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Uma pedagogia perfeita não serviria

para formar um homem, o qual tem a necessidade


de que se seja com ele, ao mesmo tempo, bom e
mau para que atinja sua estatura. O vício de uma
educação sistemática é não produzir mais que um
homem-criança, como o são na maior parte das
vezes os filhos primogênitos.

Tentava abolir em mim essa regra aristocrática que


orienta todos os jovens professores: não dar a aula
senão para os melhores. É preciso pensar nos
piores, dizia a mim mesmo, cansado de mudar de
opinião toda vez que era informado da visita do
inspetor, cuja função é só a de fazer falar os
melhores e, por aí, julgar o trabalho do ensino.
Procurei sempre abrir os cérebros fechados, os
cérebros rudes, pensando que, se obtivesse
qualquer resultado com os alunos medianos, os
melhores nos seriam dados por acréscimo. Sócrates
falava às pessoas simples de Atenas e surgiu Platão.

O peso mais
duro para a alma é não saber o que é necessário
fazer. Aquele que tomou um partido pode vir a
sofrer da perda de seus bens ou da resistência das
vontades que lhe são hostis, mas não mais sofrerá
de incerteza. (Seja decidido)

É que a falta do objeto exterior faz surgir em


nosso centro um impulso que o substitui; é o eu
substituindo a coisa, é o gênio. Todas as vezes que
substituímos um objeto por um auxílio vindo de
nosso interior, estamos no caminho da renovação
de nós próprios e do mundo. De modo que nunca é
necessário lamentarmos demasiado pelos que
sofrem de uma falta, desde que eles tenham feito o
juramento de perseverarem. As condições mais favoráveis nem sempre são as
melhores, tanto o homem desperdiça aquilo que
possui em superabundância. Como explicar que os
universitários, cuja ocupação é aprenderem a
pensar e a escrever, produzam menos obras
duráveis que esses amadores que escrevem à
maneira clandestina de descontração?

Esse momento é penoso. Poucos o suportariam, se


a necessidade não os obrigasse. Foi bom que
Balzac tenha sido crivado de dívidas: sem isso, as
suas produções adormeceríam nele, em vez de se
transformarem em livros. Se não fôssemos
obrigados a trazer à luz a nossa maré interior,
nunca se exprimiria nada. É uma grande dor dar um
corpo ao pensamento, “crucificarmo-nos à caneta”,
como Lacordaire aconselhou a Ozanam.
É bom ser coagido à obrigação limitada pelo
tempo; é até mesmo útil que nos falte o tempo
necessário.

O que provoca a
força de uma tentação não são os desafios do mal,
mas o sorriso do bem que está ali misturado.

Na verdade, o que unicamente seria digno de


absorver a atenção é o fato iluminado por uma
idéia; ou seja, a idéia encarnada no fato. Todo o
espírito das ciências reside nisso. O puro fato não
tem existência. O que deve ser objeto de nossa
pesquisa não é o fato puro, e sim, o fato na medida
em que ele nos transporta a uma lei geral. E, do
mesmo modo, uma lei pura e abstrata não é
concebível: a lei deve sintetizar uma multidão de
fatos.

O instinto do gênio consiste em reparar nas coisas


singulares que contém em si o universal em
potência e que são suscetíveis de dar-nos, graças ao
acréscimo da analogia, muitos outros
conhecimentos. (Acerca de Simbólica)

Um escritor, normalmente, ama a solidão e


não pode suportar uma presença estranha perto de
si. E por outro lado, um jovem imagina de bom
grado que vai perder o seu gênio se freqüentar a
escola. Idéia falsa essa, assim o creio, porque a
verdadeira originalidade desenvolve-se no seio de
uma cultura e não a partir do nada, e o talento,
quando existe, não pode extrair de um tal
intercâmbio senão facilidades para se descobrir a si
mesmo.

Certamente aos estudantes não falta talento ou


gênio. O infortúnio é que eles têm demasiadas
idéias, que não sabem escolher uma só e
desenvolvê-la: é como se a natureza quisesse
compor uma árvore que fosse simultaneamente
faia, carvalho e bétula, e não pudesse resignar-se
com as espécies. (Acerca de argumentação e estudos/pesquisa).
Assim, o trabalho que se deve aconselhar à
juventude não consiste só em recolher idéias ou
informações, e amontoar frases sobre frases, mas,
ao contrário, em escolher uma idéia e desdobrá-la,
como um tecido, completamente. Era esse trabalho
que outrora ensinava a retórica.

Para nos fazermos compreender é


necessário, pois, decompor tanto quanto possível:
dizer apenas uma coisa de cada vez. Mais ainda: é
preciso repetir. Em
todos os casos, para exprimir um pensamento é
necessário depurá-lo, discernindo quer os aspectos
que o objeto desse pensamento comporta, quer os
princípios que lhe são implícitos e que um tal
pensamento pressupõe. Tais aspectos e tais
princípios, uma vez conhecidos, precisamos expôlos um a um. Imaginar alguém que
costura,
enquanto se trabalha, é bom: fará lembrar que tudo,
no trabalho e na vida, faz-se ponto por ponto, para
citar aqui a frase de Madame Valmore, que SainteBeuve reporta. A dificuldade em
matéria de ensino, de exposição
ou de apologia, é a de se repetir sem dar a
impressão de que se repete (Uso de metáforas e analogias com princípios similares).

O hábito de ler só
com os olhos, que tão precioso é e tão bem se
ajusta à prosa, torna-nos insensíveis à poesia e até
mesmo a esse ritmo que é a poesia presente na
prosa. (Basta lembrar da poesia de Pessoa)

No fundo, a
arte de contar é a de Deus, na medida em que Deus
redestina, isto é, no sentido de que ele, o narrador,
cria os acontecimentos à medida das pessoas, em
meio à aparente negligência, e aos seres e às coisas;

O resultado é o de seduzir o ouvinte, contando-lhe


uma vida análoga à sua, porém superior em
colorido, tal como se observa na história de Abraão
ou na de Ulisses. (O Ulisses do Joyce tem um quê de grandioso por tratar tal
grandiosidade de uma forma supostamente banal).

Precisamos ler os romances para conhecermos o


sentido de nossa vida e da vida dos que nos
rodeiam, um sentido que o embotamento do
quotidiano nos esconde; precisamos lê-los para
penetrar em meios sociais diferentes do nosso e
para neles encontrarmos, para além da diferença
dos costumes, a semelhança da natureza humana;
para estudarmos, como se fosse num laboratório, os
problemas fundamentais, que são os do pecado, do
amor e do destino, e isso de forma concreta e sem
as transposições da moral; enfim, para que
enriqueçamos a nossa vida com a substância e a
magia de outras existências.

É notável que um livro de ciência, quando não é de


geometria, não dura mais de trinta anos. O
conhecimento que se nos afigura ser o mais
verdadeiro é o que mais depressa desacredita-se-,
nada envelhece mais depressa que uma obra de
constatação empírica ou de erudição publicada no
começo deste século: basta uma pequena
descoberta para torná-la caduca para sempre, ao
passo que a poesia e a filosofia não envelhecem. É
que nesses trabalhos exatos que compõem a ciência
ou a crítica entra uma grande quantidade de
símbolos, ao passo que a observação da natureza
humana ou o pensamento puro atingem diretamente
um elemento substancial. Como é estranho que os
gregos antigos pareçam-nos nascidos ontem e que
nos mostrem os contrastes do homem, do ser, da
política, e não sabendo nada do que nós hoje
sabemos! Zola é antigo ao lado de Homero, e
Bergson diante de Platão.

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