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100 Anos de Comunismo Ver 22-03
100 Anos de Comunismo Ver 22-03
ORGANIZADOR
Edmilson Costa
Marly Vianna
Rodrigo Freire
José Reinaldo Carvalho
Ana Prestes
Ronald Rocha
Breno Altman
Iole Ilíada
Rayane Andrade
Wladimir Pomar
Escola Latino-americana
de História e Política
Escuela Latinoamericana
de Historia y Política
Valter Pomar
ORGANIZADOR
Edmilson Costa
Marly Vianna
Rodrigo Freire
José Reinaldo Carvalho
Ana Prestes
Ronald Rocha
Breno Altman
Iole Ilíada
Rayane Andrade
Wladimir Pomar
Escola Latino-americana
de História e Política
Escuela Latinoamericana
de Historia y Política
100 anos de comunismo no Brasil
2022
1a edição digital
ELAHP - Escola Latino-americana de História e Política
Associação de Estudos Página 13
Revisão
Adriano Bueno
Escola Latino-americana
de História e Política
Escuela Latinoamericana
de Historia y Política www.pagina13.org.br
www.elahp.com.br
Sumário
Apresentação
100 anos de comunismo no Brasil
7
Edmilson Costa
PCB: 100 anos de luta pelo socialismo no Brasil
11
Marly Vianna
Entrevista concedida no dia 1 de março de 2022
35
Rodrigo Freire
O PCB e a resistência à ditadura militar: entre a luta de massas e a
violência genocida
47
Ana Prestes
Entrevista concedida no dia 04 de março de 2022
87
Ronald Rocha
O PRC na diáspora e na reorganização comunista
95
Breno Altman
Partido Comunista: construção interrompida
117
Iole Ilíada
As relações dos partidos comunistas com o PT: a tensão dialética entre
o comunismo e o Partido dos Trabalhadores
127
Rayane Andrade
O que o futuro nos reserva?
145
Wladimir Pomar
100 anos de fundação do primeiro partido comunista no Brasil
157
Valter Pomar
Reflexões sobre 2122
163
Apresentação
100 anos de comunismo no Brasil
O
ponto de partida deste li- Nacional Libertadora e o Levan-
vro é um curso realizado te de 1935; 4) o Partido Comunista
pela Escola Latino-ameri- durante a ditadura Vargas, a confe-
cana de História e Política (Elahp) rência da Mantiqueira e a fase final
sobre os 100 anos do comunismo do governo Vargas; 5) a legalida-
no Brasil. de, a participação nas eleições e na
O curso começou no dia 10 de Constituinte, a cassação da legenda
julho de 2021 e seu plano inicial e dos mandatos; 6) do “Manifesto
incluía 46 horas distribuídas nas de janeiro” de 1947 à “Declaração
seguintes 23 aulas: 1) uma intro- de março” de 1958, passando pelas
dução geral e uma exposição sobre grandes greves, a morte de Vargas e
a fundação do Partido Comunista o impacto do XX Congresso; 7)do V
(antecedentes, o congresso, as re- congresso de 1960 à cisão de 1962;
soluções); 2) o Partido Comunis- 8) o PCB e o golpe de 1964, o VI Con-
ta e a Internacional Comunista nos gresso do PCB e as cisões da luta ar-
anos 1920; 3) o Partido Comunista mada; 9) o PCdoB e o golpe de 1964,
frente a Revolução de 1930, a con- a Sexta Conferência e as cisões; 10)
trarrevolução de 1932, a Aliança a luta armada urbana e o Araguaia;
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11) o PCB nos anos 1970: resistên- Vianna, Mauro Iasi, Milton Pinhei-
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Encerramos esta apresentação há como provar se e quando tere-
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Edmilson Costa
Edmilson Costa é professor de economia e dirigente do PCB.
Edmilson Costa
PCB: 100 anos de luta pelo socialismo no Brasil
11
ções economicistas e, portanto, não riência dos bolcheviques e dos par-
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cultura e até mesmo do futebol. No Geral dos Trabalhadores) até his-
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interior do País contra as tropas do por importações, levando à queda
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tavam Getúlio Vargas como franco fascismo e do nazismo na Europa.
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ça Nacional Libertadora (ANL) e ele- tecimento. No dia 27 de novembro
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Estados Unidos. Mas a virada do obrigado a decretar a anistia e con-
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votação nas grandes cidades, par- envio de soldados brasileiros para
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era possível o caminho pacífico da onde decidem sair do PCB, convo-
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terminou com um acordo concilia- vimentos culturais do País, e pos-
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tório, após a adesão do III Exército suía grande influência entre a inte-
à posse do vice-presidente. Diante lectualidade progressista.
da possibilidade de guerra civil, os O desfecho dessa conjuntura dos
golpistas recuaram, mas o movi- primeiros anos de década de 60 foi
mento pela legalidade também fez o golpe militar, com apoio de vários
concessões: o vice-presidente João setores da igreja, do conjunto do
Goulart assumiria a presidência, empresariado e do imperialismo. O
mas o regime seria parlamentaris- País viveu a partir daí uma ditadura
ta. que durou 21 anos e o PCB foi per-
☭
Por trás dessa crise estava a seguido de maneira implacável pelo
disputa entre dois projetos: as re- novo regime. A ditadura cassou os
formas de base, defendidas pelo direitos políticos de milhares de
movimento popular e setores pro- pessoas, entre as quais mais de cin-
gressistas e democráticos e o pro- co mil militares, cassou o mandato
jeto conservador, aliado às forças de parlamentares, governadores,
reacionárias, empresariais e ao im- prefeitos e vereadores, realizou in-
perialismo. Foi o período de mais tervenção em centenas de sindica-
intensa polarização política no Pa- tos, prendeu e perseguiu suas lide-
12
ís. Nessa conjuntura, o PCB obteve ranças e implantou o terror fascista
grande crescimento entre o prole- contra toda a oposição, especial-
tariado, a juventude e o mundo da mente para as forças organizadas
cultura, bem como entre setores contra o regime. Nessa conjuntura
militares. O PCB dirigia os princi- tensa e de derrota do movimento
pais sindicatos do País e o Coman- popular, grande parte da juventu-
do Geral dos Trabalhadores (CGT); de e alguns dirigentes, desconten-
possuía grande influência no sin- tes com a linha política do Partido,
dicalismo do campo; tinha vários que no VI Congresso de 1967 se defi-
comandantes de tropas no Exérci- niu pela constituição de uma Frente
to, nas entidades dos sargentos e Democrática como tática para der-
praças e militantes com comando rotar a ditadura, romperam com o
na Aeronáutica. Entre a juventude Partido e optaram pela luta armada
participava da direção da União Na- urbana, formando várias organiza-
cional dos Estudantes (UNE) e diri- ções guerrilheiras, todas destroça-
gia o Centro Popular de Cultura da das pela ditadura.13
UNE, até hoje um dos maiores mo- Operando na mais absoluta
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clandestinidade, o PCB estruturou militantes na Volkswagen e este
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vidades em meio a grande repres- lio e aferrados à política de frente
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guardar supostas alianças com se- Consolidado o poder no interior
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sociais. Esses erros políticos tam- do PCB. Mesmo ainda sem uma arti-
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O documento do Rio de Janeiro lismo e capitalismo para o campo
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jogo a nossa história, o nosso patri- guintes votações: Fomos, Somos e
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Mas não bastava convocar o Con- golpe contra as deliberações do IX
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uma sociedade socialista. Por ou- de Reorganização nos mesmos dias
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tro lado, marca uma ruptura com e no mesmo Estado onde seria rea-
os métodos burocráticos, antide- lizado o Congresso dos liquidacio-
mocráticos e deformadores da vida nistas. E assim foi feito: marcou-se
do Partido (...) Queremos um par- a conferência para os dias 25 e 26 de
tido que seja um instrumento qua- janeiro de 1992 no Colégio Roose-
lificado para contribuir na direção velt, em São Paulo, mesmos dias e
das lutas sociais no Brasil, com in- mesmo Estado onde se realizaria o
serção viva nas fábricas, no cam- Congresso fraudulento. Decidiu-se
po, nos bancos, nos escritórios, no ainda que iríamos em passeata até
☭ comércio, no movimento comuni- o Teatro Zaccaro, onde eles esta-
tário, nas escolas secundárias, nas vam realizando o Congresso, para
universidades. Um Parido educado expormos as razões porque não irí-
na perspectiva da revolução social amos participar daquele evento e,
e política e na transformação radi- ao mesmo tempo, chamar os dele-
cal da sociedade brasileira, por isso gados que quisessem permanecer
profundamente vinculado ao so- no PCB a se unirem à nossa Confe-
cialismo”.25 rência.
Conforme combinado, antes de
A conferência de começar a conferência, realizamos
reorganização uma assembleia com os 500 de-
Como era de se esperar, a dire- legados presentes e seguimos em
ção do Movimento começou a to- passeata para o Teatro Zaccaro com
mar conhecimento das fraudes que nossas bandeiras e cantando a In-
estavam ocorrendo na tirada de de- ternacional. Ao chegarmos no tea-
legados para o X Congresso em vá- tro, eles quiseram impedir a nossa
rias regiões e da interferência de entrada, mas acabaram cedendo
forças conservadoras, ligadas ao diante da argumentação de que es-
MDB, fornecendo militantes e in- távamos dispostos a entrar de qual-
fraestrutura para a participação no quer forma e que queríamos apenas
Congresso. Diante disso, a direção explicar as razões porque não par-
do Movimento decidiu que não mais ticiparíamos daquele congresso e
iria participar do Congresso porque porque decidimos permanecer no
a presença da Esquerda nesse even- PCB. Conforme negociado, entra-
to fraudulento seria sua legitima- mos no Congresso e dois represen-
ção e se definiu por uma Conferência tantes nossos e dois deles falariam
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aos delegados e depois nos retira- liação, onde mobilizamos centenas
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socialista, rompendo com anos de a grande burguesia monopolista,
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sucedidos de reconstrução comu- bosa, alfaiate; José Elias da Silva, funcio-
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chegaram à praça de Sé os comunistas já Essa incorporação iria dar um novo fôle-
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[15] O documento que orientava essa ta- movimento sociais na história brasileira,
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Marly Vianna
Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (1990).
Professora aposentada pela Universidade Federal de São Carlos, foi
diretora do Arquivo de História Contemporânea daquela Universidade e
até 2002 diretora-presidente da Fundação Pró-Memória de São Carlos.
Marly Vianna
Entrevista concedida no dia 1 de março de 2022
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A Química produziu o “fedor”, rio”, porque a situação estava mais
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porque o partido estava completa- hora que você expulsasse o impe-
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assim, os motivos pra que essa irri- chegou inclusive a criar o cargo de
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Ramón, que eu conheci em Moscou, dominar essa língua riquíssima. E
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principalmente os que foram cria- cúpula. Nós tivemos muita força no
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al diz assim: “o Marighella era um operária. Nós nunca tivemos um
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ma coisa que fez o Jarbas Passari- mos na Faculdade de Filosofia, nós
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tos grupos da esquerda, como o PT, tuação foi grande, ao mesmo tem-
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está chegando. Essas coisas estão muito grande, mas os embriões es-
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ocorrendo porque o capitalismo re- tão lá. E temos que ter esperança,
almente está em crise. E, cuidado, né, porque o contrário é terrível.
que crise não quer dizer que este-
Eu queria te pedir, sobre os assun-
ja acabando. Ele pode estar sendo
tos que a gente tratou aqui, algumas
muito mais agressivo exatamente
sugestões de leitura e filmes.
por causa disso. A miséria cresce no
mundo; as diferenças sociais cres- Sugiro dois livros do Enzo Tra-
cem no mundo; o continente afri- verso, um se chama As Novas Faces
cano entregue à barbárie; então, do Fascismo. Populismo e a Extrema
☭ que futuro tem o capitalismo? Cada Direita. Outro é Melancolia de es-
vez mais acirrando essas contradi- querda: marxismo, história e memó-
ções. E é aí que entra o papel des- ria. Outro é biografia do Marx es-
ses pequenos núcleos de esquerda, crita pelo José Paulo Netto. Um dos
chamem-se Partido Comunista ou filmes que eu mais gostei até hoje
não. Porque simplesmente porque é Il Compagni, Os Companheiros,
não há outra saída. A outra saída é com Marcelo Mastroianni. Outro
a barbárie absoluta. O trabalho pre- filme, que fala da desesperança é
cário foi naturalizado, a precariza- aquele com a Jane Fonda, A noi-
ção. Então, eu acho que, rondando, te dos desesperados. E O jardineiro
rondando está a extrema direita. fiel, mostrando como a indústria
Mas, eu acho que nós estamos pre- farmacêutica usa a África para suas
sentes, sofremos um retrocesso experiências.☭
44
45
☭
O
centenário do Partido Co- tes, o PCB se tornou o principal ator
munista Brasileiro (PCB)1 é da esquerda brasileira, estando pre-
motivo de celebração para sente em todas as lutas pela demo-
quem luta por uma sociedade livre, cratização nacional, contra a domi-
democrática e socialista. Afinal, o nação imperialista, pela expansão
PCB foi o primeiro partido organi- dos direitos da classe trabalhadora e
zado nacionalmente que, inspirado pelo socialismo. Assim, mais que do
pela Revolução Russa de 1917, as- julgar o PCB pelos seus acertos ou
sumiu como estratégia a revolu- erros, e considerando-o como pro-
ção socialista no Brasil, em torno duto do seu tempo -o “breve sécu-
da qual passou a organizar a classe lo XX”, no dizer de Eric Hobsbawm
trabalhadora. Nas décadas seguin- -, é esta trajetória de lutas que ora
[*]Dedico este artigo aos camaradas: José Salles e Nelson Rosas, que atuaram no Comitê
Central do PCB nos anos 1970, sendo Salles como membro titular e Nelson como inte-
grante da Seção de Agitação e Propaganda, redigindo artigos para os órgãos do Partido;
José Anísio Corrêa Maia, Antônio Augusto e Marlene Almeida, dirigentes do PCB da Para-
íba em 1964; Hermano Nepomuceno, presidente do PT de Campina Grande, e presidente
do PCB/PPS da Paraíba nas décadas de 1980 e 1990 e; Egesipe, meu pai, militante comu-
nista que me apresentou ao PCB. E agradeço ao Valter Pomar, pela gentileza de sempre.
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deve ser celebrada. O PCB e a luta de massas
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de forças do momento, como tam- Tais posições eram combati-
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tual e ao desenvolvimento da luta vos, além do amplo engajamento
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e “blanquistas”, por desconsiderar armada, tradicional forma de luta
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guesia deveria ser incorporado na Nordeste e do Centro-Oeste. Cres-
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As eleições de 1974 possibilita- man, David Capistrano Filho e Luiz
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latos à Comissão Nacional da Verda- apodo utilizado pelos militares para
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161). que ele não era infiltrado, que era
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e Dilma. pseudônimo. Dizia o relatório:
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João XXIII, as quais abriram a pos- lino, chefe do CIE, concluía que “os
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Em anexo ao relatório, estava Ocorre que em fevereiro de 1975,
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uma relação nominal dos membros “Eli” e “Artur” já haviam sido se-
do CC, com um respectivo álbum fo- questrados pela repressão.
tográfico - que não consta do docu- Como demonstram ambos do-
mento disponibilizado no Arquivo cumentos, desmantelar o esquema
Nacional. de impressão e distribuição do Voz
Noutro documento, o Exército Operária era uma prioridade para o
deixava clara sua intenção de “neu- aparato repressivo. Afinal, o “ele-
tralização do PCB”. Tratava-se da vado estágio de organização [do
Informação Nº 768 M26 E2/757, da- PCB] no território Nacional” facili-
☭ tada de 30 de abril de 1975, que dizia: tava a distribuição do jornal, fazen-
do dele um importante instrumento
“O DOI/CODI/II Ex, analisando a
de mobilização contra a Ditadura. O
estrutura e funcionamento do PCB,
primeiro grande golpe da repres-
organizou uma relação de mem-
são contra o Voz Operária se deu no
bros do CC que, pela atuação e po-
Nordeste, em 1973, com a queda do
sição no partido, se presos, causa-
aparelho comunista no Ceará res-
riam com suas ‘quedas’ danos ir-
ponsável por imprimir e distribuir
reparáveis a curto e médio prazo a
as publicações da SAP na região.
essa organização subversiva.”
A operação foi descrita no jornal
Na lista apareciam nomes como “Correio da Manhã”, de 10 de abril
Giocondo Dias8, Hercules Correa, de 1973:
Orlando Bonfim Júnior, Jaime Amo-
“Os órgãos de Segurança desman-
rim de Miranda Elson Costa e Hiran
telaram uma célula do extinto Par-
de Lima Pereira. Tal Informação di-
tido Comunista Brasileiro que ope-
zia ainda que
rava no Ceará. Inicialmente insta-
“As ‘quedas’ de ‘ELI’ [Elson Costa] lada no Sul do país, a imprensa do
e ‘ARTUR’ [Hiran de Lima Perei- PCB decidiu deslocar várias células
ra] apresentam maior importância, para outras áreas, uma das quais
pelo fato de ter sido publicado o nº para o Ceará, onde a tipografia e
120 da ‘Voz Operária’, referente ao grande quantidade de material
mês de fevereiro de 1975, possivel- subversivo foram apreendidos. (...)
mente sob orientação de um ou de Na gráfica eram impressas as re-
ambos. Enquanto não forem pre- vistas Mundo em Revista, Estudos,
sos, a SAP terá condições de reor- o jornal Voz Operária, panfletos e
ganizar-se.” opúsculos de cunho subversivo di-
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fundidos da Bahia até o Maranhão dicalista Luiz Inácio Lula da Silva.
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luta pela redemocratização do país, processo político em favor de uma
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objetivando a legalização junto ao TSE. Em [6] Consta do documento AFZ_
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José Reinaldo Carvalho
é jornalista, membro do Comitê Central e da Comissão Política
Nacional do PCdoB e secretário-geral do Cebrapaz (Centro Brasileiro
de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz). Foi vice-presidente do
partido entre 2001 e 2005.
José Reinaldo Carvalho
PCdoB: 100 anos de luta por direitos do povo, democracia,
independência nacional e socialismo
À Daniel Ilirian Carvalho, meu saudoso filho,
militante do Partido.
A João Amazonas, mestre, amigo, camarada
e dirigente
O
Partido Comunista do Brasil PCB, foram marcados pela tenta-
completa 100 anos de exis- tiva de implantação no movimen-
tência. Fundado a 25 de mar- to sindical, quando a luta social era
ço de 1922 como Seção Brasileira da considerada caso de polícia, de pro-
Internacional Comunista (SBIC), à paganda rudimentar das ideias so-
qual adere com a aceitação das suas cialistas e do ideal comunista, e de
21 condições estatutárias, surge da inserção na vida política. Em 1925
unificação dos diferentes grupos lançou o jornal A Classe Operária. Em
comunistas, herdeiros de correntes 1927 criou o Bloco Operário Campo-
socialistas e anarquistas europeias nês que disputou eleições legislati-
ligadas à intensa imigração ocorri- vas municipais e estaduais e lançou
da no país entre finais do século 19 a candidatura do operário Minervi-
e inícios do 20, quando começava a no de Oliveira à Presidência da Re-
desenvolver-se o incipiente capita- pública em 1930.
lismo nacional, herdeiro do escra-
vismo colonial. Raízes nacionais
Os primeiros anos de existên- A existência de uma vanguarda
cia, durante os quais adotou a sigla política vinculada às aspirações fun-
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damentais dos trabalhadores, origi- grado as insuficiências teóricas dos
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e empunham sem tremer as mãos e Dilma.
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mocratas de diferentes convicções ma da Conferência Nacional Extra-
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socialismo. As gerações de militan- da revolucionária com ideologia co-
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tes do nosso tempo, para cumprir as siderando que as vitórias eleitorais
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tes retrógradas, opressoras e entre- implacável sobre as classes domi-
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preenderam também que a luta de- que a luta pelo socialismo no país
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modelo único de socialismo é anti- Esta concepção orientou o pen-
essas classes como “forças poderosas zação das massas, buscando isolar
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ternativa. Insistirão até o fim na maior razão agora, quando o país
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transição conflituosa para um novo Moscou apoiou o princípio defen-
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demonstraram cabalmente a sua membro ativo do Encontro de Par-
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insidiosas contra Cuba, Nicarágua, a questão: encontra-se na ordem
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não será um caminho em linha reta, volvendo-se em cima das batalhas
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em cujo governo eram comuns as plantados no chão, mergulhando
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Partido Comunista do Brasil, para ganizados, de quadros capacitados
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apetrechado com uma linha política, de ativistas e lideranças, os melho-
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por qualquer arranjo de natureza de “renovação”, negação da “for-
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sim, esta caminhada requer visão de revolucionária do Partido (18 de fe-
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lógico e orgânico. De acordo com A celebração do 60º aniversário
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mento ainda mais complexo do que a estratégia e a tática, ou em termos
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multaneamente ampla, combativa das da revolução e do socialismo, o
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Isto implica superar debilidades e a luta parlamentar e a ação institu-
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Ana Prestes
Analista internacional, doutora em Ciência Política pela UFMG,
diretora da Fundação Maurício Grabois, integra o Comitê Central e é
Secretária de Relações Internacionais do PCdoB.
Ana Prestes
Entrevista concedida no dia 04 de março de 2022
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pou muito da campanha do Brizola UBES, em Goiânia. E aí o pessoal co-
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com ele, na campanha de 1989, foi meça a dizer “ah, tem uma Prestes
quando eu comecei a entender um lá no Grêmio da Escola Técnica”. E
pouco mais o que era o mundo da nessa época eu começo a conhecer as
política. Os amigos que a gente re- lideranças, principalmente do PT e
cebia em casa eram os amigos dele. PCdoB na área da juventude, vou co-
Muitas das referências nossas de nhecer o pessoal da União da Juven-
infância eram músicas e festas so- tude Socialista. Eles vão me convidar
viéticas, havia um ar de felicidade para uma série de atividades, ple-
na família por regressar ao Brasil e nárias e encontros, aquele processo
☭ ao mesmo nostalgia dos tempos de de tirar delegado. Eu vou entrar por
Moscou. Foi essa a minha infância e essa porta, nesse meio da juventu-
a minha adolescência, muito ligada de da UJS e do PCdoB, que era críti-
a eles, principalmente no Rio. Mes- co à figura do Prestes. Algum tempo
mo eu não morando no Rio, é nesta depois é que eu fui entender porque
época que eu estabeleço também um algumas pessoas falavam: “nos-
vínculo e uma relação muito forte sa, mas ela é Prestes, o que que ela
com a minha avó, que acaba de nos está fazendo no PCdoB?”. Eu mesma
deixar, em 4 de fevereiro de 2022. Já não entendia - nessa época - mui-
adolescente, eu vou começar a fa- to bem o que tinha acontecido em
zer movimento estudantil em Goiâ- 1962. A esta altura, final da adoles-
nia, como secundarista. Toda a mi- cência, eu fico muito impressionada
nha referência política era do meu com a força da UJS: “gente, que bom
avô e da minha avó e alguma medi- que isso existe, né?”, uma juventude
da dos meus pais, embora eles não unida em torno da luta pelo socialis-
tenham mantido atividade política mo. Nessa época vai haver o Festival
ao regressarem da URSS. Eu fui fa- da Juventude e dos Estudantes em
zer ensino médio numa escola mui- Havana, em 1997, o primeiro festi-
to tradicional em Goiânia, que era a val depois da queda do leste europeu.
Escola Técnica Federal de Goiás, a Viajo para esse festival e lá conheço
ETFG. Me envolvi com o movimento as juventudes dos outros países, jo-
estudantil e nessa época eu não tinha vens que estão lutando pelo socia-
nenhuma filiação partidária. Entrei lismo, pelo comunismo, em outros
no Grêmio da Escola Técnica. Inclu- países. Acho que foram 14 mil jovens
sive eu era de um grupo que se dizia naquele festival. Eu fico absoluta-
independente de qualquer partido. mente encantada. Eu falo: “gente, é
Nessa época, vai haver congresso da isso que eu quero para minha vida.
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Eu quero participar disso. Quero me internacionais do Partido.
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no mundo. Os comunistas atuam de naro e todo o seu entorno, os que se
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ção comunista, mesmo que não es- antes da pandemia. Essa questão da
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chegando no seu limite. As respostas “Estamos apostando no multilate-
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viu? Eu acho que deveria ser mais es- zado, com muitas fotos das viagens
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Ronald Rocha
é sociólogo e dirigente nacional do
PRC (Partido da Refundação Comunista).
Ronald Rocha
O PRC na diáspora e na reorganização comunista
O
texto que segue foi escri- pessoais, decerto polêmicas, mas
to por encomenda e com calcadas na práxis dirigente coleti-
base na aula proferida em va da organização examinada.
23/10/2021, disponível no YouTu- Em nada, sublinhe-se, pretende
be como sessão da série “100 anos reavivar os contenciosos passados
de comunismo no Brasil”, promo- e colocar obstáculos extemporâne-
vida pela Escola Latino Americana os à já tão difícil unidade no mun-
de História e Política (Elahp). Re- do laboral e das forças populares
gistra, de modo panorâmico e de- – particularmente, no que se refe-
masiadamente sucinto, em face das re aos revolucionários –, que tem
exigências editoriais, a experiência um alcance estratégico. Tal esfor-
do Partido Revolucionário Comu- ço escolhe como propósito exclu-
nista (PRC) na diáspora do movi- sivo a verificação das linhas gerais
mento comunista brasileiro, focan- que nortearam uma trajetória sin-
do na reestruturação e nas políticas gular e seus resultados, incorpo-
empreendidas, com suas grandezas rando mais um elemento à história
e mazelas. Obviamente, a redação é do movimento comunista no sécu-
prenhe de memórias e conclusões lo de sua vida partidária no Brasil.
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Refere-se a um patrimônio comum do Comitê Central (CC), aprovadas
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prosseguiria, já que a ineptidão vi- burguês-reformista e o esquerdis-
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cida como Golden Age adentrara em sacre premeditado abortou a dis-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
1972 a Fase B, marcada pela estag- cussão coletiva no CC, que decidiria
nação, também no Brasil. Sincro- sobre o crucial, complexo e doloro-
nicamente, as correntes à esquerda so debate interno acerca da resis-
efetivavam suas táticas eleitorais. tência guerrilheira. O documento
O PCdoB fez a campanha pelo voto Sobre o Araguaia, redigido pelo se-
nulo em 1966 e 1970, mas partici- cretário de organização, analisa-
pou do sufrágio em 1974, com fis- va corajosamente as dificuldades
suras, e 1978, em uníssono, cujos internas, inclusive as provocadas
resultados potencializaram o cam- pelo revés no confronto armado.
☭ po democrático e agravaram os im- Pacientemente, buscava entender
passes políticos. as causas do insucesso e as manei-
A conjuntura evoluía rapida- ras de seguir em frente, mas com a
mente, com as inconformidades unidade orgânica. O balanço disse
oposicionistas sinalizando am- que a derrota fora não “temporá-
pliações. Geisel, no Discurso aos di- ria” e causada por meras falhas da
rigentes da Arena, em 29/8/1974, “Comissão Militar”, operacionais e
logo após a terceira e última cam- táticas, mas “completa” e devida,
panha militar no conflito ao nor- basicamente, à “concepção”.
te, anunciava uma flexão visando
a controlar o rumo da “sua” tran- A VII Conferência Nacional
sição “lenta, gradativa e segura” No crepúsculo dos 1970, quan-
para uma “democracia” – como do as lutas operárias e populares
valor, conceito e substantivo uni- de massas experimentavam o novo
versal-abstrato, sem conteúdo so- ascendimento, com muros exigin-
cial e sem historicidade particular, do “Anistia Geral, Ampla e Irrestri-
não como qualificação do regime ta” – por fim obtida ma non tropo
politico. Para minimizar o risco de em 1979 –, os exilados faziam suas
ruptura, os chefes repressivos pro- malas e os dirigentes pecedobistas
gramavam eliminar os comunistas, no exterior dedicavam-se a cons-
como tentaram na Chacina da Lapa, truir a VII Conferência. O Concla-
em 16/12/1976, ao executarem Pe- ve ocorreu na pequena Tirana, com
dro Pomar, João Batista e Ângelo delegados que majoritariamente
Arroio. vieram do Brasil, vinculados às es-
Além de atingir o Partido que di- truturas sobrevivas em vários esta-
rigiu a contestação armada, o mas- dos, inclusive dois entre os quatro
98
membros do CC ainda em ativida- pletando-se a prestação de contas
99
vância. Concentrando na “conquis- [...] em marcha para o socialismo”:
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100
no avaliasse a conduta na prisão mente cinco membros dos 16 res-
101
uma votação, feita com certa ina- com nomes cooptados nove anos
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
petência: três a dois. Foi-se o Con- atrás: ocorria que só assim os dois
gresso às calendas gregas. terços exigidos para medidas ex-
Os delegados, ao pisarem o ter- tremas, já maquinadas, seriam ob-
ritório pátrio, com notícias pela tidos. Eis o resultado: quatro expul-
metade sobre o entrevero, pres- sos a toques de caixas, exatamente
taram seus informes. Alastrou-se aqueles inconformados com a deci-
o debate: os CEs de SP (Estrutu- são de Paris e favoráveis à convoca-
ra 1), BA e RJ apoiaram o Congres- ção do Congresso.
so e a discussão tornou-se nacio- Ao contrário de retirada ou “ra-
☭
nal. Também os recém-libertados cha”, simplesmente aconteceram
apresentaram suas versões. Quan- exclusões visando a eliminar di-
do Arruda chegou, em outubro, rigentes que tinham opiniões dis-
viu a situação real e percebeu que crepantes. A seguir, a dissolução
da missa conhecera somente uma dos CEs que, amparados estatuta-
parte. Passou a dialogar mais am- riamente, propunham o Congresso.
plamente, fora da bolha, em busca Também houve um desligamen-
de soluções. Atormentado, foi rece- to por solidariedade, formalizado
ber o secretário-geral no aeroporto. na reunião da comissão responsá-
Era novembro. Retornando, ainda vel pela Tendência Popular do Mo-
no automóvel, passou mal. Seu co- vimento Democrático Brasileiro
ração, combalido e aflito, cedeu às (MDB), MG: dois anos após, ainda
superlativas fadigas e tensões. Pa- sob a vigilância ditatorial, o veícu-
rou quando menos podia. lo A Classe Operária noticiou, fal-
Na circunstância configurada, samente, que teria existido “ex-
o remanescente membro da Exe- pulsão”, registro por si elucidativo.
cutiva Nacional escolheu por conta Como a liquidação nunca foi alter-
própria quem seria do CC ou reabi- nativa, os quadros afastados no tri-
litado para entrar na primeira reu- ângulo MG-RJ-SP marcaram um
nião realizada no Brasil após quatro encontro. A data caiu na Semana
anos, em março de 1980. Partici- Santa.
param 12 dirigentes. Sintomatica-
Surge o PCdoB (Esquerda)
mente, ficou de fora um que inte-
grava o Pleno desde 1971, inclusive Os dirigentes nacionais e um
os três encontros no exterior. Ale- convidado foram chegando sem
gou-se uma dúvida sobre a lista alarde à discreta Inhapim, adjacen-
102
te ao Vale do Aço mineiro. Todos como a instância dirigente: acabou
103
congressual o Estatuto, que fora re- afastavam do situacionismo e de-
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104
O I Congresso, de 1984, SP, se reuniu a sessão na-
105
tes ao secretário de organização, o Estatuto, exceto quanto ao nome
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
106
de argumentos que desejavam pa- no, que jamais cairá [...] se não for
107
Lênin se refere a “uma ação his- de que, dois anos anteriores à saga
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108
condições; o secretismo, a título de mente complexa, o ataque de ace-
109
Ensinava: “o combate à nova Cons- pós-moderna declarava guerra sem
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110
fulcrais de Marx, Engels e Lênin, memorar os resultados contíguos
111
outro insistia: “realizar uma ava- tiva, menos ainda com as lutas re-
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112
partidário se autoextinguira. pansão, aparecem os sinais de cri-
113
jeto racional e ético”, baseado em cassou e prejudicou, seriamente, o
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114
ploração, este mundo de opressão, munista se funde aos 100 anos dos
115
Breno Altman
é jornalista e fundador do site Opera Mundi.
Breno Altman
Partido Comunista: construção interrompida
N
o centenário da fundação de uma perspectiva revolucionária.
do Partido Comunista, sua Apesar dos longos períodos de
história e de suas ramifica- banimento e clandestinidade, os
ções está repleta de heroísmo, de- comunistas foram capazes, ao me-
dicação às grandes causas popula- nos durante os trinta anos de seu
res e compromisso com a emanci- apogeu, entre 1934 e 1964, de se-
pação da classe trabalhadora. Mui- mear uma cultura socialista entre
tos foram os episódios da trajetória setores populares, atrair aliados de
nacional, desde março de 1922, que distintas camadas sociais e dese-
seriam impensáveis sem a parti- nhar um bloco histórico que, de-
cipação destacada desse partido. senvolvido, poderia eventualmente
Muitas vezes pagando sua abnega- representar uma alternativa de po-
ção com sangue e prisão, os comu- der comandada pela classe operá-
nistas foram a principal corrente de ria.
esquerda até o início dos anos 80. Esse processo de amadureci-
Deve-se primordialmente à sua in- mento, porém, foi rompido com o
tervenção as fases nas quais o pro- golpe militar, diante do qual o Par-
letariado brasileiro aproximou-se tido Comunista Brasileiro (PCB),
117
principal herdeiro de 1922, viu- dência externa.
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
118
dando a depreciar ou limitar os sa- refas democrático-burguesas prin-
119
ser vistos como a expressão políti- temente da interpretação tradicio-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
120
que o comando daquele processo o surgimento do PT. Não tinham
121
dos interesses da “burguesia na- Mauro Marini e outros formulado-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
122
do com o falecimento do Cavaleiro modelo de partido fosse exporta-
123
dêmica, pudesse servir como colu- tos que confluiriam para a Revolu-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
124
riam apenas dois anos de legali- qual Prestes era o expoente, desa-
125
Iole Ilíada
Doutora em Geografia Humana pela USP, foi Secretária de Relações
Internacionais do PT e vice-presidenta da Fundação Perseu Abramo,
da qual integra atualmente o Conselho Curador.
Iole Ilíada
As relações dos partidos comunistas com o PT: a
tensão dialética entre o comunismo e o Partido dos
Trabalhadores*
127
no seio do sindicalismo e a ascen- res, “pelegos”, do sindicalismo,
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
são das lutas sociais no final dos conformando o bloco que ficou co-
anos 1970 e início dos anos 1980. nhecido como “Unidade Sindical”,
Para o PCB, que ainda atuava na do qual participavam também o
ilegalidade (condição só altera- PCdoB e o MR-8.
da em 1985), não foi um momento
Tal aproximação ajudou a con-
fácil, seja pelas dificuldades tra-
solidar a ruptura entre as duas
zidas pela linha política assumida
vertentes sindicais. Se na I Conclat
ou pela “concorrência”, até então
(Conferência Nacional da Classe
inédita, que os “novos atores” –
Trabalhadora), em 1981, estavam
☭ para citar a expressão consagrada
todos juntos, já em 1983 ocorre-
por Eder Sader – e a nova força po-
ram dois congressos distintos: um
lítica e social passaram a exercer,
em São Bernardo do Campo, que
colocando em xeque a hegemonia
fundou a CUT; o outro na Praia
que aquele partido julgava ter na
Grande que, seguindo a proposta
esquerda brasileira.
do PCB, optou naquele momento
Escorado assim em uma polí-
por não criar outra central sindical
tica cautelosa, que privilegiava a
e apenas eleger uma Coordenação
negociação e o não conflito direto
Nacional da Classe Trabalhadora/
com o regime – justificada sem-
Conclat.
pre em nome de uma transição de-
mocrática pactuada e dos riscos de A consolidação da cisão acen-
um retrocesso político no proces- tuou a caracterização crítica, por
so de reabertura – o PCB encon- parte dos sindicalistas que viriam a
trou enorme dificuldade de en- fundar o PT, desse “velho sindica-
frentar o crescimento deste setor lismo” como “reformista”, “pele-
que apostava na combatividade e go”, “não autônomo”, caracteri-
no enfrentamento inclusive como zado pelo afastamento com rela-
formas de lutar contra a Ditadura, ção às lideranças e organizações
chegando mesmo a se colocar con- locais dos trabalhadores e as suas
tra as greves e mobilizações. reivindicações, além de totalmente
128
“novos sindicalistas” e ao “novo em 1962, adotou inicialmente uma
129
ção cada vez maior com o PT. Tan- A posição desses agrupamentos
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
130
Palmares/VAR-Palmares; Organi- rompera com o PCdoB em 1967);
131
(DR), durante muito tempo con- tido dos Trabalhadores”. Também
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
132
não enxergavam mais nos “ve- É verdade que desde sua funda-
“novo”, por outro queriam reavi- tas vezes será exagerada, levando
a uma certa recusa em considerar
var o antigo projeto de um partido
a história do movimento operá-
revolucionário no Brasil. Aqui cabe
rio anterior ao partido, o que foi
bem o conceito de superação, fun-
muitas vezes criticado, inclusive
damental na dialética: a produção
por aqueles que nele ingressaram
do novo que carrega em si elemen-
vindos dessa outra tradição. Preo-
tos do velho. Isso ficará mais cla-
cupado em se apresentar como no-
ro a seguir, quando trataremos das
vidade, o PT seria acusado de “des-
ideias comunistas na formação do
considerar as heranças e as tradições
PT.
das lutas passadas”, que se fizeram
presentes, como vimos, inclusive
III.As ideias comunistas na
na sua formação.
constituição do PT
Isso levaria muitos no PT a afir-
Como apontamos acima, apesar mar – e alguns o fazem até hoje –
dessa ideia de “novidade históri- que “O PT derrubou o Muro de Ber-
ca”, as bases teóricas e ideológicas lim em 1980, quando nasceu”, como
que fundarão o PT serão uma sín- diria Lula em uma entrevista à re-
tese de rupturas, continuidades, vista Teoria e Debate1 (TD) em 1991.
desenvolvimento e superação do A história dessa “ruptura com o
pensamento dos partidos de es- Muro de Berlim”, no entanto, é
querda que o precederam, princi- bem mais complexa do que essa
palmente as correntes comunistas. afirmação pode fazer crer.
133
Antes de mais nada, é impor- palavras ecos daquele outro Mani-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
134
“Sabemos que caminhamos para de 1980, podendo ser constatada,
135
ria como tarefa o desvendamen- tes textos publicados na TD, Apo-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
136
os rumos que o Partido deveria to- cia” e na ideia de que era possível a
137
além de tudo apoiada pelo PCdoB, diata e nem sem grande debate e
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
138
trotskistas de que o momento re- los sísmicos na esquerda mundial e
139
Pode-se dizer, assim, que o PT Citamos por exemplo Augusto
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
140
com Cuba temos até hoje. É outra mente, nenhum desses caudais. O
palmente os quadros das tendên- de, que favoreça o fim de toda ex-
141
das pela herança comunista deu- primeira eleição direta para presi-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
142
que inclui a “família” comunis-
Notas
☭
[1] Falaremos mais sobre a Teoria e Debate
adiante, pelo papel que a revista cumprirá
no debate de ideias, incluindo as ideias co-
munistas, dentro do PT.
[2] O Manifesto pode ser lido em https://
fpabramo.org.br/csbh/wp-content/uplo-
ads/sites/3/2017/04/03-P1_Dossie-Doc-
tos.pdf
[3] As resoluções deste e de outros en-
contros aqui citados podem ser encontra-
das no acervo do Centro Sérgio Buarque
de Holanda, da Fundação Perseu Abramo
(https://fpabramo.org.br/csbh/encon-
tros-nacionais-do-pt-resolucoes/).
[4] O acervo com as edições da Teoria e
Debate pode ser consultado, pelo ano de
publicação, em https://teoriaedebate.org.
br/edicao/.
143
Rayane Andrade
é professora, advogada e secretária de direitos humanos do PT-RN.
Rayane Andrade
O que o futuro nos reserva?
A
pergunta inquietante so- condições precárias. Um país que
bre o que será de nós mo- vê avolumar-se nas vias públicas
biliza diversas possibilida- o contingente de pessoas em si-
des de respostas. A adivinhação do tuação de rua; cuja juventude não
porvir sempre fascinou a humani- encontra expectativas de ser apro-
dade. Busca-se pistas sobre o que veitada no mercado formal de tra-
virá nos astros, em fenômenos da balho e é assassinada aos montes
natureza, nas histórias de antepas- sem provocar qualquer comoção.
sados, em gráficos, cálculos e, ago- Esse é o retrato do passado-pre-
ra, através dos famosos algoritmos. sente, montado cuidadosamen-
Ocorre que ao revisar o centenário te pela classe dominante para que
do comunismo em nosso territó- seja imóvel.
rio a questão sobre que horizonte O planejamento de futuro dos
aguarda a classe trabalhadora bra- algozes estaria absolutamente ga-
sileira se reveste ainda mais de um rantido se não fosse a luta de clas-
tom de urgência. ses, a teimosia e a organização dos
O Brasil é um país de milhões de trabalhadores. Nesse caminho, ho-
famintos, onde a maioria reside em mens e mulheres valorosas tom-
145
baram e a tarefa de pensar a luta “O futuro não demora
pelo socialismo segue aberta. Em Já aconteceu
um momento da história em que se Olha que já aconteceu
atravessa mais uma crise profunda O que já aconteceu
do capitalismo-patriarcal-racista, Olha o que aconteceu
combinada ao estabelecimento da Já aconteceu com você
pandemia provocada pelo corona- Aconteceu comigo
vírus e a reorganização da dinâmi- O fogo que queima em você
ca geopolítica, tudo aponta para a Também queima comigo”
necessidade de antecipar as cenas Baiana System
dos próximos capítulos.
Fã assumida de Baiana System,
Nesse sentido, organizo a pre-
sempre recorro a potência de suas
sente contribuição em três pon-
poesias para acalentar a alma e co-
tos. Começo com a advertência de
locar as ideias no lugar. A provoca-
Baiana System - “O futuro não de-
ção de Russo Passapusso instiga a
mora” - onde aponto para a ne-
pensar o futuro como iminência e
cessidade de colocarmos a defesa
também como algo recorrente. Se
das ideias socialistas, de maneira
Marx falava que a história da hu-
radical e ousada, como questão da
manidade é a história das lutas de
ordem do dia e de vida ou morte.
classes, a música baiana vai tam-
Em sequência, pensando a partir
bém nesse sentido. As experiências
do poeta Cazuza, quero apresen-
se repetem e é possível identificar-
tar minhas provocações através
-se com elas, ainda que estejam
da chave - “Um museu de grandes
distanciadas por séculos, produ-
novidades” - onde destaco algu-
zindo uma sensação de pertenci-
mas das questões que penso serem
mento. Essa chama acompanhou
fundamentais para orientar uma
os operários e camponeses russos
prática política e teórica comunis-
que fizeram a Revolução de 1917 e
ta articulada com as demandas da
motivou as rebeliões nos quilom-
classe trabalhadora existente. E,
bos brasileiros. O fogo que se espa-
por fim, trago minha própria pre-
lha ao longo dos séculos na busca
dição. Em “Revolução periférica”,
de um outro mundo.
antecipo que futuro devemos mi-
Assim o futuro não demora, pois
rar e que destino desejo contribuir
as circunstâncias materiais - de ex-
para que exista.
ploração e escalonamento da bru-
O futuro não demora talidade contra os trabalhadores
e trabalhadoras - não cessam. Em depressão psicológica (banzo); 2)
147
rial” (MOURA, 1981,p.251). apenas alguns exemplos da bonita
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
148
ta cultural, a ascensão dos setores ramento e a insana guerra às dro-
149
não como um passado glorioso que as não-hetero foi construída com
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
150
de suas incontáveis metamorfo- lismo no Brasil precisa se inspirar
151
que nos caiba, envolva nosso corpo Yzalú
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
152
disseram que era uma ação radical sustar o andar de cima. Fazer isso
153
para tirar as nossas vanguardas do o esgotamento, mas não apontam
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
154
solidária e fraterna. 2012 a 2016. Brasília: Ministério da Saúde,
Notas
[1] Cf. Brasil. Ministério da Saúde. Secre-
taria de Gestão Estratégica e Participativa.
Departamento de Apoio à Gestão Partici-
pativa e ao Controle Social. Óbitos por sui-
cídio entre adolescentes e jovens negros
155
Wladimir Pomar
é militante do PT. Autor de vários livros, foi coordenador do Instituto
Cajamar e da campanha Lula em 1989.
Wladimir Pomar
100 anos de fundação do primeiro
partido comunista no Brasil
A
história do surgimento, levaram a tal multiplicação orga-
organização e desenvol- nizativa, assim como a inúmeras
vimento do comunismo dificuldades.
no Brasil talvez possua particula-
Em vista disso, talvez fosse
res que o distinguem do comunis-
conveniente àqueles que, no Bra-
mo de inúmeros outros países do
sil, enxergam no comunismo uma
mundo. O que é natural, se levar-
perspectiva de futuro superior
mos em conta os processos desi-
para o desenvolvimento humano,
guais de desenvolvimento histó- social, político e econômico, re-
rico. alizar pesquisas mais profundas
Assim, talvez mais do que em sobre as deficiências apresentadas
diversos outros países, no Bra- pelas diversas correntes ideológi-
cas e políticas que se autodenomi-
sil não é difícil encontrar, ainda
naram “comunistas”, de modo a
hoje, várias das organizações em
encontrar as raízes de tais dificul-
que esse partido se desdobrou ao
dades e diversidade.
longo desse século de vida, assim
como conhecer os motivos que as Por exemplo, talvez fosse pro-
157
veitoso levantar como as diversas peso principal da economia brasi-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
158
zar nelas uma atividade econômi- ria ou fabril, era então minoritária
159
Plano de Metas do governo JK re- As greves e lutas operárias dos
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
160
anos depois de seu surgimento vai ser capaz de responder aos de-
161
Valter Pomar
é professor da Universidade Federal do ABC e
integrante do Diretório Nacional do PT.
Valter Pomar
Reflexões sobre 2122
P
or razões de ofício, li todos contribuição dada pelos vermelhos
os artigos deste livro antes a cada uma das conquistas políti-
de sua publicação. Portan- cas, sociais e econômicas do povo
to, não considero adequado utili- brasileiro em geral e da classe tra-
zar este meu texto para contraditar balhadora em particular.
esta ou aquela afirmação de quem Ao tempo que comemoramos,
aceitou o convite para participar da também devemos reconhecer que
coletânea 100 anos de comunismo no ainda não conquistamos nossos
Brasil. Interessados em saber meu objetivos estratégicos: soberania
ponto de vista a respeito, podem ir nacional, liberdades democráticas,
ao livro Comunistas do Brasil (Edito- bem-estar social, desenvolvimen-
ra Página 13, 2021). to e dar início à transição socialista
Noves fora as polêmicas, nosso continuam sendo metas a buscar e
agora centenário movimento co- a alcançar.
munista nacional pode e deve co- Os passos maiores ou menores
memorar muita coisa, desde sua dados em direção àquelas metas -
sobrevivência contra o ferro e o especialmente durante os gover-
fogo das classes dominantes, até a nos Vargas, Goulart, Lula e Dilma
163
– não tiveram continuidade, foram vas, a fatores externos? Será que
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
164
possibilidade do comunismo tem Hoje, por exemplo, a situação
165
vez mais profunda e cada vez mais Marx morreu em 1883, Engels
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
166
na composição da classe trabalha- o da abertura de um novo ciclo de
167
des humanas há séculos e séculos. nários que revelam baixíssima dis-
|100 ANOS DE COMUNISMO NO BRASIL
168
ça, as forças armadas e policiais, ganização da classe trabalhadora,
169
Escola Latino-americana
de História e Política
Escuela Latinoamericana
de Historia y Política