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PARECER JURÍDICO

Ementa:

EDUCAÇÃO BÁSICA. MATRÍCULA OBRIGATÓRIA A


PARTIR DE 4 ANOS DE IDADE. SUSPENSÃO OU
CANCELAMENTO DE CONTRATOS. COMUNICAÇÃO
AO CONSELHO TUTELAR.

Muito se discute se, durante o período de quarentena determinada como medida de


prevenção e contenção à disseminação do novo Coronavírus, causador da pandemia de Covid-19, as
escolas teriam ou não a obrigatoriedade de desconto ou redução do valor da contraprestação mensal.
De outro lado, muitos pais e órgãos de defesa do consumidor parecem olvidar-se da obrigatoriedade
da matrícula escolar na educação básica, a partir de 4 anos de idade.

O tema central desta análise é a obrigatoriedade de matrícula na educação básica, a partir de


4 anos de idade, e as obrigações de pais e escolas diante de situações em que se requeiram a
suspensão ou o cancelamento de contratos (equivalente, portanto, ao cancelamento da matrícula).

Dessa forma, não é objeto deste estudo a validade ou validação das atividades escolares
realizadas remotamente durante o período de quarentena ou de isolamento social, pois o tema está
devidamente abordado em parecer do Conselho Nacional de Educação, que foi aprovado nesta
semana e aguarda publicação. Certo é que o ensino com utilização de tecnologias de informação e
comunicação está legalmente autorizado, ressalvada a educação infantil – que requererá
disciplinamento específico.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu art. XXVI, assegura que todo ser
humano tem direito à instrução, que deverá ser “orientada no sentido do pleno desenvolvimento da
personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades
fundamentais”. Afirma também que a instrução elementar, ou básica, é obrigatória.

No capítulo referente aos direitos e garantias fundamentais, a Constituição Federal insere a


educação como direito social (art. 6º, I). E, no art. 205, a Carta Magna, assegura a educação como
direito de todos e dever do Estado e da família, e que ela seja promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade.

Percebe-se, portanto, que a educação deve ser tratada como prioridade, sobretudo pelos pais
(que têm o dever de proporcioná-la aos filhos), mas nem todos conhecem as implicações práticas
decorrentes da Constituição, sendo a educação elevada à categoria de direito humano e fundamental
de natureza social.

Algumas manifestações, contudo, colocam o ensino em segundo plano, sobretudo ao se


referir apenas a questões contratuais entre alunos, pais ou responsáveis e as escolas da iniciativa
privada (que é opcional). Afirma-se todo o tipo de direito, com base apenas no Código de Defesa do
Consumidor, objetivando descontos ou redução de preços, revisão de planilhas e contratos, etc. E
tudo isso em virtude da interrupção de aulas presenciais, à qual as escolas não deram causa.

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Mas quais as implicações legais relativas ao ensino?

A mesma Constituição Federal estabelece, em seu art. 208, I, que a educação básica é
obrigatória dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada sua oferta gratuita
para todos, inclusive aos que a ela não tiveram acesso na idade própria. Além disso, o inciso IV
determina ao estado o dever com a educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5
(cinco) anos de idade.

É certo também que a Constituição assegura que o ensino é livre à iniciativa privada, desde
que observadas, entre outros requisitos, o cumprimento das diretrizes e bases da educação nacional.

A Lei nº 9.394/96 (LDB) ressalta os mesmos princípios e obrigações do estado e da família


relativamente à educação, e estabelece, em seu art. 6º, que “é dever dos pais ou responsáveis
efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 (quatro) anos de
idade”. No aspecto, há de se ressaltar, ainda, que os dois anos de pré-escola constituem requisito
indispensável para o ingresso no ensino fundamental.

O mesmo dever dos pais é reafirmado no art. 4º, do Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei 8.069/90), ao determinar que a efetivação do direito da criança e do adolescente à educação seja
assegurado pela família, comunidade, sociedade em geral e poder público.

O Código Civil (art. 1.566, IV), estabelece a educação dos filhos como um dos deveres de
ambos os cônjuges, o que também está previsto no art. 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

E, por seu turno, o art. 53, do Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe que “a criança e
o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo
para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho”.

Vê-se, assim, que:

I – a educação é DIREITO de todos;

II – o Estado e a família têm o DEVER com a educação;

III – os pais ou responsáveis são obrigados a matricular seus filhos em estabelecimentos


oficiais dos 4(quatro) aos 17(dezessete) anos de idade;

III – a educação DEVE ser promovida e incentivada com o apoio da sociedade.

Evidente, portanto, que a educação é um direito de todos e dever da família, dos pais ou
responsáveis, da sociedade, e do Estado, sendo obrigatória a matrícula até os 17(dezessete)
anos de idade.

Por fim, o Código Penal define como crime o ato de deixar, sem justa causa, de promover a
instrução primária de filho em idade escolar, estabelecendo pena de detenção de quinze dias a um
mês, ou multa. É o delito definido como abandono intelectual, o qual poderá ser caracterizado caso a
obrigação dos pais quanto à educação dos filhos não seja efetivada, conforme determina a legislação
vigente.

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Dessa forma, a legislação estabelece o dever dos pais e/ou responsáveis, da sociedade e do
Estado em assegurar a educação e acesso dos filhos ao ensino formal até os 17(dezessete) anos
(educação básica), podendo os pais serem punidos civil e penalmente caso não cumpram esse dever.

Quanto aos estabelecimentos de ensino, estes também têm obrigações em caso de possível
violação do direito à educação. O art. 56, II, do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que
a Escola deve comunicar ao Conselho Tutelar, entre outros, os casos de reiteração de faltas e de
evasão escolar, em especial, nas séries, anos ou períodos escolares em que a matrícula seja
obrigatória.

Portanto, em caso de aluno, cuja matrícula seja obrigatória, e houver pedido de suspensão
ou cancelamento de contrato, salvo nos casos de transferência para outra escola, a instituição deve
reafirmar aos pais ou responsáveis a obrigação dos mesmos quanto à educação dos filhos e, caso
haja pedido de rescisão contratual ou faltas reiteradas, fazer a devida comunicação ao Conselho
Tutelar e também à Promotoria da Infância e da Juventude, se assim entender pertinente.

É como entendemos, s.m.j.

Governador Valadares, 30 de abril de 2020.

Mauro Grimaldo da Silva


OAB/MG 84.091
Assessor Jurídico

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