Você está na página 1de 80

Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).

Aluno Olivia Oliveira Guimarães


DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

PRINCÍPIOS

São três os princípios norteadores do Código Civil de 2002, a saber:


a) Princípio da Socialidade
b) Princípio da Eticidade
c) Princípio da Operabilidade

O Princípio da Socialidade consiste na prevalência dos interesses coletivos sobre os


individuais. Aludido princípio se opõe ao sentido individualista que motivou o Código Civil anterior.
Dessa forma, surgiu um novo conceito de posse, a posse-trabalho, reduzindo-se o prazo de
usucapião, se o possuidor instalar no imóvel a sua moradia ou realizar investimentos de interesse
social e econômico.
O Princípio da Eticidade é o que confere maior poder ao Juiz para decidir o caso concreto, não
só suprindo as lacunas da lei, mas também resolvendo os litígios com base na equidade, quando
autorizado pelo ordenamento jurídico, ou quando a norma expressa for deficiente ou inajustável para
o caso concreto. No novo Código, nem tudo se resolve por meio de preceitos normativos expressos,
pois são fartas as referências à eqüidade, à boa-fé, à justa causa e demais critérios éticos. O grande
número de hipóteses em que a decisão deve se basear em critérios ético-jurídicos amplia, em nome
de uma solução mais justa ou equitativa, os poderes do magistrado. Como esclarece Miguel Reale, no
novo Código não prevalece a crença na plenitude hermética do Direito Positivo, sendo reconhecida a
imprescindível eticidade do ordenamento. Nesse sentido, é posto o Princípio do Equilíbrio Econômico
dos Contratos como base ética de todo Direito Obrigacional.
Finalmente, o Princípio da Operabilidade consiste no fato de estabelecer soluções normativas
de modo a facilitar a interpretação e a aplicação do direito, eliminando-se, por exemplo, as dúvidas
hermenêuticas que persistiam no Código anterior, como a polêmica distinção entre prescrição e
decadência. De fato, o Código atual enumera, na Parte Geral, os casos de prescrição, inserindo as
hipóteses de decadência em conexão com a disposição normativa que as estabelece.

DAS PESSOAS

DAS PESSOAS NATURAIS

PESSOA. CONCEITO. ESPÉCIES

Pessoa, na acepção jurídica, é o titular de direitos e obrigações. Nesse sentido, pessoa é


espécie do gênero sujeito de direito ou sujeito da relação jurídica. É, pois, o único ente dotado de
personalidade jurídica.

Duas são as espécies de pessoas:


a) pessoa natural ou pessoa física: é o ser humano.
b) pessoa jurídica ou pessoa moral ou pessoa coletiva: organizações que visam à realização
de um certo interesse.

PERSONALIDADE JURÍDICA

CONCEITO

1
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Personalidade jurídica é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações.


Tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica são dotadas dessa personalidade.
No tocante à pessoa natural, a personalidade emana do simples nascimento com vida, ao
passo que a pessoa jurídica de direito privado só a adquire a partir do registro do seu ato
constitutivo no Cartório competente. Assim, o registro da pessoa humana é meramente
declaratório, ao passo que o da pessoa jurídica é constitutivo.
Dispõe o art. 1º do CC que “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. Veja
que o Código Civil usa a palavra pessoa, em vez de homem, abstendo-se de enfatizar apenas o
aspecto masculino, outrossim, deveres, que é uma acepção mais ampla do que obrigações, pois
estas se referem apenas a prestações patrimoniais, ao passo que deveres é o gênero que abrange
as obrigações e outras imposições normativas de caráter extrapatrimonial. Portanto, não existe, no
Brasil, ser humano destituído de personalidade jurídica, esta é inerente à natureza humana. Quanto
aos apátridas, que não pertencem a Estado algum, também desfrutam de personalidade jurídica.
Igualmente os estrangeiros e os doentes mentais. No Brasil, cumpre observar que, ao tempo da
escravatura, os escravos não eram pessoas, equiparavam-se às coisas.
Quanto aos animais, não são pessoas. Por consequência, não podem adquirir direitos e
obrigações. Igualmente, as almas e santos. Nulos são, portanto, os contratos e testamentos em
favor desses seres.

INÍCIO DA PERSONALIDADE

O início da personalidade jurídica varia conforme se trate de pessoa física ou de pessoa


jurídica.
A personalidade civil da pessoa física começa a partir do nascimento com vida (art. 2º do CC).
Sobre o assunto tem três teorias. A primeira é a teoria natalista, que exige, para a aquisição
da personalidade, o nascimento com vida. A segunda é a teoria concepcionista, que defende o
início da personalidade desde a concepção, considerando o nascituro como pessoa. A terceira é a
teoria da viabilidade, adotada na França, que condiciona o início da personalidade à existência
fisiológica de vida, isto é, de órgãos essenciais ao corpo humano, como cérebro, rins, e outros.
Uma primeira corrente sustenta que o Código Civil adotou a teoria natalista, de modo que
nascituro não é pessoa.
Outra, filia-se à teoria concepcionista.
Prevalece, no entanto, a opinião de Maria Helena Diniz, que o Brasil acolheu uma teoria
mista, pois os direitos da personalidade são adquiridos desde a concepção, como o direito à vida, à
integridade física, aos alimentos, à imagem, à sepultura, etc., enquanto os direitos patrimoniais só
são adquiridos a partir do nascimento com vida, como é o caso do direito de comprar, vender,
aceitar doação, testamento, etc. Por consequência, o nascituro não tem personalidade jurídica em
relação aos direitos patrimoniais, mas tem personalidade jurídica quanto à aquisição dos direitos da
personalidade. Noutras palavras, o nascituro tem personalidade jurídica formal, que é a aptidão
para adquirir os direitos da personalidade, mas não tem personalidade jurídica material, que é a
aptidão para adquirir os direitos patrimoniais. À guisa de exemplo, cumpre mencionar que no
Estado de São Paulo a Corregedoria Geral de Justiça autoriza a inserção de um nome civil ao
natimorto.
Saliente-se, porém, que a personalidade é regida pela lei do domicílio, conforme preceitua o
art. 7º da LINDB. Portanto, tratando-se de mulher grávida domiciliada fora do Brasil, torna-se
perfeitamente possível a adoção da teoria da concepção, que atribui personalidade ao nascituro
desde a concepção, se essa doutrina for a abraçada no país de origem. Da mesma forma, poderá

2
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

ser acolhida, nesse caso, a teoria da viabilidade.


Discorrendo sobre o assunto, Washington de Barros Monteiro assevera que para que ocorra o
fato do nascimento, ponto de partida da personalidade, preciso será que a criança se separe
completamente do ventre materno. Ainda não terá nascido, acrescenta o ilustre civilista, enquanto
a este permanecer ligada pelo cordão umbilical. Não importa que o parto tenha sido natural, ou
haja exigido intervenção cirúrgica. Não importa, outrossim, tenha sido a termo ou fora de tempo.
No tocante à ruptura do cordão umbilical, creio não ser necessária, pois, como assevera Clóvis
Beviláqua, para que o nascimento com vida se perfaça basta que a criança respire o ar atmosférico,
razão pela qual também torna-se dispensável a separação completa do ventre materno. Entretanto,
a resolução nº 1/88 do Conselho Nacional de Saúde preceitua que o nascimento com vida exige a
expulsão completa da criança do ventre materno e que os sinais de vida sejam demonstrados
através da respiração ou de batimentos cardíacos. Não se exige o desprendimento da placenta.
É insuficiente, contudo, o nascimento; urge ainda que a criança tenha nascido com vida para
que se lhe reconheça a personalidade. Sobre a prova do nascimento com vida, cumpre mencionar a
docimasia hidrostática de Galeno, segundo a qual os pulmões do recém-nascido são colocados num
recipiente d’água: se sobrenadarem é porque respirou, nascendo com vida; o que não sucede com
os pulmões que não respiram. Acrescente-se, porém, que viver é respirar, de modo que a prova
dessa respiração pode ser suprida por testemunhas que presenciaram os vagidos e movimentos da
criança.
No Brasil, para a aquisição da personalidade, pouco importa o tempo de vida. Portanto, desde
que tenha respirado, serão necessários dois registros: o de nascimento e o de óbito. Se, ao revés,
não houver respirado, lavrar-se-á apenas o registro de óbito do nascituro, sendo vedado o registro
do nascimento diante do fato de não ter sido pessoa.
Não se exige também o formato humano. Basta que promane do ventre materno. Se, ao
revés, for dotado de caracteres humanos, mas não emanar de mulher, não será considerado
pessoa.
No concernente ao início da personalidade das pessoas jurídicas de direito privado, dispõem
os arts. 45 e 985 do CC que tal fato ocorre com a inscrição do ato constitutivo no respectivo
registro. Quanto às pessoas naturais, o registro do nascimento é meramente declaratório, pois a
personalidade jurídica inicia-se a partir do nascimento com vida.
As sociedades simples estão no livro do direito de empresa, mas devem ser registradas no
Registro Civil das Pessoas Jurídicas (art. 998 do CC).
Assim, as sociedades simples, associações, fundações, organizações religiosas e partidos
políticos adquirem personalidade jurídica a partir da inscrição de seus atos constitutivos no Cartório
de Registro Civil das Pessoas Jurídicas. As sociedades empresárias devem ser inscritas na Junta
Comercial.
No concernente à personalidade das pessoas jurídicas de direito público, como, por exemplo,
autarquias, emana diretamente da lei que as criou, não se exige o registro.

FIM DA PERSONALIDADE

A existência da pessoa natural termina com a morte (art. 6º, primeira parte, do CC).
A morte pode ser: real, presumida ou ficta.
a) morte real: é a que pressupõe a existência do cadáver. É atestada pelo médico. Se não
houver médico, será atestada por duas pessoas que tiverem presenciado ou verificado o fato (art.
77 da Lei 6.015/1973). Com base no atestado de óbito, o Cartório de Registro Civil lavra o registro
de óbito, e, em seguida, expede a respectiva certidão de óbito. Modernamente, prevalece o

3
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

entendimento de que a verdadeira morte é a cerebral do tipo encefálica, revelada pela ausência de
impulsos cerebrais (linha reta no eletroencefalograma, art. 3.º, § 1.º, da Lei 9.434/1997 e Resolução
CFM n. 1.480/97), pois a morte clínica, isto é, a cessação das funções circulatórias e respiratórias,
por si só, é insuficiente.

b) morte presumida: por sua vez, ocorre quando, a despeito de o cadáver não ser
encontrado, há um juízo de probabilidade acerca de sua ocorrência, apurada por meio do silogismo
lógico. Pode verificar-se em duas hipóteses:

1. se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida (art. 7.º, I, do
CC). O art. 88 da Lei 6.015/1973 contém preceito similar, pois também presume a morte
de uma pessoa desaparecida em catástrofe, quando estiver provada a sua presença no
local do desastre e não for possível encontrar o cadáver para exame. No Código Civil de
2002, não se exige o desaparecimento em catástrofe, isto é, em um grande
acontecimento, bastando dois requisitos: o perigo de vida e a probabilidade da morte.
2. se alguém desaparecido em campanha ou feito prisioneiro não for encontrado até dois
anos após o término da guerra (art. 7º, II, do CC). Enquanto na hipótese anterior a
probabilidade da morte é extrema, na hipótese em apreço a morte também é provável,
mas não de forma extrema, razão pela qual é necessário o decurso de dois anos após o
término da guerra. Anote-se que, antes desse prazo, a morte não pode ser declarada, ao
passo que na hipótese anterior esse prazo não é exigido.

Nessas hipóteses de morte presumida, a medida cabível é a ação de justificação de óbito e


não a ação declaratória de ausência. O juiz prolatará sentença declaratória de morte presumida,
fixando a data do falecimento ou se não se souber a data exata, o juiz fixa a data provável do óbito.
A declaração de morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de
esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento
(parágrafo único do art. 7º do CC).
c) morte ficta: é a que se verifica com a sentença definitiva de ausência, prolatada depois de
dez anos do trânsito em julgado da sentença que concedeu a abertura da sucessão provisória. Na
ausência, há apenas uma suspeita de morte e não propriamente uma probabilidade. A medida
cabível é a ação declaratória de ausência, e não a ação de justificação de óbito.
Finalmente, a morte civil, consistente na perda da personalidade durante a vida,
correspondente a capitis diminitio máxima do direito romano, não encontra guarida em nosso
ordenamento jurídico, pois a personalidade é irrenunciável. Há, porém, um resquício de morte civil
em relação ao herdeiro excluído por indignidade, que, para o fim de herança, é considerado morto,
tanto que os seus descendentes herdam em seu lugar, por representação. Outro resquício de morte
civil ocorre em relação ao militar declarado indigno do oficialato, ou com ele incompatível, pois
perderá o seu posto e a respectiva patente, ressalvado à sua família o direito à percepção das suas
pensões, como se houvesse falecido (art. 142, § 3.º, VI, da CF/88 e Decreto-lei 3.038/1941, art. 7.º).

COMORIÊNCIA

Comoriência é a morte de duas ou mais pessoas, na mesma ocasião, sendo elas herdeiras
entre si.
Em não se apurando a ordem cronológica dos óbitos, o art. 8.º do CC presume a comoriência,
independentemente de sexo, idade ou estado civil, considerando-os simultaneamente mortos.

4
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Assim, enquanto a premoriência, isto é, a morte precedente, e a pós-moriência, isto é, a


morte subsequente, devem ser comprovadas, a comoriência é presumida. Na dúvida sobre quem
tenha falecido primeiro, o Código presume o falecimento conjunto.
O efeito da comoriência é o seguinte: os comorientes não herdam entre si. Não haverá
transmissão de bens entre os comorientes. Imagine, por exemplo, um casal sem descendentes e
ascendentes, em que o único herdeiro do marido, além da sua esposa, seja um primo, e, por sua
vez, a única herdeira da varoa, além do marido, seja a sua irmã. Se o casal falece no mesmo evento,
podem ocorrer as seguintes situações:
a) apura-se que o marido pré-morreu à esposa. Esta recolhe a herança daquele, transmitindo
em seguida à sua irmã. Haverá dois fatos geradores do imposto causa mortis.
b) apura-se que a mulher pré-morreu ao marido. Este recolhe a herança daquela,
transmitindo em seguida ao seu primo. Igualmente, incidirão dois impostos causa mortis.
c) não se apura quem morreu primeiro. Nesse caso, presume-se a comoriência, sendo certo
que os comorientes não herdarão entre si. Assim, a herança do marido será transmitida para seu
primo; a herança da esposa, para a sua irmã. Em cada herança, incidirá um único imposto causa
mortis.

QUASE PESSOA JURÍDICA

Ao lado da pessoa natural e da pessoa jurídica há um ente intermediário que pode figurar em
algumas relações jurídicas. É a chamada quase pessoa jurídica ou ente despersonalizado.
Com efeito, trata-se de determinados patrimônios especiais ou órgãos públicos que,
conquanto destituídos de personalidade jurídica, titularizam alguns direitos e obrigações. Não
podem ser reduzidos à coisa nem alçados ao status de pessoas.
Esses entes despersonalizados são de duas ordens:

a) Patrimônios especiais:
Assemelham-se às pessoas jurídicas de direito privado, mas não se revestem dessa natureza
jurídica, pois não constam no rol do art. 44 do CC. É o caso do espólio, massa falida, herança
jacente, condomínio edilício e pessoa jurídica sem registro. Esses entes têm legitimação ad
processum, pois podem ser autor e réu nas ações patrimoniais (art. 75, incisos V, VI, VII, IX E XI, do
CPC/2015), mas não desfrutam de capacidade aquisitiva. Com efeito, não podem adquirir bens,
figurando, por exemplo, como beneficiários de um contrato de doação ou então em testamento,
porquanto não gozam de personalidade jurídica, inviabilizando-se, destarte, o registro do imóvel
alienado. Abre-se uma exceção ao condomínio edilício, pois o § 3.º do art. 63 da Lei 4.591/1964
permite-lhe a adjudicação da unidade do adquirente remisso. O aludido dispositivo legal só permite
essa adjudicação na fase de construção, atribuindo direito de preferência ao condomínio nas vinte
e quatro horas seguintes à realização da segunda praça. No Estado de São Paulo, contudo, o
magistrado Venício Antônio de Paula Salles, titular da 1.ª Vara de Registros Públicos da Capital,
conferiu ao condomínio o poder de adjudicação ou arrematação de bem imóvel em execução
movida em face de condômino por não pagamento da taxa condominial, mesmo após o término da
construção. Acrescente-se ainda que o espólio pode alienar bens com autorização judicial, por força
do art. 619, I, do CPC/2015. Igualmente, a massa falida. Não podem, porém, figurar como
adquirentes de bens, pois, como frisado, não desfrutam de personalidade jurídica. Ainda no tocante
ao condomínio edilício, desde que ele adote o regime de multipropriedade, na hipótese de
inadimplemento, por parte do multiproprietário, da obrigação de custeio das despesas ordinárias
ou extraordinárias, é cabível, na forma da lei processual civil, a adjudicação ao condomínio edilício

5
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

da fração de tempo correspondente (art. 1.358-S da Lei 13.777/2018). Na multipropriedade ou


“time sharing”, convém esclarecer, há mais de um proprietário sobre o mesmo bem imóvel, sendo
que a cada um deles se defere, com exclusividade, o direito de uso e gozo sobre o mesmo bem, em
determinado período do ano.

b) Órgãos públicos:
São os componentes de uma pessoa política, isto é, da União, Estados-membros, Municípios e
Distrito Federal. Exemplos: Câmara dos Vereadores, Assembleia Legislativa, Congresso Nacional,
Câmara dos Deputados, Senado Federal, Tribunal de Contas, Tribunal de Justiça, Ministério Público,
Secretarias de Governo etc. Esses entes podem, porém, impetrar mandado de segurança para a
defesa de suas atribuições institucionais, por força do art. 5.º, LXIX, da CF. A Mesa do Senado e a
Mesa da Câmara dos Deputados ainda podem mover a ação direta de inconstitucionalidade,
conforme preceitua o art. 103, II e III, da CF. O Ministério Público, como é sabido, pode propor as
ações penais públicas e ações civis para defesa de interesses individuais indisponíveis, difusos ou
coletivos. Afora essas exceções, nenhuma outra ação pode ser ajuizada por esses entes. Jamais
poderão figurar no polo passivo de uma relação processual, sob pena de carência de ação, salvo
quando se tratar de mandado de segurança ou habeas data. Não se pode, por exemplo, mover
ação trabalhista contra a Câmara dos Vereadores nem ação de indenização contra o Tribunal de
Justiça ou o Ministério Público. Também não se pode vender ou doar bens a esses órgãos, pois, não
sendo eles pessoas, inviabiliza-se o registro do bem. A propósito, dispõe a súmula 525 do STJ: “A
Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade judiciária, podendo
demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais”.

NASCITURO

A lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (art. 2º do CC). O nascituro é
pessoa condicional, pois a aquisição da personalidade depende do nascimento com vida. A rigor, o
nascituro, à exceção do direito de nascer, não tem direito adquirido, mas apenas expectativas de
direitos (direito in fieri).
Todavia, o nascituro pode figurar em algumas relações jurídicas autorizadas pela lei, a saber:

a) a doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal (art. 542 do
CC);
b) o testamento pode ser feito em favor de nascituro (art. 1.798 do CC);
c) o nascituro pode ser reconhecido pelos pais (parágrafo único do art. 1.609 do CC).

Esses três atos mencionados acima só produzirão efeitos se sobrevier o nascimento com vida.
Tratando-se de natimorto, opera-se a caducidade desses atos, porquanto elaborados sob condição
suspensiva.

CAPACIDADE

CONCEITO E ESPÉCIES

Duas são as espécies de capacidade, a de direito e a de fato.

1ª) Capacidade de direito ou de gozo: é a aptidão para ser titular de direitos e deveres na

6
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

ordem civil. Trata-se, na verdade, da própria personalidade. Toda pessoa é capaz de direito. Assim,
em relação às pessoas, inexiste a incapacidade civil de direito. Pode, porém, ocorrer certas
restrições de direitos, sobretudo, com relação aos estrangeiros domiciliados fora do Brasil, mas, de
um modo geral, eles podem adquirir a maioria dos direitos e deveres, desfrutando, portanto, dessa
capacidade.

2ª) A capacidade de fato ou de exercício: como ensina Clóvis Beviláqua, é a aptidão para
exercer por si os atos da vida civil. É, pois, a aptidão para praticar pessoalmente os atos da vida civil,
independentemente de assistência ou representação. A capacidade de fato é presumida; não
necessita ser demonstrada. Todavia, algumas pessoas são consideradas absolutamente incapazes e
outras relativamente incapazes, como logo veremos.

INCAPACIDADE ABSOLUTA E INCAPACIDADE RELATIVA

As pessoas absolutamente incapazes não podem praticar pessoalmente os atos da vida civil,
sob pena de nulidade absoluta (art. 166, I, do CC). Devem ser representadas nos atos ou negócios
jurídicos pelos respectivos representantes legais (pais, tutor e curador). O representante realiza o
ato ou negócio jurídico sem que haja qualquer participação do incapaz.
Dispõe o art. 3º do CC:
“ São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de
16 (dezesseis) anos”. Esta redação do art. 3º foi conferida pela lei 13.146/2.015, que instituiu o
Estatuto da Pessoa com Deficiência e revogou expressamente os incisos I, II e III do referido art. 3º
do Código Civil.
Assim, as pessoas que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário
discernimento para a prática desses atos, bem como as que, mesmo por causa transitória, não
puderem exprimir sua vontade, não são mais absolutamente incapazes, mas sim relativamente
incapazes, conforme nova redação do art. 4º do Código Civil.
As pessoas relativamente incapazes podem praticar pessoalmente os atos da vida civil, desde
que assistidas pelos representantes legais (pais, tutor ou curador). O ato praticado sem essa
assistência não é nulo, mas apenas anulável (art. 171, I). Ressalte-se, porém, a existência de alguns
atos praticáveis validamente sem a assistência.
Com efeito, a partir dos dezesseis anos já é possível, sem assistência, fazer testamento,
aceitar mandato, votar e casar. Saliente-se que, para o casamento, não é necessário a assistência,
mas sim a autorização do representante legal.

Dispõe o art. 4º do CC que são relativamente incapazes:

I. os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;


II. os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III. aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a vontade;
IV. os pródigos.

Por outro lado, cumpre consignar que não corre prescrição contra os absolutamente
incapazes, conforme preceitua o art. 198, I do CC, sendo certo que ainda podem recobrar dívida de
jogo, cujo pagamento tenha sido por eles efetuado (art. 814). Essas duas vantagens, porém, não
são aplicáveis aos relativamente incapazes, que não poderão recobrar as dívidas de jogo,
submetendo-se, ainda, à prescrição.

7
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Finalmente, na proteção ao incapaz não se compreende o benefício de restituição ou


“restitutio in integrum”, que possibilitava a anulação dos atos válidos praticados pelo representante
legal, em nome do incapaz, toda vez que esse último sofresse algum prejuízo. Não obstante o
silêncio do Código de 2002, o benefício de restituição deve ser rejeitado, pois fere o princípio da
segurança das relações jurídicas.
É anulável, porém, o negócio concluído pelo representante em conflito de interesses com o
representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou. É de cento
e oitenta dias, a contar da conclusão do negócio ou da cessação da incapacidade, o prazo de
decadência para pleitear-se a anulação do ato (art. 119 e seu parágrafo único). Essa possibilidade
de anulação nada tem a ver com o benefício de restituição, que invalidava os atos válidos, ao passo
que o citado art. 119 do CC pressupõe a má-fé do representante e da parte contrária, o que torna o
ato inválido, razão pela qual a lei prevê a sua anulação.

DISTINÇÃO ENTRE REPRESENTAÇÃO E ASSISTÊNCIA

Na representação, o incapaz não esboça a sua vontade em relação à decisão pela prática ou
não do ato ou negócio jurídico, pois esta é tomada pelo representante legal, ao passo que na
assistência o próprio incapaz decide se pratica ou não o ato ou negócio jurídico, esboçando,
portanto, a sua vontade, limitando-se o representante legal a apenas presenciá-lo durante a
celebração do ato.
Em suma, na representação, o ato é praticado pelo representante em nome do incapaz. Este
último sequer participa do ato. Na assistência, o ato é praticado pelo próprio incapaz, mas na
presença do representante legal.
Saliente-se, ainda, que todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante
instrumento particular, conforme preceitua o art. 654 do CC. A contrario senso, os incapazes devem
outorgar a procuração por instrumento público. Interpretando esse dispositivo legal, que
corresponde ao art. 1.289 do Código de 1916, pacificou-se a jurisprudência de que a procuração do
absolutamente incapaz pode ser por instrumento particular, porquanto outorgada por pessoa
capaz, qual seja, o seu representante legal.
Em contrapartida, tratando-se de relativamente incapaz, a procuração deve ser por
instrumento público, pois é outorgada pelo próprio incapaz sob a assistência de seu representante.
Recentemente, a jurisprudência vem amenizando esse entendimento, salientando que a
procuração “ad judicia” do relativamente incapaz também pode ser outorgada por instrumento
particular, com base no art. 105 do CPC/2015, exigindo-se o instrumento público apenas para a
procuração “ad negocia”.

DISTINÇÃO ENTRE INCAPACIDADE E FALTA DE LEGITIMAÇÃO

A legitimação é a posição favorável da pessoa em relação a certos bens ou interesses,


habilitando-a, destarte, à prática dos atos ou negócios jurídicos.
Excepcionalmente, porém, a lei nega essa legitimação, vedando a prática de certos atos. Fala-
se, então, em falta de legitimação, que é o impedimento para a prática de determinados atos ou
negócios jurídicos, uma espécie de incapacidade “ad hoc”. Tal ocorre, por exemplo, quando a lei
proíbe o tutor de adquirir bens do pupilo (art. 497, I, do CC), outrossim, obsta a concubina do
testador casado de ser nomeada herdeira ou legatária (art. 1801, III, do CC).
Anote-se que a falta de legitimação é o impedimento específico para certos atos ou negócios
jurídicos, ao passo que a incapacidade é genérica, estendendo-se a praticamente todos os atos ou

8
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

negócios jurídicos.
A falta de legitimação é imposta por lei, em alguns casos, atendendo-se à posição especial em
relação a certos bens, certas pessoas ou certos interesses; a incapacidade, ao revés, é fixada pela
lei, tendo em vista as deficiências da consciência ou vontade.

DISTINÇÃO ENTRE ASSISTÊNCIA E AUTORIZAÇÃO

A autorização é a permissão dada por um terceiro para que o ato ou negócio jurídico possa
ser realizado. Tal ocorre, por exemplo, quando o cônjuge deseja alienar bem imóvel. Ainda que este
seja de sua exclusiva propriedade, exige-se a autorização do outro consorte, exceto no regime de
separação absoluta (art. 1.647, I, do CC). Igualmente, na venda de ascendente para descendente é
necessária a autorização dos outros descendentes (art. 496). Acrescente-se ainda que o menor, a
partir dos 16 anos, pode se casar, mediante autorização do representante legal.
Cumpre observar que a autorização é exigida antes da prática do ato, podendo a sua falta ser
suprida por decisão judicial. A assistência, ao revés, é dada durante o ato, e, se for negada, não
poderá ser suprida judicialmente.
Finalmente, a autorização é exigida até para as pessoas capazes, ao passo que a assistência é
inerente aos relativamente incapazes.

ABSOLUTAMENTE INCAPAZES

De acordo com o art. 3º do Código Civil, cuja redação lhe fora conferida pela lei 13.146/2.015,
os únicos absolutamente incapazes são os menores de 16 (dezesseis) anos. Aquele que apresenta
alguma deficiência mental, permanente ou transitória, será capaz ou relativamente incapaz,
conforme possa ou não exprimir a sua vontade.
A capacidade é uma presunção legal, e, por isso, não há necessidade de ser demonstrada. Em
regra, as pessoas são capazes, de modo que as exceções só são admitidas quando expressas em lei.
O velho, o falido, o mudo, o surdo-mudo, o cego e o deficiente físico são plenamente capazes.
Com efeito, a velhice não reduz a capacidade civil, a não ser que haja a perda ou redução do
discernimento em razão de algum distúrbio psíquico, quando, então, a causa da incapacidade terá
sido a alienação mental e não propriamente a idade avançada. Saliente-se, contudo, que os maiores
de 70 anos só poderão contrair matrimônio no regime da separação de bens.
Em relação ao falido, verifica-se a proibição ao exercício do comércio, porque com a
decretação da falência ele perde a administração de seus bens. Anote-se, contudo, que o falido
preserva a capacidade civil, perdendo apenas a sua capacidade comercial.
Quanto ao mudo e surdo-mudo, como veremos, desde que exprimam a vontade de um modo
satisfatório são tidos como plenamente capazes. Todavia, não podem fazer outro tipo de
testamento, a não ser o testamento cerrado (art. 1.873).
O cego, por sua vez, também é plenamente capaz. Entretanto, só poderá realizar o
testamento público (art. 1.867).
Acrescente-se, ainda, que os cegos e surdos não podiam ser admitidos como testemunhas,
quando a ciência do fato que se quer provar depender dos sentidos que lhes faltam (art. 228, III, do CC).
Este dispositivo legal, entretanto, foi expressamente revogado pela lei 13.146/2.015, de modo que a
pessoa com deficiência passou a poder testemunhar em igualdade de condições com as demais
pessoas, sendo-lhe assegurados todos os recursos de tecnologia assistiva. Mas com o advento do
Código de Processo Civil restabeleceu-se a proibição, conforme art. 447, §1º, IV, ou seja, que dispõe que
são incapazes de depor como testemunhas o cego e o surdo, quando a ciência do fato depender dos

9
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

sentidos que lhes faltam. Esta lei posterior revogou nesse aspecto o que dispunha a lei 13.146/2015.
Finalmente, os deficientes físicos, bem como os deficientes mentais que exprimem a vontade,
também são plenamente capazes, mas eles podem requerer em juízo uma medida chamada
tomada de decisão apoiada, prevista no art. 1783-A do CC, segundo a qual duas pessoas são
nomeadas para prestar-lhes assistência nos atos da vida civil.

MENORES DE DEZESSEIS ANOS

Há uma presunção absoluta de que os menores de 16 anos, também denominados de


impúberes, não ostentam desenvolvimento intelectual e social suficientes para a prática dos atos
da vida civil, razão pela qual devem ser representados, sob pena de nulidade absoluta do ato ou
negócio. Assim, se esse menor comprar determinado bem, o vendedor não poderá propor ação de
cobrança, porque, sendo o ato nulo, nenhum efeito pode produzir, de modo que as partes devem
retornar ao “status quo ante”, operando-se a devolução da coisa e do sinal recebido pelo vendedor.

ROL DOS RELATIVAMENTE INCAPAZES

São relativamente incapazes:

a) os maiores de 16 anos e os menores de 18 anos;


b) ébrios habituais;
c) viciados em tóxicos;
d) aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;
e) pródigos.

MAIORES DE 16 ANOS E MENORES DE 18 ANOS

O menor, entre dezesseis e dezoito anos, sob o prisma jurídico, é denominado púbere.
Equiparam-se aos maiores quando dolosamente ocultam a idade, ao serem inquiridos pela outra
parte, ou se, no ato de obrigarem-se, declararam-se maiores (art. 180). Nesse caso, o contrato deve
ser cumprido, ainda que celebrado sem a assistência do representante legal, por força do citado
art. 180 do CC, inspirado no princípio de que não se pode alegar a própria torpeza.
Vimos, por outro lado, que certos atos esse menor pode praticar sem assistência:
a) servir de testemunha, inclusive em testamentos (art. 228);
b) testar (1.860, parágrafo único);
c) ser mandatário (art. 666);
d) votar.

ÉBRIOS HABITUAIS E VICIADOS EM TÓXICOS

Os ébrios habituais são os alcoólatras. Comprovada que a embriaguez é habitual, isto é, quase
que diária, já é possível a interdição. Portanto, para que se proceda a interdição, não é necessário
comprovar que o ébrio não exprime a sua vontade.

No tocante aos viciados em tóxicos, a lei não exige a habitualidade, isto é, o uso quase que
diário, admitindo a interdição, ainda que o consumo seja intervalado, como, por exemplo, uma vez
por semana ou de quinze em quinze dias. Igualmente, não é necessário comprovar que toxicômano

10
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

não exprime a sua vontade, basta o diagnóstico sobre a existência do vício, caracterizado pela
situação de dependência da droga.
Finalmente, o juiz, atento ao grau de lucidez do interditando, pode amenizar os efeitos da
interdição, restringindo-a aos atos de maior relevo, à semelhança do que por força de lei, já ocorre,
automaticamente, em relação ao pródigo, noutras palavras, a sentença deve fixar os limites da
curatela ( §3º do art. 754 do CPC/2015).

PESSOAS QUE NÃO EXPRIMEM A VONTADE

A pessoa que não pode exprimir a vontade, seja por causa transitória ou permanente, é tida
como relativamente incapaz. Exemplo: pessoa em coma.
O artigo 1.767, inciso I, do CC, prevê a interdição dessas pessoas.
No tocante ao surdo-mudo que não externa a sua vontade deve ser tido como relativamente
incapaz, enquadrando-se no art. 4º, III, do CC, podendo ser interditado.

Saliente-se, ainda, que se puder exprimir seu pensamento com discernimento não será
incapaz. Portanto, o surdo-mudo pode ser:

a) relativamente incapaz (art. 4º, III);


b) plenamente capaz.

A lei 13.146/2015, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Deficiência, ao considerar


relativamente incapaz aquele que não exprime a vontade, seja por causa transitória ou
permanente, desvirtuou o instituto da incapacidade relativa.
Com efeito, o relativamente incapaz é aquele que pratica pessoalmente os atos da vida civil,
sob assistência do representante legal. Exige-se, portanto, que expresse a vontade, pois é o próprio
incapaz que pratica do ato, mediante assistência. Ora, quem não expressa a vontade
evidentemente não poderá praticar pessoalmente ato algum.
Diante disso, a nova lei comporta três interpretações em relação à pessoa que não exprime a
vontade:
1a) o ato será praticado pelo representante legal. Nesse caso, teríamos uma hipótese de
relativamente incapaz idêntica ao absolutamente incapaz. Todavia, contra relativamente incapaz
corre prescrição. Por consequência, a nova lei, que queria beneficiar a pessoa com deficiência,
acabou prejudicando.
2a) o ato só poderá ser praticado pelo representante legal mediante prévia autorização
judicial. Esta solução acabaria atravancando as relações jurídicas do incapaz.
3a) a nova lei, nesse aspecto, reveste-se de inconstitucionalidade, por violação do princípio da
razoabilidade. A meu ver, esta é a melhor interpretação.

PRÓDIGO

Pródigo é o indivíduo que dilapida o seu patrimônio, de forma imoderada e habitual, pondo
em risco o próprio sustento e de seus familiares.
O reconhecimento da prodigalidade depende dos seguintes requisitos:

1º) gastos habituais excessivos, isto é, imoderados, desordenados, desenfreados;

11
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

2º) risco ao próprio sustento ou de sua família.

Os gastos excessivos, ainda que habituais, por si só, não revelam a prodigalidade. Urge, para
tanto, o surgimento do risco de dilapidação do patrimônio.
Quanto ao viciado em jogo, paira controvérsia sobre o seu estado de prodigalidade. A
jurisprudência oscila num e noutro sentido. Falta-lhe, a nosso ver, a generosidade, que é uma das
características peculiares ao pródigo.
O pródigo é considerado relativamente incapaz (art. 4º, IV). Pródigos são pessoas que,
movidas por compulsão, dilapidam habitualmente seus bens, colocando em risco o próprio
sustento e de sua família. A interdição do pródigo restringe-se aos atos patrimoniais. Com efeito,
necessitará de curador apenas para assisti-lo em empréstimos, transações, quitações, alienações,
hipotecas; enfim, para praticar, em geral, os atos que não sejam de mera administração (art.1.782).
Quanto aos atos pessoais, isto é, não patrimoniais, por exemplo, o casamento, o pródigo é
plenamente capaz, prescindindo-se da assistência do curador, salvo quanto a escolha do regime de
bens, cujo conteúdo é patrimonial, sendo, pois, essencial a assistência.
Finalmente, no Código de 1916, a interdição do pródigo só era possível quando houvesse
cônjuge, ascendente ou descendente, que pudessem promovê-la. Não mais existindo esses
parentes, a interdição era cancelada. Portanto, o pródigo, a rigor, não era protegido, pois o
legislador preocupava-se apenas com os seus familiares. No Código de 2002, o pródigo pode ser
interditado, ainda que não tenha cônjuge, ascendente ou descendente.
Com efeito, a interdição pode ser movida por qualquer parente, e, subsidiariamente, pelo
Ministério Público, colocando-se, portanto, o pródigo no mesmo nível de proteção dos demais
incapazes.

ÍNDIOS

A capacidade do índio, conforme preceitua o parágrafo único do art. 4º do CC, é regida por lei
especial.
O assunto encontra-se regulamentado pela Lei nº 6001/73, também denominada de Estatuto
do índio.
O índio não integrado à civilização apresenta uma incapacidade “sui generis”, pois, de um
lado, assemelha-se aos relativamente incapazes na medida em que é assistido pela FUNAI na
prática dos atos ou negócios jurídicos, mas, de outro lado, aproxima-se dos absolutamente
incapazes, porquanto sem a aludida assistência os atos ou negócios jurídicos serão nulos e não
apenas anuláveis. Observe-se, contudo, que os atos praticados pelos absolutamente incapazes são
sempre nulos, independentemente de prejuízo, ao passo que os atos praticados pelo índio sem a
assistência da FUNAI só serão nulos se lhes for prejudicial, caso contrário reputam-se válidos.
Saliente-se, ainda, que o art. 5º, da Lei 6.015/73 preceitua que os índios, enquanto não integrados,
não estão obrigados a inscrição do nascimento. Este poderá ser feito em livro próprio da FUNAI.
Finalmente, o Código de 2002 substituiu o termo “silvícolas” por “índios”. A alteração foi
salutar, porque silvícola é o habitante da selva, ao passo que o índio encontra-se protegido ainda
que a comunidade indígena se localize nos centros urbanos.

AQUISIÇÃO DA CAPACIDADE PLENA

12
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

FORMAS DE AQUISIÇÃO

A pessoa adquire a capacidade plena pelas seguintes formas:


a) maioridade civil;
b) levantamento da interdição;
c) integração do índio;
d) emancipação.

A MAIORIDADE CIVIL

A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada para a
prática de todos os atos da vida civil (art. 9º do CC). Assim, a pessoa se torna maior e capaz no
primeiro momento do dia do aniversário de 18 anos. Se ela nasceu num ano bissexto, a 29 de
fevereiro, a maioridade será alcançada no 18º ano, mas a 1º de março.
Finalmente, cumpre observar que, em regra, a maioridade civil implica na capacidade civil da
pessoa. Todavia, nas hipóteses dos arts. 3º e 4º do CC, não obstante a maioridade civil, persiste a
incapacidade. Em contrapartida, em regra, a menoridade implica na incapacidade civil da pessoa,
salvo quando esta estiver emancipada.

LEVANTAMENTO DA INTERDIÇÃO

Sobre o levantamento de interdição, consiste no cancelamento dos efeitos da sentença em


razão da cessação da causa que a determinou.
O pedido de levantamento poderá ser feito pelo interditando e será apensado aos autos da
interdição. O juiz nomeará perito para proceder ao exame de sanidade no interditando e após a
apresentação do laudo designará audiência de instrução e julgamento.
A sentença de levantamento da interdição será publicada na imprensa local e oficial, por três
vezes, e averbada no Registro Civil das Pessoas Naturais.
O levantamento de interdição é uma das formas de aquisição ou reaquisição da capacidade
plena.

INTEGRAÇÃO DO ÍNDIO

O índio integrado à civilização brasileira é plenamente capaz. Nesse caso, poderá requerer a
sua emancipação, mediante requerimento dirigido ao Juiz Federal, desde que preencha os
seguintes requisitos:

a) idade mínima de 21 anos;


b) conhecimento da língua portuguesa;
c) habilitação para o exercício de atividade útil, na comunidade nacional;
d) razoável conhecimento de usos e costumes da comunhão nacional.

Presentes esses requisitos, o juiz prolatará a sentença de emancipação.


Há ainda outras duas formas de emancipação do índio, a saber:
a) reconhecimento pela própria FUNAI, homologado judicialmente;
b) decreto do Presidente da República de emancipação coletiva, após requerimento da maioria
dos membros da comunidade indígena e comprovação, pela FUNAI, da plena integração à

13
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

civilização.

EMANCIPAÇÃO

Emancipação é o instituto jurídico que atribui capacidade plena aos menores de 18 anos. É,
pois, a antecipação da capacidade civil.
Apresenta as seguintes características:

a) irrevogabilidade. A emancipação válida não pode ser revogada pelos pais nem pelo menor.
Tratando-se, porém, de emancipação inválida, torna-se plenamente possível a sua anulação
por sentença judicial. Note-se que enquanto a revogação é o desfazimento de ato válido, a
anulação é o cancelamento de ato inválido, isto é, fruto de erro, dolo ou coação.
b) perpetuidade. A emancipação é sempre definitiva. Com o casamento, por exemplo, o menor
se emancipa. Se, porém, no dia seguinte, sobrevier a viuvez, ainda assim persistirá a
emancipação.
c) pura e simples. A emancipação é um ato puro e simples, porquanto não admite termo ou
condição.
Convém ainda não confundir a capacidade civil com a maioridade civil.
Conquanto a emancipação atribua capacidade plena aos menores de 18 anos, o certo é que
eles ainda continuam menores.
Assim, a emancipação os habilita aos atos da vida civil, cuja prática dependa tão somente da
capacidade. Todavia, para alguns atos, a lei exige idade mínima, de modo que para praticá-los não
basta a emancipação, urge ainda que ostentem certa idade. Portanto, o menor emancipado não
poderá tirar carteira de motorista; não terá responsabilidade penal; não poderá assistir filme
proibido para menor de 18 anos; não poderá ir ao motel; etc. Com efeito, a emancipação confere
apenas capacidade civil ao menor, com o objetivo de beneficiá-lo; todavia, ele continua adstrito às
restrições inerentes à idade, em função da sua personalidade ainda em formação, porquanto o
intuito dessas limitações é protegê-lo.
Finalmente, no tocante à forma, a emancipação pode ser voluntária, judicial e legal.

EMANCIPAÇÃO VOLUNTÁRIA

A emancipação voluntária é a concedida pelos pais, mediante escritura pública, que deve ser
inscrita no Registro Civil competente. Essa inscrição, que é essencial para a emancipação surtir
efeitos perante terceiros, independe de homologação judicial.
A emancipação é outorgada pelos pais em conjunto, sendo ainda necessário que o menor
tenha dezesseis anos completos. Antes dessa idade, é vedada a emancipação voluntária.
Nada obsta a concessão da emancipação voluntária por apenas um dos pais, na hipótese de o
outro já ter falecido ou se encontrar interditado, outrossim, quando houver decaído do poder
familiar.
Por outro lado, se um dos genitores se encontrar em lugar incerto e não sabido, o outro, para
poder emancipar voluntariamente o filho, deverá requerer a autorização judicial. Nesse caso, o juiz
não prolata uma sentença de emancipação, e sim uma decisão autorizando a emancipação por um
único progenitor.
Finalmente, a emancipação deve ser para beneficiar o menor. Assim, a emancipação
concedida pelos pais pode ser anulada se ficar provado que o ato foi praticado para libertarem-se
do dever de prestarem pensão alimentícia.
EMANCIPAÇÃO JUDICIAL

14
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

A emancipação judicial é a concedida por sentença judicial, ouvindo-se o Ministério Público.


Aludida sentença, para surtir efeitos perante terceiros, deve ser inscrita no Registro Civil
competente.
A emancipação judicial só é possível se o menor tiver 16 anos completos. Washington de
Barros Monteiro esclarece que o fato de ser analfabeto o emancipado, não traduz carecer ele de
discernimento para reger a sua pessoa. Certificando-se o Juiz de que o mesmo tem condições de
desenvolvimento mental e suficiente experiência para a si próprio dirigir, sem assistência de tutor,
deve emancipá-lo.
São duas as hipóteses de emancipação judicial:
1) menor sob tutela. O tutor não pode emancipar voluntariamente o pupilo, através de
escritura pública, pois a lei exige, nesse caso, sentença judicial;
2) divergência entre os pais. Se o pai quer emancipar o filho e a mãe se opõe, ou vice-versa,
urge que o conflito seja dirimido por sentença judicial. Nesse caso, o processo de
emancipação será contencioso, ao passo que, na hipótese anterior, o procedimento é de
jurisdição voluntária.

A emancipação deve ser denegada:


a) se não objetivar o benefício do menor;
b) se o mesmo não tiver o necessário discernimento para reger a sua pessoa e os seus bens;
c) se visar apenas a liberação de bens clausulados até a maioridade.
Finalmente, cumpre salientar que a emancipação é direito potestativo dos pais ou tutor e, por
isso, o menor não tem o direito de pedir ou exigir a sua emancipação.

EMANCIPAÇÃO LEGAL

A emancipação legal é a que se opera automaticamente, independentemente de ato dos pais,


tutor ou sentença judicial.
Verificando-se uma das hipóteses previstas em lei, a emancipação se impõe “ex vi legis”, sem
que seja necessária qualquer outra formalidade. Como veremos, em algumas dessas hipóteses,
torna-se possível a emancipação antes dos 16 anos.
A primeira hipótese de emancipação legal é o casamento. A idade núbil ocorre a partir dos 16
anos completos; a partir de então é possível o casamento com a autorização dos pais ou tutor.
Antes da idade núbil, o matrimônio não é mais possível, em nenhum caso, ainda que resulte
gravidez (art. 1520 do CC, com redação dada pela 13.881/2019).
Se, porventura, o casamento vier a ser anulado ou declarado nulo, por sentença judicial,
entendem uns que não há retorno ao estado anterior de incapacidade, pois seria um contrassenso,
o próprio cônjuge pleitear a anulação, já que é capaz, para depois tornar-se incapaz com a
procedência de ação. Em defesa desse ponto de vista, afirma Renan Lotufo, “há que se reconhecer
que quem já se aventurou, ou desventurou num casamento, não carece do mínimo de experiência
para a vida em sociedade, razão pela qual não aceitamos o retorno à incapacidade”. Discordamos
dessa exegese, porque a nulidade ou anulação implica no desfazimento do casamento; a destruição
do efeito principal impede a manutenção do efeito secundário. Ademais, o art. 1.561 do CC só
prevê a subsistência dos efeitos secundários do casamento nulo ou anulável quando houver
putatividade.
Com efeito, casamento putativo é o nulo ou anulável, mas que produz efeitos válidos em
homenagem à boa-fé de um ou ambos os cônjuges. Assim, o cônjuge menor, se estava de boa-fé,
continua emancipado; se estava de má-fé, cessa a emancipação. O art. 1.561 do CC diz que os
efeitos da putatividade perduram até o dia da sentença anulatória. Mas, a nosso ver, alguns efeitos

15
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

permanecem após a sentença, tais como:


a) o direito de usar o nome;
b) a emancipação;
c) a pensão alimentícia.

Entendimento diverso esvaziaria a importância da putatividade.


A segunda causa de emancipação legal é o exercício de emprego público efetivo. Observe-se
que a simples posse ou nomeação ainda não produzem a emancipação, pois lei fala em exercício,
exigindo-se, destarte, o início das atividades.
A expressão emprego público deve ser interpretada como sendo função pública, isto é, a
atribuição ou conjunto de atribuições que a Administração Pública confere a cada categoria
profissional ou individualmente a determinados servidores.
É mister ainda que a função pública seja exercida em caráter efetivo, isto é, definitivo, mas
não se exige a estabilidade, operando-se, destarte, a emancipação desde o início do exercício do
estágio probatório.
Acrescente-se, outrossim, que o acesso a funções efetivas depende de concurso público.
A função pública pode ser federal, estadual ou municipal. Os funcionários de autarquias e
entidades paraestatais exercem funções efetivas, razão pela qual, a nosso ver, serão atingidos pela
emancipação, mesmo porque a maturidade intelectual foi revelada na aprovação no concurso
público.
O tema, porém, não é pacífico. Washington de Barros Monteiro, por exemplo, nega a
existência de emancipação, asseverando que é preciso lei especial para que as autarquias e
entidades paraestatais obtenham qualquer dos atributos outorgados à pessoa jurídica de direito
público.
A terceira causa de emancipação legal é a colação de grau em curso de ensino superior. Não
pode ser considerado superior o curso de professor normalista nem os cursos técnicos. É preciso
colação de grau em faculdade, tornando-se raríssima essa forma de emancipação.
A quarta causa é o estabelecimento civil ou comercial com economia própria. A emancipação,
nesse caso, depende de dois requisitos: a) idade mínima de 16 anos; b) a obtenção de economia
própria, consistente na aferição de rendimentos oriundos do próprio negócio suficientes para a
autossubsistência.
Finalmente, a última causa de emancipação legal é a existência de relação de emprego. Nesse
caso, a emancipação também depende de dois requisitos:
1) idade mínima de 16 anos;
2) obtenção de economia própria, isto é, rendimentos suficientes para a autossubsistência.
Não é necessário carteira assinada, isto é, o emprego formal, pois contenta-se a lei com a
relação de emprego, consistente na prestação de serviço pessoal, de natureza não-eventual,
mediante subordinação e remuneração. Anote-se, porém, que até os 16 anos é vedado o
trabalho fora do lar (art. 403 da CLT), salvo na condição de aprendiz, desde que o menor já
tenha atingido 14 anos (CF, art. 7º, inciso XXXIII). Quanto ao trabalho noturno é vedado até
os 18 anos (CLT, art. 404).

PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO

INTRODUÇÃO

16
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

São pessoas jurídicas de direito privado (art.44 do CC):


I. as associações;
II. as sociedades;
III. as fundações;
IV. as organizações religiosas;
V. os partidos políticos.

No regime jurídico de direito privado há isonomia. Assim, uma pessoa jurídica de direito
privado não pode exercer supremacia sobre outra pessoa em suas relações jurídicas. Não pode, por
exemplo, impor obrigações unilaterais. Para anular um contrato, é preciso mover ação judicial.
Igualmente, para fazer cumprir o que nele está contido.
O rol acima para uns é taxativo, enquanto outros o consideram exemplicativo, sendo possível
a existência de outras pessoas jurídicas como é o caso do condomínio edilício, mas a posição
dominante é que o condomínio não é pessoa jurídica.
A meu ver, o rol é taxativo, porque o deferimento da personalidade jurídica é uma questão de
ordem pública, dependendo de lei, não podendo ser ampliada pelas partes.
Quanto à empresa individual de responsabilidade limitada, EIRELI, que constava no inciso VI
do art. 44 do CC, foi revogada expressamente pela Lei 14.382/2022,
Convém esclarecer que já havia se operado a revogação tácita da empresa individual de
responsabilidade limitada, tendo em vista que, com a entrada em vigor da Lei 14.195/2021, todas
as anteriores foram automaticamente transformadas em sociedades limitadas unipessoais, de tal
sorte que, por razões lógicas, novas EIRELIs já não poderiam ser constituídas.

BREVES CONCEITOS

Associação é a pessoa jurídica caracterizada pela união de duas ou mais pessoas que se
organizam para fins não econômicos.
Sociedade é a união de duas ou mais pessoas que se organizam para fim econômico, isto é,
lucrativo.
Fundação é o patrimônio ao qual se atribui personalidade jurídica para que ele possa exercer
um fim não econômico.
Organização religiosa é a pessoa jurídica caracterizada pela união de duas ou mais pessoas
que se organizam para fins religiosos.
Partido político é a pessoa jurídica de direito privado que destina-se a assegurar, no interesse
do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos
fundamentais deferidos na Constituição Federal. É, pois, uma associação com finalidade específica.

ESPÉCIES

São duas as espécies de teoria da desconsideração da pessoa jurídica:


a) Teoria maior: é a que exige, para o afastamento da personalidade jurídica, a insolvência e o uso
fraudulento da personalidade jurídica. É, pois, a teoria adotada pelo Código Civil, que em seu art.50,
exige, para o levantamento do véu, a par da insolvência para pagamento, o desvio de finalidade (teoria
maior subjetiva) ou a confusão patrimonial (teoria maior objetiva). O desvio de finalidade ocorre
quando a pessoa jurídica pratica algum ato ilícito ou fraudulento. A confusão patrimonial ocorre, por
exemplo, quando o sócio, para ocultar sua participação em negócio cuja prática estava proibida,
constitui uma pessoa jurídica, celebrando o contrato em nome dela.

17
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

b) Teoria menor: é a que exige para o afastamento da personalidade jurídica apenas a


insolvência da pessoa jurídica para pagamento de suas obrigações, dispensando-se a prova do uso
abusivo de sua personalidade jurídica.
É, pois, a teoria adotada no CDC (art.28) e no Direito Ambiental (art.4º da Lei nº 9.605/98).

DIREITOS DA PERSONALIDADE

CONCEITO

Direitos da personalidade são os atributos inerentes à própria condição humana. Conforme


ensina Francisco Amaral, são os direitos subjetivos que tem por objeto os bens e valores essenciais
da pessoa, no seu aspecto físico, moral e intelectual.
CARACTERES

Os direitos da personalidade são absolutos, extrapatrimoniais, intransmissíveis, indisponíveis,


vitalícios, irrenunciáveis, imprescritíveis e ilimitados.

Absolutos, porque oponíveis erga omnes, isto é, devem ser respeitados por todas as pessoas,
independentemente de qualquer relação jurídica anterior.

Extrapatrimoniais, porque incidem sobre bens jurídicos insuscetíveis de avaliação pecuniária.


Todavia, alguns desses direitos, como, por exemplo, a imagem de uma pessoa famosa, podem ser
mensurados economicamente de acordo com os critérios estabelecidos por publicitários,
anunciantes e meios de comunicação de massa. Assim, conquanto a regra seja a existência de
direitos à personalidade extrapatrimoniais, excepcionalmente depara-se com alguns patrimoniais,
como é o caso dos direitos à imagem e dos direitos autorais que por isso admitem a cessão de seu
uso.

Intransmissíveis, porque inerentes à própria pessoa. Assim, enquanto os direitos


patrimoniais, como a propriedade, podem ser separados da pessoa de seu titular, mediante
alienação do bem, os direitos da personalidade não podem ser destacados da pessoa que os
titulariza. Todavia, como ensina Ives Gandra, não se deve confundir a intransmissibilidade com o
direito do sucedido, em vida ou após o falecimento, nestes casos admitindo-se, inclusive, que a lei
torne um direito indisponível, “transmissível”, como, por exemplo, o direito à imagem, pelo menos
no que diz respeito à sua defesa. A titularidade dos filhos para defender a imagem paterna é
exemplo de transmissibilidade de um direito indisponível. Já se decidiu que o direito de mover ação
de indenização por dano moral é transmissível.
De fato, em se tratando de morto, o parágrafo único do artigo 12 do CC, confere legitimidade
ao cônjuge sobrevivente, a qualquer parente em linha reta e aos colaterais até o quarto grau para
tomarem as medidas judiciais visando a cessação da ameaça ou a lesão a direito da personalidade,
podendo, inclusive, reclamar as perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções de natureza
patrimonial e penal.

Indisponíveis, porque o seu exercício não pode ser cedido nem limitado pela vontade da
pessoa. Com efeito, dispõe o art.11 do CC: “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da
personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação
voluntária”. Jamais poderão ser penhorados ou transmitidos por ato inter vivos ou causa mortis.

18
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Todavia, conforme salienta Carlos Roberto Gonçalves, a indisponibilidade dos referidos direitos não
é absoluta, podendo algum deles ter o seu uso cedido para fins comerciais mediante retribuição,
como o direito autoral e o direito de imagem, por exemplo. Nesses casos, os reflexos patrimoniais
dos referidos direitos podem ser penhorados. Conforme vimos, alguns direitos da personalidade
admitem a cessão de uso (exemplos: direito à imagem e direitos autorais). O Enunciado 4 do CJF
preceitua também que: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária,
desde que não seja permanente nem geral”. Assim, a cessão de uso da imagem não pode ser
vitalícia, permanente, sob pena de nulidade do contrato.

Vitalícios, porque os direitos da personalidade acompanham a pessoa por toda a vida, até a
sua morte.
Alguns desses direitos, mesmo após a morte, são protegidos, como o respeito ao morto, à sua
memória e ao seu direito moral de autor (parágrafo único do art.12 do CC).

Irrenunciáveis, porque a pessoa não pode abdicar desses direitos da personalidade. A


eventual renúncia será nula. Observe-se, contudo, que a pessoa pode deixar de tomar as medidas
necessárias para que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, deixando, pois, de
exercer esse direito. Acrescente-se, porém, que é válida a renúncia quando se tratar de direitos da
personalidade patrimoniais.

Imprescritíveis, porque o direito da personalidade, com o passar do tempo, não pode se


convalidar, de modo que a qualquer tempo será cabível a ação judicial destinada a fazer cessar a
ameaça ou lesão a direito da personalidade.
A imprescritibilidade emana do fato de esses direitos serem irrenunciáveis.
A prescrição, a rigor, é uma renúncia tácita, e, por isso, é vedada.
Todavia, no que tange ao direito de pedir indenização, submete-se, evidentemente, à
prescrição, devido ao seu caráter patrimonial.
Finalmente, o rol dos direitos da personalidade, previsto nos arts. 11 e 12 do CC é explicativo,
pois referidos direitos são ilimitados. Exemplos: planejamento familiar, alimento, liberdade
religiosa etc.

DIREITO AO NOME

CONCEITO

Nome é o sinal que identifica a pessoa e indica a sua procedência familiar.

ELEMENTOS ESSENCIAIS

Os elementos essenciais, que são aqueles necessários para o registro do nome no cartório de
registro civil, são o prenome e o sobrenome.
Compete ao declarante, que pode ser o pai ou a mãe, bem como seu respectivo procurador
com poderes especiais, indicar o nome completo do filho.
À exceção do infante exposto, toda pessoa necessariamente há de ter prenome e sobrenome.
O infante exposto é o recém-nascido abandonado pelos pais.
Em sendo estes desconhecidos, o registro do nascimento far-se-á apenas com o prenome,
sem qualquer referência ao patronímico (art. 61 da lei 6.015/73).

19
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

ELEMENTOS FACULTATIVOS

Os elementos facultativos ou secundários, isto é, dispensáveis para o registro do nome, são


dois:
a) agnome: é o sinal acrescentado no final do nome para distinguir membros da mesma
família. Exemplos: João da Silva Junior; Caetano Lagrasta Neto; José da Silva Segundo; João de
Barros Filho; Ana de Oliveira Sobrinha.
b) a partícula: é a preposição da, das, de, do, dos.

PRINCÍPIO DA IMUTABILIDADE

O princípio da imutabilidade consiste na impossibilidade da alteração do nome civil.


É aplicável tanto ao prenome quanto ao sobrenome.
Trata-se de um princípio relativo, pois comporta exceções.
Com efeito, excepcionalmente, admite-se a alteração, que pode ser de três categorias:
a) causas comuns de mudança do prenome e sobrenome;
b) causas específicas de mudança do prenome;
c) causas específicas de mudança do sobrenome.

CAUSAS COMUNS DE MUDANÇA DO PRENOME E SOBRENOME

As causas, que autorizam tanto a alteração do prenome quanto do sobrenome, são as


seguintes:
a) Oposição. É a impugnação fundamentada, por qualquer dos genitores, perante o oficial de
registro civil onde foi lavrado o assento de nascimento, ao prenome e sobrenomes indicados pelo
declarante. O prazo é de 15 (quinze) dias, após o registro de nascimento, sob pena de decadência.
Se houver manifestação consensual dos genitores, será realizado o procedimento de retificação
administrativa do registro, mas, se não houver consenso, a oposição será encaminhada, pelo
próprio oficial, ao juiz competente, que prolatará decisão administrativa (§ 4º do art. 55 da Lei
6.015/73, com redação dada pela Lei 14.382/2022).
b) Erro gráfico. Exemplos: Osvardo, ao invés de Osvaldo; João da Sirva, ao invés de João da
Silva. Expirado o prazo quinzenal para o ingresso da oposição, a corrigenda dependerá de decisão
judicial, sendo, pois, vedado ao registrador a retificação, ainda que o erro seja grosseiro.
c) Erro no registro: ocorre quando o oficial registrador faz consignar um nome diferente
daquele declarado pelos pais. Não apresentada a oposição, por qualquer dos pais, dentro do prazo
de 15 (quinze) dias, a contar o registro, a corrigenda dependerá de ação anulatória do registro, que
pode ser proposta no prazo de 4 anos, com base no art. 138 e seguintes do CC.
d) Nome posto por agente incapaz ou sem legitimação. Não apresentada a oposição, por
qualquer dos pais, dentro do prazo de 15 (quinze) dias, a contar o registro, a corrigenda dependerá
de ação de anulação, que pode ser proposta com base no art. 104, I, do CC.
e) Nome ridículo. Se o prenome ridículo acabou sendo registrado, por falta de atenção do
oficial, nada obsta que o interessado pleiteie a sua alteração judicial, ressalvando-se que, dentro do
prazo de 15 (quinze) dias, a contar do registro, se for apresentada a oposição, a retificação poderá
ser feita perante o oficial de registro civil. Não obstante a lei se refira à possibilidade de alteração
do prenome ridículo, a jurisprudência vem estendendo esta regra para se permitir a mudança do
patronímico ridículo, como, por exemplo, Antonio Carnaval Quaresma.

20
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

f) Vítimas e testemunhas criminais coagidas ou expostas a grave ameaça em razão de


colaborarem com a investigação ou processo criminal (lei nº 9.807/99).
Aludida alteração do nome completo poderá ser estendida ao cônjuge ou companheiro,
ascendentes, descendentes e dependentes que tenham convivência habitual com a vítima ou
testemunha, conforme o especificamente necessário em cada caso.
A alteração do nome completo depende de decisão do juiz competente para a matéria de
registros públicos. Cessada a coação ou ameaça que deu causa à alteração, ficará facultado ao
protegido solicitar ao juiz competente o retorno à situação anterior.
g) Adoção. Na adoção, admite-se, a pedido do adotante ou do adotando, a mudança do
prenome do adotando, que, no entanto, poderá conservar o prenome de origem. Todavia, a
mudança do sobrenome é obrigatória, de modo que a sentença da adoção deve ordenar que, no
novo registro de nascimento, conste o sobrenome dos adotantes, sendo, pois, vedada a
manutenção do sobrenome dos pais biológicos (art. 47 da lei 8.069/90).

CAUSAS ESPECÍFICAS DE MUDANÇA DO PRENOME

O prenome, além das causas comuns mencionadas anteriormente, ainda pode ser alterado
nas seguintes situações;
a) por vontade imotivada, manifestada após atingir a maioridade civil, prescindindo-se de
ação judicial.
b) outras hipóteses previstas no ordenamento jurídico. Nesses casos, só haverá necessidade
de ação judicial, se requerida antes da maioridade civil, outrossim, após a maioridade civil, se o
prenome já havia sido alterado anteriormente por vontade imotivada.
Estas outras hipóteses são as seguintes:
a) Irmãos com prenomes idênticos;
b) apelidos públicos e notórios;
c) por vontade do transgênero ou transexual;
Convém esclarecer que a pessoa que já atingiu a maioridade e pretende alterar o prenome
pela primeira vez não precisa expor os motivos da alteração, que poderá ser pleiteada
extrajudicialmente.
Por consequência, nas hipóteses acima, só haverá necessidade de ação judicial em duas
hipóteses:
a) antes da maioridade civil;
b) após a maioridade civil, quando, por vontade motivada, o prenome já havia sido alterado
anteriormente.
Quem já atingiu a maioridade civil, não poderá pleitear judicialmente a primeira alteração
do prenome, sob pena de carência de ação, por falta de interesse de agir, tendo em vista que a
pretensão pode ser satisfeita extrajudicialmente.
Há ainda outras duas causas específicas de mudança do prenome, que podem ser feitas no
ato da naturalização, são elas:
a) tradução;
b) adaptação à língua portuguesa;

Alteração do prenome por vontade da pessoa, após atingir a maioridade civil

A pessoa registrada poderá, após ter atingido a maioridade civil, requerer pessoalmente e
imotivadamente a alteração de seu prenome, independentemente de decisão judicial, e a alteração

21
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

será averbada e publicada em meio eletrônico (art. 56 da Lei 6.015/73, com redação dada pela Lei
14.382/2022).
Antes do advento da Lei 14.382/2022, a alteração imotivada do prenome só era possível
dentro do prazo decadencial de um ano, a contar da maioridade civil.
A alteração imotivada não se sujeita mais a prazo decadencial, podendo ser requerida a
qualquer tempo, a partir da maioridade civil, devendo, no entanto, observar as seguintes normas:
a) não pode ser pleiteada antes da maioridade civil, ainda que o interessado esteja
emancipado.
b) deve ser requerida pessoalmente pelo interessado, sendo vedada a constituição de
procurador para esse fim.
c) a decisão do pedido é atribuição do Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. Em regra,
o pedido deverá ser deferido, pois se trata de um direito potestativo incondicionado. Se,
entretanto, suspeitar de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade ou simulação quanto à real
intenção da pessoa requerente, o oficial de registro civil fundamentadamente recusará a retificação
(§ 4º do art. 56).
d) a alteração será averbada no registro de nascimento. A averbação de alteração de
prenome conterá, obrigatoriamente, o prenome anterior, os números de documento de
identidade, de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) da Secretaria Especial da Receita
Federal do Brasil, de passaporte e de título de eleitor do registrado, dados esses que deverão
constar expressamente de todas as certidões solicitadas (§2º do art. 56).
e) a alteração do prenome será publicada em meio eletrônico.
f) finalizado o procedimento de alteração no assento, o ofício de registro civil de pessoas
naturais no qual se processou a alteração, a expensas do requerente, comunicará o ato
oficialmente aos órgãos expedidores do documento de identidade, do CPF e do passaporte, bem
como ao Tribunal Superior Eleitoral, preferencialmente por meio eletrônico (§ 3º do art. 56).
g) a alteração imotivada de prenome poderá ser feita na via extrajudicial apenas 1 (uma) vez,
e sua desconstituição dependerá de sentença judicial (§1º do art. 56).
Quanto à alteração imotivada do sobrenome, não é possível, por falta de previsão legal.

Irmãos com prenomes idênticos

É obrigatória a alteração do prenome de irmãos com prenomes idênticos, para não haver
confusão entre as identidades, recaindo a alteração sobre o registrado por último.

Apelidos públicos e notórios

Admite-se a substituição do prenome pelo apelido público e notório (art. 58 da Lei nº


6.015/73).
Nada obsta, porém, que o interessado apenas acrescente o apelido, quando, então, este
passará a ser um cognome.
O cognome: é o apelido que passa a integrar o nome. O apelido, quando integra o nome civil,
passa a denominar cognome. Exemplos: Luis Inácio Lula da Silva, Maria das Graças Xuxa Meneghel.
A jurisprudência também admite a substituição do prenome oficial pelo prenome de uso, isto
é, pelo qual a pessoa é conhecida.

Vontade do transgênero ou transexual

22
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Tanto o transgênero quanto o transexual são pessoas que têm uma identidade que não
corresponde ao gênero sexual biológico.
O transexual sente um forte desejo de alterar a sua anatomia sexual, através de cirurgia de
mudança de sexo ou terapia hormonal, ao passo que o transgênero não sente este tipo de
necessidade.
Manter prenome masculino a uma pessoa que se sente enquadrada no gênero feminino, ou
vice-versa, enseja uma situação vexatória, à medida que o nome passa a destoar da aparência física
e do fenótipo comportamental.
Por consequência, é possível tanto a mudança de sexo quanto a mudança do prenome,
independentemente da cirurgia de transgenitalização, pois o registro deve retratar a identidade de
gênero psicossocial, conforme jurisprudência do STJ.
Na ação direta de inconstitucionalidade 4275/DF, o STF, com base no pacto de São José da
Costa Rica, conferiu interpretação conforme à Constituição ao artigo 58 da lei 6.015/73,
reconhecendo aos transgêneros que assim o desejarem, o direito de substituir o prenome e sexo,
independentemente de cirurgia.
A questão é de índole constitucional, porque a alteração visa preservar a cidadania e a
dignidade do ser humano, razão pela qual deve ser rejeitada a opinião contrária, que nega a
alteração, argumentando a falta de previsão legal.
Ora, o princípio da legalidade dos registros públicos não pode sobrepor-se aos ditames
constitucionais.
Ademais, há previsão legal, pois a hipótese se equipara ao prenome ridículo.

Tradução

Tratando-se de estrangeiro, é possível, por ocasião do pedido de naturalização, requerer a


tradução, desde que o prenome seja traduzível, isto é, encontre correspondência em nossa língua
(art. 71, §1º da lei 13.445/2017).
Acrescente-se ainda que se o prenome estrangeiro estiver definitivamente integrado em
nossa língua, a tradução será vedada, pois implicaria em mudança de prenome. Assim, não se pode
traduzir William para Guilherme, porque o primeiro encontra-se já enraizado em nosso idioma.
Não se admite a tradução inversa, isto é, da língua portuguesa para outro idioma
estrangeiro. Quanto ao patronímico, não admite a tradução, pois pertence a todo o
grupo familiar.

Adaptação do prenome à língua portuguesa

Esta hipótese, que é também prevista no art. 71, §1º da lei 13.445/2017, refere-se à
pronúncia ou compreensão difícil, podendo ser requerida pelo estrangeiro, no pedido de
naturalização, desde que o prenome possa ser adaptado à prosódia da Língua Portuguesa.

PSEUDÔNIMO

O pseudônimo é um nome independente do nome civil, que é registrado e usado pela pessoa
especialmente para fins literatos, artísticos, políticos, científicos, etc. “Di Cavalcanti”, por exemplo,
é o pseudônimo pelo qual ficou conhecido o famoso pintor Emiliano de Albuquerque Melo.
Anote-se que o pseudônimo não integra o nome civil, ao contrário do cognome.

23
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Acrescente-se, por fim, que o pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção
que se dá ao nome (art. 19 do CC).

DIREITO SOBRE O CORPO

INTRODUÇÃO

O direito sobre o corpo compreende, dentre outros, os seguintes assuntos:

 disposição do corpo;
 transplantes;
 esterilização;
 intervenções cirúrgicas.

DISPOSIÇÃO DO CORPO

A vida se desenvolve no corpo. Portanto, a agressão ao corpo implica na ofensa à vida. É, pois,
indisponível o direito à integridade física, de modo que é nulo o negócio jurídico que objetiva a
mutilação do corpo da pessoa.
Com efeito, dispõe o art. 13 do CC que, salvo por exigência médica, é defeso o ato de
disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou
contrariar os bons costumes.
Anote-se que, ainda que a disposição do próprio corpo não importe diminuição permanente
da integridade física, o ato será vedado quando contrariar os bons costumes.
Assim, a pedido do Ministério Público ou de parentes, o juiz pode, por exemplo, impedir o
sujeito de automutilar-se num espetáculo artístico, se a disposição do corpo:

 importar em diminuição permanente da integridade física, ou;


 contrariar os bons costumes.

Acrescente-se, contudo, que as pequenas lesões são admitidas, desde que de acordo com os
costumes, como, por exemplo, para o fim de pagamento de promessa. Outro exemplo: furar a
orelha da filha para colocar brinco.
A mudança cirúrgica do sexo, conquanto implique em diminuição permanente da integridade
física, é possível por exigência médica (art. 13 do CC). Sobredita cirurgia é autorizada pela
Resolução nº 1.652/2002 do Conselho Federal de Medicina. Fundamenta-se no princípio
constitucional da inviolabilidade da intimidade (art.5º, X, da CF). O Enunciado 276 do CJF/STJ
autoriza essas cirurgias de transgenitalização com a consequente mudança do prenome e do sexo
no registro civil.
Urge, porém, que o distúrbio emocional seja extremo, a ponto de a opção pelo
transexualismo ser o único meio de se obter a cura. Não se pode, por mero capricho, na esperança
ser um pouco mais feliz, realizar essa cirurgia, pois, além de contrariar os bons costumes, ainda
importa em diminuição permanente da integridade física.

TRANSPLANTES

Transplante é a retirada de órgãos, tecidos e partes do corpo para ser introduzido noutra

24
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

pessoa.
A Constituição Federal proíbe a comercialização de órgãos, tecidos ou partes do corpo (art.
199, § 4º da CF). A comercialização, porém, significa a prática de atos medianeiros entre a produção
e o consumo com o intuito de lucro.
De acordo com José Afonso da Silva, a lei não pode prever a comercialização, mas pode
prever a alienação (venda, doação, etc) direta do titular para o utente ou para a formação de banco
de sangue, sem intuito comercial.
Discordamos desse ponto de vista, porque a venda e qualquer ato oneroso são imorais, e, por
isso, a legislação especial não pode consagrá-los.
Sendo assim, a expressão “comercialização” deve ser interpretada em sentido amplo, com o
fito de abranger qualquer ato oneroso, isto é, motivado pelo animus lucrandi.
A Lei 9.434/97, que regulamentou a matéria, só permite a doação, que pode ser concretizada
após a morte, ou ainda em vida, vedando qualquer ato oneroso.
A doação para retirada post mortem é disciplinada no art. 14 do CC, nos seguintes termos:
“É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no
todo ou em parte, para depois da morte.” Exige-se morte encefálica.
Anote-se que essa doação só é válida se o motivo for científico, isto é, para fins de pesquisa,
ou, então, altruístico, isto só, para fins de transplante. Essa doação pode ser feita:

 pela própria pessoa, antes de morrer;


 autorização de paciente maior, da linha reta ou colateral até 2º grau, ou do cônjuge
sobrevivente, mediante documento escrito perante duas testemunhas (art.4º da Lei nº
9.434/97 e Lei nº 10.211/2001).

Se, contudo, em vida, a pessoa manifestou expressamente a sua vontade de não ser doadora,
impõe-se a proibição da doação. Se, em vida, permaneceu em silêncio, daí sim o cônjuge, parentes
em linha reta ou colaterais até 2º grau poderão efetuar a doação. Essa disposição deve ser feita por
escrito, exigindo ainda duas testemunhas. Adotou-se o princípio do consenso afirmativo, isto é, a
necessidade de autorização expressa dos familiares do morto, de modo que o silêncio em vida do
potencial doador não gera a presunção de sua autorização. Se, contudo, em vida ele manifestou
expressamente o desejo de não doar os órgãos, a sua vontade prevalece sobre a vontade dos
familiares (Enunciado 277 do CJF/STJ).
Acrescente-se ainda que o parágrafo único do art. 14 do CC preceitua que o ato de disposição
pode ser livremente revogado a qualquer tempo.
Por outro lado, a doação para retirada em vida, só é cabível mediante os seguintes requisitos:

 capacidade do doador. Tratando-se de pessoa absolutamente incapaz ou relativamente


incapaz, a doação, em vida, não é possível, a não ser na hipótese de transplante de medula
em caso de comprovada compatibilidade imunológica (art. 9º, § 6º da Lei nº 9.434/97), e,
mesmo assim, desde que haja a autorização do representante legal. Anote-se, ainda, que o
menor emancipado pode figurar como doador.
 autorização judicial. O pedido deve ser formulado pelo doador, através de advogado.
Dispensa-se a autorização judicial apenas quando se tratar de transplante de medula óssea
autorizada por doador capaz (art. 9º da Lei 9.434/1997).
 justificativa médica. É vedada a doação prejudicial à saúde do doador, ou, então que não
seja indispensável ao receptor.

ESTERILIZAÇÃO

25
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

A esterilização masculina denomina-se vasectomia; a feminina, laqueadura tubária.


A esterilização voluntária só é possível a partir dos 25 anos, desde que a pessoa manifeste por
escrito a sua vontade de realizá-la, sendo certo que, para concretização cirúrgica deve decorrer o
prazo de no mínimo 60 dias, durante o qual a pessoa interessada poderá ter acesso a serviço de
regulação da fecundidade, incluindo o aconselhamento destinado a desencorajar a esterilização
precoce (art. 10 da Lei 9.263/96).
No caso de a pessoa ser casada, é necessária a autorização do cônjuge.
Acrescente-se, ainda, que a pessoa incapaz só pode ser esterilizada, mediante autorização
judicial. Quanto ao pródigo, nada obsta sua esterilização, independentemente de ordem judicial,
pois sua incapacidade é restrita aos atos patrimoniais.
Finalmente, a extirpação do útero (histerectomia) ou dos ovários (ooforectomia), para fim de
esterilização, é expressamente vedada pela lei.

INTERVENÇÃO CIRÚRGICA E TRATAMENTO MÉDICO

Dispõe o art. 15 do CC que “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida,
a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”.
A anuência do paciente à intervenção cirúrgica só é necessária quando o perigo causado pela
doença for futuro.
Se, ao revés, houver iminente perigo de vida, é perfeitamente lícita a intervenção médica ou
cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante, conforme se depreende da
análise do § 3º do art. 146 do CP, que legitima esse ato, dispensando-se autorização judicial. Em tal
situação, ainda que a vítima dispense ou recuse o socorro, o médico deve intervir, sob pena de ser
responsabilizado criminalmente pela negligência.
No tocante à transfusão de sangue, rejeitada pela convicção religiosa do paciente ou
familiares, cremos que, em caso de iminente perigo de vida, o médico deva concretizá-la, com
apoio no § 3º do art.146 do CP, sob pena de responder criminalmente pela omissão.
De fato, não pode a liberdade religiosa sobrepor-se ao direito à vida. Trata-se de uma
hipótese de estado de necessidade, em que os valores religiosos são desconsiderados em prol da
preservação da vida do paciente.
Denota-se, portanto, que a anuência do paciente é dispensada quando houver iminente
perigo de vida. É claro, porém, que se o risco de vida da cirurgia ou transfusão de sangue for maior
do que o risco de vida provocado pela doença que acomete o paciente, a intervenção médica
dependerá do consentimento do moribundo ou de seu representante legal.
AUSÊNCIA

CONCEITO E FASES DO PROCEDIMENTO

Verifica-se a ausência civil quando a pessoa desaparece de seu domicílio e não dá notícia de
seu paradeiro.
Na ausência, ao contrário da pessoa desaparecida em catástrofe, não há certeza de morte,
mas apenas uma suspeita, e, por isso, o legislador é cauteloso, presumindo a sua morte somente
após a abertura da sucessão definitiva (art. 6º).
Com efeito, o procedimento de ausência desenvolve-se em três fases sucessivas:

 curadoria do ausente;

26
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

 sucessão provisória;
 sucessão definitiva.

Aludido procedimento encontra-se disciplinado nos arts. 744 e 745 do CPC/2015. É instaurado
no último domicílio do ausente. Trata-se de jurisdição voluntária. Qualquer interessado pode
requerer a sua instauração, inclusive o Ministério Público.
O procedimento só é instaurado na hipótese de o ausente ter deixado bens. Para outros
assuntos, como, por exemplo, pensão previdenciária, a ausência pode ser demonstrada no curso da
ação, sem que haja necessidade de instauração de demorado procedimento de ausência. De fato,
para a percepção da pensão previdenciária, basta os dependentes do ausente demonstrarem o seu
desaparecimento, por mais de seis meses, no bojo da ação em que essa pensão é requerida (art. 78
da Lei nº 8.213/91).
Conquanto o ausente não seja considerado incapaz, urge que alguém o represente em
relação aos seus bens. Assim, na primeira fase, a da curadoria do ausente, a representação ficará
afeta ao curador do ausente; na segunda fase, a da sucessão provisória, o ausente será
representado ativa e passivamente pelos herdeiros que tomaram posse nos bens, de modo que
contra eles correrão as ações pendentes e que no futuro forem movidas em face do ausente. Na
última fase, a da sucessão definitiva, o ausente é considerado morto, e, por isso, ninguém mais o
representa.

CURADORIA DO AUSENTE

Nessa primeira fase, o juiz, convencendo-se de que certa pessoa encontra-se desaparecida,
após analisar a petição inicial, declarará a ausência, nomeando-lhe um curador.
O cônjuge do ausente, sempre que não esteja separado judicialmente, ou de fato por mais de
dois anos antes da declaração da ausência, será o seu legítimo curador (art. 25).
Em falta do cônjuge, a curadoria dos bens do ausente incumbe aos pais ou aos descendentes,
nesta ordem, não havendo impedimento que os iniba de exercer o cargo (§1º do art. 25).
Entre os descendentes, os mais próximos precedem os mais remotos (§2º do art. 25).
Na falta das pessoas mencionadas, compete ao juiz a escolha do curador.
O critério de escolha do curador é similar ao do inventariante.
Convém esclarecer que o Ministério Público não deve ser nomeado curador do ausente.
Outrossim, que a lei não exige prazo mínimo de desaparecimento para instauração do
procedimento.
Por outro lado, se o ausente houver deixado representante ou procurador, não se declarará a
ausência e nem se nomeará curador, a não ser que o mandatário não queira, ou não possa exercer
ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes.
Nessa primeira fase do procedimento, o juiz ainda mandará arrecadar os bens do ausente e a
administração ficará afeta ao curador do ausente, cujos poderes são similares aos dos tutores e
curadores.
Feita a arrecadação, o juiz mandará publicar editais na rede mundial de computadores, no
sítio do tribunal a que estiver vinculado e na plataforma de editais do Conselho Nacional de Justiça,
onde permanecerá por 1 (um) ano, ou, não havendo sítio, no órgão oficial e na imprensa da
comarca, durante 1 (um) ano, reproduzida de 2 (dois) em 2 (dois) meses, anunciando a arrecadação
e chamando o ausente a entrar na posse de seus bens (art. 745 do CPC).
Do exposto se dá conta que esses editais visam conferir publicidade à arrecadação e convocar
o ausente a retornar para o seu domicílio. Se, por engano, algum bem alheio houver sido
arrecadado, o interessado poderá mover os embargos de terceiro.

27
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Passado 1 (um) ano da publicação do primeiro edital, ou 3 (três) anos se o ausente havia
deixado um representante, 3 (três) situações podem ocorrer:
a) o retorno do ausente. Nesse caso, ele assume seus bens, extinguindo-se o procedimento.
Acrescente-se que o ausente terá direito de receber todos os frutos e rendimentos dos seus bens,
deduzindo-se as despesas relativas à administração;
b) a certeza da morte do ausente. Provado o seu óbito, o procedimento é convertido em
inventário;
c) a persistência da ausência. Em tal situação, o procedimento avança para a segunda fase, a
da sucessão provisória.

SUCESSÃO PROVISÓRIA

Os interessados poderão requerer que se abra provisoriamente a sucessão. Esse


requerimento, em regra, pode ser formulado somente após o decurso do prazo de 1 (um) ano da
publicação do primeiro edital, conforme salientamos anteriormente. Todavia, esse prazo passa a
ser de 3 (três) anos, se o ausente houver deixado procurador ou representante legal.
Somente se consideram interessados para requererem a sucessão provisória:

 o cônjuge não separado judicialmente;


 os herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários;
 os que tiverem sobre bens do ausente direito que dependa de sua morte;
 os credores de obrigações vencidas e não pagas.

O companheiro também tem legitimidade para requerer a sucessão provisória (Enunciado 97


do CJF).

O Ministério Público poderá também requerer a sucessão provisória em duas situações:

 se não houver nenhum desses interessados elencados acima;


 se esses interessados não formularem o requerimento.

No requerimento de abertura da sucessão provisória, o requerente pedirá a citação do


curador e dos herdeiros, sendo que esses últimos deverão providenciar a respectiva habilitação.
Após o julgamento das habilitações, o juiz prolatará a sentença determinando a abertura da
sucessão provisória. Aludida sentença só produzirá efeito cento e oitenta dias depois de publicada
pela imprensa; mas logo que passe em julgado, proceder-se-á à abertura do testamento, se houver,
e ao inventário e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido.
Assim, com o trânsito em julgado dessa sentença, efetua-se a partilha dos bens entre
herdeiros. Estes, porém, só poderão tomar posse depois de transcorrido o prazo de 180 dias a
contar da publicação da sentença na imprensa.
Além disso, os herdeiros, para se imitirem na posse dos bens do ausente, darão garantia da
restituição deles. Essa caução poderá ser concretizada mediante penhores ou hipotecas
equivalentes aos quinhões respectivos. Os ascendentes, os descendentes e o cônjuge estão
dispensados dessa caução. Quanto aos demais herdeiros, se não prestarem caução, não tomarão
posse, mantendo-se os seus quinhões sob a administração do curador, ou de outro herdeiro
designado pelo juiz, que tenha prestado essa garantia. Todavia, o herdeiro que não tomar posse,
por falta da caução, poderá requerer lhe seja entregue metade dos rendimentos do quinhão que

28
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

lhe tocaria.
Nessa fase da sucessão provisória, os herdeiros ainda não adquirem a propriedade dos bens
do ausente, mas apenas a posse, encontrando-se em situação similar ao usufrutuário, pois terão
direito aos frutos e rendimentos dos bens que lhes couberam.
Com efeito, o descendente, ascendente ou cônjuge que for sucessor provisório do ausente,
fará seus todos os frutos e rendimentos dos bens que a este couberem; os outros sucessores,
porém, deverão capitalizar metade desses frutos e rendimentos, convertendo-os em imóveis ou
títulos da dívida pública. Essa capitalização é ordenada pelo juiz, após ouvir o representante do
Ministério Público. O objetivo dessa capitalização é resguardar os interesses do ausente, caso ele
retorne e justifique o seu desaparecimento. Se, porém, o ausente aparecer e ficar comprovado que
a ausência foi voluntária e injustificada, perderá ele, em favor do sucessor, sua parte nos frutos e
rendimentos capitalizados.
Saliente-se, ainda, que os herdeiros não poderão alienar os imóveis do ausente, a não ser
mediante ordem judicial, para lhes evitar a ruína.
Quanto aos bens móveis, a venda também depende de ordem judicial.
Aliás, antes da partilha, o juiz, quando julgar conveniente, ordenará a conversão dos bens
móveis, sujeitos à deterioração ou extravio, em imóveis ou em títulos garantidos pela União, por
força do art. 29 do CC, que, por analogia, também pode ser aplicado após a partilha.
Dentro de dez anos, a contar do trânsito da sentença de abertura da sucessão provisória, ou,
então, dentro de cinco anos a contar de suas últimas notícias, se o ausente contava oitenta anos de
idade, podem ocorrer as seguintes hipóteses:

 o retorno do ausente. Nesse caso, ele reassume o seu patrimônio, cessando a sucessão
provisória dos herdeiros. O descendente, ascendente ou cônjuge que for sucessor
provisório, não terá que devolver os frutos e rendimentos dos bens ao ausente; os outros
sucessores, porém, se a ausência for involuntária e justificada, terão que lhe devolver a
metade dos frutos e rendimentos, aquela que foi capitalizada para essa hipótese de retorno
do ausente;
 a certeza da morte do ausente. Nesse caso, o juiz converte a sucessão provisória em
definitiva, ordenando ainda o levantamento das cauções prestadas;
 a persistência da ausência. Em tal situação, o procedimento avança para a terceira fase, a da
sucessão definitiva.

SUCESSÃO DEFINITIVA

Os interessados poderão requerer a sucessão definitiva em três hipóteses:

 dez anos depois de passar em julgado a sentença que concede a abertura da sucessão
provisória;
 cinco anos a contar das últimas notícias, se o ausente contava oitenta anos de idade;
 quando houver certeza da morte do ausente, comprovada por certidão de óbito.

Essa sentença de sucessão definitiva produz os seguintes efeitos:

 presunção da morte do ausente (art. 6º). Trata-se da chamada morte ficta, pois o óbito não
é sequer registrado. Nas fases anteriores há presunção que o ausente está vivo, tanto é que
na primeira fase ele é representado pelo curador e na segunda pelos herdeiros, aliás, os
herdeiros respondem pelas dívidas do ausente até as forças da herança; na terceira fase, o

29
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

ausente é considerado morto.


 averbação desta sentença no Cartório de Registro Civil (art. 9º, IV);
 dissolução do casamento (art. 1.571, § 1º). Assim, o cônjuge do ausente pode contrair novas
núpcias, sem que haja necessidade do divórcio, porquanto é reputado viúvo. Nas fases
anteriores, curadoria do ausente e sucessão provisória, a ausência fica restrita aos bens sem
dissolver o casamento.
 extinção do poder familiar (art. 1.635 e art. 6º do CC);
 levantamento das cauções prestadas pelos herdeiros que se imitiram na posse;
 imissão na posse dos herdeiros que não haviam tomado posse por falta de caução;
 aquisição da propriedade resolúvel dos bens por parte dos herdeiros.

Estes, até então, eram meros possuidores e titularizavam uma espécie de usufruto legal; a
partir da sentença de sucessão definitiva, adquirem a propriedade dos bens, e, por isso, podem
aliená-los, independentemente de ordem judicial.
Acrescente-se, contudo, que, dentro de dez anos, a contar da sentença de sucessão definitiva,
podem ocorrer as seguintes hipóteses:

 o retorno do ausente ou de algum herdeiro mais próximo.

Nesse caso, eles poderão requerer ao juiz a entrega dos bens existentes no estado em que se
acharem, ou sub-rogados em seu lugar ou o preço que os herdeiros e demais interessados
houverem recebido pelos bens alienados.
Observe-se, portanto, que o retorno do ausente, até dez anos da sucessão definitiva, provoca
a extinção da propriedade, razão pela qual esta é tida como resolúvel. Saliente-se, contudo, que o
ausente não terá direito aos frutos e rendimentos referentes ao tempo da ausência.

 a persistência da ausência. Nesse caso, a propriedade se torna definitiva. Se acaso o ausente


retornar depois de dez anos da sucessão definitiva, não terá direito a reaver nenhum de
seus bens.

DOMICÍLIO

DISTINÇÃO ENTRE MORADA, RESIDÊNCIA E DOMICÍLIO

Morada é a pousada eventual. Exemplo: casa de praia para passar o verão, em que a pessoa
chega, se abriga e parte, sem que haja qualquer estabilidade. Assim, a morada é o lugar onde a
pessoa se encontra e permanece sem a intenção de ficar.
Residência é a morada habitual. É o lugar onde a pessoa habita com uma estabilidade relativa.
Tal ocorre, por exemplo, com o estudante do interior que vem para a cidade de São Paulo estudar
durante um ano.
Domicílio, por sua vez, é a residência com ânimo definitivo, isto é, com a intenção de tê-la por
tempo indeterminado. É, pois, a morada estável e permanente.
Assim, a morada temporária, por tempo determinado, qualifica-se como residência, ao passo
que a morada permanente, com animus manendi (propósito de ali permanecer por tempo
indeterminado), identifica-se como domicílio.

30
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Finalmente, o domicílio apresenta duas características:


 a necessidade de tê-lo;
 fixidez, isto é , fixo, porém não é imutável.

DOMICÍLIO DA PESSOA NATURAL

O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo
definitivo (art. 70).
Os elementos do domicílio são:
a) elemento objetivo ou material: é a residência;
b) elemento subjetivo ou psicológico: é o animus manendi, isto é, a intenção de aí fixar-se por
tempo indeterminado.

O Código de Napoleão adota o princípio da unidade do domicílio, segundo o qual a pessoa só


pode ter um domicílio.
O Código Civil brasileiro, porém, filiou-se ao sistema da pluralidade de domicílios. Assim, se a
pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu
qualquer delas (art. 71). A propósito, dispõe o § 1º do art. 46 do CPC/2015 que tendo mais de um
domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer deles.
Finalmente, esclarece o § 4º do art. 46 do CPC/2015 que havendo dois ou mais réus, com
diferentes domicílios, serão demandados no foro de qualquer deles, à escolha do autor.

DOMICÍLIO PROFISSIONAL

De acordo com a teoria da realidade, o domicílio é o lugar da residência definitiva, ao passo


que pela teoria da ficção, a residência se distingue do domicílio, pois este se configura no lugar
onde a pessoa exerce sua profissão.
O Código Civil pátrio filiou-se aos dois sistemas, pois, consoante preceitua o art. 72, “é
também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar onde
esta é exercida”. Cuida esse dispositivo do domicílio profissional. Acrescenta o parágrafo único do
artigo 72 que “se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá
domicílio para as relações que lhe corresponderem”.
Assim, no que tange às relações profissionais, o domicílio pode ser tanto a residência
definitiva quanto o lugar onde a profissão é exercida. Anote-se que a expressão “é também
domicílio”, utilizada pelo art. 72 do CC, reforça essa exegese. Assim, no tocante às relações
profissionais, o domicílio do médico, por exemplo, é tanto o lugar do seu consultório como o de sua
residência, podendo a ação judicial ser proposta em qualquer desses lugares.
No Código de 1916, se a pessoa tinha residência numa cidade e exercia a profissão noutro
lugar, o domicílio era no lugar da residência. O Código de 2002, contudo, considera ambos os
lugares como sendo o domicílio, no tocante às relações profissionais.
O domicílio profissional, porém, é limitado às relações profissionais. A pessoa que tem
escritório de advocacia em Campinas, é dentista em Jundiaí e reside em São Paulo, no que tange as
ações relacionadas à odontologia, poderá ser demandada em São Paulo ou Jundiaí, e quanto aos
problemas com a advocacia o seu domicílio será São Paulo ou Campinas.

DOMICÍLIO APARENTE OU OCASIONAL

31
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Domicílio aparente ou ocasional é o lugar onde a pessoa for encontrada.


Com efeito, dispõe o art. 73 do CC:
“Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência habitual, o lugar onde for
encontrada”.
Aludido dispositivo legal deve ser interpretado restritivamente, porque disse menos do que
quis, à medida que exigiu, tão-somente, a ausência de residência habitual, quando, na verdade, o
domicílio aparente depende de dois requisitos: ausência de residência habitual mais ausência de
um ponto central de negócios.
Com efeito, se a pessoa não tem residência fixa, mas desenvolve a sua atividade em
determinado lugar, o seu domicílio será o lugar onde desenvolve sua atividade, ainda que se trate
de relações estranhas à sua profissão. Exegese diversa contrariaria a finalidade do domicílio, que é
a de fixar a pessoa em determinado lugar.
MUDANÇA DE DOMICÍLIO

Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com intenção manifesta de o mudar (art. 74


do CC).
Essa mudança depende de dois elementos:

a) elemento material ou objetivo: é a transferência efetiva da residência, isto é, da habitação;


b) elemento subjetivo ou psicológico: vontade de deixar definitivamente a residência anterior.
Ajunta o parágrafo único do art. 74 que “a prova da intenção resultará do que declarar a
pessoa às municipalidades dos lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais declarações não fizer,
da própria mudança, com as circunstâncias que a acompanharem”.
Anote-se que a pessoa pode mudar de domicílio sem adquirir outro, pois o Brasil admite o
domicílio aparente. Tal ocorre, por exemplo, quando a pessoa passa a ser andarilha.
Convém ainda salientar que a troca de residência sem a intenção definitiva de ficar no outro
lugar escolhido, não implica em mudança de domicílio. Assim, não se opera a mudança de
domicílio, quando a pessoa se instala em certa cidade apenas para tratamento médico, mantendo a
intenção de retornar ao lugar de onde saíra.
Ajunte-se também que a mudança de residência com ânimo definitivo é suficiente para a
alteração do domicílio, ainda que a fortuna da pessoa permaneça no lugar de origem. Se, ao revés,
apenas a fortuna é transferida para outra cidade, sem que haja a transferência da residência, o
domicílio mantém-se inalterável.
Vê-se, portanto, que a mudança de domicílio está subordinada à transferência da residência
com ânimo definitivo. Na dúvida, o juiz decide pela preservação do domicílio anterior.
Por fim, a mudança de domicílio, depois de ajuizada a ação, é irrelevante, tendo em vista o
princípio da perpetuatio jurisdicionis (art. 43 do CPC/2015). A mudança de domicílio, porém, não
tem o condão de alterar a competência, de modo que a ação continua no foro anterior, ainda que
no curso da ação ocorra a alteração do domicílio.
De fato, a competência se determina com a propositura da ação; as modificações posteriores
são irrelevantes, salvo:

 quando suprimir o órgão jurisdicional;


 alterar a competência em razão da matéria;
 alterar a competência em razão da hierarquia.

32
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

DOMICÍLIO DA PESSOA JURÍDICA

O domicílio da pessoa jurídica de direito privado é o lugar onde funciona a diretoria e


administração.
Nada obsta, porém, que o domicílio seja o lugar eleito no estatuto ou ato constitutivo da
pessoa jurídica. Todavia, nesse caso, consoante entendimento vitorioso na jurisprudência, a pessoa
jurídica pode ser demandada no lugar da diretoria e administração ou no lugar eleito no estatuto
ou ato constitutivo. Não prevalece a posição sustentada por Espínola, segundo o qual esse último
seria o domicílio principal, ao passo que o primeiro meramente supletivo. Afirma o § 1º do art. 75
que “tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será
considerado domicílio para os atos nele praticados”. Assim, cada filial ou sucursal tem o seu próprio
domicílio, ainda que o estatuto designe a matriz como sendo o domicílio da empresa. A propósito,
dispõe a súmula 363 do STF: “ A pessoa jurídica de direito privado pode ser demandada no
domicílio da agência, ou estabelecimento, em que se praticou o ato”.
Finalmente, no concernente às pessoas jurídicas estrangeiras, reputam-se domiciliadas no
Brasil as que aqui tenham agência, filial ou sucursal (parágrafo único do art. 21 do CPC/2015). Se a
administração, ou diretoria, tiver sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica,
no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento,
sito no Brasil, a que ela corresponder (§ 2º do art. 75 do CC).

CLASSIFICAÇÃO DO DOMICÍLIO

Quanto à origem, o domicílio pode ser:


I. domicílio voluntário: é o escolhido livremente pela pessoa;
II. domicílio necessário ou coativo: é o imposto pela lei, independentemente da vontade da
pessoa. Subdivide-se em:
a) original: é o adquirido ao nascer. Assim, o domicílio do recém-nascido é dos seus pais.
b) legal: é o fixado pela lei. O parágrafo único do art. 76 do CC prevê as seguintes hipóteses:
- domicílio do incapaz: é o de seu representante legal;
- domicílio do servidor público: é o lugar em que exerce permanentemente suas funções;
- domicílio do militar: é o lugar onde servir. Quanto ao militar reformado, só tem domicílio
voluntário. O militar da ativa que exerce temporariamente sua função noutro lugar, mantém como
domicílio o quartel anterior, ao qual se encontra vinculado.
- domicílio do militar da marinha e da aeronáutica: é a sede do comando a que se encontrar
imediatamente subordinado;
- domicílio do marítimo, isto é, dos oficiais e tripulantes da marinha mercante: é o lugar onde
o navio estiver matriculado;
- domicílio do preso: é o lugar em que cumprir a sentença. Urge que esta já tenha transitado
em julgado, para que o domicílio passe a ser o legal; antes do trânsito em julgado, milita em seu
favor o princípio da presunção de inocência, mantendo-se, destarte, o domicílio voluntário.
- Domicílio do itinerante: é o local onde a pessoa for encontrada.
Por outro lado, quanto à sua natureza, o domicílio pode ser:
I. domicílio geral: é o fixado para todos os atos e negócios jurídicos. É o caso do domicílio
voluntário e do domicílio necessário.
II. domicílio especial: é o fixado para um ou alguns atos ou negócios jurídicos. É o caso do
domicílio contratual.

33
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

DOMICÍLIO CONTRATUAL OU ESPECIAL

Domicílio contratual ou foro de eleição é o fixado, por convenção entre as partes


contratantes, para o cumprimento de certos direitos e obrigações.
Dispõe o art. 78 do CC:
“Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e
cumpram os direitos e obrigações deles resultantes”.
O domicílio contratual ou convencional apresenta as seguintes características:

 escrito: porque não pode ser fixado verbalmente;


 fictício: porque é um lugar que não corresponde à residência dos contratantes;
 temporário: porque sua duração está condicionada ao inadimplemento da obrigação;
 limitado: porque diz respeito a certos direitos e obrigações expressamente determinados no
negócio jurídico.

O domicílio contratual só pode versar sobre a comarca competente. É nula a eleição


contratual do juízo competente para determinada causa, porque a competência de juízo (vara) é
absoluta, e, por isso, não pode ser alterada pela vontade das partes. Igualmente, nas ações reais
imobiliárias, em que a competência é determinada pelo local em que se situa a coisa (“foro rei
sitae”), é proibido o foro de eleição, pois trata-se de competência absoluta.
Saliente-se, ainda, que, nas relações de consumo, o foro de eleição é vedado, pois o foro
competente é o domicílio do consumidor. As normas do Código de Defesa do Consumidor são de
ordem pública, razão pela qual não podem ser derrogadas por vontade das partes.
Nessas hipóteses de competência absoluta, o juiz deve declinar de ofício da competência
fixada pelo foro de eleição. Aliás, O § 3o do art. 63 do CPC/2015 preceitua que: “Antes da citação, a
cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que
determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu”.
Por outro lado, se malgrado o foro de eleição, a ação for ajuizada noutro lugar, o juiz não
poderá declinar de ofício, pois a competência territorial é relativa, devendo ser arguida pelo réu, na
contestação, sob pena de preclusão.
Finalmente, o foro de eleição que fixa uma comarca longínqua, dificultando a ampla defesa, é
inconstitucional, por dificultar o acesso ao Poder Judiciário, devendo o juiz declinar de ofício.

BENS

CONCEITO

Sob o prisma jurídico, bens são os valores materiais e imateriais, com conotação econômica,
que podem ser objeto de uma relação jurídica.

Assim, os bens podem ser:

a) corpóreos ou coisas: são os valores materiais, isto é, dotados de uma existência física.
Exemplos: roupas, automóveis, dinheiro, etc.
b) incorpóreos ou direitos: são os valores imateriais, que só podem ser compreendidos pela
inteligência do homem. Esses bens não têm um corpo, ou seja, uma estrutura física. Exemplos:
crédito; ponto comercial; direito de o autor reproduzir a obra, etc.

34
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

BENS IMÓVEIS OU DE RAIZ

De acordo com Clóvis, bens imóveis são as coisas que se não podem transportar, sem
destruição, de um para outro lugar.
Quanto a estes, se a remoção for possível, serão considerados bens móveis, como, por
exemplo, as barracas de feira e os pavilhões de circo; se, ao revés, a remoção alterar a sua
substância ou a destinação econômico-social, serão considerados imóveis, como, por exemplo, as
construções.
Saliente-se, portanto, que, em regra, os bens removíveis por força alheia, sem alteração da
substância ou da destinação econômico-social, são considerados bens móveis.
Todavia, em duas hipóteses, não obstante a possibilidade de remoção, reputam-se ainda
imóveis.
Com efeito, dispõe o art. 81 do CC que não perdem o caráter de imóveis:

I. as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas
para outro local;
II. os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem.

No tocante às edificações separadas do solo, conforme ensina Renan Lotufo, só poderão ser
consideradas imóveis se mantiverem essa destinação econômico-social, trocando apenas de lugar.
Se nunca foram imobilizadas, nunca fixadas ao solo ou nunca estiveram sujeitas à habitação, mas
tão-somente ao comércio, por exemplo, não poderão ser consideradas imóveis, e sim móveis.

Os bens imóveis classificam-se em:

a) imóvel por natureza;


b) imóvel por acessão física;
c) imóvel por força de lei.

IMÓVEIS POR NATUREZA OU POR ESSÊNCIA

Os imóveis por natureza compreendem o solo e tudo quanto nele se lhe incorpora
naturalmente.
O subsolo, o solo e o espaço aéreo encontram-se incorporados naturalmente ao solo, razão
pela qual também são considerados imóveis por natureza.
As pedras, as árvores e as plantações, que se encontram no solo, são também considerados
imóveis por natureza. Igualmente, os componentes do subsolo, como os fósseis, as jazidas e o curso
d´água. Quanto às quedas d’água e outras fontes de energia hidráulica, o Código de Águas, no
art.145, ressalva que são bens imóveis considerados como coisas distintas do solo em que se
encontrem, logo o proprietário não pode abrangê-la para fim de aproveitamento industrial. De
fato, as quedas d’água e outras fontes de energia hidráulica pertencem à União.

IMÓVEL POR ACESSÃO FÍSICA ARTIFICIAL OU INDUSTRIAL

Os imóveis por acessão física compreende tudo aquilo que o homem incorpora de forma

35
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

artificial e permanentemente ao solo, a ponto de não poder ser removido sem alteração da
substância ou da destinação econômico-social. Exemplos: Construções, semente lançada a terra e
plantações.

IMÓVEL POR FORÇA DE LEI

Dispõe o art. 80 do CC, que consideram-se imóveis para os efeitos legais:

I. os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram;


II. o direito à sucessão aberta.

O dispositivo em apreço cuida de bens incorpóreos, isto é, de direitos. A razão da imobilização


é a segurança das relações jurídicas, pois o regime jurídico de proteção aos bens imóveis é muito
mais rígido do que o referente aos bens móveis.

Os direitos reais que podem recair sobre imóveis são:


I. a propriedade;
II. a superfície;
III. as servidões;
IV. o usufruto;
V. o uso;
VI. a habitação;
VII. a hipoteca;
VIII. o compromisso de compra e venda.

Finalmente, o direito à sucessão aberta, que corresponde ao direito à herança ou legado, é


considerado bem imóvel, ainda que a herança ou legado sejam compostos só de bens móveis. Vê-
se, assim, que a classificação dos bens em móveis e imóveis estende-se também aos bens
incorpóreos, isto é, aos direitos.

BENS MÓVEIS

São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem
alteração da substância ou da destinação econômico-social (art. 82).
Os bens móveis classificam-se em:

a) bens móveis por natureza;


b) bens móveis por antecipação;
c) bens móveis por força da lei.

Convém destacar, desde já, que os navios e aeronaves são bens móveis por natureza; todavia,
para fins de hipoteca, são considerados bens imóveis.

BENS MÓVEIS POR NATUREZA OU ESSÊNCIA

Os bens móveis por natureza são os suscetíveis de movimento próprio, como os semoventes,

36
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

e os suscetíveis de remoção por força alheia, sem a alteração da sua substância, como as
mercadorias e os automóveis. O gás é bem móvel, pois pode ser removido por meio do
embotijamento.
Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam
sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum
prédio, a não ser que o proprietário tenha a intenção de reempregá-los na própria construção
demolida. Se houver a intenção de reempregá-los noutra construção, serão tidos como bens
móveis, enquanto não incorporados efetivamente nessa construção.

BENS MÓVEIS POR ANTECIPAÇÃO

Os bens móveis por antecipação são aqueles incorporados temporariamente ao solo, para
depois serem removidos, a fim de cumprirem a sua destinação econômico-social. Exemplos: árvores
destinadas ao corte, para transformação em lenha ou carvão; plantações destinadas à finalidade
industrial da fabricação de remédios; casas vendidas para serem demolidas etc.

BENS MÓVEIS POR FORÇA DE LEI

Consideram-se móveis para os efeitos legais (art. 83):

I. as energias que tenham valor econômico. O art. 155, § 3º, do CP também considera a
energia de valor econômico como sendo bem móvel. Exemplos: energia elétrica, energia genética,
energia nuclear, energia eólica (derivada do vento), energia radiotiva, etc.
II. os direitos reais sobre bens móveis e as ações correspondentes. Esses direitos reais são: o
usufruto, o uso, o penhor e a alienação fiduciária em garantia.
III. os direitos pessoais de caráter patrimonial e as respectivas ações. Assim, os direitos
pessoais patrimoniais são bens móveis, ainda que recaiam sobre imóveis. Exemplos: locação,
comodato, arrendamento, ações da S/A, a propriedade industrial (marcas, patentes), etc.

Finalmente, no tocante aos direitos do autor, no que tange ao seu aspecto patrimonial, é um
bem móvel, logo pode ser cedido sem autorização do cônjuge; todavia, no concernente ao seu
atributo moral, ingressa no rol dos direitos da personalidade.

BENS FUNGÍVEIS E INFUGÍVEIS

São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e
quantidade (art. 85).
A “contrario sensu”, são infungíveis os que não podem substituir-se por outros da mesma
espécie, qualidade e quantidade.
Assim, o bem é fungível quando a sua substituição for irrelevante, a ponto de vetar qualquer
tipo de reclamação, como, por exemplo, o dinheiro. Se, ao revés, houver possibilidade de o credor
rejeitá-la, é porque o bem é infungível. No Código Civil Brasileiro, só os bens móveis podem ser
fungíveis. Os imóveis são sempre infungíveis. Com efeito, o art. 85 do CC ao definir os bens
fungíveis referiu-se expressamente aos bens móveis.

37
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

BENS CONSUMÍVEIS E INCONSUMÍVEIS

Dispõe o art. 86 do CC que: “São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição
imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação”.
Assim, a consuntibilidade pode ser de fato e de direito.
Com efeito, a consuntibilidade de fato ou natural ou material ocorre com os bens que se
destroem com o primeiro uso. Exemplos: cigarros, bebidas, gêneros alimentícios, tintas etc. Não é
possível o uso sem a destruição, ou melhor, com o uso o bem perde a sua capacidade de utilização.
A consuntibilidade de direito ou jurídica se dá com os bens destinados à alienação. Exemplos:
o livro exposto à venda etc.
Por outro lado, os bens inconsumíveis são aqueles que comportam uso reiterado, sem a
destruição imediata da sua substância. Exemplos: roupas, relógios, etc.

BENS DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS

Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição
considerável de valor ou prejuízo do uso a que se destinam (art. 87).
Noutras palavras, bens divisíveis são aqueles que se podem partir em porções reais e
distintas, de tal modo que cada uma destas mantenha proporcionalmente a mesma substância, o
mesmo valor e a mesma utilidade que tinha o todo. Exemplos: uma saca de café; uma peça de
pano; uma fazenda; um lote de terreno etc.
Bens indivisíveis, ao revés, são aqueles cujo fracionamento implica em destruição da sua
natureza ou então diminuição considerável do valor ou do uso a que se destinam.
A indivisibilidade pode ser:

a) material ou física: as coisas cujo fracionamento implica na perda de sua substância.


Exemplos: um cachorro; uma cadeira; um automóvel, etc.;
b) econômica: as coisas cujo fracionamento implica na perda considerável do seu valor
econômico. Tal ocorre quando cada porção deixa de manter proporcionalmente o mesmo valor que
o todo. Um diamante raro, por exemplo, em função do seu tamanho, depois de fracionado pode
não apresentar o mesmo valor que tinha o todo;
c) finalística: os bens cujo fracionamento implica na alteração do uso a que se destinam.
Exemplo: uma coleção de livros; o uniforme com onze camisas de jogadores de futebol; as peças
componentes de um jogo de xadrez, etc.
d) voluntária: são bens naturalmente divisíveis cujo fracionamento é vedado pela vontade das
partes. Com efeito, podem os condôminos acordar que fique indivisa a coisa comum por prazo não
maior de cinco anos, suscetível de prorrogação ulterior. Todavia, não poderá exceder de cinco anos
a indivisão estabelecida pelo doador ou testador. A requerimento de qualquer interessado e se
graves razões aconselharem, pode o juiz determinar a divisão da coisa comum antes do prazo (art.
1320, § 1º, § 2º e § 3º);
e) intelectual ou jurídica: são bens naturalmente divisíveis cujo fracionamento é vedado por
lei. Exemplo: o imóvel rural não pode ser fracionado em dimensão inferior ao módulo rural,
conforme preceitua o Estatuto da Terra; o terreno urbano não pode ser parcelado em lotes
inferiores a 125 ms². (Lei 6.766/79); a herança não pode ser aceita ou renunciada parcialmente,
pois a lei a considera indivisível;

38
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

uma casa etc.


BENS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS

Bens reciprocamente considerados são os analisados uns em face de outros. Sob esse prisma,
podem ser principais e acessórios.
Dispõe o art. 92 do CC:
“Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja
existência supõe a do principal”.
Assim, bem principal é o que tem existência autônoma, ao passo que o bem acessório, para
existir, pressupõe a existência de um outro bem. A árvore, por exemplo, é um bem acessório,
porque sua existência depende do solo onde foi plantada.

Dentre os bens acessórios corpóreos, destacam-se:

 os frutos;
 os produtos;
 as benfeitorias;
 as acessões;
 as pertenças;
 partes integrantes.

À exceção das pertenças, os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal abrangem
também os acessórios. O princípio de que o acessório segue o principal, também chamado de
princípio da gravitação jurídica, embora não expresso na lei, encontra-se implícito no art. 94 do CC,
quando este é interpretado a contrario sensu.
Desse princípio são extraídas as seguintes consequências:

a) a natureza do acessório é a mesma da do principal, se esta é imóvel, aquela também o é;


o proprietário do principal também é proprietário do acessório;
b) a posse do imóvel faz presumir, até prova em contrário, a das coisas móveis que nele
estiverem (art. 1.209);
c) a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo
se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso (art. 233);
d) salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus
acessórios (art. 287);
e) a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não
induz a da obrigação principal (art. 184);
f) a coisa legada entregar-se-á, com seus acessórios, no lugar e estado em que se achava ao
falecer o testador, passando ao legatário com todos os encargos que a onerarem (art. 1938).

Frise-se, porém, que as pertenças, conquanto acessórias, não seguem o principal, salvo se o
contrário resultar da lei, da manifestação da vontade, ou das circunstâncias do caso.

FRUTOS

Frutos são as produções normais e periódicas, cuja percepção deixa intacta a coisa que os
produziu.
A caracterização dos frutos, como ensina Renan Lotufo, requer a conjugação de três

39
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

requisitos:

 periodicidade;
 inalterabilidade da substância;
 separabilidade da coisa principal.

Os frutos, quanto à origem, podem ser:

a. naturais: são os que se reproduzem periodicamente pela própria força orgânica da coisa.
Exemplos: as frutas e as crias dos animais;
b. industriais: são os que se reproduzem periodicamente em virtude do trabalho do homem.
Exemplo: a produção da fábrica;
c. civis: são os rendimentos produzidos por um bem. Exemplos: aluguéis, juros, lucro dos
sócios etc.
Quanto ao estado em que se encontram, os frutos podem ser:

a) pendentes: são os que estão unidos à coisa que os produziu;


b) percebidos: os já colhidos;
c) estantes: os que já foram colhidos e estão armazenados ou acondicionados para venda;
d) percipiendos: os que devem ter sido, mas ainda não foram colhidos;
e) consumidos: os que não existem mais, por terem sido utilizados.

PRODUTOS

Produtos são utilidades que se extraem da coisa, com dispêndio de sua substância. Exemplo:
o metal retirado da mina; a pedra extraída da pedreira.
Os produtos não se reproduzem periodicamente, ao passo que a reprodução periódica é a
característica principal dos frutos. Estes, quando retirados, deixam a coisa intacta; os produtos, ao
inverso, vão se reduzindo paulatinamente à medida que se extraem da coisa. Acrescente-se ainda,
que o possuidor de boa-fé, como, por exemplo, o usufrutuário, tem direito à percepção dos frutos
colhidos tempestivamente; todavia, deve restituir ou indenizar os produtos. Quanto ao possuidor
de má-fé, não tem direito aos frutos nem aos produtos, mas deve ser indenizado pelas despesas de
produção e custeio dos frutos.
Finalmente, convém salientar que, apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos
e produtos podem ser objeto de negócio jurídico autônomo e independente do bem principal,
deixando, pois, nesse caso, de ser bem acessório (art. 95).

BENFEITORIAS

Benfeitorias, na definição de Clóvis, são obras ou despesas efetuadas numa coisa para
conservá-la, melhorá-la, ou, simplesmente, embelezá-la.
As benfeitorias podem ser necessárias, úteis e voluptuárias.
As necessárias são feitas para conservar a coisa, impedindo-lhe a destruição ou deterioração,
como a construção de um muro de arrimo para evitar a queda da casa.
As úteis têm por fim aumentar ou facilitar o uso da coisa, como a construção de uma
garagem.
As voluptuárias ou suntuárias visam proporcionar mero recreio ou deleite, tornando a coisa
mais agradável ou luxuosa, como a construção de uma sauna. Essas benfeitorias não aumentam o

40
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

uso habitual do bem, ao contrário das benfeitorias úteis.


Em relação às benfeitorias necessárias, têm direito à indenização os possuidores de boa-fé e
de má-fé. No tocante às benfeitorias úteis, apenas o possuidor de boa-fé tem direito à indenização
do seu valor. Nas locações de imóveis urbanos, as benfeitorias úteis só são indenizadas quando a
sua feitura foi autorizada pelo locador (art.35 da Lei 8.245/1991).
No concernente às benfeitorias voluptuárias, o possuidor de boa-fé tem o direito de levantá-
las (jus tollendi), quando o puder sem detrimento da coisa. Se não der para levantá-la, ele as perde
sem indenização, ainda que elas sejam de elevado valor. Se der para levantá-la, ainda assim o
proprietário poderá ficar com a benfeitoria, indenizando o possuidor de boa-fé, ao invés de permitir
que ele as levante.
O possuidor de má-fé não tem direito à indenização das benfeitorias úteis e nem o direito de
levantar as voluptuárias. Ele as perde. O proprietário as recebe gratuitamente.
Por fim, salienta o art. 97 que “não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos
sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor”. De fato, os
melhoramentos ou acréscimos decorrentes da natureza, como aluvião e avulsão, são espécies de
acessões. Como esclarece Washington de Barros Monteiro, sendo obra exclusiva da natureza, quem
lucra é o proprietário do imóvel, sem compensação alguma para quem quer que seja; todavia, na
avulsão a indenização pode ser pleiteada no prazo de um ano.

ACESSÕES

Acessão é a junção de uma coisa à outra por força externa.


A acessão pode ser:
a) por obra da natureza: a união provém da força da natureza, sem a intervenção do homem.
São as seguintes: aluvião, avulsão, álveo abandonado e formação de ilhas;
b) industrial ou artificial: a união é produzida pelo homem. São as construções de obras;
c) mistas: a união provém da conjugação da força da natureza e da intervenção do homem.
São as plantações.
Cumpre não confundir as benfeitorias com as acessões industriais.
Com efeito, as benfeitorias são melhoramentos feitos em obras já existentes, como a reforma da
casa ou a construção de uma garagem, ao passo que as acessões industriais são obras que criam coisas
novas, como, por exemplo, a construção de uma casa realizada em terreno vazio.
Finalmente, a especificação é a transformação de coisa móvel em espécie nova, de modo que não
é possível o retorno à forma de origem. Trata-se da pintura em relação à tela, da escultura em relação à
matéria prima e do escrito em relação ao papel. São considerados bens principais, e não benfeitorias ou
acessões, de modo que o autor da obra de arte ou do escrito é o proprietário de todo bem, nos termos
do art.1.270 do CC.

PERTENÇAS

São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo
duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro (art. 93).
Assim, as pertenças, embora sejam coisas acessórias, conservam a sua identidade, pois não se
incorporam à coisa que se juntam. É a chamada res annexa (coisa anexada)
A acessoriedade das pertenças é meramente econômica e jurídica, tendo em vista o seu fim
de servir, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento da coisa principal.
Exemplos: os móveis e quadros da casa; o telefone do escritório; as máquinas da fábrica; o trator da

41
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

fazenda etc.
Vê-se, portanto, que a separação das pertenças não altera a coisa principal, que permanece
intacta. A pertença é livremente separável, de modo que a qualquer tempo o proprietário, a seu
critério, poderá fazer com que a coisa deixe de ser pertença. Para tanto, basta não empregá-la ao
uso, ao serviço ou ao aformoseamento da coisa principal.
Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal, em regra, não abrangem as
pertenças. Assim, na venda de uma casa não se encontram compreendidos os bens que integram a
residência alienada. Trata-se de uma exceção ao princípio de que o acessório segue o principal.
Em três hipóteses, porém, os negócios jurídicos envolvendo o bem principal abrangerá
também as pertenças.
A primeira ocorre quando houver alguma lei nesse sentido. Tal ocorre, por exemplo, com a
aquisição de um estabelecimento comercial, pois, por força dos arts. 1142 e 1143, todos os bens
que o compõe consideram-se abrangidos no negócio.
A segunda hipótese ocorre quando a vontade das partes ordena a abrangência das
pertenças. Exemplo: venda de uma casa mobiliada.
A terceira exceção ocorre quando as circunstâncias do negócio abrangem as pertenças. Se,
por exemplo, o agente compra um estúdio de gravação, torna-se evidente que o vendedor deverá
manter no local todos os equipamentos técnicos.
O bem imóvel destinado a servir outro imóvel, como uma quadra de tênis ou parque
agregados ao hotel, que os averbou no Registro de Imóveis, são também considerados pertenças,
que, nesse caso, revestem-se de natureza jurídica de bens imóveis.
Normalmente as pertenças são bens móveis, também chamados de móveis ajudantes, não
obstante a opinião contrária de Maria Helena Diniz que, classifica as pertenças móveis como sendo
bens imóveis por acessão intelectual.

BENS PÚBLICOS

Dispõe o art. 98 do CC que “são públicos os bens do domínio nacional pertencente às pessoas
jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que
pertencerem”.
O dispositivo em apreço não espelha o real conceito de bem público, pois só considera como
tal os bens de domínio nacional, quando, na verdade, para ser público, basta que o bem pertença a
uma pessoa jurídica de direito público interno (União, Estados, Municípios, Distrito Federal,
autarquias). Quanto às fundações públicas, paira polêmica se é pessoa de direito público ou
privado.
Além disso, não é verdade que os demais bens sejam particulares. Ora, como salienta
Washington de Barros Monteiro, muitas coisas existem, no mar e em terra, que não pertencem a
ninguém (os animais bravios, enquanto entregues à sua natural liberdade, as pérolas que jazem no
fundo dos mares, os tesouros, as águas pluviais não captadas, as coisas abandonadas, as “res
nullius”, etc).
Acrescente-se, ainda, que os bens pertencentes às sociedades de economia mista e empresas
públicas são também considerados bens públicos de uso especial, quando essas entidades forem
prestadoras de serviços públicos. Igualmente, os bens das concessionárias prestadoras de serviço
público. A propósito, salienta Maria Sylvia Zanella Di Prieto:
“Com relação às entidades da Administração Indireta com personalidade de direito privado,
grande parte presta serviços públicos; desse modo, a mesma razão que levou o legislador a
imprimir regime jurídico publicístico aos bens de uso especial, pertencentes às pessoas jurídicas de

42
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

direito público interno, tornando-os inalienáveis, imprescritíveis, insuscetíveis de usucapião e


direitos reais, justifica a adoção de idêntico regime para os bens de entidade da Administração
Indireta afetados à realização de serviços públicos. É precisamente essa afetação que fundamenta a
indisponibilidade desses bens, com todos os demais corolários. É sabido que a Administração
Pública está sujeita a uma série de princípios, dentre os quais o da continuidade dos serviços
públicos. Se fosse possível às entidades da Administração Indireta, mesmo empresas públicas,
sociedades de economia mista e concessionárias de serviços públicos, alienar livremente esses
bens, ou se os mesmos pudessem ser penhorados, hipotecados, adquiridos por usucapião, haveria
uma interrupção do serviço público. E o serviço é considerado público precisamente porque atende
às necessidades essenciais da coletividade. Daí a impossibilidade da sua paralisação e a sua
submissão ao regime jurídico publicístico”.
Assim, podemos conceituar os bens públicos como sendo aqueles pertencentes a uma pessoa
jurídica de direito público, qualquer que seja a sua afetação, e os pertencentes a pessoas jurídicas
de direito privado quando afetados à prestação de serviços públicos.

Os bens públicos podem ser:

a. de uso comum do povo: são aqueles cujo acesso é permitido a todos. O art. 99, I do CC
fornece-nos os seguintes exemplos: rios, mares, estradas, ruas e praças. Trata-se de um rol
meramente exemplificativo, pois qualquer bem que, por lei ou natureza, destina-se ao uso coletivo,
é considerado bem de uso comum do povo. O uso, aliás, pode ser gratuito ou retribuído, conforme
preceituar a lei da pessoa política a cuja administração pertencerem (art. 103).
b. de uso especial: são os usados pela Administração Pública para atingir seus fins. O art. 99,
II, do CC cita como exemplo os edifícios ou terrenos destinados às repartições públicas. Outros
exemplos: veículos oficiais; navios de guerra; terras dos silvícolas; cemitérios públicos; teatros
públicos; aeroportos públicos etc.
c. dominiais ou dominicais: são os que não tem destinação pública, e, por isso, integram o
patrimônio disponível do Poder Público, podendo ser aplicado inclusive para a obtenção de renda.
Exemplos: imóveis não utilizados pela Administração Pública; terrenos da marinha, terras
devolutas, salvo as necessárias à proteção dos ecossistemas, pois estas são bens públicos de uso
especial. Os bens dominiais são também chamados de bens do patrimônio privado do Estado.
Referidos bens podem ser objeto de direito pessoal ou real; admite-se inclusive a sua alienação,
observadas as exigências da lei (art.101 do CC).
Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas
jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado (parágrafo único do
art.99 do CC). Alguns autores usam o termo bem dominial como gênero, para indicar qualquer
espécie de bem público, reservando a expressão bem dominical para designar os bens públicos
desafetados, isto é, que integram o patrimônio disponível.

Os bens públicos apresentam as seguintes características:

 inalienabilidade;
 imprescritibilidade;
 impenhorabilidade;
 impossibilidade de oneração.

INALIENABILIDADE

43
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Vimos que os bens públicos de uso comum são aqueles que, por lei ou pela natureza, podem
ser utilizados por todos em igualdade de condições.
Os bens públicos de uso comum por sua própria natureza, como os mares, os rios, as praias
etc., são absolutamente inalienáveis, pois são insuscetíveis de valoração econômica.
Em contrapartida, os bens públicos de uso comum por força de lei, como as praças e as
estradas, outrossim, os bens públicos de uso especial, são relativamente inalienáveis.
Com efeito, só serão inalienáveis enquanto conservarem essa qualificação de bem de uso
comum ou de uso especial (art. 109). Esses bens podem ser alienados, se forem desafetados.
Desafetação é a retirada da finalidade pública do bem, transformando-o em bem público
dominical. Assim, uma lei municipal pode determinar o fechamento da praça, ordenando a sua
alienação.
Quanto aos bens dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.
A alienação dos bens públicos, consoante preceitua o art. 17 da Lei 8.666/93, depende dos
seguintes requisitos:

 demonstração de interesse público;


 prévia avaliação;
 licitação;
 autorização por lei, se for bem imóvel. Tratando-se de imóvel da União, além da lei, é ainda
necessário decreto do Presidente da República (Lei 9.636/98).

IMPRESCRITIBILIDADE

Os bens públicos, seja qual for a sua natureza, são imprescritíveis, no sentido de serem
insuscetíveis de usucapião (art. 102).

IMPENHORABILIDADE

A execução contra a Fazenda Pública deve ser feita mediante precatório, conforme preceitua
o art. 100 da CF, sendo, pois, proibida a penhora de seus bens.

IMPOSSIBILIDADE DE ONERAÇÃO

Os bens públicos não podem ser objeto de hipoteca, penhor etc.


O penhor e a hipoteca não podem ser admitidos sequer por lei, pois o bem empenhado ou
hipotecado, no caso de inadimplência, pode vir a ser penhorado na futura execução, burlando,
destarte, a norma do art. 100 da CF que proíbe a penhora do bem público.

DOS FATOS JURÍDICOS

CONCEITO

Em sentido amplo, os fatos jurídicos compreendem os acontecimentos naturais e voluntários,


em virtude dos quais nascem, se modificam e se extinguem os direitos e as obrigações.
Assim, nesse sentido lato sensu, os fatos jurídicos subdividem em:

a) fatos jurídicos em sentido estrito ou fato natural: são os acontecimentos naturais, alheios à
vontade humana, que criam, modificam ou extinguem direitos e obrigações. Exemplos: aluvião,
avulsão, nascimento, a maioridade, a morte natural, etc.

44
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

b) atos ou negócios jurídicos: são os acontecimentos emanados da vontade lícita do homem,


em virtude dos quais nascem, subsistem e se extinguem os direitos e obrigações. São chamados de
fatos humanos voluntários. Exemplos: casamento, contrato, testamento, etc;
c) atos ilícitos: são os acontecimentos emanados de dolo ou culpa, lesivos aos interesses
alheios. São conhecidos como fato humano involuntário. Exemplo: a reparação prevista para o caso
de dano.

AQUISIÇÃO DOS DIREITOS

O direito nasce a partir de um fato jurídico, e não da lei. Esta cria apenas a possibilidade de o
direito vir a nascer, mediante a ocorrência do seu fato gerador.
Os direitos podem ser adquiridos:

 por ato próprio do adquirente;


 por intermédio de outrem, como no caso de mandato, representação e gestão de negócios;
 por força de natureza. Exemplos: aluvião e avulsão.

Os modos de aquisição do direito podem ser originários e derivados.


Os modos originários são as aquisições dos direitos sem que haja qualquer relação jurídica
entre o adquirente e o seu antecessor. Exemplos: usucapião, ocupação de res nullius (coisa sem
dono) e res derelicta (coisa abandonada) etc. Tratam de causas autônomas, que, por si só, bastam
para aquisição dos direitos.
Os modos derivados compreendem as aquisições por transmissão, em que há um vínculo
jurídico entre o adquirente e o seu antecessor. Exemplos: herança, legado, compra e venda etc.
No modo derivado, o adquirente deve pagar o imposto de transmissão de bens imóveis,
subsistindo, ainda, os direitos reais que oneravam o bem, como a hipoteca, o usufruto, servidão
etc. No modo originário, ao inverso, não há incidência de imposto de transmissão, extinguindo-se,
ainda, os direitos reais que oneravam o bem, expurgando-se quaisquer gravames reais que sobre
ele pudessem pesar.

DIREITOS ATUAIS E DIREITOS FUTUROS

Direitos atuais são os completamente adquiridos, e futuros os cuja aquisição não se acabou
de operar.
Assim, direito atual ou adquirido é o que pode ser exercido desde já, porque reúne todos os
fatos geradores necessários à sua aquisição. Tal ocorre, por exemplo, com o funcionário público
que já completou o tempo necessário para a sua aposentadoria.
Direito futuro, por sua vez, é o que não pode ainda ser exercido, pois não reúne todos os
fatos geradores necessários à sua aquisição.
Os direitos futuros subdividem-se em:

a) futuro deferido: é aquele cuja aquisição depende apenas de um ato de vontade da pessoa.
Exemplo: com a lavratura de uma escritura pública de compra e venda, a propriedade ainda não é
adquirida, encontrando-se na dependência do registro, cuja providencia depende apenas da
vontade do comprador.Outro exemplo: o herdeiro a partir da abertura da sucessão tem direito
futuro deferido porque a aceitação da herança depende do seu puro arbítrio.
b) futuro não deferido: são aqueles cuja aquisição depende de fatos falíveis, isto é, futuros e

45
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

incertos.Tal ocorre com os direitos condicionais, direitos eventuais e expectativas de direito.

No direito condicional, as bases estruturais para a aquisição encontram-se formadas,


aguardando-se apenas a ocorrência da condição, ao passo que na expectativa de direito ( ou direito
“in fieri”) não há qualquer consistência jurídica, havendo apenas uma simples esperança de se
adquirir um direito.Assim, quem aguarda o recebimento de uma herança de pessoa viva tem mera
expectativa de direito, isto é, um nada jurídico, despido de qualquer proteção jurídica.
Quanto ao direito eventual, alguns autores empregam essa expressão como sinônima de
direito condicional. Realmente, em termos práticos têm o mesmo tratamento, por força do art.130
do CC, pois tanto o titular de direito condicional quanto o de direito eventual podem praticar os
atos destinados a conservá-lo.
Sílvio Venosa lembra da interessante distinção entre os direitos condicionais e os eventuais,
salientando que em ambos existe a subordinação a um acontecimento futuro e incerto. Os direitos
eventuais, contudo, trazem elemento futuro e incerto inerente e essencial ao próprio negócio,
como os contratos aleatórios e a venda de coisa alheia, enquanto nos direitos condicionais o fato
dito condicional é externo ao ato. De fato, nem todo elemento futuro e incerto deve ser
considerado condição. O negócio jurídico eventual é negócio jurídico ainda incompleto que
necessita que algo ocorra para completar-se. É de índole interna, essencial ao direito. Quem vende,
por exemplo, coisa que ainda não tem, depende de obtê-la para poder transmiti-la.
Saliente-se, por fim, que o direito sob termo é considerado direito adquirido, pois o termo
suspende o exercício, mas não a aquisição do direito (art. 131).
Cumpre observar, que o termo é um fato futuro e certo. Tal ocorre, por exemplo, com a
doação com início a partir de certa data.

NEGÓCIO JURÍDICO

DISTINÇÃO ENTRE ATO E NEGÓCIO JURÍDICO

O Código Civil adotou a doutrina do direito alemão, que divide o ato jurídico em sentido
amplo em duas espécies: ato jurídico em sentido estrito e negócio jurídico.
Tanto o ato jurídico em sentido estrito quanto o negócio jurídico caracterizam-se como sendo
um comportamento humano voluntário apto a adquirir, resguardar, transferir, modificar ou
extinguir direitos.
Distinguem-se, porém, sutilmente. Com efeito, no negócio jurídico o efeito jurídico dele
emanado é previamente querido pelo agente, ao passo que no ato jurídico em sentido estrito, o
efeito jurídico emana diretamente da norma, independente do querer do agente.
No negócio jurídico, o intuito negocial sobrepõe-se ao conteúdo da norma, que pode ser
afastada para que prevaleça a intenção das partes. São negócios jurídicos tanto o testamento, que
é unilateral, como o contrato, que é bilateral, caracterizando-se esse último como sendo o negócio
jurídico por excelência.
Os atos jurídicos em sentido estrito podem ser, ao revés, destituídos de intuito negocial, pois em
alguns casos, o homem os pratica sem a intenção específica de produzir o efeito jurídico que dele
advém. Assim, por exemplo, a descoberta de um tesouro é um ato jurídico, pois o inventor torna-se
proprietário, ainda que não queira. Igualmente, quem de boa-fé planta em seu terreno com semente
alheia, adquire-lhe a propriedade, a despeito do seu querer. Note-se que, nesses atos jurídicos, o
agente alcança um efeito jurídico, que não tinha a intenção de alcançar.
Convém frisar que enquanto no negócio jurídico os efeitos jurídicos são previamente

46
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

almejados e controlados pela vontade das partes, no ato jurídico os efeitos que dele emanam são
impostos pela lei, pouco importando se a partes os desejava ou não. Assim, o casamento é um ato
jurídico, pois as consequências matrimoniais são determinadas pela lei, não podendo os nubentes
subtraírem-se delas.
Podemos dizer que nos atos jurídicos os efeitos se produzem independentemente da vontade
de quem age, ao passo que nos negócios jurídicos os efeitos são intencionalmente desejados pelo
agente.
O negócio jurídico exige agente capaz, ao passo que a capacidade só é requisito do ato
jurídico, nos casos em que a lei a exige. Assim, o absolutamente incapaz que descobre um tesouro
adquire-lhe também a propriedade. Se fosse exigir a capacidade, esse ato seria nulo.
De fato, dispõe o art. 185 do CC, que as disposições referentes aos negócios jurídicos aplicam-
se, apenas, no que couber, aos atos jurídicos lícitos. Vê-se assim que o Código disciplinou o negócio
jurídico, ao passo que o Código de 1916 cuidava do ato jurídico em sentido amplo e sequer utilizava
a expressão negócio jurídico. No Código atual, as normas sobre negócio jurídico só se aplicam, no
que couber, aos atos jurídicos em sentido estrito.

ATO JURÍDICO E ATO-FATO-JURÍDICO

O ato jurídico em sentido estrito é o praticado intencionalmente pela parte, embora os seus
efeitos sejam determinados pela lei, como, por exemplo, o casamento, ao passo que, no ato-fato-
jurídico, a parte não teve sequer a intenção de praticá-lo, não obstante a repercussão jurídica
imposta por lei. Assim, a descoberta ocasional de um tesouro seria um ato-fato-jurídico;
igualmente, os atos socialmente aceitos praticados por uma criança, como a compra de um sorvete.
Cremos que o ato-fato-jurídico encontra-se embutido no conceito de ato jurídico, pois tanto
naquele quanto neste os efeitos produzidos encontram-se previamente determinados por lei. Na
verdade, os casos de atos- fatos –jurídicos não passam de exemplos de atos jurídicos em sentido
estrito.
Para os adeptos dessa tríplice classificação, negócio jurídico, ato jurídico e ato-fato-jurídico, a
linha divisória seria a seguinte:
a) vontade qualificada. É a exigida para o negócio jurídico, pois a ação humana deve ser
direcionada à produção de um determinado efeito jurídico;
b) vontade simples. É a exigida para o ato jurídico, pois a ação humana deve ser direcionada
apenas à prática do ato, sem qualquer controle sobre os seus efeitos jurídicos;
c) irrelevância da vontade. É o que ocorre em relação ao ato-fato-jurídico, pois o querer inicial
do agente é indiferente para a produção dos efeitos determinados pela lei.
Na distinção entre ato jurídico em sentido estrito e negócio jurídico destacam-se duas teorias.
A primeira é a teoria voluntarista que considera negócio jurídico a declaração da vontade
dirigida a produção dos efeitos tutelados pela norma jurídica. Essa concepção não prevalece, pois
como esclarece Maria Helena Diniz, a voluntariedade do ato existe também no ato jurídico em
sentido estrito. Referida teoria só realiza a distinção entre o negócio jurídico e o ato-fato-jurídico.
A segunda, teoria objetiva de Bulow, o negócio jurídico alicerça-se na autonomia privada, no
poder de autorregulamentação dos efeitos jurídicos que se almeja que se produzam, ao passo que
no ato jurídico em sentido estrito os efeitos emanam da lei e não podem ser alterados ou excluídos
pela vontade, vedando-se a interferência da autonomia privada sobre a regularização dos seus
efeitos.
O negócio jurídico, em regra, tem conteúdo patrimonial, mas é também possível negócios
jurídicos extrapatrimoniais, relacionados ao direito de família (exemplos: regulamentação

47
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

consensual da guarda pelos pais) ou a direitos personalíssimos (exemplo: regulamentação


consensual da permissão do uso ao direito à imagem).

EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA DOS ATOS OU NEGÓCIOS JURÍDICOS

A teoria dos atos inexistentes surgiu na França, na obra de Zachariae, para explicar a
ineficácia de certos casamentos não declarados expressamente nulos pela lei. De fato, em matéria
matrimonial, a nulidade é sempre textual, isto é, o casamento só é nulo ou anulável nos casos em
que a lei o declara expressamente. Percebeu-se, porém, que em certos casos a lei não declara
expressamente a nulidade, mas , ao mesmo tempo, seria um absurdo considerá-lo válido diante da
falta de um elemento substancial à perfeição do ato.
Surgiu, então a teoria dos atos inexistentes para negar eficácia a esses casamentos não
declarados nulos pela lei.
Assim, o negócio jurídico inexistente é o que não reúne os elementos essenciais à sua
formação.
Na doutrina, discute-se quais seriam esses elementos essenciais. De acordo com Orlando
Gomes, os pressupostos de existência são apenas a vontade e o objeto.
De fato, todo negócio jurídico é uma declaração de vontade. Sem a vontade o ato não existe.
Exemplos: vontade extorquida pela coação física ou declarada por erro obstativo. Igualmente, se
faltar o objeto, o negócio é também inexistente, como, por exemplo, a compra e venda sem coisa
ou sem preço.
Outra corrente considera que são três os requisitos de existência:
a) Declaração de vontade;
b) Objeto;
c) Forma.

Por outro lado, o negócio jurídico nulo é o constituído em desacordo com a lei. O art. 104 do
CC preceitua que a validade do negócio jurídico requer:
I. agente capaz;
II. objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III. forma prescrita ou não defesa em lei.
Vê-se, assim, que os requisitos de validade complementam os de existência. Com efeito, a
declaração de vontade deve emanar de agente capaz, o objeto deve ser lícito, possível,
determinado ou determinável e a forma deve ser a prescrita ou a não defesa em lei.
O ato inexistente não produz qualquer consequência jurídica, além disso, nunca poderá
convalidar-se.
Em regra, a inexistência para ser reconhecida, independe de ação judicial, devendo o negócio
ser simplesmente ignorado, a não ser em casos excepcionais onde a inexistência depender da
produção de prova testemunhal, como, por exemplo, a arguição de ausência de consentimento no
casamento.
O ato nulo, ao contrário do inexistente, pode ter eficácia como putativo, em homenagem à
boa-fé de um dos contratantes.
O Código Civil não cuida dos atos inexistentes.
Justifica-se a omissão pelo fato de que ao legislar, como salienta Renan Lotufo, já se está no
plano da validade, e, portanto, só se deve operar com os planos da validade e da eficácia.
O negócio jurídico eficaz é o que está apto a produzir efeitos.

48
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Saliente-se, ainda, que o ato ou negócio jurídico pode ser:


a) válido e eficaz.
b) válido e ineficaz. Tal ocorre, por exemplo, na pendência de condição suspensiva.
c) inválido mas eficaz. Tal ocorre, por exemplo, com os casos de nulidade relativa, enquanto
esta não for pronunciada judicialmente.
REQUISITOS DE VALIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

De acordo com o art. 104 do CC, os requisitos de validade são:

I. agente capaz;
II. objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III. forma prescrita ou não defesa em lei.

AGENTE CAPAZ

As pessoas absolutamente incapazes são representadas pelos representantes legais, ao passo


que os relativamente incapazes são apenas assistidos. A falta da representação gera a nulidade
absoluta do negócio jurídico (art.166, I); a falta de assistência produz uma nulidade relativa
(art.171, I).

OBJETO LÍCITO

O objeto lícito é o que está de acordo com a lei, moral, ordem pública e bons costumes. É
vedado, por exemplo, o contrato de herança de pessoa viva. Igualmente, é nulo o contrato pelo
qual alguém se compromete a realizar cenas de sexo explícito.
Em sendo ilícito o objeto, a nulidade é absoluta (art. 166, II, do CC). Portanto, o
descumprimento do avençado não enseja qualquer indenização por perdas e danos.

OBJETO POSSÍVEL

A impossibilidade física do objeto pode ser:

a. absoluta: quando a prestação for irrealizável por qualquer pessoa. Exemplos: volta ao
mundo em meia hora; viagem para Júpiter. Nesse caso, a nulidade é absoluta, de modo que a parte
não poderá pleitear indenização por perdas e danos.
b. relativa: quando a prestação for passível de realização, embora de difícil concretização.
Exemplos: construção de uma casa em uma semana; escrever um livro em cinco dias etc. Em tal
situação não se invalida o negócio, de modo que a inadimplência poderá ensejar uma indenização
por perdas e danos.

Com efeito, dispõe o art.106 do CC:


“A impossibilidade inicial do objeto não invalida o negócio jurídico se for relativa, ou se cessar
antes de realizada a condição a que ele estiver subordinada”.
Denota-se que se a impossibilidade absoluta cessar antes de realizada a condição a que
estava subordinado o negócio, este também será tido como válido, consoante se depreende da
análise da 2ª parte do citado art. 106 do CC. Assim, é inválida a estipulação de objeto que não
exista na natureza. Se, porém, o agente conseguir criar esse objeto antes da realização da condição

49
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

a que se subordinar o negócio, este se convalidará. Trata-se, como se vê, da convalidação de um


ato inicialmente nulo. O dispositivo em apreço refere-se a condição, mas, por analogia, também
deve ser aplicado aos negócios jurídicos sob termo em que a impossibilidade absoluta do objeto
cessa antes do advento deste.

OBJETO DETERMINADO OU DETERMINÁVEL

O objeto deve ser determinado ou ao menos determinável.


É determinado quando a prestação é individualizada desde o início do negócio jurídico.
É determinável quando a individualização da prestação é futura, por algum critério a ser
observado. Tal ocorre, por exemplo, com o contrato de compra e venda de peixes que caírem na
rede do pescador. Desde que seja identificada ao menos pelo gênero e quantidade, o negócio é
válido.
Anote-se, porém, que se o objeto for absolutamente indeterminado, como, por exemplo, a
compra e venda de um animal, sem especificar sequer a espécie, haverá nulidade absoluta.

FORMA

A forma é um meio de exteriorização de vontade. Dispõe o art. 107 do CC, que:


“A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei
expressamente a exigir”.
Vê-se, portanto, que o legislador adotou como regra, o princípio da liberdade das formas.
Assim, o negócio jurídico, no silêncio da lei, é de forma livre, podendo ser celebrado por escrito,
verbalmente ou por gestos. Exemplos: compra e venda de bem móvel, comodato, locação etc.
Anote-se, contudo, que o silêncio não importa em manifestação de vontade, salvo quando as
circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração expressa (art.111).
Assim, em regra, quem cala não consente.
Imagine, por exemplo, que uma certa editora envie a uma pessoa os exemplares de uma
revista fazendo consignar que a não devolução implicará em aceitação. Nesse caso, o silêncio
caracterizado pela não devolução em nada vinculará a pessoa que recebeu as ditas revistas. De
fato, o consentimento tácito deve ser inferido de atos positivos, como, por exemplo, o pagamento
da primeira prestação atinente ao recebimento das revistas, e não do silêncio, que, por si só, é
insuficiente para a celebração do negócio jurídico, a não ser quando a própria lei ou os costumes
atribuir-lhe esse efeito.
Por outro lado, os atos ou negócios jurídicos solenes são aqueles em que a lei prevê uma
forma especial. Alguns destes negócios solenes podem celebrar-se por escrito particular, como a
fiança, a doação de bens móveis, o seguro, o penhor etc., mas outros exigem escritura pública,
como os negócios envolvendo a alienação de bens imóveis, como a venda, a doação etc.
A propósito, dispõe o art. 108 do CC: “Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é
essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou
renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo
vigente no País”.
A contrario sensu, os negócios relativos a imóveis, cujo valor seja igual ou inferior a trinta
salários mínimos, admitirão a escritura particular, através da qual poderão alcançar o registro.
Inúmeros negócios relativos a imóveis, como observa Renan Lotufo, admitem escrituras
particulares para sua celebração, qualquer que seja o valor do imóvel:

50
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

a. contratos de que forem partes o Banco Nacional de Habitação ou entidades que integram o
Sistema Financeiro de Habitação (Lei 4.380/64);
b. os compromissos de compra e venda e promessa de cessão relativos a imóveis;
c. todos os atos relativos a cédula hipotecária (Dec. 70/66);
d. contratos de venda e compra de imóvel com alienação fiduciária em garantia (Lei
9.514/97).

A inobservância da forma acarreta a nulidade absoluta do negócio jurídico, mas em alguns


casos, o negócio nulo pode ser convertido noutro válido, se preencher os requisitos desse último e
essa for a real intenção do declarante. Tal ocorre, por exemplo, com a compra e venda de imóvel
superior a 30 salários mínimos celebrada por instrumento particular. Conquanto nula, pode ser
convertida em compromisso de compra e venda, uma vez que esse contrato admite o instrumento
particular. Igualmente, o testamento feito sem testemunhas é nulo, todavia, na parte referente ao
reconhecimento de filho pode ser transformado em escritura particular.
Acrescente-se, ainda, que os atos ou negócios jurídicos de forma livre podem ser
transformados em solenes, pelas partes. Com efeito, dispõe art. 109 do CC: “No negócio jurídico
celebrado com cláusula de não valer sem instrumento público, este é da substância do ato”.

MOTIVO

Causa é a finalidade econômica e social que a parte tem em mira ao celebrar o negócio
jurídico. Se, por exemplo, alguém compra uma casa para nela instalar um restaurante, essa
finalidade constitui a causa. Esta, distingue-se do objeto. No exemplo, a casa é o objeto; a
finalidade de montar um restaurante é a causa.
Motivo, por outro lado, é o antecedente psíquico da ação. É o móvel psicológico que
impulsiona o agente a celebrar o negócio jurídico. A causa é apenas uma espécie de motivo, pois
este, pode abranger uma infinidade de situações.
O Código de 1916 era anticausalista, porque deixou de incluir a causa entre os requisitos de
validade do negócio jurídico.
O Código de 2002 assumiu uma postura intermediária, pois demonstra uma tendência
causalista, dispondo no art. 166, inciso III, que é nulo o negócio jurídico quando o motivo
determinante, comum a ambas as partes, for ilícito.
Assim, o motivo ilícito, e não apenas a causa, vicia o negócio jurídico quando for comum a
ambas as partes. Basta, para que a nulidade seja decretada, que uma das partes tenha ciência da
má-fé da outra. Se, por exemplo, o locador aluga o imóvel ciente de que a finalidade do locatário é
utilizá-lo como cativeiro de um sequestro, não poderá mover-lhe a ação de cobrança dos aluguéis,
diante da nulidade do contrato. Se, ao revés, o locador estava de boa-fé, o contrato será válido,
viabilizando-se, destarte, a cobrança dos aluguéis. Anote-se que, no exemplo ministrado, o objeto
do negócio, qual seja, a casa alugada, é lícito, recaindo a ilicitude sobre a causa consubstanciada na
finalidade criminosa.
Na compra e venda de maconha, por exemplo, o objeto do negócio é ilícito. Nesse caso, para
a decretação da nulidade, pouco importa a boa-fé de um dos contratantes. Na causa ilícita, ao
revés, a boa-fé de uma das partes impede a nulidade do ato.
Força convir, portanto, que o Código de 2002 não é totalmente causalista nem anticausalista,
tendo assumido uma posição intermediária, atento à boa-fé e à má-fé das partes.

INTERPRETAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

51
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Dispõe o art. 112 do CC:


“Nas declarações da vontade se atenderá mais a intenção nela consubstanciadas do que ao
sentido literal da linguagem”.
De acordo com a teoria subjetiva ou voluntarística, o intérprete deve investigar a real vontade
dos declarantes, de modo que a intenção prevalece sobre a vontade externada nas cláusulas do
negócio.

Em contrapartida, a teoria objetiva ou da declaração preconiza a prevalência das palavras


consignadas no negócio jurídico, desprezando a vontade interna dos declarantes. Assim, a
interpretação deve ser fiel ao texto da declaração, não podendo basear-se em elementos exteriores
a ela.
O Código de 2002 adotou uma posição intermediária. Com efeito, o intérprete não pode
simplesmente abandonar a declaração contida no negócio para buscar livremente a vontade
interna dos declarantes, como sustenta a teoria subjetiva. Igualmente, não pode desprezar a
vontade interna, procurando desvendar apenas o sentido frio das palavras como quer a teoria
objetiva.
O intérprete deve partir de dados objetivos consubstanciados no negócio jurídico, buscando-
se, a partir daí, a real intenção dos declarantes, atento para a confiança que o conteúdo material do
ato despertou no destinatário e na responsabilidade do declarante, outrossim, ao que reza o
art.113 do CC: “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar
de sua celebração”.
Atente-se, porém, como salienta Silvio Venosa, que apesar do Código aconselhar preferência
pela vontade interna, tal não é de ser utilizado se as palavras são claras e não dão margem a
dúvidas. De fato, o Código não adotou, na pureza, a teoria subjetiva, de modo que o negócio
jurídico não pode colidir contra o seu conteúdo.
Finalmente, dispõe o art. 114 do CC: “Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia
interpretam-se estritamente.”

CAUSAS DE NULIDADE ABSOLUTA

As causas de nulidade ou anulabilidade são sempre contemporâneas ao nascimento do


negócio jurídico. O negócio jurídico não se torna nulo ou anulável por fato superveniente à sua
formação, pois a nulidade ou anulabilidade são vícios de origem.
O art. 166 do CC elenca as causas de nulidade absoluta do negócio jurídico. São as seguintes:

I. celebrado por pessoa absolutamente incapaz. Tratando-se, porém, de casamento contraído


por menores de 16 anos, a nulidade é apenas relativa (art. 1550).
II. for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto. Exemplo: fornecimento de escravos;
dar a volta ao mundo a pé em três dias. Vimos que apenas a impossibilidade física absoluta é causa
de nulidade; na relativa, o ato é válido.
III. o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito. Exemplo: locação de uma
casa para o fim de exploração do lenocínio. Se o locador tiver ciência do motivo do locatário, o
contrato é nulo. Se, contudo, estiver de boa-fé, o negócio é válido.
IV. não revestir a forma prescrita em lei. Assim, nos negócios jurídicos solenes, a violação da
forma é causa de nulidade absoluta. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de

52
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido se
houvessem previsto a nulidade (art. 170). Assim, o negócio nulo pode ser convertido noutro válido,
desde que:

a) contenha os requisitos do negócio válido;


b) a vontade de as partes celebrarem esse outro negócio. Trata-se de uma pressuposição da
vontade hipotética de ambas as partes.

A compra e venda de imóvel, por exemplo, é nula, se for celebrada por instrumento
particular, todavia, poderá ser convertida em compromisso de compra e venda, pois este último
contrato não exige escritura pública. Outro exemplo: a nota promissória nula por falta de requisito
essencial pode ser convertida em confissão de dívida. A conversão não pode ser determinada ex
officio, urge que seja arguida pelas partes ou por terceiro juridicamente interessado.

V. for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade. Assim, a
falta de legitimação, nos casos exigidos pela lei, pode ser causa de nulidade absoluta ou relativa,
conforme seja ou não essencial essa formalidade. Se o interesse tutelado for público, haverá
nulidade absoluta; se for privado, a nulidade será relativa. Quando, porém, a lei exigir autorização,
a nulidade é relativa, podendo o ato ser validado pela posterior ratificação desse terceiro (art.176
do CC).
VI. tiver por objetivo fraudar lei imperativa. O ato com fraude à lei, vale dizer, para subtrair-se
à sua aplicação, reveste-se de nulidade absoluta.
VII. a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção. Quando
a lei usa a expressão “é nulo” ou outra equivalente, a nulidade é absoluta. Em contrapartida, a
nulidade é relativa quando a lei usa a expressão “é anulável”. Às vezes, porém, a lei proíbe a prática
do negócio, mas permanece silente sobre o ato ser nulo ou apenas anulável. Em tal situação, o
negócio jurídico, em princípio, será nulo. Todavia, como observa Sílvio Venosa, “poderão existir
situações nas quais o negócio se apresenta aparentemente como nulo, mas a interpretação
sistemática o faz entender como anulável. Devemos ter em mente que a nulidade repousa sempre
em causa de ordem pública, enquanto a anulabilidade tem vista mais acentuadamente o interesse
privado”.
Finalmente, a última causa de nulidade absoluta é a simulação. Com efeito, dispõe o art. 167
do CC que: “É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na
substância e na forma”.

CAUSAS DE NULIDADES RELATIVAS

O negócio jurídico é anulável, conforme preceitua o art. 171 do CC, nas seguintes hipóteses:

I. por incapacidade relativa do agente;


II. por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra
credores.

O negócio ainda será anulável nos casos expressamente declarados na lei. Dispõe, por
exemplo, o art. 496 do CC que: “É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os
outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido”. É também
anulável o negócio por falta de autorização nos casos que a lei exige (art.176 do CC).

53
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

NULIDADES TEXTUAIS E VIRTUAIS

Nulidade textual é a cominada expressamente na lei, através das expressões “é nulo”, “é


anulável”, “é inválido”, etc. Essas nulidades podem ser absolutas ou relativas, conforme o tipo de
expressão utilizada e a natureza do interesse resguardado.
Nulidade virtual ou tácita é a decorrente da simples violação de algumas formalidades legais. Tal
ocorre quando a lei veda a prática do negócio, silenciando, contudo, sobre as consequências dessa
violação. Nesse caso, a nulidade encontra-se subentendida. De acordo com o art. 166, VII, do CC é nulo o
negócio jurídico quando a lei proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Em regra, as nulidades podem ser textuais ou virtuais.
Tratando-se, porém, de casamento a nulidade só pode ser textual, isto é, o casamento só é
nulo ou anulável nos casos expressos em lei.
Finalmente, as nulidades virtuais, em princípio, são absolutas, por força do art. 166, VII, do
CC. Essa norma, porém, deve ser interpretada restritivamente, pois se o interesse tutelado for
privado, a nulidade virtual será relativa.

DISTINÇÃO ENTRE A NULIDADE ABSOLUTA E A NULIDADE RELATIVA

A nulidade absoluta é imediata, absoluta, incurável e perpétua.


Imediata, porque invalida o ato desde a sua formação. A sentença que a decreta é
meramente declaratória com eficácia “ex tunc”, isto é, retroativa, salvo quanto ao casamento
putativo, cujo efeito da nulidade é ex nunc em relação ao cônjuge de boa-fé.
De fato, a nulidade ocorre de pleno direito, pois é a própria lei que se recusa a validar o
negócio.
Absoluta, porque pode ser alegada por qualquer interessado, inclusive, pelo Ministério
Público, quando lhe couber intervir, devendo ainda ser decretada de ofício pelo Juiz.
Incurável, porque as partes ou Juiz não podem sanar o vício, visando a validação do negócio
jurídico.
Perpétua, porque é imprescritível. Com efeito, dispõe o art. 169 do CC que:
“O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do
tempo”. Não obstante a imprescritibilidade da ação declaratória de nulidade, às vezes opera-se a
convalidação indireta do negócio, através da aquisição do direito pela via de usucapião.
A nulidade relativa ou anulabilidade, por sua vez, é diferida, relativa, curável e provisória.
Diferida, porque o negócio produz efeitos enquanto não for anulado. A sentença que decreta
a anulabilidade é desconstitutiva com eficácia “ex nunc”, salvo quanto aos vícios de consentimento
(erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo e fraude contra credores), em que a sentença tem
efeito retroativo (“ex tunc”), desfazendo o negócio desde o seu nascimento. Enquanto a nulidade
relativa deve ser sempre pleiteada através de ação judicial; a nulidade absoluta, quase sempre,
como observa Washington de Barros Monteiro, opera de pleno jure, ressalvada a hipótese em que
se suscita dúvida sobre a existência da própria nulidade, caso em que se tornará imprescindível a
propositura de ação para o reconhecimento de sua ocorrência, pois a ninguém é lícito fazer justiça
pelas próprias mãos.
É relativa, porque só os interessados a podem alegar, sendo vedado ao juiz pronunciar-se de
ofício. Assim, uma locação celebrada por absolutamente incapaz, é nula, logo o juiz deve decretar
de ofício a nulidade do contrato. Se, ao revés, for celebrada por relativamente incapaz sem
assistência, a nulidade é relativa, de modo que a sua decretação depende a arguição do

54
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

interessado. No caso de incapacidade relativa, a nulidade relativa só pode ser arguida pelo incapaz
ou pelo seu representante legal, vedando-se a arguição pela outra parte a não ser quando se tratar
de obrigação indivisível (art.105 do CC).
Curável ou sanável, porque o negócio anulável pode ser confirmado pela parte a quem a lei
protege. A ratificação ou confirmação purifica o negócio, que, por consequência, torna-se válido.
Com efeito, preceitua o art. 172 do CC que: “O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes,
salvo direito de terceiro”. A ratificação, como se vê, não pode prejudicar direitos de terceiros. Se,
por exemplo, um menor relativamente incapaz aliena um imóvel sem a assistência de seu
representante legal, a venda será anulável, de modo que, ao completar 18 anos, poderá ratificá-la,
sanando o vício. Se, no entanto, ao completar a maioridade civil, ao invés de ratificar a venda,
alienou o mesmo imóvel a um terceiro de boa-fé, não poderá ratificar a primeira venda, porque a
ratificação prejudicará os direitos deste terceiro. Portanto, o negócio anulável não pode ser
ratificado quando se efetuou um segundo negócio válido com terceiro de boa-fé.
A ratificação pode ser expressa e tácita. A ratificação expressa deve fazer menção às cláusulas
mais importantes do negócio, todavia, não se exige que se mencione expressamente o defeito a ser
sanado. Com efeito, dispõe o art.173 do CC: “O ato de confirmação deve conter a substância do
negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo”. Registre ainda que essa ratificação deve ter a
mesma forma prescrita para o negócio primitivo. Assim, a ratificação de uma venda de imóvel, por
exemplo, deve ser feita por escritura pública.
A ratificação tácita, por sua vez, consiste na execução completa ou parcial da obrigação, não
obstante a ciência do vício que o inquinava. Exige-se, portanto, dois requisitos:
a) cumprimento total ou parcial, da obrigação;
b) conhecimento do vício que maculava o negócio. Assim, a compra de um bem efetuado por
relativamente incapaz sem assistência, por exemplo, é passível de ratificação tácita, se o
representante legal efetuar o pagamento da primeira prestação. Igualmente, se contribuir para a
realização de benfeitorias no bem. Vê-se, portanto, que a ratificação pode ser unilateral.

A ratificação, expressa ou tácita, importa em renúncia aos meios de invalidar o negócio,


extingue todas as ações e exceções referentes a esse fato (art.175 do CC). A anulabilidade deste
não pode mais ser pleiteada, em ação ou defesa. Após a ratificação, a eventual propositura da ação
anulatória será extinta sem resolução do mérito, por falta de interesse de agir. A ratificação purifica
o ato desde a sua formação, tendo, pois, efeito retroativo. O Código de 1916 dizia expressamente:
“A ratificação retroage à data do ato” (art. 148). O Código atual é omisso, mas como o negócio
anulável produz efeitos até que haja sentença em sentido contrário, força convir que, diante da
ratificação, a purificação opera-se desde a formação do negócio, como se este tivesse nascido
perfeito.
Finalmente, a nulidade relativa é ainda provisória, porque está sujeita à decadência,
convalidando-se pelo decurso do tempo. No caso de anulabilidade por erro, dolo, coação, lesão,
estado de perigo, fraude contra credores e incapacidade relativa de uma ou ambas as partes, o
prazo decadencial para a anulação do negócio jurídico é de quatro anos, a contar do dia em que se
realizou o negócio jurídico, no caso de coação, conta-se do dia em ela cessar; e no caso de atos de
incapazes, do dia em que cessar a incapacidade. Quando a lei dispuser que determinado ato é
anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da
data da conclusão do ato (art.179 do CC). Assim, no silêncio da lei, é de dois anos o prazo para a
ação anulatória. Tratando-se de ação anulatória movida por terceiro, o prazo deve ser contado do
dia em que o terceiro tomou conhecimento do negócio, presumindo-se essa ciência se o ato estiver
registrado no Registro Público, por força do princípio da publicidade dos registros. No Código de
1916, discutia-se na nulidade relativa se o prazo era prescricional ou decadencial. O Código atual
acertadamente fez menção à decadência, dirimindo essa antiga controvérsia.

55
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

EFEITOS DA DECRETAÇÃO DA NULIDADE

Decretada a nulidade, seja ela absoluta ou relativa, o negócio é desfeito, como se nunca
tivesse existido, reconduzindo-se as partes ao estado anterior à sua celebração. Assim, anulando o
testamento, por exemplo, o herdeiro deve restituir os bens herdados. Anulada a compra e venda, o
vendedor restitui o preço e o comprador a coisa.

PRINCÍPIO DA INCOMUNICABILIDADE DAS NULIDADES

A nulidade pode ser total e parcial. A primeira afeta o negócio jurídico inteiramente; a
segunda destrói apenas uma ou algumas cláusulas.
Em regra, vigora o princípio da incomunicabilidade das nulidades, segundo o qual a nulidade
parcial de um negócio não o prejudica na parte válida se esta for da outra separável (art.184 do CC).
Assim, anulado o testamento pelo fato de ter invadido a legítima dos herdeiros necessários,
subsiste a validade na parte de reconhecimento de filho. Outro exemplo: anulada a cláusula do
divórcio, que versa sobre a herança de pessoa viva, o restante do acordo permanece válido.
O princípio da incomunicabilidade das nulidades comporta duas exceções.
A primeira é quando não for possível a separação da parte não atingida pela nulidade.
Anulada uma das cláusulas de transação, por exemplo, toda a transação será nula, por força do
princípio da indivisibilidade da transação. A segunda é a invalidade da obrigação principal, que
implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal. Assim,
anulada a compra e venda, anulam-se também as obrigações acessórias, como a hipoteca, o
penhor, a cláusula penal, etc. Todavia, a nulidade da obrigação acessória não atinge a obrigação
principal, exceto na hipótese de condição ilícita, em que a nulidade da condição atinge a obrigação
principal (art. 123, II, do CC).
Finalmente, a invalidade do instrumento, isto é, da forma escrita, não contamina o negócio
jurídico, sempre que este puder provar-se por outro meio (art.183 do CC). Assim, nos negócios
solenes, a nulidade do instrumento invalida também o negócio jurídico, mas nos negócios de forma
livre, que foram celebrados por escrito, a nulidade do instrumento não anula o negócio jurídico,
pois este poderá provar-se por outros meios.

OBRIGAÇÕES CONTRAÍDAS POR MENORES

Dispõe o art. 180 do CC que: “O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para
eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela
outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior”.
Vê-se, portanto, que o menor, ao agir com dolo quanto à sua idade, ocultando-a ao ser
interrogado pela outra parte, ou, então, declarando-se espontaneamente maior, fica inibido de
mover a ação anulatória do negócio jurídico, equiparando-se, destarte, ao maior, apesar de o ato
ter sido celebrado sem a assistência de seu representante legal.
De acordo com Sílvio Rodrigues, a regra do art. 180 do CC, para ser aplicada, não basta que o
menor tenha agido com dolo, urge ainda o erro escusável da outra parte. Tratando-se, por
exemplo, de menor com aparência infantil, a outra parte deve desconfiar. Nesse caso, o erro é
inescusável, fruto da negligência, viabilizando-se a anulação do negócio.
Finalmente, o aludido dispositivo legal é inaplicável ao menor de dezesseis anos, cujo negócio
praticado sem a representação de seu representante legal reveste-se de nulidade absoluta.

56
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

CONDIÇÃO

CONCEITO

Dispõe o art. 121 do CC: “Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da
vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto”.

A condição se decompõe em dois elementos:

a) futuridade do evento;
b) incerteza do evento.

Evento futuro é o que ainda não aconteceu. Se já aconteceu, não é condição, mas um ato
puro e simples, ainda que a parte ignore a sua ocorrência, que, porém, só surtirá efeito se o fato
realmente se verificou. Alguns autores a denominam de condição imprópria. Vejamos o exemplo de
Spencer Vampré: prometo certa quantia se premiado for meu bilhete da loteria que correu ontem.
Se o bilhete havia sido premiado, a promessa de doação é válida, como sendo pura e simples; se, ao
revés, não havia sido premiado, a promessa é nula e ineficaz, tendo em vista a absoluta
impropriedade do objeto.
Evento incerto, por sua vez, é o que pode ou não ocorrer. Urge que a incerteza seja objetiva,
real, e não meramente subjetiva, oriunda da ignorância do agente. Tratando-se de fato futuro e
certo, como a morte, haverá termo, e não condição.

CONDIÇÕES IMPOSSÍVEIS

São as irrealizáveis segundo as leis da natureza ou o ordenamento jurídico. Subdividem-se


em:

a) fisicamente impossíveis;
b) juridicamente impossíveis.

CONDIÇÕES FISICAMENTE IMPOSSÍVEIS

São as que contrariam as leis da natureza. Por exemplo: dar-te-ei cem mil reais, se
conseguires ressuscitar um morto. Essas condições, quando suspensivas, isto é, impeditivas da
aquisição do direito, como no exemplo ministrado, invalidam os negócios jurídicos que lhe são
subordinados, por força do art. 123, I, do Código Civil. Se, porém, constar como condição resolutiva,
serão tidas como inexistentes, vale dizer, não escritas. Tal ocorre, por exemplo, quando o doador
prevê a extinção da liberalidade, quando um morto ressuscitar. Nesse caso, a doação reputa-se
pura e simples, considerando-se não escrita essa condição resolutiva, isto é, extintiva da obrigação.
De fato, dispõe o art. 124 do CC: “Tem-se por inexistentes as condições impossíveis, quando
resolutivas, e as de não fazer coisa impossível”. Como exemplo de condição de não fazer coisa
impossível, podemos citar a doação sob a condição de o donatário não morrer ou de não piscar
mais os olhos. Nesses casos, a condição reputa-se não escrita, mas o negócio permanece válido.
Assim, as condições fisicamente impossíveis, para invalidarem o negócio, devem revestir-se
de dois requisitos:

57
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

a) serem suspensivas, isto é, inseridas para impedir a aquisição do direito;


b) positivas, vale dizer, implicar na prática de uma ação positiva, como dar a volta ao mundo a
pé em dois dias.

Em contrapartida, o negócio jurídico será válido, anulando-se apenas a condição, quando esta
for:

a) resolutiva, ainda que positiva. Exemplo: te dôo essa casa, desde já, mas se alguém
conseguir dar a volta ao mundo a pé em dois dias, a doação será extinta.
b) negativa, isto é, de não fazer coisa impossível. Nesse caso, o negócio será válido ainda que
a condição seja suspensiva. Exemplo: dar-te-ei tal objeto, se abstiveres de viajar numa máquina do
tempo.Tem-se por inexistente essa condição de não fazer, mas o negócio é válido como puro e
simples.

CONDIÇÕES JURIDICAMENTE IMPOSSÍVEIS

São as que contrariam o ordenamento jurídico, isto é, a lei, a ordem pública e os bons
costumes, e, por isso, jamais podem realizar-se. Exemplo: dar-te-ei cem mil reais se o Congresso
Nacional suprimir da Constituição Federal a inviolabilidade do direito à vida.
A condição juridicamente impossível, quando suspensiva, como no exemplo ministrado,
invalida o negócio jurídico que lhe é subordinado (art.123, I). Se, porém, for resolutiva, o negócio
jurídico é válido, como se não houvesse a condição, que será tida como inexistente (art. 124).
Tal ocorre, por exemplo, quando o doador diz: essa doação será extinta quando o Congresso
nacional suprimir da Constituição Federal a inviolabilidade do direito à vida.
No sistema do Código de 1916, as condições juridicamente impossíveis sempre anulavam o
negócio jurídico, fossem elas suspensivas ou resolutivas. No Código atual, apenas as condições
suspensivas têm o condão de anular o negócio jurídico.

CONDIÇÕES CASUAIS, POTESTATIVAS, MISTAS E PROMÍSCUAS

Essa divisão leva em conta a participação da vontade do sujeito.


A condição casual é a que depende de um acontecimento fortuito, isto é, do acaso, sobre o
qual a vontade não exerce qualquer controle. Exemplo: dar-te-ei mil reais se chover amanhã.
Orlando Gomes e Sílvio Rodrigues também consideram casual a condição cuja ocorrência
depende exclusivamente da vontade de um terceiro. Exemplo: dar-te-ei mil reais se Pedro viajar
para o Japão.
A condição potestativa, por outro lado, é a subordinada à vontade de uma das partes. Pode
ser:

a) condição puramente potestativa: é a que se sujeita ao puro arbítrio de uma das partes, vale
dizer, a sua ocorrência depende exclusivamente da vontade da pessoa, independentemente de
qualquer fator externo. Exemplo: dar-te-ei cem mil reais o dia em que eu vestir meu terno azul ou o
dia em que eu disser que te odeio. Dispõe o art.122, 2ª parte, que são defesas, isto é, ilícitas, essas
condições puramente potestativas, invalidando todo o negócio jurídico, por força do inciso II do art.
123 do CC.

58
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

b) condição meramente ou simplesmente potestativa: é a que se sujeita ao arbítrio de uma


das partes e de fatores externos, que escapam ao seu controle. Portanto, não se submete ao
arbítrio exclusivo da parte. Não basta que esta queira praticar o fato, pois é mister ainda a
existência de certas circunstâncias que viabilizam a concretização do evento. Exemplos: dar-te-ei
cem mil reais no dia em que eu puder viajar para o Japão. Anote-se que essa viagem para o Japão
depende de tempo e dinheiro, não estando, pois, ao arbítrio exclusivo da pessoa. Essas condições
meramente potestativas são lícitas, de modo que o negócio jurídico é válido.

A condição mista é a que depende da vontade de uma das partes e de um fato casual ou da
vontade de uma das partes juntamente com a vontade de uma terceira pessoa. Exemplo: dar-te-ei
mil reais se caminhares na chuva que cairá amanhã. Outro exemplo: dar-te-ei cem mil reais se
casares com Maria. As condições casuais e mistas também são válidas.
Finalmente, a condição promíscua é a inicialmente puramente potestativa, que acaba se
tornando dificultosa, em virtude de circunstâncias supervenientes e independentes da vontade do
sujeito. Exemplo: dar-te-ei mil reais se ergueres o braço, sendo certo que, no dia seguinte, tu sofre
um acidente, paralisando-te o braço.

DISTINÇÃO ENTRE CONDIÇÕES ILÍCITAS E CONDIÇÕES JURIDICAMENTE IMPOSSÍVEIS

As condições ilícitas são todas que contrariam a lei, a ordem pública e os bons costumes, mas
que, no entanto são passíveis de realização. Tal ocorre, por exemplo, com a condição de se
prostituir ou de matar alguém.
As condições juridicamente impossíveis, além de contrariarem a lei, a ordem pública e os
bons costumes, são insuscetíveis de realização. Tal ocorre, por exemplo, com a condição imposta ao
pai de emancipar voluntariamente o filho antes dos 16 anos de idade.
Enquanto a condição ilícita sempre invalida o negócio jurídico, seja ela suspensiva ou
resolutiva, por força do inciso II do art. 123 do CC, que não faz distinção, a condição juridicamente
impossível, ao inverso, só invalida o negócio jurídico subordinado a condição suspensiva,
preservando-se, destarte, a validade dos negócios sob condição resolutiva, como sendo puro e
simples, reputando-se inexistente a condição, por força do art. 124 do CC.
As condições ilícitas sempre contaminam o negócio jurídico, invalidando-o, sejam elas
positivas ou negativas; as condições juridicamente impossíveis só viciam o negócio quando forem
positivas, se forem negativas reputam-se inexistentes, preservando-se a validade do negócio, por
força da última parte do art. 124 do CC.

CONDIÇÕES SUSPENSIVAS

Condição suspensiva é a que impede a eficácia do negócio jurídico até a realização do evento
futuro e incerto. O negócio só adquire eficácia após o implemento da condição. Exemplo: dar-te-ei
minha casa se o Brasil vencer a Copa do Mundo de futebol.
A condição suspensiva deve ser analisada sob três estados diferentes:

a) o estado de pendência: é o que perdura enquanto não se verifica o evento futuro e incerto.
Dispõe o art. 125 do CC que: “Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva,
enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa”. Portanto, nesse
estado, não há direito adquirido, de modo que não se pode mover ação judicial para exigir a

59
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

prestação, pois esta ainda não é devida; a prescrição não está fluindo; e se o devedor pagar, por
erro, supondo ter ocorrido a condição, terá direito a reaver o que pagou, movendo a ação de
repetição de indébito. Todavia, o titular do direito condicional pode praticar atos destinados a
conservá-lo, por força do art. 130 do CC, como pedir a abertura de inventário e mover as ações
cautelares necessárias.
b) estado de implemento da condição: é o que gera a aquisição do direito, que, de condicional
passa a ser adquirido.
c) estado de frustração: quando não se verifica a condição. Nesse caso, é como se nunca
houvesse existido a estipulação. Sobre o assunto, dispõe o art. 129 do CC: “Reputa-se verificada,
quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a
quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente
levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento”. Referido dispositivo também
aplicável à condição resolutiva.
Assim, com a frustração da condição, não se adquire o direito, salvo se a parte a quem ela
desfavorecer dolosamente impedir a sua ocorrência. A expressão maliciosamente, para uns,
abrange apenas o dolo, para outros compreende também a culpa grave.

CONDIÇÕES RESOLUTIVAS

Condição resolutiva é o fato futuro e incerto que, uma vez ocorrido, provoca a extinção do
direito. Exemplo: “A” doa uma casa para “B”, estatuindo que a doação será extinta na hipótese de
certo candidato vencer uma determinada eleição. Com efeito, dispõe a 1ª parte do art. 128 do CC:
“Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos, o direito a que ela se opõe”.
Assim, na condição resolutiva, o negócio aperfeiçoa-se desde logo, mas sua eficácia fica
ameaçada pelo acontecimento futuro e incerto.
A condição resolutiva pode também ser considerada sob três aspectos:

a) estado de pendência: a parte desfruta do direito adquirido, mas ameaçado de extinção.


b) estado de implemento da condição: o negócio é desfeito automaticamente, extinguindo-se
o direito anteriormente adquirido. A parte que aguarda o implemento da condição para adquirir o
direito é titular de direito eventual e, nos termos do art.130 do CC, pode mover ações destinadas à
conservação do direito.
c) estado de frustração: o direito continua sendo adquirido, sendo certo que, diante da
inocorrência da condição, cessa a ameaça de sua extinção.

O titular de um direito sob condição resolutiva pode transferi-lo, por ato “inter vivos” ou
“causa mortis”, todavia, a condição remanesce intacta, pois essa alienação não tem o condão de
transformar o negócio em puro e simples. Desde que a condição conste no Registro de Imóveis, a
extinção do negócio retroagirá inclusive para apagar os direitos reais constituídos em favor de
terceiros, pois o registro inibe a aquisição de boa-fé.

TERMO

CONCEITO

Termo é o acontecimento futuro e certo em que começa ou termina a eficácia do negócio


jurídico.

60
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

CLASSIFICAÇÃO

O termo pode ser:

a. termo inicial (dies a quo) ou suspensivo: é o que suspende o exercício do direito, pois fixa o
dia em que o negócio começará a produzir efeitos.Exemplo: a doação terá início a partir de 1º de
janeiro de 2030. Dispõe o art. 131 do CC que: “O termo inicial suspende o exercício, mas não a
aquisição do direito”. Portanto, o direito sob termo é considerado direito adquirido. Distingue-se da
condição suspensiva, pois esta impede a aquisição do direito. Ademais, no termo, o evento é futuro
e certo; na condição, é futuro e incerto. O devedor que paga uma dívida antes do termo, não pode
reaver o que pagou; se, ao revés, efetuar o pagamento antes da condição, torna-se viável a
repetição do pagamento. Se a coisa perecer por caso fortuito ou força maior antes do advento do
termo, não há direito à indenização, pois os riscos da coisa são suportados pelo credor.
b. termo final (ad quem ou ad diem) ou resolutivo: é o que extingue o direito. Exemplo: a
locação se extinguirá em 02 de fevereiro de 2030. Assemelha-se à condição resolutiva, pois em
ambos o direito é extinto. O termo, porém, é um acontecimento futuro e certo, ao inverso da
condição, que é futuro e incerto. Ademais, a extinção em razão do advento do termo produz efeitos
“ex nunc”, sem que haja retroatividade; na condição resolutiva, ao revés, os efeitos são “ex tunc”,
retroativos, salvo quando se tratar de negócio de execução continuada ou periódica.

O termo ainda pode ser:

a. termo certo: é o que se reporta a um fato certo e com data certa. Exemplos: 07 de abril de
2020; início da primavera; quando tal pessoa atingir a maioridade.
b. termo incerto: é o que se refere a um fato certo, mas cuja data de ocorrência não se pode
precisar. O fato é certo, mas a data é incerta. Exemplo: dar-te-ei esta casa no dia em que Pedro
morrer. A morte é um fato inexorável, uma certeza matemática, razão pela qual, no exemplo acima,
estamos diante de um termo, e não de uma condição. Se, ao revés, o doador te dissesse: dar-te-ei
esta casa se Paulo morrer antes de Pedro, há condição e não termo, porque o evento é incerto.

ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS QUE NÃO ADMITEM TERMO E CONDIÇÃO

Os atos ou negócios que não admitem termo nem condição, dentre outros, são os seguintes:

a) os relativos ao estado das pessoas, como a emancipação;


b) os relativos ao direito de família, como o casamento;
c) aceitação e renúncia da herança.

No tocante à instituição de legatário, admite termo e condição. Tratando-se, porém, de


instituição de herdeiro testamentário, a lei só admite a condição, vedando o termo.
Saliente-se, contudo que, reputa-se não escrito o termo, nos casos em que não for admitido,
mantendo-se, porém, a validade do negócio, ao passo que a condição, quando não admitida,
provoca a nulidade do negócio a que se subordina.
ENCARGO OU MODO

CONCEITO

61
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Encargo (auflagen) ou modo é a cláusula imposta nos negócios gratuitos, restringindo a


vantagem do beneficiado. Por exemplo: doo o terreno a certa pessoa para nele ser construído um
asilo. Outro exemplo: testamento beneficiando uma pessoa, mas impondo-lhe a obrigação de
prestar alimentos a um terceiro.

DISTINÇÃO ENTRE ENCARGO E CONDIÇÃO SUSPENSIVA

A condição suspensiva impede a aquisição e exercício do direito, ao passo que o encargo não
suspende a aquisição nem o exercício do direito, salvo quando expressamente constar no ato como
condição suspensiva.
O encargo é coercitivo, pois a pessoa pode ser constrangida a cumprir a obrigação, salvo se o
encargo for personalíssimo, a condição, ao inverso, não coage, porque ninguém pode ser obrigado
a submeter-se a uma condição. Com efeito, se não for cumprido o encargo, o interessado pode
mover ação judicial visando o adimplemento da obrigação; na condição não lhe assiste essa
faculdade.
No encargo, antes mesmo que a obrigação seja cumprida, a pessoa já adquire o direito,
porque não suspende a aquisição nem o exercício do direito.
Denota-se, portanto, que o encargo é menos restritivo que a condição. Na dúvida, o negócio
deve ser tratado como encargo e não condição.
Nada obsta, porém, que o estipulante discipline expressamente o encargo como condição,
conforme preceitua o art. 136 do CC. Washington de Barros Monteiro afirma que a conjunção “se”
serve para indicar que se trata de uma condição, enquanto o emprego das locuções “para que”, “a
fim de que”, com a obrigação de, denota a presença de encargo. Haverá condição no seguinte
exemplo: dou-te tal terreno se nele construíres um asilo. Em contrapartida, haverá encargo quando
disseres: dou-te tal terreno para o fim de construíres um asilo.
Na condição, a aquisição e o exercício do direito só ocorrerão após a construção do asilo; no
encargo, adquire-se desde logo o terreno. Se descumprida a condição, não será possível exigir o
adimplemento da obrigação, isto é, a construção do asilo; no encargo, admite-se a ação judicial
visando o seu cumprimento. Se o descumprimento do encargo emanar de caso fortuito ou força
maior, o donatário estará liberado, mantendo-se, porém, a doação, como sendo pura e simples,
pois a doação, ainda que sujeita a encargo, não perde o caráter predominante de liberalidade. No
encargo imposto como condição suspensiva, não executado aquele, ainda que por caso fortuito ou
força maior, o donatário deixará de adquirir o direito.

LESÃO

CONCEITO E ESPÉCIES

A lesão pode ser: enorme, especial e usurária.


A lesão enorme, para caracterizar-se, basta a desproporção entre as prestações. É, pois, o
lucro exorbitante obtido por uma das partes contratantes. No Código de Defesa do Consumidor, a
lesão poder ser conceituada dessa forma, como sendo a vantagem manifestamente excessiva
obtida pelo fornecedor, conforme preceitua o art. 39, inciso V, da Lei 8.078/90. O valor excessivo
deve ser apurado pelo juiz, no caso concreto.
A lesão especial, por sua vez, exige, além do lucro excessivo, a situação de necessidade ou
inexperiência da parte prejudicada. O Código Civil, no art. 157, adotou essa lesão, salientando que:

62
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

“Ocorre a lesão quando uma pessoa sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a
prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta”. Como se vê, não basta o
lucro desproporcional, é ainda mister a situação de necessidade ou inexperiência da parte lesada.
Na lesão especial, consagrada pelo Código Civil, não se exige o dolo de aproveitamento, que é
a má-fé da parte beneficiada, o intuito de obter vantagem excessiva da situação de necessidade da
outra parte.
Finalmente, a lesão usurária ou usura real, além do lucro excessivo e da situação de
necessidade ou inexperiência da parte lesada, para se caracterizar, exige ainda o dolo de
aproveitamento, consistente na má-fé da parte beneficiada, que celebra o negócio jurídico ciente
da necessidade ou inexperiência do outro contratante. Essa lesão é prevista no art. 4º da Lei
1.521/51, encontrando-se tipificada como crime contra a economia popular, caso o lucro
patrimonial exceda a um quinto do valor da prestação, isto é, 20% (vinte por cento). Nesse caso, de
acordo com Silvio Rodrigues, a nulidade é absoluta, por ilicitude do seu objeto. O § 3º do mesmo
artigo manda o juiz ajustar os lucros usurários à medida legal, devendo ordenar a restituição da
quantia paga em excesso, com os juros legais, de modo que a situação não é de nulidade absoluta,
mas relativa, pois o ato é preservado na parte válida.

REQUISITOS DA LESÃO ESPECIAL OU LESÃO-VÍCIO

Vimos que o Código Civil adotou a lesão especial, cujo reconhecimento depende de dois
requisitos:

a) desproporção manifesta das prestações. Aprecia-se a desproporção das prestações


segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico (§1º do art.157). O
montante dessa desproporção não é prefixado pela lei, competindo ao magistrado analisá-lo no
caso concreto; urge, porém, que seja considerável, acentuada. Essa desproporção deve existir ao
tempo da celebração do negócio; tratando-se de desproporção superveniente não há falar-se em
lesão e sim em onerosidade excessiva, aplicando-se a teoria da imprevisão, quando se tratar de
contrato de execução diferida ou de trato de sucessivo, cujo efeito é a revisão ou resolução do
contrato.
b) situação de necessidade ou inexperiência da parte lesada

A necessidade é a indispensabilidade do contrato. É, pois, a impossibilidade de evitar o


contrato. Trata-se da necessidade econômica de contratar. Essa necessidade nem sempre se
caracteriza pela miséria, pois pessoas abonadas também podem necessitar de um certo contrato. A
lesão por necessidade assemelha-se à coação. Exemplo: inquilino, para evitar o despejo, concorda
com a renovação abusiva da locação.
A inexperiência, por sua vez, não é incultura do lesado, mas a inexperiência contratual, que
até o culto pode incidir. Essa lesão por inexperiência assemelha-se ao dolo. Exemplo dessa lesão é o
contrato para aquisição da casa própria em que a pessoa simplória aceita pagar valor
desproporcional, com número excessivo de prestações.

EFEITOS DA LESÃO

Presentes esse requisitos acima, a parte lesada pode pleitear a anulação do negócio jurídico.
Faculta-se, contudo, à parte favorecida oferecer suplemento suficiente para o reequilíbrio das
prestações, ou concordando com a redução do proveito, abatendo o preço, evitando-se, destarte, a

63
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

anulação do negócio. Se, por exemplo, pagou-se quarenta mil reais em um apartamento que valia
setenta mil reais, ao ser citado para a ação anulatória poderá efetuar o complemento do preço,
depositando a diferença de trinta mil reais. Esse pedido de preservação do negócio jurídico, porém,
deve ser feito em reconvenção.
Nada obsta que a parte lesada formule pedido subsidiário: revisão judicial e a anulação do
negócio jurídico, devendo este último pedido ser acolhido apenas na hipótese de a parte favorecida
não concordar com a redução do proveito.

SIMULAÇÃO

CONCEITO

Simulação é o acordo entre as partes, para dar existência real a um negócio jurídico fictício,
ou, então, para ocultar o negócio jurídico realmente realizado.
Trata-se de uma declaração enganosa da vontade, que oferece ao negócio jurídico uma
aparência diversa da desejada pelas partes. Estas, de comum acordo, fingem praticarem o negócio
simulado. A simulação não é vício de consentimento, porque o desacordo entre a vontade interna e
a declarada é intencional. É um vício social, pois a vontade é conscientemente declarada,
enganando terceiros ou violando a lei.

REQUISITOS

A simulação apresenta os seguintes requisitos:

a. Acordo entre as partes, ou com a pessoa a quem ela se destina. Assim, na simulação existe
um conluio entre as partes. Todavia, os atos unilaterais também a admitem, desde que se verifique
esse conluio entre declarante com outra pessoa. Exemplo: homem casado promete recompensa a
quem devolver certo objeto que ele diz ter perdido, mas na verdade havia deixado com a sua
concubina, combinando com esta a devolução para entregar-lhe a recompensa. Denota-se que essa
promessa de recompensa não passa de um negócio simulado para encobrir o negócio verdadeiro,
qual seja, a doação. O testamento é outro exemplo de ato unilateral passível de simulação.
b. Declaração enganosa da vontade. Há, pois, desconformidade consciente entre a vontade
declarada e a vontade interna. As partes, como observa Silvio Rodrigues, não querem o negócio
declarado, mas tão-somente fazê-lo aparecer como querido. O conteúdo do ato é falso, isto é,
narra uma mentira, caracterizando-se, inclusive, o crime de falsidade ideológica, previsto no art.
299 do CP. Saliente-se, assim, que, na simulação, há uma falsidade ideológica ou intelectual,
recaindo apenas sobre o conteúdo do negócio jurídico. Este, sob o aspecto formal, apresenta-se
perfeito. Diferentemente ocorre com a falsidade material, que incide sobre o conteúdo e também
sobre os aspectos formais, consistindo, pois, numa contrafação física, isto é, numa alteração do
documento verdadeiro, através da inserção de novos dizeres.

ESPÉCIES

A simulação pode ser:

a) absoluta;
b) relativa;

64
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

c) objetiva;
d) subjetiva;
e) maliciosa;
f) inocente.

SIMULAÇÃO ABSOLUTA E RELATIVA

Na simulação absoluta, as partes não objetivam a celebração de qualquer negócio jurídico.


Este é aparentemente celebrado para enganar terceiros ou violar a lei. Exemplo: devedor simula
venda de bens a um amigo para subtraí-los da execução dos credores. Outro exemplo: o marido
simula a confissão de dívidas com um parente para prejudicar a sua esposa no divórcio amigável.
Na simulação relativa ou dissimulação, por sua vez, o negócio jurídico aparente visa esconder
o negócio verdadeiro. Diz-se relativa, porque existe um ato simulado e um ato dissimulado.
Exemplo: homem casado faz doação de imóvel à sua concubina, mas providencia a lavratura de
uma escritura de compra e venda.

SIMULAÇÃO OBJETIVA E SUBJETIVA

Simulação subjetiva é aquela em que o negócio jurídico transmite direitos a certa pessoa,
para que esta os repasse a outra. Nessa simulação, o negócio jurídico beneficia aparentemente o
testa-de-ferro ou prestanome ou homem de palha, mas o verdadeiro beneficiado é outra pessoa.
Exemplo: homem casado simula doar imóvel para um amigo, para que este o repasse
gratuitamente à sua concubina. Outro exemplo: o pai, desejando vender um bem para seu filho,
diante da oposição dos demais filhos, finge doar para um amigo, em seguida, realiza a venda
desejada. Se o simulador, que adquiriu aparentemente o bem ou direito, celebrar algum contrato
com terceiro de boa-fé, os direitos deste serão respeitados. Com efeito, dispõe o § 2º do art. 167
que: “Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico
simulado”.
A simulação subjetiva só se caracteriza quando o testa-de-ferro transmite o bem à pessoa a
quem o negócio visa beneficiar. Enquanto isso não se realiza, não se pode falar em nulidade.
Por outro lado, diz-se objetiva a simulação quando o negócio jurídico contém declaração não
verdadeira. Assim, simulação objetiva é a que diz respeito à natureza do negócio, ao objeto ou a um
dos elementos contratuais. Exemplo: escritura pública de compra e venda com preço inferior ao
real; quando os instrumentos particulares forem ante-datados, ou pós-datados; quando o negócio
jurídico contiver declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira.

SIMULAÇÃO INOCENTE E MALICIOSA

Simulação inocente é a que não objetiva violar a lei ou prejudicar terceiro. Tal ocorre, por
exemplo, na doação mascarada de compra e venda feita por homem solteiro à sua concubina. O
Código de 1916 continha dispositivo expresso, reputando valido o negócio jurídico. O Código de
2002 é omisso. Todavia, como adverte Fábio Ulhoa Coelho:
“Se a simulação não prejudica terceiro, não existe como tal e deve ser considerado válido o
negócio praticado em descompasso com a verdadeira intenção das partes. Assim, se uma pessoa
precisa viajar mas deve assinar documento particular com data futura, por razões de conveniência
das partes, não havendo nenhum prejuízo a terceiro, não se configura a simulação”. O certo,
porém, é que o Código Civil fulmina a simulação com nulidade absoluta, sem abrir exceção para a

65
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

simulação inocente que, por isso mesmo, também é causa de nulidade absoluta. A propósito,
dispõe o enunciado 152 do CJF: “Toda simulação, inclusive a inocente, é invalidante”.
Simulação fraudulenta ou maliciosa, por sua vez, é a que objetiva fraudar a lei ou prejudicar
terceiros. Nesse caso, o ato será nulo. Há a intenção de enganar terceiros ou violar a lei. Enquanto
no dolo, uma das partes é enganada, na simulação as partes têm ciência da burla, concretizada para
enganar terceiro. Assim, não é possível a coexistência, no mesmo negócio, de dolo e de simulação.

EFEITOS

A simulação, seja ela absoluta, relativa, objetiva ou subjetiva, maliciosa ou inocente, provoca
a nulidade absoluta do negócio jurídico.
Portanto, esse vício deve ser decretado de ofício pelo magistrado.
No Código de 1916, os simuladores não podiam arguirem o vício em juízo, um contra o outro,
ou contra terceiro. No Código atual, não existe essa restrição, pois a nulidade é absoluta, podendo
ser suscitada pelas partes ou qualquer interessado, devendo ainda o juiz pronunciar-se de ofício.
A ação de nulidade do negócio jurídico é imprescritível. De fato, o negócio jurídico nulo não é
suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo (art. 169). Abre-se exceção ao
testamento simulado, que é nulo, mas se convalida se a ação de nulidade não for proposta em 5
(cinco) anos, a contar do seu registro (art. 1.859 do CC).
Por outro lado, subsistirá o que se dissimulou se válido for o negócio na substância e na
forma.
Tal ocorre, por exemplo, na simulação relativa, desfeito o negócio aparente cumpre examinar
a validade do negócio verdadeiro, que poderá manter-se intacto caso sua prática seja permitida
pelo direito (validade substancial) e seja observado o modelo legal (validade formal). Sobre o
assunto, o enunciado 153 do CJF reza: “Na simulação relativa, o negócio jurídico simulado
(aparente) é nulo, mas o dissimulado será válido se não ofender a lei nem causar prejuízos a
terceiros”. O enunciado 293 do CJF complementa que: “Na simulação relativa, o aproveitamento do
negócio jurídico dissimulado não decorre tão somente do afastamento do negócio jurídico
simulado, mas do necessário preenchimento de todos os requisitos substanciais e formais da
validade daquele”.
Por outro lado, na simulação inocente, o negócio jurídico dissimulado é válido, pois não há a
intenção de prejudicar terceiros, ou de violar disposição de lei. Também é possível a simulação
absoluta inocente, como, por exemplo, a confissão de dívidas entre “A” e “B” para evitar suicídio
alheio.
Na simulação relativa inocente, o primeiro negócio é nulo, mas o segundo será válido, se
preencher os requisitos substanciais e formais.
Em contrapartida, na simulação absoluta inocente, a nulidade atinge o negócio jurídico, não
subsistindo nenhum outro sucedâneo, porquanto a vontade das partes não se dirige à realização de
qualquer negócio.

RESERVA MENTAL

CONCEITO

Reserva mental é a declaração de vontade com a intenção de não cumpri-la, visando enganar
o declaratário ou terceiro. Tal ocorre, por exemplo, quando o vendedor aliena o objeto, mas não
tem a intenção de entregá-lo.

66
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Pode-se dizer que reserva mental é o inadimplemento premeditado; é o não querer o que
manifestou.

EFEITOS DA RESERVA MENTAL

Em regra, a reserva mental é irrelevante, subsistindo a validade do negócio jurídico, que


deverá ser cumprido tal qual a vontade exteriorizada pelo reservante, pouco importando que este
tenha guardado em mente o secreto propósito de não cumprir o prometido.
Todavia, a reserva mental, desde que conhecida da outra parte gera a inexistência do negócio
jurídico, em face da ausência de vontade, conforme salienta Moreira Alves.
Com efeito, dispõe o art. 110 do CC que: “A manifestação de vontade subsiste ainda que o
seu autor haja feito reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário
tinha conhecimento”.

FRAUDE CONTRA CREDORES

GENERALIDADES

Dispõe o art. 789 do CPC/2015 que: “O devedor responde com todos os seus bens presentes e
futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei”.
Em regra, portanto, o patrimônio do devedor responde por suas dívidas, ressalvando-se alguns
bens, como, por exemplo, o bem de família. No direito moderno, não há prisão civil por dívida, a não ser
nos casos de devedor de alimentos e depositário infiel (art. 5.º, LXVII, da CF). Toda via, a súmula
vinculante nº 25 do STF preceitua: “é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a
modalidade do depósito”. Esta proibição já constava no pacto de São José da Costa Rica, ao qual o Brasil
aderiu em 1992.
O devedor insolvente, que é aquele cujo patrimônio passivo é superior ao ativo, encontra-se
proibido de alienar bens, justamente para não desfalcar a garantia de seus credores. Se, porém,
não obstante a proibição legal, ele praticar atos de disposição de seus bens, haverá fraude contra
credores ou fraude de execução.
Pode-se dizer, assim, que bens pertencentes a terceiros respondem pelas dívidas do devedor,
quando aqueles o houverem adquiridos mediante fraude contra credores ou fraude de execução.

CONCEITO E REQUISITOS

Fraude contra credores é o negócio jurídico realizado pelo devedor insolvente, ou que o
conduz à insolvência, suscetível de diminuir ainda mais o seu patrimônio.
O devedor solvente, que é aquele cujo patrimônio ativo é superior ao passivo, tem plena
liberdade para dispor de seus bens. Todavia, ao se tornar insolvente, sofre restrição ao seu direito
de propriedade, pois não lhe é mais lícito a realização de atos de alienação, seja onerosa ou
gratuita, a não ser mediante a anuência de todos os credores.
Urge, para a caracterização da fraude contra credores, a presença de três requisitos:
consilium fraudis, insolvência e eventus damni.
Nos negócios jurídicos onerosos faz-se necessária a presença de todos esses requisitos.
Entretanto, nos negócios jurídicos gratuitos, como a doação e o testamento, dispensa-se a
comprovação do consilium fraudis, pois a lei o presume de forma absoluta.

67
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

CONSILIUM FRAUDIS

O consilium fraudis se caracteriza pelo simples fato de o terceiro adquirente ter


conhecimento ou possibilidade de saber do estado de insolvência do alienante. Não se exige o
animus nocendi, isto é, o propósito de prejudicar os credores. Aliás, a denominação – fraude contra
credores – não corresponde à realidade do instituto, pois este prescinde da intenção de enganar ou
de prejudicar.
Convém frisar que, nos negócios jurídicos gratuitos, o consilium fraudis é presumido. Com
efeito, dispõe o art. 158 do CC que: “os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de
dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o
ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos”.
Desse modo, o consilium fraudis, isto é, a má-fé do adquirente, só é necessária quando se
tratar de negócios jurídicos onerosos, como, a compra e venda, a permuta, a dação em pagamento
etc. Ocorre essa presunção de má-fé quando a insolvência for notória ou presumida.
É notória quando sabida de todos. Fato notório é o que é de conhecimento geral. Exemplos:
protesto judicial contra alienação de bens; sentença declaratória de falência ou insolvência civil;
publicações pela imprensa etc.
É presumida, quando o adquirente tinha motivos para saber do estado de insolvência do
alienante. Exemplos: parentesco próximo, amizade íntima, quem já havia protestado anteriormente
títulos do alienante, preço injusto etc.
A rigor, se o erro sobre a insolvência for inescusável, fruto da negligência do adquirente, que
não tomou as cautelas de praxe, inerentes ao negócio jurídico realizado, configura-se a má-fé,
sendo, pois, de rigor o reconhecimento da fraude contra credores, cuja exclusão depende da boa-fé
do adquirente e do erro escusável acerca do precário estado financeiro do alienante. Verifica-se o
erro escusável quando o alienante emprega a diligência normal ao negócio jurídico, mas ainda
assim a insolvência se torna imperceptível aos olhos do homem médio.
Nesse caso, o contrato oneroso será válido, afastando-se a fraude contra credores.
O ônus da prova do consilium fraudis é do autor da ação (art. 373, I, do CPC/2015).
Por outro lado, se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço
e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de
todos os interessados (art. 160 do CC). O adquirente, como se vê, pode ajuizar ação de consignação
em pagamento, depositando o preço justo em juízo, citando-se o alienante e os demais credores.
Trata-se de uma medida que inibe a decretação da fraude contra credores, preservando-se,
destarte, a validade do negócio jurídico. Se, porém, o preço for inferior ao do mercado, o
adquirente, para conservar os bens, deverá depositar o preço que lhes corresponda ao valor real
(art. 160, parágrafo único, do CC). De acordo com Yussef Said Cahali, essa chance de o adquirente
do imóvel sanar o vício fraudulento do negócio jurídico é possível mesmo depois de julgada
procedente a ação pauliana, basta ele depositar em juízo o preço correspondente ao valor real do
bem.
Observe-se, ainda, que se presumem de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis
à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de
sua família (art. 164 do CC). Exemplos: reposição do estoque rotativo do estabelecimento
comercial; compras no supermercado para subsistência da família etc. Esses negócios, em princípio,
não podem ser considerados fraudulentos. A presunção de boa-fé, porém, é juris tantum,
admitindo prova em contrário.

68
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

INSOLVÊNCIA

Insolvência é a situação em que o patrimônio passivo é superior ao ativo.

EVENTUS DAMNI

O eventus damni consiste no prejuízo causado ao credor em razão de prática do negócio


jurídico fraudulento.

AÇÃO PAULIANA

Ação pauliana é a proposta para se obter o reconhecimento da fraude contra credores.


Só o credor quirografário, isto é, destituído de garantia real, pode intentá-la. Urge ainda que
reúna essa qualidade de credor quirografário ao tempo do negócio fraudulento. Aquele que se
torna credor somente após o negócio jurídico fraudulento é parte ilegítima para a propositura
dessa ação.
Quanto ao credor com garantia real, não pode ajuizar a ação pauliana. Falta-lhe interesse de
agir, devendo o processo ser extinto sem resolução do mérito, por carência de ação. Com efeito, na
garantia real, um bem móvel (penhor) ou imóvel (hipoteca) fica vinculado ao pagamento do débito.
Sobre esse bem, o credor desfruta do direito de sequela, podendo requerer a sua penhora, ainda
que o devedor já o tenha alienado a terceiros, razão pela qual não há interesse para se obter o
reconhecimento da fraude dos negócios realizados pelo insolvente. Se, porém, a garantia real
tornar-se insuficiente, assistir-lhe-á o direito de mover a ação pauliana, conforme preceitua o § 1.º
do art. 158 do CC.
No concernente à legitimidade passiva, cumpre registrar que, na ação pauliana, há um
litisconsórcio necessário, pois a ação deve ser intentada contra o devedor insolvente e a pessoa que
com ele celebrou o negócio jurídico. Não se pode mover a ação apenas em face do devedor
insolvente, sob pena de nulidade do processo.
Se o adquirente do bem já o alienou a um subadquirente, este, ao lado dos outros dois,
também deve figurar como réu na ação, mas para que o autor obtenha êxito na ação esse
subadquirente deve ter procedido de má-fé (art. 161 do CC).
A ação pauliana é de natureza pessoal, dispensando a outorga do cônjuge. Deve ser ajuizada
em quatro anos, a contar do dia em que se realizou o negócio. Trata-se de prazo decadencial (art.
178, II, do CC).

DISTINÇÃO ENTRE FRAUDE CONTRA CREDORES E FRAUDE À EXECUÇÃO

Tanto a fraude contra credores quanto a fraude de execução têm por pressupostos: o
consilium fraudis, a insolvência e o eventus damni.
A linha divisória entre uma e outra fraude é o momento da alienação do bem.
Uma primeira corrente sustenta que a fraude à execução ocorre quando o insolvente aliena
bens após a citação em uma ação patrimonial onde figura como réu ou executado.
Uma segunda corrente preconiza que, para configuração da fraude à execução, basta que o
insolvente aliene bens após o ajuizamento dessa ação patrimonial.
Assim, para uns, a alienação antes da citação é fraude contra credores; após a citação, fraude
à execução. Outros, no entanto, sustentam que a alienação após o ajuizamento da ação já configura

69
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

fraude à execução, reservando-se a fraude contra credores para as alienações anteriores ao


ajuizamento da ação.
A meu ver, a linha divisória deve ser o ajuizamento da ação, pois de acordo com o art. 792, IV,
do CPC/2015, a alienação ou oneração de bem é considerada fraude à execução quando, ao tempo da
alienação ou oneração, corria contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência. Como se vê, a lei
não exige que a alienação tenha ocorrido após a citação.
Saliente-se, ainda, que a fraude à execução pode se verificar no processo de conhecimento e
no processo cautelar, e não apenas no processo de execução. Se, por exemplo, o devedor
insolvente alienar bens no curso de uma ação de cobrança ou de arresto, haverá fraude à execução.
Urge, porém, que ação tenha caráter patrimonial, isto é, que seja capaz de reduzi-lo à insolvência.

PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA OU CADUCIDADE

CONCEITO

Modernamente, a prescrição vem sendo conceituada como sendo a perda da pretensão, em


razão do seu não exercício no tempo. De fato, a prescrição é um instituto de direito material, razão
pela qual o termo “pretensão”, consistente no poder de exigir o direito, é o que melhor retrata o
seu conteúdo. A prescrição elimina a pretensão, neutralizando a ação, a defesa e qualquer outra
pretensão sobre a qual se funda o direito prescrito.

DISTINÇÃO ENTRE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA

Prescrição é perda da pretensão, em razão do tempo, remanescendo, porém, intacto o direito


material, tanto é que o pagamento de dívida prescrita é válido, não podendo ser objeto de
restituição.
Decadência, por sua vez, é a perda do direito material, em razão do tempo, eliminando-se,
por consequência, o direito de ação e demais pretensões.
Sobre a distinção entre prescrição e decadência, o Código adotou um critério objetivo,
eliminando qualquer dívida, enunciando taxativamente os casos de prescrição nos arts. 205 e 206,
sendo de decadência todos os demais prazos previstos em imediata conexão com a disposição
normativa que a estabelece. Assim, prazos não previstos nesses dois artigos, serão de decadência.

O REGIME JURÍDICO PRESCRICIONAL E O DECADENCIAL

Quanto ao regime jurídico, a prescrição e a decadência distinguem-se em vários aspectos.


Com efeito, o prazo prescricional pode ser impedido, suspenso e interrompido, nas hipóteses
previstas nos arts. 197 a 202 do CC. Quanto à decadência, dispõe o art. 207 do CC: “Salvo disposição
legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou
interrompem a prescrição”. Saliente-se, contudo, que, por força do art. 208 do CC, não corre o
prazo decadencial contra os absolutamente incapazes; trata-se da única hipótese de impedimento
e suspensão da decadência, prevista no Código Civil. Outro caso de suspensão da decadência
verifica-se no Código de Defesa do Consumidor, quando se tratar de vício redibitório ou aparente,
pois a reclamação do consumidor suspende o prazo para a propositura das ações edilícias até a
resposta do fornecedor, outrossim, a instauração do inquérito civil, nessas hipóteses, também
suspende o prazo até que seja concluída a investigação.

70
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

O prazo prescricional só pode emanar da lei, o prazo decadencial advém também da lei, mas
se o direito for disponível, pode ainda resultar da vontade unilateral ou bilateral. Nada obsta, por
exemplo, um prazo decadencial fixado pelo testador.
O Juiz deve decretar de ofício a prescrição, por força da Lei nº 11.280 de 16 de fevereiro de
2006. Quanto à decadência, preceitua o art. 210 do CC: “Deve o juiz, de ofício, conhecer da
decadência, quando estabelecida em lei”. Observe-se, contudo, que a decadência convencional,
estabelecida pela vontade das partes, não deve ser decretada de ofício.
O ideal é o juiz, antes de decretar a prescrição, intimar o devedor para ele se manifestar,
tendo em vista que, por razões morais, às vezes o devedor tem o desejo de efetuar o pagamento,
optando pela renúncia à prescrição. Se o devedor renunciar à prescrição e efetuar o pagamento,
aplica-se o art. 487, III, a, do CPC/2015 (reconhecimento do pedido), mas se renunciar à prescrição
e ofertar contestação para discutir a existência do débito, o processo deve prosseguir. Há sim
interesse em renunciar à prescrição e ao mesmo tempo discutir o débito, provar que se trata de
cobrança indevida e pleitear, em reconvenção, a indenização pelas perdas e danos. Se o devedor ao
ser intimado para manifestar-se sobre a prescrição, quedar-se inerte, significa que não houve
renúncia, pois a renúncia é interpretada restritivamente (art. 114 do CC).
Finalmente, os prazos prescricionais não podem ser alterados por acordo das partes (art.
192). Assim, as partes não podem ampliá-los nem suprimi-los. Em contrapartida, os prazos
decadenciais, desde que o direito seja disponível, pode perfeitamente ser ampliado ou reduzido por
convenção das partes.

RENÚNCIA À PRESCRIÇÃO

Renúncia da prescrição é o ato pelo qual o devedor abre mão do direito de argui-la.
O Código proíbe a renúncia prévia, antecipada. Noutras palavras, não se pode renunciar a um
prazo prescricional ainda em curso. Consumado, porém, esse prazo, a renúncia torna-se lícita.
Assim, por exemplo, um prazo prescricional de 10 (dez) anos só poderá ser renunciado após o
decurso desse decênio.
No tocante à decadência, quando o prazo é fixado em lei, é nula a renúncia, seja ela prévia ou
consumada, por força do art. 209 do CC. Tratando-se, porém, da decadência convencional, a
renúncia é sempre admitida, pouco importando se o prazo encontra-se em curso ou já consumado.

A RENÚNCIA PODE SER EXPRESSA OU TÁCITA.

Na primeira, o prescribente declara por escrito que não pretende arguir a prescrição; na
segunda, ele pratica algum ato positivo, incompatível com o desejo de alegar a prescrição, como
uma carta reconhecendo a dívida ou um pedido de parcelamento do débito.
Convém ainda esclarecer que a renúncia, além de exigir uma prescrição consumada, não pode
prejudicar terceiros. Urge, portanto, que o renunciante seja solvente. Se for insolvente, a renúncia
poderá ser cancelada pelos credores, através da ação pauliana.

O MOMENTO DE ARGUIÇÃO DA PRESCRIÇÃO

A prescrição e a decadência podem ser alegadas em qualquer grau de jurisdição (arts. 193 e
211).
O momento adequado para a arguição, contudo, é a contestação.
A prescrição e a decadência são exceções peremptórias, porque provocam a extinção do

71
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

processo, distinguindo-se das chamadas exceções dilatórias, como a incompetência ou suspeição,


cujo efeito é apenas suspender o andamento processual, retardando-lhe o julgamento. A prescrição
e a decadência são defesas indiretas de mérito em que o réu reconhece a existência dos fatos
alegados pelo autor, mas alega um fato extintivo do direito do autor.
Saliente-se, ainda, que a sentença que acolhe a prescrição ou decadência, ainda que
prolatada em tutela cautelar, é considerada sentença de mérito, sujeitando-se à coisa julgada
material, por força do art. 310 do CPC/2015.
A prescrição e decadência podem ser arguidas em qualquer fase do processo, isto é, em
contestação, durante os debates na audiência, em razões ou contra-razões de apelação, na
sustentação oral de apelação e em embargos infringentes. Se, porém, não forem alegadas em
nenhuma dessas oportunidades, torna-se inadmissível a arguição da prescrição e da decadência em
sede de recurso especial ou recurso extraordinário.
Com efeito, esses dois recursos só admitem a discussão de matérias prequestionadas, vale
dizer, que já tenham sido objeto de decisão anterior.
É possível o prequestionamento, pela via dos embargos declaratórios, pois a prescrição e a
decadência fixada em lei devem ser decretadas de ofício, caracterizando a omissão do acórdão que
tenha silenciado a respeito. O tribunal, ao julgar os embargos declaratórios, pode decretar a
prescrição ou decadência ou, então, afastá-las; nesse último caso, surge o interesse na interposição
de recurso especial ou recurso extraordinário.
Tratando-se de prescrição ou decadência não alegadas no processo de conhecimento, nada
obsta a sua arguição em impugnação á fase de cumprimento da sentença, desde que o prazo
decadencial tenha sido fixado por lei; se o prazo decadencial for convencional, não se admite a sua
alegação, após o trânsito em julgado da sentença.
Finalmente, após o trânsito em julgado da sentença ou acórdão, ainda é possível mover ação
rescisória, se a prescrição ou decadência não convencional não foram alegadas no processo de
conhecimento. De fato, a ação rescisória torna-se pertinente, porque, de acordo com a lei, a
matéria deveria ser conhecida de ofício, justificando-se a rescisória pela violação da lei, nos termos
do art. 966, V, do CPC/2015.

DISTINÇÃO ENTRE IMPEDIMENTO, SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO

No impedimento, o prazo prescricional não chega a se iniciar. Tal ocorre, por exemplo,
quando alguém causa prejuízo a uma criança de três anos. Nesse caso, o prazo para propositura da
ação indenizatória só começará a fluir quando a vítima completar 16 anos de idade. De fato,
conforme veremos logo adiante, não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes. Nada
obsta, porém, que o representante legal mova a aludida ação, em nome do incapaz, não havendo
necessidade de se aguardar que este atinja os 16 anos de idade.
Na suspensão, o prazo prescricional em curso sofre uma parada temporária, continuando, de
onde havia parado, após a cessação do obstáculo.
Tal ocorre, por exemplo, quando morre o credor e o seu único herdeiro tem 8 anos de idade.
Nessa situação, se já havia transcorrido seis anos do prazo prescricional de dez, após o seu
herdeiro completar 16 anos, o prazo retoma o seu curso, restando apenas quatro anos para a
consumação da prescrição.
Finalmente, na interrupção, o prazo prescricional em curso reinicia-se por inteiro,
desconsiderando-se o período anteriormente transcorrido.

CAUSAS DE IMPEDIMENTO OU SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO

72
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

As causas de impedimento e suspensão da prescrição são as mesmas.


Haverá impedimento se o obstáculo surgir antes do início do prazo; suspensão, se surgir
durante o prazo em curso.
Assim, consoante se depreende dos arts. 197 e 198, não corre prescrição:
a) entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar. O poder familiar é exclusivo dos
pais em relação aos filhos menores, cessando com a maioridade civil, emancipação, adoção e morte.
Assim, por exemplo, o prazo prescricional da ação indenizatória, que o filho menor pode mover contra
os seus pais, só começa a fluir quando ele completar 18 anos de idade;
b) entre tutor e pupilo, durante a tutela;
c) entre curador e curatelado durante a curatela;
d) entre cônjuges, na constância da sociedade conjugal. Assim, por exemplo, com o
casamento suspende-se o prazo prescricional da dívida entre os cônjuges, contraída antes do
matrimônio. Mas, a partir do divórcio, reinicia-se o fluxo prescricional, de onde havia parado antes
do casamento. Se a dívida houver sido contraída durante o casamento, a hipótese será de
impedimento do prazo, que só começará a fluir a partir do divórcio;
e) contra os absolutamente incapazes de que trata o art. 3º do CC. Vale lembrar que de
acordo com a lei 13.146/2015, que alterou o art. 3º do CC, os únicos absolutamente incapazes são
os menores de 16 (dezesseis) anos. Quanto às pessoas que, por causa transitória ou permanente,
não puderem exprimir a vontade, são relativamente incapazes e, sendo assim, contra elas, em
princípio, corre a prescrição. Penso, porém, que, por equidade, a prescrição não deverá correr, pois
nessas condições o incapaz encontra-se impedido de agir.
f) contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios.
Trata-se de rol taxativo, não compreendendo, portanto, as autarquias, empresas públicas,
sociedades de economia mista e fundações públicas. De fato, a lei excepcional, que, no caso, prevê
exceções a regra geral de fluxo normal da prescrição, não admite analogia;
g) contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra. A prescrição
só retoma o seu curso após a cessação da guerra;
h) se o fato deve ser apurado no juízo criminal. Nesse caso, a prescrição da ação civil “ex
delicto” só começará a fluir após o trânsito em julgado da sentença, ainda que absolutória. O art.
200 refere-se à sentença e não necessariamente à sentença condenatória. Com efeito, dispõe o art.
200 do CC que: “quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não
correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva”. Trata-se de interessante inovação
trazida pelo Código Civil;
i) se pendente a ação de evicção. Evicção é a perda da coisa por sentença que a atribui a
outrem. Se, por exemplo, um terceiro move ação reivindicatória do imóvel adquirido por “B”,
enquanto pendente essa ação, não corre a prescrição da ação de indenização que o adquirente
poderá mover em face do alienante, em caso de evicção. Esse dispositivo autoriza implicitamente a
ação direta de indenização, com base na evicção, devendo ser refutada a tese de que essa
indenização só poderia ser pleiteada na denunciação da lide;
j) na pendência de termo ou condição suspensivos. De acordo com o princípio da “actio nata”,
o prazo prescricional só se inicia quando nasce a pretensão, isto é, com a violação do direito
subjetivo. Na pendência de termo ou condição, o credor não pode agir para exigir o seu direito,
permanecendo, portanto, impedido o prazo prescricional.
Fora do Código Civil, ainda há outros prazos de impedimento ou suspensão da prescrição. Em
matéria trabalhista, por exemplo, não corre prescrição contra menores de 18 anos (art. 440 da CLT).
Por outro lado, Serpa Lopes, inspirado na jurisprudência francesa, sustenta que a regra

73
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

“contra non valentem agere non currit praescriptio”, isto é, contra incapaz de agir não corre
prescrição, deve ser aplicada por equidade, a despeito da omissão do Código. Assim, por exemplo,
se, em razão de alguma revolução (guerrilha interna), os fóruns acabam sendo fechados, força
convir que o lapso prescricional deve permanecer suspenso. De acordo com o ilustre civilista, os
casos de suspensão não encerram um rol “numerus clausus”, pois é cabível a aplicação analógica,
sobretudo, quando inspirada por razões de equidade.
Com base nesse mesmo raciocínio, alguns civilistas sustentam, acertadamente, que, durante
a união estável, a prescrição deve permanecer suspensa, pois sendo esta uma entidade familiar
protegida pela Constituição Federal, não deve ser estimulada a propositura de ação entre os
conviventes, para que se preserve a harmonia entre eles.
Finalmente, as causas de impedimento e suspensão da prescrição são personalíssimas, logo
incomunicáveis, salvo quando a obrigação for indivisível (art. 201). Tratando-se, de obrigação
solidária ou divisível, a suspensão em benefício de um dos credores não aproveitará aos outros,
contra os quais a prescrição fluirá normalmente. Acrescente-se, porém, que a herança, por força de
lei, é indivisível, até que sobrevenha a partilha. Portanto, se o crédito do “de cujus” acabou sendo
herdado por vários herdeiros, se um deles for absolutamente incapaz, verifica-se a suspensão da
prescrição em benefício dele, estendendo-se aos demais herdeiros.

CAUSAS INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO

De acordo com o art. 202 do CC, a primeira causa interruptiva da prescrição é o despacho do
juiz que ordena a citação do devedor. Aludido despacho, porém, só tem o condão de interromper a
prescrição se o autor promover a citação nos dez dias subsequentes a esse despacho (§2º do art.
240 do CPC/2015).
Saliente-se, contudo, que esse despacho interrompe a prescrição ainda que tenha sido
ordenado por juiz incompetente, sob a condição, porém, de a citação operar-se validamente, pois a
citação nula impede a interrupção da prescrição, ainda que o despacho citatório haja sido ordenado
por juiz competente.
O art. 202, I, do Código Civil, ao referir-se ao despacho do Juiz como ato interruptivo da
prescrição, deve ser interpretado restritivamente, aplicando-se apenas às comarcas de vara única.
Tratando-se de comarca com mais de uma vara cível, a propositura da ação verifica-se com a
distribuição, e não com o despacho que ordena a citação (art. 263 do CPC).
De fato, o §1º do 240 do CPC/2015, prevê que a interrupção da prescrição retroagirá à data
da propositura da ação.
Convém ainda esclarecer que, não se efetuando a citação dentro do prazo de 10 dias, haver-
se-á por não interrompida a prescrição, conforme preceitua o §2º do art. 240 do CPC/2015, a não
ser que a demora tenha sido por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, consoante súmula
106 do STJ e §3º do art. 240 do CPC/2015.
A citação válida feita em processo depois anulado ou então extinto sem resolução do mérito
mantém o seu efeito interruptivo da prescrição, pois a propositura da ação demonstra
inequivocamente que o autor não está inerte. Frise-se, ainda, que a citação deve ser válida; se for
nula, não ocorrerá a interrupção da prescrição. Ressalte-se, contudo, que, nas ações movidas
contra a Fazenda Pública, a citação inicial não interrompe a prescrição quando, por qualquer
motivo, o processo tenha sido anulado, conforme dispõe o art. 7º do Decreto 20.910/32.
A segunda causa de interrupção da prescrição é o protesto judicial, ainda que ordenado por
juiz incompetente (§2º do art. 726 do CPC/2015). Aludido protesto é feito por petição dirigida ao
juiz, que, ao recebê-la, ordena a intimação do devedor. Trata-se, a rigor, de uma simples notificação

74
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

judicial. Feita a intimação, os autos são entregues ao requerente, independentemente de traslado,


pois o protesto não admite defesa nem contraprotesto nos autos. Nada obsta, porém, o
contraprotesto do requerido em autos distintos.
A terceira causa de interrupção da prescrição é o protesto cambial dos títulos de crédito,
encontrando-se cancelada a Súmula 153 do STF que dispunha em sentido contrário.
A quarta causa é a apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso
de credores. Assim, a simples apresentação do crédito em inventário interrompe a prescrição,
ainda que não haja a efetiva habilitação. Nesse caso, a prescrição começa a correr a partir da
decisão do juiz remetendo o credor habilitante às vias ordinárias. Igualmente, a prescrição é
interrompida pela apresentação do crédito nos processos de falência, insolvência civil e liquidação
extrajudicial de instituições financeiras.
Também interrompe a prescrição qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor.
Esses atos judiciais são as medidas cautelares, as notificações e interpelações judiciais. A
notificação ou interpelação extrajudiciais não interrompem a prescrição, salvo quando se tratar de
protesto cambial.
Finalmente, a última causa de interrupção da prescrição consiste em qualquer ato inequívoco,
ainda que extrajudicial, pelo qual o devedor reconhece o direito do credor. Exemplos: pagamento
parcial do débito, pedido de parcelamento, confissão de dívida, etc.
A propósito, dispõe a súmula 653 do STJ:
“O pedido de parcelamento fiscal, ainda que indeferido, interrompe o prazo prescricional,
pois caracteriza confissão extrajudicial do débito”
Enquanto nas demais hipóteses, a interrupção é promovida pelo credor ou outro
interessado, nesta, o próprio devedor a interrompe. Aludida causa de interrupção assemelha-se à
renúncia tácita, porque, em ambos, o devedor pratica ato positivo revelando a intenção de pagar o
débito. A renúncia tácita, porém, ocorre após a consumação da prescrição, ao passo que a
interrupção pressupõe um prazo prescricional em curso.
Cumpre lembrar ainda que a interrupção da prescrição somente poderá ocorrer uma vez,
conforme preceitua o art. 202 do CC. Cremos que esse dispositivo deva ser interpretado
restritivamente, pois disse mais do que quis. Na verdade, desde que por causas distintas, a
prescrição pode ser interrompida mais de uma vez. Se, por exemplo, após o protesto cambial, o
credor resolve mover ação de execução contra o devedor, a citação, evidentemente, irá
interromper novamente a prescrição, não obstante a interrupção anterior oriunda do sobredito
protesto.
Por outro lado, a prescrição interrompida por atos extraprocessuais (art. 200, II, III, V e VI),
recomeça a correr da data do ato que a interrompeu. Assim, efetuado o protesto cambial, por
exemplo, a prescrição se interrompe e se inicia novamente, a partir desse protesto.
Tratando-se, porém, de interrupção por ato processual, vale dizer, a citação válida e
apresentação do crédito no processo de falência ou insolvência, a prescrição só começa a correr do
último ato do processo, que é o trânsito em julgado, conforme se depreende do parágrafo único do
art. 202 do CC. Força convir, portanto, que a prescrição intercorrente, aquela que corre durante o
processo, não é admitida, pois enquanto o processo estiver em andamento a prescrição não
recomeça a correr. No Direito Penal, a prescrição da pretensão punitiva flui normalmente durante o
andamento do processo. No Direito Civil, ela permanece interrompida, à exceção do processo de
execução suspenso por falta de bens à penhora, quando então operar-se-á a prescrição
intercorrente dentro do prazo de cinco anos. Dispõe a súmula 314 do STJ: “Em execução fiscal, não
localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da
prescrição quinquenal intercorrente”.

75
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

A propósito, o § 1o do art. 921 do CPC/2015 preceitua que quando o executado não possui
bens penhoráveis, o juiz suspenderá a execução pelo prazo de 1 (um) ano, durante o qual se
suspenderá a prescrição. Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano sem que seja localizado o
executado ou que sejam encontrados bens penhoráveis, o juiz ordenará o arquivamento dos autos
(§2o). Decorrido o prazo de que trata o § 1o sem manifestação do exequente, começa a correr o
prazo de prescrição intercorrente (§4o ). O juiz, depois de ouvidas as partes, no prazo de 15 (quinze)
dias, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição de que trata o § 4o e extinguir o processo (§ 5o ).
O prazo prescricional da fase de execução da ação é o mesmo da ação de conhecimento. Se,
por exemplo, a ação de cobrança prescreve em 10 anos. Após o trânsito em julgado da sentença,
inicia-se o prazo prescricional para a fase de execução, que também será de 10 anos. Essa
prescrição da execução no âmbito do Direito Civil, é conhecida como prescrição superveniente.
Quanto à legitimidade para promover a interrupção da prescrição, o art. 203 do CC a confere
a qualquer interessado. Exemplos: credor; credor do credor; fiador do credor etc.
Por fim, a interrupção da prescrição, em regra, é incomunicável, não beneficia os outros
credores, nem prejudica os demais devedores. Essa regra, porém, comporta as seguintes exceções:
a) na solidariedade ativa, a interrupção promovida por um dos credores beneficia os demais
credores (§ 1º do art. 204);
b) na solidariedade passiva, a interrupção operada contra um dos devedores estende-se aos
demais devedores (§ 1º do art. 204);
c) a interrupção efetuada contra o devedor principal estende-se ao fiador (§ 3º do art. 204).
Trata-se da aplicação da máxima: o acessório segue o principal. A interrupção comunica-se ao
fiador, independentemente de este vir a ser comunicado;
d) na obrigação indivisível, a interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário
prejudica os outros herdeiros ou devedores. Se, porém, a obrigação for solidária, a interrupção contra um
dos herdeiros do devedor solidário não se comunica aos outros herdeiros ou devedores (§ 1º do art. 204).

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE

Conceito

A prescrição intercorrente é a perda do direito de exigir judicialmente o cumprimento da


obrigação, em função da demora para se ultimar o processo iniciado.

Fundamento constitucional

A existência do instituto se baseia no princípio constitucional da duração razoável do


processo, previsto no art. 5º, LXXVII, da CF.

Vedação na fase de conhecimento

A prescrição intercorrente não encontra guarida na fase de conhecimento do processo civil.


Com efeito, uma vez interrompida a prescrição pela citação, ela só se inicia novamente após o
último ato do processo, que é o trânsito em julgado da sentença (art. 202 do CC).
Não há, destarte, durante a tramitação da fase processual de conhecimento, o perigo de
ocorrer a prescrição, pois a sua interrupção perdura até o trânsito em julgado.

76
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Diversamente, no processo penal, a prescrição da pretensão punitiva flui normalmente


durante a tramitação do processo de conhecimento.

Hipóteses legais

No processo civil, a prescrição intercorrente, conforme já dito, só pode se verificar na fase de


execução, quer se trate de cumprimento de sentença ou de processo autônomo de execução,
podendo ocorrer em duas hipóteses, a saber:
a) se o executado não for localizado;
b) se o executado não possuir bens penhoráveis.
Vê-se assim que, uma vez citado o devedor no processo de execução ou intimado na fase de
cumprimento de sentença, a prescrição intercorrente também poderá se iniciar quando não houver
a localização de bens penhoráveis.
Antes do advento da Lei 14.195/2021, que alterou a redação do art. 921, III, do CPC, a
prescrição intercorrente só era possível quando o executado não possuía bens penhoráveis.
Presentes uma das situações acima, o juiz suspenderá a execução, por uma única vez, pelo
prazo máximo de 1 (um) ano, durante o qual não correrá a prescrição.
Findo o prazo de um 1 (ano), sem que seja localizado o executado ou encontrado bens
penhoráveis, o juiz ordenará o arquivamento dos autos (§2º do art. 921 do CPC).
Quanto ao termo inicial da prescrição intercorrente, é a ciência da primeira tentativa
infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis,
Por consequência, computa-se no prazo prescricional o lapso de tempo anterior, que medeia
entre a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis e
a suspensão da execução.
A propósito, dispõe o § 4º do art. 921 do CPC, com nova redação trazida pela Lei
14.195/2021:
“O termo inicial da prescrição no curso do processo será a ciência da primeira tentativa
infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis, e será suspensa, por uma única vez,
pelo prazo máximo previsto no § 1º deste artigo”.
O prazo acima de 1 (um) ano não poderá ser dilatado pelo juiz, pois a lei, além de não prever
a sua prorrogação, ainda o trata como sendo o prazo máximo.
Expirado o prazo de um 1 (ano) da suspensão da execução, sem que seja localizado o
executado ou encontrado bens penhoráveis, a prescrição intercorrente retomará automaticamente
o seu fluxo, antes mesmo de o juiz ordenar o arquivamento dos autos.

Causas de interrupção da prescrição intercorrente

Dispõe o §4º-A do art. 921 do CPC:


“A efetiva citação, intimação do devedor ou constrição de bens penhoráveis interrompe o
prazo de prescrição, que não corre pelo tempo necessário à citação e à intimação do devedor, bem
como para as formalidades da constrição patrimonial, se necessária, desde que o credor cumpra os
prazos previstos na lei processual ou fixados pelo juiz”.
Vê-se assim que as causas específicas de interrupção da prescrição intercorrente são as
seguintes:
a) citação efetiva do devedor.
Esta hipótese se refere ao processo autônomo de execução, pois, na fase de cumprimento de
sentença, que é outra modalidade de execução, não há falar-se em citação.

77
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

A citação efetiva ou real é a que realmente comunica o citando sobre a existência do


processo, podendo ser realizada por meio eletrônico, pelo correio, por oficial de justiça, pelo
escrivão ou pelo chefe de secretaria.
Quanto à citação ficta ou presumida, que é o fato de a lei presumir que o citando tomou
conhecimento da demanda, não tem o condão de interromper a prescrição intercorrente, pois o
§4º-A do art. 921 do CPC só se refere à citação efetiva, expressão que não abrange a realizada por
edital ou por hora certa, que são as duas modalidades de citação ficta.
O efeito da interrupção da prescrição, emanado da citação, retroagirá à data do requerimento
da citação, desde que o credor tenha cumprido os prazos previstos na lei processual ou fixados
pelo juiz para que o ato citatório se torne efetivo, sendo este o sentido da expressão “ não corre
pelo tempo necessário à citação”, que consta no texto legal acima.
Se o devedor não tiver sido citado pessoalmente no processo de execução, mas houver a
decretação da penhora de bens , não há falar-se em prescrição intercorrente, podendo a citação ser
realizada por edital.

b) intimação efetiva do devedor.


Esta hipótese se refere ao cumprimento de sentença, onde não há citação, mas, sim,
intimação do devedor, pela imprensa oficial, através do seu advogado.
Se, entretanto, o advogado falecer ou renunciar, antes ou depois de ser intimado, será
necessária a intimação pessoal do devedor, para que constitua novo patrono e, não sendo ele
localizado, a prescrição intercorrente então se iniciará.
Iniciada, nos termos acima, a prescrição intercorrente, impõe-se, para a sua interrupção, que
haja a efetiva intimação pessoal do executado, pois a intimação por edital não tem o condão de
interromper a prescrição intercorrente.
Assim como na citação, o efeito de interrupção da prescrição intercorrente, emanado da
intimação pessoal, também retroagirá à data do requerimento de sua intimação pessoal, desde que
o credor tenha cumprido os prazos previstos na lei processual ou fixados pelo juiz, para que o ato
citatório se torne efetivo.
Se, na fase de cumprimento de sentença, o devedor não for intimado, pela imprensa oficial,
através do seu advogado ou, na ausência deste, pessoalmente, o processo será nulo, presumindo-
se o prejuízo.
A propósito, dispõe o § 6º do art. 931 do CPC:
“A alegação de nulidade quanto ao procedimento previsto neste artigo somente será
conhecida caso demonstrada a ocorrência de efetivo prejuízo, que será presumido apenas em caso
de inexistência da intimação de que trata o § 4º deste artigo”.

c) constrição de bens penhoráveis.


A penhora reputa-se realizada com a apreensão e depósito dos bens, antes mesmo da
lavratura do respectivo auto (art. 839 do CPC).
O efeito interruptivo da prescrição intercorrente retroagirá à data do requerimento da
penhora, desde que o credor tenha cumprido os prazos previstos na lei processual ou fixados pelo
juiz para as formalidades que se fizerem necessárias à constrição.
Quanto à constrição de bens impenhoráveis, não interrompe a prescrição, pois, nesse caso, a
penhora será nula.
Há, por outro lado, outras causas de interrupção da prescrição intercorrente, pois, a ela
também se aplicam as demais causas de interrupção da prescrição previstas no Código Civil (art.
206-A do CC).

78
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

Causas de suspensão da prescrição intercorrente

A causa específica de suspensão da prescrição intercorrente, conforme já visto, mas que


perdura por no máximo 1 (um ano), é a decisão do juiz que suspende a execução quando não
localizado o executado ou bens penhoráveis.
Aplica-se, entretanto, à prescrição intercorrente as demais causas de suspensão da prescrição
previstas no Código Civil (art. 206-A do CC).

Prazos da prescrição intercorrente

O prazo da prescrição intercorrente é o mesmo previsto para a propositura da ação de


conhecimento.
A propósito, dispõe o 206-A do CC, introduzido pela Lei 14.195/2021:
“A prescrição intercorrente observará o mesmo prazo de prescrição da pretensão, observadas
as causas de impedimento, de suspensão e de interrupção da prescrição previstas neste Código e
observado o disposto no art. 921 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo
Civil).”
Antes do citado art. 206-A, a jurisprudência seguia o mesmo raciocínio, aplicando a súmula
150 do STF, que cuida da prescrição executória, nos seguintes termos:
"Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação".

Decretação da prescrição intercorrente

O juiz poderá decretar de ofício a prescrição intercorrente e, no mesmo ato, extinguir a


execução.
É essencial, entretanto, antes de decidir, que as partes tenham oportunidade para se
manifestar, no prazo de 15 (quinze) dias.
De fato, reza o §5º do art. 921 do CPC:
“O juiz, depois de ouvidas as partes, no prazo de 15 (quinze) dias, poderá, de ofício,
reconhecer a prescrição no curso do processo e extingui-lo, sem ônus para as partes“.

Prescrição intercorrente na execução fiscal

A execução fiscal, que é a movida pela Fazenda Pública, também admite a prescrição
intercorrente, sendo regida pelo art. 40 da Lei 6.830/80.
Sobre o assunto, reza a súmula 314 do STJ:
“Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano,
findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente”.
Por aplicação subsidiária do CPC, também deve fluir a prescrição intercorrente, quando o
devedor não for localizado.

Distinção entre prescrição intercorrente e prescrição executória

A prescrição executória é a perda do prazo para dar início à execução (cumprimento de


sentença ou processo autônomo de execução).
A prescrição intercorrente, por sua vez, é a perda do prazo para se dar prosseguimento à

79
Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
DIREITO CIVIL – PARTE GERAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

execução já iniciada.

80

Você também pode gostar