Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Gontijo, R. A. G., & Morais, M. R. R. O homem feminino na atualidade pensado à luz da Psicanálise
Resumo
Este artigo é uma pesquisa teórica que visa a percorrer os estudos de Freud e Lacan acerca do
feminino. Desde os primórdios da Psicanálise, Freud discutiu a questão do feminino na histeria. Para o
autor, a falta do pênis – penisneid – na mulher tornou-se a marca da feminilidade ao abordar a
anatomia como destino para falar de sexualidade, considerando a anatomia como corte imbuído de
consequências na dinâmica psíquica do sujeito. Mais tarde, Lacan ampliou essa visão tratando a
questão em termos de significante. Para explicar isso, ele criou a tábua da sexuação, privilegiando os
diferentes modos de gozo para dizer também do que é ser homem ou ser mulher pelo olhar da
Psicanálise. Por meio deste estudo, ratificamos que o feminino aponta para a falta, no sentido de que
está associado à figura da mulher, mas a pergunta que perpassa esta investigação é: pode um homem
ser feminino? A resposta à indagação relaciona-se com o declínio do viril na atualidade. A nova
vestimenta que o homem utiliza diante do afrouxamento do modelo patriarcal é ser feminino ou
feminilizar-se.
Abstract
This article is a theoretical research that aims to go through Freud and Lacan’s studies about the
feminine. Since the beginning of Psychoanalysis, Freud discussed about the feminine in the hysteria,
and the lack of penis became a mark of femininity, considering the anatomy as a destiny to talk about
sexuality. Lacan expanded this vision by treating this question in terms of signifier.To explain that, he
created the “sexuation board”, approaching what it means to be man or woman by the
Psychoanalysis’s look. Through this study, we ratify that the female points to the lack, in the sense that
it is associated with the woman’s figure. But the main question that runs through this investigation is:
can a man be feminine? The answer to this question relates to the virile decline nowadays. The new
garment that man wears in the face of patriarchal loosening is to be feminine or to become yourself
feminized.
Resumen
1
Doutora em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em Psicologia pela
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Especialista em Psicopedagogia clínica e
institucional e Educação Especial. Graduada em Psicologia pela Universidade do Estado de Minas Gerais
(Uemg), Unidade Divinópolis. E-mail: raggontijo@hotmail.com.
2
Graduada em Psicologia pela Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), unidade Divinópolis. E-mail:
miriamorais.morais7@gmail.com.
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 2 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Este artículo es una investigación teórica que tiene como objetivo analizar los estudios de Freud y
Lacan sobre lo femenino. Desde los albores del Psicoanálisis, Freud ha cuestionado el tema de lo
femenino en la histeria, y la falta del pene se ha convertido en el sello distintivo de la feminidad,
considerando la anatomía como el destino para hablar sobre la sexualidad. Lacan amplió este punto de
vista al tratar la cuestión en términos de significante. Para explicar esto, creó la tabla de la sexuación,
abordando lo que es ser hombre o ser mujer desde la perspectiva del Psicoanálisis. Pero la pregunta
que atraviesa esta investigación es: ¿puede un hombre ser mujer? La respuesta a la pregunta se refiere
al declive de los hombres hoy. La nueva prenda que usa el hombre ante el aflojamiento del modelo
patriarcal es ser femenina o feminizarse.
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 3 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 4 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 5 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 6 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 7 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 8 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 9 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
liga a uma imagem acústica – impressão Lacan (1957-1958/1999) coloca dos três
psíquica, representação, significante. tempos do Édipo, tempos lógicos.
Assim, Lacan (1958/1998) vai Essa passagem é importante porque
ampliar a ideia de Freud sobre o falo, Lacan (1957-1958/1999) introduz o
tirando toda a centralidade da anatomia e significante Nome-do-Pai como o operador
passando a dar significância pela via da da trajetória edipiana, abordando a função
linguagem. paterna como simbólica e, por isso,
operando metaforicamente. Não se trata,
O falo é aqui esclarecido por sua função. Na necessariamente, da presença paterna, mas
doutrina freudiana, o falo não é uma de um significante que substituirá outro
fantasia, caso se deva entender por isso um
efeito imaginário. Tampouco é, como tal,
significante – o Nome-do-Pai substituirá o
um objeto (parcial, interno, bom, mau etc.), Desejo da Mãe, desejo sem lei, caprichoso
na medida em que esse termo tende a prezar –, e essa operação possibilitará a
a realidade implicada numa relação. E é significação fálica para o sujeito: “Em
menos ainda o órgão, pênis ou clitóris, que outras palavras, o pai como aquele que é
ele simboliza. E não foi sem razão que Freud
extraiu-lhe a referência do simulacro que ele
culturalmente portador da lei, o pai como
era para os antigos. Pois o falo é um investido pelo significante do pai, intervém
significante, um significante cuja função, na no complexo de Édipo de maneira mais
economia intersubjetiva da análise, levanta, concreta, mais escalonada, por assim
quem sabe, o véu daquela que ele mantinha dizer” (Lacan, 1957-1958/1999, p. 194).
envolta em mistérios. Pois ele é o
significante destinado a designar, em seu
No primeiro tempo do Édipo, a
conjunto, os efeitos de significado, na criança encontra-se assujeitada à mãe, ou
medida em que o significante os condiciona seja, seu desejo é o desejo da mãe. A
por sua presença de significante. (Lacan, criança identifica-se com o objeto que
1958/1998, pp. 696-697). supõe ser o objeto de desejo da mãe,
aquele que lhe falta, que é exatamente o
Portanto, para Lacan, o falo é um falo: “Se o desejo da mãe é o falo, a
significante. A importância de colocá-lo criança quer ser o falo para satisfazê-lo”
nesse lugar diz respeito justamente ao fato (Lacan, 1958/1998, p. 700).
de que muitas confusões significativas na O pai entra como mediador dessa
teoria analítica quanto ao papel do objeto relação no segundo tempo do Édipo,
fálico, inclusive no que concerne à questão ditando a lei para a mãe – a proibição do
da mulher, eram frequentes antes. Cabe incesto. Ele intervém no desejo da mãe,
ressaltar que, embora houvesse prevalência privando-a de seu objeto – a criança
do falo na obra de Freud, ele não o identificada com o falo. Se for ele quem
representou como um atributo significante, supostamente o tem, esse é o seu lugar de
como Lacan o fez em sua extensão do direito e, assim, ao apresentar-se como
termo. tendo direito à mãe, frustra a criança de ter
Desse modo, faz-se necessário a mãe como seu objeto, ou seja, ela agora
considerar a relação entre o falo e a tem um rival e impede a mãe de reabsorver
castração, pois o falo vai operar junto com o objeto. Cabe à mãe, nesse momento,
o conceito de castração, sendo tomado reconhecer a palavra do pai como lei para
como o significante do desejo e de sua lei, ela e, dessa forma, direcionar seu desejo a
e não porque o pai supostamente porta o ele para que assim a criança se confronte
falo. Para se pensar nisso, podemos também com a lei e a simbolize, cabendo a
ampliar a ideia dos escritos freudianos, no ela aceitar ou não essa privação feita à mãe
que diz respeito à mítica de Freud em pelo pai.
relação ao Édipo, e introduzir ao que
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 10 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 11 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
de mulher, ficando-lhe um resto que não sejam “homens”, estão situados do lado
passa pela função fálica. mulher. Assim, ele vai articular a diferença
Assim sendo, no decorrer de sua sexual por meio da lógica do todo fálico e
obra, Lacan vai desenvolvendo do não-todo, não consistindo em uma
proposições explicativas quanto à divisão divisão entre dois sexos, mas entre dois
do sujeito na sexualidade e, em modos de gozos – o fálico e o suplementar
consequência disso, vai tentando elucidar a –, que vão depender de como o sujeito irá
questão da feminilidade, e será no se situar diante da função fálica, pois, de
Seminário 20: mais, ainda que o autor irá acordo com Bessa (2012, p. 80), “há uma
nos apresentar a tábua da sexuação, na qual função de gozo ligada à castração e ela
ele busca delimitar dois modos de gozo, determina um modo de gozar particular
para além das identificações edípicas. para cada sujeito”.
Como exemplo, os místicos, mesmo que
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 12 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 13 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
por meninas – o que legaliza sua viril como modo de fazer apelo ao amor”
heterossexualidade –, não parece “ocupar (Guimarães, 2005, p. 72).
uma posição que, aos olhos do analista, Por esse ângulo, podemos dizer que
possa ser caracterizada como viril. Ao o homem, para dar conta da mulher atual,
contrário, tal posição é explicitamente que se constitui fálica, feminiliza-se, pois
qualificada como passiva, ou mesmo como ela o destitui do seu poder fálico. Ele usa
uma evidência clínica do declínio do viril” do feminino como uma forma de lidar com
(Santiago, 1998, p. 131). essa questão. Usa da expressão do
Partindo por outra via, podemos feminino para ser homem, e faz isso para
pensar também o homem feminilizado suturar, esconder a castração, ao mesmo
como outro sufixo que diz respeito à tempo em que a escancara.
configuração do feminino no homem, mas Assim, temos, quanto às incidências
como expressão, no que consideramos a do feminino no homem atual, um homem
feminilidade uma expressão do feminino. sexuado masculino, mas que se posiciona
Guimarães (2005), ao levantar uma de maneira feminina diante da fragilização
discussão acerca da máscara da da identificação com um pai inoperante, e
feminilidade contemporânea, referindo-se um homem que faz semblante do feminino
às mulheres que estão cada vez mais perante as mulheres fálicas da atualidade.
deixando de lado a questão do amor – que, Com o declínio do viril, o homem teve de
como vimos, fala de seu gozo –, em usar uma nova roupagem para se
detrimento das conquistas alcançadas nos apresentar para as mulheres, para estar
mais variados campos, como o jurídico e o diante das mulheres, tornando-se feminino
econômico, aponta, como consequência ou feminilizado.
disso, a feminilização do homem – uma Portanto, a contribuição lacaniana de
súplica ao amor das mulheres. A autora diz pensar os modos de gozo pela tábua da
que ele sexuação, destitui o binarismo de gêneros e
permite transitar pela lógica do todo e não-
formula esta súplica pela via do semblante, todo fálico, no qual ratifica a ideia de que o
utilizando tão sabiamente estratégias homem, mesmo portando um órgão, não
próprias à histeria. Vestindo uma nova
roupagem do homem pós-moderno faz
necessariamente se inscreve na posição
surgir o homem “metrossexual”, que tenta se masculina. A masculinidade e a
feminilizar com os adereços estéticos feminilidade são atribuições do modo de
propostos pelas histéricas contemporâneas, gozo do sujeito.
que fazem desse homem o seu novo Já em Freud (1937-1939/1975), foi
brinquedo. E, se deixando assim se fazer de
feminilizado, sustenta um apelo ao
observado que homens e mulheres têm em
romantismo. Súplica muda desse homem tão comum a “recusa da feminilidade”, ou
fragilmente dependente do amor de uma seja, esse continente negro como um
mulher. (Guimarães, 2005, p. 70). enigma perante a castração torna-se um
impasse na vida psíquica dos seres
Dessa forma, ela defende que essa humanos no que diz respeito à resposta ao
tem sido a estratégia que alguns homens da atributo fálico. Hodiernamente, com a
atualidade vêm utilizando para conseguir queda do falocentrismo, o homem busca
fazer laço de parceria com as histéricas: novas ferramentas fálicas para resolver
“Ele já se apresenta como castrado, esse impasse. Daí, a sua posição passiva
destituído de qualquer potência fálica que identificada ao feminino.
lembre de perto alguma sombra daquilo
que as histéricas feministas definem como Considerações finais
machismo. Cultivam, assim, o declínio do
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 14 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463
Página 15 de 15
Gontijo, R. A. G. & Morais, M. R. R., O Homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise
A revista PPP está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(3), São João del-Rei, julho-setembro de 2021. e-3463