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Rosana Rodrigues Heringer

A INDÚSTRIA DA SEGURANÇA PRIVADA

NO RIO DE JANEIRO

Dissertação apresentada ao Instituto


Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Mestre em Sociologia.

Rio de Janeiro
1992
2

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO, 4

I- SEGURANÇA PÚBLICA E PRIVATIZAÇÃO DA SEGURANÇA , 11

1- Segurança como monopólio do Estado, 11


2- A experiência da violência e a privatização da segurança, 14
3- A incapacidade do Estado, 16

II- O QUE SÃO AS EMPRESAS DE SEGURANÇA PRIVADA , 20

1- Definição e caracterização, 20
2- Dados disponíveis sobre as empresas e pessoal, 21
3- O mercado da segurança, 23
4- Estimativas de receita, 25
5- A indústria da segurança, 26
6- Seleção e capacitação dos vigilantes, 27
7- Organização da categoria, 30

III- HISTÓRICO, LEGISLAÇÃO E FISCALIZAÇÃO, 32

1- A segurança bancária obrigatória, 32


2- A fiscalização estadual, 33
3- A lei federal de 1983, 35
4- A criação da Comissão Executiva, 38
5- O retorno da fiscalização estadual, 33
6- A portaria nº 91/92 e a situação atual, 42
3

IV- O DEBATE SOBRE O PAPEL DA SEGURANÇA PRIVADA, 45

1- Segurança privada: atividade suplementar


ou "força auxiliar da polícia"?, 45
2- Segurança pública e privada: interseções, 47
3- Os limites da atuação das empresas, 51
4- A qualidade dos serviços de segurança privada, 56
5- Empresas clandestinas e o desgaste da
imagem do setor, 60
6- A fiscalização "cerimonial", 63

V- CONSIDERAÇÕES FINAIS, 67

ANEXO 1, 73

ANEXO 2, 75

BIBLIOGRAFIA, 76
4

INTRODUÇÃO

"Enquanto houver violência, crimes, terrorismo, e seqüestros,


haverá necessidade de segurança. A criminalidade é uma
avalanche incrível, que se tem multiplicado de forma assustadora.
O terror invadiu as casas, os escritórios e as fábricas. Está nas
ruas e nas escolas. O crime organizado terminou com a
privacidade de todos e é, hoje, o espião que transfere projetos
importantes de um para outro país. Por isso nós existimos, da
Agents - Agência de Segurança Ltda., formando um verdadeiro
exército, sem armas, porém com muita experiência.
Esta afirmação é do Sr. Francisco Gama, oficial reformado da
marinha e diretor-presidente da Agents, talvez a única empresa a
oferecer planejamento, segurança preventiva, segurança do
trabalho, agentes especiais, defesa de instalações e parques
industriais, investigações científicas, treinamento de pessoal,
perícias técnicas e sistemas eletrônicos de segurança, tudo através
de moderníssimos aparelhos eletrônicos de dar inveja aos filmes
de James Bond." (Jornal do Brasil, 07.10.79)

"As empresas privadas de vigilância poderiam formar um


verdadeiro exército, com uma tropa de 300 mil homens, 65 mil
armas curtas e 2200 longas, 654 mil cartuchos, além de 1500
veículos para transporte de valores. Hoje, todo esse arsenal está
concentrado nas mãos de 500 empresas distribuídas pelo Brasil e
o efetivo empregado corresponde à tropa reunida pelas três forças
armadas." (Estado de São Paulo, 08.06.85)

"A realidade é que elas [empresas de segurança] não deveriam


existir. Prestação de serviço de polícia é um pouco esquisito.
Toleramos as empresas de segurança com todas as deficiências,
mas não desejamos o gigantismo a ponto de chegar a ser uma
polícia paralela. (...)
Daqui a pouco cada bairro vai precisar de uma polícia
particular. Resolver o problema de assaltos com empresas
privadas não é a solução." (Joel Vieira, delegado, diretor do
DSOS; Jornal do Brasil, 14.08.78)
5

A leitura destes depoimentos transmite-nos a sensação de insegurança, a apresentação

de medidas para combater os fatos geradores deste sentimento e, por fim, a perplexidade e o

medo diante das dimensões alcançadas por estas medidas. Estas três citações, a nosso ver,

ilustram de maneira exemplar os principais aspectos relacionados ao papel da segurança privada,

tendo em vista o contexto mais amplo da política de segurança pública na sociedade brasileira

contemporânea.

Parece-nos que é necessário compreender como o sentimento de insegurança pode se

tornar tão determinante na nossa sociedade e, em função disso, conhecer a fundo as medidas

adotadas por diferentes setores da população para se protegerem e, quem sabe, voltarem a se

sentir seguros.

Este trabalho buscará mergulhar no desafio de compreender como se deu o surgimento,

como funcionam e como se expandiram as empresas de segurança privada no Brasil, notadamente

no Rio de Janeiro.

Os motivos do nosso interesse por este assunto são vários. Há muito tempo

compartilhamos da preocupação expressa por diferentes cientistas sociais sobre o divórcio

existente entre as ciências sociais e o debate sobre a criminalidade e a segurança pública:

"O tema criminal adquiriu, ao longo dos anos em que a distensão


política avançou, através da abertura, para a transição democrática, uma
forte saliência como problema público, que contrasta com sua marginalidade
na agenda dos cientistas políticos que meditam sobre os percalços da
consolidação dos prospectos democráticos na ordem social brasileira."
(PAIXÃO, 1988)

"Fala-se muito sobre a polícia. Escreve-se pouco sobre a instituição.


Pesquisa-se menos ainda. Há alguns temas que parecem ser evitados por
pesquisadores nos mais diversos ramos do conhecimento e a polícia é um
deles." (LEMGRUBER, 1985)
6
"Bem feitas as contas, o que se destaca de todo o debate público sobre a
crescente taxa de criminalidade nas grandes metrópoles brasileiras é a
medíocre contribuição dos cientistas sociais." (COELHO, 1980)

Decidimo-nos, portanto, a não continuar evitando estes temas "sujos" e começar a

refletir sobre a questão da segurança pública como um objeto legítimo e que requer muita reflexão

no âmbito do debate sociológico.

Quando falamos de segurança, estamos, na verdade, falando dos mecanismos que a

sociedade estabelece para manter a ordem social. Estamos falando da necessidade que os

indivíduos possuem de se sentir tranqüilos. Falamos, portanto, da própria sobrevivência da

sociedade. Como aponta Comparato (1979):

"No que diz respeito à segurança, o sentido fundamental do vocábulo


liga-se à etimologia (se, prefixo privativo = sine + cura): é a tranqüilidade de
ânimo, a isenção de preocupações, de cuidados. Como tal, a idéia de
segurança refere-se sempre a um bem concreto, a um interesse determinado.
Não há segurança em abstrato, mas em relação à vida, ao patrimônio, à
criação artística, à salvação eterna, ao amor de uma pessoa, à própria
identidade cultural etc."

Na tradição do pensamento social moderno, a tarefa de manutenção da ordem pública

é, quase invariavelmente, atribuída ao Estado. Na verdade, o Estado passou mesmo a ser definido

por sua caracterização como o detentor do monopólio da força, do seu uso legítimo. Esta
definição ainda é amplamente aceita pelos cientistas sociais contemporâneos, que na sua maioria

não hesitam em elencar entre as tarefas básicas do Estado a responsabilidade pela segurança e

pela manutenção da ordem pública.

Não apenas entre os sociólogos e cientistas políticos esta noção é consagrada, como

também constitucionalmente a segurança é definida como "dever do Estado, direito e

responsabilidade de todos." (BRASIL,1988)

Não obstante este consenso, sempre houve ao longo da história ações individuais ou de

determinados grupos que procuraram exercer de forma privativa seu direito à segurança,
7

eliminando adversários ou aplicando punições e sentenças segundo seus próprios critérios de

julgamento. Este tipo de ação se dá tanto pela falta de credibilidade na eficácia dos mecanismos

formais de manutenção da ordem, como por um reconhecimento de que tais mecanismos atendem

a interesses privados de determinados grupos.

Estas medidas isoladas são, na maioria das vezes, punidas pelo Estado, que, através da

delegação de poderes pelos indivíduos, deveria manter o princípio do monopólio da violência

legítima.

Nos últimos trinta anos no Brasil, no entanto, o papel do Estado como detentor do

monopólio da segurança foi progressivamente descaracterizado. Desde a década de 60 empresas

particulares de segurança começaram a surgir e a se multiplicar e isto se deu, de forma cada vez

mais institucionalizada, com a permissão, o aval e, muitas vezes, com o estímulo do Estado.

A segurança privada é hoje, no Brasil, um setor de serviços institucionalizado, que

movimenta um grande volume de recursos e emprega milhares de pessoas. Ela desafia a

compreensão de todos aqueles que estão preocupados em melhor compreender qual é o papel do

Estado em nossa sociedade e quais os mecanismos que devem ser implementados para uma

efetiva política de segurança pública, coerente com os avanços democráticos obtidos no país na

última década.

Já não se trata mais, hoje, do vigia noturno ou do inspetor de quarteirão, comuns há

alguns anos. Trata-se de centenas de empresas legalizadas e com atuação ao nível nacional. É este

universo que estamos nos propondo a desvendar e a tentar compreender e, principalmente,

analisar a atuação dos órgãos do Estado responsáveis por normatizar e fiscalizar os serviços de

segurança privada.

Desnecessário é enfatizar aqui as dificuldades de investigação sistemática que envolvem

um tema como este. Em função do período autoritário e militarizado por que passou a sociedade

brasileira, falar de segurança hoje ainda significa uma associação quase que imediata com

repressão e violência por parte da polícia, notadamente sobre segmentos da população tidos como

"perigosos" ou "suspeitos".
8

Se é assim com relação à segurança pública, o setor de prestação de serviços de

vigilância privada constitui-se em alvo de preconceitos ainda maiores, associado com práticas

ilegais e clandestinas de proteção, que permitem mesmo sua inclusão no que se poderia classificar

como um neo-vigilantismo presente na sociedade brasileira (Huggins, 1989; Paixão, 1988).

Assim, falar deste tema, entrevistar pessoas a ele vinculadas, tentar obter informações

que possam ir além das estratégias de marketing das empresas são tarefas extremamente difíceis,

que receamos não ter sido capazes de realizar plenamente. Estas atividades são envolvidas por

segredos, principalmente em função do seu envolvimento com agentes dos órgãos de segurança

pública e das práticas criminosas que de fato existem, principalmente no âmbito das empresas

clandestinas. Este é um fator fundamental a se levar em conta na realização e, quero crer, na

leitura deste trabalho. Basta dizer, a título de ilustração, que um dos entrevistados sugeriu não

aprofundarmos demais a pesquisa sobre o envolvimento de policiais na atividade das empresas,

pois correríamos o risco de não chegar ao final do trabalho.

Não obstante estas dificuldades, pudemos levantar considerável quantidade de

informações sobre a atividade das empresas e colher depoimentos importantes de pessoas

envolvidas diretamente com o assunto: delegados de polícia, secretários de estado na área de

justiça e segurança, agentes da polícia federal, representantes sindicais da categoria dos vigilantes,

parlamentares que de alguma maneira envolveram-se no debate sobre a questão (cf. Anexo 2).

Vale destacar que, apesar dos inúmeros contatos e solicitações que fizemos, não foi possível

entrevistar nenhum representante de empresa ou membro do sindicato patronal.

A realização das entrevistas, aliada à razoável quantidade de material de imprensa que

pudemos levantar e à legislação vigente sobre o assunto ofereceram os dados empíricos

necessários para a reflexão aqui apresentada.

A outra dificuldade enfrentada diz respeito à bibliografia disponível especificamente

sobre este tema no Brasil. Muitos trabalhos foram desenvolvidos no Brasil nos últimos dez anos

sobre a violência urbana. Sobre o tema específico da segurança privada, porém, a bibliografia

disponível é sensivelmente escassa. Tivemos mais sorte em localizar referências bibliográficas


9

estrangeiras, especialmente norte-americana; no entanto, não foi possível ter acesso aos textos no

período tão curto de tempo de que dispúnhamos para elaborar esta monografia. Se esta

dificuldade apresenta-se como um fator de limitação para a realização do trabalho, acreditamos no

entanto que ela serve para mostrar a relevância do mesmo no sentido de dar uma pequena

contribuição para o debate sobre o assunto ao nível nacional, já enfatizado como uma necessidade

por Paixão, ao que tudo consta, pioneiro na reflexão sobre este assunto no Brasil:

"Não conheço estudos sobre o mercado de segurança privada


no Brasil. (...) Precisamos conhecer melhor o mercado e a organização
empresarial dessa indústria nos ramos legais e ilegais de atividade." (Paixão,
1991)

É isso que modestamente tentaremos fazer aqui. Não se trata de fazer um julgamento

sobre se estas empresas devem ou não existir ou como deve ser o seu funcionamento.

Acreditamos ser necessário identificar seus fatores condicionantes e apresentar como diferentes

segmentos da sociedade avaliam esta atividade, justificando ou criticando sua existência.

Julgamos relevante refletir sobre os mecanismos de manutenção da ordem social

vigentes no âmbito público e privado, em termos de princípios e na sua aplicação prática, visando

perceber em que medida eles podem também ser controlados a fim de que não se constituam em

ameaça à consolidação democrática. O tema da segurança aparece aqui, portanto, como

estratégico para refletir não só sobre os mecanismos de prevenção e repressão ao crime, mas

sobre que tipo de ordem social se quer contruir. Como afirma Teresa Caldeira (1991):

"...talvez tenhamos na questão da privatização - da segurança,


da ordem e da vida cotidiana - um dos focos centrais para se entenderem as
mudanças por que vem passando a sociedade brasileira."

Na seqüência das diferentes seções que compõem o trabalho, começaremos

apresentando nossa reflexão sobre a segurança como atribuição do Estado e, dentro deste quadro,
10

qual seria o papel das empresas de segurança privada, trazendo o tema para o interior do debate

sociológico e buscando dialogar com outros autores que refletiram sobre a questão.

No capítulo seguinte, apresentaremos em que consistem as empresas de segurança

privada, descrevendo seus principais aspectos e fazendo referência à situação internacional.

Num terceiro momento, apresentaremos como e quando surgiram as empresas e como

evoluíram a legislação específica e os mecanismos de fiscalização existentes.

No quarto capítulo abordaremos o debate existente sobre qual papel a segurança

privada deve desempenhar no âmbito da política de segurança pública, levando também em conta

a posição dos diferentes atores envolvidos com a questão.

Por último, destacaremos alguns pontos que surgem como desdobramento deste debate

e que poderão servir de base para investigações posteriores.


11

I- SEGURANÇA PÚBLICA E PRIVATIZAÇÃO DA SEGURANÇA

1- Segurança como monopólio do Estado

Os mecanismos de controle social e sua eficácia já são temas presentes de longa data na

agenda dos pensadores que se dedicaram a refletir sobre a vida social. O problema da ordem

sempre esteve presente como necessária à convivência pacífica dos cidadãos.

No século XVII, Thomas Hobbes já apresentava, na sua defesa do absolutismo, aquela

que viria a ser a definição básica do Estado moderno: a instituição superior que, a partir da

concessão dos indivíduos, torna-se responsável pela manutenção da segurança de todos, através

do monopólio da força.

"A essência do Estado pode ser assim definida: Uma pessoa de cujos
atos uma grande multidão, mediante pactos recíprocos uns com os outros, foi
instituída por cada um como autora, de modo a ela poder usar a força e os
recursos de todos, da maneira que considerar conveniente, para assegurar a
paz e a defesa comum." (HOBBES, 1979)

"Hobbes observed that, in a state of nature, the basic equality of men's


abilities would lead to conflict in the realization of essentially equal goals
among men, adding that íf any two men desire the same thing, which
nevertheless they cannot both enjoy, they become enemies.' As long as such
condition exists 'without a common power to keep them all in awe', said
Hobbes, men will find themselves in a state of 'war of every man against every
man.' (...)
To avoid such adverse consequences, Hobbes concluded that men
introduce 'restraints upon themselves` by the creation of a 'commonwealth`
(...) Thus, even though Hobbes articulated a justification for the authoritarian
state, he ackowledged that the fundamental role of the state is to provide order
and security for the lives and property of its citizens." (SHAFFER, 1976)
12

Partindo de uma outra perspectiva, em que o Estado serviria para garantir os direitos

que os seres humanos teriam no estado de natureza, John Locke também concluiu que a grande

função do Estado seria a proteção da vida e da propriedade de uns cidadãos contra os outros.

"Onde há autoridade, poder na Terra do qual é possível conseguir


amparo mediante apelo, exclui-se a continuidade do estado de guerra,
decidindo-se a controvérsia por aquele poder." (LOCKE, 1978)

Como afirma Shaffer,

"both Hobbes (who laid an intellectual foundation for an omnipotent


state) and Locke (who narrowly restricted the functions of the state) agreed
that the primary purpose for which men create institutions of government and
law is the protection of their life and property from interferences by other
men." (1976)

Mais recentemente, Max Weber também preocupou-se em definir o Estado

sociologicamente:

"em termos dos meios específicos peculiares a ele, como peculiares a


toda associação política, ou seja, o uso da força física. (...)
...o Estado é uma comunidade humana que pretende, com êxito, o
monopólio do uso legítimo da força física dentro de um determinado
território." (WEBER, 1982)

É comum entre estes pensadores e também entre intelectuais contemporâneos a visão

de que, para que a ordem social exista é necessário que haja o monopólio do poder coercitivo

atribuído a algum ator social específico - o príncipe, o senhor feudal e, modernamente, o Estado

como detentor da força, bem como da elaboração, interpretação e aplicação da lei.

É claro que, ao longo dos séculos, a sociedade e o Estado se complexificaram. Este

ampliou suas funções, passando progressivamente a se responsabilizar por atribuições que antes

diziam respeito apenas à esfera privada da vida dos cidadãos.


13

Esteve sempre presente no debate sobre as atribuições do Estado a tentativa de definir

quais seriam suas funções básicas. Mesmo tendo como referência a idéia do "Estado mínimo",

existe uma convergência sobre ações exclusivas do Estado. Ainda hoje, quando assistimos ao

avanço das propostas neo-liberais de "enxugamento" da máquina estatal, mantêm-se presentes

como suas atribuições alguns serviços básicos, como a educação, a saúde e a segurança.

"While the privatization of public services has permitted advanced


capitalism to turn some social expenses into forms of investment - mainly by
encouraging the growth of certain profit-making human services industries, i.
e., foster care, remedial education, home health care, franchised day care
centres and old age homes, it is clear that many coercive 'public` functions
(law enforcement, imprisonment etc) cannot be carried out under private
auspices without eroding tha rational-legal legitimations upon which the
broader structure of hegemonic control must be built." (SPITZER, 1985)

Não teremos oportunidade, nos limites deste trabalho, de realizar uma exaustiva

reflexão sobre quais deveriam ser as tarefas inalienáveis do Estado moderno e qual seria, dentro

das especificidades do caso brasileiro, o tamanho do Estado ideal. Nossa preocupação básica diz

respeito apenas a uma destas tarefas: a segurança pública.

Tomando como premissa que a segurança e a manutenção da ordem pública são tarefas

indissociáveis do Estado, como entender o recente processo de institucionalização dos serviços de

segurança privada nas sociedades contemporâneas? No caso brasileiro, como compreender a


fragilidade nos mecanismos de fiscalização existentes em relação à atuação destas empresas? Em

que medida a formalização e expansão desta atividade questiona, interpela e modifica o papel e a

concepção do Estado em relação à segurança dos cidadãos e à manutenção da ordem pública?


14

2- A experiência da violência e a privatização da segurança

Esperamos não estar exagerando no impacto que este fenômeno pode ter, a médio

prazo, sobre a redefinição das tarefas básicas do Estado. Diante deste quadro, acreditamos que é

necessário entender o desenvolvimento dos serviços de segurança privada e interpretar o debate

sobre as diferentes concepções em relação ao seu papel na sociedade brasileira. Esta tarefa poderá

ser útil para uma reflexão mais ampla sobre que tipo de ordem social estamos construindo.

Todo este debate ganha ainda maior relevância no momento em que nos defrontamos

com os enormes desafios de tornar realidade um extenso rol de garantias e direitos adquiridos

legalmente na Constituição de 1988 e que ainda aguardam sua implementação prática na vida da

grande maioria da população. Como lembra Comparato (1979),

"a ampla realização do valor da segurança, em regime democrático,


sup·e a organização de garantias para a liberdade. Quer dizer, em termos
jurídicos, que não basta proclamar direitos, ainda é preciso instituir meios de
proteção a estes direitos." (grifo nosso)

A discussão sobre a segurança pública, a partir da nova ordem constitucional, torna-se

fundamental, na medida em que demandará

"a inevitabilidade de ampliação, de fato, dos direitos civis aos contingentes


populacionais periféricos, decorrente da ampliação, de direito, promovida
pela nova Constituição, o que vai implicar - a curto prazo, a adaptação das
formas de relacionamento do Poder Público com essas populaç·es à nova
ordem constitucional." (SILVA, 1990)

Nosso debate sobre a segurança pública se dá aqui a partir do enfoque específico da

privatização da segurança. Entendemos por privatização da segurança todos os meios utilizados

pelos indivíduos associados ou isoladamente com o objetivo de se protegerem ou se defenderem


15

de possíveis atos vitimizadores, especialmente aqueles agrupados como crimes violentos contra a

pessoa e contra o patrimônio.

Podemos constatar no nosso cotidiano as mais diversas ações no sentido desta

administração privativa da segurança: aparatos cada vez mais sofisticados de vigilância (alarmes,

circuitos de TV etc), transformação de complexos residenciais em condomínios fechados e

policiados privadamente, consumo crescente de armas de fogo pela população 1, proliferação de

empresas de segurança e, no limite, a atuação de "justiceiros", grupos de extermínio e a

ocorrência de linchamentos.

O aumento da sensação de insegurança por parte da população, motivado tanto por um

aumento do número de delitos quanto por um discurso que favorece este clima de medo, leva a

um descrédito na eficácia dos mecanismos repressivos do Estado destinados a manter a ordem: a

polícia, o judiciário, enfim, o sistema de justiça criminal como um todo. Como afirma Coelho

(1987):

"é importante mencionar um dos efeitos mais perversos da ineficiência


na administração da justiça criminal: a conjunção de altas taxas de
criminalidade violenta com a ampliação da margem de impunidade de que
passam a gozar os criminosos transforma em agressores (e transgressores) os
segmentos mais vitimizados da população. Pequenos comerciantes em áreas
mais vulneráveis e desprotegidas contratam os serviços de 'polícias mineiras`
e de 'esquadrões da morte`; linchamentos tornam-se mais freqüentes nas
periferias das grandes metrópoles; comunidades de baixa renda submetem-se,
quando não a solicitam, à justiça privada de delinqüentes violentos
transformados em 'protetores` e 'benfeitores` de suas áreas de controle."

Pesquisa de opinião realizada pelo jornal O Globo, divulgada na


1

edição de 02.08.92 (Violência leva carioca a querer andar


armado), apontava que 28% dos entrevistados possuiam armas e
60% achavam que a realidade da cidade justifica ter arma.
Estimativas apontam que atualmente no Rio de Janeiro existem
800 mil armas ilegais.
16

Concordamos com autores que destacam ser o diagnóstico da violência urbana em

parte resultado da ineficiência dos mecanismos de repressão ao crime, mas também, e em grande

medida, uma construção simbólica, na medida em que "ela constitui o que descreve."

(MACHADO DA SILVA, 1991)

Num enfoque semelhante, também acreditamos serem úteis no entendimento da

violência urbana as interpretações que enfatizam um enfoque amplo da mesma:

"A violência urbana é hoje um fenômeno muito mais amplo do que


aquilo que pode ser detectado pelas estatísticas de crime, ou que pode ser
explicado por possíveis motivações econômicas e por falhas dos aparelhos de
segurança encarregados da prevenção ao crime. A vivência cotidiana de uma
situação marcada pelo aumento da criminalidade violenta constitui-se em
uma experiência peculiar. Dela fazem parte o medo, uma proliferação de falas
recontando casos e apontando causas, a mudança de hábitos cotidianos, a
exacerbação de conflitos sociais, a adoção de medidas preventivas." (BRANT,
1990)

Todos estes ingredientes, definidos por Teresa Caldeira como as "experiências de

violência", constituem-se no pano de fundo para o entendimento do crescimento considerável nas

grandes cidades brasileiras "do apoio a formas violentas e privadas de combate e prevenção do

crime" (CALDEIRA, 1991).

"A cidade civil lançou mão de sua defesa, acuada entre o exército
regular (polícia) e o irregular (tráfico de drogas)." (Revista Domingo, Jornal
do Brasil, 05.04.92)

3- A incapacidade do Estado

A explicação mais freqüente que normalmente encontramos associada à privatização da

segurança é, como já foi dito, a falência dos órgãos do Estado destinados à manutenção da ordem

pública.
17

"A ausência de Justiça no cotidiano - ou, o que é pior, a cotidiana


violência dos que a solicitam - traz penosas conseqüências. A frustração de
quem se sente injustiçado suscita uma espécie de perda da auto-confiança, já
que comumente associamos a não obtenção da prestação jurisdicional com a
nossa própria incapacidade de fazer valer nossos direitos. (...)
A ausência de prestação jurisdicioanal nestes casos, pode ser mais
danosa do que uma má decisão, que viesse a tempo razoável. Daí o enorme
descrédito do Estado, substituído por outras esferas de poder e de
normatização na solução dos conflitos, sobretudo nas camadas pobres da
população." (TEPEDINO, Gustavo - (IN) JUSTIÇA E (IN) SEGURANÇA,
Jornal do Brasil, 24/10/90)

Contemporaneamente, esta falência estaria associada a um quadro mais geral de

desigualdades sociais existentes no Brasil que fazem com que grande contingente da população

esteja excluído da esfera pública. Como afirmam Reis e Cheibub (1992):

"In turn, alienation occurs when the system is no longer able to keep
that minimum level of legitimacy. Actually, assessing if legitimacy
maintenance or breakdown prevails is usually an empirical task. However,
there are indications that when social inequality reaches a critical level it
constitutes a threat to the regime because it alienates large portions of the
population from the political game. Under such circumstances the threat to the
political system comes not from competing alternatives to it but rather from
the skrinking of the political community.
High levels of absolute poverty coupled with strong relative deprivation
might lessen the incentives to belong to civil society. When that is the case,
there are no direct threats to the political regime, no overload of demands, but
evasion from the public sphere. Those outside from the distributive system
simply retreat from the political community. (...) from the macro side the
ultimate consequences point to the possibility of failure of the state to keep its
monopoly over violence. While those outside the political arena do not dispute
political power, the growing difficulties the state faces in enforcing order,
providing security, and promoting social cohesion call attention to a dramatic
discontinuity between the political system and the larger society.
The evolution of inequality patterns in recent Brazilian history suggests that
we might be dangerously approaching the above mentioned shrinking of the
political sphere." (grifo nosso)
18

Também autores preocupados com a redefinição do papel do Estado na sociedade

brasileira analisam, a partir da crise interna por que passa o Estado, as dificuldades para que este

mantenha o monopólio do controle social.

"Com a progressiva degradação da infra-estrutura econômica e a


acelerada deterioração dos serviços públicos, o Estado vem sendo condenado
ao não-cumprimento de suas responsabilidades mais elementares com a saúde,
a educação e a segurança da população." (FIORI, 1992)

Numa perspectiva internacional, vários autores também associam a privatização da

segurança com a fragilidade dos mecanismos estatais de controle social. O entendimento é de que

o crecimento da segurança privada "deve-se a uma variedade de fatores, sendo um dos mais

importantes o sentimento de insegurança da população perante o delito e o fracasso do Estado em

exercer um controle eficaz sobre o mesmo" (RICO & SALAS, 1987). Outros autores, como

Shearing e Stenning, Kakalik e Wildhorn, aos quais não tivemos acesso diretamente, porém

fartamente citados por Rico & Salas e por Paixão interpretam o incremento da privatização da

segurança desta forma.

Esta concepção, portanto, vem fortalecer um enquadramento da segurança privada no

que se poderia chamar de um neo-vigilantismo presente nas sociedades contemporâneas.

Tomando-se a definição utilizada por Huggins (1989) de vigilantismo como "atos de coerção que

violam a ordem estabelecida a fim de proteger esta mesma ordem", poderíamos, a exemplo de
Paixão, estender o conceito de neo-vigilantismo também para a "forma de organizações extra-

legais de venda de proteção a clientes 'privados`, excluídos (ou descrentes) da segurança pública"

(PAIXãO, 1991).

O interessante em relação ao objeto de análise aqui proposto - as empresas de

segurança privada - é que ele não se dá de maneira ilegal ou residual dentro de um universo de

fragmentação social que estimula o uso de recursos extremos de proteção por diferentes
19

segmentos da população. As empresas de segurança privada institucionalizadas e legais, com as

quais estamos trabalhando aqui, possuem, ao contrário, efetivos semelhantes ou muitas vezes

superiores aos das polícias locais e funcionam com o aval e, em algumas ocasiões, com o estímulo

do Estado. São regularizadas, pagam impostos, possuem uma legislação própria que as normatiza.

Dentro do raciocínio que estávamos desenvolvendo até agora, as atividades privadas de

segurança se dariam sempre em momentos agudos de crise e em dimens·es residuais, em função

de decis·es individuais ou de determinados grupos. As empresas de segurança, porém,

representam um setor de serviços perfeitamente estabelecido, em franca expansão ao longo das

últimas décadas, não só no Brasil, mas em vários países do mundo.


20

II - O QUE SÃO AS EMPRESAS DE SEGURANÇA PRIVADA

1- Definição e Caracterização

O objeto deste trabalho são as empresas de vigilância que atuam no Rio de Janeiro, seu

funcionamento, estrutura, atividades, seu papel no conjunto do sistema de segurança local e sua

relação com o poder público.

O que estamos chamando aqui de empresas de vigilância são instituições prestadoras de

serviços de segurança bancária, industrial, comercial, residencial e em condomínios, entre outras

modalidades, para fins de proteção do patrimônio destes estabelecimentos e dos indivíduos que ali

circulam. Estas empresas comumente oferecem um ou mais dos seguintes serviços:

-equipes de guardas treinados (armados ou desarmados);

-frota motorizada;

-segurança eletrônica;

-investigação sigilosa;

-cães de proteção/ adestramento de cães;

-segurança pessoal;

-transporte de valores;

-plantão permanente;

-escolta e acompanhamento de executivos.


21

Como aponta Paixão (1991),

"há sérios problemas metodológicos na estimativa acurada do


tamanho da segurança privada - que varia conforme a fonte dos dados (...) e
os critérios adotados na identificação da mão-de-obra empregada em
segurança."

Acreditamos, no entanto, que estas dificuldades são maiores ao se tentar identificar os

números referentes ao universo da segurança privada como um todo, incluindo aí as empresas

clandestinas, o que não buscaremos fazer aqui.

2- Dados disponíveis sobre empresas e pessoal

Para efeitos desse trabalho, estamos tratando apenas das empresas legalizadas que

prestam serviços de vigilância e transporte de valores. Os números para este setor ao longo das

últimas décadas variaram muito. Porém, após checar diferentes fontes de informação (Polícia

Federal, Sindicato das Empresas e Sindicato dos Vigilantes) chegamos a um número de 55

empresas atuando regularmente no Rio de Janeiro em 1992 (cf. Anexo 1).

Existem hoje no Rio de Janeiro cerca de 70 mil guardas particulares empregados nestas

empresas. O presidente do Sindicato dos Vigilantes, Fernando Bandeira, acredita que outros 70

mil homens trabalham irregularmente, em empresas clandestinas ou contratados diretamente por

estabelecimentos comerciais e outros para o serviço de segurança. As estimativas para o número

de empresas clandestinas existentes no Rio giram em torno de 50 empresas.


22

O contingente de pessoal ocupado em segurança privada cresceu mais de 50% na

última década, representando hoje no Rio de Janeiro um número bem maior de empregados do

que as polícias civil e militar juntas. No Brasil, estima-se que o pessoal ocupado em serviços de

vigilância chega a 550 mil pessoas, embora prognósticos mais generosos apresentem um total

provável de um milhão de vigilantes em todo o país.

------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
CONTINGENTES DAS POLÍCIAS CIVIL, MILITAR, EXÉRCITO E SEGURANÇA
PRIVADA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - 1982/1992
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
1982 HAB/HOMENS 1992 HAB/HOMENS
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Polícia Militar 24 mil 458 32 mil 468
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Polícia Civil 11 mil 1000 12 mil 1250
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Forças Armadas 74 mil 148 92 mil 163
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Seguranças/
Vigilantes 30 mil 366 70 mil 216
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Fonte: Revista Domingo, Jornal do Brasil, 05.04.92, com base em dados fornecidos pelas
corporações.

A magnitude destes números assemelha-se aos dados existentes sobre este setor para

outros países. A maior empresa de segurança privada existente no mundo é a Pinkerton, norte-

americana, fundada no final do século XIX juntamente com a Wells Fargo e a Brink's. A

Pinkerton contava nos anos 70 com cerca de 37 mil empregados em diferentes países.

Em 1975 contabilizavam-se 46 empresas legalizadas no Estado do Rio, empregando

cerca de 7 mil homens. No ano seguinte, a estimativa já apontava para 44 empresas e 22 mil

homens, pouco menos que o quadro da PM (29 mil) e superior à Polícia Civil (14 mil) (O Estado

de São Paulo, 23.05.76). Estes números realmente oscilam e são sempre objeto de polêmica, visto

que muitas empresas foram fechadas nos anos seguintes por irregularidades. As sucessivas
23

mudanças nas normas de funcionamento alteravam rapidamente o quadro de empresas legais e

ilegais.

No final da década de 70 os dados para os Estados Unidos contabilizavam 800 mil

homens trabalhando como vigilantes, sendo 450 mil o número de policiais (Jornal do Brasil,

12.12.76).

Com relação à proporção entre forças privadas e públicas, os dados indicam uma

relação de 1,6 guardas particulares para cada policial no Rio de Janeiro. Esta razão é menor do

que a verificada para os Estados Unidos, por exemplo, onde em 1990 a proporção era de dois

vigilantes para cada policial (cf. Rico & Salas, 1987).

3- O mercado da segurança

O debate público em meados da década de 70 girava em torno da conveniência, ou

mesmo tomava como fato consumado algumas vezes, que a segurança privada deveria ser apenas

bancária, não atuando em outros setores e, principalmente estando fora da segurança particular

(residencial e pessoal) e da segurança no local de trabalho. É interessante notar como este

pressuposto rapidamente se diluiu ao longo das décadas seguintes, fazendo mesmo com que

algumas empresas deixassem de fazer segurança bancária para atuar apenas em comércio,

indústrias e residências.

Um indicador ilustrativo desta inversão do mercado atendido pela segurança privada

são os índices disponíveis para 1989. Do total do pessoal ocupado nas empresas de vigilância,

40% atuavam em condomínios; 30% em bancos; 20% em indústrias, clubes e residências e 10%

em repartições públicas (Jornal do Brasil, 22.12.89).

A primeira empresa a funcionar no Rio de Janeiro foi a SESVI, seguida pela SBIL. A

maior empresa em operação até hoje no Rio - a SEG - já era líder no setor em 1975. Aqui cabe

uma observação específica sobre um aspecto recorrente nos depoimentos sobre o mercado da

segurança, que é a cartelização do setor. Desde a década de 70 já havia manifestações de


24

autoridades neste sentido, afirmando que era necessário algum tipo de controle mais eficaz.

Entretanto, parece que a solução para este aspecto foi deixada à suposta auto-regulação do

mercado. O Cel. Kurt Pessek, então presidente da Comissão Consultiva para Assuntos de

Segurança Privada do Ministério da Justiça, afirmava: "é importante que novas empresas de

vigilância sejam abertas para aumentar a concorrência no mercado, pois antes estava se formando

um cartel" (Estado de São Paulo, 08.06.85).

Este aspecto relacionado à concentração da atividade nas mãos de poucas empresas

também pode ser verificado ao nível internacional. Nos Estados Unidos,

"dez firmas de guarda representam 33% do total dos


rendimentos do setor. (...) Ainda que a validade dos dados possa ser
questionada, os estudos demonstram o controle da indústria da segurança
privada por um pequeno número de empresas transnacionais. (...) Os dados da
Inglaterra, assim como os da França, Bélgica, Holanda e Alemanha
Ocidental, também apresentam cifras similares." (Rico & Salas, 1987)

Vale notar que já em 1975 havia no Rio de Janeiro uma avaliação de que o mercado da

segurança privada estava saturado e desestimulava-se a criação de novas empresas de serviços.

Estudo da DSOS (Divisão de Segurança de ãrgãos e Sistemas), vinculada à Secretaria de

Segurança Pública, constatava ser a prestação de serviços de vigilância em todo o Estado uma

atividade não só já saturada, mas ineficiente, convindo mais estimular as grandes empresas a
dispensar a segurança oferecida por terceiros e a criar seus próprios quadros de vigilantes (O

Globo, 28.10.75).

Esta iniciativa de criar o próprio quadro de segurança das empresas também se

expandiu ao longo das décadas. Além de ser utilizada por grandes empresas, esta é a opção

encontrada por pequenos estabelecimentos que não têm condições de custear a contratação de

empresas de vigilância. Esta é também a grande fatia onde se encontra a segurança clandestina.

Estes chamados corpos orgânicos de segurança, no jargão policial, são o objeto legal de

fiscalização pela DSOS, embora no caso do Rio de Janeiro este órgão também se auto-defina
25

como fiscalizador de todos os tipos de prestação de serviços de segurança privada. Algumas

vezes o motivo alegado para a criação destes corpos orgânicos de segurança pelas empresas

apoia-se na insatisfação com os serviços prestados por terceiros:

"Além das firmas de segurança, é comum, hoje, que os próprios


bancos, os grandes magazines e as maiores fábricas tenham seu próprio
serviço de segurança. Sai mais barato e dá menos dor de cabeça. O serviço
das empresas particulares está cada vez mais precário e já não inspira
confiança aos próprios banqueiros e empresários" (Em tempo, 20.02.78).

Os empresários da área de segurança argumentam, porém, que esta não é a melhor

solução, na medida em que, se houver algum "incidente" decorrente da ação dos vigilantes, o

empresário irá responder criminalmente pelo fato. Se o vigilante for contratado por uma empresa

especializada, porém, a responsabilidade recairá sobre esta última.

4- Estimativas de receita

Os dados mais atuais revelam que, no Brasil, hoje,

"existem 516 empresas de prestação de serviços de vigilância


autorizadas a funcionar: 21% especializadas em prestação de serviço de
transporte de valores e 77% especializadas em vigilância. Há ainda 121
cursos de formação de vigilantes e três de segurança pessoal." (O Globo,
10.01.91)

Não obtivemos muitas informaç·es sobre a receita e os lucros das empresas de

segurança, mas as estimativas apontam que o setor trabalha com margens de lucro bastante altas.

"Para o leão do Imposto de Renda o setor declara US$ 550


milhões. Estima-se, contudo, que o montante dos negócios ultrapasse US$ 1
bilhão." (O Estado de São Paulo, 25.08.91)
26

Para os Estados Unidos, os dados indicam que o faturamento das empresas de

segurança chegava em 1981 a US$ 21,7 bilh·es, enquanto os gastos públicos com segurança

alcançavam apenas US$ 13,8 bilh·es (cf. Rico & Salas, 1987).

Dados publicados na imprensa apontam que

"as maiores empresas do setor têm folhas de pagamento com


mais de 2 mil empregados e algumas somam mais de 15 mil vigilantes em todo
o país." (Revista Domingo, Jornal do Brasil, 05.04.92)

No Rio existem 10 centros de treinamento de empresas, destinados à formação de

vigilantes.

Na maioria dos casos, porém, os empregados em empresas de vigilância não são

suficientemente preparados e em alguns casos as empresas não cumprem com todas as obrigações

trabalhistas a que os empregados teriam direito. Fernando Bandeira, presidente do Sindicato dos

Vigilantes, afirma que a jornada de trabalho dos vigilantes é com freqüência de 11 horas por dia,

de segunda a sábado e o pagamento de horas extras nem sempre é feito regularmente. Além disso

muitas empresas não respeitam o piso salarial da categoria, que é de três salários mínimos.

5- A indústria da segurança

"O volume de investimentos na fase de implantação da empresa


- US$ 1,2 milhão - e os nomes dos acionistas (a família Birmann, ex-dona do
Banco Crefisul; Roberto Teixeira da Costa, presidente da Brasilpar Comércio
e Participaç·es; Karlos Rischbieter, ex- Ministro da Fazenda, e Márcio Fortes,
ambos da direção da Markap Administração e Participações) indicam uma
convicção de que vender segurança é hoje um grande negócio no Brasil. (...)
Segundo eles, a decisão de investimento no mercado de
segurança fundamentou-se na constatação de que existe um interessante
mercado potencial e, principalmente, no exemplo de outros países, onde se
registra um rápido crescimento do negócio da segurança.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o setor cresce 30% ao ano,
superior até mesmo ao mercado de informática, atesta Michael Constantine,
27
diretor adjunto da ISS - Sistemas Internacionais de Segurança S.A." (Gazeta
Mercantil, 25.10.83)

Nessa perspectiva, é fácil compreender como a segurança torna-se investimento e,

insegurança, sinônimo de lucro. A expansão da indústria da segurança está associada ao aumento

da criminalidade e da sensação de insegurança por parte da população, fazendo crer que, "em

relação ao mercado de segurança se pode dizer, sem exagero, que quanto pior as coisas, melhor

para os negócios" (Folha de São Paulo, 03/02/85).

"Neal Holmes, diretor-geral da Allied Security, de Pittisburgh,


EUA, disse recentemente em entrevista à Time: Só há um négócio melhor do
que o nosso: o crime. Enquanto este negócio for bem, o nosso irá também."
(Estado de São Paulo, 05.06.77)

"A recente onda de seqüestros no Rio tem dado trabalho às


empresas de segurança. A procura desse tipo de serviço, que havia diminuído
em função das restrições econômicas, praticamente dobrou, segundo
informações de empresas do ramo." (Jornal do Brasil, 31.05.90)

Como nem a criminalidade violenta nem o sentimento de insegurança dão sinais de

retrocesso, a tendência é que a expansão do setor continue:

"...aumenta a cada dia o interesse de investidores em cuidar da


segurança alheia. A Abrevis (Associação Brasileira das Empresas de
Vigilância e Transporte de Valores) mantém um cadastro de mais de 600
empresas. São 115 só em São Paulo, 15 delas abertas no primeiro semestre
deste ano, uma média de 2,5 por mês. Sem contar as clandestinas." (O Estado
de São Paulo, 25.08.91)

6- Seleção e capacitação dos vigilantes

Percorrendo o noticiário da grande imprensa sobre o assunto, percebemos que a pouca

qualificação dos vigilantes sempre foi identificada como um grave problema pelos diversos

segmentos envolvidos na prestação destes serviços.


28

Em 1975 já havia referências na imprensa criticando a má qualidade dos serviços e

afirmando que poucas empresas estavam então capacitadas a funcionar (Jornal do Brasil,

26.10.75). E, no início da década de 80, podia-se ler:

"Em todos os assaltos a banco verificados no ERJ, a DSOS


constatou falhas por parte dos vigilantes - natural conseqüência da má
preparação dos guardas de segurança, ou da contratação de candidatos
reprovados, ou que nem sequer se submeteram a exame na Academia de
Polícia e psicotécnico." (Folha de São Paulo, 16.05.82)

Ou ainda:

"A busca de uma segurança quase individualizada, que a


polícia não pode dar, foi a principal razão do surgimento das empresas de
vigilância e dos vigias noturnos particulares. Inicialmente eram empresas
apenas de segurança bancária, que depois expandiram o serviço para a
indústria, comércio e residências. (...) Usuários, empresários, autoridades
policiais e os próprios vigias hoje acham que, se a idéia foi boa, a segurança
fornecida não tem sido das melhores, salvo raras exceções. O maior problema
é o despreparo dos homens encarregados da vigilância." (O Estado de São
Paulo, 11.12.83)

No que diz respeito a este aspecto de treinamento é interessante observar que, embora

o setor tenha passado por um forte processo de institucionalização, a profissionalização dos

vigilantes não necessariamente representou uma melhora significativa na qualidade dos serviços

prestados.

Com a crise econômica e o desemprego atuais, o setor não precisa mais, como fazia de

início, nos anos 60 e 70, recrutar desocupados, sem nenhuma seleção, nos pontos de

concentração no centro das grandes cidades, segundo ilustra a matéria da Folha de São Paulo:

"A realidade das empresas de vigilância, contudo, começa na


própria forma de recrutamento. Os seus automóveis estacionam logo cedo em
pontos estratégicos da cidade, onde é grande o movimento de desempregados
ou migrantes. Na estação do Norte (Roosevelt), parque Dom Pedro, Largo de
Pinheiros ou Largo 13 de Maio, em Santo Amaro, os futuros vigilantes são
29
atraídos pelos recrutadores das empresas que, tão logo conseguem completar
a lotação do carro, rumam para os escritórios." (09.09.79)

Mensalmente são oferecidos cursos de formação para vigilantes nos centros mantidos

pelas empresas. Estes cursos têm a duração de 15 dias e cerca de 1000 pessoas participam deles a

cada mês. De acordo com a portaria nº 91/92 do Ministério da Justiça (BRASIL,1992), do

currículo do curso constam:

-Defesa Pessoal e Primeiros Socorros;

-Noções Elementares de Direito Penal;

-Armamento e Tiro;

-Técnica Operacional;

-Segurança Física de Instalações;

-Prevenção e Combate a Incêndios;

-Relações Humanas no Trabalho.

Os candidatos que freqüentam mensalmente as 120 horas exigidas legalmente dos cursos de

formação de vigilantes pagam entre 1/2 e 1 1/2 salários mínimos pelo mesmo. Ao final, recebem

um certificado emitido pela Polícia Federal, mas apenas uma pequena parte consegue emprego.

Mesmo este setor que tende a crescer com a crise e o aumento da criminalidade não parece ter

fôlego suficiente para absorver todos os que se oferecem para a função. Conclusão: formam-se

pessoas que são fortes candidatas a engrossar as fileiras da segurança improvisada e na maioria

das vezes clandestina empregada por estabelecimentos comerciais.

Por outro lado, a imagem da ocupação de vigilante como "a opção para quem não tem

opção na vida" (Jornal do Brasil, 17.02.77) parece não possuir muito fundamento hoje. A

expansão do setor terminou por atrair desempregados do comércio, escritório etc, fazendo com

que as empresas tenham possibilidade de contratar inclusive vigilantes com escolaridade acima do

mínimo exigido (4ª série do 1º grau).


30

7- Organização da categoria

Um outro dado que demonstra a institucionalização e a crescente profissionalização do

setor diz respeito aos órgãos de representação existentes nos seus diferentes níveis. No âmbito

internacional, as empresas de segurança privada congregam-se através da ASIS - Associação de

Serviços Internacionais de Segurança, que reúne-se anualmente, quase sempre nos Estados

Unidos. A ASIS congrega milhares de empresas existentes em mais de 20 países. No final da

década de 70, o representante da ASIS para a América Latina visitou o Brasil com o objetivo de

reunir novos associados (Jornal do Brasil, 28.02.78).

Ao nível nacional, as empresas organizaram-se através da Associação Brasileira das

Empresas de Vigilância e Transporte de Valores - ABREVIS e, posteriomente, através da

FENAVIST - Federação Nacional das Empresas de Vigilância e Transporte de Valores. Ao nível

local, através das associaç·es e, posteriormente sindicatos patronais. No Rio de Janeiro, o

SINESV-RJ - Sindicato das Empresas de Segurança e Vigilância do Estado do Rio de Janeiro

congrega 36 empresas.

Também em relação aos empregados do setor, a mobilização é grande. Embora a

profissão só tenha sido reconhecida em 1983, a Associação Brasileira dos Vigilantes foi fundada

em 1975, transformando-se em entidade profissional em 1979, contando então com cerca de 5000

sócios. Em 1986 a entidade no Rio de Janeiro transformou-se em sindicato, sendo o segundo

fundado no país, precedido por Brasília. Atualmente o sindicato do Rio conta com cerca de 8500

sindicalizados e possui ums estrutura razoavelmente organizada, com assessoria jurídica,

promoção de atividades assistenciais e recreativas e presença atuante nas negociações trabalhistas

da categoria.
31

O presidente do sindicato carioca, Fernando Bandeira, está presente desde o início da

organização da categoria, na década de 70. Desde então, ele sempre esteve a frente do sindicato,

com exceção do período em que ocupou por duas vezes uma vaga na Assembléia Legislativa,

pelo PDT, entre 1982 e 1990. Nas últimas eleições Fernando Bandeira foi candidato a vereador

pelo mesmo partido, obtendo cerca de 6000 votos. Vale lembrar que outra liderança importante

da categoria, Chico Vigilante, é hoje deputado federal, pelo PT-DF.


32

III- HISTÓRICO, LEGISLAÇÃO E FISCALIZAÇÃO

1- A segurança bancária obrigatória

A prestação de serviços de segurança privada teve início em meados da década de 60,

através das empresas criadas para transporte e guarda de valores, ligadas à segurança bancária. A

primeira empresa de vigilância e transporte de valores fundada no Brasil foi a Sesvi - Serviço

Especial de Segurança e Vigilância Industrial, em 1962, no Rio, ainda durante o governo de João

Goulart. Logo depois dela foi criada a Sbil. Operavam também no país empresas estrangeiras,

como a Brink's. Em 1969 a segurança bancária tornou-se obrigatória através do decreto-lei

federal nº 1034, de 21.10.69 (BRASIL, 1969), assinado pela junta militar que substituiu o

Presidente Costa e Silva, motivado pelo crescente número de assaltos a estabelecimentos

bancários, muitos deles ligados à atividade de grupos políticos de esquerda. Esta regulamentação

deu-se sob a inspiração do AI5, ainda que a Lei de Segurança Nacional estabelecesse como crime

"constituir, integrar ou manter organização do tipo militar, de qualquer forma ou natureza,

armada ou não, com ou sem fardamento, com finalidade combativa" (O Estado de São Paulo,

29.07.79). Este decreto-lei teve sua constitucionalidade questionada pela Comissão de Serviço

Público da Câmara.

Em função de muitos bancos demorarem a atender a esta prescrição, em abril de 1970

o Presidente Médici expediu o decreto-lei nº 1103, fixando em 31/05/70 (BRASIL,1970) o prazo

para que as agências bancárias cumprissem a exigência de adoção dos dispositivos de segurança,

sob pena de serem interditadas pelo Banco Central. Neste momento, portanto, a fiscalização dos

equipamentos de segurança se restringia apenas aos bancos e era feita pelo Banco Central.

A partir de 1969 e até 1983, a responsabilidade pela fiscalização e controle das

empresas de segurança privada ficou a cargo do Banco Central no que diz respeito à segurança

bancária, do Ministério do Exército em relação ao controle de armas (através do Serviço de


33

Fiscalização de Importação, Depósito e Tráfico de Produtos Controlados, que fixava que apenas

2/3 do efetivo de cada empresa poderia ter armas) e das secretarias de segurança pública de cada

estado, que, com relativa autonomia na matéria, baixavam portarias e criavam normas próprias

para determinar o funcionamento das empresas.

Esta fiscalização ocorreu sempre de maneira precária, tanto em função desta

fragmentação de responsabilidades, como também da falta de aparato próprio e eficiente pelos

órgãos responsáveis. Ainda em 1976, já havia declarações de autoridades de segurança chamando

a atenção para esta fragmentação: "Em torno dos empregados de empresas de segurança privada

a legislação é complicada, com determinaç·es federais, estaduais e municipais muitas vezes

colidentes" (Jornal do Brasil, 08.03.76).

Acompanhando o desenrolar deste aparato de fiscalização principalmente no Rio de

Janeiro e em São Paulo, podemos perceber que os passos dados no sentido de institucionalizar a

fiscalização ocorreram de forma muitas vezes autônoma em ambos os estados. Algumas medidas

que pudemos registrar ilustram esta orientação.

2- A fiscalização estadual

O órgão responsável pela fiscalização das empresas de segurança privada no Rio de

Janeiro no âmbito estadual é a DSOS (Divisão de Segurança de Órgãos e Sistemas), vinculada à

Secretaria de Segurança Pública - hoje Secretaria de Polícia Civil. A DSOS tem a

responsabilidade de autorizar, orientar e fiscalizar o funcionamento de organizações de segurança,

transporte de valores e sistemas de segurança de empresas privadas. Suas atividades contemplam

a responsabilidade pelo controle da documentação relativa à existência legal da empresa, o

número de guardas e a idoneidade dos diretores e empregados das empresas.

Em 1975, a DSOS, suspendeu por tempo indeterminado a concessão de licença para o

funcionamento de novas empresas, enquanto não fossem regularizadas as já existentes até aquele

momento. Este é um período de grande debate sobre a natureza e o papel destas empresas, um
34

momento em que, ao que parece, os órgãos responsáveis pela segurança começam a se dar conta

da necessidade de um controle maior sobre as mesmas, para que não se transformem em força

paralela independente do Estado. Declarações de autoridades da época ilustram esta preocupação:

"O quadro é tão alarmante que provocou a reação da própria


Polícia Civil. Em outubro de 76, delegados de 14 estados, reunidos em Belo
Horizonte, exigiram um limite para o crescimento desta força policial
particular: é mister se procure restringir, por lei federal, a atuação de
empresas particulares de vigilância privada, algumas multi-estaduais e outras
até formadas com capital estrangeiro e dirigida por estrangeiros. Das
responsabilidades destas empresas, que cobram caro a segurança e pagam
mal os vigilantes, surgem problemas que se tornarão, em breve prazo, difíceis
de contornar." (Em tempo, 20.02.78)

No caso do Rio de Janeiro, a secretaria de segurança do estado decidiu em 1975

promover modificações nas normas até então vigentes para o funcionamento das empresas,

através da portaria E-0052/70 (ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1970) Concretamente, no ano

de 1975 a medida tomada foi a suspensão da concessão de novos alvarás de funcionamento,

através de portaria que começou a vigorar em 22/05/75.

A partir daí começou-se a trabalhar na elaboração de uma proposta de resolução da

secretaria nesta matéria, que veio a ser expedida em 11/11/76. Esta portaria (ESTADO DO RIO

DE JANEIRO, 1976) teve o mérito de estabelecer alguns parâmetros para o funcionamento das

empresas, como capital social mínimo, número mínimo e máximo de funcionários, exigências para
o treinamento e capacitação dos empregados, com a obrigatoriedade de que todas as empresas

mantivessem um Centro de Promoção Profissional e que os vigilantes só pudessem trabalhar após

aprovados em exame prestado na Academia de Polícia, entre outras medidas. No início das

discussões sobre a proposta havia inclusive a intenção de proibir que os vigilantes andassem

armados ou fardados fora do horário de serviço.

Também passou a ser norma em função desta portaria a orientação para que cada

empresa tivesse ao menos um militar - oficial superior - em sua direção, com a intenção de

estabelecer um maior controle sobre o aspecto de formação técnica dos vigilantes. Acreditamos
35

que esta norma, que vigorou até 1983, foi fundamental para que possamos explicar ainda hoje o

elevado número de militares e de oficiais da polícia militar entre os proprietários de empresas de

vigilância.

Em função das normas estabelecidas nesta portaria, no ano seguinte, até junho, 11

empresas de segurança haviam sido fechadas e havia a expectativa de que 12 estavam em vias de

fechar também.

Em São Paulo, a tentativa de maior regulação pelo poder público sobre a ação das

empresas deu-se através da resolução SSP-62-75 (ESTADO DE SãO PAULO, 1976), pela qual a

secretaria de segurança pública buscava impor limites à atuação das empresas, permitindo o

trabalho de vigilantes apenas nos setores bancários e financeiros. Esta portaria foi revogada antes

mesmo de começar a vigorar. Outras portarias normativas foram elaboradas ao longo deste

período, na maioria das vezes fixando-se em aspectos específicos do funcionamento das empresas.

3- A lei federal de 1983

A grande mudança em termos legais se daria em 1983, quando foi sancionada pelo

Presidente João Figueiredo a lei nº 7.102, de 20/06/83 (BRASIL, 1983a). Desde os decretos-leis

de 1969 e 1970, esta foi a primeira tentativa de regular a questão da segurança em âmbito

nacional, num quadro bastante distinto da realidade enfrentada 15 anos antes. Em 1983 as

preocupações voltavam-se para a necessidade de impor limites à atuação das empresas, em função

do seu crescimento substancial ao longo do período.

A lei federal em vigor que disciplina a matéria ainda hoje é a lei 7102/83 (BRASIL,

1983a). Resumidamente, esta lei reitera o caráter obrigatório da segurança bancária, regulamenta

a profissão de vigilante, assegurando ao mesmo prisão especial por ato decorrente da atividade

profissional e seguro de vida em grupo feito pela empresa. A lei também estipula que o Banco

Central continuará fiscalizando os estabelecimentos financeiros, porém o controle das empresas

prestadoras de serviços de vigilância passa a ser feito pelo Ministério da Justiça "por intermédio
36

de seu órgão competente ou mediante convênio com as Secretarias de Segurança Pública dos

Estados" (BRASIL, 1983a).

A promulgação desta lei, no entanto, não foi suficiente para normatizar de maneira

mais eficaz esta matéria. Para começar, sua regulamentação demorou quase seis meses para ser

expedida, através do decreto nº 89.056, de 24.11.83 (BRASIL, 1983b). O decreto e a lei ainda

deixavam de fora várias especificidades referentes ao cotidiano de fiscalização das empresas e, ao

transferirem esta tarefa para o Ministério da Justiça, não se ocuparam de explicitar que órgão

interno do Ministério iria exercer esta função.

"Desde junho a fiscalização das empresas de vigilância é


função do Ministério da Justiça, enquanto o Banco Central fiscaliza as
agências bancárias. (...) A lei 7102/83 tirou dos estados a competência para
fiscalizar e apenas em novembro saiu uma regulamentação, que ainda precisa
de especificações, pois não fala nos cursos necessários ao vigilante, como ele
será examinado e aprovado." (O Estado de São Paulo, 11.12.83)

"Um exército paralelo de 60 mil homens, comparável em


número à força da polícia militar, embora não tenha a sua eficiência, está sem
comando há dez meses em São Paulo: uma lei federal transferiu o seu controle
para o Ministério da Justiça, mas não determinou quem vai exercer na prática
a fiscalização." (O Estado de São Paulo, 15.04.84)

"O prazo para que as empresas se adaptassem à nova


legislação terminou em dezembro e, até hoje, o Ministério da Justiça não tem
um órgão específico de fiscalização e sua Consultoria Jurídica não dispõe de
dados suficientes sobre as empresas." (Jornal do Brasil, 17.06.84)

A regulamentação não diz qual é o "órgão competente" do Ministério da Justiça que

deve se ocupar da fiscalização das empresas e em junho de 1984 o Ministério ainda não tinha

definido qual seria este órgão.

Diante deste impasse, ocorrem neste momento dois movimentos no sentido de

estabelecer os mecanismos de fiscalização das empresas: um ao nível federal e outro ao nível

estadual, no caso do Rio de Janeiro.


37

No âmbito do Ministério da Justiça, o trabalho de fiscalização terminou por tornar-se

atribuição do Departamento de Polícia Federal.

"Segundo o superintendente da Polícia Federal, Romeu Tuma,


o governo federal está seriamente preocupado com a situação que vivem há
cinco meses as empresas do setor, sem qualquer controle sobre suas atividades
e funcionando fora das normas estabelecidas por lei. Por isso, o ministro Abi-
Ackel determinou à Polícia Federal a responsabilidade pela fiscalização,
antes feita com eficiência pelas secretarias de segurança estaduais." (Folha de
São Paulo, 16.05.84)

Na época em que era Ministro da Justiça o Sr. Fernando Lyra, o advogado Marcelo

Cerqueira foi consultor deste ministério e trabalhou num parecer sobre a matéria. Em reportagem

publicada no Jornal do Brasil em 17.04.85, Marcelo Cerqueira propunha o desarmamento dos

guardas particulares, proposta esta criticada tanto pelos representantes dos vigilantes quanto das

empresas.

Fernando Lyra promoveu uma atualização dos alvarás de funcionamento das empresas,

que só seriam entregues “às empresas especializadas que possuam os antigos alvarás expedidos

pelos governos estaduais e tenham obtido laudo de vistoria favorável emitido pela Polícia

Federal.” (Folha de São Paulo, 12.02.86)

Em função das diversas deficiências apontadas, teve início neste momento a discussão

sobre um projeto de lei que viria a substituir a lei 7102/83 (BRASIL, 1983a). Este processo,
entretanto, não teve andamento e mesmo hoje não conseguimos localizar se há em tramitação no

Congresso Nacional alguma proposta neste sentido. Uma sugestão surgida na discussão deste

projeto era de tornar facultativa aos bancos a utilização de serviços de segurança o que,

obviamente, sofreu forte oposição tanto da parte das empresas como dos sindicatos de vigilantes

(Folha de São Paulo, 14.09.86).


38

4- A criação da Comissão Executiva

Em dezembro de 1986, o Ministro da Justiça Paulo Brossard criou a Comissão

Executiva Para Assuntos de Vigilância e Transporte de Valores. Com a criação desta comissão

"os sindicalistas (vigilantes) esperavam o fechamento de mais de 500 empresas fantasmas em todo

o país, a revisão das existentes, fiscalização nas instalações e na contratação de vigilantes e

reformulação dos cursos de treinamento" (Jornal do Brasil, 12.09.87).

Compunham a comissão um representante do Ministério da Justiça, que a presidia, um

do Ministério do Exército, um do Banco Central, um da Associação de empresas e um do

sindicato de empregados e quase um ano depois de instituída, apenas uma reunião havia sido

realizada. O que ocorreu de fato é que o presidente da Comissão, Cel. Kurt Pessek, passou a

decidir pelo conjunto, havendo denúncias de que ele estaria favorecendo empresas com

irregularidades e concedendo alvarás de funcionamento para empresas de parentes.

"O Cel. avalia sozinho os pedidos de alvarás de funcionamento


para as empresas de vigilância e entre os 300 concedidos em julho está um
para uma organização onde seu filho, Kurt Pessek Filho, é diretor-executivo.
(...)
Um outro processo autoriza o funcionamento da empresa
Rioforte, que se chamava Sentel até perder uma concorrência no Ministério da
Justiça e deixar de pagar impostos e encargos sociais. As instruções da
Polícia Federal determinam que uma empresa só pode conseguir alvarás de
funcionamento se apresentar certidão negativa de débitos com o governo.
Segundo o Sindicato dos Vigilantes do DF, a Rioforte ainda não quitou suas
dívidas com o Ministério da Fazenda." (Jornal do Brasil, 12.09.87)

Mesmo neste quadro de irregularidades na área governamental, em 1987 houve nova

iniciativa no sentido de uma fiscalização massiva das empresas de segurança, motivada por várias

denúncias de irregularidades,

"como a não apresentação de certidões negativas de


antecedentes criminais dos dirigentes das empresas, contratação de vigilantes
despreparados para o exercício da função, compra iregular de armas e
39
munições - principalmente no mercado negro e por contrabando, e estatutos
que não definem com clareza a atividade de vigilância e transporte de
valores." (Jornal do Brasil, 06.03.87)

"Todas as superintendências da Polícia Federal iniciarão


amanhã a operação de fechamento de empresas de vigilância e transporte de
valores que não preencherem os requisitos legais para o seu funcionamento.
Embora ainda não existam dados oficiais sobre o número de empresas
clandestinas, a Comissão para Assuntos de Vigilância e Transporte de Valores
do Ministério da Justiça calcula que elas devem chegar a 600 (200 com
processos indeferidos e 400 clandestinas), mas da metade das que se
encontram em funcionamento hoje no Brasil." (O Estado de São Paulo,
10.03.87)

Estas iniciativas de fiscalizar com maior rigor as empresas não se fazem, no entanto,

sem imediatas reações:

"A decisão do Ministro Brossard de moralizar o ramo das


empresas de vigilância encontrou algumas resistências. Uma fonte do governo
garantiu que alguns parlamentares chegaram a procurar o ministro tentando
fazê-lo desistir da operação ou dilatar o prazo para a concessão de registros.
Segundo a mesma fonte, as press·es existem pelo fato de muitas dessas
empresas pertencerem a militares reformados e a políticos." (O Estado de São
Paulo, 10.03.87)

5- O retorno da fiscalização estadual

O outro movimento no sentido de estruturar a fiscalização oficial sobre as empresas

deu-se através da Secretaria de Polícia Civil do Rio de Janeiro. O decreto 89.056/83 (BRASIL,

1983b) previa, no seu artigo 38, que "para que as empresas especializadas operem nos Estados,

Territórios e Distrito Federal, além de autorizadas a funcionar na forma deste regulamento,

deverão promover comunicação à Secretaria de Segurança Pública do respectivo Estado,

Território ou Distrito Federal. Da comunicação devem constar [entre outras especificações]

outras informações, a critério da respectiva Secretaria de Segurança Pública".


40

Este trecho da regulamentação abriu o precedente para que a Secretaria de Polícia Civil

do Estado do Rio de Janeiro passasse também a exercer sua própria fiscalização, o que tornou

mais burocrático e, não necessariamente mais eficiente, o controle sobre as empresas de

segurança privada no estado.

Neste aspecto é interessante notar a especificidade do Estado do Rio de Janeiro com

relação à fiscalização. Enquanto nos outros estados foi feita a transferência para o governo federal

e as secretarias estaduais se desimcumbiram da tarefa, no Rio sempre houve uma mobilização da

parte do governo estadual para que a ele coubessem estas atribuições.

No caso de São Paulo, por exemplo, as autoridades de segurança pública assim se

manifestaram:

"Como o controle da vigilância foi para a área federal, não


temos mais nada com isso, pois nos limitamos agora à fiscalização da
segurança patrimonial e das guardas noturnas, municipal e particular, que
continuam sendo credenciadas aqui, informa o delegado F. Assad Chad, do
Departamento de Registros Gerais da Secretaria de Segurança Pública de São
Paulo." (O Estado de São Paulo, 15.04.84)

Por parte da Secretaria de Polícia Civil do Rio começaram a haver gestões, desde

meados de 1988, para que fosse firmado um convênio transferindo a responsabilidade pela

fiscalização das empresas para o âmbito estadual. Alegava-se que nem o Banco Central tinha

interesse em exercer o controle sobre os estabelecimentos bancários, nem a Polícia Federal tinha

pessoal suficiente para exercer a função.


Entendendo que a melhor alternativa a adotar seria não discutir a constitucionalidade

da Lei 7.102 (BRASIL, 1983a) - que atribui à União a competência para autorizar e supervisionar

o funcionamento de empresas especializadas de vigilância e transportes de valores e dos cursos de

formação de vigilantes - Saboya decidiu propor o convênio (O Globo, 11.01.90).

O secretário de Polícia Civil baseou-se, para firmar o convênio, no artigo 6º da lei

7102/83 (BRASIL,1983a), que em seu parágrafo único afirma:


41

"Para a execução da competência prevista no inciso II


deste artigo [fiscalizar estabelecimentos financeiros quanto ao
cumprimento desta lei], o Banco Central do Brasil poderá celebrar
convênio com as Secretarias de Segurança Pública dos respectivos
Estados, Territórios e Distrito Federal."

Diante disso, em janeiro de 1990, o Ministério da Justiça decidiu firmar um convênio

com o governo do estado, repassando novamente a tarefa para a Polícia Civil, que ficou

responsável pela fiscalização até agosto do mesmo ano, quando o Ministério da Justiça baixou

portaria, suspendendo temporariamente a eficácia do convênio firmado entre o órgão e o Governo

estadual. Desde então, tanto a autorização para a criação das empresas quanto a fiscalização

voltaram para o âmbito da Polícia Federal.

Como mais um indicador da atuação suspeita do Cel. Kurt Pessek no Ministério da

Justiça, a assinatura do convênio provocou seu pedido de demissão, ocasião em que ele formulou

críticas à incapacidade da Polícia Civil para exercer a fiscalização (Jornal do Brasil, 24.01.90).

O secretário de Polícia Civil, Hélio Saboya, rebateu as críticas de Pessek dizendo que

tanto a Comissão Executiva para Assuntos de Vigilância quanto a Polícia Federal, encarregada de

acompanhar e fiscalizar os cursos de formação de vigilantes, haviam dado mostra nos últimos

anos de que não tinham condições de controlar a qualidade dos serviços de vigilância bancária.
"As coisas não funcionavam direito na Secretaria Executiva, que não tinha critérios para licenciar

as empresas capazes de fazer uma boa vigilância bancária", atacou o secretário, após ressaltar que

a Superintendência Regional da Polícia Federal, apesar de ajudar muito a polícia carioca nos casos

de assaltos a bancos, reconhece que não tem condições materiais e de pessoal para fiscalizar a

formação de vigilantes (Jornal do Brasil, 24.01.90).

No início de 1991, o Secretário de Polícia Civil Heraldo Gomes assinou a Resolução

440/91 (ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1991), tentando "amarrar" a fiscalização das empresas
42

novamente ao governo estadual, alegando que a lei federal só trata da vigilância de

estabelecimentos financeiros.

Com a posse do Governador Leonel Brizola, instala-se um novo comando na área de

segurança pública que passa a fazer críticas a forma como a fiscalização vinha se dando. O

Secretário de Polícia Militar, Cel. Cerqueira, chega inclusive a propor que a tarefa de fiscalização

da segurança privada volte a ser atribuição do governo do estado, mas que seja feita pela Polícia

Militar:

"A PM é o órgão mais indicado para controlar o trabalho das


empresas particulares, pois estamos todos os dias nas ruas, cuidando da
segurança pública." (Jornal do Brasil, 04.04.91)

O secretário de Polícia Civil e de Justiça e vice-governador, Nilo Batista, volta a alegar

que a legislação federal referente à segurança privada diz respeito apenas a transporte e guarda de

valores, referindo-se, portanto, apenas à segurança bancária. Quanto à fiscalização da vigilância

particular, própria dos estabelecimentos, esta cabe à DSOS. Ele mantém em vigor a portaria

440/91 (ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1991).

6- A portaria nº 91/92 e a situação atual

Em fevereiro/92 o Ministro Jarbas Passarinho assinou a portaria nº 91 (BRASIL, 1992)

que regulamenta as atividades de segurança particular. Esta portaria, entitulada "Normas para o

exercício das atividades de segurança privada no país" foi instituída, segundo informações da

Polícia Federal, a partir de um lobby feito pelas empresas de segurança, no sentido de reunir em

único documento os diferentes dispositivos pontuais sobre o assunto expedidos pelo Ministério da

Justiça desde 1984.

Os principais aspectos desta portaria são:


43

- a criação de Comissões de Vistoria em cada Superintendência da Polícia Federal. Estas

Comissões têm a função de dar autorização para a compra de armas, fazer vistoria nas empresas

ao menos uma vez por ano, apurar denúncias de irregularidades, cadastrar empresas e

empregados e decidir sobre o encerramento das atividades de empresas clandestinas;

- criação da Comissão Consultiva para Assuntos de Segurança Privada, ligada ao

Departamento para Assuntos de Segurança Pública do Ministério da Justiça, responsável pela

normatização e concessão de autorização para funcionamento das empresas e pela decisão sobre

punições às empresas que tenham incorrido em irregularidades;

- definição da segurança privada não só como aquela exercida em instituiç·es

financeiras, mas também "em outros estabelecimentos públicos e particulares" (BRASIL, 1992).

Em 1992, portanto, a fiscalização das empresas de segurança privada no Rio de Janeiro

é normatizada pela lei 7102/83 (BRASIL, 1983a), o decreto 89.056 (BRASIL, 1983b) que a

regulamenta, a portaria ministerial 91/92 (BRASIL, 1992) e a resolução estadual 440/91

(ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1991). Segundo os depoimentos das autoridades que

pudemos colher, o fato de haver esta fiscalização em duas diferentes instâncias não contribui para

que a mesma se dê de forma mais eficiente e, na maioria dos casos, apenas faz com que aumente a

burocratização do setor.

A Comissão de Vistoria da Superintendência da Polícia Federal do Rio de Janeiro conta

hoje com um agente e dois peritos, pessoal visivelmente insuficiente para dar conta das

atribuições da Comissão. Na opinião de membros da Comissão, a dupla fiscalização só atrapalha e

a Polícia Civil age de forma ilegal, na medida em que a lei estipula que a fiscalização é federal.

Na opinião do responsável pela fiscalização no âmbito estadual, diretor do DSOS, a lei

7102/83 (BRASIL, 1983a) fere a autonomia dos estados, já que segurança pública é matéria de

legislação estadual e não federal. A DSOS conta hoje com 20 funcionários, estrutura considerada

deficiente, como "acontece em todo o serviço público". Segundo declarou o secretário Nilo

Batista, o executivo está preparando um projeto de lei a ser enviado à Assembléia Legislativa que

regulamenta a vigilância particular.


44

Ao longo destas três décadas, portanto, a fiscalização das atividades de segurança

privada por parte do poder público mudou muitas vezes de competência, passando por diversos

órgãos tanto federais quanto estaduais. Ainda hoje o que se percebe é um nítido conflito de

competências entre estas duas esferas de governo, o que dificulta uma fiscalização mais rigorosa

das empresas por parte do Estado.

Ao mesmo tempo, não deixa de causar estranheza o fato de que uma tarefa trabalhosa e

não geradora de receita como é a fiscalização das empresas seja motivo de disputa entre duas

esferas de governo. Pelas indicações que temos, seria possível interpretar esta disputa como

resultado do lobby das empresas de segurança para exercer sua influência nos órgãos de

fiscalização, dependendo de onde estiverem situados. Tivemos informações inclusive de que

haveria uma pressão por parte do sindicato das empresas para que a fiscalização se tornasse

municipal.
45

IV- O DEBATE SOBRE O PAPEL DA SEGURANÇA PRIVADA

1- Segurança privada: atividade suplementar ou "força auxiliar da polícia"?

A justificativa por parte dos atores envolvidos nas atividades de segurança privada,

notadamente empresários e trabalhadores do setor, para a existência da mesma, dá-se em dois

sentidos.

Em primeiro lugar, seguindo os argumentos já apresentados anteriormente, assumem

como dada a incompetência do Estado para atuar eficazmente na área de segurança pública.

Como afirma o presidente do Sindicato dos Vigilantes, Fernando Bandeira:

"O aparelho público de segurança está deficiente: salários


baixos, necessidade de policiamento maior nas áreas mais pobres. Diante
disso, a insegurança leva qualquer empresário, por menor que seja, a querer
se proteger. Há, em função disso, uma necessidade de segurança privada, mas
ela deve ser legalizada e deve respeitar a legislação trabalhista."

Este é o principal argumento daqueles que defendem a segurança privada. Dado que a

polícia acumula diferentes atribuições e não tem sido competente no controle da criminalidade, as

empresas de segurança privada exercem uma função fundamental como força suplementar ao

trabalho da polícia.

Nesta linha pudemos registrar uma grande variedade de depoimentos tanto de

empresários como de empregados do setor, comerciantes e representantes de órgãos oficiais. Os

argumentos neste sentido vão desde uma análise neo-malthusiana de que a população cresce em

progressão geométrica e o contingente policial em progressão aritmética até uma avaliação, não

comprovada, de que os crimes contra o patrimônio decresceram depois que os estabelecimentos

bancários, comerciais e industriais passaram a contratar vigilantes.


46

Em segundo lugar apresentam a atividade da segurança privada como complementar à

ação dos órgãos oficiais de segurança e necessária para liberar a polícia de atividades que não

seriam de sua atribuição: vigilância patrimonial, segurança pessoal, transporte de valores, fazendo

com que os órgãos policiais estejam mais disponíveis para combater a criminalidade.

"Uma meta do Cel. Cerqueira é a maior integração entre o


trabalho dos policiais particulares com a polícia militar e civil. 'A secretaria
de saúde do município, por exemplo, quer pedir à PM para fazer a segurança
dos hospitais. Esse é um trabalho bom para as empresas particulares, pois os
policiais militares devem estar nas ruas e fazendo investigação criminal. Mas
essas empresas devem ser melhor controladas, para trabalhar melhor e
desobrigar a PM de certas tarefas`, diz o comandante." (Jornal do Brasil,
04.04.91)

Temos aí, portanto, um outro tipo de enfoque para a segurança privada. De atividade

emergencial da qual os setores que se sentem mais inseguros lançariam mão, num recurso

alternativo à segurança oferecida pelo Estado, a indústria da segurança transforma-se em força

auxiliar da polícia na manutenção da ordem pública.

Nesta linha de argumentação, cada setor deve ser visto como uma opção distinta de

proteção entre as alternativas existentes, invalidando, portanto, a visão de que, se o serviço de

segurança oficial fosse competente e eficaz não haveria necessidade de segurança privada.

"Entretanto, os executivos do setor privado não atribuem o


crescimento à falta de recursos policiais, considerando que a indústria
privada cumpre uma função (a proteção à propriedade) que sempre existirá,
independentemente da efetividade policial." (RICO & SALAS, 1987)

Como afirmava Bernardo Kruz, secretário da ABREVIS em 1976:

"Seria preciso igualar o preparo dos homens de vigilância com


o do efetivo da PM, pois os serviços de vigilância particular e policial são
complementares e não vão se extingüir, já que servem para conter um
problema social, provocado pelo aumento da população e o consequente
crescimento da criminalidade." (Movimento, 16.02.76)
47

Este parece ser, para nós, um dos aspectos fundamentais no questionamento sobre o

impacto que a segurança privada institucionalizada pode ter na redefinição das "atribuições

elementares" do Estado. Seu papel passa a ser definido não apenas pelo suposto "vácuo" deixado

pelo Estado neste setor - como, de resto, ocorre em relação à provisão de vários serviços básicos

- mas de maneira positiva, afirmando o espaço (ou o mercado) existente na sociedade

especificamente para este tipo de atividade.

2- Segurança pública e privada: interseções

Toda esta discussão sobre a complementariedade ou autonomia da segurança privada

em relação às forças policiais deve ser vista sob um novo ângulo quando nos deparamos com as

interseções existentes entre os profissionais que exercem estas funções.

São bastante comuns as referências à participação de policiais nas atividades de

segurança privada, constituindo-se esta última efetivamente como uma segunda opção de

emprego para grande parte dos empregados nos órgãos de segurança pública, não apenas policiais

civis e militares, mas também agentes da polícia rodoviária, ferroviária, agentes penitenciários,

bombeiros.

Alegando baixos salários, pouca qualificação profissional e condições de trabalho

insatisfatórias, os policiais lançam mão de atividades paralelas sem nenhuma cerimônia, levando a

se construir uma imagem da corporação como um "exército de biscateiros". Em pesquisa de

opinião realizada pelo jornal O Globo em meados de 1992 junto a 886 policiais militares, 66%

deles admitiram que fazem algum tipo de biscate para ajudar no orçamento familiar. Desses, 36%

confessaram que se dedicam à segurança comercial (O Globo, 28.06.92).

Comparando os rendimentos obtidos pelos policiais através da corporação e nos

serviços extras, percebe-se que os policiais militares que têm a segurança comercial como

segundo emprego conseguem ganhar a mesma coisa ou mais do que na corporação (O Globo,

30.06.92).
48

Os argumentos relacionados à baixa remuneração, no entanto, são insuficientes para

explicar o outro tipo de interseção comum entre a polícia e a atividade de segurança privada: o

grande número de oficiais envolvidos nestas atividades.

No caso dos oficiais, tanto da Polícia Militar como das Forças Armadas (e também

delegados e funcionários mais qualificados de outros órgãos de segurança), a vinculação se dá

mais freqüentemente como proprietários, instrutores ou consultores de empresas de segurança

privada. Como já foi dito anteriormente, esta associação tem suas origens no próprio início das

atividades de segurança privada no país, quando estabeleceu-se como obrigação legal a presença

de militares ou policiais como instrutores. Esta permuta de profissionais entre a segurança pública

e privada não é privilégio do Brasil.

"A maioria dos estudos tem demonstrado que uma percentagem


alta dos executivos das empresas privadas foram oficiais de órgãos públicos
antes do seu ingresso na indústria privada. Os estudos da Inglaterra, Canadá
e Estados Unidos demonstram que uma grande proporção dos policiais
considera a indústria privada como um emprego alternativo." (RICO &
SALAS, 1987)

A diferença parece ser que, no Brasil, muitos policiais e militares na ativa lançam mão

desta atividade. Estimativas do comando da Polícia Militar do Rio de Janeiro apontam que 50%

dos policiais militares de alta patente - coronéis, majores e tenentes - possuem algum tipo de

atuação na área da segurança privada, seja como proprietários de empresas ou responsáveis pela

formação dos vigilantes.


A atividade paralela de policiais no ramo da segurança privada é tão explícita que

parece ter se tornado regra, a ponto de um Comandante da PM declarar que desconfia "do PM

que não tem outra atividade. Para viver, deve estar recebendo propina" (O Globo, 28.06.92).

Um exemplo ilustrativo é o próprio presidente do Sindicato dos Vigilantes, Fernando

Bandeira, que é ao mesmo tempo instrutor de escola de formação de vigilantes e detetive da

Polícia Civil. Embora esta dupla atividade seja proibida pela corporação, Bandeira afirma que já
49

sofreu dois inquéritos administrativos, mas que nunca chegou a ser punido e que sua dupla

ocupação é de conhecimento de todos na polícia.

Este "lugar comum" em relação à participação de policiais em atividades de segurança

privada chegou a tal ponto que suscitou uma discussão não no sentido de coibir esta prática, mas

de legalizá-la. Na opinião do próprio Bandeira, não há nenhum problema no fato de se permitir ao

policial trabalhar na segurança privada nas suas horas de folga, alegando que esta situação implica

um risco menor do que quando o policial o faz de forma irregular.

Trata-se, portanto, do debate sobre o segundo emprego para os policiais. O princípio

da dedicação exclusiva vem sendo amplamente questionado, inclusive pelos próprios responsáveis

pela segurança pública no Rio de Janeiro.

O Secretário de Polícia Civil, Justiça e Vice-Governador, Nilo Batista, está preparando

um projeto de lei a ser enviado à Assembléia Legislativa que pretende regulamentar a

possibilidade do segundo emprego para os policiais. Ele acredita que não se tomou esta iniciativa

até hoje por tabu e preconceito e que este recurso funcionará no sentido de um maior controle do

comando da corporação sobre as atividades dos policiais inclusive nos horários de folga.

Também compartilham desta opinião outras pessoas que tivemos a oportunidade de

entrevistar. O vereador Alfredo Syrkis, por exemplo, incluiu a recomendação para

regulamentação do segundo emprego para policiais no relatório final da Comissão Parlamentar de

Inquérito por ele presidida destinada a "apurar a utilização irregular de seguranças, agress·es e

crimes ocorridos em estabelecimentos comerciais" (MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, 1991).

"Ao analisar essa realidade complexa, a CPI, em suas


recomendações, opta por um caminho intermediário que implica na
possibilidade de legalização de algumas dessas atividades paralelas
combinada com um controle disciplinar mais rígido da coibição com relação a
outras. Como princípio geral deve-se tomar como compatíveis as atividades
que não conflitem com o primado da fidelidade do agente à segurança pública
e com o tipo de formação operacional e psicológica que recebeu na polícia.
(...) No caso das atividades de segurança seria necessária uma separação
muito criteriosa. Se a atividade de proteção de valores e o seu transporte não
parece incompatível com o preparo psicológico e técnico do policial,
50
atividades como a de 'leão-de-chácara` de bar, casa noturna ou restaurante,
guarda de supermercado etc...exigem uma segurança desarmada, bem como
talentos específicos para o trato com o público."

Ainda no debate sobre o segundo emprego dos policiais vale à pena comentar aqui uma

outra proposta surgida no âmbito do governo estadual.

"O Governo do Estado criou ontem uma comissão que vai


estudar a possibilidade de a Polícia Militar começar a cobrar pela seguranca
que presta às agências do Banerj e a grande eventos, como jogos de futebol,
"Rock in Rio" ou corridas de Fórmula-1, distribuindo integralmente o dinheiro
que for arrecadado entre os soldados que participarem do serviço.(...)
A proposta feita pelo Subsecretário de Polícia Militar, Coronel Jorge de
Paula, é a de que a PM ofereça seus policiais para serviços de vigilância até
para shopping centers e grandes casas comerciais. O Vice-Governador e
Secretário de Polícia Civil, Nilo Batista, disse que, com a nova proposta, ficou
praticamente afastada a idéia de legalizar o segundo emprego dos policiais
civis e militares. Os policiais só poderiam dar segurança privada através da
PM. A comissão tem 15 dias para apresentar a conclusão de seus estudos.(...)
Na reunião, foi lembrado também que o Deputado Estadual Eduardo Chuay
(PDT) tem uma proposta de criar uma empresa pública para oferecer
segurança privada. A empresa - que ganhou o nome hipotético de Segurj ou
Segur-Rio - cadastraria os policiais civis interessados em trabalhar em
segurança privada nas horas de folga e distribuí-los pelos serviços
contratados." (O GLOBO, 26.04.91; grifo nosso)

Esta é, sem dúvida, a situação limite a que se poderia chegar em termos da privatização

de um serviço público. Seria o mesmo que chegar num hospital da rede oficial e pagar por uma

consulta médica. É claro que só alguns teriam acesso a este tipo de serviço. E o que aconteceria

com os que não pudessem pagar?

O segundo emprego para os policiais é permitido nos Estados Unidos. Segundo Rico e

Salas (1987), 24% dos policias norte-americanos cumprem funções privadas nas suas horas livres,

sendo esta proporção de até 85% nas áreas urbanas. Esta dupla atividade, no entanto é criticada

por chefes de polícia, basicamente por três razões:

- "a possível responsabilidade legal do corpo policial por


atividades realizadas durante o emprego privado;
51
- o possível abuso de poder e conflitos de interesses;
- a capacidade física do pessoal em manter jornadas duplas de
trabalho." (RICO & SALAS, 1987)

As interseções existentes entre os serviços público e privado de segurança,

especialmente no aspecto de pessoal possuem grande influência tanto sobre a qualidade dos

serviços de segurança privada quanto sobre sua relação com os órgãos de fiscalização.

A polícia, como afirma Paixão (1991), simboliza a ordem coletiva e, com todos os

limites no cumprimento de suas funções, continua a ser vista como possuidora de um papel de

regulação fundamental na sociedade.

Acreditamos, portanto, que a oficialização da prestação de serviços de segurança

privada por agentes de segurança pública poderá tornar-se um complicador a mais no sentido da

descaracterização da tarefa da segurança como monopólio do Estado. Desta forma, não se

trataria mais de uma alternativa entre segurança pública e privada, mas de sua simbiose

3- Os limites de atuação das empresas

A tarefa do controle social, como a estamos entendendo até aqui, é atribuição do

Estado. A segurança privada se ocupa de atividades no âmbito privado, complementando a

atuação policial. Qual é, porém, o limite da atuação das forças privadas de segurança?

Procurando fazer um paralelo entre os órgãos de segurança pública e as empresas de

segurança privada, Rico e Salas (1987) resumem as principais características atribuídas a uma e

outra instituição, a partir de pesquisas feitas principalmente nos Estados Unidos.

A comparação define a segurança pública como responsável pela defesa da comunidade

em geral, ao passo que a segurança privada atua em defesa do patrimônio, isto é, da propriedade

privada.
52

Também no que diz respeito ao local de atuação as duas forças se diferenciam, na

medida em que a segurança privada não têm competência para exercer vigilância em áreas

públicas.

O papel da segurança privada é identificado basicamente como preventivo e destinado

a impedir possíveis perdas, enquanto a atuação da polícia oficial se concentra na manutenção da

ordem, de maneira mais ampla e na prevenção e repressão ao delito. Assim é que a eficácia da

polícia se mede comumente pela repressão aos delitos, ao passo que a eficácia da segurança

privada seria medida pela redução na ocorrência dos mesmos.

A diversificação de atribuições da polícia na sociedade contemporânea é

freqüentemente citada como um dos principais aspectos que torna a avaliação da sua atuação

geralmente negativa. Segundo Paixão (1991),

"a criação da moderna polícia burocratizada no século XIX


envolveu o reconhecimento - ainda que implícito - de um duplo domínio
organizacional a ela atribuído: a prevenção e repressão do crime e a
manutenção da ordem pública; (...) a polícia enfrenta crescimento dramático
de demandas de intervenção por parte de públicos ou moralmente exigentes ou
desprovidos de acesso a outras burocracias do Estado."

"Uma análise dos orçamentos dos serviços de polícia indica


que, ao assumir uma maior função social, as forças públicas serão forçadas a
reduzir os esforços relacionados com a repressão ou a prevenção do delito."
(RICO & SALAS, 1987)

Voltamos a nossa pergunta anterior. Como atuam as empresas de segurança nesta

atividade "preventiva" e "complementar"?

"Em alguns casos, este pessoal conta com uma autoridade legal
semelhante à da força pública. Por exemplo, muitas das universidades norte-
americanas mantêm seus próprios órgãos de segurança com a mesma
autoridade das forças públicas. Entretanto, a natureza privada destes órgãos
pode conduzir a situaç·es em que a força privada tem mais poder que a
pública, já que não está regida pelas mesmas normas jurídicas." (RICO &
SALAS, 1987)
53

O que está em jogo aqui são os interesses a que atendem as forças privadas e públicas

de segurança. Os interesses das últimas

"são definidos de acordo com as leis estabelecidas para


proteger os interesses da comunidade em geral. As forças privadas respondem
a interesses ditados pela indústria ou pela empresa que empregam." (RICO &
SALAS, 1987)

Num enfoque semelhante, Paixão expõe de maneira brilhante os dilemas a serem

enfrentados quando nos deparamos com esta diversidade de interesses entre os órgãos de

segurança pública e a segurança privada:

"Como demarcar as fronteiras entre polícia pública (o


instrumento de proteção dos cidadãos contra a externalidade criminosa;
contido pelos formalismos legais e pelos controles burocráticos e políticos
que garantem os direitos humanos dos protegidos) e a segurança privada
como bem divisível em seu consumo e potencialmente liberada dos
formalismos e controles que limitam a ação 'no melhor interesse dos clientes`
pelo respeito aos direitos humanos de indivíduos e grupos por ela afetados?"
(1991; grifo nosso)

"Segundo o Juiz Alberto Mota Morais, do I Tribunal do Júri, os


limites legais da ação de um vigilante não ultrapassam os de um cidadão
qualquer, não cabendo a ele interrogar, investigar, ou exercer as funções de
polícia constituída. (...)
'A função dos vigilantes, no caso de desconfiarem que uma
pessoa está furtando algo, não poderá ser nunca a de interrogar, investigar,
exigir explicaç·es, mas encaminhar o suspeito à delegacia de polícia mais
próxima, para que o caso seja averiguado, pela autoridade competente`, disse
o Juiz." (O Globo, 22.01.78)

Apesar de parecer ser esta a orientação dada aos vigilantes quanto aos limites do

cumprimento de suas funções, não identificamos, em nenhum dos textos legais consultados, a

indicação explícita das atribuições referentes ao exercício da segurança privada, o que se reflete

na fragilidade dos mecanismos de punição estabelecidos.


54

O decreto nº 89.056/83 (BRASIL, 1983b) define, em seu artigo 5º:

"Vigilância ostensiva, para efeitos deste Regulamento, consiste


em atividade exercida no interior dos estabelecimentos e em transporte de
valores, por pessoas uniformizadas e adequadamente preparadas para impedir
ou inibir ação criminosa."

Por outro lado, a resolução 440/91 (ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1991), da

Secretaria de Polícia Civil do Rio de Janeiro, de duvidoso valor legal por estar subordinada à

portaria ministerial, especifica que a atividade de vigilância só pode se dar em "recinto privado

(...) com vistas exclusivamente, aos bens a proteger, mantendo-se o vigilante afastado do

público".

As empresas de vigilância, por sua vez, fazem questão de declarar que seu poder de

polícia é reduzido e que reconhecem os limites de sua atuação. Como afirmou o Dr. Carmelo

Perrone, da Transforte: "protejo patrimônios e não ordens sociais ou fronteiras" (Revista

Domingo, Jornal do Brasil, 05.04.92).

Há também quem declare, como o presidente da Agents, Francisco Gama (Jornal do

Brasil, 17.06.84), que a função do vigilante seria de "impor respeito", tendo um efeito

intimidatório sobre um potencial delinqüente.

Os dilemas enfrentados diante da prática repressiva de muitos policiais vis à vis os

limites legais de suas ações tornam-se mais radicalizados quando estamos falando de vigilantes

que, empregados de uma empresa que presta serviços a um determinado cliente, não

necessariamente estarão pautando sua conduta pelas normas legais impostas às instituições

policiais.

"A segurança privada - no contexto democrático - não apenas


detém poder de polícia no âmbito privado (...) como também a exerce (...) livre
dos formalismos que, no espaço público, protegem o indivíduo contra o
arbítrio do Estado." (PAIXÃO, 1991).
55

Aqui consideramos oportuno trazer um exemplo da "eficiência" da segurança privada

em contraposição à atividade policial.

"A private police force, as heavily armed and sometimes as


violent as the drug dealers it is hired to confront, is stalking the dealers in
some of Brooklyn's poorest neighborhoods, acording to residents, police
officers and the guards themselves. (...)
The Police Departament says it opposes vigilante justice, but some officers
on the beat and neighborhood residents are enthusiastic about the company's
tactics.(...)
Mr. Weber, the head of SSI, said conventional security measures are
ineffective in drug-ridden buildings.
'We couldn't control this when we went in a nice manner, like any security
company`, he said. 'it did not work.`(...)
Mr. Weber likes to boast that he can do what law-enforcement officials
cannot, although he would not describe his tactics and methods.
'My speciality is buildings with heavy drugs,' he said, seated at a large
dining room table in his small basement apartament in Williamsburg.(...)
'They work closely with us,' said one sargeant, who did not want to be
identified. 'If there is a problem, they call us. If they see something, they let us
Know. They have really cleaned the Noble Drew Ali Plaza up, and it has made
our job in there a lot easier'.(...)
Residents at Atlantic Towers also say that the number of drug dealers there
has declined since the security guards arrived three months ago.(...)
'SSI is a serious security team', said Jeannette Gadson, who is the district
manager for Community Board 16 and who has her office in Atlantic Towers.
'They have a diferent way of doing things, but they have gained the respect of
the people. I don't Know exactly how they do it, but they seem to be very good
at it.'(...)
Community leaders, residents and the guards themselves acknowledge that
the guards have earned respect because they confront the uninhibited violence
of the street with uninhibited violence of their own.(...)
'If they spill one pin drop of our blood, we spill gallons of theirs,' one guard
boasted.(...)
Guards earn about $6 or $7 an hour, but when the company first goes into
drug-infested housing they can earn up to $15 an hour, SSI officials say. (...)
'We go in and shoot in the walls,' said the SSI official who supervises the
raids. 'We tell them that the next time we will shoot them in the head."(New
York Times, 16.06.91)

Consideramos necessário transcrever todo este trecho sobre as atividades da empresa

SSI em Nova Iorque para que possamos dimensionar o significado de uma força policial paralela
56

com poderes de agir "acima da lei". O apoio da comunidade, a conivência das autoridades e a

arrogância dos empregados da empresa dão a medida do que pode significar a privatização dos

serviços de segurança pública, podendo mesmo ser verdade que estes venham a substituir a

atuação policial a médio prazo.

Estas constatações levantam de imediato preocupações com relação aos limites

impostos à liberdade dos indivíduos a partir da forma como é exercida a segurança privada. O

aumento deste setor implica na ampliação dos mecanismos de controle social sobre os cidadãos e

numa conseqüente diminuição da sua privacidade, "ao transferir a missão de vigilância de uma

entidade pública, com os seus correspondentes limites, a uma entidade privada, que responde

somente aos interesses do seu patrão" (RICO & SALAS, 1987).

O fato é que a presença da segurança privada é tão ostensiva que extrapola, levando

diversos setores da sociedade a terem medo não só das causas como também das conseqüências

da violência e do sentimento de insegurança. Do ponto de vista do cidadão, preocupa o fato de

andarem armadas pessoas que não são policiais, não receberam formação adequada, trabalham em

empresas cujo fim último é o lucro e, sobre as quais acumulam-se diversas denúncias sobre a

deficiência dos serviços prestados.

4- A qualidade dos serviços de segurança privada

Alguns relatos que pudemos registrar associados a denúncias sobre a má qualidade dos

serviços prestados pelas empresas, ao menos nas décadas passadas, contribuem para compor uma

avaliação crítica sobre a sua atuação.

"A grande diferença existente entre as empresas privadas que


vendem serviços no Brasil e as norte-americanas, inglesas, espanholas ou
francesas, é o homem. Nos EUA, por exemplo, o homem tem um biotipo, um
peso e uma cultura adequados à profissão, que existe e é respeitada.
[No Brasil] o homem entra na profissão porque não tem ocupação e sai dela
por falta de vocação. Esta profissão aqui, ao contrário do exterior, não tem
57
nenhum status, remunera mal e sua rotina é de uma monotonia irritante,
explica Germano Botelho, irmão do dono da empresa Pires." (Jornal do
Brasil, 22.12.89)

"Pelo que sabemos, 80% dos vigilantes em São Paulo são


nordestinos. Para eles, o que interessa é vestir o uniforme de vigia e andar
com uma arma na cintura, para depois escrever para a família dizendo que é
policial" - Declaração do Presidente da Associação Profissional dos
empregados em empresas de vigilância e segurança, Josilmar França. (Folha
de São Paulo, 02.03.87)

Em 1978, o então Secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Gal. Brum

Negreiros, afirmava que "as empresas causam mais trabalho à polícia do que os delinqüentes"

(Jornal do Brasil, 13.08.78). Ao que parece, esta declaração refere-se a fatos semelhantes aos

relatados pelo Secretário de Polícia Civil, Hélio Saboya, em 1990, quando afirmava que os

vigilantes bancários eram displicentes nas suas funções, fazendo com que, dos quase 2000

deslocamentos de carros de polícia para agências bancárias, apenas pouco mais de 500 se

mostrassem realmente necessários, em função de disparo acidental ou da precipitação dos

vigilantes (O Globo, 11.01.90).2

Em vários outros momentos identificamos declarações de autoridades públicas ou da

imprensa que demonstravam uma avaliação negativa da atuação das empresas, associada à

ambição por um lucro excessivo, ao despreparo dos vigilantes ou, mais raramente, a práticas

violentas e abusivas por parte dos guardas.

"Eu tenho ordem de não reagir e muitas vezes não tenho mesmo
condição de enfrentar o bandido. Não vou dizer que atiro bem, mas tento
acertar. Se não é para reagir, para que vigilância? (...) Se nem a polícia está

Em relação ao aspecto específico da segurança bancária, a


2

efetividade de sua atuação tem como limitação a displicência com


que muitos bancos tratam a obrigatoriedade da segurança, em
função do seguro de suas reservas proporcionado pelo Banco
Central. As instituiç·es que perdem valores em assaltos, parecem
não se interessar numa reação efetiva por partes dos guardas de
segurança aos assaltantes, na medida em que o valor roubado será
ressarcido pelo seguro. Desta maneira, a função dos vigilantes
parece ser, muitas vezes, apenas figurativa.
58
vencendo a violência, como é que o vigilante vai conseguir? A gente só mata
se for por muita sorte. Quem reage e mata o assaltante não ganha nada com
isso e às vezes é até transferido de posto." (O Estado de São Paulo, 15.04.84)

Esta avaliação negativa da capacitação profissional dos vigilantes é o principal aspecto

relacionado com as críticas ao desempenho das empresas. Como afirmam Rico e Salas (1987),

"embora a indústria da segurança privada represente custos


mais altos do que os ocasionados pela polícia pública, é surpreendente a falta
de informação sobre a natureza ou a efetividade deste setor em reprimir o
delito ou em reduzir o medo do mesmo."

"Em nenhum momento foi provada até que ponto a presença de


um guarda de segurança, mesmo que ostensiva, inspire autoridade diante, por
exemplo, de um estabelecimento bancário." (Jornal do Brasil, 07.09.76)

Podemos identificar basicamente dois tipos de irregularidades. A primeira diz respeito

ao aspecto mais formal de funcionamento das empresas, suas obrigações legais e trabalhistas, sua

documentação e registro, bem como em aspectos referentes à aquisição de armamentos e à

capacitação dos vigilantes.

Segundo representante da Comissão de Vistoria da Polícia Federal, as irregularidades

mais comuns dizem respeito ao não cumprimento da reciclagem obrigatória dos vigilantes, que

deve ser promovida pela empresa a cada dois anos. Já o Sindicato dos Vigilantes aponta falha das

empresas em relação aos seus compromissos trabalhistas, como o fornecimento de vale-


transporte, por exemplo.

O outro tipo de irregularidade cometida pelas empresas diz respeito a práticas abusivas

e arbitrárias, como conseqüência da imprecisão acerca das atribuições do vigilante. São práticas

recorrentes:

-a perseguição de "suspeitos" fora dos limites do estabelecimento comercial ou de

outra natureza que os guardas dão proteção;

-tortura;

-cárcere privado;
59

-uso de violência de forma abusiva;

Estas práticas foram relatadas em dezenas de depoimentos coletados na imprensa nos

últimos 25 anos, revelando que a polícia privada muitas vezes extrapola de seu poder,

sobrepondo-se mesmo ao papel da polícia pública.

Por outro lado, pudemos registrar vários relatos de práticas ilegais cometidas por

vigilantes dentro ou fora do exercício de suas funções, porém em estreita relação com o fato de

portarem uma arma e de sentirem-se respeitados como uma autoridade. Alguns relatos registrados

em diferentes jornais foram:

- guardas praticaram assaltos com as armas que utilizavam em serviço;

- vigilante baleou gerente da agência onde trabalhava;

- vigilantes assaltaram transeuntes usando armas de serviço;

- vigilante assaltou agência bancária onde trabalhava;

- guardas das empresas particulares de segurança são fornecedores de armas a

marginais;

- guarda matou a tiros seu colega para roubar CR$ 500 mil;

- guarda baleou estudante numa discussão;

- guarda comandou grupo de favelados no maior assalto de bancos registrado no Brasil

até 1975;

- guarda teve acesso de loucura e manteve como reféns seis funcionários da agência

onde trabalhava;

- vigilante matou cliente de banco depois de discussão.

Todas estas práticas arbitrárias e ilegais colocam a nu a situação das empresas de

segurança privada, questionando especialmente o argumento da sua eficiência em contraposição

ao papel desempenhado pela polícia.

Em que pese o fato de que as empresas legalizadas hoje têm contra si menos denúncias

do que nas décadas anteriores, ainda está associado a elas este clima de irregularidade e
60

arbitrariedade no exercício de suas atividades. E estas irregularidades ainda existem, auxiliadas

pela modesta fiscalização existente e pelo conflito de competências em relação à mesma.

Assim, um serviço caro, que se pretende suplementar à atribuição estatal em relação à

segurança pública e exercido por milhares de trabalhadores em todo o país possui na sua história

sinais de que esta suposta eficiência é questionável, podendo muitas vezes se constituir em risco

ao invés de segurança para a população.

Como os limites entre a legalidade e a ilegalidade muitas vezes são tênues, um outro

fantasma que ronda a atividade da segurança privada é a proliferação de empresas clandestinas,

onde as fronteiras entre a proteção, a extorsão e o crime apresentam-se bastante indefinidas.

5- Empresas clandestinas e o desgaste da imagem do setor

As denúncias sobre a existência de empresas clandestinas de segurança privada são

recorrentes, tão antigas quanto as próprias empresas legalizadas. Estas últimas, inclusive, têm uma

preocupação permanente em denunciar estas atividades, a fim de que seu trabalho não seja

avaliado negativamente em função das atividades ilegais existentes.

A má imagem que o setor possui é um dos principais aspectos contra o qual os

sindicatos das empresas têm se debatido, buscando apresentar-se como uma prestação de serviços

como outra qualquer.

O major reformado da Polícia Militar Wilson Carneiro de Lima, diretor de uma

empresa de segurança afirmava:

"As guardas de segurança dão ao Estado policiamento de


graça, dinheiro através da arrecadação do INPS, FGTS, IR e oferecem
emprego." (Jornal do Brasil, 13.08.78)
61

Os executivos do setor enfrentam, no entanto, algumas dificuldades neste sentido. A

presença de oficiais reformados (ou mesmo da ativa) das Forças Armadas e da Polícia Militar nos

seus quadros dificulta, como eles mesmos avaliam, uma modernização do setor.

"As empresas brasileiras de segurança patrimonial estão


substituindo nos seus quadros os coronéis reformados e os delegados
aposentados para tentar recuperar, pela eficiência, a enorme distância que as
separa das congêneres dos países desenvolvidos." (Jornal do Brasil, 22.09.89)

"Existe uma preocupação evidente dos dirigentes da Abrevis


em mudar a imagem de que os dirigentes das empresas que vendem serviços
de segurança sejam pessoas comprometidas com órgãos de segurança ou
mesmo com a polícia.
- Estamos na Nova República e politicamente é importante que
o setor mostre que não faz parte do chamado entulho autoritário, comenta o
presidente da Abrevis, Amâncio Barker" (Jornal do Brasil, 22.11.85)

"Os empresários de segurança não gostam de falar de mortes e


violência, porque já foram muito criticados por causa disso e ainda estão
sofrendo as conseqüências da imagem negativa que nos anos passados
acompanhou os vigilantes. Eles se queixam de que nunca se dá notícia ao
trabalho de prevenção, quando para a segurança é o mais importante." (O
Estado de São Paulo, 15.04.84)

Nesta linha de marketing, todo o esforço dos empresários é no sentido de associar

qualquer tipo de prática violenta ou atuação desqualificada às empresas clandestinas e irregulares

que atuam no setor. O problema é que, diante da falta de transparência sobre sua atuação, das

ligaç·es ainda hoje explícitas com a polícia e da persistência de práticas condenáveis como o

episódio da concorrência para a prestação de serviços de vigilância ao Banco Meridional (policiais

militares a mando de uma empresa mantiveram em cárcere privado o diretor de outra empresa

para que esta não participasse da concorrência), a imagem do setor ainda está bastante associada

a práticas ilícitas.

Os dados disponíveis sobre o número de empresas clandestinas operando no Rio e no

Brasil variam. Geralmente estima-se que praticamente para cada empresa legalizada exista uma

clandestina. Vez por outra tanto o sindicato das empresas como o dos vigilantes divulgam listas
62

de empresas clandestinas em operação, embora raramente se saiba qual foi o desfecho dado a

estas denúncias.

Um outro aspecto importante com relação à atividade clandestina de segurança é a

contratação direta de vigilantes ou "seguranças" por estabelecimentos comerciais, bares,

restaurantes e hotéis. Este tipo de segurança é normalmente ilegal, dando margem a muitas

arbitrariedades por parte tanto dos estabelecimentos - que negam qualquer vínculo de emprego

com o vigilante caso haja algum conflito - como dos "seguranças", que normalmente atuam sem

nenhum preparo, sem nem mesmo terem freqüentado o curso de formação obrigatório por lei.

"Os principais hotéis da orla marítima do Rio têm, e até


anunciam, uma equipe de segurança própria para tranqüilizar os turistas.
Policiais das delegacias de Copacabana garantem que 70% das lojas -
principalmente joalherias - do bairro e de Ipanema e Leblon também partiram
para uma solução caseira, seja contratando empresas de segurança ou
agentes particulares clandestinos." (Jornal do Brasil, 15.01.84)

Este também é o grande mercado de trabalho para a atuação de policiais como

vigilantes, não só individualmente como, muitas vezes, agenciados por um oficial superior.

"Na área do SAARA (Sociedade dos Amigos das Adjacências da


Rua da Alfândega), no Centro do Rio, trabalham na segurança das lojas 48
homens. 'Geralmente, nós pegamos policiais ou militares reformados. Temos
também PMs que aproveitam para fazer um bico`, conta o presidente do
SAARA, ãnio Bittencourt. Também no mercado São Sebastião, na Penha, a
segurança é feita clandestinamente por cerca de 100 homens." (Jornal do
Brasil, 15.01.84)

"A questão do envolvimento de policiais civis e militares em


atividades irregulares de segurança é outro aspecto fundamental da questão.
A CPI constatou que este envolvimento é gigantesco e assume dimensões de
verdadeiras empresas informais com oficiais da Polícia Militar agenciando a
atuação de seus praças e suboficiais na prestação de serviços de segurança
particular nas horas de folga ou até mesmo em horário de serviço."
(MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, 1991)
63

Este trecho do relatório final da CPI da Câmara Municipal do Rio de Janeiro ilustra

bem o quadro da participação de policiais na segurança clandestina. Aliás, os próprios fatos

motivadores da criação desta CPI denunciaram esta situação à opinião pública. Trata-se do

assassinato de dois jovens em dois restaurantes da Zona Sul do Rio de Janeiro em outubro de

1990, episódios que ficaram conhecidos como os "casos Sagres e Alcazar". Em ambas situações

os autores do crime foram "seguranças" dos estabelecimentos.

Como resultado desta CPI, além de outras recomendaç·es, foi criada a lei municipal nº

1.890 (MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, 1991), que condiciona a concessão de alvarás de

funcionamento a estabelecimentos que mantenham serviço de segurança à regularização deste

serviço junto à Secretaria de Fazenda do município. Além disso, a CPI elaborou um projeto de

emenda ao Código Penal que estipula como crime a "prestação de serviços de vigilância ou

segurança sem a autorização das autoridades competentes, bem como sem o atendimento das

exigências e prescrições legais" (MUNICµPIO DO RIO DE JANEIRO, 1991).

Os fatos ocorridos nos restaurantes Sagres e Alcazar estimularam a opinião pública a

refletir sobre o papel da segurança privada e os limites de sua atuação legal. Várias pessoas

manifestaram-se publicamente sobre estes episódios, levantando aspectos referentes às causas do

aparecimento destes serviços e à necessidade de maior fiscalização dos mesmos. Julgamos,

entretanto, que, ao concentrarem-se de maneira excessiva no aspecto referente às empresas

clandestinas estas manifestações muitas vezes reduziram o problema a uma questão de regulação

da atividade por parte do Estado. Este é, a nosso ver, um aspecto importante da questão, mas

insuficiente para dar conta dos desafios colocados pela privatização da segurança na sociedade

brasileira hoje.

"Quem contrata 'seguranças` para si próprio está sujeito a toda


sorte de deveres e responsabilidades com terceiros, pois passa a responder,
direta e objetivamente, pelos excessos que este tipo de 'proteção` degenera (...)
(...) se o comerciante convoca seus 'capangas`, 'seguranças` ou
'protetores` para 'dar uma solução ao caso`, como acontece cotidianamente,
sobrepõe-se a um delito menor um outro infinitamente maior e mais grave, que
64
é 'fazer justiça pelas próprias mãos para satisfazer pretensão, embora
legítima`, segundo estatui o artigo 345 do Código Penal, o que é inadimissível
em todos os sentidos e em qualquer circunstância, ao menos nas sociedades
politizadas e sob o império da lei, que repele tal procedimento." (BÉJA, Jorge
de Oliveira, Sagres, Alcazar maldito, Jornal do Brasil, 24/10/90)

6- A fiscalização "cerimonial"

Os dilemas já relatados anteriormente sobre a imprecisão na definição dos serviços de

segurança privada ganham ainda maior peso quando nos debruçamos sobre as atribuições das

empresas de vigilância e os mecanismos existentes para fiscalização de sua atuação. Tomando a

expressão utilizada por Paixão (1991), pudemos perceber a "natureza puramente cerimonial do

controle público sobre a segurança privada", que acreditamos ter ficado explícita nos capítulos

anteriores. Junte-se a isso a relação íntima existente entre pessoas ligadas à segurança pública e o

staff dirigente das empresas de segurança, facilitando enormemente o tráfico de influências e o

lobby por parte das mesmas na definição destes mecanismos de fiscalização.

O maior exemplo desta situação é o fato de que a portaria 91/92 do Ministério da

Justiça (BRASIL, 1992), atualmente em vigor, estipula como órgão máximo para decidir sobre

irregularidades cometidas pelas empresas a Comissão Consultiva para Assuntos de Vigilância e

Transporte de Valores, ligada ao Departamento de Assuntos de Segurança Pública do Ministério,

da qual participam representantes das empresas, dos empregados, e dos órgãos da administração

pública responsáveis pela fiscalização. Sem querer eximir os setores diretamente interessados do
debate e da decisão sobre esta matéria, acreditamos, no entanto, que por tratar-se de assunto tão

delicado, o aspecto das irregularidades e punições deveria ser objeto de decisão dos órgãos

governamentais de fiscalização, não sendo passível de decisão através de auto-regulamentação,

como parece se dar no âmbito da Comissão Consultiva.

Além disso, as próprias irregularidades passíveis de punição especificadas na portaria

91/92 (BRASIL, 1992), ao nosso ver, não dão conta da necessidade de um maior controle sobre a
65

natureza e as atribuições dos serviços de segurança privada. A grande maioria delas diz respeito

apenas a aspectos burocráticos e normativos em relação à documentação exigida para

funcionamento, treinamento e capacitação de vigilantes e manipulação do armamento em poder

das empresas. Com exceção do artigo 85, que pune com concelamento da autorização para

funcionamento a empresa que "funcionar com desvio de seus objetivos sociais ou indicando

destino das atividades para fins ilícitos, contrários, nocivos ou perigosos ao bem público e à

segurança do Estado e da coletividade" (BRASIL, 1992) nenhum dos outros dispositivos

especifica como irregularidade o mal cumprimento do serviço de vigilância em si ou eventuais

abusos cometidos pelos vigilantes no exercício de suas funções.

No âmbito estadual de fiscalização também foi possível contatar críticas no

desempenho destes órgãos:

"Antigamente, diz Fernando Bandeira, a DSOS mantinha uma


fiscalização efetiva. O agente encontrado na guarda de um estabelecimento
bancário sem carteira de vigilante, que lhe dá direito a porte de arma em
serviço, devidamente carimbada pela Secretaria de Segurança, era retirado do
posto pela fiscalização e levado à DSOS, que convocava os diretores da
empresa e esta era punida. Atualmente, a fiscalização é rara e os fiscais
limitam-se a perguntar ao agente a empresa de segurança a que pertence. (...)
Quando é encontrado um vigilante em situação irregular, não aprovado na
Academia de Polícia, a fiscalização da DSOS limita-se a anotar seu nome."
(Folha de São Paulo, 16.05.82)

Conforme declarou o diretor da Divisão de Segurança de ãrgãos e Sistemas no Rio de

Janeiro, os mecanismos disponíveis para a punição de irregularidades praticadas pelas empresas

de segurança privada são os artigos 19 e 47 da Lei de Contravenções Penais, que tratam do porte

ilegal de arma e do exercício irregular da profissão. Ora, nenhum destes mecanismos, a nosso ver,

é suficiente para impor maior controle às atividades de segurança privada no país.

Assim, encontramo-nos hoje no Brasil numa situação em que, se a atividade policial

possui maiores possibilidades de ser fiscalizada a partir do seu papel constitucional, na tentativa

de impor limites a eventuais arbitrariedades cometidas por membros da corporação, para a


66

atividade de segurança privada não encontra-se amparo legal para que os abusos no exercício

desta função sejam coibidos.

Diante deste quadro, parece claro que há a necessidade de se instituirem mecanismos

mais eficazes de fiscalização em relação às empresas de segurança privada. A adoção destes

mecanismos, porém, não virá a garantir necessariamente uma delimitação do campo de atuação da

segurança privada, no sentido anteriormente colocado dos limites à liberdade individual.

"Para os otimistas, o crescimento da segurança privada e os riscos


potenciais por ela representados para a ordem democrática (...) são
problemas de regulação. (...) Os pessimistas (...) não hesitam em identificar,
nessa cooperação, a base de construção de ordem social próxima ao modelo
foucaultiano da 'sociedade disciplinar'."(PAIXÃO, 1991)

O conflito de visões exposto acima ilustra os dilemas colocados pelo tema da

privatização da segurança que, ao nosso ver, vão além, numa visão mais "pessimista", do

aperfeiçoamento dos mecanismos de regulação existentes.


67

V- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta última parte gostaríamos de retomar as principais reflexões desenvolvidas ao

longo do trabalho e de apontar os desafios colocados àqueles que estão preocupados com a

democratização da sociedade brasileira em função da expansão dos serviços de segurança privada.

Nossa reflexão desenvolveu-se no sentido de apresentar:

1º) o consenso existente entre vários cientistas sociais clássicos e contemporâneos

sobre a segurança pública como monopólio do Estado;

2º) a experiência da violência nos grandes centros urbanos e o aumento da

criminalidade violenta como fatores que levam vários setores da população a buscarem se

proteger ou se defender;

3º) a privatização da segurança como uma forma de proteção ou defesa adotada por

indivíduos ou grupos, em função da incapacidade do Estado em exercer com eficiência a atividade

da segurança pública;

4º) as empresas de segurança privada, em função de sua institucionalização e expansão

num espaço de tempo relativamente curto, como objeto específico de análise que descaracteriza a

idéia da privatização da segurança como sendo de caráter residual e medida isolada adotada por

alguns indivíduos;

5º) uma descrição da atividade desenvolvida pelas empresas de segurança privada no

Rio de Janeiro e, em linhas gerais, no Brasil;

6º) um histórico do surgimento e desenvolvimento destas empresas, dando especial

destaque aos aspectos normatizadores do seu funcionamento;

7º) quest·es específicas referentes ao debate sobre o papel da segurança privada na

sociedade contemporânea.
68

Esperamos que a sistematização de informações e a reflexão aqui apresentadas tenham

possibilitado uma melhor compreensão do fenômeno da segurança privada de caráter empresarial

existente no Brasil.

Gostaríamos de voltar ao ponto inicial deste trabalho a fim de resgatar a discussão

sobre a segurança como dever do Estado. Esta atribuição constitucional, a nosso ver, não se deu

por acaso e nem será, como muitos o querem, facilmente transferida para a iniciativa privada sem

que altos custos sejam impostos ao conjunto da sociedade.

A pergunta que continua a nos intrigar é: se a qualidade dos serviços de segurança

pública está ruim, por que não tentar melhorá-los ao invés de substituí-los por empresas

particulares? Por que não se pode apostar na eficiência da polícia e dos outros órgãos do sistema

de justiça criminal, a fim de que os mesmos tenham maior credibilidade e legitimidade junto à

população?

Se uma parte da resposta a estas perguntas reside nas dificuldades inerentes ao próprio

Estado que, como já afirmou Fiori (1992), não tem conseguido cumprir nem mesmo seus

compromissos mínimos, a outra parte encontra-se escamoteada por trás do discurso da eficiência

da segurança privada e da ameaça da expansão descontrolada da criminalidade. Vamos por partes.

A "indústria da segurança" ou, como chamou um jornalista, "o bom negócio que vive

do crime", depende da permanência do sentimento de insegurança da população para poder se

manter e se expandir.

"...perguntamo-nos: a quem interessa o estado de pânico, a


síndrome da insegurança? Por que a insistência no item policiamento, e só
nele? Por que se alega sistemática e obstinadamente que a cidade está
despoliciada? Por que se tenta provar que o policiamento ostensivo ou é
ineficiente ou é inexistente? Por quê? Por que se tenta provar que a Polícia
Militar é um caso perdido?
Os brasileiros já consumimos de tudo: plástico, bicicleta,
eletrodomésticos, roupas etc. A nossa preocupação agora é com a expansão
da 'indústria da segurança`. Pretende-se transformar a segurança pública em
artigo de consumo, em torno do qual proliferam as empresas particulares de
segurança e as guardas de todo o gênero. E a síndrome vai mais adiante. É
69
preciso deixar o cidadão bem inseguro, bem vulnerável, com pavor. Do
contrário ele não vai comprar os equipamentos eletro-eletrônicos que
constituem toda a parafernália consumista dessa indústria." (SILVA, 1985)

Raciocinando nesta linha, poderíamos concluir que a crítica à ineficácia dos serviços de

segurança pública e a necessidade de consolidar a "síndrome da insegurança" são dois lados da

mesma moeda.

O problema que gostaríamos de levantar, porém, é o seguinte. Se a segurança passa a

ser, como lembrou Paixão (1991), um bem semi-público e divisível, um produto de maior ou

menor valor dependendo das suas características e contra-indicações, isto significa que alguns

poderão e irão querer pagar por ela e outros não. E isto significa, também, que alguns se

utilizarão dos serviços privados de segurança contra aqueles que estão de fora do seu círculo

imediato, contra os "outros", os desconhecidos, os perigosos, aqueles todos que potencialmente

poderão tornar-se ameaça. Em resumo, poderíamos concordar que: "É um problema seríssimo,

porque a população acaba ficando com menos segurança, para que esse pessoal trabalhe para as

elites", como afirmou Fernando Bandeira (Jornal do Brasil, 06.07.90).

É neste sentido que gostaríamos de enfatizar aqui como o tema da segurança e da

criminalidade são paradigmáticos para que pensemos sobre as dimensões do público e do privado

em nossa sociedade e, ao mesmo tempo, sobre os processos de diferenciação social em curso.

Teresa Caldeira expressa muito bem esta dimensão:

"A discriminação social expressa no discurso da violência, o


apoio ao uso da força e a ênfase na privatização, a meu ver, são questões
bem mais amplas do que as do crime e da segurança, mas encontram aí um
excelente meio de expressão. Do ponto de vista das elites, a ênfase na
necessidade de uma melhor segurança, geralmente privada, parece ser uma
resposta ao que elas sentem como sendo uma invasão indevida da cidade e do
espaço da cidadania pelas camadas populares e pelas minorias. (...) Trata-se
de criar novas ordens privadas - já que uma ordem global não parece ser mais
exeqüível - onde seja possível manter os privilégios de classe. Assim, a
segurança (...) parece servir como emblema básico para que as camadas
médias (...) abandonem o espaço público que antes ocupavam nas cidades
para viver nos seus condomínios fechados, nas suas ruas fechadas por
70
correntes (...) sempre guardadas por altos muros, equipamentos eletrônicos e,
se possível, por vigilância privada.(...) É por esse caminho que segurança vira
sinônimo de exclusão, de distinção, de status." (1991)

Este é, ao nosso ver, o entendimento mais correto que podemos ter do fenômeno da

privatização da segurança institucionalizada. E, não só da segurança, mas de outros serviços

básicos a que a população tem direito. Como nos dizia o delegado da DSOS, "nós, da classe

média, temos que colocar nossos filhos na escola particular, ter plano de saúde privado, usar

nosso carro para ir para ao trabalho, porque o serviço público está ineficiente e não pode nos

atender. Assim também acontece com a segurança".

Sem dúvida, estes são bons exemplos de serviços públicos que já foram em parte

privatizados em nosso país, ao menos para aqueles que podem pagar. No que diz respeito à

segurança, entretanto, a privatização parece ser uma solução menos "simples", na medida em que,

quando eu me protejo, possivelmente estou isolando e colocando em risco a vida de qualquer

estranho, potencialmente suspeito caso não tenha "boa aparência". O limite entre o direito

individual (privado) à proteção e a ameaça à segurança (pública) dos demais cidadãos, é,

portanto, bastante tênue.

Por outro lado, a fragilidade dos mecanismos de controle sobre a atuação da segurança

privada deixa margem para que esta atue, como já foi apresentado, acima da lei, levando a

possíveis arbitrariedades que se confrontam com os objetivos de uma sociedade democrática.

"A consolidação da ordem democrática envolve tanto o controle


institucional do uso privado da violência na resolução de conflitos quanto a
contenção do uso da violência pelo Estado através de normas explícitas que o
regulam." (PAIXÃO, 1988)

É nesta linha que vemos, portanto, a continuidade da reflexão aqui proposta.

Acreditamos ter mostrado como se deu a institucionalização e a expansão dos serviços de

segurança privada, levantando os seus principais problemas. Cabe agora enfrentar os dilemas

colocados para que a segurança de todos os cidadãos esteja garantida pelo Estado, seja através de
71

um maior controle das empresas privadas ou do melhor cumprimento daquela que ainda

consideramos entre uma de suas atribuições básicas: a segurança pública.

Esta discussão, ao nosso ver, desemboca naturalmente no debate sobre o acesso do

conjunto da população a direitos básicos, constituintes da cidadania, que continuam a ser

amplamente desrespeitados.

E aqui referimo-nos especialmente à constituição dos direitos civis no Brasil,

considerados como o pilar sobre o qual os direitos políticos e sociais podem se desenvolver

plenamente (CARVALHO, 1992).

Quando estamos falando aqui sobre o limite legal da atuação da segurança privada, as

arbitrariedades cometidas e a exacerbação de medidas de proteção e defesa que têm sido tomadas

por indivíduos sozinhos ou em grupo, estamos na verdade falando também de limites colocados

ao exercício dos direitos civis no Brasil.

O direito a não ser processado e sentenciado a não ser pela autoridade competente, não

ser preso a não ser em flagrante ou por ordem judicial e não ser privado da liberdade sem o

devido processo legal choca-se com a existência de mecanismos privados e legalizados que

controlam e vigiam a vida dos cidadãos diariamente, chegando às vezes ao extremo de exercer

seu poder de justiça acima da lei.

A conquista dos direitos civis no Brasil, a nosso ver, passa também pelo maior controle

da política de segurança pública e, dentro dela, por uma discussão do papel desempenhado pela

segurança privada.

Carvalho (1992) afirma que "sem a garantia das leis civis, é ilusória a cidadania civil, é

ilusória a esperança do fortalecimento da independência pessoal." E continua:

"Ninguém fala em reforma da justiça neste país. No entanto todos


sabem que ela é inoperante no que se refere à maioria da população. Na
região do Rio de Janeiro (...) falar de justiça é piada. A polícia é vista como
inimigo (...) Numa situação dessas é impossível o desenvolvimento de uma
cidadania."
72

Nós ousamos acrescentar que também é dificultado o exercício da cidadania numa

sociedade que institucionaliza e, ao mesmo tempo, fiscaliza de forma tão frágil sistemas privados

de manutenção da ordem e da segurança pública.


73

ANEXO 1

Relação das empresas de segurança privada em funcionamento no município do Rio de Janeiro

(1992):

a) Empresas sindicalizadas:

AAIB VISE
SERVIG ARKI
VIGBAN POCAPO
VIGFORT DINÂMICA
AGENTS EXECUTIVE SERVICE
SPEV ESTRELA AZUL
CONFEDERAL LIVISEG
PLESVI (*) MASEL
REAL PIRES
TRANSEGUR PROTEGE
WARRANT SEG
BICAM PROFISSIONAL
ESIC SEPROVIG
PROBAN SESVI
CENTAURO (*) TRADICOM
THOR ZENOP
SERAUCO TRANSPREV
TRANSFORTE SBIL

TOTAL: 36

(*) irregular em 1987


74

b) Empresas não sindicalizadas:

ABS
APOLO
BERTEL
ANTÔNIO MARINHO
PRIVACY
SADI
VIGLEX
STARK
ESQUEMA ASSESSORIA COMERCIAL
LACROM
SR
PRO-SEG
TOTAL
MINASFORTE
RIOFORTE (**)
SOS PLANEJAMENTO TÉCNICO E ASSES. SEG. LTDA (***)
VEZÔ (***)
BRAZILFAIR (***)
PIAUÍ (***)

TOTAL: 19

(**)legalizada em 1987, após ter sido extinta por irregularidades com o nome de SERTEL.
(***) denunciada pelo SINESV por irregularidades em 1992 (julho/agosto).

TOTAL DAS EMPRESAS SINDICALIZADAS E NÃO SINDICALIZADAS: 55


75
ANEXO 2

Entrevistas realizadas que subsidiaram as informações utilizadas neste trabalho:

- Prof. Gisálio Cerqueira Filho, diretor geral do CEUEP (Centro Unificado de Ensino e
Pesquisa), vinculado à Vice-governadoria do Estado do Rio de Janeiro.

- Dra. Vera Malagutti, diretora geral da Vice-governadoria do Estado do Rio de Janeiro.

- Cel. PM Carlos Magno Nazareth Cerqueira, Secretário de Estado da Polícia Militar do


Estado do Rio de Janeiro.

- Cel. PM Celso de Oliveira Guimarães, Assessor Técnico de Assuntos Especiais da Secretaria


de Estado da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro.

- Dr. Nilo Batista, Secretário de Estado de Justiça, Polícia Civil e Vice-Governador do Estado
do Rio de Janeiro.

- Dr. Jorge Cipriano Alves, delegado, diretor da Divisão de Segurança de Órgãos e Sistemas,
da Secretaria de Estado de Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro.

- Dr. Luís Carlos da Silva, Secretário do Sindicato dos Empregados em Empresas de


Vigilância e Transporte de Valores do Rio de Janeiro.

- Dr. Fernando Bandeira, presidente do Sindicato dos Empregados em Empresas de Vigilância


e Transporte de Valores do Rio de Janeiro; ex-deputado estadual.

- Dr. Cícero Sílvio Pontes Pinho, Agente do Departamento de Polícia Federal; presidente-
interino da Comissão de Vistoria das Empresas de Vigilância e Transporte de Valores da
Superintendência Regional do DPF no Rio de Janeiro.

- Dr. Alfredo Syrkis, vereador pelo PV; presidiu na Câmara Municipal do Rio de Janeiro uma
Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a apurar a utilização irregular de seguranças,
agressões e crimes ocorridos em estabelecimentos comerciais.
76

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