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Sumário
2. Casamento ...........................................................................................................................24
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3.1. Histórico.......................................................................................................................87
3.4. Noções fundamentais e diferenciação entre união estável, concubinato e união livre
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5.2. Pressupostos ou requisitos para a prestação (Art. 1.694 a 1.695, CC) ....................... 127
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DIREITO DE FAMÍLIA
1. Noções gerais
1.1. Conceitos iniciais
1.1.2. A família
A família é fenômeno cultural, e não jurídico. Dizer isso é realçar que a concepção de família não
pode ser estritamente biológica. O conceito de família é construído a partir de valores sociais, não
necessariamente jurídicos.
Muito mais do que uma concepção jurídica, família é possibilidade de convivência. E o direito
haverá de regulamentar a família a partir das diferentes possibilidades de convivência.
Atualmente duas leis federais apresenta conceitos legais de família:
a) Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha, em seu art. 5º, inciso II): “(...) compreendida como a
comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços
naturais, por afinidade ou por vontade expressa”.
b) Lei 12.010/2009 (Lei da Adoção): traz a figura da família extensa ou ampliada, que vai além da
unidade de pais e filhos, formada por parentes próximos com os quais a criança ou o adolescente
convivem e mantém vínculos de afinidade e afetividade (art. 25, ECA1).
1 Lei 8.069/90, art. 25: Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e
seus descendentes. Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além
da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou
adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.”.
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A Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, consagra um sistema jurídico de Direito de Família
aberto, inclusivo e não discriminatório:
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes.
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela
mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº
66, de 2010)
§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
O direito de família brasileiro, tradicionalmente, apenas reconhecia como família legítima aquela
constituída pelo sacramento do matrimônio. Também na Europa, o Direito de Família antigo era muito
influenciado pela Igreja e, durante muitos anos, coube à Igreja consagrar a família.
Hoje, o sistema constitucional pátrio, além do casamento, reconhece também como entidades
familiares a união estável e o núcleo monoparental (formado por qualquer dos pais e sua prole). Desde
1988, portanto, a CR deu um passo magnífico ao reconhecer família não apenas decorrente do
matrimônio, trazendo um conceito aberto.
Os conceitos de família não se esgotam apenas nesses núcleos expressamente reconhecidos como
formas de família (casamento, união estável ou núcleo monoparental). A doutrina mais abalizada (Paulo
Lôbo, Luis Edson Fachin, Maria Berenice Dias) reconhece que outros arranjos familiares, ainda que não
explicitamente previstos, merecem a devida tutela jurídica e constitucional.
Até porque seria impossível ao constituinte ou ao legislador ordinário esgotar as formas de família.
Lei nenhuma no Brasil ou no mundo poderia encerrar o conceito de família, dada sua complexidade. Ex.:
madrinha que cria o afilhado por toda vida, como se fosse seu filho. Esta não seria uma família? Ou,
ainda, o irmão mais velho que cria o irmão menor, depois que ambos perdem os pais. Trata-se de outras
formas de arranjos familiares cunhados em torno da afetividade.
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Recentemente, o próprio Supremo entendeu que, embora a família homoafetiva não seja
expressamente reconhecida pelo constituinte, o conceito aberto adotado pelo ordenamento permite o
reconhecimento desse núcleo familiar.
Pelo exposto, é possível concluir, sem pretender esgotar a definição, que a família, base da
sociedade (art. 226, da CR), é um ente despersonificado, moldado pelo vínculo da socioafetividade,
dotado de estabilidade e merecedor da tutela jurídica.
Veja que a família tem uma vocação à estabilidade. É mais densa e estruturada que um simples
namoro. Mas deve-se ter em mente que nenhum conceito encerra essa ideia por completo.
Já houve autores defendendo a tese de que a família seria uma pessoa jurídica (Savatier e
Carbonnier), mas a doutrina costuma reconhecer superada essa tese. Por isso, diz-se que a família é um
ente despersonificado.
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A entidade familiar pode inclusive ser formada por pessoas que não guardem entre si estrito vínculo
de consanguinidade. Ex.: “parente” bem distante que cria o primo como filho seu (parente colateral
depois do 4º grau não é, para fins de direito, parente). Há, aqui, uma família.
O artigo 5º da Lei Maria da Penha consagra essas características modernas do conceito de família,
especialmente a anaparentalidade. Menciona como unidade doméstica, para efeito de proteção da lei, a
família formada fora do vínculo de consanguinidade, integrando ao conceito de unidade familiar aquelas
pessoas “agregadas”:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação
ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano
moral ou patrimonial:
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se
consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida,
independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.
A partir da concepção de família exposta no item “1.1” acima, é possível construir os paradigmas do
direito de família.
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O Código de 2002, seguindo as pegadas dos arts. 226 e 227 da CR, admite novos paradigmas de
família.
A família deixa de ser única e passa a ser múltipla, plural (além do casamento, há a união estável,
a família monoparental etc.) Torna-se igualitária, democrática e hetero ou homoparental. A
homoparentalidade decorre da monoparentalidade. Não há a necessidade de se discutir, ao menos agora,
a questão da união homoafetiva, bastando reparar que existe a família monoparental.
A família passa a ser biológica ou socioafetiva. Como decorrência disso, cessa a categorização e
passa a haver a paridade dos filhos. A família deixa de ser indissolúvel e passa a existir a dissolubilidade
dos vínculos.
O direito de família deixa de se preocupar com a família e passa a se preocupar com as pessoas que
a integram. A família deixa de ser uma instituição e passa a ser um instrumento. Descobriu-se que o
direito de família existe para a proteção das pessoas que as compõem, e não à proteção das famílias em
si. Ninguém tem direito por ter família. A família é quem protege as pessoas.
Como visto acima, essa concepção instrumental da família é chamada de família eudemonista:
a família serve para a busca da felicidade e para a realização pessoal do ser humano. Ou seja, a família
não é um fim em si mesmo, na medida em que ninguém precisa tem uma família para ser protegido.
Quem busca ter família está buscando sua própria realização (a felicidade). A pedra de toque do direito
de família deixa de ser a proteção da família e passa a ser a proteção das pessoas que a compõem.
Essa ideia de família instrumento estabelece que os valores que presidem o direito de família são
afeto, ética, dignidade e solidariedade. São eles que permeiam a noção eudemonista de família.
Exemplo dessa concepção encontra-se na Súmula 364 do STJ, que prevê a impenhorabilidade do
imóvel da pessoa sozinha (chamada pelo STJ de “single”):
Súmula 364 - O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente
a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
A pessoa sozinha é uma família? Ela constitui uma família de si mesma? A família envolve
pluralidade de sujeitos (duas ou mais pessoas). A pessoa sozinha não é família de si mesma. Alguns
autores tentaram forçar a interpretação de que haveria a família unipessoal (família de uma pessoa só).
Essa concepção não vingou. Todavia, ainda assim, o bem daquela pessoa sozinha está protegido pelo bem
de família. É possível elastecer a proteção do direito de família às pessoas humanas.
Note que a Súmula 364 do STJ diz que a pessoa sozinha merece a mesma proteção, apesar de não
ser propriamente família. A Sumula está alicerçada, a toda evidência, na nova concepção instrumental
da família e do direito de família.
A partir desse caráter instrumental da família, a doutrina criou uma tese nova: o direito de família
mínimo (ou princípio da intervenção mínima do Direito de Família). Este princípio, desenvolvido por
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autores como Rodrigo da Cunha Pereira, sustenta não poder o Estado invadir a esfera íntima da família,
sufocando-a ou oprimindo-a.
O Estado não pode, portanto, decidir pela família, invadindo seu espaço pessoal.
Se a família é instrumento de proteção da pessoa humana (meio, e não fim), deve-se valorizar a
autonomia privada. Essa valorização da vontade da pessoa humana traz a reboque a intervenção mínima
do Estado. É algo bastante parecido com a intervenção mínima do Direito Penal.
A intervenção mínima do Estado nas relações de família é apelidada de “direito de família mínimo”.
Na medida em que a família é um instrumento de realização da pessoa humana, nada mais justo que
respeitar a autonomia privada.
Exemplos da aplicação da tese do direito de família mínimo:
i) art. 1.639, § 2º, do CC (permite a mudança do regime de bens no casamento):
Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que
lhes aprouver. (…)
§ 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos
os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
O STJ vem entendendo que é possível a mudança do regime de bens do casamento mesmo para as
pessoas que se casaram antes do advento do CC/02 (REsp 730.546/MG).
ii) EC 66/2010 (abolição dos prazos para o divórcio):
As pessoas ficam casadas ou não em razão da sua vontade, e não em razão da imposição de prazos
pelo Estado.
iii) Lei 12.344/2010 (alterou a idade para o regime de separação obrigatória, de 60 para 70 anos):
Ainda que tenha havido uma evolução, perceba que ainda se trata da intromissão do Estado da
autonomia privada, uma violação da tese do direito de família mínimo.
iv) concordância do adolescente com a colocação em família substituta:
A tese do direito de família mínimo evoluiu tanto que está presente inclusive no ECA (ganhou
alcance infanto-juvenil). Assim, deve-se respeitar a autonomia privada até mesmo nas relações que
envolvem criança e adolescente. Ou seja, houve maior valorização da vontade da criança e do adolescente.
Exemplo disso é a nova redação do art. 28 do ECA, que exige o consentimento do maior de doze
anos de idade para sua colocação em família substituta:
Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente
da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei.
§ 1º Sempre que possível, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe interprofissional,
respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá
sua opinião devidamente considerada. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2º Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em
audiência. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
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Art. 226 (...) § 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável,
o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e
científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais
ou privadas.
Ao tratarem dos princípios constitucionais do direito de família, vários autores citam diversos
princípios que, na verdade, são universais, fundamentais a todas as relações jurídicas (ex.: dignidade e
solidariedade).
No RE 201.819/RJ, o STF consagrou a tese da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Tratava-se de uma associação (privada) cujo estatuto previa procedimento de expulsão de associado. Na
forma do estatuto (ou seja, da relação privada), o associado foi expulso. Judicialmente, ele alegou que
não teria havido o respeito a garantias constitucionais. O STF concluiu que deve haver a aplicação direta
de direitos fundamentais às relações privadas.
Assim, se o direito de família disciplina uma relação privada, via de consequência incidem os
direitos e garantias fundamentais (dignidade humana, solidariedade social). Todavia, nem por isso se
pode dizer que sejam princípios específicos do direito de família, mas princípios genéricos, que incidem
em toda e qualquer relação jurídica.
A partir disso, conclui-se que se os direitos e as garantias fundamentais incidem nas relações de
família (que são privadas), consequentemente, é possível afirmar que boa-fé objetiva e função social (que
têm pano de fundo nas garantias fundamentais) também se aplicam no direito de família.
O art. 1.642, V, do Código Civil, por exemplo, prevê a cessação do regime de comunhão de bens pela
separação de fato do casal há mais de cinco anos:
Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente: (…)
V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao
concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal
estiver separado de fato por mais de cinco anos;
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A previsão da comunhão no caso de separação de fato ofende claramente a boa-fé objetiva. Aquele
que, separado de fato, adquire imóvel sem o esforço comum do outro não pode ter o bem partilhado com
o ex-cônjuge, sob pena de ofensa à boa-fé.
A questão se agrava no caso da união estável, que é admitida após dois anos de separação de fato.
Pela letra da lei, o sujeito estaria em união estável e, se amealhasse patrimônio junto com a companheira,
teria de dividi-lo com ela e a ex. Um absurdo.
Em razão disso, o STJ, no REsp 555.771/SP, mandou aplicar a boa-fé objetiva nas relações de
família, para dizer que a simples separação de fato cessa o regime de bens, por não haver mais
colaboração recíproca.
Hoje, já se fala abertamente na tese da função social da família, a qual restou consagrada no Código
Civil, em seu art. 1.513:
Art. 1.513. É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida
instituída pela família.
Não se deve olvidar a importância do estudo dos princípios. Segundo Canotilho, a norma jurídica
é igual a norma-regra mais norma-princípio. O pano de fundo (a mensagem) dessa fórmula é de que todo
princípio tem força normativa. Se é assim, todo princípio vincula, obriga.
Até bem pouco tempo atrás, o art. 4º da LINDB deixava subentendido que os princípios não tinham
força normativa, mas natureza de meras recomendações (seriam meros conselhos):
Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios
gerais de direito.
Por conta da colaboração que o direito constitucional deu à teoria geral do direito, passou-se a
entender que os princípios têm força normativa e, em razão disso, deveriam ser estudados. E mais, que
o eventual conflito entre norma-princípio e norma-regra deveria ser resolvido em favor daquela.
Os arts. 226 e 227 da CR estabelecem os princípios que serão estudados a seguir. Não constam
desses dispositivos dois, listados por Maria Berenice Dias: monogamia e afeto. Seriam eles princípios
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constitucionais do direito de família? Monogamia não é princípio constitucional (“para ser sincero, nem
é princípio”).
Regra é norma de conteúdo fechado. Princípio é norma de conteúdo aberto. Logo, na regra a
solução jurídica é apriorística. No princípio, casuística. Diante dessa diferenciação, percebe-se que
monogamia é regra, não princípio (não dá para ser “meio” monogâmico). De antemão
(aprioristicamente) já se sabe que não é possível casar-se duas vezes ao mesmo tempo. Assim, a
monogamia é regra (implícita) do Código Civil (e não da CR).
Não se está a dizer que direito de família brasileiro não seja monogâmico. Somente que a
monogamia é regra, não princípio.
No que concerne ao afeto, segundo Chaves, ele também não seria princípio constitucional. Caso
contrário, considerando que os princípios têm força normativa, as pessoas poderiam se ver obrigadas a
dar afeto às outras (afeto exigível juridicamente), o que para o autor é um absurdo.
A jurisprudência vinha entendendo que o afeto seria um valor jurídico não exigível (não teria
natureza principiológica, ainda que esteja presente nas relações de família). No RE 567.164/MG e no
REsp 514.350/SP, STF e STJ consagraram que a negativa de afeto não ensejaria indenização por dano
moral. A posição do STJ mudou, conforme se verificará.
Para Chaves, afeto/amor/carinho dá quem tem. Não parece que seja possível obrigar juridicamente
um pai a gostar do filho. As pessoas são diferentes, uns mais afetuosos, outros menos. A indenização não
fará com que o pai passe a gostar do filho. Teria de ser criado um “afetômetro”, ou seja, a estipulação de
um grau médio de afeto na sociedade. Criar-se-iam “standards” afetivos, e a questão poderia chegar ao
absurdo de uma denunciação da lide ao avô, que não ensinou o pai a ser afetuoso com o filho.
Como se verificará adiante (tópico “1.6”), a questão não e pacífica na doutrina. Há autores que
sustentam entendimento contrário, como Pablo Stolze e Giselda Hironaka, fundamentados na tese
segundo a qual o afeto teria natureza de princípio.
1.5.1. Princípio da proteção da dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III, CF)
Inicialmente assevera Flávio Tartuce tratar-se do que se denomina princípio máximo, ou
superprincípio, ou macroprincípio, ou princípio dos princípios. Diante desse regramento inafastável de
proteção da pessoa humana é que está em voga, atualmente, falar em personalização, repersonalização
e despatrimonialização do Direito Privado.
Nesse sentido, nas palavras de Kant, a dignidade da pessoa humana é aquilo que a pessoa é como
ser racional, considerando- se um fim em si mesmo. A pessoa humana será sempre fim, e nunca
meio, de modo que não se admite sua instrumentalização sob pena de lesão ao princípio.
São Exemplos de aplicação do princípio no Direito de Família:
a) Súmula 364, STJ: “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o
imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.”.
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O fim social da Lei 8.009/1990 é a proteção moradia e da dignidade humana (art. 6º, CF3). A norma
não protege um grupo de pessoas, mas A PESSOA.
b) Tese do Abandono Afetivo: É possível condenar pais a indenizarem filhos pela falta de
convivência? A princípio, não (REsp 757.411/MG, de 2005); mas, em entendimento recente, já
se manifestou que sim (REsp 1.159.242/SP, de 2012, com base no art. 229 da CF/1988,
argumentando-se que “amar é faculdade, mas cuidar é dever”).
c) Direito à busca pela felicidade, citado como paradigma contemporâneo na impactante decisão
do Supremo Tribunal Federal2 que reconheceu a igualdade entre a paternidade socioafetiva e a
biológica, bem como possibilidade de multiparentalidade, com vínculo concomitante.
1.5.3.Princípio da igualdade entre os filhos (art. 227, § 6.º, da CF/1988 e art. 1.596 do
CC)
Segundo Flávio Tartuce Todos os filhos, havidos ou não durante o casamento, são iguais perante a
lei, sendo vedada qualquer forma de distinção ou discriminação.
Essa igualdade engloba os filhos havidos em união estável ou em relação extraconjugal. Também
engloba os filhos adotivos, os filhos havidos de técnica de reprodução assistida heteróloga e os filhos
socioafetivos.
São vedadas expressões discriminatórias, como filhos “adulterinos”, “incestuosos”, “ilegítimos”,
“espúrios” ou “bastardos”. Filho é filho e ponto final.
O tema retornará em estudo mais aprofundado por ocasião do estudo da filiação e do
reconhecimento dos filhos.
2 (STF, RE 898.060/SC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, j. 21.09.2016, publicado no seu Informativo n.
840).
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igualdade”. O autor explica que o conceito jurídico da igualdade é substancial: tratar desigualmente quem
está em posição desigual.
Ele traz a ideia de discrimen (a situação fática subjacente que justifica a desigualdade no caso
concreto). Ou seja, existindo uma situação fática subjacente de desigualdade, há discrimen, devendo o
tratamento jurídico ser desigual.
Portanto, de acordo com o princípio constitucional da igualdade, nas relações de família, homem e
mulher podem ter tratamento desigual, quando houver razão para tanto. Não havendo discrímen, o
tratamento deve ser igual. Ex.: a Lei Maria da Penha estabelece proteção especial à mulher que sofre
violência doméstica. O homem que apanha de mulher não pode invocar a proteção da lei, pois a violência
familiar contra o homem é pontual. Não há um histórico de homens vitimados sistematicamente no
âmbito da família.
Rogério Sanches entende que a Lei Maria da Penha é também aplicável aos transexuais e aos
travestis.
Assim como há a igualdade entre filhos, como outra forma de especialização da isonomia
constitucional a lei reconhece a igualdade entre homens e mulheres no que se refere à sociedade conjugal
ou convivencial formada pelo casamento ou pela união estável
Segundo Flávio Tartuce trata-se de uma especialização da igualdade entre homens e mulheres (art.
5º, inciso I, CF).
Há igualdade na chefia familiar, que antes era exercida pelo homem (o pátrio poder transformou-
se em poder familiar). Antes havia uma hierarquia, hoje uma “diarquia” ou “família democrática”.
Nesse sentido, há os artigos 1.565, CC, e 1.631, CC.
Obs.: O CPC/1973, no art. 100, previa o foro privilegiado da mulher para as ações de família. O art.
53 do CPC/2015, por sua vez, não prevê foro privilegiado da mulher e consagra o foro do guardião do
incapaz como o competente para as ações de família.
1.5.5. Princípio da não intervenção ou da Liberdade (art. 1.513, CC, e art. 1.565, §2º,
CC)
Dispõe o art. 1.513 do Código Civil Brasileiro que “é defeso a qualquer pessoa de direito público ou
direito privado interferir na comunhão de vida instituída pela família”. Trata-se de consagração do
princípio da liberdade ou da não intervenção na ótica do Direito de Família.
Segundo Flávio Tartuce quando se escolhe, na escalada do afeto (conceito de Euclides de Oliveira),
com quem ficar, com quem namorar, com quem noivar, com quem ter uma união estável ou com quem
casar, está-se falando em autonomia privada.
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Quanto ao ato de ficar, este é o primeiro degrau da escalada do afeto, sendo certo que o STJ já
entendeu que tal conduta pode influenciar na presunção de paternidade, principalmente se somada à
recusa ao exame de DNA3.
1.5.6.Principio do Maior Interesse da Criança e do Adolescente (art. 227, caput, CF, art.
3º, ECA; arts. 1.583 e 1.584, CC).
Conforme lição de Flávio Tartuce o princípio do maior interesse da criança e do adolescente é uma
exceção ao princípio acima estudado.
No Código Civil de 2002, o princípio do maior interesse da criança e adolescente é tutelado pelos
dispositivos que tratam da guarda no poder familiar (arts. 1.583 e 1.584, CC). Como será visto, a regra é
a guarda compartilhada, nos termos das alterações promovidas pelas Leis 11.698/2008 e 13.058/2014.
Encontra previsão na Convenção de Haia, que consagra a expressão “best interest of
child/children”.
(STJ, REsp 557.365/RO, 3.ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 07.04.2005, DJ 03.10.2005, p. 242).
3
(AgInt nos EDcl no REsp 1.590.554/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA
4
O princípio da pluralidade das entidades familiares foi consagrado no caput do art. 226 da CR:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...)
Assim dizendo, a CR determina que qualquer família tem especial proteção do Estado, e não
somente a oriunda do casamento. O princípio da pluralidade é norma jurídica de inclusão, não de
exclusão. Com isso, ele estabelece proteção a diferentes tipos de família.
O princípio da pluralidade também foi consagrado pelo ECA, no art. 28, ao fazer referência a três
diferentes tipos de família: natural, estendida (ampliada) e substituta. Natural é a que se forma entre
duas pessoas (por casamento ou não) e a sua prole. Família não pressupõe a existência de filho, mas
menciona-se prole, aqui, pois se trata do conceito do ECA (que envolve a existência de uma criança ou
adolescente). Ampliada é a composta por duas pessoas, mais os parentes de cada uma dessas pessoas
(avó, tio etc.). Substituta é a formada por guarda, tutela ou adoção.
O art. 226 da CR também faz menção a três diferentes tipos de família:
i) família casamentária (matrimonializada): §§ 1º e 2º;
ii) família convivencial (união estável): § 3º;
iii) família monoparental (comunidade de ascendentes e descendentes): § 4º
Surge a dúvida: o rol do art. 226 é taxativo? Como ressaltado, doutrina e jurisprudência são
unânimes em reconhecer que o rol é meramente exemplificativo. Até porque os parágrafos devem ser
interpretados de acordo com o caput, que se refere a toda e qualquer família, e não a uma específica.
Em outras palavras, existem novas entidades familiares além do rol constitucional, chamadas de
“Novas Famílias” por Maria Berenice Dias, que merecem especial proteção do Estado (avô e neto, tio e
sobrinho, irmão e irmã etc.). A família formada por dois irmãos é chamada de “anaparental”.
Se o conceito de família é aberto, há outros tipos de família, os quais vêm sendo designados de
famílias sociológicas ou entidades parafamiliares. Também devem ser protegidas pelo Estado.
Nesse sentido é reconhecida a Família Pluriparental ou “Mosaico”, como aquela que tem várias
origens, decorrendo de famílias reconstituídas. Exemplo: homem solteiro, que vive com as três filhas de
três relacionamentos distintos, passa a viver em união estável com mulher que tem três filhas também de
relacionamentos distintos, vivendo todos juntos com os filhos em comum do casal. “Os meus, os teus, os
nossos filhos” (Rolf Madaleno).
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União homoafetiva é família? Duas pessoas do mesmo sexo constituem unidade familiar? Carlos
Roberto Gonçalves e Maria Helena Diniz, historicamente, sustentavam que não, que se tratava de mera
sociedade de fato, e, portanto, disciplinadas pelo direito obrigacional.
Essa posição há muito já não era majoritária na doutrina (Maria Berenice Dias, Gustavo Tepedino,
Paulo Lobo), que passou a sustentar o caráter familiar da união homoafetiva (que será encontrada
também como união homoerótica). Nesse sentido: STJ REsp 820.475/RJ (reconhece, em 2008, a
possibilidade jurídica do pedido em ação declaratória de entidade familiar homoafetiva); TSE REsp
Eleitoral 24.564/PA (união homoafetiva como entidade familiar para fins de inelegibilidade eleitoral do
art. 14 da CR); e STF ADI 4277 (com efeitos erga omnes, reconhece a natureza de entidade familiar das
uniões homoafetivas, Rel. Carlos Ayres Britto).
O STF não disse, em momento algum, que união homoafetiva é união estável ou casamento. Disse
que se trata de entidade familiar protegida pelo direito de família. Todavia, teve de disciplinar tais uniões.
Com base no art. 4º da LINDB (quando a lei for omissa o juiz decide por analogia), entendeu que, sendo
entidade familiar, seria caso de analogia com a entidade mais parecida com ela, disciplinada em lei: a da
união estável. Assim, se o STF mandou aplicar as regras da união estável por analogia, ele disse que não
é união estável. Caso contrário, não seria necessária a aplicação analógica das regras.
Sendo aplicada toda a disciplina da união estável, a união homoafetiva gerará todos os efeitos
pessoais e patrimoniais daquela (alimentos, herança, nome etc.)
Veja que uma daquelas regras é justamente a possibilidade de conversão da união em casamento,
através de pedido dirigido ao juiz (art. 1.726 do CC):
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz
e assento no Registro Civil.
Assim, o atual panorama sobre o tema é que com a decisão do STF na citada ADPF, passou a ser
possível o casamento homoafetivo.
A ideia é que decisão do STJ de 2011, REsp 1.183.378/RS, entendeu que, se é possível converter a
união estável homoafetiva em casamento, também é possível efetuar o casamento direto no cartório.
A partir de 2012, Normas de Corregedorias dos Tribunais de Justiça passaram a regulamentá-lo.
Em 2013, surgiu a Resolução 175 do CNJ, de 2013, prevê: "Art. 1º É vedada às autoridades
competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em
casamento entre pessoas de mesmo sexo. Art. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata
comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis".
Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem
concubinato.
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Para o Código, o concubinato não é família, mas mera sociedade de fato, gerando efeitos tão
somente obrigacionais, a serem reclamados pelo concubino (amante) em vara cível, sem a intervenção
do MP. Concubino não tem direito de família.
Todavia, o art. 1.727 não estaria em rota de colisão com o princípio constitucional da pluralidade
de famílias? O STF, no RE 397.762-8/BA, e o STJ, no Ag em AI 1 130.816/MG, estabeleceram que o
concubinato não é família, mas sociedade de fato, por não merecer o tratamento de união estável.
O MP/GO exigiu isso em prova. Para Chaves, há uma hipótese em que o concubinato assumiria
caráter familiar: no caso de boa-fé. Nesse caso, caracterizar-se-ia uma união estável putativa (ou de boa-
fé), que ocorre quando a terceira pessoa ignora a existência da família anterior. Essa hipótese é possível
no caso, por exemplo, de motoristas, caminhoneiros. Esta tese conta com o apoio do TJ/RS, que construiu
a expressão “triação”, ao invés de “meação” (já que haverá a divisão do patrimônio em três).
A boa-fé de que se trata é a subjetiva. Mas poderia ser muito bem a objetiva, no caso em que todos
sabem e aceitam a situação. Em ambos os casos haveria a união estável putativa.
Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade.
§ 1º O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou
companheiro.
§ 2º Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável.
O parentesco por afinidade ocorre tanto nos casamentos quanto nas uniões estáveis, hetero ou
homossexuais.
ii) impedimento matrimonial (art. 1.521, II, do CC):
Na linha reta, o impedimento matrimonial não se dissolve nunca, nem pela morte, nem pelo
divórcio.
iii) exclusividade no exercício do poder familiar (art. 1.636 do CC):
Art 1.636. O pai ou a mãe que contrai novas núpcias, ou estabelece união estável, não perde, quanto aos
filhos do relacionamento anterior, os direitos ao poder familiar, exercendo-os sem qualquer interferência
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Parágrafo único. Igual preceito ao estabelecido neste artigo aplica-se ao pai ou à mãe solteiros que casarem
ou estabelecerem união estável.
O Código Civil não previu alimentos ou herança nas famílias recompostas. Assim, aquele que
precisar de alimentos não pode exigi-los do parente por afinidade. Também não tem direito de herança
o parente por afinidade se o falecido não deixar herdeiros. Ignora-se que o fundamento do direito de
família é o princípio da solidariedade.
A despeito da ausência de previsão do Código, há três outros efeitos jurídicos decorrentes do
parentesco por afinidade:
i) benefício previdenciário (art. 217, II, “a”, da Lei 8.112/1990):
II - temporária:
a) os filhos, ou enteados, até 21 (vinte e um) anos de idade, ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez;
(...)
Art. 1.105. Serão citados, sob pena de nulidade, todos os interessados, bem como o Ministério Público.
Se, citado, o pai ou a mãe se recusar à inserção do nome do padrasto ou madrasta, tal recusa não
vinculará o juiz, que poderá acatá-la, se motivada.
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Art. 226 (...) § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda
Constitucional nº 66, de 2010)
Casar e não permanecer casado revelam o verso e o reverso da mesma moeda, ou seja, aspectos de
um mesmo direito, que é a liberdade afetiva. Assim, à liberdade de casar corresponde seu espelho
invertido, que é a liberdade de não ficar casado.
Ao prever essa liberdade de não ficar casado, a EC 66/2011 produziu três efeitos:
i) abolição dos prazos para o divórcio (acabando com a diferença entre divórcio direto e divórcio-
conversão);
ii) impossibilidade de discussão de culpa pelo fim do casamento (não há interesse público na causa
da ruptura do casamento):
Observe que continua possível discutir culpa para fins de modificação da natureza dos alimentos e
para fundamentar eventual pedido de indenização, mas não para a discussão acerca da causa da ruptura.
iii) extinção do instituto da separação:
Doutrina e jurisprudência hoje caminham no sentido da extinção da separação. Até porque, se a
separação (que possui prazo) tivesse permanecido, haveria a estranha situação em que não seria
necessário prazo para o divórcio (o mais), mas haveria para a separação (o menos).
Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal. (...)
§ 4º Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e
pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal. (Incluído
pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5º A assistência referida no § 4º deste artigo deverá ser também prestada a gestantes ou mães que
manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Art. 13. (...) Parágrafo único. As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para
adoção serão obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude. (Incluído pela Lei nº
12.010, de 2009)
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Primeiramente, é importante desfazer o mito de que afeto é sinônimo de amor. Afeto é conceito
psicanalítico. Vem do verbo “afetar”, “interferir”. Logo, afeto é conviver. Oposto ao afeto é a indiferença,
a ausência de convívio.
Segundo a doutrina majoritária, o afeto é um princípio jurídico (Maria Berenice Dias, Maria Helena
Diniz, Paulo Lôbo, Luiz Edson Fachin, Giselda Hironaka e Ricardo Calderon). A jurisprudência superior
tem acompanhado essa ideia. Nesse sentido, o STJ se posicionou no REsp 1.026.981/RJ e o STF, no RE
898.060/SC (repercussão sobre a parentalidade socioafetiva):
Nesse sentido, trabalha-se com o afeto como valor jurídico de duas frentes: abandono afetivo e afeto
como formador de vínculos jurídicos.
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7 Enunciado 256, II JDC: “A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de
parentesco civil.”.
8 Vale observar que o STJ tem confirmado as indenizações concedidas pelos TJ´s aos homens que cobram da
mãe danos morais em decorrência de haverem os enganado e criado filho alheio. Mas veja que a indenização é
contra a ex-mulher. Nada tem contra o filho.
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criador dessa teoria da nulidade, respondeu que o casamento entre pessoas do mesmo sexo seria
inexistente. Ele e todos os franceses do século XIX seguiram esse posicionamento. E o que existe não é
válido nem inválido. Está fora do ordenamento jurídico.
Toda a doutrina brasileira clássica (Orlando Gomes, Silvio Rodrigues, Maria Helena) repetiu essa
certeza inconteste.
Problema prático: duas mulheres, no RS, pretenderam se casar. Não conseguiram decisões
favoráveis em primeira e segunda instâncias. No REsp 1.183.378/RS (leitura recomendada), o STJ faz
uma longa preleção sobre duas questões: i) não há expressa proibição no sistema de casamento
homoafetivo; ii) (parte criticada) um país democrático é aquele que protege suas minorias. Aquele que
não o faz, segundo o Ministro Salomão, só é democrático “no nome”, pois democracia significa proteger
diferenças. Esperar que o Congresso Nacional, que somente cuida de interesses majoritários (porque
eleito pela maioria) proteja a minoria é simplesmente exigir algo que nunca ocorrerá. Logo, conclui o
Ministro, cabe aos três Poderes a proteção das minorias. Não há monopólio de nenhum, podendo a
proteção ser feita por decisão judicial. Portanto possível o casamento entre as duas mulheres (seria dar
direitos a uma minoria ignorada). Alguns chamaram a decisão de ativismo judiciário. Simão chama de
proteção das minorias.
Mas era um precedente sem força vinculante. O problema do precedente é que causa fissura na
represa. A partir dele, vários estados da Federação passaram a mudar suas normas das Corregedorias, e
passaram a admitir, por norma dessa natureza, casamento homoafetivo, obrigando os registros civis a
celebrarem tais casamentos: BA, PI, AL, SE, PB, SP, PR, MS e ES. Nos demais, alguns toleravam (PE) e
outros vetavam (RJ).
O problema era a diferença de competência territorial. As pessoas passaram a falsificar documentos
para poderem casar. Até que veio, em maio de 2013, a pá de cal temporária da questão: a Resolução 175
do CNJ, obrigando todos os registros civis do Brasil a celebrarem casamentos homoafetivos, sob pena
de punição perante a Corregedoria.
2. Casamento
2.1. Conceito
Nos termos do art. 1.511 do CC, lembrando a doutrina de Van Wetter, pode-se definir o casamento
como uma instituição oficial, solene/formal que firma uma comunhão plena de vida entre os cônjuges,
na perspectiva do princípio constitucional da igualdade:
Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres
dos cônjuges.
Segundo Flávio Tartuce, o casamento é a união de duas pessoas, reconhecida e regulamentada pelo
Estado, formada com o objetivo de constituição de uma família e baseado em um vínculo de afeto.
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A própria lei, ao definir casamento, faz referência ao princípio da isonomia. Isto porque,
historicamente, tanto no direito brasileiro quanto estrangeiro, a mulher sofreu com o tratamento dado a
ela pelo Direito de Família. Clóvis Bevilaqua, há 100 anos, já dizia que o casamento não poderia significar
a degradação jurídica da mulher, tamanho o sofrimento que a ela era imposto.
O CC/2002, afinado à teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, tratou de consagrar
o princípio da igualdade no conceito de casamento, para acabar de vez com essa degradação sofrida pela
mulher.
Para a corrente privatista, o casamento é um instituto de direito privado (ainda que regulado por
normas que não podem ser afastadas ao alvedrio das partes). Essa corrente subdivide-se entre os autores:
i) não contratualistas; e ii) os contratualistas.
Os autores não contratualistas entendem que o casamento, embora instituto de direito privado, não
é um contrato. Reunidas sob o denominador comum não contratualista, há variadas opiniões acerca da
natureza jurídica do casamento, podendo-se destacar as seguintes:
i) o casamento é um negócio complexo;
ii) o casamento é um acordo;
iii) o casamento é um ato-condição (Leon Duguit):
Ato-condição é aquele que, quando praticado, coloca a parte em uma situação impessoal. Ou seja,
a parte, ao casar, se coloca em uma situação cujas regras não pode alterar. A maioria da doutrina dá o
casamento como exemplo de ato-condição, embora essa seja uma ideia não aceitável.
iv) o casamento é uma instituição (Maria Helena Diniz).
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Respeitável parcela da doutrina, desde Clóvis Beviláqua, chegando a Orlando Gomes, afirma, por
sua vez, que o casamento é um contrato especial de Direito de Família.
Claro que o casamento não pode ser comparado a um contrato qualquer, como um contrato de
alienação fiduciária, por exemplo. No entanto, diz-se que o casamento é um contrato, pois o núcleo dele
corresponde ao núcleo de um contrato: o consentimento das partes.
Com algumas condições específicas, o casamento pode ser anulado, tal como o contrato. Ex.: o
casamento pode ser anulado por erro, o que explicita sua natureza contratual.
2.2.2.1. Institucionalista
A teoria institucionalista defende que o casamento é uma instituição jurídica e social. Para esta
corrente, o casamento merece proteção por si só, autonomamente.
A tese é sustentada, entre outros, por Maria Helena Diniz e Rubens Limongi França, Havendo nessa
corrente uma forte carga moral e religiosa.
2.2.2.2. Contratualista
A teoria contratualista defende que o casamento não merece proteção por si só, mas pelas pessoas
que compõem o casamento. Para esta segunda corrente, encabeçada por Silvio Rodrigues, o casamento é
um contrato, um negócio entre as partes.
Sendo negócio entre as partes, precisa atender à vontade das partes, ao interesse recíproco. O
casamento é fundado na manifestação de vontade.
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Segundo a lição de Flávio Tartuce é mais pertinente afirmar que o casamento constitui um
negócio jurídico especial, com regras próprias de constituição e princípios específicos que, a priori,
não existem no campo contratual9:
i. Princípio da monogamia – pode ser retirado do art. 1.521, inc. VI, do CC, uma vez que não
podem casar as pessoas casadas; o que constitui um impedimento matrimonial a gerar a
nulidade absoluta do casamento (art. 1.548, inc. II, do CC). Na opinião deste autor, tal
princípio continua tendo aplicação para o âmbito do casamento.
ii. Princípio da liberdade de escolha, como exercício da autonomia privada – salvo os
impedimentos matrimoniais, há livre escolha da pessoa do outro cônjuge como
manifestação da liberdade individual, princípio esse retirado do art. 1.513 do CC.
iii. Princípio da comunhão plena de vida, regido pela igualdade entre os cônjuges – Retirado
do art. 1.511 do CC/2002, segundo o qual “o casamento estabelece comunhão plena de vida,
com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”. Tal regramento pode ainda ser
retirado do art. 1.565 do CC, ao enunciar que “pelo casamento, homem e mulher assumem
mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da
família”.
9Tartuce, Flávio. Manual de direito civil : volume único / Flávio Tartuce. – 9. Ed. Ver, atual. E ampl. – Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019. P.
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Não obstante a utilização da teoria geral do negócio jurídico como fundamento para a análise dos
pressupostos existenciais do casamento, há peculiaridades próprias no direito de família que têm de ser
observadas.
São pressupostos (ou requisitos) existenciais do casamento: consentimento, celebração por
autoridade materialmente competente e, ainda para alguns, diversidade de sexos.
Para existir um casamento, deve haver manifestação expressa de consentimento. As partes não
podem ficar em silêncio ou fazer brincadeiras, sob pena de a celebração restar suspensa pela autoridade
celebrante (que é obrigada a fazê-lo). Aqui, não se aplica a máxima “quem cala consente”.
Art. 1.554. Subsiste o casamento celebrado por aquele que, sem possuir a competência exigida na lei,
exercer publicamente as funções de juiz de casamentos e, nessa qualidade, tiver registrado o ato no
Registro Civil.
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do mesmo sexo é uma forma de família, merecedora da mesma proteção conferida às demais, formadas
por pessoas de diferentes sexos.
Em São Paulo, um juiz converteu em casamento a união estável entre pessoas do mesmo sexo, em
atenção à determinação constitucional no sentido de que a lei deve facilitar a conversão de uniões estáveis
em casamento. Já há diversas outras decisões, no mesmo sentido.
Como visto o CNJ editou a Resolução nº 175, determinando às serventias do país a celebração de
casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Tal Resolução está sendo questionada, via ADI, no STF.
Diante dessas questões, este terceiro requisito, que sempre foi um pressuposto existencial do
casamento, passa a ter de ser reanalisado.
Tradicionalmente, a diversidade de sexos é pressuposto existencial do casamento, por princípio
amplamente consagrado (Caio Mário). Inclusive, em reforço a este raciocínio, vale lembrar que,
diferentemente da união estável, o casamento é instituto formal e que gera estado civil, recomendando,
por segurança jurídica, a edição de lei que passasse a admitir o casamento civil entre pessoas do mesmo
sexo, como se deu por meio da lei espanhola de 1º de julho de 2005.
Todavia, a despeito da ausência de lei específica, como a pioneira decisão da 2a Vara de Família de
Jacareí, em São Paulo, admitiu a conversão da união estável em casamento civil, a evolução
jurisprudencial vem superando este terceiro requisito.
Pablo não é contra a decisão do juiz de São Paulo. A conclusão é lógica. Todavia, ela não
necessariamente significa que a jurisprudência caminhará no sentido de inadmitir este terceiro requisito,
na medida em que a diversidade de sexos sempre foi um pressuposto importantíssimo levantado pela
doutrina brasileira, e não é possível entender que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo seja
algo já aceito.
Isso porque o casamento é um procedimento formal, com habilitação, registro no Cartório de
Registro Civil, Registro de imóveis, proclamas etc., e muda o estado civil das pessoas. A união estável,
por sua vez, sempre teve o traço da informalidade.
De qualquer maneira, na opinião do professor Cristiano Chaves, após o julgamento da ADI 4277, é
preciso registrar o entendimento posterior do STJ de que é possível converter união homoafetiva em
casamento. Assim, para ele, o elemento diversidade de sexos não mais é elemento existencial do
casamento. Essa decisão altera a histórica fórmula dos elementos de existência do casamento.
Inicialmente, Flávio Tartuce leciona que conforme a corrente mista ou eclética, o casamento é um
negócio jurídico especial, solene e formal, pois segue regras específicas de constituição e formalidades.
Essas regras prevalecem sobre as regras da Parte Geral.
Ademais, a capacidade para o casamento não se confunde com os impedimentos matrimoniais. A
capacidade é genérica ou geral, ou seja, quem é incapaz não pode se casar com quem quer que seja;
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enquanto os impedimentos são específicos, envolvendo legitimação para o casamento e, por isso, atingem
determinadas pessoas em casos determinados.
A capacidade para o casamento é também chamada de capacidade núbil. Nos termos do art. 1.517
do Código Civil, homem e mulher podem se casar a partir dos dezesseis anos completos:
Art. 1.517. O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os
pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil.
Parágrafo único. Se houver divergência entre os pais, aplica-se o disposto no parágrafo único do art. 1.631.
Acabou a distinção de idades para o casamento entre homem e mulher, que havia no CC/16
(homem podia casar com mais de dezoito e mulher com mais de dezesseis).
A partir dos dezesseis anos completos até os dezoito incompletos, para o casamento é necessária
autorização do representante legal (pai, mãe ou tutor) ou do juiz, a depender da circunstância do caso
concreto, caso haja falta de um dos pais ou divergência.
Os arts. 1.518 e 1.519 do CC determinam que, até a data da celebração do casamento, o pai, tutor ou
curador pode revogar a autorização. E a revogação injusta poderá ser suprida pelo juiz, autorizando a
realização do casamento:
Art. 1.518. Até à celebração do casamento podem os pais, tutores ou curadores revogar a autorização.
Art. 1.519. A denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz.
Art. 1.520. Não será permitido, em qualquer caso, o casamento do menor de 16 anos, observado o
disposto no Art. 1.517 deste Código.
A alteração legislativa deu causou divergência na doutrina especialmente quanto à sanção caso
houvesse casamento do menor de 16 anos, sendo que:
i. Para a 1ª corrente o casamento passou a ser nulo. Posição de Cristiano Chaves Rolf
Madaleno – art. 166, VII, 2ª parte.
ii. Para a 2ª corrente, o casamento é anulável. Posição defendida por José F. Simão, Luciano
Figueiredo, Roberto Figueiredo, Pamplona, Maria Berenice Dias, entre outros – art. 1.550,
I, CC.
Finalmente, Flávio Tartuce ressalta que há equivalência entre o art. 1.517 e o art. 3º do Código Civil,
alterado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência. Portanto, a pessoa incapaz para a prática dos atos da
vida civil em geral também será incapaz para o casamento.
A pessoa com deficiência pode se casar livremente, conforme art. 6º, I, da Lei 13.146/201510 (EPD),
não mais havendo previsão da nulidade do casamento do enfermo mental.
10 Lei 13.146/2015, art. 6º, I: “A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: I -
casar-se e constituir união estável”
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Existem dois tipos básicos de casamento: i) o casamento civil; e ii) o casamento religioso com
efeitos civis (admitido pela Constituição de 1934).
Até 1890, os casamentos no Brasil eram realizados somente pela igreja. O Decreto 181/1890
determinou que todo casamento passasse a ser exclusivamente civil. A Constituição de 1934, no entanto,
flexibilizou a regra, admitindo o casamento religioso com efeitos civis. Hoje, os nubentes submetem-se a
um procedimento de habilitação e o casamento assumirá uma das modalidades acima. O casamento
religioso com efeitos civis tem como diferencial básico o fato de ser celebrado por autoridade religiosa
(padre, pastor, líder espiritual da umbanda etc.)
O Tribunal de Justiça da Bahia, em decisão pioneira (MS 34.739-8/2005), admitiu o casamento
espírita com efeitos civis. O casamento espírita (Kardecista) até então não havia sido admitido no país.
Há quem diga que o espiritismo não seria religião. Todavia, segundo Dalmo Dallari, não há na lei
requisitos que determinem o que seja religião. Também não há requisitos para a caracterização de
autoridade religiosa. O espiritismo não nasceu como religião, mas desenvolveu-se no Brasil como tal
(IBGE).
São formas especiais de casamento: i) o casamento por procuração (art. 1.542 do CC); ii) o
casamento nuncupativo (in articulo mortis ou in extremis), previsto no art. 1.540 do CC; e iii) o
casamento em caso de moléstia grave (art. 1.539 do CC).
A procuração para o casamento não pode ultrapassar noventa dias (esse é o prazo de validade
jurídica dela). É possível de haver dois procuradores casando seus representados.
Casamento nuncupativo é aquele realizado pela pessoa que está no leito de morte, para morrer.
Não há tempo para a realização das formalidades do casamento (formalização da habilitação), nem para
chamar o juiz.
No casamento por doença grave, o nubente não tem condições de se deslocar ao local da celebração.
O estado do nubente é menos grave. Dá tempo de chamar a autoridade celebrante.
No passado, o noivado era considerado uma oportunidade para as partes se conhecerem melhor
(aquilatação de afinidades). Com a evolução da sociedade, vive-se numa era em que até a “ficada” restou
conceituada em ementa de julgado (REsp 557.365/RO).
Hoje, é possível considerar noivado como a promessa de casamento que, quando
injustificadamente descumprida, poderá, por quebra de boa-fé objetiva, resultar em responsabilidade
civil por dano material e moral. A doutrina não diverge muito a esse respeito. Veja que não é sempre que
isso ocorrerá. Também não se trata de fim de namoro, que não possui roupagem jurídica.
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consultar um oráculo, que revela que ele estava mantendo relações sexuais com sua própria mãe e que,
em consequência disso, ela se mataria. Édipo, então, tomado de emoção e ainda apaixonado pela própria
mãe, voltou a casa e encontrou a mãe com os olhos arrancados, pois o oráculo tinha também aparecido
para ela no espelho.
Assim, os impedimentos matrimoniais visam a prevenir os efeitos deletérios que o casamento pode
implicar para a coletividade. As proibições para o casamento têm natureza biológica, psicológica e social,
exatamente porque não se deve permitir o casamento de determinadas pessoas, pela potencialidade de
efeitos danosos.
É digno de nota que a Lei 12.133/2009 estabeleceu que a habilitação para o casamento tramitará
perante o Oficial de Registro Civil, com intervenção do Ministério Público, só indo ao juiz em caso de
impugnação ou havendo necessidade de suprimento.
A lei diz que o MP tem de intervir no procedimento de habilitação. Na Bahia, todavia, há uma
orientação no sentido de que o MP somente deve intervir se houver interesse de criança ou de
adolescente. Deve-se checar se há regra análoga em cada estado.
Os impedimentos matrimoniais são analisados nessa fase da habilitação para o casamento.
No CC/16, eles eram tratados no art. 183. A doutrina, ao interpretar o dispositivo, reconhecia três
categorias de impedimentos matrimoniais: i) impedimentos absolutamente dirimentes; ii)
impedimentos relativamente dirimentes (ou impedimentos privados); e iii) impedimentos proibitivos ou
impedientes.
2.8.2. Impedimentos
Os impedimentos matrimoniais são analisados na fase da habilitação para o casamento.
No CC/16, eles eram tratados no art. 183. A doutrina, ao interpretar o dispositivo, reconhecia três
categorias de impedimentos matrimoniais: i) impedimentos absolutamente dirimentes; ii)
impedimentos relativamente dirimentes (ou impedimentos privados); e iii) impedimentos proibitivos ou
impedientes.
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Nos termos do art. 1.595 do CC, há parentesco por afinidade entre um cônjuge (ou companheiro11)
e os parentes do outro consorte (ou convivente).
É importante frisar que esse vínculo é perpétuo, não se extinguindo com o divórcio: “Sogra é
para a vida toda!”.
Obs.: os cunhados podem se casar livremente, pois são parentes afins colaterais.
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
Esta regra existe porque é como se a esposa do adotado fosse nora do adotante, nesse caso, Vale a
máxima pela qual a adoção imita a família consanguínea.
Sendo assim, até por ausência de previsão legal, o adotado pode se casar com a irmã do adotante,
pois esta seria como se sua tia fosse.
IV - os irmãos, unilaterais [só de pai ou só de mãe] ou bilaterais [germanos], e demais colaterais, até
o terceiro grau inclusive;
Além da ética familiar, não podem se casar os irmãos para evitar doenças recessivas graves.
Também não podem casar tio e sobrinha. Vale observar, entretanto, que a despeito da proibição
constante na parte final do inciso IV do art. 1.521, a doutrina brasileira (Enunciado 98 da I Jornada12),
amparada no DL 3.200/1941, sustenta a excepcional possibilidade de casamento entre colaterais de
terceiro grau, se houver parecer médico favorável, o chamado casamento avuncular.
É permitindo o casamento entre primos, pois são colaterais de 4º grau.
VI - as pessoas casadas;
Segundo Flávio Tartuce, o atual Código continua consagrando o princípio da monogamia para
o casamento. Mesmo sendo tratada como impedimento matrimonial – e assim deve ser visualizada como
categoria jurídica criada pela lei –, a hipótese parece ser de incapacidade matrimonial. Isso porque a
pessoa casada não pode contrair matrimônio com qualquer um que seja.
VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu
consorte.
Para a incidência desta hipótese, a lei não fala em trânsito em julgado da sentença penal
condenatória, mas Flávio Tartuce aponta que a posição majoritária é de que o crime deve ser doloso, com
trânsito em julgado da sentença condenatória. A sentença penal superveniente não nulifica o casamento
já efetuado.
Não consta mais no rol de impedimentos aquele referente à impossibilidade de o casal condenado
por adultério contrair núpcias. Isso não significa que o adultério tenha deixado de ser ilícito. Há inúmeras
decisões no Brasil reconhecendo que se trata de ato desvalioso, passível de responsabilização civil
(indenização por danos morais).
O casamento nulo encontra referência nos arts. 1.548 e 1.549 do CC:
Art. 1.549. A decretação de nulidade de casamento, pelos motivos previstos no artigo antecedente, pode
ser promovida mediante ação direta, por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público.
Arremata Flávio Tartuce no sentido de que “Em relação aos efeitos, os impedimentos matrimoniais
impossibilitam a celebração do casamento mediante procedimento administrativo que corre perante o
Cartório de Registro das Pessoas Naturais (arts. 1.529 e 1.530 do CC). A sua oposição poderá ocorrer até
o momento da celebração, por qualquer pessoa capaz (art. 1.522 do CC). Caso o oficial do registro ou
qualquer juiz tenha conhecimento do impedimento, deverá reconhecê-lo de ofício (ex officio). Caso o
casamento seja celebrado, será ele nulo de pleno direito, havendo nulidade absoluta (art. 1.548, inc. II,
do CC).”.
Art. 1.523. Não devem casar: [observe que a lei fala em “não devem”, em contraposição ao
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I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e
der partilha aos herdeiros;
A razão deste inciso é evitar confusão de patrimônio do marido que morreu com o do marido novo.
Ademais, além do regime da separação obrigatória de bens (art. 1.641, CC), impõe-se como sanção
a hipoteca legal a favor dos filhos sobre os imóveis dos pais (art. 1.489, II, CC).
Obs.: Se a prole for de apenas um dos cônjuges, não se impõe a causa suspensiva ao sobrevivente,
pois se trata de limitação da autonomia privada que somente pode decorrer de lei, não admitindo
interpretação extensiva ou analogia.
II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois
do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;
A razão deste impedimento é evitar a confusão acerca da paternidade de eventual filho (turbatio
ou confusio sanguinis): se ela tiver um filho, ele poderá ser do primeiro marido.
Flávio Tartuce observa que com os avanços da medicina, esta causa suspensiva tende a desaparecer,
pois se busca cientificamente a realização de um exame que demonstre a parentalidade da criança via
exame de DNA, sem que isso ofereça riscos à prole e à sua mãe.
III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;
A razão deste dispositivo é a mesma do primeiro: evitar a confusão patrimonial (que ocorreria, por
exemplo, se o novo casamento fosse realizado sob o regime da comunhão total de bens) , uma vez que o
divórcio pode ser concedido sem a prévia partilha de bens (art. 1.581 do CC).
Anote-se que a lei exige apenas a homologação ou decisão da partilha e não a sua efetivação em si.
IV - o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa
tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas
contas. (...)
A razão é moral, pois, supostamente, o tutor ou o curador poderia induzir o tutelado ou o curatelado
a erro, diante de uma relação de confiança, o que geraria repercussões patrimoniais.
Em todas as hipóteses, enuncia o parágrafo único do art. 1.523 do Código Civil que desaparece a
causa suspensiva se for provada a ausência de prejuízo aos envolvidos.
Ademais, conforme visto acima, as causas suspensivas não impedem a celebração do casamento.
Não é possível o conhecimento de ofício de tais causas, sendo que somente podendo ser arguidas
pelos interessados descritos no art. 1.524 do Código Civil:
CC, art. 1.524: “As causas suspensivas da celebração do casamento podem ser argüidas pelos parentes em
linha reta de um dos nubentes, sejam consangüíneos ou afins, e pelos colaterais em segundo grau, sejam
também consangüíneos ou afins.”.
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O CC/2002, com alguma mudança de conteúdo, os trata como “causas de anulação do casamento”,
no art. 1.550. Quem se casa violando o dispositivo tem como consequência também a anulabilidade.
Portanto, mutatis mutandis (houve aperfeiçoamentos), os impedimentos relativamente dirimentes são
tratados como causa de anulação (e não nulidade) do casamento:
Como visto, o menor que tiver menos idade do que o limite mínimo para casar está agora totalmente
impedido de contrair matrimônio, diante da nova redação do art. 1.520 do Código Civil, modificado em
2019, pela Lei 13.811.
II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;
O adolescente entre dezesseis e dezoito anos que não tenha a devida autorização celebra casamento
anulável.
Segundo Flávio Tartuce como hipótese de convalidação, não se anulará esse casamento quando à
sua celebração tiverem assistido – no sentido de presenciado –, os representantes legais do menor, ou se
esses representantes tiverem manifestado a sua aprovação (art. 1.555, § 2.º, do CC).
III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;
13 Flávio Tartuce ilustra com o exemplo de A e B, marido e mulher, vendem um imóvel a C, que o adquire de
boa-fé. O casamento dos primeiros é declarado nulo por sentença judicial, pois A já era casado. Mesmo havendo
essa nulidade, o que geraria eventual partilha do bem, a venda é válida, pois celebrada com boa-fé por C, que
funciona como um escudo contra a nulidade.
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Tratam-se das hipóteses de casamento celebrado sob coação moral (vis compulsiva), bem como
casamento celebrado havendo erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge (error in persona).
Nesse sentido, merecem especial atenção as hipóteses de anulação do casamento por vício da
vontade, previstas nos arts. 1.556 a 1.558 do CC:
Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao
consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.
I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento
ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
Exemplos: o sujeito casa e, depois, descobre que a esposa é uma viciada inveterada em jogo; o
sujeito casa e, depois, descobre que o marido ou a mulher tem ou teve vida sexual pretérita. Exemplo de
erro quanto à identidade: um transexual pode se casar com um homem, na medida em que tem sua
identidade alterada (há uma mudança oficial do status do transexual). Aquele que se casa com o
transexual tem o direito de saber dessa condição pretérita. Caso não saiba, pode anular o casamento por
erro.
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;
Exemplo: o sujeito se casa com uma mulher e descobre que ela responde a diversos processos por
crimes graves praticados antes do casamento.
Flávio Tartuce alerta que não há necessidade do trânsito em julgado da sentença, bastando a
repercussão social do crime e a insuportabilidade da vida em comum
III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou
de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro
cônjuge ou de sua descendência;
Exemplo: a esposa casa e descobre que o marido portava moléstia grave, transmissível por contato
sexual, da qual ele era portador, sabia e não disse. Vale observar que se o portador da doença não sabia
da enfermidade, não há que se falar em anulação, cabendo somente o divórcio (que hoje não tem
condicionantes).
Exemplo comum dado pela doutrina de defeito físico irremediável que pode gerar a anulação do
casamento é a impotência coeundi (impossibilidade de ter ereção) descoberta depois do casamento. A
noiva, nesse caso, terá de provar que não tinha intimidade com o marido. A impotência coeundi não se
confunde com a generandi (incapacidade de ter filhos), que não anula o casamento. O casal que, depois
do casamento, descobre que sofre de infertilidade, não pode, por essa razão, anular o casamento.
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O caso de impotência generandi ou concipiendi (que impede ter filhos) não anula o casamento,
entretanto, caso um cônjuge engane o outro, dizendo que poderia ter filhos, a anulação é possível com
fundamento no inciso I: a má conduta, o engodo, o engano (desvio de caráter, de conduta moral).
O casamento tem finalidade reprodutiva para algumas religiões, mas não para o direito14.
Finalmente, observa-se que o inciso IV do art. 1.557 foi revogado pelo Estatuto da Pessoa com
Deficiência (Lei 13.146/2015), pois mencionava a descoberta de doença mental grave para fins de
anulação.
Segundo o art. 1.558, define-se a coação moral quando há temor de mal considerável e iminente
para a vida, a saúde e a honra do nubente ou de seus familiares.
Flávio Tartuce aponta duas diferenças em relação à coação moral prevista para a teoria geral do
negócio jurídico, uma vez que a última pode estar relacionada a bens e a pessoas que não sejam da família
do coagido (art. 151 do CC).
Trata das hipóteses do Art. 4º, II e III, CC, ou seja, os viciados em álcool e tóxicos e as pessoas que,
por causa transitória ou definitiva, não puderem exprimir sua vontade (um cidadão em coma p. ex.).
O pródigo pode casar livremente, sua interdição não alcançará o casamento (art. 1.782 do CC),
poois somente diz respeito a atos de alienação direta de bens, como emprestar, transigir, dar quitação,
alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado.
V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e
não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
Se o mandante revoga o mandato e não avisa o mandatário, o casamento celebrado é anulável. Para
Pablo, deveria ser inexistente, pois, revogado o mandato, a vontade desaparece. Mas não é essa a
determinação legal.
Ademais, se o mandato for reconhecido como inválido/nulo, o casamento continua anulável (art.
1.550, § 1º, CC).
O dispositivo excepciona a hipótese em que o mandante coabita com o outro cônjuge. Neste caso,
considera-se que houve convalidação do vício e confirmação do casamento.
Flávio Tartuce leciona que a hipótese trata da incompetência relativa em relação ao local
(ratione loci)
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Caso se verifique algum dos vícios acima é possível manejar a “ação anulatória” que é constitutiva
negativa, o que justifica todos os prazos decadenciais previstos em lei, consoante tabela a seguir:
a) Coação – 4 anos;
b) Erro – 3 anos;
c) Incompetência relativa – 2 anos;
d) Demais situações – 180 dias.
Em regra, a contagem se faz a partir da celebração do casamento.
A despeito da polêmica, é razoável a tese segundo a qual a eficácia da sentença anulatória de
casamento é retroativa (Zeno Veloso, Tartuce, Simão). Há doutrina em sentido diverso (Orlando Gomes,
Maria Helena Diniz), de modo que a sentença que anula o casamento retroage para atingir o Registro
Civil em sua origem (cancela-se o registro e o sujeito volta a ser solteiro). O divórcio não tem essa
consequência, pois o ex-cônjuge não volta a ser solteiro, mas se torna divorciado.
Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento,
em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.
§ 1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos
aproveitarão.
§ 2º Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos
aproveitarão.
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Art. 1.554. Subsiste o casamento celebrado por aquele que, sem possuir a competência exigida na lei,
exercer publicamente as funções de juiz de casamentos e, nessa qualidade, tiver registrado o ato no
Registro Civil.
Pablo prefere não falar em casamento inexistente putativo, mas em uma “situação excepcional de
casamento inexistente que tem seus efeitos jurídicos preservados”.
Exemplo: irmãos casam-se sem saber que eram irmãos. O juiz trata do casamento putativo como
se fosse um divórcio. Ele desfaz o casamento, mas separa os bens, garante o direito aos alimentos etc.
Se apenas um dos cônjuges estiver de boa-fé o casamento é nulo, mas preservam-se os efeitos
jurídicos com relação ao de boa-fé. Ex.: sujeito casado se casa em outro estado com outra mulher (já que
não há sistema informatizado nacional de registro civil). A segunda mulher terá direito de levar de volta
o que trouxe ao casamento, partilhar o que foi adquirido na constância do casamento, direito de
alimentos etc.
A despeito da polêmica, é razoável a tese segundo a qual o juiz, por decorrência da norma superior
da boa-fé objetiva poderá, de ofício, reconhecer a putatividade. Isso decorre não só da boa-fé objetiva
como da função social da família. Trata-se, contudo, de controversa discussão acadêmica.
Na lição de Flávio Tartuce três regras devem ser observadas:
1ª hipótese: Boa-fé de ambos os cônjuges.
O casamento gera efeitos para ambos e para os filhos até o trânsito em julgado da sentença
anulatória/declaratória de nulidade.
2ª hipótese: Má-fé de ambos os cônjuges.
O casamento somente gera efeitos para os filhos e não para os cônjuges de má-fé. A eventual
partilha de bens será feita de acordo com as regras obrigacionais e não pelas regras do Direito de Família.
Aplicam-se as regras da vedação do enriquecimento sem causa (art. 884, CC).
3ª hipótese: Boa-fé de um dos cônjuges e má-fé do outro
O casamento gera efeitos para os filhos e para o cônjuge de boa-fé. Neste caso, o art. 1.564 do CC
considera o cônjuge de má-fé como culpado, atribuindo-lhe duas sanções: a primeira delas é perda de
todas as vantagens patrimoniais havidas do cônjuge inocente. A segunda sanção é a necessidade de
cumprimento das promessas feitas no pacto antenupcial, como, por exemplo, a promessa de doação.
Todavia Flávio Tartuce alerta que, com a entrada em vigor da Emenda do Divórcio (EC 66/2010),
há quem entenda que a culpa foi banida do sistema de casamento, o que inclui a anulação do casamento,
perdendo aplicação o dispositivo em comento
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Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes,
companheiros e responsáveis pelos encargos da família.
§ 1º Qualquer dos nubentes [nubente não é o casado, mas o noivo], querendo, poderá acrescer ao
seu o sobrenome do outro.
I - fidelidade recíproca;
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O dever de sustento, guarda e educação dos filhos, previsto no inciso IV, deriva da condição de pai
e mãe (poder familiar). Não é propriamente decorrente do casamento.
O dever de coabitação pode ser mitigado por razões profissionais, ou mesmo por decisão conjunta
dos consortes. Ainda que, sem justificativa, o abandono do lar possa significar a frustração desse dever,
com a emenda do divorcio tal abandono perdeu a importância de outrora.
Observa Orlando Gomes que a coabitação representa mais do que a simples convivência sob o
mesmo teto, mas também união carnal (debitum conjugale). Segundo os autores clássicos, não havendo
razões de saúde ou decisão conjunta de abstenção, o dever de coabitação envolveria o dever sexual (numa
relação sexual normal).
Os autores mais modernos costumam criticar a expressão debitum conjugale, tratando como dever
o ato sublime do sexo, à luz do princípio da personalidade. Contudo, para Pablo, os autores que realizam
essa justa crítica não se preocupam em dizer o que seria o debitum conjugale (eles dizem o que não é).
Não se pode deixar de reconhecer que o ato sexual é um efeito jurídico do casamento, uma
consequência. Tanto que, se descumprida, poderá gerar repercussões. Há um julgado do TJRS em que a
esposa recusou-se à relação sexual de forma peremptória e teve o casamento anulado. A fundamentação
foi que o sexo é uma consequência natural e esperada do casamento (Apelação Cível 70016807315).
i) quase-adultério:
Trata-se da situação em que existem atos preparatórios à relação sexual espúria. Ex.: o sujeito
encontra a esposa beijando o pescoço do outro. Aquilo é um gesto de infidelidade que a doutrina costuma
chamar de quase-adultério.
ii) adultério inocente, casto ou de seringa:
Tecnicamente, não se trata de adultério, pela ausência de relação sexual. Traduz a situação de
infidelidade praticada por meio de método científico de reprodução humana assistida não autorizada
pelo cônjuge traído. É algo muito difícil de ocorrer, na medida em que os laboratórios hoje seguem
protocolos rígidos.
Há dois tipos de reprodução assistida: homóloga (o material fecundante é do próprio casal) e
heteróloga (o material fecundante é de terceiro). Caso a esposa realize inseminação heteróloga sem a
autorização do marido, ele se considerará traído e a se configurará a hipótese de adultério inocente, casto
ou de seringa.
iii) adultério precoce:
O adultério precoce ocorre quanto o cônjuge abandona o outro imediatamente após a celebração
do casamento.
iv) adultério “virtual”:
Esta hipótese, que melhor seria se denominada “infidelidade virtual” (por não haver contato físico
entre os parceiros) opera-se por meio da tecnologia digital, mediante troca de e-mails, chats de bate-papo
e redes sociais e de relacionamento. A 2ª Vara Cível de Brasília, segundo o site Consultor Jurídico,
reconheceu a infidelidade virtual de um homem e o condenou a pagar R$ 20.000,00 à esposa pelos
“desvios amorosos” cometidos via Internet.
Relativamente ao adultério virtual, pergunta-se acerca da eventual ilicitude da prova colhida, em
cotejo com o direito de intimidade. No caso acima, a juíza entendeu que o computador era de ambos os
consortes. Todavia, Pablo entende que, à luz da proporcionalidade, a fonte de prova poderia ser aceita,
com base no cotejo entre o direito à intimidade e o direito moral da esposa traída.
O adultério virtual é tema a ser abordado em concurso, em virtude do avanço da tecnologia e do
surgimento de diversos meios de comunicação e interação social (ex.: os “avatares” criados no Second
Life). Um “adultério” no Second Life pode gerar quebra do dever de fidelidade?
Com o crescente avanço tecnológico, anota-se tendência do direito brasileiro e internacional no
sentido de buscar mecanismos de responsabilidade civil que visem a coibir abusos e preservar os direitos
da personalidade.
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Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que
lhes aprouver.
§ 1º O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento. (...)
Ainda que com outras palavras, está dito aqui que durante o procedimento de habilitação para o
casamento, que corre no Cartório de Registro Civil, os noivos podem fazer uma opção por um regime de
bens.
A escolha do regime de bens opera-se por meio de um contrato especial e solene, denominado pacto
antenupcial (arts. 1.653 e seguintes do CC). Esse contrato deve ser lavrado por escritura pública e levado
a registro no Cartório de Registro Civil e no Cartório de Registro de Imóveis. Evidentemente, o pacto
antenupcial é um contrato condicionado ao casamento, sob pena de ineficácia:
Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o
casamento.
No Brasil, existem os seguintes regimes de bens: i) comunhão universal de bens; ii) comunhão
parcial de bens; iii) separação de bens; e iv) participação final dos aquestos. A escolha por um deles, como
visto, faz-se através do pacto antenupcial.
Embora não seja comum, a doutrina considera juridicamente possível que, no pacto antenupcial,
possam ser mescladas regras de regimes diversos (Enunciado 331 da IV Jornada de Direito Civil):
Enunciado nº 331 - Art. 1.639: O estatuto patrimonial do casal pode ser definido por escolha de regime de
bens distinto daqueles tipificados no Código Civil (art. 1.639 e parágrafo único do art. 1.640), e, para efeito
de fiel observância do disposto no art. 1.528 do Código Civil, cumpre certificação a respeito, nos autos do
processo de habilitação matrimonial.
É como se se estivesse no campo da autonomia privada. Isso não é comum. Geralmente, os noivos
optam por um dos regimes puramente (“o pacote pronto”), mas nada impede que eles mesclem regras de
regimes diversos. Essa possibilidade já foi exigida em concurso.
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Art. 1.640. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os
cônjuges, o regime da comunhão parcial.
Parágrafo único. Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este
código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto
antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas.
Assim, desde 1977, se os noivos não escolherem o regime de bens através de pacto antenupcial,
ficarão submetidos ao da comunhão parcial de bens. Antes de 1977, o regime legal supletivo era o da
comunhão universal de bens.
Pablo considera bom que o regime da comunhão parcial seja o regime legal supletivo, por ser, de
todos, talvez o mais justo: separam-se os bens anteriores ao casamento e são divididos os bens adquiridos
onerosamente pelo casal no curso do casamento.
Segundo Flávio Tartuce, o regime de bens é regido pelos seguintes princípios fundamentais:
i. Princípio da autonomia privada: há liberdade na escolha das regras quanto ao regime
de bens, nos termos do art. 1.639 do CC.
Esse princípio encontra limitações nas normas de ordem pública. Exemplo: O art. 1.641 do CC, que
impõe o regime da separação obrigatória de bens (separação legal).
Flávio Tartuce observa que o exercício da autonomia privada se dá pelo pacto antenupcial, em
regra, que não pode contrariar os preceitos de ordem pública. Sendo assim, podem os cônjuges escolher
outro regime que não seja o regime legal (comunhão parcial de bens); fazendo opção pela comunhão
universal, pela participação final nos aquestos ou pela separação de bens.
É possível, ainda, a criação de um regime misto, combinando as regras dos regimes previstos em
lei, de modo que o rol de regime de bens acima é exemplificativo (numerus apertus).
Os nubentes podem estipular regimes diversos por meio do pacto antenupcial ou do contrato de
convivência (exercício da autonomia da privada), conforme Enunciado 331 da IV Jornada de Direito
Civil15.
15Enunciado 331, IV JDC: “O estatuto patrimonial do casal pode ser definido por escolha de regime de bens
distinto daqueles tipificados no Código Civil (art. 1.639 e parágrafo único do art. 1.640), e, para efeito de fiel
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Trata-se de inovação do Código Civil de 2002, trazida pelo Art. 1.639, § 2º, do CC, que prevê a
possibilidade aos cônjuges da propositura de uma ação judicial para modificar o regime, desde que de
forma consensual, na linha do defendido por autores como Orlando Gomes (que já levantava essa
bandeira antes da entrada em vigor do novo Código):
Art. 1.639 (...) § 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido
motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de
terceiros.
Hoje, portanto, é possível que os nubentes alterem o regime de bens no curso do casamento. Na
prática, essa mudança opera-se mediante autorização judicial, em pedido motivado de ambos os
cônjuges.
Essa ação deverá estar fundada em justo motivo e devem ser ressalvados os direitos de terceiros -
art. 734 do CPC16, de modo que não pode ser realizada administrativamente
Ex.: a mudança no regime de bens não pode prejudicar credores do marido, empresário individual.
Como se sabe, o empresário individual registra-se na Junta Comercial e, quando o faz, aponta seu regime
de bens. Não pode o empresário individual, endividado, alterar o regime para fazer escapar do seu
patrimônio bens e, com isso frustrar credores.
Por conta disso, o juiz, no procedimento de alteração de regime, deve publicar editais, para dar
ciência a terceiros, ainda que haja a possibilidade de impugnação posterior.
observância do disposto no art. 1.528 do Código Civil, cumpre certificação a respeito, nos autos do processo de
habilitação matrimonial.”
16 6CPC, art. 734: “A alteração do regime de bens do casamento, observados os requisitos legais, poderá ser
requerida, motivadamente, em petição assinada por ambos os cônjuges, na qual serão expostas as razões que
justificam a alteração, ressalvados os direitos de terceiros. [...]”
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Feita a alteração, o juiz deve expedir mandado ao Cartório de Registro Civil em que está registrado
o casamento, ao Cartório de Registro de Imóveis (caso eles possuam algum imóvel) e, se qualquer dos
nubentes for empresário, à Junta Comercial.
Na opinião de Pablo, o pedido é formulado na Vara de Família, por conta da alteração do estado
civil (de casado).
Conforme já decidiu o STJ17 e entende a doutrina majoritária, a sentença que altera o regime de
bens tem eficácia ex nunc, sendo Flávio Tartuce entende que visando a proteger interesses de terceiros.
Logicamente, se os efeitos são ex nunc, os interesses de terceiros estão protegidos, o que torna inócua a
parte final do § 2º do art. 1.639 do CC, do art. 734 do CPC e do Enunciado 11318, quanto ao justo motivo
e à necessidade de ampla publicidade
Quando o CC/02 entrou em vigor, parte da doutrina passou a defender que a regra nova somente
seria aplicável aos casamentos ocorridos a partir da nova lei. No entanto, o STJ já pacificou o
entendimento de que pessoas casadas antes do CC/02 também podem alterar o seu regime de bens19.
Há um julgado do STJ, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, admitindo a mudança de regime de
bens para quem foi casado sob o regime da separação obrigatória de bens (REsp 821.807/PR).
Cuidado ao falar em “regime de separação de bens”, pois há duas espécies de separação de bens: i)
convencional (escolhida mediante pacto antenupcial pelos nubentes); e ii) a legal (imposta pela lei, nas
hipóteses do art. 1.641 do CC):
I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
[como visto, as causas suspensivas estão no art. 1.523 do Código Civil]
II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.344, de 2010) [antes da
mudança, o regime de separação obrigatória era aplicável àqueles que se casassem com
mais de sessenta anos]
17 (STJ. REsp n. 1.300.036/MT, Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe de
20/5/2014);”
18 Enunciado 113, I JDC: “É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando então o
pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva
dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida de qualquer
natureza, exigida ampla publicidade.”.
19 (STJ. REsp 730.546 - MG. 2005/0036263-0. Rel. Min. Jorge Scartezzini. Julg. 23/08/2005. Dj.
03/10/2005).
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Súmula 377 - No regime de separação legal de bens, comunicam-se os bens adquiridos na constância do
casamento. (pelo esforço patrimonial comum – Pacificação do STJ em 201821)
Note que a Súmula permite que sejam partilhados bens adquiridos com esforço comum do casal,
mas não transforma o regime de separação legal em comunhão parcial de bens. A partilha de bens
comuns não é a única característica da comunhão parcial, a qual possui regras específicas.
Ademais, a Súmula não se aplica à separação convencional, que é absoluta, por haverem as partes
escolhido o regime.
O Código Civil, quando disciplina os regimes de bens, é bastante detalhado no que concerne aos
bens que entram ou não na meação.
20 Enunciado 125 da I JDC: “A norma que torna obrigatório o regime de separação absoluta de bens em razão
da idade dos nubentes não leva em consideração a alteração da expectativa de vida com qualidade, que se tem
alterado drasticamente nos últimos anos. Também mantém um preconceito quanto às pessoas idosas que, somente
pelo fato de ultrapassarem determinado patamar etário, passam a gozar da presunção absoluta de incapacidade
para alguns atos, como contrair matrimônio pelo regime de bens que melhor consultar seus interesses.”
21 (EREsp 1.623.858/MG, Rel. Desembargador Lázaro Guimarães, Segunda Seção, julgado em 23.05.2018,
DJe 30.05.2018).
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casamento, a título oneroso, por um ou ambos os cônjuges. Dentre outros, os bens adquiridos antes do
casamento e os sub-rogados em seu lugar não entram no patrimônio comum22.
Nesse sentido, ensina Flávio Tartuce que se comunicam os bens havidos durante o casamento
(posteriores ou comuns), excluindo-se dos bens incomunicáveis, tidos como bens particulares, caso dos
bens anteriores à união.
Ex.: um carro que o sujeito tinha antes do casamento pertence ao patrimônio exclusivo dele. Se ele
vender esse veículo e, com o dinheiro, adquirir outro carro no curso do casamento, o carro mantém-se
do sujeito, não entrando na meação. Todavia, se o sujeito adquire um veículo em valor superior (ex.:
vende o carro por R$ 25.000,00 e adquire outro, no casamento, por R$ 100.000,00), a diferença
entrará na comunhão.
Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância
do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por
doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; [bens adquiridos a título gratuito não entram
na comunhão]
II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos
bens particulares;
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; [esta hipótese pode conduzir a uma
conclusão injusta, no caso, por exemplo, da esposa que ajuda o dentista a montar seu
consultório]
Pela letra da lei, o direito ao crédito salarial (provento do trabalho pessoal de cada cônjuge) não
entraria na meação (ainda que haja a comunicabilidade dos bens adquiridos com o salário). Ocorre que
o STJ, em mais de uma oportunidade, já decidiu contra legem: buscando evitar situações em que a esposa
saísse do casamento sem qualquer bem, o Tribunal mandou dividir o crédito trabalhista referente ao
período em que o casal esteve junto (REsp 421.801/RS e REsp 646.529/SP). Admitindo a divisão do
FGTS, em união estável, ver o REsp 758.548/MG.
22 Para uma visão completa dos patrimônios pessoais e comum, deve-se ler o art. 1.658 a 1.660 do Código
Civil.
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Ademais, é de se observar que no caso dos incisos VI e VII do art. 1.659, CC, deve-se fazer uma
interpretação restritiva para não ferir o “espírito do regime”. Assim, se o valor for patrimonializado,
haverá a comunicação.
I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos
cônjuges; [o sujeito que adquire um carro ou um escritório, ainda que só com o salário dele,
terá de dividir o valor com a esposa, em caso de divórcio, Para a comunicação não há
necessidade de prova de esforço comum, havendo presunção de ingresso nos aquestos]
II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; [se o
sujeito ganhar na Mega Sena, metade do prêmio será da esposa]
III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do
casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão. [aluguéis de imóvel e verbas trabalhistas
recebidas ou pendentes durante a união. REsp. 646.529/SP e REsp. 1.399.199/RS.]
Outra regra importante na comunhão parcial é a prevista no art. 1.661 do Código Civil:
Art. 1.661. São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento.
Trata-se do exemplo dado anteriormente, do sujeito que possuía um carro antes do casamento e,
com o dinheiro da venda, adquire outro, no curso do casamento. O carro adquirido não entrará na
comunhão, uma vez que a aquisição teve por título uma causa anterior ao casamento. Da mesma forma,
se o sujeito tinha uma poupança, o que ele tinha até o casamento não se divide.
Questão interessante: o sujeito, solteiro, celebra um compromisso de compra e venda, financiando
a aquisição de um apartamento, e quita todas as prestações antes do casamento. Como se sabe, quando
o promitente comprador quita todas as prestações, é então lavrada a escritura definitiva de compra e
venda. Celebrada a promessa, o sujeito não é efetivamente dono da coisa. Somente com a quitação de
todas as parcelas é lavrada a escritura definitiva de compra e venda, ocasião em que o sujeito passa a ser
considerado dono. Pois bem, o sujeito casa-se e a escritura de compra e venda é lavrada somente após o
casamento. Formalmente, o sujeito torna-se dono da coisa com a lavratura da escritura definitiva. No
entanto, como determina o art. 1.661 do CC/2002, tal bem é incomunicável, na medida em que a
aquisição teve por título uma causa anterior ao casamento. Orlando Gomes chega a dizer que a escritura
definitiva, nesse caso, é um ato devido, consequencial, decorrente da necessidade de formalização.
Caso o cidadão, no exemplo dado, tivesse pagado metade das prestações enquanto casado, a esposa
teria direito proporcional de meação no que se refere ao valor das prestações pagas ao longo do
casamento. Trata-se de presunção de esforço comum, pouco importando se as parcelas foram pagas com
o salário exclusivo do cônjuge.
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A comunhão universal era o regime de bens preferido do direito antigo, tanto que até 1977 era o
supletivo, como visto. Era preponderante em Portugal (por isso influenciou a legislação brasileira) e
elogiado por autores clássicos, com Lafayete Rodrigues Pereira. Hoje, ele está em desuso, na medida em
que as pessoas tendem a não optar por regime (caindo na comunhão parcial) e, quando o fazem, não
optam por ele, pelas razões que serão vistas a seguir.
O regime de comunhão universal de bens tende à unidade patrimonial. Vale dizer, nele se opera
uma comunicabilidade de bens anteriores e posteriores ao casamento, adquiridos a título gratuito ou
oneroso, ressalvadas algumas exceções (art. 1.667 e seguintes do CC).
Na comunhão universal, segundo Arnaldo Rizzardo, ocorre uma comunicabilidade quase que total
do patrimônio do casal. Dividem-se os bens adquiridos antes do casamento e os bens adquiridos a título
gratuito. Até determinadas dívidas anteriores se comunicam, se contraídas em razão do casamento
(provenientes de despesas com os aprestos ou revertidas em proveito comum, nos termos do art. 1.668,
III). Por isso que as pessoas tendem a não optar por esse regime:
Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros
dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.
III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos [presentes de
casamento, dívidas com o enxoval etc.], ou reverterem em proveito comum;
IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;
Quanto aos frutos, são eles comunicáveis, mesmo que sejam retirados de bens incomunicáveis,
mas desde que vençam ou sejam percebidos na constância do casamento (art. 1.669 do CC). Para
ilustrar, os aluguéis retirados por um dos cônjuges em relação a um imóvel recebido com cláusula de
incomunicabilidade são comunicáveis.
Art. 1.669. A incomunicabilidade dos bens enumerados no artigo antecedente não se estende aos frutos,
quando se percebam ou vençam durante o casamento.
23 O fideicomisso, ensina Flávio Tartuce, é uma forma de substituição testamentária em que um primeiro
herdeiro (fiduciário) pode ser substituído por outro (fideicomissário). Quando o bem estiver com o fiduciário (1.º
herdeiro) haverá incomunicabilidade, pois a sua propriedade é resolúvel, protegendo-se o direito do fideicomissário
(2.º herdeiro).
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2.10.2.4. Regime da participação final nos aquestos (Art. 1.672 a 1.686, CC)
O regime da participação final nos aquestos nasceu fadado ao desuso (Silvio Venosa, Débora
Brandão). Ele nasce na Europa, e surge no CC/02, em substituição ao regime dotal, hipótese em que o
pai da noiva dava um dote ao marido, para que ele administrasse os bens dela. A ela era reservada a
possibilidade de administrar poucos bens, chamados de “parafernais”. A esposa, no regime dotal, era
considerada quase como incapaz.
Os autores brasileiros, quase que unanimemente, dizem que se trata de um regime horroroso,
complexo, confuso, de normas problemáticas e de difícil execução. Segundo Maria Berenice Dias, seria
necessário haver uma contabilidade ao longo do casamento, para evitar fraudes.
Segundo Flávio Tartuce durante o casamento, há uma separação convencional de bens. No caso de
dissolução, há algo próximo de uma comunhão parcial. Cada cônjuge terá direito a uma participação
quanto aos bens que colaborar para a aquisição, devendo comprovar o esforço patrimonial comum.
No regime da separação convencional de bens (a mais profunda, por ser escolhida pelas partes), há
nítida diferença entre os patrimônios. O bem adquirido no nome de um dos cônjuges somente a ele
pertence, cabendo ao outro, eventualmente, demandar o ex em eventual ação de enriquecimento ilícito.
Na comunhão parcial, opera-se uma separação do passado e uma comunicabilidade dos bens adquiridos
durante o casamento, a título oneroso.
A ideia da participação final nos aquestos, em si, é boa. O problema é executá-la: é a criação de um
regime autônomo, com características híbridas. Ao longo do casamento, ele funciona como um regime
de separação de bens (cada um administra seus próprios bens). Todavia, tudo o quanto adquirido com o
esforço comum do casal (e não só de um dos cônjuges), entrará na meação. A diferença para o regime
da comunhão parcial é que, nesta, entram na meação não somente os bens adquiridos pelo casal, a título
oneroso, mas também é dividido aquilo que for adquirido por um só dos cônjuges. O problema da
participação final nos aquestos é a dificuldade que há na investigação, ao longo do casamento, dos bens
porventura adquiridos pelo casal, a título oneroso.
Ou seja, terão de ser investigadas cinco massas patrimoniais: i) o que o marido tinha antes do
casamento; ii) o que o marido tinha depois do casamento; iii) o que a esposa tinha antes do casamento;
iv) o que a esposa tinha depois do casamento; e v) o que foi adquirido pelo casal a título oneroso. Na
comunhão parcial de bens, investiga-se somente o que foi adquirido a título oneroso, por um ou por
ambos. Na participação final nos aquestos, deve-se analisar o que o casal adquiriu. As regras de cálculo
na participação final nos aquestos são específicas (arts. 1.673 e 1.674), para evitar enriquecimento sem
causa ou fraudes.
A disciplina do regime de participação final nos aquestos é feita a partir do art. 1.672 do Código
Civil:
Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio,
consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à
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metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.
A característica do regime da participação final nos aquestos, como visto, é a seguinte: funciona ao
longo do casamento como se fosse de separação de bens, mas admite, ao tempo do divórcio, a meação
acerca dos bens adquiridos onerosamente pelo casal, meação essa que será calculada especialmente nos
termos dos arts. 1.673 e 1.674:
Art. 1.673. Integram o patrimônio próprio os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os por ele
adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento.
Parágrafo único. A administração desses bens é exclusiva de cada cônjuge, que os poderá livremente
alienar, se forem móveis.
Art. 1.674. Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aqüestos,
excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:
Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos durante o casamento os bens móveis.
O regime de participação final nos aquestos dificilmente será aplicado no Brasil, por isso, Flávio
Tartuce considera pouco provável que ele caia em questão prática, para evitar questionamentos e críticas,
em virtude da dificuldade de intelecção de suas normas.
Ademais, deve ficar claro que os bens de participação não se confundem com a meação, pois a
última independe da prova de esforço comum para a comunicação.
Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um
dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.
O grande problema deste regime de bens decorre das modificações operadas pelo CC/02 no direito
das sucessões, as quais serão estudadas adiante. Paradoxalmente, o cônjuge casado sob o regime da
separação total de bens concorre na herança com os descendentes do morto, mesmo que não sejam filhos
comuns do casal. Trata-se de uma contradição, na medida em que a separação foi criada justamente com
o propósito de separar patrimônios: ocorre como que uma separação em vida e uma união na morte.
O STJ tem um interessante julgado, com intenção boa, mas fundamentação discutível, para tentar
contornar essa injustiça: um casal se separou de fato, não partilhou bens, mas continuava casado no
papel. O ex-cônjuge passou a viver com outra pessoa e adquiriu patrimônio com ela. A ex-esposa pleiteou
direito sobre os bens adquiridos na vigência daquela união estável. O STJ reconheceu que a primeira
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mulher tem direito somente à partilha dos bens adquiridos até a separação de fato, na medida em que
não tem sentido falar-se em partilha de bens (condomínio), se não há mais afeto (REsp 555.771/SP).
Finalmente, é de se notar que a Súmula n. 377 do STF não se aplica à separação convencional
de bens, somente à separação legal conforme já visto acima e decidido pelo STJ24.
Quem é casado não tem mais a liberdade para a prática de determinados atos, como se solteiro
fosse, de modo que tais atos somente poderão ser praticados com a anuência do outro, a chamada “vênia
conjugal”ou outorga conjugal, que a depender de quem pratica o negócio pode ser:
i. Uxória = esposa;
ii. Marital = marido.
Geralmente, a vênia conjugal é chamada de outorga uxória, mas os mais puristas preferem designar
como outorga uxória somente a autorização da pela esposa ao marido, enquanto que a dada pelo marido
à esposa seria a autorização marital. Pablo considera essa diferença terminológica um preciosismo, mas
ela pode ser exigida em prova.
A autorização ou vênia conjugal é uma expressão que serve para ambos os casos e designa a
autorização dada pelo cônjuge para a prática de determinados atos. Está prevista no art. 1.647 do Código
Civil (o dispositivo deve ser memorizado):
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro,
exceto no regime da separação absoluta [Pablo, na linha de Nelson Nery, interpreta essa
expressão “separação absoluta” como designando a convencional, na medida em que a legal
ou obrigatória admite patrimônio comum]:
IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem
economia separada.
Nenhum dos cônjuges pode, exceto no regime de separação absoluta convencional, alienar ou
gravar de ônus reais os bens imóveis sem autorização do outro, ainda que o bem a ser alienado pertença
ao patrimônio exclusivo dele. Veja que o cônjuge pode adquirir bens sem autorização.
O que a lei toma por referência para a dispensa da outorga não é a origem do bem, mas o tipo de
regime de bens. A única ressalva feita pela lei é a hipótese do sujeito casado no regime de separação
absoluta.
24 (REsp 1.481.888, Rel Min. Marco Buzzi. Quarta Turma. Julgado em 10/04/2018, DJe 17/04/018).
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Note que mesmo quem é casado sob o regime da participação final nos aquestos deverá obter a
outorga uxória para a prática dos atos acima, na medida em que a lei não ressalva esse regime. Todavia
no caso da participação final, há uma norma possibilitando às partes que afastem, no pacto antenupcial,
a necessidade de outorga uxória para a disposição dos bens imóveis particulares (art. 1.656). Para todos
os demais incisos, deverá buscar a outorga uxória:
Art. 1.656. No pacto antenupcial, que adotar o regime de participação final nos aqüestos, poder-se-á
convencionar a livre disposição dos bens imóveis, desde que particulares.
Súmula 332 - A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia.
A Súmula não menciona o aval, mas Pablo entende que o raciocínio tem de ser o mesmo, entretanto,
o Enunciado 114 da III JDC26 estabelece que o aval não pode ser anulado por falta de outorga pois
ofenderia o princípio da circulação dos títulos de credido, de modo que o caso seria de ineficácia, oq eu
segundo Flávio Tartuce é contra legem.
A respeito da controvérsia, o STJ27 decidiu que os arts. 1.647 e 1.649 somente se aplicam para os
títulos de crédito atípicos (art. 903, CC). Para os títulos de créditos típicos, a falta de outorga gera
ineficácia do aval.
O STJ manifestou-se no REsp 1.299.866/DF, sobre a aplicação da Súmula 332 à união estável e
decidiu que, ainda que união estável esteja formalizada por meio de escritura pública, é válida a fiança
prestada por um dos conviventes sem a autorização do outro. Isso porque o entendimento de que a
“fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia”, conquanto
seja aplicável ao casamento, não tem aplicabilidade em relação à união estável. Isso porque a união
estável somente produz efeitos intra partes, mesmo que esteja registrada formalizada em cartório. Dessa
forma, terceiros não podem ser afetados pela união estável. O companheiro que prestou fiança sem a
autorização da companheira, responderá civilmente em face da companheira pelos danos causados, mas
o credor terá o direito de execução de seu crédito.
O STJ não quer dizer a união estável seria uma entidade de segunda classe, mas apenas que são
entidades distintas que produzem efeitos distintos. O casamento é formal e solene e produz efeitos erga
omnes. A união estável é informal e não solene e somente produz efeitos intra partes.
25 Segundo Fábio Ulhoa “aval é o ato cambiário pelo qual uma pessoa (avalista) se compromete a pagar título
do art. 1.647 apenas caracteriza a inoponibilidade do título ao cônjuge que não assentiu.” (contra legem).
27 (REsp 1.633.399/SP, 4ª turma, de 2016; REsp 1.526.560/MG, 3ª turma, de 2017).
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A Doação remuneratória é aquela realizada em atenção a serviços prestados (ex.: doação ao médico
da família, que nunca cobrou nada). Em regra, não poderá o cônjuge, sem a anuência do outro, fazer
doação (salvo remuneratória) de bens comuns ou que possam integrar futura meação. Até porque se trata
de ato de alienação. Caso se trate de imóvel, incidirá a regra do inciso I. Caso se trate de móvel, caberá a
do inciso IV.
As doações nupciais são válidas, independentemente da anuência do outro, porque feitas aos filhos.
Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges a
denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-la.
Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o
ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a
sociedade conjugal.
Parágrafo único. A aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento público, ou particular,
autenticado.
Aqueles atos que somente podem ser prestados com a anuência do outro, se praticados, são
anuláveis, no prazo de dois anos, contados do fim do casamento, a teor do Art. 1.649, acima visto.
Finalmente, Flávio Tartuce assevera que o art. 1.650 do CC estipula serem legitimados para a
propositura da ação anulatória (interessados) o cônjuge a quem cabia conceder a outorga ou seus
herdeiros.
Nesse sentido, o próprio cônjuge que praticou o ato não tem legitimidade para pleitear a anulação
(venire contra factum proprium non potest).
Na lição de Flávio Tartuce o pacto antenupcial constitui um contrato formal e solene pelo
qual as partes regulamentam as questões patrimoniais relativas ao casamento (arts. 1.653 a 1.657 do CC).
Assim, deve celebrado por escritura pública, no Tabelionato de Notas, sob pena de nulidade
do pacto e não do casamento, sendo ineficaz o pacto se não for seguido pela solenidade.
Interessante questão aborada do Flávio Tartuce diz respeito à possibilidade de se aproveitar o pacto
como contrato de convivência, com base no princípio da conservação do negócio jurídico
(posicionamento de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald já utilizado pelo STJ28).
O art. 1.655 do CC dispõe que é nula a convenção ou cláusula que constar no pacto que conflite com
disposição absoluta de lei, ou seja, que colida com normas de ordem pública. P. ex. Cláusula que afasta
o art. 1.641 do CC (causas de separação obrigatória) ou Cláusula que afaste a concorrência sucessória –
art. 426, CC.
O art. 1.656 do CC permite que o pacto antenupcial afaste a aplicação do art. 1.647, I, do CC, no
regime da participação final dos aquestos. Aplica-se aos bens imóveis particulares.
28 (REsp n. 1.483.863/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti. Julg. 10/05/2016. Dje. 22/06/2016)
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O art. 1.657 do CC estabelece que o pacto deve ser levado a registro no Cartório de Registro de
Imóveis do domicílio dos cônjuges para que tenha efeitos erga omnes, ou seja, contra terceiros.
Todo casamento é civil e civis são seus efeitos. Portanto, no Brasil, o casamento religioso ou
eclesiástico será no máximo união estável. Não se pode confundir o casamento civil com cerimônia
religiosa, que é o mais comum no Brasil.
O sistema brasileiro diz que o casamento é civil, mas a cerimônia pode ser civil, presidida pelo juiz,
ou eclesiástica (religiosa), celebrada pela autoridade religiosa. De qualquer forma, deve ter havido
habilitação para o casamento e certidão do cartório para casar. Faltando um desses requisitos não se
tratará de casamento.
A cerimônia do casamento civil pode ser religiosa. Porém, pode ser de qualquer religião? Em razão
da garantia constitucional da liberdade de crença, qualquer religião pode celebrar a cerimônia de
casamento civil. Já há precedentes na jurisprudência de casamentos realizados na religião de umbanda
e no centro espírita. Lembre que os requisitos civis devem ser observados na cerimônia de casamento
realizada por qualquer religião.
O art. 1.512 do CC confirma que o casamento é civil e que civis são os seus efeitos. Atenção, pois o
Código diz, ainda, que o casamento é civil e a sua celebração é gratuita. Essa celebração gratuita é a
cerimônia civil. Assim, a pessoa que queira se casar com cerimônia religiosa terá de se submeter às taxas
que cada religião eventualmente cobrar:
Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos,
emolumentos e custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.
Além de a cerimônia civil ser sempre gratuita, a habilitação, o registro e a primeira certidão serão
gratuitos para as pessoas reconhecidamente pobres, na forma da lei. Pobre na forma da lei é quem assim
se declara, dizendo que não pode pagar as custas sem sacrifício de sua subsistência e de sua família (art.
1.512, parágrafo único do CC).
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Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil,
equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua
celebração.
Art. 1.516. O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento
civil.
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retroativa, pois havia impedimento matrimonial. No período compreendido entre 1995 e 1999, João
esteve casado com Tereza.
Assim, a existência de impedimento matrimonial obsta a retroatividade. Essa ideia emana de uma
interpretação sistêmica do CC/02.
Art. 1.525. O requerimento de habilitação para o casamento será firmado por ambos os nubentes, de
próprio punho, ou, a seu pedido, por procurador, e deve ser instruído com os seguintes documentos:
II - autorização por escrito das pessoas sob cuja dependência legal estiverem, ou ato judicial que a supra;
III - declaração de duas testemunhas maiores, parentes ou não, que atestem conhecê-los e afirmem não
existir impedimento que os iniba de casar;
IV - declaração do estado civil, do domicílio e da residência atual dos contraentes e de seus pais, se forem
conhecidos;
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Como visto, a idade núbil no Brasil é 16 anos. O art. 1.520 do CC autoriza o casamento do menor de
16 anos, quando houver suprimento judicial da idade. São as hipóteses de gravidez ou para impedir a
aplicação de sanção penal (essa segunda parte restou prejudicada, pois o casamento não mais é causa de
extinção da punibilidade). Nesse caso, o regime do casamento obrigatoriamente será o de separação de
bens:
Art. 1.520. Excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (art.
1517), para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez.
Evidentemente, a autorização prevista no inciso II só será necessária para as pessoas que tenham
entre 16 e 18 anos de idade. Havendo recusa de um ou de ambos os pais, admite-se suprimento judicial
do consentimento (os pais devem ser citados).
O art. 71 do CPC diz que o incapaz somente pode litigar no processo se estiver devidamente
representado ou assistido:
Art. 71. O incapaz será representado ou assistido por seus pais, por tutor ou por curador, na forma da lei
No caso de suprimento judicial, os pais iriam se recusar a assistir esse menor no processo. A solução
está no art. 72 do CPC, que diz que havendo conflito entre os interesses do incapaz e o do seu
representante ou assistente, o juiz nomeará curador especial para regularizar a representação processual:
As testemunhas do casamento e da habilitação podem ser parentas dos noivos. Normalmente são,
inclusive. Só existe um caso em que a testemunha não pode ser parenta: é o casamento nuncupativo.
ii) publicação dos editais de proclamas:
Apresentados os documentos, serão publicados os editais de proclamas, com prazo de 15 dias para
impugnação. Os editais serão publicados no cartório e na imprensa oficial, onde houver. Findo o prazo,
com ou sem impugnações, a habilitação será remetida para o MP.
A homologação judicial, nesse caso, é dispensada. O juiz somente intervirá se houver impugnação
ou contrariedade do MP.
iii) expedição da certidão de habilitação para o casamento:
Essa certidão será entregue aos nubentes, para que possam casar.
iv) registro da certidão:
Os nubentes devem registrar a certidão, para que possa fluir o prazo de 90 dias para que o
casamento seja celebrado. O casamento tem de ser celebrado dentro desse prazo de 90 dias, sob pena de
decadência.
2.16.1. Formalidades
Sendo o casamento formal e solene, é natural que existam algumas formalidades na sua celebração.
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É importante perceber que a celebração do casamento exige um número mínimo de pessoas. Para
que se inicie a cerimônia de casamento, exige-se a presença: dos dois nubentes, pessoalmente ou por
procurador; da autoridade celebrante (autoridade judiciária, se o casamento for civil ou autoridade
eclesiástica, se o casamento for religioso); duas testemunhas (as testemunhas podem ser parentas dos
noivos); se a cerimônia for civil, deve estar presente o oficial do cartório.
O número de pessoas que devem estar presentes na cerimônia de casamento está previsto no art.
1.535:
Art. 1.535. Presentes os contraentes, em pessoa ou por procurador especial, juntamente com as
testemunhas e o oficial do registro, o presidente do ato, ouvida aos nubentes a afirmação de que pretendem
casar por livre e espontânea vontade, declarará efetuado o casamento, nestes termos: "De acordo com a
vontade que ambos acabais de afirmar perante mim, de vos receberdes por marido e mulher, eu, em
nome da lei, vos declaro casados."
O número mínimo é de seis pessoas, mas se a cerimônia for religiosa dispensa-se a presença do
Oficial de Cartório, pois nesse caso os noivos disporão do prazo de 90 dias para registrar a ata do
casamento posteriormente.
Nesse prazo de 90 dias para o registro, se os noivos não registrarem a ata do casamento opera-se a
decadência. O casamento será inexistente e os noivos terão que casar de novo, tendo de se submeter a
uma nova habilitação.
Os noivos podem fazer-se representar por procurador. Essa procuração deve ser por escritura
pública, com poderes especiais para o ato e tem prazo de validade de 90 dias. O casamento é um ato
personalíssimo, mas pode ser celebrado por meio de procurador.
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dúvida, o art. 1.514 do Código Civil afirma que o momento existencial do casamento (o momento em que
ele passa a existir) é o da leitura da fórmula sacramental:
Art. 1.514. O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a
sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados.
Art. 1.539. No caso de moléstia grave de um dos nubentes, o presidente do ato irá celebrá-lo onde se
encontrar o impedido, sendo urgente, ainda que à noite, perante duas testemunhas que saibam ler e
escrever.
§ 1º A falta ou impedimento da autoridade competente para presidir o casamento suprir-se-á por qualquer
dos seus substitutos legais, e a do oficial do Registro Civil por outro ad hoc, nomeado pelo presidente do
ato.
§ 2º O termo avulso, lavrado pelo oficial ad hoc, será registrado no respectivo registro dentro em cinco
dias, perante duas testemunhas, ficando arquivado.
Se um ou ambos os nubentes padecem de moléstia grave e já houve habilitação (estão aptos para
casar, por já possuírem autorização do cartório), a autoridade celebrante (o juiz) poderá antecipar a
cerimônia, dirigindo-se ao local em que estiverem os nubentes e, na presença do oficial do cartório,
celebrar a cerimônia de casamento. Nesse caso, os nubentes não podem esperar até a data do casamento,
em razão de moléstia grave.
Note que há uma flexibilização mínima, pois os nubentes já estavam habilitados. A autoridade
dispensa apenas a espera pela data, hora e local previamente determinados.
ii) casamento nuncupativo (art. 1.540 e seguintes)
Art. 1.540. Quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo a presença da
autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser celebrado na
presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em linha reta, ou, na colateral,
até segundo grau.
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Casamento nuncupativo é aquele em iminente risco de morte (in extremis vitae). Nesta hipótese,
não houve habilitação prévia e os nubentes estão passando por caso de iminente risco de morte. Os
nubentes devem declarar a vontade na presença de seis testemunhas, que não podem ser parentes. Exige-
se o perigo de morte (não há tempo para cumprimento das formalidades ou para que seja possível a
presença do juiz) e seis testemunhas, que não podem ser parentes.
Superada a situação de risco, as seis testemunhas dispõem do prazo de 10 dias para requererem em
juízo a homologação desse casamento. Esse prazo é impróprio (prazo de preclusão fraca), isto é, depois
desses 10 dias, não só as testemunhas, mas qualquer interessado poderá requerer a homologação do
casamento nuncupativo. Ex.: se os próprios noivos sobreviveram, eles poderão requerer a homologação,
seus parentes, caso tenha havido morte etc.
O juiz manda processar a habilitação para o casamento para que se verifique se não há
impedimentos matrimoniais e, após isso, determina a instrução. Na instrução devem ser provados: a
presença das seis testemunhas, a declaração de vontade e o risco de morte. O MP deve ser ouvido antes
da decisão do juiz.
Na prática, se as seis testemunhas morreram será de difícil a comprovação o casamento
nuncupativo.
Se, porventura, não houver prova, o juiz indeferirá a homologação e o ato é considerado inexistente.
Caso venha a homologar o casamento, o fará no regime de separação obrigatória de bens. Os efeitos da
homologação são retroativos à data da celebração do casamento.
Casamento consular é o casamento de conacionais (pessoas da mesma nacionalidade) que estejam
no estrangeiro, celebrado perante a sua autoridade consular. Ex.: dois brasileiros que estão em Portugal
e se casam perante o cônsul brasileiro; ou dois Argentinos que estão no Brasil e se casam perante o cônsul
argentino.
O consulado é uma extensão do país. Por isso, o casamento consular se submete às regras do país
de origem dos noivos. Pegadinha de concurso: não se deve confundir casamento consular com registro
de casamento celebrado no estrangeiro. Ex.: brasileira que se casa com um alemão, na Alemanha,
submete-se às regras alemãs. Contudo, ela deseja que eventualmente, retornando ao país, mantenha o
seu estado de casada, e para isso ela deve registrar o casamento no Brasil. É hipótese de casamento
realizado no estrangeiro que deve ser registrado no Brasil.
O CC/02 estabelece que, dentro de 180 dias, contados da data em que voltar a ter domicílio no
Brasil, o interessado deve registrar o casamento no Cartório de Registro Civil do 1º Ofício de seu
domicílio. Registrado o casamento, garante-se o estado civil de casado, também no Brasil.
Caso deseje, o interessado pode registrar o casamento antes mesmo de voltar a ter domicílio no
Brasil. Porém, se não registrado dentro do prazo, a pessoa permanece solteira no Brasil, ainda que possua
o status de casada em outro país.
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O casamento termina apenas de duas formas: com a morte ou com o divórcio. Assim, a pessoa que
não declare que é casada em outro país só poderá casar-se novamente no Brasil após divorciar-se ou
proceder ao inventário no outro país.
A vantagem do registro no Brasil é que o divórcio ou inventário (dissolução do casamento) poderá
ser feito no Brasil.
Art. 1.554. Subsiste o casamento celebrado por aquele que, sem possuir a competência exigida na lei,
exercer publicamente as funções de juiz de casamentos e, nessa qualidade, tiver registrado o ato no
Registro Civil.
2.17.1. Introdução
No direito brasileiro, o casamento pode ser dissolvido de três diferentes formas:
i) pela morte de um dos consortes (forma mais comum, habitual);
ii) pela declaração de ausência de um dos consortes;
iii) pelo divórcio.
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Convém chamar a atenção para o fato de que não está prevista acima, dentre os mecanismos
dissolutivos do casamento, a separação. Doutrina e jurisprudência vêm entendendo, prevalecentemente,
que com a EC 66/2010 a separação foi extirpada do sistema. Mesmo assim, ela será objeto de estudo em
tópico abaixo, em decorrência da existência de posição minoritária em sentido oposto.
A nulidade ou anulação não é uma forma dissolutiva, mas desconstitutiva do casamento. É como
se o casamento nunca houvesse existido. Por isso, ela não foi englobada também dentre as formas de
dissolução do casamento.
2.17.2. Morte
A morte de um dos cônjuges dissolve o casamento. A morte da qual trata este tópico é a real (a
declarada por laudo médico), prevista no art. 1571 do CC:
Art. 1.571 (...) § 1o O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio,
aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente.
A única dúvida que fica é a seguinte: o art. 1571, § 1º não previu em qual das fases o casamento será
dissolvido. O procedimento de ausência organiza-se de modo trifásico. A primeira fase é a da curadoria
dos bens do ausente. Posteriormente, vem a sucessão provisória. Por fim, a terceira fase é a da sucessão
definitiva.
A esmagadora maioria da doutrina entende que a dissolução do casamento ocorre na ocasião da
abertura da sucessão definitiva (3ª fase). Isso a partir de uma interpretação o art. 6º do Código, que se
refere à sucessão definitiva como o momento da morte do ausente:
Art. 6o A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos
casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.
Para Chaves, não parece a melhor solução, pois para que se chegue à sucessão definitiva, exige-se
o transcurso de 11 anos, no mínimo. É muito tempo, de modo que o correto deveria ser o momento da
abertura de sucessão provisória. Chaves entende que o art. 6º refere-se às relações patrimoniais, não às
existenciais. Essa posição, contudo, é minoritária. Prevalece e deve ser seguida em prova a posição
anterior.
Se o ausente eventualmente retornar, depois de declarada a sucessão definitiva, o casamento não
se reestabelece (o retorno é irrelevante, o casamento se mantém dissolvido). Se o ausente quiser o
casamento, precisa casar de novo.
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Há, nesse ponto, um detalhe curioso: não há enquadramento para o estado civil do ausente, depois
do retorno. O cônjuge do ausente, depois de estabelecida a sucessão definitiva, torna-se viúvo por
presunção. Retornando o ausente qual o seu estado civil? Ele não é mais casado, pois o casamento está
dissolvido. Divorciado também não, pois não houve divórcio.
2.17.4. Divórcio
O divórcio tem a ver com a dignidade da pessoa humana, pois é necessário viabilizar meios para
evitar que as famílias se destruam ao longo do tempo. O Estado brasileiro sempre teve uma postura
antidivorcista. Todavia, facilitar o divórcio (como fez a emenda do divórcio) não é o mesmo que incentivá-
lo.
A promoção da dignidade da pessoa humana, na perspectiva do princípio da afetividade, torna
necessária a implantação de meios, não de incentivo, mas de facilitação democrática de acesso ao
divórcio. A matemática das pesquisas em torno do tema não engana: somente em 2006, contabilizaram-
se cerca de 162.000 divórcios, segundo dados do IBGE.
Entre 2005 e 2006, o número de divórcios aumentou 7%, até por conta da volatilidade das relações
sociais contemporâneas. Assim, se por um lado não cabe ao Estado incentivar descasamento, por outro
cabe sim a facilitação do acesso democrático àqueles que pretendem se divorciar. Não se trata de
banalizar o casamento. Banalização de casamento é incentivar a manutenção de casamentos falidos. O
que banaliza o casamento é o desrespeito. A facilitação democrática do divórcio permite a constituição
de novos núcleos familiares, promovendo a dignidade da pessoa humana, sem desrespeitar uma ou outra
concepção religiosa (até porque o Estado brasileiro é laico).
Tendo em vista a discussão sobre a manutenção ou não da separação judicial no ordenamento
jurídico frente à EC 66/2010, que instituiu o divórcio direto, o instituto será estudado.
Outrora denominada de desquite, a separação judicial pretende, tão somente, a dissolução da
sociedade conjugal, não afetando, todavia, o vínculo matrimonial. Vale dizer, a separação judicial (assim
como a administrativa) apenas dissolve determinados deveres do matrimônio (art. 1.576), mas ainda não
permite um novo casamento.
Art. 1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de
bens.
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Art. 175 (…) § 1º - O casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja
prévia separação judicial por mais de três anos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 9. de 1977)
A Constituição Federal de 1988, por sua vez, aperfeiçoou o divórcio, para permitir que o divórcio
indireto (ou por conversão) fosse obtido respeitado o prazo de um ano. Além disso, facilitou o divórcio
direto, exigindo, todavia, um prazo de separação de fato por mais de dois anos. Assim, em seu antigo art.
226, § 6º, a CR reconheceu dois tipos de divórcio: o direto e o indireto, regulados pelo art. 1.580 do
CC/2002:
Redação antiga:
Art. 226 (...) § 6º - O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por
mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos.
O divórcio indireto era aquele que partia da conversão da separação em divórcio. O casal já estava
separado judicialmente e, após o prazo de um ano, pediria a conversão:
Art. 1.580. Decorrido um ano do trânsito em julgado da sentença que houver decretado a separação
judicial, ou da decisão concessiva da medida cautelar de separação de corpos, qualquer das partes poderá
requerer sua conversão em divórcio.
O problema dessa modalidade de divórcio indireto era que, primeiramente, deveria o casal se
submeter a uma separação, esperar o prazo de um ano e, após, convertê-lo. Na prática: 5, 8, 10 anos para
a concessão do divórcio.
Ao lado do divórcio indireto, a CR/88 consagrou o que na Lei 6.515/1944 era muito tímido. Houve
a facilitação do divórcio direto, que era aquele que dispensava a prévia separação judicial, exigindo,
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apenas, nos termos da redação original do § 6º do art. 226 da CR, comprovada separação de fato por mais
de dois anos.
Esse aprimoramento do divórcio direto foi, na verdade, uma manifestação tímida (pouco corajosa,
por assim dizer), do constituinte.
Na prática, as pessoas preferiam aguardar o prazo de separação de fato por mais de dois anos para
pleitear o divórcio direto. O Congresso Nacional percebeu isso. Na PEC do divórcio (apelidada de “PEC
do amor”), pretendeu-se revolucionar o instituto do divórcio.
Antes dela, outro marco importante na história do divórcio no Brasil foi a aprovação da Lei
11.441/2007, que, respeitados os termos da CR, passou a admitir o divórcio e a separação administrativos,
desde que consensuais e, ainda, dada a ausência de filhos incapazes (art. 1.124-A, do CPC/1973):
Assim, a doutrina passou utilizar o termo “separação de direito” ou “jurídica”, que engloba a
separação judicial e a separação extrajudicial, sendo ambas separações formalizadas. O termo foi criado
para diferenciar-se da “separação de fato”, que é informal.
Foi um grande avanço, no sentido da desjudicialização do divórcio, desde que ocorrido
consensualmente. O casal passou a poder se divorciar administrativamente. Não poderia haver filhos
menores ou incapazes, hipótese em que o divórcio deveria ser judicial.
A lei não desafogou completamente o Judiciário, na medida em que, além de não permitir o
divórcio em tabelionato quando houver crianças, muitas pessoas preferem o divórcio judicial, e não há
obrigatoriedade do divórcio administrativo. O CNJ disciplinou administrativamente a Lei 11.441/2007
por meio da Resolução nº 35.
Em 2010, foi aprovada a “PEC do Divórcio” - Emenda Constitucional 66/2010 - por proposta do
IBDFAM, que alterou a redação do art. 226, § 6º da Constituição Federal. Entretanto, não houve
modificação ou revogação expressa de qualquer norma infraconstitucional.
Redação originária (art. 226, § 6º, CC) Redação atual (art. 226, § 6º, CC)
“§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo “§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo
divórcio, após prévia separação judicial por mais de um divórcio.”
ano nos casos expressos em lei, ou comprovada
separação de fato Obs.: não há menção a prazos nem à separação
judicial.
por mais de dois anos”
Finalmente, o CPC de 2015 reafirmou expressamente a “separação de direito”, ao prevê-la nos
seguintes dispositivos, sem prejuízo de outros:
Art. 53 (definiu a competência para as ações de família).
CPC, art. 53: “É competente o foro: I - para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e
reconhecimento ou dissolução de união estável: a) de domicílio do guardião de filho incapaz; b) do último
domicílio do casal, caso não haja filho incapaz; c) de domicílio do réu, se nenhuma das partes residir no
antigo domicílio do casal"
CPC, art. 693: “As normas deste Capítulo aplicam-se aos processos contenciosos de divórcio, separação,
reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação. Parágrafo único. A ação de
alimentos e a que versar sobre interesse de criança ou de adolescente observarão o procedimento previsto
em legislação específica, aplicando-se, no que couber, as disposições deste Capítulo.”
CPC, art. 731: “A homologação do divórcio ou da separação consensuais, observados os requisitos legais,
poderá ser requerida em petição assinada por ambos os cônjuges, da qual constarão: I - as disposições
relativas à descrição e à partilha dos bens comuns; II - as disposições relativas à pensão alimentícia entre
os cônjuges; III - o acordo relativo à guarda dos filhos incapazes e ao regime de visitas; e IV - o valor da
contribuição para criar e educar os filhos. Parágrafo único. Se os cônjuges não acordarem sobre a partilha
dos bens, far-se-á esta depois de homologado o divórcio, na forma estabelecida nos arts. 647 a 658.”
O cenário atual é inflamado por um grande debate acerca do Fim da separação de direito no
ordenamento jurídico.
Como dito, o divorcio direto na CR/88 exigia um prazo de separação de fato por mais de dois anos.
O Congresso Nacional, sensível aos reclamos da sociedade brasileira, acolheu a Proposta de Emenda
Constitucional denominada de “PEC do Amor”, que resultaria na EC 66/2010. Por iniciativa do IBDFAM,
foi originariamente apresentada pelo Deputado Antonio Carlos Biscaia, e posteriormente pelo Deputado
Sergio Barradas Carneiro.
Em sua redação original, a PEC dizia: “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio,
consensual ou litigioso, na forma da lei”. Note que a redação não fazia mais menção à separação judicial
nem aos prazos para o divórcio.
Paulo Lobo, um dos mentores da Emenda, disse que a parte final do dispositivo, ao se referir a “na
forma da lei”, era perigosa, na medida em que abria espaço argumentativo àqueles que entendiam que a
separação judicial poderia ser mantida pelo legislador ordinário. A PEC foi, a pedido dele, alterada, para
não abrir espaço para que o legislador ordinário pudesse avançar naquilo que o constituinte pretendera.
Assim, para evitar indevido espaço de atuação do legislador ordinário, a Emenda aprovada,
respeitando o princípio da intervenção estatal mínima no direito de família, intencionalmente suprimiu
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a referência à separação judicial, banindo o instituto (posição de autores como Paulo Lobo, Rodrigo da
Cunha Pereira, Maria Berenice Dias, Flávio Tartuce etc.), bem como suprimiria os prazos para a obtenção
do divórcio.
É um argumento histórico: no trâmite da Emenda, a supressão da expressão “na forma da lei” visou
justamente a acabar com a separação, não dando espaço ao legislador ordinário para a manutenção de
um instituto que o constituinte não mais desejava. Argumenta-se que a CR não proibiu a separação.
Todavia, nenhum constituinte colocaria a expressão: “vedada a separação”. Seria uma atecnia absurda.
Uma interpretação social e histórica da norma recomenda o fim da separação, considerando a evolução
do instituto e os objetivos do constituinte. Faz-se uma interpretação autêntica: o próprio Deputado que
propôs a PEC possuía diversos artigos nesse sentido.
Hoje, a redação do art. 226, § 6º ficou da seguinte forma:
Art. 226 (...) § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda
Constitucional nº 66, de 2010)
Não há mais menção à separação ou a prazos para o divórcio. A separação judicial não pode ser
mantida como opção para os interessados. Ela traz consigo a discussão da culpa. Foi uma grande
revolução a proscrição do sistema da discussão da culpa pelo descasamento.
Canotilho defendeu, em sua obra, o princípio da vedação ao retrocesso. Aplicando-se tal princípio
ao direito de família, defender a manutenção da separação é ofender, sem dúvida nenhuma, o retrocesso
em matéria do direito de família. A separação está caindo em desuso, e com o tempo se verificará que ela
acabou (à unanimidade, os juízes de Salvador entenderam, em encontro recente, que o instituto está
enterrado).
Portanto, a corrente abolicionista, a despeito de respeitáveis autores em contrário (Mário Delgado,
Luis Felipe Brasil), afirma que a nova norma constitucional deve ser interpretada não apenas da sua
literalidade, mas em uma perspectiva histórica e, sobretudo, social, que tem no banimento da separação
e da discussão da culpa um marco de evolução que respeita o princípio da vedação ao retrocesso
desenvolvido por Canotilho.
Da norma constitucional, deve ser extraída uma interpretação conforme. A manutenção da culpa é
um marco que deve ser superado. A sociedade já absorveu isso. A conclusão é de que as normas da
separação já estariam implicitamente revogadas. Mesmo que o STF venha a entender pela mantença da
separação, trata-se de um instituto fadado ao ostracismo social. Defender o fim da separação é facilitar a
objetivação do direito de família, evitando a intromissão do Estado nas relações familiares.
Os alemães tratam do “princípio da desativação do afeto”, para dizerem que o divórcio é um fato
objetivo: o que deve orientar a doutrina é a objetivação das relações familiares.
A jurisprudência encontra-se dividida, com decisões favoráveis à supressão da separação judicial
(TJMG 0315694-50.2010.8.13.0000, Boletim 179 do IBDFAM e Enunciado aprovado na I Jornada dos
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Juízes de Família de Salvador), havendo também pronunciamentos contrários (TJRS Apelação Cível
70040844375). Não há, ainda, posição definitiva do STF.
Para acabar com a discussão, o PL 7.661/2010 expressamente prevê o fim da separação judicial.
Observe que isso não significa que a separação não haja acabado. Ele simplesmente coloca uma pedra na
discussão.
A EC 66/2010 também acabou com os prazos para o divórcio. A esse respeito, não há quase
divergência. Com isso, ele se tornou um direito potestativo não condicionado e sem causa específica.
Se a pessoa se arrepender do divórcio, casa-se novamente. “É altamente romântico” (Pablo).
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
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Consequentemente, para fins de indenização por ilicitude, a discussão da culpa é necessária. Ex.:
lesões corporais, ofensas físicas, transmissão de doenças venéreas, injúria grave etc.
Curiosidade: a competência para processar e julgar esse pedido indenizatório é da vara de família,
como se vem assentando a jurisprudência.
Além disso, o art. 1.694, § 2º, do Código Civil estabelece que o juiz fixará alimentos meramente
para a sobrevivência (subsistência) quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os
pleiteia:
Art. 1.694 (...) § 2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de
necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
O dispositivo expressamente permite que a culpa se discuta para diminuir o valor da pensão
alimentícia. Esta hipótese não está restrita ao casamento. A discussão sobre a culpa, baseada no art.
1.694, § 2º, é possível em qualquer relação familiar. Ex.: uma filha tenta matar os pais e, não obtendo
êxito, acaba presa, processada e cumpre pena. Caso, anos depois, ela seja colocada em liberdade, sem
emprego e não tenha como subsistir, não terá outro caminho que não pleitear alimentos aos pais (os
quais tentou matar). Nesse caso, os alimentos decorrerão de culpa de quem os pleiteia e o juiz fixará os
alimentos com base apenas na subsistência, e não nas regras comuns.
Observe, mais uma vez, que a discussão da culpa para fins de mutação da natureza dos alimentos é
aplicável em todas as relações familiares, e não somente na hipótese da dissolução do casamento. Aquele
que está se divorciando pode pretender discutir a culpa para modificar o valor da pensão que pagará.
Provando a culpa da esposa, prestará a ela, na hipótese de ela precisar de alimentos, pensão num valor
reduzido, em relação à prestação normal de alimentos.
De um modo ou de outro, em nenhuma das duas hipóteses essa discussão sobre a culpa será travada
na ação de divórcio, mas na ação indenizatória ou de alimentos.
iii) extinção do instituto da separação, em juízo ou em cartório:
É importante assinalar, uma vez mais, que a opinião prevalecente na doutrina e na jurisprudência
é pela extinção do instituto da separação. Defendem essa corrente muitos autores, como Pablo Stolze,
Tartuce, Chaves, Maria Berenice Dias, Rodrigo da Cunha Pereira, Vicente Greco Filho e outros. A maioria
da jurisprudência também caminha nesse sentido.
Uma das razões desse entendimento é que a separação se mostra inútil, na medida em que não há
mais prazo para o divórcio. Manter a separação seria afirmar, ilogicamente, que quem pode o mais (o
divórcio) não pode o menos (a separação). O cônjuge poderia o mais (se divorciar), mas não poderia o
menos (se separar), pois a separação exige um ano de casado, e o divórcio não mais exige prazo algum.
Além disso, outro argumento em favor da separação soa absurdo. Alguns autores dizem que a
separação subsistiria porque a CR não teria revogado o Código Civil. Para Chaves, esse argumento chega
a ser risível, pois nenhum texto constitucional precisa revogar legislação infraconstitucional nenhuma.
Isso vem da força normativa constitucional.
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Também não procede o argumento segundo o qual a separação serviria para as pessoas que
quisessem “dar um tempo” na relação, sem se divorciar. O caminho para elas foi dado pelo STJ, que
resolveu o problema com facilidade, no REsp 1.065.209/SP: a separação de fato e a separação de corpos
produzem todos os efeitos jurídicos de uma separação judicial (término do regime de bens, cessação dos
deveres conjugais etc.) Assim, o que o STJ está dizendo é que a separação tornou-se inútil. Não há
necessidade da separação para que os efeitos dela se produzam.
Bem por isso, andou muito bem a EC 66/2010 ao colocar fim ao instituto da separação.
Em cartório, o Oficial deve simplesmente se negar a lavrar a escritura pública, pois a providência
jurídica pretendida não mais existe. Em juízo, trata-se de hipótese de extinção do processo, sem resolução
do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido.
Nas separações que já tramitavam antes da vigência da EC 66/2010, deve o magistrado intimar os
autores para adequarem o pedido, já que a providência anteriormente pretendida não mais existe no
direito brasileiro. Não adequado o pedido, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito.
Como fica a questão intertemporal relacionada às pessoas que já eram separadas, à luz da EC
66/2010? Trata-se de uma questão de estado da pessoa, de modo que quem era separado permanece
separado. É um curioso caso de ultratividade da norma civil.
Separação é um instituto-meio, nunca um instituto-fim. Ela não dissolve o casamento. Portanto,
para quem era separado encerrar o casamento, deve dissolvê-lo pela morte, pela declaração de ausência
ou pelo divórcio. A qualquer tempo, portanto, os separados podem requerer a conversão do divórcio.
Caso não o façam, morrerão ou se tornarão viúvas (os).
Observe que uma pessoa que já é viúva ou divorciada (portanto, que teve seu casamento dissolvido)
pode ter interesse de agir na promoção da ação de nulidade do casamento. Isso porque, como visto, a
nulidade ou a anulação do casamento não dissolve, mas desconstitui o casamento (as finalidades são
distintas). Ex.: o divorciado pode querer a declaração da nulidade de seu casamento para voltar a ser
solteiro.
A partir da EC 66/2010, é correto dizer que a medida cautelar de separação de corpos, que tem o
condão de especialmente suspender o dever de coabitação, continua em vigor. Assim, logicamente, como
as medidas protetivas da Lei Maria da Penha. Quanto a este efeito, não há muita controvérsia.
Tecnicamente, a medida cautelar de separação de corpos tanto pode servir para forçar um dos
cônjuges a sair do lar quanto a autorizá-lo a tanto. Para Pablo, se a pessoa “abandona o lar”, esse
abandono pode ser usado em desfavor dela. Ex.: alegações desvaliosas buscando a obtenção da guarda
dos filhos.
A Lei Maria da Penha é uma lei especialíssima. O Delegado, ao lavrar o BO, pode representar ao
juiz para a aplicação das medidas lá previstas. Pablo utiliza as medidas acautelatórias preventivas,
baseadas na Lei Maria da Penha, e entende que elas continuam perfeitamente vigentes com a Emenda
do divórcio.
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No passado, no Brasil, o que definia a guarda era a culpa. Era um raciocínio desastroso. A culpa
não interfere no divórcio, ainda que possa ensejar responsabilidade civil (há decisões nesse sentido). Uma
infidelidade pode ser a causa de divórcio, mas não significa que o cônjuge infiel não resguarde da melhor
maneira possível o interesse da criança.
Nesse sentido, a Lei 6.515/1977, previa a influência da culpa na guarda de filhos. O culpado pelo
divórcio perdia direito à guarda dos filhos, concedida unilateralmente ao inocente. Dessa circunstância,
dado o costumeiro reconhecimento da inocência da mulher, surgiu a máxima da guarda unilateral
materna, geralmente, com o direito de visitas do pai.
A emenda do divórcio não altera a sistemática constitucional que consagrou o interesse existencial
dos filhos (Pietro Perlingieri, na obra “Perfis de direito civil constitucional”), em lugar da criticada e
superada utilização do critério da culpa.
Na mesma linha, os arts. 1.583 e seguintes do Código Civil, a serem vistos adiante, não cuidam de
utilizar a culpa como vetor de definição da guarda, mas o melhor interesse da criança e do adolescente.
Como dito, com a nova sistemática constitucional, não é a culpa que determinará a guarda, mas o
“interesse existencial dos filhos” (Perlingieri). Analisar-se-á o comportamento do pai ou da mãe no
interesse dos filhos. Evidentemente, se a culpa interferir na educação deles, ela prejudicará a concessão
da guarda, mas não necessariamente a culpa implicará na perda da guarda do culpado.
Em regra, prevaleceria o acordo entre os genitores. Não havendo acordo, a guarda unilateral
deveria ser atribuída a quem oferecesse as melhores condições para exercê-la, resguardando o regime de
visitas ao outro genitor.
Fundamentalmente, há quatro modalidades básicas de guarda:
i. Guarda unilateral (ou exclusiva): Uma pessoa exerce a guarda de forma exclusiva e a outra
possui a seu favor a regulamentação de visitas ocasionais.
ii. Guarda conjunta (ou compartilhada): Ambos os genitores exercem a guarda conjunta,
dividindo as atribuições relativas ao filho, que terá um lar único.
Em 2008, com o advento da Lei 11.698/2008, foi introduzida no sistema a Guarda Compartilhada,
que passou a ser a regra, altamente recomendada, há necessidade de uma convivência pacífica entre os
genitores.
iii. Guarda alternada: O filho convive com ambos os genitores de forma fracionada/dividida e
em lares distintos.
Chamada de “guarda da mochila”. Não é recomendável, por trazer prejuízos à formação da criança.
A Lei 13.058/2014 tornou a “guarda compartilhada” obrigatória, confundindo-a com a “guarda
alternada”, ao alterar os arts. 1.583 e 1.584 do Código Civil.
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29 Enunciado 603 da VII JDC: “A distribuição do tempo de convívio na guarda compartilhada deve
atender precipuamente ao melhor interesse dos filhos, não devendo a divisão de forma equilibrada, a que alude o §
2 do art. 1.583 do Código Civil, representar convivência livre ou, ao contrário, repartição de tempo
matematicamente igualitária entre os pais.”. 16 Enunciado 604 da VII JDC: “A divisão, de forma equilibrada,
do tempo de convívio dos filhos com a mãe e com o pai, imposta na guarda compartilhada pelo § 2° do art. 1.583 do
Código Civil, não deve ser confundida com a imposição do tempo previsto pelo instituto da guarda alternada, pois
esta não implica apenas a divisão do tempo de permanência dos filhos com os pais, mas também o exercício
exclusivo da guarda pelo genitor que se encontra na companhia do filho.”Enunciado 605 da VII JDC: “A guarda
compartilhada não exclui a fixação do regime de convivência.”Enunciado 606 da VII JDC: “O tempo de convívio
com os filhos ‘de forma equilibrada com a mãe e com o pai’ deve ser entendido como divisão proporcional de tempo,
da forma que cada genitor possa se ocupar dos cuidados pertinentes ao filho, em razão das peculiaridades da vida
privada de cada um.”Enunciado 607 da VII JDC: “A guarda compartilhada não implica ausência de pagamento
de pensão alimentícia.”
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os pais). Na guarda compartilhada, há dois definidores do futuro da criança. É a modalidade que melhor
evita a alienação parental (uma síndrome detectada em 1985).
Além da guarda compartilhada, há a chamada guarda alternada, que com aquela não se confunde.
Guarda alternada é aquela em que o pai e a mãe revezam períodos exclusivos de guarda, cabendo ao outro
direito de visitas. O juiz, na guarda alternada, define que a guarda fica em determinado período com um
dos pais, cabendo ao outro o direito de visitas (alternância de períodos exclusivos de guarda). O
inconveniente é que, neste caso, os pais em geral não se dão bem (caso contrário a guarda seria
compartilhada), e essa alternância acaba por prejudicar a criança (muitas escolas não aceitam essa
situação).
Por fim, há uma quarta espécie de guarda: a nidação ou aninhamento. Espécie pouco comum na
jurisprudência brasileira, é mais ocorrente em países europeus. Para permitir que a criança não sofra
dano na disputa de custódia, abandonando o meio em que vive, ela permanece no mesmo domicílio em
que vinha sendo criada, revezando-se os pais em sua companhia.
Esta modalidade parte dos mesmos princípios de corresponsabilização da guarda compartilhada,
mas difere dela pela seguinte razão: na guarda compartilhada, na prática, não há domicílio único da
criança, que tanto pode ficar no domicílio do pai quanto no da mãe (os pais se entendem,
consensualmente).
Segundo Flávio Tartuce não é possível a guarda compartilhada com genitores residindo em cidades
distintas diante das peculiaridades do caso concreto, conforme já entendido pelo STJ30.
Finalmente, diante da nova Lei (13.058/2014), a doutrina e a jurisprudência divergem em relação
à possibilidade de imposição da guarda compartilhada, mesmo que não haja uma convivência pacífica
mínima entre os genitores, havendo decisão em sentido positivo (Maria Berenice e REsp 1.629.994/RJ,
3ª Turma do STJ, Rel. Min. Nancy Andrighi) e em sentido negativo (Rolf e Flávio Tartuce REsp
1.417.868/MG, 3ª Turma do STJ. Rel. Min. Noronha).
Obs.: O art. 1.585, CC, trata da possibilidade de cautelar e liminar para a fixação da guarda de filhos,
atualmente o enquadramento processual do tema se dá em sede de tutela provisória (arts. 294 e
seguintes, do CPC), a decisão sobre a guarda dos filhos observará, preferencialmente, a oitiva prévia das
partes.
Como já visto, a emenda do divórcio não alterou o sistema apresentado, permanecendo ainda em
vigor o art. 1.579 do Código Civil:
Art. 1.579. O divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos.
Parágrafo único. Novo casamento de qualquer dos pais, ou de ambos, não poderá importar restrições aos
direitos e deveres previstos neste artigo.
(REsp 1.605.477/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em
30
Art. 1.578. O cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome
do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar:
II - manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida;
§ 1º O cônjuge inocente na ação de separação judicial poderá renunciar, a qualquer momento, ao direito
de usar o sobrenome do outro.
Leciona Flávio Tartuce baseando-se no entendimento do STJ de que a separação judicial está
mantida no sistema, o cônjuge inocente poderá manter ou renunciar ao nome adotado.
Enquanto o cônjuge culpado na separação perde o direito de usar o nome do outro, em regra, a não
ser que tenha algum problema de identificação social, inclusive quanto aos filhos.
Entretanto, apesar da literalidade da norma, Flávio Tartuce entende, citando o Enunciado n. 124
do CJF/STJ, que os dois parágrafos do artigo deveriam ser tidos como não recepcionados pela EC 66,
pois desnecessários diante do exercício da autonomia privada do interessado e do reconhecimento de que
o nome constitui um direito da personalidade daquele cônjuge que o incorporou, nesse sentido também
é a posição da jurisprudência (REsp 1.482.843/RJ e REsp 241.200/RJ).
Art. 1.702. Na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e desprovido de recursos,
prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz fixar, obedecidos os critérios estabelecidos no art.
1.694.
Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro
obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na
ação de separação judicial.
Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em
condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando
o juiz o valor indispensável à sobrevivência.
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Veja que a culpa era o vetor determinante dos alimentos. Na prática da jurisprudência, é inegável
que, mesmo antes da emenda do divórcio, essa discussão da culpa já havia sido flexibilizada,
preocupando-se muito mais o juiz, à luz do princípio da proporcionalidade, com o binômio
necessidade/capacidade, do que propriamente com a busca de um culpado.
Assim, muito embora o Código Civil exija a discussão da culpa (regras que serviam tanto para a
separação quanto para o divórcio), a fixação de alimentos já vinha sendo objetivada pelos aplicadores.
A partir da emenda do divórcio, que para grande parte da doutrina não recepcionou as normas de
separação, o que dizer acerca da discussão da culpa no que se refere ao pedido de alimentos? Como se
delineia o panorama doutrinário em torno dos alimentos?
A doutrina brasileira não é pacífica, após a EC 66/2010, quanto à discussão da culpa em sede de
alimentos.
Uma primeira corrente (a de Pablo Stolze), na linha de Paulo Lobo e Leonardo Moreira Alves,
sustenta que, com a supressão da separação, a partir da nova emenda, não se deve mais discutir culpa,
devendo o juiz se ater ao binômio capacidade/necessidade. As questões envolvendo dano, culpa e
responsabilidade civil devem ser discutidas no âmbito próprio (área cível). Os alimentos são fixados com
base no princípio da solidariedade familiar31.
Outros autores, como José Fernando Simão, admitem a discussão da culpa restrita à ação
autônoma de alimentos.
Uma terceira corrente, defendida, dentre outros, por Flavio Tartuce continua admitindo a
discussão da culpa para a fixação dos alimentos em sede do próprio divórcio. Tartuce entende que é
possível pedir, cumulativamente, divórcio, alimentos e discutir culpa no procedimento de divórcio para
a fixação dos alimentos. Para Pablo, isso é difícil de sustentar, na medida em que, como defende o próprio
Tartuce, a separação (que era a sede de discussão da culpa) foi banida.
A nova emenda do divórcio não alterou a sistemática dos regimes de bens, lembrando que, à luz do
art. 1.581 do CC, a partilha pode ser deixada para depois do próprio divórcio:
Art. 1.581. O divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha de bens.
Acrescente-se, ainda, que será de separação obrigatória o regime de bens do divorciado que se casa
sem prévia partilha.
A Lei 6.515/1977 (Lei do Divórcio), em seu art. 43, dizia que para a pessoa se divorciar, tinha de
resolver o regime de bens, partilhando-os:
Art 43 - Se, na sentença do desquite, não tiver sido homologada ou decidida a partilha dos bens, ou quando
esta não tenha sido feita posteriormente, a decisão de conversão disporá sobre ela.
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Na prática, muitos casais que tinham patrimônio preferiam mentir, dizendo não possuir bens, para
evitar o recolhimento de tributos etc. O art. 1.581 revogou o dispositivo da Lei do Divórcio, para dar ao
casal que tenha patrimônio a opção de se divorciar e deixar a partilha para depois. A emenda
constitucional do divórcio não mexeu com isso. Assim, como dito, a pessoa divorciada que não partilhou
os bens do primeiro casamento não poderá escolher seu regime de bens: terá de casar em separação
obrigatória.
Segundo Flávio Tartuce um dos maiores problemas surgidos com a promulgação da Emenda
Constitucional 66/2010 refere-se à viabilidade jurídica de discussão da culpa para dissolver o casamento,
em sede de ação de divórcio, nesse sentido, a doutrina aponta para três posicionamentos:
i. 1ª corrente: não há separação de direito no sistema, não sendo possível a discussão sobre
a culpa no divórcio.
Para essa corrente, há um direito potestativo ao divórcio. É a posição dominante no IBDFAM,
seguida por Maria Berenice Dias, Rolf Madaleno, Rodrigo da Cunha Pereira, Pablo Stolze, Rodolfo
Pamplona e Paulo Lôbo.
ii. 2ª corrente: não há separação judicial no sistema, mas a culpa pode ser debatida em ação
de divórcio para fins de alimentos e responsabilidade civil. Corrente seguida por Zeno
Veloso, José Fernando Simão, Alvaro Villaça, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald.
iii. 3ª corrente: a separação de direito e a culpa permanecem no sistema, podendo ser ela
debatida também em divórcio. Corrente adotada por Mário Delgado, Maria Helena Diniz e
Gustavo Tepedino
2.17.5. Separação
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2.17.5.2. Conceito
A separação judicial, outrora denominada de “desquite”, é medida que fora prevista a partir do art.
1.571 do Código Civil e que visava a dissolver a sociedade conjugal (art. 1.576), mantendo-se o vínculo
matrimonial.
A dissolução da sociedade conjugal significa que as pessoas, mesmo que separadas, não podem
reconstruir suas vidas, na medida em que o vínculo matrimonial a ser rompido continua existente. Ou
seja, na prática, a separação apenas dissolve alguns deveres do casamento, mas os cônjuges continuam
proibidos de casar com terceiro, até que haja o divórcio ou um deles morra.
Quando a pessoa está separada judicialmente, a vida dela não está resolvida. A razão da defesa da
antiga designação “desquite” era a seguinte: o estado civil da pessoa era “desquitado” (sabia-se que a
pessoa estava separada judicialmente). Dizer “separado” deixava dúvidas sobre se havia a separação
judicial ou de fato. A separação judicial não faz aquilo que o casal mais almeja: a ruptura do vínculo
conjugal, nos termos do art. 1.576:
Art. 1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de
bens.
Quanto ao regime de bens, cumpre ressaltar, sequer se trata de efeito necessário, pois o casal tinha
a faculdade de deixar a partilha dos bens para depois. Então, na prática, a separação judicial já estava
esvaziada.
A tradição do direito brasileiro, todavia, resistiu muito ao divórcio. Durante muitos anos, a
separação judicial era a primeira e, na prática, a única via de dissolver uma sociedade conjugal falida.
32 (REsp 1.247.098/MS. 4ª Turma. Rel. Min. Maria Isabel Gallotti. Julg. 14/03/2017).
33 Enunciado 514, CJF: “A Emenda Constitucional n. 66/2010 não extinguiu o instituto da separação
judicial e extrajudicial.” Enunciado 515, CJF: “Pela interpretação teleológica da Emenda Constitucional n.
66/2010, não há prazo mínimo de casamento para a separação consensual.” Enunciado 516, CJF: “Na separação
judicial por mútuo consentimento, o juiz só poderá intervir no limite da preservação do interesse dos incapazes ou
de um dos cônjuges, permitida a cindibilidade dos pedidos com a concordância das partes, aplicando-se esse
entendimento também ao divórcio.” Enunciado 517, CJF: “A Emenda Constitucional n. 66/2010 extinguiu os
prazos previstos no art. 1.580 do Código Civil, mantido o divórcio por conversão.”
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A sepração de fato também está mantida no sistema, sem controvérsias quanto a isso e é
caracterizada quando existe um distanciamento físico e/ou afetivo dos cônjuges.
A separação de fato constitui os seguintes efeitos jurídicos:
i. O separado de fato pode constituir união estável com terceiro (ar. 1.723, § 1º);
ii. O STJ tem entendido que a separação de fato põe fim à sociedade conjugal (REsp
555.771/SP), mas não ao casamento.
Assim, a separação de fato teria efeito jurídico similar à separação de direito.
Ademais, a teor do art. 356 do CPC, que trata do julgamento parcial do mérito, é possível que a ação
de separação (caso se entenda ainda vigente) e a ação de divórcio sejam cumuladas com outros pedidos
(fim da sociedade conjugal, partilha dos bens, alimentos, guarda dos filhos etc.).
Assim, o juiz decreta o divórcio/separação do casal e segue na discussão dos outros temas.
Art. 1.574. Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges se forem casados por mais
de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por ele devidamente homologada a convenção.
Parágrafo único. O juiz pode recusar a homologação e não decretar a separação judicial se apurar que a
convenção não preserva suficientemente os interesses dos filhos ou de um dos cônjuges.
Diversamente da anterior, o procedimento da separação litigiosa era contencioso. Havia uma lide,
e não pedido conjunto. A outra parte poderia até não resistir ao pedido, mas existia demanda (um pedido
em face da outra).
A doutrina em geral costumava subdividir a separação litigiosa em:
i) separação-falência (art. 1.572, § 1º);
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Art. 1572 (…) § 1o A separação judicial pode também ser pedida se um dos cônjuges provar ruptura da vida
em comum há mais de um ano e a impossibilidade de sua reconstituição.
Art. 1.572 (...) § 2º O cônjuge pode ainda pedir a separação judicial quando o outro estiver acometido de
doença mental grave, manifestada após o casamento, que torne impossível a continuação da vida em
comum, desde que, após uma duração de dois anos, a enfermidade tenha sido reconhecida de cura
improvável.
Art. 6º - Nos casos dos §§ 1º e 2º do artigo anterior, a separação judicial poderá ser negada, se constituir
respectivamente, causa de agravamento das condições pessoais ou da doença do outro cônjuge, ou
determinar, em qualquer caso, conseqüências morais de excepcional gravidade para os filhos menores.
O juiz, nesses casos, poderia se recusar a decretar a separação, se verificasse que poderia haver
excessivo sofrimento do cônjuge doente ou dos filhos.
Para Pablo, a recusa do juiz à homologação de acordo de separação consensual não representa
cláusula de dureza. A possibilidade de recusa de homologação por violação da ordem pública ou outros
motivos trata-se de algo que decorre do sistema.
Essas discussões esvaziam-se em vista do fim da separação. Mas o tema tem de ser estudado, como
dito, pois não há, ainda, pronunciamento definitivo do STF.
iii) separação-sanção:
Além das duas acima, havia uma terceira espécie de separação litigiosa, a chamada “separação-
sanção”, a qual tinha seu fundamento no caput do art. 1.572 do CC, complementado pelas hipóteses do
art. 1.573.
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Era a forma mais comum de separação. Por ser forma de separação litigiosa, nela havia uma
demanda e se discutia culpa (ainda que essas tipologias variassem de autor para autor). Ou seja, era
separação que ocorria por causa subjetiva.
Não havia prazo para decretação. A esposa agredida na lua de mel já poderia, desde logo, pedir
separação. Havia uma incongruência: para a decretação da separação consensual havia um prazo de um
ano, enquanto que, se houvesse briga, era possível a separação.
Neste tipo de separação, segundo as normas do Código Civil, não bastava o desafeto. Necessário
seria, para o decreto de separação, que restasse provada a culpa do réu, por violação de dever conjugal
ou pela prática de conduta desonrosa.
Vale acrescentar que, pelo direito anterior, o culpado na separação também sofreria efeitos
colaterais condenatórios, como a obrigação do pagamento de pensão, a perda do uso do nome e, até
mesmo, da guarda dos filhos (quanto à guarda, isso vigorou até a vigência do CC/02, ainda que a CR
houvesse trazido uma nova perspectiva a esse pensamento).
Eram petições terríveis, horrendas. Ex.: mulher que queria a todo custo a separação com culpa,
descobriu que o réu foi acometido de câncer e passou a pedir sucessivos adiamentos da audiência, para
que ele morresse e ela pudesse pleitear a herança.
Assim, para a separação de forma litigiosa, segundo a lei, não bastava a impossibilidade da vida em
comum. Era necessária a imposição (e prova) de culpa, nas hipóteses previstas no art. 1.573 do CC:
Art. 1.572. Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação de separação judicial, imputando ao outro qualquer
ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum.
Art. 1.573. Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes
motivos:
I - adultério;
II - tentativa de morte;
VI - conduta desonrosa.
Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em
comum.
Não bastava dizer “não gosto mais dela”, para que houvesse a separação. Se “A” desejasse se separar
(e não fosse caso de separação falência ou remédio) e o outro cônjuge não, “A” teria supostamente que
praticar uma conduta desonrosa para poder se separar. Essa era a maior das incongruências da separação
judicial.
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Ruy Rosado de Aguiar tem acórdão paradigmático, enquanto esteve no STJ, que convidava a uma
reflexão acerca daquele paradoxo: a incongruência da exigência legal da culpa na separação, para
possibilitar a dissolução do casamento. Tratava-se de caso em que João imputava a Maria uma conduta
desonrosa, para justificar a separação. Maria reconveio, imputando a João também conduta desonrosa.
O Ministro não verificou culpa de nenhum dos dois lados, e decretou a separação (contra o direito
vigente) com base no simples desafeto.
Portanto, o maior inconveniente da separação judicial litigiosa (caput do art. 1.572) era, sem
dúvida, é a exigência da discussão da culpa no bojo da demanda, quando, em verdade, o moderno Direito
de Família apontava no sentido de ser suficiente o desafeto, a falência da afetividade, para a dissolução
do casamento, e da própria sociedade conjugal, como inclusive decidiu o STJ no emblemático REsp
467.184/SP. Com isso, já se percebe que a supressão do sistema de separação, a par da sua inutilidade,
marca um passo de evolução pelo banimento da culpa no juízo de família.
A culpa deve ser discutida no cível, em ação de responsabilidade civil. Ela nunca é de um só. O
banimento da discussão da culpa respeita a impossibilidade de se investigar um elemento que não deve
ser investigado numa Vara de Família.
A separação não resolvia a vida do casal, pois dissolvia sociedade conjugal sem colocar por terra o
vínculo matrimonial. O art. 1.573, parágrafo único, do CC poderia até abrir a possibilidade de separação
pelo desafeto:
Art. 1.573. Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes
motivos: (...)
Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em
comum.
Todavia, existe aquela regra de hermenêutica segundo a qual o parágrafo deve ser lido de acordo
com o caput, e a jurisprudência era conservadoríssima.
O fim da separação tem como grande passo o deslocamento da discussão da culpa para a via
ordinária, em outro juízo, que não o do divórcio. Para Pablo, o grande avanço da EC 66/2010 foi a
objetivização do divórcio.
3. União estável
3.1. Histórico
A União Estável equivale a uma união livre/informal, sempre reconhecida como um fato social,
ainda que antes da sua institucionalização
Em um primeiro momento, a união estável não mereceu o reconhecimento do direito brasileiro.
Considerava-se que apenas o casamento legitimava a família.
Com efeito, no final do século XIX (início da República), a união estável não era reconhecida no
Brasil. O direito civil sempre foi patrimonialista e despreocupado com a dignidade da pessoa humana. A
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expressão que se utilizava para caracterizá-la era o “concubinato”, que tem raiz latina e designa (“dormir
com alguém”). Era expressão com pesada carga pejorativa, preconceituosa.
Coube ao direito previdenciário dar os primeiros passos no sentido do reconhecimento de direitos
da companheira. Esse ramo do direito sempre foi moderno, no sentido de vanguardista em determinadas
questões polêmicas, como ocorreu no reconhecimento da união estável homoafetiva. O direito civil
somente olhava para o casamento. Por isso que a união não matrimonializada não legitimava a família.
O direito civil, em um primeiro momento, reconheceria à companheira mera indenização por
serviços domésticos prestados, evoluindo para, em um segundo momento, mas ainda no campo do direito
obrigacional, reconhecer-lhe direito à partilha do patrimônio comum (Súmula 380 do STF):
Súmula 380 - Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução
judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.
Entre as décadas de 1940 e 1960, segundo Cláudia Pessoa, a situação começa a evoluir. A
indenização por serviços domésticos era uma piada, quando se pensava numa mulher que, por muitos
anos, vivera com um homem e constituíra família.
A Súmula 380 do STF, posto não reconhecesse a relação de companheirismo como forma de
família, conferiu à companheira o direito de pleitear uma parcela do patrimônio comum, como se fosse
integrante de uma sociedade de fato. A companheira precisava demonstrar haver colaborado com a
constituição do patrimônio comum, para que tivesse direito à partilha.
Essa Súmula marcou época. Durante décadas, no Brasil, ela determinou que a mulher companheira
não constituía família, sendo considerada sócia daquele que amou e com quem teve filhos e viveu por
anos.
Com a Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), houve o reconhecimento da possibilidade de a
companheira utilizar o sobrenome do companheiro, desde que houvesse autorização dele e um justo
motivo. Esse dispositivo não foi revogado expressamente (art. 57, § 2º2), mas o entendimento
prevalecente é de que ele não é mais aplicado. Deve ser aplicada a regra do art. 1.565, §1º, CC, por analogia
(REsp 1.206.656/GO).
Somente com a CR/88 (art. 226, § 3º), a união estável passou a ser considerada uma entidade
familiar, o que, por via de consequência, fez com que passasse a ter a tutela jurídica do direito de família.
Isso mostra a evolução por que passou o Direito Civil:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...)
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Do texto constitucional verifica-se que não há mais hierarquia entre o casamento e a união estável.
Orlando Gomes, em obra comemorativa dos seus 50 anos de cátedra, demonstrou que uma marca
do direito civil do final do século XX foi justamente a migração de determinados assuntos para o âmbito
de proteção constitucional.
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Após a CR, duas leis foram aprovadas disciplinando aspectos da união estável: Lei 8.971/1994 e Lei
9.278/1996. Interessante notar que a primeira lei previa prazo mínimo de 5 anos para a União Estável, a
segunda afastou esse prazo.
Hoje, a lei mais nova, que serve de regulamentação da união estável e derrogou (revogação parcial)
dispositivos dessas leis anteriores, é o CC/02, que disciplina a matéria a partir do seu art. 1.723.
Entretanto, em dois aspectos das duas leis (Lei 8.971/94 e Lei 9.278/96) não foram tratados pelo
Código Civil de 2002, mantendo- se em vigor: Competência da Vara da Família e o direito Real de
Habitação do(a) companheiro(a).
Em 2011 no julgamento da ADPF 132/RJ e ADI 4277/DF houve o reconhecimento da união
homoafetiva como entidade familiar, com aplicação analógica das mesmas regras da união heteroafetiva.
União estável é a entidade familiar não matrimonializada, marcada pela convivência pública,
contínua e duradoura, com objetivo de constituição de família34 (art. 1.723 do CC):
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada
na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. (...)
Art. 1.723 (...) § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se
aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
(...)
34 Trata-se de conceito do Prof. Álvaro Villaça Azevedo, responsável por introduzir o tratamento da união
caracterização do concubinato”.
36 Diversamente de Pablo, Chaves entende que a jurisprudência do STF reconhece a união homoafetiva como
uma entidade familiar diversa da união estável, muito embora àquela sejam aplicadas as regras desta, por analogia.
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III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
VI - as pessoas casadas;
VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu
consorte.
Todavia, há uma exceção. Caso um ou ambos os companheiros sejam casados, para a constituição
da união estável eles têm de estar separados judicialmente ou de fato.
Assim, os impedimentos do art. 1.521 aplicam-se à união estável, com exceção do inciso VI, na
medida em que a pessoa casada pode constituir união estável, se estiver separada judicialmente ou de
fato do seu cônjuge.
As causas suspensivas do art. 1.523 do CC, por sua vez, não impedem a caracterização da união
estável:
Art. 1.723 (...) § 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.
I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e
der partilha aos herdeiros;
II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois
do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;
III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;
IV - o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa
tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas
contas. (...)
O STJ tem aplicado o disposto no art. 1.641 do CC e a Súmula 377 do STF à união estável, com a
necessidade de prova do esforço comum (Tese nº 6, Ed. 50 do Jurisprudência em Teses 12 e EREsp
1.171.820/PR),
Ademais, diante do quanto dispõe o art. 1.723 do CC, indaga-se: quanto tempo é necessário à
caracterização da união estável? É necessária a coabitação ou a prole comum? Alguns parlamentares
chegaram a instituir um tempo mínimo. Todavia, não existe tempo mínimo para a configuração da união
estável, assim como não se exige coabitação (Súmula 382 do STF) nem prole comum.
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Súmula 382 - A VIDA EM COMUM SOB O MESMO TETO, "MORE UXORIO", NÃO É INDISPENSÁVEL
À CARACTERIZAÇÃO DO CONCUBINATO.
Segundo Flávio Tartuce os elementos caracterizadores da união estável são subjetivos, havendo
uma verdadeira “cláusula geral” na sua configuração, provocando incerteza e dúvidas em sua aplicação,
assim, é possível afirmar que olegislador brasileiro optou por um sistema aberto de caracterização da
união estável.
Não optou por critérios objetivos, como o cronológico, a coabitação ou a existência de prole comum,
ainda que esses elementos, reunidos, reforcem a tese. Todavia, nenhum deles, de per si, é indispensável.
Há na jurisprudência casos de casal, junto por quatro meses, que vivia em união estável, e de 16 anos de
namoro que não configuraram união estável.
A união estável, diversamente do casamento, não gera estado civil, não precisa ser registrada e não
depende de habilitação (uma sindicância prévia). É algo informal.
Obviamente que tais elementos, especialmente quando conjugados, reforçam a tese, mas o critério
hermenêutico mais relevante é o teleológico (ou finalístico): o objetivo de constituição de um núcleo
familiar (visível, aparente, público, notório).
Asism, conforme afirmam José Fernando Simão e Zeno Veloso, no namoro/noivado, a família é
futura, com intenção/objetivo projetado no futuro. Na união estável, a família é presente - já existe. A
diferença está no animus familiae.
Ex.: o sujeito que apresenta a namorada como tal, demonstra a informalidade excessiva do namoro.
Quem apresenta alguém como companheira dá uma carga muito mais pesada ao relacionamento. Há
quem fale em esposa. Conta corrente conjunta, dependência em cartão de crédito, compra conjunta de
apartamento etc. são critérios que demonstram o eventual intuito de constituição de família.
Segundo leciona Flávio Tartuce esse ânimo familiar é analisado sob duas perspectivas:
i. Reputação (reputatio) e
ii. Tratamento (tractatio ou tractatus).
Evidentemente, a linha entre o namoro e a união estável é muito tênue. Por conta disso, o brasileiro
criou o chamado “contrato de namoro” (Revista nº 23 do IBDFAM). Trata-se de uma declaração
formalizada pelo casal, especialmente em tabelionato de notas, por meio da qual afirma manter uma
simples relação de namoro, com o propósito de afastar o regramento da união estável. A ideia é até
interessante. A informalidade da união estável faz com que, por exemplo, não seja possível precisar o
início e o fim dela, cabendo ao juiz, muitas vezes, decifrar esses marcos dos elementos do processo.
Silvio Venosa entende que a união estável é um fato da vida. Por essa razão, não poderia um
contrato de namoro afastar um regramento que é de ordem pública. Caso o juiz reconheça a existência
de união estável, a despeito do contrato firmado, ele dará ao relacionamento a disciplina dela. Isso não
significa que o contrato não servirá como prova da não configuração.
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Portanto, caso o juiz se convença ter se configurado a união estável, não poderá o contrato de
namoro afastar esse regramento de direito de família, que é de ordem pública.
O contrato de namoro não se confunde com o “contrato de convivência”, este sim reconhecido pelo
ordenamento jurídico e objeto de estudo de Francisco Cahali, em obra com o mesmo título. Trata-se da
declaração negocial em que, nos termos do art. 1.725 do CC, os companheiros reconhecem a união estável
e disciplinam efeitos patrimoniais dela decorrentes:
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações
patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Esse contrato é muito comum de ser encontrado. Muitas vezes ele somente declara a união estável,
simplesmente com fins previdenciários.
Quem está em união estável submete-se ao regramento da comunhão parcial de bens, a não ser
que, por meio de contrato, discipline diversamente as relações patrimoniais (art. 1.725).
No Editorial nº 5, no site de Pablo, há precedente do STJ (Noticiário de 23 de junho de 2010)
aplicando a separação legal de bens na união estável, quanto houver pessoa com idade superior a 60 anos
(no atual sistema, o entendimento seria aplicável ao maior de 70).
Os companheiros submetem-se aos direitos e deveres equiparáveis aos do casamento (art. 1.724):
lealdade (que, como visto, envolve a fidelidade), respeito, assistência (que envolve alimentos), guarda,
sustento e educação dos filhos:
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e
assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
A união estável, nos termos do art. 1.726 do CC, poderá converter-se em casamento, mediante
pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil. Essa conversibilidade é disciplinada por
provimento dos Tribunais de Justiça:
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz
e assento no Registro Civil.
O casamento putativo é aquele aparente e inválido, mas cujos efeitos são mantidos, em razão da
boa-fé do cônjuge que desconhecia a invalidade, para preservar direitos dele (ex.: alimentos, partilha de
bens etc.)
Pablo entende que o mesmo raciocínio da teoria da putatividade tem de ser aplicado à união estável
(ex.: sujeito que constitui uniões estáveis com duas mulheres, que não sabiam uma da outra). Até porque
há a máxima do direito segundo a qual “onde há a mesma razão, haverá o mesmo direito”.
É digno de nota, entretanto, que o REsp 789.293/RJ não aceitou a teoria da união estável putativa
para proteger uma segunda companheira de boa-fé. Nesse caso, pouco importava, para o julgado, se a
primeira relação era de união estável ou de casamento. Para Pablo, a decisão está equivocada, na medida
em que discrimina, de forma violadora da isonomia, a companheira da esposa.
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Na visão acadêmica de Pablo, se o sujeito é casado e constitui uma segunda união estável
concomitante, sendo que esta segunda esteja de boa-fé, poderá haver o reconhecimento da união estável
putativa.
Como visto, acima, o direito civil, em um primeiro momento, reconheceria à companheira mera
indenização por serviços domésticos prestados, evoluindo para, em um segundo momento, mas ainda no
campo do direito obrigacional, reconhecer-lhe direito à partilha do patrimônio comum (Súmula 380 do
STF). A mulher não poderia pleitear alimentos, pois o concubinato não era tido como família:
Essa indenização era fixada em prestações mensais. Assim, ainda que com outro nome, o juiz
concedia alimentos à mulher. A competência para fixar essa indenização era do juiz da Vara Cível, pois
não era uma relação de família. A jurisprudência, então, deu um jeito de dar alimentos à companheira,
travestidos por outro nome.
Entre as décadas de 1940 e 1960, segundo Cláudia Pessoa, a situação começa a evoluir. A
indenização por serviços domésticos era uma piada. Depois de muitos anos vivendo e tendo constituído
família, a mulher teria direito a uma indenização por serviços prestados.
Vale ressaltar, ainda, que a Lei 6.015/73 permitiu que a concubina pudesse acrescer ao seu
sobrenome o de seu concubino. Além disso, na década de 1970, lei previdenciária permitiu que a
concubina recebesse benefício previdenciário de seu concubino.
A Súmula 380 do STF, posto não reconhecesse a relação de companheirismo como forma de
família, conferiu à companheira o direito de pleitear uma parcela do patrimônio comum, como se fosse
integrante de uma sociedade de fato. A companheira precisava demonstrar haver colaborado com a
constituição do patrimônio comum, para que tivesse direito à partilha.
Esta Súmula marcou época. Durante décadas, no Brasil, ela determinou que a mulher companheira
não constituía família, sendo considerada sócia daquele que amou e com quem teve filhos e viveu por
anos.
Somente com a CR/88 (art. 226, § 3º), a união estável passou a ser considerada uma entidade
familiar, o que, via de consequência, fez com que passasse a ter a tutela jurídica do direito de família. Isso
mostra a evolução por que passou o Direito Civil. Assim, a CR elevou o concubinato ao status de entidade
familiar.
O concubinato então mudou de nome, visto que esta expressão estava carregada de estigma,
preconceito. “Concubina” era uma expressão pejorativa. O constituinte, por influência da Igreja Católica,
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buscou no antigo testamento o antigo nome do casamento: união estável. Ocorre a mudança de nome, na
busca de uma nova terminologia para o concubinato.
Porém, nem todo concubinato foi elevado ao status de família: o concubinato puro ganhou o nome
de união estável e passou a ser tratado como entidade familiar (art. 226, § 3º, da CR); o concubinato
impuro passou a ser chamado somente de “concubinato” e continua a ser tratado como sociedade de fato
(art. 1.727 do CC: não há intervenção do MP e eventual ação deve ser ajuizada na Vara Cível):
Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem
concubinato.
Diante desse histórico e da divergência constitucional entre os institutos, união livre pode ser
conceituada como a união entre duas pessoas humanas sem intenção de constituir uma família. Não há
affectio familiaris. Não se verifica a intenção futura de formar uma entidade familiar, mas a intenção
presente de estar vivendo uma família. Ex.: namoro, noivado e até mesmo “ficar”. No noivado, a affectio
familiaris é futura e não presente.
Para o sistema jurídico, as uniões livres não são entidades familiares. São meras entidades
obrigacionais e podem, quando muito, produzir efeitos no direito das obrigações. Nunca produzirão
efeitos no direito de família. Houve o caso de um cantor que deu um carro de presente à namorada e,
pouco depois, a namorada o traiu. O cantor queria tomar o carro de volta, em razão da infidelidade.
Contudo, o presente dado pelo namorado à namorada tem natureza de doação, e, assim sendo, é
irrevogável e irretratável.
Nesta linha de raciocínio, namorados e noivos não se submetem ao dever jurídico de fidelidade, ao
parentesco por afinidade etc., pois não há nenhum efeito familiar.
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O concubinato, por outro lado, é a união entre pessoas humanas impedidas de casar. São as pessoas
que sofrem impedimento matrimonial do art. 1.521 do CC. O art. 1.727 estabelece que no Brasil o
concubinato é mera sociedade de fato.
Por fim, união estável (art. 226, § 6º, da CR) é a união entre duas pessoas, sem formalidades e com
intenção de viverem como se casadas fossem.
Lembre que as pessoas que vivem em união estável devem ser desimpedidas para casar, pois
havendo impedimento descaracteriza-se a união estável e caracteriza-se o concubinato. Assim, os
impedimentos matrimoniais se aplicam à união estável. Isso se dá por um motivo simples: quem vive em
união estável deve estar livre para casar. É uma entidade familiar.
Obs.: Havia uma classificação do Prof. Álvaro Villaça, já superada pelo CC/2002, que dividia os
institutos da seguinte forma: Concubinato lato sensu:
i. Concubinato puro (união estável)!
ii. Concubinato impuro (propriamente dito - art. 1.727 do CC), subdividido em:
a) Adulterino (com pessoa casada).
b) Incestuoso (pessoa da mesma família).
c) Desleal (mais de uma união estável).
Finalizando a questão, Flávio Tartuce apresenta uma tabela diferenciando os institutos:
União Estável Concubinato
Pessoas solteiras, viúvas, divorciadas ou separadas Pessoas casadas não separadas; havendo
(de fato, judicialmente ou extrajudicialmente). impedimento decorrente de parentesco ou crime
(art. 1.521 do CC).
Há meação, sucessão e direito a alimentos. Não há meação, sucessão ou direito a alimentos.
Aplica-se a já vista súmula 380 do STF.
Obs.: Não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas” (casamento ou outra união
estável).
União estável plúrima, presente quando alguém vive vários relacionamentos que podem ser tidos
como uniões estáveis ao mesmo tempo, há três correntes:
i. 1ª corrente: nenhum relacionamento é união estável. Posição de Maria Helena Diniz e
Álvaro Villaça, por considerarem uniões desleais. Tese prevalecente no STJ;
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ii. 2ª corrente: todos os relacionamentos são uniões estáveis. Posição de Maria Berenice
Dias;
iii. 3ª corrente: união estável putativa (art. 1.561, CC). Corrente adotada por Flávio Tartuce,
Euclides de Oliveira e Rolf Madaleno.
Não se confunda com aUnião poliafetiva, em que existe um vínculo entre mais de duas pessoas.
Foram lavradas algumas escrituras públicas de uniões poliafetivas em São Paulo e no Rio de
Janeiro, porém, o CNJ, em junho/2018, proibiu tais escrituras – consideradas nulas e ilícitas (art. 166,
CC).
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Na união estável, a relação precisa ser notória. Todavia, a publicidade não significa registro em
cartório, nem o ajuizamento de ação para que o reconhecimento da união estável. A publicidade, aqui,
significa que deve ser uma relação ostensiva, não clandestina.
v) ausência de impedimentos matrimoniais do art. 1.521:
Para a caracterização da união estável, não pode haver impedimento matrimonial. Diante desse
fato, somente pode se caracterizar como união estável aquilo que pode ser casamento. Ou seja, só haverá
união estável quando for possível a sua conversão em casamento.
Como visto, aplicam-se na união estável os impedimentos matrimoniais, com exceção do inciso que
veda o casamento à pessoa que ainda é casada, mas já está separada de fato. Ex.: homem que ainda não
se divorciou, mas que não mais convive com a sua esposa. Isso significa que ele já está separado de fato,
mas já vive em união estável. O fundamento dessa exceção é que com a cessação do afeto no casamento,
já se caracteriza a união estável. Excepcionalmente, nessa hipótese, a união estável ainda não pode ser
convertida em casamento.
Neste ponto, há no Código Civil duas incoerências relevantes para fins de concursos públicos:
i) o art. 1.642, V, parte final estabelece que somente cessa o regime de bens do casamento se o casal
estiver separado de fato há mais de 5 anos:
Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente:
V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao
concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal
estiver separado de fato por mais de cinco anos;
ii) o art. 1.830 estabelece que o direito à herança no casamento somente cessa depois de 2 anos da
separação de fato:
Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do
outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova,
neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.
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pois está no CC/02. Todavia, se o examinador fizer a mesma pergunta de acordo com o entendimento do
STJ, a resposta deve ser de que a mera separação de fato cessa os efeitos do casamento.
Portanto, o art. 1.723, § 1º entrou em rota de colisão com o art. 1.642, V e o art. 1.830, ambos do
CC. O STJ dirimiu esse conflito a favor do art. 1.723, § 1º, dizendo que a simples separação de fato cessa
os efeitos do casamento.
Veja que o CC mandou aplicar à união estável os impedimentos matrimoniais, mas não as causas
suspensivas do art. 1.523 (“não devem se casar”). Estas causas suspensivas impõem o regime de
separação obrigatória de bens, mas elas não se aplicam na união estável. A conclusão a que se chega é a
seguinte: quem vive em união estável não se submete ao regime de separação obrigatória.
Entretanto, o STJ já decidiu que o regime da separação obrigatória se aplica na união estável para
o maior de 70 anos. Na letra do CC/02, não há obrigatoriedade do regime de separação obrigatória para
a união estável.
Os requisitos apresentados são objetivos e, portanto, um namoro muito longo (de 10 anos, por
exemplo) poderia se caracterizar em união estável. Todavia, o último requisito não deixa que isso ocorra:
intuitu familiae. É a intenção de viver como se casados fossem (convivência more uxorio). Este é o
requisito subjetivo e é isso que distingue a união estável de um namoro prolongado.
É importante perceber que a questão aqui é probatória, processual. Sob o ponto de vista do direito
material, exige-se o ânimo de viver, atualmente, como se casados fossem, sem a necessidade de morar
sob o mesmo teto. Não basta a intenção futura de viver como se casados fossem, tem de haver a vontade
atual (art. 1.723, caput, do CC).
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e
assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
Conforme já salientado, os efeitos são válidos para as uniões heteroafetivas e homoafetivas, ambas
de competência da Vara da Família
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Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade.
§ 1º O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou
companheiro.
§ 2º Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável.
Lembre que, na linha reta, o parentesco por afinidade não se dissolve nunca; na linha colateral se
dissolve. Com isso, será impossível casar ou manter união estável com a ex-sogra ou ex-enteada, mas é
possível casar com a ex-cunhada.
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Art. 57 (...) § 2º A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem solteiro, desquitado ou viúvo,
excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de
nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios, de
família, desde que haja impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das
partes ou de ambas. (Incluído pela Lei nº 6.216, de 1975).
Nome é direito da personalidade. Por isso, quem modificou o sobrenome pelo casamento ou união
estável somente voltará a ter o nome anterior quando da dissolução, se assim desejar.
3.6.6. Adoção
O sexto efeito é a possibilidade de adoção pelo casal em união estável (art. 42, § 2º, do ECA):
Art. 42 (...) § 2º Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou
mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de
2009)
Quem vive em união estável pode adotar pelo par, ou seja, não é adoção unilateral, mas adoção do
casal. É possível que o casal adote mesmo depois da dissolução da união estável, se a convivência com o
adotante se iniciara anteriormente à dissolução. Ex.: se durante a convivência o casal obteve a guarda do
menor, nada impede que mesmo depois da dissolução da união estável eles venham a adotá-lo.
I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte
deste; (Redação dada pela Lei nº 12.195, de 2010)
Art. 12. Em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da união estável, a locação
residencial prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel.
(Redação dada pela Lei nº 12.112, de 2009) (...)
O companheiro tem o direito de continuar na locação, ainda que o locador não tenha celebrado o
contrato com ele. Nesse caso, o locador é obrigado a suportar o companheiro em sub-rogação (não pode
despejá-lo), mas pode exigir garantia do companheiro que se sub-rogou:
Art. 12 (...) § 1º Nas hipóteses previstas neste artigo e no art. 11, a sub-rogação será comunicada por escrito
ao locador e ao fiador, se esta for a modalidade de garantia locatícia. (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009)
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§ 2º O fiador poderá exonerar-se das suas responsabilidades no prazo de 30 (trinta) dias contado do
recebimento da comunicação oferecida pelo sub-rogado, ficando responsável pelos efeitos da fiança
durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador. (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009)
Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento,
em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.
Nesse caso, todo o patrimônio seria dividido por três. O TJSP chama esse fenômeno de “triação”.
Maria Berenice Dias adverte para um detalhe: a boa-fé nesse caso não é apenas a subjetiva (de
conhecimento), mas pode ser também a boa-fé objetiva (de comportamento). Seria o caso existente em
Sergipe, de um homem que mantém relação estável com três mulheres, sendo que as três sabem da
existência uma da outra e aceitam esse comportamento. A boa-fé aqui seria objetiva, mas todas as três
seriam relações de união estável putativa.
Esse argumento é apenas doutrinário, pois na jurisprudência prevalece o entendimento de que o
concubinato é sempre e somente sociedade de fato e nunca união estável. A jurisprudência não aceita o
concubinato como entidade familiar, nem mesmo com boa-fé. Não existe a tese da união estável putativa
na jurisprudência.
O professor pondera que se as pessoas confiam naquela situação, ainda que putativa, merecem
proteção.
Não são efeitos pessoais da união estável:
i) coabitação (Súmula 382 do STF);
ii) fidelidade: na união estável há lealdade (que é mais amplo que a fidelidade) e respeito;
iii) emancipação;
iv) mudança do estado civil: quem vive em união estável não altera seu estado civil;
v) estabelecimento de presunção de paternidade do art. 1.597: esse é um efeito exclusivo do
casamento, não aplicável à união estável;
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vi) caracterização como herdeiro necessário (art. 1.845): o cônjuge é herdeiro necessário, mas o
companheiro não:
Em vista de todos esses efeitos, pode-se afirmar que a união estável não se confunde com o
casamento, embora também seja uma entidade familiar. Ambos são entidades familiares, mas o
casamento é formal e solene, ao passo que a união estável é informal e não solene.
A diferença entre casamento e união estável repousa em uma lógica: se o casamento é público e
formal, ele produz efeitos entre as partes e em relação a terceiros; já a união estável é informal e não
solene, produzindo efeitos apenas intra partes. Não existem efeitos da união estável em relação a
terceiros, com a exceção do parentesco por afinidade (art. 1.595), previsto em lei.
Exemplos: o art. 496 do CC prevê que na compra e venda de ascendente para descendente é
necessário o consentimento dos demais filhos e do cônjuge. O dispositivo não se aplica à união estável,
por envolver terceiros. O art. 499 prevê que a compra e venda entre cônjuges é lícita, com relação aos
bens excluídos da comunhão. O dispositivo se aplica à união estável, por produzir efeitos apenas entre as
partes.
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações
patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Aplicam-se na união estável as regras do regime de comunhão parcial de bens. Esse regime gera
presunção absoluta de colaboração entre os cônjuges, não admitindo prova em contrário. Se um casal
vive em união estável e compra um terreno, a lei presume de forma absoluta essa colaboração, que não é
apenas financeira ou econômica, podendo ser subjetiva, moral ou espiritual.
Uma exceção à presunção absoluta é o contrato de convivência, termo cunhado por Francisco
José Cahali, não obrigatório, que pode ser feito por escritura pública ou instrumento particular.
Nele, pode-se escolher regime patrimonial diverso da comunhão parcial e, ainda, declarara
existência da própria união estável.
Esse contrato se assemelha, de certo modo, ao pacto antenupcial, mas com ele não se confunde. O
pacto antenupcial deve ser feito por escritura pública, sob pena de nulidade, e registrado no Cartório de
Imóveis, sob pena de ineficácia em relação a terceiros. Já o contrato de convivência pode ser feito por
escritura pública ou particular e não poderá ser registrado no Cartório de Imóveis, mas apenas no de
notas.
Outra peculiaridade é que o pacto antenupcial é sempre celebrado antes do casamento, ao passo
que o contrato de convivência pode ser celebrado a qualquer tempo. Em regra, o contrato de convivência
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não produz efeitos retroativos. Portanto, até a sua celebração, aplicam-se as regras da comunhão parcial
de bens; após, as regras do regime escolhido.
Como a união estável produz efeitos apenas entre as partes, o contrato de convivência é inoponível
perante terceiros. Isso gera um efeito: se uma pessoa que vive em união estável quiser alienar ou onerar
bens imóveis que estejam apenas registrados em seu nome (adquiridos na constância da união estável),
não será necessário obter o consentimento da companheira. É lógico que se o bem imóvel estiver em
nome de ambos será necessário o consentimento do outro.
Segundo o STJ, é nula a cláusula que atribui eficácia retroativa ao regime de bens pactuado em
escritura de união estável37, de sorte que prevalece o regime legal (comunhão parcial) no período anterior
à lavratura da escritura.
Discute-se ainda a aplicação do art. 1.647 do CC16 (outorga conjugal), por analogia, à união estável
(outorga convivencial), sobre o tema, três correntes:
i. 1ª corrente: sim, pois a união estável equipara-se ao casamento. 38
Segundo Flávio Tartuce não se pode negar que esta corrente é fortalecida pelo art. 73, §3º, CPC,
pois este dispositivo exige outorga convivencial para as ações reais imobiliárias (art. 1.647, II, CC).
ii. 2ª corrente: não, pois a união estável não é totalmente igual ao casamento. Outrossim, o
art. 1.647 não admite analogia por ser norma restritiva de direitos, nesse sentido o
Enunciado 641 da JDC39.
iii. 3ª corrente: Aplica-se o art. 1.647 no caso da união estável feita por escritura pública e
registrada no Cartório de Registro de Imóveis40.
Finalmente, não se deve confundir contrato de convivência com contrato de namoro. O contrato de
convivência, sobre o qual alude o art. 1.725, é a disciplina dos efeitos patrimoniais da união estável. Já o
contrato de namoro é o negócio jurídico pelo qual as partes declaram que estão namorando, e não vivendo
em união estável.
O contrato de namoro torna-se um instrumento inócuo, pois quer estabelecer que as partes estejam
apenas namorando e não vivendo em união estável, mas não é instrumento idôneo para obstar a união
estável quando presentes os seus requisitos caracterizadores. Assim, ainda que haja um contrato de
namoro celebrado, se o juiz entender que estão presentes os requisitos caracterizadores da união estável,
ela será reconhecida (norma de ordem pública).
37 (STJ. REsp 1.597.675/SP. 3ª Turma. Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. Julg. 25/10/2016)
38 (REsp 755.830/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/11/2006, DJ
01/12/2006, p. 291)
39 Enunciado n. 641, com a seguinte dicção: “a decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a
inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil não importa equiparação absoluta entre o casamento e a união
estável. Estendem-se à união estável apenas as regras aplicáveis ao casamento que tenham por fundamento a
solidariedade familiar. Por outro lado, é constitucional a distinção entre os regimes, quando baseada na solenidade
do ato jurídico que funda o casamento, ausente na união estável”. (REsp 1.299.866/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 21/03/2014).
40 (REsp 1.424.275-MT, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 4/12/2014, DJe 16/12/2014)
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Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos
onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: (...)
Obedecendo ao art. 226, § 3º, da CR, foi editado o art. 1.726 do CC:
Art. 226 (...) § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a
mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz
e assento no Registro Civil.
Existem dois requisitos para a conversão da união estável em casamento: i) pedido dirigido ao juiz;
ii) registro no Cartório de Registro Civil.
Pergunta-se: se para casar não é preciso pedido dirigido ao juiz, por que ele seria necessário na
união estável, em vista do comando constitucional que diz que a lei facilitará a conversão?
À primeira vista poderia ser uma dificuldade, mas como a conversão da união estável depende de
pedido ao juiz, admite-se a eficácia retroativa a ele atribuída. Permite, portanto, que a conversão em
casamento opere efeitos retroativos.
Na prática, em muitas unidades da Federação, a conversão é feita unicamente no Cartório de
Registro Civil, como no estado de São Paulo, mediante norma da Corregedoria do Tribunal de Justiça.
STF. Plenário. RE 646721/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso e RE
41
878694/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 10/5/2017 (repercussão geral) (Info 864).
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42 Enunciado 103, I JDC: “O Código Civil reconhece, no art. 1.593, outras espécies de parentesco civil além
daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental
proveniente quer das técnicas de reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu
com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse do estado de filho.” Enunciado
256, III JDC: “A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil.” -
Informativo 840 do STF: Repercussão geral da parentalidade socioafetiva. “Vínculo de filiação e reconhecimento
de paternidade biológica”.
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heteróloga, aquela efetivada com material genético de terceiro, caso em que o vínculo será estabelecido
com aquele que planejou e não com o doador do material genético.
Ou ainda com fundamento na parentalidade socioafetiva, na posse de estado de filhos e no vínculo
social de afeto.
Na linha reta, São parentes as pessoas que estão umas para com as outras na relação de
ascendentes e descendentes, contando-se os graus são contados pelo número de gerações na medida
em que se sobe ou se desce na “escada parental”, a teor do quanto previsto no Art. 1.594:
CC, art. 1.594: “Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral,
também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até
encontrar o outro parente.”.
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Filiação é a relação jurídica de parentesco entre ascendentes e descendentes no primeiro grau. Note
que o conceito de filiação não é apenas biológico, mas plural, na medida em que ele não se restringe à
biologia. Assim, reconhece-se a pluralidade de vínculos (origens) filiatórios, como o oriundo da adoção.
Cumpre lembrar que a biotecnologia enriqueceu o conceito de filiação, na medida em que estabeleceu
novas formas de filiação.
Art. 227 (...) § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos
direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consangüinidade ou outra origem.
Esta parte final (“ou outra origem”) deixa claro que a filiação respeita a igualdade existencial: seja
qual for a origem, todo filho merece igual tratamento. A partir desse princípio é que se reconhece, por
exemplo, a paternidade socioafetiva (ex.: adoção à brasileira, filho de criação etc.)
iii) designativo:
Por fim, a igualdade entre os filhos é designativa. Não mais se admite designação, qualificação de
filhos. Como consequência, não mais se pode falar em filho legítimo, ilegítimo, incestuoso, bastardo etc.
Todo filho merece o mesmo tratamento.
No estudo do principio constitucional da igualdade, deve-se lembrar da lição de Celso Antonio
Bandeira de Melo (em “O conteúdo jurídico do princípio da igualdade”): deve-se sempre considerar a
ideia de discrimen (o princípio da igualdade nada mais é que aquinhoar de modo igual quem estiver em
situação fática igual, e de modo diferente quem estiver em situação fática diferente). Discrimen, portanto,
é a existência de uma situação fática subjacente de desigualdade.
Diante dessa ideia fundamental, o principio constitucional da igualdade entre os filhos permite
tratamento desigual entre eles, desde que haja discrímen. No campo sucessório, ele jamais haverá, de
modo que todo filho terá sempre o mesmo direito.
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Um caso em que poderá haver discrimen, por exemplo, é o da prestação de alimentos. O sujeito
com suficiente capacidade contributiva tem dois filhos, da mesma idade, com duas mulheres diferentes.
Um deles mora na capital e outro mora em cidade pequena do interior. São crianças diferentes, com
necessidades diferentes (o custo de vida na capital é bastante maior), de modo que a pensão entre eles
será diferente (o filho que mora na capital terá pensão maior). Caso o outro venha a morar da capital, a
pensão poderá ser revisada para se tornar igual, ou até maior, dependendo da situação fática subjacente
(a esse respeito, ver o art. 1.694 do CC, segundo o qual a fixação dos alimentos se dará com base na
necessidade, possibilidade e na capacidade). No exemplo dado, tratá-los igualmente ferirá a igualdade.
Pensão não é salário, de modo que deve servir para cobrir as despesas, não para sobrar.
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exemplo). Nesta multiplicidade filiatória, haveria três pais, três mães, 24 avós etc. Chaves respeita a tese,
mas não concorda com ela, na medida em que traz a reboque a da plurihereditariedade. Aquele que tem
mais de um pai e de uma mãe herda de todos eles. A tese traz como inconveniente visível uma
patrimonialização do conceito filiatório. Certos pais serão escolhidos com interesses econômicos.
Segundo José Fernando Simão, há que se conhecer, acerca deste tema, dois precedentes que
admitem a multiparentalidade: um do TJSP e outro do TJRS. Os casos eram semelhantes: o sujeito tem
filhos, fica viúvo cedo e se casa novamente. A madrasta passa a criar os filhos do marido como se dela
fossem, numa relação que ultrapassa a de madrasta-enteada, tornando-se materno-filial.
Problema: as duas não pedem ao Judiciário a adoção das crianças, para evitar o rompimento do
vínculo biológico com a família da mãe falecida. Elas queriam somar, e não excluir. Em am-bos os casos,
os Tribunais entenderam possível a soma de vínculos. Mas veja que a mãe biológica falecera. Na prática,
era uma mãe, mas na certidão eram duas.
Interessante que em SP, em primeira instância, o juiz tentou convencê-la adotar, tendo a madrasta
alegado no recurso que não achava justo que os “filhos” perdessem o vínculo afetivo com a família da mãe
falecida.
O caso mais complicado, para fins de concurso, é a dupla paternidade, pois não há decisões de
tribunal acerca do tema. Há apenas duas decisões, de primeira instância, mas nenhuma de SP43. A mulher
engravida, não conta ao namorado, muda de cidade, conhece outro, que diz que com ela se casará e será
pai da criança. Ele cria o vínculo afetivo e, muito tempo depois, o antigo namorado descobre que é pai e
pretende o reconhecimento de seu direito de ser pai, privado pela mãe. Dois querem ser pais. Esse é o
caso mais dramático. Há três decisões possíveis:
i) prevalece a socioafetividade: seria uma punição ao genitor, em favor do interesse da criança;
ii) prevalece o vínculo biológico;
iii) (decisões de primeira instância em Ariquemes, RO, e Cascavel, PR) as crianças ganharam dois
pais e uma mãe.
Esse tema é difícil, para fins de concurso, porque esbarra no tema: a decisão de ter dois pais atende
ao melhor interesse da criança, princípio norteador de todo o Direito de Família? Para alguns, melhor ter
três do que nenhum. Todavia, ter três pode ser ruim, por exemplo, na condução da educação, ou na
hipótese de, já adulta, a pessoa ter de vir a sustentá-los na velhice. Este tema é espinhoso.
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I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;
II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação
judicial, nulidade e anulação do casamento;
III - havidos por fecundação artificial [reprodução assistida] homóloga [com material genético dos
cônjuges ou companheiros], mesmo que falecido o marido;
V - havidos por inseminação artificial [reprodução assistida] heteróloga [com material genético de
terceiro], desde que tenha prévia autorização do marido.
Quis o CC que a presunção ficasse restrita ao casamento, entretanto o cenário atual conforme
carreado acima, demanda que a presunção seja utilizada para outras formas de família, especialmente à
união estável (nesse sentido, Tartuce e Maria Berenice Dias).
Salienta-se que todas são presunções relativas ou iuris tantum
Há um precedente nesse sentido (REsp 23/PR). Maria Berenice Dias vai adiante e entende aplicável
a presunção na união homoafetiva.
Obs.: Sobre a Técnica de Reprodução Assistida, há regulamentação trazida pela Resolução
2.168/2017 do Conselho Federal de Medicina (CFM), bem como o Provimento 63/2017 do CNJ..
Obs2.:Além das técnicas de reprodução assistida homóloga, há as seguintes:
i. Técnica GIFT: quando a fecundação ocorre no corpo da mulher (seringal);
ii. Técnica ZIFT: quando a fecundação ocorre fora do corpo da mulher (proveta).
Enunciado nº 129 - Proposição para inclusão de um artigo no final do cap. II, subtítulo II, cap. XI, título I,
do livro IV, com a seguinte redação:
Parágrafo único: Nos casos de utilização das técnicas de reprodução assistida, a maternidade será
estabelecida em favor daquela que forneceu o material genético, ou que, tendo planejado a gestação, valeu-
se da técnica de reprodução assistida heteróloga.
Tal presunção de maternidade pela gestação, todavia, é relativa. Como visto, o conceito de filiação
não é exclusivamente biológico, não podendo a presunção mater is certus ser considerada absoluta.
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Enunciado nº 105 – Art. 1.597: As expressões “fecundação artificial”, “concepção artificial” e “inseminação
artificial” constantes, respectivamente, dos incs. III, IV e V do art. 1.597 deverão ser interpretadas como
“técnica de reprodução assistida”.
Enunciado nº 257 – Art. 1.597: As expressões “fecundação artificial”, “concepção artificial” e “inseminação
artificial”, constantes, respectivamente, dos incs. III, IV e V do art. 1.597 do Código Civil, devem ser
interpretadas restritivamente, não abrangendo a utilização de óvulos doados e a gestação de substituição.
Se o casal vai se submeter à fertilização assistida, ele pode acertar com o médico seleção genética?
A bioética proíbe, porque do contrário haveria o “super-homem genético”. Admitir a escolha de material
genético é tratar o ser humano como objeto, e não o sujeito da relação. Havendo erro na seleção, o filho
não poderá ser devolvido sob a alegação de vício redibitório.
Finalmente, é possível a “gestação de substituição” somente de forma gratuita e entre pessoas da
mesma família (até o 4º grau) – “Máxima do planejamento”
Flávio Tartuce adver para o não uso do termo “barriga de aluguel”.
Nesta forma de gestação, tem-se:
i. "Genetrix": fornece o material genético (o vínculo será com ela);
ii. "Gestatrix:" aquela que gesta.
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Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de
embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento,
atendidas as seguintes condições:
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já
congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data
de congelamento. (...)
Esse embrião entra na sucessão legítima? O art. 1.798 do CC não é claro nesse sentido. Diz que são
legitimados a suceder (podem suceder) os nascidos e os já concebidos no momento da abertura da
sucessão, ou seja, quem já é nascido ou concebido quando da morte:
Autores como Caio Mário da Silva Pereira entendem que somente a concepção uterina gera direito
hereditário, de modo que o laboratorial não terá direito sucessório. Maria Berenice Dias e Giselda
Hironaka entendem que o embrião laboratorial terá direito à herança. A Chaves, parece que a segunda
corrente é a mais substanciosa, em virtude do princípio constitucional da igualdade entre os filhos.
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O tema é polêmico.
O direito civil clássico sempre tratou da questão de maneira muito simples: nascidos são os que já
se separaram da mãe; nascituros, historicamente, sempre foram considerados os em-briões implantados
no ventre materno. Portanto, herdeiros eram os já nascidos e os nascitu-ros.
Com as técnicas de reprodução humana assistida, que permitem a concepção extrauterina (fora do
útero da mulher), surge um problema prático: há embriões, que são seres concebidos (porque já houve o
encontro do gameta masculino e do feminino), mas eles têm uma vida extrauterina. A pergunta que o
direito se faz é: esses embriões são herdeiros, para fins de sucessão legítima?
Veja que se o pai deixou apenas espermatozóides ou a mulher deixou óvulos congelados, não há
dúvida de que não há relação sucessória, pois eles sozinhos não compõem um ser humano. O problema
ocorre quando já houve esse encontro dos gametas masculino e feminino. Veja que embrião é um termo
da biologia com o qual o direito nunca se preocupou. Somente tratava dos nascituros e dos nascidos. O
CC não deu conta de explicar a situação do embrião expressamente, pois o tema é muito recente.
Morrendo o pai e havendo embrião crioconservado, há duas possíveis soluções, para aqueles que
entendem pela possibilidade de herança (posição moderna):
1ª corrente: para que o embrião seja herdeiro, ele deve ser gestado no prazo de dois anos,
contados da abertura da sucessão (da morte).
Esta corrente aplicava, por analogia, o art. 1.800, § 4º, do CC, que cuida da chamada prole eventual
(o testamento caduca se em dois anos não houver a gestação da prole eventual). Mas isso tem um
problema prático seríssimo: se a criança nascer cinco ou seis anos após a morte, ela será menos filha do
falecido?
2ª corrente (Gustavo Tepedino, Silmara Chinellato e Zeno Veloso): o embrião, ao nascer é
herdeiro, independentemente de prazos.
O problema prático é o seguinte: no momento em que nasce, o embrião se torna herdeiro. Mas o
patrimônio do falecido já foi partilhado e os bens já estão nas mãos dos irmãos ou ou-tros herdeiros. Para
a doutrina, ele teria de manejar a ação de petição de herança, na qual ele pede a entrega daquilo que já é
dele (veja que ele não pede o reconhecimento do direito, mas a entrega do que é dele). Essa pretensão (de
dar) tem prazo prescricional.
Qual seria o prazo? A orientação da doutrina majoritária é de que o prazo é o geral (dez anos), na
ausência de prazo específico.
Esse prazo inicia-se quando? Para alguns, os dez anos se iniciam com a morte. O problema técnico
a enfrentar é de que, se a criança nascesse onze anos depois da morte, ela teria perdido o direito enquanto
ainda era embrião (crioconservado e fora do útero materno, perderia um direito enquanto não poderia
exercê-lo). Seria exigir que o embrião ajuizasse uma ação para interromper a prescrição, para quando
fosse um dia nascer!
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José Fernando Simão não defende essa corrente. Para ele, prescrição exige inércia do titular (é
segurança jurídica mais justiça). Não dá pra dizer que o embrião seria inerte. Para o autor, o prazo se
inicia com o nascimento com vida. Outro problema é: se o prazo se inicia com o nascimento com vida, ele
tecnicamente não se iniciaria, pois não corre contra absolutamente incapaz. Portanto, esse prazo se
iniciaria aos dezesseis anos. Veja que haveria dez anos mais dezesseis (26 anos). Para Simão, o prazo é
longo, mas essa é a posição defendida por Gavião em concurso para titular na USP, e aquela a ser
defendida em eventual arguição.
Agora, imagine que o embrião demore tanto para nascer que os demais herdeiros já tenham
partilhado os bens e tenha corrido o prazo de usucapião. Aí, se o embrião vier ao mundo já esgotado o
prazo de usucapião (forma originária de aquisição da propriedade), ele não terá os bens, por ter a
usucapião “limpado” todos os vícios da propriedade.
Mas se o embrião vier à vida quando a usucapião ainda não tenha ocorrido, a mesma regra que
impede a prescrição impede a usucapião, por força de lei.
ii) presume-se a paterindade dos filhos nascidos por fertilização homóloga mesmo que se trate de
embrião excedentário:
Embrião excedentário é aquele que sobrou. O médico prepara e implanta muitos embriões. Os que
sobram são chamados de excedentários (e serão guardados por três anos). Se, no prazo de três anos, a
mulher voltar à clínica e quiser novamente implantar, haverá a presunção de paternidade.
Os maiores questionamentos ocorrem no caso de separação de fato. Chaves considera que, nesse
caso, deverá haver notificação do separado ao médico, para que descarte os embriões. O problema é que
a mulher deverá anuir com o descarte. Havendo divergência, o juiz decidirá. O Brasil não tem nenhum
precedente nesse sentido. Há na Inglaterra, tendo a questão sido decidida em favor da mulher. Chaves
coloca em dúvida se houve, nesse julgado inglês, respeito ao princípio constitucional do planejamento
familiar. Seria obrigar alguém a ser pai. A questão é polêmica.
iii) presume-se a paternidade dos filhos nascidos por fertilização heteróloga, quando houve prévia
autorização do marido:
Quando o marido autoriza sua esposa a uma fertilização heteróloga, tal autorização tem natureza
de reconhecimento prévio de filho. É o único caso no Brasil de presunção absoluta de paternidade. Não
fosse assim, implicaria em venire contra factum proprio (primeiro o sujeito autoriza, depois nega a
paternidade).
Para Chaves, o filho que nasce de fertilização heteróloga é afetivo, e não biológico.
O filho nascido de fertilização heteróloga (que tem um pai, mas não o genitor, que é o doador de
sêmen) tem o direito de propor ação de investigação de origem genética e descobrir quem é seu genitor,
ainda que isso não gere direito de família?
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É possível a recusa à realização do teste de DNA, mas tal negativa gerará efeitos jurídicos. A Súmula
301 do STJ motivou a elaboração da Lei 12.004/2009, a qual acrescentou o art. 2º-A, à Lei 8.560/1992:
Súmula 301 - Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz
presunção juris tantum de paternidade.
Art. 2º-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente
legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos. (Incluído pela Lei nº 12.004, de 2009).
Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético - DNA gerará a presunção
da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório. (Incluído pela Lei nº 12.004, de
2009).
Com base em tais dispositivos, conclui-se que é possível recusar-se ao exame de DNA. Todavia tal
recusa gera presunção relativa da prova que se pretendia produzir. Veja que, ao incorporar o
entendimento da Súmula 301, a presunção não se tornou absoluta. Ela somente deixou de ser
jurisprudencial e se tornou legal. Assim, por ser relativa, o juiz pode decidir com base em outras provas.
O próprio conceito de filiação impõe que se trate de presunção relativa.
O STJ entende que a presunção aplica-se não só nos casos de recusa como aos de retardamento da
realização do exame.
No REsp 1.272.691/SP, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, julgado em 5 de novembro de 2013, o
STJ entendeu que a aplicação da Lei 12.004/09 e do entendimento da Súmula 301 depende sempre de
um juízo de ponderação. Se o investigado for falecido, a ação deve ser dirigida contra seus sucessores. Do
mesmo modo, se um filho menor do falecido se recusar a se submeter ao exame, poderá haver uma
ponderação.
Em resumo, se o réu de uma ação de investigação de paternidade se recusar ao exame de DNA,
presume-se a paternidade. Mas, em outras circunstâncias, como nas ações promovidas contra os
sucessores e em se tratando de herdeiros menores, ou mesmo em ações negatórias de paternidade, não
se justifica a aplicação da conclusão. Os interesses devem ser ponderados caso a caso.
Na ação negatória de paternidade, se o réu menor se recusar a produzir prova, o autor continua
obrigado a produzir prova, não se aplicando a presunção em sentido contrário.
Na ação negatória de paternidade, o pai e filho ajuizam a ação com a intenção de declarar a
inexistência da relação paterno-filial. O STJ deliberou que a em ação negatória de paternidade, não é
possível ao juiz declarar a nulidade do registro de nascimento com base, exclusivamente, na alegação de
dúvida acerca do vínculo biológico do pai com o registrado, sem provas robustas da ocorrência de erro
escusável quando do reconhecimento voluntário da paternidade. Ou seja, a simples existência de dúvida
não é suficiente para desfazer o vínculo. Destaca-se o art. 1.604 do CC que dispõe não ser possível vindicar
estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do
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registro. Cabe ao interessado provar o erro ou a falsidade. Sobre o ponto de vista processual, a solução é
simples, pois cabe ao autor provar a inexistência da relação paterno-filial.
A Lei 1.060/1950 (gratuidade judiciária), em seu art. 3º, VI, estabelece que a gratuidade judiciária
alcança o exame de DNA:
VI – das despesas com a realização do exame de código genético – DNA que for requisitado pela autoridade
judiciária nas ações de investigação de paternidade ou maternidade. (Incluído pela Lei nº 10.317, de 2001)
Alguns estados da Federação, no entanto, não vêm custeando o exame (ex.: BA). Nesses casos,
segundo o STJ, se as partes não puderem custeá-lo, o juiz decidirá com base na prova testemunhal. Isso
é bastante perigoso, pois a testemunha é indiciária da concepção (ela não prova a concepção, pois não a
presenciou). E mais: a testemunha serve a provar que determinados sujeitos “ficavam”. Se eles “ficavam”,
haverá indícios de paternidade (REsp 557.365/RO).
O exame de DNA pode ser determinado de ofício pelo juiz. Além disso, o STJ vem entendendo que,
mesmo em grau recursal, o julgamento do recurso deve ser convertido em diligência para que se tente
realizar o exame.
A prova oriunda do exame não é absoluta, pois não vincula o juiz (dessacralização do DNA). Mas é
importante. Por isso, o juiz deve determiná-lo de ofício, e até mesmo em grau recursal.
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Obs.: diante dessa decisão, o Provimento n. 63/2017 do CNJ passou a admitir o reconhecimento da
parentalidade socioafetiva no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais.
Flávio Tartuce questiona sobre a possibilidade em se reconhecer a multiparentalidade em cartório,
entendendo afirmativamente (Art. 14, Provimento 63/2017, CNJ44).
Dito isso, nota-se que o vínculo socioafetivo somente pode servir para determinar a filiação. A
socioafetividade nunca será utilizada para negar a filiação. Até porque o critério é o afetivo, e não o
“desafetivo”. Caso contrário, o juiz julgaria uma investigação de paternidade improcedente sob o
argumento de que o réu odiava o filho.
A socioafetividade precisa ter sido a causa determinante da relação, mas não precisa estar presente
no momento da propositura da ação. Caso contrário, a paternidade tornar-se-ia um instituto disponível
(as partes poderiam escolher o momento da filiação).
Obs.: Paternidade alimentar é uma ideia nova, concebida por Rolf Madaleno (RS), caracterizada
pela possibilidade excepcional de condenação do genitor a pagar os alimentos que o pai não pode prestar.
Evidente que somente se falará em paternidade alimentar nos casos de filiação socioafetiva.
Ex.: caso que ocorreu em MG, de ação de investigação de paternidade de seis filhos, em que restou
provado que o pai socioafetivo era estéril, sendo que os filhos eram do dono da fazenda (um cantor). O
pai socioafetivo, citado, alegou tal condição para se manter como pai. O pedido de anulação de assento
de nascimento foi julgado improcedente, mantendo-se o pai lavrador. Segundo a tese, criada para esse
caso, se tais filhos eventualmente necessitarem, poderão ajuizar demanda contra o pai biológico, para
sustentá-los.
Chaves acrescenta à tese que a impossibilidade não deve circunscrever-se ao pai, mas à família
paterna. E mais: pela reciprocidade alimentar, esse genitor, precisando, poderá cobrar alimentos de seus
filhos biológicos.
O mesmo fundamento que serve para justificar a paternidade alimentar serve para negar a
paternidade sucessória: é possível buscar o genitor para a obtenção de alimentos (decorrentes da
necessidade/subsistência), mas não para a obtenção da herança (que é transmissão de patrimônio).
Adiante, será apresentado rol de hipóteses de filiação socioafetiva (“posse do estado de filho”), o
qual é meramente exemplificativo:
i) adoção;
ii) fertilização heteróloga com prévia autorização do marido;
iii) adoção à brasileira (registrar como seu um filho que sabe não ser):
Conforme se verificará, tendo registrado com seu um filho que sabia não ser, não pode o pai, depois
de muito tempo, ajuizar negatória de paternidade. Isso comprova que a socioafetividade pode não ser
contemporânea ao ajuizamento, podendo ser anterior e haver, inclusive, se esgotado.
iv) filho de criação;
v) et cetera (o rol sempre será exemplificativo, nunca taxativo).
Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao
processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos.
(Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. O acesso ao processo de adoção poderá ser também deferido ao adotado menor de 18
(dezoito) anos, a seu pedido, assegurada orientação e assistência jurídica e psicológica. (Incluído pela Lei
nº 12.010, de 2009)
Toda pessoa maior e capaz cuja filiação se estabeleceu pelo critério socioafetivo tem o direito de
saber a sua origem genética/ancestral (saber de onde veio). Este direito somente pode ser exercido por
pessoas maiores e capazes (art. 48 do ECA). O MP não tem legitimidade para essa ação, que é
personalíssima, ainda que ele funcione como fiscal da lei. Além de personalíssima, a ação é imprescritível
e a procedência do pedido somente serve para gerar impedimento matrimonial ou, por exemplo, para
fins terapêuticos (na medida em que os impedimentos matrimoniais são eugênicos). Fora estes, a
investigação da origem genética não gera nenhum efeito de direito de família ou sucessório. Trata-se de
um direito da personalidade, não de um direito de família.
O filho que nasceu de fertilização heteróloga não tem o direito de conhecer sua origem genética,
pelo princípio do anonimato do doador de sêmen. Todavia, excepcionalmente, em atenção à ponderação
de interesses, nada impede que o juiz autorize a investigação de origem genética, por exemplo, para fins
terapêuticos (ex.: criança que necessite de doação de medula).
119
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45 Enunciado 339, IV Jornada de Direito Civil: “A paternidade socioafetiva, calcada na vontade livre, não pode
ser rompida em detrimento do melhor interesse do filho. Enunciado 520, V Jornada de Direito Civil: “O
conhecimento da ausência de vínculo biológico e a posse de estado de filho obstam a contestação da paternidade
presumida.”
46 (STJ, REsp 709.608/MS, Quarta Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 05/11/2009,
DJE 23/11/2009).
120
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Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:
I - no registro do nascimento;
IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto
único e principal do ato que o contém.
Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu
falecimento, se ele deixar descendentes.
O reconhecimento de filho é ato irrevogável, mesmo quando feito por testamento, conforme art.
1.610 do CC, ademais o ato pode ocorrer de múltiplas formas, não é um ato formal.
A Lei 8.560/1992 afirma que somente não é possível reconhecer um filho na ata do casamento.
Caso contrário, ele já nasceria ilegítimo:
Tal disposição não foi repetida pelo CC. A maioria da doutrina entende que a norma foi revogada
tacitamente. Chaves considera que sequer é caso de revogação, mas de inconstitucionalidade, por prever
tratamento discriminatório entre os filhos.
É possível reconhecer desde o nascituro (teoria concepcionista) até o filho morto. O
reconhecimento do filho morto é chamado de reconhecimento “póstumo” ou “nuncupativo”. Somente é
possível se o morto deixou descendentes. A lógica disso é evitar que o pai, que durante toda a vida não
reconheceu o filho, o faça para receber a herança. Em outras palavras, somente é possível o
reconhecimento póstumo se o reconhecente não for herdeiro.
Nesses casos, segundo o Art. 1.613, trata-se de ato formal e incondicional, uma vez que não sujeito
a condição ou a termo, que são considerados ineficazes. Exemplo: “Reconheço você como filho se eu
vender o meu carro” (é lido como apenas “reconheço você como filho”).
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Flávio Tartuce ainda assevea que o reconhecimento de filhos constitui um ato jurídico stricto
sensu, ou em sentido estrito, justamente porque os seus efeitos são apenas aqueles decorrentes de lei
(art. 185 do CC). Não há uma composição de vontades, a fazer com que o ato seja tido como um negócio
jurídico.
Na forma do art. 1.614 do CC, o reconhecimento voluntário de filho será unilateral, se o filho for
incapaz, ou bilateral, dependendo do consentimento do filho, se ele for capaz:
Art. 1.614. O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, [e o menor pode impugnar o
reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação].
Problema: o sujeito tem 15 anos de idade, nunca foi reconhecido pelo pai, e se torna portador de
vultosa herança. O pai, se reconhecê-lo, adquirirá o usufruto e a administração dos bens adquiridos. Para
tentar resolver esse problema, o art. 1.614 estabeleceu o prazo decadencial de quatro anos para que o
filho, reconhecido unilateralmente, promova ação de impugnação de paternidade.
Flávio Tartuce adverte que a segunda parte do art. 1.614 está desatualizada, pois prevê que o filho
menor poderá impugnar o reconhecimento no prazo decadencial de quatro anos que se seguirem à
maioridade ou à emancipação, uma vez que a ação negatória pelo filho é ação de estado, portanto,
imprescritível, além das mitigações pertinentes à multiparentalidade e socioafetividade.
Cuidado para não confundir a ação negatória (art. 27 do ECA) com a ação impugnatória de
paternidade (1.614 do CC):
A negatória pode ser proposta tanto pelo pai como pelo filho e é imprescritível. Nela, exige-se a
prova da negativa. Serve para qualquer tipo de filiação. Já a impugnatória tem prazo decadencial de
quatro anos, contados da maioridade (dos 18 aos 22 anos), e independe de fundamento (é imotivada). A
inexigibilidade motivação decorre do fato de que essa ação somente pode ser realizada pelo filho
reconhecido unilateralmente.
Somente podem se valer da impugnatória aqueles que não sejam “filhos da presunção” (ex.: pais
casados ao nascer). Todavia, os filhos da presunção podem se valer da negatória. Ou seja, aquele filho
que adquiriu tal condição em virtude de declaração de vontade em cartório pode ajuizar impugnatória.
A Lei 8.560/1992 estabelece “procedimento administrativo de averiguação oficiosa”, o qual é
iniciado pelo Oficial do Cartório sempre que o filho é registrado somente em nome da mãe. O Oficial
extrai segunda via do registro, colhe os dados do suposto pai e os encaminha ao Juiz. O Juiz, recebendo
o procedimento, designa audiência para tentar o reconhecimento espontâneo. Não haverá eventual
revelia, por se tratar de procedimento administrativo. Se o suposto pai não quiser realizar o
reconhecimento espontâneo, o juiz reduz a termo suas razões e remete o procedimento ao MP, para que
o órgão analise o cabimento da ação investigatória.
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A nova redação do ECA, trazida pela Lei 12.010/2010, diz que o MP não promoverá a ação se a
criança ou o adolescente já estiver inserido (a) no cadastro de adoção. A razão é simples: nesse caso, a
declaração de paternidade atrapalhará o procedimento de adoção, na medida em que demandará a
anuência do pai.
Veja que os alimentos poderão (e não “deverão”) ser cumulados na investigação. O art. 7º da Lei
8.560/1992 estabelece que, julgada procedente a investigação de paternidade, o juiz fixará alimentos,
mesmo que não tenham sido requeridos pelo autor. Trata-se de uma exceção ao princípio da inércia
(dispositivo). Cabem embargos declaratórios, se o juiz não apresentar tal manifestação, mesmo que não
tenham sido requeridos:
Art. 7º Sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade, nela se fixarão os alimentos
provisionais ou definitivos do reconhecido que deles necessite.
Ademais, Flávio Tartuce ensina “o reconhecimento forçado ou coativo de filho se dá por meio da
ação investigatória de paternidade ou de maternidade, sendo a primeira mais comum na prática.
Afirmava-se, no sistema processual anterior, que ambas as ações deveriam seguir o rito ordinário, que
atualmente equivale ao procedimento comum (art. 318 do CPC/2015). Todavia, no sistema do CPC/2015,
é perfeitamente possível sustentar a aplicação do procedimento especial relativo às ações contenciosas
de família, constantes dos arts. 693 a 693 do Estatuto Processual em vigor. Isso porque o primeiro
comando cita expressamente as demandas fundadas na filiação.”.47
47Tartuce, Flávio. Manual de direito civil : volume único / Flávio Tartuce. – 9. Ed. Ver, atual. E ampl. – Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019. P.
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i. Prazo: Por sua natureza declaratória e por envolver estado de pessoas e dignidade humana,
a ação não está sujeita a qualquer prazo, sendo imprescritível.
ii. Foro competente: Como a ação investigatória é uma ação pessoal, em regra, será
competente o foro de domicílio do réu (art. 46 do CPC/2015)
Entretanto, se cumulada com alimentos, será do domicílio ou residência do alimentando (Súmula
1, STJ48).
Se cumulada com Petição de Herança, não encerrado o inventário, será competente o mesmo foro
desse, encerrado o inventário, será o foro de domicílio de qualquer herdeiro, a partir de interpretação do
art. 48 do CPC/201549.
Finalmente, se cumulada com Alimentos e Petição de Herança, será do domicílio ou residência do
alimentando, em aplicação à Súmula nº 1 – STJ.
iii. Legitimidade Ativa: A ação investigatória é personalíssima do filho, em regra.
Sendo menor, este deverá ser representado (menor de 16 anos) ou assistido (menor entre 16 e 18
anos), geralmente pela mãe. A ação também cabe ao filho maior de 18 anos, sem a necessidade de
representação ou assistência.
O MP também pode agir como substituto processual, tendo legitimação extraordinária, conforme
a Lei 8.560/1992.
Flávio Tartuce observa que, mitigando o caráter personalíssim, o STJ tem admitido a investigatória
também do neto contra o avô, visando constituir o vínculo do último em relação ao pai do primeiro (ação
avoenga)50.
iv. Legitimidade Passiva: Em regra, a ação será proposta contra o suposto pai ou suposta mãe.
de Julgamento: 08/11/2000, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJ 18.12.2000 p. 152 JBCC vol. 187 p.
226 LEXSTJ vol. 141 p. 35).
50 (STJ - AgRg no Ag: 1.319.333 MG 2010/0106159-3, Relator: Ministro VASCO DELLA GIUSTINA
Falecido este ou esta, a ação será proposta contra os herdeiros da pessoa investigada e não
contra o espólio, diante de seu caráter pessoal e por não ter o espólio personalidade jurídica.
Eventualmente, poderá ser proposta contra o Município ou União ou DF (herança jacente vacante)
ou ainda contra os avós, nos casos de ação avoenga, vista acima.
v. Prova: Diante das avançadas técnicas de engenharia genética, a prova mais efetiva é a
realização de exame de DNA dos envolvidos, o que traz certeza quase absoluta quanto ao
vínculo biológico.
Importante anotar que a realização do exame não é obrigatória, mas sua recusa gera a presunção
relativa de paternidade (CC, arts. 231 e 232; art. 2ª-A da Lei 8.560/1992; e Súmula 301, STJ51).
Obs.: A prova do “relacionamento plúrimo” da mãe (exceptio plurium concubentium), utilizada no
passado para afastar a atribuição de paternidade, não é mais admitida pela jurisprudência.
vi. Contestação: Dispõe o art. 1.615 do CC que qualquer pessoa que tenha justo interesse pode
contestar a ação investigatória, dispositivo que não sofreu qualquer impacto com o
CPC/2015, assim, pode contestar, v.g. cônjuge ou companheiro do suposto genitor e os seus
herdeiros.
Obs.: Atenção à Súmula 277 do STJ: ´
O entendimento tem como fundamentos a igualdade entre filhos. Ademais, segundo o art.1.616, CC,
o reconhecimento judicial produz os mesmos efeitos do reconhecimento voluntário.
Obs2.: Flávio Tartuce assevera que diante da parentalidade socioafetiva, não seria possível
desconstituir o vínculo de filiação já estabelecido.
Ilustrando, imagine-se que um casal tem um filho, que é devidamente registrado pelo marido, que
pensa ser o seu filho. Trinta anos depois, após a morte do marido, a mulher conta ao seu filho que o seu
pai não é aquele que faleceu, mas outra pessoa, com quem ela teve um relacionamento rápido quando
era jovem. Ciente do fato, o filho resolve promover a ação contra o seu suposto pai verdadeiro. Realizado
o exame de DNA no curso da ação, constata-se que o pai biológico do autor é o réu e não aquele que o
criou durante trinta anos.
5. Dos alimentos
5.1. Noções gerais
Súmula 301, STJ: “Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz
51
dignidade). Estão inseridas no conceito, portanto, outras necessidades, como educação, moradia, saúde
e até lazer e cultura.
Segundo Flávio Tartuce, citando as lições de Orlando Gomes e Maria Helena Diniz define alimentos
familiares como as prestações devidas para a satisfação das necessidades pessoais daquele que não pode
provê-las pelo trabalho próprio ().
Os alimentos podem ser concedidos in natura (quando são entregues em bens da vida, como uma
cesta básica, plano de saúde, escola etc.) ou em pecúnia (pensão alimentícia). Pensão alimentícia,
portanto, é a expressão com a qual se designam os alimentos em pecúnia.
Quando fixados em dinheiro (prestação), eles podem ser fixados em salário mínimo. Não incide a
proibição constitucional da utilização do salário mínimo com indexador. Mitiga-se, aqui, a Súmula
Vinculante nº 4 do STF, aplicando-se a Súmula 490 do mesmo Tribunal:
Súmula Vinculante nº 4 – Salvo nos casos previstos na constituição, o salário mínimo não pode ser usado
como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído
por decisão judicial.
Súmula 490 – A pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada
com base no salário mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores.
A finalidade dos alimentos é atender à subsistência, ou seja, garantir uma vida com dignidade. Mas
tal finalidade está baseada na solidariedade social e familiar. Ora, na medida em que os alimentos se
baseiam nessas “solidariedades”, pode-se perceber que eles são recíprocos. Por conta disso, quem hoje é
credor amanhã pode ser devedor, e vice-versa. Solidariedade é uma via de duas mãos.
A esse respeito, cumpre lembrar que não se deve confundir solidariedade (que tem mão e
contramão) com liberalidade (que é via de mão única). Doação envolve liberalidade (quem recebe doação
não necessariamente deve doar). Por outro lado, quem recebe alimentos amanhã pode ser compelido a
prestá-los.
Há um curioso registro do TJRS, de um pai que nunca conseguiu ser obrigado a prestar alimentos
aos filhos. Os filhos nunca conseguiram executá-lo, tendo a mãe criado os filhos sozinha, sem
colaboração. Adultos e com suas profissões definidas, aquele pai que se recusou peremptoriamente a
prestá-los, ajuizou ação de alimentos contra os filhos, quando velho. O TJRS, baseado na solidariedade,
julgou a demanda improcedente, entendendo que aquele que nunca prestou alimentos não pode exigir o
recebimento.
Em contrapartida, se fundados na solidariedade, pode-se encontrar nos alimentos um claro
exemplo da função social da família.
Em síntese, leciona Flávio Tartuce que o pagamento desses alimentos visa à pacificação social,
estando amparado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar, ambos de
índole constitucional
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Os pressupostos para o dever de prestar alimentos se encontram no arts. 1.694 e 1.695 do CC:
i. Vínculo de casamento, união estável ou parentesco;
Obs.:Enunciado 341 da IV JDC: “Para os fins do art. 1.696, a relação socioafetiva pode ser elemento
gerador de obrigação alimentar.”.
ii. Necessidade do alimentando ou credor;
Alerta Flávio Tartuce que primeiro deve ser analizada a necessidade para após verificar a
possibilidade.
iii. Possibilidade do alimentante ou devedor;
Para a verificação dessa possibilidade, poderão ser analisados os sinais exteriores de riqueza do
devedor, conforme reconhece o Enunciado n. 573 do CJF/STJ.
A necessida/possibilidade formam o binômio alimentar, que, como visto, primeiro considera a
necessidade do alimentando e, posteriormente, a possibilidade do alimentante.
Entretanto, adverte Flávio Tartuce que alguns autores consideram a existência de um trinômio
alimentar, formado por necessidade, possibilidade e um terceiro elemento a razoabilidade,
paraPaulo Lôbo ou proporcionalidade de Maria Berenice Dias.
Como exemplo de aplicação do trinômio, veja-se que segundo o STJ, os alimentos devidos entre ex-
cônjuges devem ter caráter excepcional, transitório e devem ser fixados por prazo determinado, exceto
quando um dos cônjuges não possua mais condições de reinserção no mercado do trabalho ou de
readquirir sua autonomia financeira, de modo a não gerar o “parasitismo social” nas palavras de Flávio
Tartuce.
De outro lado, ainda como exemplo de aplicação da proporcionalidade/razoabilidade, os alimentos
podem ser fixados de forma diferente em relação a filhos que tenham necessidades e condições sociais
distintas, conforme decidido pelo Tribunal Cidadão52.
Flávio Tartuce ensina que a obrigação alimentar e o correspondente direito aos alimentos têm
características únicas, que os distinguem de todos os outros direitos e obrigações (obrigação sui generis).
Tanto isso é verdade que o inadimplemento da obrigação de prestar alimentos fundados em vínculo
de Direito de Família (alimentos familiares) possibilita a prisão do devedor (art. 5.º, inc. LXVII, da
CF/1988).
Ademais, para saldar as dividas alimentares existe a possibilidade de quebra da impenhorabilidade
do bem de família (art. 3º, III, da Lei 8.009/1990).
52 (Resp 1.624.050, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 19/06/2018. DJe 22/06/18).
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Possibilita ainda a penhora do FGTS (tese 12 da Edição 777 do “Jurisprudência em Teses” do STJ e
enunciado 572 da VI Jornada de Direito Civil53).
5.3.1.Personalíssimos
No que tange ao credor ou alimentando, leciona Flávio Tartuce que o direito aos alimentos é
personalíssimo, uma vez que somente aquele que mantém relação de parentesco, casamento ou união
estável com o devedor ou alimentante pode pleiteá-los (caráter intuitu personae). Por isso, o direito a
alimentos não se transmite aos herdeiros do credor. Porém, transmite-se o dever quanto aos
herdeiros do devedor.
5.3.2. Transmissíveis
A transmissibilidade, logicamente falando, está em rota de colisão com a primeira característica
dos alimentos. Se eles são personalíssimos, deveriam ser intransmissíveis. Todavia, segundo o art. 1.700
do CC, os alimentos são transmissíveis para os herdeiros do devedor:
Art. 1.700. A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1.694.
Flávio Tartuce assevera que, segundo o entendimento majoritário, a transmissão somente se dá nas
forças da herança, nos termos do art. 1.792 do CC (intra vires hereditatis)54.
Para que exista essa transmissão, há necessidade de condenação do devedor em vida para
pagamento, nesse sentido, a Tese 7 da Edição 77 da JTSTJ55.
Há interessante indagação sobre qual obrigação seria transmitida, se a vencida ou a vincenda.
De um lado, o CC/2002 quis dizer, no art. 1.700, que se transmitem as dívidas vincendas depois da
morte do devedor.
Chaves considera essa situação complicada. Transmitir dívida vincenda é criar situação de
desigualdade. Por isso, a doutrina brasileira, em sintonia com a jurisprudência, estabeleceu limites à
transmissibilidade dos alimentos:
i) transmissão de acordo com as forças da herança;
ii) transmissão até a realização da partilha (ou seja, depois da partilha não se pagam alimentos, por
não haver mais espólio);
iii) transmissão somente se o espólio produzir frutos;
iv) transmissão apenas em favor de credores que não participam do espólio. Vale dizer, se o credor
for herdeiro ou legatário, não haverá transmissão.
53 Enunciado 572 da VI JDC: “Mediante ordem judicial, é admissível, para a satisfação do crédito alimentar
atual, o levantamento do saldo de conta vinculada ao FGTS”
54 Enunciado 343 da IV JDC: “A transmissibilidade da obrigação alimentar é limitada às forças da herança.”
55 Tese 7, edição 77, JTSTJ: “A obrigação de prestar alimentos é personalíssima, intransmissível e extingue-
se com o óbito do alimentante, cabendo ao espólio saldar, tão somente, os débitos alimentares preestabelecidos
mediante acordo ou sentença não adimplidos pelo devedor em vida, ressalvados os casos em que o alimentado seja
herdeiro, hipóteses nas quais a prestação perdurará ao longo do inventário.”.
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Exemplo de modalidade de alimentos que pode ser transmitida é a fixada em favor do ex-cônjuge,
no divórcio.
Se algum herdeiro extrair algum valor do espólio, esse desembolso nunca terá natureza de
alimentos, mas sempre de antecipação de herança, e, sendo assim, será abatido do quinhão.
O STJ, no REsp 1.337.862/SP, julgado em 2014, entendeu que o espólio do genitor do autor de ação
de alimentos não possui legitimidade para figurar no polo passivo da ação na hipótese em que inexista
obrigação alimentar assumida pelo genitor por acordo ou decisão judicial antes da sua morte. De fato, o
art. 23 da Lei do Divórcio e o art. 1.700 do CC estabelecem que a obrigação de prestar alimentos
transmite-se aos herdeiros do devedor.
Ocorre quem, de acordo com a jurisprudencia do STJ e com a doutrina majoritária, esses
dispositivos só podem ser invocados se a obrigação alimentar já fora estabelecida anteriormente ao
falecimento do autor da herança por acordo ou sentença judicial. Isso porque esses dispositivos não se
referem à transmissibilidade em abstratos do dever jurídico de prestar alimentos, mas apenas à
transmissão (para os herdeiros do devedor) de obrigação alimentar já assumida pelo genitor por acordo
ou decisão judicial antes da sua morte.
A transmissibilidade ao espólio de obrigações alimentícias, portanto, somente pode ocorrer se a
obrigação alimentícia tiver sido fixada judicialmente anteriormente ao óbito e desde que o credor dos
alimentos não seja beneficiário do espólio. Um exemplo é o caso da ex-mulher, que pode continuar a
receber a pensão alimentícia até a partilha. Caso se trate de filho, não haverá tal possibilidade, pois será
herdeiro. O recebimento de alimentos pelo filho implica tratamento desigual entre os herdeiros.
Portanto, se não havia obrigação alimentar fixada juidicialmente antes do óbito, o espólio será parte
ilegítima.
Não esquecer que esta obrigação alimentícia só será imposta ao espólio se a pensão foi fixada antes
do óbito e desde que o espólio produza frutos. Se não produzir frutos, não haverá meios de pagamento.
5.3.3. Reciprocos
A obrigação de alimentos é recíproca entre cônjuges e companheiros (art. 1.694, CC), sendo ainda
recíproca entre os parentes, havendo uma ordem prevista nos arts. 1.696 e 1.697 do CC56.
Ordem de pleito dos alimentos entre parentes:
1º) Ascendentes: o grau mais próximo exclui o mais remoto;
2º) Descendentes: o grau mais próximo exclui o mais remoto;
3º) Irmãos: começando pelos bilaterais ou germanos, depois os unilaterais.
56 CC, arts. 1.696 e 1.697: “Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e
extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. Art.
1.697. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes,
aos irmãos, assim germanos como unilaterais.
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Segundo Flávio Tartuce prevalece o entendimento de que não é possível pleitear alimentos dos
demais colaterais e parentes por afinidade (tios, sobrinhos, cunhados).
Entretanto, baseado nas lições de Maria Berenice Dias, o Professor entende que se esses colaterais
são herdeiros, tendo direitos, também têm obrigações, caso de prestar alimentos. Em outras palavras, se
têm bônus, também têm ônus.
Quanto aos parentes por afinidade, havendo parentalidade socioafetiva em relação a
padrasto, madrasta e enteados, seria possível pleito alimentar.
Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o
respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.
Súmula 379 - No acordo de desquite não se admite renúncia aos alimentos, que poderão ser pleiteados
ulteriormente, verificados os pressupostos legais.
É muito comum nos acordos (especialmente de divórcio e dissolução de união estável consensuais)
a renúncia aos alimentos.
Nesse sentido, existe posição doutrinária e jurisprudencial no sentido de que os alimentos
poderiam ser renunciados por cônjuges ou companheiros, aplicando-se o art. 1.707, CC, apenas às
relações de parentesco (Francisco Cahali e Rolf Madaleno e Enunciado 263 da III JDC57). É o que
atualmente prevalece no STJ58.
Vale dizer, uma vez renunciados pelo cônjuge ou companheiro, eles não poderão ser novamente
cobrados, nesse sentido Pablo Stolze, Pamplona, Cristiano Chaves e Rosenvald utilizam o venire contra
factum proprium non potest como argumento. Flávio Tartuce entende que os alimentos são
absolutamente irrenunciáveis.
Segundo a Súmula, portanto, os alimentos seriam irrenunciáveis somente no caso de alimentos
oriundos de parentesco.
A Súmula 336 do STJ não está em rota de colisão com esse entendimento, por um motivo simples:
ela não está dizendo que o ex-cônjuge cobrará do outro, mas que receberá pensão do INSS se provar a
necessidade superveniente. A Súmula é de direito público, não privado:
Súmula 336 - A mulher que renunciou aos alimentos na separação judicial tem direito à pensão
previdenciária por morte do ex-marido, comprovada a necessidade econômica superveniente.
57 Enunciado 263 da III JDC: “O art. 1.707 do Código Civil não impede seja reconhecida válida e eficaz a
renúncia manifestada por ocasião do divórcio (direto ou indireto) ou da dissolução da "união estável". A
irrenunciabilidade do direito a alimentos somente é admitida enquanto subsistir vínculo de Direito de Família.”
58 (STJ - EDcl no REsp: 832.902, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento:
Art. 12. A obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores.
Alguns autores entenderam que, como a prioridade do idoso é a mesma da criança e do adolescente,
a solidariedade deveria a eles se estender. O STJ refutou a tese, entendendo que a interpretação do
dispositivo deve ser restritiva.
O art. 1.698 do CC diz que os alimentos não são solidários, mas subsidiários e proporcionais:
Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar
totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas
a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra
uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.
Os alimentos serão subsidiários quando houver um único devedor. Dizer que os alimentos são
subsidiários é dizer que somente se pode cobrar de outro devedor quando provada a incapacidade do
primeiro. Havendo mais de um devedor no mesmo grau, cada um deles responde proporcionalmente à
sua capacidade contributiva.
Assim, os alimentos não são solidários, como regra. São subsidiários e proporcionais, a depender
do número de devedores no mesmo grau. Ex.: na obrigação alimentícia avoenga, somente se pode cobrar
dos avós após se provar que o pai não tem capacidade contributiva. Pode haver, no entanto, até quatro
avós. Cada um dos quatro responderá na proporção de seus recursos.
Há, no entanto uma controvérsia. A parte final do art. 1.698 diz que os demais coobrigados poderão
ser chamados a integrar a lide.
Nesse sentido, a Súmula 596 – STJ, que consagra a responsabilidade subsidiária dos avós
Súmula 596, STJ: “A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária, somente se
configurando no caso de impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais.”.
Nesses casos, a ação é proposta em face do pai/ mãe que não tem condições de suportar totalmente
o encargo, devendo então serem chamados os avós.
No regramento anterior ao CPC/2015 haviam duas correntes:
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1ª corrente: autores como Didier e Carlos Roberto Gonçalves sustentam que essa parte final
caracterizaria litisconsórcio facultativo passivo (e, como tal, dependente da vontade do autor).
2ª corrente: Maria Berenice Dias e Cássio Scarpinela Bueno sustentam que se trata de nova
modalidade de intervenção de terceiros (um novo modelo), que poderia ser provocada não só pelo
autor, mas igualmente pelo réu.
A par das celeumas anteriores ao CPC 2015 atualmente caminha-se por admitir a convocação dos
avós tanto pelo autor quanto pelo réu, conforme Enunciado nº523 da JDC59, tese que foi utilizada pelo
STJ no julgamento do Resp. 1.715.438/RS, no final de 201860. Segundo Flávio Tartuce o tema não é
pacífico de maneira nenhuma.
5.3.6. Imprescritíveis
Seguindo a lição de Flávio Tartuce A pretensão aos alimentos é imprescritível, por envolver estado
de pessoas e a dignidade humana.
Não há prazo extintivo para requerer alimentos. Todavia, há uma pegadinha: o art. 206, § 2º, do
CC estabelece o prazo de prescrição de dois anos para a execução dos alimentos. Não há prescrição para
ajuizar ação de alimentos, mas há prescrição para executar alimentos fixados:
§ 2º Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem.
Lembrar que a prescrição não corre contra o absolutamente incapaz, de modo que todos os
alimentos fixados em sentença e vencidos só terão a prescrição iniciada quando o menor completar 16
anos.
Obs.: Caso Prático: uma sentença fixou alimentos ao filho que tinha 12 anos de idade. O pai nunca
pagou esses alimentos, que se acumularam. Quando ocorrerá a prescrição para a pretensão de cobrança
de tais valores?
Sobre o assunto, duas regras devem ser consideradas:
i. Art. 198, I, CC: Não corre a prescrição contra absolutamente incapazes (menores de 16
anos).
ii. Art. 197, II, CC: Não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes durante o poder
familiar (18 anos).
59: “O chamamento dos codevedores para integrar a lide, na forma do art. 1.698 do Código Civil pode ser
requerido por qualquer das partes, bem como pelo Ministério Público, quando legitimado” (Enunciado n. 523).
60 A natureza jurídica do mecanismo de integração posterior do polo passivo previsto no art. 1.698 do
CC/2002 é de litisconsórcio facultativo ulterior simples, com a particularidade, decorrente da realidade do direito
material, de que a formação dessa singular espécie de litisconsórcio não ocorre somente por iniciativa exclusiva do
autor, mas também por provocação do réu ou do Ministério Público, quando o credor dos alimentos for incapaz -
(REsp. 1.715.438, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma. Julgado em 13/11/2018. DJe 21/11/2018).
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Assim, prevalece a regra do art. 197, inciso II, do CC, ocorrendo a prescrição 2 anos após o término
do poder familiar (caso não ocorra destituição antes), ou seja, quando o filho completar 20 anos de idade
(em regra).
5.3.8. Irrepetíveis
Tudo aquilo que se pagou a título de alimentos não se recebe de volta, mesmo que se prove a
inexistência da causa geradora.
Assim, não cabe ação de repetição de indébito (actio in rem verso) para reaver o que se pagou,
diante de sua natureza satisfativa e presença de obrigação moral.
Se um sujeito ajuíza negatória de paternidade e prova que não era pai, ele não poderá exigir de volta
as pensões pagas enquanto era considerado como tal, nem cobrá-las do verdadeiro pai (que somente será
obrigado à pensão a partir da citação), cabendo, entreanto, indenização por dano moral em caso de má-
fé, segundo entendimento do STJ62.
Rolf Madaleno defende a tese (com a qual Chaves concorda) de que excepcionalmente os alimentos
devem admitir repetição, quando são recebidos em razão da prática de ato ilícito. São recebidos
ilicitamente os alimentos, por exemplo, quando o ex-cônjuge se casa escondido e não avisa, quando o
filho maior de idade arruma emprego e não avisa o pai etc. Houve um caso em que um Promotor de
Justiça, na Bahia, continuou recebendo pensão após o ingresso na carreira.
5.3.9. Impenhoráveis
61 Tese 13, edição 77, JTSTJ: “Os valores pagos a título de alimentos são insuscetíveis de compensação, salvo
Não se admite penhora da prestação alimentícia. Isso significa que o que se recebe a título de
alimentos não pode sofrer constrição. Isso tem sentido, considerando-se que os alimentos servem para a
subsistência.
Há, no entanto, um caso excepcional, em que os alimentos podem ser penhorados: para o
cumprimento de outra obrigação de mesma natureza. Ex.: se uma pessoa recebe alimentos ressarcitórios
e o juiz a obriga a pagar alimentos ao filho, os alimentos do filho podem ser descontados dos
ressarcitórios.
5.4. Espécies
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que
necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às
necessidades de sua educação. (...)
Todavia, a própria lei prevê uma exceção, os alimentos necessários (art. 1.694, § 2º, e art. 1.704,
parágrafo único, do CC):
Art. 1.694 (...) § 2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de
necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
Art. 1.704 (...) Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver
parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a
assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.
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da sua natureza (ele deixa de ter direito aos alimentos civis e passa a fazer jus aos necessários, ou seja,
aos alimentos para a subsistência).
O cônjuge ou companheiro culpado é um exemplo (ex.: adultério). Mas esse não é o único. A culpa
pode se dar na relação de parentesco. É o que se chama de “indignidade”. Ex.: determinada pessoa tenta
matar os pais, mas não consegue. Saindo da prisão, ela pode pedir alimentos aos pais que tentou matar,
mas receberá alimentos meramente necessários, para subsistência (art. 1.694, § 2º, do CC).
5.4.2.1. Legítimos
Os alimentos são legítimos quando decorrem de uma relação de família (ex.: parentesco,
casamento, união estável). Alguns autores preferem chamá-los de “legais”. Chaves não gosta desta
expressão, pois dá a entender que os demais seriam ilegais.
5.4.2.2. Ressarcitórios
Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: (...)
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável
da vida da vítima.
É importante saber que os alimentos reparatórios sempre serão fixados por sentença, que será
prolatada por juiz cível, não de família.
A execução dos alimentos reparatórios se dá de acordo com o disposto no art. 475-Q do CPC,
incluído pela Lei 11.232/2005:
Art. 475-Q. Quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte,
poderá ordenar ao devedor constituição de capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da
pensão.
§ 1o Este capital, representado por imóveis, títulos da dívida pública ou aplicações financeiras em banco
oficial, será inalienável e impenhorável enquanto durar a obrigação do devedor.
§ 2o O juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do beneficiário da prestação em folha
de pagamento de entidade de direito público ou de empresa de direito privado de notória capacidade
econômica, ou, a requerimento do devedor, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado
de imediato pelo juiz.
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Alimentos voluntários são os que decorrem da livre manifestação de vontade do devedor. São
prestações pecuniárias livremente concedidas por ele. Ocorrem quando uma pessoa, por liberalidade,
resolve prestar alimentos a alguém. Estes alimentos voluntários podem decorrer de ato inter vivos ou
causa mortis.
Concedidos por ato inter vivos, esses alimentos chamam-se “doação por subvenção periódica”.
Concedidos por ato causa mortis, chamam-se “legado de alimentos”.
O legado de alimentos sempre será fixado por testamento. A doação em subvenção periódica
obedece à regra do art. 545 do CC/02, que é cheia de detalhes:
Art. 545. A doação em forma de subvenção periódica ao beneficiado extingue-se morrendo o doador, salvo
se este outra coisa dispuser, mas não poderá ultrapassar a vida do donatário.
Como determina o dispositivo, a doação em subvenção periódica terá o prazo determinado pelo
doador. No silêncio, perdura pela vida do doador. Vale dizer: quando o doador morrer, extingue-se. O
problema é que este doador, querendo, pode vincular seu espólio, obrigando-o a continuar pagando.
Neste caso, o limite temporal da doação será a vida do donatário.
Importante tecer alguns comentários sobre aspectos controvertidos desta classificação:
i) as três categorias podem ser fixadas em salário mínimo, não somente os legítimos (Súmula 490
do STF);
ii) os alimentos legítimos e os ressarcitórios admitem revisão judicial. Os convencionais não, por
decorrerem da autonomia privada;
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iii) somente se autoriza o uso da prisão civil como meio executivo do cumprimento dos alimentos
legítimos (REsp 93.948/SP). Os alimentos ressarcitórios e os voluntários, portanto, não admitem prisão
civil.
Ocorre que a jurisprudência entende que a prisão civil, como mecanismo abrupto (meio executivo
excepcional), precisa de determinados limites:
i) prazo máximo de 60 dias:
Malgrado o CPC diga que o prazo máximo é de três meses, a jurisprudência usa o prazo previsto no
art. 19 da Lei 5.478/1969 (Lei de Alimentos):
Art. 19. O juiz, para instrução da causa ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as
providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo,
inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias.
ii) uma pessoa não pode ser presa duas vezes pelo mesmo período de dívida:
Ela pode ser presa mais de uma vez por períodos diversos. Isso porque a prisão é meio coercitivo.
Se não logrou êxito, compelindo ao pagamento, não adiantou. Aliás, na medida em que tem tal natureza,
o pagamento da dívida implica em imediata soltura.
iii) a Súmula 309 do STJ estabeleceu que a prisão civil somente pode ser utilizada para a execução
dos chamados alimentos “atuais”, os quais se contrapõem com os “pretéritos”:
Súmula 309 - O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três
prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
Essa diferença terminológica é criada pela jurisprudência do STJ, não está na lei. Atuais são os
alimentos devidos três meses antes da propositura da ação, mais os vincendos. Alimentos pretéritos são
aqueles vencidos antes dos três meses.
De acordo com a Súmula 309, somente se permite o uso da prisão civil para a execução dos
alimentos atuais. Os alimentos pretéritos não são perdoados, mas somente podem ser executados pela
via patrimonial (penhora).
O fundamento da Súmula é a ponderação de interesses: de um lado, a necessidade do credor; do
outro, a excepcionalidade da prisão. Ora, se são para subsistência e já estão vencidos há mais de três
meses, eles não seriam tão necessários assim.
O STJ, recentemente, alterou sua jurisprudência para permitir o uso da prisão civil para os
alimentos fixados extrajudicialmente (o art. 585 do CPC permite que o MP, a Defensoria Pública ou os
advogados das partes chancelem acordos de alimentos):
Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais: (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) (...)
II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular
assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério
Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores; (Redação dada pela Lei nº 8.953, de
13.12.1994) (...)
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Segundo o STJ, esses acordos, chancelados na forma da lei, apesar de títulos executivos
extrajudiciais, autorizam o uso da prisão civil.
5.4.3.1. Provisórios
Os alimentos provisórios estão previstos no art. 4º da Lei dos Alimentos (Lei 5.478/1968):
Art. 4º Ao despachar o pedido, o juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor,
salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita. (...)
São alimentos antecipatórios, fixados initio litis, desde que haja prova pré-constituída da obrigação
alimentícia. Os provisórios são fixados antes da citação do réu (no início da lide). Eles são nada mais que
uma antecipação de tutela. Não a do art. 273 do CPC, que demanda muitos requisitos (prova inequívoca,
verossimilhança, inexistência de perigo de irreversibilidade), mas uma tutela antecipada específica, que
exige um só requisito: a prova pré-constituída.
A Lei de Alimentos diz que o juiz concederá os provisórios de ofício. E mais, ele somente deixará de
concedê-los se a parte autora expressamente disser que deles não necessita.
5.4.3.2. Provisionais
Seguindo a lição de Flávio Tartuce63 tratam-se de alimentos “estipulados em outras ações que não
seguem o rito especial mencionado, visando manter a parte que os pleiteia no curso da lide (ad litem)”.
“São fixados por meio de antecipação de tutela ou em liminar concedida em medida cautelar de
separação de corpos em ações em que não há a mencionada prova pré-constituída, caso da ação de
investigação de paternidade ou da ação de reconhecimento e dissolução da união estável. Dispõe o art.
1.706 do atual CC que “os alimentos provisionais serão fixados pelo juiz, nos termos da lei processual”.
Também têm natureza satisfativa, antecipando os efeitos da sentença definitiva”.
5.4.3.3. Definitivos
Definitivos são os alimentos fixados por sentença, em ação de alimentos ou em outra que traga
pedido de alimentos cumulado (como são os casos do divórcio, investigação de paternidade).
Os alimentos definitivos estão submetidos à cláusula rebus sic stantibus, de acordo com a qual as
coisas devem ficar como estão e, havendo alteração na situação fática subjacente, permite-se o
ajuizamento de ação de revisão de alimentos. O fundamento da revisional é justamente aquela cláusula.
Aspectos controvertidos quanto a esta classificação:
i) as três categorias permitem o uso da prisão civil como meio coercitivo de pagamento;
63Tartuce, Flávio. Manual de direito civil : volume único / Flávio Tartuce. – 9. Ed. Ver, atual. E ampl. – Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019. P.
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Art. 13 (...) § 2º. Em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação.
Esta regra é tão importante que é aplicável mesmo que os alimentos tenham sido fixados por
sentença em ação de investigação de paternidade (Súmula 277 do STJ):
Súmula 277 - Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da
citação.
Há somente dois casos excepcionais, em que os alimentos não serão devidos desde a data da
citação: de acordo com o art. 852, II, do CPC, os alimentos provisionais são devidos desde a data do
despacho da inicial; os alimentos gravídicos (Lei 11.204/2008) são devidos desde a data da concepção
(ou seja, garante-se o pagamento dos alimentos, neste caso, durante toda a gestação).
iv) uma vez que submetidos os alimentos definitivos à cláusula rebus sic stantibus, a ex-
companheira ou ex-esposa jovem (que não trabalhou, cuidava dos filhos etc.) tem direito a alimentos?
Perceba que se ela nunca procurar emprego, a situação fática nunca mudará. Outro exemplo: merece
pensão o filho estudante que, já formado, com 24 ou 25 anos e formação profissional, resolve fazer outro
curso? Se ele não parar de estudar nunca, o que ocorrerá?
Situações como essas foram submetidas à jurisprudência. Percebendo que, em alguns casos, a
cláusula rebus sic stantibus poderia levar ao ócio, a jurisprudência criou uma quarta categoria, que não
está no Código: os “alimentos transitórios”. São alimentos fixados por tempo determinado (Chaves
os chama de “resolúveis”, pois já nascem para se extinguir dentro de um tempo). São fixados para atender
a situações peculiares. Ou seja, são sob termo ou condição. No caso da ex-mulher jovem, concedem-se
alimentos por uns dois anos. No caso do filho, até a conclusão do curso.
A extinção dos alimentos transitórios é automática, ocorrendo com o advento do termo ou da
condição. Se a necessidade persistir, a pessoa deve ajuizar nova ação e provar a necessidade
superveniente (a pretérita já foi julgada).
Os alimentos transitórios podem se apresentar sob as vestes de provisórios, provisionais ou
definitivos. E o juiz pode fixá-los de ofício. Até porque, ordinariamente, autor e réu não formulam
transitórios como pedido único. Quando muito, são fixados alternativamente (pedem-se primeiro os
definitivos, depois os transitórios). O mesmo quanto ao réu, que primeiro alega que não pagará nunca e,
subsidiariamente, alega que pagará os transitórios. Por essa razão é que o juiz pode fixá-los de ofício (eles
dificilmente são pedidos).
Os transitórios geram prisão civil (Informativo 536, REsp 1.362.113) e são devidos desde a citação
(exceto os provisionais, que são devidos desde a data do despacho da inicial).
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Acerca dos alimentos transitórios entre ex-cônjuges, recomenda-se a leitura dos seguintes julgados:
REsp 1.205.408, REsp 1.388.955 e REsp 1.025.769.
Os sujeitos da obrigação alimentícia estão previstos no art. 1.694 do Código Civil, que estabelece
que a obrigação alimentícia será fixada em razão do casamento, da união estável e do parentesco:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que
necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às
necessidades de sua educação. (...)
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Não se deve esquecer de que, quando os alimentos entre cônjuges ou companheiros decorrerem de
culpa, serão meramente necessários.
A superveniência da constituição de uma nova família poderá produzir efeitos sobre os alimentos.
Se quem constituiu uma nova família for o credor, extingue-se a obrigação. Se foi o devedor, permite-se
a revisão (quem constitui nova família assume novas obrigações). A constituição de uma nova família
pelo devedor não gera exoneração, pois, caso contrário, o devedor de alimentos poderia se casar
novamente com o único objetivo de se exonerar do encargo.
Art. 1.697. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e,
faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais.
Como visto, o fundamento jurídico dos alimentos é o princípio da solidariedade. Para Chaves e
Maria Berenice Dias, essa limitação de parentes viola o princípio da solidariedade. Ex.: sujeito que não
tem parentes não pode cobrar alimentos do tio. Todavia, esse mesmo sujeito, se morrer de fome,
transmitirá o patrimônio àquele tio, do qual não poderia cobrar. Assim, essa restrição à prestação de
alimentos pelos parentes de terceiro e quarto graus viola a reciprocidade.
Os Códigos Civis da Argentina e de Portugal permitem a prestação de alimentos por colaterais de
terceiro e quarto graus e por parentes por afinidade.
Em se tratando de filho menor, haverá presunção de necessidade. Assim, um filho menor que
pleiteia alimentos de seu pai não precisará provar a necessidade. Em se tratando de maior de dezoito
anos, a necessidade deverá ser provada. A maioridade não cessa a obrigação, apenas a presunção.
Em razão disso, foi editada a Súmula 358 do STJ: o cancelamento de pensão alimentícia em razão
da maioridade do filho depende de contraditório, exatamente para permitir que ele prove a persistência
da necessidade:
Súmula 358 - O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão
judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos.
A Súmula é um desestímulo para a concessão de tutelas antecipadas nas ações exoneratórias. Ela
está dizendo ao juiz que não exonere antes da formação do contraditório.
Os alimentos podem ser concedidos em favor do nascituro, segundo determina a Lei 11.804/2008,
que regulamenta os alimentos gravídicos. Esta lei tem algumas características:
i) os alimentos gravídicos são devidos desde a concepção, para evitar que o réu fuja do Oficial de
Justiça por alguns meses;
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ii) a concessão dos alimentos gravídicos é baseada em meros indícios (não se exige prova da
paternidade, que virá depois do nascimento):
Se a concessão dos gravídicos se baseia em meros indícios, é irrelevante a negativa de paternidade
na contestação, pois o objeto cognitivo dos gravídicos são os indícios (ex.: bilhete no Facebook, MSN, e-
mail, SMS etc.).
iii) os alimentos gravídicos são irrepetíveis:
Nascida a criança, mesmo que não se trate do pai, já houve o pagamento e os valores não serão
devolvidos.
iv) sobrevindo o nascimento com vida e não havendo impugnação, os gravídicos se convertem
automaticamente em pensão alimentícia.
Os gravídicos são concedidos em ação própria e permitem prisão civil.
Hoje, há controvérsia acerca da legitimidade para pleitear os gravídicos. O art. 1º da lei estabelece
que o sujeito ativo seria a gestante:
Art. 1º Esta Lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido.
Todavia, o art. 6º, parágrafo único, prevê a conversibilidade deles em favor do menor:
Art. 6º (...) Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em
pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.
Se fossem fixados para a mãe, não poderiam ser convertidos para o filho, na medida em que faltaria
o sujeito da relação jurídica. Em prova, deve-se marcar que o sujeito ativo é a gestante. Na opinião de
Chaves, entretanto, a legitimidade é do nascituro. Porque o juiz deve se satisfazer com indícios, eles são
para o nascituro. Se fossem para a mãe, exigir-se-ia mais que indícios.
CC, art. 1.699: “Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou
na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração,
redução ou majoração do encargo.”
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Súmula 358, STJ: “O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à
decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos.”.
Ademais, o STJ tem entendimento consolidado de que a obrigação do genitor pode continuar
tratando-se de filho universitário, até que este encerre os seus estudos relativos à graduação, eventuais
pós graduação a regra permanece com a extinção64.
Finalmente, se o filho for diagnosticado com problemas mentais incapacitantes, a obrigação
persiste.
Nesses casos, o advento da maioridade não extingue, de forma automática, o direito à percepção de
alimentos, mas esses deixam de ser devidos em face do Poder Familiar e passam a ter fundamento nas
relações de parentesco, em que se exige a prova da necessidade do alimentado. No entanto, quando se
trata de filho com doença mental incapacitante, a necessidade do alimentado se presume, e deve ser
suprida nos mesmos moldes dos alimentos prestados em razão do Poder Familiar.65
64 Tese 4, edição 65, JTSTJ: “É devido alimentos ao filho maior quando comprovada a frequência em curso
universitário ou técnico, por força da obrigação parental de promover adequada formação profissional.”.
65 (REsp: 1.642.323/MG, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 28/03/2017, T3 -
Finalmente, Flávio Tartuce assevera que é possível que a indignidade gere a redução dos alimentos,
principalmente nos casos de patente necessidade do devedor.66
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