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FERNANDO PESSOA

• «Ortónimo»: personalidade
poética que mantém o nome
“Fernando Pessoa.”
• Heterónimos: diferentes
personalidades com biografia e
características próprias criadas por
Fernando Pessoa.
FERNANDO PESSOA - ORTÓNIMO

• Coexistem duas vertentes diferentes:


a tradicional e a modernista.
- Tradicional: continuador da poesia
tradicional portuguesa
(reminiscências dos contos de fadas,
cantigas de embalar e toadas do
romanceiro).
FERNANDO PESSOA - ORTÓNIMO

Linguagem / forma:
verso curto (5 e 7 sílabas métricas),
quadra e quintilha (gosto pelo popular),
rima ( cruzada)
símbolos (predomínio da metáfora)
musicalidade, ritmo embalatório,
encavalgamentos e linguagem sóbria.
FERNANDO PESSOA - ORTÓNIMO
- Modernista
(após a colaboração na revista Orpheu)
Marcado por fases diversas, desde o
Paulismo ao Intersecionismo.
Intelectualização das emoções e dos
sentimentos / ausência de sentimentalismo,
fragmentação do eu, nostalgia da infância.
- Linguagem / forma: irregularidade
métrica e estrófica; linguagem simples e
sóbria.
FERNANDO PESSOA - ORTÓNIMO
• Negação da ideia romântica do poeta
como um confessor, que se desnuda
aos olhos do leitor.
• O poeta é um ser predestinado. Brinca
intelectualmente com as emoções.
• Estas são elevadas a um plano
superior de arte, o de objeto artístico.
Autopsicografia

“Estudo ou descrição
da própria alma
do poeta.”
Autopsicografia
O poeta é um fingidor.

• Afirmação do tipo axiomático


(máxima, aforismo).

• Forma verbal no presente – ideia de


permanência.
Autopsicografia
O poeta é um fingidor.
• “fingidor”:
- aquele que engana (sentido denotativo);
- que pinta, desenha ou constrói (etimologia);
- aquele que intelectualiza as emoções, no ato
da criação poética (sentido conotativo);
- Assume-se a criação poética como um
processo puramente intelectual e fruto da
imaginação de quem escreve.
Autopsicografia
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

• Finge, fingir, dor, sente


- Para que as sensações se transformem em
arte, tem de haver um processo de
transfiguração através da razão
(fingimento poético).
Autopsicografia
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
- A tese é confirmada através da dor.
- Transforma-se a “dor sentida/real” em “dor
fingida/intelectualizada”, através da linguagem
poética.
Autopsicografia
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

- A dor real, segundo Pessoa, não cabe no


universo poético.
- Para que esta aceda a plano superior da arte,
deverá ser filtrada pela razão.
Autopsicografia
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

- A concretização da dor no poema opera na memória do


poeta o retorno à sua dor inicial, parecendo-lhe a dor
imaginada/racionalizada mais autêntica do que a dor
real.
- O poeta valoriza a dor “fingida” em relação à dor real:
sobreposição da arte ao plano da realidade
Autopsicografia
1ª estrofe
- A arte nasce da realidade, a dor deveras
sentida;
- a criação poética consiste no fingimento
dessa realidade (a dor fingida ou
intelectualizada) objetivada em palavras;
- a intelectualização é expressa de forma
tão artística que parece mais autêntica do
que a realidade.
Autopsicografia
E os que leem o que escreve

- Os leitores
(quem usufrui da obra criada);
Autopsicografia
Na dor lida sentem bem
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

- Aquando da receção do poema, os


leitores não sentem a dor real nem a
dor “fingida” do poeta.
Autopsicografia
Na dor lida sentem bem
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

- Também não sentem a dor real, mas


outra, fruto da sua interpretação
pessoal, da sua identificação com o
escritor, que não é real, isto é, não a
têm verdadeiramente.
Autopsicografia
- A poesia não está na dor experimentada mas no
fingimento dela.
- Para se elevar ao plano de arte, tem de ser fingida,
imaginada, expressa em linguagem poética.
- Mas o poeta tem de partir da dor real, “a que deveras
sente”.
- Um doente, ao relatar ao médico a sua dor real, não
está a fazer poesia.
- Assim, não há arte sem imaginação/racionalização, sem
que o real seja imaginado de forma a exprimir-se
artisticamente.
Autopsicografia
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

- “E assim:” natureza conclusiva;


- Dois polos da criação:
“razão” (território onde se constrói o poema)
“coração” (universo das emoções e sentimentos)
Autopsicografia
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

- Metáfora:
“comboio de corda” / “coração”
que “gira” “nas calhas de roda”
“a entreter a razão”
Autopsicografia
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

- Metáfora:
O coração está associado à função de
entretenimento, à função lúdica da poesia (poeta
/ leitores).
Autopsicografia
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

- Fecha-se um círculo em que nunca se esgota a


dinâmica do jogo
da
sensação/emoção vs. imaginação/razão.
Autopsicografia
Linguagem
- Simples e selecionada.
- Formas verbais no presente (ideia de permanência),
noção teórica do poema.
- Três advérbios de significado semelhante:
“Finge tão completamente” (o poeta)
“que deveras sente” (o poeta)
“Na dor lida sentem bem” (os leitores)
- Aproveitamento das capacidades expressivas das
palavras e repetição intencional de algumas.
Autopsicografia
Linguagem
- Utilização de símbolos (“as calhas”: dependência do “sentir”
em relação ao “pensar”).
- Ligação por meio do síndeto entre a 2ª e 3ª estrofes.
- “Teve” (v. 7): marca a prioridade temporal em que o poeta
experimentou as suas dores em relação ao presente (em que
o leitor experimenta a dor lida).
- “a entreter” (v. 10): aspeto durativo – repetição continuada do
processo criativo.
- Metáforas (v. 1 e vv. 9-12).
- Perífrase (v. 5).
- Poliptoto (vv. 1-3).
Autopsicografia
Forma
- Versos em redondilha maior (7 sílabas);
- Feição rítmica e popular.
- Quadras.
- Encavalgamento / transporte.
- Rima cruzada.
Autopsicografia
Título
- A teoria da criação poética, exposta no poema,
de valor universal, porque aplicável a todo o
verdadeiro poeta, foi elaborada por via da
introspeção, através da qual Pessoa
experimentou o processo em si próprio.

- O título aponta para o palco da experimentação e


verificação de uma teoria poética de valor
universal.
Autopsicografia
Tema
- “Fingimento poético”

- Sinceridade humana / sinceridade artística ou


intelectual
Autopsicografia
Em conclusão
- Na perspetiva de Pessoa, o poema nasce da
síntese entre o sensorial e o intelecto, devendo
prevalecer este último.
- Assim, poetar é um jogo intelectual, cabendo ao
poeta, esse fingidor por excelência, intelectualizar
(racionalizar / fingir) as emoções, elevando-as ao
plano superior de arte e transformando-as em
objeto artístico.

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