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© 2015, Fundação Casa de Bragança

Título:
A r t e , r e l i g i ã o e i m a g e n s e m É v o r a n o t e m p o d o A r c e b i s p o D. T e o t ó n i o d e B r a g a n ç a ,
1578‑1602

Autor :
Vitor Serrão

Imagem de capa:
G r e g ó r i o L o p e s , S a n t a H e l e n a e o m i l a g r e d o r e c o n h e c i m e n t o d a Ve r a C r u z
(por menor, com cavadores que buscam relíquias), c. 1537-1540. Évora,
Museu de Arte Sacra da Sé.

Capa e paginação:
Rita L.Henriques

Impressão e acabamento:
V á r z e a d a R a i n h a I m p r e s s o r e s, S. A .
Rua Empresarial nº 19
Z o n a I n d u s t r i a l d a Po n t e S e c a
2510-752 Gaeiras – Óbidos
Te l e f . : + 3 5 1 2 6 2 0 9 8 0 0 8
Fax: +351 262 098 582
w w w. v a r z e a d a r a i n h a . p t

ISBN: 978-989-691-361-8
Depósito Legal: 388932/15

1 ª E d i ç ã o, F u n d a ç ã o C a s a d e B r a g a n ç a , V i l a V i ç o s a
Abril de 2015
Vi t o r S e r r ã o

A rt e, r e l i g i ão e i m Ag e n s e m
ÉvorA no tempo do Arcebispo
d. teotónio de brAgAnçA,
1578‑1602
RESUMO: Este ensaio aborda a vertente mecenática de D.
Teotónio de Bragança à frente do Arcebispado de Évora, mos-
trando a importância dos seus empreendimentos construtivos
e de decoração artística e o modo actualizado como adaptou
os princípios tridentinos do ‘restauro storico’ e de revitalização
das ‘sacrae imagines’ em lugares de alegado culto paleo-cristão.
Desenvolveu um novo tipo de arquitectura sacra servindo-se
de artistas de formação romana, como o arquitecto Nicolau de
Frias ou o seu arquitecto e escultor Pero Vaz Pereira. São mui-
to relevantes as construções que custeou, como o Mosteiro da
Scala Coeli da Cartuxa , e muitas outras igrejas em vilas e aldeias
da Arquidiocese. A arte que nasce em Évora no im do século
XVI, sob signo da Contra‑Maniera, atinge assim um brilho que
rivaliza com os anos do reinado de D. João III e do humanista
André de Resende. Velhos cultos e novos temas iconográicos
emergem com D. Teotónio, como os de São Manços, São Jor-
dão, São Brissos, Santa Comba, São Torpes e outros mártires
considerados eborenses. Fez encomendas em Madrid, Roma e
Florença para enriquecer a Sé e o grandioso Mosteiro de Sca-
la Coeli da Cartuxa, por si fundado. Trata-se, portanto, de um
capítulo notabilíssimo da arte portuguesa sob signo de Trento,
que merece ser devidamente analisado.

Palavras‑chave: Évora; Tardo-Maneirismo; Restauro Stori‑


co; Concílio de Trento; Cesare Baronio; Nicolau de Frias; Pero
Vaz Pereira.

4
SUMMARY: ‘Restauro storico’ and ‘sacrae imagines’ in
Évora under the government of Archbishop D. Teotónio
de Bragança, 1578‑1602.
This essay focuses on the igure of D. Teotónio de Bragança,
the Archbishop of Évora between 1578 and 1602, showing the
importance of its building projects and artistic decorations, un-
der the sign of Tridentine values. He adapted the principles of
‘restauro storico’ and the revitalization of ‘imagine sacrae’ in alleged
Early Christian sanctuaries. He promoted a new type of sacred
architecture using artists formed in Rome, such as the architect
Nicolau de Frias or his architect and sculptor Pero Vaz Perei-
ra. Among the monuments that he has erected, the Carthusian
monastery of Scala Coeli in Evora is one of the masterpieces
of the Portuguese architecture of this period. The art born in
Évora in the late sixteenth century, under the sign of the Contra‑
‑Maniera, achieves a quality that rivals with those from the ye-
ars of King John III and the humanist André de Resende. Old
cults and new iconographic themes emerge with D. Teotónio,
such as S. Manços, S. Jordão, S. Brissos, Sta. Comba, S. Torpes and
other martyrs considered Évora-born. He made several com-
mands in Madrid, Rome and Florence to enrich the Cathedral
and the majestatic Monastery of Scala Coeli (Cartuxa), founded
by him. It is, therefore, one of the most remarkable chapters
in the Portuguese Tridentine art that deserves to be analyzed.

Keywords: Évora; Late Mannerism; Restauro Storico; Council


of Trento; Cesare Baronio; Nicolau de Frias; Pero Vaz Pereira.

5
à memória de Túlio Espanca (1913‑1993)
a Artur Goulart
A b r ev i at u r a s U t i l i z a d a s

A.D.B. – Arquivo Distrital de Beja


A.D.E. – Arquivo Distrital de Évora
A.D.P. – Arquivo Distrital de Portalegre
A.H.F.C.B. – Arquivo Histórico da Fundação da Casa de Bra-
gança, Vila Viçosa
A.H.F.E.A. – Arquivo Histórico da Fundação Eugénio de Al-
meida, Évora
A.H.M.M.O.N. – Arquivo Histórico da Misericórdia de
Montemor-o-Novo
A.M.E. – Arquivo Municipal de Elvas
A.N.T.T. – Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, Lisboa
A.S.E. – Arquivo da Sé de Évora
A.S.P. – Arquivo da Sé de Portalegre
B.A. – Biblioteca da Ajuda
B.G.U.C. – Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra
B.N.F. – Bibliothèque Nationale de France, Paris
B.N.P. – Biblioteca Nacional de Portugal (Reservados), Lisboa
B.P.E. – Biblioteca Pública de Évora
M.A.S.S.E. – Museu de Arte Sacra da Sé de Évora
M. B. – Museu de Beja
M.E. – Museu de Évora
M.N.A.A. –- Museu Nacional de Arte Antiga

8
A p r e s e n tA ç ã o e A g r A d e c i m e n t o s

Manifesto a minha gratidão e apreço à Fundação da Casa


de Bragança, na pessoa do seu Presidente, Prof. Doutor Mar-
celo Rebelo de Sousa, e do seu secretário-geral, Dr. João Car-
los Boléo-Tomé, pelo seu empenho na edição deste livro; e às
direcções da Biblioteca Nacional de Portugal (Reservados), do
Arquivo da Sé de Évora, da Biblioteca Pública e Arquivo Dis-
trital de Évora, da Direcção Regional da Cultura do Alentejo e
do Arquivo Histórico da Fundação Eugénio de Almeida, pelas
facilidades nas pesquisas efectuadas.
Este livro é novíssimo: escrevi-o integralmente entre o Ve-
rão e o Inverno de 2014. Reporta-se, todavia, a pesquisas siste-
máticas que fui realizando ao longo de muitos anos sobre a arte
eborense do século XVI. Sintetiza velhas paixões pelo Alentejo
e pelo seu património artístico, que Túlio Espanca me ajudou a
descobrir. Organiza resultados de uma paciente recolha de da-
dos de campo e de arquivo. Relecte sobre o sentido profun-
do de uma sociedade precisa – a Évora do im de Quinhentos,
em tempo de Contra-Reforma – nas suas grandezas e misérias.
O livro procura traçar um peril mecenático no seu contexto
histórico e ideológico concreto. Necessariamente houve que to-
mar partido em questões até hoje muito polémicas no campo da
História da Arte, como o concurso para o projecto do mosteiro
da Cartuxa, a autoria da fachada do Paço Ducal de Vila Viçosa,
as fontes teológicas dos programas restaurativos nas velhas igre-
jas alentejanas, ou a iliação do tecto da sacristia do Colégio do
Espírito Santo. A respeito destes assuntos aduzo materiais novos

9
e respostas que, quero crer, serão concludentes. Neste percurso
pelos anos de governo arquiepiscopal de D. Teotónio de Bra-
gança avultam algumas personalidades que se tornaram os gran-
des protagonistas do meu trabalho, algumas já bem conhecidas,
como o arquitecto Nicolau de Frias, outras praticamente ignora-
das, caso do arquitecto-escultor Pero Vaz Pereira, do entalhador
Diogo Nobre, do ourives João Luís e dos pintores Duarte Frizão
e Custódio da Costa.
Destacam-se naturalmente dois conceitos artísticos à luz dos
quais, quero crer, o governo de D. Teotónio de Bragança foi ab-
solutamente inovador: a defesa de um modelo arquitectónico
austero e «reformado», em que o restauro storico funcionou como
atestado de antiguidade legitimadora e a espacialidade dos novos
corpos foi vista como sinónimo de igrejas‑auditório de novo tipo, e
um originalíssimo conceito de decoração integral dos interio-
res, espécie de ars senza tempo pensada para o caso alentejano,
onde pintura mural, stucco, azulejo, talha, imaginária, esgraito,
obra de massa e outras artes se souberam irmanar em progra-
mas ornamentais unívocos.
Autor e livro devem muito dos seus conteúdos às facilida-
des encontradas, às portas abertas e à boa vontade de muita
gente para discutir estas matérias: desde responsáveis de ins-
titutos, fundações, arquivos, bibliotecas e museus, a párocos, a
técnicos de conservação e restauro, a inventariantes, a colegas,
alunos e amigos.
Os nomes a citar são, por tudo isso, necessariamente muitos.
Com alguns deles discuti aspectos diversos desta obra. Cito, as-
sim (com perigo de omissões): Alberto Rodrigues Machado da
Rosa, Ana Cristina Baptista, Ana Paula Avelar, D. Antão López
(Mosteiro da Scala Coeli), Antónia Fialho Conde, António Ale-
gria, António Carlos Silva, Pe António Pereira Sanches, Arnal-
do Espírito Santo, Artur Goulart de Melo Borges, Pe Bonifácio
Bernardo, Carlos Fabião, Celso Mangucci, David Baptista, Có-
nego Eduardo Pereira da Silva, Fátima Farrica, Fernando Bouza
Álvares, Fernando Correia Pina, Fernando Grilo, Fernando Ma-
rías, Pe Fernando Marques, Francisca Mendes, Francisco Bilou,

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Helena Pinheiro de Melo, Hermínio Rico, S.J., Hugo Crespo,
Jaelson Bitran Trindade, Jesué Pinharanda Gomes, João Car-
los Garcia, João Luís Cardoso, João Ruas, Joaquim Chorão La-
vajo, Joaquim Inácio Caetano, Jorge Estrela, Jorge Moleirinho,
José Aguiar, José Alberto Gomes Machado, José Artur Pestana,
José Cardim Ribeiro, José Chitas, José Eduardo Horta Correia,
José Meco, José Pedro Paiva, D. José Sanches Alves (Arcebis-
po de Évora), José de Monterroso Teixeira, Juan Gil, Laurinda
Abreu, Luís Urbano Afonso, Magda Tassinari, Maria Adelina
Amorim, Maria do Céu Grilo, Maria do Céu Ramos, Maria Eu-
génia Alves, Maria João Baptista Neto, Manuel Joaquim Bran-
co, Manuel Ribeiro, Maria de Jesus Monge, Maria José Redon-
do Cantera, Maria de Lourdes Cidraes, Mário Cabeças, Maurício
Cunha, Miguel Soromenho, Patrícia Monteiro, Paulina Araújo,
Paulo Farmhouse Alberto, Paulo Lima, Pedro Flor, Pedro Pin-
to, Ricardo Estevam Pereira, Rita Vaz Freire, Rui Mendes, Rui
Palma, Sylvie Deswarte-Rosa, Teresa Desterro, Teresa Leonor
Vale, Teresa Perdigão e Vanessa Antunes.
A todos agradeço informações fornecidas e tempo disponibi-
lizado para relexões conjuntas e partilha de ideias. Certos livros
são assim: os temas ganham forma justamente porque têm sumo
amadurecido na sequência de um trabalho pluri-disciplinar que,
com paciência, vai germinando.
Uma palavra de agradecimento enim, por todas as razões e
pour cause, a minha Mãe, a meu Pai, aos meus ilhos Diogo e Le-
onor, e às minhas netas Inês e Rita.
Nota: Os conteúdos deste livro decorrem de pesquisas e interesses antigos mani-
festados pelo autor no estudo sistemático da arte alentejana do Renascimento e do
Maneirismo. Na parte relativa à pintura mural do tempo de D. Teotónio, as investi-
gações avançadas integram-se no âmbito do projecto da FCT (coordenado por Mi-
lene Gil) PRIM’ART ‑ Redescoberta da Pintura Mural em Portugal. Estudo Histórico e cientí‑
ico do Arquiespiscopado de Évora (1516‑1615), refª nºs PTDC/CPC-EAT/4769/2012 e
FCOMP-01-0124-FEDER-028511. Na parte relativa à arquitectura ducal e às artes
em Vila Viçosa, integram-se no projecto da FCT De Todas as Partes do Mundo. O Patri‑
mónio do 5º Duque de Bragança D. Teodósio I (dirigido por Jessica Hallett), refª nº PTDC/
EAT-HAT/098461/2008.

Lisboa, Janeiro de 2015

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1. ÉvorA tridentinA:
u m A ‘ N OVA R O M A ’

1 . 1 . A E B O R A d e D . Te o t ó n i o
de Bragança

D Teotónio de Bragança (1530-1602), quarto Arcebispo de


Évora, foi uma das mais fortes personalidades da Igreja Católica
portuguesa no inal do século XVI, com uma acção que se mani-
festou em vários domínios, incluindo os da política de fomento
artístico, em que foi verdadeiro mecenas. Sem deixar nunca de
ser um Bragança, ou seja, um membro da mais destacada famí-
lia da nobreza portuguesa, investiu-se de papel muito relevante
na implementação dos valores de reforma que a Igreja assumira
a seguir ao Concílio de Trento (1545-1563).
Homem de educação esmerada, já que, depois de receber
aprendizado livresco no Paço Ducal de Vila Viçosa, estudou
Humanidades no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, a que se
seguiu uma passagem por Roma, com os jesuítas, e a frequên-
cia das Universidades de Paris e Bordéus, onde se formou, D.
Teotónio teve oportunidade de viajar pela Europa do Renasci-
mento, de Itália a França, a Espanha e a Inglaterra, convivendo
com as experiências culturais que aí se desenvolviam. No con-
texto da nova situação política estabelecida com o primeiro rei-
nado da Monarquia Dual e o início da governação ilipina, por
um lado, e com um dirigismo centrado em Évora nas vésperas

13
do triunfal Jubileu católico de 1600, por outro, o Arcebispo as-
sumiu então um papel decisivo no campo da arquitectura e ao
nível do equipamento artístico das igrejas da sua Arquidiocese,
dando incremento aos focos inluentes de mecenatismo e reve-
lando um gosto por demais actualizado em termos de soluções
e modelos seguidos.
A cidade de Évora era vista, de há muito, como a segunda do
Reino em importância e notabilidade, tendo chegado a albergar
a corte de D. João III por alguns anos e sendo desde sempre
elogiada pelo seu estatuto de Colonia Romana, com a sua muralha
quase intacta, os seus monumentos romanos, medievais e renas-
centistas, e a sua riqueza artística consensualmente reconhecida
1
. O cargo de Arcebispo de Évora era, pois, muito ambicionado,
ainda que impusesse um peril de pessoa com especiais respon-
sabilidades, peril esse encontrado em D. Teotónio de Bragan-
ça ao ser indigitado em 1578, certamente por recomendação do
Cardeal D. Henrique, para ocupar o cargo. Viviam-se então as
dramáticas circunstâncias políticas decorrentes do desastre de
Alcácer Quibir e da subsequente morte de D. Sebastião, o que
levara o Cardeal D. Henrique a ser designado rei, abandonando
o cargo arcebispal, e abrindo um período que, a breve trecho,
desembocaria na crise sucessória que levará Filipe II ao trono
português 2.
Embora sempre se tenha destacado no múnus de D. Teotónio
de Bragança o aspecto catequético, no que cabe dizer a respeito
da prática pastoral empreendida, dos sínodos que organizou, da
revisão de certos aspectos teológicos segundo os princípios con-
ciliares, do apoio assistencial aos desfavorecidos e das estraté-
gias gerais em favor do engrandecimento da Arquidiocese (com
dinâmicas que contrastam, de certo modo, com as do governo
precedente do Cardeal-Rei D. Henrique, um homem da Renas-
cença), a verdade é que também a vertente cultural e construtiva
ganhou peso com o seu governo, através de empreendimentos
de monta. Tal acento de proselitismo contra-reformista só foi
possível porque se tratava de uma personalidade culta e viajeira,
que dispôs de uma base muito sólida de investigação histórica,

14
assente num gosto romanizado e na consciencialização da im-
portância de um património comum.
Nesse sentido, a igura do Arcebispo D. Teotónio de Bragança
mostra, como aliás já acentuava o seu capelão, e atento biógrafo,
padre Nicolau Agostinho 3, um originalíssimo peril de prelado
imbuído de intuitos renovadores, dentro do que podiam ser os
preceitos de abertura e adaptação da Igreja contra-reformista.
Este aspecto da sua biograia – o do teólogo e homem da Igre-
ja – está, no essencial, bem estudado através de uma série de
contribuições incontornáveis 4. Um dos dois textos sinodais que
redigiu, datado de 1587, foi justamente dedicado à plena ade-
quação das paróquias eborenses às normas e decretos concilia-
res. Em termos de intervenção social conhece-se, por exemplo,
o seu importantíssimo papel durante os surtos de peste e fome
que o Alentejo sofreu, designadamente em 1579-1581, quando
criou uma série de espaços assistenciais e albergarias e proveu
as necessidades elementares dos carenciados, na cidade e nas
vilas e aldeias. Neste campo, seguiu uma precisa orientação tri-
dentina, olhos postos no exemplo assistencial do Cardeal Car-
los Borromeo durante a peste de Milão, sabiamente adaptado à
realidade nacional, numa resposta muito directa à forma como
a Coroa tinha organizado o campo, preenchendo os espaços
deixados abertos pelo poder político. Nesse sentido também se
entendem os contactos com Miguel de Giginta, autor do Trata‑
do de Remedio de Pobres (Coimbra, 1579), que defendia um mode-
lo inovador de «casas da caridade», razão pela qual chegou a ser
chamado a Évora pelo Arcebispo, que lhe ofereceu a oportuni-
dade de desenvolver na cidade o projecto que Lisboa recusara.
Esse projecto foi seguido em Évora à luz das circunstâncias e
possibilidades existentes 5.
Mas observam-se outros aspectos relevantes a considerar na
acção do Arcebispo, entre eles o do mecenas das artes e das le-
tras, campos em que D. Teotónio de Bragança investiu muito
do seu saber e réditos, tornando a cidade de Évora o mais im-
portante centro da Contra-Reforma portuguesa, logo a seguir
a Lisboa, o que urge ser analisado com a devida atenção. O seu

15
mecenato renovador no campo construtivo e de decoração ar-
tística eborense não se restringiu a obras de eleição como foram
os Mosteiros de Scala Coeli, primeira sede portuguesa de mon-
ges cartuxos, e de Santo António da Piedade, casa de francisca-
nos capuchos, ambos muito conhecidos e bem estudados pelos
historiadores. Também não se limitou a custear obras nas pa-
róquias da cidade e a reunir na sua colecção centenas de livros
e muitas peças de arte, entre elas alguns testemunhos do seu
interesse pelos «novos mundos». Durante os vinte e três anos
de governo daquela que era uma das maiores Arquidioceses de
toda a Cristandade, o ilustrado epíscope preocupou-se também
em assinalar e recuperar o património paleo-cristão existente no
seu território, em deinir estratégias de restauro storico desses acer-
vos segundo as directrizes romanas de autores como o cardeal
Cesare Baronio, e em organizar os programas de decoração sa-
cra das igrejas dentro dos princípios romanos promulgados na
Roma Felix e que foram dominantes durante o pontiicado de
Sisto V (1585-1590) 6.
Essas linhas caracterizadoras de desenvolvimento da Évora
teotonina assinalam um caminho que, em reacção aos ataques
da Reforma protestante, atestou as valências da antichità christiana
do seu historial, reforçada pela airmação de santos eborenses cujo
culto se recuperou, ou pela primeira vez se instalou, como são
os casos de São Manços, de São Jordão e das suas irmãs San-
tas Comba e Inonimata, dos santos mártires Vicente, Sabina e
Cristeta, de São Torpes, de São Cucufate, de São Brissos, de São
Romão e de outros mártires com alegadas origens ou ligações
alentejanos durante a era paleo-cristã 7, em parte já assinalados
nos textos dos humanistas, como o celebérrimo livro de An-
dré de Resende Historia da Antiguidade de Cidade de Evora (cuja
primeira edição data de 1553). À luz do princípio da concinnitas
promulgado pelo arquitecto quatrocentista Léon Battista Alber-
ti – uma busca da harmonia clássica muito seguida nos textos e
na prática de Resende em nome da salvaguarda do património
da cidade – 8, os pretensos santos fundadores do cristianismo
no Alentejo foram nesta altura alvo de novas investigações, por

16
vezes através de campanhas arqueológicas, e de uma verdadei-
ra política de reabilitação construtiva dos lugares hierofânicos
relacionados com os seus martírios e os seus focos de devoção
popular 9. No caso das relíquias de São Torpes, tratou-se mes-
mo de um pedido do Papa Sisto V a D. Teotónio para que in-
vestigasse a veracidade do assunto e procedesse a escavações,
algures no termo de Sines 10.
Trata-se, por isso, de uma personalidade relevante e absolu-
tamente original, tanto no contexto da governação da Igreja no
início da dinastia dos Filipes 11, como no contexto do mecena-
tismo português do século XVI, um campo em que a cidade de
Évora assumia então um papel de destaque, albergando gran-
des famílias e colecções de arte. Além da bem nutrida livraria
e recheios artísticos de D. Teotónio de Bragança (com que do-
tou, em parte, o mosteiro da Cartuxa) 12, outros acervos se des-
tacavam na cidade, caso dos recheio dos palácios da nobreza, a
provar que a riqueza da cidade não se restringia aos inesgotáveis
fundos dos mosteiros e conventos.
Os nobres Castros, condes de Basto, tinham no seu palácio
de São Miguel (hoje da Fundação Eugénio de Almeida) obras
artísticas muito signiicativas, como tapeçarias de Bruxelas, pin-
turas sacras, porcelanas da China, tapetes persas, contadores da
Índia, biombos e outras peças exóticas representativas dos «no-
vos mundos», além de possuírem rica livraria, e vários escravos
13
. É certo que outros idalgos eborenses possuíam recheios
onde o exotismo também estava presente, e o próprio D. Teo-
tónio se inseriu nesse número de colecionistas, mas o caso da
colecção dos Condes de Basto, até pelo facto de ser melhor co-
nhecido através de três inventários (o mais antigo dos quais de
1582), foi verdadeiramente excepcional.
Na residência palatina de D. Fernando de Castro (1530-1617),
1º Conde de Basto, governador militar da cidade, que estava a
ser então alvo de vultosas obras de pedraria, decoração mural
e engrandecimento intestino, eram muitas as peças avaliadas a
alto preço, como as tapeçarias de Bruxelas (uma delas com a
História de Sansão), várias alcatifas turcas e de Castela, mobiliá-

17
rio de madeiras exóticas, «cinco condises (sic) verdes de Ruam de Paris
com sua barra de veludo», marins do Oriente e um saleiro afro­
-português, «sessenta e duas peças de vidro cristalino» acaso de Ve-
neza, «dous sestos da China com tres bandeias pequenas» e um amplo
acervo de «porcelanas da Índia» (parte destas peças, ainda existen-
tes na posse dos Castros em 1644), «dois biombos grandes da India»
avaliados em 30.000 rs (seguramente uma produção do sul da
China), um «tavoleiro da China», três «bandeiras da China» e «trinta
e oito escudelas da Índia», e uma «alcatifa da India de estrato com cadi‑
lhos vermelhos» avaliada por 40.000 rs, entre muitas outras. Um
dos têxteis asiáticos assinalados como de alto preço decorava
a Casa Pintada, decerto a Sala Oval, afrescada havia pouco pelo
pintor Francisco de Campos com uma representação mitológi-
ca inspirada em Ovídio. No oratório, existiu um grande Calvário
em pintura, que será um painel ainda existente (col. particular
eborense) atribuído ao prestigiado artista local Francisco João
(1539-1595), que toma grande inspiração nos modelos de Luís
de Morales. A joalharia de ouro e prata era também abundante
na colecção dos Castros (seria alvo de avaliação, em 1617, pelo
ourives lisboeta Cristóvão Lopes) e as peças de mobiliário re-
lectiam gostos aquisitivos requintados, caso de um «contador da
India lavrado de marim que se comprou por via de Antonio Pereira mar‑
ceneiro», «huma Escrivaninha de pao pretto com seu tinteiro e pueira the‑
zoura canivete e lanseta dourado», ou um «Bofetinho de pao santo com
faxas de pao pretto e peris de marim com duas gavetas e ferragem doura‑
da». A estas peças se acrescentou em 1617, à data da morte do
1º Conde, um caro «Leito de pao santo guarnesido de pessas de Bron‑
ze dourados», que o torneiro Tomé Coelho adaptou ao novo es-
paço. Adquiriu-se ainda uma «armação de guadamexim de couros de
marzamaior cubertos de ouro e prata verde» e outras peças de couro
lavrado. Mas é o rol das «Persolanas» chinesas, pela sua extensão
e valia, que ocupa mais largos fólios do inventário dos Basto14.
Nesta residência palatina, onde amiúde estadeou o Arcebispo,
recebendo convivas e embaixadas, incluindo o próprio Filipe I
de Portugal, a extensão de peças de arte estendia-se ainda a gran-
des «armasõis de tapeçaria» reunidas por D. Fernando de Castro,

18
certamente de fabrico de Bruxelas, com temas clássicos (Triunfos
de Petrarca, História de Diana), alegóricos (Meses e paisagens), hagio-
lógicos (São Jerónimo) e vetero-testamentários (História de David e
Golias), os quais contribuíram para a opulência dos salões a que
se referem os relatos de festividades e visitas de convidados de
honra 15. Ao mesmo tempo, o Conde de Basto não só custeou
obras de modernização do velho paço gótico-manuelino (in-
cluindo a notável decoração fresquista dos salões) como o re-
cheou em preito de homenagem a seu pai D. Diogo de Castro,
o das Treze Arruelas, soldado na expedição de Carlos V a Tú-
nis (1535) e na tomada de La Goleta, feitos militares que eno-
breceram os Castros. É de lembrar que D. Fernando casou com
D. Joana de Albuquerque, ilha de Brás de Albuquerque, senhor
da Bacalhoa, crescendo o prestígio familiar com essa união das
duas casas (Castros e Albuquerques). Enviuvando sem descen-
dência, voltou a casar com D. Filipa de Mendonça (fal. 1581),
mãe do 2º titular D. Diogo de Castro (fal. 1638), que foi mem-
bro do conselho de Estado, alcaide-mor de Évora, regedor da
Casa da Suplicação, Presidente do Desembargo do Paço e vice-
­rei de Portugal. Os cargos justiicam a riqueza acumulada no
Paço: as artes sumptuárias desta casa exprimiam uma mescla de
peças de origem europeia e de exotismo colonial – um gosto em
português, em suma –, traço identitário que foi comum ao melhor
colecionismo da época 16.
A mesma opulência dos palazzi eborenses se encontrava cer-
tamente na residência de outros nobres, como os Silveiras, os
Cogominhos e os Murça, por exemplo, para os quais, todavia,
não remanescem inventários de bens. O próprio D. Teotónio
possuía muitas obras de arte no Paço Arquiepiscopal, de que
fez doação ao mosteiro da Cartuxa por si fundado. Tratava-se
de uma colecção que incluía tapeçarias e pinturas lamengas,
muitos retratos régios, marins, quadros sacros, e até uma peça
devocional de origem asiática, um «retrato da cruz de sam Tome que
veyo da yndia» 17. Já de D. Alexandre de Bragança, sobrinho de D.
Teotónio e seu sucessor no cargo arcebispal, em 1602 18, sabe-
mos que, morando alternadamente entre Évora e Vila Viçosa,

19
tinha nas suas casas peças artísticas caras: além de tapeçarias bru-
xelenses (História de Hércules, História de David, «panos de Bichos»),
possuía ricas pratas, guadamecis, alcatifas de Veneza, retábulos
e mobiliário de qualidade, e onde o exótico também estava pre-
sente, através de marins, arcas da Índia e «pinturas com pássaros e
verduras da China» 19. Um pouco mais tarde, D. Duarte de Bragan-
ça (1569-1627), Marquês de Frechilla e de Mallegón, que tinha
a seu serviço um pintor estrangeiro, Jerónimo de Vich (ouvido
em 1613 na Inquisição de Évora por suspeitas de luteranismo)20,
reunia na sua casa uma série de peças de arte, incluindo retratos
áulicos, representações de Sibilas e «pinturas da China»21.
Constitui vertente essencial da História da Arte o estudo do
gosto coleccionístico, para se compreenderem critérios de es-
colha, aquisição e exposição, em situaçõs que, como é o caso
da Évora quinhentista, são contextualizáveis e percebíveis. Os
testamentos, pleitos judiciais, róis orfanológicos, partilhas, in-
ventários de bens da nobreza, de conventos e irmandades, a
informação dos registos de compra e venda e as descrições de
festividades, permitem reconstituir acervos dispersos e perce-
ber opções estéticas, fórmulas operativas e gostos dominantes
no mercado português (nobre, sacro ou civil). É um campo de
trabalho valioso, já que, sem esquecer ‘inconstantes estéticas’ e
curvas de efemeridade que acompanham os ‘gostos’, a sua de-
inição como factor social distintivo (com peso ideológico dia-
lecticamente mutável), ou marcado por ritmos trans-memoriais
com retomas de modelos e variedade ilimitada de novas cor-
poralidades, permite estudar melhor os tecidos artísticos e os
interesses dominantes em cada época. A religiosidade militante
do tempo de D. Teotónio, por exemplo, não escondia decisivos
interesses pelos «novos mundos» e pelos exotismos.
Ainda recentemente, em reedição crítica ao clássico livro de
Julius von Schlosser (1908) sobre a colecção do arquiduque Fer-
dinando II de Habsburg, príncipe do Tirol, no castelo de Am-
bras (Innsbruck), Patricia Falguières destacou as singularidades
históricas das câmaras de maravilhas reunidas ao longo da Idade
Moderna, espécie de embrião do accrochage de peças dos museus

20
contemporâneos 22. É em nome dessa singularidade que podem
ser hoje compreendidos os gabinetes e salas de opulência do século
XVI, desde os da Rainha D. Catarina de Áustria e da Infanta D.
Maria, à do Duque de Bragança D. Teodósio I, à do conde de
Basto D. Fernando de Castro e à dos Arcebispos D. Teotónio e
D. Alexandre de Bragança. São casos em que as peças reunidas,
mais que por mera ostentação estatutária, incorporações casu-
ísticas ou a necessidade de provir ao apetrechamento da casa,
mostram um sentido de especialização que agrupa determina-
das obras segundo uma lógica colecionística com três vertentes:
o gosto pelos «novos mundos», o sentido de «actualização» e o atestado do
Catolicismo triunfante.
Era esta Évora, onde os pergaminhos de antiguidade rimavam Fig. 2
com os testemunhos de exotismo dos «novos mundos», que se
oferecia aos viajantes do im de Quinhentos que visitavam os
palácios, solares e lugares de culto, ou que adquiriam nas bem
apetrechadas livrarias da Praça Grande (hoje, do Giraldo) e da
rua de Burgos obras editadas nos prelos locais com relatos das
terras de África e da Ásia, e era tudo isso que justiicava em pa-
lavras o encómio geral. Cidade de contrastes, por certo, com a
penúria das gentes do campo sofrendo a exploração dos pode-
rosos, carregadas de tributos e sujeitas à inclemência dos ritmos
agrícolas, quando não à violência das pestes, e com a tutela do
Santo Ofício cerceando as liberdades 23... mas era essa mesma
Évora, a Liberalitas Julia dos romanos, tão enaltecida durante o
Renascimento, transformada numa urbe de «ambiente fervil e
dogmático», tal como a deiniu Túlio Espanca 24, que vivia nestas
décadas de transição do século XVI para o XVII, ao receber D.
Teotónio de Bragança como seu Arcebispo, uma fase de maior
coniança e de «cunho novo», sob o signo do Concílio de Trento.
Se a cidade de Évora nunca teve, nem podia ter, a pujança e
desenvolvimento de uma capital como Lisboa, conseguiu com
o Arcebispo D. Teotónio moldar-se, em termos de imagem e
condutas, ao igurino da Roma Felix de Gregório XIII e sobre-
tudo de Sisto V, assumindo um estatuto que é de certo modo
cotejável, no caso português, com o de «principato della religione

21
Christiana», «sede stabilita da Dio… in un templo grandíssimo et enorme‑
mente splendido», tal como dizia o secretário papal Antonio Maria
Graziano num rasgado elogio ao pontiicato sistino 25. É essa
cidade orgulhosa e desenvolvida que desponta, no inal de Qui-
nhentos, como um exemplo polar, unindo memória, tradição,
crescimento e modernidade, ainados entre si com uma espé-
cie de consciência senza tempo, aos modos da Roma papal, cen-
tro nevrálgico do catolicismo e umbilicus mundi da humanidade.

1 . 2 . N o va s l i n g u a g e n s pa r a u m a
s o c i e d a d e co n t r a ‑ re f o r m i s ta

Foi neste ambiente de abertura artística e de mundialização,


iel aos pergaminhos históricos da cidade e ao triunfo do Cato-
licismo, e relexo também de um micro­cosmos atentíssimo ao
processo das Descobertas, que D. Teotónio exerceu o seu múnus.
Tal ambiente de ostentação, conhecia-o já, de alguma forma, do
Paço de Vila Viçosa, sede da corte dos Bragança, onde tantas
vezes recolheu em tempo de veraneio, a ponto de escolher ar-
tistas (arquitectos, pedreiros, ourives, pintores) que aí actuavam,
para realizarem na Ebora Colonia Romana alguns empreendimen-
tos em igrejas e conventos do Arcebispado.
Fig. 1 O Arcebispo era um Bragança e, no im de contas, sendo
desprendido pela vocação tridentina, e austero pelo tempera-
mento, não deixou de se rodear de uma vivência imponente,
própria dos grandes senhores do tempo. As despesas miúdas
revelam a intimidade da sua corte, onde havia pagens, sangrador,
barbeiro, alfaiate, cocheiro e pintor privativo, além de secretário
permanente e de iéis capitulares a darem cumprimento às suas
ordens. Nesse contexto, o acento nas grandes realizações artís-
ticas e numa actualização dos modos de decorar – olhos pos-
tos na Roma dos papas, de Gregório XIII (1572-85), a Sisto V
(1585-90) e a Clemente VIII (1592-1605) – foi referência decisi-
va. Com ele, a aplicação das directivas conciliares de Trento não
se resumiu a novos dispositivos de organização da Igreja, nos

22
aspectos espiritual e temporal, ou de controlo da sua estratégia
imagética, antes incorporaram uma relexão profunda sobre as
bases histórico-arqueológicas do Cristianismo no território ebo-
rense sob sua jurisdição.
É certo que, sendo a idelização do decorum uma das obsessões
programáticas de todos os prelados tridentinos, D. Teotónio de
Bragança tomou, de modo muito zeloso, as rédeas desse com-
bate ao falso dogma, cumprindo assim, tal como escreveu Flávio
Gonçalves 26, aquilo que era uma das dinâmicas comportamen-
tais da hierarquia católica de então: «a Igreja apoderou-se nesse
período do comando da arte religiosa, a im de a expurgar das
notas tidas por censuráveis e de promover uma iconograia de
combate, de testemunho e de catequese». A par dessa defesa
do papel didascálico das imagens sagradas contra o que poderia
ser considerado formosura dissoluta, ou falso dogma, D. Teotónio de
Bragança soube desenvolver dinâmicas precisas no campo da
construção, tanto sacra como civil. Assim, aplicou na sua acção
pastoral, em moldes pioneiros, o conceito e a prática do restauro
histórico (tal como, desde Roma, defendera o Cardeal Baronio)
usando-o em vários santuários alentejanos com alegadas origens
paleo-cristãs. Utilizando nesse entendimento, e nessa reforma
do papel atribuído à Arquitectura, a experiência e pramatismo
dos seus arquitectos – fossem os velhos mestres «henriquinos»
Mateus Neto e Jerónimo de Torres, fosse o famoso arquitecto
da corte, Nicolau de Frias, fosse sobretudo o mais jovem Pero
Vaz Pereira, um portalegrense mandado por ele formar na pró-
pria Roma 27 – o Arcebispo ergueu novos santuários junto a ve-
lhas estruturas de origens difusas (como sucedeu na aldeia de
São Manços) e reformulou algumas das igrejas góticas da cida-
de (como São Tiago, por exemplo), conferindo-lhes um gosto
mais consentâneo com o que ele entendia ser uma espécie de
espacialidade comunitária.
Era esse o sentido de uma arquitectura sacra de novo tipo
com que pretendia polvilhar as vilas e aldeias do seu território.
Em espaços litúrgicos de claro sentido tridentino (como suce-
deu nas obras novas da capela-mor e Sacristia Nova dessa Sé

23
Fig. 57 de Elvas, de cujo desenho se incumbiu o citado Pero Vaz Pe-
reira, para o efeito mandado várias vezes à cidade raiana, entre
1599 e 1609) 28, D. Teotónio assumiu a opção por um gosto de-
purado mas cenograicamente atractivo, sequaz da doutrinação
de Carlos Borromeo nas Instructiones Fabricae et Supellectilis Ec‑
clesiasticae (1577) e que contrasta à evidência com as estruturas
gótico-manuelinas prevalecentes no conjunto dessa Sé raiana.
Na arquitectura monacal, no caso da igreja do mosteiro de frei-
ras clarissas do Salvador de Évora, ou no caso do novo mostei-
ro de carmelitas descalços de Nossa Senhora dos Remédios, de
que lançou as estruturas e impõs traças de «estilo chão», dentro
de um racional funcionalismo que relectia os pretendidos va-
lores tridentinos do decorum. E na magna fachada do mosteiro
de Scala Coeli, sua obra maior e primeira sede de cartuxos em
Portugal, assumiu na escolha da traça, de base serliana, um mo-
delo neo-antigo inspirado na tradição construtiva constantinia-
na e seguindo os gostos prescritos, por exemplo, em igrejas de
Domenico Fontana, o arquitecto de Sisto V.
Já para os interiores de todos os lugares de culto da Arqui-
diocese, defendia uma linguagem mais exuberante, em contraste
com a austeridade dos exteriores e com o pragmatismo despo-
jado das linhas arquitectónicas, recorrendo a verdadeiros pro-
gramas de arte total onde a talha dourada epimaneirista, a obra
de massa relevada, o stucco, o esgraito, o azulejo e a pintura a
fresco se unem em soluções de forte originalidade no sentido
de moldurarem paredes e coberturas, ritmarem alçados e cria-
rem um gosto ornamental de novo tipo, por certo inspirado nas igre-
jas romanas da era de Gregório XIII e de Sisto V, que o prelado
bem conhecia. D. Teotónio pudera acompanhar de visu a reno-
vação sofrida no património religioso da Cidade Papal, entre a
idelidade ao antigo e a busca de um novo tipo de proselitismo
construtivo assente na memória histórica, e introduziu esse gos-
to nas práticas construtivas da sua Diocese.
É por isso que a Évora do im do século XVI se equipara à
imagem de uma Nova Roma, orgulhosa dos seus pergaminhos e
dos seus monumentos 29. As novas construções teotoninas pon-

24
tuam com processos de renovação de velhas igrejas medievais, Fig. 25
caso da igreja de São Tiago, no coração da cidade, que perde Fig. 26
Fig. 33
assim o seu carácter gótico e se assume, com o novo projecto
construtivo posto em prática, um espaço de racionalismo triden-
tino, dentro do desejo do Arcebispo de que as naves das igre-
jas fossem verdadeiros auditórios das e para as comunidades 30.
Pelo mesmo processo passam as igrejas matrizes do Redondo,
do Lavre e de Évora-monte, e vários templos das freguesias ru-
rais de Nossa Senhora da Graça do Divor e de São Pedro da
Gafanhoeira, entre muitas outras, bons exemplos deste gosto
teotonino, aliás seguido depois, com idênticas tipologias de cons-
trução, em tantas paróquias e casas monacais da Arquidiocese
durante o múnus dos seus sucessores D. Alexandre de Bragança
(1602-1608), D. Diogo de Sousa (1610) e D. José de Melo (1611-
-1636) e mesmo nos períodos de sede vacante.
Os cuidados em equipar todos estes lugares de culto com pa-
ramentos litúrgicos de aparato leva D. Teotónio a privilegiar não
só o serviço de mestres bordadores, como o espanhol António
Garcia, mas a realizar também grandes encomendas em Roma
e em Florença, que envolveram somas consideráveis e de que
dão conta alguns dos documentos adiante recenseados. Algu-
mas dessas obras chegaram aos nossos dias, como a casula do
Museu de Arte Sacra da Sé, que integra uma cartela bordada nos
sebastos com o símbolo cartuxo da Scala Coeli, ou a dalmática,
com estola e manípulo, do Museu de Évora, que são do melhor
que existe, de paramentaria do século XVI, na arte portuguesa.
O Arcebispo chegou a enviar «amostras» de tecidos com os or-
natos pretendidos para as oicinas de Florença por si seleciona-
das, sugerindo desenhos e com indicação expressa para que se
mudassem as cores tradicionalmente usadas.
O mesmo se passou com a prataria sacra, recorrendo a mes-
tres exímios, como era o caso do ourives calipolense João Luís,
ou do espanhol Andrès Taude, em numerosas encomendas
para as casas por si fundadas ou renovadas. Uma dessas peças,
a grandiosa lâmpada de prata que se encomenda em 1588 para
a Sé de Évora, dada a fazer ao citado João Luís a partir de um

25
Fig. 10 desenho do arquitecto Nicolau de Frias, pelo excepcional pre-
ço de 600.000 rs, era considerada por diversas fontes coevas «a
mais bela e grandiosa lâmpada de prata que existiu em Portu-
gal» e, pelo seu igurino, uma «invenção nova» 31, sendo muito
de lamentar o seu desaparecimento na época dos saques das
tropas napoleónicas à cidade. Esta lâmpada seguia a forma pi-
ramidal, de evidenciado peso simbólico e triunfalista, tão em
uso na Roma de Sisto V; tratava-se de um tipo bem preciso de
simbologia tridentina, defendida e explicitada em tratado pelo
arquitecto romano Domenico Fontana (1543-1607) e ao tempo
muito seguida como directriz. Assim aparece deinida a referida
lâmpada da Sé de Évora num dos textos que se revelam, mais
adiante, no Elenco Documental deste livro: «huma custodia qua‑
drada de quatro cristais engastados nas quatro juntas larguas em baixo e
aguda em cima a modo de pirâmide e no meo em baixo e em cima emcai‑
xos onde em ambas partes encaixavam as pontas ambas do osso santo de
modo que estava direito e que se via muito bem por as vidraças», tal como
é descrita num relato de Abril de 1591 relativo à entrada da re-
líquia em Vila Viçosa 32. O tratamento dado ao mestre ourives,
que chegou a ter o coche pessoal do Arcebispo a ir buscá-lo a
Vila Viçosa, com pitanças recebidas em reconhecimento pela
qualidade do seu trabalho, atesta também a liberalidade de D.
Teotónio para com os artistas que o serviam.
Fig. 13 Idêntica morfologia piramidal registada na perdida lâmpa-
Fig. 14 da da Sé – a forma de obelisco – também se observa em outra
peça por si ordenada e que chegou felizmente aos nossos dias:
o relicário em prata e cristal que guarda a relíquia de São Man-
ços trazida de Espanha por D. Teodósio em 1592, a qual segue
a forma comemorativa, laudatória e triunfal da Roma Felix se-
gundo as recomendações tratadísticas de Domenico Fontana 33.
O modelo seguido remete para autoria escurialense: o Arcebis-
po recebeu a relíquia por licença especial de seu primo Filipe II
e é natural que a peça fosse adaptada à tipologia das peças de
ourivesaria castelhana congéneres 34. É quase certo que, tendo
o Arcebispo tratado da doação da relíquia junto ao próprio Fi-
lipe II, conhecesse bem os relicários produzidos pelos ourives

26
do Escurial, inspirados nesse simbolismo all’antico em forma de
pirâmide, o que leva à presunção de que a peça trazida por D.
Teotónio para Évora seja de autoria escurialense e, mais, que
seja a fonte de inspiração de outras que aqui se produziram com
idêntica forma. Mas a responsabilidade da factura foi sua, e os
custos foram por si suportados: como se vê na memória anó-
nima intitulada Noticias do seu Governo, que lhe elogia as «grandes
obras» feitas na Sé durante o seu múnus de vinte e três anos 35,
«fez hum peramede (sic) donde esta a relíquia de Sam Manços, tudo isto
(de) mujto presso».
O recurso do Arcebispo a um escol artístico de eleição mos-
tra as possibilidades abertas para a concretização do projecto re‑
novador tridentino do Arcebispo e será devidamente aprofunda-
do mais adiante. Sabemos por nova documentação arquivística
recenseada, por exemplo, que ele fez encomendas custosas de
têxteis em Florença. Segundo a Noticia do seu governo, que temos
citado, «no ano de 1592 ordenou fazer outro ornamento grande pª as festas
principais pª ho qual deu ordem pera Florença e mandou pintado em papel
grosso todos os xavascos e capelos de capas pera tudo vir daquela pintura,
o qual ornamento tem vinte e nove capas todas das cavastras de borcado
branco», e à hora da morte preparava outra encomenda caríssima
de paramentos litúrgicos a serem bordados em oicinas italianas
(uma lorentina e uma romana), para cuja confecção mandou
modelos com expressas indicações das cores a usar, mas essa
sua intenção seria anulada pelo Cabido em sede vacante, que gas-
tou o dinheiro noutras coisas 36.
Também se sabe que D. Teotónio de Bragança fez aquisição
de esculturas em Valladolid e em Madrid 37, encomendou obras
de talha em Lisboa (sempre sob a superintendência do seu arqui-
tecto Nicolau de Frias), comprou e mandou fazer pinturas em
Roma (documenta-se adiante um quadro para a Cartuxa, com
ordem de encomenda em Janeiro de 1602), e adquiriu peças de
prata em Castela (através de Andrés de Taude e de outros ouri-
ves). Das peças que reuniu na sua colecção e que doou ao mos-
teiro da Scala Coeli, conhece-se um elenco parcial, que adiante
se transcreve. Muitas foram, assim, as obras patrocinadas pelo

27
Arcebispo nos vinte e três anos que durou o seu múnus eboren-
se e delas nos dá conta, entre outros textos inéditos, a referida
e preciosa relação anónima intitulada Noticias do seu governo, es-
crita logo a seguir à sua morte com o intuito de sensibilizar os
sucessores no cargo a seguirem políticas ains.
Exemplos artísticos como este multiplicam-se na acção
episcopal de D. Teotónio de Bragança e mostram bem aquilo
que ele foi e signiicou para os contemporâneos: um verdadeiro
homem do Concílio de Trento, manifesto seguidor dos ditames
conciliares em todas as vertentes do seu múnus pastoral e capaz,
por isso, de qualitativamente melhorar a vivência das comuni-
dades que dirigia sob o ponto de vista espiritual.

1 . 3 . A p i n t u r a a f r e s c o e a r e n o va ç ã o
artística

Saber-se-á adiante que também a arqueologia interessou, e


muito, ao Arcebispo de Évora, não no sentido, naturalmente, em
que se virá a constituír como ciência em pleno século XIX, mas
como método de perscrutação do passado histórico. Assim, o
acento no estudo de presumíveis origens paleo-cristãs no Alen-
tejo, dentro de uma sequência da prática do humanismo cristão,
serviu a D. Teotónio razões de sobra para aprofundar uma es-
pécie de cartograia hagiológica do vastíssimo território por si
administrado. Mas a atenção do Arcebispo dirigiu-se, concomi-
tantemente, para a decoração das igrejas, cujo carácter distintivo
foi acentuado com recurso à pintura mural e a outros géneros
ornamentais usados numa perspectiva que chamaríamos de arte
total, dentro do preceito tridentino de ars senza tempo.
Sabemos que lia com atenção autores tridentinos como Carlos
Borromeu e Cesare Baronio, e que trouxe de Espanha a relíquia
de São Manços, um mártir considerado o primitivo epíscope ebo-
rense, o que originou uma série de manifestações artísticas com
grande impacto. Por isso também, fomentou outras campanhas
arqueológicas em lugares hierofânicos da Arquidiocese na busca

28
de vestígios e estruturas primevas, como nos lugares de martí-
rio de São Torpes em Sines e das de Santas Comba e Inonima-
ta na Tourega, ou de São Romão em terras de Brinches, e mais
sabemos que recolheu (ou foi testemunha da recolha, promo-
vida por seu sobrinho D. Teodósio) peças de epigraia latina (as
célebres inscrições ao deus lusitano Endovélico) e que deiniu
critérios de restauro storico, à boa maneira dos seus tão amados
reformadores italianos. Trataremos adiante dessa sua política
de consolidação de vestígios arquitectónicos de alegada origem
paleo-cristã, e das soluções com que encarou a ampliação de
estruturas arquitectónicas existentes (como sucedeu nas igrejas
de São Manços, São Pedro da Gafanhoeira ou Santa Maria de
Machede). Estes são aspectos por demais interessantes, e muito
desconhecidos, de uma personalidade verdadeiramente actuali-
zada nas bases referenciais e nas soluções advogadas.
Um dos géneros mais estimado foi a pintura mural a fresco.
Desde as épocas mais remotas, a pintura mural era já uma das
modalidades decorativas preferidas na produção de arte alen-
tejana, mas veio a ocupar um papel de relevo no novo tipo de
ornamentação intestina da era teotonina. O fresco fora prática
dominante, no Gótico e no primeiro Renascimento, por questões
climatéricas, de tradição, de durabilidade e de práxis. No século
XVI, as autoridades eclesiásticas da Arquidiocese recomenda-
vam, geralmente, que se usasse mais a pintura a fresco, em lugar
de retábulos de marcenaria com painéis pintados a óleo, por ser
esta a solução mais barata, duradoira e eicaz. Por isso, tornou­se
norma seguida tanto nas paróquias de menores recursos como
em obras citadinas de maior erudição e responsabilidade. Um
bom exemplo é-nos dado por uma recomendação capitular do
Cardeal-Infante D. Henrique, em 1575, desmotivando os fre-
gueses da igreja de São Pedro de Évoramonte a gastarem di-
nheiro com um novo retábulo de talha e painéis, dizendo-lhes
que «bastava» (sic) mandar pintar a fresco, em alternativa, um
retábulo ingido na parede fundeira da ousia 38.
Seguindo a boa tradição eborense das gerações precedentes,
como é o caso dos frescos da cimalha da igreja da Misericórdia e

29
do convento de Santa Clara (ambos tapados por opulentas telas
e revestimentos de talha barroca), e da ousia da antiga igreja de
São Vicente, servindo-se de pintores da qualidade do neerlandês
Francisco de Campos, a arte fresquista eborense continuava a
ter, no declinar do século XVI, um papel preferencial por parte
dos mercados da cidade. Francisco de Campos fora um pintor
de óleo e de fresco de altíssimos recursos, activo para a Sé no
tempo do Arcebispo D. João de Melo, para salões e oratórios
do Paço Ducal de Vila Viçosa a mando dos Duques de Bragan-
ça D. Teotónio I e D. João I, e activo na Sala Oval do Paço dos
Condes de Basto a mando de D. Diogo de Castro, tendo jus-
tamente falecido, vítima da grande peste de 1580, quando es-
tava a pintar ao serviço dos Castros já que, não tendo receado
a epidemia, prosseguiu os trabalhos. Ao admirar-se o conjunto
de tábuas que fez para os altares da Sé a mando de D. João de
Melo, uma delas a Adoração dos Magos do Museu de Arte Sacra
da Sé de Évora, sente-se a força das alterações da concepção es-
pacial e a ousadia das formas anti-clássicas, com recurso a rovine
arqueológicas ao modo de Maerten van Heemskerck e também
de Giulio Romano, tudo de desenho irrepreensível, atestado na
representação de peças de prata, armaria, barros ou livros ilu-
minados 39. Pintor de óleo e fresco, Francisco de Campos é o
nome mais destacado desta geração maneirista experimental que
se seguiu à de Gregório Lopes e o exemplo de artista interna-
cional que ousa surpreender-nos com novas errâncias de pincel
e estranhas dilatações de poses, num complicado exercício de
superação da norma clássica. Os frescos da Sala Oval do Paço
dos Bastos mostram-no com clareza, e parece certo, também,
que não seria essa Bella Maniera requintada e com laivos profa-
nos que mais agradaria ao novo Arcebispo. Por isso, o contacto
do pintor com D. Teotónio, se existiu, não foi signiicante em
resultados nem podia sê-lo, pois Campos morreu na peste do
Verão de 1580.
De outros pintores importantes ligados à Casa de Bragança,
Giraldo Fernandes de Prado (c. 1530-1592), também iluminador
Fig. 43 e calígrafo, passa por Évora no tempo de D. Teotónio e deixa

30
obra relevante de fresco na Enfermaria do mosteiro cistercien- Fig. 30
se de São Bento de Cástris (dois frescos recentemente identi-
icados com o Calvário, integrado num altar maneirista lavrado
em massa, e São Sebastião e doadora, ambos de primorosa execu-
ção). Em Évora, vivia ainda Marco António Nogueira, pintor
de fresco, que era ilho do pintor maneirista António Nogueira
e que pintou o Arco de Alconchel, em Junho de 1583, para a
Entrada de Filipe I de Portugal na cidade, uma obra fresquista
elogiada pelas fontes e que custou o alto preço de 80.000 rs 40.
Também servidor dos Braganças, o inglês Thomas Lewis (de
nome aportuguesado para Tomás Luís) seguiu alguns anos de-
pois os passos de Campos e de Giraldo, decorando em Évora,
com exuberante programa eivado de citações ovidianas e de re-
ferências laudatórias aos Castros, dois salões do Paço dos Con-
des de Basto (c. 1582-1585) e pintando de seguida, em Vila Vi-
çosa, as «casas novas» do Paço Ducal (1602-1603), com a saga
de Perseu e Andrómeda, a história de David e Golias e outras
narrações histórico-mitológicas do maravilhoso e do insólito 41.
Estes são óptimos exemplos de um Maneirismo aristocrático,
tardio mas eivado de caprichos, com pinturas de sinal histórico-
­mitológico aos modos do que se fazia em Itália no im do sé-
culo XVI. Mas existem em Évora muitas outras decorações
fresquistas de qualidade, que traem a erudita formulação de
que foram alvo por parte de agentes, mecenas e artistas: basta
ver-se o conjunto afrescado da Sacristia jesuítica do Colégio do
Espírito Santo, datado de 1599, para se assinalar um testemu-
nho especialmente cuidadoso em termos de execução plástica,
de conteúdo simbólico e de programa iconológico, sobre cuja
autoria adiante se falará 42.
O gosto estético que se impõe no grande Alentejo com D.
Teotónio de Bragança utilizou e aprofundou, assim, a antiga tra-
dição do fresco. Usou­o, naturalmente, num contexto algo aim
a esse tipo de decorações, quando se tratava de decorar salões
para clientes de estatuto acima da mediania, tal como se gene-
ralizara nas gerações precedentes. Assim fará José de Escovar,
pintor com oicina na Rua do Raimundo e com profícua acti- Fig. 58

31
Fig. 55 vidade fresquista em toda a Arquidiocese, quando se desloca a
Fig. 31 Elvas no início do século XVII e afresca não só a capela-mor da
igreja de Santa Clara como também o salão do palacete do Bailio
de Malta, o Dr. Rui de Brito 43. Com estas e outras intervenções,
Escovar ampliou os recursos e possibilidades da arte do fresco
ao saber integrá-la num tipo mais ousado de ornamentação total,
dentro de um estudado espírito de bel composto com raízes italia-
nizadas. A decoração que fez em 1605 do Refeitório do Mostei-
ro de São Bento de Cástris, com uma alegoria profana aos Me-
ses e aos Elementos, por encomenda das freiras cistercienses e
segundo programa do procurador da casa, Frei Pedro da Cruz,
é bem sintomática desse espírito e dessa linguagem 44. São de
referir outros exemplos desse tipo de ars senza tempo aplicada à
Arquidiocese, com recurso à associação de frescos, stucchi, esgra-
itos e azulejos ingidos, como sucede na igreja de São Brissos,
verdadeira pinacoteca do novo hagiológio eborense, que o mesmo Es-
covar pinta, com colaboradores, e que trai essa ‘linguagem total’,
a lembrar (com as devidas distâncias) algumas capelas afresca-
das em Roma no tempo de Sisto V. Esse gosto teotonino, que
é seguramente da responsabilidade do Arcebispo e que, sendo
mais romanizado, se situa dentro de uma tipologia «reformada»
(ou «contra-maneirista») com maior alinhamento a um espíri-
to neo‑antigo, extrapola o papel das várias modalidades artísticas,
situadas dentro daquilo que exigia a reforma tridentina vigente,
atribuindo­lhes um papel de globalidade cenográica, ou seja,
um papel de «obra de arte total» inteligível pelas comunidades.
Tal contributo, que é em si uma novidade no panorama artís-
tico eborense, já se atesta, por exemplo, no programa com que
D. Teotónio mandou afrescar a cobertura da Capela gótica de
São Lourenço no transepto da Sé, que José de Escovar iria pin-
tar em 1597, recorrendo a esse gosto neo-constantiniano que era
o do Arcebispo. Este é um bom exemplo desse gosto teotoni-
no: numa composição de stucco e fresco, com molduras de obra
de massa relevada envolvendo quadri riportati afrescados em que
se desenvolve uma narração apologética da vida e martírio do
santo, de tónus didascálico. Era esse, precisamente, o gosto do

32
que se recomendava e fazia em Roma no inal do mesmo século Figs.
28-29
XVI nas decorações papais afrescadas por artistas como Cesa-
re Nebbia, Giovanni Guerra, Niccoló Pomarancio ou Giovan
Battista Ricci da Novara 45 ! É interessante sabermos que essa
capela catedralícea de São Lourenço acabara de receber bula de
privilégio por parte do papa Clemente VIII, o que levou o Ar-
cebispo a decorá-la dentro desse gosto senza tempo que era o da
cidade de Roma, vista como a umbilicus mundi, a capital da Cris-
tandade e do Mundo.
Tal como em outros casos de decorações teotoninas de que
falaremos com maior pormenor, como é o caso do projecto
ornamental das igrejas de Nossa Senhora da Graça de Divor
e de Santa Maria de Machede, onde são outros os pintores en-
volvidos (um deles, por certo, Custódio da Costa), a supervisão
do programa decorativo da obra da Capela de São Lourenço
deve ter cabido ao seu arquitecto e escultor Pero Vaz Pereira,
que estivera em Roma, e a quem é lícito tributar o desenho e
o «modelo» para a ornamentação de massa e para a traça geral
dos quadri riportati. Sabemos exactamente que coube a Pero Vaz
Pereira deinir a traça e o programa de decoração intestina de
Santa Maria de Machede (traça de 1604), uma tarefa que assu-
mira ao longo da década precedente e para a qual a sua dupla
qualidade de arquitecto e de escultor ao serviço da Arquidiocese
(e, de seguida, ao serviço da Casa de Bragança) o apetrechavam
como a nenhum outro artista do tempo.
O incremento desse tipo de linguagem artística, com raízes
neo-constantinianas, constitui um dos pólos de novidade e de
interesse dessa renovação ideológica e estética empreendida no
tempo de D. Teotónio em toda a sua Arquidiocese. E foi por isso,
também, que estas décadas de transição do século XVI para o
XVII foram um tempo de abundância de trabalho para os fres-
quistas eborenses, como não sucedeu em nenhuma outra cidade
portuguesa: pintores como Marco António Nogueira, José de
Escovar, Manuel de Araújo, João de Moura, Francisco António,
Manuel Carvalho, Fernão Luís, Custódio da Costa ou Luís de
Escovar, entre outros, encontravam nos conventos, irmandades,

33
igrejas e oratórios da província inúmeras solicitações de traba-
lho. Era um tempo de encomendas multiplicadas por certo ainda
que, convém dizer também, com conlitos laborais e rivalidades
que os documentos deixam transpirar, mas onde alguns factos
atestam a importância da modalidade: quando em 1589 José de
Escovar foi acusado de ter morto sua primeira mulher Júlia da
Rocha, e preso no Limoeiro com condenação de degredo para
Angola, viu a pena comutada pelo facto de exercer uma activi-
dade que era importante para o Arcebispado 46. Apesar do cri-
me alegadamente cometido, a sua múltipla produção fresquista
nas três décadas seguintes comprova de modo taxativo que a
sociedade eborense lho perdoou. Para o Arcebispado era mais
importante assegurar a sua actividade de decorador freesquista,
que era rápida, barata e muito eicaz.
Vemos D. Teotónio de Bragança, em resumo, a enriquecer
substancialmente os acervos catedralíceos e das demais igrejas
arquiepiscopais, a promover novos temas iconográicos, a valo-
rizar o estatuto social dos artistas a seu serviço e a deinir uma
tipologia construtiva distinta da que pautara a arquitectura ebo-
rense precedente. Todo este esforço para modernizar a produ-
ção artística, qualiicando­a com bases históricas e segundo os
preceitos da ars senza tempo, merece ser conhecido e analisado
globalmente. Ele foi em suma, com as devidas distâncias, um
mecenas da cultura, das letras e das artes com dimensão similar
à dos seus contemporâneos D. Bernardo de Sandoval y Rojas
(1546-1618), Arcebispo de Toledo, ou D. Juan de Ribera (1532-
-1611), Arcebispo de Valência e de Sevilha, nomes ilustres do
mecenatismo artístico no contexto peninsular do chamado «lar-
go tempo» do Renascimento 47, ou ainda de D. Frei Aleixo de
Meneses (1559-1617), o Arcebispo de Goa entre 1595 e 1612,
uma fase de grande prestígio construtivo e pastoral do Estado
Português da Índia 48.
Tal como essas e outras iguras de bispos­mecenas, e não
sendo ele já um homem do Renascimento na acepção histórica
e temporal com que utilizamos o conceito, D. Teotónio inter-
veio de modo sólido na arquitectura, nas artes decorativas, no

34
coleccionismo e na cultura vivenciada no seu tempo, activando
tanto os fenómenos de persistência, de revitalização e de ruptu-
ra, lançando novos olhares sobre a prática da religião, o mundo
natural, o exercício político, o papel da mercância, a saúde pú-
blica, as estratégias da escrita e da representação do Outro, e o
descobrimento arqueológico das origens e identidades. Ele foi,
assim, um dos frutos mecenáticos dos ideais renovadores do
Concílio de Trento e do novo gosto estético implantado na fase
tardia do Maneirismo italiano, o que explica e «situa» a sua ac-
ção dentro da inluência dos cânones da Contra‑Maniera romana.
Essas linhas programáticas de novo tipo, que seguiu na sua
governação, rastreadas a partir de um sólido conhecimento da
Roma de Sisto V e da ars senza tempo, transformaram a Évora
do inal do século XVI num caso excepcional de sucesso em
termos construtivos e de renovação do seu património. É cer-
to que dispôs de um escol artístico à altura dos objectivos tra-
çados, mas a verdade é que criou um ambiente propício ao seu
trabalho, atraindo também artistas estrangeiros para assegura-
rem as obras pretendidas.
Trata-se de um campo que merece ser investigado; abundam
os materiais, os fundos arquivísticos e as remanescências artísti-
cas, e o propósito deste livro é justamente esse: dar conhecimen-
to do mecenato deste Bragança que foi ilustre homem da Igreja
no declinar do século XVI. Nesse sentido também (e apesar dos
surtos de pestes ou de anos de carestia devido a más colheitas
agrícolas), a cidade de Évora conirmou o seu estatuto de se-
gunda cidade do Reino, unindo o peso da antiguidade romana
e medieval aos novos e actualizados empreendimentos arquie-
piscopais. Com D. Teotónio de Bragança, a velha Ebora Colonia
Romana dispõs de circunstâncias privilegiadas para assumir os
dispositivos tridentinos nas suas componentes fundamentais de
prestígio histórico, de assistência cívica, de organização social,
de memória paleo-cristã e de dinâmicas de crescimento.

35
Notas

1 Cf. os textos incontornáveis de Túlio Espanca no seu Inventário Artístico de Portugal.


Concelho de Évora, Academia Nacional de Belas-Artes, 2 vols., Lisboa, 1966.
2 Joaquim Veríssimo Serrão, História de Portugal (1495‑1580), Lisboa, Verbo, vol. II,
1978, pp. 76-94
3 Nicolau Agostinho, Relaçam Summaria da Vida do illustrissimo, et Reverendissimo Senhor
Dom Theotonio de Bragãça, Quatro Arcebispoo de Évora, Off. Francisco Simões, Évora, 1614.
4 Cf. os seguintes estudos essenciais sobre o Arcebispo: Manuel Caetano de Sousa,
Collecçam de Documentos e Memorias da Academia Real de Historia Portuguesa, tomo V, Lis-
boa, 1725, ppp. 230-255; J. Pinharanda Gomes, «O Arcebispo de Évora D. Teotónio
de Bragança, fundador da Cartuxa, na Vida de Santa Teresa de Jesus», Igreja Eborense,
I, 1983, pp. 7-34; idem, Dom Teotónio de Bragança: Escritos Pastorais, Braga, 1984; Maria
Antónia Hespanhol, Dom Theotonio de Bragança. O Primeiro Arcebispo de Évora no Domí‑
nio Filipino (1578‑1602), tese de Mestrado em História Moderna, Faculdade de Letras
da Universidade de Lisboa, 3 vols., 1993; Federico Palomo del Barrio, Poder e Disci‑
plinamento en la Diocésis de Evora: el episcopado de D. Teotonio de Bragança, Madrid, Univer-
sidad Complutense, 1994; idem, «La autoridade de los prelados postridentinos y la
sociedad moderna. El gobierno de Don Teotonio de Braganza en el arzobispado de
Evora», Hispania Sacra, vol. XLVII, nº 96, 1995, pp. 587-624, e Cátia Teles e Marques,
«Os paços episcopais nos modelos de representação protagonizados por bispos de
nobreza no período pós-tridentino», A Casa Senhorial em Lisboa e no Rio de Janei-
ro, FCSH e FBARJ, 2014, pp. 27-32.
5 Laurinda Abreu, «O Arcebispo D. Teotónio de Bragança e a reestruturação do
sistema assistencial da Évora Moderna», in Igreja, Caridade e Assistência na Península
Ibérica (sécs. XVI‑XVIII), Lisboa, Colibri, 2004, pp. 155-165. Segundo A. F. Barata,
Evora Antiga, Évora, 1909, a peste de 1579-1580 provocou mais de 25.000 mortos
(números extrapolados, pois Évora não tinha mais de 13 a 15.000 habitantes); além
da rede hospitalar estruturada por D. Teotónio, houve também serviço assistencial
por parte dos jesuítas, que criaram um hospício no Loredo.
6 Cf. Federico Zeri, Pittura e Controrriforma. L’arte senza tempo de Scipione Pulzone da
Gaeta, Turim, Einaudi, 1957; Gisella Cantino, Claudio Strinati, Luigi Spezzabero e
Giorgio Fulco, Roma Nell’anno 1600, in Richerche di Storia Dell’Arte, nº 10, 1980; Ales-
sandro Zuccari, I pittori di Sisto V, Fratelli Palombi Editori, Roma, 1992; Ottavio Ni-
coli, Vedere com gli occhi del cuore. Alle origine del potere delle immagini, Roma, Laterza, 2011.
7 Vitor Serrão, «Impactos do Concílio de Trento na arte portuguesa entre o Ma-
neirismo e o Barroco (1563-1750)», O Concílio de Trento em Portugal e nas suas conquis‑
tas: olhares novos, coord. de José Pedro Paiva Lisboa, Centro de Estudos de História
Religiosa da Universidade Católica Portuguesa, 2012, pp. 103-132, refª pp. 114-115.
8 Susana Matos Abreu, «André de Resende, um novo Alberti ? Um ideólogo entre
o “princeps” e o “architectus”, na recuperação da “Vrbs” romana de Évora (1531-
-1537)», Espaços e Paisagens. Antiguidade Clássica e Heranças Contemporâneas, Centro de
Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 2010, pp. 223-230.
9 Vitor Serrão, «Restauro storico y sacrae imagines en Évora bajo el gobierno del arzo-
bispo don Teotonio de Braganza (1578-1602)», Archivo Español de Arte (no prelo).

36
10 Ricardo Estêvam Pereira, «A descoberta do túmulo de São Torpes em 1591», Actas on-
-line do 1º Congresso de Arqueologia da Associação dos Arqueólogos Portugueses, Lisboa, 2013.
11 Maria Antónia Hespanhol, Dom Theotonio de Bragança. O Primeiro Arcebispo de Évora
no Domínio Filipino (1578‑1602), cit.
12 Cf. Belmiro Fernandes Pereira, «Duas bibliotecas humanísticas: alguns livros
doados à Cartuxa de Évora por Diogo Mendes de Vasconcelos e por D. Teotónio
de Bragança», Humanitas, XLVII, 1995, pp. 845-860; e A. Aires do Nascimento, «A
livraria de D. Teodósio I, Duque de Bragança», Actas do Congresso de História. Évora,
IV Centenário do Seminário de Évora, 1994, pp. 209-220.
13 Vitor Serrão, «As artes decorativas na colecção palaciana de D. Fernando de Cas-
tro, 1º Conde de Basto, na Évora do inal do século XVI», Artis – revista de História
da Arte e Ciências do Património, nº 2, 2014, pp. 8-21. Cf. DOC. Nº 4 e DOC. Nº 56.
14 Arquivo Histórico da Fundação Eugénio de Almeida (doravante citado
A.H.F.E.A.), Inventario que se fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor Conde
de Basto dom Lourenso pires de Castro que faleseo em Catalunha no lugar de fraga sem descen‑
dentes deixando por sua universal herdeira a senhora Condessa de Basto Dona Violante de Len‑
castre sua molher. DOC. Nº 4.
15 Túlio Espanca, «Visitas de Embaixadores célebres, Reis, Príncipes e Arcebispos
a Évora nos Séculos XV-XVIII». A Cidade de Évora, nºs 27-28, 1952, pp. 139-246.
16 Vitor Serrão, «Mecenas e colecções em Portugal na Idade Moderna: dos Castro
da Penha Verde aos Basto de Évora, e uma encomenda em Pernambuco», in Colec-
ções de Arte em Portugal e Brasil nos séculos XIX e XXX. Peris e trânsitos, coord. de Maria
João Neto e Marize Malta, Lisboa, ed. Caleidoscópio, 2014, pp. 22-48.
17 A.N.T.T., Códices e documentos de proveniência desconhecida, nº 64. Sem data, mas apa-
rentando ser do princípio do século XVII, logo após a morte de D. Teotónio, apre-
senta uma etiqueta na pasta superior da encadernação com a informação Cartuxa de
Évora. Comunicação inédita do senhor Dr. Francisco Bilou, a quem agradecemos.
Cf. DOC. Nº 47.
18 O múnus de D. Alexandre, homem de personalidade absolutamente oposta à de
D. Teotónio, foi muito pouco signiicativo em termos culturais e mereceu críticas do
Cabido, tanto pelas suas ausências, como pela ostentação de vida. Logo após a sua
morte, o Cabido em sede vacante ordenou a demolição de um passadiço que ele ize-
ra construír entre os Paços arquiepiscopais e a Sé para sua exclusiva comodidade.
19 Arquivo da Sé de Évora (doravante citado A.S.E.), Inventários dos bens móveis de D.
Alexandre de Bragança, 1603 (PT/ASE/ME/B/002/Doc.003), cf. DOC. Nº 35. D.
Alexandre era ilho do 6º Duque D. João I e de D. Catarina de Bragança, que lhe do-
aram vários bens aquando da designação. Homem doente, passou parte dos anos de
governação diocesana no Paço de Vila Viçosa, de onde despachava os assuntos pas-
torais. O seu múnus, num sentido oposto ao de D. Teotónio, foi muito pouco signii-
cativo e mereceu críticas, tanto pelas ausências como pela ostentação de vida. Após
a sua morte, o Cabido em sede vacante apeou o passadiço que izera construír entre os
Paços arquiepiscopais e a Sé para sua comodidade.
20 ANTT, Inquisição de Évora, procº 5868. Informação da senhora Doutora Isabel
Drumond Braga, a quem agradecemos.

37
21 D. Duarte, irmão de D. Teodósio II, viveu muitos anos em Espanha, e foi igura
letrada, tendo custeado as edições da Etiópia Oriental de Frei João dos Santos (Évora,
1609) e da Corte na Aldeia de Francisco Rodrigues Lobo (Lisboa, 1618). O inventário
de bens consta de Archivo Historico Nacional de Madrid, Sección Nobleza, Toledo –
Casa de Frias, Cajas 1375-1377. Ver DOC. Nº 54. Informação do Doutor Fernando
Bouza Álvares, a quem agradecemos.
22 Patricia Falguières, «La société des objects» e «Lire Schlosser aujoud’hui ?», in
Les Cabinets d’art et les merveilles de la Renaissance tardive de Julius von Schlosser (Leipzig,
1908), éd. Macula, Paris, 2014, pp. 8-60 e 266-350.
23 António Borges Coelho, A Inquisição em Évora (1533‑1668), Lisboa, Editorial
Caminho, 1987.
24 Túlio Espanca, op. cit., p. XX.
25 Alessandro Zuccari, op. cit., p. 58.
26 Flávio Gonçalves, Breve Ensaio sobre a Iconograia da Pintura Religiosa em Portugal,
sep. de Belas‑Artes, 3ª série, nº 27, 1973, p. 13.
27 Vitor Serrão, O Fresco Maneirista no Paço de Vila Viçosa, Parnaso dos Duques de Bra‑
gança (1540‑1640), Caxias, Fundação da Casa de Bragança, 2008, pp. 131-136.
28 Documentação revelada em Mário Cabeças, «Obras e remodelações na Sé Ca-
tedral de Elvas (1599-1637)», Artis ‑ Revista do Instituto de História da Arte, nº 3, 2004,
pp. 239-265.
29 Cf. Paulo Simões Rodrigues Apologia da Cidade Antiga. A formação da identidade
de Évora (séculos XVI a XIX), tese de Doutoramento, Universidade de Évora, 2009.
30 Celso Mangucci, «Anatomia da Arquitectura da Igreja da Colegiada de Santiago
de Évora», Boletim do Arquivo Distrital de Évora, nº 1, Julho de 2014, pp. 27-39.
31 Túlio Espanca, «Documentos notariais inéditos e artistas alentejanos dos sécu-
los XVI-XVIII», A Cidade de Évora, 67-68, 1984-85, pp. 98-126, refª pp. 102 e 125.
32 Biblioteca Nacional de Portugal (doravante designada B.N.P.), Reservados, Cód.
146, Relação da Entrada da Reliquia de S. Manços (em Vila Viçosa), ls. 17­23. DOC. Nº 25.
33 Domenico Fontana, Della trasportatione dell’obelisco Vaticano et delle fabriche di Nostro
Signore Papa Sisto V, fatte dal caualier Domenico Fontana architetto di Sua Santita: libro primo,
Roma, appresso Domenico Basa, 1590. O exemplar guardado na B.N.P., cota res-
-2990-a, bem pode ser o que existia na Biblioteca do Arcebispo.
34 No Catálogo da Exposição De El Bosco a Tiziano. Arte y maravilla en El Escorial, co-
missariada por Fernando Checa Cremades, Palacio Real de Madrid, 2013, expuseram-
­se peças idênticas ao Relicário de São Manços. Reira­se, como curiosidade, um em-
blema numa gravura do livro de Sebastián de Covarrubias Orozco, Emblemas Morales,
de 1610 onde se representa um obelisco muito similar ao relicário de Évora, usado
como modelo num painel de azulejos de c. 1620 no Museu Nacional do Azulejo, nº
invº 4191Az (catálogo Um Gosto Português, O uso do azulejo no século XVII, Museu do
Azulejo, «entrada» de Alexandre Pais, pp. 273 e 279).
35 B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança. No‑
ticias do seu governo. Início do século XVII. Cf. DOC. Nº 46.

38
36 Segundo mais diz essa preciosa memória anónima, escrita logo a seguir à morte
do Arcebispo, «tinha então posto hum valle de dois mil e quinhentos crusados da obra para co‑
meçar outro ornamento rico em Florença o qual se não fez nem começou com sua morte. E ho cabi‑
do em Se vagãte arrecadou ho drº e se gastou no que se ordenou emtam que foi o fazerem as maças
e outras coisas» (DOC. Nº 46: B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Arcebispo de Evora D.
Theotonio de Bragança. Noticias do seu governo, ls. 5 vº e 6 vº). DOC. Nº 46.
37 Biblioteca Pública de Évora (doravante citada B.P.E.), Cód. CVII/1-28: Inven‑
tario de tudo o que o Arcebpo tem dado aos padres Cartuxos do Mosteiro de eScala caeli desta
cidade de Evora.
38 A.S.E., Lº 2 do Governo Capitular, 1574‑1577 (cota PT/ASE/CSE/C/001/Lº 2),
l. 22.
39 Sobre este artista de excelentes recursos, cf. Martín S. Soria, «Francisco de Campos
(?) and Mannerist Ornamental Design in Évora, 1555 to 1580», Belas‑Artes, Academia
Nacional de Belas-Artes, 2ª série, nº 10, 1957, pp. 22-27; Joaquim Oliveira Caetano
e José Alberto Seabra Carvalho, Frescos Quinhentistas do Paço de S. Miguel, Fundação
Eugénio de Almeida, Évora, 1990; Vitor Serrão, op. cit. (2008), pp. 96-102 e 141-
-143; Maria Teresa Desterro, Francisco de Campos (c. 1515‑1580) e a ‘Bella Maniera’ entre
a Flandres, Espanha e Portugal, tese de Doutoramento, Universidade de Lisboa, 2008.
40 Sobre Marco António Nogueira, cf. Arquivo Distrital de Évora (doravante de-
signado A.D.E.), Cód. III da Câmara de Évora, ls. 68 vº e 69, e Lº 252 de Notas de Bal‑
tazar de Andrade, ls. 104 vº­106, com referências à sua actividade em Maio de 1582.
41 Cf. Vitor Serrão, O Maneirismo e o Estatuto Social dos Pintores Portugueses, e op. cit.
(2008), pp. 113-139 e 152-155-102; Filipa Raposo Cordeiro, Thomas Luis, pintor ma‑
neirista do sacro e do profano: arte, conservação e restauro. Casos de Évora, Aldeia Galega, Elvas,
Idanha‑a‑Nova e Vila Viçosa – séculos XVI a XVIII, tese de doutoramento, Universi-
dade de Lisboa, 2014.
42 Sobre estes frescos, cf. Túlio Espanca, «Notas sobre pintores em Évora nos sé-
culos XVI e XVII», A Cidade de Évora, nºs 13-14, 1947, pp. 109-213; idem, Inventário
Artístico de Portugal. Concelho de Évora, Academia Nacional de Belas-Artes, 1966; José
Alberto Gomes Machado, «As pinturas a fresco da Sacristia Nova da igreja do Es-
pírito Santo de Évora (1599)», Homenagem ao Prof. Augusto da Silva, Universidade de
Évora, 2000, pp. 347-359; Fausto Sanches Martins, A arquitectura dos primeiros Colégios
jesuitas em Portugal, 1542‑1759, Doutoramento, Universidade do Porto, 1994; Vitor Ser-
rão, «A série seiscentista da Vida de São Francisco Xavier do antigo Colégio do Espírito
Santo de Évora: a iconograia xavieriana à luz de uma singular narração policénica»,
Oriente, nº 13, Dezembro de 2005, pp. 110-130; Celina Simas de Oliveira, As pinturas
da Sacristia Nova do Colégio do Espírito Santo de Évora. Um património a preservar, tese de
Mestrado, Universidade de Évora, 2009; e Luís de Moura Sobral, «Espiritualidade e
propaganda nos programas iconográicos dos jesuítas portugueses», Actas do Cong.
Internacional A Companhia de Jesus na Península Ibérica nos séculos XVI‑XVIII. Espiritu‑
alidade e Cultura, vol. II, 2004, pp. 385-415.
43 Cf. DOC. Nº 45. Vide também, sobre o pintor, DOCS. Nºs 6, 16, 18, 31, 32,
34, 39, 40 e 41.
44 Cf. DOC. Nº 40 (A.D.E., Cartório Notarial de Évora, Lº. 333 de Notas de Domin‑
gos Pires, ls. 191­193). Assim se esclarece um «pequeno problema» que se arrastava

39
nos estudos sobre o fresco eborense: a correcta interpretação do monograma F. Pº
+ que se vê, junto a escudo armoriado, no topo do Refeitório desse convento, e que
Túlio Espanca e outros autores pensaram fossem iniciais do ignoto pintor. Trata-se,
ainal, do nome do procurador da casa, Frei Pedro da Cruz, que nesta encomenda
com José de Escovar actuou como programador desse ciclo pictórico ! Acresce a
raridade deste ciclo em termos iconográicos: só se conhecem, quanto a programas
artísticos portugueses com representação dos Meses e Estações do Ano, as iluminu-
ras do chamado Livro de Horas de D. Manuel (M.N.A.A.), um ciclo de telas seiscentis-
tas de Baltazar Gomes Figueira e Josefa de Óbidos, e a série de cobre com Meses, de
ins do século XVI, conservadas na Sé de Miranda do Douro.
45 Cf. Alessandro Zuccari, I Pittori di Sisto V, cit., e Nicole Dacos, Viaggio a Roma. I
pittori europei nel’500, Roma, Jaca Book, 2012.
46 A.D.E., Lº 264 de Notas de Baltazar de Andrade, ls. 94­95, v. DOC. Nº 18. Ainda
em Setembro de 1619 havia ecos destes acontecimentos, aquando de partilhas de
bens em Estremoz com o ilho, pintor Luís de Escovar (A.D.E., Lº 485 de Notas de
António Gomes de Mariz, ls. 94 vº­95). Assina nesse contrato Manuel Nunes, discípu-
lo do ilho de José de Escovar.
47 Fernando Marías, El Largo Siglo XVI. Los usos artísticos del Renacimiento español, edi-
torial Taurus, col. Conceptos fundamentales para la Historia del Arte Español, Madrid, 1989.
48 Cf. Vitor Serrão, «Pintura e Devoção em Goa no Tempo dos Filipes: o Mosteiro
de Santa Mónica no ‘Monte Santo’ (c. 1606-1639) e os seus artistas», revista Oriente,
nº 20, 2011, pp. 11-50.

40
2. A personAlidAde de
d. teotónio de brAgAnçA

2.1. Um príncipe da casa de Bragança

D. Teotónio era o quinto ilho de D. Jaime, quarto duque de


Bragança, e de sua segunda mulher D. Joana de Mendonça. Nas-
ceu em Coimbra em 2 de Agosto de 1530, e bem cedo eviden-
ciou vocação pela vida religiosa, o que o levou a seguir estudos
no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra e, de seguida, no Colé-
gio da Companhia de Jesus dessa cidade. Teve intenção de pro-
fessar como jesuíta, sendo depois desaconselhado dessa escolha
pelo próprio Santo Inácio de Loyola, que o chamara a Roma no
intuito de poder vir a integrar a milícia da Companhia de Jesus.
Esclarece o seu biógrafo Nicolau Agostinho que D. Teotó- Fig. 1
nio era «homem alto de corpo, encorpado de carnes em perfeição que nem
o faziam gordo, nem icava magro: mas em huma proporção tão propor‑
cionada que, como dizem, era um homem bem posto no chão. Foi de rosto
comprido, alvo e rosado, quanto bastava para ser formoso, a testa larga, a
barba de rosto mui bem posta, de cabelo que parece que devia ser castanho‑
sobre louro, por ser já branco quando Arcebispo, a cabeça com calva hon‑
rada, o nariz comprido, um pouco aquilino. Era enim tão perfeito e igual
em todas as partes do corpo, que o faziam mui bem disposto e airozo» 49.
… Se Nicolau Agostinho, por ser capelão privativo de D.
Teotónio, dedicou o essencial da biograia do Arcebispo a esse

41
período de governação catedralícea, não dando informações su-
icientes sobre a sua vida precedente, existem dados para se re-
constituir a sua passagem temporã pelo mosteiro de Santa Cruz
de Coimbra, considerada «naquele tempo a palestra da Nobreza» e,
sobretudo, as passagens por Roma, os estudos na Universidade
de Paris em 1555-1559, onde se formou, e na de Bordéus, onde
em 23 de Maio de 1574 recebeu o grau de Doutor em Teologia
50
. Também existe alguma informação sobre os largos trechos
passados no Paço Ducal de Vila Viçosa junto do irmão D. Te-
odósio I, do sobrinho D. João I e dos numerosos parentes, o
que deixa a impressão de que o peso artístico da vida palatina
lhe inlamou os gostos e as escolhas ulteriores.
Fig. 57 Segundo Luís de Matos, o Paço de Vila Viçosa era «uma
das cortes mais ilustres do humanismo peninsular em meados
do século XVI» 51. Imagina-se, nas palavras deste historiador,
a pompa dos debates, os saraus de poesia e música, as tertú-
lias, parangonas livrescas e discussões estéticas e teológicas
que animavam os salões palatinos: «convivamos um instante
com homens de letras e de ciência, que por elas ganham a sua
vida, com idalgos eruditos e príncipes do Renascimento, que
se encontram sob o mesmo tecto do Paço Ducal. Decifra-se a
inscrição do último cipo trazido de Terena ao Paço, abre-se um
manuscrito iluminado da Biblioteca de D. Teodósio, admira-
-se a tapeçaria de seda e oiro dos feitos de Nuno Álvares, um
quadro ou uma escultura; estuda-se por outro lado a carta que
o correio real acaba de entregar, num momento de preocu-
pações políticas; toma-se posição quanto à política a adoptar
para com a Espanha e a França, pesam-se as vantagens e as
desvantagens do abandono das praças de África; Afonso Vaz
de Caminha conversa em latim com Juan Fernández, como
seria capaz de o fazer em grego e hebraico, em árabe ou em
caldeu, se achasse interlocutor; Fernão Cardoso graceja livre-
mente com Diogo Sigeu; discutem-se as obras de Mestre Aires
Barbosa e de Mestre Olmedo, de Vives e de Erasmo, trava-se
a disputa sobre se os nomes verbais eram necessários à per-
feição da gramática; D. Teodósio dialoga em grego e hebraico

42
com Mestre Sigeu, desce até à oicina de instrumentos náu-
ticos de António Rodrigues, dá-se pressa em que Maldonado
remeta a el-rei a sua Tauoada de Alturas, senta o cosmógrafo à
sua mesa para conversarem de astronomia; é o mesmo D. Te-
odósio que concebe os planos da fundação da sua Universi-
dade em Vila Viçosa...» 52.
Várias cartas do Duque seu irmão enviadas de Vila Viçosa
para Frei Brás de Barros, entre 1542 e 1555, referenciam a vida
de D. Teotónio passada em Coimbra, e os seus estudos no Mos-
teiro de Santa Cruz, onde cursou Humanidades, e recebeu lições
de D. Máximo de Sousa, que em 1535 vira publicada na cidade
a sua Arte da Gramática, primeira obra do género impressa em
Portugal 53. Também recebeu aulas dos humanistas Diogo de
Teive e Diogo Sigeu, entre outros mestres, e teve como colegas
os infantes D. Duarte e D. António, o futuro Prior do Crato.
Existem cartas do Duque D. Teodósio I (citando também o seu
irmão D. Fulgêncio) onde se denunciam situações de mal-estar
que se veriicaram amiúde com o comportamento de D. Teo-
tónio durante estes anos conimbricenses, em parte porque não
viam com bons olhos a sua opção pela vida religiosa 54. Uma car-
ta de 16 de Junho de 1548, remetida a Fr. Dionísio de Morais, é
especialmente reveladora de tensões envolvendo o aprendizado
de D. Teotónio na casa crúzia, designadamente porque (carta de
16 de Junho de 1548) se passara para o Colégio da Companhia
de Jesus sem prévia licença dos frades, o que merecia fortes re-
paros da parte do velho Duque seu irmão. Numa outra carta,
de 22 de Agosto de 1549, o padre Francisco Mendes exige que
ele nunca se ausente do mosteiro dos crúzios 55.
O chamamento ao seio dos jesuítas foi intenso, mas breve,
pois se desencantou; como se disse atrás. Na Cidade Papal, D.
Teotónio chegou a privar com o próprio Santo Inácio de Loyo-
la, que o desmotivaria a entrar na milícias, julgando que o jovem
português se revelaria pouco fadado para se adaptar à discipli-
na da Companhia, como aliás recorda o seu biógrafo Nicolau
Agostinho, gorando-se a intenção de integrar a milícia jesuítica.
Tendo optado pela formação teológica na Universidade de Paris,

43
onde estadeou, impelido pelos familiares, aí se veio a doutorar
em Teologia, em 1554. Também estadeou na Universidade de
Bordéus, e na de Salamanca, onde criou relações culturais, ad-
quirindo livros e estabelecendo pontes que lhe seriam valiosos,
mais tarde, já na condição de Arcebispo.
Sabemos que viajou muito, durante esses anos, por terras
italianas, francesas e inglesas e multiplicado contactos e conhe-
cimentos, e conhecendo os mosteiros de cartuxos, que tanto o
sensibilizaram pelo tipo de vivência eremítica, oposta à osten-
tação do século 56. Estava em 1554 em Londres, e aí assistiu ao
casamento de Maria Tudor com Filipe II. Seu sobrinho D. Te-
odósio I, quinto duque de Bragança (1532-1563), insistiu mui-
to em que voltasse ao Reino, designando-o para vir servir de
tesoureiro na Colegiada de Barcelos, mas logo renunciou a esse
cargo para poder prosseguir os seus estudos na Universidade
de Salamanca, onde teve oportunidade, em 1574, de conhecer
a própria Santa Teresa de Ávila e se corresponder com a refor-
madora do Carmelo sobre questões espirituais 57, tendo dela re-
cebido inclusive dois livros da sua autoria, La Vida y Milagros de
el glorioso padre Santo Alberto, de la sagrada religion, de nuestra Señora
del Carmen e O Caminho da Perfeição, obras que virão a ser editadas
em Évora a expensas do Arcebispo, a primeira em 1582, sem
indicação de editor, e a segunda em 1583, nos prelos da viúva
de André de Burgos 58.
Tal como escrevia André de Resende a respeito de D. João
II, chamando-lhe pater patriae por ter ultimado a reediicação do
Aqueduto romano da Água da Prata 59, poder-se-á investir des-
sa mesma imagem a igura de D. Teotónio de Bragança como
mecenas e consciência viva da sua cidade, quase um evergesta
(benfeitor) dotado de magnanimidade e espírito de concinnitas (a
harmonia, segundo o conceito albertiano). Tratou-se, assim, de
um verdadeiro homem da Igreja, dotado de vasta cultura prática,
universitária e livresca, mas dotado também de chama artística,
e nesse sentido foi chamado em Junho de 1578 pelo Cardeal D.
Henrique a regressar a Portugal para o coadjuvar, com o título
de bispo de Fez, no Arquiepiscopado de Évora.

44
Mas o desastre de Alcácer Quibir, e a decorrente subida ao
trono do Cardeal D. Henrique, conduzem D. Teotónio de Bra-
gança, em Dezembro, ao cargo arcebispal. Aí dá entrada como
Arcebispo a 7 de Dezembro de 1578, com recepção entusiástica
da população, mas regressa à capital dada a fase de conturbação
política que se vivia. No início de 1579, recebe-se de Roma o
pálio, que lhe é dado em solene entrega pelo Arcebispo de Lis-
boa D. Jorge de Almeida, em cerimónia decorrida no Mosteiro
do Carmo de Lisboa.
Só em Maio de 1579 veio D. Teotónio para Évora assumir
o seu múnus episcopal, mas a grande peste que então grassa-
va na cidade e nos campos leva-o a refugiar-se algum tempo
no palácio junto ao Santuário de Vera Cruz de Marmelar, nos
bons ares de Portel, de onde irá seguindo, na medida do pos-
sível, a dramática situação vivida, e estruturando o combate
à epidemia, através dos seus representantes, com as medidas
de assistência hospitalar, com dose de pormenores, no citado
manuscrito Noticias do seu governo… Foram meses de infortúnio
e pauperização, sobretudo das camadas de camponeses des-
protegidos e sujeitos à fome e ao abandono, apesar das acções
desenvolvidas e dos espaços assistenciais que se começaram
a criar por instâncias do Arcebispo, que chegou a abrir os ce-
leiros da Mitra para acudir aos mais necessitados. Nesse surto
pestífero morreram artistas, como os pintores Jorge Dinis e
Francisco de Campos, este último a trabalhar na cidade para
os Condes de Basto. Desse período de trevas nos dá conta,
também, o capelão e biógrafo de D. Teotónio, Nicolau Agos-
tinho. Só com o «levantamento da bandeira de saúde», em iní-
cio de 1581, afastados que eram já os perigos de contágio, re-
gressou ao seu paço, em Évora, e começou verdadeiramente
o seu múnus pastoral, com toda a eiciência.
Entretanto, ainda o Arcebispo se deslocará a Tomar, em Abril
de 1581, para intervir nas Cortes que elegeram Filipe II como
rei, com o nome de Filipe I de Portugal, mostrando sempre uma
atitude clara de apoio ao monarca espanhol, aliás a posição se-
guida pela maioria da nobreza e do clero portugueses, favorá-

45
veis à Monarquia Dual como sendo a legítima e mais adequada
solução para ultrapassar a crise dinástica. Apesar dessa sua pos-
tura, observe-se que em 1593, ano em que apareceram em Beja
exortações a um levantamento contra o rei Filipe I, D. Teotó-
nio impôs um «interdito» na sua Arquidiocese (a que a cidade
de Beja pertencia), publicando no ano seguinte a bula In coena
Domini que, segundo Fernando Bouza Álvares 60, «continha a
advertência de que seriam excomungados aqueles que apresen-
tassem à justiça secular o recurso de sentenças proferidas por
julgadores eclesiásticos», o que podia ser (e foi…) considerado
um desaio directo ao poder régio.
Estes conlitos de jurisdição, que D. Teotónio assumiu com
talento e espírito de intransigência, atingiram o clímax com a pu-
blicação do breve Clamor gravium de Clemente VIII, de 2 de Agosto
de 1594. Tratava-se de uma disputa pela autoridade jurisdicional,
em que o Arcebispo de Évora tanto se envolveu defendendo as
prerrogativas do cargo de modo inlexível, mostrando­se que
ele era, sobretudo, um homem da Igreja e que a ela devotava
todas as suas energias.

2.2. O MÚNUS PASTORAL DE ÉVORA

Ao assumir deinitivamente as rédeas do Arcebispado de


Évora, já com quarenta e oito anos de idade, essa vertente tri-
dentina torna-se especialmente clara no seu percurso. Recolheu
então, como demonstraram Pinharanda Gomes e Maria Antónia
Hespanhol, os conselhos teológicos de nomes como o Cardeal
Gabriele Paleotti, Arcebispo de Bolonha, D. Frei Bartolomeu
dos Mártires, Arcebispo de Braga, e o Cardeal Carlos Borromeo,
Arcebispo de Milão, autores que vão ter inluência decisiva nas
suas cartas pastorais, em termos canónico-jurídicos, políticos, si-
nodais, ascético-litúrgicos e de missionação propriamente dita 61.
Os conhecimentos adquiridos e a solidez da formação teo-
lógica do Arcebispo conduzem-no a uma governação exemplar e
dando cumprimento à Constituição Apostólica de Sisto V. To-

46
mou cedo o pulso da cidade, assim descrita em 1596 por um
dos seus teólogos diocesanos, o Dr. Francisco Rodrigues: «Evo‑
ra cabeça deste Arcebispado he huma Cidade mui insigne, e a segunda em
priminencia neste Reyno de Portugal, donde os Reis delle tinhão sua Corte
ordinariamente, quasi contemporânea na fundação com Roma, foy coroa‑
da de muro, torres, e barbacans pelo famosíssimo Sertorio (…) e recebeu
no culto divino pregadores evangélicos desde o tempo dos Apostolos porque
hum discípulo de Christo, chamado Mantyo, que dizem lhe deu agoa no
dia da ultima Cea pera lavar os pés dos discípulos foy o Apostolo desta
cidade, e primeiro Bispo della, e que a ornou, e esmaltou com seu sangue
sendo martirizado em o tempo do Prefeito Validio…» 62. Conhecedor
da importância histórica da cidade, D. Teotónio assumiu sem-
pre uma estratégia renovadora (não isenta de pontuais conlitos
com o Cabido e, também, com o Senado da Câmara e o gover-
nador militar da cidade, D. Fernando de Castro, Conde de Bas-
to) e levou a cabo uma investigação organizada no sentido de
enriquecer a Arquidiocese em termos construtivos e artísticos,
deixando-lhe uma marca mecenática, só em parte cumprida.
Ganhou grande prestígio junto das populações pelo modo
como enfrentou o surto de fome de 1579 e a peste de 1580,
abrindo os celeiros da cidade aos famintos, e pela sua política
assistencial, tendo fundado o Hospício da Piedade, o Recolhi-
mento de Santa Maria Madalena e o Seminário de São Manços.
Seguiu nestes empreendimentos sociais o modelo proposto
pelo ilantropo Miguel de Giginta (1534­1588), autor do Tra‑
tado de Remedio de Pobres (Coimbra, 1579) e da Exhortación a la
Compasión de los Pobres (Barcelona, 1583) e defensor das casas
da caridade, espécie de estruturas de assistência com mendicida-
de organizada e apoio assegurado por entidades públicas e pri-
vadas. Como diz Laurinda Abreu, «o Hospício da Piedade, para
pobres, o Recolhimento de S. Manços, para jovens da elite lo-
cal, o Recolhimento da Madalena, para “mulheres desonestas”,
os hospitais temporários para pestilentos, o apoio a incuráveis
e convalescentes do Hospital do Espírito Santo, compuseram
uma oferta variada, e altamente dispendiosa, custeada pelas ren-
das da Diocese e pelo património pessoal do arcebispo. Subja-

47
cente, uma visão holística do espaço social e, como objectivo, a
provisão de cuidados e recursos diferenciados de acordo com
o público-alvo e respectivas necessidades. Doentes, expostos,
presos pobres e pobres em trânsito estavam a cargo da miseri-
córdia, que partilhava com o cabido a assistência domiciliária»
63
. Neste quadro, tinham cabimento as teses de Miguel de Gi-
ginta, clérigo de Elna, que iam no sentido de se multiplicarem
pela Cristandade as casas de apoio aos desfavorecidos, onde a
simplicidade da arquitectura, a boa gestão administrativa, a eli-
minação dos exames de pobreza e o voluntariado de ingresso
fossem norma, cabendo aos pobres pedir esmolas com o dis-
tintivo da sua casa de recolhimento.
Estas casas assistenciais de novo tipo relevavam o papel da ins-
trução, da doutrina e, também, do estímulo ao trabalho em deter-
minados ofícios. Após o nascimento da casa de caridade de Toledo,
em 1580, por iniciativa do Cardeal Gaspar de Quiroga, abriram as
de Madrid, em 1581, e de Barcelona, em 1583. Atento ao modelo
proposto, e leitor atento do Tratado de Remedio de Pobres, D. Teotó-
nio chegou a convidar Miguel de Giginta para vir a Évora asses-
sorar a obra do Hospício da Piedade que pretendia criar, o que ele
não pôde fazer devido a outros compromissos, e sem deixar de
atender os pedidos dos carenciados, caso dos frades do Bom Je-
sus de Valverde que em 1594 lhe suplicavam a mercê de um moio
de trigo galego 64... Mas a verdade é que, como atestam os estudos
de Laurinda Abreu e de Federico Palomo del Barrio, os modelos
de combate à pobreza propostos por Giginta vingaram, pelo me-
nos no que toca ao modelo vivenciado, na organização e estatutos
dos hospitais de assistência criados em Évora pelo Arcebispo 65.
No inal do século XVI, o sucesso dessa política de centrali-
zação contra-reformista, com aplicação das normas apostólicas
de Sisto V, fez-se sentir tanto na sede arquiepiscopal, com seus
«tres mil passos redondos dos muros adentro (com) sete mil vizinhos, que
em numero fazem trinta mil moradores», como no vastíssimo territó-
rio arquidiocesano, «40 legoas e 22 de largo, com duas cidades Evora
e Beja e 68 villas afora mtªs aldeas e Povoações», abrangendo um total
de 67 mosteiros de religiosos e 48 casas e hospitais de Misericór-

48
dia66, todos eles visitados pessoalmente pelo epíscope e, alguns Fig. 47
destes, alvo de substanciais melhorias em termos de reconstru-
ção ou de equipamento litúrgico e decorativo. Assim sucedeu,
por exemplo, no convento de Jesus de Viana do Alentejo e em
várias igrejas de Arraiolos, Estremoz, Mértola, Vila Ruiva, Re-
dondo, Évora-monte, Lavre, Montemor-o-Novo, ou na matriz
de São Paulo de Pavia67, entre muitas outras, veriicando­se que
o Arcebispo, ou os seus visitadores, ordenavam ora a pintura
de sacrários novos68, ora a aquisição de têxteis, livros de missa e
peças de pratas, ora a guarnição intestina das naves das igrejas
com pinturas murais69, ao mesmo tempo que desaconselhavam
determinadas festas consideradas licenciosas ou impunham a
retirada de imagens antigas «com cabeleiras hereges», ou capazes de
«suscitar o falso dogma», com outras anomalias, em estado consi-
derado impróprio para a devoção dos iéis70…
Fica a conhecer-se o modo diligente como operava, com um
apertado séquito de colaboradores, com quem almoçava e reunia,
discutindo a estratégia de melhoramentos a propor caso a caso.
Também para a descrição dos inúmeros oratórios da cidade de
Évora, e os muitos outros espalhados pelo Arcebispado, existem
termos de visitações diocesanas dos anos de 1591, 1597 e 1599,
realizadas por D. Teotónio e envolvendo tanto as famílias nobres
eborenses, como D. Fernando de Castro, primeiro conde de Basto
e governador militar da cidade, e seu ilho D. Diogo de Castro, o
Conde da Vidigueira, D. António de Melo, o Inquisidor António
de Mendonça, o comendador Manuel de Macedo, o desembar-
gador Martim Vaz de Castro, o cónego da Sé Francisco de Ma-
cedo, o médico André Pires, como muitos outros existentes em
aldeias recônditas da província, além ainda que existiam em casas
de donas viúvas, e que são devidamente descritos em atenção à
sua antiguidade, recheio, aparato e «decência», com indicações pre-
cisas para o seu enriquecimento71. Obstinado no combate a tudo
o que fosse contrário à fé católica, o Arcebispo era um atento vi-
giador dos preceitos religiosos, ora exigindo em pastoral de 1583
que «todos emendemos nossos caminhos deregindo nossas vidas àquella estrada
e guardando os mandamentos de Deos»72, ora regulamentando o modo

49
de realizar procissões73, ora notiicando os párocos das igrejas
de Coruche e seu termo, em 1593, no sentido de denunciarem a
passagem de certos cristãos-novos por essas terras 74, ora ainda
vigiando e listando os nomes de quem não cumpria o preceito da
conissão 75 ou, enim, escrevendo em 1588 a todas as freguesias
da Arquidiocese pedindo que rezassem pelo bom sucesso do exér-
cito naval que ia invadir a Inglaterra protestante e que, como se
sabe, se saldou pela humilhante derrota da Invencível Armada 76.
São muitas as cartas pastorais remanescentes e que nos dão con-
ta de um epíscope com trabalho infatigável, guiado por normas
proselitistas e por um io condutor abnegado, leia­se tridentino,
pelo qual norteou a sua acção.
Homem de sólidos princípios morais, como é por todas as
fontes destacado, D. Teotónio manteve também conlitos diver-
sos com a Inquisição de Évora, a cujos despachos raramente
assistiu, recusando-se mesmo a fazê-lo na presença do inquisi-
dor Dr. Rui Pires da Veiga (que seria, apesar disso, designado
Bispo de Elvas, mas só em 1612), com quem as relações foram
sempre tensas. Houve polémicas por causa da nomeação de re-
presentantes capitulares por si indicados (caso do dominicano
frei Simão da Luz, que chegou a ser acusado de heterodoxia), os
quais seriam liminarmente preteridos pelo Santo Ofício, e em
questões como a hierarquia a seguir nas cerimónias religiosas e
nos autos-de-fé77. Pretendia D. Teotónio, em suma, preservar a
sua legítima jurisdição como Arcebispo, e conseguiu-o em boa
verdade através dos litígios constantes que manteve com os dig-
nitários da Inquisição, ameaçando mesmo recorrer contra eles
junto do Geral, para Roma. Todavia, como observa José Pedro
Paiva, «tal não signiica, da parte do prelado, total oposição à ac-
ção do Santo Ofício», como bem se prova pelo facto de ele ter
sido chamado a Valladolid, em 1602, juntamente com os Arce-
bispos de Braga e de Lisboa, mandatado pelo próprio Conselho
Geral do Santo Ofício, a im de se mostrar contrário ao anuncia-
do perdão geral que se pretendia fosse dado aos cristãos-novos,
já que esse perdão, segundo ele, «traria prejuízos ao Reino» e fa-
ria perigar a integridade religiosa nos territórios da Monarquia

50
Dual 78. Revela-se bem nestas posições o integrismo proselitista
do Arcebispo de Évora, para quem a vasta cultura e a experiên-
cia que acumulou com as viagens europeias o transformaram
num verdadeiro homem da Contra-Reforma.
Os sólidos contactos internacionais explicam o esforço de D.
Teotónio de Bragança quando, já designado Arcebispo de Évora,
envidou esforços para trazer para a cidade alentejana monges car-
tuxos e frades carmelitas descalços, para os quais fundou casas de
signiicativa importância. Além da fundação do mosteiro da Scala
Coeli da Cartuxa, impulsionará a criação em Évora do convento de
carmelitas descalços de Nossa Senhora dos Remédios, mas a sua
súbita morte em 28 de Agosto de 1602, quando se encontrava em
missão junto à corte, em Valladolid, onde se deslocara, impediu que
pudesse assistir ao lançamento da primeira pedra dessa casa religio-
sa, o que ocorreu já em tempo de seu sucessor, o sobrinho D. Ale-
xandre de Bragança (1602-1608). Trata-se de um importante pro-
jecto arquitectónico com traças do grande arquitecto Francisco de
Mora, que desenvolveu na sua concepção um grande rigorismo de
gosto «herreriano», que marcará a paisagem construtiva nacional ao
longo do século XVI como uma das vertentes do «estilo chão»79. O
seu cuidadoso desenho, por certo, não teria deixado de passar pela
batuta e pelo aval de D. Teotónio, ainda que a sua morte inviabili-
zasse o acompanhamento da construção carmelita80.
A morte súbita de D. Teotónio, em Valladolid, foi conhecida
em reunião capitular do dia 3 de Agosto com a leitura de uma
carta do Arcebispo de Lisboa, estante na cidade espanhola, em
que dava conta de que falecera no mosteiro de São Francisco da-
quela cidade espanhola, a 29 de Julho, vítima de paralisia e apo-
plexia. Davam-se mais pormenores através de uma segunda carta
de Miguel Nunes de Abreu, desembargador da casa de D. Teotó-
nio 81. Logo se designaram para o lugar de governador do Ar-
cebispado o Chantre Baltazar de Faria Severim e para Provisor
o Dr. Sebastião da Costa de Andrade, os quais vieram a cum-
prir o inventário dos bens e fazenda do defunto e a assegurar
o funcionamento da rede assistencial por ele criada, o que foi
cumprido apesar de certas reticências dos capitulares. A 8 de

51
Agosto, o governador eleito propôs que, pelos muitos serviços
devidos a D. Teotónio de Bragança, e como acto de grande con-
solação para a cidade, se conservassem o hospital de pobres e
as casas de convertidas por ele fundadas. Apesar de reservas de
alguns cónegos, dado serem elevadas as obrigações inanceiras,
por receio de que o Cabido sede vacante não pudesse assumir os
encargos da fazenda pontiical com essas casas, a proposta vin-
gou, depois de Baltazar de Faria Severim assegurar o pagamen-
to por um ano, a expensas próprias, da casa das convertidas, e
de o Dr. Gregório Rodrigues de Oliveira assumir igual encargo
face ao hospital dos pobres.
Só no dia 15 de Agosto chegou a Évora o corpo do Arcebis-
po, tendo vários membros do Cabido ido a cavalo ao encontro do
grupo que trazia o caixão, vindo a encontrá-lo junto ao rio Xarra-
ma, de onde seguiu em cortejo fúnebre para o Convento de Santo
António da Piedade, onde foi sepultado com adequadas exéquias.
Com as alterações sofridas por esta casa religiosa, que perdeu mui-
to do seu património devido a sucessivas remodelações a seguir
à exclaustração (pertence hoje ao Seminário Redemptoris Mater
e a igreja foi muito alterada após 1755), deixou de ser conhecida
a estrutura da capela onde o Arcebispo jaz, e nem a própria lápi-
de que memorizava o enterramento é localizável na actualidade82.

2.3. O Arcebispo, os seus arquitectos


e d e m a i s a rt i s ta s

O recurso do Arcebispo D. Teotónio de Bragança a um


escol artístico de eleição – como foram os arquitectos Ma-
teus Neto83, Nicolau de Frias e Pero Vaz Pereira, que adiante
reencontraremos, os pedreiros Jerónimo de Torres84 e Jorge
Pechim85, os entalhadores Ascenso Fernandes86, Gaspar Gon-
çalves87 e Diogo Nobre88, os pintores de óleo e fresco Fran-
cisco João89, José de Escovar90 e Custódio da Costa, o ourives
João Luís91, o bordador António Garcia92, o azulejador Manuel
Gonçalves93, o impressor-livreiro Cristóvão de Burgos, e vá-

52
rios outros artistas e artíices eborenses cujas actividades vão
sendo aos poucos melhor esclarecidas, como o mestre de gua-
damecis Domingos Martins94, o jardineiro Gaspar Mendes95,
o alfaiate Luís Prego96, ou o sineiro Luís Godinho97, sem se
esquecerem os mestres estrangeiros, como o neerlandês Du-
arte Frizão, que foi o pintor ao serviço do Arcebispo e fale-
ceu em Outubro de 159698, o vidreiro Gaspar de Rua (Caspar
van der Straeten, holandês ou de ascendência holandesa), que
em 1601 fez vidraças para a igreja de Santo Antão99, o ouri-
ves Andrés de Taude, e o pintor também nórdico Isbrant de
Renoy 100, activo na pintura de um retábulo para os carmelitas
de Évora – mostra as possibilidades abertas para a concreti-
zação do projecto renovador tridentino do Arcebispo.
A sua relação com os melhores arquitectos do Reino era, aliás,
inequívoca e com ritmo regular. Tal o levou a chamar a Évora,
em início de 1588, o italiano Filipe Terzi (1520-1597), uma ce-
lebridade do tempo, natural de Bolonha e artista ao serviço de
Filipe II (I de Portugal), como «ingegnere molto sperimentato». A sua
relação com Terzi foi esporádica, mas merece referência. Terzi
estadeou então a Évora, numa etapa da sua viagem a caminho
do Algarve, pois se ocupava então das obras de fortiicação do
Cabo de São Vicente, arruinada por ataques de corsários ingle-
ses 101. Era um arquitecto estimado nos círculos dos Bragança,
pois estivera cativo em Alcácer Quibir em 1578, no rescaldo da
derrota de Alcácer Quibir, junto ao jovem D. Teodósio (II) e a
centenas de cavaleiros da casa ducal, incluindo-se nesse núme-
ro de detidos o arquitecto Nicolau de Frias. Foi autor do único
manual conhecido em Portugal que se dedica às ordens arqui-
tectónicas, com inspiração no de Vignola (B.N.P., Cód. 12.956)
e tracista de uma série de edifícios sacros e civis de primeira
importância 102. É de crer que o interesse de D. Teotónio no
parecer de Terzi se relacionasse também com as traças para o
Mosteiro da Cartuxa, cujas obras se tinham entretanto iniciado,
seguindo as plantas desenhadas por Giovanni Vincenzo Casale
(1539-1593), mas não é de esquecer que Terzi tinha debuxado,
ele mesmo, uma das traças recusadas para a Scala Coeli. De fac-

53
Fig. 57 to, já em ins de 1587, início de 1588, se tinham analizado vá-
rios projectos (solicitados a Tibúrcio Spanocchi, Francisco de
Mora, Filipe Terzi e Giovanni Vincenzo Casale), decidindo-se
o rei com aval do Arcebispo (ou vice-versa) pela planta do fra-
de servita lorentino 103.
O assunto merece discussão e a ele voltaremos no capítulo
sobre a Cartuxa, já que o modelo de frontaria tripartida, que Ca-
sale apresentava no seu projecto, acabou por não ser seguido, o
que deixa subentender que o Arcebispo aceitou muitas alterações
ao «risco» do frade servita (recorrendo com toda a naturalidade
a quem tinha seu serviço e depositava maior coniança: Nicolau
de Frias) 104… Mas também é crível que, na mesma ocasião em
que passa por Évora e se reúne com o Arcebispo, Filipe Terzi
desse parecer sobre outras obras em curso, como a grimpa da
torre, acabada de chegar de Lisboa, ou a construção do Paço
Episcopal, que então decorria, não sem polémica com o Senado
da Câmara e com o Conde de Basto por causa de as suas limi-
tações restringirem o acesso livre a áreas públicas. Infelizmen-
te, o contrato notarial de 1588 onde assinam Terzi e D. Teotó-
nio 105, não nos elucida sobre a matéria que trazia o arquitecto
bolonhês a Évora, e que, a tratar-se de projecto, aparentemente
se gorou 106. O arquitecto régio estava já de volta a Lisboa em
Maio, seguindo para Madrid com plantas e desenhos de obras
que realizava, a im de as discutir com Filipe II.
A relação do Arcebispo com Nicolau de Frias (1540-1610),
reverencialmente tratado como «famoso architecto» em documen-
tação coeva 107, foi muito mais fecunda, pois se trata (como me-
lhor se verá no capítulo seguinte) de um artista que esteve anos a
io ao serviço de D. Teotónio, tal como esteve ao serviço de seu
sobrinho o Duque D. Teodósio II, em várias obras relevantes,
como é o caso do desenho para o término do corpo palatino do
Palácio Ducal de Vila Viçosa, cuja grande e monumental fachada
do Terreiro é da sua autoria e responsabilidade e constitui uma
obra-prima da construção civil quinhentista na Península. Filho
do escultor e carpinteiro de marcenaria Pedro de Frias 108, sogro
do pintor e escudeiro régio Domingos Vieira Serrão e do enge-

54
nheiro militar Alessandro Massai, e pai do arquitecto Teodósio de Fig. 4
Frias, Nicolau era um artista altamente prestigiado na corte, pois Fig. 5
Fig. 6
era Arquitecto das Obras da Cidade e do Arcebispado de Lisboa
e, antes de ser cativo em Alcácer Quibir, passara por Roma, onde
se aperfeiçoara num gosto construtivo que era já o estilo de uma
arquitectura de Contra-Reforma, despojada e monumental, eivada
de referenciais simbólicos e laudatórios, tal como operavam então,
na Cidade Papal, grandes arquitectos como Domenico Fontana,
Martino Longhi il Giovane, e alguns outros.
Certas obras de Nicolau de Frias, como a traça da abside da
igreja do Mosteiro de Santa Marta em Lisboa, no que toca à es-
trutura pseudo-quadrangular ainda existente 109 e com sua co-
bertura de stucchi maneiristas 110, ou como a imponente fachada
do Paço Ducal de Vila Viçosa, reclamam-se dessa lição roma-
nista – temperada, esta última, com contribuições poderosas da
arquitectura do chamado ciclo Príncipe Felipe, bem estudado por
Chueca Goitia 111 e que encontra nas obras palacianas de Luis
de Vega, em Castela, um óptimo exemplo. Esse gosto, dentro de
uma severidade que é a da grandiloquência despojada da Contra-
-Reforma, reclama-se herdeira do herrerianismo e da estapa es-
curialense 112, e é essa morfologia que se tentava seguir, também,
nas grandes obras teotoninas, com o seu traço romano a traír,
com as devidas distâncias, similitudes com certas empresas pa-
latinas de Domenico Fontana, o arquitecto favorito de Sisto V.
O Arcebispo de Évora chamou amiúde o arquitecto Nicolau
de Frias, cujos serviços reclamava. Conhecia-lhe bem os méri-
tos, pois seguira sem a menor dúvida as peripécias da grandiosa
obra de ampliação do Paço de Vila Viçosa, com a concepção da
longa fachada do Terreiro – sobre a qual apresentamos, no capí-
tulo seguinte, nova e valiosa documentação. É certo, assim, que
Frias dirigiu a obra de construção do mosteiro da Cartuxa, ainda
em vida de Casale, e a seguir à sua morte em 1593, desenhando
e readaptando os planos do servita e, mais ainda, destacando o
seu discípulo Pero Vaz Pereira para o término da empresa. As
alterações ao primeiro projecto de Casale indicam que houve
protagonismo autorizado, no sentido de sublinhar os aspectos

55
decorosos da frontaria cartuxa, que se queria monumental, mas
se queria sobretudo tridentina... O certo é que Nicolau de Frias
também desenhou aparatosas peças de mobiliário litúrgico para
o Arcebispo, como três retábulos para a igreja de Santo Antão
(o da capela-mor e os colaterais, entalhados por Diogo Nobre
em 1586-1588) 113, a lâmpada de prata feita na Sé de Évora pelo
ourives João Luís (1588), e o não menos celebrado e grandioso
Sepulcro do Santíssimo da mesma Sé (também em 1588), que
foi lavrado por dois bons mestres escultores e carpinteiros de
marcenaria, o eborense Ascenso Fernandes e o lisboeta Gaspar
Gonçalves, ambos já com longa e reconhecida actividade na
cidade. Trata­se de obras teotoninas onde o grau de eiciência
artística rima com o da actualização de modelos, o que atesta o
peso dirigista do Arcebispo.
O Sepulcro da Sé desenhado por Nicolau de Frias conigurou­
-se como uma espécie de teatro (segundo os próprios termos do
contrato) 114, com cerca de sete metros de altura e sobreposição
de ordens, o jónico no andar do baldaquino e o dórico nos arcos
do andar inferior. A gramática lavrada incluía almofadas lavradas
ao rústico e colunas (no segundo corpo) com ornamento troçido, por
certo inspiradas nos desenhos do tratado de Juan de Arphe y
Villafañe (1585), de que existiam exemplares em livrarias de Évo-
ra. Havia lugar, ainda, para painéis de pintura (acaso da autoria
do neerlandês Duarte Frizão, o pintor do Arcebispo) e para ina
decoração de dourado e policromia (de que se desconhecem os
artistas). Esta sumptuosa peça, com suas evidentes conotações
funerárias e referenciais eucarísticos, era anualmente montada e
desmontada na Sé e mereceu actualizações constantes, enquanto
serviu a comunidade de iéis por ocasião da Quaresma 115. Para
os anos de 1588 e 1589, conhecem-se elementos precisos sobre
a decoração efémera que a fábrica do Cabido põs em prática no
nóvel Sepulcro: incluía guadamecis, têxteis e brocados de várias
cores, painéis pintados com «emblemas» cristológicos e eucarís-
ticos, e até «papéis impressos» (pelo livreiro Cristóvão de Burgos)
para decorar as pirâmides. Tratava-se, segundo Paulo Varela
Gomes, de uma extraordinária máquina de tipo turriforme, se-

56
guindo os mesmos precisos modelos que o arquitecto Juan de
Herrera realizava então para o Mosteiro do Escurial (1586), ou
os que Hernán Ruiz, el Joven, concebia por esses anos em Sevi-
lha, de que é bom exemplo o modelo executado por Alonso de
Maeda (1587) para a Catedral andalusa 116. Eram, estas e outras,
referências artísticas conhecidas de D. Teotónio. Trata-se, em
qualquer circunstância, de modelo muito actualizado, e uma no-
vidade absoluta no vocabulário artístico nacional.
A relação que D. Teotónio manteve com Nicolau de Frias, e
com o seu seguidor Pero Vaz Pereira, comprova o empenho do
Arcebispo de Évora em acompanhar de perto os modelos e no-
vidades internacionais da arquitectura tal como, desde a Roma
contra­reformista de Sisto V, ela se reconigurava em inais de
Quinhentos, com um acento de grandiloquência que inspirava as
pessoas à devoção e airmava o triunfo do proselitismo católico.
Embora os condicionalismos portugueses não pudessem riva-
lizar com a ambiência fervilhante da Cidade dos Papas, é certo
que os grandes princípios da construção romana constituíam
o modelo primeiro que inspirava os estaleiros teotoninos. Por
isso, as discussões sobre o despojamento e grandiloquência das
fachadas, sobre a renovação dos templos e a salvaguarda do pa-
trimónio da Igreja, sobre a recuperação dos velhos lugares de
culto, sobre o papel e o sentido das ordens arquitectónicas, etc
etc, eram temas que preocupavam o Arcebispo e que ele acom-
panhava com atenção.
É revelador, a este nível, estudarem-se também as bibliotecas
eborenses do tempo, onde os livros de devoção eram natural-
mente dominantes, organizados como espécie de itinerário mo-
ralizante, ou verdadeiros templos de cultura católica, reunindo
obras que eram arsenais de argumentação contra o protestan-
tismo, buscando na sabedoria (a da Antiguidade e a da era cris-
tã) bases para uma ciência viva, militante e adequada aos novos
tempos. Muito falta estudar ainda neste campo, reconstituindo
núcleos, canais de aquisição, avaliações de acervos, estrutura
organizativa das livrarias, mas é certo que a tónica dominante
era o atestado de um saber de base tridentina. A breve notícia

57
que nos mostra D. Teotónio a mandar comprar livros em Cádis,
ou a mandá-los vir de Roma, atesta essa intenção subliminar.
Naturalmente também, a Arquitectura imperava nestas biblio-
tecas como um dos temas preferenciais. Na livraria do tercei-
ro e último Conde de Basto, D. Lourenço Pires de Castro, por
exemplo, havia exemplares de Vitrúvio (na tradução de Cesare
Cesariano), de Vignola, de Juan de Arfe y Villafañe, livros de
estampas e debuxos, e obras de outros autores cuja lição não
deixaria de se relectir, de um ou outro modo, na produção ar-
quitectónica e das artes eborenses do tempo. Também na livra-
ria de Diogo Mendes de Vasconcelos (1523-1599), um notável
escritor-humanista activo na Évora do século XVI, tradutor de
grego e latim e também arqueólogo e coleccionista, essas pre-
senças se assinalavam.
São inúmeras as provas documentais que realçam os cuida-
dos de D. Teotónio com a arquitectura dos templos sob sua ju-
risdição, como sucedeu em Janeiro de 1588 quando, tendo os
membros do Cabido da Sé de Évora a intenção de assentar um
novo cadeiral nas ilhargas da capela-mor, mandou averiguar junto
dos mais competentes mestres de pedraria activos na cidade, que
eram ao tempo Jerónimo de Torres, Mateus Neto e Brás Godi-
nho, se a obra era segura, dado envolver as estruturas seculares
do presbitério medieval 117. Estava então em debate acalorado o
projecto de D. Teotónio para ampliar a capela-mor, que se veio
a gorar. Quando se erguia, entretanto, a nova igreja matriz da
vila do Redondo, por empreitada de Manuel Rodrigues, pedreiro
de Arraiolos, e depois de se escolher o lugar deinitivo de im-
plantação, junto à muralha condal 118, foi o mestre Jerónimo de
Torres enviado pelo Cabido eborense, em Agosto de 1583 119 e
de novo em Outubro de 1588 120, para superintender às medi-
ções do templo e opinar sobre a construção que se ia fazendo,
corrigindo, por exemplo, o traçado da abóbada e seguindo-se,
em Setembro de 1591, nova diligência arcebispal para se ladri-
lhar essa igreja, com indicação precisa de que o artista que faria
o ladrilho «seja advertido que não goarnesa senão conforme o contrato e
a traça antigua» 121.

58
Nas obras de decoração intestina da igreja de Santo Antão (a
mais importante paróquia da cidade depois da Sé), dado que o
Cabido custeava em um terço tais obras, a que D. Teotónio jun-
tava réditos pessoais, o Arcebispo seguiu atentamente o proces-
so, pedindo traças a Nicolau de Frias para pelo menos três dos
retábulos, todos por mãos de Diogo Nobre, seu entalhador de
eleição. O retábulo da capela-mor (de 1588-1591) foi obra ca-
ríssima e era imponente, tendo o entalhador recebido 100.000
rs em parte de pago, e um pintor não identiicado, e que ao que
tudo leva a crer era de fora (o lisboeta Diogo Teixeira ?), 300.000
rs pelos painéis realizados 122. Constata-se a grande atenção com
que D. Teotónio seguia estes e outros empreendimentos, pois
escolhia o modelo construtivo e opinava, em termos «tridenti-
nos», sobre o equipamento complementar da arquitectura.
A vasta biblioteca de D. Teotónio, segundo os dados que
possuímos, relectia esses gostos. Os grandes clássicos lá estão,
e os livros de teologia em força, assim como outros, desde a li-
teratura de viagens à geograia do mundo. Os livros serão por
ele legados, no todo ou em parte substantiva, ao Mosteiro da
Scala Coeli, ou da Cartuxa, fundação sua (1587-1598), confor-
me ao testemunho do seu cronista e a várias referências coe-
tâneas. Entre as doações, contavam-se manuscritos raros, caso
do célebre Atlas (1571) de Fernão Vaz Dourado 123, e do Livro
Chamado da Cartuxa, da autoria do rei D. Duarte, além de mui-
tas preciosidades bibliográicas, como a edição grega de Aristo‑
telis Opera (Basileia, 1510), a Statuta Ordinis Carthusiensis a Domo
Guigone Priore Cartusiae edita (também saída em Basileia, 1510),
e o Primo Volume delle navigationi et viaggi de Ramuzio (Veneza,
1550), que mostram decidido interesse pelos temas geográicos,
a par certamente dos tratadistas de Trento, de Borromeu a Pa-
leotti e a Baronio.
Chegaram aos nossos dias, segundo o projecto da arquivis-
ta Francisca Mendes realizado para a Fundação Eugénio de Al-
meida, seiscentos e vinte e cinco livros que eram pertença da
Livraria da Cartuxa de Évora e se encontram em várias biblio-
tecas e arquivos portugueses; foram alvo de um levantamento

59
Fig. 8 exaustivo que aguarda publicação 124. Lá se encontram livros de
Arquitectura, como uma edição do tratado de Vitrúvio de 1587
por Giovanni Antonio Rusconi e, mais rara, a de 1552 125. Na
Biblioteca Central da Marinha, diz Jesué Pinharanda Gomes,
subsistem alguns desses livros da Livraria cartuxa, como a Ar‑
gumenta Satyrarum de Juvenal (Nuremberga, 1497), os Comentarii
Linguae Grecae de Guilherme Budé (Basileia, 1510), as Orationes
de Aelio Aristides (Florença, 1517), os Historiographi Libri de He-
rodoto (Colónia, 1526), De Latinae Linguae Elegantiae de Loren-
zo Valla (Paris, 1541), os Annalium de Tácito (Basileia, 1544), a
Romanorum Historiarum de Apiano (Lutécia, 1551), Della Histo‑
rie del Mondo de Giovanni Tarchagnota (Veneza, 1562), Los Cin‑
co Libros Postreros de la Cronica Geral de España de Ambrosio de
Morales (Cordova, 1586), o Tratado de la Verdadera y Falsa Pro‑
phecia de Covarrubias (Segóvia, 1588), etc 126. Quanto a Belmi-
ro Fernandes Pereira, identiicara já quarenta e oito dos livros
com que o Arcebispo dotou a livraria cartuxa, como é o caso
de alguns exemplares ainda localizáveis na B.P.E., na B.N.P. e
em outras bibliotecas, como sejam as Meditationes Vitae Christi
do pseudo-Boaventura (1499), o Norte de Cõfessores de Francisco
de Monzón (Lisboa, 1540), a Ecclesiasticae Rhetoricae de Fr. Luís
de Granada (Lisboa, 1576), as Meditationes devotíssimas del Amor
de Dios, de Diego Estella (Lisboa, 1578), o Espiritual de los Males
Linguages del Mundo, de João de Avila (1589), a par de obras di-
versas de Heródoto, Tucídides, Aristóteles, Plutarco e Séneca,
e ainda a Historia del Popolo Fiorentino, de Leonardo Bruni (Vene-
za, 1476), o Ortus Breviarium de Zacharias Lilius (Veneza, s/d),
os Commmentariii Linguae Gaecque, de Guillaume Budé (Basileia,
1530), Delle Historie del Mondo, de Giovanni Tarchagnota (Vene-
za, 1576), Los Cinco Libros Postreros de la Coronica Geral de España,
de Ambrosio de Morales (Cordova, 1586), e o Thesarus Geogra‑
phicus, de Abraão Ortelius (Veneza, 1587), entre muitos outros
127
. Alguns destes exemplares têm a preciosa indicação de serem
procedentes da Livraria da Cartuxa: «Livro da Cartuxa de Scala
Coeli de que o ilustríssimo e reverendíssimo D. Teotónio de Bragança, ar‑
cebispo de Évora, lhe fez doação, sendo fundador da mesma casa» 128. Da

60
biblioteca do Mosteiro do Vale da Misericórdia de Laveiras, que
é de presumir tivesse também recebido alguma dotação livresca
por parte de D. Teotónio ou, indirectamente, através dos padres
de Scala Coeli, restam algumas obras na Biblioteca da Academia
Nacional de Belas-Artes, entre elas um tratado de Arquitectura
de Andrea Palladio.
A respeito do celebérrimo Atlas Universal de Fernão Vaz Dou-
rado, e do modo como ele entrou na posse de D. Teotónio de
Bragança, que o doou à livraria da Cartuxa, tudo são conjectu-
ras. Face às indicações escritas no frontispício, sabe-se que per-
tenceu aos nobres Costas, pelo que se supõe ter sido oferecido
a D. Francisco da Costa (1532?-1591), um protegido de D. Luís
de Ataíde que foi nomeado Capitão de Malaca em 1564 mas só
entrou na posse do cargo em Janeiro de 1571, tendo icado três
anos nessa praça, e que depois morreu cativo em Marrocos 129.
Este D. Francisco da Costa era escritor (autor do Cancioneiro de
Dona Maria Henriques) e poderia ter ofertado a obra ao Arcebis-
po D. Teotónio, ao regressar a Portugal em 1575, antes da sua
trágida partida para o Maghreb. Outra hipótese que pode expli-
car a posse do Atlas, nunca antes aventada, tem a ver com a i-
gura de D. Constantino de Bragança (1528-1575), irmão de D.
Teotónio, que foi vice-rei da Índia de 1558 a 1561, e que bem
poderia ter tomado posse do códice em Lisboa, por mãos do
próprio Vaz Dourado, o que explicaria o modo como chegou
ao poder dos Braganças e aparece de seguida, por oferta do Ar-
cebispo de Évora, na Livraria da Cartuxa.
O códice conservou-se durante séculos como um dos te-
souros da livraria dos monges cartuxos de Évora, sempre liga-
do ao nome do seu ofertante, sendo já referido em 1652 pelo
padre Jorge Cardoso, como estando na livraria dos monges de
São Bruno 130 e em 1747 por Diogo Barbosa Machado, na Bi‑
bliotheca Lusitana, dizendo este autor o seguinte: «Fernando Vaz
Dourado igualmente perito no exercício das Armas, sendo Fron-
teiro nas terras de Goa, como versado na Geograia, escreven-
do Mapamundo, que trata de todos os Reynos, terras, Ilhas, que há na
redondeza da terra com suas derrotas, e alturas por esquadria. Em Goa

61
1571. fol. O original se conserva na Livraria dos Monges Car-
tuxos do Convento de Scala Coeli de Évora. Consta de regras,
e princípios da Hydrographia com mapas de todo o mundo pri-
morosamente illuminados de cores, e ouro» 131. Com a extinção
das Ordens Religiosas em 1834, alguns tesouros da Cartuxa de
Évora vieram para Lisboa. O Atlas de Vaz Dourado foi incor-
porado no Arquivo da Torre do Tombo, depois de algum tem-
po na Biblioteca Nacional, onde é referenciado logo em 1835.
Muitas vezes reproduzido e estudado, o Atlas Universal de Vaz
Dourado será alvo de análise minuciosa por Armando Corte-
são no vol. III dos Portugaliae Monumenta Cartographica, em1960,
e por João Carlos Garcia em livro recente e que é referência in-
contornável para a matéria132.
Embora não exista hoje nenhuma descrição com o rol dos
livros que integravam a farta livraria do culto Arcebispo e pas-
saram para Scala Coeli – o que é de lamentar pois nos impede
de poder cotejá-la com a grandiosa livraria do seu irmão D. Te-
odósio I no Paço de Vila Viçosa 133, ou com a dos Castros, que
existia no paço eborense dos Condes de Basto 134, cujos inven-
tários se conhecem –, a verdade é que ela era importantíssima
e diversiicada de interesses. Vários indicadores o atestam, e
muitas são as existências que chegaram aos nossos dias, disper-
sas pore diversas bibliotecas. Tudo foi desmantelado em várias
fases, sobretudo com o saque das tropas francesas, no início do
século XIX, e após a exclaustração135.
Alguns elementos arquivísticos permitem reconstuir ou-
tras obras da livraria cartuxa. Para a nova livraria dos padres da
Cartuxa o Arcebispo comprou e ofereceu, entre 1590 e 1593,
uma série estimável de livros litúrgicos, incluindo exemplares
da Bíblia de Sisto V e várias obras de Frei Pedro de Alcântara,
de Frei Heitor Pinto, de Jerónimo Osório, e duas Sumas de Ma-
nuel Rodrigues, além de abundantes livros de coro136. Alguns
desses livros foram adquiridos em Bordéus e vieram por barco
até Cádis, cidade onde D. Teotónio fez deslocar, em Dezembro
de 1595, o seu criado Domingos Ferreira, precisamente para ir
«buscar huma caixa de livros de canto da Cartuxa que vieram de Fran‑

62
ça»137. Não era a primeira vez que o fazia; parece deduzir-se que
o serviço prestado por este criado do Arcebispo ao ir buscar
obras vindas de livreiros franceses era comum.
A dinamização da actividade tipográica em Évora, já in-
tensa durante os governos episcopais do Cardeal D. Henrique,
intensiica­se no inal do século XVI. Os tipógrafos da família
Burgos exercem a sua arte da impressão, publicando obras para
o Arcebispo e para a Universidade, para as confrarias, os mostei-
ros e os círculos de humanistas. Maria Antónia Conde assegura
que, a partir de 1540, se estabelecem na cidade sete impressores
e quinze livreiros 138. O livreiro André de Burgos, talvez o mais
relevante, exerceu a sua actividade de impressor entre 1553 e
1578, pelo menos, tendo usado o título de «impressor e cavaleiro
da casa do Cardeal Infante», mas nem por isso evitou problemas
com a Inquisição, a primeira vez por imprimir cartas de jogar,
em 1559, e a segunda por editar serm licença o Livro do Rosario
de Frei Nicolau Dias, em 1576. Apesar disso, era respeitadís-
simo e imprimiu na sua oicina cerca de cinquenta obras. Teve
continuidade na obra dos ilhos, Martim de Burgos, activo até
1597, e Cristóvão de Burgos, falecido em 1629. Eram vergôn-
teas de forte tradição familiar, cuja importância na vida da ci-
dade icou grafada na própria toponímia139: Coube à viúva de
André de Burgos prosseguir o ofício de seu marido e será ela
quem publica, em 1583, o Tratado que escrivió la Madre Teresa de
Jesus, de Santa Teresa de Ávila, obra editada a expensas de D.
Teotónio de Bragança. Sabemos que as relações entre livreiros,
impressores, escritores e artistas eram então muito próximas,
quando não existiam mesmo vínculos familiares; por exemplo,
Francisco João, um dos melhores pintores da cidade, era genro
de Domingos Filipe 140, um importante livreiro com loja situa-
da na Praça do Giraldo.
Foi por iniciativa de D. Teotónio, e também à sua custa, que
foi impresso em Évora em primeira edição o livro de Santa Te-
resa de Jesus (ou de Ávila) Camino de Perfeción, e também a ex-
pensas suas foi mandada imprimir a obra Cartas que os Padres, e
Irmãos da Companhia de Jesus escreverão dos Reinos do Japão, e China,

63
e os da mesma Companhia, de tão grande interesse para o conheci-
mento dos «mundos novos» a Oriente. Aliás, com esta obra se
relaciona o grande esforço de missionação em terras do Extre-
mo Oriente, a que os jesuítas metiam então ombros, e de que
o tecto pintado da Sacristia do Colégio do Espírito Santo é um
óptimo exemplo, por desenvolver um programa iconológico e
simbólico eivado de referenciais asiáticos e em uníssono com as
expectativas no seu sucesso. O interesse pelos estudos sobre a
China e o Japão, aliás extensível a outros ilustres eborenses do
tempo, como os Condes de Basto, encontrou em D. Teotónio de
Bragança um forte impulsionador, através das obras que fez pu-
blicar na imprensa eborense, então em fase de apogeu, e através
do apoio declarado aos esforços missionação jesuítica na Ásia.
A opulência destas lojas que na cidade vendiam livros – a loja
dos famosos Burgos, por exemplo – é atestável por diversas re-
ferências sobre a sua buliçosa actividade e procura por parte de
muitos interessados, de dentro e de fora de Évora; tinham equi-
pamento mobiliário faustoso, aliás uma prerrogativa comum,
também, às farmácias eborenses do tempo, como era o caso da
loja do boticário Diogo Ribeiro, que por um precioso contra-
to de 29 de Novembro de 1582 se obrigou com o nosso muito
referido mestre carpinteiro de marcenaria Diogo Nobre, a este
artista (autor de tantas e boas obras de talha para o Arcebispo
e para as casas religiosas da cidade) izesse na sua loja um forro
de madeira com estantes e prateleiras, devidamente descrito na
obrigação e, ao que parece, seguindo uma traça pré-determinada
para a utilização pretendida 141. Era este tipo de equipamentos
que tornava a Évora da Contra-Reforma uma urbe apelativa aos
homens de artes e letras que a ela aluíam, pela magniicência
dos seus serviços, antiguidade do seu património e ainda, apesar
de tudo, um ambiente propício ao debate de temas humanísti-
cos, ainda que subordinados, estes, aos novos ditames de Trento.
Se D. Teotónio não redigiu nada, que se saiba, a respeito da
arquitectura de que gostava, é certo também que escreveu livros
de temário sacro, ainda que pouco remanesça a este respeito:
conhecem-se referências a uma Epistola ad Gregorium XIII, que

64
saíu impressa no tomo V da História Genealógica da Casa Real Por‑
tuguesa de D. António Caetano de Sousa; um Regimento do Auditó‑
rio Eclesiástico do Arcebispado de Évora, editado em Évora em 1598;
e uma Pastoral passada a 30 de maio de 1601 da India, e Europa, des‑
de o ano de 1545 até o de 1580, espécie de cartograia de viagens
organizada em dois tomos, saída em Évora em 1598. Todos
estes títulos conirmam, mais uma vez, o seu peril de homem
da Igreja, de ressaibos absolutamente tridentinos, e também o
seu interesse e empenho nos temas do Oriente e no esforço de
cristianização dos «mundos novos», a que a Companhia de Je-
sus já metera ombros.
São abundantes na igura de D. Teotónio os sinais de um
gosto estético actualizado e esclarecido, dentro dos preceitos da
Contra‑Maniera tridentina, adoçados pelas visitas feitas em Roma
e Florença e que atestam esse conceito de Res publica christiana
que ousou aplicar a Évora, em nome do retorno a uma antichitá
christiana que ganha vulto no pensamento teotonino e explica
as opções construtivas – aliás, fazendo eco do tipo de arquitec-
tura que pelos mesmos anos se erguia no Paço de Vila Viçosa,
governada por seu sobrinho D. João I, 6º duque de Bragança, e
de seguida pelo seu sobrinho-neto e 7º duque, D. Teodósio II,
com recurso à mesma mão-de-obra aí activa, tal como recen-
temente se provou. É a esta luz que se percebe a presença em
Évora, como se referiu, de iguras gradas de arquitectos de cor-
te como Filipe Terzi, Baltazar Álvares e Nicolau de Frias, todos
eles ouvidos em processos de obras para o Arcebispado (e mais
que ouvidos, no caso do último…), sem esquecer a presença
do frade servita lorentino Giovanni Vincenzo Casale que fez
as primeiras traças do Mosteiro da Cartuxa e a quem se deveu
o essencial dessa construção tal como chegou aos nossos dias,
conhecendo-se, como já se disse, os planos e desenhos, assina-
dos pelo próprio Arcebispo 142.
É evidente, segundo diz o historiador de arte Miguel Soro-
menho, a marca de grande unidade orgânica que se pressente
quando se vê a frontaria do mosteiro cartuxo de Évora, a qual
mantém similitudes com os precedentes edifícios eborenses do-

65
Fig. 4 tados de frontarias com pórtico externo, assim como inluências
marcantes da arquitetura romana tridentina, com acento na re-
toma de uma tipologia de exonártex com óbvias reminiscências
paleocristãs. Existe inspiração, também, sacada por Casale de
alguns desenhos do concurso para a fachada lorentina de San
Lorenzo, promovido em 1515 pelo papa Leão X, o que leva à
presunção de que o arquitecto italiano tomou nesse concurso
algumas soluções formais para o projecto inicial apresentado a
D. Teotónio de Bragança. Mas o que predomina mesmo na fá-
brica cartuxa é a intenção subliminar de construir um edifício
com claras referências a uma inequívoca antichità christiana, de
novo recorrendo a um modelo de fachada com ressonâncias
paleo-cristãs 143.
Com D. Teotónio de Bragança, a tipologia construtiva da ar-
quitectura sacra altera­se de modo signiicativo na Arquidioce-
se de Évora. As fachadas, se bem que mais rigoristas e austeras,
retomam o uso das duas torres laterais (ausentes da arquitectu-
ra eborense desde a magna obra da igreja de Santo Antão, diri-
gida por Miguel de Arruda, Manuel Pires e Afonso Álvares 144)
e desenvolvem-se agora novas soluções de utilização, em con-
texto cristão, da ordem dórica, convergentes com a linguagem
pagã e seguindo, nesse aspecto, o livro 4º do Tratado de Sebas-
tiano Serlio (1552) na sua defesa dessa ordem clássica, «tão es-
timada pelos antigos para cultuar Júpiter, Marte ou Hércules e
do mesmo modo recomendada na construção tridentina para
sublinhar o valor heróico dos santos mártires da cristandade»
145
. É esse uso da ordem dórica, tanto em estruturas complexas
de pedraria lavrada como em soluções simpliicadas de obra de
massa, que prevalece nas igrejas paroquiais erguidas ou renova-
das na era teotonina e que vieram alterar, indiscutivelmente, a
paisagem arquitectónica alentejana.
Outras características distintivas merecem ser destacadas. Al-
gumas fachadas erguidas nestes anos retomam o uso de robus-
tos pórticos clássicos adjacentes à frontaria (tal como sucedera
no modelo jesuítico da igreja do Espírito Santo, por Diogo de
Torralva, Afonso Álvares e Manuel Pires, ele mesmo um mo-

66
delo derivado da tipologia gótico-manuelina da igreja de São Fig. 33
Francisco de Évora…): citem-se o belíssimo exonártex da igreja
de Nossa Senhora da Graça do Divor (c. 1595-1600) ou, mais
simpliicado, o da igreja de São Sebastião de Évora (1599­1600),
por exemplo.
Observam-se também soluções inovadoras ao nível da or-
ganização dos estaleiros de obra, como o facto de, em muitos
casos, se manterem as capelas-mores góticas (no caso de São
Tiago de Évora, ou em São Pedro da Gafanhoeira) e as velhas
estruturas altimediévicas (em São Manços), sendo utilizado pela
equipa de pedreiros um inovador modus operandi de reconstrução:
ou seja, seguiam-se obras com faseamento parcelar, mantendo
as velhas estruturas a demolir enquanto se ia erguendo, em sua
envolvência, o corpo unívoco das novas igrejas-caixa, e só quan-
do estavam concluídas se procedia à demolição de tais preexis-
tências. Assim se passou no caso da reconstrução da igreja de
Santa Maria de Machede na empreitada dirigida pelo arquitecto
Pero Vaz Pereira 146. Dominou sempre a tese, com directo acento
arquiepiscopal por parte de D. Teotónio, de que os corpos dos
templos são auditórios de sermões e, como tal, precisam tanto
de uma espacialidade eicaz como de um programa decorativo
catequético. Foi essa a norma seguida.
O apoio dado pelo Arcebispo aos artistas que o serviram,
ou intervieram nas obras por si patrocinadas, transparece da
documentação reunida e já foi, de resto, indicado nos casos,
por exemplo, de Nicolau de Frias ou Pero Vaz Pereira, seus ar-
quitectos. É de lamentar que nos faltem as listas de mercês aos
servidores da casa de D. Teotónio, sabendo-se que, para além
de homem da Igreja, era um senhor da casa de Bragança e vivia
com os seus pagens e a sua apertada corte episcopal; todavia, o
facto de se conhecerem alguns nomes, como o do pintor Du-
arte Frizão, pintor da casa do Arcebispo, permite-nos reconsti-
tuir uma parte dessa ambiência de esplendor. Há pormenores
por demais curiosos, como o que sucedeu em 1588, estando
já encomendada a obra da lâmpada de prata para a Sé, quando
mandou vir de Vila Viçosa o mestre ourives João Luís e man-

67
dou Cláudio, seu cocheiro privativo, buscar o artista no seu co-
che: «Deu o Recebedor a Claudeo, cocheiro do Arcebispo, quatro centos rs
pª gastos que fes no caminho de Villa Viçosa com o carro que foi busquar
João Luis, ourives de pratta, pª fazer a lâmpada de prata, entre as quais
400 rs se lhe deram a mais (…) do que acharão noutra adição porque
disse que gastara mais» 147.
O codicilo do testamento de D. Teotónio de Bragança, da-
tado de 16 de Abril de 1602 148, e a outra versão que subsiste
no fundo conventual da B.P.E. 149, mostram que o Arcebispo,
temente da morte aquando da última viagem (e depois de alte-
rar a intenção de vir a ser enterrado no Colégio dos jesuítas de
Valladolid, caso falecesse na viagem, e optando expressamente
pelo mosteiro franciscano de Santo António da Piedade em Évo-
ra), preveniu o futuro dos seus empreendimentos conventuais e
hospitalares, assegurando medidas para o seu normal funciona-
mento e prossecução de obras. Tal aspecto, porém, revelar-se-ia
pleno de engulhos, como nos conta com dose de pormenores
o biógrafo padre Nicolau Agostinho, surgindo diiculdades de
ordem diversa no cumprimento das últimas vontades de D. Te-
otónio de Bragança, o que levou ao empenho pessoal de alguns
ilustres da cidade, como o cónego Baltazar de Faria Severim e,
mais tarde, seu sobrinho o chantre Manuel Severim de Faria…

68
Notas

49 Nicolau Agostinho, op. cit., pp. 79 vº e 80.


50 Maria Antónia Hespanhol, op. cit., vol. I, pp. 78-115.
51 Luís de Matos, A corte literária dos Duques de Bragança no Renascimento (conferência
proferida no Paço de Vila Viçosa em 15 de Outubro de 1955), Lisboa, Fundação da
Casa de Bragança, 1956, p. 25.
52 Idem, ib., pp. 25-26.
53 J. Pinharanda Gomes, Dom Teotónio de Bragança (Escritos Pastorais), Braga, 1984, p. 10.
54 B.N.P., Reservados, MS. 250, nº 42 (fundo de cartas autógrafas respeitantes à
educação de D. Teotónio no mosteiro de Santa Cruz de Coimbra).
55 B.N.P., Reservados, MS. 250, nº 42.
56 J. Pinharanda Gomes, «O Arcebispo de Évora D. Teotónio de Bragança, funda-
dor da Cartuxa, na Vida de Santa Teresa de Jesus», Igreja Eborense, I, 1983, pp. 7-34.
57 J. Pinharanda Gomes, op. cit.
58 Maria Antónia Hespanhol, op. cit., vol. I, pp. 286-298; e J. Pinharanda Gomes,
op. cit., pp. 34-35.
59 Cf. a este respeito Francisco Bilou, A refundação do Aqueduto da Água da Prata em
Évora, 1530‑1537, Lisboa, Colibri, 2010.
60 Fernando Bouza Álvares, Portugal no tempo dos Filipes. Política, Cultura, Representações
(1580‑1640), Lisboa, Edições Cosmos, 2000, pp. 127-146.
61 J. Pinharanda Gomes, op. cit. (1984), e Maria Antónia Hespanhol, op. cit., vol. I,
p. 133 e segs.
62 B.P.E., Fundo Cunha Rivara, Arm. V-VI, nº 12, peça 5; cf. Túlio Espanca, «Misce-
lânea Histórico-Artística», A Cidade de Évora, 19-20, 1949, p. 174.
63 Laurinda Abreu, op. cit., p. 172.
64 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 85, nº 26, ls. 134­135.
65 Cf. Laurinda Abreu, op. cit., 2004, pp. 155-165; idem, O Poder e os Pobres. As dinâ‑
micas políticas e sociais da pobreza e da assistência em Portugal (séculos XVI‑XVIII), Lisboa,
Gradiva, 2014; e Federico Palomo Del Barrio, op. cit., 1995, pp. 587-624.
66 Túlio Espanca, op. cit. (1949), pp. 178-179.
67 A.D.E., Arquivo da Câmara Eclesiástica, Visitas Pastorais, 1555‑1689, cx. 2, com
várias referências à obra do retábulo (pintado por Francisco João), cuja factura se ar-
rastava desde o tempo do Arcebispo D. José de Melo (l. 37), e para o qual o Conde
de Redondo chegou a dar 20.000 rs de ajuda (l. 46 vº).
68 A.D.E., Arquivo da Câmara Eclesiástica, Visitas Pastorais, cx. 3, l. 88 (ordena­se
em 1587, por exemplo, a pintura de um sacrário na igreja dse Nossa Senhora de En-
tre Ambas as Águas, Mértola).
69 A.D.E., Arquivo da Câmara Eclesiástica, Visitas Pastorais, nº 4, cx. 2, com refe-
rência à visita do Dr. Brás Lopes, visitador de D. Teotónio, à igreja matriz de Vila

69
Ruiva, em Janeiro de 1590, mandando «goarneser as igreja toda por dentro», a fresco, já
que «goarnecidos os arcos som.te não ica boa obra» (l. 17 vº).
70 A.D.E., Arquivo da Câmara Eclesiástica, Visitas Pastorais, nº 4, cx. 2, l. 25 (visi-
ta a uma igreja de Vila Ruiva de D. António Temudo, visitador de D. Teotónio, em
Abril de 1598).
71 Cf. Maria Antónia Hespanhol, op. cit., vol. I, pp. 185-231, e vol. II, pp. 26-331,
com transcrição integral das visitas a uma centena de oratórios da Arquidiocese.
72 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. CIX/2-7, nº 6.
73 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. CIX/2-7, nº 44.
74 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. CIX/2-7, nº 21: intimação de 20-III-1593 aos pa-
dres de Coruche, Couço, Mato, São Torcato, Nossa Senhora do Peso, etc, que de-
nunciem certas famílias de cristãos-novos.
75 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. CIX/2-7, nº 53: «Rol do Estado da Igreja eborense
(…), rol de revéis do ano de 1595 (…) na fregª de S. Bartolameu de Villa Visosa», anotando-
-se nessa freguesia), entre várias outras pessoas, o caso de um «Jorge, criado do pintor»
(pintor que será André Peres, ao serviço do Duque D. Teodósio II).
76 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. CIX/2-7, nº 42: carta do Arcebispo de 5-III-1588
ordenando orações de apoio à Invencível Armada a serem rezadas nas igrejas (indica-
das or esta ordem no mapa da pastoral) de Évora, Evoramonte, Vimieiro, Estremoz,
Borba, Vila Viçosa, Sousel, Cano, Coruche, Avis, Benavente, Arraiolos, Alcáçovas,
Torrão, Alcácer do Sal, Grândola, Santiago do Cacém, Sines, Odemira, Ourique, Al-
modôvar, Panóias, Alvalade, Aljustrel, Ferreira, Mértola, Entradas, Beja, Serpa, Mou-
ra, Mourão, Portel, Monsaraz, Terena, Redondo e Vidigueira.
77 José Pedro Paiva, «Os Bispos e a Inquisição Portuguesa», Lusitania Sacra, 2ª série,
tomo XV, 2003, pp. pp. 53-67.
78 José Pedro Paiva, op. cit., p. 57.
79 Sobre o conceito, cf. Paulo Varela Gomes, «La cuestión del estilo en la histo-
riografía de la arquitectura portuguesa de la primera Edad Moderna», Goya, nº 344,
2013, pp. 246-263. Aí aprofunda a permanência e os paradoxos da utilização de con-
ceitos de estilo arquitectónico enquanto instrumento analítico no contexto historio-
gráico português.
80 Agustín Bustamante e Fernando Marías, «Francisco de Mora y la Arquitectura
Portuguesa», actas do simpósio luso-espanhol As Relações Artísticas entre Portugal e Es‑
panha na Época dos Descobrimentos, Coimbra, Minerva, 1987, pp. 277-318.
81 A.S.E., Lº 2º do Cabido de Sede Vacante, l. 1 vº­5 vº.
82 Deste mosteiro franciscano, muito alterado na segunda metade do século XVIII,
apenas nos chegou (além do que se divisa da estrutura da nave) uma elegante pia de
água benta assente em coluna bojuda, que parece ainda quinhentista século (será de-
senho de Pero Vaz Pereira ?) e uma tábua da Adoração dos Pastores, de um seguidor de
Gregório Lopes, hoje em colecção particular. Cf., sobre esta última, Sónia Duarte, O
contributo da iconograia musical na pintura quinhentista portuguesa, luso‑lamenga e lamenga em
Portugal, para o reconhecimento das práticas musicais da época: fontes e modelos utilizados nas oi‑
cinas de pintura, Mestrado em Ciências Musicais, F.C.S.H., 2012.

70
83 Sobre Mateus Neto, arquitecto do Cardeal D. Henrique, empreiteiro das obras
do convento de Santa Helena do Monte Calvário e da Misericórdia de Évora, e no
Aqueduto da Água da Prata, cf. Túlio Espanca, «Alguns artistas de Évora nos sécu-
los XVI-XVII», A Cidade de Évora, nºs 15-16, 1948, pp. 243.
84 Sobre Jerónimo de Torres, que foi mestre das obras do Senado, familiar do Santo
Ofício, irmão da Misericórdia, iscalizador das obras do Arcebispado, e interveio nas
empreitadas do Mosteiro da Cartuxa, do Colégio do Espírito Santo e do Colégio de
Nossa Senhora da Puriicação, abundam referências desde 1566 (cf. Túlio Espanca, op.
cit., 1948, pp. 255-258, e Celso Mangucci, op. cit., pp. 30-33). Em 1570 realizou a obra de
pedraria da capela-mor da igreja de Nossa Senhora do Carmo (B.P.E., CL/XVII/1-23,
Convento do Carmo de Évora, quitação de 19-XI-1570). Os Lºs de Registo de Alvarás do Cabi-
do (A.S.E.) mostram-no a vistoriar obras de igrejas, como a do Redondo. Acresce que
ainda estava activo em 1596, ao vistoriar a obra da nova igreja de São Tiago juntamente
com Pero Vaz Pereira. Recentemente, Francisco Bilou deu a conhecer dados sobre seu
ilho, o clérigo Bartolomeu de Torres, que estava em Roma em 1615 (A.D.E., Ordens
Sacras, Cx. 1, pc. 14, l. 20), sendo o pai, muito idoso, ainda vivo…
85 Muito activo nas empreitadas eborenses do im do século XVI (cf. Túlio Espan-
ca, op. cit., 1948, p. 250), aparece envolvido em 1587 nas obras de reconstrução da
igreja de São Tiago (A.D.E., Livro da Receita e Despesa da Obra da Parochia de S. Tiago de
Evora, 1587 ‑ D. Theotonio de Bragança, l. 26 e segs).
86 Escultor e carpinteiro de marcenaria, Ascenso Fernandes era discípulo do escul-
tor francês Pedro de Loreto (cf. Pedro Flor, «Pierre Loiret (act. 1540‑1560): um escultor do
Renascimento em Lisboa», Colóquio Internacional Lisboa e os Estrangeiros/ Lisboa dos Es‑
trangeiros até ao terramoto de 1755 Palácio dos Marqueses de Fronteira e Alorna, 2013) e
aparece a trabalhar em Évora no tempo dos arcebispados do Cardeal D. Henrique e
de D. João de Melo e Castro. Poderá vir a provar-se ser Ascenso Fernandes o autor do
célebre cadeiral maneirista da Sé de Évora, datado de 1562, sobre o qual nunca se en-
controu autoria credível.
87 Lisboeta, colaborou com Ascenso Fernandes no grandioso Sepulcro da Sé, em
1588, e em outras obras (B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 11). DOC. Nº 11.
88 Por escolha e iniciativa de D. Teotónio, Diogo Nobre realizou em 1586-1588 a
talha dos retábulos (mór, do Sacramento e de Nossa Senhora dos Prazeres) da igreja
de Santo Antão, seguindo em todos eles as traças desenhadas pelo arquitecto Nicolau
de Frias, aprovadas pelo Arcebispo (A.D.E., Lº 153 de Notas de Álvaro Ramalho, ls.
109 vº a 112 vº; e Lº 161 de Notas de Álvaro Ramalho, ls. 29 vº­32). O actual retábulo­
-mor, barroco, obra do entalhador Francisco Machado (contrato de 1-IV-1701, no
A.D.E., Lº 1026 de Notas de Domingos Nunes Moreno, ls. 32­33), é já do tempo do Ar-
cebispo D. Luís da Silva Teles. Cf. DOCS. Nºs 7 e 14.
89 Nasceu em 1539, teve oicina à Porta Nova e morreu em 1595. Cf. Túlio Espan-
ca, «A obra do pintor Francisco João», A Cidade de Évora, nºs 37-38, 1955-1956, pp.
183-200, e Helena Pinheiro de Melo, O Pintor Francisco João (act. 1562‑1595). Materiais
e técnicas de pintura de cavalete em Évora, na segunda metade do século XVI, tese de Douto-
ramento, Universidade Católica do Porto, 2014.
90 Activo em Évora de 1583 a 1622 e abundantemente documentado, o fa presto José
de Escovar pintou a fresco os espaços de muitas igrejas e capelas da Arquidiocese. Era

71
também pintor de óleo. A obra revela o gosto pelas tipologias neo-constantinianas
de enquadramento modular dominantes na era teotonina.
91 Além de João Luís, morador em Vila Viçosa, outros ourives trabalham em Évo-
ra neste tempo, como Diogo de Oliveira, que lavrou em Junho de 1592 uma custó-
dia para o mosteiro de São Francisco (A.D.E., Lº 269 de Notas de Baltazar de Andrade,
ls. 66 vº­69) e Manuel Luís Anjinho, que fez um conjunto de peças de prata para o
Inquisidor Dr. Rui Pires da Veiga (A.D.E., Lº 273 de Notas de Baltazar de Andrade, ls.
84 vº-87). Conhecem-se, ainda, os nomes de André Arriaga (1577), António Dias
(fal. 1598), Domingos Fernandes (act. 1556-1596), Henrique Fernandes (fal. 1587),
Francisco Barreto (act. 1577-1603), Domingos Abelho (fal. 1615) e Pero Vaz (fal.
1597),citados por Espanca, op. cit., 1948, pp. 167-182.
92 Este mestre bordador também se destacou no tempo do seu sucessor, o Arce-
bispo D. Alexandre de Bragança, como se vê num precioso contrato de 6 de Janeiro
de 1609 em que António Garcia se obrigou a fazer o frontal, capa, manto e demais
peças de ornamento litúrgico de D. Alexandre (A.D.E., Lº 337 de Notas de Pedro
Borges, ls. 126 vº a 128).
93 Este mestre azulejador foi irmão da Santa Casa da Misericórdia de Évora em
1593, e faleceu em 1612 (Túlio Espanca, «Alguns artistas de Évora nos séculos XVI-
-XVII», A Cidade de Évora, nºs 15-16, 1948, pp. 265-266).
94 B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 11.
95 A.D.E., Lº 297 de Notas de Pedro Borges, ls. 127­130: contrato de Gaspar Mendes, jar-
dineiro do Arcebispo D. Teotónio, por certas obras no Paço do Bom Jesus de Valverde.
96 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 85, nº 24, ls. 110 a 113. DOC. Nº 22.
97 A.S.E., Lº do Registo de Alvarás de Despesa passados ao Prioste, 1566­1598, l. 121. Foi
autor, em Abril de 1580, de dois sinos para as igrejas de Évoramonte e do Redondo.
98 Túlio Espanca, «Notas sobre pintores em Évora nos séculos XVI e XVII», A
Cidade de Évora, nºs 13-14, 1947, pp. 109-213, refª pp. 140-142.
99 A.S.E., Lº do Registo de Alvarás de Despesa passados ao Prioste, 1598­1626, l. 41.
100 Existem recibos autógrafos deste pintor integrados no Maço de Contratos de Obras
respeitantes à Capela‑Mor do Mosteiro do Carmo de Évora (1568‑1623), mss. da colecção Pe-
dro d’Azevedo. Este mss. foi recentemente adquirido pelo A.N.T.T.. Ver DOC. Nº 34.
101 Carlos Ruão, O Eupalinos Moderno». Teoria e Prática da Arquitectura Religiosa em
Portugal (1550‑1640), tese de doutoramento, 3 vols, Coimbra, Faculdade de Letras da
Universidade, 2006, vol. I, p. 447.
102 Carlos Ruão, op. cit., vol. II, pp. 129-170.
103 Agustín Bustamante e Fernando Marías, «Francisco de Mora y la Arquitectura
Portuguesa», As Relações Artísticas entre Portugal e Espanha na Época dos Descobrimentos,
Coimbra, Minerva, 1987, pp. 277-318.
104 A Biblioteca Digital de Espanha tem disponível as plantas e desenhos da Car-
tuxa de Évora feitos pelos arquitectos Giovanni Casale e Francisco de Mora. A pri-
meira planta de Casale assinada pelo Arcebispo D. Teotónio e por D. Frei João Bellot
mostra claramente os acertos feitos in loco. A obra será seguida de perto por D. Luís

72
Telmo, primeiro prior da Cartuxa. Junto a esta, uma planta de Casale para o jardim
da quinta de Fernão da Silva a Belém.
105 A.D.E., Lº 261 de Notas do Tabelião Baltazar de Andrade, de Évora, ls. 99­105. Ver DOC.Nº 14.
106 A.D.E., Lº 160 de Notas do Tabelião Álvaro Ramalho, de Évora, l. 106 vº­110 vº.
Trata-se de um arrendamento de casas, de 14 de Janeiro de 1588, em que D. Teotónio
apresentou como testemunha o arquitecto Filipe Terzi, estante em Évora.
107 Carlos Ruão, op. cit. vol. II, pp. 171-206.
108 O imaginário Pedro de Frias trabalhou em Évora em 1543, fazendo uma es-
tante para o mosteiro de Santa Clara, avaliada por Garcia Leal e Francisco Rodri-
gues, carpinteiros (B.P.E., Lº 63 do Mosteiro de Santa Clara, Documentação vária, nº 33).
109 A.N.T.T., Lº 21 de Notas de António Pinheiro, ls. 84­88. Contrato de 2­XI­1588.
110 A capela-mor do antigo mosteiro de Santa Marta, que possuía um retábulo de
Amaro do Vale (1590), preserva ainda uma bela cobertura com cartela maneirista em
stucco, possivelmente por «debuxo» de Nicolau de Frias (cf. Isabel Mayer Godinho
Mendonça, «Um tecto quinhentista na capela-mor da igreja do Convento de Santa
Marta», Monumentos, nº 17, 2002, pp. 125-131).
111 Fernando Chueca Goitia, «El estilo herreriano y la arquitectura portuguesa», El
Escorial 1563‑1963, Madrid, IV Centenario, 1963, pp. 215-253.
112 Alfonso Rodríguez G. de Ceballos, La arquitectura religiosa y sus cambios tras el Con‑
cilio de Trento. in El arte del Renacimiento en el territorio burgalés (coord. de Emilio Jesús
Rodríguez Pajares, María Isabel Bringas López, Burgos, 2008.
113 A.D.E., Lºs 153 e 161 de Notas de Álvaro Ramalho, ls. 109 vº a 112 vº, e ls. 29
vº-32. Cf. DOCs. Nº 7 e Nº 13.
114 A.D.E., Lº 261 de Notas do Tabelião Baltazar de Andrade, de Évora, ls. 99­105. Ver DOC. Nº 14.
115 Em 1629, o Arcebispo D. José de Melo mandou refazer a pintura do Sepulcro,
chamando para o efeito os pintores Pedro Nunes, António Vogado, Bartolomeu Sán-
chez e Manuel Fernandes, por alto preço de 600.000 rs (A.D.E., Lº 571 de Notas do
Tabelião Gil Solteiro, de Évora, ls.26­29).
116 Paulo Varela Gomes, Arquitectura, Religião e Política em Portugal no Século XVII. A
planta centralizada, Porto, Faculdade de Arquitectura, 2001, pp. 165-166.
117 A.S.E., Lº 7 das Lembranças dos Negoçios que se tratarão em Cabido, cota PT/ASE/
CSE/C/001/Lº 7, 1591­1597, l. 36 vº. DOC. Nº 11.
118 Sabemos que em Junho de 1572, ainda em tempo de D. João de Melo, o mes-
tre foi ao Redondo escolher lugar para a nova igreja (A.S.E., Lº de Registo de Alvarás
de Despesas do Cabido, 1566‑1598, l. 78, e que a obra se entregou de empreitada a Ma-
nuel Rodrigues, com vistoria constante de Jerónimo de Torres (A.S.E., Lº de Registo
de Alvarás, ls. 62 vº, 65, 95, 112 vº e 120).
119 A.S.E., Lº de Registo de Alvarás…, 1566‑98, ls. 150 e 159: «da igrª nova do Redomdo,
depois de lhe cair a abobada, a medição se fez em o Redondo por Jeronimo de Tores, m.tre pedreiro,
em o Verão passado de 1583».
120 A.S.E., Livro 6 das Lembranças dos Negoçios que se tratarão em Cabido, cit., l. 209.

73
121 A.S.E., Lº 7 das Lembranças…, cota PT/ASE/CSE/C/001/Lº 7, 1591-1597,
l. 36 vº.
122 Não nos chegou o contrato de pintura. O de entalhe consta em: A.D.E., Lºs
153 e 161 de Notas de Álvaro Ramalho, ls. 109 vº­112 vº e ls. 29 vº­32, cf. DOC. Nº
14. É possível que uma excelente tábua maneirista representando a Adoração dos Pas‑
tores, muito aim ao estilo do pintor lisboeta Diogo Teixeira (c. 1540­1612), e que foi
reutilizada num dos altares de Santo Antão (banda do Evangelho) pertencesse a esse
desmantelado retábulo.
123 Segundo João Carlos Garcia, Atlas Universal de Fernão Vaz Dourado, 1571, Lisboa,
ed. M. Moleiro, 2014, o Atlas Universal de Vaz Dourado foi elaborado em Goa, em
1571, no inal do governo de D. Luís de Ataíde, 3º Conde de Atouguia e 10º Vice­
-Rei da Índia (1568-1571), ou no início do governo de D. António de Noronha, 11º
Vice-Rei (1571-1573), sobrinho neto de Afonso de Albuquerque, nomeado por D.
Sebastião, que chegou à Índia em Setembro de 1571.
124 Francisca Mendes, Contributos para a reconstituição virtual da Livraria do Convento da
Cartuxa (1587‑1834), projecto, Fundação Eugénio de Almeida, 2014.
125 Exemplar na Biblioteca Nacional de Portugal, RES 3296V.
126 J. Pinharanda Gomes, op. cit., pp. 57-59.
127 Cf. Luís de Matos, «Ebora humanística», A Cidade de Evora, nº 59, 1976, pp. 5-
-21; e Belmiro Fernandes Pereira, op. cit., pp. 845-860.
128 J. Pinharanda Gomes, op. cit., p. 59.
129 João Carlos Garcia, op. cit.
130 Jorge Cardoso, Agiológio Lusitano, vol. I, Lisboa, 1652, p. 508; e J. Pinharanda
Gomes, op. cit., p. 53.
131 Diogo Barbosa Machado, Bibliotheca Lusitana, vol. II, Lisboa, 1747, p. 64.
132 João Carlos Garcia, op. cit.
133 Ana Isabel Buescu prepara, no âmbito do projecto De Todas as Partes do Mun‑
do. O Património do 5º Duque de Bragança D. Teodósio I (dirigido por Jessica Hallett), um
estudo exaustivo sobre a Livraria do Duque D. Teodósio I, inventariada em Vila Vi-
çosa em 1564-65.
134 A.H.F.E.A., Inventario que se fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor
Conde de Basto dom Lourenso pires de Castro que faleseo em Catalunha no lugar de fraga sem
descendentes deixando por sua universal herdeira a senhora Condessa de Basto Dona Violante de
Lencastre sua molher, ls. 39 vº­76. O Dr. João Ruas prepara, com o autor deste livro,
um estudo sistemático sobre os 483 livros da biblioteca dos Castros.
135 Juan Mayo Escudero, op. cit., p. 173, dá-nos o relato de D. Nicolau José Maria
Albergati, ao tempo prior da Cartuxa: «a biblioteca, muito notável, soffreo aliena-
ção de algumas espécies impressas e manuscritas e os livros foram arremessados e
muito espezinhados».
136 Juan Mayo Escudero, op. cit., p. 33.

74
137 B.P.E., Cód. CVII/1-28: Inventario de tudo o que o Arcebpo tem dado aos padres Car‑
tuxos do Mosteiro de eScala caeli desta cidade de Evora, l. 172.
138 Maria Antónia Conde, «Do claustro ao século: o canto e a escrita no mosteiro
de São Bento de Cástris», ed. CIDEHUS, pp. 243-254; apud Túlio Espanca, op. cit.,
1948, pp. 191-194.
139 Esta ideia é refutada por Túlio Espanca, op. cit., 1948, p. 191, pois o topónimo
seria anterior à existência de André de Burgos.
140 Túlio Espanca, «A obra do pintor Francisco João», cit., 1955-56, pp. 183-185.
141 A.D.E., Lº 209 de Notas de Domingos Pires, ls. 47 vº­48 vº.
142 Miguel Soromenho, «As possíveis fontes tipológicas da fachada da Igreja (da
Cartuxa de Évora)», Monumentos, nº 10, 1999, pp. 8-13.
143 Idem, ibidem.
144 Manuel Joaquim Branco, «Renascimento, Maneirismo e ‘Estilo Chão’ em Évo-
ra», in catálogo Do Mundo Antigo aos Novos Mundos. Humanismo, Classicismo e Notícias
dos Descobrimentos em Évora (1516‑1624), Évora, Comissão Nacional para as Come-
morações dos Descobrimentos Portugueses, 1999, pp. 237-240; e Celso Mangucci,
op. cit., pp. 28-29.
145 Celso Mangucci, op. cit., p. 35.
146 Artur Goulart e Vitor Serrão, «O ciclo de Sibilas e Profetas da igreja de Nossa
Senhora de Machede (c. 1604-1625) e o seu programa iconológico», Artis – Revista
do Instituto de História da Arte, nº 3, 2004, pp. 211-238.
147 B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 6. D0C. Nº 16.
148 B.P.E., Lº 1 do Mosteiro da Cartuxa (Escrituras), ls. 355­358; cf. J. Pinharanda
Gomes, op. cit. (1984), pp. 33-135; e Maria Antónia Hespanhol, op. cit., pp. 447-453.
149 B.P.E., Manuscritos dos Conventos, cód. 1.401, ls. 72­109.

75
3. A f o r m Aç ão A rt í s t i c A n A
c o rt e d e v i l A v i ç o s A

3 . 1 . Vi l a Vi ç o s a , a « C O R T E NA ALDEIA»

Se a juventude e primeira formação de D. Teotónio de Bra-


gança se passou dentro das paredes do Paço Ducal de Vila Vi-
çosa, a célebre «corte na aldeia» de Rodrigues Lobo, é evidente
que a série de obras relevantes que aí se desenvolviam, quer a
nível da morosa construção, quer da fervilhante acção literária
passada nas tertúrias palatinas, foram importantes no gosto do
futuro Arcebispo de Évora. Aliás, foi sempre um espaço fami-
liar, que amiúde frequentou na idade adulta, após o período de
escolaridade em Santa Cruz de Coimbra, e depois das longas
viagens em périplos pela Europa, voltando ao palácio briganti-
no em várias outras fases da sua existência,
É necessário perceber-se o que foi construído no Paço de Vila
Viçosa durante a segunda metade do século XVI, e o espírito
que presidiu às decorações intestinas, para se seguir o percurso
formativo de D. Teotónio de Bragança. Foi nesse preciso con-
texto que ele se educou em termos estéticos, aliando um gosto
de base renascentista entretanto moldado pela experiência das
viagens empreendidas por França, Itália, Espanha e Inglaterra,
ao inluxo do que em Vila Viçosa se ia fazendo em termos ar-
quitectónicos e artísticos. Desse contexto de extraordinário ful-

77
gor – as campanhas construtivas empreendidas por seu irmão
D. Teodósio I, 5º Duque de Bragança (1532-1563), e sobretudo
pelo sobrinho, o 6º Duque D. João I (1563-1583), fase em que
o essencial da grande fachada e corpos do terreiro ducal foram
erigidos – guardará o futuro Arcebispo de Évora uma forte e
duradoira impressão. Ele próprio vai empregar nas obras mais
importantes da sua Arquidiocese, anos mais tarde, alguns dos
artistas que aí encontrara em plena actividade e cuja personali-
dade admirara, desde os arquitectos Nicolau de Frias, ao ourives
local João Luís, ao pedreiro Manuel Ribeiro, aos pintores Fran-
cisco João, Giraldo Fernandes de Prado e Custódio da Costa, e
ao paramenteiro António Garcia, que estarão envolvidos depois,
em Évora, em diversas empreitadas teotoninas, entre o inal do
século e a passagem para o século XVII. De um destes artis-
tas, o já muito referido Pero Vaz Pereira, educado na cidade de
Roma, o Arcebispo fá-lo-á mesmo seu arquitecto e escultor ao
assumir o múnus eborense.
O Paço Ducal de Vila Viçosa, emblemática sede da Casa de
Bragança, estima-se entre os mais notáveis empreendimentos
da arquitectura senhorial do século XVI da Península Ibérica.
Apresenta na esplêndida massa da sua fachada palatina, dispos-
ta em triplo andar com vinte e três tramos forrados de mármo-
re, um prospecto arquitectónico grandiloquente, de inspiração
maneirista «ao italiano», concebida em idelidade a uma tratadís-
tica serliana que remete para conhecimento de bons exemplos
castelhanos e transalpinos 150. Apesar de a sua linguagem esti-
lística se conformar à lição de módulos da arquitectura interna-
cional, como aliás esclarecem as informações fornecidas atra-
vés da contra-prova arquivística, a cronologia da fachada ainda
hoje continua a dividir a opinião dos historiadores de arte. Con-
sidera Rafael Moreira 151 e, na sua esteira, vários outros autores
152
, que D. Teodósio I, tendo sido indigitado como Condestável
do Reino em 1535, e ao negociar o casamento de sua irmã D.
Isabel com o Infante D. Duarte, irmão de D. João III, proveu
a ampliação do velho Paço a im de o tornar condigno para as
festas que se anunciavam, sendo dessa época a imponente fa-

78
chada que admiramos. Ou seja, o esforço de promoção da Casa
de Bragança que levou D. Teodósio a erguer um corpo palatino
junto às «casas velhas» (o paço tardogótico do Reguengo), como
que exorcizando a pesada memória de seu pai D. Jaime, tornaria
Vila Viçosa o expoente urbanístico italianizado de um Renasci‑
mento de mármore 153, caso ímpar no tempo de D. João III, de que
o Paço calipolense seria o mais evoluído testemunho.
Essa opinião não é, todavia, consensual e pôde ser fundamen-
tadamente contestada em estudos recentes. É certo que com as
obras realizadas na sequência das festas de 1537 a fachada do
Terreiro estava parcialmente erguida, «ao romano», com dois pi-
sos sobrepostos: regista uma fonte coetânea que «em im do anno
de 1552 em tempo de El‑Rey D. João III tem o terreiro do paço de Villa
Viçosa de longo 66 braças e d’ancho 55»154, e o autor anónimo da
crónica das festas155 descreve-a como obra esplendorosa, com
suas «janellas lavradas ao modo antigo romano de bases e capiteis cor‑
nigeas e outras obras romanas» 156. Essa campanha, segundo Rafa-
el Moreira, seria da responsabilidade de Benedetto da Ravena,
um engenheiro militar de Carlos V que passa em 1535 por Por-
tugal e trabalhará entretanto na fortaleza de Mazagão 157. Ora
sabemos pelos róis das Aposentadorias de Março de 1565 quais
foram precisamente as obras custeadas pelo Duque a seguir a
1537, e após o seu casamento com D. Beatriz de Lencastre, ava-
liadas pelos mestres pedreiros Domingos Lourenço e Marcos
de Pina: pode apurar-se com exactidão o que se fez na fachada
e em salas do paço e pode reconstituir-se o pré-existente antes
das deinitivas remodelações dos anos de 1580 sob batuta de
Nicolau de Frias 158.
De facto, com a governação de D. Teodósio I izeram­se
obras de expansão do corpo palatino, excluindo-se embora gran-
de parte da ala sul, a torre central com o portal de serventia e o
terceiro piso da ala norte (este, ainda por ultimar à data em que
Pier Maria Baldi desenha a fachada do paço, aquando da visi-
ta do Grão-Duque da Toscana Cosme de Médicis em 1669). O
quinto Duque iniciou o corpo do Terreiro com uma ala de dois
pisos angulando com o velho paço do Reguengo, prolongando-o

79
Fig. 57 mais ou menos até ao lanço que integra a Sala dos Tudescos159.
Ao certo, sabemos que o paço se amplia de 1537 a 1559, adqui-
re um facies ao romano e abandona resquícios da primeva tipolo-
gia gótico-mudejar. Existem referências precisas, entre outras, a
decorações com tondi relevados dentro do gosto renascentista,
que são inequívocas sobre a obra que então se erguia. Um dos
lanços de avaliação de 1559 contabiliza 698.000 rs com os «treze
vãos de pedrarya que estão no terreyro do alpendre ate o Jardjm», corres-
pondendo a obras feitas entre 1540 e aquele ano, «descontando
as janellas que não são deste tempo»160, o que signiica que já à data se
pensava seriamente em dar ao prospecto uma imagem cenográ-
ica consentânea com modelos de palácios peninsulares coevos.
Todavia, o prospecto da ala teodosina de cerca de 1537 foi
substancialmente alterado com a intervenção deinitiva de 1583
que prolongou a fachada até às dimensões actuais e lhe moder-
nizou o carácter arquitectónico, com torre central integrando o
corpo da longa frontaria, remate com serliana, ina molduração
das fenestras e adição de um piso superior pensado como con-
tínuo. Em 1571, à data da visita do Cardeal Alexandrino, lega-
do do Papa, o cronista Giovan Battista Venturino 161 descreve-
-nos ainda uma «casa comprida» onde a comitiva papal pernoitou
e que não deveria ser a actual Sala dos Tudescos, situada à di-
reita da escadaria nobre, pois a avaliação de Março de 1565 fala
repetidamente de uma Casa dos Hóspedes sita no ângulo junto ao
paço do Reguengo. Só no inal do governo do Duque D. João
I (1563-1583) se iniciará a grande campanha de ampliação e re-
modelação integral, que lhe conferiu o carácter monumental que
hoje se admira. As obras das chamadas «casas novas» trazem-nos
esclarecedoras referências, a partir de vários contratos notariais
com pedreiros que laboram nessa campanha com direcção es-
sencial do Duque D. Teodósio II e de Nicolau de Frias, «arqui‑
tecto de sua casa e obras della» 162.
Voltando às obras do segundo quartel do século XVI, só nos
restam alguns elementos de equipamento doméstico (como um
antigo oratório ducal pintado a fresco) 163 e nada em absoluto
remanesce na fachada que remeta para a campanha teodosina,

80
toda ela reformulada em prospecto majestático quando inal-
mente houve condições políticas para o fazer: e, essas, foram
as condições que a crise dinástica impunha e os pergaminhos
dos Braganças exigiam. Foi no im dos anos 70 do século XVI
que se concebe a monumental fachada do terreiro. Em termos
estilísticos, torna-se uma evidência contestar a proposta de cro-
nologia de cerca de 1537 nos termos em que o faz o historiador
de arte Miguel Soromenho ao observar, justamente, que «a so-
breposição vitruviana das ordens e o coroamento de vãos, em
pisos alternados, com frontões triangulares e semicirculares,
não tinham ainda sido tentados (naquela data), e só o vieram a
ser muito mais tarde», enquanto que «a concepção planiicada
do muro parece mais próxima de um tipo de linguagem inisse-
cular, enriquecida pelo sentido experimental introduzido atra-
vés das opções do desenho da fachada do paço da Ribeira, que
continuava a ser o termo de referência mais internacionalizado
da arquitectura civil portuguesa»164.

3 . 2 . A fac h a d a pa l at i n a
A proposta de cronologia do corpo palaciano do Terrei-
ro, que teria sido erguido no tempo de D. Teodósio I «num pre-
núncio de bom augúrio para as grandezas futuras»165, tem feito
escola, apesar da evidência estilística que a lição arquitectónica
proporciona, e da probatória documentação que subsiste.
De facto, as descrições esclarecedoras, as contas das aposenta‑
dorias que elencam obras de construção entre 1540 e 1563, e a
leitura estilística, permitem reconstituir exactamente como seria
a fachada nos anos de governação do quinto Duque. Embora
uma análise cuidada de tal documentação permita deduzir que
em 1559 já estava prevista a extensão da frontaria senhorial para
vinte e três tramos166, revelando a intenção de engrandecimento
que os Braganças entendiam vital como sua estratégia de airma-
ção, tratando-se da mais poderosa nobreza do Reino, o cumpri-
mento desse desiderato só terá modo de concretização, e modelo
adequado à ambição do programa, no tempo de D. Teodósio II,
segundo traças de Nicolau de Frias, ao conigurar a fachada do
Terreiro com a isionomia que chegou aos nossos dias.

81
Assim, a «obra romana» da fachada de D. Teodósio I (cujo res-
ponsável pode ser agora revelado fruto de nova documentação)
não é a que remanesce: coube a seu ilho D. João I a tarefa de
gizar o projecto monumental de fachada palatina, dentro de uma
severidade tridentina que era a do novo gosto de arquitectura
senhorial dominante na Península. Essa fachada maneirista, ide-
alizada em tempo de crise dinástica e nas vésperas de viragem
para a Monarquia Dual, deve-se, com a segurança proporcio-
nada por base documental sólida, a custosas «traças» realizadas
em 1583 pelo arquitecto Nicolau de Frias, que lhe conferiram
o actual prospecto, austero e grandiloquente ao mesmo tempo,
ao gosto da arquitectura castelhana do terceiro quartel do sé-
culo XVI e assumindo notória dimensão internacional 167. Frias
começa a trabalhar na renovação e ampliação da fachada com
o governo de D. João I, sendo já em 1578 considerado «famo‑
so architecto destes tempos» pela educação italiana e arrojo de cer-
tas obras (como a elogiada planta do Dormitório do Convento
de São Domingos de Lisboa, com coniguração de «huma cruz
perfeita de tres braços»). Porém, tendo icado cativo por um
ano no rescaldo da trágica expedição de Marrocos («para sitia‑
dores do campo ião Filipe Estercio, italiano, e Nicolao de Frias, grandes
architectos») 168, só em 1583 retoma as obras do Duque D. João I:
recebe a 15 de Março 50.000 rs «por respeito de vir a Lxª per man‑
dado do duque que Ds tem a esta villa Viçosa onde esteve ate ora fazendo
as traças» 169, são-lhe pagos 20.000 rs em 3 de Abril da parte do
novo Duque D. Teodósio II como «arquitecto da sua casa», e mais
20.000 rs a 12 de Maio «por todas as traças que mais fez» 170. Trata-
-se indiscutivelmente do projecto de renovação da fachada paçã:
como observa Carlos Ruão, pelos desenhos de remodelação do
palácio Nicolau de Frias recebeu a fabulosa soma de 70.000 rs
(em parte de pago), o que aponta para «um projecto de grande
relevância» 171, coerente com a modernidade pretendida.
Trata-se de uma tipologia ligada com proximidade ao mode-
lo maneirista que se impõs em Castela com a reorganização dos
paços régios e envolveu arquitectos de corte como Alonso de
Covarrubias, Luis de Vega e seus colaboradores Hernán Gonzá-

82
lez de Lara, Francisco de Villalpando, Gaspar de Vega, etc, onde
se coniguram novas soluções de cenográica grandiloquência
(palácios de Madrid, Aranjuez, Valladolid, Segóvia, Toledo, Val-
saín, etc). Esse gosto, chamado por Chueca Goitia estilo Príncipe
Felipe 172, dentro da deliberada severidade contra-reformista 173,
é a nosso ver o que domina na opção estética seguida no Paço
de Vila Viçosa com D. João II e D. Teodósio II – ou seja, mui-
tos anos após a morte de D. Teodósio I.
Recentes pesquisas arquivísticas deram a conhecer o nome
do artista que esteve ao serviço de D. Teodósio I e surge taxa-
tivamente nomeado como mestre responsável das suas obras:
o arquitecto e escultor francês François de Loiret, ou na gíria
portuguesa Francisco de Lorete e, ainda, Francisco de Loreto 174.
Trata-se de um artista oriundo da região do Loiret (um aluente
do rio Loire), antiga província de Orléans, que chega a Portu-
gal por volta de 1530, a quem se deve, conforme provou Pedro
Flor, a obra do magníico portal renascentista da igreja matriz
de Arronches 175. Uma carta escrita nessa vila alentejana a 4 de
Fevereiro de 1542 pelo crúzio Frei Brás de Barros, dirigida a D.
João III, diz-nos o seguinte: «Item. Senhor ho portal da Igreja estaa
Ja assentado muito boom conforme a ella. E porque nom tem portas e a
Igreja estaa sem ellas devassa sera boom Vossa Alteza as mandar fazer
de bordos has quaaes fara ho mesmo Francisco de Loreto que fez ho portal
por ser assi em pedra como em madeira grande oicial» 176. A referência
é clara: o francês lavrara o portal marmóreo da igreja de Arron-
ches (durante muitos anos atribuído a Nicolau Chanterene) em
composição clássica com frontão triangular integrando a cruz
da Ordem de Cristo, pilastras coríntias assentes em plintos de-
corados, e dois soberbos tondi com iguras evocativas das virtu-
des cristãs, e este seu trabalho merecera devido encómio, a pon-
to de se lhe dar de seguida o entalhe das portas de madeira 177.
O «grande oicial» Francisco de Loreto era conhecido dos crú-
zios de Coimbra, pois em 1531 acrescentara o cadeiral do mos-
teiro de Santa Cruz (de mestre Machim Fernandes) e lavrara,
no ano seguinte, um facistol e uma caixa de órgão segundo de-
senhos «ao romano» que apresentara178. Nos anos que passou em

83
Coimbra, o francês teve casas na rua da Soia e privou com os
escultores João de Ruão, Odarte e Nicolau Chanterenne, o pe-
dreiro Juan de la Faya, o marceneiro Charles e o pintor Vasco
Fernandes, o que atesta papel de destaque no centro decisório das
grandes encomendas ligadas aos crúzios. Por essa via, desloca-
-se em 1533 ao Convento de Cristo de Tomar para realizar la-
vores de marcenaria em altares da Charola, e volta mais tarde
a trabalhar nas obras do Noviciado. Em 1542, como se viu, ul-
timou o lavor do portal da matriz de Arronches e em seguida,
segundo defende Pedro Flor, lavrou o portal e demais obra re-
nascentista da igreja da Madalena em Olivença. Mais se sabe que
Francisco de Loreto vem para Portugal acompanhado de um ir-
mão escultor, chamado Pierre Loiret (Pedro de Loreto), que em
1551 declara viver no Reino há vinte e um anos (chegara, pois,
em 1530), sendo casado há onze com Antónia de Morais, irmã
do pintor Cristóvão de Morais, e tendo trabalhado em 1542 no
Convento de Cristo de Tomar 179. As relações artísticas dos dois
irmãos Loreto com os círculos do humanismo renascentista,
tanto crúzios, como cortesãos, percebem-se pela constância de
encomendas em Coimbra, Tomar, e nos Jerónimos. A acção na
órbita do Infante D. Luís depreende-se do inventário de bens
e dívidas de Pedro de Loreto, cujo cunhado, Cristóvão de Mo-
rais, possuía um valioso livro de debuchos por si emprestado 180.
Acresce a este peril biográico o facto absolutamente rele-
vante de se saber, agora, que Francisco de Loreto foi o mestre
das obras do Duque de Bragança. A revelação de que foi este
francês o arquitecto-escultor do Duque esclarece a nebulosa de
conhecimentos do que eram os círculos artísticos da corte du-
cal! O documento que em nota se transcreve (e cuja comunica-
ção devemos aos historiadores de arte Francisco Bilou e Manuel
Joaquim Branco) contribui para resolver o problema das enco-
mendas palatinas dos anos sequentes ao casamento de 1537. Fi-
camos a saber que Francisco de Loreto estava a morar em Vila
Viçosa em 1539, na qualidade de «mestre das obras do Duque nos-
so senhor», data em que arrematou em escritura notarial a obra
de construção da igreja de Arronches181.

84
A obra de arquitectura de Francisco de Loreto em Arron-
ches foi, no essencial, a modernização da antiga hall church ‘ma-
nuelina’, aditando-lhe o belíssimo portal, o porta-óleos renas-
centista e outros elementos de gosto «ao romano», com destaque
maior para os «portados de pedra d’estremoz com sua moldura roma‑
na»182. A sua intervenção nesse templo estendeu-se até Feverei-
ro de 1542, quando Frei Brás de Barros escrevia ao rei a elogiar
a magniicência com que o seu portal fora lavrado pelo «grande
oicial» Francisco de Loreto183. Apura-se, assim, que Francisco
de Loreto era o mestre das obras do Duque D. Teodósio I nos
anos subsequentes ao célebre casamento de D. Isabel com D.
Duarte, e que, tal como outros mestres franceses que com ele
vieram para Portugal, não esgotava a sua actividade em obras
de lavor pétreo e em escultura de madeira, mas também na di-
recção de empreitadas de arquitectura.
É seguro, assim, dado o cargo que ocupava junto a D. Teo-
dósio, que tivesse dirigido a obra de ampliação da fachada do
Paço e bem assim, em 1536, a construção «ao romano» da igre-
ja do convento das Chagas de Vila Viçosa (onde o desenho do
portal, da clássica fenestra renascentista e do bem lançado arco
triunfal têm ainidades lagrantes com a obra de Arronches)184.
É de crer que Francisco de Loreto se ocupasse por alguns anos
no serviço do Duque e que várias obras descritas nas Aposen‑
tadorias fossem responsabilidade sua. De seguro, sabemos que
após o término da igreja de Arronches em 1542, trabalhará para
o Bispo de Ceuta: deve-se-lhe, segundo Pedro Flor, a decoração
renascentista da igreja da Madalena de Olivença (1546-48); de
seguida, desloca-se para o Norte de África, ao serviço do mesmo
Bispo, senhor de Olivença, tendo lá falecido em circunstâncias
ainda ignotas. O que o seu estilo nos revela, pela concepção e
lavor de cinzel do extraordinário pórtico e demais obra renas-
centista de Arronches, e pela inura de cinzelado do arco­mestre
e fenestra moldurada na igreja das Chagas de Vila Viçosa, é ver-
dadeiramente um gosto «romano» de primeira ordem, mas em
tudo diferente da limguagem que se pode admirar na fachada
do Paço. Podemos presumir, assim, quanto à obra da fachada do

85
quinto Duque, elogiada pelas suas «janellas lavradas ao modo anti‑
go romano de bases e capiteis cornigeas e outras obras romanas»185, que a
responsabilidade da empresa se deveu a Francisco de Loreto, o
mestre das obras do Duque. Mas a verdade é que, dessa facha-
da teodosina, nada mais resta do que a memória.
A actual fachada do Paço calipolense revela uma linguagem
que nada deve à que se intui vendo, por exemplo, as fenestras
molduradas e a morfologia clássica do portal da igreja das Cha-
gas e, com maior evidência, o portal de Arronches, de cerca de
1536-1542. O que chegou aos nossos dias é uma magna cons-
trução erguida muito mais tarde segundo os cânones do Ma-
neirismo peninsular (dentro do já muito referido gosto áulico e
despojado que se denomina estilo Príncipe Felipe). A fachada deve
ter começado a ser pensada pelo Duque D. João I nas vésperas
de Alcácer Quibir, campanha militar para onde a Casa de Bra-
gança enviou nada menos que um milhar de cavaleiros e onde
icaram cativos o próprio príncipe Teodósio (futuro sétimo du-
que), o arquitecto de serviço Nicolau de Frias, o engenheiro Fi-
lipe Terzi e, provavelmente ainda, o pintor-calígrafo Giraldo de
Prado. Assim que se resgataram estas personagens, a fachada
prosseguiu célere, num afã de substituir as remanescências «ao
romano» do francês, já desusadas, e conferir ao terreiro a digni-
dade pretendida.
Tal como Teodósio I apagara as marcas do gosto medievali-
zante de seu pai («não eram de seu contentamento», diz o cronista das
festas de 1537), também D. João I virou a página já considerada
retrógrada dessa arquitectura «ao romano» incentivada pelo pro-
genitor, de que o castelo de Evoramonte, a igreja das Chagas
de Vila Viçosa, ou Arronches, são testemunho demonstrativo.
Passou­se em Vila Viçosa algo de similar ao que os crúzios ize-
ram em Tomar, ousando corrigir o plano do claustro grande, de
João de Castilho, que deu lugar ao claustro maneirista de Dio-
go de Torralva... Outro exemplo, mais próximo, passou-se no
Paço de São Miguel (ou dos Condes de Basto) em Évora, onde
a reconstrução-ampliação maneirista do tempo de D. Diogo de
Castro e de D. Fernando de Castro, 1º conde de Basto, cobriu

86
a primeva estrutura gótico-mudéjar da construção do primeiro
quartel do século XVI, seguindo e desenvolvendo as disposições
que já se indicavam em Serlio para as modernizações de velhas
casas de idalguia 186. Eram tempos novos, e os Braganças aspi-
ravam ao reforço político da sua imagem, que passava também
pelo prospecto magniicente da sua sede residencial.
O que predomina hoje em Vila Viçosa é uma nobilíssima
fachada da segunda metade do século XVI. Nada já do corpo
mais restrito que se fez no tempo de D. Teodósio I, por enge-
nho de Francisco de Loreto e outros artistas, e que estava em
parte erguido aquando das festas de 1537. O gosto construtivo
imperante com a Contra-Reforma segue aqui um modelo especíico
de palácio peninsular (a lembrar os de Luis de Vega e de Alonso de
Covarrubias nas construções palatinas de Castela) 187, abrindo
espaço a uma alternativa monumental, que se adequava às ambi-
ções políticas da Casa: grande corpo-fachada de dois andares a
dominar o Rossio palatino, com novas câmaras e salões abertos
à fruição de convidados de luxo e à vivência requintada de uma
corte‑Parnaso. É também notória a derivação dos modelos de ex-
tensas fachadas palatinas concebidas por Sebastiano Serlio, que
eram bem conhecidos de Nicolau de Frias (tanto pela viagem a
Itália como pela sua formação própria em Arquitectura), caso
do alçado de palácio real que ilustra um dos fólios do Sesto Libro,
ou do desenho de uma fachada coríntica, com seu piso nobre
de balaústres, num dos fólios do Quarto Libro 188. A ideia geral
do Paço calipolense encontrou aí a sua génese. Analisando-se o
rol de obras realizadas no tempo de D. Teodósio I e D. Brites,
cujos documentos nos chegaram, a referência a salas como de
David, de Cipião, e outras que existiam no paço renascentista,
não se confunde com novas salas tituladas da mesma forma que
se rebaptizam nas «casas novas» do Palácio renovado e ampliado
a partir do Duque D. João I. É importante, por isso, a contra-
-prova fornecida por preexistências que prevalecem do paço
teodosino, caso do Oratório dito de D. Teodósio I (ainda com
frescos de Francisco de Campos e de Giraldo de Prado), para se
perceberem as grandes alterações sucedidas nos anos 70 e 80 189.

87
A imagem arquitectónica do Paço, visto pelo exterior no ter-
reiro, a partir da igreja dos Agostinhos, tal como já se podia ad-
mirar no im do século XVI, oferecia um novo prospecto que
invejava os visitantes. Um ilustre escritor castelhano dessa épo-
ca, Luís Zapata (1526-1595), indica Vila Viçosa entre as cinco
melhores praças de toda a Península Ibérica, a partir do prestí-
gio, escala e ostentação da arquitectura: «la mayor de Valladolid y el
Ruxio de Lisboa y la de Medina del campo y la del Duque de vergança en
Villaviciossa y la de antepalacio de Lisboa de la casa real»190. Era esse
impressionante prospecto que fazia da sede da Casa de Bragan-
ça um dos monumentos-chave do Reino. Num tratado seiscen-
tista da autoria do arquitecto régio Luís Nunes Tinoco (e não
de seu pai João Nunes Tinoco como se tem airmado), diz­se
que o paço de Vila Viçosa era um dos grandes monumentos do
Reino e, como tal, digno de nota:
«…também no nosso Portugal há maravilhosos templos, & sumptuosos
edifícios fabricados ao antíguo, moderno, & Romano, como são o Templo‑
Real da Batalha, o de Alcobaça, o de Thomar, o de Stª Cruz de Coimbra,
o de Belem em lixª, & outros muitos mandados fazer pelos nossos Sere‑
nissimos Reys de Portugal, como tambem o Templo Real de S. Vic.te de
Fora, o do Collegio de Stº Antão da Compª de Jhs, o do Carmo de Lixª,
o do Loreto que ao prezente se esta fabricando, o da Ermida Nova feita
por ordem da Serenissimª Raynha de Portugal nossa Snra, e outros mui‑
tos ininitos, que há em todo o Reyno que por não ser preluxo não relato.
Como também o Ediicio real da obra do Forte do Palacio em que assistem
os sereníssimos Reys de Portugal. Os Paços de Syntra, os de Almeirym,
os de Villa Viçosa, os de Salvaterra, & outros muitos. Como tãobem o
Ediicio sumptuoso do Marquez de Castel Rº que hoje hé do serenissimo
Infante de Portugal D. Pedro, irmão delRey D. Afonso 6º nosso Senhor
q. Deos goarde» 191.
A ampliação-remodelação da fachada por Nicolau de Frias
teve no pedreiro da casa ducal Manuel Ribeiro o empreiteiro
de serviço192. As referências à obra abundam e intensiicam­se
na sua fase inal, aquando das festas de casamento de D. Teo-
dósio II com D. Ana de Velasco y Girón, da casa de Feria, que
apressaram a sua conclusão. Estes contratos notariais, de enor-

88
me importância para o historial do Paço, comprovam o que ai-
nal se passou desde o im dos anos 70, com D. João I, ao pla-
near o prolongamento e uniicação do corpo da frontaria com
traças de Nicolau de Frias num severo mas monumental gosto
maneirista «ao escurialense»193. Tudo revela uma obra excelsa,
tanto na sua concepção como nos seus acabamentos, nos alça-
dos e nos pormenores arquitectónicos. O recorte dos capitéis
é ino e atesta a presença de mão­de­obra habilitada, e o jogo
alternado de frontões nas janelas dos três andares reforça a im-
pressão de um rigorismo tratadístico eloquente, que se expressa
também no modelo serliano dos três janelões centrais da torre,
no terceiro piso. A sobreposição de ordens clássicas – toscana,
jónica e coríntia em três pisos –, com tipologias bem estrutura-
das nos vãos das aberturas e pilastras de fuste liso assentes em
pedestais de bom desenho, reforçam a majestade do conjunto.
São estas características que atestam o rigor do projecto de Ni-
colau de Frias na execução desta fábrica grandiosa, ampliando e
diluindo os traços de uma anterior campanha renascentista hoje
com vestígios indeléveis e restrita a algumas salas e câmaras no
extremo norte da longa fachada194.

3 . 3 . N i c o l a u d e F r i a s e P e r o Va z
Pereira

O arquitecto Nicolau de Frias (c. 1550-1610), já em anterior


capítulo presente nestas páginas, formara-se em Itália, depois
de aprendizado juvenil de carpintaria junto a seu pai Pedro de
Frias, e teve de seguida actividade próxima à de Filippo Terzi
(com quem esteve cativo após a derrota militar de Alcácer Qui-
bir), sendo nomeado, após obtido o resgate, arquitecto das obras
do Senado e do Arcebispado de Lisboa. Autor de programas
grandiosos para D. Teotónio, como o muito referido Sepulcro
da capela-mor da Sé de Évora (1588), concebido como teatro ri-
camente estruturado, tal como o monumento para as exéquias
de Filipe I de Portugal no Mosteiro dos Jerónimos (1599), tam-

89
bém se responsabilizou, junto a seu genro, o pintor Domingos
Vieira Serrão, pelo programa decorativo dos «octógonos» da
mítica Charola do Convento de Cristo em Tomar com efusiva
ornamentação de frescos e estuques, além de ter desenhado pe-
ças de retabulística (para a igreja de Santo Antão e acaso tam-
bém para a da Cartuxa de Évora), e peças litúrgicas de ourivesa-
ria (como o lampadário da Sé de Évora, feita pelo ourives João
Luís a mando do Arcebispo D. Teotónio 195.
A sua actividade relevante centrou-se ao serviço dos Bragan-
ças, ora em Évora junto ao Arcebispo D. Teotónio, tio-avô de
D. Teodósio II 196, ligado às obras do Mosteiro da Cartuxa, ora
em Vila Viçosa, ao serviço dos duques D. João I e D. Teodósio
II. Por mando deste último, por exemplo, ocupou-se de obras
na igreja de São Silvestre de Unhos (Sacavém), povoação per-
tencente à Casa de Bragança, onde gizou nova torre e realizou
outras ampliações197. Mas também trabalhou para D. Álvaro de
Castro, em 1575, traçando a capela dessa família no Mosteiro de
São Domingos de Benica 198, e para D. Fernando de Castro, o
1º Conde de Basto, governador militar de Évora: em 1592 de-
senha a traça da matriz de Almodôvar, formosa hall kirch ain-
da existente 199, onde assumiu um projecto de «retoma» de um
modelo com ressonâncias tardo-medievais (no tipo previsto de
abobadamento único para as três naves), e por esses mesmos
anos deve ter seguido as obras que os pedreiros Diogo Gonçal-
ves e Manuel Filipe realizavam no Paço de São Miguel e outras
propriedades dos Castros 200. Em Junho desse ano de 1592, de-
senhou a traça do palacete de D. Jerónimo Coutinho em Caci-
lhas 201. Pouco antes, também em Lisboa, traça a planta da nova
igreja de Nossa Senhora da Vitória, com uma «forma» que ser-
viu de modelo para outras 202, e trabalhara no Mosteiro de São
Domingos de Benica (traça a primeira capela dos Castros, no
claustro), desenhara a belíssima capela de planta centralizada do
Hospital de Nossa Senhora da Luz em Carnide, e izera obras
em Santa Catarina do Monte Sinai, em Lisboa, uma igreja ligada
à importante confraria dos livreiros, a que também estava asso-
ciado Filipe Terzi. Entre outros retábulos, desenha o da cape-

90
la de São Tiago na igreja de São Julião de Lisboa, que o mestre
nórdico Jacques de Campos executaria de entalhe, com painéis
da autoria de Fernão Gomes, mas que infelizmente desapareceu.
É de corrigir, entretanto, o errado parecer de alguns auto-
res que extrapolaram o facto de que Nicolau de Frias, por ser
ilho de imaginário (Pedro de Frias), teria necessariamente uma
formação-base no campo da marcenaria (já que deu traças para
muitas obras de entalhe, desde as citadas da Sé e de Santo An-
tão de Évora, ao retábulo da Misericórdia de Sintra, ao monu-
mento das celebrações fúnebres de Filipe I nos Jerónimos, etc)
203
, sendo a sua obra de arquitecto para D. Teotónio algo de re-
sidual. Nada de mais falso: Frias tanto desenhou para o Arce-
bispo peças de luxuoso equipamento litúrgico, tanto de marce-
naria como de prataria, mas foi sobretudo como projectista de
obras de arquitectura que se impõs. A sua formação romana, e
a imagem adquirida com o risco da fachada do Paço Ducal de
Vila Viçosa, bastavam para lhe irmar o nome junto do ilustre
prelado eborense. Hoje, sabe-se bem o que Nicolau de Frias
concebeu como arquitecto, e entre essas suas obras contam-se
algumas das mais inovadoras do seu tempo: basta citar-se uma
obra-prima do melhor rigorismo maneirista de ressaibos her-
rerianos, como é a capela centralizada do Hospital de Nossa
Senhora da Luz de Carnide (actual capela do Colégio Militar),
onde o «risco» dado a fazer a Nicolau de Frias em 1599 pela
testamentaria da Infanta D. Maria vem conirmar as suas altís-
simas capacidades de tracista de formação italiana, ao nível do
que izera na fachada do Paço de Vila Viçosa e nas obras para
D. Teotónio de Bragança 204.
Para a fachada do Paço ducal, sua empresa mais aprimora-
da, para a qual desenhou planos em 1583, estando a obra em
andamento, faltam documentos para acompanhar a empreitada
de pedreiros nos anos 1585-1590, mas voltamos a tomar pul-
so do seu andamento, com direcção do pedreiro da casa ducal
Manuel Ribeiro, no im da centúria. O essencial estava cumpri-
do em 1603, mostrando o risco que Nicolau de Frias tinha não
só conhecimento da tratadística clássica, de Vitrúvio a Serlio,

91
mas também dos bons modelos palacianos da Península Ibé-
rica (as encomendas da regência de Filipe II). Sendo provedor
das obras ducais Escovar de Lira, contratam-se em 1601 os
pedreiros Manuel de Loureiro e Manuel Rodrigues para ulti-
marem os tramos da fachada sul e o corpo principal da torre,
utilizando para o efeito «pedraria velha» do anterior projecto de
D. Teodósio I 205. Os mestres obrigavam-se a «fazer pera as dit‑
tas casas novas de Sua Excellençia a obra de pedreria seguinte na fron‑
taria que os paços fazem pera o terreiro: huma crescença de pedraria no
cabo da dª frontaria da parte das Chagas conforme a amostra que pera
isso teem, a qual crescença he do deradeiro pillar que hora estaa feito de
pedraria ate o canto das dittas casas novas que se hora fazem que serão
dez ou onze palmos de largo, e quanto a altura será conforme a da fron‑
tarya que estaa feita de pedraria em toda a sua alltura, que sam duas
ordens». Os tramos da fachada a erguer seriam «conforme a pedra‑
ria da ditta frontaria que já estaa feita fazendosse hum pillar no cabo
das dittas casas dalto a baixo com toda a pedraria conforme aos pillares
velhos», sendo o lavor de molduras, pedestais, pilares, carran-
cas da cornija, silharia e janela «do tamanho que na dita amostra
esta no andar da segunda ordem». Em outra cláusula especiica­se
que «no telhado do passadisso pera cima que se hade fazer pera o mos‑
teiro das Chagas hadese cobrir o pillar que será tornejado pera a parte
da orta das Chagas e tudo aquillo que mostra pella frontaria do terrei‑
ro, he torre, entendese assi no pilar, como no capitel, alquitrave, frizo, e
cornija da segunda ordem de cima sendo o ditto pillar ho mais resaltado
como se vê pella dita frontaria velha» 206.
Na crónica de Francisco de Morais Sardinha, em 1618,
elogia­se o efeito inal da fachada, essa obra de «grandíssima au‑
toridade e apparato», com três pisos («o treceiro he coríntio tem vinte
palmos de altura, não esta delle acabado mais do que a meã parte com treze
janellas»), e aduz-se um dado esclarecedor: «teem assi os paços velhos
como os novos que todos correm por linha recta, vinte e sinco janellas com
suas portas verdes» 207. Também Sebastião Lobo Vogado, na Relação
de Festas do casamento de D. Teodósio II, em 1603, descreve o
prospecto magniicente da fachada, «posto que ultimamente edeica‑
do e ainda agora imperf.to nos sobrados superiores» 208.

92
Reencontramos assim o nosso arquitecto Pero Vaz Pereira,
também de formação italiana tal como Nicolau de Frias, que re-
gressa de Roma em 1594, serve D. Teotónio em Évora até à sua
morte, e entra em 1604 ao serviço de D. Teodósio II como seu
arquitecto e escultor. É ele quem vai ultimar as obras da facha-
da, iniciadas havia cerca de vinte e cinco anos, em idelidade às
traças de Frias. Tem­se identiicado obra numerosa sua, já em
parte referida atrás (capela no termo de Portel, igreja de San-
ta Maria de Machede, igreja de São Manços, obras na Cartuxa,
Sacristia Nova e portal marmóreo da Sé de Elvas, término do
Aqueduto das Amoreiras também em Elvas, obras no conven-
to de São Paulo da Serra d›Ossa 209, traça da Fonte Grande de
Vila Viçosa, palacete em Castelo de Vide, etc) 210. Para D. Teo-
dósio II, dirige programas intestinos e decorações no Paço ca-
lipolense (é de sua lavra e traça a a chaminé da Sala de Medusa,
além de que concebeu uma das capelas da Tapada, etc). Escre-
ve e dedica ao Duque seu protector um Tratado de Rádio Latino
211
, e é ele quem segue a obra do último andar da empreitada da
fachada desenhada por Nicolau de Frias, assim como as obras
intestinas de câmaras e espaços 212. Apurou-se recentemente que
Pereira, «architeto do senhor Duque de Bragança», traçou em 1620 o
palácio de D. Mendo Álvares de Matos, em Castelo de Vide, e a
descrição desta casa senhorial, infelizmente alterada213, lembra
irresistivelmente uma tipologia de sobriedade maneirista inspi-
rada no modelo palatino de Vila Viçosa: «toda a cantaria com sinco
janellas…, com seus fromtespiçios de altura e medida que as tem já asemta‑
do,… he por todo gramde na forma que esta feito, he por emtre as janellas
he dali pera sima de diamantes bem lavrados, com suas gargulas e remates,
he simalha, he cunhais, tudo de boa cantaria», com indicação expres-
sa do arquitecto «que era milhor ser toda a fromtaria de camtaria cham
he bem llavrada» 214. No mesmo ano de 1620, em Julho, Pero Vaz
Pereira estava activo, de novo, em Évora, pois se achava envol-
to em certa obra, pensamos que a dos Paços episcopais, quan-
do lhe faleceu, vindo de Vila Viçosa, um seu moço criado 215.
Em Junho de 1601, já Vaz Pereira devia estar a substituír
Frias (muito ocupado com várias obras na capital) na empresa

93
do Paço de Vila Viçosa. Nesse mês se contrata o mestre Fran-
cisco Lopes, de Borba, para «fazer dous vãos de pedraria na
frontaria das casas dos paços de Sua Excellençia sobre as duas
ordens de pedraria que já estão feitas nas dittas casas», a 40.000
rs cada vão, segundo a «traça» fornecida216. Na obrigação lê-se
que «cada vão se entende de pillar a pillar em largura e há altura se esten‑
de de sima da cornija da segunda ordem ate ao alquitrave da terceira ordem
da torre que são desassete palmos dalto, fazendo em cada vão destes hum
pedrestal e simalha vasa e pilar conforme aos que estão jaa feitos na tore,
e a arquitrave, frizo e cornija será conforme ao modelo da mostra que ica
em poder de Sua Excellençia». Em cada vaso rasgar-se-ia uma janela
«que responda ao vão de cada huma dellas conforme os debaxo que já estão
feitos na dita frontaria, com ha altura conforme a amostra e assi a feição
e molduras que pera isso se darão moldes, a qual janela será de pedraria
branca e assi mesmo os pilares, o vão que ica entre elles e as janellas será
de pedraria preta, e toda a dita pedraria terá muito bons leitos de modo que
ella por si se tenha e será toda muito bem lavrada e bornida a bornideiras
sem falhas nem quebraduras e toda muito bem dezempenada com os junctos
e leitos muito bem feitos, posta toda ao pee da frontaria dos paços do dito
senhor». Em Junho desse ano, faz-se ainda marmoreado de dois
vãos das «casas novas», pelo pedreiro de Estremoz André Fran-
cisco217, recebendo «riscos» e indicações «da mão de Manuel Ribeiro
mestre das obras de Sua Exª e escudeiro de sua casa»218. A obra destes
vãos refere-se ao andar «sobre as duas ordens de pedraria que já estão
feitas nas ditas casas», mais dizendo que «cada vão se entende de pillar
a pillar e largura, e a altura se entende de cima da cornija da segunda or‑
dem ate o alquitrave da terceira ordem da torre, que sam desassete palmos
dalto, fazendo em cada vão destes hum pedestal e simalha, vasa e pillar
conforme aos que estão já feitos na torre e a alquitrave, frizo e cornija será
conforme ao modelo da mostra que iqua em poder de Sua Excellençia»,
dentro dos trâmites da obrigação feita com Francisco Lopes,
cabendo a ambos a factura de quatro tramos do andar superior.
Seguindo o estudo das existências, e a informação documen-
tal, a 5 de Novembro de 1601 Escobar de Lira contrata ainda o
mestre Manuel de Loureiro para integrar a empreitada das «casas
nobres» junto a Manuel Ribeiro e Manuel Rodrigues e acelerar o

94
seu término219. Ao mesmo tempo, decorrem no interior as obras
de forro de carpintaria e começam grandes campanhas de pin-
tura fresquista nas salas de Medusa e David, no oratório de D.
Catarina e na galerietta destinada a D. Ana de Velasco y Girón,
esposa de Teodósio II, tudo ainda existente e já devidamente
documentado e estudado220. É no âmbito destas obras da pro-
vedoria da Casa Ducal que se adquirem azulejos de majólica em
Talavera (da oicina de Fernando de Loyasa) e se contratam em
1602 os pintores Custódio da Costa e Tomás Luís para fazerem
decorações a fresco e outras obras nessas novas câmaras desti-
nadas a habitação imediata.
Sabemos que o arquitecto Pero Vaz Pereira – nomeado ar-
quitecto da casa ducal em 23 de Março de 1604 com ordenado
anual de 60.000 rs 221– prosseguiu as obras do Paço de Vila Vi-
çosa traçadas por Frias e esteve ao serviço de D. Teodósio II
(fal. 1630) e do oitavo Duque D. João II (que em Julho de 1641,
já tornado rei após a Restauração, o designa para cargo hono-
ríico, o de arquitecto do Convento de Cristo de Tomar222). As
suas intervenções são, além do equipamento das salas e de obras
de escultura de fogões, mas também no acabamento da fronta-
ria (será da sua responsabilidade certamente o remate do cor-
po central e o último piso, que se prolongaram mais uns bons
anos). Lendo-se, por exemplo, o que diz Diogo Ferreira de Fi-
gueiroa, que visitou o Paço em 1632, à data do casamento de
D. João II com D. Luísa de Guzmán, refere esse autor que na
fachada «o frontespiçio avendo de prefeiçoarsse virá a ser composto com
quatro columnas três janellas a do meyo hade ser rasgada de sacada con‑
forme ao que mostra» 223.
Em termos gerais, Pero Vaz Pereira seguiu esse modelo de
«fromtaria de camtaria cham he bem llavrada» que aprendera com Ni-
colau de Frias e com a memória viva de um estágio onde vira os
palazzi de Roma. A sua importância era reconhecida na corte, a
ponto de D. João IV o designar para arquitecto do Convento de
Cristo de Tomar, em 1641, um cargo que era sobretudo hono-
ríico, dada a idade avançada de Pero Vaz Pereira. Até a morte
o surpreender em ins de 1643 (jaz em campa rasa na igreja do

95
Convento das Chagas de Vila Viçosa, à entrada da nave, junto
à grade do coro baixo), deve ter prosseguido essa obra de ul-
timação do andar superior da fachada palatina. A frontaria, de
facto, ainda estava por acabar na totalidade à data da visita do
Grão­Duque da Toscana, em 1668, segundo aiança o precio-
so desenho de Pier Maria Baldi, o pintor italiano que integrava
a comitiva de Cosme III. As delongas percebem-se: a mudan-
ça da corte calipolense para Lisboa, após a Restauração do 1º
de Dezembro de 1640, alterou deinitiva e inexoravelmente o
ritmo construtivo do Paço calipolense. Ainda no tempo de D.
João V e de D. Maria I essas obras de término da fachada se ar-
rastavam, cabendo a sua responsabilidade, em 1786, ao mestre
arquitecto Bento José Brochado 224.
Entretanto, um precioso desenho da segunda metade do sé-
culo XVII, conservado em arquivo parisiense e que pertencia
à colecção do cavaleiro Roger de Gaignières (1642-1715), vem
enriquecer a magra iconograia do Paço Ducal de Vila Viçosa.
Esse apontamento de discreta qualidade e, ao que parece, ina-
cabado, mostra-nos uma rara visão do palácio, com o terreiro
adjacente, a fachada com o corpo central destacado, e marcação
dos arruamentos, das Chagas, do castelo e dos adarves da forti-
icação seiscentista, coevos das guerras da Restauração 225. Em-
bora pouco acrescente de relevante para a análise empreendida
neste capítulo, vem-nos revelar, pelo menos, a necessidade de
se pesquisarem sistematicamente as fontes gráicas integradas
em acervos de viajantes a Portugal, na presunção de que, além
do desenho de Baldi, mais testemunhos iconográicos subsisti-
rão sobre Vila Viçosa e o seu celebrado paço dos Duques bri-
gantinos. É uma investigação que, por certo, alargará conheci-
mentos e trará frutos.
Podemos concluír, assim, que:
1) O Paço Ducal de Vila Viçosa é uma das obras-primas
da arquitectura civil portuguesa da Idade Moderna, e a
sua traça deve-se ao arquitecto régio Nicolau de Frias,
que terá iniciado o projecto cerca de 1577 a mando do
sexto Duque D. João I, interrompendo a obra com Al-

96
cácer Quibir e retomando­a com celeridade em 1583,
já a mando do Duque D. Teodósio II. Dessa obra gi-
gantesca, com frontaria de 110 m de comprido, sem
precedentes na arquitectura civil portuguesa, onde sa-
biamente se utilizam as ordens toscana, jónica e co-
ríntia sobrepostas ao longo de vinte e três tramos de
três andares, e modelo de serliana no corpo central,
sobressai a solução contra-reformista de raiz italiana,
com incidência de modelos palaciais castelhanos gene-
ralizados na época da regência de Filipe II.
2) É absolutamente incontornável que esta solução só vi-
gorou em Portugal em plena segunda metade do século
XVI e não pode ser, em caso algum, confundida com
o modelo construtivo da campanha de D. Teodósio I.
Ao mesmo tempo, a magna obra atesta aquilo que Fer-
nando Marías defende serem, no século XVI tardio,
valores absolutos da Arquitectura: a consciência cívica dos
mecenas, e o orgulho cívico dos tracistas e empreiteiros
de obra na valorização dos lugares de excelência 226.
3) Por outro lado, o conhecimento que temos hoje do
estilo do francês Francisco de Loreto, arquitecto das
obras de D. Teodósio I, pelo que nos deixou nas igre-
jas de Arronches e das Chagas de Vila Viçosa, vem-
-nos iluminar sobre o que era o gosto desse Duque e
o tipo de obras que custeou no seu paço.
4) Assim temos que a campanha deinitiva de Nicolau de
Frias – aquela que chegou aos nossos dias – proveu
a ampliação, reformulação e substituição de uma an-
terior fachada renascentista «ao romano», mais peque-
na, concebida e acaso lavrada pelo arquitecto francês
Francisco de Loreto no tempo de D. Teodósio I, da
qual nada resta.
5) Tal campanha veio conferir ao Terreiro ducal o carác-
ter que preserva na actualidade, com a força severa
de uma arquitectura maneirista de gosto herreriano-
-escurialense a rimar com o desejo de emulação e sen-

97
tido de modernidade pretendidos pelos Braganças, não
escondendo já as suas ambições de sucessão dinástica.
6) Que o Arcebispo de Évora D. Teotónio de Bragança
seguisse o andamento destas obras, sugerindo quiçá
ao Duque seu sobrinho alterações no seu curso, e re-
cebendo delas uma forte impressão que se consubs-
tanciaria em ideias e inluências, parece ser, também,
algo por demais evidente.

98
Notas

150 Sobre a fachada, cf. Túlio Espanca, Inventário Artístico de Portugal. Distrito de Évo‑
ra, Lisboa, 1978, pp. 611-644; José Teixeira, O Paço Ducal de Vila Viçosa, Fundação
da Casa de Bragança, Lisboa, 1983, pp. 71-87; Túlio Espanca, op. cit., 1984-85, pp.
103-105; Rafael Moreira, «Uma ‘cidade ideal em mármore’. Vila Viçosa, a primei-
ra corte ducal do Renascimento português», Monumentos, nº 6, 1997; Vitor Serrão, O
fresco maneirista no Paço de Vila Viçosa, cit., 2008, pp. 113-120; Carlos Ruão, O Eupali‑
nos Moderno, cit., 2006, II, pp. 184-202; Miguel Soromenho, 2009, pp. 81-83; Patrícia
Monteiro, A Pintura Mural no Norte Alentejano (sécs. XVI‑XVIII): núcleos temáticos da
Serra de S. Mamede, Lisboa, tese doutoral, Faculdade de Letras, 2012, p. 50 e n. 85; e
Nuno Senos e Alexandre Pais (coord.), Da Flandres. Os Azulejos encomendados por D.
Teodósio I, 5º Duque de Bragança, Lisboa: Museu Nacional do Azulejo e Fundação da
Casa de Bragança, 2013.
151 Rafael Moreira, art. cit., 1997, pp. 50-52.
152 Esta foi a opinião maioritariamente difundida pela generalidade dos investiga-
dores envolvidos no âmbito do projecto De Todas as Partes do Mundo: O Património do
5º Duque de Bragança, D. Teodósio I, coordenado por Jessica Hallett (FCT – PTDC/
EAT-HAT/098461/2008).
153 Rafael Moreira, art. cit , 1997, pp. 50-52.
154 B.N.P., Reservados, Memórias Históricas, Cód. 675; cf. José Teixeira, op. cit., pp.
36-37, e Carlos Ruão, op. cit., II, p. 185.
155 Segundo Moreira, art. cit., trata-se do escritor Francisco de Morais, criado da
casa e autor do romance Palmeirim de Inglaterra.
156 B.N.P., Reservados, Mss. Cód. 1544 (Festas e apercebimentos que fés em Villa Vicoza
o Duque de Bragança Dom Theodosio e os casamentos do Infante Dom Duarte e da srª Infante
Dona Izabel sua irmam No mês de Abril do anno de 1537).
157 Rafael Moreira, art. cit., p. 51.
158 Sobre este importantíssimo documento (Arquivo Histórico da Fundação da
Casa de Bragança, doravante citado A.H.F.C.B.), Avalliaçam das obras das casas de Vila
Viçosa, Res. Ms. 17, Maço 1, t.2), cf. a primeira referência e revelação de existência
em João Ruas, 2006, p. 90 e nº 105, e a primeira transcrição em Vitor Serrão, O fresco
maneirista…, pp. 235-246.
159 B.N.P., Reservados, Cód. 1544, cit. em José Teixeira, op. cit., p. 114.
160 A.H.F.C.B., Avalliaçam das obras…, l. 24. Cfr. Serrão, O Fresco Maneirista... (2008),
pp. 243-244.
161 Túlio Espanca, art. cit., 1952, pp.146-150.
162 A.C.B., Mercês de D. Teodósio II, mss. nº 135, l. 2 vº, refª em José Teixeira, op.
cit., p. 120, Túlio Espanca, op. cit., pp. 615 e seg., Vitor Serrão, op. cit. (2008), p. 113, e
Carlos Ruão, op. cit., vol. II, pp. 184-202.
163 Vitor Serrão, op. cit., pp. 184-187.
164 Miguel Soromenho, op. cit., pp. 81-82.

99
165 Rafael Moreira, op. cit., p. 49.
166 É útil cruzar estes dados arquivísticos, e a informação iconográica calipolense,
com as pesquisas de reconstituição ‘in situ’ de Nuno Senos e Ana Lopes, no âmbi-
to do projecto De Todas as Partes do Mundo. Cf. Alexandre Nobre Pais, Maria Antónia
Pinto de Matos e Nuno Senos (coord.), Da Flandres. Os Azulejos encomendados por D.
Teodósio I, 5º Duque de Bragança, Lisboa: Museu Nacional do Azulejo e Fundação da
Casa de Bragança, 2013, p. 31.
167 Cf. a este respeito, entre outros, Chueca Goitia, op. cit., 1962, pp. 215-253; Fer-
nando Marías, op. cit., 1989; José Manuel Barbeito, El Alcázar de Madrid, Madrid, 1992;
Carlos Ruão, op. cit., 2008; e Miguel Soromenho, op. cit., 2009.
168 Fonte citada em José Teixeira, op. cit., p. 72 e n. 28.
169 José Teixeira, op. cit., p. 120.
170 José Teixeira, op. cit., pp. 120-121.
171 Carlos Ruão, op. cit., II, p. 187.
172 Chueca Goitia, op. cit., pp. 215-253.
173 Alfonso R. de Ceballos, op. cit., 2008.
174 Pedro Flor, «O escultor francês Pierre Loiret», Actas do Colóquio Lisboa e os Es‑
trangeiros / Lisboa dos Estrangeiros, coord. de Maria João Ferreira, Pedro Flor e Tere-
sa Leonor Vale (coord.), Lisboa, Fundação das Casas de Fronteira e Alorna, Grupo
Amigos de Lisboa, 2013.
175 Pedro Flor, «O Portal da Igreja Matriz de Arronches e a Escultura do Renas-
cimento em Portugal», in O Largo Tempo do Renascimento. Arte, Propaganda e Poder, Lis-
boa, Caleidoscópio, 2008, pp. 131-152.
176 A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 71, nº 77. Cf. Pedro Flor, op. cit., 2008, p. 137.
177 Ao contrário do que se pensa, não estava interdita a prática da talha em madei-
ra a um escultor de lavor pétreo. Abundam exemplos em contrário, como se infere
deste caso explícito de Arronches com um artista que é, simultaneamente, escultor
de pedra e madeira e, ainda, mestre de arquitectura. O mesmo sucedeu com Diogo
de Çarça. Cf. Pedro Flor, op. cit., 2008, pp. 137-138.
178 Vergílio Correia e A. Nogueira Gonçalves, Inventário Artístico de Portugal. Cida‑
de de Coimbra, Lisboa, 1947; Robert C. Smith, Cadeirais de Portugal, Lisboa, Livros
Horizonte, 1968.; Pedro Dias, «A presença de artistas franceses no Portugal de Qui-
nhentos», Mundo da Arte, nº 15, 1983, pp. 3-18.
179 Sobre Pedro de Loreto, cf. o que mais nos diz Pedro Flor, art. cit., 2013: o artista vi-
via em Lisboa (Belém), trabalhou em Coimbra (Santa Cruz) e Tomar (Charola) e, ainda,
na Trofa do Vouga, em cuja igreja deve ter intervindo, segundo Pedro Flor, na escultura
do célebre panteão dos Lemos. Segundo mais aduz Francisco Bilou, morreu nos cárceres
da Inquisição em 1561 (A.N.T.T., Inquisição de Lisboa, Processo nº 10.946, l. 29. Inédito).
180 Pedro Flor, op. cit., 2013.
181 Arquivo Distrital de Portalegre (doravante designado A.D.P.), Convento de Nos‑
sa Senhora da Luz ‑ Concelho de Arronches, CNSLARR, maço 1, Lº 1, nº 37, ls. 62 e vº

100
e 69 e vº. Comunicação inédita do Dr. Manuel Branco e do Dr. Francisco Bilou, a
quem devo a leitura paleográica: Saibam quamtos este estromemto de iamça e obrjguaçam
vyrem que no anno do nacimento de nosso sennhor Ihesuus xpristo de mjll e quinhemtos e trimta e
noue annos vymte e dous dias do mes de nouembro em vila vyçosa nas casas e morada de mim taba‑
liam e peramte mim e testemunhas ao diamte nomeados pareceram Framçisco de Loreto mestre das
obras do duque nosso senhor e Joham Louremço Manso e Vasco SeRam pedreyro moradores em a
dita villa e dise elle Francisquo de Loreto que era verdade que elle tinha ora tomado d´empreytada
huma obra d´aluenaria da Igreja de samta Maria da vylla d´aRomches por certo preço conforme
A escritura que diso tem ffeito pera o quall lhe era necesario dar fyamça segumdo pellos oiciaes da
confrarja da dita nossa Senhora lhe fora mamdado per A quall fyamça o dito Framçisco de Lore‑
to dise que apresemtaua e apresemtou por seus iadores Aos ditos Johão Lourenço e Vasco Serram
pera a contya de çemto e vinte e cimquo mjll Reaes que polla dita obra esta comçertado e pera As
paguas e seguridade della apresemtou por iadores aos sobreditos Vasco Serram e Johão Louremço
pollos quaaes ambos foy dito que lhes aprazia e de feito Aprouue de iar e iaram ao dito Framçis‑
co de Loreto na dita obra E paguas della ambos jumtos de mão nuum huum por Ambos e ambos
por huum pera f.69//f. 69v o qual Nomearam e Ipotecarão A fazemda segujmte convem saber o
dito Vasco Serram obrjgou e ypotecou huumas casas que tem na dita vila viçosa na Rua de samto
espirito que partem com casas de Vasco Fernamdez Marcos e asy huuma vijnha ahomde chamão o
chafariz que parte com vijnha de Vale da Rama criado do dito senhor duque e bem asy a metade
de huum oliuall no dito chafarizo que parte com Manuel Martinz bacharel. E o dito Joam Lou‑
remço dise que hobrjguaua e ypotecaua pera a dita iamça humas casas em que viue na Rua das
Cortes que partem com casas dos ilhos de Framçisco Vaasquez e bem assy huuma vynha boa e tal
na serra termo da mesma que parte com vijnha de Pero Lopez trapeyro e bem asy outra vijnha nas
Cortes Ahomde se chama o pomar da Felipa que parte com vijnha de Fernam Cordeiro tabaliam
do Judiciall e maijs todos os outros seus beens moueis e Raijz avidos e por aver a quall iamça deram
pera a dita obra e paguas e seguridade della ate de todo ser acabada A qual fyamça e obrjguaçam
eu tabaliam estipuley e aceitey e aceyto em nome das partes a quem pertemçer por nom serem pre‑
semtes a isto e em testemunho de verdade mamdarão e outorgaram ser l. 69 v// l. 62 ffeito este
estromemto A que foram presemtes Lopo Guomçaluez oleiro e Pedro outrosy oleiro e Per´Eanes
mestre d´alcunha moradores em a duque que este estromemto escriui e da nota treladey e em elle
meu pubrico synall iz que tal he [sinal de tabelião] … pagos L reaes».
182 Idem, ibidem.
183 A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 71, nº 77. Cf. Pedro Flor, art. cit.,
2008, pp. 131-152.
184 Já os tondi do portal desse templo calipolense, que data de 1536, revelam um
trabalho de artista mais fruste.
185 B.N.P., Reservados, Mss. Cód. 1544, Festas e apercebimentos que fés em Villa Vicoza
o Duque de Bragança Dom Theodosio e os casamentos do Infante Dom Duarte e da srª Infante
Dona Izabel sua irmam No mês de Abril do anno de 1537.
186 Manuel Joaquim Branco, op. cit., 1999, pp. 242-243, e Joaquim Oliveira Caetano
e José Alberto Seabra Carvalho, «He nobreza as cidades haverem em ellas boas casas. A pro-
pósito de dois palácios eborenses», Monumentos, nº 6, 2004, refª pp. 59-57.
187 Estas ainidades foram acertadamente sublinhadas e sugeridas como pólo com-
parativo com a fachada de Vila Viçosa pela Prof. Maria José Redondo Cantera, a quem
agradecemos. Sobre o Palacio de los Cobos em Valladolid, essa historiadora de arte

101
atesta que o autor da traça conhecia – tal como sucede no risco da fachada de Vila
Viçosa e outra arquitectura palacial do pleno Quinhentos – um desenho saído na
primeira edição ilustrada do tratado de Marco Vitrúvio Polião por Frei Giocondo (M.
Vitruvius per Iocundum solito castigatior factus sum iguris et tabula ut iam legi et intelligi possit,
libro I, l. 4º, Venecia, 1511). Esta obra encontrava­se entre os tratados de arquitectu-
ra disponíveis na livraria dos Condes de Basto em Évora (A.H.F.E.A., Inventario que se
fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor Conde de Basto…, l. 69 vº: «Vetruvio
De Architetura de quarto em pergaminho, avaliado em duzentos reis») ! O desenho de Vitrúvio,
modelo de um tipo ortogonal de representação frontal em perspectiva, foi seguido pelo
arquitecto Luís de Vega no palácio de los Cobos, cuja origem remonta a 1526-1527,
prolongando­se as obras até cerca de 1545, com adições no im da centúria. Maria
José Redondo Cantera destaca «la excelencia atribuida a la composición de la facha-
da» e acrescenta: «Hasta entonces los grandes palacios vallisoletanos destacaban más
por la gran supericie que ocupaban y por sus imponentes volúmenes, por la riqueza
de su decoración exterior o la incorporación de un lenguaje al romano, si bien éste ya
había sido introducido en la ciudad gracias a la portada del Colegio de Santa Cruz
(…). Ora Luis de Vega «se jactaba ante su cliente de que la fachada seguía «la mexor
manera que nunca se ha visto en delantera de casa». Si tomamos como referencia la apertura
de los huecos, que han permanecido en el cuerpo central de la fachada aunque alte-
rados en sus dimensiones y molduras al menos en dos ocasiones, la novedad consis-
tiría en la regularidad de su distribución. Ciertos datos de las reformas realizadas en
1602 en la fachada conirman que en ella se abrían 13 ventanas, distribuidas en dos
alturas y siete ejes, de los que el central correspondía a la puerta, que actuaba como eje
de simetría, como se mantiene en la actualidad. Por encima corría una galería bajo la
cornisa. Tal organización presenta una gran proximidad con la que se aplicó en otras
fachadas posteriores: la del Patio de Armas en el antiguo Palacio Arzobispal de Alcalá
de Henares; la principal del Alcázar de Toledo (trazada por Alonso de Covarrubias
en 1545) y la de los ubetenses palacios del deán Fernando Ortega y de Juan Vázquez
de Molina (Andrés de Vandelvira, ca. 1550), sobrino de Cobos y buen conocedor de
su casa por haber sido secretario de Isabel de Portugal, quien habitó allí ininterrum-
pidamente entre 1536 y 1538. Como ya se ha señalado en el caso de este último, el
modelo fue el ejemplo de representación, según la Ortographia o imagen frontal, del
ediicio civil propuesto como ideal de dispositio en la edición del tratado de Vitrubio
que hizo Fra Giocondo. Si admitimos que la fachada vallisoletana constituiría el inicio
de esa serie, nos encontraríamos con que Luis de Vega sería uno de los más tempra-
nos vitrubianos de la Arquitectura española del Renacimiento».
188 José Teixeira, op. cit., p. 84, e as citações de Serlio in Quarto Libro, ls. 177 vº e
179 vº, e Sesto Libro, ms, l. LXXII1 r.
189 Vitor Serrão, O fresco maneirista…, 2008, pp. 184-187.
190 Luis de Zapata, Miscelânea. Memorial Histórico Español, XI, Madrid, 1859, p. 447,
e Fernando Bouza Alvares, op. cit., p. 166.
191 Teresa Campos Coelho, Os Nunes Tinoco, uma dinastia de arquitectos régios dos sé‑
culos XVII e XVIII, tese de Doutoramento, Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e
Humanas, 2014, p. 305.
192 Mercês de D. Teodósio II, mss. 135, l. 158, refª José Teixeira, op. cit., p. 120.

102
193 José Teixeira, op. cit., pp. 8-13.
194 Caso do Oratório ducal junto à actual Sala de Hércules.
195 Túlio Espanca, art. cit., 1983-84, pp. 102 e 145. Lavrado em 1588 por excepcio-
nal preço de 600.000 rs, era «a mais bela e grandiosa lâmpada de prata que existiu em Portu‑
gal, invenção nova, desenhada pelo arquitecto Nicolau de Frias».
196 Segundo nos informa Manuel Branco, em 1586 o arquitecto Filipe Terzi avaliou
a nova grimpa da Sé de Évora mandada fazer em Lisboa por D. Teotónio de Bragan-
ça a Nicolau de Frias (B.P.E., Colecção Manizola, Cód. 85, doc. 1).
197 Vitor Serrão, op. cit., 2008, p. 41, n. 72.
198 A.N.T.T., Cartório Notarial nº 7­A, Lº 5, ls. 53 a 55 vº.
199 A.N.T.T., Livro de Notas do Tab. Belchior de Montalvo, contrato de 29-V-1592; A.D.E.,
Lº 275 do Tab. Baltazar de Andrade, ls. 55 a 56 vº (contrato de 22­V­1593 sobre a em-
preitada dessa igreja pelo mestre pedreiro Domingos Moreira).
200 A.D.E., Lº 280 de Notas de Baltazar de Andrade, ls. 71 vº­73 vº; Lº 284, ls. 36­37 vº.
201 A.D.E., Cartório Notarial de Lisboa nº 11, Lº 13 de Notas de Heitor Dias de Ma‑
galhães, ls. 18­19 vº.
202 A.N.T.T., Cadernos do Distribuidor, Cx. 1, lº 3, l. 61: «Concerto os Irmãos de N.ª Sr.ª
da Vitória e Nicolau de Frias».
203 Segundo documento que há muitos anos puvlicámos, em 1581, estando a ser
discutido como devia ser o retábulo da Misericórdia de Sintra (que Cristóvão Vaz ha-
veria de pintar), foi discutida uma «traça» pedida pelos mesários a Nicolau de Frias.
204 Este interessantíssimo contrato notarial da A.N.T.T. aguarda melhor oportuni-
dade para conclusão de um estudo, em vias de publicação.
205 A.D.E., Lº 6 de Notas de André Luís de Cerveira, tabelião de Vila Viçosa, ls. 60 vº a 63 vº.
206 Outra escritura de 5 de Novembro (Lº 8 de Notas, cit., ls. 12­14) especiica que
«se moveo e acreçemtou obra».
207 José Teixeira, op. cit., pp. 121-122.
208 Idem, ibidem, p. 66; e Carlos Ruão, op. cit., vol. II, p. 191.
209 Nas obras do Convento da Serra d’Ossa, Pero Vaz Pereira teve a colaboração
do seu genro Jerónimo Rodrigues, mestre pedreiro, cavaleiro da Casa de Bragança,
com quem lavrou um fogão de sala, entre outras campanhas para ols frades paulis-
tas. Cf. Luísa d’Orey Capucho Arruda e Teresa Campos Coelho, Convento de S. Paulo
de Serra de Ossa, Lisboa, Edições Inapa, 2004.
210 Para a obra da Fonte do Aqueduto das Amoreiras, traçada por Vaz Perei-
ra e executada pelos pedreiros Agostinho Nunes e Fernão Gomes, cf. contrato de
18-VIII-1628 no A.D.E., Lº 80 de Notas de Manuel de Oliveira, de Vila Viçosa, ls. 20­23.
211 Luís de Albuquerque, «Notícia de dois manuscritos portugueses saobre o Rádio
Latino de Orsini», As Navegações e a sua projecção na Ciência e na Cultura, Lisboa, Gradi-
va, 1987, pp. 163­180. Um desses manuscritos foi identiicado pelo Doutor Henrique
Leitão como sendo o perdido mss. do tratado de Pero Vaz Pereira.

103
212 Sobre Pero Vaz Pereira, cf. José Teixeira, op. cit., 1983, p. 120; Manuel Inácio
Pestana, art. cit., 1987, pp. 153-166; Manuel Branco, op. cit., 1999, pp. 219-247; Mário
Cabeças, «Obras e remodelações na Sé Catedral de Elvas (1599-1637)», Artis ‑ Revista
do Instituto de História da Arte, nº 3, 2004, refª pp. 249-261; Artur Goulart e Vitor Ser-
rão, art. cit., 2006, pp. 211-238; Vitor Serrão, op. cit., 2008, pp. 131-136; Carlos Ruão,
op. cit., vol., I, pp. 306-310 e vol. II, pp. 192-193; e Patrícia Monteiro, A Pintura Mural
no Norte Alentejano (sécs. XVI‑XVIII): núcleos temáticos da Serra de São Mamede, Lisboa,
tese de Doutoramento, Faculdade de Letras, 2012, pp. 41-52 e 98-99.
213 Informa-nos a Doutora Rosário Salema de Carvalho que esta casa solarenga de
Castelo de Vide sobreviveu, com a sua fachada maneirista de boa traça, posto que muito
modiicada na sua estrutura interna aquando da adaptação a hospital de campanha duran-
te as guerras de fronteira. No livro de Augusto Moutinho Borges, Reais Hospitais Militares
em Portugal (1640‑1834), Imprensa da Universidade de Coimbra, 2009, há referências à
sua função hospitalar. Trata-se da casa onde é tradição ter nascido Mousinho da Silvei-
ra, e que Luís Keil (Inventário Artístico de Portugal. Distrito de Portalegre, 1942, p. 43) destaca
pelo seu interesser como arquitectura solarengas seiscentista. Em César Videira, Memória
Histórica (…) de Castelo de Vide…, 2ª ed., pp. 87-88, diz-se que em 1714 (segundo os re-
gistos de sisas do Concelho) a casa pertencia aos herdeiros da senhora D. Ana Cardoso
de Matos mas tinha já funções hospitalares, a cargo dos religiosos de São João de Deus.
214 A.D.P., Cartório Notarial – Castelo de Vide, Lº 8, ls. 231 vº­233 vº. Leitura inédita
da Doutora Patrícia Monteiro.
215 Túlio Espanca, op. cit., 1948, pp. 258-259 (A.D.E., Lº dos Defuntos da Misª, 1610‑30, l. 81).
216 A.D.E., Lº 6 de Notas de André Luís de Cerveira, tabelião de Vila Viçosa, ls. 109 a 111 vº.
217 Foi autor, em 1613, do túmulo com jacente de D. Pedro de Carvajal Girón, bispo
de Cória, na igreja de San Nicolás de Plasência, com estátua-orante (Florêncio-Javier
García Mogollón, «El sepulcro del obispo de Coria D. Pedro de Carvajal Girón. Una
obra del escultor portuguès Andrés Francisco», Norba‑Arte (V), 1984, pp. 141-162).
218 A.D.E., Lº 6 de Notas de André Luís de Cerveira, tabelião de Vila Viçosa, ls. 111 vº a 114 vº.
219 A.D.E., Lº 8 de Notas de André Luís de Cerveira, ls. 12 a 14.
220 Sobre as pinturas murais e a pinacoteca da casa ducal, cf. Vitor Serrão, O fres‑
co maneirista…, 2008.
221 José Teixeira, op. cit., p. 121.
222 F. M. de Sousa Viterbo, Dicionario Historico e Documental dos Architectos…, 2ª sé-
rie, Lisboa, 1911, p. 249.
223 Diogo Ferreira de Figueiroa, Epítome das Festas que se izeram no casamento do Sere‑
níssimo Princepe Dom João (Évora, 1633), l. 4, apud José Teixeira, op. cit., p. 85.
224 Fernando Castelo-Branco, «Subsídios para a história do palácio de Vila Viçosa»,
Belas‑Artes, nº 31, 2ªsérie, 1977, pp. 71-76.
225 Bibliothèque Nationale de France, Paris, Ville et chateâu de Villa viciosa, P188796,
desenho, 45 x 63 cms, revelado pelo senhor Dr. Francisco Bilou, a quem nos confes-
samos gratos pela informação inédita.

226 Cf. Fernando Marías, El Largo Siglo XVI, cit., 1989, p. 54.

104
4 . A s o b r A s c At e d r A l í c e A s d e
d. teotónio

4.1. Um arcebispo‑mecenas das artes

Muitas foram as obras realizadas pelo Arcebispo nos vinte e


três anos do seu múnus na Sé de Évora. Delas nos dá conta a in-
teressantíssima relação inédita, já muito referida, que se intitula
Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança. Noticias do seu governo
e foi escrita no início do século XVII, muito provavelmente da
autoria do padre Nicolau Agostinho, antigo capelão e biógrafo
de D. Teotónio 1. Se a atribuição do manuscrito (que pertenceu
ao escritor Manuel Severim de Faria) tem a seu favor a coinci-
dência absoluta de certas referências aí feitas com o que apare-
ce ulteriormente descrito no livro editado em 1614, pode ser-se
mais preciso, também, em torno da cronologia dessa «relação»
de feitos dignos de memória: deve ter sido redigida cerca de
1610, pois coincide com a designação de um novo Arcebispo,
D. José de Melo, e terá havido da parte do autor a intenção de
sublinhar factos relevantes da governação diocesana de D. Te-
otónio em termos de empreendimentos artísticos, os quais, por
menor empenhamento dos seus dois imediatos sucessores, não
tinham tido a sequência merecida.
Desde que fez entrada em Évora para servir a Arquidiocese,
deiniu as regras que deviam imperar no serviço dos membros

105
do Cabido, através de um Regimento da Obra da Sé de 30 de Se-
tembro desse ano 228, onde se deinem ao pormenor os deveres
e responsabilidades dos capitulares, desde o recebedor, ao vedor,
ao escrivão, com pormenores que chegam ao ponto de incum-
bir, por exemplo, «o cuidado de visitando as capellas da See em enfor‑
marse sempre da umidade que resembra (sic) nellas e dar ordens para que
se remedeie sendo possível (…), «e tanto que vier tempo quente e emxuto
mandará logo branquear as nodoas e sinais que a umidade tiver feito nas
ditas capellas». Prescrições como esta, a que poderíamos chamar
de conservação preventiva, são constantes na prática de D. Teo-
tónio com indicações de idêntico teor tanto nas cartas pastorais
como nas visitações às igrejas do Arcebispado.
Foram, de facto, numerosas, e relevantes as obras empreen-
didas pelo Arcebispo durante o seu múnus, ainda que nem todas
pudessem ser concretizadas. Elencam-se neste livro bastantes
obras por si ordenadas, muitas de pedraria, outras de talha, pa-
ramentaria, prata, imaginária e pintura. Tinha escolhas precisas
no campo artístico, como se viu, com nomes escolhidos para
superintenderem em obras nas várias modalidades, e a eles re-
corria, consoante as necessidades. Ainda que por vezes fossem
de Lisboa, ou estrangeiros, os mestres cujos serviços eram re-
quisitados, foram anos de prosperidade para a arte e os artistas
eborenses.
Diz o padre Nicolau Agostinho que D. Teotónio «desejou alar‑
gar, & estender a Capella mór para mais comodo dos Conegos, e Benei‑
ciados, por ser pequena, mas não foi possiuel fazello, por não achar pos‑
to para isso» 229. A verdade é que começou a planiicar um novo
presbitério, que implicava adquirir terrenos contíguos à ousia,
e pensar em soluções para altear e remontar o retábulo lamen-
go, tendo escolhido artistas para lavrar a nova pedraria, algo que
todavia se gorou. Um dos mestres envolvidos nesses trabalhos
foi o arquitecto Mateus Neto, oriundo daquela brilhante geração
de hábeis pedreiros do tempo do Cardeal-Infante D. Henrique
com presença nos grandes monumentos da cidade 230. Mateus
Neto chegou a lavrar pedras para esse desiderato que, de segui-
da, o Arcebispo D. Teotónio iria tentar ultimar. Mas as diicul-

106
dades cedo surgiram à volta deste projecto de alterar e ampliar Fig. 25
a capela­mor, incluindo resistências do Cabido, que izeram falir
o propósito e, assim, o projecto teotonino não avançou.
Inviabilizada foi, também, a sua intenção de «arrasar, & igualar
o terreiro», dada a resistência do Conde de Basto e do Município,
que defendiam direitos adquiridos da população, bem como a
intenção de (diz o seu biógrafo Nicolau Agostinho) soterrar «a
Crasta baixa da Sé (…) e entulhála, & levantála ao andar da Igreja, de
forma que iquasse toda rasa, & clara», num afã anti-goticista que se
adequa bem à sua personalidade e gostos e encontra exemplos
na Roma dos mesmos anos. Lembremos o que se passou com
a demolição das naves góticas de São Tiago, no âmbito de uma
reforma geral dos templos da cidade, já referida, em que o pro-
jecto de redimensionação da velha igreja só poupou a peque-
na e baixa capela-mor gótico-manuelina, integrada num amplo
e espaçoso corpo de arquitectura «chã», adequado à nova ideia
tridentina dos templos‑auditório. As obras teotoninas da região de
Évora reclamam-se, aliás, desse espírito reformista de novo tipo
em que o Arcebispo foi mentor e campeão.
No caso do projecto de remodelação do andar baixo da cras-
ta da Sé, a morte súbita do prelado, em Valladolid, inviabilizou
esse e alguns outros planos, que aliás não encontravam pleno
acolhimento no seio do Cabido eborense. As resistências eram
de ordem económica, por vezes, ou revestiam-se de carácter
político, em termos de equilíbrio de poderes, senão em termos
de agenda, quando as prioridades impostas pelas pestes e pe-
las fomes endémicas recomendavam outras opções e respos-
tas imediatas. Mas no caso do soterramento do andar inferior
do primitivo claustro gótico, depois de removidas as sepulturas
de antigos epíscopes, percebe-se mal a proposta de D. Teotó-
nio, pois tal não era imperioso para, como ele tanto desejava, se
digniicar o andar da crasta correspondente ao nível da igreja.
Faltam-nos, todavia, dados mais precisos para perceber a ver-
dadeira intenção do Arcebispo.
O projecto de D. Teotónio para digniicação dos Paços Ar-
quiepiscopais foi outra obra assaz importante investimento do

107
seu governo, dando decisivo desenvolvimento à construção hen-
riquina e conferindo-lhe uma marca de imponência, mas também
de austeridade tridentina, com o seu alçado de quatro pisos, as
elegantes iadas de janelas molduradas, e a sua difícil implanta-
ção no alcantilado terreno do cómoro da cidade, ao lado da Sé
e não longe do Templo Romano. Sabemos de vistorias à obra
por Filipe Terzi, vindo à cidade em 1588 e, mais tarde, por Pero
Vaz Pereira, e referenciam-se empreitadas de pedraria por Jeró-
nimo de Torres, um dos nomes habituais nos estaleiros teotoni-
nos, mas a verdade é que a obra só seria ultimada após a morte
de D. Teotónio, já sob o arcebispado de D. José de Melo (1611-
-1633). Os Paços, muito alterados em fases ulteriores, albergam
hoje o Museu de Évora, com projecto de João Luís Carrilho da
Graça; o portal ostenta no remate as armas de D. José de Melo,
em cujo governo a construção se acabou, marcando em moldes
emblemáticos o conjunto da acrópole citadina.
Tanto os Paços como a Sé deviam ser envolvidos, segundo
desejava D. Teotónio, pela construção de um gradeamento de
ferro correndo em volta de ambos os imóveis e limitando-lhes o
acesso público, mas a intenção não foi por diante, para desgosto
do epíscope. Vinha criar conlitos com o Senado da Câmara, por
se tratar de área pública, e com os moradores da alta da cidade.
Em 1596, o Conde de Basto D. Fernando de Castro assumiu a
corrente contrária a essa obra, que era também a voz de parte
da população, e o «cerrado» foi formalmente impedido 231. De-
vendo recorrer-se a arbitragem especializada, o Conde de Basto
solicitou a Madrid o envio de um perito, e deslocou-se então a
Évora o arquitecto lisboeta Baltazar Álvares, não só para ver as
obras do Arcebispado, mas sobretudo para se pronunciar sobre
essa matéria polémica, «e se informe do Arçebº e do Conde e faça hum
debuxo della», sobre «se será inconveniente cerrar o adro, e traga tudo mtº
berm visto e entendido», optando-se então por contrariar a vontade
do Arcebispo por se tratar de serventia pública 232.
Se a acção de D. Teotónio de Bragança se resumisse a tais
falhados projectos na sua Sé, o seu peril de mecenas das artes
seria, naturalmente, pouco signiicativo enquanto pastor de um

108
grande Arcebispado. Mas a verdade é que, desde a designação
para o cargo, levou a efeito uma série de empreendimentos de
monta, em que a Sé ocupa um lugar cimeiro 233, e também vá-
rios conventos, hospitais e igrejas, e de que é imperioso falar-se
com maior detalhe.

4 . 2 . A d e c o r a ç ã o d a n o va c a p e l a ‑ m o r e
d o s a lta r e s l at e r a i s

No panorama das muitas obras que na Sé de Évora se pen-


saram e izeram no tempo de D. Teotónio, o desejo de alterar
a capela-mor gótica, considerada estreita e sem a devida pro-
fundidade, já fora discutido em tempo do múnus do Cardeal D.
Henrique e voltou a ser tomado como projecto pessoal pelo
novo Arcebispo. Aquele prelado já em 1575 procedera a obras
de pedraria visando adaptar o presbitério da Sé a novas funções
tridentinas, delas encarregando então o seu mestre pedreiro Ma-
teus Neto, que desenhou os apontamentos necessários 234.
D. Teotónio servia, na altura, como bispo de Fez, no Arce-
bispado henriquino, e pôde certamente acompanhar esses tra-
balhos. Em 16 de Julho de 1575, perante o tesoureiro das obras
da Sé, Luís de Castro, celebrou-se uma obrigação com Manuel
Mendes, mestre de carpintaria, que lavrava a pedra de Estremoz
a utilizar na remodelação da capela-mor, e no âmbito de qual
se pensou desmontar e alterar a estrutura do famoso retábulo-
-mor de cerca de 1500, pintado em Bruges e adquirido no tem-
po do Cardeal-Infante D. Afonso de Portugal. Caberia a Manuel
Mendes, mestre de carpintaria, assentar a pedraria já lavrada pela
equipa de Mateus Neto no supedâneo do retábulo, por preço de
22.000 rs, fazendo o necessário forro de madeira de bordo para
assentar as pedras lavradas, «sendo muito bem feitos todos os envasa‑
memtos do retabolo da ditta capella da ditta See conforme ao debuxo»…
Ou seja, pensava­se apear o grande retábulo lamengo, alvo de
restauro («reparar a talha antiga e as iguras que no dito retabolo exis‑
tem») e remontar a máquina retabular acima da nova e opulenta

109
base de pedraria lavrada. Mas a obra henriquina frustrou-se, não
só devido à crise que dinástica que se iria seguir a breve trecho,
mas também por diiculdades inanceiras, resistências dos capi-
tulares, ou má gestão das contas catedralíceas.
Quando D. Teotónio tomou as rédeas do Arcebispado em
1578, uma das primeiras medidas foi substituir o tesoureiro das
obras de D. Henrique por um homem da sua coniança: como
diz a memória anónima que muito citámos, escrita pouco de-
pois do falecimento do Arcebispo, «ho snõr dom theotonio entrou
na çidade e a 3 dela foi a elvas a beijar a mão da majestade de elrei fellipe
donde esteve poucos dias, e se tornou a sua Se e começou a entender nella
e a que ornamentar, que estava muj falta de ornamentos e prata, e come‑
çou a entender com a obra e tinha deitado fora de recebedor a hum joam de
crasto, criado do cardeal, e fez então a Antonio Simões». Nessa condi-
ção, já com António Simões nas rédeas do cargo de Recebedor
da Obra da Sé, voltou a pensar na ideia de alargar e ampliar a
capela-mor medieval, baixa, estreita e pouco profunda – como,
aliás, mandaeria fazer na Sé de Elvas, em 1598, ao seu arquitec-
to Pero Vaz Pereira, impondo ao Bispo dessa cidade, D. Antó-
nio de Matos de Noronha, a solução de um novo presbitério-
­auditório, em moldes ielmente triderntinos.
Resume um dos biógrafos de D. Teotónio de Bragança que
ele tomou a si o desejo do antecessor de ampliar o presbitério
da Sé: «Quis fazer a capela mor mais larga e comprida, para ho qual ti‑
nha já lavrado pedraria que custou alguns tresentos mil reis, da qual não
se pos por obra por o Cabido anterior, e a pedra se vendeo e se gastou com
mujto pouco proveito» 235. Se o projecto anterior foi vetado, ao que
parece por resistências do próprio Cabido, com D. Teotónio
izeram­se mesmo algumas obras de adaptação da capela­mor,
ainda que longe de cumprirem o objectivo global que ele tinha
em mente. Sucedeu que na madrugada de 28 de Janeiro de 1586
ocorreu um acontecimento funestro e que, por ironia, relançou
o projecto: caíu um raio na torre da Sé sobre o cruzeiro, fazen-
do muitos estragos não só no exterior mas também no inte-
rior da capela-mor 236: «derrobou pella banda de fora munta parte da
dita torre: fez huma fenda na Capella Mor por fora: cobrou a vidraça de

110
Nossa Senhora; chamuscou muita parte do retábulo da capela‑mor; que‑
brou a sacra» 237. O desastre obrigou D. Teotónio a intervir, ten-
do gasto mais de 200.000 rs em reparações exteriores da torre
e mandando, em 1588, fazer em Lisboa a grimpa da torre, que
seria lavrada por risco do seu romanizado arquitecto Nicolau
de Frias, pelos vistos o seu artista de referência e maior apre-
ço. Essa grimpa, que se encontra bem identiicada, era pintada
e dourada esmeradamente, foi executada por um conceituado
carpinteiro de Lisboa de nome mestre Francisco, e foi avaliada
(diz-se que o arquitecto Filippo Terzi, estando em Évora no iní-
cio de 1588, teria assumido essa tarefa), custando tudo o preço
de 48.230 reis 238.
Retomado o projecto henriquino de alargamento da capela-
-mor, apesar das resistências de muitos capitulares, sabe-se que
D. Teotónio conseguiu fazer cumprir, em 1588, nova ordenação
do retábulo lamengo, cujos painéis e iguras da obra de talha
foram cuidadosamente limpos com «rabos de raposa» em respei-
to pela qualidade das pinturas, e havendo reparações na marce-
naria lamejante que os envolvia, a cargo dos mesmos carpin-
teiros que faziam o monumental Sepulcro, devendo ter sido da
sua responsabilidade, nessa altura, a retirada dos seis painéis da
predela (com cenas da Paixão de Cristo), que passaram para a Ca-
pela do Esporão. A terem-se passado as coisas assim, deslinda-
-se um dos mistérios ainda obscuros do historial desse notá-
vel conjunto brugense encomendado pelo Bispo D. Afonso de
Portugal, e que foi muito polemicamente discutido à data do
recente restauro 239.
Subsiste alguma indicação documental importante a este res-
peito, do ano de 1588. Temos pagas aos mestres carpinteiros
Gaspar Gonçalves e António Fernandes, entre outras notícias
e despesas dessa empreitada, como a que se segue: «Deu mais a
Gaspar Glz e Amtº frz carpintrºs de alimparem a capella moór e o Re‑
tabollo e a Capella do Santissimo Sacramento e do Santo Lenho, capella
e retavollo, e os Retavollos de fora, todos em que gastarão cada hum tres
dias a rezão de 160 rs por dia que foi 11:12:13 dias de agosto que tudo
faz soma de nove cemtos e sessenta rs (…). Despendeo mais cento e ses‑

111
senta rs em quatro espomgas pª alimparem e lavarem os paineis dos
Retavollos e dous rabos de rapoza pª saquodirem o dourado do poo dos
Retavollos, e hum algedar, e huma panella que foi necessário» 240. Mas a
intervenção teotonina quedou-se pela reinstalação do conjun-
to retabular: o referido testemunho coevo é taxativo ao dizer-
-nos que «quis fazer a capela mor mais larga e comprida, para ho qual
tinha já lavrado pedraria que custou alguns tresentos mil reis, da qual não
se pos por obra por o Cabido anterior, e a pedra se vendeo e se gastou com
mujto pouco proveito» 241.
Mesmo assim, a sua intervenção na capela­mor não icou por
aqui: em 1592, sendo contabilizados os estragos que o raio cau-
sara, seis anos antes, na cimalha do célebre retábulo lamengo,
e face ao novo dispositivo com que o políptico se distribuía na
parede fundeira da ousia, o Arcebispo ordenou que se pintas-
se e colocasse no remate uma grande tábua com a Assunção da
Virgem, padroeira da Sé, por faltar justamente essa iconograia
no conjunto retabular. De facto, no políptico brugense a cena
da Assunção da Virgem apenas surge pintada no complemento do
painel da Morte da Virgem, e D. Teotónio, muito atento às ques-
tões de iconograia, entendeu dever acrescentar ao retábulo­mor
a «história» alusiva à padroeira. A memória das obras teotoni-
nas que vimos citando descreve precisamente esse complemen-
to ordenado pelo Arcebispo em 1592 como tratando-se de um
«painel de Nossa Senhora no altar mor, o que esta no alto do retavolo, que
custou duzentos crusados» 242. Trata-se de uma referência preciosa,
ainda que, infelizmente, nada nos diga sobre o seu autor, mas
é possível colmatar-se essa lacuna, já que o quadro em questão,
segundo pensamos, sobreviveu até aos ossos dias.
É grande a probabilidade de este painel de 1592 ser a Assun‑
ção da Virgem que se encontra hoje exposta no Museu de Arte
Sacra da Sé de Évora (M.A.S.S.E., nº de invº EV.SE.1092pint)
e que, dadas as dimensões, a escala de composição e iguras, o
temário preciso, a notícia de procedência e a cronologia apro-
ximada, se adequa por inteiro ao que se infere do citado docu-
mento. Antes de mais, deve esclarecer-se que no Museu de Arte
Sacra, além dessa excelente tábua maneirista da Assunção, se ex-

112
põe também uma outra pintura quinhentista portuguesa com o Fig. 27
mesmo tema, mas essa é algo mais antiga (c. 1570), além de ser
procedente do Colégio de Nossa Senhora da Puriicação, nada
tendo a ver com os antigos acervos da Sé 243. A tábua que ora
nos preocupa, e que será a peça pintada em 1592 a mando de
D. Teotónio, estava num precário estado de conservação e foi
alvo de restauro, num processo em que perdeu alguns dos seus
valores originais, mas mostra, mesmo com algumas das iguras
de anjos desiguradas no decurso da intervenção, características
de estilo muito próximas ao que se conhece do mestre lisboe-
ta Diogo Teixeira (c. 1540-1612). Trata-se de um dos melhores
pintores portugueses do Maneirismo e, ao tempo, um dos mais
conceituados da capital na sua arte, o que valoriza a boa esco-
lha do Arcebispo.
A tábua (a ser a que o manuscrito Noticia do seu governo refe-
rencia como pintada em 1592) ornou o centro da cimalha do re-
tábulo lamengo, depois das obras teotoninas remodelarem a es-
trutura do conjunto. Seria retirada da capela-mor da Sé aquando
das grandes obras de Ludovice no tempo de D. João V, quando
se fez o novo presbitério barroco. A Assunção da Virgem respei-
ta o espírito de decorum exigido pelos ditames tridentinos, numa
evidenciada busca pelo sentido do despejo, tão caro aos manei-
ristas, e tem dimensões avantajadas, compagináveis com as das
célebres tábuas lamengas do retábulo­mor da Sé. Assim, parece
adequar-se muito bem ao que D. Teotónio pretendia para remate
do altar catedralíceo em termos de escala, decorum e pendor ca-
tequético. Se foi esta a tábua que se acrescentou no remate do
conjunto retabular, trata-se de um bom testemunho da ars sen‑
za tempo tal como a deiniam os mercados artísticos de Roma e
tal como o conceito poderia ser interpretado por mestre Diogo
Teixeira – se é que se trata da peça que foi executada em 1592
na sua oicina de Lisboa, como tudo leva a crer.
Sobre a questão da autoria desta magníica peça, acrescenta-
da ao retábulo de 1500, a atribuição avançada assenta no facto
de o repertório formal das poses de igura, a caracterização dos
anjinhos, a tipologia solta dos panejamentos e a singularidades

113
de desenho de cabeças serem coincidentes com muitas outras
pinturas saídas da oicina de Diogo Teixeira, seja nas tábuas da
igreja da Luz de Carnide, ou nas da Misericórdia do Porto, ou
ainda nas do Museu de Arte Sacra de Arouca, todas estas exe-
cutadas em datas próximas à da tábua do M.A.S.S.E. e com uma
«maneira» estilística coincidente 244. Se as coisas se passaram desta
forma, e parece que sim, veriica­se que o Arcebispo de Évora
preteriu tanto o melhor pintor de óleo da sua cidade, Francisco
João (que só faleceu em 1595), como o seu próprio pintor de
câmara, Duarte Frizão (só falecido em 1596). Olhando-se esta
grande Assunção da Virgem (por sinal exposta hoje na mesma sala
do Museu de Arte Sacra onde se mostram as obras de Francis-
co João), ela destaca-se justamente pela correcta factura, dentro
dos cânones de comedimento e sentido didascálico que eram os
da oicina de Diogo Teixeira, características que justiicaram as
boas referências recebidas por parte dos historiadores de arte
como Túlio Espanca e Adriano de Gusmão.
Será a altura de dizer que Diogo Teixeira (c. 1540-1612) fora
pintor do Infante D. António, Prior do Crato, o malogrado pre-
tendente ao trono, deve ter pintado para Évora uma outra obra
importante: o retábulo-mor da igreja de Santo Antão. Teixeira
formara-se, como outros pintores italianizados, nos círculos de
inluência da Infanta D. Maria, ilha de D. Manuel I e grada hu-
manista. Essas relações explicam que em 1577 dirigisse ao rei
D. Sebastião uma importante ‘carta-manifesto’ a reivindicar a
liberalidade da sua arte, tendo obtido despacho favorável por ser
considerado «hum dos milhores pintores de imaginarja dolio que havia
nestes Reinos». A obra, estudada pela primeira vez por Adriano
de Gusmão, mostra um artista italianizado a partir dos modelos
dos que foram a Itália, como Campelo, Gaspar Dias e Francis-
co Venegas, mas com uma linguagem muito pessoalizada, que
se revela numa sempre repetida tipologia de iguras femininas,
considerada «excelente demonstração das suas faculdades de re-
tratista e de pintor», com desenho «sensível à graça feminina…, e
soube transmiti-la numa representação plena de elegância e com
extraordinária inura de pincel, colocando­se assim na linhagem

114
dos nossos poucos e bons retratistas do seu século» 245. O artis-
ta inspirou, de forma mais ou menos marcante, uma legião de
colaboradores (Cristóvão Vaz, António da Costa, Belchior de
Matos, e ainda o já referido Tomás Luís, que trabalharia a fres-
co para os Braganças), os quais iriam perpetuar muitas das ‘re-
ceitas’ formais de Diogo Teixeira. Em São Francisco de Évora,
existe uma Anunciação oicinal, bem identiicada por Adriano de
Gusmão e devidamente descrita por Túlio Espanca 246. A atri-
buição a Diogo Teixeira da Assunção da Virgem da Sé de Évora
e ainda da Adoração dos Pastores de Santo Antão, a conirmarem­
-se, atesta não só o respeito que o artista grangeava nos merca-
dos do Sul, como as boas escolhas do Arcebispo, conhecedor
atento do que em Lisboa se fazia.
Diogo Teixeira não foi o único dos grandes pintores de Lis-
boa a pintar para Évora no im do século XVI. Em Maio de
1600, Simão Rodrigues e Domingos Vieira Serrão (que também
trabalham nestesa anos para o mercado de Elvas, e para o Du-
que de Bragança) cumpriram uma encomenda da testamentaeria
da Infanta D. Maria e pintaram os retábulos laterais da igreja de
Santa Helena do Monte Calvário em Évora, com as belíssimas e
grandes tábuas do Pentecostes e da Assunção 247. Com essa obra ter-
minava a decoração intestina de uma casa religiosa fundada pela
Infanta D. Maria, ilha de D. Manuel I, e que em 1594, também
a expensas da mesma testamentaria, recebera no altar-mor um
bom retábulo do maneirista eborense Francisco João. E, anos
mais tarde, os mesmos pintores Simão Rodrigues e Domingos
Vieira Serrão viriam a afrescar, com supervisão do arquitecto
Pero Vaz Pereira, o tecto da Sacristia Nova da Sé de Elvas, que
era obra esplendorosa, pois seguia o modelo que ambos haviam
pintado em 1612 no Hospital de Todos-os-Santos em Lisboa:
«A samcrestya se pymtara na comformydade da pymtura que está feyta
no Hospytall de todos os santos da cidade de llysboa e terá nove payneys
repartydos, … ha quoall pymtura fará da cornyja pera symaa» e, mais,
«esta pymtura sera hobrygado ho dyto Simão Rodriges fazer per suas pro‑
pryas mãos e trara por adymdo e companheyro pera ella a domingos vyeyra
pymtor porque ambos e nenhum houtro farão a dyta hobra prefeysoandoa

115
Fig. 43 a sua proprya custa e despesa de tudo aquylo que for ouro e pymturas…».
Tudo obras malogradamente desaparecidas 248, onde mais uma
vez se adivinha a supervisão de Pero Vaz Pereira na deinição
de programa, escolha de modelo e opção pelos especialistas
chamados da capital.
Voltando às obras da capela-mor da Sé eborense, mais diz o
anónimo autor das Noticias do seu governo que D. Teotónio «com‑
prou pª a credencia do altar mor hum jarro dourado de bastians (sic), hum
gomil, hum saleiro, tudo de muita grandesa e feitio, e huma bacia de prata
e servindo alguns annos neste ministério do culto devino se apartou da Se e
se deu para uso profano por ordem do senhor dom Joseph de mello, ho como
se pode fazer deixo a juízo de quem ho quiser julgar». O texto do me-
morialista, cheio de saudosismos pelo tempo de governação de
D. Teotónio, está naturalmente eivado de críticas aos capitulares
e mesmo aos dois sucessores, por terem interrompido uma fase
de incremento da Sé. Mais nos diz que D. Teotónio «fez na See
no amte choro a porta que serve pª a crasta e as escadas com hum corrimão
de ferro. Fazendo‑se tudo isto em 23 annos, que pouco mais foi tempo, se
gastaram mais de quarenta mil crusados. E deu ordem pª que a See fosse
ornamentada e acresentada com muitas obras»…
Mandou também colocar ricos paramentos para decoração
dos altares laterais da Sé de Évora, entre panos de altar e guada-
mecis, a im de estarem melhor ornados e próprios para o cul-
to. Esses altares, infelizmente desmantelados no século passado
(ainda existem fotograias dos arquivos da D.G.E.M.N. com os
altares íntegros), haviam sido colocados no tempo do Arcebis-
po D. João de Melo e Castro (1565-1574) e incluíam, todos eles,
painéis de excelente pintura, devidos, cinco deles, a um dos me-
lhores mestres da nossa pintura maneirista, o pintor de origem
neerlandesa Francisco de Campos. Esses painéis, hoje no Museu
de Arte Sacra, representam a Adoração dos Magos, Sant’Ana, a Vir‑
gem e Santa Isabel, o Baptismo de Cristo, a Última Ceia, e Santo Amaro,
São Bento e São Romão 249 e cada um ocupava o vão de cinco dos
seis altares distribuídos pelas naves laterais, sendo o sexto altar
ocupado por uma tábua com Santo António com São Vicente e suas
irmãs Santa Sabina e Santa Cristeta 250. Esta última pintura, com as

116
mesmas dimensões e características, mas muito mais frouxa de Fig. 44
execução, tem um altíssimo interesse iconográico por represen-
tar «São Vicente das irmãs», ou seja, os «mártires de Évora» de
Resende, e é atribuída a um pintor de Beja de bitola muito secun-
dária, chamado António de Oliveira, considerado discípulo ou
seguidor dos modelos de Francisco de Campos e também autor
do retábulo do Milagre do Reconhecimento da Vera Cruz (1584) do
Santuário de Vera Cruz de Marmelar 251.
Existe uma sétima tábua (também exposta no M.A.S.S.E.)
com a Lamentação sobre o corpo de Cristo, muito mais qualiica-
da em termos artísticos que a de Oliveira, e que também per-
tencia a um dos desmantelados altares da Sé: trata-se de uma
encomenda dada a fazer a outro artista de fora, o pintor sevi-
lhano Lourenço de Salzedo, que trabalhara em Roma junto a
Girolamo Siciolante da Sermoneta e que, desde cerca de 1570,
estadeou em Lisboa ao serviço da Raínha viúva D. Catarina de
Áustria, tendo morrido prematuramente em 1577 252. Ao con-
trário da série de painéis de altar de Francisco de Campos, este
quadro constitui peça isolada e que não teve sequência. Na ver-
dade, não é crível que o forte ascetismo romanista de Salzedo ti-
vesse agradado muito aos capitulares, face ao que podemos in-
ferir da escolha preferencial de D. João de Melo e Castro por
Campos, cujo arrojado gosto maneirista, aberto a ressonâncias
nórdica da sua formação, colhia melhor impacto no gosto ebo-
rense desses anos (cerca de 1565-1575) – os mesmos anos em
que ainda estava muito vivos os ecos do notabilíssimo cadeiral
da Sé (datado de 1562), que se izera com uma linguagem ma-
neirista exuberante, com cenas lavradas e iguras irrequietas e
com caprichosos grottesche lamengos. Seja como for, tratou­se
de uma encomenda moderna e de responsabilidade, por certo
cara e a revelar a máxima actualidade do Cabido em termos de
gosto. É de referir, a propósito da Lamentação de Salzedo, o facto
de integrar no fundo um obelisco, reminiscência all’antico com
toda a forte simbologia da Roma triumphans da Contra-Reforma
que vimos já muito presente na iconograia artística eborense
do último terço do século XVI.

117
Era esse o gosto maneirista do tempo de D. Henrique e, so-
bretudo, de D. João de Melo e Castro, não admirando que a es-
colha deste último prelado por Francisco de Campos, pintor dos
Braganças, fosse sublinhada com a presença das próprias armas
do Arcebispo no painel que representa Sant’Ana, a Virgem e San‑
ta Isabel. É esse Maneirismo de raíz lamenga que se devia sentir,
também, nos vários espaços do Paço de Vila Viçosa que Cam-
pos afrescou a mando do Duque D. Teodósio I, a cujo serviço
esteve, como pudemos demonstrar em outro trabalho. Nesses
anos centrais do século XVI, a vida cortesã atingia alto desen-
volvimento no Paço Ducal, é a época em que se pintam vários
salões e em que algumas das salas recebem azulejos de majólica
lamenga oriundos de oicinas de renome que trabalham des-
de Antuérpia para Vila Viçosa 253. Sendo ainda problemática a
identidade do monogramista F.IAB 1558 que executa a História
de Tobias no rodapé de uma das Salas de Música (durante muito
tempo identiicado com Jan van Bogaert e, mais tarde, conside-
rado por Claire Dumortier 254 como correspondendo ao atelier
Den Salm e a outro ceramista dessa oicina, Franz Franchoys),
a verdade é que se trata de um conjunto excepcional de azule-
jo, cuja encomenda correspondeu a propósitos especíicos por
parte do Duque D. Teodósio I.
Os grotescos da azulejaria do Paço de Vila Viçosa são de uma
subtileza e de uma complexidade assinaláveis, tal como o dese-
nho das cenas historiadas, e mostram que «um projecto desta
ambição e envergadura implicava a existência de um mentor que
permanece ainda desconhecido» 255. Observando-se bem estes
azulejos de majólica antuerpiana de Vila Viçosa, que ostentam
fantasiosos grottesche tal como os que são utilizados por Francisco
de Campos nas suas pinturas retabulares, e as cenas historiadas
que se inspiram em gravuras maneiristas, entre outras, da autoria
de Dirk Voolkerstz, o Coornhert, segundo modelos de Maerten
van Heemskerck, muito seguidas também em pinturas daquele
artista, é tentador imaginar-se quem pudesse ser o muito refe-
rido Campos mentor do programa artístico e o intermediário
de D. Teodósio I na encomenda. Ainda não se sabe, porém, em

118
que ano Francisco de Campos chegou a Portugal, o que impõe
cautelas metodológicas nesta presunção.
Já o historiador de arte Martin Soria sugerira, em 1957 256,
que o «risco» para as composições do cadeiral maneirista da Sé
de Évora (datado de 1562) se pudesse dever a este mesmo pin-
tor, e a verdade é que existem semelhanças evidenciadas no tipo
dos grotescos aí utilizados com os que surgem nas cinco cita-
das pinturas de Campos hoje no Museu de Arte Sacra da Sé de
Évora, bem como na Senhora da Rosa do Museu de Beja, e em
outras obras suas, como o retábulo da igreja de Boa Nova, em
Terena. Campos é precisamente o mesmo artista que, depois de
servir D. Teodósio, cerca de 1555-1563, e o Arcebispo D. João
de Melo e Castro, em 1565-1574, é responsável pela caprichosa
decoração fresquista da Sala Oval (1578) do Palácio dos Condes
de Basto em Évora 257. Essa cobertura, com oito galantes nin-
fas em volta, abrigadas em edículas, com paisagens, inspiradas
nas Metamorfoses de Ovídio (editada em Évora, 1574, oicina de
André de Burgos), é uma stuffeta, com putti ao centro, em inter-
pretação livre das Imagine de Filostrato 258.
Este fresco de Francisco de Campos na Sala Oval dos Cas-
tro constitui um dos exemplares mais interessantes – mas não
o único – a atestar a utilização da Mitologia clássica nos pro-
gramas do Maneirismo português 259, e documenta um gosto
requintado e para-erótico eivado de referenciais laudatórios à
antiquitas do tronco familiar do encomendante, um gosto que a
Casa de Bragança incrementava, recorrendo de seguida a fres-
quistas como Giraldo Fernandes de Prado, André Peres e To-
más Luís. Os dois primeiros seriam, sucessivamente, designados
pintores da Casa Ducal a seguir à morte de Campos em 1580:
Giraldo em 1581, Peres em 1594. Sabemos hoje que D. Diogo
de Castro, progenitor do 1º Conde de Basto, promoveu obras
de decoração da igreja da Misericórdia de Évora por volta de
1555-60, recorrendo ao pedreiro Mateus Neto e à direcção do
arquitecto Manuel Pires, mestre das obras do Cardeal-Infante D.
Henrique, Arcebispo de Évora 260. Tais obras, realizadas sendo
Provedor o idalgo D. Garcia de Meneses, integraram de segui-

119
da um revestimento parietal a fresco, nos altos da nave, com a
representação das Obras de Misericórdia. Estes frescos ainda sub-
sistem sob o equipamento de talha quinto-joanina e, pelo que
se pode observar pelos indícios, são estilisticamente adstríveis
aos pincéis de Campos 261. O mesmo parece ser atestável nas
duas tábuas no andar superior do retábulo da Ermida de São
Brás em Évora (diferentes no estilo, as duas do andar inferior
desse retábulo são indubitavelmente do mesmo mestre das tá-
buas da igreja da Tourega, acaso Duarte Frizão), mas o mau
estado de conservação dessas pinturas impede uma apreciação
mais segura.
Voltemos ainda às obras de Francisco de Campos para D. Teo-
dósio I em Vila Viçosa, já que, se o artista morreu em 1580 e nada
pôde ter já a ver com os estaleiros de obras de D. Teotónio, é
certo e seguro que o Arcebispo conhecia bem as suas obras,
tanto nos altares da Sé como na Sala Oval dos Castros; que ad-
mirasse essa linguagem artiiciosa, bem dentro dos caprichos da
Bella Maniera, tão diversa do seu gosto comedido e tridentino, é
já outra questão… Há poucos anos, ao ser descoberta e devida-
mente intervencionada a decoração murária do antigo Oratório
junto à actual Sala de Hércules (que será o do próprio D. Teo-
dósio I e terá servido, depois, à Duquesa D. Catarina, junto do
seu toucador privativo), surgiu sob espesso repinte um fresco de
notável qualidade, de cerca de 1555­1560, com iguras de cavalei-
ros de turbante, parecendo tratar-se de um passo do Calvário, da
indiscutível autoria de Francisco de Campos. Essa composição
de excelente desenho, dentro da boa tradição dos modelos de
segundos planos criados por Gregório Lopes, recorda irresisti-
velmente várias pinturas dos mesmos anos que Campos pintou
(Sé de Évora, matriz de Góis, Misericórdia de Alcochete, igreja
da Boa Nova, etc) 262 e constitui um raro testemunho das cam-
panhas fresquistas realizadas por Campos para o quinto Duque,
a que aludem as avaliações de Maio de 1565. Por esse fragmen-
to pode imaginar-se o que era o esplendor de duas dezenas de
câmaras e oratórios revestidos de fresco que tornavam o Paço,
ampliado em sequência das festas de 1537 por responsabilidade

120
de D. Teodósio I e do francês Francisco de Loreto, um singular
monumento aristocrático 263.
As deinitivas alterações que o Paço de Vila Viçosa recebe
com a grande campanha de Nivolau de Frias no inal do ducado
de D. João I e no início do de D. Teodósio II proveram a subs-
tituição de muitos dos espaços, como se sabe, e no novo corpo
palatino far-se-iam novas decorações por artistas como Giral-
do de Prado, André Peres e Tomás Luís. É por isso que a rema-
nescência do antigo Oratório de D. Teodósio I, sendo a única
que resta de pintura nos velhos paços, com parte dos frescos de
Francisco de Campos anteriores às remodelações de Nicolau de
Frias, constitui um testemunho artístico (ainda que isolado) de
grande importância para o conhecimento do que eram o gosto
e o espírito da arte do primeiro Teodósio.
E mostra-nos também, em última instância, outro aspecto
interessante: as diferenças estéticas entre os dois irmãos Bra-
ganças. Enquanto o quinto Duque era um homem de formação
renascentista que se abria à sedução da Bella Maniera italianizan-
te, o Arcebispo de Évora foi um homem de Trento, avesso aos
caprichos do Maneirismo na sua fase de pleno fulgor e muito
mais atreito a defender uma arte didascálica de cariz senza tem‑
po, incondicionalmente ao serviço da Igreja contra-reformada.

4 . 3 . Pa r a m e n to s , p r ata s e o u t ro s
equipamentos

O gosto particular de D. Teotónio de Bragança pela arte da


paramentaria sacra levou-o a encomendar, durante o seu múnus,
pelo menos cinco conjuntos importantes de têxteis bordados,
que se elencam na documentação que temos muito citado, so-
bretudo nas Noticias do seu governo, manuscrito anónimo escrito a
seguir ao seu falecimento como balanço de obra feita 264.
A primeira compra realizada é logo de 1581 e incluía um or-
namento integral para a Sé e numerosos panos de tela: «mandou
fazer hum ornamento de tella branco com tella rozada e sete capas, frontal,

121
casula e duas dalmáticas que custou seiscentos mil – 600V – e logo no
im deste anno se comprarão em panos de tella que foram da infanta dona
maria por seiscentos mil rs – 600V».
A segunda compra data do ano seguinte e foi especialmen-
te signiicativa: «No anno de 1582 se izeram trinta capas de damasco
branco capelos e outras de tela amarela. Mais dez vestimentas de damasco
branco, quatro para conegos seis pª beneiciados, as dos conegos com chevas‑
tos enteiros de tela amarela. Mais se izerão huma vestimenta pª ho altar
mor e duas dalmáticas tudo em pano enteiro de tela amarela. Mais des
frontais para o cruseiro, altar mor e nossa Snõra tudo de damasco branco
bases e mangas e sobre frontal de tella amarela mais hum pano de púlpito
de damasco branco, com tela amarela pano de estante des das estantes da
Se, hum pano da porta pas, manga da crus, tudo em bocaxim e franjado
de seda e ouro. Verde. Fizeramse de damasco verde nove frontais e canas‑
tras de veludo verde. Dez vestimentas de damasco verde, 4 de conegos com
sebastros de veludo e seis para beneiciados com baras de veludo (sic) tudo
frania com seda verde foradas de bocaxim de veludo verde para oaltar mor
hum frontal, huma casula, duas dalmáticas, huma capa tudo com xanastras
inteiras de tela branca, hum pano de púlpito do mesmo, e mtº pano de estan‑
te, e pª as estantes do altar mor hum pano de porta pas tudo com, franjas
de verde prata e seda. Mais duas capas de veludo verde com seus xavastres
para a cõpanharem ao sábado ao que sustenta a tarde quando cinza da
dominga. Manga de veludo verde e tela branca. No ano de 89 se izeram
duas mantas de veludo roxo pª as domingas do avento, dous estolães (sic),
hum de veludo roxo e outro de damasco roxo. De veludo negro, frontal pª
o altar mor duas dalmáticas, huma vestimenta e hum estolam, hum pano
mui grande pª sobre a tumba sexta frª de emdoenças. De damasco carmesim
huma capa palio, manga de crus pª o Santissimo Sacramtº izeram neste
tempo de veludo negro tres vestimentas de sexta feira de Endoenças para o
cruciixio com xauastras de tela amarela. Mais se fez huma capa de tela
negra com franjão de ouro e seda. Mais hum pano pª o altar mor borlado
detrás da crus. Mais huma manga negra pª a crus».
De 1592, existe outro registo de aquisições de têxteis pelo
Arcebispo, com indicação de que a execução das peças se fez
em oicina de Florença, mas seguindo modelos pintados que,
de Évora, enviou ao atelier escolhido: «Neste tempo no ano de 1592

122
ordenou fazer outro ornamento grande pª as festas principais pª ho qual
deu ordem pera Florença e mandou pintado em papel grosso todos os xa‑
vascos e capelos de capas pera tudo vir daquela pintura, o qual ornamento
tem vinte e nove capas todas das cavastras de borcado branco. Os corpos de
vinte e huma são de tela rasa e sete de tela frizada com alcachofras de tres
altos, huma capa pª ensenso e do altar mor de borcado, huma vestimentas
do mesmo, e duas dalmáticas, hum frontal, tudo de borcado e hum pano de
púlpito, hum palio do mesmo. Panos de estante. Mais nove frontais pª ho
cruzeiro e pª nossa Snõra de tela rasa branca com xanastras frontaleiras e
mangas de tela rosada, huma manga de crus de borcado branco, tudo isto
com franjas de po de ouro e prata com seda. Mais huma capa de brocado
amarelo com hum capelo tecido de ouro com huma nossa Snra que custou
esta capa sento e vinte mil rs e que he do altar mor todo forrado de tafeta
dobrado e tudo o mais forrado de bocaxim». É interessante ver-se que
nesta riquíssima encomenda o prelado português dá provas de
grande autonomia em relação ao que eram as peças de vestuá-
rio padronizado, impondo-se a escolha dos motivos decorativos,
enviados em desenhos coloridos, e a própria escolha de cores,
como a púrpura, o carmim, o amarelo e o verde, para enrique-
cer os brocados e sedas 265.
Infelizmente nada se sabe de concreto a respeito dessa en-
comenda nem consta que nos arquivos de Florença exista re-
ferência a tal aquisição. Todavia, a presença em Évora de Frei
Giovanni Vincenzo Casale, que veio desenhar o projecto da
Cartuxa, poderia ter tido, segundo sugere a historiadora de
arte Magda Tassinari, um papel de ponte nos contactos entre
D. Teotónio e os ateliers lorentinos, que o frade servita devia
conhecer bem. Casale, como arquitecto, escultor e decorador,
estivera ao serviço de Ferdinando de’Medici (que fora cardeal
em Roma antes de ser grão-duque da Toscana) e tinha relações
próximas com as manufacturas lorentinas dessa corte, além de
que trabalhara para a Basílica della SS. Annunziata, centro ar-
tístico da maior importância onde a paramentaria teve na altura
um relevante papel. Tudo isso permite supor que o Arcebispo
de Évora teve no primeiro arquitecto da Cartuxa um contacto
privilegiado com a pátria toscana para encomendas desse tipo.

123
Sabe-se também que esta arte se interligava fortemente com a
da pintura, por implicar desenho ino e, em alguns casos, traba-
lho de têmpera a pincel. Em Florença, por exemplo, o famoso
pintor Jacoppo Ligozzi (1547­1627), aliás ilho de um compe-
tente artista de têxteis milanês («ricamatore»), fez desenhos para
ornamentos para as festas galantes da corte dos Médicis, desig-
nadamente as bodas do próprio Grão-Duque com Cristina de
Lorena, o que sugere, mais uma vez, as íntimas aproximações
dos artistas de pincel com os bordadores, ambos concebendo
«modelos» para os têxteis que realizavam, entre outras artes de-
corativas 266. Aventou-se a possibilidade, no caso eborense, de
o pintor da casa de D. Teotónio, o holandês Duarte Frizão, ter
desenhado e colorido esses «modelos» enviados para Florença.
Seja como for, caso a notável casula da Sé, e algumas das pe-
ças do Museu acima descritas, correspondem à encomenda de
1592, elas serão trabalho lorentino e, ainda que, como assevera
Magda Tassinari, não revelem uma qualidade acima da mediania
do tempo, mostram cuidado trabalho de pincel nos medalhões
bordados no fecho e nas costas do sebasto.
Em 1602, realizou-se um «ornamtº de veludo negro para os defun‑
tos» na Sé, e também foram feitas encomendas para enriquecer
o Mosteiro da Cartuxa. Na altura, estavam a decorrer diligên-
cias para uma nova e custosa encomenda de têxteis em Floren-
ça, possivelmente na mesma oicina que, com bons resultados,
cumprira a precedente. Era uma encomenda de grande vulto,
mas a morte de D. Teotónio e o desejo do Cabido em que esse
dinheiro fosse gasto de outro modo inviabilizaram de todo a
sua realização: «Fezse outro ornamento de veludo carmesim de tela capas
frontal casula dalmáticas pª o qual quando morreo tinha comprado com
côvados de veludo, posse em excusas em se vacante na sua morte. Tinha en‑
tão posto hum valle de dois mil e quinhentos crusados da obra para come‑
çar outro ornamento rico em Florença o qual se não fez nem começou com
sua morte. E ho cabido em Se vagãte arrecadou ho drº e se gastou no que
se ordenou emtam que foi o fazerem as maças e outras coisas».
Sobre esta encomenda tardia, sabemos por outra documen-
tação inédita que foi mandado a Itália um cónego da Sé, o pa-

124
dre Domingos Martins, munido de desenhos coloridos com os Fig. 23
modelos de padrão desejados. De facto, em início de 1602 (e a Fig. 24

poucos meses da morte), D. Teotónio fez a encomenda seguinte


ao referido cónego, que ia a caminho de Roma: «Em casa do Sõr
Conde Fernão Taverna esta huma casula, e huma dalmática de buquexim
para se fazerem outras por ellas, e aqui vão outros desenhos para o broca‑
do, e para os sebastros, e os peris que nelles estão azuis, hão de ser cor que
parecer, e o branco hade ser vermelho, e porque queria tãobem fazer hum
ornamento branco para a Cartuxa da feição do da See de tela, e não há
que ter mais que frontal que he de quinze palmos de cumprido, como vereis
pela medida que vai ao pé do retabllo, e huma vestimenta, e panno pera o
faldistório que he a estante, a casula hade ser toda de brocado como a minha
capa que se fes em Florençia, e o frontal, e faldistório, taobem os sebastos e
folhas que levam ao redor hão de ser fabricadas de ouro conforme ao papel
que levais» 267. Parece que, com o falecimento do Arcebispo, esta
encomenda de paramentos italianos se gorou.
Uma das peças de maior notabilidade da paramentaria de D.
Teotónio é a já referida e famosa Casula exposta no Museu de
Arte Sacra (M.E.S.S.E.). É obrada em tecido lavrado, com se-
basto bordado e pintado em forma de cruz na frente e costas,
com tira bordada e pintada a debruar toda a peça e rematada
com galão franjado. Mede de frente 107 cm de alto por 97 cm
de largo e, de costas, 141 cm por 110 cm. A respeito do tecido,
a matéria­prima utilizada é o io de seda, branco e carmim, e o
io laminado dourado e prateado, com alma de seda amarela e
branca, respectivamente. A técnica de taqueté usada no tecido
recorre, como era usual, ao veludo cortado e a tramas de io la-
minado, dourado e prateado, formando efeitos anelados. A gra-
mática ornamental inclui enrolamentos lorais e acânticos, com
elementos de pinha no cimo das volutas, e um traçado secundá-
rio muito ino, que acompanha e diverge do traçado principal.
Quanto ao bordado, o material é o io de seda polícroma e o
io de laminado dourado, com base de sebasto, taqueté de seda
branca e io prateado e base do medalhão em linho e seda, en-
quanto que a técnica foi a aplicação de io dourado a deinir os
motivos, com interior pintado e, no medalhão, ponto de ouro

125
estendido, pouco denso, sujeito a io de seda, com efeitos de cor-
dãozinho dourado e lâmina metálica, canutilho, pontas de seda
matizada e eventuais vestígios localizados de reutilização. O or-
namento do sebasto segue um tronco ino que se desenvolve em
vertical, com ramagens, lores e frutos, e duas cartelas de ornato
maneirista, uma pequena e outra maior, no topo das costas. A
tira do debrum tem folhas em S e minúsculas cartelas, e a car-
tela maior mostra a representação do símbolo cartuxo da Scala
Coeli, de belo desenho, com a mitra, bordada em io metálico, a
escada de São Bruno e, ao cimo, a Virgem Maria, com vestígios
de pintura a têmpera. Também o forro, de seda vermelha, é de
execução cuidada, tal como o galão, de tecido franjado e tecido
de seda também vermelha e io laminado de ouro.
Trata-se de uma peça de luxo, mesmo que não atingindo qua-
lidade de excelência quanto à manufactura, e que mostra a es-
pecial devoção que D. Teotónio de Bragança nutria pelos seus
cartuxos. Segundo Teresa Alarcão e José Alberto Seabra, que
descreveram a peça com toda a minúcia, trata-se de trabalho de
oicina italiana da segunda metade do século XVI 268; podemos
ser agora mais precisos, conirmando esse parecer e estabele-
cendo o lugar de fabrico em Florença e a data de factura em
1592 ou pouco antes desse ano. Segundo estes autores, «a solu-
ção ornamental, utilizando várias técnicas, é de extrema leveza,
muito distante dos pesados tecidos carregados de ouro. Aqui,
o brilho é dado essencialmente pelo io prateado, integrado no
taqueté do fundo». Também merece ser destacado o facto de
no medalhão dos sebastos se ter utilizado o bordado a sedas e
ouro, enquanto nos campos e nas tiras se usou para a valoriza-
ção dos motivos, sombreados a pincel, aplicação de io dourado.
Os mesmos autores observam, com toda a pertinência, que a
decoração é similar à de muitas peças de ourivesaria e de ferra-
gem do mesmo tempo, e acrescentaríamos que se trata de uma
gramática igualmente presente nas barras e cimalhas das compo-
sições fresquistas pintadas nestes mesmos anos no Alentejo – o
que conirma que D. Teotónio mandou mesmo para Florença
«pintado em papel grosso todos os xavascos e capelos de capas pera tudo vir

126
daquela pintura». Quem sabe se tal tarefa coube ao seu pintor Du-
arte Frizão, que em 1592 ainda estava em actividade ? Parece ser
hipótese muito plausível. De novo em Janeiro de 1602, a poucos
meses da morte, D. Teotónio mandou fazer em Roma uma casula
e uma dalmática, …«e aqui vão outros desenhos para o brocado, e para
os sebastros, e os peris que nelles estão azuis, hão de ser cor que parecer, e
o branco hade ser vermelho», ordenando também ao cónego que en-
viou à Cidade Papal um ornamento branco para a Cartuxa igual
ao da Sé, «como vereis pela medida que vai», dizendo mais que a casu-
la devia ser de brocado «como a minha capa que se fes em Florençia»269.
Na recente exposição temporária Paramentos de D. Teotónio de
Bragança, no Museu de Évora, organizada por Maria do Céu Gri-
lo, expuseram-se, além da casula da Sé, com as armas da Cartuxa,
mais seis peças do ornamento de D. Teotónio, todas pertencen-
tes aos acervos do Museu e para o efeito devidamente benei-
ciadas 270. Destacou-se um precioso pálio processional (invº ME
172/6), em bom estado, ainda com suas passamanarias, bordado
com minúcia, usando uma ina teia de io dourado e prateado
a denotar a excelência da execução, com decoração de grottesche
que parecem inspirados nas gravuras de Nicoletto da Modena
ou em outras estampas sequazes dos motivos de candelabra e en-
rolamentos clássicos da Antiguidade (embora no dossel, como é
compreensível, não apareçam troféus ou outra simbologia pagã
e, sim, putti, animais e aves, mascarões e cartelas). É obra italia-
na, por certo executada no quadro da mesma remessa lorenti-
na, e também neste caso o artista toscano cumpriu o desejo do
encomendante de seguir modelos enviados desde Évora.
Contam-se neste paramento teotonino uma dalmática com
estola e manípulo, dos acervos catedralíceos do Arcebispo (com
o nº ME 1272/2, e que segue o mesmo padrão da casula da Sé),
e um frontal ou pano de altar (nº ME 172/7), especialmente da-
niicado por ter estado durante anos exposto na igreja de São
Vicente, tendo a luz destruído motivos da decoração. Num dos
pluviais nota­se ainda o efeito do io de prata acoplado ao ouro,
conferindo à peça efeitos lumínicos de belo efeito. A gramáti-
ca que ostentam é a mesma, com enrolamentos de folhagem e

127
motivos de alcachofra estilizados, com a sua marca simbólica,
e devem ser, também estes, de fabrico lorentino. Acresce que
na igreja matriz do Alvito foi ultimamente localizado, segundo
informa Maria do Céu Grilo, um paramento completo da era
teotonina, que carece de estudo e intervenção de salvaguarda.
Outras obras importantes ocuparam nestes anos o múnus de
D. Teotónio de Bragança no que respeita à decoração da sua Sé.
Sabemos, por exemplo, que enriqueceu o acervo de pratas do
tesouro da Catedral com aquisições e encomendas (uma delas a
muito referida e elogiada lâmpada de prata, obra do mestre cali-
polense João Luís, segundo um deseho do arquitecto Nicolau de
Frias). Diz o muito citado mss. Notícias do seu Governo que «comprou
e fez de prata as pessas seguimtes. Huma alampada que tem seis arrobas de
prata a maior pessa e de milhor feitio que tem Espanha, fez dous tocheiros
de muita grandura como se ve, fez hum são Sebastião de vulto de prata que
custou quinhentos crusados, fez huma alanterna de prata, fez hum peramede
donde esta a relíquia de Sam Manços, tudo isto mujto presso» 271.
As pratas foram, como se atesta, outra das paixões de D. Teo-
tónio, sabendo-se que dotou muitas igrejas e oratórios da Arqui-
diocese com peças de prata, algumas delas por si custeadas. Em
1592, «comprou pª a credencia do altar mor hum jarro dourado de bastians,
hum gomil, hum saleiro, tudo de muita grandesa e feitio, e huma bacia de
prata», peças essas que, conta-nos o memorialista das Noticias do
seu Governo, foram desprezadas após a morte de D. Teotónio e
utilizadas indevidamente («ho como se pode fazer deixo a juízo de quem
ho quiser julgar»). Além da muito referida (mas destruída) lâmpada
de prata da Sé, por João Luís, segundo desenho de Nicolau de
Frias, já ordenara em 1582 que «pera a relíquia do bem aventurado são
sebastião se faça huns vultos de prata em onrra deste bemaventurado mar‑
tyr por ser nosso advogado neste trabalho que padecemos o anno passado»,
isto é, lembrando o papel deste santo como protector contra as
pestes 272. Terá sido João Luís o autor desses «vultos» e, também,
do grande e custosissimo São Sebastião atado a uma palmeira, peça
em prata destinada a saír nas procissões, para o qual o Arcebis-
po dispendeu em 1592 a alta soma de 500 cruzados, mas que do
mesmo modo desapareceu nas rapinas das tropas napoleónicas.

128
É de lamentar a quase ausência de peças de ourivesaria da
época de D. Teotónio, se excluirmos a peça de prata e cristal
com a relíquia de São Manços, esta aliás, como se disse em capí-
tulo anterior, de factura castelhana, pois se tratará de uma ofer-
ta de seu primo Filipe II, acompanhando a doação da relíquia,
antes de o Aercebispo seguir viagem para Évora com o almeja-
do troféu religioso. Também sabemos que, tendo recebido do
Prior-mor da Ordem Cartuxa uma relíquia de São Bruno, fez
um busto‑relicário de prata de São Bruno que depois ofereceu a Sca-
la Coeli, mas que do mesmo modo desapareceu (DOC. Nº 56).
Sabendo-se que realizou outras encomendas em Florença para
além das de paramentaria que se citaram, bem pode ser dessa
origem um elegante cálice em ouro esmaltado, certamente de
fabrico italiano, que se guarda no Museu de Arte Sacra da Sé de
Évora, entre outras peças de luxo que se devem a D. Teotónio
de Bragança (as referidas alfaias litúrgicas). Entretanto, existem
outras peças de prata, patentes na exposição Mestria dos Ouri‑
ves (Museu de Évora), que podem reclamar-se do seu mecena-
to, caso de uma custódia vinda de Santa Catarina de Sena (invº
ME/29/1) ou um cálice (nº ME/1482/1) oriundo do mostei-
ro do Bom Jesus de Valverde. Dúvidas não existem, entretanto,
para um belíssimo porta-paz de prata conservado no M.N.A.A.
com discutível factura italiana, por estar irmado com a seguinte
inscrição: Teotonivs. de. Bragança. Arco. Piscopvs Elborens 273.
A documentação recenseada mostra o empenho do Arce-
bispo em desenvolver os também os trabalhos de cereeiro, de
ferreiro, de vidreiro, de relojoeiro, de carpinteiro, de guadame-
cileiro, e outras artes que eram importantes para o quotidiano
da vivência capitular, sem esquecer a impressão e a encaderna-
ção de livros. Desenvolveu também a música catedralícea, con-
vidando um escol de cantores e ilustres músicos estrangeiros,
de que se conhecem os nomes, citados no manuscrito Noticias
do seu governo. Mandou a Valência um seu escravo índio, de nome
Sousa, aperfeiçoar-se na arte de cerieiro, que depois assumirá
ao serviço da Sé.

129
Notas

227 B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança. No‑
ticias do seu governo. Início do século XVII. In­4º, 12 ls. Cf. DOC. Nº 46.
228 B.P.E., Cód. CIX/2-7, nº 51.
229 Nicolau Agostinho, op. cit.,, cap. V, p. 20.
230 A.D.E., Lº 50 de Notas de Fernão de Arcos, ls. 42 vº­47.
231 Maria Antónia Hespanhol, op. cit., vol. I, p. 250-252.
232 A.D.E., Lº das Ementas da Câmara, 1596‑98, l. 10, apud Maria Antónia Hespa-
nhol, op. cit., vol. I, pp. 251 e 303.
233 Ver DOCS. Nºs 15, 16, 17, entre outros.
234 A.D.E., Lº 50 de Notas de Fernão de Arcos, ls. 42 vº­47.
235 B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança.
Noticias do seu governo. DOC. Nº 46.
236 A.S.E., Lº 9 de Acórdãos do Cabido, l. 90 e segs.
237 B.P.E., Fundo Manizola, Códice 98-2.
238 B.P.E., Fundo Manizola, Códice 85. Segundo nos informa Manuel Branco, em
1588 foi avaliada a nova grimpa, mandada fazer em Lisboa por D. Teotónio com tra-
ça de Nicolau de Frias. Ver DOC. Nº 12.
239 Cf. nº 6/7 da revista Conservação e Restauro, do Instituto dos Museus e da Con-
servação, 2010; e Maria das Mercês de Carvalho Daun e Lorena Taquinho, Pintura
Flamenga em Portugal. Os retábulos de Metsys, Morrisson e Ancêde. Estudo técnico e material,
tese de Doutoramento, Universidade de Évora, 2013.
240 B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 6. DOC. Nº 16.
241 B.N.P., Reservados, Mss. 29, nº 50, Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança.
Noticias do seu governo (DOC. Nº 46), l. 7 vº. DOC. Nº 46.
242 B.P.E., Reservados, MSS 29, nº 50 (DOC. Nº 46), l. 5 vº.
243 Esta pintura de c. 1560-1570 e de autor desconhecido mostra desenho exímio
na igura da Virgem Maria, longilínea de pose, e na elegância geral de composição,
com belos anjos com amplas vestimentas, dentro da tradição renascentista e com
reminiscências nórdicas, tal como na linda paisagem marinha esboçada na zona in-
ferior. Túlio Espanca, Inventário…, 1966, p. 90. Espanca dá-a como «do maior inte-
resse artístico», opinião corroborada por Adriano de Gusmão, in «A Pintura Manei-
rista em Évora», cit.
244 Sobre este artista, cf. Adriano de Gusmão, Diogo Teixeira e seus colaboradores, Lis-
boa, Realizações Artis, 1955; e Vitor Serrão, «O retábulo de D. Lopo de Almeida e
a actividade do pintor maneirista Diogo Teixeira na Misericórdia do Porto (1590-
-1592): inovação da obra e expansão regional dos seus modelos», Actas do II Congresso
de História da Santa Casa da Misericórdia do Porto. Culto, Cultura, Caridade, Santa Casa da
Misericórdia do Porto, 2012, pp. 108-147.
245 Adriano de Gusmão, op. cit., p. 14.

130
246 Cf. Adriano de Gusmão, «A Pintura Maneirista em Évora», cit., e Túlio Espan-
ca, Inventário…, 1966, pp. 159 e 245.
247 A.N.T.T., Lº 16 do Distribuidor, Notas de João Rodrigues Jácome, Maio de 1600, cx. 3, s/nº ls.
248 A.D.P., Lº 35 de Notas Tabeliónicas de Elvas, l. 34 vº e segs., Patrícia Monteiro, A
Pintura Mural no Norte Alentejano…, cit.
249 Sobre estes excelentes quadros, cf. Martín S. Soria, «Francisco de Campos (?)
and Mannerist Ornamental Design in Évora, 1555 to 1580», cit., pp. 22-27; e Maria
Teresa Desterro, Francisco de Campos (c. 1515‑1580) e a ‘Bella Maniera’ entre a Flandres,
Espanha e Portugal, cit., 2008.
250 Vitor Serrão, «Uma sociedade de pintores em Beja no im do século XVI: os
maneiristas António de Oliveira e Júlio Dinis de Carvo», revista Museu, IV série, nº
11, 2003, pp. 35-75.
251 Vitor Serrão, «Uma sociedade de pintores em Beja», cit.
252 Vitor Serrão, «Lourenço de Salzedo en Roma. Inluencias del Manierismo ro-
mano en la obra de la Reina Catarina de Portugal», Archivo Español de Arte, LXXVI,
2003, nº 303, pp. 249-265.
253 Sobre estes azulejos antuerpianos, cfr. J. M. dos Santos Simões, op. cit., 1945;
José Teixeira, op. cit., pp. 60-63; José Meco, Azulejaria Portuguesa, Lisboa, 1985, p. 19;
idem, 1988, pp. 51-52; idem, O Azulejo, Publicações Alfa, 1989; Joaquim Torrinha,
«Os azulejos renascentistas», Monumentos, nº 6, 1997, pp. 26-31; Claire Dumourtier,
«Contribution à l’étude des carreaux anversois de Vila Viçosa», Azulejo, nº 1, 1991,
pp. 22-32; idem, «Frans Andries, ceramista de Amberes establecido en Sevilla», La‑
boratório de Arte, nº 8, 1995, pp. 51-60; idem, Céramique de la Renaissance à Anvers, Bru-
xelas, 2002; Alexandre Pais ed alii, cat. cit., 2013, pp. 42-57.
254 Cf. Dumortier, art. cit., 1995, pp. 51-60; idem, 2002; José Meco, op. cit., 1995;
Alexandre Pais ed alii, cat. cit., 2013.
255 Alexandre Pais ed alii, cat. cit., 2013, p. 52.
256 Martín S. Soria, art. it., 1957, pp. 26-27.
257 Cf. Martín Soria, art. cit., 1957, pp. 22-27; Joaquim Oliveira Caetano e José Al-
berto Seabra, op. cit., 1983; idem, art. cit., 2007, pp. 59-65; Vitor Serrão, art. cit., 2003,
pp. 226-231; idem, O Fresco Maneirista…, 2008, caps. 2.3 e 4.1; Teresa Desterro, Fran‑
cisco de Campos (c. 1515‑1580) e a ‘Bella Maniera’ entre a Flandres, Espanha e Portugal, cit.,
2008, pp. 147-150; idem, O Tapete…, cit., 2008, pp. 96-112 e 141-143. Sobre as pin-
turas da Sala Oval no Paço dos Condes de Basto (1578), existe uma tese de Douto-
ramento em curso, da autoria da técnica de conservação e restauro Rita Vaz Freire,
com defesa prevista para 2015 na Universidade de Évora.
258 Joaquim Caetano e José Alberto Seabra, art. cit., 2007, p. 66.
259 O recém-descoberto inventário da livraria dos Condes de Basto atesta a presen-
ça de livros dos clássicos greco-latinos, incluindo as Mitologias de Ovídio.
260 Vitor Serrão, «A igreja-salão de Monsaraz…», cit., pp. 217-236.
261 Sobre essas obras, cf. A.H.F.E.A., o Inventario que se fez de todos os bens que icarão
per falesimento do senhor Conde de Basto, cit. Os frescos, que foram uma decoração inte-

131
gral acima dos silhares (cobertos em 1737 por grandes telas de Francisco Xavier de
Castro, emolduradas de gorda talha barroca), são passíveis de supericial análise pe-
las fotograias, coevas de um restauro do templo há alguns anos, mostradas ao autor
por Joaquim Inácio Caetano e José Artur Pestana, a quem nos confessamos gratos.
O estilo mostra, de facto, similitudes com a obra de Campos.
262 Cf. o ‘corpus’ actualizado da obra do artista em Maria Teresa Desterro, Fran‑
cisco de Campos…, tese cit., 2008.
263 Sobre as campanhas fresquistas paçãs na 2ª metade do século XVI, cf. Vitor
Serrão, O Fresco Maneirista do Paço de Vila Viçosa, cit.
264 B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança.
Noticias do seu governo, ls. 4 vº a 6 vº. DOC. Nº 46.
265 Cf. um aspecto muito interessante que sobressai da leitura da tese de Maria João
Pacheco Ferreira, Os Têxteis Chineses em Portugal nas Opções Decorativas Sacras de Aparato
(séculos XVI‑XVIII), tese de Doutoramento, Faculdade de Letras do Porto, 2011, vol.
I, pp. 25-28 e 122-129, quando fala da concordância cromática estabelecida, com o
triunfo da Contra­Reforma, em termos de deinição de cores a usar na paramentaria
sacra. Ora o que se veriica na encomenda de D. Teotónio para Florença é que, para
as vestes e outras alfaias referidas, nem todas as cores assinaladas coincidem com as
que eram defendidas por Roma, à luz das directrizes conciliares.
266 Agradecemos à senhora Doutora Magda Tassinari as suas valiosas informações
a este respeito e bem assim o artigo de Paolo Peri, «Inediti disegni di ricamo eseguiti
in occasione delle nozze di Ferdinando I di’Medici e com Cristina di Lorena», Il Ri‑
camo in Italia dal XVI al XVIII Secolo, Atti delle Giornate di Studio, org. de Flavia Fiori e
Margherita Zanetta Accornero, Novara, 2001, pp. 33-51, com desenhos de modelos
de paramentaria especialmente concebidos para as bodas de Ferdinando de’Medici
com Cristina de Lorena, prova de que este tipo de decorações era seguido com a
maior atenção pelos mecenas.
267 B.P.E., Lº 1º da Cartuxa, l. 120. DOC. Nº 33.
268 Teresa Alarcão e José Alberto Seabra, Imagens em Paramentos Bordados. Séculos XIV
a XVI, Lisboa, Instituto Português dos Museus, 1993, pp. 222-225.
269 B.P.E., Lº 1º da Cartuxa, ls. 120 e vº.
270 Maria do Céu Grilo (org.), Paramentos de D. Teodósio de Bragança, Museu de Évo-
ra, 2014 (sem catálogo). Agradecemos à senhora Dra Maria do Céu Grilo as precio-
sas indicações a respeito deste acervo, maioritariamente desconhecido. O trabalho
de beneiciação do pluvial envolveu técnicos do Laboratório Hércules e do Labora-
tório de Conservação e Restauro José de Figueiredo.
271 B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Noticias do seu governo…, l. 6 vº. DOC. Nº 46.
272 A.S.E., Visitações do Sr Arcebpº Dom Theotº (desde 1579) athe 1583 e 1584, cader-
no solto (PT/ASE/CSE/A/009/Mç. 1, 1444-1595). Existe cópia na B.P.E., Cód.
CIX/2-7, nº 52.
273 Museu Nacional de Arte Antiga, nº de invº 96 (Ourivesaria). Nuno Vassallo e
Silva, a quem agradecemos o parecer, destacou o italianismo desta peça, não estra-
nhando que se trate de encomenda de D. Teotónio em Itália.

132
5. o mosteiro dA scAlA coeli dA
c A rt u x A d e Évo r A

5.1. O chamamento cartuxo

A obra de arquitectura mais mediática que se deve à respon-


sabilidade de D. Teotónio de Bragança durante o seu governo
arquiepiscopal foi a construção do Mosteiro da Scala Coeli, fora
das muralhas da cidade e junto ao Aqueduto da Água da Prata,
destinado a albergar os primeiros monges cartuxos em terras
portuguesas.
Apesar de alterado na sua fachada devido aos bombardea-
mentos sofridos aquando da investida castelhana em Maio e Ju-
nho de 1663, altura em que a igreja serviu de hospital de guerra
às tropas de Diego Caballero, general do exército invasor de D.
Juan de Áustria, e chegou mesmo a ser incendiada 274, o monu-
mento preserva a grandeza e o esplendor peculiares das cons-
truções cartuxas: é a mais importante de todas as obras de ar-
quitectura teotoninas !
No portal rusticado que abre para o pátio de acesso à belíssi-
ma fachada, corre na cimalha a inscrição votiva EREMOS DEI
PARE VIRGINIS MARIAE SCALA COELI ORDINIS CAR-
TUSIANORUM 1604, que cronografa o término da construção
na sua primeira fase, iniciada em 1587 com o célebre concurso
para escolha da planta. Como se sabe, o arranque da constru-

133
Fig. 4 ção do mosteiro remonta ao ano de 1587, com primeira pedra
colocada a 7 de Novembro desse ano, e tem sido considerado
«um processo peculiar, indiferente ao panorama arquitectónico
da época» 275, já que foi muito célere e, como disse George Ku-
bler, em termos de morfologia estilística e descontando as carac-
terísticas vinculadas à organização das construções cartuxas, «a
inspiração italianizante do conjunto é assinalável» 276. Conforme
notaram os historiadores de arte Agustín Bustamante, Fernando
Marías e Miguel Soromenho, a frontaria revela «sintagmas arqui-
tectónicos de extracção erudita» que vão buscar a fonte inspira-
dora ao tratado de Serlio, mas também a modelos lorentinos da
era mediceia, sem esquecer o modelo da casa-mãe de Santa Cruz
de Jerusalém em Roma, e tomando também evidentes referen-
ciais historicistas (leia-se paleo-cristãos) na ideia geral da fronta-
ria com o recurso ao motivo triunfal, isto é, a união do pilar-arco
e da coluna-entablamento, presente na elegante composição do
nártex. Tudo é por demais requintado, com o pórtico clássico
com os seus cinco arcos de volta perfeira e as suas colunas es-
triadas de ordem dórica, a constituír como que uma espécie de
base sobre a qual se estrutura e organiza, em forma piramidal,
toda a fachada. De novo encontramos a inspiração romana no
modelo triunfal da pirâmide, esse «requintado e antiquário mo-
tivo triunfal», tão querido ao gosto do Arcebispo, como teste-
munho de gloriicação da Igreja contra­reformada e simbologia
adequada para a imaginização Scala Coeli.
A magna obra, de fachada tão aprimorada e erudita, de al-
guma maneira em contraste com o pauperismo desejado pelos
monges de São Bruno vindos de Tarragona, foi pensada jus-
tamente com o sentido do grande esplendor que a regra justi-
icava, e mereceu um debate sério por parte do promotor, que
analisou com atenção pelo menos quatro plantas solicitadas aos
melhores arquitectos e engenheiros da corte, não se ignorando
também o parecer do rei no sentido de avalisar a mais adequa-
da. Quase certo é D. Teotónio ter tido a avisada opinião de Ni-
colau de Frias para a escolha do melhor projecto, sendo ele, à
data, o arquitecto de serviço do Arcebispado de Évora e o artista

134
a quem se encomendavam todos os riscos – e por essa mesma
razão será ele quem prosseguirá com a obra, a seguir à morte
de Casale… Mas já lá iremos.
Se é certo que D. Teotónio de Bragança gastou somas avul-
tadas da sua fortuna pessoal para realizar obras importantes em
outras instituições religiosas e caritativas por si criadas, o maior
destaque destas empresas cabe seguramente ao Mosteiro da
Cartuxa, obra-prima de todas as construções erigidas no tempo
da sua governação, «fazendoo, ornandoo, e provendo à sua Sanchristia
de tantos, & tão ricos Ornamentos, de Ouro, Prata, e Seda, e Figuras
de Sanctos de Prata maciça, Retabollos iníssimos, e ricas Alcatifas, e das
peças de serviço…» 277. Embora o Arcebispo tenha custeado tam-
bém um empreendimento de peso como foi o mosteiro fran-
ciscano de Santo António da Piedade, iniciado já pelo Cardeal
D. Henrique (e onde D. Teotónio seria enterrado em Agosto
de 1602, após o corpo regressar de Valladolid, onde faleceu de
morte súbita), foi na obra da Cartuxa que empregou o melhor
do seu talento e dos seus réditos 278.
Desde que regressou de suas viagens que o Arcebispo con-
servava uma profunda admiração pela regra de São Bruno e pelo
espírito de pauperismo dos seus monges, «vivos imitadores dos
anjos na terra», e por isso sondou o Papa Gregório XIII, em
Janeiro de 1583, a respeito da possibilidade de a ordem se po-
der instalar em Portugal 279. Deve ter tido ecos favoráveis à sua
pretensão, pois em 1587 já existia carta branca de Roma para se
chamarem os frades oriundos do mosteiro do Castelo de Morea,
na Catalunha, e se discutiam o sítio de implantação e o projecto
a seguir 280. Pediu-se primeiro uma traça ao engenheiro Tiburcio
Spanochi, que foi liminarmente recusada por não agradar dada
a falta de monumentalidade pretendida, e analisaram-se de se-
guida outras traças, da autoria de Frei Giovan Battista Casale,
de Filippo Terzi e de Francisco de Mora, tendo o Arcebispo de
Évora optado pela primeira, por ser justamente a que melhor
considerava a grandiosidade pretendida 281. Não é despiciendo
notar que era, também, a traça mais «tridentina», aquela que me-
lhor acentuava esse aspecto, cenográico e simbólico ao mesmo

135
tempo, da fachada-pirâmide em andares sobrepostos, articulada
com um nártex-base com clara inspiração nos templos paleo-
-cristãos. Tudo isso agradava sobremaneira ao Arcebispo e aos
seus postulados no campo da Arquitectura.
Mas é interessante lembrar que, à data em que o concurso
decorreu, ainda não havia uma decisão deinitivamente tomada
quanto ao terreno onde se ia implantar a casa cartuxa, ainda que
o Arcebispo se inclinasse já para o vale que bordeja o percurso
do Aqueduto da Água de Prata. Assim sendo, os projectos foram
concebidos sem conhecimento certo do sítio a escolher para a
construção, o que explica discrepâncias por parte dos seus au-
tores. Sabemos que, de certeza, além do vencedor do concurso,
também Terzi se deslocou a Évora.
A vocação pró-cartuxa de D. Teotónio é bem explicada por
uma bem documentada crónica manuscrita com o historial de
Santa Maria Scala Coeli, escrita em 1725 por um anónimo car-
melita do convento de Nossa Senhora dos Remédios de Évora,
onde se diz que D. Teotónio «andou peregrinando por partes de Italia,
Alemanha, França, e Castella, e recebeo grandes caridades nos conventos
da Cartuxa a que se chegava; sendo elle virtuoso, mais attendis à virtude
que via, do que às caridades que recebia. Fez hum grande concepto daquela
sagrada religiam: pelo que via de fora, teve curiosidade de saber o que via
por dentro; examinou e informouse de tudo o que pode, e achou que tudo
era Deos, e mais Deos, sem cuidado algum, ou divertimento das cousas do
mundo; que viviam aquelles homens, não como homens vestidos de carne
mortal, mas como anjos revestidos della, que elle não tanto via, quanto ve‑
nerava dentro das paredes daqueles conventos».
A experiência sentida por D. Teotónio inspirou-o, levando-o
a cimentar a ideia de que era possível fundar na sua Arquidiocese
um mosteiro desta regra, que seria o primeiro em terras portu-
guesas e, mais, a grande obra do seu múnus: «Soube que daquellas
portas para dentro, tudo era jejum de todo o ano, cilicio perpetuo, clausu‑
ra indispensável, silencio inviolável, penitencia continua, oraçam de todo
o dia e toda a noite, dandose todos à contemplação das cousas divinas, ou
ao santo exercício do clero, exceptas somente as poucas horas a que obriga
o descanço a fragilidade humana, enquanto vive ca em baixo, em que ella

136
não pode dispensar por sem elle não se pode viver, sendo os homens obri‑
gados a conservar a vida, enquanto o sor Deos a empresta. Entendeo que
estava esta religiam, e se conservava, em o primitivo rigor da observantia,
e sem agravar as outras religiões sagradas, tem esta o primeiro lugar entre
as monachais» 282.
Pode concluir-se, em suma, que o empenho do Arcebispo
em favor da Ordem de São Bruno foi crescendo à medida que
ia conhecendo melhor a vivência dos monges cartuxos, em Es-
panha e em França: «sabendo, conhecendo, entendendo e admirando D.
Theotonio tudo isso», depois de passar por Tarragona, no seu re-
gresso de Paris, em cuja Universidade se doutorara em Teologia,
logo empreendeu todos os esforços para fundar em terras por-
tuguesas uma casa para os monges brancos. Diz o mesmo cro-
nista que «nove anos gastou com animar dentro do seu alto pensamento o
grande facto que concebera, e queria produzir: chegoulhe inalmente o tem‑
po de lançar à luz esse seu facto, ou já posto no anno de 1587, resolveuse
a trazer Cartuxos a Portugal, e que havia de ser Evora, ou ao menos o
seu Arcebispado o primeiro berço» 283. As diligências junto de D. Je-
ronimo Marchant, o Geral Prior da Ordem Cartuxa, estante na
casa-mãe francesa de Champmol, e o aval do Papa, permitiram
que D. Teotónio convidasse a virem, do mosteiro da Scala Co-
eli de Tarragona, alguns monges para darem corpo à primeira
cartuxa portuguesa. Deste modo chegaram a Évora, semanas
volvidas ao pedido, Frei Luis Telmo, ao tempo prior do mostei-
ro de Tarragona, os padres D. Jeronimo Ardion e D. Francisco
Monrroi, e o converso Fr. Joam Vellis. Todos foram instalados
no velho paço real, junto a São Francisco, onde viveram vários
anos, enquanto as obras do futuro mosteiro não se iniciavam.
A primeira diligência do Arcebispo para fundar o mostei-
ro cartuxo, assim que teve a autorização papal, e ainda antes
da chegada dos frades, levara-o a escolher sítio junto à vila de
Portel («ocorrialhe querer ajuntar a doçura do mel com a aspereza da
serra ou hermo» 284), mas teve de abandonar esse projecto, estan-
do já algumas estruturas erguidas, por razões ignotas, fossem
as condições ásperas do lugar, fosse a distância de Évora, ou a
opinião de D. Jerónimo Marchant. Assim sendo, experimentou

137
outra solução junto à cidade de Évora («queria ter os seus cartuxos
mais perto de si, pois os tinha no coração»), primeiro numa herdade
chamada do Azinhal e, inalmente, no local onde se veio a ins-
talar o cenóbio, junto ao convento capucho de Santo António
da Piedade, perto do Aqueduto da Água de Prata, em espaço
sadio, espaçoso e muito aprazível, sobranceiro às campinas de
Évora e com vista desafogada sobre a cidade.
Para o malogrado projecto de Portel, nunca devidamente
investigado, D. Teotónio optara por um sítio ermo chamado
Corte de Pinto, a caminho do Alqueva, mas a ideia não vingou.
Seja como for, ainda em data recente subsistiam nesse lugar
marcos em pedra a assinalar os limites territoriais da Ordem
de São Bruno (a pedra lavrada com o símbolo da Scala Coeli),
bem como estruturas de um edifício que parece ter sido aban-
donado pouco tempo depois de se lhe dar início 285. Mas que
os cartuxos de Évora guardavam memória do primitivo pro-
jecto do Arcebispo, explica-o o facto de D. Beltrão Morellio,
em 1595 (estando já a Scala Coeli habitada havia quatro anos),
mandar construir uma capela nessa Herdade da Corte de Pinto,
em Portel, que foi dada a fazer ao mestre pedreiro portelense
Vicente Ferreira, para que aí erguesse um templo, provavel-
mente vde invocação de São Bruno, e certamente segundo as
traças apresentadas pelo arquitecto e escultor Pero Vaz Perei-
ra, um artista ao serviço de D. Teotónio e já muito referido
neste livro 286. Aí se ergueu, então, um templinho de estrutura
simples, com sua abóbada e capela-mor com decorações de
stucco, com natural dedicação a São Bruno, facto que atesta o
empenho dos monges cartuxos em icarem indissoluvelmente
ligados àquelas terras onde estivera projectada a sua primei-
ra casa conventual. Ou seja, os monges brancos continuaram
a manter viva a tradição de um sítio que fora primeira esco-
lha de D. Teotónio para a suas casa e que, embora se tivesse
malogrado, preservava para a ordem a sua carga hierofânica e
simbólica. Desse templinho situado no termo de Portel ainda
subsistem algumas estruturas em ruínas.

138
5.2. A construção do mosteiro

As obras do Mosteiro de Scala Coeli iniciaram-se com cele- Fig. 6


ridade no início do ano de 1588, com empreitada do mestre Je-
rónimo de Torres, e estavam prontas em 1604. Aliás, já em 1598
a casa estava em estado de poder ser habitada, como foi. Diz o
cronista carmelita que vimos citando que «cresciam muito a olhos
vistos», ainda que «traçada conforme a grandeza de animo do seu autor,
mais do que ao dosejo dos Padres, para quem se traçava» 287, prolongando-
-se os trabalhos de construção por onze anos, já que tudo esta-
va pronto no essencial em 1598, e a 15 de Dezembro desse ano
já se puderam mudar, inalmente, os monges. Após a morte de
D. Teotónio, e já em tempo do seu sucessor D. Alexandre, as
obras conheceram o seu término a breve trecho, como se infere
da data de 1604 gravada na entrada do recinto monacal e o diz
o autor de uma crónica manuscrita chamada Prado Cartusiano,
que data do início do século XVIII 288.
O empenho de D. Teotónio no projecto do seu mosteiro de
Scala levou-o a dar grande prioridade às obras, enquanto os pri-
meiros monges oriundos da Catalunha se albergaram nos anti-
gos paços reais, a São Francisco, onde estiveram durante onze
anos, ainda que em Agosto de 1591 já houvesse vida comuni-
tária no novo cenóbio, como adiante se prova. Sabia-se que em
im de 1598 eles estavam já a viver em Scala Coeli, mas a saída
deinitiva dos cartuxos dos paços de São Francisco para se ins-
talarem na nóvel e sumptuosa casa que fora para eles criada de-
correu, talvez em fases paulatinas, desde 1591. Em 1598, sim,
as obras estavam prontas e a casa era considerada o melhor dos
conventos da cidade.
A empreitada correu por direcção desse pedreiro já bastante
referido pela sua envolvência nos grandes estaleiros de D. Hen-
rique e D. Teotónio, o mestre Jerónimo de Torres, responsável
pela construção da igreja e Colégio do Espírito Santo (segundo
traças de Diogo de Torralva, Afonso Álvares e Manuel Pires),
que em 1592 dirigia a equipa de pedreiros, obreiros e servido-
res activos a bom ritmo na obra do mosteiro cartuxo 289, e que,

139
Fig. 5 a nosso ver, correram sempre sob a batuta do arquitecto Nico-
lau de Frias, até pela ausência e doença de Casale, ocupado com
as obras de fortiicação da barra do Tejo, que eram prioritárias.
Diz Nicolau Agostinho, biógrafo de D. Teotónio, que ele
gastou de sua fazenda a verdadeira fortuna de 150 mil cruzados
no custo das obras 290, mas o anónimo cronista carmelita que se
vem citando aiança que foram 250 mil cruzados, entrando «nes‑
sa soma os ornamentos da sacristia, ricos de sedas, prata, e ouro, imagens
e iguras de Santos, algumas de prata batida, reliquias insignes e insigne‑
mente engastadas, entre elas avulta mais a cabeça de Sto Erasmo, Bispo de
Antioquia e mártir…, e o mesmo dos excelentes retabolos, pinturas admra‑
veis, e athe riquíssimas alfatifas e tudo o mais necessario e ainda supérluo,
sendo que o não pode ser o que se da a Deos, e a seus servos por amor
de Deos» 291. Sabe-se concretamente, por referência de algumas
fontes, incluindo o Prado Cartusiano, que fez lavrar em prata um
busto-relicário para uma relíquia de São Bruno que recebeu do
Prior-mor das Cartuxas, mas tudo se perdeu com a vandaliza-
ção a que foi submetido o mosteiro com a invasão napoleónica.
É ainda matéria de discussão o projecto aprovado, da auto-
ria do arquitecto e frade servita de Florença Giovanni Vincenzo
Casale (1539-1593), que se insere num famoso livro de desenhos
depositado na Biblioteca Nacional de Madrid, e o único dos que
foi analisado no concurso e mereceu o aval de aprovação nos se-
guintes termos: «Theotº Arcebº dEvora e fr. Joan Bellot Prior indigno da
Cartuxa de Evora» 292. Pergunta-se, antes de mais, por que razão se
preteriram os outros debuxos, sobretudo o de Filipe Terzi – que,
lembre-se, passara por Évora no início de 1588, reunindo com o
Arcebispo e sendo talvez, dos artistas chamados a concurso, aque-
le que melhor conhecia o local de implantação, até porque izera,
nessa ocasião, um desenho com o panorama da cidade. Infeliz-
mente, o álbum da Biblioteca Nacional de Madrid não conserva
a totalidade dos projectos para a Cartuxa, o que impede de saber
o que distinguia e destacava a proposta de Casale face às outras.
A resposta parece estar relectida no próprio desenho. Era o mais
«tridentino» dos projectos apresentados, pelo menos segundo o
entendimento de D. Teotónio de Bragança!

140
Quem era Giovanni Vincenzo Casale? Este frade, discípu-
lo do escultor Miguel-angelesco Giovanni Agnolo Montorsoli,
era sobretudo um engenheiro de fortiicações altamente espe-
cializado, a ponto de Filipe II o ter chamado em 1588 a Lis-
boa, juntamente com o também engenheiro militar Alessandro
Massai, seu sobrinho, para actualizar e reforçar o sistema de-
fensivo da barra do Tejo, constantemente lagelada por piratas
ingleses293. Foi nesse âmbito que concebeu, em 1590, os fortes
da Cabeça Seca (espécie de embrião do Forte de São Lourenço
do Bugio) e de Santo António do Estoril. Residiu em Lisboa
até à sua prematura morte, cumprindo o que Filipe I de Portu-
gal lhe exigia desde Madrid, já que a fortiicação da barra tinha
prioridade absoluta sobre quaisquer outras obras, incluindo-se
nessas a construção da Cartuxa de Évora, por isso mesmo ne-
gligenciadas. Era um arquitecto competentíssimo, defendendo
e mantendo, face às interrogações do rei e de seus conselheiros,
a justeza dos seus projectos, nomeadamente a escolha da forma
curvilínea, mais resistente face às correntes do mar, ao invés da
tradicional forma angular 294.
Para um artista tâo estimado pelo rei da Monarquia Dual –
facto que talvez tenha contado em termos de recomendação no
concurso para a Cartuxa –, G. V. Casale conheceria o espaço
onde o mosteiro ia ser implantado e fez vários desenhos com
acento erudito e espírito de grandiloquência, que mereceram
cabal aprovação do Arcebispo. Este, aliás, tinha relações com
Casale e com seu sobrinho Massay, que foi, aliás, testemunha
no processo de creditação das relíquias de São Torpes na altura
em que o Papa Sisto V encarregou D. Teotónio de Bragança de
ir a Sines investigar o assunto, promover escavações e descobrir
o lugar do alegado enterramento dos ossos do santo pisano.
Seja como for, também é evidente que o projecto de Casa-
le não foi integralmente seguido na realização deinitiva, o que
deixa subentender que teve de haver alterações na traça inicial,
com a conivência do Arcebispo, talvez já ainda em vida de Casa-
le, que morre em 1593. Tais alterações datam em parte, é certo,
da campanha do tempo do Prior D. Basílio de Faria, entre 1619

141
e 1625, e da que se lhe seguiu em im do século XVII, quando
com o apoio de D. Pedro II se corrigiram alguns estragos causa-
dos pela invasão e cerco castelhano à cidade de Évora em 1663,
altura em que a Cartuxa teria sido alvo da artilharia de D. Juan
de Áustria e, ademais, sofreu um incêndio. Ainda se discute qual
o real efeito deste bombardeamento na casa religiosa mas é cer-
to que foram extrapolados, pois nem o frontispício da fachada
ruíu, nem o mosteiro sofreu mais que alguma ruína na cerca e
em dependências complemetares. Como atestou Miguel Soro-
menho295, as obras realizadas no inal do século XVII, solicitadas
pelos monges ao Conselho de Guerra, provam que os estragos
causados pela ocupação das tropas castelhanas não foram tão
signiicativas como se infere, e o mesmo se deduz do contrato
de obras realizadas em 1695-1597 (sendo delas encarregado o
mestre pedreiro Manuel João Penalvo 296), que foram sobretudo
de consolidação do andar superior da fachada. Houve sim uma
‘barroquização’, que se atesta pela busca de uma «pompa e bizar‑
ria» na decoração adequada ao gosto dos tempos de D. Pedro
II (termos utilizados numa descrição de crónica cartusiana que
mais adiante se fará)….
Vendo-se com atenção o remate da fachada com frontão
triangular a sobrepujar a zona do ático, é certo que, mantendo-
-se no remate o projecto teotonino, aí se introduziram então
novos elementos de decoração, ainda que, repetimos, sem al-
terar o essencial da traça quinhentista. Aliás, parece prová-lo
também, e di-lo o mesmo Miguel Soromenho, «o recurso a uma
ordem de colunas mais pesadas e com marcação cintada do
terço inferior do fuste – artifício que repugnaria sem dúvida
ao lavrante mais purista das ordens inferiores –, o peril ani-
mado das aletas e, com certeza, a assinatura inequívoca dada
pelas armas reais pedrinas no tímpano do frontão triangular
que coroa o conjunto» 297.
Mesmo assim, o frontão não se afasta muito (em termos ge-
rais de desenho, que não de decoração) da traça original de Ca-
sale, de modo a inscrever a composição, como de facto inscre-
ve, num quadrilátero perfeito que acentua a pretendida noção

142
triunfal da pirâmide ascendente para que o conjunto da fachada
aponta. O projecto aprovado pelo Arcebispo previa essa inten-
ção subliminar, que as obras de necessário «restauro» realizadas
em 1695 grosso modo respeitaram, já que foram essencialmente
obras de consolidação. A presença das armas régias de D. Pedro
II atesta tão-só o investimento da Coroa na ultimação de uma
obra de tão grande simbolismo como era a Cartuxa de Évora,
fazendo­se reparar os estragos, aliás pouco signiicativos, que a
invasão de D. Juan de Austria causara havia pouco mais de trinta
anos. O contrato com o mestre Penalvo parece conirmar essa
interpretação, e se se procedeu então a uma exagerada «barro-
quização» do discurso da frontaria, tal se deveu a inevitáveis
contaminações por parte do gosto que dominava...
Voltemos ao concurso de 1587 e à primeira fase das obras.
É de lembrar que em im desse ano de 1593 uma mercê dada
a Pedro Fernandes de Viseu, que servia Filipe Terzi como seu
medidor de traças, refere explicitamente a dispensa de Casale,
por se encontrar enfermo, na obra do mosteiro de São Francis-
co de Coimbra, a que Terzi meteria ombros 298. O que signiica
que houve uma espécie de revisão das empresas que o servita
concebera, por parte de outro artista, a quem o Arcebispo quis
sublinhar determinadas intenções 299. Assim, a estrutura elo-
quente do nártex do piso térreo, com a sua forma porticada de
arcos de volta perfeita, cinco ao todo (seguindo os princípios
vitruvianos explanados no Livro IV, caps. 3, 6 e 7), «mostra uma
erudição de desenho da ordem dórica, que se estende à elegân-
cia das colunas caneladas assentes em altos pedestais, com um
correcto entablamento e, ladeando o vão central, dispostas aos
pares com nichos nos intercolúnios» 300. Trata-se, como obser-
vou Soromenho, de uma singular adaptação da travata albertia-
na, união de pilar­arco e coluna­entablamento que airmam a
ideia da fachada como motivo triunfal, ou seja, uma arquitectura
all’antico, que por certo agradaria ao Arcebispo. Convém lem-
brar, de novo, que se trata de um projecto diferente: andar de
cinco arcos e não de apenas de três, como surgia no desenho
aprovado de Casale.

143
Fig. 57 É de crer, assim, que não se respeitou totalmente a traça do
servita, e se quis justamente acentuar esse efeito cénico, belís-
simo, dando ênfase e exagerando a extensão do suposto pódium
sobre o qual se ergue, em escala piramidal, a restante fachada.
Ora essa solução para a estrutura porticada inferior (onde não
por acaso se descobre a data de 1604, que regista a fase de aca-
bamento) mostra que o projecto sofreu alterações substantivas
– e de novo a batuta do Arcebispo e do seu arquitecto Nicolau
de Frias surgem como iguras tutelares do programa de obras.
Claro que tudo foi naturalmente adequado às circunstâncias,
aos meios disponíveis e, sobretudo, à necessidade de acolher os
frades no mais curto espaço de tempo: em 1591 já eles lá esta-
vam albergados, como se provou. Mas existiu uma ideia motriz
e, essa, foi não só muito maturada pelo Arcebispo mas inte-
gralmente levada à prática, e encontra a sua plenitude na mo-
numental frontaria.
No caso da Cartuxa, ter-se-á passado o mesmo fenómeno
que decorreu com a morte de Casale no caso de outras obras
por si desenhadas: e é neste ponto que urge lembrar, mais uma
vez, a crescente importância do arquitecto Nicolau de Frias nas
agendas construtivas do Arcebispo. Nos anos de 1586, de 1587
e de 1588, como vimos, ele aparece-nos a desenhar todos os
projectos de D. Teotónio e a superintender nas obras mais im-
portantes do Arcebispado, ao mesmo tempo que estava no clí-
max a construção, por si dirigida, do Paço Ducal de Vila Viçosa.
Tudo isto nos leva a crer que coube a Nicolau de Frias a direc-
ção e acompanhamento das obras da Cartuxa, com alteração de
vários aspectos do desenho do alçado por Casale, segundo os
desejos precisos do Arcebispo. O rigorismo que a fachada apre-
senta quando comparada com a do Paço de Vila Viçosa, no que
concerne ao seu desenho arquitectónico, em termos de efeito
cenográico, de escala monumental e de detalhismo na deini-
ção dos pormenores, parece corroborar a hipótese de trabalho
que aqui se defende.
Em favor desta tese concorre o facto de serem imensas as
referências a Frias na documentação contabilística, tanto do Ar-

144
cebispado como também da Cartuxa, nos anos inais do século
XVI. Trata-se, é certo, no caso da Scala Coeli, de referências a
contas miúdas (ainda que envolvendo altos quantitativos) com
aquisições de objectos diversos para apoio às obras de cons-
trução que decorriam ou para serviço da comunidade cartu-
xa. Mas esses gastos conirmam, ao mesmo tempo, o grande
envolvimento do arquitecto no magno projecto do Arcebispo.
Entre outras referências, temos notícia da compra, entre No-
vembro de 1587 e início de 1591, de várias peças para serviço
dos monges, que envolvem o arquitecto: «de ferragem do porto
com mil pregos livrados que Nicolau de Frias mandou de lixboa quinze
mil cento e setenta reis», «de huma Romaã grande com seus pregos que
ho dito Nicolau de Frias mandou de lxª que custou dous mil e setecen‑
tos reis», «doze thesouras e doze canivetes que o dito Nicolau de Frias
mandou q. custarão dous mil cento e sesentas rs», «doze fechos de segredo
com suas chaves dobradas que o dito Nicolau de Frias mandou de Lisboa
que custarão noue mil rs», «huma Campainha com sua porqª e ferragem
que Nicolau de Frias mandou de Lixª para a Cartuxa que custou mil e
quinhentos rs», «hum almofariz grande com sua mão que mandou o dito
Nicolau de Frias de Lixª que custou tres mil e oitocentos rs», «Seis mesas
grandes que mandou Nicolau de Frias de lixª e da ferragem e correias,
custaram 15V600, (e) a tavoada das Missas que mandou o dito Nicolau
de Frias de Lixª que custou cinco mil e quinhentos rs» e ainda, já em
1589, registam-se «dous mil rs que Nicolau de frias deu a hum homem
que solicitou as cousas que elle comprou pª a Cartuxa 2V000», e ainda
«novesentos e sessenta digo cinqtª rs que custarão alguns envoltórios e cor‑
das para se liarem as cousas que o dito Nicolao de frias comprou para a
Cartuxa V950» 301. Fez­nos notar Francisco Bilou, em relexão
conjunta em torno destas despesas só aparentemente «meno-
res», que estamos perante aquisições próprias de um término
de obra, como na realidade se tratava: de facto, a casa estava
habitável desde o Verão de 1591 e com vivência comunitária a
funcionar e era preciso dotá-la de bens essenciais, como os que
nestes róis foram contabilizados.
É certo que não existe referência expressa, nem desenhos
de Nicolau de Frias, que o airmem autor da obra da Cartuxa,

145
mas dada a convicção consensualmente aceite de que o projecto
de Casale foi inevitavelmente readaptado às circunstâncias 302,
cremos que coube a Nicolau de Frias algo mais que o acompa-
nhamento da grande empresa de D. Teotónio. E tinha de ser
assim mesmo: Frias não era apenas um hábil tracista de obras
de marcenaria como já se quis fazer crer, pelo facto de ser ilho
de imaginário, e com ele formado, mas um notável arquitecto
de formação romana, e com concepção de obra que o credita-
va, como a ampliação do Paço Ducal de Vila Viçosa à cabeça.
As relações mantidas com o Arcebispo, para quem realizara já
tantas obras de monta, levam à convicção de que era ele o mes-
tre a quem D. Teotónio recorria neeses anos 80 e 90 do sécu-
lo XVI para os seus empreendimentos. A ele se reportam cer-
tamente documentos como a provisão de 12 de Julho de 1598
em que o Arcebispo gasta determinado quantitativo com férias
de pedreiros, cavouqueiros, tijoleiros e servidores actuantes no
estaleiro de obras da Cartuxa 303.
Uma certeza pode ser desde já estabelecida: em 1591 as obras
estavam muito avançadas, a ponto de já nesse ano haver vida
monástica instalada em Scala Coeli, com observância sob tute-
la prioral de D. Luís Telmo ! Tal se depreende de um processo
do Santo Ofício de Évora que envolveu, em 1591, o frade pari-
siense Olivarius Brisom, de trinta e sete anos de idade 304. Este
homem era ilho de Luís Brison, cristão­velho, advogado do Rei
de França no Parlamento de Paris, e de Isabel Faber, também
cristã-velha, e foi preso em 14 de Agosto de 1591, com sentença
a excomunhão maior e conisco de bens no auto­de­fé de 13 de
Fevereiro de 1594. Olivarius Brisom tinha estudado nas Univer-
sidades de Paris e de Poitiers, foi professor de latim no Reino da
Catalunha, ermitão no Convento de Nossa Senhora do Monte
da Virgem na Serra de Ossa, termo da vila do Redondo, e era à
data da prisão noviço no recém-fundado Mosteiro da Cartuxa.
O processo inquisitorial é assaz interessante pois envolve uma
sinistra questão de alegado desrespeito pelas imagens sagradas.
O réu possuía três imagens de Santa Maria do Loreto impressas
em relevo sobre papel branco, que foram apostas ao processo

146
como prova-crime, já que era acusado de as ter amarrotado e Fig. 56
maltratado num acto de iconoclastia: representavam a desloca-
ção da Santa Casa onde viveu a Sagrada Família, transportada
por anjos da Terra Santa para Loreto, Itália, e com a inscrição
S. MARIA DE LORETO ORA PRO NOBIS.
Que se passou ainal ? O noviço cartuxo fora preso por de-
núncia dos monges, desde o próprio prior D. Luís Telmo ao sa-
cristão D. Jorge, ao vigário D. Vicente Brum, ao monge D. Neu-
tel, a D. Luís e a outros religiosos da comunidade, por defender
posições contrárias à religião católica, designadamente posições
luteranas e calvinistas, o que causara grande escândalo nos de-
nunciantes 305. Por especial denúncia do Licenciado Diogo Nu-
nes Figueira, foi dado conhecimento de que já antes de ingressar
na Cartuxa, e enquanto ermitão do convento de Nossa Senhora
do Monte Virgem, termo da vila do Redondo, o francês deitara
ao chão e pisara três estampas de Nossa Senhoras do Loreto, o
que causara muito mal-estar nos assistentes: «o dito Oliuario bri‑
son tomou a dita imagem a esteue pizando com os dedos E depois de a ter
maltratado a despegou apartando as tres dobras de papel huma de outra e
desfeita a lançou no chão de que muito se escandalizarão algumas pessoas
que o uirão». Agravou o caso o facto de que, estando já preso, o
noviço francês teve atitude de desrespeito para com uma imagem
de Nossa Senhora que estava na parede da cela, com escândalo
dos outros detidos. Era seguramente um personagem destemi-
do e com comportamentos ousados, de todo inadequados numa
época de tão grande intolerância religiosa, o que explica que o
processo inquisitorial acabasse três anos depois com a sua con-
denação, sendo Brisom relaxado ao braço secular.
Deste processo do Santo Ofício de Évora é possível extra-
ír algumas conclusões importantes sobre a construção da Car-
tuxa: ica provado que o mosteiro já funcionava no essencial
em Agosto de 1591, mesmo que com obras em curso, pois os
monges viviam na casa, privavam no claustro, dormiam nas ce-
las, e eram em número suiciente quando se impôs excluir da
sua convivência um noviço francês com posições heterodoxas
e comportamentos contrários à iconoilia tridentina...

147
Fig. 7 Um escândalo como este foi seguramente do conhecimen-
Fig. 10 to do Arcebispo e não podia deixar de chocar espíritos tão iel-
mente alinhados com os ditames de Trento. Entre 1587 e 1591,
D. Teotónio, que aliás chegou a viver e a despachar a partir do
Mosteiro da Scala Coeli, fez várias encomendas para a sua opu-
lenta fundação cartuxa: há referências a esculturas que mandou
vir de Madrid, como é o caso do vigoroso Cristo Cruciicado, que
integra o altar maneirista da sacristia (este, certamente «riscado»
por Nicolau de Frias), bem como um Ecce Homo, e outras pe-
ças de imaginária destinadas à igreja e às dependências da Scala
Coeli. O grande Cristo do altar da sacristia é especialmente notá-
vel pela elegante modelação do torso e pela inlamada aura que
exala. Algumas das pequenas esculturas de madeira do mesmo
altar da sacristia seriam, entretanto, alvo de estofo e douramento
pelo pintor-dourador Custódio da Costa e de enquadramento de
talha pelo mestre de marcenaria e entalhador Diogo Nobre 306.
A obra do Mosteiro da Cartuxa foi, portanto, muito célere:
estava pronta, no essencial, em 1591 e já com obras de decora-
ção intestina a decorrer em pleno. As referências na documen-
tação da Cartuxa à presença de Pero Vaz Pereira, com ligações
à construção, ainda que imprecisas, permitem admitir a sua par-
ticipação no término desta fase das obras, tanto no nártex da
frontaria como no claustro pequeno, lembrando-se que num dos
arcos do andar inferior da fachada se insere a data de 1604, que
ixará uma das campanhas já dirigidas por Vaz Pereira.
Em 1598, estando erguido o essencial, com a igreja, a sacristia,
as celas e o vastíssimo claustrum dos monges brancos (o maior
dos claustros portugueses), a vida no mosteiro corria dentro
da normalidade e segundo a regra de São Bruno. No claustro,
um gigantesco espaço quadrangular imaginado como metáfora
do deserto anacorético, com seu laranjal, projectou-se um belo
fontenário central, de planta octógona. Este fontenário teria
sido pensado para ser concebido segundo um desenho que o
próprio Arcebispo D. Teotónio teria solicitado directamente de
França, a partir do modelo do famoso «puits de Moise» existen-
te na chartreuse de Champmol, ainda que depois não tenha sido

148
exactamente seguido em toda a sua complexidade e se optasse
por um modelo clássico de bom recorte 307.
Todavia, a morte de D. Teotónio interrompeu o bom anda-
mento das obras da Scala Coeli durante dois decénios, por falta
de investimento dos arcebispados de D. Alexandre de Bragança
(homem doente, recolhido muitas vezes no Paço de Vila Viço-
sa) e D. Diogo de Sousa (de brevíssimo tempo de governação),
sabendo-se hoje melhor dos esforços que em tempo de D. José
de Melo (1611­1633) se izeram para melhorar a gestão inan-
ceira das avultadas propriedades com que, por testamento de D.
Teotónio, a casa fora dotada 308. De facto, após a campanha de
obras mais directamente ‘teotonina’, que se ultima em 1604, as
obras cartuxas só retomariam o seu curso quando ia avançado
o múnus de D. José de Melo.
É desses anos a belíssima fonte clássica do Claustro Grande,
atrás referida, constituída por três taças de mármore branco as-
sentes cada uma delas em colunas bojudas, com uma moderna
imagem de Nossa Senhora de Fátima (de 1994) por remate, e
com um grande lago no centro 309. Sabemos que essa fonte foi
executada por volta de 1620, ao tempo do priorado de D. Ba-
sílio de Faria, nome escolhido, ao tomar ordens, pelo famoso
historiador e escritor Chantre da Sé de Évora Baltazar de Faria
Severim (1559-1625), o qual professou como cartuxo em 1609,
sendo depois prior das casas cartuxas de Laveiras, primeiro, e
de Scala Coeli, no im da vida.
Muito a esse respeito nos é explicado pela bem documentada
crónica manuscrita com o historial de Santa Maria Scala Coeli
que foi escrita em 1725 por um anónimo carmelita do conven-
to de Nossa Senhora dos Remédios de Évora, onde se elogia
muito o priorado de D. Basílio e se diz o seguinte: «nesse tempo
(1619), vagando o priorado de Evora, largou a Laveiras por Evora (…),
porem no material achou o Convento como o deixara o seu fundador, com
as obras não pendentes mas de todo paradas, porque no mesmo estado: ao
menos não acho que algum outro lhe puzesse mão ou pedra sobre pedra.
Vinha com mão folgada, do que obrara em Laveiras: quis também cá pro‑
var a mão, quis, e pôde continuar a fazer obras dignas da sua mão: poz

149
mão à obra e pôde accabar a claustra grande, a que faltava grande parte:
não sei se fez também algumas cellas, mas cuido que de entam para cá só
se izeram as duas ultimas por ordem delrei D. Pedro que Deos guarde.
Alem de acabar assim esse claustro, lhe poz no meio do seu grande vaam a
famosa fonte, que anima a cerca, pomares e jardim, de lores, pomo de ouro
e outras varias castas de fructos» 310.
Apura-se assim, sem margem para dúvidas, que o elegante
fontenário que centra o Claustro Grande, envolto por sete al-
tos ciprestes plantados em 1960 (e que evocam os sete monges
que então restauraram a ordem, ao reocuparem a casa eborense
a mando do benemérito Vasco Maria Eugénio de Almeida), foi
obrado entre 1619 e 1625. Pensar-se que se trata de obra traça-
da por Pero Vaz Pereira parece hipótese que é por demais cre-
dível, sendo ele o arquitecto que, desde o tempo do fundador,
acompanhara os projectos de Casale e de Frias, e lhes dera ul-
timação em várias partes. Peças como esta fonte dos Cartuxos,
a pia de água benta de Santo António da Piedade, o púlpito de
Santa Maria de Machede, a chaminé de sala do Paço de Vila Vi-
çosa e, ainda, a fonte-tempietto de Elvas, assumem-se como con-
cepção de um mesmo artista.
Também na mesma crónica setecentista se airma taxativa-
mente que foi durante o mandado de D. Basílio que se ultimou a
obra de arquitectura da fachada. A crer no testemunho (que nes-
te caso é manifestamente exagerado no elogio ao governo de D.
Basílio), ele interveio no acabamento (ou alterações) da fachada
com «pompa e bizarria», o que pode ser entendido já como sinal
da ‘barroquização’ introduzida na decoração da cimalha. É evi-
dente que ela não foi feita de raíz, poisjá estava ultimada havia
vinte anos: este Prior apenas deve ter realizado trabalhos de aca-
bamento e decoração da cimalha pois, como se viu, a frontaria es-
tava pronta, no essencial, em início de Seiscentos: «Acabadas estas
pomposas e magestozas obras, empreendeo outra, ainda de maior majestade:
o famozo e admirável pórtico da Igreja nova, de pedraria de Estremos, már‑
mores iníssimos, e lavrados com todo o primor da arte, que a acabarse como
elle o começou, será dos melhores na pompa e bizarria; dará mate forçado
aos mais magestosos pórticos que celebra a fama; mas impediolhe o acabálo,

150
e continuar com a Igreja como desejava, quem tudo embarga, embargando a
vida e cortandolhe os ios: a morte» 311. É de lembrar, para justiicar os
equívocos provocados por esta passagem, que o cronista citado
escreve cerca de 1725, muito tempo após as obras que a fachada
sofreu no inal do século XVII, mas ainda sendo delas conhece-
dor, o que explicará a contaminação de dados em relação à cam-
panha de D. Basílio. Seja como for, sabemos que no tempo de D.
Basílio houve obras na cimalha da frontaria, quase de certeza sob
direcção do arquitecto Pero Vaz Pereira – mas o essencial da obra
da frontaria cartuxa de Scala Coeli, com o seu «magestoso pórtico»,
estava, desde as primícias do século XVII, ultimado...
Nestes anos, a comunidade cartuxa tinha no seu seio pelo
menos um monge-artista de renome: trata-se de D. Tomé, o prior
da Cartuxa que sucedeu a D. Basílio, e que fazia «riscos» para
retábulos e outro equipamento litúrgico. Sabemos que em 1625
foi o responsável pela traça do custoso retábulo da Árvore de
Jessé destinado à Capela de Nossa Senhora do Rosário na igre-
ja do mosteiro de São Domingos de Évora 312. Esse conjunto,
executado pelo carpinteiro de marcenaria João Nobre (parente
do mestre Diogo Nobre tão referido nestas páginas), integrava
numerosas imagens de Profetas, bem como do Patriarca Jessé
e da Senhora do Rosário, lavradas pelo escultor Adrião Pires de
Faria e pintadas e estofadas por três pintores eborenses, Antó-
nio Vogado, Bartolomeu Sánchez e o nosso conhecido Custódio
da Costa. Apesar de desaparecida, esta obra mostra o prestígio
grangeado pela comunidade cartuxa, a ponto de ser chamada a
projectar e desenhar obras de certo vulto.

5 . 3 . O re tá bu lo d a s ac r i s t i a e o u t ro
equipamento artístico

A documentação sobre as fases de decorações da igreja e de-


pendências cartuxas abunda e precisa de ser analisada em sui-
ciência: esclarece-nos sobre os têxteis, pratas, móveis, imagens,
painéis ou livros litúrgicos adquiridos para prover o mosteiro da

151
Fig. 7 Cartuxa com um dos melhores de toda a Península. Infelizmen-
te, as malfeitorias cometidas pela invasão das tropas francesas,
no início do século XIX, a que se seguiu a dispersão do restante
espólio aquando da exclaustração das ordens, depauperaram o
mosteiro de grande parte do seu equipamento artístico. Hoje,
nada existe, salvo no altar da sacristia, nenhum vestígio do que
era o rico espólio de talha, pintura, pratas e têxteis do primitivo
mosteiro da Scsla Coeli.
Resistiu, no espaço tão austero da sacristia cartuxa, o grandio-
so retábulo maneirista que ocupa o altar fundeiro, de planta recta,
um só tramo delimitado por um par de pilastras de ordem jónica,
onde se rasgam nichos com pequenas imagens policromadas, o
friso dórico do entablamento, o frontão interrompido e, ao cen-
tro, uma grande escultura de vulto de Cristo Cruciicado, popular-
mente conhecida como o Senhor Jesus da Cartuxa. Trata-se, assim,
de uma composição horizontal dividida em sotobanco, banco,
corpo único e ático, dentro da tipologia contra-maneirista313. É
peça de excelência, que levou Robert C. Smith a sugerir tratar-
-se de obra castelhana, tanto o entalhe como a escultura314. Esta,
apura-se agora, face aos documentos já referenciados, que veio
de certeza de Madrid, em Outubro de 1589, pela qual o padre
Jerónimo Ardion pagou 7.000 rs 315. É uma magníica peça de
escultura, de uma elegância maneirista contida e com vigoro-
sa modelação anatómica, sendo de lastimar que, por enquanto,
não se tenha achado identidade para o ignoto escultor. Acresce
a qualidade da encarnação, que valoriza o seu pathos expressivo.
Já as duas dezenas de pequenas esculturas em madeira pintada
que ocupam os nichos das pilastras que cingem o vão, com i-
guras de santos desde São Bruno a São Teotónio, a São Pedro e São
Paulo, São João Evangelista, São Marcos, São Bartolomeu, Santo André,
Santo Estêvão e Santa Maria Madalena, e as alegorias à Fé e à Es‑
perança, entre outras, foram com toda a certeza feitas em Évora
no inal do século XVI, tal como todo o conjunto de carpinta-
ria e lavor do retábulo, segundo risco provavelmente da autoria
de Nicolau de Frias, o arquitecto do Arcebisopo, er «mãos» de
Diogo Nobre. Segundo nos assevera D. Antão López, a selec-

152
ção das pequenas imagens anichadas nas ilhargas do retábulo
só na aparência parece enigmática, pela sua aparente diversida-
de em termos cultuais e iconográicos, mas corresponde a uma
selecção (além de São Bruno e de São Teotónio) dos santos que à
época tinham maior devoção em Évora. Por sua parte, a pintu-
ra de estofo de grutesco que reveste, num trabalho com grande
inura de pincel, as bases dos nichos e outros elementos da es-
trutura retavbular, mostra um grau de especialização que leva a
pensar no nome de Custódio da Costa, ao tempo activo na casa,
e a tributar-lhe tais intervenções.
Adivinham-se, a partir da documentação existente, os nomes
dos artistas envolvidos: a obra de entalhe será com toda a certe-
za de Diogo Nobre, o entalhador preferido de D. Teotónio e que
se sabe activo na Cartuxa, seguindo neste caso uma traça de Ni-
colau de Frias; algumas das imagens podem bem ser de Pero Vaz
Pereira, que nos primeiros anos de actividade, além de arquitecto,
serviu como escultor do Arcebispo, sendo de estimar em especial
as esculturas de São Teotónio e de São Bruno, mais cuidadas; o dou-
rado e pintura das mesmas poderá ser devido a Manuel de Araújo,
pintor de têmpera e fresco que também surge referido nas contas
cartuxas precisamente a policromar imagens 316; enquanto a ina
decoração pictórica de pincel com temas de grotesco (incluindo
enrolamentos acânticos, cartelas, aves, candelabra, pâmpanos, lo-
res e mascarões) que se admira nas bases dos nichos, nos frisos,
e no intradorso do entablamento será, como dissemos acima e
com toda a probabilidade, da autoria de Custódio da Costa. Este
pintor era especialista nessa linguagem ornamental, tendo feito
por esses anos, por exemplo, a decoração de grotescos do leito
ducal de D. Teodósio II em Vila Viçosa (desaparecido), e estava
a pintar então na Cartuxa, associado ao escultor Pero Vaz Pereira,
quando este retábulo se fazia 317. Apenas a tábua com a cidade de
Jerusalém que constitui o fundo da escultura do Cristo Cruciicado
destoa, pela sua muito inferior qualidade, tratando-se de decora-
ção refeita em data ulterior.
Pensamos que, pela mesma altura, o Arcebispo discutiu com
o conceituado pintor régio de Filipe II, Fernão Gomes (1548-

153
Fig. 9 -1612), morador na corte de Lisboa, a factura de um grande re-
tábulo para a capela-mor da Cartuxa, mas a empresa parece que
se gorou, por razões ainda não totalmente esclarecidas. Fernão
Gomes era um artista nascido em Albuquerque e formado em
Delft, mas cedo instalado em Lisboa, onde se torna pintor da
corte do rei e grangeia sucesso, tendo recebido informação ar-
tística italiana (se é que não esteve em Itália, como defendeu Ni-
cole Dacos 318) através do já referido Lourenço de Salzedo, que
trabalhou para a Sé de Évora, como vimos, e foi em Abril de
1577 o seu padrinho de casamento 319. Sabemos que em 1591
já se fazia um retábulo para a igreja de Scala Coeli, prova cabal
da rapidez que a construção tomou. Mas desse retábulo resta
tão-só a memória de um projecto que se tem considerado fali-
do: um excelente desenho ou estudo preparatório da autoria de
Fernão Gomes, guardado na Biblioteca Pública de Évora, ain-
da com a quadrícula apontada (prova de que estava pensado já
em termos de transposição de escala) e com a indicação de que
«não se fes». O desenho, onde se mostram várias iguras agitadas
que buscam ascender à Scala Coeli que conduz à presença de Je-
sus Cristo e da Virgem Maria, no alto, é de um arrojo e capricho
maneiristas que surpreende, e que o situa bem dentro dos valo-
res da Bella Maniera, e possivelmente foi por isso que a propos-
ta retabular não teria agradado ao proselitista D. Teotónio, que
pretenderia por certo um painel mais decoroso 320...
Seja como for, há que reconhecer que essas iguras serpenti‑
natas e longilíneas de Gomes tinham público no mercado por-
tuguês, como se vê no magníico retábulo­mor da Sé de Porta-
legre, que o mesmo Gomes pinta por esses anos (c. 1592-1595)
a mando de D. Amador Arrais, onde surgem iguras absoluta-
mente ains em tábuas como a Ascensão e o Pentecostes, sem es-
quecer também a Ascensão do Museu de Arte Sacra do Funchal,
que Fernão Gomes pinta para uma confraria rica da Sé madei-
rense. Ou seja, não haverá que extrapolar em demasia uma ale-
gada posição de D. Teotónio em desfavor do desenho, quando
o que pode ter sucedido mesmo foi tão-só uma impossibilidade
de agenda do próprio pintor régio que levou a que o projecto

154
retabular da Cartuxa não tivesse passado de um mero debuxo
com indicação de «não se fes».
Mas pode ser que estejamos a analisar mal o problema e que,
no im de contas, Fernão Gomes tenha mesmo feito o painel do
avantajado retábulo-mor da Cartuxa, com o tema da Scala Coeli:
que por estes anos se fez um retábulo para o altar-mor da igre-
ja acabada de construir é coisa certa, e o facto de no desenho
se ler a inscrição «não se fes» pode ter outra interpretação, que
nos é dada por uma interessante nota inclusa na contabilidade
do Mosteiro. A 25 de Janeiro de 1602 lançou-se em rol uma sé-
rie de instruções dadas pelo Arcebispo ao Cónego Domingos
Martins, que ia então a Roma 321; a maioria das diligências tinha
a ver com dízimos, rendas e certidões de bens do Arcebispa-
do, assuntos do Colégio das Donzelas, um pleito a tratar com
o Geral da Companhia de Jesus e, bem assim, uma carta secre-
ta para o Papa, mas também se incluíram duas diligências liga-
das a obras de arte para as quais D. Teotónio requeria especial
atenção. Uma delas já foi referido no capítulo precedente e diz
respeito a peças de paramentaria como uma «huma casula, e huma
dalmática de buquexim (que estão) em casa do Sõr Conde Fernão Taverna
(…) para se fazerem outras por ellas», mandando-se desenhos para
serem seguidos no brocado, nos sebastos e nos peris, com in-
dicação das cores. A outra é de especial importância para o as-
sunto do retábulo-mor da Cartuxa: «Levais o retablo do Altar
mor da Cartuxa pera mandar fazer hum em tella pera o modo que vai um
papel dentro do milhor oficial, e seja escolhido pera o Cardeal Tornes» 322.
Ou seja, daqui se infere que D. Teotónio mandou fazer um
desenho do painel do retábulo já existente (desenho este da au-
toria de Fernão Gomes, tal como era também, quase de certeza,
o painel retabular da capela-mor) para que em Roma, a partir
desse modelo, se passasse para tela por mão de um dos melho-
res artistas da Cidade Eterna.
E não é de somenos a referência aos contactos romanos do
Padre Domingos Martins: um deles era o Cardeal Eduardo Far-
nèsio, ilho de D. Maria de Portugal (que pelo casamento com
Alessandro Farnèsio em 1565 se tornara duquesa de Parma e

155
Plasência), a qual era ilha de D. Isabel de Bragança e do Infan-
te D. Duarte; assim sendo, o Carderal era ainda sobrinho de D.
Teotónio, o quer explica o próximo relacionamento. Voltando à
lacónica nota de cujo cumprimento se incumbiu o Cónego Do-
mingos Martins, pode inferir-se que o «não se fes» acrescentado
ao desenho da Biblioteca Pública de Évora dizia justamente res-
peito ao tal modelo do retábulo-mor que se quis mandar para
Roma, já com quadrícula para apoio à sua ampliação na cópia
que se desejava fazer em tela, mas que acabou por não ser exe-
cutado. E pode imaginar-se porquê: o falecimento do Arcebispo,
alguns meses volvidos sobre a partida do Cónego, gorou mui-
tas das intenções expressas no rol, que passaram pelas novas
circunstâncias a não ser prioritárias para o Cabido sede vacante…
A ser assim (e se interpretamos bem este item do documen-
to), Fernão Gomes teria mesmo pintado o grande painel do
retábulo-mor da igreja da Cartuxa, representando a Scala Coeli, e
o desenho que chegou aos nossos dias é o único e por isso pre-
cioso testemunho cripto-artístico dessa obra malogradamente
perdida ! Em qualquer circunstância, é muito interessante que os
cartuxos de Évora tenham desejado, num determinado momen-
to, fazer uma cópia em tela a partir do modelo da composição
do retábulo-mor, pintada em madeira, com o tema da Scala Co‑
eli, com destino, porventura, a outro espaço do cenóbio, e que
tivessem em mira mandar fazê-lo ao melhor pintor de Roma (a
indicar por um seu contacto na Cidade Papal, o Cardeal Tor-
nes). A referência «ao milhor oicial» tanto pode referir-se ao au-
tor do desenho enviado como ao mestre romano que passara o
modelo a tela – ou a ambos. Tudo se gorou: «não se fes»… e basta
imaginar que fosse a morte súbita de D. Teotónio, em meados de
1602, a malograr a empresa de que incumbira em Janeiro desse
mesmo ano o seu cónego Domingos Martins.
Um precioso rol de obras de pintura e tapeçaria que foi re-
alizado, tudo leva a crer, logo a seguir à morte de D. Teotónio
de Bragança em 1602, salienta entre as peças por ele doadas à
Scala Coeli uma série de obras de grande valia: incluem-se na
lista dois trípticos de fechar, certamente lamengos, várias ta-

156
peçarias de fabrico de Bruxelas, uma com a História de Salomão,
outra com a História de Trajano, outra com a saga de Rómulo e
Remo, várias tapeçarias com temas do Antigo Testamento, nu-
merosos retratos de corte incluindo os de Filipe II e da Raínha,
os do imperador Carlos V e da imperatriz D. Isabel, o do prín-
cipe D. Carlos, «treze Retratos de prinçepes»,e um raríssimo e sin-
gular «retrato de huma dama que por engenho lhe bolem as meninas dos
olhos», «huma cruz comtiafeita (sic) que são Tome fez», bem como
um porta­paz de marim, um «retrato da cruz de sam Tome que veyo
da yndia», e diversas pinturas de temário religioso, muitas das
quais certamente destruídas nas ondas vandálicas e nas vendas
ao desbarato que o acervo do mosteiro de Scala Coeli sofreu no
século XIX a seguir à exclaustração 323. A referência a um re-
trato com engenho remete para peças congéneres nas grandes
colecções europeias do Renascimento, onde era requinte usual,
entre outros preciosismos e curiosidades das Gesamkunstwerk, a
presença de retratos com mecanismo, para gáudio dos convi-
dados. Tratava-se, assim, de uma pinacoteca muito importante,
ainda que parecendo um tanto deslocada, face aos temas, para
decorar uma dependência do mosteiro da Cartuxa.
Os acervos de Scala Coeli acolhiam também ofertas gradas,
entre elas peças exóticas relacionados com a diáspora asiática,
tão admiradas por D. Teotónio, sempre atento aos conhecimen-
tos sobre a China, o Japão e a generalidade do Extremo-Oriente.
De seu sobrinho, o sétimo Duque de Bragança D. Teodósio II,
recebeu com destino ao mosteiro da Cartuxa de Évora uma
caixa-escritório recamada de madrepérola, referência que ates-
ta, ademais, a circulação, em data temporã e em círculos da alta
aristocracia, deste tipo de objectos exóticos de iniciativa privada,
oriundos da península do Hindustão, que se destinavam tanto a
casas nobres e à corte (a de Filipe II, I de Portugal, em Lisboa),
como também a conventos e irmandades 324.
O mosteiro da Cartuxa recebeu em várias fases pessoas ilus-
tres que nele buscavam recolhimento e paz espiritual, caso do
chantre da Sé de Évora Baltazar de Faria Severim, tio de Manuel
Severim de Faria, que chegará a professar, como atrás se disse, e

157
será, sucessivamente, prior do mosteiro de Laveiras e, mais tar-
de, do da Scala Coeli, tendo feito obras de vulto em ambas as
casas. No caso da Cartuxa de Laveiras, D. Basílio acompanhou
a traça do mosteiro primitivo, com obras iniciadas pelo arqui-
tecto Teodósio de Frias; no caso de Évora, entre 1619 e 1625
acabou o Claustro Grande, com a sua fonte, bem como as celas
que faltavam, e o que carecia ultimar na frontaria. Também em
anos recentes foi professo na Cartuxa de Évora o historiador
António Francisco Barata.
Mas houve outras iguras gradas da História a buscar nas casas
cartuxas o repouso e protecção religiosa de que necessitavam, es-
pécie de fuga à conturbada vida política: foi o caso do 2º Conde
de Basto D. Diogo de Castro, homem de grande idelidade ao par-
tido ilipino e que foi governador do Reino e detentor de outros
altos cargos 325. Pelo treslado do testamento deste político, escrito
«de memória» a 19 de Setembro de 1631, estando então enfermo e
residindo no «Convento da Cartuxa de Nossa Senhora do Vale da Mi‑
sericordia junto a Lisboa». O Conde de Basto enumera aí os cargos
que teve de vice-rei de Portugal, membro do Conselho de Esta-
do, Regedor da Casa da Suplicação e Presidente do Desembargo
do Paço, numa espécie de auto­biograia que a atmosfera cartu-
xa teria ajudado a redigir, já que, além das habituais obrigações
de missas, de legados, de partilhas e de dívidas e da enumeração
de bens móveis e imóveis, rendas e propriedades, rendimentos
da comenda de Almodôvar e das terras de Basto, etc, nos narra
também vários episódios da sua vida: diz que, logo a seguir ao
seu casamento, partiu para África com D. Sebastião, tendo icado
cativo em Alcácer Quibir e que, sendo resgatado, achou «o Reino
todo revolto» com os sucessos dinásticos e, tomando por sua a cau-
sa ilipina, embarcou na armada do Marquês de Santa Cruz e co-
labora activamente com o partido de Filipe II na luta contra os
partidários do Prior do Crato. Serviu depois o novo monarca em
diversos cargos relevantes, e nesse âmbito realizou muitas deslo-
cações a Castela com gasto de sua fazenda.
O 2º Conde de Basto ordena, assim, que seu corpo seja se-
pultado com as insígnias da Ordem de Santiago cobrindo o há-

158
bito de São Francisco, de que era especial devoto, numa nova
capela tumular que previa erigir para si e os seus antepassados,
sem especiicar onde seria e a ordem religiosa envolvida: «(…)
ainda que a capella mor da Santa Mizericordia da cidade de Evora per‑
tensa a esta caza pella aver comprado e dotado a senhora Dona Lianor de
Ataide, minha avoo, que nella esta sepultada, er que seja desta caza huma
capella que esta na claustra da See da dita cidade, em que estão sepultados
os senhores dom Diogo e dom Fernando primeiros deste nome nesta caza,
ilho e netto do senhor dom Alvaro pires de castro o mosso, meus tresavoo
e bisavô, e assim mais outra capella que esta na claustra de Sam Francisco
da mesma cidade em que estam sepultados os senhores dom Joam de souza
e sua mulher, e posto que Dom Diogo, segundo deste nome meu senhor e
Avoo tivesse tomado o Capitollo de nossa senhora do Espinheiro para seu
enterro, contudo o Conde meu senhor e pai, que santa gloria aja, e eu, dese‑
jamos sempre consertar outro Jasigo para esta caza em que se assemtassem
os antepassados della, e com este intento teve o dito senhor contratado com
os Religiosos de nossa senhora do Espinheiro a capella mor do dito mosteiro
na forma de huns capitollos que estão na minha mão, na qual capella moor
esta em hum caixão a ossada da Condessa dona Felipa de mendonsa minha
mãi e senhora, e per inconvenientes que depois se offerecerão se suspendeo o
effeito do dito contrato, sendo Nosso Senhor servido darme vida, determino
resolver esta nateria e ordenar jazigo para esta caza conforme a este inten‑
to tendo ordenado nelle será meu corpo sepultado no lugar que declararei
quando ordenar o dito Jaszigo, mas não havendo o tal Jazigo a tempo de
meu falesimento, ou não estando acabada a obra delle neste cazo quero e
mando que meu corpo se ponha em deposito no capitollo de Nossa Senhora
do Espinheiro e para isso se meterá em hum caixão que meus testamentei‑
ros ordenaram thé se mudar para o dito Jazigo, que eu deixar feito ou que
o Conde meu ilho izer (…) e o caixão hira em huns varais de andas sem
se chamar ninguém nem aver acompanhamento mais que de doze Religiosos
de nossa senhora do Espinheiro, sendo a sepultura no seu mosteiro, que sen‑
do em outro, lavaram os mesmos doze Religiosos e a Ordem em cuja caza
estiver o Jazigo os mais doze Religiosos» só virá a morrer em Maio de
1638, sendo enterrado no mosteiro do Espinheiro 326…
A «approvação» deste testamento, a 20 de Setembro de 1631,
decorreu no mesmo Mosteiro da Cartuxa de Laveiras, no ter-

159
mo de Lisboa, sendo testemunhas D. Miguel de Castro, ilho do
Conde, António Leal, Sebastião de Faria, António Pereira, Pero
da Graça, Pero Fialho e João Martins da Gândara, seus criados.
As invasões francesas e as vicissitudes sucedâneas à extinção
das ordens religiosas em 1833 agravam o declínio do conven-
to cartuxo, bem como da Quinta de Valbom (comprada pelos
monges após a expulsão dos jesuítas, mas alugada em 1857 a
um grupo de lavradores abastados para de criar uma escola ab-
gríocola), e tudo caminha para um inexorável declínio, que as
fontes da época testemunham com dose de pormenores. Em
1852, o Estado intervém e cria nos espaços da antiga casa mo-
nacal de Scala Coeli a Escola Agrícola da Cartuxa de Évora, que
tem existência efémera. Finalmente, a propriedade é adquirida
em 1871, em arrematação do Ministério da Fazenda, por José
Maria Eugénio de Almeida, que adapta as instalações fradescas
a várias inalidades (sobretudo agrícolas mas, também, a oicina
de fabrico de rolhas de cortiça), estancando-se paulatinamen-
te a ruína 327.
Em suma, e em relação à monumental fachada do Mostei-
ro de Santa Maria Scala Coeli da Cartuxa de Évora, podemos
concluír o seguinte:
1) O Mosteiro de Santa Maria Scala Coeli nasceu em 1587
seguindo num primeiro momento uma traça de Gio-
vanni Vincenzo Casale, aprovada entre outras solici-
tadas pelo Arcebispo;
2) O estaleiro de obras iniciou-se em 1588, sob direcção
do mestre pedreiro Jerónimo de Torres e sob orienta-
ção do arquitecto Nicolau de Frias, estando a casa já
habitada pelos monges no Verão de 1591, e as obras
prontas em 1604;
3) Nicolau de Frias foi certamente o responsável pelos
novos desenhos do alçado, adaptando a traça original
do servita mas adequando a fachada aos princípios e
referenciais neoantigos preferidos por D. Teotónio;
4) Por investimento do Arcebispo, a igreja, sacristia e de-
mais dependências são então decoradas com custosas

160
obras de arte envolvendo os grandes artistas portu-
gueses do im de Quinhentos, assim como com peças
oriundas de Castela, de Florença e de Roma;
5) A cimalha da fachada da igreja só se ultimou em 1619-
-1625 durante o priorado de D. Basílio de Faria e sob
direcção do arquitecto Pero Vaz Pereira, em idelidade
à traça de Casale-Frias;
6) As destruições sofridas durante a invasão de Évora pe-
las tropas castelhanas, com ocupação do mosteiro, em
1663, se não foram tão signiicativas como se tem su-
posto, obrigaram mesmo assim a vultosas reparações;
7) Só no inal do século XVII o mestre pedreiro Ma-
nuel João Penalvo interveio na fachada, daniicada em
1663, revestindo de mármores e enfatizando eventu-
almente a redecoração da cimalha segundo os gostos
da era pedrina;
8) Tudo concorre, assim, para que o Mosteiro da Cartuxa
seja não só a mais importante das iniciativas constru-
tivas de D. Teotónio de Bragança como um dos mais
aprimorados monumentos da arquitectura portuguesa
da Idade Moderna.

161
Notas

274 Túlio Espanca, Inventário…, 1966, pp. 308-313; Padre Francisco da Fonseca,
Evora Gloriosa, Évora, 1728, pp. 377-378; e António F. Barata, Breve mermória históricas
sobre a fundação e existência até ao presente da Cartuxa de Evora, Évora, 1888.
275 Miguel Soromenho, «Classicismo, italianismo e ‘estilo chão’. O ciclo ilipino»,
in História da Arte Portuguesa, direcção de Paulo Pereira, Círculo de Leitores, vol. II,
1995, pp. 377-403, refª p. 390.
276 George Kubler, Portuguese Plain Architecture between spices and diamonds, 1521 to 1706, Har-
mondsworth, 1976, pp. 91-93; e Agustín Bustamante e Fernando Marías, op. cit., pp. 285-286.
277 Nicolau Agostinho, op. cit., p. 68.
278 Maria Antónia Hespanhol, op. cit., vol. I, pp. 321-406.
279 J. Pinharanda Gomes, op. cit., pp. 52-55.
280 B.P.E., Fundo Manizola, Cod. 71, nº 15, 3-9, Pinharanda Gomes, op. cit., pp. 52-
-55, e Maria Antónia Hespanhol, op. cit., I, pp. 451-455.
281 Agustín Bustamante e Fernando Marías, op. cit., pp. 285-286; e Orietta Lanzari-
ni, «Il codice cinquecentesco di Giovanni Vincenzo Casale e i suoi autori», Annali di
Architettura, Vicenza, CISA, 1998-99, nºs 10-11, pp. 188-202.
282 Juan Mayo Escudero, As Cartuxas de Portugal através dos séculos. Crónicas das Cartuxas
portuguesas, vol. 268 de Analecta Cartusiana, editores James Hogg, Alain Girard e Daniel
Le Blévee, Salzburg,. 2011, pp. 81-98 (transcrição do mss. de 1725, citação pp. 81-82).
283 Juan Mayo Escudero, op. cit., p. 83.
284 Juan Mayo Escudero, op. cit., p. 84.
285 Segundo nos informa o Dr. Paulo Lima, autor do levantamento arqueológi-
co da zona do vale da Corte Pinto (Freguesia de Amieira, Concelho de Portel), em
1989-1990, aí foram localizados «muitos locais de interesse patrimonial, e a tradi-
ção de que esse lugar tinha sido habitado pelos frades da Cartuxa». O Dr. Paulo
Lima e a Dra Ana Pagará registam tradições locais de «relatos de encontro de cor-
pos enterrados com roupas de padre, e uma memória muito presente, inclusive,
dum sítio chamado do Tanque ou lagoa dos frades, que ica no sopé do monte. A
umas centenas de metros do monte, para poente, achou-se uma estrutura aparen-
tando ser restos de uma igreja, e o topónimo Monte da Capela». Cf. Carta Arque‑
ológica do Concelho de Portel, C. M. de Portel, 1991, parcela XXXV | oitavo 490.8 |
CORTE PINTO.
286 Arquivo Distrital de Évora, Lº 311 de Notas de Pero Borges, ls. 10 vº­13. Ver
DOC. Nº 27.
287 Juan Mayo Escudero, op. cit., p. 85.
288 A.N.T.T., Prado Cartusiano, em que se mostrão varias Flores, e Plantas que tem lorescido
na Sagrada Religião da Cartuxa, & donde se podem colher grandes frutos para aproveirtamento
dos amadores da Virtude, Manuscritos da Livraria, nº 878, cap. 36.
289 Vitor Serrão, «Um desenho de Fernão Gomes para o Mosteiro da Scala Coeli
de Évora», Monumentos, cit., p. 33.

162
290 O mesmo valor se repete no mss. Prado Cartusiano, A.N.T.T., Manuscritos da Li‑
vraria, nº 878, cap. 36, que gaba a arquitectura como «singular» no contexto do Reino.
291 Juan Mayo Escudero, op. cit., pp. 85-86.
292 Alicia Cámara Muñoz, «El papel de la arquitectura militar y de los ingenieros»,
Felipe II y el arte de su tiempo, Madrid, Visor, 1998, pp. 390-391.
293 Agustín Bustamante e Fernando Marías, op. cit., pp. 277-318.
294 Cf. a este respeito Carlos Pereira Callixto, Fortiicações Marítimas do Concelho de
Oeiras, Câmara Municipal de Oeiras, 2002; António Lopes Pires Nunes, Dicionário de
Arquitetura Militar, Casal de Cambra, ed. Caleidoscópio, 2005; Carlos Margaça Veiga,
A Herança Filipina em Portugal, Lisboa, CTT, 2005; e Joaquim Boiça e Maria de Fátima
Barros, O Forte e Farol do Bugio, Oeiras, Fundação Marquês de Pombal, 2006, p. 43 e segs.
295 Cf. Miguel Soromenho, «A Cartuxa de Évora: novos dados e o mito da sua des-
truição em 1663», Monumentos, nº 26, 2007, pp. 100-105.
296 B.P.E., Cód. CLXVII/ 2­10, l. 259 e segs. Informa­nos Francisco Bilou de
que também no Cód. CLXVII/ 2-5 constam despesas com essa campanha pedrina,
nomeadamente a vinda de Vila Viçosa do ouvidor e mestres para avaliar as obras,
e despesas a «hum Pintor por dous payneis e outras couzas trez mil reys» (l. 111), prova de
que na altura se izeram melhoramentos intestinos.
297 Miguel Soromenho, «As possíveis fontes tipológicas da fachada da igreja», Mo‑
numentos, nº 10, 1999, p. 10.
298 Fernando Bouza Álvares, op. cit., pp. 30 e 297.
299 Agustín Bustamante e Fernando Marías, «Album de Fra Giovanni Vincenzo
Casale», Dibujos de Arquitectura y Ornamentacion de la Biblioteca Nacional. Siglos XVI y
XVII, Madrid, Ministerio de Cultura, 1991.
300 Miguel Soromenho, art. cit. in Monumentos, 1999, p. 10.
301 B.P.E, Cód. CVII/1-28: Inventario de tudo o que o Arcebpo tem dado aos padres Cartuxos
do Mosteiro de eScala caeli desta cidade de Evora, asi dinheiro, pam, como movel, e outras cousas ao
diante declaradas, MDLXXXVIII Annos, ls. 139 e vº, 155, 186 e 270 vº. Cf. DOC. Nº 10.
302 Cf. Agustín Bustamante e Fernando Marías, op. cit., pp. 277-318; e Carlos Ruão,
op. cit., vol. I, pp. 449-458.
303 B.P.E., Fundo Rivara, Arm. III-IV, nº 36, apud Maria Antónia Hespanhol, op.
cit., vol. II, pp. 90-96.
304 A.N.T.T., Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, procº nº 5295. Processo de
Olivarius Brissom. Informação inédita do Dr. Francisco Bilou, a quem agradecemos
a generosidade da informação partilhada.
305 Transcrevem-se alguns trechos deste processo (reproduzindo, com a devida vé-
nia, a leitura de Francisco Bilou): «Anno do naçimento de nosso Senhor Jesu Cristo de mil E
quinhentos nouenta e hum anos aos doze dias do mês de Agosto do dito anno nesta çidade de Eu‑
ora nas pousadas do Senhor Licenciado Hector Gomes Madureira, Vigario geral (…) Em como
hum homem estrangeiro françes de nação por nome Oliuario Brison que Esteue por irmitão Em
nossa Senhora de Monte Virgem termo da villa do Redondo E hora Esta no conuento dos padres
cartuxos de nossa Senhora de Scalla Celi sito em Esta cidade de Euora (…) (l. 53); E logo no

163
dito dia doze deste presente mês de Agosto de nouenta e hum o dito Senhor Vigario geral comigo es‑
crivão foi ao moesteiro de nossa Senhora de Escalla Celi da ordem da cartuxa sito nesta dita cidade
de Euora. E perguntou as testemunhas seguintes. Pero Pereira o Escrevi (f. 54v). O padre dom frei
Luis Telmo prior no moesteiro da cartuxa de Escalla Celli (…) o dito Oliuario Brissom conteúdo
no auto dizia que o papa não era cabeça da igreja E para que erão contas e tantas imagens (…) e
muito afeiçoado as cousas do Mandoma (…) dizia que não eramos obrigados a dar credito aos liu‑
ros dos Machabeos (…) (l. 54). O padre Dom Jorge samcristão do moesteiro da cartuxa desta çi‑
dade de Euora sacerdote (…) E outro dia trocando Elle testemunha com ho dito Oliuario Brisom
lhe ouuio dizer que hum judeu por ser judeu não mereçia que o queimassem (…) E o dito Brisom
lhe respondeo (l. 56) o grão turquo se hum turquo deixa a lei de Mafoma queima o asi tambem
se hum cristão deixa a sua lei he muito bem que ho queimem. O padre Dom Noutel da ordem da
cartuxa no moesteiro de Escalla celi desta cidade de Euora (…) que falando elle com Oliuario Bri‑
som francês (…) lhe disse que era nossa liberdade na ter o liuro da sapiençia (…) lhe disse que
porque não rezaua por horas de nossa Senhora E elle respondeo que o que Estava nos salmos E
o que Estava nas horas (…) E lhe gabou o latim de Caluino E que ca senão defendiam as suas
obras nem as de Lutero (…) (l. 56 vº). Dom frei Viçente Brum Vigario do moesteiro de escala
celi da ordem da cartuxa desta cidade de Euora (disse que achou o réu) muito inclinado as partes do
mandoma dizendo que tinha muito poder E que tinha de sua parte toda a caualaria de frança E
que muitos dos catholicos o segião porque o vião com tanto poder (…) E que o dito Mando, a prome‑
tera ao Papa que Elle lhe daria a Cecilia E o Reino de Napoles (l. 57). O padre Dom Luis da
ordem da cartuxa (…) E hum dia estando elle testemunha (l. 57 vº) na horta com o dito Oliuario
Brison lendo por hum liurinho da schisma (sic) de Inglaterra e nas cousas daquele Reino (…). Nas
pousadas do Senhor Licenciado Aleixo Nunes Leal que ora serue de vigário geral neste arcebispa‑
do por elle dito Senhor foi dito que o Senhor Licenciado Diogo Nunes Figueira gouernador teue in‑
formação Em como Oliuario Brison françes de nação que esteue por irmitão Em nossa Senhora de
Monte Virgem termo da villa do Redondo e hora prezo no aljube desta corte dando lhe huma ima‑
gem de nossa Senhora do Loreto empreça em branco sobre tres dobras de papel grudadas humas nas
outras o dito Oliuario brison tomou a dita imagem a esteue pizando com os dedos E depois de a ter
maltratado a despegou apartando as tres dobras de papel huma de outra e desfeita a lançou no chão
de que muito se escandalizarão algumas pessoas que o uirão (…) (l. 61). Matheus Pires alcaide do
Aljube desta corte Ecclesiastica (…) disse que sua molher e sua ilha disseram a elle testemunha que
ontem vinte e noue deste presente mês de Agosto viera ao dito aljube hum homem E dera aos presos
que lhe davão alguma Esmola humas imagens de nossa Senhora do Loreto brancas em papel e dera
huma das ditas imagens a Oliuario Brison francês prezo (…) (f. 61 vº). E oje trinta deste dito mês
não estando o pai della testemunha em casa antes de jantar, chegou testemunha a vella E oulhou o
que fazião os presos E vio estar o dito Oliuario Brison assentado Em huma cadeira de ilharga pera
os outros prezos E o vio levantar se E chegar aonde Estauão humas imagens que os prezos tem na
parede E tomar dali (l. 62 vº) huma cousa branca (que lhe) pareçeo ser a dita imagem de nossa
Senhora. Acordão (…) chegando a certo lugar no Arcebispado de Euora depio o trajo de soldado
com que ali chegara e se vestio em habito de peregrino e se Recolheo no Alpendre de çerta hermida so‑
frendo nelle muitos frios em tres meses de Inuerno que aly esteue E depois por certa ocasião pera dar
majores mostras de sua falsa penitencia se foi a serra d’ossa E no mais alto fez huma cova por suas
próprias mãos E ali esteue sinco meses e fazia vida solitária e daua mostras de abstinência e se man‑
tinha de esmolas que pedia a portas dos Musteiros que estauam ali vezinhos (…) (l. 183) e tanto
na coua onde estaua o que escrevia erão muitos erros em seus escriptos que depois se acharão (…) E
por ordem que lhe foi dada se recolheo em certo Mosteiro na Cidade de Euora (…) e se fechou em
hum aposento onde se recolheo e se despio (l. 183 vº) escondidadmente do trajo em que andava e
sevestio de habito de Peregrino e se pos em ordem de fugir (…)».

164
306 B.P.E., Cód. CVII/1‑28: Inventario de tudo o que o Arçebispo tem dado aos padres car‑
tuxos... Cf. DOC. Nº 10.
307 Margarida Fonseca e Carlos Boal, «Intervenções de conservação nas fontes do
Claustro norte e do claustro grande», Monumentos, nº 10, 1999, pp. 60-65.
308 Cf. a este respeito Laurinda Abreu e Rute Pardal, A Memória História do Con‑
vento da Cartuxa de Santa Maria Scala Coeliatravés da sua documentação, Évora, Fundação
Eugénio de Almeida, 2011.
309 Aurora Carapinha, «Desertum, Claustrum e Hortus: os horizontes do jardim car-
tusiano», Monumentos, nº 10, 1999, ppp. 20-23.
310 Juan Mayo Escudero, As Cartuxas de Portugal através dos séculos. Crónicas das Cartuxas
portuguesas, vol. 268 de Analecta Cartusiana, editores James Hogg, Alain Girard e Da-
niel Le Blévee, Salzburg, 2011, pp. 81-98 (transcrição do mss. de 1725, citação a p. 97.
311 Juan Mayo Escudero, op. cit., pp. 97-98.
312 A.D.E., Lºs 555 e 556 de Notas de Francisco Gonçalves Pegas, respectivamente a ls.
65-67 vº e 104-107. Segundo informa o Santuario Mariano de Frei Agostinho de San-
ta Maria (t. III, 1718, pp. 345-346), este retábulo da Árvore de Jessé foi apeado em
1683 para dar lugar a um outro, mais imponente, tendo as esculturas dos Profetas
passado para a capela da Quinta do Regalo, em Santiago do Escoural.
313 Francisco Lameira, «A talha (da Cartuxa)», in Monumentos, nº 10, 1999, pp. 25-29.
314 Robert C. Smith, A Talha em Portugal, Lisboa, 1962, p. 36.
315 B.P.E., Cód. CVII/1­28, l. 254. CDOC. Nº 10.
316 B.P.E., Cód. CVII/1­28, l. 8 vº: «Tres mil e seiscentos rs que se pagarão a Manoel de araujo
pintor de aparelhar e dourar sertas Imagens que estão na Cartuxa per provisão feita a 10 de Março
de 1590 em antº Gomez Rºr do pam do celrº». Manuel de Araújo, documentado em Évora de
1584 a 1600, foi um colaborador regular de José de Escovar, com quem emparelhou em
muitas decorações fresquistas, e era também um hábil dourador-estofador de imagens.
317 B.P.E., Cód. CVII/1­28, l. 256, atesta­se a sua actividade para a Cartuxa, ain-
da que não no retábulo da sacristia: «Em 19 de octº (1591) se pagou a Custodio da Costa
seis mil e dozentos rs de pintar huma imagem de nossa Snõra e outras cousas pera a Cartuxa».
318 Nicole Dacos, Viaggio a Roma. I pittori europei nel’500, Roma, 2012, pp. 177 e 244.
319 O casamento de Fernão Gomes, celebrado a 15 de Abril de 1577, teve como
testemunha o pintor Lourenço de Salzedo (A.N.T.T., Lº 1‑Misto de Casamentos da Fre‑
guesia de Santa Catarina de Monte Sinai, l. 17 vº. Refª inédita de Francisco Bilou).
320 Vitor Serrão, «Um desenho de Fernão Gomes para o Mosteiro da Scala Coeli
de Évora», Monumentos, nº 10, 1999, pp. 30-37.
321 B.P.E., Lº 1º da Cartuxa, l. 120. Comunicação inédita de Francisco Bilou. O
referido Cónego jaz numa das capelas adjacentes ao claustro pequeno do Mosteiro
da Cartuxa (ainda decorada com azulejos enxaquetados e cobertura maneirista com
apainelados de massa), em lápide datada de 1610. Era, certamente, a capela privativa
desse Cónego, por si instituída na Scala Coeli.
322 B.P.E., Lº 1º da Cartuxa, l. 120. DOC. Nº 33.

165
323 A.N.T.T., Códices e documentos de proveniência desconhecida, nº 64. Sem data, apre-
senta uma etiqueta na pasta superior da encadernação com a informação Cartuxa de
Évora. Já referido por F. M. de Sousa Viterbo, Noticia de alguns pintores portuguezes e de
outros que, sendo estrangeiros, exerceram a sua arte em Portugal, 1ª série, Lisboa, 1903, pp.
XII-XIII. DOC. Nº 47.
324 Cf. M. Gachard, Lettres de Philippe II à ses Filles les Infantes Isabelle et Catherine éc
rites pendant son Voyage en Portugal (1581‑1583), Paris, 1884.
325 A.H.F.E.A., Inventário… ls. 93­113.
326 D. Diogo de Castro sobreviveu sete anos ao testamento e só virá a morrer em
Maio de 1638, sendo enterrado no mosteiro do Espinheiro Na realidade, os Con-
des de Basto terão jazigo na capela-mor do Mosteiro do Espinheiro, cumprindo-
-se assim o voto do 2º Conde: em 1683, D. Margarida de Castro de Albuquerque,
condessa de Vimioso e sobrinha de D. Violante de Lencastre, a viúva do 3º e últi-
mo Conde, deu cumprimento ao testamento de sua tia na parte correspondente a
esse vínculo. Chamou-se então o arquitecto Mateus do Couto (Sobrinho) para fa-
zer a traça dessa capela e os respectivos túmulos, tendo sido trasladados os ossos
de todos os Castros para essa espécie de panteão familiar, decorado com azulejos
de Gabriel del Barco.
327 Elsa Caeiro, Convento da Cartuxa de Santa Maria da Scala Coeli: Construção, Recons‑
trução e Manutenção de um Espaço Monástico, Évora, Fundação Eugénio de Almeida,
2009-2010, pp. 17-25.

166
6 . A r e v i t A l i z A ç ã o d o c u lt o d e
são mAnços

6.1. A relíquia do primeiro Bispo de


Évora

Desde o início do seu múnus, uma das prioridades do Arce- Fig. 19


bispo D Teotónio de Bragança foi centrar o seu labor pastoral
na dinamização dos lugares de alegado martírio dos santos do
hagiológio eborense, dentro da tradição aberta com os escritos
de André de Resende. A igura lendária de São Mânçio, ou São
Manços, considerado o primeiro Bispo de Évora, martirizado
no tempo do Imperador Trajano e com tradição de culto em
terras alentejanas328, constituíu por isso um objectivo maior na
sua agenda.
Num ambiente cultural de forte tradição humanística como
era a Évora Colonia Romana do século XVI, urbe inovadora onde
arte e memória, piedade e devoção, andaram sempre de mãos
dadas 329, a produção artística deste tempo foi uma espécie de
laboratório qualiicado, iel aos cânones contra­reformistas de
Trento, em uníssono no combate ao protestantismo e na ide-
lidade às arcanas memórias da cidade. Não admira, pois, que
os textos de André de Resende e outros humanistas mereces-
sem do Arcebispo uma leitura especial e um estímulo para re-
forçar o culto das relíquias e a devoção pelos lugares santos,
num afã historicista de relegitimar os pólos hierofânicos da

167
província que, de um ou outro modo, se relacionassem com
cultos paleo-cristãos.
Assim, tendo-se deslocado a Madrid, entre Março de 1590
e Abril de 1592, para tratar de questões do Arcebispado jun-
to da corte, D. Teotónio conseguiu nesse período a necessária
licença régia de seu primo Filipe II para poder receber as re-
líquias de São Manços, existentes num mosteiro de Segóvia.
Já em acórdão do Cabido de 7 de Junho de 1588 se assinalavam
diligências feitas pelo Arcebispo de Évora junto do monarca no
sentido de obter a almejada relíquia 330. A questão revestia-se de
especial signiicado para o Arcebispado português, já que de São
Mâncio (ou Manços), o alegado bispo de Évora que, segundo
a versão que aí circulava, teria sido martirizado no século I da
nossa era, existiam relíquias na Abadia de Villa Nueva de San
Mancio, de Sahagún, e era importantíssimo reavê-las e trazê-las
para a Sé alentejana 331.
As lendas a seu respeito diziam que Mâncio, companheiro de
Jesus Cristo, presente na Última Ceia como serviçal, convertendo-
-se então ao cristianismo, fora alvo de martírio pelos romanos
no tempo de Trajano, avançando-se mesmo o ano de 100 d.C.
como o da morte 332. Umas versões defendiam que fora marti-
rizado no tempo do Imperador Trajano e com tradição de cul-
to em Évora, outras que vivera em tempos visigóticos e fora
vítima dos maus tratos da família judia de quem era escravo 333.
Estudos recentes têm identiicado a Elbora do martírio de São
Manços citada na Passio hispânica como sendo Talavera, na es-
trada romana e tardo-antiga que ligava Toledo a Mérida, e não
a cidade alentejana de Évora 334. Seja como for, no século XVI
acreditava-se em Évora que São Manços era um mártir local e
companheiro de Jesus Cristo e era essa crença que se mante-
ve. Acrescia o facto de existir tradição de certos locais estarem
relacionados com a sua vivência e o seu suplício e, no caso da
aldeia de São Manços, com o culto dos seus despojos. Por isso,
muitas diligências se izeram por parte de D. Teotónio de Bra-
gança para reaver a relíquia, e que estão, aliás, bem documenta-
das na correspondência do epíscope.

168
Eram os anos em que Roma manifestava orgulho por um
calendário de santos da cristandade em que 62% dos patronos
dos dias do ano ou eram romanos ou eram martirizados na Ci-
dade Papal. Os cultos martiriais tornaram-se prioridade maior
da Igreja reformada com a descoberta das catacumbas de São
Calixto, em 1578, e a saída da primeira edição do Martyrologio
de Cesare Baronio. Essa admiratio da Igreja romana pelos Milites
Christi atesta-se em 1591, por exemplo, quando as relíquias dos
santos Papia e Mauro, mártires do século IV, passam de Santo
Adriano in Forum para Santa Maria in Vallicella, ou quando as
relíquias de Santa Flávia Domitila, São Nereu e São Achileo in-
tegram o mesmo tempo, para o efeito sujeito a um «restauro sto‑
rico» dentro dos moldes de Baronio, ou ainda quando as igrejas
de Santa Susana e o próprio Gesú são decoradas com programas
picturais alusivos. O interesse manifesto pelas rovine dos primi-
tivos cristão leva ao surgimento de verdadeiros «arqueólogos»,
dentro da acepção de interesses que o espírito de Trento esti-
mulava, caso do famoso Antonio Bosio (1575-1629), um maltês
que conheceu Pompeo Ugonio, Alonso Ciacconio e o próprio
Baronio, a quem se deve a descoberta da catacumba de Domi-
tila, registando os vestígios (sarcófagos, epigraia, frescos, estru-
turas construtivas) e reunindo materiais para a obra que sairá
póstuma sob o título Roma sotterranea (Roma, 1632), espécie de
inventário das remanescências paleo-cristãs.
Mas também fora de Roma o processo de revalorização de
uma arcana memória paleocristã foi incentivado: como se sabe,
em Milão, São Carlos Borromeu promove o culto de Santo
Ambrósio, que fora bispo dessa cidade no século IV, dentro do
mesmo espírito historicista e renovador. Também fora de Itá-
lia, e no caso da Península Ibérica, se atesta um idêntico rumo
de reivindicação da sua própria memória a partir dos estudos
do cristianismo primevo. É por isso que o caso até hoje muito
ignorado de D. Teotónio de Bragança assume tão grande im-
portância e signiicado. Se é facto que o Arcebispo de Évora
incorporou uma atitude comum a outros epíscopes peninsula-
res – casos de Burgos em torno de Santa Casilda, ou de Aragão

169
em torno de Santa Engrácia e Santa Orosia, por exemplo –, que
buscavam legitimar os velhos cultos paleocristãos nas suas dio-
ceses, parece certo que procurava cumprir um desígnio coin-
cidente, de maior amplitude. Segundo se conclui num recente
ensaio de Cécile-Vincent Cassy, essa revalorização dos cultos
matriciais levada a cabo pelos bispos espanhóis era movida por
um não escondido esforço de reivindicar frente a Roma o peso
de uma «cristandade de cunho hispânico» 335, e o mesmo pro-
pósito deve sem dúvida tributar-se também, no caso português,
a D. Teotónio de Bragança – facto que não pode deixar de ter
signiicativa importância histórica.
De Novembro de 1590 existe uma carta do Arcebispo por-
tuguês irmada em Madrid e dirigida a Monsenhor Muzio Pas-
samonte, Núncio Apostólico, entre outras dirigidas a Philippe
Séga, e Bispo de Piacenza, designado cardeal em 1591, redigidas
em castelhano, onde trata de assuntos de política internacional,
como a situação que levara a que a França «se librara de manos
de los hereges», mas também os temas relacionados com as igre-
jas da sua Arquidiocese em idelidade com os ditames de Sisto
V. Numa outra carta de D. Teotónio ao mesmo padre Philippe
Séga, conidencia que «hame dicho que ay unos monjes de S. Bernar‑
do muy capuchinos y de grande Religion y penitencia, deseo plantarlos in
mi Iglesia...». Refere enim, sem especiicar, alguns assuntos que
tratara com o próprio rei Filipe – um dos quais era, decerto, o
da almejada posse da relíquia de São Manços, que tanto deseja-
va levar para Évora 336.
A relíquia em causa era constituída por um osso do braço
(outras fontes falam, com menor rigor, em cana da perna) 337
e foi efectivamente recuperada por D. Teotónio nas diligências
feitas junto do monarca seu primo, aquando dessa sua viagem a
Madrid, o que constituiu um considerável sucesso pessoal. Aliás,
na temporada em Madrid, cidade em que se delongou por causa
de uma carregada agenda, foi tratado com todas as deferências,
mostrando mais uma vez que ele era visto, mais do que como
um Arcebispo da Monarquia Dual, como um príncipe da casa de
Bragança 338. De regresso a Portugal em ins de Março de 1592,

170
o epíscope entrará primeiro com a relíquia em Elvas, terá de se- Fig. 13
guida, no dia 3 de Abril, uma solene recepção em Vila Viçosa,
da qual existe relato minucioso (e que revela, ou pelo menos não
esconde, alguns desaguisados seus na corte dos Bragança, pois
não esteve presente em algumas das cerimónias realizadas no
Paço) 339. Só chegará a Évora alguns dias volvidos, com entrada
triunfal, cortejo até à Catedral e festejos que se multiplicaram
um pouco por toda a Arquidiocese 340.
Diz o seu biógrafo Nicolau Agostinho que foram grandes as
solenidades à chegada da relíquia em 7 de Abril de 1592, tendo-
-se organizado uma grandiosa procissão até à Sé, acompanha-
da pelo Cabido, o clero regular e secular, as irmandades, os i-
dalgos e o povo, incluindo os habitantes de São Manços, com
música e orações. A relíquia icou exposta na Sé, «onde está mui
decentemente em um sacrário no altar‑mor, seu devido lugar», como re-
fere uma fonte do tempo. Quanto ao relicário, que o Arcebispo
trouxe de Madrid, peça em prata e cristal em forma de pirâmi-
de, já atrás destacámos o seu simbolismo tridentino, ligado a um
certo tratado romano do arquitecto Domenico Fontana e com a
exaltação da Roma triumphans. O relicário, de excelente qualidade
artística, constituído por uma pirâmide de cristal de faces envi-
draçadas e guarnecida de ouro e rematada com globo de prata
com cruz latina, conserva-se no Museu de Arte Sacra da Sé de
Évora 341, e deve ser obra de ourives escurialense, pelo menos
foi oferta do rei e tipologicamente aim a outros que então se
produziam, também em forma piramidal, nesse Real Mosteiro.
Já se referiu a inluência dessa forma simbólica e triunfal, tipi-
camente tridentina, bem como o papel do arquitecto de Sisto
V, Domenico Fontana, na sua difusão.
À chegada a Évora, e face ao clima de júbilo que se viveu
na cidade com a posse da relíquia, D. Teotónio ordenou que se
incrementasse o culto a São Manços, o que passou por várias
etapas: mandou fazer outro relicário similar, para quando a re-
líquia saísse, a um ourives habilitado da sua arquidiocese (acaso
o calipolense João Luís); avançou com diligências para que se
ampliasse a igreja da freguesia de São Manços, aldeia tradicio-

171
Fig. 11 nalmente ligada ao primitivo culto do santo bispo e que muito
Fig. 14 crescera, sob estímulo dessa tradição; mandou que, antes de se
realizar essa obra, em 1594, se izessem escavações nas estruturas
antigas existentes no sítio, na expectativa de recuperar vestígios
relevantes; incentivou a fundação de uma confraria de homens
bons sob a égide e patronato de São Manços, que efectivamen-
te se criou; buscou criar uma iconograia credível do santo342; e
empreendeu esforços, junto da Câmara, para que se valorizasse a
coluna alegadamente da lagelação do santo, embutida num dos
troços da muralha junto às Portas de Moura, e que aí se izes-
se uma ermida com a mesma invocação do bispo São Manços.

6.2. Os templos dedicados a São


Manços

A partir de Abril de 1592, urgia desenvolver, como diz o


mesmo biógrafo Nicolau Agostinho, o culto de São Mâncio, ou
Manços, «na freguesia de invocação do Sancto, que está a quatro Legoas
da Cidade, onde seu corpo esteve antiguamente, depois de ser achado nos
monturos fora da dita Cidade por hum Lavrador, a quem elle appareceo
em sonhos, para que lhe desse sepultura, que o levou à sua Herdade, onde
lhe fez huma Egreja, em que esteve venerado ate às Guerras, e perdição
de Hespanha: no qual tempo foy levado a Castella, onde lá icou…» 343.
Assim, D. Teotónio envidou esforços para que a igreja da
freguesia de São Manços fosse ampliada e enobrecida segundo
as traças para o efeito concebidas. Essas traças deviam manter
a imponente estrutura arqueológica existente, alegadamente
paleo-cristã, e a 11 de Março de 1594 iniciou-se a obra de em-
preitada do templo, pelo pedreiro eborense Diogo Martins 344.
Trata-se de uma igreja de escala imponente a que se adossa, na
ousia, um corpo de pedraria robusta, que datará, dando forma
à tradição, do século IV d.C. e que confere ao conjunto um ca-
rácter cenográico inusual. Esta campanha teotonina constitui
um bom exemplo daquilo que consideramos ser a arquitectura
contra‑reformista teotonina marcada pelo sentido de renovação que

172
tem base nas doutrinas baroniana em que tal estratégia se ins- Fig. 16
creveu. Bom leitor dos teóricos de Trento, D. Teotónio desejou Fig. 17

ligar no seu múnus a este esforço historicista de reclamar iden-


tidade eborense na vasta História da Igreja triunfante, em vés-
peras do Jubileu Católico de 1600. Assim, existiu da parte da
Arquidiocese de Évora, nestes anos de transição para o século
XVII, um esforço notório de «lançar pontes entre dois univer-
sos facilmente irredutíveis, caucionando as referências à Anti-
guidade clássica com as lições dos textos bíblicos» 345.
Ainda a respeito da relíquia de São Manços, escreve Agosti-
nho Nicolau em 1614 que o Arcebispo desejou «fazerlhe uma igreja
na parte onde na Cidade foy martirizado: como por tradição se diz: à Por‑
ta de Moura, onde està huma coluna de pedra mármore, metida na parede
do muro, com hum Cruciixo em cima: à qual dizem foi atado, quando em
seu martirio o açoutaram» 346. Em Fevereiro de 1599 o Senado da
Câmara pediu ao Arcebispo que tomasse por sua conta a nova
ermida «de avocação do dito santo», fundada no «lugar em que consta
que ho bem aventurado S. Mançio foi marterezado segundo consta por tra‑
dição antiquíssima e esta huma coluna donde assi mesmo se airma que foi
atormentado», ao que o Arcebispo aquiesceu, digniicando o mi-
núsculo templinho 347. Essa capela embutiu-se na Casa Soure no
corpo da torre da primitiva cintura romana, junto às Portas de
Moura, com seu nicho parietal para conservar a piedosa coluna‑
‑calvário de pedra mármore. Por ser lugar de concorridas pere-
grinações dos eborenses e dos que visitavam a cidade, impõs-
-se a sua decoração, o que foi cumprido de seguida, a esmero,
à custa de um devoto da cidade chamado Baltazar Vieira, que
mandou azulejar as paredes, pintar de brutesco o tecto e fazer
um retábulo com a iconograia do santo 348.
Nesta capela existia (até ser, em boa hora, retirado para cabal
preservação no Arquivo da Sé) um precioso pergaminho ilumi-
nado, com data de 1596, onde se lê o texto latino de doação da
relíquia ao Arcebispado de Évora e se admiram, na parte infe-
rior, três belos medalhões com cartelas maneiristas envolvendo
as meias­iguras dos santos mártires São Manços, São Primitivo e
São Facundo, com as respectivas legendas que dizem S. MAN-

173
Fig. 15 CIVS, S. PRIMITIVVS e S. FACVNDO. A iluminura atribui-
Figs. -se ao pintor do Arcebispo, o holandês Duarte Frizão 349. Aqui,
18-21
o santo Bispo de Évora aparece-nos como mancebo, jovem de
túnica violácea, com palma de coroa de mártir e segurando um
frasco de água que simboliza o lava-pés na Última Ceia. A pre-
sença, a ladear São Manços, dos mártires-irmãos São Facundo e
São Primitivo, também nada tem de estranho: explica-se porque
eram, ambos, os patronos da cidade de Sahagún. Assim, a no-
meação conjunta dos três santos faz todo o sentido, e justiica
a sua presença na iluminura do pergaminho de 1596 350.
A capelinha de São Manços da Coluna, tal como era designada
na gíria popular, está forrada de azulejos polícromos de padrão de
maçaroca e possui um retábulo tardo-maneirista com quatro telas
tenebristas do segundo quartel do século XVII, assim como com
um tecto pintado de brutesco, do im dessa centúria. O retábulo,
de morfologia epimaneirista, inclui a imagem em madeira poli-
cromada do orago, no nicho central, como bispo com o báculo,
o jarro de água e a salva do lava-pés, seus atributos. As quatro
telas, distribuídas pelas edículas em volta, representam a prisão
de São Manços, o seu martírio do santo, a sua lagelação, e os
trabalhos a que foi submetido, segundo as crónicas, quando foi
obrigado pelo pretor a servir de cabouqueiro e fazer outras ta-
refas de pedreiro contra sua vontade. Trata-se de um conjunto
pictórico iconograicamente muito interessante, posto que de
nível secundário em termos plásticos, onde se desenvolve, com
acerto, o conceito baroniano de uma pedagogia de martírio, ou
seja, um tema puramente tridentino 351. Não sendo já do tempo
de D. Teotónio, e sim, provavelmente, do de D. José de Melo,
relectem um programa iconográico que foi estabelecido na al-
tura da chegada da relíquia e de que com toda a certeza existiram
mais testem unhos. Estas telas serão obra do pintor Bartolomeu
Sánchez, um dos artistas com maior actividade vem Évora na
primeira metade do século XVII. Trata-se de um pintor ‘tene-
brista’ originário de Las Penas de San Pedro em Múrcia, que se
instala na cidade no início de Seiscentos e que tem actividade
documentada de pintor de óleo e dourado em várias igrejas e

174
conventos eborenses, bem como na Sé de Elvas (onde pintou e Fig. 22
dourou a antiga capela do Sacramento) e, ainda, na Misericór-
dia de PorteI (onde existe uma tela da Visitação da sua autoria,
de 1632), sempre de nível secundário 352.
À falta de base para narrar os «milagres» e «histórias» que
eram pretendidos, o artista recorreu a gravuras correntes da
Paixão de Cristo saídas, por exemplo, no conhecidíssimo livro
póstumo de Jerónimo Nadal, Evangelicae Historiae Imagines (An-
tuérpia, 1593), e em outras fontes, adaptando-as à nova repre-
sentação hagiológica de São Manços. Vem à margem lembrar,
a respeito dessa fonte iconográica, que o padre Jerónimo Na-
dal (1507-1580) passou por Évora em 1553, com o Provincial
dos jesuítas Padre Diogo Miram, vendo as obras do Colégio do
Espírito Santo, que se iniciavam 353, facto que tem interesse na
presunção de que o famoso historiador, a quem se deve uma
das mais marcantes ixações iconográicas dos Evangelhos, pode
ter deixado marca das suas propostas iconográicas nos contac-
tos então estabelecidos. Voltando às telas do Oratório de São
Manços, o forte tenebrismo das pinturas acentua a pretendida
carga dramática num espaço exíguo onde o verdadeiro objec-
to de veneração era a secular coluna da lagelação, embutida na
parede mas visível do lado exterior por uma abertura na mura-
lha. Estas telas do oratório de São Manços têm o interesse de
legitimar uma nova iconograia necessária para a solidiicação
de um «culto novo», tal como sucedeu com outros programas
de hagiológio desenvolvidos pelo Arcebispo.

6.3. As bAses do ‘restauro storico’

Os critérios de intervenção de D. Teotónio de Bragança no


campo das rovine alentejanas que lhe interessaram recuperar
pautaram-se pelo que era norma na Roma contra-reformista e
fora deinido pelos textos do oratoriano Cardeal Cesare Baronio
(1538-1607) 354. A necessidade de a Igreja Católica responder
aos ataques dos protestantes explicitados nas famosas Centúrias

175
de Magdeburgo (Basileia, 1559-1574), repondo a defesa do ideal
evangélico e reforçando o conhecimento da sua própria Histó-
ria, levou então a um esforço desmesurado no sentido da inves-
tigação das fontes e de uma nova consciência de salvaguarda do
património construído, designadamente o medieval e, mesmo, o
paleo-cristão. Como sintetiza Gaetano Mirelli Mariani, «rinascità
paleocristiana e ricerche antiquaria sono quindi le una necessá-
ria all’altra» 355 e é no sentido desse conceito de narrativo rerum
gestarum com que Cesare Baronio via a História que se percebe
a força das decisões que conduziram a uma política restaurativa
como nunca se vira.
As obras de Baronio, e de outros autores, em torno do con-
ceito reformado de restauro storico, assentavam na recolha de
fontes arcanas passíveis de legitimar as opções tomadas face ao
património pretérito, e tal se passou em Roma como nos imen-
sos territórios da cristandade 356. Entre a prática de um restauro
devoto, onde impera o sentido de uma orgânica de culto acima
do respeito pelas preexistências do edifício, e a paulatina cons-
ciência de um restauro storico já atento à arquitectura a interven-
ciar, sujeita a investigação histórico-documental, a campanhas de
arqueologia de sítio e a «restauro» de estruturas sobreviventes,
emerge a revalorização desta segunda via. O arquitecto de Sis-
to V, Domenico Fontana, foi um dos grandes intérpretes desse
pensamento, ora concebendo novos espaços (como a Cappella
del Presepe em Santa Maria Maggiore, uma espécie de «nova Be‑
lém» desse papado), ora intervindo, em Roma, na recuperação
e readaptação de velhos lugares de culto paleo-cristão espalha-
dos pela cidade 357.
O papel de Baronio, «peritissimus antichitatis», autor atenta-
mente lido em Évora nos círculos de D. Teotónio, foi essencial,
dado o prestígio que grangeara como historiador, como «res-
taurador» de lugares hierofânicos e como mentor dos critérios
de restauro storico e recuperação, manutenção e reinterpretação
das pré-existências paleo-cristãs e medievais 358. Desde que che-
ga a Roma em 1556, e contacta com o ambiente dos oratorianos
e com o próprio São Filipe Neri 359, a sua formação religiosa e

176
historiográica reforça­se, metendo mãos a longos e difíceis tra-
balhos de revisão de fontes como o Martyrologium romanum (que
ultima em 1583 e será editado em 1586, com várias reimpres-
sões) e a compilação dos Annales ecclesiastici (doze tomos, edita-
dos em 1588-1607). Nomeado Cardeal com o título dos Santi
Nereo e Achilleo em 1596, já então se impusera como erudito
estudioso das tipologias arquitectónicas paleo-cristãs e especia-
lista no restauro dos seus monumentos, bem como no campo
da função da imagem sacra e do culto das relíquias 360. Era, por
todas estas razões, igura incontornável na bibliograia disponi-
vbilizada nos círculos teotoninos onde os seus arquitectos Ni-
colau de Frias e Pero Vaz Pereira, e pedreiros como Jerónimo
de Torres, seguramente discutiriam alguns desses postulados.
O interesse de D. Teotónio pelos programas comemorativos
jubilares mostra também franca atenção às teses de Baronio sob
o prisma da valorização das funções simbólica e didascálica da
arte, como o atesta o esforço desenvolvido com os velhos cul-
tos (São Manços, em particular). É evidente (e de lamentar) que
nada de escrito remanesça nos fundos eborenses equiparável
ao processo de restauro da igreja carolíngia dos Santos Nereo
e Achilleo em Roma (1596-1602), ou do oratório junto a San
Gregorio Magno al Celio (1602-1607), ou ainda da igreja de S.
Cesareo in via Appia (intervenções de 1597-1603), sem esque-
cer o «restauro» especíico aquando da trasladação das relíquias
dos santos Nereu, Aquileo e da mártir Domitila – obras para
as quais existem planos debuxados, notícias de escavações pre-
liminares, indicações criteriosas sobre os cuidados a ter face às
pré-existências arqueológicas e artísticas, e ressonâncias das dis-
cussões teórico-práticas com os arquitectos e artistas envolvidos.
O conceito baroniano de «restauro storico» ediicou­se precisa-
mente com tais intervenções, de claríssimo pendor historicista
e patrimonial no sentido que visava legitimar a auctoritas católi-
ca e reforçar a sua identidade secular, sem diminuir a intenção
de cumprir uma espécie de «restituzione» das estruturas originais.
Quando vemos, no Oratório de São Manços em Évora, o modo
como a coluna da alegada lagelação do santo foi restituída à de-

177
Fig. 15 voção pública e a um sentido memorial inteligível, transferindo-o
para um lugar de exposição e culto, estamos face ao que Baro-
nio izera, nos citados monumentos da velha Roma paleo­cristã,
movido pelo sentido da «conservatione dell’antichità».
A opção tomada por Cesare Baronio face ao mosaico absi-
dal da igreja dos Santos Nereo e Acchileo, ainda coevo do pon-
tiicado de Leão III (795­816) e em estado de ruína, ordenando
a recuperação daquilo que de original se mantinha bem como
o necessário preenchimento das lacunas usando o stucco pinta-
do a têmpera com tons integradores, foi em absoluto uma ati-
tude que poderá chamar-se moderna. Um desenho da Biblioteca
Vallicelliana mostra o estado em que se encontrava o mosaico
de Leão III nessa igreja carolíngea à data em que se procedeu
ao restauro baroniano, o que atesta os máximos cuidados do
Cardeal em preservar escrupulosamente as existências, como
revelam estas indicações: «al pintor si ordina che essendo il mosaico di
gran valore storico esso debbia esser restaurato afinchè tutte le parti man‑
canti siano instasurate in modo a non ledere la opera musiva. Si relievi
tutto il mosaico e suoi colori et nelle parti mancanti si proceda ad un into‑
naco colorato et si faccia la consolidatione delle parti che tuttora pervennero
in dai tempi antichi» 361. Para os espaços despidos de decoração
da mesma igreja, do século VIII d.C., Baronio ordenou a fac-
tura de frescos inspirados naquela linguagem, numa espécie de
revivalismo ilológico­artístico das fontes, mostra uma via re-
novada de intervenção no campo do património que é de ab-
soluta modernidade.
No Oratorio de San Andrea de Roma, por exemplo, ainda
persistem, graças a Baronio, parte dos frescos medievais, que
puderam ser conservados na sua intervenção. Também se pre-
ocupou em deixar testemunhos das existências, antes de quais-
quer intervenções mais profunda no sentido da reconstrução
e revalorização da obra em causa, ou de assegurar memória da
pré-existência através de intervenções que poderíanmos chamar
‘revivalistas’, passe o termo, caso das pinturas a fresco de tipo
neo-paleo-cristão que surgem em algumas das referidas igrejas
da velha Roma paleo-cristã e medieval, atestando a ancianida-

178
de das mesmas 362. Ora é precisamente a mesma atitude tomada
por D. Teotónio de Bragança quando funda o Oratório de São
Manços, na muralha romana onde era tradição ter sido o san-
to lagelado, e ao mandar pintar na cimalha da coluna dita do
martírio do santo um Cristo na cruz deliberadamentre arcaizante !
O sentido baroniano de «restituzione dell’antichità dei luoghi» con-
gregou o interesse de teólogos, intelectuais e artistas e teve eco
signiicativo nos anos precedentes ao grande Jubileu de 1600 363,
abrindo perspectivas de estudo da simbologia cristã que terão
fortuna na História da Arte dos séculos XVII e XVIII e marca-
rão, mesmo que já sem consciência da sua origem, alguns dos
critérios de intervenção patrimonial dos nossos dias. Na Évora
desse longo tempo do Renascimento que foram os anos do humanis-
mo cristão e das pesquisas de Resende, ideias como as de Baro-
nio e de outros teóricos da Contra-Reforma ligados às questões
do património pretérito não podiam deixar de ser acolhidas com
interesse, o que explica a opção de D. Teotónio em relação aos
lugares de culto que urgia recuperar. Existiu, assim, uma pos-
tura de arqueólogo avant la lettre 364 na prática do Arcebispo ao
mandar escavar sítios onde existiam ruínas de suposta presen-
ça paleo-cristã, reconstruindo ou construindo de raíz corpos
de igrejas acopladas a tais ruínas (como sucedeu na aldeia de
São Manços em 1594), ou onde era tradição existirem relíquias
de mártires, como sucedeu no pretenso túmulo de São Torpes,
em Sines, escavado em 1590 a mando do próprio Papa Sisto V.
Os valores baronianos foram também digeridos por D. Frei
Bartolomeu dos Mártires, o cultíssimo dominicano que esteve
como delegado no Concílio de Trento e foi Arcebispo de Braga,
faltando ainda um estudo a respeito da sua conduta no campo da
reconstrução e decoração das igrejas do seu Arcebispado e dos
seus resultados, mas é sobremaneira interessante o manuscrito
baroniano da Biblioteca Vallicelliana com apontamentos sobre
a importância do Reino português na consolidação do cristianis-
mo na Península e o papel relevante que na Reconquista cristã
tivera o Arcebispado de Braga 365. Foi com este sentido de va-
lorização patrimonial que o restauro storico de Baronio se impõs,

179
como recomendação e como prática: modo de assegurar uma
memória identitária, de valorizar a dimensão hierofânica dos
lugares de culto, e numa adaptação das existências consistente
com os vestígios conservados. Não é de esquecer, entretanto,
uma igura como António Fernández de Córdoba (nascido em
Bellpuig d’Urgell em 1550 e falecido em Valladolid em 1606),
homem com presença em Roma junto da cúria papal, até pelo
facto de ser um exacto contemporâneo de D. Teotónio de Bra-
gança e de poder imaginar-se que ambos estabeleceram contac-
tos, durante as estadas do Arcebispo em Castela (coisa que não
está documentada). Mas importa relevar que existem coincidên-
cias de comportamento no campo que vimos referindo, pois
Fernández de Córdoba, que foi membro do Conselho de Estado
e embaixador em Roma, teve papel inluente (e parece que po-
lémico) junto a Sisto V a respeito das disputas jurisdicionais de
Espanha com os arcebispos de Nápoles e de Milão, imiscuindo-
-se também em questões artísticas, pelo que as ideias baronianas
e as orientações referidas não lhe seriam estranhas.

180
Notas

328 Paulo Farmhouse Alberto, Santo Adrião, Santa Natália e São Manços, Lisboa, cole-
ção «Santos e Milagres da Idade Média em Portugal», vol. 8, Edição Traduvárius, 2014.
329 A documentação notarial eborense abunda de referências a escritores e homens
de letras de nomeada, caso do próprio André de Resende, que surge a assinar como
testemunha num contrato de 20 de Junho de 1548 (A.D.E., Lº 27 de Notas de Fernão
de Arcos, l. 41 vº) e de novo em 20 de Abril de 1570 (A.D.E., Lº 45 de Notas de Fernão
de Arcos, l. 20), o cosmógrafo­mor do Reino Dr. Pedro Nunes a testemunhar numas
procuração de 19 de Fevereiro de 1573 (A.D.E., Lº 172 de Notas de Pedro Rodrigues, l.
52 vº), a poetisa Públia Hortensia de Castro, que nos surge a assinar um contrato de
1577 (A.D.E., Lº 130 de Notas de Álvaro Ramalho, l. 67 vº), e o poeta, militar, escri-
tor e também pintor Jerónimo Corte-Real, que era do Conselho de Sua Magestade
(A.N.T.T., Lº 51 de Notas de Belchior de Montalvo, ls. 97 vº­98 vº), citado em Évora em
1573 num arrendamento (A.D.E., Lº 113 de Notas de Álvaro Ramalho, ls. 106 vº­109),
que em 1586 era provedor da Misericórdia de Évora (A.D.E., Lº 292 de Notas de Pedro
Borges, ls. 86 vº­97) e foi, também, juíz da Irmandade das Almas em Santo Antão, em
cujo altar se encontra a tábua São Miguel e as Almas, que lhe está atribuída. Também
se atesta, abundantemente, a documentação notarial a respeito dos Severim de Faria.
330 Cf. a este respeito Luis A. García Moreno, «Judíos y Mártires Hispano-Cristianos»,
Boletín de la Real Academia de la Historia, t. CCX, caderno III, 2013, pp. 377-403.
331 Cf. María Fernández Catón, San Mancio: culto, leyenda e reliquias. Ensayo de crítica
hagiográica («Fuentes y Estudios de Historia Leonesa», 30), León, 1983; Pedro Cas-
tillo Maldonado, Los Mártires Hispanorromanos y sus Cultos en la Hispania de la Antigüedad
Tardía, Universidad de Granada, 1999, e Paulo Farmhouse Alberto, op. cit.
332 Francisco Galvão, erudito eborense, numa carta a Manuel Severim de Faria
(1641), defendia essa data: «San Mançio discípulo de Xº bpo de Evora, segundo Jeronimo Oso‑
rio, martirizado cerca do ano 100 em tempo de Trajano como dizem auctores de mta conta» (B.P.E.,
‘Portuguezes insignes ou q. forão pessoas notáveis ‘, MSS 29, nº 47­123, l. 63).
333 Paulo Farmhouse Alberto, op. cit.
334 Luis A. García Moreno, op. cit., e Paulo Farmhouse Alberto, op. cit. Segundo aque-
le autor, a Elbora da Passio s. Mantii seria Talavera, e Miliana, a propriedade agrícola
onde decorre a acção com Millanes, a aldeia de Navalmoral de la Mata. O complexo
martirial descrito no texto teria inspiração num edifício octogonal em Las Vegas de
Pueblanueva que serviu de basílica paleocristã (sendo na origem um mausoléu tardo-
-romano). Os argumentos de García Moreno são muito interessantes, ainda que es-
barrem com o facto de também em Évora (a citada Elbora ?) existirem, na aldeia de
São Manços, vestígios imponentes do alegado conjunto martirial descrito pelo hagi-
ógrafo e que foi base dos textos de Resende.
335 Cf. o recente ensaio de Cécile-Vincent Cassy, Les Saintes Vierges et Martyres dans
l’Espagne du XVIIème siècle. Culte et Image, Madrid, Casa de Velázquez, 2011, p. 183 e
segs («une sainteté espagnole»).
336 Bibliothèque Nationale de France (B.N.F.), Département des manuscripts, Français
3979 «Collection Mémoires de la Ligue. Recueil de lettres et de pièces originales (1501­1600), ls.
156-157. Agradece-se ao Dr. Francisco Bilou a comunicação inédita.

181
337 B.N.P., Mss. 29, nº 47/3, Arcebispo D. Teotónio de Bragança, l. 217: «Reliquia de S. Mãços
que trouxe em 1592. Vindo o Arcebispo Dom Theotonio de Madrid, onde tinha ido por ocasião da
grande diferença que neste tempo tem durado com os freires das ordens militares de Santiago e S. Bento
de Avis, trouxe consigo huma relíquia da cana da perna de S. Manços, que está no altar mor da Sé,
veio pousar com ella ao Mostrº de Santo Antº a … de abril de 592 e dahi se fez huma procissão solene
Domingo 7 dabril do dito anno com toda a clerezia e cabido e freguesias e confrades de S. João, S. Tiago,
S. Francisco, e pôs se a relíquia na Se (…), o cónego Martim Afonso de Melo fez a 1ª missa solene».
338 Conhecem-se, por exemplo, pagamentos do coche em que se fez transportar
o Arcebispo, despesas com o cocheiro que o serviu, contas com um relojoeiro ma-
drileno a quem encomendou um relógio com despertador, e a outras aquisições re-
alizadas (B.P.E., Fundo Manizola, Nº, nº 19).
339 B.N.P., Cód. 146, Relação da Entrada da Reliquia de S. Manços (em Vila Viçosa),
adiante transcrito (DOC. Nº 25), ls. 17­23.
340 A.S.E., Lº 11 de Acórdãos, 18 e 20 de Outubro de 1591.
341 Artur Goulart (coord.), Tesouros de Arte e Devoção, Exposição de Arte Sacra, Évora,
Fundação Eugénio de Almeida, 2006, nº 119.
342 Cf. Túlio Espanca, Inventário…, 1966, pp. 40, 42, 93 e 374. Optou­se pela igu-
ra de um santo bispo, com báculo, segurando a jarro e a bacia, símbolos do lava-pés.
São todavia raros os testemunhos da iconograia de São Manços que subsistem, além
da imagem de madeira policromada (que tem esses atributos) e das telas do Oratório
de São Manços da Coluna, existe uma tábua de c. 1550 no Museu de Arte Sacra da
Sé (atribuída a Sebastião Lopes, um pintor activo para o Cardeal D. Henrique) onde
o santo mártir igura em corpo inteiro, com o jarro numa mão e a salva do lava­pés
na outra, trajando como apóstolo, junto a outros santos em meio corpo. De assina-
lar também o pergaminho muito citado de 1596, onde se representa em meio corpo,
como mancebo e mártir e não como bispo, segurando a palma e um frasco, além da
tela seiscentista da Galeria de Retratos de Arcebispos e Bispos.
343 Nicolau Agostinho, op. cit., cap. V, pp. 21-22.
344 A.D.E., Lº 309 de Notas de Pero Borges, ls. 36­38 (DOC.Nº 27). Sabemos que
este pedreiro neerlandês, irmão da Santa Casa da Misericórdia, faleceu em Évora a
15 de Agosto de 1597.
345 Celso Mangucci, art. cit., 2014, p. 35.
346 Nicolau Agostinho, op. cit., cap. V, pp. 21-22.
347 B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 10, apud Maria Antónia Hespanhol, op. cit.,
vol. II, p. 115.
348 Túlio Espanca, Inventário…, 1966, pp. 92-93.
349 Artur Goulart, in Tesouros de Arte e Devoção, Fundação Eugénio de Almeida,
2006, nº 118.
350 Segundo Paulo Farmhouse Alberto e José Cardim Ribeiro, a quem agradece-
mos a informação, eram mártires leoneses de obscura origem e cujo culto não parece
ter sido anterior à época moçárabe. Cf., também, Carmen García Rodríguez, El culto
de los santos en la Roma romana y visigoda, Madrid, Consejo Superior de Investigaciones
Cientiicas, 1966, pp. 245­246.

182
351 Alessandro Zuccari, «Baronio e l’iconograia del martirio», Cesare Baronio tra
santità e scrittura storica, Roma, Viella, 2012, pp. 445-501.
352 Arquivo Distrital de Évora, Habilitações De Genere, Maço 18, Procº 648. Bartolo-
meu Sánchez já estava instalado na cidade em 1612, e morreu em 1641. Tem activi-
dade conhecida em igrejas de Évora, na Sé de Elvas e na Misericórdia de Portel. Foi
pai do também pintor Pedro López Vállejo. Sobre o artista, cf. Vitor Serrão, «Fran-
cisco Nunes Varela e a pintura em Évora no século XVII…», cit.
353 B.P.E., Cód. CXXX/1-10: Padre Manuel Fialho, Evora Illustrada, manuscrito do
início do século XVIII, tomo III, 1ª parte, cap. 12, l. 29 vº.
354 Gabriela Casella Teixeira, O Senso e o Signo. A relação com as préexistências români‑
cas (1564‑1700). Contributos para uma História do Restauro Arquitectónico em Portugal, tese
doutoral, Universidade de Lisboa, 2004, vol. I, pp. 47-60.
355 Gaetano Mirelli Mariani, «I ‘cristianesimo primitivo’ post-tridentino e alcune
incidenzesui momento del passato», L’Architettura a Roma e in Italia (1580‑1621), Atti
del XXIII Congresso di Storia dell’Architettura, Roma, 1988, vol. I, pp. 135-166.
356 A.D.E., Habilitações De Genere, Maço 18, Procº 648. Bartolomeu Sánchez já se
achava instalado na cidade em 1612, e morreu em 1641. Foi pai do também pintor
Pedro López Vállejo. Sobre o artista, cf. Vitor Serrão, «Francisco Nunes Varela e a
pintura em Évora no século XVII…», cit.
357 Archivio di Stato di Roma, Camerale I, 1527.49: Libro del signor cavalier Domenico
Fontana architetto, ove sono notate tutte le spese fatte nelle fabbriche innalzate dalla gloriosa memo‑
ria di Papa Sisdto V dall’anno 1585 al 1589.
358 Lucrecia Spera, «Cesare Baronio, ‘peritissimus antiquitatis’, e le origini della arqueologia
christiana», in Cesare Baronio tra santita e scrittura storica, Roma, ed. Viella, 2012, pp. 393-423.
359 Alessandro Zuccari, «La politica culturale dell’Oratorio Romano nelle imprese
artistiche di Cesare Baronio», StArte, nº 42, 1981, pp. 171‑193.
360 Existe um conjunto fundamental de estudos a este propósito nas actas do Con-
gresso Baronio e l’arte – Atti del Convegno internazionale di studi, Sora, 1984.
361 Gabriela Casella Teixeira, op. cit., vol. II, pp. 2-3.
362 Alessandro Zuccari, Arte e committenza nella Roma di Caravaggio, Torino, 1984, pp.
52-53. O rigor metodológico e escrúpulo intelectual de Baronio levaram-no a ordenar,
antes de qualquer intervenção, umja cópia do mosaico, conmserfvada como testemunho
na Biblioteca Apostolica Vaticana (cf. A. Guerrieri, La chiesa dei Ss. Nereo ed Achilleo (nº 16
da Collezione ‘Amici delle Catacombe’), Roma, Città del Vaticano, 1951, pp. 115-118).
363 G. Incisa della Rocchetta, «Cesare Baronio restauratore di luoghi sacri», in Atti
Cesare Baronio. Scritti vari, cit., Sora, 1963, pp. 323-332, refª p. 330.
364 Cf. Carlos Fabião, «Para a História da Arqueologia em Portugal», Penélope – Fa‑
zer e Desfazer a História, nº 2, 1989, pp. 10-26.
365 Cf. Eduardo Duarte, «Uma viagem a Itália no século XVI: D. Frei Bartolomeu
dos Mártires, a arquitectura, a escultura e as porcelanas», Arte Teoria, nº 12-13, 2010,
pp. 221-229. Sobre o manuscrido da Biblioteca Vallicelliana de Roma, cf. Gabriela
Casella Teixeira, op. cit., vol. I, pp. 167-171, e vol. II, doc.º nº 3.

183
7 . o u t r o s c u lt o s r e n A s c i d o s e
n o vA s i c o n o g r A f i A s

7 . 1 . O s s a n t o s m á r t i r e s d a To u r e g a

Nos campos da freguesia rural de Nossa Senhora da Assun- Fig. 37


ção da Tourega, não longe do paço e conventinho do Bom Jesus
de Valverde, onde já o Arcebispo Cardeal D. Henrique estade-
ava e D. Teotónio amiúde lhe seguiu os passos, foram por esta
época desenvolvidas pesquisas arqueológicas de valorização do
sítio ligado ao martírio das Santas Comba e Inonimata, irmãs
de São Jordão, um bispo-mártir de Évora aqui activo durante a
ocupação romana. O historial, já de si lendário, carece de fon-
tes literárias objectivas, sendo ainda a mais completa a forneci-
da por um escritor eborense do tempo de D. João IV chamado
Francisco Galvão, que envolve o seu relato de intuitos naciona-
listas, próprios da parenética anti-castelhana 366.
São difusas as memórias do local, citado embora por André
de Resende e por outros humanistas, como Diogo Mendes de
Vasconcelos e Manuel Severim de Faria, mas subsistem as pro-
vas materiais, já que nas terras do Monte do Barrocal, no sítio
da Tourega, não longe da igreja de Nossa Senhora da Assunção,
ainda se admiram ruínas de uma ermida que era de invocação
de Santa Comba e, junto desta, a chamada Fonte Santa (a que
Resende apelida de Cova dos Mártires), alegando-se ser o lugar de

185
Fig. 38 suplício desses cristãos que foram vítimas, no início do século
Fig. 39 IV, das perseguições movidas pelo pretor Daciano 367. O facto
de a matriz da Tourega preservar uma importante campanha
de obras teotoninas não assegura, só por si, que tivesse havido
nessa altura campanhas arqueológicas tendentes à sacralização
do sítio; mas a verdade é que nessa altura se ergueu a referida
capela dedicada a Santa Comba, junto ao lugar do alegado mar-
tírio, que é templinho da segunda metade do século XVI, hoje
totalmente em ruínas, e que se implantou no mesmo terreno
onde existiriam velhas estrururas que, em tempos imemoriais,
lhe asseguravam culto e aos demais companheiros cristãos.
Se todas estas ruínas foram valorizadas durante o múnus de
D. Teotónio, é algo de que, como se disse, não existe certeza
absoluta, mas a força da tradição, que fala também de ruínas no
lugar da Fonte Santa – onde teriam tombado as cabeças degola-
das destes mártires –, não inirma que se trate de um dos luga-
res hierofânicos revalorizados pelas campanhas arquiepiscopais
do inal de Quinhentos.
A igreja matriz da Tourega, dedicada a Nossa Senhora da
Assunção, aparenta um simples projecto do século XVI pleno,
mas na realidade é de origem pelo menos quatrocentista (já es-
tava erguida no ano de 1469 estando sufragânea ao Cabido da
Sé de Évora) 368. Com a campanha de remodelação que sofreu
(como tantas outras igrejas arquidiocesanas) no im do século
XVI, a matriz da Tourega assumiu um gosto maneirista «refor-
mado», que torna a possibilidade de intervenções profundas no
tempo de D. Teotónio nos «lugares santos» muito credível, por
coincidir com a política de incremento de revalorização de cultos
hierofânicos que justamente o Arcebispo assumira. Aliás, junto
ao templo existem também as ruínas de um paço senhorial que
a tradição diz ser dos Cogominhos, e que terá servido de acolhi-
mento nas passagens dos agentes do Arcebispado no tempo do
Cardeal D. Henrique, ele próprio visitante do sítio 369. Os sinais
de ancianidade eram então evidentes e múltiplos, com a ermida
de Santa Comba, a Fonte Santa e, recolhida na capela-mor da
igreja vinda de uma próxima e muito importante villa romana, a

186
pedra tumular epigrafada de Quinto Júlio Máximo, que serviu Fig. 40
de base de altar, tendo mais tarde passado para o adro, antes de Fig. 41

ser recolhida no Museu de Évora.


A presença deste monumento romano «recristianizado» no
contexto do culto, dentro da igreja, valoriza essa impressão de
ancianidade paleo-cristã que se quis perpetuar, e que estava mui-
to viva no tempo em que o Dr. Francisco Galvão escreve o seu
relato sobre a Tourega 370. Aí se diz, também, que no início do
século XVII um dos priores, padre António Mendes, possuía
um pergaminho que valia como espécie de atestado à santida-
de do sítio, lugar de suplício dos referidos santos, o qual ainda
foi visto e creditado por Manuel Severim de Faria 371. Os factos
artísticos são o melhor testemunho: a capela-mor da igreja da
Tourega, de planta semi­esférica, sofreu mesmo obra signiica-
tiva no inal do século XVI, adquirindo uma cobertura belíssi-
ma em obra de massa com decoração em forma de vieira, com
uma decoração de stucchi que se estende ao intradorso do arco
triunfal e que envolve o retábulo. Este, de boa estrutura lavrada,
conserva no nicho central a imagem da padroeira (já do século
XVIII, tendo a primitiva desaparecido), também com uma viei-
ra no remate semi-circular que o encima. Em volta, distribuem-
-se nove tábuas de excelente pintura, quatro delas ladeando o
nicho e cinco outras, mais pequenas, na predela. As tábuas re-
presentam, à esquerda, São Cristóvão e o Bispo São Jordão (e não
São Brás como se tem dito), e à direita São João Baptista e Santo
António pregando aos peixes. Na predela, ao centro, admira-se São
Pedro entre Santo Antão e São João Evangelista, numa única tá-
bua e aos lados, da esquerda para a direita, os meios-corpos de
São Lourenço, Santo André, São Paulo e Santo Estêvão. Algumas
iguras apresentam cabeças de vincada execução, mas os efeitos
causados pelos inábeis retoques, feitos com objectivo de desta-
car cores mais sumidas, são evidentes.
É muito interessante que na encomenda feita pelo Cabido
tenha sido escolhida a representação do Bispo São Jordão, um dos
mártires eborenses da propaganda oicial de então, e cuja pre-
sença fazia todo o sentido nesta igreja, em lembrança das suas

187
irmãs e companheiros martirizados nas perseguições de Dacia-
no. Trata-se de pinturas muito interessantes, de desenho cui-
dadoso e, apesar dos maus tratos do tempo, com uma matéria
pictural transparente e delicada. Podemos identiicar o artista:
são obra do mesmo artista que executou, cerca de 1560, as tá-
buas retabulares da Ermida de São Brás, em Évora, que repre-
sentam a Pregação de São Brás aos animais e os Martírios de São Brás
372
. Também é da mesma mão uma excelente Lamentação sobre o
corpo de Cristo, procedente dessa Ermida e hoje exposta no Mu-
seu de Évora sob designação «Mestre de São Brás» e como sen-
do do 3º quartel do século XVI (nº de invº ME Pint.3220). Nas
duas tábuas com passos da iconograia de São Brás, na Ermida
do mesmo titular, os detalhes de paisagem situam-se dentro da
melhor tradição lamenga, é assinalável o rigor de desenho dos
animais, tecidos, armas e adereços, assim como a elegância das
poses e das soluções compositivas, aspectos que mereceram o
elogio rasgado do historiador de arte Adriano de Gusmão 373.
São do melhor que a pintura eborense produziu, depois de Gre-
gório Lopes e do retábulo do Santo Lenho (1537), e só encon-
tram correspondente nas obras de Diogo de Contreiras para
São Bento de Cástris (1550-1560) e nas de Francisco de Cam-
pos para a Sé (c. 1565-1574)! Ora as tábuas da igreja da Tourega
têm ainidades inegáveis de estilo com estas da Ermida de São
Brás: mesmo desenho, mesmos pessoalismos, mesmo repertó-
rio de rostos e tecidos, mesma tipologia de segundos planos…
São, por conseguinte, da mesma mão.
O conjunto pictural da Tourega é um dos retábulos de exce-
lência que subsiste, do século XVI avançado, no aro eborense,
facto que se reconhece e exige das tutelas um eforço no sentido
do seu restauro cientíico. Tem­se chamado a esse artista, à fal-
ta de identidade, Mestre da Tourega. Pensamos que a designação
se deve manter, alargada às outras peças da mesma mão que se
citaram. Porém, e quanto à identidade deste pintor ao serviço
do Arcebispo, que tem personalidade erudita, com pormenores
de uma delicadeza de miniaturista, podemos avançar um pouco
mais: presumimos que venha a ser identiicado com Duarte Fri-

188
zão, o pintor neerlandês que esteve ao serviço de D. Teotónio,
o que não é nada improvável. Se Duarte Frizão foi também o
autor das iluminuras do pergaminho de 1596 com autenticação
da relíquia de São Manços, a probabilidade autoral reforça-se.
Sobre as ruínas do sítio da Tourega, quer a ermida quer a
Fonte Santa, ambas em completo abandono, exigem interven-
ção arqueológica e, de seguida, um trabalho de consolidação das
suas estruturas. Do altar da pequena ermida desapareceram as
imagens de São Jordão, Santa Comba e Santa Inonimata, ainda refe-
renciadas no im do século XVIII. Todavia, ainda restam vestí-
gios de decoração mural, muito diluídos. Estamos face a um dos
lugares hierofânicos que o Cabido contra-reformista eborense
revalorizou, não se sabendo ainda ao certo de que modos, mas
que com toda a certeza era alvo de concorrida devoção, ainda
documentada no início do século XVIII, a crer num minucioso
relato da freguesia de Nossa Senhora da Assunção da Tourega
que atesta não só a passagem de viajantes como um incremen-
to do surto peregrinatório junto à Fonte Santa e à Ermida de
Santa Comba 374. Em ins de Setecentos, a fonte ostentava uma
inscrição onde se lia TEM ESTA FONTE TAL VERTUDE /
QVE MATANDO DA SAVDE. 1780. O abandono acelerado
destas velhas estruturas, hoje em propriedade agrícola, foi cau-
sa da sua gradual ruína.

7 . 2 . S ã o To r p e s e m S i n e s

Neste período que precede o Jubileu de 1600, outros velhos


santuários e lugares alentejanos com tradição hierofânica e liga-
ção a presumíveis cultos fundadores foram alvo da atenção do
Arcebispo, atestando o seu interesse pelas origens do Cristianis-
mo no território sob sua administração pastoral.
Temos a certeza que interveio nos campos próximos de Si-
nes, no litoral alentejano, em busca de relíquias de São Torpes,
porque o seu biógrafo Nicolau Agostinho é nisso taxativo. Mais
sabemos que foi o Papa Sisto V (1585-1590) a ordenar a D. Te-

189
otónio que investigasse o assunto. O empenho de D. Teotónio
de Bragança em dinamizar e vivenciar os velhos lugares hiero-
fânicos do seu Arcebispado levou-o também, em 1592, a inves-
tigar certas informações recolhidas e a desenvolver escavações
junto à vila de Sines depois de, um ano antes, se ter localizado
o sítio arqueológico do «corpo de San Torpes que na mesma perdição
de Hespanha foy enterrado, & cuberto de areas nos alisserses da igreja
donde antes fora venerado» 375.
O corpo de São Torpes, mártir cristão do tempo de Nero,
martirizado por volta de 67 d.C. e cujos ossos vieram parar mila-
grosamente ao litoral de Sines, segundo o maravilhoso lendário,
passou a usufruir de concorridas romagens à igreja entretanto
erguida no local onde se guardavam as suas alegadas relíquias376.
Os preceitos construtivos seguidos nesta empresa foram, como
tudo leva a crer, os recomendados pelo restauro storico do Car-
deal Cesare Baronio, autor também citado a propósito por um
anónimo memorialista, bem informado quanto ao historial em
causa 377. A escavação de Sines permitiu, por um lado, detactar
e recolher o «casco da cabeça», a «pomazinha quebrada de barro» e até
«a estampa de pedra preta debuxada» 378, relíquias essas que passa-
ram a ser venerados na matriz da vila, e construír um templo
junto às estruturas postas a descoberto e consideradas à data
como sendo de um antigo lugar de culto paleo-cristão. Infeliz-
mente, pouco se sabe dessa ermida. Trata-se, mais de uma vez,
de uma intervenção teotonina onde imperou o espírito histo-
ricista e a ideologia «reformada», movida pelo zelo de recupe-
rar memórias perdidas sobre as origens do cristianismo no ter-
ritório arquiepiscopal, com soluções pensadas à luz da teoria e
prática baronianas.
Casos como a ampliação e «restauro» da igreja da freguesia
rural de São Manços em 1594, e a obra do templo dedicado a
São Torpes, mostram respeito pelas préexistências e o prévio
papel da veriicação histórico­arqueológica no terreno, seguin-
do os preceitos de Cesare Baronio e outros escritos congéneres,
sob signo de Trento. No caso de São Torpes (um mártir pisano
de nome Salvio Torpes), estamos perante um soldado conver-

190
tido ao cristianismo, que fora valido de Nero e que, sendo mar-
tirizado, foi lançado ao rio Arno numa jangada com um galo e
um cão. Segundo a tradição, as suas relíquias, clandestinamente
conservadas depois do seu martírio, teriam sido trazidas para o
litoral alentejano. Ainda segundo o maravilhoso lendário, uma
cristã chamada Celarina, a quem um sonho teria avisado das cir-
cunstâncias em que iria achar os ossos do santo na praia junto
a Sines, teria protegido os ossos do santo, gerando assim um
grande foco devocional que se perpetuaeria pelos séculos. Tam-
bém alvo de martírio, no tempo do Imperador Domiciano San-
ta Celarina seria alvo de surto devocional, a par de São Torpes.
Esta era a lenda. Conhecedor dela, o Papa recorreu a D. Te-
odósio de Bragança para averiguar os factos. O pedido de Sisto
V para que o Arcebispo izesse diligências para descobrir o lugar
de enterramento das relíquias desse mártir, algures no lugar da
Junqueira, atesta antes de mais o respeito que D. Teotónio gran-
geava nos círculos papais. A partir do inquérito e da campanha de
campo a que se procedeu, narrados por um escritor do tempo de
D. João V, Estêvão de Lis Velho (1691-1748), médico e erudito
local com fortes ligações aos oratorianos, numa bem informada
monograia sobre as antiguidades de Sines 379, foi descoberto em
1591 um túmulo de mármore com um esqueleto sem cabeça e
com uma lápide alusiva a São Torpes e uma segunda alusiva a
uma outra igura lendária, a referida Santa Celarina. Esta senhora
cristã teria, segundo a lenda, recolhido as relíquias e criado um
pequeno santuário em honra de São Torpes, razão que levaria a
que, durante as perseguições de Domiciano, fosse martirizada
no mesmo lugar380. Um testemunho do pároco de Sines, já ao
tempo da Restauração, informa-nos que o reconhecimento das
relíquias se fez, em 1592, consultando pessoas qualiicadas, entre
eles o engenheiro militar Alexandre Massai, que à data morava
em Sines, e identiicou o esqueleto decapitado como sendo o de
São Torpes, recordando-se no seu singular testemunho, aliás, de
ter visto o crânio do mártir em Itália, antes de vir para Portu-
gal 381... Os vestígios achados na escavação e identiicados com
sendo destes dois santos, Torpes e Celarina, foram mandados

191
recolher na igreja matriz, onde vieram a perder-se, muito mais
tarde, em circunstâncias nunca esclarecidas.
Com D. Teotónio de Bragança, veio a erguer-se na ocasião
uma igreja junto às ruínas, dedicada a São Torpes, e também, ao
que diz a tradição, uma ermida dedicada a Santa Celarina, esta
junto ao mar na ponta leste de Sines – mas falecem as notícias
concretas a respeito de quando e como foram erguidas, que culto
geraram, e o que lhes sucedeu. Apesar do sailêncio que prevale-
ce, há aspectos que estão esclarecidos: deve-se a Ricardo Este-
vam Pereira 382 a mais completa investigação a respeito de São
Torpes e do seu culto, a partir do que sobre o assunto escreveu
Lis Velho e, mais tarde, o erudito arcebispo D. Manuel do Ce-
náculo Vilasboas Neto, que também se interessou pela lenda e
buscou estudar o assunto.
É interessante veriicar a ligação que se percebe entre D.
Teotónio de Bragança, o arquitecto lorentino Giovan Vincen-
zo Casale, e o sobrinho deste, o engenheiro militar Alexandre
Massai, radicado em Sines e não por acaso chamado a vistoriar
os achados arqueológicos de São Torpes. Descobrem-se, assim,
elos relacionais entre todas estas personagens, o Arcebispo, o
primeiro arquitecto da Cartuxa e o engenheiro militar, em torno
de uma questão tão relevante como era o descobrimento destes
achados de mártires paleo-cristãos. A circunstância de se tratar
de uma região acabada de saír de um forte surto epidémico, no
Campo de Ourique de Sines, mais valorizava este descobrimento,
que criava um pólo de devoção popular e não podia deixar de ser
visto como uma mais-valia memorial por parte das populações.

7 . 3 . S ã o R o m ã o , « S ã o Vi c e n t e d a s
irmãs», São Brissos…

Base para alguns dos cultos que renascem foi a segunda edi-
ção do livro de André de Resende. Saíu em 1576 pela oicina
de André de Burgos a segunda edição da Historia da antiguidade
da cidade de Euora / fecta per meestre Andree de Reesende. E agora nes‑

192
ta segunda impressam emendada pelo mesmo autor, onde defendeu a Fig. 43
origem eborense dos santos Manços (Mâncio), Vicente, Sabina, Fig. 31

Cristeta, Cucufate, Torcato, Jordão, Comba, Inonimata, e ou-


tros, e desenvolveu o estudo histórico e arqueológico dos bens
paleo-cristãos da Arquidiocese. Foi uma das grandes fontes do
interesse por estes temas nas eras henriquina e teotonina.
O culto a São Romão, um mártir paleo-cristão que é conside-
rado o advogado contra a raiva, também interessou as autorida-
des arquiepiscopais e mereceu cuidados no sentido de impulsio-
nar o seu culto. Este santo (que não deve ser confundido com
o homónimo diácono de Antioquia martirizado em 303 d.C.,
durante as perseguições de Galério) foi um soldado romano do
século III que, pertencendo à guarda de Valeriano (253-260), se
converteu ao cristianismo. A conversão, diz a Legenda Áurea de
Tiago de Voragine, sucedeu após ter assistido ao suplício de São
Lourenço, sendo por isso decapitado às ordens do Imperador,
em 9 de Agosto de 258, que passou a ser o dia da festa do santo.
O culto a São Romão em terras portuguesas é residual, ainda
que as Memórias Paroquiais de 1758 apontem alguns casos, todos
eles enfatizando o papel do santo como protector contra a rai-
va dos cães danados. No Alentejo, existiu culto: na própria Sé,
houve um altar dedicado a São Romão, para o qual Francisco de
Campos, cerca de 1570, pintou um quadro representando San‑
to Amaro, São Bento e São Romão; na Ermida de São Matias, no
termo de Évora, existe um altar com a imagem do santo, sete-
centista; e ainda sabemos da titulação a São Romão no altar co-
lateral direito da Ermida de São Brás, no qual existe a imagem
setecentista 383. Em todas se representa o santo mártir como
jovem soldado. Nos frescos do Santuário de São Brissos (San-
tiago do Escoural), porém, ele apresenta-se-nos como um gen-
tilhomem da era ilipina, com chapéu de plumas, gibão, meias
golpeadas, espada à cinta, numa reinterpretação livre da igura
de soldado romano…
É importante dar a conhecer que em Panóias, no actual Dis-
trito de Beja, existiu um foco cultual importante dedicado a São
Romão, que envolveu o redescobrimento de alegadas relíquias

193
suas. Nessa vila baixo-alentejana ainda eram veneradas, no prin-
cípio do século XVII, as relíquias do mártir São Romão, como
se deduz de um instrumento de procuração feito em 1622 pe-
los oiciais da Câmara local a António Soares Homem, morador
em Lisboa, «sobre huma feira franca na villa de Panoias à conta da san‑
ta relíquia do bem aventurado são Romão cujo corpo está na mesma casa,
e a ossada no termo desta vila na (capela ?) anexa à matris desta villa»
384
. O comendador da vila de Panóias, D. António de Miranda,
e o prior da vila, tomavam então diligências para que as festivi-
dades em honra do santo se izessem, com a concordância do
Arquiepiscopado de Évora.
O culto a São Vicente, alegado mártir de Évora, e a suas ir-
mãs Sabina e Cristeta, também teve especial incremento com
o governo arquiepiscopal do Cardeal D. Henrique, a quem se
deve a formosa igreja ab quadratum, de um racionalismo contra-
­reformista que justiicou estudo detalhado a Paulo Varela Go-
mes, sensibilizado pela sabedoria italianizada que o projecto
encerra 385. Todavia, a origem eborense destes santos é tudo
menos provável, tratando-se de mártires referidos na Passio Le‑
ocadiae e aí relacionados com Ávila, lugar de martírio, e com o
lendário de Santa Leocádia, e a referência a Elbora como sua
origem dirá mais respeito a um lugar junto a Talavera, segundo
as fontes; tinham festa a 28 de Outubro, já citada nos calendá-
rios moçárabes, e a trasladação das suas relíquias para Arlanza,
em 1062, favoreceu o culto 386. Só tardiamente a reivindicação
da origem alentejana dos três santos irmãos surge nos textos
portugueses, por especial esforço de Resende. A igreja de São
Vicente data do início dos anos de 1560, sob batuta henriquina,
ainda que a construção se prolongasse pelo múnus de D. João de
Melo (1565-1575). Desconhece-se ainda quem foi o seu arqui-
tecto, mas pode mesmo tratar-se de uma ideia (um desenho) do
próprio André de Resende, como já se aventou, dada a solidez
all’antico que revela a traça, destacada por Paulo Varela Gomes,
e a lembrar, como fez Susana Abreu, a sua formação em Alber-
ti. Resende seguia o princípio da concinnitas (harmonia) promul-
gada pelo famoso arquitecto de Nicolau V, assim equilibrando

194
uma mens all’antico com o sentido proverbial de tolerância dos Fig. 49
humanistas 387, e era leitor atento do seu tratado, tal o de Mar-
co Vitrúvio Polião, autor tão estimado pelo escritor eborense
388
. Voltamos a lembrar que eram obras disponíveis nas biblio-
tecas eborenses do tempo.
Sabe-se, entretanto, que nos primeiros decénios a ousia da
igreja esteve preenchida com um «retábulo ingido» a fresco, de
grandes dimensões, representando os três titulares em nichos
simulados, com São Vicente ao meio e as irmãs dos lados, pin-
tura essa atribuída a Francisco de Campos (c. 1570). O fresco
encontra­se coberto pelo actual retábulo, o que signiica que só
se apresentou à comunidade durante cerca de vinte anos, per-
dendo as suas funções no momento em que a confraria de São
Vicente das Irmãs obteve fundos para executar o retábulo de
madeira e pintura 389. O caso, como vimos, foi frequente nas
capelas-mores das igrejas alentejanas: muitas deles tiveram ‘re-
tábulos ingidos’ a fresco provisórios, com intenção de serem
cobertos, quando houvesse melhores condições monetárias (o
caso da Capela de São Pedro em Montemor-o-Novo é um bom
exemplo). Alguns desses frescos ‘retabulares’ foram-se manten-
do como permanentes.
Do tempo de D. Teotónio de Bragança é precisamente a obra
do retábulo-mor da igreja de São Vicente, que data do último
decénio do século XVI (sabemos que estava pronto em 1597),
e merece encómio por incluír o mais completo programa ico-
nográico alusivo aos alegados santos mártires de Évora, ainda den-
tro da tradição local recolhida por André de Resende, que aliás
contribuíra para a construção deste templo com verba inscrita
no seu legado testamentário. O retábulo maneirista da igreja de
São Vicente data dos anos 90 e mostra, no andar principal, em
nichos, as três iguras dos santos Vicente, Sabina e Cristeta em
escultura de madeira policromada, com o interesse de ixarem
uma iconograia. Desconhece­se o nome do imaginário, mas o
entalhe pode ser da autoria de Diogo Nobre, um nome muito
repetido nestas páginas por ter sido o mais requestado dos ar-
tistas eborenses na sua modalidade.

195
Quanto às pinturas, elas devem­se ao bejense António de
Oliveira, eventualmente com colaboração de seu «sócio» Júlio
Dinis de Carvo (já que ambos trabalharam algumas vezes asso-
ciados), mas eram artistas de nível secundário, o que se atesta
nas pinturas retabulares 390. Não se estranhe tal facto (aliás, os
retoques ulteriores, que são visíveis sobretudo na predela, agra-
varam o efeito de menoridade destas pinturas), já que se tratava
de encomenda de uma irmandade com menores recursos, ain-
da que com dotação de esmolas por parte do Senado e do Ca-
bido. António de Oliveira já trabalhara na Sé, com o apoio de
um cónego seu protector, e pintara em 1584 o grande painel do
retábulo do santuário de Vera Cruz de Marmelar, pintura me-
díocre, ainda que de alto interesse iconográico, como de resto
se manifesta nas tábuas da igreja de São Vicente, onde essa ver-
tente é imensa, dada a magreza de representações da história
dos chamados Mártires de Évora.
A origem destes santos, cujas relíquias muito se veneraram,
desde a Reconquista cristã em Ávila, é como se sabe obscura: é
certo, porém, que eles não se relacionam com Évora e sim com
a cidade de Ávila. Coube a André de Resende reivindicar o cul-
to como eborense ao defender, aliás sem base, o nascimento
dos três irmãos na cidade alentejana. Com as perseguições do
Imperador Diocleciano (284-305) no início do século IV, por
ordem do pretor Daciano, os irmãos Vicente, Sabina e Cristeta
sofreram martírio em Ávila por se negarem fazer sacrifício aos
deuses pagãos tal como era imposto pelo IV Édito do Impera-
dor. Diz a lenda que, com ajuda de Sabina e Cristeta, Vicente
conseguiu escapar às perseguições romanas, mas foram presos
em Alba, torturados e lapidados. As tábuas mostram-no, com
as duas irmãs, em fases de martírio (a lagelação e a roda). Os
corpos foram depositados numa rocha, e as relíquias translada-
das para o Mosteiro de São Pedro de Arlanza por ordem do Rei
Fernando I de Leão e Castela em 1062. O actual lugar de vene-
ração é a basílica de São Vicente de Ávila.
No retábulo, uma das pinturas de maior formato mostra Vi-
cente quando recebeu a visita das duas irmãs estando na pri-

196
são. Aí deixou impressão dos pés numa pedra, a im de mostrar Fig. 48
aos guardas quem era Jesus Cristo, o que foi suiciente para os
converter: os guardas viram os pés de Jesus gravados na rocha
e sentiram o odor de Nosso Senhor. A outra tábua maior mos-
tra o martírio de Vicente às mãos dos algozes de Daciano. Ao
centro, um grande Calvário, que tem o interesse de se inspirar
no que o Padre Giuseppe Valeriano pintara em Évora em 1579.
Na predela vemos Vicente negando­se a sacriicar aos deuses
perante o Pretor Daciano, e os corpos de Vicente, Sabina e
Cristeta abandonados após o martírio, numa tábua do mesmo
retábulo eborense.
A respeito do Calvário, painel do centro da iada principal,
acima dos três nichos com as imagens dos titulares, é interes-
sante também a «colagem» que o modesto artista faz ao modelo
miguelangelesco de Giuseppe Valeriano, o quadro pintado para
os jesuítas de Évora quando por aqui passou em 1579. O padre
Valeriano, como se sabe, chamado a opinar, como arquitecto,
sobre certas obras inacianas que decorriam, pintolu então um
«painel de Cristo vivo na cruz» para os padres 391. O painel em causa,
hoje em colecção particular, destinava-se ao oratório da herdade
de Nossa Senhora da Conceição em Montes Claros, lugar de ve-
raneio dos padres da Companhia, e inspira-se directamente no
célebre modelo de Miguel Ângelo pintado para Vittoria Colon-
na, ainda que numa variação «tridentina», isto é, minorando no
efeito de terribilità do vigoroso desnudo na perdida pintura de
Miguel Ângelo, e retirando­lhe a relexão sobre a vida e a morte
ao suprimir os anjos merencorosos que ladeiam o cimo da cruz
no desenho hoje em colecção inglesa 392. Tratou-se, assim, de
uma interpretação «reformada» do miguelangelismo, que Vale-
riano já experimentara no quadro de San Vito de Recanati, na
Macerata – modelo esse que, em Portugal, vai ter muitas ver-
sões, como na igreja do Salvador de Évora (Pedro Nunes), num
fresco da sacristia da igreja dos Lóios de Évora (oicina Escovar
?), numa tela seiscentista da igreja de Santo António da Piedade
e, fora de Évora, numa tábua de Simão Rodrigues do retábulo
de São Domingos de Elvas (cerca de 1595), numa tela do coro

197
alto do mosteiro das Chagas de Vila Viçosa (por André Peres,
cerca de 1615), num dos fólios do Missal Pontiical de Estêvão
Gonçalves Neto (1604-1622) da Academia das Ciências de Lis-
boa, e em outros exemplos directa ou indirectamente sequazes
da releitura de Miguel Ângelo proposta pelo Padre Valeriano.
No caso do retábulo da igreja de São Vicente de Évora (que
estava recém-ultimado em 1597), o modesto pintor procurou, as-
sim, mostrar-se atento e informado às novidades artísticas que a
Contra‑Maniera italiana introduzia, por via directa de um dos seus
bons representantes em Roma, visando acompanhar o debate
sobre o papel das artes que com Trento se agitava, e acentuan-
do, assim, o impacto narrativo das «histórias» dos santos mártires
de Évora pintadas no mesmo altar, santos esses cujas relíquias, a
exemplo das de São Manços, a cidade também reclamava.
Quanto a São Brissos, santo mártir originário de Myrtillis, a
vila de Mértola, e alvo de martírio em 312 d.C., foi segundo a
tradição o segundo Bispo de Évora, a seguir a São Manços. Por
essa razão, tem culto na Arquidiocese de Évora, designadamen-
te na aldeia que conserva o seu nome, situada na freguesia do
Escoural, Concelho de Montemor-o-Novo, onde se ergue um
santuário que, como muitos outros neste livro citados, recebeu
obras no inal do século XVI, dentro do mesmo espírito que
regeu as obras teotoninas. Tratava-se, para os promotores capi-
tulares, de valorizar os cultos hierofânicos, como sempre, ainda
que neste caso nada se saiba sobre a existência de presumíveis
relíquias, e nesse sentido o Cabido empreendeu obras na sede
desta extinta freguesia, que foi alvo de reconstrução e revaloriza-
ção. Também no Distrito de Beja, em freguesia rural da cidade,
existe uma paróquia de São Brissos, também relacionada com a
existência de vestígios arqueológicos e, por conseguinte, de len-
das fundacionais, que em 1534 era ilial da igreja do Salvador de
Beja, e na qual Túlio Espanca registou uma imagem do orago 393.
Destacou Túlio Espanca, a respeito da primeira das citadas
igrejas de São Brissos, sita na freguesia de São Tiago do Escoural,
no concelho de Montemor-o-Novo, a «estranheza construtiva
do alpendre, sua planta, ornamentos e sobretudo a orientação,

198
(que) sugerem uma provável adaptação da primitiva abside gó- Fig. 31
tica, aquando da integral reforma do templo actual, em ins do
século XVI» 394. Deve ter sido assim que tudo se passou, sendo
poupada a preexistência tardo-medieval quando se construíu
o corpo adjacente dentro do ideário do Arcebispo. Como su-
cede em todas as velhas igrejas intervencionadas na época de
D. Teotónio, a traça segundo a qual se ampliou a preexistência
buscou manter algo de arcano, dentro do objectivo-âncora, já
bem explicitado, de criar espaços‑auditório. Esta igreja não foge à
regra, e tem o interesse acrescido de manter – caso único – um
programa integral de pinturas a fresco onde se representam todos os santos
mártires com alegada vinculação eborense !
O facto mais relevante dessa campanha na igreja de São Bris-
sos é sobretudo este: o programa da decoração fresquista com
representações hagiológicas e ingimentos geométricos, que co-
bre a capela-mor e se estende ao apainelado do tecto da nave.
No presbitério, admira­se um conjunto de «retábulos ingidos»
de forte poder cenográico, com iguras de santos em corpo
inteiro (Santo Amaro e São Luís, Rei de França, no arco-mestre,
Santa Bárbara, São Geraldo, Santa Apolónia e São Neutel, da banda
esquerda, e Santa Luzia, São Brissos, Santa Águeda e São Romão,
à direita), tudo relacionado com o retábulo de talha com pintu-
ras sobre madeira, e envolto por molduras simuladas e tabelas
geométricas de tipo neo-constantiniano, afrescadas com gosto.
Nas trompas da cúpula, admiram-se os Evangelistas, de boa exe-
cução plástica, e no tecto do corpo foram pintados os Apóstolos,
em quadri riportati envolvendo, no eixo, as iguras dos mártires
eborenses São Brissos, São Manços e São Jordão.
Trata-se de um espaço artístico do maior interesse, posto que
muito pouco conhecido. Alguns dos ornatos afrescados imitam
azulejaria enxaquetada com lambris de forma losângica, de bom
efeito decorativo, e tudo reverte para um sentido espacial unitá-
rio, que se desejou coerente e eicaz. É, por isso, um dos bons
testemunhos da concepção de «arte total» teotonina, e só é pena
faltar-nos a documentação que permitiria conhecer o nome dos
artistas envolvidos 395.

199
O empenho que existiu nestes anos em se seguir os mode-
los de uma arquitectura paleo-cristã ou altimediévica, histórica e
teologicamente justiicada, multiplica­se não só nas deliberadas
«citações» de que fez corpo muita da construção sob égide do
Arcebispado, com seu tónus «civilista», mas também nos mo-
dos de decorar os espaços-auditório seguindo uma linguagem
que remetia para o neo-constantinianismo, gosto especialmente
difundido com o papado de Sisto V e sobretudo com os restau-
ros empreendidos no tempo de Clemente VIII, como atestam
os exemplos referidos.
Um caso assaz interessante de «revivalismo» contra -
-reformado fora já, nos anos de D. João III, a retoma que nesse
tempo se fez de um modelo com origens no século VII, o da
igreja de São Frutuoso de Montélios, em Braga, para ser apli-
cado na estrutura da belíssima igreja centralizada do Bom Jesus
de Valverde como uma das fontes de inspiração do arquitecto
Miguel de Arruda ! O facto de aquele templo minhoto ter sido
em determinado momento incorporado pela ordem franciscana
explicará, de algum modo, essa «citação» antiga, mas o facto de
tal retoma ter ocorrido em Évora é em si um fenómeno mui-
to interessante, por razões subliminares de um gosto neo‑antigo
cheio de simbolismo e carregado de referências arqueológico-
-historicistas de sabor medievalizante. Infelizmente, pouco de
concreto se sabe sobre essa inusual construção que buscou mo-
delo inspirador na primitiva igreja de São Frutuoso 396…
Com a penetração dos valores da Contra-Reforma, quase
meio século passado, o que fora uma espécie de acto isolado
no Bom Jesus de Valverde passa a ter legitimação teológica e
força estratégica para ser utilizado em maior escala por todo o
Arcebispado. Esse foi já o tempo e o mundo em que se moveu
D. Teotónio de Bragança, um mundo que se explica pela sua
sólida formação tridentina e que se justiica pelo conhecimento
aprofundado que tinha sobre as origens arcanas, reais ou ictí-
cias, do vasto território arquiepiscopal sujeito à sua jurisdição.

200
Notas

366 Francisco Galvão, em carta a Manuel Severim de Faria (1641), diz que «São vte,
sta sabina e sta Cristeta irmãos naturaes desta cidade que foram martirizados em 303
q.do da perseguição aos cristãos de Daciano, presidente na Espanha», e ainda que
«Sãta Comba com hum Bispo e outra irmã tãobm virgem foram martirizados neste mesmo tpo com
outros mts martyres junto a Tourega como se vé da tradição» (B.P.E., ‘Portuguezes insignes ou q.
forão pessoas notáveis ‘, MSS 29, nº 47-123).
367 Túlio Espanca, Inventário Artístico…, 1966, pp. 344-347.
368 Airma­o Túlio Espanca, Inventário Artístico…, 1966, p. 345, e vem atestá-lo a
existência de, pelo menos, uma peça quatrocentista: o painel gótico que representa
Nossa Senhora e São João Evangelista (fundo de Calvário), carecido de restauro e de estu-
do analítico, que se resguarda no Santuário do Bom Jesus de Valverde. Num exame
pericial realizado com o técnico de documentação de fotograias de obras de arte
José Pessoa, em 1998, veriuicou­se que a peça preserva, além de desenho subjacen-
te signiicativo, iguras debuxadas no reverso do suporte. A existência deste quadro
demonstrará a maior ancianidade do templo.
369 Em 1695, sendo Arcebispo D. Luís da Silva Teles, foram feitas vistorias de
obras nas casas junto à igreja, de que era senhorio a Mesa Pontiical, depois de uma
petição nesse sentido de Francisco Cordovil de Brito (A.D.E., Arquivo da Câmara
Eclesiástica, Mitra, cx. 4, 09-14).
370 B.P.E., ‘Portuguezes insignes ou q. forão pessoas notáveis ‘, MSS 29, nº 47-123.
371 B.P.E., MSS 29, cit., nº 47-123. Todavia, esta ancianidade é refutada como falsa
por um jesuíta, Padre Martim Cardoso de Azevedo, Historia das Antiguidades da Cidade
de Evora, 1736 (ed. Évora, 1793).
372 As tábuas do andar cimeiro desse retábulo, Adoração dos Pastores e Ressurreição de
Cristo, foram pelo autor deste livro atribuídas a Francisco de Campos. Esse retábu-
lo da Ermida de São Brás deve ser encomenda do Cardeal D. Henrique no segundo
mandato como Arcebispo (1575-1578).
373 Adriano de Gusmão, «A Pintura Maneirista em Évora», sep. de A Cidade de Évo‑
ra, 1956, p. 7. Também Luís Reis-Santos (Garcia Fernandes, Realizações Artis, 1957,
p. 16) refere de passagem estas tábuas, com uma deslocada atribuição ao lisboeta
Garcia Fernandes.
374 B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 71, Noticias da Freguezia da Assumpção de Tourega
(relato anónimo de 1736). Este longo mss. merecia ser integralmente publicado, da-
dos os pormenores que revela sobre o sítio e o testemunho sobre a secular tradição
que acima referenciamos.
375 Nicolau Agostinho, op. cit., cap. V, p. 22.
376 Idem, ibidem, pp. 21-22.
377 B.N.P., Reservados, Mss 29, nº 47, Noticias relativas a S. Manços e S. Torpes. Sobre São
Torpes, o anónimo memorialista cita a autoridade de Cesare Baronio para airmar que
ele foi martirizado em 69 d.C. algures no Alentejo. Ricardo Estêvam Pereira prepara um
estudo a respeito do culto de São Torpes em Sines e das circunstâncias que o envolveram.

201
378 José Leite de Vasconcelos, Religiões de Lusitania, vol. I, Lisboa, 1897, pp. 21-23.
379 Estêvão de Lis Velho, Exemplar de constância dos martyres em a vida do glorioso S.
Torpes, mordomo e valido de Nero desde o seu nascimento ate o seu glorioso triunfo, e se relata a
vinda prodigiosa do seu corpo a este Reino à vila de Sines, Lisboa, 1746, n. 56.
380 Frei Manuel Baptista de Castro, Mappa de Portugal Antigo e Moderno, tomo II,
Lisboa, 1763, p. 175.
381 Ricardo Estêvam Pereira, «A descoberta do túmulo de São Torpes em 1591»,
Actas on-line do 1º Congresso de Arqueologia da Associação dos Arqueólogos Portugue-
ses, Lisboa, 2013.
382 Ricardo Estêvam Pereira, «A descoberta do túmulo de São Torpes em 1591»,
Actas on-line do 1º Congresso de Arqueologia da Associação dos Arqueólogos Portugue-
ses, Lisboa, 2013.
383 Ricardo Estêvam Pereira, Pereira, «A descoberta do túmulo de São Torpes em
1591», Actas on-line do I Congresso de Arqueologia da Associalção dos Arqueólogos Portu‑
gueses, Lisboa, 2013.
384 Túlio Espanca, Inventário…, 1966, pp. 321, 364 e 381.
385 Paulo Varela Gomes, Arquitectura, Religião e Política em Portugal no Século XVII. A
planta centralizada, Porto, Faculdade de Arquitectura, 2001, pp. 55-60.
386 Carmen García Rodríguez, El culto de los santos en la Roma romana y visigoda, Ma-
drid, Consejo Superior de Investigaciones Cientiicas, 1966, pp. 245­246.
387 Apesar desse apregoado espírito de tolerância, Hugo Crespo (em «André de
Resende na Inquisição de Évora e a apologética anti-judaica: ciência teológica, doutri-
na e castigo (1541). Um autógrafo inédito. Novos documentos para as biograias sde
André de Resende e Jorge Coelho», revista Humanismo, Diáspora e Ciência. Séculos XVI
e XVII, Lisboa, 2013, pp. 151-212) mostra-nos outra faceta do humanista-escritor
eborense. Ainal, ele só epidermicamente manteve idelidade aos princípios erasmia-
nos, assumindo antes o papel de um ortodoxo militante proselitista em luta contra o
protestantismo e todas as heresias. O caso do mercador Pêro Álvares, cristão-novo
reprimido pelo Santo Ofício, dá-nos uma nova visão de Resende e esclarece melhor
a sua ulterior obra, dentro dos ressaibos tridentinos.
388 Susana Matos Abreu, «André de Resende, um novo Alberti ? Um ideólogo entre
o “princeps” e o “architectus”, na recuperação da “Vrbs” romana de Évora (1531-
-1537)», Espaços e Paisagens. Antiguidade Clássica e Heranças Contemporâneas, Centro de
Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 2010, pp. 223-230.
389 Túlio Espanca, Inventário…, pp. 179­180. Existem boas fotograias desse fres-
co, descoberto em 1965 aquando do restauro do templo, tendo-se decidido voltar a
cobri-lo com o retábulo.
390 Vitor Serrão, «Uma sociedade de pintores em Beja no im do século XVI: os
maneiristas António de Oliveira e Júlio Dinis de Carvo», revista Museu, IV série, nº
11, 2003, pp. 35-75.
391 Sobre a passagem do Padre Valeriano por Portugal, cf. Maria Cali, Da Miche‑
langelo all’Escorial. Momenti del dibatto religioso nell’arte del Cinquecento, Turim, Einaudi,
1980, pp. 195 e n. 198.

202
392 Vitor Serrão, «Calvário / Padre Giuseppe Valeriano», in A Pintura Maneirista
em Portugal – arte no tempo de Camões, cat. de exp., C.C.B, Lisboa, 1985, pp. 282-285.
393 Túlio Espanca, Inventário Artístico de Portugal. XII. Distrito de Beja, 1992, pp. 237-238.
394 Túlio Espanca, Inventário Artístico de Portugal. VIII. Distrito de Évora, 1975, p. 403.
395 A atribuição tradicional aponta para que seja obra de José de Escovar e da sua
oicina e dos anos de transição do século XVI para o XVII. De facto, anotam­se es-
tilemas próximos da ‘oicina Escovar’, mas também é certo que a pintura da cúpula é
de qualidade superior, e que no tecto da nave, aparentemente mais tardio, devermos
concordar com Túlio Espanca (Inventário Artístico de Portugal. VIII. Distrito de Évora,
p. 404) quando observa ainidades com os frescos da sacristia da Ermida de Nossa
Senhora de Guadalupe.
396 Segundo José Eduardo Horta Correia, Arquitectura Portuguesa. Renascimento, Ma‑
neirismo e Estilo Chão, Lisboa, Editorial Presença, 1991, p. 39, trata-se de uma solução,
devida à traça de Miguel de Arruda, que «procura aliar a mais erudita cultura mate-
mática do Renascimento a sugestões de antigas tradições nacionais».

203
8. d. teotónio de brAgAnçA e A
c o m pA n h i A d e J e s u s

8.1. A Universidade de Évora e os


padres inacianos

A relação de D. Teotónio de Bragança com os padres da


Companhia de Jesus que se instalaram no Colégio do Espírito
Santo, transformado em 1559 em Universidade por esforço do
seu antecessor, Cardeal D. Henrique, foi naturalmente inten-
sa, dada a importância crescente da milícia de Santo Inácio de
Loyola e a sua fortíssima expressão cultural.
O Colégio do Espírito Santo, com a Universidade de Évora
foi um dos grandes empreendimentos nacionais do século XVI.
Erguida por D. Henrique (que desde 1553 aspirava criar em Évo-
ra um pólo universitário concorrente a Coimbra), em íntima as-
sociação aos padres da Companhia de Jesus, e tomando como
modelo inspirador a rede-pluricolegial em torno do Colégio de
San Ildefonso de Alcalá de Henares, projecto do célebre Cardeal
Cisneros 397, como defendeu Rui Lobo, e também o do Colégio
das Artes da Universidade de Coimbra, foi desde cedo uma refe-
rência prestigiante da cidade e razão de elogio dos visitantes 398. A
igreja deinitiva, com a sua tipologia fundadora do «estilo chão»
na sua vertente jesuítica, e com referências pragmáticas tomadas
da arquitectura gótico-manuelina do Mosteiro de São Francisco,
foi traçada em 1566 por Diogo de Torralva (que faleceu nesse

205
ano) e por Afonso Álvares (que adaptou as traças de Torralva)
399
, sendo a empreitada conduzida pelos laboriosos mestres Ma-
nuel Pires (até 1569), Baltazar Fernandes (falecido em 1570), e
Jerónimo de Torres, este a partir de 1570 e dirigindo o estaleiro
de obras, que se prolongaram até ins do século XVI 400.
Mas já desde meados da sexta década do século se erguiam
os novos corpos universitários. É o «modo nostro» dos jesuítas 401
que inspira essas construções que, desde 1556, começaram a
ser erguidas com determinação, deinindo e envolvendo o Pá-
tio dos Gerais, com a Sala dos Actos (lugar da primitiva e mo-
desta igreja) no eixo e os edifícios escolares em volta 402. O No-
viciado ergue-se a partir de 1566, dando o Cardeal «grande calor
à obra», segundo diz o Padre António Franco 403, tornando-se
no seu grosso, como escrevera o cronista padre Baltazar Telles,
«em matéria de edifício para colegiais, o mais grandioso que há em todo o
Portugal» 404. O conjunto visava completar-se (tal como em Al-
calá de Henares) com outros edifícios colegiais: foi construído,
assim, o Colégio de Nossa Senhora da Puriicação, traçado por
um celebrado arquitecto da Companhia para o efeito chama-
do, o padre Silvestre Jorge 405. Dessa campanha (de que existem
plantas assinadas por esse padre-arquitecto, na Biblioteca Na-
cional de França, aliás como para o Colégio do Espírito Santo),
sabemos que correram em empreitada célere com o mestre pe-
dreiro Jerónimo de Torres.
Como se viu, ao traçarmos em capítulo anterior a biograia
do Arcebispo D. Teotónio, e tal como nos recorda o seu biógra-
fo Nicolau Agostinho, a relação que manteve com a Companhia
de Jesus nem sempre foi tranquila, pois passou por conlitos em
torno da jurisdição de poderes e das prerrogativas da autorida-
de arquiepiscopal. A preferência que ele manifestou por cartu-
xos e franciscanas também gerou ocultas tensões. Prevaleceu,
contudo, a dimensão cultural que os estudos jesuíticos assegu-
ravam, ao oferecerem, através de um ensino de novo tipo e de
uma produção literária fecunda, alternativas sólidas às polémi-
cas teológicas e recuperando a boa imagem da Igreja nos palcos
europeus, depois das investidas dos protestantes.

206
O testemunho do Padre Baltazar Teles, na sua famosa Cró‑
nica da Companhia de Jesus, assegura que, enquanto Arcebispo de
Évora, D. Teotónio de Bragança manteve muito boas relações
com os padres da Companhia de Jesus, passado que estava, havia
muitos anos, o desaguizado que levara Santo Inácio de Loyola,
em Roma, a preteri-lo como membro da milícia. Terá sido as-
sim, tanto mais que a ele coube a tarefa de multiplicar na cidade
a rede de colégios – o de São Paulo, de eremitas da Serra d’Ossa,
e o da Madre de Deus, ambos desaparecidos 406 –, a im de dar
corolário ao projecto henriquino de tornar Évora uma espécie
de alternativa a Coimbra no campo do ensino. Também o anó-
nimo autor das Notícias do seu Governo chega ao detalhe de enu-
merar os padres jesuítas que, durante a grande peste de 1579-
-1581 407, abnegada e corajosamente serviram as populações da
cidade e dos campos, seguindo as directrizes do Arcebispo na
assistência aos desvalidos e, alguns deles, contraindo a doença.
Esse esforço foi imenso, tendo chegado os jesuítas a montar
um hospital provisório no Louredo para assistir aos pestíferos,
sendo todo esse empenho merecendo do geral aplauso do Ar-
cebispo, assim que se ergueram «bandeiras de saúde». Na Capela
de Música da Sé muitos eram os jesuítas que a integraram, entre
eles nomes sonantes de cantores e compositores: é o caso, en-
tre muitos outros exemplos, do padre Domingos de Pina, que
foi depois reitor no Colégio da Companhia de Jesus em Salsete,
no Estado da Índia 408.
Um autor já referido, o Dr. Francisco Galvão, que escreve a
respeito do múnus de D. Teotónio em termos encomiásticos, ain-
da que sem dose de pormenores dignos de destaque, conirma
também esse bom relacionamento com os padres da Companhia
de Jesus 409, pesem os conlitos que ocorreram, mais ou menos
públicos, por causa da hierarquia que era devida ao Arcebispo.
Ora, não sendo essa hierarquia respeitada muitas vezes, e sendo
D. Teotónio homem para constantemente reclamar esse direito,
com o respeito devido à sua dignidade, não via com bons olhos
certos protagonismos dos inacianos, quando era justamente o seu
cargo o mais relevante como primeiro pastor da Igreja eborense.

207
Fig. 48 O campo artístico uniu, entretanto, vontades e estratégias.
O arquitecto padre Silvestre Jorge, igura muito estimada das
artes no seio da Companhia de Jesus, já atrás referido, e que
Fausto Sanches Martins muito bem estudou, vem a Évora em
1575 inteirar-se dos trabalhos do Colégio do Espírito Santo e,
sobretudo, os do Colégio de Nossa Senhora da Puriicação que
então se iniciavam, e para os quais forneceu as traças 410. Eram
obras importantes pelo seu papel assistencial à Universidade e
que, por isso, correram com rapidez, recebendo-se já colegiais
em 1593. Face às necessidades dos padres, a empreitada iniciada
em 1575 pelo mestre Jerónimo de Torres (um artista muito esti-
mado pelo Arcebispo por assegurar muitas das suas obras411), e
que teve na direcção do Colégio da Puriicação obra competen-
te e célere 412. A aprovação dos Estatutos deste Colégio univer-
sitário, entretanto, ditava as bases do seu funcionamento, com
cinquenta estudantes em regime de internato e com rendimen-
tos perpétuos para o seu pleno funcionamento.
Se D. Teotónio seguiu a construção desse Colégio, e teria
contactado Silvestre Jorge, como era seu timbre face aos artistas
de fora, não sabemos já se chegou a contactar também com o
arquitecto-pintor Giuseppe Valeriano, que estadeou em Évora,
como vimos 413. De facto, fora chamado por D. Henrique, em
1579, sendo este já rei, dadas as circunstâncias que afastaram
o Arcebispo da cidade durante o primeiro ano do seu múnus,
que coincidem precisamente com a passagem do artista italia-
no, vindo aqui para avaliar o curso das obras. A estada de Va-
leriano em Évora é ainda problemática, pois se em Lisboa ele
foi chamado a opinar sobre o avanço das obras colegiais que se
desenrolavam em Santo Antão, já em Évora, onde passou nove
meses, a sua atividade não poderia restringir-se apenas à pintu-
ra de um quadro do Calvário para um oratório jesuítico. Defen-
demos já, noutro lugar, que a sua estada pode ser relacionada
com o debuxo do belíssimo túmulo que se fazia, em tempo de
vida, para o próprio Cardeal D. Henrique, e que veio a lavrar-se
de seguida e colocado no transepto da igreja do Espírito Santo,
da banda do Evangelho.

208
Voltemos ao percurso do Arcebispo D. Teotónio. Interessou
na sua acção pastoral colher algumas das dinâmicas jesuíticas no
campo da evangelização dos territórios por si governados, com
grande atenção às especiicidades das populações, bem como
aprofundar os interesses pelo descobrimento dos «mundos no-
vos» e pelo esforço missionário que então se abria, apontado
muito em especial para terras da Ásia. A instalação da Univer-
sidade em Évora, sonho de D. Henrique e aposta do seu amigo
Frei Luís de Granada, pusera em prática esses objectivos414. Se
os primeiros tempos que os padres da Companhia passaram na
cidade (instalados provisoriamente no convento das religiosas de
São João de Malta, em 1553, e mudando-se daí para as desafec-
tadas instalações dos antigos paços reais, junto ao mosteiro de
São Francisco) foram de algum modo conturbados e marcados
por alguns conlitos e diiculdades de inserção415, bem cedo a
qualidade do ensino universitário se impôs. Após uma fase ex-
perimental assegurada por mestres como Pedro da Fonseca, o
«Aristóteles português», como o próprio D. Frei Bartolomeu dos
Mártires, ou o Dr. Pedro Margalho, a seguir a 1556, sob a ba-
tuta do mestre Inácio Martins, então com seiscentas vagas para
estudantes, número que subiria para mil e seiscentas em 1592,
o magistério atinge altíssimo prestígio.
A Universidade surgia dotada de poderes para ministrar to-
das as disciplinas do saber, se excluímos apenas Medicina, Di-
reito Civil e a parte contenciosa de Direito Canónico, que eram
prerrogativas dos cursos da Universidade de Coimbra416. No
campo das artes, a Arquitectura e temas ains constituíam área
reforçada de estudo, com documentada presença dos tratados de
Durer, Léon Battista Alberti, Girolamo Maggi, Sebastiano Ser-
lio, Jacopo Barosio, Pietro Cattaneo ou Jacopo Vignola, autores
com títulos que Fausto Sanches Martins referencia como estan-
tes na Biblioteca universitária de Évora e cuja presença mostra
o grande interesse dos jesuítas pelos estudos da perspectiva, da
simetria, das ordens arquitectónicas, da emblemática, da libera-
lidade das artes, da geometria, da matemática e da arte de forti-
icar, entre outros temas estudados 417.

209
«A nova academia jesuítica convertia-se no ex-libris cultural de
Évora, a grande embaixatriz que iria levar ao perto e ao longe o
seu nome», diz em suma Joaquim Chorão Lavajo 418. Como «bas-
tião da Contra-Reforma no sul do país, a Universidade de Évora
formou teólogos, ilósofos e professores que preservaram o nos-
so país dos desvios doutrinais em voga pela Europa». Por certo,
esta dimensão do ensino ministrado pela Companhia de Jesus
não passou à margem das pastorais de D. Teotónio, ele mesmo
formado nos mesmos sólidos valores teológicos e pedagógicos.

8.2. Percursos coincidentes

As bases da cultura jesuítica em Évora foram estabelecidas,


é um facto, pelo empenho e prestígio do Cardeal D. Henrique.
Mas foi sob essa base que vários repertórios do «modo nostro»
passaram, em vertentes mais vernáculas, para muitas obras de
arquitectura fora da Companhia. Um dos aspectos coincidentes
no estilo D. Teotónio, digamos assim, em referência aos critérios
de reconstrução, ampliação e revalorização das velhas igrejas do
Arcebispado, radica justamente no uso de exonártex, tal como na
igreja do Espírtito Santo, a digniicar várias fachadas paroquiais
e a conferir a esses templos uma deliberada imagem neo-antiga.
Essa solução tem a sua génese no modelo da igreja jesuítica
do Espírito Santo, tal como a conceberam em 1566 os arquitec-
tos Diogo de Torralva, Afonso Álvares e Manuel Pires às ordens
do Cardeal D. Henrique, no sentido de unir a imagem identitária
dos templos paleo-cristãos com a necessidade de criar espaços-
-auditório abertos às comunidades e reforçando o novo papel
interventivo da Igreja, à luz dos preceitos conciliares. Já o cro-
nista Padre Baltazar Telles atesta esse referencial «historicista»
da nova igreja, que «determinou de fazer tal que parecesse obra digna
de quem a mãdava fazer, & do Senhor pera quem se fazia, & assi nos
consta, que seus primeyros intentos foram ediicar hum templo, que igoa‑
lasse na grandeza a igreja do mosteyro dos Padres de San Francisco da
cidade de Evora, que he obra muy sumptuosa, & por isso muy parecida

210
com seu magniico fundador, que foy o felicissimo Rey Dom Manoel, pay
do serenissimo Infante» 419.
Assim, a presença do nártex saliente, espécie de portada com
arcaria a dominar as fachadas, remetendo para fontes primevas
do Cristiasnismo, seria utuilizada no Espírito Santo e retomada,
de seguida, em muitas igrejas do Arquiepiscopado: em Nossa
Senhora da Graça do Divor, por exemplo, tal como já o fora
em São Mamede de Évora (aqui por traças atribuídas a Diogo
de Torralva) 420 ou, ainda, na igreja de São Sebastião de Évora
(cuja campanha de pedraria data de 1599-1600), em Santa Ma-
ria de Évora-Monte (cuja campanha de pedraria também está
documentada), e em algumas outras igrejas e capelas alenteja-
nas recenseadas no incontornável Inventário Artístico de Túlio Es-
panca e onde se assinalam, com maior ou menor desenvoltura,
tipologias de exonártex.
O historiador de arte Jorge Henrique Pais da Silva, ao mes-
mo tempo que observava com toda a pertinência o modo como
a ideia de nártex se inspirou no caso monacal gótico-manuelino
de São Francisco de Évora, deiniu as características essenciais
desta arquitectura jesuítica inaugurada com a igreja do Espírito
Santo: «… planta rectangular de uma só nave, capela-mor pou-
co profunda, capelas laterais comunicando entre si e por vezes
dominadas por tribunas, púlpito situado a meio da nave (com
vista a melhorar a audição das predicações em todo o salão),
vestígio de transepto, que não é saliente e tem altura inferior à
nave» 421. Como se constata, a proposta jesuítica por uma cons-
trução unindo novidade formal, clareza espacial e memória his-
tórica não andava longe do que era o tipo de arquitectura sacra
deinida nos templos que Nicolau de Frias, Pero Vaz Pereira e
outros construtores teotoninos levaram a cabo. Ou seja, o modo
nostro da arquitectura jesuítica soube aderir às especiicidades (e
necessidades) portuguesas (e do «mundo português»)…
Preocupação de D. Teotónio de Bragança foi, também, im-
pulsionar novos cultos e alargar iconograias credíveis para en-
riquecer as bases didascálicas da pastoral da Igreja. Se recupe-
rou e revitalizou cultos como o de São Manços, de São Torpes

211
ou de São Brissos (vimo-lo em capítulo precedente), tal impera-
tivo levou-o certamente a desenvolver o culto imaculista e a se-
guir, também, o esforço da Companhia de Jesus na preparação
dos processos de beatiicação dos seus santos Inácio de Loyola e
Francisco Xavier 422. Sabemos que a pintura portuguesa teve pa-
pel fundamental na deinição de uma primeira iconograia credí-
vel para servir o culto de São Francisco Xavier, o Apóstolo das
Índias, e o de Santo Inácio de Loyola. Tal se deveu a programas
estrategicamente estabelecidos e que foram pensados mantes da
beatiicação (1619) e ulterior canonização (1622) dos dois famosos
jesuítas. Congregando diversas fontes e informações idedignas,
e muito antes de serem canonizados, já existiam programas ico-
nográicos promocionais, que mantinham a chama do culto nos
espaços dos Colégios inacianos. Assim sucedeu em Évora com
a primeira representação narrativa da vida e feitos de Inácio de
Loyola, ainda em 1599, e o mesmo se passará com a iconogra-
ia xavieriana, em 1619, com o extraordinário ciclo de vinte telas
pintadas por André Reinoso e um colaborador para os espaldares
dos arcazes da sacristia do Colégio de São Roque em Lisboa 423.
Para a Companhia de Jesus – e para D. Teotónio de Bragan-
ça, que acolhia e seguia com atenção estas iniciativas promocio-
nais –, a creditação dos novos cultos avant la lettre impunha que,
a par da difusão de textos de cariz hagiográico, se criasse uma
iconograia oicial que viesse legitimar perante os seus membros,
e com paulatina abertura aos iéis de todo o mundo, sobretudo
em áreas de missionação, a verdadeira lenda que os testemunhos
e escritos iam entretecendo sobre Inácio de Loyola e Francisco
Xavier e que desse corpo às igurações através de protótipos
passíveis de ser seguidos em obras de pintura, de escultura, de
gravura, de baixo-relevo, de iluminura, de ourivesaria, de azule-
jo e em outros suportes e «géneros» plásticos aptos para servir
um culto ainda não oicializado, através de narrativas imagéticas
facilmente captáveis pelos crentes.
Facto que consideramos de grande importância nesse sentido,
o Arcebispo estimulou a presença de medalhas promocionais
de Inácio de Loyola e Francisco Xavier na Sé (e quase de certe-

212
za noutros lugares de culto), a ponto de tal provocar reservos,
senão protestos, da parte de pessoas mais zelosas: tal se perce-
be por um assento do Cabido, já após a morte de D. Teotónio,
onde se criticava a Companhia de Jesus por «pôr entre as relíquias
do Santuario as reliquias e imagens dos seus padres Inacio e Francisco Xa‑
vier», o que era razão de escândalo para algumas pessoas, por se
tratar de iguras que não estavam canonizadas 424. O próprio Pa-
dre António de Vasconcelos, Reitor do Colégio da Companhia
de Jesus de Évora, se viu obrigado então a escrever ao Cabido
em sede vacante, em carta com data de 15 de Novembro de 1608,
prometendo não continuar a pôr tais imagens no santuário da
Sé já que eram razão de desconiança e mal­estar 425.
Ora o que se constata é que tal presença de imagens, medalhas
e estampas promocionais da santiicação de Inácio de Loyola e
Francisco Xavier era, de há muito, uma prática corrente a cam-
panha de promoção e abriram reforçado caminho à candidatu-
ra do célebre missionário jesuítica. Daí a grande importância de
que se reveste, tanto pela qualidade artística como pela profun-
da carga de simbolismo e, ainda, pela hábil instrumentalização
da propaganda, a pintura do tecto da Sacristia do Colégio do
Espírito Santo, onde o anúncio da candidatura à santiicação de
Inácio de Loyola pela primeira vez se deiniu com base imagéti-
ca pensada ao pormenor. O facto de se tratar de um espaço não
propriamente público, mas de acesso restrito aos jesuítas e seus
convidados, reforçava o recurso tomado a tal extraordinária en-
cenação propagandística de que aí deram mostras.

8.3. O tecto da sacristia do Colégio


do Espírito Santo

No panorama de pintura mural portuguesa na viragem do


século XVI para o XVII, período extremamente rico pela quan-
tidade e qualidade de espécimes remanescentes, tema lugar de
destaque a obra fresquista que decora a Sacristia Nova do Colégio
do Espírito Santo, dos padres jesuítas de Évora, datada de 1599.

213
O facto mais extraordinário que se atesta neste conjunto
formado por decoração de brutescos e emblemas e por «pai-
néis» historiados com a iconograia de Inácio de Loyola, é que
se trata de um programa pictural que antecede em vinte e três
anos a canonização do fundador da Companhia de Jesus. Não
se trata, todavia, de situação única: também a respeito de São
Francisco Xavier existe o ciclo de vinte magníicas telas do
pintor André Reinoso nos arcazes da sacristia da igreja de São
Roque, em Lisboa, que data de 1619 e antecede portanto, em
três anos, a canonização do Apóstolo das Índias 426. O que se
passou foi que os jesuítas desde cedo conceberam uma for-
midável campanha no sentido de promover as suas iguras de
referência, através de bem urdidas campanhas visando a sua
canonização junto do Papado a curto ou médio prazo. Nesse
quadro era imperioso criar-se uma sólida narração de «factos
maravilhosos», de «lendas» e de «milagres», pelo que a icono-
graia artística assumiu, nessa estratégia, um papel de máxima
importância. No caso da Sacristia Nova, tratar-se-á do primei-
ro testemunho pictórico que assumiu tal campanha de promo-
ção. Vimos já que próprio Arcebispo estimulava essa campa-
nha, permitindo que pequenas estampas e medalhas de Inácio
de Loyola e Francisco Xavier tivessem presença entre as relí-
quias mostradas na Sé – algo que também suscitava reservas e
até protestos em alguns círculos da cidade…
Os fundos arquivísticos dos jesuítas, geralmente ricos, nada
nos dizem de concreto sobre esta grande empresa decorativa da
Sacristia do Colégio de Évora. Apenas se regista, em Outubro
de 1599, uma lacónica despesa dos padres eborenses que diz o
seguinte: «Fez‑se a nova sachristia e estucou‑se a Portaria» 427. Também
se sabe, pela documentação reunida por Fausto Sanches Mar-
tins 428, que foi uma dama da alta sociedade eborense, D. Maria
Alarcão, a benfeitora dessas obras, com altas quantias entregues
para tal im ao Reitor, padre Pedro Novais 429. Não custa admitir,
por outro lado, que tenha sido Peero Vaz Pereira, o arquitecto
do Arcebispo, a traçar a nova Sacristia jesuítica, tal como fazia,
quase de seguida, com a da Sé de Elvas, ainda que possa tratar-

214
-se do cumprimento de um programa de há muito contemplado
no «risco» de Diogo de Torralva e que só agora se ultimava 430.
Os programadores da decoração afrescada conheciam a fun-
do os textos de Inácio de Loyola, caso do Relato de um Peregrino,
de 1553, e a Vita Beati Patris Ignatii Loyolae Societatis Jesu Fundatoris,
de 1572, ainda que sem disporem de uma base iconográica que
pudesse ser seguida (apenas e só na Vita de Thomas de Leu, de
1590, surgem pequenas estampas sugerindo actos milagrosos e
esboçando uma primeira base iconográica inaciana). É de refe-
rir, antes de prosseguirmos, que em recente tese com o estudo
iconológico e simbólico da decoração, Celina Simas de Oliveira
defende que só a decoração de brutesco corresponde à data de
1599, ano do acabamento das obras da Sacristia Nova, sendo as
«cenas historiadas» posteriores à canonização ou, pelo menos,
posteriores a 1609, data da edição das primeiras séries de gra-
vuras com ‘milagres inacianos’ (por Theodore Galle, Cornelis
Galle, Adriaen Collaert e Karel Van Mallery) 431.
Cremos porém que essa tese não colhe em absoluto, não só
por estarem a decorrer as estratégias promocionais atrás lem-
bradas, mas também por razões técnicas e de análise das ‘giorna‑
tas’ da pintura, face à sua visível unidade de execução. O que se
passou aqui, sim, foi um fenómeno igual ao que sucedeu com
a eclosão da primeira iconograia de Francisco Xavier em São
Roque, ou seja, foram as imagens criadas na fase de promoção
tendente à santiicação de ambos (ocorrida em 1622) que gera-
ram modelos iconográicos que foram, de seguida, multiplicados
através de estampas maneiristas lamengas como as citadas e que
solidiicaram as iconograias que passarão a dominar a respeito
de São Francisco Xavier e de Santo Inácio de Loyola 432. Im-
portará ver as referidas séries de gravuras, sim, como derivações
formais do programa iconográico pioneiramente representado
em Évora. A data de 1599 no centro do tecto, aliás, reforça essa
lógica interpretação, não sendo crível que se cronografasse no
centro da abóbada pintada sendo a decoração pictural ulterior…
O programa iconográico desenvolvido nos frescos da Sa-
cristia Nova do Colégio eborense insere-se, pois, nesse siste-

215
Figs. ma propagandístico que a Companhia de Jesus moveu à escala
61-62
mundial, e em que o Colégio do Espírito Santo de Évora assu-
miu um papel transcendente nesse campo, dada a sua grande
importância como casa do saber. Aliás, há que pensar no facto
de que a Sacristia Nova era um espaço que não se abria a pesso-
as de fora sem licença do Superior, e só para ‘pessoas de calidade’
como se diz num regulamento inaciano 433, um facto que mostra
o grau de secretismo com que este e outros programas congé-
neres eram imaginados, concebidos e executados, ou seja, como
propaganda para dentro da Companhia. Tudo demonstra, aliás,
uma ciência emblemática na utilização dos grotescos, dos emblemas,
hieroglifos e das decorações brutescas que merece ser assinalada, se-
guindo aquilo que, como escrevia Andrea Alciato, era deinido
como «imagens falantes».
Segundo Celina Oliveira, sente-se nas decorações de grotesco
da Sacristia Nova que envolvem os quadri riportati a inluência das
images spirituelles que os padres jesuítas tanto defendiam (como
sucede nos textos seiscentistas de Daniello Bartoli e Théophile
Raynaud), como bem destaca neste passo: «Estas imagens espiritu‑
ais devem ser observadas relativamente à ideia demonstrada por
Loiola “ratio componendi loci”, a forma de meditação pela qual as
imagens mentais são vistas e interiorizadas. Considerando uma
imagem como uma mão, cada um dos dedos é o passo necessá-
rio para o “examen conscientitae”: o primeiro dedo corresponde à
oração; o segundo, a oração dedicada a Deus Todo-Poderoso;
o terceiro, ao exame; o quarto o acto de contrição; e inalmente
o quinto passo é a resolução. Estas imagens espirituais apelam
para o chamado “oculi mentis” (olho da mente) isto é, segundo
os teóricos uma imagem é usada de uma forma melhor, quando
compreendida como um eikon. É necessário para que o crente
interiorize a mensagem que lhe é transmitida, existir represen-
tações que apelem à imaginação» 434.
As pinturas da Sacristia Nova são de um substracto criativo
muito superior ao que era oferecido, no im do século XVI, por
muitas das oicinas eborenses, como a de José de Escovar e seus
colaboradores (act. 1580-1622), que como vimos eram sempre

216
«fáceis» nas receitas e sempre repetitivas nas soluções empregues
(vejam-se casos como a Ermida de Nossa Senhora do Guada-
lupe, o Santuário de São Brissos, ou a capela de São Lourenço
da Sé, esta de 1597). Mas ainda não passara o tempo da concep-
ção erudita das abóbadas afrescadas, tanto religiosas como civis,
fossem as sancas do convento de Santa Clara, ou os tectos dos
salões do Paço dos Condes de Basto (c. 1578-1585), pintados
por Francisco de Campos, Tomás Luís e Giraldo Fernandes de
Prado. A forte impressão causada por esses conjuntos de fres-
cos persistia na tipologia e na organização espacial das decora-
ções que se realizavam, com maior ou menor grau de eiciência.
O Mestre da Sacristia do Colégio do Espírito Santo atesta uma lin-
guagem erudita, uma ciência cenográica, um rico repositório
de elementos ornamentais de grotesco e emblemas, com boa in-
formação colhida do fresquismo erudito da geração precedente,
e com pessoalismos de desenho nas cenas historiadas (os quadri
riportati com passos da vida de Inácio de Loyola, estudados ao
detalhe por um anónimo programador), o que atesta um último
estádio de «crescimento» e evolução das fórmulas maneiristas na
pintura a fresco alentejana. O conhecimento dos passos da vida
inaciana não são de espantar numa casa de jesuítas em 1599, ain-
da por cima com a franca bibliograia já disponível; o que con-
tinua a gerar discussão é a existência de um primeiro programa
em imagens, dez anos antes das gravuras que irão divulgar essas
mesmas cenas milagrosas, que foi elaborado nos círculos ebo-
renses da Companhia de Jesus e teve de contar com uma ampla
base de conhecimento histórico-simbólico e com uma não me-
nos hábil base de controlo das teias pelas quais poderia incidir
a campanha promocional que se pretendia inaugurar.
Até à data, foram aventadas duas hipóteses de autoria para
este excelente programa afrescado da Sacristia Nova, ambas
carecidas de base documental deinitiva e, também, de pista de
comparação estilística segura. Infelizmente, no panorama da pin-
tura maneirista eborense (e também na generalidade da pintura
portuguesa do inal do século XVI), não existem outras obras
de fresco, ou de óleo, que possam ser cotejáveis com estas em

217
termos de estilo. Pelo menos, tal sucede no que reporta às ce-
nas historiadas, já que no que toca aos ornatos de brutesco e
stucco existem, sim, outros pólos de similitude, ainda que sem o
requinte de execução destes.
A primeira proposta defende que se trata de obra gerada no
seio da própria Companhia de Jesus por algum padre-pintor em
regime de itinerância, como muitas vezes sucedia nas encomen-
das jesuíticas. Autores como Fausto Sanches Martins e José Al-
berto Machado 435 assumiram essa tese, acrescentando que fo-
ram dois os artistas a trabalhar, um deles muito qualiicado, a
quem coube a complexa decoração grotesca, e um segundo a
quem couberam as cenas historiadas, algo mais displicentes em
termos formais. Celina Oliveira sugere mesmo que esses dois
irmãos­pintores sejam as iguras ‘retratadas’ num dos tímpanos.
Parece uma hipótese muito frágil, sabendo-se como as crónicas
da Companhia (caso da do Padre António Franco) são muito
rigorosas na referência aos seus artistas, caso do irmão-pintor
Manuel Henriques (1598-1644), também activo no Colégio do
Espírito Santo de Évora, mas após 1635, como provámos nou-
tro lugar 436. Um irmão-pintor com esta categoria deveria ser,
certamente, citado pelo Padre Franco, ou pelo Padre Manuel
Fialho, nas suas cuidadas crónicas eborenses, no que reporta às
descrições colegiais.
A segunda proposta autoral, por nós defendida, aponta para
o nome do pintor eborense Custódio da Costa, um artista do-
cumentado entre 1591 e 1632, que serviu clientes importantes:
D. Teodósio II e a Casa de Bragança, D. Teotónio de Bragança
e o Arcebispado de Évora, os frades da Cartuxa, o Cabido da
Sé, os dominicanos, e as mais ricas irmandades eborenses. Era
pintor prolixo, pois exercia as modalidades de fresco, têmpera,
óleo, dourado e estofado, sendo estimado como especialista de
fresco (pintou a Porta da Lagoa, em 1619, aquando da visita a
Évora de Filipe II de Portugal e sua comitiva), mas infelizmen-
te toda a sua obra documentada desapareceu, pelo que são só
conjunturais as propostas de identiicação que, sob prudente
reserva, se avançam.

218
As alegorias que Custódio da Costa afrescou em 1619 no
Arco da Porta da Alagoa incluíam iguras históricas como Ser-
tório e Giraldo Sem Pavor e mártires como os santos Manços,
Vicente, Sabina e Cristeta, as alegorias dos rios Tejo e Guadia-
na437, sendo de lastimar o seu desaparecimento. Sendo o tecto
da Sacristia do Colégio (1599) uma obra que se destaca no pa-
norama da pintura mural alentejana de viragem do século XVI
para o XVII, pelo substracto criativo (bem superior aos que ofe-
reciam oicinas como a de José de Escovar), a hipótese é cre-
dível, face à linguagem erudita, ciência cenográica, repositório
de elementos ornamentais de grotesco e pessoalismos de dese-
nho que se observam na pintura inaciana. Obra requintada, com
programação ao detalhe, diicilmente pode ser comparada com
as decorações de grotesco no retábulo da sacristia da Cartuxa,
que são da responsabilidade de Custódio da Costa, ou com de-
corações fresquistas naturalmente menos complexas, como as
da igreja de Nossa Senhora da Graça do Divor ou o tecto da
nave da Capela do Paço na Quinta da Azaruja em São Miguel
de Machede 438, que apesar de tudo podem, de algum modo, ser
reunidos no acervo de decorações tardo-maneiristas inscritas na
linguagem da Sacristia do Colégio jesuítico e onde se sente, ain-
da, a inluência das decorações do Paço dos Condes de Basto.
Sobre o artista, sabe-se já alguma coisa. Nasceu por volta de
1565 439, já estava activo como pintor em Novembro de 1589 no
Mosteiro da Cartuxa (estofando imagens e pintando grutescos),
em Novembro de 1591 assina uma iança sobre a posse de casas
em Évora a favor dos monges cartuxos 440, em Setembro de 1593
ele e sua mulher Domingas Pereira adquirem ao ourives Barto-
lomeu Fernandes as casas no Terreiro da Mouraria onde instala
a oicina 441, em 1586 associa-se a Pero Vaz Pereira em obras da
Cartuxa, volta a estar documentado em Junho de 1602 ao pin-
tar em Vila Viçosa, para D. Teodósio II, o leito da sua câmara
ducal 442, em 1604 testemunha numa anulação de casamento 443
e numa venda de casa na Travessa da Mesquita 444, em Feverei-
ro de 1608 testemunha numa procuração sobre bens da Mise-
ricórdia de Évora 445, em Maio de 1608 assiste ao baptizado em

219
São Mamede da sua ilha Escolástica 446, em 1609 toma como
aprendiz André Mendes Banha 447, em 1613 faz decorações na
Sé por ocasião da visita da Raínha à cidade 448, em 1 de Agosto
de 1617 testemunha num casamento 449, em 1619 afresca a Porta
da Alagoa por ocasião da cerimónia de entrada de Filipe II 450,
em Março de 1621 depõe no processo de habilitação para fami-
liar do Santo Ofício do pintor André Mendes Banha (que não
foi aceite por ter «parte de cristão novo») 451, em Setembro de
1626 pinta e doura a mando da Confraria de Nossa Senhora do
Rosário do Mosteiro de São Domingos de Évora, junto a Bar-
tolomeu Sanchez e António Vogado, as esculturas do grupo da
Árvore de Jessé (lavradas pelo escultor Adrião Pires de Faria), em
Julho de 1631 é testemunha no assento de testamento de Antó-
nio Gonçalves 452, e em 20 de Agosto de 1632, última referência
conhecida, morre­lhe o ilho Agostinho Dinis 453.
Se se vier a provar que os frescos e stucchi da igreja da Gra-
ça do Divor (uma empresa de D. Teotónio de Bragança) são de
Custódio da Costa, notam-se de facto similitudes de estilo, a ní-
vel de igura, e no desenho das cabeças de anjos, e na decoração
geométrica, com os repertórios formais do Mestre da Sacristia
Nova. Mas, neste e noutros casos de cotejo, tem de admitir-se
sempre que se trata mais de ‘inluências de época’ que de obras
de uma mesma «mão», já que as decorações da Sacristia do Co-
légio relectem, como não podia deixar de ser, o gosto tardo­
-maneirista que era o da tradição sedimentada na cidade: a de-
coração all’antico de Tomás Luís nas salas do Paço dos Condes
de Basto, o gosto das decorações coevas do Paço de Vila Viçosa
(aliás, o pintor do Duque, André Peres, documenta-se de pas-
sagem por Évora em… 1600) e, certamente, também o gosto
das perdidas decorações de Custódio da Costa e outros artistas
locais, e tudo isso imperou nas fontes de inspiração repertorial
e estilística aqui seguidas pelo artista escolhido pelos inacianos.
Em suma: nada de sólido existe para assegurar veracidade a
esta segunda hipótese que tem, todavia, argumentos que a podem
reforçar, caso se conirme a presença de duas ‘mãos’, uma na
parte de brutescos fantasistas, outra nos ‘quadri riportati’. A este

220
respeito, a possibilidade de aqui ter intervindo junto a Custódio
da Costa um artista de fora, mas não da esfera da Companhia de
Jesus, pode ter base de sustentação. Recentes pesquisas permi-
tiram saber que em 1598-1601 estava em Évora, em misteriosa
itinerância e com origem ignota, o pintor franco­lamengo (?)
Isbrant de Renoy, citado nas fontes como Isbrando de Renoir,
a quem os frades do mosteiro do Carmo de Évora encomenda-
ram então um custoso retábulo (infelizmente desaparecido)454.
Devia ser igura de consideração, a crer no modo como a co-
munidade fradesca albergou o ilustre pintor estrangeiro, mas a
falta de obras remanescentes impede de se saber os seus verda-
deiros méritos. O que fez então em Évora, porém, é algo ainda
não apurado.
A importância dos frescos da Sacristia Nova do colégio do
Espírito santo não se restringe à parte artística propriamente dita.
O programa inaciano que agora é alvo de tratamento e estudo
multidisciplinar assume-se de grande valia, também, pelo modo
como a promoção de um futuro santo é aqui realizada, no quadro
de uma campanha vaticinada a ter sucesso a curto prazo, como
teve… É por isso que estas pinturas são um livro aberto sobre a glo‑
balização católica à luz do compendiário jesuítico. Aí se representam ani-
mais como o pavão, o pelicano, o peru, o cisne, o cão, a raposa e
a lebre, insectos como a aranha, homens de culturas asiáticas, i-
guras de híbridos como centauros e sátiros, motivos itomóricos,
‘ferroneries’ lamengas, cartelas de Antuérpia, bustos tricéfalos,
pirâmides, imitações de pedra, anjos, um eclipse solar, e cuidados
arranjos de folhagem entre outros motivos vegetalistas.
Tudo é simbólico e atesta uma narrativa coerente, como su-
cede com as referências precisas aos povos a evangelizar pelos
missionários da Companhia de Jesus, uma questão a que o Ar-
cebispo, mais uma vez, se mostrava parte profundamente inte-
ressada: o mandarim, que referencia a China e o Japão, o hin-
du, que referencia a Índia, e o índio americano, que referencia a
América meridional. Há um aspecto que parece evidente e me-
rece ser destacado: a forte inluência de modelos composicio-
nais lamengos, no tipo de molduras dos «quadri riportati» com

221
passos da vida de Inácio, no tipo de ferroneries, e mesmo no de-
senho de certas iguras nas «cenas» inacianas, o que parece vir
ao encontro da última hipótese autoral formulada.
Independentemente dos mistérios que prevalecem, a vasta
pintura da Sacristia Nova, executada em 1599, assume-se como
uma verdadeira pinacoteca imaginizada e como instrumento in-
termediário de oração exclusiva para os eleitos da Companhia,
com os seus emblemas morais cuidadosa e estrategicamente se-
riados através do esforço de um erudito programador (acaso o
próprio Superior do Colégio ?), e visando exaltar as virtudes e
milagres do seu fundador.

222
Notas

397 Ramón González Navarro, Universidad y Economia: el Colegio Mayor de San Ildefonso
de Alcalá de Henares, 1495‑1565, Universidad de Alcalá, 1998.
398 Rui Lobo, O Colégio‑Universidade do Espírito Santo de Évora, Évora, ed. CHAIA-
-Centro de História da Arte e Investigação Artística, 2009.
399 Fausto Sanches Martins, A arquitectura dos primeiros Colégios jesuitas em Portugal,
1542‑1759, Doutoramento, Universidade do Porto, 1994, pp. 223-224.
400 Túlio Espanca, «Notícia dos edifícios do Colégio e Universidade do Espírito
Santo de Évora», A Cidade de Évora, nºs 41-42, 1959, pp. 155-185.
401 Sobre o «modo nostro» na sua aplicação perninsular e ultramarina, cf. os textos
do Simposio Internacional sobre La Arquitectura Jesuitica, coord. de Jesús Criado Mai-
nar, Maria Isabel Álvaro Zamora e Javier Ibáñez Fernández, Zaragoza, 2012, desig-
nadamente o texto de Paulo Varela Gomes e Rui Lobo, «Arquitectura de los jesuítas
en Portugal y en las zonas de inluencia portuguesa», pp. 473­495.
402 Rui Lobo, op. cit., pp. 33-36.
403 Padre António Franco, Imagem da Virtude em o Noviciado da Companhia de Jesus do
Real Collegio do Espirito Santo de Evora, Lisboa, 1714, pp. 5-6.
404 Padre Baltazar Telles, Chronica da Companhia de Jesu na Provincia de Portugal, Lis-
boa, ed. Paulo Craesbeeck, 2 vols., 1645-1647, vol. I, 1645, p. 364.
405 Fausto Sanches Martins, op. cit., pp. 238-239 e 855-856.
406 Túlio Espanca, Inventário Artístico…, 1966, pp. 92-93 e 236-237. Do colégio de
São Paulo ainda nos chegaram, numa das salas que serve hoje a Direcção Geral de
Finanças, as pinturas de brutesco, datadas de 1689, que a decoram.
407 B.N.P., Reservados, D. Theotonio de Bragança. Noticias do seu governo, cit., l. B
(DOC. Nº 46).
408 B.N.P., Reservados, D. Theotonio de Bragança Noticias do seu governo, cit., ls. 10 e
vº (DOC. Nº 46).
409 B.N.P., D. Teotonio de Bragança – efemérides da sua vida, MS 29/47, 3, da autoria do
Dr. Francisco Galvão.
410 Conhecem-se os contratos de Maio de 1575 com os pedreiros Diogo Ferreira e
António Fernandes, a que assistiu como testemunha o arquitecto padre Silvestre Jor-
ge (A.D.E., Lº 120 de Notas de Álvaro Ramalho, ls. 102 vº­104). A atribuição das traças
do Colégio da Puriicação a Silvestre Jorge decorre da investigação de Fausto Sanches
Martins, op. cit., p. 238, e parece ganhar contra-prova incontornável com estes contratos.
411 A.D.E., Lº 193 de Notas de Domingos Pires, ls. 110­113 vº (contrato de 22 de Ou-
tubro desse ano com o mestre Jerónimo de Torres).
412 A.D.E., Lº 204 de Notas de Domingos Pires, ls. 95­96.
413 Fausto Sanches Martins, op. cit., p. 344.
414 Joaquim Chorão Lavajo, «As Humanidades em Évora», in Do Mundo Antigo aos
Novos Mundos. Humanismo, Classicismo e Notícias dos Descobrimentos em Évora (1516‑1624)

223
(comiss. por Fernando António Baptista Pereira), Évora, Comissão Nacional para as
Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1999, pp. 43-75.
415 Cf. Federico Palomo Del Barrio, Poder e Disciplinamento en la Diocésis de Evora: el
episcopado de D. Teotonio de Bragança, Madrid, Universidad Complutense, 1994.
416 Joaquim Veríssimo Serrão, História de Portugal, vol. III, Lisboa, Editorial Ver-
bo, 1978, pp. 363-365.
417 Fausto Sanches Martins, op. cit., vol. III, pp.65-67. Sobre os saberes e a livraria,
cf. também Maria de Fátima Nunes e Augusto da Silva,S.J. (org.), Da Europa para Évo‑
ra e de Évora para o Mundo. A Universidade jesuítica de Évora (1559‑1759), Évora, 2009.
418 Joaquim Chorão Lavajo, op. cit., p. 61.
419 Pe Baltazar Telles, Chronica da Companhia de Jesu na Provincia de Portugal, cit., vol.
II, 1647, p. 366.
420 Manuel Joaquim Branco, op. cit., pp. 240-241.
421 Jorge Henrique Pais da Silva, Estudos sobre o Maneirismo (colectânea póstuma,
org. Fernando António Baptista Pereira), ed. Presença, 1983, p. 163.
422 Luís de Moura Sobral «Espiritualidade e propaganda nos programas iconográ-
icos dos jesuítas portugueses», Actas do Cong. Internacional A Companhia de Jesus na
Península Ibérica nos séculos XVI‑XVIII. Espiritualidade e Cultura, vol. II, 2004.
423 Vítor Serrão, A Pintura Proto‑Barroca em Portugal, 1612‑1657. O triunfo do Naturalismo
e do Tenebrismo (2 volumes, polic.), Universidade de Coimbra, 1992, vol. II, pp. 75-81.
424 Chantre Alcântara Guerreiro, «Notícias da Igreja Eborense inseridas no tríp-
tico cronológico dos Papas, Reis e Prelados (1166-1910)», A Cidade de Évora, nº 55,
1972, pp. 13-99, refª pp. 67-68.
425 Idem, ibidem.
426 Vitor Serrão, A Lenda de São Francisco Xavier pelo pintor André Reinoso, Lisboa,
Quetzal e Santa Casa da Misericórdia, 1993.
427 Citado por Celina Simas de Oliveira, op. cit.
428 Fausto Sanches Martins, op. cit., pp. 223-224.
429 Idem, ibidem.
430 Fausto Sanches Martins, op. cit., pp. 238-239 e 855-856.
431 Celina de Oliveira, op. cit..
432 Vitor Serrão, «A série seiscentista da ‘Vida de São Francisco Xavier’ do antigo Co-
légio do Espírito Santo de Évora: a iconograia xavieriana à luz de uma singular nar-
ração policénica», Oriente, nº 13, Dezembro de 2005, pp. 110-130.
433 B.N.P., Reservados, Cód. 4458, dado a conhecer por Celina Oliveira, op. cit.
434 Celina Simas de Oliveira, op. cit.
435 José Alberto Gomes Machado, “As pinturas a fresco da Sacristia Nova da igre-
ja do Espírito Santo de Évora (1599)”, Homenagem ao Prof. Augusto da Silva, Dep. de
Sociologia da Universidade de Évora, 2000, pp. 347-359.

224
436 Vitor Serrão, art. cit. in Oriente, 2005.
437 A.D.É., Lº 4º do Registo da Câmara, ls. 220 e segs.
438 Aníbal da Gama Caeiro, O Paço da Quinta e a sua Capela. Um estudo, após as obras
de recuperação do templo, Évora, 1996.
439 Segundo se depreende da declaração que fez ao Tribunal do Santo Ofício de
Évora, em 1621, em que atesta ter «cinquenta anos pouco mais ou menos».
440 A.D.E., Lº 274 de Notas de Baltazar de Andrade, tabelião de Évora, ls. 104 e vº. Inédito.
441 A.D.E, Lº 308 de Notas de Pedro Borges, ls. 36 vº a 38. Inédito.
442 A.D.E., Lº 9 de Notas de André Luís de Cerveira, tabelião de Vila Viçosa, ls. 176 a 178.
443 A.D.E., Lº 372 de Notas de Manuel Galvão, ls. 169 e vº.
444 A.D.E., Lº 377 de Notas de Manuel Galvão, ls. 67 a 69 vº.
445 A.D.E., Lº 354 de Notas de Luís Gonçalves Pegas, ls. 86 vº a 88 vº. Inédito.
446 A.D.E., Lº 4 de Baptismos de S. Mamede, 1607‑1648, l. 15.
447 A.N.T.T., Habilitações do Santo Ofício, ‘André’, Maço 1, Diligência 24. Inédito.
448 B.P.E., M-597-34 (fragmento de Livro de Obras da Sé), l. 9 vº. Recebeu 15.980
rs uma primeira vez, 2.100 rs uma segunda e 3.200 rs da derradeira, conforme ao rol
que discrimina as obras realizadas.
449 A.D.E., Lº 65 de Casamentos da Sé, Cx. 30, l. 149. Informação inédita de Fran-
cisco Bilou.
450 A.D.E., Livro de emprestimo do dinheiro que se gastou na entrada de Sua Magestade nesta
cidade anno de 1619 (Câmara, Lº 7655, cx. 1), l. 24.
451 A.N.T.T., Habilitações do Santo Ofício, ‘André’, Maço 1, Diligência 24.
452 A.D.E., Lº 564 de Notas de Francisco Gonçalves Pegas, ls. 13 vº a 14.
453 A.D.E., Lº de Defuntos da Misericordia, 1630‑1639, refª em Túlio Espanca, «Notas
sobre oicinas de pintores em Évora nos séculos XVI e XVII», A Cidade de Évora,
1947, p. 184 e Doc. XXIV.
454 Colecção Pedro d’Azevedo, Maço de Contratos de Obras respeitantes à Capela‑Mor
do Mosteiro do Carmo de Évora (1568‑1623). DOC. Nº 34.

225
9. d. teotónio e o conceito
t r i d e n t i n o d e R E S TAU R O
STORICO

9 . 1 . U m a pa s to r a l at e n ta ao pa s s a d o
histórico

Foi fundamental para a formação intelectual e teológica de D.


Teotónio de Bragança o papel doutrinário renovador do Concí-
lio de Trento, muito em especial a faceta de valorização do pa-
trimónio histórico e arqueológico paleo-cristão, o que conduziu
os responsáveis da Igreja Católica a desenvolver, dentro da sua
reorganização global pós-conciliar, uma prática de conservação
e valorização dos lugares de culto do cristianismo primevo 455.
Já antes analisámos, a propósito da revalorização dos lugares
de martyrium do Alentejo, estas opções seguidas pelo Arcebispo,
olhos postos nos textos da Roma tridentina.
Essas bases doutrinárias estão consubstanciadas, como vimos
atrás, nas obras de autores como os Cardeais Cesare Baronio,
Carlo Borromeo, Roberto Belarmino e Gabriele Paleotti, sem
esquecer também o papel do português D. Frei Bartolomeu dos
Mártires, Arcebispo de Braga com passagem em Trento, obras
essas com presença certa nas bibliotecas eborenses, como era a
do próprio Arcebispo, ou a dos nobres Castro, Condes de Bas-
to e governadores militares da cidade ou, ainda, a da Univer-
sidade jesuítica, que era riquíssima. Encontram-se, assim, refe-
rências à obra de Baronio, e à sua opinião autorizada, quando

227
se tratou, por exemplo, de repropor memória, dando veracidade a
determinados historiais lendários envolvendo os alegados már-
tires alentejanos.
A arquitectura sacra foi repensada no âmbito do Concílio de
Trento seguindo o princípio da Restauratio est Rinnovata Creatio,
que D. Teotónio acolheria, ao defender a subordinação do espa-
ço sacro a uma liturgia empenhada em seduzir e esclarecer (ani‑
mos impellere), tomando como acento o valor histórico‑arqueológico e
devocional, motor da intervenção sobre as preexistências, trans-
formadas por necessidades de adaptação ao crescimento das
comunidades (instaurare). Estes princípios eram discutidos em
Roma em academias como a della Notti Vaticanae, instituída
pelos Cardeais Carlos Borromeo e Marcello Sirleto, e em cuja
agenda, tanto quanto se sabe pelos relatos entre 1561 e 1565, se
inseria justamente o debate sobre as questões da arqueologia e
do restauro, entendendidas como essência da reforma católica
que com Trento se empreendera – ainda que no Concílio muito
se discutisse o cristianismo primitivo e o reconhecimento dos
seus valores, mas pouco se tivesse falado sobre o modus operandi
face à arquitectura e ao património 456. Queremos crer que tam-
bém em Évora existiam, no inal do século XVI, tertúlias cultu-
rais do mesmo tipo, não se esquecendo que já antes dele André
de Resende e o Infante D. Luís haviam levado a cabo pesquisas
arqueológicas 457, e sabendo-se o que diz o biógrafo de D. Te-
otónio sobre o hábito que tinha de trocar ideias com os seus
colaboradores próximos no decurso de devassas e visitações.
O conceito de restauro storico deinido pelo oratoriano cardeal
Cesare Baronio, um «peritissimus antiquitatis» segundo a conside-
ração geral 458, assentou nessa justa revalorização do papel do
historiador como investigator veritatis capaz de adaptar os espa-
ços sagrados às novas funcionalidades do tempo, sem lhe retirar
autenticidade, e capaz de ixar uma hagiologia consistente dos
mártires da Igreja 459. Por isso, o papel das artes de decoração
como fonte afectiva, documental e pedagógica, adquire com Baronio
uma dimensão apologética, que integra no mesmo tecido de
preocupações a História, a Arqueologia e a Filologia justamen-

228
te para deinir e destacar, o Ad Perpetuam Rei Memoriam vs. Ad
Majorem Gloria Dei, o verdadeiro programa de valorização patri-
monial da Igreja que se deveria e era possível empreender 460. A
arte, como conirmação da presença divina no mundo, está ao
serviço da História, airma Baronio nos Annales, pelo que tem
forçosamente um duplo signiicado: como documento históri-
co e como emblema da Igreja militante 461. É com o papado de
Clemente VIII (1592-1605) que o restauro storico se assume prá-
tica aceite, sendo esse o tempo das grandes comemorações ju-
bilares da Igreja Católica e uma fase de apogeu da Roma Felix.
Ora Portugal não esteve dissociado dessas problemáticas, e tal
ideário encontrou nas políticas (re) construtivas do Arcebispo
de Évora nas igrejas da sua arquidiocese, tal como se atestou ao
longo dos capítulos precedentes, um eicaz intérprete.
A recuperação do locus sacrum através de um tipo de «restau-
ro devoto», apto a devolver função litúrgica do espaço que os
tempos desmemorizaram e arruinaram, enriquecido entretanto
por actualizações estéticas mas com atenção às questões conser-
vativas, é assunto que está em debate na Évora deste momento,
dentro da tradição humanística, de André de Resende a Severim
de Faria. Nada do apregoado obscurantismo que se seguiria a um
período de brilho, o do humanismo de meados do século XVI,
como tantos autores têm desatentamente apregoado… Surge
assim, com ressonância das teses de Cesare Baronio, uma defesa
consequente do facto histórico através da compilação da História
da Igreja, com análise rigorosa das fontes documentais, ilolo-
gicamente organizadas, e com o estudo arqueológico, sempre
que possível, das preexistências arquitectónicas (paleocristãs,
românicas ou mesmo góticas no caso do cardeal romano) – o
que permitiu seguir um método de revalorização do património
católico com eco na Arquidiocese de D. Teotónio.
Como já se airmou, nestes anos de consolidação da Re-
forma Católica em Portugal, «as fontes históricas passam a ser
objecto de dupla investigação, ilológica e patrimonial, abrindo
campo dos arquitectos, escultores, pintores, douradores, imagi-
nários, entalhadores, estucadores, azulejadores, ourives e outros

229
artistas para o cumprimento de uma espécie de arte senza tempo
pontuando o triunfo de Roma e a autoridade absoluta da Igre-
ja Católica» 462.

9.2. O conceito baroniano de


«RESTAUR O STORICO»

Com as obras de Cesare Baronio, deiniram­se dentro e fora


de Itália os princípios que deviam regular o restauro storico dos
velhos lugares de culto paleo-cristão e, bem assim, as normas
para se fundamentar no terreno uma nova arquitectura tridentina
senza tempo. O acento na construção antiga e nas suas formas e
modelos civilistas esteve, assim, na base da inspiração dos ar-
quitectos italianos do im do século XVI, caso de Domenico
Fontana e de muitos outros. O restauro da igreja de São Nereo
e Acchileo, em Roma, obra que o Cardeal orientou muito de
perto como se viu em capítulo precedente, foi uma intervenção
modelar no que toca ao respeito pela preexistência, tal como
prescreviam os princípios tridentinos, depois de o templo ser
devidamente estudado e analisado, e constituíu uma das mui-
tas referências basilares para a construção desses anos, pensa-
da como uma espécie de im de História em harmonia com o
triunfo do Catolicismo.
Atento às contribuições do Oratório de São Filipe Neri para
este debate, Baronio explorou também aspectos de conserva-
ção e restauro, já referidos atrás, e que não podemos deixar de
considerar ‘modernos’ 463. O prestígio do Cardeal era imenso;
um humanista português que o conheceu no Oratório de Roma,
Aquiles Estaço (1524-1581) elogia-lhe a erudição nos estudos
dos «insignes monumentos da antiguidade» num texto em que se mos-
tra impressionado pelo saber erudito de Baronio 464. O cardeal
acumulou cargos, no seio do Oratório e como Prefeito da Bi-
blioteca Vaticana, que lhe asseguraram não só o domínio dos
saberes sobre o património artístico paleo-cristão, como a pos-
sibilidade prática de nele bintervir, e a metodologia adequada

230
para o fazer. Reuniu um consenso tal que, nos últimos anos de Fig. 15
vida, o seu prestígio era imenso, de tal forma que será mesmo,
em 1605, um dos candidatos a papa na sucessão de Clemen-
te VIII, não tendo tido, porém, o apoio da poderosa Espanha
nessa pretensão que levaria ao trono papal (embora por poucas
semanas apenas) mais um Médici, Leão XI.
Para os conceitos baronianos, segundo defendeu Gabriela
Casella 465, as igrejas paleocristãs e medievais deviam ser vistas
a essa luz e como opus antiquitatis, ou monumentos, pelo que era
imperioso restaurar as suas estruturas, e as suas decorações de
tipo neo­constantiniano, em respeito à estratiicação do tempo.
No caso do Oratório de São Manços da Coluna em Évora, por
exemplo, o projecto teotonino revestiu-se dessa perspectiva his-
tórica a im de legitimar um culto recorrendo à secular coluna,
devidamente refuncionalizada, e ao papel da pintura neo-antiga
(nesse caso um Calvário pintado na cruz que en cima a coluna),
à boa maneira dos mosaicos carolíngeos que em SS. Nereo e
Achileo, e outras igrejas paleocristãs restauradas por Baronio,
foram alvo de estudo, consolidação e reinterpretação. Existe, as-
sim, uma dimensão de encomenda heróica, como acto providencial
de agentes tutelares, com intervenção apta a preservar a memó-
ria dos sítios hierofânicos e que assenta em avaliações qualitati-
vas das existências e das intervenções recomendadas. É por isso
que a cumplicidade territorial e a memória histórica da Igreja se
fundem, como o Cardeal airmava explicitamente nos Annales,
numa força identitária cristã que é comum à vastidão dos terri-
tórios abrangidos e que vem consolidar a sua própria auctoritas.
O Papa Gregório XIII, que Cesare Baronio tanto elogiou
pela sua politica de restauro e pela moderação face às preexistên-
cias, através de uma avisada política de salvaguarda, enviou em
1572 o Breve Cum sicut ao Arcebispo e Vigários de Braga, onde
ordenava que os eclesiásticos custeassem a restauratio das antigas
igrejas e dos seus acervos antigos para maior proveito da aucto‑
ritas romana. Com o proselitista Sisto V, e sobretudo com Cle-
mente VIII, essa inluência não deixou de se reforçar, com res-
sonâncias fora de Itália, e seria colhida na esfera de inspirações

231
de D. Teotónio de Bragança, ora através da leitura dos tratados
do arquitecto papal Domenico Fontana, ora usando o simbolis-
mo da forma piramidal para inovar a função utilitária de certos
objectos de culto (caso dos relicários de prata), ora ainda multi-
plicando as pesquisas arqueológicas em sítios de alegado culto
paleo-cristão (como sucedeu em Sines com as relíquias de São
Torpes, que o próprio papa Sisto V encarregou o Arcebispo de
Évora de procurar e revalorizar)...
Os valores baronianos surgem aplicados à realidade portugue-
sa, também, no manuscrito De Antiga et Veneranda Species Aedii‑
catione Religiosa in Regni Portucalensis Pro Maxima Causa Christiana
descoberto por Gabriela Casella na Biblioteca Vallicelliana de
Roma, onde a identidade lusitana se reforça de carácter providen‑
cial através das crónicas que aludem a milagres, relíquias e san-
tos locais – ou seja, uma hagiologia autóctone que assenta numa
encomenda heróica que integra discursos documentais e memoriais.
Esse manuscrito, irmado com o monograma M.L., prova a for-
ça de um método baroniano-tridentino aplicado às várias regi-
ões, onde a intenção apologética reforça o peso da antiguidade
cristã e a identidade de uma comitência nacional. Embora não
referindo especiicamente o caso do Arcebispado de Évora, o
que se lamenta, o pequeno mas elucidativo manuscrito baro-
niano reporta-se, sim, aos territórios da Arquidiocese de Braga,
destacando o papel histórico assumido por Portugal na intenção
subliminar que Baronio lhe desejava atribuír: o seu contributo
para a Reconquista da Península e para a cristianização do ter-
ritório, traduzida na aediicatione ecclesiae et fondatione monasterii per
mano genus portucalensis 466.

9 . 3 . D e n o v o o a r q u i t e c t o P e r o Va z
Pereira

Figura chave nas políticas de renovação construtiva de D.


Teotónio de Bragança foi o seu arquitecto e escultor Pero Vaz
Pereira (c. 1570-1644) 467. Nascido em Portalegre, por volta de

232
1570, era quase de certeza ilho do entalhador e marceneiro lo-
cal Diogo Vaz Pereira, um artista envolvido nas obras da Sé e
presumivelmente associado às empreitadas do grande escultor
Gaspar Coelho, o que leva a presumir que o jovem Pedro se ti-
vesse formado inicialmente nessas artes no atelier paterno e nos
círculos em que se produziam os retábulos das várias capelas
catedralíceas. Em 1591, de facto, encontramo-lo com a designa-
ção de «Pero Vaz Pereira, marceneiro» a testemunhar o casamento
de Francisco Fernandes com Isabel Fernandes (sua irmã ?), acto
celebrado na igreja de São Lourenço de Portalegre 468.
Já em 1593 se encontrava ao serviço do Arcebispo D. Te-
otónio de Bragança, morando em Évora e trabalhando nas
obras do Mosteiro da Cartuxa, na órbita do arquitecto Nico-
lau de Frias. Como se disse, estadeara pouco antes em Roma,
enviado pelo Arcebispo, vivendo na Cidade Papal em tempo
de Clemente VIII, e aí aprendeu as artes da escultura e da ar-
quitectura e, certamente também, os conceitos de restauro sto‑
rico do Cardeal Baronio, utilizados na recuperação dos velhos
templos paleocristãos 469. De volta ao Reino, aparece referido
como escultor do Arcebispo, como vimos atrás, numa obriga-
ção de Fevereiro de 1595 relativa à construção de uma cape-
la nos terrenos sitos no termo da vila de Portel onde estivera
previsto erguer o Mosteiro da Scala Coeli, de que se encar-
regou o pedreiro Vicente Ferreira a mando do dom prior da
Cartuxa D. Beltrão Morellio 470. Noutro contrato celebrado a
29 de Dezembro de 1595 nas casas de D. Teotónio, com o ad-
vogado Dr. Nicolau Gramaxo e o prior da Cartuxa, relativo
às doações para obras em curso nesse Mosteiro, foram teste-
munhas Pero Vaz Pereira, escultor do Arcebispo, e o pintor-
-dourador Custódio da Costa, envolvidos nessas obras 471.
Em 20 de Dezembro desse ano, os mesmos Pero Vaz Pereira,
escultor, e Custódio da Costa, pintor, testemunham da parte do
Arcebispo num contrato em latim sobre bens da casa e obras
que decorriam no mosteiro da Cartuxa, em fase terminal de
construção: assinam aí, e são indicados entre as testemunhas
como «Pietro Valasco Pereira et Custode da costa» 472.

233
Fig. 10 Veriica­se que estava muito envolvido nesses anos na cons-
trução da Scala Coeli, podendo admitir-se que Vaz Pereira se
tivesse responsabilizado por obras de imaginária sacra (no altar
da Sacristia), e pela traça do claustrim (1602), de sólido dese-
nho maneirista, que então se ergueu, bem como pela belíssima
fonte do claustro maior, que é já dos anos 20 do século XVII.
Em 1599, de novo o vemos ocupado com as traças da capela-
-mor e da Sacristia Nova da Sé de Elvas, dentro de um gosto
francamente despojado e «reformado», tendo aí a colaboração
do mestre de pedraria Manuel Ribeiro, outro artista da Casa de
Bragança 473. Em Elvas, desenhará também o portal da Sé, subs-
tituindo a primitiva portada manuelina, e atribui-se-lhe o ‘risco’
para a Fonte da Vila, em forma de tempietto clássico. Com a morte
do prelado eborense seu protector, passa ao serviço da Casa de
Bragança e em 1604 é contratado por D. Teodósio II como seu
arquitecto e escultor, sendo com esse estatuto que, nesse ano,
faz riscos para obras vultosas que decorriam no mosteiro dos
agostinhos de Nossa Senhora da Graça, em Évora 474. Também
é referido como arquitecto do Duque em 1611, no registo de
baptismo de um ilho do mestre pedreiro Manuel Rodrigues, o
ano preciso em que executa o lavabo de mármore para a Sala
de Medusa do Paço de Vila Viçosa 475. O lavabo da Sala de Me-
dusa, peça que subsiste, é de excelente prova das suas capacida-
des plásticas, ajudando a deinir melhor as suas opções estéticas,
dentro de um gosto contra‑maneirista despojado e civilista que era
a base da sua formação romana.
Não sabemos se entretanto fez nova viagem a Roma, mas
a verdade é que em 1616 se regista o facto de Pero Vaz Perei-
ra ter trazido da cidade papal certas relíquias com destino ao
altar de São Crispim e São Crispiniano da Sé de Portalegre 476,
o que referencia um papel responsável nestas políticas triden-
tinas de reforço da memória paleo-cristã. É o cónego Diogo
Pereira Sotto Maior, cronista dessa catedral e, também, amador
de antigualhas e investigador de pretensos lugares hierofânicos
na sua diocese, quem refere nesse ano de 1616 o o seguinte: ao
descrever a igreja da Sé, cita a «capela dos Santos martires Crispim

234
e Crispiniano onde estão suas reliquias muito veneradas, em hum sacrá‑
rio dourado, as quais trouxe da cidade de Roma Pero Vaz Pereira, natu‑
ral desta cidade, escultor e grande oicial nesta arte». A referência é va-
liosa, pois alude a uma viagem recente a Roma (que não devia
ser a de c. 1592-1594), além de mostrar o apreço que Vaz Pe-
reira via reconhecido na sua cidade natal e, mais ainda, o facto
de, para o cronista, ser a actividade de escultor que prevalecia
como nota encomiástica. O que leva a supor que possa ser da
sua lavra o «risco» do referido retábulo da Capela de São Cris-
pim e São Crispiniano e também do da Capela de São Mauro,
altares que se afastam tipologicamente da morfologia retabular
dos outros retábulos da Sé do tempo de D. Frei Amador Arrais
(o da capela-mor, o de Nossa Senhora da Luz, o de Nossa Se-
nhora do Carmo e o de Nossa Senhora do Rosário, todos eles
obras do famoso escultor-ensamblador Gaspar Coelho e da sua
oicina 477). As grandes imagens dos santos mártires sapateiros
poderão ser, também, do lavor de Pero Vaz Pereira, se levar-
mos em linha de conta o elogio do Cónego Diogo Pereira Sot-
tomaior aos dotes do conterrâneo nessa modalidade artística.
Este é um aspecto ainda mal esclarecido da obra deste artista: a
sua actividade como escultor. Mas será possível imaginar-se que
tanto as imagens de São Crispim e São Crispiniano da Sé de Por-
talegre, como o São Bruno numa dependência da Cartuxa, ou as
três imagens do retábulo de São Vicente de Évora, possam ser
da sua lavra ou, pelo menos, do seu risco.
A presença de Pero Vaz Pereira na sua cidade natal prolonga-
-se alguns meses, pois em Fevereiro de 1616 apadrinha na igreja
de São Tiago o baptismo de Isabel, ilha de Manuel Fernandes e
Maria Pereira 478, podendo essa estada relacionar-se com a fac-
tura do retábulo de São Crispim e São Crispiniano, que à data
se ultimava pela confraria dos sapateiros de Portalegre 479. Mas
cedo retornou a Vila Viçosa, onde morava, e ao serviço de D.
Teodósio II: em 1618, data em que desenha a Fonte Grande da
vila ducal, peça de ino desenho e ainda existente, apadrinhou,
juntamente com Catarina Frazoa, um ilho do mestre pedreiro
Francisco Lopes 480. Em 1620 encontra-se de novo em Évora,

235
quando lhe morre um moço criado. Nesse ano, passa por Cas-
telo de Vide e traça um palacete de «fromtaria de camtaria cham he
bem llavrada», ainda existente e que atesta, dentro de uma maior
severidade, certos postulados que se inspiram na fachada do
Paço Ducal de Vila Viçosa. E em 1632, instalado em em Vila
Viçosa, e já na qualidade de arquitecto do novo Duque D. João
II, apadrinha, juntamente com Ana Nunes Machada, um ilho
de André Machado e Grácia Correia 481.
Estes documentos, e outros que se atestam nos anos de Ar-
cebispado de D. Teotónio, e nos de seu sucessor D. Alexandre,
mostram o papel decisivo de Pero Vaz Pereira como intérprete
das ideias teotoninas. É por isso que muitos dos projectos de
reconstrução/ampliação e decoração de igrejas ligadas a velhos
cultos eborenses que ao longo deste estudo se foram referindo
lhe devem ser assacados. Atesta-se a sua intervenção, por força
estilística e documental, em São Tiago, na cidade, nas freguesias
rurais de Santa Maria de Machede, Nossa Senhora da Graça do
Divor e São Manços, em certas obras no mosteiro da Cartu-
xa e na igreja do mosteiro da Graça, etc, mas é natural que lhe
devam ser tributados outros desenhos de projecto a mando e
com supervisão do seu Arcebispo, como em São Pedro da Ga-
fanhoeira e em São Gregório (Arraiolos) ou em São Vicente do
Pigeiro (Évora), por exemplo. Há pesquisas que prosseguem e
estudos de terreno a cumprir.
O facto de Pero Vaz Pereira ter sido incumbido de trazer de
Roma, como se disse, determinadas relíquias para uma capela
catedralícea atesta a importância e a responsabilidade assumi-
da por Pero Vaz Pereira nas políticas de valorização dos cultos
matriciais e dos sítios hierofânicos da Arquidiocese de Évora.
Tal nos autoriza a adivinhá-lo quase de certeza presente nas
campanhas arqueológicas levadas a cabo por D. Teotónio em
Portel, quiçá na Tourega e, com toda a certeza, na aldeia de
São Manços e em Sines. Para a Casa de Bragança, trabalhará
depois, de modo sistemático, no término do Paço Ducal (dan-
do im à campanha iniciada em 1584 por Nicolau de Frias, que
alterava e ampliava a primitiva fachada da autoria do francês

236
Francisco de Loreto), e em muitas obras públicas, civis e reli-
giosas (Serra d’Ossa, Alter, Vila Viçosa, Castelo de Vide) que
se encontram bem documentadas. Mais sabemos que, entre
outra produção teórico-prática, dedicou a D. Teodósio II um
Tratado de Rádio Latino, inspirado (senão decalcado) no de La-
tino Orsini (Roma, 1583). Esse tratado pode ser o manuscrito
localizado por Luís de Albuquerque na Biblioteca da Univer-
sidade de Coimbra e estudado por Henrique Leitão. O interes-
se de Vaz Pereira no campo da cosmograia e nos estudos de
Orsini remete de novo para a sua passagem por Roma, onde
deve ter tido contacto com a obra. Como se sabe, o rádio lati‑
no tem cinco braços articulados com escalas organizadas com
diferentes aplicações, sobretudo no campo da artilharia, temas
que não podiam deixar de interessar o Duque de Bragança e
devem ter dado prestígio ao seu autor, no regresso da Cida-
de Papal, munido de saberes que na corte de Vila Viçosa não
eram certamente conhecidos 482.
Existem legítimas dúvidas sobre qual era o estado civil de
Pero Vaz Pereira, de quem se não registam casamentos, ou i-
lhos, ou herdeiros. Pode dar-se o caso de ter seguido a via reli-
giosa, tomando ordens menores, caso não invulgar no seu tem-
po, o que explicaria as condições que lhe patrocinaram uma ou
mais viagens a Roma, de onde estava mesmo habilitado a trazer
relíquias de santos... Tratando­se de um ilho de marceneiro de
Portalegre, como se explicaria a sua fulgurante carreira, que lhe
abre acesso à poderosa casa de Bragança, primeiro ao serviço
de D. Teotónio e, depois, do Duque D. Teodósio II ? O estatuto
de religioso de ordens menores poderia justiicá­lo 483: mesmo
que Pero Vaz Pereira tivesse grangeado sucesso nas obras da Sé
de Portalegre (e o elogio de Diogo Pereira Sottomaior indicia-
-o, ao chamar-lhe escultor insigne), o ascenso social e a acresci-
da notabilização do artista, só seriam explicáveis se tivesse tido
protecção de um Bispo (como Frei Amador Arrais), abrindo-
-lhe portas ao ensino religioso, acaso como estudante em Évora,
onde as portas que o levam ao serviço do Arcebispo assim se
abririam... Mas trata-se de uma questão por esclarecer.

237
Fig. 32 Voltando ao campo das artes plásticas, é de notar que a de-
Figs. signação de «escultor» com que aparece citado em alguma docu-
34-36
mentação arquiepiscopal eborense revela que Pero Vaz Pereira
tinha, além da prática da Arquitectura e dos conhecimentos de
Matemática e Geometria que se lhe reconhecem, uma actividade
regular de decorador, e é a essa luz que têm de ser vistas algumas
das obras identiicadas. O termo não atesta apenas a prática de
imaginário e escultor, sabendo-se que ele assumiu uma e outra:
fez imagens para a Cartuxa e acaso para a Sé de Portalegre, e
lavrou mármore em fogões de sala (Vila Viçosa, Serra d’Ossa)
e em fontenários. Do que se trata quando Pero Vaz Pereira apa-
rece mencionado como «escultor do Arcebispo» é, também, da sua
faceta de supervisor de obras de decoração integral de espaços
sacros entendidas como verdadeiras naves‑auditório e decoradas
com stucchi e frescos maneiristas, segundo as mesmas prescri-
ções da Roma Felix do último terço do século XVI, que ele co-
nheceu de perto!
Na realidade, ele agiu, na órbita do Arcebispado de Évora,
como supervisor de decorações de arte total. Por exemplo, na campa-
nha que dirigiu para a reconstrução e revalorização da igreja de
Santa Maria de Machede, uma das mais antigas freguesias da
Arquidiocese 484, sabemos que o artista não só traçou a obra da
nova igreja, construída dentro das tipologias funcionais e civi-
listas atrás descritas, como concebeu toda a decoração de fres-
cos, estuques e azulejos que revestem o espaço interior, e que
incluem um erudito programa pictórico com Sibilas e Profetas,
onde se equipara mais uma vez a sabedoria antiga aos valores
cristãos à luz das directrizes tridentinas. O mesmo se passara
com as gordas cartelas de stucchi (quase de certeza desenhados
por ele) que envolvem os quadri riportati da Capela de São Lou-
renço na Sé, em 1597. E no caso da decoração de fresco, de es-
tuque, de talha, de escultura e de azulejo da igreja de Nossa Se-
nhora da Graça do Divor, mais do que nos outros citados, esse
gosto pela harmonia da totalidade assume-se exponencial. Não
admira que, por alguns decénios mais, essa espécie de ars senza
tempo 485 adoçada pela união das várias modalidades artísticas

238
izesse escola, dos mercados mais ricos aos de menores recur-
sos. Trata­se de um gosto que se abre aos ingimentos, seja a
imitação de azulejo enxaquetado (em São Brissos), seja a obra
de massa simulando matéria nobre (Santa Maria de Machede),
seja o stucco dourado no lugar de entalhe (Graça do Divor). Os
azulejos da igreja da Graça do Divor são de padronagem polí-
croma, salvo os do arco-mestre, que são de brutesco, e incluem
pequenas iguras de sereias, junto a emblemas marianos, que
constituem exemplares únicos do género 486. Embora o grande
especialista Santos Simões os tenha datado de cerca de 1630, o
facto de serem aproximáveis, em termos de estilo, dos de São
Francisco de Estremoz (que datam de 1623), permitem admitir
que este revestimento azulejar seja algo mais antigo, dentro da
mesma campanha dos stucchi, esgraitos e frescos.
Tratou-se, assim, de uma opção ornamental de tipo novo que
ocupou este arquitecto como funcionário ao serviço de um di-
ligente prelado. Essa espécie de reinterpretação alentejana dos princí‑
pios sistinos destaca-se como alto cume na história da comunhão
dos géneros artísticos, o que torna as artes decorativas do tem-
po de D. Teotónio de Bragança um capítulo tão original, que se
impõe estudar em absoluto.

239
Notas

455 Gisella Cantino, Claudio Strinati, Luigi Spezzabero e Giorgio Fulco, Roma Nell’anno
1600, in Richerche di Storia Dell’Arte, nº 10, 1980.
456 Gabriella Casella, op. cit., vol. I, pp. 70-78.
457 Ainda não se levou a cabo um levantamento das referências históricas a cam-
panhas de tipo arqueológico realizadas edm Portugal durante a Idade Moderna. Por
exemplo, é pouco conhecida a campanha que o Infante D. Luís (através do arquitecto
Francisco de Holanda) realiza em Janas, junto à Ermida de São Mamede, para localizar
um suposto templo anterior. Também é pouco referida (embora seja de sentido dife-
rente por não visar comprovar a santidade de determinado lugar e, sim, pelo contrário,
atestar a falsidade de certa lenda) a campanha que o mesmo D. Luís mandou fazer no
lugar de Areias (Tomar) junto à torre de D. Guião, o chamado Ladrão Gayão, com o
objectivo de provar às populações que não existia nem nunca existira nenhum gigan-
te desse nome, motivo de assombração e temor das pessoas e viajantes. Os vestígios
achados na escavação de um túmulo junto à atalaia medieval vieram desfazer esse mito.
458 Gabriela Casella, op. cit., 2004, vol. I, pp. 92-106.
459 Cesare Baronio, Martyrologium Romanum, cum notationibus Caesaris Baronii, Roma,
1589. A obra, que mereceu aprovação papal de Gregório XIII em 1586, foi de se-
guida alvo de muitas reedições.
460 Gabriela Casella, op. cit., vol. I, pp. 47-52; Guazelli, Michetti e Barcellona, op.
cit., 2012, pp. 67-110.
461 Não deixa de ser interessante que Baronio elogie a política de Gregório XIII e
deixe críticas a Sisto V (um papa que aliás apreciava), no sentido em que, para alar-
gar ruas e modernizar o urbanismo da cidade, ele mandou destruir, dentro do seu
espírito intransigente, alguns monumentos da Roma antiga como a igreja de S. Lu-
cia ai Sette Soli...
462 Vitor Serrão, «Impactos do Concílio de Trento na arte portuguesa entre o Ma-
neirismo e o Barroco (1563-1750)», cit., p. 112.
463 Alessandro Zuccari, «La politica culturale dell’Oratorio Romano nelle imprese
artistiche di Cesare Baronio», StArte, nº 42, 1981, pp. 171‑193.
464 Américo da Costa Ramalho, «Notas sobre a formação de Aquiles Estaço», Bi‑
blos, nº 54, 1977, pp. 237-252.
465 Gabriela Casella, op. cit., vol. I, pp. 111-151.
466 Gabriela Casella, op. cit., vol. I, pp. 167-171.
467 Vitor Serrão, O fresco maneirista no Paço de Vila Viçosa, cit., pp. 130-136.
468 A.D.P., Lº de Casamentos da Freguesia de São Lourenço de Portalegre, cx. 41, l. 45 (27­
-XI-1591). Comunicação inédita de Francisco Bilou.
469 A documentação romana nada revelou que sobre esta estada do artista porta-
legrense. Todavia, numa dependência da igreja de Santo António dos Portugueses,
encontrámos (em Setembro de 1988) uma tela com a representação de Santo António
de Lisboa, com características seiscentistas e de discreta qualidade, que tem o interes-

240
se de ter uma inscrição na parte inferior que diz o seguinte: P. FRANCISCO. VAX.
PEREIRA. DE. BREGANÇA. LVSITANO. FF. Pode ser indicação de ofertante
e não de autor; de todas as formas, será que esse padre Francisco Vaz Pereira, ao
que parece ligado à Casa de Bragança e de passagem por Roma, era um parente do
arquitecto-escultor aqui tratado ?
470 A.D.E., Lº 311 de Notas de Pedro Borges, ls. 8 vº­11 vº.
471 B.P.E., Mosteiro da Cartuxa, Lº 1 (Escrituras, desde 1587), l. 58. DOC. Nº 28.
472 Idem, l. 70 e segs.
473 A.M.E., nº 6682 F.G., Lº de Receita e Despesa da Fabrica da Sé, 1598‑1638.
474 B.P.E., cód. CLXVII/1-5, Lº de Receita e Despesa do Mostº da Graça de Evora, 1604‑1628.
475 ADE, Paroquiais São Bartolomeu de Vila Viçosa, Lº 1, l. 16 (5­V­1611). Informa-
ção inédita de Francisco Bilou.
476 Tratado da Cidade de Portalegre (de) Diogo Pereira Sottomaior, ed. de Leonel Car-
doso Martins, Lisboa, IN-CM, 1982, p. 63, e Manuel Inácio Pestana, art. cit., 1993,
pp. 153-166.
477 Cf., sobre a obra de Gaspar Coelho, «mestre que foy desta arte principal nestes Rey‑
nos», o estudo basilar de Carla Alexandra Gonçalves, Gaspar Coelho, um escultor do Ma‑
neirismo, Lisboa, Livros Horizonte, 2001.
478 A.D.P., Paroquiais de São Tiago de Portalegre, Baptismos, Cx. 049, l. 2. Informação
inédita de Francisco Bilou.
479 As tábuas desse retábulo tardo-maneirista atribuem-se ao lisboeta Cristóvão Vaz,
ainda que sem conirmação; nova documentação permite admitir que nele trabalhas-
sem, em 1616, o marceneiro Manuel Dias e o pintor-dourador Alexandre de Carvalho.
480 A.D.E., Paroquiais de São Bartolomeu de Vila Viçosa, Livro 1, l. 33. Informa-
ção inédita de Francisco Bilou.
481 A.D.E., Paroquiais de São Bartolomeu de Vila Viçosa, Livro 1, l. 35. Informação
inédita de Francisco Bilou.
482 O Rádio Latino deve o nome ao do seu inventor; compõe-se de oito hastes ar-
ticuladas, com bússola e, nas hastes, escalas de medição, um quadrante geométrico,
uma escala de grau, outra para a divisão dos círculos, linhas, polígonos, pesos, e uma
medida linear, o braccio. Vários instrumentos se fabricaram então adaptando o Radio
Latino para efeitos da Arte da Guerra. No ANTT, no fundo Casa de Fronteira e Alor‑
na, encontram-se três mss. dedicados ao Rádio Latino e supomos (ainda que sem
termos realizado estudo comparativo com o ex. da B.G.U.C.) que um deles possa ser
devido a Pero Vaz Pereira...
483 Francisco Bilou, em debates com o autor, defende a hipótese de Pero Vaz Pe-
reira ter tido estudos no Colégio do Espírito Santo de Évora. Recorda-nos, também,
a circunstância de o cura de São Tiago e de São Lourenço de Portalegre ter apelido
Pereira, o que pode indiciar ligação familiar ao arquitecto-escultor dos Braganças e
reforça a presumida vocação religiosa.
484 Artur Goulart e Vitor Serrão, «O ciclo de Sibilas e Profetas…», cit., 2004, pp.
211-238.

241
485 Federico Zeri, Pittura e Controrriforma…, cit.
486 João Miguel dos Santos Simões, Azulejaria em Portugal no Século XVII, Lisboa,
Fundação Calouste Gulbenkian, tomo II, 1971, p. 204. Na capela baptismal encontra-
-se um painel de azulejos polícromos com a Virgem e o Menino, que data da mes-
ma campanha.

242
10. S A C R A E I M A G I N E S e c u lt o s
r e A c t i vA d o s n A pA i s A g e m
construídA eborense

1 0 . 1 . N o va s i c o n o g r a f i a s t r i d e n t i n a s

O tempo de D. Teotónio de Bragança foi também um tempo


de intensa renovação das representações iconográicas, seguindo
as prescrições romanas. As imagens readquirem um poder de
intermediarização de fé como desde a Idade Média não tinham
voltado a assumir, convidando os iéis a «ver com o coração»,
com os «olhos da alma» 487.
Em nenhum outro momento da História da Arte europeia
as artes igurativas foram tão veementemente pedagógicas e do-
tadas de um sentido didascálico cuja eicácia media a sua maior
ou menor qualidade estética. Não foram só os temas da vida da
Virgem e da Paixão de Cristo, dos santos do hagiológio ou das
alegorias morais, a sofrer natural adequação didascálica às dou-
trinas de Trento, embora esses fossem as representações habi-
tuais, pois mostravam às populações as imagens dos santos vivos,
ou seja, transformadas em razão de culto e testemunho de in-
termediarização junto das instâncias divinas 488.
A política normativa seguida pelo Arcebispo de Évora no
sentido da ediicação de novos e velhos lugares de culto, com
programas funcionais de «restauro» e de reestruturação e com
deinição prévia do modus aediicandi a partir dos modelos arca-

243
Figs. nos, e o equacionamento desta acção ancorada em parâmetros
41-44
de memória histórica e no conhecimento histórico-arqueológico
dos sítios, impôs que novos temas e modelos de representação
surgissem. O espírito baroniano do restauro storico impulsionou,
como de resto já vimos, a revalorização de cultos esquecidos, que
com D. Teotónio renascem do limbo, desde São Manços a São
Brissos, São Vicente e suas irmãs Sabina e Cristeta, São Jordão
e suas irmãs Comba e Inonimata, São Torpes e Santa Cesalina,
São Romão, cujos santuários e lugares hierofânicos ligados aos
cultos fundadores ganham novo sentido devocional.
É certo que já nas primícias do Arcebispado (criado em 1540)
essa intenção era intuível, tanto nos círculos de André de Re-
sende e dos outros humanistas muito preocupados com as «an‑
tigualhas», como em algumas representações artísticas do tem-
po do Cardeal D. Henrique. Sob a inluência de Resende ganha
forma e nasce, no pulmão histórico da cidade, a igreja de São
Vicente, seguindo um presumível projecto do próprio escritor
489
, e exalta-se o culto dos alegados santos mártires de Évora
Vicente, Sabina e Cristeta. Na linha dos escritos e do exemplo
dos humanistas e antiquários, e aliás dentro também das suas
próprias contradições ideológicas 490, foi decisivo o interesse da
sociedade eborense em seguir as directizes da Igreja e tomar os
santos paleocristãos considerados «locais» como novos heróis
e tópicos de veneração.
O interesse por esse saber arqueológico já se sente com a Relíquia
do Santo Lenho, fragmento da cruz onde Jesus foi cruciicado,
encontrado pela Rainha Santa Helena, mãe de Constantino, que
vem para a Sé de Évora no tempo de D. Afonso IV, depois de
passar por várias peripécias bem conhecidas 491, e a seguir à ba-
talha do Salado. Depois de dividida ao meio para que no santu-
ário da Vera Cruz de Marmelar icasse parte da relíquia, pois a
burra que a transportava, reza a lenda, se recusou a prosseguir
caminho, o fragmento do Santo Lenho chegaria enim a Évo-
ra, guardando-se em capela própria no transepto esquerdo da
catedral e dando origem, mais tarde, a um celebrado relicário
de ouro, prata, esmalte e pedras preciosas 492. Para esse altar da

244
capela do Santo Lenho pintou Gregório Lopes, cerca de 1537- Fig. 3
-1540, um extraordinário painel retabular Santa Helena e o milagre Figs.
45-46
do reconhecimento da Vera Cruz que representa uma das mais notá-
veis peças da pintura renascentista portuguesa, que se expõe no
Museu de Arte Sacra. Bem dentro dos seus estilemas e gosto re-
pertorial, sempre muito pessoalizado, o pintor régio de D. João
III desenvolveu nessa composição de minuciosa e delicadíssima
factura, com muitas iguras no primeiro plano assistindo ao mi-
lagre e com cuidadosos trajes, adereços e arquitecturas clássicas,
um pormenor fundeiro digno da maior admiração: encontram-
-se aí, quase como registo congelado de um momento «vivo»,
um grupo de trabalhadores que escavam a terra em busca das
cruzes da Gólgota, seguindo as orientações da Raínha Santa
Helena. Trata-se de um trecho vigoroso de «pintura directa»,
típico da escrita pictural de Gregório Lopes, e que atesta o novo
interesse da geração do Humanismo cristão pela arqueologia
como modo de desvendar o passado e intuír, a partir dele, ra-
zões legitimadoras 493. A propósito deste quadro, acrescente-se
que nunca mais a pintura eborense superaria a qualidade plásti-
ca atingida pelas realizações de Gregório Lopes para o Cardeal
D. Henrique, desde as pinturas da Capela do Santo Lenho às do
Santuário do Bom Jesus de Valverde, de 1544 494.
O interesse pela arqueologia como método perscrutador do
passado e base de re-conhecimento das origens foi, assim, uma
das vertentes desenvolvidas na Évora do século XVI. A icono-
graia da Vera Cruz mostra o empenho por este campo, como é
exemplo a gravura romana de Giovan Battista Cavalieri segundo
Livio Agresti, de 1569, que circulou em Portugal (foi inspirado-
ra, por exemplo, de uma das tábuas de Simão Rodrigues, c. 1605,
para o antigo retábulo do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra,
com representação dos cavadores que buscam relíquias). É um
interesse que atinge a sua plenitude no inal da centúria, quando
os ditames tridentinos conferiram novos sentidos teológicos a
essa investigação no solo com objectivos de revelar os testemu-
nhos do cristianismo primevo. Com D. Teotónio de Bragança
foi preciso, assim, renovar iconograias, senão mesmo criá­las

245
Fig. 16 de novo. A valorização das origens do culto cristão no territó-
Fig. 22 rio alentejano, mesmo que baseada em factos incredíveis ou mi-
Fig. 42
Fig. 41
tiicados, levou a entourage de D. Teotónio a reinventar modos
Fig. 43 de iguração iconográica até então nunca pensados, ou que só
marginalmente tinham sido solucionados.
Com a chegada da relíquia de São Manços, alegado primei-
ro bispo de Évora, trazida de Castela em 1592, e com a recons-
trução em 1594 da igreja da povoação que leva o seu nome e a
revitalização do sítio das ruínas paleo-cristãs, a teoria e prática
baronianas funcionou no sentido de dar corpo a uma devoção
que crescia de modo signiicativo. São Manços será, assim, re-
presentado como um bispo que segura, além do báculo, o jarro
de água e a salva de prata, atributos de quem, segundo a tradi-
ção, fora companheiro de Jesus Cristo, auxiliando no lava-pés
aos Apóstolos a seguir à Última Ceia. Assim surge, por exem-
plo, na imagem em madeira policromada que orna o altar do
Oratório de São Manços da Coluna, em Évora.
Também São Jordão, segundo bispo de Évora, será represen-
tado na iconograia teotonina com os atributos de bispo, como
se podia ver na antiga paroquial da extinta freguesia que tinha
o seu nome (Torre de Coelheiros) num dos destruídos frescos
da nave 495, e se vê ainda numa belíssima tábua no retábulo da
igreja matriz da Tourega ou ainda num fresco dessa verdadeira
galeria hagiográica alentejana que é o Santuário de São Brissos.
Quanto a São Romão (também presente na decoração da
igreja de São Brissos), será representado como um soldado ro-
mano com o livro que signiica a conversão, como se vê numa
tábua maneirista de Francisco de Campos no Museu de Arte
Sacra da Sé (onde o santo emparceira com as iguras de Santo
Amaro e São Bento), e em algumas imagens e decorações fres-
quistas em igrejas da Arquidiocese, como é o caso da de Panóias,
já no Distrito de Beja.
Falámos também de «São Vicente das Irmãs», ou São Vicente,
mártir de Ávila, distinto do santo diácono de Sagres e patrono
de Lisboa, que apesar de nada o relacionar com Évora terá, por
iniciativa de André de Resende, não só uma igreja implantada

246
no coração da cidade, como focos de devoção espalhados um Fig. 49
pouco por toda a Arquidiocese. Para este São Vicente e suas ir- Fig. 54

mãs Sabina e Cristeta, alegados mártires de Évora, criou-se uma


hagiograia em imagens que dá corpo, cerca de 1590, aos painéis do
retábulo da sua igreja.
São Gens, lendário bispo-mártir da primitiva Olisipo na época
imperial romana, considerado protector dos partos, é um santo
de Lisboa, mas teve focos cultuais no Alentejo no tempo de D.
Teotónio, talvez devido à presença de alguma relíquia. Conhece-
-se um santuário de antiga fundação, perto de Montemor-o-
-Novo, que lhe está dedicado e que, como sucedeu a tantos ou-
tros da Arquidiocese, foi renovado por inteiro no im do século
XVI. A estrutura é singela e mostra a presença de uma comu-
nidade rural, de poucas posses, que em 1598 mandou pintar na
ousia um «retábulo ingido» a fresco com o Julgamento e martírio de
São Gens, e a seguinte legenda no friso inferior: BAVTIZAM / A
SÃO GENS / DEGOLAM A SÃO GENS / A CVSTA DOS
/ FREGESES 1598». É uma composição «ingénua e piedosa»,
de um artista muito secundário, que esteve coberta durante cerca
de dois séculos por um altar de talha barroca 496. Mostra como,
ao nível mais popular, a renovação dos cultos se processou, com
reacendimentos iconográicos muito interessantes.
Só para São Torpes, mártir pisano cujos ossos teriam apor-
tado a Sines, o que levou o papa Sisto V a pedir a D. Teotónio
o especial favor de investigar as existências arqueológicas e re-
criar o culto, desconhece­se qual a tipologia iconográica segui-
da, por ausência de testemunhos na actualidade.
Na linha dos escritos de Resende, e seguindo as directizes ar-
cebispais, a arte sacra eborense tomou os santos paleo-cristãos
como novos heróis e pólos de veneração (São Manços, São Gens,
Santos Vicente, Sabina e Cristeta, São Romão, São Cucufate, San-
tos Jordão, Comba e Inonimata, São Brissos, São Torpes, etc).
Não é caso único em Portugal no início da Contra-Reforma,
pois outros se atestam e multiplicam, tanto em Braga com D.
Frei Bartolomeu dos Mártires, como na região de Torres Novas,
onde o enterramento dos chamados mártires da Concórdia, no

247
Figs. lugar de Bezelga, foi alvo de campanha arqueológica e de reno-
47-50
vação cultual, ainda que, neste caso, já depois da Restauração
de 1640 497. Incluem-se todos os referidos santos entre os novos
temas tridentinos que reclamavam novas iconograias.
Exemplos singulares de novas representações artísticas com
estes e outros novos-velhos santos multiplicaram-se nas igrejas
eborenses. A falta de iconograia precisa para o martírio de São
Manços impõe que se tivesse de tomar emprestado dos passos
da Paixão de Cristo estampas adequadas para se readaptarem os
temas pretendidos (São Manços atado à coluna, por exemplo, em
tela no Oratório de São Manços em Évora). Para as degolações
de certos santos, caso de São Cucufate, a falta de iconograia
directa levou a que, para uma pintura a fresco com esse pas-
so, pintado em 1621 na capela de São Brás, em Vila de Frades
(Vidigueira), onde se mostra o martírio de São Cucufate, se se-
guisse um modelo muito conhecido em Évora – a Degolação de
São Brás do retábulo da Ermida de São Brás – e que foi extra-
vasado, assim, para outro temário. Este exemplo é interessante
como testemunho de uma iconograia nova: o tema identiica­
-se localmente como sendo o martírio de São Cucufate, cujas
relíquias se ligam ao santuário instalado na próxima villa roma-
na, mas houve também aí necessidade de se recriar uma icono-
graia credível, o que levou os encomendantes a retomar um
protótipo de martírio-degolação já antes ensaiado na iconogra-
ia de outros santos. Era o caso de São Brás e da famosa tábua
da Ermida de São Brás de Évora, já aqui muito referenciada, a
respeito do retábulo da Tourega, por ser obra atribuída a Du-
arte Frizão. Mas também algumas pinturas na igreja de Carida-
de (aldeia do concelho de Reguengos de Monsaraz) 498 e na de
de São Brás do Regedouro (Évora) 499 e, ainda, na igreja de São
Bartolomeu em Borba, seguiram esse mesmo protótipo com-
positivo – aliás, já antes desenvolvido numa Degolação de Santa
Catarina pintada por Garcia Fernandes, hoje na sacristia da Sé
de Goa (antiga Índia portuguesa).
O controlo da representação das imagens sagradas, como se
sabe, assumiu com a XXXVª sessão do Concílio de Trento, em

248
1563, um especial acento ideológico e programático que terá lar-
gos efeitos no inal do século XVI e ao longo do século XVII.
«A Igreja apoderou-se nesse período do comando da arte reli-
giosa, a im de a expurgar das notas tidas por censuráveis e de
promover uma iconograia de combate, de testemunho e de ca-
tequese», citando de novo o que airmou em síntese o saudoso
iconólogo Flávio Gonçalves 500, explicando, assim, o que foi a
vasta reacção católica contra os ataques da Reforma protestante,
usando as imagens como arma eicaz de ensino, devoção, mili-
tância e propaganda. As directivas tridentinas nesta matéria tive-
ram imediato acolhimento no seio do mercado das artes, fossem
os mecenas, encomendantes e artistas envolvidos na produção
destinada ao culto, uns e outros dependentes de uma vasta es-
trutura de vigilância a que as Constituições Sinodais dos bispados
deram corpo de lei e os visitadores episcopais forneceram prá-
ticas de censura, quando não em moldes repressivos 501. Apesar
de essa nova situação ser cerceadora das liberdades criativas, é
certo que também foi estimuladora de um novo espírito de sole-
nidade e eiciência dos resultados artísticos, acentuando­se uma
signiicativa melhoria nas condições estatutárias dos pintores e
demais artistas que trabalharam para o mercado religioso 502.
Tal como estabeleceu o Concílio de Trento na sua derradeira
sessão, as imagens sacras servem para «anatemizar os principaes
erros dos hereges do nosso tempo», e por isso buscou adequar a
sua representação a uma inalidade de combate contra a heresia
iconoclasta do calvinismo e de reairmação do sentido tradicio-
nal do culto em airmação catequética. Retomando directrizes
do Concílio de Nicéia II, proibiu-se «que se exponha imagem al-
guma de falso dogma». Defendeu-se o papel das imagens sacras
como intermediárias de fé e a multiplicação nos locais de culto
de representações de Cristo, da Virgem e dos santos, numa ac-
ção clariicada face a qualquer espécie de idolatria, ou seja, não
para se lhes prestar um culto só devido a Deus, mas reforçando
o seu papel salvíico como intermediárias de oração. Deiniu,
também, a necessária qualidade, imprescindível para a eiciência
das reproduções artísticas dos mistérios da fé, tornando-as cre-

249
Fig. 47 díveis, no sentido de as adequar a objectivos pedagógicos junto
das populações. Temas como a Conversão de São Paulo na estrada
de Damasco, por exemplo, readquirem interesse neste contexto
didascálico por enfatizarem o arrependimento como sinónimo
de ‘conquista de almas’: veja-se o grande painel da igreja de São
Paulo de Pavia competentemente pintado por Francisco João,
cerca de 1580 503, e lembre-se que um painel com o mesmo as-
sunto, de pincel lamengo segundo o inventariante, existia em
1603 na colecção de D. Alexandre de Bragança 504. Abriu-se
também, por isso e ao mesmo tempo, uma espécie de frente de
combate contra as imagens de falso dogma e de formosura dissoluta,
em muitos casos alvo de alterações impostas ou de destruição
– contam­se em Évora, no im do século XVI e início do XVII,
inúmeros testemunhos dessa prática censória. Airmou­se a in-
tenção de ensinar que a divindade não é percebível pelos senti-
dos nem através de cores ou formas, mas que estas são dema-
siado importantes pois concorrem para abrir os olhos da alma 505.
No caso especíico de Évora, arcebispado tão lagelado pe-
las epidemias pestíferas e pelas más colheitas geradoras de fome
endémica, o culto de São Sebastião, santo mártir protector contra
a peste, multiplica-se em representações de pintura, escultura e
ourivesaria, sendo de realçar a grande imagem de prata que o
próprio D. Teotónio custeou para integrar as procissões (pro-
vavelmente da lavra do ourives João Luís, um dos seus artistas
predilectos), ou o fresco que Giraldo Fernandes de Prado pin-
tou na antiga enfermaria do Mosteiro de São Bento de Cástris,
sem esquecer também a própria igreja dedicada ao santo que
em Évora vai nascer (aliás, que se vai remover completamen-
te) em 1599-1600, utilizando o modelo teotonino de exonártex
de arcanos «referenciais civilistas», muito citado ao longo desta
obra como marca característica das construções do seu governo.
É por estes aspectos que as normas tridentinas no campo da
arte sacra foram tão marcantes em Portugal (mesmo antes de as
directrizes conciliares terem sido aceites como lei do Reino na
regência do cardeal D. Henrique, por decreto de 12 de Setem-
bro de 1564). De facto, tiveram ressonância em todo o «mundo

250
português», ainda que no nosso caso a penetração da doutrina Fig. 56
protestante não fosse signiicativa. No caso nacional, foram alvo
de vigilância maior os cristãos-novos, alegadamente envolvidos
em actos de iconoclastia anti-católica, e determinados círculos de
resistência do humanismo de inspiração erasmiana, mais atreitos
a uma tradição de liberdade que os novos ventos inquisitoriais
desaconselhavam. Caso incomum, atrás descrito, é o do frade
francês do Mosteiro da Cartuxa, Olivarius Brisom, preso pela
Inquisição em 1591, e condenado em auto-de-fé em 1594, não
só por defender teses luteranas e calvinistas mas, também, por
maltratar estampas com a imagem de Nossa Senhora.
Nunca como neste tempo as imagens assumiram tanto po-
der, razão acrescida para serem sujeitas a apertada vigilância. Era
preciso, já o dizia Giulio Carlo Argan 506, saber olhar e saber ver,
e foi nessa dimensão valorativa do papel das obras de arte, sob
o signo da fé, que decorreu a sessão do Concílio de Trento que
versou esta matéria – ainda que com um tónus incidente no as-
pecto doutrinário das imagens sagradas. O sentido discursal da arte,
apta a gerar maior convencimento, foi reforçado como um dos
objectivos dessa nova ars senza tempo que os teólogos preconiza-
vam. Mas deve esclarecer-se: para o Concílio, convencimento e
qualidade tinham de ser coincidentes para se cumprir o objec-
tivo da eicácia. Na verdade, sentia­o Argan, História e Crítica
da arte foram sempre faces da mesma moeda, ao discorrerem
sobre obras que devem ser consideradas sempre contemporâneas
(isto é: sem tempo), aptas para a fruição integral do e no nosso
tempo, e para suscitarem afecto ontem, hoje e amanhã – sem
se perder de vista o contexto mental preciso em que elas foram
geradas. Todos somos fruidores comprometidos: dedicamos às
obras de arte um olhar que anseia por integralidade, tal como
o fez Federico Zeri a respeito de pintores como Scipione Pul-
zone ou Giuseppe Valeriano, típicos produtores tridentinos da
arte senza tempo 507, variação madura da Bíblia Pauperum da Idade
Média 508. Assim, a arte da Contra‑Maniera teve essa capacidade
de assumir, através das imagens que produziu, uma renovada
dimensão trans­contemporânea, apta a surpreender pelas ini-

251
nitas possibilidades de suscitar olhares críticos. Mesmo que a
cadência de gostos, valências, critérios de aferição, imponha bi-
tolas valorativas distintas, que os valores de cada época alteram
ou promovem, o que se veriica é que, nesse sentido também,
as propostas de Trento acentuaram as dimensões catequética,
emotiva e espiritual das obras enquanto eicaz instância de in-
termediação 509.
Voltando à Évora do tempo de D. Teotónio, é interessante
seguir este processo de renovação da iconograia sacra através
das novas edições hagiográicas e o seu impacto nas populações
através dos rudimenta idei dos padres encarregasdos, como diz
Federico Palomo, das «missionações no interior». O caso dos
milagres do Rosário é ediicante e de novo Évora tem papel de re-
levo na sua difusão popular. Em 1576, um dominicano, padre
Nicolau Dias deu à estampa o Livro do Rosario de Nossa Senhora
(produzido na oicina de André de Burgos), onde se alude a vá-
rios milagres do Rosário e que fomentou, assim, a respectiva de-
voção. Em 1599, saíu nos prelos eborenses de Manuel de Lira a
edição ilustrada da Historia dos milagres do Rosario da Virgem Nossa
Senhora, da autoria do padre jesuíta João Rebelo (1541-1602), que
contou com várias edições, a primeira delas dedicada ao Pro-
vincial da Companhia de Jesus, Padre Cristóvão de Gouveia, e
a segunda (1602) dedicada à Marquesa de Castelo Rodrigo, D.
Margarida Corte Real, mulher de Cristóvão de Moura 510, sain-
do depois em edições portuguesas e castelhanas e grangeando
muito sucesso 511.
O livro do padre João Rebelo foi especialmente importante
na ixação das «histórias» do Rosário e tornou­se obra popula-
rizada em Portugal no tempo dos Filipes. O próprio autor au-
feria de bastante prestígio, pois em 1588 mandara imprimir à
sua custa muitas estampas sacras para distribuír às populações
rurais durante as suas missões, como diz umas das cartas ânu-
as da Companhia. Era um tempo em que a imagem e oralidade
andavam intimamente ligadas, e os jesuítas de Évora, só à sua
conta, difundiram nesse ano de 1588 mais de trinta mil gravu-
ras de devoção pelas terras do interior do Alentejo 512. Como

252
diz Federico Palomo, «este tipo de imágenes era un vehículo re- Fig. 59
lativamente eicaz, y poco costoso a la hora de incentivar entre
las poblaciones que visitaban los misioneros, prácticas y formas
de religiosidade más personales, más acordes com los modelos
de devoción postridentinos y, por tanto, menos vinculadas a las
expresiones religiosas de corte tradicional y comunitarioque, en
parte, fueron características de las comunidades rurales del An-
tiguo Regimen» 513.
No livro do padre Rebelo descrevem-se «milagres da Senhora»
absolutamente invulgares como, por exemplo, a história de dois
frades dominicanos que, guiados pela Virgem, assistem à morte
de uma devota do Rosário, num leito modesto com travesseiro
de palha, tendo uma visão da Rainha dos Anjos com santas e
anjos. Outra história conta-nos que um viajante, orando dian-
te de um cruzeiro à Virgem do Rosário, escondeu um pecado,
tendo vindo do céu até ele um papel escrito a referir o pecado
que havia ocultado. Noutro trecho do livro, conta-se que o Ar-
canjo São Miguel, com o Rosário numa das balanças (a das boas
obras), concedeu a graça a um onzeneiro italiano, o usurário Ja-
cobo, que «entre todos os seus males, tinha um só bem», que
era o de orar muito pela Senhora do Rosário e sempre trazer
um rosário com ele, no que fora convencido pelo próprio Pa-
dre São Domingos. Na hora da sua morte, esse usurário Jacobo
teve uma visão de São Miguel, «o qual punha em uma balança todos
os males & pecados, os quais pesavam muito mais do que todos os bens.
Estando ele muito triste por isto, viu como a Virgem gloriosa (...) advogada
dos pecadores, e de seus devotos punha um Rosário sobre suas boas obras,
com o qual seus bens pesaram muito mais, que todos seus males, e pecados».
Livros como este do padre João Rebelo tinham forçosamente
eco em círculos devocionais, eruditos e populares, e inspiravam
obras de arte. Recentemente, descobriu-se na Capela de Nos-
sa Senhora do Rosário em Outeiro Seco, Chaves, um conjunto
de frescos que formam um «retábulo ingido» que preenche a
ousia e que representam precisamente quatro dos «milagres do
Rosário» descritos na obra do padre jesuíta editada em Évora
514
! Ou seja, a confraria transmontana que encomendou esses

253
frescos no início do século XVII conhecia o livro do padre Re-
belo, dispunha das estampas que ilustravam a obra e recomen-
dou as suas «histórias milagrosas» como programa iconográico
ao anónimo pintor que procedeu à representação 515. Lá se vê o
milagre do onzeneiro Jacobo, a oração dos frades e a visão da
moribunda, o pecado escondido do viajante e o voto fundacio-
nal de uma capela dedicada à Senhora do Rosário. Literatura es-
piritual e pintura didascálica andavam claramente em uníssono
nos discursos beatos deste ‘tempo’ em que a imprensa eborense
assumia um papel de tanta relevância informativa…
Obras como as citadas, em que a literatura devocional e a re-
presentação pictórica se cruzam como narrações morais adequa-
das a esconjurar os maus costumes e valorizar a devoção mariana,
valorizam estes novos temas no quadro das novas iconograias
renovadas e enriquecidas por instâncias da Contra-Reforma ca-
tólica. Para o Rosário, aliás, as fontes seguidas eram múltiplas:
em 1597 saíra também o livro do dominicano sevilhano Juan de
Sagástizábal, Exortación a la Santa Deuoción del Rosario de la Madre
de Dios 516, onde já é narrado, entre outros, o milagre da balança
de São Miguel que pesa o rosário, tal como referido dois anos
volovidos na edição eborense do padre João Rebelo. Este iso-
lado exemplo da imprensa eborense do tempo de D. Teotónio
mostra como se tratava de uma produção literária por demais
importante e que circulava com rapidez. É absolutamente ne-
cessário estudar o que se lia, dentro da abundante literatura sa-
cra que saía na imprensa em Portugal no im do século XVI, e
que gravuras acompanhavam as edições e, enim, que fortuna
crírtica tais obras receberam. Tratava-se de histórias do sagrado e do
maravilhoso, de lendas e milagres, hierofanias e crenças populares
cujas raízes se perdiam na bruma dos tempos e ajudam a per-
ceberem melhor os mecanismos destas imagéticas devocionais
que a Reforma Católica incentivou, nos seus amplos sentidos,
gerando representações artísticas de tónus encantatório, em que
as populações se reviam e buscavam protecção.
Se os temas novotestamentários ocupam parte substantiva
dos repertórios artísticos teotoninos, não deixou a decoração

254
do tempo de D. Teotónio de abraçar temáticas providas de es- Fig. 32
pecial interesse simbólico para a história da Igreja, cotejando a
sabedoria antiga de Profetas e Sibilas com o legado cristão, tal
como se podia (e pode) ver, em Roma, na célebre Cappella del
Presepe em Santa Maria Maggiore, um dos projectos essenciais
de Sisto V. A igreja de Santa Maria de Machede, depois de recu-
perada e ampliada por traças de Pero Vaz Pereira, em 1604, foi
revestida de um programa integral de stucchi, frescos e azulejos,
com doze representações murais de Sibilas e Profetas, seis por
banda, emolduradas por tabelas de massa com duplo sentido
moralizante em airmação clássica e vetero­testamentária. Obra
de pintor desconhecido, explora as concordâncias e possibilida-
des ininitas de criação abertas pela História Sagrada em paralelo
com temáticas profana e mitológica, lembrando que as Sibilas
do Mundo Antigo – Pérsica, Líbia, Eritreia, Cumana, Gimméria,
Samos, Tiburtina, Agrippa, Hellespontica, Europeia, Cimeriana e Dél‑
ica – profetizam a vinda do Messias 517. Foram, por isso, assun-
to predilecto do Humanismo cristão: as Sibilas, na Antiguidade
clássica, com seus dons de profecia (o que, segundo São Jeró-
nimo, se devia à virtude da Virgindade), assumem novos con-
tornos com a literatura moralizante, as parangonas e também
as artes plásticas, já que as Sibilas anunciam a vinda de Jesus aos
pagãos, tal como os Profetas o fazem junto dos judeus. Na Ca-
pela de Luís de Lucena em Guadalajara, os frescos maneiristas
de Pietro Morone e Pietro Paolo de Montalbergo, de cerca de
1550, integram as iguras de Sibilas e Profetas junto a cenas do
Antigo Testamento e a Alegorias virtuosas 518. Na decoração de
escultura, estuque e pintura da capela dos Benavente, em Santa
María de Mediavilla de Medina de Rioseco 519 admiram-se quatro
Sibilas junto aos Evangelistas e a oito Profetas. E na colecção da
casa de D. Duarte, marquês de Flechillas e Malagón, irmão de
D. Teodósio II, que viveu entre Évora e Madrid e foi um aten-
to patrocinador de edições (como o livro de Frei João Álvares
Etiopia Oriental, de 1609), existiam doze quadros de Sibilas 520.
A complexidade simbólica dos referidos casos mostra que, em
termos de encomenda erudita, a iconograia não se interrompeu

255
com o início da Contra-Reforma, e o seu uso no programa de-
corativo de Nossa Senhora de Machede (onde, ao que parece, se
utilizaram as estampas de Crispín de Passe o Velho, editadas em
Colónia em 1601, e também as de Karel van Mallery segundo
desenhos de Maerten de Vos) correspondia ao objectivo de air-
mar a ancianidade do lugar, uma das mais antigas paróquias do
Arcebispado, através da inclusão das Sibilas, apresentadas como
fonte de legitimação cristológica e histórica. A tutela arcebispal
e o talento de Pero Vaz Pereira enquanto supervisor das obras
sacras da Arquidiocese tornaram Santa Maria de Machede um
caso iconográico bem interessante, testemunho da renovação
iconográica que se empreendia.

10.2.Um conceito de ‘ARS SENZA TEMPO’


aplicado ao Alentejo

Ao longo do livro, destacámos o sentido dessa arte total de novo


tipo que emerge nas obras do Arcebispado eborense do im do
século XVI e que encontrou na igura de D. Teotónio de Bra-
gança o mentor ideal para a sua deinição.
Uma das obras em que esse aspecto discursal de decoração
teotonina mais sabiamente se desenvolve será a decoração inter-
na da igreja matriz de Nossa Senhora da Graça do Divor, uma
reconstrução do im do século XVI que se realizou segundo os
cânones já observados noutras empreitadas do tempo (nártex
porticado, nave «chã» com largueza cerimonial, capela-mor pre-
servada do templo anterior), mas onde o revestimento de estu-
ques que decoram os tectos e paredes, com azulejos de ‘padrão’
e de igura avulsa, e recurso à pintura mural,segue um erudito
desenho moldurado que remete irresistivelmente para as gran-
des decorações de stucchi e frescos da Roma do tempo de Sisto
V e Clemente VIII!
Neste caso, a decoração, supervisionada por Pero Vaz Pereira,
arquitecto-escultor do Arcebispado, pode ser tributada, no que
toca ao entalhe e imaginária, ao mestre Diogo Nobre e, quanto às

256
pinturas murais, à «mão» de Custódio da Costa, pintor que apa- Figs.
34-36
rece frequentemente ligado a empresas com Vaz Pereira, como
vimos, e que chegará inclusivamente a trabalhar, também, para
a Casa Ducal de D. Teodósio II em Vila Viçosa. O arco triunfal
e o tecto da capela-mor da Graça do Divor são especialmente
interessantes pelo rigorismo do programa decorativo unívoco,
que atesta uma direcção arquitectónica precisa. A molduração
geométrica das coberturas, com stucco e cartelas pintadas, segue
modelos da velha tradição constantiniana com tipologias que
fazem escola nas obras de decoração destes anos, numa busca
incessantes de efeitos historicistas, isto é, reclamando-se de uma
herança paleo-cristã.
Na supervisão global da obra decorativa, o arquitecto inseriu
também a opção pelos azulejos de ‘padrão’ e de ‘igura avulsa’,
polícromos, com anjos e símbolos marianos, reforçando o sen-
tido conciliador do programa imagético pretendido. Já em Santa
Maria de Machede, como observou Celso Mangucci e acabámos
de citar, o uso dos azulejos ‘enxaquetados’ será também da di-
recta responsabilidade do programa de decoração total conce-
bido por Vaz Pereira, que se integra no mesmo discurso de bel
compostoo de que fazem parte relevante os frescos com Sibilas e
Profetas. Na Sala da Irmandade de Nossa Senhora da Esperança
criada em adjacência da igreja de São Tiago, embebida nos con-
trafortes do alçado da banda da Epístola, a cobertura também se
deine dentro desse gosto de tradição neo­constantiniana, ainda
que sem recurso à pintura mural (que, aliás, também aí devia estar
prevista, ou deve mesmo ter existido): «na arquitectura como na
pintura, é nesse esforço constante de lançar pontes entre estes
dois universos facilmente irredutíveis, caucionando as referên-
cias à Antiguidade Clássica com a lição dos textos bíblicos, que
se constrói boa parte da cultura artística da época» 521.
Muitas outras velhas igrejas paroquiais intervencionadas nos
anos teotoninos, como é o caso da igreja matriz (sede de fre-
guesia entretanto extinta) de São Jordão, perto de Torre de Co-
elheiros e hoje em completo e irrecuperável estado de ruína 522,
ainda mostra no arco triunfal vestígios de decorações similares

257
de estuque e de fresco, associadas a retábulos de pintura (nesse
caso já desaparecidos) 523, dentro de um gosto de bel composto e
senza tempo cuja paternidade ideológica se reconhece e cujas fon-
tes de inspiração são as romanas do tempo de Gregório XIII
ou de Sisto V 524. Apesar das modiicações ulteriores sofridas
em muitos templos diocesanos, é possível detectar-se muitas
vezes o testemunho do gosto de D. Teotónio de Bragança em
templos intervencionados no seu tempo, seguindo as directrizes
das visitações e os programas globais de decoração senza tempo
que privilegiava.
Melhor sorte que a igreja de São Jordão teve a igreja de São
Vicente do Pigeiro, templo de freguesia rural na estrada para
Reguengos de Monsaraz. Também esta sede paroquial recebeu
obras na fase teotonina, sendo ampliada e remodelada sem dei-
xar praticamente nenhum vestígio de maior ancianidade. Era
uma comenda do Hábito de São Pedro, e tinha origem góti-
ca, mas do antigo templo não restam vestígios. Foi reerguida
no período de D. Teotónio de Bragança, com traça simples e
austera, mas tirando partido da sua situação altaneira e ceno-
graicamente atractiva, a igreja ainda conserva paecelas dessa
intervenção. No seu interior, restam cinco das tábuas do anti-
go retábulo maneirista que então se pintou, e que representam
a Adoração dos Pastores, a Circuncisão, São Pedro e São Paulo, São
Miguel Arcanjo e Santo André, e o Calvário, todas infelizmente
muito prejudicadas por maus tratos e grosseiras repintaduras e
que, por isso, reclamam restauro 525. No reverso de São Miguel
e Santo André há vestígios de uma outra pintura (talvez se trate
de um reaproveitamento). Trata-se de um conjunto heterogé-
neo e de várias «mãos» ainda não identiicadas, e que nada tem
a ver, ao contrário do que já se pensou, com o estilo do Mes-
tre de São Brás (Duarte Frizão?) que pinta as tábuas da Tou-
rega. Há sequência de modelos de estampas lamengas, como
na Circuncisão (que segue gravura de Hendrick Goltzius), aliás
uma das melhores tábuas do conjunto. A tábua de São Miguel
e Santo André mostra características de estilo diferenciadas das
restantes. Tal vem atestar, mais uma vez, que muitas destas em-

258
preitadas eram entregues a oicinas que, em regime colectivo,
cumpriam a encomenda com um grau de resposta só aparen-
temente homogéneo.
Se não sabemos o nome dos pintores (seguramente de Évo-
ra) que executaram estas tábuas, apura-se pelo menos a sua data
aproximada de factura. Em 1591, pelo testamento de Isabel
Gonçalves, aberto em Évora a 4 de Agosto, sabemos que essa
abastada viúva, com terras em São Manços, Portel, Monsaraz,
Aldeia do Mato e Herdade de Santa Margarida, deixou «esmolas
para a pintura do retabulo de S. Vicente do Pigeiro» 526. Neste caso, não
sabemos, porém, o modo como se associavam as pinturas com
as obras de talha, azulejo e stucco envolventes, pois a campanha
barroca desvirtuou a do tempo de D. Teotónio. Em início do
século XVIII, mais precisamente em 1715, o retábulo-mor do
im do século XVI foi apeado e substituído pelo actual, a mando
do Cabido da Sé, entidade que superintendeu sempre às obras
desta igreja. Desse retábulo de «Estilo Nacional» se encarregou
então o mestre entalhador eborense Francisco da Silva, igura de
grande prestígio na sua arte 527, cabendo o dourado e a pintura
de brutesco da cúpula ao pintor Francisco Lopes Mendes 528.
No caso da igreja de São Bento do Mato, perto de São Miguel
de Machede, também existiram obras na época teotonina, que
incluíram um retábulo pintado de devoção privada 529. Poder-se-
-iam multiplicar exemplos de igrejas da Arquidiocese que foram
intervencionadas no último quartel de Quinhentos, seguindo o
mesmo gosto decorativo e a mesma marca teotonina: a lista seria
ininda. No caso da extinta paróquia de São Marcos da Abóba-
da, o templinho chegou aos nossos dias e é de origem gótico-
-manuelina, mas tem o nártex tardo-quinhentista, testemunho
de uma campanha de renovação da fase teotonina, possuindo
duas tábuas de um antigo retábulo da autoria do pintor Fran-
cisco João, o mais produtivo dos artistas de pincel em Évora no
im do século XVI 530.
O engrandecimento da Arquidiocese sob batuta de D. Te-
otónio de Bragança, desde o pulmão da velha cidade com os
novos empreendimentos sacros e civis, às pequenas povoações

259
envolventes, foi algo que alterou signiicativamente a paisagem
alentejana no último terço de Quinhentos. Como parece notório,
tudo seguiu um padrão ideológico e estético que, à luz do deco‑
rum tridentino, foi devidamente pensado e resolvido. De novo
a cidade de Évora, a antiquíssima Colonia Romana, que com o
Humanismo e o Renascimento se soubera italianizar, voltava a
parecer-se com a Capital dos Papas na imagem oferecida pela
sua mancha construtiva e pelos programas de decoração das
suas igrejas.
É preciso – em casos artísticos muito precisos, como o que
este livro analisa – saber sedimentar o conceito sempre am-
bíguo de programa artístico, já que tantas vezes foi utilizado pe-
los historiadores de arte sem a devida contextualização e sem
o sentido preciso que o seu uso impõe. Noção cómoda (mas
luida e, consequentemente, perigosa), o uso de programa é re-
corrente nos estudos de arte da Idade Moderna 531, épocas em
que abunda a documentação de arquivo e consequentemente
as informações sobre aquisições e encomendas, mas é mais
questionado nos estudos de arte medieval 532, justamente por-
que a falta de testemunhos documentais impõe que as análi-
ses a empreender sejam de âmbito estreitamente iconográico
e/ou epigráico. De facto, torna­se sempre difícil determinar
quais são os caminhos (metodológicos, conceptuais, documen-
tais) que a História da Arte tem de seguir com acerto quando
visa identiicar, no seio de uma obra ou de um conjunto de
obras, uma organização coerente e signiicante por detrás da
qual pode reconhecer que existiu a realização de um progra-
ma concebido desde o início por um indivíduo, por um grupo
social ou por uma instituição possidente, destinada a dar ex-
pressão a um gosto determinável e a dar cumprimento a uma
ideia preconcebida.
Parece-nos que no caso eborense do tempo de D. Teotónio
de Bragança existiu mesmo uma ideia, uma organização de ideias,
com a sua base programática e com os seus códigos signiican-
tes, que foram coerentemente articulados pelos executantes do
programa do Arcebispo: uma ars senza tempo de dialecto alen-

260
tejano, usada como arte total de novo tipo para responder a uma
situação de especial favorecimento da arquitectura e das artes
de decoração.

1 0 . 3 . U m A r c e b i s p o f i l h o d e Tr e n t o

Os vinte e três anos de governo episcopal de D. Teotónio de


Bragança foram intensos e dotados de traços inovadores. Resul-
tado deste múnus absolutamente tridentino, sobressai em todos
os domínios, da reforma de princípios teológicos à assistência,
à rede hospitalar e às grandes obras construtivas, um traço de
autoritas diligente, empenhada e, sobretudo, moderna.
Fruto da melhor cultura universitária europeia moldada pelos
novos ditames da Reforma Católica, D. Teotónio desenvolveu e
levou à prática nas construções da sua arquidiocese dois concei-
tos absolutamente inovadores na paisagem artística portuguesa:
o primeiro foi a defesa de um modelo arquitectónico austero e
«reformado» em que o restauro storico funcionou como atestado
de antiguidade legitimadora e em que a espacialidade dos novos
corpos foi entendida como sinónimo de igrejas‑auditório de novo
tipo; o segundo foi um originalíssimo conceito de decoração in-
tegral dos interiores – espécie de ars senza tempo pensada para o
caso alentejano e introduzida na sua prática ornamental – onde
as várias modalidades, desde a pintura mural a fresco e a seco
ao stucco relevado, ao azulejo de enxaquetado, de padronagem e
de igura, à talha dourada, à imaginária, ao esgraito, à obra de
massa, a cru ou pintada, às ferragens lavradas, e a outras artes,
se souberam irmanar em programas ornamentais unívocos533.
Este tempo de D. Teotónio de Bragança tem traços de reto-
ma do brilho all’antico que a cidade havia vivido nos anos trinta
do século XVI com a estada da corte de D. João III, os escritos
de João Rodrigues de Sá e Menezes534, de André de Resende e
os focos de humanismo esclarecido, a escultura renascentista de
Nicolau de Chanterene535 para as igrejas da Graça e do Paraí-
so536, a obra do arquitecto Miguel de Arruda para os agostinhos

261
e para o Bom Jesus de Valverde537, ou as pinturas de Gregório
Lopes e de Garcia Fernandes para vários espaços religiosos da
cidade538. O pensamento, o gosto e a prática de D. Teotónio de
Bragança inserem-se, assim, naquilo que se entende ser a «ter-
ceira fase» do Renascimento português, tal como as deiniu Luís
Filipe Barreto no quadro de uma larga conjuntura cultural em
que os valores do Concílio de Trento, integrados na nossa so-
ciedade no sétimo decénio de Quinhentos, não deixaram de dar
continuidade às valências do Humanismo539.
Em jeito de síntese, diz-nos Jesué Pinharanda Gomes que D.
Teotónio «foi, antes de mais, um Bragança, com alto sentido da
Pátria e com radical compromisso com a Igreja, mas é também
personalidade de inevitável recurso e de necessária menção na
história da Igreja hispânica do seu tempo» 540. As reformas pas-
torais a que meteu ombros, como dilecto discípulo dos ditames
tridentinos, não restringiram o seu múnus, como se viu: também
o acolhimento aos monges da Regra de São Bruno em Évora, e
as reformas jesuítica, através de Santo Inácio de Loyola, e car-
melita, através de Santa Teresa de Ávila, foram desenvolvidas
em terras portuguesas por seu especial impulso.
Este foi o gosto artístico, proselitista e ielmente tridentino,
de D. Teotónio de Bragança, e a marca diferencial do Tardo-
-Maneirismo eborense, tanto no modo peculiar com que en-
carou e estimulou a construção sacra, como no espírito de bel
composto (ou melhor, de ars senza tempo) com que entendeu as
decorações intestinas dos espaços religiosos que se renovavam
ou faziam de novo.
É o gosto dominante numa Évora que recebe o próprio Fi-
lipe II e os grandes da Monarquia Dual, que vê os seus palácios
enriquecidos (como o dos Condes de Basto, com os seus salões
magniicamente afrescados), com os Estudos Gerais mantidos
pelos jesuítas no Colégio do Espírito Santo, e que conserva um
mecenato interventivo e uma imprensa com alta produção edi-
torial. Esse gosto contra-reformista continuará a manifestar-se
por mais alguns decénios (incluindo o múnus de D. José de Melo),
tanto nos grandes edifícios religiosos da cidade como em casos

262
de freguesias rurais com poucos meios e com recursos artísti-
cos mais modestos (de que são exemplo muitos dos santuários
alentejanos afrescados por José de Escovar nestes mesmos anos
e que, apesar dos limites inventivos, não deixam de revelar res-
sonâncias das mesmas fontes italianizantes ‘reformadas’). Com
D. José de Melo, um pintor local chamado Pedro Nunes (1586-
-1637), chegado de Roma onde fora académico de São Lucas,
encontra na sua cidade ambiente e mecenas para poder pintar
no retábulo da Capela do Esporão da Sé um gigantesco painel
da Descida da Cruz, dentro dos referenciais neorafaelescos em
que se formara e com exímias qualidades de pincel, quer cons-
tituirá o último testemunho verdadeiramente relevante da pin-
tura maneirista em Portugal541. A força sacrossanta das imagens
sagradas, enquanto intermediárias de oração e combate pela fé
católica, foi atestada, assim, através de uma prática de abertura
unívoca, assente numa programação centralizada e em artistas
capazes de a levar a bom termo.
O esforço de recuperação de uma História oculta, muitas ve-
zes iccionada ao sabor de desígnios de propaganda, permitiu
ao Arcebispo, através dos supervisores das suas obras, como o
arquitecto-escultor Pero Vaz Pereira, reabilitar velhos locais de
martirológio, lançar novas iconograias e dar ênfase a discursos
artísticos com força catequética. Houve uma intenção apologéti-
ca de provar a ancianidade do culto cristão em terras alentejanas
(com São Manços e São Jordão à cabeça), recuperando vestí-
gios, repondo devoções e destacando a relevância e a identida-
de de uma comitência portuguesa verdadeiramente esclarecida.
Pretendia-se reivindicar, portanto, e a exemplo do que sucedia
em Espanha, a existência de um culto martirial português com
signiicativo destaque histórico­arqueológico 542. Nesse quadro
de airmação face a Roma, o Arcebispo D. Teotónio deu­lhe a
devida corporalização, revestiu-o de legitimidade, ilustrou-o com
imagens novas e sinalizou os seus espaços de devoção.
Em suma: o intuito de consolo espiritual através da emoção
provocada pelas imagens sacras como intermediárias de fé, aliado à
cenograia dos novos espaços arquitectónicos entendidos como

263
auditórios trans-memoriais das comunidades cristãs, constituíu
uma das linhas tridentinas mais importantes de renovação do
arcebispado de D. Teotónio de Bragança na Évora do inal do
século XVI e inícios do século XVII. Era preciso, por isso, dar
a conhecer a importância desse legado artístico, no seu conjun-
to, abrindo caminho para novos estudos.

264
Notas

487 Ottavio Nicoli, Vedere com gli occhi del cuore. Alle origine del potere delle immagini,
Roma, Laterza, 2011.
488 Flávio Gonçalves, Breve Ensaio sobre a Iconograia da Pintura Religiosa em Portugal, cit.
489 Paulo Varela Gomes, op.cit., e Susana Matos Abreu, op. cit.
490 Recente estudo de Hugo Crespo, «André de Resende na Inquisição de Évora e
a apologética anti-judaica: ciência teológica, doutrina e castigo (1541). Um autógrafo
inédito. Novos documentos para as biograias sde André de Resende e Jorge Coelho»,
revista Humanismo, Diáspora e Ciência. Séculos XVI e XVII, Lisboa, 2013, pp. 151-212,
demonstra que a ideia de tolerância em homens como André de Resende tem de ser to-
mada com as devidas cautelas. Era sobretudo um homem da Contra-Reforma. Mostra-
­se aí como o famoso escritor e humanista só epidermicamente manteve idelidade aos
princípios erasmianos da tolerância, que sempre lhe têm sido tributados como imagem
de marca. Ainal, assumiu­se antes como um ortodoxo militante na sua luta contra as
heresias, como se atesta no processo contra o mercador Pero Álvares, cristão-novo re-
primido pelo Santo Ofício, caso exemplar para uma nova visão de Resende, que vem
esclarecer melhor o carácter da sua obra ulterior de ressaibos tridentinos.
491 Cf. Ana Pagará (coord.), Vera Cruz de Marmelar, Portel, ed. Paróquia de Vera
Cruz de Marmelar, 2006, e Joaquim Chorão Lavajo, «Vera Cruz de Marmelar e San-
to Lenho de Évora. Contextualização histórico-religiosa», Eborensia, nº 47, 2013.
492 Rui Galopim de Carvalho, «Esplendor e pedrarias», in cat. O Santo Lenho da Sé
de Évora. Arte, Esplendor e Devoção, coord. de Artur Goulart, Évora, Fundação Eugé-
nio de Almeida, 2006.
493 Cf. Artur Goulart (coord.), Memória e Esplendor. Arte Sacra na Arquidiocese de Évo‑
ra, Fundação Eugénio de Almeida, 2014, pp. 14-15. Este painel (e a sua predela, que
representa O Imperador Heráclio e o Exalçamento da Vera Cruz) decorava o retábulo da
Capela do Santo Lenho, no transepto da Sé, até às remodelações do presbitério no
tempo de D. João V. A capela, antes de 1537, era dedicada a São Pedro e São Paulo,
razão porque Gregório Lopes, na ocasião, também pintou dois quadros com esses
santos e os respectivos martírios. Já no tempo de D. José de Melo, cerca de 1620, fo-
ram acrescentados três novos painéis com passos da História da Vera Cruz, também
expostos no Museu de Arte Sacra. Quanto ao grande painel aqui referenciado, foi
levado mais tarde, com as obras de Ludwig na capela-mor barroca, para o altar de
Santa Helena, construída no século XVIII no lado ocidental do claustro.
494 É a fase em que Gregório Lopes pinta o retábulo do mosteiro de Santos-o-
-Novo (M.N.A.A.), as esquecidas tábuas de Cem Soldos (Tomar) e as do Bom Jesus
de Valverde (1544), estas últimas identiicadas por Manuel Joaquim Branco com pro-
va documental. Em todas estas magníicas pinturas do inal do Renascimento por-
tuguês se encontram fundos compostos directamente a pincel, num virtuosismo de
igurinhas em movimento, entre paisagens e arquitecturas clássicas. São do melhor
de sempre da pintura portuguesa ! Mas cedo viria o novo gosto do despejo dos manei-
ristas, iéis a uma outra escala de iguras e com outros pressupostos estéticos, erra-
dicando dos repertórios picturais essa poesia dos segundos planos que teve em Gregório
Lopes o seu maior e melhor cultor.

265
495 Luís Urbano Afonso, A Pintura Mural Portuguesa entre o Gótico Internacional e o im
do Renascimento: formas, signiicados, funções, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian/
Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2 vols., 2009, vol. II, pp. 653-659. Os fres-
cos mais antigos desta igreja, datados de 1526, representam São Martinho, São Francis‑
co, Santo Bispo (São Jordão ?), São Miguel (?) e a Imaculada Conceição.
496 Túlio Espanca, Inventário Artístico de Portugal…, VII, 1975, pp. 384-385.
497 Os mártires da Concórdia, São Secundino e São Rómulo, companheiros de São
Donato, pereceram, segundo a tradição, nas repressões do tempo de Galiano, em
264 d.C., e as suas relíquias apareceram no lugar de Beselga, Torres Novas: cf. Padre
Jorge Cardoso, Agiologio Luzitano dos sanctos, & varoens ilustres em virtude do reino de Por‑
tugal, e suas conquistas, Lisboa, vol. II, 1652, p. 453, e vol. III, p. 263. Algumas pedras
insculpidas procedentes da alegada sepultura encontram-se na igreja do Salvador (cf.
Vitor Serrão, As Igrejas do Salvador, São Tiago e São Pedro de Torres Novas. Arquitetura e
equipamentos artísticos, Torres Novas, 2012, pp. 68-70).
498 Artur Goulart (coord.), Arte Sacra no Concelho de Reguengos de Monsaraz, F.E.A.,
2012, pp. 38­39 (icha de Jorge Moleirinho).
499 O topónimo medieval desta aldeia de remotas origens era São Brás do Jorra-
douro, segundo informação de Francisco Bilou.
500 Flávio Gonçalves, Breve Ensaio sobre a Iconograia da Pintura Religiosa em Portugal, cit., p. 13.
501 Flávio Gonçalves, História da Arte. Iconograia e Crítica, Imprensa Nacional/Casa da
Moeda, Lisboa, 1990 (colectânea póstuma de estudos deste especialista), pp. 111-127.
502 Vítor Serrão, O Maneirismo e o Estatuto Social dos Pintores Portugueses, Imprensa
Nacional/Casa da Moeda, Lisboa, 1983.
503 Helena Pinheiro de Melo, op. cit., pp. 150-154.
504 «Hum painel de landres a óleo da Conversão de S. Paulo mil e quinhentos rs»: A.S.E., Inventários
dos bens móveis de D. Alexandre de Bragança (PT/ASE/ME/B/002/Doc.003). DOC. Nº 35.
505 Ottavia Nicoli, Vedere com gli occhi del cuore…, cit.
506 Giulio Carlo Argan, «A tarefa da crítica», Arte e crítica da Arte, ed. portuguesa,
Lisboa, Editorial Estampa, 1988.
507 Federico Zeri, Pittura e Controrriforma…, cit.
508 Cf. Giordano Viroli, «I luoghi della continuità e del mutamento dalla Contro-
riforma al naturalismo del Seicento. Intenzioni e inclinazioni nella pittura in Romag-
na», Bíblia Pauperum. Dipinti dalle diocesi di Romagna, 1570‑1670, Nuova Alfa Editrice,
Ferrara, 1992, pp. XXIX-LXIX.
509 Como airmou o poeta José Tolentino de Mendonça, «a Igreja precisa dos artis-
tas para que as representações de Deus não iquem sequestradas pela racionalidade,
mas possam tocar aqueles reservatórios de mistério e de sensibilidade que é o cora-
ção do homem», em depoimento ao jornal Público de 24-XII-2013.
510 Maria de Lurdes Correia Fernandes, «Recordar os ‘Santos vivos’: leituras e prá-
ticas devotas em Portugal nas primeiras décadas do século XVII», Via Spiritus. Revista
de História da Espiritualidade e do Sentimento Religioso, vol. 1, 1994, pp. 133-157.
511 João Rebelo, S.J., Historia dos milagres do Rosario da Virgem Nossa Senhora, 1ª ed., Évora 1599.

266
512 Federico Palomo del Barrio, «Limosnas impresas. Escritos y imágenes en las
prácticas misioneras de interior en la Peninsula Ibérica (siglos XVI-XVIII», Manus‑
crits, nº 27, 2007, pp. 239-265.
513 Federico Palomo del Barrio, «Limosnas impresas…», cit., p. 258.
514 Nesta capela de Outeiro Seco, sob o nicho central, corre uma inscrição votiva
pintada a fresco com testemunho gratulatório de intercessão que, segundo o Prof.
Arnaldo Espírito Santo, a quem recorremos, é assim reconstituível (com falhas e zonas
ainda cobertas de reboco): [VIRGO PR]IVS AC POSTERIVS INTERCEDE PRO
ME, [AD / APVD] I[ES]VM XR[IS]TVM ET CONSERVA DO[MVM] [QVAM
IN LAV]DEM NOMINIS TVI [INSTRUXIMVS] / [ou CONSTRVXIMVS]/ [ou
EREXIMVS]», ou seja: Virgem antes e depois [do parto] intercede por mim, junto de Jesus
Cristo, e conserva a casa que em louvor do Teu Nome construímos. Ignora-se quem eram os
membros dessa Confraria do Rosário que encomendaram o fresco.
515 A Capela de Nossa Senhora do Rosário de Outeiro Seco está a ser alvo, na al-
tura em que este livro se ultima, de oportuno restauro por parte da equipa da empre-
sa Mural da História (técnicos de conservação e restauro José Artur Pestana, Alice
Cotovio e colaboradores).
516 Juan de Sagástizábal, Exortación a la Santa Deuoción del Rosario de la Madrte de
Dios, Sevilla, 1597, pp. 765-766.
517 Émile Mâle, L’art réligieux de la in du Moyen Âge en France, Paris, 1949, pp. 267-272.
518 Cf. Antonio Herrara Casado, «La Capilla de Luis de Lucena en Guadalajara»,
cit., pp. 5-25; e Lucía Varela Merino, «La venida a España de Pietro Morone y Pietro
Paolo de Montalbergo», cit., pp. 175-184.
519 Maria José Redondo Cantera, «Aportaciones al estudio iconográico de la ca-
pilla Benavente», Boletín del Seminario de Estudios de Arte y Arqueología (BSAA), nº 47,
1981, pp. 245-264.
520 Archivo Historico Nacional de Madrid, Sección Nobleza, Toledo – Casa de Frias,
Cajas 1375-1377. Ver DOC. Nº 55.
521 Celso Mangucci, «Anatomia da arquitectura da igreja da Colegiada de Santia-
go», cit., pp. 33-35 e 39.
522 Túlio Espanca, Inventário Artístico…, 1966, pp. 386-387. A igreja caíu ao aban-
dono nos anos 70, quando a aldeia se despovoou. Túlio Espanca ainda refere a
existência de várias imagens, pinturas e retábulos de talha, cuja salvaguarda não
foi devidamente acautelada e foram, assim, desaparecendo. Havia, por exemplo,
duas tábuas maneiristas (Anunciação e Visitação), a primeira das quais poderá ser o
painel (da autoria de Francisco João, c. 1590) que foi recentemente licitado num
leilão do Correio-Velho.
523 Luís Urbano Afonso, op. cit., vol. II, pp. 659-660, descreve os frescos, de vá-
rias fases do século XVI, que ainda se detectam na ruína desta antiga sede paroquial,
outrora próspera.
524 Federico Zeri, op. cit.
525 Túlio Espanca, Inventário…, pp. 388-389. Cf. também, do mesmo autor, Patri‑
mónio Artístico do Concelho de Évora, C.M.E., 1957, pp. 159-161.

267
526 A.D.P., PT­ADPTG­PCELV/4/12/40, tb. 21, ls. 93 vº a 99. Informação iné-
dita do Dr. Fernando Pina.
527 Celso Mangucci, «Francisco da Silva, António de Oliveira Bernardes e Francis-
co Lopes Mendes na igreja da Misericórdia de Évora», Cenáculo, nº 3, Setembro de
2008, pp. 3-18 (refªs pp. 5, 6 e 10, nota 29). O contrato consta de A.D.E., Lº 1056 de
Notas de Francisco Lopes, 1715‑1716, ls. 119­122.
528 Este dado consta do testamento inédito desse pintor setecentista (no A.D.E.)
dado a conhecer por Custódia Araújo, investigadora do projecto Prim’Art.
529 Túlio Espanca, Inventário Artístico…, 1966, p. 355. Trata-se de um retábulo man-
dado fazer em 158(?) por D. Maria de Castro, viúva de Heirtor de Melo, segundo a
inscrição. O pintor não é identiicável, mas o entalhe remete, mais uma vez, para o
estilo de Diogo Nobre.
530 Túlio Espanca, Inventário Artístico…, 1966, p. 387. Resta ainda a estrutura de
talha maneirista do retábulo (por Diogo Nobre ?). As duas tábuas maneiristas repre-
sentam São Gregório Magno e São Brás (?) e são certamente do pintor Francisco João,
c. 1580. A desafectada igrejinha pertence a propriedade particular.
531 Cf. a discussão sobre o conceito, p. ex., em M. Hochmann, J. Kliemann, J. Koe-
ring e Philippe Morel (coord.), Programme et Invention dans l’Art de la Renaissance, Actes
du Colloque de la Villa Médicis, Paris, 2008.
532 Cf. Jean-Marie Guillouët e Claudia Rabel, «En quête du programme» »,more Le
Programme. Une notion pertinente en histoire de l’art médiéval ?, Cl. Rabel et J-M. Guillou-
ët (dir.), Paris, Éditions du Léopard d’Or, CNRS - Institut de recherche et d’histoire
des textes, 2011, pp. 5-16..
533 Sobre a arte dos esgraitos em obras do tempo de D. Teotónio, caso da fachada da
igreja de São Tiago, cf. Joaquim Inácio Caetano, «Revestimentos de imitação da pedra
em Évora ou o gosto pela arquitectura erudita», Monumentos, nº 26, 2007, pp. 175-179.
534 Cf. Ana Maria Tarrio, Paisagem e erudição no Humanismo português. João Rodrigues de
Sá e Meneses, ‘De Platano’ (1527‑1537), Lisboa, F.C.G., 2009.
535 No A.D.S., Lº de Escrituras do Cabido, 1534‑1589 (PT/ASE/CSE/F/A/005/
Lv.20), ls. 92 vº a 94, consta um aforamento de casas na Rua da Oliveira, com data
de 15 de Maio de 1538, em nome de um Mestre Nicolau que pode ser o escultor.
536 Fernando Grilo, Nicolau de Chanterenne e a Escultura do Renascimento em Portugal,
tese de Doutoramento, Universidade de Lisboa, 2001; e cat. Do Mundo Antigo aos Novos
Mundos. Humanismo, Classicismo e Notícias dos Descobrimentos em Évora (1516‑1624), Évora,
Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1999.
537 Cf. textos do cat. Do Mundo Antigo aos Novos Mundos. Humanismo, Classicismo e
Notícias dos Descobrimentos em Évora (1516‑1624), comiss. por Fernando António Bap-
tista Pereira, Évora, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimen-
tos Portugueses, 1999.
538 Luís Reis-Santos, «Painéis de Mestres de Ferreirim para igrejas e conventos de
Évora», A Cidade Évora, nº 21-22, 1950, pp. 35-52.
539 Luís Filipe Barreto, Descobrimentos e Renascimento : formas de ser e pensar nos séculos
XV e XVI, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1983.

268
540 J. Pinharanda Gomes, Dom Teotónio de Bragança (Escritos Pastorais), Braga, 1984, p. 9.
541 Vitor Serrão, «Pedro Nunes (1586-1637): um notável pintor maneirista ebo-
rense», boletim A Cidade de Évora, nºs 71-76, anos XLV-L, 1988-1993 [Évora, 1994],
pp. 105-138.
542 Cécile-Vincent Cassy, Les Saintes Vierges et Martyres dans l’Espagne du XVIIème
siècle, cit.

269
e l e n c o d o c u m e n tA l

O elenco que se segue, que inclui cinquenta e seis manus-


critos transcritos, decorre de uma seriação apertada das largas
centenas de documentos, na sua maioria inéditos, reunidos no
decurso da presente investigação. Foram escolhidos pela sua
relevância para o tema em apreço (caso do mss. D. Teotonio de
Bragança. Noticia do seu governo, por exemplo) ou, ainda, como cla-
riicação especíica de determinados tipos de contrato de obra
(no campo da pedraria, da pintura ou do entalhe).
A leitura e ixação de texto devem­se ao autor, salvo alguns
casos em que a lição paleográica é da responsabilidade da Dou-
tora Patrícia Monteiro, e que devidamente se assinalam.
Tal como sucede ao longo do livro, e com excepção de al-
guns documentos que já foram publicados ou referenciados,
casos esses em que se indica naturalmente a fonte bibliográica
devida (Fernando Bouza Álvares, Francisco Bilou, José Mon-
terroso Teixeira, Manuel Joaquim Branco, Mário Cabeças, Pa-
trícia Monteiro, Pedro Flor), todos os outros são o resultado da
pesquisa inédita do autor.

271
documento nº 1. 1581, 4 de Julho. obras realizadas e peças
adquiridas na visitação à sé de Évora pelo Arcebispo d. teotónio
de bragança.

Visitação do Arcebpº do anno de 81.


Dom Theotº de Bragança por merçe de Ds e da Sancta Igreja de Roma Arçebpº de
Evora, aos que esta nossa carta de Visitação virem, saúde em Jhus xpo nosso salva‑
dor, fazemos saber que visitando nos pesoalm.te esta See, dignidades, conegos e bene‑
iciados della o anno de settenta e nove, não podendo proceder na visitação por causa
ded sermos chamados del Rey que Ds tem has cortes que se celebraram em Almeirim,
que porque durarão tanto tempo e socedeo logo o mal da peste de que Nosso Snõr
nos livre, com a ocasião della se absentaram os mais dos capitulares e se adjuntaram
muito tarde e ouvemos de ir beijar a mão a el Rey meu sõr a Elvas e fomos logo cha‑
mados no mês de Janeyro a Cortes por Sua Mag.de não podemos athe agora acabar
a dita Visitaçam, ouvemos por bem dfe a concluir e ordenamos as cousas seguintes.
Porque a autoridade desta See e o culto divino que nela se celebra respondão os
ornamentos pera maior gloria de Nosso Snõr e ediicação de todos, mandamos que
se faça hum pontiical inteyro de chamalote de prata rico pera servir nos Pontii‑
caes do Oraguo desta See por acharmos aver falta disso, & assi mandamos que
se faça huma lâmpada de prata pera a cappella mor de q. há muyta necessidade.
Ordenamos mais q. se compre huma tapeçaria de landes ina de raz de iguras
da scriptura pera se armar nas Endoenças por acharmos que não he decente a
quje agora serve.
Mandamos que as reliquias que se guardão na sancristia se ponhão com as mais
que estão na capella da vera cruz por estarem com mais deçencia e que pera a
relíquia do bem aventurado são sebastião se faça huns vultos de prata em onrra
deste bemaventurado martyr por ser nosso advogado neste trabalho que padece‑
mos o anno passado.
& conciderando as inquietações grandes que sucederão e as mudanças que ouu‑
ve de que foi forçado absentarse, & dos que falecerão, e de novo forão providos, e
o muito tempo que he passado neste meio e a poucacomodidade que ouve pera as
cousas do culto divino e serviço de nosso senhor, se assentarem com aquella autori‑
dade e veneração que sempre se fez, e se devia fazer nesta Se, nos pareceo somen‑
te por ora emquanto outra coisa não ordenarmos, mandar encomendar muyto ao
nosso Dayão, e o Cabido e mais pessoas da nossa See que com muyta vigilância e
cuidado continuem ao serviço della e guardem em tudo os statutos que ElRey que
ds tem Dom Henrique de boa memoria sendo nesta Igreja Arcebpo ordenou em
as suas visitações e asy mesmo o regimento do choro, que ora serve como deles se
spera e eu conio que farão (...).

272
Dada em Evora sob nosso sinal e sello a quatro dias de julho de mil quinhemtos
e oitenta e hum, Balthezar mendes a fez por mandado especial do Snõr Arçebpº.
Dada em Evora sob nosso sinal e sello a quatro dias de Julho de mil e quinhen‑
tos oitenta e hum. Balthesar mendez a fez por mandado special do snõr Arcebpo.
Arquivo da Sé de Évora (ASE), Visitações do Sr Arcebpº Dom Theotº (desde 1579) athe
1583 e 1584, caderno solto (PT/ASE/CSE/A/009/Mç. 1, 1444-1595). Existe cópia
na B.P.E., Cód. CIX/2-7, nº 52).

documento nº 2. 1581. regimento de d. teodósio de bra‑


gança para ser cumprido nas visitações dos oratórios da Arquidio‑
cese de Évora.

Regimento e Interrogatorios pª a visitaçam dos Oratorios.


(…) Item que verarsehá se ho lugar em que esta ho Oratorio ediicado se he de‑
cente, esse esta cercado de casas onde se durma, ou aja alguma imundiçie, ou se
esta apartado sobre si fora da serventia das casas.
Sabersehá quamto tempo he fundado, por cuja autoridade, e se tem dolte pª ser delle fa‑
bricado, e se há nisso papeis ou escreturas, e em que ppiedade tem dotte, e qto rende. (…)
Se as imagens de vulto, e as de pintura estão honestas assim na pintura como nos
vestidos, e se hos vestidos das Imagens e ornamentos que servem no oratório se ser‑
vem, ou os tomam ou dam pª outros uzos, e se os oratórios estam suficientemente
ornados, e que ornamtºs tem, e avemdo falta se proverá no que for necessário, e
sem todas estas cousas sam do dito oratório.
(…) Se os ornamentos estam encomendados a pesoa que tenha calidade pª tratar
as cousas do altar e quem lava os corporais, e se ho oratório esta sempre fechado.
Se ho sacerdote que diz missa em algum oratório he conhecido e sendo de fora do
aercebpdº se tem demissória e se tem provincial particular do Arcpº pª dizer mis‑
sa em oratórios conforme ao Synodo provincial, e se confessa ou dá ho Sacramtº a
alguém nos ditos oratórios.(…)
B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 61, Oratorios desta Cidade de Evora, ls. 5 e vº.

documento nº 4. 1582. bens que possuía d. fernando de cas‑


tro, 1º conde de basto, no seu palácio de Évora.

(l. 307 e segs.). Fazenda que tem em seu poder o Senhor D. Fernando de Castro
que levou depois do falesimento de seu pai (1580):

273
Consta per hum inventario que veio da Cidade de Lisboa que ao diante vai da
fasenda que o senhor dom Fernando levou deste cazal depois do falecimento de seu
pai em que somam as pessas de prata que tem em si conforme o dito inventario
duzentos e oitenta e seis mil seiscentos e cincoenta reis .......................286V250
Consta mais pello dito inventario de Lisboa ter o dito senhor Dom Fernando em
si de movens de caza que foi avaliado em duzentos e sesenta e nove mil e seis sen‑
tos reis ............................................................................................269V600
Consta mais ter o dito senhor Dom Fernando em si desta fazenda quatro escravos
os quais levou depois do falesimento do dito seu pai que somão de todo os pressos
delles cento e quinze mil reis, digo, quatro escravos ...........................115V000
(l. 307 vº) Consta mais ter o dito Senhor Dom Fernando desta fazenda hum
cavallo e huma mulla e dous machos prettos que tudo foi avaliado em sincoenta e
oito mil reis .......................................................................................58V000
Escravos que há em Caza. Fernando Nunes negro velho avaliado em doze mil
reis. .................................................................................................12V000;
Dameão negro velho avaliado em dezoito mil reis ..............................18V000;
Bastião escravo pretto avaliado em dezaseis mil reis por ser doente.....16V000;
Luisa preta mossa avaliada em trinta mil reis ..................................30V000;
Bento escravo que ica forro no testamento avalliado em trinta mil reis30V000;
Olaia pretta esta muito doente há muitos annos, avaliada em des mil
reis..................................................................................10V000;
Huma mulla (sic) que tem o senhor Dom Miguel Bispo, preta boa, avaliada em
trinta mil reis...................................................................................30V000;
(l. 308) Hum macho pequeno avaliado em oito mil reis ..................................8V000.
Aos vinte e hum dias do mes de Fevereiro de mil e quinhentos e oitenta e dous
annos nesta cidade de Evora nas pousadas da Senhora Dona Lianor de Ataide,
molher que foi de Dom Diogo de Castro, o juiz e partidos todos juntos prosegui‑
ram por este inventario adiante. Gaspar da Costa o sobscrevi.
Avaliassão da tapessaria que izerão Thomas Rodrigues e Luis Lopes mercadores.
Oito panos de Ras e duas guardaportas todas de fora e estopa uzados que todos
tem duzentos e sasenta e sete annas avaliada a anna a sete tostõins soma ao todo
cento e sesenta e seis mil e novesentos reis ......................................66V900 543
Huma cama de Ras nova com suas dianteiras de tafeteira (sic) de seda e descorada
(?) de retros verde avaliada em sincoenta mil reis toda juntamente, digo, forrada
de retros verde ...................................................................................50V000
Duas almofadas de rãs avaliadas em dous mil e quinhentos reis ...........2V500
(l. 308 vº) Panos de rueda que pede causa (sic) de estofa baixa que sam sasenta
annas avaliada a anna a trezentos reis soma dezoito mil reis, digo, panos de folha‑
gens de Ras desta fabrica ....................................................................... 18V000

274
Huma alcatifa da India com huma rosa no meio vermelha, e branca, com cadi‑
lhos de retros azul nas cabeseiras avaliada em nove mil reis..................9V000
Outra alcatifa de estrado grande dazull e amarello com cercadura de vermelho e
huma Roza grande vermelha no meio avaliada em dezaseis mil reis....16V000
Outra alcatifa da India uzada com seus cadilhos de retros verdes avaliasda em
tres mil reis 3V000Outra alcatifa de estrado uzada com cadilhos brancos e de
retros avaliada em seis mil...................................................................6V000
Huma alcatifa de Castella amarella avalliada em seis mil reis, digo tres mil
reis .....................................................................................................3V000
Outra alcatifa mais pequena damarello com cadilhos brancos avaliada em dous
mil reis. ..............................................................................................2V000
(l. 309) Outra alcatifa pequena preta com sua Roza no meio com cadilhos de
seda avaliada em mil e quinhentos reis.................................................1V500
Outra alcatifa de Castella de branco e vermelho com cadilhos brancos avaliasda
em mil e quinhentos reis ......................................................................1V500
Outra alcatifa de Castella com cadilhos brancos de vermelho e branco avaliada
em dous mil reis .................................................................................2V000
Tres alcatifas pequenas, duas novas e huma velha, avaliadas todas em sinco mil
reis .....................................................................................................5V000
Outra alcatifa de estrado com des rodas com cadilhos brancos ao redor avaliada
em oito mil reis ...................................................................................8V000
Outra alcatifa velha destrado de rodas avaliada em dous mil e quinhentos
reis ................................................................................................ 2V500
Outra alcatifa da India grande com cercadura preta e cadilhos pretos avaliada em
dezaseis mil reis ................................................................................16V000
Huma cubriçãm digo pano de verdura meuda de landes de dezoito annas a cru‑
zado a Ana somão sete mil e duzentos reis ..........................................7V200
(l. 309 vº) Quatro lambeis mouriscos amarelos e verdes e vermelhos nas cabesei‑
ras avaliados em sinco mil reis .............................................................5V000
Hum pano grande da Historia de Sansão velho que tem sesenta e seis annas ava‑
liado em vinte mil reis .......................................................................20V000
Hum pano velho cortado por huma ilharga que tem quarenta e duas annas, ava‑
liado por ser muito velho em sete mil reis..............................................7V000
Outro pano velho de iguras velho que tem corenta e duas anas avaliado em doze
mil reis ..............................................................................................2V000
Outro pano velho de iguras velho que tem corenta e duas anas avaliado em des
mil reis ............................................................................................10V000
Outro pano muito velho de iguras que tem sasenta e tres annas avaliado em des
mil reis .............................................................................................10V000

275
Outro pano velho de iguras que tem humas iguras grandes sem sercadura per
humas ilhargas avaliado em sinco mil reis............................................5V000
Outro pano velho, e pequeno, avaliado em dous mil reis .......................2V000
Outro pano velho de iguras avaliado em tres mil reis ...........................3V000
(l. 310) outro pano grande muito velho de iguras que tem sasenta e trez annas
avaliado em des mil reis ....................................................................10V000
Outro pano grande de iguras já uzado que tem trinta e duas annas avaliado em
doze mil reis .....................................................................................12V000
Outro pano grande de iguras já uzado, digo outro pano velho de iguras que tem vinte
e quatro annas avaliado em seis mil reis .......................................................6V000
Outro pano grande velho de iguras que tem quarenta e duas annas avaliado em
quatorze mil reis ...............................................................................14V000
Hum guardaporta de folha que he velho avaliado em dous mil e quinhentos reis
2V500
Outro pano que tem dous homens a cavallo avaliado em trez mil reis ...3V000
Hum guardaportas de iguras muito velho avaliado em mil reis ............1V000
Outro pano de iguras pequenas e de verdura muito velho que tem trinta annas
avaliado em sinco mil reis ....................................................................5V000
(l. 310 vº) Outro pano de montaria e folhas que he velho que tem vinte annas
avaliado em dous mil e quinhentos reis ................................................2V500
Outro pano de montaria em folhagem que he velho que tem vinte e quatro anãs
avaliado em tres mil e quinhentos reis ..................................................3V500
Outro pano velho e remendado de montaria e folhagem que tem trinta annas ava‑
liado em dez crusados ..........................................................................4V000
Outra guardaporta do mesmo teor avaliado em mil e quinhentos reis ....1V500
Hum lambel grande mourisco de vermelho e azul com seus cadilhos avaliado em
quatro mil reis ....................................................................................4V000
Huma alcatifa de Castella velha avaliada em tres cruzados que tem suas rodas
de verde pello meio ..............................................................................1V 200
Duas almofadas de velludo pretto cairelladas de retros avaliadas em sinco mil reis
e sam novas.........................................................................................5V000
Outras duas almofadas de velludo pretto já uzadas avaliadas em tres mil reis ..3V000
(l. 311) duas almofadas de veludo velho, digo verde, avaliadas em sinco mil reis...5V000
Quatro coxins de raz uzados avaliados em quatro mil reis .......................... 4V000
Huma cama de leito com seu sobreceo, e comedises de lambel mourisco franjado com seus
alperanozes (sic), e as franjas sam de retros, avaliado em vinte mil reis........... 20V000
Huma mão digo de label com seuis cadilhos avaliado em tres cruzados .... 1V200
Hum pano grande de iguras já velho que tem sesenta e duas annas avaliado em
doze mil reis .....................................................................................12V000

276
Outro pano velho de vinte e quatro aannas de iguras avaliado em quatro mil
reis .....................................................................................................4V000
Outro pano grande velho de iguras que tem oitenta e quatro annas avaliado em
dezaseis mil reis ................................................................................16V000
Hum leito de tofrieira (?) com suas corredisas avaliado em sinco mil reis5V000
(l. 311 vº) outro leito de Londres (?) azul franiado de retros com suas corredisas e
sem alparavazes avaliado em des mil reis ............................................... 10V000
Outro leito de panno verde de borcado de veludo já velho avaliado em sinco mil
reis .....................................................................................................5V000
Dous bancos hum azul e outro verde avaliados em tres mil reis..............................3V000
Aos vinte e dous dias do mez de Fevereiro de mill e quinhentos e outenta e dous
annos nas cazas da senhora dona Lianor de Ataide, molher do senhor Dom Diogo
de Castro que Deus tem, o Iesenseado Lansarote Leitão, Juiz de Fora dos órfãos
nesta cidade de Evora, pos termos com os partidores e avaliadores prosseguirem
com este inventario por diante e pela maneira seguinte, Gaspar da Costa o escrevi.
Huma colcha branca de Castella de lavor com hum cairel ao redor avaliada em
quatro mil reis ....................................................................................4V000
outra colcha branca lavrada avaliada em tres mil reis...........................3V000
(l. 312) outra colcha velha do mesmo teor avaliada em tres mil reis .....3V000
Outra colcha dolanda lavrada com seu cairel ao redor avaliada em seis mil reis
6V000
Outra colcha de Olanda branca com seus caireis ao redor e lavrada, avaliada em
oito mil reis ......................................................................................08V000
Outra colcha branca já rota avaliada em mil e quinhentos reis ..........................1V500
Outra colcha de seda da India forrada de Bertangil acairelada ao Redor avaliada
em oito mil reis ...................................................................................8V000
Outra colcha da India de alcachofrado de marqua grande avaliada em seis mil
reis .....................................................................................................6V000
Huma colcha da India lavrada em mandacha (?) avaliada em doze mil reis ......12V000
Huma colcha de Holanda grande lavrada com seus caireisa ao redor avaliada em
dezaseis mil reis ................................................................................16V000
(l. 312 vº) outra colcha branca já rota avaliada em mil e quinhentos reis .... 1V500
Outra colcha grande dolanda toda branca com seu cairel ao redor avaliada em
dezaseis mil reis ................................................................................16V000
Outra colcha do mesmo teor da outra asima avaliada em dezaseis mil reis..... 16V000
(l. 324) onze painéis os panos sem guarnissam a cruzado cada hum soma qua‑
tro mil e quatro sentos reis ..................................................................4V400
(l. 328) Aos vinte e sete dias do mes de Fevereiro de mil e quinhentos e outenta
e dous annos nas pouzadas da senhora dona Lianor dataide, o juiz e partidores

277
foram proseguindo com este inventario per diante na maneira seguinte, Gaspar da
Costa que ho escrevi.Porselana.
Vinte e hum que se avaliaram cento e vinte, e nove alguidarinhos de persolanas..10V300
Seis persolanas grandes avaliada cada huma a seis tostõis soma mil e oitosentos
reis .....................................................................................................1V800
Sasenta e oito persolanas de taila avaliadas humas e outras com suas pombinhas
em sete mil reis e o cofre em que estam estas persolanas a sinco tostõis ...7V500
Sinco duzias e meia de persolanas da India, convem a saber, tres dúzias grandes, e
asi mais pequenas avaliados humas por outras a sete vinteins, fazem soma nove mil
duzentos e quarenta e seis ....................................................................... 9V246
(l. 328 vº) vinte e seis pratos pequenos da India a quatro vinténs cada hum so‑
mam dous mil e setenta reis .................................................................2V070
Doze pratos grandes de persolana a modo de prata de cosinha, avaliados a seis
tostõis cada hum soma juntamente trez mil e seiscentos reis ..................3V600
Sinco bratos meãos de persolana avaliados a tostão somam quinhentos reis .... V500
Seis gomis de persolana com doze galhetas do mesmo theor, ehum saleiro de per‑
solana e huma cabassa de pao da India avaliado tudo juntamente em tres mil e
seis sentos reis... 3V600
Mais huma caixa de persolana e hum saleiro dentro avaliado tudo em tresentos
reis ....................................................................................................... V300
Hum cofre em que estava restos de persolanas avaliado em sinco tostõis .. V500
Seis dúzias e meia de pratos de persolana avaliados cada hum a quatro vinténs
somão sete mil e duzentos reis ..............................................................7V200
(l. 329) onze dúzias de persolanas de comer avaliadas a tostão cada hum soma
juntamente treze mil reis ...................................................................13V000
Hum saleiro de marim com des colheres de marim avaliado tudo juntamente em
dous mil e oitosentos reis......................................................................2V800
Arquivo Histórico da Fundação Eugénio de Almeida (A.H.F.E.A.) – Inventario que se
fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor Conde de Basto dom Lourenso pires de
Castro que faleseo em Catalunha no lugar de fraga sem descendentes deixando por sua universal
herdeira a senhora Condessa de Basto Dona Violante de Lencastre sua molher (também com
originais de 1582 e 1617, além dos de 1642-44, cozidos no mesmo maço) 544.

documento nº 5. 1584. rol de ornamentos dados pelo cabido


da sé de Évora para a igreja de santo Antão desta cidade.

Nos o Dayão e Cabido da Sta Seé D’Evora ett. Mandamos a vos Antonio Gomez
nosso prioste que deis ao Rector que ora he da ygreja de Santo Antão çincoenta mil

278
rs pª ornamentos que se mandarão fazer na dita ygreja por visitações passadas, com o
Sºr Arcebpº nosso prelado há de dar as duas partes destes custos, e por este assinado
por dous capitulares e asselado de nosso sinete segundo nosso costume vos serão levados
em conta. Jrmº dalmeida cónego e secretrº do Cabido o fez a 6 de novembro de 1584.
(aa) O Deão – O Thesoureyro
Manoel do Valle mandounos que do dinhrº do deposito da igreja de Sto Antão desta
cidade mandeis fazer pera serviço da dita igreja as cousas declaradas que por agora são
It. Tres grades pera as tres capellas do cruzeyro de ferro de balaustres redondos de
altura de oito palmos e da grossura que sãon as das tres capellas pequenas da seé.
It. Hum Retavolo pera o Altar do santo sacramtº cõ seu sacrário metido nelle.
It. Hum púlpito de madrª quadrado e bem feito.
It. Quatro cõfessionarios de madeira pequenos.
It. Huma estante de madeira pera o choro alta.
It. Hum caliz de prata pera o serviço comum da igreja.
It. Huma cruz de prata pequena pera ass unções. (n: Esta se fez e se levou a
conta o pcº della)
It. Hum missal e dous Bptisterios.
It. Huum livro gradual dos impressos em papel pera cantarem por elle as missas.
It. Huãs vidraças pera as frestas que agora estão tapadas.
It. Levantar a parede das andaynas da parte das casas que forão de dom Jorge de
mello de modo que se não devassem. It. Huum ornamento de damasco Branco com
çanefas de veludo cremesy, a saber, capa de asperges, manto, e dalmáticas, frontal
pera o Altar moor, panno de pulpeto, e pano destante e fronha pera o missal, as
tres alvas com seus Regaços do mesmo.
It. Dous frontaes do mesmo damasco e veludo pera os dous altasres das ilhargas.
It. Seis frontaes de chemalote cramessy cõ os sobrefrontaes de cetim branco pera
que digão com os da frontaria pera as capellas das naves.
It. Quatro Alvas novas pera servirem com as vestimentas quotidianas que ago‑
ra servem.
It. Duas sobrepelizes pera serviço da sãocrestia e per este escrito do escrivão de
vosso carguo no livro de vossa despª e conhecimentos das partes a que comprardes
e mandardes fazer vos sera levado em conta todo o dinheiro que nas ditas cousas
despenderdes icando as peças que forem de Receptas carregadas sobre a pessoa a
que pertencer. Manoel nogueyra o fez em Evora a bj de Mayo de bc lxxbiij e este
não passara pela Chancelaria.
(Nota: Pera Manoel do Valle que do dinhrº do depossito da igreja de Sto Antão mande
fazer as peças declaradas e mais cousas que são necessárias pera serviço da dita igreja).

Arquivo da Sé de Évora (A.S.E.), Róis de Despesa com alvarás de pagamento, 1578‑1809


(PT/ASE/CSE/G/B/007, Mç. 1)

279
documento nº 6. 1584, 11 de Agosto. obrigação que o pintor
manuel de Araújo, morador em Évora, fez em favor do pintor José
de escovar, por causa de certo delito.

Saibão os que este estromento de obriguação e declaração virem que no anno do nasci‑
mento de nosso Senhor Jesu Christo de mill quinhemtos oitemta e quatro d’ onze dias
do mes de aguosto da cidade d’ evora aas grades da cadea e prisão della estamdo hi
presente preso della das grades adentro manuell d’ araujo pimtor na dita cidade mo‑
rador por elle foi dito que elle s’ obriguava e lloguo de fecto per este pubrico estromento
se obriguou de aguora nem em tempo allgum per si nem per outrem em seu nome nem
per outra interposta pesoa da sua geração asi de sanguinidade como de ainidade de
quallquer graao que seja ou ser posa queira nem posa demandar nem obriguar per via
algua dereito razão acção nem em outra quallquer maneira ou via que comtra Jose de
escovar outro si pimtor nesta cidade morador a esta absente como se presemte fose e asi
ter aver ou se achar acerqua do neguoçio da ianella que se deixou a mestre lluis varella
prior [?] da Igreja de são pedro da dita cidade por quamto elle manoell d’ araujo o
declara asi por descarguo da sua comciemcia e por que sabe de certa certeza sciemcia
e verdadeira verdade o dito Jose de escovar não ter no dito delicto cullpa allgua mas
amtes injusta e individamente ser pello tall caso cullpa delle acusado e demandado /
E prometia e se obriguava o asi pela sobre dita maneira e todo e por todo como asima
se contem [?] toma ter [?] e cumprir e o não contradizer agora nem de tempo allgum
como dito tem per si nem por outrem em juizo nem fora delle sob obriguação de todos
seus bens avidos por aver moveis e de rais que por ello obriguou e deu testemunho de
verdade e se outorguou e mandou ser feito este estromento e os que desta nota cumpri‑
ram que eu taballião como pesoa pubrica estepullante e aceptante em nome do dito
Josee d’ escovar a este absente o estepullei e aceptei testemunhas que forão presemtes
martim llopes nunes (…) e francisco fernandes aqui morador [?] presos em dita pri‑
são (…) irmão dele manuel d’ araujo (…) e eu fernão d’ arcos tabeliam que isto iz.
(aa) Manuel d’ Araujo / Martim lopez / Pero Fernandes / Francisco Fernandes
A.D.E., Cartórios Notariais de Évora, Lº 60 de Notas de Fernão Arcos, ls. 137 vº­138.

documento nº 7. 1586, 22 de Abril. contrato de d. teotónio


de bragança com diogo nobre, mestre carpinteiro de marcenaria,
para fazer os retábulos colaterais da igreja de santo Antão segundo
traças do arquitecto nicolau de frias.

Saibam os que este estromento de obrigação virem que no ano do nacimento de


nosso senhor Jesus Christo de mill e quinhemtos e oitemta e seis em vimte e dous

280
dous [sic] dias do mes d’ abrill em esta cidade d’evora nas casas de mim tabaliam
estando ahy presemte ho Reveremdo domingos martins bacharell da dita mesma
e aqui morador o qual dise ter provisam do Muito Imllustrisimo senhor dom tio‑
tonio de bargamça arcebispo do arçebispado desta mesma pera mandar fazer os
Retavollos da capella do samto sacramento e do de nosa senhora dos prazeres da
Igreja de samto amtão desta dita cidade d’ evora pello preso que lhe bem parece‑
rem; e sobretodo se comcertar com os carapimteiros e mais hofeçiais que comprir e
do dito comcerto outroguar e mandar fazerse escrituras publicas [?] com as cllau‑
sullas e comdiçoims penas e obrigaçoims necesarias; a qual provisam e poder dise
que amostrara cada vez que fose nesesario; e bem asi estamdo ahy presemte Diogo
nobre carapimteiro de sembragem morador nesta cidade e lloguo per o dito bacha‑
rell domingos martins foi dito que era verdade que elle estava comcertado com ho
dito dioguo \nobre/ crapimteiro [sic] que presemte estava per haver de fazer na
dita Igreja de samto amtam desta cidade dous Retavollos de madeira de bordo se‑
cos bons e de receber he [?] hum pera o alltar e capella do santisimo sacramento da
dita Igreja e outro pera a capella de nosa senhora dos prazeres da dita Igreja nos
quais dous Retavollos e cada da [sic] hum delles sera obriguado ha fazer comfor‑
me asima a mostra e trasa que lhe \foi/ mostrada e dada que parece ser feita por
nicullao de frias e asinada por o senhor arcebispo que icou em poder delle diogo
nobre que elle amostrara a todo tempo que comprir e lhe for pedida pera se ver se
a obra dos ditos Retavollos e comforme a cada huma das ditas trasas tirado fora
risco da mostra do Retavollo do samto sacramento que nam fara por estar ja feito
mas sera obrigado a o samtar e encarpar no dito retavollo pera que digo com per
a dita amostra e os quais dous retavollos e cada hum delles sera elle mestre dioguo
nobre acabar de todo conforme a dita amostra bem e perfeitamente e sem fallta
allgua pomdo em elles toda a madeira de bordos e mãos e tudo o mais que for ne‑
cessario pera se acabarem a sua costa. E quamto ao samtar dos ditos Ratavollos
[sic] elle diogo nobre sera obriguado a os asemtar a sua costa damdolhe porem
elle bacharell toda a madeira pera grades e pegaduras […] e simbres [?] e tudo o
mais que for necesario pera os ditos asemtos de maneira que elle diogo nobre não
pora mais que nas mãos. Os quais doos retavollos elle diogo nobre sera obrigado
a os dar acabados e asemtados assim a perfeiçam de todo hate dia de pascoa da
resureiçam primeira que vem do ano de quinhemtos e oitemta e sete sob pena que
nam nos dando acabados ate o dito tempo de lhe paguar todas as perdas e danos
que sobre iso izerem ou reçeberem e sera preso na cadea e estaram nella ate que
se acabem e asemtem os ditos Ratavollos de todo a sua custa. Os quais doos re‑
tavollos os fara por preço e comtia de cimcoenta [?] mill reis em dinheiro que elle
bacharell lhe pagara por esta maneira seguimte llogo agora trimta mill reis e o mais
dinheiro lhe dara pello tempo em diamte como elle mestre lho pedir senam lho da‑

281
mdo nam tera elle mestre com ha dita obra por diamte; e allem disto lhe pagara
todas as perdas e danos que elle mestre sobre todo izer ou reseber e do dinheiro
que lhe asi der elle mestre lhe dara seu escrito o qual vallera aimda que seja de
mor comtia com escritura publica; e por esta maneira estava comcertado com o dito
diogo nobre o que se obrigava asi o comprir sob hobrigação de seus bens e remdas
e pello dito diogo nobre carapimteiro que presemte estava foi dito que era verdade
que elle estava comsertado com o dito reverendo bacharell domingos martins sobre
o fazer dos ditos dous Retavollos os quais se obrigava a fazer e acabar a sua pre‑
feiçam e asemtar comforme as ditas amostras que elle comfesava icasem em sua
mão e que se obrigava a comprir este estromento com todas as cllausullas e comdi‑
soims penas e obrigaçoims penas e obrigaçoims [sic] acima ditas e decllaradas as
quais e cada hua elle assim obrigava a ter e manter e comprir e que confesava ter
ja recebido do dito bacharell domingos martins os ditos trimta mill reis que se lhe
pagou d’amtemão; e que se obrigava a comprir este comtrato e comserto, e a nam
vir com embargos allguns de nenhua callidade que sejam comtra este comtrato e
obrigasão delle em juizo nem ffora delle e vimdo com elles que há por bem que nom
seja ouvido sem primeiro depositar toda a comtia de dinheiro que tinha reçebido a
comta dos ditos retavollos em mão do dito domingos martins o qual d’agora pera
amtão o a por abonado pera o tall deposito mandar fuamça pera o comprimen‑
to de tudo hobrigava todos os seus bens moveis e de raiz avidos e por aver que o
elle o obrigou e em testemunho de verdade o outrogaram; testemunhas que estavão
presemtes gaspar gonçallves […] e Joam allvares todos moradores em esta cidade
e dise mais o dito diogo nobre que sendo caso que acabados os ditos retavollos ou
qualquer delles e elle allgum que ergo modo em tall caso elle a por bem que nam
queremdo elle bacharell os tais Retavollos de lhe tornar todo dinheiro que elle tiver
reçebido e quamdo quer [?] que elle bacharell quiser os ditos retavollos lhe pagara
todo o mais que se achar que elles vallem; E llogo por reverendo antonio machado
Reitor da dita igreja de samto amtão e a que presemte estava ffoy dito que elle se
obrigava a dar e pagar ao dito bacharell domingos martins pera o retavollo da ca‑
pella mor a senhora dos prazeres trimta mill reis em dinheiro; de maneira que elle
bacharell nam dara mais pera o dito retavollo que vimte mill reis somemte pera o
qual obrigou a seus bens e remdas […] sobreditas; Eu allvaro ramalho tabeliam
que iz; entrelinhas que dizem nobre / foy / risquey depois.

[aa.] Mestre Antonio machado / domingos martins / joão alvares / Dioguo


nobre / gaspar gonçalves

A.D.E., Lº 153 de Notas de Álvaro Ramalho (nº 88 da série), 22 de Abril de 1586, ls.
109 vº-112 vº. Leitura da Doutora Patrícia Monteiro.

282
documento nº 8. 1586, 30 de outubro. carta de d. teotó‑
nio em que faz entrega de dinheiro para a fábrica da igreja matriz de
vila nova da baronia (Alvito).

Dom Theotonio de Bragança, Arçebº de Evora, mando ao contador de minha


fazenda leve em conta ao pe Manoel de morais, recebedor que foi da fabrica
o anno de 84, cincoenta mil rs que por meu mandado entreguou a Bras Dias
igueredo a conta dos trezentos e vinte mil rs que o ditto bras Dias igueredo
tinha emprestado à minha renda do drº que em seo poder tinha depositado
para se fazer a igreja de Villa nova dallvito, e por esta com conhecimento
ao dito Bras Diaas Figueiredo como reçebeo os ditos cincoenta mil rs do dito
Manoel de morais e certidão como ic a tomado em lembrança no quaderno
da conta que há antre minha fazenda e a da fabrica, como lhe devem esrtes
cincoenta mil rs pera lhe serem pagos e se meterem na arca do depozito do drº
da fabrica que estaa no Collegio dos moços do Choro, e levareis em conta hos
ditos cincoenta mil rs ao dº Manuel de morais. Diogo nunes a fez em Evora
a 30 doutubro de 586.
B.P.E., Fundo Manizola, Originais, Cód. 79, nº 5.

documento nº 9. 1586, 20 de novembro. rol de objectos de


prata, têxteis e mobiliário do paço de vila viçosa que a duquesa d.
catarina de bragança mandou entregara diogo vaz de Almeida para
governo do senhor d. Alexandre.

Quaderno das Cousas que a snõra Dona Catarina nossa snõra mandou entregar
e carregar em rec.ta a Diogo Vaz d’Almeida para serviço do snõr Alexandre a
xx dias de Novembro de MDlxxxbj.
Capella.
Huma Cruz de prata dourada com hum Christo e o pe do Monte Calvario com
quatro Anjos que pesou tres marcos e tres onças, dos quaes tiradas duas outa‑
vas que tem douro, iquão líquidos tres marcos duas onças e seis oitavas de prata,
que valem oito mil e vimte e cinco rs a rezão de tres mil e seiscentos rs o marco e
val o ouro mil rs.
Item dse feitio seis mil rs e soma tudo quinze mil e vinte e cinco rs ......15V025
Hum Cales com sua patena que pesou em branco tres marcos e cinco oitavas e
mea que valem oito mil tresentos rs e levou de ouro tres outavas que valem mil

283
outocentos e sessenta rs. Custou do feitio e de o dourarem tres mil e quinhentos rs,
que tudo soma tres mil trezentos e oitenta rs ........................................3V380
E custou a caixa trezentos noventa e dous rs e meio ......................V392 Emº
Dous castiçaes redondos e altos que pesaram dous marcos, cinco omças, seis
outavas, que valem a rezão de dous mil he seiscentos rs o marco sete mil e
oitenta e cinco rs, e tem dous mil rs de feitio, soma tudo nove mil e oitenta e
cinco rs ......................................................................................9V085
(…) Hum dossel de damasco carmesim de quatro panos e cinco côvados de com‑
prido menos huma oitava, e alparevazes (sic) de cima de mea largura que tem de
damasco tres covados e 4ª goarnecido de huma franja de ouro a roda e hum fran‑
jão também douro no alparavaz, o qual docel custou trinta e tres mil e seiscentos
e trimta rs ........................................................................................33V630
Huum frontal de damasco carmesim comprido, digo, de altura com sanefas de ve‑
ludo carmesim e huma bamda do mesmo veludo por baixo da largura das mesmas
sanefas com humas franjinhas (…) e carmezim por guarda dellas, e o sobre fton‑
tal de veludo carmesim com franjas d’ouro e carmesim forrado, tudo de bocaxim
da mesma cor, e custou o dito frontal dezasseis mil e sem rs ................16V100
Huma vestimenta de damasco carmesim com sevastros de veludo da mesma cor e
com franjas d’ouro por guarda com estolas, manipolo, irmãos da dita vestimenta,
que custou tudo dezasseis mil quinhentos e tres rs...............................16V503
(…) Hum leito de damasco carmesim franjado de douro e s. Ceo, cinco quarti‑
nhas, cobertor, mangas, e maçanetas de veludo carmesim, o qual levou oitenta e
sete côvados de damasco, o cobertor he forrado de tafeta carmesim, e o ceo forrado
de bocaxim, e custou o dito leito cento e trinta e quatro mil duzentos e noventa e
sete rs..............................................................................................134V297
Hum leito de damasco branco indrado (sic) de ouro, franjado de ouro e branco
já usado, sobre Ceo e duas quartinhas do mesmo damasco, e asi o cobertor, tres
quartinas de roda da India, mangas e maçanetas de veludo branco raxado, e da
banda de todo o dito leito de huma banda larga do veludo avelutado e forrado de
bocasim branco, e tem de damasco cincoenta e oito côvados e huma 4ª, que se com‑
prou no monte do Duque Dom Theodosio a hieronymo franco ............63V313
(à margem: As mangas e maçanetas deste veludo branco deste leito, se izeram de
novo e custarão com a guarnição e feitios dellas doze mil dozentos e cincoenta e
tres rs, e juntos aos cincoenta e hum mil e sessenta rs que o dito leito custou soma
ao todo sessenta e tres mil trezentos e treze rs) (…).

A.S.E., Inventários dos bens móveis de D. Alexandre de Bragança (PT/ASE/ME/B/002/


Doc.002), 20­XI­1586, 17 ls.

284
documento nº 10. 1587‑1589. rol de despesas várias do Arce‑
bispo d. teotónio de bragança com obras e aquisições para o mos‑
teiro da scala coeli da cartuxa de Évora 545.

(l. 8 vº) Titolo do dinhrº (…). Tres mil e seiscentos rs que se pagarão a Mano‑
el de araujo pintor de aparelhar e dourar sertas Imagens que estão na Cartuxa
per provisão feita a 10 de Março de 1590 em antº Gomez Rºr do pam do celrº.
(l. 10). Sette mil e duzentos e cinqtª e hum rs que se entregarão a Jeronimo de
Torres mestre das obras para pagar certos oficiaes contheudos no rol que traba‑
lharão no mostrº da Cartuxa e assi algumas achegas e servidores por provisão em
Amtº gomez Ror do celeiro fta a 16 de Mayo de 92.
(l. 37‑40) (ls. 170‑173) Titulo de doação de peças de prata.
Quatro colheres pequeninas, tres douradas pª os cálices e huma branca que se de‑
ram aos dºs Padres em 1300 rs a 29 de julho de 87.
Hum calice de prata que pezou tres marcos, sete onças e cinco oitavas a 2.600 rs
o marco, e feitio dele a 700 rs por marco, que tudo soma 13.060 rs.
Outro calice de prata que pesou quatro marcos e seis oitavas e feitio dele ao dito
preço, que faz soma de 13.507 rs.
Outro calice de prata que pesou quatro marcos e duas oitavas e feitio dele ao dito
preço, que faz soma de 13.305 rs.
Outro calice de prata que pesou quatro marcos e duas oitavas e o feitio dele a 700
rs o marco 13.305 rs.
Uma galheta de prata que pesou hum marco quatro onças e huma outava e mea
e feitio della tudo ao sobredito preço, fas 5.030.
Uma Custodia de prata que pesou tres marcos, tres onças e cinco outavas mais
seis outavas de ouro com que se dourou a 650 rs a oitava, que tudo faz soma de
12.883 rs não entrando nesta conta o feitio da Custodia que abaixo vai, Antº
Dias pagou a 11 de novrº 1587. 3.950 rs que se pagaram de feitio e de dourar
a dita Custodia a 1.120 rs o marco.
Uma Cruz de prata com doze canudos do mesmo esculpe que pezou dezoito marcos
e huma onça e o feitio della, faz tudo soma 56.120 rs e o feitio 9.000.
Hum turibulo de prata que pezou sete marcos com o feitio 21.000 rs.
Huma lanterna de pao preto goarnesida de prata avdº em 4.000 rs. Hum prato
de agua de mãos de prata que pezou quatro marcos e sete onças que com o feitio
se avaliou em 13.880 rs.
Hum jarro de prata coberto que pezou sete marcos e sete onças avdº em 12.080 rs.
Hum porta paz de prata dourada que pezou sete marcos e duas onças avdº em
36.200 rs com o feitio. Hum pau de abano guarnecido de prata em 200 rs.
Dois castiçais de prata pequenos com peso e feitio 2.600 rs.

285
Huma salva de prata que pezou dois marcos e quatro onças e meia com feitio 13.200 rs.
Uma caixa de pau guarnecida de prata que serve pª Reliquias avdª com feitio
em 6.000 rs.
Hum espelho de pau preto goarnesido de prata avdº em 3.000 rs.
Hum calice grande dourado com sua patena que pezou quatro marcos e tres onças
avdº com o ouro e feitio em 17.000 rs.
Huma lâmpada de prata que pezou sete marcos e meio que vale com o feitio
25.500 rs.
Hum castiçal de prata que pezou vinte e tres marcos e meo a 2.600 rs o marco
soma 61.100 rs sem feitio.
Outro castiçal de prata que pezou vinte e sinco marcos e valeu 65.000 rs sem feitio.
Huma casula de prata que pezou doze marcos qe vale 31.200 rs.
Huma Cruz de prata que valeu 14.600 rs.
Huma naveta de prata que valeu 10.000 rs.
Huma copa de prata para dar lavatório que custou 10.200 rs.
Ate aqui hei feito com o P. Hieronimo Ardion. Soma 131.000 rs. Somam as
vinte e oito adiçõens escritas erm este lº de folhas 39, 486.777 rs que em peças de
prata recebemos, o Prior e mais Padres desta Cartuxa de Evora do Sõr Arçebpº
de manrª que se conthem nas ditas adições. (a) Fr. Hieronymo Ardion.
Receberam os Padres Cartuxos de Luis Fragoso, que tem cargo de Capelão do
Aercebpº, quatro castiçaes de prata grandes do altar com sua Cruz, que pezarão
sesenta marcos e huma onça e quatro oitravas, das quais se passou provisão que
esta em poder de Luis Fragozo feita a 29 dabril de 92 e de como receberam os
ditos pelo modo e condição da dª provisão, asinou aqui o P. Frei Mathias Ferrer
procºr, em Evora a 26 dabril de 1592. (a) Fr. Mathias Ferrer procºr.
Receberam os Padres Cartuxos do P. Manoel Dias, escrivão da fazenda do
Arçebpº, seis galhetas de prata que pezaram seis marcos e uma onça e sete oitavas
que valem 16.205 rs e 7200 de feitio, monta tudo 23.405 rs. E assinou aqui o
P. Dom Miralles procºr. (a) Frei Jº Miralles procºr.
Receberam os Padres Cartuxos do P. Manoel Dias, escrivão da fazenda do
Arçebpº, dois cálices de prata que pezaram sete marcos e seis onças e tres oitavas
e mª que valem 22.725 rs mais 6.400 de feitio que tudo faz soma de 29.125 rs
e assinou aqui o P. Dom Miralles a 1 de março de 93. (a) Frei Jº Miralles procºr.
Receberam os Padres da Cartuxa huma lâmpada de prata que fes Andrès, pra‑
teiro, que pezou dezanove marcos e sete onças que a 80 rs o marco com feitio
montam 63.600 rs.
Se pagaram ao dito Andrès, prateiro, 4.030 rs que fes de gasto na dita lâmpada
como parese de hum rol que deu onde o Arcebpº passou provisão nas costas delle
que se pagassem, feita a 20 settº de 593 e se pagaram da arca.

286
Rol que entregou Felix, guarda da prata da Capela do Sõr Arçebpº aos Car‑
tuxos. Humas galhetas douradas que vieram de Valverde, dois castiçaes, trian‑
gullos de prata com huns canos altos, hum calice dourado, quatro castiçaes mais
de prata, huma cruz de prata.
Dãose mais aos Padres o seguinte: huma Cruz de prata dourada com engastes de
cristal em que entram doze relicários de latão dourado, 38.850 rs.
Dãose mais aos Padres Cartuxos hum calice que pezou quatro marcos e tres on‑
ças e tres oitavas e mea de prata e de feitio 3.800 rs que ao todo monta 135.315.
Em 10 de novrº de 97 paguei 9.600 rs que custaram o feitio de hum Cofre de
veludo carmesi por dentro e fora, seus passamanes de ouro 400 rs, treze caixas de
cálice, huma mto maior que as outras, 5.200 rs, que pagou a Djº Perª da arca e
assinou aqui o Padre Prior. (a) Fr. Morel prior.
Em 21 dagosto de 1597 se passou provisão para Djº Pereira pagar 25.000 rs
ao Licº Alvaro Tinoco por outros tantos que entregou a Andrès Taude, prateiro,
para fazer dois calices para a dita Cartuxa. E asinou o Padre Prior Fr. Morel.
Receberam mais os Padres Cartuxos as peças de prata seguintes: Hum porta
paz grande, hum calice grande, hum São Bruno de prata, doze relicários de
latão, dourados soldados com prata, duas coroas de cobre douradas soldadas
com prata com seus engastes de pedras azuis e brancas, que serrviram pª huma
Imagem de Nossa Snrª com o Menino Jezus, huma custodia de prata, duas ga‑
lhetas. Monta a prata que receberão a rezão de 2.620 rs, 88.885 rs. Monta o
feitio de todas as peças acima ditas 109.000 rs. Monta ao todo cento e noven‑
ta e sete mil oitosentos e oitenta e cinco rs, 197.885 rs. Évora, 9 de junho de
1598. (a) fr. E. Morel prior.
Titolo das peças de prata (…). Somam as vinte e oito addiçoins scritas em este
livro de folhas 37 ate folhas 39 quatrocentos oitenta seys mil setecientos setenta
e sete rs que en peças de prata recebemos ho prior e mays padres desta Cartuxa
de Evora do sõr Arcebº da manera que se contem nas ditas addiçois.

(a)Fr. Hieronimo Ardion.


Receberão os padres da cartuxa huma allampada de prata que faz Andres pla‑
tero que pezou dezanove marcos e sete onsas que a oitentya reales o marco com
feitio, montam sessenta e tres mil e seiscentos rs 63.600.
Pagarão ao dito Andres platero quattro mil e trinta rs que fes de gasto na dita
lâmpada como parese per hum rol que deu onde o Arcebpo passou provisão as
contas delle que se pagassem, feita a 20 de settbº de 93 e a pagarão darca 4V030
Em 21 dagosto de 97 se passou provisão para diogo pereira pagar 25.000 rs ao
lic. Alvaro Tinoco por outros tantos que entregou a Andres Taude platero para
fazer os cálices para a dita Cartuxae assinou aqui o dito padre 25V000

287
(a)F. Morel prior
Receberão mais os snres Cartuxos as peças de prata seguintes:
Hua porta paz grande que pesou tres marcos seis onças e sete oitavas. 8V
Hum calice grande que pesou quatro marcos digo nove marcos huma onça e seis oitavas. 10v
Hum são Bruno de prata que pesou quatorze marcos e tres oitavas. 40 V
Doze reliquarios de latão dourados soldados com prata que entrou de prata huma
onça e seis oitavas.10V
Duas coroas de cobre douradas soldadas com pratta com seus engastes de pedras
azul e branquas que sirvão pª huma imagem de nossa Snõra e menino Jhus. 20V
Huma custodia de prata que pesou quatro marcos huma onça e quatro oitavas. 5V
Duas galhetas que pezarão dous marcos e duas onças de prata. 4V
Monta a prata a resão de 2V620 rs oitenta e oito mil e oitocentos e oitenta e
cinco rs 88V885
Monta o feitio de todas as peças acima cento e nove mil rs 109V000
Montas ao todo cento e noventa e sete mil oitocentos e oitenta e sinco 197V885

(a)F. Morel prior


(apenso a l. 96) Recebemos asi en la cartuxa de Scala coeli de Diego Pineyro ves‑
timenteiro las siguientes pesas por orden y mandado del Sõr Arcobispo.
(…) Una vestimenta de damasco branco com savastros de tela y oro y forrada
de tafetan verde.
Un frontal del mesmo damasco com suas sanefas de brocado.
Un dossel grande del mesmo damasco com barras de brocado y franjoins de oro.
Una almofada del mesmo damasco com barras de brocado.
Duas vestimentas de fustan branco de cruzes.
Dos frontays do mesmo fustam com suas sanefas.
Un sobre ceo do mesmo fustam para la capela do padre prior.
Mas oyto alvas de ruam y seus amitos.
Mas oyto amittos.
Seys franyas de missal de ruam.
Quatro camisas de linyo para os mantéus das ditas camisas.
Una cogulla de estamenha branca para dezir missa.
(aa) F. Morellus 26 mensis novembris 1594 – F. Morelius prior Scalae Coeli.
(l. 96) Hes verdade que jo Frei Hieronimo Adrião p.curador de la Cartuxa de
Scala Coeli dê a Lorenço igeiredo un Christo de bulto per mandado del Arzobº
e per verdad lo asiné hoi a 14 de octobr. de 1589.

(a) Fr. Hieronº Ardion


(l. 139) Titolo de peças de ferro (…).

288
De ferragem do porto com mil pregos livrados que Nicolau de Frias mandou de
lixboa quinze mil cento e setenta reis. 15V170
De huma Romaã grande com seus pregos que ho dito Nicolau de Frias mandou
de lxª que custou dous mil e setecentos reis. 2V700
Doze thesouras e doze canivetes que o dito Nicolau de Frias mandou q. custarão
dous mil cento e sesentas rs 2V160
(l. 139 vº) Doze fechos de segredo com suas chaves dobradas que o dito Nicolau
de Frias mandou de Lisboa que custarão noue mil rs (11 de novrº de 87) 9V000
(l. 155 vº) Tº de peças de arame e latão (…). Huma Campainha com sua porqª
e ferragem que Nicolau de Frias mandou de Lixª para a Cartuxa que custou
mil e quinhentos rs 1V500.
Hum almofariz grande com sua mão que mandou o dito Nicolau de Frias de
Lixª que custou tres mil e oitocentos rs 3V800.
(l. 170‑173) Titulo de papel, pergaminho e livros. Encadernação de livros dos
Padres Cartuxos.
Dez livros da Trindade e de Frei Luis de Granada, em 21 de março de 90.
24 Breviarios, 10 Divinais, 4 hinarios, entregues a D. Mathias Ferrer procºr a
13 de julho de 92.
Dez Breviarios, tres Graduais, duas Biblias de Sixto, um Titelmano sobre os
Salmos para D. Theodoro, um Calepino de cinco lingoas para D. Medeiros, duas
Sumas de Manoel Roiz e um lº de Inventarios em 26 de abril de 96.
Em 15 de julho de 93 pagou‑se a encadernação dos evamgelhos e estatutos da
Casa mais o Testamento Velho que tem o Pe Vigario.
Livros oferecidos pelo Sõr Arcebpº aos Padres Cartuxos.
Dois Missais, uma Biblia, uma Summa Exemplarum, dez livros de Frei Pedro
dalcantara, que custarão mil e seisçentos rs 1V600 em 21 de março 90.
Seis livros de devoção entregues ao Pe D. Hieronimo, hum Martirtologyo, uma
Homilia Doctorum e Opera Abatis Lecinensis, huma Biblia de Benedicto, um
Titelmano sobre os Salmos, a 11 de abril de 93.
21 de março de 90. encadernação de dez livros da trindade e de fr. Luis de Gra‑
nada oitocentos e quarenta rs V840
Huma Biblia de xisto quinto em tres volumes. Humas epistolas de São Paulo
enquadernadas com hum martirológio que esta no capitulo. Opusculos de Dioni‑
sio cartuxano que tem o Padre Prior, em 15 de junho de 93.
Nesse mesmo dia pagou‑se a entrega das Obras de S. Jeronimo, de São Pedro
Crisologo, Osorio sobre Isaias, Osorio De gloria, Osorio De sapientia, Plato De
bono statuto religiosi, Dionisio cartusiano, De quatuor novisimis, huma Suma
de Medina para o Prior, as Obra de são Bernardo pª D. Thome, duas Primeiras
e duas Segundas de Heitor Pinto, hum Flos Sanctorum portuguez.

289
Livros de Coro. Em 4 de dezº de 95 passou‑se provisão pª dar a Dºs Ferreira,
lacaio do Arcebpº, 11.400 rs para ir a Cadiz buscar huma caixa de livros de
canto da Cartuxa que vieram de França.
Provizão pª Diogo Pereira pagar a Lope de Sam Jorge 4.900 rs por sete cadernos
de pergaminho de livros de canto que fes pª a dita Cartuxa em 10 de novrº 96.
Em 17 de Março de 98 se passou portaria pª Diogo Perª pagar a Manoel de
Lira 5.000 rs de hum caderno pª os Missais intitulado Supplemento Orationum
que imprimiu pª a dita Cartuxa.
Em 2 de settº de 99 se passou provisão pª o dito Djº Perª dar ao padre procºr
da Cartuxa 18.367 rs pª pagar ao Padre Lope de Sam Jorge que se lhe devem
de vinte e seis cadernos e huma folha que serviu de solfa e assinou aqui o padre
procºr. (a) Frei Mathias ferrer procºr
Pergaminhos. 120 rs de pergaminhos pª tapar asados de conservas a 21 cde março
de 90. 11.200 rs por dezaseis cadernos de folha em pergaminho, 13 de junho de 92.
Em 3 de fevrº de 96 receberam os Padres Cartuxos das mãos de Alberto Henri‑
ques 185 pergaminhos entre grandes e pequenos que custaram 17.500 rs.
(…) Titolo da doação de escravos. Hum escravo moço de idade de 18 athe 20
annos preto ladino por nome Dias, avd. em 40.000 rs. Outro escravo preto
por nome Antonio da mesma idade, em 40.000 rs. Outro escravo por nome
Coresma em 40.000 rs. Outro escravo de nação fullo por nome Bento que ser‑
ve de vaqueiro avdº em 50.000 rs, entregue a 26 de julho de 93. Mais outros
dois escravos, Luis índio e Pero Dias, alfaiate este, avdºs em 80.000 rs am‑
bos. Mais hum negro ferreiro que se comprou do Juiz de fora de Sua Mag.e
por 61.470 rs e assinou aqui o Pe Procurador em 24 doutº de 96. (a) Fr.
Manoel Bruno procºr.
(l. 182 vº) 1587 ‑ De huma Imagem de Nossa Snõra e feitio della. Os assentos
de bordo que forão da See que forão avaliados em trinta e cinco mil reis. 35V000
Dous mil pães de ouro com que se dourou o Retabolo dos ditos Padres 6V440.
(ls. 185‑186) Seis mesas grandes que mandou Nicolau de Frias de lixª e da fer‑
ragem e correias, custaram 15V600. A tavoada das Missas que mandou o dito
Nicolau de Frias de Lixª que custou cinco mil e qyuinhentos rs 5V500. Senta
taboas de pinho que mandou o padre Nicolau Agostinho de lixª que custarão
seis mil rs 6.000 rs. Mais doze tinteiros e doze poeiros e vinte e quatro aneis e
duzentas continhas de cavalo marinho, 34V000.
(ls. 202). Titolo dos ornamentos (...). Seis mil e seiscentos de feitioo de cinqo
frontais e cinco panos de estante ao Pinheiropor provisão de dyº pereira de fevrº
de 88. 6V600
Oitocentos setenta e dois rs que se pagarão a Salvador Dias sirgrº de huns cor‑
dões que fes pera a cartuxa. Pagou dyº pereira por provisão de 10 de junho de 88.

290
Quarenta e oito mil setecentose trinta rs que Lço Silveira pagou a frcº lopes sirgeiro
de franjas que fes para a cartuxa por provisão feita a 22de junho de 88 48V730
Trinta e sette mil e seteçentos rs que Lço Silveira pagou de ornamento pª a Car‑
tuxa a diogo pinheiro alfaiate per provisão de 22 de junho de 88.
(…) em 19 do dito mês de novembro outra provisão pª se pagar a francº lopes
sirgeiro onze mil e seiscentos e oitenta rs que gastou em duas toalhas de altar do
Prior da Cartuxa e em festão pª duas vestimentas e frontais e hum dossel e outras
coisas pª o Priorcomo parece per o rol nas costas da provisão. 11V680
Em 19 de dezembro se passou outra provisão pª pagar a Diogo Pinheiro alfaiate
des mil oitosentos e dez reis de feitio de huma vestimenta de damasco franco com
sauastros de tela de ouro forrada de tafetá verde, e hum frontal do mesmo e hum
docel do mesmo, e huma almofada do mesmo, e duas vestimentas e dous frontaes,
e hum sobrecéu de festão, e oito alvas e oito amitos e seis fronhas de missal e ou‑
tras coisas assinadas em hum rol 10V810
(l. 210): Titolo das alcatifas e sobremesas e lambeis e peles e guadamecis:
Duas alcatifas da india inas avaliadas em vinte mil rs 20V000
Outras duas alcatifas piquenas avaliadas em tres mil rs 3V000
Huma sobremesa de telilha forrada de tafetá verde avaliada em oito mil rs 8V000
Outra sobremesa pequena do mesmo, avaliada em mil rs 1V000

(a) Fr. Hieronimº Ardion em 32V000


Cento e trinta peles de guadamecis, que custarão dez mil trezentos e sessenta rs
para cobrir os altares 10V360
(ls. 253‑255 – Évora, 22 de Março de 1590). Titolo dos Retabolos.
Ho Retavolo do altar mor dos padres que foi avaliado por pintores em quinze
mil e seis sentos rs sem ho ouro que já vai lançado atras no titº da madrª a l.
183 na volta. 15V600
Outro retabolo que esta sobre a porta do terreiro que foi avaliado em tres mil rs 3V000
Outro retavollo que esta num altar dos da igreja da invocação de nossa Snõra da
Graça que foi avaliado em seis mil rs 6V000
Outro retavolo de Sancto Theotonio que foi avaliado em quatro mil rs 4V000
Outro retavolo de nossa Sª do populo que foi avaliado em tres mil rs 3V000
Dous retavolos pequenos hum do ecce homo e outro do Cruciixo que forão ava‑
liados em oito mil rs 8V000
Outro retavolo piquen o de Santa Caterina que foi avaliado em seis mil rs 6V000
Outro retavolo do Eçe homo que ho Arcebpo deu ao Prior, não avaliado.
Oito retavolos piquenos que Nicolao Agostinho comprou pª os padres dous mil
e quatrocentos rs 2V400
Outro retavolo de Nosa senhora que esta no Refectorio não avaliado.

291
Outros dois retavolos que o Arcº deu ao padre D. Pº Bruno e ao pe D. Vicente Br.
Outro retavolo que deu mais ho Arcebº ao padre vigrº de S. Hieronº guarnecido.
Hum Cruxiixo que ho Arcebpo deu ao p.e Eleuterio não avaliado.
Cinqº mil rs se pagarão ao pintor de pinturas que fez na Cartuxa per provisão
em djº pereira a 7 de novº de 1587 5V000
Dous mil rs que mais se pagarão ao dourador de dourar algumas Imagens dos
pes por provisão de Dyº perª a 9 de fevrº de 88 diguo a 7 de novrº de 87 2V000
Hum retavolo de Sam Francisco (não) avaliado.
Huma Imagem de christo cruciicado em vulto a 14 d’Octubro 89. Fr. Jeronimo
Ardion en sete mil rs...........................................................................7V000
Mil e quatrosentos rs que deram duns papeis de registo pª os Padres.
Ate aqui hei feito conta com os Padres. Somam as onze adições escritas neste livro
a folhas 253 ate estas cincoenta e seis mil e quatrosentos e conquenta rs que o P.
Prioor e mais Padres receberam conforme as adições escritas e as mais sete adições
que não estão avaliadas também recebemos tudo do sõr Arçebpº ...........56.450
(l. 255) (…) Seis mil rs que o Ldo Domingos Martins pagou a Diogo Nobre car‑
pinteiro da guarnisão da madrª que fez no Ecce Homo que veio de Madrid pª a Car‑
tuxa per provisão feita a 16 de fevrº de 91 registada a l. 33 no Lº 5º ......... 6V000
Deuse mais aos padres cartuxos as cousas seguintes, a saber, dous retratos de
Nosa Snõra grandes, Diesezete retratos piquenos, Hum retrato grande de Cristo.
Em 19 de octº se pagou a Custodio da Costa seis mil e dozentos rs de pintar huma
imagem de nossa Snõra e outras cousas pera a Cartuxa 6V200
(l. 256) Titolo de peças de pedra (…). Sete pedras pª moldes que mandou Ni‑
colao de frias de lixª que custarão mil e quinhentos rs 1V500.
Provisão dirigida a Dos Martins fta a 26 doutubro de 89.
(l. 270 vº). dous mil rs que Nicolau de frias deu a hum homem que solicitou as
cousas que elle comprou pª a Cartuxa 2V000.
Novesentos e sessenta digo cinqtª rs que custarão alguns envoltórios (sic) e cordas
para se liarem as cousas que o dito Nicolao de frias comprou para a Cartuxa V950
Biblioteca Pública de Évora, Cód. CVII/1-28: Inventario de tudo o que o Arcebpo tem dado
aos padres Cartuxos do Mosteiro de eScala caeli desta cidade de Evora, asi dinheiro, pam, como
movel, e outras cousas ao diante declaradas, MDLXXXVIII Annos.

documento nº 11. 1587, Janeiro. pedido de pareceres sobre


a obra do cadeiral da capela‑mor da sé de Évora, ordenada por d.
teotónio de bragança.

(…) Na obra das cadeiras da Capella mor q. quer o sr. Arçebispo se mande
fazer assentou o Cabido que se tomem os pareceres de Jeronimo de Torres, Ma‑

292
theus Neto e Bras Godinho e outros mestres de obras conforme as traças (com)
que corre a obra pera que se faça da forma das advertências do senhor Arcebispo.
A.S.E., Livro das Lembranças dos Negocios que se tratam e assentam em Cabido, 1587‑1591
(PT/ASE/CSE/001/Lº 6), l. 36 vº.

documento nº 12. 1587, 29 de Agosto. despesas de d. te‑


otónio de bragança com a obra do grimpo da torre da sé de Évora.

Rol dos gastos do grimpo da torre da See que se fez em Lisboa e do que se fes
nella em evora segunda vez que se pos.
Despendeo o padre pº Alvares desembargador da obra dezoito mil rs que deu ao
oicial que fes a grimpa em preto em Lixboa os quais xbiiijrs se lhe derão per
hum escrito de Felipe Tercio que disse não valer menos, os quais lhe deu nicolau
agostinho plo ditto despº.
Despendeo mais no dourar da ditta grimpa e pimtar e emcarnar quatorze mil rs
os quaes foram dados pela ordem asima ditta.
Despendeo mais mil e quinhentos rs que custou o barão que veio de Lixboa por
dizer o padre Nicollau Agostinho que tanto derão por elle.
Despendeo mais seis centos e sessenta rs que custou huma quanastra mto grande
em que veio a grimpa de lixboa e io e papel e palha em que vinham emborilha‑
das (sic) as pessas e custo que fes ate se meter na barca.
Despendeo seis mil rs que deu ao almocreve que trouxe esta ditta grimpa per virem
dous homens sempre pegados na ditta canastra e ser mto grande.
Gastos que fes a grimpa da segunda vez que se amanhou em Evora.
Despendeo o p. Pº Alllvares Dzºr da obra dous mil rs que deu a mestre Francisco
de comserto da grimpa pela desconcertar toda.
Deu o dto Dezºr ao ditto mestre Francisco dous mil e sette centos e sasenta rs de
huma arroba e quatorze arrates de ferro que pesou o barão em que agora esta a
grimpa a sasenta rs por arrátel que faz a dita soma lansada.
Deuse a hum caldeireiro de fazer hum canno de cobre pª a sphera e soldar tudo o
que for necessário quinhentos e quorenta rs.
Mais se deu a hum pintor de pintar e dourar o amjo e a sphera aquillo que foi
desmanchado seis sentos rs.
Deu o Dezºr a hum oicial latoeiro em fazer hum dado sobre que anda o Amjo
cento e sasenta rs.
Despendeo mais em azulejos que mandou vir para consertar a torre, setecentos e
oitenta rs, postos em Aldea Gallega conforme ao escrito do pe Nicollau Agostinho,
os quaes estão metidos em huma canastra na casa da obra per mandado de S.S.

293
Mais despendeo trezentos rs de os trazerem de Aldea Gallega a esta cidade.
Despendeo o dto R.dor trezentos rs de se comsertar huma cadea para a garrida.
Mais despendeo dous mil e seiscentos e noventa rs em quatro arrobas e omze arrá‑
teis e mº de chumbo que comprou pª chumbar as pedras do remate da Torre para
a grimpa, digo, o barão e tres iadas de pedra no remate per se enlear tudo colm o
dito chumbo pª irmeza da torre. Custou o arrátel do chumbo vinte rs.
Despendeo mais dous mil rs em pregaria que comprou por mtªs vezes pera se
pergar~e os Andaimos da torre e asi mto arame que se ouve mister pª a dita tor‑
re, digo, pª medidas das selchas e moldes e outras cousas necessárias.
Mais despendeo o Dº Recebedor mil e sessenta rs em sincoenta e tres cordas de vi‑
mtem que comprou pª os andaimos.
Despendeo quinhentos e sincoenta rs em outras cordas mais piquenas pª os mes‑
mos andaimes.
Despendeo o dito Pº Alvares Rdºr da obra trezentos e oitenta rs em hum pao com‑
prido sde quatro em carro que foi necessário pª os andaimos da torre.
O qual rol eu Antº Arnao espvão da obra da See is bem e ielmente em que vam
dezoito adiçõis todas da minha letra e me achei prezente nas cousas que se ize‑
ram nesta cidade em evora oie xxij dias do mês de agosto de lclxxxta bij anos.
(aa) Antonio Arnao
Dom Theotonio de bragança Arcebpo devora ett. Mãdo ao contador de minha
fazenda que por esta e pelo Rol atras escripto em desoito adiçõis leve em conta ao
padre Pedralvares Rdor que foi das Rendas da fabrica de nossa Santa See o ano
de 87 os quarenta e oito mil e duzentos e trinta rs que fez de Custo a grimpa que
se pos na torre da See, como parece do dito Rol, xpouão de ig.do a fez por nosso
mãdado em evora a 22 de frº de 588 anos.
(Sob sinal do Ldo Diogo nunes igª. Evora a nove de Mayo de 1590)
(a)Diogo nunes igrª
B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 85, nº 2.

documento nº 13. 1588, 13 de fevereiro. contrato de d. teo‑


tónio de bragança com diogo nobre e João fernandes, mestres car‑
pinteiros de marcenaria, para fazerem o retábulo‑mor da igreja de
santo Antão, segundo traças do arquitecto nicolau de frias.

Saibam os que este estromento de comcerto de obrigaçam de feitio de Retavollo vi‑


rem que no ano do nacimento de noso senhor Jesus Christo de mill e quinhemtos
e oitemta e oito em treze dias do mes de fevereiro em esta cidade de evora demtro
na Igreja de samto amtam estamdo ahy presemte ho Reverendo padre domingos

294
martins bacharell morador desta dita cidade de hua parte; e da outra estamdo
ahy presemtes Joam fernandes e dioguo nobre carapinteiros de masanaria mora‑
dores em esta dita cidade elloguo por elle dito bacharell domingos martins foi dito
que com poder e commisam que tem do Imllustrisimo e reveremdisimo senhor ho
senhor [sic] dom teotonio de bargamça arcebispo desta cidade e seu arcebispado
e por elle era mandado em visitaçam e por ello […] pennas como resebedor que
e das remdas do dito senhor arcebispo, estava comcertado e se comcertara com os
ditos Joam fernandes e dioguo nobre carapimteiros pera averem de fazer ho ra‑
tavollo da capella mor desta dita Igreja de samto amtam pella maneira seguimte
Ha que elles ditos joam fernandes e dioguo nobre seram obrigados a fazerem o
dito Retavollo da dita capella moor de madeira de bordo e não de nogueira ffeito
e acabado de todo comforme ao desenho e hamostra ffeita por niculao de frias que
elles carapimteiros tem visto que esta asinado por ho arcebispo que amda jumto as
amostras dos dous Retavollos do samto sacramento e de nossa senhora desta dita
igreja que elles izeram; o qual Retavollo elles mestres seram obrigados a darem e
acabarem todo e toda sua perfeiçam pera sua custa delles ditos carapimteiros hate
dia de natall primeiro que vira em que se acabara este presemte ano e se comesara
o ano de quinhemtos e oitemta e nove; o quall retavollo faram e seguiram em tudo
comforme ha dita trasa e amostra que acima esta decllarada e elles mestres tem
visto sem della allterarem nem demenuirem cousa allgua. E nam no dando aca‑
bado ate ho dito tempo conforme há dita amostra e em toda sua perfeiçam, Em
tall caso elle domingos martins ou quem seu carguo tever podera mandar acabar o
dito Retavollo de tudo a comta e costa delles mestres sem por isso se poderem cha‑
mar […] sem perda allgua; o qual Retavollo faram e daram hacabado de todo a
sua costa de tudo o que for necesario de madeira e feitio e amdaimos e cordas e de
todo o mais que fynallmemte for necessário tudo a sua costa; e eles carapimteiros
por preso e comtia de cemto e sessenta e cimco mil reis […] sallvo de todo […] ao
dito senhor arcebispo paguos em três paguas he cimcoemta mil reis lloguo amtes de
comesar per o dito Retavollo; e outros cimcoemta mil reis lhe daram em nome da
dita sua obra; e a demasia dos ditos semto sesemta e cimco mil reis daram tamto
que ho dito Retavollo for acabado e asemtado de todo. E por esta guisa e com es‑
tas comdiçoims dise o dito bacharell domingos martins que avia por dado o feitio
do dito retavollo aos ditos joam fernandes e dioguo nobre por o dito preso que se
obrygavão lho dar e paguar pella maneira que atras esta decllarado sob hobryga‑
çam de seus bens e remdas moveis e de raiz avidos e por aver que pera ello hobri‑
gou. E pellos ditos Joam fernandes e dioguo nobre carapimteiros que presemtes
estavam foy dito que elles tomavam e aceitavam em sy este estromento com todas
as cllausullas e comdisoins penas e obrigaçoims asima ditas e decllaradas as quais
e cada hua dellas se obrigavam a ter e mamter e comprir, e de darem acabado dito

295
retavollo da dita capella mor desta ditaa Igreja ate o dito dia de natall primeiro
vimdouro comforme a trasa E amostra de que atras se faz memçam que esta asi‑
nada por ho dito senhor arçebispo que elles mestres diseram terem visto. O qual
daram acabado em toda sua perfeiçam e assim todo a sua costa de tudo o que for
necessário por o dito preso de cemto e sesemta e cimco mil reis; E que se obriga‑
vam a nam virem com embarguos alguns a este comtrato e obrigaçoims delle e vi‑
mdo com elle que crem e am por bem que nam sejam ouvidos em juízo nem fora
deles sem primeiro depositarem todo dinheiro que tiverem Recebido em mão delle
dito domingos martins que d’agora pera […] por habonado pera o tal deposito
sem dar iamsa o que prometiam e se obrigavam asi o comprirem e de numca o
comtradizerem […] sob hobrigados bens moveis e de raiz avidos e por aver que
pera ello obrygaram e cada hum obrigou em testemunho de verdade outorgaram
e mamdaram dello ser feito este estromento e os quais cumpriram testemunhas
que estavam presemtes ho padre bras nunes e alvaro [?] lluis samcristam da dita
Igreja moradores em esta cidade e as ditas partes assinaram a nota. E eu allvaro
ramalho tabeliam que is

[aa.] Domingos martins / (…) fernandes / Diogo nobre / Bras Nunes / Al‑
varo Luis
A.D.E., Lº 161 de Notas de Álvaro Ramalho, ls. 29 vº­32. Leitura da Doutora Patrícia
Monteiro.

documento nº 14. 1588, 4 de março. contrato de d. teotó‑


nio de bragança com Ascenso fernandes e gaspar gonçalves, mes‑
tres carpinteiros de marcenaria, para fazerem a obra do sepulcro do
santíssimo sacramento da sé de Évora, segundo traças do arquitec‑
to nicolau de frias.

Saibão quantos este estromentol de contrato e obra de empreitada e obrigação virem que
no ano do nascimento de Nosso Snõr Jhus xpo de mil e quinhentos e oitenta e oito anos
aos quatro dias do mês de março nesta cidade de Evora na casa da fazenda do ilus‑
trissimo e reverendissimo sõr Don Theotonio de Bragança, arcebispo de Evora, estan‑
do ahi presente o padre Pedralllvares, beneiciado na Santa See desta cidade, recebedor
das rendas da obra e vedor da dita obra, por virtude de huma provisão que ahi mostrou
do dito senhor arcebpº feita a vinte e quatro de feverº deste ano presente de oitenta e oito
e assinada por elle e registada e com thermo de juramento nas costas della que tornou
a jurar em poder do dito padre pedro alvares, logo por elle foi dito em presença de mim,
tabeliam, e testªs ao diante escritas, como veador da dita obra da See, que asi hera ver‑

296
dade que o dito sõr arcebpº ordenara ora mandar fazer hum sepulchro na Santa See
desta cidade pª se nelle por o sanctisimo sacramento nos dias dendoença a custa da dita
obra das rendas della, e que elle como vedor a mandasse fazer a tall obra, plo qual ele
dito Pedralvares estava ora contratado pª se fazer o dito sepullcro com Ascenso Frz,
carpinteiro, mºr nesta cidade, que presente estava, e a Gaspar Glz, outrosi carpintrº,
mºr na cidade de Lixboa, estante ora nesta cidade, mestre das obras do dito sõr Arce‑
bispo e da dita obra, que também estava presente, o qual sepulcro e obra delle os ditos
Ascenso fernandes e Gaspar Gomçallvez thomarão com as condições e pela maneira
seguinte, que eles se obrigão a fazer toda a obra do dito sepulcro conforme as traças que
por mandado do dito snõr Arcebpº fez Nicullao de frias, mestre das obras da cidade
de llixboa e das obras das Igrejas do dito Arcebispado de llixboa, que estão assinadas
pelo dito snõr e pelos ditos Ascenso frz e Gºr Glz e por mim, tabeliam, as quais traças
icão em poder do dito padre Pedralvares que as mostrará a eles mestres cada vez que
necessário for e conforme a ellas se obrigão fazer a dita obra do dito sepulcro, a saber,
formarão de madrª de castanho e pinho hum reato de quinze palmos dalto e dezanove,
digo, vinte palmos de comprido e quinze de largo, e a este reato que farão de grades le‑
vadiças pª se poder armar e desarmar façilmte, farão emcostadas huma escada deça da
parte que corresponda à Porta do sol, e outra à capella de João mendez, e cada huma
destas escadas serão de duas peças pª se poderem armar mais facilmente e cada huma
destas escadas terão de largo dez palmos de modo que cada huma das partes tenha cin‑
qo de largo e serão muito bem feitas e muito fortes com suas chavetas de ferro e suas
espigas aonde for necessário da propiá madrª, e para cada huma das ilhargas destas
escadas farão huns mainéis de balaustres que vão rematar nos pedestrais das colunas
de sima e na fronte e espalda do dito reato farão huns pitoins da mesma manrª de ba‑
laustres como os ditos mainéis e se farão fortes nos ditos pedestrais, ao pee das duas es‑
cadas em cada huma dellas farão dous pedestais de tres palmos em coadrado e seis dall‑
to os quais serão de vaãos muito fortes e bem feitos com seis painéis emcaixados no vão
deles e hum dos ditos painéis sera e servirá de porta, pª se fortiicar no estrado em que
hos ditos pedestrais hãode icar fortes e levadiços, e sobre cada hum destes pedestrais que
hãode ser quatro farão huma pirâmide de tres pallmos em coadrado no pee, as quais
sobirão quinze palmos e acabarão em sima em ponta em hum palmo coadro e todas
estas quatro pirâmydas serão vaãs e trãsparentes com varias formas de cuadrados e
ovados, e pª cada hum destes vaãos farão huma grade sotil em que se preguem pedaços
de tafetá de diversas cores, e estas quatro pirâmides serão feitas de tal modo que se ar‑
mem e desarmem facilmente com perafusos, e ao pe de cada huma das ditas piramides
farão quatro bolas sobre que iquem de modo que ique vão antre o pedestral e as ditas
pirâmides com suas espigas de ferro e pao muito fortiicadas, e debaixo do dito reato
ate os pedestrais de sima e ao pee deles farão dous arqos de obra tosca e diliqada, hum
arqo respondera à porta principal e outro à capella mor, e cada hum destes arqos que

297
terão de vão dez palmos e de allto treze serão de tres peças, duas nos pees dr.tos ou em‑
postas e outra no arqo, e as ilhargas ou lados de cada hum destes arqos farão huns pi‑
lares de tres pallmos he meo de llargo e omze dalto e que farão de saqada pª fora pela
parte do arqo mº palmo e da parte dos mainéis pallmo e mº, e estes pilares terão seus
capiteis e vazas de ordem dórica e do capitel ate vaza sera repartido em almofadas la‑
vradas ao rustico, e da mesma man.rª serão as que forem nos arqos, os quaes pilares
se fortiicarão em seus llugares com suas chavetas e parafusos, e aos lados destes pilares
que vão pª as pirâmides farão humas guarnições de madrª de hum palmo e mº de lar‑
go em forma de triangolo com suas molduras e emcaixados de manrª que possão icar
dentro nellas huns painéis na mesma forma pª se nelles pintar o que parecer bem ao
snõr arcebispo conforme ao lugar, e isto farão asi da parte da porta primcipal como da
capella mor, antre os dous arqos aos lados, que ica a modo de corredor, forrarão e co‑
brirão com peças de madrª levadiça deixando a cada huma das ditas partes huma por‑
ta pª serviço e de vaãos de baixo das escadas, e o feixo deste traverso (?) farão também
de peças levadiças feitas de tal arte que pareça forro de artesõis, e que em nenhum caso
se veja o madeiramento do reato nem as escoros e paaos com que hade icar fortiicado,
sobre este dito reato farão qoatro pedestrais de cinqo palmos dallto e tres por cada lado,
os quaes pedestraes serão feitos tres parentes com muito boas molduras e cimalhas e
vazas, e nos vaãos em cada hum deles suas grades sotis pª se poder por tafeta como nas
piramides dos quaes pedestrais se fortiicarão sobre o dito reato nos angollos deles, e di‑
retamente sobre os pilares toscos e por dentro levarão huuns paaos coadrados que pa‑
vimentem (sic) os ditos pedestrais e os pilares ate o chão, e subão asima quoatro ou
cinqo palmos que entrarão pelas colunas, e farão mais sobre estes pedistaes quoatro
colunas de dezasseis palmos dallto e palmo e tres coartos de diametro as quoaes serão
de ordem jónica com suas vaças torneadas e capiteis muito bem lavrados e as ditas culu‑
nas serão lavradas com ho ornamento trocido, humas em contrº das outras, e antre o
dito ornamento as meas canas e estas colunas serão vaãs por dentero pª poder entrar o
pao que ica nos pedestraes sobreditos em que hão de icar fortiicados, e no vão que ica
asima nas ditas colunas se meterão outros paaos como os debaixo e que subão ariba
cinqo palmos em que avião de fazer fortes os frisos, os quaes formarão de muito boas
grades com seus perafusos e espigas, os quoaes frisos serão de duas faces e asi responde‑
rão de dentro das colunas como de fora com alquitraves, frisos, cimalhas e ressaltos por
fora, tudo levadiço, asima destes frisos formaerão a primrª parte do zimboerio ate a ci‑
malha do quoatro peças qjue sobirá quatro palmos de alto, o qual será de quatro peças
lavradas em volta por dentro e por fora, e as ditas quoatro peças farão hum coadrado
deminuido sobre ho qual e sobre a dita cimalha lhe porão hum painel que faça teto ao
dito zimbório, e sobre elle farão huma meia laranja de quatro peças que se venhãon a
juntar nos angullos lavradas como pareçer na traça e sobre cada huma das colunas fa‑
rão hum pedestral com suas bolas por remates e da manrª sobre a mea laranja com sua

298
cruz, xdentro das quatro colunas sobre o reato farão dous degraos e sobre os degraos
farão hum altar de oito palmos de comprido e quatro de llargo de madrª alevadiço e
sobre ho altar farão hum estrado pequeno de seis palmos de allto e oito balaustres de
sete palmos de allto lavrados com mto boa obra, os quais se emcaixarão nos cantos do
dito estrado e em sima dos capiteis dos quatro balaustres farão huma cimalha em gra‑
de com suas qoatro bolas por remates, farão mais hum pedestrall pequeno de palmo e
meio em coadrado e hum palmo dallto que seja forte no meo e se passe por em sima a
costodia com ho santissimo sacram.to, farão mais sete pedestraes com seus pes de boa
invenção pª oito brandois de cera de hum palmo de groso e os banqos que forem neces‑
sários pª cera pª tochas. E toda esta sobredita obra como se conthem neste estromento
se obrigão os ditos ascenso frz e gaspar gllz, mestres, a fazerem muito bem feita e mui‑
to forte e segura e assentada em seu próprio lugar junto as grades da capella mor e tam
forte in si mesma que de nenhuma maneira toque as ditas grades da capella mor, e as
grades de paão que asewntarem sobre o lageamento da Igreja terão seus pernos (sic) de
forro que encaixarão em buraqos que se farão no dito lageamento de maneira que ti‑
rada a obra do sepulcro não ique nenhuma ialdade nem rotura nas pedras mais que
hos buracos de hum dedo de groso, o que tudo farão a dita obra asima declarada por
preço de quoatro centos e vinte e cinco cruzados de suas mãos e lhe darão a custa das
rendas da dita obra da Se toda a madrª necessária pª a dita obra do dito sepullcro asi
de bordo como de pinho, como de castanho, e toda a pregadura e pirafusos que forem
necessários pª fortiicasão da dita obra e toda a mais ferragem que necessária for à dita
obra, o qual sepulcro e obra dele se o brigão a dar acabada com toda a perfeição e tra‑
ça e moldes do dito Nicullao de frias que verão se está conforme a esta obrigação e has
ditas traças, e faltando allguma cousa o farão ate de todo o terem cumprido e a vista
dos ditos oiciaes ou do dito nicullao de frias…
A.D.É., Lº 261 de Notas do Tabelião Baltazar de Andrade, de Évora, ls. 99­105.

documento nº 15. 1588, 15 de Junho. rol de obras realizadas


na sé de Évora a mando de d. teotónio de bragança.

Setimo Rol de cousas ordinárias que se fazem na See por mãodado do sºr pro‑
visor este ano de 88 de que he Recebedor o padre Pedralvares da obra da See e
veador della.
Despendeo o Rdor treze mil e dozentos rs em cento e vinte peles de guodemisi dou‑
rados pª as escadas do sepulchro, custou cada pelle cento e des rs cuzidas e prega‑
das, que faz a ditta soma os quais resebeo Domingos Martins, morador na Rua
da Sellaria, goadamisileiro.

299
Mais despendeo oitto centos rs de alugel de quorenta quastisais de estanho estive‑
ram desde quinta fª ate o dominguo de pascoa no sepulchro a vinte cada hum a
Lopo de Gouveia, pichilrº.
Despendeo cemto e oittenta rs que deu a dous homens que alimparão a crasta.
Deu mil e dozentos e sinquoenta rs a Xpuão de Burgos, livreiro, de oito milhei‑
ros e cento e simcoenta belmases a cento e sincoenta rs por milheiro pª se pregarem
os taffetas nas pirâmides.
Despendeo seis centos rs em doze esquapolas grandes pª meterem as grades de pao
na See a sincoenta rs cada huma, fêllas Fernão Rois, ferrº.
Mais despemdeo seis centos rs em duas duzeas descapollas mais pequenas pª me‑
terem perante as outras vespora de pascoa a 25 rs cada huma, e se izeram por
mandasdo de SS. E se pagarão ao dto Fernão Roiz, ferrº.
Mais despendeo seis centos rs em duas dúzias de escapollas mais pequenas pª me‑
terem per antre as outras vespora de pascoa a 25 rs cada huma e se izeram per
mãodado de SS. E se pagarão a Fernão Roiz, ferrº.
Mais seiscentos rs de outras duas dúzias descapollas (…) nasgrades pela cruz de
maio… a 25 rs cada huma.
Despendeo o Rdor trezentos e vinte rs em agos que levarão homens dagoa da pra‑
ta asima a torre pª curarem a sera branqua.
Despendeo em nove cargas de espadana pª a festa da Crus de maio a novecentos rs.
De a hum homem que trouxe sinquio cargas de Rama a cem rs a carga quinhentos rs.
Deu mais de espadanarem e emramarem dous homens e armarem os panos do‑
zentos rs. Na ditta festa.
Deu mais de tirarem a espadana da See sessenta rs.
De na festya dasumpção de seis cargas despadana e sinquo de Rama mil e cem
rs a cem rs a cargua.
De emramarem e espadanarem nesta festa cem rs, digo, cento e sincoenta rs, e ar‑
marem os pabnos e os desarmarem, e alimparem e dobrarem.
De tirarem esta espadana da See sessenta rs.
Despendeo mais oito cento e oitenta rs de sette varas de pano de linho a preso de
(…) que se izerão duas toalhas dagoa as mais pª a samcristia da See e mais
huma toalha, que faz a ditta soma, as quaes estãol carregadas no Lº das cousas
da See no tº das toalhas.
De quatro vªs de itta pª as ditas toalhas a x reis a vª quarenta rs.
De feitio destas toalhas quorenta rs.
Comprou seis vªs de itta emquarnada a vinte e sinco rs a vª (…) custarão cen‑
to e sincoenta rs.
Despendeo o Rdor na festa do espirito sancto em doze cargas despadim pª a See
e crasta a cem rs a carga, mil e duzentos rs.

300
Mais despendeo em sette cargas de Rama a seis vinteins a carga por não querer
menos, oitto centos e quorenta rs.
De emramarem e espadanarem e armarem os panos asi a See como a crasta, do‑
zentos reis.
De tirarem toda esta espadana cento e vinte rs.
Comprou huma dúzia de pastilhas que custarão duzentos rs.
Comprou mais huma dúzia de pivettes seis vinteins a des rs cada hum.
De trazerem o sacrário e levarem de sancta Moniqua a See pª estar o santissimo
Sacramtº plo Jubileo quorenta rs.
Deu aos homens que levarão o altar ao sepulchro da crasta e tornou aonde esta‑
va, cem rs.
Deu a quem armou o Sepulchro pelas oitavas do espirito sancto quãdo se emsa‑
rou o Sr e comsertarão as escadas com as peles, dozentos rs, os quais se deram a
Gaspar Glz.
Deu a dous homens que trouxeram a sera ao sepulchro e tiveram cuidado della e
forão busquar huns poucos de castisais e izeram outras cousas que forão necessá‑
rias o dia do emsarramtº do Sºr e o dia dantes, quatro centos rs.
Deu de aluguer de trinta castisais que estiveram no sepulchro a vinte rs cada hum
seis centos rs, eram de Lopo de gouvea, pichilleiro.
O qual Rol eu, Amtº Arnao, xpvão da obra da See, is bem e ielmente em que
vão trinta adisõis, as quais eu corri com todas elas (…), em evora oje xb dias de
junho xde jbc lxxx viij annos.
(a) Amtonio Arnao
B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 11.

documento nº 16. 1588, setembro. rol de obras realizadas na


sé de Évora a mando do Arcebispo d. teotónio de bragança.

Dom Theotonio de Bragçª Arcebpº dEvora ettc, mando a vos, Contador de minha
fazª, que por esta e pelo Rol aqui junto escrito em trinta e seis adições, leveis em
conta ao sr Pedralvarez na que der de Rºs das Rendas da obra das See do anno
de 88, vinte e hum mil tresentos e oitenta e tres rs que montão as ditas addiçõens,
Evora sob sinal do licº Diogo Nunes igrª nosso secretº e governador por nos do
nosso Arceb.pado aos xbi de Maio, francº vogado a fez de MDLxxxx.
Hum désimo Rol de coussas ordinárias que se gastarão na See este anno de 88 he
Rdor da obra da see op. pº Allvrz os quais faz por mãodado do Arcebispo e do
sr. provisor, e eu xpuão abaixo nomeado corro com todas ellas.

301
Despendeo o p. pº Alvares Rdºr da obra cemto e vte rs de levarem os banquos a sam
Vicente pelo bom suseço da armada pª o Cabido se assentar e a Relasam de SS.
Despendeo mais cem rs que deu a bras dias por ir consertar a garrida à torre.
Deus mais simquoenta rs de alimpar hum homem a crasta.
Deu mais a Gaspar Glz e Amtº frz carpintrºs de alimparem a capella moór e
o Retabollo e a Capella do Santissimo Sacramento e do Santo Lenho, capella
e retavollo, e os Retavollos de fora, todos em que gastarão cada hum tres dias a
rezão de 160 rs por dia que foi 11:12:13 dias de agosto que tudo faz soma de
nove cemtos e sessenta rs.
Deu mais a quatro homens que andarão com a escada na Capella mor e a mu‑
darem hum dia cento e simcoenta rs.
Despendeo mais cento e sessenta rs em quatro espomgas pª alimparem e lavarem
os painéis dos Retavollos e dous rapos de rapoza pª saquodirem o dourado do poo
dos Retavollos , e hum algedar, e huma panella que foi necessário.
Gastos da festa de nossa Senhora da Assumpção.
Despendeo oittocentos rs em oito cargas de rama de louro pª a ditta festa.
Despendeo mais mil e dozentos rs em doze cargas despadana pª a dita festa.
Despendeo mais oito centos rs que deu a quatro homens que armarão a Capella
mor e a See com guadamecis e a crasta, e de enramarem e espadanarem em que
gastou a vespora de nossa Snõra e a noite.
Comprou o R.dºr pª a dita festa quatro centos e settenta canas verdes pª a see e
crasta se emramar a real e mº cada huma, monta sette centos e simquo rs.
Despendeo no carreto destas canas cemto e simcoenta rs por estarem, digo, as tra‑
zerem de hum aorta fora da cidade as costas.
Comprou hum sesto pª se fazer hum dependurado no cruseiro que custou cento e
vinte rs com o estanharem e de frutto que tinha demtro quorenta rs que faz soma
cento e sessenta rs.
Deu o Rdºr aho Piquado, funileiro, de consertar huns cannos de folha de frandes
pª humas fontes que se izeram na crasta dozentos e simquoenta rs.
Comprou tres dúzias de pastilhas pª a ditta festa que custarão seis cemtos rs a
200 rs a dúzia.
Comprou duas dúzias e meia de pivettes que custaram trezentos rs a seis vinteins a dúzia.
Comprou duas Rodas daRame e huma agulha gramde e gum novello de io grão‑
de que foi necessário pª a ditta festa mais huma Mão de papel que tudo custou
cento e treze rs.
Comprou duas arrobas de breu pª os fogos que se izeram na See a noite de nos‑
sa Snõra que custou mil rs.
Comprouse o R.dor dezoito alguidares pequenos pª os ditos fogos que custarão
trezentos e sessenta rs.

302
Comprou mais quatro quartas pª as fontes da crasta que custarão quatro vinteins.
Alugou o R.dor des goadamesis dourados a Jorge vas, mercador de panos de linho,
a 80 rs cada hum, pera asi se alugarem a todos monta oito centos rs.
Alugou mais sette goadamesis por quatro centos, digo seis centos rs por quinhentos
e sessenta rs plo preço asima declarado a Simão marques, fanqueiro.
Deu de desarmarem a Capella mor e a crasta a dous homens cem rs.
Deu a hum homem que tirou a espadana da See da crasta cem rs.
Gastou o R.dor em huma cea que deu aos homens que trabalharam a noite de
bespora de nossa snõra quatrocentos rs.
Despendeo quinhentos e sessenta rs de lhe dourarem quatro argolas pª os ballaus‑
tres da charola que fendiam.
Deu ao Pinhº pª azeite do rellogio e mais sinos por ser necessário.
Deu o Rdor a hum caminheiro dozentos e sincoenta rs por ir ao Redondo levar
huma carta a Mel Roiz, mestre pedreiro, que faz a igreja da ditta villa.
Deu o Rdor a Claudeo, cocheiro do Arcebispo, quatro centos rs pª gastos que fes
no caminho de Villa Viçosa com o carro que foi busquar João Luis, ourives de
pratta,pª fazer a lâmpada de prata, entre as quais 400 rs se lhe deram a mais
(…) do que acharão noutra adição porque disse que gastara mais.
Deu mais mil e seis centos ra a geronimo de torres, pedreiro, por ir ao Redondo a
medir a obra da igreja em agosto por mãodado de SS. e o Cabido deu o seu terço.
Comprou doze cargas despadano pª a festa da Crus de settembro a cem rs a car‑
ga, monta mil e dozemtos rs.
Comprou cemto e sinquoenta quanas a real e mº cada huma monta dozentos e vinte
e sinquo rs e de carreto dellas sesemta, soma tudo dozentos e oitenta e simquo rs.
Comprou duas dúzias e mª de pastilhas pª a ditta festa e huma dúzia de pivettes,
as pastilhas custarão quinhentos rs a 200 rs a dúzia e os pivettes cemtop e vimte
que tudo faz soma seis centos e vimte rs.
Deu de Armarem a capella mor e capella do Santo lenho e de espadanarem e en‑
ramarem toda a see ao redor por omde avia de ir a procissão trezentos rs.
Deu a hum homem que desarmou as capellas e dobrou os pannos e de tirarem a
espadana da See, dozentos e vinte rs.
Mandou o Rdor fazer doze castisais grandes de lattam pª os altares do cruzeiro e
de nossa snõra e de outros castisais que não serviam já de que levarão defeito a ses‑
senta rs por aratel sinquo mil e vinte rs entrão aqui nesta conta cem rs de carreto.
O qual Rol eu Antº Arnao espvão da obra da See is bem e ielmente (…), em
evora oje xxj dias do mês de setembro de 88.
(a) Amtº Arnao
B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 6.

303
documento nº 17. 1589, 8 de Janeiro. rol de obras realizadas
na sé a mando do Arcebispo d. teotónio.

Desimo terçio Rol de cousas ordinárias que se gastam na See por mãodado do
Sºr provisor este anno de 88 de que he Reç.dºr o p. pedralvres da obra da See e
veador dellas.
Despendeo o padre pedralvares, Rdor da obra, trezentos e quorenta rs que deu
a hum quaminheiro por ir a Vila Visosa a requerer joam Luis, ourives, pª ir
acabar a lâmpada em que gastou tres diass, hum de ida e outro destada e outro
de vimda, soma o asima.
Deu a frcº Lopes, sirgueiro, de fazer tres botoins douro e consertar os cordoins
das almatticas de borcado da See e os bottoins erão pª ellas, e conserttar serttos
allmares no ornamento de veludo cramezim, quinhentos rs.
(…) Despendeo o Rdor treze mil e dozemtos rs em cento e vinte peles de goudemi‑
si douradas pª as escadas do sepulchro, custou cada pelle cento e des rs cuzidas e
pregadas, que faz a ditta soma os quais resebeo Domingos martins Roiz mºr na
Rua da Sellaria, goadamisileiro.
(…) Deu mil e dozentos rs e cinquoents rs a Xpuão de Burgos, livrº, de oito mi‑
lheiros e cento e simquoenta rs por milhº pª se pregarem, os tafettas nas pirâmides.
(…) Mandou o Rdor conserttar em 23 dias de junho de 88 hum quastiçal gra‑
mde de prata da See que tinha quebrados dous perafuzos, que levou a djº dolivrª,
ourives de o comsertar, dozemtos e simquoenta rs.
Deu o Rdor simquoenta rs de consertarem huns missais da See e os remendarem
ao Burgos, livreiro (…).
(a) Amtº Arnao
B.P.E., Fundo Manizola, cód. 76, nº 12.

documento nº 18. 1589, 23 de dezembro. fiança que fez o


pintor José de escovar, morador em Évora, então preso no limoei‑
ro por crime de morte de sua mulher Júlia da rocha, feita em nome
do pintor manuel de Araújo, seu iador,

Saibão os que este estromento de iamça e obrigação virem que no ano do nacimento de
noso senhor Jesu Christo de mill quinhentos e oitenta e nove anos aos vinte dias do mes
de dezembro nesta cidade d’ evora nas casas da morada de mim tabaliam estando hi
presente manoell d’ araujo pintor morador nesta cidadelogo por elle foi dito que asi he
verdade que Josep [sic] d’ escovar pintor se livrava na corte perante antónio siqueira da
sillva corregedor da dita corte e se livravava [sic] seguro da morte de Jullia de Rocha sua

304
molher pela qual cullpa se deu sentença em tres anos de degredo pera hum dos llugares
d’ africa na Rolação [sic] d’ ell Rei noso senhor e o dar da sentença se prendeo e esta
prezo no llimiro [sic] da cidade de lixboa e por quanto o dito Josep [sic] d’ escovar quer
impretar e aver provisão de sua magestade pera se ir apresentar sollto a hum dos llugares
d’ africa e mandar certidão de como laa ica servindo o dito degredo e pera elo lhe hera
necesario dar iança em contra de cem cruzados / portanto dise elle sobredito manuell d’
araujo pimtor que de sua propria e llivre vontade icava como logo de feito icou por ia‑
dor e principal pagador na dita contia de cem cruzados pelo dito Josep [sic] d’ escovar e
se obriga que sendo caso que ell Rei noso senhor per sua provisão aja por bem que sollto
va cumprir o dito degredo que elle se obriga que o dito Josep [sic] d’ escovar vaa comprir
os ditos tres anos de degredo a hum dos ditos lugares d’ africa e que mandara certidão
dentro no termo da ordenação de como laa ica servindo o dito degredo sob pena que
não o comprindo asi elle iador perdera dita iança de cem cruzados ou aquillo que sua
magestade delles ouver por bem pera o espritall de todos os santos da cidade de llixboa
ou para quem ho dito senhor ouver por ser serviço para o qual asi comprir e pagar dise
elle iador que obriguava como logo de feito obriguou todos seus bens avidos e por aver,
moveis e de raiz e em especiall obrigou e ipotecou huas suas casas que elle tem e pesue
nesta dita cidade na rua d’ olliveira que partem de hua parte com casas de bras couto
e da outra com adega do galvão que são tres casas por baixo e hua camara por sima e
hum quintal com suas arvores e poço foreiras ao Real cabido da santa see desta cidade
em corenta e quatro reis em fatiota e morada hum ano que bem valem com emcarego
de seu oro de sesenta mil reis livres e desobrigadas de toda a outra obrigação somente a
esta a que as ora tem obrigadas / E outorgou por todo o contheudo neste estromento ou
por qualquer cousa delle ser chamado citado e responder se comprir perante o Juiz das
iamças da arte ou perante as justiças da cidade de lixboa perante quem os oiciaes do
dito espritall ho demandar quiserem per suas cartas e sem ellas e fazer asi todo o com‑
primento de dita Justiça e inteiro pagamento renunçiando de si pera esto aver efeito Juiz
de seu foro e da terra omde ao tall tempo viver ou esteverem todos outros privilegios e
lliberdades que por si alegar posa que de nada quer usar nem gozar sallvo todo comprir
manter e pagar como se conthem neste estromento e em testemunho de verdade outorgou
e mandou elle ser feito este estromento e os que desta nota comprirem prometendo a mim
tabeliam como a pessoa publica estepulante e aceytante em nome do dito esprital e de seus
hoiçiaes a esto ausentes e aos mais aubsentes a que esto convem comvir tocar e pertemcer
pode asi o compri o estepulei e aceitei testemunhas que presentes forão Jorge da nobrega
criado de lluis allvares de tavora / e antonio fernandes cardador chão das covas grande
[?] manuell nesta de balltasar d’ andrade tabaliam o ffes
[aa.] Manuel d’ araujo / Jorge da nobrega / antonio fernandes [uma cruz]

A.D.E., Lº 264 de Notas de Baltazar de Andrade, ls. 94­95.

305
documento nº 19. 1590, novembro. recibo de um relojoei‑
ro de madrid que fez um relógio com despertador para o Arcebispo
d. teotónio.

Digo eu Alonso dias de rrojas, Relojoeiro, que Recebj de Sebastiam de faria cem
Reales em sinal de coob sinal de começo de paga de hum Relogio e despertador que
hei de fazer pera o Arcb.po de Evora como consta da escretura e contrato atras e por
ser verdade lhe dej este por mim assinado em Madrid oie 23 de novembro de 1590.
(a) Alonso dias
Dom Theotonio de bragança Arcpº devora ett, mando ao contador de minha fa‑
zenda que por esta obrigação atras leve em cõta a sebastião de faria, que serve de
nosso tizrº nesta jornada de Madrid, cem reales que tinha dado a Alonso diaa,
relogoeiro, a conta de hum relogio e despertador que faz per nosso mãodado (por
200 reales), icãdo tomados por lembrãça pª lhe descontarem como acabar a obra,
Madrid a noue de dezbrº de noventa.
(a) Arcº dEvora
B.P.E., Fundo Manizola, Nº, nº 19.

documento nº 20. 1591. rol de despesas com as festas de nos‑


sa senhora da Assunção na sé de Évora.

Quinto Rol de cousas ordinárias que se gastão na Se este anno de 90 por mão‑
dado do senhor provisor, as quaes cousas deu Xpouão Correia com todas ellas
no despender dellas.
Despendeo o padre pedralvrs, dezembadgºr da obra da see, trezentos rs em duas
dúzias e mª de pastilhas para a festa de nossa Snrª.
Mais despendeo duzentos e quorenta rs em duas dúzias de pivettes pª a dita festa.
Mais deu seiscentos rs a hum homem que fes seis duzis de fugettes (sic) pª a ditta festa.
Mais deu a hum homem que trouxe os ditos fogetes daRaiolos a esta Cidade e os
lamçou e quatro Rodas de fogo que se fezeram juntam.te com os fugettes trezen‑
tos e cinquoenta rs.
Despendeo mais dozemtos e des rs que deu a dous homens que serviram na festa
de nossa senhora em tudo o que era necessário.
Deu de quatro novellas de barmãote pª os fogettes dozentos rs e duas mãos de pa‑
pel sinquoenta rs.
Mais despendeo dozentos simquoenta rs com pregos e esquapollas que se compra‑
rão pª se armarem os goadamesis.

306
Comprou mais tres Rodas darame pª a ditta festa que custarão cento e vinte rs.
Despendeo mais oitenta rs de gitta que se gastou na dita festa
Despendeo mais cento e sesemta rs que deu a dous pedreiros que consertarão os
ferros na cova de gomez pires.
Deu mais dozentos e oitenta rs a Bras denis, serralheiro, de chumbo a vinte e sinco
rs cada aratel, pª chumbarem as ditas grades, soma trezentos rs.
Comprou huma tigela grãode de fogo pª derreter o chumbo que custou des rs.
Deu cem rs ao sineiro pª ir concertar a garida.
Festa da Cruz de Setembro.
Deu cento e oitenta rs, digo, dozentos e trinta rs, de armarem, a Capella mor e a
Capella do sto lenho e o dossel na dita capella e tornar a desarmar.
Deu de duas duzias de pastilhas e huma de pivettes trezentos e sessenta rs.
Deu de treze cargas despadana mil e trezentos rs a cem rs a carga.
Deu de cem canas cemto e simquoenta rs.
Deu o Rºr de emramarem e espadanarem e trazerem as canas de huma orta dosentos rs.
Comprou duas roldanas por quorenta rs para armarem o dossel.
Deu cemtto e quorenta rs a quatro homens que varreram a See toda a redor por
mãodado de S. Revª pª ir ver a procissão com o Sto Lenho.
Deu mais de tirarem mta immundisia que estava a porta da See cem rs, por onde
avia de passar a procissão.
Deu de tirarem a espadana da See cem rs.
Despendeo mais tres mil trezentos sessenta rs, em vinte e oito vªs de pano de linho
a cento e vinte rs a vara, pª tres sobrepelise dos mºs da Samcristia.
Deu de feittio das tres sobrepelizes trezentos rs.
Despendeo mais mil e quinhentos e sessenta rs em treze vªs de panno da Imdia
para huma sobrepeliz do sobretizrº da See a cemto e vinte rs a vª e se comprarão
todas per mãodado do sºr provisor.
Deu quinhentos rs de feittio da sobrepeliz.
Despemdeo mais oitto centos e quorenta rs em sette vªs de panno de linho que se
comprou pª duas toalhas de irmãos da samcrestia.
Deu de feitio de toalhas atras quorenta rs.
Comprou dezassete vªs de itta branqua pª as toalhas e huas amittas a sette rs a
vª momta cemto e trinta e seis rs.
Comprou sinco vªs e mª dollamda quatro centos e quorenta rs a vª soma dous mil
e duzentos rs de que se izeram vinte mesas de corporais e vinte pallas.
Deu de feitio de duas mesas de corporais e duas pallas de transinhas que mãodou
fazer pª o altar mor mil rs.
Deu de feittio de duas mesas de corporais e quatro pallas de remdas pª o mesmo
altar mor quinhentos rs.

307
Deu mais de feittio de quatorze pallas chãs cento e quorenta rs.
Deu mais de vinte bottoins pª as vinte pallas cem rs.
Comprou hum veo rasado douro que tem quatro centos a dozentos e simquoen‑
ta rs o cdº pª a Costodia em que davão a comunhão aos emfermos, soma mil rs
e de remda douro e prata que tem a roda quatro vªs e mª dozentos e sinquoen‑
ta rs e vª e mª despigilla douro que tem pelo meo settenta e sinquo rs e de feittio
quorenta rs soma.
A qual Rol eu Amtº Arnao xpvão da obra is bem e ielmente em que vão trimta
e oito adissõis e corri com todas ellas, e o sºr provisor assinou aqui comigo xpvão
da obra da See erm evora oie xxb de setbrº de 89.
(a) Antonio Arnao
B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 85, nº 22, ls. 106­108.

documento nº 21. 1591, março. rol de obras miúdas reali‑


zadas na sé de Évora.

Dom Theotonio de Brag.ça Arcebpço de Evora ett mando a vos contador da mi‑
nha fazenda que por esta e pelo rol atras escrito leveis em conta ao padre Pedral‑
vares na que der de Rdor das rendas da obra de nossa santa See do anno de 89
dezoito mil e setecentos c inq.ta e sete rs que despendeo na dita See como consta do
dito rol Evora sob sinal do ldº Diogo Nunez igrª nosso secretario e governador
por nos do nosso Arcebispado, aos dous de Março francº vogado o fez de 1591.
(a) Diogo Nunes Figrª
Quinto Rol de cousas ordinárias que se gastão na See este anno de 90 por mão‑
dado do sºr provizor.
Mais dispendeo dozentos e sincoenta e tres rs em preguos e esquapollas que se com‑
praram pª se armarem os guadamesis.
Deu cento e quarenta rs a quatro homens que varrerão a See toda a redor per
mãodado de SS pª ir procissão com o Sto Lenho.
Deu mais de tirarem mtª immundiçie que estava a porta da See cem rs por onde
avia de passar a procissão.
Despendeo mais tres mil trezentos e sessenta rs em vinte e oito varas de panno de
linho a cento e vinte rs a vª pª tres sobrepelizes dos mºs da samcristia.
Deu de feitio das tres sobrepelises trezentos rs.
Despendeo mil e quinhentos e sessenta rs em treze varas de panno da India pª
huma sobrepeliz do sobtizrº da Sere a cento e vinte rs a vª e se comprarão todas
per mandado do sr provisor.

308
Deu quinhentos rs de feitio da sobrepeliz.
(…) Deu de feitio de duas mesas de corporais e duas telas de transinhas que man‑
dou fazer pª o altar mor mil rs.
Deu de feitio de duas mesas de corporais e quatro pallas de remdas pª o mesmo
altar mor quinhentos rs.
Comprou hum veo raxado de ouro que tem quatro cdºs a dozemtos e sincoenta rs o
cdº pª a Custodia em que levão a comunhão aos enfermos soma mil rs. E de remda
douro e prata tem a rodo vªs e mª dozentos e sincoenta rs e vª e mª de espigilla (sic)
douro que tem pelo meo setenta e sinco rs e de feitio quorenta rs soma 5V801.
O qual rol eu Antº Arnao spvão da obra is bem e ielm.te em que vão trinta e
oito adissões e corri com todas elas e o sr. Provisor assinou aqui comigo em evora
oie xxb de setbrº de 89.
B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 85, nº 23.

documento nº 22. 1591, 23 de Agosto. despesas de d. teo‑


tónio de bragança com luís prego, alfaiate.

Rol das obras de sua S. que fes Luis Prego nesta era de noventa e tres anos.
Pª sua Sª Huma Ropeta darbim que lhe conçertei quando veo de Lxª e lhe pus
humas algebeiras de fustão pardo de feitio (N: he verdade que fes isto – gaspar de
brito) .................................................................................................... V090
Mais pª sua S. tres pares de mangas dolanda pª tres gibões he outava e mea de
retros bramquo de feitio das mangas duzentos he quorenta rs e da outava e mea
de retros quorenta e sinco rs ................................................................. V225.
Duas dusias de botoins nestas mangas de seda branca a tres pospontos duzentos
e desaseis rs ........................................................................................... V216
Hum vestido de Ropeta dedo e farregoulo de feitio outo vinténs .............. V150
Item de botoins duas dúzias engorladas de linhas quarenta e oito rs .............. V048
Mais quatro pares de meas calsas pardas pª quatro escravos duzentos rs V200
Mais hum vestido pª hum moço que serve os pagens ropeta e calsas e farregoulo e
gibão de feitio tresentos rs ..................................................................... V300
Item de botonis na ropeta vinte votoins de seda a dos pespontos hum tostão .... V100
Item de botoins no gibão desasete de linhas de frandes sincoenta e dous rs V052
Hum vestido pª o sobrinho do Arcebpço de Mesquara ropeta e farregoulo e calsas
tudo apassamanado he forrado de tafeta mil e quinhentos rs .................1V500
Mais pª este vestido sincoenta varas de passamane pardo a trinta he sinco rs a
vara monta sete sentos e sincoenta rs ..................................................... V750

309
Mais pª hum vestido huma onsa de retros pardo duzentos rs .................. V200
Mais pª ropeta e calsoins nove dusias e mea de alamares a duzentos rs a dúzia
montase mil e novecentos rs ..................................................................1V900
(…) Mais sinco guardaportas de pano verde e mais hum pano para a mensa seis
tostois de feitio....................................................................................... V400
Hum vestido pª hum preto da casa Ropeta calsas capote carapusa he polainas
trezentos e vinte rs ................................................................................. V320
(…) Huma roupeta pª hum preto que se chama Gonçalo Gomes he calsas he
farregoulo he gibão he humas meas tudo de saragosa de feitio de vestido tudo qua‑
trosentos e vinte rs ................................................................................. V420
Montão as sessenta e huma adissõis do rol atras catorze mil e cento e oitenta e
quatro rs Evora oje 23 dagº de 93 ....................................................14V184
B.P.E., Fundo Manizola, Cód. 85, nº 24, ls. 110 a 113.

documento nº 23. 1591, 23 de outubro. pastoral do Arcebis‑


po d. teotónio de bragança sobre as diligências que faz em madrid
para trazer a relíquia de são manços para a sé de Évora.

Dom Theotonio de Bragança per merce de Deos, & da sancta igreja de Roma Arce‑
bispo de Evora, etc. A todos as pessoas Ecclesiasticas & Seculares deste nosso Arce‑
bispado, Saude em Jesu Xpo nosso Salvador. Fazemos saber que huma das principaes
causas da ausência de nossa igreja foy procurar por todas as vias de alcançar parte do
corpo de sam Mançio seu primeiro Bispo: o ql sendo Romano de naçam, achando‑se
na cidade de Jerusalem no tempo de Xpo nosso Señor, vendo seus milagres, & ouvin‑
do sua doutrina se converteo, & foy hum dos principaes ministros que assistiram ao
solemnissimo oficio em que o Redemptor do mundo lauou os pès a seus Discipulos,
& vindo a estas partes de Espanha, em este Reyno, principalmente nesta cidade de
Euora pregou a ley Euangelica, & deu seu sangue em testemunho da verdade alcan‑
çando gloriosa coroa de martyrio. E seu corpo foy posto na capella que hora se chama
de são Manços tres legoas desta cidade: & estando alli depositado por muitos tempos,
como consta de instrumentos públicos de muita autoridade & credito, no tempo que os
Mouros entraram Espanha, foram levadas estas sanctas Reliquias a Esturias (sic),
& depois de tomada Euora aos Mouros, trazendo‑se para se restituírem à sua igreja
dõde foram tiradas, as assaltou Dom Tello de Meneses Genro de Dom Sãcho Rey de
Portugal, senhor em terra de Campos, oito legoas de Valledolid: & icando‑se com ellas
fundou hum moesteiro da ordem de sam Bento, a que pòs o nome sam Mançio, & lhe
dotou huma Villa sua, a que chamou Villa noua de sam Mançio, & outras muitas
propriedades, como consta das doações & instrumentos públicos que o dito Dom Tello

310
de Meneses lhe fez: & considerando nós as muitas rezões que avia para não faltar nes‑
ta cidade & Arcebispado hum tão grande penhor do amor que este sancto Bispo teue
a suas ovelhas, & pera cõ a pretença de suas sacras Reliquias se exercitarem a glorii‑
car a diuina bondade, & se espertasse a memoria dos muitos benefícios que recebemos
por este meyo para os sabe r estimar & agradecer quanto em nos for, & o obrigarmos
mais a ser nosso intercessor & protector recorrendo a elle em nossas necessidades como
a padroeiro nosso diante da diuina Magestade, procuramos por meyo delRey Dom
Philippe meu Señor alcançar este grande Thesouro: o qual por fazer merce a estes seus
Reynos, & em especial a esta cidade & Arcebispado, o mandou pedir com muita ins‑
tancia, & tem em seu poder com muita devaçam & veneração, para de sua Real mão
nolo entregar, que espero leuar com ajuda de nosso Senhor. E porque a merce he tão
caliicada, & està já alcançada de Deos nosso Senhor, como principal autor de todos
os bens, temos obrigação de lhe dar grweças por ella. Pello que ordenamos que logo na
nossa Sè se izesse como se fez huma solenne procissam, onde junto o nosso Reuerendo
Cabido com a mais Cleresia & Religiosos, & com os Gouernadores da cidade, se lhe
deram publicas graças: & pois a merce he tão geral & feita especialmente a nossas ou‑
elhas, encomendamos muito a todos os Superiores, & Superioras dos moesteiros deste
Arcebispado, & mandamos aos de nossa obediência, & ao Vigairo geral da cidade
de Beja, & a todos os Vigairos, Priores & Rectores da dita cidade, & mais Villas,
Lugares do dito nosso Arcebispado, que tanto que esta nossa prouisam lhes for mos‑
trada, em hum dia de guarda a publiquem ao pouo, & ordenem huma procissam de
te Deum Laudamus, com toda a devaçam, & solemnidade possiuel, dando graças a
nosso Senhor por esta merçe, & rogando por o acrecentamento da vida, & estados
delRei meu Senhor,por cujo meyo se alcançou. Dada em Euora sob sinal somente do
Lecenciado Diogo Nunez Figueira nosso Secretario, & Gouernador por nòs de nosso
Arcebispado, aos vinte e tres de Outubro, Francisco Vogado Marreira a fez por nosso
mandado de M.D.LXXXXI.~(a)
(a) Diogo nunes igrª

A.S.E., Cartas dos Bispos (PT/ASE/CSE/B/A/oo4/Mç. 002, 1546-1633).

documento nº 24. 1591, dezembro. despesa do cabido da


sé de Évora com um terço do pagamento da obra de pintura do
retábulo‑mor da igreja de santo Antão.

Em 19 de Dezembro (de 1591) se passou alvará pª o prioste dar ao Reitor da


igrª de Santo Antão desta cidade cem mil rs que se montaram na terceira parte
que se fez de custo da pintura do Retabolo da dita igreja .................100V000

311
(à margem: pintura do Retavolo de Samto Antão)
A.S.E., Lº de Registo de Alvarás de Despesa passadas ao Prioste (PT/ASE/CSE/G/B/013/
Lv005/1566­1598), l. 228 vº.

documento nº 25. 1592, 3 de Abril. relato da entrada em vila


viçosa da relíquia de são manços.

Reliquia de São Mançio mártir da cidade de Evora.


Aos tres dias do mês de Abril de 1592 entrou o Arçebispo dEvora D. Theoto‑
nio de bragança nesta vila (Vila Viçosa) com a relíquia do bemaventurado São
Mançio a qual trouxe vindo de Madrid. Pª o recebimtº desta santa reliquia man‑
dou Sua EXxª o Duque (D. Teodósio II) armar a igreja do mosteiro de Santo
Agostinho toda dos panos da historia do conde Nunalvrez, e por cima e por bai‑
xo no Altar moor hum ornamtº de tela douro broslado e seis castiçais (riscado:
dourados), os bancos grandes, e nos Altares de jesus e de nossa Snõra frontais de
veludo cramezi guarneçidos de tela douro. E mandou Sua Exª tãobem armar a
igreja do mosteiro de Santa Crus toda por çima e por baixo de panos de ras, e
no altar moor frontal de ornam.to de veludo cramezi e na sua capella o ornam.to
riquo com todos seus aparelhos, a saber, huma crus grande e castiçais dourados e
dossel de tella douro e nos altares de fora frontais de tela douro cramezi e amarela
e nos degraos do altar seis castiçais grandes de prata com tochas. Avia recado que
vinha o prelado as oito horas pola manhã que vinha a pe ante a igreja de Santa
crus e nela estavão todos os capelães de Sua Exª e clérigos da vila e frades de san‑
to Agostinho e freguesia de todos os oiçios e insigniasd do conselho, e Sua Exª
foi a cavalo com toda a gente de suja casa a esperar receber ao caminho a relíquia
santaq e ho prelado que o mesmo dia avia partido delvas, chegou o prelado à dita
igreja de santa Crus e Sua Excª com ele as duas oras depois de meo dia, e pos a
caixa em que vinha a santa relíquia em o altar moor e por ser tarde se recolherão
Sua Exª e o prelado a comer, e o mesmo izerão os mais religiosos, clerigos e fra‑
des e mais gente do povo. Às quatro horas da tarde despois de comer no mesmo
dia veo Sua Exª a dita igreja de Santa Crus onde já estavão juntos todos com
suas bandeiras e oiçios e não veo o prelado por vir mal desposto e se não achar
em disposição pªa isso. E ordenouse a procissão na maneira seguinte.Vinhão com
o prelado dous coneguos da Sé devora Jorge de Moura e Dioguo Nunes Figueira,
e estes ambos trazião a cargo huma chave que Sua Magestade mandou entregar
ao Cabido e outra chave trazia o prelado porque a caixa da santa relíquia tinha
duas fechaduras e duas chaves, mandou o prelado a sua chave a Dioguo nunes i‑
gueira e ambos os coneguos abrirão a caixa de ferro onde vinha a santa relíquia

312
(…) e a poserão no meio do altar. A qual reliquia he hum oso grande emteiro,
huns dezião e reairmavão que era de braço e os mais que de forma hera de perna,
se era de perna era huma das canas do artelho ate ao joelho, e se do braço tãobem
pareçia huma das canas da mão ate o cotovelo, vinha metido em huma custodia
quadrada de quatro cristais engastados nas quatro juntas larguas em baixo e
aguda em cima a modo de pirâmide e no meo em baixo e em cima emcaixos onde
em ambas partes encaixavam as pontas ambas do osso santo de modo que estava
direito e que se via muito bem por as vidraças, e a caixa em que esta santa relí‑
quia vinha era como hum cofre forrado for fora de teca douro cramesi e por dentro
de tafetá cramesi, e oitavada com sua ferragem dourada, e esta caixa vinha meti‑
da em outra forrada por fora de coiro preto e por dentro de coiro vermelho. Posta
a santa relíquia com sua custodia de vidraças no altar se deram capas a todos os
capelães de Sua Exª e alguns quartanários e bacharéis da Sé devora que vinhão
com o prelado, e os mais cleriguos desta vila e de Borba, e o palio de brocado de
Sua Exª se deu asos beneiçiados da Sé e aos capelães de S. Exª, e dadas tochas
a todos os religiosos que hião sem capas e a mtos seculares que foram oitenta to‑
chas, e a todos os mais clériguos e frades vellas acesas, por o prelado estar mal des‑
posto mandou que levase a santa relíquia Peçanha de Brito, e asi tomada huma
capa de damasco branco pedrado douro tomei em minhas mãos a santa relíquia e
posto pª o povo no ultimo degrao do altar chegou Sua Exª a ofereçerse e beijar a
santa relíquia, e logo o sõr dom Duarte e o sõr dom felipe e todos os mais eclesi‑
ásticos e seculares que poderão chegar, e sahimos da igreja de santa crus com mu‑
siqua de cantores de que havia dous choros, hum do duque meu sõr, e outro choro
de musiquos da Sé de Evora, cantores e moços de choro, charamelas de Sua Exª,
e outras da Sé, que todos tangiam os choros, trombetas e atabales (sic) de S. Exª
e fomos com esta ordem ao mosteiro de santo Agostinho. E por todo o caminho
ouve sempre grande concurso de gente que chegava a beijar a relíquia (…), etc.
B.N.P., Cód. 146, Relação da Entrada da Reliquia de S. Manços (em Vila Viçosa), ls. 17­23.

documento nº 26. 1594, 6 de fevereiro. contrato de d. bel‑


trão morellio, prior da cartuxa de scala coeli, com o pedreiro vi‑
cente ferreira, sobre a factura de uma capela na herdade da torre em
portel, com supervisão de pero vaz pereira, escultor do Arcebispo.

Em nome de Ds ámen, saybam os que este estromento de obra de empreytada,


concerto e obriguação virem que no anno do nacimento de Nosso Snõr Jhus xpo
de mil quinhemtos e noventa e cinco em seis dias do mês de Fevereiro do dito anno
na cidade de Evora no moesteyro de Nossa Snõra de Escala Celle da cartuxa n

313
a çella do mº Revdº padre dom Beltrão Morellio, prior do dito mosteyro, estan‑
do elle padre prior ahi presente e bem assy o reverendo padre dom Luis segundo
procurador que disse ser do dito mosteyro, ao qual o dito padre prior tomou por
adjunto e assistente pera o caso seguinte por não entender a linguoa portuguesa
e como interprete, de huma parte e da outra Viçente ferreira, pedreyro, mºr na
villa de Portell, e logo por ele dito Viçente ferrª loi dito que era verdade que elle
estava concertado cõ elle dito padre prior e cõ o dito padre dom luis segundo pro‑
curador do dito moesteiro e padres delle pera lhe aver de fazer huma capella na
sua herdade da Corte, que tem no termo da villa de Portell, a qual capella selle
dito Viçente ferreyra se obriga a fazer na dita herdade pella maneyra seguinte,
convem a saber, terá a dita capella trinta e tres palmos de vão no comprjmento e
dezaseis palmos e meyo no vão da largura e de altura dezoito palmos da banda de
dentro de pe direito, e da parte de fora vinte e dous palmos de pe direito, e as duas
paredes cumpridas terão quoatro palmos na grusura ate sima e a parede da porta
principal terá dous palmos e meyo de grusura ate sima, e a parede adonde hade
estar o altar terá sinquo palmos de groso ate sima e dentro nessa grossura farás
huma capella a qual terá doze palmos de larguo e de pe direito dezoito palmos
e terá hum arquo de volta redonda e sera fundada esta capella dentro na parede
tres palmos e meio e assentará o portal desta capela, sendo de pedraria lavrado ao
pe da obra faça a dalvenaria, dando‑lhe as couzeiras de pedrarya lavradas e ao
pe da obra, e fara huma janella pera a parte do meyo dia de tres palmos e meyo
de larguo e sinquo dalto rasguada pella parte de dentro, e faça‑a de alvenaria e
se a quiserem de pedrariaa assentará dando‑lha lavrada ao pe da obra, e medi‑
rá esta janella onze palmos do olivel pera sima e goaerneçerá esta capella de den‑
tro em branquo salvo as simalhas e os capiteis que serão raspados e pella parte
de fora serão todas as paredes desta capella em roda embocadas ate o chão, e asy
fara o altar da dita capella dalvenaria e acabará elle dito Vicente Ferreyra esta
capella comforme a traça que lhe for dada e assinada pelo dito padre frei luis, di‑
guo, dom Luis, e pelo dito padre prior, e não será obrigado, digo, a qual capella
fará de abobeda de berço de meia volta redonda, e não sera elle dito Viçente ferrª
obrigado a fazer mais na dita capella que o atras conteúdo e declarado, posto que
a dita traça mais mostre,e dará toda esta obra acabada, segura, perfeita e de re‑
ceber à vista de oiciais que o bem entendam, a qual obra toda atras declarada
fará e acabará por preço e contia de trinta e tres mil rs em drº dos quais elle dito
Vicente fereyra confessou ter já em sy recebidos dous mil e cem rs em drº e trigo à
conta da dita obra e comeso de pagua della, e loguo ahi perante mim tabeliam e
testªs recebeo mais sinquo mil e novesentos rs em drº de contado que he por tudo
oito mil rs e deles se deu por bem paguo, entregue e satisfeito e a eles padres e ao
dito seu moesteyro por quites e livres deles e o mais lhe irão paguando as ferias

314
pella maneyra seguinte, em tres pagas os vinte e sinco mil rs restantes, convem a
saber, tendo as paredes erguidas lhe darão oito mil rs, e outros oito mil rs lhe da‑
rão despois de ter a abobada fechada, e nove que iquão lhe darão depois de toda
a dita obra que he obrigado a fazer, a ver feita e acabada e ser vista colnfolrme ao
que atras iqua dito e declarado, e assim sera obrigado ele Viçente Ferrª a conti‑
nuar na dita obra e não alevantar mão della ate de todo a ter feita e acabada, e
outrosi sera obrigado, emquanto ele a dita obra não acabar, trazer mais nela dous
oiciais afora a pessoa delle, dito vicente ferrª, de maneira que trabalharão nella
sempre tres oiciais ate se acabar, e elle prior e padres do dito mosteiro serão obri‑
gados a lhe darem tudo o necessário pera se fazer a dita obra tirando ferramenta,
ofiçiais e servidores, que isso lhe dará e paguará elle dito Viçente ferrª, e todas
mais acheguas para a dita obra lhe porão os padres a sua custa deles padres ao
pe della, e faltandolhe eles ditos padres com algumas achegas algum dia que tra‑
balharem por espaço de meyo dia ou dia lhe paguarão o dito dia ou meo dia que
deixarem de trabalhar por falta das ditas achegas, avisamdo porem elle dito Vi‑
çente Ferreira a eles padres doze dias antes das cousas que forem necessárias pera
a dita obra e acheguas della, e quanto a cal e tijolo em caso que se não possa aver
loguo todo por causa do tempo os ditos padres o avizarão pera entretanto que não
ouverem a dita cal e tijolo o tornem a avizar e dentro de oito dias despois de avi‑
zado será obriguado a tornar à dita obra e não tornando a continuar nella como
atras iqua obriguado, ou não a dando segura e acabada conforme asyma dito e
custume das tais obras e estillo dos ofiçiais que eles padres poderão mandar fazer
e acabar a dita obra a custa delle vicente ferreira por seus bens e fazenda, o que
tudo o dito Viçente ferreyra se obriguou a fazer e cumprir e como atras iqua de‑
clarado sem duvida nem embarguos que a elle ponha, com obrigação de sua pessoa
e bem asy de todos os seus bens moveis e de raiz avidos e por aver, que pera elles
obriga, e o dito padre priore o dito padre dom luis que presentes estavão dixerão
que era verdade que eles tinham feito o dito contrato como atras iqua declarado
com o dito Viçemte ferrª e aceptavão a dita obrigação asy e da maneyra que atras
se contém (…), estando presentes por testemunhas Pero Vaz Pereyra, escultor do
Arcebispo, morador nesta cidade, e Gonçallo Vaz, pedreyro morador no termo
da villa de Viana de Foz do llima na Meadella, freguesia da igreja velha, ora
estante nesta cidade, que ambos dixerão conhecerem o dito Viçemte Ferrª ser o
próprio conteúdo neste estromento, e eu Pero Borges, tabelião, o escrevy, e declaro
eu tªm que outros esteve presente a este contrato o mtº Reverendo padre don João
Monteyro, procurador geral do dito mosteyro de Scala Celle desta dita cidade de
Evora, o aqual outrosi outorgou e aceptou esta escriptura como nella se contem, e
assinou com os ditos padres, pedreiro e testemunhas as sobreditas, e eu Pero Bor‑
ges tabeliam que o esprevi.

315
(aa) fr. Beltram Morellius prior scala coeli ordinjis cartus. – fr. Joam Montero pro‑
curator – fr. Luis vallente sedº p.º – Vycemte frrª – pº vaz pireira – de gº + vaz tª.
A.D.E., Lº 311 de Notas de Pedro Borges, ls. 8 vº­11 vº.

documento nº 27. 1594, 11 de março. obrigação de contra‑


to com o pedreiro diogo martins para fazer a obra nova da igreja
de são manços.

Em nome de Ds amen, saibam os que este estromento de contrato de obriguação


de empreytada virem que no anno do nacimento de nosso senhor Jhus xpo de mil
quinhentos e noventa e quatro em onze dias do mês de março do dito anno na ci‑
dade de Evora nas pousadas de mim, tabelian, pareceram Pero Duarte e Manoel
Fernandes Talleço, lavradores e moradores no termo desta cidade na freguesia de
Sam Manços, mordomos da obra da dita ygreja de Sam Manços, e bem asy Dio‑
guo Martins, pedreyro morador nesta cidade, e per eles foy dito que eles estavão
com, digo, pelos ditos Pero Duarte e Manoell Fernandes Talleço foi dito que era
verdade que eles estavão concertados com ele dito Diogo Martins para lhes acabar
de empreitada a obra da dita igreja de Sam Manços cõforme aos apontamentos
adiante declarados e cõforme a trasa que iqua em poder deles ditos mordomos as‑
sinada por ele dito Dioguo Martins, e por eles ditos mordomos, a qual traça esta
em duas folhas de papel, e logo de feito lhe derão a dita obra de empreitada para
lha fazer e acabar pella maneyra seguinte, a saber, as simalhas pella bamda, di‑
guo, pª a bamda de fora, serão de moldura doriqua, cõ seu frizo e alquitrave e
terá tudo de alto tres palmos e sera raspada e as telhas que vem sobre a simalha
serão asamtadas em cal e emboquadas de maneyra que não entre nada por ellas,
item as paredes pella banda de dentro da dita ygreja serão guarnecidas e apince‑
ladas e terão do chão pera sima raspado sete palmos dalto asy de huma banda
como da outra, e a capella da pia de bautysar o mesmo, item hos cunhais serão de
emxilharia raspada, item o madeiramento da dita ygreja sera em cortisado e bem
pregada de cortisa como se custuma, e sera telhado cõ canudo por sima e muy bem
emboquado que não entre cousa alguma por elle com seu espiguão, item a capella
da pia de bautizar se alevantará sinco palmos mais alto do que está e será de
huma corente pera fora ao modo de traça e sera fechada dabobada da dita capella
de mea laranja e o telhado sera emboquado e por fora hum chamfro que fasa sa‑
quada e sera guarnecida pella bamda de dentro asy abobadada como paredes de
branquo e a pia de bautizar sera alevantada no andar da ygreja e o ladrilho o
mesmo e o arquo da dita capella sera alavantado sinquo palmos e será goarnesi‑
do o dito arquo e os pilares raspados e ressaltados e refendidos e terá por capitel

316
huma faixa de hum e outo de alto e correrá toda pelo pe da abobada e no luguar
de simalha, item o altar mor sera alavantado hum palmo e sera mais largo o que
for necessário conforme ao Retavolo, e ladrilhar‑se‑á a capella ao olivell da ygreja
e os degraos serão feitos como estão os velhos e o que serviu de tavoleiro não terá
mais cumprimento que o altar porque não ande a gente ygual do padre, e farseá
huma parede francessa por detrás do retavolo da altura que for necessária e ta‑
pada pelas ilhargas o vão porque não possão entrar detrás, e háde ser guarnecida
esta parede, item o arquo e os pilares da capella mor serão guarnecidos de raspa‑
do com seu relevo, e o arquo terá hum foçinho anellado, e os capiteis guarnecidos
com muldura toscana, e correra, diguo, a capella sera guarnecida de branquo e
bem caiada, item as paredes da bamda de dentro serão goarnecidas de branquo e
caiadas e pelo fecho se deitara huma faixa de hum palmo de alto com seu relevo
e refendida correra toda a casa ao redor ao livel, e o espelho sera guarnecido por
fora e por dentro com suas faixas refendido, item o teto do telhado por dentro sera
desteyra de canas bem preguadas, sera reboquado e guarnecido conforme a traça, e
os painéis da dita abobeda serão quadrados e serão os que couberem com as mol‑
duras conforme a trasa, e a moldura ao redor das faixas grandes sera hum talão
com huma faixa e raspado como se custuma araspar, e os campos serão branquos
e bem caiados, item no telhado o algeros que core da banda da torre terá hum vaso
ao longuo das paredes que metão as telhas do algeros por baixo e as juntas da
pedraria da tore serão rachadas e guarnecidas da altura da pedraria de maneyra
que ique o algerós seguro, e guarnesera o campanairo e os remates conforme ao
que pede a obra, item que toda esta obra asi e da maneyra que atras vai declara‑
da fara elle dito Dioguo Martins sem faltar nada e pera toda esta obra, diguo, e
que elle Diogo Martins será obriguado a por tudo o que for necessário pera a dita
obra ser de todo acabada a sua custa sem eles ditos mordomos serem obriguados
a lhe darem coisa alguma necessária e pertemsente pera a dita obra, a qual obra
elle dito Dioguo Martins sera obrigado a dar acabada de todo por cento e quinze
mil reis que os ditos Pero Duarte e Manoel Fernandes Talesso mordomos da dita
obra se obriguão a lhe dar e paguar (…), a tudo forão presentes Andre Lopes da
Fonseca, alcayde desta cidade, e Amrique Chamoso, tabeliam do judicial desta
mesma, e Domingos Simões, homem do mesmo alcayde nesta cidade, moradores, e
posto se diga que se assinou aos onze dias do mês de março asinouse e outorgou‑se
aos vinte e hum dias do dito mês do dito ano de noventa e quatro, testªs as sobre‑
ditas e eu Pedro Borges tabeliam o escrevi.

A.D.E., Lº 309 de Notas do Tabelião Pedro Borges, ls. 114 vº a 117.

317
documento nº 28. 1595, 22 de dezembro. instrumento de
procuração dos frades da cartuxa de Évora, em que são testemunhas
pero vaz pereira, arquitecto, e custódio da costa, pintor, presentes
no capítulo do mosteiro.

Em nome de Ds ámen, sajbão os que este estromento de declaração e moderação de


contrato como milhor dizer se possa virem que no anno do nacimento de nosso Snõr
Jhus xpo de mil e quinhentos e noventa e seis (sic) em vinte nove dias do mês de de‑
zembro do dito ano na cidade de Evora, no aposento do ilustrissimo e reverendissi‑
mo Snõr dom Theotonio de Bargamça, Arcebispo deste Arcebispado devora, funda‑
dor e dotador da Cartuxa de Escala Coeli desta cidade, estando elle dito senhor ahi
presente de huma parte, e bem assi presente dom Manoell Bruno, monge professo do
dito mostrº de nossa snõra de scala caeli desta cidade e o Licº Niculao gramaxo, ad‑
vohgado nesta dita cidade, como procuradores bastantes e deputados plo dom Prior
e monges da dita cartuxa, pera este caso como constou per hum publico instrumento
que ahi apresentarão escrito e assinado com publico por balltasar dandrade, tabelião‑
das notas desta cidade, cujo theor de verbo adverbum he o seguinte: Saibão os que este
estromento de procuração virem que no anno do nacimento de nosso sõr Jhus xpo de
mil e quinhentos noventa e cinco annos aos vinte e dous dias do mês de dezembro nesta
cidade de Evora dentro no mostrº de nossa srª de escala caeli da ordem da cartuxa na
casa do capitolo estando ahi presente juntos e chamados per som de campaã tangida
segundo sey Religioso costume pera satisfazerem ao caso seguinte os muito Reverendos
e devotos padres, convem a saber, o Reverendo padre dom Belltrão morel, prior do
dito convento, dom Matias ferreira, vigrº da casa, dom francisco durão, dom Duarte,
dom luis valente, dom Noutell de matos, dom Manoell bruno, procurador do mostrº,
dom Mabnoell Medeiros, dom Theotonio, dom thome, e outros todos padres professos
naturais conventuais e capitullares chamados no dito mostrº, logo pelos ditos prior e
padres foi dito em seus nomes e do dito seu moestrº e convento, em presença de mim,
tabelião, e das testemunhas ao diante escritas, que com livre e gerall administração i‑
zião, como logo de feito izerão e ordenarão, por seus certos e bastantes procuradolres
com poder de sobestalecer procurador e prolcuradores e os revogar se comprir, retendo
o uso desta procuração em si, ao dito padre dom Manoell Bruno, procurador do dito
convento, e a Nicolau gramaxo, advogado nesta cidade, e nella morador, os mostra‑
dores da presente, aos quaes ambos e cada hum per si in solidum disseram que davão
e outorgavão todo por seu livre e comprido poder e mandado especial e gerall pera por
eles e em seu nome e do dito seu convento e mostrº da Cartuxa desta cidade poderem
aceitar do illustrissimo e reverendissimo snõr dom Theotonio de Bargança, Arcebis‑
po deste Arcebispado devora e fundador e dotador do dito mostrº da cartuxa todas e
quaisquer doações de quaisquer fazendas de raiz, foros, censos, pensões e quaisquer

318
outras rendas de qualquer maneira, qualidade, quantidade, numero e condição que
sejam (…), estando presentes por testemunhas Martim de faria, cavaleiro do habito
de nosso snõr Jhus xpo, e Antonio Ribrº, clérigo de missa, e Antº peres e pero vas
pereira e custodio da costa, pintor, nesta cidade moradores.
B.P.E., Mosteiro da Cartuxa, Lº 1 (Escrituras, desde 1587), ls. 45­60, refª l. 58; treslado
no mesmo maço, refª l. 70.

documento nº 29. 1598‑1602. despesa com pero vaz perei‑


ra, arquitecto do Arcebispo d. teotónio, por traçar as obras da sé
de elvas.

(S. João de 98). A Pero Vaz Pereira arquitecto do sõr Arçebpº seis mil rs pelo
trabalho de ver e traçar a obra da See .................................................6V000
A Manoel Ribeiro mestre pedreiro de Sua Exª (o Duque de Bragança), trinta
mil rs por dar traças às obras da Se as vezes que parecerão neçesarias 30V000
Arquivo da Sé de Portalegre (A.S.P.), Livro de Receita e Despesa da Fabrica da Se de Elvas,
anos de 1598 a 1638, ls. 17 e 23 vº. Referências em Mário Cabeças, 2004, pp. 244­246.

documento nº 30. 1600, 18 de Janeiro. oferta de uma opa


de escarlatim feita por d. teotónio de bragança, em despacho no
mosteiro da cartuxa, a gaspar pinheiro, meirinho do santo sacra‑
mento da sé.

Dom Theotonio de bragança, Arcbº devora, mando a vós, Licº Alvaro Tinoco
que servis de Recebedor das rendas da obra da See, de que somos perpetuo admi‑
nistrador, que pageis (sic) a Gaspar Pinhrº, que serue de meirinho do Santo Sa‑
cramento da See, quatro mil e oitocentos rs que se lhe deve do seu ordenado dos
dous quarteis derradrºs do anno passado e o que acabou o ano de noventa e nove,
a rezão de noue mil e seiscentos rs por ano, e asi mais huma opa de escarlatin
(sic) pª com ella servir na confraria do Santo Sacramento de que elle he meirinho,
e por esta e seu reconhecimento feito pelo escrivão da dita obra de como os recebeo
mãodovos sejão levados em conta, iquando a rezão no lº da arca e por nosso con‑
tador, Cartuxa a 18 de janrº de 600.
(a) Arcº dEvora
A.S.-E., PT/ASE/ME/F/Mç.1, 1574-1600, Mitra. Processos de Despesas, mss. avulsos.

319
documento nº 31. 1600, 7 de março. obrigação de José de
escovar, pintor de fresco, ao bispo de elvas d. António matos de
noronha, para a pintura a fresco dos painéis da abóbada da capela‑
‑mor da sé de elvas.

Hobryguasão de Joze de escovar da capella \ da se /


Saibão quamtos este estromento de hobryguacão vyrem que haos sete dias do mes
de março do anno do nacymento de nosso senhor Jesu Christo de mill e seis semtos
annos nesta cidade d’ellvas nas casas episcopais e em prezemça de mym taballiam
e das testemunhas ao deante nomeadas estando hai prezemtes o muito illustre se‑
nhor dom antonio matos de noronha bispo deste bispado e jmquizidor gerall destes
Reinos e senhorios de portuguall e bem asi Joze d’escovar pimtor de fresquo mora‑
dor na cydade d’evora estante ora nesta dita cidade lloguo pello dito Joze d’escovar
foi dito que e verdade que elle esta comsertado com o dito senhor bispo pera pimtar
ao fresquo a capella [?] diguo todos os paineis do allto da capella mor desta samta
se desta dita cydade e frizos de emtre os ditos paineis e de deredor delles que são
pintados os ditos paineis tamto por fora frizos \ couadros / de pimtura de fres‑
quo pella maneira seguimte pimtara em cada hum dos ditos paineis a istoria que
pello senhor bispo lhe for mandado e todos e cada hua das que pimtar pimtara com
toda a perfeicão de cores inas e muito escolhidas todas as quais serão todas vistas
primeiro que as guaste e todas serão a comtemtamento do dito senhor bispo e hos
frizos todos serão de pimtura de brutesquo bem pintados ao fresquo de collores bem
coalhadas [?] no debuxo de modo que ique pouquo campo em bramquo de modo
que toda a pimtura da dita capella ique a comtemtamento asi as cores como na
mão e debuxo a qual hobra elle dito joze d’escovar dise que elle seria nesta cidade
pera a começar na segunda outava de pascoa de frores primeira que embora vem
deste prezemte anno e a começara loguo o primeiro de serviso por toda a pascoa da
qual obra não allevantara mão nem se auzemtara desta cidade ate a não deixar
acabada e posta em toda sua perfeição e semdo caso que elle se auzemte sem aca‑
bar a dita obra ou por contrario perto o deixe de acabada hou allgua couza della
Jimperfeita e comtemte e ha por bem que a sua custa busquem pintor que o faça
a comtemtamento desta escretura e lhe darão a vista dele dito joze d’escovar tudo
aquello em que o dito semhor bispo se consertar come lle e he comtemte que por
sua custa mandem buscar o tall pimtor quanto elle por maliçia hou negreygemçia
sua deixe‑a de acabar a dita obra porque quando por doença hou morte deixar
de a acabar se não uzara delle do dito Rigor e sendo caso que por houtra obra ou
respeito allgum se auzemtar e comtemte que a sua custa se mande camynheiro hou
caminheiros que nesesarios forem pera lhe fazerem as noteicaçois nesecarias pera
comprir esta obryguação ao qual darão emquanto amdar fazendo as ditas delligen‑

320
cias coatros reaees cada dias e pera comprimento desta escretura e mor segurança
desta obryguasão se hobrigou elle dito joze d’escovar a trazer hua iança da dita
çidade d’evora cham segura e habonada de duzemtos mill reais dezaforada pera
o juizo desta coreição pera o qual elle dito joze d’escovar se desafora e se obrygua
a respomder diante do corregedor desta cidade e comarqua \ ou juiz de fora desta
çidade quall elle dito senhor pode ser / a todas as duvidas que lhe forem postas
a todo o comprimento desta escretura e hobryguação e se hobrygya a tudo comprir
e manter sem a iso allgua duvida allguar e semdo caso que a tenha não quer ser
ouvido em juizo e fora te não depozitar na mão do dito senhor bispo tudo aquillo
que a comta da dita obra tiver resebido e semdo caso que se auzemte e pera isso
hou houtra qualquer cousa seja nesecario sitar sequer que pera o comprimento e
tudo se cite hum dos porteiros desta cidade e lloguo pello dito senhor bispo foi dito
que por toda a dita obra lhe dara e mandara dar a comta da fabriqua da dita
se e das remdas della sem mill reais em dinheiro de comtado da comta dos quais
lloguo o dito joze d’escovar resebeu perante mym tabaliam e testemunhas vymte
mill reais da mão de joão allvarez depozitario da dita fabriqua o qual os deu
por mandado do dito senhor bispo e ho mais dinheiro se lhe ira dando asi como
for fazemdo a obra de maneira que acabada a dita obra e posta em sua perfeição
lhe sera paguo tudo muito prinsipallmente sem dillação allgua e dos ditos vymte
mill reais iquou por seu iador e primcipall paguador e iell depozitario lluis de
pina que prezemte asi estava o qual dise que se hobryguava como iell depozitario
a que não vymdo o dito joze d’escovar a comesar a dita obra pellas outavas delle
dar e hemtreguar os ditos vymte mill reais e sendo caso que vymdo elle dito joze
d’escovar a começar a dita obra e não lhe dando pera ella mantimentos d’estuque
e mais que for neseçario fora das timtas e do que elle tem obriguação depos lhe pa‑
guarão por cada dia que follguar trezemtos reais a custa de quem for justiça per
irmeza do qual o dito joze d’escovar se hobrigou por sua pesoa e bens moveis e de
rais avidos e por aver e ho dito senhor bispo as remdas da [dita fabriqua asi ho
terem e comprirem jmteiramente e pormetem de nunqua em tempo allgum irem
nem vyrem comtra este estromento em parte nem em todo e em testemunho de ver‑
dade asi ho houtrogarão e mandarão ser feito este estromento de obryguação que
todos aseitarão estando prezemtes por testemunhas joão allvarez e pedro dias villa
nova e manoell zaguallo moradores nesta dita cidade e eu antonio peguado pereira
tabaliam ho escrevy não fação duvida as emtrelinhas que dizem / e houvados /
ou juiz de fora desta cidade qual elle dito senhor pode ser.
[aa.] O bispo d’elvas / Luis de pina / Jose d’escovar / Joam allvares / Manoel
Zagalo / Pedro diaz villa nova
A.D.P., Cartórios Notariais de Elvas, CNELV04/001, Cx. 14, Liv. 10, 7 de Março de
1600, ls. 68­70 vº. Publicado pela Doutora Patrícia Monteiro.

321
documento nº 32. 1600, 15 de Julho. contrato para a pin‑
tura da capela‑mor da sé de elvas entre o bispo d. António matos
de noronha, o pintor José de escovar e o dourador João de moura.

Hobryguação de Joze d’escovar e João de moura ao bispo.


Saibão quamtos este estromento de obryguação vyrem que aos quimze dias do mês
de Julho do anno do nacymento de nosso senhor Jesu Christo de mill e seis semtos
annos nesta cidade de elvas nas casas episcopais e em prezemça de mym tabaliam
e das testemunhas ao diante nomeadas estando ahi prezemtes o muito illustre se‑
nhor dom amtonio matos de noronha bispo deste bispado e Imquizidor guerall
destes Reynos e senhorios de portuguall cetera e bem asi Joze de escovar pimtor de
fresquo e João de moura dourador moradores na cidade d’evora estantes ora nesta
dita cidade llogo pellos ditos Joze d’escovar e joão de moura foi dito que e verdade
que elles estão consertados com o dito senhor pera lhe dourar a capella mor da sa‑
mta se desta dita cidade comvem a saber as mollduras de trimta paneis que tem
a dita capella de pimtura que serão douradas por demtro e por fora todo aquillo
que pareser a vista e hasi as cornijas e boseis dos dois frizos grandes das ylhar‑
guas e ho seo arquo da capella por demtro e por fora tudo o que for pedraria do
dito arquo e hasi mais dourarão as frestas da dita capella e ho debrum de fora do
arquo em que fecha a abobada com as duas Reprezas das elharguas do arquo o
qual debrum e Reprezas lhe paguarão de fora deste comserto o qual dourado da
dita capella e ar[quo como] dito e sera de ouro mate de ollio dando‑lhe primeiro
Imprimadura a tudo e ho ouro de made ade ser feito de bornir do mais llustrozo
que posa ser de houro ino o qual yra muito bem asemtado e resavado que ique
muito bem coberto e ho arquo e esteos sera do mesmo houro mate e pimtados a
ollio sobre ho ouro conforme a mostra que diso esta feita a qual iqua em poder
do dito senhor pera se despois conirmar com ella a obra e halem deste dourado
pimtara mais na dita capella o dito joze d’escovar des paineis a fresquo dos des
mamdamentos da llei de deus de cores comforme a mais pimtura da capella os
quais paineis se ão de pimtar por baixo dos frizos grandes e hasi mais hum lin‑
tel que obrou deredor do arquo pella parte de demtro da capella os quais paneis
fara cada hum pello preço de cada hum dos houtros e ho lintel que a de demtro
do arquo se lhe pagara de dora deste comserto e hos mais pimtara no frontespiçio
do cruzeiro hua estoria quall lhe for asjnada e mandada e se medira o espaço da
parede e quantos paneis tera do tamanho de cada hum dos houtros se lhe paguara
o mesmo preço de cada hum dos houtros pello quall dourado e pimtura do arquo
asi como dentro e hatras iqua declarado lhe ade dar o dito senhor duzemtos mill
Reais em dinheiro de comtado paguos pella maneira seguinte pa djguo sem mill
Reais llogo pera o ouro e mordemte e hos houtros paguamentos se lhe vão fazen‑

322
do como tiverem neseçidade e forem trabalhando pello que diserão os ditos Joze
d’escovar e João de moura que elles se hobryguavão a dourar a dita capella e ha
pimtar pella sobredita maneira e pello dito preço dos duzemtos mill Reais da qual
hobra não llevantarão mão ate se acabar de todo e há darão feita e dereita por
todo o mes de houtubro prymeiro seguimte deste prezemte anno e posta em toda
sua prefeição pera irmeza da qual se hobryguarão por suas pesoas e bens moveis e
de Rais avidos e por aver ambos jumtamente de mão comum E hum pello houtro
e em quem milhor pera iso estiver e de quem o dito senhor quizer peguar toman‑
do hum e deixando houtro sem por isso nenhum deles iquar desobryguado a esta
obryguação asi terem e comprirem jmteiramente e pormetem de nunqua em tempo
allgum yrem nem vyrem comtra este estromento em parte nem em todo e pera mais
segurança aprezentarão tres escreturas de iança e hobrjguação que pera esta obra
e preço que por ella lhe dão derão feitas na cidade d’evora segundo dellas paresia
hua dellas por João Ramalho djguo diogo Ramalho tabaliam das notas na dita
cidade d’evora aos treze dias do mes de abrill deste prezente anno e houtras duas
hua de iança e houtra de abonação della feitas por francisco charua tabaliam
do pubriquo Judiçiall e notas na villa de terena feita hua dellas em vymte e houto
dias do mes de Junho e houtra em doze de Julho deste prezemte anno que todas
iquão em poder de mym tabaliam pellas quais se faz obryguação e ipotequa de
fazemda bastante ao comprimento das ditas obras alem da qual fazemda pera
mor abastança aprezemtarão por abonado de toda ella a Pedro allvares mercador
e morador nesta dita cydade que houtrosi prezemte estava pello qual foi dito que
elle sobia e dava sobida a fazemda toda comteuda nas ditas escreturas de iança
e habonação e habonava as ditas ianças e fazenda dellas e se obryguava como de
feito obrygou a que semdo caso que a dita fazemda nas ditas escreturas nomea‑
das ou cada hua das pesoas della não sejam nomeadas nas ditas escreturas não
posuão tall fazemda como nellas se nomeão não semdo elle abastante pera delle o
comprir todo o dinheiro que a comta desta obra for dado \ e se der / ao dito João
de moura dourador e hao dito Joze d’ escovar pimtor e pera imteira satisfação e
comprimento da obriguação que cada hum delles tem a pimtar e dourar a dita
capella e ha por em toda sua perfeição na forma desta escretura e doutra que ja
esta feita por mym taballiam e elle dito Pedro allvares se hobrygua por sua pesoa
e bens moveis e de rais avidos e por aver a pagar todo o dinheiro que falltar ven‑
dida toda a fazendoa comteuda nas ditas escreturas de iança e habonação asi o
que tiverem dado aos ditos pimtor e dourador como o mais que for neseçario pera
custa del[e]s ditos pimtor e dourador e habonador se o cobrar de pimtar e dourar
toda a dita capela falltando algua couza de sua obriguação e llogo os ditos João
de moura e Joze d’escovar se obryguarão a tirar apos e a sallvo ao dito Pedro all‑
vares abonador das ditas ianças dizendo mais os ditos Joze de escovar e João de

323
moura que erão comtemtes a que semdo caso que eles ou allgum deles se auzemtase
hou por qualquer houtra maneira deixasem de comprir com a dita obryguação asy
no pimtar como no dourar querem e hão por bem que a sua custa se busque dourador
e pimtor que acabe aquello que lhe a elles fallta aos quaes dourador e pimtor darão
aquillo em que elle dito senhor bispo de comtentar o que se lhe dara por comta das
fazemdas ianças e habonação delles ditos Joze d’escovar e joão de moura e querendo‑
‑os obryguar auzemtando‑se ou que elles proprios venhão comprir com suas obry‑
guações podera o senhor bispo mandar a sua custa delles hum ou mais caminheiros
que nesesarios forem aos quaes podera dar a duzemtos Reais por dia ate elle com
efeito mandar comprir com suas obryguações e ho dito pedro allvares dise que ele se
obryguara a todo comprir e manter pella sobredita maneira pera a que todo se desa‑
forão de juiz de seu foro e jurisdição e se obriguão e sometem a responder perante o
corregedor desta comarqua ao qual der sentença pera então elleg[e]rem pessoa com‑
petente juiz e em testemunho de verdade asi o outrogarão e mandarão ser feito este
estromento de hobriguação que todos aseitarão estando prezemtes por testemunhas o
primaz e viguario gerall deste bispado João nogueira borba e pedro dias villa nova e
hafomço borya criado do dito senhor e eu Antonio peguado pereira tabaliam ho es‑
crevy e declarão que lhe dão os ditos duzemtos mill Reais somente pello dourado todo
e pimtura do arquo e ha outra pimtura dos paineis se paguara comforme a escretura
que ja diso esta feita e se hobryguão a qua asi o dourado como a pimtura sera com
toda a prefeição posivell testemunhas os sobredito[s] e eu taballião ho escrevy não
fação duvida os entrelinhados que dizem / em / de mão comuny a‑de ser diguo / e
se der e emmendado / fazem mandado e riscado / em quem melhor pera do / que
todo se faz [l. 144] por verdade e eu tabaliam ho escrevy
[aa.] [João n]ogueira / João de moura / Jose d’escovar / Pedro allvares / Pedro
dias villa nova / Afomso boroa
A.D.P., Cartórios Notariais de Elvas, CNELV04/001, Cx. 11, Lº 10, ls. 140­144. Pu-
blicado por Patrícia Monteiro.

documento nº 33. 1602, 25 de Janeiro. o Arcebispo d. teo‑


tónio de bragança encarrega o cónego domingos martins de enco‑
mendar em roma paramentos e pintura.

(…) Levais o retablo do Altar mor da Cartuxa pera mandar fazer hum em tella pera o
modo que vai um papel dentro do milhor oficial, e seja escolhido pera o Cardeal Tornes.
Em casa do Sõr Conde Fernão Taverna esta huma casula, e huma dalmática
de buquexim para se fazerem outras por ellas, e aqui vão outros desenhos para o
brocado, e para os sebastros, e os peris que nelles estão azuis, hão de ser cor que

324
parecer, e o branco hade ser vermelho, e porque queria tãobem fazer hum orna‑
mento branco para a Cartuxa da feição do da See de tela, e não há que ter mais
que frontal que he de quinze palmos de cumprido, como vereis pela medida que vai
ao pé do retabllo, e huma vestimenta, e panno pera o faldistório que he a estante,
a casula hade ser toda de brocado como a minha capa que se fes em Florençia, e
o frontal, e faldistório, taobem os sebastos e folhas que levam ao redor hão de ser
fabricadas de ouro conforme ao papel que levais.
B.P.E., Lº 1º da Cartuxa, ls. 119 a 120 vº.

documento nº 34. 1601‑1602. recibos de pagamentos pela


pintura e dourado do retábulo‑mor da igreja do mosteiro do carmo
de Évora, pelo pintor estrangeiro isbrant de renoy.

(l. 81). Pintor do retabolo do Carmo 12V800. Diguo eu Isbrante de Renoi


que he verdade que eu resebi do snõr frcº de faria a conta do retabolo que lhe pinto
no Carmo devora doze mil e outo sentos res em dinheiro e huma procuração pera
a alfandega de Lisboa de dosasete mil res o quoal he deste quartel primeiro de
Março de 601 e por isto ser verdade pedi a João Lopes que este por mim izese,
oie vinte oito de Maio do presente ano de 601.
(a) Isbrant de Renoy
Recebeo os 17V000 da procuração dalfandega por Baltazar do valle.
(apenso) Diguo eu Isbrante de Renoi, pimtor, que me obrigo a acabar ho re‑
tabollo de Nossa Snõra do Carmo da capella mor que já tenho começado …,
recebendo de Francisco de Faria, alcaide moór da vila de Palmela, quinze mil reis
em parte de pago… a desaseis de Abril de 602.
(a) Isbrant de Renoy (apenso)
Diguo eu Isbrante de Renoi, pintor, que dou quitação de nove mil reis que me
eram devidos pello senhor Francisco de Faria, alcaide moor da vila de Palmela,
pela pintura do retabollo do Carmo devora… a trese de agosto de 602.
(a) Isbrant de
(l. 56) Por este por mim digo eu Luís Brante de Renoi pintor que he verdade
que eu pintei ao snõr frcº de faria alcaide moór de Palmela, o retavolo da Capela
mor de Nossa Snõra do Carmo da Cidade devora e porq. lhe tinha acabado a
dita obra hora em remate de todas nosas contas dia pª todo sempre do dito feitio e
por verdade Rogei ao padre fr. Simão da ordem de Nossa Senhora do Carmo que
este por mim izesse e eu assinei por minha mão, oie 11 de Novembro de 602.
(a) Isbrant de Renoy
(nota) Do pintor. Este omem sustentámos todo o tempo que foi quase dous
annos e o curamos de uma doensa mui larga e pirigoza.

325
(ls. 60­65). Contrato de 29 de Janeiro de 1605, passado em Évora,
em nome de Lourenço Vaz de Araújo, procurador do senhor Fran-
cisco de Faria, alcaide-mor da vila de Palmela, com Manuel Francis-
co, pintor e dourador, morador em Lisboa na Rua dos Escudeiros,
para dourar o retábulo-mor da igreja do Convento do Carmo de
Évora, por 150.000 rs, que deviam ser-lhe dados em três pagas 546.
(l. 78). Aprovação da obra do retabolo.
Certiicamos nos José de Escovar he manoel Fernandes pintores e douradores mo‑
radores nesta cidade de Évora que he verdade que nos fruymos a ver ho Retabollo
da capela mor do convento de nosa Senhora do Carmo da dita cidade o qual dou‑
rou Manoel Francisco morador na cidade de Lixboa, he o dito Retabolo hestá
mto bem dourado de ouro bronhido he de mtº bom aparelho he de mta dura e mtº
irme he bem Acabado he Resanado he ysto dizemos pelo juramento dos Santos
Evangelhos que temos he que pª yso nos foy dado, o qual Retabolo fomos ver A
ystançia e per mandado do senhor chantre baltesar de Faria, e por ser verdade i‑
zemos esta por nos asinada em Évora oje 24 de Junho de 1605.
(aa) Manoel frz – José descovar
(l. 82) Recibo de Manuel Fernandes, pintor e dourador, de 6 de Dezembro de
1605, em parte da pintura do Sacrário da mesma igreja547.
Lisboa, Colecção Pedro d’Azevedo – Maço de Contratos de Obras respeitantes à Capela‑
‑Mor do Mosteiro do Carmo de Évora (1568‑1623).

documento nº 35. 1603. inventário dos painéis, mobiliário,


pratas e tapeçarias da colecção de d. Alexandre de bragança, Arce‑
bispo de Évora.

Inventrº dos Bens Moveis que o sºr Alexandre tem nesta Cidade de Lisboa e hora
he Arcebispo eleito de Evora ao tomar posse do dito Arcebispado.
(…) Treze panos da Historia de Hercules que tem quostro centas e cinco Annas
avaliada cada Anna a mil e seis ctºs rs monta seis ctºs quarenta e oito mil rs....
648V000
Cinco pabnos de Alta cajda de Raz da mesma, digo, da Historia de David que
tem duzentas e vinte e duas Annas que custão, digo, valem dozentos e oitenta e
oito mil rs .......................................................................................288V000
Tres panos de Raz Antigos de Barba Rapada que são da Historia de David e
Irmãos da Armação de sette panos que foram pª Vila Viçosa que a respeito dos
mais tem setenta e duas Annas a mil e cem rs cada, que montão settenta e nove
mil e duzentos rs .............................................................................079V200

326
Huma alcatifa de Coracene (sic) com sua rosa no meo e fundo anil, posta em qua‑
torze mil rs ..................................................................................... 14V000
Outra alcatifa do Dias de Bichos com cadilhos de retros verde posta em quinze
mil rs ................................................................................................15V000
Outra alcatifa do Dias com cadilhos de retros vermelho posta em quatorze mil
rs ......................................................................................................14V000
Huma alcatifa de Coracone (sic) velha que se ve nos pes da cama posta em des
mil rs.. 10V000
Duas alcatifas de Veneza piquenas novas a tres mil e quoatro centos rs cada que
valem e montão seis mil e outocentos rs.................................................6V800
Seis Guadamecis dourados todos novos cada hum de trinta e duas peles e mª os
cinco e hum maior que tem corenta pessas que valem vinte e oito mil e trezentos
rs .....................................................................................................28V300
Dezassete guadamexins vermelhos com sanefas douro e verde reformados de trinta
postos cada hum a tres mil quinhentos rs montão cincoenta e nove mil e quinhen‑
tos rs.................................................................................................59V500
Des panos de Guadamexim que não são reformados vermelhos com sanefas dou‑
radas posto cada hum a tres mil rs Monta trinta mil rs .....................30V000
(…) Retavollos doratorio.
Hum Retavolo de nossa Srª em pano com seu caixilho e com bhum menino com
S. João Bptª com suas corrediças de tafeta carmezim posto em oito mil rs8V000
Huma lamina de metal com seu Ecce Homo em hum caxilho de pao preto doze
mil rs ................................................................................................12V000
Huma Cruz de pao preto lavrada de ouro com huãs vidraças para o meo com fe‑
guras da paixão feitas de Marim com seu pe em vinte mil rs ............20V000
Duas Arquinhas pª Reliquias, huma grande e outra pequena, com Vidraças por
todas as partes Iavradas a ponta de diamante e forradas de setim douro e carme‑
zim vinte e dous mil rs sem Reliquiass somente o feitio das Arquinhas22V000
A outra caixa de Reliquias piquena com vidraças como as de cima em oito mil
rs ........................................................................................................8V000
Quoatro Retabolos com molduras de pao pintado douro e preto em cada hum duas
colunas de Alabastro a nove mil rs cada hum, montão trinta e seis mil e são de
Veneza .............................................................................................36V000
Tres retavolos mais piquenos da mesma feição a Rezão de tres mil e quoatro cen‑
tos rs cada hum montão tres mil e duzentos rs ................................... 3V200
Quoatro Retavolos com molduras de pao preto a mil e dozentos rs cada hum mon‑
tam oito mil e oito centols rs .............................................................08V800
Outro Retavolo da mesma feição mais piqueno em quoatro centos rs .....0V400
Outro Retavolo de prespetiva em seis centos rs......................................0V600

327
Huma imagem de S. Sebastião feito de sera e metido em huma caixa de pao tin‑
gido de preto com sua vidraça em quoatro mil rs...................................4V000
Outra caixa da mesma feição com sua vidraça onde esta a Anunciação do Anjo
a nossa Srª em seis mil rs ....................................................................6V000
Hum Retavolo de Christo ao vivo piqueno com suas molduras de ouro e azul em
mil e seiscentos rs (à margem: na Arca da g.da Roupa junto a janella) 1V600
Sette Paineis de pássaros e verdura da China a dous mil rs cada hum montão
quatorze mil rs ................................................................................14V000
Cinco painéis, digo, quatro painéis a mil e dozentos e Lta rs, parecem de China,
montão cinco mil rs .............................................................................5V000
Dous paineis da China grandes de pássaros e verdura a mil e sette ctos rs cada
hum montão tres mil e quoatro çtos rs..................................................3V400
Doze paineis da China de pássaros e verdura a rezão de quoatro centos rs cada
hum, montão quoatro mil e oitocentos rs ............................................. 4V800
Tres paineis da China de pássaros e verdura dos maiores a mil e sette centos rs
cada hum montão cinco mil rs..............................................................5V000
Hum painel de landres a óleo da Conversão de S. Paulo mil e quinhentos rs.....V500
Dezoito, digo, des cadrªs de nogrª do pal (?) das novas a seis mil rs cada huma
que são acolchoadas, sesenta mil rs ...................................................60V000
Tres cadeiras razas novas a dois mil rs cada huma montão seis mil rs .6V000
(…) hum caixão da India posto em tres mil e quinhentos rs ................3V500
Hum painel de Rojios (sic) posto em oitoçentos rs ................................... V800
Dous escritórios de nogrª com suas gavettas novos que serve de papeis na secretaria
a quoatro mil e quinhentos rs cada hum, montão nove mil rs................9V000
Hum caixão de pinho grande de Veneza posto em dous mil rs .............2V000
(…) Hum Doçel de tella amarela raza de tres pannos e guarneçido de veludo
carmezim tem de comprimento sette ctºs vale cento e cinco mil rs ........105V000
Outro docel de tella emcarnada ouro e prata raza guarnecido de tella frizada de
tres altos de braço e ouro de tres panos com elcaxafres (sic) douro e prata que val
çento trinta e sette mil rs .................................................................137V000
Outro docel que se esta fazendo cde tella de tres alttos emcarnada guarnecido ao
rredor com suas goterias de tella branca borlado com veludo carmezim todo per‑
illado douro e pratta, posto em trezentos e trinta e cinco mil rs, que tem quoatro
panos afora a guarnição borlada .....................................................335V000
(…) Louvados:G.co dolivrª Procºr do Povo desta Cidade de Lxª, Alfayatte. Antº
Prª tapeceiro del Rei. Dºs Vieira ourives de pratta. Duarte Ribrº correiro. Luis
João gadamixinrº. Mel gomez dourador. Belchior Ribrº borlador.
A.S.E., Inventários dos bens móveis de D. Alexandre de Bragança (PT/ASE/ME/B/002/
Doc.003).

328
documento nº 36. 1604, 17 de maio. contrato do prior de
santa maria de machede com pedro francisco, pedreiro, para fazer
a obra dessa igreja segundo as traças do Arquitecto pero vaz pereira.

(…) estando determinados de com a ajuda de Deos Nosso Snõr haverem de fazer huma
Igreja nova da mesma invocassão edeicada toda de novo (...) no mesmo lugar onde está
a Igreja velha», contrataram o pedreiro eborense Pero Francisco, que «fará pella trasa e
Rascunho e modello feito por Pero Vaz Pireyra arquitecto do Duque de Braguamça ora
morador em Villa Visoça, o qual Rascunho o dito Pero Francisco mestre da dita obra
tem em seu poder e por elle fará a dita cassa sem acrecentar nem demenuir no feityo da dita
cassa e Igreja cousa allguma senão assim e da maneira e conforme ao dito Rascunho»...
(...) estando presentes o Licenciado Baltazar Coelho Monteiro, capelão de Nossa Senho‑
ra de Machede, e mais estando presentes Miguel Álvares, João Gonçalves e Francisco
Ramalho, mordomos da fábrica da igreja de Nossa Senhora de Machede, estando de‑
terminados de com a ajuda de Deos Nosso Snõr haverem de fazer huma Igreja nova da
mesma invocassão edeicada toda de novo (...) no mesmo lugar onde está a Igreja velha,
e mais estando presente Pero Francisco, mestre pedreiro, morador na cidade de Évora,
(...) a dita Igreja fará pella trasa e Rascunho e modello feito por Pero Vaz Pireyra,
arquitecto do Duque de Braguamça, ora morador em Villa Visoça, o qual Ras‑
cunho o dito Pero Francisco mestre da dita obra tem em seu poder e por elle fará
a dita cassa sem acrecentar nem demenuir no feityo da dita cassa e Igreja cousa
allguma senão assim e da maneira e conforme ao dito Rascunho (...),
a dita Igreja será de comprimento de setemta palmos da porta da dita Igreja ate
o arquo do cruzeyro e de llarguo trimta pallmos, e outros trimta palmos dalltura
do chão até o movimento da abobada, e quinze pallmos de dallto e cimtre que ao
todo fazem quarenta e cinco dallto do ponto ate o chão, e as paredes serão de qua‑
tro pallmos de llarguo com seus botareus pella parte de nascente conforme a dita
traça e Rescunhos, e asi da mesma maneira edeicada e acabada a capella da dita
Igreja e allpendre e sacristia e Capella de fora de bautizar (...).
A.D.É., Lº 349 do Cartório Notarial de Évora, Notas do Tabelião Luís Gonçalves Pégas, ls.
8 a 10. Refª em Artur Goulart e Vitor Serrão, 2004, pp. 211-238.

documento nº 37. 1604, 23 de março. mercê de d. teodósio


ii, 7º duque de bragança, nomeando pero vaz pereira para o cargo
de arquitecto e escultor de sua casa.

Pº Vaz prª Architecto, e Escultor do Duq. Nosso Sºr.


Ouve S. Excª por bem de fazer merce ao dito pº Vaz prª de o aceitar por seu Ar‑
chitecto, e Escultor, com ordenado de lx mil rs per anno emquanto o ouver por bem

329
e não mandar o contrario conforme as Condições da Carta geral, & de Medico,
e botica estando doente, por Alvara feito Em 23 de Março de 604, e hum moio
de trigo anail em cada hum anno enqtº o ouver por bem conforme as Clausulas
da ditta Carta geral per Alvara feito no dia acima.

Arquivo Histórico de Vila Viçosa, Mercês de Dom Theodozio, Ms.137, l. 303. Publicado
por José TEIXEIRA, 1983, p.121.

documento nº 38. 1604, outubro. intervenção de pero vaz


pereira, arquitecto do duque de bragança, na reconstrução da igreja
do mosteiro da graça de Évora.

(l. 5) Obra. Deu a Pº Vaz mestre das obras do Duque que mandamos chamar
oito mil rs 8V000

B.P.É., cód. CLXVII/1-5, Lº de Receita e Despesa do Mostº da Graça de Evora, 1604‑1628.

documento nº 39. 1605, 28 de Janeiro. procuração envolvendo


José de escovar e outros pintores de Évora por causa de um processo
judicial intentado por seu ilho luís de escovar, pintor.

Saibam quamtos este estromento de procuraçam virem que no ano do nacimento de


noso senhor Jesus Christo de mill e seis çentos e cimquo anos aos [l. 109] vimte e
oito dias do mes de Janeiro da dita hera em a cidade d’ evora nas casas da morada
de mim tabeliam e em minha presemça e das testemunhas ao diamte nomeadas es‑
tando hi presemte Juze [sic] d’escovar pimtor morador nesta cidade lloguo por elle foi
dito que fazia e de feito lloguo fez e ordenou por seus ditos e abastantes procuradores
em todo vemdosos com poder de sobrestaballecerem ou ter poder [?] e procuradores
se comprir a manuell carvalho morador nesta cidade e a fernão lluis e a manuell
cordeiro pimtor seu Irmão moradores na villa d’estremos os mostradores da prese‑
mte aos quais todos juntamente e a cada hum por si In sollidum dise que dava e
outurguava todo seu llivre e comprido poder mandado especiall e gerall para que por
elle e em seu nome posam e cada hum per si posa procurar e requerer todo seu dito
e justiça em todos seus feitos causas demandas movidas e por mover que elle conste‑
tointe hora aja e ao diante ouver comtra quaisquer pessoas que sejão ou as pessoas
contra elle ajão e aver entendão sobre quaesquer causas e casos que sejão em espeçial
em hua causa e demanda que lhe hora quer mover luis d’escovar seu ilho morador
na villa d’estremos sobre as partilhas que se izerão por falliçimento de Julliana da

330
Rocha sua mai e esto peramte quaisquer juizes e justiças a que ho conhecimento do
caso ao dito pertemçer comtamto porem que elles seus procuradores nam posam ser
çitados em suas pessoas per nenhum caso em que requeira nova cita com que por elle
custetointe nam ser primeiro mas pera todo mais poderão citar demandar estarem
em juizo e fora delle llibellos petiçois penas […] apresemtar semtenças desenbargos
ou virem em […] por elle constetuinte dados consentirem e os fazerem relatar com
efeito e das autorias apellarem e agravarem e as apellaçoins e agravos seguirem ate
mor allçada e as fazerem ter por e emtreposam fazer dizer requerer alleguar defen‑
der mostrar por elle constetuinte todo seu direito e justiça estar compridamente ainda
aonde e se […] de juizo fazer parte estes requerimentos por escrito ou por pallavra
tomarem delle o estromento d’agravo e os seguirem amte e peramte quem disto for
jurar em sua allma juramento de callunia e outro quallquer lliçito juramento que lhe
com esto mandado for e as partes adversas ho fazer dar em lhos deixar se comprir e
inalmente foram […] sobre todo que dito he dello […] defender pera bem de sua
justiça todo que mais comprir em e necessario for asi e tam inteiramemte como elle
costetuimte haia de […] semdo presemte em sua pessoa por que pera todo lhe da e
a […] todos os poderes e dito comçedidos […] administraçam pondo ofeciais juizes
e Justiças ofeçiais e pessoas que hos […] lhe forem e em outros de novo se llevarem
permetendo e se obriguamdo d’aver primeiro bem para sempre todo por elles e cada
hum dito e feito açerca do comteudo neste estrumento sobhobriguaçam de seus bens e
por ello hobrigou moves e de Raiz avidos e por aver e em testemunho de verdade asi
ho outorgou e mandou dello ser feito este estrumento que asinou estando presemtes
por testemunhas o Licenciado amtonio da costa medico e francisco carvalho e ma‑
nuel dias moradores nesta cidade d’evora e eu domingos pires tabeliam ho escrevi.

[aa.] Francisco Carvalho / O Licenciado Antonio da Costa / Jose d’ escovar /


Manuel Dias (uma cruz)
A.D.E., Lº 249 de Notas do Tabelião Domingos Pires, ls. 108 vº.­110. Leitura de Patrí-
cia Monteiro.

documento nº 40. 1605, 8 de outubro. contrato de dona


mécia de melo, Abadessa de são bento de cástris e demais freiras,
sendo presente o pintor José de escovar, ora estante e trabalhando
no mosteiro.

[Em cima, à esquerda] Feito ao comprador


Saibão quamtos esta carta de nota pera sempre virem que no ano do nacimento
de noso senhor Jesu Christo de mill e seiscentos e sinqo anos aos oito dias do mes

331
de outubro do dito ano no termo da cidade d’ evora dentro no musteiro de são
bento de castres que he das freiras da hordem do gllorioso São bernardo na casa
do llucatorio delle estando hi das grades adentro presentes e iuntas chamadas per
som de campa tangida segundo seu antigo e Relligioso uso as devotas e Relligiosas
madres convem a saber dona mecia de mello abadesa lluzia sillveira prioresa, si‑
moa da esperansa deputada, ana pais bollseira, dona maria ffallcoa escrivã e ou‑
tras todas ffreiras proffesas naturais comvemtuais discretas cha [sic] todas ffreiras
proffesas naturais conventuais discretas chamadas em ho dito mosteiro e bem asi
estando presente ffrei pedro da crus ffeitor do dito musteiro Relligioso da hordem
do gllorioso São bernardo e lloguo por ellas madres abadesa e mais Relligiosas
e pello dito padre ffrei pedro ffoi dito peramte mim taballião e testemunhas ao
diante nomeadas que elles vendião e outorguão de venda deste dia pera todo sem‑
pre a manoell iorge avoo [?] de Rui casco de mello que presente estava hua vinha
que esta no termo desta cidade d’evora no posto de gouvea que ora esta ffeita pa‑
nasqueira e muito deneficada que parte de hua parte com o padre Simão Ramos
e da outra parte com manoell Ramalho carpinteiro a quall vinha se fforra llivre
isenta de toda a divida ipoteca e obriguasão desobriguada, e pertence a ellas ditas
madres abadesa e Relligiosas e seu musteiro por ser pera dote de maria da encar‑
nasão Relligiosa proffesa do dito musteiro que pera ese eff[eito] [...] 548 e pera o
dito musteiro a vender e Receber o dinheiro della pera ho dote da dita Relligiosa
e comprimento delle, a quall vinha ora asi lhe vendião ellas ditas madres abadesa
e Relligiosas ao dito manoell iorge que presente estava e a maria Rodrigues sua
molher e pera todos seus herdeiros e sobcessores que pos elles vierem por fforra lli‑
vre e desobriguada de toda a divida ipoteca e obriguasão e por preso e contia de
quarenta mill reis em pas e em sallvo da sisa e mais custos pera ellas ditas abade‑
sa e Relligiosas e seu musteiro os quais quarenta mil reis lloguo hi peramte mim
taballião e testemunhas ao diante nomeadas ellas madres abadesa e Relligiosas e
o dito padre ffrei pedro da crus contarão e reseberão da mão do dito manoell ior‑
ge comprador per hua soma de moedas de prata em estes Reinos correntes em que
depois de bem contados disserão aver a dita contia iusta inteiramente sem ffalta
nem deminuisão allgua e se ouverão dos ditos quarenta mill reis preso desta venda
ellas madres abadesa e mais Relligiosas por bem paguas entregues e satisffeitas e
derão delles por quite e llivre d’ oie pera todo sempre ao dito comprador e a seus
bens e herdeiros e quiserão porem mandarão e outorguarão que elle comprador e
todos seus herdeiros e sobcessores que pos elle vierem e sobcederem daqui em diante
pera sempre aião llogrem llivre e isentamente a dita vinha com todas suas emtradas
saidas direitos pertensas e serventias e llogradouros uso e ffruito ffasendo della e
em ella livremente o que lhes aprouver como de cousa sua propria isente he com seu
dinheiro comprada renunciando llogo de si ellas madre abadesa e Relligiosas e de

332
seu musteiro em elle comprador em seus sobcessores toda a pose [...] 549 direito au‑
são e propriedade que ateqi [sic] em a dita vinha tiverão e o dito seu musteiro teve
e ao diamte por direito poderião ter e aver por quallquer [...] 550 seia ou quallquer
maneira ser pudese por mor abastansa do quall se constetuirão ellas vendedoras
em nome do dito comprador a posuir por vertude desta venda que lhe ora asi della
ffasião e por esta carta o ouverão lloguo por em pose reall corporall autuall civell
e naturall que a posa tomar e tome por si ou por quem quiser tomar mão de sem
mais outra hordem de iuiso nem autoridade de iustisa com a quall pose e proprie‑
dade lhes prometerão ellas ditas madre abadesa e mais Relligiosas em seu nome
e de seu musteiro o terem manterem e em todo tempo lha livrarem e deffenderem
e ffaserem segura llivre e depos de toda a divida briga embargo e comtradisão que
lhe sobre ello seia ou ffor posto em parte ou em todo sob pena de lhe tornarem a
compoor o dito preso em dobro com quanto em a dita vinha ffor ffeito e melho‑
rado e a perda e dano que se lhe a elle comprador ou a seus herdeiros por ello se‑
guirem com as custas e despesas que fiserem sob hobriguasão de todos os bens e
rendas do dito seu musteiro que pera ello obriguarão e que toda a sobredita pena
llevada ou não llevada que todavia esta venda e carta della seia firme e valliosa
se cumpra e guarde aia e tenha seu imteiro e reall effeito como nella se comtem e
em testemunho de verdade outorguarão e mãodarão ser ffeito esta e muitas cartas
que elle comprador em si em seu nome e de seus herdeiros e sobcesores aceitou e eu
taballião como pesoa pubriqua estipullante e aceitante ho estipullei e aceitei em
nome dos ausentes a que esto comvem convir tocar pertencer pode e lloguo hi pello
dito comprador ffoi mostrado a mim taballião hua certidão de ffernão gonsallves
cogominho fidallgo da casa dell Rei noso Senhor [...] 551 e iuis pela hordenasão
nesta cidade por elle asinada e por cristovão iacome depositario dos bens de rais e
por diogo de brito escrivão que a ffes de como tinha pago os direitos desta compra
a ell Rei noso senhor da quall o tresllado de verbo ad verbum he o seguinte. Item.
Fernão gonsallves cogominho fidallgo da casa dell Rei noso Senhor vereador mais
velho e iuis pella hordenasão nesta cidade d’ evora e seu termo etc. ffaso saber aos
que esta certidão virem que no llivro das sisas adonde se escrevem os bens de rais
esta hum asento as ffolhas setenta e nove de que o tresllado he o seguimte: Aos seis
dias do mes de outubro de mil e seis centos e sinqo anos nesta cidade d’ evora nas
casas das sisas tavolla della pareceo manoell jorge avoo [?] de Rui casco de mello
morador nesta dita cidade na Rua do cano e disse que comprava hua vinha isenta
que esta no termo desta mesma no citio de gouvea pello caminho de pavia a priores‑
sa e mais ffreiras do musteiro de São bento desta dita cidade extramuros della por
preso e comtia de quaremta mill Reis de que pagou de mea sisa elle dito comprador
por as vendedoras não deverem sisa do que venderem, dous mill reis os quais llogo
Recebeo Cristovão iacome recebedor depositario dos bens de rais e sobre elle estão

333
carreguados no dito llivro por termo por mim e por elle asinado pello que mando ao
taballiam que esta carta fizer treslade e encorpore toda esta certidão de verbo ad
verbum sob as penas comteudas no Regimento a quall certidão vai por mim asinada
e pello dito depositario e pello escrivão que esta ffes eu diogo de brito escrivão das si‑
sas da tavolla por o [...]552 a fis e asinei dia mes e era atras escrito pagou desta com
o asento do llivro sesenta reis e d’ asinar nada / Cogominho / Cristovão iacome
/ diogo de brito / E mostrada e treslladada asi a dita certidão como dito he lloguo
pellas ditas vendedoras e comprador ffoi dito que por virtude della aprovavão e ra‑
teficavão esta venda compra e carta della em todo e por todo como se nella comtem
semdo presentes por testemunhas dominguos pires sapateiro d’ obra prima e iose d’
escovar pintor moradores nesta cidade e eu ffellicio de bessa taballião que ho escrevi.
[aa.] Luzia Silveira prioresa / Dona Miçia de mello abbadesa / Simoa da es‑
perança deputada / Ana paez bolseira / Dona Maria falcoa escrivã / Manoel
iorge [...] 553 / Frei Pedro da Cruz / Jose d’ escovar / Domingos Pires
A.D.E., Cartório Notarial de Évora, Lº. 333 de Notas de Domingos Pires, ls. 191­193. Lei-
tura da Doutora Patrícia Monteiro.

documento nº 41. 1605, outubro, a 1606, fevereiro. des‑


pesas com o pintor José de escovar para afrescar o tecto da casa do
despacho da santa casa da misericórdia de montemor‑o‑novo.

Despendeo [semana que decorre de 31 de Outubro a 5 de Novembro]


mil e seis sentos e oitenta rs que deu a Joze descovar pintor por conta das pinturas
que vai pintar na Sta Casa ...............................................................1 V 680
Despendeu [semana de 31.Outubro a 5 de Novembro] em Novembro de
1605) mais dous mil rs que deu a Baltesar rosado para os frascos de ouro para
dourar as chaves e represas da abbobada ...........................................2V 000
Despendeo [semana de 31 de Outubro a 5 de Novembro] mais mil rs que
deu a Joseph descovar por conta das pinturas que vai pintando na Misª 1 V 000
Despendeo [semana de 7 de Novembro a 12 de Novembro] mil rs que
deu a José descovar pintor por conta das pinturas que vai fazendo na igreja da
Misª .................................................................................................1 V 000
Despendeo [semana de 7 a 12 de Novembro] quatro mil e novesentos rs que
deu a José descovar pintor por conta das pinturas que vai fazendo na igreja da
mysericordia ......................................................................................4 V 900
Despendeo [semana de 7 a 12 de Novembro] mais seiscentos rs a Manoel
das Neves de dourar a abbobada da igrª ..............................................V 600

334
Despendeo [semana de 14 a 19 de Novembro] em setenta e quatro velas de
sevo pera os pedreiros e pintores trabalharem de serão e antes que amanhese (...)
quatrosentos e quarenta e oito rs ...........................................................V 448
Despendeo [semana de 14 a 19 de Novembro] dous mil rs que deu a Joze descovar
pintor per conta das pinturas que vai fazendo na Misª ......................................2V000
Despendeo mais mil e duzentos rs de sinquo pedras grandes de quantaria pera se
fazerem as reprezas da caza do despacho da Misª a duzentos e quarenta rs cada
pedra os quais também se derão ao pintor por conta da pintura da Caza do des‑
pacho e do feitio do retavolo do ospital que o senhor dom fernão martinz mandou
fazer por sua conta e as cinco pedras erão do dito senhor .....................1V200
Despendeo [semana de 2 a 7 de Janeiro de 1606] oito sentos rs que deu ao pin‑
tor Joze descovar por conta das pinturas que faz na mizª ............................V800
Despendeo [semana de 9 a 14 de Janeiro de 1606] trezentos e cincoenta rs
da cavalgadura em que o Pintor José descovar foi a évora ........................ V350
Despendeo [semana de 16 a 21 de Janeiro] quatro mil seiscentos e cincoenta
rs de treze livros de ouro pera o retavolo da Misª .................................4V650
Despendeo [semana de 16 a 21 de Janeiro 1606] quinhentos rs que deu a
José descovar por conta da pintura que faz no retavolo e mais pinturas ... V500
Despendeo [semana de 16 a 21 de Janeiro] mais dous mil rs que deu ao mesmo
Joze descovar por conta das pinturas que faz na Mizª ..........................2V000
Despendeo (Fevereiro de 1606) dous mil e seiscentos rs que deu a Joze descovar
por conta do que se lhe deve das pinturas da egreja ..............................3V690
Despendeo mil e quinhentos rs que deu a Joze descovar pintor por conta das pin‑
turas que f[e]s na Misª ......................................................................1V500
Arquivo Histórico da Misericórdia de Montemor-o-Novo (A.H.M.M.O.N.), Lº de
Despesa dos Mordomos de 1605‑1606.

documento nº 42. 1608, 22 de Agosto. rol das peças de pa‑


ramentaria adquiridas pelo Arcebispo d. Alexandre de bragança.

Rol das obras que is per mandado de S.S. o sr. Allexandre


huã vestimenta de borcado emcarnado com seus sabastos de tella de prata com dous
foros hum de bochaim e outro de tafeta do feitio mil e quinhentos rs
It. huãs almaticas do mesmo de fral (sic) dois foradas tãobem com os ditos dous
foros de tafeta e bocachim quatro mil réis e seus reguacoIt. huã capa do mesmo
com dous foros forada mil e quinhentos rs
it. hum frontal de sinco panos para o altar mor mil rs
It. huã mangua de crus castelhana mil rs

335
It. hum pano de per tapas(?) cem rs
It. hum pano diguo bolsa de corporais cem rs
# hum pano de tumba guarnesido de tela e franjado todo a todo a roda seiscentos rs
# huã cortina de tafeta preto duzentos rs
# huã estolla e hum manipolo de veludo preto cem rs
# hum estolão de veludo preto cem rs
# seis alvas arochetadas e pespontadas e lauradas as manguas ate o cotovelo e com
sua renda e o cabesão do mesmo modo a mil e quinhentos rs cada huma de vinte
quatro pannos cada huã co seus amitos
# huã toalha para o altar mor sinqoenta rs
# mais mil rs que custarão as rendas das alvas
certtefico eu Antonio Arnao recºr da obra da see que as pessas todas comtheu‑
das asima nesse Rol fes ilena Carvalho vistimiteiro da see por mandado de S.S.
estam na Sancrestia entregues ao padre francisco Damaral vestimiteiro da see as
quaes pessas todas estão carregadas pero martinz ho spvi.
E por tendo ser verdade passei a prezente que assinei em Evora oje dous de da‑
gosto de seiscentos e oito anos
(aa) Antonio Arnao (?)
parece me que se lhe pode dar pelas vestimentas dalmaticas e pontais cada pessa
a novecetos réis e as aluas mil e duzentos réis por cada huã, e ho mais custo que
esta em seu preço accomodado oie(?) 13 de agosto de 608
(aa) Alvaro tinoco
na vestimenta almaticas frontal se lhe da mais cem réis vista a Informacão que
tomei, e ou tres cousas o que sera quer(?) se tenha respeito
(aa) Diogo pereira
\quinze mil e novecentos e cinquenta réis
dezanove mil e novecentos e cinquenta réis/
Dom Alexandre Arcebispo de Evora perpetuo administrador da fabrica da nosa
Santa Se (?) mando a vos padre manoel dias Recebedor das rendas da dita fabrica
que pagais a Ilena Carvalho quinze mil e novecentos réis (?) ca se lhe devem das
couzas que fez (?) serão da dita Se como parece das quatorze adicões do rol atras
e preços feitos pelo Licenciado Alvaro tinoco e pelo meu escrivão de voso(?) com
que(?) mande ao meu contador volos leue en conta per provizam a fez En Evora
aos 22 de Agosto de 1608 .
B.P.E,. Fundo Manizola, Cód. 75, nº 4 (Rol das obras que is per mandado do Dom Alle‑
xandre).

336
documento nº 43. 1609, Junho‑1611, maio. despesas com
pero vaz pereira, arquitecto do duque de bragança, por traçar a sa‑
cristia nova da sé de elvas.

A Pº Vaz Pirª, architecto de Sua Exª o Duque de Bragança, oito mil rs de duas
vezes que veo a esta cidade sobre a obra da Sachristia e de fazer huma planta e
perilo pª a dita obra e cento e sessenta rs a Carvalho porteiro de a apregoar como
se vio por tres livransas assinadas pelo Senhor Bpº, a primeira das quoaes tem a
data de 11 de junho de 609 e a ultima a 18 de janrº de 610 ...............8V000
A Pero Vas Pereira architecto de Sua Exª o Duque de Bragança tres mil rs por
vir a rever a obra que se esta fasendo ................................................. 3V000
A.S.P., Livro de Receita e Despesa da Fabrica da Se de Elvas, anos de 1598 a 1638, ls. 58 vº,
63 vº e 68 vº. Referências em Mário Cabeças, 2004, p. 249.

documento nº 44. 1610, 9 de março. mercê de d. teodósio


ii a pero vaz pereira, seu arquitecto e escultor.

Pº Vaz prª Architecto, e Escultor do Duq. Nosso Sºr.


Ouve em Belchior Garçia tesoureiro des mil rs de que Sua0 Excª lhe fez merce
per huma vez por mandado feito em 9 de Março de 610.
A.H.F.C.B., Vila Viçosa, Mercês de Dom Theodozio, Ms.137, l. 303. Publicado por José
Teixeira, 1983, p.121.

documento nº 45. 1610, 10 de Julho. contrato do balio de


leça, rui de brito, com o pintor José de escovar, para afrescar a capela‑
‑mor da igreja de santa clara e um salão do seu palácio em elvas.

Saybam quoamtos este estromento de comtrato e obryguasão vyrem que aos des
dyas do mes de yulho do ano do nasymento de Nosso Senhor Yesus Christo de jm
bic e des anos em esta cydade de Elvas nas casas de morada e pousadas do Senhor
Comendador Ballyo Ruy de Bryto em presemsa de mym taballyão e das testemu‑
nhas ao dyamte nomeadas estamdo asy presentes o dyto senhor frey Ruy de Bryto
e bem asym Yosé d’Escovar pymtor e morador na Cidade d’Evora e ora estamte
nesta cydade de Elvas e llogo pello dyto senhor frey Ruy de Bryto foy dyto que ele
está comsertado com o dyto Yosé de Escovar para lhe aver de dourar e pymtar a
Capella, arquo e cruzeyro da Capella mor dos mosteyro de Santa Clara desta

337
dyta cydade de Elvas (…) de cores de fresquo o arquo gramde da Capella mor
será dourado de lavores sobre mordente de oleyo e tymtas do mesmo e lhe porá todo
ho ouro que quyzer o dito senhor comendador, mordente a oleyo e tymtas e dourar
e somente ho senhor comendador dará o ouro pera tudo e ho cruzeyro de syma do
arquo e ylharga até syma dos doys altares de São Framsysquo he Samto Amtonyo
será pymtado da mesma pymtura de fresquo com as mesmas tymtas fynas com que
for pymtada há Capella e a salla das dytas suas casas será muyto bem yesada e
pymtada de tymtas de tempera muyto boas de brutesquo e de llavores dyferentes
hums de outros por serem muytas as ffayxas e fryzos que tem e ao paos das asnas
que desem das quatro agoas hyrão de cores emtresalhados hums duma maneyra e
outras de outra e no fryzo em Redomdo de toda a caza hyrá hum llavor Romano
com paisageys e monteryas e llavor romano das mesmas cores de tempera e toda
esta obra muyto bem feyta cada huma dellas feyta com suas cores a capella de fres‑
quo e a salla de tempara lhe fará tudo por trynta e sete myll Reys em dynheiro de
comtado dos quoaes llogo resebeo o dyto Yoão, digo Yosé d’Escovar llogo peramte
mym taballião e testemunhas oyto myll Reys em dynheyro e o mays lhe yrá damdo
fazemdo a obra e será obrigado o dyto Yoze de Escovar a comesar a fazer a dyta
obra de quymze dyas do mes de Agos [to] em dyamte e não erguera mão della ate
não acabar e que o Senhor Comendador dará a madeyra e allvanes e as lhogias
nesesaryas pera ha dita obra e ele dyto Yoze de Escovar dará a ordem como se
amde fazer os dytos amdaymos pera ho dyto Yoze de Escovar obrygua seus beys
he fazemdas mays de Rays avydas e por aver a tudo compryr e mamter e promete
de numqua em tempo allgum yr nem vyr comtra este estromento de comtrato, etc.
A.D.P., Cartórios Notariais de Elvas, Lº 27, ls. 124 vº­126 vº. Leitura da Doutora Pa-
trícia Monteiro.

documento nº 46. cerca de 1610. notícias de algumas obras


realizadas no governo do Arcebispo d. teotónio de bragança. rela‑
ção anónima de início do século xvii 554.

Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança. Noticias do seu governo.


(l. a) Ho Snõr dom Theotonio de bragãça, ilho do duque dom gemez e da du‑
quesa dona Joanna de mendossa entrou por coadjutor e futuro sucessor do cardeal
dom Henrrique, Infante ilho delreidom Manoel de boa memoria, no Arçebispa‑
do de Evora que foi o anno que se perdeo el rei dom Sebastiam que foi no mês de
agosto de 1578 ho dito snõr dom Theotonio entrou na cidade de Evora no mês
de dezembro do dito ano de 78, dia de nossa Snõra da comcepsão e logo no anno
seguinte de 1579 no mês de maio tomou ho palio de Arcebispo por se ter nelle o

338
cardeal dom Henrique que o avião alevãtado por rei de Portugal por morte de elrei
dom Sebastiãm, tomou o palio erm Lixª o dito Snõr na igreja do carmo ho qual
lhe deu ho Arçebispo de lxª e asistio ho bpo de arnas (?) dom Antonio Mendez,
e outro estranjeiro (sic) e tornoua Evora tomado despacho no mês de maio do dito
anno de 1579 donde esteve residente ate ho mês de maio de 1580 no qual tempo
avia falecido ho rei dom Henrique neste mês ouve peste em Evora que durou do
dito mês de maio ate janrº de 81, no qual tempo entrou elrei fellipe 1º em Elvas
primrº lugar deste reino que conina com a Cidade de Badajos ultima de Castela
e visinha de Elvas, nesta peste que ouve em Evora e em outros lugares do Arcebpº
como foi em Estremos, Vila viçosa, redondo, no Campo de ourique, castro verde e
outros, nesta cidade se fez casa de saúde em Sãto Andre e em todo o que he cam‑
po ate adonde agora he o mostrº dos caramelitas descalsos, foi o snõr dom Theo‑
dosio então no im pª Portel adonde esteve pouco tempo, e dali se passou ao lugar
da Vera crus termo da dita vila de Portel e Pª dali dar expedição e prover toda
a cidade de Evora neste tam grande mal.
(l. B) E não somente deu ordem pª que a See fosse ornamentada e acresentada
com muitas obras, mas na cidade fez muytas e muj aventuradas, primeiramen‑
te acabou o moestrº de santo Antonio, mosteiro de frades descalços, donde gastou
muito perto de vinte mil crusados. Trouxe os pp. cartuxos a esta çidade e os teve
aposentados nos passos delrei, junto a porta do Rosio. E logo dali a tres ou qua‑
tro annos começou a ediicar hum sumptuoso mostrº ao qual deu de renda quatro
mil crusados, e começou a fundar com 3 pp. catelanis (sic) despois procedendo esses
entrarão mães clérigos portugueses e outros estudantes. Ho mostrº se vai fazendo
com a mor traça e arteiçio admirable e ho que esta feito he causa de mtª magni‑
icentia e acabado será o melhor edifício de Espanha.
Fez ho hospital dos pobres da Piedade e lhe comprou humas casas que forão do
barão por mil crusados, no qual hospital se recolhem e entrão molheres e homens
e pessoas ao qual hospital dava de pão cada mês tres moios e doze mil rs em drº,
e isto icou por sua morte como ordinaria no Arcbpº, a qual esmola se vai sem‑
pre continuando ate que he Arcº ho sõr dom Joseph de Mello, que dá toda esta
esmola e muitas mais aventuradaente, e assim se irá sempre perpetuando porque
as obras começadas pelo sõr dom Theotonio que por sua virtude e ilustre pessoa
sempre irão de bem em milhor como vão.
Trouxe também os frades carmelitas descalsos a este reino, e os aposentou em huma
irmida de nossa Snõra dos remedios donde antiguamente se curavão enfermos de
sertos males, hoje estes religiosos tem hum mostrº fora dos muros à Porta dalcon‑
chel, que quasi tem acabado com esmolas que a cidade lhe fes e faz. Fundou o
mostrº de freiras do Salvador, freiras de s. frcº ao modo das capuchas, e pª o fundar
trouxe quatro freiras de Sta marta de lixª do mesmo habito, e as aposentou em
hum mustrº muito pequeno donde antiguamente (…) (falta parte do documento).

339
(l. 1) deixando na cidade pª as cousas da justiça ao ldº rui piz da veiga, viguairo
geral que então era, ho qual adoeçeo, e entrou em Santo Antonio, mustrº de S.
frcº descalso. Na cidade pª as cousas dos enfermos deixou a pº Roiz seu veador,
e a Alvaro tinoco tesoureiro da capela e mestre das ceremonias do dito Arcebpº,
e a Nicolao Agustinho, seu capelão, e ao licº domingos martins, que despois foi
cónego da See devora, dahi a poucos dias mandou ir para sim ao veador e a ni‑
colau agostinho, icou Alvaro tinoco nas casas episcopais somente com hum com‑
praxdor, e domingos martins pª dar ordem a todo o pão que fosse necessº pª os
feridos e pobres da çidade e se lhe entregarão duzentos moios de trigo quatorze ou
quinze amassadeiras que fazião o pão e todo se deitava nas tulhas do seleiro dos
dízimos, e dahi se repartia assim pª a casa da saude, como pª a ssidade. (l. 1
vº) Alvaro tinoco dava todo ho drº necessário e provia de carne de carneiro e g.ªs
assim a Casa da Saude como a cidade, e se entregava pª a cidade a dous padres
da Companhia que andavam neste ministério pola cidade com aquatro machos
carregados assim de pão como de carne e gªs. E armavam toda a cidade dado a
cada casa ho que era neçessº de huma e outra cousa, e isto se fazia todos os dias.
Pª a casa de Saude todos os dias levavão quatro e sinco e seis cargas de pão e os
mais dos dias trinta e sinco carneiros afora galinhas e se entregava ao padre frei
martinho, frade de Sam paulo, que nunqua foi doente em todo o tempo da peste e
fazia este ministério e confessava, na casa avia outro frade leigo de S. frcº que era
homem basso, natural do algarve, estava fora do mustrº professo na terra mar‑
gem (sic), que sempre curou os apestados. E dantes da peste esteve muitos anos
nesta cidade na capela de nossa Snõra dos remedios donde todos os anos curava
duas veses todos os doentes, assim de frieldade como de doença francês. (l. 2) Este
padre leigo morreo na casa da Saude curando os apestados, hum padre da Com‑
panhia chamado Francisco Roiz, hum do Carmo, mancebno na cidade, morreo
hum padre da companhia que se chamava o padre freitas, morreo outro padre da
companhia que se chamava gªr roiz, que se meteo na companhia, era clérigo de
missa natural de campo de ourique, morreo hum padre da piedade frei jeronimo,
natural de Vila Viçosa, moço que avia sido das chaves do duque de bragamça,
morreu ho p.e paulo de sena, clérigo que confessava em sã sebastião, e por ordem
do Arcebpo andavam pelo campo e pelas quintas tres padres do habito de S. pº
a confessar por ordem do Arc.pº a que se dava a cada hum 350 rs cada dia, e
comer pª eles, e gtambem se lhe dava tudo o que pedião de pão e carne pª a gente
pobre a que hiam confessar, e avia seis homens vestidos de bocaxim que enterra‑
vão na cidade e que levavam os apestados a casa da Saude, a todos estes pagava
ho Arcebpº e de comer (l. 2 vº), na cidade também morreo hum padre de S. do‑
mingos que chamavam fr. Joam da mota, natural de Estremos, a todos estes pa‑
dres, assim da companhia como das outras ordens, mandavaselhes todo o neçessrio

340
abundantemente, e pousavão no colegio donde estão os moços de choro, outros nas
casas de dona maria branca (?) e outros na casa de de Joanna da cunha. Clérigos
de sam pº andavam na cidade a confessar, ho p.e banha, ho p.e Manoel da costa,
ho p.e Manoel roiz, o p.e belchior frz que despois foi bacharel, que ho Arçebpº
lhe deu, e aos outros. Acabada a peste mandou dar ho snõr dom Theotonio vinte
crusados cada anno, somente elle morreo.
A cidade e todo governo della se dava de casa todo o neçessº assim a meirinhos
como a juiz que a que icarão como foi Fernão (?) roiz de gois que icou por juiz
e hum seu ilho por alcaide, e joam godinho por meirinho. Dous sangradores a
que davão doze mil rs cada mês e de comer e hum cavalo em que andasse e comer
pª elle icou aqui mestre belchior medico, a que se dava tudo quanto podia (l. 3)
depois ho despachou elrei felipe quando veio a esta cidade com sesenta mil rs de
tença, e ho habito de sam tiago por este ministério.
Em aquele tempo mais de quarenta meninos mtº pequenos de hum anno ou dous
e mtºs pobres, o senhor dom Theotonio mandou a rodrigo alvares, capelão que era
do hospital, que trouxesse cargo deles e lhes buscasse amas, as quais davam cada
mês seis tostões e comer que lhes fosse neçessº. Ho senhor dom Theotonio estando
na Vera Crus mandava todos os duas duas azemollas carregadas assim de mel, e
asuquar que mandava buscar (…) por lixª estar também então com alguma peste
(…), e todas as semanas vinhão carneiros vivos em mta cantidade que mandava
buscar do campo de ourique, e sempre esta cidade pª todo governo de gente doente e
pobre esteve abundantíssima de tudo que na butica tudo o que fosse nerçessº man‑
dado ao buticario, assim mel, azeite e ovos e outras coisas (l. 3 vº) que lhes erão
necessárias pª fazer mesinhas e purgas (…). E juntamente nesta peste acudio a
todos os lugares donde avia com gasto e esmolas, comol foi Estremos, vila Viçosa,
Araiolos, Campo dourique. Acabada a peste, teve por seu esmoler a jorge pinto,
que então era quartenario e depois foi coneguo meo aprebendado, ao qual dava de
ordenado trinta mil rs e cada mês se lhe entregava cinquwnta mil rs pª as esmo‑
las ordinárias afora as que o snõr Arcebispo dom Theotº mandava dar, que eram
muitas que se faziam, assim que por via dos padres da companhia dava cada
anno todas as misericordias do seu bispado setta esmola de drº conforme aos povos.
(l. 4) (…) Acabada esta peste se aleuantou bandeira de saúde e ho snõr dom the‑
otonio entrou na çidade e a 3 dela foi a elvas a beijar a mão da majestade de elrei
fellipe donde esteve poucos dias, e se tornou a sua Se e começou a entender nella e
a que ornamentar, que estava muj falta de ornamentos e prata, e começou a en‑
tender com a obra e tinha deitado fora de recebedor a hum joam de crasto criado
do cardeal e fez então a Antonio Simões.
Tendo a obra de renda chegado escassamente a tres contos e destes paga a compa‑
nhia duzentos e catorze mil e tantos rs – 214V000 – neste anno de peste no im

341
dela que entra o anno de 681 (sic) mandou fazer hum ornamento de tella branco
com tella rozada e sete capas, frontal, casula e duas dalmáticas que custou seiscen‑
tos mil – 600V – e logo no im deste anno se comprarão em panos de tella que
foram da infanta dona maria por seiscentos mil rs – 600V. (l. 4 vº) No anno de
1582 se izeram trinta capas de damasco branco capelos e outras de tela amarela.
Mais dez vestimentas de damasco branco, quatro para conegos seis pª beneiciados,
as dos conegos com chevastos (sic) enteiros de tela amarela. Mais se izerão huma
vestimenta pª ho altar mor e duas dalmáticas tudo em pano enteiro de tela ama‑
rela. Mais des frontais para o cruseiro, altar mor e nossa Snõra tudo de damasco
branco bases e mangas e sobre frontal de tella amarela mais hum pano de púlpito
de damasco branco, com tela amarela pano de estante des das estantes da Se, hum
pano da porta pas, manga da crus, tudo em bocaxim e franjado de seda e ouro.
Verde. Fizeramse de damasco verde nove frontais e canastras de veludo verde. Dez
vestimentas de damasco verde, 4 de conegos com sebastros de veludo e seis para be‑
neiciados com baras de veludo (sic) tudo frania com seda verde foradas de bocaxim
/(l. 5)/ de veludo verde para oaltar mor hum frontal, huma casula, duas dalmá‑
ticas, huma capa tudo com xanastras inteiras de tela branca, hum pano de púlpito
do mesmo, e mtº pano de estante, e pª as estantes do altar mor hum pano de porta
pas tudo com, franjas de verde prata e seda. Mais duas capas de veludo verde com
seus xavastres para a cõpanharem ao sábado ao que sustenta a tarde quando cin‑
za da dominga. Manga de veludo verde e tela branca. No ano de 89 se izeram
duas mantas de veludo roxo pª as domingas do avento, dous estolães (sic), hum de
veludo roxo e outro de damasco roxo. De veludo negro, frontal pª o altar mor duas
dalmáticas, huma vestimenta e hum estolam, hum pano mui grande pª sobre a tum‑
ba sexta frª de emdoenças. De damasco carmesim huma capa palio, manga de crus
pª o Santissimo Sacramtº (l. 5 vº) izeram neste tempo de veludo negro tres vesti‑
mentas de sexta feira de Endoenças para o cruciixio com xauastras de tela ama‑
rela. Mais se fez huma capa de tela negra com franjão de ouro e seda. Mais hum
pano pª o altar mor borlado detrás da crus. Mais huma manga negra pª a crus.
Fez neste tempo ho Sepulchro que passou de seiscentos mil rs, que sempre se usou
(…), neste tempo deu ordem que ouuesse sera branca ina que ate entam não se
costumava nem usava por falta de diligencia, e mandou hum escracvo seu que cha‑
mavam Sousa que fosse a Valença aprender a serieiro, e fez esse a sera branca
ina e a fez nesta Se ate que morreo, ho escravo era índio e se chamava Sousa.
Neste tempo no ano de 1592 ordenou fazer outro ornamento grande pª as fes‑
tas principais pª ho qual deu ordem pera Florença e mandou pintado em papel
grosso todos os xavascos e capelos de capas pera tudo vir daquela pintura, o qual
ornamento tem vinte e nove capas todas das cavastras de borcado branco. (l. 6)
Os corpos de vinte e huma são de tela rasa e sete de tela frizada com alcachofras

342
de tres altos, huma capa pª ensenso e do altar mor de borcado, huma vestimentas
do mesmo, e duas dalmáticas, hum frontal, tudo de borcado e hum pano de púl‑
pito, hum palio do mesmo. Panos de estante. Mais nove frontais pª ho cruzeiro e
pª nossa Snõra de tela rasa branca com xanastras frontaleiras e mangas de tela
rosada, huma manga de crus de borcado branco, tudo isto com franjas de po de
ouro e prata com seda. Mais huma capa de brocado amarelo com hum capelo te‑
cido de ouro com huma nossa Snra que custou esta capa sento e vinte mil rs e que
he do altar mor todo forrado de tafeta dobrado e tudo o mais forrado de bocaxim.
Fez na Se o painel de Nossa Senhora no altar mor o que esta no alto do retavolo
que custou duzentos crusados. Fez a torre que caio de hum raio que custou maes
de duzentos mil rs. Pª os altares e capela mor onze alcatifas de Castella quatro
centos crusados. (l. 6 vº) Fezse outro ornamento de veludo carmesim de tela capas
frontal casula dalmáticas pª o qual quando morreo tinha comprado com côvados de
veludo posse em excusas em se vacante na sua morte. Tinha então posto hum valle
de dois mil e quinhentos crusados da obra para começar outro ornamento rico em
Florença o qual se não fez nem começou com sua morte. E ho cabido em Se vagãte
arrecadou ho drº e se gastou no que se ordenou emtam que foi o fazerem as ma‑
ças e outras coisas. (n: Também se fez ornamtº de veludo negro para os defuntos).
Prata. Comprou e fez de prata as pessas seguimtes. Huma alampada que tem
seis arrobas de prata a maior pessa e de milhor feitio que tem Espanha, fez dous
tocheiros de muita grandura como se ve, fez hum são Sebastião de vulto de prata
que custou quinhentos crusados, fez huma alanterna de prata, fez hum peramede
(sic) donde esta a relíquia de Sam Manços, tudo isto mujto presso.
(l. 7) Quis fazer a capela mor mais larga e comprida, para ho qual tinha já lavra‑
do pedraria que custou alguns tresentos mil reis, da qual não se pos por obra por o
Cabido anterior, e a pedra se vendeo e se gastou com mujto pouco proveito. Comprou
pª a credencia do altar mor hum jarro dourado de bastians (sic), hum gomil, hum
saleiro, tudo de muita grandesa e feitio, e huma bacia de prata e servindo alguns an‑
nos neste ministério do culto devino se apartou da Se e se deu para uso profano por
ordem do senhor dom Joseph de mello, ho como se pode fazer deixo a juízo de quem
ho quiser julgar. Fez na See no amte choro a porta que serve pª a crasta e as escadas
com hum corrimão de ferro. Fazendo‑se tudo isto em 23 annos, que pouco mais foi
tempo, se gastaram mais de quarenta mil crusados.
(l. 7 vº) Ainda houve em todo este tempo ho Collegio dos moços do Choro no qual
sempre ouue quatorse moços de choro que oyto Collegiais que aprendiam latim que
eram dos mesmos moços de choro, e depois que sabiam musica emendavam os tiples
(sic) o qual se sustentava a conta da fabrica, pª o qual tinhão hum reitor clérigo
omrrado e de boa vida e comumente era beneiciado da See (…). Houve neste tem‑
po nove caponis (sic) e meninos taples que ho snõr dom Theotonio mandou buscar a

343
castelã de dez ate doze ou treze anos. Recebeu mais (como mestre de capela) francisco
lopez, natural da (…) de monte alvas, que depois de servir ate des ou doze anos foi
cantor na capela delrei em lixboa, e ahi morreo, o 2º foi Jeronimo Sacedo, natural
de Barsente, junto a toledo, muito bom compositor (…), o 3º Gregorio guerreiro, na‑
tural de Madrid, ora em lxª, cantor del rei, o 4º luis concha na mesma capela (…).
(l. 10) (…) Da Companhia, Domingos Pina, mui abil na muzica, oje na India
de Portugal, donde lê theologiae foi rector de Salsete. Em Sam fr.cº, de abelida‑
de, hum ilho de bras de igeiredo, frei Manoel, que falleceo em beja, e fr. Frcº do
crato, e fr. Frcº de evora, e fr. Estevão Leão, de boas abelidades na musica, oje
vivem. De sam Domingos dous, hum (…) que se chamava morais, outro vive e se
chama fr. Francisco de evora. Do Carmo, dous, hum natural de Palmela, e outro
do crato. Todos estes foram no tempo do senhor dom Theotonio, dos quais resta ho
licenciado Alvaro Francisco (?) que foi bacharel na See e hoje conego. Em Santo
Augostinho, o pe fr. Martinho, natural desta cidade de Evora, de muita abelidade
na musica, ho pe frei Joam da Silva, natural de monte mor, musico o milhor tenor
que tem Espanha, ho padre fr. Nicolao freire, natural de Estremos, mui grande
contralto, fr. Joam da Rosa, desta cidade de Evora, mui grande contralto, o pe fr.
M.el pousão, natural de alandroal, mui abil na musica.. (l. 10 vº) Ho padre fr.
Antonio madeira mui abil na musica, e pregador e mºr na India oriental, e fr.
Manoel Roiz, pregador e mºr na India, natural de Alvito.
B.N.P., Reservados, MSS 29, nº 50, Arcebispo de Evora D. Theotonio de Bragança. Noticias
do seu governo. Início do século XVII. In­4º, 12 ls. Documento em mau estado, que
pertenceu a Manuel Severim de Faria.

documento nº 47. início do século xvii. lista de pinturas


e tapeçarias doadas por d. teotónio de bragança ao mosteiro da
cartuxa de Évora.

Liuro da Carthuxa de Scala coeli de que o illustrissimo e Reverendissimo Se‑


nhor D. Theotonio de Bargança Arcebispo de Euora lhe fes doação sendo fun‑
dador da mesma casa.
Retavolos (l. 7 vº)
It. hum Retauolo em arco de duas peças na huma tem nossa Senhora e São João
da outra são Joam e nosso Senhor.
It. quatro peças de Retauolos que se fechão como Livro.
It. quatro Retauolos de nossa Senhora de Graça.
It. hum Retauolo do Retrato da igura de nosso Senhor.
It. hum Retauolo como porta paz com a igura de sam João Bautista.

344
It. hum Retauolo de penas com hum cruciixo e a igura do emperador
Retauolos (l. 8)
It. hum menino Jesus d’alabastro.
It. hum retrato da cruz de sam Tome que veyo da yndia.
It. huma igura de nossa Senhora dalamtiga (sic).
It. huma porta paz de marim de vulto de nossa Senhora da Graça.
Tapeçaria (l. 18)
It. vimte e seis panos – e três guarda portas das Istorias del Rey Salomão e de el
Rey Acab – E da Rainha Ister de laam (…).
Tapeçaria (ls. 18 vº a 20)
It. omze panos da Istoria de Romulo (…)
It. quatro panos do testamento velho (…)
It. três panos da Istoria de Trajano (…)
It. cimco panos de deferemtes Istorias (…)
Retratos (l. 49)
It. hum Retrato delRey.
It. outro da Rainha nossa Senhora.
It. outro delRey dom Fernamdo.
It. treze Retratos de prinçepes.
It. hum del Rei dom Filipe.
It. outro do emperador Carlos.
It. outro do Infante dom Carlos.
It. três da Rainha dona Isabel.
It. hum da Rainha dona Joana.
It. outro da Rainha dona Maria Regente de frandes.
It. outro da Rainha de Dinamarca.
It. outro da enperatriz dona Isabel.
Retratos (l. 49 vº)
It. hum Retrato de huma dama que por egenho lhe bolem as meninas dos olhos.
It. outro da primçesa de Dinamarca.
It. outro do principe dom Felipe de castella.
It. huma cruz comtrafeita que são Tome fez.
It. huma igura grande em pano de linho.
It. hum purgaminho comprido de peças de gelosia de Reis e primçepes.
It. duas fundas de vaca pera dous Retratos.
A.N.T.T., Códices e documentos de proveniência desconhecida, nº 64. Sem data, apresenta
uma etiqueta na pasta superior da encadernação com a informação Cartuxa de Évo‑
ra. Referência em F. M. de Sousa Viterbo, 1903, p. XIII. Comunicação do senhor
Dr. Francisco Bilou.

345
documento nº 48. 1611, 29 de outubro. paga de d. teodó‑
sio ii a pero vaz pereira, seu arquitecto e escultor, pela obra de uma
chaminé para o paço de vila viçosa.

Pº Vaz prª Architecto, e Escultor do Duq. Nosso Sºr.


Ouve no dito thesoureiro tres mil rs de que Sua Exçelencia lhe fes merçe para fazer
hua chaminé nas suas Casas per portaria do Secretario feito em 29 de outubro de 611.
A.H.F.C.B., Vila Viçosa, Mercês de Dom Theodozio, Ms.137, l. 303. Publicado por José
Teixeira, 1983, p.121.

documento nº 49. 1614, 23 de Junho. Ajuda dada por d. te‑


odósio ii a pero vaz pereira, seu arquitecto e escultor, para as obras
de sua casa em vila viçosa.

Pº Vaz prª Architecto, e Escultor do Duq. Nosso Sºr


Ouve no dito, digo, em Balthesar Roiz de Abreu, thezoureiro, vinte mill rs de que
Sua Exçelencia lhe fes merçe para ajuda de fazer sua Casa por provisão de 23
de Maio de 614. Ouve Sua Exçª por bem de fazer merce ao dito Pº Vaz Perª.
A.H.F.C.B., Vila Viçosa, Mercês de Dom Theodozio, Ms.137, l. 303 vº. Publicado por
José Teixeira, 1983, p.121.

documento nº 50. 1614, 23 de Junho. mercê dada por d. te‑


odósio ii a pero vaz pereira, seu arquitecto e escultor, de ordenado.

Pº Vaz prª Architecto, e Escultor do Duq. Nosso Sºr.


Ouve Sua Exçª por bem de fazer merce ao dito Pº Vaz Perª. De vinte mil rs de
merçe ordinaria e hum moio de trigo de ordenado em cada hum anno emquanto
o ouver por bem e não mandar o contrário e ele o servir autualmente conforme as
condições da Carta geral per duas provisões feitas em 23 de Junho de 614.
A.H.F.C.B., Vila Viçosa, Mercês de Dom Theodozio, Ms.137, l. 303 vº. Publicado por
José Teixeira, 1983, p.121.

documento nº 51. 1617. inventário de bens e despesas feitas


na casa de d. fernando de castro, 1º conde de basto.

(l. 227) Despeza que Francisco Cordovil fés em iferentes pessas de madeira nos
mezes de Junho e Julho Anno de 1617.

346
Onze mil e quinhentos reis por hum contador da India lavrado de marim que se
comprou por via de Antonio Pereira marcieiro ...................................11V500
Quinhentos e oitenta reis ao dito Antonio Pereira de conserto do contadorV500
Taboa pª escrever cuberta por veludo negro cairellada de ouro
Oitenta reis da obra .............................................................................. V080
Setesentos e vinte e sinco reis de meio côvado de veludo negro para a cubrirV725
Cento e vinte reis ao bainheiro de lhe asentar o velludo ........................... V120
Trezentos e oitenta e dous reis de seis outavas de ouro que levou os caireis a 26
reis a oitava .......................................................................................... V382
Duzentos reis feitio dos caireis ............................................................... V200
Escrivaninha de pão pretto com seu tinteiro e pueira thezoura canivete e lanse‑
ta dourado.
(l. 221 vº) Tres mil e quinhentos reis a Antonio pereira da escrivaninha de pao
pretto e das gavetas com sua fechadura e chave .....................................3V500
Quatrosentos e vinte reis de hum tinteiro com seu chumbo e pueira de pao pretto..... V420
Quinhentos reis da thezoura canivete e lanseta ....................................... V500
Quatrosentos reis do dourado da chave de cortado .................................. V400
Cem reis do dourado da chave do cortado ............................................... V100
Cento e vinte reis ao bainheiro de forrar de veludo o lugar das thezouras V120
Bofetinho de pao santo com faxas de pao pretto e peris de marim com duas ga‑
vetas e ferragem dourada.
Quatro mil reis a Antonio perª marceeiro deste bofetinho .....................4V000
Seis sentos reis de dourar de cortado seis perafuzos com suas chapas e chave deste
bofete ................................................................................................... V600
Bofetes de nugueira.
Quatro mil e quatro sentos reis a Antonio Dias marceeiro de dois bofetes de nu‑
gueira de sinco palmos e meio de comprido e três de largo ......................4V400
Mil e oitenta reis de quatro aldrabas com seus perafuzos e oito machefemeas tudo
estanhado ............................................................................................2V080
(l. 222) Tres mil reis de hum bofete de nugeira de seis palmos e meio de comprido
e quatro de largo com sua taboa per baixo .......................................... 3V000
Trezentos e vinte reis de quatro machefemeas estanhados pª este bofete a oitenta
reis cada huma ..................................................................................... V320
Doze cadeiras com os coiros de Moscovia pespentados de retros amarello e pregos
de latão oitavados dourados.
Oito mil e quatro sentos reis a Antonio dias de doze cadeiras de nugueira a 700
reis cada huma................................................................................... 8V400
Tres mil e seiscentos reis de seis couros de moscovia que se tomarão a alfandega a
seis sentos reis cada hum .....................................................................3V600

347
Oitosentos e oitenta reis de onse carneiros atamarados para forro dos emcostos a
oitenta reis ............................................................................................ V880
Seissentos reis de doze asentos de cabello a sincoenta reis cada hum ........ V600
Novesentos e des reis de doze varas de calhamasso a 70 reis ................... V910
Mil e quinhentos e setenta e sinco reis de dosentos e seis oitavas de retros pª o pes‑
ponto ..................................................................................................1V575
Mil e seis sentos e oitenta reis de vinte e quatro arratens de arobas de boi a sa‑
tenta reis .............................................................................................1V680
(l. 224) Leito de pao santo guarnesido de pessas de Bronze dourados tem de Al‑
tura des palmos, des de comprimento e sete e meio de largo.
Vinte e tres mil reis a Thome Coelho torneiro per o dito leito de pao santo com todas
as pessas de bronze e parafuzos oitavados com sua chave tudo por durar....24V000
Seis mil e quinhentos reis a Domingos Rodrigues dourador de dourar de moído to‑
das as pessas de Bronze e de cortado os oito perafuzos com suas chapas ... 6V500
(l. 226) Despeza que Francisco Cordovil fez em algumas pessas e outras couzas
nos meses de Junho e Julho Anno de 1617.
Armação de guadamexim de couros de marzamaior cubertos de ouro e prata verde.
Noventa e oito mil e des reis a Jeronimo Fernandes guadamecineiro de quinhentos
quarenta e quatro couros e meio de morcamases enbrando tres sanefas per cada
couro em que se armarão duas cazas em Santo Antonio do Tojal a 18 reis cada
coiro..................................................................................................98V000
Paramento de leito de damasco amendoado de Granada com guteiras e rodapees
de tella verde e cubertor do mesmo damasco com suas franjas e alamares de oiro.
Satenta e quatro mil e sem reis de satenta e oito côvados de damasco, a saber, sin‑
coenta e sinco para as quartinas e seos e vinte e sinco para o cubertor a novesentos
e sincoenta rs cada .............................................................................74V100
A.H.F.E.A., Inventario que se fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor Conde
de Basto dom Lourenso pires de Castro que faleseo em Catalunha no lugar de fraga sem descen‑
dentes deixando por sua universal herdeira a senhora Condessa de Basto Dona Violante de Len‑
castre sua molher.

documento nº 52. 1619. descrição das pinturas a fresco rea‑


lizadas no Arco da porta de Alagoa, pelo pintor custódio da costa,
a mando do senado da câmara de Évora, para a entrada real de fi‑
lipe iii que decorreu a 14 de maio.

(…) o primeiro (arco) se pintou a fresco na porta da Alagoa por onde havia de
ser a entrada, servindo de arco a mesma porta; sobre ella se levantou uma fa‑

348
brica sobre quatro columnas doricas que fazião tres vãos, cada hum dos quais
se repartia em dous paineis hum superior e outro inferior, rematandose toda a
Obra em hum frontispicio de cornijas que acabava em porta no meio da qual
estavam as armas do Reino; no painel superior que se fazia entre as duas co‑
lumnas do meio que icavam sobre o arco de entrada estavam pintadas as San‑
tas Martyres e irmãs Sabina e Christeta naturaes desta cidade; e no painel que
lhe respondia da parte direita entre as outras columnas icava o seu irmão São
Vicente martir, e no outro da porta esquerda o bemaventurado São Mançio,
discipulo de Christo, primeiro bispo de Evora, que nella foy martyrisado; debai‑
xo das santas se pintou a cidade de Evora coroada de espigas tendo em huma
mão huma salva com chaves de suas portas, e na outra huns ramos de olivei‑
rea, parra, e fructos; da banda direita tinha o Tejo, e da outra o Rio Guadia‑
na, e por baixo estes versos: ‘A mão, que conhecer desejam Seytas, Que os bens
abrindo regue o novo mundo, Lybia enfrea, Asia assombra, Europa ampara,
Tome as chaves das portas e dos peitos. Prostrada aos pés, que pizam monar‑
chias, A maior entre vós, Guadiana e Tejo, Dóes mostro, que em mi prodigas
derramam Minerva, Pallas, Ceres, Amalthéa’. No painel que respondia a este
da parte direita estava a igura de Sertorio, e no outro da esquerda o Capitão
Giraldo, que recuperou a cidade do poder dos mouros, a pé, armado, com as
duas cabeças nas mãos» 555.

A.D.E., Lº 4º de Registo da Câmara, l. 220 e segs.; publicado por Túlio ESPANCA,


1952, pp. 161-162.

documento nº 53. 1622, 27 de Abril. Ajuda dada por d. te‑


odósio ii a pero vaz pereira, seu arquitecto e escultor, para um ves‑
tido para a Joyeuse Entrée de filipe iii em lisboa.

Pº Vaz prª Architecto, e Escultor do Duq. Nosso Sºr


Ouve Sua Exçelencia por bem de fazer merce ao ditto Pº Vaz Pereira de sette
mil rs de que S. Exçª lhe fez merçe pera o vestido que fez em Lisboa na vinda de
Sua Magestade a este Reino e se lhe passou mandado para Manoel Foreiro lhos
pagar, feito em 27 de Abril de 622.

A.H.F.C.B., Vila Viçosa, Mercês de Dom Theodozio, Ms.137, l. 303 vº. Publicado por
José Teixeira, 1983, p.121.

349
documento nº 54. 1643. inventário dos bens de d. violante
de castro, viúva do 3º conde de basto d. lourenço pires de castro.

Anno do nascimento de nosso senhor Jesus Christo de mil seiscentos quarenta e


trez annos. Aos dezaseis dias do mez de Abril do dito anno nesta Cidade de
Evora nos passos do Conde de Basto que Deos tem, estando ahi prezentes o Le‑
senseado Francisco Moreira de Freitas juiz de fora dos órfãos e de alçada per el
Rei nosso senhor nesta cidade e seu termo, e sendo prezente a senhora Dona Vio‑
lante de Lancastre, condessa de Basto, o dito juiz lhe deu juramento dos santos
Evangelhos pera que a dita senhora pôs sua mão sob cargo do qual / [l. 4 vº]
lhe encarregou na verdade declararem‑se os herdeiros que icarão per morte do dito
seu marido assim prezentes como auzentes, e seus nomes e idades e dê‑se a in‑
ventario todos os bens de que icara e estava de posse, assim de raiz como moveis,
dinheiro amoedado per peças de ouro e de prata, auções, dividas que se devam à
casa, e o que a casa deve, e tudo o mais que por qualquer via pertensa à casa, e
a dita senhora Condessa aseitou o dito juramento e assim o prometeo de fazer, e
sob cargo delle declarou que do Conde seu marido não icarão ilhos, descenden‑
tes nem ascendentes, e que ella icara por sua universal herdeira como constava do
testamento que aprezentava, e que queria ser herdeira a beneicio de inventario,
e que não tinha duvida que elle juiz izesse inventario, e que lhe mandaria dar
e nomear a inventario todos os bens do casal e dividas que o casal deve, e assim
mandou aos avaliadores os avaliassem e de tudo o juiz mandou fazer este auto
que asinou com a ditta senhora Condessa e avaliadores, Manoel Dias Rebocho,
escrivão dos órfãos, o escrevi.
(aa) Condesa – frcº Mendes parocho – Frcº Moreira de Freitas – Jacome Alvrs

[l. 5] Aos des dias do mes de marso de mil e seissentos quarenta e quatro an‑
nos nesta cidade de Evora nas pouzadas da senhora Condessa Dona Violante
de Lencastre, Condessa de Basto, estando ahi presente o lesenceado Francisquo
Moreira de Freitas, juiz de fora dos órfãos com alçada por el Rei nosso senhor
nesta cidade e seu termo, perante elle pareseo Sebastiam Ribeiro de Faria, cava‑
leiro do habito de Christo, procurador da dita Condessae requereu a elle juiz que
perquanto se tinha feito inventario da fazenda que icou do senhor Conde Dom
Diogo de Castro requeria a ele juiz mandasse conrtinuar com este pello auto de
juramento atrás feito, porque já se tinha noticia dos bens que se avião de asentar
que por se não ter foi causa de dilação e per outros respeitos, o que visto pello dito
Juiz mandou que se continuasse de que mandou fazer este termo que asinou, Ma‑
noel Dias Rebocho escrivão dos órfãos que o escrevi.
(aa) Frcº Moreira de Freitas – Rocha – Alveres.

350
[l. 5 vº] Titollo das Joias.
Trezentos botoins de ouro calados e matizados de negro com cada hum seu dia‑
mante, os ditos trezentos botoins forão entregues em casa de Duarte Fernandes, e
ao prezente estam em casa de Diogo Rodrigues de Lisboa, duzentos e noventa e
nove e tantos se pezarão e pezão seis marcos, seis onças e seis oitavos, que valem
duzentos sasenta e dous mil e oitosentos reis, e os diamantes avaliados em mil reis,
e de feitio cento quarenta e nove mil e quinhentos reis, o que tudo junto faz soma
de setesentos e onze mil e trezentos reis...............................................711V30
Hum apertador de ouro de diamantes que tem vinte pessas, a saber, des de sete dia‑
mantes cada hum, e os outros des de seis diamantes cada hum, e huma Rosa gran‑
de no meio do apertador que tem quarenta e novediamantes, peza de ouro trinta e e
oito oitavos, avaliado o ouro, diamantes e feitio em duzentos mil reis ....200V000
Huma sinta de ouro e diamantes com sincoentae nove pessas que tem sinco diaman‑
tes cada huma, e duas bi / [l. 6] biqueiras que tem cada huma nove diamantes,
o broche do meio com sua coroa que tem sasenta e sinco diamantes, e o diamante
do meio he grande lasca e peza de ouro hum marco, sete onsas e três oitavas, e foi
avaliado ouro, diamantes e feitio em oito sentos mil reis ....................800V000
Doze lores de ouro e diamantes com treze diamantes cada huma que pezam de
ouro vinte e oito oitavas avaliado o ouro, diamantes e feitio em sento e oitenta mil
Reis ................................................................................................180V000
Huma Cadeia de ouro e diamantes de oitenta e quatro pessas com dous diamantes
cada huma, pezou de ouro hum marco e duas oitavas, avaliado o ouro, diamantes
e feitio em duzentos e sincoenta mil Reis .........................................250V000
Estas Joias forão avaliadas em Lisboa como paresse da certidão dos contrastes
Simão Rodrigues, Domingos Correia e Pero da Costa junta ao appenso.
Titollo do ouro.
Trezentos botoins de ouro esmaltados de negro amelonados (sic) que pezam / [l.
6 vº] oito marcos, sinco onças e seis oitavas a rezão de seiscentos e sasentareis a
oitava, importão trezentos e noventa e seis mil reis,e de feitio a trezentos reis cada
hum noventa mil reis, que tudo junto faz soma de quatrosentos oitenta e seis mil
reis .................................................................................................486V000
Huma cadeia de meia cana de ouro que peza sdinco onças e trinta outavas e meia,
que tem seis voltas que a respeito do presso assima importa o ouro trinta mil e
trinta reis e de feitio seis mil reis, que ao todo faz soma de trinta e seis mil e trin‑
ta reis ..............................................................................................36V030
Huma cadeia de ouro emfeitada com aquatro vultos voltos (sic) que peza seis on‑
sas e sete oitavas que a respeito do presso asima importa o ouro trinta e seis mil e
trezentos reis e de feitio des mil reis que ao todo faz soma de quarenta e seis mil
e trezentos reis ..................................................................................46V300

351
Huma sinta de ouro de quarenta e sete pessas pequenas, e oito maiores com sua
brocha, asentados todos em huma ita de ouro de martelho, que tudo peza hum
marco, duas onsas e quatro oitavas que a respeito do presso asima importa o ouro
quarenta e seis mil e duzentos reis e de feitio vinte mil rs que ao todo faz soma de
sasenta e seis mil e duzentos reis ........................................................66V200
[l. 7] sincoenta botoins de ouro esmaltado de negro que valem vinte mil e vinte
reis ...................................................................................................20V020
Todas estas pessas forão avaliadas em Lisboa pellos mesmos contrastes atrás no‑
meados como paresse de sua certidão junta ao appenso.
Titollo da prata dourada.
Hum prato e jarro de agoa (…) asi tudo dourado que pezou nove marcos seis onsas
e duas oitavas a rezão de três mil quatro sentos e quarenta reis o marco que faz soma
de trinta e tres mil e seis sentos e quarenta reis............................................33V640
Hum saleiro, asucareiro e pimenteiro com seus rollos e tapadouros, tudo de prata
dourada que pezarão sinco marcos que a rezão de tres mil quatro sentos e qua‑
renta reis o marco faz soma de dezassete mil e dusentos reis ...............17V200
Hum talher de prata dourada que pezou quatro marcos duas onsas e seis oitavos
que a rezão de três mil e quatrosentos e quarenta reis o marco faz soma de qua‑
torze mil novesentos e vinte reis ..........................................................14V920
[l. 7 vº] treze colheres e treze garfos dourados que pezarão quatro marcos trez
onsas e seis oitavas que a rezão de três mil e quatrosentos e quarenta reis o marco
faz soma de quinze mil trezentos e setenta reis ..................................15V370
Huma campainha de prata dourada que peza hum marco e huma onsa e sinco
oitavas e meia que a rezam de três mil quatrosentos e quarenta reis o marco soma
quatro mil sento e sincoenta reis .........................................................4V150
Titollo da prata branca.
Quatro pratos de prata de cosinha que pezam vinte e sinco marcos e quatro onsas
que a rezão de três mil e quatrosentos e quarenta reis o marco soma oitenta e sete
mil setecentos e vinte reis ....................................................................47V720
Seis prattos de prata de meia cosinha que pezarão vinte e oito marcos e duas on‑
sas e quatro oitavas que a rezão do mesmo presso soma noventa mil e quinhentos
reis ...................................................................................................90V500
Quatro farmenguilhos que pezarão doze marcos que a rezão do dito presso o mar‑
co fas soma de quarenta e hum mil duzentos e oitenta reis ..................41V280
[l. 8] Doze pratos trincheos que pezarão vinte e dous marcos e duas onsas que a
rezão do dito presso soma satenta e seis mil quinhentos e quarenta reis76V540
Humas galhetas com suas tapadeiras e prato ovado que peza tudo quatro marcos
três onsas e quatro oitavas que a rezão do dito presso soma quinze mil duzentos
e sincoenta reis ..................................................................................15V250

352
Duas colheres e dous garfos de prata branca que pezarão e valem dois mil e seis
sentos reis ..........................................................................................2V600
huma salseira tres pires e dous oveiros com suas duas colherinhas, huma metida
de onsa, hum bocal de garrafa, que pezou tudo três marcos e sete onsas que a re‑
zão do mesmo presso soma treze mil trezentos e trinta reis ................ 13V330
Dous pucaros, hum ovo de esquentar as mãos, humas castanha de lenso huma
colher pequena quatro remates de braseiro que tudo pezou três marcos sinco on‑
sas e três oitavas que a rezão do dito presso faz soma de des mil e quatro sentos
e sasenta reis .....................................................................................10V460
Hum espetinho de prata que pesou e vale três mil e seissentos e quarenta reis....3V640
[l. 8 vº] Duas falangonas de prata que pezarão seis marcos seis marcos e trinta
onsas que a rezão do dito presso faz soma de vinte e dous mil setecentos e noventa
reis ...................................................................................................22V790
Huma salva grande de canais de prata que pezou treze marcos e huma onsa que a re‑
zão do dito presso faz soma de quarena e sinco mil sento e sincoenta reis....45V150
Dous engastes de hum avano avaliados em dous mil reis...................... 2V000
Duas pomas de prata com suas tapadoiras e chaves para a agua que pezarão sete
marcos e duas onsas que a rezão do dito presso fas soma de vinte e quatro mil
novesentos e quarenta reis ..................................................................24V940
Huma panelinha de prata com sua tapadoira do mesmo que pezou hum marco
quatrocentas e seis oitavas que a rezão do dito presso faz soma de sinco mil qua‑
tro sentos e sasenta reis....................................................................... 5V460
Hum candeeiro de prata de três lumes de varilha com as pessas que lhe pertencem
que pezou treze marcos e seis onsas que a rezão do dito presso faz soma de qua‑
renta e sete mil e trezentos reis ...........................................................47V300
[l. 9] Dous castiçais grandes de prata que pezarão doze marcos huma onsa e
quatro oitavas que a rezão do dito presso faz soma de quarenta e hum mil nove
sentos e vinte reis ...............................................................................41V920
Dous castiçais pequenos quebrados de prata que pezarão dous marcos quatrocen‑
tas e duas oitavas que a rezam do dito presso faz soma de oito mil e setesentos
reis .....................................................................................................8V700
Dous castisais pequenos redondos que pezarão seis marcos digo dous marcos e seis
sentos e sinco oitavas que a rezão do dito presso soma a nov e mil e seis sentos e
des reis................................................................................................9V610
Hum braseiro de prata pequeno de culunas com quatro remates menos com sua
caldeira também de prata que pezou dezasete marcos e humaq onsa que a rezão
do dito presso faz soma de sincoenta e oito mil novesentos e des reis.....58V910
Huma casoila de prata que pezou hum marco e seis onsas que a rezão do dito
presso soma seis mil e vinte reis............................................................6V020

353
Mais prata dourada empenhada em Lisboa.
Sinco talheres com seus saleiros dourados tudo de prata que pezarão vinte e hum
marcos / [l. 9 vº] marcos, huma onsa e huma oitava que a rezão de três mil e
seiscentos reis o marco por que se vendeo para pagamento de Francisco Ferreira
Barreto em cuja mão estavão empenhados faz soma de satenta e seis mil sento e
seis reis .............................................................................................76V106
Dous saleiros de prata dourada de pees altos com suas cubertoiras que pezaram
sinco marcos sincoenta e huma oitava que pello dito presso de três mil e seiscentos
reis por que se venderão faz soma de vinte mil trezentos e seis reis ......20V306
Hum saleiro com sua cobertoira de prata dourada de quatro pees baixos que pezou
três marcos trezentos e huma oitava que pello ditto presso por que se vendeo faz soma
de onze mil setesentos e sincoenta e seis reis ............................................ 11V756
Duas salvas de prata douradas com medalhas que pezaram seis marcos sinco on‑
sas e oitava e meia que a rezão do dito presso soma vinte e três mil novesentos e
trinta e quatro reis ............................................................................23V934
Prata Branca.
Duas salvas de prata branca que pezarão seis marcos, sinco onsas e três oitavas
que a razão de três mil quatro sentos e quarenta reis o marco faz soma de vinte
e dous mil novesentos e sincoenta e dous reis .......................................22V952
[l. 10] Dous pratos grandes decosinha de prata que pezarão vinte e dous marcos
sinco onsas e três oitavas que a rezão do dito presso soma satenta e sete mil nove
sentos noventa e dous reis...................................................................77V992
Quatro pratos de cosinha de prata que pezarão vinte e quatro marcos e tres on‑
sas que a rezão do dito presso faz soma de oitenta e tres mil oitosentos e sincoenta
reis ...................................................................................................83V850
Seis pratos meãos de prata que pezarão vinte e seis masrcos huma onsa e sete oi‑
tavas que a rezão do dito presso faz soma de noventa mil duzentos e quarenta e
oito reis .............................................................................................90V248
Dous castisais grandes de prata que pezarão de marcos huma onsa e huma oita‑
va que ao dito presso faz soma de trinta e quatro mil oitosentos e oitenta e quatro
reis ...................................................................................................34V884
Hum guomil com sua cubertoira de prata que pezou seis marcos e sete onsas que
ao dito presso faz soma de vinte e três mil seis sentos e sincoenta reis...23V650
Huma basia ovada com seu escalfador tudo de prata que pezou nove marcos e seis
onsas que ao dito presso faz soma de trinta e tres mil e quinhentos e quarenta
reis .....................................................................................................3V540
[l. 11 vº] Hum assafate de prata de lavar de sesto que pezou vinte e tres marcos
e huma onsa que ao dito presso faz soma de satenta e nove mil quinhentos e sin‑
coenta reis .........................................................................................79V550

354
Hum brazeirinho de folha de estampa de prata com suas columnas de latam dou‑
rado e caldeira de cobre avaliado tudo em dous mil e quinhentos reis.....2V500
Persolanas.
Des boiõens de persolana da India meiõis sinco delles com tapadoiros avaliados
todos em três mil reis ...........................................................................3V000
Tres boions grandes hum grande cõ tapadoira avaliados em doze mil reis ...12V000
Duas garrafas da India huma dellas quebrada avaliados em seiscentos reis ... V600
Hum boião pequeno cõ tapadeira e outro muito pequenino avaliados em mil e du‑
zentos reis ...........................................................................................1V200
Duas escudellas muito grandes avaliadas em tres mil reis .....................3V000
[l. 11] Dous Jarros da India avaliados em trezentos e vinte reis ........... V320
Duas confeiteiras da India avaliadas em duzentos reis ........................... V200
Huma garrainha da India pequena avaliada em sem reis ..................... V100
Huma persolana de prato que tem huma borda quebrada avaliada em quinhen‑
tos reis .................................................................................................. V500
Trinta e oito escudelas da India de differentes tamanhos avaliados em sete mil e
seis sentos reis .....................................................................................7V600
Dous tavoleiros da China avaliados em dous mil reis ...........................2V000
Três bandeiras da China e mais outra pintada avaliados em mil reis ...1V000
Armas.
Huma escopeta pequena avaliada em dous miI reis ..............................2V000
Huma espingarda grande comprida avaliada em sinco mil reis .............5V000
[l. 11 vº] Quatorze arcabuses avaliados em sete mil reis ......................7V000
Seis mosquetes avaliados em seis mil reis ........................................... 6V000
Vinte frascos com alguns polvarinhos todos muito velhos avaliados em mil reis .....1V000
Hum cano velho de arcabus e huma cronha quebrada pequeno avaliado em seis
sentos reis ............................................................................................ V600
Tres alabardas avaliadas em mil reis..................................................1V000
Duas Bestas com suas gafas avaliadas ambas em seiscentos digo em mil e seis sen‑
tos reis ................................................................................................1V600
Huma courassa muito velha de laminas avaliada em trezentos reis......... V300
Des rodelas da China avaliadas todas em oito mil reis.........................8V000
Vestidos do senhor Conde.
Vestidos do senhor Conde que icarão no guarda roupa e outras meudezas ava‑
liados em quarenta mil reis ...............................................................40V000
[l. 12] Pinturas.
Vinte e quatro quadros differentes pequenos avaliados todos em sinco mil reis ......5V000
Hum Retrato de todo o corpo da infanta Dona Izabel ilha de Felipe segundo de
castella avaliado em dous mil reis .......................................................2V000

355
Armasõis
Oito panos de Ras de seis annas de queda dos Triumphos de Petrarcha que tem
quinhentos e sincoenta e sinco annas avaliada a mil e seiscentos reis a anna faz
soma de oitosentos oitenta e oito mil rs os quais seis delles tem letra : E: e dous:
letra f..............................................................................................888V000
Quatro panos de Ras de seis annas de queda da Historia de David, três delles tem
sincoenta e quatro annas cada hum ehum sasenta e seis, que fazem todos soma de
duzentos e vinte e oito annas avalliadas a oitosentos reis cada huma soma sento
e oitenta e dous mil e quatro sentos reis, os quais tem letra: G .........182V400
Seis panos de Ras de sinco annas de queda da Historia de Diana que tem du‑
zentos e satenta e oito annas avaliada cada huma a oitosentos reis, que faz soma
de sento e quarenta e dous mil e oitosentos reis, os quais tem letra. H 142V800
[l. 12 vº] Seis panos de Raz de paisaigens de sinquo annas de queda que fazem
sento e quarenta e nove annas avaliados a quatro sentos reis cada anna, faz soma
de sincoenta e nove mil e seiscentos reis os quais tem letra: D ..............59V600
Sinco panos de rãs de folhagens de seis annas de queda groseiros e velhos que tem
dusentos e quarenta e huma annas avalliada cada huma a dusentos reis que faz
soma de quarenta e oito mil e dusentos reis, tem letra : L ..................48V200
Quatro panos de Ras de três annas e meia de queda que mostram os Mezes que
fazem noventa annas avaliada cada huma a quatrosentos reis faz soma de trinta
e seis mil reis, tem letra: M................................................................36V000
Sete panos de Ras de folhagens de quatro annas de queda que fazem cento e trinta
e quatro annas a duzentos e sincoenta reis cada huma, faz soma de trinta e três
mil e quinhentos reis, tem letra J........................................................33V500
Huma guarda porta de Ras de seis annas de queda que tem vinte e dous annas /
[l. 13] a trezentos reis cada huma faz soma de seis mil e seis sentos rs tem letra
B .......................................................................................................6V600
Outro guarda porta de Ras de seis annas de queda que tem dezoito annas a tre‑
zentos reis cada huma soma sinco mil e quatro sentos reis ...................5V400
Outro guarda porta de Ras de seis annas de queda que tem dezoito annas a tre‑
zentos reis cada huma faz soma de sinco mil e quatro sentos reis .........5V400
Outro guarda porta de Ras de quatro annas de queda tem doze annas a quatro‑
sentos reis cada huma faz soma de quatro mil e oitosentos reis ............4V800
Outro guarda porta de Ras de quatro annas de queda tem doze annas a quatrosentos
reis cada huma faz soma de quatro mil e oitosentos reis ............................... 4V800
Huma sobre janella de Ras de duas annas e meia de queda que tem sete annas e
meia a quatrosentos reis a anna soma três mil reis ..............................3V000
[l. 13 vº] Outra sobrejanella de Ras de duas annas e meia de queda que tem oito an‑
nas e meia a quatrosentos reis cada huma soma tres mil e dusentos reis ....... 3V200

356
Outra sobrejanella de rãs mais velha tem des annas e meia de queda que tem seis an‑
nas a trezentos reis cada huma soma mil oitosentos reis................................ 1V800
Outra sobrejanella de Ras do mesmo tamanho e presso ........................1V800
Duas respaldeiras de anna de queda que tem oito annas e meia a quatrosentos
reis a anna faz soma de três mil e quatrosentos reis ............................ 3V400
Tres meias almofadas de Ras que tem seis annas a quatrosentos reis cada huma
soma dous mil e quatro sentos reis .......................................................2V400
Tres paninhos de Ras que paresse forão quartinas e ceo de cama de quatro annas
de queda que fazem quarenta annas a mil e duzentos reis cada huma soma ao
todo quarenta e oito mil reis ..............................................................48V000
[l. 14] Duas guteiras que parese serem da dita estofa que tem quatro annas a
mil e duzentos reis a anna faz soma de quatro mil e oito centos reis .....4V800
Hum pano de tres annas de queda de Sam Jeronimo que tem algum ouro que tem nove
annas a quatro mil reis cada huma faz soma de trinta e seis mil reis .........36V000
Tres reposteiros antigos velhos avaliados em mil e duzentos reis ............1V200
Seis reposteiros uzados avaliados a dous mil reis cada hum soma doze mil reis........12V000
Alcatifas.
Huma alcatifa da India de estrato com cadilhos vermelhos em bom uso de sete varas
de comprido e três de largo numero dois avaliado em quarenta mil reis.......40V000
Outra alcatifa da India do mesmo tamanho com o numero três avaliada em qua‑
renta mil reis ....................................................................................40V000
Huma alcatifa meiam (sic) da India uzada ina forrada de bocaxim de quatro
varas de comprido e duas de largo. Nº 4. Avaliada em dezaseis mil reis16V000
[l. 14 vº] Huma alcatifa da India forrada de bocaxim com cadilhos carmezins
de duas varas e meia de comprido e vara e meias de largo em meio uso nº 6 ava‑
liada em sinco mil reis .........................................................................5V000
Huma alcatifa da India também forrada de bocaxim ina com cadilhos azuis de
duas varas de comprido e vara e meia de largo em meio uso nº 7 avaliada em seis
mil reis ...............................................................................................6V000
Huma alcatifa de Veneza de humas rodas velha de quatro varas de comprido e
duas de largo avaliada em oito mil reis ...............................................8V000
Huma alcatifa de Castella uzada amarella e azul de três varas de comprido e
vara e meia de largo avaliada em três mil reis ......................................3V000
Hum tapetão da India em mais de meio uso de seis varas de comprido e tres de
largo avaliado em vinte mil reis .........................................................20V000
[l. 15] Outro tapetão do mesmo tamanho e uso avaliado em vinte mil reis ... 20V000
Quatro tapetes felpudos da terra de ilharga de cama azuis muito velhos e rotos
avaliados todos em dous mil reis ..........................................................2V000
Almofadas.

357
Vinte e oito Almofadas de veludo carmesim com pasamanel e borlas de ouro emredados
a quatro mil reis cada huma avaliados soma ao todo sento e doze mil reis ...112V000
Seis almofadas de tella e veludo carmesim avaliados a dous mil reis cada huma
soma doze mil reis.............................................................................12V000
Dezoito almofadas de cor do vão baio (sic) pespentados de azul com massanellos
e caireis de prata e azul avaliados a dous mil reis cada huma soma trinta e seis
mil reis .............................................................................................36V000
Onze almofadas de veludo e damasco roxo com seu cairel e massanetas de retros
velhos avaliados a mil e quinhentos reis cada huma soma dezasete mil e quinhen‑
tos reis ..............................................................................................17V500
[l. 15 vº] Quatro almofadas de cor do vão baio velhos avaliados em mil reis ... 1V000
Huma almofada da cor do vam com cairel azul velha avaliada em quinhentos
reis ...................................................................................................... V500
Quatro almofadas de guadamecim velhas avaliadas em seiscentos reis .................V600
Huma almofadinha carmesim velha avaliada em quinhentos reis ........... V500
Outra almofadinha de camilha de seda de cores velha avaliada em duzentos reis
V200
Quartinas.
Sinco quartinas de tafetá carmesim singello com sua pentilha de ouro avaliados
todos em trez mil e quinhentos reis ......................................................3V500
[l. 16] Duas quartinas de damasco verde com sua franja do mesmo avaliados em
sinco mil reis .......................................................................................5V000
Huma guarda destrado de tafetá encarnado dourada avaliada em quatro sentos
reis ....................................................................................................... V400
Duas guardas destrado de tafetá leonado (sic) que tem ambas vinte e dous côvados
e huma largura avaliada em dous mil e quinhentos reis ........................... 2V500
Doceis e panos de Bofete.
Hum docel de veludo carmesim de sinco larguras a quartina de seis côvados de
queda, o seo com suas guteiras com franjas de ouro muito largos alamares e fra‑
nias estreitas tudo Rico com seus cordois de chadilho (sic) carmesim avaliado em
sento e vinte mil reis ........................................................................120V000
Outro dosel de tella de primavera de quatro larguras de seis côvados de queda com
suas franias e alamares de ouro avaliado em sento e vinte mil reis ....120V000
Dous panos de bofetes de marca grande grande de veludo carmezim forrados de
bocaxim na mesma cor com suas franjas e alamares de ouro e seus coiros forrados
em tafetá carmezim avaliados em trinta mil reis ............................... 30V000
[l. 16 vº] Dous panos de bofetes de marca grande de tella verde forrados de
bocaxim verde com franjas e alamares de ouro avaliados em trinta e dous mil
reis ..............................................................................................32V000

358
Hum pano de bofete de marca meam de damasco carmezim com tafetá de roxo de
ouro, franjas e alamares de ouro, resguardo de tafetá carmezim com sua pentilha
avaliado em oito mil reis......................................................................8V000
Hum pano de bofete de marca pequena de damasco verde com franjas e alamares
de ouro com seu resguardo de coiro forrado de tafetá verde avaliado em sinco mil
reis .....................................................................................................5V000
Hum pano de bofete meão de damasco azul com franjas e alamares de retros azul
uzado avaliado em três mil reis ...........................................................3V000
Outro pano de bofete de marca pequena de pouca queda de coiro listado com franja
de ouro e verde forrado de bocaxim verde avaliado em mil e duzentos reis1V200
Hum pano quadrado de bofete de mrca meam de veludo e ouro da Persia com os
salefos de veludo carmezim bordados de ouro e franja de ouro forrado em pano
vermelho avaliado em dezaseis mil reis ...............................................16V000
[l. 17] Hum pano de bofete de damasco carmezim com sanefas curtas de veludo
carmezim já velho avaliado em mil e dusentos reis................................1V200
Huma sobremeza quadrada de damasco carmezim com sua franja de ouro e coiro
forrado de tafetá carmezim avaliado em doze mil reis.........................12V000
Outra sobremeza de damasco verde com sua franja de ouro forrado em frestão pardo
com hum coiro baio de resguardo avaliado em oito mil reis .......................... 8V000
Dous panos listados que servem nos cofres de resguardo das almofadas e paresem
de erva avaliados em oito sentos reis ...................................................... V800
Paramentos de Cama.
Hum paramento de cama de felpa carmezim com franjas e alamares de ouro que
contem ceo e quatro quartinas de tafetá doble mosqueado cobertor de felpa carme‑
zim e azul e rodapees do mesmo tudo com suas franjas de ouro largos e estreitos e
alamares de ouro e quatro massanetas de io de ouro de sergueiro tudo Rico ava‑
liado em dusentos reis ......................................................................200V000
[l. 17 vº] Hum paramento de cama de damasco encarnado que contem ceo e qua‑
tro quartinas e rodapees tudo com suas franjas e alamares de pratta ricos, e mas‑
sanetas de io de pratta de sergueiro avaliado em sento e vinte mil reis120V000
Hum paramento de cama de volante branco e carmezim que contem ceo e quatro
quartinas e rodapees com franjas e alamares de seda uzada avaliado em seis mil
reis .....................................................................................................6V000
Hum pavilhão de Olanda avaliado em dous mil e quinhentos reis ............... 2V500
Outro pavilhão do mesmo avaliado em tres mil reis..............................3V000
Hum pavilhão de Ló verde com capello de damasco com franja de ouro e verde
avaliado em seis mil reis ..................................................................... 6V000
Duas quartinas de lambeis que paresse forão de cama avaliados ambos em dous
mil reis 2V000

359
Hum pavilhão de rede avaliado em dous mil reis .................................2V000
[l. 18] Duas quartinas de rede velhas avaliadas em mil e dusentos reis 1V200
Hum ceo e duas quartinas branquas avaliadas em dois mil reis ...........2V000
Hum paramento de retrete de veludo carmezim avaliado em dous mil e quinhen‑
tos reis ................................................................................................2V500
Colchas e outras pessas tocantes a cama.
Huma colcha grande de montaria lavrada de amarello avaliada em quinze mil
reis ...................................................................................................15V000
Outra colcha mais pequena de montaria lavrada de amarello avaliada em dezoito
mil reis ...............................................................................................8V000
Huma colcha branca da India pespestada ina avaliada em nove mil reis9V000
Outra colcha da mesma sorte avaliada em nove mil reis .......................9V000

[l. 18 vº] Huma colcha brranca ina sem franja avaliada em quatro mil reis ......4V000
Huma mantilha de colcha de montaria avaliada em dous mil reis................ 2V000
Huma mantilha de veludo carmezim e felpa de sobrecama com seu passamane de
ouro avaliada em doze mil reis ..........................................................12V000
Dous recheos grandes com suas almofadinhas de tafetá amarello com pasamane
de ouro avaliados em tres mil reis ........................................................3V000
Tres coiros do sinde (?) afogueados forrados em bocaxim com sua franja verde
avaliados em seis mil reis.....................................................................6V000
Huma colcha branca grande da terra avaliada em seis mil reis .............6V000
Quatro cobertores de papalhim (?) de raixa uzados avaliados em dous mil e seis
sentos reis2V600
[l. 20] Leitos.
Hum leito de pão santo bronzeado com sua grade cabeseira, pêra frizos das culu‑
nas, paos e taboas e mais madeira que lhe pertense com nove fundos de feira (sic)
amarella de resguardo e dous caixõis de pinho em que se recolhe tudo avaliado em
trinta mil reis....................................................................................30V000
Outro leito de pão santo bronzeado da mesma sorte com todas suas pessas e seus
fundos e caixõis avaliado em trinta mil reis........................................30V000
Hum leito meão de pão santo com sua grade a que faltam / [l. 20 vº] algumas
taboas avaliado em quatro mil reis ......................................................4V000
Cadeiras.
Dezoito cadeiras de veludo carmezim com franja de ouro e carmezim e pregaria
dourada com seus fundos de feira (sic) vermelha avaliados a sinco mil reis cada
huma faz soma de noventa mil reis ....................................................90V000
Dous tamboretes de ilhargas de cama de veludo carmezim com franja de ouro com seus
coiros de resguardo forrados de feira vermelha avaliados em quatro mil reis ......4V000

360
Doze cadeiras de coiro de mosquovia cham com pregos dourados uzados avaliadas
a mil e duzentos reis cada huma soma quatorze mil e quatro sentos reis14V400
Dous tamboretes de coiro de mosquovia pespentados dobradissos avaliados ambos
em mil e seiscentos reis.........................................................................1V600
Huma cadeira de andar com seus paos e correoins (sic) avaliada em dous mil
reis .....................................................................................................2V000
Outra cadeira de andar velha sem paos nem correois avaliada em seissentos reis .....V600
Duas cadeiras huma de veludo verde outra de veludo negro velhas avaliadas am‑
bas em mil reis ....................................................................................1V000
[l. 21] Des cadeiras deferentes humas e outras velhas e quebradas avaliadas em
mil e seis sentos reis .............................................................................1V600
Bofetes.
Hum bofete do charão de quatro palmos de comprido e dous de largo avaliado em
des mil reis........................................................................................10V000
Dous bofetes pequenos de pão santo marchetados destrado avaliados ambos em
três mil reis .........................................................................................3V000
Dous bofetes de pão preto marchetados com suas gavetas avaliados a quatro mil
reis cada hum soma oito mil reis ..........................................................8V000
Dous bofetes de pão santo de marqua meam com cantoneiras e perafusos dourados
avaliados ambos em quatro mil reis .....................................................4V000
Hum bofete de pão santo de marqua maior com suas cantoneiras e perafusos dou‑
rados avaliado em dous mil e quinhentos reis .......................................2V500
Dous bofetes de nugueira de marqua grande com suas colunas sem nenhum pera‑
fuzo uzados avaliados ambos em tres mil reis ......................................3V000
Dous bofetes de nogueira de marqua meam com suas colunas sem nenhum pera‑
fuzo avaliados ambos em tres mil reis ..................................................3V000
Dous bofeters de nogueira de marqua meam com suas colunas sem nenhum pera‑
fuso avaliados ambos em dous mil e quatro sentos reis .........................2V400
[l. 21 vº] (…)
Hum bofete de pao do Brasil com sua tavoa avaliado em mil reis ............... 1V000
Duas mezas de nogueira grandes com seus pees avaliados ambos em mil reis ... 1V000
Huma mesa da China dourada velha com seus pees avaliada em quinhentos
reis ...............................................................................................V500 (…)
[l. 22] Contadores e escritórios.
Dous contadores de pão pretto marchetados de marim de três palmos e meio de com‑
prido com sete gavetas cada hum avaliados ambos em dezaseis mil reis .......16V000
Dous contadores de pão pretto marchetados de marim e cana da India de três
palmos e meio de comprido com nove gavetas cada hum avaliados ambos em de‑
zaseis mil reis ...................................................................................16V000

361
[l. 22 vº] Hum escritório de Alemanha muito velho avaliado em seis sentos reis .... V600
Huma arca da India marchetada com gavetas avaliada em oito mil reis ....................8V000
[l. 29] (…) Horatorio.
Hum feitio de hum Christo per encarnar em huma crus de pão santo avaliado o
feitio em dous mil reis..........................................................................2V000
Hum Retavolo do eçe homo com molduras de pão santo avaliado em quatro mil
reis ....................................................................................................4V000
Hum Retavolo de Nossa senhora das Angustias com molduras de pão santo ava‑
liado em quatro mil reis ......................................................................4V000
Três quadros, hum do Menino Jesu, outro de São Lourenso, outro do Christo co‑
piado de Santarem avalliados em oito mil reis ............................... 8V000556
[l. 29 vº] Huma lamina de Nossa senhora guarnesida de pao preto com hum
Menino Jezu no colo avaliada em quatro mil reis ............................... 4V000
Outra lamina de nossa Senhora com o menino Jesus dormindo que chamão do Repou‑
zo, guarnecida de pao preto avaliada em três mil reis.................................... 3V000
Hum caixinho de pao tinto de negro com hum sam Francisco dentro avaliado em
mil reis ...............................................................................................1V000
Hum caixilho de pao santo com Santa Maria Madalena dentro avaliado em mil
reis ....................................................................................................1V000
Adqueridos.
O feitio de hum Christo de metal avaliado em quatro mil reis.................. 4V000
Sinco quadros, hum de Nossa Senhora da Piadade, outro de Christo no horto,
outro de Nossa Senhora com o menino Jesus no colo, outro de Sam Jeronimo, e
outro de Santa Tereza, avaliados em vinte mil rs ...............................20V000
Hum Retavolo de Christo crucifcado com muldura de pão preto avalliado em dous
mil reis ...............................................................................................2V000
Huma lamina oitavada com mulduras de pão preto de Christo com a crus às cos‑
tas avaliado em três mil reis ................................................................3V000
[l. 30] Huma lamina de Santo Izidro com huma muldura de pedra guarnesida de pao
pretto e huma (de) vidros avalliado em quatro mil reis .......................................4V000
Hum Retavollo de Santa Sicilia avalliado em quinhentos Reis............... V500
Hum frontal de damasco carmezim com sanefas mangas e pontaleira de tella al‑
cachofrada nugueirada e prata e ouro, tudo com franjos de ouro pequenos avalia‑
do em oito mil reis 8V000
Huma vestimenta de damasco carmezim guarnesida da mesma tella e franjas de
ouro com sua estola e manipullo, avaliada em quinze mil reis .......... 15V000
Huma bolsa de corporais de damasco carmezim avaliada em quinhentos reis ... V500
Hum veo de calis de tafetá carmezim cõ listros de couro avaliado em quinhentos
reis ...................................................................................................... V500

362
Duas frontaleiras dos degraos em que estão os santos de setim avelutado carme‑
zim com pasamanes largos de ouro e prata avaliados em dous mil reis . 2V000
Hum frontal de tafetá branco com franjas de retros laraniado e branco avaliado
em tres mil reis....................................................................................3V000
[l. 30 vº] duas frontaleiras de lam branqua com franja de ouro e retros carmezim
que serve dos mesmos degraos, avalliadas em seis sentos reis .................. V600
(…) Hum frontal de chamalote de seda roxo com sanefas e mangas do mesmo
panno de retros amarello e roxo em bom uso avaliado em seis mil reis .6V000
[l. 31] (…)
Tres laminas pequenas a saber huma de Santa Teresa, outra de São Diogo, e ou‑
tra de Santa Eugenia, guarnesida de prata com molduras de pão pretto avaliadas
em mil e quinhentos rs .......................................................................1V500
(…) Joias.
Hum anel de ouro com vinte e sinco diamantes avaliado ouro diamantes e feitio
em trinta e dois mil e duzentos reis ....................................................32V200
[l. 31 vº] Dous anéis de ouro com hum camafeo e outro com huma pedra avalia‑
dos ambos em três mil reis ...................................................................3V000
Huns brincos de orelhas com diamantes esmaltados de preto tem dous diamantes
grandes de fasetos (sic) e os dependurados tem outros dois diamantes amêndoas de
facetas cravados no ar com duas pengentes dependuradas avaliado ouro, diaman‑
tes, pérolas e feitio em sento e sincoenta mil reis, empenhandose em casa de Dioguo
Rodrigues em Lisboa...................................................................... 150V000
Huma gargantilha de trinta e nove pessas com seus diamantes dependurados com dous
diamantes cada hum que peza de ouro vinte e quatro oitavas que a rezão de seis sen‑
tos e sasenta reis cada oitava soma quinze mil oito sentos e quarenta reis avaliados os
diamantes em duzentos e sasenta mil reis, e de feitio trinta mil reis, que tudo junto faz
soma de trezentos e sinco mil oitosentos e quarenta reis ............................ 305V840
Dous barceletes de azeviche que tem ambos vinte e quatro pessas de ouro com cada
huma sinco diamantes de meio fundo que pezarão de ouro des mil reis e os dia‑
mantes avaliados em noventa e seis mil reis e de feitio des mil reis, que tudo faz
soma de sento e dezaseis mil reis ......................................................116V000
[l. 32] Huma banda de coral e ouro avaliada em vint e seis mil e quatrosentos
reis .................................................................................................. 26V400
Dous barseletes do mesmo avaliados em quatro mil duzentos e noventa reis..... 4V290
Hum engaste de ouro que tem huma pequena de peonia avaliado em quatro mil
e oitosentos reis....................................................................................4V800
Hum feitio de Sam Miguel de ouro que pezou dous mil seis sentos e oitenta reis....... 2V680
Hum feitio de Varonica de ouro que peza mil e seis sentos e sincoenta reis....... 1V650
Hum assovio de prata que peza duzentos e vinte reis ............................. V220

363
Vazos de cristal guarnesidos de ouro.
Hum púcaro de cristal alto com asas e bocal de ouro esmaltado de negro avaliado
em oito mil reis ...................................................................................8V000
Hum vazo de cristal a modo de garrafa com huns engastes de ouro avaliado em
oito mil novesentos e sasenta reis .........................................................8V960
[l. 32 vº] Huma caixa de coro em que esta este vazo, avaliada em quatrocentos
e sessenta reis ....................................................................................... V460
Hum púcaro de cristal de feição de tasso (?) com huns engastes de ouro lavrado e
esmaltado de negro avaliado em seis mil reis ....................................... 6V000
Duas bolas de cristal avaliadas em seis sentos reis................................. V600
Prata.
Hum prato de bastiãis dourado que peza satenta e dous mil quinhentos e vinte
reis e de feitio e ouro oitenta e sete mil quinhentos e vinte reis, que tudo faz soma
de sento e sasenta mil e quarenta reis ...............................................160V040
Hum gomil de bastiãis que peza trinta e tres mil e trinta e nove reis e de feitio
e ouro dezoito mil e quatrosentos reis que tudo faz soma de sincoenta e hum mil
quatrocentos e trinta e nove reis .........................................................51V439
Huma salva de bastião que peza dezaseis mil duzentos e sasenta reis e de feitio
e ouro dezasseis mil e duzentos e sasenta reis que tudo faz soma de trinta e dous
mil e quinhentos e vinte rei ................................................................32V520
[l. 33 vº] (…) Persolanas.
Onze persolanas da India avaliadas huma por outra em duzentos reis soma dous
mil e duzentos reis .............................................................................2V200
Duas palanganas da India grandes avaliadas em dous mil reis ............2V000
Vinte e quatro persolanas de prato avaliado hum por outro em sento e sincoenta
reis faz soma de três mil e seis sentos reis .............................................3V600
Três escudelas de persolana grandes avaliadas em quatro sentos e sincoenta reis
V450
Onze escudelas mais pequenas avaliadas em mil e sem reis...................1V100
Vinte e seis escudellas pequenas que chamão de feição de sino avaliadas a oitenta
reis cada bhuma, soma mil e duzentos reis .......................................... 1V200
[l. 34] Treze pires muito pequeninos avaliados em quinhentos e vinte reis..... V520
Onze escus (?) de vinho muito pequeninos avaliados a quarenta reis cada hum
soma quatrosentos e quarenta reis ........................................................ V440
Hum saleiro e duas garrafas pequenas avaliadas em quatrosentos reis .... V400
Huma persolaria de prato quebrada avaliada em quinhentos reis ........... V500
Huns porcos de vazos de vidro deferentes huns dos outros avaliados em dous mil
reis .................................................................................................... 2V000
Tapessaria.

364
Hum paninho de Ras de seda e ouro do nasimento de duas annas e meia de que‑
da que tem ao todo sete annas avaliado a quatro mil reis cada anna soma vinte
e oito mil reis .................................................................................. 28V000
Hum pano de Ras da Historia de David de seis annas de queda que tem quarenta e
sinco annas avaliado a oito sentos reis a anna soma trinta e seis mil reis ........ 36V000
Hum pano de Ras da Historia de Diana de sinco annas de queda tem vinte e
sete / [l. 34 vº] annas avaliada a oitosentos reis cada anna faz soma de vinte e
hum mil e seiscentos reis ....................................................................21V600
Doze almofadas de estrado de huma parte de veludo da Persia azul e amarello e
da outra de damasco das mesmas cores avaliados em trinta mil reis ... 30V000
Huma alcatifa de ilharga de cama da India avaliado em doze mil reis................... 12V000
Dous viombos grandes da India avaliados em trinta mil reis ............. 30V000
Dous tapetes da terra avaliados em três mil reis ...................................3V000
Hum paramento de cama de Roixa de dous verdes que contem ceo e quarto quar‑
tinas rodapees pano de bofete tudo franjado e com lamares das ditas cores avalia‑
do em oito mil reis ...............................................................................8V000
Outro paramento de cama de Raixa verde e amarella que serve de anãs de caminho
de huma agoa com seu galam das mesmas cores avaliado em seis mil reis ..... 6V000
[l. 35] Outro paramento de cama de volante verde e branco de marqua grande
com seo quatro quartinas rodapees e masanetas avaliadso em oito mil reis ........
8V000
Hum paramento de cama de tafetá carmezim roxado de ouro os guteiros rodapees
matisados com franjas e alamares de ouro com seo quatro quartinas e masanetas
tudo rico avaliado em sem mil reis ...................................................100V000
Huma colcha branca de marqua pequena com humas nódoas avaliada em seis mil
reis .................................................................................................... 6V000
Outra colcha branca do mesmo tamanho avaliada em seis mil reis ....................6V000
Outra colcha branca do mesmo tamanho avaliada em seis mil reis ....................6V000
Outra colcha da India branca do mesmo tamanho avaliada em seis mil reis .....6V000
Huma colcha da India groseira já uzada avaliada em mil e quinhentos reis .....1V500
Hum cobertor de pano vermelho já uzado avaliado em mil e duzentos reis... 1V200
[l. 39 vº] (…) Leitos.
Hum leito de pão santo bronzeado com todos os pertenses maior do ordinário com
seus fundos de frisos de resguardo e seu caixão avaliado tudo em quarenta mil
reis .................................................................................................. 40V000

A.H.F.E.A., Inventario que se fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor Conde
de Basto dom Lourenso pires de Castro que faleseo em Catalunha no lugar de fraga sem descen‑
dentes deixando por sua universal herdeira a senhora Condessa de Basto Dona Violante de Len‑
castre sua molher.

365
documento nº 55. 1627. galeria de painéis que d. duarte,
marquês de flechilla e malagón, sobrinho‑neto do Arcebispo d. te‑
otónio e irmão do duque de bragança d. teodósio ii, possuía na
sua casa de madrid à data da morte.

Paineis: D. Duarte de cuerpo entero y medio armado (…). Condestable Don


Nunoalvares Pereira en habito de religioso. Duque D. Juan. D. Duarte siendo
niño. Pinturas de la China. D. Duarte de edad perfecta. 4 lienzos de genesis. D.
Felipe. 12 sibilas. D. seraina. Muerte de Santo Domingo. Princesa de Parma.
Lienzo de S. Frº de Quito. D. Cherubina siendo niña. Descripción del Peru. In‑
fanta D. Isabel. Cardenal Farnesio. Reina Catalina de Austria (…). D. Juan
III. Un pelicano. Infante D. Luis. Princesa D. Maria.D. Francisco, hijo de D.
Duarte. Cardenal D. Enrique. D. Fernando, hijo de D. Duarte. 17 Retratos de
los Reyes de Portugal de cuerpo entero desde Alfonso Enriques hasta Henrique
I. Un pájaro. Principe D. Juan (…) y muchisimas más obras.
Archivo Historico Nacional de Madrid, Sección Nobleza, Toledo – Casa de Frias, Cajas
1375-1377. Referência do Doutor Fernando Bouza Álvares.

documento nº 56. 1644, 14 de Junho. inventário da livraria


do paço dos condes de basto.

[l. 39 vº] Termo de juramento aos livreiros para avaliarem os livros ao diante
declarados.
Aos quatorze dias do mês de Junho de mil e seis sentos e quarenta e quatro an‑
nos nesta cidade de Evora nos passos da Condessa de Basto sendo ahi prezente
o lesenseado Francisco Moreira de Freitas, juiz de fora dos órfãos com alçada per
el Rei nosso senhor nesta dita cidade e seu termo, e bem assim os partidores, o
dito Juiz mandou vir perante si a Manoel Ribeiro e Antonio Mendes, livreiros,
moradores nesta cidade, e lhes deu juramento dos santos Evangelhos em que eles
puzerão suas mãos sob cargo do qual lhes encarreguão que eles em boa e sã cons‑
ciençia e dos avaliadores juntamente avaliasem os livros que ao diante se seguem
em que ele juiz se louvava e elles aseitarão o dito juramento e assim prometeram
de fazer e farão avaliando na forma que vão lansados, e de tudo o dito atrás man‑
dou fazer este termo que o asinou com os sobreditos. Manoel Dias, escrivão dos
órfãos, que ho escrevi.
(aa) Freitas – Alveres – Manoel Ribrº – frcº Mendes – Antº Mendes.
[l. 40 vº] os Annais de Aragão sete tomos emquadernados em pasta de Bezerro
dourado, avaliados em quatro mil reis, digo, sinco mil reis ....................5V000

366
Símbolo da Fee de frei Luis de Granada encadernado em pasta de (…) dourada
hum so tombo de folha, avalliado em outo sentos reis ............................. V800
Fernão Mendes Pinto emquadernado em bezerro acamarado dourado avaliado
em quinhentos reis................................................................................. V500
Catalogo dos Bispos do Porto enquadernado em bezerro atamarado e dourado
num soo tombo, avaliado em seis sentos reis ........................................... V600
A Viagem del Rei dom Felipe de castella ao Reino de Portugal enquadernado em
bezerro atamarado dourado, avaliado em mil reis ................................1V000
Historia Eclesiastica de eThiopia em quarto enquadernado em bezerro atama,
digo, negro dourado, avaliado em quatrosentos reis ................................. V400
[l. 40 vº] Nobiliario dos Reis de Espanha de folha enquadernado em bezerro
atamarado dourado hum tomo, avaliado em mil reis ............................1V000
As Carónicas de Sam Bento em sete tombos de folha emquadernados de Branco
pergaminho, avaliados em sinco mil reis ...............................................5V000
Flos sanctorum de Ribadeneira, primeira e segunda parte, enquadernados em per‑
gaminho de folha avaliados em mil e duzentos reis ...............................1V200
Vida de Santo Inacio de Rebedaneira (sic) em folha de pergaminho avaliado em
quinhentos reis ...................................................................................... V500
Vida de São frcº Xavier pello padre Lucena da Companhia em folha enquader‑
nado em pergaminho avaliado em quinhentos reis................................... V500
Doctrina Christam do padre frei Luis de granada em folha enquadernado de per‑
gaminho avaliado em quinhentos reis ..................................................... V500
Dialogos de frei Amador em folha enquadernado de pergaminho avaliado em
quatro sentos reis .................................................................................. V400
[l. 41 vº] historia do Preste João de folha emquadernado em bezerro atamarado
dourado avaliado em quinhentos reis...................................................... V500
Viagem de Felipe primeiro a Alemanha de folha enquadernado em pergaminho
avaliado em quatro sentos reis ............................................................... V400
Caronica do grande Cardeal de Espanha em folha emquadernado em pergaminho
avaliado em quatro sentos reis ............................................................... V400
Historia dos Reis de Castella e de Leão de folha emquadernado em pergaminho
avaliado em quinhentos reis ................................................................... V500
Caronica do Imperador de Hespanha Dom Afonso septimo de folha enquader‑
nado em pergaminho avaliado em quatro sentos reis ............................... V400
Horasio Comentado de folha enquadernado em pergaminho avaliado em seis sen‑
tos reis .................................................................................................. V600
[l. 41 vº] obra de Lucio Marineo Sicullo de folha enquadernado em pergaminho
avaliado em quatro sentos reis ............................................................... V400
Historia das Ordens militares de folha enquadernado em pergaminho avaliado
em quinhentos reis................................................................................. V500

367
Grandezas de Madrid de folha emquadernado em pergaminho avaliado em qui‑
nhentos reis ........................................................................................... V500
Vida de Dom frei Bartolameu dos mártires Arcebispo de Braga de folha enqua‑
dernado em bezerro dourado avaliado em setecentos reis ......................... V700
Primeira parte da Historia delRei felipe quarto de folha enquadernado em per‑
gaminho avaliado em quinhentos reis ..................................................... V500
O perfeito capitão de folha enquadernado em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
[l. 42] Jornada do Arcebispo de Goa dom frei Aleixo de Menezes de folha en‑
quadernado em pergaminho avaliado em trezentos reis ......................... V300
Varias Antiguidades de Portugal de folha enquadernado em pergaminho avalia‑
do em duzentos reis ............................................................................... V200
Historia da India no tempo que a governou dom luís de Taide de folha enquader‑
nado em pergaminho avaliado em quatro sentos reis .............................. V400
Historia das Antiguidades de Madrid de folha emquadernado em pergaminho
avaliado em quatro sentos reis ............................................................... V400
Caronica de Espanha delRei dom Affonso el sábio de folha emquadernado em
pergaminho avaliado em quinhentos reis ............................................... V500
Espelho da consciência de folha enquadernado em pergaminho avaliado em qua‑
tro sentos reis ....................................................................................... V400
[l. 42 vº] Agricultura de hienera (sic) de folha enquadernado em pergaminho
avaliado em quinhentos reis ................................................................... V500
Caronica delRei dom Pedro de folha emquadernado em pergaminho avaliado em
quatro sentos reis .................................................................................. V400
Novelas de Miguel de servantes de oitavo em pasta dourado avaliado em dusentos
reis ....................................................................................................... V200
Insinuacion de la Divina Piedad, em quarto enquadernado em pergaminho, ava‑
liado em sento e sasenta reis................................................................... V160
Trabalhos de Jesu em oitavo primeiro e segundo tomo de pasta dourados avaliados
em trezentos rs ...................................................................................... V300
Suma da Vida de Dom Theotonio de Bargansa em quarto de pasta dourado ava‑
liado em duzentos reis ........................................................................... V200
Milagres de Santarém em quarto enquadernado em pasta dourado avaliado em
duzentos reis ........................................................................................ V200
[l. 43] os trabalhos de Perilis e sigismunda de quarto enquadernado em pasta
dourado avaliado em sento e sasenta reis ................................................ V160
Caronica del rei dom João o terseiro de folha enquadernado em pasta de bezerro
digo avaliado em sento e sasenta reis ..................................................... V160
Caronica delRei dom João segundo de castella de folha enquadernado em perga‑
minho avaliado em quatro sentos reis.................................................... V400

368
Cartas do Japão de folha enquadernado em pasta dourado avaliado em seis sentos
reis ....................................................................................................... V600
Frei Amador Arrais de folha enquadernado em bezerro dourado avaliado em
quatro sentos reis .................................................................................. V400
Caronicas de elRei dom Afonso onzeno (sic) de folha enquadernado em bezerro
avaliado em seis sentos reis .................................................................... V600
Discórdia traduzido por Laguna de folha enquadernado em pasta negra avaliado
em oitosentos reis ................................................................................... V800
[l. 43 vº] Caronica de Marco Antonio de folha enquadernado em bezerro ava‑
liado em seis sentos reis ......................................................................... V600
Caronica geral de Espanha de folha grande enquadernado em bezerro negro ava‑
liado em oito sentos reis ......................................................................... V800
Ho livro dos Livros quarto e quinto da historia do Descobrimento da India em‑
quadernado em bezerro de folha avliado em oitosentos reis .................... V800
Hum livro dos sinco livros da historia geral de Hespanha de folha emquadernado
em bezerro avaliado em seis sentos reis ................................................. V600
Ginelogicos (sic) dos reis despanha de folha de marquilha emquadernado em per‑
gaminho avaliado em sete sentos reis .................................................... V700
O oitavo livro da historia do descobrimento da India de folha enquadernado em
pasta (pasta) avaliado em quatrosentos reis ........................................... V400
Comentarios a Af, digo, do grande Afonso de Albuquerque de folha enquader‑
nado em pergaminho avaliado em seis sentos reis .................................... V600
[l. 44] Caronica das três ordens Santiago Calatrava e Alcantera de folha en‑
quadernado em pergaminho avaliado em quatrosentos reis...................... V400
Conquista das Ilhas moluquas de folha enquadernado em perganminho avaliado
em quatro sentos reis ............................................................................. V400
Conquista de guiribai quatro tombos de marquilha enquadernados em pergami‑
nho avaliados dois mil reis...................................................................2V000
Res publicas del mundo três tombos de folha enquadernado em pergaminho ava‑
liados em dous mil reis ........................................................................2V000
Vida de Sam Carlos borromeo de quarto enquadernado em pergaminho avaliado
em sem reis ........................................................................................... V100
Caronica del Rei Dom Manoel de folha em pergaminho avaliado em quatro sen‑
tos reis .................................................................................................. V400
[l. 44 vº] Historia imperial de Mexico de folha emquadernado em pergaminho
avaliado em setecentos reis ..................................................................... V700
Demanda del Santo Birial (sic) de folha emquadernado em pasta avaliado em
quatro sentos reis .................................................................................. V400
Ásia de Joam de Barros de marquilha emquadernado em pasta avaliado em qui‑
nhentos reis ........................................................................................... V500

369
As guerras do restador de landes por dom Carlos Colonna de folhas enquader‑
nado em pergaminho avaliado em quinhentos reis................................... V500
Dom fernando terseiro que ganó a Sevilla de folha em pergaminho avaliado em
quatro sentos reis .................................................................................. V400
Historia pontiicial em quatro tomos de folha enquadernado em pergaminho ava‑
liado em dous mil e quinhentos reis ......................................................2V500
Caronica de toda a Espanha especialmente do Reino de Valensa em dous tombos
de folha emquadernados em pergaminho avaliado em mil reis ...............1V000
[l. 45] Boetio de consolatione de folha em pergaminho avaliado em quatrocentos
reis ....................................................................................................... V400
Conservação de Monarchias e discursos políticos de folha emquadernado em per‑
gaminho avaliado em quinhentos reis ..................................................... V500
Caronica dos Reis católicos de folhaemquadernado em pergaminho avaliado em
quatrosentos reis ................................................................................... V400
Copilação de todas as obras de Gil Visente de folha enquadernado em pergami‑
nho avaliado em quatrosentos reis .......................................................... V400
Vida de João de Deos em quarto enquadernado em pergaminho avaliado em du‑
zentos reis V200
Historia das Indias de hirrera (sic) em quatro tombos de folha emquadernado em
pergaminho avaliado em mil e quinhentos reis ......................................1V500
Sitio de Bredad (sic) de folha emquadernado em pasta verde avaliado em quatro
sentos reis ............................................................................................. V400
[l. 45 vº] Vida de Santa Joana da crus, em quarto pequeno, em pergaminho,
avaliado em cem reis.............................................................................. V100
Hum livrinho pequenino do Anjo da Guarda de outavo em pergaminho avaliado
em oitenta reis. ...................................................................................... V080
Estado dos bem aventurados de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis
V080
Exercícios divinos de meio oitavo em pergaminho avaliado em sincoenta reis .....
V050
Arte para servir a Deos de meio oitavo em pergaminho avaliado em sincoenta
reis ....................................................................................................... V050
Tratado das nove penas de meio oitavo em pergaminho avaliado em sincoenta
reis ....................................................................................................... V050
[l. 46] Historia geral de Espanha por mariano (sic) que tem dous tombos pri‑
meiro e segundo de folha emquadernado em pergaminho em meio uso avaliado em
mil e duzentos reis...............................................................................1V200
Huma Biblia gótica em espanhol de folha antiga em pergaminho avaliada em ou‑
tosentos rs ............................................................................................ V800

370
Flos sanctorum de Villegas de folha em pasta dourada avaliado em setesentos
reis ....................................................................................................... V700
Historia de Africa de vfolha emquadernado em pergaminho primeiro e segundo
tombo em dous volumes avaliado em oitosentos reis ............................... V800
Ouvidio nasonis comentado de folha enquadernado em pasta dourado avaliado
em oito sentos reis.................................................................................. V800
O governador christão de folha enquadernado em pasta de bezerro dourado ava‑
liado em quinhentos reis ........................................................................ V500
[l. 46 vº] Origem das dignidades seglares de Castella e Leão de folhas enquader‑
nadas em pasta dourado avaliado em quatro sentos reis ........................ V400
Caronica del rei dom João o segundo de folha enquadernado em pasta dourado
avaliado em quinhentos reis ................................................................... V500
Caronica dos Reis de Portugal per Duarte Nunes de Leão de folha emquaderna‑
do em pasta dourado avaliado em setesentos reis digo outosentos reis ....... V800
Vida de Santa Getrudis de folha emquadernado em pasta dourado avaliado em
setesentos reis ........................................................................................ V700
Tratado da Hespera de folha em pasta dourado avaliado em quinhentos
reis ..............................................................................................V500
Relação annual de quarto em pasta dourado avaliado em duzentos reis .. V200
[l. 47] Obras esprituaes do padre frei Joam de la crus de quarto emquadernado
em pergaminho avaliado em duzentos reis ............................................. V200
Cartas espanholas de Antonio perez em quarto emquadernado em pergaminho
avaliado em duzentos reis ...................................................................... V200
Os livros da madre Tereza de Jesus de quarto em pergaminho avaliado em du‑
zentos e quarenta reis ............................................................................ V240
Arte poética de quarto emquadernada em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Vida de frei Thomas de villa nova Arcebispo de Valensa de quarto em pergami‑
nho avaliado em cento e sasenta reis ....................................................... V160
Defensão das lágrimas dos Justos de quarto em pergaminho avaliado em cento e
sasenta reis .......................................................................................... V160
[l. 47 vº] historia de Aragão em doze tombos eclesiásticos de folha emquaderna‑
do em bezerro de pasta avaliado em mil e duzentos reis........................1V200
De la Religion de los Antigos Romanos de quarto grande em pergaminho avalia‑
do em duzentos reis ............................................................................... V200
Cerquo de Diu de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em cem reis ..
V100
Elogios contra a avareza de quarto escrito de mão em pergaminho emquadernado
nelle avaliado em quinhentos reis ........................................................... V500

371
Discripção de secretários de senhores de quarto emquadernado em pergaminho
avaliado em duzentos reis ...................................................................... V200
Insignio christão de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em cento e sa‑
senta reis............................................................................................... V160
[l. 47] Caronica dos Reis de Castella escrita em pergaminho de folha emquader‑
nado em bezerro avaliada em mil e quinhentos reis ..............................1V500
Obras de Francisco de sá de Miranda de quarto enquadernado em pergaminho
avaliado em duzentos reis ...................................................................... V200
Vida de Pio quinto de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em duzen‑
tos reis .................................................................................................. V200
Itenirario (sic) da Terra santa por frei Pantilião de Aveiro de quarto enquader‑
nado em pergaminho avaliado em sento e sasenta reis ............................ V160
Os Morais de San Gregorio gotico emquadernado em pergaminho de folha ava‑
liado em quatro sentos reis .................................................................... V400
[l. 48 vº] Instrução de sacerdotes por frei Antonio de molinia (sic) de quarto em‑
quadernado em pergaminho avaliado em trezentos reis ........................... V300
As trezentas de Joam de mena de folha letra gótica emquadernado em duzentos
e cincoenta reis ...................................................................................... V250
As ordenações de Castella goticas escritas de mão de folha grande emquadernado
em pergaminho avaliado em quatrosentos reis ........................................ V400
Historia dos Reis de Castella escritas em pergaminho de mão e emquadernadas
em pasta de folha avaliado em mil reis .................................................1V000
Grandezas de Lisboa de quarto emquadernado em pergaminho avaliado em du‑
zentos e quarenta reis ............................................................................ V240
[l. 49] Destreza de las armas de carranta (?) de quarto emquadernado em per‑
gaminho avaliado em trezentos reis ....................................................... V300
As embaixadas da Persia de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em
duzentos reis ......................................................................................... V200
Fernão Calvo de Alveitaria de quarto emquadernado em pergaminho avaliado
em trezentos reis.................................................................................... V300
Exame de Antiguidades de quarto emquadernado em pasta avaliado em duzen‑
tos reis .................................................................................................. V200
Rellação das couzas que izerão os padres da companhia de quarto emquaderna‑
do em pergaminho avaliado em sento e sasenta reis ................................. V160
Hum livro de taboas de matemática emquadernado em pergaminho antigo ava‑
liado em duzentos reis ........................................................................... V200
[l. 49 vº] Vida de Dom Duarte de Menezes por dom Agostinho Manuel de
quarto em pergaminho avaliado em sento e sincoenta reis........................ V150
Jornada de Africa de quarto emquadernado em pergaminho avaliado em sento e
sasenta reis ........................................................................................... V160

372
Vinola de Archetetura de folha emquadernado em pergaminho avaliado em qua‑
trosentos reis ......................................................................................... V400
As Luziadas de luís de Camoens e Rimas em dous tombos de quarto emquader‑
nados em pergaminho avaliado em trezentos reis .................................... V300
Elogio a la vida e morte delRei Felipe de quarto enquadernado em pergaminho
avaliado em sem reis.............................................................................. V100
Historia do padre mariana de quito emquadernado em pergaminho avaliado em
duzentos reis ......................................................................................... V200
[l. 50] Plazo Universal de todas as sciencias e artes de quarto emquadernado em
pasta douro avaliado em quatro sentos reis ............................................ V400
Arte para ensinar a falar mudoz de quarto enquadernado em pergaminho ava‑
liado em duzentos reis ........................................................................... V200
Vida de santa Tereza de Jesus de quarto emquadernado em pasta dourado ava‑
liado em trezentos reis ........................................................................... V300
Historia de França de herrera de quarto emquadernado em pergaminho avaliado
em dusentos reis .................................................................................... V200
Descrição de Portugal de Duarte Nunes de Leão de quarto emquadernado em
pergaminho avaliado em duzentos reis ................................................... V200
[l. 51 vº] Exame de pilotos de quarto enquadernado em pergaminho avaliado
em duzentos reis ................................................................................... V200
Silva de Varia Lição de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em du‑
sentos e cincoenta reis ............................................................................ V250
Desempenho de património de Castella de quarto em pergaminho avaliado em
sento e sincoenta reis .............................................................................. V150
Canónica do Grão capitão de folha emquadernado em pergaminho avaliado em
quatrosentos reis ................................................................................... V400
Obras de Dom Diogo de Mendonça de quarto emquadernado em pergaminho
avaliado em dusentos reis....................................................................... V200
Relação da origem ed sucesso dos Xarifes de quarto emquadernado em pergami‑
nho avaliado em dusentos reis ................................................................ V200
[l. 51] Dom Quixote de la mancha de quarto emquadernado em pergaminho
avaliado em duzentos reis ...................................................................... V200
Epitomo de Carlos quinto de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em
duzentos reis ......................................................................................... V200
O Lima de Diogo Bernardes de quarto emquadernado em pergaminho avaliado
em oitenta reis .....................................................................................V0800
Nobreza de Espanha de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em du‑
sentos reis ............................................................................................. V200
Relação de dom Joam de pérsia de quarto enquadernado em pergaminho avaliado
em sento e sasenta reis ........................................................................... V160

373
Historia dos girois de castella de folha emquadernado em pergaminho avaliado
em quatrosentos reis .............................................................................. V400
[l. 51 vº] Cercos de Moçambique de quarto enquadernado em pergaminho ava‑
liado em cem reis ................................................................................... V100
Historia da India de Castanheda de folha velho emquadernado em pasta avaliado
em trezentos reis V300 historia de Africa segunda parte de folha enquadernado
em pergaminho avaliado em tresentos reis............................................... V300
Cercos de Malaca de quarto enquadernado em pergaminho avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
Polidoro Virgilio em castelhano de quarto enquadernado em pergaminho avalia‑
do em trezentos reis ............................................................................... V300
Tratado do conselho e dos conselheiros dos príncipes de quarto emquadernado em
pergaminho avaliado em dusentos e quarenta reis .................................. V240
[l. 52] Duas origens da lingoa portugueza por Duarte Nunes de Leão de quarto
enquadernaqdo em pergaminho avaliado em trezentos reis ...................... V300
Ortographia da Lingoa portugueza por Duarte Nunes de Leão de quarto em
pergaminho avaliado em sento e sincoenta reis ........................................ V150
Historia do Grão Tamorlão de folha enquadernado em pergaminho avaliado em
trezentos reis ......................................................................................... V300
Livro de montara de folha enquadernado em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Dom Joam de Austria sua historia de quarto enquadernado em pergaminho ava‑
liado em quatrosentos reis...................................................................... V400
Tratado das drogas da India por gracia dorta de quarto emquadernado em gua‑
damessim avalliado em dusentos reis ...................................................... V200
[l. 52 vº] Hipistolado de dom Antonio de Gavarra (?) de oitavo emquadernado
em pergaminho digo em pasta avaliado em sento e sasenta reis ................ V160
Exame de engenhos de oitavo em pergaminho avaliado em cem reis ........ V100
Vida e morte do Thesoureiro mor de quarto emquadernado em pergaminho ava‑
liado em cento e vinte reis ...................................................................... V120
Tratado de acimetria (sic) de quarto digo de oitavo em pasta avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
Salústio em castelhano de pergaminho de oitavo avaliado em sento e vinte reis.V120
Vida do Padre Gonçalo da silveira de quarto em pergaminho avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
A viagem de Agostinho de Roixas de oitavo em pergaminho avaliado em cento e
sincoenta reis ......................................................................................... V150
[l. 53] Vocabulario do cazo (?) de oitavo em pergaminho avaliado em sento e
sasenta reis ........................................................................................... V160

374
Sam Joseph de oitavo em pergaminho avaliado em sento e sincoenta reis.. V150
Policia christiana de oitavo enquadernado em pergaminho avaliado em sem reis ..... V100
Relação das cousas que izerão os padres da companhia no Japão de quarto em
pergaminho avaliado em sento e vinte reis .............................................. V120
Caronica de Espanha de oitavo em pergaminho avaliado em sento e vinte reis....V120
Caronica do Infante dom Fernando no oitavo em pergaminho avaliado em sento
e sincoenta reis ...................................................................................... V150
[l. 53 vº] Suma Gaetana de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis V100
Declaração da doutrina christiana de oitavo em pergaminho avaliado em sento e
vinte reis ............................................................................................... V120
Principio do divino amor de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis V100
Vida de mecenas de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ....... V080
Vida de santa Iria de quarto em pergaminho avaliado em sento e vinte reis... V120
Como hum hebreu se pode salvar de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
Seis comedias de Terensio em castelhano de oitavo em pasta avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
Relação da procissão de são Carlos de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
[l. 54] Lucano em pasta de oitavo avaliado em oitenta reis .................. V080
Dittos graciozos de oitavo em pasta avaliado em sem reis ....................... V100
Livro em outava de são Joseph de outavo enquadernado em pergaminho avaliado
em sento e sincoenta reis ....................................................................... V150
Instrucion Christam em outavo enquadernado em pergaminho avaliado em cem
reis ....................................................................................................... V100
As trezentos de Mena de oitavo emquadernado em pasta avaliado em sento e sa‑
senta reis V160
Historia de dom Christovão da Gama de quarto em pasta avaliado em duzentos
reis ....................................................................................................... V200
Inquiridem dos tempos de quarto em pasta de oitavo avaliado em duzentos reis..V200
[l. 54 vº] as Conissões de Santo Agostinho de oitavo de pasta avaliado em sento
e vinte reis............................................................................................ V120
Hipistolas e Evangelhos de todo anno de outavo em pasta avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
Vida de São Jeronimo de quarto em papel avaliado em sento e vinte reis ....V120
Os feitos de gracia de Paredes de quarto em pergaminho avaliado em oito vin‑
teins ...................................................................................................... V160
As guerras civens de Granada de outavo em pergaminho avaliado em sem
Reis ................................................................................................. V100

375
As obras de Cicero de outavo em pergaminho avaliado em oitenta reis.... V080
Historia particular de Inglaterra de quarto em pergaminho avaliada em duzentos
reis ....................................................................................................... V200
[l. 55] Virtudes de Principe Christão de quarto em pergaminho avaliado em
sento e sincoenta reis .............................................................................. V150
Contos de Tranquozo de quarto em pergaminho avaliado em oitenta reis V080
Diana de Montemor de oitavo em pergaminho avaliado em sento e sincoenta
reis ....................................................................................................... V150
Vida de Dom João da Ribeira de quarto em pergaminho avaliado em sento e vin‑
te reis .................................................................................................... V120
Amparo de los pobres de quarto em pergaminho avaliado em sento e sincoenta
reis ....................................................................................................... V150
Lapidara Justina de quarto em pergaminho avaliado em sento e vinte reisV120
Historia de Plinio de quarto em pergaminho avaliado em duzentos reis .. V200
[l. 55 vº] El Cavalheiro detriminado de quarto em pasta avaliado em duzentos
reis ....................................................................................................... V200
La vida del Cardenal Sisneros de quarto em pergaminho avaliado em sento e vin‑
te reis .................................................................................................... V120
A historia de Portugal de herrera de quarto em pergaminho avaliado em duzen‑
tos reis. ................................................................................................. V200
Elogios dos Reis de Portugal de frei Bernardo de Britto de quarto em pergaminho
avaliado em quatro sentos reis ............................................................... V400
Historia de dom Pedro Tenório de quarto em pergaminho avaliado em sento e sa‑
senta reis............................................................................................... V160
Naufragio de Manuel de souza de quarto em pergaminho avaliado em sento e sa‑
senta reis............................................................................................... V160
Politica de Justo Lipsio de quarto em pergaminho avaliado em duzentos
reis ..............................................................................................V200
[l. 56] hum livro de autos portugueses de quarto em pergaminho avaliado em
duzentos rs V200
Itenerario da India de frei Bernardino de quarto emquadernado em pergaminho
avaliado em duzentos reis ...................................................................... V200
As obras de Cornelio Tacito de quarto em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Filosophia de hum hebreo de quarto em pergaminho avaliado em dusentos reis .
V200
Compendio de disciplina militar de quarto em pergaminho avaliado em duzentos
reis ....................................................................................................... V200
Cazamento perfeito de quarto em pergaminho avaliado em sento e vinte reis .. V120

376
[l. 56 vº] Gusmão de Alfarache primeira e segunda parte de quarto em perga‑
minho avaliado em duzentos reis ........................................................... V200
Nobreza de Espanha de quarto em pergaminho avaliado em duzentos reis ... V200
Comedia aulagrasia (?) de quarto em pergaminho avaliado em sento e sincoenta
reis ....................................................................................................... V150
Comedias portuguezas de Maxgado de quarto em pergaminho avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
Discursos vários políticos de quarto em pergaminho avaliado em duzentos reis ...V200
Arte do computo Eclesiastico de quarto em pergaminho avaliado em oitenta reis .... V080
Gramatica franceza de outavo emquadernado em pergaminho avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
[l. 57] Hum livro de varias relaçõens portuguezas de quarto em pergaminho ava‑
liado em duzentos reis .......................................................................... V200
O sitio de Lisboa de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ................ V080
Marco Aurelio de oitavo em pasta avaliado em sem reis......................... V100
Dictos delRei dom Alonso de oitavo em pasta avaliado em sem reis........ V100
Chisma de Inglaterra de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis . V080
Pe.aços de historia de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis........... V100
Tratado de peeste de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ....... V080
[l. 57 vº] MortedelRei Felipe terseiro de quarto em pergaminho avaliado em oi‑
tenta reis ................................................................................................. V80
As obras de Cabedo de oitavo em pergaminho avaliado em duzentos reis V200
Arte da cassa daltenacia (?) de quarto em pergaminho avaliado em sento e vinte
reis ....................................................................................................... V120
Cerquo de Mazagão de quarto em perganminho avaliado em oitenta reis V080
Relação de Aragão de quarto em pergaminho avaliado em oitenta reis.... V080
Historia da Ilha de sam Miguel de quarto em pergaminho avaliado em sento e
sasenta reis ........................................................................................... V160
[l. 58] Auricana (?) de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis ...... V100
Historia do Duque de Biren de oitava em pergaminho avaliado em sem reis.. V100
Cancioneiro general de oitavo em pergaminho avaliado em dusentos reis.. V200
Galatea de Servantes de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis ...... V100
Historia do Reino de Escocia de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis..... V080
Maravilhas de Roma de oitavo em pergaminho avaliado em sento e sasenta
reis .................................................................................................. V160
Floresta hispanhola de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis ........ V100
[l. 58 vº] O Cisne de Apolo de outavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ....V080
Hispistolas e Evangelhos de oitavo em pasta avaliados em sem reis ........ V100
Livro de Seneca de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ................... V080

377
El Cortezano de oitavo em pasta avaliado em sem reis........................... V100
Boscão de grasilasso de oitavo em pasta avaliado em sem reis.................. V100
Guerra de Alemanha de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis ..... V100
Ensenhansa de los nobles de outavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ......V080
Historia de Felipa de Cantaneza de outavo em pergaminho avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
Vida del (…) de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis............ V080
[l. 59] Historia da morte delRei de França de oitavo em pergaminho avaliado
em sem reis ........................................................................................... V100
Doutrina politica de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis ............ V100
Las patranhas do servo de Dios Gregório Lopez de oitavo emquadernado em
pergaminho avaliado em oitenta reis ...................................................... V080
Carnes dolendas (?) de olitavo em pergaminho avaliado em sasenta reis ......V060
Obras de Dom Jorge Manrrique de oitavoem pergaminho avaliado em sem
reis .................................................................................................. V100
[l. 59 vº] Cartas do Japão de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis.....V080
Cartas do Japão de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ......... V080
El asno de ouro de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ................... V080
A guerra de friza de oitava em pergaminho avaliado em oitenta reis....... V080
De la razón de Estado de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reisV080
Comedias Villalpando de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reisV080
Historia da Mamora de quarto em pergaminho avaliado em sento sasenta reis ..V160
Historia dos Comentarios de dom Antonio de Mendonssa de quarto em perga‑
minho avaliado em duzentos e quarenta reis ......................................... V240
[l. 60] Historia de Mexico de oitavo em pergaminho avaliado em sento e vinte
reis ....................................................................................................... V120
Elogios funerais de quarto em pergaminho avaliado em sem reis ............. V100
Caronica do príncipe dom Joam de folha em pergaminho avaliado em quatro sen‑
tos reis .................................................................................................. V400
Hum livro gótico velho de folha da Historia de Castella em pergaminho avaliado
em quinhentos reis ................................................................................ V500
Rimas de Antonio Gomez de outavo em pergaminho avaliado em sem reis ... V100
Panagirico funeral de quarto em pergaminho avaliado em sem reis .......... V100
Carta e Catholico, digo, origem da nobreza politica de quarto em pergaminho
avaliado em sento e sasenta reis ............................................................. V160
[l. 60 vº] Quatro sermoins na cruz de quarto em pergaminho avaliado em sento
e sasenta reis ......................................................................................... V160
Livro dos Evangelhos da Vida de Christo de quarto em pergaminho avaliado em
trezentos reis ......................................................................................... V300

378
Hum livro de estampas varias de quarto grande em pasta dourada avaliado em
quinhentos reis ...................................................................................... V500
Maravilhas de Roma de outavo em pergaminho sem estampas avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
Hum livro de quarto das fortalezas da India em pasta avaliado em quatro centos
reis ....................................................................................................... V400
Quinta e septima Decada de Couto emquadernado em pasta de bezerro de folha
avaliado em mil e duzentos reis ...........................................................1V200
Quarta Decada de Labanha em pasta de bezerro de folha avaliado em novesen‑
tos reis .................................................................................................. V900
Quarta Decada de Coito de folha em pergaminho avaliado em quatro sentos
reis ....................................................................................................... V400
[l. 61] Segunda parte dos Dialogos da Imagem da Vida Christãm por frei Hei‑
tor Pinto de oitavo em pasta avaliado em dusentos reis ........................... V200
Par, digo, Privilegios das Cortes de Tomar de outavo em pergaminho avaliado em
sento e sasenta reis ................................................................................ V160
Leis delRei Dom Sebastião de outavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ..V080
Thezoiro de pobres de folha em pergaminho avaliado em trezentos reis ... V300
Segunda Parte das Resoluçõins de santa Bertrudis de quarto em pergaminho ava‑
liado em dusentos e cincoenta reis ........................................................... V250
Hum livro gótico de Brasoins de armas gótico de quarto em pergaminho avaliado
em sento e sasenta reis .......................................................................... V160
Marco Tulio Cicerão (sic) de outavas em pergaminho avaliado em oitenta
reis ..............................................................................................V080
[l. 61 vº] Privilegios que El Rei Felipe concedeo a este Reino de oitavo em per‑
gaminho avaliado em sem reis ................................................................ V100
Tarquinio el suberbio de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis . V080
Obras de grasilasso pequenino em pergaminho avaliado em oitenta reis... V080
Romulo de Cabedo pequenino em pergaminho avaliado em outenta reis .. V080
Hum livro de problemas escrito em pergaminho enquadernado em pasta de qua‑
tro avaliado em quatrosentos reis ........................................................... V400
Comedia de vilaalpando (sic) pequenino em pergaminho avaliado em sasenta
reis ....................................................................................................... V060
Martírio de três Religiozos de sam domingos de oitavo em pergaminho avaliado
em oitenta reis ...................................................................................... V080
[l. 62] Antiguidades de Evora de Rezende pequenino em pergaminho avaliado
em oitenta reis ....................................................................................... V080
Repertorio das Ordenasois neste Reino em pasta de bezerro de folha avaliado em
quatro sentos reis .................................................................................. V400

379
Monarchia Luzitana primeira parte de frei Bernardo de Brito de folha em per‑
gaminho avaliado em oito sentos reis ...................................................... V800
Quarta parte da Monarchia lusitana de folha enquadernado em pergaminho ava‑
liado em seis sentos reis ......................................................................... V600
Hum livro de folha grande emquadernado em taboa e dourado escrito em letra
de mão todo em pergaminho que contem as pazes feitas entre elRei dom Joam de
castella e elRei dom Joam de portugual avaliado em mil e quinhentos reis1V500
Hum livro velho todo escrito em pergaminho de folha letra de mão Antiga ava‑
liado em quinhentos reis ........................................................................ V500
[l. 62 vº] A historia delRei Felipe feita por Luis Cabreira de folha avaliado em
oito sentos reis ....................................................................................... V800
Historia da vida do Imperador Carlos quinto em dous tombos de folha grande
avaliado em mil e seis sentos reis..........................................................1V600
Caronica da Religião de São Joam de Jerusalem de folha avaliado em seis sentos
reis ....................................................................................................... V600
Republica de Joam Godino de folha avaliado em sete sentos reis ............. V700
Quinta parte da historia pontiicial de folha avaliado em seis sentos reis . V600
Annaias de Flandes primeiro e segundo tombo de folha per Manoel Soeiro ava‑
liado em mil e quinhentos reis..............................................................1V500
Quarta parte da historia general pontiical e catholica de folha avaliado em outo
sentos reis ............................................................................................. V800
[l. 63] Segunda e terseira Decada de Joam de barros de folha avaliado em mil e
duzentos reis ......................................................................................1V200
Segunda e terceira parte da historia de sam Jeronimo de folha avaliado em mil he
quinhentos rei .....................................................................................1V500
Caronica delRei dom Fernando de Castella de folha avaliado em seis sentos reis .... V600
Rupta peregrina de quarto avaliado em duzentosa e sincoenta reis .......... V250
Obras do Conde de Villa mediana (sic) de quarto avaliado em trezentos reis.....V300
Rezois do Cabido da cidade de Conque de folha avaliado em quatro sentos
reis .................................................................................................. V400
Ordenansas del consejo de hazienda de folha avaliado em trezentos reis .. V300
Parentescos de Dom Joam Antonio de vera em folha avaliado em trezentos
reis .................................................................................................. V300
[l. 63 vº] Guerras de Granada de quarto avaliado em sento e sasenta reis.... V160
Naufrágio de Jorge de Albuquerque de quarto avaliado em oitenta reis . V080
Sumario de lo que aconteceo los annos adelãnte per mairiana (sic) de folha ava‑
liado em seis sentos reis ......................................................................... V600
Restauração da Baia de quarto avaliado em sento e vinte reis ................ V120
Razonamento panegírico de quarto avaliado em sento e sasenta reis ....... V160

380
Livros em Latim e outras lingoas com estampas.
Theatrum orbis terrarum enquadernado em pasta dourado de marquilha avalia‑
do em seis mil reis ...............................................................................6V000
[l. 64] Instrussão para insinar cavallos e Regras de cavallaria del Rei de França
com estampas de folha em pergaminho avaliado em oito sentos reis ......... V800
Sinco tomos das idades do mundo de folha enquadernados em pasta negra doura‑
dos avaliados em doze mil reis ...........................................................12V000
Historia dos Pontiices de platina de quarto em pasta dourado avaliado em mil
reis .....................................................................................................1V000
Hum livro de como se instituio a cavalaria do Tusão que contem os brasois de
França todo em pergaminho resprensasdo cõ luminasõis emquadernado em pasta
dourado avaliado em três mil reis digo sinco mil reis.............................5V000
Hum livro grande escrito em pergaminho que contem o Estado do Brazil com ta‑
boas e iluminasõis de pergaminho emquadernado em pasta dourada avaliado em
seis mil reis .........................................................................................6V000
[l. 64 vº] Hum livro defolha grande que contem Arvores das geraçois dos prín‑
cipes do mundo enquadernado em perganminho avaliado em miI reis....1V000
As obras de Tito Livio enquadernados em pasta de folha avaliado em outosentos
reis ....................................................................................................... V800
Plutarco paralellos vida dos varõis illustres de folha em pasta dourada avaliado
em mil e duzentos reis .........................................................................1V200
A historia da sagrada religião de Sam Joam geronimitano em folha de pergami‑
nho avaliado em quatro sentos reis......................................................... V400
Historia laimani (sic) de folha enquadernado em pasta douradao avaliado em oito
sentos reis ............................................................................................. V800
Bibliotheca de folha enquadernada em pasta de folha de genere avaliada em mil
reis .....................................................................................................1V000
[l. 65] Juvenal e pesero (sic) comentados de folha em pasta avaliado em oito sen‑
tos reis .................................................................................................. V800
As obras de Maerino Italiano de folha enquadernado em pergaminho avaliado
em mil reis ..........................................................................................1V000
Christofare clavi da companhia de Jesus de folha em pergaminho avaliado em oi‑
tosentos reis ........................................................................................... V800
Paulo himilio terra dos Reis de fransa de folha em pasta dourado avaliadoem mil
reis .....................................................................................................1V000
A Blibia (sic) em espanhol de quarto grande em pasta avaliado em seis sentos
reis ....................................................................................................... V600
Plutartco apotemas de folha em quadernado em pasta avaliado em oito sentos
reis ....................................................................................................... V800

381
O vocabulário de Antonio dembuza (sic) de folha em pasta avaliado em oitosen‑
tos reis V800
[l. 65 vº] A hesphera de Joanisaero Bosco de folha em pergaminho avaliado
em seis sentos reis .................................................................................. V600
Cornelio Tacito de folha emquadernado em pasta dourado avaliado em mil
reis .................................................................................................. V000
Euclidis Taboas matamaticas de folha em pergaminho avaliado em oitosentos
reis ....................................................................................................... V800
Juvenal os sátiros comentados de folha em pergaminho avaliado em seissentos
reis ....................................................................................................... V600
Archimedes seracusani plhilosoi de folha em pasta avaliado em seis sentos reis...V600
As emprezas de Rutilio em folha de pasta avaliado em oitosentos reis .... V800
Valerio Marino dos feitos dos Romanos de folha em pasta avaliado em novesen‑
tos reis V900
Josepho de antiquitatibus de folha em pasta avaliado em oitosentos reis... V800
[l. 66] Soares de legibus de folha emquadernado em pasta negra avaliado em ou‑
tosentos reis ........................................................................................... V800
Annais de França de avelardo Rei dano de folha em perganminho avaliado em
oito sentos reis ....................................................................................... V800
Christovão clavi de matamatica de folha em pergaminho avaliado em oito sentos
reis V800
Christovão clavi de matamatica de folha em pergaminho avaliado em oito sentos
reis V800
Christovão clavi de matamatica de folha em pergaminho avaliado em oito sentos
reis V800
Christovão clavi de matamatica de folha em pergaminho avaliado em oito sentos
reis V800
Relação universal de Europa e de Botero de quarto em pergaminho avaliado em
quatrosentos reis ................................................................................... V400
[l. 66 vº] Vida dos Emperadores de estrada de folha em pasta avaliado em oito
sentos reis ............................................................................................. V800
Academia franceza de quarto em pasta dourada avaliado em quatrosentos reis..V400
As obras de estacio poeta em dous tomos de quarto em pergaminho avaliados em
seis sentos reis ....................................................................................... V600
Reizende de Antiguidade de folha em pasta avaliado em quatro sentos reis ... V400
Historia e principi Roderigici de folha em pasta avaliado em quinhentos reis ......V500
Catalogo dos livros prohibidos de folha em pasta dourada avaliado em mil e du‑
zentos reis ...........................................................................................1V200
Eclogas comentadas de folha em pasta dourada avaliado em oitosentos reis .... V800

382
Família Napolitana de folha em pasta dourada avaliado em novesentos reis .. V900
[l. 67] Calopino de sete lingoas de folha em pasta dourada avaliado em mil e
duzentos reis .......................................................................................1V200
As Epistolas de Plinio de quarto em pasta avaliado em quatrosentos reisV400
As obras de Senica de folha grande em pasta avaliado em quinhentos reisV500
Aliansas delRei de França de folha com as armas enquadernado em pasta ava‑
liado em seis sentos reis ......................................................................... V600
Biblia latina de folha em pergaminho avaliado em quatro sentos reis ...... V400
Bulla de Breves Apostolicos de folha em pergaminho avaliado em oito sentos
reis ....................................................................................................... V800
Casanen catalogo gloria mundi de folha em pasta avaliado em oitosentos reis ......V800
[l. 67 vº] Historia de Milão Italianno de quarto em pergaminho avaliado em
trezentos rs.V300
Todas as obras dos poetas Latinos hum tombo de quarto em pergaminho digo
dous tomos avaliado em seiscentos reis .................................................... V600
Historia do Reino de Napoles Italiano de quarto em pergaminho avaliado em
duzentos reis ......................................................................................... V200
Historia da guerra de Jerosalem em taliano (sic) de quarto em pasta avaliado em
trezentos reis ......................................................................................... V300
As obras do divino poeta Dante de quarto em pergaminho avaliado em dusentos
e cincoenta reis ...................................................................................... V250
Historia de Italia de Ricardino de quarto em pergaminho avaliado em duzentos
e sincoenta reis ...................................................................................... V250
As obras de trachganhota (sic) historia universal do mundo em sinco tomos de
quarto em pergaminho avaliado em dous mil reis ................................ 2V000
Origem da família de Italia de quarto em pergaminho avaliado em quatrosentos
reis ....................................................................................................... V400
[l. 68] Historia de largintina (sic) Italiano de quarto em pergaminho avaliado
em dusentos reis .................................................................................... V200
Repertorio Monti Alvi de folha em pergaminho velho avaliado em duzentos reis .... V200
Hum livro escrito em letra de mão das couzas que se izerão no Consilio em Ita‑
liano de folhas em pergaminho avaliado em quinhentos reis ................... V500
Historias de Idacio de Sandoval de folha em pergaminho dos Arcebispos de Es‑
panha em espa nhol avaliado em seis sentos reis .................................... V600
Nautica mediterraniae de gome (sic) di terrania de folha em pasta de bezerro ava‑
liado em seis sentos reis ......................................................................... V600
Historia dos pontíices de platina da vida dos pontíices de quarto em pergaminho
italiano avaliado em seis sentos reis ...................................................... V600
Salustio Comentado de quarto em pergaminho avaliado em trezentos reisV300

383
[l. 68 vº] Coroa dos Princepeschristãos de folha em pergaminho avaliado em qui‑
nhentos reis .......................................................................................... V500
Fabrica do mundo em Jtaliano de quarto em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Atlas minor de pasta de bezerro avaliado em mil e duzentos reis .........1V200
Caronica de olanda de olandorum de quarto em pergaminho avaliado em trezen‑
tos reis V300
Relacion universal de Botero de quarto em pergaminho avaliado em quatro sen‑
tos reis V400
Deodoro Siculo historia grega de folha em pasta avaliado em setesentos reis.... V700
Vida e Costumes dos turcos de quarto em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Tito Petronis sátiras de quarto em pasta dourada avaliada em quatro sentos
reis ....................................................................................................... V400
[l. 69] Sacra Coronologia del serviso samerio (?) de folha em pergaminho ava‑
liado em seis sentos reis ......................................................................... V600
Magino de mata matria de quarto em pergaminho avaliado em trezentos reis ....V300
Vida del Rei Felipe tres tomos, digo, quatro tomos da vida delRei Felipe em Ita‑
liano de quarto feito por Agostinho de campana em pasta avaliado em mil e qui‑
nhentos reis .........................................................................................1V500
Historia de Portugal em italiano de quarto em pasta avaliado em quatro sentos
reis ....................................................................................................... V400
Tractatu de mariar de mão em quarto de peregaminho avaliado em duzentos
reis ....................................................................................................... V200
As obras de Izidori clari Italiano em dous volumes de quarto de pasta avaliado
em quinhentos reis................................................................................. V500
As obras de Petrarcha de quarto em pergaminho avaliado em trezentos reis .....
V300
[l. 69 vº] Vetruvio De Architetura de quarto em pergaminho, avaliado em du‑
zentos reis ............................................................................................. V200
Os sermõins de frei Felipe dias de quarto em pergaminho avaliado em sento e
vinte reis V120
Veselium Italiano dos traios antigos de quarto em pergaminho avaliado em sento
e vinte reis............................................................................................. V120
As Epistolas de Sãoto Elisio de outavo em pergaminho avaliado em sem reis...
V100
Arte hebraica e grega de quarto em pergaminho avaliado em duzentos reis .... V200
Cantos de princepes Italianos de quarto em pasta avaliado em sento e sasenta
reis ....................................................................................................... V160

384
As Novelas de Bocasio em Italiano de quarto em pergaminho avaliado em du‑
zentos reis V200
Aureis gelide pasta e quarto avaliado em duzentos reis .......................... V200
Justo Lipsio emp (?) de theatro de quarto em pasta avaliado em trezentos
reis ..............................................................................................V300
[l. 70] Suma de visios e virtudes de oitavo em pergaminho avaliado em sento e
sincoenta reis ......................................................................................... V150
Carta de princepes em Italiano de quarto em pergaminho tomo segundo avaliado
em duzentos reis .................................................................................... V200
Relação universal de botero de quarto em pergaminho tomo segundo avaliado em
duzentos reis ......................................................................................... V200
Secretos de Jacobo bazitis (sic) de oitavo em pasta com falta de folhas rotas ava‑
liado em sincoenta reis ........................................................................... V050
Método gramatical para todas as lingoas em Italiano de quarto em pergaminho
avaliado em sento e sasenta reis ............................................................. V160
Corolog., digo, cronologia de sumos pontíices em Italiano de quarto em pergami‑
nho avaliado em duzentos reis ............................................................... V200
Nicolau zanderi de oitavo em pasta avaliado em sento e vinte reis ......... V120
[l. 70 vº] Epistolas apostólicas digo Epistolas Apostolicas de Erasmo Retarda‑
no (sic) de oitavo de quarto avaliado em sasenta reis ................................ V60
Rimas de gavino de outavo pequenino em pergaminho avaliado em sesenta reis .
V60
Arcadia de sanazaro (sic) de oitavo em pergaminho avaliado em sem reisV100
Hum livro de Retratos de varõis Ilustres de quarto em pergaminho avaliado em
quatrosentos reis ................................................................................... V400
Companhia de la lisina de outavo em pergaminho avaliado em outenta reis ... V080
Bodino Italiano de quarto em pergaminho avaliado em duzentos reis ...... V200
Fenestrela de magistratibusvirtana (?) de pasta avaliado em sem reis ...... V100
Hum livro de Retratos dos homes ilustres do mundo de quarto em perganminho
avaliado em quatrosentos reis ................................................................ V400
[l. 71] Virgilio de oitavo em pergaminho avaliado em sasenta reis ........ V060
Sam Francisco bersensi de outavo em pergaminho avaliado em sasenta reisV060
Tratado de Jejum de quarto em pergaminho avaliado em oitenta reis ...... V080
Polidoro de Virgilio do pró, digo, de outavo em pergaminho avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
Antonio faquilino de quarto em pasta avaliado em sento e sasenta reis ... V160
Joam botero Italiano dos princepes de Genova de oitavo em pergaminho avaliado
em oitenta reis ....................................................................................... V080
Suetonio tranquilio de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis .............. V080

385
Trocato Tasso em Italiano de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis .....V080
[l. 71 vº] os Retratos dos Emperadores Romanos em oitavo em pergaminho ava‑
liado em duzentos reis ........................................................................... V200
Antonio posivini de oitavo de pasta avaliado em duzentos reis ............... V200
Os Retratos dos pontíices Romanos de oitavo em pasta avaliados em duzentos reis..V200
A vida de Fernando de Avila italiano de quar, digo, oitavo em pergaminho ava‑
liado em oitenta reis .............................................................................. V080
As obras de Oividio de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ............ V080
Botero de couzas memoráveis Italiano em oitavo peregaminho avaliado em sem
reis ....................................................................................................... V100
Comentario de Antonio gomez de folha em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Index dos livros prohibidos antigos de quarto em pergaminho avaliados em sasen‑
ta reis ................................................................................................... V060
[l. 72] Arismetica de Cardano de folha em pergaminho avaliado em quatrocen‑
tos reis .................................................................................................. V400
Duarte Nunes de Leão em latim de Regnum Portugaliae de quarto em pergami‑
nho avaliado em duzentos reis ............................................................... V200
Imagem dos varoins ilustres de quarto em pergaminho avaliado em trezentos
reis ....................................................................................................... V300
Paridis clasi de serimonia cardinalis de quarto em pergaminho avaliado em du‑
zentos reis ............................................................................................. V200
Sete jornadas do Mundo trocato tasso de oitavo de pasta avaliado em sento e se‑
senta reis............................................................................................... V160
Historia de Polibii de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ..... V080
Merlincoray de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis ............... V080
[l. 72 vº] El Cortezano de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis . V100
Miraculum E maravilhozo effeito de oitavo em perganminho avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
Xenophonte de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis .................... V100
as Rimas de Marino de oitavo que sam três em pergaminho avaliado em trezen‑
tos reis .................................................................................................. V300
aphiani alexandri de oitavo em pasta avaliado em sento e sasenta reis .... V160
sumas de virtudes e vicio de oitavo em pasta avaliado em sento e sasenta reis.......V160
Epistolas de Plinio de outavo em pasta avaliado em sem reis.................. V100
Tragano bozalino del monte parnasso de outavo em pergaminho avaliado em sem
reis V100
[l. 73] Maravilhas de Roma de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis.....V100
Pastor ido de garino pequenino em pergaminho avaliado em oitenta reis .....V080

386
Rimas de torquato tassa pequeno em pergaminho avaliado em sasenta reis .... V060
Gramatica de Reboredo de oitavo em pergaminho avaliado em sasenta reis .... V060
Retorica de cripiano de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis.... V080
Petrarcha triumphos da furtuna de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis .....V100
Thezaurus puenlis (sic) de oitavo em past avaliado em sento e vinte reis .. V120
[l. 73 vº] La pasces capasia (?) Italiano de oitavo em pergaminho avaliado em
oitenta reis ............................................................................................ V080
Vida de Santa Izabel Rainha de Portugal em Italiano de oitavo em pergaminho
avaliado em quarenta reis...................................................................... V040
Simoni deropeo de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis........... V080
Claudianus de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ......................... V080
Erasmo retardano in Evangelis de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis.V080
Silis Italiei de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis .......................... V080
Alberto magino de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta reis .......... V080
Phalai phati de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ........................ V080
[l. 74] Hum livro de segredos de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis .... V080
Aucrogevico (sic) noites aticas de oitavo em pergaminho avaliado em sem reis .....V100
Orlando Furioso de quarto em pergaminho avaliado em duzentos reis .... V200
Catulus Tiberus de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis .................. V080
Galateo Italiano pequenino em pergaminho avaliado em sasenta reis ...... V060
Jerozalem liberata de trocato tasso pequenino em pasta avaliado em sem reis ......V100
Michaelis ritis de oitavo em pasta avaliado em oitenta reis ..................... V080
Bipartitum morali philosophi de quarto em pergaminho avaliado em sento e sa‑
senta reis............................................................................................... V160
[l. 74 vº] Index dos livros da theologia philosophia de quarto em pergaminho
avaliado em sento e sasenta reis ............................................................ V160
Montavanum de quarto em pergaminho avaliado em sem reis................. V100
Historia da sagraqda Religião de samto jeronimitano de folha em pergaminho
avaliado em oitosentos reis ..................................................................... V800
Hum livro de mão da liberdade de Veneza de folha em pergaminho avaliado em
quinhentos reis ...................................................................................... V500
Concilio celebrado em Toledo escrito de mão de folha em pasta avaliado em qui‑
nhentos reis ........................................................................................... V500
Theatrum orbis terrarum emquadernado em pasta dourado avaliado em seis mil
reis 6V000
Humas Oras de Nossa Senhora escritas em pergaminho de mão iluminadas enquader‑
nadas em veludo azul guarnesido de prata avaliados em quatro mil reis ...........4V000
[l. 75] Hum livro escrito em pergaminho de mão de oitavo emquadernado em
veludo carmezim avaliado em oitosentos reis........................................... V800

387
Hum Breviairio em dous tomos de folha escritos de mão em pergaminho enqua‑
dernados em pasta enluminados, avaliados em seis mil reis ...................6V000
Hum livro antigo escrito em pergaminho que trata del rei dom Joam da guerra de
Seita de quarto em pasta avaliado em mil reis .....................................1V000
Livros em papel.
Historia general dos Reis de França de folha escritos per Gerardo seniúr (sic) ava‑
liado em oito sentos reis ......................................................................... V800
Annaes sagrados e profanos de Torneelo em dous tomos de folha avaliados em mil
e oitosentos reis....................................................................................1V800
[l. 75 vº] Historia das vida dos pontiices per Vitoreo de folha grande avaliado
em mil e seiscentos reis.........................................................................1V600
Hum livro del exercicio de cavalaria em Italiano de folha avaliado em quinhentos
reis ....................................................................................................... V500
Poleanteas (?) em tres tomos de folha grandes avaliado em dous mil e quatrosen‑
tos reis ................................................................................................2V400
Os Annais de Saleano em sete digo em seis volumes de folha grande avaliados em
quatro mil reis ....................................................................................4V000
As obras de Virgilio Comentadas por Laserda em três volumes de folha grandes
avaliados em dous mil e quatro sentos reis ..........................................2V400
As obras de Trajano bozalino de quarto avaliado em duzentos reis ........ V200
Joannis blacai argenis de oitavo avaliado em oitenta reis ......................... V080
[l. 76] Hora susessiva de quarto avaliado em dozentos reis ................... V200
As Republicas do Mundo em vinte e nove volumes pequenos de oitavo avaliados
em dois mil reis ...................................................................................2V000
Visente da Costa de Matos de quarto contra judeus em pergaminho avaliado em
duzentos reis ......................................................................................... V200
Sentensas do Conde do Vimiozo de oitavo em pergaminho avaliado em oitenta
reis ....................................................................................................... V080
A.H.F.C.B., Inventario que se fez de todos os bens que icarão per falesimento do senhor Conde
de Basto dom Lourenso pires de Castro que faleseo em Catalunha no lugar de fraga sem descen‑
dentes deixando por sua universal herdeira a senhora Condessa de Basto Dona Violante de Len‑
castre sua molher.

documento nº 57. início do século xviii. referência a uma


relíquia de são bruno ofertada a d. teotónio de bragança pelo grão
prior da cartuxa e por si dada ao mosteiro da cartuxa de Évora.

No anno de mil e seis centos e vinte e oito em que houve hum notavel eclypse na Lua
adoeceu o Senhor Dom Theodosio segundo deste nome e sexto duque de Bragança
de huma infermidade tão grave e perigosa que a todos dava poucas esperanças de

388
melhora, principalmente aos médicos que por desconiarem da doença não permi‑
tão que pessoa alguma entrasse a falar lhe. Era neste tempo prior da Cartuxa de
Évora o Padre Dom Antonio Coelho, o qual tendo noticia do evidente perigo em
que se achava aquelle principe partio Logo para Villa Viçoza acompanhado do
Padre Dom Alvaro da Fonseca, procurador do mesmo convento, Levando consigo
a inestimável relíquia do nosso Padre S. Bruno, que aqui se conserva dentro de
hum meio corpo de prata, para que o dito Senhor a adorasse em memoria do que
daquela sagrada relíquia era prenda que o Padre Geral da Grã Cartuxa tinha
mandado ao Illustrissimo Senhor Dom Theotonio de Bragança seu muito preza‑
do thio, e Fundador deste Real Convento.
Chegados pois os ditos Padres a Villa Viçoza forão admitidos a entrar na Ca‑
mera donde o dito Senhor estava doente, o qual para os receber se compoz na cama
com grande decencia, e o padre prior lhe mostrou a santa relíquia com toda a ve‑
neração e rezando com seu companheiro preces com a antífona e oração do santo
Patriacha, lha deu a beijar estando presentes o Senhor Dom Eduardo e Dom
Alexandre seus ilhos, os quais com os joelhos em terra tinhão duas tochas acesas
nas mãos. Depois que o infermo bejou e adorou a sagrada relíquia dice a seus i‑
lhos que elle coniava muito em Deos que lhe havia dar saúde, porquanto mereceu
ser visitado na sua infermidade por aquele santo. Retirou se o Padre prior Logo
para fora da camera, receando que o dito Senhor quisesse deixar em seu poder a
sagrada relíquia conforme ele tinha entendido. E foi Deos servido que no mesmo
instante se começarão a ver as melhoras tão evidentes, que na mesma noite acha‑
vão os médicos ao infermo Livre da febre, por cuja causa em breve tempo se vio
restituido à sua perfeita saúde.
Quis o Santo Patriarcha nesta ocasião agradecer à Serenissima casa de Bragan‑
ça os favores que a sagrada Religião Cartusiense lhe devia, pois se o Illustrissimo
Senhor Dom Theotonio de Bragança se dignou honrar a Religião introduzindo os
ilhos de S. Bruno neste Reyno, razão era que S. Bruno obrasse o prodígio de dar
saúde ao sobrinho do mesmo Senhor fundador desta casa, a cujo Real sangue esta
prometida a coroa deste Reyno. Permitio o Senhor se guardar na sucessão da mes‑
ma sereníssima casa os felizes auspícios de dilatados impérios para que o domínio
Lusitano possa arvorar o estandarte da santissima cruz entre as gentes que igno‑
rão o verdadeiro caminho da vida, e as mesmas gentes conheção que não ha outro
Deos senão aquelle que a nação portuguesa devia dar a conhecer em todo o mundo.

A.N.T.T., Manuscritos da Livraria, n.º 878 (Prado Cartusiano, em que se mostrão varias
Flores, e Plantas que tem lorescido na Sagrada Religião da Cartuxa, & donde se podem
colher grandes frutos para aproveirtamento dos amadores da Virtude), Cap. 36, l. 279.

389
Notas

543 A medida usada na avaliação das tapeçaria foi a «ana» castelhana («aulna»),
que segundo a Dra Manuela Santana correspondia a cerca de 65 ou 66 cm. Segundo
María Teresa Cruz Yábar, La Tapicería en Madrid (1570‑1640), Madrid, Instituto de
Estudios Madrileños, 1996, pp. 65-85, a «aulna lamenga» correspondia a 66 cm e era
utilizada nas inventariações por ser considerada mais rigorosa que o «palmo» (20,9
cm) ou a «vara castelhana» (83,5 cm). Os inventariantes das colecções eborenses tam-
bém utlizavam essa medida.
544 O manuscrito, de 928 ls., com 31 cm.­E., encadernado de carneira singela, bem
legível e em bom estado, constituiu o Lote 386 do Leilão nº 53 de Pedro d’Azevedo
Lda, em Maio de 2008.
545 Este manuscrito contém outras despesas posteriores ao triénio de 1587-1589
e que se estendem até ao ano de 1599. DOC. Nº 10.
546 Contam, apensos, vários recibos do artista lisboeta: de 30 de Janeiro de 1605,
respeitante a 25.800 rs, em que assina também Diogo de Leão, dourador, seu adjun-
to, morador em Lisboa (l. 66); em 14 de Fevereiro, respeitante a 20.000 rs, onde é
chamado «pintor de tempera» (l. 68); em 17 de Abril, respeitante a 20.000 rs (l. 72);
em 2 de Junho, relativo a 50.000 rs (l. 72); em 11 de Novembro, relativo à despesa
com o batefolha e à venda de um escravo, e a mais 11.000 rs da obra do retábulo (l.
73); a 17 de Julho, relativo a 4.000 rs (l. 75); e a 13 de Janeiro de 1606, relativo aos
derradeiros 13.000 rs pagos a Manuel Francisco (l. 76).
547 Apensa­se a ls. 33­88 deste livro de avulsos o contrato que a 8 de Junho de
1590 izeram Diogo Nobre, mestre carpinteiro de marcenaria, e João Fernandes,
carpinteiro, moradores em Évora, para fazerem a obra do cadeiral da capela-mor da
igreja do Carmo, por 64.000 rs em início de pago. Há vários recibos da obra (p. ex.,
de 16.000 rs a 7 de Julho de 1590, l. 87).
548 Rasura na margem inferior do documento.
549 Palavra de difícil leitura.
550 Rasura na margem inferior do documento.
551 Rasura na margem inferior do documento.
552 Rasura na margem inferior do documento.
553 Palavra de difícil leitura.
554 Este precioso documento (rascunho rasurado para uma memória), que julga-
mos ter sido redigida pelo antigo capelão de D. Teotónio, Padre Nicolau Agostinho,
pertenceu ao Chantre Manuel Severim de Faria e data do início do governo arquie-
piscopal de D. José de Melo (1611-1633).
555 Arquivo Distrital de Évora, Livro de emprestimo do dinheiro que se gastou na entrada
de Sua Magestade nesta cidade anno de 1619 (Câmara, Lº 7655, cx. 1), ls. 24 a 38. A 6 de
Maio, o Senado deu a Custódio da Costa a pintura a fresco do Arco da Porta da Ala-
goa, para a entrada real de Filipe III, colaborando na decoração (que demorou nove
dias a pintar) Diogo Vogado, Bartolomeu Sánchez e Manuel Fernandes II. A 6 de
Maio, Custódio da Costa recebeu 10.000 rs e, a 15 de Maio, 6.000 rs.

390
556 Sobre o Oratório, existe uma descrição de 1591 (A.D.E., Fundo Manizola, Cód.
61, Visitação dos Oratorios de Évora, ls. 50 e vº), onde se refere a presença de «hum re‑
tavollo da invocassam de Jhesus em hum painel com huma moldura a roda de bordo» (provavel-
mente um Calvário), e uma série de frontais de cetim de damasco (cf. Antónia Fialho
Conde, Arquitectura(s) no Paço dos Condes de Basto, confª na Fundação Eugénio de Al-
meida, Fevereiro de 2013).

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Apresentação e agradecimentos ...................................... 9

1. Évora tridentina, uma ‘nova Roma’ ............................ 13


1.1. A Ebora de D. Teotónio de Bragança ................................ 13
1.2. Novas linguagens para uma sociedade contra -
-reformista .............................................................................. 22
1.3. A pintura a fresco e a renovação artística .................... 28

2. A personalidade de D. Teotónio de Bragança ........... 41


2.1. Um príncipe da casa de Bragança ................................. 41
2.2. O múnus pastoral de Évora............................................. 46
2.3. O Arcebispo, os seus arquitectos e demais artistas .... 52

3. Formação artística na corte de Vila Viçosa ............... 77


3.1. Vila Viçosa, a «corte na aldeia» ......................................... 77
3.2. A fachada palatina ........................................................... 81
3.3. Nicolau de Frias e Pero Vaz Pereira ............................. 89

4. As obras catedralíceas de D. Teotónio .....................105


4.1. Um arcebispo-mecenas das artes ................................ 105
4.2. A decoração da capela-mor e dos altares laterais ..... 109
4.3. Paramentos, pratas e outros equipamentos ............... 121

5. O Mosteiro da Scala Coeli dos cartuxos de Évora ....133


5.1. O chamamento cartuxo ................................................ 133
5.2. A construção do mosteiro ........................................... 139
5.3. O retábulo da sacristia e outro equipamento artístico ...151
6. A revitalização do culto de São Manços ...................167
6.1. A relíquia do primeiro Bispo de Évora ...................... 167
6.2. Os templos dedicados a São Manços ......................... 172
6.3. As bases do ‘restauro storico’ ........................................... 175

7. Outros cultos renascidos e novas iconograias .........185


7.1. Os santos mártires da Tourega.................................... 185
7.2. São Torpes em Sines ..................................................... 189
7.3. São Romão, «São Vicente das irmãs» e São Brissos... ...192

8. D. Teotónio de Bragança e a Companhia de Jesus ..205


8.1. A Universidade de Évora e os padres inacianos ....... 205
8.2. Percursos coincidentes ................................................. 210
8.3. O tecto da sacristia do Colégio do Espírito Santo ... 213

9. D. Teotónio e o conceito tridentino de «restauro storico»...227


9.1. Uma pastoral atenta ao passado histórico ................. 227
9.2. O conceito baroniano de «restauro storico» .................. 230
9.3. De novo o arquitecto Pero Vaz Pereira ..................... 232

10. Sacrae imagines e cultos reactivados na paisagem cons‑


truída alentejana ...........................................................243
10.1. Novas iconograias tridentinas .................................. 243
10.2. Um conceito de ‘ars senza tempo ‘ aplicado ao Alentejo ...256
10.3. Um Arcebispo ilho de Trento .................................. 261

Elenco Documental ...................................................... 271


Bibliograia ...................................................................392
1. Retrato de D. Teotónio de Bragança.
Tela anónima da segunda metade do século XVII. Évora, Sé Catedral.

2. Conjunto monumental de Évora.


3. Gregório Lopes, Santa Helena e o milagre do reconhecimen‑
to da Vera Cruz (pormenor, com cavadores que buscam relíquias),
c. 1537-1540. Évora, Museu de Arte Sacra da Sé.
4. Mosteiro da Scala Coeli, ou da Cartuxa, em Évora,
fundação de D. Teodósio de Bragança, 1587-1604, com traça de Giovan-
ni Vincenzo Casale (1587) e direcção de Nicolau de Frias (1587-1598)
e Pero Vaz Pereira (1598-1604).

5. Pormenor da planta de Giovanni Vincenzo Casale (1587) para a igreja e


mosteiro da Cartuxa de Évora (pormenor). Biblioteca Nacional de Madrid.
6. Pormenor do andar inferior da fachada do Mosteiro da Cartuxa.
Ultimação de Nicolau de Frias.
7. Retábulo da Sacristia do Mosteiro da Cartuxa, c. 1589-1591.
Risco atribuído a Nicolau de Frias, imagem de Cristo de oicina madrilena,
talha de Diogo Nobre (?), pintura e dourado de Custódio da Costa.

8. Introduction del Symbolo de la Fe de Frei Luís de Granada,


exemplar da antiga Livraria da Cartuxa assinado por D. Teotónio de Bra-
gança (Biblioteca Pública de Évora, cota RES. 60).
9. Fernão Gomes, Scala Coeli, desenho para o antigo retábulo-
-mor da igreja do Mosteiro da Cartuxa de Évora, c. 1590-1600.
Biblioteca Pública de Évora.
10. Claustro pequeno do Mosteiro da Cartuxa,
traça de Pero Vaz Pereira, c. 1604.

11. Domenico Fontana (1543-1607), Della trasportatione dell’obeli‑


sco Vaticano et delle fabriche di Nostro Signore Papa Sisto V, fatte dal caua‑
lier Domenico Fontana architetto di Sua Santita : libro primo. - In Roma:
appresso Domenico Basa, 1590.-108, [4] f. : il. ; 2º (43 cm).
Cota do exemplar da BNP: res-2990-a.
12. Desenho de fachada romana sixtina,
por Domenico Fontana (Roma, 1590).
13. Relíquia de São Manços, peça de prata e cristal, cerca de 1592.
Museu de Arte Sacra da Sé de Évora.
14. Domenico Fontana, Della trasportatione dell’obelisco Vaticano et delle fabriche
di Nostro Signore Papa Sisto V, Roma, 1590.

15. Coluna dita de São Manços, no Oratório da Coluna, em Évora, funda-


da por D. Teotónio no lugar tradicionalmente tido como do martírio.
16. Fachada da igreja de São Manços, reconstruída e ampliada,
com manutenção da basílica paleo-cristã, 1594-1595. Traça atribuída à su-
pervisão de Pero Vaz Pereira.
17. Flanco da igreja de São Manços, incorporando as ruínas paleo-cristãs,
1594-1595. Traça atribuída à supervisão de Pero Vaz Pereira.

18. Pergaminho de autenticação da Relíquia de São Manços, 1596, com


belos medalhões maneiristas igurando os meios corpos de S. MANCIVS,
S. PRIMITIVS e S. FACVNDO, por Duarte Frizão (?); e texto de doação
da relíquia. Arquivo da Sé de Évora.
19. S. MANTIVS, S. MANÇIO, ou SÃO MANÇOS, lendário criado na
Última Ceia de Jesus Cristo, primeiro Bispo de Évora e mártir da era pa-
leocristã, em iluminura de Duarte Frisão (?) datada de 1596 e realizada a
mando de D. Teotónio de Bragança (Arq. do Cabido da Sé).
20. Duarte Frizão (fal. 1597), medalhão com SÃO PRIMICIO, per-
gaminho iluminado de autenticação da Relíquia de São Manços, 1596.
Évora, Arquivo do Cabido.

21. Duarte Frizão (fal. 1597), medalhão iluminado de São Facundo, perga-
minho de autenticação da Relíquia de São Manços, 1596, que era do Ora-
tório de São Manços da Coluna.
22. Retábulo epimaneirista, de c. 1620,
no Oratório de São Manços em Évora, com a imagem do santo bispo-
-mártir e telas com passos do seu hagiológio.

23. Casula do Arcebispo D. Teotónio. Peça de fabrico lorentino,


cerca de 1592. Museu de Arte Sacra da Sé de Évora.
24. Sebasto com grotesco de candelabra,
do acervo de paramentos de D. Teotónio de Bragança. Museu de Évora.
25. Fachada da igreja de São Tiago de Évora, com «renovação» do arqui-
tecto teotonino Pero Vaz Pereira, c. 1595-1600.

26. Igreja de S. Pedro da Gafanhoeira (Arraiolos), igreja reconstruída e


ampliada por instâncias de D. Teotónio, traça atribuída a Pero Vaz Pereira.
27. Nossa Senhora da Assunção, tábua de 1592, de Diogo Teixeira,
encomendada por D. Teotónio para remate do retábulo-mor da Sé.
Museu de Arte Sacra da Sé.
28. Decoração a fresco da Capela de São Lourenço da Sé de Évora, 1597,
por José de Escovar, com fresco, stucchi, medalhões, grotesco e estruturas
neo-constantinianas.

29. Decoração a fresco da Capela de São Lourenço da Sé de Évora,


por José de Escovar, 1597 (pormenor).
30. Giraldo Fernandes de Prado, São João Evangelista,
pormenor do fresco da antiga Enfermaria cisterciense do Convento de
São Bento de Cástris, c. 1580-1585.
31. Igreja de S. Brissos (Montemor-o-Novo): frescos do iní-
cio do século XVII com representação de mártires eborenses,
por José de Escovar e sua ‘equipa’.

32. Interior da igreja de Nossa Senhora de Machede,


com decoração de c. 1625-30 (púlpito, stucchi, frescos, azulejos),
com supervisão do arquitecto Pero Vaz Pereira.
33. Fachada com exonártex da igreja de Nossa Senhora da Graça do Divor
(Évora). Traça atribuída a Pero Vaz Pereira. No frontão, a invocação latina
DIVORVUM HANC MOLEM DOMINAE POSVERE COLONI GRA‑
TIA SVBTANT OMNINE CERTA MANET.

34. Decoração teotonina da igreja de Nossa Senhora da Graça do Divor,


com stucchi e frescos de c. 1595-1600. Supervisão de Pero Vaz Pereira.
35. Decoração teotonina da igreja de Nª Sª da Graça do Divor,
com stucchi e frescos de c. 1595-1600

36. Decoração teotonina da igreja de Nª Senhora da Graça do Divor, com


stucchi e frescos de c. 1595-1600, supervisão do arquitecto Pero Vaz Perei-
ra, pintura e dourado de Custódio da Costa (?).
37, 38 e 39. Complexo hierofânico de Nossa Senhora da Tourega,
com ruínas da Fonte Santa e da ermida, lugar de alegado martírio das
Santas Comba e Inonimata.
40. Capela-mor teotonina da igreja de Nossa
Senhora da Assunção da Tourega, de im do século XVI,
com obra de massa e retábulo tardo-maneirista.

41. São Jordão, pintura do retábulo da igreja de Nos-


sa Senhora da Assunção da Tourega, de im do século XVI,
atribuída ao chamado Mestre de São Brás.
42. São Manços, pintura atribuída a Sebastião Lopes, c. 1550-60, no Museu
de Arte Sacra da Sé de Évora.

43. São Amaro, São Bento e São Romão, painel de um antigo altar da Sé, por Fran-
cisco de Campos, cerca de 1560-1570. Évora. Museu de Arte Sacra da Sé.
44. São Vicente, suas irmãs Sabina e Cristeta, e Santo António, painel de um
antigo altar da Sé, por António de Oliveira (?), c. 1575-1580. Évora.
Museu de Arte Sacra da Sé.
45. Invenção da Santa Cruz, por Simão Rodrigues
(Sacristia do Carmo de Coimbra, 1605).
46. Invenção da Santa Cruz, gravura de Giovan Battista Cavalieri
(segundo Livio Agresti), 1569.
47. Conversão de São Paulo, por Francisco João, c. 1580-85,
igreja matriz de Pavia.
48. Giuseppe Valeriano, Cristo cruciicado, c. 1579. Évora, col. privada.

49. Ático do retábulo da igreja de São Vicente de Évora, com o Calvário


miguelangesco inspirado em modelo do Padre Giuseppe Valeriano, e duas
das tábuas com martírios de São Vicente, Sabina e Cristeta.
50. Mestre de S. Brás (Duarte Frizão ?), Martírio de S. Brás.
Conjunto e pormenor. Cerca de 1565. Évora, Ermida de S. Brás.
51. Autor Desconhecido, Martírio de S. Brás, im do século XVI. Igreja de
Caridade (Reguengos de Monsaraz).
52. Degolação de São Cucufate, fresco anónimo de 1621. Capela de São Brás,
Vila de Frades (Vidigueira).

53. Martim Valenciano (?), Martírio de S. Brás. Pormenor. Cerca de 1640.


Igreja de S. Brás do Regedouro, Évora.

54. Fresco ingénuo de 1598, de oicina maneirista eborense, com o baptis‑


mo, julgamento e martírio de S. Gens. Igreja de S. Gens, Montemor-o-Novo.
55. José de Escovar, Calendário: Alegoria ao Mês de Maio, 1605. Refeitório do
Mosteiro de São Bento de Cástris, Évora.

56. Estampa com Nossa Senhora do Loreto, apreendida pela Inquisição de


Évora no processo do frade cartuxo Olivier Brisom, em 1591 (A.N.T.T.).
57. Fachada do Paço Ducal de Vila Viçosa, sede da Casa de Bragança, tra-
ça de Nicolau de Frias (cª 1583-1603), acabamento de Pero Vaz Pereira.
58. Sala da Batalha de La Goleta do Paço de São Miguel, dos Condes de
Basto, com frescos maneiristas encomendados por D. Fernando de Castro,
1º titular, da autoria de Tomás Luís e colaborador.
59. Milagres do Rosário, frescos da Capela de Nossa Senhora do Rosário de
Outeiro Seco, Chaves, de início do século XVII, inspirados em histórias
do livro do jesuíta João Rebelo Historia dos milagres do Rosario da Virgem Nos‑
sa Senhora, editado em Évora em 1599.

60. Armas de D. Teotónio de Bragança, Arcebispo de Évora.


61 e 62. Pormenores da decoração mural da Sacristia do Colégio do Espí-
rito Santo de Évora, de 1599.

(fotograias de Artur Goulart e do autor)

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