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INTRODUÇÃO
Um símbolo étnico transgressor, o turbante, está presente na história e cultura do
Brasil, como também na sociedade mundial, especialmente no continente Africano, com
várias significações diferentes entre os locais. A sua construção é feita com os mais
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-Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Federal do
Rio Grande/FURG. Grupo de estudos e pesquisa interdisciplinar Lélia Gonzalez.
diferentes tecidos e acessórios. Em sua história é importante ressaltar que a sua origem
ainda é um mistério, mas na atualidade, devido a propagação das mídias, principalmente
das redes sociais, o uso dos turbantes se tornou mais visto nos diferentes lugares do
mundo.
No Brasil, no período que era colônia de Portugal, o turbante chega através da
cultura africana, em que as mulheres africanas escravizadas trazidas de diferentes
lugares do continente africano, como Senegâmbia (Guiné), Angola, Congo, Costa da
Mina e Benin; usavam em suas cabeças. O adorno envolvia a cabeça das mulheres
negras para cobrir os cabelos, para proteção de suas cabeças para carregarem os cestos
pesados sobre elas, para carregarem seus filhos, para esconder as suas cabeças
raspadas, devido a sua fé como proteção, entre outros. Em cada país da qual estas
mulheres foram trazidas haviam significados diferentes. Desta maneira, é importante
contar aos afrodescendentes este resgate de um pouco da história dos seus, com a
importância da sua cultura, pois segundo Adichie (2019)
Todas essas histórias me fazem quem eu sou. Mas insistir só nas
histórias negativas e simplificar minha experiência e não olhar para as
muitas outras histórias que em formaram. A história única cria
estereótipos, e o problema com os estereótipos, não é que sejam mentira,
mas que são incompletos. Eles fazem com que uma história se torne a
única história. (ADICHIE, 2019 p.26)
2 Dissertação de Ana Cecilia Rodrigues dos Santos Godoi no Programa de Pós- Graduação em
Educação, Culturas e Identidades da Universidade Federal Rural de Pernambuco, no ano de 2016,
nomeada de “Porque fomos sequestradas dos pés até o último fio de cabelo: práticas pedagógicas no
movimento de mulheres negras e a ressignificação do corpo negro”
alisamento dos cabelos, nos mais diversos cantos do país, em que também utilizam o
turbante para se aproximar das suas origens.
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Enegressência é um conceito utilizado em eventos para reafirmar a importância da autoafirmação da
estética negra a partir da palavra enegrecer que significa torna(-se) negro, dar ou adquirir tonalidades
escuras
Considerado como um símbolo transgressor, devido aos atravessamentos que o
mesmo faz entre multiculturas, raças, gêneros e classes; foi possível criar uma forma de
educação através do mesmo, junto a educação antirracista. Ser um(a) docente
antirracista é criar conteúdo e aplicar sobre as questões para as relações étnico-raciais,
para que as crianças e as pessoas negras se vejam, se amem, sem pensar que somente
a branquitude é a cor ideal. Porque as exigências ideológicas vindas da herança dos
colonizadores no Brasil, provocaram de forma violenta uma problemática diante dos
valores estéticos e culturais para a população negra, segundo Kabengele Munanga
(2020)
Na sua totalidade, a elite negra alimentava um sonho: assemelhar-se
tanto quanto possível ao branco para, na sequência, reclamar dele o
reconhecimento de fato e de direito. (...) Ora, para chegar a isso,
pressupunha-se a admiração da cor do outro, o amor ao branco, a
aceitação da colonização e a autorecusa. E os dois componentes dessa
tentativa de libertação estão estreitamente ligados: subjacente ao amor,
pelo colonizador, há um complexo de sentimentos que vão da vergonha
ao ódio de si mesmo. O embranquecimento do negro realizar-se-á
principalmente pela assimilação acontecerá pelo domínio da língua do
colonizadora. Por isso, todo povo colonizado sempre admirou as línguas
invasoras, que achava mais ricas do que a sua. Num grupo de jovens
africanos de qualquer país de seu continente, aquele que se expressava
bem e tinha controle da língua não materna (francês, inglês ou português)
era muito respeitado. (MUNANGA, 2020, p. 35-36)
A partir disso, se transgredir tem como um dos seus significados ir além, fazer
atravessamentos, uma educação através dos turbantes, está para além da formalidade
do ensino para com as pautas raciais, muito mais além para com o ensino formal nos
espaços escolares, em que a autonomia para a criação desta pratica requer coragem
para os embates que ocorreram. Desta maneira, uma professora do extremo sul do Brasil
criou o seu projeto de ensino através dos turbantes, pensando prioritariamente na Lei de
nº10.639/03 a qual garante a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-
Brasileira nos currículos escolares, uma lei que já tem dezoito anos, e ainda existem
falhas, como disciplinas não obrigatórias para os cursos de licenciaturas nas
universidades. Para Zélia Amador de Deus,
Vale ressaltar que a aplicação da lei se apresenta como um grande
desafio para os docentes, pois muitos desconhecem qualquer conteúdo
que trate da África e da cultura afro-brasileira. Nessa perspectiva o papel
do educador, assume grande dimensão, pois, além de buscar formação
para cumprir suas funções, na medida em que são poucas as
universidades brasileiras que já adequaram seus currículos visando à
aplicabilidade da lei, esse docente tem que iniciar um processo de
descontruir imagens estereotipadas que sempre enfocam a África
ressaltando aspectos negativos: atraso, selva, fome, doenças
endêmicas, AIDS, guerras, misérias, pobreza. Essa imagens
estereotipadas precisam sair de cena e dar lugar (DEUS, 2020, p.65-66)
Acotirene que foi considerada a matriarca no Quilombo dos Palmares e conselheira dos
escravizados e escravizadas, em alguns registros está com seu turbante. E Zeferina,
nascida em Angola foi trazida para o Brasil para a região da Bahia ainda criança como
uma menina escravizada, lutava pela sua liberdade, fundou o Quilombo Urubu, com seu
turbante lutava.
Na década de 60, a afro- estadunidense Eunice Kathleen Waymon conhecida pelo
seu nome artístico como Nina Simone, cantora, compositora pianista e militante que
lutava pelos direitos civis dos afro-estadunidenses através de suas canções, em muitas
fotos está com vários tipos de amarrações de turbantes, destacando a importância do
Orgulho Negro. No texto de Glenda B.Ferreira, chamado de Nina Simone: Uma das cores
da minha alma, apresenta que “Ela usava turbantes, brincos gigantes, joias, estampas
super colors, pulseiras, óculos grandes. “(2016). Uma das frases mais conhecidas da
pianista é “ Eu te digo o que a liberdade significa para mim: não ter medo.”
A escritora e feminista francesa Simone de Beuvoir, usava o turbante com outro
formato e significações do que para as mulheres negras, uma das frases mais conhecida
de Simone é “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”. A cantora Carmem Miranda
também foi uma das mulheres que estiveram presentes nesta pesquisa devido ao seu
uso dos turbantes, com formas diferentes e da sua representatividade no país, em que
segundo em NASSER (1989), para Carmem
Os Turbantes, são feitos por Miranda, os balangaundas são da baixa do
sapateiro de Salvador, isto mostra a influência da cultura baiana na moda
e nas criações de Carmem Miranda. Sendo assim na viagem que fez a
Bahia antes de ir para América do Norte, ela levou toda cultura baiana
pautando-se na tropicalidade e o carnaval do povo brasileiro criando
assim uma moda particular. Os colares, turbantes, vestidos, saias,
chapéus, jóias e sapatos plataformas eram características do vestir de
Camem Miranda nas apresentações pelos Estados Unidos sempre
revelando o que é que a baiana tem ( NASSER,1989).
Este projeto tem como um dos objetivos ensinar a história do turbante para contar
a transversalidade do mesmo em vários aspectos sejam eles étnicos, religiosos ou de
gêneros. Ensinar o respeito pelo seu próximo e tornar um cidadão mais consciente e
antirracista. Outro aspecto relevante da oficina é exaltar o turbante como símbolo étnico
africano e afro-brasileiro, símbolo de resistência para a população negra, como forma de
autoestima, autoafirmação racial e identitária.
O projeto está presente para os muros das escolas, pois já esteve presente em
postos de saúde, associações de bairros, shoppings, câmara dos vereadores, museu da
cidade, OAB, universidades, hospitais e em conversas virtuais. Em que tem percurso ao
longo dos meses, mas no mês de outubro e novembro devido as comemorações do
outubro rosa e do mês de novembro ser referência para a população negra, como o mês
da consciência negra.
Nas redes sociais é possível ter contato com todas as fotos das oficinas. Por fim,
esta oficina tem um papel importante na sociedade para que todos se unam contra o
racismo e qualquer tipo de discriminação referente a raça, religião e gêneros diante do
seu turbante. Os resultados esperados são a aprovação do grupo e atingir as
expectativas do grupo, quanto à oficina.
CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considera-se que a história dos turbantes não se encerra através deste trabalho
que está em desenvolvimento, em um resgate sobre as suas origens e definições,
tornando-o um símbolo transgressor, pelo fato de estar para além dos gêneros, das
classes e das raças. Mas nesta pesquisa sob um recorte da sua história através de
representatividades do feminino no Brasil e demais lugares, apresentando a diferença
do seu significado para mulheres negras e mulheres não-negras.
Assim, através desta escrita é possível perceber o quanto se faz eficaz ensinar a
história e a cultura do mesmo, pensando em um método de educação antirracista através
dos turbantes, empoderando as crianças negras nos espaços de ensino, na tentativa de
mudar a significação da escola para a população negra tão violentada. A experiência
escolar, segundo Cavalleiro é
Para indivíduos negros, a experiência escolar também parece repleta de
acontecimentos prejudiciais, o que dificulta a aquisição de uma
identidade positiva, ao mesmo tempo que lhes confere o lugar daquele
que não é bem-vindo e aceito no grupo. (CAVALLEIRO, 2020, p.83)
Dessa maneira, o projeto turbante-se tem uma importância para uma educação
através dos turbantes, em que apenas um tecido poderá unir os alunos, pois mesmo que
tenha uma legislação a qual deveria ser cumprida ainda existe muita resistência dos
docentes pelo ensino de trabalhos voltados para a pauta racial, mesmo sabendo que
racismo também é crime.
O Brasil, vive um período político desgovernado, em que muitos racistas saíram
do armário, algo entristecedor que ocasiona revolta e medo, em que para realizar estas
oficinas através do projeto se torna um ato de coragem, através de um ensino que está
contra os segmentos do governo.
A partir de todos os aspectos citados se torna visível que o ensino através dos
turbantes como pratica pedagógica garante um engajamento de todas e todos
envolvidos, quando existe a explicação sobre sua história, em que
(...)o uso de Turbantes por mulheres negras emerge como engajamento,
reconhecimento, estética de resistência e afirmação cultural. Uma luta
construída por essas mulheres durante anos, mulheres que hoje são
reconhecidas, constroem representatividade, quebram estereótipos e
padrões impostos. Dentre algumas das referências que fazem parte do
meu processo de empoderamento, fortalecimento e representatividade
cito: Dandara de Palmares, rainha Nzinga, Ângela Davis, Lélia Gonzalez,
Chimamanda Ngozi Adichie, Tais Araújo, Maju Coutinho, Conceição
Evaristo, Renilda Cintra, Vilma Reis, Grada Kilomba, Danie Sampaio, Maitè
Freitas, Djamila Ribeiro, Tauá Pires, Érica Malunguinho, Linda Marx, Éllen
Cintra, Sandra Campos, Adriana Barbosa, Cristiane Gutierrez, Cris Blues,
Beth Beli: algumas tantas... ” (SILVA, 2020, p. 20-21).
REFERÊNCIAS
GODOI, Ana Cecília Rodrigues dos Santos. Porque fomos sequestradas dos pés ao
último fio de cabelo: práticas pedagógicas no movimento de mulheres negras e a
ressignificação do corpo negro/Ana Cecília Rodrigues dos Santos Godoi –
Recife,2016. Dissertação (Mestrado em Educação, Culturas e Identidades)-
Universidade Federal Rural de Pernambuco/Fundação Joaquim Nabuco. Departamento
de Educação da UFRPE, Recife:2016.
GOMES, Nilma Lino. O Movimento Negro educador: saberes construídos nas lutas
por emancipação/Nilma Lino Gomes. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.
SILVA, Rosyane Maria da. Iqhiya: um olhar sobre o significado do uso de Turbantes
por mulheres negras. 2017. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Gestão
de Projetos culturais e Eventos) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017. 47f.
WILLIAM,Rodney. Apropriação cultural/Rodney William. – São Paulo: Editora
Jandaíra,2020. 208.p (Feminismos Plurais/ coordenação de Djamila Ribeiro.
http://www.conexaojornalismo.com.br/colunas/estetica/estilo/a-historia-do-turbante-poe-
fim-ao-equivoco-da-apropriacao-cultural-58-46403
https://suporteanoite.wordpress.com/2016/07/24/turbantes-por-que-seu-uso-nuncasera-
apropriacao-cultural/
http://www.neim.ufba.br/wp/wp-content/uploads/2013/11/simone.pdf
https://www.cidadaocultura.com.br/nina-simone-uma-das-cores-da-minha-alma/
http://zelmar.blogspot.com/2009/05/sob-o-turbante-de-simone.html