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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA

INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DE SÃO BERNARDO DO


CAMPO (SP)

ÓTAVIO HENRIQUE ALVINO ROCHA, nascido em 29 de


outubro de 2019, filho de VALDINEIA ALVINO PIRES e EDELSON
ROCHA DOS SANTOS, representado por sua genitora, brasileira,
divorciada, auxiliar de limpeza, portadora da cédula de identidade RG nº
37.848.154-X, inscrita no CPF/MF sob o n.º 071.102.246-19, residente e
domiciliada na Avenida Nova Esperança, n.º 38, Bairro dos Alvarengas, CEP
09857-050, São Bernardo do Campo - SP, por meio da Defensoria Pública
do Estado de São Paulo, dispensada da apresentação de instrumento de
mandato, conforme artigo 128, inciso XI, da Lei Complementar nº 80/1994,
vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fulcro nos
artigos 5°, inciso LXIX, 6º, 205 e 208, inciso IV, da Constituição Federal,
artigos. 3º, 4º, 53 e 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente e artigo 1°
e seguintes da Lei 12.016/09, impetrar,

MANDADO DE SEGURANÇA, com pedido de liminar

em face do SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO


BERNARDO DO CAMPO, com endereço à Rua Wallace Simonsen, nº 222,
Nova Petrópolis, São Bernardo do Campo, Estado de São Paulo, CEP 09771-
210, sendo interessado o órgão de representação judicial do MUNICÍPIO DE
SÃO BERNARDO DO CAMPO, localizado no Paço Municipal - 13º andar, CEP
09750-901, Centro, São Bernardo do Campo, São Paulo, pelos motivos de
fato e de direito a seguir expostos.

I – DOS FATOS

O impetrante é criança que conta atualmente com 05


(cinco) meses de idade.

Considerando que os genitores do impetrante precisam


trabalhar e que a criança precisa de alguém que cuide de suas necessidades
durante esse período e de sua educação, a genitora dirigiu-se a esta
Unidade da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, solicitando
providências para matricular o filho em creche no período integral, próxima
à sua residência, especificamente, na EMEB FRANCISCO DIASSIS
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GOMES TEIXEIRA, uma vez que efetuou inscrição de matrícula no dia 23
de janeiro de 2020 e não houve resposta à solicitação de matrícula.

Diante dessa situação, foi realizada uma pesquisa ao


Município, que informou que a criança, encontra-se inscrita para o ano
letivo de 2020, para a classe de Berçário Inicial, na Unidade escolar EMEB
FRANCISCO DIASSIS GOMES TEIXEIRA e se encontra em lista de
espera, na 13ª posição, nos termos da Resolução SE nº 17/2019.

Considerando o patente descumprimento do dever da


Administração Pública de oferecer vagas em unidade de educação infantil,
para efetivação do direito fundamental à educação, foi necessário o
ajuizamento desta demanda para que se cumpra, por determinação judicial,
o mandamento constitucional. Não podendo aguardar por mais tempo a
demora na disponibilização da vaga, pois esta constitui omissão ilegal e
abusiva, violando direito fundamental de acesso ao ensino infantil gratuito,
que, inclusive, é obrigatório.

Destaque-se, por oportuno, que o impetrante é de família


carente, de parcos recursos financeiros, e seus genitores não possuem
condições de pagar por esse serviço em estabelecimento privado, mormente
quando os preços cobrados estão muito acima do padrão de vida usufruído
pela família da criança.

Nesse contexto, encontra-se a criança relegada ao


descaso do Poder Público Municipal na prestação de atividade essencial para
o pleno desenvolvimento físico e intelectual.

O ato exarado pela autoridade coatora constitui afronta a


direito líquido e certo da impetrante. Senão vejamos.

II – DO DIREITO

A Constituição da República em seu art. 6º prevê como


primeiro direito social básico a educação.

Em capítulo especial (artigos 205/214), a Constituição da


República determina que a educação, direito de todos e dever do Estado,
será provida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.

O art. 208, da Magna Carta, dispõe que o dever do Estado


com a educação será efetivado mediante a garantia de educação infantil,
em creche e pré-escola.

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e


Culturais do qual o Brasil é signatário, em seu art. 13 dispõe:

“Art. 13. 1. Os Estados-partes no presente Pacto


reconhecem o direito de toda pessoa à educação.
Concordam em que a educação deverá visar ao pleno
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desenvolvimento da personalidade humana e do sentido
de sua dignidade e a fortalecer o respeito pelos direitos
humanos e liberdades fundamentais...
2. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem que,
com o objetivo de assegurar o pleno exercício desses
direitos: a) A educação primária deverá ser obrigatória e
acessível gratuitamente a todos”.

Já no sistema regional de proteção dos direitos humanos,


dispõe o art. 19, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos:

“Art. 19. Toda criança terá direito às medidas de proteção


que a sua condição de menor requer, por parte da sua
família, da sociedade e do Estado”.

Se o Brasil ratificou os pactos acima, não há porque dizer


que será cumprido na medida do possível, já que tal alegação viola
disposição do próprio instrumento, o que demonstra que a assinatura nada
mais é do que uma decisão política e não jurídico-obrigacional.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal n°


8.069/90) também regula o direito à educação (Capítulo IV, arts. 53/59),
reiterando princípios e garantias já postos pela Constituição da República, e
estendendo e criando direitos.

Deste modo, no que importa ao caso em exame, destaca-


se o artigo 54, inciso IV, da Lei n° 8.069/90 que garante à criança o
atendimento em creche e pré-escola. Acerca de tal assunto explica a
doutrina:

“O inciso IV, por sua vez, diz ser também dever do Estado
assegurar creche e pré-escola às crianças de zero a seis
anos de idade. O acerto dessas garantias dispensa
maiores comentários, por sabermos o valor e a
necessidade de que se revestem. A creche e a pré-escola
devem figurar como imprescindíveis nos campos da
assistência e da educação. (...)
O § 1º do art. 54 estabelece, com invulgar clareza que “o
acesso ao ensino obrigatório e gratuito”, é “direito público
subjetivo”, porquanto é faculdade assegurada a pessoas
nas Constituições Federal e estadual, assim como nas leis
orgânicas dos Municípios e na legislação ordinária,
enquanto o § 2º o complementa, esclarecendo e
determinando que a não oferta do ensino obrigatório pelo
Poder Público e o seu não oferecimento regular ensejam
aos prejudicados a busca de mecanismos judiciais para
responsabilizar as autoridades competentes.”
(VASCONCELOS, Helio Xavier de. Estatuto da Criança e do
Adolescente Comentado. 11. ed. Ed. Malheiros. p. 267 e
268).
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Assim, tendo prioridade absoluta a criança em frequentar
a escola infantil, não pode a Municipalidade negar ou demorar
demasiadamente para a concessão da vaga, causando grave violação ao
direito fundamental da criança de ter acesso ao ensino público.

Vale ressaltar que, não há que se falar em violação à


separação de poderes. A discricionariedade do Poder Executivo é
extremamente restringida quando se trata de políticas públicas para a
garantia de direitos fundamentais ao ser humano. É pacífica a judicialização
destas políticas.

O Poder Judiciário, integrante do Estado, tem o dever de


fazer cumprir os objetivos e fundamentos da República Federativa do Brasil.

Ressalte-se que o Poder Judiciário, quando assim atua, o


faz para garantir a Democracia, já que os serviços públicos, utilizados em
especial pelos pobres, são de baixa prioridade pelo Executivo, violando o
direito das minorias (ou maioria no Brasil). A jurisprudência atual é pacífica
neste sentido:

“APELAÇÃO MANDADO DE SEGURANÇA. Ensino


Impetração visando imediata matrícula de criança em
creche ou escola pública municipal. Ordem concedida em
primeiro grau. Decisório que merece subsistir. Sentença
Nulidade Não-configuração. Decisão que não se revela
ultra nem extra petita, porquanto adstrita ao pedido
deduzido pelos impetrantes. Imposição de prazo para
cumprimento da obrigação, ademais, que prescinde de
pedido específico. Inteligência do art. 461 do CPC.
Preliminar afastada. Disponibilização de vaga em creche
ou escola pública municipal. Direito constitucional dos
impetrantes e dever do Município no atendimento da
educação infantil pré-escolar (arts. 208, IV e 211, § 2º,
da CF). Norma constitucional, ademais, reproduzida no
art. 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Insuficiência de vagas para atender a demanda que não
exime a Administração de cumprir sua obrigação, não
podendo se beneficiar da sua própria omissão - Garantia
ao menor do direito de vaga em creche municipal que não
configura indevida ingerência do Judiciário em poder
discricionário do Executivo, mas o exercício de missão
constitucional de apreciar violação ou ameaça de violação
a direito. Precedentes. Reexame necessário (pertinente na
espécie) desacolhido e apelo voluntário do Município de
São José do Rio Preto improvido.”
(1298341820078260000 SP 0129834-18.2007.8.26.0000,
Relator: Rubens Rihl. Data de Julgamento: 07/11/2012,
8ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação:
09/11/2012).

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Qualquer norma infraconstitucional (portaria, resoluções,
etc.) que contrarie as normas constitucionais de aplicabilidade imediata,
como por exemplo, de direitos fundamentais (art. 5º, § 1º, da CF), deve ser
declarada inconstitucional.

Não há como afastar o dever do Estado de garantir a


TODOS o direito à educação. A lista de espera, que perdura sempre por um
longo tempo, é instrumento de exclusão e, portanto, de discriminação.

Nesse sentido, para evitar violação de direitos tidos como


prioritários, reconhecida a carência de vagas na rede pública, o Município
deve ser obrigado a garantir a educação a requerente por meio da rede
particular. Seja na rede pública, seja na rede privada, a criança deve ter o
seu direito à educação efetivada pelo Município, nos termos do
mandamento constitucional.

III - DA LIMINAR

É imperiosa a necessidade de o impetrante ser


matriculado em escola próxima à sua residência. Repita-se, há dois
interesses a se tutelar: o primeiro referente à educação, e outro, referente
à saúde e desenvolvimento físico.

Não pode o impetrante ficar desamparada no curso do


processo, pois, é evidente o risco de desenvolvimento físico e psíquico
deficiente, caso seja sonegado o direito de frequentar escola mantida pelo
Poder Público, uma vez que os genitores da criança não têm condições de
levá-lo diariamente à creche distante do seu local de moradia.

Pois bem, estão preenchidos os requisitos da tutela de


urgência. Com efeito, o fumus boni juris encontra-se consubstanciado na
prova documental acostada à presente petição inicial e, o periculum in mora
decorre da necessidade que tem o impetrante de frequentar a escola, nos
termos pretendidos, evitando maiores males. A satisfação de seu direito
líquido e certo não pode esperar.

IV – DO PEDIDO

Por todo o exposto requer:

a) a concessão da liminar a fim de que seja determinada


ao Município de São Bernardo do Campo a efetivação da matrícula em
período integral, no BERÇÁRIO INICIAL da criança requerente na EMEB
FRANCISCO DIASSIS GOMES TEIXEIRA, ou outra escola próxima de
sua residência, garantido o transporte escolar caso a distância seja
superior a 2 km do local de moradia dos genitores;

b) a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça,


nos termos da Lei n° 1.060/50;

c) seja notificado o coator para que, querendo, apresente


informações nos termos do art. 7º, inciso I, da Lei 12.016/09;
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d) seja cientificada a Fazenda Pública Municipal para que
se manifeste, conforme art. 7º, II, da Lei nº 12.016/09, no seguinte
endereço: Procuradoria Geral do Município, Endereço: Paço Municipal - 13º
andar, Centro, São Bernardo do Campo, CEP: 09750-901;

e) seja o réu condenado a pagar as despesas e custas


fixadas por Vossa Excelência;

f) seja feita a intimação pessoal em todos os graus de


jurisdição e contagem em dobro dos prazos, nos termos do artigo 128, I, da
Lei Complementar 80/94;

g) seja ao final julgada procedente a ação, confirmando-


se a liminar e garantindo à criança o direito de ser matriculada na mesma
creche, em período integral, qual seja na EMEB FRANCISCO DIASSIS
GOMES TEIXEIRA ou outra próxima de sua residência, garantido o
transporte escolar caso a distância seja superior a 2 km do local de
moradia dos genitores.

Dá à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais) para


efeitos fiscais.

Termos em que pede deferimento.

São Bernardo do Campo, 12 de março de 2020.

FERNANDA FERNANDES GOMES ROZO


Defensora Pública
13ª Defensoria Pública da Unidade São Bernardo do Campo

PRISCILA CALISTO DA SILVA


Estagiária de Direito

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