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Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa

Otite Média Aguda e suas


Complicações
A propósito de um caso clínico
Rita Montez do Nascimento
Ano lectivo 2015/2016

Orientador: Professor Doutor Augusto Cassul

Clínica Universitária de Otorrinolaringologia – Serviço de Otorrinolaringologia


Hospital Santa Maria
Regente Otorrinolaringologia: Professor Doutor Óscar Dias
Índice

Lista de Abreviaturas ........................................................................................................................................... 2


Resumo ................................................................................................................................................................ 3
Introdução ............................................................................................................................................................ 4
Métodos da revisão ............................................................................................................................................ 10
Caso Clínico ...................................................................................................................................................... 11
Discussão ........................................................................................................................................................... 14
Conclusão .......................................................................................................................................................... 22
Bibliografia ........................................................................................................................................................ 24
Anexo 1 ............................................................................................................................................................. 29
Anexo 2 ............................................................................................................................................................. 31

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Lista de Abreviaturas

OMA – Otite Média Aguda

AB – Antibacterianos

MA – Mastoidite Aguda

TC – Tomografia Computorizada

CIC – Complicações Intracranianas

TSL – Trombose do Seio Lateral

RM – Ressonância Magnética

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Resumo
A OMA é dos diagnósticos mais efectuados em idade pediátrica, afectando todas as faixas etárias, e a
grande maioria das crianças até aos 5 anos já teve pelo menos um episódio. A imaturidade do sistema
imunitário e a anatomia em desenvolvimento da trompa de Eustáquio levam ao grande número de
OMA diagnosticada nesta população.

O curso da doença é habitualmente auto-limitado e benigno, mas o seu tratamento tem sido alvo de
constante investigação e actualização, estando hoje em dia preconizada uma estratégia mais contida
do uso de AB, uma vez que esta terapêutica terá um impacto limitado no curso da doença,
principalmente em crianças acima dos 2 anos. No entanto, as complicações são uma realidade ainda
actualmente e ocorrem quando o processo infeccioso do ouvido médio se estende às estruturas
vizinhas e podem ser locais ou extracranianas ou intracranianas, sendo a mais comum a MA.

No presente trabalho descrevemos um caso clínico de uma criança de 5 anos, com diagnóstico de
OMA com MA bilateral, uma complicação extra craniana e múltiplas CIC.

Este trabalho mostra que as complicações da OMA são ainda uma realidade na era dos AB, cujo
diagnóstico deverá ser de elevada suspeição clínica e cuja abordagem médico-cirurgica ainda não
está bem estabelecida na literatura.

Summary
AOM is the most common diagnosis made in the pediatric setting, affecting all age groups. Almost
every child until the age of 5, had at least one episode. The immature immune system and the
developing anatomy of the Eustachian tube are risk factors for this condition in these ages.

The clinical course of AOM is usually benign and self-limited, but its treatment has been
investigated thoroughly changed in the last years of investigation. Nowadays a more contained
approach with the use of AB is mandatory, as it has a limited impact in the clinical evolution of the
disease, mainly in children above 2 years old. Nevertheless, there are complications and they occur
when the suppurative process extends beyond the middle ear to the neighbor structures. The
complications can be extra or intra-cranial; the most common is acute mastoiditis.

In the present case report we describe a child of 5 years old with AOM, bilateral acute mastoiditis, an
extra-cranial complication and multiple intra-cranial complications.

This work shows that the AOM complications are still a reality in the AB-era, the diagnosis requires
a high suspicion index and that its treatment is not well described in the literature.

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Introdução
A otite média aguda (OMA) além de ser a infecção bacteriana mais frequente em idade pediátrica, é
também a doença em que mais antibacterianos (AB) são prescritos nos Estados Unidos (Rodrigues,
V. 2012; Lieberthal, A. 2013).

O diagnóstico de OMA é feito pela presença de um dos seguintes factores:

 Presença de protusão moderada a grave da membrana timpânica OU início de novo de


otorreia que não se deve a otite externa.
 Presença de protusão moderada da membrana timpânica E início recente (menos de 48h) de
otalgia OU eritema intenso da membrana timpânica.

Em simultâneo o diagnóstico de OMA não deve ser feito em crianças que não apresentem efusão no
ouvido médio, com base na observação por otoscopia. É importante também a distinção entre OMA
severa e não severa em função da presença ou ausência de otalgia grave e febre, com temperatura
superior a 39ºC. A OMA não complicada é definida pela ausência de otorreia (Lieberthal, A. 2013).

Cerca de 75% das crianças têm pelo menos um episódio de OMA antes dos 5 anos. Num estudo de
coorte, multicêntrico prospectivo realizado em vários países Europeus, a incidência de OMA
documentada foi de 256/1000 casos/ano, sendo que a incidência foi superior no grupo etário dos 0
aos 2 anos (299/1000 casos/ano), em relação ao grupo entre os 3 e os 5 anos (212/1000 casos/ano)
(Liese, J. 2014).

O pico de incidência é no primeiro ano de vida em que 22% das crianças têm diagnóstico de OMA;
no fim do terceiro ano de vida 80% já teve pelo menos um episódio de OMA (Atkinson, H. 2015).

As bactérias chegam à cavidade timpânica, que normalmente é estéril, por via ascendente através da
Trompa de Eustáquio, secundariamente a uma infecção do tracto respiratório superior, habitualmente
de etiologia viral. A inflamação provocada pela infecção leva ao edema e consequentemente ao
bloqueio da Trompa de Eustáquio. Assim, o ar do ouvido médio é reabsorvido, criando uma pressão
negativa nesta cavidade e facilitando o refluxo de bactérias da nasofaringe. Em 70% dos casos de
OMA verifica-se infecção respiratória superior pré-existente (Atkinson, H. 2015). Tanto os vírus
como as bactérias podem ser agentes etiológicos de OMA; as bactérias mais frequentemente
encontradas são o Streptococcus pneumoniae (35%), o Haemophilus influenzae (25%), a Moraxella
Catarrhalis (13%) e menos frequentemente o Streptococcus pyogenes (4%) (Hoffman, H. 2012).

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Além da presença de infecção respiratória superior, é de destacar a existência de outros factores de
risco para OMA, nomeadamente, o sexo masculino, classes socioeconomicas mais baixas, o
tabagismo parental, a frequência na creche com mais de 10 crianças, o uso de chupeta, existência de
irmãos, história familiar positiva, prematuridade e doença de refluxo gastro-esofágico (Atkinson, H.
2015; Hoffman, H. 2012).

A OMA é habitualmente uma infecção auto-limitada, em que, segundo uma meta-análise de 2003, a
resolução completa dos sintomas agudos ocorre em 61% das crianças tratadas com placebo às 24h de
evolução da doença; esta percentagem aumenta para 80% ao fim de 2 a 3 dias. Entre os 7 e os 14
dias, 70% das crianças apresenta resolução clínica completa. Em relação às complicações supurativas
da OMA, este estudo indica também que a sua prevalência é idêntica quer o tratamento inicial seja
feito ou não com AB (Rosenfeld, R. 2003).

Nos últimos anos, a terapêutica da OMA tem sido alvo de grande discussão e investigação, visto que
na Holanda cerca de 56% dos casos de OMA são tratados com AB, e noutros países, como os
Estados Unidos da América e Canadá, esta percentagem é superior a 90% (Venekamp, R. 2015).
Alguns autores, como van Zuijlen e colaboradores, advogavam num estudo de 2001, que o atraso na
prescrição de AB estaria associado a um aumento da incidência de complicações supurativas,
nomeadamente a mastoidite aguda (MA) (van Zuijlen, D. 2001).

No entanto, a recomendação de uma abordagem inicial baseada em protelar o uso de AB (do anglo-
saxónico “wait-and-see”) foi já proposta pela primeira vez em 1985 pelo “Dutch College of General
Practitioners” (van Buchem, F. 1985).

Recentemente, também vários ensaios clínicos controlados e randomizados, comparando o uso de


AB e placebo ou uma terapêutica expectante numa abordagem inicial da OMA, mostraram que o
protelar o uso de AB não alterou significativamente o curso da doença e diminuiu o uso destes
fármacos (Chao, J. 2008, Spiro, D. 2006, McCormick, D. 2005, Le Saux, N. 2005).

Uma meta-análise de ensaios controlados e randomizados do uso de AB versus placebo e do uso de


AB imediata vs protelada da The Cochrane Library (Venekamp, R. 2015) de 2015 chega à conclusão
que o uso de AB não tem influência na remissão clínica da OMA nem na incidência de complicações
supurativas e que esta deve ser usada com parcimónia tendo um papel limitado no seu tratamento.
Assim, a atitude expectante é justificável na abordagem inicial da OMA.

Esta abordagem inicial é de crucial importância no contexto da medicina actual pois diminuiu a
necessidade e a administração de AB (Marchetti, F. 2005), o que estará associado a diminuição da

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emergência de estirpes resistentes, sem consequências negativas nos cuidados de saúde, como é
exemplo a Suécia (Molstad, S. 2008). Outros benefícios são a diminuição dos custos em saúde e
também da prevalência de efeitos secundários associados à AB (van Zuijlen, D. 2001). Num país
como Portugal, em que a prescrição de AB para a OMA tem tendência a ser de largo-espectro, e com
elevadas taxas de resistências (Spratley, J. 2000), esta abordagem poderá ser uma mais-valia.

Assim, a AB deve ser tratamento inicial em casos específicos, nomeadamente, em todas as crianças
abaixo dos 6 meses, para crianças entre os 6 meses e os 2 anos com diagnóstico seguro de OMA e
para todas as crianças com doença grave (OMA bilateral, e OMA associada a otorreia). Uma
terapêutica expectante é segura nos restantes casos: crianças entre os 6 meses e os 2 anos com
sintomas ligeiros e diagnóstico duvidoso e crianças mais velhas com sintomas ligeiros, mesmo que
com certeza do diagnóstico (Venekamp, R. 2015, Machado, M. 2012).

O fármaco de escolha no início da AB deve ser a amoxicilina em alta dose (80-90 mg/kg/dia),
excepto se a criança fez AB nos últimos 30 dias, tiver infecção concomitante como conjuntivite
purulenta e se for alérgica à penicilina. Nos casos de OMA grave ou persistência de OMA após
amoxicilina deve ser acrescentada cobertura para microrganismos produtores de beta-lactamases e
substituir-se por amoxicilina com ácido clavulânico (Lieberthal, A, 2013, Machado, M. 2012).

As complicações da OMA ocorrem quando o processo infeccioso do ouvido médio se estende às


estruturas vizinhas e podem ser divididas em locais ou extracranianas e intracranianas (CIC)
(Atkinson, H. 2015). Das complicações locais ou extracranianas podemos destacar a perfuração da
membrana timpânica, a mastoidite e o abcesso subperiósteo, a paralisia do nervo facial, a labirintite,
a síndrome de Gradenigo e os abcessos de Bezold, Citelli e Luc. Em relação CIC podemos destacar a
trombose do seio lateral (TSL), a meningite, o abcesso do lobo temporal, o abcesso extradural ou
subdural e o hidrocéfalo otogénico (Atkinson, H. 2015).

A incidência de complicações na OMA não é desprezível, sendo as mais comuns a perfuração da


membrana timpânica e a MA.

Em relação às complicações locais podemos destacar as principais características. A perfuração da


membrana timpânica ocorre em 7% das OMA, com resolução completa em 98% dos casos; a
principal sequela é a timpanosclerose ou a perfuração crónica da membrana com risco de surdez de
condução. A labirintite é uma complicação mais rara e resulta do atingimento da cóclea pela
inflamação, provocando hipoacusia e vertigem. A paralisia do nervo facial tem uma incidência
global após OMA de 0,005%, mas pode ocorrer até 25% das crianças com MA e ocorre por extensão

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da inflamação ao trajecto intra-temporal do nervo; esta complicação manifesta-se por assimetria
facial e incapacidade de fechar o olho homolateral. A formação de abcessos pode ocorrer noutras
áreas por progressão do abcesso mastoideu. Um abcesso subperiósteo forma-se pela extensão da
infecção ao periósteo do osso temporal. O abcesso de Bezold forma-se pela extensão até ao triângulo
cervical posterior, resultando numa massa com flutuação ao longo do esternocleidomastoideu. O
abcesso de Citelli atinge o feixe posterior do digástrico e o abcesso de Luc o canal auditivo posterior.
Estes abcessos tipicamente requerem incisão e drenagem. A síndrome de Gradenigo ou inflamação
do ápex petroso leva à tríade de paralisia do VI par, dor retrobulbar ou no território do trigémio e
otorreia. Estas complicações geralmente requerem um elevado índice de suspeição para o seu
diagnóstico, devido ao seu curso clínico insidioso, devendo-se suspeitar quando há manutenção da
febre ou picos febris sob AB, aumento da letargia, alterações sensoriais, irritabilidade e sinais
inflamatórios locais (Atkinson, H. 2015; Daniero, J. 2012).

A MA está entre as mais graves complicações da OMA e na sua sequência podem ocorrer as
complicações já enumeradas e as restantes CIC. Um estudo norueguês de 2007 revelou uma
incidência de mastoidite de 13,5 a 16,8 / 100 000 casos em crianças abaixo dos 2 anos durante o
período de estudo, tendo a incidência um pico durante o segundo e terceiro anos de vida (Kvaermer,
K. 2007). Em Portugal, há a destacar dois trabalhos: um realizado no Centro Hospitalar do Porto que
revelou uma prevalência de 18,6% de MA (Silva, H. 2013) e outro do Departamento de Pediatria do
Hospital Fernando da Fonseca que revelou uma incidência de 9,3/ 10 000 casos (Salgueiro, A. 2007).
Em ambos os estudos mais de metade dos casos de MA foi precedida de OMA com AB. Mas em
vários estudos, mais uma vez, não foi encontrada relação entre o uso de AB prévia e o
desenvolvimento de MA (Ho, D. 2008, Grossman, Z. 2015 Jung, T. 2012).

De facto, actualmente, após a introdução dos AB na prática clínica no tratamento da OMA, a MA


aguda é um evento raro, com incidências entre os 0,2 e os 2% (Spratley, J. 2000).

Devido às recentes recomendações de adiar o uso de AB nos casos de OMA, vários autores
mostraram preocupação com o aumento da incidência de MA (Ho. D. 2008; Spratley, J. 2000); no
entanto, várias grandes séries de MA recentes não confirmaram esta tendência (Palma, S. 2007;
Anthonsen, K. 2013; Groth, A. 2012)

Num estudo de coorte no Reino Unido o uso de AB diminuiu para metade o risco de MA após um
episódio diagnosticado de OMA, mas sendo esta uma condição rara que afectou neste trabalho 1,2
crianças por 10 000 anos de seguimento, o número de doentes com OMA necessário tratar é alto.

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Neste estudo o risco global de desenvolvimento de mastoidite aguda nos 3 meses subsequentes à
OMA foi de 2,4 / 10 000 casos de OMA (Thompson, P. 2009).

A apresentação clínica mais frequente da MA (em cerca de 80% dos casos) cursa com sinais
inflamatórios retro-auriculares: edema, hiperémia, dor e otorreia, sendo mais frequente abaixo dos 2
anos de idade (Palma, S. 2007). A febre como sintoma tem uma sensibilidade considerável para o
diagnóstico de MA e pode predizer a eventual necessidade de cirurgia (Lin, H. 2010). Evidência
recente indica que a realização de tomografia computorizada (TC) pode ser protelada nos casos de
MA não complicada, enquanto que a AB endovenosa deve ser imediatamente iniciada com
cefalosporinas de 3ª geração. A TC deve ser realizada se houver suspeita inicial de CIC, se o estado
clínico não melhorar às 48h ou se houver deterioração do mesmo. O tratamento com miringotomia
ou colocação de tubos de ventilação na membrana timpânica deve ser considerado inicialmente se
crianças abaixo dos 2 anos (ver algoritmo de tratamento da MA no anexo 1) (Chesney, J. 2014). De
notar que o tratamento cirúrgico diminuiu em 80% desde o início da era da AB (Spratley, J. 2000).

Em relação ao tratamento, de modo geral, a MA não coalescente (sem erosão óssea), pode ser tratada
com AB e colocação de tubos trans-timpânicos; se a MA for coalescente, com erosão óssea
concomitante, é necessária uma intervenção cirúrgica mais agressiva e a colocação dos tubos de
ventilação deve ser combinada com a mastoidectomia (Daniero, D. 2012).

No que diz respeito às restantes CIC supurativas, a sua prevalência e incidência ainda é inferior à da
mastoidite, com números que rodam os 5% a 13% em crianças com mastoidite aguda (Palma, S.
2007, Santander, C. 2010, Jung, T. 2012) e no global com uma incidência de 0,13% a 1,97%
(Penido,). Apesar de a incidência ter baixado drasticamente desde a introdução da AB na rotina
médica, estas complicações, hoje-em-dia raras, podem ter consequências graves. Assim, é importante
estar alerta para o seu diagnóstico e tratamento atempado, uma vez que nem sempre se apresentam
com os sintomas otológicos clássicos da OMA, sendo o quadro dominado pelos sintomas
neurológicos (Osborn, A. 2011), sendo a alteração do estado de consciência, os vómitos, as cefaleias
e a fotofobia importantes sinais de alerta (Atkinson, H. 2015)

A TSL apresenta-se de modo diferente, consoante a cobertura AB; se resultar de OMA não tratada
apresenta-se frequentemente com otorreia, otalgia, febre e cefaleia enquanto que em zonas em que a
AB está facilmente disponível os sintomas mais frequentes são a cefaleia, rigidez da nuca, fotofobia,
papiledema, paralisia do VI par e ocorrem mais tardiamente na história da doença, cerca de 4
semanas após a OMA (Osborn, A. 2011). O trombo pode inclusivamente propagar até à veia jugular
interna. O tratamento passa pela mastoidectomia com inserção de tubos trans-timpânicos e AB

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endovenosa durante 4-6 semanas; mesmo com tratamento efectivo, a mortalidade reportada desta
complicação é de cerca de 5% (Sitton, M. 2012). A cobertura AB deve ser de largo espectro,
cobrindo também anaeróbios. A anti-coagulação também parece ter um papel importante no
tratamento, no entanto com resultados inconsistentes em vários trabalhos, uma vez que a frequência
de TSL é demasiado baixa para a realização de ensaios randomizados. Apesar disso, a anti-
coagulação parece ser uma medida razoável neste contexto (Osborn, A. 2011).

A TSL pode ser seguida de hidrocéfalo otogénico, uma vez que se pensa que a congestão venosa seja
o principal mecanismo fisiopatológico (Osborn, A. 2011).

Quando a infecção no osso temporal forma uma colecção por fora da dura-mater forma-se um
abcesso epidural, que pode ocorrer na fossa craniana média ou posterior, e pode estar associado a
aumento da pressão intra-craniana, desvio da linha média e no extremo herniação. A acumulação de
material purulento entre a dura-máter e a aracnóideia leva à formação de um abcesso subdural. Os
abcessos podem ser também intraparenquimatosos, cuja localização mais frequente é o lobo temporal
e o cerebelo. Estes dois últimos estão associados a alteração do estado de consciência, convulsões,
náuseas e vómitos e o abcesso intraparenquimatoso pode resultar em morbilidade significativa, com
défices neurológicos permanentes e ter uma mortalidade de cerca de 30% (Osborn, A.2011; Daniero,
D. 2012). Todos eles requerem pronta avaliação neurocirúrgica.

A meningite otogénica é actualmente uma complicação rara, devido à vacinação generalizada com
Hib e PVC7. No entanto, apesar de poder ser reconhecida pela presença de sinais meníngeos, febre,
altaração do estado de consciência e fotofobia, trata-se de uma complicação com elevada
morbilidade com cerca de 17% de sequelas neurológicas, nomeadamente surdez neurossensorial, 5%
destas podem mesmo consistir em défices neurológicos graves como afasia, ataxia e parésia. O
tratamento passa pela cirurgia para controlo do foco infeccioso (Osborn, A. 2011; Daniero, D. 2012).

Também em alguns estudos foi reportada a associação de várias complicações, apesar de as séries de
doentes serem de pequenas dimensões. Num estudo de Zevallos com 108 crianças com MA com
indicação para tratamento cirúrgico, cerca de ¼ apresentavam uma complicação intracraniana em
simultâneo, sendo que a mais frequente foi a TSL, seguida do abcesso subdural, meningite e
hidrocéfalo otogénico. Seis crianças tinham CIC múltiplas (Zevallos, J. 2009).

No presente trabalho, e a propósito das complicações da OMA, apresentamos o caso clínico de uma
criança de 5 anos com diagnóstico de OMA, com um quadro dominado por sintomas neurológicos e
com várias complicações em simultâneo.

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Métodos da revisão

O presente trabalho foi realizado com base numa revisão da literatura, essencialmente realizada na
Pubmed, com as seguintes palavras-chave: acute otitis media, complications of acute otitis media,
acute mastoiditis, intracranial complications of acute otitis media.

Foram considerados todos os estudos em crianças e excluídos os realizados em adultos, com idade
superior a 18 anos; de igual modo foram apenas incluídos estudos com otite média aguda e
consideradas as suas complicações, excluindo-se os casos de otite média crónica e otite média serosa.
Foram pesquisados trabalhos que contemplassem complicações múltiplas em crianças e estudos de
caso de complicações mais raras.

Foram também contemplados estudos escritos em duas línguas: inglês e português.

O presente trabalho foi realizado na Clínica Universitária de Otorrinolaringologia da Faculdade de


Medicina da Universidade de Lisboa e cumpre as normas éticas adequadas.

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Caso Clínico

Criança actualmente com 5 anos de idade, sexo feminino, raça caucasiana, sem antecedentes
familiares relevantes e sem consanguinidade dos progenitores.

A gestação foi de 39 semanas e decorreu sem intercorrências; o parto foi cesariana por distócia de
progressão; o peso ao nascer foi 3035g e o índice de Apgar 10/10. O período neonatal decorreu sem
intercorrências, com rastreio de doenças endócrino-metabólicas e auditivo sem alterações.
Crescimento e desenvolvimento psico-motor adequados à idade até aos 5 anos. Aos 5 anos e
coincidente com o episódio de doença descrito de seguida, o peso baixou para o percentil 25.

Até aos 5 anos a criança foi aparentemente saudável, sendo negado pela mãe infecções respiratórias
de repetição, otites e outros processos patológicos. A 09/03/2015 (D1 de doença) iniciou quadro com
febre (entre os 37ºC e os 40ºC) que cedia mal ao paracetamol e ibuprofeno e vómitos. Ao D3 de
doença, além da febre e dos vómitos, iniciou diarreia, recusa alimentar e cefaleias occipitais
esquerdas intensas, tendo recorrido ao serviço de urgência do hospital de referência, tendo sido
diagnosticada com otite externa e medicada com ofloxacina tópica. Ao D4 de doença por
agravamento dos sintomas foi medicada com amoxicilina no mesmo hospital, com o diagnóstico de
OMA esquerda.

Ao D6 apresentava cefaleias holocranianas, fotofobia e ao exame objectivo (segundo os registos)


encontrava-se prostrada, com os olhos encovados, rigidez da nuca e hiperémia da membrana
timpânica esquerda. Analiticamente a destacar: leucócitos de 16600/uL, com 80% de neutrófilos e
PCR de 33,2 mg/dL. Neste contexto foi feita uma punção lombar que revelou: líquido turvo com
glicorráquia de 48 g/dL (glicémia de 98 g/dL), proteinorráquia de 89 mg/dL e 653 células com
predomínio de polimorfonucleares (63%), tendo sido a AB alterada para vancominina e ceftriaxona.

A D7 por permanência dos sintomas e início de otorreia e dor retro-auricular esquerda foi realizada
TC crânio-encefálica que revelou “otomastoidite bilateral com empiema epidural temporal
adjacente, sinusopatia esfenoidal direita e maxilar bilateral”, tendo sido transferida para o Hospital
de Santa Maria, Lisboa.

Neste hospital a ressonância magnética realizada no dia seguinte revelou “sinais de otomastoidite
bilateralmente, com maior gravidade á esquerda, existindo deste lado lesão mastoideia (27x22x20
mm), que se associa a erosão óssea e extensão do processo inflamatório à fossa posterior – fina
lâmina de empiema e leptomeningite focal e incipiente edema do parênquima cerebeloso.

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Coexistência de trombose venosa nos terços médio e distal (sigmóide) do seio lateral esquerdo com
extensão à jugular”. Neste mesmo dia foi realizada intervenção cirúrgica pela otorrinolaringologia
com mastoidectomia esquerda, com drenagem da colecção purulenta do antro e remoção de abcesso
intramastoideu, com miringotomia e colocação de tubo transtimpânico à esquerda. À AB foi
adicionado o metronidazol.

Do D8 ao D13 esteve internada na Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos sem melhoria do


quadro clínico, tendo realizado revisão da mastoidectomia ao D10, com colocação de novo dreno e
timpanoplastia bilateral; a partir daí verificou-se melhoria ligeira do quadro com diminuição dos
sinais inflamatórios retro-auriculares e das cefaleias.

A repetição da TC crânio-encefálica foi realizada ao D15, já no internamento de infecciologia


pediátrica e que, em comparação com a TC anterior revelou “aumento da espessura da colecção
infectada extra-axial da fossa posterior à esquerda, adjacente à mastóide, com cerca de 7,6 mm de
maior diâmetro. Mantém ausência de preenchimento por contraste iodado do seio sigmóide e golfo
da jugular à esquerda – trombose venosa – sem lesões parenquimatosas isquémicas ou hemáticas de
novo. Mantém-se o espessamento dural da tenda do cerebelo à esquerda. Mantém-se preenchimento
por tecido de densidade de partes moles das cavidades otomastoideias com extensão á esquerda ao
pavilhão auricular e tecidos moles subcutâneos periauriculares”. A AB foi actualizada para
meropenem com vancomicina.

Ao D16 iniciou terapêutica com enoxaparina, com melhoria clínica nos dias subsequentes, e que
suspendeu após 12 dias de tratamento.

Ao vigésimo sétimo dia de doença iniciou quadro com novo pico febril (38,8ºC) e cervicalgia,
acompanhado analiticamente por subida da PCR para 5,9 mg/dL. A RM crânio-encefálica e cervical
realizada ao D28 mostrou “sinais de otomastoidite bilateral, persistindo colecção infecciosa extra-
axial – empiema – ao nível do ângulo ponto-cerebeloso esquerdo com cerca de 7 mm de espessura.
Não se observam sinais de trombose venosa sino-dural, documentando-se menor preenchimento do
seio sigmóide direito comparativamente ao contralateral. Após injecção endovenosa de produto de
contraste documenta-se a existência de processo infeccioso laterocervical cervical esquerdo,
envolvendo os espaços carotídeo e retrofaríngeo, com moldagem da via aérea. Não se observam
colecções abcedadas. Coexiste extensão do processo inflamatório ao espaço parafaríngeo e aos
planos musculares laterocervicais posteriores à esquerda.”

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Com o diagnóstico de abcesso de Bezold foi novamente realizada intervenção cirúrgica para revisão
da mastoidectomia.

Os isolamentos de hemocultura, biópsia e exsudado obtido no procedimento cirúrgico foram sempre


negativos para microrganismos aeróbios e anaeróbios. Realizou igualmente serologias (IgG e IgM)
para citomegalovirus que foram negativas.

A criança teve alta após 45 dias de doença e 39 de internamento. Em termos de AB, cumpriu 9 dias
de ceftriaxone, 39 dias de vancomicina, 8 dias de metronidazol e 31 de meropenem. Ficou com
acompanhamento periódico em consulta externa de infecciologia, otorrinolaringologia e
neurocirurgia.

Actualmente encontra-se bem, está a frequentar o jardim-de-infância, pratica actividade física (Ballet
e ginástica), sem dificuldade e não apresenta alterações aparentes no comportamento, função
neurológica e aprendizagem.

O timpanograma de 21/07/2015 revela hipoacusia de transmissão do ouvido esquerdo para as


frequências agudas. A RM de 22/4/2015 não apresenta alterações significativas.

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Discussão

O caso clínico descrito torna-se relevante neste contexto, pois as CIC da OMA são um
acontecimento raro, principalmente após o uso por rotina de AB na prática médica, mais ainda
complicações múltiplas, numa criança do sexo feminino, com mais de 2 anos de idade e não
prematura, ou seja, sem os principais factores de risco descritos na literatura.

Neste caso clínico apresentamos uma criança do género feminino, de 5 anos, sem antecedentes
pessoais relevantes e com a primeira manifestação de doença otológica – OMA – acompanhada de
febre, vómitos e cefaleias desde o início do quadro. NA evolução da doença apresentou
otomastoidite bilateral, com extensão à fossa posterior, empiema epidural e leptomeningite temporal,
trombose do seio lateral esquerdo, empiema do ângulo ponto-cerebeloso e abcesso de Bezold.

Para começar com a apresentação clínica do caso, é de realçar que as manifestações iniciais não eram
otológicas, como está descrito na literatura para o diagnóstico de OMA, sendo o quadro dominado
por sintomas constitucionais – febre alta e persistente e vómitos – e logo ao terceiro dia de doença
por diarreia, recusa alimentar e cefaleias. Por um lado, estes sintomas mais inespecíficos seriam mais
expectáveis em crianças em idade pré-verbal e, por outro, as cefaleias praticamente desde o início do
quadro indicam uma apresentação pouco comum de OMA.

Apesar de a otalgia ser útil no diagnóstico de OMA, esta está presente apenas em 50% a 60% das
crianças com OMA (Rothman, R. 2003), estando ausente neste caso. Os vómitos, diarreia e recusa
alimentar podem estar presentes na OMA, mas numa proporção mais baixa de crianças, as cefaleias
não estão descritas como sintoma inicial em vários ensaios (Spiro, D. 2006 Liese, J. 2014), logo
devem-nos por na pista de uma complicação e ser encaradas como um sinal de alerta (Osborn, A.
2011). No entanto, a apresentação das complicações da OMA, nomeadamente da MA e suas CIC tem
habitualmente um curso mais prolongado, de 1-2 semanas de início insidioso de sintomas
neurológicos (Osborn, A. 2011), o que está frequentemente, em vários estudos observacionais,
associado à toma prévia de AB, que pode prolongar a duração e mascarar os sintomas de MA, sendo
necessário um elevado índice de suspeição clínica. (Groth, A. 2012). As cefaleias também não são
um sintoma muito descrito em séries de doentes com MA, estando presentes em 9% dos casos do
estudo de Hongisto, A. (2014).

Assim uma complicação não seria expectável, uma vez que raramente tem um início agudo, sendo
que inclusivamente a cerca de metade dos casos de MA apresenta uma história recente de OMA que
resolveu com AB, o que não se verificou neste caso (Osborn, A. 2011). Em vários estudos

14
retrospectivos a percentagem de crianças com MA e história prévia de OMA é muito variável, desde
72% com OMA prévia no estudo de Marchisio, P. (2014), 56% no estudo português de Spratley, J.
55% no trabalho de Hongisto, A. (2014) a 10% no trabalho suéco de Groth, A. Por outro lado, nestes
estudos, as restantes crianças apresentaram-se inicialmente com suspeita de doença avançada, já com
sinais de MA, o que foi igualmente frequente.

Os dados em relação à idade também não são lineares, com diferenças entre os estudos. No entanto, é
nas crianças mais novas, abaixo dos 2 anos, que a maioria dos estudos indica que a MA foi o 1º sinal
de doença do ouvido, nomeadamente no estudo de Groth, A, sendo a principal explicação a
imaturidade do sistema imunitário e o facto de as células mastoideias serem mais pequenas com
menos área de defesas imunes. No caso descrito neste trabalho, temos uma criança de 5 anos, em que
um nível tão avançado de doença já não seria tão expectável.

Também neste estudo de Groth, A., a maior parte dos casos de MA não ocorreu em doentes com
tendência a otites de repetição, o que se verifica neste caso clínico em que temos uma criança sem
antecedentes de OMA.

De realçar que apesar disso, no estudo já referido, retrospectivo na Suécia, com 678 casos de MA,
um dos maiores até à data, 57% das crianças não tinham nenhum episódio de OMA previamente ao
diagnóstico de MA (Groth, A. 2012).

Assim, na apresentação clínica os sintomas não são preditivos de OMA neste caso clínico (Rothman,
R. 2003), tendo esta sido diagnosticada pela observação da membrana timpânica. E, apesar de
existirem alguns aspectos que nos levem a pensar numa complicação de OMA, temos igualmente
várias variáveis contra esta hipótese.

De realçar que a apresentação mais frequente de CIC supurativas inclui cefaleias, vómitos e febre
(Bair-Merritt, 2007), o que se verificou neste caso.

O índice de suspeição de uma complicação intracraniana neste contexto, apesar de tudo, deve ser
alto, pois comportam uma mortalidade entre os relativamente elevada (na era pré-AB chegava aos
50% a 100%) apesar da baixa prevalência (podem ocorrer em 5% a 15% dos casos de MA) (Osborn,
A. 2011) e incidência - 0,13-1,97% (Izuzquiza, R. 2015).

O estudo Suéco de 2012 de Groth, A. e colaboradores, já citado, sendo uma das maiores séries
restrospectivas com 678 crianças com MA, revela uma prevalência de 2% de complicações extra-
cranianas e 2% de CIC., sendo que ambas foram mais prevalentes em crianças mais velhas (8 aos 16

15
anos). A complicação mais frequente foi o abcesso subperiósteo, em 20% dos casos de MA; a
complicação extra-craniana mais frequente – 1% dos casos – foi o abcesso da parede posterior do
canal auditivo. As CIC reportadas foram a trombose venosa, meningite, abcesso epidural, fístula de
liquor e aumento da pressão intra-craniana, não estando referidas complicações em simultâneo. A
mastoidectomia foi realizada em 24% dos casos. As sequelas foram muito raras, estando descritas em
3 casos (2 casos de surdez neurossensorial e 1 caso de luxação da bigorna). Não foram reportados
casos de mortalidade.

Num estudo Italiano, mais recente de Marchisio, P., com 913 crianças com MA, houve uma taxa de
complicações de 7,6%, sem diferenças entre grupos etários, sendo a sua distribuição: 2,4% trombose
do seio homolateral, 1,8% paralisia do nervo facial, 0,5% abcesso intracraniano e 0,3% meningite.

No caso descrito neste trabalho, além da MA ser bilateral, o que por si só é raro, estando descrito
apenas em 2 crianças do trabalho referido anteriormente de Groth, A., temos múltiplas CIC –
meningite otogénica, empiema subdural e TSL – e uma outra complicação rara extracraniana –
abcesso de Bezold, que, pela sua raridade, merecem uma breve descrição dos achados na literatura.

Por outro lado, vários trabalhos indicam que estas são mais prevalentes associadas à otite média
crónica do que à OMA, com uma proporção de 9,2:1 (Penido, N. 2005), por estarem associadas à
otite com colesteatoma.

As CIC ocorrem por extensão directa da infecção otogénica ou por via hematogénica, pela
tromboflebite das veias entre os seios venosos e a dura-máter. A literatura sugere que a sinusite
frontal leva mais provavelmente a estas complicações que a sinusite maxilar, etmoidal ou esfenoidal,
por a dura-máter ser menos aderente nesta cavidade; no caso descrito a OMA ocorreu com sinusite
esfenoidal e maxilar (Bair-Merritt, 2007).

A meningite otogénica hoje-em-dia é, das CIC da OMA, menos frequente que o abcesso
intracraniano e a TSL e manifesta-se por sinais meníngeos e febre alta (Osborn, A. 2011). A
incidência de meningite secundária a OMA é 0,42/100000 casos (Atkinson, H. 2015). A explicação
da diminuição da sua prevalência é atribuída às elevadas taxas de implementação da vacinas contra o
Haemophilus influenza (Hib) e Streptoccocus pneumoniae (PVC7). A punção lombar faz o
diagnóstico de meningite (presença de leucócitos e hipoglicorráquia) e o diagnóstico diferencial com
hidrocéfalo otogénico.

Slovik e colaboradores propõem a seguinte conduta nos casos de meningite otogénica: todos os casos
devem ser referenciados a um especialista de otorrinolaringologia para documentar a existência de

16
otite ou sinusite, o tratamento principal é com AB, a miringotomia e a pesquisa do microrganismo
envolvido deve ser realizada em todos os casos, a cirurgia é provavelmente necessária se houver
falência à terapêutica com AB às 48 horas, a TC de alta resolução é recomendada em todos os
doentes com tratamento conservador para determinar a necessidade de cirurgia (Slovik, K. 2007).

De facto, em vários estudos observacionais, o abcesso intracraniano é mais prevalente que a


meningite otogénica (Go, C. 2000; Mattos, J. 2014) e pode ser epidural, subdural ou
intraparenquimatoso. No empiema subdural (que ocorreu no caso clínico) e abcesso
intraparenquimotoso, além da apresentação clínica típica dos abcessos intracranianos com cefaleias,
febre, otalgia e otorreia, pode também ocorrer alteração do estado de consciência, convulsões,
náuseas e vómitos, o que mais uma vez chama a atenção para a apresentação do caso aqui descrito.

Tendo em consideração a origem otológica destes abcessos, a sua localização é quase sempre
adjacente ao osso temporal e quase exclusivamente no lobo temporal e cerebelo, o que é indicativo
de uma extensão da infecção como processo fisiopatológico, pela erosão e lesões osteolíticas do osso
temporal (Penido, N. 2005).

Nestes casos, além do tratamento com AB, deve ser realizada mastoidectomia, de modo a controlar o
foco infeccioso (Osborn, A. 2011). No caso apresentado, o diagnóstico por ressonância magnética de
abcesso epidural foi acompanhado de otorreia abundante (além dos sintomas já presentes e que se
mantiveram e que não cederam ao tratamento com AB) e foi seguida de mastoidectomia com
drenagem do abcesso intramastoideu. Pela fisiopatologia a drenagem através da mastóide é
normalmente suficiente, não sendo necessária uma craniotomia adicional (Penido, N. 2005).

Nos casos de abcesso intracraniano, não é desprezível a possibilidade de ocorrência de sequelas,


como disfunção vestibular, hipoacusia neurossensorial, disfunção dos pares cranianos, encefalopatia
e paralisia (Osborn, A. 2011).

Em relação à TSL, Penido e colaboradores levantam a hipótese de se tratar de uma complicação


subestimada, uma vez que os doentes com esta complicação seguem um curso clínico com
manifestações pouco exuberantes e geralmente com outras CIC concomitantes. Além disso, neste
estudo os autores apenas diagnosticaram esta complicação na sequência de TC realizada para
controlo de outras CIC (Penido, N. 2005).

A TSL trata-se de uma complicação rara, tendo ocorrido apenas em 2,4% dos casos com
complicações de MA do trabalho de Marchisio, P. e em dois casos do estudo português de Spratley,
J. Apesar de a sua incidência estar a diminuir pelo uso de AB, a mortalidade permanece nos 10%,

17
com cerca de 15% dos casos a permanecerem com sequelas, nomeadamente alteração da função
cognitiva ou motora persistente (Novoa, E. 2013).

O uso de AB pode igualmente ser responsável pela variabilidade de sintomas que acompanham esta
complicação, como os picos febris, mal-estar geral, cefaleia severa e otalgia. Por estes motivos a
TSL deve ser activamente procurada por exames de imagem nas crianças com MA (Novoa, E. 2013).

A trombose tipicamente tem início no seio sigmóide pela sua proximidade à mastóide, que é
particularmente vulnerável a alterações inflamatórias, e desenvolve-se por extensão da infecção. À
medida que este processo ocorre, o trombo pode propagar-se a outros seios venosos e à veia jugular
interna (Bales, C. 2013). Assim, o trabalho de Novoa, E. e colaboradores explorou algumas causas
pró-trombóticas, nomeadamente a pré-disposição pró-trombótica, através da análise do factor V, da
mutação do factor V de Leiden e dos factores VIII, XI e XII, tendo sugerido que o seu papel, apesar
de pouco significativo, não pode ser descartado. Também o papel pró-trombótico dos agentes
patogénicos poderá ter um papel, mas que ainda não está completamente esclarecido (Novoa, E.
2013).

Em último grau, a extensão deste processo fisiopatológico, pode obstruir a drenagem do líquido
cefalo-raquidiano, levando ao aumento da pressão intracraniana e hidrocéfalo associado.

No caso apresentado, onde dominam os sintomas neurológicos, é difícil atribuirmos a cada


complicação um sintoma; sendo o conjunto dos sintomas importantes para a suspeita de CIC neste
caso, logo desde a sua apresentação ao 3º dia de doença. Esta apresentação com cefaleias, vómitos,
mal-estar geral, fotofobia e rigidez da nuca, contudo, é consistente com o estudo de Bales, C. e
colaboradores, que apresentam uma série de 13 doentes pediátricos com TSL nos Estados Unidos.

O diagnóstico da TSL deve ser feito com TC com contraste ou ressonância magnética. O tratamento
é, ainda, muito discutido, devido ao baixo número de doentes com esta complicação. No entanto, é
aceite que a anti-coagulação é segura em pediatria, deve fazer parte do tratamento e poderá estar
associada a diminuição do risco de sequelas e da mortalidade (Novoa, E. 2013, Bales, C. 2009).
Além do tratamento médico, a maioria dos autores assume que o tratamento cirúrgico tem também
um papel importante, nomeadamente a mastoidectomia com inserção de tubos de ventilação (Novoa,
E. 2013).

De realçar dois aspectos em relação às CIC da OMA e da MA otogénica:

18
- A imagiologia apesar de dados discordantes, tem um papel fundamental no diagnóstico de MA e
especialmente na suspeita de uma complicação uma vez que não é possível definir um índice de
suspeição baseado na evidência clínica para as CIC em doentes com MA. Assim, um exame de
imagem – TC ou RM – em conformidade com a apresentação clínica é mandatório (Luntz, M. 2012).
Sinais e sintomas que requerem avaliação rápida por TC incluem otalgia e febre persistente apesar da
AB, letargia, cefaleia e vómitos (Spratley, J. 2000). Na MA, a TC deve ser realizada a doentes com
sinais neurológicos, suspeição de colesteatoma ou estado geral deteriorado à admissão, em doentes
cujo estado clínico não melhore ou piore enquanto recebem tratamento conservador e em doentes em
que se suspeite de uma CIC (Chesney, J. 2014)

- O tratamento das complicações pode ser médico e/ou cirúrgico. O tratamento médico deve passar
por AB de largo espectro, tendo sido vastamente suportado por cefalosporinas de terceira geração
(Marchisio, P. 2014; Groth, A. 2012). Na presença de TSL deve ser feita cobertura de anaeróbios
com metronidazol (Osbor, O. 2011). O tratamento cirúrgico descrito pode ser mínimo (AB com
miringotomia), moderado (AB com miringotomia e drenagem de abcesso subperiósteo) ou agressivo
(AB com mastoidectomia) (Spratley, J. 2000), havendo também pouco consenso em relação às
indicações para cada tipo. A flutuação poderá ser um preditor de mastoidectomia (Kvestad, E. 2000);
Para crianças mais novas e com CIC a mastoidectomia deve ser o tratamento de referência e o
tratamento conservador do abcesso subperiósteo pode ser usado em crianças com mais de 6 anos sem
CIC (Gorphe, P. 2012).

O abcesso de Bezold é, igualmente, uma condição rara nos dias de hoje. A fisiopatologia foi descrita
em 1881 por Friedrich Bezold e consiste na extensão da colecção purulenta presente na MA, pela
apófise mastoideia, através da incisura do digástrico e que se espalha entre os músculos digástrico e
esternocleidomastoideu (Spiegel, J. 1998, McMullan, B. 2009). Este abcesso pode ainda complicar-
se com a extensão da infecção ao longo dos grandes vassos, podendo atingir o espaço perivisceral, a
laringe, o espaço retrofaríngeo, triangulo posterior do pescoço, espaço supraesternal e mediastino
(Marioni, G. 2001). O risco de expansão da infecção está relacionado com a pneumatização da
mastóide, que aumenta o risco de desenvolvimento deste tipo de abcesso e, portanto, é mais
frequente em crianças mais velhas e adultos em que a pneumatização já se encontra completa
(Nelson, D. 2013).

Na literatura estão descritos 35 casos entre 1967 e 2001 (Marioni, G. 2001) e 18 casos não
sobreponíveis na literatura Japonesa (Nelson, D. 2013). Dos 35 casos, apenas 5 ocorreram em

19
crianças abaixo dos 5 anos. Foi encontrado ainda nesta revisão um caso numa criança de 18 meses
(Marioni, G. 2001), numa de 8 anos (McMullan, B. 2009) e numa de 12 anos (Nelson, D. 2013).

A apresentação clínica no primeiro e terceiro casos foi com tumefacção da região cervical e o
segundo com cervicalgia, tal como no presente caso.

Estes casos ocorreram no contexto de OMA e com MA como complicação; em apenas um deles se
verificou otomastoidite bilateral e concomitantemente verificou-se uma CIC que foi a TSL à direita
(McMullan, B. 2009).

Na literatura encontram-se descritos muito poucos casos de complicações múltiplas intracranianas,


tendo sido apenas encontrado um caso semelhante ao descrito neste trabalho. Este caso foi descrito
por Van Munster, M. e colaboradores e diz respeito a uma criança de 3 anos, diagnosticada com
OMA, complicada com MA, trombose do seio venoso, meningite e empiema cerebelar. À
apresentação clínica é de destacar a presença de OMA tratada com amoxicilina e 2 semanas após
com recorrência da febre, início de vómitos e “movimentos anormais do olho esquerdo” e marcha
vacilante. O tratamento realizado foi AB de largo espectro com ceftriaxone, desametasona,
anticoagulação, mastoidectomia e trombectomia. O exame de imagem realizado foi a TC e não
resultaram sequelas (Van Munster, M. 2013)

Uma descrição mais detalhada dos principais estudos observacionais relativos às CIC da OMA pode
ser encontrada no Anexo 2.

Apesar das exuberantes manifestações infecciosas, não foi isolado agente neste caso. Nos principais
estudos já citados, verifica-se uma taxa elevada de não isolamento – 44% no estudo de Marchisio, P.
e 32% no estudo de Groth, A., sendo estas as maiores séries Europeias.

Assim, a descrição deste caso clínico tem valor pela complexidade da sua apresentação e raridade
dos diagnósticos colocados, sendo cada um individualmente pouco comum, e muito mais raramente
em simultâneo.

Em relação às sequelas, neste caso clínico destacamos a hipoacusia de transmissão do ouvido


esquerdo. Na literatura a taxa de sequelas na OMA e MA é baixa. A surdes de transmissão está mais
associada à OMC, e no caso da MA com as respectivas CIC, a principal preocupação são as sequelas
neurológicas.

No entanto, apesar desta sequela, a hipoacusia parece não ter impacto na qualidade de vida nem na
aprendizagem desta criança.

20
21
Conclusão

A OMA é das doenças mais frequentes em idade pediátrica. No entanto, exactamente pela sua
elevada frequência, e por ser das doenças com maior necessidade de AB, muitas vezes de largo
espectro, e no contexto actual de emergência de microrganismos resistentes, a conduta na OMA tem
sido grandemente analisada na literatura, nunca deixando de ser um tema actual.

É igualmente uma doença cm impacto considerável sobre as crianças e suas famílias, com sequelas
que não são desprezíveis.

Desde a actualização das recomendações em relação ao tratamento AB da OMA e da introdução por


rotina da vacina contra o S. pneumoniae, ambas as medidas em vigor na maioria dos países
Europeus, muito se tem especulado sobre o seu impacto nas complicações da OMA. Apesar de
alguma controvérsia, de modo geral, parece não ter havido um impacto negativo, com manutenção
das taxas de incidência de complicações, que se mantém muito baixo e com vantagens claras na
redução do uso de AB. Muito tem também sido discutido noutros artigos a respeito das resistências
aos AB, da emergência de estirpes resistentes e da possível falta de opções terapêuticas neste
contexto. Assim, o facto de ser possível o protelamento da terapêutica com AB na OMA, sem
aumentar o risco de complicações, parece ser uma medida promissora com impacto importante em
termos de saúde pública.

Apesar de não estarem relacionadas com o tratamento AB prévio, e de serem raras, as complicações
da OMA podem ser graves e acarretam risco de sequelas e de mortalidade importante. Nas idades
mais jovens devemos, ainda assim, suspeitar e estar mais atentos a casos de doença mais grave e de
progressão para complicações, uma vez que a apresentação clínica pode não ser esclarecedora.

Havendo falta de consenso tanto no diagnóstico de MA, como das CIC, a TC desempenha um papel
importante em casos de suspeita e de evolução clínica não favorável, sendo que a RM poderá vir a
ter um papel crescente, devido à preocupação de exposição a radiações de crianças tão jovens.

É importante manter a investigação nesta área, de modo a estabelecer critérios de diagnóstico da


MA, para que possam ser identificados factores de risco e de prognóstico, no sentido de identificar
uma conduta médica mais efectiva.

22
Agradecimentos

Gostaria de agradecer sobretudo a quem me acompanhou nesta jornada do curso de Medicina e que
espero que me acompanhe nos desafios futuros desta profissão.

Agradeço ao Professor Doutor Augusto Cassul, pelo acompanhamento constante na realização desta
Tese.

Ao Professor Doutor Óscar Dias, pela escolha deste tema e deste caso clínico, de extremo interesse, e
pela dedicação à disciplina de que é regente na Faculdade de Medicina de Lisboa.

Um agradecimento muito especial à criança mencionada neste trabalho, uma menina cheia de
coragem, que relatou o que lhe aconteceu e aos seus pais, por darem autorização e por apoiarem a
realização do presente trabalho, e a quem desejo as maiores felicidades.

23
Bibliografia
Apresentada por ordem alfabética

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28
Anexo 1
Algoritmo de tratamento da mastoidite aguda

29
MASTOIDITE AGUDA

Suspeita de complicação Não complicada Abcesso subperiósteo


intracraniana

Admissão
Exame imagem (-)

(+) Miringotomia + Miringotomia +


Antibióticos ev Drenagem +
Antibióticos ev

Miringotomia +
Mastoidectomia simples +
Antibióticos ev Boa resposta Má resposta Boa resposta

3 -5 dias
Mastoidectomia simples

Normalmente
≥ 1 semana
CURA – ALTA

* Adaptado de Chesney et al.: What Is the Best Practice for Acute Mastoiditis in Children?

30
Anexo 2
Principais estudos observacionais de Complicações Intracranianas de Otite Média Aguda

31
Resumo de Estudos observacionais – COMPLICAÇÕES INTRA-CRANIANAS DE OMA E MA

Estudo Local Caracterização História e Sintomas e Complicações Tratamento Observações /


demográfica Antecedentes Achados Discussão
Mattos, J. EUA 109 doentes - 53,3% tinham - 33% S. - 86% mastoidites - 56% receberam AB As complicações
Int J Ped Oto 1998-2013 51% rapazes história de OMA pneumoniae, - 38% abcesso previamente à admissão são incomuns mas
2014 Retrospectivo documentada 55% dos quais subperiosteo - 10% tratamento médico podem ter sérias
- Sintomas mais eram multi- -16,7% paralisia do - 31% miringotomia + AB consequências
frequentes: febre, resistentes nervo facial ev Febre e otalgia
otalgia, otorreia, - 100% - TC - 8,3% TSL - 97,5% dos abcessos foram os sintomas
infecção - 7,4% abcesso epidural subperiósteos foram tratados mais comuns
respiratória - Outras (<2%) – com mastoidectomia, tal associados à
superior, papiledema, aumento da como 8/10 doentes com apresentação de
irritabilidade, PIC, hidrocéfalo abcesso epidural (também uma complicação
paralisia facial e otogénico, síndrome de incisão e drenagem do
dor retroauricular gradenigo, paralisia do abcesso)
VI par, petrosite, fístula
labiríntica, abcesso pós-
auricular, hipoacusia
neurossensorial, enfarte
cerebelar, meningite e
empiema subdural
Wu, J. China 285 Apenas 12 casos 253 dos 285 tiveram A maioria dos
Acta Oto- 1987-2008 42,5% dos quais de OMA, 10 dos apenas 1 complicação casos foram de
Laryngologica < 20 anos quais em crianças OMC e
2012 com < 11 anos colesteatoma
Pellegrini, S. Argentina 17 doentes 47% estavam a - 3 tinham - 52.9% MA - 100% AB ev A resolução das
Acta 2008-2009 1-152 meses receber AB para febre - 41.2% labirintite - 16/17 – miringotomia complicações
Otorrinolaringol 30% < 12 meses OMA - 1 tinha - 5.9% paralisia facial - 3/17 drenagem de abcesso requer tratamento
Esp cefaleia - 17.6% CIC (2 TSL e 1 subperiósteo cirurgico
2012 - 3 tinham meningite) - 2/17 -
otalgia - Sequelas: 1 caso timpanomastoidectomia
surdez neurossensorial
Penido, N. Brasil 33 casos Febre persistente - 58% mais que uma - 17 casos com craniotomia
Oto Head and 1987-2002 6M-79 anos Cefaleia CIC e drenagem de abcesso (12
Neck Surg Retrospectivo Sem diferença de Otorreia purulenta 26 casos abcesso dos quais mastoidectomia
2005 género Proteus mirabilis, cerebral subsequente por abcesso
66% < 25 anos Enterococos e P. 21 casos meningite recorrente)
aeruginosa 5 casos de TSL - 10 casos mastoidectomia
2 casos empiema aberta e drenagem
subdural - 8 casos mastoidectomia
1 caso empiema aberta
epidural - 2 casos mastoidectomia
1 caso meningocelo fechada
- 66% sem sequelas
- 24% sequelas
- 9% morreram
Go, C. EUA 118 crianças com 10 dias de AB a Otorreia - 3 casos TSL - 100% com AB ev Não
Int J Ped Oto 1986-1998 MA– só 6,8% 87% dos doentes persistente e/ou
- 2 casos abcesso - Mastoidectomia total em documentaram
2000 Retrospectivo tiveram CIC (8 com CIC otalgia em epidural todos os doentes e colocação aumento das CIC
doentes) todos - 2 casos de TSL + de TTT a 7/8 Cefaleias e
20 meses – 14 Febre e otalgia
abcesso epidural alteração do
anos (62%) - 1 caso TSL + estado de
Cefaleia (50%)
meningite consciência não
Otorreia (25%) estão
- 25% normalmente
S.pneumoniae presentes na MA
TC a todos os e devem alertar
doentes para CIC
AB – Antibiótico; CIC – Complicações intra-cranianas; MA – Mastoidite Aguda; OMA – Otite Média Aguda TC – Tomografia Computorizada; TSL – Trombose do Seio
Lateral; TTT – Tubo Transtimpânico

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