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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS PASTAGENS NATURAIS

(Holechek et al., 2001)


DEFINIÇÃO DE PASTAGENS NATURAIS

Pastagens naturais são todas as áreas do mundo que não são ocupadas por
desertos áridos, cultivos agrícolas, cobertas por solo nú, rocha, gelo ou concreto. A
maior parte das pastagens naturais não é apropriada ao cultivo, mas todas as pastagens
naturais são capazes de propiciar habitat para animais domésticos e silvestres. Portanto,
pastagem natural pode ser definida de modo geral como uma terra não cultivável que é
capaz de proporcionar as condições mínimas necessárias para a vida de animais
pastejadores e/ou ramoneadores. O principal processo que caracteriza as pastagens
naturais é a herbivoria e, embora o manejador possa estar interessado num leque de
potencialidades da pastagem natural, o foco principal está sobre os animais pastejadores
ou ramoneadores.
Em razão das constantes mudanças nacionais e internacionais nos valores
econômicos e sociais, o percentual total das terras do globo ocupado com pastagens
naturais pode variar de uma ano para outro. Portanto, é precipitado definir todas as
pastagens naturais como sendo impróprias para o cultivo. Contudo, a maior parte das
pastagens naturais ao redor da Terra não suportará o cultivo, devido a limitações como
baixa precipitação, solos rasos, topografia acidentada e/ou temperaturas muito baixas.

DEFINIÇÃO DE MANEJO DE PASTAGENS NATURAIS

Manejo de pastagens naturais é a manipulação de componentes das pastagens


naturais para obter a combinação ótima de bens e serviços para a sociedade, numa base
sustentável. Os dois componentes básicos do manejo de pastagens naturais são: (1) a
proteção e o aumento da complexidade do solo e da vegetação e (2) a manutenção ou
melhoria da geração de produtos aproveitáveis, como carne, fibra, madeira, água e vida
silvestre.
A profissão do manejador de pastagens como um todo e do manejador de
pastagens naturais em especial é peculiar entre as vocações agrícolas pelo fato de lidar
com a interface planta-animal, mais do que lidar com plantas ou animais isoladamente.
A característica que distingue o manejo de pastagens naturais é que ele lida com a
manipulação do pastejo exercido pelos herbívoros, de modo que a produção vegetal e
animal serão mantidas ou elevadas. Práticas de manejo de pastagens naturais
restringiam-se à manipulação da intensidade, da freqüência e da época do pastejo, a fim
Este material foi desenvolvido pelo Dr. Magno José Duarte Cândido, professor da Universidade Federal
do Ceará, Campus do Pici, Departamento de Zootecnia.
de amenizar impactos adversos sobre o solo e a vegetação. Mais recentemente, o
conceito de manejo de pastagens naturais se ampliou e passou a abranger também a
manipulação de outros componentes dos ecossistemas de pastagens naturais além do
rebanho, tais como o fogo, a vida silvestre e as atividades humanas. Ainda assim, o foco
principal do manejo de pastagens naturais permanece sendo o rebanho em pastejo.
O manejo das pastagens naturais está alicerçado em cinco conceitos básicos:
1) A pastagem natural é um recurso renovável;
2) A energia do sol é capturada pelas plantas verdes que, por sua vez, podem ser
colhidas pelo animal em pastejo;
3) As pastagens naturais suprem os humanos com alimento e fibra a um custo muito
inferior, quando comparado àqueles associados às terras cultivadas;
4) A produtividade de determinada pastagem natural é determinada pelas suas
características edáficas, topográficas e climáticas;
5) Uma variedade de produtos, incluindo alimento, fibra, água, recreação, vida silvestre,
minerais e madeira podem ser obtidos das pastagens naturais.

RELAÇÃO ENTRE O MANEJO DE PASTAGENS NATURAIS E OUTRAS DISCIPLINAS

O manejo de pastagens naturais difere de outras disciplinas pelo fato de que ele
integra num sistema unificado conhecimentos oriundos de diversas disciplinas. Os
componentes básicos do manejo de pastagens naturais podem ser categorizados em
fatores biológicos, físicos e antropológicos. Inicialmente, os manejadores lidaram com o
componente biológico, particularmente as plantas, estudando a resposta de comunidades
de plantas ao pastejo. Contudo, rapidamente se percebeu que a resposta da comunidade
de plantas ao pastejo não podia ser entendida sem o conhecimento dos processos
fisiológicos individuais das plantas. Como a produtividade das plantas depende da
interação entre clima e solo, assim como da influência do pastejo, a necessidade de uma
compreensão adicional acerca do ambiente físico tornou-se evidente.
Como diferentes espécies de animais afetam o ecossistema de pastagens naturais
de forma distinta e como a produtividade animal não entre ecossistemas de pastagens
naturais, há a necessidade também de um entendimento do comportamento e das
exigências nutricionais de animais domésticos e silvestres, a fim de maximizar sua
produtividade. Ademais, como o manejo de pastagens naturais enseja a geração de
produtos úteis ao homem, considerações sociais, econômicas, culturais e tecnológicas
são uma parte importante do processo decisório no manejo de pastagens naturais.
Este material foi desenvolvido pelo Dr. Magno José Duarte Cândido, professor da Universidade Federal
do Ceará, Campus do Pici, Departamento de Zootecnia.
IMPORTÂNCIA DAS PASTAGENS NATURAIS PARA O HOMEM

Explosão Demográfica da Humanidade

Um dos principais problemas que afeta a humanidade atualmente é o aumento


populacional estimado para os próximos 50 anos (Tabela 1.1). Apesar dos programas de
planejamento familiar e controle de natalidade desenvolvidos em inúmeros países, há
uma expectativa de que a população mundial atinja 11 bilhões antes da sua
estabilização. Embora em muitos países desenvolvidos, como nos EUA, haja um
excesso de produção de alimentos, nos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos
a escassez de alimentos ainda é um problema importante e deve perdurar por décadas.
Dessa forma, na maior parte dos países ao redor do globo as pastagens naturais têm
assumido uma importância crescente a cada dia.

Tabela 1.1 - Crescimento e densidade da população humana em várias partes do mundo

Crescimento anual % Tempo para dobrar Hab./Km2


Mundo 1,4 51 46
África 1,5 48 27
Kênia 2,1 34 51
Sudão 2,9 25 14
China 1,0 72 135
Índia 1,8 40 337
Europa 0,3 240 106
Am. Norte 1,4 51 16
Canadá 1,2 60 4
México 1,9 38 52
EUA 1,0 72 30
Oceania 1,5 48 4
Austrália 1,1 65 3
N. Zelândia 1,1 65 14
Am. do Sul 1,4 51 20
Argentina 1,3 55 13
Brasil 1,4 51 20
Fonte: FAO (1998)
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do Ceará, Campus do Pici, Departamento de Zootecnia.
Área da Terra e Produção de Forragem

Independentemente da forma como os valores são interpretados, as pastagens


naturais são o principal tipo de terra ao redor do mundo. Segundo dados da FAO de
1998, 11% das terras mundiais são áreas agrícolas, 24% são pastagens, 31% são
florestas, 34% são desertos, áreas glaciais, picos montanhosos, terras urbanas e/ou
industrializadas e desses 34%, 4-5% são áreas cobertas por concreto (casas, cidades,
estradas pavimentadas etc.). Se todas as terras atualmente sob pastejo por animais
domésticos forem consideradas, as pastagens naturais representam 50% do total da
superfície terrestre. E se todas as terras não cultivadas mas com potencial para suportar
o pastejo por animais domésticos forem contabilizadas, as pastagens naturais perfazem
em torno de 70% do total das terras do globo (Tabela 1.2).

Tabela 1.2 - Porcentagem de fazendas produtoras de grãos, pastagens cultivadas,


florestas e pastagens naturais

Culturas Pastos permanentes Florestas Potencial p/ P.N.


Mundo 11 25 29 70
África 6 30 23 69
Kênia 4 7 4 91
Sudão 5 24 20 87
China 10 42 13 77
Índia 52 4 20 33
Europa 28 17 32 53
Am. Norte 13 17 32 66
Canadá 5 3 35 64
México 13 38 21 70
EUA 20 26 31 61
Oceania 5 56 18 66
Austrália 6 60 14 69
N. Zelandia 2 53 26 90
Am. Do Sul 6 28 46 74
Argentina 10 51 21 75
Brasil 7 22 58 77
Fonte: FAO (1998)
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do Ceará, Campus do Pici, Departamento de Zootecnia.
Geração de produtos animais

Pastagens naturais têm um importante papel em suprir a população mundial com


produtos animais em todas as regiões do globo não cobertas pelo gêlo. A Índia tem a
maior população mundial de bovinos e a China de caprinos. Porém, os EUA são os
líderes na produção de carne bovina e a China de carne ovina. Austrália é a líder na
produção de lã. Na Índia, embora haja o maior rebanho bovino do mundo, não há um
grande abate e consumo de carne bovina, por razões religiosas. Lá a principal utilidade
do gado é como força de tração. A África tem duas vezes o rebanho bovino americano,
mas apenas 1/3 do total de carne comercializada nos EUA. Em grande parte dos países
africanos, os povos nômades consideram o gado um símbolo de riqueza, não sendo
aproveitado para o abate. Contudo 80 a 90% da energia consumida pelos povos
nômades africanos vêm da carne, do leite e do sangue fornecido pelo seu próprio
rebanho. Estes animais também podem ser utilizados como moeda de troca para a
aquisição de outros gêneros alimentícios. A manutenção de grande rebanho como forma
de status também foi o caso dos índios norte-americanos com relação aos eqüinos antes
da constituição do Estado Federativo Norte-americano. Neste último caso, ocorreu a
degradação de muitas áreas de pastagens naturais pelo superpastejo e há o risco de que
tal fato se repita na África e no Semi-árido Brasileiro.
O problema da degradação de pastagens naturais pelo superpastejo é
preocupante principalmente na maior parte dos países em desenvolvimento, onde nos
próximos 25 anos espera-se um declínio na disponibilidade de pastagens naturais devido
à conversão de parte delas em áreas agrícolas.
Nos países desenvolvidos, especialmente nos EUA, como há excesso de
produção de alimentos para a população, as pastagens naturais estão adquirindo outros
valores, já que não há grande demanda para a extração de alimentos das mesmas. Em
tais países outros produtos oriundos das pastagens naturais estão sendo enfatizados.

Vida silvestre

As pastagens naturais são o primeiro habitat para a maioria dos animais


silvestres com grande valor para produção de carne, caça e apreciação estética. Seu
valor econômico está sendo crescentemente reconhecido em países desenvolvidos e em

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desenvolvimento. No Texas (EUA) a renda gerada com a venda de caça pode chegar a
exceder a renda com a venda de animais do rebanho em algumas fazendas. No Kênia, a
renda obtida com apreciação dos animais silvestres pelos turistas é de crucial
importância para a economia do país. A própria carne de animais silvestres abatidos tem
potencial para consumo humano em muitos países africanos. Em muitos países, como
nos EUA, a possibilidade de exploração de animais silvestres para o abate está
condicionada à atividade agrícola. Onde esta última usa tecnologia que permite uma
produção excedente, não há grande demanda da população por alimentos de origem
animal, reduzindo a necessidade de utilização das pastagens naturais para rebanhos
domésticos e favorecendo a manutenção e exploração racional dos animais silvestres
nessas áreas.

Água

Em regiões como na Califórnia (EUA), em que a população humana cresce


rapidamente, mas condições de aridez ou semi-aridez prevalecem, água está tornado-se
um produto das pastagens naturais mais importante que a produção de forragem. A
condição do complexo solo-vegetação na qual a chuva cai tem grande influência na
qualidade e quantidade da água disponível para o consumo humano. Práticas de manejo
das pastagens naturais podem afetar o fluxo de rios e córregos; a taxa de sedimentação
nos reservatórios; quantidade de coliformes nos sedimentos dos reservatórios, rios e
córregos; e a qualidade da água captada em outras terras que pode se armazenada em
reservatórios.

Recreação

O adensamento populacional em muitas regiões tem tornado as pastagens


naturais atrativas como lugar para propósitos recreativos, como caminhadas, cavalgadas,
camping, piquenique, caça, pescaria, parques temáticos (cultura sertaneja) etc.

Produtos vegetais

As pastagens naturais proporcionam uma grande variedade de plantas que


podem trazer inúmeros benefícios para a sociedade. Espécies tolerantes ao estresse
salino (como a erva-sal, Atriplex canescens) podem ser utilizadas como forragem em
terras com seca prolongada e/ou com salinidade excessiva (como as áreas de perímetro
Este material foi desenvolvido pelo Dr. Magno José Duarte Cândido, professor da Universidade Federal
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irrigado manejadas incorretamente). Neste último caso, espécies tolerantes ao estresse
salino podem ser usadas para a remoção de parte do excesso de sal da área. Pode-se
obter alguma renda com a venda de arbustos ornamentais (cactáceas de modo geral,
Agave). A Jojoba (Simmondsia chinensis) pode substituir o óleo de baleia na indústria
de lubrificantes. Algumas espécies podem conter ligas de borracha para fabricar pneus.
Outras podem ser usadas como plantas medicinais (anticancerígenas) etc.

Madeira e minério

Madeira e elementos minerais são importantes produtos de pastagens naturais. No caso


de minerais, como o pastejo tem pouco efeito, decisões a respeito da sua exploração
podem ser tomadas apenas pelo geólogo e têm que passar por uma autorização
governamental. Já no caso da madeira, como sua produção pode sofrer influência do
pastejo, as estratégias de manejo do pastejo e da atividade silvícola devem ser definidas
conjuntamente entre o engenheiro florestal e o manejador de pastagens.

Espaço aberto

A perda de espaço está emergindo como um dos maiores problemas ambientais


do século XXI nos países desenvolvidos. Nos EUA, a população dos estados de Utah,
Novo México, Arizona, Idaho e Colorado (região desértica do interior do continente)
elevou-se em 25% nos últimos dez anos, com a afluência de parte da população de
regiões costeiras do Atlântico e do Pacífico. As áreas de pastagens naturais mantidas
sob preservação não são apenas apreciáveis ao espírito humano mas também têm um
importante papel na purificação do ar e da água e servem de habitat para espécies
animais e vegetais raras.

DESERTIFICAÇÃO

Desertificação é a formação de condições desérticas, em grande parte como


conseqüência da ação do homem, em áreas que não possuem clima desértico. A
produtividade é comprometida enquanto as condições adversas permanecerem na área.
Atividades humanas que causam desertificação incluem pastejo sem controle do
manejador, queima, desmatamento, cultivos intinerantes e o abandono de terras áridas e
semi-áridas.
Este material foi desenvolvido pelo Dr. Magno José Duarte Cândido, professor da Universidade Federal
do Ceará, Campus do Pici, Departamento de Zootecnia.
Dados climáticos têm mostrado que a seca é um problema recorrente em regiões
desérticas. Contudo, os efeitos da seca sobre a vegetação têm se ampliado e as secas
mais recentes têm sido mais severas que as secas ocorrentes no passado. Com o
aumento da pressão populacional sobre as áreas áridas e semi-áridas, as práticas
racionais de manejo das pastagens naturais têm potencial podem minimizar ou até
reverter o processo de desertificação em muitas áreas.

Este material foi desenvolvido pelo Dr. Magno José Duarte Cândido, professor da Universidade Federal
do Ceará, Campus do Pici, Departamento de Zootecnia.

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