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ENSINO DE HISTÓRIA: ENTRE TEORIAS E VIVÊNCIAS

Marcia Regina de Oliveira Lupion


(Universidade Estadual de Maringá)

Resumo. Refletir acerca das tentativas de aplicação das teorias propostas nas
Diretrizes Curriculares do Paraná no Ensino de História em nível fundamental e das
vivências dela resultantes.

Palavras-chave: Diretrizes Curriculares; Estado do Paraná; Ensino; História;


Vivências.

Um sujeito é fruto de seu tempo histórico, das relações sociais em que


está inserido, mas é, também, um ser singular, que atua no mundo a
partir do modo como o compreende e como dele lhe é possível
participar.

Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná para o Ensino de História 1.

Introdução e Justificativa

Refletir acerca da prática em sala de aula é sempre um desafio, afinal,


acabamos expondo algo que nos é bastante caro, e mesmo íntimo, que é “como
damos aula”. Com isso corremos o risco de ter nosso trabalho questionado assim
como nossos métodos e resultados. Mas, por outro lado, ao nos expormos abrimos
caminhos para outros que também estão em busca de novas formas de ensinar assim
como podem surgir outros cuja experiência, ao ser compartilhada, enriquece nosso
trabalho.
É por isso que nos propomos discorrer sobre o ensino de História considerando
o documento norteador que são as Diretrizes Curriculares para o Ensino de História
no Paraná e, refletir para além dessa documentação ao expor como e se os
pressupostos teóricos e metodológicos presentes nesse documento de fato se
efetivaram ou não em sala de aula.

1
Diretrizes curriculares de História. Disponível em <
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/dce_hist.pdf> Acesso em 28
jan. 2013. p. 14.
Com essas premissas acreditamos ser possível iniciar uma discussão na qual
o ensino de História seja pensado considerando as interferências que subjazem ao
trabalho em sala de aula e que se apresentam no momento em que professor e aluno
se encontram no mesmo espaço físico que é a própria Escola.
Esperamos que com a reflexão aqui proposta o olhar sobre o fazer em sala de
aula seja compreendido como um trabalho cujos resultados visam sobretudo a
formação humana dos alunos e alunas dentro da qual os conhecimentos científicos
associados aos saberes trazidos pelos educandos intencionam tornar a vivência
individual e coletiva no ambiente escolar, mas não somente neste, enriquecedora por
meio exatamente da valorização desse encontro de saberes.
A experiência aqui relatada ocorreu em quase cinco anos de trabalho no
Colégio Estadual Dirce de Aguiar Maia, na cidade de Maringá, estado do Paraná onde
fui professora de História, Ensino Religioso e Sociologia entre os anos de 2012 até o
início de 2016.

Objetivos

De forma geral, esse texto então se propõe apresentar uma reflexão acerca do
ensino de História cujo referencial teórico e metodológico foram as Diretrizes
Curriculares do Estado do Paraná (DCs) publicadas em 2008 para essa disciplina e,
de forma específica, considera ainda como se deu essa vivência em sala uma vez que
a “cultura escolar” (BITTENCOURT, 2004, p. 38) impõe desafios ao fazer pedagógico
que influenciam de maneira significativa no processo de elaboração do conhecimento
junto aos alunos e alunas.

Resultados

Após cinco anos de trabalho em sala de aula fica fácil compreender porque
trabalhos recentes sobre o ensino como um todo e o ensino de História em especial
buscam enfatizar a importância da valorização dos saberes internos e externos ao
espaço escolar. Afinal, a partir dos anos 1990 tanto o aluno quanto a escola passam
a ser compreendidos dentro de uma outra lógica pedagógica e social na qual não há
hierarquia entre o sujeito e a instituição. Inclusive, autoras como Circe Bittencourt
(2004, p. 38) refletem acerca da escola como uma instituição que obedece a uma
lógica particular e específica “da qual participam vários agentes, tanto internos quanto
externos” mas, que deve ser considerada como um lugar de produção de um saber
próprio. As disciplinas então e a partir dessa perspectiva, devem ser analisadas como
parte integrante da cultura escolar, exatamente para que as relações com o exterior,
com a cultura geral da sociedade estejam vinculadas à produção de saberes
escolares.
Sendo a escola compreendida “como o espaço do confronto e diálogo entre os
conhecimentos sistematizados e os conhecimentos do cotidiano popular” (DCs, 2008,
p. 21) quando da organização do programa da disciplina de História para os alunos
do ensino fundamental do 6º ao 9º ano buscou-se a elaboração do mesmo de acordo
com a DCs e também considerando o Caderno de Expectativas de Aprendizagem
referentes à disciplina de História cuja proposta é constituir-se

[...] numa referência de avaliação do processo pedagógico, bem como


do conhecimento auferido pelos alunos, que, de acordo com as
Diretrizes Curriculares da Educação Básica – História (2008, p. 83), se
caracteriza pelas “condições de identificar processos históricos,
reconhecer criticamente as relações de poder neles existentes, bem
como intervirem no mundo histórico em que vivem, de modo a se
fazerem sujeitos da própria História”. (CADERNO DE
EXPECTATIVAS, 2012, p. 61)

Além disso, agregou-se à proposta pedagógica o pressuposto acerca do


método investigativo pautado sobretudo no trabalho com fontes históricas diversas,
na problematização dos conteúdos, na fundamentação teórica e na organização
estruturada por narrativas produzidas pelos sujeitos como proposto pelas DCs (2008,
p. 69). A organização dos conteúdos partindo dos Conteúdos Estruturantes marcados
pelas Relações de Poder, Relações de Trabalho e Relações Culturais foram
essenciais para estabelecer os parâmetros sobre os quais seriam estudados os
conteúdos básicos e específicos.
Em termos teóricos, adotou-se o proposto pelo historiador alemão Jörn Rüsen
acerca do conceito de consciência histórica e também da historiadora portuguesa
Isabel Barca sobre a Educação Histórica (2001). Numa síntese um tanto quanto
simplista, podemos resumir as propostas destes historiadores acerca da consciência
histórica como o processo no qual os homens interpretam sua experiência no mundo
e de como essa experiência pode orientar, intencionalmente, sua vida prática no
tempo. Ou seja, é a constituição do sentido das experiências no tempo de tal forma
que essas experiências sejam utilizadas como referência para ações no presente
assim como para o exercício da alteridade (DCs, 2008, p. 57).
Além dos pressupostos teóricos acima descritos referentes à Educação
Histórica, o planejamento dos conteúdos e métodos considerou o processo avaliativo
a partir como o proposto pelas Diretrizes a qual considera que a “avaliação deve estar
a serviço da aprendizagem de todos os alunos, permeando o conjunto das ações
pedagógicas, e não como elemento externo a esse processo” (DCs, 2008, p. 78).
Adotou-se então uma perspectiva de avaliação considerando três modelos
avaliativos sendo o diagnóstico, o formativo e o somatório. A opção pela adoção dos
três modelos foi baseada exatamente por compreender a sala de aula como um
espaço de diversidade de sujeitos e, portanto, de múltiplas formas de relacionamento
com o saber. Ou seja, os alunos e alunas aprendem e interagem com os conteúdos
de formas diversas e portanto, as avaliações devem acompanhar essa diversidade.
Um modelo único de avaliação poderia limitar as possibilidades de expressão do
aprendizado por parte dos alunos o que comprometeria todo um trabalho anterior e,
em último, poderia levar à mudanças metodologias na preparação das aulas quando
na verdade, somente o método avaliativo é que colocara em risco o trabalho
desenvolvido anteriormente.

Assim, tanto conteúdos estudados quanto métodos de avaliação e


fundamentos teóricos foram organizados dentro do planejamento da disciplina numa
tentativa de reproduzir em sala de aula o que propunham os documentos norteadores
sem perder de vista a questão da cultura escolar. Em sala porém, o que parecia tão
bem organizado na teoria, mostrou-se difícil de ser implementado na prática. Essas
dificuldades se apresentaram em diferentes dimensões como por exemplo, a
resistência dos alunos e alunas ao ensino de História, a dificuldade em trazer para a
sala de aula um número expressivo de documentos para investigação e análise, os
diversos níveis cognitivos e as diferentes faixas etária dos alunos e, sobretudo, o
Projeto Político Pedagógico (PPP) que não permitia avaliações formativas como
método de verificação de aprendizagem. Todas essas situações foram
compreendidas como elementos que interferem no processo de produção do
conhecimento em sala de aula e não foram vistos de forma negativa e sim como
elementos presentes na própria estrutura da cultura escolar e que podem ser
modificados mediante um trabalho sistemático de análise da realidade escolar em
consonância com as propostas teóricas e pedagógicas da disciplina.
Diante dessa estrutura foram elaboradas estratégias que, pouco a pouco
tornaram o ensino de História menos “opressor” para os alunos. Essas estratégias
estavam ligadas exatamente às propostas presentes na DCs e na perspectiva da
Educação Histórica para o trabalho em sala de aula. O uso do Datashow e do Livro
Didático tornaram-se alternativas para a ausência de documentos em número
suficiente para os alunos assim como trabalhos de pesquisa realizados no Laboratório
de informática. Problematizar a realidade dos alunos como introdução aos conteúdos
também mostrou-se um método bastante eficaz para relacionar presente-passado-
presente como proposto pela ideia da História como elemento orientador das ações
no presente cujo reflexo será a construção da sociedade futura. Ao realizar esse
exercício, os alunos e alunas perceberam-se como sujeitos da história e, acima de
tudo, como recebem influência do seu momento histórico podendo intervir ou não num
processo de mudança social.
Noutras vezes, o trabalho desenvolvido em sala problematizou questões
presentes como a legalização das propriedades das comunidades quilombolas e
capacitou os alunos a refletirem acerca de questões como a propriedade privada e as
lutas de determinados grupos para manterem tanto o seu espaço físico quanto sua
cultura em meio a valores opostos como os oriundos do mundo capitalista. Nesse
sentido, a aula sensibilizou os alunos e também demonstrou historicamente como se
dão as relações de poder dentro da sociedade capitalista e de como as relações
culturais serviram, muitas vezes, como elemento aglutinador desses grupos sociais e
suas vivências. Considera-se por meio de exemplo, como o currículo do ensino de
História trabalha com a intencionalidade política ao elencar determinados conteúdos
e abordá-los considerando as dimensões de poder, de trabalho e culturais.
Contudo, ainda restava o PPP. Como um documento norteador das atividades
pedagógicas na escola, o PPP não contemplava uma proposta efetiva de avaliação
marcada pelo processo formativo e, nesse sentido, não houve a possibilidade efetivar
esse processo de avaliação em sua forma integral. Com isso perdeu-se não foi
possível avaliar potencialmente o trabalho desenvolvido de acordo com as DCs e a
proposta da Educação Histórica. Além disso, o número expressivo de conteúdos a
serem estudados para cada ano/série nem sempre permitia que todos os conteúdos
fossem trabalhados de forma devida. Por vezes, aulas montadas a partir de temas
foram mais eficazes nesse sentido uma vez que aulas com essa perspectiva permitem
um passeio por diversos momentos históricos em busca de vestígios acerca de
determinados temas. Contudo, o ensino de história pautado em temas é característico
apenas do ensino médio enquanto de no fundamental a opção proposta pelas DCs é
de um estudo sistematizado da História que permita “acesso ao conhecimento de
múltiplas ações humanas no tempo e no espaço” (2008, p. 74) colocando a história
local e nacional como referência para os estudos.

Considerações Finais

O trabalho realizado no colégio Dirce de Aguiar Maia mostrou-se bastante


produtivo como se pode observar quando das avaliações. Contudo, é importante
destacar que nem sempre o referencial avaliativo foi pautado pelo Caderno de
Expectativas de Aprendizagem, muitas vezes tomou-se como referência objetivos
marcados pela relevância de determinados conteúdos e que foram estabelecidos pela
professora com base em suas próprias experiências e estudos como historiadora.
Sem pretender elaborar uma conclusão para o exposto acima, considera-se que ainda
muito precisa ser realizado para que o ensino de História possa ser aplicado de acordo
com os documentos norteadores. Uma das questões que o trabalho levantado
suscitou foi o número expressivo de conteúdos a serem estudados em cada ano/série
e que inviabilizam um trabalho extenso em sala de aula dos próprios conteúdos.
Até que o sistema educacional apresente uma outra organização marcada
exatamente pela valorização da diversidade dos sujeitos presentes na sala de aula
assim como da diversidade das formas de ensino e aprendizagem como por exemplo,
por meio de salas com um número reduzido de alunos, nós professores de História do
ensino público, seja ele fundamental ou médio, necessitamos organizar nosso
trabalho a partir de referências comuns que, por vezes necessitam ser revistos,
repensados e reescritos, mas, que sem dúvida são orientadores do nosso fazer
pedagógico.
Teorias e vivências em sala de se mostraram então complementares quando o
trabalho pedagógico foi organizado a partir das teorias propostas e da DCs e tendo a
cultura escolar como um fator essencial a ser considerado. Pois, compreender a
escola como mais um espaço de conhecimento é compreender a complexidade da
sociedade em que estamos inseridos.

Referências

BARCA, I. Educação Histórica: uma nova área de investigação. Revista da Faculdade


de Letras. História, v. 2. Porto: 2001. p. 13-21.
BITTENCOURT, C. M. F. Conteúdos e métodos de ensino de História: breve
abordagem histórica. In: _____ . Ensino de História: fundamentos e métodos. São
Paulo: Cortez, 2004. (Coleção docência em formação. Série ensino fundamental.
CADERNO DE EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM. Disponível em <
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/caderno_expectativa
s.pdf> Acesso em 28 jan. 2013.
DIRETRIZES CURRICULARES DE HISTÓRIA. Disponível em <
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/dce_hist.pdf>
Acesso em 28 jan. 2013.

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