Você está na página 1de 10

CAPACIDADE BIOCIDA DAS TINTAS LÁTEX PREDIAIS:

SUGESTÕES PARA AS NORMAS BRASILEIRAS

Breitbach, Aécio de Miranda(1) ; Thiesen, Écio Aurélio(2) ; Albuquerque,


Plinio(3) ; Costa, Cleide (4); Gaylarde, C(5).

1: Engenheiro Civil e Consultor e-mail:ambreitbach@terra.com.br;


2: Revestir Tintas e Texturas Ltda e-mail:ecio@tintasrevestir.com.br
3: PPG Industrial do Brasil: palbuquerque@ppg.com
4: Arxada do Brasil Especialidades Quimicas Ltda. e-mail: cleide.costa@lonza.com
5: Oklahoma University, Norman, OK 73019, USA. e-mail:cgaylarde@gmail.com

1
Palavras chaves: manifestação patológica, pintura, fachada, infestação biológica,
biofilmes.

RESUMO: As manifestações patológicas de pintura e repintura externa em


edificações têm sido frequentes e vem prejudicando o desempenho deste tipo de
acabamento final, muito utilizado por sua facilidade de aplicação, redução da
permeabilidade do substrato, efeito decorativo e custo acessível.
A contaminação por microrganismos sobre o filme seco, mesmo após limpeza da
velha superfície por hidrojateamento, tem sido motivo de descrédito deste sistema
de acabamento final de fachadas. As normas brasileiras da ABNT conseguem
garantir a sanidade de tais superfícies, considerando apenas os microrganismos de
maior frequência. É necessário reconhecer o grande avanço técnico representado
pelo estabelecimento de normas neste setor, nas últimas décadas. Este artigo
relata o estudo de um caso de severa infestação biológica em Florianópolis (SC),
onde a influência marinha e climática, característica desta cidade, é considerada
como agravante. Em termos geológicos a ilha de Santa Catarina, onde está
Florianópolis, é resultante da formação de um arquipélago com metade do seu
território composto por morros, dunas, mangues, restingas e lagunas,
proporcionando microclimas subtropicais favoráveis ao desenvolvimento de algas,
fungos e cianobactérias de diversas espécies. A partir da análise de tal
contaminação sobre a pintura é apresentado um diagnóstico, que aponta para
ineficiência dos agentes biocidas da tinta, que embora estejam em conformidade
com as normas vigentes, é apontado como agente causador do dano. Finalmente
são apresentadas diretrizes que visam proporcionar uma melhora no desempenho
do sistema de pintura.

1. INTRODUÇÃO

Enunciado do problema

A contaminação por microrganismos em pinturas e repinturas prediais tem ocorrido


com maior frequência e a identificação de sua gênese, de parte dos envolvidos na
cadeia produtiva e de aplicação das tintas, não tem acompanhado este
crescimento. O domínio técnico sobre capacidade antimicrobiana dos materiais de
pintura predial está mais no campo da biologia do que da engenharia civil.
Prevalece o senso comum de que a pintura apresenta vida útil curta e que somente
uma repintura periódica é capaz de manter preservada a estética predial. Isto não
tem contribuído para gerar conhecimento a partir dos danos ocorridos. Com o
surgimento de legislação protetiva ao consumidor, como o Programa Brasileiro de
Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-h), como a Lei Federal 8.078/1990 –
Direitos do Consumidor e como a NBR 15.575/2013- Edificações habitacionais-
Desempenho, os fabricantes de tinta passaram a dar mais atenção ao desempenho
de seus produtos. Apesar disso, ainda não conseguiram garantir a qualidade
Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
desejada em relação à prevenção aos ataques microbiológicos, por uma série de
fatores os quais serão abordados neste trabalho.

Contaminação microbiana de superfícies pintadas

Existem muitos trabalhos publicados sobre os microrganismos oriundos do


ambiente que aderem às superfícies pintadas, formando um biofilme, uma película
complexa composta por vários microrganismos (e.g., Gaylarde and Gaylarde, 2025;
Zyska et al., 1988; Lonhi et al., 2019; Ravikumar et al., 2012 e suas referencias;
Obidi and Okekunjo, 2017; Allsopp et al., 2016). Quase todos os grupos de
microrganismos podem ser encontrados dentro deste biofilme, desde os fototróficos
como algas e cianobactérias, os quais não precisam de matéria orgânica para
crescer, até os fungos, que utilizam compostos orgânicos para seu crescimento. As
bactérias foram apontadas como as primeiras colonizadoras (Albertano et al.,
2003), tendo uma taxa de crescimento maior que as algas e os fungos, e 2
produzindo fontes nutritivas para os fungos. O filme seco de tinta também fornece
substâncias nutritivas para as bactérias não-fotossintéticas, levando a um biofilme
inicial que inclui elas e as cianobactérias. As algas necessitam de luz e água para
seu crescimento, mas crescem de forma relativamente lenta e em lugares muito
úmidos; são frequentemente os organismos predominantes nas bases de prédios,
onde a água da chuva coletada acumula.

Agentes antimicrobianos utilizados em tintas

Todas as tintas contêm os mesmos componentes básicos: um agente aglomerante


(resina), pigmentos, aditivos, cargas e um solvente. No caso de tintas látex, o
solvente é água. Os demais ingredientes (aproximadamente 5% do total) incluem
os biocidas, os quais podem ter objetivo de proteger a tinta em lata ou o filme
seco. Não existe um só biocida que sirva para todas as tintas, capaz de inibir todos
os organismos danificadores e se mostra compatível com os regulamentos
governamentais (Gaylarde et al., 2011). Um exemplo sem efeitos colaterais, que
pode ser utilizado com outras moléculas no filme seco, é o inibidor de fotossíntese,
Igarol,(2-(metiltio)-4-(tert-butilamino)-6-(ciclopropilamino)-s-triazina) que se
utiliza para inibir o crescimento das algas. Outras misturas de biocidas
frequentemente utilizadas para proteger o filme seco são a isotiazolinona, 3-iodo2-
propilbutil butilcarbamata (IPBC), junta com N- (3,4-diclorofenil)-N,N-dimetilurea
(diuron), ou duas isotiazolinonas, 2-octil-3(2H)-isotiazolinona (OIT) com 4,5-
dicloro-2-n-octil-4-isotiazolino-3-ona (DCOIT). Compostos com mais de dois
biocidas também são utilizados. Atualmente existem muitas pesquisas exitosas no
desenvolvimento de substâncias biocidas amigáveis ao meio ambiente, mas ainda
sem utilização imediata, dependendo de mais desenvolvimento para a sua
utilização em tintas.

Dificuldades enfrentadas na repintura dos prédios no Brasil

No Brasil, as tintas são produzidas praticamente com a mesma formulação para


serem comercializadas e aplicadas em qualquer ponto do vasto território nacional.
Frente à enorme diversidade biológica e climática do país, é compreensível que
estas tintas apresentem desempenho microbiológico desigual e insatisfatório nas
diferentes regiões. Foi destacado por Shirakawa et al. (2011) a diferença entre os
microrganismos crescendo nas superfícies pintadas em diferentes áreas climáticas
do estado de São Paulo. O mesmo grupo de pesquisas identificou uma diferença
enorme entre os biofilmes em São Paulo e os desenvolvidos em superfícies pintadas
em Belém, uma cidade quente e com muita umidade. A relação pigmento:volume
(PVC) e a presença de biocida se mostraram ser menos importantes no crescimento
fúngico e, especialmente, o das cianobactérias que as condições climáticas de
iluminação, temperatura e umidade (Shirakawa et al., 2010). No entanto, estas
pesquisas citadas acima foram realizadas utilizando-se amostras de alvenaria
Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
pintados preparados no laboratório, já limpos e esterilizados. Na vida real, o
substrato cimentício das edificações modernas nunca será estéril nem tão limpo.
Com a volatização dos componentes presentes no substrato, que a princípio inibem
o crescimento microbiológico, com o tempo, passa a se tornar uma superfície de
ancoramento para a formação de biofilmes. Sua preparação para receber a pintura
é a primeira providência para garantir sua ancoragem no substrato poroso,
principalmente em primeira pintura. Nas repinturas, a limpeza do substrato é
determinante para remover a sujeira, o pó resultante da degradação do filme da
tinta e os microrganismos existentes. O clima brasileiro dominante subtropical
favorece a degradação do filme de tinta. Nas repinturas não há mais porosidade
aparente disponível capaz de proporcionar uma nova e forte ancoragem. A pintura
externa de edificações é a solução de acabamento final mais empregada em
decorrência de seu baixo custo e desempenho satisfatório, pelo menos durante os
primeiros anos. Em função de sua simplicidade de aplicação, nem sempre as
melhores práticas são utilizadas, o que pode provocar diversas manifestações 3
patológicas. Algumas deficiências intrínsecas à formulação das tintas, como baixo
teor de biocidas para filme seco, ou mesmo utilização de biocidas ineficientes,
levam a redução da vida útil e consequente repintura em maior frequência do que a
necessária.

Preparação para a repintura

A preparação do substrato das fachadas para repintura inicia pela lavagem por
hidrojateamento para remoção mecânica das sujeiras e contaminações biológicas
existentes. Em ambientes urbanos os gases da combustão dos motores dos
veículos impregnam as fachadas misturando-se com névoa salina marítima, como
em Florianópolis. Assim o biofilme resultante da simbiose entre diversos
microrganismos recebe a interferência dos cloretos e da deposição de resíduos da
combustão de combustíveis fósseis. Os cloretos inibem o crescimento da maioria
dos microrganismos, levando ao crescimento dos halofílicos (Gaylarde et al., 2017)
e as emissões de veículos podem servir como fonte nutritiva para as bactérias e os
fungos (Sáiz-Jiménez, 1997). De tal forma somente a eficiente remoção destes
agentes é capaz de proporcionar um substrato limpo capaz de receber a formação
de novo filme de tinta látex que tenha aderência e durabilidade. A remoção
deficiente destes agentes pode até acelerar a degradação do novo filme de tinta,
que possui carbono como fonte de alimento preferencial. Sendo assim, além da
remoção mecânica deve ser buscada a remoção também química destes agentes.
Os fungos migram suas hifas para o interior do revestimento argamassado,
perfurando o filme de tinta, e ressurgem com avidez, consumindo o carbono novo
disponibilizado pela repintura, caso não sejam eliminados, elevando a alcalinidade.
As algas são organismos fototróficos que se desenvolvem sobre o filme de tinta,
sem agredi-la diretamente, embora aumentem a retenção de água com seu efeito
danoso. A aplicação de solução de cloreto de sódio é uma providência simples,
eficiente e de baixo custo, que após 15 dias da lavação simples e secagem pode
eliminar tais hifas. De tal forma, a sanitização prévia do substrato é determinante
do sucesso da repintura, embora Shirakawa et al (2012) tenham constatado que as
cianobactérias podem resistir a hidrojateamento, diferente dos fungos.

2. Estudo de Caso

2.1. Descrição do ambiente da pesquisa e repintura

Trata-se de um prédio de apartamentos com 2.800 m2 de área de fachada e 16


pavimentos, posicionado em centro de terreno elevado, afastado 580 m do mar, na
região central de Florianópolis. O local é totalmente urbanizado e a edificação está
cercada por muitos outros prédios, conforme Figuras 1 a) e b).

Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
4

Figura 1a – Localização do prédio, conforme assinalado. Figura 1b - Vista da


edificação.

Para repintura predial as suas fachadas foram lavadas por hidrojateamento e


aplicação com rolo de lã de carneiro de solução de hipoclorito de sódio, com 10 a
12% de princípio ativo e diluído em água 30%. Algumas restaurações de reboco e
corrosão de armaduras foram realizadas previamente. Foi aplicada tinta texturizada
acrílica branca e depois tinta acrílica Premium lisa emborrachada, na cor palha. A
desinfecção do substrato executada não pode ser condenada, pois as fachadas
foram desinfetadas em conformidade e não se mostravam com aspecto visível de
contaminação prévia alguma, quer antes ou depois da limpeza. Ou seja, a
sanitização foi realizada mesmo não sendo identificada visualmente contaminação
biológica prévia.

2.2. Caracterização da causa da infestação

No final dos trabalhos já era possível identificar a formação inicial de uma


contaminação intensa e localizada de microrganismos, conforme mostrado pelas
fotografias 2 até 5, tomadas 30 a 60 dias após a conclusão dos serviços. Os muros
e equipamentos do térreo, que foram pintados por último, começaram a apresentar
sinais de contaminação primeiro, e em alguns locais das fachadas também,
principalmente em algumas floreiras, fotografia 6.

Fotografia 2 - Contaminação de muro Fotografia 3 - Contaminação no


térreo

Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
A figura formada pela contaminação sugere a existência de halos sem
contaminação, fotografia 3. A contaminação, após 60 dias, não evoluiu mais,
estabilizando.

Fotografia 4 - Contaminação da casa Fotografia 5 - Contaminação da


do gás floreira

Na região em torno desta edificação não havia prédios com contaminação


semelhante, que pudesse ser causa de recontaminação. Duas outras hipóteses,
para explicar a contaminação ocorrida, foram analisadas. A primeira supunha que
as tintas empregadas pudessem estar contaminadas e a outra pressupunha que
tais microrganismos já estivessem no substrato e não tivessem sido removidos de
forma eficiente.
A contaminação não era superficial, pois
estava contida dentro da tinta, mostrada
pela remoção de uma amostra da
superfície pintada (fotografia 7). Os
fabricantes das tintas foram acionados e
começaram a estudar e investigar o
ocorrido conjuntamente.

2.3. Testes e avaliações

O fabricante da tinta emborrachada

Fotografia 6 - Floreiras com inicio de


contaminação na fachada

apresentou resultado parcial de


identificação dos microrganismos
existentes, dando conta da presença de
bactérias (Bacillus sp) e de fungo
(Penicillium sp). No entanto, não foi
capaz de identificar naquele momento
outro fungo por deficiência de Fotografia 7 - Amostra removida para
reprodução, e se propôs a reanalisar. análise.
Foi sugerida também a realização de
um teste de eficiência da tinta usada submetida aos fungos identificados. O
fabricante da textura apresentou resultado de ensaio contra fungos de seu produto,
Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
constatando sua eficiência contra os microrganismos previstos em norma brasileira,
pelo Laboratório de Serviço Técnico Thor Brasil Ltda., através do Relatório Serviço
Técnico Nº. 211/03.21. Mais adiante, o fabricante da textura apresentou
identificação de microrganismos contaminantes do local, sob Nº 106470/2021A,
produzido pelo Controlbio (www.controlbio.com.br) Assessoria Técnica
Microbiológica S/S Ltda., com a seguinte identificação de fungos: Verticillium
tenerum (encontrado mundialmente em solos); Alternaria alternata e A. fumigatus,
os quais podem ser encontrados no ar, o A. fumigatus sendo causador de doenças
respiratórias séries em pessoas com o sistema imunológico debilitado
(https://sigarra.up.pt/fmup/pt/ noticias_geral.ver_noticia?p_nr=726), e Aspergillus
tubingensis, um agente degradante natural de fosfatos em rochas (Reddy et al.,
2002) e de polímeros como poliuretano (Khan et al., 2017).

Depois, a fabricante da tinta emborrachada apresentou o resultado de um ensaio


de laboratório indicando ter havido uma contaminação menor de 10% sobre seu 6
produto, com os fungos existentes nas fachadas. A NBR 15.987/2020 considerava a
amostra como resistente quando a contaminação fosse menor que 10%. Hoje em
dia tal norma foi alterada e não aceita mais qualquer taxa de contaminação,
indicando a flexibilidade das normas em função das experiências dos usuários.

Finalmente o fabricante apresentou um relatório dizendo que sua tinta


emborrachada atende às especificações técnicas de fabricação, através do Relatório
Microbiológico TSR CC2021_272, elaborado pela Arxada do Brasil Especialidades
Químicas Ltda. e constata que o microrganismo, agora identificado e existente no
prédio mediante ensaio realizado, é o fungo Acremonium sclerotigenum. Tal
microrganismo não está previsto na lista de resistência e desempenho aplicado às
tintas pelas normas NBR 15.987-2016 e NBR 15.987-2020, que contempla apenas
os fungos Aspergillus niger (ATCC6275), muito comum no ar, e Talaromyces
pinophilus (ATCC11797), um colonizador das folhas de plantas. De fato este último
microrganismo não é de neutralização prevista em norma brasileira para tintas.

Existem cerca de 150 espécies conhecidas de fungo Acremonium que degradam


matéria orgânica e reciclam nutrientes. Ele requer alto nível de umidade para
crescer. Então é uma das causas de danificação pela água em edificações, inclusive
em seus ambientes internos onde pode causar infestação. Banheiros, lavanderias e
porões são os locais de preferência, mas infiltrações também abrigam com
facilidade tais organismos. Podem se desenvolver em condensação de água e
dentro dos aparelhos de ar condicionado. O fungo Acremonium pode contaminar
superficialmente a pele humana. Pode infectar mais profundamente através de
cortes e ou arranhões na pele, chegando a crescer dentro do corpo. Espécies
mortais de Acremonium já foram identificadas em infecções de pacientes pós-
cirúrgicos em hospitais, onde o sistema de condicionamento de ar era a fonte de
contaminação. A espécie Acremonium sclerotigenum é um organismo encontrado
em solos, no mar, em plantas e também na comida humana, onde foi identificado
como agente de deterioração resistente ao calor (Summerbell et al., 2018).

3. Análise e discussão dos resultados

A literatura técnica consultada (https://scientiapt.com/-acremonium) relata


crescimento lento do fungo Acremonium, o que contradiz com o ocorrido. A forma
de identificação de microrganismos cientificamente aceita tradicionalmente é
através do incremento de seu crescimento nos meios de cultura artificiais no
laboratório. Ocorre que a amostra de tinta aplicada enviada ao laboratório
possivelmente estava contaminada com uma mistura de vários microrganismos.

Ao fornecer alimento em cultivo da amostra foi propiciado o crescimento daqueles


microrganismos que mais se alimentarem e se reproduzirem nestes meios
artificiais, mesmo não sendo os agentes dominantes da amostra. Isto pode
Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
distorcer o resultado de identificação que se busca. Ou seja, precisamos identificar
com exatidão o microrganismo causador do dano e não o mais capaz de sobreviver
em ambiente controlado.

Os microrganismos que cresceram em nosso meio podem ser comparados com eles
mostrados por microscopia direta no estudo realizado no Campus da UFSC
(BREITBACH, 2009), onde foram identificados os seguintes microrganismos em
superfícies pintadas com tinta látex acrílica e monitoradas durante 12 meses:
Fungo Cladosporium; fungo Alternaria; cianobactérias Gloeocapsa e Scytonema;
alga Trentepohlia; bactérias gram positivas actinomicetos; algas e cianobactérias
cocóides não identificadas. Já o fabricante da textura informou ter identificados os
seguintes fungos em fachadas na região da grande Florianópolis, Penicilium sp;
Aspergilus sp; Alternaria e Mycelia Sterilia.

Não há relatos de identificação de Acremonium sclerotigenum em nossa região. De 7


tal forma resta incerta a gênese da infestação em relação aos produtos utilizados,
já que a mão de obra obedeceu aos preceitos básicos. A tinta texturada havia sido
descartada como causadora da infestação, em função dos ensaios apresentados.

A reinfecção de superfícies pintadas de prédios já foi estudada por Shirakawa et al.


(2004). Fungos e células fototróficas foram identificados antes e durante um ano
depois da pintura de duas fachadas de prédios no campus universitário de São
Paulo. A desinfecção com hipoclorito de sódio e jateamento a alta pressão resultou
numa redução nos números dos microrganismos presentes de pelo menos 85%.
Depois da limpeza, a tinta foi aplicada com o sem uma biocida (0.25% w/w)
composta de carbendazim, N-octil 2H-isothiazolin-3-ona e N-(3,4-diclorofenil)N,N-
dimetil ureia. A presença do biocida reduziu a colonização fúngica por até 10 meses
em um prédio, mas no outro não fazia diferença estatística. O principal
contaminante fúngico era o género Cladosporium. Depois de 10 meses, o
Aureobasidium também apareceu, associado com uma descoloração preta. Nas
fachadas de ambos prédios, os fungos foram detectados antes dos organismos
fototróficos, diferente de várias citações científicas (Bravery, 1988; Wee, 1988;
Vázquez-Nion et al., 2016; Fuentes et al., 2022).

Um ano após hidrojateamento e repintura dos prédios universitários, a MEV


mostrou células fúngicas presentes nas superfícies pintadas e também entre a
camada velha e a nova da pintura, bem como entre a pintura velha e a argamassa
(Shirakawa et al., 2002). Este desenvolvimento de fungos entre as camadas de
tinta também foi constatado por Labres (2019). Provavelmente, significa que a
sanitização realizada antes da pintura não foi eficiente em remover todos os
microrganismos existentes.

3.1. Técnica de restauração

Frente à contaminação inusitada ocorrida, alguns testes de sanitização foram


realizados e o processo proposto pela Tintas Revestir o processo que finalmente
logrou melhor êxito foi o seguinte:

Etapa 1:
1. Descontaminação química com aplicação de hipoclorito de sódio com o mínimo
de 10% de cloro ativo em solução 1:1, resultando 5% de ativo final;
2. Aplicação da solução com uso de rolo de lã de carneiro ou pulverização por
aspersão, umedecendo bem a superfície para proporcionar maior contato do agente
químico com as contaminações;
3. Lavação de toda a superfície descontaminada para remover possíveis resíduos da
solução, no mínimo uma hora após sua aplicação.

Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
Etapa 2:
1. Aplicação de Fundo Bloqueador de Contaminações (produto composto por
resina acrílica modificada, aditivos, micro biocidas não metálicos de amplo espectro
e água) em demão única, em toda a superfície da fachada;
2. Aplicação de impermeabilizante emborrachado com dosagem biocida, em demão
única;
3. Aplicação da tinta látex acrílica emborrachada, com algicidas e fungicidas, na cor
palha.

3.2. Avaliação da restauração

Tanto o corpo do prédio como muros e demais dependências do térreo foram


sanitizados e repintados, conforme técnica anteriormente apresentada. Houve
eliminação completa da contaminação sem ressurgimento, como anteriormente
ocorrido, conforme fotografias 8 e 9m tomadas seis meses após a repintura. 8

Fotografia 8 - Casa do gás restaurada Fotografia 9 – Salão de Festas do térreo


(fotografia 4) restaurado (fotografia 3)

4. Recomendações e conclusão

Não foi possível identificar a origem da contaminação havida, mas foi possível, após
conhecer os microrganismos atuantes, sanitizar e restaurar a pintura. Notório é que
as normas brasileiras não contemplam repelência a amplo espectro de agentes
biológicos, o que nos conduz a tintas em conformidade normativa que não atendem
às necessidades da diversidade bioclimática brasileira.

De tal forma, resta aos fabricantes regionais de tintas procurarem atender a


demanda por maior eficiência biocida, em função de sua proximidade com o
ambiente e com o mercado.

A pesquisa e o conhecimento dos fenômenos de contaminação biológica atípicos,


em pinturas prediais, só avançam mediante relato de experiências havidas e troca
de informações entre fabricantes e consumidores, como neste caso.

Em repinturas prediais o intervalo entre a assepsia do substrato e a aplicação de


um fundo preparador aditivado de biocidas, deve ser o mais breve possível para
evitar recontaminação. Para superfícies novas recomenda-se a aplicação de selador
ou fundo preparador tão logo o reboco complete os 28 dias, pois a superfície vai
perdendo alcalinidade o que facilita a colonização por microrganismos.

Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BARBOSA, Rodrigo Porto; DA SILVA, Raul; GRITTI, Aline Rodrigues; RAMALHO,


Vanessa; Aspergilose pulmonar invasiva causada por Aspergillus fumigatus, Revista
Saúde em Foco, Faculdade Santo Agostinho, Teresina (PI), – Edição nº 11, p.463-
467,2019. Disponível em:https://portal.unisepe
.com.br/unifia/wpcontent/uploads/sites/10001/2019/04/40_ASPERGILOSE-
PULMONAR-INVASIVA-CAUSADA-POR-ASPERGILLUS-FUMIGATUS.pdf
BREITBACH, Aécio de Miranda; Avaliação da influência das cores sobre a
biodeterioração da pintura externa. Dissertação mestrado, Faculdade de Engenharia
UFSC, Florianópolis (SC), p.99. 2009. Disponível em:
https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/92387.
9
SHIRAKAWA, M.A., TAVARES, R.G., GAYLARDE, C.C., TAQUEDA, M.E.S., LOH, K. e
JOHN, V.M., 2010. Climate as the most important factor determining anti-fungal
biocide performance in paint films. Science of the Total Environment, 408(23),
pp.5878-5886.
GAYLARDE, C.C., MORTON, L.H.G., LOH, K. and SHIRAKAWA, M.A., 2011.
Biodeterioration of external architectural paint films–A review. International
Biodeterioration & Biodegradation, 65(8), pp.1189-1198.
SHIRAKAWA, M.A., John, V.M., GAYLARDE, C.C., GAYLARDE, P. E GAMBALE, W.,
2004. Mould and phototroph growth on masonry facades after repainting. Materials
and structures, 37(7), pp.472-479.
SHIRAKAWA, M.A., LOH, K., JOHN, V.M. e GAYLARDE, C.C., 2012. Resistance of
cyanobacterial fouling on architectural paint films to cleaning by water jet. Current
microbiology, 64(4), pp.312-316.
SHIRAKAWA, M.A., LOH, K., JOHN, V.M., SILVA, M.E.S. e GAYLARDE, C.C., 2011.
Biodeterioration of painted mortar surfaces in tropical urban and coastal situations:
Comparison of four paint formulations. International Biodeterioration &
Biodegradation, 65(5), pp.669-674.
SHIRAKAWA, M.A., GAYLARDE, C.C., GAYLARDE, P., GAMBALE, W. E JOHN, V.M.,
2002. Fungal Colonization In The Paint Interfaces Of A Building Façade. In
INTERNATIONAL CONFERENCE ON DURABILITY OF MATERIALS AND COMPONENTS
(Vol. 9).
LABRES, H.S., 2019. Análise da biodeterioração de sistemas de fachadas e a
eficácia de tintas na inibição do desenvolvimento fúngico. Acesado a: repositorio.
jesuita.org.br no 16 setembro, 2022.
ALBERTANO, P., MOSCONE, D., PALLESCHI, G., HERMOSIN, B., SAIZ-JIMENEZ, C.,
SANCHES-MORAL, S., HERNANDEZ-MARINÉ, M., URZI, C., GROTH, I.,
SCHOROECKH, V. E SAARELA, M., 2003. Cyanobacteria attack rocks (CATS):
control and preventive strategies to avoid damage caused by cyanobacteria and
associated microorganisms in Roman hypogean monuments. Em: Saiz-Jimenez C
(ed) Molecular biology and cultural heritage. Swets and Zeitlinger BV, Lisse, pp
151–162, 287
GAYLARDE, C.C. e GAYLARDE, P.M., 2005. A comparative study of the major
microbial biomass of biofilms on exteriors of buildings in Europe and Latin America.
International biodeterioration & biodegradation, 55(2). pp, 131-139.
ZYSKA, B.J., CIEPLIK, Z.T., KWIATKOWSKA, D., WICHARY, H.M. e KOZLOWSKA,
R., 1988. Fungal Colonization of Organic Coatings in Cotton Mills. In
Biodeterioration 7. Springer, Dordrecht. pp. 486-492

Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil
LONDHE, S., PATIL, S., KRISHNADAS, K., SAWANT, A.M., YELCHURI, R.K. e
CHADA, V.G., 2019. Fungal diversity on decorative paints of India. Progress in
Organic Coatings, 135, pp. 1-6.
RAVIKUMAR, H.R., RAO, S.S. e KARIGAR, C.S., 2012. Biodegradation of paints: a
current status. Indian Journal of Science and Technology, 5(1), pp. 1977-1987.
OBIDI, O. e OKEKUNJO, F., 2017. Bacterial and fungal biodeterioration of discolored
building paints in Lagos, Nigeria. World Journal of Microbiology and Biotechnology,
33(11), pp. 1-9.
ALLSOPP, D., SEAL, K., GAYLARDE, C., BENTO, F.M., SHIRAKAWA, M, SAAD, DS,
2016. Introdução a Deterioração [Introduction to Biodeterioration], Porto Alegre,
UFRGS Editora. pp. 107-110.
GAYLARDE, C., BAPTISTA-NETO, J.A., OGAWA, A., KOWALKI, M., CELIKKOL-AYDIN,
S. e BEECH, I., 2017. Epilithic and endolithic microorganisms and deterioration on 10
stone church facades subject to urban pollution in a sub-tropical climate. Biofouling,
33(2), pp. 113-127.
SÁIZ-JIMÉNEZ, C., 1997. Biodeterioration vs biodegradation: the role of
microorganisms in the removal of pollutants deposited on historic buildings.
International Biodeterioration & Biodegradation, 40(2-4), pp. 225-232.
KHAN, S., Nadir, S., SHAH, Z.U., SHAH, A.A., KARUNARATHNA, S.C., XU, J., KHAN,
A., MUNIR, S. e HASAN, F., 2017. Biodegradation of polyester polyurethane by
Aspergillus tubingensis. Environmental pollution, 225, pp. 469-480.
REDDY, M.S., KUMAR, S., BABITA, K. e REDDY, M.S., 2002. Biosolubilization of
poorly soluble rock phosphates by Aspergillus tubingensis and Aspergillus niger.
Bioresource technology, 84(2), pp. 187-189.
SUMMERBELL, R.C., GUEIDAN, C., GUARRO, J., ESKALEN, A., CROUS, P.W., GUPTA,
A.K., GENÉ, J., CANO-LIRA, J.F., VAN IPEREN, A., STARRINK, M. e SCOTT, J.A.,
2018. The Protean Acremonium. A. sclerotigenum/egyptiacum: Revision, food
contaminant, and human disease. Microorganisms, 6(3), pp. 88.
BRAVERY, A.F., 1988. Biodeterioration of paint—a state-of-the-art comment. In
Biodeterioration 7, Springer, Dordrecht, pp. 466-485
WEE, Y.C., 1988. Growth of algae on exterior painted masonry surfaces.
International Biodeterioration, 24(4-5), pp. 367-371.
VÁZQUEZ-NION, D., RODRIGUEZ-CASTRO, J., LÓPEZ-RODRIGUEZ, M.C.,
FERNADEZ-SILVA, I. e PRIETO, B., 2016. Subaerial biofilms on granitic historic
buildings: microbial diversity and development of phototrophic multi-species
cultures. Biofouling, 32(6), pp. 657-669.
FUENTES, E., VÁZQUEZ-NION, D. e PRIETO, B., 2022. Laboratory development of
subaerial biofilms commonly found on buildings. A methodological review. Building
and Environment, p.109451. doi.org/10.1016/j.buildenv.2022.109451

Capacidade biocida das tintas látex prediais- - Sugestões para norma brasileira - Congresso Internacional de Tintas
ABRAFATI SHOW 21-23NOV2023 – São Paulo (SP) - Brasil

Você também pode gostar