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Proposta de redação

Produza um texto dissertativo-argumentativo — de 25 a 30 linhas e título sugestivo —, que discuta por que a
literatura foi fundamental na sua formação? Seu texto deve, obrigatoriamente, ser escrito em 1ª pessoa do
singular. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para a defesa de seu
ponto de vista.

Texto I

O poema “Autopsicografia”, do poeta português Fernando Pessoa, é daqueles que muita gente sabe de cor - e
por isso mesmo gosta de relê-lo, escutá-lo ou declamá-lo. Por isso, vamos lê-lo juntos:
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Pergunto a meu leitor: quantas dores temos neste poema?


Vamos contar:
(1) a dor real do poeta, aquela que ele sente de verdade;
(2) a dor fingida pelo poeta a partir da dor verdadeira;
(3) a dor que o leitor lê no poema, que não é nem a que o poeta sentiu nem exatamente a que ele escreveu;
(4) a dor que o leitor sente ao ler o poema, diferente da dor que de fato sentia antes de ler o poema;
(5) a dor real do leitor, aquela que ele sentia antes de ler o poema.
Cinco dores, portanto. Qual delas é a mais verdadeira?
Num sentido, todas são verdadeiras. Em outro sentido, a mais intensa (e mais verossímil), para o poeta, é
aquela que ele fingiu e escreveu, porque tem a forma que lhe deu, enquanto que para o leitor a mais intensa (e
mais verossímil) é aquela que ele leu, porque esta lhe empresta a forma para o que sente, a qual, por sua vez,
difere do que sentia.
À arte não importa a verdade imanente ou essencial da “coisa”, mas sim a verdade subjetiva, isto é, a verdade
do interesse e da emoção. O fingimento proposto pelo poeta para o leitor é mais verdadeiro do que o
sentimento original, porque a dor fingida e então lida se torna uma dor que se pode reconhecer e com a qual
se pode conviver. Desse modo, ela é sentida como mais viva e mesmo mais real do que a dor à vera. Fernando
Pessoa é muito conhecido não só como autor de poemas antológicos como este, mas também como criador de
vários heterônimos, isto é, de poetas fictícios com estilos próprios e diferentes do seu. Um deles é o
romancista Bernardo Soares, autor do fabuloso “Livro do desassossego”. No fragmento 260 deste romance,
Bernardo Soares explica em prosa os versos de “Autopsicografia”.
À arte consiste em fazer os outros sentir o que nós sentimos, em os libertar deles mesmos, propondo-lhes a nossa
personalidade para especial libertação. O que sinto, na verdadeira substância com que o sinto, é absolutamente
incomunicável; e quanto mais profundamente o sinto, tanto mais incomunicável é. Para que eu, pois, possa
transmitir a outrem o que sinto, tenho que traduzir os meus sentimentos na linguagem dele, isto é, que dizer tais
coisas como sendo as que eu sinto, que ele, lendo-as, sinta exatamente o que eu senti. E como este outrem é, por
hipótese de arte, não esta ou aquela pessoa, mas toda a gente, isto é, aquela pessoa que é comum a todas as
pessoas, o que, afinal, tenho que fazer é converter os meus sentimentos num sentimento humano típico, ainda que
pervertendo a verdadeira natureza daquilo que senti.

Sua definição de arte é exemplar: libertar os outros de si mesmos, isto é, levá-los a transcender os limites
estreitos da sua individualidade. Para conquistar esta meta ambiciosa, o poeta precisa antes libertar-se de si
mesmo e dos seus próprios sentimentos, transcendendo os limites estreitos da sua própria individualidade. A
melhor metáfora deste processo são os heterônimos de Fernando Pessoa, que de a partir de si mesmo criou
várias “pessoas”.
Depois de definir o que entende por arte, Bernardo Soares pede ao leitor que imagine sentir uma vaga tristeza.
Se o leitor tentar traduzir essa emoção por frases sinceras e verdadeiras, quanto mais sinceras e verdadeiras
elas forem, menos ele conseguirá comunicar sua emoção aos outros, no máximo, provocará constrangimento
nas pessoas à volta.
Por analogia, peço eu ao leitor que experimente contar o sonho que teve nesta noite para todos os amigos
com que encontrar: todos, sem exceção, escutarão constrangidos, entediados ou irritados, na melhor das
hipóteses esperando impacientes que você acabe o seu sonho para eles poderem contar os seus e constrangê-
lo também.
Ora, o sonho é uma espécie de emoção íntima, e como tal incomunicável. É por isso que precisamos pagar
(caro) a alguém para ouvir os nossos sonhos. As emoções mais fortes e mais íntimas são igualmente
incomunicáveis. E, se não há como comunicá-las a outros, continuará Bernardo Soares, seria melhor senti-las
sem a escrever.
Se, todavia, o leitor deseja comunicar aquela emoção, aquela vaga tristeza que sente aos outros, isto é, fazer
dela arte, pois a arte é a comunicação aos outros da nossa identidade íntima com eles, ele deve procurar qual
emoção humana vulgar (ou seja, do vulgo, do povo) teria o tom e a forma daquilo que sente. Nesse instante o
leitor pode perceber que a emoção que produz na alma vulgar uma sensação equivalente à sua pode ser, por
exemplo, a saudade da infância perdida.
Leitor, essa é a chave para a porta do seu tema! Escreva e chore sua infância perdida; demore-se sobre os
pormenores da mobília da velha casa da avó no subúrbio; evoque a felicidade de ser livre por não saber pensar
nem sentir. Se esta evocação for bem feita como prosa, despertará no leitor uma emoção equivalente àquela
que sentiu, e que aliás não tinha nada a ver com infância.
Isso significa, prezado leitor, que você mentiu? Não, significa que você compreendeu e ainda ajudou seu
próprio leitor, por sua vez, a compreender. Porque:
A mentira, salvo a que é infantil e espontânea, e nasce da vontade de estar a sonhar, é tão-somente a noção da
existência real dos outros e da necessidade de conformar a essa existência a nossa, que se não pode conformar a
ela. A mentira é simplesmente a linguagem ideal da alma, pois, assim como nos servimos de palavras, que são sons
articulados de uma maneira absurda, para em linguagem real traduzir os mais íntimos e sutis movimentos da
emoção e do pensamento, que as palavras forçosamente não poderão nunca traduzir, assim nos servimos da
mentira e da ficção para nos entendermos uns aos outros, o que, com a verdade, própria e intransmissível, se
nunca poderia fazer.

Segundo Bernardo Soares, a verdade é não apenas não-toda, ou seja, não pode jamais ser completamente
apreendida; ela é também intransmissível, incomunicável. Por isso, precisamos comunicar uma ficção da
verdade como se ela fosse a verdade mesma. O fingimento, nesse sentido, é condição sine qua non da arte, da
própria vida e, por extensão, de toda forma de amor:
Fingir é amar. Nem vejo nunca um lindo sorriso ou um olhar significativo que não medite, de repente, e seja de
quem for o olhar ou o sorriso, qual é, no fundo da alma em cujo rosto se sorri ou olha, o estadista que nos quer
comprar ou a prostituta que quer que a compremos. Mas o estadista que nos compra amou, ao menos, o comprar-
nos; e a prostituta, a quem compremos, amou, ao menos, o comprarmo-la. Não fugimos, por mais que queiramos,
à fraternidade universal. Amamo-nos todos uns aos outros, e a mentira é o beijo que trocamos.

O trecho final do fragmento 260 do “Livro do desassossego” é forte. Fortíssimo, eu diria. O que Fernando
Pessoa e Bernardo Soares nos dizem (ainda que o segundo não exista a não ser como uma criação do primeiro)
é que, para tocarmos na compreensão dos outros, precisamos antes tornar-nos outros nós mesmos
precisamos “outrar-nos”, para usar o neologismo do próprio poeta. Em outras palavras, ao inventarmos a dor
que deveras sentimos para falarmos com nossos semelhantes tão diferentes, inventamo-nos como outra
pessoa e nos tornamos melhores do que de fato éramos.
Todo processo de sedução não passa por isso? João não tenta se mostrar como o homem ideal que Maria
deseja para ela? E Maria não tenta se mostrar como a mulher ideal que João deseja para ele? E neste processo
de sedução e fingimento não acontece de cada um deles se tornar mais parecido com o ideal um do outro, a
ponto de se tornarem melhores do que eram antes?
Não é a essa bela ficção que emprestamos o nome de: amor?

(BERNARDO, Gustavo. 2013. Conversas com um professor de literatura. Rio de Janeiro: Rocco, p. 142-147).

Texto II

“a literatura tem sido um instrumento poderoso de instrução e educação, entrando nos currículos, sendo
proposta a cada um como equipamento intelectual e afetivo. Os valores que a sociedade preconiza, ou os que
considera prejudicais, estão presentes nas diversas manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática. A
literatura confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de vivermos
dialeticamente os problemas.”

– Antonio Candido, do ensaio “O direito à literatura”, no livro “Vários escritos”. 3ª ed.. revista e ampliada. São
Paulo: Duas Cidades, 1995.

O direito à literatura

Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível, todas as criações de toque poético, ficcional ou
dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos de
folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das grandes civilizações.

Vista deste modo, a literatura aparece claramente como manifestação universal de todos os homens em todos
os tempos. Não há povo e não há homem que possa viver sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em
contato com alguma espécie de fabulação. Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de
passar as vinte e quatro horas do dia sem alguns momentos de entrega ao universo fabulado. O sonho
assegura durante o sono a presença indispensável deste universo, independente da nossa vontade. E durante a
vigília, a criação ficcional ou poética, que é a mola da literatura em todos os seus níveis e modalidades, está
presente em cada um de nós, analfabeto ou erudito – como anedota, causo, história em quadrinhos, noticiário
policial, canção popular, moda de viola, samba carnavalesco. Ela se manifesta desde o devaneio amoroso ou
econômico no ônibus até a atenção fixada na novela de televisão ou na leitura seguida de um romance.
Ora, se ninguém pode passar vinte e quatro horas sem mergulhar no universo da ficção e da poesia, a literatura
concebida no sentido amplo a que me referi parece corresponder a uma necessidade universal, que precisa ser
satisfeita e cuja satisfação constitui um direito.

Alterando o conceito de Otto Ranke sobre o mito, podemos dizer que a literatura é o sonho acordado das
civilizações. Portanto, assim como não é possível haver equilíbrio psíquico sem o sonho durante o sono, talvez
não haja equilíbrio social sem a literatura. Deste modo, ela é ator indispensável de humanização e, sendo assim,
confirma o homem na sua humanidade, inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e no
inconsciente. Neste sentido, ela pode ter importância equivalente à das formas conscientes de inculcamento
intencional, como a educação familiar, grupal ou escolar. Cada sociedade cria as suas manifestações ficcionais,
poéticas e dramáticas de acordo com os seus impulsos, as suas crenças, os seus sentimentos, as suas normas, a
fim de fortalecer em cada um a presença e atuação deles.

Por isso é que em nossas sociedades a literatura tem sido um instrumento poderoso de instrução e educação,
entrando nos currículos, sendo proposta a cada um como equipamento intelectual e afetivo. Os valores que a
sociedade preconiza, ou os que considera prejudiciais, estão presentes nas diversas manifestações da ficção,
da poesia e da ação dramática. A literatura confirma e nega, propõe e denuncia, apóia e combate, fornecendo a
possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas. Por isso é indispensável tanto a literatura sancionada
quanto a literatura proscrita; a que os poderes sugerem e a que nasce dos movimentos de negação do estado
de coisas predominante.

A respeito destes dois lados da literatura, convém lembrar que ela não é uma experiência inofensiva, mas uma
aventura que pode causar problemas psíquicos e morais, como acontece com a própria vida, da qual é imagem
e transfiguração. Isto significa que ela tem papel formador da personalidade, mas não segundo as convenções;
seria antes segundo a força indiscriminada e poderosa da própria realidade. Por isso, nas mãos do leitor, o livro
pode ser fator de perturbação e mesmo de risco. Daí a ambivalência da sociedade em face dele, suscitando por
vezes condenações violentas quando ele veicula noções ou oferece sugestões que a visão convencional
gostaria de proscrever. No âmbito da instrução escolar, o livro chega a gerar conflitos, porque o seu efeito
transcende as normas estabelecidas.

Numa palestra feita há mais de quinze anos em reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
sobre o papel da literatura na formação do homem, chamei a atenção entre outras coisas para os aspectos
paradoxais desse papel, na medida em que os educadores ao mesmo tempo preconizam e temem o efeito dos
textos literários. De fato (dizia eu), há “conflito entre a ideia convencional de uma literatura que eleva e edifica
(segundo os padrões oficiais) e a sua poderosa força indiscriminada de iniciação na vida, com uma variada
complexidade nem sempre desejada pelos educadores. Ela não corrompe nem edifica, portanto; mas trazendo
livremente em si o que chamamos o bem e o que chamamos o mal, humaniza em sentido profundo, porque faz
viver”.

A função da literatura está ligada à complexidade da sua natureza, que explica inclusive o papel contraditório,
mas humanizador (talvez humanizador porque contraditório). Analisando-a, podemos distinguir pelo menos
três faces:

(1) ela é uma construção de objetos autônomos como estrutura e significado;

(2) ela é uma forma de expressão, isto é, manifesta emoções e a visão do mundo dos indivíduos e dos grupos;

(3) ela é uma forma de conhecimento, inclusive como incorporação difusa e inconsciente.
Em geral pensamos que a literatura atua sobre nós devido ao terceiro aspecto, isto é, porque transmite uma
espécie de conhecimento, que resulta em aprendizado, como se ela fosse um tipo de instrução. Mas não é
assim. O efeito das produções literárias é devido à atuação simultânea dos três aspectos, embora costumemos
pensar menos no primeiro, que corresponde à maneira pela qual a mensagem é construída; mas esta maneira é
o aspecto, senão mais importante, com certeza crucial, porque é o que decide se uma comunicação é literária
ou não. Toda obra literária é antes de mais nada uma espécie de objeto, de objeto construído; e é grande o
poder humanizador desta construção, enquanto construção.

(https://www.revistaprosaversoearte.com/o-direito-a-literatura-antonio-candido/)

Texto III

A arte em geral e a literatura em particular não servem para nada? São atividades cuja grandeza reside nessa
sublime “inutilidade”? A fruição de uma pintura, de um poema, de uma obra de arte é apenas isso: fruição?

No entanto, o prazer que sentimos na leitura de um conto, de um romance, de uma crônica é um prazer
interessante e interessado. O prazer estético que a literatura proporciona nos torna mais atentos às dores e
aos odores da vida. Kafka dizia que um livro deve ser como “martelo que rompa a espessa camada de gelo”
sob a qual nos escondemos.

Afinal, para que serve a literatura? Para que escrever um texto, brincar com as palavras, conceber imagens,
metáforas? Para que criar diálogos entre seres inventados, descrever mundos paralelos, fazer jorrar e enxugar
lágrimas invisíveis? O professor francês Antoine Compagnon tem uma resposta simples e impactante: “quando
começamos a ler uma narrativa ou um poema corremos o risco de nos tornar diferentes do que éramos antes
dessa leitura”. A literatura nos transforma.

Educar é transformar

Leituras educadoras são aquelas que nos transformam, não só em leitores melhores, mas em pessoas mais
atentas ao próprio ato de viver. Essa transformação se opera, por exemplo, na maneira de ver o mundo.
Aprendemos a ver o que não víamos antes. Como nos fazem entender estes versos do poeta mineiro Murilo
Mendes:

As mãos veem, os olhos ouvem, o cérebro se move.

A luz desce das origens através dos tempos

E caminha desde já

Na frente dos meus sucessores (“Somos todos poetas”)

É como se nossa percepção ganhasse força. Nossa sensibilidade aumenta. O tato, a visão e a audição se
deslocam. O cérebro, preso aos lugares-comuns, começa a se mover para todos os lados. Experimentamos a
lucidez. Enxergamos o passado e o futuro mais nitidamente.

Tornamo-nos, assim, pessoas mais críticas, menos manipuláveis. Já não nos seduzem certas programações,
certos discursos, certas certezas. Até mesmo certas obras literárias se mostram insuficientes quando outras
leituras já nos ensinaram a escolher e a ler melhor. A ler melhor as linhas e as entrelinhas, a forma e o fundo, o
óbvio e o interpretável.

Não precisamos mistificar a leitura como se o toque mágico da palavra literária operasse milagres! Mas é um
fato constatável que ler mais e melhor nos ajuda a vencer algumas submissões. Lendo com frequência,
tendemos a exigir, de nós mesmos e de nossos interlocutores, uma clareza maior ao falar, mais sutileza ao
pensar, um pouco mais de originalidade ao viver.

Resistir ou desistir?

Do que fala a literatura, afinal de contas? Ainda que se refira a outros planetas, a outras sociedades, a outras
terras, a outros seres, é sempre de mim que a literatura fala. De mim e de você. É sempre de nossas esperanças
e desesperos que ela fala. É da nossa humanização e da nossa desumanização que ela fala. Lendo
intensamente, sentimo-nos intensamente visados. Reforçamos nossa autoconsciência. E daí brota a vontade
de resistir.

A “desistite” é uma doença da alma que nos faz abrir mão da responsabilidade de viver. Uma existência sem
sentido nos leva à desistência. Desistimos de encontrar nos meandros dos significados comuns, que dormem
durante décadas no dicionário, um sentido especial para prosseguir no jogo da vida, na leitura da vida.

Desistir é também desistir de pensar. A leitura educadora, em contrapartida, convida à resistência, ao uso da
inteligência, ao desejo da experiência, ao sentido da urgência. Um personagem complicado denuncia minhas
complicações. Um verso cheio de ambiguidades me interroga. Vou buscar meu tempo perdido. Vou respirar
meu sopro de vida. Vou contar meus cem anos de solidão.

Num tempo em que a atividade dos professores parece ter sido substituída pela informação abundante e pelo
entretenimento onipresente, a literatura pode vir em nosso auxílio. Porque, nela, é possível encontrar
caminhos para a formação de si mesmo e para o reencontro com nossos semelhantes que são, em última
análise, nossos dessemelhantes.

Resistir tem a ver com o reconhecimento de quem nós somos. O nosso autorreconhecimento. É de justiça (e
isso ninguém discute) que os outros reconheçam o nosso valor. Mas se não formos nós os primeiros a
reconhecê-lo, nada feito. Nós valemos, em boa medida, aquilo que lemos. Nossas leituras fazem parte de nossa
identidade. Somos o que lemos e o modo como lemos. Gostar de ficção nos aproxima da realidade.

O músico Jorge Mautner costuma dizer que existem dois tipos de imbecis: “os imbecis que não leem, e os
imbecis que leem”. A diferença é a seguinte: os que leem conhecem a extensão da imbecilidade própria e
alheia, ao passo que os que não leem ignoram até mesmo a sua lamentável situação. Os que fogem da leitura
mal desconfiam que andam perdidos em todos os espaços.

As perguntas retornam: para que serve mesmo a literatura? Será uma disciplina entre as outras? Ou uma coisa
belamente inútil?

Gabriel Parissé é professor, palestrante, tradutor e escritor brasileiro, mestre em Literatura Brasileira (USP) e
doutror em Filosofia da Educação (USP).

( https://revistaensinosuperior.com.br/para-que-serve-a-literatura/)

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