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Aspectos Conceituais do Psicodiagnóstico

Conteudista: Prof.ª Dra. Regiane Ribeiro de Aquino Serralheiro


Revisão Textual: Prof.a Dra. Selma Aparecida Cesarin

Objetivos da Unidade:

Compreender a importância do Processo Psicodiagnóstico clínico;

Discutir as possibilidades teóricas e técnicas do Psicodiagnóstico;

Reconhecer as aplicações e limites do Processo Psicodiagnóstico.

📄 Contextualização
📄 Material Teórico
📄 Material Complementar
📄 Referências
📄 Contextualização
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A área de avaliação psicológica tem importância significativa no Brasil e no mundo. No Brasil, foi
regulamentada como atividade privativa do Psicólogo, de acordo com a Lei 4.119, de 27 de agosto de 1962
(BRASIL, 1962), que considera a utilização de métodos e técnicas psicológicas usadas para diagnóstico
psicológico, orientação, seleção profissional e orientação psicológica entre outras atividades.

Figura 1 – Simulação de atendimento psicológico


Fonte: Freepik
#ParaTodosVerem: foto de duas pessoas uma em frente à outra, em que uma delas
segura uma prancheta nas mãos, fazendo anotações, e a outra se encontra deitada em
um sofá. Fim da descrição

O Conselho Federal de Psicologia define que o uso dos métodos e das técnicas em avaliação psicológica
são privativos dos psicólogos. É um processo estruturado que investiga fenômenos psicológicos no âmbito
individual, grupal ou institucional, com condições e finalidades específicas, de acordo com as demandas
apresentadas, e tem como objetivo oferecer informações que auxiliem na tomada de decisão (CONSELHO
FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2022).

A avaliação psicológica sofreu críticas em sua história por ter sido utilizada como produtora de exclusão
social (PATTO, 1997) e, atualmente as questões acerca da função da avaliação e do Psicodiagnóstico, do
ponto de vista ético, abrangem quais os benefícios para aqueles que solicitam, visto que, atualmente, a
patologização se tornou banalizada e os autodiagnósticos têm sido observados (OLIVEIRA; SAMICO, 2019).

Dessa maneira, torna-se fundamental reafirmar o compromisso da Psicologia com a Sociedade,


estimulando o desenvolvimento da prática ética, do compromisso social e dos avanços na formação
profissional.

Algumas questões norteadoras são:

Quais os principais desafios do profissional que realiza Psicodiagnóstico?

O que é necessário considerar para garantir uma prática adequada, consistente e ética?

Para o profissional que irá realizar atividades avaliativas e psicodiagnósticas, o que é


fundamental na formação do psicólogo?

Nesta Unidade, veremos os fundamentos do Processo Psicodiagnóstico, sua importância, seus limites e
sua abrangência.
📄 Material Teórico
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Introdução
Antes de definirmos o Processo Psicodiagnóstico, destacaremos alguns pontos históricos e relevantes para
fundamentar nossa discussão sobre o tema.

Cunha (2003) considera que a Avaliação Psicológica é um conceito amplo, enquanto o Psicodiagnóstico

trata-se de uma avaliação com propósitos clínicos, o que não inclui todos os modelos que avaliam
diferenças individuais. Trata-se de uma investigação das forças e das fraquezas no funcionamento
psicológico, observando a existência ou não de psicopatologia.

As raízes da testagem são bem antigas e há registros de que, em 2200 a.C., na China, já se fazia uso de

testes para avaliação no Serviço Público. Em relação à origem do Processo Psicodiagnóstico, tal prática
derivou da Psicologia Clínica de Lighter Witmer, em 1896, a partir das tradições da Psicologia Acadêmica e
das influências da Medicina na identidade profissional do Psicólogo.

Mas foi no final do século XIX e início do XX, com os trabalhos de Galton, com o estudo das diferenças
individuais, e com Cattel, com as primeiras provas denominadas testes mentais, e com as contribuições de
Binet, que propõe o uso de exame psicológico para a avaliação de medidas intelectuais associadas à
avaliação pedagógica de crianças que o Psicodiagnóstico se desenvolve (CUNHA, 2003).

A partir das escalas Binet, a tradição psicométrica se desenvolve e possibilita a criação dos testes Army

Alfa e Army Beta, utilizados no exército americano, em 1917, por Robert Yerkes, bem como as contribuições
nosológicas de Emil Kraeplin e de Freud, no início do século XX.
Saiba Mais
Nosologia é um ramo da Medicina e significa classificação de doenças.

São as contribuições de Freud para o dinamismo psíquico que inauguraram uma nova forma de
compreender os indivíduos. Com o teste de Jung de Associação de Palavras, em 1906, surgem outras
técnicas projetivas como o Rorschach, em 1921, o Teste de Apercepção Temática – TAT, em 1935, ainda
amplamente utilizados.

Apesar do grande interesse nos testes projetivos, eles sofreram certo declínio com o surgimento de outras
formas de investigação, como os inventários e as baterias de origem psicométrica. Nos últimos anos, houve
grande desenvolvimento dos testes psicológicos no Brasil, principalmente, a partir de 2003, com a criação
do Sistema de Avaliação dos Testes Psicológicos – SATEPSI, com a proposta de avaliar a qualidade
técnico-científica dos instrumentos, considerando parâmetros internacionais, para os profissionais e a
comunidade (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2022).

A preocupação com os critérios científicos dos instrumentos passa a ser vista como forma de garantir a
qualidade do trabalho profissional, a avaliação psicológica e o Processo Psicodiagnóstico.
Saiba Mais
A palavra diagnóstico deriva do grego diagnõstikós, que significa faculdade de

conhecer, ver através de, discernimento.

Psicodiagnóstico – Definição
O Psicodiagnóstico é considerado uma prática bem delimitada, com o objetivo de alcançar descrição e
compreensão a mais completa possível da personalidade do paciente ou do grupo familiar. Envolve

aspectos pretéritos, presentes – que envolve o diagnóstico – e futuros, que abarcam o prognóstico. Após a
compreensão completa do caso, incluindo os aspectos adaptativos e patológicos, realiza-se o informe
descritivo e o encaminhamento adequado ao caso, se necessário psicoterapia etc. (OCAMPO et al., 1999).

O profissional Psicólogo, ao realizar um diagnóstico, utiliza observações, avaliações, interpretações


pautadas na sua compreensão e percepção dos fatos, experiências, informações levantadas e reflexões de
todo o fenômeno observado, para além do senso comum.

O Diagnóstico Psicológico teve como base os modelos médico, psicométrico e behaviorista. No modelo
médico, foram enfatizados os aspectos patológicos do indivíduo e as referências nosológicas. No modelo
psicométrico, foi estabelecido como campo exclusivo para a atuação do Psicólogo, para determinar a
capacidade intelectual de crianças, aptidões e dificuldades a partir do uso de testes e o modelo
behaviorista, a partir da compreensão de que o comportamento não seria inato e sim aprendido, sendo
portanto modificável, utiliza avaliações próprias, como levantamento de repertório ou análises do
comportamento (ANCONA-LOPEZ, 1984).

A Avaliação Psicológica Clínica, também conhecida como Psicodiagnóstico, é uma prática bastante comum
no Brasil, e parece ser mais comum quando o profissional faz uso de testes psicológicos. Mas será que
Psicodiagnóstico ocorre somente no uso de testes?
O uso de testes no Psicodiagnóstico, historicamente, parece ser bastante associado. Arzeno (1995)
considerou que o uso de testes é necessário para o Psicodiagnóstico e Cunha destacou que:

“ Psicodiagnóstico é um processo científico, limitado no tempo, que utiliza técnicas e

testes psicológicos (input), em nível individual ou não, seja para entender problemáticas à

luz de pressupostos teóricos, identificar e avaliar aspectos específicos, seja para

classificar o caso e prever seu curso possível, comunicando os resultados (output), na

base dos quais são propostas soluções, se for o caso.”

- CUNHA, 2003, p. 26

Krug, Trentini e Bandeira (2016) destacam que essa discussão é infrutífera, visto que o caráter diagnóstico
e investigativo é o que define o Psicodiagnóstico, e não o uso de instrumentos específicos.

O Conselho Federal considera que a avaliação psicológica compreende um processo estruturado de

investigação dos fenômenos psicológicos, que inclui métodos, técnicas e instrumentos, com o intuito de
oferecer informações à tomada de decisão, tanto em relação ao indivíduo, grupos ou instituições a partir das
demandas apresentadas (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2022).

Krug, Trentini e Bandeira defendem que a atividade prática de avaliação realizada por Psicólogos seja com
testes ou não, possa ser chamada de Psicodiagnóstico, pois entendem ser necessário incluir as diferentes
formas desse procedimento clínico de investigação, a partir de diferentes Teorias Psicológicas.

Os autores consideram, portanto, que:


“ O Psicodiagnóstico é um procedimento científico de investigação e intervenção clínica,

limitado no tempo, que emprega técnicas e/ou testes com o propósito de avaliar uma ou

mais características psicológicas, visando um diagnóstico psicológico (descritivo e/ou

dinâmico), construído à luz de uma orientação teórica que subsidia a compreensão da

situação avaliada, gerando uma ou mais indicações terapêuticas e encaminhamentos.”

- KRUG, TRENTINI E BANDEIRA, 2016, p. 27

De acordo com Cunha (2003) os objetivos do Psicodiagnóstico podem ser:

Classificação simples: comparação do comportamento do examinando com amostra de


condições demográficas equivalentes;

Descrição: identificação de forças e fraquezas acerca do desempenho do paciente;

Classificação nosológica: avaliação com base em critérios diagnósticos (DSM-V; CID-X);

Diagnóstico diferencial: investigação de irregularidades ou inconsistências do quadro de


sintomas para diferenciar nível de funcionamento ou natureza da patologia;

Avaliação compreensiva: determinar o nível de funcionamento da personalidade, funções


egóicas, insights, mecanismos de defesas e recursos adaptativos;

Entendimento dinâmico: pressupõe um nível mais elevado de inferência clínica, antecipa-se


ao processo terapêutico, fontes de dificuldades na terapia ou definição de foco terapêutico;

Prevenção: identificar precocemente problemas, riscos, forças e fraquezas egóicas,


capacidade para o enfrentamento de situações novas e estressantes;

Prognóstico: determinar o curso provável do caso;


Perícia forense: fornecer subsídios para questões de insanidade, exercício das funções do
cidadão, investigar incapacidades ou patologias que podem estar relacionadas ao
acometimento de infrações;

Figura 2 – Criança brincando com tinta: no Psicodiagnóstico


infantil, utilizamos muitos recursos lúdicos
Fonte: Freepik

#ParaTodosVerem: foto de uma criança com síndrome de down, com as palmas das
mãos cobertas por tinta colorida. As mãos estão na altura do rosto. Fim da descrição.

A perícia forense pode não ser considerada por alguns um Psicodiagnóstico, visto que o objetivo é
responder a questões legais, solicitadas por um juiz. Em muitos aspectos, a perícia na avaliação forense se
diferencia do contexto clínico e, por ser uma avaliação compulsória ou solicitada para responder a uma
questão jurídica, a presença de dissimulação e de simulação tornam a avaliação mais complexa. A
Resolução CFP 08/2010 dispõe sobre a atuação do Psicólogo como perito e Assistente Técnico no Poder
Judiciário.

O Psicodiagnóstico pode ser realizado com crianças, adolescentes, adultos e idosos. A preocupação com a
saúde mental na terceira idade vem aumentando, o que tem possibilitado instrumentos específicos para
serem utilizados em idosos, a fim de compreender sua capacidade cognitiva, afetiva, motora, sexual e social
e, nos casos de suspeita de demência, a avaliação neuropsicológica é de grande importância (MACHADO et
al., 2019).

No trabalho do Psicólogo Clínico, o diagnóstico pode ser compreendido como uma etapa que antecede à
Psicoterapia, vez que tende a buscar compreender quais são as dificuldades apresentadas pelo indivíduo,
seus recursos e quais são as intervenções adequadas para o caso. Entretanto, no modelo tradicional, não se
prevê intervenção, cabendo ao momento da devolutiva a orientação e a informação dos resultados, bem

como os encaminhamentos necessários. Além do modelo tradicional, temos o Psicodiagnóstico


compreensivo (TRINCA, 1984) o modelo interventivo (ANCONA LOPEZ, 1995, 2014).

Psicodiagnóstico Compreensivo
A proposta de um modelo compreensivo foi decorrente da necessidade de uma prática abrangente, que, no
diagnóstico psicológico, incluiria um conjunto de informações disponíveis, relevantes e significativas da
personalidade. Evita-se a unilateralidade ao buscar uma visão totalizadora do indivíduo, abrangendo as
dinâmicas intrapsíquicas, intrafamiliares e socioculturais (TRINCA, 1984).

Seus principais fatores estruturantes são: elucidar o significado das perturbações (compreender a função
das perturbações e os fatores inconscientes que a mantém), ênfase na dinâmica emocional inconsciente,
pautada na psicanálise, considerações de conjunto para o material clínico, ou seja, tudo que é relevante ao
caso e que interessa à elucidação do caso: entrevistas, observações, testes e outras técnicas de
investigação e aspectos da própria personalidade do profissional, para alcançar uma visão global do

paciente (TRINCA, 1984, TARDIVO, 2007).

A compreensão psicológica de uma visão globalizada do paciente conta com a interação na personalidade
de diferentes fatores:
Forças intrapsíquicas que não apenas se expressam no momento atual, mas marcam os
períodos evolutivos na vida do paciente;

Forças intrafamiliares que são decisivas em termos psicopatológicos


e patogênicos que influenciam o paciente, mas também podem ser
por ele determinados;

Forças socioculturais presentes nos dados básicos e que não devem ser negligenciadas.

No modelo compreensivo:

“ O terapeuta interage com o paciente de forma empática e obtém um conhecimento

profundo sobre seu funcionamento mental. Nos últimos anos, cada vez mais, os

profissionais da psicanálise se aproximam de seus pacientes tentando abstrair aspectos

de suas personalidades”

- MILANI et al., 2014, p.81

Winnicott (e suas consultas terapêuticas) é considerado precursor desse tipo de avaliação, em que, na
maioria dos casos, realizava interpretações e tratamento nas poucas entrevistas, a partir do clima de

confiança e da disponibilidade do paciente para as interpretações (MILANI et al., 2014).

Nas principais técnicas empregadas no diagnóstico compreensivo, além das entrevistas clínicas, testes,
anamnese e observação, estão o Jogo do Rabisco de Winnicott, observação lúdica ou hora de jogo proposto
por Aberastury e procedimento de Desenhos Histórias de Trinca (TRINCA, 1984).
Figura 3 – Foto das mãos de uma criança brincando
Fonte: Getty Images

#ParaTodosVerem: foto das mãos de uma criança brincando com um jogo de montar
peças para encaixe, com peças das cores azul, laranja, verde e vermelho. Fim da
descrição

Psicodiagnóstico Interventivo
O Processo Psicodiagnóstico dos aspectos da personalidade do indivíduo, com suas etapas bem definidas,

a partir do contato inicial e de entrevistas com o paciente, aplicação de testes e técnicas projetivas,
encerramento do processo, devolutiva oral e informe por escrito ao solicitante (OCAMPO et al., 1999) pode
suscitar no profissional muita angústia frente ao pouco intervalo de tempo que ele tem e a magnitude da
tarefa proposta (ANCONA-LOPEZ, 1995).

A pessoa/família que procura auxílio do Psicólogo o faz em um momento delicado de sua vida, no qual as
estratégias anteriores de resolução não foram bem-sucedidas e podem levar à expectativa de que o
profissional, no risco de uma relação assimétrica, tenha uma atitude passiva dos que procuram
esclarecimentos de sua atuação (ANCONA-LOPEZ, 1995).

A busca por ajuda favorece que o indivíduo entre em contato com suas próprias atitudes e auxilia a auto-
observação, e mesmo que já tenha um autodiagnóstico e busque sua confirmação, pressupõe-se a
importância da confiança depositada no profissional e na qualidade da relação bipessoal estabelecida
(ANCONA-LOPEZ, 1995; OCAMPO et al., 1999).

As atitudes presentes no paciente devem ser assinaladas, mas há divergências em relação à quando elas
devem ocorrer. Enquanto que para alguns ela deve surgir no Psicodiagnóstico diante de bloqueios,
paralisações ou momentos em que seja necessário retomar o objetivo da tarefa (OCAMPO et al., 1999), há
aqueles que que destacam que o processo é permeado de angústias e, muitas vezes, em serviço-escola
diante de uma fila de espera significativa, em que crianças são encaminhadas pelas Escolas, diante de
queixas de aprendizagem, a demora para serem atendidas, e o tempo empregado para a avaliação pode
incrementar angústias, pois mesmo que o encaminhamento seja o de Psicoterapia, novamente a espera
numa nova fila parecia contribuir pouco para mitigar a ansiedade e trazer benefícios mais imediatos para
pacientes e família (ANCONA-LOPEZ, 2014).

Diante desse cenário, a necessidade de fazer alguns apontamentos durante o processo favoreceria uma
compreensão mais ampla e um trabalho em conjunto com o avaliando. A conduta de realizar perguntas,
sugestões e comentários e assinalamentos já ocorre durante o processo e, ao mesmo tempo que amplia o
olhar do profissional, altera a qualidade do atendimento e possibilita observar com mais clareza os limites e
as possibilidades do paciente, e funcionaria também como devoluções parciais, que favorecem ao
avaliando uma melhor compreensão de si mesmo (ANCONA-LOPEZ, 2014; ANCONA-LOPEZ, 1995).

A visão clássica do Psicodiagnóstico sugere uma atitude neutra por parte do profissional, o que implica
certo distanciamento na relação. No entanto, no modelo interventivo, essa postura pode impedir que a
intervenção ocorra, já que, de qualquer maneira, ela ocorrerá, vez que a relação entre o cliente e o
profissional envolve sujeitos com suas subjetividades, que irão se inter-relacionar durante o processo. Ao
receber o cliente, caberá ao profissional clarear sua demanda e, dessa maneira, considerá-lo coparticipante
desse processo, ao mesmo tempo em que permitirá uma atitude flexível do profissional, inventiva e
responsável. Não se trata de igualar o Psicodiagnóstico ao Processo de Psicoterapia, mas reconhecer que é
um encontro privilegiado e significativo com o cliente (ANCONA-LOPEZ, 1984).
O Processo Psicodiagnóstico é considerado um momento de transição, em que o cliente encontrará
acolhida por suas dúvidas e sofrimentos. No caso de atendimento infantil, deve-se acolher os pais, explorar
as queixas trazidas e os sintomas apresentados pela criança, bem como compreendem a situação com o
filho e a própria postura em relação a ele. Se os pais não recebem orientações, apoio, motivação e não estão
empenhados para esse processo, pode contribuir para sua deserção (YEHIA, 2014).

Independentemente do modelo escolhido pelo profissional, se clássico, compreensivo ou interventivo,


destaca-se que toda a prática deverá ser acompanhada de uma teoria que sustente o caráter científico do
processo avaliativo, no qual os fenômenos estudados ocorrem por meio de técnicas e métodos
reconhecidos pela Ciência e respaldado pelas Teorias Psicológicas.

Além da qualidade dos instrumentos, o cuidado com a formação profissional é fundamental. O CFP destaca
que, no processo avaliativo, deve-se considerar o funcionamento global dos indivíduos, sua integralidade e

equidade e livres de conteúdos que possam ser discriminatórios ou estigmatizantes (CFP, 2022).

Formação Profissional e Cuidados Éticos


Realizar um Psicodiagnóstico exige do profissional Psicólogo habilidades desenvolvidas ao longo de sua

formação desde a Graduação, passando por Especializações, supervisão e experiência profissional.

Cabe ao Psicólogo avaliar com cuidado a demanda trazida ou a fonte de encaminhamento que, muitas
vezes, não tem clareza do que necessita exatamente, e é papel do profissional avaliar como deve atender
aquela demanda.

É necessário tecer objetivos daquele processo e considerar os aspectos éticos, além do preparo pessoal e
técnico, que considera dominar os conhecimentos específicos de avaliação e de áreas afins (Psicologia do
Desenvolvimento, Psicopatologia, Avaliação Psicológica, Estatística, Teorias da Personalidade, Processos
cognitivos e Pesquisa Científica entre outras). O preparo pessoal envolve seu processo terapêutico
individual, de preferência orientado na mesma base teórica que sustenta sua clínica, associado às
avaliações realizadas e supervisionadas por outro profissional mais experiente (BANDEIRA; TRENTINI;
KRUG, 2016).
No Psicodiagnóstico, deve-se avaliar com cuidado a demanda trazida ou a fonte de encaminhamento,
realizar considerações éticas e se favoráveis, tecer os objetivos para sua realização, levando em
consideração as habilidades do Psicólogo para realizar tal tarefa, a partir de uma formação sólida e

consistente, e com auxílio de uma prática supervisionada (BANDEIRA et al., 2016).

As questões éticas permeiam atenção ao que já foi publicado na Área, necessitando do profissional
acompanhamento constante das publicações científicas, das atualizações dos materiais avaliativos como
testes ou materiais complementares, bem como os princípios do Código de Ética do Psicólogo – CEP
(BANDEIRA et al., 2016; CFP 010/2005).

Além dos princípios presentes no CEP, atenção especial deverá ser dada às resoluções do CFP, como a
Resolução 001/2009, que dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental dos serviços psicológicos
prestados, Resolução 31/2022 que estabelece diretrizes para a realização da Avaliação Psicológica no
exercício profissional e a Resolução CFP 006/2019, que orienta sobre os documentos escritos.

Considerando a Demanda
O Processo Psicodiagnóstico e seu resultado dependem da demanda: suas questões e clareza. A demanda
é o primeiro desafio, pois nem sempre está clara e o paciente não consegue informar o que precisa ou
perceber o seu sofrimento. Muitas vezes, as demandas são genéricas e cabe ao profissional estabelecer
boas questões, visto que trata-se de um processo científico, no qual as hipóteses são imprescindíveis
(BANDEIRA et al., 2016).

Muitas vezes, as fontes encaminhadoras não são claras ou podem solicitar uma avaliação, quando o
atendimento psicoterápico possa ser mais urgente, em condições clínicas agudas, cujo objetivo, no caso, é
mitigar o sofrimento. Outras condições clínicas podem emergir no processo, que necessitará do Psicólogo a
relação com outros profissionais para um olhar global, evitando reducionismos e integrando aspectos
emocionais, cognitivos, físicos, motores e neurológicos (BANDEIRA et al., 2016).

Ao receber uma demanda para atendimento, caberá ao profissional avaliar a pertinência do caso, realizar
diagnóstico diferencial, identificar forças e fraquezas do paciente e rede de atenção, pautar a compreensão
do caso numa Teoria Psicológica e refletir sobre os encaminhamentos necessários e ou avaliações
complementares com outros profissionais (Fonoaudiólogo, Neurologistas e Psiquiatras entre outros). Ao
avaliar a demanda, caberá ao Psicólogo estabelecer o objetivo do Psicodiagnóstico, que irá nortear a
escolha das técnicas e ou instrumentos a serem utilizados (BANDEIRA et al., 2016)

Em Síntese
Nesta Unidade, vimos os aspectos históricos do Processo Psicodiagnóstico, sua definição e seus aspectos
éticos.

O Psicodiagnóstico é um processo científico, com começo, meio e fim. Tem como objetivo responder a
hipóteses levantadas a partir da demanda e utiliza técnicas e ou instrumentos psicológicos, para avaliar
uma ou mais características psicológicas. A avaliação deve ser global e considerar os aspectos descritivos
e dinâmicos do caso, sendo compreendido à luz de uma orientação teórica, que irá embasar o caso e os
devidos encaminhamentos que se fizerem necessários.

Discutimos que o Psicodiagnóstico pode ser no modelo clássico, em que se busca, por tempo limitado,
responder à demanda, não o tornando um processo terapêutico, porém, no decorrer da história, vimos
propostas de um modelo compreensivo, que pressupõe técnicas que permitem maior liberdade para o
material clínico, incluindo aspectos dinâmicos psíquicos intrafamiliares, socioculturais e do próprio
avaliando, com a proposta de compreensão global
Figura 4 – Mãe acompanhando o processo de seu filho
Fonte: Getty Images

#ParaTodosVerem: a imagem, vemos uma mãe com o filho sentado em seu colo no canto
direito da imagem, ao lado esquerdo está uma mulher vestindo calça jeans, camisa preta
e blazer amarelo, com uma prancheta em mãos, parece anotar o que a mãe fala. Fim da
descrição.

O modelo interventivo considera a importância de inserir família e avaliando no processo, ao orientá-los e


discutir todos os passos, bem como compreende que a família é corresponsável no trabalho, isto é, uma
situação de cooperação, em que se realiza um trabalho de focalização e ampliação, na busca de melhor
explicitar o significado dos fenômenos para os envolvidos.

Abordamos, também a necessidade de acompanhar as resoluções do Conselho Federal de Psicologia, bem


como os pressupostos do Código de Ética Profissional, além de acompanhar as produções científicas na
Área.
O Psicodiagnóstico, como atividade profissional do Psicólogo, exige formação consistente, estudo contínuo
e abordagem teórica que sustente a sua prática. Os cuidados com a formação e os cuidados com os
aspectos psíquicos da pessoa do Psicólogo também é fundamental para a realização da atividade
profissional adequada, bem como supervisão para desenvolver experiência.
📄 Material Complementar
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Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Vídeos

Live Sobre Avaliação Psicológica – Contexto Clínico e Justiça


O Conselho Federal de Psicologia, em 2021, realizou uma live sobre a avaliação psicológica no contexto
atual, seus limites e possibilidades de atuação
LIVE SOBRE AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA - CONTEXTO CLÍNICO E J…
J…

Leitura

Cartilha de Avaliação Psicológica do Conselho Federal de Psicologia,


2022
O Conselho Federal de Psicologia busca, por meio do material orientativo Cartilha de Avaliação Psicológica,
informar sobre o conceito de avaliação, limites, princípios éticos, competências do Psicólogo, critérios na
escolha das técnicas e dos instrumentos e discussão sobre avaliações compulsórias como na área do
trânsito e para manuseio de arma de fogo entre outras.

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ACESSE
Resolução CFP NR 008/2010
Dispõe sobre a atuação do Psicólogo como Perito e Assistente Técnico no Poder Judiciário

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ACESSE

Adolescência e Autolesão: uma Proposta Psicodiagnóstica


Compreensiva e Interventiva
Artigo científico que apresenta uma proposta de Psicodiagnóstico interventivo e compreensivo em um
estudo de caso de uma pré-adolescente com comportamentos autolesivos

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ACESSE
📄 Referências
Página 4 de 4

ANCONA-LOPEZ, M. (org.) Psicodiagnóstico: processo de intervenção. São Paulo: Cortez, 1995.

ANCONA-LOPEZ, M. Contexto Geral do Diagnóstico Psicológico. In: TRINCA, W. Diagnóstico psicológico:


prática clínica. São Paulo, EPU, 1984.

ANCONA-LOPEZ, S. (org.) Psicodiagnóstico interventivo: evolução de uma prática. São Paulo, Cortez, 2014.

ARZENO, M. E. G. Psicodiagnóstico Clínico: novas contribuições. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

BANDEIRA, D. R.; TRENTINI, C. M.; KRUG, J. S. Psicodiagnóstico: formação, cuidados éticos, avaliação de
demanda e estabelecimento de objetivos. In: HUTZ, Claudio Simon (org.). Psicodiagnóstico. Porto Alegre:
Artmed, 2016, p. 21 -25. (e-book)

BARBIERI, V. Psicodiagnóstico tradicional e interventivo: confronto de paradigmas? Psicologia: Teoria e

Pesquisa, [S.l.], v. 26, n. 3, p. 505-513, jul. 2010. Doi: <https://doi.org/10.1590/S0102-37722010000300013>.

BRASIL. Lei Nº 4.119, de 27 de agosto de 1962. Dispõe sobre os cursos de formação em psicologia e
regulamenta a profissão de psicólogo. Diário Oficial da União, 5 set. 1962.

CFP – CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução n° 010, de 21 de julho de 2005. Aprova o Código de
Ética Profissional do Psicólogo. Disponível em: <https://site.cfp.org.br/wp-
content/uploads/2005/07/resolucao2005_10.pdf>. Acesso em: 16/04/2023.
CFP – CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução nº 006, de 29 de março de 2019. Institui regras
para a elaboração de documentos escritos produzidos pela(o) psicóloga(o) no exercício profissional e
revoga a Resolução CFP nº 15/1996, a Resolução CFP nº 07/2003 e a Resolução CFP nº 04/2019. Disponível
em: <https://atosoficiais.com.br/cfp/resolucao-do-exercicio-profissional-n-6-2019-institui-regras-para-a-
elaboracao-de-documentos-escritos-produzidos-pela-o-psicologa-o-no-exercicio-profissional-e-revoga-a-
resolucao-cfp-no-15-1996-a-resolucao-cfp-no-07-2003-e-a-resolucao-cfp-no-04-2019?q=006/2019>. Acesso
em: 16/04/2023.

CFP – CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Cartilha Avaliação Psicológica. 3. ed. Brasília, 2022.
Disponível em: <https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2022/08/cartilha_avaliacao_psicologica-
2309.pdf>. Acesso em: 16/04/2023.

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução nº 001, de 30 de março de 2009. Dispõe sobre a


obrigatoriedade do registro documental decorrente da prestação de serviços psicológicos. Disponível em:
<https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2009/04/resolucao2009_01.pdf>. Acesso em: 16/04/2023.

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução nº 031, de 15 de março de 2022. Estabelece diretrizes


para a realização de Avaliação Psicológica no exercício profissional da psicóloga e do psicólogo,
regulamenta o Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos – SATEPSI e revoga a Resolução CFP nº
09/2018. Disponível em: <https://atosoficiais.com.br/cfp/resolucao-do-exercicio-profissional-n-31-2022-
estabelece-diretrizes-para-a-realizacao-de-avaliacao-psicologica-no-exercicio-profissional-da-psicologa-e-
do-psicologo-regulamenta-o-sistema-de-avaliacao-de-testes-psicologicos-satepsi-e-revoga-a-resolucao-
cfp-no-09-2018?origin=instituicao>. Acesso em: 16/04/2023.

CUNHA, J. A. Psicodiagnóstico-V. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2003.

KRUG, J. S., TRENTINI, C. M.; BANDEIRA, D. R. Conceituação de Psicodiagnóstico na Atualidade. In: HUTZ,
Claudio Simon (org.). Psicodiagnóstico. Porto Alegre: Artmed, 2016. p. 16-20. (e-book)

MACHADO, A. C. M. et al. Psicodiagnóstico: a importância da avaliação de sintomas demenciais em idosos.


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