ 2º Consideram-se adquiridos credores é denominada ação pauliana,
assim os direitos que o seu titular, ou
diante de sua origem romana. Também
alguém por êle, possa exercer, como
aquêles cujo comêço do exercício tenha é utilizada a expressão ação
têrmo pré-fixo [se refere ao termo final, revocatória, mas essa mais utilizada em
pois quanto ao termo inicial não é falência.
pacífico se o dispositivo a ele se refere], A ação pauliana, cf. CC, 161,
ou condição pré-estabelecida [condição deve ser proposta:
resolutiva] inalterável, a arbítrio de
“Art. 161. A ação, nos casos dos
outrem.
arts. 158 e 159, poderá [na verdade,
§ 3º Chama-se coisa julgada ou
DEVERÁ] ser intentada contra o
caso julgado a decisão judicial de que já
devedor insolvente, a pessoa que com ele
não caiba recurso.”
celebrou a estipulação considerada
fraudulenta, ou [“e”, não “ou”] terceiros
adquirentes que hajam procedido de má-
2. Fraude contra credores fé.”
CC, 158 a 165. O art. 161 na verdade deve ser
Conceito. É um vício social do lido como estabelecendo um
negócio jurídico presente quando o litisconsórcio necessário. Cf. CPC, 113.
devedor insolvente ou que beira a Isso porque o bem deve voltar ao
insolvência realiza atos de disposição patrimônio do devedor. Cf. também
onerosas ou gratuita de bens com o REsp 750135/RS.
intuito de prejudicar credores. Exemplo: Terceiros adquirentes de boa-fé
tenho obrigações assumidas e alieno o estão protegidos, não podendo ser
meu patrimônio. atingidos pela anulação. REsp
1.100.525/RS (ler esse julgado).
47
Confirmando que o bem volta ao tiver pago o preço e este for,
patrimônio do devedor: aproximadamente, o corrente,
“Art. 165. Anulados os negócios desobrigar-se-á depositando-o em juízo,
fraudulentos, a vantagem resultante com a citação de todos os interessados.
reverterá em proveito do acervo sobre Parágrafo único. Se inferior, o
que se tenha de efetuar o concurso de adquirente, para conservar os bens,
credores. poderá depositar o preço que lhes
Parágrafo único. Se esses corresponda ao valor real.”
negócios tinham por único objeto atribuir Outra aplicação do princípio da
direitos preferenciais, mediante hipoteca, conservação do negócio jurídico:
penhor ou anticrese, sua invalidade “Art. 164. Presumem-se, porém,
importará somente na anulação da de boa-fé e valem os negócios ordinários
preferência ajustada.” indispensáveis à manutenção de
Requisitos da fraude contra estabelecimento mercantil, rural, ou
credores: industrial [empresarial ou rural] [função
social da empresa], ou à subsistência do
a) se houve disposição onerosa – devedor e de sua família. [tese do
exemplo: venda de um imóvel. É a regra ESTATUTO JURÍDICO DO
geral. São dois os requisitos: 1) conluio PATRIMÔNIO MÍNIMO]”
fradulento ou colusão (consilium Atenção! Não confundir fraude
fraudis); 2) prejuízo ao credor (eventus contra credores com a fraude à
damni). execução (CPC, 792 e Lei n.
Atenção! Presume-se 13097/2015).
relativamente o conluio fraudulento se a “Art. 792. A alienação ou a
insolvência do devedor for notória ou oneração de bem é considerada fraude
à execução:
houver motivo para ser conhecida pelo I - quando sobre o bem pender
outro contratante (art. 159). Exemplo: ação fundada em direito real ou com
venda entre irmãos. pretensão reipersecutória, desde que a
b) se o caso foi de disposição pendência do processo tenha sido
gratuita (doação) de bens ou remissão averbada no respectivo registro
público, se houver;
de dívida – só há um requisito: provar o II - quando tiver sido averbada,
prejuízo ao credor (eventus damni). É no registro do bem, a pendência do
uma interpretação do art. 158. processo de execução, na forma do art.
“Art. 158. Os negócios de 828;
transmissão gratuita de bens ou remissão III - quando tiver sido averbado,
de dívida, se os praticar o devedor já no registro do bem, hipoteca judiciária
insolvente, ou por eles reduzido à ou outro ato de constrição judicial
insolvência, ainda quando o ignore, originário do processo onde foi arguida
poderão ser anulados pelos credores a fraude;
quirografários, como lesivos dos seus IV - quando, ao tempo da
direitos. alienação ou da oneração, tramitava
§ 1º Igual direito assiste aos contra o devedor ação capaz de reduzi-
credores cuja garantia se tornar lo à insolvência;
insuficiente. V - nos demais casos expressos
§ 2º Só os credores que já o eram em lei.
ao tempo daqueles atos podem pleitear a § 1º A alienação em fraude à
anulação deles.” execução é ineficaz em relação ao
Fraude não ultimada ou não exequente.
aperfeiçoada. CC, 160: o adquirente do § 2º No caso de aquisição de
bem não sujeito a registro, o terceiro
bem alienado em fraude poderá afastar a
adquirente tem o ônus de provar que
anulação do negócio pagando o preço adotou as cautelas necessárias para a
do bem nos autos da ação pauliana. É aquisição, mediante a exibição das
uma aplicação do princípio da certidões pertinentes, obtidas no
conservação do negócio jurídico. domicílio do vendedor e no local onde
“Art. 160. Se o adquirente dos se encontra o bem.”
bens do devedor insolvente ainda não
48
STJ, 375: “O reconhecimento da Material de Apoio - Direito Civil - João
fraude à execução depende do registro Aguirre - Aula 05.pdf
da penhora do bem alienado ou da INVALIDADE
prova de má-fé do terceiro adquirente.” DO NEGÓCIO JURÍDICO
Pela STJ, 375 e pela jurisprudência,
quem deve provar a má-fé é o
prejudicado pela alienação (exequente). 1. Teoria das nulidades
Mas o CPC/2015 prevê que quem deve A expressão invalidade é usada
provar a boa-fé é o adquirente no caso para designar um negócio que não
de bens móveis não sujeitos a registro. produz os efeitos desejados.
Trata-se de uma questão processual e A nulidade pode ser absoluta ou
não material e que ainda aguarda novos relativa.
posicionamentos dos Tribunais.
FRAUDE CONTRA FRAUDE À 1.1. Nulidade absoluta
CREDORES EXECUÇÃO
Direito Civil – vício do Direito Processual civil -
Sanção imposta pela Lei, que
negócio jurídico; responsabilidade determina a privação de efeitos
patrimonial; jurídicos do ato negocial, praticado em
Tenho obrigações e Tenho ações (citação ou
alieno o patrimônio; registro) e alieno o
desobediência ao que a norma jurídica
patrimônio; prescreve.
Existe um atentado à Atentado ao processo Gera o negócio jurídico nulo.
parte; (afeta a dignidade da
Justiça);
Ordem privada; Ordem pública; 1.2. Nulidade relativa
Há necessidade de ação Ação já existe; Neste caso o negócio jurídico
específica (paulina); produzirá efeitos até a sua anulação.
Gera anulação do Gera ineficácia (plano
negócio jurídico (plano da eficácia). Aqui termos o negócio jurídico
da validade). anulável.
Fraude contra credores vs.
simulação: os dois são vícios sociais. 2. Hipóteses de nulidade (absoluta)
Na simulação temos o “parece mas não O art. 166 do CC prescreve que é
é”, uma discrepância entre a aparência e nulo o negocio jurídico:
a essência, bem como o fato de o i) celebrado pelo absolutamente
negócio jurídico simulado ser nulo – incapaz [menor de 16 anos, apenas, cf.
nulidade absoluta (CC, 167), havendo Lei n. 13] sem estar devidamente
necessidade de se provar o vício, não representado;
tendo prazo para ser declarada, e pode ii) quando o objeto for ilícito,
ser de ofício. Na fraude contra credores impossível, indeterminado ou
temos anulabilidade - nulidade relativa. indeterminável.
Em alguns casos temos a Segundo Pontes de Miranda, esse
simulação e fraude contra credores ao é o ilícito nulificante. Mas há também
mesmo tempo. A dúvida que se coloca: o ilícito indenizante, que é a base da
qual a consequência jurídica na responsabilidade civil, que gera a
coexistência dos dois vícios? A obrigação de reparação ou compensação
consequência jurídica é anulabilidade do dano, bem como o ilícito
ou nulidade? Ex.: um pai vende imóveis caducificante, que geram a perda de
para o fílho escondendo doação, direitos (como a perda do poder
também com o intuito de prejudicar familiar, CC, 1638).
credores. Nesse caso, prevalece a iii) quando o motivo determinante
simulação (nulidade absoluta) por do negócio, para ambas as partes, for
envolver ordem pública. ilícito.
49
O motivo diz respeito ao plano III - o motivo determinante,
subjetivo do negócio, i. é, a intenção das comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita
partes. É diferente da causa, que está no em lei;
plano objetivo (objeto). V - for preterida alguma
Segundo Zeno Veloso, a venda de solenidade que a lei considere essencial
um carro para sequestro, com para a sua validade;
conhecimento do vendedor. A venda do VI - tiver por objetivo fraudar lei
imperativa;
carro é um objeto lícito (como não VII - a lei taxativamente o
conseguiria nunca ser a venda de declarar nulo, ou proibir-lhe a prática,
drogas), mas o motivo é ilícito. Outro sem cominar sanção.”
exemplo: aluguel de uma casa
(plenamente lícito) para explorar
lenocínio (motivo ilícito). I - Nulidade
iv) quando o negócio não se As hipóteses do art. 166
revestir da forma prevista em lei ou constituem rol exemplificativo. No
quando for preterida alguma solenidade próprio CC existem outras hipóteses de
essencial para sua validade. nulidade. Exemplos: art. 548 (doações
Obs.: a forma é gênero, sendo que inoficiosas); art. 1.548 (casamento
a solenidade é a espécie (instrumento nulo).
público ou a celebração. Exemplo do
casamento) ou não solene (não demanda 1) Efeitos da nulidade absoluta
forma pública, como no caso da fiança). A nulidade envolve norma de
v) tiver por objeto fraudar lei ordem pública. Pode ser alegada por
imperativa. Segundo Zeno Veloso, não qualquer interessado ou pelo MP
se confunde com ilicitude do objeto quando lhe couber intervir no processo.
porque na fraude à lei há uma Além disso, deve ser declarada de ofício
infringência oblíqua e indireta da Lei pelo juiz, quando o juiz conhecer do
proibitiva. Exemplo: REsp 1076571/SP, negócio ou de seus efeitos e encontrar
de uma retrovenda para dar legalidade a provadas as nulidades.
um mútuo com juros abusivos. “Art. 168. As nulidades dos
vi) quando a lei expressamente o artigos antecedentes podem ser alegadas
por qualquer interessado, ou pelo
declarar nulo ou proibir-lhe a prática Ministério Público, quando lhe couber
sem cominar sanção. intervir.
Aqui temos duas possibilidades: Parágrafo único. As nulidades
a) a nulidade expressa ou textual. devem ser pronunciadas pelo juiz,
O exemplo: art. 1548, III do CC: é nulo quando conhecer do negócio jurídico ou
dos seus efeitos e as encontrar provadas,
o casamento por afronta aos
não lhe sendo permitido supri-las, ainda
impedimentos matrimoniais. que a requerimento das partes.”
b) nulidade implícita ou virtual. Existe a súmula 381 do STJ,
Quando a lei proíbe sem declarar muito criticada, segundo a qual o juiz
sanção. Exemplo do CC, 426: não pode não pode reconhecer as cláusulas
ser objeto de contrato herança de pessoa abusivas (nulas, segundo o CDC)
viva. presentes em contratos bancários: “Nos
“CAPÍTULO V
contratos bancários, é vedado ao
Da Invalidade do Negócio Jurídico
Art. 166. É nulo o negócio julgador conhecer, de ofício, da
jurídico quando: abusividade das cláusulas.” Enfim,
I - celebrado por pessoa trata-se de uma exceção à regra levada a
absolutamente incapaz; efeito pela jurisprudência do STJ, o
II - for ilícito, impossível ou Tribunal da Cidadania.
indeterminável o seu objeto;
50
A nulidade não pode ser suprida declarada a qualquer tempo...”). No
pelo Juiz, ainda que requerida pelas mesmo sentido, AgRg noAREsp
partes. Significa dizer que também que 249743.
não pode ser ratificada pelas partes. O 2ª) A segunda corrente defende
negócio nulo não é suscetível de que a ação para declarar a nulidade do
confirmação. ato está sujeita a maior prazo
Segundo o CC, 169, o negócio prescricional previsto em lei. Essa
jurídico não convalesce com o decurso corrente é encabeçada por Gustavo
do tempo. Assim, a conclusão é que a Tepedino, Maria Celina Bodin de
nulidade possui um efeito fatal, i. é, é Moraes, Heloisa Helena Barboza. É
imperativa, liquidando o negócio chamada Escola do Rio de Janeiro.
jurídico. Segundo essa corrente, essa regra deve
“Art. 169. O negócio jurídico nulo ser usada especialmente para efeitos
não é suscetível de confirmação, nem patrimoniais, pois entram em jogo
convalesce pelo decurso do tempo.”
outros interesses, como a boa-fé de
De acordo com o art. 166, VII, há
terceiros.
nulidade quando a lei proibir a prática
3ª) A ação para declarar que o ato
do ato sem cominar sanção. Daí,
é nulo é sempre imprescritível, mas a
segundo o art. 367 do CC, não pode ser
prescrição pode se aplicar para outras
objeto de novação as obrigações nulas:
“Art. 367. Salvo as obrigações
pretensões, decorrentes da nulidade do
simplesmente anuláveis, não podem ser negócio jurídico. Ou seja, dividem em
objeto de novação obrigações nulas ou partes o negócio jurídico. É a conclusão
extintas.” do CJF:
“VI Jornada de Direito Civil -
2. Ação declaratória de nulidade Enunciado 536. Resultando do negócio
Segue em regra o procedimento jurídico nulo consequências patrimoniais
capazes de ensejar pretensões, é possível,
comum do CPC, com preceitos de quanto a estas, a incidência da
ordem pública. prescrição.”
Pergunta. Corre prazo Exemplo para explicar: um pedido
prescricional no caso da ação de reparação civil dos danos decorrentes
declaratória de nulidade? Segundo da nulidade. Temos duas possibilidades:
Agnelo Amorim Filho é imprescritível. 1) declaração da nulidade é
*mais uma vez foi feita referência ao imprescritível; 2) a reparação do dano
artigo do professor Agnelo Amorim prescreve.
Filho. Essa corrente faz distinção entre o
“Art. 169. O negócio jurídico pedido tendente unicamente ao
nulo não é suscetível de confirmação,
nem convalesce pelo decurso do
reconhecimento da invalidade
tempo.” (imprescritível), e os efeitos
Contudo, esse tema é muito patrimoniais decorrentes da invalidade
controverso e existem 3 (três) correntes (passíveis de prescrição).
sobre ele: Segundo Tartuce, “os efeitos
1ª) Defende a imprescritibilidade. patrimoniais da declaração de nulidade
É a maioria da doutrina (Álvaro Villaça; também não estão sujeitos à prescrição,
Silvio Venosa; Tartuce; Chaves e pois a ordem pública relacionada ao ato
Rosenvald; Jones Figueiredo; Mário nulo deve prevalecer” (a ser considerada
Delagado) e também forte na em concursos). Isto porque a
jurisprudência do STJ (REsp imprescritibilidade da pretensão à
1353864/GO – onde encontramos os declaração de nulidade não teria
seguinte excerto: “...os atos nulos não nenhum efeito prático ou jurídico.
prescrevem, podendo a nulidade ser
51
II – Anulabilidade do Negócio jurídico “Art. 180. O menor, entre
(nulidade relativa) dezesseis e dezoito anos, não pode, para
eximir-se de uma obrigação, invocar a
Envolve preceitos de ordem sua idade se dolosamente a ocultou
privada, ou seja, de interesse entre as quando inquirido pela outra parte, ou se,
partes. no ato de obrigar-se, declarou-se maior.”
Mas, se uma pessoa pagou ao
1. Hipóteses de anulabilidade incapaz e a obrigação foi,
Segundo o CC, 191, o negócio posteriormente, anulada, a pessoa que
jurídico é anulável: efetuou o pagamento terá que provar
a) quando celebrado por que o menor dele se beneficiou para
relativamente incapaz sem a devida poder reaver o dinheiro pago.
assistência. Contudo, não são todos os b) quando houver vício resultante
atos em que o relativamente incapaz de erro, dolo, coação [moral], estado de
deve estar assistido, a exemplo do perigo, lesão e fraude contra credores
testamento do maior de 16 anos (CC, (CC, 171, II). Vale lembrar que na
1860, p. ú.). simulação o negócio é nulo.
“Art. 3º São absolutamente c) nos demais casos previstos em
incapazes de exercer pessoalmente os lei (art. 171, caput). São exemplos: a
atos da vida civil os menores de 16
(dezesseis) anos. (Redação dada pela Lei falta da vênia conjugal nos casos do CC,
nº 13.146, de 2015) (Vigência) art. 1697, cf. art. 1649, com a ressalva
I - (Revogado); (Redação dada nos casos de fiança de que trata a STJ,
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) 332: “A fiança prestada sem
II - (Revogado); (Redação dada autorização de um dos cônjuges implica
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
III - (Revogado). (Redação dada
a ineficácia total da garantia.”; também
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) o art. 496, segundo o qual é anulável a
Art. 4º São incapazes, venda de ascendentes a descendentes.
relativamente a certos atos ou à maneira “Art. 171. Além dos casos
de os exercer: (Redação dada pela Lei nº expressamente declarados na lei, é
13.146, de 2015) (Vigência) anulável o negócio jurídico:
I - os maiores de dezesseis e I - por incapacidade relativa do
menores de dezoito anos; agente;
II - os ébrios habituais e os II - por vício resultante de erro,
viciados em tóxico; (Redação dada pela dolo, coação, estado de perigo, lesão ou
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) fraude contra credores.”
III - aqueles que, por causa
transitória ou permanente, não puderem 2. Efeitos
exprimir sua vontade; (Redação dada
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
A anulabilidade afeta o interesse
IV - os pródigos. privado. Assim, só pode ser suscitada
Parágrafo único. A capacidade pela pessoa juridicamente interessada. O
dos índios será regulada por legislação juiz não poderá conhecê-la de ofício, e
especial. também não pode ser suscitada pelo
Parágrafo único. A capacidade
dos indígenas será regulada por
MP.
legislação especial. (Redação dada pela A existência da anulabilidade o
Lei nº 13.146, de 2015)” negócio existe e gera efeitos concretos
Ainda, segundo a regra do art. até que sobrevenha a declaração de
180, não pode o menor, para eximir-se invalidação.
de uma obrigação, invocar a sua idade, Assim, uma conclusão é que as
quando relativamente capaz, se 1) partes podem ratificar o negócio
dolosamente ocultou a sua idade quando anuláve, salvo interesse de terceiro (CC,
inquirido pela outra parte; ou 2) se no 172).
ato de obrigar-se declarou-se maior.
52
“Art. 172. O negócio anulável Para MHD (majoritária), significa
pode ser confirmado pelas partes, salvo o momento em que ocorreu a celebração
direito de terceiro.”
do ato, quando ele passa a ser válido no
campo jurídico (o STJ tem
3. Ação anulatória
jurisprudência nesse sentido, cf. REsp
É uma ação que segue o
1025920/RO; REsp 868524/ MT).
procedimento comum. Sua natureza é
José Fernando Simão e Zeno
constitutiva negativa. Relacionada ao
Veloso entendem que o prazo deve ser
direito potestativo de pleitear a
contado da celebração, mas deve ser
anulação, sendo vinculada a prazos
contado da ciência correspondente. Por
decadenciais.
exemplo: numa compra e venda de
a) prazos – previstos nos artigos
imóvel, o prazo deve ser contado do
178 e 179:
“Art. 178. É de quatro anos o
registro no CRI e não da escritura
prazo de decadência para pleitear-se a (como garantia da segurança jurídica e
anulação do negócio jurídico, contado: estabilidade das relações negociais).
I - no caso de coação, do dia em Essa última corrente foi seguida no
que ela cessar; enunciado n. 538 das JDC:
II - no de erro, dolo, fraude “VI Jornada de Direito Civil -
contra credores, estado de perigo ou Enunciado 538. No que diz respeito a
lesão, do dia em que se realizou o terceiros eventualmente prejudicados, o
negócio jurídico; prazo decadencial de que trata o art. 179
III - no de atos de incapazes, do do Código Civil não se conta da
dia em que cessar a incapacidade. celebração do negócio jurídico, mas da
Art. 179. Quando a lei dispuser ciência que dele tiverem.”
que determinado ato é anulável, sem
estabelecer prazo para pleitear-se a
São contra esse enunciado
anulação, será este de dois anos, a contar Tartuce, Paulo Lobo, e Humberto
da data da conclusão do ato.” Theodoro Jr., que entendem que conta-
Observações: se o prazo do momento em que a
1) O prazo para anular o negócio escritura é firmada (negócio já existe e é
quando se tratar de incapacidade válido).
relativa ou coação (moral) deve ser 3) Existem exceções (regras
contado do momento em que elas especiais sobre prazos de
cessarem. anulabilidade). Ex: três anos para anular
Dica: pela regra do art. 1560, IV, o casamento por erro sobre a pessoa
o prazo para anular o casamento sob (art. 1560, III - anotei os demais artigos
coação é de quatro anos contados do da parte do CC para dar uma melhor
casamento e não do momento em que visão do problema):
cessar a coação. “Art. 1.550. É anulável o
2) Há um problema relativo à casamento:
I - de quem não completou a
contagem do prazo nos casos de erro, idade mínima para casar;
dolo, estado de perigo, lesão ou fraude II - do menor em idade núbil,
contra credores, pois é dúbia a quando não autorizado por seu
expressão “do momento em que se representante legal;
realizou o negócio jurídico” (art. 178, III - por vício da vontade, nos
termos dos arts. 1.556 a 1.558;
II). Nos demais casos do art. 179, conta- IV - do incapaz de consentir ou
se o prazo “da conclusão do negócio manifestar, de modo inequívoco, o
jurídico”. Assim, o que se entende por consentimento;
“momento em que se realizou o negócio V - realizado pelo mandatário,
jurídico” e “conclusão do negócio sem que ele ou o outro contraente
soubesse da revogação do mandato, e
jurídico”? não sobrevindo coabitação entre os
cônjuges;
53
VI - por incompetência da b) eficácia da sentença na ação
autoridade celebrante. anulatória – possui efeitos inter partes.
§ 1º Equipara-se à revogação a
invalidade do mandato judicialmente
A doutrina tradicional sempre defendeu
decretada. (Redação dada pela Lei nº a eficácia “ex nunc” da sentença, com
13.146, de 2015) fundamento no art. 177 do CC.
§ 2º A pessoa com deficiência “Art. 177. A anulabilidade não
mental ou intelectual em idade núbia tem efeito antes de julgada por sentença
poderá contrair matrimônio, expressando [eficácia ex nunc para a primeira
sua vontade diretamente ou por meio de corrente], nem se pronuncia de ofício; só
seu responsável ou curador. (Incluído os interessados a podem alegar, e
pela Lei nº 13.146, de 2015) aproveita exclusivamente aos que a
(...) alegarem, salvo o caso de solidariedade
Art. 1.557. Considera-se erro ou indivisibilidade.”
essencial sobre a pessoa do outro Contra: Pablo Stolze e Pamplona.
cônjuge: Zeno Veloso, Chaves e Rosenvald, que
I - o que diz respeito à sua
identidade, sua honra e boa fama, sendo
entendem que teria eficácia ex tunc,
esse erro tal que o seu conhecimento com base no art. 182:
ulterior torne insuportável a vida em “Art. 182. Anulado o negócio
comum ao cônjuge enganado; jurídico, restituir-se-ão as partes ao
II - a ignorância de crime, anterior estado em que antes dele se achavam
ao casamento, que, por sua natureza, [eficácia ex tunc], e, não sendo possível
torne insuportável a vida conjugal; restituí-las, serão indenizadas com o
III - a ignorância, anterior ao equivalente.”
casamento, de defeito físico irremediável Para Zeno Veloso, tanto a
que não caracterize deficiência ou de sentença de nulidade como a que anula
moléstia grave e transmissível, por o negócio jurídico têm eficácia retro-
contágio ou por herança, capaz de pôr
em risco a saúde do outro cônjuge ou de
operante, restaurando o estado anterior.
sua descendência; (Redação dada pela Exemplo: casamento anulado os
Lei nº 13.146, de 2015) cônjuges voltam a ser solteiras.
IV - (Revogado). (Redação dada Numa prova objetiva, o ideal é
pela Lei nº 13.146, de 2015) adotar a corrente tradicional.
(...)
Art. 1.560. O prazo para ser
intentada a ação de anulação do III – Conversão substancial do negócio
casamento, a contar da data da jurídico
celebração, é de: Segundo o CC, 170, a conversão
I - cento e oitenta dias, no caso do substancial só ocorre no negócio
inciso IV do art. 1.550;
jurídico nulo. OU seja, Um negócio
II - dois anos, se incompetente a
autoridade celebrante; nulo que possuir os requisitos de outro,
III - três anos, nos casos dos e se supor que as partes poderiam
incisos I a IV do art. 1.557; desejá-lo, nele será convertido.
IV - quatro anos, se houver “Art. 170. Se, porém, o negócio
coação. jurídico nulo contiver os requisitos de
§ 1º Extingue-se, em cento e outro, subsistirá este quando o fim a que
oitenta dias, o direito de anular o visavam as partes permitir supor que o
casamento dos menores de dezesseis teriam querido, se houvessem previsto a
anos, contado o prazo para o menor do nulidade.”
dia em que perfez essa idade; e da data Percebe-se que o negócio nulo
do casamento, para seus representantes não está sendo sanado e nem está
legais ou ascendentes.
§ 2º Na hipótese do inciso V do produzindo efeitos. Assim, deve existir:
art. 1.550, o prazo para anulação do 1) requisito subjetivo – é a
casamento é de cento e oitenta dias, a vontade das partes por outro negócio
partir da data em que o mandante tiver jurídico – “... permitir supor que as
conhecimento da celebração.” partes o teriam querido...”. Assim o
Brasil adota a teoria subjetiva em que se
54
deve verificar se existe vontade de No artigo 205 não adotou a
conversão do negócio; diferenciação entre ações pessoais e
2) requisito objetivo – a situação reais, sendo o prazo comum de 10 (dez)
fática deve permitir a conversão pela anos.
similaridade entre o negócio nulo e o No artigo 206 temos os prazos
outro negócio (ou seja, o negócio no especiais, de 1, 2, 3, 4 e 5 anos.
qual será convertido deve ser similar ao Os demais prazos em outros
nulo, existir e ser válido). artigos são de decadência, como
Ex.: o exemplo clássico é a falta exemplos o 178, 179, 445, 1649 etc.
de escritura pública de compra e venda Macete: MHD – colaborando
de imóvel de valor superior a 30 s. m., para a facilitação, se tenho prazo:
que será nula (art. 108), será convertida - em dias, meses e ano e dia:
em compromisso particular de compra e decadência;
venda de bem imóvel. - em anos: pode ser de
***** prescrição ou de decadência.
Além disso, colaborando ainda
mais com a facilitação, o CC/2002
adotou os critérios desenvolvidos por
Material de Apoio - Direito Civil - Agnelo Amorim Filho (trabalho clássico
Flavio Tartuce - Aula 02 On line RT 300/7 em que associou a natureza
(II).pdf do prazo com o critério tripartido de
classificação das ações de Pontes de
PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA Miranda):
(CC, 189 a 211) - se houver uma ação
condenatória (v. g., cobrança ou
reparação de danos): o prazo é de
1. Introdução prescrição;
O fundamento histórico é a - se for o caso de ação constitutiva
máxima latina “O Direito não socorre os positiva ou negativa (v. g. ação
que dormem”. Seus fundamentos são a anulatória): prazo decadencial;
certeza (os direitos não são eternos), a - ação declaratória (nulidade
segurança, a estabilidade, a boa-fé absoluta): imprescritibilidade.
estatal e a punição ao negligente. “Fórmula Tartuce”. Premissas:
“Os direitos não são eternos.” 1) identifique a forma de contagem; 2)
No CC/1916 essa temática da identifique o art. do CC/2002; e 3)
prescrição e da decadência era muito identificar a ação correspondente.
confusa e algumas gerações de juristas Perceba que é justamente a aplicação
se perderam sem entender as diferenças das lições acima dadas pelos vários
entre os institutos. juristas que se debruçaram sobre o
No CC/2002 a matéria é clara e tema.
didática, seguindo o princípio da Exemplos:
operabilidade (na faceta simplificação 1) a ação de alimentos é
dos institutos civis, que no caso do tema imprescritível, porque é declaratória,
em análise se deu sob a separação: porém prescreve em dois anos a partir
artigos 189 a 206 tratam da prescrição; dos respectivos vencimentos, a
artigos 207 a 211, decadência). pretensão para cobrança de alimento
Os prazos de prescrição foram fixados em acordo ou s