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Notas de Aula 9 (História da Física.

DEFIMAT - IFCE Campus Fortaleza, 2023-1)(*)


Tycho Brahe

Por José Carlos Parente de Oliveira, 03-2023.

Tycho Brahe: "Não me parece que vivi em vão".


Tycho Brahe nasceu no ano de 1546 de nossa era,
sendo o filho mais velho de uma rica e nobre família
dinamarquesa o que lhe poderia garantir uma vida de
ócio, caçando ou muito atribulada em guerras, pois
eram estas as ocupações aristocráticas naturais à
época.
Ele tinha um tio de nome Joergen, também rico,
além de escudeiro rural e vice-almirante, portanto
formalmente educado. Como Joergen não tinha filho
o pai de Tycho concordou, antes de Tycho nascer,
que se ele fosse um menino, o tio poderia adotá-lo e
criá-lo.
Contudo, ao nascer Tycho o seu pai desistiu de cedê-
lo à adoção. Mas, com o nascimento do irmão mais
novo o tio sequestrou Tycho. O seu pai ameaçou
assassinar o tio, mas acabou cedendo, pois Tycho
herdaria uma grande propriedade do tio.
Aos sete anos seu tio insistiu que Tycho inicia seus Tycho Brahe (1546, Suécia; 1601, Tchéquia)
estudos de latim. Os seus pais se opuseram, mas o
tio os convenceu dizendo que isto ajudaria Tycho a se tornar advogado. Aos treze anos, Tycho
ingressou na Universidade de Copenhague para estudar Direito e Filosofia. Desde que esta idade as
crianças são impressionáveis, Tycho ao assistir um eclipse parcial do Sol, um evento espetacular que
mudou completamente o destino de sua vida. Este eclipse havia sido previsto e ocorreu dentro do
prazo estabelecido. Então, para este garoto havia "algo de divino no fato dos homens conhecerem os
movimentos das estrelas com tanta precisão que fossem capazes de prever com antecedência seus
lugares e posições relativas". Esta previsibilidade aliada ao fato de não apreciar os estudos do Direito
atraiu de forma marcante Tycho Brahe.
Como a riqueza é uma facilitadora de vontades, Tycho imediatamente comprou um exemplar do livro
Almagesto de Ptolomeu (em latim), assim como alguns conjuntos de tabelas astronômicas, que
mostravam as posições dos planetas em determinado momento. Essas tabelas foram produzidas por
Ptolomeu e revisadas na Espanha por um grupo de astrônomos em 1252, os quais foram reunidos sob
os auspícios de Alfonso X de Castela, e que foram chamadas de Tabelas Alfonsinas. Adicionalmente,
Tycho Brahe comprou um conjunto recente de tabelas com base na teoria de Copérnico.

(*) Notas de Aula escrita com consultas a diversas páginas da Wikipedia e em diversas ocasiões.

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Com dezesseis anos Tycho foi para Leipzig, na Alemanha, a pedido do tio para continuar seus estudos
de Direito. Ele foi acompanhado de um tutor, de nome Anders Vedel, de 20 anos, que veio a se tornar
famoso por ser o primeiro grande historiador da Dinamarca.
Entretanto, desde o evento do eclipse Tycho era obcecado por Astronomia e, escondido de seu tutor,
ele comprava livros e instrumentos astronômicos e passava grande parte das noites observando as
estrelas. Aos dezessete anos, ele observou um evento especial em 17 de agosto de 1563, data em que
os planetas Júpiter e Saturno passaram muito próximos um do outro – uma conjunção planetária. Ao
verificar as tabelas, ele descobriu que as Tabelas Alfonsinas estavam erradas em um mês na previsão
deste evento, e as tabelas de Copérnico estavam erradas por vários dias. Tycho imaginou que tabelas
melhores poderiam ser construídas apenas com observações mais precisas das posições dos planetas
durante um longo período de tempo. Ele então decidiu que era isto o que ele faria.
Vedel estava convencido que Tycho não se dedicaria ao Direito e desistiu de tentar continuar a ser seu
tutor em Direito.
Em 1565, seu tio, Jorgen Brahe, morreu de pneumonia,
em virtude de Jorgen ter resgatado o rei da Dinamarca
do afogamento em águas muito frias. Nesta época
Tycho se acompanhava de alguns jovens astrônomos
amadores e ricos em Augsburg. Ele os convenceu da
necessidade de terem melhores instrumentos de
observação.
Como os instrumentos eram ainda rudimentares eles
necessitavam de melhores e maiores quadrantes para
obter linhas de visada das estrelas mais precisas.
Assim, eles construíram um grande quadrante de
madeira com parte de uma circunferência com raio
de dezenove pés (5,8 m), como mostrado ao lado. A sua
montagem necessitou de vinte homens e ele foi
graduado em sessenta avos de um grau. Foi aí que ele
desenvolveu muitas de suas ideias para a construção de
grandes equipamentos para obter linhas de visadas das
estrelas. Este foi o grande início das observações
precisas de Tycho.
Tycho era um jovem muito impetuoso, além de gostar
muito de cerveja, e, ainda estudante na Alemanha, ele
perdeu a paciência em uma briga com outro aluno sobre Quadrante
quem era o melhor matemático dinamarquês. Tal dis
cussão provocou um desafio a um duelo de espada em que parte do nariz de Tycho foi cortada e o
pedaço perdido foi substituído por uma prótese de uma liga de ouro e prata, e Tycho sempre carregava
consigo uma caixa metálica contendo um "unguento colante" que ele frequentemente esfregava no
nariz, para manter a peça presa.
De 1568 a 1570, o pai de Tycho pagou suas despesas educacionais e de viagem. No início da década
de 1570, ele viveu e trabalhou com seu tio materno, Steen Bille, que fundou a primeira fábrica de
papel e vidro na Dinamarca. Steen tinha um laboratório de alquimia instalado na Abadia de Herreved,
e foi o único membro da família que aprovou a observação das estrelas por Tycho. Por este apoio,

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Steen Bille foi hostilizado por sua família. Eles desprezaram as observações das estrelas realizadas por
Tycho Brahe e o culparam por Tycho ter abandonado os estudos de Direito.
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Até final do século XV eram comuns as estranhas práticas médicas, a exemplo da prática das curas
simpáticas: uma planta com uma folha em forma de coração era considerada ser boa para tratar doenças
cardíacas; ou um machado que corta a mão de uma pessoa ser enfaixado, e também enfaixar a mão, já que
era impossível determinar se foi a mão ou o machado que se extraviou e ambos podem precisar de cura.
No o início do século XVI, Theophrastus Paracelcus(*), por ser um homem devotado à Medicina,
redirecionou a alquimia. Paracelso teve a ideia de observar cuidadosamente um paciente doente e, em
seguida, prescrever curas com base nessas observações. Desta forma, a Medicina foi revolucionada.
Muita atenção se voltou para os remédios, principalmente a busca pelo elixir da vida.
Do convívio com seu tio, que tinha um laboratório de alquimia, Brahe estudou as obras de
Paracelso e estava constantemente tentando fazer remédios. Algumas dessas misturas foram listadas na
farmacopeia oficial dinamarquesa. Uma vez que Paracelso teve uma grande influência sobre Brahe, é
razoável acreditar que essa foi a fonte do seu interesse em observações cuidadosas e tediosas.
Tycho foi um alquimista convicto e capaz. E, àquela época, ser alquimista era um elogio supremo! Apesar
de adorar Matemática e Astrologia, ele também buscava a Pedra Filosofal, mas não motivado pela busca
de mais fortuna pessoal. Em vez disso, seu esforço foi direcionado mais para os desenvolvimentos
medicinais e místicos da alquimia. Como exemplo do meticuloso trabalho de Tycho, um de seus
assistentes passou oito anos no laboratório acendendo uma fogueira para destilar suavemente dois mil
ovos de galinha. Acredita-se que isto foi feito para criar um reagente forte para uso em remédios, mais
que na descoberta da pedra filosofal. Tycho Brahe não precisava de riqueza pessoal – na década de 1580,
estima-se que ele detinha 1% de todo o valor da Dinamarca.
(*) Paracelso, pseudônimo de Philippus Aureolus Theophrastus Bombastus von
Hohenheim, (Einsiedeln, 1493 — Salzburgo, 1541) foi um médico, alquimista, físico,
astrólogo e ocultista suíço-alemão. A ele também é creditado a criação do nome do elemento
zinco, chamando-o de zincum. Ele é considerado por muitos como um reformador do
medicamento. Também é aclamado por suas realizações em Química e como fundador da
Bioquímica e da Toxicologia.
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Em 1572, um novo evento astronômico ocorreu que mudou ainda mais a vida de Tycho. Em 11 de
novembro, voltando do laboratório de Alquimia de seu tio Steen, Tycho notou uma nova estrela no céu
que era mais brilhante do que Vênus. Ele não acreditou em seus olhos. Ele chamou a testemunha
de alguns criados, alguns camponeses, para assegurar-lhe de que ela realmente existia e estava lá.
A nova estrela era tão brilhante que podia ser vista à luz do dia. Esse fenômeno durou dezoito meses.
Tal fenômeno é o que agora é chamado de o aparecimento de uma supernova, um evento raro.
A questão crucial do ponto de vista astronômico e teológico era, onde exatamente estava essa nova
estrela? Foi um evento na atmosfera superior, isto é, abaixo da Lua, o que então se denominou na
região sublunar? Se fosse assim, não haveria problema porque essa região, abaixo da Lua, era onde a
mudança e a decadência ocorriam – de acordo com Aristóteles!
Por outro lado, se estivesse lá fora na oitava esfera, as estrelas fixas, na borda do céu, isto contradizia o
dogma aristotélico e cristão, porque aquela esfera permanecera inalterada desde o dia da criação, e
deveria permanecer assim.

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Astrônomos importantes nos diversos lugares tentaram detectar o movimento na nova estrela
alinhando-a com as estrelas fixas conhecidas, usando como direcionadores fios esticados. Eles não
conseguiram ver qualquer movimento da nova estrela.
Por outro lado, Tycho pode pesquisar o movimento da nova estrela, com o uso de um novo
instrumento que ele acabara de construir. Tratava-se de um novo sextante, com braços de 1,5 metros
de comprimento, uma enorme dobradiça de bronze, uma escala metálica calibrada em minutos
(sessenta avos de grau) e uma tabela de correções para os pequenos erros restantes no instrumento. A
sua tecnologia estava muito à frente da concorrência – que usavam fios esticados alinhados às estrelas
– e ele foi capaz de resolver a discussão.
A nova estrela não se moveu em relação às estrelas fixas. E ela estava além da Lua, na oitava esfera!
Tycho publicou um relato detalhado de seus métodos e descobertas no ano seguinte. Ele hesitou algum
tempo antes de publicar, porque escrever livros parecia um pouco indigno para um nobre. Da mesma
forma, quando alguns dos outros jovens nobres lhe pediram para dar um curso de astronomia, ele
recusou e só mudou de ideia quando o rei lhe disse para fazê-lo.
Abaixo são mostrados diagramas no livro de Tycho Brahe de 1573, "De Nova Stella", mostrando a
posição da estrela supernova de 1572 em relação às estrelas brilhantes na constelação de Cassiopea. A
falta de paralaxe detectável forçou Brahe a localizar a nova estrela além da esfera da Lua, ou seja, no
reino celestial, que era supostamente inalterável de acordo com a doutrina aristotélica.

Na verdade Tycho testemunhou a explosão de uma supernova, a Supernova SN 1572: uma supernova
do tipo Ia, na constelação de Cassiopeia, uma das oito supernovas visíveis a olho nu registradas na

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história da Astronomia. A explosão da supernova foi observada em novembro de 1572 e foi descoberta
independentemente por vários outros astrônomos.
A consequência do trabalho de Tycho foi uma grande fama na Europa e em 1575 ele embarcou em
uma viagem para visitar astrônomos em muitas cidades. Então, ele decidiu se mudar para a Basiléia, na
Suíça, uma cidade bela, encantadora e civilizada. O rei Frederico II da Dinamarca (cuja vida havia sido
salva pelo seu tio) ficou muito apreensivo com a ideia de perder seu melhor astrônomo (e também
astrólogo) e, após a recusa de alguns castelos para colocar seu laboratório, Tycho Brahe aceitou
toda uma ilha, plana com penhascos brancos, com cerca de três milhas de comprimento (~5 km),
chamada Hveen, em Hamlet.

A Dinamarca financiaria a construção de um observatório e uma casa, e os habitantes da ilha, que


trabalhavam em quarenta fazendas agrupadas em torno de uma pequena aldeia, se tornariam os súditos
de Tycho. (O rei da Dinamarca, um país muito pequeno, era muito rico porque a Reforma Protestante
havia colocado as terras e os recursos da Igreja em suas mãos).
Tycho contratou um arquiteto alemão e construiu seu Uranienborg (castelo dos céus): ele era cercado
por uma parede quadrada de 250 pés de lado (~76 m); uma cúpula em forma de cebola, semelhante à
do Kremlin; uma fachada de palácio italiano; salas para enormes instrumentos de precisão; murais
fantásticos; uma fábrica de papel e impressora; uma fornalha de alquimista e uma prisão para
inquilinos que causassem problemas.
Por mais de vinte anos, Brahe planejou e realizou suas observações cuidadosas dos seis planetas, Sol,
Lua e uma variedade de estrelas. Ele tinha um globo de latão polido de 5 pés de diâmetro (~1,6 m)
feito por ele para que pudesse registrar os cursos dos corpos celestes. Algumas de suas descobertas e as
conclusões que ele tirou contradiziam Aristóteles e dogmas da Igreja Católica.
Tycho acreditava que a Astrologia poderia ser aprimorada e foi o encarregado de fazer prognósticos
anuais para o rei Frederico II. Da mesma forma, anos depois na Boêmia (República Tcheca), ele foi o
matemático do rei e foi contratado por causa de seus conhecimentos sobre o enigma e os mistérios do
universo.
Tycho Brahe contratou Kepler como seu assistente, apesar de Kepler ser religioso, e que na descrição
dos afazeres que o rei Rodolfo II tinha para Kepler (sucessor de Brahe em Praga) exigia que ele fizesse
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horóscopos para os nobres. Kepler se referiu à astrologia como a filha da Astronomia que cuidou da
própria mãe.

Castelo laboratório Uranienborg

Quadrante de parede

Na biblioteca, Tycho instalou um globo de


latão com um metro e meio de diâmetro que
fizera para ele em Augsburg. Esta era uma
esfera precisa altamente polida, e as
posições das estrelas estavam gravadas
nela conforme eram medidas ao longo de
um período de 25 anos. No escritório de
Tycho, um quadrante foi construído na
própria parede, com um mural pintado pelo
próprio Tycho na parede.
O Grande Globo de Tycho, de 1580, (ao
lado) com cerca de 1,6 metros de raio,
levou mais de 10 anos de construção. Este
instrumento entrou em serviço no final de
1580. A maior parte do trabalho envolvia
Grande Globo tornar o globo oco de madeira o mais per-
feitamente esférico possível, após o que ele
era coberto com placas de latão. O globo teve dois usos científicos primários; passou a ser usado para
registrar a posição das estrelas observadas por Tycho. Em 1595, ele tinha 1.000 estrelas inscritas no
globo, todas observadas com precisão. No entanto, ele foi originalmente concebido como um
dispositivo computacional. Por meio de círculos auxiliares, as coordenadas locais de azimute e

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altitude, medidas com os instrumentos de Tycho, foram convertidas nas coordenadas celestes
convencionais usadas para registrar as posições estelares e planetárias.

Mais tarde, ele construiu um outro obser-


vatório, o Stjerneborg. O observatório
Stjarneborg (ao lado), palavra que
significa "castelo das estrelas", é possível
ver vários tipos de instrumentos usados
naquela época. Os observatórios de
Stjarneborg e Uranienborg, ambos situa-
dos na ilha Hven, foram os mais avança-
dos observatórios da época que antece-
deu à descoberta do telescópio.

Castelo laboratório Stjarneborg

1576 – O Quadrante Azimutal de Latão


O quadrante azimutal de latão de Tycho, com 65
centímetros de raio, foi construído em 1576. Ele foi um
dos primeiros instrumentos construídos em Hveen e foi
usado para observações do cometa de 1577. Ele tinha
uma precisão estimada de 48,8 segundos de arco. O
quadrante foi centrado em uma janela aberta através da
qual as observações foram feitas. Vários relógios foram
usados simultaneamente para tentar cronometrar as
observações com a maior precisão possível – neste
equipamento um observador e um cronometrista
trabalharam juntos.
Tycho por ser muito rico possuía uma equipe muito
grande e vários conjuntos de equipamentos permitiam
quatro medições independentes da mesma coisa
simultaneamente, reduzindo muito a possibilidade de
erro.
A precisão das medições com o quadrante azimutal de
latão se manteve em dez minutos de arco desde
Ptolomeu, e ela foi reduzida em Uranienborg para um
minuto de arco. Quadrante Azimutal

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1577 – O Grande Sextante
Este é o grande sextante que Tycho Brahe
construiu e usava em suas observações. Este
equipamento não tem qualquer relação com o
instrumento moderno de navegação que
conhecemos com o nome de sextante.
Na verdade, o equipamento de Tycho Brahe
correspondia a 1/6 de um círculo, daí o seu nome de
"sextante", que era conectado a um pedestal por uma
junta universal que permitia que ele girasse em
qualquer direção.
Usando esses equipamentos Tycho Brahe
observou, em 1577, um cometa. As medições de
paralaxe feitas por ele demonstraram que estes
objetos estavam além da Lua. Brahe começou a
escrever um livro sobre este cometa mas nunca o
terminou. Grande Sextante

Nas figuras abaixo, à direita está uma representação do cometa de 1577 observado por Tycho, que
permaneceu visível de novembro de 1577 a janeiro de 1578. As suas observações não revelaram
nenhuma paralaxe mensurável, o que implica que o cometa estava localizado além da esfera da Lua.
Sua reconstrução da trajetória orbital do cometa (à esquerda), do clareamento e escurecimento e
deslocamento em relação às estrelas de fundo, indicou que o cometa se moveu através das esferas
cristalinas planetárias concêntricas. Isso apoiava a noção de um "céu fluido" e contradizia a realidade
física dessas esferas como conchas esféricas reais, duras, transparentes e contíguas.

O caminho do cometa é traçado dentro do sistema planetário de Tycho, onde todos os planetas orbitam
ao redor do Sol, com este orbitando uma Terra fixa, conforme visto na Figura a seguir.
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Observe que a trajetória do cometa atravessa
inúmeras esferas planetárias, a partir das quais
Tycho concluiu que as ditas esferas não poderiam
ser objetos sólidos e cristalinos como Considerado
por Aristóteles. (Figura ao lado)
Semelhantemente a Nicolaus Copernicus e outros
astrônomos anteriores, Tycho agarrou-se
firmemente à noção de órbitas perfeitamente
circulares para todos os corpos celestes.

O modelo planetário tychoniano


Tycho Brahe rejeitou a crença de que
houvesse uma dicotomia entre o mundo
sublunar imperfeito e mutável e os céus
supralunar, perfeitos e imutáveis, que era
a doutrina comum na época. Ele concluiu
a partir de cálculos de distância do Sol,
cometas e planetas que os céus não
poderiam ser preenchidos por esferas
sólidas carregando os planetas.
Ele também não podia aceitar a teoria
heliocêntrica completa de Copérnico,
principalmente por causa da não
observação de paralaxe – mesmo tendo os
equipamentos mais precisos até então
construídos – e ele insistia que a Terra era
o centro do universo. A ideia de uma
Terra em movimento parecia contrária à
interpretação da Bíblia na época. Talvez
também fosse difícil para Brahe lidar
com a ideia de atribuir movimento à
Terra tanto em termos de rotação quanto
de deslocamento ao redor do Sol. Com a
Terra como o centro do universo, ele
poderia manter a Física Aristotélica (a
única Física disponível à época). Talvez o
gasto de 25 anos de registro de dados
em um globo de latão extremamente caro que teria de ser descartado também foi levado em
consideração. Ainda assim, os dados coletados de Tycho trouxeram muitos benefícios para futuros
astrônomos e matemáticos.
O modelo planetário tychoniano, concebido por Tycho Brahe por volta de 1583, foi uma tentativa
pouco convincente de reintroduzir o geocentrismo no "sistema planetário copernicano". A partir de
suas observações de 1572 (super) nova e do cometa, em 1577, Tycho estava convencido da falsidade
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do sistema ptolomaico. Estas ideias de Brahe
de centralizações duais (Sol, Terra) para o
universo era muito popular em meados do
século XVII.
No seu sistema, a Terra é absolutamente fixa,
de modo que o movimento diário das estrelas
fixas é atribuído a uma rotação diária da
esfera mais externa, como no sistema
ptolomaico. Um sistema planetário
semelhante foi proposto na antiguidade por
Heraclides de Pontus (388-315 a.C.) que
propôs que a Terra gira diariamente sobre
seu próprio eixo; e que Vênus e Mercúrio
orbitam o Sol, além da existência de
epiciclos.
Do ponto de vista dos movimentos
planetários aparentes, visto da Terra, este
Sistema é observacionalmente indistinguível Esta imagem mostra detalhes do sistema de Tycho
do modelo de Copérnico, no sentido de que Brahe. O desenho não se encontra em escala.
os movimentos relativos de todos os corpos
celestes (exceto as estrelas) são os mesmos
nos dois sistemas, mas ele mantém a Terra fixa. Esta última crença foi mantida por Tycho até o fim de
sua vida, em grande parte porque ele havia sido incapaz de detectar a paralaxe anual das estrelas fixas
prevista pelo modelo de Copérnico, apesar da precisão sem precedentes das observações realizadas
com seus "instrumentos gigantes" em Uranienborg.
Tycho podia medir paralaxe até 2 minutos de arco (1/30 de um grau); sua falta de detecção de
paralaxe para estrelas fixas implicava que as últimas teriam de estar localizadas a cerca de 700 vezes
mais longe que Saturno, o planeta mais externo conhecido na época.

A imagem ao lado
compara os modelos
cosmológicos de
Ptolomeu, Copérnico
e Tycho Brahe.

Um pouco da vida de Tycho Brahe


Na ilha observatório havia um fluxo constante de visitantes ilustres: astrônomos, príncipes, sábios,
cortesãos e até mesmo o rei Jaime VI da Escócia. Tycho era beberrão e oferecia grandes banquetes
para seus visitantes, nos quais ocasionalmente se ordenava o silêncio para ouvir as reflexões de um
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anão chamado Jepp, que Tycho acreditava que o anão tinha uma segunda visão dos fatos. Ele também
tinha um alce domesticado, que morreu uma noite tropeçando escada abaixo depois de muita cerveja
forte.
Ele foi casado com uma camponesa, e tiveram muitos filhos, mas segundo o costume dinamarquês,
todos eram considerados ilegítimos, dada a condição não nobre de sua esposa.
Infelizmente para Tycho, o rei Ferdinand morreu em 1588, supostamente por excesso de bebida. O
novo jovem rei, Christian IV, com que Tycho Brahe teve, em 1596, uma polêmica sobre questões
religiosas iniciou medidas restritivas para reduzir a renda de Tycho a proporções mais ―razoáveis‖ e,
com o passar dos anos, Tycho foi ficando entediado na ilha. Assim, em 1597, ele reuniu sua família,
servos, assistentes, Jepp, o anão, e a maior parte de seu equipamento e começou a se mover pela
Europa em busca de um novo local adequado para estabelecer o observatório.
Todos os seus instrumentos poderiam ser desmontados e transportados, porque, disse ele, "um
astrônomo deve ser cosmopolita, porque não se pode esperar que estadistas ignorantes valorizassem
seus serviços".
Durante os dois anos seguintes, ele ficou em várias cidades alemãs; em 1599, a comitiva chegou a
Praga, na Boêmia, onde o imperador Rodolfo II nomeou Tycho de Mathematico Imperial, com um
salário de 3.000 florins por ano, e um castelo que ele escolhesse. Dessa forma, Tycho se transfere, com
seus instrumentos, para a corte de Rudolph II, em Praga, onde ele passaria a trabalhar com Johannes
Kepler.
Um dos maiores legados dados por Brahe (e Kepler) foi o exemplar comportamento de colegialidade.
É bom lembrar que Tycho Brahe era um homem de crença forte e temperamento explosivo, portanto, é
digno de nota que ele tenha deixado o trabalho de sua vida inteira para Kepler, mesmo que os dois
terem discussões veementes sobre o sistema solar de Copérnico. A honestidade intelectual de Tycho
Brahe é surpreendente e elogiável, pois ele não falseou seus dados para apoiar suas próprias teorias.
Isto permitiu que mais tarde Kepler pudesse usar as medidas que Tycho Brahe para desenvolver suas
leis a respeito do movimento elíptico. Assim, o trabalho de um cientista obstinado pôde ser revisado
com uma nova forma de matemática, permitindo que a ciência continuasse a sua evolução.

RESUMO
Tycho Brahe (1546-1601): nobre dinamarquês; astrônomo brilhante e excepcional construtor de
instrumentos; admirador de Copérnico como matemático; critico da ideia de uma Terra em
movimento. Ele foi um excepcional observador que acumulou mais de 20 anos de dados planetários
precisos. Tycho era um homem brilhante, obstinado e combativo, além de inveterado apreciador de
cerveja.
A estrela Nova de 1572: em novembro de 1572, Tycho notou uma nova estrela brilhante na
constelação de Cassiopeia. Ele realizou medições detalhadas ao longo dos 16 meses seguintes: suas
medições falharam em medir uma paralaxe, concluindo que a nova estrela estava no reino celestial
além da Lua. Isso fato foi um golpe para o sistema ptolomaico.
Ao colocar a nova estrela além da Lua, que era uma região celestial estável e livre de mudança, ele se
colocava em séria contradição com o ideal aristotélico de perfeição celestial. O evento estimulou os

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interesses astronômicos de Tycho e marcou o início de seus esforços ao longo da vida para
desenvolver seu próprio "Sistema Tychonico", um híbrido dos sistemas copernicano e ptolomaico.
O Sistema Tychonico (Sistema Híbrido Geocêntrico/Heliocêntrico):
A Terra está no centro;
A Lua e o Sol orbitam a Terra;
Os planetas orbitam o Sol;
Os epiciclos continuam a ser utilizados como forma fazer com que tudo funcione em detalhes;
Da mesma forma que Copérnico, ele não utiliza os Equantes;
As ideias de uma Terra imóvel e de movimentos circulares uniformes são preservadas.

O laboratório de Uraniborg
Com o apoio da coroa dinamarquesa, ele construiu "Uraniborg" (Castelo Celestial) em Hven, uma
pequena ilha no estreito de Øresund, entre a Dinamarca e a Suécia:
O castelo estava equipado com os melhores instrumentos que ele pode projetar;
Ele obteve uma precisão de medição sem precedentes de 1 a 2 minutos de arco;
O laboratório era o principal centro de pesquisa astronômica da Europa.
20 anos de trabalho de Tycho (de 1577 a 1597) produziram dados planetários precisos que
formavam o maior Banco de dados astronômico existente em todo o mundo;
Posições de 777 estrelas com precisão de 1 a 2 minutos de arco;
O Grande Cometa de 1577 (o cometa estava mais longe do que a Lua e orbitando o Sol);
Observação intensiva de Marte (ele tentou, mas falhou em observar a paralaxe de Marte);
Acumulou dados precisos sobre as oposições de Marte;
As observações cuidadosas de Marte (e também dos outros planetas) que se mostrariam de uma
importância fundamental, que iam muito além de sua própria imaginação (ou intenções).
Todas essas observações atestam não apenas as habilidades consideráveis de Tycho, mas também
contêm os ingredientes para a contestação da visão aristotélica do mundo, que afirmavam que cometas
e estrelas novas (os últimos agora entendidos como explosões estelares) eram considerados fenômenos
atmosféricos, pois uma mudança não poderia ocorrer no reino celestial supralunar. Adicionalmente, ele
demonstrou que o centro de movimento do Grande Cometa de 1577 era o Sol e não a Terra: este fato
foi um golpe mortal no amago do ponto de vista geocêntrico.

Tycho teve um desentendimento com o novo rei dinamarquês, deixando a Dinamarca em 1597.
Em 1599 ele foi nomeado Matemático Imperial em Praga;
Em 1600 ele contratou Johannes Kepler como seu assistente;
Em 1601 ele morreu em Praga, Kepler o substituiu na direção do laboratório e também como
astrólogo;
Tycho Brahe realizou duas contribuições essenciais para a ciência:
1. Ele adquiriu os melhores dados a olho nu sobre estrelas e planetas e
2. Ele contratou Johannes Kepler para analisar esses dados.
Relatos contemporâneos registram que as últimas palavras de Tycho foram "Não me parece que vivi
em vão".
Seu desejo era que Kepler usasse seus dados para provar que o seu sistema Tychonico era verdadeiro.
Contudo, como veremos mais adiante, o seu desejo não se efetivou, pois Kepler conseguiu algo bem
diferente. Mas, com certeza ele entendeu Kepler, afinal de contas Tycho Brahe foi um excepcional
observador.
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