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DIREITO CIVIL
PROF.ª MAITÊ DAMÉ
SUMÁRIO
01. PARTE GERAL.................................................................................................................................. 2
02. DIREITO DAS COISAS............................................................................................................... 157
03. DIREITO DE FAMÍLIA ............................................................................................................... 250
04. SUCESSÕES .................................................................................................................................355
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1.2 Divisão da Parte Geral
O Código Civil divide a parte geral em três partes. A teoria das pessoas, que trabalha com
os sujeitos de direitos (pessoas naturais e jurídicas); a teoria dos bens, que se destina a estudar
os objetos de direitos; e a teoria dos fatos, que são os eventos que criam, modificam,
conservam, transferem ou extinguem direitos (negócios jurídicos, atos jurídicos – lícitos e ilícitos,
prescrição e decadência, prova).
Existe, portanto, uma lógica de estudo. 1) estudam-se as pessoas; 2) estudam-se os bens,
que são os objetos dos direitos; 3) estuda-se os fatos jurídicos, ou seja, o meio pelo qual nascem,
modificam-se e extinguem-se os direitos.
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A questão, agora, é saber a partir de quando a pessoa pode ser considerada sujeito de
Direito, ou seja, basta que uma pessoa nasça para que seja assim considerada e, dessa forma,
adquira personalidade.
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GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: parte geral.
18.ed. v.1. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 132.
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1.3.1.1 Nascituro
Nascituro é aquele que está por nascer, ou seja, aquele que está se desenvolvendo no
ventre materno, que foi concebido, mas não nasceu ainda.
O art. 2.º, CC protege os direitos do nascituro desde sua concepção.
Ao nascituro são reconhecidos certos direitos, desde que reconhecida sua personalidade
e, posteriormente, sua capacidade. Sendo assim, possui capacidade reduzida.
Mas o art. 2.º, CC também protege os direitos do natimorto, ou seja, aquele que não
chegou a nascer com vida (não chegou a respirar). Nesse aspecto, o enunciado 1 das Jornadas
de Direito Civil prevê que há a proteção do nome, da imagem e da sepultura:
A proteção que o Código defere ao nascituro alcança o natimorto no que
concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome, imagem e
sepultura.
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* Para todos verem: esquema
1.3.2 Incapacidades
As pessoas que não possuem a capacidade de fato têm capacidade limitada e são
chamadas de incapazes. Não existe incapacidade de direito, já que, conforme o art. 2.º, CC todos
que nascem com vida adquirem a capacidade de direito (mas não a de fato). Dessa maneira, as
incapacidades são restrições impostas às pessoas, em condições peculiares, que necessitam,
em razão dessa condição, de proteção especial.
Deve-se destacar que o Estatuto da pessoa com deficiência, lei 13.246/2015, alterou
significativamente a teoria das incapacidades.
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1.3.2.1 Pessoas Absolutamente Incapazes
Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da
vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
A incapacidade absoluta impede que a pessoa exerça por si só o direito. Dessa forma, o ato
só poderá ser praticado pelo representante legal do absolutamente incapaz.
O absolutamente incapaz possui direito. Porém, não pode exercê-lo por si próprio. São as
pessoas que não tem aptidão para praticarem, sozinhas ou por si próprias, os atos da vida civil.
Significa dizer que possuem capacidade de direito, mas não possuem a capacidade de fato ou
exercício.
Nestes casos, o ato jurídico é praticado por outra pessoa (o representante legal), em nome
do incapaz. Trata-se da REPRESENTAÇÃO. Dessa maneira, o ato é praticado pelo incapaz,
representado pelo pai ou responsável legal.
Ex.: Fulano de tal, menor absolutamente incapaz, representado por seus pais, Beltrano e
Beltrana de Tal.
A inobservância dessa regra gera a nulidade do ato, nos termos do art. 166, I, CC.
Como já mencionado, o Estatuto da pessoa com deficiência alterou a teoria das
incapacidades. Atualmente, não há outra hipótese de incapacidade absoluta que não seja em
razão da idade (menor de 16 anos). Antes dessa alteração, as pessoas com deficiência eram
absolutamente incapazes. Agora, não são. As pessoas com deficiência são, via de regra,
plenamente capazes de exercer atos da vida civil. Não há mais, portanto, interdição absoluta.
Poderá ocorrer alguma situação de incapacidade relativa (art. 4.º, CC).
A incapacidade relativa permite que o incapaz realize o ato, desde que esteja assistido
pelo representante legal. Nesses casos, o próprio indivíduo, relativamente incapaz, pratica o ato,
sendo assistido pelo representante legal. Trata-se da ASSISTÊNCIA.
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Maiores de 16 anos e menores de 18 anos.
Aqueles indivíduos que estejam entre os 16 e os 18 anos de vida podem praticar atos da
vida civil, mas assistidos pelos representantes legais, sob pena de ser anulado o ato.
Caso seja praticado o ato, poderá ser anulado (art. 171, I, CC), desde que a ação seja
proposta no prazo de 4 anos a contar do momento em que cessar a incapacidade (art. 178, CC).
Contudo, existem atos que podem ser praticados pelo relativamente incapaz, mesmo sem
a assistência do seu representante legal, como p. ex., ser testemunha (art. 228, I), aceitar
mandato (art. 666), fazer testamento (art. 1.860, § único), casar (art. 1.517, CC – necessita de
autorização dos genitores).
Havendo conflito de interesses entre o pai/representante legal e o relativamente incapaz,
o juiz deverá nomear curador especial (art. 1.692, CC).
Deve-se observar que o objetivo do Código Civil é estabelecer uma proteção diferenciada
para os maiores de 16 e menores de 18 anos.
Dessa forma, caso o relativamente incapaz pratique um ato ocultando sua idade, não
poderá invocar a idade para eximir-se de obrigação, pois o Código não protege a má-fé. Nesse
sentido é a disposição do art. 180, CC:
Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-
se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou
quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-
se maior.
Se, contudo, não houver malícia por parte do relativamente incapaz, o ato será anulável,
nos termos do art. 171, I, CC:
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o
negócio jurídico:
I - por incapacidade relativa do agente;
Mas essa incapacidade, por se tratar de exceção pessoal, só pode ser arguida pelo próprio
incapaz ou pelo representante legal. Nesses termos, o art. 105, CC:
Art. 105. A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser
invocada pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos co-
interessados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do
direito ou da obrigação comum.
Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a vontade
Aqui enquadram-se todas as pessoas que não possam exprimir sua vontade, seja por
situação permanente ou transitória. Nesse quadro estão os surdos-mudos, desde que não
tenham recebido educação adequada e permaneçam isolados. Se tiverem recebido educação e
puderem, por qualquer forma, exprimir sua vontade, serão capazes.
Também se encaixam os portadores de mal de Alzheimer.
Em todos os casos, necessária a interdição, conforme já mencionado.
Alguns, mais desavisados, podem questionar: e os portadores de síndrome de down, são
enquadrados como? Em razão do Estatuto da pessoa com deficiência que, sabiamente, alterou
a teoria das incapacidades, estes indivíduos – até por questões de desenvolvimento e estímulo –
são, via de regra, plenamente capazes. Eventualmente, pode ser caso de tomada de decisão
apoiada ou, então, enquadrados como relativamente incapazes por força do inciso III, do art. 4.º,
CC. Contudo, é situação excepcional. A regra é a capacidade plena.
Pródigos.
Pródigo é aquele que dissipa seu patrimônio desvairadamente, aquele que gasta
imoderadamente, colocando seu patrimônio em risco. Contudo, o pródigo só passará a ser
considerado relativamente incapaz com a sentença de interdição que lhe qualifique como tal.
A justificativa da interdição do pródigo é o fato de que está permanentemente em risco
de se submeter a miséria, colocando todo seu patrimônio fora. Sua interdição refere-se tão
somente quanto a atos de disposição e oneração do patrimônio. Pode administrar seu
patrimônio, mas não poderá praticar atos que venham a desfalca-lo. Os demais atos (votar, ser
jurado, testemunha, etc) poderá praticar.
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Situação dos índios
O art. 4.º, no seu § único traz a normatização com relação aos índios, deixando para lei
especial a apreciação. O Estatuto do Índio (lei 6.001/73), deixa a responsabilidade, quanto a sua
proteção, a cargo da FUNAI (Fundação Nacional do Índio). A Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio)
considera que o índio que não estiver integrado ficará sob tutela, reputando-se nulos todos os
atos praticados por eles sem a devida assistência do órgão responsável (art. 8.º). Contudo, se o
índio demonstrar discernimento, aliado à inexistência de prejuízo pelo ato praticado, será
considerado plenamente capaz para os atos da vida civil.
Sabe-se que os índios estão constantemente sendo integrados na sociedade brasileira, de
forma que não há mais justificativa para que sejam considerados incapazes. Assim, os índios
somente poderão ser considerados incapazes quando restar comprovado que não são
civilizados e que não possuam discernimento sobre os atos a serem praticados.
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* Para todos verem: mapa mental sobre Pessoa Natural
QUESTÕES
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02. Cessação da incapacidade em razão da idade. Maioridade e emancipação. Tutela e
curatela
2.1.1 Maioridade
Nos termos do art. 5.º, CC, a incapacidade cessa aos 18 anos, quando a pessoa passa a estar
habilitada para praticar todos os atos da vida civil. A menoridade cessa, dessa forma, no primeiro
momento do dia em que o indivíduo perfaz os 18 anos, ou seja, se o nascimento ocorreu em 29
de fevereiro de ano bissexto, completa a maioridade no dia 1.º de março. Ex.: nasceu em 05/10.
Completa a maioridade em 05/10.
O critério é etário e não há diferença entre o homem e a mulher. Contudo, essa
capacidade civil não pode ser confundida com a capacidade eleitoral ou a capacidade para o
casamento, previstas em dispositivos especiais, nem mesmo com a maioridade penal.
Com a maioridade, os jovens passam a responder civilmente pelos danos causados a
terceiros, ficando autorizados a praticar todos os atos da vida civil, sem a necessidade de
assistência de seu representante legal.
2.1.2 Emancipação
Mas a capacidade plena também pode ser antecipada, em razão da autorização dos
representantes legais do menor ou do juiz ou, ainda, pela ocorrência de fato que a lei atribui
força para tanto. Trata-se dos casos de emancipação.
A emancipação é, portanto, uma forma de aquisição da capacidade civil antes da idade
legal. É a antecipação da aquisição da capacidade de fato (exercício da capacidade civil por si
próprio).
Nos termos do art. 5.º, § único, a incapacidade cessará:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante
instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou
por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos
completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
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V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação
de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos
completos tenha economia própria.
Deve-se observar que se trata de aquisição de capacidade para fins civis. Mas o indivíduo
não deixa de ser menor, ou seja, segue sendo aplicado o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Nesse sentido, o enunciado 530 da Jornada de Direito Civil:
A emancipação, por si só, não elide a incidência do Estatuto da Criança e
do Adolescente.
Sendo assim, mesmo emancipado, não pode retirar carteira de motorista, ou entrar em
locais proibidos ou, então, ingerir bebida alcóolica.
A emancipação, uma vez realizada, é definitiva, irretratável e irrevogável, salvo por
ocorrência de vício de vontade (todos os negócios jurídicos ou atos praticados podem ser
anulados em razão de vício de vontade). Neste sentido, o enunciado 397 das Jornadas de Direito
Civil:
A emancipação por concessão dos pais ou por sentença do juiz está
sujeita à desconstituição por vício de vontade.
Pela redação do § único do art. 5.º, CC, a emancipação, conforme a causa ou origem, pode
ser de três espécies: voluntária, judicial e legal.
a) Emancipação voluntária: Ocorre pela concessão dos pais, quando estes, em conjunto (ou,
um deles, na falta do outro), concedem, mediante escritura pública, independentemente de
homologação judicial, a emancipação para o filho que tenha completado 16 anos. A
emancipação é ato irrevogável, de forma que os pais não podem, a posteriori, arrependerem-se
de ter emancipado o filho. Contudo, respondem pelos danos causados pelo filho que
emanciparam. Deve ser registrada no Cartório do Registro Civil, nos termos do art. 107, § 1.º, Lei
6.015/73.
b) Emancipação judicial: A emancipação judicial é aquela concedida pelo juiz, nos casos em
que o menor está sob tutela, sendo ouvido o tutor, se o menor contar com 16 anos completos.
Pode ser, também, nos casos em que um dos genitores concordar e o outro não com a
emancipação. Deve ser registrada no Cartório do Registro Civil, nos termos do art. 107, § 1.º, Lei
6.015/73. No caso de incapacidade relativa declarada por decisão judicial (aplicável aos ébrios
habituais, pródigos, etc.), bem como nos casos de incapacidade superveniente (ou não afastada)
pela maioridade, a retomada da capacidade dar-se-á apenas mediante nova decisão judicial.
Até tal reconhecimento, será realizada nomeação de responsável (curador, para maiores; tutor,
para menores) pela assistência ou representação do incapaz (relativo ou absoluto).
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c) Emancipação legal: A emancipação legal é aquela que advém da disposição legal. Trata-se
dos casos previstos nos incisos II, III, IV e V, CC, ou seja, em razão de casamento, emprego
público, constituição de empresa ou colação de grau em curso superior. Dispensa o registro no
Cartório de Registro Civil, produzindo efeitos independentemente desse registro.
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* Para todos verem: esquema
2. 2. TUTELA E CURATELA
A tutela, assim como a curatela, faz parte do chamado “direito assistencial”, no estudo
das relações familiares. A base de sustentação destes dois institutos é a solidariedade familiar.
2.2.2.1 Tutores
O art. 1.729, CC estabelece que os pais têm o direito de nomear tutor, através de
testamento ou outro documento público. Isto porque, o tutor será a pessoa responsável pela
formação e pela administração do patrimônio dos infantes cujos pais não mais existem.
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Se o testamento contiver a nomeação de mais de um tutor, entende-se haver uma
ordem de preferência, de forma que a tutela será deferida àquela pessoa primeiro nomeada,
sendo que os demais serão substitutos. Art. 1.733, §1.º, CC.
Se, contudo, os pais não tiverem feito a nomeação, o art. 1.731 estabelece a ordem de
preferência na indicação dos tutores:
Art. 1.731. Em falta de tutor nomeado pelos pais incumbe a tutela aos
parentes consanguíneos do menor, por esta ordem:
I - aos ascendentes, preferindo o de grau mais próximo ao mais remoto;
II - aos colaterais até o terceiro grau, preferindo os mais próximos aos
mais remotos, e, no mesmo grau, os mais velhos aos mais moços; em
qualquer dos casos, o juiz escolherá entre eles o mais apto a exercer a
tutela em benefício do menor.
Este rol não é absoluto, cabendo ao juiz analisar a situação que maior benefício trará
para a criança ou adolescente.
Além disto, aos irmãos, será nomeado um só tutor e, no caso de não haver tutor indicado
pelos pais e, ainda, não sendo possível nomear tutor que seja parente consanguíneo da criança
ou adolescente, o tutor nomeado deve residir no mesmo local em que os tutelados.
2.2.2.2 Espécies
São três as formas de tutela:
a) Testamentária: regulada pelos arts. 1.729 e 1.730, CC, quando o tutor será nomeado
pelos pais, em conjunto. Enquanto vivos os pais podem – no exercício do poder familiar –
deixarem testamento nomeando tutor aos filhos menores de idade. Esta nomeação pode ser
feita através de testamento ou de qualquer outro documento público ou particular – qualquer
documento, desde que as assinaturas dos pais estejam com firma reconhecida pelo
Tabelionato.
b) Legítima: é a tutela que se estabelece quando não há a nomeação de tutor por parte
dos pais. Está indicada no art. 1.731, CC, sendo estabelecida a ordem de preferência – esta ordem
não é absoluta, devendo ser observado o melhor interesse da criança e do adolescente.
c) Dativa: esta é a tutela que ocorre quando não há a nomeação de tutor pelos pais e
não há a possibilidade de ser nomeado nenhum dos parentes do menor de idade indicados
pelo art. 1.731 (ou porque não existem ou porque são inidôneos). Está prevista no art. 1.732, CC.
Em regra, quem é parente do menor não pode se escusar, exceto se preencher alguma
dessas situações elencadas.
Se, porém, não houver parentesco com o menor, há a possibilidade de recusa, se houver
algum parente em condições de exercê-la, nos termos do art. 1.737,CC.
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O procedimento para a escusa é através de simples petição ao magistrado que o
nomeou, no prazo de 5 dias, nos termos do art. 760, CPC/2015. O prazo inicia antes de aceitar o
encargo, da data da intimação para prestar compromisso e, depois de entrar no exercício do
encargo, da data em que sobrevier o motivo da escusa.
Deve-se atentar, contudo, para o fato de que o tutor não é pai. É certo que o tutelado
deve obediência ao tutor, mas este último não tem a possibilidade de disciplinar o menor de
idade. Neste caso, há a necessidade de atuação judicial, pois o tutor não exerce o poder familiar.
O tutor também não tem a obrigação de sustentar o menor. Seu sustento sairá de parte
de seus bens, devendo o juiz fixar as quantias que lhe pareçam suficientes e necessárias. Art.
1.746, CC.
Existem outros atos que exigem para sua concretização, a atuação/interferência do juiz.
São aqueles que, normalmente, envolvem o patrimônio do tutelado:
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Art. 1.748. Compete também ao tutor, com autorização do juiz:
I - pagar as dívidas do menor;
II - aceitar por ele heranças, legados ou doações, ainda que com
encargos;
III - transigir;
IV - vender-lhe os bens móveis, cuja conservação não convier, e os
imóveis nos casos em que for permitido;
V - propor em juízo as ações, ou nelas assistir o menor, e promover todas
as diligências a bem deste, assim como defendê-lo nos pleitos contra ele
movidos.
Parágrafo único. No caso de falta de autorização, a eficácia de ato do
tutor depende da aprovação ulterior do juiz.
2.2.2.7 Cessação
A tutela terminará com o término da incapacidade. Nestes termos, o art. 1.763:
Art. 1.763. Cessa a condição de tutelado:
I - com a maioridade ou a emancipação do menor;
II - ao cair o menor sob o poder familiar, no caso de reconhecimento ou
adoção.
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Art. 1.764. Cessam as funções do tutor:
I - ao expirar o termo, em que era obrigado a servir;
II - ao sobrevir escusa legítima;
III - ao ser removido.
2.2.3.1 Curador
Para ser curador de alguém é necessário que a pessoa tenha capacidade para os atos da
vida civil. Assim, em tese, qualquer cidadão pode ser curador de outrem. Contudo, não é
admissível que qualquer indivíduo, aleatoriamente, seja nomeado curador. Há uma previsão de
ordem legal no art. 1.775, CC:
Art. 1.775. O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de
fato, é, de direito, curador do outro, quando interdito.
§1º Na falta do cônjuge ou companheiro, é curador legítimo o pai ou a
mãe; na falta destes, o descendente que se demonstrar mais apto.
§ 2º Entre os descendentes, os mais próximos precedem aos mais
remotos.
§ 3º Na falta das pessoas mencionadas neste artigo, compete ao juiz a
escolha do curador.
Esse rol, contudo, não é vinculativo do juiz, ou seja, ele poderá escolher o curador
atentando para o melhor interesse do curatelado.
Pode, ainda, haver a nomeação de dois curadores, nos termos do art. 1.775-A, CC, nos
casos de pessoa com deficiência.
A curatela será deferida durante o curso do processo de interdição (arts. 747 e ss.,
CPC/2015), que terá natureza declaratória, com eficácia ex tunc, de forma que o magistrado
apenas declarará uma situação já existente.
TUTELA CURATELA
Representação legal de menores de idade (art. 3º, Representação legal de maiores de idade, mas
art. 4º, I, CC) incapazes (Art. 4º, II, III e IV, CC)
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A perícia determinará os atos que podem e os
Se os pais não nomearem tutor, caberá aos
que não podem ser praticados pelos
parentes consanguíneos (tutela legítima – 1731, CC)
interditandos.
Não havendo nomeação, nem parentes, cabe ao juiz Sentença de interdição estabelece a
indicar o tutor (Tutela dativa – Art. 1732) incapacidade e nomeia curador.
Descendentes
Juiz escolhe
03. Tomada de decisão apoiada e da capacidade plena da pessoa com deficiência. Extinção
da personalidade e direitos de personalidade
3.5 Tomada de decisão apoiada
O art. 6.º do Estatuto da pessoa com deficiência (lei 13.146/2015) determina que a
deficiência não afeta a plena capacidade para gestão do plano familiar e existencial do
indivíduo:
Art. 6º A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa,
inclusive para:
I - casar-se e constituir união estável;
II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;
III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a
informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;
IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;
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V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e
VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como
adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais
pessoas.
A tomada de decisão apoiada está prevista, também, no art. 1.783-A, CC. Trata-se de um
processo pelo qual o deficiente pode escolher duas pessoas idôneas e de sua confiança para
auxiliar nas decisões de atos da vida civil.
Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a
pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com
as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-
lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes
os elementos e informações necessários para que possa exercer sua
capacidade. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 1o Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com
deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os
limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores,
inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos
direitos e aos interesses da pessoa que devem apoiar. (Incluído
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
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§ 2o O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa
a ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a prestarem o
apoio previsto no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)
§ 3o Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão
apoiada, o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, após oitiva do
Ministério Público, ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que
lhe prestarão apoio. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 4o A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre
terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio
acordado. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 5o Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial
pode solicitar que os apoiadores contra-assinem o contrato ou acordo,
especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado.
(Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 6o Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo
relevante, havendo divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um
dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a
questão. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 7o Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não
adimplir as obrigações assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer
pessoa apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz.
(Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 8o Se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará,
ouvida a pessoa apoiada e se for de seu interesse, outra pessoa para
prestação de apoio. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
(Vigência)
§ 9o A pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término de
acordo firmado em processo de tomada de decisão apoiada.
(Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 10. O apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do
processo de tomada de decisão apoiada, sendo seu desligamento
condicionado à manifestação do juiz sobre a matéria. (Incluído pela
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 11. Aplicam-se à tomada de decisão apoiada, no que couber, as
disposições referentes à prestação de contas na curatela. (Incluído
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
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A tomada de decisão apoiada visa o auxílio da pessoa com deficiência para a celebração
de atos mais complexos – casos dos contratos. Trata-se de um processo judicial no qual a
pessoa com deficiência elege duas pessoas, de sua confiança, para lhe auxiliar nos atos da vida
civil. Com a nomeação dos apoiadores, toda decisão tomada por pessoa portadora de
deficiência será válida e produzirá efeitos, nos limites do apoio acordado (art. 1.783-A, § 4.º, CC).
Não se trata de interdição!
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A morte divide-se, portanto em (o aprofundamento dessas situações será feito no direito
sucessório):
* Para todos verem: esquema
Por sua vez, o art. 10, CC trata das averbações em registros públicos:
Art. 10. Far-se-á averbação em registro público:
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I - das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento,
o divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade
conjugal;
II - dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a
filiação;
Averbação é anotação feita à margem do registro para informar sobre alguma alteração
ocorrida no estado jurídico do registrado. Nesse sentido, o casamento é registrado e o divórcio,
averbado.
Todo nascimento deve ser levado a registro no local onde ocorreu o parto ou no lugar da
residência dos pais, no prazo de 15 dias ou, no prazo de até 3 meses quando o local do parto ou
da residência for distante mais de 30 km da sede do cartório.
Art. 50. Todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá ser
dado a registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da
residência dos pais, dentro do prazo de quinze dias, que será ampliado
em até três meses para os lugares distantes mais de trinta quilômetros
da sede do cartório.
§ 1º Quando for diverso o lugar da residência dos pais, observar-se-á a
ordem contida nos itens 1º e 2º do art. 52.
§ 2º Os índios, enquanto não integrados, não estão obrigados a inscrição
do nascimento. Este poderá ser feito em livro próprio do órgão federal de
assistência aos índios.
§ 3º Os menores de vinte e um (21) anos e maiores de dezoito (18) anos
poderão, pessoalmente e isentos de multa, requerer o registro de seu
nascimento.
§ 4° É facultado aos nascidos anteriormente à obrigatoriedade do
registro civil requerer, isentos de multa, a inscrição de seu nascimento.
§ 5º Aos brasileiros nascidos no estrangeiro se aplicará o disposto neste
artigo, ressalvadas as prescrições legais relativas aos consulados.
O registro de nascimento do indivíduo compete, pela ordem legal (art. 52, LRP):
Art. 52. São obrigados a fazer declaração de nascimento:
1o) o pai ou a mãe, isoladamente ou em conjunto, observado o disposto
no § 2o do art. 54;
2º) no caso de falta ou de impedimento de um dos indicados no item 1o,
outro indicado, que terá o prazo para declaração prorrogado por 45
(quarenta e cinco) dias;
29
3º) no impedimento de ambos, o parente mais próximo, sendo maior
achando-se presente;
4º) em falta ou impedimento do parente referido no número anterior os
administradores de hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem
assistido o parto;
5º) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da
mãe;
6º) finalmente, as pessoas (VETADO) encarregadas da guarda do
menor.
§ 1° Quando o oficial tiver motivo para duvidar da declaração, poderá ir à
casa do recém-nascido verificar a sua existência, ou exigir a atestação do
médico ou parteira que tiver assistido o parto, ou o testemunho de duas
pessoas que não forem os pais e tiverem visto o recém-nascido.
§ 2º Tratando-se de registro fora do prazo legal o oficial, em caso de
dúvida, poderá requerer ao Juiz as providências que forem cabíveis para
esclarecimento do fato.
Deve-se observar que a Lei nº 13.484, de 2017 prevê, uma alteração no art. 54 da lei dos
registros públicos, no que diz respeito ao local da naturalidade do indivíduo, que será o
município do nascimento ou o de residência de sua genitora:
§ 4º A naturalidade poderá ser do Município em que ocorreu o
nascimento ou do Município de residência da mãe do registrando na
data do nascimento, desde que localizado em território nacional, e a
opção caberá ao declarante no ato de registro do nascimento.
Pode-se dizer que são direitos da personalidade: vida e integridade físico-psíquica, nome
da pessoa (natural ou jurídica), imagem (imagem-retrato e imagem-atributo), honra (subjetiva e
objetiva) e intimidade. Essa proteção dos direitos da personalidade encontra-se, tanto no
Código Civil, como, também, na Constituição Federal de 1988, que prevê, no seu art. 5. º, X:
“X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”.
3.4.1 Natureza
Quanto a natureza jurídica desses direitos, a maior parte da doutrina entende que, por se
tratarem de direitos inatos ao ser humano, cabe ao Estado apenas reconhecê-los e sancioná-los
no âmbito do direito positivo, de forma que o indivíduo possa proteger tais direitos contra
arbítrios do poder público ou de particulares.
No caso do Brasil, esses direitos, além de serem protegidos no âmbito do Direito Civil,
também tem uma proteção constitucional, conforme visto (art. 5.º, X, CF), o que lhes confere um
status diferenciado – direito subjetivo (possibilidade de exigir respeito) + direito objetivo
(vinculação a todos, dever de não infringir).
3.4.2 Titularidade
Os direitos da personalidade são próprios dos seres humanos. Contudo, como já discutido,
também protege o nascituro que, embora não tenha personalidade jurídica, detém proteção,
desde a concepção, dos seus direitos da personalidade (art. 2.º, CC).
Não se pode excluir, contudo, as pessoas jurídicas desta proteção, pois, nos termos do art.
52, CC, aplica-se “às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”.
Dessa forma, as pessoas jurídicas também têm a faculdade de exigir respeito e proteção quanto
à sua imagem (intimidade, vida privada e honra, não é possível em razão das particularidades
de tais direitos), podendo ser requerida indenização pela violação a tal direito. Este
31
entendimento consubstancia-se na redação da súmula 227 do STJ, que diz que: “A pessoa
jurídica pode sofrer dano moral.” Tenham cuidado com o enunciado 268 das Jornadas de
Direito Civil, que diz que não pode a pessoa jurídica ser titular de direitos da personalidade. Este
enunciado contraria o que determina a súmula 227 do STJ. Esta súmula é que poderá ser
cobrada no Exame da OAB, por ser a posição majoritária.
3.4.3 Características
Os direitos da personalidade são ligados à pessoa humana, representando seus direitos
íntimos e fundamentais. São qualidades que se agregam ao homem e, portanto,
intransmissíveis e irrenunciáveis. O art. 11, CC traz algumas das características dos direitos da
personalidade: Contudo, existem outras características:
• Inato: inerente, pertencente desde o nascimento.
• Absolutos: os autores falam que os direitos da personalidade são absolutos, sendo
uma forma de materialização da oponibilidade erga omnes.
Apesar dessa característica, deve-se ressaltar que os direitos da personalidade
podem ser restringidos, dependendo da situação.
Os enunciados das Jornadas de Direito Civil dispõe sobre essa possibilidade de
relativização ou limitação voluntária dos direitos da personalidade.
Enunciado n.º 4: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação
voluntária, desde que não seja permanente nem geral”.
Significa dizer, portanto, que em cada caso concreto deverá ser feito um
sopesamento a fim de verificar se é ou não necessária a relativização do direito da
personalidade.
Ex.: biografias não autorizadas. Podem ser publicadas, embora sem autorização,
referente a pessoas públicas. Relativização dos direitos da personalidade em nome
a vedação da censura.
Enunciado n.º 139: “Os direitos da personalidade podem sofrer limitações, ainda
que não especificamente previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso
de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes”.
Ex.: proteção da intimidade e vida privada é relativizada quando há uma exposição
desse direito. Top less em praia pública – relativização da intimidade.
Ex.: art. 15, CC. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a
tratamento médico ou a intervenção cirúrgica. Um paciente, a beira da morte,
necessita de cirurgia. A intervenção trará alto risco, gerando dúvidas se o médico
deve ou não realizar o procedimento. Isso gera uma série de discussões, pois há
resoluções do Conselho Federal de Medicina que autorizam o médico a suspender
o tratamento de pacientes terminais, de doenças incuráveis quando assim for de
32
sua vontade (ortotanásia). Contudo, decisões judiciais já foram contrárias a essa
prática.
Há, ainda, o Enunciado 528, das Jornadas de Direito Civil, que autoriza o chamado
testamento vital ou biológico, que nada mais é do que uma autorização para a
prática da suspensão do tratamento médico:
“É válida a declaração de vontade expressa em documento autêntico, também
chamado "testamento vital", em que a pessoa estabelece disposições sobre o tipo
de tratamento de saúde, ou não tratamento, que deseja no caso de se encontrar
sem condições de manifestar a sua vontade”.
De igual modo, há, também a situação de paciente que, em razão de sua crença
religiosa, não permita submissão a tratamento médico. No caso de este paciente
estar sob risco real e iminente de morte, pode ser dispensada a autorização para a
realização de cirurgia. Significa dizer, então que, nestes casos, o médico pode salvar
a vida, mesmo sem a autorização do paciente ou familiar. Trata-se de um conflito
entre o direito a vida e o direito a liberdade religiosa. Deve-se utilizar a técnica da
ponderação, neste caso. Há quem diga que, pela ponderação, deve prevalecer a
vida. Outros dirão que a vontade do paciente deve ser respeitada. Neste sentido, o
enunciado 403 das Jornadas de Direito Civil:
“O Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art. 5º, VI, da
Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a tratamento
médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de morte, em razão do
tratamento ou da falta dele, desde que observados os seguintes critérios: a)
capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo representante ou assistente; b)
manifestação de vontade livre, consciente e informada; e c) oposição que diga
respeito exclusivamente à própria pessoa do declarante.”
• Generalidade: são outorgados a todas as pessoas, pelo simples fato de existirem.
• Extrapatrimonialidade: ausência de conteúdo patrimonial direto, ou seja, os
direitos, em si, não possuem valor patrimonial, ainda que, havendo lesão, possa
haver indenização pecuniária (mas, neste caso, em razão do dano causado).
• Indisponibilidade: significa que tais direitos não podem, por vontade do indivíduo,
mudar de titular. Abrange tanto a intransmissibilidade (impossibilidade de
modificação de titular gratuita ou onerosa, ou seja, não é possível ceder tal direito a
outrem), como a inalienabilidade (não podem ser alienados), a inacessibilidade
(não podem ser objeto de cessão), e a intransacionabilidade (não podem sofrer
transação ou compromisso de arbitragem). É permitida, contudo, a cessão de uso
da imagem, por exemplo, (famoso que autoriza a utilização de sua imagem em
outdoors). Isso significa que há uma parcela dos direitos da personalidade, que se
33
relaciona a direitos patrimoniais, que pode ser passível de disposição (direitos de
imagem, direitos autorais, cessão de partes do corpo para fins científicos ou
altruísticos – art. 14, CC).
• Irrenunciabilidade: trata-se da impossibilidade voluntária do abandono, de
abdicar, de forma que ninguém pode renunciar direitos da personalidade.
Exemplo: contrato de namoro. Este contrato é nulo, pois seria uma forma de
pessoas que vivem em união estável renunciarem aos direitos dela decorrentes. A
união estável envolve direitos existenciais de personalidade. Ademais, é uma
espécie de fraude a lei imperativa, o que conduz a nulidade absoluta do
documento firmado (art. 166, VI, CC).
Outro exemplo seriam os reality shows (Big Brother Brasil), onde o participante
renuncia a qualquer direito de buscar indenização por danos morais em
decorrência da exibição de sua imagem. Tal contrato também é nulo, pois não é
possível a renúncia a direitos da personalidade, a teor dos arts. 11 e 166, VI, CC.
Nestes casos é possível, inclusive, que se utilize das medidas previstas no art. 12, CC
para fazer cessar a exibição das imagens que violem a moral do participante.
• Imprescritibilidade: não se extinguem pelo não uso, de forma que não há prazo
para o seu exercício. Salienta-se que esta imprescritibilidade é quanto ao direito
em si, não quanto ao exercício do direito de reparação quanto a dano moral pela
violação do direito da personalidade (honra, p.ex.).
O exercício do direito a reparação de danos se sujeita a prazos prescricionais – 3
anos, no caso, nos termos do art. 206, § 3.º, V, CC.
Contudo, existem decisões do STJ que reconhecem a imprescritibilidade do pleito
de reparação de danos: “É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de
Justiça segundo o qual as ações de indenização por danos morais e materiais
decorrentes de atos de violência ocorridos durante o Regime Militar são
consideradas imprescritíveis, independentemente dos legitimados ad causam.”
“Como é cediço, a prescritibilidade é a regra, só havendo falar em
imprescritibilidade em hipóteses excepcionalíssimas, como no tocante às ações
referentes ao estado das pessoas. Somente alguns direitos subjetivos, observada
sua envergadura e especial proteção, não estão sujeitos a prazos prescricionais,
como na hipótese de ações declaratórias de nulidades absolutas, pretensões
relativas a direitos da personalidade e ao patrimônio público”. (EDcl no AgRg no
REsp 1229068/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado
em 06/10/2015, DJe 16/10/2015)
• Impenhorabilidade: em razão de serem inerentes à pessoa e dela inseparáveis,
não podem ser penhoráveis, pois a função da penhora é a venda judicial para
34
satisfação de um crédito. Contudo, esta indisponibilidade é quanto ao direito em si
(vedação da penhora do direito à imagem), mas não se refere a penhora dos
direitos patrimoniais resultantes do exercício deste direito (a cessão de uso da
imagem gera um ressarcimento patrimonial e, este, pode ser penhorado). O art.
832, CPC/2015 determina que estão a salvo da execução os bens que a lei considere
impenhoráveis ou inalienáveis. Neste caso, enquadram-se os direitos da
personalidade.
• Vitaliciedade: são adquiridos no momento da concepção e acompanham a pessoa
até sua morte, ainda que alguns desses direitos sejam resguardados mesmo após
a morte da pessoa (honra, memória, direito de autor, p. ex.). Ex.: não é porque o
Chico Anísio faleceu que sua imagem caiu no domínio público. Há o direito de
indenização pelo uso indevido da imagem do humorista. Neste sentido, o art. 12
define que a legitimação para requerer a indenização é do cônjuge sobrevivente
ou qualquer parente em linha reta (filho, neto, pais, avós) ou colateral até quarto
grau (primos).
3.4.4 Classificação
Apesar de haver um rol de direitos da personalidade previsto no Código Civil, este rol não é
taxativo (enunciado 274, Jornada de Direito Civil). São direitos inatos ao ser humano, qualidades
que se agregam ao homem. O texto protege a vida, nome integridade físico-psíquica, honra,
imagem, intimidade e produção intelectual. Contudo, não tutela questões de liberdade sexual,
por exemplo. A proteção quanto aos direitos da personalidade divide-se em:
a) CORPO – Vida e integridade física (corpo vivo, cadáver, voz).
b) MENTE – integridade psíquica e criações intelectuais (liberdade, criações intelectuais,
privacidade, segredo).
c) ESPÍRITO – integridade moral (honra, imagem, identidade pessoal).
Aborto: interrupção criminosa da vida em formação. É crime previsto nos arts. 124 a 227,
CP. Contudo, há a exclusão do crime em diferentes hipóteses:
Aborto terapêutico – não houver outro meio de salvar a vida da Mãe. Art. 128,I, CP
Aborto sentimental (ético) – consentido pela gestante, quando a gravidez resultar de
estupro. Art. 128,II, CP
Aborto de feto anencefálico – feto que, comprovadamente, não possui atividade cerebral –
decisão do STF na ADPF 54 (2012).
Aborto dentro do primeiro trimestre de gestação – “... 3. Em segundo lugar, é preciso
conferir interpretação conforme a Constituição aos próprios arts. 124 a 126 do Código Penal –
que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção
voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. A criminalização, nessa hipótese,
viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da
proporcionalidade. 4. A criminalização é incompatível com os seguintes direitos fundamentais:
os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter
uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas
escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo
e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que homens não
engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da
mulher nessa matéria”. (HC 124306, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:
Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-052 DIVULG 16-03-2017 PUBLIC 17-03-2017).
Fertilização in vitro: nos casos de fertilização in vitro, mesmo havendo o descarte dos
embriões que tenham sido fecundados, o STF decidiu, no julgamento da Lei de Biossegurança
36
(ADI 3510), que não há aborto neste caso, pois não houve a gravidez ainda, sendo, portanto,
permitida a realização de pesquisa em células tronco embrionárias.
37
Pode haver, também, cessão de direitos de uso de material biológico, para fins de
pesquisa, nos termos do enunciado 401 das Jornadas de Direito Civil:
Não contraria os bons costumes a cessão gratuita de direitos de uso de
material biológico para fins de pesquisa científica, desde que a
manifestação de vontade tenha sido livre, esclarecida e puder ser
revogada a qualquer tempo, conforme as normas éticas que regem a
pesquisa científica e o respeito aos direitos fundamentais.
O art. 14, por sua vez, dispõe sobre a disposição post mortem do próprio corpo:
Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição
gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a
qualquer tempo.
Para tanto, é preciso que seja diagnosticada a morte encefálica. Assim, se o indivíduo
pretende ser doador, deverá deixar declaração escrita. Se nada dispuser a respeito, a família
deverá anuir expressamente para que seja feita a doação. Nesse sentido, o enunciado 277 das
Jornadas de Direito Civil:
O art. 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do
próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico, para depois da
morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos
38
em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação
do art. 4º da Lei n. 9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do
potencial doador.
Segundo o art. 15, CC, ninguém pode ser obrigado a submeter-se a tratamento médico ou
cirúrgico que importe risco de vida.
Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida,
a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.
Não significa que tratamentos de risco sejam vedados, mas o indivíduo deve estar ciente,
antes de se submeter a tal tratamento, dos riscos dele provenientes. Cabe, portanto, ao médico,
informar ao paciente, devendo registrar tal fato por escrito, para evitar responsabilidades
futuras.
O doente pode, portanto, negar-se a tratamento de risco. Nesse aspecto, o enunciado 403
das Jornadas de Direito Civil prevê:
O Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art. 5º,
VI, da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a
tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de
morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observados
os seguintes critérios: a) capacidade civil plena, excluído o suprimento
pelo representante ou assistente; b) manifestação de vontade livre,
consciente e informada; e c) oposição que diga respeito exclusivamente à
própria pessoa do declarante.
39
Também o enunciado 533 das Jornadas de Direito Civil dispõe:
O paciente plenamente capaz poderá deliberar sobre todos os aspectos
concernentes a tratamento médico que possa lhe causar risco de vida,
seja imediato ou mediato, salvo as situações de emergência ou no curso
de procedimentos médicos cirúrgicos que não possam ser
interrompidos.
Nome é a designação jurídica pela qual a pessoa é conhecida no mundo. Assim, envolve o
sentido completo do termo → nome + sobrenome. Esse elemento serve para individualizar a
pessoa, tanto durante a vida, quanto durante a morte, passando a integrar a personalidade do
indivíduo (tanto que é protegido o nome enquanto direito da personalidade).
O nome é um código identificador de cada pessoa. É uma designação pela qual a pessoa
identifica-se na família e na sociedade. É uma característica marcante da personalidade, sendo
inalienável e imprescritível da individualidade da pessoa. Dessa forma, todo ser humano deve
portar um nome.
Dessa forma, nome é o nome completo. Ex.: Maitê Damé Teixeira Lemos. Constitui-se de
prenome e sobrenome. Ex:
Maitê – prenome (nome próprio)
Damé Teixeira Lemos – sobrenome, apelido familiar, nome de família (nome).
No Brasil, os pais podem escolher livremente o prenome dos filhos, desde que não o
exponham ao ridículo. Ex.: FACEBOOKSSON.
Nesse sentido, o § único, do art. 55 da Lei dos Registros Públicos dispõe que:
Os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor
ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com
40
a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independente da
cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz competente.
Depois de passado esse prazo de 1 ano a alteração poderá ser feita mas, neste caso,
dependerá de ordem judicial, nos termos do art. 57, LRP.
O art. 57 da Lei dos Registros Públicas autoriza a alteração quando houver evidente erro
gráfico, a alteração poderá ser feita, nos termos do art. 57, Lei dos Registros Públicos, através do
procedimento previsto no art. 110, da mesma Lei:
Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e
motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por
sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o
mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a
hipótese do art. 110 desta Lei.
Art. 110. Os erros que não exijam qualquer indagação para a constatação
imediata de necessidade de sua correção poderão ser corrigidos de ofício
pelo oficial de registro no próprio cartório onde se encontrar o
assentamento, mediante petição assinada pelo interessado,
representante legal ou procurador, independentemente de pagamento
de selos e taxas, após manifestação conclusiva do Ministério Público.
§ 1o Recebido o requerimento instruído com os documentos que
comprovem o erro, o oficial submetê-lo-á ao órgão do Ministério Público
que o despachará em 5 (cinco) dias.
§ 2o Quando a prova depender de dados existentes no próprio
cartório, poderá o oficial certificá-lo nos autos.
§ 3o Entendendo o órgão do Ministério Público que o pedido exige
maior indagação, requererá ao juiz a distribuição dos autos a um dos
cartórios da circunscrição, caso em que se processará a retificação, com
assistência de advogado, observado o rito sumaríssimo.
§ 4o Deferido o pedido, o oficial averbará a retificação à margem do
registro, mencionando o número do protocolo e a data da sentença e seu
trânsito em julgado, quando for o caso.
Quando a mudança for necessária em razão de expor seu portador ao ridículo, assim
como outras alterações, dependerá de procedimento judicial de retificação de nome, nos
termos do art. 109, LRP:
42
Art. 109. Quem pretender que se restaure, supra ou retifique
assentamento no Registro Civil, requererá, em petição fundamentada e
instruída com documentos ou com indicação de testemunhas, que o Juiz
o ordene, ouvido o órgão do Ministério Público e os interessados, no
prazo de cinco dias, que correrá em cartório.
§ 1° Se qualquer interessado ou o órgão do Ministério Público
impugnar o pedido, o Juiz determinará a produção da prova, dentro do
prazo de dez dias e ouvidos, sucessivamente, em três dias, os
interessados e o órgão do Ministério Público, decidirá em cinco dias.
§ 2° Se não houver impugnação ou necessidade de mais provas, o
Juiz decidirá no prazo de cinco dias.
§ 3º Da decisão do Juiz, caberá o recurso de apelação com ambos os
efeitos.
§ 4º Julgado procedente o pedido, o Juiz ordenará que se expeça
mandado para que seja lavrado, restaurado e retificado o assentamento,
indicando, com precisão, os fatos ou circunstâncias que devam ser
retificados, e em que sentido, ou os que devam ser objeto do novo
assentamento.
§ 5º Se houver de ser cumprido em jurisdição diversa, o mandado
será remetido, por ofício, ao Juiz sob cuja jurisdição estiver o cartório do
Registro Civil e, com o seu "cumpra-se", executar-se-á.
§ 6º As retificações serão feitas à margem do registro, com as
indicações necessárias, ou, quando for o caso, com a trasladação do
mandado, que ficará arquivado. Se não houver espaço, far-se-á o
transporte do assento, com as remissões à margem do registro original.
Esta hipótese serve para os casos de pessoas do sexo masculino registradas com nome
feminino. Ex.: Arlete, Salete, etc.
Também é possível a alteração do prenome registral pelo prenome de uso. Essa
autorização está contida no art. 58 da Lei dos Registros Públicos:
Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua
substituição por apelidos públicos notórios.
Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em
razão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a
apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente,
ouvido o Ministério Público.
43
Isto porque, a função da imutabilidade do prenome é pelo fato de que a pessoa é
conhecida por aquele signo distintivo. Contudo, se a notoriedade é em razão de outro prenome,
este é que passa a ser imutável. Ex.: Pelé = Edson Arantes do Nascimento. A notoriedade do
prenome Pelé é muito maior do que Arantes. Neste caso, é possível que, caso ele tenha
interesse, faça requerimento para alterar o prenome para “Pelé Arantes do Nascimento” ou
“Zezé de Camargo” = Welson David de Camargo.
Também há a possibilidade de alteração em razão da situação de transexual operado,
quando o registro civil passa a não corresponder com a realidade física, não correspondendo,
portanto, a verdade. Nesse sentido, essa alteração tem sido autorizada, tanto do registro do
nome, quanto do sexo. Deve-se observar que a ADI 4275, julgada em março de 2018 autorizou a
alteração do prenome dos transexuais, independentemente de alteração do sexo e de
autorização judicial:
... julgou procedente a ação para dar à lei dos registros interpretação
conforme a Constituição Federal e pactos internacionais que tratam dos
direitos fundamentais, a fim de reconhecer aos transgêneros que
desejarem o direito à alteração de nome e gênero no assento de registro
civil, independentemente da cirurgia. Para ela, são desnecessários a
autorização judicial e os requisitos propostos.
(http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=3710
85)
44
Art. 59. Quando se tratar de filho ilegítimo, não será declarado o nome do
pai sem que este expressamente o autorize e compareça, por si ou por
procurador especial, para, reconhecendo-o, assinar, ou não sabendo ou
não podendo, mandar assinar a seu rogo o respectivo assento com duas
testemunhas.
Nestes casos, para que haja o registro dos filhos, basta que compareça a mulher portando
a certidão de casamento. Neste caso, o filho será registrado como filho do casal. Contudo, se o
filho não for advindo de relação matrimonial, dependerá da presença do pai para que faça o
registro, quando, então, estará reconhecendo voluntariamente o filho.
O nome tem uma importância tanto pública quanto individual. A importância pública do
nome se dá em razão de que o Estado tem interesse na identificação correta e precisa dos
indivíduos, determinado, assim, que seja procedido seu registro (nos termos da Lei dos
Registros Públicos), vedando sua alteração (somente em casos excepcionais é admitida). A
importância individual está no direito ao nome, que cada indivíduo tenha direito a portar um
signo identificador e, mais do que isto, de exigir o respeito e proteção a este signo identificador,
podendo reprimir abuso por parte de terceiros. A proteção ao nome é feita através de ações
(dano moral, p.ex.). Através dessas ações podem ser exigidos, por exemplo, que seja divulgado o
45
nome verdadeiro: ex.: sai uma foto publicada no jornal, de dois amigos (João e Carlos). Logo em
seguida a descrição: Joãozinho e sua namorada. Cabe, neste caso, uma ação para contestar o
nome publicado, exigindo a retificação, a fim de que conste o nome correto.
Nesse sentido, os arts. 17 e 18, CC preveem:
Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em
publicações ou representações que a exponham ao desprezo público,
ainda quando não haja intenção difamatória.
Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda
comercial.
Havendo violação ao direito ao nome é cabível a reparação por danos. Ex.: Luciano Huck
entrou com processo de indenização por danos contra um empreendimento imobiliário que,
para vender maior número de imóveis, veiculou que seria um atrativo o fato de que Huck seria
um dos moradores.
Nesse sentido, há a súmula 403, STJ que determina que “Independe de prova do prejuízo
a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou
comerciais”.
Os responsáveis pelo ressarcimento serão tanto o autor da publicação quanto o veículo de
divulgação. É o que prevê a súmula 221, STJ: “São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de
dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do
veículo de divulgação”.
Além disso, também não se pode esquecer que há a utilização dos chamados
pseudônimos, ou seja, nomes figurativos ou codinomes, nomes fictícios que servem para
identificar o autor do escrito, normalmente artistas. Ex.: Fafá de Belém (Maria de Fátima Palha
de Figueiredo); Cazuza (Agenor de Miranda Araújo Neto); Lima Duarte (Ariclenes Venâncio
Martins); Xuxa (Maria da Graça Meneguel). Esses pseudônimos, quando usados licitamente,
gozam da mesma proteção que se dá ao nome (art. 19, CC):
Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção
que se dá ao nome.
O enunciado 275 das Jornadas de Direito Civil incluiu o companheiro também como
legitimado:
O rol dos legitimados de que tratam os arts. 12, parágrafo único, e 20,
parágrafo único, do Código Civil também compreende o companheiro.
Trata-se da tutela da voz, também protegida pelo art. 5.º, XXVIII, a, CF. Neste caso se
enquadra o caso de Galvão Bueno, por exemplo.
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à
reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades
desportivas;
A pessoa que tiver sua imagem ou voz utilizadas de forma indevida, sem autorização,
poderá acionar a justiça para impedir o uso e, ainda, receber indenização pelo uso indevido.
Contudo, o STJ julgou a ADIn 4815, que dá ao art. 20, CC interpretação conforme a
Constituição. Nesta ação, foi autorizada a publicação das “biografias não autorizadas”, ou seja, a
possibilidade de publicação de obras biográficas literárias ou audiovisuais, independentemente
do consentimento do biografado. O Presidente do STF a época (Ricardo Lewandowski) afirmou
que “não é possível que haja censura ou se exija autorização prévia para a produção e
publicação de biografias”, de forma que “a censura prévia está afastada, com plena liberdade de
expressão artística, científica, histórica e literária, desde que não se ofendam os direitos
constitucionais dos biografados”.
Trata-se de uma forma de limitação dos direitos da personalidade, que acaba ocorrendo
através da ponderação ou aplicação do princípio da proporcionalidade. Nesse sentido é a
redação do enunciado 279 das Jornadas de Direito Civil:
Trata-se de uma forma de limitação dos direitos da personalidade, que
acaba ocorrendo através da ponderação ou aplicação do princípio da
proporcionalidade.
47
a) Proteção à intimidade
O art. 5.º, X, da CF prevê:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;
De início, é preciso que se diferencie privacidade e intimidade, pois são diferentes.
Contudo, a linha divisória é muito tênue, quase imperceptível.
Privacidade ou vida privada = comportamentos e acontecimentos atinentes aos
relacionamentos pessoais em geral, relações comerciais e profissionais que o indivíduo não
deseja que se espalhem ao conhecimento público. Se refere àquilo que a pessoa deseja excluir
do conhecimento pelos outros. É o controle das informações sobre si mesmo. É o direito do
indivíduo não ter seus assuntos pessoais e profissionais expostos a terceiros.
Intimidade = conversações, episódios mais íntimos, envolvendo relações familiares e
amizades mais próximas. A intimidade, como atributo da personalidade, é a vida familiar,
pessoal, a vida interior da pessoa; é aquela vivida entre quatro paredes, em sua residência,
incluindo-se na esfera mais íntima.
Deve-se destacar que há interesse público sobre acontecimentos que ocorram com
determinadas pessoas, por serem públicas. É o que acontece com as celebridades, artistas,
quando fatos relativos a sua privacidade são expostos para o público, para satisfazer o interesse
geral. Assim, existem fatos da privacidade de alguém que, levados a público, podem ser tidos
como admissíveis ou como abusivos, tudo dependendo da maneira como o indivíduo que está
sendo exposto vive.
Os direitos fundamentais, como vimos, podem ser objeto de restrições, no limite da
dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, é possível que alguém, por ocasião da morte de
um ente querido, dê entrevista a respeito. Ex.: caso da morte de Rafael Mascarenhas, filho da
atriz Cissa Guimarães. O caso teve maior publicização em razão da mãe do rapaz ser pessoa
pública. A atriz limitou sua intimidade e expôs o caso para a imprensa, dando entrevistas e
falando sobre a dor da perda do filho.
Nesse sentido, é de se verificar até que ponto houve a autorização para a publicação da
imagem da pessoa, invadindo sua intimidade. Por isso, deve-se levar em conta a forma como a
pessoa leva a vida, ou seja, seu modo de agir. Como exemplo, tem-se o fato de uma mulher,
fazendo “top-less” ser fotografada em uma praia pública. O seu agir está a expor sua intimidade.
Dessa forma, não há como querer impedir a publicação de uma foto na qual ela apareça.
Nesse sentido é o julgado do STJ:
DIREITO CIVIL. DIREITO DE IMAGEM. TOPLESS PRATICADO EM CENÁRIO
PÚBLICO.
48
Não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade,
estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para
torná-la imune de qualquer veiculação atinente a sua imagem.
Se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou
indevida sua reprodução pela imprensa, uma vez que a proteção à
privacidade encontra limite na própria exposição realizada.
Recurso especial não conhecido.
(REsp 595600/SC, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA,
julgado em 18/03/2004)
Contudo, a questão do interesse público não deve ser confundida com o interesse do
público. Isso porque, por óbvio, a revelação de algum hábito sexual heterodoxo de um político
não possui o mesmo coeficiente de interesse relevante que teria o noticiário de igual
comportamento praticado por um cidadão comum. Assim, não deve-se confundir o interesse
público com o interesse do público, de maneira a expor a vida de pessoas pública apenas para
satisfazer as curiosidades do público, sem qualquer relevância pública.
Dessa forma, deve haver uma ponderação entre o interesse público da notícia e a
privacidade do indivíduo, a fim de verificar qual dos dois direitos fundamentais será mais
importante se proteger no caso concreto.
Isso não quer dizer que todo homem público, por assim o ser, terá seu direito à
privacidade sempre preterido em razão do interesse público. Pelo contrário, ele possui igual
proteção desse direito, como se sujeito comum fosse. Contudo, existem casos, que sua conduta,
em razão da exposição pública, gera o interesse público, de maneira que possa haver a
limitação do seu direito à intimidade.
E mais, para que haja a exposição da privacidade do homem público, deve haver o
interesse público, no sentido de constituir um elemento útil a que o indivíduo que vai receber a
informação se oriente melhor na sociedade em que vive, ou seja, não basta só o interesse do
público, mas o interesse público, a utilidade da informação veiculada. Não se inclui, portanto, os
hábitos sexuais ou alimentares do homem público, pois isso em nada traz utilidade da
informação para a sociedade.
O mesmo ocorre com quem deixou de ser homem público e volta ao anonimato. Essa
pessoa deve ser “deixada de lado”, de maneira a ser respeitada sua intimidade e sua vida
privada, pois deixou de ser de interesse público. Também no mesmo sentido é a proteção
daqueles que deixam a penitenciária e precisam se reajustar à sociedade. Eles possuem o
direito de não ter expostos os motivos que o levaram à prisão, pois já cumpriram com sua pena
e, agora, tem o direito de recomeçar, de maneira a não terem sua vida privada exposta
novamente. Esta é a tutela do chamado “direito ao esquecimento”, conforme previsão dos
enunciados abaixo:
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Enunciado 531: A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da
informação inclui o direito ao esquecimento.
Enunciado 576: O direito ao esquecimento pode ser assegurado por
tutela judicial inibitória.
Verifica-se, pois, que cabe se utilizar de tutela inibitória para evitar a lesão e reparação de
danos para a vítima, a fim de reparar o dano sofrido.
O direito ao esquecimento deve ser reconhecido, portanto, como direito da personalidade.
Na verdade, como resumo, para verificação da proteção à intimidade e à vida privada, em
conflito com o direito à liberdade de informação, deve-se levar em conta o princípio da
proporcionalidade e suas máximas (necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido
estrito). Trata-se da utilização da técnica de ponderação que se encontra tipificada no Código de
Processo Civil. Essa técnica, embora possa sofrer críticas é utilizada pelo STJ:
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E
MATERIAIS DECORRENTES DA REALIZAÇÃO DE EXAME DE HIV NÃO
SOLICITADO, POR MEIO DO QUAL O PACIENTE OBTEVE A INFORMAÇÃO
DE SER SOROPOSITIVO - VIOLAÇÃO AO DIREITO À INTIMIDADE - NÃO
OCORRÊNCIA - INFORMAÇÃO CORRETA E SIGILOSA SOBRE SEU
ESTADO DE SAÚDE - FATO QUE PROPORCIONA AO PACIENTE A
PROTEÇÃO A UM DIREITO MAIOR, SOB O ENFOQUE INDIVIDUAL E
PÚBLICO - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I - O direito à intimidade, não é absoluto, aliás, como todo e qualquer
direito individual. Na verdade, é de se admitir, excepcionalmente, a
tangibilidade ao direito à intimidade, em hipóteses em que esta se revele
necessária à preservação de um direito maior, seja sob o prisma
individual, seja sob o enfoque do interesse público. Tal exame, é certo,
não prescinde, em hipótese alguma, da adoção do princípio da
dignidade da pessoa humana, como princípio basilar e norteador do
Estado Democrático de Direito, e da razoabilidade, como critério
axiológico;
II - Sob o prisma individual, o direito de o indivíduo não saber que é
portador do vírus HIV (caso se entenda que este seja um direito seu,
decorrente da sua intimidade), sucumbe, é suplantado por um direito
maior, qual seja, o direito à vida, o direito à vida com mais saúde, o direito
à vida mais longeva e saudável;
III - Mesmo que o indivíduo não tenha interesse ou não queira ter
conhecimento sobre a enfermidade que lhe acomete (seja qual for a
razão), a informação correta e sigilosa sobre seu estado de saúde dada
50
pelo Hospital ou Laboratório, ainda que de forma involuntária, tal como
ocorrera na hipótese dos autos, não tem o condão de afrontar sua
intimidade, na medida em que lhe proporciona a proteção a um direito
maior;
IV - Não se afigura permitido, tão-pouco razoável que o indivíduo, com o
desiderato inequívoco de resguardar sua saúde, após recorrer ao seu
médico, que lhe determinou a realização de uma série de exames, vir à
juízo aduzir justamente que tinha o direito de não saber que é portador
de determinada doença, ainda que o conhecimento desta tenha se dado
de forma involuntária. Tal proceder aproxima-se, em muito, da defesa em
juízo da própria torpeza, não merecendo, por isso, guarida do Poder
Judiciário;
V - No caso dos autos, o exame efetuado pelo Hospital não contém
equívoco, o que permite concluir que o abalo psíquico suportado pelo
ora recorrente não decorre da conduta do Hospital, mas sim do fato de o
recorrente ser portador do vírus HIV, no que o Hospital-recorrido, é certo,
não possui qualquer responsabilidade;
VI - Sob o enfoque do interesse público, assinala-se que a opção de o
paciente se submeter ou não a um tratamento de combate ao vírus HIV,
que, ressalte-se, somente se tornou possível e, certamente, mais eficaz
graças ao conhecimento da doença, dado por ato involuntário do
Hospital, é de seu exclusivo arbítrio. Entretanto, o comportamento
destinado a omitir-se sobre o conhecimento da doença, que, em última
análise, gera condutas igualmente omissivas quanto à prevenção e
disseminação do vírus HIV, vai de encontro aos anseios sociais;
VII - Num momento em que o Poder Público, por meio de exaustivas
campanhas de saúde, incentiva a feitura do exame anti HIV como uma
das principais formas de prevenção e controle da disseminação do vírus
HIV, tem-se que o comando emanado desta augusta Corte, de
repercussão e abrangência nacional, no sentido de que o cidadão teria o
direito subjetivo de não saber que é soropositivo, configuraria indevida
sobreposição de um direito individual (que, em si não se sustenta, tal
como demonstrado) sobre o interesse público, o que, data maxima venia,
não se afigura escorreito;
VII - Recurso Especial improvido.
51
(REsp 1195995/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão
Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2011, DJe
06/04/2011)
4.1.2 Vontade humana criadora: A manifestação da vontade dos indivíduos que compõe a
pessoa jurídica é indispensável para sua existência. Não há como se compreender a formação
de uma pessoa jurídica por determinação estatal, por exemplo.
4.1.3 Observância das condições legais para a instituição: devem ser cumpridas as
exigências legais para que a pessoa jurídica passe a existir e ser dotada de personalidade
52
jurídica. Assim, há a necessidade de que os atos constitutivos da pessoa jurídica (estatuto
social ou contrato social) sejam registrados no registro peculiar (registro das pessoas
jurídicas). Dependendo do tipo de atividade, há, também, a necessidade de autorização
do governo para o funcionamento (ex.: companhias de seguro).
4.1.4 Licitude do objeto: o objeto da pessoa jurídica (a atividade a ser desenvolvida) deve ser
lícito e não ser proibido pelo sistema jurídico, ou seja, não é possível uma pessoa jurídica
criada para comercialização de drogas ilícitas.
4.2 Surgimento da pessoa jurídica – início da personalidade
A pessoa jurídica, por sua vez, surge por obra humana (atos bilaterais – criação por
contrato ou unilaterais – criação por testamento) e com a inscrição dos atos constitutivos no
registro competente. É nesse sentido a determinação do art. 45, CC:
Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado
com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida,
quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo,
averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato
constitutivo.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das
pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo,
contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro.
53
II - o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos
diretores;
III - o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente,
judicial e extrajudicialmente;
IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de
que modo;
V - se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas
obrigações sociais;
VI - as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu
patrimônio, nesse caso.
A pessoa jurídica só surge no momento do seu registro. Antes disso, não se fala em pessoa
jurídica enquanto sujeito de direito. Assim, antes de realizado o registro civil da pessoa
jurídica, só se pode falar em sociedade irregular ou de fato, que é a pessoa jurídica desprovida
de personalidade jurídica, mas com capacidade para se obrigar perante terceiros. A disciplina
desse tipo societário é trazida pelo livro referente ao Direito de Empresa, no Código Civil, no art.
986, CC:
Art. 986. Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a
sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto neste
Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem
compatíveis, as normas da sociedade simples.
Assim, existe o benefício de ordem (executar primeiro os bens da sociedade para, depois,
os do sócio), mas não para o sócio que contratou pela sociedade (sócio representante).
Uma questão se impõe: uma sociedade foi criada em 01/06/2011, mas só foi registrada em
03/04/2012. Durante este período realizou negócios jurídicos. Como ficará esta situação?
Durante o período em que não houve o registro a sociedade é irregular e, com isso, há a
responsabilidade ilimitada dos sócios. Após o registro, passará a existir a personalidade jurídica
da sociedade e, em razão disso, será diferida da personalidade de seus sócios.
54
Contudo, a constituição irregular da sociedade/pessoa jurídica não é justificativa para que
os contratantes se neguem a pagar o valor devido à pessoa jurídica.
55
* Para todos verem: esquema
São pessoas jurídicas de direito público interno a União, Estados, Distrito Federal,
Territórios, Municípios, autarquias e demais entidades de caráter público.
São pessoas jurídicas de direito público externo as organizações internacionais (ONU, OIT,
etc) e a Santa Sé ou outras entidades congêneres.
Para o direito civil interessam apenas as associações, sociedades e fundações.
a) Associações
Nos termos do art. 53, CC, as associações são entidades, formadas pela união de
indivíduos, que tem como objetivo fim não econômico. Não são, portanto, empresas. Não
visam lucro. Podem ter lucro, mas não podem ter fins lucrativos. Seus lucros devem ser
revertidos para a própria associação. O que não há, neste caso é a partilha de dividendos
advindos da sociedade. A receita obtida serve para reverter em benefício da própria associação,
visando a melhoria das atividades.
Não existem direitos e obrigações recíprocos entre a associação e os associados (art. 53,
§único, CC). Dessa forma, o associado constitui-se de uma individualidade, com seu patrimônio,
direitos e obrigações próprios e, a associação, outra individualidade, com seus bens, obrigações
e direitos, sem que haja reciprocidade.
Sua criação se dá através de estatuto, nos termos do art. 54, CC, que faz a previsão do que
é necessário conter no estatuto das associações, no mínimo:
Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá:
I - a denominação, os fins e a sede da associação;
56
II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;
III - os direitos e deveres dos associados;
IV - as fontes de recursos para sua manutenção;
V – o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos
deliberativos;
VI - as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a
dissolução.
VII – a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas
contas.
b) Sociedades
O Código Civil de 2002 revogou a parte inicial do Código Comercial, passando, dessa
forma, a disciplinar a matéria relativa ao direito societário. No Direito Civil trabalha-se apenas
com noções gerais a respeito do direito societário, já que existe matéria específica com este fim.
57
De qualquer forma, sociedade pode ser conceituada como sendo uma agregação de
pessoas com mesmos objetivos e fins econômicos – pretende ganhar dinheiro. Ex.: floricultura,
empresa de ônibus, etc.
O objetivo da sociedade é exercer uma atividade econômica e partilhar os lucros.
Constitui-se via contrato social, através da união de duas ou mais pessoas, nos termos do art.
981, CC:
Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente
se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de
atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou
mais negócios determinados.
As sociedades podem ser empresárias ou simples. Empresárias, que são as que exploram
empresa, desenvolvem atividade econômica de circulação de bens ou serviços. Empresário, por
sua vez, é aquela pessoa que desenvolve profissionalmente a atividade econômica organizada
(art. 966, CC). Simples são as que exploram atividades econômicas específicas. (art. 982, CC). As
sociedades simples foram introduzidas pelo novo Código Civil em substituição às sociedades
civis, abrangendo aquelas sociedades que não exercem atividade própria de empresário sujeito
a registro (art. 982), isto é, atividades não empresariais ou atividade de empresário rural. Ex.:
sociedade de advogados.
A sociedade só adquire personalidade com o registro de seus atos constitutivos no
Registro Público de Empresas Mercantis – Junta Comercial dos Estados (se empresária) ou no
Registro Civil das Pessoas Jurídicas 9se não empresárias).
c) Fundações
As fundações são patrimônios personalizados, pois não são compostas, não resultam da
união de pessoas, mas sim da afetação de um patrimônio. A finalidade da fundação está
determinada na lei, não podendo ser criadas fundações para fins diferentes daqueles previstos
no art. 62, CC:
Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura
pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o
fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.
Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins
de:
I – assistência social;
II – cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;
III – educação;
58
IV – saúde;
V – segurança alimentar e nutricional;
VI – defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do
desenvolvimento sustentável;
VII – pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas,
modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de
informações e conhecimentos técnicos e científicos;
VIII – promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos
humanos;
IX – atividades religiosas;
Para a criação da fundação, o instituidor determina que seu patrimônio (e os frutos dele)
seja empregado na concretização dos fins por ele escolhidos (dentre o rol do parágrafo único do
art. 62, CC. O instituidor via testamento ou escritura pública, afeta seu patrimônio, definindo o
fim para o qual se destina.
Para a criação de uma fundação devem ser seguidas algumas etapas:
1)Afetação de bens livres por meio de ato de dotação patrimonial: deve ser destacada
uma parcela do patrimônio pessoal do instituidor, composta por bens móveis e/ou
imóveis.
2) Instituição por escritura pública ou testamento: não é possível por escrito particular,
apenas nestas formas.
3) Elaboração dos estatutos: o próprio instituidor pode elaborar o estatuto da fundação
(forma direta) ou determinar que alguém o faça.
4) Aprovação dos estatutos: o MP tem o dever de aprovar os estatutos da fundação, com
recurso ao juiz, em caso de discordância.
5) Realização do registro civil: deve ser feito o registro dos atos constitutivos no Cartório
do Registro Civil das Pessoas Jurídicas.
Não havendo aprovação unânime, o art. 68, CC prevê que os administradores da fundação
deverão submeter o estatuto ao MP, sendo dado vista a parte vencida para impugnação.
Caso houver desvirtuamento da finalidade da função ou, caso o prazo da existência tenha
se expirado, define o art. 69, CC que o MP promoverá a extinção da fundação e seu patrimônio
será incorporado em outra fundação com fim semelhante ou igual, designada pelo juiz, salvo se
houver disposição contrário no ato constitutivo.
Art. 69. Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a
fundação, ou vencido o prazo de sua existência, o órgão do Ministério
Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção,
incorporando-se o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato
constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz, que
se proponha a fim igual ou semelhante.
d) Organizações religiosas
Organizações religiosas são os agrupamentos de pessoas, cujo propósito é o culto da fé,
possuindo doutrina e rituais próprios. Enquadram-se Igrejas, seitas, confrarias ou irmandades.
Visam a manifestação da espiritualidade humana. É livre a criação de organizações religiosas,
por força do art. 44, § 1.º, CC, bem como do art. 19, I, da CF.
e) Partidos políticos
Partidos políticos são associações de pessoas, unidas por uma ideologia ou interesses
comuns, que, organizadas estavelmente, influenciam a opinião popular e a orientação política
do país2.
É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, tendo como
limitações a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos
fundamentais da pessoa humana.
2
BULOS, Uadi Lâmmego. Curso de direito constitucional. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 882.
60
O art. 17, CF, prevê, ainda, alguns preceitos que devem ser observados:
• Caráter nacional: aquele que tiver repercussão no Brasil inteiro, não sendo possível
partido que atue em apenas uma região. Serve para evitar que interesses de
grupos minoritários e que não representem toda a sociedade venham a ter
legitimidade.
• Proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo
estrangeiros ou de subordinação a estes: controle financeiro que se embasa na
soberania nacional – evita que o Brasil fique subordinado a capital estrangeiro.
• Prestação de contas à Justiça Eleitoral: trata-se de regra que, contudo, sabe-se
não é cumprido, pois, se fosse, não haveria “caixas dois” ou “recursos não
contabilizados”.
• Funcionamento parlamentar de acordo com a lei: a lei é que define os critérios
aferidores do status de nacional.
Autonomia dos partidos políticos – os partidos possuem autonomia para definir sobre
sua organização interna, estatuto, forma de escolha dos candidatos, critérios de filiação, etc.,
devendo, contudo, obedecer às normas de fidelidade e disciplina partidárias. Assim, o Estado
não pode intervir nos partidos políticos que, devem estar de acordo com as diretrizes legais.
Registro partidário – os partidos só adquirem personalidade jurídica depois de efetuarem
o registro de seus estatutos na forma da lei civil e no TSE (art. 17, § 2.º, CF).
61
órgão de representação ou conselho deliberativo que irão atuar em nome da pessoa jurídica.
Nesse sentido:
Art. 47. Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos
nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo.
Art. 48. Se a pessoa jurídica tiver administração coletiva, as decisões se
tomarão pela maioria de votos dos presentes, salvo se o ato constitutivo
dispuser de modo diverso.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular as decisões a que
se refere este artigo, quando violarem a lei ou estatuto, ou forem eivadas
de erro, dolo, simulação ou fraude.
Art. 49. Se a administração da pessoa jurídica vier a faltar, o juiz, a
requerimento de qualquer interessado, nomear-lhe-á administrador
provisório.
62
O objetivo da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine) é
coibir a fraude, sem que, com isso, o instituto da autonomia da pessoa jurídica seja
comprometido. Significa dizer que a desconsideração da personalidade jurídica não coloca em
xeque a personalidade jurídica da empresa, mas tão somente, em certos casos, visando, coibir
fraudes ou abuso de poder, desconsidera a personalidade jurídica da empresa, para atingir o
patrimônio pessoal dos sócios.
A previsão da desconsideração da personalidade jurídica está no art. 50, CC3:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo
desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a
requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber
intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e
determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens
particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica
beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela
Medida Provisória nº 881, de 2019)
§ 1º Para fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização
dolosa da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a
prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Medida
Provisória nº 881, de 2019)
§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de
fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Medida
Provisória nº 881, de 2019)
I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do
administrador ou vice-versa; (Incluído pela Medida Provisória nº 881, de
2019)
II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações,
exceto o de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela
Medida Provisória nº 881, de 2019)
III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
(Incluído pela Medida Provisória nº 881, de 2019)
3
A redação originária do art. 50 do Código Civil é: “Em caso de abuso da personalidade
jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz
decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no
processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos
bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.
63
§ 3º O disposto no caput e nos § 1º e § 2º também se aplica à extensão das
obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído
pela Medida Provisória nº 881, de 2019)
§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos
requisitos de que trata o caput não autoriza a desconsideração da
personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Medida Provisória nº
881, de 2019)
§ 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da
finalidade original da atividade econômica específica da pessoa
jurídica. (Incluído pela Medida Provisória nº 881, de 2019)
65
4.5 Domicílio
Domicílio tem a ver com morada, residência, local onde se localiza. Pode ser civil (local de
residência) ou político (local de votação). Os arts. 70 a 78 tratam do domicílio, tanto da pessoa
natural, quanto da pessoa jurídica.
66
RESIDÊNCIA = há uma estabilidade maior, sendo considerado como local onde ela se
estabelece habitualmente. Ex.: sujeito que mora em uma cidade, sendo ali encontrado
habitualmente. É a residência do indivíduo.
DOMICÍLIO = é mais complexo. Abrange a noção de residência (e, por consequência, de
morada), adicionando o propósito de ali permanecer com âmbito definitivo.
Assim, para que se configure o domicílio, necessária a presença de dois elementos: o
objetivo (residência) e o subjetivo (ânimo definitivo, de fixar-se permanentemente). É a
conjunção desses elementos que forma o domicílio.
Nesse sentido, a residência é um dos elementos do domicílio, mas não é o reflexo dele.
Residência indica a radicação do indivíduo em determinado lugar. O domicílio, por sua vez,
estabelece uma situação jurídica.
Uma mesma pessoa pode ter um só domicílio, mas mais de uma residência (domiciliada
em Santa Cruz do Sul, mas com casa na praia), mas também pode ter mais de um domicílio.
Dessa forma, o Direito Civil admite a pluralidade de domicílios, quando o indivíduo tenha
diversas residências, vivendo nelas de forma alternada (art. 71, CC):
Art. 71. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde,
alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas.
Ou, ainda, prevê o § único do art. 72 que havendo diversos locais de trabalho, também
haverá a pluralidade de domicílios:
Parágrafo único. Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos,
cada um deles constituirá domicílio para as relações que lhe
corresponderem.
Ex.: João mora com a família em Santa Cruz do Sul. Tem escritório profissional em Santa
Cruz, Venâncio e Rio Pardo, comparecendo neles em dias alternados. Qualquer um desses
locais será considerado domicílio de João, podendo ser citado em qualquer deles (art. 46, § 1.º,
CPC/2015).
Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens
móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu.
§ 1o Tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de
qualquer deles.
Se, contudo, a pessoa não tem residência habitual, será considerado seu domicílio o local
onde for encontrada (art. 73, CC). Ex.: ciganos, viajantes.
67
Art. 73. Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha
residência habitual, o lugar onde for encontrada.
As pessoas podem mudar de domicílio e, para tanto, não basta alterar o endereço, mas
deve haver a intenção manifesta de mudar – art. 74, CC
Art. 74. Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção
manifesta de o mudar.
Parágrafo único. A prova da intenção resultará do que declarar a pessoa
às municipalidades dos lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais
declarações não fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a
acompanharem.
Nesse sentido, o STF sumulou (súmula 363), a questão do domicílio da pessoa jurídica: “a
pessoa jurídica de direito privado pode ser demandada no domicílio da agência ou do
estabelecimento em que se praticou o ato”.
68
Se a administração for no exterior, o domicílio será o lugar do estabelecimento situado no
Brasil (§ 2.º).
69
* Para todos verem: mapa mental sobre pessoa jurídica e esquema sobre domicílio
70
05. Bens jurídicos e bem de família
5.1 Bens Jurídicos
Bem é tudo aquilo que possa corresponder às solicitações de nossos desejos. Assim, na
relação jurídica, o bem é o objeto sobre o qual desenvolve-se o poder de fruição da pessoa.
Assim, bem jurídico, segundo Gagliano e Pamplona Filho (p. 301) podem ser conceituados
como “toda a utilidade física ou ideal, que seja objeto de um direito subjetivo”.
Dessa forma, todo bem econômico é jurídico, mas nem todo bem jurídico é econômico
(personalidade – direito à imagem, por exemplo). Isto porque, existem bens jurídicos que não
podem ser avaliados pecuniariamente.
71
* Para todos verem: esquema
72
b) BENS MÓVEIS E IMÓVEIS
BENS IMÓVEIS são aqueles que não podem ser transportados de um lugar para outro,
sem que sua substância se altere. Ex.: terreno urbano. Há a necessidade de uma solenidade para
sua transmissão/tradição (contrato), que se perfectibiliza com o registro.
BENS MÓVEIS são passíveis de deslocamento, quebra, fratura. Ex.: livros, computador. Há,
ainda, os bens que possuem movimento próprio. Neste caso, ainda que se enquadrem na
classificação de bens móveis, são chamados de semoventes (animais – bovinos, equinos, ovinos,
caprinos, etc). Não há necessidade de solenidade para sua transferência, bastando a tradição.
EMPRÉSTIMO/ Concessão de superfície – art. 1.369 Apenas contrato de mútuo – art. 586
CONCESSÃO
DIREITO PENAL Não são objeto de furto ou roubo São objeto de furto ou roubo.
73
• Imóveis por acessão natural, artificial ou industrial – art. 79, CC, 2.ª parte, CC
Acessão significa aderência a outra coisa.
Trata-se da hipótese em que árvores e todas as adjacências naturais se integrarem ao solo,
como pedras, fontes, cursos de água, que corram naturalmente.
Deve-se considerar, contudo, que, quando as árvores são plantadas para corte (acácia e
eucalipto, por exemplo) são consideradas móveis por antecipação e independem, para
alienação, de outorga uxória ou marital.
Há também a possibilidade de formação de ilhas, quando a natureza faz acréscimos ao
solo, de forma que insto se incorpora ao patrimônio do proprietário (art. 1.248, CC), de forma que
predomina a ideia de que o acessório segue o principal.
Além disso, o homem pode fazer com que móveis (materiais de construção, sementes) se
integrem ao solo, dando origem às acessões artificiais ou industriais. São acessões artificiais
porque dependem do trabalho humano. Ainda assim, integram o patrimônio do proprietário,
pois presume-se que toda plantação existente sobre o terreno foi feita pelo proprietário (art.
1.253, CC).
O art. 81 ainda faz a previsão de que as edificações, ainda que separadas do solo, mas
considerando sua unidade, se forem removidas para outro local, conservam o caráter de
imóveis (ex.: chalé/casa pré-fabricada, que pode ser transportada de um terreno para outro).
74
Classificação dos BENS MÓVEIS:
Os arts. 82 a 84, CC trazem a referência sobre os bens móveis.
• Móveis por sua própria natureza – art. 82, CC
Aqueles que podem ser transportados, através da força alheia, de um lugar para outro
sem que se altere sua substância – livro, carteira, bolsa, etc.
Aqui inclui-se a casa pré-fabricada antes de ser incorporada a algum terreno (enquanto
esteja a venda). Após ser assentada sobre o terreno, passará a ser imóvel.
Também são considerados móveis os materiais de construção, enquanto não forem
empregados na construção, enquanto estiverem a venda. Contudo, ainda que retirados da
construção, se houver a pretensão de reempregá-los, serão considerados como imóveis – ex.:
retirada de telhas para reforma das tesouras/madeiramento interno do telhado.
75
Ex.: um boi é fungível, mas, emprestado ao vizinho para a lavoura, passa a ser infungível,
devendo ser devolvido, sem ser substituído por outro.
A importância da diferenciação entre bens fungíveis e infungíveis ocorre em razão dos
contratos de mútuo e comodato. O mútuo é o contrato para empréstimo de bens fungíveis. O
comodato, por sua vez, de bens infungíveis.
Empréstimo de dinheiro – mútuo – art. 586, CC – mútuo para a construção da casa própria,
p.ex. – Caixa Federal.
Empréstimo de aparelho de celular – comodato – art. 579, CC.
76
- por vontade das partes: o acordo entre as partes torna indivisa a coisa, por prazo não
maior que 5 anos, suscetível de prorrogação posterior (art. 1.320, § 1.º).
Se o bem for divisível, o proprietário pode alienar a terceiro, sem dar preferência aos
demais comunheiros. Se, contudo, o bem for indivisível, deverá dar preferência aos
comunheiros.
Ex.: área de terras em condomínio – deve dar preferência aos demais.
Ex.: apartamento em um edifício – não precisa dar preferência aos demais.
b) Bens acessórios
Pressupõe a existência do principal. Não existe por si próprio. Ex.: árvore (só existe se
houver o solo onde foi plantada).
A regra é o que a natureza do principal é a mesma do acessório. Ex.: se o principal é imóvel
(solo), o acessório também será (árvore). O acessório sempre segue o principal em seu destino.
Ex.: se for extinta a obrigação principal, a cláusula penal (acessória) também o será. O
proprietário do principal também o é do acessório.
Os bens acessórios classificam-se em: frutos, produtos, rendimentos e benfeitorias.
77
FRUTOS – são utilidades que a coisa principal produz periodicamente, cuja percepção
(uso) não diminui a sua substância. Nascem e renascem da coisa, sem acarretar-lhe a destruição
no todo ou em parte. Ex.: soja, maçã, terneiro, juros, aluguel. Se o uso/percepção inutilizar a coisa
principal, não há que se falar em frutos.
Caracterizam-se pela a) periodicidade; b) inalterabilidade da substância da coisa principal;
c) separabilidade desta.
A percepção dos frutos é importante, especialmente, quanto aos direitos reais, pois o
possuidor de boa fé (aquele que detém a posse de algo de boa fé) tem direito aos frutos
colhidos e percebidos, devendo restituir os pendentes ao tempo em que cessar a boa fé.
Os frutos podem ser:
Naturais: gerados pelo bem principal, sem a necessidade da intervenção humana direta.
Decorrem do desenvolvimento orgânico vegetal ou animal. Ex.: laranja, soja, crias de um
rebanho
Industriais: são decorrentes da atividade humana, surgem em razão da atuação ou
indústria do homem sobre a natureza. Ex.: produção de uma fábrica.
Civis: rendimentos produzidos pela coisa em virtude de sua utilização por outra pessoa
que não seja o proprietário. Ex.: juros ou aluguel.
Os frutos ainda podem ser: colhidos ou percebidos (se já foram retirados da coisa, mais
ainda existentes); pendentes (ainda estão ligados à coisa); percipiendos (deveriam ter sido
colhidos e não o foram); estantes (já destacados, mas que estão armazenados para a venda);
consumidos (não mais existem).
PERTENÇAS – são coisas acessórias que se destinam a conservar ou facilitar o uso das
coisas principais, sem que delas sejam parte integrante. Ex.,: máquinas utilizadas na fábrica,
implementos agrícolas, aparelhos de ar condicionado. Art. 93, CC.
79
c) aqueles indisponíveis pela vontade humana: deixados em testamento ou doados,
com cláusula de inalienabilidade (arts. 1.848, 1.911).
d) os valores e direitos da personalidade – honra, liberdade, vida, órgãos do corpo
humano, etc.
A. Espécies:
Existem duas espécies de bem de família: voluntário (decorre da vontade do instituidor,
devendo obedecer certos requisitos) e o legal (independe da vontade do instituidor, de forma
que a lei torna impenhorável o imóvel simplesmente pelo fato de o devedor residir nele).
a) Convencional/voluntário:
A instituição do bem de família voluntário pode ser feita pelo proprietário ou pela
entidade familiar (art. 1.711, CC). Uma vez que seja instituído um imóvel como bem de família,
não responde mais por dívidas futuras (mas responde pelas pretéritas), pois a
impenhorabilidade não possui efeito retroativo (1.715, CC).
O bem de família poderá ser instituído pelos cônjuges, companheiros, integrante-chefe da
família monoparental ou por terceiro, por ato inter vivos ou causa mortis (testamento), desde
que ambos os cônjuges beneficiados ou membros da família contemplada aceitem
expressamente a liberalidade (art. 1.711, parágrafo único). Deve haver o assento no Registro de
imóveis (art. 1.714), para que tenha oponibilidade erga omnes.
O bem de família pode constituir de prédio urbano ou rural, bem como seus pertenças
(mobília), que a família destina para ser o abrigo ou domicílio familiar (art. 1.712).
Existem limites à instituição do bem de família: só pode usar 1/3 do patrimônio líquido do
instituidor, existente ao tempo da instituição. Dessa forma, o proprietário, para poder instituir o
bem de família, deve ter, no mínimo 3 imóveis (art. 1.711). Trata-se de uma medida legal protetiva
dos credores, ante a possibilidade de má-fé do instituidor. Além disto, apenas pessoas mais
abastadas podem se utilizar deste instrumento, tornando-o de pouco uso.
80
Essa isenção dura enquanto viverem os cônjuges (ou companheiros) ou enquanto os
filhos forem menores de idade. Somente depois de finda a cláusula é que o bem ficará sujeito
ao pagamento dos credores e o prédio será levado a inventário. Ademais, deve ser lembrado
que o bem não fica isento de responsabilidade quanto aos débitos de condomínio e IPTU, por
exemplo.
REQUISITOS:
- institui-se por Escritura Pública.
- não ultrapassar 1/3 do patrimônio.
- constitui-se por registro no Cartório de Registro de Imóveis.
- se na família existirem menores ou incapazes (interditos) não pode ser eliminada a
cláusula que institui o bem de família, salvo se houver sub-rogação (art. 1.719).
Só pode haver alienação do prédio no qual foi instituído o bem de família se houver a
concordância do interessado (instituidor ou filhos menores) e ouvido o MP (art. 1.717). No caso de
falecerem os cônjuges e deixarem filhos menores, o tutor é que será responsável por gerir o
bem de família. Se houver necessidade de vendê-lo, poderá fazê-lo desde que com autorização
judicial e ouvido o MP.
Se restar comprovada a impossibilidade de manter o bem de família, como por exemplo,
para pagar despesas com UTI, poderá haver requerimento ao juiz que extinga o bem de família,
ouvido o MP e o interessado (instituidor ou filhos menores). Neste caso poderá haver a sub-
rogação de outro bem no lugar, quando ficará gravado como bem de família ou o produto da
venda será depositado judicialmente, sendo o valor liberado para o pagamento da UTI, por
exemplo (art. 1.719).
A administração do bem de família caberá a ambos os cônjuges, em igualdade de
condições (art. 1.720). Se ambos os cônjuges falecerem, a administração passa ao filho mais
velho ou ao seu tutor, se menor.
A cláusula de bem de família só poderá ser levantada por mandado judicial.
Só haverá a partilha quando for eliminada a cláusula que o institui, pela morte dos
cônjuges e maioridade de todos os filhos, por exemplo.
b) Legal:
A lei 8.009/90 institui o bem de família legal, impedindo a penhora do único bem imóvel
rural ou urbano da família, destinado a moradia permanente, excluindo casas na praia ou casas
de campo. Tais bens não responderão pelos débitos contraídos pela entidade familiar. Contudo,
se o devedor oferecer este bem à penhora, não poderá, depois, pleitear a exclusão.
O bem de família legal não responde por qualquer tipo de dívida (civil, comercial, fiscal,
previdenciária, ou qualquer natureza) (art. 1.º, lei 8.009/90), podendo ser oposta a
81
impenhorabilidade em qualquer tempo ou grau de jurisdição. A lei 13.144/2015, alterou o art. 3.º,
III da lei 8.009/90, de forma que pode ocorrer a penhora do bem de família para pagamento de
débito alimentar, resguardado o direito do coproprietário.
Para que essa impenhorabilidade seja reconhecida, o único imóvel do devedor deve estar
sendo habitado por ele e sua família. PODE ESTAR LOCADO, mas a renda deve reverter para a
subsistência da família:
Súmula 486, STJ: É impenhorável o único imóvel residencial do devedor
que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação
seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.
O fato de o devedor possuir mais bens não impede que seja declarada a
impenhorabilidade sobre o imóvel de residência da família.
A execução da dívida alimentar afasta a impenhorabilidade do bem de família.
Cuidar que a vaga de garagem, que possui matrícula própria, pode ser penhorada!
Súmula 449 - A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não
constitui bem de família para efeito de penhora. (Súmula 449, CORTE ESPECIAL, julgado em
02/06/2010, DJe 21/06/2010)
Lembrar, também, da súmula 549 - É válida a penhora de bem de família pertencente a
fiador de contrato de locação.(Súmula 549, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe
19/10/2015)
82
* Para todos verem: esquemas sobre Bens
83
06. Fato jurídico. Planos de existência, validade e eficácia do negócio jurídico
Só se considera fato jurídico aquele acontecimento que produz efeitos jurídicos. Daí
chamarmos de fatos jurídicos em sentido amplo.
84
* Para todos verem: esquema
4
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 368.
85
a) Gratuita: só o adquirente obtém vantagem. Ex.: sucessão hereditária.
b) Onerosa: quando o adquirente efetua uma contraprestação ao outro contratante. Ex.:
compra e venda, locação.
Existem situações em que há expectativa de que o direito seja adquirido. Nestas situações,
chama-se de expectativa de direito, que consiste na mera possibilidade de se adquirir um
direito. Ex.: os filhos têm expectativa de sucederem aos pais quando de seu óbito. Enquanto os
pais forem vivos os filhos não possuem qualquer direito.
Contudo, quando já está parcialmente cumprido, ou seja, quando o interesse do titular
não está completo, têm-se o direito eventual, pois não foram realizados todos os elementos
básicos exigidos pela norma. Trata-se de um direito concebido, mas ainda não concretizado,
pois depende, para efetivação, do interesse do adquirente. Ex.: aceitação de proposta de compra
e venda ou exercício do direito de preferência.
Há, ainda, o direito condicional, que é aquele que se completa ou perfectibiliza se ocorrer
fato ou acontecimento futuro e incerto. Ex.: cessão de direitos autorais se o livro chegar à 10.ª
edição.
Venosa5 destaca a diferença entre direito eventual e direito condicional:
Tanto nos direitos eventuais como nos condicionais existe subordinação
a evento futuro e incerto. Há numerosas coincidências nessas duas
categorias. Os direitos eventuais, contudo, trazem elemento futuro e
5
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: parte geral. 12.ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 341.
86
incerto inerente e essencial ao próprio negócio jurídico, enquanto nos
direitos condicionais o fato dito condicional é externo ao ato. Nem todo
elemento futuro e incerto deve ser considerado condição. O negócio
jurídico eventual é negócio jurídico ainda incompleto que necessita que
algo ocorra para completar-se. É de índole interna. Quem vende, por
exemplo, coisa que ainda não tem, depende de obtê-la para poder
transmiti-la.
Nos direitos condicionais o direito já se perfez. Apenas se agregou um
elemento externo, uma condição, para ser exercido, uma vez que sua
existência jurídica depende desse elemento condicional. A condição
aposta a um direito é acessório.
87
b) Atos de defesa do direito lesado: ajuizamento de ações cognitivas ou executivas,
quando houver violação a direito.
6
TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 339.
89
6.5 ATO- FATO JURÍDICO
Os atos-fatos jurídicos são uma categoria especial e que possui características
inconfundíveis. Não existe previsão legal para esta categoria, mas não se pode deixar de
reconhecer sua existência e efeitos jurídicos.
* Para todos verem: esquema
É uma categoria intermediária, porque está entre o fato da natureza e a ação humana.
A categoria do ato-fato refere-se a aquele comportamento que, embora derive do
homem, é desprovido de vontade consciente em face do resultado jurídico produzido.
Trata-se de um fato jurídico qualificado pela atuação humana7, pois a atuação é
substancia deste fato jurídico. Contudo, não importa para a norma se existiu ou não a intenção
da prática da conduta.
Importa a consequência do ato, o fato resultante, sem se levar em consideração a vontade
de praticá-lo. O efeito pode não ser o buscado pelo agente, mas decorre de conduta e é previsto
pela lei. A vontade está presente, mas o direito a desconsidera e apenas atribui juridicidade ao
fato resultante – existe ação humana, mas é valorado o resultado prático.
Ex.: pessoa que encontra um tesouro. A lei, neste caso, determina que caberá àquele que
encontrou o tesouro, a metade dele (art. 1.264, CC).
Para ficar mais claro, utilize-se o exemplo da união estável. Trata-se de um ato-fato
jurídico. Não importa a vontade das partes, pois o fato humano é que gera importância jurídica
e social. Significa dizer que o fato de viverem juntos, de forma pública, contínua, duradoura e
com o intuito de constituir família basta para a qualificação da união estável. Não importa se o
casal quer ou se não quer o reconhecimento ou a configuração da união. Basta que estejam
presentes os requisitos legais.
Outro exemplo, utilizado pela doutrina é a compra e venda feita por crianças. Se uma
criança compra um chocolate em um boteco, ela não tem a vontade direcionada a contratar
formalmente. Não pode ser considerado um negócio jurídico porque falta o elemento da
capacidade do agente. Assim, melhor enquadrar como um ato-fato jurídico, aceito socialmente.
7
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 375.
90
O enunciado 138 do CJF dispõe que: “A vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese
do inc. I do art. 3º é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles
concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para tanto”.
Os atos-fatos jurídico podem ser classificados em:
a) Atos reais: denominados de atos materiais. Decorrem de certos acontecimentos em
que importa o fato resultante, independentemente da existência ou não de vontade
de obtê-lo. Ex.: a criança que descobre um tesouro enterrado adquire a propriedade,
independentemente de intencionar achá-lo.
b) Atos-fatos indenizativos: casos de indenização sem que haja ilicitude, ou seja, as
situações em que um ato humano, não contrário ao direito, cause prejuízo a outrem e
o dever de indenizar. Ex.: casos de estado de necessidade – para salvar uma pessoa de
um incêndio, alguém quebra a porta da casa onde está a pessoa.
c) Atos-fatos caducificantes: situações que, independentemente do ato humano,
trazem efeito que seja a extinção de determinado direito e, com isto, da pretensão, da
ação e da exceção decorrente. Ex.: prescrição e decadência.
91
Ex.: uma criança torna-se proprietário dos peixes pelo fato de pescar (instituto da
ocupação), de forma que a incapacidade não torna nulo o ato.
Ex.: fixação de domicílio (quando a pessoa fixa residência em determinado local
estabelece seu domicílio, independentemente de emitir manifestação de vontade neste
sentido).
O ato jurídico em sentido estrito trata-se de um simples comportamento humano
voluntário e consciente, cujo efeitos estão previamente determinados na lei. Vale dizer, no ato
em sentido estrito não existe autonomia privada e liberdade na escolha dos efeitos jurídicos
produzidos, ou seja, o ato em sentido estrito é uma simples ação humana prevista em lei.
Trata-se, pois, de “simples manifestação de vontade, sem conteúdo negocial, que
determina a produção de efeitos legalmente previstos”8.
No ato jurídico em sentido estrito o agente não tem a liberdade de escolha na
determinação dos efeitos resultantes do seu comportamento. Deve haver a manifestação da
vontade, mas ela não é qualificada. Ex.: confissão de dívida.
Os efeitos jurídicos derivados da praticado do ato não têm como determinar os efeitos,
porque este vem determinado em lei, uma vez que os atos jurídicos em sentido estrito são
desprovidos em escolha dos efeitos. Ex.: a percepção de um fruto, a caça, a pesca, o
reconhecimento de filho, a fixação do domicílio voluntário.
Estão previstos no art. 185, CC: Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos,
aplicam-se, no que couber, as disposições do Título anterior.
Classificam-se em:
a) Atos materiais (reais): simples atuação humana, baseada em uma vontade
consciente, tendente a produzir efeitos jurídicos previstos em lei9. Embora haja
vontade, ela não é voltada ao alcance dos efeitos. Eles se produzem
independentemente do “querer produzi-los”. Ex.: ocupação, percepção de frutos,
fixação de domicílio, etc.
b) Participações: trata-se de ato de comunicação, dirigidos a alguém e sem conteúdo de
negócio. Ex.: notificação, oposição, aviso, intimação.
8
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 377
9
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 379.
92
a) Existência: o negócio jurídico, para ser considerado como tal, deve cumprir certos
requisitos mínimos. Os elementos estruturais estão presentes. São o suporte fático do
negócio jurídico. Existem apenas substantivos, s/em qualquer qualificação. Esses
substantivos são: partes (ou agentes), vontade, objeto e forma. Na falta de algum
desses elementos estruturais ou pressupostos, o negócio é inexistente.
b) Validade: o fato de existir, não significa que seja considerado perfeito, ou seja, com
condições legais para produzir efeitos. Uma vez que o negócio seja existente, deve-se
analisar se está perfeito ou se contém algum vício ou defeito inviabilizante. Os
requisitos devem estar presentes. Na escala da validade, os substantivos são
qualificados, ou seja, ganham adjetivos, ou seja: partes ou agentes capazes; vontade
livre e não viciada; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita
ou não defesa em lei (art. 104, CC).
c) Eficácia: o fato de existir e ser válido não significa que esteja apto a produzir efeitos
imediatos, pois a produção de efeitos pode estar limitada por elementos acidentais. O
negócio pode produzir efeitos só a partir do momento em que for implementada uma
condição. São os efeitos gerados entre as partes e em ralação a terceiros.
* Para todos verem: esquema
Chama-se de Escala Ponteana e pode ser representada através de degraus, onde o plano
da existência representa o primeiro degrau, o plano da validade, o segundo e, o plano da
eficácia, o terceiro degrau da Escala Ponteana.
Pela representação do esquema, percebe-se que, para que um negócio jurídico seja
válido, precisa existir. Para que produza efeitos, precisa ser válido. Contudo, nem sempre isto
ocorre, pois pode ocorrer de um negócio ser existente, inválido e eficaz. Então, antes de se
analisar cada um dos planos, deve-se destacar que um negócio jurídico pode ser:
a) existente, válido e eficaz. Ex.: casamento - capazes, sem impedimentos, realizado por
autoridade competente.
93
b) existente, válido e ineficaz. Ex.: testamento de pessoa capaz, formalmente legal, antes
da morte do testador. Ex.: contrato celebrado sob condição suspensiva e que não esteja, ainda,
gerando efeitos jurídicos e práticos.
c) existente, inválido e eficaz. Ex.: casamento putativo - negócio jurídico anulável, antes da
decretação da anulabilidade. Da celebração até a anulação produz todos os efeitos.
d) existente, inválido e ineficaz. Ex.: doação feita pessoalmente por pessoas absolutamente
incapazes (menor de 16 anos).
e) existente e eficaz. Ex.: nascimento com vida, pintura, dano causado a bem alheio.
f) inexistente. Neste caso, não se analisa os demais planos, pois todos dependem da
existência do negócio jurídico. Ex.: casamento celebrado sem a manifestação da vontade.
6.8.4 Forma
Forma é o meio pelo qual a declaração de vontade é exteriorizada, ou seja, se oral, escrita,
silêncio, sinais, etc. A vontade sempre deve ser manifestada de alguma forma.
Não se deve confundir a forma (elemento existencial) com a forma legalmente prescrita
(pressuposto de validade). Ex.: João compra 30ha de terras de Pedro. Paga a quantia e recebe
de Pedro um recibo. Não fazem escritura pública de compra e venda. Neste caso, apesar de não
ser válido o negócio jurídico por não se revestir da formalidade legal, é necessário reconhecer
que o ato negocial de compra e venda existiu, pois Pedro, inclusive, passou recibo. Neste caso
temos os elementos existenciais: manifestação da vontade (vender e comprar), agentes
(sujeitos de direitos), objeto (bem imóvel) e forma (escrita).
10
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 406.
96
6.9.1 Manifestação da vontade livre e de boa-fé
A manifestação da vontade deve ser livre e de boa-fé (não impregnada de malícia). Os
vícios do negócio jurídico atacam a liberdade de manifestação da vontade ou a boa-fé, de forma
que o ordenamento jurídico tende a reagir, anulando ou declarando nulos tais negócios. (Os
defeitos dos negócios jurídicos serão tratados adiante).
Para que a manifestação da vontade seja válida, dois princípios surgem: a autonomia da
vontade e a boa-fé.
Princípio da autonomia da vontade. Trata-se da liberdade negocial, que, contudo, não é
plena, pois sofre limitações da lei, da moral e da ordem pública.
Princípio da boa-fé. Trata-se de princípio ético formador da vontade negocial válida.
Assim, se uma das partes conseguiu a manifestação da vontade da outra através da coação, há
a violação deste princípio. A boa-fé deve ser tanto a subjetiva (estado psicológico, subjetivo do
indivíduo), quanto a objetiva (que as partes comportem-se segundo um padrão ético objetivo
de confiança recíproca).
11
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 418.
98
6.10 Plano da eficácia do negócio jurídico
Analisados os planos da existência e da validade, necessário se faz considerar sobre a
eficácia do negócio jurídico.
Eficácia é a potencialidade, ou seja, a capacidade dos negócios jurídicos gerarem efeitos.
É eficaz o negócio jurídico quando repercute juridicamente no plano social, ou seja, se não
depender de nenhum acontecimento futuro para ser exigível. Ex.: compra e venda. Uma vez
celebrada e registrada, produz efeitos.
Este acontecimento futuro é tratado pela doutrina como “elementos acidentais do
negócio jurídico”, que são: condição, termo e modo ou encargo. Nestas situações, a produção de
efeitos do negócio só se perfectibiliza com a ocorrência do elemento acidental.
6.10.1 Condição
É um elemento acidental que consiste em um evento futuro e incerto, por meio do qual
subordina-se ou resolve a produção de efeitos jurídicos.
Ex.: indivíduo que se obriga a doar o imóvel X para João quando ele se casar. O casamento,
no caso, é uma condição acessória suspensiva.
Ex.: indivíduo que adquire o usufruto do bem X, para auferir renda, até que cole grau no
ensino superior. No momento da colação, extingue-se o usufruto, tratando-se, neste caso, de
uma condição resolutiva.
A condição é caracterizada pela incerteza e futuridade. Art. 121, CC.
a) Incerteza
Se o fato que subordina a vontade for certo, estaremos diante de um termo. A condição é
sempre incerta.
A incerteza é com relação a própria ocorrência do fato e não com relação ao tempo de sua
ocorrência. A morte, neste sentido, é sempre certa. O que não se sabe é quando irá acontecer.
Trata-se, portanto, de um termo incerto.
b) Futuridade
Acontecimento já ocorrido não pode caracterizar condição. A condição deve ser futura. Ex.:
prometo doar 10mil reais se meu bilhete de loteria for premiado.
99
b) Condição resolutiva
Neste caso, enquanto não se realizar a condição vigorará o negócio jurídico. Assim que se
operar a condição ocorrerá a conclusão do negócio extinguindo-se o direito (art. 127, CC).
Ex.: enquanto João cursar a faculdade de Direito poderá utilizar o valor dos alugueis do
imóvel X para custear suas despesas. Com a conclusão do curso, extingue-se o direito de uso
dos alugueis.
Art. 128. Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os
efeitos, o direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio de
execução continuada ou periódica, a sua realização, salvo disposição em
contrário, não tem eficácia quanto aos atos já praticados, desde que
compatíveis com a natureza da condição pendente e conforme aos
ditames de boa-fé.
O art. 128 refere-se a negócios continuados. Ex.: concedo o usufruto sobre imóvel a João
enquanto cursar Direito, beneficiando-se de toda a renda proveniente da venda de gado até a
colação de grau. Neste caso, se João tiver pactuado venda de gado a terceiro e, neste meio
tempo, tiver colado grau, a condição resolutiva não prejudicará a venda já pactuada. Deverá ser
concluída e João receberá o dinheiro do pagamento.
As condições podem ser positivas (verificação de um fato – auferir renda até colação de
grau) ou negativas (inocorrência de um fato – empréstimo da casa até que a enchente deixe de
assolar sua cidade).
As condições devem ser lícitas, pois as ilícitas invalidam o negócio jurídico, eivando-o de
nulidade absoluta (art. 123, II e 166, VII, CC).
O art. 122, CC repudia as condições perplexas (incompreensíveis ou contraditórias – são
aquelas que privam de efeitos o negócio jurídico. Ex.: empresto o imóvel, desde que você não
more e não o alugue) e as puramente potestativas (são as que derivam do arbítrio de uma das
partes. Ex.: se eu quiser, caso seja do meu interesse, etc).
No que diz respeito à possibilidade, as condições devem ser física e juridicamente
possíveis. São ilícitas as condições fisicamente impossíveis, que são aquelas irrealizáveis, em
razão de exigência de esforço sobrenatural. Ex.: dar a volta no Beira Rio em 2 segundos
(impossível! O Beira Rio é Giganteeeeee). Se a condição fisicamente impossível tiver natureza
suspensiva, invalida o negócio (nulidade absoluta). Se tiver natureza resolutiva, será reputada
inexistente. Também são ilícitas as condições juridicamente impossíveis, pois contrariam o
direito (ex.: doação condicionada à alienação de bem de uso comum do povo – praça). Neste
caso, existindo uma condição dessa natureza, será inválido o negócio jurídico.
6.10.2 Termo
100
O termo é o “acontecimento futuro e certo que subordina o início ou o término da
eficácia jurídica de determinado ato negocial”12. As características, são, então, a certeza e a
futuridade.
O termo pode ser inicial ou final. Ex.: contrato de arrendamento que se inicia em 05 de
janeiro de 2017. Trata-se do termo inicial da produção de efeitos do contrato. Antes desta data,
não produz efeitos. Ex.: arrendamento com término em 05 de janeiro de 2017. Até esta data
produz efeitos. A partir dela, não mais.
Mesmo quando se tem termo inicial, apesar da exigibilidade do negócio ser só a partir da
data acordada, já há a aquisição de direitos (art. 131, CC). A exigibilidade está suspensa até a
ocorrência do termo inicial, mas os direitos e deveres decorrentes do ato são adquiridos de
imediato. No exemplo do contrato de arrendamento, cujo termo inicial é 05 de janeiro de 2017,
desde logo estão as partes ligadas pelo vínculo contratual. Contudo, a exigibilidade das
obrigações definidas no contrato só serão exigíveis a partir de 05 de janeiro de 2017. Mas, se o
arrendatário, por exemplo, quiser efetuar o pagamento pactuado antes desta data, não há
impedimento. Contudo, o que não pode é o arrendante/arrendador exigir tal pagamento antes
do termo inicial previsto.
O termo pode ser certo ou incerto. Será certo quando a data estiver estipulada (05 de
janeiro de 2017). Será incerto quando, apesar de ser certa a ocorrência, não se puder precisar a
data (quando João morrer).
O período de tempo entre o termo inicial e o final é denominado de prazo (art. 132, CC). O
prazo é contado excluindo-se o dia do começo e incluindo-se o dia do vencimento. Ex.: contrato
de 30 dias13. Termo inicial: 24/08/2016. O prazo será = 23/08/2016.
Art. 132. Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-
se os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento.
§ 1o Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o
prazo até o seguinte dia útil.
§ 2o Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia.
§ 3o Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de
início, ou no imediato, se faltar exata correspondência.
§ 4o Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.
12
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 489.
13
A contagem de prazos processuais é diferente. Verificar art. 219, CPC/2015.
101
a) Convencional: fixado pelas partes.
b) Legal: determinado pela lei.
c) De graça: fixado por decisão judicial (prazo determinado pelo juiz para que o
devedor de boa-fé cumpra sua obrigação
14
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 493.
102
* Para todos verem: esquemas
103
07. Aspectos gerais do negócio jurídico
7.1 NEGÓCIO JURÍDICO
O negócio jurídico envolve uma declaração de vontade que objetiva a produção de certos
efeitos jurídicos admitidos pela lei.
* Para todos verem: esquema
104
de vontade, instauram uma relação jurídica, cujos efeitos, quanto a elas e às demais, se
subordina à vontade declarada, nos limites consentidos pela lei.
O negócio jurídico é o principal instrumento que as pessoas possuem para realizar seus
interesses, sendo relevante para a concepção de contrato. O estudo dos negócios jurídicos
também é um estudo sobre os contratos, envolvendo os elementos, vícios, casos de nulidade e
anulação15. Também é um negócio jurídico o casamento, o testamento.
Significa dizer que vale mais a intenção das partes ou a vontade real dirigida a
determinado fim permitido em lei.
Contudo, existe, também a teoria objetivista ou da declaração, segundo a qual a
vontade declarada é essencial para o negócio jurídico, ou seja, o negócio jurídico é o meio para
a produção de efeitos jurídicos.
* Para todos verem: esquema
TEORIA DA DECLARAÇÃO
VOLUNTARISTA OU TEORIA DA VONTADE
Para esta teoria, o núcleo essencial do Para esta teoria, o núcleo essencial do
negócio jurídico seria a vontade interna ou negócio não seria a intenção do declarante,
a intenção do declarante. mas sim, própria vontade externa ou
declarada.
Não há razão prática para a diferenciação entre vontade interna (intenção) e vontade
declarada, pois negócio jurídico seria a “declaração de vontade, emitida em obediência aos
seus pressupostos de existência, validade e eficácia, com o propósito de produzir efeitos
admitidos pelo ordenamento jurídico pretendidos pelo agente”16.
15
TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 342.
16
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 389.
105
a) Unilaterais: apenas a manifestação da vontade de uma pessoa (testamento, renúncia,
etc)
a. Receptícios: a declaração de vontade deve se tornar conhecida do destinatário
para produzir efeitos. Ex.: revogação de mandato.
b. Não receptícios: o conhecimento, por parte de outras pessoas, é irrelevante.
Ex.: testamento, confissão de dívida.
b) Bilaterais: manifestação de vontade de duas partes, formadoras do consenso (compra
e venda, locação, prestação de serviços, etc).
a. Bilaterais simples: somente uma das partes percebe vantagem e a outra
detém o ônus. Ex.: doação, comodato.
b. Sinalagmático: há a reciprocidade de direitos e obrigações, ou seja, existem
ônus e vantagens recíprocos. Ex.: locação, compra e venda.
c) Plurilaterais: envolvem mais de duas partes, quando, então, as deliberações não
decorrem de um intercâmbio de declarações convergentes, mas sim, por decisões de
maioria (contrato de uma sociedade, etc).
106
d) Bifrontes: negócios que tanto podem ser gratuitos, quanto onerosos. Tudo depende
da intenção das partes. Ex.: contrato de depósito (geralmente gratuito, podendo ser
oneroso).
Quanto à forma:
a) Formais ou solenes: exigem a observância de formas legais para aperfeiçoamento. Ex.:
casamento e testamento.
b) Não formais ou forma livre: a forma é livre, sem interferência legal. Podem ser até
verbais. Ex.: doação de um móvel. Trata-se da regra geral (art. 107, CC).
Quanto à existência:
a) Principais: existem por si mesmos (compra e venda), não dependendo de qualquer
outro para que tenham existência e validade. Ex.: contrato de locação.
b) Acessórios: a existência pressupõe a do principal. Ex.: contrato de fiança que se
relaciona com o contrato principal (financiamento, locação).
Quanto ao conteúdo:
a) Patrimoniais: relacionados com bens ou direitos aferíveis pecuniariamente (negócios
reais, obrigacionais, etc).
b) Extrapatrimoniais: referentes a direitos sem conteúdo econômico (direitos de família,
personalidade, etc).
7.5 Representação
A manifestação da vontade pode se dar por si próprio ou por representante. O Código Civil
disciplina a representação nos arts. 115 a 120. Assim, a manifestação da vontade através da
representação produz todos os efeitos.
108
Se o negócio jurídico é praticado por representação, quem o pratica é o representante,
que o faz em nome do representado.
Assim, representação é a atuação jurídica em nome de outra pessoa, que pode ocorrer em
razão da vontade ou da lei.
7.5.4 Autocontratação
Pode ocorrer situações em que o representante seja a outra parte no negócio jurídico. A
isto chama-se de autocontratação. Para que isto seja lícito e possível, deverá haver a previsão no
mandato desta cláusula (mandato em causa própria). Ex.: “podendo alienar tal bem a terceiro
ou a si próprio”.
Neste sentido, o art. 117, CC, determina que a autocontratação deve estar prevista no
instrumento de mandato.
08. Defeitos do negócio jurídico: erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo, fraude contra
credores e simulação
8.6 Defeitos do negócio jurídico
A manifestação da vontade, nos negócios jurídicos deve ser livre e de boa-fé. Os negócios
jurídicos podem, contudo, sofrer com vícios de consentimento, ou seja, aqueles que impedem
que a vontade seja manifestada de forma pura e de boa fé. Estes vícios atingem o segundo
degrau da Escala Ponteana, ou seja, o plano da validade, pois maculam a manifestação da
vontade. E, ainda, com vícios sociais, que são a simulação e a fraude contra credores.
Vícios de consentimento: erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo.
Vícios sociais: simulação e fraude contra credores.
110
8.6.1 Erro ou ignorância
O erro é uma falsa representação da realidade. Trata-se de um engano fático, ou uma falsa
noção sobre a pessoa, objeto do negócio ou a um direito. Significa dizer que o agente atua de
modo que não seria sua vontade, se conhecesse a verdade. Ex.: Homem que reconhece o filho
da esposa, acreditando ser seu (se soubesse que o filho não era seu, não o reconheceria).
Erro e ignorância são coisas distintas, mas levam à anulabilidade do negócio jurídico.
Erro = ideia falsa da realidade.
Ignorância = total desconhecimento da realidade.
Para que o erro seja passível de anulação, deve ser essencial (substancial) e escusável
(perdoável).
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de
vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por
pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.
Essencial é o erro que incide sobre a essência ou substância do ato praticado. Se tal erro
não estivesse presente, o ato não seria realizado. Ex.: colecionador que, pretendendo comprar
uma peça de marfim, compra uma de material sintético.
Contudo, o enunciado 12 do CJF determina que:
Na sistemática do art. 138, é irrelevante ser ou não escusável o erro,
porque o dispositivo adota o princípio da confiança.
Tanto no erro quanto na ignorância, a pessoa engana-se sozinha, de forma que o erro
pode incidir, então, sobre:
a) A natureza do negócio = art. 139, I, CC. Ocorre quando se troca a natureza do negócio,
trocando-se uma causa jurídica por outra. Ex.: comodato com doação.
111
b) A identidade da pessoa = art. 139, II, CC. O que diz respeito a qualidade ou
características de determinada pessoa. Ex.: erro essencial sobre a pessoa do outro
cônjuge (arts. 1.556 e 1.557, CC).
c) A identidade do objeto = art. 139, I, CC. Quando se declara querer comprar o cavalo
“X” e acaba levando o cavalo “y”, sem querer.
d) A essência do objeto = art. 139, I, CC. Erro sobre as propriedades essenciais do objeto.
Erro quanto a qualidade. Ex.: compra um anel, imaginando ser de ouro, não sabendo
que se trata de cobre. Ex.: comprar bijuteria ao invés de ouro. Ex.: comprar um modelo
intermediário achando tratar-se de um luxuoso.
Neste aspecto, no que diz respeito ao erro quanto a essência do objeto, tem-se decisão
do STJ que envolve a possibilidade de anulação de negócio jurídico de compra e venda
de veículo automotor onde a parte adquire carro de modelo intermediário pensando
tratar-se de modelo luxuoso.
Processo civil. Direito do consumidor. Aquisição de veículo automotor.
Alegação do consumidor de que comprou determinado modelo,
pensando ser o mais luxuoso, e de posterior constatação de que se
tratava do modelo intermediário. Ação proposta um ano após a
aquisição. Decadência. Desnecessidade de se aguardar o término do
prazo de garantia. Alegado inadimplemento do dever de informação,
pelo vendedor, que se insere no âmbito do contrato de compra e venda.
- O início da contagem do prazo de decadência para a reclamação de
vícios do produto (art. 26 do CDC) se dá após o encerramento da garantia
contratual. Precedentes.
- A postergação do início da contagem desse prazo, contudo, justifica-se
pela possibilidade, contratualmente estabelecida, de que seja sanado o
defeito apresentado durante a garantia.
- Na hipótese em que o consumidor não adquire bem propriamente
defeituoso, mas alega ter se enganado quanto ao objeto adquirido,
comprando o automóvel intermediário em vez do mais luxuoso, não há,
necessariamente, qualquer defeito a ser corrigido durante o prazo de
garantia. A decadência para pleitear a devolução da mercadoria, a troca
do produto ou o abatimento do preço, portanto, conta-se, sendo
aparente a diferença entre os modelos, da data da compra.
- A inversão do ônus da prova pressupõe hipossuficiência (técnica,
jurídica ou econômica) ou verossimilhança das alegações feitas pelo
consumidor. Os costumes comerciais indicam que a parte interessada na
aquisição de um automóvel de luxo costuma buscar, ao menos, as
112
informações quanto aos modelos existentes. A prática também indica
que todos os modelos disponíveis, notadamente os mais caros, sejam
apresentados ao comprador. Não há, portanto, verossimilhança na
alegação de que a concessionária omitiu do consumidor a informação
sobre o modelo luxuoso. Também não há hipossuficiência do
consumidor uma vez que: (i) não é economicamente fraca a parte que
adquire automóvel de luxo; (ii) não há desequilíbrio técnico ou jurídico se
o comprador adquire o automóvel pelo convênio mantido entre a
montadora e Associação de Magistrados. Recurso especial conhecido e
improvido. (REsp 1021261/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 06/05/2010)
O erro deve, ainda, ser escusável, ou seja, perdoável, dentro do que se espera do homem
médio. Assim, não se admite erro daquele que agiu com acentuado grau de displicência e
negligência. Ex.: a compra de uma joia falsa, pelo homem médio, é um erro escusável. Contudo,
por um especialista, não é.
Também pode ocorrer nos casos de registro de nascimento, no qual o pai é induzido a
erro pela Mãe da criança e acaba registrando filho que não é seu.
Admite-se, ainda, o erro de direito, desde que não traduza oposição ou recusa à aplicação
da lei, o que não se confunde com ignorância da lei. Ex.: alguém que contratou a importação de
determinado produto, sem saber que foi, recentemente, proibida por decreto a entrada de tal
produto no país. Neste caso, deve-se admitir o erro de direito e permitir a anulação do contrato.
O art. 140, CC trata do falso motivo, o que, em regra, não invalida o negócio. Motivo é de
ordem pessoal: bom preço, boa localização, presentear alguém. Assim tem-se o exemplo do pai
que compra veículo para presentear a filha que está de aniversário. Contudo, ao chegar na data,
o pai se dá conta de que, em verdade, é o filho quem está de aniversário. Esse erro não é capaz
de anular o negócio de compra e venda do veículo.
Deve-se destacar que o erro deve ser substancial, pois o erro acidental não pode ser
objeto de anulabilidade do negócio jurídico. O erro, neste caso, pode ser suprido pelas
circunstâncias. Nestes casos, convalece o ato.
Art. 142. O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a
declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e
pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.
O prazo para buscar a anulação do negócio jurídico eivado de erro é de 4 nos, a contar da
celebração do negócio, nos termos do art. 178, II, CC.
8.6.2 Dolo
O dolo é erro provocado por terceiro e não pelo sujeito enganado. Trata-se de um artifício
malicioso pelo qual uma das partes, visando prejudicar o outro, induz-lhe a celebração de
negócio jurídico. Ex.: vender caneta de cobre como se fosse de ouro. Neste caso, caberá
anulação do negócio.
114
Trata-se de dolo essencial, onde “uma das partes do negócio utiliza artifícios maliciosos,
para levar a outra a praticar um ato que não praticaria normalmente, visando a obter vantagem,
geralmente com vistas ao enriquecimento sem causa”17. É a arma do estelionatário.
Este dolo é maligno, ou seja, visa enganar o outro. É diferente do dolus bonus, onde
alguém realça demais as vantagens e qualidades do produto, induzindo o outro a contratar.
O dolo deve ser provado por quem alega, independendo de prova de efetivo prejuízo para
sua caracterização, ou seja, basta que indivíduo tenha sido induzido a efetuar negócio jurídico.
Não é só o dolo do negociante que gera a anulabilidade. O dolo de terceiro também tem
o condão de anular o negócio jurídico. Nesse sentido, o art. 148, CC prevê que:
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de
terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter
conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico,
o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem
ludibriou.
Por fim, cabe classificar o dolo. Quanto à extensão, o dolo pode ser:
TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
17
2016, p. 391.
115
a) Principal – essencial, determinante ou causal – ataca a causa do negócio em si.
Invalida o negócio. O negócio, sem a presença do dolo, não seria praticado.
b) Acidental – não invalida o negócio, mas só dá direito a eventual perdas e danos a favor
do prejudicado. Nestes casos, o negócio seria praticado do mesmo jeito, havendo ou
não a presença do dolo. Art. 146, CC. Ex.: os promitentes compradores afirmam que a
promitente compradora entrará na posse do imóvel dentro de 30 dias, mesmo
sabedores de que o atual inquilino só desocupará o imóvel dentro de 60 dias.
Neste sentido, Tartuce18 traz o seguinte quadro comparativo:
* Para todos verem: esquema
18
TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 392.
116
Quanto à conduta das partes, o dolo pode ser:
a) Dolo positivo (ou comissivo) – dolo praticado por ação. Ex.: publicidade enganosa por
ação. Vendo carro completo: ar condicionado, direção hidráulica, pneus zero. Após a
aquisição o comprador verifica que não tem ar condicionado e os pneus estão carecas.
b) Dolo negativo (ou omissivo) – praticado por omissão. Ex.: venda de apartamento
decorado, em que não se revela ao comprador que os móveis são feitos sob medida,
induzindo-o a erro. Art. 147, CC. O prejudicado deve provar que se soubesse não
celebraria o negócio.
c) Dolo recíproco (ou bilateral) – ambas as partes agem dolosamente, um tentando
prejudicar o outro. Via de regra, há compensação dos dolos, não havendo a anulação
do negócio jurídico.
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-
lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.
8.6.3 Coação
A coação é uma pressão física ou moral exercida sobre o negociante, obrigando-o a
assumir uma obrigação que não quer.
Coator – quem coage
Coacto, coagido ou paciente – quem sofre a coação.
Segundo o art. 151, CC, para que a coação seja capaz de invalidar o negócio jurídico, deverá
ser relevante, fundada em temor de dano iminente e considerável ao paciente, seus familiares
ou seus bens.
Classifica-se a coação em:
a) Coação física – constrangimento corporal capaz de retirar totalmente o
consentimento da pessoa. Em razão disto, é causa de nulidade. Ex.: venda celebrada a
pessoa hipnotizada. São de pouca aplicabilidade prática!!!
b) Coação moral ou psicológica – esta é a mais utilizada. Quando alguém obriga outrem
a realizar negócio jurídico sob a ameaça fundada de dano a si próprio, sua família ou
seus bens. Gera a anulabilidade do ato. Art. 151, CC.
A análise da coação deve ocorrer caso a caso, pois a idade, sexo e condição do paciente
influencia na configuração ou não desde defeito do negócio jurídico. Art. 152, CC.
O prazo para pleitear a anulação é de 4 aos, a contar de quando cessar a coação (art. 178, I,
CC).
O art. 154, CC prevê que a coação praticada por terceiro também gera a anulabilidade do
negócio jurídico, se o beneficiado pela coação dela tinha conhecimento. Permanece válido, se o
beneficiado não tinha conhecimento da coação (art. 155, CC).
117
O art. 153, CC, por sua vez, prevê situações que não configuram coação:
Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um
direito, nem o simples temor reverencial.
Trata-se de ato anulável (art. 171, II + art. 178, II, CC), que pode ser pleiteada em 4 anos a
contar da celebração.
O negócio jurídico pode ser mantido, no caso do estado de perigo, desde que possa ser
revisado pelo juiz. Art. 156 + art. 157, CC. É o que dispõe o enunciado 148 do CJF/STJ (Conselho da
Justiça Federal e Superior Tribunal de Justiça): “Ao ‘estado de perigo’ (art. 156) aplica-se, por
analogia, o disposto no § 2.º do art. 157”.
19
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 442.
118
8.6.5 Lesão
A lesão está prevista no art. 157 e pode ser conceituada como sendo “o prejuízo resultante
da desproporção existente entre as prestações de um determinado negócio jurídico, em face
do abuso da inexperiência, necessidade econômica ou leviandade de um dos declarantes”.
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade,
ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente
desproporcional ao valor da prestação oposta.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores
vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento
suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
Destaca-se, ainda, que a base estrutural do vício é o fato de que essa onerosidade
excessiva atinge a vontade, enquanto elemento subjetivo.
Segundo o § 2.º do art. 157, não haverá anulação do negócio se as partes fizerem acerto e
houver um aumento da prestação ou diminuição do preço, conforme o caso de onerosidade
excessiva.
119
gratuita ou onerosa o seu patrimônio, para afastar a possibilidade de responderem os seus bens
por obrigações assumidas em momento anterior à transmissão”20.
Exemplo: João, na iminência do vencimento de uma dívida que não terá condições de
pagar, vende a Maria imóvel de seu patrimônio. Maria sabe deste estado de insolvência.
Configura-se, assim, o vício social que pode levar à anulação do negócio jurídico (art. 158,
CC), desde que proposta ação anulatória, pelo credor, no prazo de 4 anos a contar da celebração
do negócio fraudulento (art. 178, II, CC). Esta ação é denominada de ação revocatória ou ação
pauliana. Somente os credores que já o eram no momento da disposição fraudulenta terão
legitimidade para propor a ação pauliana (art. 158, § 2.º, CC). No polo passivo devem figurar o
devedor fraudulento e o terceiro que haja atuado de má-fé (art. 161, CC).
Os fundamentos da ação pauliana são:
a) Negócios de transmissão gratuita de bens – art. 158, CC (doação);
b) Remissão de dívidas – art. 158, CC (devedor insolvente perdoa dívida de terceiro);
c) Contratos onerosos do devedor insolvente:
a. Quando a insolvência for notória
b. Quando houver motivo para ser conhecida do outro contratante (a pessoa que
adquire o bem do devedor é um parente próximo, que deveria presumir o seu
estado de insolvência);
d) Antecipação de pagamento feita a um dos credores em detrimento dos demais – art.
162, CC (neste caso, a ação é proposta também contra o beneficiário do pagamento da
dívida não vencida, que deverá repor aquilo que recebeu);
e) Outorga de garantia de dívida dada a um dos credores, em detrimento dos demais –
art. 163, CC (presunção de fraude. Caso da constituição de hipoteca sobre bem do
devedor insolvente, em benefício de um dos credores).
Anulado o negócio fraudulento, a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo
sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores (art. 165, CC).
Art. 165. Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante
reverterá em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o
concurso de credores.
Parágrafo único. Se esses negócios tinham por único objeto atribuir
direitos preferenciais, mediante hipoteca, penhor ou anticrese, sua
invalidade importará somente na anulação da preferência ajustada.
20
TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 406.
120
Na fraude contra credores há um elemento objetivo, ou seja, a atuação prejudicial do
devedor e de terceiro, bem como um elemento subjetivo, ou seja, a vontade, a intenção de
prejudicar os credores.
Para que possa haver a anulação, deve haver a colusão, ou seja, atuação fraudulenta entre
aquele que dispõe do bem e quem adquire, além do prejuízo causado ao credor. Não havendo
tais requisitos, não há que se falar em anulação.
Quando houver disposição gratuita de bens ou remissão de dívidas, há a dispensa do
elemento subjetivo (art. 158, CC). Assim:
* Para todos verem: esquema
Deve-se destacar que a fraude contra credores é diferente da fraude à execução. A fraude
à execução está prevista no art. 792, CPC/2015:
Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à
execução:
I - quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com
pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha
sido averbada no respectivo registro público, se houver;
II - quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do
processo de execução, na forma do art. 828;
III - quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária
ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi
arguida a fraude;
IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o
devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;
V - nos demais casos expressos em lei.
§ 1o A alienação em fraude à execução é ineficaz em relação ao
exequente.
121
§ 2o No caso de aquisição de bem não sujeito a registro, o terceiro
adquirente tem o ônus de provar que adotou as cautelas necessárias
para a aquisição, mediante a exibição das certidões pertinentes, obtidas
no domicílio do vendedor e no local onde se encontra o bem.
§ 3o Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à
execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se
pretende desconsiderar.
§ 4o Antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o
terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no
prazo de 15 (quinze) dias.
122
8.6.7 Simulação
Simulação é uma declaração enganosa, que vida produzir efeito diverso daquele indicado.
Segundo Gagliano e Pamplona Filho21, “na simulação celebra-se um negócio jurídico que tem
aparência normal, mas que, na verdade, não pretende atingir o efeito que juridicamente
deveria produzir”.
Não é vício de vontade, mas sim um vício social.
Na simulação há um desacordo entre a vontade declarada e a vontade interna, ou seja,
uma discrepância entre a vontade real e a declarada, entre a essência e a aparência. As duas
partes negociantes estão mancomunadas e objetivam iludir a terceiros.
A simulação pode ser:
a) Absoluta: o negócio forma-se a partir de uma declaração de vontade ou confissão de
dívidas emitida para não gerar efeito jurídico algum. É criada uma situação jurídica
irreal, lesiva ao interesse de terceiro.
Ex.: para livrar bens da partilha imposta pelo regime, um dos cônjuge simula negócio
com amigo, contraindo falsa dívida, visando transferir bens para efetivar o pagamento
e prejudicar o outro cônjuge.
Neste caso, o negócio foi praticado para não produzir qualquer efeito. É, portanto, uma
simulação.
b) Relativa: também chamada de dissimulação. Há uma emissão de declaração volitiva
ou confissão falsa visando encobrir ato de natureza diversa, cujos efeitos são proibidos
por lei. Também ocorre quando a declaração de vontade é emitida aparentando
conferir direitos a uma pessoa, mas transferindo-os, em verdade, para terceiro, não
integrante da relação jurídica. Aqui, diferente da simulação absoluta, as partes
pretendem atingir o resultado ou efeitos jurídicos concretos, embora vedados por lei.
Ex.: homem casado que pretende doar bem à concubina. Como a lei veda essa doação,
o homem simula uma compra e venda que, em seu bojo, encobre o ato que
efetivamente se quer praticar: doação de bem à concubina.
Ex.: na mesma situação, o homem transfere a um terceiro o bem, que, em seguida, doa
o mesmo à concubina do homem casado.
Ex.: quando as partes de um negócio pós-datam ou antedatam documento,
objetivando situá-lo cronologicamente em período de tempo diverso do qual
realmente foi celebrado.
21
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 445.
123
A simulação gera a nulidade do negócio praticado. Sendo simulação absoluta, é nulo todo
o ato. Caso seja simulação relativa, será nulo o negócio, mas subsistirá o que se dissimulou se for
válido na substância e na forma.
Ex.: um proprietário cede um imóvel a outrem celebrando contrato de comodato.
Contudo, por detrás dos panos é cobrado aluguel. O comodato, neste caso é inválido, mas a
locação é válida, desde que não ofenda a lei ou direitos de terceiros.
Ex.: alguém que faz contrato de prestação de serviços pelo CC. Contudo, estão previstos
todos os requisitos de contrato de trabalho regido pela CLT. Neste caso, será nulo o contrato de
prestação de servidos, mas válido o contrato regido pela CLT.
É o que prevê o art. 167, CC:
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se
dissimulou, se válido for na substância e na forma.
A alegação da simulação pode ser feita por terceiro, alheio ao negócio e, também, pelos
próprios negociantes, um contra o outro. Neste aspecto o enunciado 294, CJF/STJ: “Sendo a
simulação uma causa de nulidade do negócio jurídico, pode ser alegada por uma das partes
contra a outra”. Não há necessidade de ação específica para a nulidade do negócio simulado.
Pode haver o reconhecimento incidental e de ofício pelo juiz em demanda que tenha outro
objeto.
A simulação pode ocorrer em três hipóteses, previstas no art. 167, § 1.º, CC. Trata-se de rol
exemplificativo, podendo ocorrer outros casos de simulação, sempre que houver uma
disparidade entre a vontade manifestada e a oculta.
a) De negócios jurídicos que visem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas
daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem (simulação subjetiva);
b) De negócios jurídicos que contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não
verdadeira (simulação objetiva);
c) De negócios jurídicos cujos instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-
datados (simulação objetiva).
Para encerrar, deve-se considerar a questão da reserva mental, que está prevista no art.
110, CC e quando ilícita e conhecida do destinatário é vício social capaz de gerar a nulidade do
negócio jurídico. A reserva mental constitui-se de situações em que um dos declarantes oculta
sua verdadeira intenção, ou seja, quando não quer um efeito jurídico que declara querer. Trata-
124
se de uma enganação ao outro contratante. Se o outro negociante souber da reserva mental, o
negócio é nulo. Se o outro declarante, no entanto, não souber da reserva, o ato subsiste e
produz efeitos que o declarante não desejava.
- se a outra parte não tem conhecimento da reserva mental ➔ negócio válido.
- se a outra parte sabe da reserva metal ➔ negócio nulo, pois similar à simulação.
Exemplos de reserva mental:
a) Declaração de uma obra literária que anuncia que o produto da venda de seus livros
será destinado a uma instituição de caridade, quando, em verdade, não pretende nada
dito. Seu único objetivo é aumentar a venda dos livros. Caso os compradores tenham
conhecimento da reserva, a venda pode ser nulificada.
b) Declaração do testador que, com o objetivo de prejudicar herdeiro, faz disposição em
benefício de quem se diz devedor, o que não é verdade.
c) Homem que, visando relação sexual com uma mulher, promete toma-la como esposa.
125
09. Invalidade do negócio jurídico. Prescrição e decadência
9.1 Invalidade do negócio jurídico
A expressão invalidade é utilizada para definir o negócio que não produz os efeitos
desejados pelas partes envolvidas. A invalidade do negócio jurídico abrange: a) a inexistência do
negócio; b) a nulidade absoluta (negócio nulo); a nulidade relativa ou anulabilidade (negócio
anulável).
O art. 183, CC prevê que a invalidade do instrumento não induz a invalidade do negócio
jurídico celebrado, desde que possa ser provada a celebração do mesmo por outra forma. Ex.:
contrato preliminar não pode ser anulado, se puder ser provado pelas testemunhas (a forma é
dispensada nos contratos preliminares – art. 462, CC).
Além disto, a invalidação de parte de um negócio jurídico não impede a validade da outra
parte, se esta for separável (art. 184, CC). Ocorrerá, neste caso, a redução do negócio jurídico para
a parte válida. Ex.: negócio jurídico cuja multa ou cláusula penal tenha sido celebrada com lesão
(art. 157, CC). Neste caso, somente a multa é anulável, permanecendo o restante como válido.
9.1.2 Nulidade
Nulidade é a sanção imposta pela lei aos negócios jurídicos, através da privação de efeitos
jurídicos, em razão de desobediência à prescrição da norma jurídica. Trata-se da consequência
imposta aos negócios jurídicos quando não estiverem preenchidos os requisitos básicos para a
existência válida do negócio.
A nulidade pode ser: absoluta (trata-se da nulidade propriamente dita) ou relativa (trata-
se das questões de anulabilidade do negócio). Neste tópico será tratada a nulidade absoluta. A
nulidade relativa será abordada em tópico próprio.
Na nulidade, o negócio não produz efeitos pois faltam a ele os requisitos de validade
previstos no art. 104, CC. Há uma ofensa às normas de ordem pública, sendo o negócio
absolutamente inválido.
O art. 166, CC estabelece as hipóteses de nulidade:
a) Negócio celebrado por absolutamente incapaz, sem representação (art. 3.º, CC);
b) Objeto ilícito, impossível, indeterminado ou indeterminável.
126
c) Motivo determinante do negócio for ilícito (intenção das partes). O objeto em si não é
ilícito, mas houve conluio entre as partes para alcançar fim ilegítimo ou criminoso (ex.:
venda de automóvel para utilizar num sequestro; aluguel de casa para abertura de
uma casa de prostituição – a venda e o aluguel não são ilícitos, mas o motivo
determinante dela sim).
d) Quando o negócio não obedecer a forma prevista na lei ou alguma solenidade exigida
não for obedecida (incisos IV e V). Ex.: compra e venda de imóvel de valor superior a 30
salários mínimos celebrado por escritura particular (art. 108, CC) (salário de 880,00 =
R$26.400,00).
e) Negócio que tiver como objetivo fraudar a lei imperativa. Ex.: retrovenda cujo objetivo
é dar aparência de legalidade a um contrato de mútuo em que foram cobrados juros
abusivos. “Trata-se de manobra engendrada pelo fraudador para violar dispositivo
expresso de lei, objetivando esquivar-se de obrigação legal ou obter proveito ilícito. As
legislações fiscal e trabalhista costumeiramente são atingidas por esta espécie de
fraude, realizada sob diferentes formas”22.
f) Quando a lei expressamente o declarar nulo ou proibir a prática, sem cominar sanção.
Ex.: vedação de doação de todos os bens sem reserva de mínimo para sobrevivência
do doador (art. 548, CC). Ex.: é nulo o contrato que tenha por objeto herança de pessoa
viva.
Além dessas hipóteses, também é nulo o negócio simulado, subsistindo, apenas o que se
dissimulou (art. 167, CC).
Também é nulo o negócio jurídico viciado em razão de coação física, em razão da
ausência de vontade livre e de boa-fé.
22
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral.
v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 463.
127
Via de regra, a nulidade liquida totalmente o negócio jurídico. Contudo, prevê o art. 170,
CC que, se o negócio jurídico contiver requisitos de outro, subsiste o negócio quando o fim a
que visavam as partes permitir supor que teriam querido este outro negócio se soubessem da
nulidade. Assim, poderá o juiz fazer a conversão a este novo negócio, sem decretar a nulidade.
Ex.: compra e venda de imóvel de valor superior a 30 salários mínimos celebrado por escritura
particular. É nulo o negócio. Contudo, pode ser convertido em compromisso de compra e venda
(que pode ser feito por escrito particular). Para que isto ocorra, o negócio nulo deve conter todos
os requisitos do negócio a ser convertido.
A sentença que declara a nulidade tem efeitos erga omnes (contra todos). Os efeitos
declaratórios têm efeitos ex tunc, ou seja, retroagem ao momento da celebração do negócio.
Contudo, os interesses de terceiros de boa-fé devem ser preservados. Neste sentido, o
enunciado 537, CFJ/STJ, determina: “A previsão contida no art. 169 não impossibilita que,
excepcionalmente, negócios jurídicos nulos produzam efeitos a serem reservados quando
justificados por interesses merecedores de tutela”. Ex.: casamento entre irmãos. Produz todos os
efeitos até a declaração de nulidade. Os efeitos retroagem à data da celebração, sendo o
casamento considerado como se jamais tivesse existido. Contudo, os efeitos são aproveitados às
partes que estiverem de boa-fé.
9.1.3 Anulabilidade
A nulidade relativa ou anulabilidade envolve preceitos de ordem privada, de interesse das
partes.
As hipóteses de anulabilidade constam no art. 171, CC:
a) Negócio celebrado por relativamente incapaz, sem a devida assistência (art. 4.º, CC);
b) Existência de vício no negócio jurídico: erro, dolo, coação moral ou psicológica, lesão,
estado de perigo ou fraude a credores.
c) Casos especificados pela lei como de anulabilidade. Ex.: venda de imóvel exige outorga
conjugal (art. 1.647 e 1.649). Se não houver tal outorga, o negócio jurídico celebrado é
anulável.
Procedimento da anulabilidade. Para que um negócio seja anulado, deve haver a
propositura de ação anulatória. Esta ação tem natureza constitutiva negativa, o que significa
dizer que possui prazos decadenciais, os quais estão previstos nos arts. 178 e 179, CC:
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a
anulação do negócio jurídico, contado:
I - no caso de coação, do dia em que ela cessar;
II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do
dia em que se realizou o negócio jurídico;
III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.
128
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem
estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a
contar da data da conclusão do ato.
129
não provido. (AgRg no REsp 743.890/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,
TERCEIRA TURMA, julgado em 20/09/2005, DJ 03/10/2005, p. 250)
Efeitos da anulabilidade. A anulabilidade não pode ser reconhecida de ofício pelo juiz.
Deve ser alegada pelo interessado, através da ação de anulação (arts 177 e 178, CC). Também
não cabe ao Ministério Público propor a ação.
O art. 172, CC prevê que o negócio jurídico anulável pode ser confirmado (convalidado)
pelas partes, salvo o direito de terceiro. Trata-se da valorização a boa-fé. A convalidação deve
conter uma confirmação expressa do negócio jurídico, com manifestação expressa da vontade
(art. 173, CC). Se o negócio já tiver sido cumprido em parte pelo devedor, mesmo ciente do vício,
há a dispensa da convalidação expressa (art. 174, CC). Neste caso, trata-se de uma convalidação
tácita. O art. 175, CC prevê que uma vez tendo sido confirmado o negócio, não há mais como
revogar o negócio, não cabendo qualquer requerimento de anulação posterior.
O art. 176, CC prevê que: “quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização de
terceiro, será validado se este a der posteriormente”. Assim, o negócio celebrado por menor
púbere (16 a 18 anos) pode ser validado se houver autorização do pai ou tutor posteriormente.
O menor púbere (16 a 18 anos) não pode se valer da própria torpeza, beneficiando-se de
ato malicioso. Assim, não cabe a alegação da idade, para eximir-se da obrigação, quando, na
celebração do negócio, omitiu a informação de ser relativamente incapaz. Neste caso, reputa-se
válido o negócio (art. 180, CC).
Além disto, o art. 181, CC prevê que “Ninguém pode reclamar o que, por uma obrigação
anulada, pagou a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga”.
Em razão da vedação do enriquecimento sem causa, permite-se que, havendo prova de que o
menor se beneficiou, a pessoa reveja o dinheiro pago.
A sentença anulatória produz efeitos inter partes. Os efeitos são ex nunc (não retroagem),
ou seja, só produz efeitos a sentença a partir do seu trânsito em julgado (art. 177, CC). Contudo,
há o desfazimento do negócio, voltando ao estado anterior. Ex.: casamento anulável (volta ao
status de solteiro).
130
* Para todos verem: esquema
131
• Objetivo do negócio de fraude à lei
imperativa
• Lei prevê a nulidade absoluta
(nulidade textual) ou proibir o ato sem
cominar sanção (nulidade virtual)
• Negócio simulado, incluída a reserva
mental
• Presença de coação física
Esse rol é exemplificativo, pois existindo outras formas, elas não serão excluídas. Neste
aspecto, o art. 369, CPC/2015, dispõe:
Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem
como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste
Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a
defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.
Sendo assim, cabe, por exemplo, provas obtidas através de meio eletrônico. A prova
digital, obtida pela internet, não pode ser classificada como documento. Os Enunciados 297 e
298, CJF/STJ já previam:
297 – Art. 212. O documento eletrônico tem valor probante, desde que
seja apto a conservar a integridade de seu conteúdo e idôneo a apontar
sua autoria, independentemente da tecnologia empregada.
O CPC/2015 prevê a possibilidade de utilização desse meio de prova. O art. 422 faz essa
previsão.
Art. 422. Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, a
cinematográfica, a fonográfica ou de outra espécie, tem aptidão para
fazer prova dos fatos ou das coisas representadas, se a sua conformidade
com o documento original não for impugnada por aquele contra quem
foi produzida.
§ 1o As fotografias digitais e as extraídas da rede mundial de
computadores fazem prova das imagens que reproduzem, devendo, se
impugnadas, ser apresentada a respectiva autenticação eletrônica ou,
não sendo possível, realizada perícia.
§ 2o Se se tratar de fotografia publicada em jornal ou revista, será exigido
um exemplar original do periódico, caso impugnada a veracidade pela
outra parte.
133
§ 3o Aplica-se o disposto neste artigo à forma impressa de mensagem
eletrônica.
As publicações em redes sociais também vêm sendo admitidas como meio de prova. A
partir daí, necessário que se analise cada um dos meios de prova contidos no art. 212, CC:
confissão, documento, testemunha, presunção e perícia.
Confissão.
A confissão é uma declaração feita por alguém, contra quem se pretende provar fato ou
negócio jurídico. Neste aspecto é a previsão do art. 389, CPC/2015:
Art. 389. Há confissão, judicial ou extrajudicial, quando a parte admite a
verdade de fato contrário ao seu interesse e favorável ao do adversário.
Documentos.
Representam um fato, destinando-se a conservá-lo para prová-lo no futuro.
Os documentos podem ser: públicos e particulares.
Particulares – feitos mediante atividade privada, ou seja, documentos firmados por
particulares. Ex.: cartas, telegramas.
Públicos – documentos elaborados por autoridade pública no exercício de suas funções.
Ex.: escritura pública, certidões, traslados, etc.
O art. 215, CC dispõe que a escritura púbica é documento dotado de fé pública. Assim, não
cabe provar com testemunhas contra a escritura, pois ela é documento fidedigno, em razão da
fé púbica do tabelião.
O art. 215, § 1.º, CC estabelece os requisitos que devem constar na escritura pública:
§ 1o Salvo quando exigidos por lei outros requisitos, a escritura pública
deve conter:
I - data e local de sua realização;
II - reconhecimento da identidade e capacidade das partes e de quantos
hajam comparecido ao ato, por si, como representantes, intervenientes
ou testemunhas;
III - nome, nacionalidade, estado civil, profissão, domicílio e residência das
partes e demais comparecentes, com a indicação, quando necessário, do
regime de bens do casamento, nome do outro cônjuge e filiação;
IV - manifestação clara da vontade das partes e dos intervenientes;
V - referência ao cumprimento das exigências legais e fiscais inerentes à
legitimidade do ato;
VI - declaração de ter sido lida na presença das partes e demais
comparecentes, ou de que todos a leram;
VII - assinatura das partes e dos demais comparecentes, bem como a do
tabelião ou seu substituto legal, encerrando o ato.
Se esses requisitos não forem observados pelo Tabelião de Notas, fará com que a escritura
pública seja nula.
135
A escritura pode ser lavrada em qualquer Tabelionato de Notas do território nacional. Não
é obrigatório lavrar a escritura no local onde se reside ou onde está localizado o imóvel.
Contudo, o registro imobiliário deve ser feito no local onde está localizado o bem. Segundo o art.
108, CC, só se exige escritura pública para lavratura de atos de disposição de imóveis acima de
30 salários mínimos.
O § 2.º do art. 215, CC prevê que se algum comparecente não puder ou não souber
escrever, outra pessoa capaz assinará por ele, a seu rogo. O ato, ainda assim, será válido.
A escritura é redigida em língua nacional (§ 3.º). Se não o for, será nula.
(§ 4.º) Se qualquer dos comparecentes não souber a língua nacional e o tabelião não
entender o idioma em que se expressa, deverá comparecer tradutor público para servir de
intérprete, ou, não o havendo na localidade, outra pessoa capaz que, a juízo do tabelião, tenha
idoneidade e conhecimento bastantes.
(§ 5.º) Se algum dos comparecentes não for conhecido do tabelião, nem puder identificar-
se por documento, deverão participar do ato pelo menos duas testemunhas que o conheçam e
atestem sua identidade. Sendo assim, primeiro o Tabelião deve identificar os comparecentes
documentalmente (documento com foto).
Assim, quando a lei exigir instrumento público, nenhuma outra prova, por mais especial
que seja, pode substituir sua falta (art. 406, CPC/2015).
O documento deve ser exibido, como prova, no formato original. Contudo, também
servirão de prova, as certidões judiciais. Art. 216, CC:
Art. 216. Farão a mesma prova que os originais as certidões textuais de
qualquer peça judicial, do protocolo das audiências, ou de outro qualquer
livro a cargo do escrivão, sendo extraídas por ele, ou sob a sua vigilância, e
por ele subscritas, assim como os traslados de autos, quando por outro
escrivão consertados.
136
II - os traslados e as certidões extraídas por oficial público de
instrumentos ou documentos lançados em suas notas;
III - as reproduções dos documentos públicos, desde que autenticadas
por oficial público ou conferidas em cartório com os respectivos originais;
IV - as cópias reprográficas de peças do próprio processo judicial
declaradas autênticas pelo advogado, sob sua responsabilidade pessoal,
se não lhes for impugnada a autenticidade;
V - os extratos digitais de bancos de dados públicos e privados, desde
que atestado pelo seu emitente, sob as penas da lei, que as informações
conferem com o que consta na origem;
VI - as reproduções digitalizadas de qualquer documento público ou
particular, quando juntadas aos autos pelos órgãos da justiça e seus
auxiliares, pelo Ministério Público e seus auxiliares, pela Defensoria
Pública e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas repartições públicas
em geral e por advogados, ressalvada a alegação motivada e
fundamentada de adulteração.
§ 1o Os originais dos documentos digitalizados mencionados no inciso VI
deverão ser preservados pelo seu detentor até o final do prazo para
propositura de ação rescisória.
§ 2o Tratando-se de cópia digital de título executivo extrajudicial ou de
documento relevante à instrução do processo, o juiz poderá determinar
seu depósito em cartório ou secretaria.
Significa dizer que os documentos assinados, públicos ou particulares, tem eficácia (são
verdadeiros) entre as partes que neles lançaram suas assinaturas (art. 408, CPC/2015). Trata-se
de presunção relativa, podendo ser afastada por outro meio de prova. Ex.: cartão ponto no
137
direito do trabalho faz prova da jornada de trabalho. Cabe, contudo, ao trabalhador fazer prova,
por outros meios da existência de horas extras não registradas e não pagas.
Declarações enunciativa – qualificação das partes, por exemplo.
Existem situações que a lei determina que o cônjuge outorgue anuência ao outro, para
que possa celebrar negócio jurídico (ex.: art. 1.647, CC). Nestes casos, o art. 220 dispõe que:
Art. 220. A anuência ou a autorização de outrem, necessária à validade de
um ato, provar-se-á do mesmo modo que este, e constará, sempre que
se possa, do próprio instrumento.
Assim, só por instrumento público poderá ser a procuração outorgada pelos cônjuges, um
ao outro, para a outorga marital, para a venda de bens imóveis, essencial a validade da escritura
pública.
Diferente do instrumento público, o particular não tem força probante absoluta. O que
consta em instrumento particular pode ser provado de outra forma (testemunhas, por
exemplo). O instrumento particular gera efeitos apenas entre as partes que o firmaram. Para
valer contra terceiros, deve ser registrado no Cartório de Títulos e Documentos.
O art. 222, CC trata do telegrama, prevendo que quando houver contestação de sua
autenticidade, a prova poderá ser feita mediante conferencia com o original assinado.
Art. 222. O telegrama, quando lhe for contestada a autenticidade, faz
prova mediante conferência com o original assinado.
138
negócios jurídicos e praticar atos jurídicos sem a presença corpórea
simultânea das partes ou de seus representantes.
A cópia fotográfica de documento, conferida por tabelião de notas, valerá como prova da
declaração de vontade, mas, impugnada sua autenticidade, deverá ser exibido o original (art.
223, CC). Trata-se das cópias autenticadas.
139
Parágrafo único. A prova resultante dos livros e fichas não é bastante nos
casos em que a lei exige escritura pública, ou escrito particular revestido
de requisitos especiais, e pode ser ilidida pela comprovação da falsidade
ou inexatidão dos lançamentos.
Não se trata de prova absoluta, pois pode ser afastada a presunção de veracidade, através
da comprovação da falsidade, por perícia técnica.
Testemunhas.
Testemunhas são pessoas chamadas a depor sobre determinados fatos, visando a
comprovação ou elucidação dos mesmos. As testemunhas podem ser:
Judiciárias. Aquelas convocadas para depor em juízo.
Instrumentárias. São as que se pronunciam extrajudicialmente, sobre determinado
documento.
A prova testemunhal é sempre admissível, desde que a lei não exija prova de modo
diverso (art. 442, CPC/2015).
As pessoas que depuserem em juízo como testemunhas deverão prestar compromisso de
dizer a verdade. Caso não digam a verdade, poderão incorrer no crime de falso testemunho. O
juiz esclarece isto às testemunhas e, se aceitarem, estarão compromissadas com o juízo.
Contudo, não podem ser testemunhas (art. 228, CC + art. 447, CPC/2015):
Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:
I - os menores de dezesseis anos;
II - (Revogado);
III - (Revogado);
IV - o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das
partes;
V - os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o
terceiro grau de alguma das partes, por consanguinidade, ou afinidade.
§ 1o Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o
depoimento das pessoas a que se refere este artigo.
§ 2o A pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de
condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurados todos os
recursos de tecnologia assistiva.
Presunção.
É a dedução de um fato conhecido para demonstrar outro desconhecido. Consequência
que tem como ponto de partida um fato conhecido para chegar ao ignorado.
Exemplo de presunção: como é conhecido o fato de que o credor só entrega o título
(promissória) ao devedor com o pagamento, presume-se que se o devedor está de posse da
promissória, houve pagamento.
As presunções podem ser: legais (decorrentes da lei. Ex.: presunção de paternidade) ou
comuns (que se baseiam no que ordinariamente ocorre, na experiência da vida. Ex.: presume-se
que as dívidas do marido sejam contraídas em benefício da família).
Neste aspecto, deve-se destacar os arts. 231 e 232, CC:
Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário
não poderá aproveitar-se de sua recusa.
Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a
prova que se pretendia obter com o exame.
Situação mais comum é nos casos de investigações de paternidade em que o suposto pai
nega-se a fazer o exame de DNA. Neste caso, cabe a presunção de paternidade, não sendo mais
necessária a prova da paternidade através do exame, em razão da recusa. No mesmo sentido é
a previsão da súmula 301, STJ:
“Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame
de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.”
Trata-se de uma presunção relativa, pois pode ser afastada através da realização posterior
do exame de DNA.
Aliás, as presunções podem ser: absolutas (que não admitem prova em contrário. Ex.:
vulnerabilidade do consumidor) ou relativas (que admitem prova em contrário. Ex.: presunção
de paternidade).
Perícias.
Perícia é o exame ou vistoria.
142
Exame é a apreciação de alguma coisa, por peritos, para auxiliar o juiz a formar sua
convicção. Ex.: exame grafotécnico, exame de sangue
Vistoria é uma perícia restrita à inspeção ocular. É diligencia frequente nas ações
imobiliárias, possessórias ou demarcatórias.
Também é prova pericial a avaliação, ou seja, atribuição de valor de mercado a algum
bem.
O ato ilícito é um só, mas pode atingir várias esferas do direito: civil, administrativo e penal.
Ex.: um homem atravessa o sinal vermelho, bate de carro em outra pessoa, causando prejuízos
financeiros (danos ao veículo) e danos físicos na pessoa que está no carro. Neste caso, as três
esferas foram violadas. Haverá multa de trânsito, por passar o sinal vermelho; indenização por
danos materiais, por ter estragado o carro; e privação da liberdade, em razão do crime
cometido.
O ato ilícito é, portanto, um ato consciente e voluntário do ser humano que transgride
dever jurídico.
143
Neste aspecto é a previsão do art. 186, CC:
Sendo assim, havendo o dano, causado pelo ato ilícito, haverá a responsabilidade.
Mas para que exista a responsabilidade, deve haver a presença de três elementos:
a) Fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência;
b) Ocorrência de um dano patrimonial ou moral;
c) Nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente.
O abuso de direito são situações em que alguém abusa de seu direito e prejudica outrem.
Não há que se provar a culpa para que surja o dever de indenizar os danos causados.
9.3.2 Prescrição
A prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito violado, em razão da inércia
do titular, dentro do prazo previsto pela lei. Neste aspecto, o art. 189, CC, determina:
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se
extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.
Pretensões imprescritíveis
Apesar de a prescrição ser a regra, existem pretensões que são imprescritíveis (exceção):
a) Que protegem os direitos da personalidade: vida, honra, liberdade, integridade física
ou moral, imagem, nome, obras literárias, artísticas ou científicas.
146
b) As que se prendam ao estado das pessoas: filiação (prescreve, contudo, a ação de
petição de herança – 10 anos a contar do óbito), qualidade de cidadania (interdição),
condição conjugal (separação, divórcio)
c) As de exercício facultativo ou potestativo: não existe direito violado, como as
destinadas a extinguir o condomínio (ação de divisão – Art. 1.320, CC), pedir a meação
no muro do vizinho;
d) As referentes a bens públicos de qualquer natureza;
e) As que protegem o direito de propriedade, que é perpétuo;
f) As pretensões de reaver bens confiados à guarda de outrem, a título de depósito, penhor
ou mandato.
g) As destinadas a anular inscrição do nome empresarial feita com violação de lei ou
contrato (Art. 1.167, CC).
h) Pretensões de ressarcimento do erário por danos decorrentes de atos de improbidade
administrativa (segundo o STJ)
147
Assim, no caso de uma dívida, a prescrição começa a correr no momento em que não há o
pagamento (vencimento + inadimplemento). No caso de um ato ilícito, inicia a prescrição com a
ocorrência do evento danoso.
Em havendo uma condição ou prazo, a contagem da prescrição inicia com a
implementação
Mas para que se configure a prescrição, necessária a presença de três elementos:
a) Existência de uma pretensão exercitável;
b) Inércia do titular pelo seu não exercício;
c) Decurso de tempo fixado em lei.
O art. 190 estabelece que a exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão. A
exceção é a alegação de uma pretensão como defesa.
Renúncia da prescrição.
Art. 191 – não cabe renúncia prévia da prescrição. Só é cabível quando já consumada a
prescrição. Assim, são dois os requisitos para a validade da renúncia à prescrição: a) que já tenha
sido consumada; b) que não prejudique terceiros (credores que poderão ser prejudicados com a
renúncia da prescrição).
A renúncia pode ser:
a) Expressa – manifestação taxativa, inequívoca, escrita ou verbal, por parte do devedor,
de que não pretende se utilizar da prescrição.
b) Tácita – art. 191, CC, é a que se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a
prescrição. Ex.: uma vez consumada a prescrição, ato de reconhecimento da dívida por
parte do devedor, como, por exemplo, o pagamento parcial da dívida ou composição
visando a solução futura do débito.
Sendo assim, mesmo havendo dívida prescrita, não há óbice ao fato de o devedor quitar
tal dívida. Contudo, o art. 882, CC determina que não cabe repetição do indébito quando feito
pagamento para quitar dívida prescrita.
Prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo entre as partes
Art. 192 – os prazos prescricionais não podem ser alterados por acordo entre as partes.
149
Aqui incluem-se, não só os cônjuges, durante o matrimônio, mas também os conviventes,
durante a união estável (enunciado 296, CJF/STJ).
Quanto a situação dos arts. 197, II e art. 198, I, CC, deve-se destacar a questão dos
alimentos. Em se tratando de suspensão ou impedimento de início da contagem do prazo
prescricional, deve-se considerar que, no caso de alguém com 17 anos não corre prescrição,
podendo cobrar todo o débito alimentar (de 1999 até 2014, por exemplo). Contudo, mesmo que
complete 18 anos, só a partir dali é que começa a correr o prazo prescricional de 2 anos. Significa
dizer que até os 20 anos cabe cobrar todo o período devido.
* Para todos verem: esquema
PRESCRIÇÃO
150
I - pendendo condição suspensiva;
II - não estando vencido o prazo;
III - pendendo ação de evicção.
Nas duas primeiras situações, o direito ainda não se tornou exigível, não sendo possível,
portanto, falar-se em prescrição. Se terceiro propor ação de evicção, a prescrição só corre após o
desfecho final.
Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo
criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.
No caso de reparação civil, só inicia a contagem do prazo quando houver sentença penal
condenatória definitiva.
Art. 201. Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só
aproveitam os outros se a obrigação for indivisível.
A prescrição é benefício pessoal e só aproveita as pessoas mencionadas, mesmo em caso
de solidariedade. Para que a suspensão da prescrição que favoreça um dos credores solidários
beneficie aos demais, a obrigação deve ser indivisível.
Ex.: a obrigação de entrega de animal é indivisível. Se forem três credores de devedor
comum. Um dos credores é absolutamente incapaz. Contra ele não corre prescrição. Como a
obrigação é indivisível, beneficia a todos a prescrição. neste caso, só iniciaria o prazo de
contagem a partir do momento em que fizesse 16 anos.
Ex.: obrigação de pagar importância em dinheiro. Se forem três credores de devedor
comum. Um dos credores é absolutamente incapaz. Contra ele não corre prescrição. Como a
obrigação é divisível, não haverá benefício aos demais.
151
I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se
o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
Esse despacho deve ser seguido da citação válida. Uma vez operada a citação, a
interrupção retroage a data da propositura da ação (art. 240, § 1.º, CPC/2015). Com isto, mesmo
que a citação demore, não haverá a prescrição.
II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;
III - por protesto cambial;
A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado (art. 203, CC)
Os efeitos da prescrição são pessoais. O efeito da interrupção da prescrição por um credor
não aproveita aos demais, assim como aquela promovida contra um devedor ou seu herdeiro,
não prejudica aos demais coobrigados (art. 204, CC). Esta regra, contudo, admite exceção: a
interrupção por um dos credores solidários aproveita aos demais.
Prazos prescricionais
Os prazos prescricionais podem ser:
a) Ordinários: quando não houver prazo especial, o prazo prescricional é de 10 anos,
tanto para ações reais, quanto para pessoais (art. 205, CC).
Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja
fixado prazo menor.
b) Especiais: são prazos mais exíguos, previstos especificiamente no art. 206, CC e podem
ser de 1, 2, 3, 4 ou 5 anos.
Art. 206. Prescreve:
152
§ 1o Em um ano:
I - a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados a
consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da
hospedagem ou dos alimentos;
II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra
aquele, contado o prazo:
a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data
em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo
terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do
segurador;
b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;
III - a pretensão dos tabeliães, auxiliares da justiça, serventuários judiciais,
árbitros e peritos, pela percepção de emolumentos, custas e honorários;
IV - a pretensão contra os peritos, pela avaliação dos bens que entraram
para a formação do capital de sociedade anônima, contado da
publicação da ata da assembléia que aprovar o laudo;
V - a pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e
os liquidantes, contado o prazo da publicação da ata de encerramento da
liquidação da sociedade.
§ 2o Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a
partir da data em que se vencerem.
§ 3o Em três anos:
I - a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;
II - a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias
ou vitalícias;
III - a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações
acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com
capitalização ou sem ela;
IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;
V - a pretensão de reparação civil;
VI - a pretensão de restituição dos lucros ou dividendos recebidos de má-
fé, correndo o prazo da data em que foi deliberada a distribuição;
VII - a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da
lei ou do estatuto, contado o prazo:
a) para os fundadores, da publicação dos atos constitutivos da sociedade
anônima;
153
b) para os administradores, ou fiscais, da apresentação, aos sócios, do
balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou
da reunião ou assembléia geral que dela deva tomar conhecimento;
c) para os liquidantes, da primeira assembléia semestral posterior à
violação;
VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar
do vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;
IX - a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro
prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório.
§ 4o Em quatro anos, a pretensão relativa à tutela, a contar da data da
aprovação das contas.
§ 5o Em cinco anos:
I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de
instrumento público ou particular;
II - a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais,
curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da
conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou
mandato;
III - a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em
juízo.
9.3.3 Decadência
Decadência é a perda do direito potestativo pela inércia de seu titular no período
determinado pela lei. O objeto são os direitos potestativos de qualquer espécie, disponíveis ou
indisponíveis, direitos que conferem ao titular o poder de influir ou determinar mudanças na
esfera jurídica de outrem, por ato unilateral, sem que haja dever correspondente, apenas uma
sujeição.
Na decadência o prazo começa a correr no momento em que o direito nasce. O prazo
prescricional, por sua vez, inicia no momento em que há a violação do direito.
A decadência pode resultar e lei, do testamento ou do contrato. A prescrição deriva
apenas da lei.
Os prazos de prescrição são taxativos (apenas as hipóteses dos arts. 205 e 206, CC). Os
demais prazos são decadenciais.
Na decadência há a perda de um direito previsto em lei. A lei estabelece que determinado
ato deva ser exercido dentro de um prazo determinado. Em não o sendo, não mais poderá
efetivar-se, pois seu titular decaiu do direito. A decadência é o não exercício de um direito
154
potestativo dentro do prazo. Ex.: direito de pleitear a anulação de um negócio jurídico (prazo de
180 dias a contar da celebração).
A decadência pode ser legal ou convencional. No caso da decadência convencional,
estabelece o art. 211, CC, que a parte a quem aproveita pode alega-la em qualquer grau de
jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação. O juiz deve, de ofício, reconhecer a decadência,
quando for legal (art. 210, CC).
Em princípio, os prazos decadenciais são fatais e peremptórios, o que significa dizer que
não se aplica à decadência as situações de interrupção e suspensão da prescrição (art. 207, CC)
(salvo disposição em contrário).
Aplica-se à decadência as situações dos arts. 195 e 198, I, CC (art. 208, CC), que dizem
respeito a incapazes. Assim, não flui o prazo de decadência contra absolutamente incapazes,
sendo uma exceção ao disposto no art. 207.
Segundo o art. 209, CC, a decadência legal é irrenunciável. Isto ocorre em razão do
interesse geral. Contudo, os prazos decadenciais convencionais podem ser renunciados.
Prazos de decadência
Os prazos decadenciais estão previstos em locais esparsos na legislação. Tem-se como
alguns exemplos:
- 30 dias: para o comprador propor ação em que pretenda rescindir o contrato e reaver o
preço pago pela coisa móvel (art. 445, CC)
- 60 dias: para o exercício do direito de preferência, caso inexista prazo estipulado, na coisa
imóvel, contado da data em que o comprador tiver notificado o vendedor (art. 516, CC).
- 180 dias: para o exercício do direito de preferência do condômino a quem não tenha sido
dado tal direito e o imóvel tenha sido vendido a terceiro.
- 1 ano: para revogação da doação por ingratidão ou diante da inexecução do encargo.
- 1 ano e 1 dia: para desfazer janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio, em face
do vizinho. Prazo conta-se da conclusão da obra (art. 1.302, CC).
- 3 anos: anulação de casamento celebrado com erro essencial quanto à pessoa do outro,
contado da data da celebração
- 4 anos: para anular negócio jurídico celebrado com vício do consentimento
- 5 anos: para impugnar a validade de testamento, contado da data do seu registro.
155
* Para todos verem: esquema
156
02. DIREITO DAS COISAS
01. Coisas e direitos reais: noções gerais. Posse: conceito e classificação
I – NOÇÕES INTRODUTÓRIAS E CONCEITUAIS
1. Direito das Coisas – conceito e noções introdutórias
O Direito das Coisas é um ramo do direito civil – direito privado, portanto – que se
preocupa em estudar as relações jurídicas que se estabelecem entre as pessoas e coisas
determinadas, no que diz respeito a apropriação destas coisas. Trata, pois, do domínio e do
pertencimento de um determinado bem a uma pessoa. Para Penteado23 o Direito das Coisas
disciplina “as normas jurídicas que dispõem sobre situações jurídicas que desencadeiam
direitos que têm por objeto coisas”. Tartuce24 afirma que “o Direito das Coisas é o ramo do
Direito Civil que tem como conteúdo relações jurídicas estabelecidas entre pessoas e coisas
determinadas, ou mesmo determináveis”. Assim, o Direito das Coisas estuda os direitos
subjetivos que incidem sobre coisas.
Quando se estudam os bens jurídicos (parte geral) percebe-se que existem bens jurídicos
materiais e bens jurídicos imateriais. Entende-se, com base em Gagliano e Pamplona Filho25
que coisas são os bens corpóreos, materiais e, segundo Tartuce26, coisas é tudo aquilo que não é
humano. Os bens, por sua vez, são tanto os objetos corpóreos e materiais (coisas) quanto os
ideais e imateriais, de forma a justificar que a liberdade, a honra, a imagem, a vida de alguém
possa ser considerado como bem jurídico (ainda que não seja uma coisa).
É preciso que se esclareça que o Direito das Coisas estuda os bens jurídicos corpóreos, ou
seja, as coisas, pois somente elas podem ser objeto de direitos de posse e de direitos subjetivos
reais. A coisa possui três características que lhe identificam: o caráter corpóreo, material; a
possibilidade de apropriação; a utilidade ou valor econômico.
O caráter corpóreo da coisa refere-se a sua existência física, material. Como regra, o
Direito das Coisas aplica-se somente às coisas materiais. Contudo, havendo previsão expressa
em lei pode ser, também, aplicado aos bens incorpóreos ou direitos, como nos casos dos
23
PENTEADO, Luciano de Camargo. Direito das Coisas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. E-
book. Disponível em: https://proview.thomsonreuters.com. Acesso em 02 out. 2020.
24
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 1.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
25
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: parte geral.
18. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 329-330.
26
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 1.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
157
direitos autorais (propriedade intelectual), em que é admitido falar em propriedade sobre bens
intelectuais (obra artística, literária, científica, programa de computador, etc).
Diante das inovações impostas ao Código Civil pela lei da liberdade econômica, Tartuce 27
apresenta a seguinte crítica:
As coisas podem ser apropriadas pela pessoa, ou seja, podem tomar posse da coisa,
tornar a coisa como sua, adquirir a propriedade. Ademais, possuem utilidade ou valor
econômico, ou seja, a coisa é capaz de satisfazer as necessidades.
27
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 1.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
28
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 5.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
158
Importante observar que o Direito Civil estuda os direitos patrimoniais e os não
patrimoniais (direitos de personalidade, por exemplo). Os direitos patrimoniais se dividem em
direitos pessoais e direitos reais.
Os direitos patrimoniais pessoais são previstos pelo direito de obrigações, pelo direito
dos contratos, pelo direito empresarial. Já os direitos pessoais patrimoniais são disciplinados
pelo direito de família e sucessório. Nestas relações o sujeito ativo pode exigir apenas do sujeito
passivo a prestação sobre a qual estão vinculados. Ex.: no contrato de locação, o proprietário do
imóvel pode exigir do locatário o pagamento do aluguel, assim como o locatário pode exigir do
locador o respeito aos direitos originários do contrato de locação. Os efeitos são, portanto, inter
partes. Neste caso, havendo inadimplemento do negócio (da locação, por exemplo), a
vinculação será da pessoa e não incidirá sobre a coisa.
Por sua vez, os direitos patrimoniais reais são disciplinados pelo Direito das Coisas e
refere-se as situações que podem incidir sobre um bem corpóreo determinado, sobre o qual o
titular poderá exercer seu direito, exigindo-o contra qualquer pessoa que se oponha. Neste caso,
partindo do mesmo exemplo do contrato de locação, o locatário pode exigir de qualquer pessoa
o respeito a posse direta que exerce sobre o imóvel locado, inclusive sobre o proprietário do
imóvel. Os direitos reais tem efeito, portanto, erga omnes. Neste caso, havendo o
inadimplemento do negócio (tomando-se como exemplo uma hipoteca, onde tem-se um bem
em garantia, caso o valor não seja pago, o bem ofertado em garantia, fica vinculado a esse
empréstimo.
Deve-se destacar que ambas as teorias possuem doutrinadores de renome a elas filiados e
esta diferenciação é mais no âmbito conceitual do que, propriamente, prático.
29
MELO, Marco Aurélio Bezerra de. Direito Civil: coisas. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 4. E-
book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530986216/cfi/6/20!/4/34/2/2@0:0. Acesso em 16
out. 2020.
30
MELO, Marco Aurélio Bezerra de. Direito Civil: coisas. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 5. E-
book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530986216/cfi/6/20!/4/34/2/2@0:0. Acesso em 16
out. 2020.
31
Art. 1.225. São direitos reais:
I - a propriedade;
II - a superfície;
III - as servidões;
IV - o usufruto;
V - o uso;
VI - a habitação;
VII - o direito do promitente comprador do imóvel;
VIII - o penhor;
IX - a hipoteca;
X - a anticrese.
XI - a concessão de uso especial para fins de moradia;
XII - a concessão de direito real de uso; e
XIII - a laje.
32
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO.
MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA (TIME-SHARING). NATUREZA JURÍDICA DE DIREITO
REAL. UNIDADES FIXAS DE TEMPO. USO EXCLUSIVO E PERPÉTUO DURANTE CERTO PERÍODO
ANUAL. PARTE IDEAL DO MULTIPROPRIETÁRIO. PENHORA. INSUBSISTÊNCIA. RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. O sistema time-sharing ou multipropriedade
imobiliária, conforme ensina Gustavo Tepedino, é uma espécie de condomínio relativo a
locais de lazer no qual se divide o aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé,
apartamento) entre os cotitulares em unidades fixas de tempo, assegurando-se a cada
160
e) Perpetuidade: os direitos reais permanecem enquanto existir o objeto, ou seja, sua
existência não se extingue pelo não uso.
f) Preferência: o titular de um direito real tem direito de preferência. Ex.: no recebimento
de créditos, aquele que tiver um direito real de garantia, como a hipoteca, por
exemplo, tem preferência sobre os credores quirografários, “porque nos direitos reais
de garantia o bem dado em garantia fica afetado ao cumprimento da obrigação”33.
g) Possibilidade de abandono: é possível a renúncia a direitos reais.
h) Incorporação da coisa pela posse: pelo exercício do domínio fático da coisa por certo
tempo.
i) Aquisição via usucapião: em razão do exercício da posse, o direito real pode ser
adquirido via usucapião (bens imóveis, móveis ou servidões).
A posse é, pois, o domínio físico que alguém tem sobre a coisa, que vem a ser protegido
pelo Direito, sendo, portanto, concedido efeitos jurídicos a este domínio. Segundo Loureiro35,
posse “é o exercício, em nome próprio, das prerrogativas inerentes a um direito real”, “é o
exercício de fato de um dos poderes inerentes à propriedade”. Assim, é domínio físico/fático
sobre a coisa, mas também direito, pois assim a lei reconhece.
34
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 32.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
35
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 761.
162
3. Posse x detenção
Necessário se faz, compreender o conceito de detenção, pois ele difere-se do conceito de
posse. Na posse, o sujeito que possui o domínio físico da coisa age como se dono fosse, pois
objetiva ter a coisa para si. Já na detenção, embora tenha o domínio físico da coisa, o sujeito
sabe que a coisa não é sua e pretende devolvê-la após o uso (objeto da locação, livro da
biblioteca, etc).
O art. 1.198, CC prevê que “considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de
dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens
ou instruções suas”. Assim o detentor tem a coisa em razão de uma situação de dependência
econômica ou de subordinação. Ex.: o capataz da fazenda tem a detenção do imóvel,
conservando a posse em nome do proprietário, em cumprimento de suas obrigações.
Tartuce36 ainda traz como exemplo de detenção, a situação de alguém que deixa seu carro
em um estacionamento. Nesta situação, a empresa, proprietária do estacionamento detém a
posse do veículo, em razão do contrato firmado entre o proprietário e o estacionamento
(mesmo que verbal). Já o manobrista (funcionário do estacionamento), este tem detenção do
veículo, pois exerce a posse em nome do estacionamento.
O detentor exerce a posse em nome de outrem. A ele, em nome próprio, não é permitido
exercer as ações possessórias, mas ele pode exercer o direito de defesa da posse alheira, por
meio da autotutela37, nos termos do enunciado 493 das Jornadas de Direito Civil: “O detentor
(art. 1.198 do Código Civil) pode, no interesse do possuidor, exercer a autodefesa do bem sob seu
poder” (Enunciado n. 493).
Mas é possível transformar a detenção em posse, desde que rompida a subordinação,
conforme entendimento do enunciado n. 301 das Jornadas de Direito Civil: “É possível a
conversão da detenção em posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício
em nome próprio dos atos possessórios”.
O STJ tem entendimento firmado de que a ocupação indevida de bem público também
se configura em detenção: “Súmula 619, STJ. A ocupação indevida de bem público configura
mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e
benfeitorias”.
O mesmo Tribunal decidiu que no caso de um proprietário que deixa seu veículo na
concessionária para a realização de reparos, que a concessionária é detentora do bem, não
36
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 40.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
37
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 37.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
163
detendo sua posse e, com isto, não podendo retê-lo em caso de falta de pagamento pelo
serviço prestado. O STJ entendeu que a concessionária tem a detenção do veículo, que “ficou
sob sua custódia por determinação e liberalidade da proprietária, em uma espécie de vínculo de
subordinação” (STJ, REsp 1.628.385/ES, 3.ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j.
22.08.2017, DJe 29.08.2017).
4. Posse – classificação
Estudar a classificação da posse é importante em razão dos efeitos desta posse, pois,
conforme for ela de boa ou má-fé, justa ou injusta, direta ou indireta, serão os efeitos advindos
daí.
A posse direta é aquela em que o sujeito tem o controle material, físico e imediato do
bem. Ex.: o locatário, no contrato de locação, exerce a posse direta do imóvel, com autorização
do locador.
A posse indireta é aquela exercida através de outra pessoa. Trata-se de uma concessão,
geralmente por parte do proprietário, para que terceiro exerça a posse direta. Ex.: o locador, no
contrato de locação, exerce a posse indireta do imóvel, e o locatário, a posse direta.
Essas duas posses são coexistentes, ou seja, uma não anula a outra (art. 1.197, CC) e ambas
podem ser tuteladas. Ex.: possuidor indireto (locador) pode utilizar-se dos interditos proibitórios
para defesa de seu direito contra terceiros, mas não pode exercer contra o possuidor direto
(locatário), pois este último exerce a posse em razão de um contrato (uma relação pessoal)38. Ex.:
o possuidor direto (locatário) pode exercer sua posse contra terceiros e, também, contra o
possuidor indireto, mesmo que este seja proprietário do imóvel.
4.2. Composse – art. 1.199, CC
Art. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada
uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os
dos outros compossuidores.
38
No caso de inadimplemento dos valores de aluguel, por exemplo, a ação cabível não é
reintegração de posse, mas sim, ação de despejo por falta de pagamento. Lembre-se que a
posse direta é oriunda de um contrato de locação.
164
A composse ocorre quando existir uma posse comum sobre uma coisa, isto é, quando
duas ou mais pessoas possuírem o domínio fático da coisa. Neste caso, há um condomínio de
posse e este pode ser derivado da herança ou de ato inter vivos (contrato).
Cada compossuidor pode usar a coisa e exercer direitos possessórios contra terceiros, mas
não pode impedir que os demais compossuidores também a utilizem. Assim, tem-se como
exemplo a situação dos herdeiros, que, pela transmissão da herança (princípio da saisine)
recebem os bens que compõe o acervo hereditário como um todo unitário e indivisível (art.
1.791, CC). Os herdeiros são compossuidores dos bens da herança. Podem usá-los durante o
período da indivisão (do óbito até a efetivação a partilha), mas não podem impedir que os
outros herdeiros também os usem.
O STJ decidiu em 2010 que os herdeiros podem manejar as possessórias, uns contra os
outros, sempre que houver turbação ou esbulho da posse de um dos herdeiros por parte dos
outros.
Princípio saisine. Reintegração. Composse. Cinge-se a questão em
saber se o compossuidor que recebe a posse em razão do
princípio saisine tem direito à proteção possessória contra outro
compossuidor. Inicialmente, esclareceu o Min. Relator que, entre os
modos de aquisição de posse, encontra-se o ex lege, visto que, não
obstante a caracterização da posse como poder fático sobre a coisa, o
ordenamento jurídico reconhece, também, a obtenção desse direito pela
ocorrência de fato jurídico – a morte do autor da herança –, em virtude do
princípio da saisine, que confere a transmissão da posse, ainda que
indireta, aos herdeiros independentemente de qualquer outra
circunstância. Desse modo, pelo mencionado princípio, verifica-se a
transmissão da posse (seja ela direta ou indireta) aos autores e aos réus
da demanda, caracterizando, assim, a titularidade do direito possessório
a ambas as partes. No caso, há composse do bem em litígio, motivo
pelo qual a posse de qualquer um deles pode ser defendida todas as
vezes em que for molestada por estranhos à relação possessória ou,
ainda, contra ataques advindos de outros compossuidores. In casu, a
posse transmitida é a civil (art. 1.572 do CC/1916), e não a posse natural (art.
485 do CC/1916). Existindo composse sobre o bem litigioso em razão
do droit de saisine é direito do compossuidor esbulhado o manejo de
ação de reintegração de posse, uma vez que a proteção à posse
molestada não exige o efetivo exercício do poder fático – requisito
exigido pelo tribunal de origem. O exercício fático da posse não encontra
amparo no ordenamento jurídico, pois é indubitável que o herdeiro tem
165
posse (mesmo que indireta) dos bens da herança, independentemente
da prática de qualquer outro ato, visto que a transmissão da posse dá-
se ope legis, motivo pelo qual lhe assiste o direito à proteção possessória
contra eventuais atos de turbação ou esbulho. Isso posto, a Turma deu
provimento ao recurso para julgar procedente a ação de
reintegração de posse, a fim de restituir aos autores da ação a
composse da área recebida por herança. Precedente citado: REsp
136.922-TO, DJ 16.03.1998” (STJ, REsp 537.363/RS, Rel. Min. Vasco Della
Giustina (Desembargador convocado do TJRS), j. 20.04.2010).
A composse pode ser pro diviso ou pro indiviso. Quando os compossuidores possuírem
apenas uma fração ideal da posse, esta composse será pro indiviso, como no caso dos herdeiros
sobre os bens da herança, onde todos os herdeiros são detentores da posse sobre uma fração
ideal da coisa. No caso em que os compossuidores sabem, no plano fático, a parte da coisa
sobre a qual exercem a posse, está-se diante da composse pro diviso, como no caso de dois
sujeitos que exercem a posse sobre um terreno grande, um deles, na parte da frente e, o outro,
na parte dos fundos, havendo uma cerca que divide o terreno ao meio. Neste caso, embora
ambos exerçam a posse sobre o terreno, cada um está sobre uma porção real do imóvel.
A posse justa, conforme a redação do art. 1200, CC é aquela que não for violenta,
clandestina ou precária, ou seja, ela não ofende a previsão legal, tendo sido adquirida de forma
legítima e merecendo proteção legal. Trata-se de uma posse limpa.
A posse injusta, é aquela obtida de forma violenta, clandestina ou precária, de forma que
sua aquisição tenha sido ilícita, ou seja, viciada por ter sido adquirida por violação da lei. Assim, a
posse violenta é a retirada da coisa do antigo possuidor contra a sua vontade, “obtida por meio
de esbulho, for força física ou violência moral” 39. A posse precária é aquela adquirida a partir do
abuso de confiança ou do abuso de direito, que resulta da “retenção indevida da coisa que deve
ser devolvida ao seu possuidor indireto”40. Por fim, a posse clandestina é aquela obtida de
forma oculta, às escondidas (não pública).
39
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 45.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
40
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 771.
166
Os vícios (posse injusta) estão ligados ao momento de sua aquisição, de forma que até
podem deixar de existir.
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância
assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou
clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.
Contudo, há entendimento que, mesmo nestes casos, a posse não deixa de ser injusta,
pois sua origem derivou de uma forma contrária a lei.
A posse de boa-fé é aquela na qual o possuidor acredita ser proprietário da coisa, por
ignorar existência de vício que impeça a aquisição da mesma. A boa-fé é do possuidor que, no
momento da aquisição da coisa não sabia que estava lesando o direito de alguém, ou seja, o
possuidor não tinha ideia de que existisse algum obstáculo que impedisse que ele viesse a
adquirir a propriedade da coisa.
A doutrina afirma que a boa-fé implica um “desconhecimento não culposo”, isto é, se o
indivíduo, na aquisição, recebeu a posse por um justo título, sem saber da existência de um
defeito que impedisse a aquisição da propriedade. Neste aspecto, Tartuce41 afirma que:
[...] o possuidor de boa-fé é aquele que ignora os vícios que inquinam sua
posse. Esses vícios podem ser os da violência, os da clandestinidade ou os
da precariedade, mas não necessariamente, ou seja, os vícios estão
presentes, mas são por ele desconhecidos. Daí, sua ausência de
consciência significar boa-fé subjetiva.
Assim, a existência de um justo título, pela redação do art. 1.201, parágrafo único, presume
a boa-fé (um contrato de promessa de compra e venda, uma cessão de direitos possessórios,
etc.). O enunciado 312 das Jornadas de Direito Civil traduz esta situação: “Pode ser considerado
41
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 53.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
167
justo título para a posse de boa-fé o ato jurídico capaz de transmitir a posse ad usucapionem,
observado o disposto no art. 113 do Código Civil”. Ainda, o enunciado 313 das Jornadas de Direito
Civil traz a previsão do instrumento de cessão de direitos como sendo justo título, embora não
exista a necessidade de estar a transmissão materializada por instrumento:
Considera-se justo título, para a presunção relativa da boa-fé do
possuidor, o justo motivo que lhe autoriza a aquisição derivada da posse,
esteja ou não materializado em instrumento público ou particular.
Compreensão na perspectiva da função social da posse.
Contudo, se ele não observou os deveres de cuidado que uma pessoa normal deveria ter,
se ele foi negligente quanto a aquisição da coisa, equipara-se a posse de má-fé. De má-fé é,
também, a posse em que o indivíduo sabia que sua conduta, ao adquirir a coisa, violava direito
de outrem, pois ele tinha consciência de sua conduta.
A posse de boa-fé pode transformar-se em posse de má-fé a partir do momento em que o
possuidor toma ciência do vício ou que possui a coisa indevidamente.
Art. 1.202. A posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o
momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não
ignora que possui indevidamente.
168
ato, torna este como um ato-fato jurídico (não há uma vontade juridicamente relevante para a
existência do ato).
A posse nova é aquela que conta com menos de ano e dia, ou seja, é a posse de até um
ano.
A posse velha é que possui, pelo menos, um ano e um dia.
169
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
170
02. Posse: aquisição, efeitos, ações possessórias, perda da posse
171
Significa dizer, então, que se a aquisição da posse se deu de forma viciada, os vícios
também são transmitidos ao atual possuidor, mesmo que ele esteja de boa-fé. Donizetti e
Quintella42 apresentam o seguinte exemplo:
Silvio, que havia furtado a coisa, vende-a a Helena. A posse de Silvio era
injusta (clandestina) e, por mais que Helena se torne possuidora de boa-
fé, por desconhecer o defeito da posse que lhe foi transmitida, terá posse
injusta.
Assim, salvo prova em contrário, a posse mantém o mesmo caráter com o qual foi
adquirida (art. 1.203, CC).
a. Apossamento
A aquisição originária ocorre pelo apossamento ou ocupação, quando o sujeito assume o
controle, o domínio fático da coisa.
Ex.: alguém que encontra um celular no lixo. Trata-se de um apossamento, pois o sujeito
adquire a posse daquela coisa de forma originária.
O apossamento também pode ocorrer pelo esbulho, quando alguém toma para si a coisa,
apoderando-se dela e retirando do domínio fático de outrem.
b. Tradição
A aquisição derivada ocorre pela tradição, ou seja, quando o antigo possuidor transmite
ao atual possuidor o domínio fático da coisa. A tradição independe de existência de documento
escrito transferindo a coisa, bastando a conduta de entregar (antigo possuidor) e receber (atual
possuidor) a coisa.
A tradição pode ser real – quando há a efetiva entrega da coisa pelo antigo possuidor –,
simbólica – quando a transmissão não é da coisa em si, mas de algo que represente a coisa
(chaves de um imóvel, por exemplo) – ou ficta – é a que ocorre por presunção, pela transmissão
de um documento, sem que exista qualquer contato com a coisa (inquilino que adquire, por
compra e venda, a propriedade do imóvel em que reside).
c. Constituto possessório
Trata-se de uma forma de aquisição derivada, pelo modo simbólico, pois a coisa não é
entregue de forma física, apenas simbólica, mas a posse é transmitida. Ocorre o constituto
possessório quando houver uma cláusula de convenção, pela qual o cedente, ainda que
transmita a coisa, permanece na posse dela, como possuidor, em nome do adquirente.
42DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2017, p.
696.
172
Ex.: o proprietário de um apartamento vende o imóvel, mas segue alugando o mesmo do
novo proprietário.
A posse pode ser adquirida: pela própria pessoa e, neste caso, ocorrer diretamente ou por
seu representante; ou por terceiro, sem mandato de representação, dependendo, neste último
caso, de ratificação do ato por parte da pessoa em nome de quem se adquire.
A partir daí, verifica-se que o representante legal ou convencional da parte não é
possuidor da coisa, mas mero detentor (art. 1.198, CC).
Uma vez que tenha ocorrido a morte, abre-se a sucessão e a herança é transmitida aos
herdeiros como um todo unitário e indivisível (princípio da saisine). Assim, na sucessão, quando
se está diante de uma sucessão a título universal, existe uma continuidade na posse, por parte
dos sucessores com relação ao falecido43. A posse é a mesma, transmitindo-se com todos os
vícios ou qualidades, ou seja, não se trata de nova posse, mas a mesma exercida pelo
antecessor.
Já na aquisição a título singular, o novo possuidor pode escolher entre continuar o
tempo da posse do antecessor ou iniciar nova posse. Ex.: aquele que adquire um imóvel por
compra e venda pode optar por somar sua posse à posse do antecessor/vendedor ou, então,
zerar a contagem e iniciar novo prazo de posse. De toda forma, a transmissão da posse ocorre
com as mesmas características anteriores.
43
Aqui vale observar que, tanto na sucessão legítima, quanto na sucessão testamentária
(mesmo no caso do legado que é sucessão a título singular), o sucessor continua a posse do
falecido.
173
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância
assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou
clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.
Os atos de permissão ou tolerância não induzem posse. Este é o caso do detentor, que
conserva a posse em nome do dono (art. 1.198, CC).
De igual forma, os atos clandestinos ou violentos não autorizam a aquisição da posse.
Significa que nos casos de conflitos de terra, por exemplo, em que haja a tomada violenta da
posse da área, estes não poderão adquirir a posse, em razão da violência do ato. Contudo,
depois que cessar a violência ou a clandestinidade poderão eles adquirir a posse.
Assim, a proteção liminar nas ações possessórias, havendo violência e clandestinidade, só
ocorre quando estas datarem de menos de ano e dia, nos termos do art. 558, CPC/2015.
2. Efeitos da posse
O Código Civil estabelece, dos arts. 1.210 ao 1.222 os efeitos da posse. Tais efeitos podem ser
de ordem material ou processual.
Os efeitos materiais dizem respeito a percepção dos frutos e suas consequências, ao
direito a indenização e retenção das benfeitorias, as responsabilidades e ao direito de usucapião.
Já os efeitos processuais dizem respeito a possibilidade de utilização dos interditos
possessórios, as ações possessórias e a legítima defesa da posse e do desforço imediato.
174
desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às
despesas da produção e custeio.
O possuidor de boa-fé tem direito aos frutos percebidos (colhidos). Já os frutos pendentes
(ainda não colhidos) devem ser restituídos, assim como aqueles que tenham sido colhidos por
antecipação. Já o possuidor de má-fé deve devolver todos os frutos colhidos ou pendentes, bem
como aqueles que deixou de colher por culpa sua (art. 1.216, CC), devendo, neste último caso, ser
responsabilizado no caso de perecimento do frutos não colhidos por sua culpa (reparação de
danos – responsabilidade civil). Mas tem direito, o possuidor de má-fé a ser indenizado pelas
despesas de produção e custeio.
Os frutos naturais são aqueles provenientes da coisa principal (frutas, por exemplo). Estes,
tão logo sejam separados da coisa principal consideram-se colhidos.
Os frutos industriais são aqueles que derivam de uma atividade humana (tudo o que
venha a ser produzido em uma fábrica, por exemplo). Estes, assim, como os naturais, logo após
separados consideram-se colhidos.
Os frutos civis derivam de uma relação jurídica ou econômica (rendimentos de aplicações
financeiras, aluguel de imóveis, por exemplo). Estes são percebidos na data prevista para
vencimento do aluguel ou do “aniversário” da aplicação financeira.
44
São necessárias as benfeitorias realizadas para evitar um estrago iminente ou deterioração
da coisa principal (reparos realizados na viga; troca do telhado). São úteis aquelas realizadas
com o objetivo de facilitar a utilização da coisa (abertura de uma nova entrada para servir de
garagem para a casa). São voluptuárias aquelas feitas para o mero prazer, sem aumento da
utilidade da coisa (decoração do jardim). Art. 96, CC.
175
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as
benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela
importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
Art. 1.221. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao
ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem.
Art. 1.222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao
possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu
custo; ao possuidor de boa-fé indenizará pelo valor atual.
176
Ex.: João se apossa do cavalo de Pedro. Neste caso, se o cavalo morrer na posse de João
por ter ingerido veneno, ele deverá indenizar a Pedro. Contudo, se a morte do animal ocorrer
por uma doença cardíaca grave, ou seja, mesmo que estivesse na posse de Pedro ele morreria,
não terá João o dever de indenizar. CUIDADO, pois, neste caso, depende de PROVA!
d. Usucapião
O principal efeito da posse é o direito de usucapião, ou seja, o exercício de posse de uma
coisa por certo tempo gera a chamada prescrição aquisitiva, que dá direito ao titular a pleitear a
propriedade da coisa através da pretensão de usucapião.
e. Proteção possessória
Dentro dos efeitos da posse encontra-se a possibilidade que o possuidor tem de se utilizar
das ações possessórias (ou interditos possessórios) para proteção e defesa de sua posse.
Importante observar que as ações possessórias tanto podem ser exercidas pelo proprietário
detentor da posse, como também por aquele que, embora não tenha a propriedade, se
encontra na posse da coisa.
Quanto a proteção possessória, o CC prevê os seguintes dispositivos:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se
tiver justo receio de ser molestado.
§ 1 o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se
por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de
desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou
restituição da posse.
§ 2 o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de
propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.
Art. 1.211. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á
provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a
obteve de alguma das outras por modo vicioso.
Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de
indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo
que o era.
Art. 1.213. O disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões
não aparentes, salvo quando os respectivos títulos provierem do
possuidor do prédio serviente, ou daqueles de quem este o houve.
177
De se observar, contudo, que, em se tratando de ações, a parte de procedimento está
tratada no CPC (art. 554 e seguintes).
Assim, conforme a situação, é permitido ao possuidor defender sua posse, derivando daí
os nomes defesa em sentido estrito (evitar o incômodo da posse – turbação) e desforço
imediato (para recuperar a posse – esbulho). Assim, nascem as três principais ações
possessórias:
Estas diferenciações são fundamentais para fins de exame da OAB, mas, processualmente
falando, existe o princípio da fungibilidade e da instrumentalidade das formas, ou seja, mesmo
que se ingresse com uma ação de manutenção e a ação adequada seja a de reintegração, será
processada (art. 554, CPC).
Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não
obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal
correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados.
§ 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande
número de pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que
forem encontrados no local e a citação por edital dos demais,
determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver
pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria
Pública.
§ 2º Para fim da citação pessoal prevista no § 1º, o oficial de justiça
procurará os ocupantes no local por uma vez, citando-se por edital os
que não forem encontrados.
§ 3º O juiz deverá determinar que se dê ampla publicidade da existência
da ação prevista no § 1º e dos respectivos prazos processuais, podendo,
45
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 72.
E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
178
para tanto, valer-se de anúncios em jornal ou rádio locais, da publicação
de cartazes na região do conflito e de outros meios.
Havendo várias pessoas no polo passivo das possessórias, será procedida citação pessoal
dos ocupantes encontrados no local e por edital dos demais. Haverá intimação do Ministério
Público e, caso envolva pessoas em situação de hipossuficiência econômica (como nos casos de
invasões de terras). Nestes casos, ainda, o juiz determinará a publicidade da existência da ação e
dos prazos processuais através de jornais, rádios, publicação em meio digital (no site do
Tribunal, por exemplo).
Importante, ainda, considerar que as ações possessórias adotarão o procedimento
especial, previsto no art. 554 e seguintes do CPC sempre que se tratar de ação de força nova (art.
558, CPC). Considera-se de força nova as possessórias ingressadas dentro do prazo de ano e dia
(lembre-se da diferença entre posse nova e posse velha), cabendo medida liminar. Se a posse for
de mais de ano e dia, considera-se a possessória de força velha e, neste caso, não cabe a
respectiva liminar e deve-se utilizar o procedimento comum. Merece, ainda, destaque, a
previsão do art. 565, CPC, que permite a concessão de medida liminar, nas ações possessórias
coletivas, desde que realizada previamente uma audiência de conciliação.
Nas ações possessórias que tramitem pelo procedimento especial (de força nova), é
admitido cumulação de pedidos (art. 555, CPC) e, ainda, que seja imposta medida para evitar
nova turbação ou esbulho ou cumprir a tutela provisória ou final (podendo ser requerida multa,
portanto):
Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:
I - condenação em perdas e danos;
II - indenização dos frutos.
Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida
necessária e adequada para:
I - evitar nova turbação ou esbulho;
II - cumprir-se a tutela provisória ou final.
46
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
80. E-book. Disponível em:
179
Esse pedido contraposto pode ser de proibição, de manutenção ou
mesmo de reintegração da posse em seu favor. Portanto, está
totalmente dispensada a necessidade de uma reconvenção para a
aplicação das medidas previstas no art. 555 do Estatuto Processual em
vigor, entendimento que sempre prevaleceu quanto ao art. 922 do
CPC/1973.
Nas ações possessórias não se permite propor ação de reconhecimento de domínio, salvo
contra terceira pessoa (art. 557, CPC). Se o réu provar a falta de idoneidade financeira do autor
para eventual sucumbência ou responsabilidade pelos danos, nos casos de manutenção ou
reintegração de posse, o juiz lhe concederá prazo de 5 dias para prestar caução, sob pena de
depósito da coisa litigiosa, ressalvada a impossibilidade da parte hipossuficiente (art. 559, CPC).
Ainda, importante é a possibilidade prevista no art. 1.210, § 1º, CC, que permite a legítima
defesa da posse e o desforço imediato, como formas de autotutela ou autodefesa. Quando
houver ameaça ou turbação viável a legítima defesa da posse. Havendo esbulho, cabe o
desforço imediato. Para que esses institutos possam ser utilizados, deve-se ter uma defesa
imediata, que o possuidor, ao agir, deve fazer dentro do limite do indispensável para
retomar/recuperar sua posse, evitando-se qualquer tipo de abuso. São considerados como
parâmetro o fim social e econômico, a boa fé objetiva e os bons costumes.
Contudo, sendo o caso de judicializar a demanda que discute a posse, o CPC, além das
disposições gerais quanto as ações possessórias, ainda apresenta disposições específicas para
cada as ações de manutenção e reintegração de posse e interdito proibitório.
3. Ações possessórias
Além das três típicas ações possessórias: manutenção e reintegração de posse e interdito
proibitório, existem outras formas de proteção da posse, o que será discutido neste item.
a. Reintegração de posse
A ação de reintegração de posse tem lugar quando a posse de alguém for esbulhada, ou
seja, quando de forma violenta, precária ou clandestina alguém retira a posse de outrem.
Os arts. 560 a 566, CPC fundamentam a ação de manutenção e reintegração de posse
para as ações de posse nova, ou seja, com menos de ano e dia. As ações de posse velha, com
mais de ano e dia, devem ser propostas pelo procedimento comum.
Segundo o art. 561, CPC o autor, na inicial, deve provar sua posse, o esbulho ou turbação
praticados, bem como a data em que ocorreu e a perda ou continuação da posse, embora
b. Manutenção de posse
A ação de manutenção de posse tem lugar quando a posse de alguém for turbada, ou
seja, quando há um incômodo da posse. Significa que o possuidor segue exercendo a posse,
mas alguém está lhe importunando, incomodando no exercício desta posse.
Em termos de procedimento, devem ser analisados, tanto os arts. 560 a 566, CPC, os quais
fundamentam tanto a ação de manutenção, quanto a de reintegração de posse, para as ações
de posse nova (neste sentido, observar o que foi descrito no item relativo a reintegração de
posse). Além destas disposições específicas, devem ser observadas as disposições gerais sobre
as ações possessórias, previstas nos arts. 554 a 559, CPC.
c. Interdito proibitório
O interdito proibitório visa impedir a turbação ou o esbulho da posse. Utilizada quando
houver uma ameaça a posse, tendo como pedido principal uma abstenção (não atentar contra
a posse), ou seja, uma obrigação de não fazer, sob pena de incidência de multa (art. 567, CPC).
181
Trata-se de ação possessória que adota o procedimento comum e, portanto, eventual
liminar deve observar os requisitos de concessão de tutela de urgência.
f. Embargos de terceiro
Os embargos de terceiro podem ser utilizados para a defesa da posse ou da propriedade
naquelas situações de turbação ou esbulho ocorridos via judicial (arresto, sequestro, penhora,
etc) e manejados por aqueles que não sejam parte no processo. Esta ação é de procedimento
especial dos arts. 674 a 681, CPC (neste aspecto, sugere-se a análise específica deste
procedimento especial).
h. Ação publiciana
A ação publiciana também é uma ação petitória, que se fundamenta no domínio.
Também segue procedimento comum do CPC.
4. Perda da posse
A perda da posse ocorre quando alguém deixa de agir como se dono/proprietário fosse.
Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do
possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196.
Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o
esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou,
tentando recuperá-la, é violentamente repelido.
A perda pode ocorrer de várias formas, mas quatro delas são as principais: derrelicção, ou
abandono voluntário da coisa; tradição, que é quando há a transmissão voluntária da posse a
terceiro; esbulho, que é quando a posse é tomada/subtraída do seu possuidor, contra sua
vontade; destruição da coisa, ou seja, quando a coisa deixa de existir.
182
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
183
03. Direitos reais. Propriedade: disposições gerais, descoberta, formas de aquisição da
propriedade imóvel
I – DIREITOS REAIS
Loureiro47 conceitua os direitos reais como sendo aquele que “refere-se habitualmente
sobre um bem corpóreo determinado, em face do qual o titular exerce diretamente seu direito”.
O Código Civil estabelece, nos arts. 1.225 a 1.227 as disposições sobre os direitos reais.
47
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 792.
184
pela tradição (art. 1.226) e os direitos reais sobre bens imóveis através do registro do título
aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis (art. 1.227).
II – PROPRIEDADE
1. Propriedade – conceito
O direito de propriedade é um direito real que determina que uma coisa fica submetida a
vontade de uma pessoa, limitada pela lei e pela função social ou cláusulas derivadas da vontade
impostas sobre a coisa. Seu conceito está mais direcionado aos atributos do direito de
propriedade do que, propriamente, a uma definição. Este direito consiste em poder usar, gozar
e dispor do bem, podendo, também, reaver contra aquele que injustamente detenha ou
possua. Apenas para ilustrar, dos vários conceitos apresentados pela doutrina, Tartuce48
entende que a propriedade é
o direito que alguém possui em relação a um bem determinado. Trata-
se de um direito fundamental, protegido no art. 5.º, inc. XXII, da
Constituição Federal, mas que deve sempre atender a uma função
social, em prol de toda a coletividade. A propriedade é preenchida a
partir dos atributos que constam do Código Civil de 2002 (art. 1.228), sem
perder de vista outros direitos, sobretudo aqueles com substrato
constitucional.
Como visto o direito de propriedade é direito fundamental, inscrito no art. 5.º, XXII, da CF
que pode ser oponível contra todos os membros da sociedade (direito erga omnes). Deve
atender a uma função social, em benefício da coletividade. Por fim, seu conceito/definição está
diretamente ligado aos atributos ou faculdades relativas à propriedade: usar, gozar, dispor e
reaver (art. 1.228, CC), sendo, portanto, um direito exclusivo do titular e complexo.
48
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
133. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
185
Direito de disposição, ou seja, sendo o proprietário da coisa, poder transmiti-la a terceiro,
seja por ato entre vivos (compra e venda) ou causa mortis (testamento), seja de forma onerosa
(mediante pagamento) ou gratuita (negócio benéfico, sem pagamento).
Direito de reinvindicação, ou seja, possibilidade de, através de ação petitória, com
fundamento na propriedade, reivindicar a coisa de quem a detenha injustamente. A ação
reivindicatória é a ação petitória mais comum, tratando-se de ação real fundada no domínio.
Tartuce49 afirma que pode-se “afirmar que proteção da propriedade é obtida por meio dessa
demanda, aquela em que se discute a propriedade visando à retomada da coisa, quando
terceira pessoa, de forma injustificada, a tenha, dizendo-se dono”. Existe discussão acerca do
prazo prescricional da ação reivindicatória. Pela previsão do CC o prazo seria o do art. 205, CC, ou
seja, 10 anos a contar da violação do direito de propriedade. O STJ, contudo, tem entendido ser
imprescritível tal ação, tendo em vista seu caráter declaratório. Neste sentido, Tartuce50 afirma:
Na realidade, deve-se entender que a ação reivindicatória não é sujeita à
prescrição ou à decadência, embora se trate de ação real, porque o
domínio é perpétuo e somente se extingue nos casos previstos em lei e
que serão estudados oportunamente. O efeito da ação reivindicatória é
de fazer com que o possuidor ou detentor restitua o bem com todos os
seus acessórios. Porém, se no caso concreto for impossível essa
devolução, como nos casos de perecimento da coisa, o proprietário terá o
direito de receber o valor da coisa se o possuidor estiver de má-fé, sem
prejuízo de eventuais perdas e danos.
A ação reivindicatória é, pois, uma ação real, que visa a restituição da coisa, provando-se
que o proprietário tinha a posse e injustamente a perdeu. Esta ação segue o procedimento
comum.
Estes quatro atributos da propriedade: Gozar, Reivindicar, Usar e Dispor, são resumidos na
expressão GRUD. Se uma pessoa tiver todos estes atributos terá a propriedade plena. Contudo,
faltando algum deles ou, caso esses atributos sejam divididos entre duas ou mais pessoas,
haverá a propriedade restrita.
49
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
135. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
50
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
136. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
186
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa,
e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a
possua ou detenha.
§ 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as
suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados,
de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e
artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
§ 2 o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer
comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar
outrem.
§ 3 o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de
desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social,
bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.
§ 4 o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel
reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé,
por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela
houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços
considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.
§ 5 o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização
devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o
registro do imóvel em nome dos possuidores.
Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo
correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não
podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por
terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse
legítimo em impedi-las.
Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais
recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos
arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.
Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os
recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que
não submetidos a transformação industrial, obedecido o disposto em lei
especial.
Art. 1.231. A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em
contrário.
187
Art. 1.232. Os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando
separados, ao seu proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial,
couberem a outrem.
Assim, ao mesmo tempo em que uma fazenda de 1000 hectares pode se prestar para o
cultivo de lavouras de soja, consorciada com a criação de gado, estando, com isto, cumprindo
com sua função social; uma mesma fazenda de 1000 hectares pode encontrar-se abandonada,
com sua casa em ruínas e tomada pelo mato, de forma a não cumprir com sua função social.
Em termos do § 2.º, poderia ser usado como exemplo a demolição de um casarão histórico
devidamente tombado. Este ato traz prejuízos a sociedade. Tartuce52 ainda apresenta um
exemplo, tratando do § 2.º, onde um proprietário de apartamento faz festas em seu imóvel
todas as noites, e o excesso de barulho prejudica aos vizinhos. Esta situação envolve uma
responsabilidade civil objetiva.
O § 3.º do art. 1.228, CC trata das sanções pela inobservância da função social da
propriedade, através da desapropriação da coisa por necessidade ou utilidade pública ou
interesse social e da requisição no caso de perigo. A própria CF prevê no art. 5.º, XXV, a
possibilidade da desapropriação e da requisição de bens particulares.
51
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas,
2017, p. 725.
52
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
153. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
188
Os §§ 4.º e 5.º do art. 1.228, CC tratam da chamada desapropriação privada por posse
trabalho, que, na realidade é a possibilidade de desapropriação de imóvel, quando se
configurar em área extensa que esteja sendo ocupada por um considerado número de pessoas,
que exerçam posse ininterrupta e de boa-fé por mais de 5 anos, tendo nela realizado obras e
serviços de interesse social e econômico relevante. Em situações como esta será o imóvel
desapropriado, fixada indenização justa, a ser paga ao proprietário pelos possuidores, que só
adquirem a propriedade com o pagamento e o registro da sentença no Cartório de Registro de
Imóveis (ver julgamento do STJ no caso conhecido como Favela Pullman).
Importante mencionar alguns enunciados das Jornadas de Direito Civil sobre essa
temática.
Enunciado 82 - É constitucional a modalidade aquisitiva de propriedade
imóvel prevista nos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do novo Código Civil.
Enunciado 83 - Nas ações reivindicatórias propostas pelo Poder Público,
não são aplicáveis as disposições constantes dos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do
novo Código Civil.
Enunciado 84 - A defesa fundada no direito de aquisição com base no
interesse social (art. 1.228, §§ 4º e 5º, do novo Código Civil) deve ser
argüida pelos réus da ação reivindicatória, eles próprios responsáveis
pelo pagamento da indenização.
Enunciado 240 - A justa indenização a que alude o § 5º do art. 1.228 não
tem como critério valorativo, necessariamente, a avaliação técnica
lastreada no mercado imobiliário, sendo indevidos os juros
compensatórios.
Enunciado 241 - O registro da sentença em ação reivindicatória, que
opera a transferência da propriedade para o nome dos possuidores, com
fundamento no interesse social (art. 1.228, § 5º), é condicionada ao
pagamento da respectiva indenização, cujo prazo será fixado pelo juiz.
Enunciado 304 - São aplicáveis as disposições dos §§ 4º e 5º do art. 1.228
do Código Civil às ações reivindicatórias relativas a bens públicos
dominicais, mantido, parcialmente, o Enunciado 83 da I Jornada de
Direito Civil, no que concerne às demais classificações dos bens públicos.
Enunciado 305 - Tendo em vista as disposições dos §§ 3º e 4º do art. 1.228
do Código Civil, o Ministério Público tem o poder-dever de atuar nas
hipóteses de desapropriação, inclusive a indireta, que encerrem relevante
interesse público, determinado pela natureza dos bens jurídicos
envolvidos.
189
Enunciado 306 - A situação descrita no § 4º do art. 1.228 do Código Civil
enseja a improcedência do pedido reivindicatório.
Enunciado 307 - Na desapropriação judicial (art. 1.228, § 4º), poderá o juiz
determinar a intervenção dos órgãos públicos competentes para o
licenciamento ambiental e urbanístico.
Enunciado 308 - A justa indenização devida ao proprietário em caso de
desapropriação judicial (art. 1.228, § 5º) somente deverá ser suportada
pela Administração Pública no contexto das políticas públicas de reforma
urbana ou agrária, em se tratando de possuidores de baixa renda e desde
que tenha havido intervenção daquela nos termos da lei processual. Não
sendo os possuidores de baixa renda, aplica-se a orientação do
Enunciado 84 da I Jornada de Direito Civil.
Enunciado 309 - O conceito de posse de boa-fé de que trata o art. 1.201
do Código Civil não se aplica ao instituto previsto no § 4º do art. 1.228.
Enunciado 310 - Interpreta-se extensivamente a expressão "imóvel
reivindicado" (art. 1.228, § 4º), abrangendo pretensões tanto no juízo
petitório quanto no possessório.
Enunciado 496 - O conteúdo do art. 1.228, §§ 4º e 5º, pode ser objeto de
ação autônoma, não se restringindo à defesa em pretensões
reivindicatórias.
190
Propriedade plena – o proprietário da coisa reúne os atributos de usar, gozar, dispor e
reivindicar.
Propriedade restrita – o proprietário possui alguns atributos, mas, em razão da incidência
de algum ônus, como, por exemplo, a hipoteca, a servidão, o usufruto (direito real sobre coisa
alheia), não é plena sua propriedade ou, então, nos casos de ser resolúvel a propriedade, em
face de condição ou termo. Nestes dois casos (existência de ônus ou propriedade resolúvel), um
ou alguns atributos estão em mãos de terceiros (direito real sobre coisa alheia). Ex.: João é
proprietário do imóvel X. Paulo é usufrutuário do imóvel X.
A partir daí, pode-se dividir a propriedade em nua-propriedade e domínio útil. A nua-
propriedade pertence ao titular do domínio, ou seja, o proprietário, aquele que tem o bem
registrado em seu nome. Não possui os atributos do uso e fruição. Já o domínio útil refere-se
aos atributos de usar, gozar e dispor da coisa. Quando estes dois elementos estiverem sendo
titularizados pela mesma pessoa, haverá a propriedade plena.
6. Descoberta
Os arts. 1.233 a 1.237 do CC tratam da descoberta, que nada mais é do que o achado de
uma coisa alheia que esteja perdida.
Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao
dono ou legítimo possuidor.
Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo,
e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade competente.
191
Art. 1.234. Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo
antecedente, terá direito a uma recompensa não inferior a cinco por
cento do seu valor, e à indenização pelas despesas que houver feito com
a conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la.
Parágrafo único. Na determinação do montante da recompensa,
considerar-se-á o esforço desenvolvido pelo descobridor para encontrar o
dono, ou o legítimo possuidor, as possibilidades que teria este de
encontrar a coisa e a situação econômica de ambos.
Art. 1.235. O descobridor responde pelos prejuízos causados ao
proprietário ou possuidor legítimo, quando tiver procedido com dolo.
Art. 1.236. A autoridade competente dará conhecimento da descoberta
através da imprensa e outros meios de informação, somente expedindo
editais se o seu valor os comportar.
Art. 1.237. Decorridos sessenta dias da divulgação da notícia pela
imprensa, ou do edital, não se apresentando quem comprove a
propriedade sobre a coisa, será esta vendida em hasta pública e,
deduzidas do preço as despesas, mais a recompensa do descobridor,
pertencerá o remanescente ao Município em cuja circunscrição se
deparou o objeto perdido.
Parágrafo único. Sendo de diminuto valor, poderá o Município abandonar
a coisa em favor de quem a achou.
Assim, quem encontrar, deverá restituí-la ao dono e a não devolução constitui crime de
“apropriação de coisa achada”. Se não souber quem é o dono, deverá entregar à autoridade
competente, que deverá dar conhecimento da descoberta através da imprensa. Se passados 60
dias da publicação da notícia ou do edital não aparecer o proprietário, o bem deverá ser levado
a hasta pública, deduzidos o valor da recompensa e despesas do descobridor e o saldo
pertencerá ao Município onde a coisa foi descoberta. Deve ser observado que aquela máxima
de que “achado não é roubado” não é de todo verdade, pois o descobridor, aquele que encontra
a coisa perdida, não se torna proprietário da coisa, pois lembre-se que o direito de propriedade
não se extingue pelo não uso.
Contudo, o descobridor tem direito a receber uma recompensa que não pode ser inferior
a 5% o valor da coisa, além do reembolso das despesas para a conservação da coisa e localização
do proprietário. Caso não haja o pagamento, o proprietário pode abandonar a coisa e, neste
caso, o descobridor pode adquirir a propriedade pela ocupação.
192
O descobridor não tem responsabilidade quanto aos danos sofridos pela coisa, salvo se
proceder com dolo, ou seja, se intencionalmente causar dano, devendo, neste caso, indenizar o
proprietário.
53
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
190. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
193
ou incorporar, tendo em vista o princípio geral do direito que “o acessório
segue o principal”. Destarte, o dono do principal também será dono do
acessório54.
Formação de ilhas
Para fins do direito civil, as ilhas que se formarem em rios não navegáveis ou particulares,
pertencem ao domínio particular.
Art. 1.249. As ilhas que se formarem em correntes comuns ou particulares
pertencem aos proprietários ribeirinhos fronteiros, observadas as regras
seguintes:
I - as que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos
sobrevindos aos terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na
proporção de suas testadas, até a linha que dividir o álveo em duas partes
iguais;
II - as que se formarem entre a referida linha e uma das margens
consideram-se acréscimos aos terrenos ribeirinhos fronteiros desse
mesmo lado;
III - as que se formarem pelo desdobramento de um novo braço do rio
continuam a pertencer aos proprietários dos terrenos à custa dos quais
se constituíram.
54
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 817.
55
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 756.
56
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 758-759.
194
No caso do inciso II, as ilhas formadas do meio para uma margem, pertencerão aos
proprietários daquela margem, proporcionalmente a sua testada, conforme esboço abaixo:
Por fim, no caso do inciso III, as ilhas que se formarem em razão de um “novo braço do rio”
continuam a pertencer aos proprietários dos terrenos da margem em que se constituíram,
conforme representação:
195
Aluvião
Aluvião são acréscimos formados por depósitos e aterros naturais de forma quase
imperceptível.
Art. 1.250. Os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por
depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo
desvio das águas destas, pertencem aos donos dos terrenos marginais,
sem indenização.
Parágrafo único. O terreno aluvial, que se formar em frente de prédios de
proprietários diferentes, dividir-se-á entre eles, na proporção da testada
de cada um sobre a antiga margem.
Estes acréscimos formam-se em razão do desvio natural do leito de rios ou por depósito
de sedimentos e adere a propriedade do terreno em que houve o acréscimo, sem que haja o
dever de indenização por parte deste proprietário.
Avulsão
Ocorre avulsão quando há um deslocamento natural, mas brusco de terras de um terreno,
que acaba se unindo a outro. Para que ocorra avulsão o deslocamento deve se dar por FORÇA
NATURAL VIOLENTA, ou seja, sem culpa do proprietário do imóvel de onde se desloca a terra.
Art. 1.251. Quando, por força natural violenta, uma porção de terra se
destacar de um prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a
propriedade do acréscimo, se indenizar o dono do primeiro ou, sem
indenização, se, em um ano, ninguém houver reclamado.
196
Parágrafo único. Recusando-se ao pagamento de indenização, o dono do
prédio a que se juntou a porção de terra deverá aquiescer a que se
remova a parte acrescida.
Abandono do álveo
Álveo abandonado ocorre quando um curso d’água muda seu curso, de forma natural.
Assim, o curso anterior (álveo) acaba sendo abandonado.
Art. 1.252. O álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários
ribeirinhos das duas margens, sem que tenham indenização os donos
dos terrenos por onde as águas abrirem novo curso, entendendo-se que
os prédios marginais se estendem até o meio do álveo.
197
Plantações e construções
Como regra geral, a respeito das plantações e construções, que são bens móveis que
acedem ao imóvel por conduta humana, o art. 1.253, CC estabelece que elas se presumam feitas
pelo proprietário do terreno e a sua custa, salvo prova em contrário.
Art. 1.253. Toda construção ou plantação existente em um terreno
presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o
contrário.
Art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com
sementes, plantas ou materiais alheios, adquire a propriedade destes;
mas fica obrigado a pagar-lhes o valor, além de responder por perdas e
danos, se agiu de má-fé.
Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde,
em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se
procedeu de boa-fé, terá direito a indenização.
Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder
consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou
edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da
indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.
Art. 1.256. Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as
sementes, plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões.
Parágrafo único. Presume-se má-fé no proprietário, quando o trabalho
de construção, ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação
sua.
Art. 1.257. O disposto no artigo antecedente aplica-se ao caso de não
pertencerem as sementes, plantas ou materiais a quem de boa-fé os
empregou em solo alheio.
Parágrafo único. O proprietário das sementes, plantas ou materiais
poderá cobrar do proprietário do solo a indenização devida, quando não
puder havê-la do plantador ou construtor.
Art. 1.258. Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo
alheio em proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o
construtor de boa-fé a propriedade da parte do solo invadido, se o valor
da construção exceder o dessa parte, e responde por indenização que
represente, também, o valor da área perdida e a desvalorização da área
remanescente.
Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos neste
artigo, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que
198
invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da construção
exceder consideravelmente o dessa parte e não se puder demolir a
porção invasora sem grave prejuízo para a construção.
Art. 1.259. Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio
exceder a vigésima parte deste, adquire a propriedade da parte do solo
invadido, e responde por perdas e danos que abranjam o valor que a
invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da
desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a demolir
o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão
devidos em dobro.
Plantações e construções sempre acedem ao solo, ou seja, são bens acessórias, que não
vivem sem o principal. Desta forma, o art. 1.254, CC, estabelece que aquele que planta ou
constrói em terreno próprio, com materiais ou sementes alheias, tem o dever de indenizar o
dono pelo seu valor, sem prejuízo de eventuais perdas e danos, no caso de ter agido de má-fé.
O art. 1.255, CC determina que aquele que usar suas sementes e materiais na plantação ou
construção em terreno alheio, perde estes para o proprietário do solo, podendo receber
indenização pelo valor respectivo se tiver agido de boa-fé. Ademais, se a plantação ou a
construção exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que plantou ou construiu
adquire a propriedade do solo, devendo indenizar o proprietário pelo valor ajustado ou, caso não
haja acordo, pelo valor fixado judicialmente.
O art. 1.256, CC determina que se ambas as partes (aquele que planta ou edifica em
terreno alheio e, também, o proprietário do solo) estiverem de má-fé, o proprietário do solo
adquire a propriedade das acessões, mas deverá ressarcir o valor das mesmas. Considera-se de
má-fé o proprietário quando a atuação se deu em sua presença e sem impugnação.
Quando a construção invade o prédio vizinho em porção igual ou inferior a vigésima parte
deste, o art. 1.258, CC, prevê duas situações. Quando a construção for feita por o construtor de
boa-fé, este adquire a propriedade do solo invadido quando o valor da construção exceder o
valor do solo, devendo indenizar o valor da área e a desvalorização a remanescente. Ex.: Terreno
invadido que vale R$200.000,00; construção que vale R$50.000,00 e não ultrapassa a vigésima
parte do terreno invadido (10.000,00). Neste caso, deverá indenizar em R$10.000,00 e pela
desvalorização da área remanescente.
Neste mesmo caso, se o construtor estiver de má-fé e a construção ultrapassar
consideravelmente o valor da fração invadida, adquirirá a propriedade se pagar 10 vezes o valor
da área perdida e da desvalorização e, ainda, não for possível demolir a porção invasora sem
grave prejuízo para a construção. Ex.: Terreno invadido que vale R$200.000,00; construção que
199
vale R$500.000,00 e não ultrapassa a vigésima parte do terreno invadido (10.000,00). Neste
caso, deverá indenizar em R$10.000,00 + desvalorização da área remanescente = total x 10.
Quando a construção invade o prédio vizinho em porção superior a vigésima parte.
Também, neste caso, há a previsão de boa-fé e má-fé. Se o construtor age de boa-fé, ele adquire
a propriedade da porção invadida e indenizará o proprietário do terreno invadido em quantia
que corresponda a valorização que a construção terá pela invasão + indenização pelo valor da
porção invadida + desvalorização da área remanescente. Ex.: Terreno invadido que vale
R$200.000,00. Invasão foi de 50% do terreno (100.000,00). A área remanescente passou a valer
(80.000,00), tendo havido desvalorização da área remanescente de R$20.000,00. Construção
que invadiu valorizou R$80.000,00 a mais. Assim, o valor a ser pago é: 80.000 (valorização da
construção) + 100.000 (área invadida) + 20.000 (desvalorização da área invadida) = 200.000. Se o
construtor estiver de má-fé, deverá demolir o que construiu e pagar perdas e danos em dobro.
57
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 820.
200
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez
anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia
habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
201
7.1.5. Usucapião especial rural
Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano,
possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de
terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a
produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia,
adquirir-lhe-á a propriedade.
202
integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
(Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)
§ 1 o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo
possuidor mais de uma vez.
Introduzido no CC pela lei que institui o programa Minha Casa Minha Vida
REQUISITOS: posse ad usucapionem exercida de forma direta; lapso temporal
incontestado e ininterrupto de 2 anos; área urbana de até 250m², usada para moradia (posse
direta); do qual o usucapiente seja proprietário em conjunto com ex-cônjuge ou companheiro
que tenha abandonado o lar; não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
203
O Estatuto das Cidades – lei 10.257/2001 – prevê a possibilidade da usucapião especial
urbana coletiva.
REQUISITOS: núcleos urbanos informais (aquele clandestino, irregular ou no qual não foi
possível realizar, por qualquer modo, a titulação de seus ocupantes, ainda que atendida a
legislação vigente à época de sua implantação ou regularização); posse ad usucapionem; lapso
temporal de 5 anos; área por possuidor, inferior a 250m²; não serem os possuidores proprietários
de outro imóvel urbano ou rural.
A pretensão de usucapião dos possuidores deve ser julgada por sentença, onde o juiz irá
determinar a formação de um condomínio indivisível entre os possuidores, e a cada um caberá
uma fração ideal igual na área do terreno, independentemente da área ocupada.
Daí deriva a máxima de que “quem não registra não é dono”, pois somente o registro do
título translativo é que a propriedade será adquirida. Enquanto não houver o registro, o imóvel
continua em nome do alienante e, caso ele, agindo de má-fé, aliene o imóvel a outra pessoa e
esta leve o título ao registro, esta adquirirá a propriedade e, o primeiro adquirente apenas
poderá demandar a responsabilização civil do alienante.
204
7.2.2. Da sucessão hereditária de bens imóveis
Segundo o art. 1.784, CC, no exato instante da morte do proprietário, seus bens, sua
herança, transmite-se aos herdeiros. Esta transmissão ocorre como um todo, unitário e
indivisível (art. 1.791, CC), e há a necessidade de realização da partilha da herança entre os
herdeiros e o registro dos formais de partilha para que se efetive a transmissão da propriedade
no Registro de Imóveis e reste regularizada a propriedade. Contudo, desde a morte do autor da
herança, seus bens já são de propriedade dos sucessores (embora não tenha havido, ainda, a
individualização dos bens ou quotas parte).
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
205
04. Propriedade: formas de aquisição da propriedade móvel, perda da propriedade. Direito
de vizinhança.
206
Usucapião ordinária.
Prevista no art. 1.260, CC, exige posse ad usucapionem, lapso temporal de 3 anos, justo
título e boa-fé.
Usucapião extraordinária.
Prevista no art. 1.261, CC, exige posse ad usucapionem, lapso temporal de 5 anos. Não
exige justo título e nem boa-fé.
b. Ocupação
Art. 1.263. Quem se assenhorear de coisa sem dono para logo lhe adquire
a propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei.
É quando alguém toma para si coisa que não tem dono, adquirindo, assim, sua
propriedade. Tanto pode ser objeto da ocupação uma coisa sem dono, como, também, uma
coisa abandonada. O requisito mais importante desta forma aquisitiva é a “coisa sem dono”. Ex.:
alguém que pesca um peixe no rio, adquire-lhe a propriedade.
Havendo dono, é coisa perdida. Ex.: alguém que encontra um livro e pega para si. Neste
caso, alguém esqueceu ou perdeu.
Se a coisa é sem dono, há justo título. Se a coisa é perdida ou esquecida (tem dono), não
há justo título (achado de coisa perdida = descoberta – art. 1.233, CC).
Aquele que achar coisas de valor, preciosas, tesouros, que estejam ocultas e que não se
sabe ou não se tem memória de quem seja seu dono, adquire metade dos bens, pois a outra
metade é do proprietário do prédio onde o tesouro foi encontrado. Ex.: um pedreiro que está
demolindo uma parede e encontra uma pepita de ouro no meio dos tijolos.
207
Se o próprio proprietário do terreno ou prédio encontrar o tesouro (ou alguém a seu
mando), adquirirá a propriedade de todo o achado.
Por fim, o art. 1.266, CC regula o achado em terreno aforado. O aforamento refere-se a
enfiteuse, instituto que passou a ser proibido pelo CC/2002. Contudo, ainda existem enfiteuses
de Marinha, em terras na costa brasileira. Nestas situações há a divisão em domínio direto e
domínio útil. O domínio direito fica nas mãos do proprietário das terras e o domínio útil nas
mãos do enfiteuta. Este último poderá usar, fruir, dispor e reivindicar o bem, pagando um foro
ou laudêmio. O tesouro será dividido por igual entre o descobridor e o enfiteuta ou
integralmente deste último se ele for o descobridor.
Ocorre especificação quando alguém, por seu trabalho, altera a coisa, transformando-a
em outra. Ex.: artista que transforma mármore em obra de arte.
Assim, se a matéria-prima (mármore) pertence ao artista (chamado de especificador), a
obra de arte (escultura) por ele desenvolvida lhe pertence.
A questão é saber quando a matéria-prima não pertence total ou parcialmente ao
especificador.
O art. 1269 estabelece que se a matéria-prima pertence parcialmente a terceiro, o
especificador adquire a propriedade.
Se a matéria-prima for totalmente alheia, o art. 1270 determina que o especificador de
boa-fé adquire a propriedade da espécie nova, desde que não possa desfazê-la, reconstituindo a
matéria ao estado anterior. Se for possível desfazer, o dono da matéria a reaverá. Não sendo
208
possível e tendo o especificador agido de má-fé, o dono da matéria adquire a propriedade da
espécie nova. Contudo, se o valor da espécie nova ultrapassar consideravelmente o valor da
matéria-prima, o especificador adquire a propriedade.
O proprietário da matéria-prima tem direito a ser indenizado pelos prejuízos sofridos.
58
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas,
2017, p. 771.
209
Havendo má-fé por parte daquele que mistura as substâncias alheias, o prejudicado pode
escolher entre adquirir a propriedade da coisa, pagando o que não for seu, deduzido do valor
que lhe pertence ou, então, renunciar ao bem que lhe pertencia e passou a formar um novo.
Neste último caso, receberá indenização do valor do bem móvel cuja propriedade renunciou.
f. Da tradição
Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios
jurídicos antes da tradição.
Parágrafo único. Subentende-se a tradição quando o transmitente
continua a possuir pelo constituto possessório; quando cede ao
adquirente o direito à restituição da coisa, que se encontra em poder de
terceiro; ou quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do
negócio jurídico.
Art. 1.268. Feita por quem não seja proprietário, a tradição não aliena a
propriedade, exceto se a coisa, oferecida ao público, em leilão ou
estabelecimento comercial, for transferida em circunstâncias tais que, ao
adquirente de boa-fé, como a qualquer pessoa, o alienante se afigurar
dono.
§ 1 o Se o adquirente estiver de boa-fé e o alienante adquirir depois a
propriedade, considera-se realizada a transferência desde o momento
em que ocorreu a tradição.
§ 2 o Não transfere a propriedade a tradição, quando tiver por título um
negócio jurídico nulo.
A propriedade de coisas móveis transfere-se pela tradição/entrega da coisa, que pode ser
real (entrega da própria coisa), simbólica (entrega de algo que simbolize a coisa) ou ficta (que se
dá por presunção, por possuir a coisa em nome alheio e passar a pertencer em nome próprio).
Quanto ao art. 1267, Tartuce59 afirma que entende-se por tradição:
–Quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório
(tradição ficta).
–Quando o transmitente cede ao adquirente o direito à restituição da
coisa, que se encontra em poder de terceiro (tradição simbólica – traditio
longa manu).
59
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
279. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020
210
–Quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do negócio
jurídico (tradição ficta – tradição brevi manu).
O art. 1268 determina que a tradição feita por terceiro que detém a coisa, mas não é
proprietário, não aliena a propriedade (traditio a non domino). Seria ineficaz tal alienação
(terceiro degrau da escala ponteana). Existe a exceção, prevista na parte final do caput, que se
refere as situações em que a coisa é ofertada em leilão, aparentando que o alienante seja o
dono.
211
§ 2 o Presumir-se-á de modo absoluto a intenção a que se refere este
artigo, quando, cessados os atos de posse, deixar o proprietário de
satisfazer os ônus fiscais.
a. Alienação
Por esta forma, ao mesmo tempo em que a propriedade é adquirida (por aquisição
derivada) por aquele que “compra”, é perdida por aquele que “vende”. Ex.: contrato de compra e
venda; troca/permuta; doação.
No caso de imóveis, há a necessidade de registro no Cartório de Registro de Imóveis para
efetivar a transmissão e, no caso de móveis, há a necessidade da tradição.
b. Renúncia
Ocorre quando o proprietário abre mão do seu direito. Ex.: renúncia da herança – art. 1804
e seguintes do CC. Para a eficácia da renúncia de bem imóveis, há que se ter o registro do título
renunciativo.
c. Abandono
Ocorre quando o dono abandona a coisa, deixa ela com a intenção de não tê-la mais para
si. Também chamada de derrelicção, ou seja, ato praticado com a intenção de perder a
propriedade. A propriedade originária da coisa abandonada pode ser adquirida por ocupação
(móveis) ou por usucapião (móveis ou imóveis).
O art. 1276, § 2.º, CC estabelece, quanto aos bens imóveis, que haverá presunção do
abandono quando o proprietário, além da derrelicção, parar de pagar os impostos referentes ao
imóvel.
d. Perecimento da coisa
Ocorre quando a coisa, o bem, é perdido, ou seja, quando algum fenômeno excluir o
objeto do direito de propriedade do mundo fático. Ex.: uma casa que é demolida; um quadro
que pega fogo; o colar da Rose, jogado em alto mar em Titanic. Os direitos de propriedade sobre
esses bens são perdidos.
e. Desapropriação
Ocorre quando o poder público, por necessidade, finalidade púbica ou interesse social
adquire a propriedade através do pagamento de justa e prévia indenização. A desapropriação é
revista no art. 5.º, XXIV, da CF. A desapropriação independe da vontade do proprietário,
podendo, apenas, discutir o valor da indenização.
212
II – DIREITO DE VIZINHANÇA
2. Uso da propriedade
Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de
fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à
saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade
vizinha.
Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a
natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que
distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância
dos moradores da vizinhança.
Art. 1.278. O direito a que se refere o artigo antecedente não prevalece
quando as interferências forem justificadas por interesse público, caso
em que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao vizinho
indenização cabal.
O proprietário de uma coisa/prédio não pode usar de sua propriedade de forma a impedir
ou limitar o exercício da propriedade por parte do prédio vizinho. Desta forma, o art. 1.277, CC
permite que o proprietário de um prédio faça cessar as interferências prejudiciais a utilização da
sua propriedade.
Existe, portanto, uma proibição ao uso nocivo da propriedade, que importa em
perturbação da segurança, do sossego ou da saúde dos vizinhos 60. Pode-se usar como exemplos
deste uso nocivo da propriedade: um prédio encravado, onde o prédio vizinho impeça a
passagem para a via pública; a construção realizada no prédio vizinho que impeça o acesso a
água em uma propriedade rural; construção no prédio vizinho que impeça o acesso a luz solar;
terreno ou imóvel em que mantém água parada e verifica-se a proliferação de mosquito da
dengue; enfim, são situações que a realização de obras – ou o próprio exercício da propriedade –
em um imóvel provocam danos ao prédio vizinho.
60
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas,
2017, p. 799.
213
De se observar que essa proteção trazida pelo art. 1.277, CC é conferida tanto ao
proprietário como, também, ao possuidor que podem se utilizar de medidas variadas
(responsabilidade civil, obrigação de não fazer, nunciação de obra nova, etc) para fazer cessar a
interferência. Estas proibições de interferências levarão em conta a utilização e localização do
prédio, limites ordinários e tolerância dos moradores da vizinhança.
O art. 1.278, CC, por sua vez, determina que não prevalece o direito de fazer cessar a
interferência, se as mesmas forem justificadas por interesse público. Em uma situação como
esta, haverá o dever, por parte do proprietário do prédio que causa o dano, de indenizar o
vizinho. Ex.: construção de açudes que invadem parte da propriedade vizinha, passagem de
rede elétrica.
Sempre que for possível, o vizinho poderá exigir a redução ou eliminação das
interferências, ainda que por decisão judicial devam ser toleradas – art. 1.279, CC. Ex.: foi tolerada
a construção do açude, mas o mesmo secou e, neste caso, o proprietário pode recuperar o uso
da sua propriedade.
Quando o prédio ameaçar ruína, o proprietário o prédio vizinho pode exigir demolição ou
reparação, além de poder exigir caução pelo dano iminente. Art. 1.280, CC. Sempre que houver
iminência de dano, na construção sobre o prédio vizinho, poderá o outro exigir garantia de
eventual prejuízo (art. 1.281, CC).
3. Árvores limítrofes
Art. 1.282. A árvore, cujo tronco estiver na linha divisória, presume-se
pertencer em comum aos donos dos prédios confinantes.
Art. 1.283. As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do
prédio, poderão ser cortados, até o plano vertical divisório, pelo
proprietário do terreno invadido.
Art. 1.284. Os frutos caídos de árvore do terreno vizinho pertencem ao
dono do solo onde caíram, se este for de propriedade particular.
Havendo árvores sobre a linha divisória entre duas propriedades, presume-se que as
mesmas pertençam a ambos os prédios. Há casos, inclusive de que as árvores são utilizadas
como delimitação entre os terrenos. Trata-se de um condomínio necessário, de forma que
nenhum dos condôminos pode cortar a árvore sem a anuência do outro, salvo se houver perigo
de dano iminente. Art. 1.282, CC.
Toda raiz ou ramo que ultrapassar o limite da divisão, podem ser cortados pelo dono do
terreno invadido, no limite da linha divisória. Art. 1.283, CC. Trata-se do direito de corte do
proprietário do terreno que sofre a invasão dos galhos e raízes da árvore do terreno vizinho.
214
Obviamente que o corte não pode comprometer a vida da árvore e, ainda, devem ser
observadas as questões e legislação ambiental.
Quanto aos frutos, os que caírem para dentro do terreno vizinho e estiverem no solo,
pertencerão a este. Se os frutos caírem em uma praça, por exemplo, que é solo público,
consideram-se coisas sem dono e sua propriedade pode ser adquirida pela ocupação. Art. 1.283,
CC.
4. Passagem forçada
Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente
ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger
o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se
necessário.
§ 1 o Sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e
facilmente se prestar à passagem.
§ 2 o Se ocorrer alienação parcial do prédio, de modo que uma das partes
perca o acesso a via pública, nascente ou porto, o proprietário da outra
deve tolerar a passagem.
§ 3 o Aplica-se o disposto no parágrafo antecedente ainda quando, antes
da alienação, existia passagem através de imóvel vizinho, não estando o
proprietário deste constrangido, depois, a dar uma outra.
Todo imóvel deve ser acessível e, em razão disto, o dono do prédio encravado – sem
acesso – pode exigir do vizinho a passagem forçada. Essa passagem será concedida pelo imóvel
mais natural e que mais facilmente se preste a passagem, mediante indenização cabal
(conforme o valor da área da passagem + a desvalorização) e o rumo (localização da passagem)
será fixado judicialmente quando não houver acordo entre as partes.
O enunciado 88 das Jornadas de Direito Civil prevê que esse direito a passagem forçada
“também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado,
consideradas, inclusive, as necessidades de exploração econômica”.
De se observar que a passagem forçada é diferente da servidão de passagem. Esta última
é direito real e se constitui por acordo entre os proprietários de prédios vizinhos, quando um
deles seja encravado. Ademais, deve ser levado a registro no Cartório de Registro de Imóveis. A
passagem forçada é obrigatória e a servidão é facultativa.
6. Águas
Art. 1.288. O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber
as águas que correm naturalmente do superior, não podendo realizar
obras que embaracem o seu fluxo; porém a condição natural e anterior
do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo dono ou
possuidor do prédio superior.
Art. 1.289. Quando as águas, artificialmente levadas ao prédio superior, ou
aí colhidas, correrem dele para o inferior, poderá o dono deste reclamar
que se desviem, ou se lhe indenize o prejuízo que sofrer.
Parágrafo único. Da indenização será deduzido o valor do benefício
obtido.
Art. 1.290. O proprietário de nascente, ou do solo onde caem águas
pluviais, satisfeitas as necessidades de seu consumo, não pode impedir,
ou desviar o curso natural das águas remanescentes pelos prédios
inferiores.
Art. 1.291. O possuidor do imóvel superior não poderá poluir as águas
indispensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos
imóveis inferiores; as demais, que poluir, deverá recuperar, ressarcindo os
danos que estes sofrerem, se não for possível a recuperação ou o desvio
do curso artificial das águas.
216
Art. 1.292. O proprietário tem direito de construir barragens, açudes, ou
outras obras para represamento de água em seu prédio; se as águas
represadas invadirem prédio alheio, será o seu proprietário indenizado
pelo dano sofrido, deduzido o valor do benefício obtido.
Art. 1.293. É permitido a quem quer que seja, mediante prévia
indenização aos proprietários prejudicados, construir canais, através de
prédios alheios, para receber as águas a que tenha direito, indispensáveis
às primeiras necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo
considerável à agricultura e à indústria, bem como para o escoamento de
águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de terrenos.
§ 1 o Ao proprietário prejudicado, em tal caso, também assiste direito a
ressarcimento pelos danos que de futuro lhe advenham da infiltração ou
irrupção das águas, bem como da deterioração das obras destinadas a
canalizá-las.
§ 2 o O proprietário prejudicado poderá exigir que seja subterrânea a
canalização que atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou
quintais.
§ 3 o O aqueduto será construído de maneira que cause o menor prejuízo
aos proprietários dos imóveis vizinhos, e a expensas do seu dono, a quem
incumbem também as despesas de conservação.
Art. 1.294. Aplica-se ao direito de aqueduto o disposto nos arts. 1.286 e
1.287.
Art. 1.295. O aqueduto não impedirá que os proprietários cerquem os
imóveis e construam sobre ele, sem prejuízo para a sua segurança e
conservação; os proprietários dos imóveis poderão usar das águas do
aqueduto para as primeiras necessidades da vida.
Art. 1.296. Havendo no aqueduto águas supérfluas, outros poderão
canalizá-las, para os fins previstos no art. 1.293, mediante pagamento de
indenização aos proprietários prejudicados e ao dono do aqueduto, de
importância equivalente às despesas que então seriam necessárias para
a condução das águas até o ponto de derivação.
Parágrafo único. Têm preferência os proprietários dos imóveis
atravessados pelo aqueduto.
Toda propriedade, para que possa cumprir com sua função social necessita ser servida de
água. Assim, considerando as situações ambientais pertinentes, o direito de vizinhança dispõe
217
acerca da passagem das águas. Quanto as águas, deve-se, sempre considerar, também, as
disposições ambientais respectivas.
A primeira disposição acerca das águas – art. 1.288 – diz respeito a obrigatoriedade do
prédio inferior a receber as águas naturais que correm do superior, sendo vedadas obras que
impeçam o fluxo das águas naturais. Neste caso, havendo obstrução, o proprietário do prédio
superior poderá ajuizar ações para afastar as obstruções, independentemente de eventuais
perdas e danos. Contudo, o prédio inferior também não pode ser prejudicado – com infiltrações,
por exemplo – por conta das obras feitas pelo prédio superior.
Em se tratando de águas artificiais, ou seja, colhidas pelo prédio superior e escoadas
artificialmente para o inferior, o dono do prédio inferior pode requerer que sejam elas desviadas
ou que lhe seja indenizado o prejuízo que eventualmente sofre. Desta indenização será
deduzido eventual benefício obtido (art. 1.289). Não se pode esquecer, contudo, da viabilidade
da passagem forçada de tubulações prevista nos arts. 1.286 e 1.287, CC.
O art. 1.290 prevê a situação das nascentes e do escoamento das águas pluviais entre
prédios limítrofes, determinando que o proprietário do terreno onde há a nascente pode
abastecer-se dela para consumo, mas não pode impedir que ela corra naturalmente para os
prédios inferiores. Também não pode o proprietário poluir as águas indispensáveis aos imóveis
inferiores devendo, se for o caso, recuperá-las e, caso não seja possível deverá desviá-las ou
indenizar o proprietário dos imóveis inferiores para onde correrem as águas poluídas (art. 1.291).
O direito de vizinhança permite que o proprietário possa represar águas pela construção
de açudes e barragens. Isto, contudo, não autoriza que impeça o fluxo das águas, prejudicando
o prédio inferior com a escassez de água. Mais. Prevê o art. 1.292 que, se houver danos no prédio
inferior, este poderá exigir indenização pelos danos causados por eventual vazamento,
deduzido o valor do benefício.
O art. 1.293 regula os aquedutos, ou servidão de aquedutos, ou seja, a construção de canais
de irrigação, que passem por prédios vizinhos. O custo dessa construção será sempre do
proprietário do aqueduto. Tal possibilidade prevê, contudo, a necessidade de indenização dos
proprietários prejudicados pela passagem do canal, os quais poderão exigir que a passagem
seja subterrânea, canalizada, nas áreas edificadas e nas de pastos, hortas, jardins ou quintais.
Prevê, também, o direito dos terrenos prejudicados com eventuais infiltrações ou interrupções
provenientes do aqueduto.
Os proprietários dos imóveis por onde passarem os aquedutos poderão deles se utilizar,
podendo, também, sobre eles – quando subterrâneos – construir, devendo, contudo, observar
sua conservação. Art. 1.295, CC.
Por fim, prevê o art. 1.296 a possibilidade que outros proprietários canalizem o aqueduto
para servir suas próprias necessidades. Havendo canalização, os proprietários prejudicados
deverão ser indenizados, assim como o dono do aqueduto.
218
7. Limites entre prédios e do direito de tapagem
Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de
qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu
confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a
aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados,
repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas
despesas.
§ 1 o Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes
vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se,
até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes,
sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade,
a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e
conservação.
§ 2 o As sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de
marco divisório, só podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum
acordo entre proprietários.
§ 3 o A construção de tapumes especiais para impedir a passagem de
animais de pequeno porte, ou para outro fim, pode ser exigida de quem
provocou a necessidade deles, pelo proprietário, que não está obrigado a
concorrer para as despesas.
Art. 1.298. Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se
determinarão de conformidade com a posse justa; e, não se achando ela
provada, o terreno contestado se dividirá por partes iguais entre os
prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um
deles, mediante indenização ao outro.
219
Se os limites forem confusos, a divisão será feita pela posse justa, conforme art. 1.298, CC
ou, então, será o terreno divido em partes iguais ou, então, adjudicado a um, mediante
indenização ao outro.
Não sendo possível estabelecer a demarcação entre os prédios vizinhos de forma
consensual entre os proprietários, qualquer deles tem legitimidade para promover Ação
Demarcatória, conforme procedimento especial previsto nos termos do art. 574 e seguintes do
CPC.
8. Direito de construir
Art. 1.299. O proprietário pode levantar em seu terreno as construções
que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos
administrativos.
Art. 1.300. O proprietário construirá de maneira que o seu prédio não
despeje águas, diretamente, sobre o prédio vizinho.
Art. 1.301. É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a
menos de metro e meio do terreno vizinho.
§ 1 o As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as
perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco
centímetros.
§ 2 o As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou
ventilação, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de
comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso.
Art. 1.302. O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da
obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu
prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao
disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o
escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho.
Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual
for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo,
levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade.
Art. 1.303. Na zona rural, não será permitido levantar edificações a menos
de três metros do terreno vizinho.
Art. 1.304. Nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a
alinhamento, o dono de um terreno pode nele edificar, madeirando na
parede divisória do prédio contíguo, se ela suportar a nova construção;
mas terá de embolsar ao vizinho metade do valor da parede e do chão
correspondentes.
220
Art. 1.305. O confinante, que primeiro construir, pode assentar a parede
divisória até meia espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o
direito a haver meio valor dela se o vizinho a travejar, caso em que o
primeiro fixará a largura e a profundidade do alicerce.
Parágrafo único. Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos, e não
tiver capacidade para ser travejada pelo outro, não poderá este fazer-lhe
alicerce ao pé sem prestar caução àquele, pelo risco a que expõe a
construção anterior.
Art. 1.306. O condômino da parede-meia pode utilizá-la até ao meio da
espessura, não pondo em risco a segurança ou a separação dos dois
prédios, e avisando previamente o outro condômino das obras que ali
tenciona fazer; não pode sem consentimento do outro, fazer, na parede-
meia, armários, ou obras semelhantes, correspondendo a outras, da
mesma natureza, já feitas do lado oposto.
Art. 1.307. Qualquer dos confinantes pode altear a parede divisória, se
necessário reconstruindo-a, para suportar o alteamento; arcará com
todas as despesas, inclusive de conservação, ou com metade, se o vizinho
adquirir meação também na parte aumentada.
Art. 1.308. Não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos
ou quaisquer aparelhos ou depósitos suscetíveis de produzir infiltrações
ou interferências prejudiciais ao vizinho.
Parágrafo único. A disposição anterior não abrange as chaminés
ordinárias e os fogões de cozinha.
Art. 1.309. São proibidas construções capazes de poluir, ou inutilizar, para
uso ordinário, a água do poço, ou nascente alheia, a elas preexistentes.
Art. 1.310. Não é permitido fazer escavações ou quaisquer obras que tirem
ao poço ou à nascente de outrem a água indispensável às suas
necessidades normais.
Art. 1.311. Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço
suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que
comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido
feitas as obras acautelatórias.
Parágrafo único. O proprietário do prédio vizinho tem direito a
ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido
realizadas as obras acautelatórias.
221
Art. 1.312. Todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção
é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e
danos.
Art. 1.313. O proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o
vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para:
I - dele temporariamente usar, quando indispensável à reparação,
construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;
II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem
casualmente.
§ 1 o O disposto neste artigo aplica-se aos casos de limpeza ou reparação
de esgotos, goteiras, aparelhos higiênicos, poços e nascentes e ao aparo
de cerca viva.
§ 2 o Na hipótese do inciso II, uma vez entregues as coisas buscadas pelo
vizinho, poderá ser impedida a sua entrada no imóvel.
§ 3 o Se do exercício do direito assegurado neste artigo provier dano, terá
o prejudicado direito a ressarcimento.
O proprietário tem o direito de construir sobre seu terreno devendo, contudo, respeitar os
direitos de vizinhanças e as normas relativas a edificação e ocupação do solo (plano diretor do
município). Nesta construção, não poderá despejar água no terreno vizinho. Qualquer
construção que extrapole os limites do direito de vizinhança poderá ser atacada através de
ação demolitória, através de procedimento comum ou nunciação de obra nova, por exemplo.
As construções de janelas, terraços, varandas devem observar a distância mínima de 1,5m
da divisa do terreno vizinho, para respeitar a privacidade entre os confinantes. Se a janela não
for voltada para a linha divisória, a distância será de 0,75m (75cm) 61. Este regramento não se
aplica a aberturas de luz ou ventilação com tamanho entre 10cm largura e 20cm de
comprimento, que sejam construídas a mais de 2m de altura do piso. Esse regramento visa a
proteção do direito a intimidade e vida privada das pessoas, tratando-se de uma espécie de
limitação, restrição legal ao direito de propriedade.
É permitida, pela súmula 120 do STF a construção de parede de tijolo de vidro, pois não
viola a privacidade do vizinho.
O vizinho que se incomodar com a construção de janela, terraço, sacada, tem prazo
decadencial de ano e dia para o desfazimento da mesma, contado da conclusão da obra (art.
1.302, CC). Caso de ação demolitória.
Na zona rural, a exigência de distância é de 3 metros para qualquer construção.
61
A doutrina entende que não se aplica a súmula 414, STF diante desta redação do CC.
222
O art. 1.304, CC refere-se a possibilidade de utilizar-se da parede divisória do vizinho para
dar início a sua construção, nos casos em que as construções utilizam-se de toda a largura do
terreno, podendo o prédio vizinho, desde que a parede já existente suporte, apoiar a sua, desde
que indenize metade do valor da parede e do chão correspondente. Ex.: casarios coloniais
brasileiros. Segundo Tartuce62 é o “que se denomina como direito de travejamento ou
de madeiramento, ou seja, de colocar uma trave, viga ou madeira no prédio vizinho nos casos
em que há o referido alinhamento”.
Na mesma linha, o art. 1.305, CC prevê a situação da “parede meia”, ou seja, paredes
divisórias, quando a construção é feita no limite dos terrenos, podendo o que primeiro construir,
utilizar-se de 50% do alicerce e construção da profundidade da parede para dentro do terreno
vizinho (meia espessura). Neste caso, o dono do outro terreno, pretendendo travejá-la, deverá
indenizar o que primeiro construiu em metade do valor da parede. As chamadas meia-paredes
podem ser utilizadas por cada condômino no limite da metade da espessura (art. 1.306, CC). Ex.:
fixação de armários.
Se, contudo, não pretender travejá-la, não poderá o dono do segundo prédio a ser
construído, “fazer-lhe alicerce ao pé sem prestar caução àquele, pelo risco a que expõe a
construção anterior. Eventualmente, caberá a ação de dano infecto para se exigir a caução”63.
A parede divisória pode ser elevada em altura por qualquer dos condôminos e a sua custa,
a não ser que o vizinho pretenda adquirir meação da parte aumentada (art. 1.307, CC).
O art. 1.308 proíbe encostar na parede divisória lareiras, fogões, fornos ou chaminés
capazes de produzir infiltrações para o vizinho, podendo utilizar-se sempre de nunciação ou
demolição para evitar. Aqui, entende-se casos de fogões a lenha e não os fogões tradicionais de
cozinha, pela leitura do parágrafo único. Também são vedadas construções que possam poluir
ou inutilizar águas de poço ou nascente preexistentes a construção (art. 1.309, CC), bem como a
realização de escavações ou obras que retirem de poço ou nascente alheia a água para suas
necessidades (art. 1.310, CC).
Qualquer obra realizada no terreno vizinho deve observar as normas de segurança e,
sendo necessário, antes de realizar qualquer obra ou escavação no próprio terreno, necessário
realizar obras acautelatórias, a fim de evitar dano ao prédio vizinho. De toda forma, se realizada
a obra não observando-se estas cautelas, o prejudicado poderá utilizar-se de nunciação de obra
62
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
352. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020
63
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
353. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020
223
nova, ação de dano infecto ou demolitória, sem prejuízo do direito de ser indenizado, havendo
danos ao seu prédio.
O art. 1.312, CC prevê que as violações aos direitos de vizinhança através de construções
que não observem as normativas, podem ser objeto de ação de demolição, sem prejuízo das
perdas e danos.
Por fim, o art. 1.313 estabelece as situações em que o acesso de um vizinho no prédio do
outro deve ser tolerado, mediante aviso prévio: a) dele temporariamente usar, quando
indispensável à reparação, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro
divisório, corte de árvores ou cercas vivas, reparo e limpeza de esgotos, goteiras, poços, etc; b)
apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente (exemplo: bola
de futebol dos filhos que “teima” em passar para o pátio do vizinho). Neste caso, o vizinho pode
autorizar a entrada ou, então, devolver o objeto.
EM RESUMO
224
05. Condomínio.
I – CONDOMÍNIO
1. Condomínio – conceito
Quando houver mais de um titular sobre o mesmo direito de propriedade, cada um com
uma fração ideal sobre a mesma coisa, haverá condomínio ou copropriedade. São três as
espécies de condomínio: voluntário (decorrente da vontade dos proprietários), necessário
(decorrente da lei, em função da indivisibilidade da coisa) e edilício (condomínio de unidades
autônomas, com partes comuns).
64
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
370. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
225
Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte
a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a
quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço,
haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de
cento e oitenta dias, sob pena de decadência.
Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver
benfeitorias de maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior.
Se as partes forem iguais, haverão a parte vendida os comproprietários,
que a quiserem, depositando previamente o preço.
Em caso de alienação a terceiro, sem ser dado o exercício do direito de preferência, esse
direito deve ser exercido dentro do prazo de 180 dia, a contar da ciência da venda, requerendo a
adjudicação para si da quota alienada a terceiro.
Quando houverem dívidas provenientes do condomínio, cada um dos condôminos
responde por sua quota-parte, podendo eximir-se do pagamento, desde que renuncie a sua
65
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
389. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
226
fração (art. 1.316, CC). Contudo, se algum dos condôminos contrair dívida sozinho, em nome do
condomínio, este é que responderá pelas mesmas. Terá ele, contudo, direito de regresso contra
os demais.
Cada condômino tem direito a participação quanto aos frutos da coisa comum, em
percentual que equivalha a sua quota-parte. Não pode um condômino locar a coisa a terceiro
sem a anuência dos demais.
Os arts. 1.323 a 1.326, CC estabelecem a forma de administração do condomínio voluntário,
que será exercida por um dos condôminos, havendo consenso ou, então, por administrador,
que poderá ser estranho ao condomínio, mas que dependerá de deliberação por maioria. O
cálculo da maioria é realizada pelo quinhão dos condôminos e a deliberação deve ser realizada
por maioria absoluta, ou seja, da totalidade dos condôminos e não dos presentes na
deliberação.
O condomínio voluntário pode ser desfeito a qualquer tempo. Nos termos do art. 1.319, CC
é lícito que o condômino exija a divisão da coisa comum sempre que for possível tal intento (há
condomínios que são indivisíveis por natureza), e cada condômino deverá responder pelas
despesas de divisão de sua parte.
Para a extinção/dissolução/divisão do condomínio, devem ser aplicadas as regras de
partilha de herança, previstas nos arts. 2.013 a 2.022 do CC (art. 1.321, CC) à ação de divisão de
condomínio. Esta ação de divisão está prevista no CPC nos procedimentos especiais, art. 569 e
seguintes.
Neste caso, sendo a coisa divisível ela será dividida e, para tanto, poderá ser necessária
realização de perícia para determinar/propor a forma de divisão. Não sendo possível a divisão,
deverá haver a alienação da coisa e repartido entre os condôminos o valor, sempre que um
deles não pretender adquirir a parte do outro.
227
4. Condomínio edilício
O condomínio edilício é tratado pelo CC do art. 1.331 a 1358 e é assim considerado aquele
condomínio formado por unidades autônomas, pois existem condomínios considerados
edilícios e que são apenas loteamentos e não edifícios. Nesta modalidade, a propriedade é
dividida em planos horizontais, utilizando-se o solo e subindo para o “céu”.
O condomínio edilício é composto de partes comuns e partes individuais (art. 1.331, CC). As
partes individuais, são as unidades autônomas (apartamentos, salas, escritórios, lojas, etc). No
caso de um edifício de apartamentos, cada unidade, cada apartamento, é considerado a fração
real, ou seja, pode esta fração ser alienada independentemente do exercício do direito de
preferência previsto no art. 504, CC. Significa dizer que se o proprietário de um apartamento em
um condomínio edilício resolver alienar seu imóvel, não necessitará notificar os demais
condôminos.
Contudo, o box de garagem só pode ser alienado ou alugado a pessoa estranha ao
condomínio se houver autorização da convenção de condomínio. Neste sentido, prevê o art.
1.339, CC:
Art. 1.339. Os direitos de cada condômino às partes comuns são
inseparáveis de sua propriedade exclusiva; são também inseparáveis das
frações ideais correspondentes as unidades imobiliárias, com as suas
partes acessórias.
§ 1 o Nos casos deste artigo é proibido alienar ou gravar os bens em
separado.
§ 2 o É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade
imobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa
faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela não se
opuser a respectiva assembléia geral.
O box acaba sendo considerado como acessória, sendo possível a alienação a outro
condômino, desde que não haja vedação pela assembleia geral.
Com relação a área comum: solo, telhado, áreas comuns do condomínio (garagem,
saguão, etc), estas não podem ser alienadas em separado, pois constituem o todo condominial,
havendo fixação de uma fração ideal, em percentual para cada unidade autônoma, quanto ao
solo e quanto as áreas comuns edificadas. Estas são objeto, portanto, de copropriedade. O
terraço entende-se, como regra, sendo de área comum, salvo existência de disposição
condominial que estabeleça pertencer a apenas uma ou alguma das unidades. Nenhuma
unidade autônoma pode ficar sem acesso a via pública, nem sem elevador, mesmo que
inadimplentes com o condomínio.
228
Há que se destacar o entendimento do STJ, firmado na jurisprudência em teses (edição
68, n.16 – TESE DO STJ), no sentido de que é possível a reforma e utilização exclusiva de área
comum do condomínio, desde que haja autorização da assembleia geral. Tartuce 66 usa como
exemplo “nos prédios com um apartamento por andar, o uso do hall do elevador privativo da
unidade”.
Também importante mencionar que outra TESE DO STJ é no sentido de que na relação
entre condomínio e condôminos não se aplicam as normas do CDC (edição 68, n.10): “10) Nas
relações jurídicas estabelecidas entre condomínio e condôminos não incide o Código de Defesa
do Consumidor – CDC”.
Embora existam discussões doutrinárias e jurisprudenciais, o condomínio é considerado
um ente despersonalizado, ou seja, não é uma pessoa jurídica.
66
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
398. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
229
a) a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos
para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio. Estas despesas se
constituem de obrigações propter rem, ou seja, próprias da coisa, de forma que seguem o bem
esteja ele com quem estiver. Neste sentido, a convenção deve fixar a forma de rateio dessas
despesas e a TESE DO STJ (Edição 68, n.9) é no sentido de que possa ser “de maneira diversa da
regra da fração ideal pertencente a cada unidade”.
b) sua forma de administração, com previsão de reeleição ou não, duração dos
mandatos de síndico e sub-síndico;
c) a competência das assembleias, forma de sua convocação e quórum exigido para as
deliberações, observando-se as determinações do art. 1.350, CC que prevê que a primeira
assembleia anual deve aprovar o orçamento, prestar contas e determinar o valor das
contribuições anuais. Além disto, as assembleias extraordinárias podem ser convocadas pelo
síndico ou por ¼ dos condôminos, nos termos do art. 1355, CC.
d) as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores, como nos casos de
multas por importunação, por violação do silêncio, etc.;
e) o regimento interno, que seria o estabelecimento de regras de convivência no
condomínio, horários de funcionamento, proibições e permissões, etc.
230
o condômino apresentar comportamento antissocial, com perturbação permanente do
sossego, a multa pode chegar a 10 vezes o valor de suas contribuições mensais (art. 1.337, CC).
O art. 1.338, CC prevê a preferência dos condôminos para alugar o abrigo de veículos
(garagem).
No caso de uso de área comum com exclusividade – saguão do elevador em edifício de
um apartamento por andar por exemplo ou, então, uso do terraço – cabe ao condômino pagar
as despesas relativas a tal parte. Art. 1.340, CC.
Deve-se observar que as obrigações condominiais são consideradas propter rem, ou seja,
seguem com a coisa. Assim, a aquisição da propriedade, traz consigo os débitos do condomínio,
inclusive quando há compromisso de compra e venda (mesmo não registrado), havendo TESE
DO STJ (Edição 68, n. 4) definindo que a obrigação é tanto do proprietário, quanto do
promitente comprador: “Havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a
responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor
quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto.
(Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/73 - Tema 886)”.
Ainda. Importante mencionar a possibilidade de penhora do imóvel – ainda que seja o
único (art. 3º, IV, lei 8009/90) – para a garantia do pagamento das despesas de condomínio,
havendo, neste sentido TESE DO STJ (Edição 68, n.1): “É possível a penhora do bem de família
para assegurar o pagamento de dívidas oriundas de despesas condominiais do próprio bem”.
Por fim, ao tratar da regulamentação do condomínio, o CC determina a necessidade de
contratação de seguro contra incêndio, destruição parcial ou total. Art. 1.346, CC.
5. Condomínio de lotes
A lei 13.465/2017 inseriu o art. 1.358-A no CC, passando a dispor a respeito do condomínio
de lotes, que seria uma forma de condomínio edilício, mas sem construção, onde existem partes
de propriedade exclusiva e partes comuns. Seria a regulamentação dos chamados
“condomínios fechados”.
Aplica-se a esta espécie, as disposições acerca do condomínio edilício e toda infraestrutura
necessária ao empreendimento deve ser realizada pelo empreendedor.
67
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p.
460. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16 out.
2020.
233
manutenção ordinária e extraordinária, de conservação e limpeza e de pagamento da
contribuição condominial; II - o número máximo de pessoas que podem ocupar
simultaneamente o imóvel no período correspondente a cada fração de tempo; III - as regras de
acesso do administrador condominial ao imóvel para cumprimento do dever de manutenção,
conservação e limpeza; IV - a criação de fundo de reserva para reposição e manutenção dos
equipamentos, instalações e mobiliário; V - o regime aplicável em caso de perda ou destruição
parcial ou total do imóvel, inclusive para efeitos de participação no risco ou no valor do seguro,
da indenização ou da parte restante; VI - as multas aplicáveis ao multiproprietário nas hipóteses
de descumprimento de deveres.
O art. 1.358-I estabelece que o instrumento de instituição da multipropriedade e a
convecção de condomínio poderão estabelecer os direitos multiproprietário, mas garante ainda
que este poderá: I - usar e gozar, durante o período correspondente à sua fração de tempo, do
imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário; II - ceder a fração de tempo em
locação ou comodato; III - alienar a fração de tempo, por ato entre vivos ou por causa de morte,
a título oneroso ou gratuito, ou onerá-la, devendo a alienação e a qualificação do sucessor, ou a
oneração, ser informadas ao administrador; IV - participar e votar, pessoalmente ou por
intermédio de representante ou procurador, desde que esteja quite com as obrigações
condominiais, em: a) assembleia geral do condomínio em multipropriedade, e o voto do
multiproprietário corresponderá à quota de sua fração de tempo no imóvel; b) assembleia geral
do condomínio edilício, quando for o caso, e o voto do multiproprietário corresponderá à quota
de sua fração de tempo em relação à quota de poder político atribuído à unidade autônoma na
respectiva convenção de condomínio edilício.
O art. 1.358-J traz as obrigações do multiproprietário: I - pagar a contribuição condominial
do condomínio em multipropriedade e, quando for o caso, do condomínio edilício, ainda que
renuncie ao uso e gozo, total ou parcial, do imóvel, das áreas comuns ou das respectivas
instalações, equipamentos e mobiliário; II - responder por danos causados ao imóvel, às
instalações, aos equipamentos e ao mobiliário por si, por qualquer de seus acompanhantes,
convidados ou prepostos ou por pessoas por ele autorizadas; III - comunicar imediatamente ao
administrador os defeitos, avarias e vícios no imóvel dos quais tiver ciência durante a utilização;
IV - não modificar, alterar ou substituir o mobiliário, os equipamentos e as instalações do imóvel;
V - manter o imóvel em estado de conservação e limpeza condizente com os fins a que se
destina e com a natureza da respectiva construção; VI - usar o imóvel, bem como suas
instalações, equipamentos e mobiliário, conforme seu destino e natureza; VII - usar o imóvel
exclusivamente durante o período correspondente à sua fração de tempo; VIII - desocupar o
imóvel, impreterivelmente, até o dia e hora fixados no instrumento de instituição ou na
convenção de condomínio em multipropriedade, sob pena de multa diária, conforme
234
convencionado no instrumento pertinente; IX - permitir a realização de obras ou reparos
urgentes.
O § 1.º do mesmo dispositivo traz as sanções por descumprimento das obrigações, as quais
deverão constar da respectiva convenção de condomínio em multipropriedade: I - multa, no
caso de descumprimento de qualquer de seus deveres; II - multa progressiva e perda
temporária do direito de utilização do imóvel no período correspondente à sua fração de tempo,
no caso de descumprimento reiterado de deveres.
As despesas decorrentes de reparos no imóvel serão divididas entre os multiproprietários,
quando derivadas do uso normal, ou, então, suportadas pelo multiproprietário que deu causa ao
estrago, sem prejuízo da multa (§ 2º, art. 1.358-J).
Alienações da fração de tempo/propriedade do multiproprietário não dependerão de
anuência dos demais. (§ 2º, art. 1.358-L), de forma a não existir, neste caso de condomínio, o
direito de preferência (como regra, podendo estar estabelecido em convenção esta preferência).
A multipropriedade será administrada pela pessoa indicada no instrumento de instituição
ou convenção de condomínio ou, não havendo, pela pessoa escolhida na assembleia (art. 1.358-
M). As atribuições são as mesmas do síndico: I - coordenação da utilização do imóvel pelos
multiproprietários durante o período correspondente a suas respectivas frações de tempo; II -
determinação, no caso dos sistemas flutuante ou misto, dos períodos concretos de uso e gozo
exclusivos de cada multiproprietário em cada ano; III - manutenção, conservação e limpeza do
imóvel; IV - troca ou substituição de instalações, equipamentos ou mobiliário, inclusive: a)
determinar a necessidade da troca ou substituição; b) providenciar os orçamentos necessários
para a troca ou substituição; c) submeter os orçamentos à aprovação pela maioria simples dos
condôminos em assembleia; V - elaboração do orçamento anual, com previsão das receitas e
despesas; VI - cobrança das quotas de custeio de responsabilidade dos multiproprietários; VII -
pagamento, por conta do condomínio edilício ou voluntário, com os fundos comuns
arrecadados, de todas as despesas comuns.
Os arts. 1.358-O até 1.358-U estabelecem as disposições gerais acerca das unidades
autônomas de condomínios edilícios. O condomínio edilício pode adotar a modalidade
multipropriedade através de previsão no instrumento de instituição ou deliberação da maioria
absoluta dos condôminos.
II – PROPRIEDADES TEMPORÁRIAS
Como regra geral, a propriedade é perpétua, perene, mas a lei prevê algumas formas de
propriedade especial que são temporárias: a propriedade resolúvel e a propriedade fiduciária.
235
1. Propriedade resolúvel
Entende-se por propriedade resolúvel aquela que pode ser resolvida pelo implemento de
uma condição resolutiva ou pelo termo final (lembre-se da escala ponteana, degrau da eficácia
e subordinação dos efeitos a elementos acidentais). Uma vez resolvida a propriedade, o
proprietário a quem beneficia da resolução pode reivindicar a coisa em poder de quem ela
esteja.
Ex.: compra e venda com cláusula de retrovenda (vendedor se reserva o direito de
recomprar dentro de certo prazo – até 3 anos). Neste caso, a propriedade do comprador é
resolúvel até se operar o prazo de 3 anos.
Ex.: venda com reserva de domínio. Até o pagamento final das parcelas, a propriedade do
comprador é resolúvel.
Ex.: disposição testamentária com cláusula de fideicomisso e o direito do fiduciário – art.
1.953, CC
Deve-se observar que a propriedade resolúvel deve estar inscrita no Cartório de Registro
de Imóveis para que produza efeitos perante terceiros.
Se a resolução da propriedade se deu por fato superveniente – no caso da doação com
encargo, havendo descumprimento do encargo, é possível a resolução da doação pela
ingratidão – e tiver havido a alienação da propriedade – o donatário tiver alienado – o doador
(antigo proprietário) não poderá se valer da reivindicação contra o terceiro adquirente, mas
poderá se utilizar de ação contra o ingrato, para reembolso do valor do bem.
2. Propriedade fiduciária
Propriedade fiduciária é “a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível, que o
devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor. Trata-se, portanto, do contrato de
alienação fiduciária de bens móveis” 68.
No caso da alienação fiduciária, a propriedade é resolúvel por uma causa contida no
próprio título de propriedade, que se fundamenta em um contrato de alienação fiduciária em
garantia. Geralmente utilizado com relação a veículos. O devedor (fiduciante), embora
mantenha a posse direta do bem, transfere a propriedade do mesmo ao credor (fiduciário). Art.
1.361, CC + Decreto-lei 911/1969. O devedor pode se utilizar da coisa, mas deve guardá-la com
diligência (art. 1.363, CC).
A propriedade fiduciária configura-se pelo registro do título no Registro de Títulos e
documentos ou, no caso de veículos, junto ao DETRAN e no ato constitutivo/contrato, deve
constar o valor da dívida, o prazo para pagamento, a taxa de juros, descrição da coisa, etc. (art.
1.362, CC).
68
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 883.
236
Com a quitação da dívida a propriedade transfere-se das mãos do credor para o devedor
(fiduciante) (art. 1.361, §3.º). Se não for quitada, o credor deve alienar judicial ou
extrajudicialmente o bem e, com o produto, pagar seu crédito e entregar o saldo ao devedor
(art. 1.364, CC), sendo vedado o pacto comissório (art. 1.365,CC), ou seja, ficar com a coisa se a
dívida não for paga. Se a venda não for suficiente para saldar a dívida, fica o devedor obrigado
com relação ao restante (art. 1.366, CC).
A propriedade fiduciária em garantia de bens móveis ou imóveis, segundo o art. 1.367, CC:
“sujeita-se às disposições do Capítulo I do Título X do Livro III da Parte Especial deste Código e,
no que for específico, à legislação especial pertinente, não se equiparando, para quaisquer
efeitos, à propriedade plena de que trata o art. 1.231”. As disposições do CC indicadas são as
constantes nos arts. 1.419 a 1.430, CC.
No que diz respeito a bens imóveis, aplica-se a lei 9.514/97, art. 22 e seguintes. Se a dívida
vencer e não for paga total ou parcialmente, tendo sido constituído em mora o fiduciante,
consolida-se a propriedade do imóvel em nome do fiduciário (art. 26). Neste caso, o devedor será
intimado para em 15 dias pagar a dívida. Caso seja purgada a mora, o contrato de alienação
fiduciária convalesce. Não sendo purgada, haverá a consolidação da plena propriedade nas
mãos do fiduciário, comprovando-se a quitação do imposto de transmissão. Em seguida, o
fiduciário, no prazo de 30 dias, a contar da averbação na matrícula da consolidação da
propriedade, deve promover leilão do imóvel. Não havendo oferta ou se esta for menor que o
valor do imóvel, realizar-se-á segundo leilão em 15 dias. Se mesmo vendido o bem, o valor
apurado não for suficiente para saldar a dívida, o devedor segue responsável pelo restante.
Prevê o §5.º do art. 27 que se após duas tentativas, em dois leilões, o maior lance não for igual ou
superior ao valor da dívida, despesas, prêmios de seguro e encargos, a dívida considera-se
extinta e o credor exonerado de indenizar benfeitorias.
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
238
06. Direitos reais sobre coisa alheia. Direito real de aquisição. Direitos reais de garantia.
1.1. Superfície
Pelo direito de superfície, o proprietário do imóvel concede a outrem, por tempo
determinado ou indeterminado, o direito de construir sobre seu terreno. Essa autorização pode
se dar de forma gratuita ou onerosa, mas sempre por escritura pública, que deve ser registrada
no Cartório de Registro de Imóveis (art. 1.369, CC) e autoriza apenas o uso do solo para cima, não
autorizando o uso do subsolo.
No direito de superfície, estão presentes as seguintes figuras: fundieiro ou concedente,
que é o proprietário do imóvel; superficiário, que recebe a coisa, podendo nela plantar ou
construir, além de poder usar e gozar do imóvel pelo período previsto na escritura pública. Essa
transmissão do direito de uso e gozo, pode ser de forma gratuita ou onerosa, permanente ou
temporária, sendo o superficiário responsável pelo pagamento dos tributos relativos ao imóvel.
O direito de superfície pode ser transmitido a terceiros ou a herdeiros, em caso de morte
do superficiário. Em qualquer caso, o concedente (fundieiro) não tem direito a receber
pagamento pela transferência. Contudo, em caso de alienação do terreno ou do direito de
superfície, terão direito de preferência o superficiário e o concedente, respectivamente.
Ocorre a extinção do direito real de superfície pelo advento do termo previsto (quando por
prazo determinado), podendo, também, ocorrer a extinção pela destinação diversa para a qual
foi concedida. Havendo extinção, o direito de uso e gozo retorna para o proprietário do terreno.
Consolida-se a plena propriedade, inclusive sobre as obras, benfeitorias e acessões realizadas
239
sobre o terreno, independentemente de indenização, salvo se pactuada na escritura pública
(art. 1.375, CC).
1.2. Servidão
A servidão é o direito real pelo qual os proprietários de dois imóveis estabelecem, através
de escritura pública ou por testamento, devidamente registrada no Cartório de Registro de
Imóveis, a concessão de benefícios de um imóvel para o outro. Geralmente a servidão é de
passagem, que beneficia o prédio encravado, gravando o prédio serviente, com o direito de
usar/passar pelo prédio de outra pessoa.
A servidão pode se constituir, também, através de usucapião, pois, nos termos do art. 1.379,
CC, o exercício inconstestado de uma servidão aparente por 10 anos, autoriza a registrar a
servidão no Registro de Imóveis, valendo a sentença como título. Se não houver título, o prazo
de usucapião será de 20 anos.
Na servidão, estão presentes as seguintes figuras: prédio serviente, que é o imóvel sobre o
qual se institui a servidão, para beneficiar ao prédio dominante, que é aquele que tem a
servidão a seu favor.
A doutrina traz as seguintes características para a servidão: predialidade, pois as servidões
incidem sobre imóveis; acessoriedade, pois elas dependem da existência do prédio sobre o
qual recaem para existir (não existem sozinhas); ambulatoriedade, pois em caso de alienação
do imóvel serviente, a servidão acompanha a transmissão; indivisibilidade, não podendo se
adquirir ou perder por partes; perpetuidade, não se estabelece por tempo determinado,
embora possa ser extinta a servidão.
A ação confessória é o meio através do qual se reconhece o direito à servidão e a ação
negatória é o meio de afastar a pretensão do proprietário do prédio serviente de estabelecer
servidão.
A servidão é diferente da passagem forçada. A primeira é facultativa, enquanto a segunda
é compulsória e exige pagamento de indenização. A servidão é direito real de gozo ou fruição e
a passagem forçada, instituto do direito de vizinhança. A passagem forçada aplica-se a casos de
prédio que não tem acesso a via pública. A servidão pode ser instituída para melhorar o uso do
imóvel dominante.
A servidão classifica-se em: urbana ou rústica; positiva ou negativa; contínua ou
descontínua; aparente ou não aparente.
Urbana é a servidão de imóvel urbano. Rústica é a servidão que incide sobre imóvel rural.
Positiva é a servidão que concede um direito de ação, como, por exemplo, a passagem.
Negativa é a servidão que determina um dever de abstenção, como por exemplo, não plantar
árvores para não gerar sombra no canteiro vizinho (pouco usada) ou não construir sobre o
terreno.
240
Contínua é a servidão quando seu exercício independe da ação, ocorrendo por fato da
natureza, como é o caso passagem de luz ou de som. Descontínua é a servidão que depende
de ação, como no caso da servidão de trânsito/passagem.
Aparente é a servidão que se manifesta por obras visíveis, como o caminho traçado pelo
trânsito, o aqueduto, etc. Não aparente é a servidão que não tem visibilidade, que é a que
ocorre quando há trânsito, mas sem caminho marcado.
Somente pode haver posse de servidão aparente, sendo possível sua aquisição por
usucapião e proteção possessória. Neste sentido é a súmula 415 do STF: “Servidão de trânsito
não titulada, mas tornada permanente, sobretudo pela natureza das obras realizadas,
considera-se aparente, conferindo direito à proteção possessória”.
O art. 1.381, CC prevê que o dono do prédio dominante pode realizar as obras necessárias a
conservação e ao uso da servidão. As despesas, neste caso, serão do(s) proprietário(s) do(s)
prédio(s) dominante(s).
O dono do prédio serviente não pode embaraçar o uso da servidão (art. 1.383, CC), de
forma que em se tratando de servidão de passagem, não poderá impedir o exercício regular.
Contudo, poderá impedir a passagem de veículos se o convencionado for passagem a pé. O
prédio serviente deve sofrer a menor restrição, assim, o uso da servidão deve limitar-se a
necessidade do prédio dominante. Mas se a servidão por de passagem de caminhões, por
exemplo, entende-se abrangida a passagem de carros e a pé. Mais, o exercício da servidão deve
ocorrer no local estipulado e não em local diverso, admitindo-se a alteração de local, conforme o
art. 1.384,CC, nas hipóteses de ser realizada pelo dono do prédio serviente e à sua custa, se em
nada diminuir as vantagens do prédio dominante; ou pelo dono do prédio dominante e à sua
custa, se houver considerável incremento da utilidade e não prejudicar o prédio serviente.
Por natureza a servidão é indivisível e, havendo divisão do prédio serviente, ambos
responderão pela servidão e, se a divisão for do prédio dominante, ambas as partes seguem se
beneficiando da servidão (art. 1.386, CC).
Segundo o art. 1.387, CC, a servidão pode ser extinta pelo cancelamento no Cartório de
Registro de Imóveis, em razão de determinação legal ou desapropriação. O art. 1.388, CC prevê
as hipóteses que autorizam que o dono do prédio serviente peça o cancelamento judicial do
registro da servidão: quando o titular houver renunciado a sua servidão; quando tiver cessado,
para o prédio dominante, a utilidade ou a comodidade, que determinou a constituição da
servidão; quando o dono do prédio serviente resgatar a servidão. Além disto, o art. 1.389, CC
prevê as hipóteses de cancelamento da servidão, mediante a prova da extinção: pela reunião
dos dois prédios no domínio da mesma pessoa; pela supressão das respectivas obras por efeito
de contrato, ou de outro título expresso; pelo não uso, durante dez anos contínuos.
241
1.3. Usufruto
O usufruto concede a terceiro o direito de usar e fruir da coisa alheia por determinado
período de tempo. Assim, acaba determinando que a propriedade se torne nua, pois o
proprietário tem os direitos de dispor e reivindicar, mas não pode usar, nem fruir do bem que
lhe pertence. Daí decorre que: o direito de usar, de locar o imóvel é do usufrutuário. Por outro
lado, o direito de vender o imóvel é do nu-proprietário. A ação reivindicatória só pode ser
proposta pelo nu-proprietário, pois só ele possui o direito de reivindicar. As ações possessórias
podem ser manejadas por ambos, pois o usufrutuário tem a posse direta e o nu-proprietário a
posse indireta da coisa.
Segundo o art. 1.390, CC o usufruto pode recair sobre bens móveis ou imóveis (um ou
vários), inclusive sobre todo o patrimônio. Em se tratando de usufruto de bem imóveis,
necessita de registro no Cartório de Registro de Imóveis, podendo ser objeto de aquisição via
usucapião.
O usufruto é inalienável, mas seu exercício pode ser objeto de cessão gratuita ou onerosa
(art. 1.383, CC).
O usufruto classifica-se em:
1) quanto ao modo de constituição. Judicial é o usufruto requerido pelo exequente em
processo de execução, que entende que, dessa forma, terá a satisfação de seu crédito. Legal é o
determinado pela lei, como nos casos de bens de propriedade dos filhos menores de idade,
onde o usufruto pertence aos seus pais enquanto durar o poder familiar (art. 1.689, I, CC).
Convencional é o instituído unilateralmente, através de testamento ou por acordo de vontades,
em um contrato. Por usucapião ocorreria na hipótese em que aquele que constituiu o usufruto
não era proprietário da coisa.
2) quanto ao objeto. Próprio é quando a mesma coisa entregue ao usufrutuário é
devolvida ao nu-proprietário. Impróprio é quando o usufruto recai sobre coisa consumível,
sendo outra de mesma espécie, qualidade e quantidade restituída ao nu-proprietário.
3) quanto à duração. Vitalício é o usufruto que dura a vida toda do usufrutuário,
extinguindo-se pela sua morte. Por prazo determinado é quando houver um prazo de duração.
4) quanto ao número de usufrutuários. Individual é o usufruto que beneficia apenas uma
pessoa. Simultâneo é o exercido por mais de uma pessoa.
Os arts. 1.394 a 1.399 do CC estabelecem os direitos do usufrutuário quanto a possuir, usar
e fruir da coisa, podendo cobrar dívidas quando o usufruto for de títulos de crédito; receber os
frutos naturais pendentes no tempo da instituição do usufruto; receber os frutos civis que se
venceram na data final do usufruto. Além disto, poderá o usufrutuário alterar a destinação
econômica do prédio desde que tenha autorização expressa do proprietário.
Os arts. 1.400 a 1.409 do CC estabelecem os deveres do usufrutuário, que envolvem,
principalmente, inventariar os bens que receber, determinando o estado em que se acham, e
242
dar caução, fidejussória ou real, se for exigida, de velar-lhes pela conservação, e entregá-los
findo o usufruto. Não é obrigado a dar caução o doador que se reserva do usufruto da coisa
doada. Se o usufrutuário não puder prestar a caução exigida, perde o direito de administrar a
coisa, ficando essa função nas mãos do nu-proprietário que, então, deverá, mediante caução,
entregar os rendimentos ao usufrutuário. O usufrutuário deve responder pelas despesas de
conservação da coisa, mas não responde pelas deteriorações do uso regular. Importante a
disposição do art. 1.408, CC que determina que no caso de destruição do prédio, não é obrigado
o nu-proprietário a reconstruir a coisa. Mas se houver sua reconstrução em razão da indenização
do seguro, o usufruto se restabelece.
Extingue-se o usufruto nos casos previstos nos arts. 1.410 e 1.411, CC, mediante
cancelamento do registro no Cartório de Registro de Imóveis: I - pela renúncia ou morte do
usufrutuário; II - pelo término do prazo; III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o
usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se
começou a exercer; IV - pela cessação do motivo de que se origina; V - pela destruição da coisa;
VI - pela consolidação; VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar
os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos
de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art.
1.395; VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai. No caso de usufruto
simultâneo, com a morte de um dos usufrutuários, salvo disposição expressa em sentido
contrário, extingue-se o usufruto sobre a parte do falecido.
1.4. Uso
O uso envolve o direito de utilizar a coisa para seu próprio bem. Por exemplo, uso de jazigo
em cemitério. Por se tratar de direito real, deve estar inscrito no Cartório de Registro de Imóveis
(até para diferenciar da locação).
Teoricamente não envolve o direito de fruir (neste caso, seria usufruto), mas o art. 1.412, CC
determina a possibilidade de fruir quando as necessidades do usuário ou da família exigirem.
Por fim, aplicam-se as regras de usufruto ao uso no que forem cabíveis.
1.5. Habitação
O direito real de habitação envolve o direito de usar a coisa para fins de moradia. Não
permite alugar, nem emprestar a coisa, apenas habitar na coisa alheia. Se for constituído em
favor de várias pessoas, todas podem exercer o direito, sem impedir as demais e, se uma delas
habitar sozinha, não terá dever de pagar aluguel às demais.
Em se tratando de direito real de habitação convencional, o instrumento de instituição
deverá ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis. Todavia, em se tratando de direito real
243
de habitação legal, não haverá essa necessidade, como no caso do art. 1.831, CC (direito real de
habitação do cônjuge/companheiro sobrevivente no imóvel de residência do casal).
1.6. Laje
O direito real de laje está previsto nos arts. 1.510-A a 1.510-E do CC e refere-se à
possibilidade do proprietário de uma construção base ceder a superfície superior ou inferior de
sua construção para terceiro edificar unidade distinta daquela originariamente construída sobre
o solo.
O titular do direito real de laje poderá abrir matrícula própria no Registro de Imóveis, mas
não será titular de parcela ideal do terreno. Terá apenas o direito de laje (construir sobre a
construção já existente). A construção base e o terreno pertencerão ao proprietário do imóvel
base.
1.7. Enfiteuse
A enfiteuse passou a ser vedada pelo CC/2002, nos termos do art. 2.038, embora não tenha
extinto as já existentes. Trata-se de instituto antigo no Direito brasileiro e que envolve a divisão
da propriedade em titularidade do imóvel (domínio direto) e direito de uso, gozo, disposição e
fruição, considerado domínio útil. Assim, o enfiteuta ou foreiro, titular do domínio útil, poderia
construir sobre imóvel de propriedade de terceiro (senhorio ou enfitente), que teria direito a
receber anualmente um valor fixo, chamado de foro.
244
Os artigos 1.419 a 1.510 do CC tratam de direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e
anticrese. Tais direitos referem-se a garantias reais – vinculação a um bem – para pagamento de
dívidas. Assim, estabelecem uma vinculação entre o credor e uma coisa dada em garantia para
cumprimento de uma obrigação.
Os direitos reais de garantia referem-se a hipoteca, penhor e anticrese, enquanto formas
de deixar bens em garantia de dívidas. Trata-se de uma garantia mais formal do cumprimento
da obrigação, já que, se não quitada pelo devedor, autoriza o credor a satisfazer seu crédito
sobre o bem deixado em garantia. Já a fiança e o aval também são garantias para pagamento
de dívidas, mas obrigam as pessoas, pois são relações pessoais.
Apenas quem tem poder de alienar a coisa é que pode dá-la em garantia (art. 1.420).
Havendo condomínio sobre a coisa, ela não pode ser dada, em sua totalidade, em garantia, mas
a parte do condômino pode.
Constitui-se a garantia real sobre coisa imóvel quando o contrato é levado a registro. No
caso dos móveis, havendo a tradição, se a lei não exigir, também, o registro.
Assim, havendo inadimplemento, o credor deverá levar o bem a leilão (se móvel) ou praça
(se imóvel), sendo vedado o pacto comissório, ou seja, que o credor poderá ficar com a coisa em
pagamento da dívida, sendo nula a cláusula que contenha tal previsão (art. 1.428, CC). O valor
obtido com a alienação judicial será utilizado para quitar o débito. Se superior, devolve-se ao
devedor o saldo. Se inferior, permanece o débito quanto ao saldo. Pode o credor, após o
vencimento da dívida, dar a coisa em pagamento (art. 1.428, § único).
Os credores com garantia real terão preferência para receber seus créditos quando
houver concurso de credores.
Pagamentos parciais do débito não exoneram a parte correspondente da garantia, ou
seja, enquanto não for quitada a totalidade da dívida, não será liberada a garantia.
Considera-se vencida a dívida de forma antecipada (art. 1.425, CC): I - se, deteriorando-se,
ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, não a
reforçar ou substituir; II - se o devedor cair em insolvência ou falir; III - se as prestações não
forem pontualmente pagas, toda vez que deste modo se achar estipulado o pagamento. Neste
caso, o recebimento posterior da prestação atrasada importa renúncia do credor ao seu direito
de execução imediata; IV - se perecer o bem dado em garantia, e não for substituído; V - se se
desapropriar o bem dado em garantia, hipótese na qual se depositará a parte do preço que for
necessária para o pagamento integral do credor.
No caso de falecimento do devedor, seus sucessores não poderão resgatar parcialmente o
penhor ou hipoteca. Deverão saldar o total e se sub-rogar nos direitos do credor sobre as quotas
dos demais herdeiros.
245
3.1. Penhor
O penhor é uma forma de garantia real sobre bem móvel, através da qual o devedor
entrega ao credor o bem, sendo, ainda, exigido o registro do instrumento de penhor no Cartório
de Títulos e documentos (art. 1.432). O credor é chamado de credor pignoratício. No caso dos
penhores especiais tratados abaixo, o próprio devedor fica na posse da coisa, funcionando como
um depositário.
Penhor é diferente de penhora. Penhor é direito real de garantia. Penhora é garantia
judicial de dívida (instrumento processual).
O art. 1.433, CC estabelece os direitos do credor pignoratício: I - à posse da coisa
empenhada; II - à retenção dela, até que o indenizem das despesas devidamente justificadas,
que tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua; III - ao ressarcimento do prejuízo que
houver sofrido por vício da coisa empenhada; IV - a promover a execução judicial, ou a venda
amigável, se lhe permitir expressamente o contrato, ou lhe autorizar o devedor mediante
procuração; V - a apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu poder; VI
- a promover a venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que haja receio
fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, devendo o preço ser depositado. O
dono da coisa empenhada pode impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou oferecendo
outra garantia real idônea. O credor só deve devolver a coisa após o pagamento integral da
dívida.
O credor pignoratício tem como obrigações: I - à custódia da coisa, como depositário, e a
ressarcir ao dono a perda ou deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na
dívida, até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade; II - à defesa da posse da
coisa empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das circunstâncias que tornarem necessário o
exercício de ação possessória; III - a imputar o valor dos frutos, de que se apropriar (art. 1.433,
inciso V) nas despesas de guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida,
sucessivamente; IV - a restituí-la, com os respectivos frutos e acessões, uma vez paga a dívida; V
- a entregar o que sobeje do preço, quando a dívida for paga, no caso do inciso IV do art. 1.433.
O penhor extingue-se pela extinção da obrigação; pelo perecimento da coisa; pela
renúncia do credor; pela confusão, na mesma pessoa, do credor e dono da coisa; através de
adjudicação judicial, remissão ou venda da coisa empenhada (art. 1.436, CC). A produção de
efeitos da extinção ocorre a partir do cancelamento do registro (art. 1.437).
O penhor possui formas especiais: penhor rural; penhor industrial e mercantil; penhor de
direitos e títulos de crédito; penhor de veículos; penhor legal.
Penhor rural.
É o penhor agrícola ou pecuário, que se constitui por meio de instrumento público ou
particular a ser registrado no CRI. O penhor agrícola, que pode recair sobre máquinas,
246
implementos, colheitas pendentes, frutos armazenados, lenha cortada, carvão vegetal, animais
de serviço, tem prazo máximo de 3 anos, prorrogável por igual prazo. O penhor pecuário, que
pode recair sobre animais que integram a atividade pastoril, agrícola ou de laticínios, tem prazo
máximo de 4 anos, também prorrogável por igual prazo.
Admite-se a emissão de um título de crédito – cédula rural pignoratícia – quando o
devedor compromete-se a pagar a dívida em dinheiro. O credor pignoratício rural tem direito
de inspecionar a coisa empenhada, já que ela permanece nas mãos do devedor como
depositário.
Os animais podem ser alienados com autorização do credor. Havendo notícia de
pretensão de alienação dos animais sem autorização do credor, este poderá requerer que sejam
os animais depositados sob a guarda de terceiro. Se os animais empenhados morrerem e outros
forem comprados no lugar para substituí-los, estes serão sub-rogados no lugar.
Penhor de veículos.
Veículos de qualquer espécie de transporte ou condução são passíveis de penhor, pelo
prazo máximo de 2 anos, prorrogável por igual prazo, constituído através de instrumento
247
público ou particular a ser levado a registro no Cartório de Títulos e Documentos e anotado no
certificado de propriedade. Como penhor especial, o bem fica na posse do devedor.
Penhor legal.
O art. 1.467, determina que são credores pignoratícios, independentemente de convenção:
I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, jóias ou
dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas casas ou
estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí tiverem feito; II - o dono do prédio rústico
ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo
prédio, pelos aluguéis ou rendas.
Nestes casos, o credor pode tomar em garantia um ou mais objetos para chegar ao valor
da dívida, requerendo homologação judicial.
3.2. Hipoteca
A hipoteca é uma garantia real que recai, como regra, sobre imóveis, podendo incidir,
também, sobre alguns móveis previstos na lei. Pode recair, ainda, sobre direitos reais. Necessita
de registro no Cartório de Registro de Imóveis. Admite-se a emissão de cédula hipotecária, nos
termos do art. 1.484, CC.
A hipoteca pode ser convencional ou legal, conforme resulte ou não da vontade das
partes.
Na hipoteca, o bem se mantém nas mãos do devedor, sendo vedada/nula cláusula que
proíba o proprietário de vender o imóvel. Além disto, pode ser constituída mais de uma
hipoteca sobre o mesmo imóvel.
O art. 1.473 estabelece que podem ser objeto de hipoteca: I - os imóveis e os acessórios dos
imóveis conjuntamente com eles; II - o domínio direto; III - o domínio útil; IV - as estradas de
ferro; V - os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se
acham; VI - os navios; VII - as aeronaves; VIII - o direito de uso especial para fins de moradia; IX - o
direito real de uso; X - a propriedade superficiária.
No caso de existirem várias hipotecas sobre o mesmo bem, vencendo-se a segunda
hipoteca, a execução só pode correr após o vencimento da primeira, salvo nas hipóteses de
insolvência do devedor. Há, portanto, um direito de preferência no recebimento das hipotecas.
A hipoteca estabelece o direito de sequela, ou seja, não impede a venda do bem, mas permite
ao titular que busque a coisa nas mãos de quem se encontrar. O adquirente pode exonerar-se,
pagando a dívida ou abandonando ao credor hipotecário o imóvel.
A hipoteca poderá ser prorrogada por até 30 anos da data do contrato, desde que
requerida a averbação por ambas as partes. Após este prazo, necessitará reconstituição por
novo título e novo registro, mantendo a precedência sobre outras hipotecas. Art. 1.485, CC.
248
Admite-se a instituição de hipoteca para garantia de dívida futura, nos termos do art.
1.487, CC, desde que estabeleça o valor máximo do crédito a ser garantido.
Súmula 308, STJ: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior
ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os
adquirentes do imóvel”.
A hipoteca legal ocorre nos casos previstos no art. 1.489, CC, que determina que a lei
confere hipoteca: I - às pessoas de direito público interno (art. 41) sobre os imóveis pertencentes
aos encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos fundos e rendas; II -
aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras núpcias, antes de fazer o
inventário do casal anterior; III - ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do
delinqüente, para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais;
IV - ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha, sobre o imóvel
adjudicado ao herdeiro reponente; V - ao credor sobre o imóvel arrematado, para garantia do
pagamento do restante do preço da arrematação.
Segundo o art. 1.497, CC as hipotecas legais dependem de registro para que produzam
seus efeitos e, somente a partir de então constituem-se de direito real.
A hipoteca extingue-se: I - pela extinção da obrigação principal; II - pelo perecimento da
coisa; III - pela resolução da propriedade; IV - pela renúncia do credor; V - pela remição; VI - pela
arrematação ou adjudicação. Além disto, extingue-se a hipoteca pela averbação do
cancelamento do registro.
As hipotecas das vias férreas serão registradas no local onde estiver localizada a estação
inicial da linha.
3.3. Anticrese
Anticrese é o direito real pelo qual o devedor entrega ao credor o bem imóvel, autorizando
que ele perceba os frutos e rendimentos da coisa, compensando na dívida. Para sua
constituição, necessário que o contrato onde há o ajuste da garantia, seja registrado no Cartório
de Registro de Imóveis. Anualmente, o credor anticrético deve fazer balanço do que tiver
recebido. O credor pode arrendar o imóvel a terceiro, mantendo direito de retenção do imóvel
até que seja paga a dívida. Eventuais deteriorações que o imóvel sofrer por culpa do credor
anticrético, serão por ele respondidas, assim como os frutos que não forem percebidos.
Extingue-se a anticrese quando liquidada a dívida.
249
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
250
interesse que o Estado tem na proteção da família como célula básica, de especial importância
na sociedade e para que o próprio Estado se mantenha.
ATENÇÃO: as questões podem conter expressões como “ramo do direito civil com viés
publicista” – estaria verdadeira. Se, contudo, contiver a expressão “ramo do direito público” –
está errada.
251
ATENÇÃO: muitas questões podem ser resolvidas lembrando das características do direito de
família. Ex.: irrenunciabilidade do direito a alimentos; irrevogabilidade do reconhecimento de
filiação (pode ser anulado, mas apenas nos casos de comprovação de erro ou coação).
DIREITO MATRIMONIAL
Até a Proclamação da República, em 1889 – apenas casamento religioso.
1891 – surgimento do casamento civil
Código Civil de 1916 – casamento como única forma de constituição de família, não
havendo outra forma de convívio que fosse aceitável. O casamento era indissolúvel.
Desquite – possibilidade de romper com o casamento, mas que não dissolvia o vínculo
matrimonial, impedindo, portanto, novo casamento. Em razão do desquite e da impossibilidade
de constituição de novo casamento, diversas famílias informais passaram a ser constituídas,
sem que houvesse regulamentação do Estado nesse sentido.
Lei do Divórcio (lei 6.515/1977) – estabeleceu o divórcio e a separação judicial. (o desquite
foi transformado em separação e, ainda, criado o instituto do divórcio, que dissolvia o vínculo
252
matrimonial, possibilitando, então, novo casamento). A separação rompia com a relação
matrimonial e o divórcio, com o vínculo matrimonial.
CF/88 – passou a considerar como entidades familiares relacionamentos outros, que não a
família formada pelo casamento. Assim, foram reconhecidas as famílias constituídas pela união
estável e as famílias monoparentais, aquelas que são formadas por um dos pais e seus filhos.
Código Civil de 2002 – não inovou na redação, copiando as disposições do Código de 1916,
disciplinando, apenas, situações relativas à união estável e às famílias monoparentais.
EC 66/2010 – alterou o § 6.º do art. 226 da CF e o sistema de dissolução do matrimônio,
deixando de contemplar a separação judicial ou fática como requisito para a extinção do
vínculo conjugal. Assim, tal Emenda Constitucional estabeleceu que o casamento pode ser
dissolvido pelo divórcio, sem a necessidade de implementação de qualquer prazo para tato
(tanto consensual quanto litigioso).
ATENÇÃO: Em termos de divórcio, cuidado para o que a questão pede: ou a visão do Código
Civil (e aí deve-se considerar os prazos) ou a chamada “visão moderna” ou “visão constitucional”
(e, neste caso, considera-se apenas o divórcio).
69
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. Direito de
Família – as famílias em perspectiva constitucional. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 118-119.
253
civil regido pelas normas comuns aos contratos. Aperfeiçoa-se pelo simples consentimento das
partes. Adeptos: Silvio Rodrigues, Caio Mário Pereira, Orlando Gomes, Pablo Stolze Gagliano.
• Mista: Ato complexo, um contrato quando de sua formação e uma instituição no que
diz respeito ao seu conteúdo, existência e efeitos. O casamento-ato é um negócio jurídico e o
casamento-estado é uma instituição. Adeptos: Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Flávio
Tartuce. Esta teoria é a que conta com mais adeptos na atualidade.
70
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 98.
254
Assim, são requisitos a serem provados (IMPORTANTE OBSERVAR):
a) Existência da promessa de casamento feita pelos noivos e não por terceiros.
b) Recusa injustificada de contraí-lo, de forma que é necessário que essa recusa chegue
ao conhecimento do outro noivo;
c) Existência de dano (material ou moral);
d) Nexo causal.
O dano pode ser: moral e/ou material. A desistência injustificada de casar por um dos
nubentes gera o dever de indenizar ao outro se este comprovar que teve despesas com o
casamento (DANO MATERIAL). Mas a ruptura de noivado por si só não determina a
responsabilidade do desistente, o que pode ensejar a reparação moral são as circunstâncias em
que a outra parte foi comunicada de seu intento. Isto porque o não cumprimento da promessa
de casamento não enseja reparação, pois o relacionamento entre duas pessoas é espontâneo,
livre de coação. O DANO MORAL vem sendo reconhecido pelos Tribunais quando o
comportamento atinge bens imateriais caros e importantes, como a dor, a humilhação, o
desprezo, a angústia e agressão à honra e à imagem da pessoa, casos em que, em qualquer
outra hipótese, diversa daquela aqui tratada, a reparação se imporia. IMPORTANTE: Meros
dissabores x humilhação pública. Ex.: chegar no altar e dizer: aceita fulana como sua legítima
esposa? “Bem, pra ser franco, não!”. O noivo vai embora e deixa a noiva na frente do padre e dos
convidados.
O dano moral está sendo deferido apenas em casos excepcionais, quando reste
evidente a humilhação e exposição de um dos nubentes a situações vexatórias.
5. Espécies de casamento:
São admitidas duas formas de casamento (art. 226, § 1.º e § 2.º, CF): o civil (art. 1.512, CC) e o
religioso com efeitos civis (art. 1.515 e 1.516, CC). Existem ainda outras modalidades especiais de
casamento: o casamento por procuração, o nuncupativo, o putativo, o homossexual, o consular,
o de estrangeiros.
• Civil: Realizado perante o oficial do Cartório do Registro Civil, pelo juiz de paz. É ato
solene levado a efeito por um celebrante e na presença de testemunhas. Pode ser realizado nas
dependências do Cartório ou em outro local. É previsto pela Constituição no art. 226, § 1.º e no
art. 1.512, CC. A celebração é gratuita para as pessoas cuja pobreza for declarada, incluindo a
habilitação, o registro e a primeira certidão de casamento (art. 1.512, § único, CC).
• Religioso com efeitos civis: O casamento religioso com efeitos civis foi reconhecido, no
Brasil, com a Constituição de 1934, que estabeleceu que o casamento religioso, celebrado
perante um ministro de qualquer religião, produzirá os mesmos efeitos do casamento civil,
255
desde que fosse procedida a habilitação. A CF/88 também faz esta previsão (art. 226, § 2.º),
desde que preenchidos certos requisitos (arts. 1.515 e 1.516, CC). Não é necessária a celebração do
ato civil, basta que o matrimônio realizado pelo ministro de Deus (de qualquer religião, não só o
casamento católico) seja registrado no Cartório de Registro Civil. Para tanto, devem ser
obedecidos os requisitos da habilitação (antes ou depois do ato religioso). Os efeitos civis são
admitidos a partir do registro e a qualquer tempo, retroagindo a data da celebração da
solenidade religiosa (art. 1.515, CC). No caso de prévia habilitação, o prazo para registro é de 90
dias. Depois desse prazo é possível o registro, desde que efetuada nova habilitação. Portanto,
realizado o casamento religioso, poderá ser inscrito no registro civil, bastando que seja feita a
devida habilitação junto a autoridade competente (art. 1.516, CC). Se o casamento religioso for
anulado, em tendo sido procedido o registro civil do mesmo, tal não afeta a validade deste. Se
entre a celebração do casamento religioso e o registro um dos cônjuges casar no civil com
terceiro, há impedimento para efetuar o registro (art. 1.516, § 3.º, CC), pois haveria bigamia, neste
caso.
• Por procuração: art. 1.542, CC. O instrumento procuratório deve ser público e com
poderes especiais (constar expressamente que é para casar com Fulano de Tal). A procuração é
válida por 90 dias. A revogação da procuração também é por instrumento público. Se a
revogação não chegar ao conhecimento do mandatário e o casamento for celebrado o
mandante responde por perdas e danos. Revogado o mandato a lei determina que o
casamento é anulável (art. 1.550, V, CC). Há a possibilidade de o casamento ter validade na
hipótese de, mesmo sendo revogado o mandato, ocorrer a coabitação entre os cônjuges. O
contato sexual entre os cônjuges é que dá a validade ao casamento (não significa que o
casamento se consuma na noite de núpcias, mas quer evitar que exista o uso malicioso desse
expediente, conseguindo favores sexuais do cônjuge).
256
sentença que o desconstitui. Com relação aos filhos todos os efeitos se operam. Havendo a boa-
fé, sendo o casamento nulo ou anulável, a sociedade conjugal dissolve-se, como se tivesse
ocorrido a morte de um dos cônjuges (o de má-fé), se partilhando os bens. No caso de ambos
estarem de boa-fé, o pacto antenupcial deve ser observado na partilha. Se a nulidade for
decretada após a morte de um dos cônjuges, o outro herda normalmente. Em caso de morte: a)
decretada a nulidade antes da morte, o sobrevivente não herda, pois o término do casamento e
do regime de bens ocorreu com a sentença que declarou a nulidade ou anulação do
matrimônio; b) se a nulidade for decretada após a morte de um dos cônjuges, o outro herda
normalmente. Se o cônjuge morre após a anulação, não herdará. Se o casamento putativo for
de um bígamo, morrendo este, ambos os cônjuges serão herdeiros e a meação será divida
entre ambos (25% para cada um).
257
licença para casar deve ser baseada em fundamentos sérios e justificáveis, de maneira que
se for diferente, poderá o juiz conceder a licença (art. 1.519, CC).
Indivíduo emancipado não precisa da autorização dos genitores.
Segundo o art. 1.520, CC, pela redação trazida pela lei 13.811/2019, é vedado, em qualquer
hipótese, o casamento de quem não completou a idade núbil (menor de 16 anos).
Mas e há uma idade limite para o casamento? O CC não estabelece idade limite, mas,
estabelece que aquele que tiver mais de 70 anos terá de casar sob o regime da separação
obrigatória de bens (art. 1.641, II, CC).
• Autorização dos pais, curador ou tutor Art. 1.517, CC. A necessidade de consentimento é
para nubentes entre 16 e 18 anos (quando atinge a maioridade civil). Se o menor for
emancipado, não precisa de autorização dos pais para casar. O interdito precisa de autorização
do curador. Até a celebração do casamento a autorização emitida pelos responsáveis pode ser
revogada (Art. 1.518, CC).
• Declaração firmada pelos nubentes (ou por procurador com poderes especiais), com o
fim de esclarecer o estado civil, profissão, filiação e domicílio (seu e de seus pais). No caso de os
nubentes residirem em locais diferentes, a publicação dos editais deve ocorrer em ambos os
lugares;
258
nulo ou anulado, deve apresentar a sentença, com trânsito em julgado, que anulou ou declarou
nulo o casamento anterior. O divorciado deve apresentar o registro da sentença de divórcio.
Processo de habilitação:
A habilitação ocorre no Registro Civil, com a audiência do Ministério Público – NÃO HÁ
MAIS A NECESSIDADE DE HOMOLOGAÇÃO PELO JUIZ.
Apresentados os documentos ao oficial, os pretendentes requererão certidão de que
estão habilitados para o casamento (Art. 1.517, CC, Art. 67, caput, Lei 6.015/73).
Edital se publicará pela imprensa se houver (Art. 1.527, CC, Art. 67, § 1.º, Lei 6.015/73). Se os
nubentes residirem em circunscrições diversas, o edital deverá ser publicado em ambas (Art. 67,
§ 4.º, Lei 6.015/73).
Função do edital = conhecimento aos terceiros para oposição de impedimento, que
devem ser opostos através de um documento escrito e assinado (Art. 1.529, CC). Esta
oportunidade perdurará até o momento da celebração do casamento.
Se ninguém opuser impedimento o Oficial certificará que os pretendentes estão
habilitados para se casar (Art. 1.531, CC, Art. 67, § 1.º§ 3.º, Lei 6.015/73) dentro dos três meses
imediatos – 90 dias (prazo da habilitação) (Art. 1.532, CC). Não se realizando o casamento nesse
prazo, a habilitação deverá ser renovada.
Oficial do Registro, no processo de habilitação, esclarecer aos nubentes sobre os fatos que
podem invalidar o casamento, bem como sobre os diversos regimes de bens (Art. 1.528, CC).
Havendo oposição = Oficial cientificará os nubentes da nota de oposição, indicando os
fundamentos, as provas e o nome de quem a ofereceu (Art. 1.530, CC). Os nubentes terão direito
ao contraditório e a ampla defesa, tendo prazo razoável para fazer contraprova, bem como
promover ações civis e criminais contra o oponente de má-fé (Art. 67, § 5.º, Lei 6.015/73). A
decisão final será do juiz, com a oitiva dos interessados e do Ministério Público.
8. Celebração do casamento:
Processada a habilitação, estão os nubentes em condições de casar.
259
A celebração é pública, de maneira que qualquer pessoa pode participar da solenidade. O
procedimento de celebração inicia-se pelo requerimento dos nubentes indicando dia, hora e
local onde deverá ser realizado o matrimônio (Art. 1.533, CC).
Via de regra realiza-se o casamento no Cartório. Entretanto pode ocorrer em local diverso,
desde que às portas abertas, para que seja público (Art. 1.534 e § 1.º, CC). No Cartório – 2
testemunhas; Fora do Cartório (ou quando um dos nubentes for analfabeto - Art. 1.534, § 2.º, CC)
– 4 testemunhas.
A cerimônia é celebrada pelo juiz de paz, pessoa escolhida e designada segundo as leis do
Estado, não podendo haver substituição por qualquer outra autoridade.
Juiz de paz pergunta aos nubentes se pretendem casar por livre e espontânea vontade
sim, declarará o celebrante formalizado o casamento, nos termos da segunda parte do Art.
1.535, CC. Neste momento o casamento passa a produzir os efeitos. Maria Berenice Dias defende
que a perfectibilização do ato depende de um duplo requisito: manifestação da vontade das
partes e a declaração do celebrante de que estão casados71.
Se responderem não, manifestarem dúvida (ainda que de brincadeira), a celebração será
suspensa (Art. 1.538, CC).
O registro do casamento deverá conter os dados constantes no Art. 1.536, CC.
Igualdade constitucional = qualquer dos cônjuges pode pode adotar o sobrenome do
outro. Art. 1.565, § 1.º, CC.
9. Provas do casamento:
Prova de casamento celebrado no Brasil = certidão do registro (Art. 1.543, CC); casamento
celebrado no exterior = documento emanado pelo país estrangeiro, devidamente autenticado
pelas autoridades consulares (prazo de 180 dias, a contar da volta para o Brasil, para fazer o
registro do casamento, que deverá ser feito no domicílio do casal ou no 1.º Ofício de Registro
Civil da Capital do Estado (Art. 1.544, CC) – prova direta.
Inexistindo o registro = prova indireta – admitida qualquer outra espécie de prova (Art.
1.543, § único, CC) ação judicial (ação declaratória ou justificação judicial) que visa declarar o
estado de casado. Ex.: Carteira de Identidade onde conste o estado civil de casado. Também
pode ser feita a prova do estado de casado por testemunhas. No caso da ação declaratória, sua
sentença deve ser inscrita no registro civil, que produzirá seus efeitos quanto aos cônjuges e
quanto a seus filhos, desde a data do casamento (Art. 1.546, CC).
71
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 166.
260
Posse do Estado de casados.
Aquelas pessoas que não possam manifestar vontade (por morte ou outra circunstância –
doença mental, por exemplo) e que vivam na posse do estado de casadas – como se casadas
fossem – poderão ter o reconhecimento do casamento, sendo a posse do estado de casadas um
início de prova.
Requisitos: a) nomen: a mulher usa o nome do marido ou vice-versa; b) tractatus: ambos
tratam-se, ostensivamente, como marido e mulher; c) fama: a sociedade dever reconhecer esta
condição dos cônjuges.
I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer
inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros – visa evitar a confusão de
patrimônios. A existência de casamento entre essas pessoas poderia causar dificuldades para a
262
identificação do patrimônio das distintas proles por dificuldade na identificação. Poderá ser
solicitado ao juiz que não aplique a causa suspensiva se comprovado que não houvera prejuízo
aos herdeiros, como no caso de não haver patrimônio a ser partilhado.
II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado,
até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal –
evitar a confusão sanguínea, de maneira que possa nascer um filho nesse período e, caso a
mulher tenha casado novamente, não se saiba qual é o pai. Na verdade, nascendo um filho
nesse período, presume-se seja do primeiro marido. Ver art. 1.597 e 1.598, CC.
III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos
bens do casal – evitar a confusão patrimonial.
IV - o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados
ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou
curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas – evitar que o incapaz case para
isentar o administrador de seus bens da prestação de contas.
Parágrafo único. É permitido aos nubentes solicitar ao juiz que não lhes sejam
aplicadas as causas suspensivas previstas nos incisos I, III e IV deste artigo, provando-se a
inexistência de prejuízo, respectivamente, para o herdeiro, para o ex-cônjuge e para a
pessoa tutelada ou curatelada; no caso do inciso II, a nubente deverá provar nascimento
de filho, ou inexistência de gravidez, na fluência do prazo.
MATRIMÔNIO REALIZADO COM INOBSERVÂNCIA DE CAUSA SUSPENSIVA = imposição
do regime de separação obrigatória (art. 1.641, I, CC).
Juiz e official do
Impedimentos No processo de habilitação registro (de ofício),
Oposição (em até o momento da Ministério Público e
declaração celebração qualquer interessado
escrita, (1.522)
assinada e com Parentes em linha reta
provas) – 1.529 Causas Só no processo de e colateral até 2º grau
suspensivas habilitação, até 15 dias após (consanguíneos ou
os proclamas afins) (1.524)
263
ATENÇÃO:
Impedimento = não PODEM – 1.521
Causa suspensiva = não DEVEM – 1.523
72
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei n.º 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense,
2006, p. 104.
264
Declaração de inexistência: pode ser declarada de ofício. Simplesmente averba-se a
inexistência do ato. Em havendo ação judicial, esta será declaratória (declara a inexistência do
matrimônio) e os efeitos práticos serão os mesmos da nulidade (a seguir veremos).
d. Casamento nulo:
O casamento que for celebrado com a violação dos impedimentos previstos no art. 1.521,
CC será eivado de nulidade. Nesse sentido, o art. 1.548, CC traz as causas de nulidade do
casamento: violação dos impedimentos.
CUIDADO! O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) retirou do rol de
situações de nulidade o casamento quando contraído por enfermo mental desprovido de
discernimento. Referida lei incluiu um parágrafo no art. 1.550, que permite que a pessoa com
deficiência mental ou intelectual em idade núbil possa casar, expressando sua vontade
diretamente ou por meio de seu responsável ou curador.
Quando os nubentes não forem capazes de manifestar de modo inequívoco sua
vontade/consentimento, trata-se de casamento anulável (art. 1.550, IV, CC).
Revela-se nulo o casamento: contraído com inobservância a impedimento (art. 1.521)
73
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 189.
74
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 189.
265
No caso de o casamento ser celebrado por alguém que não esteja investido na função de
juiz de casamento e, embora com essa falta de investidura, desempenha publicamente tal
função, efetuando o registro do casamento, embora, a rigor o ato fosse nulo, a lei sobreleva a
nulidade, nos termos do Art. 1.554, CC.
e. Casamento anulável:
O casamento é anulável quando celebrado em ferimento apenas do interesse de pessoas
que o legislador quer proteger por considerá-las hipossuficientes. A lei não quer o matrimônio
e, se foi contraído, autoriza a dissolução. O silêncio das partes permite que um ato jurídico
defeituoso convalesça, o que equivale a uma ratificação tácita, ou melhor, a uma ratificação
presumida. Art. 1.550, CC. É anulável o casamento:
I - de quem não completou a idade mínima para casar – casos dos menores de 16
anos. Não se anulará, todavia o casamento, por motivo de idade, se dele resultou gravidez (Art.
1.551, CC). O menor poderá confirmar seu casamento quando alcançar os 16 anos, com a
autorização de seus representantes legais ou com suprimento judicial (Art. 1.553, CC). É uma
ratificação do ato, que ocorre com um termo, constando a assinatura do ratificante, duas
testemunhas e os representantes legais, perante o Oficial do Registro Civil e o juiz de paz, sem
necessidade da convalidação judicial. Esse ato não importa em nova celebração do casamento.
Mesmo que não tenha sido ratificado o ato, quando atingida a maioridade, o ato segue gerando
seus efeitos, pois trata-se de ato anulável. Também poderá ser confirmado o matrimônio
quando atingida a maioridade.
Para que haja a anulação do casamento de menores de 16 anos o requerimento deve
partir do próprio cônjuge, por seus representantes legais ou por seus ascendentes (Art. 1.552,
CC).
PRAZO = Art. 1.560, § 1.º, CC: 180 dias, contado o prazo do dia em que o menor completou
16 anos para ele e, da data do casamento para seus representantes legais ou ascendentes.
II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal –
entre 16 e 18 anos deve haver anuência de seus responsáveis (pais) para poderem casar. Se o
menor tiver sido emancipado não é necessário tal consentimento. PRAZO = 180 dias, por
266
iniciativa do incapaz, ao deixar de sê-lo, de seus representantes legais, a partir do casamento, ou
de seus herdeiros necessários, a partir da morte do incapaz. Não poderá haver anulação se os
representantes legais do incapaz tiverem assistido ao ato de celebração do casamento ou
manifestado, de qualquer modo, sua concordância (Art. 1.555, CC).
III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558 – Sem o consentimento o
casamento inexiste, pois é requisito essencial. Mas é necessário que o ato seja livre e
espontâneo, não viciado, a fim de que tenha eficácia.
75
TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2016, p. 9
267
OBSERVAÇÃO: O Estatuto da Pessoa com Deficiência revogou o inciso IV do art. 1.557, CC,
que mencionava a ignorância de doença mental grave, que fosse anterior ao casamento, grave
e desconhecida pelo outro cônjuge. Agora este casamento é válido, visando a inclusão social
das pessoas.
PRAZO NOS CASOS ACIMA: 3 anos (art. 1.560, III, CC), contando da data da celebração do
casamento.
Art. 1.558, CC – Coação: a coação é a pressão física ou moral, ou o constrangimento que
sofre uma pessoa, com o fim de ser obrigada a realizar um ato ou negócio. Ocorre no momento
da celebração do casamento. Somente o cônjuge que sofreu a coação pode demandar a
anulação de casamento, mas a coabitação, havendo ciência do vício, valida o ato. A coação, para
viciar a declaração de vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano
iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens ou temor de morte.
PRAZO: 4 anos a contar da celebração do ato (art. 1.560, IV, CC).
268
hipótese de juiz de paz incompetente o casamento se convalida. Se for outra pessoa (delegado,
ministro, prefeito...) o casamento é inexistente. PRAZO = 2 anos, a contar da data da celebração
(Art. 1.560, II, CC).
PARENTESCO
“Entende-se por parentesco a relação jurídica, calcada na afetividade e reconhecida pelo
Direito, entre pessoas integrantes do mesmo grupo familiar, seja pela ascendência,
descendência, ou colateralidade, independentemente da natureza (natural, civil ou por
afinidade)” (Gagliano e Pamplona Filho).
O parentesco pode ser (art. 1.593, CC): natural ou biológico; civil (adoção ou inseminação,
por exemplo); afetividade (ainda que a legislação não faça previsão, há o reconhecimento desta
modalidade de parentesco pelos Tribunais (decisões que permitem a inclusão de dois Pais ou
duas Mães na certidão de nascimento).
Processo de desbiologização da paternidade-maternidade-filiação – evolução da
engenharia genética deixou de limitar os vínculos de parentesco à verdade biológica.
269
Parentesco natural: Parentesco natural é o que decorre da consanguinidade dos
parentes, ou seja, é o vínculo biológico que liga as pessoas.
Parentesco civil: Parentesco civil é o decorrente da socioafetividade, do parentesco por
adoção, tendo qualquer outra origem, que não seja a biológica (fertilização in vitro, p. ex.).
Parentesco por afinidade: Parentesco por afinidade é o decorrente do casamento e da
união estável, vinculando-se com os parentes do cônjuge ou companheiro. Significa dizer que
somos parentes dos parentes do nosso cônjuge ou companheiro (ou, em uma linguagem
vulgar, com o casamento, o pacote vem completo). Contudo, os afins de um cônjuge não são
afins do outro, nem os parentes colaterais dos afins são parentes em relação àquele. Nesse
sentido o art. 1.595, § 1.º, CC estabelece:
270
O critério para a contagem dos graus é o número de gerações. Grau, portanto, é a distância que
separa um parente do outro.
CONTAGEM EM LINHA RETA: Toma-se como ponto de partida determinada pessoa e
conta-se a distância geracional entre ela e o parente que se quer chegar. Tantos serão os graus
quantas forem as gerações (art. 1.594, 1.ª parte).
CONTAGEM EM LINHA COLATERAL: Inicia-se a partir de determinada pessoa, subindo-se
até o ascendente comum da outra pessoa (o primeiro comum), daí descendo-se até esta, para
se poder constatar ou não a relação de parentesco, no limite legal de 4.º grau. Não há parentes
colaterais de primeiro grau, pois uns não descendem dos outros.
Ex.: para contar o grau de parentesco entre A e seu tio B, sobe-se de A a seu pai C; a seguir
a seu avô D e depois se desce a B, tendo-se então, 3 graus, correspondendo cada geração a um
grau.
* Para todos verem: esquema sobre grau de parentesco
Avô
“D”
Tio 3.º 2.º Pai
“B” “C”
1.º
A
271
divórcio). Art. 1.595, § 2.º. Deve-se observar que essa extinção só ocorre com o divórcio e não com
a separação.
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
272
Possibilidade de mesclar diversos regimes de bens, ou seja, adotarem um regime e, com
referência, a certos bens, elegerem outro. Ex.: adotar o regime da separação total de bens,
estipulando que com relação ao bem X vigorará o regime da comunhão de bens.
1. Princípios:
1. Variedade do regime de bens: a lei oferece uma multiplicidade de regimes de bens: 4
diferentes regimes de bens para que os consortes possam optar pelo que mais lhes convier:
comunhão universal, comunhão parcial, separação e participação final dos aquestos.
2. Liberdade dos pactos antenupciais: é decorrência do primeiro. É a liberdade de
escolha dentre os vários regimes de bens existentes, podendo ainda, criar um regime novo,
mesclando partes de um regime e elementos de outro (art. 1.639, CC). O Estado não pode, salvo
havendo motivo relevante e norma específica, intervir demasiadamente e coativamente na
relação matrimonial, de forma a impor o regime de bens.
Assim, podem os cônjuges:
Existem, contudo, casos em que a liberdade de escolha dos nubentes é relativizada (ou
podada!), ou seja, existem casos em que a lei determina um regime obrigatório – o da
separação de bens – seja por precaução ou para punir os nubentes. Nesses casos, se eles
regularem diferentemente, via pacto antenupcial, seus interesses econômicos, as cláusulas
serão nulas, prevalecendo a determinação legal (art. 1.655, CC).
3. Mutabilidade do regime de bens: o art. 1.639, § 2.º, CC (+ art. 734, CPC/2015) veio admitir
a mutabilidade do regime matrimonial adotado, desde que haja, em jurisdição voluntária,
autorização judicial, atendendo a um pedido motivado de ambos os cônjuges, após a
verificação da procedência das razões por eles invocadas e da certeza de que tal modificação
não causará qualquer gravame a direitos de terceiros.
4. Imediata vigência do regime de bens: a vigência do regime de bens é imediata a
celebração do ato nupcial.
2. Pacto antenupcial:
273
Quando o regime não for o legal dispositivo (CPB), a escolha do regime de bens é feita
através de um negócio jurídico solene: o pacto antenupcial, realizado mediante escritura
pública, no Tabelionato de Notas (art. 1.653, CC).
CPB76 – regra: sem pacto; havendo alteração: com pacto; CUB – sempre com pacto;
PFA – sempre com pacto;
SOB – sempre sem pacto – imposição legal;
SCB (SAB) – sempre com pacto. Separação consensual = absoluta.
76
CPB – Comunhão parcial de bens; CUB – Comunhão universal de bens; PFA – Participação
final nos aquestos; SOB – Separação obrigatória de bens; SCB – Separação convencional de
bens (também conhecido como SAB – separação absoluta de bens).
274
Essa autorização é exigida quando um dos cônjuges praticar ato que afeta o patrimônio
do casal (alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis, litigar em juízo acerca desses bens,
prestar fiança ou aval, etc).
REGRA: necessidade da outorga. EXCEÇÕES:
a) No regime da separação convencional de bens (art. 1.647, CC).
b) No regime da participação final nos aquestos, quando o casal convencionar a livre
disposição dos bens.
Caso o cônjuge não possa dar a autorização (por estar doente ou incapaz) ou não queira, o
suprimento será dado pelo juiz – art. 1.648, CC.
4. Regime Legal:
4.1. Regime Legal Dispositivo
Determinado pelo Estado = CPB.
Se os nubentes não escolherem o regime de bens CPB (regime legal dispositivo).
De forma prática, essa súmula faz uma aproximação entre o regime da separação legal e
o regime de comunhão parcial de bens. A separação fica adstrita aos bens adquiridos antes do
casamento.
IMPORTANTE!!!
Há discussões sobre a exigência do esforço comum ou não. A jurisprudência não é
unânime, pois nem o STJ tem um mesmo posicionamento. Há decisões que exigem a prova do
esforço comum. Outras, não. Sendo assim, em termos de concursos públicos – primeira fase –
pouca exigência há quanto a esta questão. Em termos de segunda fase, sugere-se que o aluno
posicione-se a respeito, fundamentando seu posicionamento.
275
IMPORTANTE!!!!!
Há a possibilidade de modificação do regime legal obrigatório quando a hipótese que lhe
deu causa tiver sido superada. Só não é possível no caso dos maiores de 70 anos.
5. Regime Convencional:
Os nubentes poderão escolher o regime de bens que mais lhe aprouver, dentre os
previstos no Código Civil ou mesclá-los. Art. 1.639, CC.
6. Mutabilidade:
Possibilidade de alterar o regime de bens escolhido para a celebração do casamento.
Também é permitida nos casos de união estável, bastando um singelo acordo, podendo
retroagir a data do início da união estável.
Vedação de alteração nas hipóteses do art. 1.641, CC, SALVO SE A CAUSA QUE DEU
ORIGEM TIVER CESSADO! Enunciado 262, da III Jornada de Direito Civil, realizada pelo Conselho
da Justiça Federal: “A obrigatoriedade da separação de bens, nas hipóteses previstas no art.
1.641, I e III, do CC não impede a alteração do regime, desde que superada a causa que o impôs”.
Contudo, esse enunciado não abrange as hipóteses do art. 1.641, II, ou seja, quando os cônjuges
tiverem mais de 70 anos quando da celebração do casamento. Neste caso, não poderá haver a
modificação.
b) motivação relevante: a alteração não pode estar baseada apenas no desejo dos
cônjuges. Entre os motivos relevantes está a alteração do regime de comunhão parcial para o
de separação de bens, em razão de os cônjuges passarem a ter vidas econômicas e profissionais
próprias, sendo conveniente a existência de patrimônios próprios para garantirem obrigações
que necessitam profissionalmente ou para incorporação em capital social de empresa.
276
c) ressalva dos direitos de terceiros: terceiros são os que estejam de boa-fé e possam ser
atingidos em seus patrimônios ou créditos com a alteração do regime de bens. A regra é que a
mudança de regime apenas valerá para o futuro, não prejudicando os atos jurídicos perfeitos. A
mudança só alcançará oi passado se o regime adotado beneficiar os terceiros credores, pela
ampliação das garantias patrimoniais.
Não é necessária a lavratura de pacto antenupcial para a mutação do regime de bens.
EFEITOS: entre cônjuges: ex tunc (retroagindo a data das núpcias); com relação a
terceiros: ex nunc, visto que poderá prejudicar credores.
É exigida ampla publicidade para a autorização da mudança. Nesse sentido, o STJ, ao
realizar a I Jornada de Direito Civil, aprovou o Enunciado 113: “é admissível a alteração do regime
de bens entre os cônjuges, quando então o pedido, devidamente motivado e assinado por
ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de terceiros,
inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida de qualquer natureza,
exigida ampla publicidade”.
277
Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a
mulher podem livremente:
I - praticar todos os atos de disposição e de administração necessários
ao desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecida no
inciso I do art. 1.647;
II - administrar os bens próprios;
III - desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou
alienados sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;
IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a
invalidação do aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do
disposto nos incisos III e IV do art. 1.647;
V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou
transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os
bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver
separado de fato por mais de cinco anos;
VI - praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.
O art. 1.643, CC traz as permissões para que os cônjuges possam atuar de forma individual.
Tratam-se de situações necessárias à manutenção da vida doméstica, onde não haveria a
necessidade de autorização expressa do outro para que tais despesas fossem assumidas.
Art. 1.643. Podem os cônjuges, independentemente de autorização um
do outro:
I - comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia
doméstica;
II - obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas coisas
possa exigir.
Com relação às dívidas, contudo, a responsabilidade patrimonial é solidária – art. 1.644, CC:
Art. 1.644. As dívidas contraídas para os fins do artigo antecedente
obrigam solidariamente ambos os cônjuges.
O art. 1.647, CC traz os atos que nenhum dos cônjuges pode praticar sem autorização do
outro, exceto no regime de separação absoluta:
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges
pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação
absoluta:
I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
278
II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III -
prestar fiança ou aval;
IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que
possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando
casarem ou estabelecerem economia separada.
EM RESUMO
279
* Para todos verem: esquema
280
Da mesma maneira ocorre com os bens que forem adquiridos no lugar dos recebidos em
doação, testamento ou daqueles que já eram de propriedade de um dos cônjuges antes do
casamento. Isto se denomina sub-rogação, ou seja, os bens que forem colocados no lugar dos já
existentes.
Ex.: Carlos possuía um carro, no valor de R$ 20.000,00 antes de casar. Casa-se com Joana.
Após o casamento, Carlos vende o carro por R$20.000,00 e compra outro de mesmo valor.
Joana não terá direito sobre o carro, pois se trata de sub-rogação. Contudo, se Carlos comprar
um carro no valor de R$ 50.000,00 Joana terá direito a receber a diferença, ou seja, R$
30.000,00.
Também não se comunica a herança que um dos cônjuges vier a receber, mesmo que
depois da celebração do casamento, nem os produtos que dela resultarem (no caso de herança
em dinheiro).
Contudo, os frutos dos bens particulares percebidos na constância da união se
comunicam (art. 1.660, V, CC). Nesse caso, o bem em si não se comunica, mas os aluguéis
recebidos ou os juros, sim.
281
IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
O cônjuge faltoso é responsável pelos atos ilícitos que praticar (com seu patrimônio
particular), salvo se ambos os cônjuges vierem a tirar proveito de tal ato, quando então o
patrimônio comum do casal responderá pelos prejuízos causados com o ilícito.
Ex.: o marido pratica uma fraude tributária, sonegando a receita, para comprar uma casa
na praia para que a família desfrute. Neste caso, haverá a comunicação da dívida.
É nesse sentido a súmula 251, STJ: “A meação só responde pelo ato ilícito quando o credor,
na execução fiscal, provar que o enriquecimento dele resultante aproveitou o casal”.
Questão complicada é a das joias. Algumas possuem valor altíssimo. Sendo assim, a
doutrina se divide. Dias77 afirma que há que se reparar na forma de aquisição de tais bens. Se
forem recebidos por presente de um cônjuge ao outro, serão incomunicáveis, pois configura-se
77
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 317.
282
doação. No entanto, se comprados no intuito de investir algum dinheiro (situação bastante
difícil de ocorrer), deverão ser partilhados.
283
e, conseqüentemente, acrescer o patrimônio, fruto, portanto, do trabalho
e empenho de ambos.
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 895344/RS, Rel. Ministra
NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJe
13/05/2008)
Art. 1.661 - Também são incomunicáveis os bens adquiridos por causa anterior ao
casamento
Ex.: se a moça solteira vender um imóvel antes do casamento e só após vier a receber o
valor devido, o dinheiro apurado com a venda não se comunica, pois existente em razão de
causa anterior ao casamento.
Mostra-se sem razão a incomunicabilidade dos proventos do trabalho pessoal de cada
cônjuge, já que a maior parte das famílias sobrevive da contraprestação pecuniária de quem
trabalha. Assim, se alguém transforma suas economias em patrimônio, torna-se incomunicável
e isto é injusto com aquele que também trabalha e transforma suas economias em alimentos,
vestuário para a família, etc.
285
ou outro meio admitido em direito, que foram adquiridos em data anterior ao ato nupcial. Art.
1.662.
II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou
despesa anterior;
Ex.: jogo, aposta, loteria, bingo. Os bens advindos do valor recebido nessas loterias
III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os
cônjuges;
Herança ou testamento só se comunicam se forem em favor de ambos os cônjuges.
IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
Tudo que for acrescido aos bens particulares dos cônjuges entra na divisão do patrimônio
comum, desde que haja a presunção de que foram feitas com o produto do esforço comum,
para evitar o enriquecimento indevido.
V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na
constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Isto porque são ganhos posteriores ao casamento e esse regime visa a composição de um
patrimônio comum após a união.
Ex.: se um dos cônjuges for acionista de uma sociedade anônima na qual hajam ganhos
periódicos em razão dos lucros. O valor percebido integra o patrimônio comum.
Ex.: os aluguéis, ainda que de imóvel particular de um dos cônjuges também passa a
integrar o patrimônio comum.
286
Contudo, será necessária a anuência de ambos para prática de atos que impliquem, a
título gratuito, em cessão do uso ou gozo desses bens (art. 1.663, § 2.º). Também é necessária a
anuência para alienar ou gravar os bens imóveis (art. 1.647, I).
Se ficar comprovada a má administração dos bens comuns, o magistrado poderá atribuir
a administração a apenas um dos cônjuges (art. 1.663, § 3.º), ou seja, o que solicitou ao juiz, em
razão de ter sido prejudicado. Com o deferimento desse pedido, os atos praticados pelo outro
cônjuge serão nulos.
A administração dos bens particulares competirão ao cônjuge proprietário, exceto se
houver convenção contrária estabelecida no pacto antenupcial (art. 1.665), mas para alienar
imóvel, dependerá da anuência do outro (art. 1.647, I). O cônjuge que administra o patrimônio
particular do outro age como seu representante, apenas.
b. Dívidas
Cada consorte responde pelos próprios débitos anteriores ao casamento, pois se
constituem patrimônios separados.
Se o débito for subseqüente ao casamento, contraídas no exercício da administração do
patrimônio comum, obrigam aos bens comuns e aos particulares do cônjuge que o administra
e aos do outro na proporção do proveito que houver auferido (art. 1.663, § 1.º).
O débito contraído por qualquer dos consortes na administração dos bens particulares e
em benefício destes não obrigam os bens comuns (art. 1.666).
Quando a dívida for para atender aos encargos da família (contas de água, luz,
alimentação), despesas de administração dos bens comuns (reparos) e decorrentes de
imposição legal (impostos) os bens comuns irão responder, para resguardar direitos dos
credores (art. 1.664).
c. Dissolução
Dissolve-se pela morte de um dos cônjuges, separação, divórcio, nulidade ou anulação de
casamento. No caso de morte, o patrimônio particular do falecido transmite-se aos filhos, sem
que haja meação. Quanto ao patrimônio comum, deverá ser partilhado entre o viúvo/viúva
meeira e os herdeiros.
287
3. Regime da Comunhão Universal de Bens:
* Para todos verem: esquema
DA MULHER DO MARIDO
Importa na comunhão de todos os bens dos cônjuges, presentes e futuros, bem como de
suas dívidas. Cada cônjuge passa a ter direito a metade ideal do patrimônio comum, de
maneira que não poderão constituir sociedade entre si (art. 977).
Antes da dissolução e partilha não há meação, mas a metade ideal de bens e dívidas (art.
1.667). Não há propriedade sobre metade de cada bem, pois há uma indivisão. O que há é a
propriedade sobre a metade ideal do patrimônio comum, ou seja, não se sabe quem é
proprietário do que, pois ambos o são de todo o patrimônio.
Assim, tudo o que entra para o acervo subordina-se a comunhão, de modo que se torna
comum tudo o que cada consorte adquire, no momento da aquisição. Os cônjuges são meeiros
em todos os bens do casal, mesmo que não tenha trazido nada ou nada adquirido na
constância do casamento.
Neste caso, o bem não se comunica com o cônjuge do fiduciário. Os bens só passam a se
comunicar a partir do momento em que se implementar a condição (apenas com o cônjuge do
fideicomissário, se for o caso).
É lógico que essa propriedade deve ser incomunicável, para que o fiduciário possa, a certo
tempo ou em certa condição, transmitir o bem ao fideicomissário. Assim, a propriedade só
ingressa no patrimônio comum se ocorrer a condição antes do falecimento do fideicomissário,
pois se isto ocorrer antes, caduca o fideicomisso, consolidando-se a propriedade nas mãos do
fiduciário (art. 1.958).
Ex.: se um dos nubentes antes de casar tinha direito a uma pensão, esse direito não se
comunica pelo casamento. Mas o dinheiro que receber após as núpcias se comunica a partir do
vencimento da prestação.
Contudo, estas incomunicabilidades não se estendem aos frutos percebidos ou vencidos
durante a constância do casamento.
Art. 1.669. A incomunicabilidade dos bens enumerados no artigo
antecedente não se estende aos frutos, quando se percebam ou vençam
durante o casamento.
290
A administração dos bens excluídos da comunhão caberá ao proprietário, salvo
estipulação em contrário.
Havendo morte de um dos cônjuges, o outro administrará os bens até que seja efetivada
a partilha entre eles e os herdeiros do falecido.
3.3 Dívidas
Pelas dívidas contraídas na gestão da administração dos bens, respondem os bens
comuns e os particulares do cônjuge administrador. Os bens particulares do outro cônjuge só
responderão se provado que ele obteve algum proveito.
Quanto aos débitos oriundos da administração do patrimônio particular não serão responsáveis
os bens comuns.
3.4 Extinção
A extinção do regime se dá com a dissolução da sociedade conjugal pela morte de um
dos cônjuges, sentença de nulidade ou anulação ou pela separação ou divórcio ou, ainda, com a
separação de fato.
Com a ocorrência de um desses fatos, deverá ser operada a partilha para que seja posta
fim à indivisão.
Se houver separação de fato, os bens ou dívidas adquiridos posteriormente, ainda que não
tenha se operado a partilha, não serão partilhados, pois a separação de fato põe fim ao regime
de bens.
Com a morte, caso o cônjuge supérstite tiver realizado aumento no patrimônio, esse fica
excluído da partilha. Partilha-se 50% para o cônjuge sobrevivente e 50% entre os herdeiros. Se
houverem bens incomunicáveis estes só serão partilhados entre os herdeiros.
No caso de nulidade, não se tem comunhão de bens, pois o casamento não existiu, de
maneira que cada cônjuge retira o que trouxe para o casamento. Se houve, nesse período,
aquisição de bens em conjunto, esse será partilhado na proporção da colaboração financeira.
Caso de casamento anulável, se tiver sido considerado putativo, haverá a partilha dos
bens. Se um dos cônjuges for culpado, perderá as vantagens que obteve e não terá direito a
meação quanto ao patrimônio que o outro trouxe para o casamento. Contudo, o inocente terá
direito de exigir sua meação sobre tudo.
Extinta a comunhão e efetuada a divisão do ativo e passivo, cessará a responsabilidade de
cada um dos cônjuges para com os credores do outro por dívidas que este houver contraído
(art. 1.671).
78
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 180.
79
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 181.
80
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 304.
81
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 322.
292
4.1 Administração dos bens
A administração do patrimônio inicial é exclusiva de cada cônjuge, que administrará os
bens que possuía ao casar, os adquiridos por doação e herança e os obtidos onerosamente,
durante a constância do casamento.
Em princípio nenhum dos cônjuges pode alienar ou gravar os bens sem a anuência do
outro (art. 1.647, I). Contudo, pode ser estabelecido no pacto antenupcial a livre disposição dos
bens imóveis, quando não será necessária qualquer anuência do outro cônjuge para alienar ou
gravar (art. 1.656).
4.2 Dívidas
Pelas dívidas contraídas por um dos cônjuges antes do matrimônio, responde seu
patrimônio particular. Quanto aos débitos posteriores ao casamento, contraídos por um dos
cônjuges, em princípio, o patrimônio particular deste é que responderá, salvo de comprovado o
proveito comum, quando o patrimônio do outro consorte responderá na proporção do seu
proveito (art. 1.677).
No caso de um dos cônjuges pagar dívida do outro, com bens de seu patrimônio, o valor
deverá ser atualizado e imputado na meação do devedor, na data da dissolução (art. 1.678).
Quando as dívidas de um dos cônjuges for superior a sua meação, não obrigam o outro,
ou a seus herdeiros (art. 1.686). Assim, se falecer o cônjuge devedor, seus credores só terão
direito a sua meação e, se não for suficiente para saldar a dívida, não poderão cobrar do outro
cônjuge ou dos herdeiros, pois estes só têm responsabilidade no exato teor do que lhes couber
na herança.
No caso de direito de terceiros, presume-se como sendo do cônjuge devedor os bens
móveis (art. 1680).
4.3 Dissolução
Com a dissolução da sociedade conjugal pela morte de um dos cônjuges, invalidade,
separação ou divórcio apura-se o montante dos aquestos, excluindo-se da soma o patrimônio
próprio dos cônjuges: bens anteriores ao casamento, os sub- rogados em seu lugar e os obtidos
pelos cônjuges por herança, legado ou doação, bem como os débitos relativos a esses bens (art.
1.674). Incluem-se na partilha os frutos dos bens particulares. Os bens móveis, salvo prova em
contrário, presumem- se adquiridos na constância do casamento (art. 1.674, parágrafo único).
Por ocasião da partilha, para a apuração do montante dos aquestos, ficam excluídos:
Art. 1.674. Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o
montante dos aqüestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:
293
I - os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-
rogaram; II - os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou
liberalidade;
III - as dívidas relativas a esses bens.
Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos
durante o casamento os bens móveis.
No caso de bens adquiridos com o esforço comum dos cônjuges, ambos terão direito a
quota igual no condomínio (50% para cada cônjuge) (art. 1.679).
Ex.: se uma casa foi construída em conjunto (esforço comum), sobre o terreno de um
deles, o cônjuge que contribuiu para a construção da casa terá direito apenas a indenização,
pois o imóvel pertencerá ao dono do solo, pois se operou a acessão artificial.
Se houver doação feita por um cônjuge sem a autorização do outro, este poderá ser, ao
final do matrimônio, indenizado em sua meação (art. 1.675). Pode haver a reivindicação desse
bem. Contudo, também se pode optar por fazer integrar o monte partilhável o valor
equivalente ao bem (art. 1.676).
No caso de separação ou divórcio o montante a ser apurado com os aquestos será o da
data que cessou a convivência (art. 1.683). Neste caso, utiliza-se da contabilidade para realizar a
divisão, pois se levanta o acréscimo patrimonial de cada cônjuge no período da vigência do
casamento. Faz-se o balanço e aquele que tiver enriquecido menos terá direito à metade do
saldo encontrado.
GANHO OU AQUESTOS
500.000,00 200.000,00
ENRIQUECIMENTO
294
Assim, os bens adquiridos durante a separação de fato ou na pendência da separação
judicial ou do divórcio não entrarão na partilha. Contudo, se houver reconciliação antes do fim
da ação, haverá a comunicação desses bens.
Como já dito, é um regime misto, pois durante a vigência é separação de bens e, na
dissolução, comunhão parcial, devendo haver partilha dos bens amealhados a título oneroso ou
por esforço comum, desde que durante a união.
O direito a meação é irrenunciável, incessível ou impenhorável na vigência do regime
patrimonial (art. 1.682). No entanto, é possível a penhora da meação do devedor sobre
determinado bem comum. Se a penhora ocorrer sobre a totalidade do bem, o outro consorte
poderá resguardar sua meação via embargos de terceiro.
Pode ocorrer de que não seja possível a divisão dos bens em natureza. Neste caso, será
calculado o valor da meação, para que este receba sua parte (art. 1.684). Ex.: um carro – não é
possível sua divisão. Dessa forma, haverá a avaliação do bem para que o cônjuge não
proprietário receba sua meação em dinheiro.
No caso de não poder ser feita a reposição do direito a meação em dinheiro, em razão de
poucos recursos do cônjuge proprietário, será feita avaliação e alienação judicial de tantos bens
quantos bastem para o ressarcimento da meação (art. 1684, parágrafo único).
295
Qualquer dos cônjuges pode alienar ou gravar seus bens sem anuência do outro cônjuge
(caso seja separação convencional). Poderá, também, qualquer dos cônjuges, prestar fiança,
aval, pleitear direitos acerca de bens ou direitos imobiliários, sem autorização do outro (art.
1.647).
O art. 1.647, CC deve ser interpretado no sentido de que quando trata da “separação
absoluta”, refere-se a separação convencional e não na separação obrigatória. Isto porque na
separação convencional os cônjuges podem, no pacto antenupcial dispor aquilo que
pretenderem e, no caso da separação obrigatória, não.
Nesses termos:
SEPARAÇÃO ABSOLUTA = convencional, com pacto.
SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA = não é absoluta. Aplica-se a súmula 377, STF.
No pacto antenupcial tudo pode ser disposto, desde que não seja contrário a lei.
Ativo e passivo são separados, de maneira que nenhuma dívida se comunica, seja ela
anterior ou posterior ao matrimônio.
Quanto às despesas da família, ambos os cônjuges possuem obrigação com elas, na
proporção de seus bens ou de seus rendimentos, salvo se houver alguma estipulação em
contrário no pacto antenupcial. Ex.: estabelecer que só ao marido compete o sustento da
família.
O regime da separação de bens tanto pode provir de imposição legal (art. 1.641), quanto
de convenção (art. 1.687).
Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas
suspensivas da celebração do casamento;
As causas suspensivas são as previstas no art. 1.523. Deve-se observar que
em qualquer das causas, se comprovado que não há prejuízos, poderá
ser requerido ao juiz que não imponha a separação de bens.
II - da pessoa maior de setenta anos;
Contudo, nessa hipótese, se houver existido união estável há mais de dez anos
consecutivos ou tiver resultado filhos, não seria aplicada a regra, podendo os nubentes escolher
livremente o regime de bens. É nesse sentido o Enunciado 261 do Conselho da Justiça Federal,
na III Jornada de Direito Civil:
261 – Art. 1.641: A obrigatoriedade do regime da separação de bens não se
aplica a pessoa maior de sessenta anos, quando o casamento for
precedido de união estável iniciada antes dessa idade.
296
A imposição do regime de bens é unicamente para evitar casamentos por interesse
econômico.
Deve-se destacar que para todos os outros casos de imposição do regime da separação
obrigatória, a lei permite que seja requerida ao juiz a exclusão dessa pena (art. 1.523, § único).
Mas essa chance não é concedida aos noivos maiores de 70 anos. Assim, como na união estável
não vigora essa “pena”, se pretenderem outro regime de bens, que o façam através de união
estável.
Aliás, demonstra Maria Berenice Dias82 que tal imposição é descabida, pois no caso dos
noivos menores de 18 anos, quando os pais não consentem com o casamento, há o suprimento
judicial. Em havendo, há a imposição do regime da separação obrigatória de bens. Contudo, o
juiz pode, a requerimento das partes, não aplicar essa penalidade. Então, se o juiz não aplica aos
menores de 18 anos, quando os pais não concordam com o casamento, porque não liberar os
maiores de 70 anos? Qual é a justificativa para essa limitação? Na verdade, não há explicação: é
assim porque é!
5.1 Dívidas
Pelas dívidas contraídas antes ou depois do casamento não responde o patrimônio do
outro cônjuge, só o patrimônio daquele que é devedor. Contudo, as dívidas que forem
82
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 7.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2010. p. 243.
297
contraídas, ainda que sem a autorização do outro cônjuge, em proveito de ambos, ou seja, para
o bem da família, se comunicarão ao outro cônjuge.
5.2 Administração
Cada consorte terá a administração e fruição do que lhe pertence, sem necessidade de
anuência um do outro para alienar ou gravar seus bens (art. 1.687).
5.3 Dissolução
Na dissolução cada um dos consortes retira seu patrimônio próprio. No caso de óbito de
um dos consortes, o outro entrega aos herdeiros o patrimônio do falecido, e, se houver bens
comuns, o administrará até a partilha.
a. Partilha de Bens83:
A partilha de bens decorre do modelo de regime escolhido. Contudo, algumas questões
especiais têm aparecido nas decisões.
Animais. O casal que tiver animais de estimação pode estabelecer não só a
guarda/custódia do bichinho, como também o direito de convivência e o pagamento de
alimentos.
Mancomunhão. Cada cônjuge é proprietário de metade do patrimônio, estando em
condomínio sobre os bens comuns.
Diferença de partilha. Havendo diferença de partilha, incide ITCD, pois entende-se que
houve transmissão gratuita de patrimônio entre os ex-cônjuges.
Uso exclusivo de bem comum. Ao final do relacionamento, se um dos cônjuges ficar
usando, sozinho, bem que é comum, deverá fazer o pagamento pelo uso (sobre a metade do
valor, já que a outra metade lhe pertence) – espécie de indenização.
Sub-rogação. Se um dos cônjuges tiver bens particulares recebidos por doação ou
herança, estes são incomunicáveis. Caso efetue a venda destes e aquisição de outro, com o
produto da venda, também ficará incomunicável, ainda que a aquisição tenha ocorrido durante
o matrimônio. Trata-se de sub-rogação. No caso de a aquisição ocorrer por valor superior ao
valor da venda dos bens particulares, ocorre sub-rogação parcial, devendo haver a partilha do
valor que foi acrescido ao patrimônio.
Dívidas e encargos. As dívidas também são comuns do casal, sempre que contraídas em
benefício da família. No caso de financiamento, deve-se verificar o número de prestações
quitadas durante o matrimônio e o percentual do bem que o valor se refere. A partilha será do
percentual do imóvel que foi quitado durante o relacionamento.
83
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 335-358
298
FGTS, verbas rescisórias e créditos trabalhistas. Com relação ao FGTS, deve-se atentar
para a polêmica existente, pois trata-se de frutos civis, rendimentos do trabalho pessoal,
estando excluído da comunhão, nos termos do art. 1.659, VI, CC. Contudo, a jurisprudência tem
entendido que se os valores, no momento do divórcio, permanecem depositados, são
incomunicáveis. Contudo, se foram levantados para aquisição de algum bem, o imóvel deverá
ser partilhado. Da mesma forma ocorre com as verbas rescisórias e créditos trabalhistas:
transformado em patrimônio = dever de partilhar.
Ativos financeiros. Embora os frutos do trabalho pessoal sejam excluídos da comunhão,
uma vez que tenham sido aplicados em instituições financeiras, deverão ser partilhados. Ex.:
depósito do salário em conta conjunta = partilha desse valor.
Edificação em imóvel de terceiro. Pode ocorrer de o casal construir casa sobre terreno
alheio (normalmente do pai de um deles). No momento da separação, o filho do dono do
terreno permanece com o imóvel. Contudo, terá de indenizar o outro sobre metade do
valor do que a casa agregou sobre o terreno.
1. Conceito:
Considerando a decisão do STF na ADIN 4277, o conceito de União estável se modificou,
de forma que GAGLIANO e PAMPLONA FILHO afirmam que é possível se conceituar a “união
estável como uma relação afetiva de convivência pública e duradoura entre duas pessoas, do
mesmo sexo ou não, com o objetivo imediato de constituição de família”.
2. Requisitos e aspectos controvertidos:
São requisitos da união estável, por força do art. 226, § 3.º da CF e do art. 1.723 do CC:
ESTABILIDADE: não é qualquer relacionamento fugaz e transitório que configura a união
estável. A proteção é para aquelas uniões que se apresentam com os elementos do casamento,
ou seja, que tenham por objetivo a constituição de família.
DURADOURA: Assim que deriva da estabilidade a característica de ser DURADOURA. Não
há a estipulação de um prazo, mas a convivência, com intuito de constituir família, por um
período mais ou menos longo é o retrato da estabilidade e da duração da união. Assim, o prazo
é importante, mas não absoluto, eis que podem existir uniões que não possuindo prazo (podem
ser inferiores a 1 ano), possuem o intuito de constituir família, sendo que podem, inclusive, ter
gerado filhos.
CONTINUIDADE: é complemento da estabilidade, de maneira que a união deve ser
contínua, sem interrupções, com ânimo de permanência e definitividade. Contudo, depende de
prova, pois nem sempre um rompimento afasta o conceito de união estável.
DIVERSIDADE DE SEXOS: Em razão da decisão do STF na ADIN 4.277 não mais se exige a
diversidade de sexos.
PUBLICIDADE: é importante a notoriedade da união, ou seja, deve ser uma relação onde o
casal se apresenta como se marido e mulher fossem perante a sociedade.
OBJETIVO DE CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIA: esse é o objetivo principal da união estável:
constituir família. Para tanto, não é necessária a existência de prole, mas a união com o objetivo
de constituir família é aquela que se traduz na comunhão de vida e interesses. Aqui entra, por
exemplo, a questão da fidelidade, pois sem ela cai por terra a comunhão de vida, de interesses e
sentimentos.
COABITAÇÃO = tal elemento não é obrigatório, pois existem casos em que existe união
sólida, duradoura e notória, mas onde o casal não reside na mesma casa, sem que, contudo,
301
desconfigure a união estável. Assim, a estabilidade da relação não é afetada por essa
circunstância, quando os companheiros se comportarem, nos espaços públicos e sociais, como
se casados fossem.
Nesse sentido a súmula 382, STF:
A VIDA EM COMUM SOB O MESMO TETO, "MORE UXORIO", NÃO É
INDISPENSÁVEL À CARACTERIZAÇÃO DO CONCUBINATO.
Por ser ato-fato jurídico, a união estável não necessita de qualquer manifestação de
vontade para que produza seus efeitos jurídicos. Basta sua configuração fática. Assim, o
CONTRATO DE NAMORO não tem efeitos, pois não importa o que venha a dispor, se os
requisitos da união estável restarem configurados, poderá haver o reconhecimento
(espontâneo ou judicial), pois ser um ato-fato jurídico, não necessita da vontade das partes para
a configuração. Quanto ao contrato de namoro, segundo Flávio Tartuce e José Fernando Simão,
“é nulo o contrato de namoro nos casos em que existe entre as partes envolvidas uma união
estável, eis que a parte renuncia por esse contrato e de forma indireta a alguns direitos
essencialmente pessoais, como é o caso do direito a alimentos. Esse contrato é nulo por fraude
à lei imperativa (art. 166, VI, do CC), e também por ser o seu objeto ilícito (art. 166, II, do CC)” 84.
Mas qual, então, a diferença entre a união estável e o namoro? Tartuce e Simão (p. 269)
afirmam que a constituição de família é que estabelece esta diferença. Se a constituição de
família é um projeto para o futuro, trata-se de namoro. Se a família já está constituída,
independentemente da existência ou não de filhos, trata-se de união estável.
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE
UNIÃO ESTÁVEL - IMPROCEDÊNCIA - RELAÇÃO DE NAMORO QUE NÃO
SE TRANSMUDOU EM UNIÃO ESTÁVEL EM RAZÃO DA DEDICAÇÃO E
SOLIDARIEDADE PRESTADA PELA RECORRENTE AO NAMORADO,
DURANTE O TRATAMENTO DA DOENÇA QUE ACARRETOU SUA MORTE -
AUSÊNCIA DO INTUITO DE CONSTITUIR FAMÍLIA - MODIFICAÇÃO DOS
ELEMENTOS FÁTICOS-PROBATÓRIOS - IMPOSSIBILIDADE -
INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 7/STJ -
RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. I - Na hipótese dos autos, as Instâncias
ordinárias, com esteio nos elementos fáticos-probatórios, concluíram, de
forma uníssona, que o relacionamento vivido entre a ora recorrente, F. F.,
e o de cujus, L., não consubstanciou entidade familiar, na modalidade
união estável, não ultrapassando, na verdade, do estágio de namoro, que
84
TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil: direito de família. 8.ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2013, p. 2.
302
se estreitou, tão-somente, em razão da doença que acometeu L.; II -
Efetivamente, no tocante ao período compreendido entre 1998 e final de
1999, não se infere do comportamento destes, tal como delineado pelas
Instâncias ordinárias, qualquer projeção no meio social de que a relação
por eles vivida conservava contornos (sequer resquícios, na verdade), de
uma entidade familiar. Não se pode compreender como entidade
familiar uma relação em que não se denota posse do estado de casado,
qualquer comunhão de esforços, solidariedade, lealdade (conceito que
abrange "franqueza, consideração, sinceridade, informação e, sem
dúvida, fidelidade", ut REsp 1157273/RN, Relatora Ministra Nancy Andrighi,
DJe 07/06/2010), além do exíguo tempo, o qual também não se pode
reputar de duradouro, tampouco, de contínuo; III - Após o conhecimento
da doença (final de 1999 e julho de 2001), L. e F. F. passaram a residir, em
São Paulo, na casa do pai de L., sem que a relação transmudasse para
uma união estável, já que ausente, ainda, a intenção de constituir família.
Na verdade, ainda que a habitação comum revele um indício
caracterizador da affectio maritalis, sua ausência ou presença não
consubstancia fator decisivo ao reconhecimento da citada entidade
familiar, devendo encontrar-se presentes, necessariamente, outros
relevantes elementos que denotem o imprescindível intuito de constituir
uma família; IV - No ponto, segundo as razões veiculadas no presente
recurso especial, o plano de constituir família encontrar-se-ia
evidenciado na prova testemunhal, bem como pelo armazenamento de
sêmen com a finalidade única de, com a recorrente, procriar. Entretanto,
tal assertiva não encontrou qualquer respaldo na prova produzida nos
autos, tomada em seu conjunto, sendo certo, inclusive, conforme
deixaram assente as Instâncias ordinárias, de forma uníssona, que tal
procedimento (armazenamento de sêmen) é inerente ao tratamento
daqueles que se submetem à quimioterapia, ante o risco subseqüente
da infertilidade. Não houve, portanto, qualquer declaração por parte de L.
ou indicação (ou mesmo indícios) de que tal material fosse, em alguma
oportunidade, destinado à inseminação da ora recorrente, como sugere
em suas razões. Bem de ver, assim, que as razões recursais, em confronto
com a fundamentação do acórdão recorrido, prendem-se a uma
perspectiva de reexame de matéria de fato e prova, providência
inadmissível na via eleita, a teor do enunciado 7 da Súmula desta Corte;
V - Efetivamente, a dedicação e a solidariedade prestadas pela ora
303
recorrente ao namorado L., ponto incontroverso nos autos, por si só, não
tem o condão de transmudar a relação de namoro para a de união
estável, assim compreendida como unidade familiar. Revela-se
imprescindível, para tanto, a presença inequívoca do intuito de constituir
uma família, de ambas as partes, desiderato, contudo, que não se infere
das condutas e dos comportamentos exteriorizados por L., bem como
pela própria recorrente, devidamente delineados pelas Instâncias
ordinárias; VI - Recurso Especial improvido. (REsp 1257819/SP, Rel.
Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/12/2011, DJe
15/12/2011)
85
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 341-342.
304
paulista. Nesse apartamento reside Maria Carmem, com quem Tício tem um relacionamento
desde o final do ano de 2004. Essa sua convivente está grávida e espera um filho seu.
No caso hipotético, uma Maria não sabe da existência da outra como convivente de seu
companheiro, até que, um dia, o pior acontece e o mundo desaba.
A partir daí, como ficam os direitos das conviventes? Segundo Tartuce86 existem três
posicionamentos diferentes a esse respeito.
1. Nenhum dos relacionamentos constitui união estável. Como não há lealdade na
relação, não constitui um dos seus requisitos, sem o qual não há a entidade familiar
(posicionamento de Maria Helena Diniz). As conviventes poderão pleitear indenização por
danos morais e materiais, em razão da boa-fé.
2. Aplicação das regras do casamento putativo. Neste caso, como as Marias
estavam de boa-fé e não sabia da existência uma das outras, devem pedir a aplicação analógica
do art. 1.561, CC.
Se não houver filhos em comum o segundo parceiro terá pretensão contra o primeiro no
campo das relações patrimoniais, segundo o modelo do direito das obrigações, quando à
partilha dos bens adquiridos com esforço comum ou à indenização por serviços prestados. Os
filhos comuns terão direito tanto a pretensão de natureza patrimonial, quanto pessoal.
Nesse sentido a jurisprudência do STJ:
União estável. Reconhecimento de duas uniões concomitantes.
Equiparação ao casamento putativo. Lei nº 9.728/96.
1. Mantendo o autor da herança união estável com uma mulher, o
posterior relacionamento com outra, sem que se haja desvinculado da
primeira, com quem continuou a viver como se fossem marido e mulher,
não há como configurar união estável concomitante, incabível a
equiparação ao casamento putativo.
2. Recurso especial conhecido e provido. (STJ. REsp 789.293/RJ. Rel.
Min. Carlos Alberto Menezes Direito. j. 15/02/2006).
No mesmo sentido tem ocorrido quando há um casamento e uma união estável paralelas.
Os Tribunais Superiores não tem reconhecido o direito da segunda companheira, não
reconhecendo, nesta relação, uma união estável, mas sim, o concubinato.
DIREITO DE FAMÍLIA E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO
DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. HOMEM CASADO.
86
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 342-349.
305
OCORRÊNCIA DE CONCUBINATO. INDAGAÇÕES ACERCA DA VIDA
ÍNTIMA DOS CÔNJUGES.
IMPERTINÊNCIA. INVIOLABILIDADE DA VIDA PRIVADA. SEPARAÇÃO DE
FATO NÃO PROVADA. ÔNUS DA PROVA QUE RECAI SOBRE A AUTORA
DA AÇÃO.
1. A jurisprudência do STJ e do STF é sólida em não reconhecer como
união estável a relação concubinária não eventual, simultânea ao
casamento, quando não estiver provada a separação de fato ou de
direito do parceiro casado.
2. O acórdão recorrido estabeleceu que o falecido não havia desfeito
completamente o vínculo matrimonial - o qual, frise-se, perdurou por
trinta e seis anos -, só isso seria o bastante para afastar a caracterização
da união estável em relação aos últimos três anos de vida do de cujus,
período em que sua esposa permaneceu transitoriamente inválida em
razão de acidente. Descabe indagar com que propósito o falecido
mantinha sua vida comum com a esposa, se por razões humanitárias ou
qualquer outro motivo, ou se entre eles havia "vida íntima".
3. Assim, não se mostra conveniente, sob o ponto de vista da
segurança jurídica, inviolabilidade da intimidade, vida privada e
dignidade da pessoa humana, discussão acerca da quebra da affectio
familiae, com vistas ao reconhecimento de uniões estáveis paralelas a
casamento válido, sob pena de se cometer grave injustiça, colocando em
risco o direito sucessório do cônjuge sobrevivente.
4. Recurso especial provido.
(REsp 1096539/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
TURMA, julgado em 27/03/2012, DJe 25/04/2012)
306
3. Efeitos:
A união estável gera efeitos a partir do seu início. Contudo, bastante difícil estabelecer
seu prazo inicial. Assim, o início da união estável é o início da convivência dos companheiros.
Havendo coabitação mais fácil a identificação do momento de início da produção de efeitos.
Não havendo, necessário identificar o tempo em que os companheiros passaram a viver como
se marido e mulher fossem perante as relações sociais. A prova pode ser feita por
correspondências, fotos, documentos de viagens, etc. No caso de companheiro casado, para a
configuração do início da união estável com outrem é necessária, no mínimo, a separação de
fato. Não há distinção entre os filhos advindos de relações matrimoniais e filhos advindos de
relação de união estável. Assim, quanto a direitos pessoais aplicam-se
as mesmas regras quanto a poder familiar, filiação, adoção, etc. (art. 1.724).
307
Lei dos Registros Públicos (art. 57) – permite que um companheiro adote o sobrenome do
outro se forem (ambos ou um apenas) separado de fato ou judicialmente, pois tal fato
configura impedimento para o matrimônio.
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL.
ALTERAÇÃO DO ASSENTO REGISTRAL DE NASCIMENTO. INCLUSÃO DO
PATRONÍMICO DO COMPANHEIRO. POSSIBILIDADE.
Pedido de alteração do registro de nascimento para a adoção, pela
companheira, do sobrenome de companheiro, com quem mantém
união estável há mais de 30 anos. A redação do o art. 57, § 2º, da Lei
6.015/73 outorgava, nas situações de concubinato, tão somente à mulher,
a possibilidade de averbação do patronímico do companheiro, sem
prejuízo dos apelidos próprios, desde que houvesse impedimento legal
para o casamento, situação explicada pela indissolubilidade do
casamento, então vigente. A imprestabilidade desse dispositivo legal
para balizar os pedidos de adoção de sobrenome dentro de uma união
estável, situação completamente distinta daquela para qual foi
destinada a referida norma, reclama a aplicação analógica das
disposições específicas do Código Civil relativas à adoção de sobrenome
dentro do casamento, porquanto se mostra claro o elemento de
identidade entre os institutos e a parelha ratio legis relativa à união
estável, com aquela que orientou o legislador na fixação, dentro do
casamento, da possibilidade de acréscimo do sobrenome de um dos
cônjuges, pelo outro. Assim, possível o pleito de adoção do sobrenome
dentro de uma união estável, em aplicação analógica do art. 1.565, § 1º, do
CC-02, devendo-se, contudo, em atenção às peculiaridades dessa relação
familiar, ser feita sua prova documental, por instrumento público, com
anuência do companheiro cujo nome será adotado.
Recurso especial provido. (REsp 1206656/GO, Rel. Ministra NANCY
ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/10/2012, DJe 11/12/2012)
Se, contudo, forem ambos livres e desimpedidos para casar, não poderão se valer desse
direito.
REGIME DE BENS: comunhão parcial ou qualquer outro convencionado formalmente
pelos conviventes. Em razão disto, qualquer alienação depende da autorização do outro
companheiro, sob pena de possibilidade de anulação do ato. O terceiro de boa-fé tem direito,
no caso de anulação, de pleitear do cônjuge que lhe vendeu o bem, o ressarcimento dos valores
pagos e indenização por perdas e danos. Necessidade de registrar o contrato no registro de
308
imóveis para que as cláusulas estabelecidas tenham validade contra terceiros. Se não for
registrado o contrato, para efeitos contra terceiros, presume-se a comunhão parcial de bens, de
modo que poderá haver a penhora de parte de um imóvel adquirido depois da união, para
pagamento de dívida de um dos companheiros (mesmo que o regime estabelecido no
contrato – e não registrado – seja o da separação de bens).
Deve-se observar, ainda, que o CPC/2015, no art. 73, § 3.º, exige a aquiescência do
convivente em união estável nas ações que versarem sobre direitos reais imobiliários, desde
que a união estável esteja comprovada nos autos.
O STJ tem tese no sentido de que se aplica à união estável o regime legal obrigatório da
separação de bens (art. 1.641): “Na união estável de pessoa maior de setenta anos (art. 1.641, II, do
CC/02), impõe-se o regime da separação obrigatória, sendo possível a partilha de bens
adquiridos na constância da relação, desde que comprovado o esforço comum.”
Se a união estável iniciou-se antes da entrada em vigor do CC, a ela também se aplica o
regime da comunhão parcial de bens, salvo se os companheiros estipularam algo em contrário.
4. Contrato de convivência:
Aos conviventes é lícito estabelecerem convenções por escrito quanto ao direito
patrimonial, assim como ocorre com o casamento, sendo aplicado, supletivamente, as regras
quanto aos regimes de bens. Não é necessária escritura pública, podendo ser feito por
documento particular. Para que tenha eficácia contra terceiros, é preciso que o contrato de
convivência seja feito por escritura pública ou registrado no Cartório de Títulos e Documentos.
IMPORTANTE (Tartuce87): “no caso de dois nubentes que celebraram um pacto
antenupcial por escritura pública no Tabelionato de Notas. O casamento não se realiza, o que
faz com que o pacto não tenha eficácia, para fins de casamento. Todavia, se ambos passarem a
viver em união estável, o pacto antenupcial vale e gera efeitos como se fosse um contrato de
convivência”.
Aplicam-se subsidiariamente as normas aplicáveis aos pactos antenupciais, ou seja, não
podem ser fixadas cláusulas que nos pactos também são vedadas. Dessa maneira, só são
permitidas cláusulas que estabeleçam quanto ao regime de bens dos companheiros e nada
mais. Pode ser estabelecido pelos companheiros, no contrato de união estável, que o regime de
bens seja retroativo, mas tem como limite a proteção dos interesses de terceiros de boa-fé. No
caso de ausência desse pacto escrito, aplicam-se as regras pertinentes ao regime da comunhão
parcial de bens.
87
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 161.
309
5. Alimentos:
Qualquer dos companheiros, em caso de necessidade, pode exigir do outro alimentos (art.
1.694). Basta que seja comprovada, em ação pertinente, a necessidade. Essa ação pode ser tanto
a que visa o reconhecimento e a dissolução da união estável, quanto a ação de alimentos
propriamente dita.
6. Direito sucessório:
O direito sucessório dos conviventes era tratado pelo art. 1.790 do CC, que acabou sendo
declarado inconstitucional pelo STF em maio de 2017. Sendo assim, atualmente aplica-se à
sucessão do companheiro, a mesma regra da sucessão do cônjuge.
7. Conversão em casamento:
O art. 1.726 dispõe que a união estável poderá ser convertida em casamento, mediante
pedido dos companheiros ao juiz e assento no registro civil. Contudo, deve-se observar que essa
disposição não dispensa os procedimentos preliminares e o processo de habilitação do
casamento.
Na conversão há dispensa da celebração do casamento, mas da habilitação, não. Há, sim,
uma simplificação na habilitação, pois a união estável pressupõe que a união tenha sido
constituída sem violação aos impedimentos matrimoniais, tornando desnecessária publicação
de edital. O único impedimento é quanto ao convivente que estivesse separado de fato ou
judicialmente no início da união estável, quando terá de comprovar que já se encontra
divorciado, para possibilitar o casamento.
O pedido deve ser feito por ambos os conviventes ou por procuradores com poderes para
tanto. Feita prova da união estável o juiz determinará o registro do casamento.
A conversão não produz efeitos retroativos. As relações pessoais e patrimoniais da
união estável permanecerão desde seu início até a conversão em casamento. A partir daí os
efeitos do casamento passarão a viger. Assim, se os cônjuges estabelecerem o regime da
separação total de bens, por pacto antenupcial, os bens adquiridos durante a união estável
ingressam no regime legal da comunhão parcial, permanecendo em condomínio e, em caso
de dissolução, serão partilhados igualitariamente. HÁ DIVERGÊNCIAS, POIS ROLF MADALENO
ENTENDE QUE HÁ A RETROATIVIDADE DO CASAMENTO ATÉ A DATA DO INÍCIO DA UNIÃO
ESTÁVEL. DESSA FORMA, TAMBÉM O REGIME DE BENS RETROAGIRÁ A DATA DO INÍCIO A
UNIÃO ESTÁVEL.
310
8. Dissolução e partilha de bens:
Quando houver a dissolução da união estável, o quadro assemelha-se a separação
consensual ou litigiosa. Contudo, termina da mesma maneira que inicia, sem qualquer ato
jurídico ou decisão judicial, bastando a separação de fato.
A dissolução pode ser amigável ou litigiosa. Se for amigável os conviventes poderão fazer
documento escrito (público ou particular). No caso de dissolução litigiosa, se não houver
contrato de união estável, será necessária a ação de reconhecimento e dissolução da união
estável. Na partilha de bens, reconhecida a união estável, aplica-se os princípios da comunhão
parcial (art. 1.725 + art. 1.658 e seguintes), se não houver contrato em contrário.
311
absoluta do vínculo conjugal, com a ausência do divórcio, até o divórcio direto, sem exigência
de prévia separação, introduzido pela chamada “PEC DO AMOR”.
312
2. Modelo dual ou não?
Em razão da alteração trazida pela EC 66 ao ordenamento jurídico brasileiro, há
discussões se permanece vigente o modelo dual de dissolução do casamento no Brasil, ou seja,
separação e do divórcio. Deve-se observar, contudo, que a separação apenas coloca fim na
sociedade conjugal, mas não extingue/dissolve o vínculo matrimonial, que apenas ocorrerá
com o divórcio.
Há, nesse aspecto, grandes discussões, na atualidade, sobre a manutenção ou não desse
sistema dual.
Alguns entendem que com a alteração introduzida pela EC 66/2010, houve a derrogação
das disposições infraconstitucionais contrárias, ou seja, a parte do Código Civil que dispõe sobre
a dissolução do casamento através da separação, estaria derrogado. Outros, no entanto,
entendem que a separação se mantém no sistema jurídico e que cabe às partes decidirem o
que pretendem: romper com a relação matrimonial (entrar com separação e respeitar o CC) ou
com o vínculo conjugal (entrar com divórcio, nos termos da EC 66/2010).
3. Separação de fato:
A separação de fato é o que realmente coloca um ponto final no casamento, podendo
resultar de decisão conjunta do casal ou da iniciativa de um dos cônjuges. Todas as
conseqüências dessa situação fática passam a correr da ruptura da união, ou seja, da separação
de fato. A separação de fato não exige que o casal já se encontre residindo em residências
distintas, sendo aceita a separação de fato de casais que ainda residem sob o mesmo teto. Com
o término do casamento pela separação de fato as partes podem, inclusive, constituir novo
relacionamento, através da união estável.
A separação de fato faz cessar o dever de vida em comum, configurando requisito
suficiente para o fim do regime de bens. Este é o momento da apuração dos bens para efeitos
de partilha (ex.: participação final nos aquestos – art. 1.683).
4. Separação Judicial:
A separação é o gênero do qual a separação consensual e a litigiosa são as espécies. É
uma forma de dissolver a sociedade conjugal, romper com os deveres do casamento. NÃO
ROMPE O VÍNCULO MATRIMONIAL.
É a dissolução do vínculo conjugal, da sociedade conjugal decretada e homologada pelo
juiz, sem a extinção do vínculo matrimonial.
Tem caráter pessoal, personalíssimo, não podendo o Pai, por exemplo, buscar a separação,
através de ação judicial, em nome da filha. Pode, contudo, nos termos do art. 1.576, § único, a
313
ação ser feita por outra pessoa (curador, ascendente ou irmão), no caso de um dos cônjuges ser
incapaz. Só cabe em caso de separação judicial, pois na extrajudicial os cônjuges devem estar
em pessoa presentes na frente do Tabelião.
314
união, pois é como se um dos cônjuges estivesse se negando a prestar mútua assistência ao
outro. Então, na dissolução a partilha ficará da seguinte forma: reverterão em favor do enfermo,
que não pediu a separação, o remanescente dos bens que levou para o casamento (comunhão
universal) e se o regime permitir, a meação dos bens adquiridos na constância do casamento.
315
Na realidade, todas essas causas podem ser concentradas nos itens “b” ou “i” quando a
separação for irreversível e impossível a reconciliação.
Sempre que ficar caracterizada a insuportabilidade ou a impossibilidade da vida em
comum o juiz deve decretar a dissolução judicial, sem investigar a culpa de um ou outro
cônjuge e sem o requisito do prazo anual da separação de fato (art. 1.572, caput).
Na separação judicial litigiosa cabe ao autor comprovar a culpa do outro cônjuge,
imputando-lhe a causa que levou à dissolução da sociedade conjugal.
Na inicial o autor deve estabelecer todas as cláusulas da separação (alimentos, guarda,
nome do cônjuge, partilha de bens, direito de visitas, etc.), para que se possa discutir ou
conciliar sobre essas cláusulas no correr da ação.
Se na inicial o autor alegar a culpa do outro pelo fim do casamento, na contestação, o
outro poderá alegar que a culpa não era dele, mas sim do autor, fazendo prova nesse sentido.
316
determinará a expedição de novo mandado para averbação no Registro, restabelecendo o
vínculo. No entanto, são ressalvados os direitos de terceiros. O regime de bens será o mesmo.
Para que haja a mudança, só com petição nesse sentido (art. 1.639, § 2.º). A reconciliação não
dispõe de eficácia retroativa. Os bens adquiridos na constância da separação não se
comunicam. Se tiver sido convertida a separação judicial em divórcio não mais será possível o
restabelecimento, sendo necessário novo casamento, inclusive com o processo de habilitação.
Obs.: o divórcio não permite reconciliação!
5. Divórcio:
O divórcio é o meio voluntário de dissolução do casamento. Possui fundamento
constitucional. Será nos termos dos arts. 731 e ss, CPC/2015. Em razão da EC 66/2010 para que as
partes possam requerer o divórcio, não mais existem requisitos de prévia separação judicial ou
de separação de fato por 2 anos. Pode ser requerido a qualquer tempo: no mesmo dia ou no dia
seguinte ao casamento. O CPC/2015, no entanto, previu, ainda, o processo de separação
consensual (arts. 693 a 699, CPC/2015 – processo litigioso e arts. 731 a 734, CPC/2015 – processo
consensual).
317
chegarem a um acordo, o juiz decidirá sobre as questões decorrentes do divórcio (guarda,
alimentos, manutenção ou não do sobrenome, etc.).
O divórcio consuma-se pelo trânsito em julgado da sentença, que deverá ser registrada
no cartório.
5.5. Efeitos:
O maior efeito do divórcio é a dissolução do casamento (a sociedade conjugal termina
com a separação, mas o vínculo do casamento só com o divórcio). Quanto ao nome, poderá
manter, salvo disposição em contrário. Art. 1.571, § 1.º. Contudo, quanto ao poder familiar,
independentemente da modalidade de divórcio, não há alteração, exceto quanto ao tipo de
guarda que ficar acordado ou decidido pelo juiz. Ainda assim, a guarda exclusiva de um dos
pais não retira do outro o direito de acesso do filho ao pai não guardião e deste àquele ou o
direito-dever do pai não guardião de participar da formação moral, religiosa e intelectual do
filho (art. 1.579).
318
Se o divórcio for realizado no exterior, sendo um ou ambos os cônjuges brasileiros, os
efeitos ficam suspensos por um ano da data da sentença judicial. Lei 12.036/2009. Essa regra
não se aplica se o direito estrangeiro também fizer a previsão de prévia separação judicial e
houver transcorrido o prazo de 1 ano da respectiva sentença, de maneira que produzirá efeitos
diretos no Brasil. Contudo, com a EC 66/2010, entende-se que este prazo de suspensão não
precisa ser cumprido88. Em qualquer hipótese, contudo, deverá haver a homologação da
sentença estrangeira pelo STJ. Assim, o casamento do divorciado no exterior sem que tenha
havido homologação do divórcio pelo STJ é nulo.
c) Visitas: art. 1.589. No caso de a guarda ficar exclusivamente com um dos genitores, o
outro deverá ter direito de visitas, que deverá ser estipulado na separação a forma que se dará
(livre ou com hora marcada). A lei 12.398/2011 estabeleceu o direito de visitas extensivo aos avós,
no caso de ser benéfico à criança e/ou adolescente.
d) Dever alimentar: Deve ser fixado tanto em favor dos filhos, quanto com relação ao
casal, podendo haver a dispensa mútua dos alimentos (quanto ao casal, não quanto aos filhos).
Por quê? Pois decorrem do parentesco e são irrenunciáveis.
88
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio. 12.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011, p. 1048-1050
319
discutir culpa pelo fim do relacionamento. Se houver a configuração de alguma das hipóteses
do art. 1.578, CC, deverá ser mantido o sobrenome do cônjuge.
89
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, p. 566-568.
90
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 276.
320
e) Assistência de advogado.
Quanto as cláusulas, a escritura deve expressar a livre decisão do casal quanto aos
alimentos – poderá haver estipulação de um em favor do outro ou mútua dispensa –, descrição
e partilha dos bens comuns, estipulação quanto a mantença ou mudança do sobrenome do
outro.
Enunciado 571: Se comprovada a resolução prévia e judicial de todas as
questões referentes aos filhos menores ou incapazes, o tabelião de notas
poderá lavrar escrituras públicas de dissolução conjugal.
Havendo discordância com relação a qualquer dessas cláusulas o Tabelião não poderá
lavrar a escritura.
Havendo transmissão de bens de um para o outro (no caso de os bens ficarem para um
dos cônjuges apenas), ou seja, quando a partilha não for igualitária, incidirá o ITBI (Imposto de
Transmissão de Bens Imóveis), que deverá ser pago e consignado na escritura, em razão da
diferença de partilha.
No caso do divórcio extrajudicial o Tabelião deve consignar na escritura, pelo menos, o
depoimento de uma testemunhas, que prove que o casal está separado de fato a mais de 2
anos. COM A EC 66 NÃO MAIS É EXIGIDO.
No caso de separação e divórcio extrajudiciais a partilha dos bens não poderá ser feita
após, ou seja, na mesma escritura que faz a separação ou divórcio já deve ser feita a partilha dos
bens, pois na escritura pública não podem ficar pendências remetidas à decisão judicial (por
isso da concordância dos cônjuges quanto a todas as cláusulas do ato).
Os efeitos do divórcio e da separação produzem efeitos imediatos, pois independem de
homologação judicial, de maneira que assinada a escritura e extraído o traslado, este deverá ser
averbado no Registro Civil e no Registro de Imóveis, para publicizar aos terceiros interessados.
A assistência do advogado é obrigatória e não se resume a somente assinar a escritura. O
advogado deve acompanhar todos os passos da escritura, aconselhando seus clientes, fazendo
a minuta das cláusulas da separação/divórcio, ... Na escritura constará a qualificação do
advogado e o número da OAB. Cada cônjuge pode ter o seu advogado ou ambos estarem
representados por apenas um. Podem também ser assessorados pelo Defensor Público, no
caso de não possuírem condições de arcar com os honorários (art. 134, CF).
Os pobres que assim se declararem perante o Tabelião ficarão isentos dos emolumentos
que seriam devidos ao Cartório. Isso porque o Tabelionato e serviço público delegado pelo
Poder Judiciário, ainda que exercido em caráter privado.
Os cônjuges poderão se fazer representar por procurador, com poderes específicos para
tanto. Ainda nesse caso a presença do advogado é indispensável.
321
No caso de separação, transcorrido um ano da lavratura da separação, os separados
poderão lavrar outra escritura, convertendo a separação em divórcio. No mesmo caso, poderão
fazer com a separação que tenha se operado judicialmente.
A reconciliação dos separados extrajudicialmente será formalizada também mediante
escritura pública, que será levada à averbação no Registro Civil.
Se já tiver sido proposta a ação judicial, os cônjuges podem optar pela separação ou
divórcio extrajudiciais? Sim, basta pedir a suspensão da ação ou desistir do mesmo.
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema sobre relações não matrimoniais e dissolução
322
06. Guarda, Alienação parental, Filiação e Reconhecimento de filhos
PROTEÇÃO DA PESSOA DOS FILHOS – GUARDA:
O rompimento da relação entre os pais não pode significar separação de pais e filhos.
Assim, ao chegar ao fim a relação conjugal, deve ser estabelecida a guarda dos filhos,
estabelecendo com quem ficarão os menores. Contudo, ainda que a guarda seja estabelecida
em favor de um dos pais, o outro tem o direito e o dever de visitar permanentemente o filho.
Os filhos não têm de escolher entre um pai ou outro. Tem o direito de convivência com
ambos. Contudo, sempre que o juiz entender necessário, para estabelecer a guarda do menor,
poderá a criança ser ouvida, atentando para o melhor interesse da criança, sem jamais levá-la a
escolha.
A questão da guarda encontra-se, atualmente, estabelecida pela lei 13.058/2014, prevendo
que a guarda será, obrigatoriamente, compartilhada entre os pais. Desde a entrada em vigor
desta lei, muitas confusões vêm ocorrendo e, a maioria delas, ainda, são no sentido de
confundirem a guarda compartilhada com a guarda alternada. Sendo assim, inicialmente,
apresenta-se a diferenciação entre as modalidade de guardas existentes: unilateral,
compartilhada e alternada.
1. Guarda unilateral
A guarda unilateral é aquela em que um dos genitores é detém a guarda física da criança
ou adolescente e o outro detém o direito de visitas. Pela redação trazida pela lei 13.058/2014,
esta modalidade será aplicável apenas quando um dos genitores manifestar que não tem
interesse em deter a guarda do filho.
323
Também é unilateral a guarda estabelecida a terceiro quando o juiz se convencer que
nenhum dos pais preenche as condições necessárias para tal.
No estabelecimento da guarda, em casos de separação, não importa se um dos pais foi
considerado ou não culpado pela separação. Isto não influenciará na fixação da guarda, mas
sim o melhor interesse da criança. Dessa forma, o filho ficará com aquele que detiver melhores
condições de exercício da guarda.
Melhores condições não significa, de maneira alguma, melhores condições financeiras. O
juiz deve levar em conta o conjunto de situações existentes para o desenvolvimento moral,
educacional, psicológico do filho. Fator relevante é o de menor impacto emocional ou afetivo
sobre o filho, para essa delicada escolha.
Em situações excepcionais o juiz pode deferir a guarda a terceiros, quando concluir que
nenhum dos pais tem condições de ficar com o filho. Ex.: pais viciados em drogas. Nesses casos,
o parente mais próximo, normalmente presume-se o mais indicado para ficar com a guarda
(avós, por exemplo), mas essa aptidão deve ser confirmada. Nestes casos, ainda, deve ser levado
em conta a afetividade entre a criança e a pessoa que assumirá a guarda. Ex.: um tio/tia ou
madrasta/padrasto podem ter mais afetividade do que os avós.
2. Guarda compartilhada:
A Lei 13.058/2014 alterou o sistema de guardas até então vigente no Brasil, estabelecendo
a guarda compartilhada como obrigatória, estabelecendo-se mesmo em caso de litígio entre os
genitores (embora não se saiba bem como se daria este funcionamento).
A guarda compartilhada pode ser requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por
qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável
ou, ainda, decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da
distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
O art. 1.584, § 2.º, CC, com a redação da lei 13.058/2014, estabelece que a guarda
compartilhada é obrigatória ou compulsória.
§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do
filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder
familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores
declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.
91
Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 265.
324
Enunciado 603: A distribuição do tempo de convívio na guarda
compartilhada deve atender precipuamente ao melhor interesse dos
filhos, não devendo a divisão de forma equilibrada, a que alude o § 2 do
art. 1.583 do Código Civil, representar convivência livre ou, ao contrário,
repartição de tempo matematicamente igualitária entre os pais.
Enunciado 604: A divisão, de forma equilibrada, do tempo de convívio
dos filhos com a mãe e com o pai, imposta na guarda compartilhada
pelo § 2° do art. 1.583 do Código Civil, não deve ser confundida com a
imposição do tempo previsto pelo instituto da guarda alternada, pois
esta não implica apenas a divisão do tempo de permanência dos filhos
com os pais, mas também o exercício exclusivo da guarda pelo genitor
que se encontra na companhia do filho.
Enunciado 605: A guarda compartilhada não exclui a fixação do regime
de convivência.
Enunciado 606: O tempo de convívio com os filhos "de forma equilibrada
com a mãe e com o pai" deve ser entendido como divisão proporcional
de tempo, da forma que cada genitor possa se ocupar dos cuidados
pertinentes ao filho, em razão das peculiaridades da vida privada de cada
um.
Contudo, a lei 13.058/2014, ao estabelecer essa obrigatoriedade, vai contra uma situação
importante: a necessidade de diálogo entre os genitores para que esta modalidade de guarda
possa ser implementada. A lei torna a guarda compartilhada medida impositiva, mesmo
havendo litígio entre os genitores e, neste sentido, cria mais problemas, do que apresenta
soluções.
Nestes casos, é estabelecida a residência do filho na residência de um dos pais, até para
que a criança tenha referência de um lar, mas terá a liberdade de freqüentar a casa do outro
quando e como quiser ou, até mesmo, viver de forma alternada em uma ou outra casa.
O ponto central da guarda compartilhada é a igualdade entre os genitores nas decisões
que influenciem na vida do filho, de modo que evita que um dos genitores seja mero
coadjuvante e só colabore financeiramente para o sustento do filho.
Deve ficar claro que o estabelecimento desta modalidade de guarda nada tem de relação
com a dispensa do pagamento de alimentos com relação aos filhos, devendo, para tanto,
sempre ser levado em consideração a relação do trinômio necessidade x possibilidade x
proporcionalidade.
Enunciado 607: A guarda compartilhada não implica ausência de
pagamento de pensão alimentícia.
325
3. Guarda alternada:
A guarda alternada é uma modalidade que se aproxima da guarda compartilhada, pois o
tempo de convivência do filho é divido entre os pais, passando a viver alternadamente, de
acordo com o que ajustarem os pais ou o que for decidido pelo juiz, na residência de um e de
outro. Ex.: no caso de pais que vivam em cidades diferentes, o filho reside durante o período
escolar com um dos pais e, durante as férias, com o outro.
Sua utilização é bastante rara, pois pode trazer certa instabilidade para a criança, sendo
aplicada apenas em casos excepcionais e se evidenciado que trará benefícios para o menor.
O filho permanece um tempo com o pai e um tempo comm a mãe,
pernoitando certos dias da semana com o pai e outros com a mãe. [...]
Alguns a denominam como a guarda do mochileiro, pois o filho sempre
deve arrumar a sua mala ou mochila para ir à outra casa92.
No Brasil não é aplicável e vem sendo muito confundida com a guarda compartilhada,
especialmente após a entrada em vigor da lei 13.058/2014, que estabelece no art. 1.583, § 2.º que,
na “guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma
equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses
dos filhos”.
A guarda pode ser unilateral ou exclusiva, quando exercida por apenas um dos pais; ou
compartilhada, quando exercida por ambos.
Quando os pais estiverem separados, a preferência é para que acordem quanto a guarda
dos filhos. Contudo, o juiz deve observar se o acordo observa o melhor interesse da criança (art.
1.586).
A guarda pode ser modificada se ficar provado que o guardião ou pessoas de sua
convivência familiar não trata convenientemente a criança ou o adolescente. Ex.: a mãe que
ficou com a guarda do filho que vem a contrair nova união. Se o companheiro da mãe tiver
conduta prejudicial à formação da criança, a guarda poderá determinar a retirada do menor de
tal convivência, transferindo a guarda para o pai ou terceiro. Também poderá haver a
modificação da guarda se este abusar de seu direito, excedendo os limites da guarda.
A guarda pode ser estabelecida a terceira pessoa, desde o nascimento, se houver
abandono afetivo. Ex.: se a mãe biológica abandonou a criança, a guarda pode ser estabelecida
em favor da avó.
4. Direito de visitas
92
Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 271.
326
O genitor que não ficar com a guarda terá direito de visitas, conforme convencionado
entre os genitores ou definido pelo juiz. Não devem haver grandes limitações, sob pena de
prejudicar a própria criança.
A regulamentação do direito de visitas deve ser estabelecida já na separação ou divórcio
(art. 729, III, CPC/2015).
O direito de visitas não se restringe a visitar o filho na residência do guardião ou no local
que este designe. Abrange o direito de ter o filho em sua companhia e o de fiscalizar sua
manutenção e educação (art. 1.589, CC).
Cabe ao pai não guardião o direto-dever de fiscalizar o exercício da guarda, de maneira
que se ela não estiver sendo desempenhada da melhor forma possível, no melhor interesse da
criança, o genitor não guardião poderá requerer ao juiz que destitua aquele que está com a
guarda exclusiva e a transfira para si.
Mas o direito de visita não se restringe apenas ao pai não guardião, mas também aos
familiares deste (avós, tios, primos), ou seja, a criança deve ter contato afetivo tanto com a
família da mãe, quanto a do pai – art. 1.589, § único.
As visitas só podem ser negadas – tanto nos casos dos genitores, quanto nos casos dos
familiares destes – quando houver sérios indícios de prejuízos para a criança, que
desaconselhem as visitas. Nestes casos o juiz poderá restringir ou suspender as visitas.
327
Assim, um dos genitores, magoado com o fim do relacionamento, procura afastar os filhos
do outro genitor, denegrindo sua imagem perante a criança e prejudicando o direito de visitas.
Esta conduta é prevista no art. 2.º da lei 12.318:
328
FILIAÇÃO E RECONHECIMENTO DOS FILHOS
“A filiação pode ser conceituada como sendo a relação jurídica decorrente do parentesco
por consanguinidade ou outra origem, estabelecida particularmente entre os ascendentes e
descendentes de primeiro grau” 93.
No direito brasileiro a filiação é biológica ou não biológica, reforçando-se a ideia da
necessidade de reconhecimento da paternidade/maternidade por afetividade.
Como é feita a comprovação da filiação? A filiação é demonstrada pela certidão do
registro de nascimento, efetuado junto ao cartório civil.
Possibilidade do reconhecimento da multiparentalidade, ou seja, do reconhecimento, no
registro civil dos indivíduos, tanto da paternidade biológica, quanto da socioafetiva. Não existe
um grande número de decisões a esse respeito, mas algumas sentenças já estão determinando
o registro duplo da criança (dois pais ou duas mães) e, a partir daí, direitos alimentares e
sucessórios, também múltiplos.
93
TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil: direito de família. 8.ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2013, p. 328.
329
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha
prévia autorização do marido.
Essa presunção, contudo, não é absoluta, sendo ilidida através de prova em contrário. Mas
a ação para ilidir a presunção de paternidade só pode ser proposta pelo marido ou
companheiro da mãe da criança. A prova é feita via DNA. Neste aspecto, deve-se atentar para o
fato de que ação que contesta esta paternidade (1.601, CC) é a negatória de paternidade. Esta
ação só é cabível se proposta pelo pai (art. 1.601) e é imprescritível. Deve-se observar, contudo, a
questão da paternidade socioafetiva nestes casos.
A prova da impotência do varão à época da concepção (impotência generandi), ilide a
presunção de paternidade (art. 1.599), mas a confissão de adultério não ilide (1.600 + 1.602). O
exame de DNA serve como forma de sanar quaisquer dúvidas quanto a paternidade.
No caso de inseminação artificial heteróloga a presunção de filiação decorre
exclusivamente da verdade afetiva, de modo que é reconhecida a filiação mesmo diante da
certeza da inexistência de filiação biológica.
2. Paternidade registral:
O registro de nascimento é meio de prova da filiação, não sendo, contudo, o único, já que
a declaração manifestada perante o juiz, a escritura pública, o escrito particular e o testamento,
também comprovam a filiação (art. 1.609).
Todo aquele que se apresenta no Cartório e registra um recém nascido, declarando-se
como pai do mesmo, passa assim o ser considerado para todos os fins legais. O registro só pode
ser invalidado se houver erro ou falsidade (art. 1.604). Nestes casos, se o pai que registrou a
criança, acreditando ser filho seu, descobrir que não é, deve ingressar com ação anulatória de
paternidade.
Segundo Tartuce94, esta situação não se aplica nos casos de socioafetividade. Para ele:
94
TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil: direito de família. 8.ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2013, p. 349
330
3. Inseminação artificial:
O art. 1.597 presume como tendo sido concebidos na constância do casamento os filhos
havidos por técnicas de reprodução assistida: homóloga, mesmo que falecido o marido;
havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de
concepção artificial homóloga; e os havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que
exista prévia autorização do marido.
332
A tutela jurídica da posse do estado de filho abriga dos chamados filhos de criação, que se
enquadram na filiação socioafetiva. A posse do estado de filiação, consolidada no tempo, não
pode ser contraditada por investigação de paternidade fundada em prova genética.
5. Prova da filiação:
No direito brasileiro a prova da filiação é feita pela certidão de nascimento registrada no
Registro Civil (art. 1.603). Contudo, essa prova não é exclusiva, pois se admite a prova da posse
do estado de filiação (art. 1.605). Também não é definitiva, pois admite eventual invalidação (art.
1.604).
O art. 50 da Lei 6.015/73 estabelece que todo nascimento deverá levado a registro, no
lugar onde tiver ocorrido o parto ou no local de residência dos pais, no prazo de 15 dias.
O art. 52 estabelece que o dever de fazer a declaração de nascimento é dos pais ou, na
falta destes, o parente mais próximo, prosseguindo sucessivamente o ônus nas pessoas dos
administradores de hospitais, dos médicos, das parteiras, terceiros, que tiverem assistido ao
parto.
Se a mãe for casada, constará o nome do marido como pai, pela presunção de
paternidade. Se não o for, o nome do pai só constará no registro se ele assim se declarar.
O registro de nascimento produz uma presunção de filiação quase absoluta, pois apenas
pode ser invalidade se provado que houve erro ou falsidade.
O art. 1.604 estabelece que ninguém poderá vindicar estado contrário ao que resulta do
registro de nascimento. Assim, a validade do registro pode ser impugnada apenas nas
hipóteses de erro ou falsidade.
A prova da filiação, acolhida em juízo, é o quanto basta para regularizar o registro de
nascimento e a certificação da paternidade e maternidade. A ação de estado de filiação não
prescreve nem decai em tempo algum.
Ação de prova de filiação ≠ ação de investigação de paternidade A ação de prova de
filiação (art. 1.606) busca comprova a situação de fato (posse do estado de filho), cuja aparência
resulta de presunção veemente ou de começo de prova escrita dos pais. É a regularização do
registro de nascimento que deixou de ser feito por algum motivo. O pai sempre se comportou
como tal. Não cabe o exame de DNA. Na segunda, objetiva-se o reconhecimento compulsório
do filho, por omissão ou recusa do investigado, tenha ou não havido convivência familiar.
O legitimado para propor a ação de prova de filiação é somente o filho, que não pode ser
substituído por quem quer que seja. É um direito personalíssimo e imprescritível (o titular pode
propor enquanto estiver vivo). Os herdeiros não podem propor esta ação, de maneira que só
poderão prosseguir na ação iniciada pelo titular.
No caso de filho menor a ação poderá ser intentada pelo representante legal, porque será
o próprio filho o autor da ação.
333
6. Reconhecimento de filho:
O reconhecimento é o ato que declara a filiação, estabelecendo, juridicamente, o
parentesco entre pai, mãe e filho. Não cria a paternidade, apenas declara um fato. Dessa
maneira, o ato de reconhecimento é declaratório e não constitutivo.
O reconhecimento de estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e
imprescritível, podendo ser exercido contra os pais ou seus herdeiros, sem quaisquer
limitações. Sendo ato personalíssimo, não pode ser feito por avô ou filho, por exemplo. Todavia,
é permitido o reconhecimento por procurador, com poderes especiais para tanto, pois a
declaração de vontade já está expressa na própria procuração.
O ato declaratório do reconhecimento pode decorrer da livre manifestação dos pais,
quando será voluntário ou de sentença proveniente de ação de investigação de paternidade
ou maternidade, quando será judicial.
Voluntário:
O reconhecimento voluntário é o meio legal pelo qual pai, mãe, ou ambos, revelam
espontaneamente o vínculo que os liga ao filho, outorgando-lhe o status correspondente (art.
1.607).
Filho maior – art. 1.614 – necessidade de consentimento.
Filho menor – pode impugnar o reconhecimento nos 4 anos posteriores a sua maioridade
ou emancipação.
Reconhecimento de filho falecido – art. 1.609, § único – só é permitido se o filho tiver
deixado herdeiros, caso em que cabe a eles consentir com o ato de reconhecimento. Essa
exigência existe para evitar que haja reconhecimento de filhos a fim de receber herança (caso
de não haverem descendentes, os ascendentes herdarão).
Reconhecimento = ato irretratável ou irrevogável, inclusive se feito em testamento (art.
1.610). Pode, contudo, ser anulado, se eivado de vício de vontade, como erro, coação, ou se não
observar as formalidades legais (através da anulatória).
O reconhecimento será feito (art. 1.609, CC – lei 8.560/92):
I - no registro do nascimento. O pai comparece ao Registro Civil e presta declarações
sobre a descendência do registrado, assinando o termo na presença de testemunhas. Se o pai é
o declarante, constando a maternidade no termo de nascimento (emitido pelo Hospital), a mãe
só poderá contestar provando a falsidade do termo ou das declarações nele contidas (art. 1.608).
O registro de nascimento feito por quem sabe não ser o pai biológico da criança é tido como
adoção à brasileira e gera paternidade socioafetiva.
II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório. A
escritura pública não precisa ser específica para esse fim, podendo ocorrer em uma escritura de
334
compra e venda, quando a paternidade será declarada de modo incidente, assinado pelo
declarante e testemunhas. Pode também ocorrer por escritura particular, com firma
reconhecida, devendo ser arquivada no Cartório.
III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado. O testamento pode ser
cerrado, público ou particular ou especial (art. 1.886). Ainda que o testamento venha a ser
anulado, o reconhecimento constante nele não perderá o efeito, a menos que o testador não
tenha condições de manifestar sua vontade de forma inequívoca (ex.: se for demente).
IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento
não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.
Judicial:
Resulta de sentença proferida em ação intentada com o fim de ter o reconhecimento do
filho (ação de reconhecimento da paternidade ou maternidade). Essa ação deve ser intentada
pelo filho, por ser pessoal, mas os herdeiros poderão prosseguir nela, no caso do falecimento do
titular do direito. A ação pode ser ajuizada contra o pai, contra a mãe, ou contra ambos. A
contestação pode ser feita por qualquer pessoa que tenha interesse moral ou econômico na
ação (art. 1.615) (ex.: cônjuge do réu, herdeiros, etc.). A sentença tem eficácia absoluta, valendo
contra todos. Deverá já haver a fixação dos alimentos provisionais ou definitivos. Deve ser
averbada no registro competente.
Oficioso:
Lei 8.560/92, art. 2.º. Se apenas a mãe comparecer no Cartório de Registro Civil e esta
indicar o nome do pai, o registrador deverá remeter ao juiz corregedor a certidão do registro e o
nome do indicado pai, devidamente qualificado, para que oficiosamente se verifique a
procedência da imputação da paternidade. A indicação falsa leva a mãe a incursionar no crime
de falsidade ideológica.
O juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade alegada e será notificado o
suposto pai para se manifestar.
Se o suposto pai confirmar a paternidade, será lavrado termo de reconhecimento,
remetendo-se a certidão ao oficial do Registro, para que faça a averbação da paternidade.
Se o suposto pai não se apresentar dentro de 30 dias da notificação judicial, ou se negar a
paternidade, os autos serão remetidos ao MP para que intente ação de investigação de
paternidade, mesmo sem a iniciativa do interessado direto. O MP age como substituto
processual. Mas se o interessado (investigado) quiser, poderá intentar a ação de investigação –
art. 2.º, § 6.º, Lei 8.560/92.
335
Art. 2° Em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade
estabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e o
nome e prenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, a fim
de ser averiguada oficiosamente a procedência da alegação.
§ 1° O juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade
alegada e mandará, em qualquer caso, notificar o suposto pai,
independente de seu estado civil, para que se manifeste sobre a
paternidade que lhe é atribuída.
§ 2° O juiz, quando entender necessário, determinará que a diligência
seja realizada em segredo de justiça.
§ 3° No caso do suposto pai confirmar expressamente a paternidade, será
lavrado termo de reconhecimento e remetida certidão ao oficial do
registro, para a devida averbação.
§ 4° Se o suposto pai não atender no prazo de trinta dias, a notificação
judicial, ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá os autos ao
representante do Ministério Público para que intente, havendo
elementos suficientes, a ação de investigação de paternidade.
§ 5º Nas hipóteses previstas no § 4o deste artigo, é dispensável o
ajuizamento de ação de investigação de paternidade pelo Ministério
Público se, após o não comparecimento ou a recusa do suposto pai em
assumir a paternidade a ele atribuída, a criança for encaminhada para
adoção. (Redação dada pela Lei nº 12,010, de 2009)
§ 6º A iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem
tenha legítimo interesse de intentar investigação, visando a obter o
pretendido reconhecimento da paternidade. (Incluído pela Lei nº
12,010, de 2009)
Efeitos do reconhecimento:
O reconhecimento (voluntário ou judicial) de filho havido fora do casamento produz
efeitos ex tunc, retroagindo até o dia do nascimento do filho ou mesmo de sua concepção se
isto for de seu interesse. O reconhecimento produz os seguintes efeitos:
• Impede que o filho reconhecido por um dos cônjuges resida no lar conjugal sem a
concordância do outro (art. 1.611).
336
• Sujeita o filho menor ao poder familiar do genitor que o reconheceu e, se ambos o
reconheceram, e não houver acordo, sob o poder de quem melhor atender aos interesses do
menor (art. 1.612).
• Concede direito à alimentos tanto para o genitor quanto para o filho (art. 1.694 e art.
1.696).
7. Ações de filiação:
I. Negatória de paternidade:
Casos do art. 1.597, CC – a paternidade pode ser impugnada por aquele cujo nome veio a
ser declinado como genitor da criança (marido da mãe da criança). A presunção de paternidade
não é absoluta, de modo que o pai pode elidi-a provando o contrário. A ação é de ordem
pessoal, privativa daquele a quem foi atribuída a paternidade, de maneira que só ele é
legitimado a propor referida ação (art. 1.601). Contudo, se o titular da ação falecer, seus herdeiros
poderão prosseguir com a ação (art. 1.601, § único). A ação negatória é imprescritível (art. 1.601).
IMPOTÊNCIA GENERANDI: impossibilidade de conceber filho. Para tanto será exigida
perícia médica que comprove a impotência absoluta, pois se houver mero distúrbio psíquico
transitório, a presunção será mantida, só sendo elidida pelo exame de DNA. Trata-se da
impotência em razão de infertilidade.
ADULTÉRIO DA MULER: deve provar que houve adultério e relação sexual de sua mulher
com outro homem. Mas por si só não é fato para justificar a negatória de paternidade, devendo,
ainda, provar que estava fisicamente impossibilitado de gerar filhos à época da concepção. Ex.:
estava separado judicialmente, não tendo convivido um só dia sob o mesmo teto, daí não ter
havido qualquer relaçao sexual entre eles. Assim, o adultério serve como prova complementar
na negatória de paternidade.
337
III. Anulatória:
Quando o reconhecimento é feito pelo suposto genitor (voluntária ou judicialmente). É
ato irretratável e incondicional. Contudo, poderá emanar de vícios de vontade ou defeitos
formais de registro. Neste caso a modificação do registro somente se admite com a ação
anulatória. O autor da ação poderá ser tanto o pai que reconheceu, quanto o filho reconhecido.
Pode também ser proposta pelo MP, quando pai e filho estarão no polo passivo da ação. A ação
é imprescritível, pois se trata de estado de filiação.
IV. Investigatória:
Por meio da ação investigatória de paternidade busca-se a declaração de seu respectivo
status familiae. Processa-se mediante ação ordinária proposta pelo filho contra o genitor ou
seus herdeiros ou legatários. Caso o investigante faleça antes do fim da ação, seus herdeiros
poderão prosseguir na ação, mas não poderão intentá-la em nome do investigante. Nesse
sentido, o direito à investigação de paternidade é personalíssimo, na medida em que pode ser
exercida somente pelo filho (podendo ser representado ou assistido, se menor de idade); é
indisponível, já que não pode ser renunciado; é imprescritível, pois pode ser exercido a
qualquer momento (súmula 149, STF).
Contudo, deve-se destacar que a Lei 8.560/92, no art. 2.º, §§ 4.º e 5.º reconheceu a
possibilidade de o MP propor a ação de investigação de paternidade.
Questão controvertida na investigação de paternidade – a paternidade socioafetiva:
existindo paternidade socioafetiva o entendimento é de que ela não pode ser desconstituída
em nome da verdade biológica.
Questão controvertida na investigação de paternidade – a negativa do suposto pai
de se submeter ao exame de DNA: Há discussões sobre a negativa do pai a submeter-se ao
exame de DNA por ser atentatório a sua dignidade e intimidade. A maioria da doutrina, bem
como o STJ (súmula 301) entende que haverá a presunção da paternidade neste caso. SÚMULA
301, STJ: Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz
presunção juris tantum de paternidade. Para terminar com as discussões, a Lei 12.004/09, veio a
regulamentar essa questão, incluindo o art. 2.º-A, § único, da Lei 8.560/92, e estabelecendo que a
recusa do réu em se submeter ao exame de DNA gerará a presunção da paternidade, que
deverá ser apreciada em conjunto com o contexto probatório. Essa presunção é relativa. O juiz,
para reconhecê-la, deve analisar outras provas (fotos da relação do casal, cartas, testemunhas,
etc).
V. Investigação de maternidade:
A ação de investigação de maternidade será proposta pelo filho contra a suposta mãe ou
seus herdeiros. Ocorre apenas em situações excepcionais, pois invariavelmente se tem certeza
338
sobre a maternidade, já que normalmente se o genitor não fizer o registro, a própria mãe o fará.
Prova-se a maternidade, naturalmente, pelo parto. Porém possível a investigação da
maternidade nos casos de abandono, ocultação, exposição indevida e rapto.
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
339
07. Alimentos: diferença entre alimentos e obrigação familiar de sustento; características;
pressupostos de fixação; classificação dos alimentos
ALIMENTOS:
Juridicamente, “os alimentos significam o conjunto das prestações necessárias para a
vida digna do indivíduo” (Gagliano e Pamplona Filho, p. 683).
340
Não se deve confundir a obrigação de prestar alimentos com os deveres familiares de
sustento, assistência e socorro que tem o marido em relação à mulher e vice-versa e os pais
para com os filhos menores, devido ao poder familiar, pois seus pressupostos são diferentes.
Dever familiar de sustento ≠ obrigação alimentar. Dever familiar de sustento é
decorrência do poder familiar. Obrigação alimentar é fixada judicialmente. O dever familiar de
sustento cessa com a maioridade, sem necessidade de qualquer declaração. Obrigação
alimentar deve ser extinta judicialmente, através de ação de exoneração.
ATENÇÃO para essas características! Muitas questões podem ser resolvidas com base
nelas!!!
3. É incessível em relação ao credor, de maneira que o crédito não pode ser cedido a
terceiro, por ser inseparável da pessoa do credor.
4. É irrenunciável. É possível que se deixe de exercer, mas não que se renuncie o direito
a alimentos. Pode-se renunciar o exercício, mas não o direito. Art. 1.707.
Discute-se sobre a possibilidade de renúncia de alimentos em sede de separação/divórcio.
A doutrina e a jurisprudência não são uníssonas, ainda que o entendimento majoritário seja no
341
sentido de admitir a renúncia no divórcio. Nesse sentido, a III Jornada de Direito Civil aprovou
enunciado:
Enunciado n.º 263, CJF/STJ: O art. 1.707 do Código Civil não impede que
seja reconhecida válida e eficaz a renúncia manifestada por ocasião do
divórcio (direto ou indireto) ou da dissolução da ‘união estável’. A
irrenunciabilidade do direito a alimentos só é admitida enquanto
subsista vínculo de Direito de Família.
Apesar disto, ainda não há uma uniformidade, de forma que, ainda hoje, se encontrem
decisões em ambos os sentidos (algumas admitindo a renúncia e outras, não). Em concursos
públicos, na primeira fase, deve- se observar o que diz a lei: irrenunciabilidade, nos termos do
art. 1.707, CC. Nas segundas fases e provas orais, deve-se explanar essas discussões doutrinárias
e jurisprudenciais.
5. É imprescritível. Mesmo que não seja exercido, não prescreverá o direito de, no
futuro, pleitear os alimentos. Contudo, se fixados os alimentos, prescreve em 2 anos a pretensão
de cobrança das parcelas em atraso, salvo exceções. Tartuce (p. 436) apresenta uma tabela
sobre a matéria:
* Para todos verem: quadro
342
6. É impenhorável. Destina-se a prover a subsistência do necessitado e dessa maneira
não pode, de maneira alguma, responder por suas dívidas.
7. É incompensável. Se houvesse compensação dos alimentos com outras obrigações,
tirariam os meios de sobrevivência do alimentado. Mesmo que o alimentante torne-se credor
do alimentado, não poderá haver compensação.
8. É intransacionável. Não é possível a transação quanto ao direito a alimentos, mas
quanto ao valor da prestação, sim.
9. É atual. Os alimentos visam satisfazer as necessidades atuais ou futuras e não as
passadas do alimentando.
10. É irrestituível. Uma vez pagos, os alimentos não devem ser restituídos, mesmo que a
ação do beneficiário seja julgada improcedente.
13. É periódico. O pagamento da obrigação alimentar deve ser periódico, pois assim se
atende à necessidade de se prover a subsistência. Normalmente é mensal.
A obrigação de prestar alimentos possui as seguintes características:
1. Condicionalidade. Só surge quando ocorrem seus pressupostos legais. Faltando um
deles, cessa a obrigação (se o alimentado adquirir recursos materiais que lhe possibilitem a
mantença, o obrigado ficará liberado).
2. Mutabilidade do quantum da pensão alimentícia. Os alimentos podem sofrer
343
variações quantitativas e qualitativas. O quantum é fixado analisando o binômio necessidade x
possibilidade. Pode haver redução, majoração ou exoneração. Também haverá a alteração com
as atualizações monetárias e variações do salário mínimo.
3. Reciprocidade. O parente que presta os alimentos poderá, se mudar sua situação
econômica, solicitá-los àquele a quem prestava.
4. Periodicidade. Seu pagamento poderá ser quinzenal ou mensal, de maneira que não
pode ser pago de uma única vez.
4. Pressupostos:
Os pressupostos essenciais da obrigação alimentar são:
a) Existência de companheirismo, vínculo de parentesco ou conjugal entre o
alimentando e o alimentante. Podem ser exigidos alimentos entre irmãos? Sim, trata-se de
vínculo de parentesco. Art. 1.697.
b) Necessidade do alimentando. O alimentado deve estar precisando dos alimentos,
pela impossibilidade de trabalhar e prover seu próprio sustento.
c) Possibilidade econômica do alimentante. O alimentante deverá cumprir com o
dever, sem que haja desfalque do necessário ao seu próprio sustento.
d) Proporcionalidade, na sua fixação, entre as necessidades do alimentário e os
recursos econômico-financeiros do alimentante.
5. Classificação:
Quanto à finalidade:
a) Provisionais: se concedidos em ação cautelar preparatória ou incidental. Serão
arbitrados pelo juiz. Podem ser revogados a qualquer momento. Os fixados em cautelar de
separação de corpos, por exemplo. Art. 1.706.
b) Provisórios: Fixados incidentalmente pelo juiz no curso do processo de congnição ou
liminarmente em despacho inicial na ação de alimentos. Tem natureza antecipatória. Liminar
em ação de alimentos.
344
instrução, assistência, recreação). Art. 1.694, caput.
Quanto à causa jurídica:
a) Voluntários: resultantes de declaração de vontade, inter vivos ou causa mortis. Ex.: o
marido, na separação, estipula a pensão a prestar à mulher.
c) Legítimos: impostos por lei em virtude do fato de existir entre as pessoas um vínculo
de família.
Quanto ao momento da reclamação:
Quanto à modalidade:
a) Próprios: é o fornecimento direto de alimentos no próprio lar do alimentante, que
fornece hospedagem e sustento ao alimentado. Fornecimento de alimentos in natura.
Normalmente o genitor que fica com a guarda presta alimentos próprios.
b) Impróprios: pagamento de prestação pecuniária, na forma de pensão mensal. É a
forma mais comum de pagamento de alimentos. Geralmente é pago pelo genitor não detentor
da guarda.
Tartuce (p. 423) afirma que os alimentos devidos entre os cônjuges tratam-se de
alimentos compensatórios, ideia desenvolvida por Rolf Madaleno, que entende que trata-se de
uma prestação periódica, paga de um cônjuge para o outro, visando compensar um possível
desequilíbrio econômico causado pela separação/divórcio. Isto porque, durante o matrimônio o
casal experimentava um nível de vida que pode, eventualmente, ter sido reduzido (condições
econômicas) em razão do rompimento. Devem ser prestados por determinado tempo,
possibilitando que o cônjuge necessitado possa se qualificar para se inserir no mercado de
trabalho.
345
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
Só as pessoas que procedem de um mesmo tronco ancestral comum é que podem exigir
alimentos uma das outras, excluindo-se os afins (sogro, genro, ...).
Os parentes mais próximos excluem os mais remotos na exigência da obrigação
alimentar, passando-se aos mais distantes só na falta dos mais próximos.
346
Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais
próximos em grau, uns em falta de outros.
Mas é possível pleitear alimentos complementares dos parentes mais remotos, na falta
dos mais próximos.
Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não
estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados
a concorrer os de grau imediato;
Avós – obrigação avoenga – enunciado 342, CJF/STJ = Art. 1.695: Observadas suas
condições pessoais e sociais, os avós somente serão obrigados a prestar alimentos aos netos em
caráter exclusivo, sucessivo, complementar e não- solidário quando os pais destes estiverem
impossibilitados de fazê-lo, caso em que as necessidades básicas dos alimentandos serão
aferidas, prioritariamente, segundo o nível econômico-financeiro de seus genitores.
Súmula 596, STJ - A obrigação alimentar dos avós tem natureza
complementar e subsidiária, somente se configurando no caso de
impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais. (Súmula
596, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/11/2017, DJe 20/11/2017)
Dessa maneira, se o pai prestar 30% dos alimentos necessários, o filho poderá exigir do
avô que complemente, devendo este prestar 70%.
Tio não tem dever de prestar alimentos a sobrinho. Também não existe obrigação
alimentar entre primos!
Deve-se observar o fato da adoção. Neste caso, extinguindo-se o parentesco
biológico, o adotado não pode exigir dos pais naturais alimentos, na impossibilidade dos
adotivos prestarem, nem os pais biológicos podem exigir alimentos do filho que foi
adotado. Contudo, essa obrigação surge entre o adotado e os parentes do adotante e vice-
versa.
Nessa ordem não entra o cônjuge, pois o dever de alimentos é por força de outro
fundamento legal, o dever de assistência do marido à mulher e vice-versa.
347
Nestes casos, se o alimentado (cônjuge) passar a viver com outra pessoa, constituir nova
família, ou praticar atos desonrosos contra o alimentante, exonerará o devedor da obrigação de
prestar alimentos. Mas precisa de ação judicial para que a exoneração se opere. Art. 1.708.
Mas a constituição de nova família por parte do alimentante não o exonera da obrigação
alimentar prestada à ex mulher. Contudo, pode haver a minoração do valor prestado. Art. 1.709.
No caso de separação, o cônjuge culpado perderá o direito a alimentos. Estes só serão
fixados, nestes casos, se o culpado não tiver parentes que possam prestar os alimentos, nem
aptidão para o trabalho. Art. 1.704, § único. Se ambos os cônjuges forem culpados, não haverá a
fixação de alimentos.
É possível a fixação de alimentos gravídicos: alimentos fixados à mulher para que possa
atender a suas necessidades especiais. Esses alimentos serão fixados pelo juiz contra o suposto
pai, havendo indícios da paternidade. A lei 11.804/2008 é que disciplina essa matéria.
Estes alimentos serão os valores suficientes para cobrir despesas adicionais do período
gestacional – desde a concepção até o parto –, inclusive as decorrentes de alguma alimentação
especial, assistência médica, internação, exames, etc.
Deve-se atentar para o fato de que os valores deverão ser custeados na proporção das
possibilidades dos genitores (suposto pai e gestante), já que tais alimentos são para o feto e não
348
para a gestante. Deve-se, portanto, observar a questão da proporcionalidade na fixação de tais
alimentos.
Legitimada para pleitear = a mãe da criança.
3. Ação de alimentos:
A ação de alimentos é o meio técnico de reclamar a prestação alimentícia, desde que se
configurem os pressupostos jurídicos.
349
A lei 5.478/68 estabelece o rito especial para a ação de alimentos, que deve ser célere.
Para tanto, deve haver prova pré-constituída da existência da relação de parentesco
(paternidade já reconhecida).
Esta ação é imprescritível. Contudo, para exigir a execução dos alimentos, já fixados, e que
estão vencidos, o prazo prescricional é de 2 anos.
O foro competente é o do domicílio do alimentando – art. 53, II, CPC/2015. Depende de
intervenção do MP.
Podem os pais propor ação de alimentos a fim de fixar o valor devido aos filhos? Sim. Ver
art. 24, lei 5.478/68.
Art. 24. A parte responsável pelo sustento da família, e que deixar a
residência comum por motivo, que não necessitará declarar, poderá
tomar a iniciativa de comunicar ao juízo os rendimentos de que dispõe e
de pedir a citação do credor, para comparecer à audiência de conciliação
e julgamento destinada à fixação dos alimento a que está obrigado.
2. Fixação de alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor desde a citação – art. 4.º.
3. Há uma fase inicial de conciliação, onde o juiz tenta um acordo entre as partes – art. 5.º.
4. Nessa audiência será apresentada a contestação, caso não haja acordo.
5. Fase de instrução.
6. Sentença final (retroativa a data da citação, a partir de quando as prestações mensais
poderão ser exigidas.
a) Título executivo extrajudicial – ação de execução – rito da prisão (art. 911, CPC/2015);
b) Título executivo extrajudicial – ação de execução – rito da expropriação (art. 913,
95
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 621-622.
350
CPC/2015);
c) Cumprimento de sentença ou decisão interlocutória (nos mesmos autos) – rito da
prisão (art. 528, CPC/2015);
d) Cumprimento de sentença ou decisão interlocutória (nos mesmos autos) – rito da
expropriação (art. 530, CPC/2015);
Deve-se destacar que mesmo havendo bens para garantir a execução (seja por
cumprimento de sentença ou por execução autônoma), a preferência será o desconto em folha.
Assim, se o devedor é trabalhador assalariado, seu empregador ou o ente público (para quem
ele trabalha) deverá descontar os valores de sua remuneração, conforme determinado por
ofício judicial, sob pena de desobediência. O desconto pode ocorrer das parcelas vencidas (em
atraso) e das mensais, desde que não ultrapasse 50% dos ganhos líquidos do alimentante96.
96
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, 622.
97
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 591-592.
351
Não havendo pagamento, ou se a justificativa não for aceita, o juiz, além de mandar
protestar a decisão, determinará a prisão civil do executado pelo prazo de 1 a 3 meses (§ 3.º).
Havendo prisão, esta deverá ser cumprida em regime fechado e em separado dos presos
comuns (§ 4.º).
Sobre a prisão dos avós, ver o Enunciado n.º 599, VII Jornada de Direito Civil:
ENUNCIADO 599 – Deve o magistrado, em sede de execução de
alimentos avoengos, analisar as condições do (s) devedor (es), podendo
aplicar medida coercitiva diversa da prisão civil ou determinar seu
cumprimento em modalidade diversa do regime fechado (prisão em
regime aberto ou prisão domiciliar), se o executado comprovar situações
que contraindiquem o rigor na aplicação desse meio executivo e o torne
atentatório à sua dignidade, como corolário do princípio de proteção aos
idosos e garantia à vida.
Uma vez que a prestação seja paga, o juiz determinará a suspensão da ordem de prisão (§
6.º).
Lembrando que o débito que autoriza a prisão é o correspondente a até 3 meses de
débito alimentar (anteriores ao ajuizamento da ação) e as vencíveis no curso do processo (§ 7.º).
Pode, ainda, o credor escolher em cobrar o débito alimentar nos termos do cumprimento
definitivo de sentença (arts. 523 a 527, CPC/2015). Neste caso não haverá incidência de prisão
civil. A vantagem deste caminho é a incidência de multas. Cabe, nestas situações, a pena de
penhora.
Optando pelo cumprimento definitivo, o juiz determinará que o executado seja intimado
para pagar o débito em 15 dias, acrescido de custas. Não havendo pagamento neste prazo,
incide multa de 10% e honorários de 10%. Havendo pagamento parcial, a multa e os honorários
incidirão apenas pelo que falta a pagar. Não havendo pagamento dentro do prazo, haverá
expedição de mandado de penhora.
Vale lembrar que o cumprimento de sentença dispensa nova ação e nova citação.
Tramitam nos mesmos autos da ação de alimentos ou ação que tenha fixado-os.
98
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11.ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016, p. 619.
353
12) Admite-se, na execução de alimentos, a penhora de valores decorrentes do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço FGTS, bem como do Programa de Integração Social PIS.
13) Os valores pagos a título de alimentos são insuscetíveis de compensação, salvo quando
configurado o enriquecimento sem causa do alimentando.
14) Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir
da citação. (Súmula n. 277/STJ)
2) Na execução de alimentos, é possível o protesto (art. 526, § 3º do NCPC) e a inscrição do
nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito.
5) O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as
três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do
processo. (Súmula n. 309/STJ) (Art. 528, § 7º do NCPC)
6) O atraso de uma só prestação alimentícia, compreendida entre as três últimas atuais
devidas, já é hábil a autorizar o pedido de prisão do devedor, nos termos do artigo 528, § 3º do
NCPC (art. 733, § 1º do CPC/73).
8) O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à
decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos. (Súmula n. 358/STJ)
9) O pagamento parcial da obrigação alimentar não impede a prisão civil do devedor.
10) A base de cálculo da pensão alimentícia fixada sobre o percentual do vencimento do
alimentante abrange o décimo terceiro salário e o terço constitucional de férias, salvo
disposição expressa em contrário. (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/73 - Tema 192)
11) Cabe ao credor de prestação alimentícia a escolha pelo rito processual de execução a
ser seguido.
13) A constituição de nova família pelo alimentante não acarreta a revisão automática da
quantia estabelecida em favor dos filhos advindos de união anterior.
14) Os alimentos devidos entre ex-cônjuges devem ter caráter excepcional, transitório e
devem ser fixados por prazo determinado, exceto quando um dos cônjuges não possua mais
condições de reinserção no mercado do trabalho ou de readquirir sua autonomia financeira.
15) A responsabilidade dos avós de prestar alimentos aos netos apresenta natureza
complementar e subsidiária, somente se configurando quando demonstrada a insuficiência de
recursos do genitor.
354
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
04. SUCESSÕES
01. Abertura da sucessão; Princípio da saisine; Morte real; Morte presumida com e sem
decretação de ausência
SUCESSÃO EM GERAL
1. Abertura da sucessão
A sucessão se abre com o óbito. No exato momento da morte há a abertura da sucessão e
a transmissão da herança (bens, dívidas, créditos e obrigações) deixada pelo falecido aos
herdeiros (princípio da saisine) – art. 1.784.
Não há herança de pessoa viva, embora possa ocorrer a sucessão do ausente.
São, portanto, pressupostos da sucessão:
a) que o de cujus tenha falecido;
b) que lhe sobreviva herdeiro.
Se o autor da herança estiver vivo, não há sucessão. Assim, só se abre a sucessão havendo
óbito real ou presumido.
Em termos de morte civil, existem três modalidades: a) morte real; b) morte presumida
sem declaração de ausência; c) morte presumida com declaração de ausência.
355
a. Morte real
Aquela que se dá com corpo presente, ou seja, existe a materialidade (morte natural, por
atropelamento, por um tiro, cerebral, ...). Neste caso, necessário um laudo médico, atestando a
morte, para a elaboração do registro do óbito.
Nestes casos, após buscas e averiguações poderá ser requerida a declaração judicial da
morte presumida, quando, na sentença, deverá constar a data provável do falecimento99.
c. Morte presumida com declaração de ausência
Ao lado da morte natural, o legislador previu a morte presumida do ausente (art. 6.º).
Considera-se ausente aquele que desaparece de seu domicílio sem dar notícias, sem deixar
representante ou procurador para administrar-lhe o patrimônio, conforme art. 22:
Art. 22. Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver
notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem
99
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das sucessões. V. 6. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p.
13.
356
caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer
interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-
á curador.
O CPC/2015, contudo, traz a previsão, no § 1.º do art. 745, que o edital fará a previsão de
prazo e, no final deste prazo, é que poderá ser requerida a abertura da sucessão provisória.
§ 1º Findo o prazo previsto no edital, poderão os interessados requerer a
abertura da sucessão provisória, observando-se o disposto em lei.
100
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das sucessões. V. 6. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p.
14-20.
357
A doutrina tem entendido que aplica-se a disposição do CPC e não do CC (que prevê a
contagem de 1 ano a partir da arrecadação).
Poderão requerer a abertura da sucessão provisória:
Art. 27. Para o efeito previsto no artigo anterior, somente se consideram
interessados:
I - o cônjuge não separado judicialmente;
II - os herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários;
III - os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente de sua
morte;
IV - os credores de obrigações vencidas e não pagas.
A sentença de abertura da sucessão provisória só produz efeitos após 180 dias da sua
publicação na imprensa, ou seja, o trânsito em julgado desta sentença possui prazo especial e
diferente do geral (art. 28, CC).
Art. 28. A sentença que determinar a abertura da sucessão provisória só
produzirá efeito cento e oitenta dias depois de publicada pela imprensa;
mas, logo que passe em julgado, proceder-se-á à abertura do
testamento, se houver, e ao inventário e partilha dos bens, como se o
ausente fosse falecido.
§ 1º Findo o prazo a que se refere o art. 26, e não havendo interessados na
sucessão provisória, cumpre ao Ministério Público requerê-la ao juízo
competente.
§ 2º Não comparecendo herdeiro ou interessado para requerer o
inventário até trinta dias depois de passar em julgado a sentença que
mandar abrir a sucessão provisória, proceder-se-á à arrecadação dos
bens do ausente pela forma estabelecida nos arts. 1.819 a 1.823.
Art. 29. Antes da partilha, o juiz, quando julgar conveniente, ordenará a
conversão dos bens móveis, sujeitos a deterioração ou a extravio, em
imóveis ou em títulos garantidos pela União.
Após este prazo é possível a abertura de eventual testamento e do inventário para partilha
dos bens. Para que os herdeiros ingressem na posse dos bens do ausente, deverão dar garantia,
através de penhor ou hipoteca dos seus bens (art. 30). Os que não puderem dar as garantias não
receberão o patrimônio, que ficará sob a administração do curador. Contudo, o cônjuge, os
descendentes e ascendentes poderão ingressar na posse, independentemente da garantia.
358
Art. 30. Os herdeiros, para se imitirem na posse dos bens do ausente,
darão garantias da restituição deles, mediante penhores ou hipotecas
equivalentes aos quinhões respectivos.
§ 1º Aquele que tiver direito à posse provisória, mas não puder prestar a
garantia exigida neste artigo, será excluído, mantendo-se os bens que lhe
deviam caber sob a administração do curador, ou de outro herdeiro
designado pelo juiz, e que preste essa garantia.
§ 2º Os ascendentes, os descendentes e o cônjuge, uma vez provada a
sua qualidade de herdeiros, poderão, independentemente de garantia,
entrar na posse dos bens do ausente.
Art. 31. Os imóveis do ausente só se poderão alienar, não sendo por
desapropriação, ou hipotecar, quando o ordene o juiz, para lhes evitar a
ruína.
Art. 32. Empossados nos bens, os sucessores provisórios ficarão
representando ativa e passivamente o ausente, de modo que contra eles
correrão as ações pendentes e as que de futuro àquele forem movidas.
Os herdeiros tem direito a percepção dos frutos dos bens. Se descendente, ascendente ou
cônjuge, percebem todos os frutos. Os demais sucessores, somente a metade.
Art. 33. O descendente, ascendente ou cônjuge que for sucessor
provisório do ausente, fará seus todos os frutos e rendimentos dos bens
que a este couberem; os outros sucessores, porém, deverão capitalizar
metade desses frutos e rendimentos, segundo o disposto no art. 29, de
acordo com o representante do Ministério Público, e prestar anualmente
contas ao juiz competente.
Parágrafo único. Se o ausente aparecer, e ficar provado que a ausência foi
voluntária e injustificada, perderá ele, em favor do sucessor, sua parte nos
frutos e rendimentos.
Art. 34. O excluído, segundo o art. 30, da posse provisória poderá,
justificando falta de meios, requerer lhe seja entregue metade dos
rendimentos do quinhão que lhe tocaria.
Art. 35. Se durante a posse provisória se provar a época exata do
falecimento do ausente, considerar-se-á, nessa data, aberta a sucessão
em favor dos herdeiros, que o eram àquele tempo.
359
Art. 36. Se o ausente aparecer, ou se lhe provar a existência, depois de
estabelecida a posse provisória, cessarão para logo as vantagens dos
sucessores nela imitidos, ficando, todavia, obrigados a tomar as medidas
assecuratórias precisas, até a entrega dos bens a seu dono.
Se o ausente retornar nos 10 anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, terá direito
aos bens no estado em que se encontram, os sub-rogados em seu lugar ou o preço que os
herdeiros tiverem recebido pelos bens alienados. O § 4.º do art. 745, CPC/2015 determina que no
retorno do ausente deverão os sucessores provisórios ou definitivos serem citados para
contestar:
§ 4º Regressando o ausente ou algum de seus descendentes ou
ascendentes para requerer ao juiz a entrega de bens, serão citados para
contestar o pedido os sucessores provisórios ou definitivos, o Ministério
Público e o representante da Fazenda Pública, seguindo-se o
procedimento comum.
Se o ausente não retornar dentro do prazo de 10 anos, os bens serão definitivamente dos
herdeiros.
Art. 39. Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da
sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes,
aquele ou estes haverão só os bens existentes no estado em que se
acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e
demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois
daquele tempo.
360
Parágrafo único. Se, nos dez anos a que se refere este artigo, o ausente
não regressar, e nenhum interessado promover a sucessão definitiva, os
bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito
Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao
domínio da União, quando situados em território federal.
Trata-se de uma exceção do sistema sucessório, “tendo em vista que se admite a abertura
de sua sucessão simplesmente em razão de seu desaparecimento, sem que se tenha certeza de
seu falecimento”101.
101
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das sucessões. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 34.
361
Do contrário, inexiste qualquer interesse jurídico nessa pesquisa. O principal efeito da
presunção da morte simultânea é que, não tendo havido tempo ou oportunidade para a
transferência de bens entre os comorientes, um não herda do outro.
No caso de comoriência a sucessão de cada um deve ser regulada como se o comoriente
jamais houvesse existido. Nenhuma das pessoas atingidas sucederá a outra: por ficção jurídica é
como estas pessoas nunca tivesse existido. Não há transferência de bens e direitos entre os
comorientes.
EXEMPLO:
Num mesmo acidente morrem marido e mulher sem filhos. Com a regra, a sucessão de
cada um é regulada como se o comoriente jamais tivesse morrido. Venosa demonstra a vital
importância da comoriência:
[...] já que a pré-morte de um casal, por exemplo, tem implicações no
direito sucessório. Se faleceu primeiro o marido, transmitiu a herança à
mulher; se ambos não tivessem descendentes ou ascendentes, e a
mulher falecesse depois, a herança iria para os herdeiros dela, ou seja,
seus colaterais. O oposto ocorreria se provasse que a mulher falecera
antes. Tal situação pode ocorrer em casos de catástrofes, acidentes ou
mesmo por coincidência. Para evitar os entraves das presunções de pré-
morte, portanto, o Código presume comoriência, isto é, o falecimento
conjunto (VENOSA, 2012, p. 13)
362
Para que haja a transmissão é preciso que:
a) o herdeiro exista ao tempo da morte;
b) que a esse tempo não seja incapaz de herdar – a capacidade sucessória é verificada
no momento da morte.
Com a morte, extingue-se a personalidade civil e, por óbvio, a existência da pessoa natural
(art. 6.º), bem como a capacidade para ser titular de direitos e obrigações. Assim, pelo princípio
da saisine a posse da herança se transmite desde logo aos herdeiros. Segundo Tartuce (2012, p.
9) no momento da morte ocorre a delação (oferecimento da herança), segundo a qual os bens
do falecido transferem- se ao patrimônio dos herdeiros. Trata-se do período existente entre a
abertura da sucessão e a aceitação ou renúncia da herança.
No caso da aceitação, o efeito é retroativo à data do óbito. A aquisição dos direitos não
ocorre com a aceitação, mas sim com a morte do autor da herança. A aceitação é apenas uma
confirmação do direito do herdeiro, mas trata-se de um ato essencial, já que ninguém pode ser
herdeiro contra sua vontade (VENOSA, 2012, p. 15). Havendo renúncia, entende-se que o
renunciante jamais foi herdeiro.
A importância de saber o momento da morte é para que seja definida a lei que regula a
sucessão e a capacidade (legitimidade) para suceder, nos termos do art. 1.787, CC:
Art. 1.787. Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao
tempo da abertura daquela.
Tartuce (2012, p. 7) traz um exemplo para deixar clara a questão da capacidade para
suceder (e também para testar):
Determinado marido elabora um testamento deixando a parte
disponível de seus bens à sua esposa e, posteriormente, em razão de
esclerose, torna-se absolutamente incapaz. Em razão da doença, a
esposa o abandona, vindo ele a falecer cinco anos depois do divórcio do
casal. No caso descrito, o testador era capaz no momento da elaboração
do testamento e sua incapacidade superveniente não retira a validade do
testamento (art. 1.861, CC). Sua esposa tinha legitimidade para receber a
herança quando o testamento foi feito, mas perdeu-a no momento da
abertura, pois já se encontrava divorciada. Não será herdeira, portanto.
363
Desta forma, a capacidade de suceder é a do tempo da abertura da sucessão (momento
da morte) e, além disto, o lugar onde se abre a sucessão é o do último domicílio do de cujus.
Nestes termos:
Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.
364
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
365
Estrangeiro:
Na sucessão de bens de estrangeiros, há uma disciplina especial. No caso de bens de
estrangeiros, situados no Brasil, aplica-se, via de regra, a lei do último domicílio do falecido (lei
estrangeira), salvo se a lei brasileira for mais favorável ao cônjuge ou filhos brasileiros (o
benefício é para situações em que o falecido for casado com brasileiro ou tiver filhos brasileiros).
Significa dizer que a lei protege o direito do cônjuge e dos descendentes em prejuízo de outros
herdeiros (ascendentes, colaterais).
* Para todos verem: esquema
2. Espécies de sucessão
O art. 1.786 define que a sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade.
a. Legítima
Decorre da lei; obedece a ordem da vocação hereditária (1.829) - ab intestato (bens fora do
testamento, testamento nulo) – art. 1.788. A sucessão legítima será sempre a título universal,
pois os herdeiros recebem a totalidade dos bens do falecido, ou, uma fração ideal (não
366
localizada) do patrimônio. Desta forma, os herdeiros participam da totalidade do ativo e do
passivo.
b. Testamentária
Decorre da manifestação da última vontade - bens abarcados pelo testamento (é válido
apenas sobre a quota disponível – 50% da sua parte). O falecido não tem o poder de dispor
livremente e integralmente do seu patrimônio. Havendo herdeiros necessários (cônjuge,
ascendentes e descendentes – 1.845), fica limitado pela liberdade de testar disposta no art. 1.789,
CC. O poder de dispor integralmente só ocorre na hipótese de herdeiros facultativos.
c. Simultânea:
A sucessão será simultaneamente legítima e testamentária quando houver testamento e
o extinto tiver herdeiros necessários.
RESUMO
* Para todos verem: quadro
e. Sucessão contratual
Apesar de não existir herança de pessoa viva (art. 426), é possível a sucessão contratual,
sendo vedado o pacto sucessório. Porém, excepcionalmente, podem em vida, a teor do art.
2.018, os ascendentes partilharem o seu patrimônio entre os descendentes por escritura pública
(com anuência de todos os descendentes):
367
Art. 2.018. É válida a partilha feita por ascendente, por ato entre vivos ou
de última vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros
necessários.
f. Sucessões irregulares
Sucessão irregular ou anômala é aquela que não obedece às normas próprias e à ordem
da vocação hereditária. A CF/88 estabelece, no art. 5.º, XXXI, o benefício ao cônjuge ou filhos
brasileiros, na sucessão de bens de estrangeiros situados no Brasil, permitindo a aplicação da lei
pessoal do de cujus, se mais favorável.
a. Espécies de sucessores
Herdeiro ou sucessor é aquele que será beneficiado com o patrimônio deixado pelo
falecido. O herdeiro pode ser legítimo ou testamentário.
a. Herdeiro legítimo:
O herdeiro legítimo é o que consta na ordem da vocação hereditária, indicada pela lei. Art.
1.829, CC e 1.790 (união estável). Classificam-se como necessários (descendentes, ascendentes e
cônjuge) e facultativos (colaterais e companheiros ou conviventes). É chamada a sucessão que
resulta da lei.
i. Necessários (legitimário ou reservatário):
É o descendente ou ascendente sucessível e o cônjuge (art. 1.845, CC), isto é, todo parente
em linha reta não excluído da sucessão por indignidade ou deserdação (ou renúncia). Os
herdeiros necessários não podem ser privados por disposição de última vontade. Sua existência
impede que o testador disponha a totalidade de seus bens. A eles é reservada a legítima
(metade da herança).
Segundo o art. 1.846, pertence aos herdeiros necessários a metade dos bens da herança
(legítima). A legítima corresponde, portanto a metade dos bens da herança deixada pelo
falecido, após a retirada da meação (se houver) e pagas as dívidas e despesas de funeral. Assim,
ao lado da expressão herdeiros necessários surge a ideia de legítima e de porção disponível,
conceitos que estão todos interligados.
Nesse sentido, o art. 1.789 afirma que havendo herdeiros necessários “o testador só pode
testar a metade da herança”. Não existindo herdeiros necessários (ascendente, descendente e
cônjuge) o testador pode dispor de 100% de seus bens. IMPORTANTE: durante a vida há a
liberdade de alienar, onerosamente, todo o patrimônio existente, não deixando nada de
herança. O que não pode haver é doação de todo o patrimônio ou excedendo a parte da
liberalidade para um dos filhos.
368
Nesse caso, algumas hipóteses podem ocorrer:
i. Se o autor da herança tiver doado, em vida, para algum herdeiro, em detrimento dos
demais, não mencionando que essa doação sai da sua parte disponível o herdeiro que
recebeu deverá, no inventário, trazer esses bens recebidos por doação a colação, descontando
da sua quota parte (entende-se como adiantamento de legítima);
ii. Se o autor da herança tiver doado, em vida, para algum herdeiro, mencionando que
se trata da sua parte disponível, não poderá exceder ¼ do patrimônio do casal (no caso de
comunhão universal, ou seja, ½ de meação e ½ de herança – dessa ½ da herança, somente a ½
(¼ do patrimônio, portanto) pode ser disponível).
Cálculo da legítima
O art. 1.847 traz a forma de cálculo da legítima. A legítima é calculada sobre a meação do
falecido, representada pelos bens existentes a época da abertura da sucessão.
Art. 1.847. Calcula-se a legítima sobre o valor dos bens existentes na
abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas do funeral,
adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos a colação.
O cálculo da legítima é feito a partir do ativo da herança, ou seja, sobre a herança líquida,
descontadas as dívidas e despesas de funeral. Devem, ainda, ser adicionados os bens sujeitos à
colação.
Patrimônio de R$ 100.000,00
Regime de bens: comunhão universal
Cônjuge sobrevivente = meação → 50% → R$ 50.000,00 Herança = 50% → R$ 50.000,00
Dívidas do de cujus = R$ 10.000,00 Funeral = R$ 5.000,00
Total de despesas = R$ 15.000,00
50.000,00 – 15.000,00 = 35.000,00
Parte disponível = ½ → R$ 35.000,00 / 2 = 17.500,00
Legítima = a outra metade + eventuais bens doados em vida como adiantamento de
legítima.
369
Com herdeiros necessários = apenas 50% da herança (excluída meação). A outra metade
constitui-se da legítima dos herdeiros. Deve ser respeitada a metade disponível aos herdeiros
necessários - art. 1846, CC.
E COMO SE CALCULA O VALOR PASSÍVEL DE SER TESTADO? O valor da parte disponível
(o que importa é o valor da avaliação e não o número de bens existentes) será definido nos
termos do art. 1.847, CC.
Após a avaliação será definido se o testador se manteve dentro da parte disponível. Se
houver excesso, haverá redução conforme as disposições dos arts. 1.966 a 1.968, CC:
Art. 1.966. O remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, quando o
testador só em parte dispuser da quota hereditária disponível.
Art. 1.967. As disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ão
aos limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos
seguintes.
§ 1º Em se verificando excederem as disposições testamentárias a porção
disponível, serão proporcionalmente reduzidas as quotas do herdeiro ou
herdeiros instituídos, até onde baste, e, não bastando, também os
legados, na proporção do seu valor.
§ 2º Se o testador, prevenindo o caso, dispuser que se inteirem, de
preferência, certos herdeiros e legatários, a redução far-se-á nos outros
quinhões ou legados, observando-se a seu respeito a ordem estabelecida
no parágrafo antecedente.
Art. 1.968. Quando consistir em prédio divisível o legado sujeito a redução,
far-se-á esta dividindo-o proporcionalmente.
§ 1º Se não for possível a divisão, e o excesso do legado montar a mais de
um quarto do valor do prédio, o legatário deixará inteiro na herança o
imóvel legado, ficando com o direito de pedir aos herdeiros o valor que
couber na parte disponível; se o excesso não for de mais de um quarto,
aos herdeiros fará tornar em dinheiro o legatário, que ficará com o prédio.
§ 2º Se o legatário for ao mesmo tempo herdeiro necessário, poderá
inteirar sua legítima no mesmo imóvel, de preferência aos outros,
sempre que ela e a parte subsistente do legado lhe absorverem o valor.
3. Herança e espólio
A herança é conjunto patrimonial que é transmitido em razão do falecimento de alguém.
Deve-se destacar que a herança inclui tanto os bens, quanto os créditos e dívidas existentes em
nome do falecido.
A herança constitui o espólio, que é o titular do patrimônio. O espólio é um ente
despersonalizado, uma massa patrimonial ou universalidade de coisas, até a individualização
pela partilha. É utilizado sob o prisma processual. Ao espólio é reconhecida legitimidade ativa e
passiva e o seu representante é o inventariante ou, antes de sua nomeação, pelo administrador
provisório (art. 75, VII, CPC/2015).
O espólio responde pelas dívidas do falecido até a partilha e dentro dos limites da
herança. O espólio tem legitimidade para propor ação de despejo de imóveis de propriedade do
falecido. Após a partilha, cada herdeiro responderá pela dívida, dentro das forças de seu
quinhão. Realizada a partilha, o espólio deixa de existir, pois desaparece a universalidade
patrimonial.
371
Em razão disto, prevê o art. 1.793, CC, que apenas por escritura pública pode haver a
transmissão da herança (escritura pública de cessão de direitos hereditários). Trata-se de
requisito essencial para a validade do ato jurídico. Além disto, há a necessidade de outorga do
cônjuge do herdeiro, para a validade do ato (art. 1.647., I, CC).
Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que
disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
372
5. Cessão de direitos hereditários
O art. 1.793 prevê que toda a herança ou parte dela (quota) é suscetível de alienação
(onerosa ou gratuita). O titular dos direitos hereditários, desde o momento da abertura da
sucessão, goza da faculdade dispositiva. Com a abertura da sucessão instaura-se a o
condomínio sucessório entre os herdeiros legítimos e testamentários (art. 1.784). Antes da morte
não é possível a cessão, pois o direito brasileiro veda o chamado pacto sucessório (contrato que
tem como objeto a herança de pessoa viva) – arts. 426 e 166, II e VII, CC. A forma de transmissão
destes direitos é a cessão. O cedente (herdeiro legítimo ou testamentário) transfere a qualidade
hereditária patrimonial.
A efetiva transferência do direito só se opera com a partilha (trânsito em julgado,
registrado no CRI). Porém, o cessionário se investe instantaneamente nos direitos alienados,
devendo, quando da abertura do inventário, se habilitar.
O Herdeiro único e universal pode ceder, também, no todo ou em parte. Se for universal, o
herdeiro-cedente nada mais terá a ver com a herança (persiste, é óbvio, sua responsabilidade
perante o cessionário até a efetividade do título hereditário: partilha averbada).
Forma e objeto
O direito à sucessão aberta é considerado bem imóvel e, nesse sentido, para que seja
realizada a cessão, deve ser feita por escritura pública, com outorga uxória como condição de
validade do negócio jurídico (art. 1.793; art. 1.647, I; art. 166, IV).
A escritura deve estipular se a cessão é feita de forma gratuita ou onerosa; se estão sendo
cedidos todos os direitos hereditários ou somente de parte do quinhão; etc.
O objeto do contrato são os direitos hereditários.
O cedente: deve ter capacidade para alienar; garante a existência da herança, não sua
extensão.
O cessionário (aquele que adquire): recebe a herança no estado em que se encontra,
correndo o risco de ser mais ou menos, dependo da existência de dívidas; sub-roga-se nos
direitos do cedente, como se fosse ele próprio.
A cessão não pode ser feita quanto a um bem determinado, mas somente quanto à quota
parte do herdeiro cedente, sem individualização. Isto se dá em razão da indivisibilidade da
herança (todo unitário), de forma que é ineficaz a cessão de bem individualizado (art. 1.793, § 2.º,
CC).
§ 2º É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre
qualquer bem da herança considerado singularmente.
Não quer dizer que a cessão não possa ser feita, mas dependerá da concordância dos
demais herdeiros. Ex.: “cede para Fulano de Tal os direitos hereditários que tem por falecimento
373
de XXX, sobre o imóvel Y”. Dependerá da concordância/liberalidade dos demais co-herdeiros.
Isto acontece, normalmente, quando os herdeiros fizeram a partilha de forma amigável,
dividindo entre eles os bens existentes.
Direito de acrescer
A cessão realizada abrange apenas os direitos hereditários existentes no momento da
cessão. Se depois de realizada houver, em favor do cedente, substituição ou direito de acrescer
(em razão de renúncia de um co-herderio, p. e.x.), os direitos daí resultantes não estarão
compreendidos na cessão realizada anteriormente (GONÇALVES, 2012, p. 58).
Caso não tenha sido dado o direito de preferência à algum co-herdeiro, este poderá, nos
termos do art. 1.795, CC, exercer este direito a posteriori:
Art. 1.795. O co-herdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão,
poderá, depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o
requerer até cento e oitenta dias após a transmissão.
Este direito deverá ser exercido em até 180 dias após a ciência da alienação. E se mais de
um herdeiro quiser exercer o direito de preferência? Neste caso, segundo Tartuce (2012, p. 18)
deverá o quinhão cedido ser distribuído entre eles, na proporção de suas quotas hereditárias:
Art. 1.795. Parágrafo único. Sendo vários os co-herdeiros a exercer a
preferência, entre eles se distribuirá o quinhão cedido, na proporção das
respectivas quotas hereditárias.
374
inventário (deverá se habilitar). Se for único herdeiro, pode requerer a adjudicação do bem
cedido. Pode ser nomeado inventariante. Pode requerer a abertura do inventário.
- Quando for feito inventário extrajudicial, pode-se realizar a cessão de direitos no
mesmo dia da escritura de inventário. Basta que todos os impostos (transmissão) estejam
pagos.
- Pela força dos § § 2º e 3º do art. 1.793, o cedente não responde pela evicção, a menos
que ceda bens inexistentes, ou que não lhe pertençam, em relação à sua quota-parte. Esta
regra decorre do princípio da indivisibilidade da herança e do caráter aleatório da cessão.
- A cessão depende da anuência conjugal (na hipótese de casados) porque a cessão é
translativa. Havendo resistência do cônjuge ou companheiro em anuir à cessão, possível a
busca do suprimento judicial de consentimento. Exceção: art. 1.647: alienar, fazer doação,
prestar fiança ou aval (Regime da Separação de Bens);
- O cessionário, responde como responderia o cedente, pelo passivo da herança (até o
limite do quinhão).
- A cessão pode sofrer desconstituição Judicial, quando eivada de qualquer dos vícios de
consentimentos;
- A ação anulatória deve ser promovida em autos próprios. Pode ocorrer a suspensão do
inventário ou não (depois de decidida a questão, faz-se, então, uma sobrepartilha).
375
7. Abertura do Inventário – art. 1.796
O art. 1.796 prevê que 30 dias após a abertura da sucessão deve-se instaurar o inventário. O
CPC/2015 prescreve no art. 611 o prazo de dois meses a contar do óbito (abertura da sucessão)
para a instauração do inventário. O art. 616 do CPC/2015 arrola outras pessoas que têm
legitimação concorrente.
A inobservância do prazo pode acarretar sanção de natureza fiscal, com a imposição de
multa sobre o imposto, conforme súmula 542, STF. No caso do Rio Grande do Sul não há
nenhum tipo de sanção. Essa multa é, quase sempre, relevada pelo juízo do inventário. CADA
ESTADO REGULA A APLICAÇÃO DESTA SANÇÃO102.
O foro competente para a propositura do inventário é o mesmo do lugar da abertura da
sucessão:
Art. 1.796. No prazo de trinta dias, a contar da abertura da sucessão,
instaurar-se-á inventário do patrimônio hereditário, perante o juízo
competente no lugar da sucessão, para fins de liquidação e, quando for o
caso, de partilha da herança.
Mas quem será o administrador provisório? O art. 1.797, CC traz o rol daqueles que podem
ser administradores provisórios:
102
São Paulo: Lei Estadual 10.705/2000; Minas Gerais: Lei Estadual: 14.941/2003; Maranhão:
Lei Estadual .912/1998.
376
Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da
herança caberá, sucessivamente:
I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da
abertura da sucessão;
II - ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se
houver mais de um nessas condições, ao mais velho;
III - ao testamenteiro;
IV - a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos
incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo
grave levado ao conhecimento do juiz.
Questão que não é pacífica é a obediência ou não a esta ordem. Há decisões que
flexibilizam e permitem que a nomeação do administrador provisório seja distinta desta ordem
do art. 1.797, CC. Outras, contudo, entendem que deva ser, rigorosamente, obedecida.
Segundo Tartuce (2012, p. 23) o art. 1.798, CC trata da sucessão legítima, admitindo como
herdeiro legítimo somente a pessoa natural e não a jurídica.
A partir daí, vem a tona a questão do nascituro. Salienta Gonçalves que os “nascituros
podem ser, assim, chamados a suceder tanto na sucessão legítima como na testamentária,
377
ficando a eficácia da vocação dependente do seu nascimento. Podem, com efeito, ser indicados
para receber deixa testamentária” (GONÇALVES, 2012, p. 69). Assim, nascendo com vida, os
efeitos retroagem a data da concepção. Se nascer o feto morto, não terá direitos, será como se
nunca tivesse existido. Assim, os direitos do nascituro são subordinados a condição resolutiva,
ou seja, nascimento com vida (TARTUCE, 2012, p. 24). Da mesma forma, caducam as disposições
testamentárias que beneficiam pessoas já falecidas (a deixa testamentária volta para a sucessão
legítima).
Mas para que tenha direitos, já deve estar o embrião implantado no útero materno? Se for
uma situação de fecundação in vitro haverá direitos sucessórios reservados ou não? De início é
preciso que fique claro que não há uma uniformidade ou unanimidade, nem na doutrina, nem
na jurisprudência.
Há quem entenda que apenas o nascituro (o embrião já implantado no útero materno –
com gravidez comprovada) poderá suceder legitimamente e não o embrião. Nesse sentido:
Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim afirmam que deve- se exigir a implantação no útero
materno para que possa haver o regular desenvolvimento com vida (TARTUCE, 2012, p. 24).
Em sentido contrário, há os que levam em consideração o art. 1.597, CC, que dispõe que se
presumem concebidas na constância do casamento as pessoas nascidas a qualquer tempo, em
se tratando de embriões excedentários, fecundados por fertilização homóloga. Neste caso: Zeno
Veloso afirma que mesmo após a morte do pai, havendo a implantação do embrião e sendo a
gestação levada a termo, o nascimento com vida e a aquisição da personalidade fazem com
que este filho seja herdeiro, porque considera-se que estava concebido quando o genitor
faleceu e, além disto, há a questão da igualdade trazida pelo art. 227, § 6.º, CF (TARTUCE, 2012, p.
25).
A III Jornada de Direito Civil, realizada em 2004, aprovou o enunciado 267, do Conselho da
Justiça Federal e do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema:
Enunciado 267 - Art. 1.798: A regra do art. 1.798 do Código Civil deve ser
estendida aos embriões formados mediante o uso de técnicas de
reprodução assistida, abrangendo, assim, a vocação hereditária da
pessoa humana a nascer cujos efeitos patrimoniais se submetem às
regras previstas para a petição da herança.
Desta forma, entende o STJ que embrião também é considerado sucessor legítimo.
Para que alguém possa suceder, não basta invocar a ordem da vocação hereditária.
Devem ser preenchidas algumas condições (VENOSA, 2012, p. 53):
a. deve ser pessoa – animais não podem suceder. O que pode haver é o testador impor
378
ao herdeiro testamentário um encargo de cuidar de um animal em específico.
b. deve estar viva – pode já estar concebido na época da morte e terá direito se nascer
com vida e, então, tornar-se-á herdeiro desde a concepção.
c. deve ser capaz – é a aptidão específica para a herança, a legitimação. Assim não
basta existir no momento da morte, tem de ser legítimo, pois se o autor da herança tiver
deixado descendente, os ascendentes, mesmo que vivos, não serão legítimos;
d. não pode ter sido declarada indigna – aquele que praticar atos contra o autor da
herança, que sejam presumidos incompatíveis com os sentimentos de afeição real ou
presumida.
No inciso I, o legislador abre exceção à regra geral, possibilitando que filhos não
concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que estas estejam vivas quando da
abertura da sucessão, venham a ser herdeiros testamentários. É a chamada prole eventual ou o
concepturo.
Mas, se, por exemplo, o testador instituir cláusula no testamento, contemplando o filho
não concebido de sua filha (seu eventual neto, portanto) e, quando a sucessão for aberta sua
filha estiver morta, caducará a disposição testamentária.
Dispõe o art. 1.800, CC que depois de feita a partilha os bens serão entregues a um curador
nomeado pelo juiz:
Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança
serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo
juiz.
§ 1º Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à
pessoa cujo filho o testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente,
às pessoas indicadas no art. 1.775.
379
§ 2º Os poderes, deveres e responsabilidades do curador, assim nomeado,
regem-se pelas disposições concernentes à curatela dos incapazes, no
que couber.
§ 3º Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a
sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte
do testador.
§ 4º Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for
concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em
contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.
Deve ser destacado o § 4.º, que estabelece que se até dois anos após a abertura da
sucessão não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados caberão aos herdeiros
legítimos.
Quem deve existir no momento da morte do autor da herança são os pais do beneficiado,
não este, que, na hipótese, sequer precisa estar concebido (GONÇALVES, 2012, p. 73).
IMPORTANTE: Também deve ser salientado que essa disposição do art. 1.799, I, CC, aplica-
se tanto a filhos biológicos, quanto a filhos adotivos, em razão da igualdade estabelecida pela
CF, no art. 227, § 6º.
Com relação aos filhos havidos em razão de inseminação artificial, a questão é
diferenciada (e, de certa forma, injusta). Gonçalves (2012, p. 75) explica bem a situação:
Em princípio não se pode falar em direitos sucessórios daquele que foi
concebido por inseminação artificial post mortem, uma vez que a
transmissão da herança se dá em consequência da morte (CC, art. 1.784)
e dela participam as “pessoas nascidas ou já concebidas no momento
da abertura da sucessão” (art. 1.798).
A questão, no entanto, é tormentosa e cabe à doutrina e à jurisprudência
fornecer subsídios para sua solução. A doutrina brasileira se inclina no
sentido de negar legitimação para suceder aos filhos havidos por
métodos de reprodução assistida, quer na hipótese de a morte do
ascendente preceder à concepção, quer na de implantação de embriões
depois de aberta a sucessão. Solução favorável à criança ocorreria se
houvesse disposição legislativa favorecendo o fruto de inseminação post
mortem.
[...]
[...]se o Código Civil de 2002 trata os filhos resultantes de fecundação
artificial homóloga, posterior ao falecimento do pai, como tendo sido
“concebidos na constância do casamento”, não se justifica a exclusão de
380
seus direitos sucessórios. Entendimento contrário conduziria à aceitação
da existência, em nosso direito, de filho que não tem direitos sucessórios,
em situação incompatível com o proclamado no art. 227, § 6.º, da
Constituição Federal.
O inciso II, do art. 1.799, CC permite que também as pessoas jurídicas possam ser
beneficiadas no testamento. Desta forma, qualquer pessoa pode ser contemplada no
testamento, tanto física quanto jurídica, simples ou empresária, de direito público ou privado.
O inciso III, do art. 1.799, CC permite que o testador beneficie uma fundação que, nos
termos do art. 62, pode ser criada por escritura pública ou testamento. Neste último caso,
segundo Gonçalves (2012, p. 77), “por ainda não existir a pessoa jurídica idealizada pelo testador,
aberta a sucessão os bens permanecerão sob a guarda provisória da pessoa encarregada de
instituí-la, até o registro de seus estatutos, quando passará a ter existência legal”.
A doutrina admite que o testador deixe bens para uma pessoa jurídica existente de fato,
mas não de direito. São os casos das sociedades de fato, nos termos do art. 986, CC. O que se
deve perceber é que estas pessoas jurídicas existem, já estão atuando, ainda que não tenham
seus documentos constitutivos registrados. O que não se permite é que o testador beneficie
pessoa jurídica que, sequer existe de fato.
Se, contudo, os bens destinados para constituir a fundação forem insuficiente e o testador
não dispuser de forma diversa, deverão os bens serem destinados a outra fundação que tenha
finalidade igual ou semelhante (art. 63, CC). OBSERVAÇÃO: Já caiu questão no exame de
ordem sobre esta situação!
ii. Pessoas que não podem ser nomeados herdeiros testamentários, nem legatários
O art. 1.801 menciona que outras pessoas não podem ser nomeadas herdeiras, nem
legatárias:
Art. 1.801. Não podem ser nomeados herdeiros nem legatários:
I - a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou
companheiro, ou os seus ascendentes e irmãos;
II - as testemunhas do testamento;
III - o concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver
separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos;
IV - o tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão, perante
quem se fizer, assim como o que fizer ou aprovar o testamento.
Assim, mesmo com as proibições dos arts. 1.801, 1.798, 1.799, I, se forem contempladas
pessoas neles contantes, de forma direta ou mediante simulação, as disposições testamentárias
serão NULAS.
A nulidade da deixa testamentária pode revestir-se de duas formas: a) o
testador dissimulada a liberalidade sob a aparência de contrato oneroso;
ou b) recorre a interposta pessoa para beneficiar o proibido de suceder
(GONÇALVES, 2012, p. 84).
b) o testador utiliza um “testa de ferro” para realizar a operação que tinha em mente;
c) o testador, com intenção de beneficiar a concubina, institui o pai da mulher,
beneficiando-a, indiretamente.
É lícita, contudo, a deixa ao filho do concubino, se também o for do testador (art. 1.803).
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
382
03. Aceitação da herança; Renúncia da herança; Exclusão da sucessão por indignidade e
deserdação; Herança jacente e vacante; Petição de herança
01. Aceitação da herança
Com o falecimento abre-se a sucessão e a transmissão opera-se desde logo. A aceitação
revela a anuência do beneficiário em receber a herança. Assim, o recebimento da herança é
facultativo, pois o beneficiário poderá deliberar (aceitar ou renunciar) seu direito. A aceitação (ou
adição) da herança é o ato pelo qual o herdeiro concorda com a transmissão dos bens do de
cujus, que ocorreu, por lei, no momento da abertura da sucessão.
Obs: Enquanto não manifestada a aceitação, entrementes, não é definitiva a
transmissão, no que foi claro o Código em seu art. 1.804 CC. Embora se de a transmissão
imediata, a aceitação vem a ser uma confirmação da aquisição que se dá a partir da
abertura da sucessão.
Espécies de aceitação:
O art. 1.805, estabelece as duas formas de aceitação: expressa e tácita.
383
e. Expressa - É a manifestada por escrito, público ou particular, de que o beneficiário
deseja receber a herança.
f. Tácita - É a que prevalece (Art. 1805, segunda parte, CC). A aceitação tácita resulta de
qualquer ato que demonstre a intenção de aceitar a herança, atos compatíveis com caráter de
herdeiro:
a) se o herdeiro cede seus direitos hereditários;
b) se o herdeiro nomeia advogado e se faz representar como tal no inventário;
c) se o herdeiro concorda com a avaliação, ou contesta;
d) se o herdeiro efetua cobrança de dívidas do espólio;
e) se requer a abertura do inventário;
f) quando paga dívida dos de cujus com numerário proveniente do espólio;
Art. 1805, §1º, CC: “não exprimem aceitação da herança os atos oficiosos, como o funeral
do finado, os meramente conservatórios, ou os de administração e guarda interina”. Esses atos
são praticados de forma altruísta, sem o intuito de aceitar a herança.
ATOS OFICIOSOS = praticados de forma desinteressada, com objetivo de prestar favor.
ADMINISTRAÇÃO E GUARDA PROVISÓRIA = praticados pelo herdeiro para atender a uma
necessidade premente, sem intenção de tê-los para si.
Art. 1805, §2º, CC: a cessão pura e simples para os demais coerdeiros também não importa
aceitação da herança – equivale a uma renúncia (GONÇALVES, 2012, p. 91).
c) Presumida - É o que ocorre no caso do art. 1807, CC, quando algum interessado em
saber se o herdeiro aceita ou não a herança faz requerimento ao juiz, após passados 20 dias da
abertura da sucessão, para que lhe intime a dizer, em prazo não superior a 30 dias, se aceita ou
não a herança (GONÇALVES, 2012, 91). Nesse caso, o silêncio é interpretado como manifestação
da vontade (aceitação presumida).
Percebe-se, então, que a aceitação tácita difere da presumida, pois esta última
depende da provocação de um terceiro interessado, enquanto que a primeira resulta “de
atos próprios da qualidade de herdeiro”.
Todavia, quem seriam esses interessados?
a) Os demais herdeiros;
b) As pessoas que, em caso de não aceitação, serão promovidas à condição de herdeiros;
384
c) Algum credor.
385
Assim, considerando que se trata de modalidades de sucessão distintas, nada impede que
o beneficiário renuncie ou não aceite integralmente a uma sucessão, conservando a outra. Ele
renuncia a toda herança e aceita o legado por inteiro, ou renuncia a todo o legado, aceitando
toda a herança.
O herdeiro ao continuar na posse dos bens, ocupa o lugar do de cujus em todas “as
relações jurídicas, sub-rogando-se em seus direitos e obrigações”.
O que lhe é vedado é aceitar parcialmente a herança. (A segunda parte do § 1º do art. 1.808
é que permite a renúncia parcial). Portanto, não pode o sucessor aceitar a herança sob
determinada condição (aceita, mas se não tiverem dívidas a serem pagas).
Irrevogabilidade da aceitação
O Código Civil, em seu art. 1.812, define a irrevogabilidade da aceitação e de renúncia.
Assim, realizada a aceitação (expressa ou tácita ou presumida) não haverá possibilidade de
revogar tal ato, de modo que a aceitação gera efeitos imediatos e definitivos.
Anulação da aceitação
Assim, depois de realizada a aceitação, se for verificado que o aceitante não é o herdeiro,
como por exemplo, chamar-se à sucessão os colaterais e, depois, verificar-se a existência de
filhos, deverá ser declarada a ineficácia da aceitação, devolvendo-se a herança a quem de
direito. Se, contudo, o inventário já tiver sido julgado, como homologação da partilha, apenas
com a ação de petição de herança é que será possível reivindicar o que lhe cabe.
O art. 1808 NÃO ADMITE CONDIÇÃO OU TERMO na renúncia, ou seja, ela é essencial, pura
e simples.
386
EX: Escritura pública de renúncia: por meio desta escritura pública de renúncia, Joãozinho
renuncia a herança de Carlinhos, para que Marquinhos seja beneficiado. Nesse caso, se o
herdeiro renunciante declarar que deseja beneficiar outro herdeiro, a hipótese não é de
renúncia, mas de cessão de direitos hereditários.
Características da Renúncia:
Rizzardo aponta as principais características da renúncia, acompanhando o entendimento
doutrinário dominante:
a) A unilateralidade, por não depender da vontade de outros herdeiros.
b) A abstratividade, isto é, a ausência de motivações. Não é colocada nenhuma razão, e
muito menos vem mencionado algum pagamento, posto que aí a figura seria cessão.
d) Ato jurídico puro, ou seja, sem depender de condições ou termo. Art. 1.808
CC.
f) Efeito retroativo, valendo a contar da morte do autor da herança. Arts. 1.784 e 1.804.
g) O formalismo, que é de rigor, nunca se acolhendo que seja reconhecida à renúncia
por manifestação verbal, nem por instrumento particular. A renúncia deve ser feita por
instrumento público ou termo judicial (art. 1.806). Não há presunção de renúncia ou renúncia
tácita. Deve ser expressa e formal.
387
mortis). Já no caso da renúncia translativa, há a incidência de dupla tributação: causa mortis
(ITCD – de cujus ao herdeiro) e inter vivos (ITBI - herdeiro ao terceiro/beneficiário). Equivale a
uma cessão de direitos hereditários.
Nesse sentido, o art. 1.813, CC prevê que, se o herdeiro renunciar a herança e os credores
sentir-se prejudicados, poderão aceitar a herança pelo herdeiro:
388
Art. 1.813. Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à
herança, poderão eles, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do
renunciante.
Efeitos da Renúncia:
Muitas são as implicações do ato de renunciar, irradiando alguns efeitos, em especial, a
exclusão do herdeiro renunciante de forma ampla e definitiva.
a) Exclusão, da sucessão, do herdeiro renunciante: o RENUNCIANTE é tratado como
se nunca tivesse sido herdeiro (retroage à data da abertura da sucessão, ou seja, desde o
óbito). O renunciante é afastado da sucessão (art. 1.810 e 1811). NÃO CABE, PORTANTO, DIREITO
DE REPRESENTAÇÃO.
b) direito de acrescer: a parte do renunciante passa imediatamente à dos outros
herdeiros da mesma classe, nos termos do art. 1810, CC.
389
* Para todos verem: esquema
B herdeiro renunciante
“H” e “L” herdarão por cabeça – 50% para cada um.
390
* Para todos verem: esquema
C herdeiro renunciante
A e B recebem a cota de “C”.
Herdeiros de C: não herdam
A, B e C = herdeiros renunciantes
X, H, L e Y herdam por direito próprio ou cabeça. Não há diferença de percentual na
herança, neste caso.
e) SE A RENÚNCIA FOR LESIVA AOS CREDORES, aplica-se o art. 1813, de forma que o
credor poderá aceitar a herança pelo renunciante. Satisfeito o débito, havendo saldo, este será
devolvido ao monte, para repartir entre os demais herdeiros.
391
Renúncia de Legado e Herança:
Há diferença entre a renúncia de herança legítima e testamentária. No segundo caso,
havendo renúncia ao testamento, se houver substituto, este receberá. Do contrário, será
devolvido à massa. O art. 1.947, CC permite que o testador indique um substituto no
testamento, caso o beneficiário não aceite a herança ou legado:
Com isto, se houver substituto, havendo renúncia por parte do beneficiário, o substituto
herdará. Se não houver (ou o substituto também renunciar), a herança ou legado deixados por
testamento deverá ser partilhada.
De qualquer forma, na sucessão testamentária, a renúncia do herdeiro acarreta a
caducidade da instituição, salvo se o testador tiver indicado substituto (CC, art. 1.947) ou houver
direito de acrescer entre os herdeiros (art. 1.943).
Expressa Expressa
Irrevogável Irrevogável
393
O art. 1.814, CC traz expressas as causas que importam na exclusão do herdeiro
considerado indigno. Trata-se de situações taxativas, não se admitindo qualquer tipo de
interpretação expansiva.
Para Gonçalves (2012, p. 112), a exclusão por indignidade pressupõe:
a) seja o herdeiro ou legatário incurso em casos legais de indignidade;
b) não tenha sido reabilitado pelo de cujus;
c) haja uma sentença declaratória da indignidade.
O art. 1814, caput, CC enumera as hipóteses exaustivas da exclusão, que se dão em razão
de:
a) atentados contra a vida (dolo);
b) atentados contra a honra
c) atentados contra a liberdade do de cujus.
Não se admitem outros casos. A matéria não admite INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA OU
ANALÓGICA. O reconhecimento da indignidade deverá ser porfiado em ação própria,
estritamente, nas hipóteses legais.
394
A prova do fato e da culpabilidade é feita no curso da ação civil. Não é preciso que já tenha
havido condenação criminal. Contudo, se já tiver sido condenado no crime, não mais se discute
no cível sobre quem é o autor do fato (a sentença penal transitada em julgado faz coisa julgada
no cível). Também, se o autor do fato tiver sido absolvido no criminal, não poderá ser declarado
indigno no juízo cível.
Além da sanção cível – exclusão por indignidade – o autor dos atos atentatórios contra a
vida do autor da herança ou ascendentes ou descendentes seus, sofrerá, ainda, as sanções
penais cabíveis.
E se houver sentença criminal absolvendo o réu (herdeiro), por inimputabilidade? E se o
juiz, absolver o réu pela inexistência do fato?
Nestes casos, a sentença criminal faz coisa julgada no cível, ou seja, civilmente a exclusão
ou a tentativa desta não surtirá efeitos (art. 935, CC). Portanto, a sentença do juízo criminal
impede que no cível se reconheça a indignidade.
Por outro lado, verifica-se que a lei exige que o homicídio seja voluntário. Exclui-se,
portanto, o homicídio culposo, decorrente de imprudência, imperícia e negligência. O dolo é
essencial para o reconhecimento da exclusão do herdeiro.
II – a hipótese retrata caso de denunciação caluniosa (art. 339, CP), da calúnia (art.
138), injuria (art. 139) e difamação (art. 140, CP). APENAS NA FORMA CONSUMADA – não
existe, neste caso, tentativa
O que diz o art. 339 do CP: “dar causa a instauração de investigação criminal ou processo
judicial contra alguém, (...) imputando-lhe a prática de crime que sabe ser inocente”.
Denunciação caluniosa.
Nos casos de calúnia, injúria e difamação ocorre o mesmo.
Pergunta-se: É necessária a condenação do herdeiro para se reconhecer a indignidade? O
que importa é, sem dúvida, saber se o herdeiro deu causa à ação penal contra o falecido.
III – Neste caso a lei visa garantir a plena liberdade de disposição do de cujus.
Inibir é cercear a livre disposição dos bens. Obstar é impedir a livre disposição. Em ambos
os casos, a conduta do herdeiro importa em indignidade. Trata-se, aqui, da fraude, do dolo e da
coação, denominados de atos inibitórios, que interferem na vontade do autor herança. Ora, se o
herdeiro pratica atos inibitórios abusando da confiança do testador ou falsificando a
manifestação de vontade, deve responder pelo ato, ensejando o afastamento da sucessão pelo
reconhecimento da indignidade, em autos apartados. Algumas situações fáticas:
a) herdeiro constrange o de cujus a testar;
b) herdeiro impede-o de revogar testamento anterior;
395
c) herdeiro suprime testamento cerrado ou particular dele;
d) herdeiro elabora testamento falso;
e) herdeiro cientemente, pretende fazer uso de testamento falsificado.
396
* Para todos verem: esquema
H – herdeiro indigno.
A e B – herdarão por representação (no lugar de seu pai, como se ele nunca tivesse
existido).
Com isto:
X – recebe 1/3 Y – recebe 1/3
A e B – dividem o 1/3 que caberia a seu pai.
Se, contudo, não houverem herdeiros descendentes do indigno (se, no caso acima, A e B
não existissem), a parte do indigno será partilhada entre os herdeiros de mesma classe, que
herdarão por direito próprio. Neste caso, X e Y herdariam, cada um, 50% dos bens deixados.
No caso da sucessão testamentária, se houver substituto, este herdará. Do contrário,
voltará para o monte partilhável.
d) perda do usufruto e da administração dos bens que couberem aos filhos: com a
declaração de indignidade, se o excluído tiver filhos, estes serão os beneficiários da herança. O
art. 1.689, I e II, CC, prevê que os pais são os administradores e usufrutuários dos bens dos filhos.
397
Neste caso, sendo declarado indigno, o genitor perderá este direito. Se assim não fosse, poderia
tirar proveito dos bens da herança, da qual foi afastado por ingratidão.
Se o indigno é considerado um morto civil, para efeitos sucessórios, é natural que se lhe
retire a administração e o usufruto dos bens. Art. 1.816, § único.
3.2 Deserdação
A deserdação é uma causa de exclusão pela qual o autor da herança, através de
disposição de última vontade – testamento – exclui de sua sucessão o herdeiro necessário que
tenha praticado atos moralmente censuráveis e previstos na lei civil.
Características da deserdação
399
Causas da deserdação – art. 1.814, art. 1.962 e art. 1.963, CC
Os arts. 1.814, 1.962 e 1.963 trazem as causas da deserdação. Dispõe o art. 1.814, CC:
Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio
doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu
cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança
ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou
companheiro;
III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o
autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última
vontade.
Além destas, também autorizam a deserdação as causas previstas no art. 1.962 e 1.963, CC:
• Ofensas físicas: não bastam ameaças. A violência dever ser real e efetiva. Ato
voluntário do filho contra o pai. Ainda que tenha acarretado somente lesões corporais de
natureza leve e independentemente de condenação criminal. Aplicam- se ao caso as
excludentes de ilicitude.
• injúrias graves: devem ser dirigidas diretamente contra o testador. Não se justifica a
deserdação quando a ofensa atinge aos seus familiares. Contudo, a injúria contra o cônjuge ou
companheiro é passível de deserdação (art. 1.814, II). O adjetivo grave deve ser considerado e a
gravidade será avaliada conforme o caso concreto: cartas, bilhetes, gestos obscenos, condutas.
400
los da sucessão.
c) expressa declaração de cláusula prevista em lei: as causas estão no art. 1.814, 1.962 e
1.963, CC. O rol é taxativo. Não se admitem outras causas não previstas. O testador deve
mencionar no testamento o motivo, a causa que o leva a deserdar o herdeiro.
d) propositura de ação ordinária: para que a deserdação seja ultimada, não basta a
simples declaração via testamento. Deve haver, ainda, uma ação ordinária, promovida pelo
beneficiário pela deserdação do herdeiro, que prove a veracidade da causa alegada pelo
testador, nos termos do art. 1.965.
Efeitos da deserdação:
O art. 1.816, CC afirma que os efeitos da exclusão são pessoais. Apesar de não haver
previsão expressa para a deserdação, aplica-se este mesmo dispositivo, tendo em vista que o
objetivo da indignidade e da deserdação é o mesmo.
- Privação em todo ou parte, da legítima, sendo o deserdado havido como se morto
fosse;
- É de índole pessoal a sanção;
- Aos ascendentes não cabe a representação;
- Os descendentes recolhem a herança por direito de representação;
401
INDIGNIDADE DESERDAÇÃO
Decorre de lei, que prevê a sanção nos casos de Decorre da vontade do autor da herança que,
prática de atos previstos no art. 1.814, CC. em testamento, pune o responsável.
É instituto da sucessão legítima, ainda que Só pode ocorrer na sucessão testamentária, pois
também possa alcançar o legatário. depende do testamento, com expressa
declaração de causa (art. 1.964).
Sua efetivação se dá por ação judicial, proposta A deserdação se dá por testamento, com
por terceiros interessados, em ação própria e expressa declaração da causa (art. 1.964).
obtida mediante sentença judicial (art. 1.815).
Nem sempre os fatos são anteriores à morte do Os suportes fáticos são anteriores à morte do
autor da herança autor da herança.
3.4 Diferenças entre ser excluído da sucessão e não ter legitimidade para suceder:
* Para todos verem: esquema
A pessoa recebe a coisa e a perde A pessoa nunca recebeu, pois não tinha
legitimidade para tanto.
É uma pena civil aplicada ao herdeiro ou É a inaptidão para receber a herança, por
legatário pela prática de determinados atos motivos de ordem geral, independente de
de ingratidão. seu mérito ou demérito.
O indigno existe e perde a herança havida, ou O ilegítimo não existe para a sucessão,
seja, o direito existiu até a declaração de portanto, não tem direito de suceder.
indignidade
402
recebem
Casos de jacência:
Para que se configure a jacência deve haver – art. 1.819, CC:
a) ocorrência do óbito;
b) sem deixar testamento conhecido ou ser este caduco. Neste caso, tem-se duas
situações:
Sem testamento:
a. Inexistência de herdeiros conhecidos
b. Renúncia da herança por todos os herdeiros
403
Com testamento:
c. Herdeiro instituído ou testamenteiro não existir ou não aceitar a herança
Há, ainda, a hipótese de ser considerada jacente a herança na qual o de cujus testou para
o filho concebido, mas ainda não nascido, seus bens. Neste caso, falecendo o testador e ainda
não tendo nascido a criança, a herança será declarada jacente e recolhida, até o nascimento
com vida do beneficiário. É possível, neste caso, que seja retirado valor para a manutenção da
gestação da mãe, se ela não tiver meios de subsistência.
Cabe ao curador:
Art. 739, § 1o Incumbe ao curador:
I - representar a herança em juízo ou fora dele, com intervenção do
Ministério Público;
II - ter em boa guarda e conservação os bens arrecadados e promover a
arrecadação de outros porventura existentes;
III - executar as medidas conservatórias dos direitos da herança;
IV - apresentar mensalmente ao juiz balancete da receita e da despesa;
V - prestar contas ao final de sua gestão.
§ 2º Aplica-se ao curador o disposto nos arts. 159 a 161.
404
Durante a arrecadação o juiz ou a autoridade policial que estiver cumprindo a diligência
(art. 740, § 2.º, CPC/2015) fará a inquirição dos vizinhos do falecido, visando descobrir sua
qualificação, existência de outros bens e o paradeiro de seus sucessores.
A arrecadação será suspensa se aparecerem o cônjuge, companheiro ou herdeiro do
falecido para reclamar os bens (§ 6º, art. 740, CPC/2015).
Finalizada a arrecadação, serão expedidos editais, nos termos do art. 741, CPC/2015 – na
internet, site do tribunal e na plataforma do CNJ, devendo permanecer por 3 meses. Em não
havendo o site, a publicação deverá ocorrer na imprensa da Comarca, por 3 vezes, com
intervalos de 1 mês entre cada uma.
Havendo herdeiro habilitado, a arrecadação converte-se em inventário (art. 741, § 1.º, § 3.º,
CPC/2015).
Declaração de vacância
Não havendo herdeiro habilitado, após um ano da publicação do edital, a herança será
declarada vacante (art. 743, CPC/2015).
Será VACANTE a herança quando, depois de todas as diligências, inclusive com a
publicação de editais, passado um ano, não houverem herdeiros sucessíveis habilitados. Há
uma exceção: se todos os chamados a suceder renunciarem a herança, será, desde logo,
declarada vacante (art. 1.823, CC), sem que haja a fase de jacência.
Uma vez sendo declarada, por sentença, a vacância, o cônjuge, companheiro ou herdeiros
só poderão reclamar seu direito através de ação de petição de herança (art. 743, § 2.º, CPC/2015).
Após a declaração de vacância, podem os credores pedir o pagamento das dívidas
reconhecidas, nos limites da força da herança (art. 1.821, CC + art. 741, § 4.º, CPC/2015).
Mas essa declaração de vacância não faz com que os bens da herança se incorporem,
desde logo, ao patrimônio do Município ou Distrito Federal (se localizados nos seus territórios)
ou à União (se localizados em território federal). Para tanto, o art. 1.822, CC prevê o prazo de 5
anos da abertura da sucessão.
O Código não deixa dúvida sobre a exclusão dos colaterais da sucessão se não
habilitarem até a sentença de vacância – art. 1.822, § único. Os demais herdeiros têm o
prazo de 5 anos.
405
Nesse caso, para que esse herdeiro possa ter seu direito reconhecido e, então, receber
parcela que lhe cabia na universalidade, deverá ingressar com uma ação judicial. Esse é o caso
da petição de herança.
EXEMPLOS:
1. Alguém que se aposse ilegalmente da herança ou de parte dela;
2. Herança que é recolhida por parentes mais afastados do falecido e o interessado é de
grau mais próximo, de classe preferencial;
* Para todos verem: esquema
Filho 1 = pré-morto.
Filho 2 = desaparecido – não se sabe da existência
Neto 1, 2 e 3 = herdarão por direito próprio, pois a classe anterior (dos filhos) não existe = 1/3
para cada um.
Neto 1 = pré-morto → sua quota parte será divida entre Bisneto 1.1 e 1.2.
Quanto o Filho 2 for “descoberto”, terá direito de pleitear a herança (sua quota parte).
Neste caso, ficará com a ½ da herança e a outra ½ será dividida entre os herdeiros de Filho 1.
3. A herança é distribuída entre os herdeiros legítimos, e aparece testamento do de
cujus, em que outra pessoa é nomeada herdeira;
4. O filho não reconhecido ingressa com ação de investigação de paternidade e, de
forma cumulada, com a petição de herança.
Conceito:
A petição de herança é uma ação, oferecida pelo herdeiro preterido, no sentido de que lhe
seja deferida a quota parte que lhe cabe, por direito. Trata-se, pois, do meio jurídico pelo qual o
herdeiro (excluído por qualquer razão – não se sabia da existência, por exemplo) pode se utilizar
para garantir sua condições e o acesso aos bens deixados pelo falecido (art. 1824, CC)
406
A ação visa, portanto, o reconhecimento da qualidade de herdeiro e a satisfação quanto ao
acervo hereditário, ou seja, contemplar o herdeiro – autor da ação – com sua quota parte na
herança. Necessita, contudo de uma ação de estado, ou seja, de uma ação que objetive a
declaração do parentesco.
A petição de herança tem dúplice objetivo:
a) o reconhecimento judicial da qualidade do herdeiro ou a condição de herdeiro
(qualidade sucessória);
b) a proclamação do princípio de que, sendo vários os herdeiros, qualquer deles pode
demandar a totalidade da herança.
RESUMO:
* Para todos verem: esquema
Universal Singular
Proposta pelo herdeiro a ser reconhecido Proposta pelo legatário, por exemplo
407
LEGITIMIDADE ATIVA: A lei fala: “o herdeiro pode”, isto significa, que o herdeiro legítimo
ou testamentário ostentam a qualidade, a titularidade ativa. Tem legitimação ativa, também, o
síndico, o administrador, o testamenteiro, o curador, o companheiro (a), etc.
a) O inventariante;
b) O testamenteiro;
c) O filho em ação de Investigação de Paternidade (de forma cumulada);
d) Herdeiro testamentário excluído da sucessão;
e) O companheiro sobrevivo;
f) Parentes do de cujus excluídos por outros titulares;
g) O curador da herança do morto;
h) Herdeiros não necessários preteridos pelos testamentários;
i) Filho não reconhecido pelo pai;
j) Síndico/administrador da falência do morto;
LEGITIMIDADE PASSIVA: Será réu nessa ação, aquele que estiver na posse da herança
como se fosse herdeiro, aparentando uma qualidade e assumindo a posição de herdeiro, sem o
ser verdadeiramente.
a) Herdeiro aparente (possuidor dos bens hereditários);
b) Terceiro estranho à sucessão causa mortis;
c) Herdeiro que possua por outro título (usucapião).
d) Estado (quando há herança jacente)
Efeitos da sentença:
Reconhecida a qualidade hereditária do autor da petição de herança, transmite- se a
titularidade do patrimônio deixado em seu favor. Com a procedência da ação e o trânsito em
julgado há o reconhecimento da ineficácia da partilha em relação ao autor da ação, sendo
dispensada sua anulação. Bastará o requerimento de retificação da partilha realizada
anteriormente.
Esses efeitos também são diferentes com relação ao possuidor de boa e má-fé e quanto
ao terceiro adquirente:
408
Possuidor:
Aquele que possua os bens, com o julgamento da petição de herança, deverá devolvê-los,
com todos os acessórios. Responderá por perdas e danos e pelos frutos que tiver colhido, salvo
direito de retenção, se estiver de boa-fé.
Art. 1.826. O possuidor da herança está obrigado à restituição dos bens do
acervo, fixando-se-lhe a responsabilidade segundo a sua posse,
observado o disposto nos arts. 1.214 a 1.222.
Parágrafo único. A partir da citação, a responsabilidade do possuidor se
há de aferir pelas regras concernentes à posse de má-fé e à mora.
Assim, se o possuidor for de boa-fé: Será de boa-fé a posse do herdeiro aparente que a
houver adquirido acreditando ser verdadeiramente o herdeiro (art. 1.201, CC).
a) tem direito aos frutos percebidos (1214), devendo restituir os pendentes e os colhidos
por antecipação (1215);
b) os frutos naturais ou industriais reputam-se percebidos e colhidos (art. 1215);
c) não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa (art. 1217);
d) tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, podendo levantar as
voluptuárias (art. 1219).
Já o possuidor de má-fé:
a) Art. 1216, CC – pelos frutos colhidos e percebidos (e pelo que deixou de perceber por
culpa);
b) responde pela perda e deterioração da coisa, a que não der causa (art. 1218);
c) não tem direito de retenção de benfeitorias (nem levantar as voluptuárias); as
necessárias serão ressarcidas (art. 1218, 1220, 1222).
Terceiro adquirente:
A questão que se discute é se a alienação feita pelo herdeiro aparente é válida ou não.
Art. 1.827. O herdeiro pode demandar os bens da herança, mesmo em
poder de terceiros, sem prejuízo da responsabilidade do possuidor
originário pelo valor dos bens alienados.
Parágrafo único. São eficazes as alienações feitas, a título oneroso, pelo
herdeiro aparente a terceiro de boa-fé.
O Dispositivo regula a hipótese do bem não se encontrar nas mãos do possuidor, mas de
terceiros.
409
Se a alienação tiver sido feita a título gratuito, os bens devem ser devolvidos ao herdeiro,
de imediato.
Contudo, se o negócio tiver sido realizado pelo terceiro adquirente e pelo herdeiro
aparente a título oneroso, se o adquirente estiver de boa-fé, será válido o negócio.
Herdeiro aparente (Art. 1.817CC):
É aquele que recebe a herança como se fosse o titular desse direito, ou seja, reputa-se ser
aquele o herdeiro, porém, não o é.
Exemplos:
1) pessoa que entra na posse dos bens, sem saber que existiam outros herdeiros de grau
mais próximo;
2) na hipótese de herdeiro testamentário, cujo testamento é invalidado.
3) a posse de herdeiros, quando há posterior reconhecimento de outro em Ação de
Investigação de Paternidade.
4) se herdeiro (aparente), cumpriu a vontade do testador (com bona fide), tem seus atos
protegidos (terceiro adquirente de boa-fé).
O art. 1.828 prevê que o herdeiro aparente de boa-fé tem seus atos protegidos por lei em
benefício de terceiros de boa fé:
Art. 1.828. O herdeiro aparente, que de boa-fé houver pago um legado,
não está obrigado a prestar o equivalente ao verdadeiro sucessor,
ressalvado a este o direito de proceder contra quem o recebeu.
410
prescrição não corre contra pessoas absolutamente incapazes – só começa a correr quando
completar 16 anos, passando a ser relativamente incapaz.
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
411
04. Sucessão legítima: falecido solteiro
SUCESSÃO LEGÍTIMA
A sucessão legítima é subsidiária da sucessão testamentária. Nestes termos, o art. 1.788,
CC dispõe:
Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos
herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem
compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o
testamento caducar, ou for julgado nulo.
Cumpre destacar, que a sucessão pode ser legítima e testamentária e, muito embora a
primeira tenha caráter subsidiário por força do disposto no artigo 1.788 é aquela que na prática
tem universal ocorrência. Com isto, a existência de testamento não exclui a sucessão
testamentária.
412
Desta forma, haverá sucessão legítima:
a) quando o falecido não tiver deixado testamento;
b) quando o falecido deixou testamento apenas sobre parte de seus
bens;
c) quando o falecido deixou testamento mas este caducous ou foi
declarado nulo.
De resto, o chamamento dos sucessores é por classes, quando a mais próxima exclui a
mais remota, nos termos dos artigos 1.833, 1836, § 1º e 1.840, CC, em relação absoluta e
preferencial, com as exceções apontadas (direito de representação, indignidade, deserdação,
renúncia).
Desta forma, se “A”, solteiro, falece, deixando filho e pai vivos, a sucessão regular-se-á da
seguinte forma: o filho recebe toda a herança do pai e, seu avô (pai do falecido), nada receberá,
pois a classe mais próxima exclui a mais remota.
415
a. Descendentes
Os filhos herdam por direito próprio, por cabeça ou per capita, recebendo quotas iguais e,
os netos herdam por estirpe, a não ser que todos os filhos já faleceram. Nesse caso, os netos, por
estarem no mesmo grau, herdam por cabeça ou direito próprio (sucessão avoenga).
EXEMPLOS:
1. Por direito próprio:
Cada filho receberá ¼.
* Para todos verem: esquema
Além disto, na linha descendente, os de grau mais próximo, excluem os mais remotos:
* Para todos verem: esquema
2. Por estirpe:
* Para todos verem: esquema
O filho 2 receberá ½ - por direito próprio. Os netos receberão a outra metade, em razão do
filho 1 ser pré morto – por estirpe (representação).
416
3. Por direito próprio (dos netos):
* Para todos verem: esquema
• Netos – sucedem por estirpe. Se, contudo, os filhos forem todos falecidos, os netos
herdarão por cabeça, por serem todos de mesmo grau.
b. Ascendentes
Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os ascendentes. Não se admite o
direito de representação na linha ascendente (art. 1.852).
§ 1º - mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção de linhas;
* Para todos verem: esquema
Pai = ½ da herança.
Mãe = ½ da herança.
Se, contudo, A falece, deixando a mãe viva e sendo o pai premorto, mesmo que tenha avós
paternos vivos, sua mãe recolherá toda a herança.
Pai = ½ da herança. Mãe = ½ da herança.
417
§ 2º - linha paterna e materna (metade)
* Para todos verem: esquema
418
* Para todos verem: esquema
2. Herdeiros necessários
O art. 1.845, CC estabelece quem são os herdeiros necessários:
Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o
cônjuge.
1. descendentes
2. ascendente
3. cônjuge (o companheiro não é herdeiro necessário, mas sim, facultativo)
Herdeiros necessários são os que não podem ser afastados da sucessão legítima por
vontade do autor da herança. Possuem a garantia da legítima.
Legítima: a porção (a metade) que a lei reserva aos Herdeiros Necessários, sobre o acervo
existente, quando da abertura da Sucessão.
419
* Para todos verem: esquema
Cláusulas restritivas
O autor da herança, conforme determina o art. 2.014, CC pode definir quais os bens e
valores que comporão os quinhões hereditários de cada herdeiro:
Art. 2.014. Pode o testador indicar os bens e valores que devem compor
os quinhões hereditários, deliberando ele próprio a partilha, que
prevalecerá, salvo se o valor dos bens não corresponder às quotas
estabelecidas.
Assim, apenas se houver justa causa é que essas cláusulas poderão ser estabelecidas pelo
de cujus via testamento. Essa justa causa deve ser trazida pelo de cujus no testamento. Ex.:
incomunicabilidade, pois o cônjuge do herdeiro necessário é um caçador/caçadora de dotes, pq
420
o cônjuge do herdeiro possui filho fora do casamento e, em razão do regime da comunhão
universal, esse filho acabará por herdar o patrimônio do de cujus, etc. Inalienabilidade e
incomunicabilidade, pois o herdeiro é consumidor compulsivo e aposta em jogos de azar, etc.
Art. 1.849.
Art. 1.849. O herdeiro necessário, a quem o testador deixar a sua parte
disponível, ou algum legado, não perderá o direito à legítima.
3. Direito de representação
Existem duas maneiras diferentes de suceder:
a) Por direito próprio/cabeça;
b) Por representação.
421
O direito de representação é restrito e ocorre quando a lei chama certos parentes do
falecido a suceder em seu lugar, assumindo todos os direitos que ele teria se vivo fosse, ou seja,
chama outrem a herdar em lugar de parente mais próximo do autor da herança, porém
premorto, ausente ou incapaz de suceder (GONÇALVES, 2012, p. 216). Nestes casos, se opera a
vocação indireta na sucessão legítima.
O chamado a suceder, neste caso, receberá por estirpe.
Herança per capita: Per capita, quer dizer “por cabeça”. Ex. morre o pai; se ficam três
filhos, todos herdam e a cada um cabe um terço do monte mor.
Herança por estirpe: Por linha genealógica. Ex. morre o pai (de cujus); dos três filhos que
teve, um é pré-morto em relação ao de cujus, mas deixou dois herdeiros. A herança do de cujus
será dividida em três partes; os filhos do herdeiro pré-morto receberão o quinhão que a este
caberia, dividindo-o em dois. Eles concorrem por estirpe à herança, junto com os demais filhos
do de cujus, e que são seus tios.
Pressupostos (requisitos):
1) A morte do representado: não há representação de herdeiro vivo. Exceção: ter sido
declarado deserdado, indigno ou ausente. Não cabe na renúncia.
2) Parentesco em linha descendente: o representante deve ser descendente do
representado, ou, EXCEPCIONALMENTE, colateral – filho do irmão (sobrinho) do autor da
herança. A descendência é a civil e não apenas a biológica (adoção, também).
3) Capacidade sucessória do representante em relação ao representado: (legitimação
para herdar). Deve ter legitimação para herdar. Ex. O filho substitui o pai morto na herança do
avô (linha descendente); ou filho substitui o pai pré-morto na sucessão de um tio (linha
colateral). Importante ressaltar a isonomia Constitucional: igualdade dos filhos.
4) Inexistir solução de continuidade no encadeamento de grau entre o representante e
o representado: não se opera per saltum et omisso médio. Ex. o bisneto não representa o filho
do autor da herança se ainda vive o neto deste.
5) Que reste, no mínimo um filho do de cujus ou, na linha colateral um irmão do falecido.
Se não a sucessão será por direito próprio.
Efeitos
A representação produz dois efeitos:
1) O representante (representantes) só pode herdar o que herdaria o representado, se
vivesse (se vivo fosse) (art. 1854, CC). A porção é a mesma;
2) O quinhão do representado partir-se-á por igual entre os representantes (art. 1855,
CC).
3) O renunciante à herança de uma pessoa pode inobstante representá-la na sucessão
422
de outra. Na renúncia, os descendentes do abdicante não herdam por direito de representação
(art. 1856, CC). Assim, os efeitos da renúncia não passam da herança à qual houve manifestação
de repúdio.
4) Os representantes estão obrigados a trazer à colação os bens doados ao
representado pelo autor da herança (art. 1791); quando os netos, representando os pais,
sucedem os avós, serão obrigados a trazerem colação, para igualdade de legítima;
5) O representante é considerado um herdeiro legítimo (e necessário... colaterais, não),
com todos os direitos inerentes (direito da saisina – art. 1572 – 1.784), sendo igualitária sua
posição relativamente aos co-herdeiros.
6) A responsabilidade do representante por dívidas do espólio se sujeita ao benefício do
inventário – responde por elas até o limite do quinhão;
7) A quota hereditária do representante não responde pelas dívidas do representado,
mas pelas do autor da herança.
8) O direito de representação se opera na sucessão legítima (excepcionalmente, na
testamentária, quando será chamada de substituição.
423
Posição:
O irmão unilateral recebe metade do que receberá o irmão bilateral;
- os filhos de irmão unilateral (sobrinhos do “de cujus”) recebem metade do que
receberão os tios.
EXEMPLOS:
1º Exemplo: Se o de cujus deixa três irmãos, sendo que um deles já falecido com filhos, a
herança será dividida em três partes, cabendo uma para cada irmão vivo e a terceira deverá ser
repartida entre os sobrinhos que herdarão por representação. Receberão a parte que caberia ao
pai, se vivo fosse.
2º Exemplo: o de cujus deixa um (1) irmão vivo; um irmão (pré-morto) com dois filhos e
outro irmão (pré-morto) com três filhos. Divide-se em três partes iguais, correspondente às três
estirpes.
3º Exemplo: o de cujus deixa 3 irmãos vivos, 1 irmão pré-morto com filhos e outro irmão
pré-morto sem filhos. Divide-se em quatro (4) partes.
4º Exemplo: o de cujus deixa três irmãos vivos; um irmão pré-morto com filhos; outro
irmão pré-morto, com um filho pré-morto que tem um filho vivo. Divide- se em quatro (4)
partes... sobrinho-neto não herda.
Linha Ascendente
Art. 1852: O direito de representação se dá na linha reta descendente; mas nunca na linha
ascendente. Se um filho, ao falecer, deixa o pai vivo e a mãe já se encontra falecida, sem
quaisquer herdeiros descendentes, o progenitor vivo será contemplado com toda herança. Os
progenitores maternos nada herdarão.
424
Na renúncia à herança (Art. 1.811, CC)
Não há direito de representação. Porém, se todos os herdeiros da classe renunciarem, os
filhos dos herdeiros renunciantes virão ao inventário por direito próprio, recebendo a herança
por cabeça, isto porque, o ato do renunciante tem caráter pessoal, não se estendendo aos filhos.
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
425
05. Sucessão legítima: falecido casado ou convivente em união estável
1. Cônjuge sobrevivente OU Companheiro sobrevivente103
A ordem da vocação hereditária do art. 1.829 coloca o cônjuge sobrevivente como herdeiro
concorrente com descendentes e ascendentes e, na falta destes, como herdeiro da totalidade
da herança.
Assim, traz a grande inovação do Código em matéria de sucessões, em relação à condição
do cônjuge: a concorrência com descendentes (no Regime da Comunhão Parcial, com bens
particulares, etc..) e a concorrência com ascendentes (desimportando o regime de bens).
CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTES: condicionado ao regime;
A concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes do de cujus vai depender
do regime matrimonial de bens. Não haverá concorrência se o cônjuge sobrevivente tiver sido
casado (com o falecido) pelo regime da comunhão universal de bens (1.667) ou pelo regime da
separação obrigatória (1.641), ou se, no regime da comunhão parcial (1.658), o autor da herança
não houver deixado bens particulares.
CONCORRÊNCIA COM ASCENDENTES: independente do regime.
103
Em 10/05/2017 o STF reconheceu repercussão geral em que entende inconstitucional a
diferenciação na sucessão do cônjuge e do companheiro.
426
prazo para a realização do divórcio direto. Como a EC 66/2010 possibilita a realização do divórcio
tão logo tenha havido o rompimento do casal, entende-se, com base em Tartuce (2012, p.
151) que este prazo não mais deve ser considerado.
O que se verifica é que o critério utilizado pelo legislador para definir a concorrência ou
não com os descendentes é o regime de bens que regia do casamento do autor da herança e o
cônjuge sobrevivente.
A regra é, então, que haja a concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes
do autor da herança. Existem, contudo, exceções.
Exemplo:
* Para todos verem: esquema
- Patrimônio de R$100.000,00
- Meação: R$ 50.000,00
- Legítima: R$ 50.000,00
- A = R$ 25.000,00
- B = R$ 25.000,00
427
Obs: Neste Regime (CUB) não é justificável a meação e a parte legítima.
A meação é de 50% de todos os bens (onerosos e gratuitos), não importando a data e a
forma de aquisição.
428
1ª corrente – concorrência apenas sobre bens particulares
Esta é a posição MAJORITÁRIA da doutrina. O cônjuge, neste caso, receberia, apenas
parte dos bens particulares e não da totalidade da herança, ou seja, seria meeiro dos bens
comuns e herdeiro, em concorrência com os descendentes, dos bens particulares.
EXEMPLO:
* Para todos verem: esquema
EXEMPLOS:
Patrimônio: R$ 10.000,00 (particulares)
R$ 100.000,00 (aqüestos)
Herança: R$ 60.000,00 (50 +10).
429
* Para todos verem: esquema
Art. 1.832
Cônjuge = 50% de meação + 1/4 da herança
em concorrência
Filhos = dividem ¾ da herança = 15% para
cada um
430
podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for
ascendente dos herdeiros com que concorrer.
Mãe = 1/3
Neste caso, mesmo que o bem seja deferido, pelo inventário, a outro herdeiro, caberá ao
cônjuge o direito real de habitação, sendo, então, vedada a venda deste imóvel (desde que seja
o único daquela natureza a inventariar).
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
433
06. Sucessão testamentária: testamento em geral, capacidade para testar, formas de testar
SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
• Se alguém falece sem deixar testamento sucessão legítima (sucessão por força de lei)
obedece a ordem da vocação hereditária.
• Se o testamento não compreender todos os bens do testador ou o testamento for
invalidado ou caducar também haverá sucessão legítima.
• Sucessão testamentária representa a vontade do testador.
• Se não foi feito testamento, presume-se que a pessoa tenha concordado com a ordem
da vocação hereditária.
1. Conceito:
A noção de testamento está clara no art. 1.857 e 1.858 do Código Civil, sendo considerado
um “ato personalíssimo e revogável pelo qual alguém dispõe da totalidade dos seus bens, ou de
parte deles, para depois de sua morte” (GONÇALVES, 2012, p. 228).
Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade
dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.
434
Mas essa noção do art. 1.857 limita a vontade do testador a disposições de caráter
patrimonial. Contudo, sabe-se que o testamento serve, também, para disposições de caráter
diferente do patrimonial:
2. Características:
a) Ato personalíssimo: é privativo do autor da herança. Não se admite testamento por
procuração.
b) Ato revogável (mudado a qualquer tempo): a expressão revogável é mais adequada e
correta; é a principal característica dos testamentos. A revogabilidade é da essência do
testamento.
c) Negócio jurídico unilateral: aperfeiçoa-se com a vontade única do testador. Não há a
necessidade de manifestação da vontade do beneficiário.
d) Unipessoal: um só agente pode testar, num só ato. O testamento de mão comum é
defeso em lei, visa garantir a liberdade das disposições e evitar o pacto sucessório - proibido art.
1.863 CC. Assim é vedado o testamento conjuntivo (mão comum), feito por duas ou mais
pessoas, seja simultâneo (disposição conjunta para beneficiar terceira pessoa), recíproco
(instituindo benefícios mútuos) ou correspectivo (disposições em retribuição de outras
correspondentes). Nada impede, contudo, que o casal faça cada um seu testamento em que
um deixa os bens para o outro. O que não pode é isso ser feito em um mesmo ato. Podem fazer,
no mesmo momento, mas em atos diferentes.
e) Solene: é um negócio jurídico não apenas formal, mas provido de formalidades
essenciais, prescritas em lei. A solenidade assegura a existência, a validade e a eficácia. O
formalismo constitui garantia e salva-guarda à liberdade de testar.
Exceção: testamento nuncupativo (de viva voz), admissível como espécie de testamento
militar (art. 1.896).
f) Gratuito: não exige do contemplado qualquer correspectivo, contrapartida ou
reciprocidade, ou seja, não há vantagens para o testador. Mesmo que haja encargo para o
beneficiário, o testamento segue sendo gratuito. Está contida na unilateralidade. Não existe
contra-prestação (exigível). Entretanto, o herdeiro responde pelas dívidas (arts. 1.792 e 1.821).
g) Revogável: a vontade testamentária é essencialmente revogável (art. 1.969), é ato de
435
última vontade, desde que não tenha sido modificado; A revogabilidade é conceito legal e da
essência do testamento. É irrenunciável a liberdade de revogar ou modificar o testamento. Toda
renúncia é considerada não escrita. Pode, contudo, o testador, modificar o testamento a
qualquer momento e quantas vezes quiser (art. 1.858). Exceção: o testamento é irrevogável com
relação a cláusula na qual eventualmente o testador tenha reconhecido filho fora do
matrimônio (art. 1.609, III). Se houverem vários testamentos sucessivos, feitos pelo mesmo
testador, com seu falecimento, terá validade apenas o último, a não ser que sirva para
completar o anterior.
h) Patrimonialidade não necessária: serve para dispor de parte ou de todo patrimônio
(parte disponível), bem como para instituir herdeiros, deserdá-los ou retratar a deserdação
(1.857, § 2º).
i) Ato causa mortis: a morte do testador é condição de eficácia do testamento, com
imediata abertura do processo sucessório. Assim, o testamento só produz efeitos com a morte
do testador. A abertura da sucessão é essencial para o cumprimento das disposições contidas
no testamento.
Além desses requisitos gerais, para o testamento ainda são exigidos os requisitos da
inteligência e da vontade, de compreender e de querer, ou seja, a possibilidade de
compreender o caráter e os efeitos do ato e querer praticá-los.
A regra, portanto é a capacidade e a incapacidade é a exceção, de forma que a capacidade
se presume e a incapacidade se prova.
Nesse sentido, o art. 1.860 dispõe:
Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-
lo, não tiverem pleno discernimento.
Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos.
436
O dispositivo legal dispõe sobre os que não podem testar, por não terem discernimento,
de forma que se subentende que todos os demais possuem capacidade para testar. Assim,
podem testar os cegos e os analfabetos, por exemplo. A norma do art. 1.860 é restritiva e só
abrangem os casos específicos, não permitindo interpretação extensiva.
b) Por falta de discernimento: aquelas pessoas que não tem discernimento não são
amentais, ou seja, se encontram, momentaneamente, fora de seu juízo perfeito, em razão de
uma patologia (arteriosclerose, excessiva pressão arterial, etc), embriaguez, uso de
entorpecente, etc. Trata-se de uma situação transitória.
c) Incapacidade testamentária dos relativamente incapazes: os relativamente
incapazes são proibidos de testar, exceto os maiores de 16 anos, cujo § único do art. 1.860 prevê a
possibilidade. Não podem testar, portanto os ébrios habituais e os viciados em tóxicos, por não
terem consciência dos atos praticados. O surdo mudo só não testa se não conseguir expressar
sua vontade. O surdo, mas não mudo, poderá testar, conforme art. 1.866.
d) Hipóteses não geradoras da incapacidade: exceto as hipóteses previstas no art.
1.860, todas as pessoas podem fazer testamento válido. A idade avançada, por exemplo, não é
suficiente para negar a capacidade testamentária. O que determina a incapacidade
testamentária é a falta de discernimento. Deve-se destacar que, em razão do Estatuto da
Pessoa com Deficiência, houve alteração dos arts. 3.º e 4.º do CC. Sendo assim, os deficientes
mentais não são mais incapazes podendo, portanto, testar.
Observação:
438
Formas de testamento conjuntivo:
Simultâneo: quando os testadores contemplam terceiros
Recíproco: testadores instituem um ao outro. O que sobreviver fica com todo o
patrimônio.
Correspectivo: quando o benefício outorgado por um dos testadores ao outro retribui
vantagem correspondente.
Não se impede, porém, que, SEPARADAMENTE, marido e mulher façam testamento um
para o outro. Pode até ser na mesma data, com termos semelhantes, mas em ATOS DISTINTOS,
separados.
439
Cumprimento, registro e abertura do testamento:
Realizado o testamento público, deve-se, com o falecimento do testador, se realizar o
registro do testamento. Isto é feito através de uma ação judicial através da qual o portador do
traslado do testamento (ou de uma certidão) pede ao juiz que determine o cumprimento do
mesmo. Art. 736, CPC/2015.
c. Testamento cerrado – Arts. 1.868 a 1.875, CC:
O testamento cerrado é aquele pelo qual o testador elabora o termo (ou alguém a seu
rogo e pelo testador assinado), com caráter sigiloso, que depende de instrumento de aprovação
do Tabelião, realizado na presença do testador e duas testemunhas, seguindo-se do seu
fechamento e costura do instrumento, sendo o documento entregue ao testador.
Só tem eficácia com a lavratura do auto de aprovação, pelo tabelião, na presença de 2
testemunhas.
Art. 1.872 – O testador deverá saber ler, pois precisa ter meios de se certificar que, no caso
de terceiro redigir o testamento a seu rogo, seguiu corretamente e fielmente as suas instruções.
Neste caso, o testador pode não saber escrever, mas, necessariamente, deve saber ler.
Art. 1.873 – O surdo-mudo pode fazer testamento cerrado, desde que escreva e assine.
Requisitos:
O art. 1.868, CC estabelece os requisitos e formalidades do testamento cerrado. O
testamento cerrado se compõe de algumas fases:
a) a elaboração do testamento. O Tabelião pode escrever e aprovar o testamento (1.870).
Assinatura do testamento é imprescindível. Entrega ao Tabelião, acompanhado de 2
testemunhas. Requer a lavratura do auto de aprovação (art. 1.869).
440
Abertura, registro e cumprimento.
O art. 1.875, CC dispõe acerca da abertura, registro e cumprimento do testamento cerrado.
Assim, falecendo o testador, deverá o testamento ser apresentado ao juiz que o abrirá, o fará
registrar e determinará seu cumprimento. Deve-se observar, portanto, que, quem abre a cédula
testamentária devidamente cosida é o juiz. Será extraída cópia autêntica do testamento para
juntar ao inventário.
Art. 735, CPC/2015 = se não houver vício externo que o torne suspeito de nulidade ou
falsidade, o juiz abre o testamento e mandará que o escrivão leia na presença do apresentante.
Depois de ouvido o MP, estando tudo nos conformes, o juiz mandará registrar, arquivar e
cumprir o testamento. Uma vez registrado o testamento, deverá o testamenteiro (indicado ou
dativo) assinar o termo de testamentaria.
Testamento dilacerado (1.972): ter-se-á como revogado. É o risco desta modalidade de
testamento: uma deterioração ou dilaceramento acidental.
Requisitos:
O art. 1.876 apresenta os requisitos e formalidades do testamento particular.
a) Deve ser escrito e assinado pelo testador.
b) Inquirição das testemunhas em juízo (confirmar o testamento);
c) Pode ser feito em idioma estrangeiro;
d) A lei permite que terceira pessoa redija, pois pode ser datilografado;
e) Se for escrito a mão, deverá ser feito pessoalmente pelo testador.
f) Uma testemunha pode confirmar (Leite, 393).
g) Leitura e assinatura de 3 testemunhas
441
Art. 737, CPC/2015: com o falecimento do testador deverá haver o requerimento de
registro do testamento. Poderão requerê-lo o herdeiro, legatário, testamenteiro ou outra
pessoa, detentora da cédula testamentária. O herdeiro que não tiver requerido a publicação do
testamento deverá ser intimado (§ 1.º). Uma vez que esteja tudo nos conformes e ouvido o MP, o
juiz confirmará o testamento.
e. Testemunhas instrumentárias
A atuação das testemunhas no testamento tem a função de conferir validade ao ato.
Em princípio, todas as pessoas capazes, podem ser testemunhas. Contudo, o art. 228, CC
determina as pessoas que não podem ser testemunhas (cuidado com as alterações do Estatuto
da Pessoa com Deficiência):
Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:
I - os menores de dezesseis anos;
II - (Revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) III -
(Revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) IV - o
interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes; V -
os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o
terceiro grau de alguma das partes, por consangüinidade, ou afinidade.
§ 1º Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o
depoimento das pessoas a que se refere este artigo.
§ 2º A pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de
condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurados todos os
recursos de tecnologia assistida. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
(Vigência)
442
e) reconhecer filho havido fora do matrimônio;
f) indicação de divisas e limites;
g) liberalidade não pode ultrapassar 10% do acervo imobiliário.
Formas:
- é hológrafo; simplificada; sem formalidades;
- é válido datilografado, desde que datado e assinado pelo testador;
- não exige testemunhas;
- pode ser escrito por meios mecânicos (jurisprudência dominante);
Execução:
As mesmas regras do testamento particular. Se público ou cerrado, segue-se as normas
de execução destes (art. 737, § 3.º, CPC/2015).
Art. 1885 – Se fechado, para manter secreto, a abertura se processa como o testamento
cerrado: será aberto pelo juiz que fará registrar.
Consequências:
Art. 1.882 – O codicilo pode ser autônomo, ou pode existir como parte integrante de um
testamento.
- Não revoga testamento. Por este é revogável (1.884);
- É revogável por outro codicilo;
- Mais de um codicilo: Na dúvida, vale a última disposição;
- É válido exista ou não testamento;
- Sendo o codicilo parte integrante ou complementar do testamento, anulado ou
revogado este, deixa de existir aquele;
- As regras da capacidade no testamento valem para o codicilo.
443
testamentos tem como características a redução das formalidades, em razão da presença
destas circunstâncias ou situações excepcionais.
Art. 1.886. São testamentos especiais:
I - o marítimo;
II - o aeronáutico;
III - o militar.
Art. 1.887. Não se admitem outros testamentos especiais além dos
contemplados neste Código.
Seu registro e cumprimento se dará de acordo com o art. 737, § 3.º, CPC/2015, obedecendo
as regras do testamento particular.
a. Marítimo
É a declaração de última vontade, feita a bordo de navios, embarcações: em alto mar.
Pode ser feito pelos tripulantes ou pelos passageiros (art. 1.888). Justifica- se em caso de
emergência e necessidade. Não prevalece se a embarcação estiver em local onde o testador
poderia ter desembarcado e testado de forma ordinária (art. 1.892). Caducará se o testador não
morrer em viagem, nem nos 90 dias subsequentes ao seu desembarque em terra, onde possa
fazer, na forma ordinária, outro testamento (art. 1.891).
Requisitos
- viagem realizada em navio nacional (extensão do território nacional);
- navio de guerra ou mercante (transporte de pessoas de um porto a outro).
Formas
- na forma do Público ou cerrado;
- exige apenas duas testemunhas;
- será lavrado, em regra, pelo Comandante;
- se o testador não puder assinar, alguém assina a rogo;
- o registro do testamento será no diário de bordo: parágrafo único, do art. 1888.
Caducidade: Efemeridade
Art. 1.891 – Caducará: Tem eficácia temporal e condicional:
a) não morrer na viagem;
b) 90 dias subsequentes ao desembarque não testar da forma ordinária
c) É nulo o testamento feito em portos – neste caso, poderia ser feito através de uma
forma ordinária de testamento. Tem que ser em alto mar (Art. 1892).
Requisitos
- Que a Força esteja “em campanha” (dentro ou fora do país) – mesmo missão de paz.
Formas
Pode ser de 3 formas: público, cerrado ou nuncupativo.
445
- Público: o comandante da tropa ou diretor do hospital ou oficial de saúde funcionará
como tabelião. Lavrado perante duas testemunhas ou por três, caso o testador não saiba assinar
(uma delas assinará a rogo).
- Cerrado: o testador entregará o escrito, devidamente assinado, ao oficial de patente
mais acima, que o datará, indicará o lugar em que lhe foi apresentado, assinando-o com as duas
testemunhas, devolvendo-o ao apresentante.
- Nuncupativo: é feito de viva voz, perante duas testemunhas, por alguém que esta
empenhada em combate ou ferida, ou seja, a pessoa está exposta a risco de vida e
impossibilitada de usar a forma escrita. Se findar a guerra ou o testador convalescer, cessarão os
motivos que autorizam esta forma de testamento.
As declarações são feitas a duas testemunhas: que devem escrevê-las e confirmar em
juízo. É exceção e possui o risco, pois se o testador falecer, ficará nas mãos das
testemunhas.
446
EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
a. Interpretação do testamento:
Quando da interpretação das cláusulas testamentárias, deve-se atentar para buscar a
verdadeira intenção do testador, ainda que não tenha se saído bem com as palavras escritas. É
nesse sentido a determinação do art. 1.899, CC.
b. Regras proibitivas:
• Nomeação a termo: Art. 1898
447
A designação do tempo: é vedada, com exceção do Fideicomisso. É cláusula não escrita. A
herança se transmite imediatamente, a partir do óbito. Aberta a sucessão o herdeiro não tem o
que aguardar.
Reafirma o princípio da saisine – a herança transmite-se com a morte.
Nesse caso, não há o prejuízo da nomeação em si, mas sim da designação do termo
(inicial ou final).
• Beneficiar pessoa incerta, a ser identificada por terceiro: Art. 1.900, III
É simples. Neste caso, não seria uma liberalidade personalíssima do falecido, mas sim do
terceiro, que determinaria quem seria beneficiado.
448
Art. 1.801. Não podem ser nomeados herdeiros nem legatários:
I - a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou
companheiro, ou os seus ascendentes e irmãos;
II - as testemunhas do testamento;
III - o concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver
separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos;
IV - o tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão, perante
quem se fizer, assim como o que fizer ou aprovar o testamento.
Art. 1.802. São nulas as disposições testamentárias em favor de pessoas
não legitimadas a suceder, ainda quando simuladas sob a forma de
contrato oneroso, ou feitas mediante interposta pessoa.
Parágrafo único. Presumem-se pessoas interpostas os ascendentes, os
descendentes, os irmãos e o cônjuge ou companheiro do não legitimado
a suceder.
c. Regras permissivas:
• Nomeação pura e simples: art. 1897
Puro e simples: não tem condição suspensiva e nem resolutiva. Não há qualquer encargo,
condição ou contraprestação.
Ex.: nomeio Fulano como meu herdeiro, que receberá x% da minha herança.
449
descumprido o encargo, os interessados deverão propor ação judicial para que seja declarada a
ineficácia da deixa testamentária.
3. Rompimento do testamento
Ocorre a ruptura do testamento quando “há a superveniência de uma circunstância
relevante, capaz de alterar a manifestação de vontade do testador, como, verbi gratia, o
surgimento de um herdeiro necessário” (Gonçalves, p. 457)
Enquanto a revogação depende da vontade do testador, o rompimento independe de sua
vontade, sendo determinado pela lei.
450
a. Superveniência de descendente sucessível (art. 1.973):
Ex.: ação de investigação de paternidade procedente posterior ao testamento, sem o
conhecimento prévio do testador.
A existência de qualquer filho quando da feitura do testamento afasta a caducidade,
mesmo que, após, surjam outros.
Hipóteses:
a) Nascimento posterior de filho, ou outro descendente. Só no caso do testador que não
tinha nenhum descendente.
b) Aparecimento de descendente, que o testador supunha falecido, ou cuja existência
ignorava. Se o testador sabia da existência do herdeiro e, ainda assim, testou, o testamento
subsiste.
4. Revogação do testamento
CADUCIDADE – o ato perde a validade por uma causa que o esvazia, ou em razão de um
fato que lhe retira o objeto.
NULIDADE – há um vício, embora as consequências sejam idênticas: deixa de existir a
disposição testamentária, ou se invalida, ou perde todo o efeito. Entretanto, a nulidade depende
de declaração judicial, enquanto a revogação é ato unilateral.
REVOGAÇÃO – O testamento é essencialmente revogável. Trata-se de mudança na
redação feita pelo próprio testador.
451
a. Espécies de revogação
REVOGAÇÃO EXPRESSA: dá-se mediante a confecção de novo testamento, onde é
indispensável mencionar a revogação do anterior, ou parte dele. Observa-se a mesma
solenidade pra a celebração (art. 1.969 CC). Não é necessário que a revogação seja efetuada por
outro testamento da mesma modalidade, mas, necessariamente, tem de ser feita por outro
testamento. Ex: testamento marítimo pode revogar público; cerrado pode revogar particular.
REVOGAÇÃO TÁCITA: decorre do surgimento de novo testamento, cujos dizeres e o
conteúdo apresentam-se incompatíveis com o anterior. Ante a contradição, permanece sempre
a disposição mais recente. O simples fato de existir novo testamento não significa que tenha
revogado o anterior. Ambos podem coexistir, desde que não sejam contraditórios, ou seja,
desde que se complementem.
b. Formas de revogação:
Segundo o art. 1.970, CC, a revogação do testamento pode se dar de forma total ou parcial.
1) Total = revogação pura e simples: declara-se, em novo testamento, a revogação do
anterior, não fazendo qualquer limitação ou reserva.
2) Parcial: limita-se ao tópico atingido – art. 1.970 CC
3) A revogação de um testamento, mas existindo outro, sem que a este haja alguma
referência, leva a concluir quanto à revogação de apenas um, perdurando o outro.
4) A revogação do testamento de reconhecimento de filho é válida. Contudo,
revoga-se o testamento, não a declaração de reconhecimento – esta é intangível – única
forma irrevogável do testamento.
5) O novo testamento não atinge os legados, pois estes são especificações dos bens.
c. Efeitos da revogação:
- priva-se o testamento de qualquer eficácia, se total, ou da eficácia na parte atingida,
se parcial;
452
O erro, obstáculo e a violência física determinam a nulidade e não a simples a nulidade do
testamento, visto que determinam a falta de vontade, não sendo, rigorosamente, vícios de
consentimento.
Certas formas testamentárias excluem a possibilidade de ocorrência de alguns vícios de
vontade.
O erro determina a anulabilidade quando se dá:
a) nos motivos;
b) na designação;
c) na indicação dos bens.
a. Situações OU Classificação:
Legado de coisa alheia – não pode o testador legar coisa certa que não lhe pertença no
momento da abertura da sucessão (art. 1.912).
Exceções:
Art. 1.912 – será válido o legado de coisa alheia, se a coisa, mesmo não pertencendo ao
testador na época do testamento, após o testamento, vier a integrar o patrimônio do testador.
Art. 1.913 – o testador determina que o herdeiro entregue bem seu (dele herdeiro) a
terceira pessoa. Trata-se, na verdade, de um encargo que, se não cumprido, equivale à renúncia.
Art. 1.915 – confuso. Como deve o herdeiro cumprir o legado.
Legado de crédito. Art. 1.918 – trata-se de uma cessão de crédito, em que o legatário
substitui o testador e primitivo credor e pode promover a respectiva cobrança.
Legado de alimentos. Art. 1.920 – engloba o sustento, a cura, o vestuário e a casa,
enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor. Via de regra, cabe ao testador
453
fixar o valor. Caso não o faça, o Juiz deverá fixar estes alimentos, atendendo para as forças da
herança e para as necessidades do alimentário. Exemplo: compelir herdeiro a pagar alimentos a
terceiros.
c. Direito de Pedir:
Desde a morte do testador o legatário tem direito de pedir a coisa deixada por legado art.
1.923 CC.
a. Conceito:
Ocorre quando o testado contempla vários beneficiários no testamento, deixando para
todos a mesma herança, em porções não determinadas e um deles vem a faltar.
O direito de acrescer ocorre, também, no direito das coisas (art. 1.411, CC), como nos casos
em que o usufruto é constituído em favor de duas ou mais pessoas. Nestes casos, havendo o
usufruto simultâneo (e deve estar expresso no documento), a parte do usufrutuário que falecer,
454
acrescerá ao do sobrevivo. Ex.: imóvel com usufruto para o casal João e Maria, de forma
simultânea (50% para cada). Neste caso, falecendo João, o usufruto será 100% de Maria.
Este direito de acrescer, no caso do direito sucessório, ocorre apenas na sucessão
testamentária, pois na sucessão legítima o direito de representação impede a aplicação deste
instituto, salvo os casos de direito de renúncia.
Exemplos:
* Para todos verem: esquema
Sucessão testamentária:
Se o falecido tiver deixado 10% de seu patrimônio (ou uma casa) para A e B, a herança será
dividida: 90% (por sucessão legítima), entra A, B e C (30% para cada um); 10% entre A e B. Como,
neste caso, o testador não deixou expresso como seria a divisão dos 10% entre A e B, caso B
faleça, A receberá todos os 10% (pelo direito de acrescer). Diferente será se o falecido disser:
“Deixo 10% do meu patrimônio para A e B, em parte iguais” (ou em qualquer percentual
definido). Neste caso, não haverá o direito de acrescer.
Desta forma, o direito de acrescer, na sucessão testamentária, ocorrerá na hipótese do art.
1.941, CC – caso do exemplo acima – ou, ainda, no caso do art. 1.942, CC – quando os nomeados
455
em conjunto receberem uma só coisa (legado) ou quando esta não puder ser dividida sem risco
de desvalorização.
Art. 1.941. Quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária,
forem conjuntamente chamados à herança em quinhões não
determinados, e qualquer deles não puder ou não quiser aceitá-la, a sua
parte acrescerá à dos co-herdeiros, salvo o direito do substituto.
Art. 1.942. O direito de acrescer competirá aos co-legatários, quando
nomeados conjuntamente a respeito de uma só coisa, determinada e
certa, ou quando o objeto do legado não puder ser dividido sem risco de
desvalorização.
Portanto, não haverá o direito de acrescer quando o testador tiver deixado, de forma
expressa, a especificação do quinhão de cada co-herdeiro ou co-legatário (um terço, metade,
etc). Se isto ocorrer, a quota do herdeiro ou legatário que não quiser ou não puder aceitar a
sucessão testamentária será devolvida aos herdeiros legítimos – art. 1.944, CC.
O direito de acrescer também não ocorre no caso de haver substituição. Ex.: deixo 10% do
meu patrimônio para João e Carla e, em substituição de qualquer deles, para Fernando. Se João
ou Carla não quiserem ou não puderem aceitar, Fernando herdará.
b. Fundamentos:
a) Decorrência da vontade presumida do testador – quando nomeia vários beneficiários
pela mesma disposição testamentária, para toda a herança ou parte dela, sem determinar a
porção de cada um; ou quando deixa a vários legatários a mesma coisa ou parte dela.
Presume-se que ele desejava que se um faltasse, os demais ficassem com a herança.
b) Quando ocorre o direito de acrescer, o acréscimo é forçado, pois não pode o
beneficiário (co-herdeiro ou co-legatário) aceitar sua parte e renunciar ao direito de acrescer.
Ademais, nos termos do art. 1.943, § único, os co- herdeiros ou co-legatários, aos quais acresceu
o quinhão daquele que não quis ou não pôde suceder, ficam sujeitos às obrigações ou encargos
que o oneravam.
c. Pressupostos:
Para que ocorra o direito de acrescer, alguns pressupostos ou requisitos devem estar
presentes:
a) Nomeação de vários herdeiros ou legatários na mesma disposição testamentária;
b) Atribuição sem discriminar as porções ou o quantum, no mesmo bem ou porção de
bens.
456
c) A falta ou impossibilidade de herdar de um herdeiro ou legatário instituído no
testamento.
d) O testamento não pode ter indicado uma pessoa determinada para que, na falta do
herdeiro ou legatário, receba sua parte – não pode haver substituto.
e) Indivisibilidade do bem, no caso de legados.
f) Indeterminação das quotas hereditárias.
Deve-se destacar que só haverá direito de acrescer nas conjunções real e mista. Na verbal
não há, pois o testador especifica o quinhão de cada um. Fica expressa a vontade do testador de
que cada um receba a quota que ele determinou.
457
f. Direito de acrescer entre legatários:
Arts. 1.941/1.942 CC: há um ou mais bens especificados, mas todos os legatários são
nomeados para o recebimento em comum deste patrimônio, em que não é possível sua divisão
(deterioração).
- inexiste acréscimo no legado em dinheiro (por ser genérico).
- também, no legado de alimentos (ao necessitado);
- o acrescentamento abrange-lhes os ônus (1.943, CC).
g. Legado de usufruto
Testamento institui o exercício do usufruto em favor de duas ou mais pessoas. O usufruto
é o direito de usar e gozar da coisa, por tempo certo ou vitaliciamente. Haverá o direito de
acrescer quando a nomeação for conjunta, sem especificação das quotas. Assim, são requisitos:
a) que haja a nomeação conjunta, sem especificar as frações em que incide o usufruto; b)
sempre sobre um bem individuado.
7. Substituições testamentárias
O testador pode, além de estabelecer o beneficiário de seu testamento, instituir o
substituto, ou seja, a pessoa que, na impossibilidade do herdeiro testamentário (ou legatário) de
herdar (seja por já ser falecido ou por não aceitar a herança, p.ex.), herdará em seu lugar. É o que
estabelece o art. 1.947, CC:
Art. 1.947. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro ou ao
legatário nomeado, para o caso de um ou outro não querer ou não poder
aceitar a herança ou o legado, presumindo-se que a substituição foi
determinada para as duas alternativas, ainda que o testador só a uma se
refira.
a. Substituição vulgar
Quando o testador designa uma ou mais pessoas para ocupar o lugar do herdeiro ou
legatário que não quiser ou não puder aceitar o benefício.
Trata-se de uma instituição condicional (que só ocorre que o beneficiário não puder ou
não quiser receber) e subsidiária (só produz efeitos se a disposição principal não produzir
efeitos). Estabelece a vocação direta, pois o substituto herda diretamente do falecido.
458
A substituição vulgar pode ser:
a) Simples ou singular, um só substituto para um ou muitos herdeiros instituídos
b) Coletiva ou plural, quando há mais de um substituto a ser chamado
simultaneamente
c) Recíproca, quando são nomeados dois ou mais beneficiários, estabelecendo que
reciprocamente se substituam. Neste caso, os herdeiros recolherão a cota do que faltar.
b. Substituição fideicomissária
Trata-se das situações nas quais o testador estabelece um beneficiário, mas com a
incumbência de, após, por sua morte, ou em vida, transmitir o bem a outra pessoa, inclusive sob
certa condição.
Existem três figuras: a) Fideicomitente – o instituidor, testador, doador; b) Fiduciário (ou
gravado) – que recebe o bem para, após, efetuar a transmissão; c) Fideicomissário (ou
substituto) – pessoa que recebe o bem quando da morte do fiduciário.
O testador fixa o tempo do fideicomisso: vitalício (até a morte do fiduciário); a termo (em
tempo prefixado pelo testador) ou condicional (se depender de implementação de alguma
condição resolutiva).
Trata-se de uma vocação dupla, pois tanto o fiduciário, quanto o fideicomissário se tornam
titulares da herança. O fiduciário enquanto estiver vivo ou não ocorrer a condição ou termo. O
fideicomissário após estes períodos.
Há direito de acrescer – art. 1.956, CC: Se o fideicomissário aceitar a herança ou legado,
terá direito a receber também aquilo que acresceu aos fiduciários.
É proibido o fideicomisso sucessivo, ou seja, não pode o testador deixar o bem para A, com
o dever de, com sua morte, transmitir para B e este, para C. A cláusula não será totalmente nula.
Quando A falecer, B adquirirá a propriedade do bem.
459
Assim, deve-se apurar o valor total do patrimônio na data da abertura da sucessão,
abatidas as dívidas e despesas de funeral, adicionando-se os bens sujeitos a colação (art. 1.847,
CC). A partir daí, o valor líquido é divido em duas metades – uma delas a legítima e a outra, a
parte disponível. Os valores que ultrapassarem a metade disponível devem ser reduzidos,
proporcionalmente, nos termos do art. 1.967, CC.
Ordem: 1) herdeiro instituído (ou proporcionalmente, se houver mais de um); 2) legatário,
na proporção do seu valor; 3) redução das doações (começando pela mais nova ou
proporcionalmente se forem na mesma data).
O testador pode, ainda, estabelecer forma diferente para a redução (§ 2.º):
9. Testamenteiro:
Testamenteiro é o executor do testamento. É a pessoa que o de cujus encarrega de fazer
cumprir suas disposições de última vontade.
O testador pode nomear um ou mais testamenteiros, conjuntos (quando a atuação é
conjunta, cumulando funções) ou separados (quando o exercício da testamentaria é feito uns
em falta dos outros).
Testamentaria – conjunto de funções que são realizadas pelo testamenteiro, o complexo
de direitos e obrigações.
Trata-se de encargo complexo na execução do testamento – não é múnus ou função
pública, mas encargo de ordem privada, de caráter facultativo. Há ampla liberdade de escusar-
se à testamentaria. Um ou mais, conjuntos ou separados, para cumprir a última vontade.
460
a. Espécies de testamenteiro:
O testamenteiro pode ser:
b. Nomeação do testamenteiro:
O testamenteiro pode ser nomeado no próprio testamento ou codicilo. O testador pode,
ainda, instituir um ou vários testamenteiros para atuar em conjunto ou em separado. Se não
houver testamenteiro, o cumprimento do testamento deverá ser cumprido pelo cônjuge ou
companheiro sobrevivente ou qualquer herdeiro. Se não houver testamenteiro, o juiz nomeará
dativo, obedecendo a ordem (§ 4.º, art. 735, CPC/2015).
c. Aceitação do encargo:
A pessoa que é nomeada testamenteira pode aceitar ou não o encargo. Em se tratando de
um múnus privado ninguém é obrigado a exercer.
d. Atribuições do testamenteiro:
1.979, CC – Registro do testamento – como o testamenteiro é o detentor (em regra) do
testamento, a ele incumbe (compete/pode) levá-lo a registro.
1.980, CC – Obrigação do Testamenteiro: cabe ao testamenteiro a execução do
testamento. Para tanto, deve:
1. apresentar o testamento em juízo para o registro.
2. depois de registrado o testamento, dar cumprimento, ou seja, executar as disposições
nele constantes – prazo – 180 dias.
1.982, CC - O testamenteiro – executor da última vontade – age de acordo com os poderes
conferidos pelo Testador.
1.983, CC - Prazo de 180 dias: suficiente. O prazo pode ser prorrogado (§ único)
1.984, CC – Na ausência de nomeação de testamenteiro, a execução testamentária,
compete a um dos cônjuges ou herdeiro nomeado pelo juiz.
461
3. defender a validade do testamento – art. 1.981, CC
1.981, CC - Propugnar a validade do testamento: deve defender a validade do testamento,
contra quem impugnar em juízo.
4. exercer as funções de inventariante, se estiver na posse e na administração da
herança ou se não houver cônjuge, nem herdeiros necessários.
1.990, CC - O testamenteiro exerce as funções de inventariante, na hipótese do testador
“tiver distribuído toda a herança em legados”.
5. prestar contas – art. 1.980.
1.985, CC - o encargo não se transmite aos herdeiros do testamenteiro. É encargo pessoal
indelegável. O testamenteiro pode fazer-se representar em juízo por procurador (1.985) e
mandatário (1.764)
1.986, CC - Mesmo conteúdo – responsabilidade solidária dos testamenteiros aceitantes.
462
INVENTÁRIO E PARTILHA
1. Inventário
Aberta a sucessão com o falecimento do autor da herança, seu patrimônio é, desde logo,
transmitido aos herdeiros legítimos e testamentários, de acordo com o art. 1.784, CC. Como a
herança é transmitida “como um todo unitário”, é preciso que seja feita a individualização de
cada quota parte dos herdeiros, a fim de terminar com o estado de comunhão. Nesse sentido,
deve-se instaurar o processo de inventário, para que seja possível realizar a partilha dos bens e
individualização dos quinhões hereditários.
Inventário significa achar, encontrar. Utilizada juridicamente no sentido de enumerar e
catalogar aquilo que “foi encontrado”, que pertence, neste caso, ao falecido.
O procedimento de inventário é previsto no art. 610 e seguintes do CPC/2015.
2. Inventário negativo
Mesmo que não existam bens, é possível que seja feito o processo de inventário. Serve, tão
somente, para comprovar que aquele que faleceu não possui bens a inventariar.
Ex.: art. 1.523, I – causa suspensiva – viúvo que não deu partilha aos filhos não deve casar –
regime da separação obrigatória de bens (art. 1.641, I). É possível que esta penalidade não seja
imposta se restar comprovado que não haverá prejuízo aos filhos. A forma de fazer essa prova é
o inventário negativo.
Será dada abertura ao inventário, feita a pesquisa de bens e a sentença judicial declarará a
inexistência de bens a serem partilhados.
3. Inventário conjunto
Em situações excepcionais é possível que seja realizado o inventário de duas pessoas ao
mesmo tempo, no mesmo processo, visando a economia processual. HIPÓTESES: Art. 672,
CPC/2015 – identidade de herdeiros, herança deixada pelos dois cônjuges ou companheiros ou
dependência de uma das partilhas em relação à outra.
4. Dispensa de Inventário
Dependendo dos bens que componham o acervo hereditário o inventário pode ser
dispensado – Lei 6.858/80 - Pagamento, aos Dependentes ou Sucessores, de Valores Não
Recebidos em Vida pelos Respectivos Titulares – FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço) e PIS-PASEP (Fundo de Participação) – art. 666, CPC/2015.
Outros bens:
- bens que o de cujus tenha apenas a posse – não é necessário fazer inventário –
aquisição originária da propriedade – uscucapião.
463
- contas poupança – se o de cujus tiver um segundo titular na conta, este poderá sacar
os valores, ainda que a jurisprudência tenha uma tendência a deferir só a metade dos valores.
- Alvará judicial: em sendo necessário o levantamento de importâncias em dinheiro ou
venda de algum bem antes de completado o inventário, é possível que as partes façam
requerimento em juízo de alvará judicial para tal fim. Normalmente a justificativa utilizada é o
pagamento das custas do inventário, impostos, taxas, etc.
5. Inventário Judicial
O inventário judicial é divido em:
464
- certidões de nascimento, ou outro documento, dos herdeiros;
Foro competente
O foro competente para processamento do inventário é o foro do último domicílio do de
cujus, mesmo que os herdeiros residam em localidade diversa (arts. 1.785 e 1.796, CC e art. 48,
CPC/2015).
Administrador provisório
Até que seja nomeado inventariante e este preste compromisso, a administração da
herança ficará a cargo do administrador provisório nomeado pelo juiz (art. 613, CPC/2015). Este
tem a função de representação do espólio, devendo trazer ao acervo frutos percebidos, tendo
direito de ser reembolsado pelas despesas necessárias. Responde por danos a que der causa
(art. 614, CPC/2015).
Nomeação de inventariante
Ingressando os herdeiros com o processo do inventário, o juiz despachará e nomeará o
inventariante, que prestará compromisso e as primeira declarações (prazo de 20 dias) (art. 620,
CPC/2015). A função do inventariante é administrar os bens do espólio, sendo seu representante
legal até que a partilha seja efetivada.
A ordem preferencial104 de pessoas que podem ser nomeadas inventariante é trazida pelo
art. 617, CPC/2015:
Art. 617. O juiz nomeará inventariante na seguinte ordem:
I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse
convivendo com o outro ao tempo da morte deste;
II - o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se
não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes não
puderem ser nomeados;
III - qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na
administração do espólio;
IV - o herdeiro menor, por seu representante legal;
V - o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do espólio
ou se toda a herança estiver distribuída em legados;
VI - o cessionário do herdeiro ou do legatário; VII - o inventariante judicial,
se houver;
VIII - pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial.
104
O STJ entendeu que esta ordem é preferencial e não absoluta (REsp 402.891)
465
Depois de escolhido o inventariante pelo juiz, deverá prestar compromisso em 5 dias, de
bem e fielmente desempenhar o cargo (art. 617, § único, CPC/2015).
Obs.: o compromisso de inventariante poderá ser assinado por procurador, desde que
com poderes especiais para assinatura do termo de compromisso de inventariante (art. 105,
CPC/2015).
As atribuições do inventariante estão dispostas nos arts. 618 e 619, CPC/2015, de onde se
destacam as principais: representação do espólio, administrador dos bens, prestar as primeiras
declarações, juntar aos autos documentos e certidões necessários.
O inventariante pode ser removido do encargo nos casos previstos no art. 622, CPC/2015.
Como o inventariante realiza um múnus público, pode ser removido a qualquer momento, se
comprovada a prática de determinados fatos, descritos no art. 622, CPC/2015:
Art. 622. O inventariante será removido de ofício ou a requerimento:
I - se não prestar, no prazo legal, as primeiras ou as últimas declarações;
II - se não der ao inventário andamento regular, se suscitar dúvidas
infundadas ou se praticar atos meramente protelatórios;
III - se, por culpa sua, bens do espólio se deteriorarem, forem dilapidados
ou sofrerem dano;
IV - se não defender o espólio nas ações em que for citado, se deixar de
cobrar dívidas ativas ou se não promover as medidas necessárias para
evitar o perecimento de direitos;
V - se não prestar contas ou se as que prestar não forem julgadas boas;
VI - se sonegar, ocultar ou desviar bens do espólio.
Essa enumeração é exemplificativa, podendo haver casos outros em que o juiz entenda
que é caso de remoção do inventariante. Contudo, a simples demora no término do inventário
não justifica a remoção. Para que isto ocorra, deve a demora ter se dado por culpa do
inventariante.
O procedimento para remoção do inventariante está constante nos arts. 623 a 625,
CPC/2015.
Primeiras declarações
Com a nomeação do inventariante, deverá prestar as primeiras declarações no prazo de
20 dias. Essas primeiras declarações deverão conter (art. 620, CPC/2015):
I - o nome, o estado, a idade e o domicílio do autor da herança, o dia e o
lugar em que faleceu e se deixou testamento;
II - o nome, o estado, a idade, o endereço eletrônico e a residência dos
466
herdeiros e, havendo cônjuge ou companheiro supérstite, além dos
respectivos dados pessoais, o regime de bens do casamento ou da união
estável;
III - a qualidade dos herdeiros e o grau de parentesco com o
inventariado; IV - a relação completa e individualizada de todos os
bens do espólio,
inclusive aqueles que devem ser conferidos à colação, e dos bens alheios
que nele forem encontrados, descrevendo-se:
a) os imóveis, com as suas especificações, nomeadamente local em que
se encontram, extensão da área, limites, confrontações, benfeitorias,
origem dos títulos, números das matrículas e ônus que os gravam;
b) os móveis, com os sinais característicos;
c) os semoventes, seu número, suas espécies, suas marcas e seus sinais
distintivos;
d) o dinheiro, as joias, os objetos de ouro e prata e as pedras preciosas,
declarando-se-lhes especificadamente a qualidade, o peso e a
importância;
e) os títulos da dívida pública, bem como as ações, as quotas e os títulos
de sociedade, mencionando-se-lhes o número, o valor e a data;
f) as dívidas ativas e passivas, indicando-se-lhes as datas, os títulos, a
origem da obrigação e os nomes dos credores e dos devedores;
g) direitos e ações;
h) o valor corrente de cada um dos bens do espólio.
Fase de impugnações:
Concluídas as citações as partes poderão impugnar alguma declaração prestada pelo
inventariante, no prazo de 15 dias, nos termos do art. 627, CPC/2015.
Se a impugnação for julgada procedente, o juiz determinará que as declarações sejam
retificadas.
Em caso de haver uma questão que demande produção de provas que não a documental,
especialmente no que se refere ao art. 627, III, CPC/2015 – contestar a qualidade de herdeiro – o
juiz deverá remeter o impugnante para as vias ordinárias (dilação probatória) e suspender o
inventário (art. 627, § 3.º, CPC/2015).
Últimas declarações:
Depois de aceita a avaliação dos bens ou resolvidas possíveis impugnações à avaliação, o
inventariante deverá prestar as últimas declarações (art. 636, CPC/2015), quando poderá
descrever bens que, porventura tenham sido esquecidos (mesmo que por desconhecimento).
As partes serão ouvidas sobre as últimas declarações, podendo alegar a sonegação de bens pelo
inventariante somente depois da última declaração feita por ele, de que não existem outros
bens a inventariar (art. 621, CPC/2015).
468
Nesse caso, quando da abertura do inventário já são juntados todos os documentos
necessários, prova da quitação do imposto, partilha, etc, e o juiz apenas homologa, nos termos
do art. 2.015, CC.
Como é um procedimento sumário, é desburocratizado e, nesse sentido, o art. 660,
CPC/2015 dispensa a lavratura de termos de quaisquer espécies.
6. Inventário administrativo:
A lavratura da Escritura Pública de Inventário trata de uma forma facultativa. Não há
obrigatoriedade da partilha extrajudicial. Assim, se todos forem capazes e concordes, o
inventário e a partilha poderão ser feitos no Tabelionato de Notas (art. 610, § 1.º, CPC/2015).
Requisitos/pressupostos:
Todos capazes (capacidade de todos os interessados) e de acordo (ausência de
litigiosidade). Não pode envolver incapazes, nem existir testamento. Objetiva desburocratizar e
agilizar o procedimento judicial de inventário e partilha.
Se o testamento já foi anulado, pode ser feito o inventário extrajudicial, fazendo constar da
Escritura as informações da ação anulatória transitada em julgado.
Os herdeiros e meeiros são representados por advogado (indispensável, conforme art. 610,
§ 2.º, CPC/2015) e devem assinar a Escritura.
Se por todos reconhecida a União estável do falecido, poderá o companheiro sobrevivente
promover o inventário extrajudicial. Do contrário, via judicial e com reconhecimento.
A opção pela via extrajudicial, poderá, inclusive, ser solicitada durante o trâmite do
procedimento judicial do inventário (arrolamento), mediante a suspensão ou desistência.
Na via judicial existe a fixação da limitação em face da competência territorial: local do
óbito/último domicílio do de cujus. No âmbito extrajudicial, a escolha do Tabelião é liberalidade
das partes, não se condicionando ao domicílio, situação dos bens ou local do óbito.
7. Sonegados:
Aberto o inventário, é dever do inventariante apresentar as primeiras e últimas
declarações, com a indicação e caracterização dos bens a serem partilhados. Caso o
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inventariante ou algum herdeiro não descreva algum bem, intencionalmente, de forma a
desfalcar o ativo do espólio, cometerá o delito civil de sonegação, sujeitando-se às penas dos
arts. 1.992 e 1993, CC.
Penas:
Os arts. 1.992 e 1.993 do CC determinam as penas aplicadas; ao herdeiro que sonegar –
perderá o direito que teria sobre o bem, devendo restituí-lo, bem como aos seus frutos; se o
sonegador for o inventariante, ainda será removido da inventariança.
A pena é civil. Remoção do inventariante (art. 622, VI, CPC/2015) e perda do bem sonegado,
que é imposta por sentença.
A pena só poderá ser imposta em ação ordinária (LEITE, p. 724). Se o sonegador for
testamenteiro perde direito à vintena e é removido do cargo de inventariante.
Para que tenha cabimento a ação de sonegados não é preciso que o sonegador negue a
restituição dos bens, mas que tão somente não os descreva, estando tais bem em seu poder, ou
em poder de terceiros, com sua ciência.
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8. Do pagamento das dívidas
O espólio responde pelas dívidas do falecido, mas feita a partilha, cada herdeiro
responderá, dentro do limite de seu quinhão (art. 796, CPC/2015).
ART. 1997
Onde há dívidas, há responsabilidade solidária dos herdeiros. Antes da distribuição da
herança, pagam-se as dívidas. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido. O
patrimônio do de cujus é a garantia dos credores.
Ex. se existe um só herdeiro, ele é responsável exclusivo de todo pólo passivo sucessório.
Até a partilha: da abertura da sucessão até a partilha – os bens da herança,
respondem pelo passivo. Feita a partilha, a proporcionalidade da parte (quota) é que
responde. A partir da divisão da herança, cada herdeiro responde – individualmente – pela
satisfação da dívida da herança (LEITE, p. 735).
Constituem-se em encargos da herança:
1. Despesas funerárias;
2. Vintena do testamenteiro;
3. Dívidas do falecido;
4. Cumprimento dos legados.
Antes da partilha, podem os credores pedirem ao juiz o pagamento das dívidas vencidas e
exigíveis (art. 642, CPC/2015).
9. Colação
Instituto de origem romana, a colação é reunião dos bens recebidos pelo(s)
descendente(s), a título de liberalidade (doação), antes da abertura da sucessão.
O que exceder a metade disponível, para cálculo das legítimas, devem ser conferidos na
parte indisponível.
ART. 2002 - Apenas os descendentes estão sujeitos a colação.
ART. 2003 - A colação visa igualar as legítimas dos descendentes e do cônjuge
sobrevivente.
Art. 621, § único, CPC/2015 – os bens a serem colacionados terão seu valor calculado pelo
valor do tempo da abertura da sucessão (para óbitos ocorridos após a entrada em vigor desta
lei). No caso de óbitos ocorridos antes de março de 2016, aplica-se a regra do art. 2004 – O valor
da colação é aquele atribuído na liberalidade; se não tiver valor, por ocasião da partilha, se
estimará o valor da época da liberalidade( os bens serão avaliados com base no valor do tempo
da liberalidade); as benfeitorias, frutos e rendimentos são do donatário, “que responde pelos
danos e perdas que eles sofrerem” (§§ 1º e 2º, do art. 2004).
471
ART. 2009 - Também, os netos, que herdam por direito de representação substituindo o
pai pré-morto, “serão obrigados a trazer à colação”.
a. Dispensa da colação.
“O doador pode dispensar o donatário da colação, determinando que a liberalidade saia
de sua metade disponível, contanto que a doação não exceda o valor da quota disponível,
comutado o seu valor ao tempo da doação” (Gonçalves, p. 542).
ART. 2005 – Contanto que não excedam a parte disponível (sua metade), computada ao
tempo da liberalidade (doação).
Deve ser expressa tal condição, em que pese inexistir forma sacramental.
Se a doação não exceder a parte disponível, não há que falar em colação. Se exceder, o
excesso deve ser colacionado. (Cf. LEITE, p. 770).
ART. 2006 - A dispensa da colação pode ser outorgada pelo doador em testamento, ou no
próprio título de liberalidade.
A dispensa deve constar da Escritura Pública (liberalidade); do testamento: deve ser
expressa e constar do próprio título.
ART. 2007 - São sujeitas à redução as doações em que se apurar o excesso... no
momento da liberalidade.
O caput do art tem redação mas técnica que a do Código de 16, determinado a redução e
na a colação (e metade disponível).
ART. 2008 – Determina que o herdeiro renunciante deve conferir as doações recebidas,
para buscar a igualdade das legítimas.
ART. 2010 - São excluídos da colação: gastos ordinários como: educação, alimentos,
vestuário, despesas com casamento e doença. “Havendo excesso... perdem o caráter de
ordinários e devem ser colacionados” (LEITE, p. 782).
ART. 2011 - As doações remuneratórias, também, denominadas sob encargo, não
constituem liberalidade, sendo desnecessária a colação.
ART. 2012 – Por ocasião do inventário de cada cônjuge se travará a colação.
10. Partilha
Terminado o inventário, partilham-se os bens entre os herdeiros e cessionários,
separando-se a meação do cônjuge sobrevivente. É a forma de terminar com a comunhão dos
bens, com o condomínio (salvo se não for possível dividir o bem – quando deverá ficar em
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condomínio, sendo, apenas, definido o percentual de propriedade de cada herdeiro sobre o
bem).
Se houver apenas um herdeiro, providencia-se a adjudicação dos bens, pois não haverá
partilha dos bens, nem divisão, de forma que poderá haver o inventário simplificado.
Procedimento: ver arts. 647 a 658, CPC/2015
ART. 2016 – se houver divergência ou algum herdeiro for incapaz. Nestes casos, a partilha
judicial é obrigatória, sendo a divisão determinada pelo juiz, respeitando os valores e
proporcionalidade das quotas.
c. Plano de partilha:
Melhor critério: bom senso, equilíbrio, igualdade possível.
Sempre que os herdeiros divergirem as partes formularão ao juiz pedido de quinhão e o
juiz deliberará. Deverá ser apresentado o esboço da partilha que deverá ser efetivada pelo juiz.
ART. 2017 – Igualdade possível: quanto à natureza, valor e qualidade.
Igualdade é equidade. Princípio fundamental da partilha.
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Neste caso, se o juiz tiver de decidir a partilha, normalmente optará pela mais justa e
equânime possível (provavelmente, dividir tudo entre todos).
d. Partilha em vida:
A partilha em vida é aquela feita pelo pai ou qualquer ascendente, via escritura pública ou
testamento, mas que não pode prejudicar a legítima dos herdeiros necessários.
ART. 2018 – Partilha em vida: possibilidade de ser fazer a partilha em vida ou por
testamento, reservada a legítima dos herdeiros necessários.
ART. 2019: Divisão Cômoda: Venda Judicial: Divisão do valor apurado:
“Dos bens insuscetíveis de divisão cômoda”: bens que não o couberem na meação do
cônjuge (ou companheiro) ou no quinhão do herdeiro, serão vendidos judicialmente.
a) venda judicial;
b) cessão de direitos;
c) partilha-se o valor apurado.
d) Parágrafo Primeiro: adjudicação a todos. Um, dois ou três podem requerer a
adjudicação (total das quotas). Não se fará a venda se os herdeiros requerem a adjudicação.
ART. 2020 – divisão dos frutos percebidos é fundamental. Podem ser partilhados em
aditamento. Respondem por dano (dolo ou culpa) deram causa.
ART. 2021 – Bens litigiosos, remotos, liquidação morosa ou difícil: poderá ser feita a partilha
dos outros e, a sobrepartilha dos demais, “com o consentimento da maioria dos herdeiros”.
Não há razão para sobrestar a partilha. “A partilha do líquido não se pode demorar por
causa do ilícito”.
e. Sobrepartilha:
ART. 2022 –
Se a partilha foi feita com dolo ou outro vício de consentimento, cabe ação de anulação e,
não sobrepartilha.
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Somente depois de recolhidos todos os impostos é que a partilha será julgada e que será
expedido o auto de partilha, para ser registrado no CRI.
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EM RESUMO
* Para todos verem: esquema
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