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Por Que o Arranco não é Discutido nos Cursos de Física?

E Quanto ao Estalo? À Crepitação? Ao Estouro?

José Carlos Parente de Oliveira, Dr.


DEFIMAT, IFCE – Campus Fortaleza, em 07/09/2022.

O deslocamento, a velocidade e a aceleração são conceitos bem conhecidos por todos aqueles
que estudam Física, tanto no ensino médio quanto no universitário. Entretanto, a derivada
temporal da aceleração (arrasto, o nome português para a variável jerk, em inglês), assim
como as derivadas temporais de mais altas ordens da posição são dificilmente mencionadas,
e raramente discutidas em livros universitários de Física ou Engenharia.
Os textos universitários de Física que são adotados no Brasil, a exemplo dos livros do
“Halliday/Resnick”, do “Sears/Zemansky”, do “Serway/Jewett”, do “Moyses”, do
“Alonso/Finn”, não mencionam o arranco ou as derivadas de mais alta ordem da posição.
Aprendemos nos cursos introdutórios de Física Geral que os movimentos de objetos são
resolvidos precisamente com a utilização de apenas duas variáveis de estado – a posição e o
instante de tempo – juntamente com a primeira e a segunda taxa de variação temporal da
posição, que são a velocidade e a aceleração, respectivamente. Dessa forma, a noção de
arrasto, ou taxa de variação da aceleração (terceira derivada da posição), nunca aparece e,
portanto, ela é desnecessária para descrever ou prever o movimento de objetos. Em
consequência, também não são usadas as variáveis que descrevem a quarta, quinta e sexta
derivadas temporais da posição de um objeto. Os nomes dessas derivadas são: o “estalo” (do
inglês snap), md4r/dt4; a “crepitação” (crackle), d5r/dt5 e o “estouro” (pop), md6r/dt6.
A segunda lei do movimento de Newton é comumente escrita como F = ma, ou seja, “força
resultante é igual ao produto da massa do objeto pela sua aceleração”, embora Newton não
tenha usado o termo aceleração em suas equações: originalmente ele afirmou que a força
resultante era igual à taxa de variação do momento linear. Se a aceleração muda com a força,
então a derivada da aceleração muda com a derivada da força. Em outras palavras,
se md2r/dt2 = F, então, d3r/dt3 = (dF/dt)/m .
Ou seja, o arranco é a taxa temporal na qual a força está mudando, dividida pela massa do
objeto, sendo representado pelo símbolo, j. O arranco é uma grandeza vetorial dada por, j =
d3r/dt3 = (dF/dt)/m e tem unidades no SI de m/s3, ou m/s2/s.
Se você "empurra" um objeto, você está alterando brevemente a força aplicada ao objeto de
zero para algum valor final, e quanto menor for o intervalo de tempo durante o qual você
leva o objeto de nenhuma força para a força final, maior é o “arranco” da ação.
Podemos então indagar: é possível os sistemas físicos – os humanos incluídos – sentirem o
arrasto? A resposta é positiva, pois se os sistemas físicos podem sentir algo, eles também
podem sentir a mudança que ocorre com esse algo. Uma vez que a aceleração é sentida,
então, também será sentido o arrasto, que é a variação da aceleração.
O arrasto vem crescentemente sendo considerado em muitas aplicações em ciência e
engenharia. Por exemplo, o arrasto vem sendo usado há algum tempo como um importante
fator nos projetos de montanhas russa, de parques de diversão, como garantidor de conforto.
O arranco também é considerado em projetos de navios, elevadores, ônibus e trens. E em
projetos de rodovias e de linhas férreas os valores do arrasto lateral, por exemplo, são
utilizados para garantir conforto dos passageiros.
Outro campo de pesquisa do efeito do arrasto é na indústria de equipamentos para navios de
guerra, que necessitam ser à prova de choques. Aqui a premissa básica é que tanto o
equipamento quanto o próprio navio estarão sujeitos às mesmas explosões, as quais se
caracterizam por bruscas variações. Não seria viável, por exemplo, o navio suportar
explosões, mas o equipamento de controle não.
Em elevadores o limite do solavanco vertical é essencial para a conveniência dos
passageiros. As normas estabelecidas pela Organização Internacional para Padronização,
ISSO, (International Organization for Standardization) especificam os níveis de qualidade de
passeio aceitável ou inaceitável. Essas normas classificam um arrasto vertical de 2 m/s3 como
aceitável e de 6 m/s3 como intolerável. Em hospitais, essas normas recomendam 0,7 m/s3
como limite!
O estudo do arranco é muito importante nos processos industriais de usinagem. As variações
que ocorrem na aceleração de ferramenta de corte ocasionam desgaste prematuro da
ferramenta ou podem resultar em irregulares na peça confeccionada. Portanto, os modernos
controladores de movimento incluem limitações às variações da aceleração (arranco). Em
projetos de engenharia mecânica onde vibrações podem estar presentes, o arranco, além da
velocidade e aceleração, é considerado. A vibração no processo de usinagem é uma
preocupação no desenvolvimento de perfis das peças que devem se ajustar em movimento:
cada peça deve seguir o perfil dos outros componentes sem vibração, respeitando as
características tribológicas de todos os componentes.
O desenho de tênis de corrida deve atender as propriedades de atenuação do impacto na
superfície do solo, tanto na frenagem quanto na arrancada, o que inclui, necessariamente, o
conceito de arrasto.
Uma característica do corpo humano é o controle da postura pelo equilíbrio de forças
exercidas pelos músculos: segurar um peso em uma das mãos requer que a musculatura
humana desenvolva um mecanismo de controle capaz de atingir o equilíbrio desejado. No
entanto, se a postura mudar muito rapidamente, os músculos podem não relaxar ou tensionar
rápido o suficiente, podendo resultar na perda temporária de equilíbrio. O corpo humano
possui um tempo de reação em resposta às mudanças no estado de equilíbrio. Esse tempo
depende tanto das condições fisiológicas quanto do nível de atenção cerebral: o equilíbrio é
mais rapidamente estabelecido quando se espera uma mudança, contrariamente ao que ocorre
quando há um aumento ou diminuição repentina de carga.

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