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ACCOUNTABILITY E

TRANSPARÊNCIA PÚBLICA
AULA 6

Prof. Fernanda Alves Andrade Guarido


CONVERSA INICIAL

A transparência pública é realizada com o suporte de ferramentas. É


importante compreendê-las e saber como elas podem colaborar na
disseminação da informação e da comunicação, favorecendo a gestão pública
brasileira. Assim, em nosso primeiro tema, abordaremos as tecnologias da
informação. Merecem destaque os computadores e sua rede mundial – a
internet. Com ela, a sociedade se transformou. O jeito de atuar também. Em
nosso segundo tema, abordaremos os marcos regulatórios, que com sua força
aprimoraram a transparência. Trabalharemos aspectos da Lei Complementar n.
101, de 2000, da Lei Anticorrupção – LAC e da Lei de Acesso à Informação –
LAI.
Na sequência, vamos estudar as audiências públicas e sua contribuição
à transparência pública. Depois, cuidaremos das consultas públicas, abordando
a sua distinção em relação às audiências públicas, sua utilidade, bem como os
roadshows. Por fim, voltando às tecnologias da informação, trataremos das
mídias sociais e de seu papel na disseminação da informação e na promoção da
transparência. Ao final, com um exemplo prático e real, vamos comentar a
operação Lava Jato, especialmente o modo como os instrumentos voltados à
transparência serviram de suporte para legitimar a operação, combater a
corrupção e recuperar dinheiro público. Ao final, faremos um arremate
necessário, lembrando que a transparência pública e a accountability, quando
efetivas, consolidam a nossa democracia.

TEMA 1 – INTERNET E TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO

O computador trouxe muitos benefícios ao mundo moderno, pois facilitou


muitas tarefas. Além disso, a criação da internet, sem sombra de dúvida,
revolucionou o mundo em termos de comunicação e de disseminação da
informação. O surgimento da internet se deu após a Segunda Guerra Mundial,
pelo exército dos Estados Unidos. No início dos anos 2000, entretanto, a internet
ganhou o cenário mundial, tendo se tornado acessível à população em geral
(Lenhardt; Fontana, 2016).
Considerando que a sociedade industrial foi cedendo espaço à sociedade
da informação, a internet tornou-se um meio importante de inclusão. É que as
tecnologias da informação (TICs) permitiram uma nova estruturação da
sociedade, que tem o ciberespaço como local privilegiado para comunicações e
conexões (Lenhardt; Fontana, 2016). Na rede mundial de computadores, há
intercâmbio cultural, e-commerce (comércio através da internet),
conscientização política e interação de todo o gênero. A liberdade de opinião e
de expressão se desenvolve na internet, como também os debates, a
organização em prol de algumas causas, e a própria discussão acerca de
demandas políticas.
Por meio dos computadores e de sua rede mundial, a transparência
pública também sofreu transformações incríveis. A disponibilização e o acesso
a dados, e até mesmo a própria comunicação, tornaram-se muito mais ágeis.
Por isso, é importante facultar aos cidadãos o acesso à internet. O acesso a
computadores e a internet para todos, em vista disso, tornou-se uma política
pública denominada inclusão digital. O governo passou a ter por meta, portanto,
a massificação do acesso dos cidadãos à internet, pois, como nesse espaço se
desenvolve toda uma organização social, as pessoas têm direito de nele
interagir.
A inclusão digital foi considerada, dessa forma, um direito social, quer
dizer, o Estado é obrigado a desenvolver políticas públicas que propiciem o
acesso de todos à rede mundial de computadores, a fim de garantir as interações
necessárias. No âmbito das ações do governo, muitas das suas obrigações para
com a sociedade são realizadas através da internet. Seja na atuação cotidiana
pelo uso de softwares, o que propiciou a informação e o controle, seja no
intercâmbio entre cidadãos e governo, seja na facilidade para a prestação de
serviços, a internet em muito modificou o dia a dia das atividades no âmbito
público, ampliando a disseminação das informações e a própria organização da
sociedade.
A internet ampliou a transparência, pois de suas casas os cidadãos
passaram a ter acesso não somente a serviços, mas também a dados relativos
à gestão pública. Isso permitiu a ampliação do conhecimento acerca das políticas
públicas, além da organização das pessoas e a própria fiscalização e cobrança.
A internet, portanto, elevou os níveis de transparência e de accountability por
parte dos cidadãos.

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1.1 Portais de transparência

Os portais da transparência são um exemplo de atuação concreta das


tecnologias da informação em prol da realização do ideal democrático. Criados
no âmbito dos governos, os portais são páginas na internet em que são
disponibilizados dados acerca das atividades governamentais, notadamente
aquelas atinentes a gastos públicos, contratações etc.
Por meio dos portais, os cidadãos podem ter acesso a dados abertos,
solicitar notificações sobre certos assuntos, ler notícias ligadas à atuação
pública, interligar-se com redes de transparência e ter acesso a informações
sobre repasses, execução de políticas públicas, ocupações de cargos públicos
por algumas pessoas, gastos com viagens e serviços realizadas com cartões de
pagamento, licitações públicas e contratos administrativos celebrados. São
muitas informações acessíveis aos cidadãos, sem que eles tenham que sair de
casa ou gastar dinheiro (além das despesas com internet) para obtê-las.
A rede de transparência, disponível, por exemplo, no portal da
transparência do governo federal, traz muitos links úteis, que dão acesso a
informações variadas (cidadania, controle social, cultura, ciência, tecnologia,
benefícios sociais, bancos, auditoria e fiscalização, desenvolvimento, compras,
entre outras). A rede funciona no âmbito da administração pública federal,
porque os portais da transparência têm existência no âmbito de cada ente. Dessa
forma, informações sobre contratos, cultura, ciência e tecnologia são relativas ao
ente público criador do portal. Se for um portal do estado, as informações tratam
daquele estado. O portal federal, por sua vez, traz informações sobre a gestão
pública no âmbito da União.
A fim de ilustrar as benesses trazidas pelas TICs, a seguir vamos explicar
o que é e como funciona o software Siafi.

1.2 Siafi

Outro instrumento de transparência, previsto na LRF (Lei de


Responsabilidade Fiscal) (Lei Complementar n. 101, de 2000) é o Siafi (Sistema
Integrado de Administração Financeira do Governo Federal). Trata-se de um
sistema que foi criado nos idos de 1987, junto com a Secretaria do Tesouro
Nacional. O desenvolvedor do Siafi foi o Serpro (a empresa pública encarregada
do processamento de dados no âmbito do governo federal). O Siafi está

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encarregado do registro, acompanhamento e controle da execução
orçamentária, financeira, patrimonial e contábil no âmbito do governo federal.
Trata-se de uma ferramenta hábil no fornecimento de informações gerenciais. O
Siafi está encarregado de municiar o gestor de informações necessárias à
tomada de decisão, além de permitir o controle (Ferreira, 2018).
O Siafi opera sobre as diretrizes básicas do orçamento: previsão de
receita e estimativa de despesas. Por isso, concentra dados econômicos e
financeiros dos entes e entidades da federação, através da integralização de
balancetes. Pelo Siafi, é possível conhecer e definir gestores, sendo que o
sistema suporta até 5.000 (cinco mil) atendimentos simultâneos. Apesar de ser
uma ferramenta para uso de gestores públicos, a reuniões de informações em
um único sistema foi capaz de permitir e de aprimorar o controle interno, de
aprimorar a contabilidade pública, de padronizar métodos e rotinas de trabalho,
de permitir o acompanhamento e a avaliação de recursos públicos no âmbito do
governo federal e, em suma, de proporcionar a transparência de seus gastos.

TEMA 2 – MARCOS REGULATÓRIOS PROPICIADORES DA TRANSPARÊNCIA

A transparência pública vem se aprimorando no dia a dia na gestão


pública brasileira. Desde a promulgação da Constituição da República de 1988,
muitos dos instrumentos voltados à transparência vêm se revelando como
verdadeiros promotores da transparência, a serviço da disseminação da
informação e do aprimoramento da qualidade do que se divulga. São
considerados, entre outros, a clareza de compreensão acerca dos dados
divulgados, a qualidade e a utilidade da informação. Um marco regulatório forte,
com alto poder de sanção e de coerção, é considerado um dos instrumentos
mais importantes na promoção da transparência. Dessa forma, leis que sejam
capazes de promover a transparência acerca do que se faz na gestão pública
vêm surgindo no cenário governamental.

2.1 Lei de Responsabilidade Fiscal

A lei complementar n. 101, de 2000, conhecida como Lei de


Responsabilidade Fiscal (LRF), promoveu importantes medidas no que tange ao
aspecto informacional. O capítulo IX da lei é dedicado à transparência, ao
controle e à fiscalização da gestão fiscal. Constam como instrumentos de

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transparência: relatórios de execução orçamentária (resumido) e de gestão
fiscal; planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; prestações de
contas e o respectivo parecer prévio. Como ferramentas de transparência, a LRF
também elenca a participação popular, as audiências públicas e a liberação, em
tempo real, de informações detalhadas acerca da execução orçamentária e
financeira, que deve ocorrer em tempo real, em meios eletrônicos de acesso ao
público.
O art. 48-A da LRF estabeleceu o dever de os entes da federação
(estados, municípios, União e Distrito Federal) disponibilizarem a qualquer
interessado, pessoa física ou jurídica, informações relativas à receita e à
despesa pública. Assim, informações relativas ao lançamento e ao recebimento
de receitas, inclusive decorrentes de recursos extraordinários, uma vez
solicitadas, devem ser objeto de informação aos interessados. Da mesma forma,
atos de execução de despesa devem ser informados aos interessados,
notadamente no que tange ao processo licitatório realizado, à contratação e ao
contratado (beneficiário de pagamentos), com valores de pagamentos, bens
fornecidos e serviços prestados.
O art. 49 da LRF determina que as contas de governadores, prefeitos e
do presidente da República devem ficar disponíveis no Poder Legislativo
respectivo (assembleias, câmaras de vereadores e congresso), e também no
âmbito do governo, no órgão técnico que elaborou as contas para que os
cidadãos e as instituições da sociedade possam consultá-las.
Observa-se na disciplina relativa à fiscalização e controle contábil e
orçamentário uma preocupação com o acesso à população, seja no que tange à
participação para a elaboração dos orçamentos, seja no acompanhamento dos
atos de gestão. Interessante registrar que esse capítulo da LRF sofreu alterações
em 2009, 2010 e 2016. Assim, a LRF, que é de 2000, recebeu aprimoramento
no que tange à disseminação da informação, o que, além de colaborar para a
efetivação da transparência, possibilita a ampliação da participação do cidadão
na gestão pública, colaborando, portanto, com o aperfeiçoamento da nossa
democracia.

2.2 Lei de Acesso à Informação

A LAI (Lei de Acesso à informação), Lei Federal n. 12.527, de 2011, é uma


lei de procedimentos, que busca viabilizar a garantia de acesso à informação,
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presente nos art. 5º, XXXIII, 37, parágrafo 3º, II e 216, parágrafo 2º, todos da
Constituição da República. Assim, a Constituição da República de 1988 (CR)
assegurou o acesso à informação de interesse particular, coletivo (de dada
categoria, a exemplo de professores, certos consumidores etc.), ou geral (da
sociedade, indiscriminadamente) a todos os interessados. A única reserva feita
pela CR é para a informação sigilosa, indispensável para a segurança da
sociedade e do Estado.
Por sua vez, o acesso de usuários a registros administrativos e
informações sobre atos de governo é considerado forma de participação do
usuário na Administração direta e indireta – art. 37, parágrafo 3º, II, CR. O
usuário da Administração tem o direito de requerer informações relativas à
gestão pública. Ao fazê-lo, já participa da gestão. É claro que a participação de
fato ocorre no instante em que, de posse da informação, o usuário possa utilizá-
la para fins voltados ao interesse público (como realizar cobranças, solicitar
investigações, realizar julgamentos e seleções, ainda que pelo voto).
Vamos ressaltar também que a Constituição, no capítulo reservado à
cultura, determina que a gestão da documentação governamental cabe à
Administração Pública – art. 216, parágrafo 2º CR. Dessa forma, enquanto
encarregada de zelar pelo nosso patrimônio histórico e cultural, é seu dever
cuidar, entre outros aspectos, das

formas de expressão, dos modos de criar, fazer e viver, das criações


científicas, artísticas e tecnológicas, das obras, objetos, documentos,
edificações e espaços destinados a manifestações artístico-culturais,
dos conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e cientifico. (Moraes, 2008, p.
820)

Todos os dispositivos constitucionais mencionados deixavam claro que a


Administração Pública deveria promover o acesso àquelas informações na
forma da lei. Assim sendo, em 2011 adveio a Lei de Acesso à Informação (LAI),
Lei n. 12.527, de 2011. A LAI regulamenta, portanto, cada um dos três
dispositivos da Constituição da República. Mencionamos que o acesso à
informação é uma garantia. Enquanto tal, inserida no rol do art. 5º da CR, é
também uma cláusula pétrea. A palavra pétreo vem de pedra, e significa algo
duro, permanente. Isso quer dizer que os dispositivos tachados como cláusula
pétrea não podem ser modificados, a menos que a própria CR seja mudada.
Assim, os dispositivos que são cláusulas pétreas não podem ser objeto de
emenda à Constituição. O acesso à informação é, portanto, uma garantia, um
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direito fundamental do cidadão brasileiro. Dessa forma, a LAI é um grande
avanço no que se refere ao respeito a esse direito fundamental, também com
referência aos avanços realizados na transparência pública.
A LAI abrange tanto a Administração Pública de todos os entes da
federação (União, estados, Distrito Federal e municípios) quanto suas
administrações indiretas. Abrange o Judiciário, o Legislativo, o Ministério Público
e os Tribunais de Contas. As entidades privadas sem fins lucrativos que recebam
recursos públicos também têm a obrigação de prestar informações relativas aos
recursos públicos recebidos e à sua destinação.
Para obter acesso à informação, os cidadãos devem cumprir um rito, isto
é, um procedimento que está previsto na própria LAI. Primeiramente, deve-se ter
em conta que o procedimento precisa obedecer aos princípios básicos da
Administração Pública. Trata-se dos princípios constantes no caput do art. 37 da
CR – legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. De
maneira muito simplória, podemos afirmar que o acesso à informação deve ser
feito em cumprimento da lei e do ordenamento jurídico, sem estabelecer
preferências ou distinções entre os requerentes, atendendo aos valores que são
caros à sociedade brasileira, tendo a publicidade como regra e primando pela
eficiência – isto é, fornecendo a informação de uma maneira adequada, viável,
útil.
Ao prestar informações, a Administração deve ter em conta que é seu
dever gerir e proteger as informações em seu poder. Também se deve ter em
conta que informar é um dever. Dessa forma, as informações de interesse
público devem sempre ser fornecidas, independentemente de solicitação. Ao dar
publicidade de seus atos, a Administração deve primar pelo estímulo à cultura
da transparência. A cultura é, em termos gerais, o acervo de crenças, hábitos,
costumes e tradições de uma dada sociedade. Assim, quando a LAI menciona
que a intenção é disseminar a cultura da transparência, ela afirma que o ato de
informar acerca da gestão deve ser natural na sociedade brasileira, corriqueiro,
costumeiro; assim sendo, há de se tornar parte do modo de viver, do modo de
gerir a gestão pública, sem causar espanto, reserva ou temor. O ato de informar
igualmente há de propiciar o controle social da Administração Pública. Enquanto
tal, há de promover igualdade, por reduzir distâncias ou estreitar relações
hierárquicas entre governantes e governados, fortalecendo a democracia.

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O procedimento para acesso à informação é o seguinte: o interessado
deve fazer o seu requerimento por qualquer meio legítimo (escrito, eletrônico,
outro, se houver). Em seu requerimento, o interessado deve fornecer os dados
(identidade, endereço) e a informação requerida. Não há necessidade de
justificar a solicitação, caso o requerimento se relacione com informações de
interesse público.
A Administração deve apreciar o pedido e imediatamente conceder o
acesso à informação. No entanto, caso não seja possível à Administração
conceder o acesso imediato, deverá responder ao pedido em até 20 dias (o prazo
pode ser prorrogado por mais 10 dias, mediante justificativa expressa). A
administração pode informar ao requerente onde obter a informação, informar
que não a possui (neste caso, indicando quem a possui, se souber), ou ainda
recusar o acesso, informando os fundamentos que a sustentam. Da decisão que
nega o acesso, cabe recurso, no prazo de 10 dias, à autoridade imediatamente
superior àquela que negou o acesso; desta decisão, cabe recurso à CGU –
Controladoria-Geral da União (em âmbito federal). Também no âmbito federal
existe uma Comissão Mista de Reavaliação de Informações, a quem o
interessado deve recorrer se até mesmo a CGU negar o acesso à informação
solicitada.
As informações a serem prestadas serão sempre gratuitas, sendo vedado
à Administração cobrança para prestá-las. A única cobrança autorizada se refere
a custos de materiais usados para prestar as informações solicitadas. Assim,
cobrar pelas cópias, ou pelo fornecimento de CD, pen drive ou outro instrumento,
é lícito. É possível obter informações gerais acerca de programas, metas,
registros, documentos produzidos, auditorias sofridas, uso de recursos públicos,
licitações, contratos administrativos, entre outras.
A informação dada pela Administração Pública deve ser primária,
autêntica, íntegra e atualizada. A informação tem que ser exata; ela não pode
passar pelo crivo da interpretação de ninguém. Ela não deve ser um relatório,
mas a fonte que permite gerar relatórios e outros informações. A informação
somente pode ser um relatório se este é o documento original de acesso.
Observe a diferença entre uma fonte primária e uma fonte secundária: por
exemplo, uma reunião, que é gravada e relatada em ata. A gravação é uma fonte
primária, enquanto a ata da reunião é uma fonte secundária, porque já passou
pela interpretação de alguém (no caso, do secretário que redigiu a ata). Assim,

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sempre que possível, deve-se primar pela entrega do dado primário, que
permitirá interpretações livres de interpretações anteriores.
A informação também deve ser íntegra, ou seja, inteira. A informação
somente será parcial se houver sigilo em relação a uma parte. Nesse caso,
apenas a parte sigilosa não será objeto de fornecimento do dado. A atualidade
da informação é igualmente um dever. Assim, sempre que solicitada, a
Administração deve entregar os dados mais atuais de que dispuser.
A LAI também determina que a Administração Pública deve criar serviços
de informações ao cidadão, além de realizar audiências ou consultas públicas,
incentivando a participação popular. Os serviços de informação ao cidadão
devem orientar o público acerca da tramitação de documentos e, em linhas
gerais, do acesso à informação.
Por fim, em alinhamento com os direitos à intimidade, à vida privada, à
honra e à imagem, as informações pessoais receberam tratamento diferente pela
LAI. Assim, seu acesso é restrito, independentemente da classificação de sigilo,
sendo acessíveis aos agentes públicos e às pessoas a quem se referem. O
acesso a informações pessoais é possível se houver autorização legal ou da
própria pessoa a quem a informação se refere.
Por fim, a lei de processos administrativos federais – Lei n. 9.784, de 1999,
deverá ser consultada, pois é fonte subsidiária da LAI. Assim, quando a LAI for
omissa em relação a algo, deve-se buscar a resposta na Lei n. 9.784.

2.3 Lei Anticorrupção

A Lei n. 12.846 surgiu no cenário nacional em agosto de 2013, sendo


considerada uma ferramenta importante no combate à corrupção. Conhecida
como Lei Anticorrupção (LAC), a mencionada regra estabelece a chamada
responsabilização objetiva de pessoas jurídicas que praticarem atos ilícitos
contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira. A LAC se destina,
portanto, a punir empresas infratoras que lesem a Administração Pública.
A responsabilização das empresas infratoras é objetiva, isto é, em sendo
verificada a prática do ilícito, não precisa estar provada a culpa – a simples
constatação de participação por parte da empresa para praticar o ilícito será
suficiente para responsabilizá-la. Logo, o simples envolvimento da empresa com
a prática de crimes que lesem a Administração já enseja o dever de reparação e
a possibilidade de a empresa ser punida. A Administração Pública pode,
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internamente, instaurar processo administrativo, quando pode haver ação
judicial e condenação dada por um juiz à empresa infratora.
No âmbito administrativo, as penalidades são multas e há publicação
extraordinária da decisão condenatória – essa publicação é feita em jornal de
grande circulação no local em que ocorreu a infração. No âmbito civil, as
penalidades são perda de bens, direitos e valores adquiridos com o ato ilícito;
suspensão ou interdição parcial das atividades da empresa; ou até mesmo
dissolução compulsória da pessoa jurídica, além da proibição de receber
empréstimos e outros benefícios de bancos públicos.
Ainda que as pessoas jurídicas sejam punidas, as pessoas físicas ligadas
à empresa igualmente poderão ser penalizadas. Ficou famoso na imprensa o
chamado Acordo de Leniência, previsto na Lei Anticorrupção. Tal acordo tem o
poder de suavizar a pena de quem assume que praticou crimes contra a
Administração e decide colaborar contando a verdade, denunciando envolvidos
e cooperando plenamente com as investigações. O acordo de leniência é
celebrado se a pessoa jurídica for a primeira a se manifestar sobre o ilícito, se
estiver disposta a cooperar, e se ela cessar a sua participação na prática do ilícito
a partir da celebração do acordo. Os crimes praticados por empresas são vários,
estando todos descritos na lei. Incluem desde a obtenção de vantagens
indevidas, até patrocínios ilícitos e atos relacionados à prática de fraudes em
processos licitatórios.
A lei anticorrupção, além de penalizar e buscar a reparação pelos danos
praticados contra a Administração Pública, faz vir a público atos de corrupção e
pesadas penalidades contra eles. Com isso, desestimula a prática de outros atos
de corrupção. Ademais, o fato de que existe uma lei que reprime severamente
tais crimes coopera com o aumento da credibilidade em relação à gestão pública,
fator que pode colaborar com o aumento da confiança. Por sua vez, um país
confiável atrai investidores, o que pode gerar mais desenvolvimento, trazendo,
por conseguinte, benefícios à nação.

TEMA 3 – AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

As audiências públicas têm sido utilizadas na gestão pública brasileira.


Elas são uma forma de garantir a participação da sociedade, representada por
pessoas interessadas nos mais diversos projetos. Trata-se de reuniões
previamente agendadas, nas quais a população interessada é convocada a se
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manifestar acerca de um dado assunto. A Administração que está encarregada
de convocar a audiência também deve cuidar dos processos, organizando-a.
Não existe um rito específico para a sua realização. É importante, no entanto,
que ela seja organizada de modo que a Administração Pública preste as
informações iniciais acerca dos projetos que pretende realizar, e também como
pretende fazê-lo, para em seguida franquear o acesso, de modo que os demais
presentes façam suas exposições e forneçam as contribuições que entenderem
necessárias.
A Administração não é obrigada a aceitar as sugestões feitas nas
audiências públicas. No entanto, enquanto canal de diálogo entre governo e
sociedade, é muito importante que o gestor público esteja atento às abordagens
realizadas, ao que agrada, ao que não agrada o público interessado, aos prós e
contras do projeto que se intenciona realizar. A legislação brasileira faz menção
a audiências públicas em algumas ocasiões. A lei federal de licitações públicas
– Lei n. 8.666, de 1993 – determina que, para as licitações de grande vulto
(aquelas que ultrapassam os 37,5 milhões de reais), é obrigatória a realização
da audiência pública prévia. Além disso, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)
determina que, durante a elaboração de planos plurianuais, leis orçamentárias e
leis de diretrizes orçamentárias, devem ser realizadas audiências públicas. A
ideia, em ambos os casos, é permitir que a população opine acerca da alocação
de recursos públicos, da realização de planos e da execução de projetos.
Por meio da audiência pública, portanto, dissemina-se a informação
acerca da gestão pública; além disso, no instante em que ocorre o intercâmbio
entre o cidadão e a Administração, com o compartilhamento de atos decisórios,
há participação efetiva, com a redução da distância entre usuário e
administração, o que sem dúvida colabora para dar legitimidade às ações
realizadas no âmbito da gestão pública brasileira. Um ato é considerado legítimo
quando é tido por adequado, correto, conforme os anseios de seus destinatários.
Em uma audiência pública, em que é garantida a oportunidade de participação
ao público, quando todos são efetivamente ouvidos, pode-se dizer que o projeto
ali exposto foi referendado pelas partes presentes, o que propicia legitimidade
ao projeto. Nesse contexto, acreditamos que a audiência pública é um
instrumento a serviço da transparência pública, com potencial de gerar o
fortalecimento de nosso Estado Democrático de Direito.

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TEMA 4 – CONSULTAS PÚBLICAS

As consultas públicas são formas de conectar Administração Pública e


sociedade na realização de projetos de interesse público. A finalidade é ouvir a
sociedade acerca do projeto, receber informações relevantes, para que seja
possível, antes de realizá-lo, promover ajustes que sejam considerados
importantes. Trata-se de uma ferramenta de grande utilidade na promoção da
transparência. Diferentemente das audiências públicas, tais consultas não
acontecem presencialmente. Elas se efetivam pela disponibilização de projetos
à sociedade ou aos interessados, por um dado tempo em um certo local. Assim,
é dada oportunidade de que os cidadãos tenham, em um dado tempo, a
liberdade de opinar acerca do projeto. Os sítios eletrônicos oficiais, por meio da
internet, têm sido um veículo promotor das consultas públicas. Geralmente, os
interessados em participar se cadastram nos sítios eletrônicos, têm acesso aos
projetos e, em um dado período, podem se manifestar sobre eles.
As empresas que entendem do assunto e que estão interessadas em
contratar com a Administração geralmente participam das consultas públicas.
Elas costumam trazer importantes contribuições aos projetos, porque entendem
o que a Administração está disposta a fazer. Para a Administração, é muito bom
contar com a expertise das empresas fornecedores, as quais, antes de os
projetos serem licitados, têm a oportunidade de opinar. É preciso, entretanto, ter
cuidado com a colaboração feita pelas empresas. Antes de realizar as
modificações sugeridas, a Administração tem de ter certeza de que, além de
benéfica, a mudança sugerida não causará nenhum direcionamento – quer dizer,
a mudança não impedirá que um número considerável de empresas possa
oferecer propostas e se candidatar a um contrato com o poder público. Além
disso, é preciso ter em conta que, apesar de a participação das empresas ser
importante, a sociedade como um todo também é muito bem-vinda na
participação, sempre que houver uma consulta pública em andamento.
Um exemplo de consulta pública está na lei de Parcerias Público-
Privadas, no art.10, VI. O artigo determina a realização de consulta pública, com
a obrigação de submeter minutas do edital e do contrato de PPP à sociedade
em geral, a fim de que participem com suas opiniões sobre a contratação que
será realizada. Assim, antes mesmo de a licitação ser publicada, os modelos de
editais de licitação e de contratos de PPP ficam disponíveis, para que a

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sociedade tenha conhecimento do assunto, de modo que possa mostrar o seu
ponto de vista, sugerir e, em suma, opinar. Tal como é feito na audiência pública,
a Administração não é obrigada a seguir as sugestões feitas; porém, em sendo
viáveis, úteis e relevantes, a Administração realiza as mudanças sugeridas. Com
isso, aproxima-se daquilo que a sociedade deseja: uma gestão mais cooperativa,
algo ansiado em tempos de boa governança.

4.1 Roadshows

Por fim, os roadshows são uma espécie de ferramenta que vem sendo
usada pela Administração Pública, a serviço da transparência. Assemelham-se
a workshops, sendo eventos itinerantes. Dessa forma, a Administração vai a
algumas cidades, levando exposições acerca dos projetos que deseja realizar.
Nesses locais, ouve a sociedade, os interessados em contratar com a
Administração. Com isso, tem a oportunidade de realizar as mudanças e
transformações que entender necessárias nesses projetos.

TEMA 5 – MÍDIAS SOCIAIS

As mídias sociais são também resultado do desenvolvimento das


tecnologias da informação. Pelo seu desenvolvimento, e pela importância que
vêm ganhando, merecem destaque. As mídias sociais são plataformas nas quais
acontece a comunicação entre as pessoas. São exemplos de mídias sociais:
Facebook, Instagram, Twitter e WhatsApp.
Com o desenvolvimento da internet e a ampliação do acesso pela
população, ampliou-se a comunicação e a integração entre as pessoas através
desses recursos. Atualmente, as pessoas mantêm amizades, estudam,
trabalham, conversam e interagem das mais variadas formas. Recentemente, no
Brasil, ganhou destaque a atividade política realizada pelas mídias sociais, que
ajudou a eleger um presidente da República sem muito espaço para
propagandas em televisão, e sem grandes recursos financeiros para promover
sua campanha política.
As mídias sociais têm tido um importante papel na disseminação de
informação e na organização de pessoas. É importante, entretanto, estar atento
à qualidade da informação divulgada e à necessidade de verificar se ela é
verdadeira, tendo cuidado no repasse das informações. Se, por um lado, as

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benesses são muitas, no que tange ao intercâmbio que as mídias sociais
promovem, por outro, com a velocidade que as informações são transmitidas,
muito pode ser feito, seja para o bem, seja para o mal. Assim, é importante estar
atento à informação recebida, verificar (mesmo que na internet, em sítios
eletrônicos) se o dado é verdadeiro e, em seguida, tomar providências quanto
àquele dado (passando-o adiante, mobilizando pessoas em prol de ações
efetivas atinentes à informação recebida etc.).
O certo é que, fazendo uso responsável das mídias sociais, utilizando
suas informações para organização e ações concretas em prol da transparência
e da accountability, muitos avanços podem ser conseguidos, com vistas à
consolidação de uma gestão pública verdadeiramente dedicada à igualdade e à
democracia.

NA PRÁTICA

Os avanços obtidos em prol da transparência têm sido consideráveis.


Podemos citas ações de combate à corrupção como exemplos concretos. Por
meio da internet, neste século XXI, a população brasileira organizou movimentos
sociais, levou a população à rua e cobrou mudanças na política. A conhecida
operação Lava Jato, e suas investigações feitas pela Polícia Federal, conduziu
políticos e empresários poderosos à prisão. As mídias sociais trouxeram os fatos
a público, e a população deu o suporte necessário para legitimar a operação.
Assim, por meio da transparência dos atos de corrupção, e do andar das
investigações, garantiu-se o apoio necessário para conduzir os culpados à
prisão, o que foi feito por uma força-tarefa no âmbito da Polícia Federal e também
do Ministério Público e do Judiciário. A operação Lava Jato fez uso de muitos
dos instrumentos voltados à transparência pública, e com isso recuperou altas
quantias de dinheiro público desviado.
Este é um exemplo de como o intercâmbio entre as pessoas, a
comunicação e a disseminação de informações podem colaborar com o
aprimoramento da gestão pública, tendo em vista o combate ao crime e à lesão
aos cofres públicos.

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FINALIZANDO

A transparência é uma ferramenta poderosa no aperfeiçoamento da


gestão pública. Vimos que há diversas ferramentas a serviço da transparência,
as quais transformaram o cenário de comunicação e de informação no Brasil.
Um marco regulatório forte, ilustrado pelas mudanças ocorridas na Lei de
Responsabilidade Fiscal, com a publicação de leis anticorrupção e de acesso à
informação, são bons exemplo. Por sua vez, a internet e o novo ambiente de
interação social que ela trouxe elevaram a transparência a níveis jamais vistos.
Merece destaque também o uso e o aprimoramento de softwares, a serviço da
Administração Pública, que melhoraram o modo de atuar, propiciando controle.
As audiências públicas, as consultas públicas e os roadshows levam, seja
presencialmente, seja pela internet (caso de consultas públicas), os projetos
para a sociedade, buscando sua participação. Assim, são ferramentas de
intercâmbio entre governo e sociedade, de grande valia à gestão pública
contemporânea. As mídias sociais (Twitter, WhatsApp, Facebook, entre outras)
também mereceram destaque em nosso estudo, pois permitem uma rápida
transmissão da informação, com a formação de opinião acerca de fatos, pessoas
e ações.
Para ilustrar, trouxemos o exemplo da Lava Jato. Pelo uso de muitos
desses instrumentos, e acima de tudo pela publicidade que ganhou nas mídias
e na imprensa, a operação viabilizou a recuperação de elevadas quantias de
dinheiro público desviado, conduzindo à prisão políticos e empresários
influentes.
Essas ferramentas aprimoraram a transparência pública em níveis
altíssimos. Assim, se bem utilizadas, têm potencial para consolidar ainda mais o
nosso Estado Democrático de Direito, a nossa democracia, e a Constituição lhe
dá vida.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000. Diário Oficial da


União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 5 maio 2000.

_____. Lei n. 12.527, de 18 de novembro de 2011. Diário Oficial da União,


Poder Legislativo, Brasília, DF, 18 nov. 2011.

_____. Lei n. 12.846, de 1º de agosto de 2013. Diário Oficial da União, Poder


Legislativo, Brasília, DF, 2 ago. 2013.

LENHARDT, A.; FONTANA, E. Políticas Públicas de Acesso à internet: a


(possível) cobrança de dados e a consequente mitigação do acesso à internet
no país. In: SEMINÁRIO NACIONAL DEMANDAS SOCIAIS E POLÍTICAS
PÚBLICAS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA, 12., 2016. Anais... Santa
Cruz: UNISC, 2016.

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