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HISTÓRIA DA CIÊNCIA: UMA ABORDAGEM SOCIOCULTURAL

FREDERICO SCHORNBAUM CORTES COSTA

PERÍODO:2023-1

COSMOGONIAS, RELIGIÃO E CIÊNCIA: O HELIOCENTRISMO


E O GEOCENTRISMO

i Introdução
Antes do predomínio do paradigma científico ocidental em nível
global, existia uma série de cosmogonias de diferentes culturas que
posicionam a terra (e por extensão o homem) em relação ao céu observável,
é importante ressaltar que a posição do planeta Terra é intimamente ligado
as cosmogonias antigas, portanto o lugar da Terra, o mundo dos homens, no
espaço se mostra por correspondência como uma explicação inclusive do
lugar que a própria humanidade ocupa no mundo.

Entender o contexto do lugar do mundo em relação ao universo, céu


observável, é fundamental para entender a revolução que o pensamento de
Galileu provocou em relação as explicações cosmogônicas do
posicionamento da Terra. Antes de Galileu, houveram várias explicações em
relação ao posicionamento da Terra referente aos astros, nas explicações que
o presente trabalho busca enfocar, é importante destacar que essas
explicações consistiam na lógica, a entender na pura dedução, num primeiro
momento na lógica dos filósofos gregos e num segundo momento na lógica
escolástico aliada ao pensamento teológico da Igreja Católica.

Portanto, o nosso movimento no presente artigo consiste na


descrição e breve explicação dos modelos explicativos anteriores a Galileu
Galilei, para que então possamos melhor entender o salto qualitativo da
metodologia e das descobertas de Galileu referentes a concepção dos
homens no tempo histórico.

ii Cosmogonias: Visões Lógicas da Terra no Universo


Os primeiros modelos de posicionamento da Terra no universo são
derivados da inferência lógica apoiada por certos axiomas, filosóficos ou
dogmáticos. Os primeiros modelos explicativos gregos consistem em
Anaximandro e Pitágoras, o primeiro posicionava a Terra no centro de um
sistema, já o segundo às margens.

Posteriormente, Platão e Aristóteles, escreveram modelos


geocêntricos para a explicação do posicionamento da Terra. Portanto, no que
consistia o método dos pré-socráticos quando comparado com os filósofos
da era clássica? Anaximandro e Pitágoras trabalhavam com a doutrina dos
quatro elementos gregos: ar, terra, fogo e água, e entendiam portanto o
posicionamento de um fogo não visto no céu1

O método portanto dos pre socráticos consistia em partir do


movimento visível dos astros relativos a Terra, inferir o posicionamento do
fogo não visto, para determinar a centralidade ou não da Terra, para
Pitágoras a Terra e todos os astros, inclusive o Sol, giravam em torno de um
fogo central. Já Anaximandro considerava que o planeta existia presa em um
pilar cercado por anéis, e que a Lua, o Sol e as estrelas eram furos nesses
anéis que permitiam que os terráqueos vissem o fogo.2

1 KEPLER, Johannes. Epitome of Copernican Astronomy. Book IV, Part 1.2


2 FRASER, Craig. The cosmos: A historical perspective. Greenwood Press, 2006. pg. 13-
25.
Os filósofos clássicos por sua vez, partiam de caminhos diferentes
para a explicação da posição da Terra partiam igualmente da observação
visível da Terra, mas construíam seus modelos explicativos não a partir de
elementos, mas sim de princípios metafísicos e da lógica, portanto
Aristóteles e Platão, ambos trabalhavam em níveis de abstração maiores que
seus predecessores pré socráticos.

Simplicius em 500 a.C, em seus comentários sobre Do Céu de


Aristóteles, colocou que Platão é que havia colocado a grande questão para
os astrônomos de ‘salvar as aparências’ dos movimentos irregulares e
‘aparentemente’ circulares dos astros no céu.3 E essa foi a questão que
permaneceu durante toda a antiguidade até que Ptolomeu de Alexandria em
meados do século II criou o modelo explicativo que permaneceria até o
século XVI.4

O modelo geocêntrico ptolomaico consistia em uma série de


observações realizadas em meados do século II, e o uso de cálculos
matemáticos para a comprovação de suas hipóteses. A partir de cálculos
geométricos formulou duas hipóteses possíveis de órbitas geocêntricas: uma
hipótese excêntrica e outra epciclica.5

Durante o período medieval o modelo geocêntrico ptolomaico


permaneceu indisputado e aliando-se a escolástica serviu para fomentar a
centralidade do homem, num primeiro momento enquanto criado à imagem
de Deus e segundo enquanto o centro do universo, visto que o segundo
ponto decorre do primeiro e é comprovado pelo modelo geocêntrico

3 HETHERINGTON, Norriss. Planetary Motions: a historical perspective. Greenwood


Press, 2006.
4 Britannica, The Editors of Encyclopaedia. "geocentric model". Encyclopedia
Britannica, , https://www.britannica.com/science/geocentric-model. Acessado em 19 de
Junho de 2023.
5 HETHERINGTON, ib ibid, 33.
ptolomaico. Portanto, a centralidade do homem no universo na doutrina
cristão era um dos pilares da doutrina escolástica e, obviamente da doutrina
Cristão imposta pela administração da Igreja Apostólica Católica Romana.

No século XVI, 100 anos antes das descobertas de Galileo Galilei, o


modelo geocêntrico foi questionado, pelo alemão Nicolaus Copernicus com
a publicação de ‘De Revolutionibus Orbium Coelestium’ o trabalho de
Copernicus contia inexatidões matemáticas, e trabalhava com órbitas
circulares e não elípticas, quem realizou essa correção foi Kepler. O livro de
Copernicus não foi em si revolucionário, mas indicou um caminho o qual
um novo saber revolucionário poderia surgir.6

iii O Salto Galileano


Esse caminho foi seguido por Galileo Galilei, professor na
Universidade de Pisa desde 1589, Galileo começou a duvidas da física
Aristotélica e em uma carta enviada a Kepler em 1597, Galileo afirma que já
há muito tempo aceitava as hipóteses de Copernicus. 7 Com a invenção do
telescópio em 1609, Galileo pode começar a realizar observações precisas
das órbitas e luas dos astros no céu celeste, começou portanto o seu trabalho
de comprovar as hipóteses de Copernicus.

A partir de 1610 Galileo começou a investigar com um telescópio o


universo observável na sua carta Sidereus Nuncius, ele havia confirmado
que a superfície da Lua não era completamente uniforme mas contia várias
deformações confirmadas a partir das sombras nas crateras que eram
observadas pelo telescópio.

6 HETHERINGTON, ib ibid, 93.


7 FRASER. ib. ibid. 65.
Em 7 de janeiro de 1610 Galileo começou as observações das luas de
Júpiter, verificando que existiam quatro corpos celestes que orbitavam o
planeta, estas observações foram publicadas no mesmo ano. Durante o
inverno de 1610 Galileo começou a focar em Vênus com o seu telescópio, a
movimentação de Vênus telescópio indicava uma comprovação para o
modelo de Copernicus e não de Ptolomeu como um discipulo já havia
escrito para Galileo.8 A partir de 1612 Galileo começou a observar as
manchas solares de maneira minuciosa, o carácter estacionário das manchas
em relação a Terra era mais uma das armas de Galileo contra a física
aristotélica. Em 1632 ‘O Diálogo Sobre os Dois Principais Sistemas do
Mundo” é publicado por Galileo, no qual crítica os físicos aristotélicos
duramente e faz algumas críticas ao modelo de Copernicus, devido ao
considerar a Terra como estática. Galileo foi capaz de destruir o argumento
escolástico contra o não movimento da Terra, mas foi incapaz de provar a
movimentação da Terra.9

O papel de Galileo foi fundamental no desenvolvimento científico,


cumprindo um papel fundamental na Revolução Copernicana, junto de
muitos outros como Kepler, Newton e Tycho. O grande papel de Galileo foi
o de suas investigações empíricas e de suas formulações matemáticas, o
mérito de Galileo é ligado a seu duplo movimento da formulação de
hipóteses teóricas, da experimentação e investigação e depois sua
capacidade de conceituar e sistematizar suas descobertas em um pensamento
coerente e objetivo.

iv- A Ciência e a Descentralidade do Homem no Universo


As investigações de Galileu mostraram categoricamente a
centralidade do sol e a submissão da terra as forças da gravitação e dessa

8 HETHERINGTON, 121.
9 Ibid. 125.
maneira a marginalidade do homem na constituição do universo. Por vez a
teológica apoiada pela agora destruída física aristotélica, colocava o homem,
feito a imagem de Deus, no centro do universo. Portanto as investigações de
Galileo questionava os paradigmas da Igreja.

No contexto da Contra-Reforma do século XVII, a Igreja Católica se


mostrava cada vez mais vigilante e vindicante em relação a proteção de suas
doutrinas. Galileo ao atacar vitriolicamente os físicos aristotélicos, muitas
vezes tinha que lidar com argumentos de cunho teológico para a
fundamentação argumentativa de seus rivais. Galileo defendia uma leitura
metafórica da bíblia, com ação do Papa Urbano VIII em 1632 com a
publicação do Discurso fez com que Galileo fosse inquerido por suas
afirmações e que renunciasse às suas descobertas, o que Galileo acatou.

A crítica do saber da Igreja, e por extensão, o questionamento da sua


autoridade, enquanto detentora da verdade universal e da autoridade do
conhecimento no contexto da Contra Reforma, gerou vários conflitos que
ocorreram no campo do conhecimento, estando a teologia e a ciência em
desacordo, se seguiu uma série de perseguições em diferentes graus,
Galileo é só mais um exemplo.

Assim, não se surpreende, que durante a Renascença, quando a


Revolução Copernicana se tornou categórica, que a doutrina da dupla
verdade de Averrois fosse fortemente retomada, enquanto tentativa de
resolução da oposição entre a filosofia (e a ciência por extensão nesse
tempo) e a teologia. Separando as verdades teológicas das verdades
filosóficas, permitindo então que o saber teológico mantenha sua autoridade,
mesmo quando desacreditada nos termos objetivos do método cientifico.10
10 LUKÁCS, György. Para uma ontologia do ser social 1. Boitempo editorial, 2015. pg.
326
Bibliografia

HETHERINGTON, Norriss. Planetary Motions: a historical


perspective. Greenwood Press, 2006. pg. 33-55; 88-130.
Britannica, The Editors of Encyclopaedia. "geocentric model".
Encyclopedia Britannica, , https://www.britannica.com/science/geocentric-
model. Acessado em 19 de Junho de 2023.
KEPLER, Johannes. Epitome of Copernican Astronomy. Book IV,
Part 1.2
FRASER, Craig. The cosmos: A historical perspective. Greenwood
Press, 2006. pg. 13-25.
LUKÁCS, György. Para uma ontologia do ser social 1. Boitempo
editorial, 2015. pg. 326

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