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LFG

CARREIRAS JURÍDICAS
INTENSIVO I
Módulo I

DIREITO CIVIL
Pablo Stolze

Stolze Volume Único.pdf cardiorrespiratório do recém nascido


marcaria o início da vida.
Livro Schreiber Civil Constitucional.pdf Sucede que a segunda parte do
mesmo dispositivo aparenta contradizer
pablostolze@terra.com.br (dúvidas) a primeira, ao reconhecer direitos do
Material de Apoio _ Direito Civil_ nascituro desde a concepção.
Pablo Stolze_ Aula 01.pdf Ora, assim sendo, o nascituro
Material do Professor - Direito Civil - também não seria considerado pessoa?
Pablo Stolze - ParteGeral - 01.pdf
3. O nascituro
Com inspiração na doutrina de
Personalidade jurídica Limongi França, podemos definir o
nascituro como aquele que está por
1. Conceito nascer, ou seja, um ente concebido, mas
Personalidade jurídica é uma ainda não nascido, de vida intrauterina.
aptidão genérica para se titularizar Observação: não confundir
direitos e contrair obrigações na ordem nascituro com natimorto e com o
jurídica. concepturo.
Vale dizer, a personalidade Natimorto é o nascido morto, em
qualifica a pessoa física ou natural e a face de quem determinados direitos
pessoa jurídica. personalíssimos são reconhecidos
Obs.: por conta da complexidade (enunciado 01 da JDC).
das relações sociais, em situações
especiais, o Direito admite que “A proteção que o Código defere
determinados entes, embora ao nascituro alcança o natimorto no que
concerne aos direitos da personalidade,
desprovidos de personalidade, possam tais como: nome, imagem e sepultura.”
ser considerados sujeitos de direito
(exemplo: um órgão). Na mesma linha, não posso
confundir o nascituro com o concepturo
2. Pessoa física ou natural ou prole eventual, aquele que nem
Em que momento a pessoa física concebido ainda foi.
ou natural adquire personalidade Afinal de contas, qual a natureza
jurídica? jurídica do nascituro? Ele teria
A primeira parte do art. 2º do CC personalidade?
aparentemente responde a nossa
pergunta, ao dispor que “a 4. Teorias explicativas
personalidade civil da pessoa começa do Trata-se de uma matéria
nascimento com vida”, ou seja, o acentuadamente polêmica, não havendo
funcionamento do aparelho uniformidade na doutrina.

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Fundamentalmente, temos três faria aderir a uma concepção próxima
teorias principais explicativas do da concepcionista.
nascituro: Finalmente, a teoria
i) teoria natalista – defendida concepcionista sustenta que o nascituro
direta ou indiretamente por Vicente é considerado pessoa desde a
Ráo, Silvio Rodrigues, Silvio Venosa; concepção, podendo titularizar direitos
ii) teoria da personalidade personalíssimos e até mesmo certos
condicional – Serpa Lopes; direitos materiais de conformidade com
iii) teoria concepcionista – a sua peculiar situação.
Silmara Chinelato, Flávio Tartuce.
A primeira teoria – natalista - O Código Civil adotou alguma
tradicional em nosso sistema, sustenta dessas teorias?
que a personalidade somente seria Clóvis Beviláqua, em seu livro
adquirida a partir do nascimento com “Comentários ao Código Civil dos
vida, de maneira que o nascituro não Estados Unidos do Brasil”, editora Rio,
seria considerado pessoa, gozando de 1975, pág. 178, após elogiar
mera expectativa de direitos. abertamente a teoria concepcionista
Ainda que se defenda a teoria conclui que o Código Civil adotou
natalista, a sua aplicação deve sempre natalista “por parecer mais prática”,
levar em conta o princípio da dignidade embora existam situações em que o
da pessoa humana, razão pela qual no nascituro se apresenta como pessoa.
direito comparado, era absurda a A opinião de Beviláqua ainda é
redação do anterior do art. 30 do Código atual. A primeira parte do art. 2º
da Espanha, que reconhecia a aparentemente adota a teoria natalista,
personalidade somente se o feto, uma mas a segunda parte do mesmo
vez nascido, tivesse forma humana e dispositivo e dispositivos outros no
sobrevivesse às primeiras vinte e quatro ordenamento indicam a influência
horas. concepcionista.
A segunda teoria – da Observação: em nosso sentir,
personalidade condicional – por sua mesmo após o julgamento da ADI 3510
vez, admite que o nascituro já seria (Lei de Biosegurança), a polêmica
titular de certos direitos personalíssimos quanto à natureza do nascituro e às suas
(como o direito à vida e à saúde), mas teorias continua.
somente consolidaria direitos de cunho A teoria concepcionista e a
material ou econômico, sob a condição jurisprudência brasileira.
de nascer com vida. Trata-se de uma Especialmente nos últimos anos, a
teoria muito presente na jurisprudência. teoria concepcionista vem ganhando
*MHD dá uma opinião próxima dessa força no Direito Brasileiro:
teoria da personalidade condicional, a) lei dos alimentos gravídicos
tratando de explicar que o nascituro (Lei n. 11804/2008);
possuiria uma personalidade formal, b) o reconhecimento do dano
para titular certos direitos moral ao nascituro (REsp 399028/SP,
personalíssimos, como o direito à vida, REsp 931556/RS);
mas os direitos de natureza econômica c) a possibilidade de indenização
adviriam apenas com o nascimento com pelo seguro DPVAT por conta da morte
vida. Stolze entende que essa teoria de do nascituro (REsp 1120676/SC e
MHD se aproxima da Linha da informativo STJ de 15-05-2011).
personalidade condicional. Já Tartuce Vale acrescentar ainda que o
entende que essa posição de MHD a REsp 1.415.727/SC, rel. Min. Luis
Felipe Salomão, salienta o crescimento

2
da importância e da influência da teoria 2º), ainda que para atuar necessite do
concepcionista no Brasil (recomenda-se auxílio de institutos protetivos como a
leitura). curatela e a tomada de decisão apoiada
A despeito do fortalecimento da (artigos 6º e 84 do EPD).
teoria concepcionista, não se pode dizer Para que se possa perceber a
ainda que ela soluciona todas as dimensão do Estatuto da Pessoa com
situações de fato apresentadas. No atual Deficiência, confira-se o seu art. 6º em
estágio do nosso Direito, p. ex., ainda que a capacidade da pessoa civil com
não se admite a transmissibilidade deficiência é expressamente reafirmada:
direta da herança de um nascituro para a
mãe. Terá, pois, de nascer com vida “”
para consolidar o Direito,
eventualmente transmitindo-o. O estatuto considera a curatela,
Capacidade Jurídica art. 85, medida extraordinária, que só
será aplicada quando rigorosamente
1. Distinção necessário. Além disso a curatela é
Vale lembrar inicialmente a limitada à prática de atos de natureza
distinção existente entre capacidade e negocial e patrimonial. Exemplo: venda
legitimidade. de imóvel.
A capacidade é conceito mais Outra novidade é a possibilidade
amplo, que nos conduz a uma aptidão de se nomear mais de um curador para a
geral, reconhecida em Lei para atuar na mesma pessoa: curatela
vida jurídica. compartilhada.
Tradicionalmente, subdivide-se Diversos direitos foram
em capacidade de direito e capacidade reconhecidos nos âmbitos da educação,
de fato. da família, da vida política, garantia de
Diferentemente, a legitimidade é mobilidade e acessibilidade, enfim, uma
específica, traduzindo uma pertinência verdadeira consolidação das conquistas
subjetiva (Calmon de Passos) para a obtidas pela convenção sobre os direitos
prática de certos e determinados atos, das pessoas com deficiência
vale dizer, uma pessoa pode ser capaz, (Convenção de New York).
mas não ter legitimidade para a prática Ora, com reconhecimento da
de certo ato (exemplo: dois irmãos capacidade legal da pessoa com
maiores e capazes não podem casar deficiência, os artigos 3º e 4º do CC
entre si). sofreram profunda modificação, uma
vez que, como dito, a deficiência não é
2. Advento do Estatuto da Pessoa com mais causa de incapacidade civil.
Deficiência
O Estatuto da pessoa com “Art. 3o São absolutamente
deficiência (Lei n. 13146 de 6-7-2015), incapazes de exercer pessoalmente os
atos da vida civil: 
reconstruiu a teoria da capacidade civil. I - os menores de dezesseis anos; 
Até então, os artigos 3º e 4º do CC II - os que, por enfermidade ou
Brasileiro, dispondo sobre incapacidade deficiência mental, não tiverem o
absoluta e relativa, inseriram a necessário discernimento para a prática
deficiência como causa de incapacidade desses atos;
III - os que, mesmo por causa
civil. transitória, não puderem exprimir sua
A partir do EPD, operou-se uma vontade.
verdadeira desconstrução ideológica: a Art. 3o  São absolutamente incapazes
pessoa com deficiência passa a ser de exercer pessoalmente os atos da vida
considerada legalmente capaz (EPD, civil os menores de 16 (dezesseis)

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anos.  (Redação dada pela Lei nº 13.146, é regulada por lei especial: Estatuto do
de 2015)   (Vigência) Índio – Lei n. 6001/73, art. 8º.
I - (Revogado); (Redação dada pela
Lei nº 13.146, de 2015)   (Vigência)
*Deficiência não é causa de
II - (Revogado); (Redação dada pela incapacidade...a_ a brecha autofágica -
Lei nº 13.146, de 2015)   (Vigência) Jus Navigandi.pdf
III - (Revogado). (Redação dada
pela Lei nº 13.146, de 2015)   (Vigência)
Art. 4o São incapazes,
relativamente a certos atos, ou à maneira
Material do Professor - Direito Civil -
de os exercer:  Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (2).pdf
Art. 4o  São incapazes, Material de Apoio _ Direito Civil_
relativamente a certos atos ou à maneira Pablo Stolze_ Aula 02.pdf
de os exercer: (Redação dada pela Lei nº
13.146, de 2015)   (Vigência)
I - os maiores de dezesseis e
Comentários aos artigos 3º e 4º do CC
menores de dezoito anos; Conforme já vimos, os artigos 3º e
II - os ébrios habituais, os 4º do CC foram reconstruídos a partir
viciados em tóxicos, e os que, por do estatuto da pessoa com deficiência:
deficiência mental, tenham o
discernimento reduzido;   “Art. 3º São absolutamente
III - os excepcionais, sem incapazes de exercer pessoalmente os
desenvolvimento mental completo;   atos da vida civil:
II - os ébrios habituais e os viciados I - os menores de dezesseis anos;
em tóxico; (Redação dada pela Lei nº II - os que, por enfermidade ou
13.146, de 2015)   (Vigência) deficiência mental, não tiverem o
III - aqueles que, por causa necessário discernimento para a prática
transitória ou permanente, não puderem desses atos;
exprimir sua vontade;  (Redação dada III - os que, mesmo por causa
pela Lei nº 13.146, de 2015)   (Vigência) transitória, não puderem exprimir sua
IV - os pródigos. vontade.
Parágrafo único. A capacidade Art. 3º São absolutamente
dos índios será regulada por legislação incapazes de exercer pessoalmente os
especial. atos da vida civil os menores de 16
Parágrafo único.  A capacidade (dezesseis) anos. (Redação dada pela Lei
dos indígenas será regulada por nº 13.146, de 2015) (Vigência)
legislação especial. (Redação dada pela I - (Revogado); (Redação dada
Lei nº 13.146, de 2015)   (Vigência)” pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
II - (Revogado); (Redação dada
A partir do EPD, a única hipótese pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
de incapacidade civil absoluta é a do III - (Revogado). (Redação dada
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
menor impúbere (abaixo dos 16 anos) e,
além disso, as hipóteses de incapacidade Art. 4º São incapazes,
relativa não contemplam mais a relativamente a certos atos, ou à maneira
deficiência. de os exercer:
O inciso III do art. 4º foi mal Art. 4º São incapazes,
posicionado, pois não se pode relativamente a certos atos ou à maneira
de os exercer: (Redação dada pela Lei nº
considerar relativamente incapaz uma 13.146, de 2015) (Vigência)
pessoa que se encontra em estado I - os maiores de dezesseis e
vegetativo (coma), já que em verdade é menores de dezoito anos;
absolutamente incapaz posto que não II - os ébrios habituais, os
pode exprimir vontade alguma. viciados em tóxicos, e os que, por
deficiência mental, tenham o
Por fim, o EPD modificou a discernimento reduzido;
expressão “índios” por “indígenas”, III - os excepcionais, sem
pois a primeira palavra é considerada desenvolvimento mental completo;
pejorativa. A capacidade dos indígenas

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II - os ébrios habituais e os Patrimônio Mínimo”, segundo a qual as
viciados em tóxico; (Redação dada pela normas civis devem resguardar um
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
III - aqueles que, por causa
mínimo patrimonial para que cada
transitória ou permanente, não puderem pessoa tenha vida digna. Esse
exprimir sua vontade; (Redação dada pensamento justifica as normas de
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) proteção do pródigo e as normas do
IV - os pródigos. bem de família.
Parágrafo único. A capacidade
dos índios será regulada por legislação
Outro ponto digno de nota é no
especial. sentido de que a idade avançada, por si
Parágrafo único. A capacidade só, não é causa de incapacidade civil,
dos indígenas será regulada por segundo pensamento tradicional.
legislação especial. (Redação dada pela A partir do Estatuto da Pessoa
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)”
com Deficiência, a deficiência mental
ou intelectual, como vimos, não é mais
Todas as hipóteses de
causa de incapacidade civil.
incapacidade decorrentes de deficiência
Assim, por exemplo, se o pai de
desapareceram. Salientamos, nos termos
João, Sr. Joaquim, tem 93 anos, e é
do novo sistema normativo a
portador de uma deficiência mental,
impropriedade do inc. III do art. 4º, na
ainda assim, é considerado legalmente
medida em que, pessoas impedidas de
capaz, embora possa ser nomeado um
exprimir vontade, a exemplo de quem
curador para representá-lo quanto a atos
está em coma, não poderiam ser
negociais ou patrimoniais.
consideradas apenas relativamente
2. Benefício de restituição ou restitutio
incapazes.
in integrum.
Ainda tratando da incapacidade
A expressão restitutio in integrum
relativa, observamos que os pródigos
não apenas pode se referir ao benefício
continuam contemplados na norma.
de restituição, mas também, no âmbito
O que se entende por pródigo?
da responsabilidade civil, pode
Segundo Clóvis Beviláqua, pródigo é
significar restituição ou reparação
aquele que desordenadamente gasta o
integral do dano. O benefício de
seu patrimônio, podendo reduzir-se à
restituição é um instituto clássico de
miséria. Em geral, decorre de um
Parte Geral de Direito Civil. Lembra
transtorno de personalidade, uma
Clóvis Beviláqua, em sua obra “Theoria
compulsão. Nos termos do art. 1782,
Geral do Direito Civil”, que este
por conta da sua relativa incapacidade,
benefício era concedido aos menores
poderá ser nomeado um curador ao
incapazes, a fim de que pudessem
pródigo, que irá assisti-lo apenas em
invalidar um ato perfeitamente
atos de conteúdo patrimonial. Vale
praticado alegando simples prejuízo.
acrescentar ainda, que o pródigo tem
Segundo esse jurista, esse benefício
liberdade para casar, de maneira que o
violaria o direito adquirido prejudicando
seu curador apenas deverá se manifestar
a circulação de bens.
quanto ao regime de bens escolhido.
O CC/1916, em seu art. 8º,
O processo de
expressamente proibia o benefício de
constitucionalização do Direito Civil
restituição. O CC/2002 é silente. Mas o
resultou no reconhecimento de que a
melhor entendimento é no sentido de
pessoa, e não o patrimônio, está no
que a proibição persiste, à luz do
epicentro do sistema normativo
princípio da boa-fé objetiva.
brasileiro. Nessa perspectiva, à luz do
Obs.: cf. no material de apoio,
princípio da dignidade da pessoa
apostila 01, os comentários ao art. 119
humana, o professor Luiz Édson Fachin
do CC.
elaborou a tese “Estatuto Jurídico do

5
para a definição da capacidade civil aos
3. Efeitos da redução da maioridade 18 anos não altera o disposto no art. 16,
I, da Lei n. 8.213/91, que regula
O art. 5º do CC estabelece que a específica situação de dependência
maioridade é atingida aos 18 anos econômica para fins previdenciários e
completos. outras situações similares de proteção,
Segundo Washington de Barros previstas em legislação especial.”
Monteiro, a maioridade é alcançada no
primeiro instante do dia do aniversário. 4. Emancipação
O mesmo autor afirma que ignorada a É instituto presente em diversos
data de nascimento, deverá ser feito sistemas no mundo a exemplo do que se
exame médico para a verificação da lê no art. 133 do CC de Portugal. A
maioridade e, havendo dúvida, pender- emancipação opera a antecipação da
se à pela capacidade (“in dubio pro capacidade plena podendo, em termos
capacitate”). classificatórios, ser:
A redução da capacidade civil dos i) voluntária (CC, 5º, p. ú, I,
21 para os 18 anos, causou acentuada primeira parte) – a emancipação
polêmica especialmente no âmbito dos voluntária é a concedida por ato dos
alimentos. pais, ou um deles na falta do outro,
A Jurisprudência do STJ já se mediante instrumento público, em
consolidou (REsp 347010/SP; REsp caráter irrevogável e independentemente
442502/SP; HC 55606/SP; STJ, 358), de homologação judicial, se o menor
no sentido de que o alcance da tiver ao menos dezesseis anos
maioridade não implica cancelamento completos; o menor deve participar do
automático da pensão. ato emancipatório, não para autorizar os
A título de complementação de pais, mas para que, dele tomando
pesquisa, vale lembrar que, conforme ciência, surta efeitos em sua esfera
parâmetro geral da jurisprudência, a jurídica.
pensão alimentícia é paga até a A doutrina (ver “A
conclusão dos estudos. responsabilidade dos pais pelos filhos
Contudo, a obrigatoriedade de menores” de Silvio Venosa), bem como
pagar pensão, nos termos do REsp a própria jurisprudência (REsp
1312706/AL, não alcança os estudos de 122573/PR, AgRg no Ag 1239557/RJ),
pós-graduação. apontam no sentido de que em caso de
Finalmente, o mesmo Tribunal emancipação voluntária, os pais
tem defendido a tese dos alimentos continuam solidariamente responsáveis
transitórios (REsp 1.388.955/RS), pelos ilícitos cometidos pelos filhos
segundo a qual os alimentos entre ex menores emancipados até que
cônjuges ou ex companheiros em que o completem 18 anos de idade.
credor tenha saúde e aptidão para o ii) judicial (CC, 5º, p. ú, I,
trabalho são temporários. segunda parte – é aquela concedida pelo
A redução da maioridade civil juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver
interferiu no âmbito previdenciário? dezesseis anos completos; ou
Segundo forte entendimento iii) legal (CC, 5º, II a V) – as
doutrinário, as normas previdenciárias hipóteses previstas nos incisos II a V
são especiais, de maneira que um são de emancipação por força de lei:
eventual auxilio ou benefício deve ser a) Casamento – ainda que o
pago até o limite previdenciário menor emancipado venha a se divorciar
estabelecido. ou separar, a emancipação persiste, uma
vez tais atos dissolutórios têm efeitos ex
“I Jornada de Direito Civil - nunc. Todavia, seguindo a melhor
Enunciado 3. A redução do limite etário

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doutrina (Tartuce, Simão, Zeno Veloso) cláusulas gerais. Sobre o tema, ver as
em caso de invalidação do casamento, obras de Judith Martins-Costa.
uma vez que os efeitos da sentença se Economia própria é um conceito aberto
projetam ex tunc, é razoável concluir, ou indeterminado que será preenchido
salvo caso de putatividade, que o ato pelo juiz de acordo com as
emancipatório perde efeitos. circunstâncias do caso concreto.
Veremos nas aulas de família, a Observação: o prof. Miguel Reale
excepcional hipótese de casamento Lembra (cf. parte final da apostila 01)
abaixo dos 16 anos (CC, 1520). que o CC/2002 é informado por três
b) exercício do emprego público princípios: o da operabilidade (aquele
efetivo – também, nos termos do inciso que orienta a codificação no sentido da
III, a emancipação pode decorrer do abertura de suas normas para melhor
exercício do emprego público efetivo. aplicação ao caso concreto); o da
Mas a expressão “emprego” deve ser socialidade (que projeta a função social
lido como “cargo” ou “função”. no CC); e o da eticidade (que projeta a
Segundo MHD, em seu “Curso de boa-fé no CC).
Direito Civil Brasileiro”, não haverá
emancipação em face de quem exerça “Art. 5º A menoridade cessa aos
mera função de confiança ou de quem dezoito anos completos, quando a pessoa
fica habilitada à prática de todos os atos
celebra contrato temporário com a da vida civil.
Administração Pública. Parágrafo único. Cessará, para os
c) colação de grau em curso de menores, a incapacidade:
ensino superior – a emancipação ainda I - pela concessão dos pais, ou de
deriva, nos termos do inciso IV, da um deles na falta do outro, mediante
instrumento público, independentemente
colação de Grau em curso de ensino de homologação judicial, ou por sentença
superior. Note-se que não é a aprovação do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver
em vestibular, mas a colação de grau dezesseis anos completos;
que emancipa. II - pelo casamento;
d) pelo estabelecimento civil ou III - pelo exercício de emprego
público efetivo;
comercial, ou pela existência de relação IV - pela colação de grau em
de emprego, desde que, em função curso de ensino superior;
deles, o menor com dezesseis anos V - pelo estabelecimento civil ou
completos tenha economia própria – comercial, ou pela existência de relação
finalmente, a emancipação poderá de emprego, desde que, em função deles,
o menor com dezesseis anos completos
decorrer do estabelecimento civil ou
tenha economia própria.”
estabelecimento comercial ou da relação
de emprego desde que o menor com Questões especiais envolvendo a
dezesseis anos completos tenha emancipação:
economia própria. 1) o menor emancipado que
Em nosso sentir, a perda do exerça atividade empresarial, na forma
emprego, ou o fim do estabelecimento da Lei de Falências, poderá falir.
civil ou comercial, não deve resultar no Eventual ilícito penal praticado deve ser
retorno à incapacidade, sob pena de tratado como ato infracional, na forma
insegurança jurídica. do ECA. Ver Paulo Henrique Sumariva
O que se entende por economia (“A lei de falências e inimputabilidade
própria? Como se sabe, o CC/2002 é um penal”). Vale lembrar que a
sistema aberto de normas, na emancipação não antecipa a capacidade
perspectiva do princípio da penal;
operabilidade (Miguel Reale) permeado 2) emancipação e alimentos – O
por inúmeros conceitos abertos e emancipado, assim como se dá com o

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maior de 18 anos, pode não perder o testemunhas se não houver o
direito aos alimentos, de acordo com as profissional (art. 77 e seguintes).
circunstâncias do caso concreto (AC Morte presumida. O CC
7001.142.9321/TJRS); estabelece situações de morte
3) emancipação e união estável – presumida, nos casos de ausência (art.
segundo a letra da Lei, o casamento 6º, 2º parte) e 22 e seguintes, e nas
emancipa e não a união estável. Mas, a hipóteses do art. 7º do CC (sem
questão comporta discussão na doutrina decretação de ausência).
(ver Thiago Simões: “A emancipação “Art. 6º A existência da pessoa
decorrente da união estável: uma natural termina com a morte; presume-se
esta, quanto aos ausentes, nos casos em
possibilidade jurídica”); que a lei autoriza a abertura de sucessão
4) emancipação e Código de definitiva.
Transito – o emancipado não pode obter Art. 7º Pode ser declarada a morte
a carteira de habilitação, uma vez que o presumida, sem decretação de ausência:
inc. I do art. 140 do CTB exige que a I - se for extremamente provável a
morte de quem estava em perigo de vida;
pessoa seja penalmente imputável. II - se alguém, desaparecido em
5) emancipação e prisão civil - campanha ou feito prisioneiro, não for
embora não tenha capacidade penal encontrado até dois anos após o término
admite-se a prisão civil do menor da guerra.
emancipado por débito alimentar. Isso Parágrafo único. A declaração da
morte presumida, nesses casos, somente
porque não se trata de uma prisão poderá ser requerida depois de esgotadas
criminal, mais de um meio coercitivo de as buscas e averiguações, devendo a
cumprimento da obrigação. Nessa linha, sentença fixar a data provável do
Otávio de Oliveira Pinto sustenta a falecimento.”
possibilidade de prisão civil, temperada Quanto à ausência recomenda-se
por um regime diferenciado, a exemplo fundamentalmente a leitura dos artigos
da prisão domiciliar (“A prisão civil do 22 e seguintes do CC; cf. também texto
menor emancipado devedor de complementar especial na área do
alimentos” Ed. Virtual Books). aluno. Essencialmente a ausência é um
procedimento. Em concursos, o que cai
Material de Apoio _ Direito Civil_ em geralmente é o texto da Lei.
Pablo Stolze_ Aula 03.pdf Conceitualmente, a ausência
Material do Professor - Direito Civil - ocorre quando a pessoa desaparece do
Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (3).pdf seu domicílio, sem deixar notícia ou
Material do Professor - Direito Civil - representante.
Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (4).pdf No momento em que é aberta a
5. Extinção da pessoa física sucessão definitiva dos bens do ausente
Nos termos do art. 6º do CC, a ele é considerado morto por presunção.
morte marca o fim da pessoa física ou Vale lembrar ainda, que o
natural. CPC/2015 refere-se à ausência nos
O Conselho Federal de Medicina artigos 744 e 745, valendo também
por meio das resoluções 1826/2007 e anotar que a sentença de ausência não é
1480/1997, dispõe a respeito do marco registrada no livro de óbitos, mas em
final da existência humana, livro especial, no cartório do domicílio
estabelecendo que “a morte encefálica anterior do ausente (LRP, art. 94).
equivale à morte clínica”. Também pode haver morte
A Lei de Registros Públicos (Lei presumida, sem decretação de ausência,
n. 6015/73), dispõe que a morte deverá nos termos do art. 7º do CC.
ser atestada por médico ou, Nas hipóteses ai previstas,
excepcionalmente, por duas existem contundentes indícios ou provas

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de que a morte aconteceu, embora o tratamento ou cuidado médico, na fase
corpo não haja sido encontrado. mais avançada da sua doença
Nas hipóteses do art. 7º, deve-se Em provas, só aplica-se a
instaurar um procedimento de comoriência se a questão der a ordem
justificação, a ser devidamente dos óbitos.
instruído, cuja sentença que declarar o *****
óbito deve ser registrada no próprio
livro de óbitos (livro “C”), cf. opinião PESSOA JURÍDICA
de Luis Ramon Alvares.
1. Introdução
6. Comoriência Orlando Gomes, em sua obra
O que é comoriência? “Introdução ao Direito Civil”, pondera
Inicialmente não devo confundir que a categoria da pessoa jurídica
comoriência com a premoriência, que (outrora denominada por Teixeira de
significa pré-morte. Freitas “ente de existência ideal”),
Comoriência significa morte decorreu da necessidade de se
simultânea. Nos termos do art. 8º do personificar grupos sociais para que
CC, não se podendo identificar a participassem melhor do comércio
sequência cronológica dos óbitos, jurídico. Em outras palavras, o conceito
aplica-se a presunção da comoriência, básico de pessoa jurídica decorreu do
no sentido de que os comorientes teriam fato associativo.
morrido ao mesmo tempo. Se isso Com efeito, respeitando a sua
ocorrer, abrem-se cadeias sucessórias origem sociológica, podemos definir
autônomas e distintas (um comoriente pessoa jurídica, a exemplo das
nada herda do outro). sociedades e das associações, como um
“Art. 8º Se dois ou mais grupo humano personificado, criado na
indivíduos falecerem na mesma ocasião, forma da lei, para realização de fins
não se podendo averiguar se algum dos
comorientes precedeu aos outros,
comuns.
presumir-se-ão simultaneamente Complementando esta noção, nos
mortos.” dias de hoje, diante da complexidade
Observação: Os comorientes não das relações sociais, surgem outras
precisam estar no mesmo local! A Lei pessoas jurídicas de estrutura peculiar
se refere apenas ao momento, pela das fundações e das EIRELI (empresas
expressão “ocasião”. Em geral, é no individuais de responsabilidade
mesmo lugar, mas não sempre. Dito de limitada).
outra forma, em geral, os comorientes
estão no mesmo lugar (v. g., mesmo 2. Teorias explicativas
avião). Mas podem não estar, uma vez Existem diversas teorias
que o art. 8º se refere à mesma ocasião. explicativas da natureza jurídica da
Observação 2: temas como pessoa jurídica: lógico-formal (Kelsen)
eutanásia, ortotanásia, aborto, e da teoria institucionalista (Hauriou).
testamento vital são vistos em outras Fundamentalmente, as correntes
grades do curso. doutrinárias que reputamos mais
Quanto ao testamento vital, a sua importantes são as seguintes: a) corrente
disciplina é feita pela Resolução n. negativista (BRINZ, BEKKER,
1995/2012 do CFM. É uma ato jurídico PLANIOL); e b) a corrente
expressão da dignidade da pessoa afirmativista.
humana, pelo qual o paciente emite uma A corrente negativista negava a
declaração de vontade antecipada no existência e a autonomia da pessoa
sentido de não querer determinado jurídica, reconhecendo-a como um

9
simples patrimônio coletivo, ou um Parágrafo único. Decai em três
mero grupo de pessoas. anos o direito de anular a constituição
das pessoas jurídicas de direito privado,
Prevaleceu, no entanto, a corrente por defeito do ato respectivo, contado o
afirmativista, que admitia a existência prazo da publicação de sua inscrição no
da pessoa jurídica. registro.”
Dentro da corrente afirmativista Obs.: caso não haja o registro,
há apenas três teorias fundamentais: estaremos diante de um ente
teoria da ficção (WINDSCHEID; despersonificado (art. 986),
SAVIGNY); teoria da realidade objetiva tradicionalmente tratado como
(Lacerda de Almeida, Clóvis sociedade irregular ou de fato
Beviláqua); teoria da realidade técnica (Waldemar Ferreira), tema do Direito
(FERRARA). Empresarial.
Para a teoria da ficção, a pessoa Em geral, o registro do ato
jurídica teria uma mera existência constitutivo é feito no CRPJ (cartório de
abstrata ou ideal, fruto da técnica pura registros de pessoas jurídicas) ou na
do direito, sem uma realidade objetiva Junta Comercial.
ou social. Excepcionalmente, nos termos da
A segunda teoria, por sua vez, segunda parte do art. 45 (cf. acima), a
reconhece a pessoa jurídica como um pessoa jurídica necessita de um
organismo social vivo, embora negue a autorização ou aprovação especial do
importância da técnica do Direito em Poder Executivo. Não é a regra. É o
sua formação. É uma teoria influenciada caso dos bancos ou das seguradoras,
pelo organicismo sociológico. Ela cai que necessitam de autorização da
no exagero oposto ao da teoria da SUSEP - superintendência de seguros
ficção, negando a importância da privados.
técnica do Direito. O que são os entes
Sem dúvida, a terceira teoria, da despersonificados? Trata-se, segundo a
realidade técnica, é a mais equilibrada. teoria geral do Direito Civil, nos termos
Em nosso sentir, é a teoria adotada pelo do art. 45 do Código, de entes que,
Direito Brasileiro. Segundo ela, a embora não sejam tecnicamente pessoas
pessoa jurídica teria existência e atuação jurídicas, têm capacidade processual
objetiva e social, embora a sua (art. 12, CPC/73; art. 75 CPC/2015). É
personalidade fosse conferida pela o caso do espólio, do condomínio, da
técnica do direito. herança jacente. Segundo MHD, seriam
Em que momento a pessoa grupos despersonalizados ou com
jurídica adquire personalidade? personificação anômala.
Diferentemente da pessoa física, o Quanto ao condomínio, é forte a
registro da pessoa jurídica é constitutivo doutrina no sentido de que se trata de
de sua personalidade, cf. art. 45 do CC. um ente despersonificado, embora tenha
Isso porque, segundo a expressa e CNPJ, por ficção tributária, o que é
literal dicção do art. 45 do CC, “começa reforçado pelo antigo PL 80/2011.
a existência legal” da pessoa jurídica a Questão de concurso: o que é
partir do registro do seu ato constitutivo corporação de mão morta? Tema
“Art. 45. Começa a existência estudado por “José Antônio Ávila”. O
legal das pessoas jurídicas de direito CC/1916 fazia referência a elas. Trata-
privado com a inscrição do ato
constitutivo no respectivo registro, se daquelas corporações que conservam
precedida, quando necessário, de perpetuamente os seus bens, isentos de
autorização ou aprovação do Poder encargos, e sem a obrigação de aliena-
Executivo, averbando-se no registro los, como as Igrejas e os Mosteiros,
todas as alterações por que passar o ato Santas Casas de Misericóridas etc.
constitutivo.

10
expulsão de um condômino? Já existe
3. Espécies básicas de pessoas jurídicas fundamento jurídico e jurisprudência
de direito privado nesse sentido.
O art. 44 do CC, em um rol não
exaustivo, dispõe sobre as pessoas
jurídicas de direito privado. Material de Apoio _ Direito
Aqui, trataremos das espécies Civil_ Pablo Stolze_ Aula 04.pdf
mais importantes, respeitados os limites O art. 57 do CC trata da expulsão
do Direito Empresarial: associações, do associado, e não do condômino. Em
fundações e sociedades. situações excepcionais, uma parcela da
Obs.: na apostila parte geral 02, doutrina (JDC, 508: “Verificando-se
ver o item 8, a respeito do art. 2031 do que a sanção pecuniária mostrou-se
CC. ineficaz, a garantia fundamental da
função social da propriedade (arts. 5º,
3.1. Associações XXIII, da CRFB e 1.228, § 1º, do CC) e
Conceito. As associações, a vedação ao abuso do direito (arts.
espécies de pessoas jurídicas de Direito 187 e 1.228, § 2º, do CC) justificam a
Privado, são formadas pela união de exclusão do condômino antissocial,
indivíduos para realização de fins não desde que a ulterior assembleia
econômicos (art. 53 do CC). prevista na parte final do parágrafo
Toda associação deve ter único do art. 1.337 do Código Civil
finalidade não econômica ou ideal. delibere a propositura de ação judicial
O ato constitutivo de uma com esse fim, asseguradas todas as
associação é seu estatuto (art. 54), que garantias inerentes ao devido processo
deve ser levado ao CRPJ. O órgão legal.”), como reflexo na jurisprudência
máximo de uma associação é sua (AC 957743-1 TJPR), à luz do princípio
assembleia geral, cujas atribuições estão da função social, admite a expulsão de
explicitadas no art. 59 do CC. um condômino, mediante ação judicial
Nos termos do art. 55, em uma que lhe imponha uma obrigação de não
associação, pode haver categorias fazer (não morar).
diferentes de associados, mas dentro de
cada categoria, não pode haver 3.2. Fundações
discriminação. Obs.: regra geral, à luz As fundações de direito privado
do art. 61, dissolvida uma associação, o resultam não da união de indivíduos,
seu patrimônio será atribuído a mas de um patrimônio que se
entidades de fins não econômicos personifica para realização de uma
designadas no estatuto, ou, omisso este, finalidade ideal (ponto em comum com
a instituição municipal estadual ou a associação), nos termos do art. 62 do
federal, de fins iguais ou semelhantes. CC.
Cf. art. 57 do CC, admite-se, “CAPÍTULO III
havendo justa causa, respeitado o DAS FUNDAÇÕES
Art. 62. Para criar uma fundação,
contraditório, a expulsão do associado. o seu instituidor fará, por escritura
“Art. 57. A exclusão do associado pública ou testamento, dotação especial
só é admissível havendo justa causa, de bens livres, especificando o fim a que
assim reconhecida em procedimento que se destina, e declarando, se quiser, a
assegure direito de defesa e de recurso, maneira de administrá-la.
nos termos previstos no estatuto. Parágrafo único. A fundação
(Redação dada pela Lei nº 11.127, de somente poderá constituir-se para fins
2005)” religiosos, morais, culturais ou de
Nessa linha de pensamento, é assistência.
juridicamente possível, também, a Parágrafo único. A fundação
somente poderá constituir-se para fins

11
de: (Redação dada pela Lei nº CPC/2015, segundo o qual o juiz
13.151, de 2015) decidirá quando houver dúvida quanto
I – assistência social;
(Incluído pela Lei nº 13.151, de 2015)
ao estatuto elaborado pelo MP;
II – cultura, defesa e conservação e) por fim, o registro do cartório
do patrimônio histórico e artístico; de registro de pessoas jurídicas
(Incluído pela Lei nº 13.151, de 2015) O art. 66 do CC, alterado pela Lei
III – educação; (Incluído pela n. 13151/2015, deixa claro a precípua
Lei nº 13.151, de 2015)
IV – saúde; (Incluído pela Lei
função fiscalizatória do MP em face das
nº 13.151, de 2015) fundações privadas.
V – segurança alimentar e “Art. 66. Velará pelas fundações o
nutricional; (Incluído pela Lei nº Ministério Público do Estado onde
13.151, de 2015) situadas.
VI – defesa, preservação e § 1º Se funcionarem no Distrito
conservação do meio ambiente e Federal, ou em Território, caberá o
promoção do desenvolvimento encargo ao Ministério Público Federal.
sustentável; (Incluído pela Lei nº (Vide ADIN nº 2.794-8)
13.151, de 2015) § 1º Se funcionarem no Distrito
VII – pesquisa científica, Federal ou em Território, caberá o
desenvolvimento de tecnologias encargo ao Ministério Público do Distrito
alternativas, modernização de sistemas Federal e Territórios. (Redação dada
de gestão, produção e divulgação de pela Lei nº 13.151, de 2015)
informações e conhecimentos técnicos e § 2º Se estenderem a atividade por
científicos; (Incluído pela Lei nº mais de um Estado, caberá o encargo, em
13.151, de 2015) cada um deles, ao respectivo Ministério
VIII – promoção da ética, da Público.”
cidadania, da democracia e dos direitos De acordo com esse dispositivo, a
humanos; (Incluído pela Lei nº função fiscalizatória primária das
13.151, de 2015) fundações privadas é do Ministério
IX – atividades religiosas; e
(Incluído pela Lei nº 13.151, de 2015)
Público estadual ou do MPDFT.
X – (VETADO). (Incluído Em situações especiais e
pela Lei nº 13.151, de 2015)” justificadas, o MPF poderá exercer
Requisitos para a constituição de atividade fiscalizatória, (cf. JDC, 147) a
uma fundação. exemplo de quando há suspeita desvios
a) afetação de bens livres do de recursos originados de convênio com
instituidor; a União.
b) instituição da fundação deve O art. do CC, 67, cuida dos
ser feita por escritura pública ou por requisitos para alteração do estatuto de
testamento; uma fundação. Para que se possa alterar
c) elaboração do estatuto da os estatuto da fundação.
fundação. O estatuto da fundação Nos termos do art. 68, vale
poderá ser elaborado diretamente por acrescentar, a minoria vencida, que
seu criador ou, nos termos do art. 65, discordou da alteração, terá o prazo
por um terceiro, em confiança. Caso decadencial de dez dias para impugnar a
este terceiro não elabore o estatuto, o alteração em juízo.
MP, subsidiariamente, poderá fazê-lo “Art. 67. Para que se possa alterar
o estatuto da fundação é mister que a
(ver “O MP e as Fundações Privadas”
reforma:
de Lincoln de Castro). I - seja deliberada por dois terços
d) aprovação do estatuto. Em dos competentes para gerir e representar
geral, a aprovação do estatuto é feito a fundação;
pelo MP. Caso o próprio MP elabore o II - não contrarie ou desvirtue o
estatuto, nos termos do art. 1.209 do fim desta;
III - seja aprovada pelo órgão do
CPC/1973, caberia ao juiz aprová-lo. Ministério Público, e, caso este a
Melhor é a redação do art. 764 do

12
denegue, poderá o juiz supri-la, a A profunda transformação
requerimento do interessado. experimentada pela teoria da empresa
III – seja aprovada pelo órgão do
Ministério Público no prazo máximo de
ao longo do século XX, dentre outros
45 (quarenta e cinco) dias, findo o qual efeitos, alterou a percepção jurídica do
ou no caso de o Ministério Público a fenômeno societário. E esta influência é
denegar, poderá o juiz supri-la, a percebida em nosso CC (art. 982).
requerimento do interessado. À luz da moderna teoria da
(Redação dada pela Lei nº 13.151, de
2015)
empresa, fonte de inspiração do art. 982
Art. 68. Quando a alteração não do CC, não mais civis ou mercantis, as
houver sido aprovada por votação sociedades hoje são: simples ou
unânime, os administradores da empresárias.
fundação, ao submeterem o estatuto ao Inicialmente, merece referência o
órgão do Ministério Público, requererão
que se dê ciência à minoria vencida para
art. 977 do CC, que trás uma regra
impugná-la, se quiser, em dez dias. peculiar. Nos termos deste dispositivo,
Finalmente, vale lembrar, que o os cônjuges não poderão contratar
art. 69 do CC trata do destino do sociedade, entre si ou com terceiros, se
patrimônio da fundação que acaba. forem casados em comunhão universal
Art. 69. Tornando-se ilícita, ou separação obrigatória de bens.
impossível ou inútil a finalidade a que Vale acrescentar ainda que, nos
visa a fundação, ou vencido o prazo de termos de forte corrente de pensamento
sua existência, o órgão do Ministério
no Brasil (ver parecer jurídico 125/2003
Público, ou qualquer interessado, lhe
promoverá a extinção, incorporando-se o do DNRC, hoje chamado DREI -
seu patrimônio, salvo disposição em Departamento de Registro Empresarial
contrário no ato constitutivo, ou no e Integração), as sociedades entre
estatuto, em outra fundação, designada cônjuges, constituídas antes do
pelo juiz, que se proponha a fim igual ou
CC/2002, não são atingidas pela regra
semelhante.”
do art. 977, à luz da garantia do ato
Delicada questão diz respeito à
jurídico perfeito.
cláusula de reversão dos bens da
Outro interessante aspecto
fundação extinta. Daniel Dias, na obra
introdutório, diz respeito ao p. ú. do art.
“Negócio Fundacional” (editara GEN),
982, segundo o qual por força de Lei,
em posição pioneira e singular, defende
a licitude da cláusula, ou seja, o considera-se empresária a sociedade por
ações, e simples as cooperativas..
instituidor poderá fazer os bens
A cooperativa, tema do Direito
voltarem para si ou para terceiro que ele
Empresarial, nos termos do referido p.
designar (cf. Ap 10529-0/2007 TJBA).
ú., é tratada com sociedade simples, o
que levou parte da doutrina (Julieta
3.3. Sociedades
Lunz; Paulo Rego) que o seu registro
Trata-se de um tema a ser
seria feito no CRPJ. Mas ainda é forte o
desenvolvido na grade de Direito
entendimento segundo o qual o registro
Empresarial, cabendo-nos apresentar
é feito na Junta Comercial (JDC, 69).
uma noção fundamental a respeito do
A diferença entre sociedade
assunto.
simples e empresária é um dos pontos
Diferentemente das associações e
mais profundos e complexos do Direito
fundações, a sociedade é pessoa jurídica
Empresarial, tendo em vista a polêmica
de Direito Privado constituída por meio
em torno do fenômeno da
de contrato social (art. 981), com o
empresarialidade. Em nosso sentir, o
objetivo de exercer atividade econômica
art. 982, concluímos que empresária é a
e partilhar lucro. Vale dizer, nos termos
sociedade que reúnem um elemento
do CC, sociedade tem finalidade
material – exercício de atividade
lucrativa.

13
tipicamente empresarial, aliada a um alterou o estatuto da OAB para admitir
elemento formal – registro na Junta que o advogado possa constituir uma
Comercial. Faltando qualquer um pessoa jurídica unipessoal para o
desses dois requisitos, a sociedade é exercício da advocacia.
simples. Finalmente, temos que a RFB,
Em verdade, a distinção prática aparentemente, mudou entendimento
nem sempre é fácil. Para facilitar a para reconhecer que mesmo a EIRELI
compreensão, acrescentamos que uma simples (v. g., aquela constituída por um
sociedade empresária, com registro na médico) deve ser tributada como pessoa
junta e sujeita a falência é marcada pela jurídica. Cf. Solução de Consulta n. 272
impessoalidade. Vale dizer, na da COSIT de 26-09-2014.
sociedade empresária, seus sócios *****
apenas articulam fatores de produção
(capital, trabalho, tecnologia, matéria Material de Apoio I - Direito Civil -
prima), sem que a figura de cada sócio Flavio Tartuce - Aula 05.pdf
seja pessoalmente indispensável ao Material de Apoio II - Direito Civil -
exercício da atividade (exemplos: Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
bancos, concessionárias). Material de Apoio III - Direito Civil -
Por outro lado, as sociedades Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
simples, registradas no CRPJ (em geral) Material de Apoio IV - Direito Civil -
e com regras próprias de dissolução, é Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
marcada pela pessoalidade, uma vez que Material de Apoio V - Direito Civil -
os próprios sócios pessoalmente Flávio Tartuce - Aula 05.pdf
realizam a sua atividade a exemplo da
sociedade de médicos, de advogados, DIREITOS DA PERSONALIDADE
etc. (artigos 11 a 21 do Código Civil)
O grande fenômeno com que se
depara hoje o jurista é a transformação 1. Conceito
de uma sociedade simples em Os direitos da personalidade são
empresária. aqueles inerentes à pessoa humana e à
sua dignidade.
3.4. Noções básicas de EIRELI Teoria dos direitos inatos da
Trata-se de instituto típico do pessoa. São direitos originários, teoria
Direito Empresarial. defendida por Rubens Limongi França,
A Lei n. 12441/2011 alterou o Carlos Alberto Bittar e MHD (bem
CC, art. 980-A para consagrar a EIRELI como Tartuce).
(EMPRESA INDIVIDUAL de A pessoa jurídica possui direitos
responsabilidade limitada), pessoa da personalidade não por sua natureza,
jurídica unipessoal, distinta do sujeito mas por equiparação legal (cf. CC, 52).
que a criou, e com responsabilidade “Art. 52. Aplica-se às pessoas
limitada ao seu capital (que deve ser no jurídicas, no que couber, a proteção dos
direitos da personalidade.”
mínimo de 100 salários mínimos). Cf.
Como os danos morais são lesões
ADI 4637.
aos direitos da personalidade, a pessoa
A doutrina tem admitido (João
jurídica pode sofrer dano moral, cf. STJ,
Glicério; Alexandre Gialluca) a
227.
constituição da denominada EIRELI
O CC/2002 tutela os seguintes
simples para o exercício de atividade
direitos da personalidade:
não empresarial, a exemplo daquela
- direito à vida;
constituída por um médico.
- direito à integridade físico-
Recentemente, a Lei n. 13247/2016
psíquica;

14
- direito ao nome; “Art. 8º Ao aplicar o ordenamento
- direito à honra (subjetiva, ou jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e
às exigências do bem comum,
auto estima, e objetiva, ou reputação resguardando e promovendo a dignidade
social); da pessoa humana e observando a
- direito à vida privada, proporcionalidade, a razoabilidade, a
intimidade e segredo; e legalidade, a publicidade e a eficiência.”
- direito à imagem (imagem Segundo Kant (que inspirou a
retrato, ou fisionomia e imagem colocação da dignidade na CRFB e no
atributo, ou repercussão social). CC), a dignidade da pessoa humana é
*Esses direitos foram especialmente aquilo que a pessoa é, como ser
desenvolvidos pela doutrina italiana. racional, considerando-se um fim em si
Obviamente, pessoa jurídica não mesmo. A pessoa humana é sempre fim,
conta com defesa ao direito à vida, à nunca meio. Se a pessoa for meio,
integridade física e psíquica, à honra instrumentalizada, haverá lesão à
subjetiva, vida privada, intimidade, mas dignidade humana).
apenas ao nome, à honra objetiva, ao *Aulas de Michael Sandel, professor de
segredo, bem como à imagem retrato Harvard, no Youtube com legendas em
(como a marca) e imagem atributo. português.
Rubens Limongi França dizia que Viola a dignidade humana:
os direitos da personalidade são os - contrato de prostituição?
direitos de integridade, e utilizava uma - “pessoa-seta”?
classificação tripartida: - contrato de venda de órgãos?
i) direitos de integridade física – - barriga de aluguel (gestação de
direito ao corpo, vivo ou morto; substituição remunerada)?
ii) direitos de integridade moral – Para Kant, as quatro situações
nome, honra, imagem, intimidade etc. violam a dignidade da pessoa humana.
iii) direitos de integridade Existem direitos da personalidade
intelectual – as invenções, criações, que estão previstos na CRFB/88 como
direitos de autor etc. direitos fundamentais, v. g., o direito de
O rol dos direitos da associação.
personalidade do CC/2002 é taxativo Segundo o Professor português
(numerus clausus) ou exemplificativo José de Oliveira Ascensão, trata-se de
(numerus apertus)? Trata-se de rol uma questão de perspectiva, pela qual
exemplificativo, posto que existem os direitos de personalidade estão para o
outros direitos da personalidade. Cf. Direito Civil, assim como os direitos
JDC, 274: “Os direitos da fundamentais estão para o Direito
personalidade, regulados de maneira Constitucional, bem assim como os
não-exaustiva pelo Código Civil, são direitos humanos estão para o Direito
expressões da cláusula geral de tutela Internacional.
da pessoa humana, contida no art. 1º, Ademais, existem direitos da
inc. III, da Constituição (princípio da personalidade que sequer estão escritos,
dignidade da pessoa humana). Em caso a exemplo do direito à opção sexual (cf.
de colisão entre eles, como nenhum REsp 613374/MG, conhecido como
pode sobrelevar os demais, deve-se “Hélio Bicha”) e o direito ao
aplicar a técnica da ponderação.” esquecimento (JDC, 531: “A tutela da
*A técnica da ponderação foi dignidade da pessoa humana na
desenvolvida na Alemanha por Robert sociedade da informação inclui o
Alexy. direito ao esquecimento”).
Cf. ainda o art. 8º do CPC, que é * Quanto a este último, direito ao
um complemento ao art. 5º da LINDB: esquecimento, cf. REsp 1334097/RJ

15
(caso em que a Rede Globo foi - C é a conclusão, com enunciado
condenada por publicar no programa de preferência (e, como quer o
Linha Direta uma história que CPC/2015, fundamentada em critérios
contradizia absolvição no caso da objetivos.
Chacina da Candelária). Ex.: um paciente médico, chega a
**Caso da Xuxa, e seu filme “Amor, um Hospital baleado e de madrugada. O
estranho amor”, quando entrou com médico de plantão ordena a cirurgia de
ação contra a Bandeirantes, que estava emergência e o paciente afirma que, por
prestes a reapresentar o filme. Houve convicções religiosas, não quer se
um acordo e a empresa não mais exibiu submeter à intervenção (Testemunha de
o filme. Jeová), pois não aceita transfusão
CPC, 489: sanguínea. O médico e sua equipe,
“Seção II guiados pelo art. 15 do CC e pelo
Dos Elementos e dos Código de Ética Médica, sedam ao
Efeitos da Sentença
Art. 489. São elementos
paciente e realizam a cirurgia, salvando
essenciais da sentença: a sua vida. Anos após, o paciente
(...) ingressa com ação de indenização por
§ 2º No caso de colisão entre danos morais contra o médico, sua
normas, o juiz deve justificar o objeto e equipe e o hospital. Como juiz, decida.
os critérios gerais da ponderação P1 P2
efetuada, enunciando as razões que
Dignidade Vida Dignidad Direito à
autorizam a interferência na norma
humana e opção
afastada e as premissas fáticas que
humana religiosa
fundamentam a conclusão.
T1 T2 T3 T4
Foi adotada a técnica da Cirurgia Não Vida Ação de
ponderação de Humberto Ávila, de aceita salva indenizaçã
sobre normas de qualquer natureza, e emergênci transfusã o
não a de Robert Alexy – para este a o
último, a ponderação se aplica apenas sanguíne
a
aos direitos fundamentais.
Nesses casos de ação de
Para Robert Alexy, os direitos
indenização, o que se tem entendido que
fundamentais tem a forma de princípios
prevalece o direito à vida.
e seriam mandamentos de otimização.
Ex.2: Caso Daniela Cirelli, que
Os direitos fundamentais, como
estava na praia mantendo relações
princípios e mandamentos de
sexuais com o namorado e foi filmada.
otimização, podem ser aplicados a
Duas demandas: 1) tutela inibitória; 2)
qualquer relação jurídica, inclusive as
responsabilidade civil. A primeira foi
privadas e, nessa realidade, é comum a
julgada procedente, posto que o direito
existência de conflito entre eles.
à intimidade prevalece sobre o direito à
*Ler o artigo do professor em que
informação. Na ação de
debateu com Lenio Streck a validade da
responsabilidade civil, julgou-se
ponderação. Segundo Lenio, a
improcedente, posto que ela assumiu o
ponderação vem sendo utilizada como
risco quando se expôs, prevalecendo o
varinha de Harry Potter ou teoria da
direito à informação sobre à intimidade.
Katachanga real.
Perceba-se: mudou o pedido, mudou o
Fórmula da ponderação:
peso do princípio.
- P1 e P2 são os
Stefano Rodotari (italiano) –a
princípios/direitos fundamentais/normas
pessoa que se exibe profissionalmente
em colisão;
deve ter sua intimidade analisada de
- T1, T2, T3, ..., Tn são os fatores
forma diferente daquela pessoa comum
fáticos;
que, ao contrário, foge da evidência.

16
Os principais casos de ponderação Os direitos da personalidade, em
no STF e STJ envolvem direito à regra, são intrasmissíveis,
intimidade e á imagem (cRFB, 5º, V e irrenunciáveis e indisponíveis. A pesar
X) vs. direito à informação e a liberdade do CC, 11, ab initio se referir aos “casos
de imprensa (art. 5º, IV, IX e XIV da previstos em lei”, casos há em que tais
CRFB). A jurisprudência, características sedem sem previsão
principalmente do STF, tem dado maior legal.
peso à liberdade de imprensa (direito de Entretanto, existe uma parcela dos
informação que, na dúvida, é atribuído direitos da personalidade, relacionada a
maior peso). Exemplo do julgamento aspectos patrimoniais, que é
das biografias não autorizadas. transmissível, renunciável e disponível.
*Enquanto nos países europeus se dá Exemplos: uso da imagem com
maior peso à intimidade e à imagem, fins econômicos; direitos morais do
nos EUA o peso maior é do direito à autor e os respectivos direitos
informação. patrimoniais de autor (Lei n. 9610/98).
JDC, 279: “A proteção à imagem Enunciados das JDC:
deve ser ponderada com outros “I Jornada de Direito Civil -
interesses constitucionalmente Enunciado 4 O exercício dos direitos da
personalidade pode sofrer limitação
tutelados, especialmente em face do voluntária, desde que não seja
direito de amplo acesso à informação e permanente nem geral.”
da liberdade de imprensa. Em caso de Exemplo: contrato de uso vitalício
colisão, levar-se-á em conta a de imagem, no Brasil, é nulo por
notoriedade do retratado e dos fatos ilicitude do objeto. Cf. artigos 11 e 166,
abordados, bem como a veracidade II. Dizem também que é o caso do
destes e, ainda, as características de Ronaldo com Nike.
sua utilização (comercial, informativa, “III Jornada de Direito Civil -
biográfica), privilegiando-se medidas Enunciado 139. Os direitos da
que não restrinjam a divulgação de personalidade podem sofrer limitações,
ainda que não especificamente previstas
informações.” em lei, não podendo ser exercidos com
O último aspecto é denominado abuso de direito de seu titular,
função social da imagem por Tartuce. contrariamente à boa-fé objetiva e aos
*Imagem atual, finalidade da imagem, bons costumes.”
tempo de exposição dentre outros são CC, 187. O exemplo é o abuso na
temas tratados por Anderson Sheraiber. informação ou na veiculação da notícia.
Ver REsp 1195995/SP. Versou Cf. acima caso “Hélio Bicha”.
sobre o direito de não saber (intimidade)
vs. direito à saúde da pessoa e de ii) art. 12 – tutela da
terceiros. personalidade
“Art. 12. Pode-se exigir que [1]
cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da
2. Análise dos artigos do CC personalidade, e [2] reclamar perdas e
relacionados aos direitos da danos, sem prejuízo de outras sanções
personalidade previstas em lei.
i) art. 11 – características dos Parágrafo único. Em se tratando
direitos da personalidade de morto, terá legitimação para requerer
“CAPÍTULO II a medida prevista neste artigo o cônjuge
DOS DIREITOS DA sobrevivente, ou qualquer parente em
PERSONALIDADE linha reta, ou colateral até o quarto grau.”
Art. 11. Com exceção dos casos Em “1”, trata-se do princípio da
previstos em lei, os direitos da prevenção. Cabem medidas de tutela
personalidade são intransmissíveis e específica (ex.: multa diária ou
irrenunciáveis, não podendo o seu astreintes), cf. CPC, 497.
exercício sofrer limitação voluntária.”

17
“Seção IV sobrinhos, primos, tios-avós e sobrinhos-
Do Julgamento das Ações netos].”
Relativas às Prestações de Fazer, de Não “Art. 20.
Fazer e de Entregar Coisa (...)
Parágrafo único. Em se tratando
Art. 497. Na ação que tenha por de morto ou de ausente, são partes
objeto a prestação de fazer ou de não legítimas para requerer essa proteção o
fazer, o juiz, se procedente o pedido, cônjuge, os ascendentes ou os
concederá a tutela específica ou descendentes.”
determinará providências que assegurem Mudaram o art. 12 e esqueceram
a obtenção de tutela pelo resultado de modificar o art. 20. Atenção a esse
prático equivalente.
detalhe em provas, pois pode ser que
Parágrafo único. Para a seja certo incluir o companheiro (a
concessão da tutela específica destinada doutrina inclui companheiro nos dois,
a inibir a prática, a reiteração ou a cf. JDC, 275). No art. 20, p. ú., a
continuação de um ilícito, ou a sua doutrina inclui também os colaterais
remoção, é irrelevante a demonstração da
ocorrência de dano ou da existência de
(por todos (Silmara Chinellato).
culpa ou dolo.” Exemplos: livros biografia de
Em “2” estamos diante do Garrincha e Lampião (“O Mata Sete”).
princípio da reparação integral dos “V Jornada de Direito Civil -
Enunciado 398 - As medidas previstas no
danos, através de ação reparatória de art. 12, parágrafo único, do Código
danos materiais, morais, e estéticos. Cf. Civil podem ser invocadas por qualquer
STJ, 37 (“São cumuláveis as uma das pessoas ali mencionadas de
indenizações por dano material e dano forma concorrente e autônoma.”
moral oriundos do mesmo fato.”) e 387 “V Jornada de Direito Civil -
Enunciado 400 – Os parágrafos únicos
(“É lícita a cumulação das indenizações dos arts. 12 e 20 asseguram
de dano estético e dano moral.”): legitimidade, por direito próprio, aos
“III Jornada de Direito Civil - parentes, cônjuge ou companheiro para
Enunciado 140. A primeira parte do art. a tutela contra lesão perpetrada post
12 do Código Civil refere-se às técnicas mortem.”
de tutela específica, aplicáveis de ofício, Então, são dois lesados indiretos:
enunciadas no art. 461 do Código de
Processo Civil [497 do CPC/2015],
o dano indireto ou dano em ricochete,
devendo ser interpretada com resultado que atinge o morto e repercute no
extensivo.” familiar; e o dano direto, que atinge o
próprio familiar.
Material de Apoio - Direito Civil -
Flávio Tartuce - Aula 06.pdf
O art. 12, p. ú., adotando o iii) art. 13 - tutela da integridade
modelo português, reconhece direitos da físico-psíquica. Direito ao corpo vivo.
personalidade do morto (geral), e deve É defeso o ato de disposição do
ser confrontado com o art. 20, p. ú, que próprio corpo, quando importar
reconhece direito à imagem do morto diminuição permanente da integridade
(específico). Nos dois artigos há física, ou contrariar os bons costumes,
legitimidade dos lesados indiretos, que salvo por exigência médica.
são seus familiares (dano em ricohete) “Art. 13. Salvo por exigência
“Art. 12. médica, é defeso o ato de disposição do
(...) próprio corpo, quando importar
Parágrafo único. Em se tratando diminuição permanente da integridade
de morto, terá legitimação para requerer física, ou contrariar os bons costumes.
a medida prevista neste artigo o cônjuge Parágrafo único. O ato previsto
sobrevivente, ou qualquer parente em neste artigo será admitido para fins de
linha reta [ascentedentes e descentes], ou transplante, na forma estabelecida em lei
colateral até o quarto grau [irmãos, tios, especial.”

18
Obs.: transexualismo (patologia) falecidas para transplantes ou outra
vs. transexualidade (condição). Ainda é finalidade terapêutica, dependerá da
autorização do cônjuge ou parente, maior
tratado como transtorno. Com indicação de idade, obedecida a linha sucessória,
médica é possível a cirurgia de reta ou colateral, até o segundo grau
transgenitalização. Realizada a cirurgia, inclusive, firmada em documento
deve ocorrer a mudança do nome e do subscrito por duas testemunhas presentes
sexo no registro civil (cf. Inf. 411 STJ). à verificação da morte. (Redação dada
pela Lei nº 10.211, de 23.3.2001)
Há tendência de ser passar a ser Parágrafo único. (VETADO)
transexualidade. Este tema encontra-se (Incluído pela Lei nº 10.211, de
com repercussão geral reconhecida no 23.3.2001)”
STF. Qual vontade prevalece, do
“IV Jornada de Direito Civil - doador ou do familiar? Prevalece a
Enunciado 276 – O art. 13 do Código vontade do doador, posto que se trata de
Civil, ao permitir a disposição do próprio
corpo por exigência médica, autoriza as direito personalíssimo:
cirurgias de transgenitalização, em “IV Jornada de Direito Civil -
conformidade com os procedimentos Enunciado 277 – O art. 14 do Código
estabelecidos pelo Conselho Federal de Civil, ao afirmar a validade da
Medicina, e a conseqüente alteração do disposição gratuita do próprio corpo,
prenome e do sexo no Registro Civil.” com objetivo científico ou altruístico,
para depois da morte, determinou que a
Serve para todos os fins jurídicos, manifestação expressa do doador de
como penal (aplicação da Lei Maria da órgãos em vida prevalece sobre a
Penha), trabalhistas, previdenciários. vontade dos familiares, portanto, a
Se o casamento for celebrado e o aplicação do art. 4º da Lei n. 9.434/97
transexual (agora mulher) não revelar ficou restrita à hipótese de silêncio do
potencial doador.”
sua situação anterior, caberá anulação
Quando houver dissenso entre os
por erro? A resposta atual ainda é sim
parentes, a solução provável é a não
(Carlos Roberto Gonçalves; MHD).
doação.
v) direitos do paciente médico
iv) Direito ao corpo morto -
(Art. 15):
disposições post mortem de partes do “Art. 15. Ninguém pode ser
corpo. As disposições post mortem são constrangido a submeter-se, com risco de
possíveis a título gratuito, com os vida, a tratamento médico ou a
objetivos científicos ou de transplantes, intervenção cirúrgica.”
sendo o ato revogável a qualquer tempo. A expressão “risco de vida” é
É proibida a venda de órgãos. jurídica, pois significa risco de morte.
“Art. 14. É válida, com objetivo Cuidado como for cobrado em
científico, ou altruístico, a disposição concursos, pois as duas formas podem
gratuita do próprio corpo, no todo ou em ser consideradas corretas, mas se é
parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de cobrado o texto da lei, deve-se segui-lo
disposição pode ser livremente revogado à risca.
a qualquer tempo.” Esse dispositivo não pode excluir
A matéria também é tratada pela o direito à vida (bem maior), em regra.
Lei n. 9434/1997, pelo princípio do Estão em jogo dois princípios: da
consenso afirmativo: beneficência e da não maleficência (o
“CAPÍTULO II profissional da área da saúde deve fazer
DA DISPOSIÇÃO POST MORTEM DE o bem e não pode fazer o mal).
TECIDOS, ÓRGÃOS E PARTES DO
CORPO HUMANO PARA FINS O problema do “testamento”
DE TRANSPLANTE. biológico ou vital. Código de Ética
(...) Médica:
Art. 4º A retirada de tecidos, “Capítulo V
órgãos e partes do corpo de pessoas RELAÇÃO COM PACIENTES

19
E FAMILIARES 2) sobrenome, patronímico ou
É vedado ao médico: nome de família, que também pode ser
(...)
Art. 41. Abreviar a vida do
simples ou composto;
paciente, ainda que a pedido deste ou de 3) partículas (de, dos, da...);
seu representante legal. 4) agnome (expressão de
Parágrafo único. Nos casos de manutenção de nome anterior, como
doença incurável e terminal, deve o Júnior, Filho, Neto, Sobrinho,
médico oferecer todos os cuidados
paliativos disponíveis sem empreender
Segundo);
ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis Além desses elementos, o art. 19
ou obstinadas, levando sempre em do CC, bem como na L9610/98, há
consideração a vontade expressa do também proteção do pseudônimo, que é
paciente ou, na sua impossibilidade, a de o nome por trás do qual se esconde o
seu representante legal.”
autor de obra intelectual, cultural ou
Testamento biológico ou vital é
artística (inclui o nome artístico).
uma declaração feita pelo paciente ou
Exemplos: Ricardo Reis, Tiririca, Silvio
seus representantes quais os tratamentos
Santos, Xuxa.
médicos deseja ou não se submeter (ou
Segundo a Lei de Registros
seja, dirigida aos profissionais da área
Públicos (Lei n. 6015/73), o nome, em
de saúde). Representa o direito à morte
regra, é imutável, cf. art. 58. Exceções:
com dignidade.
alteração administrativa; modificação
Essa declaração é admitida
judicial (ação de retificação de registro
também pela Res. CFM 1.995/2012,
civil).
denominada com diretivas antecipadas
Hipóteses de alteração do nome:
de vontade dos pacientes.
a) nome que expõe a pessoa ao
Cf. www.testamentovital.com.br
“V Jornada de Direito Civil -
ridículo, inclusive em caso de
Enunciado 528 – É válida a declaração homonímias (nomes iguais). Exemplo:
de vontade expressa em documento Jacinto Aquino Rego, Sum Tim Am,
autêntico, também chamado "testamento Armando Pinto, Francisco de Assis
vital", em que a pessoa estabelece Pereira (Maníaco do Parque), Valdisnei
disposições sobre o tipo de tratamento
Miquei Donald, Jacinto Pinto Aquino
de saúde, ou não tratamento, que deseja
no caso de se encontrar sem condições Rego.
de manifestar a sua vontade.” b) tradução de nomes
Isso porque é possível a estrangeiros: John – João; Mary –
ortotanásia, que é o não emprego de Maria; Josehp – José; Bill – Guilherme;
técnicas de sobrevivência. Seu contrário c) erro crasso de grafia.
é a distanásia. De qualquer forma não se Exemplos: Frávio, Cráudio, Gredtoni
confunde com a eutanásia. (Gladston);
d) adequação de sexo;
vi) tutela do nome – artigos 16 a e) introdução de alcunhas,
19. O nome é o sinal que representa a cognomes ou apelidos. Ex.: Xuxa.
pessoa na sociedade. Todos os f) casamento, união estável,
elementos do nome estão protegidos: reconhecimento de filho e adoção.
“Art. 16. Toda pessoa tem direito g) proteção de testemunhas (Lei
ao nome, nele compreendidos o prenome 9807/99);
e o sobrenome.
h) inclusão de sobrenome de
(...)
Art. 19. O pseudônimo adotado padrasto ou madrasta por enteado ou
para atividades lícitas goza da proteção enteada havendo justo motivo e
que se dá ao nome.” concordância deste (Lei Clodovil – Lei
1) prenome, ou primeiro nome, n. 11924/2009);
que pode ser simples ou composto;

20
i) inclusão de nome de família Esse artigo tem muitos problemas.
remoto para obtenção de cidadania É necessário traduzi-lo: Em regra, a
estrangeira. Tema não pacífico na utilização da imagem alheia depende da
jurisprudência. autorização do seu titular, com duas
j) casos de abandono afetivo pelo exceções:
pai, retirando-se o seu sobrenome (REsp - administração da Justiça (v. g., a
1.304.718/SP) solução de crimes);
Obs.: lei n. 6015/73, art. 56: - ordem pública.
“Art. 56. O interessado, no Esse artigo, levado à risca,
primeiro ano após ter atingido a conduza à censura. Para que isso não
maioridade civil, poderá, pessoalmente
ou por procurador bastante, alterar o
ocorra, o dispositivo deve ser ponderado
nome, desde que não prejudique os com outros valores constitucionais
apelidos de família, averbando-se a como a liberdade de imprensa e o
alteração que será publicada pela direito à informação. Cf. CRFB, artigos
imprensa. (Renumerado do art. 57, pela 5ª, IV, IX e XIV.
Lei nº 6.216, de 1975).” “Art. 5º
Tem-se entendido que esse prazo (...)
de um ano não se aplica havendo IV - é livre a manifestação do
motivo plausível para modificação, pensamento, sendo vedado o anonimato;
como nos casos de lesão à dignidade (...)
IX - é livre a expressão da
humana, (segundo Tartuce a ação seria atividade intelectual, artística, científica
imprescritível) Cf. REsp 538187/RJ. e de comunicação, independentemente de
Prevenção e reparação integral censura ou licença;
na tutela do nome: artigos 17 e 18. (...)
“Art. 17. O nome da pessoa não XIV - é assegurado a todos o
pode ser empregado por outrem em acesso à informação e resguardado o
publicações ou representações que a sigilo da fonte, quando necessário ao
exponham ao desprezo público, ainda exercício profissional;”
quando não haja intenção difamatória Foi o que fez o STF no
[essa parte sublinhada é irrelevante no julgamento das biografias não
dispositivo]. autorizadas (ADIN 4815), concluindo
Art. 18. Sem autorização, não se
pode usar o nome alheio em propaganda
que não cabe a proibição a priori. A
[na verdade, publicidade. Propaganda é análise é a posteriori da eventual
termo técnico que se refere a responsabilidade civil.
proselitismo político] comercial.” “IV Jornada de Direito Civil -
Enunciado 279 – A proteção à imagem
vii) tutela da imagem – refere-se deve ser ponderada com outros
interesses constitucionalmente tutelados,
tanto à proteção da imagem retrato especialmente em face do direito de
(fisionomia, fotografia) quanto atributo amplo acesso à informação e da
(repercussão social). Essa divisão é liberdade de imprensa. Em caso de
atribuída a Adriano De Cupis. colisão, levar-se-á em conta a
“Art. 20. Salvo se autorizadas, ou notoriedade do retratado e dos fatos
se necessárias à administração da justiça abordados, bem como a veracidade
ou à manutenção da ordem pública, a destes e, ainda, as características de sua
divulgação de escritos, a transmissão da utilização (comercial, informativa,
palavra, ou a publicação, a exposição ou biográfica), privilegiando-se medidas
a utilização da imagem de uma pessoa que não restrinjam a divulgação de
poderão ser proibidas, a seu informações.”
requerimento e sem prejuízo da Atenção: STJ, 403: “Independe de
indenização que couber, se lhe atingirem prova do prejuízo a indenização pela
a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, publicação não autorizada de imagem
ou se se destinarem a fins comerciais.
(Vide ADIN 4815)”
de pessoa com fins econômicos ou
comerciais.” É irrelevante o atentado à

21
honra e à boa fama como consta ao final Em regra, o domicilio da pessoa
do art. 20, pois o uso indevido de natural é o local de sua residência, ou
imagem não autorizada gera dano moral seja, aquele onde ela se estabelece com
presumido (in re ipsa). É o que se ânimo definitivo de permanência.
chama na Itália de “lucro na Considera-se residência onde a
intervenção”. pessoa mantêm seus bens de uso
pessoal, particular, íntimo.
viii) tutela da intimidade, vida “TÍTULO III
privada e segredo (CC, 21) Do Domicílio
“Art. 21. A vida privada da Art. 70. O domicílio da pessoa
pessoa natural é inviolável [CRFB, 5º, natural é o lugar onde ela estabelece a
X], e o juiz, a requerimento do sua residência com ânimo definitivo.”
interessado, adotará as providências A Lei admite a pluralidade dos
necessárias para impedir ou fazer cessar domicílios residenciais:
ato contrário a esta norma. (Vide ADIN “Art. 71. Se, porém, a pessoa
4815)” natural tiver diversas residências, onde,
A vida privada da pessoa natural alternadamente, viva, considerar-se-á
em verdade não é inviolável. A domicílio seu qualquer delas.”
intimidade não é absoluta, devendo ser Existe também o domicílio laboral
ponderada com outros direitos e valores. ou profissional:
“Art. 72. É também domicílio da
Exemplos: raio-X em aeroportos, pessoa natural, quanto às relações
biografias, fiscalização de e-mails concernentes à profissão, o lugar onde
corporativos, fiscalização do local de esta é exercida.
trabalho. Anderson Shreiber. Parágrafo único. Se a pessoa
exercitar profissão em lugares diversos,
cada um deles constituirá domicílio para
Observação. Muitos autores as relações que lhe corresponderem.”
afirmam que os direitos da Perceba-se que também é
personalidade são imprescritíveis admissível a pluralidade de domicílios
(Rubens Limongi França, Francisco profissionais, cf. o p. ú. acima.
Amaral e MHD). Porém, prevalece na Essa é uma diferença do atual CC
doutrina e na jurisprudência a tese com o anterior, posto que no antigo
segundo a qual a ação de reparação de admitia-se apenas um domicílio que, de
danos por lesão à personalidade regra, era o residencial. Agora, temos
prescreve em três anos (CC, art. 206, § dois domicílios, o pessoal e o
3º V; Carlos Roberto Gonçalves, Pablo profissional, sendo essa nossa regra
Stolze e Rodolfo Pamplona; Tartuce atual.
também). Para a pessoa que não tenha
Entretanto, o STJ tem entendido residência fixa (habitual), o local de
que a ação de reparação de danos, no domicílio é o lugar onde for encontrada:
caso de tortura (ditadura) é “Art. 73. Ter-se-á por domicílio
imprescritível. AgRg no REsp da pessoa natural, que não tenha
1480428/RS. residência habitual, o lugar onde for
encontrada.”
Material de Apoio - Direito Civil - Exemplos: nômades (hippies,
Flavio Tartuce - Aula 01 On line.pdf ciganos, circenses). Caixeiro viajante
não é exemplo, tendo em vista que ele
DOMICÍLIO possui vários domicílios.
Classificação do domicílio da
1.Conceito pessoa natural:
a) domicílio voluntário – aquele
1.1. Domicílio da pessoa natural que decorre da autonomia privada, isto

22
é, da intenção manifesta de mudar ou de heterotópicas, pois são de cunho
se estabelecer em um local: material.
“Art. 74. Muda-se o domicílio, “Seção V
transferindo a residência, com a intenção Da Declaração de Incompetência
manifesta de o mudar. Art. 112. Argúi-se, por meio de
Parágrafo único. A prova da exceção, a incompetência relativa.
intenção resultará do que declarar a Parágrafo único. A nulidade da
pessoa às municipalidades dos lugares, cláusula de eleição de foro, em contrato
que deixa, e para onde vai, ou, se tais de adesão, pode ser declarada de ofício
declarações não fizer, da própria pelo juiz, que declinará de competência
mudança, com as circunstâncias que a para o juízo de domicílio do réu.
acompanharem.” (Incluído pela Lei nº 11.280, de 2006)”
b) domicílio legal ou necessário – No CPC/2015 ficou assim:
é aquele imposto pela norma jurídica, “Art. 63. As partes podem
nas hipóteses do art. 76 do Código modificar a competência em razão do
valor e do território, elegendo foro onde
Civil. O domicílio legal não será proposta ação oriunda de direitos e
necessariamente exclui o voluntário. obrigações. [conceito legal]
“Art. 76. Têm domicílio § 1º A eleição de foro só produz
necessário o incapaz, o servidor público, efeito quando constar de instrumento
o militar, o marítimo e o preso. escrito e aludir expressamente a
Parágrafo único. O domicílio do determinado negócio jurídico.
incapaz é o do seu representante ou § 2º O foro contratual obriga os
assistente; o do servidor público, o lugar herdeiros e sucessores das partes.
em que exercer permanentemente suas § 3º Antes da citação, a cláusula
funções; o do militar, onde servir, e, de eleição de foro, se abusiva, pode ser
sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a reputada ineficaz [atenção ao comentário
sede do comando a que se encontrar abaixo] de ofício pelo juiz, que
imediatamente subordinado; o do determinará a remessa dos autos ao juízo
marítimo, onde o navio estiver do foro de domicílio do réu.
matriculado; e o do preso, o lugar em § 4º Citado, incumbe ao réu
que cumprir a sentença.” alegar a abusividade da cláusula de
c) domicílio contratual – fixados eleição de foro na contestação, sob pena
em contratos escritos, para o exercício e de preclusão.”
cumprimento de direitos e obrigações a Ou seja, no § 3º parece ter havido
eles concernentes. Exemplos: local do um retrocesso porque apesar de não
pagamento, da prestação do serviço, da mencionar aplica-se a contratos de
entrega da mercadoria, da entrega do adesão. Inclusive, pelo CDC, será
imóvel, da entrega das chaves, da entra cláusula nula, mas pelo CPC será
da obra e assim sucessivamente. ineficaz.
“Art. 78. Nos contratos escritos,
poderão os contratantes especificar 1.2. Domicílio das pessoas jurídicas de
domicílio onde se exercitem e cumpram direito público e de direito privado
os direitos e obrigações deles “Art. 75. Quanto às pessoas
resultantes.” jurídicas, o domicílio é:
Atenção! Domicílio contratual I - da União, o Distrito
não se confunde com a cláusula de Federal;
eleição de foro. II - dos Estados e Territórios,
No CPC/73, art. 112, havia as respectivas capitais;
III - do Município, o lugar
previsão da nulidade da cláusula de onde funcione a administração
eleição de foro em contrato de adesão municipal [Prefeitura];
com possibilidade de conhecimento de IV - das demais pessoas
ofício. jurídicas, o lugar onde funcionarem as
*Apesar de se tratarem de normas respectivas diretorias e administrações,
ou onde elegerem domicílio especial
constantes do CPC, as regras abaixo são no seu estatuto ou atos constitutivos

23
[domicílio estatutário da pessoa da personalidade jurídica (“disregard of
jurídica]. the legal entity” ou “disregard
§ 1º Tendo a pessoa jurídica
diversos estabelecimentos em lugares
doctrine”, ou ainda “teoria da
diferentes, cada um deles será penetração”).
considerado domicílio para os atos nele Segundo Fábio Ulhoa Coelho,
praticados. [ou seja, há pluralidade de levanta-se o véu da pessoa jurídica.
domicílios também da pessoa jurídica] Também se fala em retirar o escudo da
§ 2º Se a administração, ou
diretoria, tiver a sede no estrangeiro,
pessoa jurídica.
haver-se-á por domicílio da pessoa Segundo MHD, não é mais teoria,
jurídica, no tocante às obrigações pois já está positivado na Lei. Mas nos
contraídas por cada uma das suas concursos ainda é cobrado como “teoria
agências, o lugar do estabelecimento, da desconsideração”.
sito no Brasil, a que ela corresponder.”
[empresa com sede no estrangeiro tem
Não se pode confundir
domicílio no local da filial situada no desconsideração com despersonificação
Brasil] ou despersonalização:
***** Desconsideração da Despersonificação ou
Personalidade (art. despersonalização
50) (art. 51)
A pessoa jurídica não A pessoa jurídica é
é extinta; há apenas extinta (dissolvida).
DESCONSIDERAÇÃO DA uma ampliação de Há apuração do ativo
PERSONALIDADE JURÍDICA responsabilidades. Há e passivo e fim da
quebra da autonomia pessoa jurídica.
da p. j.
“Art. 50. Em caso de abuso da
2. Desconsideração da personalidade personalidade jurídica, caracterizado
jurídica pelo desvio de finalidade, ou pela
A pessoa jurídica é uma realidade confusão patrimonial, pode o juiz
técnica e orgânica e, por isso, não se decidir, a requerimento da parte, ou do
Ministério Público quando lhe couber
confunde com seus membros (sócios e
intervir no processo, que os efeitos de
administradores). Ou seja, há uma certas e determinadas relações de
autonomia da pessoa jurídica frente aos obrigações sejam estendidos aos bens
seus componentes (CC/1916, art. 20; particulares dos administradores ou
CC/2002, art. 45). sócios da pessoa jurídica.
“Art. 45. Começa a existência Art. 51. Nos casos de
legal das pessoas jurídicas de direito dissolução da pessoa jurídica ou
privado com a inscrição do ato cassada a autorização para seu
constitutivo no respectivo registro, funcionamento, ela subsistirá para os
precedida, quando necessário, de fins de liquidação, até que esta se
autorização ou aprovação do Poder conclua.
Executivo [v. g., sociedade seguradora], § 1º Far-se-á, no registro onde a
averbando-se no registro todas as pessoa jurídica estiver inscrita, a
alterações por que passar o ato averbação de sua dissolução.
constitutivo. § 2º As disposições para a
Parágrafo único. Decai em três liquidação das sociedades aplicam-se,
anos o direito de anular a constituição no que couber, às demais pessoas
das pessoas jurídicas de direito privado, jurídicas de direito privado.
por defeito do ato respectivo, contado o § 3º Encerrada a liquidação,
prazo da publicação de sua inscrição no promover-se-á o cancelamento da
registro.” inscrição da pessoa jurídica.”
Porém, diante de abusos Duas são as modalidades de
praticados por sócios e administradores desconsideração da personalidade
da pessoa jurídica surgiu, no Direito jurídica:
Comparado, uma teoria que quebra essa a) direta ou regular – é a prevista
autonomia, a teoria da desconsideração no CC, 50 e CDC, 28, em que bens dos

24
sócios ou administradores respondem Observações:
por dívidas da p. j.; 1) JDC, 281 – “A aplicação da
b) indireta, inversa ou invertida – teoria da desconsideração, descrita no
já era tratada pela doutrina e art. 50 do Código Civil, prescinde da
jurisprudência e encampada pelo demonstração de insolvência da pessoa
CPC/2015: bens da pessoa jurídica jurídica.”
respondem por dívidas dos sócios ou 2) JDC, 284 – “As pessoas
administradores. Cf. Rolf Madaleno, jurídicas de direito privado sem fins
JDC, 283, e decisões do próprio STJ lucrativos ou de fins não-econômicos
(Inf. 440), bem como o CPC, 133, § 2º: estão abrangidas no conceito de abuso
“IV Jornada de Direito Civil - da personalidade jurídica.” Cabe
Enunciado 283. É cabível a desconsideração inclusive de EIRELI.
desconsideração da personalidade
jurídica denominada "inversa" para
Qualquer pessoa jurídica, inclusive S/A,
alcançar bens de sócio que se valeu da associações, fundações podem ter a
pessoa jurídica para ocultar ou desviar desconsideração da pessoa jurídica.
bens pessoais, com prejuízo a terceiros.” JDC, 469 – “A empresa individual
“Teorias” da desconsideração, de responsabilidade limitada (EIRELI)
aplicadas às duas modalidades acima: não é sociedade, mas novo ente jurídico
a) teoria maior – adotada pelo CC, personificado.”
art. 50. Decorre do abuso da 3) JDC, 285 – “A teoria da
personalidade jurídica, pelo desvio de desconsideração, prevista no art. 50 do
finalidade, ou confusão patrimonial, Código Civil, pode ser invocada pela
aliados a um prejuízo ao credor. pessoa jurídica, em seu favor.”. Assim,
Aplicando a teoria maior, JDC, a pessoa jurídica pode pleitear a
282: “O encerramento irregular das desconsideração em relação a outra p. j.,
atividades da pessoa jurídica, por si só, bem como a sua própria
não basta para caracterizar abuso da desconsideração para atingir um de seus
personalidade jurídica.”. Também sócios.
entendimento do STJ no repetitivo 4) Em regra, a desconsideração
AgRg no REsp 1306553/SC: ou seja, o ocorre em ação judicial, mediante
mero encerramento irregular das pedido do MP ou do interessado.
atividades não basta para a aplicação da Porém, como exceção, a lei
teoria maior. anticorrupção (Lei n. 12846/2013)
Cuidado: em execução fiscal o criou uma modalidade de
entendimento é justamente o desconsideração administrativa, sem
contrário. ação judicial (art. 14), cf. inclusive já
b) teoria menor – supostamente pode decidir o STF, Inf. 732:
foi adotada pelo art. 28, § 5º do CDC e “Art. 14. A personalidade
também na Lei n. 9605/98, art. 4º jurídica poderá ser desconsiderada
(danos ambientais). Basta o prejuízo ao sempre que utilizada com abuso do
direito para facilitar, encobrir ou
credor. dissimular a prática dos atos ilícitos
O julgado paradigma é o RESp previstos nesta Lei ou para provocar
279273/SP, do caso da explosão do confusão patrimonial, sendo estendidos
Shopping Center Osasco. todos os efeitos das sanções aplicadas à
Curiosidade quanto ao CDC, 28. pessoa jurídica aos seus administradores
e sócios com poderes de administração,
No caput trata da teoria maior, e no § 5º observados o contraditório e a ampla
a teoria menor. Quando pesquisamos o defesa.”
veto ao § 1º percebemos que o veto Interessante que adota a teoria
deveria ter também arrastado o § 5º. maior.
Como as leis são feitas no Brasil...

25
5) o CPC/2015 criou um novo Cf. art. 1062 a desconsideração é
incidente de desconsideração da cabível também nos JECív.
personalidade jurídica, com *****
contraditório, afastando, em tese, a
desconsideração de ofício (artigos 133 a
137).
“CAPÍTULO IV PRINCIPAIS MODALIDADES
DO INCIDENTE DE DE BENS
DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA
Art. 133. O incidente de
desconsideração da personalidade 3. Dos Bens. Objeto do direito
jurídica será instaurado a pedido da parte 3.1. Introdução. Bens vs. coisas
ou do Ministério Público, quando lhe Sempre houve divergência sobre o
couber intervir no processo.
§ 1º O pedido de desconsideração
significado de cada uma dessas
da personalidade jurídica observará os expressões, bens e coisas. Para CMSP,
pressupostos previstos em lei. bem é gênero e coisa espécie (bem tudo
§ 2º Aplica-se o disposto neste que me agrada; coisa bens corpóreos).
Capítulo à hipótese de desconsideração O CC não adotou a ideia de Caio
inversa da personalidade jurídica.
Art. 134. O incidente de
Mário da Silva Pereira. Na parte geral, o
desconsideração é cabível em todas as CC adotou coisa para gênero de tudo
fases do processo de conhecimento, no que não é humano (casa, carro,
cumprimento de sentença e na execução dinheiro, animais, etc.). Já a expressão
fundada em título executivo bem é espécie, a coisa com interesse
extrajudicial.
jurídico e ou econômico.
§ 1º A instauração do incidente
será imediatamente comunicada ao Patrimônio. É a soma de bens
distribuidor para as anotações devidas. corpóreos e incorpóreos da pessoa que
§ 2º Dispensa-se a instauração do tenham valor econômico. Exemplos:
incidente se a desconsideração da imóveis, veículos, dinheiro,
personalidade jurídica for requerida na
conhecimento, experiência, dotes
petição inicial, hipótese em que será
citado o sócio ou a pessoa jurídica. físicos.
§ 3º A instauração do incidente Tese do “estatuto jurídico do
suspenderá o processo, salvo na hipótese patrimônio mínimo.” Luiz Edson
do § 2º. Fachin. Deve-se assegurar à pessoa um
§ 4º O requerimento deve mínimo de direitos patrimoniais para
demonstrar o preenchimento dos
pressupostos legais específicos para que viva com dignidade (personalização
desconsideração da personalidade do patrimônio e do Direito Civil), com a
jurídica. valorização dos direitos existenciais. É
Art. 135. Instaurado o incidente, uma expressão do mínimo existencial
o sócio ou a pessoa jurídica será citado estudado em Direito Constitucional.
para manifestar-se e requerer as provas
cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias. Exemplos: 1) STJ, 364: é bem de
Art. 136. Concluída a instrução, família, portanto impenhorável, o
se necessária, o incidente será resolvido imóvel onde reside pessoa solteira,
por decisão interlocutória. tendo em vista que o fim social da Lei
Parágrafo único. Se a decisão for do Bem de Família (Lei n. 8009/90) é a
proferida pelo relator, cabe agravo
interno. proteção da pessoa e do direito à
Art. 137. Acolhido o pedido de moradia, e não do patrimônio; 2) CC,
desconsideração, a alienação ou a 548: nulidade da doação universal de
oneração de bens, havida em fraude de todos os bens sem a reserva do mínimo
execução, será ineficaz em relação ao para a sobrevivência do doador (“o
requerente.”
Direito não aceita o ato Franciscano”).

26
Deve reservar o usufruto, alimentos, direitos reais sobre imóveis (v. g.,
renda ou qualquer instituto que proteja hipoteca) e o direito à sucessão aberta
sua mantença. Cf. também a CRFB, 1º, “Art. 80. Consideram-se imóveis
III; 6º (moradia) e CPC, 8º. para os efeitos legais:
“Art. 8º Ao aplicar o ordenamento I - os direitos reais sobre imóveis
jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e e as ações que os asseguram;
às exigências do bem comum, II - o direito à sucessão aberta.
resguardando e promovendo a dignidade Além disso, há que se considerar:
da pessoa humana e observando a Art. 81. Não perdem o caráter de
proporcionalidade, a razoabilidade, a imóveis:
legalidade, a publicidade e a eficiência.” I - as edificações que, separadas
do solo, mas conservando a sua unidade,
forem removidas para outro local;
3.2. Classificação ou modalidades de [exemplo é a casa pré-fabricada, o chalé
bens no CC/2002 de madeira]
II - os materiais provisoriamente
3.2.1. Quanto à modalidade (CC, 79 a separados de um prédio, para nele se
84) reempregarem.” [exemplo da cobertura
de um galpão]
a) bens imóveis – são aqueles cujo
transporte ou remoção implica em
b) bens móveis – aqueles cujo
destruição ou deterioração.
“Art. 79. São bens imóveis o solo transporte ou remoção não implica em
e tudo quanto se lhe incorporar natural destruição ou deterioração.
ou artificialmente.” São três modalidades:
a.1) bens imóveis por natureza – a b.1) bens móveis por natureza – a
imobilidade decorre de sua essência, mobilidade decorre de sua essência.
como exemplos a árvore que nasceu Eles têm movimento por força alheia, a
sozinha; exemplo de um automóvel, ou por força
a.2) bens imóveis por acessão própria, como os animais (nesse caso,
física industrial – a imobilidade decorre os semoventes);
de uma atuação humana concreta e b.2) bens móveis por antecipação
efetiva. Exemplo: construções e – a mobilidade decorre de uma atuação
plantações. humana concreta e efetiva (exemplos:
a.3) bens imóveis por acessão plantação colhida; materiais
física intelectual – a imobilidade provenientes da demolição de um
decorre da vontade do proprietário prédio;
(móveis incorporados ao imóvel pela b.3) bens móveis por
vontade. Exemplos: equipamentos do determinação legal – CC, art. 83:
estúdio da Rede LFG; o trator em uma energias com valor econômico (solar,
propriedade rural. Essa categoria elétrica); direitos reais sobre móveis
persiste? Segundo o JDC, 11, não: “Não (penhor que recair sobre uma joia); e
persiste no novo sistema legislativo a direitos pessoais patrimoniais (direitos
categoria dos bens imóveis por acessão autorais da Lei n. 9610/98)
intelectual, não obstante a expressão “Seção II
"tudo quanto se lhe incorporar natural Dos Bens Móveis
Art. 82. São móveis os bens
ou artificialmente", constante da parte suscetíveis de movimento próprio, ou de
final do art. 79 do Código Civil.” Para a remoção por força alheia, sem alteração
maioria da doutrina persiste, da substância ou da destinação
confundindo-se com o conceito de econômico-social.
pertenças. Assim, há dúvida doutrinária Art. 83. Consideram-se móveis
para os efeitos legais:
séria. I - as energias que tenham valor
a.4) bens imóveis por econômico;
determinação legal – CC, art. 80:

27
II - os direitos reais sobre objetos constituindo partes integrantes, se
móveis e as ações correspondentes; destinam, de modo duradouro, ao uso,
III - os direitos pessoais de caráter
patrimonial e respectivas ações.
serviço ou ao embelezamento
Art. 84. Os materiais destinados a (aformoseamento) de outro. Geralmente
alguma construção, enquanto não forem são móveis incorporados ao imóvel pela
empregados, conservam sua qualidade de vontade do proprietário e, em regra, não
móveis; readquirem essa qualidade os seguem o principal (CC, 94), salvo se o
provenientes da demolição de algum
prédio.”
contrário resultar da lei, da
Atenção! Navios e aeronaves não manifestação de vontade ou das
móveis especiais, tendo em vista que circunstâncias do caso.
admitem hipoteca e têm registro Exemplos: MHD dá o exemplo de
especial (Capitania dos Portos e ANAC, um piano que foi incorporado a uma
respectivamente). casa ou a um conservatório. Na venda
Aliás, a hipoteca pode ser móvel da casa, as circunstâncias indicam que o
ou imóvel. Aquela que recai sobre uma piano não acompanha; já no
casa é imóvel; já aquela que recai sobre conservatório, acompanhará.
um navio é móvel. b.4) partes integrantes – são
acessórios que formam com o principal
3.2.2. Classificação quanto à um todo uno e indivisível. Nas partes
dependência ou bens reciprocamente integrantes, não possuem a autonomia
considerados (CC, 92 a 96) funcional das pertenças. Exemplos:
Os bens são considerados em lâmpada do lustre; lente da câmera.
relação com outros bens. Um bom exemplo: um carro que
a) bens principais – existem sobre já vem com um toca CD embutido é
si de forma concreta ou abstrata, parte integrante; aquele que é instalado
independentemente dos demais. no orifício próprio é pertença.
Exemplo: uma casa; b.5) benfeitorias – são acréscimos
b) bens acessórios – aqueles bens e melhoramentos realizados no
cuja existência supõe a do bem principal principal.
(CC, art. 92). Na verdade, a doutrina brasileira
Princípio da gravitação jurídica. não elucidou bem a diferença entre
O acessório segue o principal. Aplica-se benfeitorias e pertenças. Para Tartuce, a
a bens, obrigações e contratos. benfeitoria é feita por terceiro, enquanto
São bens acessórios: a pertença pelo proprietário, e o maior
b.1) frutos – saem do principal exemplo disso é a lei de locações que
sem diminuir sua quantidade. Segundo trata apenas das benfeitorias. Há quem
Beviláqua, são eles: diga que a benfeitora é mais profunda.
- frutos naturais: provêm das São três categorias de benfeitorias
essência das coisas. Exemplo: frutas dos (CC, 93):
vegetais; a) necessárias – revelam a
- frutos industriais: atividade conservação da coisa, como o telhado
humana. Exemplo: cimento da fábrica; de uma casa;
- frutos civis: são os rendimentos b) úteis – facilitam o uso, como o
dos bens: juros de um capital, aluguéis corrimão de uma escada;
de um imóvel, dividendos de ações etc.; c) voluptuárias – são aquelas de
b.2) produtos: saem do principal, mero deleite ou recreio, como a piscina
diminuindo a sua quantidade. Exemplo: numa casa.
“CAPÍTULO II
pepita de outro retirada de uma mina; Dos Bens Reciprocamente Considerados
b.3) pertenças: não era prevista no Art. 92. Principal é o bem que
CC/1916. São bens acessórios, que não existe sobre si, abstrata ou

28
concretamente; acessório, aquele cuja comodato, mútuo e fiança geram a
existência supõe a do principal. quebra da regra ora estudada.
Art. 93. São pertenças os bens “Seção III
que, não constituindo partes integrantes, Dos Bens Fungíveis e Consumíveis
se destinam, de modo duradouro, ao uso, Art. 85. São fungíveis os móveis
ao serviço ou ao aformoseamento de que podem substituir-se por outros da
outro. mesma espécie, qualidade e
Art. 94. Os negócios jurídicos que quantidade.
dizem respeito ao bem principal não
abrangem as pertenças, salvo se o
contrário resultar da lei, da manifestação 3.2.4. Quanto ao consumo ou
de vontade, ou das circunstâncias do consuntibilidade (CC, 86)
caso. Temos dois critérios totalmente
Art. 95. Apesar de ainda não distintos:
separados do bem principal, os frutos e
produtos podem ser objeto de negócio
- consumo fático – se o consumo
jurídico. do bem gera ou não destruição imediata;
Art. 96. As benfeitorias podem ser - consumo jurídico – se o bem é
voluptuárias, úteis ou necessárias. alienável ou inalienável.
§ 1º São voluptuárias as de mero Assim, podemos ter bens
deleite ou recreio, que não aumentam o
uso habitual do bem, ainda que o tornem
consumíveis e não consumíveis ao
mais agradável ou sejam de elevado mesmo tempo...
valor. “Art. 86. São consumíveis os
§ 2º São úteis as que aumentam bens móveis cujo uso importa
ou facilitam o uso do bem. destruição imediata da própria
§ 3º São necessárias as que têm substância, sendo também considerados
por fim conservar o bem ou evitar que se tais os destinados à alienação.”
deteriore. a) bens consumíveis – o uso gera
Art. 97. Não se consideram destruição imediata, bem como os
benfeitorias os melhoramentos ou alienáveis;
acréscimos sobrevindos ao bem sem a
b) bens inconsumíveis – o uso não
intervenção do proprietário, possuidor ou
detentor.” gera destruição imediata bem como os
inalienáveis.
3.2.3. Classificação quanto à Como os critérios são totalmente
fungibilidade distintos, um bem pode ser consumível
a) bens infungíveis – são e inconsumível ao mesmo tempo.
insubstituíveis, podendo ser móveis (um Um carro quitado, sem nenhuma
cavalo famoso; um automóvel (por restrição, é um bem consumível, do
conta do número de chassi) ou ponto de vista jurídico (pode ser
imóveis; vendido, doado), e inconsumível do
b) bens fungíveis – são os móveis ponto de vista fático (já que usado não
que podem ser substituídos por outros desaparece).
de mesma espécie, qualidade e Atenção! Em regra, o bem
quantidade. Exemplo: dinheiro. fungível equivale a um bem consumível
O contrato de empréstimo tem faticamente, e o bem infungível a um
duas categorias: tratando-se de bem bem inconsumível. Mas há exceções,
infungível, teremos o comodato, ou como no exemplo da última garrafa de
empréstimo de uso (o bem será usado e uma bebida famosa: é consumível
depois devolvido), como de uma casa faticamente juridicamente e, ao mesmo
ou de um carro; já o contrato de bem tempo, infungível.
fungível é o mútuo, ou empréstimo de
consumo (sendo devolvido outro de Material de Apoio - Direito Civil - João
mesmo gênero, espécie e quantidade). Aguirre - Aula 01.pdf
No futuro veremos como essa regra

29
Material do Professor - Direito Civil - i) bem de família voluntário ou
Pablo Stolze - ParteGeral - 01 (5).pdf convencional – CC, 1711 e seguintes.
BEM DE FAMILIA
a) sujeitos:
A proteção do bem de família 1) cônjuges, decorrente de
legal consiste na tutela do direito à casamento heterossexual ou
moradia (CRFB, 6º), da dignidade homossexual.
humana e da solidariedade. 2) entidades familiares:
O CC/2002 rompeu o paradigma - união estável, hetero ou
patrimonialista e valorizou o ideal homossexual.
existencialista. Isso ensejou uma O CC/2002 tem uma deficiência
verdadeira revolução no Direito no tocante à união estável. Apesar de a
privado. regulamentar, em vários dispositivos
Além disso, na obra clássica do acaba dando tratamento discriminatório
atual Min. Edson Fachin, “O Estatuto pelo esquecimento (ex. do art. 12 sobre
Jurídico do Patrimônio Mínimo”, ele a proteção dos direitos da
aborda a tese da garantia de um mínimo personalidade).
existencial para se preservar a dignidade - família monoparental – formada
da pessoa humana. Esse é um escopo da por qualquer dos pais e seus
L8009/90, inspirada no homestead do descendentes;
Estado do Texas. - família anaparental – família
É nesse sentido, de garantia de um sem pais;
mínimo existencial, que o STJ editou a - família socioafetiva – família
súmula 364: “O conceito de eudemonista;
impenhorabilidade de bem de família - STJ, 364: solteiros, separados
abrange também o imóvel pertencente a judicialmente, divorciados, viúvos;
pessoas solteiras, separadas e viúvas”. - família unipessoal: uma só
Corrobora esse entendimento a pessoa, cf. doutrina de Rodrigo da
tese de que, aferida à saciedade que a Cunha Pereira, que existe apenas para a
família reside no imóvel sede da extensão da proteção.
empresa, impõe-se a exegese 3) Terceiro, que institui o bem de
humanizada à luz do fundamento da família através de testamento ou
República voltada à dignidade da doação, caso em que a constituição do
pessoa humana. Proteção do bem de bem de família submete-se à aceitação
família. Cf. STF, REsp 6261399/RS. de ambos os cônjuges ou da entidade
O STF tem uma interpretação familiar ou do separado de fato.
teleológica (finalidade) da Lei n. “SUBTÍTULO IV
8009/90, que é a tutela da dignidade Do Bem de Família
Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou
humana e a proteção ao direito de a entidade familiar, mediante escritura
moradia. pública ou testamento, destinar parte de
seu patrimônio para instituir “bem de
1) Conceito família”, desde que não ultrapasse um
Consiste no imóvel utilizado terço do patrimônio líquido existente
ao tempo da instituição, mantidas as
como residência da entidade familiar, regras sobre a impenhorabilidade do
impenhorável e que não pode ser objeto imóvel residencial estabelecida em lei
de execução por dívida civil, fiscal, especial.
comercial ou de qualquer natureza, Parágrafo único. O terceiro
salvo as exceções previstas em Lei. poderá igualmente instituir bem de
família por testamento ou doação,
dependendo a eficácia do ato da
1.1. Espécies aceitação expressa de ambos os

30
cônjuges beneficiados ou da entidade Art. 1713. (...)
familiar beneficiada.” § 1º Deverão os valores
mobiliários ser devidamente
b) Objeto individualizados no instrumento de
instituição do bem de família.
Será bem imóvel residencial § 2º Se se tratar de títulos
urbano ou rural, destinado ao domicílio nominativos, a sua instituição como bem
familiar. Essa proteção inclui todos os de família deverá constar dos respectivos
bens acessórios que o compõe, livros de registro.
inclusive as pertenças. Ou seja, é uma § 3º O instituidor poderá
determinar que a administração dos
exceção à exceção do princípio da valores mobiliários seja confiada a
gravitação jurídica. instituição financeira, bem como
“Art. 1.712. O bem de família disciplinar a forma de pagamento da
consistirá em prédio residencial urbano respectiva renda aos beneficiários, caso
ou rural, com suas pertenças e em que a responsabilidade dos
acessórios, destinando-se em ambos os administradores obedecerá às regras do
casos a domicílio familiar, e poderá contrato de depósito.
abranger valores mobiliários, cuja renda Art. 1.714. O bem de família,
será aplicada na conservação do imóvel e quer instituído pelos cônjuges ou por
no sustento da família.” terceiro, constitui-se pelo registro de seu
título no Registro de Imóveis.”
Relembrando a regra das
pertenças: “Art. 94. Os negócios d) efeitos
jurídicos que dizem respeito ao bem Com a instituição do bem de
principal não abrangem as pertenças, família voluntário o prédio se torna:
salvo se o contrário resultar da lei, da - inalienável e impenhorável;
manifestação de vontade, ou das - o bem de família voluntário não
circunstâncias do caso.” A instituição responderá elas dívidas posteriores à
do bem de família legal abrange as instituição, i. é, as dívidas anteriores
pertenças, de forma que, nesse caso, o alcança o bem, como também as dividas
acessório segue o principal, mesmo posteriores relacionadas a tributos
sendo uma pertença. decorrentes do imóvel e dívidas de
O bem de família voluntário pode condomínio posteriores à instituição do
abranger valores mobiliários (títulos, bem de família.
debêntures etc.) cuja renda será aplicada Se o bem de família, nos casos
na conservação do imóvel e no sustento acima, responde por alguma dívida, o
da família. saldo deve ser destinado em outro
“Art. 1.713. Os valores prédio, como bem de família, ou em
mobiliários, destinados aos fins previstos títulos da dívida pública, para sustento
no artigo antecedente, não poderão
exceder o valor do prédio instituído da família. Mas o juiz, por motivos
em bem de família, à época de sua relevantes, devidamente justificados,
instituição. pode determinar outra solução.
“Art. 1.715. O bem de família é
c) Forma isento de execução por dívidas
Depende de escritura pública (não posteriores à sua instituição, salvo as que
provierem de tributos relativos ao prédio,
se aplicando no caso o art. 108) ou ou de despesas de condomínio.
testamento, desde que o valor do bem Parágrafo único. No caso de
não ultrapasse 1/3 do patrimônio líquido execução pelas dívidas referidas neste
do instituidor ao tempo da instituição. artigo, o saldo existente será aplicado em
Ou seja, deve ser feito por escrito outro prédio, como bem de família, ou
em títulos da dívida pública, para
e registrado no cartório de registro de sustento familiar, salvo se motivos
imóveis (CRI) do local em que o imóvel relevantes aconselharem outra solução, a
está situado. critério do juiz.”

31
A inalienabilidade só pode ser companheiros e a maioridade dos filhos,
afastada é a regra geral, e só pode ser desde que não sujeitos a curatela.
afastada mediante consentimento dos
interessados (membros da entidade ii) bem de família legal
familiar), ouvido o MP, por decisão (L8009/90)
judicial apurada a procedência das Cf. art. 1º, caput:
razões dos requerentes. “Art. 1º O imóvel residencial
próprio do casal, ou da entidade familiar,
é impenhorável e não responderá por
e) extinção qualquer tipo de dívida civil, comercial,
Comprovada a impossibilidade de fiscal, previdenciária ou de outra
manutenção do bem de família natureza, contraída pelos cônjuges ou
convenciona o juiz poderá, a pelos pais ou filhos que sejam seus
requerimento dos interessados, extingui- proprietários e nele residam, salvo nas
hipóteses previstas nesta lei.”
lo ou autorizar a sub-rogação real,
Ou seja:
ouvido o instituidor e o MP.
1º) imóvel residencial próprio do
A instituição durará até que
casal ou da entidade familiar;
ambos cônjuges faleçam ou até que os
2º) é impenhorável;
filhos completem a maioridade (CC.
3º) não responderá por qualquer
1716). Apesar de o dispositivo se referir
dívida (contraída pelos cônjuges ou
apenas aos cônjuges, aplica-se também
pelos pais ou filhos que sejam seus
aos companheiros ou membros da
proprietários e nele residam), salvo as
entidade familiar.
“Art. 1.716. A isenção de que exceções previstas na própria Lei.
trata o artigo antecedente durará Trata-se de uma norma
enquanto viver um dos cônjuges, ou, na imperativa, de ordem pública. Ainda
falta destes, até que os filhos completem que o proprietário venha a dar o bem em
a maioridade.” garantia se torna uma garantia ineficaz.
CC, 1721. A dissolução da STJ, 305: “A Lei 8.009/90 aplica-
sociedade conjugal por separação, se à penhora realizada antes de sua
divórcio, morte, nulidade ou vigência”. É assim porque é uma norma
anulabilidade não extingue o bem de de ordem publica. Trata-se de uma
família. Mas aplica-se também à união retroatividade justificada ou
estável. motivada em prol das normas de
“Art. 1.721. A dissolução da
sociedade conjugal não extingue o bem ordem pública.
de família..” Observações:
Dicas: 1) AgRg no AREsp 140598/SP. Já
1) dissolvida a sociedade conjugal que é norma de ordem pública, pode ser
pela morte de um dos cônjuges o conhecida de ofício pelo juiz.
sobrevivente poderá pedir a extinção da 2) AgRg no REsp 292907. Antes
proteção se for único bem do casal. da arrematação do bem, a alegação de
Vale também para a união estável. Se impenhorabilidade é cabível por petição
ocorrer, não afasta a proteção da Lei n. simples, não cabendo a preclusão;
8009/90. 3) o que acontece se o devedor,
“Art. 1721. antes de constituir advogado, nomeou o
Parágrafo único. Dissolvida a bem de família à penhora e, depois, por
sociedade conjugal pela morte de um dos embargos do devedor arguiu a
cônjuges, o sobrevivente poderá pedir a
extinção do bem de família, se for o
impenhorabilidade do bem de família?
único bem do casal” É o que se chama de bem de família
2) extingue-se o bem de família ofertado. São duas correntes: para a
pela morte dos cônjuges ou primeira, os embargos devem ser
rejeitados, porque a) não se pode alegar

32
a própria torpeza; ou b) pela proibição equipamentos, inclusive os de uso
do comportamento contraditório (venire profissional; e móveis que guarnecem a
contra factum proprium). Essa tese tem casa.
como pressuposto ser o bem de família Ainda, segundo o art. 2º:
legal renunciável (Daniel Assumpção). “Art. 2º Excluem-se da
Para a segunda, a proteção do bem de impenhorabilidade os veículos de
transporte, obras de arte e adornos
família legal não é passível de renúncia suntuosos.
por se tratar de norma de ordem pública Parágrafo único. No caso de
(Flávio Tartuce). imóvel locado, a impenhorabilidade
No AgRg 888654/ES e no REsp aplica-se aos bens móveis quitados que
511023, o bem de família legal visa a guarneçam a residência e que sejam de
propriedade do locatário, observado o
tutela do direito existencial e por isso disposto neste artigo.”
não admite renúncia, desde que Também, o entendimento do STJ,
preservada a boa-fé. 449: “A vaga de garagem que possui
No REsp 1299580/RJ e no REsp matrícula própria no registro de
1364509/RS se decidiu que a arguição imóveis não constitui bem de família
de impenhorabilidade do bem de família para efeito de penhora”.
deve verificar os ditames da boa-fé
objetiva. 5) Exceções à impenhorabilidade
A preservação da dignidade do bem de família legal (L8009,, art.
humana e proteção do direito à moradia 3º):
permite uma interpretação extensiva da (I) as dívidas com o empregado
proteção ao bem de família legal. que trabalha no próprio imóvel foi
No REsp 950663/SC retiramos a revogado pela LC 150/2015. Atenção!
regra de que a proteção vale para o (II) pelo titular do crédito de
único imóvel do devedor que esteja em financiamento destinado à aquisição ou
usufruto para moradia de sua mãe, construção do próprio bem imóvel, no
pessoa idosa. limite dos créditos e acréscimos do
STJ, 486: “É impenhorável o contrato;
único imóvel residencial do devedor (III) pelo credor de pensão
que esteja locado a terceiros, desde que alimentícia. Deve observar o direito do
a renda obtida com a locação seja co-proprietário sobre o bem, ressalvadas
revertida para a subsistência ou a as hipóteses em que ambos responderão
moradia da sua família.”. pela dívida. Atenção: Cf. REsp
No EREsp 1216187/SC se decidiu 1826108/MS, os honorários de
que bem de família insuscetível de advogado estão excluídos da exceção do
penhora o único imóvel do devedor em art. 3º, III.
que resida seu familiar, ainda que o (IV) cobrança de impostos, taxas
proprietário não o habite. e contribuições sobre o imóvel familiar
Como consequência, o STJ não (ex.: IPTU). Trata-se de obrigação
estabelece limite de valor para a proter rem e vale para as dívidas
proteção do bem de família. REsp condominiais (cf. REsp 1324107/SP).
114719/SP, REsp 1087727/GO e REsp (V) a execução da hipoteca sobre
712259/SP o imóvel oferecido como garantia real
pelo casal ou pela entidade familiar.
4) Bem objeto da proteção. A O STJ tem entendido que a
impenhorabilidade compreende o exceção à impenhorabilidade só se
imóvel sobre o qual se assentam as aplica se a hipoteca for constituída no
construções, plantações, benfeitorias de interesse de ambos os cônjuges ou da
qualquer natureza; todos os família (prova a cargo do credor). Caso

33
contrário, prevalece a de imóvel urbano. Segundo o STF essa
impenhorabilidade. Cf. AgRg no Ag exceção é constitucional e pode gerar a
597243/GO (bem de família hipotecado penhora do bem de família (RE
para dívida da empresa. 352940/SP).
Impenhorabilidade) e REsp 1115265/ *****
RS (pequena propriedade rural que visa Material de Apoio - Direito Civil -
a subsistência, dada como garantia de Flavio Tartuce - Aula 02 (II).pdf
dívida. Impenhorabilidade). Material do Professor - Direito Civil -
(VI) imóvel adquirido com Pablo Stolze - ParteGeral - 02 (II).pdf
produto de crime ou para execução de TEORIA DO
sentença penal condenatória a FATO OU NEGÓCIO JURÍDICO
ressarcimento, indenização ou Artigos 104 a 185 do CC.
perdimento de bem. Cf. REsp
711889/PR, que exige prévia e expressa 1. Conceitos iniciais: fato, ato e negócio
sentença penal condenatória. jurídico
(VII) por obrigação decorrente da
fiança concedida em contrato de locação
Fato natural ou
fato jurídico
strictu sensu
-exemplo é o
decurso do tempo
Negócio jurídico
-ato jurídico com
composição de
Fato jurídico ou
interesses e
fato jurídico lato
finalidade
sensu ou em
lícito ou
sentido amplo
ato jurídico lato
- fato que
sensu
Fato interessa ao direito
Fato humano ou Ato jurídico
-é qualquer
fato jurígeno stricto sensu
ocorrência
-possui o elemento -ato jurídico
volitivo (vontade) decorrente de
efeitos legais
ilícito
-responsabilidade
civil;
Ato fato jurídico*
pode adquirir
qualquer uma das
formas deste
esquema
(metamorfo).
Fato não jurídico

a) fato jurídico lato sensu – é um Contudo, esse conceito não é


fato que interessa ao Direito (fato + pacífico. Há uma polêmica doutrinária.
direito); Alguns autores sustentam que o ato
b) ato jurídico lato sensu – é um ilícito também é ato jurídico lato sensu
fato jurídico com elemento volitivo e (Pontes de Miranda e Moreira Alves –
conteúdo lícito (fato+ Direito + vontade que chega a afirmar que foi adotado
+ licitude). pelo CC). Porém, a doutrina majoritária
entende que somente ato lícito é ato

34
jurídico lato sensu (Vicente Ráo, Exemplo: reconhecimento de
Orosimbo Nonato, Zeno Veloso, Pablo filho, ato jurídico em sentido estrito,
Stolze e Rodolfo Pamplona, e Tartuce) pode haver ação de anulação por erro,
– a antijuridicidade não faz com que o dolo, coação; o pagamento direto pode
ato seja considerado relevante e ser anulado por dolo etc.
aceitável para o Direito. e) ato-fato jurídico ou ato real
c) negócio jurídico – é um ato (Pontes de Miranda) – conceito não
jurídico em que há uma manifestação ou aceito por todos os autores. É um fato
composição de interesses com jurídico qualificado por uma vontade
finalidade específica (fato + Direito + não relevante juridicamente em um
vontade + licitude + interesse(s) + primeiro momento, mas que se revela
finalidade específica). relevante por seus efeitos.
A expressão negócio vem de neg Exemplos: 1) uma criança de 6
+ otium, i. é, negação do ócio, com a (seis) anos que compra lanche na
ideia de movimento. cantina da escola (cf. JDC, 138: “A
Segundo Antônio Junqueira de vontade dos absolutamente incapazes,
Azevedo, negócio jurídico é todo fato na hipótese do inc. I do art. 3º é
jurídico consistente em declaração de juridicamente relevante na
vontade, a que todo o ordenamento concretização de situações existenciais
jurídico atribui os efeitos designados a eles concernentes, desde que
como queridos, respeitados os demonstrem discernimento bastante
pressupostos de existência, validade e para tanto.”); 2) o achado de um
eficácia impostos pela norma jurídica tesouro sem querer; 3) relação
que nele incide. contratual de fato, em que Junqueira dá
O negócio jurídico é a principal o exemplo de um pouso de emergência
forma de expressão da autonomia feito por um avião privado em um
privada, da vontade individual, v. g., aeroporto privado
contrato, casamento e testamento. O ato-fato jurídico é um conceito
d) ato jurídico stricto sensu – é metamorfo, i. é, pode se transformar em
um ato jurídico em que os efeitos são qualquer outro (negócio jurídico, ato
meramente legais (Marcos Bernardes de jurídico etc.).
Mello). A fórmula: (fato + Direito +
vontade + licitude + efeitos legais). 2. Elementos constitutivos do negócio
Exemplos: pagamento direto de uma jurídico
obrigação; reconhecimento de filho; Escada ponteana (ou pontiana).
ocupação de um imóvel. Pontes de Miranda dividiu a
O ato jurídico stricto sensu constituição do negócio jurídico em três
representa o “mero preenchimento de planos: plano da existência, plano da
um espaço jurídico”, enquanto o validade e plano da eficácia.
negócio jurídico “cria o espaço”. Não há Plano da
criação de instituto próprio como no Eficácia
negócio jurídico.
Plano da
“TÍTULO II
Validade
Dos Atos Jurídicos Lícitos
Art. 185. Aos atos jurídicos
Plano da
lícitos, que não sejam negócios jurídicos
Existência
[ou seja, aos atos jurídicos em sentido
estrito], aplicam-se, no que couber, as
disposições do Título anterior [aplicam-
se as mesmas regras do negócio O esquema é perfeitamente
jurídico, especialmente a teoria das lógico, pois para que o negócio jurídico
nulidades].” seja válido, ele deve existir. Para que o
35
negócio gere efeitos, deve existir e ser Venosa, Pablo Stolze e Rodolfo
válido, “em regra”. Porém, é possível Pamplona).
que o negócio exista, seja inválido e
esteja gerando efeitos. Exemplo: um 2.2. Plano da validade
negócio anulável antes da propositura Surgem nesse plano os requisitos
da ação anulatória. Aliás, se a ação não de validade, pois os substantivos (parte,
for proposta no prazo decadencial objeto, vontade e forma) recebem
previsto em lei, o negócio convalida. adjetivos, na forma do art. 104 do CC
Pela convalidação o negócio inválido (partes capazes; vontade livre; objeto
passa a ser válido. lícito, possível, determinado ou
determinável; forma prescrita ou não
2.1. Plano da existência defesa em lei).
Se o negócio jurídico apresentar
Neste plano estão os elementos problema ou vício quanto a esses
mínimos do negócio jurídico que elementos, será inválido.
formam o seu suporte fático Classificação da invalidade:
(pressupostos de existência). i) quanto ao grau/gravidade:
Macete. São substantivos sem a) nulidade absoluta ou nulidade –
adjetivos: partes, vontade, objeto e gera negócio jurídico nulo (artigos 166
forma. Se o negócio jurídico não e 167), envolvendo ordem pública;
apresentar tais pressupostos, será b) nulidade relativa ou
inexistente (um nada para o direito). anulabilidade – gera negócio jurídico
Se o negocio jurídico não anulável (artigo 171), envolvendo
apresentar tais pressupostos será ordem privada;
inexistente, um “nada para o Direito”.
O CC/2002, assim como seu ii) quanto à extensão:
antecessor, não adotaram a teoria da a) invalidade total – o negócio é
inexistência, procurando resolver os nulo ou anulável;
problemas do negócio jurídico apenas b) invalidade parcial – parte do
no plano da validade (teoria das negócio é nulo ou anulável.
nulidades). Dizia Silvio Rodrigues que a “Art. 184. Respeitada a intenção
teoria da inexistência é inútil, das partes, a invalidade parcial de um
negócio jurídico não o prejudicará na
inconveniente e inapropriada (MHD, parte válida, se esta for separável [a
Rubens Limongi França, Flávio parte útil de um negócio não o prejudica
Tartuce). na parte útil – princípio da conservação
A teoria da inexistência foi do negócio jurídico]; a invalidade da
desenvolvida na Alemanha por obrigação principal implica a das
obrigações acessórias, mas a destas não
Zachariae em 1808 para resolver o induz a da obrigação principal.”
problema do casamento entre pessoas Exemplo: somente a cláusula de
do mesmo sexo (exemplo que juros de um contrato é nula (nulidade
desapareceu na realidade brasileira, absoluta parcial). Retira-se essa cláusula
porque segundo o STF é possível e aproveita-se o restante do contrato.
casamento entre pessoas do mesmo Nesse mesmo sentido, CDC, 51.
sexo). Requisitos de validade:
A maioria da doutrina brasileira é a) partes capazes – artigos 3º e 4º
adepta à teoria da inexistência, apesar do Código Civil, alterados pelo EPD.
de não adotada pela Lei (Pontes de Além de capazes, as partes devem
Miranda, Junqueira, Caio Mário da ser legitimadas. Legitimação é uma
Silva Pereira, Zeno Veloso, Silvio capacidade específica para o negócio
jurídico. Exemplos: artigos 1647 e 1649

36
do CC, que exigem a outorga uxória ou d) forma prescrita ou não defesa
marital (outorga conjugal) para em lei.
determinados negócios, sob pena de Não se confunde a forma (gênero,
anulabilidade para vender imóvel, fazer qualquer formalidade, a exemplo da
doação e prestar fiança. forma escrita) com a solenidade
(espécie, como o ato público, a exemplo
b) objeto lícito, possível, da escritura pública).
determinado ou determinável – é Cf. CC, 107, os negócios jurídicos
exigível sob pena de nulidade absoluta são informais e não solenes (princípio
do negócio (CC 166, II). da liberdade das formas).
“Art. 106. A impossibilidade Cf. CC, 108, a escritura pública é
inicial do objeto não invalida o negócio essencial para validade dos atos de
jurídico se for relativa, ou se cessar antes
de realizada a condição a que ele estiver
disposição de imóvel com valor
subordinado.” superior 30 (trinta) salários mínimos,
“A impossibilidade inicial do sob pena de nulidade absoluta.
objeto não invalida o negócio jurídico Cf. CC, 109, as partes podem
se for relativa” significa um objeto estipular que a escritura pública é
determinável, como na obrigação de dar essencial ao ato.
coias incerta. Exemplo: entrega de um
boi ou de um cavalo. Há uma 2.3. Plano da Eficácia
impossibilidade inicial de entregar o boi Aqui estão as consequências do
que, mais na frente é sanada. É chamada negócio jurídico: modificações ou
de impossibilidade sanável. extinção de direitos (MHD).
c) vontade livre – sem os vícios Temos:
do consentimento (erro, dolo, coação i) elementos acidentais –
moral, estado de perigo e lesão, cuja condição, termo e encargo (modo);
presença geram anulabilidade). ii) inadimplemento – resolução;
Aplicam-se aqui as regras de iii) juros, multa, perdas e danos;
interpretação da vontade: artigos 111 a iv) regime de bens de casamento;
114: v) registro imobiliários.
“Art. 111. O silêncio importa Esse plano da eficácia deve ser
anuência, quando as circunstâncias ou assistido em aula on line.
os usos o autorizarem, e não for
necessária a declaração de vontade
expressa. [a regra do Direito Civil é
Observação final. Negócio
“quem cala não consente”]. jurídico processual. Instrumento de
Art. 112. Nas declarações de gerenciamento processual. É um fato
vontade se atenderá mais à intenção jurídico voluntário em cujo suporte
nelas consubstanciada do que ao sentido fático esteja conferido ao respectivo
literal da linguagem. [prevalência da
boa-fé sujetiva/intencional sobre a
sujeito o poder de escolher a categoria
palavra escrita] jurídica ou de estabelecer dentro dos
Art. 113. Os negócios jurídicos limites fixado no próprio ordenamento
devem ser interpretados conforme a boa- jurídico, certas situações processuais
fé e os usos do lugar de sua celebração. (Pedro Henrique Nogueira). Cf. artigos
[interpretação conforme a boa-fé
190 e 191 do CPC.
objetiva e regras de tráfego]
Art. 114. Os negócios jurídicos Dica: enunciados ENFAM e
benéficos [=gratuitos] e a renúncia Forum nacional de processualistas civis.
interpretam-se estritamente Cf. no site do professor a aula n. 6 da
[=restritivamen-te].” [o grande exemplo EPD.
é a fiança, cf. art. 819]

37
Material de Apoio _ Direito Civil_ Pablo normal, em face das circunstâncias do
Stolze_ Aula 03 (II).pdf negócio.”
Material do Professor - Direito Civil - Vale lembrar ainda, com
Pablo Stolze - ParteGeral - 03 (II).pdf inspiração na doutrina de Roberto de
Rugiero, que o erro, quanto à sua
DEFEITOS DO classificação, poderá ser em face do
NEGÓCIO JURÍDICO objeto, do negócio, da pessoa ou do
próprio direito positivo (erro de direito).
“Art. 139. O erro é substancial
1. Erro quando:
I - interessa à natureza do
1.1. Conceito negócio, ao objeto principal da
A doutrina brasileira costuma declaração, ou a alguma das qualidades a
distinguir erro da ignorância. O erro ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à
seria uma falsa representação positiva
qualidade essencial da pessoa a quem se
da realidade , ao passo que a ignorância refira a declaração de vontade, desde que
traduziria um estado de espírito tenha influído nesta de modo relevante;
negativo (desconhecimento). Para o CC III - sendo de direito e não
essa distinção não tem qualquer implicando recusa à aplicação da lei, for
o motivo único ou principal do negócio
relevância prática.
jurídico.”
O erro, disciplinado a partir do
O erro sobre o objeto é aquele que
art. 138 do CC, causa de invalidade do
incide nas próprias características do
negócio jurídico, segundo a doutrina
objeto do negócio. Ex.: ao comprar um
tradicional, deverá ter dois requisitos:
elefante de marfim, paga como se fosse
a) deve ser essencial ou
de marfim, mas leva um de resina; foi
substancial (cf. Resp 1163118/RS); e
comprar um relógio de ouro, paga o
b) o erro deve ser escusável ou
preço respectivo, mas leva um folhado,
perdoável (REsp 744311/MT).
por engano.
Essencial ou substancial é o erro
O erro sobre o negócio, por sua
que contamina a essência do negócio
vez, é aquele que incide no
jurídico. Perdoável/escusável é o erro
enquadramento da própria declaração de
que qualquer pessoa de conhecimento
vontade manifestada. Exemplo: imagino
médio, de conhecimento médio, no
celebrar uma doação, quando em
lugar daquele que agiu com erro,
verdade celebrei um comodato.
também erraria.
Temos ainda o erro sobre pessoa,
Esta última característica do erro
aquele que incide nas características ou
vem sendo questionada. Provar que o
elementos de identificação do outro
erro é escusável é algo muito subjetivo.
declarante. Ex.: minha empresa de
A doutrina moderna, como (Augusto
marketing se interessou em contratar
Bufulin – “O Erro e os seus requisitos”
um modelo para um ensaio; o preposto
JDC, 12) entende que à luz do princípio
foi até o domicílio do modelo e
da confiança, que inspira o CC, o erro,
celebrou o contrato com o irmão gêmeo
para se configurar, dispensa o requisito
univitelino do mesmo. Observação: vale
da escusabilidade.
“CAPÍTULO IV
lembrar que o erro sobre a pessoa tem
Dos Defeitos do Negócio Jurídico especial aplicação no Direito de
Seção I Família, podendo resultar na anulação
Do Erro ou Ignorância de casamento (artigos 1556 e 1557).
Art. 138. São anuláveis os Erro de direito. Clóvis Beviláqua
negócios jurídicos, quando as
não era simpático à tese de erro de
declarações de vontade emanarem de
erro substancial que poderia ser direito, razão pela qual o CC/1916 não o
percebido por pessoa de diligência contemplava. A evolução da nossa

38
doutrina, todavia, desembocou na
aceitação da tese. Grandes autores como 2.1. Conceito
Eduardo Espíndola, Carvalho Santos, Segundo Clóvis Beviláqua, em
Caio Mário da Silva Pereira, defendiam sua Teoria Geral do Direito Civil, o
o erro de direito desde que não dolo é defeito do negócio que se
traduzisse intencional recusa à aplicação caracteriza pelo artifício astucioso para
da Lei. O erro de direito é aquele que enganar uma das partes, induzindo-a ao
incide no âmbito de atuação permissiva erro. Vale dizer, o dolo, causa de
da norma, ou seja, um erro sobre a invalidade do negócio jurídico
ilicitude do ato: o declarante, de boa-fé, (anulabilidade), caracteriza-se pela má-
ao interpretar a norma, imagina fé empregada para enganar ou ludibriar
permitido o que é proibido. uma das partes.
“Art. 139. O erro é substancial Nos termos do Código Civil, o
quando: dolo que resulta na invalidade é o
(...)
III - sendo de direito e não
principal (CC, 145), o qual não se
implicando recusa à aplicação da lei, confunde com o dolo acidental (art.
for o motivo único ou principal do 146), que resulta apenas em perdas e
negócio jurídico.” danos.
Outro importante aspecto diz “Seção II
respeito à denominada cognoscibilidade Do Dolo
do erro, ou seja, para se configurar, o Art. 145. São os negócios
jurídicos anuláveis por dolo, quando este
erro deve ser de conhecimento da outra for a sua causa. [dolo essencial]
parte? Há quem a exija, como José Art. 146. O dolo acidental só
Fernando Simão. Embora a matéria não obriga à satisfação das perdas e danos, e
seja pacífica na doutrina, entendemos é acidental quando, a seu despeito, o
que esta cognoscibilidade é dispensável, negócio seria realizado, embora por
outro modo. [dolo acidental]”
na medida em que se a outra parte
Observação. Tradicionalmente,
percebe o erro, ingressamos na seara do
por influencia do direito romano,
dolo.
costuma-se diferenciar o dolo enquanto
Questão especial de concurso. O
vício ou defeito (dolus malus) do
que é erro impróprio? Segundo a
denominado dolus bonus, socialmente
Professora Ana Magalhães (“O erro no
aceito, especialmente utilizado como
negócio jurídico” – Atlas), o erro
técnica de publicidade (puffing) tema de
impróprio ou erro obstáculo, derivado
especial interesse no Direito do
do pensamento de Savigny e que não
Consumidor. Por ela o produto tem suas
tem aplicação prática no Direito
características superestimadas (ex.: “o
Brasileiro, é aquele que incide apenas
melhor do mundo”; é muito usada
na vontade declarada do sujeito, ou seja,
também nas propagandas de creme
é o erro que se caracteriza quando
dental, de shampoo; as imagens nas
alguém emite mal a sua vontade. Em
lanchonetes em que o produto tem
nosso sentir, essa categoria de erro é
aparência muito mais atrativa que a
inútil e imprecisa. Ele se confunde com
entregue ao consumidor).
os outros erros, pois o declarante incide
A denominada mensagem
em erro na declaração da vontade,
subliminar caracteriza prática dolosa e
podendo ser invalidado.
abusiva? Segundo Henrique Pinheiro
Obs.: deve ser diferenciado o erro
(“Mensagem Subliminar na Teoria do
do vício redibitório, o que será estudado
Negócio Jurídico”), as mensagens
na teoria geral dos contratos.
subliminares são estímulos enviados de
forma dissimulada abaixo dos limites da
2. Dolo

39
percepção consciente, aptos a “Art. 150. Se ambas as partes
influenciar escolhas a atitudes. procederem com dolo, nenhuma pode
alegá-lo para anular o negócio, ou
A mensagem subliminar, de reclamar indenização.”
acordo com a principiologia do CDC, O que se entende por dolo de
tem sido encarada como uma prática terceiro? O art. 148 do CC trata do dolo
dolosa e abusiva, passível de de terceiro. Em tal situação, o negócio
responsabilização. jurídico somente será invalidado se o
ConJur - Juiz manda emissora retirar beneficiário do dolo dele sabia ou tinha
clipe institucional do ar.pdf como saber; em caso contrário, se não
ConJur - Promotora quer que empresas sabia nem tinha como saber, o negócio é
expliquem propaganda.pdf mantido, respondendo apenas o terceiro
O indivíduo, vítima de pelas perdas e danos. Ex.: “A” tem uma
propaganda subliminar por mensagem fazenda de gado, e recebe uma visita de
que lhe é enviada, induzido a consumir, “B”, e reclama da qualidade do rebanho,
segundo Pablo Stolze, vítima da que afirma não valer R$10.000,00. “B”
captação dolosa da vontade, o que é promete vender assim mesmo, mas por
uma hipótese de negócio jurídico R$50.000,00. “B”, enganando o
viciado pelo dolo (professor: “em nosso comprador “C” sobre a qualidade da
sentir, se a mensagem subliminar induz vacada, vende mesmo por esse valor
o declarante à prática de determinado maior. Se ficar demonstrado que “A”
negócio, operou-se uma captação dolosa sabia ou tinha como saber, “C” pode
da sua vontade, de maneira que invalidar o negócio; se não, poderá
podemos concluir que, em tese, o apenas exigir perdas e danos do terceiro
negócio jurídico celebrado, é viciado “B”.
pelo dolo”). “Art. 148. Pode também ser
Dolo negativo. Vale lembrar anulado o negócio jurídico por dolo de
ainda, o denominado dolo negativo, terceiro, se a parte a quem aproveite dele
previsto no art. 147 do CC, e que resulta tivesse ou devesse ter conhecimento; em
caso contrário, ainda que subsista o
da violação do dever de informar negócio jurídico, o terceiro responderá
derivado da cláusula geral de boa-fé por todas as perdas e danos da parte a
objetiva. Em outras palavras, é um dolo quem ludibriou.”
consistente numa malévola omissão
intencional, um silêncio reprovável. 3. Coação
“Art. 147. Nos negócios jurídicos Trata-se aqui da coação moral
bilaterais, o silêncio intencional de uma (=psicológica), tendo em vista que a
das partes a respeito de fato ou qualidade
que a outra parte haja ignorado, constitui coação física torna o negócio
omissão dolosa, provando-se que sem ela inexistente.
o negócio não se teria celebrado.”
O CC trata ainda do dolo de 3.1. Conceito
representante (art. 149) e do chamado A coação (moral ou psicológica),
dolo bilateral (art. 150). Este último, o causa de invalidade (anulabilidade) do
dolo bilateral, se configura quando as negócio jurídico, nos termos do art. 151,
duas partes, simultaneamente tentam consiste na ameaça ou violência
enganar uma à outra. psicológica dirigida contra uma das
“Art. 149. O dolo do partes (ou a pessoa que lhe seja
representante legal de uma das partes só próxima) ou aos seus bens. Francisco
obriga o representado a responder
civilmente até a importância do proveito Amaral escreve muito bem sobre esse
que teve; se, porém, o dolo for do tema.
representante convencional, o “Seção III
representado responderá solidariamente Da Coação
com ele por perdas e danos.”

40
Art. 151. A coação, para viciar a 4.1. Conceito
declaração da vontade, há de ser tal que O estado de perigo não foi
incuta ao paciente fundado temor de
dano iminente e considerável à sua
contemplado no CC/1916, mas sim no
pessoa, à sua família, ou aos seus bens. art. 156 do CC/2002, influenciado, sem
Parágrafo único. Se disser dúvida, pelo princípio da função social.
respeito a pessoa não pertencente à Trata-se de um defeito que se
família do paciente, o juiz, com base nas diferencia da lesão pelo seu caráter
circunstâncias, decidirá se houve
coação.”
emergencial.
Toda coação é apreciada em O estado de perigo se configura
concreto. A ameaça dirigida a um não quando uma pessoa, premida da
tem o mesmo efeito que aquela dirigida necessidade de salvar-se ou a pessoa
a outrem. Dito de outro forma, é próxima, de grave perigo de dano
importante anotar, nos termos do art. conhecido pela outra parte, celebra um
152, que toda coação é analisada em negócio assumindo uma obrigação
concreto. Na mesma linha, acrescenta o excessivamente onerosa. O estado de
art. 153, a coação não se confunde com perigo exige para sua caracterização,
o simples temor reverencial nem com a que a outra parte saiba o perigo de dano
ameaça do exercício normal de um (dolo de aproveitamento), resultando na
direito. invalidade do negócio.
“Seção IV
“Art. 152. No apreciar a coação,
Do Estado de Perigo
ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a
Art. 156. Configura-se o estado de
condição, a saúde, o temperamento do
perigo quando alguém, premido da
paciente e todas as demais circunstâncias
necessidade de salvar-se, ou a pessoa de
que possam influir na gravidade dela.
sua família, de grave dano conhecido
Art. 153. Não se considera coação
pela outra parte, assume obrigação
a ameaça do exercício normal de um
excessivamente onerosa.
direito, nem o simples temor
Parágrafo único. Tratando-se de
reverencial.”
pessoa não pertencente à família do
Assim como no dolo, a coação declarante, o juiz decidirá segundo as
também pode provir de terceiro (artigos circunstâncias.”
154 e 155). Na mesma linha, o negócio A jurisprudência brasileira tem
jurídico em que há coação de terceiro amadurecido para admitir o
somente será invalidado se o reconhecimento do estado de perigo
beneficiário soubesse ou tivesse como (ver REsp 918392/RN).
saber, com a peculiaridade de que Especial aplicação do estado de
responderá solidariamente com terceiro perigo, temos na absurda exigência do
pelas perdas e danos. cheque caução ou de outra garantia
“Art. 154. Vicia o negócio como condição para o atendimento
jurídico a coação exercida por terceiro,
se dela tivesse ou devesse ter
hospitalar de emergência.
conhecimento a parte a que aproveite, e Finalmente, vale acrescentar que a
esta responderá solidariamente com Lei n. 12653/2012 alterou o CP para, no
aquele por perdas e danos. artigo 135-A considerar crime a
Art. 155. Subsistirá o negócio exigência de cheque caução ou
jurídico, se a coação decorrer de terceiro,
sem que a parte a que aproveite dela
equivalente como condição para o
tivesse ou devesse ter conhecimento; mas atendimento hospitalar de emergência.
o autor da coação responderá por todas
as perdas e danos que houver causado ao
coacto.” Material de Apoio - Direito Civil - João
Aguirre - Aula 04 (II).pdf
4. Estado de perigo I) Lesão
1. Noção

41
Cf. art. 157, a lesão ocorre quando judicial do negócio por meio da redução
alguém, por premente necessidade ou do proveito do lesionador ou do
complemento do preço.”
inexperiência assume uma prestação
manifestamente desproporcional com
2. Elementos
relação à prestação oposta.
i) elemento objetivo – é a
Segundo MHD, visa-se proteger o
desproporção entre as prestações. A
contratante que está em desvantagem
desproporção acarreta prejuízo a uma
(inferioridade) devido à desproporção
das partes.
entre as duas prestações.
“Seção V ii) elemento subjetivo – segundo
Da Lesão Stolze/Pamplona, não mais se admite o
Art. 157. Ocorre a lesão quando “negócio da China”. É possível um bom
uma pessoa, sob premente necessidade, ganho, mas não pode representar lucro
ou por inexperiência, se obriga a abusivo, manifestamente
prestação manifestamente
desproporcional ao valor da prestação
desproporcionais.
oposta. Para Tartuce, a manifesta
§ 1º Aprecia-se a desproporção desproporção configura a excessiva
das prestações segundo os valores onerosidade para a parte prejudicada.
vigentes ao tempo em que foi celebrado Álvaro Villaça Azevedo alerta
o negócio jurídico.
§ 2º Não se decretará a anulação
para a diferença entre a lesão subjetiva,
do negócio, se for oferecido suplemento prevista no CC, 157, que deve ser
suficiente, ou se a parte favorecida analisada casuisticamente, pelo
concordar com a redução do proveito.” desequilíbrio entre as partes (sujeitos);
A revisão judicial ou extrajudicial da lesão objetiva, prevista no art. 480.
do negócio jurídico consagra os “Art. 480. Se no contrato as
princípios da: 1) função social do obrigações couberem a apenas uma das
contrato; e 2) princípio da conservação partes, poderá ela pleitear que a sua
prestação seja reduzida, ou alterado o
do negócio jurídico. modo de executá-la, a fim de evitar a
O CC, 157, § 2º dispõe que a onerosidade excessiva.”
invalidade negocial pode ser afastada Segundo Villaça, os elementos
em duas hipóteses: 1) se for oferecido subjetivos da lesão do art. 157 são “sob
suplemento suficiente; ou 2) se a parte premente necessidade” ou
favorecida concordar com a redução do “inexperiência”, conceitos abertos.
proveito. Percebe-se que é a própria Assim, a lesão do art. 157 tem uma
conservação do negócio jurídico. O fórmula: [(premente necessidade/
momento processual correto para inexperiência) + (desproporção) =
oferecer o suplemento é a defesa. lesão].
Enunciados do CJF: *Segundo MHD, os conceitos
“III Jornada de Direito Civil - indeterminados, que compõe a clausula
Enunciado 149. Em atenção ao princípio
da conservação dos contratos, a
aberta, geralmente possuem uma
verificação da lesão deverá conduzir, estrutura formada por um sujeito e um
sempre que possível, à revisão judicial adjetivo (ex: boa-fé; justa causa; extensa
do negócio jurídico e não à sua anulação, área/considerável número de pessoas
sendo dever do magistrado incitar os etc.)
contratantes a seguir as regras do art.
157, § 2º, do Código Civil de 2002.”
Premente necessidade. Esse
“IV Jornada de Direito Civil - conceito indeterminado que deve ser
Enunciado 291. Nas hipóteses de lesão preenchido pelo juiz no caso concreto.
previstas no art. 157 do Código Civil, Exemplo de Tartuce: a compra e venda
pode o lesionado optar por não pleitear a de um imóvel pode caracterizar uma
anulação do negócio jurídico, deduzindo,
premente necessidade? Sim, em razão
desde logo, pretensão com vista à revisão
do direito social à moradia do art. 6º da

42
CRFB (mínimo existencial, cf. Fachin, utilizado para encobertar outro.
na obra “Estatuto jurídico do patrimônio Exemplo: divórcio simulado, para
mínimo”). fraudar os credores.
Segundo Teresa Ancona Lopez, é Na simulação existe um negócio
preciso distinguir a lesão do estado de jurídico aparente que não corresponde à
perigo e do estado de necessidade: realidade. No exemplo acima, o casal
- estado de necessidade – obriga o está aparentemente divorciado, a partir
sujeito a causar a destruição ou a de uma sentença que homologou o
deterioração de coisa alheia ou um dano acordo judicial, mas continuam vivendo
à pessoa a fim de livrar-se de perigo como casados.
iminente (cf. art. 188, II do CC). Trata- A simulação caracteriza um
se de uma excludente de ilicitude; desacordo voluntário entre a vontade
- estado de perigo – o sujeito sabe declarada e a vontade interna, real.
da necessidade de se salvar ou de salvar Existe a possibilidade de uma
alguém de um perigo e assume uma simulação inocente, i. é, que não traz
prestação excessivamente onerosa prejuízo a ninguém. Mesmo assim,
imposta pela outra parte que sabia da como é de ordem pública, acarreta a
existência desse perigo (dolo de invalidade.
aproveitamento); “III Jornada de Direito Civil -
- Lesão – “estado de precisão” Enunciado 152. Toda simulação,
inclusive a inocente, é invalidante.”
econômica ou financeira. Segundo
Contra esse entendimento se opõe
CMSP, “não se trata da alternativa entre
abertamente Cristiano Chaves de Faria e
a fome e o negócio (perigo), mas de
Nelson Rosenvald, bem como Silvio
uma necessidade contratual”.
Venosa.
Inexperiência. Falta de intimidade
Somos mais acostumados com a
ou de familiaridade com o tipo de
alegação da simulação por parte de
negócio celebrado. Tb. outro conceito
terceiros, mas ela pode ser alegada pela
indeterminado. Segundo Moreira Alves,
própria parte na simulação, sem medo
que foi da comissão de juristas revisora
de caracterização de venire contra
do CC a inexperiência não se confunde
factum proprium. Como ela acarreta
com o erro, pois não se trata de
nulidade, entende-se que pode ser
desconhecimento ou falso
suscitada por qualquer pessoa.
conhecimento: o inexperiente conhece a “IV Jornada de Direito Civil -
desproporção, mas por fala de Enunciado 294. Sendo a simulação uma
experiência da vida, concorda com ela causa de nulidade do negócio jurídico,
sem se atentar para seus efeitos pode ser alegada por uma das partes
prejudiciais. contra a outra.”
“V Jornada de Direito Civil - Cf. STJ, REsp 1140380/DF, num
Enunciado 410. A inexperiência a que se contrato de compra e venda com
refere o art. 157 não deve quitação simulada com o intuito de
necessariamente significar imaturidade adquirir financiamento bancário. Nesse
ou desconhecimento em relação à prática
de negócios jurídicos em geral, podendo caso, o STJ decidiu que se trata de
ocorrer também quando o lesado, ainda simulação inocente que a própria
que estipule contratos costumeiramente, quitação possui uma presunção relativa ,
não tenha conhecimento específico sobre ou seja, trata-se de entendimento
o negócio em causa.” contrário à JDC, 294.
II. Simulação 2. Simulação absoluta e relativa
1. Noção i) simulação absoluta – um
“Fazer uma coisa passar por negócio jurídico é celebrado para ser
outra”, um negócio jurídico que é

43
aparente, mas na verdade, não deseja preencher todos os requisitos
negócio algum. substanciais e formais de validade; 2)
Dica: não existe alteração na não pode ofender a Lei; 3) não pode
situação anterior. Existe um negócio prejudicar terceiros.
jurídico aparente mas, na prática, nada Cf. art. 167, § 1º, haverá
mudou (nenhuma alteração no status simulação nos negócios jurídicos
quo ante). quando:
ii) simulação relativa – celebra-se I) aparentarem conferir ou
um negócio jurídico para que ele transferir direitos a pessoas diversas das
apresente essas características a que realmente se conferem ou
terceiros, mas se deseja um outro transmitem. Essa situação se chama
negócio. simulação subjetiva. O sujeito diverso
Dica: existe alteração na situação é chamado de interposta pessoa, laranja,
anterior, mas não da forma que está cítrico, “testa de ferro”;
aparente. II) contiverem 1) declaração, 2)
Na simulação relativa, existe um confissão, 3) condição ou 4) cláusula
negócio jurídico aparente mas, na não verdadeira;
prática pretende-se a produção de III) os instrumentos particulares
efeitos de um outro negócio. forem antedatados ou pós-datados.
Na simulação relativa existem II e III tratam da simulação
dois negócios: objetiva.
1º) negócio aparente – simulado, *****
que é nulo;
2º) negócio oculto – dissimulado,
que pode ser válido.
O exemplo clássico é uma doação Material de Apoio - Direito Civil -
simulada por uma compra e venda. Flavio Tartuce - Aula 01 On line
Veja o caso. O marido compra (II).pdf
para a amante um apartamento. Ele paga
R$1500000,00. Coloca o apartamento Aula em dois temas: 1) Plano da
no nome da amante. A mulher consegue eficácia do negócio jurídico; 2) Fraude
na Justiça modificar o registro do contra credores.
imóvel para o nome do casal, o que em
nada interferiu no negócio com o 1. Plano da eficácia do negócio
vendedor. jurídico
“III Jornada de Direito Civil - Pontes de Miranda, na obra
Enunciado 153. Na simulação relativa, o Tratado de Direito Privado,
negócio simulado (aparente) é nulo, mas
o dissimulado será válido se não ofender
influenciado pela doutrina alemã,
a lei nem causar prejuízos a terceiros.” dividiu o negócio jurídico em três
“IV Jornada de Direito Civil - planos:
Enunciado 293. Na simulação relativa, o 1) plano da existência;
aproveitamento do negócio jurídico 2) plano da validade;
dissimulado não decorre tão-somente do
afastamento do negócio jurídico
3) plano da eficácia.
simulado, mas do necessário É o esquema que dá origem à
preenchimento de todos os requisitos escada ponteana.
substanciais e formais de validade
daquele.” PLANO DA
EFICÁCIA
Assim, segundo a conjugação de (consequências
tais enunciados, para que o negócio PLANO DA do negócio).
jurídico dissimulado (oculto) produza VALIDADE Elementos
PLANO DA (CC, 104): acidentais do
efeitos na simulação normativa: 1) deve
44
EXISTÊNCIA -partes negócio I - as condições física ou
-partes; capazes; jurídico: CC, juridicamente impossíveis, quando
-vontade; - vontade livre; 121 a 137. suspensivas;
-objeto; e -objeto lícito,
II - as condições ilícitas, ou de
- forma. possível e
determinável;
fazer coisa ilícita;
- forma III - as condições
prevista ou incompreensíveis ou contraditórias.”
não defesa em Exemplos de condições perplexa e
lei. potestativa: dou-lhe um carro se você
Os elementos acidentais não são ganhar o campeonato de futebol mas
essenciais; estão relacionados à não jogando (perplexa); dou-lhe um
modificação e extinção de direitos carro se eu quiser (puramente
decorrentes do negócio jurídico. São potestativa).
três elementos: II) Quanto à possibilidade:
a) condição; - condições possíveis – são
b) termo; aquelas que podem ocorrer no plano
c) encargo ou modo. fático e jurídico (dou-lhe um carro se
for aos EUA);
a) Condição - condições impossíveis: aquelas
Elemento acidental do negócio que não podem ocorrer (v. g., dou-lhe
jurídico que associa a sua eficácia a um um carro se fores a Marte). Geram a
evento futuro e incerto. nulidade do negócio quando
Temos duas conjunções: suspensivas, cf. CC, 123, I. Então,
- “se”: condição suspensiva; cuidado! Deslocamos a discussão para o
- “enquanto”: condição plano da validade, percebeu?
resolutiva. Cuidado:
“Art. 124. Têm-se por
Classificação das condições: inexistentes as condições impossíveis,
I) quanto à licitude: quando resolutivas [ou seja, não escritas
- condições lícitas – são aquelas – ex.: dou-lhe uma renda enquanto não
que não contrariam a lei, a ordem fores a Marte], e as de não fazer coisa
pública ou os bons costumes (CC, 122); impossível.”
- condições ilícitas – aquelas que
contrariam os parâmetros acima, e III) Quanto à origem:
acarretam a nulidade do negócio - condições casuais (ou causais) –
jurídico. decorrem da natureza, v. g., “dou-lhe
“CAPÍTULO III um carro se chover amanhã”;
Da Condição, do Termo e do Encargo - condições potestativas -
Art. 121. Considera-se condição a decorrem da vontade. Temos duas
cláusula que, derivando exclusivamente modalidades: 1) puramente potestativas:
da vontade das partes, subordina o efeito
do negócio jurídico a evento futuro e
são ilícitas cf. visto acima (vontade de
incerto. um + vontade do mesmo). Exemplo:
Art. 122. São lícitas, em geral, dou-lhe um carro se eu quiser; 2)
todas as condições não contrárias à lei, à simplesmente potestativas: são lícitas
ordem pública ou aos bons costumes; (vontade de um + vontade do outro).
entre as condições defesas se incluem as
Exemplo: dou-lhe um carro se você
que privarem de todo efeito o negócio
jurídico [perplexas], ou o sujeitarem ao cantar no show amanhã;
puro arbítrio de uma das partes - condições mistas – decorrem da
[puramente potestativas]. natureza e da vontade, v. g., dou-lhe um
Art. 123. Invalidam [nulidade carro se você cantar no show amanhã e
absoluta] os negócios jurídicos que lhes
estiver chovendo.
são subordinados:

45
IV) Quanto aos efeitos Contudo, o termo inicial tem uma
- condições suspensivas – são especificidade, pois ele não impede a
aquelas que enquanto não verificadas, aquisição, mas apenas o exercício:
suspendem a aquisição e o exercício do “Art. 131. O termo inicial
direito (art. 125 do CC). Ou seja, não há suspende o exercício, mas não a
aquisição do direito.”
direito adquirido. Exemplo: dou-lhe um
Exemplo: o termo inicial da
carro se você for de São Paulo a
minha locação é amanhã. Eu já tenho
Aparecida (nesse caso não há direito
direito adquirido sobre o contrato.
adquirido sobre o carro);
Porém eu não posso exercer os meus
- condições resolutivas – enquanto
direitos.
não realizadas vigora o negócio
Quanto à origem o termo pode ser
jurídico, podendo exercer-se os direitos
legal ou convencional. Exemplo do
por este estabelecidos (CC, 127). Ou
primeiro: o termo inicial para a atuação
seja, há direito adquirido que pode
do inventariante é quando ele firma o
ser exercido (“enquanto”). Ocorrendo
compromisso como inventariante; do
a condição, o negócio é extinto, com o
segundo: termos iniciais e finais dos
fim dos direitos correspondentes (CC,
contratos.
128). Exemplo: dou-lhe uma renda
O termo pode ainda ser certo
enquanto você estudar Direito.
“Art. 128. Sobrevindo a condição determinado ou indeterminado. Certo
resolutiva, extingue-se, para todos os determinado: sei que ocorrerá e quando
efeitos, o direito a que ela se opõe; mas, ocorrerá (v. g., termo final de um
se aposta a um negócio de execução contrato). Certo e indeterminado: sei
continuada ou periódica, a sua que ocorrerá mas não sei quando
realização, salvo disposição em
contrário, não tem eficácia quanto aos
(exemplo: morte).
atos já praticados, desde que compatíveis
com a natureza da condição pendente e C) Encargo ou modo
conforme aos ditames de boa-fé.” É um ônus ou fardo introduzido
em ato de liberalidade (doação e
b) Termo testamento). É o famoso “presente de
É o elemento acidental do negócio grego”. As conjunções são “para que”
jurídico que associa a sua eficácia a um ou “com o fim de”.
evento futuro e certo (“quando”). O exemplo clássico de Beviláqua:
Exemplo: “dou-lhe um carro “dou-lhe um terreno para que construa
quando seu pai morrer”. em parte dele um asilo”. O donatário já
Quanto aos efeitos, o termo pode recebe o terreno; se não construir o asilo
ser: no prazo fixado pelo doador caberá
- inicial (começo ou dies a quo); revogação da doação.
ou Conforme art. 136, há direito
- final (término ou dies ad quem). adquirido:
Prazo é o lapso temporal entre o “Art. 136. O encargo não
dies a quo e o dies ad quem. suspende a aquisição nem o exercício do
Quanto ao termo inicial, aplicam- direito, salvo quando expressamente
imposto no negócio jurídico, pelo
se as regras da condição suspensiva; e disponente, como condição suspensiva.”
quanto ao termo final, da condição “Seção II
resolutiva, no que couber. Da Revogação da Doação
“Art. 135. Ao termo inicial e final Art. 555. A doação pode ser
aplicam-se, no que couber, as revogada por ingratidão do donatário, ou
disposições relativas à condição por inexecução do encargo.”
suspensiva e resolutiva.” Considera-se não escrito o
encargo ilícito ou impossível:

46
“Art. 137. Considera-se não Esses atos de alienação em fraude
escrito o encargo ilícito ou impossível são anuláveis (cf. CC, 171), havendo
[regra], salvo se constituir o motivo
determinante da liberalidade, caso em
um prazo decadencial de 4 (quatro),
que se invalida [nula] o negócio contados da realização do negócio, para
jurídico.” a propositura da ação anulatória (CC,
Exemplo: “dou-lhe uma casa para 178).
que você mate 100 (cem) pessoas” “Art. 790. São sujeitos à
execução os bens:
(...)
CONDIÇÃO TERMO ENCARGO
VI - cuja alienação ou gravação
SUSPENSIVA INICIAL MODO
com ônus real tenha sido anulada em
- se; - quando; - para que;
razão do reconhecimento, em ação
- suspende a - não - não
autônoma, de fraude contra credores;”
aquisição e o suspende suspende a
exercício do aquisição, aquisição Assim, há uma tese antiga no
direito; mas sim o nem o sentido de que, na fraude contra
exercício do exercício; credores, as alienações devem ser
direito; consideradas como ineficácia e não
- não há - há direito - há direito como anulabilidade (cf. Alexandre
direito adquirido; adquirido,
adquirido; bem como
Câmara e Carlos Roberto Gonçalves).
possibilidade Alguns julgados adotam essa premissa
de exercício. (cf. REsp 971884/PR). Isso para afastar
Na LINDB: a possibilidade do credor que promoveu
“Art. 6º A Lei em vigor terá efeito a ação “ganhar, mas não levar”. Como o
imediato e geral, respeitados o ato art. 790 do NCPC confirma a anulação,
jurídico perfeito, o direito adquirido e a
essa tese está enfraquecida, até porque
coisa julgada.
§ 1º Reputa-se ato jurídico existem julgados do STJ que adotam a
perfeito o já consumado segundo a lei anulação (REsp 710810/RS).
vigente ao tempo em que se efetuou. A ação anulatória na fraude contra
§ 2º Consideram-se adquiridos credores é denominada ação pauliana,
assim os direitos que o seu titular, ou
diante de sua origem romana. Também
alguém por êle, possa exercer, como
aquêles cujo comêço do exercício tenha é utilizada a expressão ação
têrmo pré-fixo [se refere ao termo final, revocatória, mas essa mais utilizada em
pois quanto ao termo inicial não é falência.
pacífico se o dispositivo a ele se refere], A ação pauliana, cf. CC, 161,
ou condição pré-estabelecida [condição deve ser proposta:
resolutiva] inalterável, a arbítrio de
“Art. 161. A ação, nos casos dos
outrem.
arts. 158 e 159, poderá [na verdade,
§ 3º Chama-se coisa julgada ou
DEVERÁ] ser intentada contra o
caso julgado a decisão judicial de que já
devedor insolvente, a pessoa que com ele
não caiba recurso.”
celebrou a estipulação considerada
fraudulenta, ou [“e”, não “ou”] terceiros
adquirentes que hajam procedido de má-
2. Fraude contra credores fé.”
CC, 158 a 165. O art. 161 na verdade deve ser
Conceito. É um vício social do lido como estabelecendo um
negócio jurídico presente quando o litisconsórcio necessário. Cf. CPC, 113.
devedor insolvente ou que beira a Isso porque o bem deve voltar ao
insolvência realiza atos de disposição patrimônio do devedor. Cf. também
onerosas ou gratuita de bens com o REsp 750135/RS.
intuito de prejudicar credores. Exemplo: Terceiros adquirentes de boa-fé
tenho obrigações assumidas e alieno o estão protegidos, não podendo ser
meu patrimônio. atingidos pela anulação. REsp
1.100.525/RS (ler esse julgado).

47
Confirmando que o bem volta ao tiver pago o preço e este for,
patrimônio do devedor: aproximadamente, o corrente,
“Art. 165. Anulados os negócios desobrigar-se-á depositando-o em juízo,
fraudulentos, a vantagem resultante com a citação de todos os interessados.
reverterá em proveito do acervo sobre Parágrafo único. Se inferior, o
que se tenha de efetuar o concurso de adquirente, para conservar os bens,
credores. poderá depositar o preço que lhes
Parágrafo único. Se esses corresponda ao valor real.”
negócios tinham por único objeto atribuir Outra aplicação do princípio da
direitos preferenciais, mediante hipoteca, conservação do negócio jurídico:
penhor ou anticrese, sua invalidade “Art. 164. Presumem-se, porém,
importará somente na anulação da de boa-fé e valem os negócios ordinários
preferência ajustada.” indispensáveis à manutenção de
Requisitos da fraude contra estabelecimento mercantil, rural, ou
credores: industrial [empresarial ou rural] [função
social da empresa], ou à subsistência do
a) se houve disposição onerosa – devedor e de sua família. [tese do
exemplo: venda de um imóvel. É a regra ESTATUTO JURÍDICO DO
geral. São dois os requisitos: 1) conluio PATRIMÔNIO MÍNIMO]”
fradulento ou colusão (consilium Atenção! Não confundir fraude
fraudis); 2) prejuízo ao credor (eventus contra credores com a fraude à
damni). execução (CPC, 792 e Lei n.
Atenção! Presume-se 13097/2015).
relativamente o conluio fraudulento se a “Art. 792. A alienação ou a
insolvência do devedor for notória ou oneração de bem é considerada fraude
à execução:
houver motivo para ser conhecida pelo I - quando sobre o bem pender
outro contratante (art. 159). Exemplo: ação fundada em direito real ou com
venda entre irmãos. pretensão reipersecutória, desde que a
b) se o caso foi de disposição pendência do processo tenha sido
gratuita (doação) de bens ou remissão averbada no respectivo registro
público, se houver;
de dívida – só há um requisito: provar o II - quando tiver sido averbada,
prejuízo ao credor (eventus damni). É no registro do bem, a pendência do
uma interpretação do art. 158. processo de execução, na forma do art.
“Art. 158. Os negócios de 828;
transmissão gratuita de bens ou remissão III - quando tiver sido averbado,
de dívida, se os praticar o devedor já no registro do bem, hipoteca judiciária
insolvente, ou por eles reduzido à ou outro ato de constrição judicial
insolvência, ainda quando o ignore, originário do processo onde foi arguida
poderão ser anulados pelos credores a fraude;
quirografários, como lesivos dos seus IV - quando, ao tempo da
direitos. alienação ou da oneração, tramitava
§ 1º Igual direito assiste aos contra o devedor ação capaz de reduzi-
credores cuja garantia se tornar lo à insolvência;
insuficiente. V - nos demais casos expressos
§ 2º Só os credores que já o eram em lei.
ao tempo daqueles atos podem pleitear a § 1º A alienação em fraude à
anulação deles.” execução é ineficaz em relação ao
Fraude não ultimada ou não exequente.
aperfeiçoada. CC, 160: o adquirente do § 2º No caso de aquisição de
bem não sujeito a registro, o terceiro
bem alienado em fraude poderá afastar a
adquirente tem o ônus de provar que
anulação do negócio pagando o preço adotou as cautelas necessárias para a
do bem nos autos da ação pauliana. É aquisição, mediante a exibição das
uma aplicação do princípio da certidões pertinentes, obtidas no
conservação do negócio jurídico. domicílio do vendedor e no local onde
“Art. 160. Se o adquirente dos se encontra o bem.”
bens do devedor insolvente ainda não

48
STJ, 375: “O reconhecimento da Material de Apoio - Direito Civil - João
fraude à execução depende do registro Aguirre - Aula 05.pdf
da penhora do bem alienado ou da INVALIDADE
prova de má-fé do terceiro adquirente.” DO NEGÓCIO JURÍDICO
Pela STJ, 375 e pela jurisprudência,
quem deve provar a má-fé é o
prejudicado pela alienação (exequente). 1. Teoria das nulidades
Mas o CPC/2015 prevê que quem deve A expressão invalidade é usada
provar a boa-fé é o adquirente no caso para designar um negócio que não
de bens móveis não sujeitos a registro. produz os efeitos desejados.
Trata-se de uma questão processual e A nulidade pode ser absoluta ou
não material e que ainda aguarda novos relativa.
posicionamentos dos Tribunais.
FRAUDE CONTRA FRAUDE À 1.1. Nulidade absoluta
CREDORES EXECUÇÃO
Direito Civil – vício do Direito Processual civil -
Sanção imposta pela Lei, que
negócio jurídico; responsabilidade determina a privação de efeitos
patrimonial; jurídicos do ato negocial, praticado em
Tenho obrigações e Tenho ações (citação ou
alieno o patrimônio; registro) e alieno o
desobediência ao que a norma jurídica
patrimônio; prescreve.
Existe um atentado à Atentado ao processo Gera o negócio jurídico nulo.
parte; (afeta a dignidade da
Justiça);
Ordem privada; Ordem pública; 1.2. Nulidade relativa
Há necessidade de ação Ação já existe; Neste caso o negócio jurídico
específica (paulina); produzirá efeitos até a sua anulação.
Gera anulação do Gera ineficácia (plano
negócio jurídico (plano da eficácia). Aqui termos o negócio jurídico
da validade). anulável.
Fraude contra credores vs.
simulação: os dois são vícios sociais. 2. Hipóteses de nulidade (absoluta)
Na simulação temos o “parece mas não O art. 166 do CC prescreve que é
é”, uma discrepância entre a aparência e nulo o negocio jurídico:
a essência, bem como o fato de o i) celebrado pelo absolutamente
negócio jurídico simulado ser nulo – incapaz [menor de 16 anos, apenas, cf.
nulidade absoluta (CC, 167), havendo Lei n. 13] sem estar devidamente
necessidade de se provar o vício, não representado;
tendo prazo para ser declarada, e pode ii) quando o objeto for ilícito,
ser de ofício. Na fraude contra credores impossível, indeterminado ou
temos anulabilidade - nulidade relativa. indeterminável.
Em alguns casos temos a Segundo Pontes de Miranda, esse
simulação e fraude contra credores ao é o ilícito nulificante. Mas há também
mesmo tempo. A dúvida que se coloca: o ilícito indenizante, que é a base da
qual a consequência jurídica na responsabilidade civil, que gera a
coexistência dos dois vícios? A obrigação de reparação ou compensação
consequência jurídica é anulabilidade do dano, bem como o ilícito
ou nulidade? Ex.: um pai vende imóveis caducificante, que geram a perda de
para o fílho escondendo doação, direitos (como a perda do poder
também com o intuito de prejudicar familiar, CC, 1638).
credores. Nesse caso, prevalece a iii) quando o motivo determinante
simulação (nulidade absoluta) por do negócio, para ambas as partes, for
envolver ordem pública. ilícito.

49
O motivo diz respeito ao plano III - o motivo determinante,
subjetivo do negócio, i. é, a intenção das comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita
partes. É diferente da causa, que está no em lei;
plano objetivo (objeto). V - for preterida alguma
Segundo Zeno Veloso, a venda de solenidade que a lei considere essencial
um carro para sequestro, com para a sua validade;
conhecimento do vendedor. A venda do VI - tiver por objetivo fraudar lei
imperativa;
carro é um objeto lícito (como não VII - a lei taxativamente o
conseguiria nunca ser a venda de declarar nulo, ou proibir-lhe a prática,
drogas), mas o motivo é ilícito. Outro sem cominar sanção.”
exemplo: aluguel de uma casa
(plenamente lícito) para explorar
lenocínio (motivo ilícito). I - Nulidade
iv) quando o negócio não se As hipóteses do art. 166
revestir da forma prevista em lei ou constituem rol exemplificativo. No
quando for preterida alguma solenidade próprio CC existem outras hipóteses de
essencial para sua validade. nulidade. Exemplos: art. 548 (doações
Obs.: a forma é gênero, sendo que inoficiosas); art. 1.548 (casamento
a solenidade é a espécie (instrumento nulo).
público ou a celebração. Exemplo do
casamento) ou não solene (não demanda 1) Efeitos da nulidade absoluta
forma pública, como no caso da fiança). A nulidade envolve norma de
v) tiver por objeto fraudar lei ordem pública. Pode ser alegada por
imperativa. Segundo Zeno Veloso, não qualquer interessado ou pelo MP
se confunde com ilicitude do objeto quando lhe couber intervir no processo.
porque na fraude à lei há uma Além disso, deve ser declarada de ofício
infringência oblíqua e indireta da Lei pelo juiz, quando o juiz conhecer do
proibitiva. Exemplo: REsp 1076571/SP, negócio ou de seus efeitos e encontrar
de uma retrovenda para dar legalidade a provadas as nulidades.
um mútuo com juros abusivos. “Art. 168. As nulidades dos
vi) quando a lei expressamente o artigos antecedentes podem ser alegadas
por qualquer interessado, ou pelo
declarar nulo ou proibir-lhe a prática Ministério Público, quando lhe couber
sem cominar sanção. intervir.
Aqui temos duas possibilidades: Parágrafo único. As nulidades
a) a nulidade expressa ou textual. devem ser pronunciadas pelo juiz,
O exemplo: art. 1548, III do CC: é nulo quando conhecer do negócio jurídico ou
dos seus efeitos e as encontrar provadas,
o casamento por afronta aos
não lhe sendo permitido supri-las, ainda
impedimentos matrimoniais. que a requerimento das partes.”
b) nulidade implícita ou virtual. Existe a súmula 381 do STJ,
Quando a lei proíbe sem declarar muito criticada, segundo a qual o juiz
sanção. Exemplo do CC, 426: não pode não pode reconhecer as cláusulas
ser objeto de contrato herança de pessoa abusivas (nulas, segundo o CDC)
viva. presentes em contratos bancários: “Nos
“CAPÍTULO V
contratos bancários, é vedado ao
Da Invalidade do Negócio Jurídico
Art. 166. É nulo o negócio julgador conhecer, de ofício, da
jurídico quando: abusividade das cláusulas.” Enfim,
I - celebrado por pessoa trata-se de uma exceção à regra levada a
absolutamente incapaz; efeito pela jurisprudência do STJ, o
II - for ilícito, impossível ou Tribunal da Cidadania.
indeterminável o seu objeto;

50
A nulidade não pode ser suprida declarada a qualquer tempo...”). No
pelo Juiz, ainda que requerida pelas mesmo sentido, AgRg noAREsp
partes. Significa dizer que também que 249743.
não pode ser ratificada pelas partes. O 2ª) A segunda corrente defende
negócio nulo não é suscetível de que a ação para declarar a nulidade do
confirmação. ato está sujeita a maior prazo
Segundo o CC, 169, o negócio prescricional previsto em lei. Essa
jurídico não convalesce com o decurso corrente é encabeçada por Gustavo
do tempo. Assim, a conclusão é que a Tepedino, Maria Celina Bodin de
nulidade possui um efeito fatal, i. é, é Moraes, Heloisa Helena Barboza. É
imperativa, liquidando o negócio chamada Escola do Rio de Janeiro.
jurídico. Segundo essa corrente, essa regra deve
“Art. 169. O negócio jurídico nulo ser usada especialmente para efeitos
não é suscetível de confirmação, nem patrimoniais, pois entram em jogo
convalesce pelo decurso do tempo.”
outros interesses, como a boa-fé de
De acordo com o art. 166, VII, há
terceiros.
nulidade quando a lei proibir a prática
3ª) A ação para declarar que o ato
do ato sem cominar sanção. Daí,
é nulo é sempre imprescritível, mas a
segundo o art. 367 do CC, não pode ser
prescrição pode se aplicar para outras
objeto de novação as obrigações nulas:
“Art. 367. Salvo as obrigações
pretensões, decorrentes da nulidade do
simplesmente anuláveis, não podem ser negócio jurídico. Ou seja, dividem em
objeto de novação obrigações nulas ou partes o negócio jurídico. É a conclusão
extintas.” do CJF:
“VI Jornada de Direito Civil -
2. Ação declaratória de nulidade Enunciado 536. Resultando do negócio
Segue em regra o procedimento jurídico nulo consequências patrimoniais
capazes de ensejar pretensões, é possível,
comum do CPC, com preceitos de quanto a estas, a incidência da
ordem pública. prescrição.”
Pergunta. Corre prazo Exemplo para explicar: um pedido
prescricional no caso da ação de reparação civil dos danos decorrentes
declaratória de nulidade? Segundo da nulidade. Temos duas possibilidades:
Agnelo Amorim Filho é imprescritível. 1) declaração da nulidade é
*mais uma vez foi feita referência ao imprescritível; 2) a reparação do dano
artigo do professor Agnelo Amorim prescreve.
Filho. Essa corrente faz distinção entre o
“Art. 169. O negócio jurídico pedido tendente unicamente ao
nulo não é suscetível de confirmação,
nem convalesce pelo decurso do
reconhecimento da invalidade
tempo.” (imprescritível), e os efeitos
Contudo, esse tema é muito patrimoniais decorrentes da invalidade
controverso e existem 3 (três) correntes (passíveis de prescrição).
sobre ele: Segundo Tartuce, “os efeitos
1ª) Defende a imprescritibilidade. patrimoniais da declaração de nulidade
É a maioria da doutrina (Álvaro Villaça; também não estão sujeitos à prescrição,
Silvio Venosa; Tartuce; Chaves e pois a ordem pública relacionada ao ato
Rosenvald; Jones Figueiredo; Mário nulo deve prevalecer” (a ser considerada
Delagado) e também forte na em concursos). Isto porque a
jurisprudência do STJ (REsp imprescritibilidade da pretensão à
1353864/GO – onde encontramos os declaração de nulidade não teria
seguinte excerto: “...os atos nulos não nenhum efeito prático ou jurídico.
prescrevem, podendo a nulidade ser

51
II – Anulabilidade do Negócio jurídico “Art. 180. O menor, entre
(nulidade relativa) dezesseis e dezoito anos, não pode, para
eximir-se de uma obrigação, invocar a
Envolve preceitos de ordem sua idade se dolosamente a ocultou
privada, ou seja, de interesse entre as quando inquirido pela outra parte, ou se,
partes. no ato de obrigar-se, declarou-se maior.”
Mas, se uma pessoa pagou ao
1. Hipóteses de anulabilidade incapaz e a obrigação foi,
Segundo o CC, 191, o negócio posteriormente, anulada, a pessoa que
jurídico é anulável: efetuou o pagamento terá que provar
a) quando celebrado por que o menor dele se beneficiou para
relativamente incapaz sem a devida poder reaver o dinheiro pago.
assistência. Contudo, não são todos os b) quando houver vício resultante
atos em que o relativamente incapaz de erro, dolo, coação [moral], estado de
deve estar assistido, a exemplo do perigo, lesão e fraude contra credores
testamento do maior de 16 anos (CC, (CC, 171, II). Vale lembrar que na
1860, p. ú.). simulação o negócio é nulo.
“Art. 3º São absolutamente c) nos demais casos previstos em
incapazes de exercer pessoalmente os lei (art. 171, caput). São exemplos: a
atos da vida civil os menores de 16
(dezesseis) anos. (Redação dada pela Lei falta da vênia conjugal nos casos do CC,
nº 13.146, de 2015) (Vigência) art. 1697, cf. art. 1649, com a ressalva
I - (Revogado); (Redação dada nos casos de fiança de que trata a STJ,
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) 332: “A fiança prestada sem
II - (Revogado); (Redação dada autorização de um dos cônjuges implica
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
III - (Revogado). (Redação dada
a ineficácia total da garantia.”; também
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) o art. 496, segundo o qual é anulável a
Art. 4º São incapazes, venda de ascendentes a descendentes.
relativamente a certos atos ou à maneira “Art. 171. Além dos casos
de os exercer: (Redação dada pela Lei nº expressamente declarados na lei, é
13.146, de 2015) (Vigência) anulável o negócio jurídico:
I - os maiores de dezesseis e I - por incapacidade relativa do
menores de dezoito anos; agente;
II - os ébrios habituais e os II - por vício resultante de erro,
viciados em tóxico; (Redação dada pela dolo, coação, estado de perigo, lesão ou
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) fraude contra credores.”
III - aqueles que, por causa
transitória ou permanente, não puderem 2. Efeitos
exprimir sua vontade; (Redação dada
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
A anulabilidade afeta o interesse
IV - os pródigos. privado. Assim, só pode ser suscitada
Parágrafo único. A capacidade pela pessoa juridicamente interessada. O
dos índios será regulada por legislação juiz não poderá conhecê-la de ofício, e
especial. também não pode ser suscitada pelo
Parágrafo único. A capacidade
dos indígenas será regulada por
MP.
legislação especial. (Redação dada pela A existência da anulabilidade o
Lei nº 13.146, de 2015)” negócio existe e gera efeitos concretos
Ainda, segundo a regra do art. até que sobrevenha a declaração de
180, não pode o menor, para eximir-se invalidação.
de uma obrigação, invocar a sua idade, Assim, uma conclusão é que as
quando relativamente capaz, se 1) partes podem ratificar o negócio
dolosamente ocultou a sua idade quando anuláve, salvo interesse de terceiro (CC,
inquirido pela outra parte; ou 2) se no 172).
ato de obrigar-se declarou-se maior.

52
“Art. 172. O negócio anulável Para MHD (majoritária), significa
pode ser confirmado pelas partes, salvo o momento em que ocorreu a celebração
direito de terceiro.”
do ato, quando ele passa a ser válido no
campo jurídico (o STJ tem
3. Ação anulatória
jurisprudência nesse sentido, cf. REsp
É uma ação que segue o
1025920/RO; REsp 868524/ MT).
procedimento comum. Sua natureza é
José Fernando Simão e Zeno
constitutiva negativa. Relacionada ao
Veloso entendem que o prazo deve ser
direito potestativo de pleitear a
contado da celebração, mas deve ser
anulação, sendo vinculada a prazos
contado da ciência correspondente. Por
decadenciais.
exemplo: numa compra e venda de
a) prazos – previstos nos artigos
imóvel, o prazo deve ser contado do
178 e 179:
“Art. 178. É de quatro anos o
registro no CRI e não da escritura
prazo de decadência para pleitear-se a (como garantia da segurança jurídica e
anulação do negócio jurídico, contado: estabilidade das relações negociais).
I - no caso de coação, do dia em Essa última corrente foi seguida no
que ela cessar; enunciado n. 538 das JDC:
II - no de erro, dolo, fraude “VI Jornada de Direito Civil -
contra credores, estado de perigo ou Enunciado 538. No que diz respeito a
lesão, do dia em que se realizou o terceiros eventualmente prejudicados, o
negócio jurídico; prazo decadencial de que trata o art. 179
III - no de atos de incapazes, do do Código Civil não se conta da
dia em que cessar a incapacidade. celebração do negócio jurídico, mas da
Art. 179. Quando a lei dispuser ciência que dele tiverem.”
que determinado ato é anulável, sem
estabelecer prazo para pleitear-se a
São contra esse enunciado
anulação, será este de dois anos, a contar Tartuce, Paulo Lobo, e Humberto
da data da conclusão do ato.” Theodoro Jr., que entendem que conta-
Observações: se o prazo do momento em que a
1) O prazo para anular o negócio escritura é firmada (negócio já existe e é
quando se tratar de incapacidade válido).
relativa ou coação (moral) deve ser 3) Existem exceções (regras
contado do momento em que elas especiais sobre prazos de
cessarem. anulabilidade). Ex: três anos para anular
Dica: pela regra do art. 1560, IV, o casamento por erro sobre a pessoa
o prazo para anular o casamento sob (art. 1560, III - anotei os demais artigos
coação é de quatro anos contados do da parte do CC para dar uma melhor
casamento e não do momento em que visão do problema):
cessar a coação. “Art. 1.550. É anulável o
2) Há um problema relativo à casamento:
I - de quem não completou a
contagem do prazo nos casos de erro, idade mínima para casar;
dolo, estado de perigo, lesão ou fraude II - do menor em idade núbil,
contra credores, pois é dúbia a quando não autorizado por seu
expressão “do momento em que se representante legal;
realizou o negócio jurídico” (art. 178, III - por vício da vontade, nos
termos dos arts. 1.556 a 1.558;
II). Nos demais casos do art. 179, conta- IV - do incapaz de consentir ou
se o prazo “da conclusão do negócio manifestar, de modo inequívoco, o
jurídico”. Assim, o que se entende por consentimento;
“momento em que se realizou o negócio V - realizado pelo mandatário,
jurídico” e “conclusão do negócio sem que ele ou o outro contraente
soubesse da revogação do mandato, e
jurídico”? não sobrevindo coabitação entre os
cônjuges;

53
VI - por incompetência da b) eficácia da sentença na ação
autoridade celebrante. anulatória – possui efeitos inter partes.
§ 1º Equipara-se à revogação a
invalidade do mandato judicialmente
A doutrina tradicional sempre defendeu
decretada. (Redação dada pela Lei nº a eficácia “ex nunc” da sentença, com
13.146, de 2015) fundamento no art. 177 do CC.
§ 2º A pessoa com deficiência “Art. 177. A anulabilidade não
mental ou intelectual em idade núbia tem efeito antes de julgada por sentença
poderá contrair matrimônio, expressando [eficácia ex nunc para a primeira
sua vontade diretamente ou por meio de corrente], nem se pronuncia de ofício; só
seu responsável ou curador. (Incluído os interessados a podem alegar, e
pela Lei nº 13.146, de 2015) aproveita exclusivamente aos que a
(...) alegarem, salvo o caso de solidariedade
Art. 1.557. Considera-se erro ou indivisibilidade.”
essencial sobre a pessoa do outro Contra: Pablo Stolze e Pamplona.
cônjuge: Zeno Veloso, Chaves e Rosenvald, que
I - o que diz respeito à sua
identidade, sua honra e boa fama, sendo
entendem que teria eficácia ex tunc,
esse erro tal que o seu conhecimento com base no art. 182:
ulterior torne insuportável a vida em “Art. 182. Anulado o negócio
comum ao cônjuge enganado; jurídico, restituir-se-ão as partes ao
II - a ignorância de crime, anterior estado em que antes dele se achavam
ao casamento, que, por sua natureza, [eficácia ex tunc], e, não sendo possível
torne insuportável a vida conjugal; restituí-las, serão indenizadas com o
III - a ignorância, anterior ao equivalente.”
casamento, de defeito físico irremediável Para Zeno Veloso, tanto a
que não caracterize deficiência ou de sentença de nulidade como a que anula
moléstia grave e transmissível, por o negócio jurídico têm eficácia retro-
contágio ou por herança, capaz de pôr
em risco a saúde do outro cônjuge ou de
operante, restaurando o estado anterior.
sua descendência; (Redação dada pela Exemplo: casamento anulado os
Lei nº 13.146, de 2015) cônjuges voltam a ser solteiras.
IV - (Revogado). (Redação dada Numa prova objetiva, o ideal é
pela Lei nº 13.146, de 2015) adotar a corrente tradicional.
(...)
Art. 1.560. O prazo para ser
intentada a ação de anulação do III – Conversão substancial do negócio
casamento, a contar da data da jurídico
celebração, é de: Segundo o CC, 170, a conversão
I - cento e oitenta dias, no caso do substancial só ocorre no negócio
inciso IV do art. 1.550;
jurídico nulo. OU seja, Um negócio
II - dois anos, se incompetente a
autoridade celebrante; nulo que possuir os requisitos de outro,
III - três anos, nos casos dos e se supor que as partes poderiam
incisos I a IV do art. 1.557; desejá-lo, nele será convertido.
IV - quatro anos, se houver “Art. 170. Se, porém, o negócio
coação. jurídico nulo contiver os requisitos de
§ 1º Extingue-se, em cento e outro, subsistirá este quando o fim a que
oitenta dias, o direito de anular o visavam as partes permitir supor que o
casamento dos menores de dezesseis teriam querido, se houvessem previsto a
anos, contado o prazo para o menor do nulidade.”
dia em que perfez essa idade; e da data Percebe-se que o negócio nulo
do casamento, para seus representantes não está sendo sanado e nem está
legais ou ascendentes.
§ 2º Na hipótese do inciso V do produzindo efeitos. Assim, deve existir:
art. 1.550, o prazo para anulação do 1) requisito subjetivo – é a
casamento é de cento e oitenta dias, a vontade das partes por outro negócio
partir da data em que o mandante tiver jurídico – “... permitir supor que as
conhecimento da celebração.” partes o teriam querido...”. Assim o
Brasil adota a teoria subjetiva em que se
54
deve verificar se existe vontade de No artigo 205 não adotou a
conversão do negócio; diferenciação entre ações pessoais e
2) requisito objetivo – a situação reais, sendo o prazo comum de 10 (dez)
fática deve permitir a conversão pela anos.
similaridade entre o negócio nulo e o No artigo 206 temos os prazos
outro negócio (ou seja, o negócio no especiais, de 1, 2, 3, 4 e 5 anos.
qual será convertido deve ser similar ao Os demais prazos em outros
nulo, existir e ser válido). artigos são de decadência, como
Ex.: o exemplo clássico é a falta exemplos o 178, 179, 445, 1649 etc.
de escritura pública de compra e venda Macete: MHD – colaborando
de imóvel de valor superior a 30 s. m., para a facilitação, se tenho prazo:
que será nula (art. 108), será convertida - em dias, meses e ano e dia:
em compromisso particular de compra e decadência;
venda de bem imóvel. - em anos: pode ser de
***** prescrição ou de decadência.
Além disso, colaborando ainda
mais com a facilitação, o CC/2002
adotou os critérios desenvolvidos por
Material de Apoio - Direito Civil - Agnelo Amorim Filho (trabalho clássico
Flavio Tartuce - Aula 02 On line RT 300/7 em que associou a natureza
(II).pdf do prazo com o critério tripartido de
classificação das ações de Pontes de
PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA Miranda):
(CC, 189 a 211) - se houver uma ação
condenatória (v. g., cobrança ou
reparação de danos): o prazo é de
1. Introdução prescrição;
O fundamento histórico é a - se for o caso de ação constitutiva
máxima latina “O Direito não socorre os positiva ou negativa (v. g. ação
que dormem”. Seus fundamentos são a anulatória): prazo decadencial;
certeza (os direitos não são eternos), a - ação declaratória (nulidade
segurança, a estabilidade, a boa-fé absoluta): imprescritibilidade.
estatal e a punição ao negligente. “Fórmula Tartuce”. Premissas:
“Os direitos não são eternos.” 1) identifique a forma de contagem; 2)
No CC/1916 essa temática da identifique o art. do CC/2002; e 3)
prescrição e da decadência era muito identificar a ação correspondente.
confusa e algumas gerações de juristas Perceba que é justamente a aplicação
se perderam sem entender as diferenças das lições acima dadas pelos vários
entre os institutos. juristas que se debruçaram sobre o
No CC/2002 a matéria é clara e tema.
didática, seguindo o princípio da Exemplos:
operabilidade (na faceta simplificação 1) a ação de alimentos é
dos institutos civis, que no caso do tema imprescritível, porque é declaratória,
em análise se deu sob a separação: porém prescreve em dois anos a partir
artigos 189 a 206 tratam da prescrição; dos respectivos vencimentos, a
artigos 207 a 211, decadência). pretensão para cobrança de alimento
Os prazos de prescrição foram fixados em acordo ou sentença
concentrados em dois artigos do CC: (prescrição parcial), cf. art. 206, § 2º;
205 e 206. 2) prescreve em 3 (três) anos a
pretensão para cobrança de aluguéis em

55
geral (art. 206, § 3º, I). Prescreve
também em 3 (três) anos a pretensão 2. Regras quanto à prescrição
para reparação civil (art. 206, § 3º, V), Prescrição extintiva e aquisitiva
enquanto nas relações de consumo o (doutrina tradicional de CMSP):
prazo para reparação por acidente de - prescrição extintiva, estudada na
consumo é de 5 (cinco) anos (prescrição parte geral, é a extinção da pretensão,
do art. 27 do CDC); estando relacionada a direitos subjetivos
3) prescreve em 5 (cinco) anos, cf. de cunho patrimonial (cf. CC, 189 e
CC, 206, § 5º, a pretensão para 190);
cobrança de dívidas líquidas (=certas, - prescrição aquisitiva, usucapião,
quanto a existência, e determinadas, é estudada na parte geral.
quanto ao valor), constantes em “TÍTULO IV
instrumento público ou particular; Da Prescrição e da Decadência
CAPÍTULO I
pretensões de honorários em geral, Da Prescrição
inclusive de advogados; e pretensão do Seção I
vencedor para haver do vencido o que Disposições Gerais
gastou em juízo; [Atenção: não é extinção do
4) os prazos para anulação do direito de ação, mas da pretensão! Isso
era previsão do CC/1916 e pega
negócio jurídico são decadenciais: corriqueiro em concursos] Art. 189.
- CC, 178: 4 (quatro) anos quando Violado o direito, nasce para o titular a
há incapacidade relativa e erro, dolo, pretensão, a qual se extingue, pela
coação, estado de perigo, lesão e fraude prescrição, nos prazos a que aludem os
contra credores; arts. 205 e 206.
Art. 190. A exceção prescreve no
- CC, 179: 2 (dois) anos, quando a mesmo prazo em que a pretensão.”
Lei prevê que o negócio é anulável sem Não é só o ataque de uma
estabelecer prazo (exemplo: venda de cobrança que prescreve. A exceção ou
ascendente para descendente sem defesa também. Exemplo: alegação de
anuência); uma compensação, pois o crédito
5) ação declaratória de nulidade compensado também está sujeito a
absoluta pelo CC, 169 é imprescritível prescrição. Se “A” devia 10 para B
(nulidade não convalesce pelo decurso (prescrito) e B deve 20 para A, B não
do tempo); pode requerer a compensação daquele
6) STF, 149: “É imprescritível a crédito prescrito.
ação de investigação de paternidade Início do prazo prescricional: “I
[ação declaratória], mas não o é a de Jornada de Direito Civil - Enunciado
petição de herança [10 anos, por ser 14. 1) O início do prazo prescricional
ação de cobrança].” Alguns entendem ocorre com o surgimento da pretensão,
que também seria imprescritível a que decorre da exigibilidade do direito
petição de herança (Hironaka, Tartuce, subjetivo; 2) o art. 189 diz respeito a
Luis Paulo Vieira de Carvalho, casos em que a pretensão nasce
Chaves/Rosenwald e também o Código imediatamente após a violação do
Civil italiano); direito absoluto ou da obrigação de não
7) STJ, 412: “A ação de repetição fazer.”
de indébito de tarifas de água e esgoto Assim: no caso de cobrança, do
sujeita-se ao prazo prescricional inadimplemento; no caso de ato ilícito,
estabelecido no Código Civil [10 da sua ocorrência (TEORIA DA
anos].” Isso porque o CDC não tem ACTIO NATA EM FACETA
previsão de prazo para repetição de OBJETIVA de Savigny). A Teoria da
indébito. Aplicação da teoria do diálogo actio nata objetiva sempre foi criticada
das fontes. no Brasil, primeiramente por Câmara

56
Leal, e mais recentemente por José *Tartuce incluiu apenas em 2016 essa
Fernando Simão em tese de livre nova teoria da actio nata em faceta
docência, pois gera várias injustiças nos subjetiva nas suas obras.
casos concretos. Assim cresce na “Art. 192. Os prazos de
doutrina, jurisprudência e na lei a prescrição não podem ser alterados por
acordo das partes [sob pena de nulidade
TEORIA DA ACTIO NATA EM absoluta cf. art. 166, II, segunda parte].
FACETA SUBJETIVA, segundo a Obs.: a prescrição apenas decorre
qual o prazo de prescrição será contado de lei (cf. mais à frente), diferentemente
não da lesão, mas do conhecimento ou da decadência que pode ser legal ou
ciência da lesão (Câmara Leal; Breno convencional. Ex.: uma cláusula
Fisher; José Fernando Simão). contratual que preveja prazo
Exemplos: prescricional diferente daquele legal é
1) legal – CDC, 27: nula.
“Art. 27. Prescreve em cinco anos Art. 193. A prescrição pode ser
a pretensão à reparação pelos danos alegada em qualquer grau de jurisdição,
causados por fato do produto ou do pela parte a quem aproveita.”
serviço prevista na Seção II deste
Capítulo, iniciando-se a contagem do Cf. CC, 193, não há preclusão.
prazo a partir do conhecimento do dano e Exemplo: prescrição não alegada em
de sua autoria. contestação pode ser alegada em
Parágrafo único. (Vetado).” apelação (cf. REsp 157840/SP). Mais
2) jurisprudencial – STJ, 278: “O recentemente, o STJ concluiu que a
termo inicial do prazo prescricional, na prescrição pode ser conhecida de ofício
ação de indenização, é a data em que o em qualquer grau de jurisdição (AgRg
segurado teve ciência inequívoca [laudo no REsp 1.176.688/RJ).
médico] da incapacidade laboral.” O art. 194 do CC, que vedava ao
3) STJ, Inf. 544 “DIREITO juiz suprir de ofício a alegação de
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. prescrição salvo para beneficiar
TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO absolutamente incapaz foi revogado
NAS DEMANDAS POR pela Lei n. 11.280/2006. Além dessa
INDENIZAÇÃO DO SEGURO revogação, o art. 219, § 5º do CPC/1973
DPVAT NOS CASOS DE passou a prever que o Juiz “pronunciará
INVALIDEZ PERMANENTE DA de ofício a prescrição” (com
VÍTIMA. RECURSO REPETITIVO fundamento na celeridade e na razoável
(ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008- duração do processo cf. CRFB, 5º,
STJ). No que diz respeito ao termo LXXVIII). Mais ainda, a prescrição de
inicial do prazo prescricional nas ofício foi confirmada pelo CPC/2015:
demandas por indenização do seguro “Art. 487. Haverá resolução de
DPVAT que envolvem invalidez mérito quando o juiz:
permanente da vítima: a) o termo inicial (...)
II - decidir, de ofício ou a
do prazo prescricional é a data em que requerimento, sobre a ocorrência de
o segurado teve ciência inequívoca do decadência ou prescrição; (...)”
caráter permanente da invalidez; e b) Mas a dúvida persiste. Se há uma
exceto nos casos de invalidez ação de cobrança e o juiz percebe que a
permanente notória, a ciência dívida está prescrita, como deve
inequívoca do caráter permanente da proceder? Sempre apontamos duas
invalidez depende de laudo médico, soluções:
sendo relativa a presunção de 1) solução prática – conhecer de
ciência.”. Cf. tb. STJ, 405 que esclarece ofício a prescrição;
ser prazo de prescrição de 3 (três) anos 2) solução técnica – antes de
em relação ao DPVAT. conhecer a prescrição de ofício, deve

57
citar o réu e ouvi-lo quanto à renúncia, à decretação ex officio da prescrição ou da
prescrição e quanto a eventual decadência deve ser precedida de oitiva
existência de impedimento, suspensão das partes.”, revelando mais uma vez a
ou interrupção da prescrição. solução técnica.
Essa última solução vinha Ou seja, o CPC não resolveu o
prevalecendo tanto na doutrina quanto problema.
na jurisprudência (cf. REsp A prescrição pode ser impedida,
1005209/RJ). suspensa ou interrompida. No
“IV Jornada de Direito Civil - impedimento e na suspensão os efeitos
Enunciado 295. A revogação do art. 194 são similares, porque o prazo não
do Código Civil pela Lei n. 11.280/2006,
que determina ao juiz o reconhecimento
começa no impedimento ou para na
de ofício da prescrição, não retira do suspensão, e nos dois casos continua de
devedor a possibilidade de renúncia onde parou.
admitida no art. 191 do texto Impedimento e suspensão
codificado.” envolvem situações entre pessoas,
A renúncia só é possível após a conforme podemos observar dos artigos
consumação, vedada a renúncia prévia. 197, 198 e 199:
Pode ser expressa ou tácita, judicial ou “Seção II
extrajudicial. Então, por isso, foi Das Causas que Impedem
aprovado o enunciado acima, senão a ou Suspendem a Prescrição
renúncia judicial estaria extinta. Art. 197. Não corre a prescrição
[situações de direito de família]:
Com o novo CPC, o conflito das I - entre os cônjuges, na
duas soluções se agravou, porque se constância da sociedade conjugal [não
aplicamos o art. 332, § 1º do CPC menciona a união estável. Como o
(solução prática), CPC/2015 equiparou a união estável
“CAPÍTULO III para todos os fins, reforçou a tese do
DA IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO JDC, 296: “Não corre a prescrição
PEDIDO entre os companheiros, na constância da
Art. 332. Nas causas que união estável.”];
dispensem a fase instrutória, o juiz, II - entre ascendentes e
independentemente da citação do réu, descendentes, durante o poder familiar;
julgará liminarmente improcedente o [extinto, em regra, aos 18 anos.
pedido que contrariar: Acumulam-se os valores e, quando o
(...) filho completa 20 prescreve tudo de uma
§ 1º O juiz também poderá julgar vez]
liminarmente improcedente o pedido se III - entre tutelados ou curatelados
verificar, desde logo, a ocorrência de e seus tutores ou curadores, durante a
decadência ou de prescrição.” tutela ou curatela.
ocorre discrepância com o quanto Art. 198. Também não corre a
prescrição: [impossibilidade de
previsto no próprio CPC, art. 10, que cobrança]
expressamente adota a boa-fé objetiva I - contra os incapazes de que
processual com a vedação da decisão trata o art. 3º; [absolutamente incapazes,
surpresa, o que leva à necessidade de menores de 16 anos]
ouvir o réu e o autor (art. 487, p. ú.), II - contra os ausentes do País em
serviço público da União, dos Estados ou
revelando uma solução técnica. dos Municípios; [cf. JDC, 156, aplica-se
“Art. 10. O juiz não pode
também aos ausentes mortos: “Desde o
decidir, em grau algum de jurisdição,
termo inicial do desaparecimento,
com base em fundamento a respeito do
declarado em sentença, não corre a
qual não se tenha dado às partes
prescrição contra o ausente.”]
oportunidade de se manifestar, ainda
III - contra os que se acharem
que se trate de matéria sobre a qual
servindo nas Forças Armadas, em tempo
deva decidir de ofício.”
de guerra. [aplica-se também à Força de
Depois foi aprovado o JDC, 581: paz da ONU]
“Em complemento ao Enunciado 295, a

58
Art. 199. Não corre igualmente a A interrupção envolve atos do credor ou
prescrição: [tb. impossibilidade de do devedor.
cobrança] “Seção III
I - pendendo condição suspensiva; Das Causas que Interrompem
[exemplo: discussão administrativa do a Prescrição
débito, como perante uma seguradora, Art. 202. A interrupção da
cf. STJ, 229: “O pedido do pagamento de prescrição, que somente poderá ocorrer
indenização à seguradora suspende o uma vez, dar-se-á:
prazo de prescrição até que o segurado I - por despacho do juiz, mesmo
tenha ciência da decisão.”] incompetente, que ordenar a citação, se o
II - não estando vencido o prazo interessado a promover no prazo e na
[para cobrança da dívida]; forma da lei processual; [Antes, face à
III - pendendo ação de evicção.” discrepância com o art. 219 do CPC/73,
Observação: além dessas que mencionava a interrupção com a
hipóteses, o CPC/2015 reconhece a citação válida retroagindo à propositura
suspensão da prescrição antes do da ação, a doutrina entendia que a
reconhecimento da prescrição interrupção ocorreria com o despacho
do juiz, retroagindo à propositura (JDC,
intercorrente – no curso do processo só 417). Cf. CPC, 240, essa solução foi
no arquivo (CPC, 921). expressamente adotada.]
“TÍTULO IV II - por protesto [judicial], nas
DA SUSPENSÃO E DA condições do inciso antecedente;
EXTINÇÃO DO PROCESSO III - por protesto cambial [está
DE EXECUÇÃO superada a STF, 153 que prevê o
CAPÍTULO I contrário];
DA SUSPENSÃO DO PROCESSO DE Surge um problema. Protestado o
EXECUÇÃO
Art. 921. Suspende-se a título, a prescrição é interrompida. Se
execução: depois vem a ação de cobrança, o que
(...) acontece com o prazo, para afastar a
III - quando o executado não prescrição intercorrente com o
possuir bens penhoráveis; “processo vivo”? Temos duas soluções:
(...)
§ 1º Na hipótese do inciso III, o
1) segundo CMSP, em posição que
juiz suspenderá a execução pelo prazo de prevalece, há dualidade de interrupção;
1 (um) ano, durante o qual se suspenderá 2) para Tartuce, o protesto interrompe e
a prescrição. a ação suspende (condição suspensiva
§ 2º Decorrido o prazo máximo de da dívida).
1 (um) ano sem que seja localizado o IV - pela apresentação do título de
executado ou que sejam encontrados crédito em juízo de inventário ou em
bens penhoráveis, o juiz ordenará o concurso de credores; [exemplo:
arquivamento dos autos. falência]
§ 3º Os autos serão desarquivados V - por qualquer ato judicial que
para prosseguimento da execução se a constitua em mora o devedor;
qualquer tempo forem encontrados bens [notificação judicial sim; extrajudicial,
penhoráveis. não]
§ 4º Decorrido o prazo de que VI - por qualquer ato inequívoco,
trata o § 1º sem manifestação do ainda que extrajudicial, que importe
exequente, começa a correr o prazo de reconhecimento do direito pelo devedor.
prescrição intercorrente. [v. g., o pagamento parcial da dívida,
§ 5º O juiz, depois de ouvidas as dos juros, da multa; e-mail ou carta
partes, no prazo de 15 (quinze) dias, reconhecendo o débito]
poderá, de ofício, reconhecer a Parágrafo único. A prescrição
prescrição de que trata o § 4º e extinguir interrompida recomeça a correr da data
o processo.” do ato que a interrompeu, ou do último
ato do processo para a interromper.”
Na interrupção o prazo para e
volta ao início, o que somente pode 3. Regras quanto à decadência
ocorrer uma vez (em regra), cf. art. 202.

59
Conceito. Decadência é a perda prescrição e a decandência
do direito potestativo, estando convencional.
relacionada a um estado de sujeição (a Assim:
outra parte fica “encurralada”). Segundo - prescrição: deve ser conhecida
Francisco Amaral, o direito potestativo de ofício;
é um direito sem crédito. - decadência legal: deve ser
“CAPÍTULO II conhecida de ofício;
Da Decadência - decadência convencional: não
Art. 207. Salvo disposição legal pode ser conhecida de ofício.
em contrário, não se aplicam à
decadência as normas que impedem,
fftartuce@uol.com.br
suspendem ou interrompem a prescrição. *****
Art. 208. Aplica-se à decadência o
disposto nos arts. 195 [relativamente
incapazes e pessoas jurídicas tem ação Material de Apoio - Direito Civil -
contra os seus assistentes e
representantes legais que derem causa à
Flávio Tartuce_ Aula 6 (II).pdf
decadência ou não a alegarem
oportunamente] e 198, inciso I [não TEORIA GERAL DAS
corre a decadência contra OBRIGAÇÕES
absolutamente incapazes].” (Artigos 233 a 420)
A decadência, em regra, não pode
ser impedida, suspensa ou interrompida. 1. Conceito de obrigação e elementos
A exceção é o art. 208, pois a obrigacionais
decadência não corre contra Tanto o CC/1916 quanto o
absolutamente incapazes. CC/2002 não conceituaram obrigação
A decadência pode ser: (nem contrato), de forma que tais
1) legal; conceitos são doutrinários.
2) convencional – exemplo: prazo A obrigação é uma relação
de garantia dado pelo vendedor de um jurídica transitória existente entre um
bem (relação de consumo). sujeito ativo (credor) e um sujeito
CMSP dizia que a prescrição passivo (devedor), cujo conteúdo é uma
equivaleria à decadência convencional, prestação economicamente apreciável.
o que foi originalmente adotado pelo Em casos de inadimplemento, poderá o
CC/2002, mas quebrado em 2006 com a credor satisfazer-se no patrimônio do
previsão da prescrição de ofício devedor. Esse conceito é utilizado por
(esqueceram de revogar o art. 211 do Clóvis Beviláqua, WB Monteiro, MHD
CC). e Villaça.
“Art. 209. É nula a renúncia à
decadência fixada em lei. [Já a
Portanto, são elementos
decadência convencional pode ser obrigacionais:
renunciada, ou sejá, igual à prescrição]
Art. 210. Deve o juiz, de ofício, 1.1. Elementos subjetivos
conhecer da decadência, quando São as pessoas envolvidas na
estabelecida por lei. [decadência legal]
obrigação.
Art. 211. Se a decadência for
convencional, a parte a quem aproveita a) sujeito ativo – credor, aquele
pode alegá-la em qualquer grau de que tem um direito dentro da obrigação.
jurisdição, mas o juiz não pode suprir a Trata-se de um direito subjetivo de
alegação. [em outras palavras, a exigir a prestação.
decadência convencional não pode ser
b) sujeito passivo – trata-se do
conhecida de ofício]”
devedor, que dentro da obrigação tem
A quebra da harmonia está ai. O
um dever jurídico de comportamento,
CPC perdeu a chance de revogar o art.
de dar, fazer ou não fazer.
211 e restabelecer a harmonia entre a

60
Observação: o sistema Elemento mediato. Mais remoto,
obrigacional brasileiro (aliás, qualquer que pode ser de coisa (dar), tarefa
ordenamento dentro do sistema romano- (fazer) ou abstenção (não fazer). Trata-
germânico) protege o devedor (in favor se da classificação tripartida romana.
debitoris). O direito português antigo Trata-se do bem jurídico tutelado (Pablo
acabou compilando muito das máximas Stolze e Rodolfo Pamplona).
antigas do direito romano nas suas A respeito do objeto da obrigação,
ordenações e o CC/1916, bem como o até o séc. XIX prevalecia a teoria
CC/2002, assim o repetiram. Exemplos: monista, pela qual a obrigação seria
obrigação de dar coisa incerta a escolha fundada em único conceito: a prestação.
é do devedor; na obrigação alternativa, A partir do séc. XX, passou a prevalecer
quem faz a escolha é o devedor; local, a teoria dualista (de Alois Brinz), pela
via de regra para o cumprimento da qual a obrigação seria fundada em dois
obrigação é o domicílio do devedor e conceitos: a) débito (debitum ou
assim por diante. Schuld), aquilo que o devedor deve; b)
Atenção! Na atualidade, raras são responsabilidade (obligatio ou Raftung),
as situações em que uma parte é só que é consequência que surge quando o
credora e a outra somente devedora. débito não é cumprido.
Prevalecem as hipóteses em que as A partir da teoria dualista, temos
partes são credoras e devedoras entre si, duas situações:
havendo proporcionalidade nas 1ª) débito sem responsabilidade –
prestações. No Direito Civil temos ou do latim debitum sine obligatio ou
então o sinalagma, o que acontece na do alemão Shuld ohne Haftung. Ou seja,
grande maioria dos contratos a dívida existe mas não pode ser
contemporâneos (compra e venda, exigida. É o que ocorre na obrigação
empreitada, locação etc.). Esse incompleta ou natural. Exemplos:
sinalagma forma a base objetiva do dívida prescrita, gorjeta e jogo não
negócio jurídico ou relação regulamentado. Cf. o art. 882 do CC,
obrigacional complexa, porque as que explica muito bem a teoria dualista,
partes não estão isoladamente em posto que a dívida prescrita não pode
posição jurídica só de devedora ou só de ser exigida mas pode ser paga. Sendo
credora. paga, não cabe repetição de indébito;
A onerosidade excessiva quebra “Art. 882. Não se pode repetir o
o sinalagma, i. é, seu ponto de que se pagou para solver dívida prescrita,
ou cumprir obrigação judicialmente
equilíbrio. Temos aqui outra expressão, inexigível.”
do “efeito gangorra”, em que uma das *assistir aula on line sobre prescrição.
partes, por possuir uma vantagem 2º) responsabilidade sem débito –
excessiva, acaba rompendo o equilíbrio do latim obligatio sine debitum e do
e ficando na situação de maior “peso”, o alemão Haftung ohne Schuld. A pessoa
que ocasiona sua parada na posição é responsável sem que a dívida seja sua.
baixa da gangorra. Exemplo: fiador. O artigo que melhor
*Capa da obra “onerosidade excessiva explica essa situação é o art. 820, pois o
no contrato civil” de Paulo Magalhães fiador assume obrigação frente ao
Nasser. credor:
“Art. 820. Pode-se estipular a
1.2. Elemento objetivo (conteúdo) fiança, ainda que sem consentimento do
Elemento imediato. Elemento devedor ou contra a sua vontade.”
mais próximo. Trata-se da prestação,
economicamente apreciável. 1.3. Elemento imaterial, virtual ou
espiritual

61
É o vínculo jurídico que une as Vale lembrar que dívidas sobre as
partes ao objeto e que gera a contas de consumo do imóvel, como
responsabilidade civil contratual nos água, esgoto, gás e luz, são pessoais, e
casos de inadimplemento. não propter rem (cf. AgRg no AREsp
Os principais artigos da 29879/RJ). Cf. STJ, 412, pela repetição
responsabilidade civil contratual são de indébito no caso de pagamento por
389, 390 e 391. terceiro nesses casos.
“TÍTULO IV 2. Conceito de obrigação como
Do Inadimplemento das Obrigações processo. Clóvis do Couto e Silva, em
CAPÍTULO I
Disposições Gerais
leitura de Karl Larenz. A obrigação é
Art. 389. Não cumprida a um contínuo processo de colaboração
obrigação, responde o devedor por entre as partes que deve guiá-las ao
perdas e danos, mais juros e atualização cumprimento e, por isso, a relação
monetária segundo índices oficiais obrigacional teria os deveres principais
regularmente estabelecidos, e honorários
de advogado. [este artigo se refere-se a
(dar, fazer ou não fazer) e os deveres
obrigações positivas, de dar ou fazer] anexos ou laterais (ínsitos à boa-fé, i.
Art. 390. Nas obrigações é, decorrem da boa educação contratual:
negativas o devedor é havido por dever de cuidado, de respeito, de
inadimplente desde o dia em que lealdade, de cooperação, de informação,
executou o ato de que se devia abster.
[trata do descumprimento de obrigação
de transparência). Esses deveres anexos
negativa, de não fazer] devem ser observados em todas as fases
Art. 391. Pelo inadimplemento obrigacionais ou contratuais. Exemplo
das obrigações respondem todos os bens da jurisprudência alemã: uma diarista
do devedor. [trata do princípio da faz o serviço em quatro horas; se ela
responsabilidade patrimonial, cuja
termina antes, ela deixa o troco sem
ressalva são os bens impenhoráveis, cf.
CPC, 833]” necessitar qualquer cobrança.
A CRFB expressamente, cf. art.
5º, LXVII, a prisão civil para o 2. Classificação básica da obrigação
depositário infiel e para o devedor de (quanto à prestação)
alimentos. Mas o STF, na SV, 25, baniu É a que consta no CC, artigos 233
a prisão do depositário infiel, para a 251 (dar, fazer, não fazer). As
qualquer hipótese de depósito, inclusive especiais estão a partir do art. 252.
o judicial.
Observações finais: 2.1. Obrigação de dar
1. Obrigação propter rem ou Obrigação positiva. Pode ser de
“própria da coisa”. É a obrigação que duas ordens: obrigação de dar coisa
uma pessoa tem sobre uma coisa e que certa (obrigação específica) e obrigação
acompanha esta com quem quer que ela de dar coisa incerta (obrigação
esteja (daí porque ser também chamada genérica).
de obrigação ambulatória ou obrigação a) obrigação de dar coisa certa –
reipersecutória). Para alguns (cf. por denominada obrigação específica, pois a
todos Venosa), é uma obrigação mista coisa se encontra individualizada
ou híbrida, porque seria parte pessoal e (objeto determinado, cf. art. 104, II).
parte real. Exemplos: dívidas de Não há qualquer escolha (como ocorre
condomínio (art. 1345); impostos sobre na obrigação genérica). Exemplo:
o imóvel (IPTU). contrato de compra e venda do imóvel
“Art. 1.345. O adquirente de “X”.
unidade responde pelos débitos do “Art. 313. O credor não é
alienante, em relação ao condomínio, obrigado a receber prestação diversa da
inclusive multas e juros moratórios.” que lhe é devida, ainda que mais
valiosa.”

62
O art. 313 trata da antiga regra Exemplos: 1) vigente um
Nemo aliud pro alio. comodato, o veículo é roubado a mão
A coisa certa, em regra, abrange armada. Nesse caso, o comodatário nada
os seus acessórios, salvo se o contrário deve pagar ao comodante (res perit
resultar do título ou das circunstâncias domino); 2) vigente uma locação, o
do caso. Cf. art. 233 (princípio da imóvel é destruído por uma enchente. O
gravitação jurídica). Os frutos e as locatário somente deve pagar ao locador
benfeitorias seguem coisa principal; as os eventuais aluguéis em aberto.
pertenças, não (em regra, pois a 6. Obrigação de restituir. Perda da
pertença pode ser essencial, como o coisa com culpa do devedor.
piano no conservatório. Cf. CC, 94). Responderá este pelo equivalente, mais
Regras de inadimplemento da perdas e danos. CC, 239.
obrigação de dar coisa certa (incluindo a “Art. 239. Se a coisa se perder por
obrigação de restituir): culpa do devedor, responderá este pelo
equivalente, mais perdas e danos.”
1. Obrigação de dar coisa certa.
7. Obrigação de restituir.
Perda da coisa sem culpa do devedor.
Deterioração da coisa sem culpa do
Resolve-se (“volta ao estado primitivo”)
devedor. O credor somente pode exigir
a obrigação para ambas partes. Cf. art.
a coisa, no estado em que se encontrar.
234.
A coisa perece para o dono
2. Obrigação de dar coisa certa.
parcialmente.
Perda da coisa com culpa (dolo e culpa
8. Obrigação de restituir.
em sentido estrito) do devedor.
Deterioração da coisa com culpa do
Responderá o devedor pelo equivalente,
devedor. O art. 240, parte final, manda
mais perdas e danos (art. 234).
aplicar o art. 239. Perceba que não há
3. Obrigação de dar.
equivalência com a regra “4”, acima.
Deterioração da coisa sem culpa do
Aqui houve evidente erro de digitação,
devedor. O credor pode resolver a
pois deveria ter mandado aplicar o art.
obrigação ou aceitar a coisa no estado
236, pois como foi colocado, não
em que se encontrar, abatido no seu
respeita a conservação do negócio
preço a desvalorização. CC, 235.
jurídico. Aqui aplica-se o JDC, 15: “as
4. Obrigação de dar. Deterioração
disposições do art. 236 do novo Código
da coisa com culpa do devedor. O
Civil também são aplicáveis à hipótese
credor pode exigir o equivalente à coisa,
do art. 240, in fine”.
ou aceitá-la no estado em que se “Art. 240. Se a coisa restituível se
encontrar, nos dois casos, com perdas e deteriorar sem culpa do devedor, recebê-
danos. CC, 236. la-á o credor, tal qual se ache, sem
Nas obrigações de restituir direito a indenização; se por culpa do
(locação e comodato): devedor, observar-se-á o disposto no art.
239.”
5. Obrigação de restituir. Perda da
Obs.: desde a Lei n. 10.444/2002,
coisa sem culpa do devedor. Sofrerá o
é possível tutela específica para
credor a perda, pois a coisa perece para
cumprimento das obrigações de dar
o dono (res perit domino), e a obrigação
coisa certa (inclusive de restituir), a
se resolve; ressalvados os seus direitos
exemplo da multa diária (astreinte), cf.
até o dia da perda. Cf. CC, 238.
“Art. 238. Se a obrigação for de art. 498 do CPC.
restituir coisa certa, e esta, sem culpa do
devedor, se perder antes da tradição, b) obrigação de dar coisa incerta –
sofrerá o credor a perda, e a obrigação se é denominada obrigação genérica, pois
resolverá, ressalvados os seus direitos até a coisa é indicada pelo gênero e pela
o dia da perda.”
quantidade. O objeto é determinável.
Exemplo: compra e venda de um imóvel

63
no loteamento “Y”. Haverá necessidade 1º) cumprimento forçado do
de uma escolha para concentrar o devedor por tutela específica (CPC,
objeto, que em regra cabe ao devedor. 497, sendo para este novo código
“Seção II independente de existência dolo ou
Das Obrigações de Dar Coisa Incerta culpa);
Art. 243. A coisa incerta será
indicada, ao menos, pelo gênero e pela
2º) cumprimento por terceiro, às
quantidade. custas do devedor originário (CC, 249);
Art. 244. Nas coisas determinadas 3º) resolução com perdas e danos.
pelo gênero e pela quantidade, a escolha Atenção: essas três opções são
pertence ao devedor, se o contrário não judiciais. Além delas, há uma autotutela
resultar do título da obrigação; mas [o
devedor] não poderá dar a coisa pior,
civil, em casos de urgência (art. 249, p.
nem será obrigado a prestar a ú. do CC).
melhor.” “Art. 249. Se o fato puder ser
A escolha deve ser em gênero executado por terceiro, será livre ao
credor mandá-lo executar à custa do
intermediário para manter o equilíbrio devedor, havendo recusa ou mora deste,
da obrigação. sem prejuízo da indenização cabível.
“Art. 245. Cientificado da escolha Parágrafo único. Em caso de
o credor, vigorará o disposto na Seção urgência, pode o credor,
antecedente. independentemente de autorização
Art. 246. Antes da escolha, não judicial, executar ou mandar executar o
poderá o devedor alegar perda ou fato, sendo depois ressarcido.”
deterioração da coisa, ainda que por b) obrigação de fazer infungível –
força maior ou caso fortuito.”
não pode ser cumprida por terceiro,
Ou seja, cf. art. 246, não existe
sendo personalíssima ou intuitu
inadimplemento de obrigação genérica,
personae (insubstituível).
pois o gênero não perece (genus non
Havendo inadimplemento com
perit). No exemplo acima, se os lotes
culpa do devedor, o credor pode exigir:
não existissem mais, o devedor seria
1º) cumprimento forçado, por
obrigado a encontrar outros lotes.
tutela específica. Exemplo: astreintes
Também, não cabe cumprimento
(CPC, 497).
de tutela específica em obrigação
2º) resolução com perdas e danos
genérica.
(CC, 247).
*Tartuce ainda possui dúvidas se o p. ú.
2.2. Obrigação de fazer
do art. 497, quando se refere a ilícitos,
Tem como conteúdo uma tarefa a
se refere também a responsabilidade
ser desempenhada pelo devedor.
contratual.
Exemplo: contrato de prestação de
Tanto na obrigação de fazer
serviços (empreitada).
fungível quanto na fungível:
Obrigação positiva. Pode ser “Art. 248. Se a prestação do fato
fungível (pode ser cumprida por tornar-se impossível sem culpa do
terceiro) e obrigação de fazer devedor, resolver-se-á a obrigação [ex.:
infungível. se o devedor morrer]; se por culpa dele,
É assim subclassificada: responderá por perdas e danos.”
a) obrigação de fazer fungível – Obs.: cf. CC, 607, a prestação de
aquela que por sua natureza ou previsão serviços termina com a morte das partes
no instrumento pode ser cumprida por (o que não vale para a empreitada!).
terceiro.
Havendo inadimplemento com 2.3. Obrigação de não fazer
culpa do devedor, o credor poderá CC, 250 e 251. Única obrigação
exigir: negativa, e não possui classificação.
Tem como conteúdo uma abstenção. O
exemplo de contrato mais corrente é o

64
de sigilo industrial (confidencialidade DE OBRIGAÇÕES
empresarial), chamado em inglês de (CC, 252 A 285)
secret agreement, que se faz com multa
pesada.
Havendo inadimplemento com 1. Classificação da obrigação quanto à
culpa do devedor, o credor poderá complexidade da prestação
exigir:
1º) que o ato não seja praticado ou 1.1. Obrigação simples
desfeito por meio de tutela específica. É a que possui apenas uma
Exemplo: astreintes (CPC, 497; CC, prestação. Ou “dar”, ou “fazer” ou “não
251); fazer”.
2º) não mais interessando,
resolução mais perdas e danos. 1.2. Obrigação composta objetiva
Além das opções judiciais, o p. ú. Aquela que possui mais de uma
do art. 251 do CC prevê uma autotutela prestação. Pode ser de duas
civil para os casos de urgência. modalidades:
Contudo, estamos falando de uma a) obrigação conjuntiva ou
obrigação infungível. Assim, na prática, cumulativa – aquela que tem mais de
torna-se inaplicável a disposição legal. uma prestação, sendo certo que todas
Segundo Mário Delgado, que participou elas devem ser cumpridas pelo devedor,
da confecção do CC/2002, foi pensado sob pena de mora ou inadimplemento
para regras de vizinhança, porque para absoluto. A conjunção é “E”. Exemplo:
contratos é impossível sua aplicação. obrigação do locador e do locatário, Lei
Por fim, se a obrigação de não n. 8245/91.
fazer tornar-se impossível sem culpa do “SEÇÃO IV
devedor, estará extinta e resolvida. Dos deveres do locador e do locatário
Art. 22. O locador é obrigado a:
Exemplo: o devedor que assinou o I - entregar ao locatário o imóvel
sigilo foi assassinado. alugado em estado de servir ao uso a que
se destina;
“CAPÍTULO III II - garantir, durante o tempo da
Das Obrigações de Não Fazer locação, o uso pacífico do imóvel locado;
Art. 250. Extingue-se a obrigação III - manter, durante a locação, a
de não fazer, desde que, sem culpa do forma e o destino do imóvel;
devedor, se lhe torne impossível abster- IV - responder pelos vícios ou
se do ato, que se obrigou a não praticar. defeitos anteriores à locação;
Art. 251. Praticado pelo devedor o V - fornecer ao locatário, caso
ato, a cuja abstenção se obrigara, o este solicite, descrição minuciosa do
credor pode exigir dele que o desfaça, estado do imóvel, quando de sua entrega,
sob pena de se desfazer à sua custa, com expressa referência aos eventuais
ressarcindo o culpado perdas e danos. defeitos existentes;
Parágrafo único. Em caso de VI - fornecer ao locatário recibo
urgência, poderá o credor desfazer ou discriminado das importâncias por este
mandar desfazer, independentemente de pagas, vedada a quitação genérica;
autorização judicial, sem prejuízo do VII - pagar as taxas de
ressarcimento devido.” administração imobiliária, se houver, e
de intermediações, nestas compreendidas
as despesas necessárias à aferição da
idoneidade do pretendente ou de seu
fiador;
Material de Apoio - Direito Civil - VIII - pagar os impostos e taxas, e
Flavio Tartuce - Aula 03 On line ainda o prêmio de seguro complementar
(II).pdf contra fogo, que incidam ou venham a
incidir sobre o imóvel, salvo disposição
expressa em contrário no contrato;
MODALIDADES ESPECIAIS

65
IX - exibir ao locatário, quando consentimento prévio e por escrito do
solicitado, os comprovantes relativos às locador;
parcelas que estejam sendo exigidas; VII - entregar imediatamente ao
X - pagar as despesas locador os documentos de cobrança de
extraordinárias de condomínio. tributos e encargos condominiais, bem
Parágrafo único. Por despesas como qualquer intimação, multa ou
extraordinárias de condomínio se exigência de autoridade pública, ainda
entendem aquelas que não se refiram aos que dirigida a ele, locatário;
gastos rotineiros de manutenção do VIII - pagar as despesas de
edifício, especialmente: telefone e de consumo de força, luz e
a) obras de reformas ou gás, água e esgoto;
acréscimos que interessem à estrutura IX - permitir a vistoria do imóvel
integral do imóvel; pelo locador ou por seu mandatário,
b) pintura das fachadas, empenas, mediante combinação prévia de dia e
poços de aeração e iluminação, bem hora, bem como admitir que seja o
como das esquadrias externas; mesmo visitado e examinado por
c) obras destinadas a repor as terceiros, na hipótese prevista no art. 27;
condições de habitabilidade do edifício; X - cumprir integralmente a
d) indenizações trabalhistas e convenção de condomínio e os
previdenciárias pela dispensa de regulamentos internos;
empregados, ocorridas em data anterior XI - pagar o prêmio do seguro de
ao início da locação; fiança;
e) instalação de equipamento de XII - pagar as despesas ordinárias
segurança e de incêndio, de telefonia, de de condomínio.
intercomunicação, de esporte e de lazer; 1º Por despesas ordinárias de
f) despesas de decoração e condomínio se entendem as necessárias à
paisagismo nas partes de uso comum; administração respectiva, especialmente:
g) constituição de fundo de a) salários, encargos trabalhistas,
reserva. contribuições previdenciárias e sociais
Art. 23. O locatário é obrigado a: dos empregados do condomínio;
I - pagar pontualmente o aluguel e b) consumo de água e esgoto, gás,
os encargos da locação, legal ou luz e força das áreas de uso comum;
contratualmente exigíveis, no prazo c) limpeza, conservação e pintura
estipulado ou, em sua falta, até o sexto das instalações e dependências de uso
dia útil do mês seguinte ao vencido, no comum;
imóvel locado, quando outro local não d) manutenção e conservação das
tiver sido indicado no contrato; instalações e equipamentos hidráulicos,
II - servir - se do imóvel para o elétricos, mecânicos e de segurança, de
uso convencionado ou presumido, uso comum;
compatível com a natureza deste e com o e) manutenção e conservação das
fim a que se destina, devendo tratá - lo instalações e equipamentos de uso
com o mesmo cuidado como se fosse comum destinados à prática de esportes e
seu; lazer;
III - restituir o imóvel, finda a f) manutenção e conservação de
locação, no estado em que o recebeu, elevadores, porteiro eletrônico e antenas
salvo as deteriorações decorrentes do seu coletivas;
uso normal; g) pequenos reparos nas
IV - levar imediatamente ao dependências e instalações elétricas e
conhecimento do locador o surgimento hidráulicas de uso comum;
de qualquer dano ou defeito cuja h) rateios de saldo devedor, salvo
reparação a este incumba, bem como as se referentes a período anterior ao início
eventuais turbações de terceiros; da locação;
V - realizar a imediata reparação i) reposição do fundo de reserva,
dos danos verificados no imóvel, ou nas total ou parcialmente utilizado no custeio
suas instalações, provocadas por si, seus ou complementação das despesas
dependentes, familiares, visitantes ou referidas nas alíneas anteriores, salvo se
prepostos; referentes a período anterior ao início da
VI - não modificar a forma locação.
interna ou externa do imóvel sem o 2º O locatário fica obrigado ao
pagamento das despesas referidas no

66
parágrafo anterior, desde que - havendo impossibilidade de uma
comprovadas a previsão orçamentária e o prestação, sem culpa, subsiste a outra;
rateio mensal, podendo exigir a qualquer
tempo a comprovação das mesmas.
- se houver culpa do devedor,
3º No edifício constituído por haverá resolução com perdas e danos.
unidades imobiliárias autônomas, de Se a escolha não é do credor, será a
propriedade da mesma pessoa, os última que se impossibilitou a
locatários ficam obrigados ao pagamento determinar o valor a ser exigido, além
das despesas referidas no § 1º deste
artigo, desde que comprovadas.”
das perdas e danos. Se a escolha é do
A obrigação conjuntiva não tem credor, é o valor de qualquer uma que
tratamento na teoria geral das ele escolher, mais perdas e danos.
Art. 253. Se uma das duas
obrigações, mas apenas nos contratos prestações não puder ser objeto de
em espécie, como no contrato de obrigação ou se tornada inexeqüível,
locação. subsistirá o débito quanto à outra.
b) obrigação alternativa ou Art. 254. Se, por culpa do
disjuntiva – artigos 252 a 256. Mais de devedor, não se puder cumprir nenhuma
das prestações, não competindo ao
uma prestação sendo certo que apenas credor a escolha, ficará aquele obrigado a
uma delas deve ser cumprida pelo pagar o valor da que por último se
devedor. A conjunção é “OU”. O impossibilitou, mais as perdas e danos
exemplo típico é no contrato estimatório que o caso determinar.
ou venda em consignação. Art. 255. Quando a escolha
couber ao credor e uma das prestações
Haverá necessidade de escolha da tornar-se impossível por culpa do
prestação a ser cumprida o que em regra devedor, o credor terá direito de exigir a
cabe ao devedor. O modelo romano prestação subsistente ou o valor da outra,
germânico protege o devedor (in favor com perdas e danos; se, por culpa do
debitoris). Eventualmente essa escolha devedor, ambas as prestações se
tornarem inexeqüíveis, poderá o credor
pode caber, como exceção, ao credor, a reclamar o valor de qualquer das duas,
um terceiro ou até ao juiz. além da indenização por perdas e danos.
“CAPÍTULO IV Art. 256. Se todas as prestações se
Das Obrigações Alternativas tornarem impossíveis sem culpa do
Art. 252. Nas obrigações devedor, extinguir-se-á a obrigação.”
alternativas, a escolha cabe ao devedor, Observações:
se outra coisa não se estipulou.
§ 1º Não pode o devedor obrigar o 1) não confundir a obrigação
credor a receber parte em uma prestação alternativa (acima) com a obrigação
e parte em outra. [se houver previsão no simples de dar coisa incerta:
contrato é possível] OBRIGAÇÃO OBRIGAÇÃO DE
§ 2º Quando a obrigação for de ALTERNATIVA DAR COISA
prestações periódicas, a faculdade de INCERTA
opção poderá ser exercida em cada - é uma obrigação - obrigação simples
período. objetiva com mais de com uma só
§ 3º No caso de pluralidade de uma prestação; prestação;
optantes, não havendo acordo unânime - pode ser de dar (com - dar (mesmo gênero,
entre eles, decidirá o juiz, findo o prazo gêneros distintos), da obrigação
por este assinado para a deliberação. fazer e não fazer; genérica).
§ 4º Se o título deferir a opção a *Interessante observar que havendo
terceiro, e este não quiser, ou não puder
exercê-la, caberá ao juiz a escolha se
questionamento sobre obrigações de
não houver acordo entre as partes. fazer ou não fazer cabe apenas
Inadimplemento das obrigações obrigação alternativa, cf. na tabela.
alternativas (CC, 253 a 254). Teremos: 2) não confundir obrigação
- se o inadimplemento se der sem alternativa (composta) com obrigação
culpa do devedor, resolve-se a facultativa (simples, porque possui
obrigação (voltando ao estado anterior); apenas uma prestação e, junto com ela,
uma faculdade, que é uma segunda
67
opção do devedor que não pode ser - convencional – o principal caso
exigida pelo credor). Exemplo da é o do fiador em relação ao devedor
segunda: dar um cavalo, mas se quiser principal. O fiador, em regra, não é
pode substituir o pagamento pelo valor devedor solidário, mas subsidiário, pois
de R$5.000,00. tem a seu favor o benefício de ordem
(CC, 827). Porém, por força do
2. Estudo das obrigações solidárias contrato, ele – fiador – pode renunciar a
(artigos 264 a 285 do CC) esse benefício ou assumir a condição de
solidário (CC, 828).
2.1. Regras gerais “Seção II
As obrigações solidárias somente Dos Efeitos da Fiança
Art. 827. O fiador demandado
interessam se houver mais de um credor pelo pagamento da dívida tem direito a
ou mais de um devedor. As obrigações exigir, até a contestação da lide, que
que têm mais de um devedor ou mais de sejam primeiro executados os bens do
um credor são as obrigações compostas devedor.
subjetivas. Parágrafo único. O fiador que
“CAPÍTULO VI alegar o benefício de ordem [de
Das Obrigações Solidárias excussão], a que se refere este artigo,
Seção I deve nomear bens do devedor, sitos no
Disposições Gerais mesmo município, livres e
Art. 264. Há solidariedade, desembargados, quantos bastem para
quando na mesma obrigação concorre solver o débito.
mais de um credor [solidariedade ativa], Art. 828. Não aproveita este
ou mais de um devedor [solidariedade benefício ao fiador:
passiva], cada um com direito, ou I - se ele o renunciou
obrigado, à dívida toda.” expressamente;
II - se se obrigou como principal
Na solidariedade, as partes são pagador, ou devedor solidário;
tratadas como se fossem uma só (in III - se o devedor for insolvente,
solideem). ou falido.”
“Art. 265. A solidariedade não E se essa renúncia foi imposta ao
se presume; resulta da lei [solidariedade devedor em contrato de adesão? Veja:
legal] ou da vontade das partes
“Art. 424. Nos contratos de
[solidariedade convencional].”
adesão, são nulas as cláusulas que
*Atenção! Esse dispositivo é aplicado estipulem a renúncia antecipada do
para a responsabilidade contratual. Para aderente a direito resultante da natureza
a responsabilidade extracontratual, por do negócio.”
ato ilícito, há norma específica no art. JDC, 364: “No contrato de fiança
942, p. ú. (coautoria) e nas hipóteses do é nula a cláusula de renúncia
art. 932. antecipada ao benefício de ordem
Vejamos: quando inserida em contrato de
Solidariedade ativa (entre adesão.”
credores):
- legal – entre locadores, cf. art. 2º Solidariedade mista ou recíproca
da Lei n. 8245/91; (credores e devedores):
- convencional – contrato - legal – a exemplo daquela entre
bancário com dois bancos credores locadores e locatários (art. 2º da Lei n.
solidários. 8245/91);
Solidariedade passiva (entre - convencional – v. g., contratos
devedores): bancário de vários credores e devedores,
- legal – entre locatários, como do todos solidários ao mesmo tempo.
art. 2º da Lei n. 8245/91, e a dos Não tem previsão específica no
comodatários, CC, 585; CC, mas é regulada pelas regras já
vistas das solidariedades ativa e passiva.
68
(CC, 272) - relação interna, entre
2.2. Regras quanto à solidariedade ativa credores.
Existe em relação aos vários Em regra há divisão igualitária
credores, que são tratados como se entre credores, mas eles podem dispor
fossem um só credor. de forma contrária.
1ª regra) na solidariedade ativa, 6ª regra) A um dos credores
cada um dos credores tem direito a solidários não pode o devedor opor as
exigir do devedor o cumprimento da exceções pessoais oponíveis aos outros
prestação por inteiro. Enquanto alguns (CC, 273). Exceções pessoais são
dos credores solidários não defesas existentes somente contra
demandarem o devedor comum, a determinadas pessoas, a exemplo de
qualquer dos credores poderá o devedor incapacidades e vícios da vontade.
pagar (CC, 267 e 268). Antes da ação Exemplo: credores solidários “A”, “B”
judicial, então, o devedor pode pagar e “C” e o devedor “D”, com uma
para quem quiser e como quiser. prestação de R$30.000,00. Quando a
Depois de proposta a ação, só pode relação obrigacional foi constituída,
pagar para o que demandou houve dolo de “A” contra “D”; depois,
(prevenção judicial quanto à dívida). “C” entra com ação de cobrança da
2ª regra) o pagamento feito a um dívida; a única defesa que “D” tem é o
dos credores solidários extingue a dolo que “A” praticou. A ação de
dívida até o montante do que foi pago cobrança de “C” será procedente. É uma
(CC, 269). Mesmo aquele que recebeu regra que pode dar ensejo a fraude, mas
parcialmente pode cobrar o restante da assim está previsto (perceba: C poderia
dívida. estar mancomunado com A...).
Na solidariedade ativa, temos: 7ª regra) nova redação do art. 274:
- relação externa: entre credores e “Art. 274. O julgamento contrário a
devedor, UNA; um dos credores solidários não atinge
- relação interna: entre os os demais, mas o julgamento favorável
credores, FRACIONÁVEL. aproveita-lhes, sem prejuízo de exceção
3ª regra) Se um dos credores pessoal que o devedor tenha direito de
solidários falecer deixando herdeiros, invocar em relação a qualquer deles.”
cada um destes herdeiros só terá direito É uma regra complementar ao art.
a exigir e receber a quota do crédito que 273.
corresponder ao seu quinhão hereditário *A redação anterior desse dispositivo
(refração do crédito), salvo se a foi alterada pelo CPC/2015 justamente
obrigação for indivisível (CC, 270). Por por ser perplexa.
que? Tendo em vista que com a morte a
solidariedade se extingue, já que esta é 2.3. Regras quanto à solidariedade
pessoal. passiva
4ª regra) convertendo-se a Existe em relação aos devedores,
prestação em perdas e danos, subsiste que são tratados como se fossem um só
(permanece) para todos os efeitos a devedor.
solidariedade (CC, 271). Esse efeito é o 1ª regra) CC, 275: “O credor tem
que diferencia a solidariedade da direito a exigir e receber de um ou de
indivisibilidade (esta, convertida em alguns dos devedores, parcial ou
perdas e danos, desaparece). totalmente, a dívida comum [opção de
5ª regra) O credor que tiver demanda]; se o pagamento tiver sido
remitido (perdoado) a dívida ou parcial, todos os demais devedores
recebido o pagamento responderá aos continuam obrigados solidariamente
outros pelas partes que lhes caibam pelo resto.”

69
Imagine-se: credor “A” e solidário em relação aos demais
devedores “B”, “C” e “D” e uma dívida devedores.
solidária de R$30.000,00. Se B paga 4ª regra) O pagamento parcial
R$10.000, os outros R$20.000,00 pode feito por um dos devedores e a remissão
ser cobrado de qualquer dos devedores, por ele obtida aproveitam aos outros
total ou parcialmente, inclusive do devedores, até a concorrência da quantia
próprio “B”. paga ou relevada (=perdoada) (CC,
2º regra) RENÚNCIA À 277).
SOLIDARIEDADE. CC, 282: “Art. Na solidariedade passiva, há uma
282. O credor pode renunciar à relação externa, entre credor e
solidariedade em favor de um, de alguns devedores (UNA), e uma relação
ou de todos os devedores. Parágrafo interna, entre devedores, que é
único. Se o credor exonerar da fracionável.
solidariedade um ou mais devedores, 5ª regra) Impossibilitando-se a
subsistirá a dos demais.” prestação por culpa de um dos
Imagine, no exemplo acima, a devedores solidários, subsiste
renúncia à solidariedade de B, Nesse (permanece) para todos o encargo de
caso, ele passa a ser um devedor pagar o equivalente à prestação; mas
fracionário, e deve apenas R$10.000,00, pelas perdas e danos só responde o
sem poder ser cobrado pelos outros culpado (CC, 279) Esse efeito
R$20.000,00, enquanto C e D diferencia a solidariedade da
continuam devedores solidários por esse indivisibilidade.
valor, já que se abatem os R$10.000,00 Exemplo: um locador e dois
exonerados. locatários. Há uma valor em aberto em
“IV Jornada de Direito Civil - alugueis de R$30.000,00. Um dos
Enunciado 349. Com a renúncia à locadores foi responsável por um
solidariedade quanto a apenas um dos
devedores solidários, o credor só poderá
incêndio no imóvel que causou um
cobrar do beneficiado a sua quota na prejuízo de R$30.000,00 (danos
dívida, permanecendo a solidariedade emergentes). Só o culpado pode ser
quanto aos demais devedores, abatida demando a pagar os R$60.000,00 (valor
do débito a parte correspondente aos total da dívida acrescida das perdas e
beneficiados pela renúncia.”
danos), enquanto o inocente pode ser
A renúncia à solidariedade não se
demando apenas pela dívida do aluguel.
confunde com a remissão, em que o
6ª regra) Relação interna – o
beneficiado fica totalmente liberado
devedor que satisfez a dívida por inteiro
(CC, 388):
“Art. 388. A remissão concedida a
tem direito a exigir de cada um dos co-
um dos co-devedores extingue a dívida devedores as suas quotas, havendo
na parte a ele correspondente; de modo presunção de divisão igualitária entre
que, ainda reservando o credor a eles (art. 283 do CC). Se a dívida
solidariedade contra os outros, já lhes solidária interessar exclusivamente a um
não pode cobrar o débito sem dedução da
parte remitida.”
dos devedores, responderá este devedor
3ª regra) CC, 276: Se um dos por toda a dívida para com aquele que a
devedores solidários falecer deixando pagar (CC, 285).
“Art. 283. O devedor que
herdeiros, cada um destes será obrigado satisfez a dívida por inteiro tem direito
a pagar a cota que corresponder ao a exigir de cada um dos co-devedores a
seu quinhão hereditário. O dispositivo sua quota, dividindo-se igualmente por
traz duas exceções: 1) se a obrigação for todos a do insolvente, se o houver,
indivisível, poderá ser exigida por presumindo-se iguais, no débito, as
partes de todos os co-devedores.
inteiro; 2) os herdeiros reunidos serão (...)
considerados como um devedor

70
Art. 285. Se a dívida solidária dívida, sub-roga-se no direito do credor
interessar exclusivamente a um dos em relação aos outros coobrigados.”
devedores, responderá este por toda ela
para com aquele que pagar.”
Aquele devedor que pagar a
dívida (toda) só poderá exigir dos
3. Estudo das obrigações divisíveis e demais devedores a quota que cabe a
indivisíveis (CC, 257 a 263) cada um.
Assim como as solidárias, estas 2º regra) CC, 260. Se a
obrigações somente interessam se pluralidade for dos credores, poderá
houver mais de um credor ou mais de cada um destes exigir a dívida inteira.
um devedor. Mas o devedor ou devedores se
Porém, apesar desse ponto em desobrigarão, pagando: I) a todos os
comum, tais obrigações não se credores conjuntamente; II) a um dos
confundem: credores, dando este credor caução de
OBRIGAÇÕES OBRIGAÇÕES ratificação (garantia) dos outros
DIVISÍVEIS E SOLIDÁRIAS credores.
INDIVISÍVEIS O credor que recebe por inteiro
Decorrem da Decorrem da lei ou deve pagar aos outros credores as suas
natureza da prestação da vontade das partes
cotas em dinheiro.
Origem objetiva Origem subjetiva
As indivisíveis, Ainda que convertidas
3ª regra) CC, 263: Art. 263. Perde
quando convertidas mantêm a a qualidade de indivisível a obrigação
em perdas e danos, solidariedade. que se resolver em perdas e danos.§ 1º
perdem a Se, para efeito do disposto neste artigo,
indivisibilidade. houver culpa de todos os devedores,
responderão todos por partes iguais. § 2º
3.1. Obrigações divisíveis Se for de um só a culpa, ficarão
Por sua natureza, podem ser exonerados os outros, respondendo só
exigidas ou cumpridas em partes (de esse pelas perdas e danos.
forma fracionada). A regra do § 2º não é aceita
“CAPÍTULO V facilmente:
Das Obrigações “VI Jornada de Direito Civil -
Divisíveis e Indivisíveis Enunciado 540. Havendo perecimento do
Art. 257. Havendo mais de um objeto da prestação indivisível por culpa
devedor ou mais de um credor em de apenas um dos devedores, todos
obrigação divisível, esta presume-se respondem, de maneira divisível, pelo
dividida em tantas obrigações, iguais equivalente e só o culpado, pelas perdas
e distintas, quantos os credores ou e danos.”
devedores.” [concursu partes fiunt]

3.2. Obrigações indivisíveis Material do Professor - Direito Civil -


São as obrigações que não podem Pablo Stolze - Aula 07 (II).pdf
ser exigidas ou cumpridas em partes, Material de Apoio _ Direito Civil_
por sua natureza, por motivo de ordem Pablo Stolze_ Aula 07 (II).pdf
econômica, ou dada a razão
determinante do negócio jurídico. TEORIA DO PAGAMENTO
Exemplo clássico: entrega do touro
reprodutor. 1. Conceito
1ª regra) CC, 259: “Art. 259. Se, Pagamento. Pagamento significa
havendo dois ou mais devedores, a cumprimento da obrigação.
prestação não for divisível, cada um Lembra Clóvis Beviláqua, em sua
será obrigado pela dívida toda. obra direito das obrigações, que pagar
Parágrafo único. O devedor, que paga a não é apenas dar dinheiro, uma vez que

71
o pagamento também se aplica a outras obrigacional poderá repercutir
modalidades de obrigação. (exemplo: o fiador ou avalista).
Vale lembrar que, se um terceiro
2. Natureza jurídica interessado paga, ele terá não apenas um
Quanto à sua natureza jurídica, direito ao reembolso do que pagou, mas
pagamento é um fato jurídico. No se sub-rogará também em todas as
entanto, a doutrina debate que tipo de garantias e privilégios do credor
fato seria: se negocial ou não negocial. originário.
Nessa linha, lembrando Caio Terceiro não interessado é aquele
Mário da Silva Pereira, o pagamento desprovido de interesse jurídico no
poderá ter natureza negocial ou não, cumprimento da obrigação, vale dizer, o
dependendo das circunstâncias do caso. caso do pai ou do marido que quer
Segundo Pablo Stolze, o pagar a dívida do filho maior ou da
pagamento tem sim natureza negocial, esposa.
pelo que assim se explica a aplicação a Se um terceiro não interessado
ele os defeitos do negócio jurídico. paga, duas situações podem ocorrer: a)
Exemplo: ligar para o banco e pedir o se paga em nome do próprio devedor,
estorno do pagamento, pois o não terá direito a nada; b) se paga em
pagamento foi feito por erro. Professor: seu próprio nome, terá ao menos direito
“Em nosso sentir, o reconhecimento da ao reembolso, mas não se sub-rogando
natureza negocial do pagamento, como um terceiro interessado.
explica com mais clareza a Obs.: o devedor pode se opor a
possibilidade de aplicação de um pagamento feito por terceiro? Nos
determinados defeitos do negócio, a termos do art. 306 é possível a oposição
exemplo do erro.” do devedor ao pagamento feito pelo
*Lembrar: contratos não são os únicos terceiro, desde que por óbvio, o faça de
anos negociais! forma fundamentada (ex.: a dívida está
prescrita; ou para macular a imagem).
3. Condições do pagamento (requisitos) Contudo, o devedor deve ter meios para
1) Condições subjetivas: quem cumprir a obrigação, sob pena de não
deve pagar; a quem se deve pagar. poder impedir o pagamento.
2) Condições objetivas: objeto;
prova; tempo; e lugar. ii) a quem se deve pagar (CC, 308
e 309) – o ordenamento jurídico
3.1. Condições subjetivas do pagamento brasileiro admite que o pagamento seja
i) quem deve pagar (CC, 304 e feito ao credor ou ao representante dele,
305) – o devedor ou seu representante afigurando-se também possível o
são os que devem pagar. Também é pagamento feito a um terceiro, desde
possível que um terceiro, interessado ou que observadas certas condições
não interessado, pague. (artigos 308 e 309)
O CC (artigos 304 e seguintes) “Seção II
reconhece que o pagamento pode ser Daqueles a Quem se Deve Pagar
Art. 308. O pagamento deve ser
feito pelo devedor (ou representante feito ao credor ou a quem de direito o
dele), bem como por um terceiro, seja represente, sob pena de só valer depois
ele interessado ou não interessado. de por ele ratificado, ou tanto quanto
Terceiro interessado é aquele que reverter em seu proveito.
detém interesse jurídico no Obs.: o pagamento feito a terceiro,
cumprimento da obrigação, ou seja, em nos termos da parte final do art. 308, só
face de quem o inadimplemento será válido e eficaz sendo ratificado
pelo credor, ou não tendo sido, houver

72
prova de que reverteu em seu proveito. Art. 314. Ainda que a obrigação
Ex.: todo mês se paga o imóvel da casa tenha por objeto prestação divisível, não
pode o credor ser obrigado a receber,
onde resido à Dona Maria. Mês nem o devedor a pagar, por partes, se
passado, indo a casa dela, um jovem se assim não se ajustou.
apresenta como afilhado e assina em As pessoas não tem direito a um
nome próprio. Numa primeira hipótese, parcelamento, que só haverá se antes
ela manda uma mensagem no celular do houve acordo, ou quando deriva
locatário confirmando o pagamento. diretamente da lei (ex.: parcelamento do
Noutra hipótese, liga cobrando o IR). Assim, em regra, o pagamento deve
pagamento afirmando não ter recebido o ser feito de forma indivisível.
mesmo até então e não aceita a Art. 315. As dívidas em dinheiro
explicação de ter sido feito ao afilhado, deverão ser pagas no vencimento, em
mas daí alguns momentos se descobre moeda corrente e pelo valor nominal,
salvo o disposto nos artigos
que ela esteve na venda e afirmou que subseqüentes.
estava quitando a divida por ter Assim é que uma loja pode não
recebido o aluguel (prova testemunhal). receber cheque ou cartão, por o que tem
Merece atenção a hipótese do curso forçado é apenas a moeda
pagamento feito ao credor aparente ou nacional. Ou seja, segundo o art. 315,
putativo. Nos termos do art. 309, credor está claro que nas dívidas pecuniárias, é
putativo é aquele terceiro que aparenta a moeda nacional que tem curso
ser o credor verdadeiro, mas não o é. forçado. Por isso, não há
Em tal caso, o pagamento feito de boa- obrigatoriedade em se receber cheque
fé ao credor putativo é considerado ou outra forma de pagamento.
juridicamente eficaz. Valor nominal. O que significa a
A teoria da aparência justifica a expressão “valor nominal” constante no
legitimidade deste pagamento na art. 315? Este artigo consagra o
perspectiva da cláusula geral de boa-fé. princípio do nominalismo, segundo o
“Art. 309. O pagamento feito de
boa-fé ao credor putativo é válido qual o devedor se libera pagando a
[segundo a doutrina, eficaz], ainda mesma quantidade nominal de moeda,
provado depois que não era credor.” prevista no título da obrigação. Este
Ex.: a empresa demite o princípio é vigorosamente relativizado
funcionário encarregado de receber os pelos índices de correção monetária
pagamentos em diversos municípios que, não se confundindo com juros,
feitos pelas empresas compradoras, mas atualizam o valor da moeda em face da
não avisa tais empresas. natural depreciação de mercado (IGPM,
INPC etc.). Cf. REsp 494377/SP (O TJ
fez um cálculo e reduziu aquele feito
3.2. Condições objetivas do pagamento pelo banco – empréstimo de $90,000,00
3.2.1. Objeto que se tornou uma dívida de R$
Cuida de regras básicas quanto ao 1.282.973. 258,00).
objeto da obrigação (CC, 313 a 316). É possível utilizar uma moeda
“Seção III estrangeira como índice de correção
Do Objeto do Pagamento e Sua Prova monetária? Excepcionalmente, é
Art. 313. O credor não é obrigado
a receber prestação diversa da que lhe é admitida a variação cambial como
devida, ainda que mais valiosa.” critério de correção (Lei n. 8880/94 e
Este artigo alberga a regra aliud AgRg no Ag 845988/SP).
pro alio. O credor não está obrigado a Obs.: o que é “Tabela Price”?
receber uma coisa por outra, ainda que Criada por Richard Price, teólogo,
mais valiosa. matemático e filósofo, também
conhecida como sistema francês de

73
amortização, a price incorpora juros ao utiliza a expressão “sempre”] poderá ser
cálculo de um financiamento, embora dada por instrumento particular,
designará o valor e a espécie da dívida
mantenha a uniformidade das prestações quitada, o nome do devedor, ou quem
(cf. “A tabela Price é ilegal?” de Luiz por este pagou, o tempo e o lugar do
Scavone Jr. e Pedro Gomes). Diversas pagamento, com a assinatura do credor,
entidades de defesa do consumidor ou do seu representante.
atacam a tabela price afirmando que ela Parágrafo único. Ainda sem os
requisitos estabelecidos neste artigo
mascara anatocismo (capitalização valerá a quitação, se de seus termos ou
indevida de juros). As instituições das circunstâncias resultar haver sido
financeiras combatem a tese (cf. paga a dívida.”
noticiário STJ de 21-9-2009). O STJ Ou seja, não importa se o contrato
tem entendido que a apuração da exige forma solene: se o recibo for
legalidade ou não da tabela depende da passado por instrumento particular ele
análise do caso concreto, por ser será válido assim mesmo.
questão de matemática financeira, de Os artigos 322, 323 e 324
maneira que não caberia ao STJ a sua estabelecem presunções, relativas, de
apreciação (cf. dentre os diversos pagamento, ou seja, mesmo não
julgados nesas linha o repetitivo REsp havendo prova ou documento da
1124552/RS). quitação, haverá uma presunção de que
Art. 316. É lícito convencionar o o devedor pagou.
aumento progressivo de prestações “Art. 322. Quando o pagamento
sucessivas.” for em quotas periódicas, a quitação da
Tanto pela ótica da seara última estabelece, até prova em
consumerista quanto na civilista essa contrário, a presunção de estarem
cláusula só pode ter sido mal redigida, solvidas as anteriores.
Art. 323. Sendo a quitação do
pois estabelece situação extremamente capital sem reserva dos juros, estes
gravosa para o devedor. Contudo, esse presumem-se pagos.
artigo significa apenas que ele permite a Art. 324. A entrega do título ao
previsão de índices de correção devedor firma a presunção do
monetária (Mário Delgado). Mas essa pagamento.
Parágrafo único. Ficará sem efeito
redação permitiu uma série de condutas
a quitação assim operada se o credor
abusivas. Esse art. 316 embora possa provar, em sessenta dias, a falta do
estar se referindo à incidência dos pagamento.”
índices de correção monetária, tem uma
redação passível de crítica, na medida 3.2.3. Tempo
em que abusos podem ser cometidos Quanto ao tempo do pagamento, a
sob o seu pálio, em violação aos regra geral é no sentido de que a
princípios da função social e da boa fé. obrigação deverá ser cumprida em seu
vencimento.
3.2.2. Prova Todavia, não se tratando de
A prova do pagamento se dá pela obrigação condicional, caso a obrigação
quitação (Cf. CC, 319 e seguintes). A não tenha vencimento estipulado,
quitação é o ato jurídico que comprova poderá ser exigida de imediato (arts.
o pagamento realizado. 331 e 332).
O documento ou instrumento da “Seção V
quitação é o recibo. Do Tempo do Pagamento
“Art. 319. O devedor que paga Art. 331. Salvo disposição legal
tem direito a quitação regular, e pode em contrário, não tendo sido ajustada
reter o pagamento, enquanto não lhe seja época para o pagamento, pode o credor
dada. exigi-lo imediatamente.
Art. 320. A quitação, que sempre Art. 332. As obrigações
[boa questão para prova objetiva já que condicionais cumprem-se na data do

74
implemento da condição, cabendo ao Art. 328. Se o pagamento
credor a prova de que deste teve ciência consistir na tradição de um imóvel, ou
o devedor.” em prestações relativas a imóvel, far-se-á
O art. 333 cuida das hipóteses de no lugar onde situado o bem.
vencimento antecipado da obrigação. Art. 329. Ocorrendo motivo grave
“Art. 333. Ao credor assistirá o para que se não efetue o pagamento no
direito de cobrar a dívida antes de lugar determinado, poderá o devedor
vencido o prazo estipulado no contrato fazê-lo em outro, sem prejuízo para o
ou marcado neste Código: credor.
Art. 330. O pagamento
I - no caso de falência do devedor, reiteradamente feito em outro local faz
ou de concurso de credores; presumir renúncia do credor
relativamente ao previsto no contrato.”
II - se os bens, hipotecados ou Este art. 330 exemplifica
empenhados, forem penhorados em aplicação dos institutos da supressio e
execução por outro credor; surrectio (temas de intensivo II)
manifestações da regra proibitiva do
III - se cessarem, ou se se
tornarem insuficientes, as garantias do
venire contra factum proprium,
débito, fidejussórias, ou reais, e o desdobramento da função reativa da
devedor, intimado, se negar a reforçá-las. boa-fé objetiva (figura parcelar).
Parágrafo único. Nos casos deste Teoria do adimplemento
artigo, se houver, no débito,
solidariedade passiva, não se reputará
substancial. (...)
vencido quanto aos outros devedores
solventes.”
Obs.: vale lembrar, no que se
refere a mútuo de dinheiro que, nos Material de Apoio - Direito Civil -
termos do art. 592, II do CC, não Flávio Tartuce - Aula 08.pdf
havendo vencimento certo, o devedor REGRAS ESPECIAIS
tem o prazo mínimo de trinta dias para DE PAGAMENTO
pagar. E FORMAS DE PAGAMENTO
(CC, 334 A 388)
3.2.4. Lugar
O CC disciplina o lugar do
pagamento a partir do art. 327. 1. Introdução
Regra geral, as dívidas são Diferenciação. Na doutrina
quesíveis ou querable, o pagamento é tradicional, as regras especiais de
feito no domicílio do devedor. Por pagamento seriam atos unilaterais quais
exceção, poderá ser feito o pagamento sejam: consignação, imputação do
no domicílio do credor, caso em que a pagamento, e sub-rogação legal;
dívida é portável ou portable (cf. art. enquanto as formas de pagamento
327). indireto são atos bilaterais: sub-rogação
“Seção IV convencional, novação, dação em
Do Lugar do Pagamento pagamento, compensação, confusão e
Art. 327. Efetuar-se-á o
pagamento no domicílio do devedor,
remissão.
salvo se as partes convencionarem
diversamente, ou se o contrário resultar 2. Pagamento em consignação
da lei, da natureza da obrigação ou das Trata-se do depósito judicial ou
circunstâncias. extrajudicial realizado pelo devedor ou
Parágrafo único. Designados dois
por terceiro [no interesse do devedor]
ou mais lugares, cabe ao credor escolher
entre eles. com os fins de afastar os efeitos da
mora e do inadimplemento absoluto.
“CAPÍTULO II

75
Do Pagamento em Consignação II - se o credor não for, nem
Art. 334. Considera-se mandar receber a coisa no lugar, tempo e
pagamento, e extingue a obrigação, o condição devidos; [mora accipiendi ou
depósito judicial ou em estabelecimento mora do credor]
bancário da coisa devida, nos casos e III - se o credor for incapaz de
forma legais.” receber, for desconhecido, declarado
Trata-se de um instituto ausente, ou residir em lugar incerto ou de
misto/hibrido, de Direito material e acesso perigoso ou difícil;
[impossibilidade do pagamento direto.
processual. No CPC/1973, a partir do Obs.: a incapacidade não se refere apenas
art. 890; no CPC/2015, a partir do art. à civil, mas qualquer tipo de
539. O CC deveria tratar apenas da incapacidade]
extrajudicial (feita no banco, que IV - se ocorrer dúvida sobre quem
procede todo o procedimento), bem deva legitimamente receber o objeto do
pagamento; [dúvida subjetiva ativa, ou
como o CPC apenas da judicial, mas seja, o devedor não sabe a quem pagar]
não é isso que ocorre. V - se pender litígio sobre o
“TÍTULO III objeto do pagamento. [ex.: duas pessoas
DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS disputam o imóvel objeto da locação, e o
CAPÍTULO I locatório consigna em banco ou em
DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM juízo]”
PAGAMENTO Majoritariamente entende-se que
Art. 539. Nos casos previstos em
lei, poderá o devedor ou terceiro se trata de rol exemplificativo.
requerer, com efeito de pagamento, a Exemplo: conflito pessoal entre as
consignação da quantia ou da coisa partes (imagine-se um relacionamento
devida. péssimo entre locador e locatário).
§ 1º Tratando-se de obrigação em Para que a consignação tenha
dinheiro, poderá o valor ser depositado
em estabelecimento bancário, oficial força de pagamento (e afastar as regras
onde houver, situado no lugar do da mora e inadimplemento absoluto),
pagamento, cientificando-se o credor por devem ser observadas as mesmas regras
carta com aviso de recebimento, assinado do pagamento direto, quais sejam:
o prazo de 10 (dez) dias para a partes (consignação para pessoa
manifestação de recusa.
§ 2º Decorrido o prazo do § 1º,
correta); objeto (aquele previsto no
contado do retorno do aviso de negócio jurídico); lugar (local correto);
recebimento, sem a manifestação de tempo (termo) – ou seja, “quem, o que,
recusa, considerar-se-á o devedor onde e quando”. Cf. CC, 336 e 337:
liberado da obrigação, ficando à “Art. 336. Para que a consignação
disposição do credor a quantia tenha força de pagamento, será mister
depositada. concorram, em relação às pessoas, ao
§ 3º Ocorrendo a recusa, objeto, modo e tempo, todos os
manifestada por escrito ao requisitos sem os quais não é válido o
estabelecimento bancário, poderá ser pagamento.
proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação Art. 337. O depósito requerer-se-á
de consignação, instruindo-se a inicial no lugar do pagamento, cessando, tanto
com a prova do depósito e da recusa. que se efetue, para o depositante, os juros
§ 4º Não proposta a ação no prazo da dívida e os riscos, salvo se for julgado
do § 3º, ficará sem efeito o depósito, improcedente.”
podendo levantá-lo o depositante.” A jurisprudência do STJ passou a
CC, 335 – hipóteses de exigir na ação de revisão de contrato o
consignação: depósito da parte incontroversa da
“Art. 335. A consignação tem
lugar:
obrigação, com o fim de demonstrar a
I - se o credor não puder, ou, sem boa-fé do autor. Essa regra foi
justa causa, recusar receber o pagamento, introduzida no CPC/73 pela lei n.
ou dar quitação na devida forma; [mora 12873/2013 (art. 285-B), e confirmada
accipiendi ou mora do credor] pelo CPC/2015, no seu art. 330, § 2º

76
(sob pena de inépcia da inicial). Parece vencidas quer imputar o pagamento, se
uma regra mais material que processual, aceitar a quitação de uma delas, não terá
direito a reclamar contra a imputação
mas consta do CPC. feita pelo credor, salvo provando haver
“Seção III ele cometido violência ou dolo.
Do Indeferimento da Petição Art. 354. Havendo capital e juros,
Inicial o pagamento imputar-se-á primeiro nos
juros vencidos, e depois no capital, salvo
Art. 330. A petição inicial será estipulação em contrário, ou se o credor
indeferida quando: passar a quitação por conta do capital.
Art. 355. Se o devedor não fizer a
I - for inepta; indicação do art. 352, e a quitação for
(...) omissa quanto à imputação, esta se fará
§ 2º Nas ações que tenham por nas dívidas líquidas e vencidas em
objeto a revisão de obrigação decorrente primeiro lugar. Se as dívidas forem todas
de empréstimo, de financiamento ou de líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a
alienação de bens, o autor terá de, sob imputação far-se-á na mais onerosa.”
pena de inépcia, discriminar na petição
inicial, dentre as obrigações contratuais,
aquelas que pretende controverter, além 4. Pagamento com sub-rogação
de quantificar o valor incontroverso do Sub-rogação significa
débito. substituição.
§ 3º Na hipótese do § 2º, o valor A sub-rogação trata-se da mera
incontroverso deverá continuar a ser
pago no tempo e modo contratados.”
substituição do credor por um terceiro
que efetua o pagamento, mantendo-se
3. Imputação do pagamento os demais elementos da obrigação, caso
Imputar significa indicar, apontar. dos seus acessórios (juros, multa,
Imputação do pagamento trata-se garantias, fiança).
“Art. 349. A sub-rogação
da indicação feita pelo devedor, pelo transfere ao novo credor todos os
credor ou pela Lei de qual dívida está direitos, ações, privilégios e garantias do
sendo paga nos casos de pluralidade de primitivo, em relação à dívida, contra o
obrigações com mesmas partes. devedor principal e os fiadores.”
Cabe primeiro ao devedor; em Os acessórios da dívida
segundo lugar, em seu silêncio, ao continuam, especialmente a fiança.
credor; ainda sendo caso de silêncio das A sub-rogação pode ser de duas
duas partes, vai para a ordem de modalidades:
imputação legal. Primeiramente, a) legal, automática ou de pleno
imputa-se nos juros; se não houver, na direito – ato unilateral;
dívida que venceu primeiro; se i) do credor que paga a dívida do
coincidirem, na dívida mais onerosa devedor comum;
que, em regra, é a de maior valor. Se as ii) do adquirente do imóvel
dívidas forem idênticas, a lei não hipotecado que paga ao credor
previu, mas se entende que o pagamento hipotecário; bem como do terceiro que
será proporcional (constava do antigo efetuou o pagamento para não perder o
CCom, mas foi revogado, e a doutrina imóvel (evicção);
continua mantendo a mesma solução). iii) terceiro interessado, a exemplo
“CAPÍTULO IV do fiador.
Da Imputação do Pagamento
Art. 352. A pessoa obrigada por b) sub-rogação convencional –
dois ou mais débitos da mesma natureza,
a um só credor, tem o direito de indicar a
decorre de acordo das partes (ato
qual deles oferece pagamento, se todos bilateral).
forem líquidos e vencidos. i) quando o credor recebe o
Art. 353. Não tendo o devedor pagamento de terceiro e expressamente
declarado em qual das dívidas líquidas e lhe transfere os seus direitos. Cf. art.

77
348, aplicam-se as regras da cessão de Dou Coisa por Coisa
crédito, sendo necessária a notificação Dou Coisa por Dinheiro
do devedor; Dou Dinheiro por coisa
ii) quando o terceiro empresta Veja que no último caso (taxado),
dinheiro ao devedor para ele pagar a não pode haver dação em pagamento,
dívida ficando convencionada a sub- porque, cf. art. 357, configura compra e
rogação (mútuo). venda. Nos outros dois casos pode
“Art. 347. A sub-rogação é haver dação em pagamento.
convencional: “Art. 357. Determinado o preço
I - quando o credor recebe o da coisa dada em pagamento, as relações
pagamento de terceiro e expressamente entre as partes regular-se-ão pelas
lhe transfere todos os seus direitos; normas do contrato de compra e venda.”
II - quando terceira pessoa A coisa dada pode ser um título de
empresta ao devedor a quantia precisa
para solver a dívida, sob a condição
crédito do qual o devedor é credor,
expressa de ficar o mutuante sub-rogado aplicando-se as regras da cessão de
nos direitos do credor satisfeito. crédito, cf. art. 358.
Art. 348. Na hipótese do inciso I “Art. 358. Se for título de crédito
do artigo antecedente, vigorará o a coisa dada em pagamento, a
disposto quanto à cessão do crédito.” transferência importará em cessão.”
Polêmica. Art. 350. Na sub- O art. 359 trata da evicção da
rogação legal, o sub-rogado (novo coisa dada em pagamento (perda da
credor) poderá exercer os direitos e coisa). Se ocorrer, restabelece-se a
ações do credor primitivo, mas apenas situação anterior, ressalvado os direitos
até a soma que tiver desembolsado para de terceiro de boa-fé.
desobrigar o devedor. Ou seja, a sub- “Art. 359. Se o credor for evicto
rogação legal não pode ter intuito da coisa recebida em pagamento,
restabelecer-se-á a obrigação primitiva,
especulativo. A polêmica é: essa regra ficando sem efeito a quitação dada,
se aplica à sub-rogação convencional? ressalvados os direitos de terceiros.”
São duas correntes: 1) não (mais liberal,
CMSP), pois como decorre de contrato 6. Novação (ou novatio)
pode ter intuito especulativo, ou seja, Forma de pagamento indireto em
visar lucro; 2) sim (mais que as partes convencionam a criação
intervencionista Judith Martins-Costa, de uma obrigação nova em substituição
Tartute), pois nenhuma sub-rogação de uma antiga pela substituição dos seus
pode ter intuito especulativo. elementos.
“Art. 350. Na sub-rogação legal o O principal efeito é a extinção de
sub-rogado não poderá exercer os
direitos e as ações do credor, senão até à
todos os elementos da obrigação antiga,
soma que tiver desembolsado para inclusive dos seus acessórios (juros,
desobrigar o devedor.” multa, garantias e fiança), em regra. Cf.
artigos 364 e 366.
5. Dação em pagamento (datio in “Art. 364. A novação extingue os
solutum) acessórios e garantias da dívida, sempre
que não houver estipulação em contrário.
Conceito. Forma de pagamento Não aproveitará, contudo, ao credor
indireto em que as partes convencionam ressalvar o penhor, a hipoteca ou a
a substituição da prestação por outra, anticrese, se os bens dados em garantia
mantendo-se os demais elementos pertencerem a terceiro que não foi parte
obrigacionais (caso dos acessórios. na novação.
(...)
Cuidado quanto à fiança, que é extinta, Art. 366. Importa exoneração do
cf. art. 838, III). fiador a novação feita sem seu consenso
Exemplos: com o devedor principal.”
ENTRA SAI

78
Ou seja, é possível novação Art. 367. As obrigações nulas ou
parcial (o professor nunca viu na extintas não podem ser novadas. As
prática, mas conforme a lei é possível. anuláveis podem (hipótese de
Exemplo: estipular que a multa convalidação)
contratada, ou os juros, ou o fiador, “Art. 367. Salvo as obrigações
continuam). simplesmente anuláveis, não podem ser
objeto de novação obrigações nulas ou
Requisitos da novação: extintas.”
1º) obrigação antiga, que é a
dívida novada, que resta extinta; 7. Compensação
2º) obrigação nova, dívida É a forma de pagamento indireto
novadora; que gera a extinção de dívidas mútuas
3º) ânimo de novar (animus ou recíprocas até o ponto em que se
novandi) encontrarem.
O ânimo de novar pode ser Seu fundamento é o princípio da
expresso ou tácito, mas não pode ser economia, tanto material quanto
inequívoco (não deixar dúvida). Se processual. Para alguns, por se referir a
deixar dúvida não há novação, e a matéria também processual, seria de
segunda obrigação apenas confirma a ordem pública (ponto polêmico).
primeira. Obrigações incompensáveis:
Ex.1: instrumento particular de “Art. 373. A diferença de causa
novação – ânimo de novar expresso; nas dívidas não impede a compensação,
Ex. 2: simples concessão de exceto:
moratória (paga depois) não há ânimo I - se provier de esbulho, furto ou
roubo; [ilícitos civis]
de novar, nem expresso, nem tácito. II - se uma se originar de
Ex. 3: dar cheque em pagamento comodato, depósito ou alimentos;
de duplicada – não há ânimo de novar [comodato e depósito são
tácito. personalíssimos; alimentos, cf. art. 1707,
Ex. 4: trocar duplicatas por embora alguns entendam que sejam os
alimentos incompensáveis no caso de
cheques, há ânimo de novar tácito. pagamento a mais]
Classificação da novação (art. III - se uma for de coisa não
360): suscetível de penhora.” [dívidas
a) novação objetiva ou real – impenhoráveis.]
aquela que se dá pela substituição da Segundo o CPC, 833 a partir de
prestação um determinado valor:
b) novação subjetiva ativa – se dá “Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
pela substituição do sujeito ativo;
IV - os vencimentos, os subsídios,
c) novação subjetiva passiva – se os soldos, os salários, as remunerações,
dá pela substituição do devedor. Pode os proventos de aposentadoria, as
ser: pensões, os pecúlios e os montepios, bem
c.1) por delegação – ocorre com o como as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao
consentimento do antigo devedor;
sustento do devedor e de sua família, os
c.2) por expromissão – art. 362: ganhos de trabalhador autônomo e os
sem o consentimento do antigo devedor, honorários de profissional liberal,
ou seja, entrar na obrigação sem ser ressalvado o § 2o;
convidado. (...)
*No concurso, na dúvida entre X - a quantia depositada em
caderneta de poupança, até o limite de 40
delegação e expromissão, haverá (quarenta) salários-mínimos;
expromissão, pois para ser por (...)
delegação deve ser expressa a questão. § 2º O disposto nos incisos IV e X
do caput não se aplica à hipótese de
penhora para pagamento de prestação

79
alimentícia, independentemente de sua a) compensação legal – decorre da
origem, bem como às importâncias norma jurídica devendo seguir os
excedentes a 50 (cinquenta) salários-
mínimos mensais, devendo a constrição
rígidos requisitos dos artigos 368 a 370
observar o disposto no art. 528, § 8º, e no do CC: reciprocidade; dividas líquidas;
art. 529, § 3º.” vencidas; de coisas fungíveis
O que é penhorável é (substituíveis); coisas de mesma
compensável. qualidade (identidade total). Por conta
Questiona-se, por conta do art. deste último requisito, não é fácil
371, se a compensação é exceção observar uma compensação legal, a não
pessoal. ser o caso de dinheiro (MHD).
“Art. 371. O devedor somente “Art. 368. Se duas pessoas forem
pode compensar com o credor o que este ao mesmo tempo credor e devedor uma
lhe dever; mas o fiador pode compensar da outra, as duas obrigações extinguem-
sua dívida com a de seu credor ao se, até onde se compensarem.
afiançado.” (...)
Como cabe exceção da Art. 370. Embora sejam do
compensação pelo fiador, não é pessoal. mesmo gênero as coisas fungíveis, objeto
das duas prestações, não se compensarão,
Veja: locador, locatário e fiador. O verificando-se que diferem na qualidade,
locatário deve R$30.000,00 a título de quando especificada no contrato.”
alugueis; o locador deve R$30.000,00 b) convencional – decorre do
ao locatário por benfeitorias. Daí, acordo entre as partes, não seguir os
espertamente, o locador cobra as rígidos requisitos acima (mais
locações do fiador, e este último liberdade). C. art. 375, pode ser
compensa a cobrança com aquilo que o renunciada ou afastada pela parte.
locador deve ao locatário. Veja que a *Há dúvida doutrinária se o 375
exceção não é pessoal. também se aplica à legal.
Uma moratória concedida pela c) compensação judicial – decorre
parte, por exemplo, não obstam a de decisão do juiz. Indicada por alguns
compensação, com fundamento na boa- doutrinadores, parece ser um exagero,
fé objetiva, pela regra tu quoque (não pois as duas acima dão conta de todas as
fazer contra o outro que não quer que modalidades.
seja feita contra você). Cf. art. 372
“Art. 372. Os prazos de favor [ex. 8. Confusão
da moratória], embora consagrados pelo
uso geral, não obstam a compensação.”
Gera a extinção da obrigação pois
Exemplo: A deve 1 milhão a B, na mesma pessoa confundem-se as
que deve 10 mil a A. B concede qualidades de credor e devedor.
moratória. A pode cobrar seu crédito e, Quanto à extensão (art. 382), ela
mesmo sob a moratória, B ainda pode pode ser total (=própria), quando pega
compensar (porque a intenção de A, na toda a dívida; ou parcial (=imprópria),
malandragem, era pedir a moratória que atinge apenas parte da dívida (ex.:
para poder, na sequência, livremente solidariedade, cf. art. 383).
“Art. 382. A confusão pode
cobrar sem a compensação). verificar-se a respeito de toda a dívida,
Classificação da compensação: ou só de parte dela.
i) quanto à extensão: Art. 383. A confusão operada na
a) compensação total – as duas pessoa do credor ou devedor solidário só
dívidas são extintas pois idênticas no extingue a obrigação até a concorrência
da respectiva parte no crédito, ou na
valor; dívida, subsistindo quanto ao mais a
b) compensação parcial – uma solidariedade.”
dívida é extinta e a outra compensada. CONFUSÃO CONFUSÃO
ii) quanto à origem: TOTAL PARCIAL
Pai e filho. Filho deve Pai e tio são credores

80
um milhão para o pai. solidários do (instrumento particular), que gera mera
É o único herdeiro. O filho/sobrinho de R$ presunção relativa de pagamento direto.
pai morre. A dívida se 1 milhão. Filho é
extingue. único sucessor do pai.
Devolução de objeto empenhado
Pai morre. Resta (penhor), não é remissão tácita, mas
apenas a dívida de apenas renúncia à garantia:
R$500 mil para com o “Art. 387. A restituição voluntária
tio. do objeto empenhado prova a renúncia
Efeito fênix da obrigação. Art. do credor à garantia real, não a extinção
da dívida.”
384. A obrigação reaparece. Imagine-se
que o pai morreu por aparência e depois
reaparece.

9. Remissão
Remissão e remição. O próprio
Material de Apoio _ Direito Civil_
legislador confunde as duas expressões
Pablo Stolze_ Aula 09 (II).pdf
na parte de hipoteca. Remissão é o
Material do Professor - Direito Civil -
perdão da dívida, que deve ser aceito
Pablo Stolze - 09.pdf
pelo devedor, cf. art. 385, tratando-se de
pablostolze@terra.com.br
negocio bilateral e pagamento indireto.
Remição, é o resgate da coisa pelo
pagamento, como no caso da hipoteca
(no Direito Penal também existe
TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES
remissão da pena pelo trabalho, estudo
etc.)
“Art. 385. A remissão da dívida,
aceita pelo devedor, extingue a Na linha de pensamento do grande
obrigação, mas sem prejuízo de terceiro.” Clóvis do Couto e Silva, a relação
Classificação: obrigacional é dinâmica, assemelhando-
i) quanto à extensão: se a um processo (obra “A obrigação
a) remissão total; como processo”, editora FGV). I. é, a
b) remissão parcial – ex.: ocorre relação obrigacional não é estática. Ela
na solidariedade, cf. art. 388: nasce, por exemplo, de um contrato e
“Art. 388. A remissão concedida a movimenta-se em direção do pagamento
um dos co-devedores extingue a dívida (em regra, para satisfazer o interesse do
na parte a ele correspondente; de modo
que, ainda reservando o credor a
credor) ou do inadimplemento.
solidariedade contra os outros, já lhes O tema “transmissão das
não pode cobrar o débito sem dedução da obrigações” acentua este aspecto
parte remitida.” dinâmico da relação obrigacional.
ii) quanto ao modo/forma: Vale lembrar, segundo a doutrina
a) remissão expressa – quando se de Antunes Varela (“Das obrigações em
faz por exemplo o instrumento escrito; geral”, Editora Almedina), que tem se
b) remissão tácita – exemplo: tornado comum nas relações civis,
devolução de instrumento particular, cf. formas comerciais de transmissão das
art. 386. obrigações, a exemplo do endosso. Mas
“Art. 386. A devolução voluntária não é do endosso que vamos tratar.
do título da obrigação, quando por
escrito particular, prova desoneração do
Trataremos aqui de três formas
devedor e seus co-obrigados, se o credor tipicamente civis de transmissão das
for capaz de alienar, e o devedor capaz obrigações:
de adquirir.” a) cessão de crédito;
Atenção! Não confundir com a b) cessão de débito (assunção de
devolução de título de crédito dívida);

81
c) cessão de posição contratual ou Obs.: nesse contexto, vale lembrar
cessão de contrato. ainda, nos termos do art. 287 que, salvo
O Código Civil de 1916 tratou disposição em contrário, a cessão de
apenas da cessão de crédito. Já o crédito abrange os seus acessórios.
CC/2002 avançou, tratando da cessão de À luz da cláusula geral de boa-fé
crédito e de débito. Mas, perdeu a objetiva, base normativa do dever de
oportunidade de regular a cessão de informação, é fundamental a teor do art.
contrato, tema tratado por doutrina e 290 que o devedor seja comunicado da
jurisprudência. cessão feita (“O dever de informar no
Direito Civil”, Cristoph Fabian).
1. Cessão de crédito A comunicação da cessão feita,
Embora a cessão de crédito possa ao devedor, é necessária para que o
derivar da lei ou de uma decisão devedor saiba a quem pagar, bem como
judicial, trataremos aqui dada sua pelo fato de que poderá opor ao novo
suprema importância, da cessão de credor as defesas que tinha contra o
crédito negocial. primeiro (art. 292 e 294).
Obs.: O STJ, em mais de uma
1.1. Conceito oportunidade, já se pronunciou no
A cessão de crédito consiste em sentido de que a ausência de notificação
um negócio jurídico por meio do qual o do devedor não significa inexigibilidade
credor (cedente) transfere o seu crédito do crédito (AgRg no REsp 1408914/PR,
a um terceiro (cessionário), mantendo- AgRg no AREsp 311428/RS).
se a mesma relação obrigacional com o Obs. 2: conforme se lê no AgRg
devedor (cedido). no AREsp 591952/SP, j. 19/4/2016, no
Obs.: não se confunde com a contrato de factoring, a transferência
novação, uma vez que não se considera dos créditos não se opera por simples
criada obrigação nova. Na mesma linha, endosso, mas por cessão de crédito.
não se pode dizer que a cessão de Nos termos dos artigos 295 a 297
crédito identifica-se com o pagamento temos que, como regra geral, uma
com sub-rogação, pois a cessão poderá cessão de crédito opera-se pro soluto (o
ser gratuita. cedente apenas garante a existência do
A cessão de crédito é tratada no crédito cedido). Todavia, caso o credor
CC a partir do art. 286. Da leitura deste cedente também garanta o pagamento, a
artigo, concluímos que uma cessão de cessão passa a ser pro solvendo.
crédito não poderá ocorrer em três
hipóteses: 2. Cessão de débito
a) se a natureza do crédito for A cessão de débito, também
incompatível com a cessão (ex.: crédito chamada de assunção de dívida, é
de alimentos); conceituada no art. 299 do CC. Por
b) se houver vedação legal (ex.: definição, a cessão de débito se opera
artigo 1749, III do CC – o tutor não quando um terceiro assume a obrigação
pode se tornar cessionário de crédito do devedor primitivo com expresso
contra o tutelado); consentimento do credor.
c) se houver cláusula proibitiva no Obs.: não se confunde com a
contrato. novação subjetiva passiva, pois não se
A cláusula proibitiva de cessão de considera criada obrigação nova.
crédito leva o nome de pacto de non Obs. 2: nos termos do art. 302, o
cedendo, o qual deverá expressamente novo devedor não poderá opor ao credor
constar no contrato. as defesas pessoais que competiam ao
devedor primitivo (ex.: dolo ou coação),

82
mas poderá opor defesas gerais e caso, a cessão independe da vontade da
comuns (ex.: prescrição, ou dívida já outra parte.
paga). (houve aqui um problema na Contrato de gaveta. O que se
transmissão da aula. Cf. no material se entende por contrato de gaveta? Esta
perdi alguma anotação importante) figura, que encontra terreno fértil na
sociedade brasileira, pode ser
3. Cessão de posição contratual (cessão objetivamente definida como uma
de contrato) cessão de posição contratual irregular,
Segundo Emílio Betti (“Teoria na medida em que não houve a anuência
Geral das Obrigações”), a cessão de da outra parte.
contrato realiza a mais completa forma Como vimos, a regra geral, para a
de sucessão a título particular, na adequada cessão de contrato é de que
relação obrigacional. Isso porque, haja a anuência da outra parte, sob pena
mediante um único ato, o sujeito de se caracterizar um contrato de
assume integralmente um dos polos da gaveta. No âmbito do SFH, a
relação obrigacional. jurisprudência do STJ admite,
O código civil brasileiro não observados os requisitos do art. 20 da
reguou expressamente a cessão de Lei n. 10150/2000, a validade dos
contrato, matéria tratada pela doutrina e contratos de gaveta celebrados até
jurisprudência e também no Direito 25/10/1996. Após essa data, é
Internacional (artigos 424 e seguintes indispensável a anuência da instituição
do CC de Portugal). financiadora (cf. STJ, REsp
A cessão de posição contratual é 1150429/CE). Cf. tb. REsp 1181068/SP.
muito mais ampla do que a cessão de
crédito ou a cessão de débito. Isso 3. Tema avulso
porque se opera, mediante um único ato O que é tutela externa do
a transferência de toda a posição crédito? Deve-se, nesse ponto,
contratual de uma das partes (cedente) a reconhecer a contribuição de Antônio
um terceiro (cessionário). Para tanto, é Junqueira de Azevedo (USP). Na
indispensável que a cessão perspectiva da função social do contrato
convencionada seja integral ou global e e da boa-fé objetiva, embora a relação
haja a anuência da outra parte. obrigacional vincule as próprias partes,
Quanto à natureza jurídica da a tutela externa do crédito sustenta que
cessão, diferentemente do que terceiro não pode indevidamente
sustentavam os adeptos da teoria da interferir na relação em curso. Fala-se
decomposição ou atomística (Ferrara, pois que a relação obrigacional teria,
Crome) os quais fragmentavam a cessão além de uma eficácia interna (geradora
de posição contratual em várias cessões de direitos e deveres das partes), uma
de débito e crédito, razão assiste à teoria eficácia externa (para impedir a
unitária, segundo a qual a cessão se dá indevida intromissão de terceiro, em
de forma “una, global e integral em um violação à boa-fé objetiva). Seria uma
único ato”. espécie de manto protetor a gerar efeitos
Questão especial de concurso: o para fora da própria relação
que é cessão de contrato legal ou obrigacional. Tereza Negreiros usa a
imprópria? Trata-se de uma figura expressão “contrato para além do
anômala, excepcionalmente admitida, contrato”. Essa proteção gera a
em que a cessão da posição contratual possibilidade de terceiros serem
resulta de uma norma legal. Exemplo: § civilmente responsabilizados. Outro
1º do art. 31 da Lei n. 6766/79. Em tal nome da teoria é a de “teoria do
terceiro cúmplice”. O mais notório

83
exemplo de aplicação da teoria da tutela Obs.: será visto na aula de
externa é analisado pela Prof. Judith Responsabilidade Civil a distinção entre
Martins-Costa no texto “Zeca fortuito interno e externo, bem como
Pagodinho, a razão cínica e no novo especiais situações de aplicação da
código civil brasileiro”. Trata-se do teoria na Jurisprudência (vale lembrar
famoso caso Zeca Pagodinho versus que o STJ tem entendido que assalto a
cervejaria. ônibus é fortuito externo, excludente de
***** responsabilidade civil, cf. por todos
AgRg no AREsp 531.739/SP).

2.2. Inadimplemento absoluto culposo


Material de Apoio _ Direito Civil_ O inadimplemento absoluto
Pablo Stolze_ Aula10 (II).pdf culposo, por sua vez, resulta de fato
TEORIA DO INADIMPLEMENTO imputável ao devedor, conduzindo à
responsabilidade civil. Trata-se do mais
comum dos inadimplementos (o
1. Conceito de inadimplemento inadimplemento fortuito, se fosse a
Inadimplemento significa regra, geraria total insegurança
descumprimento da obrigação. jurídica).
Pode ser absoluto (culposo ou O art. 389 do CC é a regra
fortuito) ou relativo (gerando a mora). fundamental do inadimplemento
culposo que conduz à responsabilidade
2. Inadimplemento absoluto civil. Complementa-o, o art. 402.
O inadimplemento absoluto traduz “Art. 389. Não cumprida a
o descumprimento total da obrigação, obrigação, responde o devedor por
perdas e danos, mais juros e atualização
podendo ser fortuito (art. 393) ou monetária segundo índices oficiais
culposo (art. 989). regularmente estabelecidos, e honorários
de advogado.
2.1. Inadimplemento absoluto fortuito (...)
Nos termos do art. 393 resulta de Art. 402. Salvo as exceções
expressamente previstas em lei, as perdas
fato não imputável ao devedor (caso e danos devidas ao credor abrangem,
fortuito ou força maior). além do que ele efetivamente perdeu
Em regra, do inadimplemento [dano emergente], o que razoavelmente
fortuito não resulta responsabilidade deixou de lucrar [lucro cessante].”
civil, ressalvadas as hipóteses em que o
próprio devedor assume a obrigação, Frequentemente, as situações de
mesmo em caso de evento fortuito, a inadimplemento vivenciadas no Brasil
exemplo do que se dá com as pelo devedor são de inadimplemento
companhias de seguro (cf. art. 393). culposo da obrigação que conduzem à
Obs.: será visto no Intensivo II o responsabilidade civil.
tema “caso fortuito e força maior”, A doutrina contemporânea
especialmente sua diferenciação (Guilherme Nogueira da Gama; Jorge
conceitual. Ferreira) admite haver inadimplemento
“Art. 393. O devedor não gerador de responsabilidade civil, em
responde pelos prejuízos resultantes de caso de descumprimento, não apenas da
caso fortuito ou força maior, se obrigação principal, mas também de
expressamente não se houver por eles
responsabilizado. obrigações ou deveres anexos derivados
Parágrafo único. O caso fortuito da boa-fé objetiva, como o dever de
ou de força maior verifica-se no fato assistência ou o dever de lealdade
necessário, cujos efeitos não era possível
evitar ou impedir. [tema do Intensivo II]”

84
(violação positiva do contrato, cf. descumprimento total da obrigação, que
Tartuce bem o explica). ainda interessa ao credor. O CDC, no §
1º do art. 52, esclarece o limite de 2%
2. 3. Cláusula penal para a cláusula penal moratória.
A cláusula penal, também “Art. 411. Quando se estipular a
chamada de pena convencional ou cláusula penal para o caso de mora, ou
em segurança especial de outra cláusula
multa contratual, é um pacto acessório determinada, terá o credor o arbítrio de
pelo qual a partes previamente fixam a exigir a satisfação da pena cominada,
indenização devida em caso de juntamente com o desempenho da
descumprimento total da obrigação obrigação principal.”
(cláusula penal compensatória) ou em O tema “arras” é visto no
caso de descumprimento de certa Intensivo II.
cláusula do contrato ou de mora Na perspectiva do princípio da
(cláusula penal moratória). função social, é correto, em nosso
A função primordial da cláusula sentir, o entendimento de que o juiz
penal é previamente fixar o valor da poderá de oficio reduzir o valor da
indenização devida (função cláusula penal, quando houver
compensatória), mas não se pode negar abusividade (artigos 412, 413 e
que tenha também função intimidatória. enunciados JDC 355 e 356).
Por óbvio, com base no princípio “Art. 412. O valor da cominação
imposta na cláusula penal não pode
que veda o enriquecimento sem causa, a exceder o da obrigação principal.
cláusula penal não poderá ultrapassar o Art. 413. A penalidade deve ser
valor da obrigação principal (art. 412). reduzida eqüitativamente pelo juiz se a
Nos termos do art. 410, temos que obrigação principal tiver sido cumprida
a cláusula penal é uma alternativa para o em parte, ou se o montante da penalidade
for manifestamente excessivo, tendo-se
credor, ou seja, ou ele executa ou cobra em vista a natureza e a finalidade do
a cláusula, ou ingressa com uma negócio.”
demanda autônoma. O que não se “IV Jornada de Direito Civil -
afigura possível é fazer as duas coisas Enunciado 355. Não podem as partes
ao mesmo tempo (STJ, AgRg no AG renunciar à possibilidade de redução da
cláusula penal se ocorrer qualquer das
741776/MS).
hipóteses previstas no art. 413 do Código
“Art. 410. Quando se estipular a
Civil, por se tratar de preceito de ordem
cláusula penal para o caso de total
pública.”
inadimplemento da obrigação, esta
“IV Jornada de Direito Civil -
converter-se-á em alternativa a benefício
Enunciado 356. Nas hipóteses previstas
do credor.”
no art. 413 do Código Civil, o juiz
Se o credor entender que a deverá reduzir a cláusula penal de
cláusula penal é insuficiente, alegando ofício.”
que seu prejuízo é maior, poderá pedir
indenização suplementar? Nos termos O que é cláusula de decaimento?
do CC, 416, p. ú., a indenização Inicialmente, friso que consórcio
suplementar só será possível se houver tem regras próprias (Lei n. 11795/2008;
no contrato, expressa previsão neste noticiário STJ de 9-8-2010; AgRg no
sentido (ver tb. JDC, 430: “No contrato REsp 1394973/RS).
de adesão, o prejuízo comprovado do O CDC, em seu art. 53, prevê, em
aderente que exceder ao previsto na contratos de compra e venda de móveis
cláusula penal compensatória poderá ou imóveis, mediante pagamento em
ser exigido pelo credor prestações, bem como nas alienações
independentemente de convenção”.) fiduciárias, a nulidade absoluta da
O art. 411 trata da cláusula penal cláusula de decaimento, aquela que
moratória, caso em que não há um prevê a perda de todas as prestações

85
pagas. Segundo Cristiano Cassetari, se Requisitos da mora do devedor
houver cláusula neste sentido, deve-se (Clóvis Beviláqua):
apurar um percentual justo de perda i) a existência de uma dívida
(10%, 15% etc.). Cf. obra “Multa líquida e certa;
Contratual” de Cristiano Cassetari. Cf. ii) vencimento da dívida;
tb. REsp 1132943/PB. Caso a dívida tenha vencimento
certo, dispensa-se que o credor
3. Inadimplemento relativo (mora) comunique a mora (dies interpelat pro
A mora traduz o inadimplemento homine), caso em que a mora é ex re
relativo da obrigação. Nos termos do (CC, 397, caput).
art. 394, ocorre a mora quando o Todavia, nos termos do CC, 397,
pagamento não é feito no tempo, lugar e p. ú., não havendo termo de
forma convencionados. vencimento, o credor precisará
“CAPÍTULO II comunicar ao devedor que ele está em
Da Mora mora. Neste caso a mora é chamada ex
Art. 394. Considera-se em mora o
devedor que não efetuar o pagamento e
personae.
o credor que não quiser recebê-lo no “Art. 397. O inadimplemento da
tempo, lugar e forma que a lei ou a obrigação, positiva e líquida, no seu
convenção estabelecer.” termo, constitui de pleno direito em mora
o devedor. [mora ex re]
Este dispositivo trata da mora Parágrafo único. Não havendo
solvendi ou debendi, i. é, a mora do termo, a mora se constitui mediante
devedor, bem como a mora do credor, interpelação judicial ou extrajudicial.”
chamada mora credendi ou accipiendi. Obs.: o STJ tem entendido, no
âmbito da alienação fiduciária, que a
3. 1. Mora do credor mora do devedor decorre
Segundo Silvio Rodrigues, a automaticamente do termo de
recuas injustificada do credor pode vencimento, ou seja, é ex re. Cf. AgRg
caracterizar a mora, cujos seus efeitos no AREsp 703060/MG.
estão previstos no art. 400 do CC. iii) culpa do devedor (art. 396);
“Art. 400. A mora do credor [1] iv) viabilidade do cumprimento
subtrai o devedor isento de dolo à tardio da obrigação. Por óbvio, se a
responsabilidade pela conservação da
coisa, [2] obriga o credor a ressarcir as
obrigação torna-se completamente
despesas empregadas em conservá-la, e inviável, não há simples mora, mas
[3] sujeita-o a recebê-la pela estimação inadimplemento absoluto (ver CC, 395,
mais favorável ao devedor, se o seu valor p. ú. e JDC, 162).
oscilar entre o dia estabelecido para o “Art. 395.
pagamento e o da sua efetivação.” Parágrafo único. Se a prestação,
Obs.: havendo mora simultânea devido à mora, se tornar inútil ao credor,
do credor e do devedor, os prejuízos este poderá enjeitá-la, e exigir a
compensam-se (MHD, Washington de satisfação das perdas e danos.”
Barros Monteiro).
3.2.1. Efeitos da mora do devedor
3.2. Mora do devedor Fundamentalmente, a mora do
Mora debendi ou solvendi. Trata- devedor acarreta: responsabilidade civil
se da modalidade mais comum de mora. pelo atraso (CC, 395, caput), e ainda a
A mora do devedor, em linhas gerais, responsabilidade pela integridade da
configura-se quando há retardamento coisa (perpetuatio obligationis), à luz
culposo (atraso) no cumprimento da do art. 399.
“Art. 395. Responde o devedor
obrigação, que ainda interessa ao pelos prejuízos a que sua mora der causa,
credor. mais juros, atualização dos valores
monetários segundo índices oficiais

86
regularmente estabelecidos, e honorários DIREITO DE FAMÍLIA
de advogado. OU
(...)
Art. 399. O devedor em mora
DIREITO DAS FAMÍLIAS
responde pela impossibilidade da
prestação, embora essa impossibilidade
resulte de caso fortuito ou de força 1. Introdução constitucional ao Direito
maior, se estes ocorrerem durante o de Família
atraso; salvo se provar isenção de culpa,
ou que o dano sobreviria ainda quando a
A CRFB/88, art. 226, rompendo
obrigação fosse oportunamente com o paradigma clássico, adotou, à luz
desempenhada.” do princípio da dignidade da pessoa
Obs.: afastando-se do humana, um sistema normativo de
entendimento da antiga STJ, 284, o STJ direito de família aberto, inclusivo e não
passou a entender, cf. se vê no REsp discriminatório. Cf. Paulo Lôbo,
(repetitivo) 1418593/MS que após a Lei Giselda Hironaka, Maria Berenice Dias
n. 10931/2004, nos contratos de etc.
alienação fiduciária, em caso de É fato que a concepção de família
descumprimento da obrigação, o na atualidade rompeu aquele conceito
devedor somente se exonera pagando o sobre o qual se assentou ainda há pouco
débito integral (parcelas vencidas e todo do Direito de Familia, em que esta
vincendas). era um núcleo econômico e de
reprodução. O constituinte, além de
reconhecer como família aquela
Material de Apoio _ Direito Civil_ formada pelo casamento, também a
Pablo Stolze_ Aula11.pdf união estável e a monoparental. Além
Tema avulso sobre obrigações. dessas expressas referências, outros
Duty to mitigate the loss. Deve- arranjos também são admitidos, posto
se à Prof. Vera Jacob de Fradera o que a CRFB impôs um regime aberto,
pioneirismo, em doutrina, na abordagem inclusivo e não discriminatório.
deste tema no âmbito do direito Dada a magnitude social e a
obrigacional (“Pode o credor ser instado profundidade jurídica do conceito de
a mitigar o próprio prejuízo?” RTDC, família, a melhor linha hermenêutica é
Vol. 19). no sentido de que, por consagrar um
Conceito. À luz da boa-fé sistema aberto e inclusivo, a CRFB/88,
objetiva, deve o próprio titular do para além dos núcleos familiares
direito, o credor, atuar na medida do expressamente previstos (casamento,
possível, para mitigar o próprio união estável, núcleo monoparental),
prejuízo. Fala-se então no dever de admite e protege outras formas de
mitigar. O JDC, 169 abraça o instituto, arranjos familiares, a exemplo da
que tem diversas aplicações práticas família homoafetiva.
(“O princípio da boa-fé objetiva deve
levar o credor a evitar o agravamento
do próprio prejuízo.”) 2. Conceito de família
No STJ, cf. REsp1325862/PN; Lembrando Caio Mario da Silva
REsp 1401233/RS; HC 171753/GO. Pereira (“Direito Civil: alguns aspectos
***** de sua evolução”), não há como fixar
um modelo social uniforme de família.
Por isso nenhum conceito é definitivo.
Com essas considerações, arriscamos
Material do Professor - Direito Civil - dizer que família, base da sociedade, é
Pablo Stolze - Aula 11.pdf um núcleo moldado pelo afeto, tendente

87
à estabilidade, na perspectiva do não contratualista e a teoria
princípio da função social. Família é um contratualista.
ente despersonificado, moldado pela Dentre os não contratualistas, os
afetividade, e com a precípua função argumentos variam. Para eles, o
social de permitir a realização pessoal casamento não seria um contrato, mas
dos seus integrantes. um acordo ou negócio complexo, ou um
São características do moderno ato-condição (Duguit), ou uma
conceito de família: instituição (MHD).
a) é sócio-afetiva – moldada, Para os contratualistas (Orlando
preenchida e justificada pelo afeto; Gomes, Silvio Rodrigues, Cristiano
b) é anaparental – é composta Chaves/Nelson Rosenwald), por sua
também por pessoas que não guardam vez, o casamento seria um contrato
vínculo técnico ou consanguíneo entre especial, de Direito de Família. Obs.:
si; Flávio Tartuce e José Simão defendem
c) é eudemonista – à luz da função uma teoria mista ou eclética. O
social, deve servir de ambiente para que casamento é instituição quanto ao
os seus membros busquem a felicidade conteúdo, e contrato especial quanto à
pessoal. Eudemonismo foi uma corrente formação.
filosófica que defendia que o ser
humano deveria procurara a felicidade 4. Pressupostos do Direito de Família
na Terra. Tradicionalmente, a doutrina
A Lei Maria da Pena, em seu art. costumava apontar 3 (três) pressupostos
5º, ao definir a violência doméstica e de existência do casamento:
familiar contra a mulher se utiliza destas a) consentimento;
características da família para delimitar b) celebração por autoridade
sua aplicação. materialmente competente;
c) diversidade de sexos.
3. Casamento Após o julgamento, no STF, da
Art. 1311. O casamento, nos ADI 4277, e da ADPF 132, e ainda com
termos do art. 1511 do CC, estabelece a edição da Resolução 175/2013 do
comunhão plena de vida entre os CNJ, a doutrina afastou o pressuposto
cônjuges, com base na igualdade de da diversidade de sexos. Com isso, no
direitos e deveres. atual estágio do nosso Direito, admite-
se o casamento homoafetivo (ver
3.1. Natureza jurídica do casamento também REsp 1183378/RS).
A matéria é polêmica em Permanecem apenas como
doutrina. Em geral, temos o seguinte pressupostos existenciais do casamento
(cf. Orlando Gomes): o consentimento (art. 1538, I) e a
1ª) corrente publicista – afirma celebração por autoridade
que o casamento é instituto de Direito materialmente competente.
Público. Estão querendo dizer que é ato Obs.: Como vimos, é pressuposto
administrativo, praticado pelo juiz. Não existencial do casamento que a
vingou essa teoria. Apesar de ser regido autoridade celebrante tenha
por normas de ordem pública, é instituto competência legal material, mas se a
de Direito Privado; incompetência é apenas relativa ou
2ª) corrente privatista – segundo a territorial, o casamento é somente
qual o casamento é instituto de Direito anulável, nos termos do art. 1550, VI do
Privado, regido por normas de ordem CC. Vale acrescentar ainda que, à luz do
pública. Dentro dessa corrente, temos princípio da boa-fé e com base na teoria
duas vertentes fundamentais: a teoria da aparência, mesmo ausente

88
competência legal ou material, os Art. 1.517. O homem e a mulher
efeitos do casamento poderão ser com dezesseis anos podem casar,
exigindo-se autorização de ambos os
preservados em respeito à segurança pais, ou de seus representantes legais,
jurídica e inocência dos noivos (art. enquanto não atingida a maioridade civil.
1554 do CC). Parágrafo único. Se houver
divergência entre os pais, aplica-se o
5. Capacidade para o casamento disposto no parágrafo único do art.
1.631.
Também chamada capacidade Art. 1.518. Até à celebração do
núbil. Nos termos do art. 1517, a casamento podem os pais, tutores ou
capacidade para casar é alcançada aos curadores revogar a autorização.
16 anos de idade. No entanto é Art. 1.518. Até a celebração do
indispensável a autorização dos pais ou casamento podem os pais ou tutores
revogar a autorização. (Redação dada
do representante legal pela Lei nº 13.146, de 2015)
(excepcionalmente, do juiz), até que a Art. 1.519. A denegação do
pessoa complete dezoito anos de idade consentimento, quando injusta, pode ser
(cf. artigos 1518 a 1519). suprida pelo juiz.
Obs.: O art. 1520 do CC admite Art. 1.520. Excepcionalmente,
será permitido o casamento de quem
que o juiz possa autorizar casamento
ainda não alcançou a idade núbil (art.
abaixo dos 16 (dezesseis) anos, em caso 1517), para evitar imposição ou
de gravidez, ou para evitar a pena cumprimento de pena criminal ou em
criminal. O fato é que, conforme será caso de gravidez.”
visto em aulas de Direito Penal e
Processo Penal, especialmente após a 6. Deveres do casamento (deveres
reforma do CP (Lei n. 12.015/2009), a matrimoniais)
parte final da norma civil está O art. 1566 do CC trata dos
praticamente esvaziada (ver noticiário deveres decorrentes do casamento.
STJ de 26-8-2014). O inciso V trás o respeito e
Questão especial de concurso. O consideração como supremos deveres
que se entende por esponsais? matrimoniais.
Esponsais consistem no conhecido O inc. IV contempla o sustento,
noivado ou “promessa de casamento”. guarda e educação dos filhos como
Trata-se de tema que tem desafiado a dever legal do casamento.
doutrina desde Antonio Chaves. Nos O inc. III trata da mútua
dias de hoje, a doutrina não apenas assistência como dever dos cônjuges.
enfrenta a temática, mas analisa a Cuida-se, não só da assistência material
repercussão da sua ruptura injustificada. (alimentos), mas também da assistência
A promessa de casamento, quando moral, psicológica e espiritual.
descumprida de forma injustificada, Obs.: quanto aos alimentos, objeto
pode resultar em responsabilidade civil, de aula própria e que, como vimos,
à luz do princípio da boa-fé objetiva. Na emanam do dever de assistência
jurisprudência, cf. TJRJ – AC material, o STJ, quando da dissolução
2001.001.17643; STJ, REsp 251689; do casamento entre cônjuges saudáveis
TJPN, AC 0282469-5. O que e aptos ao trabalho, têm adotado a tese
fundamenta essa tese é a teoria do abuso dos alimentos transitórios (REsp
de direito. 1025769/ MG).
O TJRS, por sua vez, já teve
oportunidade de decidir que ruptura de
namoro não gera responsabilidade civil “CAPÍTULO IX
Da Eficácia do Casamento
(TJRS, AC 78220634).
Art. 1.565. Pelo casamento,
“CAPÍTULO II
homem e mulher [atenção, porque
Da Capacidade para o Casamento

89
atualmente serve também às relações Segundo Orlando Gomes, a
homoafetivas] assumem mutuamente a coabitação representa, mais do que a
condição de consortes, companheiros e
responsáveis pelos encargos da família.
convivência sob o mesmo teto, mas
§ 1º Qualquer dos nubentes, também união carnal (debitum
querendo, poderá acrescer ao seu o conjugale). Trata-se, aliás, de posição
sobrenome do outro. forte na doutrina tradicional (MHD,
§ 2º O planejamento familiar é de Carvalho Santos, Orlando Gomes, etc.).
livre decisão do casal, competindo ao
Estado propiciar recursos educacionais e
Obs.: esta posição sofre crítica da
financeiros para o exercício desse direito, doutrina moderna (Maria Berenice
vedado qualquer tipo de coerção por Dias).
parte de instituições privadas ou Vale registrar o julgado do
públicas. Tribunal de Justiça do RS (AC
Art. 1.566. São deveres de
ambos os cônjuges:
70016807315) que admitiu a anulação
I - fidelidade recíproca; do casamento pelo fato de um dos
II - vida em comum, no cônjuges não haver revelado que
domicílio conjugal; “jamais” teve a intenção de manter
III - mútua assistência; relações sexuais com o outro. Nesse
IV - sustento, guarda e
caso, houve quebra de boa-fé objetiva.
educação dos filhos;
V - respeito e consideração Obs.: “namoro qualificado”.
mútuos. Sobre a coabitação, vale lembrar que
Art. 1.567. A direção da não se trata de pressuposto necessário
sociedade conjugal será exercida, em para a união estável. Aliás,
colaboração, pelo marido e pela mulher,
recentemente, o STJ decidiu que poderá
sempre no interesse do casal e dos filhos.
Parágrafo único. Havendo haver simples “namora qualificado”
divergência, qualquer dos cônjuges mesmo que um casal more sob o mesmo
poderá recorrer ao juiz, que decidirá teto (REsp 1454643/RJ).
tendo em consideração aqueles Dever de fidelidade. Trata-se de
interesses. uma dos mais importantes deveres
Art. 1.568. Os cônjuges são
obrigados a concor-rer, na proporção de matrimoniais, dotado de antigas raízes
seus bens e dos rendimen-tos do (ver Título XXXVIII das Ordenações
trabalho, para o sustento da família e a Filipinas).
educação dos filhos, qualquer que seja o O dever de fidelidade, previsto no
regime patrimonial. art. 1566, I, segundo o pensamento
Art. 1.569. O domicílio do casal
será escolhido por ambos os cônjuges, corrente, é um valor jurídico que guarda
mas um e outro podem ausentar-se do conexão com a monogamia. Segundo
domicílio conjugal para atender a jurisprudência, a violação do dever de
encargos públicos, ao exercício de sua fidelidade pode gerar responsabilidade
profissão, ou a interesses particulares civil. Acrescentamos, todavia, que em
relevantes.
Art. 1.570. Se qualquer dos nosso pensar, a autonomia privada pode
cônjuges estiver em lugar remoto ou não flexibilizar este dever de fidelidade, a
sabido, encarcerado por mais de cento e exemplo do que se dá nas situações de
oitenta dias, interditado judicialmente ou poliamorismo (em que o casal,
privado, episodicamente, de consciência, consensualmente, “abre” a relação de
em virtude de enfermidade ou de
acidente, o outro exercerá com
afeto para outros partícipes, situação em
exclusividade a direção da família, via de ser regulamentada, quanto a
cabendo-lhe a administração dos bens.” uniões estáveis, pelo CNJ).
De que maneira o dever de
Material de Apoio _ Direito Civil_ fidelidade é violado? Apenas pelo
Pablo Stolze_ Aula12.pdf adultério? A forma mais grave é o
adultério (relação sexual espúria – i. é,

90
vedada – com terceiro), que é a relação O TJBA, no julgamento do MS
sexual. Obs.: a doutrina reconhece ainda 34739-8/2005, admitiu a validade
algumas variações para a expressão jurídica e os efeitos civis do casamento
adultério: realizado perante Centro Espírita (ver,
a) “quase-adultério”, que no material de apoio, texto de Dalmo
significa beijos, afagos, carícias, em Dallari).
violão ao dever de fidelidade; Além das formas básicas, temos
b) adultério inocente, casto ou “de ainda as formas especiais de casamento:
seringa” – neste caso, a quebra do dever a) casamento em caso de moléstia
de fidelidade opera-se por meio de uma grave (art. 1539) – pessoa já habilitada
técnica de reprodução assistida não para o casamento mas, na data do
consentida pelo outro; casamento, está de cama. O casamento
c) adultério precoce – ocorre será feito onde a pessoa estiver;
quando um cônjuge abandona o outro, “Art. 1.539. No caso de moléstia
de modo infamante, logo em seguida ao grave de um dos nubentes, o presidente
do ato irá celebrá-lo onde se encontrar o
matrimônio; impedido, sendo urgente, ainda que à
Infidelidade virtual. Trata-se de noite, perante duas testemunhas que
um tema atual e de grande importância. saibam ler e escrever.
A infidelidade virtual, que pode gerar § 1º A falta ou impedimento da
responsabilidade civil, caracteriza-se autoridade competente para presidir o
casamento suprir-se-á por qualquer dos
pelas relações espúrias e proibidas de seus substitutos legais, e a do oficial do
afeto ou intimidade pela via eletrônica Registro Civil por outro ad hoc,
(e-mail, chat, facebook, whatsapp etc.) nomeado pelo presidente do ato.
“Adultério virtual” não seria expressão § 2º O termo avulso, lavrado pelo
feliz, posto que adultério, como antes oficial ad hoc, será registrado no
respectivo registro dentro em cinco dias,
tratado, exige a relação sexual. perante duas testemunhas, ficando
O Prof. Lourival Serejo, no arquivado.”
boletim IBDFAM n. 54, reflete a b) casamento em iminente risco
respeito do avanço tecnológico, a de vida (nuncupativo ou in articulo
proliferação da rede mundial de mortis ou in extremis), cf. art. 1540;
computadores e os reflexos no Direito “Art. 1.540. Quando algum dos
de Família. Nessa linha, há quem contraentes estiver em iminente risco de
mantenha vínculos apenas virtuais de vida, não obtendo a presença da
autoridade à qual incumba presidir o ato,
afeto, caracterizando família digital
nem a de seu substituto, poderá o
(exemplo: programas de casamento ser celebrado na presença de
relacionamento, como o Second Life). seis testemunhas, que com os nubentes
O STJ já entendeu que o amante não tenham parentesco em linha reta, ou,
não tem dever de indenizar o cônjuge na colateral, até segundo grau.”
traído (REsp 982462/SP). Procedimento:
“Art. 1.541. Realizado o
casamento, devem as testemunhas
7. Formas de casamento comparecer perante a autoridade judicial
As formas básicas de casamento mais próxima, dentro em dez dias,
são: civil e religioso com efeitos civis. pedindo que lhes tome por termo a
O Decreto n. 181/1890 oficializou declaração de:
o casamento civil, retirando o I - que foram convocadas por
parte do enfermo;
monopólio da Igreja Católica. A C. de II - que este parecia em perigo de
1934 passaria a admitir também o vida, mas em seu juízo;
casamento religioso com efeitos civis III - que, em sua presença,
(Lei n. 379/37). declararam os contraentes, livre e
espontaneamente, receber-se por marido
e mulher.

91
§ 1º Autuado o pedido e tomadas 7. Impedimentos matrimoniais e causas
as declarações, o juiz procederá às suspensivas do casamento
diligências necessárias para verificar se
os contraentes podiam ter-se habilitado,
As denominadas causas
na forma ordinária, ouvidos os suspensivas do casamento estão
interessados que o requererem, dentro previstas no art. 1523 e, no passado
em quinze dias. (CC/1916) eram tratadas como
§ 2º Verificada a idoneidade dos impedimentos impedientes ou
cônjuges para o casamento, assim o
decidirá a autoridade competente, com
proibitivos.
recurso voluntário às partes. A incidência de uma dessas
§ 3º Se da decisão não se tiver causas suspensivas (art. 1523) resulta
recorrido, ou se ela passar em julgado, não na invalidade do casamento, mas
apesar dos recursos interpostos, o juiz apenas na imposição do regime da
mandará registrá-la no livro do Registro
dos Casamentos.
separação legal ou obrigatória de bens
§ 4º O assento assim lavrado (CC, 1641, I).
retrotrairá os efeitos do casamento, “CAPÍTULO IV
quanto ao estado dos cônjuges, à data da Das causas suspensivas
celebração. Art. 1.523. Não devem casar:
§ 5º Serão dispensadas as I - o viúvo ou a viúva que tiver
formalidades deste e do artigo filho do cônjuge falecido, enquanto não
antecedente, se o enfermo convalescer e fizer inventário dos bens do casal e der
puder ratificar o casamento na presença partilha aos herdeiros; [para evitar
da autoridade competente e do oficial do confusão patrimonial]
registro.” II - a viúva, ou a mulher cujo
casamento se desfez por ser nulo ou ter
c) casamento por procuração (art.
sido anulado, até dez meses depois do
1542); começo da viuvez, ou da dissolução da
“Art. 1.542. O casamento pode sociedade conjugal; [para evitar a
celebrar-se mediante procuração, por confusão de sangue ou turbatio
instrumento público, com poderes sanguinis]
especiais. III - o divorciado, enquanto não
§ 1º A revogação do mandato não houver sido homologada ou decidida a
necessita chegar ao conhecimento do partilha dos bens do casal; [também para
mandatário; mas, celebrado o casamento evitar a confusão patrimonial]
sem que o mandatário ou o outro IV - o tutor ou o curador e os seus
contraente tivessem ciência da descendentes, ascendentes, irmãos,
revogação, responderá o mandante por cunhados ou sobrinhos, com a pessoa
perdas e danos. tutelada ou curatelada, enquanto não
§ 2º O nubente que não estiver em cessar a tutela ou curatela, e não
iminente risco de vida poderá fazer-se estiverem saldadas as respectivas contas.
representar no casamento nuncupativo. Parágrafo único. É permitido aos
§ 3º A eficácia do mandato não nubentes solicitar ao juiz que não lhes
ultrapassará noventa dias. sejam aplicadas as causas suspensivas
§ 4º Só por instrumento público se previstas nos incisos I, III e IV deste
poderá revogar o mandato.” artigo, provando-se a inexistência de
d) casamento celebrado por prejuízo, respectivamente, para o
autoridade diplomática (art. 18 da herdeiro, para o ex-cônjuge e para a
LINDB). pessoa tutelada ou curatelada; no caso do
No que toca ao casamento inciso II, a nubente deverá provar
nascimento de filho, ou inexistência de
celebrado perante autoridade gravidez, na fluência do prazo.
diplomática (art. 18 da LINDB), tema Art. 1.524. As causas suspensivas
de Direito Internacional, trata-se o da celebração do casamento podem ser
matrimônio contraído por brasileiro, argüidas pelos parentes em linha reta de
fora do território nacional, perante a um dos nubentes, sejam consangüíneos
ou afins, e pelos colaterais em segundo
autoridade diplomática. grau, sejam também consangüíneos ou
afins.”

92
Já os impedimentos (art. 1521), “Art. 1.522. Os impedimentos
são mais graves, pois quando violados, podem ser opostos, até o momento da
celebração do casamento, por qualquer
resultam na invalidade do casamento. pessoa capaz.
No CC/1916 os impedimentos Parágrafo único. Se o juiz, ou o
eram tratados no art. 183 de maneira oficial de registro, tiver conhecimento da
peculiar: existência de algum impedimento, será
a) impedimentos dirimentes obrigado a declará-lo.”
públicos ou absolutos (incisos I a VIII); Obs.: no que se refere à proibição
b) impedimentos dirimentes legal de casamento entre colaterais de
privados ou relativos (incisos IX a XII); terceiro grau (ex.: tio e sobrinha), há
c) impedimentos impedientes ou forte entendimento em doutrina no
proibitivos (incisos XIII a XVI). sentido de se admitir excepcionalmente
O CC/2002 simplificou demais o matrimônio, caso haja parecer médico
essas categorias: os impedimento favorável. Base: DL n. 3200/41; JDC,
públicos ou absolutos se tornaram 98.
simplesmente “impedimentos”, Obs. 2: parcela da doutrina
relacionados no art. 1521. Os (Tartuce; Simão) entende que o
impedimentos privados ou relativos, impedimento do inciso VII pressupõe
com algumas mudanças, são tratados transito em julgado da sentença penal
como causas de anulação, e têm como condenatória.
matriz o art. 1550. Já os impedimentos
impedientes ou proibitivos se tornaram 8. Invalidades do casamento
causas suspensivas, vistas acima. Nesse caso, ou nos referimos à
O CC/2002 simplificou a matéria nulidade ou anulabilidade.
tratando dos impedimentos em seu art.
1521. A violação de um impedimento 8.1. Nulidade (casamento nulo)
resulta na nulidade do casamento (art. O art. 1548 regula as hipóteses de
1548, II). nulidade do casamento.
“CAPÍTULO III Ate a entrada em vigor no
Dos Impedimentos Estatuto da Pessoa com Deficiência, o
Art. 1.521. Não podem casar: art. 1548 contemplava duas hipóteses de
I - os ascendentes com os nulidade. Com o estatuto passou a
descendentes, seja o parentesco natural
ou civil; contemplar uma só (violação de
II - os afins em linha reta; [ex.: impedimento), na medida em que a
padrasto com enteada; sogra com genro] deficiência mental não é mais causa de
III - o adotante com quem foi incapacidade civil. Trata-se de uma
cônjuge do adotado e o adotado com revolução.
quem o foi do adotante;
IV - os irmãos, unilaterais ou
bilaterais, e demais colaterais, até o Material de Apoio _ Direito Civil_
terceiro grau inclusive [tio com Pablo Stolze_ Aula13.pdf
sobrinho]; O Art. 1548 do CC disciplina a
V - o adotado com o filho do figura do casamento nulo:
adotante; “Art. 1.548. É nulo o casamento
VI - as pessoas casadas; contraído:
VII - o cônjuge sobrevivente com I - pelo enfermo mental sem o
o condenado por homicídio ou tentativa necessário discernimento para os atos da
de homicídio contra o seu consorte.” vida civil;
Os impedimentos podem ser I - (Revogado); (Redação dada
opostos por qualquer pessoa capaz, até a pela Lei nº 13.146, de 2015)
celebração do casamento. O juiz ou II - por infringência de
oficial também poderá reconhecê-lo de impedimento.”
ofício.

93
Como se pode notar, o Estatuto da seu responsável ou curador. (Incluído
Pessoa com Deficiência (EPD) revogou pela Lei nº 13.146, de 2015)”
o inciso I deste artigo, de forma que Obs.: o § 2º do art. 1550 foi
remanesceu apenas, como hipótese de inserido pelo EPD. Com isso, a pessoa
nulidade, o inciso II (infringência de com deficiência mental ou intelectual
impedimento). passa a ter expresso amparo normativo
Obs.: concordamos com Silvio para casar, desde que manifeste a sua
Venosa no sentido de que a nulidade vontade por si ou por seu curador ou
(absoluta), em matéria de casamento, representante legal. Data venia, a última
não pode ser declarada de ofício. Não parte da norma, que prevê a
se trata de posição unânime, mas muito manifestação de vontade por um
forte na doutrina. terceiro inspira cautela e cuidado.
“Art. 1.549. A decretação de Merecem ainda especial
nulidade de casamento, pelos motivos referência os artigos 1.556 a 1558 que
previstos no artigo antecedente, pode ser cuidam da anulação do casamento por
promovida mediante ação direta, por vício de vontade.
qualquer interessado, ou pelo Ministério “Art. 1.556. O casamento pode
Público.” ser anulado por vício da vontade, se
Até aqui tratamos do casamento houve por parte de um dos nubentes, ao
nulo (art. 1548). As hipóteses de consentir, erro essencial quanto à pessoa
casamento anulável, por sua vez, estão do outro.
previstas fundamentalmente no art. Art. 1.557. Considera-se erro
essencial sobre a pessoa do outro
1550 do CC. cônjuge:
“Art. 1.550. É anulável o I - o que diz respeito à sua
casamento: identidade, sua honra e boa fama, sendo
I - de quem não completou a esse erro tal que o seu conhecimento
idade mínima para casar; ulterior torne insuportável a vida em
II - do menor em idade núbil, comum ao cônjuge enganado;
quando não autorizado por seu II - a ignorância de crime, anterior
representante legal; ao casamento, que, por sua natureza,
III - por vício da vontade, nos torne insuportável a vida conjugal;
termos dos arts. 1.556 a 1.558; III - a ignorância, anterior ao
IV - do incapaz de consentir ou casamento, de defeito físico
manifestar, de modo inequívoco, o irremediável, ou de moléstia grave e
consentimento; transmissível, pelo contágio ou herança,
V - realizado pelo mandatário, capaz de pôr em risco a saúde do outro
sem que ele ou o outro contraente cônjuge ou de sua descendência;
soubesse da revogação do mandato, e IV - a ignorância, anterior ao
não sobrevindo coabitação entre os casamento, de doença mental grave que,
cônjuges; [segundo a doutrina, deveria por sua natureza, torne insuportável a
ser casamento inexistente, mas foi vida em comum ao cônjuge enganado.
declarado anulável pela lei] III - a ignorância, anterior ao
VI - por incompetência da casamento, de defeito físico irremediável
autoridade celebrante. [cf. visto na aula que não caracterize deficiência [esse
passada, se refere a autoridade com ponto a prática tem potencial de gerar
competência material, mas sem muitas discussões sobre o limite entre
competência territorial. Se a defeito físico irremediável e deficiência]
incompetência for material, o casamento ou de moléstia grave e transmissível, por
é inexistente] contágio ou por herança, capaz de pôr
§ 1º Equipara-se à revogação a em risco a saúde do outro cônjuge ou de
invalidade do mandato judicialmente sua descendência; (Redação dada pela
decretada. Lei nº 13.146, de 2015)
§ 2º A pessoa com deficiência IV - (Revogado). (Redação dada
mental ou intelectual em idade núbia pela Lei nº 13.146, de 2015)
poderá contrair matrimônio, expressando Art. 1.558. É anulável o
sua vontade diretamente ou por meio de casamento em virtude de coação, quando

94
o consentimento de um ou de ambos os o cônjuge de má-fé poderá ter de pagar
cônjuges houver sido captado mediante alimentos ao outro (REsp 69108/PR).
fundado temor de mal considerável e
iminente para a vida, a saúde e a honra,
No REsp 789293, o STJ não
sua ou de seus familiares.” admitiu aplicação da teoria da
Obs.: fazer a leitura dos demais putatividade à união estável.
artigos referentes à anulabilidade do *****
casamento.
Finalmente, concluímos que, uma
vez invalidado o casamento (nulo ou
anulável), as partes retornam ao status SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO
quo ante. Vale dizer, filiamo-nos à
corrente doutrinária, segundo a qual,
mesmo em caso de sentença anulatória, 1. Separação
os seus efeitos são ex tunc, razão por Outrora denominada desquite, a
que os cônjuges voltam à condição de separação, nos dias de hoje, após a EC
solteiros (Tartuce, Zeno Veloso, etc.). 66/2010 caiu em flagrante desuso e
Questão especial de concurso. O inutilidade.
que é casamento putativo. Cf. a tese de A separação, nos termos do art.
Yussef Said Cahali. Trata-se do 1576 do CC, apenas desfaz alguns
casamento nulo ou anulável contraído deveres matrimoniais (coabitação e
de boa-fé por um ou ambos os cônjuges fidelidade), mas não dissolve o vínculo
(art. 1561). Entendemos que o juiz matrimonial.
poderá de ofício reconhecer a Quanto às espécies, a separação
putatividade. Na prática, em razão deste poderá ser:
instituto, mesmo que se invalide o a) consensual (art. 1574);
matrimônio, os seus efeitos são b) litigiosa (por causa objetiva –
resguardados para o cônjuge de boa-fé. separação falência e separação remédio;
“Art. 1.561. Embora anulável ou ou por causa subjetiva – discute culpa,
mesmo nulo, se contraído de boa-fé por cf. art. 1572).
ambos os cônjuges, o casamento, em “[separação consensual] Art.
relação a estes como aos filhos, produz 1.574. Dar-se-á a separação judicial por
todos os efeitos até o dia da sentença mútuo consentimento dos cônjuges se
anulatória. forem casados por mais de um ano e o
§ 1º Se um dos cônjuges estava de manifestarem perante o juiz, sendo por
boa-fé ao celebrar o casamento, os seus ele devidamente homologada a
efeitos civis só a ele e aos filhos convenção.
aproveitarão. Parágrafo único. O juiz pode
§ 2º Se ambos os cônjuges recusar a homologação e não decretar a
estavam de má-fé ao celebrar o separação judicial se apurar que a
casamento, os seus efeitos civis só aos convenção não preserva suficientemente
filhos aproveitarão.” os interesses dos filhos ou de um dos
Quando o juiz reconhece a cônjuges.”
putatividade, ele protege quem estava
de boa-fé. “[separação litigiosa] Art. 1572.
Obs.: diferentemente do que se dá (...)
§ 1º A separação judicial pode
no divórcio, entendemos que aqui a também ser pedida se um dos cônjuges
culpa (e a má-fé) repercutirão: o provar ruptura da vida em comum há
cônjuge de má-fé perderá as vantagens mais de um ano e a impossibilidade de
havidas do outro que estava de boa-fé sua reconstituição. [separação falência]
(cônjuge inocente), devendo ainda § 2º O cônjuge pode ainda pedir a
separação judicial quando o outro estiver
cumprir as promessas do pacto acometido de doença mental grave,
antenupcial (Paulo Lobo) e, além disso, manifestada após o casamento, que torne

95
impossível a continuação da vida em posterior aprovação da Lei n. 6.515/77
comum, desde que, após uma duração de (vale dizer, as C. anteriores sempre
dois anos, a enfermidade tenha sido
reconhecida de cura improvável.
consideravam o casamento um vínculo
[separação remédio] indissolúvel).
§ 3º No caso do parágrafo 2º, A CRFB/88, por sua vez, em seu
reverterão ao cônjuge enfermo, que não art. 226, § 6º, contemplaria o divórcio,
houver pedido a separação judicial, os fazendo menção inclusive à separação
remanescentes dos bens que levou para o
casamento, e se o regime dos bens
judicial:
“§ 6º O casamento civil pode ser
adotado o permitir, a meação dos
dissolvido pelo divórcio, após prévia
adquiridos na constância da sociedade
separação judicial por mais de um ano
conjugal. [regra de amortização dos
nos casos expressos em lei, ou
efeitos negativos da separação em favor
comprovada separação de fato por mais
do cônjuge que não pediu a separação]
de dois anos.”
[O art. 6º da Lei n. 6515/77,
consagrava a cláusula de dureza (clause A EC n. 66/2010, em respeito aos
de durete, Härteclause) segundo a qual o princípios da afetividade e da
juiz poderia negar a separação falência intervenção mínima do direito de
ou remédio, se constatasse prejuízo para família, alterou o § 6º do art. 226 da
a prole ou outro cônjuge. O CC/2002 não
tem previsão nessa linha.]”
CRFB, para simplesmente dizer: “O
A modalidade mais tradicional de casamento civil pode ser dissolvido
separação é a litigiosa baseada na culpa pelo divórcio.” Não há mais menção à
do outro cônjuge, cf. art. 1572, caput. separação nem previsão alguma de
“Art. 1.572. Qualquer dos prazos para o divórcio.
cônjuges poderá propor a ação de “§ 6º O casamento civil pode ser
separação judicial, imputando ao outro dissolvido pelo divórcio. (Redação dada
qualquer ato que importe grave violação Pela Emenda Constitucional nº 66, de
dos deveres do casamento e torne 2010)”
insuportável a vida em comum. Obs.: a extinção da separação,
[separação litigiosa por causa mesmo após o CPC/2015, é matéria
subjetiva, baseada na culpa do outro. controvertida. De um lado, a corrente
Cf. art. 1573 abaixo]
não-abolicionista, segundo a qual a
Art. 1.573. Podem caracterizar a
impossibilidade da comunhão de vida a matéria continuaria passível de
ocorrência de algum dos seguintes regulamentação pelas normas
motivos: infraconstitucionais. Ainda nessa linha,
I - adultério; há quem defenda uma posição mitigada,
II - tentativa de morte;
segundo a qual a separação continuaria
III - sevícia ou injúria grave;
IV - abandono voluntário do lar como mera opção ao divórcio. Nessa
conjugal, durante um ano contínuo; linha, Mário Delgado, Luiz Felipe
V - condenação por crime Brasil, Maria Helena Diniz. Cf. também
infamante; o JDC, 514: “”.
VI - conduta desonrosa. E, de outro lado, temos a corrente
Parágrafo único. O juiz poderá
considerar outros fatos que tornem abolicionista, segundo a qual, a partir
evidente a impossibilidade da vida em da EC n. 66/2010, a separação judicial
comum.” não mais teria eficácia dada à ausência
de fundamento constitucional e na
2. Divórcio própria perspectiva do princípio da
O divórcio, diferentemente da vedação ao retrocesso (Paulo Lôbo,
separação, além de extinguir certos Rodrigo Pereira, Maria Berenice Dias,
deveres matrimoniais, rompe o vínculo Flávio Tartuce, R. P. Filho).
que une os cônjuges.
O divórcio somente foi possível Divórcio administrativo. Embora
no Brasil a partir da EC n. 9/77 e com a aspectos de procedimento integrem a

96
grade de processo, merece atenção o
denominado divórcio administrativo (ou
separação administrativa para quem
defende sua manutenção). O divórcio Material de Apoio - Direito Civil -
administrativo, ou extrajudicial, foi Pablo Stolze - Aula14 (II).pdf
consagrado pela Lei n. 11.441/2007, Temas avulsos para concursos
que alterou o CPC/1973, cf. art. 1124- 1. Responsabilidade civil por abandono
A. Hoje a matéria é regulada no art. 733 afetivo
do CPC/2015. A doutrina contemporânea admite
“Art. 733. O divórcio consensual, a projeção dos princípios e normas da
a separação consensual e a extinção responsabilidade civil nas relações de
consensual de união estável, não
havendo nascituro ou filhos incapazes
família. Trata-se de tema atual e
e observados os requisitos legais, polêmico, com reflexos em vários
poderão ser realizados por escritura pontos da jurisprudência, a exemplo da
pública, da qual constarão as disposições responsabilidade derivada da violação
de que trata o art. 731. do dever de fidelidade no casamento.
§ 1º A escritura não depende de
homologação judicial e constitui título
Recomenda-se a leitura da obra
hábil para qualquer ato de registro, bem coletiva, coordenada por Rolf Madaleno
como para levantamento de importância – “Responsabilidade Civil no Direito de
depositada em instituições financeiras. Família”, Editora Atlas,
§ 2º O tabelião somente lavrará a Responsabilidade Civil por Dano
escritura se os interessados estiverem
assistidos por advogado ou por defensor
Afetivo. Trata-se de um tema muito
público, cuja qualificação e assinatura controvertido.
constarão do ato notarial.”
Esta forma de divórcio ou 1.1. O abandono afetivo do pai (ou mãe)
separação administrativa é sempre em face do filho(a) rejeitado(a), gera o
consensual e exige que não haja dever de indenizar?
nascituro ou filhos incapazes (cf. JDC, Trata-se de um tema muito
571 “” e Res. n. 220 de 26-04-2016 do controvertido. Anderson Schreiber
CNJ). (Responsabilidade Civil e Direito de
Ainda sobre o tema, a título de Família: a proposta da reparação não
complementação de pesquisa, confiram- pecuniária) sugere medidas a
se a Resolução n. 35/2007 e também a alternativas à reparação em dinheiro, a
Lei n. 12874/2013 (autoridade consular exemplo da obrigação judicial de o pai
também tem atribuição para lavrar o frequentar ¾ das reuniões na escola do
divórcio ou a separação administrativa). filho.
Obs.: é juridicamente possível o Em nosso sentir, a indenização
“divórcio liminar”? Considerando-se por abandono afetivo – sério dano
que, especialmente após a EC n. afetivo psicológico causado ao filho –
66/2010, o divórcio passou a ser justifica-se à luz do princípio da função
entendido como um direito potestativo social, tendo em vista não apenas sua
incondicionado e não sujeito a prazo, natureza compensatória, mas também
era perfeitamente possível a concessão pedagógica (teoria do desestímulo).
“liminar” à luz do CPC/73, art. 273, § Obs.: merece referência, no
6º. O CPC/2015, por sua vez, de forma âmbito do abandono afetivo e a sua
mais técnica e precisa, admite este repercussão, o “caso Alexandre” (REsp
divórcio automático, como julgamento 757411/MG), pois o tema foi
antecipado parcial de mérito (art. 356, I pioneiramente discutido no STJ e, nesse
do CPC/2015). primeiro momento, a tese foi negada (o
***** desprezo geraria apenas a perda do

97
poder familiar). Sucede que o STJ, (má-fé) da mãe poderá existir
posteriormente passaria a admitir a tese responsabilidade civil.
da responsabilidade civil por abandono A segunda situação é a
afetivo (cf. notíciário STJ de 15/5/2012, responsabilidade civil por falsa
REsp 1159242/SP e REsp atribuição judicial de paternidade.
1557978/DF). Tornou-se célebre a frase Inicialmente é digno de nota que o
da Min. Nancy Andrighi: “amar é exercício do direito de ação é, em
faculdade; cuidar é dever.” essência, legítimo (AgRg no Ag
O STJ, por sua vez, tem sido 704019/DF). Em nosso sentir,
cauteloso na aplicação da tese que exige comprovado o abuso do direito
a detida análise do caso concreto. Vale processual de demandar, poderá haver a
dizer, trata-se de responsabilidade responsabilidade civil. É o que está, em
subjetiva, cujos pressupostos, inclusive tese, com a falsa atribuição de
o dano e o nexo causal devem estar paternidade derivada de um processo
provados (cf. noticiário STJ de 28-12- temerário. Em tal caso, defendemos a
2015). linha de pensamento de que a genitora
Vale acrescentar ainda, nos poderá responder por conta do dolo ou
termos do AgRg no AREsp 766159/MS, má-fé.
haver o STJ entendido que antes do Obs.: o TJDFT foi além,
reconhecimento da paternidade, não há conforme se lê no noticiário de seu
abandono afetivo. Segundo o STJ portal oficial (23-6-2016), ao admitir a
(notícia de 25/9/2012), o prazo responsabilidade civil por falsa
prescricional para se formular pretensão imputação de paternidade em caso de
de responsabilidade civil por abandono simples omissão culposa da genitora ré
afetivo começa a fluir quando o (ela protelava em submeter a criança a
interessado atinge a maioridade. exame de DNA durante muito tempo
Merece referência ainda o PLS n. demandados pelo pai registrário).
700/2007 que pretende disciplinar a
responsabilidade civil por abandono 3. Síndrome do Bebê Sacudido (Shaken
afetivo. Baby Syndrome)
Como sabemos, o princípio
2. Responsabilidade civil por falsa constitucional da proteção à criança e ao
imputação de paternidade adolescente projeta-se na relação de
Primeiramente, é necessário família. Nesse contexto, merece detida
lembrar que imputar significa atribuir. atenção a silenciosa e assustadora S. B.
Nessa linha, pergunta-se: existe S. (ler o artigo “A síndrome do bebê
responsabilidade civil na hipótese em sacudido e o silêncio dos inocentes”).
que uma mãe induz o sujeito a crer na A S. B. S. – cujas vítimas são,
falsa paternidade ou ajuíza demanda principalmente, crianças até 2 (dois)
temerária baseada na mesma falsidade? anos de idade – é causada pela
O primeiro caso é a aceleração e rotação bruscas do crânio,
responsabilidade civil por ou seja, pela indevida movimentação da
reconhecimento voluntário derivado de criança, resultando em lesões
erro. A despeito da sua natureza não intracranianas, que podem levar ao
negocial, o STJ tem admitido a óbito.
invalidação do ato de reconhecimento A interpretação conjugada dos
de filho por erro (REsp 878954/RS). artigos 1643, I e 1638 do CC, não
Em nosso sentir, não sendo caso de hipótese em que a síndrome resulte de
responsabilidade civil objetiva, somente castigo imoderado dos pais, conduz ao
em caso de haver demonstração de dolo reconhecimento de que é possível a

98
destituição do poder familiar, em medida em que o Direito brasileiro
prejuízo da responsabilidade civil (CC, evoluiu para admitir, em certas
186). situações, a supremacia do afeto sobre a
verdade biológica. Descobriu-se que
4. Concubinato “ser pai” ou “ser mãe”é muito mais que
Finalmente, já que estamos ser genitor.
abordando questões especiais de direito O estudo da filiação, por razão
de família, merece atenção o REsp didática, bifurca-se e será analisado em
1185337/RS, que admitiu efeitos dupla perspectiva:
jurídicos típicos da relação de família i) reconhecimento voluntário de
em face do concubinato (relação filhos;
impedida entre amantes). ii) reconhecimento judicial de
Inicialmente, não se deve filhos (ação de investigação de
confundir união estável (relação de paternidade).
família equiparada ao casamentos, com
previsão constitucional e legal) com Material de Apoio _ Direito Civil_
concubinato (relação espúria entre Pablo Stolze_ Aula15 (II).pdf
amantes) e poliamorismo (entidade Material do Professor - Direito Civil -
formada por 3 ou mais pessoas que, Pablo Stolze - Família 2 (II).pdf
aceitando-se, constituem uma relação Material do Professor - Direito Civil -
aberta de afeto – mas sem previsão Pablo Stolze - Família 3 (II).pdf
expressa em lei). Material do Professor - Direito Civil -
O STJ, preponderantemente, Pablo Stolze - Família 4 (II).pdf
prestigia os valores da fidelidade e da 1.1. Reconhecimento voluntário de
monogamia, de maneira, ao menos atual filhos
estágio do nosso Direito, não se tem Nos termos do art. 1.609, o
reconhecido direitos de família à amante reconhecimento voluntário de filhos
(concubina ou concubino). Esta tem poderá se dar:
sido a regra geral. a) registro de nascimento;
No referido REsp 1185337, o STJ, b) escrito público ou escrito
entendendo tratar-se de caso particular, a ser arquivado em cartório;
peculiaríssimo, reconheceu, em favor da c) testamento;
concubina de 70 anos, direito aos d) declaração perante o juiz.
alimentos. O Ministro invocou os Observações:
princípios da dignidade e da 1) Nos termos do p. ú. do art.
solidariedade humanas, e observou que 1.609, o reconhecimento pode preceder
a relação durou 40 anos. o nascimento do filho (exemplo:
***** nascituro), ou ser posterior ao seu
falecimento, se ele deixou descendentes
(para evitar reconhecimento
FILIAÇÃO interesseiro).
“Art. 1.609. O reconhecimento
dos filhos havidos fora do casamento é
irrevogável e será feito:
1. Filiação I - no registro do nascimento;
O princípio que deve nortear o II - por escritura pública ou
nosso estudo, em primeiro plano, é o da escrito particular, a ser arquivado em
igualdade entre os filhos (CRFB, 227, § cartório;
6º). III - por testamento, ainda que
incidentalmente manifestado;
Também merece referência, como IV - por manifestação direta e
veremos, o princípio da afetividade, na expressa perante o juiz, ainda que o

99
reconhecimento não haja sido o objeto gravitando em torno da filiação: ação
único e principal do ato que o contém. anulatória de registro (REsp
Parágrafo único. O
reconhecimento pode preceder o
878954/RS), ação declaratória de
nascimento do filho ou ser posterior ao falsidade de registro (também chamada
seu falecimento, se ele deixar reivindicatória de paternidade) e a ação
descendentes.” negatória de paternidade.
2) Caso o reconhecimento do filho
seja feito por menor relativamente 1.2.1. Ação investigatória de
incapaz, entendemos ser desnecessário a paternidade
assistência do genitor(a) uma vez que Trata-se de uma ação
realiza, ao reconhecer, um ato jurídico imprescritível. A legitimidade ativa é do
em sentido estrito (e não ato negocial: suposto filho (investigado) ou do MP.
cf. Marcos Bernardes de Mello). Inclusive, o filho adotado poderá
Todavia, se for absolutamente incapaz, manejar a investigatória para buscar a
entendemos em tese, ser indispensável sua verdade biológica (AgRg
procedimento judicial com intervenção 942352/SP).
do MP. Vale acrescentar ainda, nos
Vale lembrar ainda que, o termos do art. 1.606, que a demanda
reconhecimento de filho é um ato investigatória tem caráter
formal, espontâneo, irrevogável, personalíssimo, podendo, os herdeiros
incondicional e personalíssimo do investigante continuar a ação.
(personalíssimo no sentido de que não “Art. 1.606. A ação de prova de
pode, alguém, salvo procurador com filiação compete ao filho, enquanto
poderes especiais (LRP, 59), reconhecer viver, passando aos herdeiros, se ele
morrer menor ou incapaz.
o meu filho por mim). Parágrafo único. Se iniciada a
*A L8560 trata do procedimento ação pelo filho, os herdeiros poderão
oficioso de reconhecimento de continuá-la, salvo se julgado extinto o
paternidade. processo.”
Nos termos do art. 1614, o filho Obs.: O STJ tem admitido, em
maior não pode ser reconhecido sem o uma leitura mais justa e conforme a
seu consentimento, e o menor poderá CRFB do art. 1.606, que o netos possam
impugnar o reconhecimento nos quatro diretamente ajuizar a demanda
anos que se seguirem à maioridade ou investigatória em face do avô para
emancipação. buscar o reconhecimento da relação
“Art. 1.614. O filho maior não avoenga (AR 336/RS; AgRg no Ag
pode ser reconhecido sem o seu 131933/MG). Caso o pai ainda seja
consentimento, e o menor pode impugnar vivo, não se tem admitido a
o reconhecimento, nos quatro anos que
se seguirem à maioridade, ou à
investigação de relação avoenga.
emancipação.” Quanto à legitimidade passiva, a
Obs.: Na busca da verdade real, demanda investigatória deve ser
este prazo de quatro anos para o filho proposta em face do suposto pai ou, se
que foi reconhecido menor impugnar a morto, dos seus herdeiros (ação de
paternidade, pode ser flexibilizado investigação post mortem).
(REsp 601997/RS e 9398181/RS). Obs.: o art. 1.615 prevê que
qualquer pessoa com justo interesse
1.2. Reconhecimento judicial de filhos “pode contestar o pedido formulado na
Em regra, este tema nos remete ao investigatória.
estudo da ação investigatória de “Art. 1.615. Qualquer pessoa, que
justo interesse tenha, pode contestar a
paternidade. Mas lembramos que em ação de investigação de paternidade, ou
Direito de Família existem outras ações maternidade.”

100
Quanto à instrução probatória é “Desbiologizar o direito de
inegável a suprema importância do Família.” João Batista Villela. Significa
exame de DNA, cf. REsp 397013/MG. reconhecer, especialmente que a
A exceção do concubinato plúrimo paternidade socioafetiva pode superar a
(alegação de que a mulher se relacionou biológica. A jurisprudência brasileira,
com outros homens) perdeu muito a sua com destaque no STJ, tem admitido, em
força. certas situações, a supremacia da
O que se dá quando o réu se paternidade socioafetiva sobre a
recusa a se submeter ao exame de biológica. REsp 1189663/RS; REsp
DNA? Nos termos da STJ, 301 (“Em 1128539/RN e, recentemente, o STF
ação investigatória, a recusa do suposto reconheceu a repercussão geral no RE
pai a submeter-se ao exame de DNA 898060, em que se discute a tese da
induz presunção juris tantum de supremacia da paternidade sócio afetiva.
paternidade.”), e da Lei n. 8560/92 NR Finalmente, merece especial
Lei n. 12.004/2009, art. 2º-A, p. ú, a referência a tese da multiparentalidade.
recusa injustificada ao exame gera uma Trata-se da situação em que o indivíduo
presunção relativa de paternidade. tem, ao mesmo tempo, mais de um pai
Nessa linha, o STJ também já entendeu e/ou mãe, produzindo-se efeitos
que, caso haja a recusa, a presunção não jurídicos em face de todos eles.
gera um reconhecimento automático da
paternidade, exigindo-se mínimos
elementos de prova da relação
(noticiário STJ de 12-11-2014; REsp Material de Apoio - Direito Civil - João
557365/RO). Aguirre - União Estável.pdf
Obs.: na grade de processo serão Material de Apoio - Direito Civil - João
analisados aspectos relativos ao tema Aguirre - União Estável Aula 4 On line
como competência e coisa julgada, que (II).pdf
devem ser enfrentados. Na mesma Material de Apoio - Direito Civil - Joâo
linha, recomendamos a leitura, na Aguirre - Aula 04 - Complemento Aula 4 On
apostila, do tópico referente ao tema line (II).pdf
“paternidade alimentar”. Direito de Família Exercícios (1).pdf

1.3. Fases da paternidade (evolução do UNIÃO ESTÁVEL


paradigma da paternidade)
1) paternidade legal ou jurídica –
a lei estabelecia uma presunção quase I) Breve histórico
absoluta de que pai seria o marido da O marco paradigmático sobre a
genitora (CC/1916, artigos 338, 339 e união estável, inclusive cunhando a
342), período que estava compreendido terminologia própria, é a CRFB/88,
do início do séc. XX ao início dos anos quando ela foi alçada ao status de
1980; entidade familiar.
2) paternidade biológica ou No período anterior, a
científica – por conta do exame de terminologia utilizada era concubinato,
DNA, caberia à ciência dizer que seria o relação concubinária, não sendo
pai, ou seja, este seria sempre o genitor; considerada uma família. O CC/1916
3) paternidade sócio-afetiva – em tratava do concubinato, mas para
que se reconhece em certos casos a cercear direitos em relação ao cônjuge.
supremacia do afeto sobre a verdade do Uma tentativa de amenizar a
sangue. dureza do tratamento discriminatório
estava retratada na STF, 380, que

101
ascendia o status do concubinato a uma direitos da personalidade do morto) e
sociedade de fato. Mas apenas com a 1647, por exemplo.
CRFB é que o paradigma existencialista Já o CPC/2015 foi mais
do direito constitucional e civil- cuidadoso. Exemplo é o art. 53, I que,
constitucional, que se passa a tutelar tratando da competência para ações, já
como família a união estável. se lembrou da união estável. Da mesma
Assim foi o histórico da união forma outros dispositivos trataram
estável: do nada jurídico, passando pelo expressamente da união estável.
pretitium carnis e, depois, para receber
indenização como se empregada II) Conceito
doméstica fosse até que, por fim, com a Cf. art. 1723, é a união
STF, 380, reconhecendo uma sociedade duradoura, pública, contínua, entre
de fato em que, ainda assim, era homem e mulher, com o objetivo de
necessário fazer a prova do sacrifício constituir família.
comum. Atenção! Na ADI 4277/DF e na
Mesmo com a previsão ADPF 132/RJ o STF já decidiu que a
constitucional (art. 226, § 3º), devido à união estável homossexual, ou
força da tradição, se negava sua homoafetiva (MHD), é família
autoaplicação do dispositivo, de forma merecedora da proteção do Estado.
que foram necessárias duas leis para Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona
fazer valer o direito, qual sejam as Leis trazem como elementos caracterizadores
n. 8971/94 e n. 9728/96. Nesta última se da união estável:
fixou que não existia mais prazo para A) elementos essenciais
que se firmasse a união estável. (requisitos):
Posteriormente, veio o CC/2002, - estabilidade (duradoura);
que revogou, ainda que tacitamente, os - publicidade;
dispositivos das duas últimas leis acima, - continuidade;
mantendo-se delas apenas a - objetivo de constituir família.
competência da Vara de Famílias para B) elementos acidentais:
o trâmite das ações a elas relativas. Cf. - tempo (no sentido de rigidez,
CC, 1923 a 1727, 1694 e seguintes pré-determinado pelo legislador);
(alimentos) e 1790. - prole;
“CAPÍTULO VII - coabitação.
DA FAMÍLIA, DA CRIANÇA, DO Análise dos elementos essenciais:
ADOLESCENTE E DO IDOSO
Da Família, da Criança, do Adolescente,
a) estabilidade da relação – a
do Jovem e do Idoso relação deve se protrair no tempo. Mas
(Redação dada Pela Emenda não se exige um prazo determinado pela
Constitucional nº 65, de 2010) norma para sua caracterização (cf. REsp
Art. 226. A família, base da 1194059-SP: lei não exige tempo
sociedade, tem especial proteção do
Estado.
mínimo, nem convivência sobre o
(...) mesmo teto, mas exige publicidade,
§ 3º Para efeito da proteção do continuidade, convivência e objetivo de
Estado, é reconhecida a união estável constituir família);
entre o homem e a mulher como b) publicidade – as relações
entidade familiar, devendo a lei facilitar
sua conversão em casamento.
clandestinas não se coadunam com a
(....)” união estável.
Podem ser ainda feitas algumas Deve-se tornar público o objetivo
críticas ao CC/2002, pois há omissão de constituição de família. O projeto
em relação ao companheiro nos artigos futuro de constituição de família não
12 e 18 (relacionados à lesão aos caracteriza uma união estável. Cf. REsp

102
1263015/RN entendeu-se haver um persistir. Contudo, ainda é uma visão
namoro qualificado, mas não constituiu forte na doutrina e jurisprudência.
união estável). 3º momento) distinção entre união
c) continuidade da relação – ideia estável e concubinato com o advento do
que o relacionamento deve se prolongar, CC/2002:
não podendo haver rupturas, mas que UNIÃO ESTÁVEL CONCUBINATO
- CC, 1723: a união - CC, 1727:
não se confundindo com pequenas a) duradoura; a) as relações não eventuais
brigas onde acabam fazendo as pazes. b) pública; entre duas pessoas
c) contínua; impedidas de casar
d) objetivo de constituir família – d) entre duas pessoas; constituem concubinatos.
é a construção de um projeto existencial e) com o objetivo de Nesse caso não há família.
constituir família. Essa relação não gera
pautado no afeto, solidariedade, vida em A união estável é família, direito a alimentos,
comum, formação de patrimônio – dando direitos a alimentos, sucessão e regime de bens.
sucessão e regime de bens. Quando muito, teremos
mesmo que naturalmente, sem um uma sociedade de fato,
projeto escrito ou bem definido. Cf. cuja ação de
reconhecimento é de
REsp 1.381609/MG dizendo que não se competência da vara cível.
caracterizou a união estável por “TÍTULO III
ausência de requisitos. DA UNIÃO ESTÁVEL
Análise dos elementos acidentais: Art. 1.723. É reconhecida como
entidade familiar a união estável entre
a) prole – é possível a o homem e a mulher, configurada na
caracterização de união estável sem convivência pública, contínua e
filhos. duradoura e estabelecida com o
b) coabitação – significa vida em objetivo de constituição de família.
comum sob o mesmo teto. Cf. REsp § 1º A união estável não se
constituirá se ocorrerem os
1194059/SP; STF, 382 “A vida em impedimentos do art. 1.521; não se
comum sob o mesmo teto more uxorio, aplicando a incidência do inciso VI
não é indispensável à caracterização do no caso de a pessoa casada se achar
concubinato [=união estável].” separada de fato ou judicialmente.
(...)”
III – Distinção entre concubinato e Assim é que a caracterização da
união estável união estável exige a inexistência de
1º momento) pré CRFB: apenas impedimento matrimonial, salvo duas
concubinato (expressão derivada do exceções:
latim onde tinha o significado “divisão - pessoa separada judicial ou
de leito”, em sentido amplo; extrajudicialmente;
Em sentido estrito, significava - pessoa separada de fato.
qualquer relação duradoura entre *Obs. lateral: permanece a dúvida sobre
homem e mulher, sem casamento, e que a permanência ou não da possibilidade
tivesse a comunhão de vida. da separação após a EC 66/ . A maioria
2º momento) com a CRFB/88, a da doutrina, juntamente com
união estável passou a ser uma entidade posicionamento do CNJ, entende que
familiar. não subsiste mais o instituto.
Segundo Álvaro Villaça Pessoa casada com outra relação
Azevedo, temos: duradoura:
1ª Posição 2ª Posição
a) concubinato puro – entre Concubinato, cf. art. União estável, cf. art.
homem e mulher não impedidos de 1727. São uniões 1729, § 1º. A pessoa é
casar (união estável); paralelas. Cf. STF RE casada, mas
b) concubinato impuro – entre 397762/BA. No STJ, efetivamente separada
pessoas impedidas de casar. cf. REs 1096539/RS e de fato.
REsp 1157273/RN.
Para o Professor, após o CC/2002
essa distinção não mais teria razão de Interessante é o fato de que parte
da doutrina entende que a união estável
103
gera um estado, reconhecível como segundo a qual nenhuma das duas é
“convivente” ou “unido estavelmente”. união estável.
Já a maioria entende que não gera um Por outro lado, havendo má-fé de
novo estado, mantendo-se o estado uma das companheiras, teríamos os
anterior (casado, separado efeitos de um concubinato.
judicialmente, divorciado, solteiro).
IV – Efeitos patrimoniais da união
IV – Efeitos pessoais da união estável estável
Deveres Deveres Segundo o art. 1725, aplica-se à
Casamento União Estável união estável o regime da comunhão
Art. 1.566. São Art. 1.724. As
parcial, no que couber (essa ressalva, o
deveres de ambos os relações pessoais
cônjuges: entre os companheiros grande problema!), salvo contrato
I - fidelidade obedecerão aos escrito (contrato de convivência).
recíproca; deveres de lealdade, O contrato de convivência:
II - vida em comum, respeito e assistência, 1) por instrumento particular –
no domicílio e de guarda, sustento
tem efeitos entre os conviventes;
conjugal; e educação dos filhos.
III - mútua 2) por instrumento público -
assistência; efeitos com relação a terceiros.
IV - sustento, guarda É necessária a autorização do
e educação dos companheiro para a prática dos atos do
filhos; art. 1647 do CC? São os atos que
V - respeito e
consideração mútuos. demandam a vênia conjugal, também
Quanto ao sustento dos filhos, chamada outorga uxória ou marital.
“Art. 1.647. Ressalvado o
vale dizer que é um dever mais em disposto no art. 1.648, nenhum dos
relação ao estado de parentesco que cônjuges pode, sem autorização do outro,
propriamente do casamento união exceto no regime da separação absoluta:
estável. I - alienar ou gravar de ônus real
Fidelidade e lealdade são a mesma os bens imóveis;
II - pleitear, como autor ou réu,
coisa? Para a doutrina majoritária, a acerca desses bens ou direitos;
fidelidade é gênero, do qual lealdade e III - prestar fiança ou aval;
consideração são espécies. IV - fazer doação, não sendo
O único dever que não é correlato remuneratória, de bens comuns, ou dos
é a necessidade de vida em comum no que possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as
domicílio conjugal (mais uma vez, cf. doações nupciais feitas aos filhos quando
STF, 382). casarem ou estabelecerem economia
Admitindo-se que a lealdade separada.”
compreende o dever de fidelidade, Os argumentos geralmente
como ficam duas uniões estáveis elencados são:
paralelas? Numa primeira situação, - a norma restritiva deve ser
tendo-se em conta a boa-fé das duas interpretada restritivamente. Assim, a
companheiras, deveria ser aplicada por norma co CC, 1647 só é aplicável ao
analogia a norma do art. 1561 do CC, casamento;
relativa ao casamento putativo, - o STJ tem entendimento que se
preservando-se as duas uniões estáveis aplica também à união estável, pois se
(posição majoritária, como Rolf trata de norma que protege a família
Madaleno, Euclides de Oliveira e (RESp 755830/SP).
Rodrigo da Cunha Pereira, sem Fazendo o cotejo com o art. 70 do
manifestação jurisprudencial até hoje). CPC,
Uma segunda posição é a de MHD, “Art. 73. O cônjuge necessitará do
consentimento do outro para propor ação

104
que verse sobre direito real imobiliário, duradoura e estabelecida com o objetivo
salvo quando casados sob o regime de de constituição de família.
separação absoluta de bens. (...)
§ 1º Ambos os cônjuges serão § 2º As causas suspensivas do
necessariamente citados para a ação: art. 1.523 não impedirão a
I - que verse sobre direito real caracterização da união estável.”
imobiliário, salvo quando casados sob o A maior parte da doutrina entende
regime de separação absoluta de bens; que não se aplica o regime da separação
II - resultante de fato que diga
respeito a ambos os cônjuges ou de ato
obrigatória ao maior de 70 (setenta)
praticado por eles; anos na união estável (cf. MBD, Zeno
III - fundada em dívida contraída Veloso, Flávio Tartuce, Paulo Lobo
por um dos cônjuges a bem da família; etc.). Contudo o STJ tem entendido pela
IV - que tenha por objeto o aplicação do regime da separação
reconhecimento, a constituição ou a
extinção de ônus sobre imóvel de um ou
obrigatória ao companheiro
de ambos os cônjuges. (temperando com o entendimento da
§ 2º Nas ações possessórias, a STF, 377: “No regime de separação
participação do cônjuge do autor ou do legal de bens, comunicam-se os
réu somente é indispensável nas adquiridos na constância do
hipóteses de composse ou de ato por
ambos praticado.
casamento.”), cf. REsp 1171820/PR e
§ 3º Aplica-se o disposto neste REsp 1090722/SP.
artigo à união estável comprovada nos *****
autos.”
Ver o art. 74 do novo CPC, e
especialmente este art. 73. Percebe-se
que o legislador de 2015 estendeu para DOS ALIMENTOS
a união estável, pelo menos quanto à
legitimação para ações, o quanto do
CC/2002 previu para o casamento. 1. Conceito
Aplica-se o regime da separação São prestações devidas para a
obrigatória de bens do art. 1651 do CC satisfação das necessidades pessoais
à união estável estável? daquele que não pode provê-las pelo
“Art. 1.641. É obrigatório o próprio trabalho.
regime da separação de bens no
casamento:
I - das pessoas que o contraírem 2. Fundamento
com inobservância das causas É o princípio da solidariedade, na
suspensivas da celebração do perspectiva social dos alimentos:
casamento; [basicamente, não se encontramos em Flávio Tartuce a
aplicam as causas suspensivas à união
menção ao fundamento previsto na
estável]
II - da pessoa maior de sessenta CRFB, 6º:
anos; “Art. 6º São direitos sociais a
II – da pessoa maior de 70 educação, a saúde, a alimentação, o
(setenta) anos; (Redação dada pela Lei nº trabalho, a moradia, o transporte, o lazer,
12.344, de 2010) [não se aplica à união a segurança, a previdência social, a
estável] proteção à maternidade e à infância, a
III - de todos os que dependerem, assistência aos desamparados, na forma
para casar, de suprimento judicial.” desta Constituição. (Redação dada pela
“TÍTULO III Emenda Constitucional nº 90, de 2015)”
DA UNIÃO ESTÁVEL No REsp 933355/SP (caso da
Art. 1.723. É reconhecida como psicóloga dos Jardins), no qual o STJ
entidade familiar a união estável entre o decidiu que os alimentos entre cônjuges
homem e a mulher, configurada na têm caráter excepcional, e não devem
convivência pública, contínua e
ser mantidos para manter o parasitismo
de um dos membros.
105
“SUBTÍTULO III pagamento, não prove que o efetuou ou
Dos Alimentos não apresente justificativa da
[neste capítulo trata-se dos impossibilidade de efetuá-lo, o juiz
alimentos nas relações de família, e não mandará protestar o pronunciamento
naqueles decorrente de atos ilícitos] judicial, aplicando-se, no que couber, o
Art. 1.694. Podem os parentes, os disposto no art. 517.
cônjuges ou companheiros pedir uns aos § 2º Somente a comprovação de
outros os alimentos de que necessitem fato que gere a impossibilidade absoluta
para viver de modo compatível com a de pagar justificará o inadimplemento.
sua condição social, inclusive para § 3º Se o executado não pagar ou
atender às necessidades de sua educação. se a justificativa apresentada não for
§ 1º Os alimentos devem ser aceita, o juiz, além de mandar protestar o
fixados na proporção das necessidades pronunciamento judicial na forma do §
do reclamante e dos recursos da pessoa 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1
obrigada. (um) a 3 (três) meses.
§ 2º Os alimentos serão apenas os § 4º A prisão será cumprida em
indispensáveis à subsistência, quando a regime fechado, devendo o preso ficar
situação de necessidade resultar de culpa separado dos presos comuns.
de quem os pleiteia.” [lembrar do § 5º O cumprimento da pena não
exemplo dos dois irmãos que receberam exime o executado do pagamento das
a mesma herança milionária, e um deles prestações vencidas e vincendas.
gasta ela toda com drogas e mulheres, § 6º Paga a prestação alimentícia,
enquanto o segundo a mantém e, no o juiz suspenderá o cumprimento da
futuro, o pródigo vem a pedir pensão ordem de prisão.
para seu irmão] § 7º O débito alimentar que
autoriza a prisão civil do alimentante é o
3. Classificação que compreende até as 3 (três) prestações
anteriores ao ajuizamento da execução e
1) Quanto às fontes as que se vencerem no curso do
- alimentos legais – ou alimentos processo.
familiares (CC, 1694 e ss), com vínculo § 8º O exequente pode optar por
relacionado ao Direito de Família, dos promover o cumprimento da sentença ou
quais pode decorrer a prisão civil do decisão desde logo, nos termos do
disposto neste Livro, Título II, Capítulo
alimentante; III, caso em que não será admissível a
- alimentos convencionais – que prisão do executado, e, recaindo a
decorrem do direito contratual, como penhora em dinheiro, a concessão de
aqueles expressos em uma escritura efeito suspensivo à impugnação não
pública de divórcio ou de união estável. obsta a que o exequente levante
mensalmente a importância da prestação.
De início estabeleceu-se a dúvida § 9º Além das opções previstas no
se seria possível a prisão civil do art. 516, parágrafo único, o exequente
devedor de alimentos convencionais. pode promover o cumprimento da
Mas com o advento do CPC/2015: sentença ou decisão que condena ao
“CAPÍTULO IV pagamento de prestação alimentícia no
DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA juízo de seu domicílio.”
QUE RECONHEÇA A “CAPÍTULO VI
EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DA EXECUÇÃO DE ALIMENTOS
DE PRESTAR ALIMENTOS Art. 911. Na execução fundada
Art. 528. No cumprimento de em título executivo extrajudicial que
sentença que condene ao pagamento de contenha obrigação alimentar, o juiz
prestação alimentícia ou de decisão mandará citar o executado para, em 3
interlocutória que fixe alimentos, o juiz, (três) dias, efetuar o pagamento das
a requerimento do exequente, mandará parcelas anteriores ao início da
intimar o executado pessoalmente para, execução e das que se vencerem no seu
em 3 (três) dias, pagar o débito, provar curso, provar que o fez ou justificar a
que o fez ou justificar a impossibilidade impossibilidade de fazê-lo.
de efetuá-lo. Parágrafo único. Aplicam-se,
§ 1º Caso o executado, no prazo no que couber, os §§ 2º a 7º do art.
referido no caput, não efetue o 528.

106
Art. 912. Quando o executado a) alimentos naturais, necessários
for funcionário público, militar, diretor ou indispensáveis – visam a
ou gerente de empresa, bem como
empregado sujeito à legislação do
manutenção da sobrevivência. Eram a
trabalho, o exequente poderá requerer o regra no CC/1916, e passaram a exceção
desconto em folha de pagamento de no CC/2002 (cf. art. 1694, § 2º):
pessoal da importância da prestação “§ 2º Os alimentos serão apenas
alimentícia. os indispensáveis à subsistência, quando
§ 1º Ao despachar a inicial, o a situação de necessidade resultar de
juiz oficiará à autoridade, à empresa ou culpa de quem os pleiteia.” [cf.
ao empregador, determinando, sob anotações no início desse tema]
pena de crime de desobediência, o b) alimentos civis ou côngruos –
desconto a partir da primeira visam a manutenção da condição social,
remuneração posterior do executado, a
contar do protocolo do ofício.
inclusive o pagamento com despesas de
§ 2º O ofício conterá os nomes e educação (regra no CC/2002, cf. art.
o número de inscrição no Cadastro de 1694, caput):
Pessoas Físicas do exequente e do “SUBTÍTULO III
executado, a importância a ser Dos Alimentos
descontada mensalmente, a conta na Art. 1.694. Podem os parentes, os
qual deve ser feito o depósito e, se for o cônjuges ou companheiros pedir uns aos
caso, o tempo de sua duração. outros os alimentos de que necessitem
Art. 913. Não requerida a para viver de modo compatível com a
execução nos termos deste Capítulo, sua condição social, inclusive para
observar-se-á o disposto no art. 824 e atender às necessidades de sua
seguintes, com a ressalva de que, educação.”
recaindo a penhora em dinheiro, a
concessão de efeito suspensivo aos 3. Quanto ao tempo
embargos à execução não obsta a que o
exequente levante mensalmente a
a) alimentos pretéritos – não
importância da prestação.” podem ser cobrados, pois não foram
como se vê, com o CPC/2015, fixados ou por sentença ou por acordo
observando-se o quanto previsto no art. das partes;
911, p. ú., a inadimplência dos b) presentes – exigidos no
alimentos convencionais pode momento;
ocasionar a prisão civil do devedor. c) futuros – são os pendentes.
- alimentos indenizatórios -
também chamados “ressarcitórios” ou 4. Quanto à forma de pagamento
“indenitários”, que são decorrentes de a) alimentos próprios ou in natura
ato ilícito. Como decorrem dos artigos – são os alimentos pagos através de
948 (homicídio, caso em que outras hospedagem, alimentação, vestuário
pessoas pedem alimentos, que não a etc.;
vítima) a 950 (lesão que inabilita a b) alimentos impróprios – pagos
vítima par ao trabalho ou diminui sua através de pensão.
“Art. 1.701. A pessoa obrigada a
capacidade laborativa), também são
suprir alimentos poderá pensionar o
legais, mas a doutrina não se refere a alimentando, ou dar-lhe hospedagem e
eles por essa forma, cf. se viu acima. sustento, sem prejuízo do dever de
STJ tem entendimento pacificado de prestar o necessário à sua educação,
que não cabe prisão civil do devedor de quando menor.”
alimentos ressarcitórios (cf. HC
182228/SP e HC92110/DF). 5. Alimentos quanto à sua finalidade
a) alimentos definitivos ou
3. Classificação dos alimentos quanto a regulares
sua extensão b) alimentos provisórios –
previsto na Lei n. 5478/68, que
estabelece rito especial, que exige a
107
comprovação documental da filiação que o fez ou justificar a impossibilidade
(certidão de nascimento; certidão de de efetuá-lo.
(...)
casamento; obs.: a escritura pública de § 3º Se o executado não pagar ou
união estável nem sempre é documento se a justificativa apresentada não for
hábil, pois esta é situação de fato); aceita, o juiz, além de mandar protestar o
c) alimentos provisionais – outras pronunciamento judicial na forma do §
ações, como v. g., a ação de 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1
(um) a 3 (três) meses.”
investigação de paternidade (cf. Lei n.
Como o CPC não revogou
8560/92, art. 9º);
expressamente, e a Lei n. 5478/68 é
Observações:
especial, alegam alguns que não teria
1) a Lei n. 5478/68, Lei de
ocorrido revogação. O STJ tem decisões
Alimentos, continua em vigor, tendo o
nos dois sentidos. Acredita-se que o
novo CPC revogado os seus artigos 16 a
prazo de 1 (um) a 3 (três) meses tende a
18, cf. se percebe da norma expressa no
prevalecer.
art. 1.072 do CPC/2015:
“Art. 1.072. Revogam-se: d) alimentos gravídicos – fixados
(...) pela Lei n. 11.804/08. O art. 1º dessa
V - os arts. 16 a 18 da Lei no Lei estabelece que os alimentos
5.478, de 25 de julho de 1968; e gravídicos são devidos à mulher
(...)” gestante. Contudo, há aqueles que
2) e o art. 19 da Lei n. 5478/68? O entendem que o titular dos alimentos é o
CPC/2015 não resolveu a questão do nascituro (Silmara Chinelato e Flávio
prazo da prisão civil do devedor de Tartuce).
alimentos. Para este, o prazo máximo é e) alimentos transitórios -
de 60 dias, enquanto no novo CPC é de correspondem ao estágio atual da
3 meses: jurisprudência do STJ, sendo exigidos
“Art. 19. O juiz, para instrução da
causa ou na execução da sentença ou do por determinado tempo, até a reinserção
acordo, poderá tomar todas as do alimentando no mercado de trabalho
providências necessárias para seu (cf. a decisão prolatada no REsp
esclarecimento ou para o cumprimento 1025769/MG). O caso mais comum é o
do julgado ou do acordo, inclusive a do planejamento de um projeto de vida
decretação de prisão do devedor até 60
(sessenta) dias.
familiar, em que os dois tenham as suas
§ 1º O cumprimento integral da profissões, inclusive com sucesso, mas
pena de prisão não eximirá o devedor do um abre mão em razão do sucesso
pagamento das prestações alimentícias, profissional do outro ou para cuidar da
vincendas ou vencidas e não pagas. prole, geralmente atingindo a mulher.
§ 2º Da decisão que decretar a
prisão do devedor, caberá agravo de
f) alimentos compensatórios –
instrumento. tese levantada por Rolf Madaleno, que
§ 3º A interposição do agravo não vem sendo aceita por nossos Tribunais,
suspende a execução da ordem de no qual os alimentos servem para
prisão.” compensar um desequilíbrio econômico
“CAPÍTULO IV
DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
experimentado com o padrão de vida
QUE RECONHEÇA A anterior. Esses alimentos devem ser
EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO pagos de forma indenizatória em valor
DE PRESTAR ALIMENTOS único, para evitar o parasitismo.
Art. 528. No cumprimento de
sentença que condene ao pagamento de
4. Características
prestação alimentícia ou de decisão
interlocutória que fixe alimentos, o juiz, i) direito personalíssimo – os
a requerimento do exequente, mandará alimentos são intuito personae, não se
intimar o executado pessoalmente para, transferindo automaticamente aos
em 3 (três) dias, pagar o débito, provar herdeiros do credor;

108
ii) reciprocidade – parentes, “Art. 1.698. Se o parente, que
cônjuges e companheiros devem deve alimentos em primeiro lugar, não
estiver em condições de suportar
alimentos reciprocamente; totalmente o encargo, serão chamados a
Observações: concorrer os de grau imediato
1) até onde se estende a obrigação [complementação]; sendo várias as
alimentar entre parentes? Em regra, pessoas obrigadas a prestar alimentos,
temos as normas dos artigos 1696 e todas devem concorrer na proporção dos
respectivos recursos, e, intentada ação
1697 que apresentam uma ordem a ser contra uma delas, poderão as demais ser
seguida: 1º) ascendentes; 2º) chamadas a integrar a lide.”
descendentes (ou seja, ordem inversa da Exemplo: dois estudantes de
sucessão...); 3º) colaterais até o 2º grau, Direito, estagiários, cada um morando
ou seja, até os irmãos (no que difere da com seus pais. Não ficou muito claro
herança, quando alcança até o 4º qual seria a modalidade de intervenção
grau...) de terceiro aplicável. Não caberia
“Art. 1.696. O direito à prestação denunciação da lide nem ação de
de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo a todos os regresso, nem chamamento ao
ascendentes, recaindo a obrigação nos processo, porque nenhum dos casos
mais próximos em grau, uns em falta de previstos em lei para estas espécies seria
outros. aplicável. Até hoje não é muito claro, e
Art. 1.697. Na falta dos alguns defendem que seria uma
ascendentes cabe a obrigação aos
descendentes, guardada a ordem de intervenção sui generis a espera de
sucessão e, faltando estes, aos irmãos regulamentação legal.
[colaterias de segundo grau], assim “V Jornada de Direito Civil -
germanos como unilaterais.” Enunciado 523. O chamamento dos
Boa parte da doutrina, como codevedores para integrar a lide, na
forma do art. 1.698 do Código Civil,
MBD, entende que essa limitação até o pode ser requerido por qualquer das
segundo grau para fins de alimentos o partes, bem como pelo Ministério
fundamenta no fato de que até o 4º grau Público, quando legitimado.”
podem receber herança (“se tem o No REsp 964866 também se
bônus, herança, devem ter o ônus, que referiu a chamamento.
são os alimentos”). Contudo esse No JDC, 342, percebe-se que os
entendimento não é o do STJ, que alimentos avoengos são:
acompanha a letra da Lei, de que não há “V Jornada de Direito Civil -
obrigação alimentar entre tio e sobrinho, Enunciado 342. Observadas suas
condições pessoais e sociais, os avós
cf. REsp 1032846/RS; somente serão obrigados a prestar
2) Existe obrigação alimentar alimentos aos netos em caráter exclusivo,
decorrente da parentalidade sucessivo, complementar e não-solidário
socioafetiva? quando os pais destes estiverem
“IV Jornada de Direito Civil - impossibilitados de fazê-lo, caso em que
Enunciado 341. Para os fins do art. as necessidades básicas dos alimentandos
1.696, a relação socioafetiva pode ser serão aferidas, prioritariamente, segundo
elemento gerador de obrigação o nível econômico-financeiro de seus
alimentar.” genitores.”
Hoje em dia, inclusive, é muito Ou seja, a situação dos netos não
comum a lavratura de escritura pública pode representar um salto qualitativo
de reconhecimento de parentalidade que não represente um nível superior ao
socioafetiva. padrão dos pais. Afere-se a situação dos
3) e a pensão avoenga? Sim, é pais para medir a pensão aos netos.
possível, mas ela é subsidiária e ii) irrenunciabililidade – o CC,
complementar: 1.707 dispõe sobre a irrenunciabilidade
dos alimentos, cf. STF, 379. Mas essa

109
súmula é muito antiga (remonta a São as relações jurídicas
década de 1960, fazendo referência ao estabelecidas entre pessoas que mantêm
desquite), e o STJ reiteradamente a entre si um vínculo familiar, sobretudo
aceitava a renúncia entre cônjuges. Mas de afetividade.
adveio o CC/2002: Esse vínculo familiar, sobretudo
“Art. 1.707. Pode o credor não de afetividade trata do conceito de
exercer, porém lhe é vedado renunciar família.
o direito a alimentos, sendo o respectivo
crédito insuscetível de cessão,
compensação ou penhora.” 2. Formas de parentesco
Ou seja, houve um retrocesso “Art. 1593. O parentesco é
natural ou civil, conforme resulte de
nesse ponto. Rolf Madaleno e Silvio consanguinidade ou de outra origem.”
Rodrigues entenderam que era um “Art. 1.595. Cada cônjuge ou
retrocesso, pois não seria cabível as companheiro é aliado aos parentes do
pessoas maiores poderem dele se outro pelo vínculo da afinidade.
desfazer (para o caso de cônjuges e § 1º O parentesco por afinidade
limita-se aos ascendentes, aos
companheiros). Foram acompanhados descendentes e aos irmãos do cônjuge
pelo entendimento das JDC, em ou companheiro.
enunciado de Guilherme Calmon: § 2º Na linha reta, a afinidade
“III Jornada de Direito Civil - não se extingue com a dissolução do
Enunciado 263. O art. 1.707 do Código casamento ou da união estável.”
Civil não impede seja reconhecida válida Nesses dispositivos temos as três
e eficaz a renúncia manifestada por forma de parentalidade:
ocasião do divórcio (direto ou indireto)
ou da dissolução da "união estável". A i) parentesco natural, sanguíneo
irrenunciabilidade do direito a alimentos ou consanguíneo – a expressão
somente é admitida enquanto subsistir “natural” é alvo de crítica, porque
vínculo de Direito de Família.” segundo ela os demais parentescos
Cf. STJ, 336: “A mulher que seriam artificiais (MBD, Tartuce). É
renunciou aos alimentos na separação estabelecido através do vínculo
judicial tem direito à pensão biológico, que ganhou muita força com
previdenciária por morte do ex-marido, a descoberta do DNA na década de
comprovada a necessidade econômica 1980;
superveniente.” O entendimento é que ii) parentesco por afinidade – CC,
essa súmula admite tacitamente a 1595. É aquele que se estabelece entre
renúncia. Contudo, em provas objetivas cônjuge/companheiro e os parentes do
de concurso é melhor responder de outro cônjuge/companheiro;
acordo com a Lei, porque existe iii) parentesco civil – “outra
entendimento do STJ no AgRg no Ag origem”, cf. art. 1593. Quais são essas
668207/MG contra a renúncia. outras origens?
a) adoção – é regida pelo ECA,
tanto para a pessoa menor quanto para o
Material de Apoio - Direito Civil - João maior (cf. CC, 1618 e 1619, NR Lei de
Aguirre - Aula 5 On line (II).pdf adoção – L12010/2009, que revogou
Material de Apoio 2 - Direito Civil - várias normas de adoção do CC,
João Aguirre - Aula Online_Parte III harmonizando os sistemas);
Aula 5 On Line (II).pdf “Art. 1.618. A adoção de crianças
Material_Professor_artigo_regime_de_b e adolescentes será deferida na forma
ens_ Aula 5 On line (II).pdf prevista pela Lei no 8.069, de 13 de julho
de 1990 - Estatuto da Criança e do
Adolescente. (Redação dada pela Lei nº
PARENTESCO 12.010, de 2009)”
“Art. 1.619. A adoção de maiores
1. Conceito de 18 (dezoito) anos dependerá da

110
assistência efetiva do poder público e de sem o nome. No ordenamento francês,
sentença constitutiva, aplicando-se, no se há o nome e o tratamento, o vínculo
que couber, as regras gerais da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto
de parentalidade se torna inatacável.
da Criança e do Adolescente. (Redação Na tese de Fachin é feita uma
dada pela Lei nº 12.010, de 2009)” distinção entre parentalidade jurídica,
estabelecida nos termos da norma (v. g.,
b) técnicas de reprodução a presunção de paternidade do CC,
assistida (técnicas de RA), para as quais 1597: pater is est) , biológica (que
o legislador foi atécnico ao utilizar decorre do DNA) e sócio-afetiva (que
termos relacionados a essa situação. decorre das relações de afeto).
Para as técnicas de RA não há No âmbito do STF temos a
regras legais, mas aquelas do Conselho repercussão geral reconhecida em que
Federal de Medicina, sendo a última a há prevalência da paternidade
Res. n. 2121/2015. socioafetiva sobre a biológica (ARE
c) socioafetividade: 692186 RG/PB).
“IV Jornada de Direito Civil - No STJ, quanto à questão
Enunciado 339. A paternidade relacionada à paternidade socioafetiva, a
socioafetiva, calcada na vontade livre,
não pode ser rompida em detrimento do
prevalência da paternidade socioafetiva
melhor interesse do filho.” pode ser conferida no REsp 709608/MS
“V Jornada de Direito Civil - e, da maternidade socioafetiva no REsp
Enunciado 519. O reconhecimento 1000356/SP.
judicial do vínculo de parentesco em
virtude de socioafetividade deve ocorrer
a partir da relação entre pai(s) e filho(s),
3. Filiação
com base na posse do estado de filho,
para que produza efeitos pessoais e 3.1. Conceito
patrimoniais.” É a relação jurídica decorrente do
O primeiro doutrinador que tratou parentesco por consanguinidade ou
do tema da parentalidade socioafetiva outra origem, estabelecida entre os
foi João Baptista Vilela. Luiz Edson ascendentes e os descendentes de
Fachin, em sua tese de doutoramento, primeiro grau. É a relação de pai e filho.
também tratou dessa temática. Na norma fundamental do art.
A posse do estado de filho exige 227, § 6º da CRFB, temos o princípio
três requisitos para sua caracterização: da igualdade da filiação:
1) nome; “Art. 227. É dever da família, da
2) tratamento; sociedade e do Estado assegurar à
criança, ao adolescente e ao jovem, com
3) fama ou reputação.
absoluta prioridade, o direito à vida, à
Se a pessoa carrega o nome de saúde, à alimentação, à educação, ao
família daquela pessoa com quem quer lazer, à profissionalização, à cultura, à
estabelecer o vínculo de parentalidade; dignidade, ao respeito, à liberdade e à
se se dão respectivamente o tratamento convivência familiar e comunitária, além
de pai e filho; se a sociedade os vê de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração,
como pai e filho, então temos a relação violência, crueldade e opressão.
de pai e filho. (Redação dada Pela Emenda
O caso em que geralmente se nega Constitucional nº 65, de 2010)”
essa relação ocorre quando o casal briga “§ 6º Os filhos, havidos ou não da
e homem recebe a informação que o relação do casamento, ou por adoção,
terão os mesmos direitos e qualificações,
filho é de outro. proibidas quaisquer designações
Existe um abrandamento do discriminatórias relativas à filiação.”
primeiro requisito, pelo qual a posse do O art. 1597, I e II nos apresenta da
estado de filho pode ser caracterizada presunção de paternidade, que

111
remontam ao Direito Romano, sendo a nascido dentro dos trezentos dias a
primeira a) mater semper certa est (a contar da data do falecimento deste e, do
segundo, se o nascimento ocorrer após
mãe sempre é certa) e a segunda b) esse período e já decorrido o prazo a que
pater is est quem nuptiae demonstrat (é se refere o inciso I do art. 1597.”
pai aquele que as núpcias demonstram, Voltando ao art. 1597
ou seja, o pai é o marido da mãe no “Art. 1.597. Presumem-se
momento da concepção). concebidos na constância do casamento
Atualmente, as duas presunções os filhos:
(...);
são relativizadas, como retratado no III - havidos por fecundação
REsp 355392/RJ, acerca da troca de artificial homóloga, mesmo que falecido
bebês na maternidade. o marido;
As referidas presunções, mesmo IV - havidos, a qualquer tempo,
apesar de tantas questões que as quando se tratar de embriões
excedentários, decorrentes de concepção
refutem, ainda são regras postas do art. artificial homóloga;
1597, I e II. V - havidos por inseminação
“Art. 1.597. Presumem-se artificial heteróloga, desde que tenha
concebidos na constância do casamento prévia autorização do marido.”
os filhos: Todos os termos sublinhados
I - nascidos cento e oitenta dias,
pelo menos, depois de estabelecida a acima foram utilizados de forma
convivência conjugal; atécnica, na verdade se tratando de
II - nascidos nos trezentos dias técnicas de reprodução assistida
subsequentes à dissolução da sociedade (técnicas de RA).
conjugal, por morte, separação judicial, Técnica homóloga. Tem o
nulidade e anulação do casamento;
(...)” material genético dos donos do projeto
Na Lei n. 8560/92, ainda vigente, parental. Exemplo: sêmen do marido e
está previsto que, em registro de menor óvulos da esposa.
apenas com a maternidade estabelecida Técnica heteróloga. Aquela que
etc..., a presunção do art. 1597, II, vale vai utilizar o material genético de
para quem? A pergunta decorre da terceiro, a exemplo do sêmen de um
redação do caput, que se refere apenas doador e óvulos da esposa.
ao casamento. Dessa forma, criança que O Código Civil, como adotou
nasceu fruto de uma união estável, caso paradigmas romanos, não tratou da
o pai não esteja presente, não pode o possibilidade do material genético que
nome dele ser registrado, conforme a não da esposa, e também da gestação
maior parte da doutrina. Ou seja, nessa por substituição.
“I Jornada de Direito Civil -
linha de raciocínio a presunção do art. Enunciado 104. No âmbito das técnicas
1597, II não caberia para a união de reprodução assistida envolvendo o
estável. emprego de material fecundante de
Trata-se de uma questão terceiros [reprodução assistida
polêmica: aplica-se a presunção dos hetoróloga, art. 1597, V], o pressuposto
fático da relação sexual é substituído
incisos I e II do art. 1597 à união pela vontade (ou eventualmente pelo
estável? Segundo Tartuce, sim, havendo risco da situação jurídica matrimonial)
precedente do STJ no RESp juridicamente qualificada, gerando
1.194.059/SP, em que se aplicou a presunção absoluta ou relativa de
presunção do inciso II do art. 1597. paternidade no que tange ao marido da
“Art. 1.598. Salvo prova em mãe da criança concebida, dependendo
contrário, se, antes de decorrido o prazo da manifestação expressa (ou implícita)
previsto no inciso II do art. 1.523 da vontade no curso do casamento.”
[causas suspensivas], a mulher contrair “III Jornada de Direito Civil -
novas núpcias e lhe nascer algum filho, Enunciado 258. Não cabe a ação prevista
este se presume do primeiro marido, se no art. 1.601 do Código Civil se a

112
filiação tiver origem em procriação estável? Sim, para a maior parte da
assistida heteróloga, autorizada pelo doutrina (Paulo Lobo, MBD, Tartuce,
marido nos termos do inc. V do art.
1.597, cuja paternidade configura
Rodrigo da Cunha Pereira).
presunção absoluta.” Embriões excendetários. Na ADI
O art. 1.601 é o permite a 3510/DF foi autorizado o uso das
propositura de ação negatória de células tronco embrionárias para
paternidade: pesquisa científica e terapia. Obs.: a
“Art. 1.601. Cabe ao marido o comercialização dessas células tronco é
direito de contestar a paternidade dos crime (L9434/97, art. 15).
filhos nascidos de sua mulher, sendo tal 2) Pode-se criar um “cardápio
ação imprescritível.
Parágrafo único. Contestada a
genético” ou um “cardápio de
filiação, os herdeiros do impugnante têm esperma”? A doutrina é pacífica no
direito de prosseguir na ação.” sentido que NÃO, pois esse cardápio
Quando o JDC, 104 diz ser responderia ao que se chama eugenia,
absoluta ou relativa, o que a doutrina além de que há proibição expressa na
tem entendido é que, tratando-se de Res. CFM n. 2121/2015.
reprodução assistida heteróloga com a Além disso, a L11105/2005 (Lei
autorização do marido, a presunção de de Biossegurança), art. 6º, proíbe
paternidade é absoluta, e não cabe ação expressamente a clonagem humana (IV)
negatória de paternidade, tendo em vista e a engenharia genética em célula
a proibição do comportamento germinal humana, zigoto humano e
contraditório (venire contra factum embrião humano (III). O mesmo está
proprium). proibido pela lei n. 9434/97 (proíbe a
Na Res. CFM n. 2121/2015 há comercialização do material).
previsão da necessidade de autorização 3) é possível ao casal
expressa do marido. O médico não deve homossexual recorrer às técnicas de
fazer o procedimento sem a autorização RA? SIM, cf. STJ, REsp 1281093/SP,
expressa. Se ocorrer a prática sem sua questão essa que perdeu ainda mais a
autorização expressa, deve-se perquirir sua polêmica com a decisão da ADI
sobre sua intenção, daí a possibilidade 4277/DF, julgada conjuntamente com a
de presunção relativa. ADPF 132/RJ.
Observações paralelas sobre a 4) é lícita a chamada “barriga de
ação negatória de paternidade e a aluguel”? A expressão é infeliz, porque
parentalidade socioafetiva: o útero não pode ser alugado por
- O STJ possui um entendimento vedação legal (mesmo a que consta da
bastante consolidado, segundo o qual a Res. 2121/2005, “doação temporária de
ação negatória de paternidade deve útero”). Prefere-se a expressão
provar a) a inexistência da origem “gestação em substituição”, chamado
biológica e, cumulativamente, que b) negócio jurídico existencial, no qual
não se tenha constituído um vínculo de teremos como partes os donos do
socioafetividade (cf. REsp projeto parental (que pode ser uma
1059214/RS); pessoa apenas ou um casal), a genetrix
- O pai não pode desconstituir o (fornece o material genético) e a
vínculo após caracterizada a gestratix (fornece o útero).
socioafetividade (cf. REsp Nesse tipo de contrato não há
1088157/PB); direito de arrependimento.
Questões polêmicas sobre “JDC, 129 – Proposição para
parentalidade: inclusão de um art. no final do Cap. II,
Subtítulo II, Cap. XI, Título I, do Livro
1) as presunções dos art. 1597, IV, com a seguinte redação: Art. 1.597-
incisos III, IV e V aplicam-se à união A. “A maternidade será presumida pela

113
gestação. Parágrafo único. Nos casos de lançou a seguinte tese: a separação
utilização das técnicas de reprodução obrigatória é o gênero, do qual são
assistida, a maternidade será estabelecida
em favor daquela que forneceu o
espécies a separação legal, do art. 1641,
material genético, ou que tendo e a separação convencional, decorrente
planejado a gestação, valeu-se da técnica da autonomia privada. O raciocínio
de reprodução assistida heteróloga.” decorre do direito sucessório, por conta
***** do art. 1829, I, segunda parte.
“Art. 1.829. A sucessão legítima
defere-se na ordem seguinte:
(Vide Recurso Extraordinário nº
646.721) (Vide Recurso Extraordinário
REGIME DE BENS nº 878.694)
I - aos descendentes, em
concorrência com o cônjuge
1. Regime de bens sobrevivente, salvo se casado este com o
É o estatuto jurídico que regula as falecido no regime da comunhão
universal, ou no da separação obrigatória
relações econômicas entre cônjuges ou de bens (art. 1.640, parágrafo único)
companheiros e também às suas [deveria ser 1641]; ou se, no regime da
relações com terceiros. Exemplos: a comunhão parcial, o autor da herança
vênia conjugal do art. 1647 do CC. não houver deixado bens particulares;”
Em 2015 consolidou-se o
2. Regimes de bens entendimento da 2ª Seção do STJ de
a) comunhão parcial – é o “regime que a separação total é gênero, e a
legal” desde 26-12-1977, data em que separação obrigatória e a convencional
entrou em vigor a Lei de Divórcio; constituem suas espécies. Portanto, o
b) comunhão universal; cônjuge casado pela separação
c) separação total; e convencional concorre com os
d) participação final nos aquestos. descendentes do falecido sobre a sua
Para escolha dos três últimos herança, enquanto isso não ocorre na
regimes são necessários o pacto separação obrigatória, ou seja, o
antenupcial. entendimento clássico. Cf. REsp
Dicas: 1382170/SP e, tb. no EREsp
1) a comunhão universal era o 1472945/RJ
regime legal até o advento da Lei n. A separação de bens, ou
6515/77 (Lei do Divórcio). Aqui deve separação total é o gênero, do qual são
ser tomado bastante cuidado com a data espécies:
do casamento, porque é uma pegadinha a) separação convencional: CC,
de concurso. 1687 e 1688, resultando de um acordo;
2) é possível se escolher um “CAPÍTULO VI
Do Regime de Separação de Bens
regime misto, o que deve ser feito Art. 1.687. Estipulada a separação
através do pacto antenupcial; de bens, estes permanecerão sob a
3) regime de separação total. Para administração exclusiva de cada um dos
a maioria, o regime de separação total é cônjuges, que os poderá livremente
gênero, que abrange duas espécies: a) alienar ou gravar de ônus real.
Art. 1.688. Ambos os cônjuges
obrigatória/legal (determinado por lei, e são obrigados a contribuir para as
imposta aos nubentes cf. art. 1641) e b) despesas do casal na proporção dos
convencional, que decorre do acordo de rendimentos de seu trabalho e de seus
vontades, expressão da autonomia bens, salvo estipulação em contrário no
privada. pacto antenupcial.”
Em 2009, a Min. Nacy Andrighi, b) separação obrigatória ou
como relatora no Resp 992742/MS, legal: cf. CC, 1641, imposto por Lei (a
ideia é a tutela de um cônjuge que esteja
114
em situação de vulnerabilidade em haveria comunicação. Para alguns
relação ao outro). (minoritário – Cahali e Aguirre), ela não
“Art. 1.641. É obrigatório o estaria mais vigente. Cf. AgRg no REsp
regime da separação de bens no 1008684/RJ e o REsp 1199790/MG, e
casamento:
I – das pessoas que o contraírem
aplica-se à união estável, cf. AgRg no
com inobservância das causas AREsp 675912/SC.
suspensivas da celebração do casamento; Admitindo-se que a STF, 377
II - da pessoa maior de sessenta aplica-se à união estável, esta não se
anos; tornou uma comunhão parcial, já que o
II – da pessoa maior de 70
(setenta) anos; (Redação dada pela Lei nº
texto da súmula não faz a ressalva para
12.344, de 2010) a comunicação ocorrer apenas aos
III – de todos os que adquiridos onerosamente? NÃO: o STJ
dependerem, para casar, de faz a interpretação que a comunicação
suprimento judicial.” se dá pelos bens adquiridos a título
oneroso.
3. Separação obrigatória ou legal Mas existe dúvida sobre haver ou
Art. 1641. É obrigatório o regime não presunção do esforço comum no
da separação: contexto da súmula, ou a prova do
“Art. 1.641. É obrigatório o
regime da separação de bens no
esforço comum se faz necessária para a
casamento: sua aplicação? No AgRg no AREsp
I – das pessoas que o contraírem 675912/SC, bem como no REsp
com inobservância das causas 140419/MG, exigiu-se a prova do
suspensivas da celebração do esforço comum. No AgRg no REsp
casamento;
1008684 se entendeu pela presunção do
II – da pessoa maior de 70
(setenta) anos; esforço comum.
III – de todos os que dependerem,
para casar, de suprimento judicial.” 4. Pacto antenupcial
Vários doutrinadores entendem Contrato solene e sob condição,
que o inc. II é inconstitucional, mas não através do qual os nubentes podem
o STF, que o entende como norma disciplinar as questões patrimoniais do
protetiva. casal. As questões patrimoniais são a
Questões importantes: escolha do regime de bens, e até a
1) aplica-se o regime da separação formulação de um regime misto.
obrigatória para a união estável (cf. Características:
REsp 1383624/MG e REsp i) contrato solene – exige escritura
1369860/PR; na doutrina, há divisão: a pública, referindo-se ao plano da
favor da aplicação, Zeno Veloso e validade, e sua falta acarreta nulidade
Guilherme Calmon Nogueira da Gama; pela falta da forma prescrita em lei (CC,
contra, Franscisco José Cahali e 1653).
Euclides de Oliveira); Serão três cartórios:
2) STF, 377: “No regime da a) tabelionato de notas, onde
separação legal de bens, comunicam-se haverá lavratura do pacto antenupcial;
os adquiridos na constância do b) registro civil das pessoas
casamento.” Esta súmula refere-se ao naturais, onde o pacto antenupcial será
regime da separação obrigatória. A registrado para produzir efeitos entre os
razão de ser dela, que é de 1964, referia- cônjuges;
se ao “alçapão” (expressão de Silvio c) registro de imóveis do
Rodrigues), pois o CC/1916 tinha uma domicílio dos cônjuges, para produzir
armadilha: se não se colocasse no pacto efeitos perante terceiros (art. 1657).
que os aquestos não se comunicariam,

115
ii) contrato sob condição - iii) o juiz deve apurar a
segundo o CC, 1653, o pacto é ineficaz, procedência das razões e ressalvar os
se não lhe seguir o casamento. Plano da interesses de terceiros.
eficácia, já que se trata de uma condição Na alteração, há ineficácia com
suspensiva; relação aos credores anteriores à
Questão polêmica: é possível alteração do regime de bens. O
disciplinar questões de direito pessoal CPC/2015 previu a necessidade de
no pacto antenupcial? SIM! Contudo, serem publicados editais em seu art.
devem ser respeitados os princípios 734, § 1º, recebendo várias críticas,
gerais e os requisitos de validade dos tendo em vista que a ação refere-se a
negócios jurídicos (boa-fé objetiva, conteúdo existencial do casal, que
função social do contrato etc.) terceiros não deveriam ter direito de
Exemplo de questão de direito influir:
pessoal: escolha do colégio em que os “Art. 734. A alteração do regime
filhos estudarão de bens do casamento, observados os
requisitos legais, poderá ser requerida,
Cuidado! Não tem validade a motivadamente, em petição assinada por
cláusula de renúncia a direitos ambos os cônjuges, na qual serão
hereditários (art. 426 proíbe a expostas as razões que justificam a
celebração de contrato sobre herança de alteração, ressalvados os direitos de
pessoa viva). Também inválida a terceiros.
§ 1º Ao receber a petição inicial, o
cláusula de renúncia a alimentos (art. juiz determinará a intimação do
1707 proíbe a renúncia aos alimentos, Ministério Público e a publicação de
ainda que admita a renúncia posterior). edital que divulgue a pretendida
“CAPÍTULO II alteração de bens, somente podendo
Do Pacto Antenupcial decidir depois de decorrido o prazo de 30
Art. 1.653. É nulo o pacto (trinta) dias da publicação do edital.
antenupcial se não for feito por escritura § 2º Os cônjuges, na petição
pública, e ineficaz se não lhe seguir o inicial ou em petição avulsa, podem
casamento. propor ao juiz meio alternativo de
Art. 1.654. A eficácia do pacto divulgação da alteração do regime de
antenupcial, realizado por menor, fica bens, a fim de resguardar direitos de
condicionada à aprovação de seu terceiros.
representante legal, salvo as hipóteses de § 3º Após o trânsito em julgado
regime obrigatório de separação de bens. da sentença, serão expedidos mandados
Art. 1.655. É nula a convenção ou de averbação aos cartórios de registro
cláusula dela que contravenha disposição civil e de imóveis e, caso qualquer dos
absoluta de lei. cônjuges seja empresário, ao Registro
Art. 1.656. No pacto antenupcial, Público de Empresas Mercantis e
que adotar o regime de participação final Atividades Afins.”
nos aqüestos, poder-se-á convencionar a
livre disposição dos bens imóveis, desde 6. Vênia conjugal
que particulares.
Art. 1.657. As convenções Art. 1647 do CC. É a necessária
antenupciais não terão efeito perante autorização do outro cônjuge para a
terceiros senão depois de registradas, em prática dos atos previstos no art. 1.647.
livro especial, pelo oficial do Registro de Denomina-se outorga uxória ou marital.
Imóveis do domicílio dos cônjuges.” “Art. 1.647. Ressalvado o
disposto no art. 1.648, nenhum dos
5. Alteração do regime de bens cônjuges pode, sem autorização do outro,
CC, 1639, § 2º permite a alteração exceto no regime da separação absoluta:
I - alienar ou gravar de ônus real
do regime de bens, nas seguintes os bens imóveis [quaisquer que sejam,
condições: mesmo que não façam parte da
i) judicial; comunhão, i. é, não tenham se
ii) pedido motivado; comunicado];

116
II - pleitear, como autor ou réu, Material de Apoio - Direito Civil - João
acerca desses bens [imóveis] ou direitos; Aguirre - Guarda 5 (Aula Extra On Line
III - prestar fiança ou aval;
IV - fazer doação, não sendo
I).pdf
remuneratória, de bens comuns, ou dos
que possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as
doações nupciais feitas aos filhos quando GUARDA
casarem ou estabelecerem economia
separada.”
A vênia conjugal é obrigatória nos
regimes de comunhão parcial, 1. Estatuto da Criança e Adolescente
Capítulo III
comunhão universal, na participação Do Direito à Convivência Familiar e
final nos aquestos (desde que não Comunitária
afastada no pacto antenupcial) e na Seção I
separação legal. Disposições Gerais
“Art. 1.656. No pacto antenupcial, “Art. 19. É direito da criança e
que adotar o regime de participação final do adolescente ser criado e educado no
nos aqüestos, poder-se-á convencionar a seio de sua família e,
livre disposição dos bens imóveis, desde excepcionalmente, em família
que particulares.” substituta, assegurada a convivência
A vênia conjugal não é obrigatória familiar e comunitária, em ambiente
que garanta seu desenvolvimento
no regime de separação absoluta de integral. (Redação dada pela Lei
bens. O STJ tem exigido a vênia nº 13.257, de 2016)”
conjugal nos casos da STF, 377. Cf. Assim: a regra é a manutenção
REsp 1199790/MG. junto com a família.
“Art. 1.649. A falta de Observação. Em alguns países é
autorização, não suprida pelo juiz,
quando necessária (art. 1.647), tornará
possível que a educação dos filhos seja
anulável o ato praticado, podendo o outro feita em casa, com professores
cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois particulares. Em nosso País, não é
anos depois de terminada a sociedade possível, tendo em vista o direito
conjugal. fundamental à educação, expresso tanto
Parágrafo único. A aprovação
torna válido o ato, desde que feita por
na CRFB quanto no ECA, sendo direito
instrumento público, ou particular, da criança e dever dos pais matricular e
autenticado.” garantir a frequência regular dos filhos
Obs.: STJ, 332: A fiança prestada na rede regular de ensino, sob pena
sem autorização de um dos cônjuges inclusive de suspensão ou destituição do
implica a ineficácia total da garantia. poder familiar. Além disso, é direito
fundamental em nosso ordenamento a
Material de Apoio - Direito Civil - João convivência comunitária, pois faz parte
Aguirre - Guarda 1 (Aula Extra On Line de seu desenvolvimento não ser criada
I).pdf em uma bolha (são necessários laços de
Material de Apoio - Direito Civil - João afeto, bem como o aprendizado da
Aguirre - Guarda 2 (Aula Extra On Line concorrência, que será muito importante
I).pdf para a vida adulta).
Material de Apoio - Direito Civil - João “§ 1º Toda criança ou adolescente
Aguirre - Guarda 3 (Aula Extra On Line que estiver inserido em programa de
acolhimento familiar ou institucional terá
I).pdf sua situação reavaliada, no máximo, a
Material de Apoio - Direito Civil - João cada 6 (seis) meses, devendo a
Aguirre - Guarda 4 (Aula Extra On Line autoridade judiciária competente, com
I).pdf base em relatório elaborado por equipe
interprofissional ou multidisciplinar,
decidir de forma fundamentada pela

117
possibilidade de reintegração familiar ou Art. 25. Entende-se por família
colocação em família substituta, em natural a comunidade formada pelos pais
quaisquer das modalidades previstas no ou qualquer deles e seus descendentes.
art. 28 desta Lei.” [perceba que não utilizou a expressão
O acolhimento familiar e o filhos, mas descendentes, de forma que
acolhimento institucional são medidas quer se referir ao parentesco em linha
reta, e não apenas aos pais e filhos.]”
provisórias e excepcionais, utilizáveis
Família extensa ou ampliada:
como forma de transição para a “Parágrafo único. Entende-se por
reintegração familiar (regra), ou para a família extensa ou ampliada aquela que
colocação em família substituta quando se estende para além da unidade pais e
a reintegração familiar não for possível. filhos ou da unidade do casal [vai além
O acolhimento familiar e do parentesco em linha reta], formada
por parentes próximos com os quais a
institucional só podem ocorrer mediante criança ou adolescente convive e mantém
expedição de guia de acolhimento pela vínculos de afinidade e afetividade.
autoridade judiciária. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)”
No acolhimento familiar, a O parágrafo único não se refere
criança ou adolescente é acolhida por apenas à parentalidade sanguínea, mas
uma família previamente cadastrada, e também a figuras como os padrinhos e o
depois é reintegrada à sua família “tio” (amigo dos pais que estavam
natural quando o problema que juntos em todos os momentos).
ocasionou sua saída é regularizado. Família substituta:
O acolhimento institucional se dá “Seção III
por entidades cadastradas para tal fim. Da Família Substituta
Subseção I
Cf. AREsp 1220138/RN, em que se Disposições Gerais
decidiu que não é do melhor interesse Art. 28. A colocação em família
da criança e do adolescente o substituta far-se-á mediante guarda,
acolhimento institucional (medida tutela ou adoção, independentemente da
excepcional). situação jurídica da criança ou
adolescente, nos termos desta Lei.”
DICA: excepcionalmente e, em
caráter de urgência, as entidades que i) guarda – os pais mantêm o
promovem o programa de acolhimento poder familiar;
institucional poderão acolher crianças e ii) tutela – pressupõe suspensão
adolescentes sem prévia determinação ou extinção do poder familiar;
da autoridade judiciária, mas nesse caso iii) adoção – pressupõe a extinção
devem em 24 horas comunicar o Juízo do poder familiar.
da Infância e da Juventude, sob pena de Perceba que se trata de uma
responsabilidade. escada, em que se passa da medida
“§ 2º A permanência da criança e menos grave, a guarda, passando pela
do adolescente em programa de intermediária – tutela – até chegar na
acolhimento institucional não se adoção.
prolongará por mais de 18 (dezoito
meses), salvo comprovada necessidade 3. Guarda (ECA, artigos 33 a 35)
que atenda ao seu superior interesse,
“Subseção II
devidamente fundamentada pela
Da Guarda
autoridade judiciária.”
Art. 33. A guarda obriga a
A maior parte da doutrina entende prestação de assistência material, moral
que deve se estender essa regra para o e educacional à criança ou adolescente,
acolhimento familiar, diante da falta de conferindo a seu detentor o direito de
regra para seu caso específico. opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
(Vide Lei nº 12.010, de 2009)”
2. A família no ECA
Família natural: Deveres do guardião: assistência
“Seção II material (alimentos), mora (valores,
Da Família Natural cuidado) e educacional.
118
Direitos: opor-se a terceiros, filho comum. Essa é a regra de nosso
inclusive aos pais. ordenamento.
A depender da situação, o A guarda compartilhada pode ser
guardião pode pedir alimentos aos pais. imposta pelo Juiz.
O § 1º explicita que estamos “Art. 1.583. A guarda será
falando da guarda de direito, que visa unilateral ou compartilhada. (Redação
dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
regularizar uma situação de fato: § 1º Compreende-se por guarda
“§ 1º A guarda destina-se a unilateral a atribuída a um só dos
regularizar a posse de fato, podendo ser genitores ou a alguém que o substitua
deferida, liminar ou incidentalmente, nos (art. 1.584, § 5º) e, por guarda
procedimentos de tutela e adoção, exceto compartilhada a responsabilização
no de adoção por estrangeiros.” conjunta e o exercício de direitos e
“§ 2º Excepcionalmente, deferir- deveres do pai e da mãe que não vivam
se-á a guarda, fora dos casos de tutela e sob o mesmo teto, concernentes ao poder
adoção, para atender a situações familiar dos filhos comuns. (Incluído
peculiares ou suprir a falta eventual dos pela Lei nº 11.698, de 2008).”
pais ou responsável [guarda peculiar],
podendo ser deferido o direito de A guarda compartilhada não se
representação para a prática de atos confunde com a guarda alternada. Esta
determinados.” última, inclusive, é mal quista pelo
Guarda no ECA Guarda no CC, Poder Judiciário e também pelos
arts. 33 a 35 arts. 1583 a 1585 especialistas (psicólogos, psiquiatras,
- provisória; - unilateral;
terapeutas).
- definitiva; - compartilhada.
“§ 2º Na guarda compartilhada, o
- peculiar.
tempo de convívio com os filhos deve ser
Competência do Competência da Vara
dividido de forma equilibrada com a mãe
Juizado da Criança e de Família
e com o pai, sempre tendo em vista as
Adolescente
condições fáticas e os interesses dos
Na guarda provisória e definitiva, filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058,
geralmente estamos diante de uma de 2014)”
questão processual (liminares e decisão A NR do § 2º dada pela
definitiva). L13058/2014 parece confundir guarda
Na guarda peculiar, temos compartilhada com alternada. Mas não é
situações como de estudos em outra isso, apenas que na guarda
cidade. Outro exemplo: pai que perde a compartilhada, o tempo de convívio
esposa, inicialmente cuida sozinho do com os filhos deve ser dividido de
filho mas cai numa grande depressão, forma equilibrada com a mãe e o pai,
foi morar com o irmão; a irmã do pai, sempre tendo em vista as condições
que era madrinha, toma a guarda. fáticas e os interesses dos filhos.
Já a guarda no CC refere-se a um “§ 3º Na guarda compartilhada, a
litígio entre os pais que estão querendo cidade considerada base de moradia dos
filhos será aquela que melhor atender aos
ficar com a companhia do filho. interesses dos filhos. (Redação dada pela
A guarda unilateral é aquela Lei nº 13.058, de 2014)”
fixada em favor de um dos pais com Dica: REsp 1147138/SP, em que
regime de visitas para o outro. Trata-se se fixou a guarda compartilhada entre
atualmente da exceção, porque hoje avós e tios, resguardando-se o superior
fixa-se em regra a guarda interesse da criança e do adolescente
compartilhada. (no caso, os pais morreram e iniciou-se
A guarda compartilhada consiste uma briga para saber quem melhor
na responsabilização conjunta dos pais e cuidaria dos filhos).
o exercício de direitos e deveres do pai Dica: REsp 1186086/TO e CC
e da mãe que não vivam sobre o mesmo 111130/SC, segundo a qual o STJ tem
teto, concernentes ao poder familiar do adotado a regra do juízo imediato dos

119
artigos 147, I e II do ECA, em que a (dezoito) anos incompletos. (Redação
mudança do domicílio pode importar no dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. O deferimento
deslocamento do processo. Ela se aplica da tutela pressupõe a prévia decretação
a ações de guarda, tutela e de da perda ou suspensão do pátrio poder
destituição do poder familiar. Segundo a poder familiar e implica necessariamente
regra do juízo imediato, a perpetuatio o dever de guarda. (Expressão
jurisdictionis não tem força para substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)”
suplantar o superior interesse da criança A tutela pressupõe a suspensão ou
e do adolescente. a extinção do poder familiar.
“Art. 23. A falta ou a carência de
Voltando ao art. 33, § 3º do ECA: recursos materiais não constitui motivo
“§ 3º A guarda confere à criança
suficiente para a perda ou a suspensão do
ou adolescente a condição de
pátrio poder poder familiar. (Expressão
dependente, para todos os fins e efeitos
substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)
de direito, inclusive previdenciários.”
§ 1º Não existindo outro motivo
O ECA é a Lei n. 8.069/90. que por si só autorize a decretação da
Depois de sua edição, a Lei n. 9.528/97 medida, a criança ou o adolescente será
alterou a Lei n. 8213/91, art. 16, § 2º, mantido em sua família de origem, a qual
retirando a condição de dependente para deverá obrigatoriamente ser incluída em
serviços e programas oficiais de
fins previdenciários da criança e proteção, apoio e promoção. (Redação
adolescente sobre guarda. Temos um dada pela Lei nº 13.257, de 2016)”
conflito entre a norma do ECA e aquela Art. 24. A perda e a suspensão do
estampada na legislação previdenciária. pátrio poder poder familiar serão
O intuito do legislador previdenciário decretadas judicialmente, em
procedimento contraditório, nos casos
era evitar uma fraude que estava se
previstos na legislação civil, bem como
tornando corriqueira, perpetuando uma na hipótese de descumprimento
pensão para o neto, que poderia se injustificado dos deveres e obrigações a
estender até quando ele completasse os que alude o art. 22 [cuidado: criação,
estudos em nível superior. Isso acabou sustento, educação]. (Expressão
substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)
gerando um efeito perverso contra a
maior parte dos casos em que não há A tutela no código civil:
“Seção III
esse tipo de má-fé. O STJ tem Da Suspensão e Extinção do
entendimento bastante consolidado no Poder Familiar
sentido de que, com o advento da Lei n. Art. 1.635. Extingue-se o poder
9528/97, a criança e o adolescente sob familiar:
guarda não possuem mais a condição de I - pela morte dos pais ou do
filho;
dependentes para fins previdenciários. II - pela emancipação, nos termos
Cf. AgRg no REsp 1482391/SP; AgRg do art. 5º, parágrafo único;
no REsp 1370171/PI; AgRg no REsp III - pela maioridade;
1285355/ES. IV - pela adoção;
Mas há entendimento contrário a V - por decisão judicial, na
forma do artigo 1.638 [casos de perda
essa injustiça que se estabeleceu em do poder familiar].”
nome de uma quantidade bem menor de As hipóteses previstas em negrito
fraudadores, quanto comparados aos acima é que podem gerar uma tutela.
casos de boa-fé. Cf. REsp 1186086/GO, “Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe,
que se trata de entendimento abusar de sua autoridade, faltando aos
minoritário. deveres a eles inerentes ou arruinando os
bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo
algum parente, ou o Ministério Público,
4. Tutela (ECA, 36 a 38) adotar a medida que lhe pareça
“Subseção III reclamada pela segurança do menor e
Da Tutela seus haveres, até suspendendo o poder
“Art. 36. A tutela será deferida, familiar, quando convenha.
nos termos da lei civil, a pessoa de até 18

120
Parágrafo único. Suspende-se b) lesão; (Incluído pela Lei nº
igualmente o exercício do poder familiar 13.010, de 2014)
ao pai ou à mãe condenados por sentença II - tratamento cruel ou
irrecorrível, em virtude de crime cuja degradante: conduta ou forma cruel de
pena exceda a dois anos de prisão.” tratamento em relação à criança ou ao
Já nesse art. 1.637 temos as adolescente que: (Incluído pela Lei nº
hipóteses de suspensão do poder 13.010, de 2014)
a) humilhe; ou (Incluído pela Lei
familiar: nº 13.010, de 2014)
1) suspende-se o poder familiar b) ameace gravemente; ou
com base no art. 1.637, caput, (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)
caracterizado o abuso de autoridade, em c) ridicularize. (Incluído pela Lei
que a) os pais faltam com seus deveres, nº 13.010, de 2014)”
ou b) os pais arruinam os bens dos Ainda no ECA:
“Art. 157. Havendo motivo
filhos; grave, poderá a autoridade judiciária,
2) pai e ou mãe condenados por ouvido o Ministério Público, decretar a
sentença irrecorrível a pena que exceda suspensão do pátrio poder poder familiar,
mais de dois anos de prisão. liminar ou incidentalmente, até o
“Art. 1.638. Perderá por ato julgamento definitivo da causa, ficando a
judicial o poder familiar o pai ou a mãe criança ou adolescente confiado a pessoa
que: idônea, mediante termo de
I - castigar imoderadamente o responsabilidade. (Expressão
filho; substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)
II - deixar o filho em abandono ”
[material ou moral]; Assim, além do rol rígido do CC,
III - praticar atos contrários à o ECA tem uma amplitude bem maior
moral e aos bons costumes; para ocorrer a suspensão do poder
IV - incidir, reiteradamente, nas
faltas previstas no artigo antecedente. familiar. O motivo grave, aliás, na
V - entregar de forma irregular o prática pode gerar a extinção do poder
filho a terceiros para fins de adoção. familiar. Contudo, para concursos, com
(Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017)” questões objetivas, é bom se basear no
O castigo está definido no ECA, que previsto no CC.
18-A: Dicas:
“Art. 18-A. A criança e o 1) Cf. AgRg no AgRg no Ag
adolescente têm o direito de ser educados
e cuidados sem o uso de castigo físico ou 1.412.265/RJ; AgRg no REsp
de tratamento cruel ou degradante, como 1.356.384/RJ, não há obrigatoriedade da
formas de correção, disciplina, educação presença da Defensoria Pública nos
ou qualquer outro pretexto, pelos pais, processos de destituição do poder
pelos integrantes da família ampliada, familiar. O Ministério Público atua na
pelos responsáveis, pelos agentes
públicos executores de medidas
curadoria dos interesses da criança e
socioeducativas ou por qualquer pessoa adolescente;
encarregada de cuidar deles, tratá-los, 2) a sentença transitada em
educá-los ou protegê-los. (Incluído pela julgado na ação de destituição (perda)
Lei nº 13.010, de 2014) do poder familiar faz coisa julgada
Parágrafo único. Para os fins
desta Lei, considera-se: (Incluído pela
material e não pode ser objeto de ação
Lei nº 13.010, de 2014) anulatória. Cf. REsp 1.112.265/CE. A
I - castigo físico: ação de natureza sentença deve ser averbada à margem
disciplinar ou punitiva aplicada com o do registro.
uso da força física sobre a criança ou o
adolescente que resulte em: (Incluído
pela Lei nº 13.010, de 2014)
Material de Apoio - Direito Civil - João
a) sofrimento físico; ou Aguirre - Adoção 1 (Aula Extra On
(Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014) Line II).pdf

121
Material de Apoio - Direito Civil - João a) adoção bilateral – rompe-se o
Aguirre - Adoção 2 (Aula Extra On vínculo com ambos os pais naturais;
Line II).pdf b) adoção unilateral – rompe-se o
Material de Apoio - Direito Civil - João vínculo com apenas um dos pais
Aguirre - Adoção 3 (Aula Extra On naturais (exemplo: adoção pelo
Line II).pdf padrasto, cf. REsp 1.106.637/SP, Inf.
Material de Apoio - Direito Civil - João 437; adoção pela companheira da mãe
Aguirre - Adoção 4 (Aula Extra On biológica, cf. REsp 1.281.093/SP).
Line II).pdf ii) com relação ao
estabelecimento de vínculos com nova
família:
a) adoção singular: o vínculo se
ADOÇÃO dá com apenas um adotante;
b) adoção conjunta: dois
adotantes, um casal, sendo necessário
1. Conceito que exista um vínculo matrimonial ou
Constitui forma excepcional de de união estável (a legislação busca
colocação em família substitua, que semelhança a família natural). O
rompe os vínculos de parentesco com a vínculo pode ser hetero ou
família natural, exceto para homossexual.
impedimentos matrimoniais, DICA: ECA, art. 42, § 4º, que
constituindo vínculos plenos com a autoriza a adoção por separados judicial
nova família. ou extrajudicialmente
Ou seja, o conceito deixa “§ 4º Os divorciados, os
transparecer que apenas os judicialmente separados [tb. os
extrajudicialmente separados] e os ex-
impedimentos matrimoniais companheiros podem adotar
permanecem (CC, 1.521), bem como conjuntamente, contanto que acordem
ressalta a não referência a “família sobre a guarda e o regime de visitas e
adotiva” para não indicar qualquer tipo desde que o estágio de convivência tenha
de discriminação. sido iniciado na constância do período de
“CAPÍTULO III convivência e que seja comprovada a
Dos Impedimentos existência de vínculos de afinidade e
Art. 1.521. Não podem casar: afetividade com aquele não detentor da
(...) guarda, que justifiquem a
IV - os irmãos, unilaterais ou excepcionalidade da concessão.
bilaterais, e demais colaterais, até o (Redação dada pela Lei nº 12.010, de
terceiro grau inclusive; 2009) ”
V - o adotado com o filho do Os requisitos previstos acima são:
adotante; - os separados judicialmente ou
(...)” extrajudicialmente, divorciados e ex-
Perceba que o inc. V é um ranço companheiros podem adotar
que se manteve do CC/1916, tendo em conjuntamente, contanto que: 1)
vista que já está contido no inc. IV e, acordem sobre a guarda e regime de
além disso, remonta à época em que o visitas; 2) o estágio de convivência
adotado não era considerado irmão do (requisito objetivo para adoção, como se
filho do adotante, posto que ali havia verá mais a frente) com o adotado tenha
um contrato de adoção. se iniciado quando o casal ainda
convivia (ainda tinham vida em
2. Classificação da adoção comum); 3) que seja comprovada a
i) com relação ao rompimento do existência de vínculos de afinidade e de
vínculo com a família natural: afetividade com o adotante que não será
detentor da guarda (o que hoje está mais

122
abrandado por conta da regra ser a § 6º Caso a modificação de
guarda compartilhada). prenome seja requerida pelo adotante, é
obrigatória a oitiva do adotando,
observado o disposto nos §§ 1º e 2º do
3. Características da adoção art. 28 desta Lei. (Redação dada pela Lei
i) plena – significa dizer que ela nº 12.010, de 2009)
estabelece vínculos plenos com a nova § 7º A adoção produz seus efeitos
família; a partir do trânsito em julgado da
sentença constitutiva, exceto na hipótese
ii) personalíssima – é vedada prevista no § 6º do art. 42 desta Lei, caso
adoção por procuração; em que terá força retroativa à data do
iii) irrevogável – o vínculo da óbito. (Incluído pela Lei nº 12.010, de
adoção não pode ser dissolvido pela 2009)
alteração da vontade do adotante. Trata- § 8º O processo relativo à adoção
assim como outros a ele relacionados
se de um item importante na adoção serão mantidos em arquivo, admitindo-se
internacional posto que, países como a seu armazenamento em microfilme ou
Itália admitem a revogação da adoção, por outros meios, garantida a sua
causando um grande problema. Não conservação para consulta a qualquer
pode ser confundido com a invalidade tempo. (Incluído pela Lei nº 12.010,
de 2009) Vigência
(nulidade ou anulação);
§ 9º Terão prioridade de
iv) imprescritível – e também não tramitação os processos de adoção em
decai, ou seja, à semelhança do que o adotando for criança ou
parentesco biológico; adolescente com deficiência ou com
v) judicial – cf. art. 97, o vínculo doença crônica. (Incluído pela Lei
nº 12.955, de 2014)
da adoção constitui-se por sentença
§ 10. O prazo máximo para
judicial e essa sentença judicial deve, conclusão da ação de adoção será de 120
necessariamente ser inscrita no registro (cento e vinte) dias, prorrogável uma
civil mediante mandado do qual não se única vez por igual período, mediante
fornecerá certidão. Esse mandado será decisão fundamentada da autoridade
arquivado e cancelará o registro original judiciária. (Incluído pela Lei nº 13.509,
de 2017)”
do adotado.
“Art. 47. O vínculo da adoção
O adotado tem direito de conhecer
constitui-se por sentença judicial, que sua origem biológica, que é um direito à
será inscrita no registro civil mediante identidade, referente aos direitos da
mandado do qual não se fornecerá personalidade, garantido-se acesso
certidão. irrestrito ao processo de adoção:
§ 1º A inscrição consignará o “Art. 48. O adotado tem direito de
nome dos adotantes como pais, bem conhecer sua origem biológica, bem
como o nome de seus ascendentes. como de obter acesso irrestrito ao
§ 2º O mandado judicial, que será processo no qual a medida foi aplicada e
arquivado, cancelará o registro original seus eventuais incidentes, após completar
do adotado. 18 (dezoito) anos. (Redação dada pela
§ 3º A pedido do adotante, o novo Lei nº 12.010, de 2009)
registro poderá ser lavrado no Cartório Parágrafo único. O acesso ao
do Registro Civil do Município de sua processo de adoção poderá ser também
residência. (Redação dada pela Lei nº deferido ao adotado menor de 18
12.010, de 2009) (dezoito) anos, a seu pedido, assegurada
§ 4º Nenhuma observação sobre a orientação e assistência jurídica e
origem do ato poderá constar nas psicológica.”
certidões do registro. (Redação dada
A morte do adotante não
pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5º A sentença conferirá ao restabelece o vínculo com a família
adotado o nome do adotante e, a pedido natural.
de qualquer deles, poderá determinar a
modificação do prenome. (Redação 4. Natureza da jurídica da sentença de
dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
adoção

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Ela é desconstitutiva do vínculo dispensado se os pais forem
com a família natural e constitutiva do desconhecidos ou tenham sido
vínculo com a nova família. destituídos do poder familiar. Se o
Essa sentença produz efeitos a adotado for maior de 12 (doze) anos,
partir do seu trânsito em julgado da seu consentimento será necessário.
sentença constitutiva, em regra. A “Art. 45. A adoção depende do
exceção está na adoção post mortem ou consentimento dos pais ou do
representante legal do adotando.
póstuma, ECA, 42, § 6º: § 1º. O consentimento será
“§ 6º A adoção poderá ser dispensado em relação à criança ou
deferida ao adotante que, após adolescente cujos pais sejam
inequívoca manifestação de vontade, vier desconhecidos ou tenham sido
a falecer no curso do procedimento, antes destituídos do pátrio poder poder
de prolatada a sentença. (Incluído pela familiar. (Expressão substituída pela Lei
Lei nº 12.010, de 2009)” nº 12.010, de 2009)
Nesses casos, os efeitos da § 2º. Em se tratando de adotando
sentença retroagirão à data do óbito, cf. maior de doze anos de idade, será
art. 47, § 7º, segunda parte do ECA. também necessário o seu
consentimento.”
5. Requisitos da adoção Dica: cf. STJ, REsp
i) requisitos subjetivos: 1.423.640/CE, houve relativização das
a) idoneidade do adotante – trata- formalidades exigidas no consentimento
se de um requisito muito mal visto pela para a adoção. No caso, havia uma
doutrina, tendo em vista que é muito paternidade socioafetiva consolidada
amplo; com o padrasto, decidindo-se em favor
b) motivos legítimos – também é do superior interesse da criança e
criticado, mas refere-se a sindicância adolescente.
sobre a maturidade e reais interesses do c) cadastro prévio – exigido
adotante, de verdadeiramente cuidar do conforme o art. 50 do ECA, tratando-se
adotado, e não motivos fúteis; de um registro das crianças e
Os dois requisitos acima devem adolescentes em condições de serem
ser analisados com razoabilidade, adotados, bem como no outro registro
baseados na preservação do superior das pessoas interessadas na adoção.
interesse da criança e adolescente. d) estágio de convivência –
c) reais vantagens para o adotado exigido pelo art. 46 do ECA. Ele tem
– demonstra a necessidade de duas formas:
preservação do superior interesse do 1) adoção nacional – o adotante é
adotado. Refere-se à vantagem domiciliado no Brasil,
existencial, e não meramente independentemente de sua
patrimonial (cf. STJ, REsp 1281093 e nacionalidade. O estágio de convivência
RMS 19508/SC). dar-se-á pelo período definido pela
i) objetivos autoridade competente.
a) idade – quanto à idade: 2) adoção internacional – adotante
- o adotante deve ser ao menos 16 domiciliado no exterior. Durará no
(dezesseis) anos mais velho que o mínimo 30 (trinta) dias.
adotado; Dicas:
- o adotante deve ser maior de 18 - a adoção pelo padrasto pode
(dezoito) anos. Quando for casal, os resultar em dispensa do consentimento
dois devem ser maiores de 18. em razão da socioafetividade (cf. REsp
b) consentimento dos pais ou 1444747/DF; SEC 10697/EX; SEC
destituição do poder familiar – ECA, 10700/EX);
45. O consentimento pode ser - cf. REsp 1540814/PR, inscrição
de homoafetivo para adoção. O MP
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estadual sustenta que, nesse caso, só
poderá adotar um adolescente (maior de
12 anos) para que se obtenha o seu
consentimento, mas o STJ reafirmou
que não há previsão legal para essa
exigência.
- REsp 1.448.969/SC, em que
houve uma relativização da proibição da
adoção por ascendentes. No caso, a
menina de 8 anos foi adotada já grávida,
vítima de abuso sexual, deu à luz aos
nove anos e os adotantes pretendem
adotar também seu filho (neto deles).
Lembre-se. Impedidos de adotar:
1) os ascendentes do adotando;
2) os irmãos do adotando;
3) o tutor e o curador enquanto
não prestar contas de sua administração.
Esses impedimentos decorrem da
proteção da adoção contra intuitos
patrimoniais ou assistenciais.

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