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PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO No , DE 2009

(Do Sr. WILSON PICLER)

Acrescenta o § 4º ao art. 208 da


Constituição Federal.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado


Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte
emenda ao texto constitucional:

Art. 1º O art. 208 da Constituição Federal passa a vigorar


acrescido do § 4º com a seguinte redação:

"Art. 208. ...


....................................................................................
§ 4º - O Poder Público regulamentará a educação
domiciliar, assegurado o direito à aprendizagem das
crianças e jovens na faixa etária da escolaridade
obrigatória por meio de avaliações periódicas sob
responsabilidade da autoridade educacional. (NR)”
Art. 2º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data
de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O debate sobre a educação domiciliar tem se


intensificado nos últimos anos em nosso País. Em primeiro lugar, isso vem
ocorrendo porque mais de um caso de pais que optaram por educar seus filhos
em casa se transformou em notícia nacional na medida em que foi questionado
judicialmente.
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Em 2001, a família Vilhena Coelho de Anápolis, em


Goiás, impetrou mandado de segurança para garantir o direito de ensinar em
casa seus três filhos, à época com 9, 8 e 6 anos de idade. Formalmente
matriculadas numa escola privada, as crianças não freqüentavam as aulas,
recebiam instrução em casa dos pais e iam ao colégio apenas para a entrega
de trabalhos e realização de provas. Com a ação judicial, a família buscou o
reconhecimento estatal da modalidade do ensino domiciliar e a emissão do
certificado quando os filhos concluíssem o ensino fundamental. A polêmica
chegou ao Supremo Tribunal Federal e a Suprema Corte do País indeferiu o
direito pretendido, evocando a Constituição Federal.

Mais recentemente foi a vez da família Andrade Nunes


em Timóteo, no interior de Minas Gerais. Em 2006, uma denúncia anônima
levada ao Conselho Tutelar deu início a batalha judicial pelo direito de educar
em casa os dois filhos, então com 14 e 15 anos de idade. Em decorrência
desse fato, o casal responde a dois processos – um cível, por infringir o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), onde corre o risco de perder a
guarda dos filhos, e outro penal, por crime de abandono intelectual, conforme
previsto no art. 246 do Código Penal Brasileiro. No primeiro, já houve uma
condenação quando o casal foi obrigado a rematricular os filhos na escola e a
pagar multa de 12 salários mínimos. Mas não desistiram e recorreram da
sentença. Em 2008, os meninos foram aprovados no vestibular de Direito de
uma faculdade particular em Ipatinga e o resultado desse exame serve agora
como defesa nos processos judiciais contra seus pais. E foi no processo
criminal que a Justiça determinou que os meninos sejam avaliados por provas
aplicadas pela Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, o que foi
comemorado pelo casal como uma vitória. Segundo eles, pela primeira vez, a
Justiça admitiu a possibilidade de se provar que não há abandono intelectual
no ensino domiciliar.

O terceiro caso é o da família Faria da Silva em Maringá,


no noroeste do Paraná. O pai, professor universitário, decidiu junto com a mãe
educar os filhos, hoje com 10 e 8 anos, em casa, e não matriculá-los na escola
regular, responsabilizando-se por sua alfabetização e aprendizagem formal.

Em segundo lugar, o debate também se intensifica


porque, no Congresso Nacional, tramitam Projetos de Lei que se propõem
legalizar a educação domiciliar no Brasil. Na Câmara dos Deputados,
encontram-se em apreciação dois Projetos com esse objetivo. São eles o PL nº
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3.518, de 2008, dos Deputados Henrique Afonso e Miguel Martini e, apensado,


o PL nº 4.122, de 2008, do Deputado Walter Brito Neto. Na discussão desses
projetos na Comissão de Educação e Cultura da Câmara, foi realizada no dia
15 de outubro de 2009 audiência publica sobre o ensino domiciliar com a
presença do Ministério da Educação, das duas famílias que educam seus filhos
em casa – os Andrade Nunes e os Faria da Silva – e também com a
participação de outros dois professores universitários.

Entretanto, independentemente dos argumentos


favoráveis ou contrários à educação domiciliar, na interpretação dos
especialistas a Constituição Federal não permite sua adoção no Brasil.

De acordo com a interpretação vencedora entre os


operadores do Direito – Ministério Público e Poder Judiciário, o que a lei
prescreve no Brasil é a matrícula no ensino formal. Em consequência, o Estado
tem o dever de intervir nas situações em que a criança ou o adolescente estão
fora da escola. Portanto, segundo o ordenamento constitucional vigente, os
pais que decidem não matricular seus filhos na escola e educá-los em casa,
estariam infringindo princípios constitucionais, contrariando o Código Penal,
ferindo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB).

Assim, se queremos viabilizar a educação domiciliar em


nosso País necessário se faz alterar o texto constitucional. Mas... por que
tornar constitucional a educação domiciliar no Brasil?

A chamada educação domiciliar é adotada em vários


países como Austrália, Canadá, França, Inglaterra, Irlanda, Suíça, e alguns
Estados dos Estados Unidos da América. Nos EUA, a adesão ao
homeschooling (ensino domiciliar) hoje reúne mais de 1 milhão de adeptos. A
Unesco contabiliza que, ao todo, existiriam no mundo 2 milhões de crianças
nesse sistema de ensino.

Na Irlanda, é na Constituição do País que se reconhece o


direito da família de escolher a educação de seus filhos, podendo provê-la em
casa ou numa escola privada ou numa escola mantida pelo Estado. O Estado
não pode obrigar os pais a enviar seus filhos a nenhum determinado tipo de
escola, mas, como guardião do bem comum, deve assegurar que as crianças
recebam um mínimo de educação moral, intelectual e social.
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É para dar consequência a princípios já consagrados na


Constituição Federal de 1988 que formulamos a presente alteração do texto
constitucional. É a Constituição que estatui, no artigo 205, ser “A educação,
direito de todos e dever do Estado e da família (...)”, no artigo 209, que “O
ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I -
cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e
avaliação de qualidade pelo poder público.“, e no artigo 210, que “Serão
fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar
formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais
e regionais.”

Em consonância a esses princípios constitucionais, a Lei


nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional (LDB), art. 23, caput, dispõe que “A educação básica
poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância
regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na
competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização,
sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar”.

Com base nesses dispositivos, em nosso entendimento é


possível amparar a experiência da educação domiciliar em nosso País, por um
lado, com base nos princípios fundamentais da cidadania e da dignidade da
pessoa humana, assegurando aos pais e responsáveis o direito de escolher o
tipo de educação que querem dar a seus filhos e, por outro lado, garantindo às
crianças e aos adolescentes o direito à educação, ou seja, à aprendizagem dos
conteúdos mínimos fixados para os ensinos fundamental e médio obrigatórios,
com a recente extensão da obrigatoriedade do ensino também à faixa etária
correspondente ao ensino médio pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009.
Para isso, é necessário que o Estado regulamente o direito à educação
domiciliar, de tal forma que os pais ou responsáveis possam obter da
autoridade competente a autorização para educar seus filhos em casa e que as
crianças e jovens sejam regularmente avaliados pela rede oficial de ensino e,
como em algumas experiências internacionais, a renovação dessa autorização
esteja condicionada ao seu bom desempenho nessas avaliações. Cumpridas
essas condições, não há porque o Estado não permitir às famílias brasileiras
que assim o desejarem que seus filhos ou tutelados sejam educados em casa.
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Na formulação dessa Proposta de Emenda à


Constituição, optamos por acrescentar novo parágrafo ao art. 208 do texto
constitucional dispondo que o Poder Público regulamentará a educação
domiciliar no Brasil, mas desde já fixando na Constituição que deverá ser
assegurado o direito à aprendizagem por meio de avaliações periódicas sob
responsabilidade de autoridade educacional. E é claro que tal modalidade de
educação só se justifica como alternativa na faixa da escolaridade obrigatória,
agora ampliada para a faixa etária dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de
idade.

Certos de que somente a iniciativa da alteração


constitucional abrirá definitivamente o caminho para a educação domiciliar no
Brasil, esperamos contar com o apoio de nossos ilustres Pares para a
aprovação da presente Proposta de Emenda à Constituição.

Sala das Sessões, em de de 2009.

Deputado WILSON PICLER

PDT/PR

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