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Constituinte Interrompida Menck
Constituinte Interrompida Menck
1823
A CONSTITUINTE
INTERROMPIDA
Obra comemorativa dos 200 anos da Assembleia Geral
Constituinte e Legislativa do Império do Brasil –
a primeira experiência parlamentar nacional
Secretário-Geral da Mesa
Luís Otávio Veríssimo Teixeira
Diretor-Geral
Celso de Barros Correia Neto
Câmara dos
Deputados
1823
A CONSTITUINTE
INTERROMPIDA
Obra comemorativa dos 200 anos da Assembleia Geral
Constituinte e Legislativa do Império do Brasil –
a primeira experiência parlamentar nacional
edições câmara
CÂMARA DOS DEPUTADOS
Diretoria-Geral: Celso de Barros Correia Neto
Consultoria-Geral: Wagner Primo Figueiredo Júnior
Consultoria Legislativa: Geraldo Magela Leite
Centro de Documentação e Informação: João Luiz Pereira Marciano
Coordenação Edições Câmara: Ana Lígia Mendes
2023, 1ª edição.
Linha Legado.
Introdução
A Constituinte interrompida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
Capítulo I
Convocação da Constituinte. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
Capítulo II
Abertura da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do
Império do Brasil. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
Capítulo III
Dos deputados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
Capítulo IV
Das proposições legislativas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
Capítulo V
Projeto de Constituição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
Capítulo VI
Dissolução da Constituinte. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121
Apêndice
Nominata dos deputados da Constituinte de 1823 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151
Anexos
Anexo I – Legislação referente às cortes convocadas no Rio de
Janeiro por D. João VI. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187
Anexo II – Legislação referente ao Conselho de
Procuradores‑Gerais das Províncias convocado por D. Pedro I . . . . . . . . 189
Anexo III – Legislação referente à Constituinte de 1823 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193
Anexo IV – Extrato dos Anais da Constituinte de 1823. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203
Anexo V – Projeto de Constituição para o Império do Brasil . . . . . . . . . . . . . . 251
Anexo VI – Documentos referentes à dissolução da Assembleia. . . . . . . . 279
Referências............................................................................................................................................................................ 287
9
APRESENTAÇÃO
Esta obra faz parte do ciclo de homenagens ao bicentenário da Câmara
dos Deputados, que ocorrerá em 2026. A primeira legislatura brasileira foi
instaurada no ano de 1826, em conformidade com a Constituição de 1824,
que estabeleceu uma monarquia constitucional representativa. Antes, no
entanto, em 1823, instaurou-se a primeira Assembleia Constituinte de
nossa história.
Fruto da pesquisa e do empenho do consultor legislativo e doutor em
História José Theodoro Mascarenhas Menck, o presente livro ilumina as-
pectos pouco discutidos de um momento riquíssimo para se compreender a
gênese da formação política nacional.
A publicação é uma honra para esta Casa. Em seu trabalho, o autor des-
creve a convocação da Constituinte, o perfil dos deputados, as proposições,
os projetos apresentados e, por fim, a dissolução da Constituinte pelo im-
perador D. Pedro I.
Com detalhes que esmiúçam o contexto político e social da época, Menck
nos apresenta as bases da formação do nosso Estado, de forma a franquear
a todos os cidadãos o acesso ao conhecimento histórico acerca das negocia-
ções ocorridas na primeira iniciativa de se escrever uma Constituição genui-
namente brasileira.
Assim, esta obra nasce como leitura fundamental para todos os que de-
sejam compreender o Brasil desde os primórdios de sua concepção como a
grande nação democrática em que nos transformamos.
Arthur Lira
Presidente da Câmara dos Deputados
PREFÁCIO
No ano em que se comemora o bicentenário da nossa primeira Assembleia
Nacional Constituinte, a Edições Câmara, em boa hora, traz a lume 1823: a
Constituinte interrompida, excelente contribuição fruto de minuciosa pes-
quisa do historiador José Theodoro Mascarenhas Menck. A publicação é
parte do ciclo comemorativo do bicentenário da Câmara dos Deputados, que
teve sua primeira legislatura instalada em 1826, nos moldes da primeira
Constituição, a do império, de 1824, e que em 2026 comemorará, portanto,
dois séculos da data de sua existência.
A Constituinte de 1823 representava a consolidação da Independência,
cujo processo havia se iniciado, efetivamente, em 9 de janeiro do ano ante-
rior, com o Fico.
À guisa de contextualização, em agosto de 1820 acontecia em Portugal
a Revolução do Porto, ou Revolução Constitucionalista, que rapidamente
se espalhou por todo o país. Os revolucionários tomaram o poder, convoca-
ram uma Assembleia Constituinte que ganhou o pomposo nome de “Cortes
Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa”, a qual simplesmente cha-
mamos de “cortes de Lisboa”. Elevadas ao poder, as cortes iniciaram seus
trabalhos em janeiro de 1821 e assumiram não só o papel de Assembleia
Constituinte, mas também de órgão governamental que passou a ditar or-
dens para toda a monarquia portuguesa, em ambos os lados do Atlântico.
Com amplo apoio popular, em Portugal e também no Brasil, as cor-
tes passaram a exigir de D. João VI o regresso a sua terra natal, para
onde acabou partindo a contragosto em 24 de abril de 1821, e também
o juramento prévio à Constituição que seria elaborada. Em Portugal, o
soberano transformou-se em quase um prisioneiro no próprio palácio,
posto que o poder de fato havia sido tomado na revolução e agora era
exercido pelas cortes.
Como desde 1815 o Brasil tivesse sido elevado à categoria de Reino
Unido de Portugal, Brasil e Algarves, representantes daqui foram também
convidados a participar da Constituinte de Lisboa. Cada província brasileira
elegeu sua delegação de deputados para compor as cortes. Contudo, os por-
tugueses compunham numericamente imensa maioria naquela Assembleia.
Ao longo de 1821, foram aos poucos chegando as deputações brasileiras
de cada província, separadamente, que eram recebidas de forma fraterna em
Prefácio
13
Prefácio
15
em abundância, e nos põe pela porta fora com a maior sem-cerimônia pos-
sível” (Dolhnikoff, 2012, p. 148). Segundo Raymundo Faoro, “antes que os
brasileiros o consagrassem, consagraram-no os portugueses com o título de
‘Patriarca da Independência’” (Menck, 2019, p. 122).
Em meados de junho, ante o clima exaltado nas cortes, Antônio Carlos
escreveu de Lisboa a D. Pedro e a José Bonifácio um relato sobre o que se
passava na Assembleia. Nas cartas, dizia que os deputados portugueses co-
gitavam enviar tropas para o Brasil, obrigar o retorno do príncipe, e prender
José Bonifácio juntamente com os membros da junta paulista que assina-
ram a proclamação de dezembro propondo o Fico. Antônio Carlos expunha
que o que se desejava por lá era reduzir o Brasil a uma província submetida
a Portugal, quase uma colônia novamente.
As correspondências de Antônio Carlos a José Bonifácio e a D. Pedro
que contavam os acontecimentos de Lisboa chegaram ao Rio de Janeiro
no final de agosto de 1822, juntamente com documentos oficiais das cor-
tes. A notícia de que se falava em obrigar a volta de D. Pedro, aqui já visto
como nosso soberano, e a prender José Bonifácio, aqui visto como pode-
roso ministro do império, além da pretensão de reduzir o Brasil à condição
análoga à de colônia, caiu como uma bomba. Todavia, quando tais cartas
chegaram ao Rio de Janeiro, D. Pedro estava em viagem para São Paulo.
José Bonifácio solicitou à princesa a convocação de uma reunião urgente
do Conselho de Ministros, o que de pronto fez D. Leopoldina, na qualidade
de regente devido à ausência do príncipe. O Conselho se reuniu sem de-
mora e decidiu que era necessário informar imediatamente a D. Pedro tudo
o que se passava em Portugal.
A José Bonifácio pareceu que chegara o momento decisivo e, então, es-
creveu a D. Pedro, e concluiu nestes termos:
O Brasil vos quer para seu monarca. Com o vosso apoio ou sem o
vosso apoio ele fará a sua separação. O pomo está maduro, colhei-o já,
senão apodrece. Ainda é tempo de ouvirdes o conselho de um sábio que
Prefácio
17
Prefácio
19
Prefácio
21
Lafayette de Andrada
Coordenador da comissão especial curadora destinada a
elaborar e viabilizar a execução das comemorações em torno
do tema “Os 200 anos da Câmara dos Deputados”
INTRODUÇÃO
A Constituinte interrompida
Introdução
25
Fica, pois, a magna questão: como explicar que D. Pedro, auxiliado por
sua esposa, D. Leopoldina, e por seu ministro José Bonifácio, tendo com-
preendido e bem conduzido as forças profundas que se agitavam, mesmo
já anteriormente previstas por D. João, seu pai, quando o aconselhou a
apossar-se da coroa antes que o fizesse qualquer aventureiro, houvesse,
um ano depois, praticado um ato violento que contrariava tal corrente
de sentimento?
O objetivo do presente trabalho, ao par de divulgar a memória daqueles
homens que deram início e feição às nossas instituições, é tentar lançar
alguma luz a essa questão.
Introdução
27
CAPÍTULO I
Convocação da Constituinte
D. João VI e a tentativa de
convocação de cortes no Brasil
Embora pareça contraditório, a convocação de deputados constituintes para
a reformulação completa da organização do Estado brasileiro nasceu espon-
taneamente nas mãos de nosso último monarca absolutista. Em verdade,
podemos dizer que nasceu como um gesto contrarrevolucionário.
Em 24 de agosto de 1820, estourou na cidade do Porto, em Portugal, uma
insurreição armada que rapidamente ganharia o país e que passaria à his-
tória como a Revolução Constitucionalista (ou Liberal) do Porto de 1820.1
Tratava-se de um movimento que procurava solucionar a gravíssima crise
econômico-social lusitana por intermédio de uma Carta Constitucional ela-
borada por cortes constituintes, que se sobreporiam ao poder régio.
D. João VI, ao perceber que a revolução havia definitivamente triunfado
na porção europeia da monarquia portuguesa, e aconselhado por seu minis-
tro secretário de Estado, Thomaz Antônio de Villa-Nova Portugal, optou por
contrapor às cortes constituintes já funcionando em Lisboa outra, no Rio
de Janeiro, que reuniria, sob sua supervisão, delegados de todas as demais
possessões do império colonial lusitano.
Com efeito, podemos ler no Decreto de 18 de fevereiro de 1821 o se-
guinte texto:
2 Vide, no Anexo I, o decreto de D. João VI que nomeou os primeiros membros das cortes consti-
tuintes no Brasil.
Capítulo I
29
3 Renomeado Praça da Constituição após esse episódio e, hoje, conhecido como Praça Tiradentes.
4 Francisco Adolfo de Varnhagen, o visconde de Porto Seguro, escreveu que o grupo revolucionário
fluminense “celebrava suas reuniões todas as tardes em casa do dito padre Macamboa, e por influên-
cia até da rainha que desejava que el-rei fosse obrigado a retirar-se para Portugal, chegaram a pôr-se
em inteligência com o príncipe real, vendo-o em palácio, na sala de seu guarda-roupa, por baixo da
sala chamada dos Pássaros. Reconhecera ademais o príncipe que, proclamada já a Constituição na
Bahia, era intempestiva e perigosa a tentativa aconselhada por Thomaz Antônio e prometera que,
chegando o caso, auxiliaria um movimento constitucional” (Varnhagen, 1957, p. 48).
Capítulo I
31
Capítulo I
33
Capítulo I
35
vez, nenhum texto de lei, nem mesmo uma constituição, poderia ser pro-
mulgada se não recebesse antes a sanção do Executivo.
Dado o ardor com que eram defendidas as duas posições, logo a diver-
gência política transmudou em inimizade pessoal.
Capítulo I
37
Por fim, como recurso para conseguir a manifestação das demais pro-
víncias, D. Pedro, mesmo não tendo o número mínimo de procuradores de
três províncias no Rio de Janeiro (quórum exigido pelo decreto que criou o
Conselho), convocou a reunião do Conselho dos Procuradores-Gerais das
Províncias.
Em 2 de junho de 1822, com representantes apenas do Rio de Janeiro
(José Mariano de Azevedo Coutinho e Joaquim Gonçalves Ledo) e da Cis-
platina (D. Lucas José Obes), D. Pedro instalou o Conselho de Procuradores.
Justificou seu açodamento em função de haver recebido “dos povos” petição
para que “haja uma Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, como me
foi comunicado pelas câmaras” (Brasil, 1973, p. 4) e solicitou o imediato
parecer dos procuradores.
No dia seguinte, após deliberar, o Conselho apresentou a D. Pedro repre-
sentação cujo início foi lavrado nos seguintes termos:
Capítulo I
39
dando ao augusto príncipe regente o título, que não cabia nos corações,
de imperador do Brasil, e que era a sincera expressão de todos os votos,
continuou por muito tempo em universais vivas, assim a este digníssimo
objeto da nossa veneração e à sua real consorte, como à Independência
do Brasil, aos Exmos. Deputados e aos assuntos que entusiasmam nossos
fiéis corações. (Mello Moraes, 1982, t. 2, p. 450-452)
Capítulo I
41
CAPÍTULO II
O dia 3 de maio de 1823 foi declarado dia de grande fausto e gala na corte
do recém-fundado Império do Brasil. Comemora-se nesse dia, no calendá-
rio litúrgico da Igreja católica, a Festa da Invenção da Santa Cruz. Sabia-se
que o primeiro nome dado ao território havia sido justamente “Ilha da Vera
Cruz. Foi esse nome dado à descoberta que induziu, por muitas gerações, a
se acreditar que o Brasil fora descoberto no dia 3 de maio de 1500. Isso ex-
plica a escolha da data para a solene abertura dos trabalhos da Assembleia
Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil.9
Naquele dia, o Paço e a Capela Imperial, assim como todos os edifícios
das ruas por onde deveria passar o cortejo de nosso primeiro imperador,
D. Pedro I, estavam ornados de brilhantes cortinas e alcatifas de seda, das
mais variadas cores, realçados alguns de bordados. As ruas haviam sido co-
bertas de folhas aromáticas. As tropas, com trajes de gala, ocupavam-nas na
melhor ordem e disciplina. Com garbo, procuravam representar “no soldado
brasileiro o honrado cidadão, fiel executor das ordens soberanas e não um
rebelde janízaro, terror de seus concidadãos” (Rodrigues, 1974, p. 32).
9 A data fora unanimemente escolhida pelos deputados presentes na terceira sessão preparatória,
ocorrida em 30 de abril, justamente por ser o 3 de maio “já distinto na história do Brasil”. Na quarta
sessão preparatória, em 1º de maio, Antônio Carlos “lembrou que se declarasse feriado neste ano
e nos seguintes o dia 3 de maio, por ser o da instalação da assembleia, mas tendo-se reconhecido
que era dia santo fixo, julgou-se desnecessária a declaração” (Brasil, 1823, p. 7 e 10; Brasil, 1876,
p. 31 e 33).
Por volta das 11h15, teve início uma série de fogos de artifício, acompa-
nhados imediatamente por salvas de tiros das várias fortalezas que guar-
neciam a cidade. Foram disparados 101 tiros que anunciavam que suas
majestades o imperador D. Pedro I, a imperatriz D. Leopoldina e a herdeira
do trono, D. Maria da Glória, haviam deixado o Palácio de São Cristóvão
em direção ao Paço, onde se reuniam as cortes.10 A família imperial vinha
acompanhada por dez coches conduzindo os grandes do império, os criados
e oficiais mores da casa imperial, bem como os ministros e secretários de
Estado. Fechava o préstito um esquadrão de cavalaria das Minas Gerais.
O cerimonial havia sido longa e minuciosamente discutido pela Assem-
bleia, nas quatro sessões preparatórias já ocorridas. A ordem de entrada, os
trajes, a posição das cadeiras, o trono, tudo fora discutido e encontrava-se
já previsto. Desconhecia-se apenas o teor do discurso que o imperador faria.
10 “Em dezembro de 1822, por determinação do ministro da Fazenda, Martim Francisco Ribeiro
de Andrada, foi expedida ordem para se preparar casa, destinada aos trabalhos da Assembleia Geral
Constituinte Brasileira, cuja reunião seria a 3 de maio de 1823. O edifício, que se achava desocupado
e melhores proporções oferecia, era o da Cadeia Velha. Foi incumbido da decoração do edifício, para
os trabalhos da Assembleia Constituinte e Legislativa, Theodoro José Biancardi, por indicação de José
Bonifácio de Andrada e Silva, no intuito de prestar este auxílio ao seu irmão, ministro da Fazenda, na
preparação daquela casa histórica. Biancardi foi o encarregado, também, da organização da respec-
tiva Secretaria” (Castro, 1926. p. 687). Theodoro José Biancardi posteriormente será aproveitado pela
Assembleia Constituinte como seu oficial maior e será o responsável pela coordenação da publicação
dos Anais da Constituinte, função que desincumbirá a contento, mesmo depois de ter sido dissolvida
a Constituinte.
Capítulo II
43
É hoje o dia maior, que o Brasil tem tido; dia, em que ele pela pri-
meira vez começa a mostrar ao mundo, que é império, e império livre.
Quão grande é meu prazer, vendo juntos representantes de quase todas
as províncias fazerem conhecer umas às outras seus interesses, e sobre
eles basearem uma justa, e liberal Constituição, que as reja! (Brasil, 1823a,
p. 15; Brasil, 1876, p. 28)
E logo em seguida acrescentou que “não foi somente este o fim, e motivo,
por que fiz semelhante convocação, o principal foi para que os brasileiros
melhor conhecessem a minha constitucionalidade” (Brasil, 1823a, p. 17).
Capítulo II
45
Bem custoso seguramente me tem sido que o Brasil até agora não go-
zasse de representação nacional; e ver-me eu por força de circunstâncias
obrigado a tomar algumas medidas legislativas; elas nunca pareceram
que foram tomadas por ambição de legislar, arrogando um poder, no qual
somente devo ter parte; mas sim, que foram tomadas para salvar o Brasil.
(Brasil, 1823a, p. 17)
Capítulo II
47
de outubro, bem como comentários sobre essas ocorrências, que vão ser
responsáveis pela ausência de muitos heróis da Independência na Cons-
tituinte, a exemplo do que discursou o deputado Martiniano Alencar, ao
defender o projeto de anistia àqueles que estavam sendo perseguidos:
12 A chamada “Bonifácia” foi o inquérito que José Bonifácio mandou abrir contra Gonçalves Ledo
e seus seguidores da Maçonaria. D. Pedro foi convidado para integrar a organização, dominada pelo
grupo de Gonçalves Ledo, embora fosse José Bonifácio o grão-mestre. O príncipe foi aceito na ordem
em 2 de agosto de 1822.
Em 4 de outubro, mediante manobra contra José Bonifácio, foi convocada sessão presidida por Gon-
çalves Ledo, e o príncipe foi empossado no cargo de grão-mestre, em substituição de José Bonifácio.
Nessa mesma solenidade interna, com toda a pompa, o príncipe foi aclamado imperador do Brasil,
marcando-se para 12 de outubro a cerimônia pública de aclamação, tendo José Clemente Pereira e
Gonçalves Ledo conseguido, por meios astuciosos, a anuência de D. Pedro ao juramento prévio da
Constituição quando daquele ato público.
José Bonifácio resolveu impedir, a todo custo, que vingassem os planos do grupo de Gonçalves Ledo
no sentido de ser o príncipe constrangido, no ato de sua aclamação, a jurar obediência à futura Cons-
tituição, tal qual ocorrera com seu pai em fevereiro de 1821, mesmo tendo concordado em fazê-lo na
intimidade da Maçonaria. O ministro convenceu o príncipe da inconveniência do que pretendiam e
sugeriu que D. Pedro chamasse Gonçalves Ledo e José Clemente na noite de 9 de outubro, fazendo-
-lhes severas advertências.
José Bonifácio veio a saber, depois, que o príncipe, no seu entusiasmo pela Maçonaria, ao ser eleito
grão-mestre, aceitara assinar três folhas de papel em branco que foram entregues a Gonçalves Ledo
e a José Clemente Pereira.
Em 26 de outubro, aborrecido com algumas condutas do príncipe, José Bonifácio pediu demissão
do cargo de ministro, no que foi seguido pelo irmão Martim Francisco. No dia 27, D. Pedro foi com
D. Leopoldina duas vezes à casa de José Bonifácio, pedindo sua volta, e no dia seguinte esteve no-
vamente lá com sua consorte, mas José Bonifácio mantinha-se irredutível em sua decisão. Somente
após muita insistência, no dia 30 de outubro, José Bonifácio aceitou retornar ao ministério, mas
impondo suas condições, que foram aceitas por D. Pedro I. Voltava o Andrada ao cargo de ministro
dos Negócios do Reino e Estrangeiros, ainda mais prestigiado.
José Bonifácio, conhecendo os expedientes a que recorriam seus adversários, que levaram o príncipe
aos maiores absurdos, não vacilou em tomar atitude enérgica e resoluta. Iniciou, então, um conjunto
de medidas repressivas para afastar os “mal-intencionados”, “intrigantes”, “caluniadores”, “autores
de vil cabala”, como se referia a Gonçalves Ledo, José Clemente e seu grupo. José Clemente e o cônego
Januário Barbosa foram exilados, partindo do Rio de Janeiro em 20 de dezembro para a França, ao
passo que Gonçalves Ledo fugiu para Buenos Aires. Foi instaurado processo contra várias pessoas
daquele grupo. A esse conjunto de medidas repressivas, os opositores dos Andradas apelidaram “Bo-
nifácia”.
Capítulo II
49
***
Creio que são horas de irmos à capela, para se ouvir missa e prestar
o juramento. Conveio a Assembleia, e dali se dirigiu em corpo à capela
Capítulo II
51
imperial, onde assistiu à missa solene do Espírito Santo, que oficiou o Sr.
Bispo Capelão-Mor o qual, logo depois, prestou o juramento de deputado
nas mãos do decano do cabido, pronunciando de joelhos em voz alta o
mesmo juramento pela fórmula aprovada. Igualmente juraram perante
o Sr. Bispo, presidente da Assembleia, o Sr. Secretário e mais deputados,
pondo, cada um por sua vez, a mão sobre os Santos Evangelhos, e dizendo:
Assim o juro. (Brasil, 1876, p. 8, 2ª col.)
CAPÍTULO III
Dos deputados
das instruções, que mandou executar meu augusto pai pelo Decreto de
7 de Março de 1821, na parte em que for aplicável e não se achar revogado
pelo presente Decreto. (Brasil, 1887, p. 6)
Capítulo III
55
Das bancadas
Aprovadas na sessão do dia 18 de junho, foram as instruções publicadas no
dia seguinte, firmadas por José Bonifácio (Brasil, 1987, p. 42).15 Determina-
vam que a Assembleia teria cem deputados, divididos entre as províncias
de acordo com o número de seus habitantes, verificado no censo de 1819,
levantado pelo conselheiro desembargador Antônio Rodrigues Velosa de
Oliveira (Rodrigues, 1974, p. 26, nota 9). Foram incluídos no cálculo a popu-
lação livre, os escravizados e os analfabetos.
Com relação às bancadas eleitas para as cortes de Lisboa, de acordo com
as instruções de José Bonifácio, houve um aumento generalizado no nú-
mero de deputados, mas nem todas as cadeiras previstas foram ocupadas.
A tabela a seguir apresenta o número de cadeiras previstas para as cortes
de Lisboa, o número previsto para a Assembleia Constituinte de 1823 e o
número de cadeiras efetivamente ocupadas na Constituinte:
Cadeiras Cadeiras
Cadeiras
previstas para efetivamente
Província previstas para a
as cortes de ocupadas na
Constituinte
Lisboa Constituinte
Alagoas 3 5 4
Bahia 9 13 11
Ceará 5 8 7
Cadeiras Cadeiras
Cadeiras
previstas para efetivamente
Província previstas para a
as cortes de ocupadas na
Constituinte
Lisboa Constituinte
Maranhão 2 4 –
Minas Gerais 13 20 20
Pará16 2 3 –
Paraíba 3 5 4
Pernambuco 8 13 12
Rio de Janeiro 5 8 8
São Paulo 7 9 9
Goiás 117 2 1
Santa Catarina 1 1 1
Espírito Santo 1 1 1
Rio Grande do 2 1 1
Norte
Piauí 2 1 –
Cisplatina 1 2 –
16 O Amazonas (Comarca da Barra de Nossa Senhora da Conceição de Manaus), mesmo sendo parte
integrante do Grão-Pará, teve uma vaga nas cortes de Lisboa, mas não contou com representação
autônoma na Constituinte de 1823.
17 Nas eleições para as cortes de Lisboa, em função de cizânia surgida entre as comarcas de São João
das Duas Barras e a da capital, foram eleitos dois deputados efetivos e dois suplentes, não obstante
a capitania de Goiás tivesse apenas uma única vaga. O primeiro dos eleitos, Joaquim Teotônio Segu-
rado, que aportou em Lisboa (eleito pela comarca de São João das Duas Barras), foi reconhecido como
deputado de Goiás e foi quem representou a capitania naquele congresso.
18 Mato Grosso elegeu um deputado a Lisboa, mas ele não viajou.
Capítulo III
57
19 Joaquim Gonçalves Ledo foi substituído por José Joaquim Carneiro de Campos, futuro marquês
de Caravelas e membro da comissão de redatores da Constituição de 1824. Ledo chegou a escrever à
Assembleia justificando sua ausência. Seu ofício foi encaminhado na sessão de 9 de maio à Comissão
de Poderes, que na sessão do dia 12 de maio respondeu, nos seguintes termos:
“A Comissão de Poderes examinando o diploma do deputado pela província do Rio de Janeiro
Joaquim Gonçalves Ledo o achou legal por se achar conforme a ata, e esta conforme as ins-
truções; e é de parecer que o dito deputado eleito pode vir tomar assento nesta Assembleia
uma vez que se mostre sem crime que o iniba, em conformidade do disposto nas mesmas
instruções; visto que no seu próprio requerimento confessa ter sido obrigado a retirar-se
desta cidade por motivos políticos” (Brasil, 1823a, p. 53; Brasil, 1876, p. 80).
Esse parecer foi aprovado pelo plenário na sessão do dia 16 de maio, mas Gonçalves Ledo não se fiou
nas garantias que a Assembleia lhe concedia e jamais apareceu para tomar seu assento (Brasil, 1823a,
p. 63; Brasil, 1876, p. 94).
Capítulo III
59
de parecer que não tem lugar a admissão de sua súplica por não julgar
razão suficiente a idade que tem, e por serem destituídas de fundamento
as moléstias que alega, visto que o não têm impossibilitado de compa-
recer e que mais se fundam em temor do que na sua existência. (Brasil,
1879, p. 167, 2ª col.)
Capítulo III
61
A Constituinte perante
a historiografia
A historiografia do século XIX foi muito dura em relação à Constituinte
de 1823. João Armitage, em seu pioneiro livro História do Brasil, publicado
originalmente em Londres, em inglês, em 1836, e que teve uma influência
enorme no Brasil, assim descrevia a Constituinte de 1823:
Capítulo III
63
Por fim, Alencar declarou ser possível provar, com os documentos pro-
duzidos pelo autor:
Capítulo III
65
Capítulo III
67
21 O deputado padre José Custódio Dias, em um debate com Antônio Carlos, disse: “não admito
decisão que não seja a da Assembleia, nem o magistério que se arroga o ilustre preopinante” (Brasil,
1876, p. 36).
Capítulo III
69
Capítulo III
71
Silva Lisboa não defendia o fim da escravidão, mas, como bom conser-
vador, adotava medidas suavizadoras e antidiscriminatórias. Insurgia-se,
muitas vezes, contra as posturas do deputado Montezuma, que via como
demagógicas.22 Em um belo discurso, aderiu à proposta de Martim Francisco
e louvou e agradeceu, em nome da nação, a atuação de lorde Cochrane na
libertação do Maranhão.23
Ainda que não tivesse temor por se manifestar, nem por isso assumia
ares temerários. Sabia ser prudente e realista. Quando, na sessão da Noite
da Agonia, em 12 de novembro, se pretendeu convocar o recém-nomeado
e octogenário ministro da Guerra, ou quando se pretendeu deslocar a As-
sembleia para outra localidade, para longe da pressão das forças armadas
e de D. Pedro, Silva Lisboa chamou a Assembleia à realidade, opondo-se
às propostas apresentadas por Montezuma e Alencar:
Eu, não obstante os cabelos brancos da mirrada cabeça, não sei o que
é temor, quando encha o que é dever, mas sei também qual é o perigo
de ajuntamentos populares, que podem degenerar em tumultos; prezo-
-me de ser cauteloso, sem fantasiar de ser capoeira, e perdoe-me esta
augusta Assembleia o ter-me escapado este nome do vulgo, impróprio
ao lugar, e objeto. Não é racionável o pôr em contraste, e menos em
conflito, o corpo do povo com o corpo militar. [...]
Ouvi com pasmo a um senhor deputado propor, que esta Assembleia
nada delibere antes de que o governo assegure a tranquilidade pública,
fazendo repor a tropa nos seus aquartelamentos, e, do contrário estabe-
Ribeiro de Andrada propôs então uma moção de congratulação ao primeiro almirante, que voltou a
ser combatida por Montezuma, que foi acompanhado pelo deputado França.
Foi nessa ocasião que interveio Silva Lisboa, em primoroso discurso em defesa do Voto de Agradeci-
mento proposto por Martim Francisco Ribeiro de Andrada (Brasil, 1884a, p. 8-12).
Capítulo III
73
Aguerridos ou prudentes
Os mais aguerridos, afora os Andradas, foram Montezuma, da Bahia, e
Carneiro da Cunha, da Paraíba. Por outro lado, os mais prudentes e cheios
de bom senso foram Fernandes Pinheiro, o futuro visconde de São Leo-
poldo, e Araújo Lima, o futuro regente e marquês de Olinda, o segundo
muito mais participante que o primeiro.
Os grandes juristas
Os grandes juristas da Assembleia foram todos baianos, ainda que nem
todos tenham sido eleitos por sua província. Destacaram-se os irmãos José
Joaquim Carneiro de Campos e Francisco Carneiro de Campos. O primeiro
era representante do Rio de Janeiro, o segundo da Bahia. A lista segue com
Luís José Carvalho e Melo e Antônio Luís Pereira da Cunha, o primeiro re-
presentando a Bahia, o segundo, o povo fluminense. Por fim, devemos somar
à lista o já citado José da Silva Lisboa, este último representando a Bahia.
Capítulo III
75
Os ultraconservadores
Manoel Jacinto Nogueira da Gama, o futuro marquês de Baependi, e João
Severiano Maciel da Costa, o futuro marquês de Queluz, ambos mineiros,
eram igualmente cultos e preparados. O primeiro, matemático, representou
a província do Rio de Janeiro; já o segundo, jurista, representou sua pro-
víncia natal. Concorreram como campeões do servilismo e da cortesania ao
poder imperial. Ambos pensavam que servir ao Brasil era o mesmo que ser-
vir ao imperador. Estavam sempre ao lado do governo, de qualquer governo.
Nogueira da Gama foi o autor da exposição sobre o estado da fazenda
pública e veio dele a sugestão de se contrair vultoso empréstimo às casas
bancárias inglesas, algo somente possível sob péssimas condições.
Maciel da Costa, que governou a Guiana Francesa quando de sua
ocupação por D. João VI, e cuja administração, de acordo com o barão do
Rio Branco, foi elogiada pelos próprios franceses, foi também descrito de
maneira elogiosa pelo áulico-mor de D. Pedro I, Francisco Gomes da Silva
(Silva, 1966, p. 86), o Chalaça, como “hábil político e respeitável jurista”.
Desde sua estreia na Constituinte, em 8 de agosto, nunca escondeu seu ser-
vilismo. Comparado politicamente com ele, Cairu era um liberal. Segundo
Vasconcelos Drummond (Drummond, 2012, p. 144), veio a ser nobilitado em
lista preparada por Domitila de Castro Canto e Melo, a marquesa de Santos.
Maciel da Costa encareceu, em discursos vários, a necessidade de não
se desmantelar o edifício social, que, se fosse reformado, deveria sê-lo com
jeito e prudência. Atacou as inovações, revelou sua paixão pelas antigas ins-
tituições, declarando-se inimigo de novidades. Sua posição contra a con-
cessão do direito de nacionalidade aos libertos, que foi compartilhada por
Costa Barros, era tão revolucionariamente retrógrada que contra ele Silva
Lisboa pronunciou um de seus grandes discursos (Brasil, 1880, p. 205).
Houve outros que tiveram participações discretas, mas que vieram a ad-
quirir algum brilho posteriormente, como José da Costa Carvalho e Miguel
Calmon.
Em suma, havia toda uma plêiade de parlamentares que desmentem a
sentença segundo a qual a Constituinte de 1823 seria desprovida de talen-
tos. A bem da verdade, a realidade é justamente o inverso.
Capítulo III
77
Capítulo III
79
Reconhecimento do diploma do
padre Henriques de Resende
Importante na fixação dos princípios norteadores da admissão de parlamen-
tares e de seu reconhecimento apenas pelo próprio Poder Legislativo foi
a contenda referente ao reconhecimento do padre Venâncio Henriques de
Resende como deputado, eleito por Pernambuco.
Capítulo III
81
Resende, pois que a sua exclusão somente podia ter lugar nos colégios
eleitorais, em que obteve votos, decidindo-se, pela competente mesa,
que ele não era afeito à causa do Brasil, ou que tinha os outros defei-
tos, que o inabilitavam para ser deputado na forma das instruções. Como
porém a Câmara de Olinda se fundou em provas que nos papéis públicos
se lhe apresentaram, das más doutrinas, que professava e propagava o
dito padre, poder-se-ia desculpar, mas nunca aprovar, este seu ilegal pro-
cedimento a bem da causa do Brasil, se com efeito o corpo de delito fosse
claro e real; mas não o sendo, como se depreende da leitura imparcial
das suas cartas acusadas, não pode a Comissão dos Poderes deixar de
apresentar, o seguinte seu parecer: 1º, que o padre Venâncio Henriques
de Resende se acha no caso de ser reconhecido deputado pela provín-
cia de Pernambuco a esta Assembleia, e ter nela assento, não obstante a
falta de diploma, visto que, pela ata da Câmara de Olinda, se verifica que
obteve nos colégios eleitorais 169 votos, vindo a dever ocupar o oitavo
lugar entre os 11 que obtiveram diplomas; 2º, que merece ser repreen-
dida a Câmara de Olinda por se haver arrogado a jurisdição, que só com-
petia às mesas dos colégios eleitorais na forma das instruções.
Paço da Assembleia, 12 de maio de 1823.
Estevão Ribeiro de Resende.
Manoel Jacinto Nogueira da Gama.
Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva. (Brasil, 1876,
p. 80-81)
Capítulo III
83
guir, assim como os vizinhos de toda a América, “de quem se dizia o mesmo
desde que os americanos por excelência [os estadunidenses]”, proclamaram
a sua independência; e “hoje eles têm provado ser o seu o melhor governo do
mundo” (Brasil, 1876, p. 88).
Em seguida falou Martim Francisco, defendendo a interessante tese de
que a Assembleia, ainda que constituinte, possuía, em sua competência
constitucional, limites que haviam sido colocados previamente pela nação.
escolhida pela nação, que já declarou altamente a sua vontade pela voz
de todas as Câmaras, segue-se que foi justamente excluído do cargo de
deputado na forma das instruções; e portanto voto que não deve ser
admitido nesta augusta Assembleia. (Brasil, 1876, p. 90)
É verdade que concordo com ele, que a causa do Brasil é a mesma que
a da monarquia constitucional, que só ela é quem nos pode segurar nas
bordas do abismo das revoluções a que tendem a despenhar-nos loucos
inovadores.
O estado de civilização e cultura do Brasil, os hábitos e costumes e
mesmo os prejuízos dos brasileiros lhes não deixam aberta outra vereda
plausível de prosperidade, senão esta. Se o padre Venâncio não adotasse
a monarquia, se ele ao menos claramente lhe solapasse os alicerces, eu
seria o primeiro a votar contra a sua admissão. Eu serei sempre inimigo
decidido daqueles que contra a natureza das coisas, contra a experiência,
querem no Brasil desvairar a opinião pública com sonhos e quimeras
republicanas, e por bem da sua precária fortuna vadear rios de sangue,
para chegarem a um alvo que jamais conseguirão. Mas é mister que isto,
quanto, ao padre Venâncio, fosse provado plenamente; e é o que me
não parece.
Examinando as duas cartas do padre Venâncio, que fazem o corpo de
delito no processo que em certa maneira se lhe intenta, não parece, a meu
ver, inimizade deliberada à monarquia; nem se infira que isto existe por-
que a ideia que ele tem de monarquia constitucional parece avizinhar-se
às constituições espanhola e portuguesa as quais o nobre preopinante
julga mais democracias do que monarquias. […]
Confesso que o padre Venâncio não entende o que diz, nem nós o
podemos entender quando fala em poder republicano executado por um
rei, e outros absurdos.
Ele falou com franqueza; as suas cartas mostram uma assombrosa
confusão de ideias; mostram que é noviço em matérias de organização
social; mostram que não tem ideias claras das matérias de que fala;
mostram que nunca as distinguiu, separou e menos coordenou; mas
não mostram claramente que o seu escritor seja inimigo da monarquia
constitucional, e por isso inimigo da causa do Brasil.
A justiça me força a confessar que de quando em quando assomam
nas cartas expressões que podem parecer contrárias à monarquia e que
ressumbram quimeras republicanas; tal parece a asserção que atacou o
Sr. Gama, e à qual, na minha opinião, não respondeu completamente o Sr.
Muniz Tavares.
Capítulo III
85
25 Note-se que a palavra “democrático”, no sentido que lhe emprestavam no século XIX, era um
conceito muito pouco lisonjeiro e significava algo que hoje pode ser definido como “demagógico”.
CAPÍTULO IV
Trabalho da Assembleia
O fato de a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil
ter sido dissolvida apenas seis meses e nove dias após ter sido inaugurada,
sem conseguir votar uma carta constitucional, não significa que não tenha
trabalhado, ou que seus esforços tenham sido em vão. Pelo contrário. Certa-
mente podemos dizer que a Carta Constitucional de 1824, que inaugurou o
regime jurídico que iria consolidar o Brasil como nação independente, teve
direta inspiração no texto da Constituinte que estava sendo discutido e vo-
tado na Assembleia quando de sua dissolução. Cerca de 80% dos dispositivos
da Constituição de 1824 se encontram no projeto da Constituinte de 1823.
Ademais, em seu curto período de existência, a Assembleia não ape-
nas discutiu e inaugurou sua forma de funcionar – lembremo-nos de que
era a primeira experiência parlamentar no Brasil, sem precedente algum
de onde tirar um modelo de funcionamento, salvo a participação de alguns
seus membros como deputados nas Cortes de Lisboa no ano anterior –, mas
também, dada sua natureza dupla “de Constituinte e Legislativa”, discutiu
um razoável número de proposições legislativas, abarcando os mais dife-
rentes assuntos, e chegou a promulgar seis leis. Além disso, procurou ana-
lisar e responder as inúmeras petições que lhe foram enviadas de todo o
território nacional.
Todas as vezes que os deputados se questionavam sobre suas atribui-
ções reportavam-se ao seu juramento de posse, em cuja fórmula Antônio
Carlos indicara, com a necessária indeterminação, as funções e atribuições
da Assembleia: “fazer a Constituição política do Império do Brasil e as re-
formas indispensáveis e urgentes”. “Constituição” todos intuíam com certo
grau de precisão o que era, já as “reformas urgentes” (Brasil, 1876, p. 26),
quais deveriam ser?
26 O regimento previa três turnos de votações para cada proposição, tendo várias proposições ficado
pelo caminho em diferentes pontos de tramitação.
Capítulo IV
89
Das comissões
Ainda em sua primeira sessão preparatória, em 17 de abril de 1823, o recém-
-eleito presidente da Assembleia, o Bispo Capelão-Mor, preocupou-se em
formar as duas primeiras comissões, encarregadas, como comentamos no
Capítulo III, de verificar a legalidade dos diplomas dos que se apresentaram
como deputados.
Na sessão seguinte, a segunda preparatória, ocorrida no dia 18 de abril,
foi lembrada a necessidade de se formar uma comissão que teria como ta-
refa preparar um regimento interno para a Assembleia, a fim de que os tra-
balhos tivessem uma ordem a seguir e pudessem fluir.
Já no dia 2 de maio, na última sessão preparatória, nas vésperas da ses-
são solene de inauguração da Assembleia, o deputado secretário, Manoel
José de Souza França, solicitou que fosse nomeada uma Comissão Extraor-
dinária de Polícia, com três membros, para que lhe ajudassem a organizar a
sessão do dia seguinte.
Na sessão do dia 7 de maio, o deputado Araújo Lima declarou que acre-
ditava ser “indispensável, para se não roubar o tempo à Assembleia, a no-
meação da Comissão de Petições para as examinar e dar-lhes as respectivas
direções” (Brasil, 1876, p. 62). Na mesma ocasião o deputado Costa Aguiar
declarou:
Peço licença para lembrar a V.Exa. [dirigia-se ao presidente da Assem-
bleia] a nomeação das comissões, porque sem elas não podem os negó-
cios progredir em ordem; e apontarei como muito necessária a de Polícia
para o governo interno da Assembleia, a de Redação do Diário, porque os
taquígrafos escrevem, e o público nada sabe das sessões, e a da Fazenda.
(Brasil, 1876, p. 63)
Tabela 2 – As comissões
Capítulo IV
91
Ribeiro de Resende
28 Na sessão de 30 de maio, Pereira da Cunha requereu a nomeação de outro membro para substi-
tuir Gama, no seu impedimento.
29 Na sessão de 14 de outubro, a Comissão de Constituição solicitou a nomeação de dois membros
para suprir a falta dos senhores: Andrada e Silva (licença), Pereira da Cunha (gravemente doente) e
Gama (ausente). Foram nomeados dois membros: Vergueiro e Pinheiro de Oliveira.
30 Na sessão de 4 de novembro, considerando a falta de 3 membros, foi nomeado, interinamente, o
barão de Santo Amaro.
31 Comissão permanente criada após a instalação da Assembleia. Para as sessões preparatórias, ver
comissões 1 e 2.
Resende Costa
Barão de Santo Amaro
Toledo Rendon
32 Na sessão de 25 de junho, foi feita proposta para nomeação interina, a fim de substituir três
membros que se achavam doentes.
33 Na sessão de 25 de junho, houve a nomeação de três novos membros (Fernandes Pinheiro, Gon-
dim e Pacheco Silva) para substituir membros adoentados.
Capítulo IV
93
34 Na sessão de 28 de julho, foram eleitos mais dois membros: Fernandes Pinheiro e Carvalho e
Mello.
35 Na sessão de 7 de agosto, foram nomeados mais quatro membros: Silva Lisboa, Maciel da Costa,
Carvalho e Mello e Vergueiro.
36 Na sessão de 7 de novembro, foi nomeado Costa Carvalho no impedimento de Maciel da Costa,
eleito presidente da Assembleia, para o mês de novembro.
37 Ver a Comissão de Fora (n. 21) criada para auxiliá-la.
38 Na sessão de 4 de junho, foi nomeado novo membro: Nogueira da Gama.
39 Na sessão de 11 de julho, foi nomeado Pedro José da Costa Barros em substituição a Couto Reis.
40 Na sessão de 23 de setembro, foi feita proposta para nomeação de membros que faltavam.
41 Na sessão de 24 de setembro, foram nomeados: Ferreira de Araújo e Silveira Mendonça.
Pinheiro de Oliveira
Capítulo IV
95
46 A Comissão teve autorização para chamar oito membros de fora, sendo quatro membros para os
negócios da Marinha e quatro para os negócios da Guerra.
Capítulo IV
97
Primeiras matérias
Texto do Juramento de Posse
Quando do início das sessões preparatórias, ainda em abril de 1823, duas
foram as preocupações iniciais dos deputados que pela primeira vez se reu-
niam: o reconhecimento dos seus respectivos diplomas como parlamentares
e a imediata organização dos seus trabalhos.
Na primeira e na segunda sessões preparatórias, ocorridas em 17 e 18
de abril de 1823, cuidou-se precipuamente da verificação dos diplomas dos
deputados eleitos. Apenas na última parte da segunda sessão preparatória,
foram abordados o juramento de posse e as normas que deveriam reger in-
ternamente os trabalhos da Assembleia.
Foi o deputado Antônio Carlos quem primeiro levantou a questão do
juramento que deveria ser feito por todos os parlamentares: “Sendo in-
dispensável que prestemos juramento, e devendo por isso adotar-se al-
guma fórmula, lembrei-me de formar uma a qual lerei com a permissão do
Sr. Presidente”.
Regimento Interno
Uma vez firmado o texto do juramento a ser feito pelos deputados quando da
abertura da Assembleia Constituinte, o assunto seguinte foi a necessidade
de um regimento interno.
Capítulo IV
99
A deputação foi muito bem recebida por D. Pedro, de acordo com o se-
guinte registro formulado por José Bonifácio:
Capítulo IV
101
Outro deputado, padre José Custódio Dias, cerrou fileiras com Andrade
Lima e se indignou com a observação de D. Pedro:
Resolução da Assembleia
Para José Bonifácio de Andrada e Silva
Ilmo. e Exmo. Sr.
Capítulo IV
103
Capítulo IV
105
Capítulo IV
107
se opondo a que a licença fosse dada, e o último, que foi o vencedor, sempre se
batendo pela licença, que foi afinal concedida pela Assembleia.
O objetivo da quarta das leis promulgadas pela Assembleia foi a revoga-
ção do Alvará de 30 de março de 1818. Por este, D. João VI visava atacar os
maçons ou pedreiros livres, tendo por fim “declarar por criminosas e proi-
bidas as sociedades secretas: ficando incursos os que se congregarem em
lojas, ou aqueles, que as promoverem, nas penas da Ordenação II v. 5º, tit.
6º §§ 5º e 9º” (Brasil, 1889a, p. 28).
O ato, que continha ainda a proibição do uso das medalhas e catecismos
das sociedades secretas, foi referendado por Thomaz Antônio de Villa-Nova
Portugal, o que lhe valeu a sincera antipatia dos primeiros políticos brasi-
leiros, que se esqueceram completamente de sua contribuição e méritos ao
acompanhar a obra de D. João no Brasil.
Essa lei, cujo projeto era da autoria do deputado Rodrigues de Carva-
lho, levou quatro meses entre discussão e votação, findos os quais o presi-
dente da Assembleia “sentiu verdadeiro alívio ao ver-se livre do assunto, em
ordem do dia”.
Com a publicação da referida lei, foram postos em perpétuo silêncio
todos os processos pendentes em virtude do Alvará de 30 de março de 1818,
e foi proibida para o futuro a existência de sociedades secretas. Esclarece
Agenor de Roure que todos os oradores opinaram pela revogação de uma
lei, que custava a crer, ainda existisse no século XIX e só podia ter sido obra
feita por “homens degenerados”, “homens piores do que bárbaros do Norte”
(Brasil, 1876, p. 62), como disse o deputado Muniz Tavares.
Realmente o alvará revogado não podia merecer a simpatia da maioria
da Constituinte, composta de espíritos liberais, pois, sendo uma resultante
dos acontecimentos de Pernambuco, em 1817, aplicava as penas de confisco,
proscrição, infâmia e morte.
Era, pois, indigno de constituir lei do Brasil tal alvará que, no dizer caus-
ticante de Antônio Carlos, era façanhoso e que valia “pelos últimos arran-
cos do despotismo assustado, como um parto da calejada insensibilidade,
embotada inteligência e perfeita imbecilidade de um ministro que, com
indelével vergonha do Brasil, enxovalhara por algum tempo os seus fastos
ministeriais” (Roure, 2016, p. 237).
Durante os debates, Carneiro de Campos defendeu D. João VI, que tanto
bem fez ao Brasil, atacando, porém, violentamente o ministro Villa-Nova
Portugal, bem como outros ministros, “mais interessados na conserva-
ção integral dos plenos poderes, de que dispõem a seu bel prazer, do que
em corrigir o vício radical de semelhante governo, de modo a formar o
trono no coração dos povos, em vez de firmá-lo por violência e pelo terror”
(Roure, 2016, p. 238).
É interessante a discussão sobre a regulamentação das sociedades se-
cretas, “conventículos de conspiradores” (Roure, 2016, p. 238), como pro-
punha Antônio Carlos que fossem chamados.
Outro ponto da discussão que empolgou os deputados mais cultos e in-
teligentes foi o relativo à abolição da pena de morte, chegando a dizer o
deputado Gomide, no combate que estava mantendo contra ela, que “o pri-
meiro homicídio e muito atroz perpetrado sobre a terra não fora punido de
morte pelo Eterno e Supremo Juiz, que imprimiu um ferrete, um estigma ao
crime do fratricida e o abandonou aos remorsos de sua alma e à execração
dos outros homens” (Roure, 2016, p. 238).
Não pouca importância parlamentar teve a quinta das leis promulgadas
pela Constituinte, ainda que não tenha gerado grandes polêmicas parla-
mentares. Determinava o texto que continuaria em vigor toda a legislação
pela qual se regera o Brasil até 25 de abril de 1821, bem como as leis e de-
cretos promulgados por D. Pedro I, como regente e imperador.
Pereira da Cunha foi quem apresentou o projeto à consideração da As-
sembleia, pedindo fossem também regulamentados os erros crassos das
Ordenações Filipinas. Anexa à lei, havia uma lista das leis que continuavam
em vigor.
O mesmo, no entanto, não se deu com a sexta e última das leis: dava
forma aos governos das províncias e criava para cada uma delas um presi-
dente e um conselho, bem como revogava as leis das cortes de Lisboa, que
estabeleceram juntas provisórias, em 1º de outubro de 1821.
Tal assunto, de magna importância política, teve nada menos de três
projetos apresentados à Assembleia: um do deputado Souza e Mello, outro
de Antônio Carlos e o terceiro pelo deputado Gomide.
O projeto de Souza Melo dava a cada província um governador e um chefe
militar, aquele com ascendência sobre este, nomeados ambos pelo impera-
dor. O projeto de Gomide previa um presidente de província, nomeado para
mandato de três anos, e um conselho, composto por quatro conselheiros e
um secretário eleitos. A Assembleia aprovou o projeto de Antônio Carlos,
que previa um presidente e um conselho para cada província.
Ao justificar seu projeto pelo qual criava-se o presidente, em vez de uma
junta de governo, declarou Antônio Carlos que esta era uma das primeiras
necessidades da lei, “isto de entregar a muitas cabeças a administração era
lembrança que só podia ter partido da razão em delírio dos franceses, nos
Capítulo IV
109
CAPÍTULO V
Projeto de Constituição
Fomos escolhidos para fazer uma Constituição e só para isso é que nos
escolheram; somos uma convenção ad hoc, não uma legislatura comum;
as necessidades, porém, do Brasil fizeram que ensanchássemos, talvez
com injustificável arbítrio, o poder que só nos pertencia, e que nos decla-
rássemos competentes também para reformas indispensáveis e urgentes,
além da Constituição. (Brasil, 1876, p. 126)
Proclamação de princípios
Tardou o projeto de Constituição, em função de ter surgido uma série de
intrigas de jornalistas que estavam criando cizânia entre a Assembleia e o
imperador, pois atribuíam aos deputados o desejo de cercear as atribuições
do mandatário. Resolveu, então, a Assembleia resgatar a ideia do depu-
tado Maia, apresentada em fins de maio, de que fosse redigida uma pro-
clamação em que os constituintes expusessem as bases em cima das quais
trabalhariam.
À comissão que lhe fora felicitar pelo seu restabelecimento de um grave
acidente viário que havia sofrido, o imperador respondeu que: “Enquanto
vivesse havia de defender as atribuições que lhe competiam, de direito,
como imperador constitucional e defensor perpétuo do Brasil” (Brasil, 1879,
p. 73, 2ª col.). Essas palavras, pronunciadas quando a Assembleia se negou
a lhe dar os vivas propostos por Montezuma, denunciavam que as relações
da Assembleia com o imperador estavam estremecidas.
Incumbiu-se a redação da proclamação à mesma comissão que tinha o
encargo de redigir o projeto de Constituição: Pereira da Cunha, Andrada
Machado, Ferreira da Câmara, Araújo Lima e Costa Aguiar. O primeiro foi
escolhido como relator. Na sessão do dia 11 de agosto, o deputado relator
desincumbiu-se de sua atribuição e leu a minuta que havia redigido.
Capítulo V
113
Apresentação do projeto
de Constituição
Na sessão de 16 de agosto, o deputado Andrada Machado comunicou:
Capítulo V
115
Por duas razões: uma, para se não dar esse ar de importância a uma
coisa que pode ainda passar por muitas alterações, e até mesmo ser rejei-
tada; segunda, para que se não entenda que é um ajuste entre a Assem-
bleia e o imperador, porque o pacto social é entre os habitantes, ou ao
menos entre as províncias do Brasil, que a isto se haviam proposto antes
mesmo da aclamação. (Brasil, 1880, p. 61-62)
Tramitação do projeto
de Constituição
A forma de se debater e votar a Constituição veio à baila na sessão do dia
11 de setembro, ocasião em que a Comissão de Constituição declarou ser de
parecer que houvesse apenas uma única discussão, podendo cada deputado
falar três vezes a cada artigo; e que, depois de discutido todo o projeto,
viesse a revisão em que se pudesse “reformar algum absurdo ou contradi-
ção manifesta” (Brasil, 1880, p. 72, 1ª col.).
Naquela ocasião, ao solicitar licença para tratamento da saúde, José
Bonifácio declarou que:
Capítulo V
117
Objetos de muito menor monta temos nós sempre tratado com toda
a consideração possível, e quando se apresenta este, o maior de todos os
que se têm oferecido à deliberação desta Assembleia, pretende-se que
seja debatido em uma só discussão e que apenas depois possa ser re-
visto para se corrigir algum absurdo ou emendar alguma palavra! (Brasil,
1880, p. 97)
têm sido muitas da Europa, é preciso que seja apropriada ao país, e com
analogia aos sentimentos e princípios que se têm arraigado geralmente
nos povos. (Brasil, 1880, p. 99)
Capítulo V
119
50 D. Pedro I não aceitava que a Constituição houvesse sido simplesmente “outorgada” uma vez que
a submeteu ao crivo das câmaras municipais de todo o Brasil, recebendo delas o pedido para que o seu
texto entrasse imediatamente em vigor. O imperador teria apenas anuído com o pedido dos “povos do
Brasil” que teriam se manifestado por suas câmaras locais.
Capítulo V
121
CAPÍTULO VI
Dissolução da Constituinte
Antecedentes
Quando da convocação da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do
Império do Brasil, em 3 de junho de 1822, era importante marcar posição
frente às Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes da Nação Portu-
guesa, as cortes de Lisboa, cuja atividade legislativa para o reino do Brasil
era vista como ofensivamente desagregadora. Na época, não se colocava em
dúvida a manutenção dos vínculos do Reino Unido; pelo contrário, a justi-
ficativa da sua convocação era justamente reforçar os laços com Portugal,
porém dentro de um quadro que fosse considerado justo.
Contudo, em fins de agosto de 1822, aportou no Rio de Janeiro, vindo
de Lisboa, o navio Quatro de Abril. Trazia novas de Portugal, bem como
uma série de decretos das cortes de Lisboa que, na visão dos deputados
lisboetas, trariam de volta à obediência o reino do Brasil, bem como seu
regente. Tais decretos suprimiam os poderes de D. Pedro e determinavam a
prisão de José Bonifácio e outros colaboradores da causa da Independência.
D. Pedro encontrava-se em viagem por São Paulo. Respondia pelo governo
do reino do Brasil D. Leopoldina, assessorada pelo ministro e secretário de
Estado José Bonifácio de Andrada e Silva.
As correspondências vindas de Portugal, entre as quais uma de Antônio
Carlos, então deputado constituinte nas cortes de Lisboa, para José Bo-
nifácio na qual descrevia o ambiente radical nas cortes e as verdadeiras
intenções de fazer retornar o Brasil a um estado de colônia, prender José
Bonifácio e obrigar em breve o regresso de D. Pedro a Portugal. Os decretos
chegados de Portugal, nesse sentido, deram origem a uma série de aconte-
cimentos.
Após se inteirar do conteúdo dos documentos, D. Leopoldina, aconse-
lhada por José Bonifácio, convocou imediatamente o Conselho de Estado,
Capítulo VI
123
51 Entre outras citações, destaca-se a seguinte, em carta de D. Pedro I ao pai datada no Rio de Ja-
neiro de 22 de setembro de 1822: “Eu e meus irmãos brasileiros lamentamos muito e muito o estado
de coação em que Vossa Majestade jaz sepultado. [...] E como eu agora, mais bem informado, sei que
Vossa Majestade está positivamente preso [...]” (Arquivo Nacional, 1973, p. 311).
Capítulo VI
125
Capítulo VI
127
Capítulo VI
129
Capítulo VI
131
Noite da Agonia
A intensidade e o vigor dos debates não se restringiam ao plenário da As-
sembleia e reverberavam em inflamados artigos publicados nos periódicos
da capital.
Estremecidas, assim, as relações entre a Assembleia e o governo, a tropa,
cuja maior parte era composta de portugueses, interveio na questão e assu-
miu arrogantemente uma atitude hostil à Constituinte. A esse crime militar,
o historiador deve dizê-lo com dor, foi sacrificada a primeira Assembleia
Constituinte do Brasil, encarnação da soberania nacional.
Dominados pelo espírito faccioso, os oficiais da guarnição da corte, pou-
cos dias antes, em 1° de novembro, dirigiram-se ao palácio de São Cristóvão
e apresentaram uma petição ao imperador, pela qual exigiam a expulsão dos
Capítulo VI
133
Sr. Presidente, tenho que fazer uma proposta, que requeiro se tome
logo em consideração para se deliberar sobre ela. A situação da capital do
Rio de Janeiro me determina a fazê-la. O dia de ontem foi um dia muito
notável; as tropas estiveram em armas toda a noite e, correndo a cidade,
a puseram em geral inquietação; os cidadãos pacíficos não dormiram; e
propagando-se vozes de se atacarem alguns deputados, foi preciso tomar
cautelas, e velar em defesa própria.
À vista disto, cumpre-nos, como sentinelas da nação, vigiar pela sua
segurança.
Sua Majestade acha-se atualmente no seu palácio rodeado de todos
os corpos, até dos de artilharia, o que indica haver causa que, suposto a
não conheçamos, deve ser da mais alta consideração. E como nós somos
responsáveis à nação, proponho que esta Assembleia se declare em sessão
permanente, e que se destine uma deputação para pedir a Sua Majestade
que pelo governo se nos transmitam os motivos de tão extraordinários
movimentos nas tropas, e o que obriga a que os corpos estejam com car-
tuchos embalados como prontos para ataque, quando não aparece razão
para isto. (Brasil, 1884a, p. 287)52
Capítulo VI
135
tumulto, uma vez que não se comportaram e haviam tornado inviável qual-
quer deliberação.
Martiniano de Alencar e Antônio Carlos se manifestaram, em seguida,
declarando ter sido precipitada a decisão, pois com admoestações teria sido
possível contornar a situação.
É importante lembrar que uma das razões invocadas por D. Pedro I para
dissolver a Constituinte seria justamente o fato de a sessão do dia 10 de
novembro ter sido encerrada prematuramente em função do tumulto nela
imperante.
Então, foi colocada em votação a proposta de tornar permanente a
sessão, até que o anormal acantonamento das tropas em torno do palácio
de São Cristóvão se esclarecesse.
Montezuma apoiou integralmente a proposta, já Alencar pediu calma,
declarando que apenas concordava em solicitar explicações.
Seguiu-se o debate até que foi anunciada pelo secretário, deputado
Miguel Calmon, a presença, à porta, de oficial enviado pelo recém-
-empossado ministro do Império, o general Francisco Vilela Barbosa, futuro
marquês de Paranaguá, que trazia um comunicado do imperador, cujo teor
leu, in verbis:
Capítulo VI
137
Por volta das 15h, o presidente interrompeu a discussão para dar a pa-
lavra ao deputado Vergueiro, que iria ler o parecer da Comissão Especial
relativo ao ofício do imperador que chegara à Assembleia. A conclusão do
parecer, após congratular-se com as medidas do imperador para manter a
ordem, foi no sentido de pedir melhores esclarecimentos sobre o conteúdo
do ofício lido. In litteris:
Capítulo VI
139
Capítulo VI
141
[...] que a Assembleia está coacta, e que não podemos deliberar assim,
porque nunca se delibera debaixo de punhais de assassinos e por conse-
quência quero que se acrescente e se diga ao governo que não havendo
motivo que justifique os movimentos da tropa, exponha o fim verdadeiro
deles. [...] Faça-se, enfim, saber ao governo que não há senão as baionetas
que perturbam o sossego público; que apoiados do povo nunca se podem
considerar como provas de inquietações. (Brasil, 1884a, p. 297)
Capítulo VI
143
DECRETO
Havendo eu convocado, como tinha direito de convocar, a Assembleia
Geral Constituinte e Legislativa, por decreto de 3 de junho do ano próximo
passado; a fim de salvar o Brasil dos perigos que lhe estavam iminentes;
e havendo esta Assembleia perjurado ao tão solene juramento que pres-
tou à nação de defender a integridade do império, sua independência, e
a minha dinastia, hei por bem, como imperador e defensor perpétuo do
Brasil, dissolver a mesma Assembleia, e convocar já uma outra na forma
das instruções feitas para convocação desta, que agora acaba, a qual de-
verá trabalhar sobre o projeto de Constituição que eu lhe hei de em breve
apresentar, que será duplicadamente mais liberal do que o que a extinta
Assembleia acabou de fazer. Os meus ministros e secretários de estado de
todas a diferentes repartições o tenham assim entendido e façam executar
a bem da salvação do império.
Paço, 12 de novembro de 1823, segundo da Independência e do
Império. Com a rubrica de S.M. Imperial
Clemente Ferreira França
José de Oliveira Barbosa
Capítulo VI
145
SR. RIBEIRO DE ANDRADA: Creio que V.Exa. deve mandar tirar uma
cópia do decreto para ficar aqui, e entregar-se o original ao oficial que
o trouxe.
O Sr. Secretário Calmon tirou a cópia.
SR. GALVÃO: Sr. Presidente, eu devo declarar que este oficial me disse
que S.M. Imperial mandara esta tropa para defender a Assembleia de
qualquer insulto que se lhe pretendesse fazer.
Muitos Srs. Deputados disseram que agradeciam a Sua Majestade.
SR. ANDRADA MACHADO: É preciso fechar a ata com a cópia do decreto
de Sua Majestade, e declarar que em consequência dele se dissolveu a
Assembleia. Estes papéis se entregarão aos do novo congresso.
SR. PRESIDENTE: Pode o Sr. Oficial assegurar a Sua Majestade da parte
da Assembleia que ela se dissolve.
SR. ANDRADA MACHADO: Nós já não somos Assembleia.
SR. SILVA LISBOA: Parece-me pouco decente esta maneira de responder
nas atuais circunstâncias; talvez deveríamos fazê-lo dirigindo um ofício
ao ministro da repartição competente. Não digo isto por covardia, mas
porque o objeto é de alta consideração.
Alguns Srs. Deputados pediram a palavra.
SR. ALENCAR: Não sei para que se pede a palavra; as nossas discussões
estão acabadas.
SR. ANDRADA MACHADO: Nós já não temos que fazer aqui. O que resta
é cumprir o que Sua Majestade ordena no decreto que se acabou de ler.
Saíram então da sala todos os Srs. Deputados, dissolvendo-se, assim,
a Assembleia pela uma hora da tarde do dia 12 de novembro de 1823.
(Brasil, 1884a, p. 308-309)
Capítulo VI
147
54 Vide as Cartas de D. Pedro príncipe regente do Brasil a seu pai D. João VI rei de Portugal (1821-
1822), edição de 1916 organizada por Eugênio Egas, passim.
55 A notícia para a Inglaterra era péssima uma vez que havia conseguido concluir tratado com Por-
tugal em que este país aceitava a abolição do comércio internacional de escravos. Por conseguinte,
estando Portugal (com suas colônias africanas) separado do Brasil, formando cada um uma nação
independente, estava automaticamente colocado fora da lei o comércio de escravos transatlântico.
No entanto, caso o Reino Unido voltasse a existir, o tráfico voltaria a ser interno, dentro da mesma
nação, o que significaria um grande recuo para a política antiescravista inglesa.
Capítulo VI
149
APÊNDICE
Rio de Janeiro
A bancada fluminense foi composta por nomes tais como José Joaquim
Carneiro de Campos, Manoel Jacinto Nogueira da Gama, Martim Francisco
Ribeiro de Andrada e Antônio Luiz Pereira da Cunha, quatro personagens
indiscutivelmente de primeira ordem no mundo político do império.
Apêndice
153
57 Segundo outras fontes, a redação daquela primeira minuta do texto que viria a ser a Constituição
de 1824 seria de seu irmão, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva, que ocupou a rela-
toria do projeto de Constituição apresentada à Constituinte em setembro de 1823.
Apêndice
155
Bahia
A Bahia se fez representar por nomes do quilate de José da Silva Lisboa,
que, a par de suas convicções políticas conservadoras, sempre revelou um
profundo conhecimento de todos os assuntos; Luiz José de Carvalho e
Melo e Francisco Carneiro de Campos, dois grandes juristas; José da Costa
Carvalho, futuro membro da Regência Trina Permanente; Antônio Fer-
reira França e Francisco Gê Acaiaba de Montezuma, dois parlamentares
especialmente combativos, que por vezes raiaram a demagogia; Felisberto
Caldeira Brant Pontes de Oliveira Horta, personagem de primeira ordem
no mundo diplomático e político nos anos seguintes; e Miguel Calmon du
Pin e Almeida, que se destacaria por seus conhecimentos econômicos e
administrativos.
Apêndice
157
Espírito Santo
Manoel Pinto Ribeiro Pereira de Sampaio (…?-1857)
Apêndice
159
Minas Gerais
A bancada mineira foi composta por nomes tais como Manuel Ferreira da
Câmara, João Severiano Maciel da Costa, Estevão Ribeiro de Resende, Lúcio
Soares Teixeira de Gouveia, José Antônio da Silva Maia e José Teixeira da
Fonseca Vasconcelos, nomes que honrariam qualquer legislatura.
58 Há profunda discordância entre Sacramento Blake (1899) e Joaquim Macedo (1876) quanto
aos anos que um e outro apontam como de nascimento e morte desse antigo inconfidente mineiro.
Assim, enquanto o primeiro desses autores menciona 1765-1841, o segundo fixa os anos de 1767-
1874, “Contra toda a evidência que resulta de assentamentos paroquiais e documentos oficialmente
divulgados em várias publicações por nós consultadas”, diz Nelson Coelho de Senna (1926, p. 121).
Apêndice
161
Apêndice
163
Apêndice
165
São Paulo
Entre os eleitos por São Paulo, encontravam-se José Bonifácio de Andrada
e Silva, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva, indiscutivel-
mente o melhor orador e o maior líder parlamentar da Constituinte, Nicolau
Pereira de Campos Vergueiro, brasileiro ainda que nascido em Portugal, ve-
terano das cortes de Lisboa, Antônio Rodrigues Velloso de Oliveira e José
Arouche de Toledo Rendon, todos nomes de respeito.
Apêndice
167
59 Estando na prisão, e tendo sido aconselhado a pedir clemência ao rei, Antônio Carlos respondeu:
“Perdão, só peço a Deus. Do rei quero justiça”.
60 Certa feita, na sessão do dia 9 de maio de 1822, interrompido em seu pronunciamento por ma-
nifestações das galerias, Antônio Carlos gritou: “Silêncio! Aqui desta tribuna, até os reis têm que me
ouvir”.
Apêndice
169
Apêndice
171
Goiás
Silvestre Álvares da Silva (…?)
Pernambuco
Pernambuco enviou o antigo revolucionário de 1817, então convertido em
liberal moderado, o padre Francisco Muniz Tavares, bem como o jovem ba-
charel Pedro Araújo Lima, futuro marquês de Olinda e o futuro segundo
regente único, dois veteranos das cortes de Lisboa e que em muito se des-
tacariam nos decênios seguintes. Da bancada pernambucana ainda se so-
bressaiu Manoel Caetano de Almeida e Albuquerque.
Apêndice
173
Apêndice
175
61 De acordo com Pedro Calmon (1972), foi capitão do regimento miliciano dos nobres, sucessor
de seu pai no ofício de escrivão de defuntos e ausentes, ofício que perdeu por ter tomado parte na
Revolução de 1817. Faleceu em 1834, ou 1844.
Ceará
A província do Ceará enviou, entre outros representantes, Pedro José da
Costa Barros, futuro senador, e o padre José Martiniano de Alencar, veterano
das cortes de Lisboa e igualmente futuro senador. Na bancada, João Antônio
Rodrigues de Carvalho, revolucionário em 1817, conservador em 1823, se
salientaria nos debates e nos pareceres e alcançaria igualmente o Senado
do Império.
Apêndice
177
estava para ser jurado. Foi pai do romancista José de Alencar. Deputado às
cortes de Lisboa de 10 de maio de 1822 a 4 de novembro de 1822. Deputado
constituinte de 3 de maio de 1823 a 11 de novembro de 1823. Deputado na 2a
Legislatura. Senador pelo Ceará de 2 de maio de 1832 a 13 de março de 1860.
Mato Grosso
Antônio Navarro de Abreu (...?-1845)
62 O reconhecimento do diploma do deputado de Mato Grosso foi questionado em razão de ter ele
sido sufragado apenas por duas das três comarcas da província. A Comissão de Verificação de Poderes,
na segunda Sessão Preparatória, assim se manifestou sobre o caso:
À comissão pareceu que o Sr. Deputado nomeado pelos distritos de Cuiabá e Paraguai Dia-
mantino não pode por ora tomar assento, por não ser eleito pela província toda, não tendo
concorrido o distrito de Vila Bela; como porém as dissensões existentes entre os distritos,
e repugnância do de Vila Bela, foram as causas que deram origem a esta ilegalidade, e não
devam dois distritos deixar de ser representados, pela pertinácia de um terceiro, a comis-
são deixa à Assembleia depois de instalada a decisão deste delicado negócio. (Brasil, 1876,
p. 24-25)
Apêndice
179
Paraíba
Destacou-se, na bancada da Paraíba, o deputado Joaquim Manuel Carneiro
da Cunha, parlamentar bravo e independente.
Alagoas
Da província de Alagoas destacou-se o deputado Caetano Maria Lopes
Gama, futuro visconde de Maranguape, pernambucano de nascimento.
Apêndice
181
Santa Catarina
Diogo Duarte Silva (1774-1857)
Apêndice
183
63 Nas cortes de Lisboa consta o deputado pelo Rio de Janeiro Luiz Martins Bastos, que os autores
dizem ser o presente deputado. A publicação de Octaciano Nogueira e João Sereno Firmo Parlamen-
tares do Império (1973) registra os dois nomes como pertencentes a pessoas distintas.
ANEXO I
Legislação referente às
cortes convocadas no Rio de
Janeiro por D. João VI
64 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1821 (Brasil, 1889b, p. 20).
Para presidente
Marquês de Alegrete
Para deputados
Barão de Santo Amaro
Monsenhor Almeida
Luiz José de Carvalho e Mello
Antônio Luiz Pereira da Cunha
Antônio Rodrigues Velloso de Oliveira
João Severino Maciel da Costa
Camillo Maria Tonellet
João de Souza do Mendonça Corte Real
José da Silva Lisboa
Mariano José Pereira da Fonseca
João Rodrigues Pereira de Almeida
Antônio José da Costa Ferreira
Francisco Xavier Pires
José Caetano Gomes
Procurador da Coroa
José de Oliveira Botelho Pinto Mosqueira
Secretários
Manoel Jacinto Nogueira da Gama
Manoel Moreira de Figueiredo
65 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1821 (Brasil, 1889b, p. 21).
Anexo I
189
ANEXO II
66 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1822 (Brasil, 1887, p. 6).
Anexo II
191
ANEXO III
Legislação referente à
Constituinte de 1823
67 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1822 (Brasil, 1887, p. 19).
CAPÍTULO I
DAS ELEIÇÕES
1. As nomeações dos deputados para a Assembleia Geral Constituinte do
Brasil serão feitas por eleitores de paróquia.
2. Os eleitores, que hão de nomear os deputados, serão escolhidos dire-
tamente pelo povo de cada uma das freguesias.
3. As eleições de freguesias serão presididas pelos presidentes das câ-
maras com assistência dos párocos.
4. Havendo na cidade ou vila mais de uma freguesia, será a presidência
distribuída pelos atuais vereadores da sua Câmara, e na falta destes pelos
transatos.
5. Toda povoação ou freguesia que tiver até 100 fogos, dará um eleitor;
não chegando a 200, porém se passar de 150, dará dois; não chegando a 300
e passar de 250, dará três, e assim progressivamente.
6. Os párocos farão afixar nas portas das suas igrejas editais, por onde
conste o número de seus fogos, e ficam responsáveis pela exatidão.
7. Têm direito a votar nas eleições paroquiais todo cidadão casado e todo
aquele que tiver de 20 anos para cima sendo solteiro, e não for filho-família.
Devem, porém, todos os votantes ter pelo menos um ano de residência na
freguesia onde derem o seu voto.
8. São excluídos do voto todos aqueles que receberem salários ou solda-
das por qualquer modo que seja. Não são compreendidos nesta regra uni-
camente os guarda-livros e 1ºs caixeiros de casas de comércio, os criados da
Casa Real, que não forem de galão branco, e os administradores de fazendas
rurais e fábricas.
9. São igualmente excluídos de voto os religiosos regulares, os estrangei-
ros não naturalizados e os criminosos.
68 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1822 (Brasil, 1887, v. 1, p. 42-49).
Anexo III
195
CAPÍTULO II
DO MODO DE PROCEDER ÀS ELEIÇÕES DOS ELEITORES
1. No dia aprazado para as eleições paroquiais, reunido na freguesia o
respectivo povo, celebrará o pároco missa solene do Espírito Santo, e fará,
ou outro por ele, um discurso análogo ao objeto e circunstâncias.
2. Terminada esta cerimônia religiosa, o presidente, o pároco e o povo se
dirigirão às casas do Concelho, ou às que melhor convierem, e tomando os
ditos presidente e pároco assento à cabeceira de uma mesa, fará o primeiro,
em voz alta e inteligível, a leitura dos Capítulos I e II destas instruções.
Depois proporá dentre os circunstantes os secretários e escrutinadores, que
serão aprovados ou rejeitados por aclamações do povo.
3. Na freguesia que tiver até 400 fogos inclusive, haverá um secretário e
dois escrutinadores, e nas que tiverem daí para cima, dois secretários e três
escrutinadores. O presidente, o pároco, os secretários e os escrutinadores
formam a Mesa ou Junta Paroquial.
4. Lavrada a ata desta nomeação, perguntará o presidente se algum dos
circunstantes sabe e tem que denunciar suborno ou conluio para que a elei-
ção recaia sobre pessoa ou pessoas determinadas. Verificando-se por exame
público e verbal a existência do fato arguido (se houver arguição), perderá o
incurso o direito ativo e passivo de voto. A mesma pena sofrerá o caluniador.
Qualquer dúvida que se suscite será decidida pela Mesa em ato sucessivo.
5. Não havendo, porém, acusação, começará o recebimento das listas.
Estas deverão conter tantos nomes quantos são os eleitores que tem de dar
aquela freguesia; serão assinadas pelos votantes e reconhecida a identidade
pelo pároco. Os que não souberem escrever chegar-se-ão à Mesa e, para
evitar fraudes, dirão ao secretário os nomes daqueles em quem votam; este
formará a lista competente, que depois de lida será assinada pelo votante
com uma cruz, declarando o secretário ser aquele o sinal de que usa tal
indivíduo.
6. Não pode ser eleitor quem não tiver, além das qualidades reque-
ridas para votar, domicílio certo na província há quatro anos inclusive
pelo menos. Além disso deverá ter 25 anos de idade, ser homem probo
e honrado, de bom entendimento, sem nenhuma sombra de suspeita e
inimizade à causa do Brasil, e de decente subsistência por emprego, ou
indústria, ou bens.
7. Nenhum cidadão poderá escusar-se da nomeação, nem entrar com
armas nos lugares das eleições.
CAPÍTULO III
DO MODO DE APURAR OS VOTOS
1. Recolhidas, contadas e verificadas todas as listas, a Mesa apurará os
votos aplicando o maior cuidado e exação neste trabalho, distribuindo o
presidente as letras pelos secretários e escrutinadores, e ele mesmo lendo
os nomes contidos nas mencionadas listas.
2. Terminada a apuração destas, proceder-se-á à conta dos votos, e o se-
cretário formará uma relação de todos os sujeitos que os obtiveram, pondo
o número em frente do nome. Então o presidente e a Mesa, verificando se os
que alcançaram a pluralidade possuem os requisitos exigidos e demarcados
no § 6° do Capítulo II, os publicará em alta voz. No caso de empate, decidirá
a sorte.
3. O ato destas eleições é sucessivo; as dúvidas que ocorrerem serão de-
cididas pela Mesa, e a decisão será terminante.
4. Publicados os eleitores, o secretário lhes fará imediatamente aviso
para que concorram à casa onde se fizeram as eleições. Entretanto lavrará
o termo delas no livro competente, o qual será por ele subscrito, e assi-
nado pelo presidente, pároco e escrutinadores. Deste se extrairão as cópias
necessárias, igualmente assinadas, para se dar uma a cada eleitor, que lhe
servirá de diploma, remeter-se uma à Secretaria de Estado dos Negócios do
Brasil e uma ao presidente da Câmara das cabeças do distrito.
5. As câmaras das vilas requererão aos comandantes militares os solda-
dos necessários para fazer guardar a ordem e tranquillidade, e executar as
comissões que ocorrerem.
6. Reunidos os eleitores, os cidadãos que formaram a Mesa, levando-os
entre si e acompanhados do povo, se dirigirão à igreja matriz, onde se can-
tará um Te Deum solene. Fará o pároco todas as despesas de altar, e as câ-
maras todas as outras, bem como proverão de papel e livros todas as juntas
paroquiais.
7. Todas as listas dos votos dos cidadãos serão fechadas e seladas, e
remetidas com o livro das atas ao presidente da câmara da comarca, para
serem guardadas no arquivo dela, pondo-se-lhes rótulos por fora, em que se
declare o número das listas, o ano e a freguesia, acompanhado tudo de um
ofício do secretário da junta paroquial.
8. Os eleitores, dentro de 15 dias depois da sua nomeação, achar-se-ão
no distrito que lhes for marcado. Ficarão suspensos pelo espaço de 30 dias,
contados da sua nomeação, todos os processos civis em que eles forem au-
tores ou réus.
Anexo III
197
CAPÍTULO IV
DOS DEPUTADOS
1. Os deputados para a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do
Reino do Brasil não podem ser por ora menos de 100. E porque a neces-
sidade da mais breve instalação da Assembleia obste a que se espere por
novos e mais bem formados censos, não devendo merecer atenção por ine-
xatos todos os que existem, este número l00 será provisoriamente distri-
buído pelas províncias na seguinte proporção:
Província Cisplatina 2
Santa Catharina 1
São Paulo 9
Mato Grosso 1
Goiás 2
Minas Gerais 20
Rio de Janeiro 8
Capitania 1
Bahia 13
Alagoas 5
Pernambuco 13
Paraíba 5
Ceará 8
Piauí 1
Maranhão 4
Pará 3
2. Para ser nomeado deputado cumpre que tenha, além das qualidades
exigidas para eleitor no § 6º do Capítulo II, as seguintes: que seja natural do
Brasil ou de outra qualquer parte da monarquia portuguesa, contanto que
tenha 12 anos de residência no Brasil, e sendo estrangeiro que tenha 12 anos
Anexo III
199
CAPÍTULO V
DAS ELEIÇÕES DOS DEPUTADOS
1. Os eleitores das freguesias, tendo consigo os seus diplomas, se apre-
sentarão à autoridade civil mais graduada do distrito, que há de servir-lhes
de presidente até a nomeação do que se ordena no § IV deste Capítulo,
para que este faça inscrever seus nomes, e freguesias a que pertencem,
no livro que há de servir para as atas da próxima eleição dos deputados,
marque-lhes o dia e o local da reunião, e faça intimar à Câmara a execução
dos preparativos necessários.
Anexo III
201
Manda S.A. Real o príncipe regente, pela Secretaria de Estado dos Negó-
cios do Reino, remeter ao governo provisório da província d... os exemplares
inclusos dos Decretos de 1º e 3 do corrente, das proclamações de S.A. Real,
e o discurso dirigido ao mesmo pelos procuradores-gerais conselheiros de
Estado, que se reuniram na primeira sessão do Conselho, e finalmente das
instruções a que se refere o citado Decreto de 3 do corrente, para as eleições
dos deputados da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa. E espera S.
A. Real, pela confiança que tem nos patrióticos sentimentos que animam o
mesmo governo, a favor da causa sagrada da união e independência deste
reino, que dará sem hesitação o devido cumprimento, pela parte que lhe
toca, às reais determinações, de cuja observância e execução depende es-
sencialmente a sólida felicidade do Brasil, fundada na posse segura dos seus
69 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1822 (Brasil, 1887, p. 50).
sagrados direitos por tantas maneiras sagazmente isolados, mas que serão
sempre protegidos e sustentados pelo seu perpétuo defensor.
70 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1823 (Brasil, 1887, p. 59).
Anexo III
203
ANEXO IV
Sessão de 11 de novembro
Noite da Agonia71
71 Texto extraído do tomo 6 dos Anais da Assembleia Constituinte de 1823 (Brasil, 1884a, p. 286-309).
INDICAÇÃO
Proponho:
1º Que se declare sessão permanente enquanto durarem as inquieta-
ções da capital;
2º Que se depute a Sua Majestade Imperial, rogando que o governo
comunique à Assembleia os motivos dos estranhos movimentos militares
que perturbam a tranquillidade desta capital;
3º Que se escolha uma comissão especial, que vigie sobre a seguridade
da corte, e se comunique com o governo e autoridades, a fim de deliberar-
-se quais as medidas extraordinárias que demandam as nossas delicadas
circunstâncias.
Andrada Machado
Anexo IV
205
cheia. Logo que cessou o rumor, tomei a palavra para fazer ver ao povo ali
reunido quão grande era a confiança que nele punham seus representantes,
franqueando-lhe o santuário em que livremente expunham suas opiniões,
os quais por isso mesmo tinham direito a esperar que um povo tão generoso
se conduzisse com todo o acatamento e moderação, que no caso contrá-
rio, ao primeiro sinal de aprovação ou desaprovação do que se dissesse na
Assembleia, eu cumpriria o que manda o Regimento. Não aproveitou isto
nada, porque afogueados os espíritos, interromperam o orador, e levantou-
-se um motim tal que ninguém se entendia, e apenas ouvi as vozes de alguns
dos Srs. Deputados que pediam fortemente a execução do Regimento.
Neste estado de coisas, e depois de ordenar repetidas vezes silêncio
inutilmente, que tinha mais que esperar? Que se rompesse em excessos?
E quem será capaz de calcular toda a extensão das consequências? Pene-
trado então do meu dever, e querendo afastar de mim uma enorme respon-
sabilidade, levantei a sessão, o que nenhum mal podia acarretar ao bem
nacional.
SR. ALENCAR: Estou persuadido que V.Exa. obrou muito bem, mas como
menciona que a Assembleia dispensou o Regimento, consentindo a entrada
do povo no recinto da sala, parecendo deduzir que desta permissão se origi-
nou o motim, direi que não estou convencido disso.
Não foi esta a primeira vez que da parte do povo se faltou à devida aten-
ção, bem que logo se comedisse apenas foi advertido, e portanto não vejo
razão para atribuir à sua entrada na sala o que ontem aconteceu. Eu fui o
que propus a sua admissão porque estava certo que o público não era capaz
de faltar ao respeito devido à Assembleia, e que antes seria mui sujeito às
suas deliberações. Eu não espero dele outra coisa, e se ontem se demasiou,
no que não fez bem, houve motivos extraordinários para isso, que nada têm
de comum com a sua entrada na sala. Parece-me que devia fazer esta refle-
xão, sem que com isto pretenda atacar a determinação de V.Exa.
SR. ANDRADA MACHADO: Como apoiei ontem a proposta do Sr. Alencar,
direi também alguma coisa. No Regimento não se proíbe a entrada do povo
neste recinto, e portanto não foi preciso dispensá-lo; mas quando o fosse,
tinha mandado quem podia fazê-lo; e todas as vezes que houver povo que
não caiba nas galerias, eu serei de voto que se admita a ouvir junto de nós.
Agora o que eu creio é que não se executou o Regimento, porque este só
manda levantar a sessão em caso extremo, sem que baste para isso qualquer
inquietação ou ruído de vozes. O Sr. Presidente devia fazer as suas admoes-
tações, e só quando fosse a elas renitente o povo é que poderia levantar a
sessão. Acho que houve medo demais, e este susto excessivo menoscaba o
povo brasileiro, o mais pacífico de quantos tenho visto. O que requeiro pois
é que o Regimento fique em seu inteiro vigor, e que se proceda de modo que
não se caia em excessos.
Nas cortes de Lisboa, estando eu a falar, fui atacado por gritos de nume-
rosa multidão das galerias, e nem por isso se levantou a sessão; o presidente
bradou, e por fim obedeceram.
Em outra ocasião até se ouviram gritos de “mata, mata”, e o presidente
bateu na mesa, talvez cinco ou seis minutos, e o povo acomodou-se, sem se
dar o mau exemplo de levantar a sessão, apesar de se ouvirem proposições
horríveis. Entendo, pois, que os apoiados que ontem se deram não podiam
julgar-se motivo bastante para levantar a sessão; bastava chamar à ordem,
e esta seria conservada.
SR. PRESIDENTE: O ilustre deputado é que se engana, porque o Regimento
é contra ele em ambos os pontos. Quanto ao 1º está bem claro no art. 193
que diz:
“Não poderá assistir às sessões maior número de pessoas estranhas do
que aquele que bem couber no lugar destinado.”
Logo, é manifesto que não podia eu tomar sobre mim a novidade que
se pedia de se admitir o povo na sala das sessões, lugar sagrado, onde os
deputados devem estar desassombrados e livres. Quanto ao 2º, aqui está o
art. 196:
“Quando a inquietação do público, ou dos deputados, não puder coibir-
-se pelas admoestações do presidente, poderá este levantar a sessão.”
Ora, eu penso que ninguém negará ter havido, não simples inquietação,
mas um motim, e tal que ninguém se entendia, nem se ouvia, nem eram
atendidos o orador e outros senhores que pediam silêncio e atenção.
Ao exemplo do que se passou nas cortes de Portugal, respondo que não
sei o que lá houve, que nunca as tomarei para norma de minha conduta, e
que em casos tais prefiro perder antes por prudente que por valentão.
SR. ANDRADA MACHADO: Eu não pretendo dar a lei a V.Exa. O que digo
é que precisamos que o Regimento se execute, e que se não está bem
claro, que o expliquemos, fixando uma regra para o futuro. Eu confio que
nunca nos será precisa, porque o povo brasileiro tem um caráter mui pa-
cífico, e nunca dará motivo para se levantar a sessão, mas bom é que haja
a prevenção, e eu desejo que se estabeleça expressamente que, só depois
da 1a e 2a advertências inúteis, se possa levantar a sessão. Eu mandarei à
Mesa na ocasião competente uma indicação para inteligência do art. 196.
Anexo IV
207
O Sr. Secretário Calmon deu conta de uma felicitação dos juízes ordiná-
rios do julgado de Curvelo. Foi recebida com particular agrado. Deu, também
conta das participações de moléstia dos Srs. Carvalho e Mello e Nogueira da
Gama. Ficou a Assembleia inteirada.
SR. SECRETÁRIO CALMON: Como veio à Mesa a indicação do Sr. Andrada
Machado, e é de matéria estranha à da Ordem do Dia, é necessário que se
decida pela Assembleia se entra ou não em debate agora, como requereu o
seu autor.
SR. PAULA E MELLO: Lembro que é preciso observar o Regimento no que
determina a respeito da urgência das propostas.
SR. ANDRADA MACHADO: Eu já declarei que o negócio é da maior urgên-
cia. O que se segue é decidir-se pelo debate se há ou não essa urgência por
mim indicada.
Seguiu-se, então, a leitura da indicação. Finda ela o Sr. Presidente propôs
à votação a urgência, e sendo esta apoiada e aprovada, entrou a matéria em
discussão.
SR. MONTEZUMA: Sr. Presidente, em todos os semblantes tenho visto
hoje pintada a inquietação que sobressalta os habitantes desta capital, em
que é geral a consternação e o susto, e creio que a ninguém mais cumpre
acompanhá-los na sua mágoa do que aos representantes da nação.
Eu assim o faço e, encarando os seus males, posto que grandes, não me
acovardo. Tenho o coração assaz corajoso, a alma bastante enérgica para,
no meio das desgraças públicas, procurar remediá-las, e embaraçar a ruína
da pátria.
Ao ver famílias espavoridas fugir, e espalhado em geral o pavor e o
susto, meditei algum meio de remediar os males dos meus concidadãos,
e não tenho achado nenhum preferível ao lembrado pelo Sr. Andrada
Machado. Eu tive em vista propor a suspensão das sessões da Assembleia
até se saber de Sua Majestade as causas e os motivos de tão grande pertur-
bação, e que se vissem tomadas as medidas própria para a apaziguar, mas
quais seriam as consequências daquela suspensão?
A primeira, e muito funesta, era quebrar-se o vínculo da união dos dois
poderes, que nunca esteve mais em perigo de dissolver-se do que na si-
tuação presente; depois, sendo nós os escolhidos da nação, deveríamos
desampará-la, em lugar de lhe acudir por meio de acertadas deliberações
em que podemos autorizar o governo para obrar segundo convier em bene-
fício da pátria? Não, senhores, ao contrário devemos aqui permanecer para
debater as medidas que lembrarem, para olhar e acudir a todos os lados, e
para ordenar os remédios mais próprios, e com a maior prontidão possível.
Anexo IV
209
Anexo IV
211
Art. 22. A lei conserva aos inventores a propriedade das suas descober-
tas, ou das suas produções, segurando-lhes privilégio exclusivo temporá-
rio, ou remunerando-os em ressarcimento da perda que hajam de sofrer
pela vulgarização.
Art. 24. Aos bispos, porém, fica salva a censura dos escritos publicados
sobre dogmas e moral, e quando os autores, e na sua falta os publicado-
res, forem da religião católica, o governo auxiliará os mesmos bispos para
serem punidos os culpados.
Anexo IV
213
Anexo IV
215
PARECER
A Comissão Especial, vendo o ofício do ministro do Império da data
de hoje, no qual participa que os oficiais da guarnição desta corte foram
ontem representar a S.M. Imperial os insultos que dizem ter sofrido em
respeito à sua honra, e mormente sobre a falta do alto decoro devido à au-
gusta pessoa de S.M. Imperial, o que dizem ter origem em certos redatores
de periódicos e seu partido incendiário, ao que S.M. Imperial respondera
lembrando-lhes o dever que a tropa tem de se conservar inteiramente
pacífica, que S.M. Imperial; para evitar qualquer desordem, saíra da ci-
dade com a tropa que se acha aquartelada em São Cristóvão, certifica a
subordinação da mesma e igualmente o respeito às autoridades constituí-
das e firme adesão ao sistema constitucional. Conclui, finalmente, que a
Assembleia tome este negócio em consideração, e dê as providências que
tanto importam à tranquilidade pública.
A Comissão, sentindo muito os primeiros movimentos da tropa, que
puseram em inquietação o povo desta capital, muito se lisonjeia do acerto
das medidas momentâneas tomadas pelo governo de S.M. Imperial, fa-
zendo reunir a mesma tropa fora da cidade para conservá-la em subor-
dinação, sendo ainda mais sensível à Comissão a enunciação da falta do
alto respeito devido à augusta pessoa de S.M. Imperial que os oficiais in-
cluíram em sua representação com que parece quererem reforçar a ofensa
sua particular de que se queixam.
Não pode, porém, a Comissão conceituar cabalmente os motivos ver-
dadeiros e especiais que ocasionaram aquele triste acontecimento pela
generalidade com que vêm enunciados, ignorando-se se foram todos os
oficiais da guarnição, ou parte deles, e quantos os que representaram,
quais os insultos e sua natureza, quais os redatores de periódicos, e os
lugares em que se acham esses insultos, qual o partido incendiário, sua
força e objeto.
A Comissão entra em maior dúvida quando compara os acontecimen-
tos com a asserção do ministro sobre a subordinação da tropa, e respeito
da mesma às autoridades constituídas, o que serve a convencer a Comis-
são que a crise se resolverá favoravelmente, e que o sossego e a quietação
pública se restabelecerão com facilidade e prontidão.
Ainda quando a Comissão tivesse mais circunstanciadas informações,
é de parecer que ao governo compete empregar todos os meios que cabem
em suas atribuições, e lembrar a esta Assembleia as medidas legislativas e
extraordinárias que julgar necessárias, no que seguramente encontrará a
sua mais franca e eficaz cooperação, para o que é a Comissão igualmente
de parecer que a Assembleia deve ficar em sessão permanente, até que
Anexo IV
217
PARECER
Foi aprovado.
Declarou-se, portanto, que a Assembleia ficava em sessão permanente,
sendo incumbido o Sr. Secretário de expedir o ofício ao governo na forma do
parecer, o que assim se praticou nos termos seguintes:
Às 6 horas da tarde pediu licença o Sr. Barão de Santo Amaro para se re-
tirar por incomodado. À 1 hora da noite chegou a resposta de Sua Majestade
do seguinte teor, a qual foi lida pelo Sr. Secretário Calmon:
Anexo IV
219
Anexo IV
221
disse o que a minha consciência me ditou, pergunto como é que se faz uma
acusação destas sem conhecimento de causa? Na verdade, é este um caso
que nenhum representante da nação, e até nenhum simples cidadão, poderá
considerar com indiferença.
Enfim, o governo a nada respondeu do que se lhe perguntou, e, por isso,
não sei o que a Comissão há de dizer. Mas vá, contanto que eu não vote,
apesar de ser um dos membros dela, como já requeri, visto que sou arguido,
bem que falsamente, e veremos como encara este objeto, pois o que eu vejo
é a capital em desordem, assustada a Assembleia, e proscrita a honra dos
seus membros; não sei mais nada.
Quisera, contudo, que o ministério de Sua Majestade me desse a razão de
ter feito este grande espalhafato, que não vejo preciso para coisa alguma;
e bom será que se reconheça aqui, por verdade, que a Assembleia não pode
dar providências, sem que o governo responda de outra forma, indicando as
que se julgam precisas, porque é evidente que ela não há de assinar de cruz.
Eis aqui o que tenho a dizer sobre o ofício. Agora, quanto à permanência
da sessão, creio que não há que discutir: devemos estar aqui até que este
negócio se termine, e acabem as desconfianças, recuperando a capital a sua
antiga segurança. Se não obrarmos assim, seremos fracos, incapazes de ser
deputados da generosa nação brasileira.
SR. HENRIQUES DE RESENDE: O que é a Assembleia? O que é o imperador?
São dois poderes, ambos e colhidos pela nação, e ambos encarregados da
segurança pública, que é e que atualmente não existe. O imperador retira
as tropas da capital como para acautelar algum perigo; e quando ele assim
se acautela, e toma medidas, deverão os membros da Assembleia ir dormir,
para sua casa? Quando assim trabalha o chefe da nação, deve a Assembleia
estar sossegada? Creio que não é precisa nenhuma outra reflexão para nos
conservarmos em sessão permanente.
O Sr. Presidente propôs à Assembleia:
lº Se devia ir o ofício à Comissão. Venceu-se que sim.
2º Se devia ficar-se em sessão permanente. Venceu-se que sim.
Como era preciso completar a Comissão, porque o Sr. Barão de Santo
Amaro tinha saído, e o Sr. Andrada e Silva pediu dispensa por ser um dos
arguidos, declarou o Sr. Presidente que eram substituídos pelos imediatos
em votos, os Srs. Câmara e Carneiro, que tinham obtido 16 cada um.
O Sr. Silva Lisboa retirou-se, por incomodado, depois da uma hora.
O Sr. Vergueiro, às três horas e três quartos, voltou à sala com os mais
membros da Comissão Especial, e, como relator, leu o seguinte:
Anexo IV
223
PARECER
A Comissão Especial viu o ofício do ministro dos Negócios do Império,
datado de ontem e recebido hoje pela uma hora da manhã, em resposta ao
que foi dirigido ao mesmo ministro pelo secretário da Assembleia. Prin-
cipia o ministro, dizendo que o governo sente infinito que a Assembleia
Geral Constituinte e Legislativa desconheça a presente crise em que se
acha a capital, crise que até se manifestou neste augusto recinto a ponto
de suspender-se anteontem a sessão, o que junto à representação dos
oficiais de todos os corpos desta corte, por meio de uma deputação a S.M.
Imperial, deu motivo à prudente medida de se fazer marchar a tropa para
o campo de São Cristóvão, onde se conserva em toda a paz.
Depois disto, declara o ministro que os periódicos a que se refere a
representação são a Sentinella e o Tamoyo, atribuindo a influência em um
e a redação de outro aos Srs. Andrada Machado, Ribeiro de Andrada, e
Andrada e Silva, o que confessa o governo que muito lhe custa a crer,
sendo a consequência das suas doutrinas produzir partidos incendiários,
de que não pode calcular a força que têm e poderão adquirir. E conclui
que as medidas legislativas serão mais acertadas provindo da sabedoria
do corpo legislativo.
A Comissão não pode compreender como o governo se persuadisse
que a Assembleia desconhece a atual crise, quando esta em seu ofício,
em resposta ao do governo, fez sentir quanto lhe era doloroso o aconte-
cimento que deu lugar à inquietação do povo desta cidade, passando a
declarar-se em sessão permanente, ainda que não desse importância à
comoção das galerias, que consistiu apenas em meros apoiados.
Quanto à representação em que ora se sabe tiveram parte os oficiais
de todos os corpos por meio de uma deputação, como o governo assegura
ter sido feita com submissão, e não consta que excedesse os limites de
petição, nada tem a Comissão que propor.
Quanto ao abuso da liberdade da imprensa, reconhece a Comissão
ter havido excesso nos periódicos apontados pelo ministro, e em alguns
outros, o que de certo tem provindo de falta de legislação própria que
os contenha, o que a Assembleia já reconheceu, preferindo a discussão
da lei sobre tais abusos a outras matérias. E a Comissão é de parecer
que se suspenda a discussão do projeto de Constituição até se concluir
a referida lei, o que parece será suficiente para restabelecer o sossego,
em vista da certeza afirmada pelo ministro, da subordinação da tropa, do
respeito da mesma às autoridades constituídas, e firme adesão ao sistema
constitucional.
Entretanto, se o governo julga que a presente crise é de tal magni-
tude que possa ainda perigar a segurança pública com a demora que é
indispensável na discussão da lei, declarando-o assim, parece à Comis-
são que se façam algumas restrições na liberdade da imprensa, até que
se ponha em execução a lei que deve regular.
Anexo IV
225
está coacta, e que não podemos deliberar assim, porque nunca se delibera
debaixo de punhais de assassinos. Por consequência, quero que se acres-
cente e se diga ao governo que, não havendo motivo que justifique os mo-
vimentos da tropa, exponha o fim verdadeiro deles, e que proponha quais
são as medidas que quer postas em prática; e que se diga a razão por que
apontou que se desejava que a Assembleia expulsasse do seu seio os ditos
deputados, e o motivo por que os designou.
Mostre-se-lhe que, ainda que somos obrigados a morrer pelo povo brasi-
leiro, isto se entende quando essa morte for útil, quando servir para aniqui-
lar a escravidão, e que, estando a Assembleia nesta corte rodeada da força
armada, está coacta e não pode continuar a deliberar.
Faça-se, enfim, saber ao governo que não há senão as baionetas que per-
turbam o sossego público; que apoiados do povo nunca se podem considerar
como provas de inquietações; e que é ridículo, e induz a crer que o governo
não tem a que se apegar, o querer persuadir que a inquietação de toda a
capital procede de apoiados das galerias, e que este desassossego exige me-
didas extraordinárias.
A Comissão lembra-se de restrições à liberdade de imprensa, mas é ne-
cessário não esquecer que uma lei sobre este objeto há de fazer-se como
outra qualquer, nem que as que há são mancas a respeito de escritos incen-
diários.
Em uma palavra, se há abuso, ao governo pertence tomar medidas contra
ele, fazendo chamar a jurados os infratores. O governo tem na sua mão tudo
que é necessário. Não se precisam novas restrições, e nisso me oponho in-
teiramente ao parecer da Comissão. O que eu desejava é que ela falasse com
mais clareza, que dissesse que o que nos faltava na capital era o sossego, e
nada mais.
E como o haverá, vendo-se toda a tropa reunida ao chefe da nação, sem
se saber para que fim?
O governo, pois, é que pode evitar este desassossego; o remédio está na
sua mão; mande para longe essa tropa que com tanta energia chama subor-
dinada. Não se crimine o povo brasileiro pelo que aconteceu anteontem; ele
é muito manso; ninguém executa melhor o evangelho do que ele.
Não admito, pois, restrições à liberdade de imprensa; o que quero é que
se diga ao governo que a falta de tranquilidade procede da tropa e não do
povo; e que a Assembleia não se acha em plena liberdade como é indispen-
sável para deliberar, o que só se poderá conseguir removendo-se a tropa
para maior distância. Eu mando à Mesa uma emenda:
EMENDA
Que se diga ao governo que a Assembleia não tem conhecimento de
inquietação na capital, que não seja o susto causado pela reunião repen-
tina de tropas. Que os apoiados do povo que deram causa a se levantar a
sessão não podem pela Assembleia ser considerados como prova de per-
turbações na capital. Que as leis ordinárias são suficientes para reprimir
os escritos chamados incendiários, e que, quando haja falhas nas ditas
leis, a que se está discutindo as suprirá. Que as tropas que se afirma serem
subordinadas parecem, ao contrário, sediciosas à vista dos seus atos. Que
a Assembleia, na presença de uma força armada, mal reprimida pelo go-
verno, e indisposta contra membros seus, se não acha em perfeita liber-
dade para poder deliberar, e espera que o governo dê o preciso remédio,
removendo as tropas para maior distância.
Andrada Machado
Anexo IV
227
À vista, pois, do que digo, parece que a Comissão não cometeu erro
em propor as restrições, sem, contudo, designar quais elas devam ser; e
julgou-as suficientes para restabelecer a tranquilidade pública, porque o
ministério afiança a subordinação da tropa, e pede providências contra os
excessos daquela liberdade, a que atribui o desassossego; nem sei como
o nobre preopinante indica por nova na sua emenda, que, antes, é uma
indicação, a declaração de não ser o povo, mas a tropa, quem tem desas-
sossegado a capital, salvo se não atendeu para o final do parecer, onde isso
expressamente se menciona.
Quanto à medida da remoção das tropas, que propõe o nobre deputado,
eu estou tão longe de a considerar útil, que antes a encaro como um novo
mal, e talvez de consequências bem funestas porque, removida a tropa,
facilitava-se a influência dos partidos, e os resultados seriam mui tristes.
A tropa sustenta o vigor do governo e a segurança pública, uma vez que
ela se acha, como afirma Sua Majestade, na maior subordinação; e a sua au-
sência poderá causar males extraordinários, por se facilitarem aos partidos
os meios de se desenvolverem.
Voto, portanto, contra a indicação como inadmissível no presente caso.
SR. CARNEIRO DA CUNHA: Falarei só sobre o que é relativo à parte da res-
posta do ministério, em que aponta o levantamento da sessão como um dos
efeitos da crise atual, em que o povo se acha desassossegado, e observarei
que então não havia inquietação alguma no povo, pois os apoiados que deu
não foram mais que filhos do entusiasmo, e insuficientes até para se levan-
tar a sessão.
Os motivos de seu desassossego são outros, e são os que impossibilitam
a Assembleia de deliberar, e é com mágoa que eu vejo atacar o governo com
falsos pretextos à Assembleia nas pessoas de alguns dos seus deputados. Se
a tropa está subordinada, por que não restabelece o governo o sossego pú-
blico? Afiançar a subordinação da tropa e não restabelecer a tranquilidade
vale o mesmo que dizer: não o faço porque não quero, pois é indubitável que
o movimento da tropa é que tem causado o desassossego da capital.
O que eu vejo nisto é o governo a querer dar-nos a lei, e então vale mais
largarmos a nossa tarefa, uma vez que se pretende abater a dignidade da
Assembleia e a de um povo generoso que tantos sacrifícios tem feito para
proclamar a sua independência. E de que servirá continuar?
Quanto a mim, vejo-me coacto, nem já posso falar como devo, e como
tenho sempre falado a bem de meus constituintes. Sei bem que seja o que
for, o Brasil é muito vasto, e que não há de sofrer outra vez o jugo da
escravidão; não, não sofrerá jamais esse jugo vergonhoso; porém, não é
menos certo que não somos respeitados, e que sem liberdade não podemos
deliberar.
Portanto, Sr. Presidente, não desmintamos a confiança que em nós pôs a
nação inteira; abusos sempre houve até nos países clássicos da liberdade, e
a lei os castiga; e se nós vamos com restrições novas algemar aquela liber-
dade, não poderemos saber a opinião pública para nos regularmos sobre o
trabalho da Constituição, que queremos ordenar sábia, moderada, e análoga
às nossas circunstâncias.
Nós já estamos tratando do projeto de lei da liberdade de imprensa, ape-
sar de se discutir o da Constituição. Que quer, pois, o governo que façamos?
E quem o autoriza para nos dar leis?
Que quer dizer chamarem-se a um lugar todas as tropas até as milícias,
e serem chamadas por aquele que mereceu o voto unânime da nação, para
seu chefe? Isto indica alguma pretensão e põe em desconfiança os cidadãos
pacíficos.
Sendo estas as circunstâncias, vê-se claramente que a resposta do mi-
nistério não é sincera e, portanto, diga-se-lhe que, se quer que continuemos
as nossas sessões, tranquilize a capital, e que é falta de prudência atacar
assim a Assembleia nas pessoas de seus deputados, quando ela tem sempre
marcado as suas deliberações com o cunho da moderação... (O orador con-
tinuou, mas o taquígrafo declarou que do resto do discurso só escrevera as
seguintes últimas palavras.)
Portanto, para salvação do estado, é necessário que se remova, não a tropa,
mas a Assembleia para fora do Rio de Janeiro, e, por isso, voto que assim se
proponha ao governo, como faço ver na seguinte emenda que mando à Mesa:
EMENDA
Foi apoiada.
Anexo IV
229
EMENDA
Foi apoiada.
SR. MONTEZUMA: (Não escreveram os taquígrafos o seu discurso.) Man-
dou, também, outra emenda no teor seguinte:
EMENDA
Anexo IV
231
haviam preparado, porque eles não são eventuais… (Alguns Srs. Deputados
pediram que falasse mais alto).
Resolvi-me, pois, a ir pedir a sua Majestade a minha demissão; e com
efeito fui logo.
Eu tinha observado a marcha dos negócios depois que cheguei de Por-
tugal, e havia achado bastante semelhança neles com os que produziram os
últimos acontecimentos daquele reino, para bem prever logo o estado de
desordem a que as coisas chegariam, e conhecer que seriam inúteis em tal
ocasião todos os meus esforços.
Antes de chegar a São Cristóvão, encontrei a Sua Majestade no caminho,
apeei-me e expus as minhas razões para não poder encarregar-me de tão
dificultosa tarefa.
Sua Majestade instou que aceitasse a pasta, lembrando-me que na crise
atual os meus serviços eram necessários à minha pátria. Alguns Srs. De-
putados que aqui se acham sabem muito bem quanto ela pode em meu
coração.
Aceitei; e disse-me, então, Sua Majestade que os oficiais da tropa tinham
ido ao seu paço fazer-lhe uma representação, e que ele ia já mandar reuni-la
no campo de São Cristóvão para evitar algumas desordens.
No dia seguinte, quando fui a Sua Majestade, soube então o motivo da
dita representação.
Queixavam-se os oficiais dos insultos que se lhe faziam em alguns pe-
riódicos, atacando-os na sua honra e probidade; e mui particularmente das
injúrias dirigidas contra Sua Majestade e da falta de decoro e respeito para
com sua augusta pessoa, sendo até ameaçada a sua existência física e polí-
tica no periódico intitulado O Tamoyo.
Algumas medidas se exigiam, que não se declararam no 1º ofício que tive
a honra de remeter a esta augusta Assembleia, mas que relatarei, se a isso
for obrigado, porque se julgou suficiente, e mesmo preciso, só indicá-las,
não podendo a perspicácia e sabedoria da Assembleia deixar de penetrar e
conhecer o negócio em toda sua extensão, para dar as providências de que
se necessitava.
Pediram-se, porém, miúdas explicações ao governo, e este satisfez com
o 2º ofício, como julgou que devia, entendendo não lhe ser decoroso nem
preciso descer a particularidades para delas se tirarem medidas gerais.
Com efeito, esperava alguma medida conciliadora, qual era pelo menos
uma lei que coibisse o abuso da liberdade da imprensa, principal motivo
daquela representação.
Mas não sucedeu assim; e fui chamado para dar ainda novas explicações
sobre os mesmos ofícios.
Entretanto, o que posso afirmar é que Sua Majestade não tem cessado
de empregar todos os seus desvelos e buscado todos os meios de manter a
ordem e a harmonia que tanto convém.
SR. MONTEZUMA: Eu estimaria que V.Exa. quisesse relatar essas coisas
que se exigiam da Assembleia, e que V.Exa. disse que referiria, se quisessem.
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Duas coisas se exigiam: 1a que se coibisse
imediatamente a liberdade da imprensa; 2a já que me obrigaram a referir
nomes de pessoas que aliás prezo, que fossem expulsos da Assembleia os
Srs. Andradas, como redatores do Tamoyo e colaboradores do Sentinella.
As razões do governo para não ter declarado isto nos ofícios que dirigia
à Assembleia foram: quanto à 1a, o evitar que se dissesse que, tendo sido
fustigado pela imprensa o ministério passado, procurava já o presente pôr-
-lhe mordaça para não se censurarem suas ações; quanto à 2a, o não querer
merecer a justa acusação de fraco e de ignorante, levando à presença da
Assembleia uma pretensão tão inconstitucional.
SR. ANDRADA MACHADO: Sr. Presidente, desejara que V.Exa. convidasse
o Exmo. Ministro a que nos dissesse se sabe quais foram os corpos que pri-
meiro pegaram em armas, e quais os oficiais que fizeram a representação,
isto é, se acaso são de todos os corpos, ou só do corpo de artilharia montada
e do 1º batalhão de caçadores.
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Eu já disse que ontem pela primeira vez estive
com Sua Majestade na qualidade de ministro de Estado; a esse tempo estava
feita a representação, e não sei que oficiais a fizeram. A respeito de corpos
que primeiro pegaram em armas, também nada posso dizer.
SR. ANDRADA MACHADO: Eu vejo a Assembleia um pouco vacilante sobre
o partido que deve tomar para salvar-se desta grande tormenta. Julgo ser
melhor seguir o interrogatório que está feito sobre os pontos que se preci-
sam explicados, e escreverem-se as respectivas respostas, para, à vista de
tudo, poder depois a Assembleia deliberar.
Assentou-se que assim se fizesse.
SR. PRESIDENTE: Queira V.Exa. dizer se os oficiais fizeram a representa-
ção de viva voz ou por escrito.
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Sua Majestade disse-me que fora de viva voz.
SR. PRESIDENTE: Qual foi a matéria da representação? E, além da queixa
dos ultrajes, pediu-se o extermínio de alguns cidadãos?
Anexo IV
233
SR. PRESIDENTE: Que medidas ordinárias tem o governo tomado para res-
tabelecer a tranquilidade e terminar desconfianças?
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: A primeira foi expedir-se ordem pela reparti-
ção da justiça para devassa e punição dos culpados; e a segunda a retirada
da tropa. Esta, porém, não se deu por conselho do ministério; já estava
dada antes dele reunido. O que posso afirmar é que Sua Majestade ali as
conserva em perfeita subordinação.
SR. PRESIDENTE: Foi o ministério sabedor da reunião das tropas que mar-
charam depois que o mesmo ministério foi nomeado?
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Não foi sabedor; estas medidas são da reparti-
ção da guerra, e só o respectivo ministro poderá informar sobre este objeto.
SR. PRESIDENTE: Por que razão, estando a cidade em sossego, se conserva
a tropa municiada de pólvora e bala?
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Não me consta que o esteja, à exceção de algu-
mas patrulhas que rondam, como é preciso e prudente na crise atual.
SR. ANDRADA MACHADO: Eu desejara que o Exmo. Ministro declarasse
positivamente, não quanto às patrulhas que rondam, mas quanto à tropa
que está em São Cristóvão, se está municiada, como se diz em toda a ci-
dade, e se à artilharia montada se tem dado novo cartuchame.
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Nada posso informar; tenho visto as tropas
acampadas, mas não sei como estão.
SR. RIBEIRO DE ANDRADA: Quisera que V.Exa. convidasse o Exmo. Minis-
tro para nos declarar, no caso de o saber, se as patrulhas têm ordem de pren-
der os redatores de alguns periódicos, porque consta que o francês Milliet
fora ontem agarrado por uma patrulha miliciana por se julgar que era o
redator do Tamoyo.
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Pela parte da polícia que recebi, nada me
consta, nem sei que haja ordem para isso.
SR. PRESIDENTE: Por que não tem pedido o ministério à Assembleia as
medidas legislativas, de que julga precisar para remediar o mal?
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: O governo julgou ter informado à Assembleia
quanto bastava para esta ocorrer com as providências legislativas que en-
tendesse necessárias para evitar desordens, que talvez já se teriam manifes-
tado, se Sua Majestade, para prevenir alguma discordância entre a tropa, a
não tivesse reunido debaixo das suas vistas.
SR. CÂMARA: Queira V.Exa. perguntar ao Exmo. Ministro como se concilia
a subordinação em que disse que as tropas estavam com essa discordância
de que fala agora. Isto precisa alguma explicação.
Anexo IV
235
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Nada posso dizer. O tempo que tenho estado
ao lado de Sua Majestade é muito pouco para adquirir esse conhecimento
que me supõem, e o que sei do espírito da tropa já o disse nos meus ofícios.
SR. ANDRADA MACHADO: Eu também quisera que V.Exa. convidasse o
Exmo. Ministro para nos dizer se tem alguns dados para julgar que aconte-
cerá aqui o mesmo que em Portugal, porque semelhança não a acho. Só se o
negócio se encaminha aos mesmos fins por meios diferentes.
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Não tenho outros dados mais que a seme-
lhança dos sucessos, que talvez sejam essencialmente diferentes, mas na
exterioridade que apresentam são mui parecidos. Se o ilustre deputado não
nota o mesmo, depende isso do modo com que cada um encara os objetos.
SR. CARNEIRO DA CUNHA: Eu concordo com o Sr. Antônio Carlos, acho
muita disparidade, porque em Portugal...
SR. MINISTRO DO IMPÉRIO: Sr. Presidente, eu peço que chame V.Exa. o
ilustre deputado à ordem. Eu tenho talvez dito mais do que devera. Vim aqui
para responder unicamente sobre os ofícios do governo, e dar as explicações
que soubesse e não para entrar em discussão com os Srs. Deputados.
SR. CARNEIRO DA CUNHA: Falo somente para esclarecimento da matéria.
Tenha o Exmo. Ministro mais um bocadinho de paciência, que eu não me
demoro. Que se fez em Portugal? Chamou o infante as tropas para depor as
cortes; e aqui o chefe da nação as chama para as manter na boa ordem, e
com efeito estão subordinadas...
SR. ANDRADA MACHADO: Por bem da ordem, isso não tem lugar: um mi-
nistro de Estado, quando vem a uma Assembleia, é para responder e não
para discutir.
SR. PRESIDENTE: A Assembleia está satisfeita e pode V.Exa. retirar-se.
Retirou-se, então, o ministro com as mesmas formalidades com que
tinha sido recebido.
SR. ANDRADA MACHADO: Como três Srs. Secretários escreveram as res-
postas do ministro, bom será ler os seus apontamentos para se combina-
rem, e ficar a Assembleia bem inteirada do que se passou.
Fez-se a leitura.
SR. MONTEZUMA: Noto só uma inexatidão: eu disse, em uma das oca-
siões em que falei, que o ministro poderia, por estar mais ao lado de Sua
Majestade, conhecer melhor o espírito da tropa, e um dos Srs. Secretários
escreveu espírito de Sua Majestade, quando não disse tal, porque deste não
duvido eu.
Anexo IV
237
Anexo IV
239
SR. ANDRADA MACHADO: Ainda que o ministro nada mais disse do que
tinha dito nos seus ofícios, se assim o querem, vá tudo à Comissão.
S R. A N D R A DA E S I LVA: Também sou do mesmo voto: estou capaci-
tado que sempre haverá mais dados do que havia pelos ofícios, que nada
eram; e poderá a Comissão firmar melhor o seu parecer, ampliando-o ou
reformando-o; por consequência voto que vá à Comissão.
SR. VERGUEIRO: Sr. Presidente, parece-me inútil ir à Comissão, porque
de fato não acresceu coisa alguma ao que estava relatado nos ofícios.
Sobre os objetos a que pedimos explicações, o ministro não as deu; que-
ríamos saber que insultos eram esses de que a tropa se queixava, e qual era o
espírito dela, e nada soubemos: disse-se o que já nos constava, que se pediam
providências sobre abusos de liberdade de imprensa, porque a respeito do re-
querimento da demissão dos três Srs. Deputados declarou o ministro que fora
rejeitado. Portanto, como nada acresce, não vejo motivo para ir novamente à
Comissão, não tendo esta para dar outro parecer senão factos velhos já con-
siderados; isto servirá para gastar tempo inutilmente.
Quando porém houvesse de ir a alguma comissão, eu diria que fosse a
outra, porque pode considerar o negócio de diferente maneira, e até pela
regra de que mais vêm quatro olhos do que dois. Talvez se descubra assim
alguma outra medida que seja conveniente adotar; mas à mesma Comissão
nunca votarei que volte.
SR. MARIANO DE ALBUQUERQUE: No caso de ir à Comissão, quisera que
se ajuntasse o parecer já dado com as emendas e aditamentos que a ele se
ofereceram, para poder a Comissão fundar bem o seu parecer.
SR. ALENCAR: Eu também voto que vá à Comissão, mas quero apresentar
à Assembleia uma ideia que me parece digna de toda a atenção, e que se
deve ter em vista antes de se tomar qualquer deliberação, ou se dar alguma
providência mesmo sobre a liberdade da imprensa, como a tropa espera.
Para que não pareça que a Assembleia está coacta, ainda que o não es-
teja, acho que primeiro se deve decidir se estamos em estado de deliberar
com a liberdade que é necessária, porque pode parecer fora que estamos
coactos; e então, ainda que a providência que tomássemos fosse filha da
mais decidida prudência e adaptada às circunstâncias, sempre se havia de
dizer que se fez o que a tropa quis, e que para isso estava em armas, e isto
mesmo entenderá a tropa, ou quem estiver à frente dela.
Que importa que a Assembleia obre em liberdade se qualquer coisa
que delibere há de, pelos estrangeiros que aqui estão, e pelas províncias,
considerar-se que foi o que a tropa quis, e não o que nós entendemos? Acho,
Anexo IV
241
coisas que declarou que não sabia são importantes, e portanto responda a
elas o ministro da Guerra.
Estou persuadido que um deputado deve propor tudo o que lhe parecer
conveniente, embora a Assembleia o rejeite, e, aproveitando-se esta ideia,
ao menos há de se deliberar com mais conhecimento de causa.
Eu estou certo que alguns Srs. Deputados hão de dizer que a Assem-
bleia tem infinitos dados para deliberar sobre o parecer da Comissão, mas
eu desejo tudo muito e muito esclarecido, e, por isso, requeiro a V.Exa. que
proponha à consideração da Assembleia o que lembro na seguinte:
INDICAÇÃO
Deputado Montezuma
SR. SILVA LISBOA: Sr. Presidente, não posso assentir à proposta de se cha-
mar o ministro da Guerra a esta augusta Assembleia porque, além de des-
necessário depois da informação nela dada pelo ministro dos Negócios do
Império, sobre o que declarou em seus dois ofícios, entendo ser indecente
fazer interrogatórios sobre um objeto de tanto melindre e consequência.
O caso é o mais extraordinário e regularíssimo, visto entrar nele o mi-
nistério na ocasião da crise em que se acha esta Assembleia. Seria tortura
compeli-lo a responder sobre o fato da tropa, pois o reduziria a perigo
de comprometer, ou a seu antecessor, ou a si próprio, ou, o que ainda é de
maior ponderação, ao nosso imperador, a respeito das ordens dadas para o
movimento e atual estado da mesma tropa.
Confesso que vi com desgosto decidir-se conforme ao parecer da Co-
missão Especial e fazerem-se tantas perguntas ao ministro do Império,
que pareceram reunir as categorias de Aristóteles, do tempo, lugar, modo,
etc., para a averiguação dos motivos e destinos que tiveram os corpos mi-
litares para saírem dos seus quartéis.
Não se pode negar às tropas o direito de peticionar, dirigindo-se a uma
das supremas autoridades como o chefe da força armada da nação.
O ministro informou que os oficiais dos corpos fizeram vocal represen-
tação.
Nisso nada mais fizeram que usar do seu direito de petição, que é cons-
titucional e comum a qualquer indivíduo ou corpo.
O mesmo ministro declarou que S.M. Imperial não deferira ao seu pe-
dido da demissão dos deputados que nomearam e de que fizeram queixa
que haviam ofendido, não só a sua honra, mas também a honra do mesmo
augusto senhor.
É bem sabido que o corpo militar tem mui sublimadas ideias da honra da
sua profissão, e, por isso, ostenta um pundonor que às vezes é exagerado,
ou sem proporcionado objeto; todavia, sempre é digno de contemplação nos
justos limites.
Sr. Presidente, para que se figura a retirada dos corpos militares e a sua
atitude atual em São Cristóvão, em ponto de vista odioso, e como em blo-
queio desta capital?
O povo está, e tem estado, tranquilo. Ontem bem se viu que esteve nas
galerias desta Assembleia, sem que entrasse na sala, como no dia antece-
dente, não havendo aliás ordem alguma em contrário, e só porque foram
certificados que o Regimento lhe designava o lugar somente nas mesmas
galerias, e se manifestaram opiniões dos deputados contra a licença conce-
dida na sessão de 10. Isto prova ser o povo fluminense um povo de ordem.
Sinto que um dos Srs. Deputados então me arguisse, dizendo que eu
temia o povo generoso do Brasil, e não temia a tropa. Eu, não obstante os
cabelos brancos da mirrada cabeça, não sei o que é temor, quando encha o
que é dever, mas sei também qual é o perigo de ajuntamentos populares, que
podem degenerar em tumultos. Prezo-me de ser cauteloso, sem fantasiar
de ser capoeira, e perdoe-me esta augusta Assembleia o ter-me escapado
este nome do vulgo, impróprio ao lugar e objeto. Não é racionável o pôr em
contraste, e menos em conflito, o corpo do povo com o corpo militar, que
aliás faz parte, e mui importante parte, do mesmo povo, por ter a especial
atribuição da defesa nacional, o que constitui a sua profissão mui honorífica,
vivendo os que a ela se dedicam de heroicos sacrifícios da própria vida pela
segurança dos seus concidadãos e glória do Estado.
Ouvi falar com entusiasmo sobre os objetos desta sessão permanente,
até invocando-se manes dos brasileiros e hidras da fábula. Eu também sei
chamar almas dos mortos e apostrofar aos montes, vales, rios com as mais
artes do estilo declamatório. Mas prescindo destes expedientes, porque só
interessa ao império tratar tais assuntos com serenidade, para se preveni-
rem os males da pátria.
Não é compatível com o sistema constitucional erigir-se o Poder Legis-
lativo na competência do Poder Executivo, que tem a confiança nacional,
para providenciar a segurança pública. O nosso imperador está exercendo o
emprego do seu título de defensor perpétuo do Brasil.
Anexo IV
243
Anexo IV
245
Anexo IV
247
SR. ANDRADA MACHADO: Creio que a ilustre Comissão pode dar o seu pa-
recer, porque nós devemos continuar a sessão, apesar da aproximação da
força armada.
SR. LOPES GAMA: E eu creio que não podemos deliberar estando cercados.
DECRETO
SR. RIBEIRO DE ANDRADA: Creio que V.Exa. deve mandar tirar uma cópia
do decreto para ficar aqui, e entregar-se o original ao oficial que o trouxe.
O Sr. Secretário Calmon tirou a cópia.
SR. GALVÃO: Sr. Presidente, eu devo declarar que este oficial me disse que
S.M. Imperial mandara esta tropa para defender a Assembleia de qualquer
insulto que se lhe pretendesse fazer.
Muitos Srs. Deputados disseram que agradeciam a Sua Majestade.
Anexo IV
249
ANEXO V
TÍTULO I
DO TERRITÓRIO DO IMPÉRIO DO BRASIL
Art. 1º O império do Brasil é um, e indivisível, e estende-se desde a foz
do Oiapoque até os trinta e quatro graus e meio ao Sul.
Art. 2º Compreende as províncias do Pará, Rio Negro, Maranhão, Piauí,
Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe d’El-Rei,
Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande
do Sul, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, as ilhas Fernando de Noronha e
Trindade, e outras adjacentes, e, por federação, o estado Cisplatino.
Art. 3º A nação brasileira não renuncia ao direito que possa ter a algu-
mas outras possessões não compreendidas no artigo 2º.
Art. 4º Far-se-á do território do império conveniente divisão em comar-
cas, destas em distritos, e dos distritos em termos, e nas divisões se aten-
derá aos limites naturais e igualdade de população, quanto for possível.
TÍTULO II
DO IMPÉRIO DO BRASIL
CAPÍTULO I
DOS MEMBROS DA SOCIEDADE DO IMPÉRIO DO BRASIL
Art. 5º São brasileiros:
73 Texto extraído do tomo 5 dos Anais da Assembleia Constituinte de 1823 (Brasil, 1880, p. 12-24).
CAPÍTULO II
DOS DIREITOS INDIVIDUAIS DOS BRASILEIROS
Art. 7º A Constituição garante a todos os brasileiros os seguintes direitos
individuais, com explicações e modificações anexas:
I. A liberdade pessoal.
II. O juízo por jurados.
III. A liberdade religiosa.
IV. A liberdade de indústria.
V. A inviolabilidade da propriedade.
VI. A liberdade da imprensa.
Art. 8º Nenhum brasileiro será obrigado a prestar gratuitamente, contra
sua vontade, serviços pessoais.
Art. 9º Nenhum brasileiro, pois, será preso sem culpa formada, exceto
nos casos marcados na lei.
Anexo V
253
Art. 10. Nenhum brasileiro, ainda com culpa formada, será conduzido
à prisão, ou nela conservado estando já preso, uma vez que preste fiança
idônea nos casos em que a lei admite fiança, e, por crimes a que as leis não
imponham pena maior do que seis meses de prisão, ou desterro para fora da
comarca, livrar-se-á solto.
Art. 11. Nenhum brasileiro será preso, à exceção de flagrante delito,
senão em virtude de ordem do juiz ou resolução da sala dos deputados, no
caso em que lhe compete decretar a acusação, que lhe devem ser mostradas
no momento da prisão; excetua-se o que determinam as ordenanças milita-
res respeito à disciplina e recrutamento do Exército.
Art. 12. Todo brasileiro pode ficar ou sair do império quando lhe conve-
nha, levando consigo seus bens, contanto que satisfaça aos regulamentos
policiais, os quais nunca se estenderão a denegar-se-lhe a saída.
Art. 13. Por enquanto haverá somente jurados em matérias criminais; as
cíveis continuarão a ser decididas por juízes e tribunais. Esta restrição dos
jurados não forma artigo constitucional.
Art. 14. A liberdade religiosa no Brasil só se estende às comunhões cris-
tãs; todos os que as professarem podem gozar dos direitos políticos no
império.
Art. 15. As outras religiões, além da cristã, são apenas toleradas, e sua
profissão inibe o exercício dos direitos políticos.
Art. 16. A religião católica apostólica romana é a religião do Estado por
excelência, e única mantida por ele.
Art. 17. Ficam abolidas as corporações de ofícios, juízes, escrivães e
mestres.
Art. 18. A lei vigiará sobre as profissões que interessam os costumes, a
segurança e a saúde do povo.
Art. 19. Não se estabelecerão novos monopólios, antes as leis cuidarão
em acabar com prudência os que ainda existem.
Art. 20. Ninguém será privado de sua propriedade sem consentimento
seu, salvo se o exigir a conveniência pública, legalmente verificada.
Art. 21. Neste caso será o esbulhado indenizado com exatidão, atento
não só [a]o valor intrínseco, como [a]o de afeição, quando ela tenha lugar.
Art. 22. A lei conserva aos inventores a propriedade das suas descober-
tas, ou das suas produções, segurando-lhes privilégio exclusivo temporário,
ou remunerando-os em ressarcimento da perda que hajam de sofrer pela
vulgarização.
Art. 23. Os escritos não são sujeitos a censura, nem antes, nem depois
de impressos; e ninguém é responsável pelo que tiver escrito, ou publicado,
salvo nos casos, e pelo modo, que a lei apontar.
Art. 24. Aos bispos, porém, fica salva a censura dos escritos publicados
sobre dogma e moral; e quando os autores, e na sua falta os publicado-
res, forem da religião católica, o governo auxiliará os mesmos bispos, para
serem punidos os culpados.
Art. 25. A Constituição proíbe todos os atos atentatórios aos direitos já
especificados; proíbe, pois, prisões, encarceramentos, desterros e quaisquer
inquietações policiais arbitrárias.
Art. 26. Os poderes constitucionais não podem suspender a Constituição
no que diz respeito aos direitos individuais, salvo nos casos e circunstâncias
especificadas no artigo seguinte.
Art. 27. Nos casos de rebelião declarada, ou invasão de inimigos, pedindo
a segurança do Estado que se dispensem por tempo determinado algumas
das formalidades que garantem a liberdade individual, poder-se-á fazer por
ato especial do Poder Legislativo, para cuja existência são mister dois terços
de votos concordes.
Art. 28. Findo o tempo da suspensão, o governo remeterá relação moti-
vada das prisões, e quaisquer autoridades que tiverem mandado proceder a
elas serão responsáveis pelos abusos que tiverem praticado a este respeito.
CAPÍTULO III
DOS DIREITOS POLÍTICOS NO IMPÉRIO DO BRASIL
Art. 29. Os direitos políticos consistem e ser-se membro das diversas au-
toridades nacionais, e das autoridades locais, tanto municipais, como admi-
nistrativas, e em concorrer-se para a eleição dessas autoridades.
Art. 30. A Constituição reconhece três graus diversos de habilidade
política.
Art. 31. Os direitos políticos perde:
I. O que se naturalizar em país estrangeiro.
II. O que, sem licença do imperador, aceitar emprego, pensão, ou conde-
coração de qualquer governo estrangeiro.
Art. 32. Suspende-se o exercício dos direitos políticos:
I. Por incapacidade física ou moral.
II. Por sentença condenatória a prisão ou degredo, enquanto durarem os
seus efeitos.
Anexo V
255
CAPÍTULO IV
DOS DEVERES DOS BRASILEIROS
Art. 33. É dever de todo brasileiro:
I. Obedecer à lei e respeitar seus órgãos.
II. Sofrer com resignação o castigo que ela lhe impuser, quando ele a
infringir.
III. Defender pessoalmente sua pátria, ou por mar, ou por terra, sendo
para isso chamado, e até morrer por ela, sendo preciso.
IV. Contribuir para as despesas públicas.
V. Responder por sua conduta como empregado público.
Art. 34. Se a lei não é lei senão no nome, se é retroativa, ou oposta à
moral, nem por isso é lícito ao brasileiro desobedecer-lhe, salvo se ela ten-
desse a depravá-lo e torná-lo vil e feroz.
Art. 35. Em tais circunstâncias é dever do brasileiro negar-se a ser o exe-
cutor da lei injusta.
TÍTULO III
DA CONSTITUIÇÃO DO IMPÉRIO E REPRESENTÇÃO NACIONAL
Art. 36. A constituição do Império do Brasil é monarquia representativa.
Art. 37. A monarquia é hereditária na dinastia do atual imperador, o Sr.
D. Pedro I.
Art. 38. Os representantes da nação brasileira são o imperador, e a As-
sembleia Geral.
Art. 39. Os poderes políticos reconhecidos pela Constituição do império
são três: o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário.
Art. 40. Todos estes poderes no império do Brasil são delegações da
nação, e sem esta delegação qualquer exercício de poderes é usurpação.
TÍTULO IV
DO PODER LEGISLATIVO
CAPÍTULO I
DA NATUREZA E ÂMBITO DO PODER
LEGISLATIVO E SEUS RAMOS
Art. 41. O Poder Legislativo é delegado à Assembleia Geral, e ao impera-
dor conjuntamente.
Art. 42. Pertence ao Poder Legislativo:
CAPÍTULO II
DA ASSEMBLEIA GERAL
Seção I
Sua divisão, atribuições e disposições comuns
Art. 43. A Assembleia Geral consta de duas salas: sala de deputados e
sala de senadores ou Senado.
Art. 44. É da atribuição privativa da Assembleia Geral, sem participação
do outro ramo da legislatura:
I. Tomar juramento ao imperador, ao príncipe imperial, ao regente ou
regência.
II. Eleger regência nos casos determinados e marcar os limites da auto-
ridade do regente ou regência.
III. Resolver as dúvidas que ocorrem sobre a sucessão da coroa.
IV. Nomear tutor ao imperador menor, caso seu pai o não tenha nomeado
em testamento.
V. Expedir cartas de convocação de futura Assembleia, se o impera-
dor o não tiver feito dois meses depois do tempo que a Constituição lhe
determinar.
Anexo V
257
na sala em que isto tem lugar, o farão saber ao imperador por uma depu-
tação, composta de igual número de senadores e deputados.
Art. 62. Igual deputação será mandada ao imperador oito dias antes de
findar cada sessão por ambas as salas de acordo, para anunciar o dia em que
se propõe terminar as suas sessões.
Art. 63. Tanto na abertura, como no encerramento, e quando vier o im-
perador, o príncipe imperial, o regente ou regência prestar juramento, e nos
casos marcados nos arts. 90 e 232, reunidas as duas salas tomarão assento
sem distinção, mas o presidente do senado dirigirá o trabalho.
Art. 64. Quer venha o imperador por si, ou por seus comissários, assim à
abertura, como ao encerramento da Assembleia, quer não venha, sempre ela
começará ou encerrará os seus trabalhos nos dias marcados.
Art. 65. Na presença do imperador, príncipe imperial, regente ou regên-
cia, não poderá a Assembleia deliberar.
Art. 66. O exercício de qualquer emprego, à exceção de ministro de Es-
tado e conselheiro privado do imperador, é incompatível com as funções de
deputado ou senador.
Art. 67. Não se pode ser ao mesmo tempo membro de ambas as salas.
Art. 68. Os ministros de Estado podem ser membros da sala da Assem-
bleia, contanto que o número dos ministros que tiverem assento esteja, para
com os membros da sala para que entrarem, na proporção de um para vinte
e cinco.
Art. 69. Sendo nomeados mais ministros do que aqueles que podem ter
assento na sala, em razão da proporção já mencionada, serão preferidos os
que tiverem mais votos, contados todos os que obtiveram nos diversos dis-
tritos do império.
Art. 70. Os membros das salas podem ser ministros de Estado; e na sala
do Senado continuarão a ter assento, uma vez que não excedam à proporção
marcada.
Art. 71. Na sala dos deputados, nomeados alguns para ministros, vagam
os seus lugares, e se manda proceder a novas eleições por ordem do presi-
dente, nas quais podem, porém, ser contemplados, e reeleitos, e acumular
as duas funções, quando se não viole a proporção marcada.
Art. 72. Os deputados e senadores são invioláveis pelas suas opiniões
proferidas na Assembleia.
Art. 73. Durante o tempo das sessões, e um termo marcado pela lei, se-
gundo as distâncias das províncias, [os deputados e senadores] não serão
Anexo V
259
Anexo V
261
arts. 84, 85, 86, 87, 88, 89 e 90, com a diferença de dizer “Senado” em vez de
“sala dos deputados” e assim inversamente.
Art. 107. É da atribuição exclusiva do Senado:
I. Conhecer dos delitos individuais cometidos pelos membros da família
imperial, ministros de Estado, conselheiros privados e senadores, e dos de-
litos dos deputados durante tão-somente a reunião da Assembleia.
II. Conhecer dos delitos de responsabilidade dos ministros de Estado e
conselheiros privados.
III. Convocar a Assembleia na morte do imperador para eleição de re-
gência, nos casos em que ela tem lugar, quando a regência provisional o
não faça.
Art. 108. No juízo dos crimes, cuja acusação não pertence à sala dos
deputados, acusará o procurador da coroa e soberania nacional.
Art. 109. Em todos os casos em que o Senado se converte em grande ju-
rado, poderá chamar para lhe assistir os membros do tribunal supremo de
cassação, que lhes aprouver, os quais, porém, responderão às questões que
se lhes fizerem, e não terão voto.
CAPÍTULO III
DO IMPERADOR COMO RAMO DE LEGISLATURA
Art. 110. O imperador exerce a proposição que lhe compete na confecção
das leis, ou por mensagem ou por ministros comissários.
Art. 111. Os ministros comissários podem assistir e discutir a proposta,
uma vez que as comissões na maneira já dita tenham dado os seus relató-
rios, mas não poderão votar.
Art. 112. Para execução da oposição ou sanção serão os projetos reme-
tidos ao imperador por uma deputação de sete membros da sala que por
último os tiver aprovado, e irão dois autógrafos assinados pelo presidente e
dois secretários da sala que os enviar.
Art. 113. No caso que o imperador recuse dar o seu consentimento, esta
denegação tem só o efeito suspensivo. Todas as vezes que as duas legislatu-
ras, que se seguirem àquela que tiver aprovado o projeto, tornem sucessiva-
mente a apresentá-lo nos mesmos termos, entender-se-á que o imperador
tem dado a sanção.
Art. 114. O imperador é obrigado a dar, ou negar, a sanção em cada de-
creto expressamente dentro em um mês, depois que lhe for apresentado.
Anexo V
263
Art. 115. Se o não fizer dentro do mencionado prazo, nem por isso dei-
xarão os decretos da Assembleia Geral de ser obrigatórios, apesar de lhes
faltar a sanção que exige a Constituição.
Art. 116. Se o imperador adotar o projeto da Assembleia Geral, se expri-
mirá pela maneira seguinte: “O imperador consente”; se o não aprovar, se
exprimirá deste modo: “O imperador examinará”.
Art. 117. Os projetos de lei adotados pelas duas salas, e pelo imperador,
no caso em que é precisa a sanção imperial, depois de promulgados ficam
sendo leis do império.
Art. 118. A fórmula da promulgação será concebida nos seguintes ter-
mos: “D. F. por graça de Deus e aclamação unânime dos povos, imperador e
defensor perpétuo do Brasil: fazemos saber a todos os nossos súditos, que
a Assembleia Geral decretou e nós queremos a lei seguinte (a letra da lei).
Mandamos, portanto, a todas as autoridades a quem o conhecimento e exe-
cução da referida lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar,
tão inteiramente como nela se contém. O secretário de Estado dos Negócios
de... (o da repartição respectiva) a faça imprimir, publicar e correr.
Art. 119. Referendada a lei pelo secretário competente, e selada com o
selo do Estado, guardar-se-á um dos originais no arquivo público, e o outro
igual assinado pelo imperador, e referendado pelo secretário competente,
será remetido ao Senado, em cujo arquivo se guardará.
Art. 120. As leis independentes de sanção serão publicadas com a mesma
fórmula daquelas que dependem de sanção, suprimidas, porém, as palavras
“e nós queremos”.
Art. 121. Não precisam de sanção para obrigarem, os atos seguintes da
Assembleia Geral e suas salas:
I. A presente Constituição e todas as alterações constitucionais, que
para o futuro nela se possam fazer.
II. Todos os decretos desta Assembleia, ainda em matérias regula-
mentares.
III. Os atos concernentes:
1. à polícia interior de cada uma das salas.
2. à verificação dos poderes dos seus membros presentes.
3. Às intimações dos ausentes.
4. À legitimidade das eleições ou eleitos.
5. Ao resultado do exame sobre o emprego da força armada pelo Poder
Executivo, nos termos dos arts. 231, 232, 235 e 242.
IV. Os atos especificados nos arts. 44, 91, 107, 113, 115 e 271.
TÍTULO V
DAS ELEIÇÕES
Art. 122. As eleições são indiretas, elegendo a massa dos cidadãos ativos
aos eleitores, e os eleitores aos deputados e igualmente aos senadores nesta
primeira organização do Senado.
Art. 123. São cidadãos ativos para votar nas assembleias primárias ou de
paróquia:
I. Todos os brasileiros ingênuos e os libertos nascidos no Brasil.
II. Os estrangeiros naturalizados.
Mas tanto uns como outros devem estar no gozo dos direitos políticos,
na conformidade dos arts. 31 e 32, e ter de rendimento líquido anual o valor
de cento e cinquenta alqueires de farinha de mandioca, regulado pelo preço
médio da sua respectiva freguesia, e provenientes de bens de raiz, comér-
cio, indústria ou artes, ou sejam os bens de raiz próprios ou foreiros, ou
arrendados por longo termo, como de nove anos e mais. Os alqueires serão
regulados pelo padrão da capital do império.
Art. 124. Excetuam-se:
I. Os menores de 25 anos, nos quais se não compreendem os casados e
oficiais militares que tiverem 21 anos, os bacharéis formados, e os clérigos
de ordens sacras.
II. Os filhos [de] famílias que estiverem no poder e companhia de seus
pais, salvo se servirem [a] ofícios públicos.
III. Os criados de servir, não entrando nesta classe os feitores.
IV. Os libertos que não forem nascidos no Brasil, exceto se tiverem pa-
tentes militares ou ordens sacras.
V. Os religiosos e quaisquer que vivam em comunidade claustral, não se
compreendendo, porém, nesta exceção os religiosos das ordens militares,
nem os secularizados.
VI. Os caixeiros, nos quis se não compreendem os guarda-livros.
VII. Os jornaleiros.
Art. 125. Os que não podem votar nas assembleias de paróquia não
podem ser membros de autoridade alguma eletiva nacional, ou local, nem
votar para a sua escolha.
Art. 126. Podem ser eleitores e votar na eleição dos deputados todos
os que podem votar nas assembleias de paróquia, contanto que tenham
de rendimento líquido anual o valor de duzentos e cinquenta alqueires de
farinha de mandioca, regulado pelo preço médio do lugar do seu domicílio,
Anexo V
265
Art. 135. Os cidadãos de todo o Brasil são elegíveis em cada distrito elei-
toral, ainda quando aí não sejam nascidos ou domiciliados.
Art. 136. O número dos deputados regular-se-á pela população.
Art. 137. Uma lei regulamentar marcará o modo prático das eleições e a
proporção dos deputados à população.
TÍTULO VI
DO PODER EXECUTIVO OU DO IMPERADOR
CAPÍTULO I
DAS ATRIBUIÇÕES, REGALIAS E JURAMENTO DO IMPERADOR
Anexo V
267
CAPÍTULO II
DA FAMÍLIA IMPERIAL E SUA DOTAÇÃO
Art. 146. A Assembleia Geral no princípio de cada reinado assinará ao im-
perador e à sua augusta esposa uma dotação anual correspondente ao decoro
de sua alta dignidade. Esta dotação não poderá alterar-se durante aquele
reinado; nem mesmo o da imperatriz no tempo de sua viuvez, existindo no
Brasil.
Art. 147. A dotação assinada ao presente imperador poderá ser alterada,
visto que as circunstâncias atuais não permitem que se fixe desde já uma
soma adequada ao decoro de sua augusta pessoa e dignidade da nação.
Art. 148. A Assembleia assinará também alimentos ao príncipe imperial
e aos demais príncipes desde que tiverem sete anos de idade. Estes alimen-
tos cessarão somente quando saírem para fora do império.
Art. 149. Quando as princesas houverem de casar, a Assembleia lhes as-
sinará o seu dote, e com a entrega dele cessarão os alimentos.
Art. 150. Aos príncipes, se casarem e forem residir fora do império, se
entregará por uma vez somente uma quantia determinada pela Assembleia,
com o que cessarão os alimentos que percebiam.
Art. 151. A dotação, alimentos e dotes, de que falam os cinco artigos
antecedentes, serão pagos pelo tesouro público, entregues a um mordomo
nomeado pelo imperador, com quem se poderão tratar as ações ativas e pas-
sivas concernentes aos interesses da casa imperial.
Art. 152. Os palácios e terrenos nacionais, possuídos atualmente pelo Sr.
D. Pedro, ficarão sempre pertencendo a seus sucessores; e a nação cuidará
nas aquisições e construções que julgar convenientes para decência e re-
creio do imperador e sua família.
CAPÍTULO III
DA SUCESSÃO DO IMPÉRIO
Art. 153. O Sr. D. Pedro, por unânime aclamação da nação, atual impe-
rador e defensor perpétuo, reinará para sempre, enquanto estiver no Brasil.
Art. 154. Da mesma maneira sucederá no trono a sua descendência le-
gítima, segundo a ordem regular da primogenitura e representação, prefe-
rindo em todo o tempo a linha anterior às posteriores; na mesma linha o
grau mais próximo ao mais remoto; no mesmo grau o sexo masculino ao
feminino; e no mesmo sexo a pessoa mais velha à mais moça.
Art. 155. No caso de extinção da dinastia do Sr. D. Pedro, ainda em vida
do último descendente, e durante o seu reinado, nomeará a Assembleia
Geral por um ato sua nova dinastia; subindo esta ao trono, regular-se-á
na forma do art. 154.
Art. 156. Se a coroa recair em pessoa do sexo feminino, seu marido não
terá parte no governo, nem se intitulará imperador e defensor perpétuo do
Brasil.
Anexo V
269
CAPÍTULO IV
DA MENORIDADE E IMPEDIMENTO DO IMPERADOR
Art. 159. O imperador é menor até a idade de 18 anos completos.
Art. 160. Durante a sua menoridade o império será governado por uma
regência.
Art. 161. A regência pertencerá ao parente mais chegado do impera-
dor, de um e outro sexo, segundo a ordem da sucessão, que tenha de idade
25 anos e não seja herdeiro presuntivo de outra coroa.
Art. 162. Se o imperador não tiver parente algum que reúna estas qua-
lidades, será o império governado por uma regência permanente nomeada
pelo Senado, sobre lista tríplice da sala dos deputados. Esta regência será
composta de três membros e o mais velho em idade será o presidente.
Art. 163. Enquanto se não eleger esta regência, será o império governado
por uma regência provisional composta dos dois ministros de Estado mais
antigos e dos dois conselheiros privados também mais antigos, presidida
pela imperatriz viúva, e na sua falta pelo mais antigo ministro de Estado.
Art. 164. Esta regência será obrigada a convocar a Assembleia Geral, e
se o não fizer, o Senado o fará, o qual para este efeito imediatamente se
reunirá.
Art. 165. Se o imperador, por causa física ou moral evidentemente reco-
nhecida por dois terços de cada uma das salas da Assembleia, se impossibili-
tar para governar, em seu lugar governará como regente o príncipe imperial,
se for maior de 18 anos. Todos os atos do governo serão emitidos em seu
próprio nome.
Art. 166. Se não tiver a precisa idade o príncipe imperial, observar-se-ão
os arts. 161, 162, 163 e 164.
Art. 167. Tanto o regente como a regência prestarão o juramento exarado
no art. 145, acrescentando-lhe a cláusula “de entregar o governo logo que o
imperador chegue à maioridade e cesse o seu impedimento”.
Art. 168. Ao juramento da regência provisional acrescentar-se-á a cláu-
sula “de entregar o governo à regência permanente”.
TÍTULO VII
DO MINISTÉRIO
Art. 173. Haverá diferentes secretarias de Estado; a lei designará os ne-
gócios pertencentes a cada uma e o seu número; as reunirá ou separará.
Art. 174. Os ministros referendarão os atos do Poder Executivo, sem o
que não são aqueles obrigatórios.
Art. 175. Os ministros são responsáveis:
I. Por traição.
II. Por concussão.
III. Por abuso do Poder Legislativo.
IV. Por exercício ilegal de poder ilegítimo.
V. Por falta de execução de leis.
Art. 176. Uma lei particular especificará a natureza destes delitos, e a
maneira de proceder contra eles.
Art. 177. Não salva aos ministros da responsabilidade a ordem do impe-
rador verbal, ou por escrito.
Art. 178. A responsabilidade dos ministros não destrói a de seus agen-
tes; ela deve começar no autor imediato daquele ato que é objeto do pro-
cedimento.
Art. 179. Não podem ser ministros de Estado:
I. Os estrangeiros posto que naturalizados.
II. Os cidadãos brasileiros nascidos em Portugal, que não tiverem doze
anos de domicílio no Brasil, e não forem casados com mulher brasileira por
nascimento, ou dela viúvos.
Anexo V
271
TÍTULO VIII
DO CONSELHO PRIVADO
Art. 180. Haverá um conselho privado do imperador composto de conse-
lheiros por ele nomeados, e despedidos ad nutum.
Art. 181. O imperador não pode nomear conselheiros senão aos cidadãos
que a Constituição não exclui.
Art. 182. São excluídos:
I. Os que não têm quarenta anos de idade.
II. Os estrangeiros, posto que naturalizados.
III. Os cidadãos brasileiros nascidos em Portugal, que não tiverem doze
anos de domicílio no Brasil, e não forem casados com mulher brasileira por
nascimento, ou dela viúvos.
Art. 183. Antes de tomarem posse prestarão os conselheiros privados
nas mãos do imperador juramento de manter a religião católica apostó-
lica romana, observar a Constituição e as leis, serem fiéis ao imperador,
e aconselhá-lo segundo as suas consciências, atendendo somente ao bem
da nação.
Art. 184. Os conselheiros privados serão ouvidos nos negócios graves,
particularmente sobre a declaração de guerra, ou paz, tratados, e adiamento
da Assembleia.
Art. 185. O príncipe imperial, logo que tiver dezoito anos completos, será
de fato e de direito membro do conselho privado; os outros príncipes da
casa imperial podem ser chamados pelo imperador para membros do con-
selho privado.
Art. 186. São responsáveis os conselheiros privados pelos conselhos que
derem, opostos às leis, e manifestamente dolosos.
TÍTULO IX
DO PODER JUDICIÁRIO
Art. 187. O Poder Judiciário compõe-se de juízes e jurados. Estes por en-
quanto têm só lugar em matérias criminais na forma do art. 13.
Art. 188. Uma lei regulará a composição do conselho dos jurados, e a
forma do seu procedimento.
Art. 189. Os jurados pronunciam sobre o fato, e os juízes aplicam a lei.
Art. 190. Uma lei nomeará as diferentes espécies de juízes de direito,
suas gradações, atribuições, obrigações e competência.
Art. 191. Os juízes de direito letrados são inamovíveis, e não podem ser
privados do seu cargo, sem sentença proferida em razão de delito, ou apo-
sentação com causa provada, e conforme a lei.
Art. 192. A inamovibilidade não se opõe à mudança dos juízes letrados
de primeira instância de uns para outros lugares, como e no tempo que a lei
determinar.
Art. 193. Todos os juízes de direito e oficias de justiça são responsáveis
pelos abusos de poder e erros que cometerem no exercício dos seus em-
pregos.
Art. 194. Por suborno, pleito e conluio, haverá contra eles ação popular.
Art. 195. Por qualquer outra prevaricação punível pela lei, não sendo
mera infração da ordem do processo, só pode acusar a parte interessada.
Art. 196. Toda a criação de tribunais extraordinários, toda a suspensão
ou abreviação das formas, à exceção do caso mencionado no art. 27, são atos
inconstitucionais, e criminosos.
Art. 197. O concurso dos poderes constitucionais não legitima tais atos.
Art. 198. No processo civil a inquirição de testemunhas, e tudo o mais
será público; igualmente no processo crime, porém só depois da pronúncia.
Art. 199. O código será uniforme, e o mesmo para todo o império.
Art. 200. As penas não passarão da pessoa dos delinquentes, e serão só as
precisas para estorvar os crimes.
Art. 201. A Constituição proíbe a tortura, a marca de ferro quente, o
baraço e pregão, a infâmia, a confiscação de bens, e enfim todas as penas
cruéis ou infamantes.
Art. 202. Toda a espécie de rigor, além do necessário para a boa ordem e
sossego das prisões, fica proibida, e a lei punirá a sua contravenção.
Art. 203. As casas de prisão serão seguras, mas cômodas, que não sirvam
de tormento.
Art. 204. [As casas de prisão] serão visitadas todos os anos por uma co-
missão de três pessoas, as quais inquirirão sobre a legalidade ou ilegalidade
da prisão, e sobre o rigor supérfluo praticado com os presos.
Art. 205. Para este efeito se nomearão em cada comarca seis pessoas de
probidade, que formem alternadamente a comissão dos visitadores.
Art. 206. [Os visitadores] serão eleitos pelas mesmas pessoas e maneira
porque se elegem os deputados; e durarão em atividade o mesmo tempo que
as legislaturas.
Anexo V
273
TÍTULO X
DA ADMINISTRAÇÃO
Art. 209. Em cada comarca haverá um presidente nomeado pelo impe-
rador, e por ele amovível ad nutum, e um conselho presidial eletivo, que o
auxilie.
Art. 210. Em cada distrito haverá um subpresidente, e um conselho de
distrito eletivo.
Art. 211. Em cada termo haverá um administrador e executor, denomi-
nado “decurião”, o qual será presidente da municipalidade, ou Câmara do
termo, na qual residirá todo o governo econômico e municipal.
Art. 212. O decurião não terá parte no Poder Judiciário, que fica reser-
vado aos juízes eletivos do termo.
Art. 213. A lei designará as atribuições, competência, e gradativa subor-
dinação das autoridades não eletivas, e os tempos da reunião, maneira de
eleição, gradação, funções, e competência das eletivas.
Art. 214. Estas disposições não excluem a criação de direções gerais para
tratarem de objetos privativos de administração.
TÍTULO XI
DA FAZENDA NACIONAL
Art. 215. Todas as contribuições devem ser [a] cada ano estabelecidas, ou
confirmadas pelo Poder Legislativo, art. 42, e sem este estabelecimento,
ou confirmação, cessa a obrigação de as pagar.
Art. 216. Ninguém é isento de contribuir.
Art. 217. As contribuições serão proporcionadas às despesas públicas.
Art. 218. O Poder Legislativo repartirá a contribuição direta pelas co-
marcas; o presidente e conselho presidial pelos distritos; o subpresidente
e conselho de distritos pelos termos; e o decurião e municipalidade pelos
indivíduos, em razão dos rendimentos que no termo tiverem; quer residam
nele, quer fora.
Art. 219. O ministro da Fazenda, havendo recebido dos outros minis-
tros os orçamentos relativos às despesas das suas repartições, apresentará
TÍTULO XII
DA FORÇA ARMADA
Art. 227. Haverá uma força armada, terrestre, que estará à disposição
do Poder Executivo, o qual, porém, é obrigado a conformar-se às regras
seguintes.
Art. 228. A força armada terrestre é dividida em três classes: exército de
linha, milícias, e guardas policiais.
Art. 229. O exército de linha é destinado a manter a segurança externa, e
será por isso estacionado nas fronteiras.
Art. 230. Não pode ser empregado no interior se não no caso de revolta
declarada.
Art. 231. Neste caso ficam obrigados o Poder Executivo e seus agentes
a sujeitar a exame da Assembleia todas as circunstâncias que motivaram a
sua resolução.
Art. 232. Este exame é de direito, e as duas salas da Assembleia, logo que
tiverem recebido notícias deste ato do Poder Executivo, reunidas nomearão
Anexo V
275
TÍTULO XIII
DA INSTRUÇÃO PÚBLICA, ESTABELECIMENTOS DE
CARIDADE, CASAS DE CORREÇÃO E TRABALHO
Art. 250. Haverá no império escolas primárias em cada termo, ginásios
em cada comarca e universidades nos mais apropriados locais.
Art. 251. Leis regulamentares marcarão o número e constituição desses
úteis estabelecimentos.
Art. 252. É livre a cada cidadão abrir aulas para o ensino público, con-
tanto que responda pelos abusos.
Art. 253. A Assembleia terá particular cuidado em conservar e aumentar
as casas de misericórdia, hospitais, rodas de expostos e outros estabeleci-
mentos de caridade já existentes e em fundar novos.
Art. 254. Terá igualmente cuidado de criar estabelecimentos para a cate-
quese e civilização dos índios, emancipação lenta dos negros e sua educação
religiosa e industrial.
Art. 255. Erigir-se-ão casas de trabalho para os que não acham empre-
gos; e casas de correção e trabalho, penitência e melhoramento para os va-
dios e dissolutos de um e outro sexo e para os criminosos condenados.
TÍTULO XIV
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 256. A Constituição facilita a todo o estrangeiro o livre acesso ao
império; segura-lhe a hospitalidade, a liberdade civil e a aquisição dos di-
reitos políticos.
Art. 257. As leis do império só vedarão os atos que prejudicarem a socie-
dade, ou imediata ou mediatamente.
Art. 258. O exercício dos direitos individuais não terá outros limites que
não sejam os necessários para manter os outros indivíduos na posse e gozo
dos mesmos direitos; tudo, porém, subordinado ao maior bem da sociedade.
Art. 259. Só à lei compete determinar estes limites; nenhuma autoridade
subordinada o poderá fazer.
Art. 260. A lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue.
Art. 261. Esta igualdade nas leis protetoras será regulada pela mesme-
dade de utilidade, de forma que, variando ela, varia proporcionalmente a
proteção.
Anexo V
277
TÍTULO XV
DO QUE É CONSTITUCIONAL E SUA REVISTA
Art. 267. É só constitucional o que diz respeito aos limites e atribuições
respectivas dos poderes políticos e aos direitos políticos e individuais.
Art. 268. Tudo o que não é constitucional pode ser alterado pelas legisla-
turas ordinárias, concordando dois terços de cada uma das salas.
Art. 269. Todas as vezes que três legislaturas consecutivas tiverem pro-
ferido um voto pelos dois terços de cada sala para que se altere um artigo
constitucional, terá lugar a revista.
Art. 270. Resolvida a revista, expedir-se-á decreto de convocação da As-
sembleia de revista, o qual o imperador promulgará.
Art. 271. A Assembleia de revista será de uma sala só, igual em número
aos dois terços dos membros de ambas as salas e eleita como é a sala dos
deputados.
Art. 272. Não se ocupará senão daquilo para que foi convocada e findo o
trabalho dissolver-se-á.
ANEXO VI
Documentos referentes à
dissolução da Assembleia
74 Texto extraído da Coleção das leis do Brasil de 1823 (Brasil, 1887, p. 85).
13 de novembro de 1823
Imperador
75 Texto extraído de D. Pedro I: Proclamações, Cartas, Artigos (Arquivo Nacional, 1973, p. 192).
Anexo VI
281
16 de novembro de 1823
76 Texto extraído de D. Pedro I: Proclamações, Cartas, Artigos (Arquivo Nacional, 1973, p. 193-199).
Anexo VI
283
Anexo VI
285
Imperador
Clemente Ferreira França
Luiz José de Carvalho e Mello
Antônio Luiz Pereira da Cunha
Barão de Santo Amaro
Pedro de Araújo Lima
Pedro José da Costa Barros
Francisco Vilela Barbosa
Manoel Jacinto Nogueira da Gama
José Joaquim Carneiro de Campos
REFERÊNCIAS
ARMITAGE, João. História do Brasil. São Paulo: Livraria Martins Fontes,
1972.
ARMITAGE, João. História do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2011.
ARQUIVO NACIONAL. Comissão Executiva Central do Sesquicentenário da
Independência do Brasil. D. Pedro I: proclamações, cartas, artigos. Rio de
Janeiro: Imprensa Nacional, 1973.
BRASIL. Atas do Conselho de Estado: Conselho dos Procuradores-Gerais
das Províncias do Brasil 1822-1823. Brasília: Senado Federal, 1973. v. 1.
BRASIL. Coleção das leis do Brasil de 1818. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1889a.
BRASIL. Coleção das leis do Brasil de 1821. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1889b. (Parte II.)
BRASIL. Coleção das leis do Brasil de 1822. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1887. (Parte II: Decretos, cartas e alvarás; Parte III: Coleção das
decisões do governo do império do Brasil.)
BRASIL. Coleção das leis do Brasil de 1823. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, [s.d.]. (Parte II: Decretos, cartas e alvarás.)
BRASIL. Diário da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do
Brasil, 1823. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1823a. t. 1.
BRASIL. Diário da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do
Brasil, 1823. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1823b. t. 2.
BRASIL. Diário da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do
Brasil, 1823. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1823c. t. 3.
BRASIL. Anais do Parlamento brasileiro, Assembleia Constituinte de 1823.
Rio de Janeiro: Tipografia de Hipólito José Pinto & Cia., 1876. t. 1.
BRASIL. Anais do Parlamento brasileiro, Assembleia Constituinte de 1823.
Rio de Janeiro: Tipografia Parlamentar, 1877. t. 2.
Referências
289
Referências
291