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PREFÁCIO
Dr. Paulo Maria Ferreira de Araújo
Professor Livre Docente em Imunologia - Instituto de Biologia - UNICAMP
Pelo contexto literário científico de o libro, somos induzidos a alçarmos vôo numa viagem... “para
além de limites previsíveis”. A premissa de sua ousadia está associada à riqueza e amplitude dos
conhecimentos aqui abordados, muitos dos quais ainda acreditados incompatíveis ou não
relacionados, ou de difíceis conexões e interfaces. Numa postura de altruísmo, segurança, firmeza e
rigor acadêmico técnico-científico o Professor Dr. Paolo Bellavite concebeu esta obra a partir de
uma intensa e vivenciada experiência profissional, cuja diversidade dos seus inúmeros escritos
constitui um legado panorâmico ricamente documentado.
O ciclo infinito de idéias e ação
Infinita experiência, infinita invenção,
Traz o saber do movimento, mas não da paz...
Onde está a vida que perdemos vivendo?
Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento?
Onde está o conhecimento que perdemos na informação?
(T. S. Eliot , “The Rock”)
A apresentação deste livro também não é menos pretensiosa, porquanto não ultrapassarei o limiar
do meu entendimento sobre vários conteúdos, ou vivências de outras práticas profissionais. Como
professor e pesquisador na área de Imunologia, venho estudando aspectos fisiológicos fundamentais
do sistema imunológico numa visão de integração com outros sistemas, como o endócrino e o
nervoso, resultando numa nova concepção para as suas operações.
Para Thales....a questão primordial não era o que sabemos, mas como sabemos.
(Aristóteles)
A proposta do livro associada à coerência no discurso do autor, foram sem dúvida instrumento de
sedução e de motivação, e que me fizeram experimentar o devaneio de uma instigante aventura do
conhecimento. Na análise da sua concepção os seguintes feitos do autor merecem ser destacados:
Resgata de maneira brilhante os conhecimentos das bases estruturais de antigas práticas médicas e
condicionantes culturais, de vários povos distribuídos pelo mundo em diferentes espaços de tempo e
história (chinesa, indiana ou yurvédica, hipocrática, etc.). E, sinalisando para a sua
contemporaneidade, restringe a exclusão do que estaria legado ao rol dos arquivos mortos da
humanidade, e fortalece a ruptura com a prática da intolerância acadêmica ocidental.
Promove e estabelece numa visão decisória a interligação e intersecção de todos aqueles
conhecimentos com as abordagens das práticas médicas as mais contemporâneas (medicina
Introdução
1
Alexis Carrel (1873-1944) foi pioneiro na pesquisa sobre transplantes de órgãos e cultura celular pêlos quais
lhe outorgaram em 1912 o Prêmio Novel pela Medicina. Como reconhecimento a contribuição de Carrel ao
desenvolvimento da medicina holística e integrada, escolhi citar este autor em varias partes do texto.
2 Claude Bernard (1873-1878) Importante fisiologista parisiense, autor de pesquisas sobre o sistema nervoso,
a termorregulação e a anestesia. O rigor científico e experimental que inspirou seu trabalho se transformou em
fundamento da medicina moderna.
3
Finalismo: Teoria segundo a qual as ações e os fenômenos que acontecem in natura estão orientados para
um objetivo posterior, ou seja, não estão simplesmente determinados por um mecanismo “cego”.
4
Homeodinâmica: O termino mais usado para descrever os equilíbrios biológicos e fisiológicos é
“homeostase” mas neste texto é preferível utilizar “homeodinâmica”, para destacar o fato que este equilíbrio
não são considerados fixos e estáveis e sim em continua mudança. Os dois termos são considerados
sinônimos.
Primeira parte
Homeostase e complexidade
A. Carrel
1
A “força vital”
Medicina chinesa
O conceito de “força vital” ou “energia vital” está presente de diversas formas
e com diversas tonalidades nas medicinas orientais. Na base de toda a
medicina tradicional chinesa está presente um conceito muito similar ao de
força vital, o do Zeng Ch’i (energia biológica) que é a energia que percorre
todo o corpo de uma forma rítmica e cíclica através dos órgãos e dos
aparelhos, em harmonia com os ciclos do cosmos e da natureza. Os
“meridianos” da acupuntura não seriam outra coisa do que a via preferencial
deste fluxo de energia vital, no qual o correto equilíbrio de forças opostas
bipolares (Ying /Yang) é o responsável pela manutenção da saúde. Tanto a
diminuição como o excesso de energia vital pode levar ao desequilíbrio
funcional ou a doença orgânica. Portanto, a cura é a regulação do fluxo de
energia mediante a aplicação de agulhas nos pontos corretos, deixando o fluxo
mais lento quando a energia está em excesso ou estimulando-os quando a
energia está diminuída ou estagnada. Também se podem usar fármacos e
comidas chamadas de “quentes” ou “frias” para modular o excesso ou repor a
carência de energia vital.
A medicina oriental, e em particular a chinesa, possui uma base teórica e
metodológica de abordagem onde prevalece a medicina biodinâmica; uma
referência a estas antigas tradições é, portanto, obrigatória neste texto,
inclusive porque se trata de um tipo de medicina que hoje está em expansão na
civilização ocidental. Faremos um resumo geral da medicina chinesa
utilizando inclusive o material gentilmente colocado a disposição por L. Sotte,
diretor da Revista Italiana de Medicina Chinesa [Sotte e Muccioli, 1992; Di
Concetto et al., 1992; Sotte, 1993].
Historia
A medicina chinesa está se difundindo de uma forma rápida e extensa na
Europa e Estada Unidos como também no Brasil e na Argentina. A utilização
da acupuntura liderou a abertura da difusão da Medicina Chinesa no ocidente
Os “cinco elementos”
Se nos restringimos aos aspectos mais essenciais, um dos pilares mais
importantes do pensamento médico naturalista chinês é o conceito de energia.
O conceito de energia Zeng Chi para esta medicina é de extrema importância
já que ela se baseia numa leitura dinâmica do conceito saúde-doença. Neste
sentido o conceito de energia não coincide com os conceitos desenvolvidos
pela física (energia térmica, mecânica, etc.), possuindo um significado
diferente que inclui também a informação biológica, que reúne as partes e o
todo numa visão integrada e harmônica. A energia pode ser (positiva/negativa,
estimuladora/inhibidora, masculina/feminina, etc.) e tem a propriedade de fluir
ciclicamente através dos elementos dos quais é feito o universo e o corpo
humano (que é do cosmos uma pequena representação). Esta “lei universal” da
natureza se resume num esquema de inter-relações, representado por vários
nodos, mostrado na figura 3.
Neste esquema, onde temos uma representação energética e não anatômica, é
importante considerar as relações analógicas existentes entre os conceitos
filosóficos e os naturalistas dos chineses. Devemos considerar também as
relações entre as forças elementares e as existentes entre os órgãos aos quais
elas se associam (com suas recíprocas influências). Isto se constitui na “lei
dos cinco elementos”. De acordo com a medicina tradicional chinesa esta
regula as relações entre: madeira (Mu), fogo (Huo), terra (Tu), metal (Jin) e
água (Shui), como também as relações entre seus órgãos correspondentes no
corpo humano (fígado, coração, baço-pâncreas, pulmões e rins,
respectivamente).
Como já tinha sido observado na primeira parte do texto, esta visão possui
uma lógica que pode ser abordada também do ponto de vista cibernético. A
analogia existente entre este modelo e a rede de cinco componentes a
descreveremos no capítulo 3 (figura 13).
A natureza “cibernética” deste antigo modo de ver as coisas, típico dos
chineses, é confirmada e reforçada pela sua tradução no modelo operacional
ao nível de computador. Obviamente, o modelo informático não foi feito para
“demonstrar” a medicina chinesa, mas é uma oportunidade para destacar a sua
correspondência [Bellavite et al., 1998]. A energia vital, na concepção chinesa
subjaze a esta lei.
WOOD EARTH
LIVER SPLEEN
WATER METAL
KIDNEY LUNG
“CYCLE OF GENERATION”
“CYCLE OF SUBMISSION”
Acupuntura
Em termos terapêuticos a medicina chinesa oferece um repertorio amplo de
possibilidades: técnicas externas, técnicas internas e a ginástica médica
praticada desde milênios ate na atualidade (Tai Chi Chuan). Entre as técnicas
externas encontramos a acupuntura, o moxabustão, o uso de ventosas, a
Medicina ayurvédica
A Ayurveda é um antiquíssimo sistema médico que teve origem na Índia
Védica muitos milhões de anos atrás e que atualmente é praticado nos países
de origem e em muitos outros [Sharma et al.; 1991; Krishnamurthy, 1991;
Iannaccone, 1997; Iannaccone et al., 2000]. O termo Ayurveda significa
Hipócrates
Entre os gregos se destaca Hipócrates (460-377 ac.) que é considerado o
primeiro representante da medicina racional no mundo ocidental. Hipócrates
designa “a força vital”como aquela força capaz de “vencer” a grande maioria
das influências patôgenas de “physis” ou “vis medicalis naturae”, de onde
deduzimos que os antigos autores já possuíam a intuitivamente a idéia da
existência de uma “farmácia interior” identificada hoje por uma miríade de
neuro-hormônios e de mediadores celulares contidos no plasma que agem na e
defesa orgânica. A consideração desta força interna foi tão importante que
levou Hipócrates a enunciar seu primeiro princípio terapêutico como “primum
non nocere” (antes de qualquer coisa, não fazer mal).
Em relação à medicina hipocrática é importante destacar que toda sua doutrina
é permeada pelo conceito de cura natural. O organismo não recebe os danos
apenas de forma passiva senão que procura repará-los com os seus sistemas de
autoregulação. Consequentemente o quadro sintomatológico está constituído
tanto por sinais e sintomas provocados pelo dano como também provocados
pelos processos de defesa. A Natureza (physis) é a que na realidade cura a
doença. A physis é uma expressão da vida não sendo apenas uma energia
especial ou abstrata, ela é inerente, imanente e instintiva; prevalece nos
processos fisiológicos e mecânicos; contrapõe-se à doença; porem
freqüentemente é incompleta e deve ser assistida pelo médico.
O conceito que exerce uma influencia básica na medicina de observação de
Hipócrates é o da doença estar constituído por dois grupos de processos, o
primeiro devido aos efeitos diretos da noxa e o segundo a reação do
Ildegarda de Bingen
Na medicina medieval encontramos um imponente trabalho da monarca
beneditina Ildegarda de Bingen (1998-1179), quem além de escrever muitos
trabalhos literários religiosos, desenvolveu uma intensa atividade de
assistência e cura aos doentes, com tratamentos de conselhos dietéticos e com
receitas fitoterápicas (herborísticas) [Gronau, 1996; Pernoud, 1996]5. Nos seus
trabalhos médicos naturalistas, cada terapia é concebida como um meio de
ajudar a viver de acordo com Deus, em harmonia com a natureza e com o
cosmos. Segundo sua concepção, a natureza contém tudo aquilo que o
organismo precisa para se manter e cada elemento da natureza possui uma
energia inerente que ela chamava de viriditas (literalmente de verde, cor da
vida).
5
Recentemente surgiu em Milão o Centro de Estudos St. Ildegarda com o objetivo de pesquisar todos aqueles
esquemas terapêuticos baseados na visão integral do homem. Entre outras coisas o Centro está cuidando da
tradução para o italiano dos principais textos de Ildegarada de Bingen.
Hahnemann
A concepção vitalista permanece no auge no final do século XIX. Uma
posição de primeiro plano é ocupada sem dúvida por C. F. S. Hahnemann
(1755-1843) e na sua principal obra O Organon podemos ler: “Nas condições
de saúde do homem, a força vital e espiritual (autocracia), a dynamis que
anima o corpo material (organismo) flui sem obstáculos e mantém todas as
partes em admirável e ativa harmonia, tanto no que se refere às sensações
como às funções” [Hahnemann, Organon of Medicine, 1994, parágrafo 9]. Seu
raciocínio procede da afirmação de que a perturbação deste “princípio
dinâmico interno” é responsável pelo aparecimento das doenças, como vice-
versa “a restituição ad integrum do princípio vital pressupõe necessariamente
o retorno à saúde de todo o organismo” (parágrafo 12).
A base do pensamento homeopático é o conceito de dinamismo saúde/doença:
a saúde não é uma condição estática e encontra-se num estado de evolução
Uma ampla série de agentes danosos de vários tipos, internos e externos, erros
na dieta ou no estilo de vida, pode modificar permanentemente ou
progressivamente o estado de saúde da pessoa. Entre as variantes genéticas
que predispõe para o deterioro ou para o erro biológico, existe a molécula
HLA, os fatores de coagulação, as proteínas que funcionam como os
precursores de depósito, como as lipoproteínas ou os amiloides e assim por
diante. Entre os vários fatores endógenos de cura temos muitíssimos que se
comportam como armas de dois gumes, e superada uma certa concentração ou
em presença de particulares sinergias com outros componentes, se voltam
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Citoquinas ou citocinas: proteínas com função de sinal que as células produzem após vários estímulos,
explicaremos a seguir.
O problema topológico
Um ponto que fundamentalmente se relaciona com a abordagem sintética é o
problema topológico. Este termo define o estudo da posição em que a matéria
viva se encontra no espaço. A análise pode dizer muito sobre a composição de
uma célula ou de um tecido, mas pouco nos diz em relação aos mecanismos de
desenvolvimento e de restituição à forma original e característica num
determinado tecido. De fato esta última depende só em parte da composição,
sendo influenciada pela “história” do próprio tecido, a forma como se
desenvolveu dinamicamente no tempo, partindo de uma simples célula e
chegando a constituir um grande número de tipos diferentes de células com
numerosíssimas e recíprocas interações O problema topológico é
particularmente importante ao nível das funções cerebrais porque adquire uma
importância cada vez maior à medida que a complexidade de um órgão ou de
um tecido aumenta. Por isso é interessante destacar, pelo menos
sinteticamente alguns aspectos da complexidade do cérebro:
1. Alto número de componentes. A morfologia do cérebro mostra que os
neurônios (dez milhões) estão conectados por milhões e milhões de
conexões sinápticas. Este número é de uma dimensão tal que ultrapassa
qualquer possível informação genética, mostrando que a estrutura do
cérebro não é determinada geneticamente (em outras palavras não é
determinada pelo material do qual é feito) e sim, pela interação entre as
potencialidades genéticas e as solicitações ambientais. As ramificações
dendríticas que conectam os neurônios se sobrepõem notavelmente (em
torno dos 70%) de forma tal que não é possível desenhar circuitos únicos e
de uma forma precisa.
2. Ausência de predeterminação. Examinando a formação do cérebro se vê
que a forma precisa e dinâmica com que as conexões entre um neurônio e
outro são realizadas dedduzimos que não poderiam ter sido predeterminadas
desde o início. Os neurônios quando emitem seus prolongamentos axônicos
não sabem para onde enviá-los, nem com quais outros neurônios devem se
conectar. Em cada indivíduo, inclusive nos gêmeos idênticos, os neurônios
se ramificam de modos diversos. Não podemos pensar que as conexões são
especificadas unicamente ao nível molecular (moléculas de adesão) porque
não existem marcadores de membrana assim especificados, como para
dirigir uma arquitetura tão complexa. Isto é defendido por G. L. Edelman,
O conceito de “sistema”
A complexidade no campo biomédico resulta óbvia: como poderíamos negar a
existência de complexidade nos mecanismos de cura biológica e nas doenças
em geral? Porem é a tal ponto óbvio sua existência que acaba sendo deixada
de lado, argumenta-se que não é incorporada nas analises teóricas ou práticas
como sendo uma possível justificativa para nossa ignorância ou incapacidade
prática de resolver situações difíceis e muitas vezes aparentemente sem
solução.
Por trás desta posição que considera a complexidade óbvia também há um
equívoco: pensa-se que a complexidade deriva apenas do aumento
quantitativo de conhecimentos acumulados nos últimos vinte ou trinta anos,
aumento tal que hoje ninguém pode sonhar em dominar todo o conhecimento
da medicina, talvez nem mesmo todo o conhecimento de uma especialidade.
Todavia, como se verá adiante, um comportamento complexo pode
determinar-se mesmo com a interação de poucos componentes.
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Sistema: Um conjunto de variáveis ou fatores que interagem entre si. Um sistema dinâmico se encontra em
tempos diferentes e em diversos estados. O sistema dinâmico está substancialmente descrito por duas partes
fundamentais: uma que diz respeito ao seu estado no espaço de fases (a natureza dos seus componentes) e
outra com respeito à sua dinâmica (a lei de evolução, ou seja, as regras que determinam o estado no tempo t >
0 relativo ao estado no tempo t = 0).
Autoorganização
A vida se mantém e se reproduz como um evento termodinamicamente longe
do equilíbrio, graças ao intercâmbio de energia e de matéria que o sistema
vivo estabelece com o ambiente. Um ser vivo poderia, portanto ser
9
Estrutura: uma configuração de partículas, átomos, moléculas ou íons; mas existem também estruturas organizadas em escala temporal.
Uma nota musical, por exemplo, é uma estrutura formada por ondas vibracionais do ar.
Abertura
Tanto se consideramos a evolução como o estado de organização em que os
seres vivos permanecem ajudam a explicar o fato de que estes são sistemas
abertos, ou seja, que estão em contínua mudança e intercâmbio com outros
sistemas.
Consideremos um sistema (figura 4) composto por um certo número de
elementos (neste caso um mínimo de três, chamados por conveniência A, B,
C) onde existe teoricamente entre eles um equilíbrio e cujas modificações são
reversíveis. A, B, C, poderiam representar variáveis10 fisiológicas ou centros
10
Variáveis: Grandezas fundamentais das equações matemáticas e dos sistemas biológicos. Os sistemas não
lineares descritos com equações matemáticas compreendem dois tipos de variáveis: as variáveis dinâmicas e
as variáveis estáticas (chamadas também de parâmetros). As primeiras mudam continuamente com o tempo
ou ao se repetirem às interações. No caso dos mecanismos sujeitos ao movimento, poderiam ser por um lado à
posição da parte em movimento e por outro a sua velocidade. As variáveis estáticas assumem valores fixos
escolhidos para cada equação, não podem mudar após as interações, nem com o tempo. Por exemplo, num
mecanismo as variáveis estáticas poderiam ser a longitude de um componente ou então a velocidade máxima
permitida por um motor.
11
Estado: O valor ou os valores (para qualquer uma das variáveis do sistema) num dado momento.
12
Entropia: função de estado que mede a probabilidade termodinâmica de um sistema. O segundo princípio
da termodinâmica afirma que cada transformação espontânea é acompanhada de uma produção de entropia. A
entropia assume o valor máximo ao atingir o equilíbrio termodinâmico, o qual corresponde ao máximo de
desordem das partículas que compõem o sistema. Quando a entropia de um sistema aumenta, sua energia total
não muda (primeira lei da termodinâmica), mas temos uma degradação da qualidade desta energia, ou seja, do
modo pelo qual esta é armazenada ou utilizada. Nos sistemas fechados à entropia aumenta inevitavelmente.
Os sistemas abertos, e entre estes particularmente os sistemas vivos, sofrem normalmente um aumento de
entropia, mas dependem também do intercâmbio de entropia com o exterior, por onde a desordem pode
diminuir e o sistema aumentar o próprio grau de organização. Ainda não foi estabelecido se a entropia do
universo físico inteiro aumentou ou não: o fato que esteja se expandindo e esfriando segundo alguns autores
nos leva a considerar que no universo a entropia total está diminuindo
Teleonomia
As leis da física e da química constituem os vínculos inevitáveis nos quais os
sistemas vivos devem obedecer, mas estes não necessariamente determinam
qual escolha deve ser feita para manter e restaurar a organização
(sobrevivência e cura). Portanto, a biologia não pode ser reduzida nem a
13
Energia: capacidade de realizar trabalho. Temos numerosos tipos de energia: térmica, elétrica, geopotencial,
nuclear, etc. Fundamentalmente, a energia pode se distinguir em duas contribuições, cinética e potencial
[Atkins, 1984]. A energia é medida em joules (J), definido como a energia necessária para deslocar um objeto
por 1 m quando se opõe uma força de 1 Newton. 1 Newton (1N) é a força necessária para acelerar uma massa
de um quilograma a uma velocidade de 1 metro/segundo em 1 segundo.
14
Informação: “aquele tipo particular de energia requerida para o trabalho de restabelecer a ordem” [Harold,
1986]. No mundo biológico, a energia pode ser “redistribuída” de modo que sua dissipação por parte do
sistema aberto leve a um aumento do “conteúdo” de energia de boa qualidade (ou seja, que aumente a energia
capaz de realizar um trabalho, energia útil ao sistema). A informação depende do tipo de trabalho e do
objetivo que será desenvolvido. Uma definição bem elaborada [Angeleri, 1992] é a seguinte: informação é o
conhecimento necessário para resolver um estado de incerteza que esteja presente em qualquer ente que
poderíamos definir como um sistema físico em condições de reagir a um estímulo externo segundo um
programa apropriado. A unidade de medida da informação é o bit, que pode ser definido como a quantidade
de informação necessária para efetuar uma escolha entre duas possibilidades alternativas (por exemplo,
branco/preto, ligado/desligado, aberto/fechado e assim por diante). Existem ainda discussões notáveis sobre o
problema da medida de informação nos seres vivos, porque nem toda a informação biológica pode ser
digitalizada, ou seja, medida em bit [Bellavite et al., 1995; Klivington, 1997].
15
Teleonomia: conceito com o qual definem-se os processos ou comportamentos biológicos que seguem um
programa interno (como p.ex. o código genético mas não só ele) que os direciona para um fin determinado
(p.ex. sobrevivência ou reprodução).
2
Os sistemas dinâmicos
17
Alostérica: uma molécula que pode ter diferentes conformações, cada uma das quais está associada a uma
atividade diferente ou a uma diferente função, em conseqüência ligada a fatores reguladores específicos.
18
Priming: o que se pretende explicar com este termo é um estado de hiperativação de resposta a um estímulo
ativo, de forma que caracterizam a célula ou o órgão após ter recebido um pré-tratamento com uma pequena
dose do mesmo estímulo (“priming” homólogo) ou de outros estímulos de diferente tipo (“priming”
heterólogo).
19
Dessensibilização: estado caracterizado pela perda de reação após um estímulo, após a célula ou o
organismo ter recebido um “pré-tratamento” com baixas, médias ou altas doses do mesmo agente ativo
(dessensibilização homóloga) ou com agentes diferentes usados para o estímulo (dessensibilização
heteróloga). Em linhas gerais, a dessensibilização (tanto homóloga como heteróloga) pode ser devida a muitos
mecanismos, dentre os quais se destaca a separação dos receptores, a “down-regulation” ou inativação dos
mesmos receptores, a falta de acoplamento dos receptores com sistemas de transdução e a desativação dos
sistemas efetores celulares. Um fenômeno similar a dessensibilização é a tolerância, que pode ser definida
como a não reatividade adquirida do sistema imunitário para determinados antígenos.
20
Down-regulation: fenômeno pelo qual os receptores de membrana de uma célula estão reduzidos em
número porque são transportados ao interior da própria célula, geralmente por um empenho excessivo deles
próprios receptores, a falta de acoplamento dos receptores com sistemas de transdução e a desativação dos
sistemas efetores celulares.
21
Inibição de contato: fenômeno pelo qual as células em cultura, quando entram em contato através da
membrana, retardam o próprio crescimento.
22
Estocástico: significa ao acaso. Assim se denomina também um estilo ou técnica de composição musical
lançados pelo grego Yannis Xenakis (1922) a fim de opor-se ao formalismo da música serial, e nos quais o
compositor introduz a teoria matemática das probabilidades.
Fenômenos oscilantes
Nos sistemas biológicos existe uma ampla série de fenômenos oscilatórios,
com períodos que variam de poucos milisegundos (oscilações enzimáticas,
atividade neuronal) a segundos (respiração), minutos (divisão celular), horas
(ritmos circadianos, atividade glandular, ritmo sono-vigília), dias (ciclo
ovárico), meses e anos (variações de população). Ou seja, todos os fenômenos
interessantes para a vida são rítmicos. Na tabela 2 temos uma série desses
fenômenos, nos quais se apresentam os respectivos períodos de oscilação
[Breithaupt, 1989; Ho e Popp, 1993; Ho, 1996; Bellavite e Signorini, 1998].
Alguns parâmetros fisiológicos parecem praticamente estáticos no adulto: por
exemplo, a altura do corpo se estabiliza após o crescimento num valor fixo por
um período longo, para depois sofrer uma leve diminuição quando chega à
velhice. Mas se pensamos no peso corpóreo podemos observar que após o
período de crescimento se atinge um peso apenas aparentemente estacionário,
enquanto podemos facilmente notar as variações circadianas e específicas de
determinado período, como àquelas ligadas aos esforços físicos contingentes.
Ainda mais evidentes são as variações temporárias das secreções de
23
O ruído é caracterizado por variações aleatórias de sinal, sem periodicidade, resultando numa somatória
nula do sinal. Quando existe um sinal real, mesmo que fraco, este sinal possui sempre uma mesma fase,
periódica, resultando numa somatória positiva ou negativa, de acordo com a fase (positiva ou negativa)
correspondente ao sinal de entrada.
24
Nucleotídeos cíclicos: moléculas com funções de segundos mensageiros intracelulares (cAMP e cGMP).
25
Inositol fosfato: molécula derivada da cisão dos fosfolipídios nas membranas celulares, responsável pela
transmissão do sinal receptorial.
26
Actina: molécula principal dos microfilamentos celulares. Existe em forma monomérica ou polimérica.
27
Sistemas de transdução: cadeias de moléculas ou de processos bioquímicos que conectam ao nível celular o
receptor aos sistemas bioquímicos efetores, ativando-os, regulando ou inibindo-os.
Ordem e desordem
No campo da matéria, os cristais são um exemplo de estrutura muito ordenada,
que possuem uma ou poucas estruturas moleculares imobilizadas por regras
fixas de interação que não permitem muita liberdade de escolha na disposição
das configurações. Os gases em alta temperatura estão entre os sistemas mais
desordenados, onde existem milhares de moléculas em movimentos rápidos.
Cada molécula caminha em direção a outras moléculas, havendo colisões
entre elas causadas pelas próprias variações internas. Em termos técnicos este
estado se chama equilíbrio termodinâmico e nele a entropia (função que define
a probabilidade que um sistema tem de existir de uma forma qualquer) atinge
o seu valor máximo. Este estado é considerado de desordem, porque as
partículas não “obedecem” a nenhuma “ordem”, não apresentam nenhuma
organização, nenhuma “forma” que permita distinguir o sistema de um outro
equivalente, enfim nenhuma coerência, nem na disposição nem no
movimento. Quando a desordem relativa à natureza do sistema considerado e
a temperatura atingiram seu máximo, nenhum processo físico interior será
capaz de fazer o sistema retornar a qualquer tipo de ordem (se ele estiver
isolado do ambiente).
Entre a ordem perfeita e a desordem total existe uma infinita variedade de
formas intermediárias, nas quais a estabilidade convive com a variabilidade.
Este é justamente o domínio da complexidade. Isto é particularmente evidente
nos sistemas biológicos: uma árvore mostra uma ordem de espécie que a faz
inconfundível, mas não existe uma árvore exatamente igual à outra; o mesmo
vale para qualquer ser vivo.
29
Fractal: objeto com uma estrutura complexa, sutilmente ramificada, dotado de dimensões fracionárias e de
autosemelhança (invariância em relação à mudança de escala).
30
Análise não-linear: analise que leva em consideração o fato de que as respostas fisiológicas não são sempre
proporcionais a quantidade e/ou qualidade do estímulo.
Atratores
O comportamento dos sistemas complexos segue regras de não linearidade
que freqüentemente o colocam em contínua mudança, mas estas mudanças
quando fisiológicas estão sempre sujeitas a controles. Sobre a base de modelos
matemáticos podem ser descritas as trajetórias dos sistemas dinâmicos de
acordo com o conceito de atrator. O atrator é o conjunto dos pontos que
representam o estado de um sistema dinâmico em tempos (ciclos) sucessivos
no espaço em várias dimensões. Ou seja, o atrator poderia ser definido como a
forma geométrica no espaço de fases34 em relação a qual todas as trajetórias
convergem e sendo mantidas no tempo.
Existem vários tipos de atratores:
- o atrator puntiforme, no qual o sistema se situa num único estado e nele se
mantém: por exemplo, um peso que se deixa cair sobre uma superfície, após
algumas oscilações, pára e assim permanece;
- o atrator periódico que descreve um sistema que passa através de ciclos ou
seqüências repetitivas, como um pêndulo que oscila em ausência de atrito. A
periodicidade pode ser mais ou menos complexa. Para um oscilador periódico
a forma do atrator no espaço de fases é uma curva fechada chamada de ciclo-
limite35.
- o atrator estranho (caótico) é representado por uma região no espaço que
descreve trajetórias que variam com cada ciclo. Tais trajetórias ocupam um
espaço não infinito, mas são representadas por um conjunto infinito de pontos
(ou seja, que nunca se repetem de uma forma exatamente igual).
34
Espaço de fases (ou espaço dos estados): representação gráfica na qual cada eixo é associado à uma variável
dinâmica. Um ponto neste espaço indica o estado do sistema num determinado instante. Cada mudança de
estado do sistema produz no espaço de fases um deslocamento do ponto que descreve uma certa trajetória.
Estes modelos geométricos podem ser bi-dimensionais, tri-dimensionais ou de qualquer dimensão segundo o
número de variáveis consideradas.
35
Ciclo-limite: atrator que descreve trajetórias em forma de curva fechada aproximadamente circulares ou
elípticas.
O primeiro atrator estranho descrito foi o de Lorenz (figura 6), que representa
um sistema dinâmico de três diferentes equações não-lineares. As trajetórias
estão representadas pela série de pontos situados no espaço tridimensional
(x,y, z) obtidas através das iterações das seguintes equações:
x(0) = y(0) = z(0) = 1
x(n+1) =x(n)+(-a*x(n)*dt)+(a*y(n)*dt)
y(n=1)=y(n)+(b*x(n)*dt)-(y(n)*dt)-z(n)*x(n)*dt)
z(n+1)=z(n) +(-c*z(n)*dt)+(x(n)*y(n)*dt)
Este sistema desenha órbitas divergentes, que nunca se encontram num
mesmo plano, mas que mostram trajetórias que de qualquer forma se “atraem”
por apenas dois pontos no espaço tridimensional.
É importante em relação a este ponto destacar que as reais funções biológicas
e fisiológicas possuem mais de um atrator, dependendo das condições nas
quais se desenvolvem. A existência de mais atratores deriva tanto da natureza
dinâmica do sistema (seu desenvolvimento no tempo, podendo se modificar os
atratores quando mudam os parâmetros), como do fato que nenhum sistema
fisiológico é na verdade isolado, estando exposto aos fluxos de informação e
de energia provenientes de outros sistemas. Quando dois sistemas não-lineares
se acoplam, de forma qualquer (aleatoriamente), sempre um acaba interferindo
no outro. Por isto o caos é “cumulativo”: sistemas acoplados são mais
suscetíveis de ir ao encontro, de se aproximar do caos do que sistemas
Fractais
Na natureza não só os fenômenos oscilantes, mas também as formas, mostram
sempre uma mesma característica de ordem e de irregularidade, que
freqüentemente assume o aspecto de estruturas simétricas (se bem que nunca
36
Bifurcação: mudança descontínua do atrator num sistema dinâmico.
37
Algoritmo: conjunto de instruções que especifica as oprarações que devem ser desenvolvidas para resolver
um determinado problema.
38
Iterações: sucessivas soluções de equações nas quais o resultado da precedente é colocado como variável na
equação posterior.
40
Pierre Simon de Laplace: Matemático francês que viveu no vigésimo oitavo século. Ele sustentava que
quando se conhece o estado de um sistema num certo instante e as leis que regulam suas modificações, se
poderia prever com certeza o comportamento futuro. “Se nós imaginássemos uma inteligência que num
instante dado compreendesse todas as relações entre as entidades deste universo, esta poderia conhecer as
41
O matemático Poincaré em 1903, já reconhecia este fato: “Mesmo no caso que as leis naturais não tivessem
mais nenhum segredo para nós, mesmo assim, poderíamos conhecer a situação inicial apenas de uma forma
aproximada. O que nos leva a conhecer a situação subseqüente também de uma forma aproximada, portanto,
poderíamos dizer que não existem fenômenos previsíveis, ou seja, governados por leis. Mas nem sempre é
assim. Porque pode acontecer que pequenas variações nas condições iniciais não produzam variações
consideráveis nos fenômenos finais. Se tivermos nas primeiras um pequeno erro, este produz um erro
considerável na segunda”do Science et Méthode di Henri Poincaré, 1903).
42
Quantização: refere-se à existência do quantum, ou seja, a uma subdivisão em partes discretas, ao redor das
quais não existem mais subdivisões possíveis. O termo deriva da física dos quantum que são essencialmente a
“pacotes” de luz. Um quantum é a menor quantidade de luz que pode existir. Não pode ter-se medido um
quantum, mas poderíamos dizer que existe um quantum ou nada. Mesmo conhecendo exatamente as
condições de um sistema físico, a certeza estatística de que um fenômeno físico possa ser verificado não é
absoluta, depende da escala que se considere. Numa escala pequena, não podemos estar seguros de que após
um determinado tempo à situação do sistema considerado seja a mesma. Observamos, portanto no campo dos
fenômenos quantizáveis uma imprevisibilidade considerável.
3
Modelos homeodinâmicos e redes
43
Ciclo mitótico: é o processo da divisão replicativa da célula, pelo qual de uma célula mãe derivam duas
células filhas iguais.
O feed-back
Na figura 7 está representado o esquema dos elementos fundamentais e das
suas comunicações num circuito homeodinâmico simples. Em seguida,
analisaremos minuciosamente este modelo, que é a base das leis que regulam
a fisiopatologia e que constitue o núcleo fundamental de modelos mais
elaborados que serão apresentados posteriormente.
O modelo representa um sistema de retroação (feed-back), onde existe uma
certa variável (neste caso se considera a variável A/A’) que pode ser
modificada de modo reversível, por exemplo aumentando a passagem de
AA’ ou vice-versa de A’A, graças a existência de mecanismos que
favorecem a reação ou a transformação nas duas direções (no caso
considerado AA’ e A’A). Chamamos tais mecanismos de sistemas efetores
sendo eles capazes de efetuar a transformação ou a modificação da variável
considerada. O estado, o nível, a concentração, a atividade ou o número
(segundo o sistema considerado) de A/A’ dependem do “desequilíbrio”
relativo da atividade dos dois sistemas efetores opostos. Na figura 7, os
parâmetros de controle da atividade AA’ e A’A são denominados k e k’,
respectivamente.
O sistema homeodinâmico mas simple, portanto, é representado por um anel
de retroação (feed-back negativo) no qual a informação sobre o resultado de
uma transformação ou de uma oscilação de atividade é reenviada, revista e
An +1 = An + An k (A max – An)
onde An + 1 é o valor de A no ciclo sucessivo n+1 que pode ser calculado com
base no resultado do ciclo precedente (An) somado do crescimento devido ao
mesmo ciclo, que é igual a An multiplicado por um parâmetro de crescimento
k e por um fator dado pela diferença entre o máximo consentido (Amax) e An.
Uma função similar a esta foi descrita pela primeira vez em 1845 pelo
matemático Verhulst ao analisar o processo de desenvolvimento das
A
di A
7
6
Valor de
5
Valore
4
3
2
1 A=8
0
0 10 20 30 40 50 60
Iterazioni
Iterações (n)(n)
B. k=0.45
Tracciato B. k=0.45
8
di A
7
6
Valor de
5
Valore
4
3
2
1 A=7
0
0 10 20 30 40 50 60
Iterazioni
Iterações (n)(n)
C. k=0.60
Tracciato C. k=0.60
8 A=6.510
dediAA
7
6
5
Valore
4
3
Valor
2
1
0
0 10 20 30 40 50 60
Iterazioni(n)(n)
Iterações
Perturbação
D. k=0.60
Tracciato D. k=0.60 A=6.511
8 A=6.511
di AA
7
Valorede
6
5
4
Valor
3
2
1
0
0 10 20 30 40 50 60
Iterazioni(n)
Iterações (n)
O “efeito borboleta”
Na figura 8D está ilustrado o resultado da iteraçãos do caso precedente (figura
8C), mas onde foi introduzida uma “perturbação” que modificou
arbitrariamente o valor de A na 24a iteração: mesmo o valor de 6.510 sendo
dado pelo computador é introduzido o valor de 6.511, que equivale a uma
modificação de 1/1000 do mesmo valor. A figura mostra claramente que, após
algumas iterações, os dois traçados divergem drástica e completamente, de
forma que nenhum ponto pode ser superposto. Não obstante, uma semelhança
fundamental entre as duas linhas deve ser ressaltada: ambas são caóticas, o
que é considerado mais importante, e os valores ficam “confinados” entre dois
extremos, um máximo e um mínimo (em cima e em baixo). Traçando um
Podemos dizer então que no caos gerado a partir desta função, na presença de
condições específicas, poderiam se apresentar “ilhas de ordem”.
A banda recursiva de ordem/desordem possui um típico comportamento não
linear, descontínuo, que não é fácil relacioná-la quantitativamente com o
aumento de k. Este esquema é típico dos fractais, palavra com a qual definem-
se aquelas figuras geométricas ou aqueles objetos que possuem dimensões
fracionárias (fractus = fragmentado) e de autosemelhança. Nas sessões
Bifurcações e fractais
Como vimos no capítulo precedente, os fractais são as formas do caos
determinístico in natura, mas as podemos encontrar também nas
representações matemáticas e geométricas. Estas formas se tornam bem
evidentes nos gráficos bi- ou tridimensionais. Como exemplo, a figura 10
mostra todas as possíveis soluções da equação com o aumento de k.
44
Recursiva porque a função possui retroação, ou seja, um determinado valor da função depende do valor
precedente.
Este modelo pode ser útil tanto no campo da biologia celular como na
fisiologia e patologia aplicada ao organismo na sua unidade, como em suas
múltiplas funções integradas. Este prevê a existência de dois estados possíveis
para cada nodo (ON e OFF): é por isso uma idealização do fenômeno pelo
qual cada sistema homeodinâmico ou processo biológico enquanto funciona
num amplo intervalo de atividade (apenas no modelo “ON” ocorrem vários
estados de atividades como conseqüência do aumento da concentração de um
ativador), podendo ser representado no limite como aceso/apagado,
ativo/inativo, expresso/reprimido, acelerado/desacelerado.
No típico modelo da figura 13 a rede é construída de modo que qualquer dos
cinco componentes estimula (ativa) o componente que imediatamente o segue
(em ordem alfabética), enquanto exerce um efeito inibidor (inativo) no
componente que segue sucessivamente. Qualquer componente recebe portanto
dos outros componentes da rede dois inputs, um ativador e um bloqueador,
Nodos Nodos
Esquema Esquema
A B C D E A B C D E
32 1 1 1 1 1 16 0 1 1 1 1
31 1 1 1 1 0 15 0 1 1 1 0
30 1 1 1 0 1 14 0 1 1 0 1
29 1 1 1 0 0 13 0 1 1 0 0
28 1 1 0 1 1 12 0 1 0 1 1
27 1 1 0 1 0 11 0 1 0 1 0
26 1 1 0 0 1 10 0 1 0 0 1
25 1 1 0 0 0 9 0 1 0 0 0
24 1 0 1 1 1 8 0 0 1 1 1
23 1 0 1 1 0 7 0 0 1 1 0
22 1 0 1 0 1 6 0 0 1 0 1
21 1 0 1 0 0 5 0 0 1 0 0
20 1 0 0 1 1 4 0 0 0 1 1
19 1 0 0 1 0 3 0 0 0 1 0
18 1 0 0 0 1 2 0 0 0 0 1
17 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0
Figura 14. Evolução dos esquemas no qual se dispõe a rede de cinco nodos
descrita na figura 13, em sucessivas iterações partindo de diversos
esquemas iniciais. Os números se referem às classificações dos esquemas
apresentados na tabela 3.
Figura 15. Gráfico da evolução dos esquemas da rede de cinco nodos (ver
figura 13) numa série de 50 iterações. O número do esquema (eixo das
ordenadas) se refere à classificação dos 32 esquemas possíveis
apresentados na tabela 3.
45
Graus de liberdade: entende-se o número de configurações diversas que um sistema pode assumir sem
nenhuma preferência que o obrigue a fazer uma escolha. Poderíamos também dizer que os graus de liberdade
são proporcionais às escolhas casuais e inversamente proporcionais a ordem. As moléculas de um cristal ideal
possuem poucos graus de liberdade (se devem dispor de acordo com o retículo cristalino e geométrico), já as
moléculas de um gás possuem um enorme número de graus de liberdade.
Oscilações coerentes
Na figura 20 mostramos os traçados de todas as cinco variáveis no tempo,
apresentados separadamente nos diversos quadros para não causar
Figura 21. Rede de cinco nodos com variáveis continuas modificada com a
inclusão de um fator de controle não-linear (Amax/Atn) no algorítmo do
nodo A.
46
Como foi visto anteriormente no capitulo 3.
Figura 22. Traçado dos valores das cinco variáveis da rede descrita na
figura 21. k = 0.53, Amax = 20, valores de t0: A = 100, B = 50, C = 0, D = -
50, E = -100
4
Notas de biofísica
O campo eletromagnético
O espaço ocupado pela matéria viva no universo é rico em campos
eletromagnéticos, devido à existência de uma sobreposição de campos
elétricos com magnéticos. Ambos estão em estreita relação, de acordo com a
lei de indução de Faraday. Quando um campo eletromagnético pulsado é
aplicado a um material eletrocondutor (como a matéria viva), um campo
elétrico é induzido perpendicular à direção (vetor) do campo magnético. Este
campo elétrico depende obviamente da superfície da área que nos interessa,
sendo de uma intensidade proporcional à freqüência e à intensidade do campo
magnético.
Temos então que um campo eletromagnético é caracterizado por uma
freqüência e uma intensidade. A freqüência deste é o número de ciclos por
segundo das ondas eletromagnéticas ou o número de pulsações deste mesmo
campo por segundo; sua unidade de medida é o Hertz (Hz). O comprimento de
onda () é a distância entre dois máximos de onda e se mede em metros (ou
seus múltiplos e submúltiplos). Obviamente que quanto mais alta é a
freqüência, tanto menor é o comprimento da onda.
A intensidade do campo elétrico é dada pelo potencial elétrico ao longo de um
determinado espaço e se expressa em Volts/metro (V/m) ou em miliVolts/
centímetro (mV/cm). Quando um sistema biológico é exposto a um campo
elétrico, as cargas móveis se colocam na direção induzida pelo campo,
formando uma corrente elétrica que se mede em amperes (A) ou seus
submúltiplos. Tomam-se como referência uma certa área de tecido ou de
órgão percorrida pela carga elétrica, existe uma certa densidade (J) desta
corrente, que se mede em Amperes/metro quadrado (A/m2) ou em
microA/cm2.
A intensidade do campo magnético se mede em Gauss (G) ou, tesla (T) e seus
submúltiplos (1T = 104 G). Por existirem dois parâmetros de medida, a
intensidade do campo magnético terrestre é da ordem de 0.02 – 0.07 mT (0.2 –
0.7 G), enquanto que a utilizada no diagnóstico de ressonância magnética é da
ordem de 0.1 – 10 mT (1 – 100 G) [Walleczek, 1992].
As ondas eletromagnéticas são usadas, como é notado no caso das
telecomunicações, como vetores de informação. Para este objetivo é usadas
uma onda “suporte” com uma freqüência escolhida numa faixa muito ampla
segundo os sistemas de transmissão e recepção. Esta onda “suporte” é
modulada de um modo específico pela informação veiculada, ou seja, é
alterada de uma forma sutil no comprimento e na amplitude, os quais podem,
47
Os campos eletromagnéticos podem ser classificados como campos magnéticos ionizantes (os quais são de
alta freqüência e alta energia, de forma que podem causar a ionização de átomos e moléculas pelo destaque de
elétrons) e campos magnéticos não ionizantes (os quais são de baixa freqüência e baixa energia e que não
causam ionização). Por exemplo, os raios X e os raios são ionizantes, as ondas de radio são não-ionizantes.
Mecanismos moleculares
Os experimentos realizados pelo grupo de Tsong indicam que um campo
elétrico fraco (20 V/cm), a 3.50C, é capaz de ativar a função de um importante
sistema da membrana envolvido na bomba de íons, a ATPase Na + / K+
dependente. Inclusive, a ativação somente acontece se as freqüências usadas
são específicas, correspondentes a 1 kHz para a bomba de K+ e 1 MHz para a
bomba de Na+. Estes resultados permitiram formular o conceito de
“acoplamento eletroconformacional”. Este modelo postula que uma proteína
enzimática vai ao encontro de mudanças conformacionais por uma interação
de tipo coulombiana com um campo elétrico (ou com qualquer outro campo
de força oscilante com o qual a proteína possa interagir). Quando a freqüência
do campo elétrico corresponde à característica cinética da reação de
transformação conformacional, ocorre a indução de uma oscilação
fenomenológica entre conformações diferentes da enzima. Na força de campo
otimizada, as conformações assim reunidas são funcionais e as oscilações são
48
Ondas de Schumann: ondas eletromagnéticas com freqüência de 7.8 Hz, que são geradas por um processo
de ressonância entre a superfície da Terra e os estratos da ionosfera.
Eletrodinâmica quântica
Já foi demonstrado que as irradiações de uma solução fisiológica com ondas
eletromagnéticas na faixa de microondas (não térmicas) modifica a capacidade
da solução no sentido de influenciar a abertura e o fechamento dos canais
iônicos da membrana. Também após o período de irradiações, a água mantém
as propriedades que acabou de adquirir [Fesenko e Gluvstein, 1995; Fesenko
et al., 1995]. Isto sugere que os efeitos dos campos eletromagnéticos sobre
estruturas biológicas poderiam ser mediados por modificações na estruturação
dos solventes (neste caso, água). Os autores citados falam explicitamente de
um fenômeno de “memória” eletromagnética da água. O “imprinting”
eletromagnético de soluções aquosas também foi proposto por outros autores
também para aplicações terapêuticas [Sudan, 1997].
Clusters de água
Diferentes modelos que descrevem a estrutura da água podem ser divididos
em duas classes principais: modelos de misturas e modelos contínuos.
O modelo de misturas é fundamentado no modelo de clusters de Frank e Wen
[Frank e Wen, 1957], no qual a água líquida se compõe não apenas de
monômeros (H2O) ou de clusters (H2O)n interligados por ligações de
hidrogênio, mas também de um equilíbrio entre estas espécies distintas. Um
pentâmero formado por moléculas de água, por exemplo, é um cluster de água
com 5 unidades H2O, ou seja, (H2O)5. Um exemplo é mostrado na figura 27
[Liu et al., 1996].
Um cluster, portanto, pode ser visto como um número variável n de unidades
moleculares interligadas formando agregados “fechados”, uma espécie de
“gaiola” que pode conter ou não moléculas em seu interior (quando não possui
molécula em seu interior, o cluster apresenta uma cavidade interna). O
tamanho dos clusters de água depende da temperatura e da pressão, da adição
de solutos e outros fatores. Na água, as moléculas podem se alinhar em forma
pentagonal ou hexagonal graças às suas ligações de hidrogênio; ao redor delas,
várias conformações poligonais podem formar, em certas condições (agitações
ou sucussões do líquido), figuras geométricas complexas, com cavidades no
seu interior.
Estudos espectroscópicos
A espectroscopia estuda a interação da radiação eletromagnética com a
matéria, sendo um dos seus principais objetivos a determinação dos níveis de
energia de átomos ou moléculas. A interação de radiação eletromagnética com
o movimento vibracional dos núcleos origina o espectro vibracional no
infravermelho ou o espalhamento Raman. Fisicamente os dois processos,
Raman e infravermelho são diferentes. O espectro de absorção no
infravermelho é um processo de ressonância, que ocorre quando uma radiação
eletromagnética incidente tem uma componente com valor de freqüência
correspondente a uma transição entre dois níveis vibracionais. A condição
para ocorrer a absorção é que haja variação do momento de dipolo elétrico da
molécula com este movimento vibracional. No efeito Raman ocorre um
espalhamento de luz, que após o processo se apresenta com freqüência maior
ou menor do que a original. As diferenças de freqüência entre a radiação
incidente e a espalhada constituem o espectro Raman. Essas diferenças
correspondem às freqüências de vibração da molécula. Sua atividade depende
da variação do momento de dipolo induzido (pelo campo eletromagnético
incidente) com a vibração. O efeito Raman foi previsto teoricamente por
Smekal em 1923 e descoberto experimentalmente por Raman em 1928. Foi
somente com o rápido desenvolvimento na tecnologia de construção de lasers,
no fim da década de „60, que a espectroscopia Raman alcançou o seu ápice e
pôde ser utilizada como uma ferramenta de análise completar às demais
espectroscopias, apartir de então chamada por alguns autores de Raman-laser.
Isto porque a intensidade dos picos observados na espectroscopia Raman está
diretamente relacionada à intensidade e à freqüência da radiação incidente, o
que torna o uso de alguns tipos de lasers excelentes fontes para se obter
espectros Raman. A introdução do uso de laser em espectroscopia Raman se
deve a um brasileiro, Sérgio Porto e de Wood, que utilizaram o laser pulsado
de rubi em 1962 e o laser contínuo de He-Ne em 1963.
No plano da física experimental, uma tentativa de abordagem ao problema da
natureza física das soluções aquosas altamente diluídas foi feita por vários
autores mediante análise de espectros (bandas de absorção, de emissão ou de
ressonância de ondas eletromagnéticas em diferentes freqüências ou
intensidades) obtidas com as técnicas do Raman-laser, de absorção no
infravermelho (IR, infrared) e principalmente de ressonância magnética
49
Relaxação: em termos gerais, relaxação pode ser definida como o retorno ao equilíbrio de um sistema que
tenha experimentado uma perturbação (normalmente pequena) em uma de suas variáveis, por um agente
externo. A relaxação decorre de processos anteriores que promoveram alguma perturbação no sistema
(através de excitação por campos elétricos, magnéticos, radiações em diferentes freqüências, etc) e tendem a
voltar a um estado de equilíbrio. De acordo com a origem destas perturbações, diferentes alterações são
provocadas no sistema, com conseqüentes variações nos respectivos tempos de relaxação. Para se entender, de
forma bem simplificada, a relaxação nos processos de ressonância magnética nuclear (NMR) podemos
imaginar um núcleo com spin diferente de zero como um pequeno ímã, com um momento magnético que vai
depender de algumas propriedades inerentes a cada núcleo. A relaxação de spin-nuclear consiste em
transições dos estados quânticos mais energéticos para aqueles de menor energia. Neste caso, as transições
espontâneas são muito pouco prováveis e a relaxação ocorre via transições estimuladas por campos
magnéticos (ou elétricos) locais, que possuam uma dependência temporal periódica a freqüências apropriadas
(freqüência de Larmor). Em sistemas líquidos, os movimentos brownianos moleculares, translacionais e
rotacionais fornecem esses campos locais. Dependendo do tipo do processo de relaxação de spins nucleares
podemos medir os tempos de relaxação longitudinal (T 1) ou transversal (T2). A relaxação longitudinal
(também chamada de relaxação spin-lattice) envolve uma transferência de energia do sistema de spins para o
seu ambiente próximo (lattice). A relaxação transversal (ou spin-spin) caracteriza-se pela perda de coerência
de fase dos momentos magnéticos nucleares, correspondendo a um aumento na entropia do sistema.
50
As substancias foram diluídas pelo método serial (1:10 e 1:100) utilizando a metodologia farmacológica
homeopática que compreende alem da diluição a utilização de fortes agitações (dinamização) para cada
diluição. Estas foram altamente diluídas a ponto de teoricamente, não conter mais moléculas do diluente, ou
seja, foram transformadas em soluções “não moleculares”.
Segunda parte
Biodinâmica e patologia
5
Caos, complexidade e patologia
Depois do apresentado e discutido até aqui, podemos nos questionar ate que
ponto os modelos do caos e das redes interconectadas entre si poderiam ser
adaptados ao estudo das causas e dos mecanismos responsáveis pelas doenças:
a resposta é positiva e neste capítulo forneceremos uma série de exemplos
destas novas aplicações. Num raciocínio teórico e analógico, que relaciona os
modelos matemáticos à realidade dos sistemas físicos complexos e dos seres
vivos, se mostra de significativa operacionalidade para o estabelecimento de
novas metodologias experimentais em vários campos da medicina.
As relações entre os conhecimentos adquiridos sobre os sistemas caóticos e a
medicina são múltiplas, mas o conceito fundamental se pode resumir assim: a
teoria dos sistemas dinâmicos é um dos instrumentos interpretativos mais
importantes desde que levemos em consideração os mecanismos que regulam
o limiar entre a saúde e a doença e seus possíveis métodos de análise
51
Patogenesia (ou patogenese): estudo dos mecanismos responsáveis por uma determinada doença. Para
compreender também as causas (fatores etiológicos) se usa o termo etiopatogênese. Em homeopatia a palavra
“patogenesia” é usada também para definir o conjunto de sintomas provocados por uma sustância
medicamentosa administrada à um experimentador saudável (ver Capitulo 9).
Patologia da complexidade
Tudo o que foi dito até agora mostra que as oscilações biológicas e
fisiológicas fazem parte da “regra” matemática que governa um sistema
homeodinâmico, isto pelo simples fato que este é organizado por sistemas de
feed-back: eles são, portanto, mesmo que em forma caótica normais. Mas,
cada aspecto da fisiologia possui seu correspondente patológico, assim
podemos, seguindo um raciocínio lógico, nos questionar quais são as
patologias da homeodinâmica a partir da sua própria caoticidade. Não é fácil
responder de um modo esquemático e definitivo a esta pergunta, mas
poderíamos tentar uma primeira classificação distinguindo duas principais
possibilidades:
1. um aumento de caoticidade devido a círculos viciosos de autoamplificação;
2. uma perda de conexão e redução de complexidade.
Considera-se que cada sistema biológico complexo tende a regular a
intensidade e a qualidade das suas próprias funções sobre a base de um certo
tipo de atrator, também podemos considerar que a patologia surge quando o
mesmo atrator muda seu comportamento pelas perturbações vindas do exterior
ou mesmo por “mutações” vindas da sua própria estrutura (como explicamos
no capítulo precedente). Desde este ponto de vista, o núcleo fundamental da
doença poderia ser encontrado onde existe uma bifurcação na dinâmica de um
Círculos viciosos
O mesmo aumento de velocidade com o qual determinadas mudanças
acontecem pode criar problemas na estabilidade de um sistema dinâmico,
porque vemos que a mudança de um parâmetro de controle (k ou A max) pode
causar bifurcações, ou seja, mudanças qualitativas imprevistas.
Em situações limite, variações muito rápidas e intensas das variáveis
envolvidas num sistema homeodinâmico podem configurar uma situação de
feed-back positivo e gerar autoamplificações de desordem do sistema.
Poderia ser o caso de sistemas biológicos submetidos a um fator nocivo forte e
contínuo (estresse), portanto, obrigados a um grande esforço de adaptação e de
reparação. Temos a seguir alguns exemplos de dinâmicas de autoamplificação
patológica de uma desordem homeodinâmica:
1. choque vasoconstrição compensatória hipoperfusão dano celular
vasodilatação hipotensão choque, etc.
2. hipertensão vasoconstrição hipoperfusão renal ativação do sistema
renina / angiotensina hipertensão, etc.
3. lesão celular por anóxia déficit de energia ausência da função da
bomba de membrana entrada de cálcio excitação celular aumento
de consumo de energia déficit de energia, etc.
4. modificações casuais (mutações) de um gene que codifica as proteínas
envolvidas nos sistemas de reparação do DNA síntese de enzimas com
funcionamento alterado alterações dos sistemas de reparação do DNA
danos genéticos posteriores modificações nos genes do crescimento
celular tumores;
5. infecções por HIV destruição dos linfócitos imunodeficiência
infecções e ativações do sistema imunitário ativação do vírus latente
replicação do vírus destruição dos linfócitos, etc.
6. infecção bacteriana atração de leucócitos com funções defensivas
ativação dos leucócitos produção de substâncias (citocinas) que atraem e
ativam outros leucócitos abscesso.
Uma forma particularmente grave do aumento da caoticidade pode ser
verificada em todas aquelas situações em que existe uma perda do controle
homeodinâmico por razões externas ao próprio sistema, que acompanha a
incapacidade do sistema de compensar a perturbação induzida. Isto se verifica
facilmente ao nível da patologia da célula quando sua homeodinâmica
energética é perturbada. Uma grande parte dos fatores patógenos que podem
Figura 28. Efeito dos diferentes fatores nocivos externos sobre alguns dos
mais importantes elementos da célula e o possível desencadeamento de
círculos viciosos (vocabulos en italiano).
52
Apoptose: morte celular “programada”, ou fisiológica, que acontece por um mecanismo de controle das
próprias células e sem liberação de enzimas hidrolíticas nos tecidos.
Redução de complexidade
Uma série de desordens da homeodinâmica pode ser reduzida essencialmente
a um “déficit” de caoticidade, como quando verificamos destruição de
conexões e/ou a perda de complexidade de sistemas específicos, que podem
reduzir as sutis variações homeodinâmicas. Mostraremos algumas evidências
clínicas e experimentais deste importante conceito:
1. Envelhecimento. A situação mais evidente é a do envelhecimento do
organismo no seu conjunto e nas suas células ao nível microscópico. A
esclerose é uma alteração típica, mesmo que não exclusiva dos tecidos das
pessoas idosas, representam modificações do tecido conectivo com redução
da sua flexibilidade, elasticidade e finalmente da sua vitalidade (atrofia).
Uma redução da complexidade (considerada como uma redução em
dimensão fractal) é observada nas trabéculas ósseas no caso da osteoporose
[Benhamou et al. 1994]. De acordo com alguns autores [Caldwell et al.
1994], a dimensão fractal fornece uma informação qualitativa da estrutura
óssea, integrando-a com novos significados a informação puramente
quantitativa fornecida pela densitometria óssea tradicional. Em neurologia
observa-se que o idoso apresenta uma ramificação menor das células de
Purkinjie, o que significaria uma diminuição nas suas dimensões fractais
[Lipsitz e Golberger, 1992]. Métodos especializados de análise baseados na
dinâmica não linear permitiram comparar grupos de sujeitos jovens e idosos
em relação à complexidade do ritmo cardíaco e as variações da pressão
arterial [Kaplan et al. 1991]. O que se observa é que esta complexidade se
reduz no transcurso do envelhecimento. Por este motivo alguns autores
sustentam que a medição da complexidade biológica baseada na teoria do
caos e dos fractais pode fornecer um instrumento novo para monitorar o
envelhecimento e testar a eficácia das intervenções direcionadas para a
53
Cortical pruning: “póda do córtex cerebral”.
54
Pacemaker: sinal compassado. Instrumento elétrico ou grupo de células capazes de ditar um ritmo à um
órgão.
Patologia celular
Coloca-se a célula como o centro da organização do ser vivo, o processo
patológico consiste fundamentalmente na alteração físico-química, estrutural e
funcional da célula, devida a alterações adquiridas pelo contato com agentes
físicos, substâncias tóxicas ou parasitas. Trata-se, portanto, de doenças que
possuem como principal característica uma anomalia no número ou no
funcionamento das células.
Um exemplo típico é a hepatopatia alcoólica onde a introdução de uma
quantidade elevada de álcool provoca várias modificações bioquímicas do
metabolismo do hepatócito, com acúmulo dos acetaldeído, radicais livres,
peróxidos lipídeos, fatores que levam a uma degeneração precoce da célula e a
médio ou longo prazo a um processo cirrótico. Outros exemplos são: anoxia,
danos causados por vírus, malária, atrofia da enervação.
Podemos destacar o seguinte: a informação genética neste caso não é alteração
primária, também não se exclui que uma patologia celular possa ser devida a
conseqüências de uma patologia primariamente genética (por exemplo, a falta
56
Inotropismo ou contractilidade é a propriedade de se contrair permitindo uma sístole eficaz.
57
Heat-shock proteins: Proteínas de choque térmico, identificadas pela primeira vez como resposta adaptativa
da célula ao calor, chamadas de proteínas do stress ou chaperoninas. São uma ampla família de proteínas com
múltiplas funções, dentre elas a assistência da correta síntese protéica, a formação de complexos
oligoméricos, a proteção da modificação da estrutura secundária e terciária, o deslocamento intracelular e a
excreção de proteínas, a estabilização do citoesqueleto.
6
As dinâmicas evolutivas das doenças
Fases evolutivas
Já definidos os conceitos sobre a dinâmica interna e as manifestações externas
das doenças, abordaremos o que tradicionalmente se define como as fases dos
processos patológicos em relação à sua evolução no tempo. Na figura 31,
apresentamos de forma esquemática, as evoluções temporais possíveis
(evoluções cinéticas) destes processos. Nestes gráficos, as doenças, induzidas
por eventos danosos ou estressantes repetitivos (setas verticais), estão
representadas numa escala de intensidade com picos mais ou menos elevados.
Nesta figura é feita uma distinção esquemática entre as fases agudas/fases
crônicas, e entre fases clínicas/fases subclínicas. Acompanhando-se a linha
contínua da evolução dinâmica do processo patológico compreendem-se
facilmente estas distinções.
Desordem subclínica
Nas figuras 31 A e 31 B, o primeiro pico a esquerda representa a primeira
reação do organismo a uma noxa de intensidade pequena (pequeno estresse de
qualquer ordem). Esta pequena reação ocorre num tempo evolutivo agudo de
poucas horas ou poucos dias, mobilizando o sistema de defesa de forma
subclínica, no sentido de desenvolver-se sem provocar ainda o que
entendemos por “doença”. Fenômenos desta natureza acontecem
continuamente, também nos sujeitos “sãos”. Isto é devido à exposição
contínua do homem ao estresse ambiental, pela qual qualquer organismo,
mesmo os mais sadios, apresentam oscilações de alguns dos seus parâmetros
Doença aguda
O segundo pico mais alto da figura 31A representa uma típica doença aguda.
Uma noxa suficientemente forte causa uma série de danos e de reações que
configuram um “quadro nosológico” com sua típica ou quase típica série de
manifestações. A emergência do quadro clínico já leva o doente a procurar um
medico. Os sintomas e as mudanças anatomopatológicas, unidas às avaliações
de laboratório ou qualquer avaliação tecnológica, permitem freqüentemente
identificar a causa desencadeante pela qual a doença se identifica com um
diagnóstico clínico preciso.
Ao refletir sobre a patogênese da doença num determinado sujeito é
necessário se questionar o que realmente distingue a primeira reação (reação
subclínica) daquela mais grave que pode alcançar o plano da evidência
clínica? No esquema mostramos que a doença clínica é causada por uma noxa
esterna (estresse) suficientemente intenso (seta dupla), o que acaba sendo
válido em linhas gerais mas de forma muito esquemática.Com esta análise
chegamos à conclusão de que as manifestações da doença dependem
fundamentalmente do tipo de resposta do hóspede. Um mesmo estado de
solicitação pode causar diferentes respostas, em diferentes indivíduos: a ponto
de não determinar uma doença num sujeito e ser uma doença muito grave em
outro. Isto é documentado de forma indiscutível pelas doenças infecciosas:
nem todos se contaminam nas epidemias que são provocadas pelo mesmo
agente etiológico (causa da doença), e aqueles que se contaminam não
apresentam a doença exatamente da mesma forma. Este mesmo conceito pode
ser estendido a inumeráveis campos da medicina até considerar, por exemplo,
o caso de uma emoção repentina, que pode matar um cardiopata e apenas fazer
empalidecer um sujeito normal.
Na evolução dinâmica de uma doença aguda é de fundamental importância
não só a intensidade da causa, mas (e principalmente) o bom funcionamento
do conjunto dos sistemas homeodinâmicos, a tal ponto que a doença se
manifesta de uma forma mais grave quanto menos otimizado está este
funcionamento. Na figura 31A, indicamos com um asterisco o primeiro ponto
de bifurcação, entendendo com isto o momento no qual os conjuntos dos
sistemas destinados à defesa e à reparação influenciam – mesmo que com
pequenas e sutis diferenças de comportamento – a evolução posterior da
Bifurcações
Nos perguntamos onde ao final se encontram as “decisões” dos pontos de
bifurcação que são sensíveis aos fatores de regulação mesmo sendo estes
pequenos, mas tão determinantes? Eles se encontram fundamentalmente nas
diversas fases dos sistemas homeodinâmicos. Estes sistemas estão
representados pelo sistema imunitário e pelo sistema inflamatório, mas
também pelo sistema de desintoxicação do fígado e do sistema hemostático
(como também de muitos outros) e tem a característica de possuir uma face
dupla, porque tanto podem curar como provocar danos. O fato de que em cada
caso em particular, possa prevalecer o dano ou a reintegração ao estado de
saúde, depende das sutis variações do comportamento do próprio sistema
homeodinâmico. O destino da reação depende da “escolha” que o sistema
deve fazer, entre o preço que deve pagar, em termos de toxicidade e
sofrimento, e a garantia de resgate das operações, em termos de sobrevivência
do organismo. Por exemplo, quando existe uma lesão na superfície dos vasos
sangüíneos, os sistemas homeostáticos (coagulação, agregação plaquetária,
aumento do tecido conectivo e da musculatura da parede vascular) entram em
ação para bloquear o risco de hemorragia e iniciar a reparação que for
necessária. Mas acontece que estes mesmos mecanismos reparadores também
podem provocar fenômenos patológicos se o sistema homeostático, por
exemplo, bloqueia a circulação de forma total no vaso sangüíneo (trombose,
aterosclerose).
Mas o que é que faz “pender a balança” numa direção positiva, em termos de
reparo tecidual ou numa direção que não é necessária para o organismo ou que
acaba resultando em patologia? Este movimento é justamente controlado pela
complexidade dos múltiplos mecanismos que estão em jogo. Uma “escolha”
deste tipo depende tanto de elementos isolados como receptores, concentração
de mediadores, (presença de substâncias químicas exógenas), como do tipo de
coordenação existente pelo controle “centralizado”, que avalia as informações
provenientes dos diferentes sistemas e elementos que estão em jogo. A
intensidade das diferentes respostas. é regulada deste modo Ao nível de uma
determinada bifurcação, o êxito da reação pode depender de uma informação
que seja significativa no plano de coordenação do ou dos sistemas que
participam da reação. Este tipo de coordenação está garantida por redes
cibernéticas, como o sistema nervoso e o hematohormonal, e inclusive, como
veremos, por regulações sutis de natureza eletromagnética. Provavelmente
Aumento de resistência
Depois que o paciente é curado de uma doença aguda seu estado de saúde
melhora pelo aumento da sua resistência (no caso de doenças infecciosas, este
estado é chamado de imunidade). Este fato é bem conhecido e é apresentado
na figura 31A representado pelo terceiro pico: este pico mostra a possibilidade
que o organismo tem de reagir a um estímulo ambiental, mesmo que intenso,
com uma resposta eficiente e coordenada, de forma otimizada e, em geral,
pela qual as reações se desenvolvem prevalescentemente ao nível subclínico.
Cronicidade
A evolução das doenças agudas é tal que após alguns dias, ou no máximo após
algumas semanas, temos o retorno da normalidade (cura e aumento de
resistência, como apresentamos nas figuras 30 e 31A). Também é possível que
a evolução dos processos patológicos tome caminhos diferentes (quadro
inferior à direita na figura 30 e tracejado da figura 31B). A doença está latente,
sem muita sintomatologia, mas sem uma direção a cura completa: algum
problema residual permanece, devido ao fato de que a “batalha” com doença
aguda foi intensa, a ponto de danificar em parte o próprio hóspede (vejam, por
exemplo, as cicatrizes residuais após danos teciduais ou os déficits hormonais
que ficam no organismo após patologias que atingem as glândulas endôcrinas,
etc.), ou devido a que a causa que provocou a doença aguda não foi totalmente
removida, ou porque o organismo possui uma alteração genética dos sistemas
de defesa e/ou de reparação. Deste modo nos encontramos frente a uma
segunda possibilidade de evolução, representada pela cronicidade do processo
patológico, onde a adaptação patológica desempenha um papel fundamental.
Na figura 31B representamos uma doença que possui um pico subclínico no
início, seguido por uma fase clínica (presença de sinais e sintomas, ou seja,
com um curso evolutivo flutuante).
Mas nem todas as doenças crônicas se manifestam inicialmente como doenças
agudas. Na realidade o que acontece mais freqüentemente com as doenças
Envelhecimento
Em relação ao que dissemos sobre as últimas fases da complicação
progressiva do quadro patológico, que acaba levando o paciente à morte, nos
chama a atenção um ponto que não é de pouca importância. É o que de fato,
de um modo ou de outro, todos os seres vivos percorrem na linha da figura
31B e terminam na zona acima e a direita. Existem alguns indivíduos que
“nunca se enfermam” mas, que de qualquer forma envelhecem, até que um
evento menor – uma infeção, um trauma - os leva a morte.
O que é o envelhecimento numa abordagem dinâmica? Trata-se de uma
acumulação progressiva de fenômenos de adaptação patológica que acontecem
ao nível subclínico.
O estado de saúde ideal é mantido com o decorrer da idade graças a um eficaz
controle dos desequilíbrios, locais e gerais, que permite regular de modo
rápido e sutil as flutuações da homeostase causadas pelos contínuos danos que
inevitavelmente acontecem. Este controle possui, porém um custo no sentido
de uma perda progressiva da eficiência da célula e dos tecidos. A resolução de
todos os microtraumas, mesmo sendo eficaz, permite a não manifestação dos
sinais e sintomas típicos de uma doença, mas não pode impedir que o
organismo perca a sua flexibilidade e sua originária integridade nas
comunicações biológicas.
Envelhecer é uma adaptação no seu estado mais puro e, neste sentido, pode ser
considerada como uma doença crônica, até mesmo, a mais crônica das
doenças. Com certeza, a maior ou menor eficiência dos mecanismos de
eliminação dos depósitos de toxinas e da reparação dos danos possui um papel
fundamental na determinação da duração da vida e nisto fatores de tipo
genético possuem uma importância considerável.
Poderia-se dizer que o envelhecimento é devido à contínua existência de
doenças subclínicas, que não deixam de atingir o organismo ao nível celular e
O exemplo da inflamação
A compreensão e a regulação dos processos inflamatórios constituem um dos
problemas mais freqüentes na área médica, devido ao fato deles se tornarem
tanto processos defensivos como processos reativos, caracterizando-se por isto
como “facas de dois gumes”.
Uma grande parte das patologias mais freqüentes da atualidade pode ser
considerada como desordens do processo inflamatório, devidas essencialmente
a dois mecanismos: um reconhecimento anormal dos próprios componentes,
que acabam sendo considerados como componentes estranhos ou um
mecanismo reativo excessivo, mesmo que oportuno, em relação ao alvo
molecular (ampliação anormal, regulação ausente do processo, difusão fora da
zona anatômica necessária). A inflamação é um campo que representa um
argumento ideal de estudo para a medicina biodinâmica e a medicina
integrada em geral. De fato, o verdadeiro objetivo deste tipo de abordagem
terapêutica é o de procurar utilizar sistemas de cura que cooperem com o
próprio processo de cura natural, usufruindo o potencial intrínseco existente
nos seres vivos.
Esquema geral
A partir das mais variadas causas endógenas e exógenas de estímulo lesional
desencadeia-se um processo no qual participam, de forma coordenada,
diferentes componentes moleculares (proteínas plasmáticas, lipídeos,
prostaglandinas, hormônios, peptídeos, íons, etc.) e componentes celulares
(leucócitos, plaquetas, macrófagos, endotélios, neurônios, etc.). Mesmo que a
Fase crônica
As reações vasculares e vásculo-exudativas possuem uma tendência de
autolimitação tanto no tempo como no espaço. Mas se não é resolvida de
forma rápida, o processo evolui para a cronicidade. Nas inflamações
experimentais, aplicando-se flogógenos potentes e duradouros, como as
microbactérias, se observam inflamações crônicas caracterizadas por um
acúmulo muito intenso de células da série branca (nem tanto granulócitos, mas
principalmente monócitos, macrófagos e linfócitos, ou seja, as células da série
mononucleadas). Nas inflamações crônicas se observam também uns
aumentos notáveis das fibras conectivas, tanto em forma difusa como em
forma de cápsula, que possui o objetivo de delimitar o processo, mas que pode
também levar a complicações locais no trofismo e na função dos tecidos.
Entre as possíveis conseqüências da inflamação encontramos a esclerose:
basta pensar na segunda intenção de cura de uma determinada ferida, nos
quelóides, na cirrose hepática, na fibrose pulmonar, na própria aterosclerose,
nos quais muitos dos elementos patogenéticos representam “uma resposta ao
dano” [Ross, 1986]. De fato, o desenvolvimento de uma placa aterosclerótica
se forma após um dano ao endotélio (por exemplo, devido ao fumo, a
hipertensão ou a uma desordem lipídica); as plaquetas se aderem e também os
monócitos se depositam sobre o endotélio. Estes monócitos englobam sob o
Mecanismos de cronicidade
As causas que impedem uma rápida resolução do processo flogístico podem
ser múltiplas: arranjos genéticos do sistema HLA (desordem no
reconhecimento do self), mas também causas exógenas como vírus, bactérias
resistentes à morte, corpos estranhos: estes desencadeiam uma reação
Radicais livres
Os radicais livres produzidos pelos fagócitos ativados desempenham um papel
importante no processo inflamatório, especialmente aqueles derivados do
oxigênio e do nitrogênio. São substâncias paramagnéticas porque existe um
elétron desemparelhado na camada de valência, ou seja, a órbita mais externa
da molécula. É interessante recordar que a produção de radicais livres é
acompanhada de fenômenos biofísicos como a emissão de quantos luminosos
(com de aproximadamente 570 nm) por parte de leucócitos ativados (figura
33) [Cheson et al., 1976]. O significado biológico deste fenômeno não está
totalmente esclarecido, considerados os efeitos de radiações luminosas e
campos eletromagnéticos sobre os próprios fagócitos [Baiguera et al., 1986;
Ricevuti et al., 1989; Shen et al., 1994; Roy et al., 1995], não se pode excluir
As citocinas
A febre existente nos processos infecciosos é devida à presença de substâncias
liberadas pelos microorganismos. Estas substâncias foram descritas já no
começo da microbiologia. Um pioneiro destes estudos foi E. Centanni que no
1893 demonstrou a presença de uma substância não protéica, termostática, em
culturas de microorganismos, que ele chamou de pirotoxina. O termo de
substância pirogênica foi mais adequado, descrita por Seibert em 1923, em
filtrados de microorganismos patógenos e não patógenos. Co Tui e
colaboradores isolaram em 1944 os polissacarídeos da Salmonella typhosa,
capazes de induzir febre nos animais. Robinson e Flusser em 1944 isolaram
substâncias similares do Proteus vulgaris e da Pseudomonas. Estas substâncias
agem em doses baixíssimas (microgramas) e foram identificadas
posteriormente com as endotoxinas (lipopolissacarídeos dos gram-negativos).
A injeção endovenosa de endotoxinas produz no homem após 75 minutos
aproximadamente, um aumento da temperatura corporal. A existência de um
período de latência fez supor que a endotoxina não agiria diretamente nos
centros termoreguladores, e sim por meio da produção de algum mediador
endógeno. O termo pirogênio endógeno sérico foi introduzido por R. Grant e
W. J. Whalen em 1953, que identificaram no soro de sujeitos tratados com
lipopolissacarídeos a presença de um fator termogênico, diferente
quimicamente dos mesmos polissacarídeos. I. L. Bennet e P. B. Beeson
descobriram no mesmo ano que o pirogênio endógeno é produzido pelos
leucócitos.
No final dos anos sessenta floresciam os estudos sobre os mediadores
endógenos da febre, mas que não estavam ainda caraterizados ao nível
molecular, mas somente como atividade. Portanto, ora se falava de pirogênio
endógeno (EP), ora de leukocytic endogenus mediator (LEM), ou de
58
Pleiotropismo: capacidade de uma única célula ou de um único sinal de influir em muitos alvos diferentes.
59
Redundância: quando fatores diferentes possuem uma atividade biológica similar.
Os “feixes neuroendócrinos”
De um lado (à esquerda na figura 38) se encontra o centro paraventricular do
hipotálamo, que produz uma série de mediadores entre os quais o
corticotropin-releasing hormon que estimula a hipófise a produzir hormônio
adenocorticotrópico que, por sua vez, aumenta a produção de corticoesteróides
por parte da supra-renal. Os corticoesteróides possuem muitas ações
estimulantes sobre o metabolismo, no fígado e em outros órgãos, mas se os
consideramos em relação ao sistema imunitário e as células inflamatórias, eles
possuem um efeito inibidor nas reações mediadas por tais células (efeito
antinflamatório que também é utilizado com fins terapêuticos).
Estimulação
da febre -
Inibição do Supressão
hormônio tiroidiano do apetite
Estimulação
Supressão
do fígado
(“fase aguda”)
IL-1 e IL-6 da libido
Estimulação Estimulação
do SN simpático Estimulação da resposta imunitaria
do sono
Figura 39. Efeitos pleiotrópicos de IL-1 e IL-6. Muitos dos sintomas dos
estados inflamatórios agudos e da resposta ao estresse são reproduzidos
no animal pela administração de citocinas purificadas.
STRESS
ALTERAÇÕES DE:
PSICOLÓGICOS HUMOR
APETITE
LIBIDO
SISTEMA SONO
NEUROENDÔCRINO DOR
ETC.
CRF, ACTH
GH, -ENDORFINE, ACTH
-ENDORFINE, PROLACTINA
TSH, LH, CITOCINAS
GH, GLUCOCORTICOIDES
SISTEMA
IMUNITARIO E
INFLAMAÇÃO ALTERAÇÕES DE:
STRESS SANGUE
QUÍMICO-FÍSICO
VASOS
BIOLÓGICOS
TECIDO CONECTIVO
MEDULA OSSEA
FIGADO
ETC.
Cancerogênese
Os principais agentes cancerígenos são, como já se sabe, substâncias químicas
contidas no cigarro, no ar poluído, nos alimentos, radiações ionizantes e
excitantes, radioisótopos, fármacos genotóxicos, vírus. Aqui, obviamente,
estamos considerando apenas as categorias gerais dos cancerígenos em relação
às moléculas com atividade cancerígena e/ou mutagênica que são da ordem de
centenas. O que torna o agente cancerígeno mais ou menos deletério depende
tanto da dose como da duração da exposição a estes, como também de fatores
ligados ao próprio organismo como, por exemplo, a capacidade de
Progressão neoplásica
Fatores cancerígenos e co-cancerígenos (ou favorecedores) levam a uma
complicação progressiva da situação biológica do tumor. Observa-se na
realidade que nos tumores estão danificados diferentes genes na mesma célula,
e que existe uma progressão na malignidade em relação ao número de
oncogenes que são ativados e de genes supressores que são inativados. Ao
nível genético surgem novas mutações, por sorte favoráveis devido a uma
redução dos sistemas de defesa e de reparação, novos estímulos aparecem para
a desorganização celular, talvez após a expressão inapropriada, mesmo os
Terceira parte
“Força vital” e medicina integrada
7
Biodinâmica e método clinico
Princípios básicos
Antes de tudo, estabeleceremos quais são as linhas médicas gerais, as quais
poderiam parecer óbvias e pleonásticas se não fosse que, freqüentemente,
estes princípios são deixados de lado na prática médica atual.
O objetivo de uma consideração terapêutica mais coerente com a perspectiva
biodinâmica é o de ajudar a própria autoorganização do organismo do paciente
para que resgate o caminho da. O paciente deve ser responsabilizado pela sua
própria saúde, sobre as causas da doença e sobre o fato de que o ator principal,
protagonista do processo de cura, é ele mesmo.
Estilo de vida
Hoje se fala muito do estresse como causa das doenças, entendendo este termo
como o fato de que a vida moderna nos países civilizados propõe, ou mais
freqüentemente, impõe às pessoas muitos fatores patógenos referentes ao tipo
de estilo de vida: ritmo de trabalho, hábitos alimentares, consumo,
comportamentos e atitudes físicas, sedentarismo, convívio muito próximo com
máquinas, concentração de indivíduos num mesmo ambiente, exposição aos
campos eletromagnéticos, “valores” propostos pela mídia, preocupações com
a incerteza do futuro, etc. Todo esta série de fatores patógenos atingem, sem
dúvida, as pessoas causando a conseqüente instabilidade dos sistemas
homeodinâmicos e patologias em vários níveis, principalmente, nos sujeitos
mais sensíveis. Como conseqüência, nos cabe perguntar se na abordagem
biodinâmica, onde se atribui extrema importância à globalidade das interações
entre os vários fatores que entram em jogo, fica possível intervir num sentido
positivo, procurando a limitação dos danos com um aconselhamento sobre o
estilo de vida.
Muitos desequilíbrios orgânicos e psíquicos seriam controlados ou impedidos
com mudanças no estilo de vida, que implicam a abolição de fatores como os
Alimentação
A questão da dieta poderia ser desenvolvida de forma longa e detalhada, mas
aqui nos limitaremos apenas a esboçar o tema de forma geral. Não existe uma
dieta para cada terapia, se entendemos ainda de forma restrita dieta como uma
série de receitas. Ao contrário disto se trata na realidade de dar uma orientação
competente sobre os hábitos alimentares para cada paciente em particular.
Numa dieta são importantes tanto a quantidade como a qualidade dos
alimentos.
Em relação à quantidade é bem notado que devemos observar não só as
calorias totais como a quantidade de alimento ingerido (no que se refere à
saciedade). Na nossa sociedade ocidental atual existe a tendência de introduzir
Componentes Tumores
alimentares ESÔFAGO PULMÕES ESTÔMAGO CÓLON FÍGADO MAMAS
RETO
Álcool
Carne vermelha
Carotenóides
Fruta
Sal
Verdura verde
Vitamina C
Vitamina E
Selênio
Cereais
Gordura animal
Cereais integrais
Carne grelhada
fator de possível risco fator de possível proteção
fator de risco provável fator de proteção provável
fator de risco seguro fator de proteção segura
A lógica biodinâmica
Para poder ilustrar o conceito da proposta sistêmica e dinâmica na terapêutica
nos podemos referir ao grande problema que nos apresenta a regulação do
processo inflamatório. Do que já foi dito na segunda parte do texto, fica claro
que do ponto de vista biológico, na inflamação não temos apenas fenômenos
patológicos, como também fenômenos que se transformam em patológicos,
apenas quando se tornam excessivos, desregulados, ou mal localizados. Todo
médico sabe que a intensidade dos sintomas das doenças, com predomínio das
inflamatórias, não está sempre relacionada a sua gravidade e isto é válido
principalmente na flogose crônica. Deduzimos também, pelo menos de um
ponto de vista teórico e ideal, que as intervenções terapêuticas mais adequadas
não deveriam estar sempre direcionadas para suprimir o fenômeno
inflamatório, pelo contrário, deveria “orientá-lo” e prevenir as complicações e
os conseqüentes círculos viciosos. Ou seja, a inflamação deve ser vista como
um fenômeno fisiológico e, consequentemente, de ajuda e manutenção,
quando possui uma duração limitada no tempo, quando possui uma extensão
limitada topograficamente e, principalmente, quando o benefício (defesa,
reparação) prevalece sobre o dano do tecido são.
A situação é complexa porque cada intervenção acaba interferindo no
conjunto típico dos sistemas biológicos homeodinâmicos, que a níveis
diferentes, tentam manter o equilíbrio mais idôneo possível para a
sobrevivência do organismo. É sabido que em todos os sistemas
homeodinâmicos cada subsistema possui seus próprios mecanismos de feed-
back. Existem os inibidores endógenos para cada sistema de ativação
principal, tanto na coagulação como nas citocinas, nos fatores de crescimento,
Estratégias terapêuticas
Se considerarmos como verdadeiro que o primeiro ato medico deve ser a
prevenção, frente ao aparecimento de uma doença existem essencialmente
quatro possíveis linhas de conduta: a terapia etiológica, a supressão, a
substituição e a regulação (figura 41).
Por terapia etiológica se entende aquela que combate ou minimiza a
causa da doença. Exemplos típicos desta proposta como a terapia
antibiótica ou antimicrobiana em geral, ou mesmo a soroterapia com
anticorpos antitoxinas nas intoxicações graves, a terapia genética e
assim por diante. Obviamente, esta apenas é possível quando se conhece
a causa e quando existem meios químicos, ou de outro gênero que
sejam adequados para combatê-la. Além do mais, algumas das
limitações da terapia etiológica podem residir nos efeitos indesejados
dos remédios antimicrobianos que infelizmente acabam sendo
empregados em doses fortes para assegurar sua eficácia.
Efeito do estresse
Já ilustramos de forma ampla como cada causa de dano/estresse provoca a
mobilização de um ou mais (geralmente de múltiplos) sistemas
homeodinâmicos. Isto pode ser considerado “patologia” ou uma manifestação
da doença, quando associado a sintomas desagradáveis ou danos orgânicos.
No esquema que estamos analisando se considera o estresse inicial como
aquele que induz um aumento considerável da atividade de um componente,
neste caso o subsistema “A”.
Considerando como um sistema similar se modifica quando o estresse altera o
estado de um dos seus componentes, vemos (figura 43) que se o nodo A, está
alterado no sentido de que seu nível de atividade aumenta, este “informa” com
um aumento dos sinais ativadores o nodo D e com um aumento dos sinais
inibidores o nodo C. Assim, o nodo D ativado estimulará o nodo E, o qual por
sua vez, produzirá um notável aumento dos sinais inibidos que tentam
controlar o aumento de A causado pelo estresse. Por outro lado, C é inibido e,
consequentemente, todo o feixe CBA se reduz e, portanto, cessa o
estímulo “endógeno” da atividade de A; também isto pode ser definido como
mecanismo de compensação.
Notamos que o “estresse” sobre um componente do sistema é aqui
representado como “aumento” de atividade, mas na realidade fisiopatológica
do estresse pode estar ligado também a uma “diminuição”. Como exemplo, a
inatividade prolongada representa estresse, assim como também a falta de
elementos nutritivos, a falta de oxigênio, etc. Igualmente, a homeodinâmica se
mobiliza, mas de uma forma oposta à indicada pela figura 43, no sentido de
que neste caso os nodos D-E sofreriam uma diminuição de atividade e B-C
um aumento.
Nesta primeira fase da reação ao estresse, a rede que simula a homeodinâmica
de muitos sistemas reage lógica e eficientemente nas direções do equilíbrio e
da cura. Portanto, se o aumento de A representa, por exemplo, um forte
contato entre toxinas exógenas e glóbulos brancos em uma infeção, o
organismo produz uma série de sinais que por uma parte mobilizam as defesas
imunitárias para chegar a uma neutralização das próprias toxinas e das
bactérias que as produziram, pela outra se preocupa de evitar que uma
ativação excessiva do sistema inflamatório leve a danos persistentes aos
tecidos. Assim se desencadeia a produção de substâncias inibidoras da
O problema é que a maior parte dos sintomas são produzidos pelos sistemas
reguladores e justamente a maior parte dos fármacos suprimem os sintomas
(analgésicos, antinflamatórios, antiespasmódicos, broncodilatadores, etc.) não
sendo muito específicos ao nível bioquímico e biológico. Como conseqüência,
a interferência com a ação reguladora endógena, que está sempre presente em
múltiplos níveis, pode ser considerável. Por outro lado, o uso de fármacos
deste tipo, especialmente se as doses usadas são fortes e repetidas, causam
efeitos colaterais de grande importância. O efeito colateral ou secundário de
um fármaco é a conseqüência da inevitável perturbação da homeostase que
cada substância biologicamente ativa provoca.
Em síntese, não se conseguiu ainda encontrar uma proposta que seja
suficientemente “fisiológica” para não causar efeitos danosos colaterais e,
principalmente, que seja orientada para atingir os vários níveis de homeostase.
O problema é essencialmente aquele mencionado na sessão anterior: em
qualquer que seja a reação que esteja homeodinamicamente desbalanceada (e
60
Aqui se usa o termo remédio de uma forma muito genérica, para indicar qualquer intervenção que tenha
efeitos reguladores sobre o sistema doente.
61
Princípio da semelhança: enunciado por Hipócrates e operacionalizado por Hanhneman e seus seguidores
imediatos (Hering, Allen, Jahr, Boenninghausen, etc.) e contemporâneos (Kent, Ghatak, Pierre Schmidt;
Paschero, etc.) (ver capitulo 9).
É óbvio que na clínica diária não é sempre fácil distinguir entre estas duas
diferentes possibilidades porque os sistemas biológicos estão entrelaçados de
forma estreita. Mesmo uma intervenção “supressora” típica (por exemplo, o
uso de corticóides em doses altas numa doença autoimune) poderia em alguns
casos ter efeitos reguladores positivos, se impedem a expansão do dano
tecidual e o desencadeamento de circuitos de amplificação. Trata-se, de
qualquer forma, de uma problemática que deveria sempre ser considerada para
poder avaliar as intervenções terapêuticas.
Devido à complexidade do problema das terapias reguladoras nas doenças
crônicas, isto não pode ser resolvido de forma fácil e deve ser analisado
profundamente. A idéia geral que queremos aqui colocar é que se trata de uma
8
Medicinas não convencionais: integração possivel?
Considerações semânticas
Uma linguagem clara, que seja conhecida por todos, seria um ponto de partida
dos mais importantes para se atingir o objetivo de integração, ou pelo menos
62
Epistemologia: “estudo crítico dos princípios, hipóteses e resultados das ciências já constituidas, e que visa
determinar os fundamentos lógicos, o valor e o alcance objetivo delas”; é a teoria da propria ciência, testa e
interroga os saberes.
Medicina convencional
A medicina convencional poderia ser definida assim: “o conjunto de teorias
fisiopatológicas e de metodologias clínico-terapêuticas que derivam do
patrimônio de conhecimento desenvolvido pelas ciências naturais desde suas
origens até os dias atuais”. As suas características fundamentais são:
está fundamentada no método experimental e por isto é chamada de
medicina científica;
é ensinada em cursos universitários;
é praticada de forma predominante no mundo;
sua prática requer habilitação e reconhecimento por parte do Sistema
Sanitário Nacional de cada país.
Por isto, seria conveniente evitar os dois termos com os quais é denominada
de medicina oficial e o de medicina alopática. O adjetivo “oficial” não é o
mais apropriado porque se refere a uma “medicina de Estado”, digna de outros
tempos e porque não existe qualquer pronunciamento de autoridade oficial a
favor desta ou daquela prática médica. As referências fundamentais do ato
64
Estado metaestável: aquele pelo qual um determinado sistema dinâmico pode passar facilmente de uma
bacia de atração para outra, por causa de uma perturbação mínima que o movimenta de uma parte para outra.
A posição de um sistema dinâmico pode ser representada como uma „esfera‟ que se encontra num percurso
feito de cristas e depressões. Quando um sistema é estável, seus movimentos (oscilações) acontecem sempre
dentro do mesmo “poço” de potencial” ; mesmo se perturbado por qualquer acréscimo ou substração de
energia, retorna espontaneamente à organização espaço-temporal de partida, em direção ao fundo do poço,
onde a energia livre é menor. O sistema metaestável se encontra sobre a “crista” entre dois poços de potencial
e sofre facilmente uma mudança irreversível, terminando num poço de potencial diferente do original.
Reforçamos o que já foi apresentado com relação aos atratores booleanos (figuras 14-18).
Neste capítulo escrito pelo autor (Paolo Bellavite) e pela médica responsável
pela edição em português do livro (Graciela A. Martínez Carrizo) quisemos
apresentar mais detalhadamente o tema da medicina homeopática que,
juntamente com a medicina tradicional chinesa , é a disciplina médica mais
aderente aos princípios da medicina homeodinâmica, segundo nossa opinião.
Como já foi explicado no prefácio, este texto não possui uma pretensão
enciclopédica e, consequentemente, alguns aspectos, mesmo que muito
importantes da abordagem integrada da medicina, não puderam ser
desenvolvidos completamente. Porém, explicaremos com maiores detalhes as
questões relacionadas à abordagem homeopática, aproveitando o fato de que
os autores possuem uma experiência direta neste campo. Esta extensão em
relação à medicina homeopática se deve a que entendemos que resultará de
valor mesmo para os que possuem outros interesses práticos como também
para os estudantes que se identificam com a medicina integrada, sendo nosso
objetivo ampliar os seus conhecimentos sobre a medicina em geral. O
raciocínio com uma “lógica” de medicina integrada estabelece relações
transversais entre as diversas medicinas e consegue encontrar os pontos de
contato que possam existir entre estas, já que a razão delas existirem é o seu
65
Sujeito: Diante da precisão teórica e clínica do conceito de sujeito, seria importante que a homeopatia se
atualizasse e definitivamente abandonasse termos como “individuo” (até pedra é um!) e “personalidade”
(psicologia) para abordar de maneira precisa o objeto primacial da sua prática: o homem como sujeito
[Checchinato, 1999].
66
Químico bastante conceituado na época.
68
Protocolo preparado pela Libera Università Internazionale di Medicina Omeopática – Napoles – Italia
(LUIMO) em 1980, elaborado por médicos homeopatas reconhecidos internacionalmente como Paschero,
Negro, Ortega, Rodriguez. Para maiores informações ver o trabalho dos médicos mencionados
(Sperimemtazione Pura e os Anais do XI Congresso Internazionale della Luimo; Lyon, 1985) .
69
Cfc: abreviação de diluição centesimal preparada por aparelho de fluxo contínuo. CH: abreviação de
diluição centesimal hahnemanniana, cuja preparação era manual, como fazia Hahnemann.
Isopatia
Uma variante interessante para a farmacologia em geral sobre a utilização do
princípio da semelhança, citada também nas edições posteriores dos textos de
Hahnemann, é o que se chama de isopatia71. O termo foi provavelmente
introduzido pelo veterinário W. Lux em torno dos anos 1831-1833 [Lux,
1833]. Este sugere que doses baixas de substâncias contagiosas (bactérias,
vírus, secreções infectadas e materiais orgânicos), após preparações especiais,
incluindo a esterilização, podiam ter um efeito terapêutico nos distúrbios
derivados daquele mesmo contágio. O princípio da semelhança similia-
similibus se transforma assim em aequalia aequalibus, ou princípio de
71
Isopatia: Se entende pelo uso, como remédio, de preparações diluídas e dinamizadas de agentes etiológicos
das próprias doenças, não segundo o princípio da similitude dos sintomas mas, do igualitarismo do agente
etiológico. Por exemplo, o uso de polém no asma alérgico, o uso dos próprios venenos para curar os
envenenamentos, o uso de preparações “homeopatizadas” de fármacos alopáticos para combater os eventuais
efeitos tóxicos destes próprios fármacos. Por isopático se entende o uso terapêutico de um material
patológico, de secreções e excreções provenientes do próprio doente, por exemplo, a secreção do furúnculo se
transforma (obviamente após preparações apropriadas) no isopático para o paciente que forneceu o material
da sua forunculose crônica. Uma forma particular de isopatia é a auto hemoterapia, na qual se usa o próprio
sangue do paciente, administrado geralmente por via intra muscular, após tratamento adequado (por exemplo,
diluição-dinamização, ozonização, agregação de um fármaco homeopático).
Dose mínima
A medicina homeopática desenvolveu um método de preparação de remédios
que consiste na trituração das substancias sólidas seguida de posteriores
diluições feitas em água e álcool, fazendo em cada diluição um número
determinado de sucussões. A intencionalidade deste método foi inicialmente a
de aumentar com a trituração a biodisponibilidade e a de reduzir com as
diluições a toxicidade das sustâncias, muitas das quais eram venenos. É
importante enfatizar que as observações realizadas por Hahnemann registram
uma paradoxal potencialização da capacidade terapêutica dos remédios
quando estes eram diluídos. É por esta razão que as progressivas diluições
72
Potencia: é a energia dinâmica adquirida pelo medicamento, com o trabalho da dinamização.
73
Diluição decimal : as siglas que a denominam são : «D», «DH», «X», o «x».
Considerações importantes
Este tipo de lógica e de modelo para analisar a similitude merece destaque de
alguns importantes corolários que não são apenas teóricos, mas também
orientadores na prática terapêutica que se baseia nestes conceitos.
Pelo esquema apresentado (figura 47) fica claro que a administração do
fármaco “similar” poderia provocar sintomas relacionados à reativação do
sistema regulador. Já que as doses são bastante baixas, a terapia de reativação
pode provocar efeitos que de qualquer modo se assemelham à doença, ou que
podem aparecer como uma reagudização da sintomatologia. De fato, a
ativação do sistema de regulação não provoca apenas a produção de sinais
direcionados à restituição da homeodinâmica, mas também de sinais que são
transmitidos aos sistemas que produzem sintomas. Isto é um fato percebido na
74
J.T.Kent foi diretor da Post-Graduate School of Homoepathy, em Filadélfia e professor de Matéria Médica
no Hahnemann Medical College and Hospital, em Chicago, autor de Filosofia Homeopática, Matéria Médica
e Repertório, três obras básicas na formação do medico homeopata. Através da sua grande experiência clínica
descobre a relação importantes que existe entre os fatos mais marcantes da vida do paciente e o surgimento de
patologias relacionados a eles no tempo, chamou este fenômeno de “historia biopatográfica”. T. P. Paschero,
medico argentino clinico homeopata que presidiou a Liga Medicorum Homeopaticha Internationalis,
trabalhou com Kent nos EEUU, Paschero também considerava de extrema importância os sintomas da historia
do paciente, continuou o trabalho kentiano e deu origem a todo um pensamento de medicina antropológica,
considerava que a doença não poderia ser separada do homem na sua totalidade individualizada, sua
circunstancia atual de vida e toda a sua historia.
75
Na abordagem homeopática os sintomas e sinais da semiologia são considerados para fazer o diagnostico
clínico. Para fazer os diagnósticos posteriores ao clínico são considerados sintomas homeopáticos aqueles que
mais caracterizam a subjetividade e especificidade de cada paciente, estes sintomas não precisam Ter uma
explicação fisiopatológica apenas precisam dizer a respeito das peculiaridades de cada paciente como ser
irrepetível e único. Pode ser um sintoma homeopático um desejo alimentar, um medo de tempestade ou de
altura, ou uma agravação pelo frio.
77
Hahnemann considerava o remédio “simillimum” como a mesma sustância que provoca a doença
(similimum = idêntico) em questão. Ao considerarmos a totalidade característica na escolha medicamentosa ,
poderíamos dizer até que existe um similimum para cada ser humano (ele é irrepetível). Por isto, e pela falta
de suficientes novas experimentações em homens saudáveis, deduzimos que existe a impossibilidade de
administrar um “simillimum” no seu verdadeiro sentido; consequentemente quando falamos de simillimun em
clínica, estamos nos referindo ao medicamento mais similar aos sintomas do paciente, ou seja aquele que na
sua patogenesia é o mais similar possível à clinica apresentada pelo paciente.
Sintomas modalizados
Para poder identificar os sintomas raros, peculiares e característicos e
necessário ter a modalização dos sintomas. Modalizar é individualizar o
sintoma. Um sintoma bem modalizado por exemplo, é aquele que aparece
numa determinada hora do dia ou numa determinada ação ou movimento, ou
após a ingestão de uma comida em especial, quando identificamos uma
relação direta entre o sintoma e um determinado clima o lugar geográfico o
sintoma também está modalizado.
A persistência dos sintomas ao longo do tempo é muito importante, estes são
os chamados sintomas históricos [Candegabe, M;1996] ou seja, aqueles que
Evolução clínica
Ao se praticar a “clinica do semelhante” [Checchinato, 1998] observamos que
um movimento biológico se inicia quando o simillimum é administrado e o
paciente reage de diferentes formas de acordo com sua homeostase atual
Pode-se observar :
melhora dos seus sintomas no que se refere a totalidade sintomática
característica acompanhada de uma sensação de bem-estar geral
(SBG);
melhora da totalidade sintomática característica no seu estado geral
mas com agravação do seus sintomas físicos mais periféricos. Esta
agravação será passageira e acompanhada de sensação de bem-estar
geral;
agravação duradoura dos sintomas sem melhora do estado geral, este
pode ser um caso onde a predisposição as doenças esteja marcada por
enfraquecimento genético ou de estilo de vida;
uma não modificação do quadro sintomático ou seja observamos que
não aparece nem melhoria nem agravação dos sintomas; esta situação
pode estar nos indicando que não existe similaridade entre o quadro
clínico e o quadro da patogenesia do remédio administrado.
Estas avaliações da evolução clínica do enfermo foram magistralmente
elaboradas por Kent, quando nos fala da segunda prescrição na sua obra
maestra Filosofia Homeopática [Kent, J; Filosofia Homeopática, 1908].
A vis medicatrix curae (a via natural de cura) possui uma direção centrifuga,
ou seja de dentro para fora, isto se observa nos processos chamados de “ cura
espontânea” , onde poderíamos pensar que existe uma autoorganização ou
uma “boa” homeostasia. O certo é que este fato se observa na clínica cotidiana
e quando o medicamento é bem escolhido (aquele que possui a maior
similaridade possível) promove este movimento de dentro para fora. È
79
Potencia “baixa” (baixas diluições/dinamizações): preparadas na escala decimal entre D1 e D8 ou na escala
centesimal entre C1 e C4. Calcula-se que este nivel de diluição baixa possue concentrações moleculares dos
agentes ativos que se administram aos pacientes entre 10-5 e 10-12 [Linde 1997] (dependendo obviamente da
concentração do extrato original). Potencias “medias” (diluições/dinamizações medias): entre D9 e D23 ou
entre C5 e C11. Trata-se de preparações altamente diluidas mas que teoricamente possuem pelo menos
algumas moleculas. Potencias “altas” (diluições/ dinamizações altas): diluições que ultrapassam a D24 e
C12. Trata-se de preparações cuja diluição certamente superam o numero de Avogadro e que como
consequencia não possuem nenhuma molecula do preparado original. Na ultima parte deste capitulo
analizaremos as hipoteses fisico-químicas que se propuseram explicar o efeito biologico destas “soluções não
moleculares”.
80
Este parâmetro é muito importante porque dá uma avaliação imediata do efeito do tratamento: um resultado
de 1.0 significa que não existe nenhuma diferença no resultado entre sujeitos tratados e sujeitos não tratados;
um valor superior a 1.0 indica quantas vezes melhor resultou a homeopatia em relação ao grupo controle;
enquanto que um valor inferior a 1.0 indica o oposto.
81
Publication bias: Erros na avaliação cumulativa de uma série de trabalhos clínicos devido à possibilidade
de que muitos estudos, cujos resultados são negativos, não sejam publicados, principalmente quando o
assunto é controvertido, como é o caso da homeopatia.
82
Harmônicas: são os componentes mais simples nos quais suas funções periódicas dadas pelas suas
superposições podem ser decompostas; as harmônicas de um determinado sistema periódico possuem todas as
freqüências múltiplas de uma fundamental, chamada de primeira harmônica.
10
Conclusões
Os limites
Quanto mais nos aprofundamos nos estudos de qualquer disciplina
(convencional e não convencional) surgem também os seus limites e inclusive
seus riscos.
Devido ao fato de que as pesquisas científicas estão ainda no estado inicial por
toda uma série de razões, tanto histórica quanto econômica, uma boa parte do
que está registrado na literatura nesta área deve ser consideradas ainda
preliminar e a espera de um consolidamento maior. Se por um lado é
importante a cautela no uso das terapias ainda não completamente
consolidadas, por outro lado é necessário que o médico moderno saiba analisar
e utilizar os conhecimentos da medicina biodinâmica para poder enfrentar a
questão terapêutica de uma forma mais ampla e atualizada.
Em cada caso, é importante que esteja esclarecido como o diagnóstico e a
terapia são atos médicos. Estes são acompanhados na sua essência de um
relacionamento com o doente e suas problemáticas de saúde, das quais não é
Perspectivas
O aumento da consciência da complexidade em medicina será acompanho de
uma reavaliação de todas aquelas propostas médicas que tenham doutrinária e
empiricamente voltado a sua atenção mais para o complexo do que para o
simples, mais para a globalidade do que para as análises, mais para “sutil” do
que para o macroscópico e mais para o “fator humano” do que para o aspecto
tecnológico. Isto não significa rejeitar a ciência, mas apenas alargar os
horizontes de observações até onde seja possível, em outros territórios que
ficaram até agora inexplorados por preconceito, por falta de convicção ou,
simplesmente, porque ainda não tinha chegado o momento oportuno.
Significa, sobretudo, utilizar os instrumentos conceituais e técnicos do método
experimental para distinguir a realidade da fantasia, o plausível do
demonstrável, o efeito orgânico do efeito psicológico, o caso esporádico do
efeito estatisticamente significativo, para estabelecer as probabilidades de
credibilidade de um teste determinado, para prever a possibilidade de sucesso
ou os riscos de uma determinada terapia.
As medicinas “naturais” as quais são representadas principalmente pelas
tradições orientais (acupuntura, fitoterapia chinesa, medicina indiana e
tibetana) e das ocidentais (homeopatia, fitoterapia, medicina antroposófica e
outras técnicas) que desde suas bases se preocupam em intervir de forma a
estimular o poder endógeno de cura do organismo e que por isto podem ser
compreendidas apenas dentro de um paradigma que se refere à ciência da
complexidade, da biofísica e da aceitação de uma dimensão integrada e
ecológica do ser humano.
Neste livro não tratamos com igual exaustividade todos os aspectos da
medicina biodinâmica, mas nos dedicamos mais em particular à medicina
chinesa e à homeopatia, duas tradições fundamentalmente empíricas que
possuem uma profunda riqueza, como a de ter colocado sempre no centro da
análise dos casos clínicos a totalidade dos sintomas e a individualidade do
paciente.
Deste ponto de partida, os médicos e os cientistas interessados nestes
fenômenos assistidos pelo método experimental e pelas normas técnicas de
pesquisa clínica e laboratorial podem avaliar as propostas terapêuticas
complementares e não convencionais no âmbito da medicina científica
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