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NOTAS DE AULA 8: COPÉRNICO E O MODELO HELIOCÊNTRICO(*)

(Copérnico promoveu, realmente, uma Revolução?)

História da Física, DEFIMAT, IFCE Campus Fortaleza, 2023-1.

José Carlos Parente de Oliveira, Dr.

A Grande Interrupção
De um lado, com a queda de Roma, em 400 d.C., a maior parte do saber e do desenvolvimento do
conhecimento clássico foi perdido ou, no máximo, vagamente lembrado na Europa.
Por outro lado, o surgimento de uma civilização islâmica brilhante em conhecimento no Oriente Médio
em 750 d.C. conseguiu fazer sobreviver o aprendizado grego clássico no mundo árabe, principalmente
por dois mecanismos:
1. os califas de Bagdá-Abbasid incentivaram e patrocinaram a tradução sistemática dos textos gregos
clássicos que sobreviveram à barbárie do início do cristianismo para o árabe no século IX na famosa
"Casa da Sabedoria" fundada pelo califa Abu al-Abbas al-Ma'mun;
2. os estudiosos islâmicos, além de preservarem as obras mais antigas, eles também avançaram o
conhecimento através de descobertas originais em Matemática e Astronomia. Os árabes contribuíram
com a invenção da Álgebra, o avanço da Trigonometria e os trabalhos fundamentais em Óptica,
Astronomia, Geografia e Medicina.
Desta forma, o antigo conhecimento clássico foi “alimentado” e ampliado pela pelos islâmicos,
enquanto a maior parte da Europa contemporânea caiu em um verdadeiro “apagão intelectual”, onde a fé
e não a ciência era valorizada como necessidade fundamental para os povos.

Redescoberta europeia
No século XI, a Espanha se tornou o centro de tradução dos textos árabes para o latim. Notadamente
esta recuperação se deveu ao trabalho de estudiosos judeus que transitavam entre as culturas e os
mundos cristão e islâmico. As bibliotecas das cidades de Toledo e Córdoba, na Espanha, foram os
principais centros desta obra magnífica de recuperação intelectual.
As obras traduzidas espalhando-se da Espanha patrocinaram, lentamente, o redescobrimento das
atividades intelectuais, entre as quais, as obras de Aristóteles e Ptolomeu, que foram redescobertos no
século XII.
No século XIII, estudiosos cristãos, a exemplo de Tomás de Aquino, procederam a reconciliação das
obras da ciência grego-muçulmana clássica com o corpo de dogmas cristãos. Em particular, a
astronomia de Ptolomeu, na forma de seu Almagesto (a tradução árabe da Sintaxe Matemática), que se
baseou na Física e Filosofia de Aristóteles, foi elevada ao nível de quase um dogma religioso. Em
particular, o principal estudioso grego que foi elevado.

Da redescoberta ao Renascimento
O período entre a Idade Média e o Renascimento foram tempos de grandes mudanças sociais e inte-

(*)
Notas de aula baseadas em pesquisas realizadas em sítios da Internet. Notas de aula não revisadas.
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lectuais. Neste período ocorreram: (i) o surgimento e ascensão das grandes universidades; (ii) a inven-
ção e difusão da impressão; (iii) os desafios à autoridade espiritual e política da Igreja Romana pelos
reformadores, notadamente Lutero; (iv) as viagens oceânicas que alargaram o mundo pela descoberta
de novas terras e pela intensificação do comércio por Portugal e Espanha.

Os problemas que a Astronomia poderia resolver


Os astrônomos no início do século XVI enfrentaram vários problemas:
1. As tabelas (por meio das quais prediziam eventos astronômicos, como eclipses e conjunções) foram
consideradas não suficientemente precisas;
2. As expedições portuguesas e espanholas ao Extremo Oriente e à América navegaram fora da vista da
terra por semanas a fio, e apenas os métodos astronômicos poderiam ajudá-los a encontrar suas
localizações em alto mar;
3. O calendário instituído por Júlio César em 44 d.C. não era mais preciso. O equinócio, que na época do
Concílio de Nicéia (325 d.C.) havia caído no dia 21, agora havia caído para o dia 11. Portanto, do ponto
de vista da Igreja havia um grande problema, pois o Equinócio era a referência para a data da Páscoa (o
principal evento no Cristianismo).
A solução de todos os três problemas teria que contar com a participação efetiva dos astrônomos.

Os descontentamentos de Copérnico
Copérnico procurou “limpar” o sistema de Ptolomeu do
complicado expediente do Equante, que viola a noção
aristotélica de movimento circular uniforme. Para ele,
um bom sistema deve agradar a mente, bem como
"preservar as aparências”, isto é, fazer previsões
precisas).
Copérnico não estava sozinho em seu desconten-
tamento com o Equante. Os astrônomos árabes nos
séculos XIII e XIV realizaram reformas no modelo
ptolomaico (especificamente os astrônomos e
matemáticos al-Tusi, al-`Urdi e ash-Shatir), enquanto
preservavam seu caráter geocêntrico geral.

Copérnico e Modelo Heliocêntrico


Copérnico nasceu em 19 de fevereiro de 1473, no que hoje é
o norte da Polônia. Ele era filho de pais ricos e importantes e
tinha duas irmãs e um irmão. Em algum momento entre 1483
e 1485, seu pai morreu e ele foi colocado sob os cuidados de
seu tio paterno, Lucas Watzenrode, o Jovem. Copérnico
estudou Astronomia por algum tempo na faculdade, mas se
concentrou em Direito e Medicina. Enquanto continuava seus
estudos de Direito na cidade de Bolonha, Copérnico ficou
fascinado pela Astronomia após conhecer o famoso
astrônomo Domenico Maria Novara. Ele logo se tornou
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assistente de Novara. Copérnico até começou a dar palestras de Astronomia. Depois de se formar em
Direito Canônico Cristão, em 1503, Copérnico estudou as obras de Platão e Cícero a respeito dos movi-
mentos da Terra. Foi nessa época que Copérnico começou a desenvolver sua teoria de que a Terra e os
planetas orbitavam o Sol. Ele teve o cuidado de não contar a ninguém sobre essa teoria, pois ela poderia
ser considerada heresia (ideias que contrariavam a doutrina ou crença cristã).
No início dos anos 1500, Copérnico desempenhou várias funções para a Igreja Católica, onde desen-
volveu teorias econômicas e legislação. A Astronomia tornou-se pouco mais que um hobby para
Copérnico, que nunca trabalhou profissionalmente na área.
Em 1514, entretanto, Copérnico ficou tão convencido da teoria de um sistema solar heliocêntrico (cen-
trado no Sol) que começou a compartilhar suas anotações com amigos.
A principal preocupação de Copérnico era com as órbitas dos planetas, uma vez que o modelo proposto
por Ptolomeu já não era mais capaz de reproduzir as posições planetárias que eram observadas. À
medida que Copérnico registrava suas observações das posições dos planetas no céu, ele se deparava
com a necessidade de fazer ajustes ainda mais detalhados às já complexas contorções impostas sobre os
"astros vagabundos ou errantes" (os planetas) no sistema estabelecido anteriormente por Ptolomeu.
Copérnico começou então a imaginar se o modelo de Ptolomeu poderia estar realmente correto. De seus
estudos sobre as ideias desenvolvidas na antiguidade, entre os gregos, Copérnico conheceu que as
primeiras especulações sobre a possibilidade do Sol ser o centro do cosmos e a Terra ser um dos
planetas que o circundam datavam do século III a.C. Em seu livro O Contador de Grãos de Areia,
Archimedes (212 a.C.), discute como expressar números muito grandes. Como exemplo, Arquimedes
propôs a questão saber de Quantos Grãos de Areia Existem no Cosmo. E para tornar esse problema mais
difícil, ele escolhe não o Cosmo Geocêntrico geralmente aceito na época, mas o Cosmo Heliocêntrico
proposto por Aristarco de Samos (310-230 a.C.), que teria que ser muitas vezes maior por causa da falta
de paralaxe estelar observável.
Portanto, ele sabia que já nos tempos helenísticos os pensadores estavam pelo menos brincando com
essa noção, e por causa da menção no livro de Arquimedes, a especulação de Aristarco era bem
conhecida na Europa, desde antes da Idade Média.
Desta forma, Copérnico ficou intrigado com a noção de um sistema planetário heliocêntrico, ou seja,
centrado no Sol. Testando essa ideia com suas próprias observações ele encontrou que ela concordava
com as evidências observacionais de um modo muito mais simples do que o modelo geocêntrico de
Ptolomeu, o que levou Copérnico a desenvolver um modelo heliocêntrico do Sistema Solar. Neste
modelo ele a noção de movimento circular perfeito, mas colocava o Sol no centro, além de estabelecer a
ordem correta dos planetas a partir do Sol.
Por volta de 1530, Copérnico começou a divulgar restritamente um manuscrito, conhecido como
Commentariolus que dava um esboço de suas ideias (existe a dúvida se o livro Comentariolus foi escrito
em 1530 ou em maio de 1514). Seu conteúdo era uma breve introdução seguida de sete axiomas ou
postulados e os capítulos com os títulos "A ordem das esferas", "Os movimentos aparentes do Sol", "Os
movimentos uniformes não devem se referir aos equinócios, mas sim às estrelas fixas", "A Lua", "Os
três planetas superiores: Saturno, Júpiter e Marte", "Vênus" e "Mercúrio".
Os cientistas da época mostraram interesse por "Comentariolus", embora sem a oposição apaixonada da
Igreja Católica, a exemplo do que ocorreu com Galileu no século seguinte.

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(a) (b)

(a) A imagem acima compara o modelo de Ptolomeu com o


de Copérnico. (b) Note que Copérnico coloca os planetas
visíveis a olho nu na sequência correta a partir do Sol, ou
seja, Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno.

Os cientistas da época mostraram interesse por "Comentariolus", embora sem a oposição apaixonada da
Igreja Católica, a exemplo do que ocorreu com Galileu no século seguinte.
Copérnico então começou a fazer planos para uma edição impressa de todo o seu trabalho. Assim, o
modelo proposto por ele, que era um grande tratado matemático, ficou pronto em 1530, mas só foi
publicado em 1543, ano de sua morte, em um livro chamado De Revolutionibus Orbium Coelestium
(Sobre as Revoluções das Esferas Celestes). No livro, Copérnico explicou que a Terra girava ao longo
de seu eixo e orbitava o Sol uma vez por ano. Ele posicionou corretamente todos os planetas conhecidos
na época e explicou por que as estações ocorriam. Ele também argumentou que a distância da Terra ao
Sol é muito menor do que a distância da Terra às outras estrelas.
Copérnico não fez qualquer menção à ideia de
Universo Heliocêntrico do astrônomo grego
Aristarco de Samos, apesar de tê-lo feito nos
manuscritos Comentariolus. Há evidências que
pouco tempo antes da publicação de seu livro De
Revolutionibus Orbium Coelestium ele retirou a
referência a Aristarco.
A recepção do De Revolutionibus foi mista. A
hipótese heliocêntrica em si mesma foi rejeitada
de imediato por quase todos, contudo o livro foi
o tratado astronômico mais sofisticado desde
Almagesto, e por isso foi amplamente admirado.
Suas construções matemáticas foram facilmente
transferidas para as geocêntricas, e muitos
astrônomos as usaram. De Revolutionibus foi
amplamente lido e comentado pelos estudiosos
da época, ambos contra e a favor de suas ideias.
Esta é a famosa passagem no manuscrito de
Em suma, de forma surpreende o livro causou Copérnico para o seu livro "De Revolutionibus"
pouca controvérsia imediata (que é uma das onde ele elimina uma seção sobre Aristarco um
pouco antes da sua publicação.
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razões pelas quais os estudiosos acreditam que Copérnico relutou tanto em publicar seu trabalho). No
entanto, foi condenado pela Igreja Católica Romana em 1616.

Esta é a página inicial da primeira edição do livro


"De Revolutionibus" de Copernicus. Ela pertenceu
a Johannes Kepler e mostra um poema
introdutório, traduzido por Kepler e assinado com
as suas iniciais.

Esta é a página do manuscrito original de


Copérnico onde ele desenhou o seu sistema
heliocêntrico. O Sol está no centro circundado por
Mercúrio (Merc), Vênus (Veneris), Terra
(Telluris), Marte (Martis), Júpiter (Jovis), Saturno
(Saturnus) e as estrelas fixas. Este manuscrito está
na biblioteca da Universidade de Cracow, na
Polônia.

O Modelo Copernicano
Copérnico é frequentemente descrito como um astrônomo solitário que argumentou desafiadoramente
que o Sol, e não a Terra, estava no centro do cosmos.
Será que as contribuições de Copérnico para a astronomia são tão significativas que justificam ter o seu
nome associado a uma revolução – A Revolução Copernicana?
A história dessa revolução é problemática por várias razões, entre elas:
1. Por mais que as ideias de Copérnico tenham rompido com o passado, seu modelo do cosmos tem mais
em comum com seus contemporâneos do que com a Astronomia e a Física modernas.

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2. Embora o modelo centrado no Sol de Copérnico fosse revolucionário, ele fazia parte de uma série de
inovações renascentistas. Por exemplo, Tycho Brahe coletou dados observacionais em uma escala sem
precedentes e desenvolveu seu próprio modelo competitivo. Da mesma forma, Johannes Kepler
desenvolveu modelos matemáticos para órbitas elípticas que desafiaram alguns dos pressupostos básicos
da cosmologia aristotélica.
3. Ao contrário do que é comumente repetido, Copérnico não provou que a Terra se move em círculo em
torno do Sol. Ele postulou isto citando um suposto axioma antigo da Física que dizia que "nada infinito
pode ser movido" e daí concluiu que os céus deveriam estar em repouso. Ele também argumentou que a
imobilidade era mais nobre e mais divina do que a instabilidade e, deste modo, ela deveria pertencer ao
céu e não a Terra. Em nenhum tempo Copernicus prova, em seu livro, que a Terra gira em torno do Sol.
4. Copérnico também faz uso de epiciclos para explicar o movimento dos planetas, exceto Mercúrio,
para o qual ele precisou desenvolver uma teoria mais complicada, semelhantemente ao que fez
Ptolomeu. Ptolomeu utilizou os epiciclos para explicar o movimento retrógrado, o que no modelo
heliocêntrico foi explicado, naturalmente, como consequência da visualização de planetas em
movimento da perspectiva de uma Terra em movimento, sem recorrer a epiciclos.
Copérnico deduziu que quanto mais perto do Sol estiver o planeta maior será sua velocidade orbital.
Dessa forma, o movimento retrógrado dos planetas foi facilmente explicado sem necessidade de
epiciclos: quando a Terra “ultrapassa” o planeta mais distante, que tem menor velocidade orbital, ele
parece “andar para trás”.

Movimento retrógrado de um
planeta com órbita externa à
da Terra.

Direita da página: posições


reais da Terra e do planeta
nas respectivas órbitas.

Esquerda da página: posições


aparentes do planeta externo
como visto da Terra.

Movimento aparente de um planeta com


órbita interna à da Terra.
Ao lado: posições aparentes do planeta
interno como visto da Terra (em vermelho).
Ao lado: posições reais do planeta interior
(órbita verde) e da Terra (órbita lilás).

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Por que Marte parece se mover para trás?
Na maior parte do tempo, o movimento aparente de Marte nos céus da Terra ocorre em uma direção,
lentamente, mas estável à frente das estrelas distantes. Mas, a cada dois anos, contudo, a Terra passa
Marte enquanto orbitam em torno do Sol. Durante a passagem mais recente em Agosto, Marte parecia
particularmente grande e brilhante. Durante este período, Marte parecia se mover parta trás, um fenômeno
chamado de Movimento Retrógrado. A foto acima é uma série de imagens digitalizadas de tal forma que
as imagens das estrelas coincidam. Vê-se que Marte parece traçar um laço no céu. No alto do laço, a
Terra passa Marte e o movimento retrógrado atinge o máximo.
Movimentos Retrógrados também podem ser vistos para outros planetas do Sistema Solar. De fato, por
coincidência, as linhas tracejadas à direita do centro da imagem é Urano fazendo a mesma coisa.

Entre os pontos que Copérnico propôs em seu livro "De Revolutionibus Orbium Coelestium" estão:
 O Sol é o centro do Sistema Solar;
 A Terra e os planetas descrevem órbitas circulares em torno do Sol;
 O dia e a noite são o resultado da rotação da Terra em torno de seu eixo;
 Os planetas Mercúrio e Vênus estão mais próximos ao Sol do que a Terra;
 Somente 3 movimentos da Terra são necessários: I. a rotação diária em torno de seu eixo; II. a
revolução anual em torno do Sol e III. a oscilação ou libração da Terra em torno do seu eixo,
explicando a precessão dos equinócios;
 O Movimento Retrógrado dos planetas era um movimento aparente (Este movimento ocorre devido
à diferença nas velocidades dos planetas, que não recua ao longo de sua trajetória. O que acontece é
que a projeção do seu movimento sobre a esfera celeste reproduz um aparente movimento
retrógrado).

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Olhando em retrospectiva, para os avanços de Copérnico, Brahe e Kepler, pode-se perguntar quem foi
exatamente o revolucionário? Ou, considerando que cada um desses astrônomos trabalhou em tradições
contínuas de modelagem e compreensão dos céus que cabe saber se, de fato, houve alguma revolução?

A busca de Copérnico por uma harmonia e ordem mais profundas


Copérnico antecipou que suas ideias seriam controversas, principalmente em relação aos dogmas da
Igreja Católica. Por causa disso, ele esperou mais de 30 anos para publicar seu livro, que ocorreu em
1543. Em sua obra “De Revolutionibus Orbium Coelestium” (Sobre as revoluções das esferas celestiais)
ele coloca o Sol no centro do Universo e a Terra como um planeta em movimento pelo céu, ao redor do
Sol. Igualmente, ele colocou os demais planetas girando em redor do Sol.
O livro De Revolutionibus inicia com um breve argumento em prol de um universo heliocêntrico que,
para ele, era uma ordem mais elegante para o universo. Em seguida ele apresenta um extenso conjunto
técnico de provas matemáticas e tabelas astronômicas.
As ideias de Copérnico se basearam em uma linha de pensamento já existente desde a Grécia antiga,
mas esquecido no tempo. O movimento de Mercúrio e Vênus parecia ser desconcertante desde há muito
tempo. Os gregos Platão e Eudoxus notaram que esses planetas nunca se afastaram muito do Sol, como
se estivessem atados ao Sol, mas observavam que esses planetas podiam se mover um pouco à frente do
Sol ou ficar para trás.
No século V de nossa era, o astrônomo Martianus Capella argumentou que Mercúrio e Vênus orbitavam
o Sol, que por sua vez girava em torno da Terra. Este modelo semi-heliocêntrico, como se sabia, não foi
o primeiro sistema centrado no Sol: Aristarco de Samos nos primórdios da Grécia propôs um sistema
heliocêntrico e antes dele os pitagóricos defendiam que o Sol era o "fogo central".
Como as ideias de Copérnico não era parte da tendência astronômica dominante pode-se dizer que as
contribuições de Copérnico para a astronomia foram revolucionárias, apesar de suas ideias diferirem
fundamentalmente da atual concepção do sistema solar. O modelo copernicano ainda exigia um
movimento circular perfeito no céu. Assim como Ptolomeu, ele precisava usar círculos centrados em
círculos, os epiciclos, para explicar o movimento dos planetas. É verdade que os círculos de Copérnico
eram muito menores que os de Ptolomeu, mas o seu modelo não dispensou a necessidade deles.
Apenas um e meio século após o aparecimento do livro de Copérnico verificou-se que havia uma
comunidade considerável de astrônomos praticantes que aceitaram a cosmologia heliocêntrica – é bom
lembrar que a cosmologia geocêntrica “reinou” por quase quinze (15) séculos! A razão para este atraso
foi que, aparentemente, a cosmologia heliocêntrica era absurda do ponto de vista físico e do senso
comum. Não se deve esquecer que os estudiosos foram formados na ideia da divisão aristotélica entre o
céu e a região terrestre, entre a ideia de perfeição e a de corrupção. Contudo, é importante salientar o
papel decisivo em prol das ideias de Aristóteles exercido pelos representantes da Igreja Católica.
A seguir é mostrado um diagrama (esquerda) em que Copérnico apresenta seu modelo dos céus centrado
no Sol. O Sol está no centro do diagrama, a Terra é representada como o terceiro planeta orbitando o Sol
e a Lua (ilustrada como um pequeno crescente) é mostrada orbitando a Terra. Observe que o círculo
mais externo, Stellariem Fixarum (as estrelas fixas) é apresentado como imóvel. O modelo centrado no
Sol foi uma ruptura com o passado, mas ainda fazia parte da tradição da Astronomia Aristotélica e
Ptolomaica.
Este modelo ainda era fundamentalmente um sistema de esferas celestiais. A simplicidade deste
diagrama obscurece muito a complexidade subjacente do sistema de Copérnico. Os diagramas em outras
partes do livro ilustram como o modelo subjacente permaneceu complicado.
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De Revolutionibus orbium coelestium
(Sobre as Revoluções das Esferas Celestiais), Nicolaus Copernicus, 1543.

O diagrama (direita) é apresentado na seção mais formal da Matemática do livro, ele ilustra a
complexidade necessária ao sistema de Copérnico centrado no Sol. O Sol está no centro e os outros
círculos são necessários para ilustrar o movimento de apenas um dos planetas. O sistema de Copérnico
exigia um movimento circular perfeito e, como tal, ainda exigia epiciclos (muito menores que os de
Ptolomeu) para que os planetas combinassem com seus movimentos observados.

Oposição a Copérnico
O Sistema Heliocêntrico Copernicano encontrou oposição de ordem religiosa e científica.
As objeções religiosas no início foram de pouca importância, sendo a principal preocupação de
Copérnico as objeções de ordem científicas.
1. Objeções Religiosas:
I. Martinho Lutero (primeiro teólogo sistemático da Reforma Protestante, líder intelectual da Reforma
Luterana), João Calvino (reformador, teólogo e modelador do protestantismo) e Philip Melanchthon
(reformador luterano) objetaram o heliocentrismo alegando que uma Terra em movimento contradizia as
escrituras;
II. A Igreja Católica ficou oficialmente silenciosa no início.
2. Objeções Científicas

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I. Uma Terra girante continuamente foi considerada um absurdo por aristotélicos, pois ambos os
movimentos da Terra requerem velocidades muito grandes: a velocidade de um ponto da superfície é de
cerca de 1280 km/h; a velocidade orbital de cerca de 107.000 km/h = 30 km/s;
II. Não houve nenhuma evidência
observacional do movimento orbital
da Terra: os Paralaxes Estelares não
foram observados. As estrelas não
eram mais brilhantes na oposição.
Paralaxe é o movimento aparente para
frente e para trás de estrelas próximas
em relação a estrelas mais distantes,
causado pela mudança de perspectiva
da Terra em suas órbitas ao redor do
Sol.
III. Não houve nenhuma evidência observacional da rotação da Terra: os movimentos diários são
facilmente explicados por uma Terra fixa. Esses movimentos não requerem uma rotação da Terra.
Copérnico estava ciente desses problemas, mas não tinha as ferramentas de observação para resolvê-los
definitivamente. Contudo, o problema mais importante foi a não observação de paralaxes estelares.

Quando uma revolução não é uma revolução


Copérnico ainda se apegou às ideias aristotélicas estritas do cosmo em seu sistema heliocêntrico, que no
final tornou-se um sistema complexo, tal qual o de Ptolomeu:
1. Ele usou epiciclos, só que agora os movimentos estivessem centrados no Sol em vez da Terra;
2. Ele manteve o movimento circular uniforme para que seu modelo fizesse previsões mais precisas (ou
seja, para "preservar as aparências"), particularmente para reproduzir as velocidades não uniformes dos
planetas;
3. Ele adotou 48 epiciclos, em comparação com 40 no sistema geocêntrico ptolomaico;
4. Ele não usou o complicado equante.

Este modelo funcionou bem?


Na verdade, o modelo copernicano não se ajustava às posições dos planetas melhor do que o sistema
ptolomaico. Por causa da suposição de órbitas circulares com velocidade constante, ele era
geometricamente quase idêntico ao modelo de Ptolomeu!
Se a Terra está se movendo em torno do Sol, as estrelas mais próximas devem exibir, como dito
anteriormente, paralaxe em relação às estrelas distantes. Ninguém foi capaz de observar qualquer
paralaxe estelar. Portanto, o modelo violou uma observação básica.

O poder das ideias


Em detalhes, o Sistema Copernicano era complexo e muito denso em termos de Matemática
simplificadora. Ele, realmente, foi uma melhoria incremental em relação ao sistema ptolomaico, na

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Desenho de Copérnico de seu sistema.

Ele observa que Marte


está longe de sua
posição prevista.

medida em que fez previsões um pouco melhores das posições dos planetas do que os cálculos
ptolomaicos da época, e foi um pouco mais fácil de usar matematicamente porque eliminou o difícil
artefato do equante.
Contudo, na prática, o modelo compensou esta falta de originalidade e atributos físicos mais robustos
oferecendo uma considerável simplicidade conceitual: muitos dos artifícios do sistema geocêntrico
necessários para explicar os movimentos retrógrados e as diferenças nos movimentos entre os planetas
inferiores e superiores foram eliminados.
Em um mundo em ebulição, como foi o início do Renascimento, a ideia por trás do Modelo
Heliocêntrico era mostrar ser esse modelo uma prova poderosa e verdadeiramente revolucionária.

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Muitos livros repetem que Copérnico é o começo de uma nova era na ciência, que o seu trabalho inicia a
astronomia científica. No entanto, se se olha para detalhes técnicos ao se escrever uma História da
Ciência, Copérnico ocupará o lugar de último dos astrônomos clássicos ao invés de primeiro dos novos
astrônomos modernos. Para vários historiadores, o primeiro grande cientista da nova era científica foi
Johannes Kepler.

Esta xilogravura da era


renascentista simboliza a
passagem das esferas de
cristal para um novo con-
ceito de Universo.

(http://www.concord.org/intec/tools/lck/overview.html,
The International Netcourse Teacher Enhancement Coalition

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