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28.

Propriedades do integral: o teorema fundamental do cálculo

1. Teorema fundamental do cálculo


Tendo em conta que quando se deriva uma função esta não ganha regularidade e, em geral,
fica menos regular (pensemos no caso da função módulo, que é contı́nua, mas cuja derivada não
só não existe em 0 como não é prolongável por continuidade a zero), é natural esperar que a
operação inversa da derivação tenha um efeito regularizador sobre uma função. Iremos agora
ver que de facto isto é assim e que a regularização da função f pelo integral implica que se f é
contı́nua, então o integral indefinido é diferenciável. Talvez ainda mais notável, é que a derivada
do integral indefinido é, de facto, o valor da função integranda no ponto em causa.
teorema 28.1 (Teorema fundamental do cálculo). Seja f : [a, b] ! R integrável em [a, b] e
contı́nua num ponto x0 2 [a, b]. Então a função F : [a, b] ! R definida por
Z x
F (x) = f (t)dt
a
é diferenciável em x0 e tem-se que
F 0 (x0 ) = f (x0 ).
Demonstração. Temos que
Z x0 + h Z x0
F (x0 + h) F (x0 ) = f (t)dt f (t)dt
a a
Z a Z x0 + h
= f (t)dt + f (t)dt
x0 a
Z x0 + h
= f (t)dt.
x0
Uma vez que f é contı́nua, temos (para h positivo e sendo mh e Mh os mı́nimo e máximo de f
em [x0 , x0 + h])
Z x0 + h Z x0 + h Z x0 + h
mh  f (t)  Mh ) mh dt  f (t) dt  Mh dt
x0 x0 x0
Z x0 + h
, h mh  f (t)dt  h Mh ,
x0
e portanto
F (x0 + h) F (x0 )
mh   Mh .
h
107
108 28. PROPRIEDADES DO INTEGRAL: O TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO

Devido à continuidade de f , temos Mh , mh ! f (0 x) quando h tende para zero, pelo que


F (x0 + h) F (x0 )
F 0 (x0 ) = lim = f (x0 ).
h!0+ h
O caso de h < 0 pode ser tratado de forma semelhante. ⇤

O Teorema Fundamental do Cálculo

Corolário 28.2. Nas condições do teorema anterior, a função G : [a, b] ! R definida por
Z b
G(x) = f (t)dt
x
é diferenciável e tem-se
G0 (x) = f (x).
1. TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO 109

Demonstração. Basta notar que


Z b
G(x) = f (t)dt
x
Z a Z b
= f (t)dt + f (t)dt
x a
Z x Z b
= f (t)dt + f (t)dt
a a
Z b
= F (x) + f (t)dt
a
e, usando o resultado anterior, obtém-se que G0 (x) = f (x). ⇤
Corolário 28.3. Seja f : [a, b] ! R uma função contı́nua em [a, b]. Então a função
F : [a, b] ! R definida por
Z x
F (x) = f (t)dt
a
é diferenciável para todo o x 2 [a, b] e tem-se F 0 (x) = f (x), ou seja, F é uma primitiva de f .
Corolário 28.4 (TFC+regra de derivação da composta). Seja f : [a, b] ! R uma função
contı́nua em [a, b], e sejam ↵, : [a, b] ! R duas funções diferenciáveis. Então a função
F : [a, b] ! R definida por
Z (x)
F (x) = f (t)dt
↵(x)
é diferenciável para todo o x 2 [a, b] e tem-se
F 0 (x) = f ( (x)) 0
(x) f (↵(x)) ↵0 (x).
Corolário 28.5 (Regra de Barrow). Seja f : [a, b] ! R uma função contı́nua em [a, b] e
F : [a, b] ! R uma sua primitiva. Então
Z b
f (t)dt = F (b) F (a).
a
Demonstração. Se F é uma primitivaZde f em [a, b], temos que F é diferenciável e F 0 (x) =
x
f (x) para todo o x 2 [a, b]. Então F (x) e f têm a mesma derivada em todos os pontos de
a
[a, b] pelo que diferem por uma constante, ou seja,
Z x
F (x) = f + c.
a
Então ! ✓Z
Z b a ◆ Z b
F (b) F (a) = f +c f +c = f.
a a a

110 28. PROPRIEDADES DO INTEGRAL: O TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO

Nota 28.1. A notação utilizada varia:


F (b) F (a) = F (x)|ba = F (x)]ba ,
por exemplo.

2. Relação entre a área e primitivas


Seja f : [a, b] ! R uma função contı́nua (que, por simplicidade, iremos assumir positiva), e
consideremos a área da região debaixo do gráfico de f – ver Figura 28.1. A região a vermelho
corresponde à área entre a e x, que designaremos por A(x). Iremos agora ver como é a variação
da área em função de x.

Figura 28.1. Variação da área delimitada pelo eixo horizontal e pelo gráfico de
uma função positiva

Para tal, consideremos a área delimitada pelo gráfico da função entre a e o ponto x + h, onde
h é um número real positivo. Temos então que
A(x + h) = A(x) + |Rh | + "(h, x)
= A(x) + h ⇥ inf f (y) + "(h, x)
y2[x,x+h]

onde "(h, x) corresponde à porção de área que fica acima do rectângulo Rh . Esta função satisfaz
" #
"(h, x)  h ⇥ sup f (y) inf f (y) ,
y2[x,x+h] y2[x,x+h]

pelo que
" #
"(h, x)
0  sup f (y) inf f (y) .
h y2[x,x+h] y2[x,x+h]
3. PRIMITIVAÇÃO POR PARTES E POR SUBSTITUIÇÃO 111

Supondo que f é suficientemente bem comportada (contı́nua, por exemplo) numa vizinhança do
ponto x temos que
"(h, x)
lim = 0.
h!0 + h
Então 
A(x + h) A(x) "(h, x)
lim = lim f (x) + = f (x).
h!0 + h h!0 + h
Mas o limite do lado direito é a derivada de A no ponto x, pelo que acabamos de mostrar que
A0 (x) = f (x)
ou seja, A é uma primitiva de f . Como estamos interessados na primitiva que satisfaz A(a) = 0,
temos Z x
A(x) = f (t)dt.
a
Exemplo 28.1.
Z 1 1
1 1 1
xn dx = xn+1 = 1n+1 0n+1 = .
0 n+1 0 n+1 n+1
Exemplo 28.2.
Z ⇡

sin(x)dx = cos(x)
= cos(⇡) + cos(0) = 2.
0 0

Se fizermos o integral entre 0 e 2⇡ iremos obter zero, o que não corresponde à área mais sim à
área com sinal.
Exemplo 28.3. Z x
x
t t
e dt = = e x + 1.
e
0 0

Neste caso temos a área a variar com x, o que corresponde à área da região entre e x e o eixo
horizontal, entre 0 e x. Quando se faz x tender para +1 obtém-se 1, que será o valor da área
debaixo do gráfico de ex de 0 a +1!

3. Primitivação por partes e por substituição


Os métodos de primitivação estudados anteriormente aplicam-se também ao integral indefi-
nido, desde que se tenha em conta os limites de integração de forma apropriada.
Exemplo 28.4 (Integração por partes). Sejam f, g : [a, b] ! R, x 2 [a, b], e suponha-se que
f, g 2 C 1 ([a, b]). Então
Z x ix Z x
f 0 (t)g(t) d t = f (t)g(t) f (t)g 0 (t) d t
a a a
Z x
= f (x)g(x) f (a)g(a) f (t)g 0 (t) d t
a

Exercı́cio 28.1. Calcular a área delimitada pelo gráfico da função f (t) = tet e o eixo
horizontal, entre 0 e x.
112 28. PROPRIEDADES DO INTEGRAL: O TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO

Exemplo 28.5 (Integração por substituição). Sejam f : [a, b] ! R uma função contı́nua e
g : [c, d] ! [a, b] uma função de classe C 1 ([c, d]) tais que g é injectiva, e g(c) = a e g(d) = b.
Então,
Z b Z g 1 (b)
f (x) d x = f (g(t))g 0 (t) d t
a g 1 (a)
Z d
= f (g(t))g 0 (t) d t.
c
Uma aplicação de mudança de variável, utilizada no cálculo da área do cı́rculo, pode ser
vista no Exemplo 29.1.
29. Aplicações do teorema fundamental do cálculo.

1. Aplicações do Teorema Fundamental do Cálculo


O Teorema Fundamental do Cálculo permite-nos estabelecer uma relação bastante directa
entre a função integranda e o integral indefinido. Por exemplo, se tivermos f contı́nua e definir-
mos Z x
F (x) = f (t) dt
a
temos que se F tiver um zero em x = b > a, f tem de ter um zero no intervalo (a, b). Mais
geralmente, se f for contı́nua em [a, b], e sendo
Z x
F (x) = f (t) dt,
a
temos, pelo teorema de Lagrange, que existe c 2 (a, b) tal que
Z b
F (b) F (a) 1
F 0 (c) = = f (t) dt,
b a b a a
que pode ser escrito na forma
Z b Z b
1 1
f (t) dt = f (c) dt.
b a a b a a
Por outras palavras, f (c) é o valor médio de f no intervalo [a, b].
Permite-nos também analisar funções definidas por integrais como se fossem funções normais,
mesmo que não saibamos calcular a primitiva envolvida ou que não seja possı́vel exprimir essa
primitiva em termos de funções já conhecidas como sejam as funções elementares.

1.1. Áreas. Vimos que para calcular áreas de regiões do plano é suficiente ser capaz de
calcular a primitiva das funções que definem a região. Iremos considerar dois tipos de exemplos:
regiões limitadas e regiões não limitadas.
Exemplo 29.1 (Área do cı́rculo). Seja C = (x, y) 2 R : x2 + y 2 = 1 . Para determnar a
área de uma região há três passos a dar:
a) Compreender qual a região; neste caso trata-se de uma figura geométrica bem conhe-
cida pelo que essa questão não se põe de forma crı́tica (para comparação, considerar o
seguinte exemplo: L = (x, y) 2 R : log2 (x) + log2 (y) = 1 ).
Z b
b) Escrever um integral que dê a área da região em causa: f g, onde f é a função
a
que delimita a região por cima, g a função que delimita a região por baixo, e a e b os
113
114 29. APLICAÇÕES DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO.

limites da região na variável de integração. Neste caso, teremos que


p
f (x) = 1 x2
p
g(x) = 1 x2
ea= b= 1. O integral em causa é então
Z 1p ⇣ p ⌘ Z 1p
1 x2 1 x2 dx = 2 1 x2 dx.
1 1
c) Calcular o integral em causa (mais uma vez, comparar com o exemplo da região L
indicada acima - nos problemas da próxima semana, este será um dos exemplos a fazer,
em que, uma vez que não é possı́vel calcular a primitiva da função nesse caso, será
indicado um método simples para poderem fazer um programa com 5 linhas para obter
uma estimativa numérica para o valor do integral).
Neste caso, o integral pode ser calculado através de uma mudança de variável que,
sem ser completamente óbvia, faz sentido (uma vez que se está a falar do cı́rculo) e
deve passar a fazer parte do vosso reportório de substituições: x = sin(t), com a ideia
de usar o facto de 1 x2 = 1 sin2 (t) = cos2 (t). Para podermos fazer a substituição
temos de calcular
x = sin(t) ) dx = d sin(t) = cos(t)
dt dt
x = ±1 ) t = ±⇡/2
Temos então
Z 1 Z ⇡/2 p
p
2 1 x2 dx = 2 1 sin2 (x) cos(t) dt
1 ⇡/2
Z ⇡/2
= 2 cos(t) ⇥ cos(t) dt
⇡/2
Z ⇡/2
= 2 cos2 (t) dt
⇡/2
Z ⇡/2
= 1 + cos(2t) dt
⇡/2
Z ⇡/2
= 1 dt
⇡/2
⇡/2
= t
⇡/2

= ⇡.
Um outro tipo de exemplo que é fundamental nas aplicações, por exemplo a estatı́stica, são
áreas de regiões não limitadas. Já vimos o caso da área da região delimitada pelo eixo horizontal
e pela função e x para x positivo, e iremos agora considerar um outro exemplo importante.
1. APLICAÇÕES DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO 115

Exemplo 29.2. Seja f↵ (x) = 1↵ para ↵ > 0. Pretende calcular-se a área delimitada pelo
x
gráfico de f↵ e o eixo horizontal, para x entre 1 e y. O integral correspondente neste caso é
bastante simples:
8
Z y Z y < y ↵+1 1
1
↵ dx =

x dx = 1 ↵ 1 ↵ , ↵ 6= 1
1 x 1 :
log(y), ↵=1
Vemos que se fizermos agora y tender para infinito, o limite só será finito se ↵ for maior do que
1, caso em que se tem
✓ ↵+1 ◆
y 1 1 1
lim = = .
y!+1 1 ↵ 1 ↵ 1 ↵ ↵ 1
A interpretação geométrica deste facto é que apesar de, para ↵ positivo a função 1/x tender
para zero quando x tende para infinito, apenas no caso em que ↵ é maior do que 1 é que essa
convergência é suficientemente rápida para tornar a área debaixo da curva finita. Este resultado
irá ter implicações no estudo de séries que iremos fazer mais tarde – notar que para ↵  0 não
faz sequer sentido pensar se a área é finita, uma vez que nesse caso a função é maior do que uma
constante positiva (fixa) para todo o x suficientemente grande.
Este último exemplo corresponde a um tipo de integrais em regiões não limitadas que é
representado por
Z +1 Z y
f := lim f
a y!+1 a
e que se diz convergente quando o limite existe. Caso contrário diz-se divergente.

1.2. Definição de novas funções. Uma outra consequência do Teorema Fundamental do


Cálculo é a possibilidade de estudar novas funções definidas pelo integral indefinido a partir de
outras já conhecidas. Iremos começãr por considerar um exemplo que, sem ser novo, ilustra este
facto.
Exemplo 29.3. Seja L a função definida por
Z x
1
L(x) = dt.
1 t
Já sabemos que se trata do logaritmo, mas suponhamos por um instante que apenas tı́namos
os polinómios e as funções racionais construı́das a partir destes. É fácil verificar que a função L
satisfaz as seguintes propriedades:
i) L está definida para todo o x 2 R+ e é contı́nua nesse conjunto;
ii) L(1) = 0;
iii) Como 1/t é contı́nua no intervalo (0, +1), L é diferenciável nesse intervalo e L0 (x) = x 1
iv)
Z xy
1
L(xy) = dt
1 t
e portanto
dL(xy) 1 d 1
= (xy) = .
dx xy dx x
116 29. APLICAÇÕES DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO.

Isto quer dizer que L(x) e L(xy) diferem de uma constante (em x, uma vez que as suas
derivadas (em x) são iguais:
L(xy) = L(x) + C.
Tomando x = 1, temos L(y) = L(1) + C = C, e portanto C = L(y) e vem
L(xy) = L(x) + L(y).
Um exemplo mais interessante é o seguinte, uma vez que aqui se trata de facto de uma nova
função.
Exemplo 29.4 (A função erro). Seja
Z x
1 t2
erf(x) = p e dt.
⇡ x
Um estudo desta função está sugerido na lista de problemas, incluindo as seguintes propriedades:
i) erf : R ! R é contı́nua em todo o seu domı́nio;
ii) erf(x) = erf( x) [erf é ı́mpar];
iii) erf(0) = 0;
2
iv) erf 0 (x) = e x e portanto erf é crescente, o que quer dizer que 0 é o único zero da
função, a qual será positiva para x > 0 e negativa para x < 0.
O gráfico desta função encontra-se representado na Figura 29.1.

Figura 29.1. Gráficos das funções erro (azul) e e t2 /p⇡ (vermelho).

Para além da função erro, nas folhas de exercı́cios estão definidas várias outras funções
importantes, como sejam a função Li(x) e a função (x).
1.3. Equações diferenciais separáveis. De forma geral, uma equação que relaciona uma
função com as suas derivadas é designada por equação diferencial. Este tipo de equações surge
naturalmente em Fı́sica e um dos exemplos mais simples tem a forma
d
(29.1) g(y(x)) y(x) = h(x),
dx
1. APLICAÇÕES DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO 117

onde g e h são funções dadas e se pretende determinar a função y = y(x). De notar que a função
que se pretende determinar [y] depende apenas de uma variável [x], e na equação surge apenas a
primeira derivada de y. Este tipo de equação toma o nome de equação [há uma incógnita que se pretende
determinar, neste caso y] diferencial [a equação envolve derivadas da incógnita] ordinária [a função a determinar depende
apenas de uma variável] de primeira ordem [a ordem da derivada mais alta que surge na equação é um]. Neste caso
particular, o facto das funções dadas que intervêm na equação [g e h] dependerem apenas de
uma variável em cada caso, faz com que tenhamos as variáveis dependente [y] e independente
[x] separadas. Uma equação da forma (29.1) designa-se normalmente por equação diferencial
separável.
A resolução de (29.1) tira partido do facto de que se duas funções são idênticas, então os
seus integrais definidos entre os mesmos extremos são iguais, e do método de integração por
substituição. Mais precisamente
Z t Z t
d
g(y(x)) y(x) dx = h(x) dx,
t0 dx t0
donde obtemos
G(y(t)) G(yt0 ) = H(t) H(t0 ),
onde G e H são primitivas das funções g e h, respectivamente. De notar que esta última
identidade ainda é uma equação em y, e pode não ser possı́vel explicitar a sua dependência na
variável x.
30. Aproximação de funções: o polinómio de Taylor

1. Aproximação de funções
No que diz respeito às chamdas funções elementares, tirando os polinómios e alguns casos
particulares (sin(⇡/4), por exemplo) mantém-se o problema de saber como calcular quantidades
como e⇡ ou sin(1/17), por exemplo. Esta questão coloca-se de forma ainda mais clara para
funções como as que vimos que podemos agora definir através de integrais, por exemplo.
Dada uma função real de variável real f , de um ponto de vista geométrico a versão mais
simples consiste em aproximar o gráfico de f num ponto a do seu domı́nio pela recta tangente
a esse gráfico no ponto (a, f (a)) (caso esta exista), ou seja, por um polinómio do primeiro grau.
Seja f : Df ! R uma função real de variável real diferenciável no ponto x = a 2 Df . A equação
da recta tangente ao gráfico no ponto (a, f (a)) é dada por
y = p1,a (x) = f 0 (a)(x a) + f (a).
Suponhamos agora que queremos aproximar f não por um polinómio de primeiro grau mas por
um polinómio de grau 2. Conseguiremos ter uma melhor aproximação? Intuitivamente isso deve
ser possı́vel, pelo menos próximo do ponto, uma vez que passámos de procurar uma aproximação
num espaço linear de dimensão dois (polinómios de grau menor ou igual a um) para um espaço
de dimensão dois que contém o primeiro espaço (espaço de polinómios de grau menor ou igual a
dois). Para podermos responder a essa pergunta de uma forma rigorosa é, no entanto, necessário
saber como medir se uma aproximação é melhor do que outra. Mais precisamente, precisamos
de ter um critério que nos permita determinar os valores de a0 , a1 e a2 tais que
p2,a (x) = a0 + a1 (x a) + a2 (x a)2
seja uma boa aproximação de f numa vizinhança de x = a no sentido definido por esse critério.
Embora haja muitas formas de medir a distância entre duas funções, a ideia que iremos explorar
aqui é que, por termos passado a ter três parâmetros, para além dos valores da função e da
derivada, devemos também poder garantir a igualdade entre os valores das segundas derivadas
da função e da sua aproximação.
p2,a (a) = a0 = f (a)
p02,a (a) = a1 = f 0 (a)
p002,a (a) = 2a2 = f 00 (a)
pelo que o polinómio de segundo grau que melhor aproxima f numa vizinhança de a (neste
sentido) é dado por
1
p2,a (x) = f (a) + f 0 (a)(x a) + f 00 (a)(x a)2 .
2
118
1. APROXIMAÇÃO DE FUNÇÕES 119

Um ponto óbvio aqui (mas não menos notável por causa disso) é que os coeficientes dos graus
0 e 1 são os mesmos que na aproximação pela recta tangente. Isto quer dizer que podemos ir
acrescentando termos de graus cada vez mais elevados, construindo a partir do que foi obtido
para os graus mais baixos.
Para grau n teremos pois
pn,a (x) = a0 + a1 (x a) + a2 (x a)2 + · · · + an (x a)n ,
e, igualando as derivadas, vem
8
> f (a) = pn,a (a) = a0
>
>
>
>
>
> f 0 (a) = p0n,a (a) = a1
>
>
>
> f 00 (a) = p00n,a (a) = 2a1
>
>
>
>
>
< ..
.
>
> (k)
>
> f (k) (a) = pn,a (a) = k!ak
>
>
>
>
>
> ..
>
> .
>
>
>
>
: f (n) (a) = p(n)
n,a (a) = n!an

e portanto, assumindo que f é diferenciável n vezes, o polinómio que aproxima f no sentido


definido acima é dado por
f 00 (a) f 000 (a) f (n) (a)
pn,a (x) = f (a) + f 0 (a)(x a) + 2 (x a)2 + (x a)3 + · · · + (x a)n
3! n!
n
X f (k) (a)
= (x a)k .
k!
k=0

Definição 30.1 (Polinómio de Taylor). Dada uma função f : Df ! R e sendo a 2 Df um


ponto onde f é n vezes diferenciável, designa-se por polinómio de Taylor de ordem n de f
no ponto a ao polinómio definido por
Xn
f (k) (a)
pn,a (x) = (x a)k .
k!
k=0

Iremos agora ver alguns exemplos.


Exemplo 30.1 (Polinómio de Taylor para ex ). No caso da função exponencial f (x) = ex
a expressão do respectivo polinómio de Taylor de grau n em torno de x = 0 é muito fácil de
calcular, uma vez que as sucessivas derivadas são sempre iguais a ex . Temos pois f (k) (0) = e0 = 1
e portanto
2 3 n
pn,0 (x) = 1 + x + x + x + · · · + x
0! 1! 2! 3! n!
Xn
xk
= .
k!
k=0

Exercı́cio 30.1. Determinar o polinómio de Taylor de ordem n no ponto 0 para o seno


hiperbólico.
120 30. APROXIMAÇÃO DE FUNÇÕES: O POLINÓMIO DE TAYLOR

Exemplo 30.2 (Polinómio de Taylor para sin(x)). No caso da função seno f (x) = sin(x) a
expressão assumida pelo respectivo polinómio de Taylor de grau n em torno de x = 0 é também
relativamente fácil de calcular. Temos agora
d sin(x) = cos(x) ) f (1) (0) = 1
dx
d2 sin(x) = sin(x) ) f (2) (0) = 0
dx2
d3 sin(x) = cos(x) ) f (3) (0) = 1
dx3
d4 sin(x) = sin(x) ) f (4) (0) = 0
dx4
havendo repetição dos valores a partir daqui: 0, 1, 0, 1, 0, 1, 0, 1, . . . . O polinómio de Taylor
vem então
2
p2n+1,0 (x) = 0 ⇥ 1 + 1 ⇥ x + 0 ⇥ x + ( 1) ⇥ x3 3! + · · · + ( 1)n x2n+1 (2n + 1)!
0! 1! 2!
Xn 2k+1
x
= ( 1)k .
(2k + 1)!
k=0
Notar que, sendo o seno uma função ı́mpar, é natural que apenas os termos ı́mpares apareçam
no seu polinómio de Taylor em torno de 0.
Exercı́cio 30.2. Mostrar que, para a função coseno, se tem
Xn
x2k
p2n,0 (x) = ( 1)k .
(2k)!
k=0

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